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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIA DA ASSEMBLEIA NACIONAL

DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 159

ANO DE 1960 30 DE MARÇO

ASSEMBLEIA NACIONAL

VII LEGISLATURA

SESSÃO N.º 159, EM 29 DE MARÇO

Presidente: Exmo. Sr. Albino Soares Pinto dos Reis Júnior

Secretários: Ex.mos Srs. Fernando Cid Oliveira Proença
António José Rodrigues Prata

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 16 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia. - foi aprovado o Diário das Sessões n.º 158.
Deu-se conta do expediente.
O Sr. Presidente comunicou que recebera da Presidência ao Conselho, para efeitos do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, vários decretos-leis.
O Sr. Deputado Manuel Cerqueira Gomes referiu-se à figura do Prof. Gregorio Marañon.
O Sr. Deputado Virgílio Cruz requereu informações sobre entradas.
O Sr. Deputado Homem de Melo falou sobre as províncias ultramarinas e solicitou o revigora atento financeiro dos Transportes Aéreos Portugueses.
O Sr. Deputado Alberto Cruz ocupou-se de problemas turísticos e económicos do Minho.
O Sr. Deputado Carlos Moreira lamentou não ter recebido ainda todas as informações constantes do seu requerimento de 16 de Outubro de 1958.

Ordem do dia. - Prosseguiu a discussão na generalidade da proposta de lei sobre a reorganização dos desportos.
Falou o Sr. Deputado Mário de Oliveira.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 18 horas.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

Adriano Duarte Silva.
Afonso Augusto Pinto.
Agostinho Gonçalves Gomes.
Aires Fernandes Martins.
Alberto Carlos de Figueiredo Franco Falcão.
Alberto Cruz.
Alberto Henriques de Araújo.
Alberto Pacheco Jorge.
Albino Soares Pinto dos Reis Júnior.
André Francisco Navarro.
Antão Santos da Cunha.
António Bartolomeu Gromicho.
António Calapez Gomes Garcia.
António Carlos dos Santos Fernandes Lima.
António de Castro e Brito Meneses Soares.
António Cortês Lobão.
António Jorge Ferreira.
António José Rodrigues Prata.
António Pereira de Meireles Rocha Lacerda.
Artur Águedo de Oliveira.
Artur Máximo Saraiva de Aguilar.
Artur Proença Duarte.
Augusto Duarte Henriques Simões.
Avelino Teixeira da Mota.
Camilo António de A. Gama Lemos de Mendonça.
Carlos Alberto Lopes Moreira.
Carlos Coelho.
Carlos Monteiro do Amaral Neto.
Castilho Serpa do Rosário Noronha.
Domingos Rosado Vitória Pires.
Duarte Pinto de Carvalho Freitas do Amaral.
Ernesto de Araújo Lacerda e Costa.
Fernando Cid Oliveira Proença.
Francisco Cardoso de Melo Machado.
Francisco José Vasques Tenreiro.

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Frederico Bagorro de Sequeira.
Henrique dos Santos Tenreiro.
Jerónimo Henriques Jorge.
João Augusto Marchante.
João Mendes da Gosta Amaral.
João Pedro Neves Clara.
Joaquim Mendes do Amaral.
Joaquim Pais de Azevedo.
Joaquim de Pinho Brandão.
Jorge Pereira Jardim.
José Dias de Araújo Correia.
José Fernando Nunes Barata.
José de Freitas Soares.
José Garcia Nunes Mexia.
José Guilherme de Melo e Castro
José Hermano Saraiva.
José Manuel da Costa.
José Monteiro da Rocha Peixoto.
José Rodrigo Carvalho.
José Rodrigues da Silva Mendes.
José dos Santos Bessa.
José Sarmento de Vasconcelos e Castro.
José Venâncio Pereira Paulo Rodrigues.
Laurénio Cota Morais dos Reis.
Luís de Arriaga de Sá Linhares.
Luís Tavares Neto Sequeira de Medeiros.
Manuel Cerqueira Gomes.
Manuel Colares Pereira.
Manuel José Archer Homem de Melo.
Manuel Lopes de Almeida.
Manuel Maria de Lacerda de Sousa Aroso.
Manuel Maria Sarmento Rodrigues.
Manuel Seabra Carqueijeiro.
Manuel de Sousa Rosal Júnior.
Manuel Tarujo de Almeida.
D. Maria Margarida Craveiro Lopes dos Reis.
Mário Angelo Morais de Oliveira.
Mário de Figueiredo.
Martinho da Costa Lopes.
Paulo Cancella de Abreu.
Purxotoma Ramanata Quenin.
Ramiro Machado Valadão.
Rogério Noel Peres Claro.
Sebastião Garcia Ramires.
Tito Castelo Branco Arantes.
Urgel Abílio Horta.
Virgílio David Pereira e Cruz.
Vítor Manuel Amaro Salgueiro dos Santos Galo.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 83 Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.

Eram 16 horas e 30 minutos.

Antes da ordem do dia

O Sr. Presidente: - Está em reclamação o Diário das Sessões n.º 158.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Se nenhum Sr. Deputado deseja fazer qualquer reclamação sobre esto Diário das Sessões, considero-o aprovado.

Deu-se conta do seguinte

Expediente

Telegramas

Vários a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Calheiros Lopes em defesa dos interesses ribatejanos.
Do Sindicato Nacional dos Engenheiros Auxiliares, Agentes Técnicos do Engenharia e Condutores a apoiar a intervenção do Sr. Deputado Saraiva de Aguilar sobre a situação dos agentes técnicos de engenharia.

O Sr. Presidente: - Enviados pela Presidência do Conselho, para cumprimento do disposto no § 3.º do artigo 109.º da Constituição, encontram-se na Mesa os n.ºs 64, 65, 66, 67 o 68 do Diário do Governo, 1.ª série, respectivamente de 18, 19, 21, 22 e 23 do corrente mês, que inserem os seguintes Decretos-Leis: n.º 42 877, que determina constituam encargo do Estado as despesas com as provas psíquicas, exames médicos e provas atléticas necessários à avaliação das características psicofisiológicas dos indivíduos candidatos a pessoal da Força Aérea; n.º 42 878, que abre créditos no Ministério das Finanças, a favor do Ministério do Ultramar, destinados à realização de despesas não previstas no orçamento respeitante ao corrente ano económico do segundo dos mencionados Ministérios; n.º 42 880, que regula a situação do pessoal da Administração-Geral do Porto de Lisboa e da Administração dos Portos do Douro e Leixões que não tenha podido ou não possa beneficiar das disposições do artigo 115.º do Decreto-Lei n.º 36 976 ou das do artigo 83.º do Decreto-Lei n.º 36 977, o ainda daquele que tenha sido ou venha a ser desligado do serviço por motivo de incapacidade física, devidamente verificada; n.º 42 881, que regula a admissão de professores civis para a regência das cadeiras e aulas práticas de carácter académico da Escola Naval, e n.º 42 883, que da nova redacção ao artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 42 117 (Fundação Raquel e Martin Sain).

Pausa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra antes da ordem do dia o Sr. Deputado Manuel Cerqueira Gomes.

O Sr. Manuel Cerqueira Gomes: - Sr. Presidente: faleceu anteontem em Madrid o Prof. Gregorio Maranion. A arteriosclerose, a temível e traiçoeira doença contra a qual se engatilham em vão os esforços terapêuticos e que tantos cérebros tem aniquilado, acaba de apagar um dos que mais luziam na medicina do nosso tempo.

O Sr. Alberto Cruz: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Não vou traçar a sua biografia, que anda suficientemente esmiuçada por vários lados. Quero neste lugar - alta representação do pensar e do sentir da Nação Portuguesa - destacar da personalidade de Marañon algumas facetas merecedoras do nosso apreço, da nossa gratidão e do nosso luto.
Professor de Endocrinologia da Universidade de Madrid, ergueu a sua disciplina - por poucos lugares do Mundo com foros de cátedra - a vértices de excepção. É extensíssima a fila dos seus trabalhos, muitos vertidos para idiomas estranhos e tantas vezes filados por outros mestres eminentes.

O Sr. Alberto Cruz: - Muito bem!

O Orador: - Há neles uma inteligência clara e arguta, que encanta e ilumina; mas há, sobretudo, um amor da observação, uma tendência objectiva, um contacto com o homem, com o doente, com a realidade da vida vivida, que crescem de trabalho para trabalho e do livro para livro acadinham uma doutrinação médica.
Marañon foi primordialmente um clínico. Para ele as fórmulas, a técnica e a experimentarão não represen-

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tavam a medicina, serviam a medicina; o essencial, escreveu certo dia, é a observação inteligente do homem e da história natural do ser humano.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Pautou a doença, como «função do indivíduo», e que «à noção de doença se sobrepõe a do conhecimento do indivíduo». Era pelos caminhos da anamnese que ensinava a checar à pessoalíssima equação de cada um, e enamorou-se da sua endocrinologia, porque através dela, podia atingir as «raízes mais finas e expressivas da personalidade».

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - O que há nesta vocação naturalista de Marañon? Doutrina de momento? Mais uma face? Mais um aspecto? Há a visão global do homem, há o homem emoldurado no quadro das suas realidades naturais - uma unidade e um todo ordenado, produto da conjunção dos factores pessoais com os da herança e os do meio. Este humanismo médico trouxe-o Marañon para os seus ensaios literários e os seus estudos históricos. É outro expoente a fixar. Em toda a beleza da sua prosa, rica, clara, transparente como a luz mediterrânea que a filigranou, o seu Enrique IV, o sen Amiel, o seu Tiberio, o seu Conde-Duque o seu Antonio Perez, são homens estudados à maneira médica, histórias clínicas em que a herança, o meio, a educação, o ambiente, a constituição somática e psíquica se desfibram e se pesam na quota em que deflagram os actos banais ou transcendentes.
A sua obra - médica ou literária, duas expressões da mesma formação, qual delas a mais sedutora - é, afinal, o homem, vive toda do homem, decompondo-lhe os elementos constitutivos, esclarecendo-o nas forças determinantes, estudando-o no mistério dos conflitos instintivos, na projecção social dos valores íntimos, até ajudando a que se compreenda, se melhore e se engrandeça.
Não admira, por isso, que Marañon fosse um espírito finíssimo, compreensivo, indulgente, rigorosamente lógico, com o seu saber naturalista. Se o Providência o tinha dotado de uma ampla bondade inicial, ele soube facetá-la e acomodá-la para aceitar e respeitar os critérios díspares. Marañon ensinava no Instituto de Patologia Médica, lugar obrigado para quantos cientistas passassem por Madrid; e os que viveram algum dia a lição daquele Instituto aprenderam bem a nobre humildade das opiniões. O que ficou pelo sen admirável livro Critica de la Medicina Dogmatica mostrou igualmente que em medicina não há lugar para dogmatismos pedantes e solenes.

O Sr. Alberto Cruz: - Muito bem!

O Orador: - A medicina é feita do verdades transitórias ou de pedaços de uma verdade cujo conteúdo se alarga na medida em que irrompem novos conhecimentos.
Pelos seus valores a pátria não lhe regateou as honrarias: a pujança, científica deu-lhe na Academia das Ciências Exactas o lugar que ficara vago desde Cajal: a excelência da medicina colocou-o cedo na Academia de Medicina; a beleza do estilo abriu-lhe as portas da Academia da Língua; o cuidado das investigações históricas levou-o para a Academia da História; e a original interpretação de El Greco engalanou-lhe a entrada na Academia das Belas-Artes.
Mas, para além das próprias fronteiras, o Prof. Marañon, que muito andou, que tanto viajou, que afanosamente participou em conferências e congressos, teve o reconhecimento de figura cimeira da medicina mundial; várias Universidades, desde as da América Latina à de Paris, o enobreceram com graus académicos. E até entre nós o sábio endocrinologista recolheu a sua exaltação como doutor honoris causa, primeiro, há catorze anos, pela Faculdade de Medicina do Porto, depois, e ainda há cinco meses, pela Faculdade de Medicina de Coimbra. Foi ali, na nossa velha cidade universitária, que Marañon recebeu a sua última consagração oficial, numa cerimónia cheia de austeridade e de pompa e na qual os seus méritos de cientista se glorificaram a par das suas riquezas do humanista.
Para nós ainda conta outra razão de luto - Marañon era um grande amigo de Portugal. Sempre com a maior alegria ele via entrar médicos portugueses no seu serviço; muitos lá aprenderam ou se aperfeiçoaram o alguns tiveram a honra de preleccionar na sua cátedra. Por numerosos vezes até nós veio trazer a sua palavra brilhante e os ensinamentos da sua longa prática. Era uma carícia ouvi-lo elogiar as belezas da nossa terra, quando por ela circulava. Lembro-me de o trazer da fronteira para o Porto num formoso dia de Primavera; os campos do Minho pareciam em festa garrida e, ao rolar pela estrada ladeada por flores sem fim, quase um roseiral contínuo, repetia embevecido: «É divino o vosso Portugal!», e a par da nossa natureza Marañon firmava, como deixou em certo passo, que os «largos anos de amor a Portugal» eram também «de estudo da sua humanidade e do seu espírito, da sua realidade viva, da sua ciência e da sim arte».
Em 1954, por motivo da festa de consagração da medicina, o Prof. Marañon pronunciou, na Sociedade do Geografia, um memorável discurso e disse carinhosamente:

Conheço Portugal e amo-o, com entranhável amor. Pelo meu retiro de Toledo passa o mesmo Tejo, que morre, largo como um mar, aqui em Lisboa; e parece-me que as suas águas, que enlaçaram o espírito de Camões e o de Garcilaso, servem agora, como sempre, de laço vivo, a nossa amizade e as nossas comuns preocupações.

Estão ainda nos ouvidos de quantos assistiram à soleníssima cerimónia as palavras que Marañon dirigiu a Salazar: «Saúdo de um modo especial o Sr. Presidente do Conselho, a quem não quero chamar somente com o seu título, mas com o seu nome, ao Professor Salazar; porque, para mim, a sua qualidade de homem e a sua qualidade de universitário está por cima da sua alta representação social; já que a sua grande obra política se deve, não a presidir ao Governo de Portugal, mas que o Governo de Portugal esteja presidido, precisamente, pelo Mestre Salazar». Foi nessa oportunidade que Marañon conheceu pessoalmente o nosso Presidente do Conselho, na sequência lógica da grande admiração que lhe votava.
Tive eu a felicidade de assistir ao diálogo que por mais de uma hora se manteve entre aqueles dois eminentes espíritos. E sabe-mo bem revelar aqui um episódio inédito: enquanto regressávamos ao hotel e Marañon me confessava a evidência da forre intelectualidade do Salazar, perguntou estranhado:

Mas, então, é assim que vive este homem, uma criada de avental branco a abrir-nos a porta, ele próprio depois da entrevista nos acompanha até à saída da casa, sem um secretário, sem um ajudante, sem uma guarda, sem uma continência, sem armas em sentido, é assim, nesta modéstia, que vive o vosso Primeiro-Ministro?

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A entrevista e as circunstâncias impressionaram decisivamente o superior espírito de Marañon. E ainda há pouco li num diário madrileno, pela pena de um conhecido jornalista, como Marañon, nas tardes do seu Cigarral de Toledo, onde se juntavam altas personagens das letras, da, ciência e da nobreza, contava a visita, a Salazar, por ele considerado o dirigente político cerebralmente melhor organizado e equilibrado.
Com a morte do Prof. Marañon perde a ciência mundial um cultor excepcional. Perde a civilização ocidental um representante de primeira grandeza. Perde a Espanha o seu espírito de maior projecção. Perde Portugal um grande amigo. E curvando-me ante a nobilíssima figura do Mestre de Madrid, presto à sua memória o meu testemunho de apreço como médico e como homem e agradeço, estou certo, em nome de nós todos ...

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - ... o «entranhável amor» que dedicou à terra e à gente portuguesa. Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Virgílio Cruz: - Sr. Presidente: pedi a palavra para mandar para a Mesa o seguinte

Requerimento

«A fim de me Habilitar com os elementos necessários a tomar parte no debate do aviso prévio sobre as nossas estradas, aviso prévio recentemente anunciado pelo ilustre Deputado Sr. Melo Machado, requeiro, ao abrigo do artigo 96.º da Constituição, que, pelo Ministério das Obras Públicas, me sejam fornecidos os elementos seguintes:

a) Indicarão das verbas despendidas em conservação corrente, reparação e construção das estradas nacionais em cada um dos últimos cinco anos, discriminando-as por distritos;
b) Meios (dotações e pessoal) que a Junta Autónomas de Estradas conta mobilizar nas reparações urgentes e indispensáveis dos danos causados pela invernia no itinerário Lisboa-Porto para que o seu pavimento permita a circulação em condições normais;
c) Meios que a Junta Autónoma de Estradas couta mobilizar para acudir aos estragos que a persistência e intensidade das chuvas tem provocado nas estradas nacionais de todo o País. Sua discriminação por distritos;
d) Extensão de estradas nacionais, em cada categoria, com a largura da faixa de rolagem de 6 m ou mais e com largura inferior a 6 m;
e) Custos da ponte da Arrábida e acessos, estrada marginal do Douro e auto-estrada Lisboa-Vila Franca de Xira».

O Sr. Homem de Melo: - Sr. Presidente: o legítimo e extraordinário interesse que a opinião pública metropolitana vem manifestando pelos acontecimentos que agitam a África de norte a sul tem-se evidenciado, sem sombra de dúvida, na Assembleia Nacional, que assim se desempenha honrosamente de uma das mais relevantes tarefas: qual seja a de se fazer eco dos interesses, anseios e preocupações do povo que a elegeu.
Trago hoje uma modesta achega aos variados problemas que resultam da dispersão geográfica do mundo português, na medida em que se afigura essencial resolvê-los o mais rápida e eficientemente possível. Para tanto talvez não seja descabido recordar, como já escrevi algures, que a concepção política portuguesa, nos moldes em que se vem processando, não encontra semelhança na época que vivemos.
Portugal projecta-se em quatro continentes paralelamente, isto é: a metrópole deixou de ser o vértice de um sistema imparcial que fazia dos restantes territórios parcelas politicamente secundárias, a que se dava o nome de colónias. Esta projecção em paralelo tornou o Minho politicamente igual a Timor e este igual a Angola ou a Moçambique. Quer dizer: a expressão «solidariedade nacional indiscriminada» bem poderá considerar-se representativa da presença portuguesa na imensidade de quatro continentes.
Ora bem: é mister que os factos, as realizações e o processo de actuação política acompanhem de perto o espírito e a letra do texto constitucional, para que a força da nossa razão se imponha a consciência do Mundo sem subterfúgios ou hesitações; numa palavra: há que apagar, de uma vez para sempre, os defeitos da concepção colonialista, que fez a sua época, aproveitando-lhe, todavia, o imenso caudal de virtudes que a caracterizou.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Exa. dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Carlos Moreira: - Tenho estado a ouvir V. Exa. com toda a atenção, mas peço licença para notar que nós nunca fizemos colonialismo, mas fizemos colonização, no bom sentido do termo, do que não temos de nos arrepender.

O Orador: - Estou absolutamente de acordo com V. Exa.
Por outro lado, o ultramar aderiu tão entusiasticamente ao princípio integrador que não pode compreender diferenças sensíveis entre a teoria e a realidade.
Quem visitar Angola e Moçambique, por exemplo, não carecerá de muito tempo para se aperceber da sensibilidade quase doentia com que se recebem curtas afirmações proferidas na metrópole e certos factos que parecem destinados a negar os princípios à sombra dos quais se deverá processar a nossa acção.
Esboço meia dúzia de entre os muitos exemplos que poderia oferecer: é o caso dos que, olhando apenas para os interesses que advogam, não hesitam em proclamar a hegemonia económica da metrópole em face das restantes parcelas do mundo português, convidando o Governo a proteger tão-sòmente os interesses da indústria e do comércio metropolitanos (como se ainda hoje fosse possível viver-se ao sabor de ideias quinhentistas, pelas quais as províncias ultramarinas deveriam ser apenas a «árvore das patacas» a explorar pelo Europeu; como se a «solidariedade nacional indiscriminada» fosse apenas uma bandeira para uso externo e constituísse o símbolo de uma «política de mentira», denunciada pelo Presidente do Conselho nos alvores da Revolução Nacional!); é o caso ainda da existência de alfândegas e de peias burocráticas que dificultam a livre circulação dos produtos entre os vários territórios; é, depois, a existência de diferentes moedas, embora hoje com o mesmo nome e de valor aparentemente igual, mas que só valem em determinado circuito económico e geográfico do território português; é a dificuldade posta a circulação das pessoas, que não raro terão mais facilidades em emigrar para outro país do que em deslocar-se de uma província, como Trás-os-Montes, para outra província, portuguesa também,

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como Moçambique; é a diferenciação polítito-administrativa, que, se não é susceptível de desaparecer de uma vez, em face do diferente estádio de desenvolvimento das populações e dos territórios, deveria encaminhar-se muito mais rapidamente pura a igualdade (assim: porque há-de ter o Ministério do Ultramar serviços próprios de instrução e justiça, quando existem dois departamentos do Estado especializados e competentes em tais matérias?); é, finalmente, para não alongar a exemplificação, o desconhecimento, por parte de alguns dirigentes, das realidades políticas e económicas que caracterizam as nossas províncias ultramarinas e a indiferença manifesta-la por certa massa populacional metropolitana, que ainda não se apercebeu de que o futuro da Pátria se joga no ultramar.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Ora, Sr. Presidente, se, como corolário da concepção integradora que corajosamente adoptamos. Macau e a índia, Gabo Verde e a Guiné, S. Tomé e Timor são parcelas territoriais semelhantes em direitos e deveres a quaisquer outras da metrópole, e como tal fazem parte integrante e inalienável do território português (ainda que um cada um incidam, como é natural, problemas específicos), Angola e Moçambique, pela sua vastidão e riqueza (efectiva e potencial), têm em si e por si outro atributo: não só são essenciais para o futuro desenvolvimento económico do País, como constituem hoje a própria razão de ser de Portugal como estado soberano e independente.
Neste ser ou não ser encontro fundamento para a preocupação com que me debruço sobre as comunicações entre as várias parcelas do mundo português, designadamente entre a metrópole, berço da nacionalidade, e Angola e Moçambique, fonte da nossa futura riqueza e penhor da nossa própria sobrevivência.
Passo em claro as comunicações por via marítima, em plena euforia de desenvolvimento; não desejaria, no entanto, fazê-lo sem que uma palavra ficasse a recordar o homem que teve o mérito de iniciar a renovação da nossa marinha mercante e que hoje tão nobre e dignamente ocupa a chefia do Estado.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Mas já não posso silenciar a minha preocupação no que respeita às comunicações aéreas.
Na era interplanetária que se aproxima, e que talvez inconscientemente já vivamos, o País tem de assegurar, faça os sacrifícios que faça, uma rápida, eficiente e constante ligação da metrópole com as duas mais importantes províncias ultramarinas.
Permito-me considerar o facto essencial e, sem temor das palavras, quero dizer, no seio da Assembleia, que da perfeição das comunicações dependerá em grande parte a integridade do território português.
E porque julgo indesmentível o asserto, todos os sacrifícios, todas as actualizações, todas as audácias se justificam. Peço perdão à Câmara, mas queria dizer mais: impõem-se todos os sacrifícios, todas as actualizações, todas as audácias.
Passageiro habitual tios Transportes Aéreos Portugueses e com outras ligações à companhia que para o caso não são chamadas, posso fazer um depoimento ao mesmo tempo objectivo e relativamente autorizado.
Com um pessoal de voo que não teme confronto em qualquer parte do Mundo ...

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - ... com um presidente do conselho da administração ainda há pouco investido, mas de categoria invulgar, os T. A. P., apesar de tudo, e esforçando-se por cumprir, não cumprem cabalmente a tarefa que lhes está confiada.

O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!

O Orador: - Não cumprem, nem poderão cumprir, enquanto não lhes furem facultados os meios e as condições que lhes permitam acompanhar dia a dia o aliás estonteante progresso da aviação comercial.
Efectivamente, pretender assegurar as ligações aéreas entre a metrópole e as duas nossas maiores províncias com três aparelhos (ainda há alguns anos considerados a última palavra da aeronáutica comercial, mas hoje pràticamente, desactualizados, em comparação com a gama dos Boeing, Caravelle e Comet, que o jacto impôs o celebrizou). pretender assegurar as nossas ligações aéreas com esses três Super-Constellation é utópico: só um milagre poderia realizá-lo. E manda a verdade dizer-se que o esforço dos T. A. P., designadamente das suas tripulações, tem andado paredes meias com o sobrenatural!
Mas é tempo, Sr. Presidente, é tempo de se acabar com as improvisações e de se solucionar a conjuntura tão generosamente quanto os interesses em causa justificam e a grandeza e essencialidade da tarefa impõem, antes que uma grande desgraça aconteça e os T. A. P. deixem de contar coma única sedução que, louvado Deus, ainda lhes é lícito manter: o facto de nunca terem sofrido qualquer desastre em voo comercial.
De mãos dadas comigo, ainda na semana passada a imprensa, sempre atenta, de uma forma geral, aos grandes problemas nacionais, se fazia eco, através do Diário Popular, da irregularidade que parece ter voltado a caracterizar os T. A. P., que nunca se sabe quando partem, nem quando chegam.
Era fatal.
Só quem não conhecesse as limitações em que a empresa se vê forçada a trabalhar e as circunstâncias em que actua poderia ter julgado que os problemas se haveriam de resolver com a substituição dos homens, quando a solução terá de só buscar no revigoramento, à escala nacional, da capacidade financeira da empresa e na consequente compra de aviões e do indispensável material de apoio.
Dentro de alguns meses (e seria ridículo querer passar por profeta declarando-o) nenhuma das companhias aéreas do Mundo terá ao seu serviço para grandes distâncias aviões de hélice - o que significa que os T. A. P. têm de acompanhar a evolução geral, sob pena de se tornarem completamente inadequados e inadaptados ao fim que visam.
Na era vertiginosa do jacto e dos foguetões siderais, as 23 horas (não raro bastante dilatadas ...) que os Super-Constellation gastam entre Lisboa e Lourenço Marques começam a ser inaceitáveis: qualquer jacto poderá transpor os 12 000 km em metade do tempo.
Não cuido necessário roubar agora à Câmara mais do que dois minutos para concluir.
Sr. Presidente: do que fica esboçado afigura-se-me lícito extrair três axiomas:
1.º As comunicações aéreas com ultramar, designadamente com Angola e Moçambique, são essenciais, pelo que devem situar-se na primeira linha de preocupações do Governo.
2.º Os T. A. P., embora actuando o melhor possível em face das circunstâncias e limitações

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apontadas, não podem desempenhar-se cabalmente daquela missão essencial, pelo que é mister proceder a uma profunda e rápida reforma de estrutura.
3.º A era do jacto impõe, antes mesmo da aquisição de aparelhos, a adaptação dos aeroportos do Luanda e Lourenço Marques a aviões desse tipo - adaptação que deverá iniciar-se o mais rapidamente possível, para que não venha a acontecer o que se verificou em Lisboa: as obras iniciaram-se quando já em todas as grandes capitais da Europa se realizavam viagens regulares com os Boeing 707, do que, salvo erro, tem resultado um sensível descréscimo de prestígio e de movimento, especialmente em passageiros, no aeroporto da Portela.

Estou certo, Sr. Presidente, de que os ilustres titulares das pastas do Ultramar e das Comunicações não deixarão de ponderar as palavras que acabo de proferir. E se concluírem como eu concluí, também estou certo de que o problema dos transportes aéreos para o ultramar será resolvido com o acerto, o interesse e a eficiência que aqueles dois distintos governantes põem nos casos que são submetidos à sua esclarecida apreciação.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Alberto Cruz: - Sr. Presidente: em tempos, já aqui desta tribuna fiz referências pouco lisonjeiras ao facto de alguns departamentos do Estado teimarem no erro de não dar a conhecer a quem nos visita as belezas do Norte de Portugal, principalmente dessa encantada região do Minho, que, desde Santa Luzia, em Viana do Castelo, passando pelo monte da Franqueira, em Barcelos, subindo à montanha onde se implanta o triângulo turístico de Braga - Bom Jesus, Sameiro e Falperra -, até finalizar em Guimarães, com o seu monte da Penha, enche a vista de beleza e espiritualiza a vida, levando os homens a cantar um hino a Deus por dádivas de tão alto preço.

O Sr. António Lacerda: - Muito bem!

O Orador: - Como acréscimo dessas belezas paisagísticas, enxameiam por lá monumentos históricos, principalmente de arte religiosa, e desses destacam-se os templos românicos, quase todos restituídos hoje à sua traça primitiva pelo esforço e inteligência de quem superintende, nos monumentos nacionais.
Também são merecedores de minuciosa, visita os seus museus, onde se albergam verdadeiras preciosidades, como o que se encontra luxuosamente instalado nos Paços dos Duques, em Guimarães, por claríssima visão dos Ministérios das Finanças e Obras Públicas, e ainda os seus velhinhos castelos, onde nasceu Portugal e onde se escreveram as primeiras e gloriosas páginas da nossa história.
Pedi auxílio para os complexos problemas dessa região, não esquecendo a necessária e utilíssima propaganda de tudo o que por lá existe de belo e grandioso.
Tudo isso pedi porque o que na região abunda em riquezas paisagísticas se torna escasso em fontes de riqueza material para sustento e fixação à terra das centenas de milhares de habitantes que constituem a sua densíssima população.
Em relação a tudo o que aqui disse, entrou-se agora em caminho diametralmente oposto, e, por isso, venho hoje em nome dessa região, ...

O Sr. Duarte do Amaral: - Muito bem!

O Orador: - ... louvar e agradecer ao Governo a visita do secretário nacional da Informação, que, numa missão de justa compreensão e boa vontade, foi estudar localmente os problemas que lhe estão afectos, e as suas sugestões e claras declarações encheram de alegria todos os minhotos, habituados há muito a verem cumpridas as promessas, a que o Governo e os seus responsáveis nunca faltaram, salvo imperiosos e imprevistos motivos.
Sr. Presidente: esta minha pequena intervenção tem, pois, a finalidade de agradecer a visita do Sr. Secretário Nacional da Informação, que nas poucas horas passadas entre os homens do Norte teve o ensejo cie conhecer também a bondade e a carinhosa e proverbial hospitalidade daquele bom povo, que ainda trabalha rezando e cantando, apesar das dificuldade que o assoberbam e de um nível de vida que urge compatibilizar com as necessidades da hora presente.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Aproveito o ensejo para mais uma vez no decurso deste II Plano de Fomento apelar para o Sr. Ministro da Economia e Srs. Secretários e Subsecretários de Estado do Comércio, Agricultura e Indústria, a fim de que tenham sempre presente no seu espírito a necessidade de nessa superlotada região se criarem fontes de riqueza permanente que modifiquem para melhor a vida das suas gentes e lhes dêem, cada vez mais, o orgulho de proclamarem bem alto o seu portuguesismo e amor à terra onde nasceram e a que todos tanto queremos.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador fui cumprimentado.

O Sr. Carlos Moreira: - Sr. Presidente: na sessão de 16 de Outubro de 1958 apresentai, au abrigo das competentes disposições constitucionais e regimentais, um requerimento em que pedia que, por cada um dos respectivos Ministérios, me fossem fornecidos os seguintes elementos:

a) Importância das despesas com vencimentos, deslocações, ajudas de custo e similares efectivamente realizados com o Ministro, Subsecretário de Estado e pessoal dos respectivos gabinetes durante os anos económicos de 1951, 1954 e 1957;
b) Montante das verbas previstas para ocorrer aos encargos resultantes da aplicação dos Decretos-Leis n.ºs 41 824 e 41 825 até no fim do ano económico corrente (o ano de 1958);
c) Importância global, por cada Ministério, das despesas efectuadas com missões individuais ou colectivas ao estrangeiro em relação aos anos de 1951, 1954 e 1957;
d) Importância despendida com bolseiros ao estrangeiro e nota das publicações por tal motivo efectuadas quanto aos mesmos anos;
e) Idem, idem, em relação ao ultramar português;
f) Importância global das verbas despendidas directamente ou por via de subsídios, se os há, a quaisquer entidades individuais ou colecti-

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vas com a propaganda e demais despesas inerentes à eleição de cada um dos Presidentes da República.

Na sessão de 23 de Outubro do mesmo ano requeria igualmente que me fossem fornecidos os seguintes elementos:

a) Remuneração anual (compreendendo todos os proventos recebidos e sob qualquer forma) dos governadores, presidentes dos conselhos de administração, administradores, delegados do Governo ou cargos equivalentes, embora com diferente denominação, nos bancos, sociedades, companhias ou empresas, quer da metrópole, quer do ultramar, em cujo capital o Estado por qualquer forma comparticipe ou que sejam de utilidade ou interesse público - tudo relativo aos anos de 1943 a 1957, inclusive;
b) Se têm sido concedidos quaisquer benefícios ou subsídios além da aludida remuneração e, em caso afirmativo, quais e em que condições;
c) Se o imposto complementar devido é satisfeito pelos interessados acima referidos e, em caso negativo, quem o satisfaz;
d) Nota, por cada Ministério, dos pedidos de autorização, devidamente identificados, para acumular cargos ou exercer funções durante o mesmo período de tempo, isto é, de 1943 a 1957, inclusive;
e) Nota dos mesmos pedidos que tenham sido indeferidos com fundamento em incompatibilidade existente, referidos ainda ao mesmo período de tempo.

Na sessão de 24 de Fevereiro de 1959 insisti pela remessa dos elementos requeridos, afirmando:

Se os tempos tivessem demonstrado a desnecessidade de tais elementos, não me teria ficado mal dizer aqui que eles já não eram precisos, mas, ao contrário, Sr. Presidente, acontece que durante esses quatro meses os factos justificaram e confirmaram que tinha razão ao pedir os referidos elementos, para usar na medida que interessam ao bem comum.

Com data de 4 de Março de 1959, recebi um ofício do Sr. Deputado 1.º Secretário da Mesa acompanhado da remessa de elementos fornecidos até à data, e que são segundo o mesmo ofício, os seguintes:

Da Presidência do Conselho, satisfazendo, na parte que lhe compete, a alínea a) do referido requerimento, para o que se envia um mapa das remunerações dos delegados do Governo em 1957 e, liem assim, cópia das normas aprovadas no Conselho de Ministros de 18 de Dezembro de 1956 sobre o critério de determinação das aludidas remunerações;
Do Secretariado-Geral da Defesa Nacional e dos Ministérios das Obras Públicas e das Comunicações, fornecendo os elementos completos;
Dos Ministérios do Interior e da Saúde e Assistência, satisfazendo o pedido sobre acumulações;
Dos Ministérios da Marinha e do Ultramar, respondendo as alíneas a), b) e c) do requerimento e esclarecendo que não possuem elementos para satisfazer o solicitado nas alíneas d) e e).
Da mesma proveniência, e com a mesma data, recebi os elementos ali enunciados, e que são os seguintes:

Do Ministério das Finanças, dando informação acerca do solicitado nas alíneas a) e b) do referido requerimento e satisfazendo a alínea c) na parte que lhe diz respeito;
Do Secretariado-Geral da Defesa Nacional e dos Ministérios da Justiça, Exército, Marinha, Obras Públicas, Ultramar, Economia, Comunicações, Corporações e Saúde e Assistência, respondendo, em parte, às alíneas c), d) e e) e informando, quanto à alínea f), que não consta dos livros de registo de despesas daquele Ministério que só tenha processado qualquer despesa para o fim ali indicado.

De então até hoje, ou seja desde 4 de Março de 1959, não recebi quaisquer outros elementos, ou melhor, recebi o ofício n.º 585/09, que pouco adianta.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: permiti-me afirmar, ao insistir na sessão de 24 de Fevereiro de 1959 pela remessa dos elementos pedidos nas referidas sessões anteriores, que não expliquei nem fundamentei tais requerimentos - julgo até que não deveria fazê-lo, em face do Regimento -, mas é evidente, para quem os ler em toda a sua contextura e nas suas alíneas, que os elementos pedidos visam no fim primacial que hoje compete a esta Assembleia: a fiscalização da administração pública, entendendo-se por administração pública não só aquela que o é por força da sua categoria estadual, mas também certas instituições que representam um interesse marcadamente público. Refiro-me a bancos, companhias, empresas de várias ordens que têm funções de relevância na vida nacional e projecção que vai além de uma limitada concepção do papel que devem representar, porque constituem preocupação pública.
A verdade, porém, é que a escassez dos elementos que me foram enviados não permite um estudo sério dos problemas que suscitam e das soluções ou remédios que se impõem.
Devo, porém, à Câmara e ao País as explicações possíveis, e é essa a razão que me levou, passado um ano, a pedir a palavra para tal efeito.
Das seis alíneas contidas no primeiro dos requerimentos citados, só a respeito de uma - a primeira (certamente por provir de um só departamento, o Ministério das Finanças) -, os elementos fornecidos constituem base suficiente de informação. Não me tendo, porém, sido enviados os elementos a que se refere a alínea b), as conclusões ficam insuficientes.
Não deixa de ser curiosa e significativa a resposta dada pelo Ministério do Interior relativamente à alínea f) do meu requerimento do 16 de Outubro de 1958, resposta do seguinte teor: «Não consta dos livros processados qualquer despesa para o fim indicado».
Como não consta também das respostas de qualquer dos outros Ministérios (aliás parece ser ao do Interior que a despesa devia competir), chega-se fatalmente à conclusão de que ou nada se gastou (o que não é possível) ou a contabilização da despesa se não efectuou. Que se gastou muito ninguém terá dúvida, mas quanto e por que verba é que não se sabe.
Antes de terminar estas ligeiras considerações, não posso nem devo deixar de manifestar a justificada estranheza perante as respostas obtidas relativamente à, matéria das alíneas c) e d) do meu primeiro requerimento - já citado e transcrito em parte -, respostas que culminam com o envio das publicações efectuadas por motivo de bolseiros enviados ao estrangeiro. Não fiquei sabendo se as houve, nem quantas, pois a única que recebi é em demasia insuficiente para nela poder assen-

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tar muna conclusão o formar um juízo pelo menos claro e seguro.
Eis, Sr. Presidente e Srs. Deputados, as condições justificativas que só me impunha fazer para elucidação da minha a atitude perante a Câmara e perante o País.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr. Presidente: - Continua em discussão na general idade a proposta de lei sobre n reorganização dos desportos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário de Oliveira.

O Sr. Mário de Oliveira: - Sr. Presidente: o desporto assume em nossos dias transcendente importância social.
Como lazer, exerce sobre a juventude singular poder de atracção, na medida em que lhe proporciona a expansão ordenada das suas energias em plena floração e crescimento, enquanto a vida profissional ou estudantil lhe impõe monótona rotina ou forcado sedentarismo.
O sentido de competição que o desporto envolve, num apelo à força muscular, à destreza, ao espírito de luta, constitui, quando bem orientado, factor de especial relevo na preparação da juventude para o embate da vida.
Raro o desportista, que o é ou que o foi, onde se não reconhece indelevelmente o sinal desse preparo.
O desporto, de um modo geral, representa, efectivamente, precioso instrumento de educação do homem, quer pelo mentido de íntimo contacto que estabelece, entre as classes sociais, na vivência de um interesse comum, quer pela acção da vontade, que exercita e apura perante o imprevisto das circunstâncias suscitadas num lance de jogo, num movimento atlético ou num insucesso competitivo.
O despique - que é elemento especifico do próprio desporto - determina, por outro lado, o interesse de alcançar metas ideais de perfeição atlética, a que a medicina da especialidade e a educação física vão emprestando novas e acrescidas possibilidades.
O certo é que o poder de irradiação do desporto - hoje a polarizar a atenção de todas as classes sociais - , a sua expressão de luta aberta e leal à vista de quantos o queiram ver, foi-o impondo como espectáculo de apaixonante interesse para um público numeroso, que se foi enquadrando afectivamente no plano de organizações desportivas, a servirem o próprio espírito de competição. Daí resultam paixões exacerbadas, quantas vezes nocivas, por sectárias. Mas também daí resultam sadias emulações e rivalidades, que incitam os praticantes a um melhor preparo, a que não é entranho o seu comportamento moral e cívico.
A modalidade do futebol, sobretudo, transformou-se no nosso país, como, aliás, em quase todo o Mundo, num espectáculo arrebatador, que atrai multidões heterogéneas, enchendo estádios, movimentando regiões sem tradição turística, polarizando interesses de toda a ordem, com profundos reflexos na vida económica e social.
Aquela modalidade dou mesmo origem ao aparecimento de certa classe de pseudodesportistas, que de futebol só conhecem o espectáculo, por nunca o terem
praticado nem vivido. E são quase sempre esses os mais apaixonados e exigentes...
O grande perigo que o desporto pode suscitar no plano político, como poderosa força imanente que é, consiste, a meu ver, na circunstância de ser um instrumento cultural polivalente. De facto, tanto pode servir para exaltar a concepção materialista, numa espécie de glorificação nietzchiana, como a cristã, pela promoção do desenvolvimento harmonioso do complexo humano em que o espírito floresce e se superioriza na morada de um corpo forte e sadio.
O grande papa que foi Pio XII, e que em seu tempo do juventude, praticara activamente o hipismo e a natação, manifestou o seu paternal desvelo pelos temas do desporto e pela formação dos desportistas.
E tem a respeito destes temas lições magníficas, a que o seu extraordinário talento emprestou preciosos conceitos.
No formosíssimo discurso que proferiu em 8 de Novembro de 1952, dirigindo-se aos representantes do Congresso Científico Italiano do Desporto e Educação Tísica, disse, em certo passo, que:

O desporto e a ginástica têm como fim próximo educar, desenvolver e fortificar o corpo, sob o ponto de vista estético e dinâmico; como fim mais remoto a utilização, por parte da alma, do corpo assim preparado para o desenvolvimento da vida interior e exterior da pessoa; como fim ainda mais profundo, contribuir para a sua perfeição; por último, como fim supremo do homem em geral, e comum a todas as formas de actividade humana, aproximar o homem de Deus.

De tudo se pode inferir que, em função da larga projecção social e humana do desporto em nosso tempo, a própria Igreja, pela boca do seu mais alto expoente, tomou activa posição no problema.
Diz o relatório preambular do projecto de proposta de lei em apreciação que as actividades desportivas se integraram inegavelmente nas culturas ocidentais, invadindo todos os meios sociais.
De facto, prossegue o mesmo relatório - no sentido de justificar o enquadramento do desporto no âmbito das preocupações do Ministério da Educação Nacional - «como elementos de uma cultura necessitam elas (as actividades desportivas) de ser cuidadosamente seleccionadas e depuradas, por forma a delas destacar, para a transmissão aos jovens, os possíveis valores que encerram».
A reatar uma observação que atras deixei assinalada, permito-me acrescentar que na verdade esses valores se situam dentro do desporto.
Para, além da representação dos valores estéticos que a própria visão do espectáculo proporciona, estão ainda ali presentes outros, que merecem ser evidenciados para não deixar o desporto extrapolar-se dos princípios que inspiram a nossa concepção da vida.
Destacá-los e aferi-los pela escala dos valores morais que nos guiam é nobre missão dos educadores, que no desporto poderão identificá-los e revelá-los, nas múltiplas manifestações que suscita, de sentimentos do lealdade, de persistência, de interajuda, de sacrifício, de renúncia, de respeito para com o adversário.
Neste campo de observação é de justiça dirigir uma palavra à imprensa desportiva portuguesa, que, entre algumas manifestações de sensacionalismo de discutível interesse e controversa vantagem, tem também subido assinalar e exaltar a ética do desporto, mesmo quando este reveste a natureza de espectáculo.
Ora, é na própria projecção social, económica e cultural do desporto, na sua presença e vitalidade, que o

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Estado encontra o mais legítimo fundamento da sua intervenção na matéria. Aliás, essa intervenção está hoje mundialmente consagrada, seja qual for o meridiano político em que nos coloquemos.
Como portador de um ideal próprio e primeiro garante de bem comum, o Estado não pode manter-se indiferente ao que se passa nesse domínio.
Isto não quer dizer que se enleie, se confluída na ordem desportiva, apoucando a sua vitalidade ou minimizando a sua hierarquia própria, mas deve, em plano sobranceiro, vigia-la atentamente, interpretando os seus problemas, arbitrando nas suas querelas, reprimindo os seus desvios e desvarios.
Por isso a intervenção do Estado Português tem um carácter supletivo.
E bom é que nesse plano se mantenha, pois só assim poderá firmar e consolidar a sua autoridade arbitrai e objectivar a sua acção na defesa da função educativa do desporto.
Merecida honra seja feita aqui ao nosso eminente colega Prof. Doutor Mário de Figueiredo, a quem desejo render a homenagem da minha alta estima e particular apreço, pela clara visão que teve do problema quando, em 1942 e 1943, promoveu, como Ministro da Educação Nacional, a publicação dos diplomas que definiram e estruturaram a intervenção do Estado na ordem desportiva, até aí, a bem dizer, abandonada a si própria, com uma organização cujo espírito nem sempre respondia aos apelos da disciplina.
Ao Prof. Eng.º Leite Pinto e ao Dr. Rebelo de Sousa, seu devotado colaborador, a cuja acção no Ministério da Educação Nacional desejo também render a sincera homenagem do alto conceito em que a tenho, fica a dever-se o projecto da presente proposta de lei, que visa a reconhecer esclarecidamente uma situação de facto, conformando-a à ordem jurídica.
A necessidade de enfrentar o problema é por de mais evidente.
À prática do desporto, que, ao tempo da juventude dos que pertenceram à geração que nos antecedeu, era considerada excentricidade de uns tantos e privilégio de alguns a quem a fortuna proporcionara disponibilidades de tempo e de dinheiro, generalizou-se hoje em tais termos que abarca, como disse, todas as classes e condições sociais e constitui sempre um espectáculo eminentemente popular.
Ora este condicionalismo exige na verdade uma visão realista do problema no sentido de caracterizar os praticantes desportivos numa gama de categorias que lhes defina a sua posição relativa, quer entre si, quer perante as organizações que eventualmente representam.
Daí o projecto da proposta de lei em apreciação, que visa essencialmente a criar as bases de um estatuto jurídico sobre a matéria.
Nesse projecto do Governo propõe-se a caracterização de três categorias de praticantes - a dos amadores, a dos não amadores e a dos profissionais.
Não há dúvida de que a classificação proposta pelo Governo corresponde ao quadro actual das situações de facto e ajusta-se à nomenclatura adoptada internacionalmente.
Mesmo a expressão usada para a categoria intermédia, embora traduza um sentido negativo, parece-me preferível à de «subsidiados», sugerida pela Câmara Corporativa em seu douto parecer, que, de certo modo, estigmatiza depreciativamente no plano social esses praticantes.
À falta de outro termo mais apropriado, submeto-me à designação de «não amadores».
Sr. Presidente: ao considerar a doutrina constante das bases propostas pela Câmara Corporativa, que respeita a economia geral do projecto do Governo, tenho em mente as razões que se têm produzido no sentido de contrariar a intervenção do Estado na ordem desportiva.
O certo, porém, é que o projecto do diploma em apreciação se situa numa esfera estritamente constitucional, em plano donde o Estado não pode demitir-se, por st; inserir no domínio dos seus princípios e fins específicos, como atrás procurei anotar.
Aliás, a relação de causa e efeito que está na génese da caracterização das três categorias consideradas só em plano nacional pode ser vista e ponderada, na medida em que as condições próprias do respectivo meio social, económico e cultural contribuem, quantas vezes decisivamente, para a integração dos praticantes em qualquer das referidas classificações.
De facto, o extraordinário poder de atracção do desporto, a incompreensão anacrónica de tantos pais e patrões, o nível económico de cada um, são factores que se sobrepõem e entrechocam, desencadeando pequenos dramas íntimos que tendem a fazer resvalar muitos jovens melhor ou pior dotados para o profissionalismo desportivo, onde só poucos triunfam a tantos soçobram.
O exame e ponderação deste quadro de circunstâncias - que é especificamente nacional - constitui naturalmente um problema de Estado.
Isto não quer dizer que se não tenha em conta o sistema normativo que rege o desporto internacional, onde deve projectar-se a nossa presença e representação. Para isso, importa que o nosso regime se não afaste das normas que regulam aquele sistema.
Daí a necessidade de promover - de harmonia, aliás, com uma evolução desejada - um reajustamento orgânica da Direcção-Geral dos Desportos no sentido de aproximar mais de perto a Administração da ordem desportiva, estabelecendo com ela e os seus órgãos representativos uma convivência intensiva e sistemática, mais adequada até ao espírito corporativo que nos deve informar.
Com isto valorizar-se-ia a hierarquia desportiva e o seu sistema institucional s diluir-se-ia, porventura, a responsabilidade política do Estado, quando posto perante a necessidade de intervir, decidir e agir.
Sr. Presidente: as considerações gerais que deixei formuladas permitem-me aderir na generalidade à doutrina constante do projecto do Governo.
As alterações propostas pela Câmara Corporativa, estando, como estão, de um modo geral de acordo com a economia do referido projecto, merecem-me aprovação, uma vez que, em meu entender, completam o pensamento da proposta, na sua aplicação concreta â caracterização dos praticantes e ao mecanismo da intervenção do Estado na matéria.
Ao observar o aspecto dispositivo constante das bases propostas pela Câmara Corporativa, quero louvar o respectivo parecer, cuja concepção e estrutura uma vez mais demonstram a dignidade e competência com que aquela Câmara trabalha.
A maneira como define na sua base e os praticantes profissionais caracteriza claramente esta categoria. A exigência de acordo bilateral e a de os respectivos praticantes fazerem do desporto a sua actividade profissional são condições bem ajustadas à realidade das coisas e aos princípios que informam o instituto jurídico da prestação de serviços.
A actividade destes praticantes sugere a criação de um estatuto próprio que defina um esquema geral de direitos e obrigações recíprocos, sem deixar de ter em conta a estrutura económica das organizações desportivas, raramente apta a suportar as imposições que

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decorrem da própria natureza dos respectivos contratos.
Neste último aspecto reside um dos principais problemas do profissionalismo no nosso país, que importa ser detidamente considerado, sob pena de se frustrarem as intenções mais generosas.
O problema da previdência assume aqui particular importância, dada a curta duração da actividade do respectivo praticante.
Sendo matéria que se situa na órbita da competência do Ministério das Corporações, constitui também assunto de extrema delicadeza e melindre, pois chama à evidência a questão de saber em que condições económicas e de qualificação profissional entram no mundo do trabalho produtivo indivíduos em plena vitalidade física, porventura dificilmente adaptáveis a outros misteres.
Na definição da categoria de não amadores está explicitamente posto o carácter unilateral das compensações materiais e a vigilância que a sua medida, regularidade e permanência impõem.
Nesta categoria residem normalmente os futuros profissionais, e é indispensável controlar a evolução que se for operando na sua posição perante a organização que representam ou servem.
Detive-me, ainda, a examinar a caracterização de amadores que a Câmara Corporativa preconiza na base II do seu parecer e encontrei virtudes nos aditamentos propostos.
Para além de ser evidente, em meu entender, que os prémios instituídos para o triunfador de uma competição não podem influir na caracterização do respectivo praticante, pela natureza impessoal e objectiva que reveste, o preceito proposto considera justificadamente, como excluídas do conceito de «proveito material», algumas compensações.
É certo que a redacção adoptada pode sugerir que o pagamento das despesas de alimentação e alojamento se refere à provisão de necessidades de rotina do praticante. Ora o que parece evidente é que deve querer aludir-se àquelas despesas que decorrem da própria deslocação dos atletas quando em representação do clube a que pertencem.
Suponho que esta nota poderá ser considerada pela Comissão de Legislação e Redacção no âmbito das suas atribuições, dispensando-me de propor qualquer emenda da redacção.
Relativamente às subvenções para estudos ou preparação profissional em estabelecimentos oficiais e às despesas de seguro contra os acidentes emergentes das competições desportivas e de viagens por estas determinadas, parece-me que, em ambos os casos, se encontra pleno fundamento para a sua exclusão da ideia de proveito material.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Quanto às primeiras, elas revestem largo alcance, pelo carácter coadjuvante que podem imprimir às organizações desportivas na habilitação profissional dos seus representantes, criando, assim, as necessárias condições para se erguerem na escala social.
Julgo até que esta orientação, podendo ser comum a todas as categorias de praticantes, tem ainda em conta o nosso nível médio de vida, que nem sempre possibilita, a cada um a promoção intelectual ou profissional compatível com as suas efectivas possibilidades. Além de mais, o proveito que daí resulta é oposto ao material - é espiritual! Torna-se evidente, porém, que a atribuição dessas subvenções deve sor também cuidadosamente vigiada no plano regulamentar, para evitar que se deturpem os objectivos visados.
Aliás, a doutrina constante da base IX proposta no parecer da Câmara Corporativa neutraliza, em grande parte, esse perigo.
Ao produzir estas considerações, tenho igualmente presentes as notas que atrás deixei registadas quanto à difusão social do desporto.
Esta circunstância torna obsoleto, em meu juízo, o conceito clássico de praticante amador, que só poderia ser sustentado e aplicado em face de dados sociais diferentes dos que hoje se verificam.
No actual estádio de expansão da actividade desportiva, quase sempre a traduzir-se num espectáculo, com um campo de recrutamento extensíssimo, a aplicação daquele conceito equivaleria a conceder apenas aos ricos o privilégio do título de amador.
Estamos realmente bem longe, porém, do tempo das «balizas às costas», dos pioneiros do futebol e de outros desportos atléticos em que o trato da vida social, por mais lento e descuidado, consentia prolongados lazeres e proporcionava mais estreita convivência e solidariedade entre os respectivos praticantes.
Nessa altura, e quantos aqui se devem lembrar disso, os praticantes pobres eram auxiliados directamente pelos ricos, proporcionando-lhes auxílios pecuniários, colocação profissional, ajudas de toda a ordem.
O problema desenvolvia-se então num quadro restrito e em esquema social bem diferente daquele a que a vida de hoje nos obriga.
O grau de preparação atlética que o espectáculo desportivo exige em nossos dias impõe a estruturação de um conceito lato de amadorismo.
Ao tocar este aspecto estou a situar-me na observação dos atletas que concorrem aos jogos olímpicos e cujo alto nível de preparação não pode manifestamente ser atingido no quadro do assinalado conceito clássico de amador.
Tudo indica, portanto, que o conceito de amador deverá ter um carácter extensivo, embora respeitando certos limites fundamentais.
No que se refere ao pagamento das despesas de seguro, parece-me evidente a vantagem da sua inclusão no preceito em referência. Não parece lícito, na verdade, devolver ao praticante, qualquer que seja a sua categoria, os riscos da deslocação em representação do clube ou aquele que decorre de acidentes emergentes dessas competições.
Daí a minha concordância com a solução proposta pela Câmara Corporativa a este respeito.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: são estas as considerações que me ocorre formular relativamente ao projecto em apreciação.
Adiro, com as reservas que pus, à redacção proposta pela Câmara Corporativa pelas razões que atrás aduzi.
O regime proposto tem, aliás, a flexibilidade bastante para se ir ajustando às realidades que forem surgindo no plano nacional e internacional, quer essas realidades se suscitem no nosso quadro social, quer na ordem desportiva interna e externa.
Mas isto mesmo parece evidenciar a necessidade de promover o reajustamento da estrutura orgânica da nossa Administração no sentido que atrás preconizei.
Aliás, a questão que ora se põe constitui apenas um aspecto restrito e concreto do problema gimnodesportivo nacional.
Para além da caracterização formal dos seus praticantes avultam outros problemas que, por sua impor-

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tância e acuidade, urge enfrentar no domínio da Administração, designadamente o da formação de professores, monitores e treinadores e o do fomento da construção de ginásios e piscinas.
Permitam as circunstâncias que o projecto que estamos a examinar represento um primeiro passo da longa caminhada que importa ainda percorrer. E porque creio firmemente que a ginástica e o desporto são excelentes meios de defender a saúde física e moral da nossa juventude e de servir utilmente a sua formação cívica, confio em que o Governo continuará a dedicar ao problema devotada atenção.
Ao dar a minha aprovação de generalidade ao projecto de proposta de lei do Governo, com as alterações preconizadas pela Câmara Corporativa, formulo ainda os melhores votos pela prosperidade do desporto nacional, que, queira Deus, possa ver cada vez mais dignificado para honra e júbilo do nosso país.
Tenho dito:

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Presidente: - Vou encerrar a sessão. Na ordem do dia da sessão de amanhã concluir-se-á a discussão na generalidade desta proposta de lei e iniciar-se-á a sua discussão na especialidade.
Está encerrada a sessão.

Eram 18 horas.

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Agnelo Ornelas do Rego.
Alberto da Rocha Cardoso de Matos.
Alfredo Rodrigues dos Santos Júnior.
Américo Cortês Pinto.
Américo da Costa Ramalho.
António Barbosa Abranches de Soveral.
António Calheiros Lopes.
António Maria Vasconcelos de Morais Sarmento.
Armando Cândido de Medeiros.
Augusto César Cerqueira Gomes.
Belchior Cardoso da Costa.
Fernando António Muñoz de Oliveira.
João da Assunção da Cunha Valença.
João de Brito e Cunha.
João Carlos de Sá Alves.
João Cerveira Pinto.
João Maria Porto.
José António Ferreira Barbosa.
José Gonçalves de Araújo Novo.
José Soares da Fonseca.
Júlio Alberto da Costa Evangelista.
Luís Maria da Silva Lima Faleiro.
Manuel Homem Albuquerque Ferreira.
Manuel Nunes Fernandes.
D. Maria Irene Leite da Costa.
Simeão Pinto de Mesquita Carvalho Magalhães.

O REDACTOR - Leopoldo Nunes.

IMPRENSA NACIONAL DE LISBOA

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