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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIADO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

QUINTA-FEIRA, 24 DE JULHO DE 1975 * SUPLEMENTO AO NÚMERO 16

NOTA. - Por terem sido publicados com algumas inexactidões de novo se reproduzem os projectos de Constituição apresentados pelo Centro Democrático Social (CDS), Movimento Democrático Português (MDP/CDE), Partido Comunista Português (PCP), Partido Popular Democrático (PPD), Partido Socialista (PS) e União Democrática Popular (UDP), bem como as propostas de sistematização publicadas.

PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELO PARTIDO DO CENTRO DEMOCRÁTICO SOCIAL (CDS)

SUMÁRIO

Preâmbulo.

Parte I - Dos princípios fundamentais:

Título I - Da estrutura do Estado.
Título II - Dos direitos, liberdades e garantias.
Título III - Dos partidos políticos e outros grupos sociais.
Título IV - Das forças armadas e de polícia.

Parte II - Da vida económica, social e cultural:

Título I - Da vida económica.
Título II - Da vida social.
Título III - Da vida cultural.

Parte III - Dos órgãos da Soberania.

Título I - Do Presidente da República:
Título II - Da Assembleia do MFA e do Conselho da Revolução.
Título III - Da Assembleia Legislativa.
Título IV - Do Governo.
Título V - Dos tribunais.

Parte IV - Da defesa e revisão da Constituição:

Título I - Da defesa da Constituição.
Título II - Da revisão constitucional.

Disposições transitórias.

Preâmbulo

A Revolução do 25 de Abril de 1974 fez-se para devolver ao povo português a dignidade que o regime derrubado sistematicamente lhe negara durante os 48 longos anos de ditadura, em nome de uma pretensa incapacidade dos Portugueses para assumirem a responsabilidade pela construção do próprio destino. Incapaz de compreender o povo, isolado do povo, o regime anterior houve que socorrer-se dos meios e processos que sustentam as ditaduras e governou sem o povo ou contra ele.
O primeiro dos fins da Revolução foi, assim, o de devolver aos Portugueses o gozo pleno dos direitos e liberdades democráticas e é no exercício desses direitos e liberdades que os legítimos representantes do povo se retinem na Assembleia Constituinte para, em cumprimento do Programa do Movimento das Forças Armadas, elaborarem uma Constituição livre. Participando num acto de importância suprema, cabe-lhes a pesada responsabilidade, que assumem perante a História, o seu povo e o Movimento das Forças Armadas, de fazerem consagrar, nessa Constituição, os direitos fundamentais dos cidadãos e as

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liberdades da democracia, para que as sombras do totalitarismo não possam voltar a macular o rosto da Pátria.
Mas a Revolução do 25 de Abril não se limitou a afirmar os princípios da democracia política. Para ser autenticamente libertadora, a Revolução visou igualmente a supressão das desigualdades que tão profundamente marcaram a sociedade portuguesa e que durante anos votaram à injustiça, ao desvalimento social e à pobreza largas camadas da população em favor do privilégio de alguns. Assim é que a Revolução veio afirmar também os princípios da democracia económica e social, na via pára um socialismo português que, na sua precisa reivindicação de originalidade, supera e rejeita, a um tempo, os capitalismos individualistas e os socialismos totalitários.
Direitos inalienáveis da pessoa humana, pluralismo e liberdades democráticas, solidariedade social e comunitária, valorização da iniciativa, reabilitação do trabalho, abolição da condição proletária, primado do trabalho sobre o capital constituem, pela legitimidade da Revolução, os marcos orientadores na caminhada para a sociedade sem classes, justa e livre, que o respeito pela personalidade nacional portuguesa exige iluminada pelos valores do humanismo cristão.
No reconhecimento destes valores, nós, os representantes eleitos do povo português, votamos e aprovamos a Constituição seguinte.

PARTE I

Dos princípios fundamentais

TITULO I

Da estrutura do Estado

ARTIGO 1.º

(Democracia personalista)

Portugal constitui um Estado democrático, fundado na soberania popular, na liberdade individual, na solidariedade social e no pluralismo político, e orientado pelo respeito da dignidade do Homem na via original para um socialismo português.

ARTIGO 2.°

(Povo português)

1. Constituem o povo português todos os cidadãos portugueses, onde quer que residam.
2. A lei determinará como se adquire e se perde a cidadania portuguesa, atendendo predominantemente ao critério da consanguinidade.

ARTIGO 3.°

(Dupla nacionalidade)

1. Será favorecida a celebração de convenções que estabeleçam o estatuto de dupla nacionalidade para os portugueses que tenham a sua residência principal e permanente em países de expressão portuguesa e para os cidadãos destes em condições idênticas em Portugal.
2. Aqueles que nos termos do número anterior adquirirem a nacionalidade portuguesa é vedado o exercício das funções de Presidente da República, conselheiro de Estado, deputado, membro do Governo, juiz dos tribunais supremos, Defensor do Cidadão, Procurador-Geral da República, agente diplomático e oficial general das Forças Armadas.

ARTIGO 4.°

(Território)

1. O território de Portugal é o que actualmente lhe pertence.
2. O Estado não aliena, por nenhum modo, qualquer parcela do seu território ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo da rectificação de fronteiras.

ARTIGO 5.°

(Domínio público)

1. A lei determinará quais as classes de bens pertencentes ao domínio público do Estado ou das autarquias locais e regulará os poderes das entidades públicas sobre eles, bem como a sua utilização ou exploração pelos particulares.
2. O Estado Português reivindica, como pertencente ao seu domínio público, um mar territorial com a extensão de duzentas milhas.

ARTIGO 6.º

(Poder político)

O poder político reside no povo, competindo o seu exercício quer directamente ao próprio povo, quer aos órgãos de soberania previstos na Constituição.

ARTIGO 7.°

(Soberania)

1. Portugal constitui um Estado independente.
2. A República Portuguesa mantém a sua participação nas organizações internacionais de que faz parte e preconiza a integração de Portugal, como membro de pleno direito, na Comunidade Económica Europeia.
3. Portugal contribuirá para a paz, o desanuviamento internacional e a cooperação interestadual em todos os domínios, aceitando as restrições de soberania que resultarem da sua participação em organizações internacionais ou supranacionais.
4. Portugal defende a justiça nas relações internacionais, o auxílio aos povos em desenvolvimento e a cooperação especial , com os países de expressão portuguesa.

ARTIGO 8.º

(Direito internacional)

1. As regras gerais do direito internacional comum fazem parte da ordem jurídica portuguesa.

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2. As normas constantes de tratados ou acordos internacionais regularmente ratificados ou aprovados vigoram na ordem interna, a partir do momento da sua publicação no Diário do Governo.

ARTIGO 9.°

(Unidade do Estado e autonomias regionais)

1. Portugal constitui um Estado unitário, podendo compreender regiões autónomas.
2. Os Açores e a Madeira gozarão de um estatuto de autonomia, incluindo a autonomia legislativa regulamentar, administrativa e financeira.

ARTIGO 10.°

(Autarquias locais)

1. São autarquias locais as regiões, os concelhos e as freguesias.
2. A região, o concelho e a freguesia terão como corpos administrativos, respectivamente, a junta regional, a câmara municipal e a junta de freguesia.
3. As autarquias locais terão o direito de eleger livremente os seus órgãos dirigentes e disporão de autonomia regulamentar, administrativa e financeira.
4. A autonomia das autarquias locais não exclui a possibilidade de o Estado legislar sobre assuntos de interesse comum, nem o exercício dos necessários poderes tutelares.

TITULO II

Dos direitos, liberdades e garantias

ARTIGO 11.°

(Bases fundamentais)

1. O Estado reconhece no Homem, como ser que aspira à justiça e à liberdade, o primeiro criador e intérprete do Direito, respeita o livre desenvolvimento da personalidade na sua dimensão individual e social e promove a formação de uma comunidade de homens livres e responsáveis.
2. Portugal adopta como sua a Declaração Universal dos Direitos do Homem, devendo todas os preceitos constitucionais e legais ser interpretados, integrados e aplicados de harmonia com essa declaração, cujo texto em português é publicado em anexo a esta constituição e dela faz parte integrante.

ARTIGO 12.°

(Direitos e liberdades)

Constituem direitos e liberdades individuais do cidadão português:
1.° O direito à vida e à integridade física;
2.° O direito à integridade moral, ao bom nome e reputação e à intimidade da vida privada;
3.° A liberdade religiosa;
4.° O direito de contrair matrimónio e de fundar família;
5.° A liberdade de opinião e de expressão do pensamento;
6.° A liberdade de criação intelectual, artística e científica e de divulgação dos seus resultados;
7.° A liberdade e o sigilo da correspondência e de todas as formas de comunicação;
8.° A liberdade de ensino;
9.° O direito de os pais darem aos filhos menores uma educação conforme às suas convicções filosóficas ou religiosas;
10.° A liberdade de circulação e de residência;
11.° A liberdade de emigração e de retorno;
12.° A inviolabilidade do domicílio;
13.° O direito ao trabalho e ao emprego;
14.° A liberdade de escolha de profissão ou género de trabalho, indústria ou comércio;
15.° A propriedade pessoal ou familiar legitimamente adquirida e a sua transmissão em vida e por morte;
16.° O direito de acesso à propriedade da habitação, da terra e da empresa;
17.° O direito de participação na gestão e nos resultados da empresa;
18.° A liberdade de organização, filiação e confederação sindical;
19.° O direito à greve;
20.° A liberdade de associação;
21.° A liberdade de reunião e de manifestação;
22.° A liberdade de imprensa;
23.° O direito de acesso aos cargos públicos, quer políticos e administrativos, quer judiciais;
24.° O direito de voto, directo, universal e secreto, quer em eleição de órgãos representativos, quer em referendo.

ARTIGO 13.°

(Garantias)

Constituem garantias individuais do cidadão português:
1.° O princípio da igualdade dos cidadãos perante a lei;
2.° O princípio da não retroactividade das leis, ressalvada a lei interpretativa e a lei mais favorável ao cidadão;
3.° O direito de não ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare punível a acção ou omissão;
4.° O direito de não sofrer pena ou medida de segurança que não estejam previstas em lei anterior à acção ou omissão;
5.° A proibição da pena de morte, da tortura e de quaisquer procedimentos cruéis ou degradantes;
6.° A proibição da privação da cidadania portuguesa por motivos de ordem política ou em consequência da aplicação de qualquer sanção;

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7.° A proibição de penas absolutamente indeterminadas, de penas perpétuas e da transmissão de qualquer pena da pessoa do delinquente;

8.º A proibição do confisco e da prisão por dívidas, mesmo resultantes da falta de pagamento de impostos ou taxas;

9.º A proibição de medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade pessoal com carácter perpétuo, com duração ilimitada ou estabelecidas por períodos indefinidamente prorrogáveis, salvas as que se fundem em anomalia psíquica e tenham fins terapêuticos;

10.° A proibição de internamento em regime fechado, em qualquer estabelecimento psiquiátrico, sem confirmação judicial;
11.º A proibição de medidas de polícia privativas ou restritivas da liberdade pessoal;

12.º A proibição da extradição de cidadãos portugueses e, quanto aos estrangeiros, da que se funde na prática de crimes políticos ou que possa conduzir à aplicação de penas ou medidas de segurança pertencentes aos tipos referidos nos números anteriores;

13.° A proibição da aplicação de qualquer pena ou medida de segurança senão pelos tribunais e da entrega de qualquer julgamento a juiz diverso do que for competente segundo a lei anterior à acção ou omissão;
14.° O princípio de que todo o acusado se presume inocente até ser condenado;
15.° O princípio da jurisdicionalização da instrução, mesmo preparatória, cabendo aos juizes de instrução garantias idênticas às dos juizes da decisão;
16.° O princípio da publicidade e do contraditório na instrução penal;
17.° O direito de, no momento da detenção, ser informado dos motivos que a fundamentam;
18.° O direito de ser assistido por advogado em todas as fases do processo penal, podendo o acusado recusar-se a prestar declarações sem a presença do seu advogado;
19.° A proibição da prisão sem culpa formada, salvo em flagrante delito ou por crime doloso a que corresponda pena maior e, neste caso, mediante ordem escrita do juiz competente;
20.° A sujeição da prisão preventiva a decisão judicial de validação, no prazo legal e ouvido o detido;
21.° O princípio de que a prisão preventiva não será ordenada, nem será mantida, quando puder ser substituída por qualquer medida adequada de liberdade provisória, prevista na lei;
22.° O direito à revisão de sentenças;
23.° A proibição de ocultar o local da prisão ou internamento e de efectuar qualquer prisão ou internamento fora de estabelecimentos a esses fins destinados:
24.º O direito à utilização da providência do habeas corpus contra a prisão, o internamento, a deportação, o desterro e o exílio ilegais ou arbitrários;
25.° O direito de defesa contra qualquer acusação em processo administrativo de tipo sancionatório;
26.º O direito de audiência no decurso de qualquer, processo administrativo de tipo não sancionatório;
27.º O direito de resposta contra declarações que ponham em causa qualquer cidadão na imprensa, rádio ou televisão;
28.º O direito à impugnação contenciosa de todos os actos administrativos definitivos, arguidos de ilegalidade;
29.° O direito. de acesso aos tribunais, em defesa dos seus direitos ou interesses legítimos;
30.º O direito de petição, representação, queixa, reclamação e recurso, perante os órgãos da soberania ou quaisquer autoridades;
31.º O direito à indemnização de todos os danos sofridos em consequência da actividade de outrem, inclusive do Estado e demais entidades públicas, quando ilícita ou especialmente perigosa ou gravosa;
32.° O direito d.e não ser prejudicado na sua situação ou emprego permanente por virtude do cumprimento de qualquer obrigação ou dever cívico, do exercício do direito de filiação partidária ou sindica! ou, ainda, por motivo das suas convicções morais ou políticas;
33.º O direito de não pagar impostos que não tenham sido estabelecidos de harmonia com a Constituição;
34.° O direito de resistir a quaisquer ordens ou comandos que infrinjam os direitos, liberdades e garantias, se não estiverem legalmente suspensos;
35.° O direito de repelir pela força a agressão particular, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.

ARTIGO 14:°

(Direitos dos estrangeiros e das pessoas colectivas)

1. Os direitos, liberdades e garantias do cidadão português são extensivos aos estrangeiras e apátridas que se encontrem ou residam em Portugal.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior os direitos políticos, salvo o exercício de funções públicas de carácter predominantemente técnico, e os direitos públicos que se traduzam num encargo para o Estado ou outra entidade pública, salva a reciprocidade de vantagens concedidas aos Portugueses no país correspondente.
3. Os direitos, liberdades e garantias especificados nos artigos antecedentes são extensivos, na parte aplicável, às pessoas colectivas.

ARTIGO 15.°

(Regime dos direitos, liberdades e garantias)

1. O exercício dos direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição só pode ser regulado por lei geral, que em caso nenhum poderá diminuir a extensão ou alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.

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2. A falta ou insuficiência da lei não obsta ao exercício dos direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição.
3. Os direitos, liberdades e garantias podem ser invocados não apenas contra o Estado, mas também contra as pessoas colectivas, os grupos sociais e os cidadãos em geral.

ARTIGO 16.°
(Suspensão da Constituição)
É vedado aos órgãos da soberania, conjunta ou separadamente, suspender ou restringir os direitos, liberdades e garantias previstos na Constituição, salvos os casos nela admitidos.

TÍTULO III

Dos partidos políticos e outros grupos sociais

CAPITULO I

Dos partidos políticos

ARTIGO 17.°

(Pluralismo partidário)

1. É livre a constituição de partidos políticos nos termos da lei.
2. É proibida toda e qualquer actuação que tenha por fim, ou por resultado, a eliminação dos partidos políticos ou a subordinação da vida política a um partido único.

ARTIGO 18.°

(Requisitos)

Só gozam do estatuto de partido político, além dos partidos representados na Assembleia Legislativa, aqueles que tiverem obtido a sua inscrição no Tribunal Constitucional, mediante requerimento subscrito por mais de 5000 eleitores no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.

ARTIGO 19.°

(Estrutura democrática)

A estrutura interna dos partidos políticos deve obedecer às regras seguintes:
a) Não poder ser negada a admissão ou imposta a exclusão por motivo de raça ou sexo;
b) Serem os estatutos e programas aprovados por todos os filiados ou por assembleia deles representativa;
c) Serem os titulares dos órgãos dirigentes eleitos por todos os filiados ou por assembleia deles representativa;
d) Serem as resoluções de coligação, fusão e dissolução tomadas, ou ratificadas, por todos os filiados ou por assembleia deles representativa;
e) Ser o funcionamento das suas assembleias representativas limitado aos respectivos militantes e orientado segundo métodos democráticos definidos por lei.

ARTIGO 20.°

(Publicidade)
1. Os partidos políticos devem desenvolver publicamente as suas actividades
2. A publicidade referida no número anterior abrangerá a conhecimento dos estatutos e programas, da identidade dos titulares dos órgãos nacionais e
locais, da proveniência e utilização dos fundos e das actividades gerais do partido.

ARTIGO 21.°

(Financiamento)

1. Compete ao Estado contribuir para o financiamento dos partidos políticos, através de isenções fiscais e de subsídios anuais a conceder nos termos que a lei estabelecer.
2. Para além do disposto no número anterior, só os cidadãos portugueses podem contribuir para o financiamento dos partidos políticos.

ARTIGO 22.º

(Associação e filiação internacional)

É livre a associação dos partidos políticos portugueses com partidos estrangeiros afins e a filiação deles em organizações internacionais democráticas, sem embargo da plena liberdade de decisão e actuação dos partidos portugueses.

ARTIGO 23.°

(Fidelidade e disciplina)

1. É proibido qualquer juramento ou compromisso de fidelidade pessoal dos filiados ao seu partido ou aos respectivos dirigentes.
2. A disciplina partidária não poderá afectar o exercício dos direitos nem o cumprimento dos deveres prescritos pela Constituição ou pela lei.

ARTIGO 24.°

(Direitos dos partidos)

Além dos referidos nos artigos anteriores, constituem direitos dos partidos políticos:
a) O direito de desenvolver as suas actividades sem interferência do Estado;
b) O direito de estabelecer relações permanentes com os restantes grupos sociais;
c) O direito de constituir ou associar à sua acção outras organizações;
d) O direito de editar publicações próprias para divulgação da sua doutrina e da sua actividade;
e) O direito de acesso a programas políticos, próprios e de conjunto, nas estações emissoras de rádio e televisão, quer estaduais, quer privadas;

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f) O direito de designar um delegado seu ao Conselho de Estado, no caso de se encontrarem representados na Assembleia Legislativa.

ARTIGO 25.°

(Suspensão e extinção)

Podem ser decretadas pelo Tribunal Constitucional a suspensão temporária ou a extinção de um partido político sempre que os seus programas ou estatutos ou a sua estrutura se não conformem com o disposto na Constituição ou na lei e, bem assim, sempre que a sua actuação se caracterize pela violação sistemática da Constituição, da lei ou dos estatutos.

CAPÍTULO II.

Dos grupos sociais em geral

ARTIGO 26. °

(Pluralismo social)

1. É livre a constituição de associações, fundações, comissões, assembleias e outras organizações de cidadãos portugueses, nos termos da lei.
2. São proibidas as associações secretas, as associações armadas e, de uru modo geral, todas aquelas cujos fins ou actividades sejam considerados ilícitos por lei.

ARTIGO 27.°

(Estrutura democrática)

É aplicável à estrutura dos grupos sociais em geral o disposto no artigo 19.°

ARTIGO 28.°

(Direitos dos grupos sociais em geral)

1. Os grupos sociais em geral beneficiam, na parte aplicável, dos direitos, liberdades e garantias consagrados nos artigos 12.° e 13.° da Constituição.
2. Além dos mencionados no número anterior, constituem também direitos e garantias dos grupos sociais em geral:
a) O direito de auto-organização e de autodissolução;
b) O direito de estabelecer relações de cooperação ou de coligação entre si;
c) O direito de filiação ou confederação em grupos mais amplos, quer de âmbito nacional, quer internacional;
d) O direito de audiência prévia em relação às grandes reformas que abarquem os assuntos compreendidos na área das respectivas atribuições, bem como á elaboração do Plano económico-social;
e) O direito de aceso aos meios de comunicação social para difundir os seus pontos de vista e divulgar as actividades desenvolvidas:
j) O direito a tratamento pelo Estado em igualdade com os demais grupos congéneres ou afins;
g) O direito de obter a realização de inquéritos, por parte dos órgãos políticos ou dos órgãos administrativos de controle, sobre matéria das suas atribuições;
h) O direito à protecção da sua existência e actividades, por parte do Estado, contra todos quantos pretendam impedir o seu livre funcionamento;
i) O direito ao sigilo dos respectivos ficheiros;
j) A legitimidade para impugnar os actos administrativos ilegais que afectem o grupa ou de algum modo prejudiquem os interesses por ele defendidos ou os membros nele filiados, enquanto tais;
l) A legitimidade para arguir, dentro dos limites traçados pelos artigos 133.° e seguintes, a inconstitucional idade dos diplomas ou actos do Estado ou outras entidades públicas, em matéria das suas atribuições.

TITULO IV

Das forças armadas e de polícia

ARTIGO 29.°

(Forças militares e policiais)

1. Compete ao Estado criar e manter as forças militares e de polícia necessárias à defesa do País e da Constituição. bem como à manutenção da ordem e tranquilidade pública.
2. A criação e manutenção das forças militares e de polícia pertencem exclusivamente ao Estado, não sendo permitida a concorrência ou colaboração, na prossecução dos respectivos fins, de quaisquer outras organizações, armadas ou não.

ARTIGO 30.°

(Missão das forças armadas)

1. As forças armadas serão o garante e o motor do processo revolucionário, conducente à construção de uma verdadeira democracia política, económica e social.
2. Além da sua missão específica de defesa da integridade e independência nacionais, as forças armadas participarão no desenvolvimento económico, social, cultural e político do País, no âmbito do seu Movimento.

ARTIGO 31.°

(Independência e estrutura do poder militar)

1. O poder militar é independente do poder civil.
2. O comandante-chefe das forças armadas será o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Arma das, que dependerá directamente do Presidente da República.
3. O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas poderá ser assistido por um Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, que o substituirá nos seus impedimentos.
4. Cada um dos ramos das forças armadas será chefiado por um chefe do estado-maior.
5. O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e os Chefes do Estado-Maior dos três ramos das forças armadas terão competência ministerial.

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ARTIGO 32.°

(Serviço militar obrigatório)

1. Todos os cidadãos portugueses do sexo masculino têm o dever de prestar serviço militar, por um período máximo de dezoito meses, salvas as excepções indicadas nos artigos seguintes.
2. Os que forem considerados inaptos para o serviço militar armado prestarão obrigatoriamente, salvos os casos de impossibilidade absoluta, serviço militar não armado, com duração idêntica à do primeiro.

ARTIGO 33.°

(Objecção de consciência)

1. É reconhecido ò direito à objecção de consciência, o qual pode todavia ser suspenso, em tempo de guerra, se as necessidade da defesa nacional assim o exigirem.
2. Os objectares de consciência prestarão serviço militar não armado com duração idêntica à do serviço militar armado.

ARTIGO 34.°
(Serviço cívico)

1. Sempre que as necessidades das forças armadas o permitirem, podem os cidadãos que assim o requeiram substituir o cumprimento do dever militar, em tempo de paz, por um serviço cívico organizado pelo Governo, com a finalidade de contribuir para a formação cívica e profissional das Portugueses e para assegurar o funcionamento dos serviços públicos essenciais.
2. Se o interesse nacional assim o exigir, pode a lei estabelecer, em tempo de paz, que todos os cidadãos, incluindo os do sexo feminino, prestem serviço cívico obrigatório por tempo determinado.
3. No caso previsto no número anterior, o cumprimento do serviço militar é do serviço cívico pelos cidadãos do sexo masculino não pode, no total, exceder um período máximo de dezoito meses.

ARTIGO 35.°

(Relevância do dever militar)

Nenhum cidadão pode conservar ou obter emprego do Estado ou de outra entidade pública se não tiver cumprido os deveres a que por lei estiver sujeito no tocante ao serviço militar ou ao serviço cívico.

PARTE II

Da vida económica, social e cultural

TITULO I

Da vida económica

ARTIGO 36.°

(Sistema económico português)

Portugal adopta como sistema económico o da economia social de mercado, baseado na liberdade de iniciativa, no acesso dos trabalhadores à propriedade privada e na socialização dos meios de produção que nos termos da Constituição e da lei devam ser submetidos ao regime de propriedade colectiva ou de gestão pública.

ARTIGO 37.°

(Iniciativa privada)

A iniciativa económica privada, sob a forma de empresa individual ou de sociedade civil ou comercial, é livre, dentro dos limites traçados pela Constituição e pela lei.

ARTIGO 38.°

(Acesso dos trabalhadores à propriedade)

1. O Estado promoverá, por todos os meios ao seu alcance, o acesso generalizado dos trabalhadores à propriedade privada da habitação, da terra e da empresa.
2. Serão protegidas e apoiadas de modo especial, todas as empresas cujo capital seja constituído, na totalidade ou em maioria, pelos respectivos trabalhadores.

ARTIGO 39.°

(Socialização de meios de produção)

1. Serão socializados os meios de produção que correspondam a algum ou a alguns dos seguintes tipos:
a) Empresas não sujeitas à concorrência nacional ou internacional;
b) Indústrias militares;
c) Indústrias básicas de primacial interesse colectivo;
d) Empresas que explorem serviços públicos essenciais, de âmbito nacional ou local;
e) Actividades que, por motivo de ordem técnica ou económica, a lei reconheça deverem ser exercidas em regime de exclusivo e que não devam ser objecto de concessão;
f) Empreendimentos considerados no Plano económico-social como necessários à economia nacional e em relação aos quais a iniciativa privada, nos prazos legalmente fixados, não ofereça soluções de interesse colectivo;
g) Propriedades rurais por explorar ou inconvenientemente exploradas;
h) Terrenos adquiridos para fins de urbanização e congelados com meros intuitos especulativos.

2. Para além do disposto no número anterior, a Estado só pode assumir a gestão de empresas privadas quando estas se mostrem incapazes de prover à sua própria sustentação e apenas pelo tempo e nos termos indispensáveis à sua devolução ao regime de gestão privada.

ARTIGO 40.°
(Regime de socialização)
1. A socialização referida no artigo anterior pode consistir na nacionalização, na municipalização ou na participação do Estado ou de outras entidades públicas no capital ou na administração das empresas.
2. A socialização de empresas ou actividades determinadas pressupõe a prévia definição por lei das situações genéricas em que aquelas se integram e im-

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plica o pagamento de justa indemnização aos legítimos proprietários.

ARTIGO 41.°

(Empresas de interesse colectivo)

1. São consideradas de interesse colectivo as empresas concessionárias de serviços ;públicos, de obras públicas e de exploração do domínio público, as sociedades de economia mista, as empresas que beneficiem de exclusivo ou privilégio e, ainda, todas as que exerçam qualquer actividade considerada por lei de interesse colectivo ou de interesse nacional.
2. As empresas de interesse colectivo ficam sujeitas a regime especial, no tocante aos seus direitos e deveres, nacionalidade, corpos gerentes, pessoal e intervenção ou fiscalização do Estado.

ARTIGO 42.°

(Planeamento e empresa)

1. As empresas públicas, as empresas nacionalizadas e as empresas de interesse colectivo serão submetidas a regimes especiais de gestão, a definir por lei, é ficam obrigatoriamente vinculadas ao cumprimento das instruções e objectivos constantes do Plano económico-social e, bem assim, das directivas do Governo.
2. O Plano económico-social não possui valor imperativo para as empresas privadas, salvo se estas se comprometerem, por acordo com o Estado, a cumprir as instruções e objectivos dele constantes, mediante a contrapartida da concessão de determinados benefícios ou auxílios.

ARTIGO 43.°

(Regime das empresas privadas)

1. A lei definirá os diversos modos de organização c os diferentes regimes de gestão admitidos para as empresas privadas.
2. Serão estabelecidos esquemas de participação dos trabalhadores na gestão e nos resultados da actividade empresarial e de difusão, no seio da empresa, da informação básica sobre a vida desta.
3. A lei favorecerá e regulará os termos em que deverão funcionar os núcleos sindicais de empresa e as comissões de trabalhadores.

ARTIGO 44.º

(Divisão paritária dos lucros)

1. Tanto nas empresas do sector público como nas empresas privadas será aplicado o princípio da divisão paritária dos lucros líquidos entre o capital e o trabalho, sem prejuízo da justa remuneração devida, nos termos gerais, aos dois factores produtivos.
2. A lei definirá os termos e as fases da aplicação progressiva do mencionado princípio e a sua orientação no sentido da promoção do acesso dos trabalhadores à propriedade.

ARTIGO 45.°

(Conflitos de trabalho)

1. Sem prejuízo do direito à greve, todos os conflitos de trabalho devem ser objecto de tentativas de conciliação e arbitragem.
2. O julgamento dos conflitos individuais de trabalho compete aos tribunais do trabalho, integrados no Poder Judicial.
3. Incumbe ao Estado desempenhar a função de medianeiro na solução dos conflitos colectivos de trabalho.

TÍTULO II

Da vida social
ARTIGO 46.°

(Família)

1. O Estado assegura a constituição e a protecção da família, como base e fundamento da vida em sociedade e da educação dos filhos.
2. A constituição da família assenta no casamento, na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges e na filiação legítima.
3. É assegurado a todos os cidadãos portugueses o divórcio, nos termos da lei.
4. A lei não fará qualquer discriminação entre os direitos dos filhos legítimos e dos filhos ilegítimos.
5. Compete ao Estado proteger e apoiar a família, nomeadamente através da política social, educativa, fiscal e habitacional.

ARTIGO 47.º

(Juventude)

1. O Estado assegura protecção especial à infância e à juventude e, em particular, aos órfãos e às crianças e jovens física ou mentalmente diminuídos.
2. Será garantida a actividade associativa da juventude, a sua informação sobre os problemas do mundo e da vida e a ocupação formativa dos seus tempos livres, na base da neutralidade política dos serviços estaduais e da liberdade de opção de cada um.
3. O Estado fomentará todas as formas de intercâmbio europeu e mundial da juventude.

ARTIGO 48.°

(Saúde)

1. O Estado reconhece e garante o direito à saúde.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de saúde, geral e gratuito.
3. São admitidas a clínica livre e as actividades de saúde de carácter privado, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com o serviço nacional de saúde.

ARTIGO 49.°

(Segurança social)

1. O Estado reconhece e garante o direito à segurança social.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de segurança social, integrado e geral, abrangendo todos os cidadãos com inclusão dos servidores da função pública.
3. São admitidas as instituições privadas de solidariedade social, bem como a concorrência e acumulação de esquemas privados de seguro social, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com o serviço nacional de segurança social.

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ARTIGO 50.°

(Habitação)

1. O Estado reconhece e garante o direito à habitação.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de habitação social, que realize e promova a construção das habitações necessárias à instalação condigna das famílias mais desfavorecidas.
3. São admitidas as cooperativas de habitação, os sistemas de autoconstrução e, de um modo geral, a iniciativa privada no sector da construção habitacional, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com o serviço nacional de habitação social.

ARTIGO 51.°

(Urbanismo e qualidade da vida)

1. O Estado reconhece e garante o direito a um ambiente humano e equilibrado.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de urbanismo e protecção da natureza, destinado a promover a implantação de novos centros populacionais e a reconversão dos existentes, bem como a preservar a pureza do ambiente urbano e natural e a suavizar as condições da vida quotidiana dos cidadãos.
3. São admitidas as iniciativas e organizações particulares que se proponham atingir as mesmas finalidades, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com o serviço nacional de urbanismo e protecção da natureza.

ARTIGO 52.°
(Transportes e comunicações)
1. O Estado reconhece e garante o direito à utilização dos transportes colectivos e das telecomunicações.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de transportes colectivos e um serviço nacional de telecomunicações, destinados a satisfazer cabalmente as necessidades nacionais nos respectivos sectores.
3. São admitidas as empresas privadas que concorram com os serviços nacionais de transportes colectivos e telecomunicações ou com eles colaborem, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com aqueles serviços.

ARTIGO 53.°
(Protecção civil)

1. O Estado reconhece e garante o direito à segurança pessoal contra calamidades naturais e acidentes.
2. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de protecção civil, destinado a prevenir e a remediar os efeitos dos incêndios, inundações, terramotos e outras calamidades naturais, bem como os dos acidentes individuais ou colectivos.
3. São admitidas as iniciativas e instituições que se proponham concorrer ou colaborar com o serviço nacional de protecção civil, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com aquele serviço.

TITULO III
Da vida cultural
ARTIGO 54.°

(Educação)

1. O Estado reconhece e garante o direito á educação.
2. A educação pertence à família e, em cooperação com ela ou na falta dela, ao Estado, à Igreja católica e demais confissões religiosas e aos particulares em geral.
3. Compete ao Estado criar e manter um serviço nacional de educação, geral e gratuito.
4. São admitidas e apoiadas as iniciativas e os empreendimentos que se proponham concorrer ou colaborar com o serviço nacional de educação, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com aquele serviço.

ARTIGO 55.°

(Investigação, cultura e desportos)

1. O Estado reconhece e garante o direito de acesso aos bens da ciência, da técnica e da cultura, bem como à prática desportiva.
2. Compete ao Estado criar e manter serviços nacionais de investigação científica e tecnológica, de conservação, criação e difusão cultural e de fomento da educação física e do desporto.
3. São admitidas e apoiadas todas as iniciativas e instituições que se proponham concorrer ou colaborar com as serviços nacionais referidos no número anterior, sem prejuízo da sua regulamentação por lei, da sua fiscalização pelo Estado e da sua articulação com aqueles serviços:

ARTIGO 56.°

(Comunicação social)

1. O Estado reconhece e garante o direito à informação e assegura a defesa do pluralismo da opinião pública.
2. São admitidas as organizações e empresas privadas que se proponham exercer a liberdade de expressão, sem prejuízo da sua regulamentação por lei e da sua fiscalização pelo Estado.
3. O Estado apoiará, em especial, a criação de empresas de comunicação social constituídas por profissionais da informação.

ARTIGO 57.°

(Confissões religiosas)

1. O regime das relações do Estado com as confissões religiosas é o da separação, sem prejuízo das relações diplomáticas de Portugal com a Santa Sé.
2. As relações do Estado com a Igreja Católica assentam na independência dos dois poderes na respectiva ordem e na colaboração que sobre matérias de interesse comum seja definida em concordatas ou acordos.
3. As confissões religiosas gozam em Portugal de personalidade jurídica, podendo constituir associações ou fundações, cuja personalidade jurídica será igualmente reconhecida.

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358-(10) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

PARTE III

Dos órgãos de soberania

TITULO I

Do Presidente da República

CAPITULO I

Da eleição e estatuto do Presidente da República

ARTIGO 58.º

O Presidente da República será o Chefe do Estado e desempenhará, por inerência, as funções de Presidente do Conselho da Revolução e de Comandante Supremo das Forças Armadas.

ARTIGO 59.º

1. O Presidente da República será eleito por um colégio eleitoral, para o efeito constituído pela Assembleia do MFA e pela Assembleia legislativa.
2. A eleição será feita por escrutínio secreto, considerando-se eleito o candidato que no primeiro escrutínio obtiver a maioria absoluta dos votos do número total dos membros do colégio eleitoral.
3. Se nenhum candidato obtiver a maioria absoluta no primeiro escrutínio, proceder-se-á a nova votação, à qual serão admitidos apenas os candidatos que tiverem obtido mais de 20% dos votos, considerando-se eleito o candidato que obtiver maior número de votos.

ARTIGO 60.º
(Elegibilidade)

Só pode ser eleito Presidente da República o cidadão português de origem, maior, de 35 anos, no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.

ARTIGO 61.º

(Candidaturas e campanha eleitoral)

1. As candidaturas, deverão ser subscritas por um mínimo de oitenta e por um máximo de cem eleitores.
2. Não haverá campanha eleitoral, mas no dia da eleição, e antes desta, todos os candidatos deverão expor o seu programa perante o colégio eleitoral, sem prejuízo de quaisquer outras declarações públicas prestadas desde a apresentação das candidaturas até ao dia da eleição.

ARTIGO 62.º
(Acto de posse)

1. O Presidente da República assumirá as suas funções uma semana após a eleição e toma Posse perante a Assembleia do MFA e a Assembleia Legislativa, reunidas em sessão conjunta.
2. No acto de posse, o Presidente eleito prestará juramento mediante a fórmula seguinte:
Juro por minha honra defender e cumprir lealmente a Constituição da República Portuguesa, respeitar as leis, garantir a justiça, promover o bem geral do povo português e assegurar a independência da Pátria.

ARTIGO 63.°

(Duração do mandato)

1. O Presidente da República eleito nos termos desta Constituição exercerá o seu mandato até à entrada em funções do Presidente eleito de harmonia com a Constituição revista, nos termos do artigo 148.°
2. O disposto no número anterior é também aplicável à hipótese de, no decurso do período aí previsto, se verificar nova eleição.

ARTIGO 64.°

(Subsídio e residência)

1. O Presidente da República tem direito a um subsídio, que será fixado pelo Conselho da Revolução antes da eleição.
2. A Presidência da República e a residência oficial do Presidente são em Lisboa, no Palácio Nacional de Belém.
3. O Presidente da República pode escolher duas propriedades do Estado para residência particular.

ARTIGO 65.°

(Ausência do País)

1. O Presidente da República não pode ausentar-se do País sem autorização da Assembleia Legislativa e do Conselho da Revolução.
2. No caso de a Assembleia Legislativa não se encontrar em funcionamento, será a sua autorização suprida pelo assentimento do Governo.
3. A inobservância do disposto nos números anteriores acarreta a perda do cargo, salvo nos casos de simples passagem ou de deslocação particular não superior a cinco dias.

ARTIGO 66.°

(Responsabilidade)

1. O Presidente da República responde exclusivamente perante a Nação, mas pode ser destituído do cargo por deliberação de dois terços dos membros da Assembleia do MFA e da Assembleia Legislativa, para o efeito reunidas em sessão conjunta.
2. A iniciativa do processo de destituição cabe exclusivamente ao Conselho da Revolução.
3. A responsabilidade criminal do Presidente da República por actos praticados durante o desempenho das suas funções efectivar-se-á perante os tribunais comuns, mas somente após o termo do mandato.

ARTIGO 67.°

(Renúncia ao cargo)

O Presidente da República pode renunciar ao cargo em mensagem dirigida à Assembleia do MFA

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e à Assembleia Legislativa e publicada no Diário do Governo.

ARTIGO 68.°

(Suplência e vacatura do cargo)

1. No caso de impedimento temporário do Presidente da República, assumirá as suas funções quem o Conselho da Revolução designar.
2. No caso de vacatura do cargo por morte, impedimento permanente, renúncia ou ausência indevida para o estrangeiro, assumirá as funções presidenciais quem o Conselho da Revolução designar, devendo proceder-se a nova eleição no prazo de sessenta dias.

CAPITULO II

Da competência do Presidente da República

ARTIGO 69.°
(Competência)

Compete ao Presidente da República:
1.° Presidir ao Conselho da Revolução;
2.° Exercer o cargo de comandante supremo das Forças Armadas;
3.° Representar a República Portuguesa nas relações internacionais, ratificar os tratados internacionais ou declarar a adesão a eles, depois de devidamente aprovados, nomear os chefes das missões diplomáticas portuguesas e acreditar os das missões estrangeiras em Portugal;
4.° Marcar o dia das eleições para a Assembleia Legislativa;
5.° Abrir solenemente as sessões anuais da Assembleia Legislativa e dirigir-lhe mensagens, que poderá ler pessoalmente ou dar a ler ao respectivo presidente;
6.° Convocar extraordinariamente, por motivo de interesse nacional, a Assembleia Legislativa para deliberar sobre assuntos determinados;
7.° Dissolver a Assembleia Legislativa, sob deliberação do Conselho da Revolução, marcando a data para novas eleições, a realizar no prazo de noventa dias;
8.° Nomear e exonerar o Primeiro-Ministro, ouvido o Conselho da Revolução;
9.° Nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro;
10.° Presidir ao Conselho de Ministros, sempre que o entender conveniente ou quando o Primeiro Ministro lho solicitar;
11.° Indultar e comutar penas;
12.° Nomear os presidentes do Tribunal Constitucional, do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Militar, do Tribunal de Contas e do Conselho Superior Judiciário, bem como o Procurador-Geral da República e o Defensor do Cidadão;
13.° Nomear três juizes do Tribunal Constitucional;
14.° Presidir ao Conselho de Estado e nomear cinco dos respectivos conselheiros:
15.° Promulgar é fazer publicar as leis da Conselho da Revolução e da Assembleia Legislativa, bem como os decretos com força de lei e os decretos-lei do Governo;
16.° Declarar o estado de sítio, após a autorização para o efeito concedida pelo Conselho da Revolução;
17.° Desempenhar a função de Grão-Mestre das Ordens Honoríficas Portuguesas.

ARTIGO 70.°

(Falta de promulgação)

A falta de promulgação, nos casos do n.° 15.° do artigo anterior, acarreta inexistência do diploma.

ARTIGO 71.°

(Referenda ministerial)
1. Carecem de referenda do Primeiro-Ministro e dos Ministros competentes os actos do Presidente da República relativos às competências referidas nos n.°s 3.°, 4.°, 6.°, 7.°, 9.°, 11.°, 12.° e 15.° do artigo 69.°
2. A falta de referenda acarreta a inexistência jurídica do acto.

CAPITULO III

Do Conselho de Estado

ARTIGO 72.°
(Composição)

1. Junto do Presidente da República, e sob a sua presidência, funciona o Conselho de Estado, com a composição seguinte:
a) O Presidente dá Assembleia Legislativa;
b) O Primeiro-Ministro;
c) O Presidente do Tribunal Constitucional;
d) Um delegado de cada partido político representado na Assembleia Legislativa;
e) Cinco individualidades de reconhecido mérito.

2. Os conselheiros pertencentes às duas últimas categorias referidas no número anterior serão nomeados pelo Presidente da República pelo período correspondente à duração do mandato presidencial, no primeiro caso mediante indicação de cada partido e, no segundo, por livre escolha do Presidente da República.

ARTIGO 73.°

(Competência)

Compete ao Conselho de Estado:
1.° Assistir ao Presidente da República sempre que ele tenha de exercer alguma das competências referidas nos n.°s 6.°, 7.°, 8.º e 11.° do artigo 69.°;
2.° Contribuir para a cooperação e bom entendimento entre os partidos políticos representados na Assembleia Legislativa;
3.° Pronunciar-se em todos os momentos de crise constitucional e, de um modo geral, sempre que o Presidente da República o julgue conveniente.

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358-(12) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.° 16

TITULO II

Da Assembleia do MFA e do Conselho da Revolução

CAPÍTULO I

Da Assembleia do MFA

ARTIGO 74.°
(Composição)

1. A Assembleia do MFA será composta por 240 representantes das forças armadas, sendo 120 do Exército, 60 da Armada e 60 da Força Aérea.
2. O moda de designação dos membros da Assembleia do MFA será definido por lei do Conselho da Revolução.
3. A Assembleia do MFA, da qual faz parte integrante o Conselho da Revolução, será presidida por este, através do seu próprio Presidente ou de quem as suas vezes fizer.

ARTIGO 75.°

(Participação no colégio eleitoral do Presidente da República)

A Assembleia do MFA faz paste, com a totalidade dos seus membros, do colégio eleitoral para a eleição do Presidente da República.

ARTIGO 76.°

(Funcionamento)

A Assembleia do MFA funcionará em sessão permanente e segundo regulamentação própria, a definir por lei do Conselho da Revolução.

CAPÍTULO II

Do Conselho da Revolução

ARTIGO 77.°

(Composição)

A composição do Conselho da Revolução será definida por lei, que ele próprio elaborará.

ARTIGO 78.°

(Competência)

Compete ao Conselho da Revolução:
1.° Definir, dentro do espírito da Constituição, as necessárias orientações programáticas da política interna e externa, e velar pelo seu cumprimento;
2.° Decidir, com força obrigatória geral, sobre a constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, sem prejuízo da competência dos tribunais para apreciar a sua inconstitucionalidade formal;
3.º Apreciar e sancionar os diplomas legislativos emanados da Assembleia ou do Governo quando respeitem às matérias seguintes:

a) Linhas gerais da política económica, social e financeira;
b) Relações externas, em especial com os novos países de expressão portuguesa; c) Política de descolonização;
d) Exercício de liberdades e direitos fundamentais;
e) Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes;
f) Regulamentação da actividade política, em especial a relativa a actos eleitorais;

4.° Exercer a competência legislativa sobre matérias de interesse nacional de resolução urgente, quando a Assembleia Legislativa ou o Governo não o façam;
5.° Velar pelo cumprimento das leis ordinárias e apreciar os actos do Governo e da administração;
6.° Propor à Assembleia Legislativa alterações à Constituição em vigor;
7.° Exercer a competência legislativa em matéria militar, devendo os respectivos diplomas, se envolverem aumento de despesas não comportáveis pelo orçamento aprovado, ser referendados pelo Primeiro-Ministro;
8.° Autorizar o Presidente da República a fazer a guerra, em caso .de agressão efectiva ou iminente, e a fazer a paz;
9.° Pronunciar-se junto do Presidente da República sobre a escolha do Primeiro-Ministro e dos Ministros que devam ser da confiança do MFA;
10.° Deliberar sobre a dissolução da Assembleia Legislativa quando o considere necessário;
11.° Autorizar o Presidente da República a declarar o estado de sítio:
12.° Pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação;
13.° Pronunciar-se sobre a impossibilidade física, temporária ou permanente, do Presidente da República;
14.° Designar, em caso de morte ou impedimento do Presidente da República, quem desempenhará interinamente as suas funções.

ARTIGO 79.°

(Funcionamento)

O Conselho da Revolução funcionará em sessão permanente, segundo regimento que ele próprio elaborará.

TITULO III

Da Assembleia Legislativa

CAPÍTULO I

Da constituição da Assembleia Legislativa

ARTIGO 80.°

(Composição e eleição)

1. A Assembleia Legislativa será composta por 240 Deputados, cabendo à lei eleitoral determinar a divisão do território em círculos eleitorais e o número de Deputados por círculo.

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2. Os Deputados serão eleitos por sufrágio universal, directo e secreto.

ARTIGO 81.°

(Duração da legislatura)

1. A legislatura da Assembleia Legislativa a eleger de harmonia com apresente Constituição durará até à data em que, segundo ó disposto no artigo 148.°, se dissolverá automaticamente.
2. O disposto no número anterior vale também para o caso de, antes da dissolução automática aí prevista, ser eleita nova Assembleia por dissolução da anterior.

ARTIGO 82.°

(Preenchimento de vagas)

Se ocorrerem vagas na Assembleia Legislativa, serão os respectivos lugares preenchidos, sem eleição suplementar, pelos candidatos não eleitos das listas em relação às quais se verificarem as vagas.

ARTIGO 83.°

(Organização interna)

Compete à Assembleia Legislativa proceder à verificação dos poderes dos seus membros, eleger a sua Mesa, elaborar o seu Regimento e regular a sua policia.

CAPÍTULO II

Dos Deputados

ARTIGO 84.°

(Natureza do mandato)

1. Os Deputados representam o povo português e não os colégios eleitorais por que foram eleitos.
2. Não é admitido o mandato imperativo.

ARTIGO 85.°

(Direitos e imunidades)

1. Os Deputados gozam dos direitos e imunidades seguintes:
a) Não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos ou opiniões que emitirem no exercício da sua função, salvas as restrições constantes do n.° 2 deste artigo;
b) Não podem ser detidos nem ficar presos sem autorização da Assembleia;
c) Não podem ser peritos ou testemunhas sem autorização da Assembleia;
d) Ficam adiados do cumprimento do serviço militar e do serviço cívico;
e) Têm direito ao subsídio que for determinado pelo Conselho da Revolução, antes da eleição;
f) Têm direito às precedências oficiais correspondentes à sua dignidade, a cartão de livre trânsito e a passaporte diplomático.
2. O disposto na alínea a) dó n.° 1 não isenta os Deputados da responsabilidade civil e criminal por difamação, calúnia e injúria, bem como por provocação pública ao crime.
3. Movido procedimento criminal contra algum Deputado e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, a Assembleia decidirá se ele deve ou não ser imediatamente suspenso para efeito do seguimento do processo, salvo se ao facto corresponder pena maior, caso. em que a suspensão será automática.
4. No caso de a Assembleia não se encontrar em funcionamento, as autorizações previstas nas alíneas b) e c) do n.° 1 deste artigo serão da competência da sua Comissão dos Direitos e Imunidades, que para o efeito reunirá imediatamente.

ARTIGO 86.°

(Perda do mandato)

1. São causas de perda do mandato:
a) A verificação de uma incapacidade eleitoral ou de uma inelegibilidade;
b) O exercício de funções incompatíveis com a de Deputado;
c) A aceitação de governo estrangeiro de qual quer emprego ou função;
d) A celebração de contrato com o Governo;
e) A utilização da qualidade de Deputado para obtenção de qualquer provento ou regalia.

2. A verificação dos factos mencionados nas alíneas a), b), c) e d) compete ao Presidente da Assembleia, ouvida a Comissão dos Direitos e Imunidades; a do facto previsto na alínea e) compete aos tribunais comuns.

ARTIGO 87.°

(Renúncia)

1. Os Deputados podem renunciar ao seu cargo, mediante declaração escrita e devidamente fundamentada.
2. A eficácia da renuncia não depende de aceitação.

CAPÍTULO III

Da competência da Assembleia Legislativa

ARTIGO 88.°
(Competência)

Compete à Assembleia Legislativa:
1.° Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las;
2.° Conceder amnistias;
3.° Conceder ao Governo autorizações legislativas;
4.° Deliberar, em segunda votação, sobre os diplomas legislativos dela emanados a que o Conselho da Revolução haja recusado a sanção;
5.° Proceder à revisão da Constituição, sempre que o Conselho da Revolução lho proponha ou logo que terminado o período de transição;
6.° Ratificar os decretos com força de lei que o Governo publicar no uso de autorização legislativa e submeter a ratificação os decretos-leis do Governo;
7.° Aprovar votos de confiança e moções de censura ao Governo;

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8.° Fiscalizar os actos do Governo e da administração;
9.° Ratificar a declaração do estado de sítio, se este tiver de prolongar-se para além de trinta dias;
10.° Criar e extinguir regiões autónomas, aprovar os respectivos estatutos e autorizar o Governo a submetê-las a regime de tutela;
11.° Autorizar a criação e extinção de autarquias locais;
12.° Aprovar, para ratificação ou adesão, os tratados de paz, aliança, arbitragem e rectificação de fronteiras e, bem assim, os que envolvam a participação de Portugal em organizações internacionais ou supranacionais ou tenham por objecto matéria de lei, nos termos do artigo 90.°;
13.° Definir o sistema dos impostos;
14.° Aprovar as bases gerais do Orçamento Geral do Estado em cada ano e autorizar anualmente a cobrança das receitas e a realização das despesas públicas;
15.° Autorizar o Governo a realizar empréstimos e outras operações de crédito que não sejam de dívida flutuante;
16.° Tomar as contas respeitantes a cada ano económico, tanto do Estado como das demais entidades públicas, as quais lhe serão apresentadas com o parecer do Tribunal de Contas e outros elementos necessários à sua apreciação;
17.° Aprovar os princípios e os objectivos fundamentais do Plano económico-social e apreciar os relatórios anuais e firais da sua execução;
18.° Tomar conhecimento das mensagens do Presidente da República.

ARTIGO 89.°

(Limites da competência legislativa)

1. A Assembleia Legislativa não pode legislar em matéria exclusiva do âmbito militar.
2. As leis e resoluções da Assembleia Legislativa carecem da sanção do Conselho da Revolução quando respeitem às matérias referidas no artigo 78.°, n.° 3.°
3. Recusada a sanção, pode a Assembleia Legislativa tomar a iniciativa de submeter os diplomas em causa a novo debate e a segunda votação e, se então se obtiver aprovação por maioria de dois terços do número total de Deputados, o Presidente da República não pode recusar a promulgação daqueles diplomas na sua forma inicial.

ARTIGO 90.°

(Reserva de lei formal)

Constitui matéria da exclusiva competência da Assembleia Legislativa a legislação sobre:
a) Nacionalidade portuguesa;
b) Divisão administrativa do território e direitos e deveres das autarquias locais;
c) Extensão e regime do domínio público;
d) Direitos, liberdades e garantias;
e) Definição dos crimes, das penas e das medidas de segurança;
f) Personalidade e capacidade jurídica, direitos pessoais, direitos da família, direito de propriedade e direitos de sucessão;
g) Contrato de trabalho;
h) Socialização dos meios de produção;
i) Requisição de bens ou serviços e expropriação por utilidade pública;
j) Lei eleitoral;
l) Partidos políticos;
m) Impostos;
n) Organização dos tribunais e estatuto dos juizes;
o) Responsabilidade dos governantes e responsabilidade da administração;
p) Direitos e deveres dos funcionários públicos;
q) Organização e funcionamento do Tribunal Constitucional;
r) Sistema monetário;
s) Padrão dos pesos e medidas.

ARTIGO 91.°

(Alcance da reserva de lei)

1. Só a Assembleia Legislativa pode legislar sobre as matérias da sua competência exclusiva, ressalvado o disposto nos números seguintes.
2. Tratando-se de matérias de interesse nacional e de resolução urgente, se a Assembleia Legislativa não estiver em funcionamento ou, estando-o, for consultada e se declarar impossibilitada de se ocupar delas, pode o Conselho da Revolução substituir-se-lhe.
3. Se a Assembleia Legislativa conceder autorização legislativa ao Governo, este fica habilitado a legislar sobre a matéria da autorização, devendo os decretos com força de lei que assim elaborar ser sujeitos a ratificação no primeiro período de funcionamento que se seguir à publicação, sob pena de caducidade.

ARTIGO 92.°

(Ratificação de Decretos-Leis)

1. A Assembleia Legislativa pode deliberar, o requerimento de dez ou mais Deputados, submeter a ratificação qualquer decreto-lei publicado pelo Governo.
2. Se a ratificação for recusada, o decreto-lei deixará de vigorar a partir da publicação no Diário do Governo, da resolução da Assembleia.
3. Se a ratificação for concedida com emendas, o decreto-lei deixará de vigorar nos mesmos termos, salvo se a Assembleia Legislativa resolver o contrário.

ARTIGO 93.°

(Referendo popular)

A Assembleia Legislativa pode, por maioria de dois terços do número total de Deputados, resolver submeter a referendo popular, de âmbito nacional ou regional, qualquer lei já aprovada, salvo em matéria de impostos.

ARTIGO 94.°

(Iniciativa legislativa)

1. A iniciativa da lei compete tanto ao Governo, mediante propostas de lei, como a qualquer Deputado, mediante projectos de lei.

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2. Os deputados não podem apresentar projectos de lei nem propostas de alteração que envolvam directamente aumento de despesas ou diminuição de receitas do Estado criadas por leis anteriores.

ARTIGO 95.°

(Poderes dos Deputados)

1. Constituem poderes dos Deputados:
a) Formular, oralmente ou por escrito, perguntas para esclarecimento da opinião pública sobre quaisquer actos ou intenções do Governo ou da administração;
b) Ouvir, consultar ou solicitar informações de qualquer serviço do Estado ou entidade pública;
c) Apresentar avisos prévios sobre problemas específicos de natureza política ou administrativa que devam ser resolvidos mediante reformas a preparar pelo Governo;
d) Promover a organização de debates sobre as grandes orientações da política governamental ou sobre temas da actualidade.

2. No caso das alíneas a) e b) do número anterior, se houver segredo de Estado, o Governo indicará por escrito ao interessado os motivos da recusa de resposta ou responderá confidencialmente, ficando o Deputado responsável nos termos legais pela conservação do sigilo.

CAPÍTULO IV

Do funcionamento da Assembleia Legislativa

ARTIGO 96.°

(Sessão legislativa)

1. Cada sessão legislativa anual compreende três períodos: o primeiro de 1 de Outubro a 15 de Dezembro, o segundo de 15 de Janeiro a 31 de Março e o terceiro de 1 de Maio a 15 de Julho.
2. Dentro dos limites fixados no número anterior, cabe à Assembleia marcar as suas reuniões e adiar, suspender ou retomar os trabalhos conforme entender.
3. O funcionamento da Assembleia Legislativa fora dos períodos marcados no n.° 1 depende de convocação extraordinária pelo Presidente da República.

ARTIGO 97.°

(Reuniões plenárias)

1. As reuniões plenárias são públicas, salvo resolução da Assembleia em contrário.
2. A ordem do dia será fixada pelo Presidente de acordo com. o que lhe for solicitado pelo Primeiro-Ministro ou pelos presidentes dos grupos parlamentares da maioria e, quanto a um terço do tempo disponível, pelos presidentes dos grupos parlamentares da oposição.
3. O Primeiro-Ministro e os restantes membros do Governo, ainda que não sejam Deputados, poderão tomar assento e usar da palavra nas reuniões plenárias.

ARTIGO 98.°

(Perguntas orais ao Governo)

Durante o funcionamento efectivo da Assembleia Legislativa haverá todas as semanas dois períodos, de uma hora cada um, para perguntas orais ao Governo, um terço dos quais reservado aos membros da oposição.

ARTIGO 99.°

(Comissões)

1. A Assembleia Legislativa organiza-se em comissões permanentes, especializadas em razão da matéria, e pode constituir comissões eventuais para se ocuparem de assuntos determinados.
2. Além das Comissões de Verificação de Poderes, do Regimento, de Redacção, da Ordem do Dia, dos Direitos e Imunidades, de Política Geral e do Defensor do Cidadão, haverá, em princípio, tantas comissões permanentes quantos os ministérios que componham o Governo e com denominação idêntica à deles.
3. O Primeiro-Ministro e os restantes membros do Governo, ainda que não sejam Deputados, participarão nas reuniões das comissões quando se discutirem propostas de lei da sua autoria ou as comissões assim lho solicitarem.
4. Todos os grupos parlamentares estarão representados nas comissões.
5. As reuniões das comissões só serão públicas se elas assim o deliberarem.

ARTIGO 140. °

(Competência das comissões permanentes)

1. Compete às comissões permanentes:

a) Acompanhar os assuntos compreendidos no âmbito das suas atribuições e seguir continuamente a acção do Governo e a evolução da opinião pública nesses domínios;
b) Receber petições e dar-lhes andamento;
c) Ouvir os cidadãos e os funcionários que assim lho requeiram ou que as comissões intimem a depor;
d) Estudar todos os assuntos que hajam de ser submetidos à Assembleia em reunião plenária e dar parecer sobre eles;
e) Discutir e votar, na especialidade, as leis aprovadas na generalidade em reunião plenária, salvo se a Assembleia resolver, por maioria de dois terços do número total de Deputados, evocar a discussão e votação na especialidade, quanto à totalidade ou a certa ou certas partes do texto em causa;
f) Sugerir ao Governo as providências que julguem necessárias ou convenientes.

2. A Assembleia Legislativa definirá em lei o processo relativo ao exercício pelas comissões da competência referida na alínea c) do número anterior, regulando nomeadamente a forma da intimação, as causas legítimas de escusa e os efeitos da falta de comparência.
3. Quanto ao disposto na primeira parte da alínea e) do n.° 1 deste artigo, uma vez votado em comissão um texto na especialidade, será o mesmo,

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358-(16) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUEM N.º 16

depois de revisto pela Comissão de Redacção, submetido a uma votação final de carácter global em reunião plenária.

ARTIGO 101. °

(Grupos parlamentares)

1. Os Deputados eleitos por cada partido, qualquer que seja o seu número, constituem um grupo parlamentar.
2. Cada grupo parlamentar elegerá o seu presidente.
3. Os presidentes dos grupos parlamentares, sob a presidência do Presidente da Assembleia Legislativa, constituirão a Comissão da Ordem do Dia, destinada a concertar com o Presidente a composição da ordem do dia de cada reunião.
4. Independentemente do disposto no número anterior, o Presidente da Assembleia consultará sempre os presidentes dos grupos parlamentares sobre o funcionamento da Assembleia Legislativa.

CAPÍTULO V

Do Defensor do Cidadão

ARTIGO 102. °

(Função)

1. Junto da Assembleia Legislativa existirá um Defensor do Cidadão, órgão independente e imparcial incumbido de receber, apreciar e decidir as reclamações ou queixas apresentadas pelos cidadãos contra quaisquer acções ou omissões do Governo ou da administração pública arguidas de injustiça, imoralidade ou ilegalidade grosseira.
2. O funcionamento do Defensor do Cidadão é independente dos mecanismos graciosos e contenciosos da justiça administrativa.

ARTIGO 143. °

(Eleição)

O Defensor do Cidadão será eleito no início de cada legislatura e pelo período desta, não podendo ser reeleito.

ARTIGO 104.º

(Competência)

1. O Defensor do Cidadão poderá, no exercício das suas funções, proceder ou mandar proceder a todas as investigações que reputar necessárias, cabendo-lhe participar aos legítimos superiores hierárquicos as infracções disciplinares que detectar e aos tribunais competentes os actos civil ou criminalmente ilícitos que averiguar.
2. O Defensor do Cidadão apresentará anualmente à Assembleia Legislativa e, por intermédio do Presidente desta, ao Governo um relatório discriminado das reclamações e queixas recebidas, das diligências feitas e dos resultados obtidos.
3. Haverá na Assembleia Legislativa uma Comissão do Defensor do Cidadão incumbida de averiguar da eficácia das decisões ou recomendações do Defensor do Cidadão junto das autoridades por ele mencionadas ou postas em causa.

TITULO IV

Do Governo

CAPÍTULO 1

Da composição e escolha do Governo

ARTIGO 105.º

(Composição)

1. O Governo é composto pelo Primeiro-Ministro e pelos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado.
2. O número e a denominação dos Ministérios e Secretarias de Estado são variáveis em função das circunstâncias e determinar-se-ão pelo número e denominação dos Ministros e Secretários de Estado, consoante resultar dos respectivos decretos de nomeação e exoneração.

ARTIGO 106.°

(Nomeação e exoneração)

1. O Primeiro-Ministro é nomeado e exonerado pelo Presidente da República.
2. Os Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado são nomeados e exonerados pelo Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro.
3. As funções dos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado cessam com a exoneração do Primeiro-Ministro e as dos Secretários e Subsecretários de Estado com a exoneração do respectivo Ministro.

ARTIGO 107.°

(Critérios de nomeação)

1. O Primeiro-Ministro será escolhido após audiência do Conselho da Revolução e consulta dos partidos e forças políticas que o Presidente da República entender convenientes.
2. O Governo será escolhido tendo em atenção a representatividade dos partidos na Assembleia Legislativa e as coligações possíveis.
3. A nomeação dos Ministros da Defesa, da Administração Interna e do Planeamento Económico depende de audiência prévia do Conselho da Revolução.

CAPÍTULO II

Da responsabilidade governamental

ARTIGO 108.°

(Princípio geral)

1. O Primeiro-Ministro é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Legislativa.
2. Os Ministros respondem politicamente perante o Primeiro-Ministro e, no âmbito da solidariedade governamental, perante a Assembleia Legislativa.
3. Os Secretários e Subsecretários de Estado respondem politicamente perante o respectivo Ministro e perante o Primeiro-Ministro.

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ARTIGO 109.°

(Investidura do Governo)

1. Nomeados o Primeiro-Ministro e os Ministros, o Governo apresentar-se-á em conjunto perante a Assembleia Legislativa.
2. Cabe ao Primeiro-Ministro expor e defender, perante a Assembleia, o programa do seu Governo, concebido em princípio para o período que faltar até ao termo da legislatura.
3. Iniciar-se-á imediatamente um debate, que não poderá demorar mais de dois dias e que culminará com a aprovação, ou não, dum voto de confiança.
4. Se for aprovado o voto de confiança, o Governo será logo empossado pelo Presidente da República e iniciará o exercício das suas funções.
5. Se for rejeitado o voto de confiança, o Presidente da República encarregará o Primeiro-Ministro designado de formar novo Governo ou escolherá outro Primeiro-Ministro, seguindo-se depois os trâmites estabelecidos nos números anteriores.
6. O procedimento de investidura do Governo previsto neste artigo é igualmente aplicável no caso de recomposição ministerial que abranja, pelo menos, um terço dos Ministros.

ARTIGO 110.°

(Pedido de confiança)

1. O Primeiro-Ministro pode pedir a confiança da Assembleia Legislativa se entender que necessita da sua confirmação, mas apenas quando esteja em causa uma questão essencial, como tal previamente declarada pelo Conselho de Ministros.
2. O debate terá a duração máxima de dois dias.
3. Se o pedido de confiança for rejeitado, o Presidente da República designará .novo Governo ou dissolverá a Assembleia Legislativa, mandando proceder a eleições gerais.

ARTIGO 111.°

(Moção de censura)

1. As moções de censura ao Governo podem ser apresentadas por cinquenta Deputados, pelo menos, seja qual for o grupo parlamentar a que pertençam, ou pelo presidente de qualquer grupo parlamentar da oposição, mas neste caso apenas por urna vez em cada sessão legislativa anual.
2. O debate terá a duração máxima de dois dias.
3. A aprovação de uma moção de censura, só por si, não terá efeitos imediatos, mas a aprovação de duas moções de censura, com pelo menos trinta dias de intervalo, obrigará, conforme os fundamentos da censura, a recomposição ministerial ou a demissão do Governo.
4. No caso de demissão do Governo, o Presidente da República designará novo Governo ou dissolverá a Assembleia Legislativa, mandando proceder a eleições gerais.

ARTIGO 112.°

(Crises extra parlamentares)

Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, o Governo pode ser sempre demitido pelo Presidente da Republica, quer por iniciativa deste, quer a pedido do Primeiro-Ministro.

CAPÍTULO III

Da competência do Governo

ARTIGO 113.°

(Competência)

Compete ao Governo:

1.° Definir, no respeito pela Constituição e pelas leis e dentro das orientações programáticas traçadas pelo Conselho da Revolução, a política interna e externa do País;
2.° Fazer decretos rum força de lei, no uso de autorizações legislativas conferidas pela Assembleia Legislativa;
3.° Fazer Decretos-Leis fora das matérias reservadas à competência exclusiva do Conselho da Revolução e da Assembleia Legislativa;
4.° Negociar e concluir tratados e acordos internacionais e aprovar, para ratificação ou adesão, os tratados que não tenham de ser aprovados pela Assembleia Legislativa;
5.° Apresentar propostas de lei ou de resolução à Assembleia Legislativa e, bem assim, submeter-lhe os documentos e assuntos sobre que ela deva pronunciar-se;
6.° Referendar os actos do Presidente da República, nos termas do artigo 71.º;
7.° Elaborar regulamentos e instruções para a boa execução das leis e o eficiente funcionamento da administração;
8.° Dirigir os serviços e organismos do Estado, orientar os institutos públicos autónomos e as empresas públicas e nacionalizadas e, bem assim, superintender no conjunto da administração pública descentralizada;
9.° Praticar todos os actos e tomar todas as providências necessárias à manutenção da ordem, ao respeito da lei e à satisfação das necessidades públicas.

ARTIGO 114.°

(Definição, orientação e execução da política governamental)

1. Compete ao Conselho de Ministros definir as linhas gerais da orientação governamental.
2. Compete ao Primeiro-Ministro presidir ao Conselho de Ministros, salvo o disposto no artigo 69.°, n.° 10.°, e dirigir, coordenar e fiscalizar a execução da política do Governo.
3. A execução da política definida para cada Ministério será assegurada pelo respectivo Ministro, sob a orientação do Primeiro-Ministro.

CAPÍTULO IV

Do funcionamento do Governo

ARTIGO 115.°

(Conselho de Ministros)

1. Do Conselho pie Ministros participam, em regra, apenas o Primeiro-Ministro e os Ministros.

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2. Podem ser convocados para o Conselho de Ministros os Secretários e Subsecretários de Estado, quando lhes esteja atribuída a substituição do respectivo Ministro e quando, pela natureza dos assuntos em apreciação, a sua presença possa ser útil.
3. Serão definidos por decreto-lei os casos em que a competência do Governo tem de ser exercida em Conselho de Ministros.

ARTIGO 116.º

(Conselhos de Ministros especiais)

1. Poderá haver Conselhos de Ministros especializados em razão da matéria.
2. O Governo definirá, por decreto-lei, quais os Conselhos de .Ministros especiais que funcionarão a título permanente, sem prejuízo da faculdade que o Primeiro Ministro terá de convocar eventualmente conselhos especiais não previstos.
3. Aos Conselhos de Ministros especiais com carácter permanente poderão ser atribuídas, por decreto-lei ou mediante delegação de poderes, funções regulamentares e administrativas.
4. Nos Conselhos de Ministros especiais participarão, em regra, os Secretários e Subsecretários de Estado competentes e poderão ser ouvidos os funcionários que for conveniente convocar.

ARTIGO 117.°

[Suplência]

1. Na ausência ou impedimento do Primeiro-Ministro ou de algum Ministro será sempre designado um membro do Governo para desempenhar interinamente as respectivas funções.
2. A substituição interina do Primeiro-Ministro caberá ao Ministro que ele propuser ao Presidente da República ou, na falta dessa proposta, ao Ministro que o Presidente da República designar.
3. A substituição interina dos Ministros caberá aos Ministros que o Primeiro-Ministro propuser ao Presidente da República ou, se for de curta duração, ao Secretário de Estado do respectivo Ministério que o Primeiro-Ministro designar.
4. O início e o termo do desempenho de funções por substituição interina será sempre divulgado, sob a forma de aviso, no Diário do Governo.

ARTIGO 118.°

(Responsabilidade dos membros do Governo)

1. Os membros do Governo são responsáveis civil e criminalmente pelos actos que praticarem ou legalizarem.
2. A Assembleia Legislativa definirá, por lei, quais os crimes de responsabilidade dos membros do Governo e quais as sanções aplicáveis aos seus autores.
3. Movido procedimento criminal contra algum membro do Governo e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, o Tribunal Constitucional decidirá se ele deve ou não ser imediatamente suspenso para efeito do seguimento do processo, salvo se ao facto corresponder pena maior, caso em que a suspensão será automática.

TITULO V

Dos tribunais

CAPÍTULO 1

Da organização dos tribunais

ARTIGO 119.°

(Poder Judicial)

1. O Poder Judicial pertence aos tribunais.
2. No exercício do Poder Judicial os tribunais são independentes e não devem obediência senão à lei.

ARTIGO 120.°

(Espécies de tribunais)

1. São judiciais todos os tribunais portugueses, excepto o Tribunal Constitucional, os tribunais militares e o Tribunal de Contas.
2. Não é permitida a existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de determinada ou determinadas categorias de crimes, mesmo que sejam contra a segurança do Estado.

ARTIGO 121.°

(Supremo Tribunal de Justiça)

1. O Supremo Tribunal de Justiça é o órgão supremo da hierarquia dos tribunais judiciais, tanto comuns como especiais.
2. O Supremo Tribunal de Justiça funciona, conforme os casos, como tribunal de revista, de apelação ou de agravo, pertencendo-lhe também proceder à uniformização da jurisprudência.
3. O Supremo Tribunal de Justiça compreenderá as seguintes secções: civil, comercial, criminal, do trabalho, do contencioso administrativo e do contencioso tributário.

ARTIGO 122.º

(Tribunais comuns)

1. Constituem tribunais comuns de 1.ª instância os tribunais de comarca e de 2.ª instância os tribunais da Relação.
2. A competência dos tribunais comuns abrange as causas de natureza civil, comercial e criminal.
3. É admitida, no âmbito dos tribunais comuns, a criação de juízos especializados para determinadas questões não criminais, nomeadamente os tribunais de menores e os tribunais de família.

ARTIGO 123.°

(Tribunais especiais)

1. Constituem tribunais especiais, dentro da ordem judicial, os tribunais do trabalho, os tribunais do contencioso administrativo e os tribunais do contencioso tributário.
2. Haverá tribunais do trabalho de 1.ª e de 2.ª instância.
3. Os tribunais de instância do contencioso administrativo serão as auditorias administrativas, salvo no tocante à impugnação dos actos praticados pelos membros do Governo, que será feita perante á secção do contencioso administrativo da Relação de Lisboa.

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4. Haverá tribunais do contencioso tributário de 1.ª e de 2.ª instância.
5. Das decisões recorríveis proferidas pela 2.ª instância dos tribunais do trabalho e do contencioso tributário, bem como das proferidas pelas auditorias administrativas e pela secção do contencioso administrativo da Relação de Lisboa, interpor-se-á recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 124. °

(Tribunais não judiciais)

1 O Tribunal Constitucional terá a competência estabelecida na Constituição.
2. Os tribunais militares constituem uma hierarquia própria, coroada pelo Supremo Tribunal Militar, e terão apenas competência para julgar os crimes essencialmente militares.
3. O Tribunal de Contas é um órgão de natureza mista, graciosa e contenciosa, ao qual compete principalmente a fiscalização da regularidade financeira das despesas públicas, o julgamento das contas públicas e dos seus responsáveis e, ainda, a emissão de parecer sobre a Conta Geral do Estado.

CAPÍTULO II

Do estatuto dos juizes

ARTIGO 125.°

(Inamovibilidade)

Os juizes são vitalícios e inamovíveis, não podendo ser transferidos nem suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos expressamente previstos na lei e com garantia da sua prévia audiência.

ARTIGO 126. °

(Irresponsabilidade)

Os juizes são irresponsáveis pelos seus julgamentos, salvo nos casos, de actuação dolosa expressamente previstos na lei.

ARTIGO 127.°

(Incompatibilidade)

Os juizes não podem desempenhar qualquer outra actividade pública ou privada.

ARTIGO 128.°

(Direitos e Imunidades)

A lei fixará os direitos e imunidades atribuídos aos juizes em virtude da sua qualidade de titulares de órgãos da soberania.

CAPITULO III

Do funcionamento dos tribunais

ARTIGO 129.°

(Audiências)

As audiências dos tribunais são públicas, salvo quando a publicidade for excluída por lei ou contrária à ordem pública ou aos bons costumes.

ARTIGO 130.°

(Ministério Público)

Os interesses do Estado e das outras entidades públicas, bem como os que a lei especialmente lhe confiar, serão representados junto dos tribunais pelo Ministério Público, cuja magistratura será paralela à judicial e organizada na dependência do Governo.

ARTIGO 131.°

(Proibição do júri)

Não será permitido o instituto do júri na administração da justiça.

ARTIGO 132.°

(Execução das decisões judiciais)

1. As decisões judiciais são obrigatórias para todos os cidadãos e autoridades.
2. Na execução das suas decisões contra qualquer cidadão os tribunais terão direito à cooperação das autoridades.
3. A lei regulará os termos da execução das decisões judiciais contra qualquer autoridade e determinará as sanções a aplicar aos responsáveis pela inexecução ilícita delas ou pelo desrespeito do caso julgado.

PARTE IV

Da defesa e revisão da Constituição

TITULO I

Da defesa da Constituição

CAPITULO I

Fiscalização da constitucionalidade

ARTIGO 133.°

[Repartição de competência]

1. Compete ao Conselho da Revolução fiscalizar a constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, podendo acerca deles tomar decisões com força obrigatória geral.
2. Compete ao Tribunal Constitucional decidir sobre a inconstitucionalidade formal das leis e outros diplomas legislativos, bem como sobre a inconstitucionalidade orgânica, formal ou material de quaisquer normas não legislativas e actos jurídicos públicos.

ARTIGO 134.°

(Processo de fiscalização)

1. Sempre que em qualquer julgamento estiver em causa a aplicação duma norma ou dum acto contrário a alguma disposição da Constituição ou a algum dos princípios nela consagrados, poderá o tribunal ou qualquer das partes levantar a questão da inconstitucionalidade.
2. Suscitada oficiosamente ou admitida a questão pelo tribunal, o incidente subirá em separado ao Tribunal Constitucional.

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3. Se o julgamento da questão for, nos termos do n.° 1 do artigo anterior, da competência do Conselho da Revolução, a Tribunal Constitucional emitirá parecer sobre o caso e remetê-lo-á, juntamente com o processo, ao Conselho da Revolução, devendo a decisão deste ser devolvida ao Tribunal Constitucional para que a comunique ao tribunal competente.
4. Se a julgamento da questão for, nas termos do n.° 2 do artigo anterior, da competência do Tribunal Constitucional, será por este imediatamente decidida.

ARTIGO 135.°

(Eficácia da decisão)

1. As decisões tomadas em matéria de inconstitucionalidade pelo Conselho da Revolução terão força obrigatória geral ou eficácia restrita ao casa sob julgamento, conforme a próprio Conselho determinar.
2. As decisões do Tribunal Constitucional aplicar-se-ão apenas ao caso que as tiver motivado.

CAPÍTULO II

Do Tribunal Constitucional

ARTIGO 136.°

(Composição)

O Tribunal Constitucional é composto por um presidente, nomeado pelo Presidente da República, e por nove juizes, dos quais três nomeados pelo Presidente da República, três pelo Presidente da Assembleia Legislativa e três pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 137.°

(Duração das funções)

1. Cada juiz será designado por seis anos e poderá ser reconduzido por uma vez.
2. Proceder-se-á bienalmente à renovação de um terça dos juízes.

ARTIGO 138.°

(Recrutamento)

1. Dois juizes de cada terço deverão ser escolhidos entre os juízes da Supremo Tribunal de Justiça ou das Relações.
2. O presidente e as restantes juizes poderão ser livremente escolhidas de entre doutores em Direito ou de entre licenciados em Direito com mais de quinze anos de exercício profissional.

ARTIGO 139.°

(Categoria e vencimentos)

O presidente, e os juizes do Tribunal Constitucional terão categoria e vencimentos idênticos aos do presidente e dos juizes do Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 140.°

(Competência do Tribunal Constitucional)

Compete ao Tribunal Constitucional:
1.° Apreciar a inconstitucionalidade formal das leis e outros diplomas legislativos;
2.° Emitir parecer sobre a inconstitucionalidade orgânica e material das leis e outros diplomas legislativos;
3.° Apreciar a inconstitucionalidade orgânica, formal e material de quaisquer normas não nomeadamente as constantes de tratado ou acordo internacional e de regulamento geral, regional ou local;
4.° Apreciar a inconstitucional idade orgânica, formal e material de qualquer acto jurídico-público concreto;
5.° Defender, nos termos que a lei estabelecer, a integridade e o conteúdo dos direitos, liberdades e garantias, quando violados ou afectados por acção ou omissão das autoridades ou dos cidadãos;
6.° Julgar os recursos eleitorais;
7.° Julgar a validade das eleições do Presidente da República e da Assembleia Legislativa e dos referendos políticas e, bem assim, proclamar as respectivos resultados;
8.° Registar a constituição das partidos políticos e aplicar-lhes as sanções legais;
9.° Decidir sobre a suspensão dos membros do Governo contra os quais tenha sido movido procedimento criminal.

TÍTULO II

Da revisão da Constituição

ARTIGO 141.°

(Princípio geral)

1. A presente Constituição pode ser revista, a todo o momento, pela Assembleia Legislativa.
2. A iniciativa da revisão constitucional pertence exclusivamente ao. Conselho da Revolução.

ARTIGO 142.°

(Âmbito da revisão)

1. A revisão constitucional será sempre limitada aos pontos tocadas na proposta apresentada pelo Conselho da Revolução.
2. O disposto no número anterior não obsta à faculdade de os Deputados apresentarem, na âmbito delimitado pela iniciativa da Conselho da Revolução, propostas de substituição, eliminação, emenda ou aditamento.

ARTIGO 143.°

(Limites constitucionais da revisão)

Nenhuma revisão constitucional poderá afectar:
a) A forma republicana de governo;
b) Os direitos, liberdades e garantias individuais;
c) A soberania popular expressa através do voto e o carácter universal e secreto do sufrágio;
d) O pluralismo partidário;
e) O reconhecimento da oposição;
f) A responsabilidade do Governo perante a Assembleia Legislativa;
g) A independência e a unidade do Poder Judicial;
h) As garantias da magistratura,

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ARTIGO 144.°

(Deliberações)

As modificações da Constituição carecem de aprovação pela maioria absoluta do número total de Deputados.

Disposições transitórias

ARTIGO 145.°

(Promulgação e entrada em vigor)

A presente Constituição será promulgada pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, e entrará em vigor na data da sua publicação.

ARTIGO 146.°

(Lei eleitoral)

1. O Governo Provisório procederá, no prazo de oito dias a contar da entrada em vigor da Constituição, à nomeação de um comissão, composta por especialistas e por delegados dos partidas representados na Assembleia Constituinte, com o mandato de, no prazo de trinta dias, apresentar um projecto de revisão da Lei Eleitoral.
2. A nova Lei Eleitoral será aprovada pelo Governo e sancionada pelo Conselho da Revolução até sessenta dias após a entrada em vigor da Constituição.

ARTIGO 147.°

(Realização de eleições)

1. As eleições parlamentares terão lugar dentro de dois meses a contar da publicação da Lei Eleitoral.
2. Na mesma data realizar-se-ão em todo o território nacional eleições municipais.
3. As eleições para a Presidência da República terão lugar dentro de dois meses a contar da data das eleições parlamentares.

ARTIGO 148.°

(Período de transição)

1. A fase do Governo Provisório terminará no dia da passe do Presidente da República eleito, iniciando-se então o período de transição.
2. O período de transição terá a duração de três anos.
3. No dia em que terminar o período de transição considerar-se-á automaticamente dissolvida a Assembleia Legislativa, devendo o Presidente da República marcar novas eleições dentro de noventa dias.
4. A nova Assembleia Legislativa terá poderes constituintes, sujeitos apenas aos limites traçados no artigo 143.°.
5. Quando o novo texto constitucional entrar em vigor, considerar-se-á extinta a Plataforma de Acordo Constitucional entre o MFA e os Partidos Políticos, assinada em 11 de Abril de 1975, será dissolvido o MFA, com todos os seus órgãos e serviços, e a acção das forças armadas será restringida ú missão específica de defesa da soberania nacional.

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PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELO MOVIMENTO DEMOCRÁTICO PORTUGUÊS (MDP/CDE)

SUMÁRIO

Preâmbulo.
Capítulo I - Princípios fundamentais do Estado.
Capítulo II - Bases económicas e sociais.
Capítulo III - Direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Capítulo IV - Órgãos de Soberania.
Capítulo V - Administração local e poder popular
Capítulo VI - Legalidade e justiça democráticas. Normas transitórias e disposições finais.

Preâmbulo

1. A luta unitária e democrática do povo português para se libertar da tirania fascista, que durante 48 anos foi causa de inúmeros sofrimentos e humilhações, gerou e multiplicou a opressão, a miséria e a ignorância ancestrais, culminou, em 25 de Abril, com a vitória histórica da liberdade, em que foi decisiva a intervenção do Movimento das Forças Armadas, apoiado e fortalecido, desde o primeiro instante, pelas massas populares.
2. Derrotando o fascismo, como forma superior de opressão, o povo português e o MFA puderam iniciar, assim, um largo processo de avanço social histórico pela liberdade económica, política e social, objectivo que une na mesma luta popular a acção contra o domínio monopolista, pela independência nacional e contra a subordinação ao imperialismo estrangeiro, pela abolição do colonialismo e da guerra colonial, contra a reacção política em todas as suas manifestações, contra as sequelas feudais há muito condenadas, pelo fim da opressão de classe e do capitalismo, em suma, preparando o socialismo, preparando o advento de um Portugal livre e do povo.
3. O processo de descolonização, logo iniciado, já reconheceu aos povos das colónias o direito de acesso à independência pela qual sempre lutaram e permitiu pôr fim à guerra injusta que, durante mais de treze anos, devorando vidas e haveres, arruinou e mortificou a Pátria e foi conduzida em proveito exclusivo de uma minoria exploradora.
4. Com a destruição imediata dos órgãos superiores da governação e da opressão fascistas e a anulação da principal legislação repressiva, o povo português alcançou o exercício das liberdades políticas, que sempre constituiu um dos seus objectivos principais e que, desde o 25 de Abril, lhe abriu o caminho que vem percorrendo das conquistas sociais históricas na sua luta contra a exploração económica. A mobilização unitária das grandes camadas da população portuguesa fazendo face aos graves problemas do País, a sua progressiva consciencialização política, o fortalecimento da sua aliança com o WA e o apoio constante ao seu avanço revolucionário permitiram lançar e vitalizar a estrutura da sociedade democrática, dominar os golpes e as intentonas dos seus inimigos, lançar medidas económicas revolucionárias contra as forças capitalistas exploradoras e assim abrir a possibilidade esperançosa de arrancar o País à miséria e ao atraso e de começar a caminhada segura em direcção ao socialismo.
5. Na dura batalha da consolidação do processo democrático e da instauração de uma sociedade socialista que irá, definitiva e totalmente, abolir as classes sociais e a exploração do homem pelo homem, devem todas as forças democráticas empenhar-se revolucionáriamente e na ciará consciência de que esse dever é uma tarefa patriótica e comum de todos os portugueses, que só poderá cumprir-se na íntima unidade de todas as camadas da população que foram vítimas da opressão fascista e exploração social.
6. O empenhamento unitário e profundo do povo português, em íntima e vigorosa união com o libertador Movimento das Forças Armadas e no apoio permanente à sua dinâmica revolucionária, é a garantia das conquistas que hão-de conduzir os Portugueses a uma sociedade nova, livre, de paz, em que não haja exploradores nem explorados, em que se combata a ignorância, em que desapareça a fome e em que se apague a vergonha da dominação estrangeira.
7. Conscientes de que a rápida aproximação do futuro socialista de Portugal é a única via para arrancar o País a esse estado de atraso económico, social

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e político causado por séculos de opressão pelas classes privilegiadas e agravado pelo último meio século de ditadura terrorista do grande capital;
Certos de que a construção desse futuro radioso não é possível sem a completa liquidação dos vestígios do fascismo e do colonialismo da sociedade portuguesa
Firmes na convicção de que a luta contra o imperialismo, pela paz e cooperação entre todos os povos do Mundo, a defesa da solidariedade internacionalista com todos os oprimidos e o fim da divisão do Mundo em blocos militares adversos estão indissoluvelmente ente ligados à defesa intransigente da independência e segurança nacionais;
Seguros de que só a unidade activa de todos os portugueses empenhados na construção da Pátria, através da aliança das massas populares e o MFA, poderá alcançar os objectivos do processo revolucionário de edificação pacífica de uma sociedade socialista;
No cumprimento do mandato do povo português e no propósito de responder à sua revolução, nós, representantes do povo português, aprovamos a Constituição Política da República Democrática Portuguesa.

TITULO I

Princípios fundamentais

ARTIGO 1.º

O Estado Português é uma República Democrática que, baseando-se nas grandes camadas da população historicamente oprimidas, promove, pela aliança revolucionária do povo com as suas forças armadas, a instauração de uma sociedade socialista.

ARTIGO 2.º

0 Estado Português é uno e indivisível e o seu território compreende o território continental e as ilhas adjacentes.

ARTIGO 3.º

1. A República Democrática Portuguesa é o Estado que, exprimindo e assegurando a histórica conquista da liberdade e seu, desenvolvimento em Portugal, facilita e reforça a organização popular, base da expansão democrática portuguesa e do seu avanço para o socialismo.
2. A soberania pertence ao povo e exerce-se pela aliança revolucionária das massas trabalhadoras oras e das forças armadas, que garante a consolidação das conquistas democráticas, promove a participação progressiva do povo em todas as instâncias, do poder e constitui o principal instrumento da construção do socialismo em Portugal.
3. A defesa da independência e da integridade da Pátria é missão fundamental das forças armadas e do respectivo movimento, aos quais incumbe igualmente não só a função de motor e dinamizador da revolução portuguesa, em aliança com as massas populares organizadas, mas ainda o dever cívico de, em conjunto com o povo, consolidar a democracia e instaurar o socialismo.

ARTIGO 4.º

Na sua tarefa de instauração do socialismo, a República Democrática Portuguesa propõe-se:
a) Banir definitivamente das mentalidades e das instituições todos os vestígios do fascismo, do colonialismo e do neocolonialismo, lutando sem tréguas pela emancipação económica e política de todos os explorados;
b) Abolir definitivamente os monopólios, latifúndios e grandes intermediários capitalistas, principais responsáveis pela opressão de que tem sido vítima o povo português;
c) Estimular a organização e consciencialização das massas populares e promover, através da sua institucionalização progressiva como órgãos do Estado, a participação cada vez mais ampla do povo em todos os níveis do poder;
d) Imprimir à evolução económico-social do Pais uma orientação que faça coincidir progressivamente o carácter social dos grandes meios de produção com a sua detenção colectiva por parte do povo português;
e) Criar, progressiva e irreversivelmente, as condições indispensáveis à instituição de uma verdadeira sociedade sem classes, liberta da exploração do homem pelo homem.

ARTIGO 5.º

1. A defesa da independência e integridade da Pátria, a luta contra todas as formas de opressão colonial e imperialista e o estabelecimento de relações fraternas com todos os povos progressivos, especialmente os de expressão portuguesa, com vista à defesa da paz e da cooperação internacional, são tarefas absolutamente indissociáveis da consolidação da democracia e da construção do socialismo.
Neste sentido:
a) A República Democrática Portuguesa reafirma o direito de todos w povos colonizados a uma verdadeira independência económica e política e assegura, nas suas relações externas, um lugar preferencial aos novos Estados resultantes do processo de descolonização iniciado com a revolução de 25 de Abril;
b) A República Democrática Portuguesa pratica o princípio da não ingerência nos assuntos internos dos Estados e respeita os compromissos internacionais assumidos no quadro da progressiva afirmação de uma política de neutralidade oposta à continuação de, blocos militares;
c) A República Democrática Portuguesa faz seus os princípios patrióticos da solidariedade internacionalista na luta contra a exploração do homem pelo homem e pela emancipação de todos os povos do Mundo.

2. A República Democrática Portuguesa garante o direito de asilo a todos os cidadãos estrangeiros perseguidos por lutarem a favor da paz, da democracia, da independência nacional, dos direitos dos trabalhadores e da defesa da dignidade humana.

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TITULO II

Bases económicas e sociais

ARTIGO 6.º

A política económica da República Democrática Portuguesa tem por objectivos: a subida do nível de vida da população e a consolidação do poder popular e da independência económica nacional.

ARTIGO 7.º

1. A economia portuguesa organiza-se em três sectores fundamentais: estatal, cooperativo e privado.
2. Compete ao Estado, através do Plano Económico Nacional, graduar e coordenar os diversos sectores, tendo em vista não apenas o aumento da produção nacional, mas também a defesa das classes trabalhadoras.

ARTIGO 8.º

Ao Estado, através da planificação económica, competirá reforçar progressivamente a promoção económica e social dos meios rurais, vencendo o seu atraso em relação aos meios urbanos, com base na transformação social dos campos em favor dos camponeses e na íntima cooperação entre os trabalhadores agrícolas e os trabalhadores da indústria.

ARTIGO 9.

Ao Estado competirá o alargamento dos domínios da indústria e dos serviços, com vista à transformação das relações económicas e sociais do País, na perspectiva da transição para o socialismo e garantindo a independência nacional.

ARTIGO 10.º

A defesa do solo e subsolo, das espécies e, de um modo geral, do ambiente caberá ao Estado e constitui indeclinável dever dos cidadãos, sendo severamente reprimidas todas as formas de actuação económica que contrariem este princípio.

ARTIGO 11.º

1. Constituem propriedade do Estado a indústria bancária, a indústria seguradora e as indústrias delas dependentes, devendo progressivamente entrar nesse domínio os sectores básicos da economia.
2. Além disso, deverá ser nacionalizado qualquer sector económico ou empresa sempre que o interesse social o justifique. O Estado definirá, em cada caso, se existe ou não indemnização e qual o seu montante, nunca podendo ter direito a ela os monopolistas, os latifundiários e os sabotadores da economia nacional.

ARTIGO 12.º

Cairão na propriedade estatal todos os meios produtivos inexplorados ou socialmente mal aproveitados, podendo o Estado conceder a sua exploração a cooperativas ou outras formas de associação de produtores.

ARTIGO 13.º

Os bens nacionais ou em vias de nacionalização deverão ser rigorosamente protegidos pelo Estado e pelas massas trabalhadoras.

ARTIGO 14.º

Constituem exclusivo do Estado as operações do comércio externo, o regime monetário e o sistema financeiro.

ARTIGO 15.º

O Estado protegerá o movimento cooperativo baseado na livre associação dos cidadãos interessados. As cooperativas exercerão a sua actividade no âmbito do Plano Económico Nacional.

ARTIGO 16.º

0 Estado concederá apoio técnico e financeiro às cooperativas, devendo estas participar na elaboração e execução do Plano Económico.

ARTIGO 17.º

Dentro dos limites da lei, a República Democrática Portuguesa reconhece o direito à propriedade privada e à sua livre disposição ou transmissão por morte, particularmente quando essa propriedade se funde no produto do trabalho ou no legítimo aforro.
Não poderão, todavia, os seus titulares formar coligações ou associações de qualquer género tendentes a dominar o, mercado com prejuízo da economia nacional.

ARTIGO 18.º

No âmbito da sua política económica, ao Estado compete defender os interesses da pequena e média propriedade industrial, comercial ou agrícola, a fim de a preservar da concentração capitalista e do domínio do grande capital. A lei definirá a dimensão máxima de tal propriedade.

TITULO III

Direitos, liberdades e garantias dos cidadãos

ARTIGO 19.º

1. O Estado reconhece e garante os mais amplos direitos e liberdades aos cidadãos, possibilitando e fomentando a participação popular na consolidação da democracia e na instauração do socialismo em Portugal.
2. Todos os cidadãos têm o direito e o dever de contribuir, pela sua actividade, para a edificação da sociedade democrática e socialista que libertará o povo português da opressão, da ignorância e da miséria a que foi sujeito durante o regime fascista.
3. Os direitos e liberdades consagrados na Constituição, bem como aqueles que constem de outras leis, não podem ser exercidos ou invocados com o fim de permitirem actuações contra-revolucinárias que visem combater a ordem democrática instaurada em 25 de Abril ou dificultar a construção da sociedade socialista.

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4. Nesse sentido, são consideradas criminosas, e como tal punidas, a defesa e a propaganda da guerra, do fascismo, do racismo, do colonialismo e do imperialismo.

ARTIGO 20.º

1. Todos os cidadãos portugueses gozam de absoluta igualdade perante a lei.
2. Sem prejuízo da consideração que merecem à República Democrática as classes trabalhadoras e as camadas mais desfavorecidas do povo português, a lei concede a todos idêntica protecção, sem distinção de sexo, raça, confissão religiosa, condição económica. social, ou qualquer outra.

ARTIGO 21.º

1. As condições em que se adquire e se perde a cidadania portuguesa são definidas pela lei.
2. Todo aquele que no estrangeiro conspire ou actue contra o povo português e as suas instituições democráticas e revolucionárias será privado da nacionalidade portuguesa e ser-lhe-ão confiscados os bens.

ARTIGO 22.º

1. A mulher tem os mesmos direitos que o homem, cabendo-lhe um papel essencial na consolidação da democracia e na instauração da sociedade socialista.
2. Para garantir o exercício desses direitos, o Estado deverá criar as necessárias condições no plano económico, político social, profissional e familiar.

ARTIGO 23.º

1. Garantir o direito à existência e ao desenvolvimento integral da personalidade, dentro do espírito e dos fins de uma sociedade democrática que caminha para o socialismo, é dever fundamental da República Portuguesa em matéria de direitos e garantias dos cidadãos.
2. Esse direito comporta a tutela da vida e da integridade físico-psíquica, bem como a reunião, das condições económicas, políticas e sociais que se revelem concretamente indispensáveis para a defesa da dignidade do homem trabalhador.

ARTIGO 24.º

1. O Estado protege a família e os direitos dela decorrentes.
2. O casamento consiste na união voluntária de um homem e uma mulher com o fim de constituírem legitimamente a família.
3. O casamento assenta na completa igualdade dos cônjuges, não necessitando a mulher de autorização do marido para exercer o comércio, a indústria ou qualquer profissão, ou para administrar os seus bens.
4. É a lei civil que regula a constituição, e a dissolução do casamento e os respectivos efeitos jurídicos.

ARTIGO 25.º

A República Democrática Portuguesa reconhece a maternidade como valor social eminente merecedor do respeito de todos os cidadãos, independentemente do estado civil da mulher-mãe.

ARTIGO 26.º

1. A República Democrática Portuguesa reconhece na criança a garantia do futuro socialista do povo português, promovendo uma política que, sem qualquer distinção, assegure o seu pleno desenvolvimento.
2. Todos os filhos têm iguais direitos qualquer que seja o estado civil dos progenitores. Nem do acto do registo de nascimento, nem das correspondentes certidões constará qualquer referência ao estado civil dos pais.
3. O Estado promoverá a investigação e o reconhecimento da paternidade e da maternidade.
4. Compete aos pais a obrigação de educar os filhos no respeito pelos valores do trabalho, da paz, da fraternidade e da igualdade entre os homens e no reconhecimento do seu papel fundamental na construção de uma Pátria socialista.

ARTIGO 27.º

1. Todo o cidadão tem direito à saúde.
2. Este direito é realizado pela criação das condições económicas e sociais que garantam a protecção da infância, da juventude e da velhice, pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, pela criação de um sistema de saúde eficiente ao serviço do povo, por uma política social orientada para a satisfação de todas as legítimas necessidades, pela promoção da cultura física e do desporto escolar e popular.
3. Apoiado nas organizações populares, o Estado procederá à criação de um Serviço Nacional de Saúde, em benefício de. todas as camadas da população, esclarecendo-as sobre as for-mas de promover a saúde e unindo meios e forças para esse fim.

ARTIGO 28.º

1. Todos os cidadãos têm direito a uma habitação condigna, para si e para a sua família.
2. Para, assegurar este direito, à República Democrática Portuguesa compete:
Programar e executar uma política de construção de alojamento;
Apoiar as iniciativas das populações tendentes a resolver o problema habitacional;
Promover a recuperação de zonas de habitação degradada, interessando nessa tarefa as organizações populares;
Estimular a construção privada dentro de um espírito de subordinação aos interesses gerais.
3. Na concretização desses objectivos, o Estado publicará legislação tendente à progressiva apropriação social do solo urbano, definindo ao mesmo tempo e seu direito de utilização pelos interessados.

ARTIGO 29.º

1. Todos os cidadãos têm direito a um ambiente de vida sadio, sendo também seu dever indeclinável a defesa desse mesmo ambiente.
2. Independentemente da tutela desse direito pelo Estado, quando, através de organizações próprias e dinamizando a iniciativa popular, promulga legislação específica para defesa do ambiente e das riquezas na-

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turais, cada cidadão ameaçado ou lesado pode reclamar em justiça as indemnizações ocorrentes e a cessação das causas de violação.

ARTIGO 30.º

1. Todos os cidadãos têm direito à educação e à cultura, sem discriminação de sexo, idade ou classe social, por forma que lhes permita o pleno desenvolvimento da sua personalidade e das suas capacidades.
2. O Estado garante o progresso da população para uma comunidade democrática de pessoas cultivadas e harmoniosamente desenvolvidas, dispondo de vastos conhecimento gerais e especiais.

ARTIGO 31.º

1. O sistema unificado de ensino, além de contribuir para eliminar todas as formas de discriminação social, deve garantir a todos os cidadãos a formação, a qualificação e o aperfeiçoamento que correspondam às necessidades sempre crescentes da sociedade. A educação deve assegurar a todos a efectiva possibilidade de contribuir para a edificação da sociedade democrática e de participar activamente na ,construção da democracia socialista.
2. A preparação das crianças, dos jovens e dos adultos para a vida social é uma preocupação dominante do sistema educativo unificado.

ARTIGO 32.º

1. É função da educação procurar, ainda, explicar e resolver as contradições levantadas pela revolução cientifica e técnica, garantindo o progresso harmonioso da sociedade democrática portuguesa.
2. Para alcançar este objectivo, combinar-se-ão a educação geral e as especialidades de carácter científico técnico e artístico com o trabalho produtivo, a investigação para o desenvolvimento, a educação Tísica, o desporto e a participação em actividades políticas e sociais.

ARTIGO 33.º

1. O direito à educação é conseguido pelo desenvolvimento e generalização da educação popular, pela escola gratuita e obrigatória, pelo ensino secundária e superior, pela ajuda fornecida aos trabalhadores adultos que desejem valorizar-se e pelo encorajamento material aos que estudam.
2. A prossecução da tarefa educativa compete ao Estado, mas constitui também um objectivo m que devem participar as organizações populares e a generalidade dos cidadãos, de acordo com as conclusões fornecidas pela ciência e em íntima relação do estudo com a vida.
3. O Estado assegura a cada um, em função da sua capacidade, dos desequilíbrios estruturais da sociedade e das necessidades do País, o acesso ao grau de ensino imediatamente superior

ARTIGO 34.º

1. O Estado tomará as medidas tendentes ao desenvolvimento integral da criança, através da oficialização e protecção efectiva da educação pré-escolar, na base da actuação conjugada dos órgãos centrais e locais da Administração e das organizações de massas.

2. O Estado encara com particular atenção a educação e o desenvolvimento da juventude. Protege sistematicamente os seus interesses assegurando a todos os jovens cidadãos as condições necessárias para o desenvolvimento das suas aptidões físicas e intelectuais.

ARTIGO 35.º

1. A cultura é uma das bases fundamentais da República Democrática Portuguesa no seu caminho para a sociedade socialista. O Estado encoraja e protege o desenvolvimento da cultura ao serviço do povo, do humanismo e do avanço da sociedade para o socialismo.
2. O Estado estimula a promoção cultural dos trabalhadores. Sendo a cultura um património de todo o povo português,, o Estado incentiva a participação dos cidadãos, através das organizações sociais e de massas, na realização, da política cultural.

ARTIGO 36.º

1. A criação artística deve provir dos laços que unem estreitamente a cultura à vida do povo. Incumbe ao Estado e a todas as forças sociais encorajar a arte e o desenvolvimento da capacidade criadora do povo, designadamente das massas trabalhadoras, permitindo-lhe o acesso às obras de arte e às realizações artísticas de qualquer natureza.
2. O Estado protege o carácter genuíno e autêntico das realizações culturais do povo, defendendo-as de toda a forma de adulteração e conservando-as cuidadosamente como uma verdadeira riqueza do, património nacional.

ARTIGO 37.º

1. A actividade criadora e a investigação científica dos cidadãos são protegidas e estimuladas pelo Estado através da sua política científica e tecnológica.
2. É missão dessa política fomentar, apoiar e, dinamizar a interacção constante entre a pesquisa fundamental e a investigação aplicada, devendo incidir uma e outra nos campos que mais interessem ao desenvolvimento do País.

ARTIGO 38.º

O Estado reconhece o direito dos cidadãos à cultura física e ao desporto, como meios de educação e cultura, orientando e promovendo a sua prática e difusão em todas as possíveis manifestações.

ARTIGO 39.º

1. Todo o cidadão tem direito ao trabalho. O direito ao trabalho é inseparável do dever cívico de trabalhar.
2. A todo o cidadão é assegurada, pelo Estado, através da aplicação de uma efectiva política antimonopolista e antilatifundiária, a possibilidade, de exercer, de acordo com a sua qualificação, uma actividade no domínio económico, administrativo, social ou cultural, remunerada segundo a ma quantidade e qualidade. A trabalho igual salário igual.
3. A lei estabelecerá as medidas adequadas de protecção e segurança nó trabalho, bem como as medidas especiais de protecção no trabalho da mulher e dos menores.

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4. A mulher trabalhadora gaza de especial protecção durante o período de gravidez, no parto o após o parto.

ARTIGO 40.º

1. Aos trabalhadores é garantido o direito de se agruparem em organizações sindicais, de harmonia com os seus interesses, entendendo-se assim que não poderão ser destruídas as vitórias já alcançadas, designadamente o princípio da unicidade sindical.
2. Os sindicatos são independentes de quaisquer opiniões ou associações políticas ou religiosas, bem como dos órgãos da Administração e do Governo.

ARTIGO 41.º

1. Pela actividade das suas organizações e pela intervenção destas ao nível do Estado, os sindicatos tomam uma larga parte:
Na formação da sociedade socialista;
Na planificação e gestão da economia nacional;
No progresso das condições de vida e de trabalho, assim como na melhoria das condições de higiene e de protecção do trabalho.
2. Nas empresas, os sindicatos participam no controle da produção,
3. Os sindicatos tomam parte activa na elaboração das normas de direito do trabalho e na fiscalização do respeito pelas garantias dos trabalhadores estabelecidas pela lei.
4. Os sindicatos participam decisivamente na gestão da segurança social dos trabalhadores.
5. Os órgãos do Estado e todos os dirigentes económicos têm o dever de cooperar estreitamente e em clima de confiança com os sindicatos.
6. Por tudo isto, são consagrados expressamente o direito à greve dos trabalhadores e a proibição do lock-out.

ARTIGO 42.º

1. Todo o trabalhador tem direito ao descanso e ao repouso.
2. 0 direito ao descanso e ao repouso é assegurado:
Pela fixação legal dos horários diário e semanal do trabalhador;
Pelas férias anuais pagas
Pelo desenvolvimento sistemático de uma rede de centros de repouso de férias promovidos pelo Estado ou por outras organizações sociais.

ARTIGO 43.º

1. Os trabalhadores têm direito à segurança material na velhice, na doença e na incapacidade de trabalho.
2. 0 direito à segurança social é realizado por pensões e abonos de doença, no quadro do sistema de segurança social.
3. 0 Estado promoverá a integração das pessoas idosas e dos incapacitados para o trabalho em associações que assegurem a sua participação activa na vida da com unidade. Os deficientes das forças armadas têm direito a medidas especiais que visem não apenas a sua recuperação, como a sua reintegração progressiva na vida do País.

ARTIGO 44.º

1. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de livre expressão do pensamento, sob qualquer forma.
2. O direito de livre expressão do pensamento não pode, em caso algum, ser invocado para permitir a divulgação de ideias fascistas, colonialistas ou de qualquer modo antidemocráticas e contrárias ao processo revolucionário que conduzirá o País ao socialismo.

ARTIGO 45.º

1. Para o efectivo exercício deste direito, o Estado tomará as medidas necessárias a impedir os grupos de pressão contra-revolucionários de manipularem e desvirtuarem os meios de comunicação social.
2. Com o mesmo fim, e atento o interesse público de que se reveste na formação da consciência democrática e socialista dos Portugueses, a exploração da televisão compete exclusivamente ao Estado.

ARTIGO 46.º

1. A todos os Cidadãos é reconhecido o direito de reunião e manifestação, nos termos da lei.
2. O Estado fomentará as organizações de massas, por forma a assegurar uma ampla participação das forças populares na vida económica política, social e cultura] do País.
3. É garantida aos cidadãos a possibilidade de se organizarem em associações profissionais, culturais ou políticas dentro do espírito da presente Constituição, de harmonia com os interesses da consolidação da democracia e da construção do socialismo.

ARTIGO 47.º

1. 0 Estado reconhece e garante a todos os cidadãos o direito à liberdade religiosa.
2. A liberdade religiosa implica o direito de professar, de não professar ou de contestar qualquer religião ou opinião religiosa, o direito de difundir doutrinas religiosas e, bem assim, o direito de os cidadãos organizarem comunidades, associações ou outros institutos com fins religiosos.
3. Não é permitida a invocaçã3 da liberdade de crença e prática religiosa para manifestar ideias ou atitudes contrárias à ordem democrática e ao processo revolucionário de construção do socialismo.

ARTIGO 48.º

1. O Estado Português é laico e absolutamente neutro perante quaisquer crenças, igrejas, religiões ou práticas religiosas.
2. Entre o Estado Português e qualquer igreja ou instituição religiosa, designadamente a igreja católica, vigora o regime de separação.

ARTIGO 49.º

1. Todos os cidadãos gozam do direito à inviolabilidade do domicilio, da correspondência e das comunicações telefónicas ou similares.
2. A lei fixa as condições em que os agentes da autoridade podem entrar no domicilio dos cidadãos, sem autorização destes, mediante ordem escrita de autoridade competente.

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ARTIGO 50º

1. O direito de voto é reconhecido a todos os cidadãos que tenham completado 18 anos é data da eleição.
2. Fora dos casos excepcionais de inelegibilidade definidos na lei, todo o cidadão maior de 21 anos é elegível para qualquer cargo em cuja eleição possa participar, excepto para o cargo de Presidente da República.

ARTIGO 51.º

1. A defesa da Pátria e das conquistas revolucionárias, no processo que conduzirá o País ao socialismo, é um direito e um dever de todos os cidadãos portugueses.
2. A lei regula as condições de prestação de serviço militar, bem como as condições de prestação de serviços cívicos equiparados àquele.

ARTIGO 52.º

O Estado protege os cidadãos portugueses que se encontram no estrangeiro, devendo tomar as medidas indispensáveis para que os trabalhadores emigrantes não sejam objecto de discriminações de qualquer natureza e possam manter bem vivos os laços que os unem à Mãe-Pátria.

TITULO IV

órgãos de Soberania

ARTIGO 53.º

Os órgãos de Soberania da República Democrática Portuguesa durante o período de transição serão os seguintes:

a) Presidente da, República;
b) Conselho da Revolução;
c) Assembleia do MFA;
d) Assembleia Legislativa;
e) Governo;
f) Tribunais.

CAPÍTULO I

Do Presidente da República

ARTIGO 54.º

O Presidente da República é o primeiro magistrado da Nação e, por inerência, o Presidente do Conselho da Revolução e o Comandante Supremo das Forças Armadas.

ARTIGO 55.º

São atribuições do Presidente da República:
a) Presidir ao Conselho da Revolução;
b) Exercer o cargo de Comandante Supremo das Forças Armadas;
c) Escolher o Primeiro-Ministro, ouvido o Conselho da Revolução;
d) Nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro;
e) Presidir ao Conselho de Ministros sempre que o entenda ou quando solicitado pelo Primeiro-Ministro;
f) Dissolver a Assembleia Legislativa, sob deliberação do Conselho da Revolução, marcando a data para novas eleições a realizar no prazo de noventa dias;
g) Promulgar e fazer publicar as leis do Conselho da Revolução e da Assembleia Legislativa, bem como os decretos-lei do Governo;
h) Fixar a data da eleição da Assembleia Legislativa;
i) Representar a Nação e celebrar tratados internacionais, sob proposta do Conselho da Revolução ou do Governo, ouvido esse mesmo Conselho;
j) Declarara guerra, em caso de agressão efectiva ou iminente, e fazer a paz, ouvido o Conselho da Revolução;
k) Declarar o estado de sítio, depois de autorizado pelo Conselho da Revolução;
l) Acreditar os representantes diplomáticos estrangeiros;
m) Nomear, sob proposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros, os embaixadores e enviados extraordinários;
n) Indultar, comutar penas e conceder amnistias, ouvidos o procurador-geral da República e o Conselho da Revolução.

ARTIGO 56.º

1. O Presidente da República será eleito por um colégio eleitoral, para o efeito constituído pela Assembleia do MFA e pela Assembleia Legislativa.
2. A eleição será feita por maioria absoluta ao primeiro escrutínio ou por maioria simples ao segundo, sendo a este admitidos apenas os candidatos que tiverem obtido no primeiro mais de 20% dos votos.

ARTIGO 57.º

0 Presidente da República é eleito por um período de cinco anos, podendo ser reeleito consecutivamente apenas uma vez.

ARTIGO 58.º

1. O escrutínio será público e nominal.
2. Em caso de morte ou impedimento permanente do Presidente da República, deverá proceder-se a nova eleição no prazo de sessenta dias.

ARTIGO 59.º

1. Os candidatos à Presidência da República deverão reunir os seguintes requisitos:
a) Terem nacionalidade portuguesa de origem;
b) Terem idade mínima de 30 anos;
c) Estarem no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.

2. As candidaturas deverão ser subscritas por um mínimo de 80 membros do colégio eleitoral.

ARTIGO 60.º

O Presidente da República iniciará o mandato nos oito dias subsequentes à eleição, tomará posse e pres-

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tará juramento perante, o colégio eleitoral, segundo a fórmula seguinte:
Juro por minha honra defender a Constituição da República Democrática Portuguesa, garantir o exercício de todos os direitos e liberdades dos cidadãos, observar e fazer cumprir as leis, promover o bem geral da Nação, a consolidação da democracia e a instauração do socialismo e assegurar a independência da Pátria Portuguesa.

ARTIGO 61.º

O Presidente da República não pode ausentar-se do território nacional sem autorização da Assembleia Legislativa, ouvido o Conselho da Revolução. No caso de não funcionamento da Assembleia Legislativa, bastará a autorização do Conselho da Revolução.

ARTIGO 62.º

A residência oficial do Presidente da República é o Palácio de Belém. Contudo, o Presidente da República pode escolher para sua residência particular um edifício do Estado que reuna condições para esse feito.

ARTIGO 63.º

O Presidente da República só poderá ser destituído das suas funções, sob proposta do Conselho da Revolução, por voto de pelo menos 2/3 dos membros da Assembleia do MFA e da Assembleia Legislativa, reunidas em sessão conjunta.

ARTIGO 64.º

1. Durante o seu mandato, o Presidente da República só poderá ser demandado criminalmente com autorização expressa do Conselho da Revolução.
2. De igual modo,, é perante o Conselho da Revolução que o Presidente da República poderá renunciar ao seu cargo.

ARTIGO 65.º

Nos casos de impossibilidade física, temporária ou permanente, de impedimento ou morte do Presidente da República, compete ao Conselho da Revolução designar quem desempenhará interinamente as suas funções.

CAPITULO II

Do Conselho da Revolução

ARTIGO 66.º

São atribuições do Conselho da Revolução:
a) Definir, dentro do espírito da Constituição, as necessárias orientações programáticas da política interna e externa e velar pelo seu cumprimento;
b) Decidir, com força obrigatória geral, sobre a constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, sem prejuízo da competência dos tribunais para apreciar a sua inconstitucionalidade formal;
c) Apreciar e sancionar os diplomas legislativos emanados da Assembleia ou do Governo quando respeitem às matérias seguintes:
1. Linhas gerais da política económica, social e financeira;
2. Relações externas, em especial com os novos países de expressão portuguesa;
3. Política de descolonização;
4. Exercício de liberdades e direitos fundamentais;
5. Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes;
6. Regulamentação da actividade política, em especial a relativa a actos eleitorais;

d) Exercer a competência legislativa sobre matérias de interesso nacional de resolução urgente, quando a Assembleia Legislativa ou o Governo o não façam;
e) Velar pelo cumprimento das leis ordinárias e apreciar os actos do Governo e da Administração;
f) Propor à Assembleia Legislativa alterações à Constituição em vigor, nos termos do artigo 77.º;
g) Exercer a competência legislativa em matéria militar, devendo os respectivos diplomas, se envolverem aumento de despesas não comportáveis pelo orçamento aprovado, ser referendados pelo Primeiro-Ministro;
h) Autorizar o Presidente da República a fazer a guerra, em caso de agressão efectiva ou iminente, o a fazer a paz;
i) Pronunciar-se junto do Presidente da República sobre a escolha do Primeiro Ministro e dos Ministros que devem ser da confiança do MFA;
j) Deliberar sobre a dissolução da Assembleia Legislativa quando o considere necessário;
k) Autorizar o Presidente da República a declarar o estado de sítio;
l) Pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação;
m) Pronunciar-se sobre a impossibilidade física, temporária ou permanente, do Presidente da República;
n) Designar, em caso de morte ou impedimento do Presidente da República, quem desempenhará interinamente as suas funções.

ARTIGO 67.º

0 Conselho da Revolução funcionará em regime de permanência, segundo regimento que ele próprio elaborará.

CAPITULO III

Da Assembleia do MFA

ARTIGO 68.º

1. A Assembleia do MFA será constituída por duzentos e quarenta representantes das forças armadas, sendo cento e vinte do Exército, sessenta da Armada e sessenta da Força Aérea, sendo a sua composição determinada por lei do Conselho da Revolução.

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2. A Assembleia do MFA, da qual faz parte integrante o Conselho da Revolução, será presidida por este, através do seu próprio Presidente ou de quem as suas vezes fizer.
3. A Assembleia do MFA faz parte, com a totalidade dos seus membros, do Colégio Eleitoral para a eleição do Presidente da República.
4. A Assembleia do MFA funcionará em regime de permanência e segundo regulamentação própria, que será da competência legislativa do Conselho da Revolução.

CAPITULO IV

Da Assembleia Legislativa

ARTIGO 69.º

A Assembleia Legislativa será composta, no máximo, por duzentos e cinquenta deputados, eleitos por sufrágio universal directo e secreto, nos termos da respectiva Lei Eleitoral.

ARTIGO 70.º

Cada legislatura terá a duração de quatro anos.

ARTIGO 71.º

A Assembleia Legislativa verificará os poderes dos Deputados, elegerá a sua Mesa e elaborará o respectivo Regimento.

ARTIGO 72.º

Os Deputados à Assembleia Legislativa são representantes de todo o Povo Português, e não dos colégios eleitorais por que foram eleitos.

ARTIGO 73.º

Os Deputados gozam dos seguintes direitos, imunidades e regalias:
a) Não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções ou por causa delas;
b) Não podem ser presos preventivamente, salvo em virtude de crime punível com pena maior e mediante autorização da Assembleia Legislativa. Fora deste caso, em que a suspensão é automática, movido procedimento criminal contra algum Deputado e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, a Assembleia decidirá se o Deputado deve ou não ser suspenso, para efeito do seguimento do processo;
c) Não podem ser jurados, peritos ou testemunhas sem autorização da Assembleia, a qual será ou não concedida após audiência do Deputado;
d) Ficam adiados do cumprimento do serviço militar ou da mobilização civil,

ARTIGO 74.º

Perdem o mandato os Deputados:
a) Que exercerem funções incompatíveis com as de Deputado ou que sejam ou venham a ser abrangidos por qualquer incapacidade;
b) Que aceitem de governo estrangeiro qualquer emprego ou para ele exerçam funções de qualquer natureza;
c) Que, por si ou por interposta pessoa, singular ou colectiva, celebrarem contratos com o Governo;
d) Que se prove terem utilizado a função de Deputado para obtenção de proventos ou regalias.

ARTIGO 75.º

Os Deputados não podem ser prejudicados na sua colocação, benefícios sociais ou emprego permanente por virtude do desempenho do seu mandato.

ARTIGO 76.º

São atribuições da Assembleia Legislativa:

a) Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, sem prejuízo do disposto na alínea c) do artigo 66.º e das conquistas legitimamente obtidas no actual processo de consolidação da democracia e de instauração de uma sociedade. socialista;
b) Proceder à revisão da Constituição Política em vigor, sob proposta do Conselho da Revolução, que lhe atribua poderes constituintes;
c) Apreciar os actos da administração pública e do Governo, podendo apresentar moções de desconfiança contra este;
d) Ratificar a composição do Governo no caso de formação inicial deste ou quando a remodelação ministerial abranja pelo menos um terço dos Ministros,
e) Participar Colégio Eleitoral para a eleição do Presidente da República;
f) Ratificar a declaração do estado de sítio quando este se prolongar para além de trinta dias;
g) Deliberar, em segunda votação, sobre os diplomas emanados da própria Assembleia Legislativa que não tenham obtido a sanção do Conselho da Revolução.

A aprovação destes diplomas exigirá os votos da maioria de dois terços do número total de Deputados.

ARTIGO 77.º

1. A Assembleia Legislativa realiza as suas sessões durante quatro meses em cada ano, a começar em 2 de Janeiro.
2. Quando a própria Assembleia o julgue necessário, pode prorrogar o seu funcionamento pelo tempo julgado suficiente, até ao máximo de trinta dias.
3. A Assembleia pode ser sempre convocada extraordinariamente por decisão do Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução.

ARTIGO 78.º

1. A Assembleia funcionará em sessões plenárias, com a maioria do número legal dos seus membros.
2. Poderá constituir comissões para o estudo de assuntos especializados.

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ARTIGO 79.°

As sessões da Assembleia Legislativa são públicas.

ARTIGO 80.°

É permitido aos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado intervir nos trabalhos da Assembleia Plenária e das comissões especializadas, sempre que os assuntos em estudo digam respeito aos seus departamentos, e podem propor quaisquer alterações aos projectos de lei em matéria não votada.

ARTIGO 81.°

Os Deputados podem requerer aos órgãos competentes da Administração os elementos, informações e publicações que considerem indispensáveis ao exercício do seu mandato, mas a resposta terá de ser sempre autorizada pelo respectivo Ministro, que a poderá legitimamente recusar se a sua divulgação for considerada inconveniente para os interesses do Estado Português.

ARTIGO 82. °

Os diplomas emanados da Assembleia Legislativa designam-se por leis e serão enviadas pelo Presidente da Assembleia ao Presidente da República para promulgação e publicação no Diário do Governo. Versando sobre qualquer das matérias da alínea c) do artigo 66.°, terão de ser previamente sancionadas pelo Conselho da Revolução.

CAPÍTULO V

Do Governo

ARTIGO 83.°

1. O Governo da República Democrática Portuguesa é presidido por um Primeiro-Ministro e constituído pelos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado.
2. O Governo funciona em sessões restritas ou plenárias do Conselho de Ministros.

ARTIGO 84.º

O Primeiro-Ministro será escolhido pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução e as forças políticas e partidos que entender por conveniente.

ARTIGO 85.°

1. O Governo é de livre escolha do Primeiro-Ministro, tendo em atenção a representatividade dos partidos na Assembleia Legislativa e as possíveis coligações e será empossado pelo Presidente da República.
2. Serão obrigatoriamente da confiança do MFA os Ministros da Defesa, Administração Interna e Planeamento Económico, pelo que a sua nomeação deverá ser feita depois de ouvido o Conselho da Revolução.

ARTIGO 86.°

Nos casos de formação inicial ou de recomposição ministerial que abranja pelo menos um terço dos Ministros, o novo Governo deverá ser submetido a voto de confiança da Assembleia Legislativa na sua primeira reunião.

ARTIGO 87.°

São atribuições do Governo:

a) Executar e zelar pela execução da política geral do Estado dentro do espírito da presente Constituição e dos propósitos da consolidação da democracia e da instauração do socialismo;
b) Legislar, através de decretos-leis, sobre matérias não reservadas ao Conselho da Revolução ou à Assembleia Legislativa e estatuir, através de decretos regulamentares, sobre os princípios definidos nos diplomas emanados destes dois órgãos;
c) Apresentar, por sua iniciativa, propostas de lei à Assembleia Legislativa;
d) Superintender no conjunto da administração pública, executando e fazendo executar as leis e resoluções do Conselho da Revolução e da Assembleia Legislativa;
e) Nomear, transferir, exonerar, reformar, aposentar, demitir ou reintegrar os funcionários civis do Estado e das pessoas colectivas de utilidade pública administrativa;
f) Nomear e demitir os Governos dos territórios ultramarinos ainda sob administração portuguesa.

ARTIGO 88.°

O Primeiro-Ministro referenda os diplomas legislativos de matéria militar emanados do Conselho da Revolução, quando envolvam aumentos de despesa não comportáveis pelo orçamento aprovado.

ARTIGO 89.°

O Primeiro-Ministro é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Legislativa.

ARTIGO 90.°

O Governo será recomposto sempre que sujeito a duas moções de desconfiança da Assembleia Legislativa com, pelo menos, trinta dias de intervalo.

ARTIGO 91.°

A substituição do Primeiro-Ministro será das atribuições do Presidente da República.

ARTIGO 92.°

Os membros do Governo são responsáveis civil e criminalmente pelos actos que legalizarem ou praticarem.

CAPÍTULO VI

Dos tribunais

ARTIGO 93.°

A justiça democrática é aplicada por tribunais comuns: o Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de 2.ª e de 1.ª instâncias.

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358-(32) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.° 16

ARTIGO 94.°

A justiça democrática, como instrumento do poder popular, será administrada com a participação de juizes populares, eleitos.

ARTIGO 95.°

Cabe aos tribunais das forças armadas o julgamento dos casos da competência do foro militar.

ARTIGO 96.°

A administração da justiça é pública, excepto quando a publicidade for contrária à ordem, aos interesses do Estado ou à moral.

ARTIGO 97.°

Os tribunais apreciarão a inconstitucionalidade formal dos diplomas legislativos.

ARTIGO 98.°

Na execução da justiça, os tribunais requisitarão as autoridades paramilitares e militares, quando necessárias para a manutenção da ordem.

TITULO V

Administração local e poder popular

ARTIGO 99.°

1. A organização popular traduzirá a via da transformação democrática do Estado, a sua passagem, constitucional e orgânica, de Estado opressor a Estado progressivamente livre e popular.
2. Para alcançar esse objectivo é consagrado o direito de livre associação popular, base do avanço democrático e socialista do País.

ARTIGO 100.°

A República Democrática Portuguesa reconhece, desde já, como órgãos de poder local definido todas aquelas associações, ligas, movimentos, comissões ou outras formas de organização popular que, sem divisões antidemocráticas, religiosas ou políticas e largamente representativas pelos seus objectivos e funcionamento unitários e patrióticos, mobilizem, por local de residência, por local de trabalho ou por actividade social conjunta, a população para ,a reconstrução nacional, para o avanço social popular e a defesa revolucionária contra a reacção.

ARTIGO 101.°

1. Compete aos próprios órgãos populares e ao Estado estimular e desenvolver a sua cooperação livre, o estabelecimento, entre eles, de novas e mais vastas formas de enlace que lhes permitam a intervenção na realização de importantes tarefas sociais a que deverão corresponder outros poderes, novos direitos e deveres, na orgânica do Estado.
2. Criados pelo povo para defesa e avanço da sua revolução e, par isso, do País, deverão estes órgãos, para se institucionalizarem como órgãos do Estado e do povo, ser declarados, geral e particularmente, como úteis, como democráticos, como efectivamente populares, pelo Governo e pelo Conselho da Revolução, que assim o deverão fazer, sempre que eles assumam tais características.

ARTIGO 102.°

O Estado e os órgãos populares promoverão e desenvolverão amplas formas. de colaboração com o MFA, visando reforçar a unidade do povo e deste com aquele movimento de libertação nacional.

ARTIGO 103.°

A organização democrática e popular local do Estado, respeitando o esforço criador e livre do povo e dos seus novos órgãos, deverá, com o apoio de legislação própria, consagrar a cooperação entre os actuais órgãos locais de Estado e aqueles que, com novas atribuições, vão ser criados.

ARTIGO 104.°

Em todo este processo democrático de construção do Estado, através da organização popular, deve ser assegurado um amplo papel aos sindicatos, representantes unitários do povo trabalhador, que, para tanto, deverão não só ser ouvidos como chamados a uma activa participação em tudo o que respeite à organização popular.

ARTIGO 105.°

São, desde já, órgãos locais do Estado as juntas de freguesia, as câmaras municipais, as assembleias e conselhos regionais, e ainda todos os órgãos que consagrem a larga participação popular local na República Democrática Portuguesa.

ARTIGO 106.°

Cada órgão local do Estado democrático deve ser o representante autêntico, amplo e eleito, dos respectivos interesses populares, na vida social do País. Assim, as juntas de freguesia serão os órgãos dos interesses populares de cada freguesia; as câmaras, dos de cada concelho; as assembleias, os conselhos populares regionais, exprimirão a vontade deliberativa e executiva da população das regiões que venham a ser definidas legalmente pela importância dos seus interesses comuns.

ARTIGO 107.°

Deverá realizar-se, anualmente pelo menos, uma assembleia, à escala nacional, dos órgãos locais do Estado em que, através de uma ampla discussão, se definam as grandes linhas de acção que permitam o aperfeiçoamento da administração local, o avanço da vida social e o reforço da unidade popular, que todos os órgãos do Estado deverão considerar e, sempre que justo, aplicar.

ARTIGO 108.°

1. O futuro Código Democrático da Administração dará sempre o devido relevo à existência e com-

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24 DE JULHO DE 1975 358-(33)

sagração das assembleias populares como órgãos do Poder e a da Administração.
2. A definição concreta dos órgãos locais e seu processo de funcionamento serão assim resultante de uma ampla reunião de todos os órgãos locais, cujas conclusões, na medida do possível e da sua justeza democrática, serão atendidas pelo Governo e demais órgãos do Estado.

TITULO VI

Legalidade e justiça democráticas

ARTIGO 109.°

A lei constituí um instrumento de consolidação do Estado democrático e de construção da sociedade socialista.

ARTIGO 110.°

Na elaboração das leis e na administração da justiça devem, progressivamente, participar as mais vastas camadas da população, com o fim de que a ordem política e jurídica seja, cada vez mais, obra comum do povo português.

ARTIGO 111.°

As leis e demais instrumentos da legalidade democrática só têm validade quando publicadas no Diário da Governo ou nos órgãos oficiais.

ARTIGO 112.°

O Estado Português pune, de acordo com a lei interna, os crimes de guerra e os crimes contra a paz e a humanidade, previstos no direito internacional, independentemente da sua tipificação na lei positiva.
Estes crimes não prescrevem.

ARTIGO 113.°

Os crimes cometidos por agentes do fascismo contra o povo português, são imprescritíveis.

ARTIGO 114.°

A justiça é exercida em nome do povo português e tem por fim:
a) A defesa da ordem e da legalidade democráticas, visando a construção da sociedade socialista;
b) A protecção das conquistas revolucionárias alcançadas pelo povo trabalhador;
c) A educação dos cidadãos no respeito pela legalidade democrática, com vista à criação de uma sociedade sem classes, eliminando a exploração do homem pelo homem;
d) A protecção dos direitos, das liberdades e da dignidade dos cidadãos.

ARTIGO 115.°

A justiça não será denegada por insuficiência de meios económicos dos interessados.

ARTIGO 116.°

A responsabilidade criminal é definida por lei. Nenhuma actividade. pode ser considerada criminosa, se a lei não a definir como tal.

ARTIGO 117.°

Para a prevenção e a repressão da criminalidade, os órgãos competentes determinarão, por norma legislativa, os meios necessários.

ARTIGO 118.°

Todo o acusado se presume inocente até que uma decisão judicial, transitada em julgado, o declare culpado.

ARTIGO 119.º

A lei define as condições da revisão dás sentenças criminais e correspondentes indemnizações de perdas e danos.

ARTIGO 120.º

A manutenção da prisão preventiva é limitada aos casos de necessidade absoluta, devendo, em princípio, ser substituída por liberdade provisória, nos termos a definir pelas leis do processo penal.

ARTIGO 121.°

Compete exclusivamente ao juiz a apreciação da legalidade e da manutenção da prisão preventiva.

ARTIGO 122.°

Todo o cidadão detido tem o direito de ser apresentado ao juiz.

ARTIGO 123.°

A autoridade que proceda à detenção deve avisar imediatamente dessa detenção a pessoa que o detido indicar.
Ressalva-se o caso de grave prejuízo para a instrução do processo, no qual o aviso deve ser feito logo que cesse a possibilidade desse prejuízo.

ARTIGO 124.°

O arguido goza do direito de se fazer assistir por defensor, escolhido por si, em qualquer fase do processo.

ARTIGO 125.°

O Ministério Público representa o Estado e os incapazes junto dos tribunais, competindo-lhe velar pelo cumprimento da legalidade democrática, com vista à criação de uma sociedade socialista.
Tem o poder de intervir em qualquer processo judicial ou do contencioso administrativo, com direito a recurso.

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358-(34) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

Normas transitórias e disposições finais

ARTIGO 126.°

A presente Constituição entra em vigor depois de promulgada pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, e o seu período de vigência será de cinco anos.

ARTIGO 127.°

Até à entrada em funcionamento dos novos órgãos de Soberania definidos nesta Constituição, as funções do Conselho da Revolução, da Assembleia do Movimento das Forças Armadas e dó Governo Provisório continuarão a reger-se pela legislação constitucional anterior.

ARTIGO 128.º

As eventuais alterações à composição do Governo Provisório até à eleição da Assembleia Legislativa e à consequente formação do Governo competirão somente à iniciativa do Presidente da Republica, ouvido o Primeiro Ministro e o Conselho da Revolução.

ARTIGO 129.°

No fim do período de transição, a Assembleia Legislativa será dissolvida e eleita nova Assembleia, que iniciará o seu mandato com poderes constituintes, procedendo-se, então, à revisão da Constituição.

ARTIGO 130.°

O período de transição termina com a entrada em vigor da Constituição revista.

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PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELO PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS (PCP)

SUMARIO

Preâmbulo

Título I - Princípios fundamentais:

Artigo 1.° (Estado democrático revolucionário).
Artigo 2.° (Forma do Estado, território, cidadania, símbolos).
Artigo 3.° (Regime político, económico e social).
Artigo 4.° (Base social).
Artigo 5.° (Base política).
Artigo 6.° (Base económica).
Artigo 7.° (Funções políticas do Estado).
Artigo 8.° (Funções económicas e sociais).
Artigo 9.° (Relações internacionais).
Artigo 10.° (Relações com os novos Estados independentes).
Artigo 11.° (Política de independência nacional).

Título II - Organização económica:

Artigo 12.° (Propriedade dós meios de produção).
Artigo 13.° (Iniciativa económica).
Artigo 14.° (Planificação da economia).
Artigo 15.° (Contrôle público da economia privada).
Artigo 16.° (Reforma agrária).
Artigo 17.° (Actividade económica por parte de estrangeiros).

Artigo 18.° (Comércio externo).
Artigo 19.° (Comércio interno).
Artigo 20.° (Cooperativas).
Artigo 21.° (Gestão das empresas).
Artigo 22.° (Indemnizações).
Artigo 23.° (Actividades antieconómicas).

Título III - Direitos, liberdades, garantias e deveres fundamentais:

Capítulo I - Princípios gerais:

Artigo 24.° (Enumeração).
Artigo 25.° (Igualdade).
Artigo 26.° (Igualdade de direitos da mulher).
Artigo 27.° (Direitos dos portugueses no estrangeiro).
Artigo 28.° (Âmbito dos direitos e liberdades fundamentais).
Artigo 29.° (Limites dos direitos e liberdades fundamentais).

Capítulo II - Direitos e liberdades pessoais:

Artigo 30.° (Direito à vida).
Artigo 31.° (Integridade moral e física).
Artigo 32.° (Liberdade pessoal).
Artigo 33.° (Vida privada).
Artigo 34.° (Família).

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358-(36) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

Capítulo III - Direitos, liberdades e deveres económico-sociais:

Artigo 35.º (Direito ao trabalho).
Artigo 36.º (Sindicatos).
Artigo 37.º (Comissões de trabalhadores).
Artigo 38.º (Direito à greve).
Artigo 39.º (Direito à saúde).
Artigo 40.º (Direito à habitação).
Artigo 41.º (Segurança social).
Artigo 42.º (Direito ao repouso).
Artigo 43.º (Educação e cultura).
Artigo 44.º (Direitos dos jovens).
Artigo 45.º (Propriedade e herança).
Artigo 46.º (Escolha de profissão).

Capítulo IV - Direitos, liberdades e deveres cívicos e políticos:

Artigo 47.º (Direito de associação).
Artigo 48.º (Direitos políticos).
Artigo 49.º (Liberdade de expressão e direito à informação).
Artigo 50.º (Criação artística e investigação científica).
Artigo 51.º (Direito de reunião).
Artigo 52.º (Liberdade religiosa).
Artigo 53.º (Liberdade de deslocação).
Artigo 54.º (Defesa da Pátria e serviço militar).
Artigo 55.º (Dever de pagar impostos).
Artigo 56.º (Serviços cívicos).
Artigo 57.º (Deveres cívicos).
Artigo 58.º (Direito de asilo).

Capítulo V - Tutela dos direitos e liberdades fundamentais:

Artigo 59.º (Reclamação, resistência, recurso).
Artigo 60.º (Indemnizações).

Título IV Estrutura e organização do Estado:

Capítulo I - Órgãos de soberania:

Artigo 61.º (Organização do poder político).
Artigo 62.º (Órgãos de soberania).

Capítulo II - Presidente da República:

Artigo 63.º (Chefe do Estado).
Artigo 64.º (Eleição).
Artigo 65.º (Requisitos de elegibilidade).
Artigo 66.º (Duração do mandato e vagatura do cargo).
Artigo 67.º (Posse e juramento do Presidente eleito).
Artigo 68.º (Ausência do País).
Artigo 69.º (Responsabilidade).
Artigo 70.º (Funções do Presidente da República).
Artigo 71.º (Referenda).

Capítulo III - Conselho da Revolução:

Artigo 72.º (Composição).
Artigo 73.º (Funções).
Artigo 74.º (Funcionamento).

Capítulo IV - Assembleia do Movimento das Forças Armadas:

Artigo 75.º (Composição).
Artigo 76.º (Funções).
Artigo 77.º (Funcionamento).

Capítulo V - Câmara dos Deputados:

Artigo 78.º (Definição).
Artigo 79.º (Composição, eleição e duração).
Artigo 80.º (Direitos e regalias dos Deputados).
Artigo 81.º (Perda do mandato).
Artigo 82.º (Preenchimento de vagas).
Artigo 83.º (Sessões e reuniões).
Artigo 84.º (Votações e deliberações).
Artigo 85.º (Competência interna).
Artigo 86.º (Competência externa).

Capítulo VI - Governo:

Artigo 87.º (Definição).
Artigo 88.º (Composição e formação).
Artigo 89.º (Funções).
Artigo 90.º (Conselho de Ministros).
Artigo 91.º (Responsabilidade política do Primeiro-Ministro e do Governo).

Capítulo VII - Tribunais:

Artigo 92.º (Justiça).
Artigo 93.º (Tribunais).
Artigo 94.º (Tribunal revolucionário).
Artigo 95.º (Participação popular na justiça).
Artigo 96.º (Ministério Público).

Capítulo VIII - Administração local e regional:
Artigo 97.º (Estrutura e organização).
Artigo 98.º (Estruturas populares unitárias de base).

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24 DE JULHO DE 1975 358-(37)

Capítulo IX - Formação das leis:

Artigo 99.º (Competência legislativa).
Artigo 100.º (Competência do Conselho da Revolução).
Artigo 101.º (Competência da Câmara dos Deputados).
Artigo 102.º (Competência do Governo).
Artigo 103.º (Iniciativa legislativa).
Artigo 104.º (Discussão pública).
Artigo 105.º (Promulgação, referenda e publicação).
Artigo 106.º (Inconstitucionalidade das leis).
Artigo 107.º (Recepção dó direito internacional).

Capítulo X - Eleições e sistema eleitoral:

Artigo 108.º (Liberdade eleitoral).
Artigo 109.º (Responsabilidade dos representantes eleitos).
Artigo I10.º (Sistema eleitoral).
Artigo 111.º (Capacidade eleitoral).
Artigo 112.º (Candidaturas).
Artigo 113.º (Representação proporcional).

Capítulo XI- Aparelho administrativo do Estado:

Artigo 114.º (Reestruturação).
Artigo l I5.º (Responsabilidade dos funcionários e do Estado).
Antigo 116.º (Acção popular).

Capítulo XII - Forças armadas:

Artigo 117.º (Funções).
Artigo 118.º (Organização).

Título V - Disposições finais e transitórias:

Artigo 119.º (Entrada em vigor da Constituição).
Artigo 120.º (Revisão da Constituição).

Preâmbulo

1. O 25 de Abril de 1974, dia em que o Movimento das Forças Armadas derrubou a odiada ditadura fascista, pertence já à História de Portugal e da Humanidade. Nessa data reencontrou o povo. português o caminho das suas tradições
revolucionárias e um lugar centre os povos de vanguarda.

A vitória veio culminar quase meio século de luta clandestina organizada da
classe operária, de resistência antifascista, de todo o povo, de acção unida da resistência antifascista de todo o povo, de acção unida das forças democráticas. Foram, também, seus factores determinantes a justa guerra :de libertação dos povos irmãos de Angola, da Guiné e de Moçambique, a solidariedade e as conquistas dos povos de todo 0 mundo, as contradições e a política criminosa dos monopolistas e latifundiários.
2. Mas a vitória consolidou-se e a Revolução tornou-se irreversível, porque desde o primeiro dia a iniciativa criadora dos trabalhadores e das forças revolucionárias soube dar forma â aliança do povo com as forças armadas, expressão original da unidade popular na luta contra a dominação e a exploração dos monopólios e grandes agrários.
A aliança entre o movimento popular de massas e o MFA tornou-se o eixo político e o motor do processo revolucionário, a base do novo poder do Estado, o princípio orientador da sua transformação em poder popular, em Estado democrático ao serviço do .povo e pelo povo controlado.
3. O fortalecimento desta aliança e da unidade, organização e dinamização do MFA vanguarda das forças armadas, e do movimento popular de massas - força organizada do povo que compreende os partidos progressistas e outros órgãos populares, sociais e políticos, unitários - são a condição e garantia da vitória final e do desenvolvimento pacifico da Revolução.
As sucessivas ofensivas da reacção têm respondido o MFA e o movimenta popular de massas com novas e decisivas conquistas para o povo. O reforço do Estado democrático revolucionário e a defesa e a extensão das liberdades democráticas, a melhoria das condições de vida das camadas sociais mais desfavorecidas e a defesa dos interesses das classes trabalhadoras o fim da guerra colonial e a firme política de descolonização, a expropriação dos latifúndios no caminho de uma reforma agrária que dê a terra a quem a trabalha e as históricas nacionalizações da banca e dos sectores industriais de base, fizeram a Revolução entrar irreversivelmente na fase da liquidação do poder económica dos monopólios e latifúndios, no período de transição para o socialismo.
4. Esta é a Constituição do período de transição fixado na Plataforma de Acordo Constitucional entre o WA e partidos políticos, cujo cumprimento integral garante.
Está é uma Constituição transitória ao serviço de uma aliança duradoura - do povo com as forças armadas e de um objectivo histórico: a construção, em Portugal, de uma sociedade socialista sem classes antagónicas baseada na colectivização dos meios de produção e que abolirá, para sempre, da Pátria Portuguesa, a exploração do homem pelo homem.
Esta é a Constituição que garante as liberdades e as conquistas revolucionárias alcançadas, aponta as profundas transformações económicas è sociais que urge realizar . na transição para o socialismo, consagra a aliança entre o Movimento das Forças Armadas e o movimento popular de massas, abre caminho à dinâmica do processo revolucionário e à iniciativa das órgãos revolucionários e do povo.

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358-(38) DIÁRI0 DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

Momento da Revolução em marcha, fruto das lutas e produto da aliança do povo com as forças armadas, esta Constituição será, nas mãos dos trabalhadores e de todo o povo, um instrumento na tarefa ingente e grandiosa da construção -com trabalho árduo, sacrifício, consciência política, disciplina, capacidade de organização e espírito criador - da independência nacional e do socialismo, de um Portugal livre e democrático, pacífico e feliz.

TITULO I

Princípios fundamentais

ARTIGO 1.º

(Estado democrático revolucionário)

O Estado Português é um Estado democrático revolucionário que tem por objectivo, num curto prazo histórico, eliminar o poder dos monopólios e latifundiários e abrir caminho à transição para o socialismo.
ARTIGO 2.º

(Forma do Estado, território, cidadania e símbolos)

1. O Estado Português é uma República unitária e independente.
2. O território da República é constituído pelo território historicamente definido na Europa e pelos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
3. O Estado Português reconhece aos povos de todos os territórios que ainda se encontrem sob administração colonial portuguesa o direito à autodeterminação e à independência imediatas.
4. São cidadãos portugueses todos os indivíduos nascidos em território nacional, filhos de pai ou mãe portugueses, e aqueles que a lei considerar como tais em razão da filiação, do lugar do nascimento ou de casamento; a lei determinará as condições da aquisição da cidadania portuguesa por naturalização e da sua perda.
5. A bandeira nacional é a bandeira verde e vermelha com a esfera armilar e as armas nacionais, adoptada pelo regime republicano criado pela Revolução de 5 de Outubro de 1910.
6. O hino nacional é A Portuguesa.
7. A capital da República é Lisboa.

ARTIGO 3.°

(Regime político, económico e social)

O regime político, económico e social caracteriza-se pela garantia e exercício das mais amplas liberdades democráticas e pela realização revolucionária de profundas transformações económicas e sociais de transição para o socialismo, o qual abolirá para sempre a exploração do homem pelo homem e instaurará um tipo superior de democracia.

ARTIGO 4.°

(Base social)

A aliança entre o povo e as forças armadas exprime a forma original de unidade e aliança da classe operária das massas trabalhadoras, dos pequenos e médios agricultores e de outras camadas sociais interessadas na luta contra os monopólios e latifundiários e no avanço do processo revolucionário a caminho do socialismo.

ARTIGO 5.º

(Base política)

1. Todo o poder pertence ao povo, que o exerce a nível local, regional e nacional, quer directamente, quer através das organizações populares, sociais e políticas, das instituições revolucionárias e dos órgãos estatais representativos, segundo o princípio da unidade do poder.
2. É declarado ilegítimo e abolido o poder dos monopólios e dos latifundiários
3. A aliança entre o movimento popular de massas e o Movimento das Forças Armadas é a base política do regime democrático e o motor do processo revolucionário.
4. A aliança entre o movimento popular de massas e o Movimento das Forças Armadas assegura o desenvolvimento pacífico e garante a vitória do processo revolucionário.

ARTIGO 6.°
(Base económica)
1. Constituem a base económica do regime de transição:
a) O sector nacionalizado - em particular a banca e a grande indústria -, propriedade do Estado democrático revolucionário e sector dominante da economia nacional;
b) O sector cooperativo, particularmente as cooperativas agrícolas de produção e as cooperativas de pescadores;
c) O sector privado: pequenos produtores independentes, pequenas e médias empresas, capital estrangeiro nas condições fixadas pela lei.

2. O sector nacionalizado e o sector cooperativo, desenvolvendo-se em propriedade colectiva dos meios de produção, permitirão criar a base material e técnica do socialismo.

ARTIGO 7.º

(Funções políticas do Estado)

São funções políticas internas e tarefas do Estado democrático revolucionário:
a) Consolidar as liberdades democráticas e assegurar os direitos individuais e económico-sociais, transformando estas liberdades e direitos numa realidade para os trabalhadores e todo o povo, na base de firmes garantias económicas, sociais, políticas e jurídicas;
b) Desenvolver de forma criadora os órgãos do poder democrático que assegurem a participação determinante das massas populares na construção do novo aparelho de Estado e na solução dos problemas nacionais;
c) Instaurar a ordem democrática e fazer cumprir a legalidade revolucionária, quebrar a resis-

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24 DE JULHO DE 1975 358-(39)

tência dos monopólios e dos latifundiários, defender o novo regime das tentativas de contra-revolução e das pressões e ingerências ou - intervenção do imperialismo internacional:
d) Sanear, reestruturar e democratizar o aparelho de Estado de modo a pô-lo ao serviço do povo e da revolução.

ARTIGO 8.º

(Funções económicas e sociais)

São funções e tarefas de organização económica e social do Estado:
a) Nacionalizar os monopólios e o grande capital, respeitando as pequenas e médias empresas privadas que contribuam para o desenvolvimento da economia nacional;
b) Realizar a reforma agrária pela expropriação do latifúndio e das grandes explorações capitalistas, segundo o princípio: a terra a quem a trabalha, respeitando a pequena e média propriedade privada da terra;
c) Organizar, dirigir e desenvolver a produção social segundo um plano centralizado visando a estabilidade económica e financeira, o desenvolvimento harmonioso da indústria e da agricultura, dos transportes e dos serviços, o progresso regional, a independência económica nacional e a satisfação crescente das necessidades materiais e culturais do povo;
d) Impulsionar, em função do processo revolucionário, o desenvolvimento das relações de produção socialistas e garantir a sua vitória definitiva, promovendo a democracia na produção, o contrôle operário, uma nova disciplina no trabalho, e a participação determinante das massas trabalhadoras na reestruturação do aparelho produtivo e na batalha da produção para o aumento decisivo do produto e da produtividade nacionais.

ARTIGO 9.º

(Relações internacionais)

1. Portugal adopta irrevogavelmente uma política de paz e amizade com todos os povos, um dos objectivos centrais da revolução iniciada no 25 de Abril de 1974.
2. Portugal faz seus e leva à prática os seguintes princípios das relações internacionais, produto e factor da luta revolucionária dos povos, da política persistente dos Estados progressistas, anti-imperialistas e pacíficos, e da acção das forças da .Paz da opinião pública mundial, princípios que encontram expressão jurídica na Carta da ONU e são normas gerais de direito internacional da validade universal:

a) Coexistência pacífica entre Estados com sistemas sociais e políticos diferentes;
b) Respeito pelo direito dos povos à autodeterminação, à soberania e à independência, igualdade em direitos e direito dos povos a disporem dos seus recursos naturais, igualdade soberana de todos os Estados;
c) Eliminação de todas as formas de colonialismo, neocolonialismo, discriminação racial, e respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais;
d) Não ingerência nos problemas internos das nações, respeito pela integridade territorial dos Estados e inviolabilidade das fronteiras;
e) Não recurso à força nem à ameaça da força. recurso a negociações para a solução dos diferendos entre Estados, segurança colectiva internacional e dissolução dos blocas militares:
f) Proibição de todas as armas de destruição massiva e cessação da corrida aos armamentos, abolição das bases militares estrangeiras e desarmamento geral, simultâneo e controlado:
g) Intercâmbio e cooperação económica, tecnológica, científica e cultural entre os Estados, sem discriminações e na base do interesse e do respeito mútuos.

ARTIGO 10. º

(Relações com os novos Estados independentes)

Portugal, reconhecendo plenamente o direito dos povos a levantar-se em armas contra a opressão colonialista e imperialista, prosseguindo firmemente a política de descolonização, proporá aos povos e aos novos Estados recentemente libertados do colonialismo português e desenvolverá com eles, na base dos princípios referidos no artigo anterior, relações de estreita cooperação e laços da mais fraternal amizade.

ARTIGO 11.º

(Política de independência nacional)

1. Portugal determina-se por uma política intransigente de independência nacional assente:

a) Na aplicação dos princípios referidos no artigo 9.º às relações com todos os Estados, desenvolvendo a .cooperação com os Estados pacíficos e progressistas de que tinha sido isolado pelo fascismo, nomeadamente os Estados socialistas e não alinhados;
b) Na defesa do direito do povo português a decidir livremente dos seus destinos, libertando-se progressivamente de dependências políticas, económicas e financeiras externas.

2. Portugal respeita os seus compromissos internacionais, sem prejuízo do direito do povo português a ver satisfeitos os princípios referidos no n.º 1 deste artigo, e da sua contribuição para a segurança colectiva, a cooperação e a paz na Europa e no Mundo.

TITULO II

Organização económica

ARTIGO 12.º

(Propriedade dos meios de produção)

1. Os meios de produção pertencem ao Estado e outras pessoas colectivas públicas, a comunidades populares, a cooperativas e a pessoas privadas ou particulares.

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2. O subsolo, os jazigos minerais, as fontes naturais de energia, as fontes de águas minerais, os cursos de água, os lagos e lagoas, o mar territorial e as praias, a plataforma continental e o espaço aéreo são propriedade do Estado, podendo ser objecto de exploração por parte de pessoas privadas apenas por concessão do Estado.

ARTIGO 13. º

(Iniciativa económica)

1. A economia está sob contrôle do Estado democrático revolucionário.
2. A lei determinará os sectores da actividade económica reservados ao Estado e aqueles em que tem lugar a iniciativa privada.
3. Serão nacionalizadas todas as empresas e grupos monopolistas, sendo proibida a criação de novos monopólios ou de acordos monopolistas.
4. O domínio do sector nacionalizado não pode ser restringido.
5. As pequenas e médias empresas que participem no desenvolvimento do País gozam da protecção do Estado.

ARTIGO 14.º

(Planificação da economia)

1. A fim de garantir a melhor utilização das forças produtivas, o crescimento económico e o desenvolvimento do carácter social da produção, a actividade económica obedecerá a um plano económico nacional, de acordo com o princípio da contabilidade e controle dos recursos, do trabalho, do consumo .nacionais.
2. O plano será elaborado pelo Estado com a participação dos sindicados e outras organizações das massas trabalhadoras.
3. O plano apoia-se sobre o sector nacionalizado e poderá ser tornado obrigatório para as empresas privadas.

ARTIGO 15.º

(«Contrôle» público da economia privada)

A lei regulará a economia privada, podendo autorizar intervenções estaduais na gestão de empresas, com o fim de conseguir a planificação nacional da economia, a defesa dos interesses dos trabalhadores e a continuidade de produção.

ARTIGO 16. º

(Reforma agrária)

1. A fim de realizar a reforma agrária, aumentar a produção e diminuir a importação de produtos agrícolas, e melhorar as condições de vida da população dos campos, serão expropriados os latifúndios, nacionalizadas as grandes explorações capitalistas, entregando-se a terra a quem a trabalha.
2. As terras expropriadas serão exploradas pelo Estado ou entregues a cooperativas de agricultores e assalariados agrícolas, ou distribuídas para exploração familiar, de acordo com os interesses da economia nacional e com a vontade das massas camponesas e das suas organizações.
3. A lei determinará o limite máximo de solo arável ou florestável que pode ser objecto de propriedade de um indivíduo, de uma família, ou de uma sociedade privada, tendo em conta a natureza dos terrenos, os tipos de cultura, o valor do produto e o peso relativo das várias camadas do campesinato em calda região.
4. É garantida a propriedade da terra dos pequenos e médios agricultores. Os pequenos e médios agricultores têm direito, individualmente ou agrupados em cooperativas, ao auxílio do Estado, nomeadamente através do crédito, assistência técnica e garantia de comercialização.
5. São abolidos os foros, revertendo as terras, a título de propriedade plena, para os actuais foreiros, bem como a parceria e a colónia, que serão substituídas pelo arrendamento. O regime de arrendamento deve salvaguardar a segurança e os justos direitos dos rendeiros.

ARTIGO 17. º

(Actividade económica por parte de estrangeiros)

A lei disciplinará a actividade económica e os investimentos por parte de indivíduos ou sociedades estrangeiros, a fim de garantir a sua contribuição para o desenvolvimento do País e de defender a independência nacional, os interesses dos trabalhadores e a planificação da economia.

ARTIGO 18.º

(Comércio externo)

O comércio externo e as relações económicas internacionais .serão controlados pelo Estado, que poderá criar empresas públicas para o efeito ou estabelecer domínios vedados às empresas privadas, visando:

a) Aumentar e diversificar as relações económicas externas;
b) Equilibrar a balança de pagamentos e reduzir o déficit da balança comercial;
c) Libertar o comércio externo do domínio dos grupos monopolistas, ou de qualquer país ou bloco.

ARTIGO 19.º

(Comércio interno)

O Estado intervirá no comércio interno com o fim de impedir a subida especulativa dos preços, eliminar o parasitismo dos grandes armazenistas e intermediários, proteger os consumidores, e salvaguardar os interesses legítimos dos pequenos comerciantes.

ARTIGO 20.º

(Cooperativas)

O Estado apoiará a criação de cooperativas, especialmente de agricultores, de artesões e de pescadores, proporcionando-lhes assistência técnica e financeira

ARTIGO 21.º

(Gestão das empresas)

1. As empresas públicas serão geridas por comissões directivas designadas pela Governo e que incluirão representantes indicados pelos sindicatos e pelos trabalhadores da empresa.
2. Nas empresas privadas os trabalhadores terão direito a fiscalizar a respectiva gestão, incluindo o

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direito a ser informados sobre a situação da empresa, sendo essa fiscalização obrigatória nas empresas acima de certa dimensão, a definir por lei.
3. São reconhecidas as comissões de trabalhadores e o seu direito de intervir na gestão das empresas e no controle da produção.

ARTIGO 22. º

(Indemnizações)

1. A lei determinará a forma e o montante da indemnização pela nacionalização de empresas tendo em conta:

a) A situação económica da empresa;
b) Os interesses dos pequenos accionistas;
c) A grandeza dos benefícios obtidos pelos grandes proprietários, empresários e accionistas;
d) O montante dos subsídios, créditos e outras vantagens económicas propiciadas peio Estado ou outras pessoas colectivas públicas até ao momento da nacionalização.

2. Tendo em conta o disposto no número anterior, a lei poderá determinar que a expropriação dos latifúndios e dos grandes proprietários, empresários e accionistas não dê lugar a qualquer indemnização.

ARTIGO 23.º

(Actividades antieconómicas)

A sabotagem económica e outras actividades delituosas contra a economia nacional serão objecto de sanções adequadas à sua gravidade, que poderão incluir a expropriação sem indemnização.

TITULO III

Direitos, liberdades, garantias e deveres fundamentais

CAPÍTULO I

Princípios gerais

ARTIGO 24.º

(Enumeração)

Os direitos, liberdades, garantias e deveres enumerados nesta Constituição não excluem quaisquer outros que sejam previstos na lei ou venham a criar-se no decurso do processo revolucionário.

ARTIGO 25. º

(Igualdade)

1. Os cidadãos _ são iguais perante a lei.
2. Todos têm os mesmos direitos, gozam das mesmas liberdades, usufruem das mesmas garantias e estão sujeitos aos mesmos deveres, independentemente de origem social, situação económica, sexo, instrução, raça, confissão religiosa ou opinião política.

ARTIGO 26.º
(Igualdade de direitos da mulher)

1. As mulheres têm direitos e deveres iguais aos homens, não podendo ser, por esse motivo, objecto de discriminação em qualquer esfera da vida económica, cultural ou política.
2. A base da igualdade de direitos e deveres da mulher é a igualdade do direito ao trabalho e a igualdade de salário para trabalho igual.

ARTIGO 27.º

(Direitos dos portugueses no estrangeiro)

1. Os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consagrados nesta Constituição que sejam compatíveis com a sua ausência do País.
2. O Estado protege os trabalhadores - portugueses emigrados, nomeadamente através dos serviços consulares, promovendo uma política de informação que traduza a realidade revolucionária, através de formas de assistência cultural e educativa, e acordos com os Estados onde trabalham de modo a garantir os seus direitos laborais e à segurança social, à habitação, à educação, bem como os direitos sociais e políticos.

ARTIGO 28.º

(Âmbito dos direitos e liberdades fundamentais)

1. Os direitos e liberdades fundamentais consagrados nesta Constituição impõem-se a qualquer pessoa ou autoridade, salvo aqueles que pela sua própria natureza só podem valer perante o Estado.
2. As pessoas jurídicas, associações, colectividades e outras organizações sociais gozam dos direitos e liberdades fundamentais consagrados nesta Constituição, salvo daqueles que pela sua própria natureza são exclusivamente individuais.

ARTIGO 29.º

(Limites dos direitos e liberdades fundamentais)

1. Salvo o disposto nesta Constituição, a lei que regular o exercício de direitos ou liberdades fundamentais não pode estabelecer outros limites senão os necessários para garantir esse exercício ou para garantir outros direitos ou liberdades, nem pode fazê-lo depender do poder discricionário de uma autoridade.
2. Os direitos e liberdades fundamentais não podem ser exercidos contra o regime democrático, contra a unidade e independência nacionais, contra o processo revolucionário ou para impedir a transição para o socialismo.
3. O exercício dos direitos e liberdades fundamentais poderá ser excepcionalmente restringido, em todo ou em parte do território nacional, quando, por efeito de declaração do estado de sítio, forem suspensas as garantias constitucionais.

CAPÍTULO II

Direitos e liberdades pessoais

ARTIGO 30.º

(Direito à vida)

1. A vida humana é inviolável.
2. Não existe pena de morte.

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ARTIGO 31.º

(integridade moral e física)

1. A integridade moral e física dos cidadãos é inviolável.
2. Ninguém pode ser sujeito a tortura ou a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
3. O bom nome e a reputação são garantidos pela lei.

ARTIGO 32.º

(Liberdade pessoal)

1. Todo o cidadão tem direito à liberdade pessoal.
2. Ninguém pode ser privado da liberdade à não ser em consequência de sentença judicial condenaria pela prática de acto criminoso punido pela lei com a pena de prisão ou em virtude de anomalia psíquica devidamente comprovada ou de situações equiparadas previstas na lei.
3. Exceptua-se deste princípio a prisão preventiva em flagrante delito ou por forte suspeita de ter sido cometido crime doloso a que corresponda pena maior, pelo tempo e mas condições que a lei determinar. Só ao juiz compete apreciar a legalidade da prisão preventiva.
4. São proibidas penas perpétuas ou medidas de segurança privativas da liberdade, prorrogáveis por - prazos indeterminados, seja qual for a natureza do crime.
5. Todo o acusado pela prática de um crime se presume inocente até que seja declarado culpado por sentença. A lei garante os direitos de defesa do acusado, incluindo o da assistência de um defensor.
6. A lei penal incriminatória não é retroactiva, salvo a lei incriminatória dos dirigentes fascistas e dos agentes e dirigentes da extinta PIDE/DGS e outras organizações repressivas do fascismo, bem como dos agentes de acções contra-revolucionárias.

ARTIGO 33.º

(Vida privada)

1. A vida privada, o domicílio e a correspondência ou outros meios de comunicação pessoal são invioláveis.
2. Ninguém pode entrar no domicílio de qualquer cidadão nem ai efectuar buscas contra sua vontade, salvo nos casos que a lei definir, se estiver munido de autorização da autoridade competente.

ARTIGO 34.º

(Família)

1. A família e a maternidade estão sob a protecção do Estado.
2. O Estado cria uma rede de maternidades, creches e jardins de infância e desenvolve o sistema de assistência materno-infantil.
3. As mulheres trabalhadoras têm direito a um período de dispensa do trabalho, sem perda de remuneração, antes e depois do parto.
4. O casamento é a base legal da família e os seus efeitos e regime jurídico serão sempre os da lei civil, incluindo o direito ao divórcio.
5. Os filhos nascidos fora do casamento não podem ser por esse motivo objecto de qualquer discriminação.

6. Os cônjuges têm iguais direitos e deveres no que respeita à capacidade civil ou política e à manutenção e educação dos filhos.
7. Os filhos não podem ser separados dos pais, salva quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais ou quando as crianças estejam em risco de ficarem abandonadas.

CAPÍTULO III

Direitos, liberdades e deveres económico-sociais

ARTIGO 35.º

(Direito ao trabalho)

1. Todos os cidadãos têm o direito ao trabalho.
2. Todos os cidadãos, salvo os velhos, os doentes e os inválidos, têm o dever de trabalhar.
3. O direito ao trabalho será efectivado pela extensão da propriedade social dos meios de produção e pela planificação do desenvolvimento económico, visando o crescimento das forças produtivas.
4. O combate ao desemprego é objectivo prioritário da política económica. Aqueles que se encontram involuntariamente desempregados têm direito a assistência material do Estado.
5. Os trabalhadores têm direito a uma retribuição proporcionada à quantidade e qualidade do seu trabalho e, sem distinção de sexo ou de idade, a um salário igual para trabalho igual.
6. A lei fixa um salário mínimo nacional, tendo em conta as justas reivindicações e necessidades dos trabalhadores, o ritmo do aumento do custo de vida, o nível de desenvolvimento das forças produtivas e as exigências da estabilidade económica e financeira e da acumulação para o desenvolvimento.
7. A fim de salvaguardar a personalidade e a integridade moral e física dos trabalhadores, a lei regulará as condições de trabalho, estabelecendo normas especiais de protecção para o trabalho dos jovens, das mulheres e dos parcialmente inválidos, bem como dos que desempenhem actividades particularmente violentas, insalubres e perigosas.
8. O direito ao trabalho inclui a proibição de ser despedido sem justa causa ou sem motivo justificado e a proibição do lock-out.

ARTIGO 36.º

(Sindicatos)

1. Os trabalhadores têm o direito à organização e à actividade sindicais.
2. Esse direito inclui o de se inscrever e participar na actividade do sindicato e de desenvolvê-la na própria empresa através de delegados e comissões sindicais de reuniões da secção sindical e da. afixação e distribuição de propaganda sindical.
3. É livre a constituição de sindicatos e a inscrição neles. Exprimindo a unidade das classes trabalhadoras e a fim de defender a liberdade sindical perante o patronato, o Estado, os partidos políticos e as confissões religiosas, a lei garante a unicidade sindical, não podendo constituir-se qualquer associação sindical que vise representar trabalhadores cuja categoria se encontre já representada por uma associação sindical do mesmo tipo e que abranja a mesma área.

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4. Os sindicatos regem-se segundo os princípios da organização democrática, que se traduzem nomeadamente no carácter electivo dos órgãos dirigentes, na participação activa dos trabalhadores em todos os aspectos da actividade do seu sindicato e na defesa da unidade sindical.
5. É reconhecido papel determinante aos sindicatos e à central sindical única dos trabalhadores portugueses na defesa dos interesses da classe operária e de todos os trabalhadores, nomeadamente através da celebração de convenções colectivas de trabalho, da elaboração, fiscalização e contrôle da legislação do trabalho, da participação no contrôle da produção e na gestão das instituições de segurança social, da participação na planificação da economia e da utilização do produto social e, finalmente, de acordo com esta Constituição, através da sua participação nos órgãos do poder político.

ARTIGO 37.º

(Comissões de trabalhadores)

1. Os trabalhadores têm o direito de criar, democraticamente, a nível de empresa, comissões unitárias de trabalhadores.
2. As comissões - de trabalhadores intervêm de modo autónomo, em cooperação com as outras organizações de trabalhadores, na gestão e no contrôle ria produção, no reforço da unidade das classes trabalhadoras e da sua mobilização para o processo revolucionário.

ARTIGO 38.º

(Direito à greve)

1. A greve é um direito dos trabalhadores.
2. A greve é uma arma dos trabalhadores para defenderem o direito ao trabalho, à remuneração pelo trabalho, às condições de trabalho e aos direitos adquiridos pelo trabalho, bem como o direito à construção de uma. sociedade que ponha fim à exploração do homem pelo homem.

ARTIGO 39.º

(Direito à saúde)

1. Todos têm direito à saúde.
2. O Estado garante este direito através da melhoria das condições económicas, saciais e culturais das classes trabalhadoras, de um sistema de medicina preventiva e da criação de um serviço nacional de saúde.

ARTIGO 40.º

(Direito à habitação)

1. O alojamento em condições compatíveis com a dignidade humana é um direito dos cidadãos.
2. Para possibilitar a efectivação deste direito, o Estado fomentará a construção social mobilizando para isso os recursos humanos, naturais, técnicos e financeiros necessários, apoiando as organizações populares, auxiliando a autoconstrução e as cooperativas de construção.
3. Relativamente à construção social, o Estado adoptará uma política tendente a estabelecer progressivamente um sistema de renda adequada ao rendimento familiar.

4. O Estado definirá e realizará uma reforma urbana, abrangendo uma política de construção, urbanização, habitação, transportes colectivos e defesa do ambiente, planificando, a utilização do solo urbano.

ARTIGO 41.º

(Segurança social)

1. Os trabalhadores e suas famílias têm direito à segurança social.
2. A lei determina como é prestada protecção na doença, velhice e invalidez, através de assistência médica; medicamentosa e hospitalar, bem como pela atribuição de pensões.
3. O sistema de previdência será substituído por um sistema de segurança social, organizado de acordo com os sindicatos e outras organizações das massas trabalhadoras, de forma a criar um regime único para todos os cidadãos.

ARTIGO 42.º

(Direito ao repouso)

1. Os trabalhadores têm direito ao repouso.
2. Para garantia deste direito a lei fixará o limite máximo da jornada de trabalho e do horário semana), bem como os períodos mínimos anuais de férias pagas.
3. O Estado promoverá uma política de aproveitamento dos tempos livres, mediante o desenvolvimento do desporto de massas e de actividades culturais, recreativas e de turismo, com vista melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e a possibilitar o pleno desenvolvimento das suas capacidades.

ARTIGO 43.º

(Educação e cultura)

1. A instrução e a cultura são um direito de todos os cidadãos.
2. O Estado procederá a uma reforma geral e democrática elo ensino visando os seguintes objectivos:

a) O alargamento e aprofundamento da educação e da cultura das massas populares;
b) A criação de uma cultura democrática e progressista;
c) A ligação do ensino a outras actividades sociais e particularmente à produção;
d) A formação de quadros originários das classes trabalhadoras capazes de participarem no desenvolvimento económico do País a caminho do socialismo.

3. A fim de atingir os objectivos indicados no número anterior, o Estado actuará no sentido de realizar um programa de extinção do analfabetismo, lançar estruturas de um ensino novo para trabalhadores e de educação permanente, criar um sistema público de educação pré-escolar, começando pelas zonas de concentração das classes trabalhadoras, efectivar um período de ensino básico obrigatório de pelo menos seis anos e unificar. o ensino secundário.
4. O acesso à Universidade deve ser regulamentado de acordo com as necessidades do País em quadros qualificados e de modo a favorecer a entrada dos trabalhadores e dos filhos das classes trabalhadoras.

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5. A criação de escolas particulares necessita de autorização do Estado, e a sua administração e o ensino nelas ministrado estão sujeitos a contrôle público.
6. O Estado promoverá o desenvolvimento da cultura e da arte nacionais, assegurará condições para a democratização da cultura e fomentará a participação popular na vida cultural, nomeadamente através da utilização intensiva dos meios de comunicação social e da :participação das organizações ,populares e do Movimento das Forças Armadas na dinamização cultural.

ARTIGO 44.º

(Direitos dos jovens)

1. Os jovens, particularmente os jovens trabalhadores, gozam de protecção especial dos seus direitos económicos e sociais, nomeadamente:

a) Igualdade no direito ao trabalho, na promoção profissional e no salário por trabalho igual;
b) Direito ao ensino e ó cultura e à formação profissional;
c) Deito ao desporto e ao aproveitamento dos tempos livres.

2. O Estado, em colaboração com as escolas, as empresas nacionalizadas. e as organizações populares, fomentará e auxiliará as organizações' da juventude que visem a defesa e ,promoção dos seus direitos e a formação revolucionária dos jovens.

ARTIGO 45.º

(Propriedade e herança)

1. É garantido a todos os cidadãos o direito de propriedade sobre os bens legitimamente adquiridos, bem como o direito de os transmitir ou receber por herança.
2. Fora os casos previstos nesta Constituição, a expropriação por motivos de utilidade pública só pode ser efectuada mediante o pagamento de justa indemnização.

ARTIGO 46.º

(Escolha de profissão)

1. Os cidadãos são livres de escolher a profissão, salvas as exigências de qualificação profissional e as restrições legais requeridas pelos interesses da economia nacional.
2. A lei poderá determinar que o acesso a lugares públicos e o exercício de cargos de direcção seja vedado a indivíduos que tenham exercido cargos de responsabilidade política ou sido membros ou colaboradores de organizações repressivas durante o regime fascista ou tenham sido condenados por corrupção.

CAPÍTULO IV

Direitos, liberdades e deveres cívicos e políticos

ARTIGO 47.º

(Direitos de associação)

1. Os cidadãos têm o direito de se associar, sem dependência de autorização ou aprovação do Estado, para fins que não sejam ilícitos ou anticonstitucionais.

2. O Estado promove o exercício do direito de associação pelas massas populares e protege as associações como forma democrática de participação colectiva nas tarefas económicas, sociais, políticas ou culturais da reconstrução nacional
3. Tendo em conta a sua especificidade, a lei poderá prever regimes próprios para certos tipos de associações, como as de carácter político, sindical, religioso, estudantil ou as organizações populares unitárias.

ARTIGO 48.º

(Direitos políticos)

1. Todos os portugueses têm o direito de participação democrática na vida política e no processo revolucionário.
2. O direito de participação política exprime-se, entre outros:

a) No direito de constituição e na actividade de partidos .políticos, associações cívicas e organizações populares unitárias;
b) No direito de participação em acções e manifestações políticas em que se traduza a mobilização revolucionária das massas populares;
c) No direito de participação em processos, incluindo as eleições, em que. se exprima a vontade popular.

3. A lei determinará a perda de direitos políticos de todos aqueles que vierem a ser condenados por prática de acções contra-revolucionárias e a dissolução dos partidos ou organizações nelas implicados.

ARTIGO 49.º

(Liberdade de expressão e direito à informação)

1. Todos os cidadãos têm o direito de expressão do pensamento e a liberdade de o transmitir através da palavra oral ou escrita ou por qualquer outra forma, sem dependência de autorização ou censura prévias.
2. Todos os cidadãos têm direito à informação. É garantida a liberdade de imprensa.
3. O Estado garante estes direitos promovendo 0 acesso das massas trabalhadoras e das suas organizações aos órgãos e meios de comunicação, social, efectuando uma profunda transformação das suas estruturas , de modo a libertá-los do contrôle monopolista nacional e estrangeiro, e levando a cabo uma política de informação que esclareça e consciencialize as massas populares na via de transição para o socialismo.
4. É proibida e considerada como crime a utilização da liberdade de informação e dos órgãos e meios de comunicação social para a realização de acções contra-revolucionárias, bem como para apologia do fascismo do colonialismo e do racismo ou para propaganda belicista devendo a lei prever as sanções adequadas à sua gravidade.
5. A televisão não pode ser objecto de propriedade privada e a lei regulará o regime de concessão da rádio.

ARTIGO 50. º

(Criação artística e investigação cientifica)

1. É livre a criação artística e a investigação científica.

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2. O Estado estimulará a criação artística e a investigação científica promovendo e incentivando a participação dos artistas e cientistas nas grandes tarefas e obras de criação da nova sociedade.

ARTIGO 51.º

(Direito de reunião)

1. São garantidos os direitos de reunião e manifestação, sendo livre o seu exercício.
2. Compete ao Estado e às entidades públicas assegurar a prática destes direitos, pondo à disposição dos trabalhadores e das organizações populares os meios materiais, os recintos e os locais necessários ao seu exercício.
3. A lei tomará providências para a não perturbação da segurança e uso corrente dos lugares onde se efectue a reunião ou manifestação.

ARTIGO 52.º

(Liberdade religiosa)

1. É reconhecida a liberdade religiosa e de prática de culto.
2. A fim de garantir a liberdade religiosa, as igrejas estão separadas do Estado, podendo as suas relações ser objecto d.e convenções.
3. É proibida a utilização da religião ou dos estabelecimentos, instituições ou cerimónias religiosas para fins de política partidária ou anticonstitucionais.

ARTIGO 53.º

(liberdade de deslocação)

1. Todos os cidadãos têm a liberdade de se desfocarem para qualquer parte do território nacional e de saírem e entrarem nele.
2. A lei pode )imitar este direito para salvaguardar a segurança e a saúde públicas ou para prevenir ou reprimir actividades contra-revolucionárias.

ARTIGO 54.º

(Defesa da Pátria e serviço militar)

1. A defesa da Pátria e da revolução é um elevado dever de todas as portugueses.
2. É obrigatório, nos termos e pelo período que a lei determinar, o cumprimenta do serviço militar nas forças armadas.
3. O cumprimento das obrigações militares não prejudica o direito ao emprega e outros direitos laborais adquiridos ao tempo da incorporação nas forças armadas.

ARTIGO 55.º

(Dever de pagar impostos)

1. Todos os cidadãos com capacidade económica devem contribuir financeiramente para as despesas públicas.
2. Os impostos serão definidos e repartidos segundo o princípio da igualdade e da justiça tributárias e de acordo com as exigências do desenvolvimento económica e do plano.
3. O Estado procederá a uma reforma tributária, cujos princípios fundamentais serão:

a) Forte progressividade de imposto, pagando mais quem mais pode;
b) Forte tributação dos grandes rendimentos da propriedade, das grandes sucessões e doações e dos capitais imobilizados;
c) Revisão e actualização do mínima de existência de acordo com o aumento da riqueza nacional.

ARTIGO 56.º

(Serviços cívicos)

1. Os cidadãos têm o dever de prestar serviços cívicos, nomeadamente na administração da justiça, fazendo parte de júris, na administração eleitoral, fazenda parle de comissões de recenseamento e de mesas de voto, bem como outros de natureza semelhante que a lei determinar.
2. Em substituição ou complemento do serviço militar, a lei poderá criar, para as jovens a partir dos 17 anos, um serviço cívico de duração limitada, o qual será desde já tornada obrigatório para os candidatos ao acesso às Universidades que não sejam trabalhadores.

ARTIGO 57.º

(Deveres cívicos)

1. Os portugueses têm o dever de observar, cumprir e fazer cumprir a Constituição e a legalidade revolucionária.
2. Os portugueses têm o dever de defender a saúde pública, a propriedade social e a economia nacional, evitando. e opondo-se ' a qualquer acção que as prejudique, nomeadamente a criação de situações de insalubridade, a má utilização do património nacional, a corrupção dos serviços públicos e a sabotagem económica.
3. Os portugueses têm o dever de defender o Estado democrático revolucionária e a processo revolucionário de transição para o socialismo, nomeadamente pela vigilância popular sobre as actividades contra-revolucionárias e pelo combate a todas as acções que ponham em causa a unidade das massas populares e a aliança entre o movimento popular de massas e o Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 58. º

(Direito de asilo)

1. Os estrangeiros perseguidos por razões políticas, nomeadamente em consequência de lutarem pelas liberdades democráticas, pela emancipação dos trabalhadores e pela libertação dos povos submetidos ao colonialismo e ao imperialismo, ou por outros princípios fundamentais consagrados nesta Constituição, gozam do. direito de asilo, nos termos da lei.
2. Só os estrangeiros acusados de crimes comuns poderão ser extraditados se houver convenção ou tratado internacional que expressamente o preveja.

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CAPÍTULO V

Tutela dos direitos e liberdades fundamentais

ARTIGO 59.º

(Reclamação, resistência e recurso)

1. Os cidadãos têm o direito de representação, reclamação ou queixa perante qualquer órgão do Estado ou autoridade pública, bem como o de lhes propor iniciativas e sugestões que visem satisfazer interesses colectivos.
2. É direito de todo o cidadão resistir a qualquer ordem ilegítima que infrinja ou perturbe os seus direitos, bem como a qualquer acto atentatório da sua integridade física e das suas liberdades.
3. Os cidadãos têm direita a recorrer perante um tribunal de todos os actos administrativos ilegais que violem os seus direitos e liberdades.

ARTIGO 60.º

(Indemnização)

1. Os prejuízos morais ou materiais causados aos cidadãos, em consequência da prática, pelos agentes do Estada ou de qualquer autoridade, de actos lesivos dos direitos e liberdades consignados nesta Constituição, deverão ser indemnizados nos termos de direito.
2. OS cidadãos injustamente condenados terão direito à revisão da sentença e à indemnização pelos prejuízos sofridos.

TITULO IV

Estrutura e organização do Estado

CAPÍTULO I

órgãos de Soberania

ARTIGO 61.º

(Organização do poder político)

1. A aliança do movimento popular de massas com o Movimento das Forças Armadas está na base da organização do poder político e determina a estrutura e o funcionamento dos órgãos de Soberania.
2. O movimento popular de massas compreende os partidos políticos empenhados no processo revolucionário e estrutura-se nas organizações populares unitárias sociais e políticas, sindicatos, ligas de pequenos e médios agricultores, comissões de trabalhadores, comissões de defesa da revolução, comissões de moradores; conselhos de aldeia, assembleias populares, locais e regionais.
3. O Movimento das Forças Armadas - movimento de libertação do povo português - tem por objectivo a independência nacional e a construção da sociedade socialista sem classes, obtida pela colectivização dos meios de produção, eliminando todas as formas de exploração do homem pelo homem.
4. As estruturas populares unitárias de base, em cooperação com os partidos empenhados no processo revolucionário e com o Movimento das Forças Armadas, são factor do reforço da unidade popular e da cooperação, participação e contrôle populares na actividade do aparelho do Estado.

ARTIGO 62.º

(Órgãos de Soberania)

1. Os órgãos de Soberania do Estado são os seguintes:

a) Presidente da República;
b) Conselho da Revolução;
c) Assembleia do M 1FA;
d) Câmara dos Deputados;
e) Governo;
f) Tribunais.

2. Serão reconhecidas a intervenção e representação políticas das organizações populares referidas no artigo anterior, em função do seu desenvolvimento autónomo e específico.

CAPÍTULO II

Presidente da República

ARTIGO 63.º

(Chefe do Estado)

O Presidente da República é o Chefe do Estado, desempenhando, por inerência, as funções de Presidente do 'Conselho da Revolução e de Comandante Supremo das Forças Armadas.

ARTIGO 64.º

(Eleição)

1. O Presidente da República é eleito por um colégio eleitoral constituído pela Câmara dos Deputados e pela Assembleia do Movimento das Forças Armadas.
2. As candidaturas deverão ser subscritas por um mínimo de oitenta eleitores do colégio.
3. A eleição será feita sem discussão por maioria absoluta à primeira volta ou por maioria simples à segunda, sendo a esta admitidos apenas os candidatos que tiverem obtido mais de 20 % dos votos no primeiro escrutínio.

ARTIGO 65.º

(Requisitos de elegibilidade)

1. Pode ser candidato à Presidência da República todo o cidadão português de origem, maior de 30 anos de idade, no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.
2. Se o eleito for membro da Câmara dos Deputados, perderá o mandato.

ARTIGO 66.º

(Duração do mandato e vacatura do cargo)

1. O Presidente da República é eleito por cinco anos.
2. A eleição terá lugar até sessenta dias antes do termo do mandato anterior, salvo se a Câmara dos Deputados tiver sido dissolvida, caso em que a eleição terá lugar após a eleição da nova Câmara.
3. O Presidente da República pode renunciar, ao cargo perante o Conselho da Revolução e a Câmara dos Deputados.

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4. Em caso de morte, renúncia ou impedimento do Presidente da República, assumirá as suas funções quem o Conselho da Revolução designar, devendo proceder-se a nova eleição no prazo de sessenta dias, salvo no caso de impedimento temporário.

ARTIGO 67.º

(Posse e juramento do Presidente eleito)

O Presidente da República toma posse perante a Assembleia do MFA e a Câmara dos Deputados, usando a seguinte declaração de compromisso:
Juro por minha honra garantir o exercício de todos os direitos e liberdades dos cidadãos, observar e fazer cumprir a legalidade democrática, defender as instituições revolucionárias, promover o progresso social è o bem geral do povo e assegurar a independência da Pátria Portuguesa.

ARTIGO 68.º

(Ausência do País)

1. O Presidente da República não pode ausentar-se do território nacional sem o assentimento do Conselho da Revolução e da Câmara dos Deputados, se esta estiver em funcionamento, salvo em viagem de carácter particular, cuja duração não exceda cinco dias.
2. Durante a ausência desempenhará as funções de Presidente da República quem o Conselho da Revolução designar.

ARTIGO 69.º

(Responsabilidade)

Por crimes estranhos ao exercício das suas funções, o Presidente da República responderá perante os tribunais, mas só depois de findo o mandato.

ARTIGO 70.º

(Funções do Presidente da República)

Compete ao Presidente da República:

a) Representar a República;
b) Escolher o Primeiro-Ministro, ouvido o Conselho da Revolução e os partidos e demais forças políticas que entender por convenientes;
c) Nomear e exonerar os membros do Governo de acordo com a proposta do Primeiro-Ministro;
d) Dissolver a Câmara dos Deputados sob deliberação do Conselho da Revolução, marcando a data para novas eleições a realizar no prazo de noventa dias;
e) Promulgar e fazer publicar as leis do Conselho da Revolução e da Câmara dos Deputados, bem como os decretos-lei e os decretos regulamentares do Governo;
f) Dirigir, em coordenação com o Conselho da Revolução e o Governo, a política externa da República;
g) Concluir acordos e ajustar tratados internacionais, directamente ou por intermédio dos seus representantes;
h) Ratificar tratados internacionais depois de devidamente aprovados;
i) Acreditar e receber os representantes diplomáticos;
j) Indultar e comutar penas;
l) Marcar, nos termos constitucionais, sob proposta do Conselho da Revolução, a data de eleições para a Câmara dos Deputados;
m) Declarar a guerra e fazer a paz, mediante prévia autorização do Conselho da Revolução;
n) Declarar o estado de sítio no caso de agressão efectiva ou iminente de forças estrangeiras ou de grande perigo para a ordem democrática e revolucionária, precedendo autorização do Conselho da Revolução;
o) Convocar extraordinariamente a Câmara dos Deputados quando assim o exigir o bem da República;
p) Pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação.

ARTIGO 71.º

(Referenda)

1. Os actos do Presidente da República devem ser referendados pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro ou Ministros competentes, sem o que serão juridicamente inexistentes.
2. Não carecem de referenda:

a) A nomeação e exoneração do Primeiro-Ministro e demais membros do Governo;
b) Os actos legislativos emanados do Conselho da Revolução, excepto aqueles a que se refere o artigo 105.º, n.º 3;
c) A mensagem de renúncia ao cargo.

3. A promulgação das leis e resoluções da Câmara dos Deputados será referendada apenas pelo Primeiro-Ministro.

CAPÍTULO III

Conselho da Revolução

ARTIGO 72.º

(Composição)

1. O Conselho da Revolução é presidido pelo Presidente da República e a sua composição é a que se encontra definida na Lei - Constitucional n.º 5/75, de 14 de Março.
2. Qualquer alteração à composição do Conselho da Revolução só poderá ser feita por legislação do próprio Conselho, de acordo com deliberação da Assembleia do MFA.

ARTIGO 73.º

(Funções)

O Conselho da Revolução terá por funções:

a) Definir, dentro do espírito da Constituição, as necessárias orientações programáticas da política interna e externa e velar , pelo seu cumprimento;
b) Decidir, com força obrigatória geral, sobre a constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, sem prejuízo da competência dos tribunais para apreciar a sua inconstitucionalidade formal:

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c) Exercer a competência legislativa que lhe é atribuída por esta Constituição;
d) Vigiar pelo cumprimento das leis ordinárias e apreciar os actos do Governo ou da administração;
e) Propor à Câmara dos Deputados alterações à Constituição em vigor;
f) Autorizar o Presidente da República a fazer a guerra, em caso de agressão efectiva ou iminente, e a fazer a paz;
g) Pronunciar-se junto do Presidente. da República sobre a escolha do Primeiro-Ministro e dos Ministros que devam ser da confiança do;
h) Deliberar sobre a dissolução da Câmara dos Deputados quando o considerar necessário à resolução de situações de impasse Político;
i) Autorizar o Presidente da República a declarar o estado de sítio e a pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação;
j) Pronunciar-se sobre a impossibilidade física, temporária ou permanente, do Presidente da República;
I) Designar, em caso de morte, renúncia ou impedimento do Presidente da República, quem desempenhará interinamente as suas funções;
m) Aprovar os tratados de cooperação militar e defesa.

ARTIGO 74. º

(Funcionamento)

1. O Conselho da Revolução funciona em regime de permanência.
2. O Conselho da Revolução reúne-se em plenário ou por secções ou comissões, conforme o regimento que elaborará.

CAPÍTULO IV

Assembleia do Movimento das Forças Armadas

ARTIGO 75.º

(Composição)

1. A Assembleia do MFA é constituída por 240 representantes das forças armadas, sendo 120 do Exército, 60 da Armada e 60 da Força Aérea.
2. A composição da Assembleia do MFA será determinada por lei do Conselho da Revolução.
3. O Conselho da Revolução faz parte da Assembleia do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 75.º

(Funções)

1. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas faz ,parte, com a totalidade dos seus membros, do colégio eleitoral para a eleição do Presidente da República.
2. O Conselho da Revolução definirá em diploma legislativo a elaborar por ele própria as funções específicas da Assembleia do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 77.º

(Funcionamento)

1. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas será presidida peio Conselho da Revolução através do seu Presidente ou de quem as suas vezes fizer.
2. A Assembleia do MFA funciona em regime de permanência e segundo regulamentação ,própria que será. da competência legislativa do Conselho da Revolução.

CAPÍTULO V

Câmara dos Deputados

ARTIGO 78.º

(Definição)

1. A Câmara dos Deputados é uma assembleia parlamentar representativa dos cidadãos eleitores.
2. A Câmara dos Deputados é responsável perante as massas populares e perante os órgãos democráticos revolucionários do poder político.

ARTIGO 79.º

(Composição, eleição e duração)

1. A Câmara dos Deputados é eleita por sufrágio universal, directo, igual e secreto.
2. A Câmara dos Deputados é eleita por um período de três anos.
3. O número de Deputados será determinado pela Lei Eleitoral, não podendo ser superior a 250.

ARTIGO 80.º

(Direitos e regalias dos Deputados)

1. Os Deputados gozam dos direitos e regalias seguintes:
a) Não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções;
b) Não podem ser sujeitos a prisão preventiva, a não ser em virtude de crime punível com pena maior e mediante autorização da Câmara;
c) Não podem ser jurados, peritos ou testemunhas sem autorização da Câmara, que decidirá após a audiência do Deputado;
d) Ficarão adiados do cumprimento do serviço militar, do serviço cívico ou da mobilização civil durante o funcionamento da Câmara;
e) Não podem ser prejudicados na sua colocação ou emprego permanentes, por virtude do desempenho das funções de Deputado;
f) Terão direito de requerer os elementos, informações e publicações oficiais que considerarem indispensáveis para o exercício do mandato.

2. Movido procedimento criminal contra algum Deputado e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, fora do caso previsto na alínea b) de número anterior, a Câmara decidirá se o Deputado deve ou não ser suspenso para efeito de seguimento do processo.

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ARTIGO 81.º

(Perda de mandato)

1. Perdem o mandato os Deputados que:

a) Venham a ser abrangidos por alguma das causas de incapacidade ou incompatibilidade previstas na lei;
b) Não tomem assento na Câmara até à quinta reunião ou deixem de comparecer em cinco sessões consecutivas, sem motivo justificado de doença ou de outro caso de força maior, ou dêem quinze faltas interpoladas não justificadas;
c) Venham a ser condenados pela prática de qualquer crime.

2. Compete à Câmara declarar a perda do mandato em que incorrer qualquer dos Deputados.
3. Os Deputados poderão renunciar ao mandato, devendo a renúncia ser declarada por escrito.

ARTIGO 82.º

(Preenchimento de vagas)

As vagas que ocorrerem na Câmara dos Deputados serão preenchidas pelo primeiro candidato não eleito, na respectiva ordem de precedência, da lista a que pertencia o titular do mandato vago.

ARTIGO 83.º

(Sessões e reuniões da Câmara)

1. A Câmara dos Deputados reúne-se por direito próprio no primeiro dia útil de Março e Outubro, em sessões de três meses cada uma.
2. A Câmara dos Deputados pode reunir em sessão extraordinária sempre que para tanto seja convocada. pelo Presidente da República, por iniciativa deste, do Governo ou do Conselho da Revolução.
3. As reuniões da Câmara dos Deputados são públicas, podendo ter carácter reservado quando nelas se tratar de matéria relativa à segurança nacional.
4. A Câmara dos Deputados funciona em reuniões plenárias, podendo constituir comissões permanentes ou eventuais para fins determinados.

ARTIGO 84.º

(Votações e deliberações)

1. A Câmara só pode reunir com a presença de mais de metade dos Deputados.
2. As deliberações são tomadas por maioria absoluta de votos, achando-se presente a maioria do número legal dos seus membros.
3. As votações não poderão ser secretas.

ARTIGO 85.º

(Competência interna)

1. A Câmara dos Deputados procederá à verificação dos poderes dos Deputados, elegerá a Mesa e regulará o seu funcionamento por meio de regimento interno.
2. A verificação dos poderes dos Deputados incluirá a fiscalização das incapacidades e incompatibilidades eleitorais.

ARTIGO 86.º

(Competência externa)

Compete à Câmara dos Deputados:

a) Fazer leis;
b) Fazer parte do colégio eleitoral para a eleição do Presidente da República;
c) Autorizar o Governo, até 15 de Dezembro de ceda ano, a cobrar as receitas do Estado e a pagar as despesas públicas na gerência futura;
d) Apreciar as contas respeitantes a cada ano, que lhe devem ser presentes pelo Governo;
e) Aprovar os tratados que versem matérias da sua competência legislativa exclusiva;
f) Definir os limites do território nacional;
g) Ratificar a declaração do estado de sítio quando este se prolongar por mais de trinta dias;
h) Exercer poderes constituintes quando por iniciativa do Conselho da Revolução lhe sejam propostas alterações à constituição;
i) Conferir ao Governo autorizações legislativas;
j) Ratificar a formação ou remodelação do Governo, nos termos do artigo 91.º;
l) Apreciar os actos do Governo e da administração, podendo votar moções de confiança ou desconfiança ao Governo, nos termos do artigo 91.º

CAPÍTULO VI

Governo

ARTIGO 87.º

(Definição)

O Governo é o principal órgão executivo da política nacional, competindo-lhe colectivamente desenvolver e aplicar as directivas do Conselho da Revolução, elaborar a legislação necessária, superintender em toda a administração pública, de modo a corresponder rápida e eficientemente aos objectivos da transição para o socialismo.

ARTIGO 88.º

(Composição e formação)

1. O Governo é constituído pelo Primeiro-Ministro, que poderá gerir os negócios de um ou mais Ministérios, pelos Ministros, Secretários de Estado e Subsecretários de Estado.
2. O Primeiro-Ministro é nomeado e exonerado livremente pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, forças políticas e partidos que entender por convenientes.
3. O Governo é escolhido pelo Primeiro-Ministro, tendo em atenção a representatividade dos partidos na Câmara dos Deputados e as possíveis coligações.
4. Os membros do Governo são nomeados e exonerados pelo Presidente da República sob proposta do Primeiro-Ministro.
5. As funções de todos os membros do Governo cessam com a exoneração do Primeiro-Ministro, e as dos Secretários e Subsecretários de Estado com as dos respectivos Ministros.
6. Poderá haver Ministros sem pasta, que desempenharão missões de natureza específica e exercerão

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funções de coordenação entre os Ministros ou quaisquer outras que lhes sejam delegadas pelo Primeiro-Ministro.
7. Os Ministros da Defesa, Administração Interna e Planeamento Económico são obrigatoriamente da confiança do Movimento das Forças Armadas, pelo que a sua nomeação não deverá ser feita antes de ouvido o Conselho da Revolução.
8. Na ausência ou impedimento do Primeiro-Ministro, será substituído pelo Ministro que ele proponha ao Presidente da República ou, na falta de tal proposta, pelo Ministro que for designado pelo Presidente da República, depois de ouvido o Conselho da Revolução.

ARTIGO 89.º

(Funções)

1. Compete ao Governo:
a) Conduzir, de acordo com as orientações programáticas do Conselho da Revolução, a política geral da Nação;
b) Elaborar e executar o plano económico nacional;
c) Apresentar à Câmara dos Deputados, até 15de Outubro de cada ano, a proposta de lei de meios e elaborar e decretar com base nela o Orçamento Geral do Estado;
d) Superintender no conjunto da administração pública;
e) Fazer decretos-lei;
f) Aprovar tratados e acordos internacionais, salvo aqueles a que se referem os artigos 73.º, alínea m), e 86.º, alínea e);
g) Elaborar decretos, regulamentos e instruções para a boa execução das leis;
h) Referendar os actos do Presidente da República, nos termos do artigo 71.º

2. O Orçamento Geral do Estado conterá todas as despesas previstas para a administração pública, de acordo com o Plano Económico para o ano a que disser respeito, e as receitas necessárias para as cobrir.

ARTIGO 90.º

(Conselho de Ministros)

1. As linhas gerais da orientação governamental e da sua execução serão definidas em Conselho de Ministros.
2. Os membros do Governo estão vinculados às deliberações tomadas em Conselho de Ministros.
3. Poderá haver Conselhos de Ministros restritos que terão os poderes e funcionarão nos termos que a lei determinar.
4. Os actos do Governo que envolvam aumento ou diminuição das receitas ou das despesas públicas terão de ser aprovados em Conselho de Ministros.

ARTIGO 91.º

(Responsabilidade política do Primeiro-Ministro e do Governo)

1. O Primeiro-Ministro é politicamente responsável perante o Presidente da República e, juntamente com o Governo, perante a Câmara dos Deputados.
2. Nos casos de formação inicial ou de recomposição ministerial que abranja pelo menos um terço dos Ministros, o novo Governo deverá apresentar-se perante a Câmara dos Deputados, logo que esta reúna, para obter um voto de Confiança.
3. Para efeitos do número anterior não se contarão os Ministros que, nos termos do artigo 88.º, são da confiança do Movimento das Forças Armadas.
4. A Câmara pode votar moções de desconfiança ao Governo.
5. As moções de desconfiança não poderão efectuar-se em relação com acções do Governo que sejam execução de directivas do Conselho da Revolução.
6. Nos seis meses subsequentes à formação inicial do Governo ou à recomposição ministerial não poderão ser votadas quaisquer moções de desconfiança.
7. A aprovação de duas moções de desconfiança feitas com pelo menos trinta dias de intervalo obrigará a recomposição ministerial.
8. A aprovação da moção de desconfiança carece de uma maioria qualificada de dois terços de Deputados.
9. A moção de desconfiança terá de ser subscrita por, pelo menos, um décimo dos Deputados.
10. Os membros do Governo têm direito a intervir nas sessões da Câmara dos Deputados em que se discutam moções de desconfiança.
11. A eleição de uma nova Câmara dos Deputados não obriga o Governo a obter a sua confiança.

CAPÍTULO VII

Tribunais

ARTIGO 92.º

(Justiça)

1. A justiça tem por fim fazer respeitar a vida, a liberdade e os direitos dos cidadãos e das organizações populares, bem ramo defender as instituições revolucionárias e a ardem económica e social da transição para o socialismo.
2. A justiça é administrada pelos tribunais em nome do povo.
3. Na aplicação da justiça os tribunais e os juízes são independentes e só devem obediência à Constituição e à lei.

ARTIGO 93.º

(Tribunais)

1. A organização e competência dos tribunais serão estabelecidas por lei de modo a realizar os objectivos previstos no artigo anterior.
2. A função jurisdicional é exercida pelo Supremo Tribunal de Justiça e pelos tribunais de 1.ª e 2.ª instâncias.
3. Poderá haver tribunais especializados, como tribunais administrativos, do trabalho e outros.
4. Além dos tribunais comuns haverá tribunais militares, cuja organização e competência a lei fixará.

ARTIGO 94.º

(Tribunal Revolucionário)

Para julgamento dos responsáveis por acções contra-revolucionárias será instituído um tribunal militar re-

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volucionário, cuja competência, composição e funcionamento serão definidos por lei do Conselho da Revolução.

ARTIGO 95.º

(Participação popular na justiça)

A lei poderá prever a criação e competência de juízes de paz, eleitos pelos cidadãos, e os casos em que deverão intervir nos julgamentos assessores populares.

ARTIGO 96.º

(Ministério Público)

O Ministério Público é um órgão de justiça a quem compete representar o Estado e as pessoas a quem este deve protecção e defender a legalidade revolucionária.

CAPÍTULO VIII

Administração local e regional

ARTIGO 97.º

(Estrutura e organização)

1. As freguesias, os concelhos e os agrupamentos de concelhos são a base geográfica da administração local e regional.
2. A lei de administração local e regional definirá a organização administrativa do País, o modo de composição, eleição, funcionamento e atribuições dos respectivos órgãos, bem como as formas de contrôle e de ligação com a administração central do Estado.
3. A administração regional dos Açores e da Madeira terá estatuto próprio que, tendo em conta os problemas específicos criados pela distância geográfica e pelas condições económicas, sociais e políticas deverá contribuir para reforçar a identidade económica de cada arquipélago no quadro da unidade e planificação nacionais.

ARTIGO 98.º

(Estruturas populares unitárias de base)

1. A nível local e regional as estruturas populares unitárias de base participarão na defesa dos interesses populares, na dinamização e controlo da administração pública e da vida política, e na renovação e democratização do aparelho de Estado na via de transição para o socialismo.
2. Às organizações populares a nível de aldeia, concelho, cidade, bairro ou região, é reconhecido o direito de intervir activamente na solução dos problemas políticos, económicos e sociais locais e regionais, nomeadamente através das assembleias populares locais e regionais e paralelamente às autarquias locais, em ligação e coordenação com estas e com os órgãos centrais do Estado.
3. Será fomentada, no que se refere aos números anteriores, a acção autónoma dos sindicatos, ligas de pequenos e médios agricultores, comissões de trabalhadores, de defesa da revolução, comissões de moradores, conselhos de aldeia, assembleias populares, locais e regionais, e outros órgãos representativos das organizações de massas.

CAPÍTULO IX

Formação das leis

ARTIGO 99.º

(Competência legislativa)

Têm competência legislativa, nos termos dos artigos seguintes, o Conselho da Revolução, a Câmara dos Deputados e o Governo.

ARTIGO 100.º

(Competência do Conselho da Revolução)

1. São da exclusiva competência legislativa do Conselho da Revolução as regras referentes a:

a) Assuntos militares;
b) Composição e regimento do próprio Conselho da Revolução
c) Composição, funções e regimento da Assembleia do Movimento das Forças Armadas;
d) Estatuto, funcionamento e competência do Tribunal Militar Revolucionário;
e) Organizações populares, a que se referem os artigos 61.º, 62.º e 98.º

2. O Conselho da Revolução poderá ainda legislar sobre qualquer outra matéria de interesse nacional e de resolução urgente, quando a Câmara dos Deputados ou o Governo o não puderem fazer.

3. Carecem de sanção do Conselho da Revolução, sem o que não poderão ser promulgadas, as leis da Câmara dos Deputados e dos decretos-leis do Governo que respeitem às matérias seguintes:
a) Linhas gerais da política económica, social e financeira;
b) Relações externas, em especial com os novos países de expressão portuguesa e com os territórios ultramar; nos ainda sob administração portuguesa;
c) Exercício das liberdades e direitos fundamentais;
d) Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes;
e) Actividade política, em especial a relativa a actos eleitorais.

4. Entender-se-á recusada a sanção se o Conselho da Revolução não se pronunciar nos trinta dias seguintes ao do envio da lei ou decreto-lei.

ARTIGO 101.º

(Competência da Câmara dos Deputados)

1. A Câmara dos Deputados pode fazer leis sobre todas as matérias não reservadas à competência legislativa do Conselho da Revolução.
2. Sem prejuízo do estabelecido no artigo anterior, constitui matéria de exclusiva competência legislativa da Câmara dos Deputados o estabelecimento de regras relativas a:
a) Aquisição e perda da cidadania;
b) Exercício dos direitos e liberdades fundamentais;
c) Organização dos tribunais, excepto a dos tribunais militares;
d) Regime da designação, valor, peso e timbre da moeda e do padrão de pesos e medidas;

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e) Determinação das remunerações do Presidente da República, dos deputados e dos membros do Governo.

3. A Câmara dos Deputados pode autorizar o Governo a legislar mediante decretos-lei sobre matérias reservadas à sua competência legislativa.
4. Os Deputados não poderão apresentar projectos de lei que envolvam aumento das despesas ou diminuição das receitas da Estado.
4. As leis e outros diplomas legislativos só se consideram existentes após a sua publicação no Diária do 0overno.

ARTIGO 102.º

(Competência do Governo)

1. O Governo pode legislar, mediante decretos-lei, em concorrência com a Câmara dos Deputados; sobre todas as matérias não reservadas à competência legislativa do Conselho da Revolução ou da Câmara dos Deputados.
2. Para a execução da sua política o Governo pode solicitar à Câmara dos Deputados autorização para Legislar sobre matérias da exclusiva competência legislativa desta.
3. Quando as leis da Câmara dos Deputados ou do Conselho da Revolução contiverem apenas bases gerais, compete ao Governo elaborar os necessários decretos regulamentares.

ARTIGO 103.º

(Iniciativa legislativa)

1. A iniciativa legislativa na Câmara dos Deputados compete aos Deputados, através de projectos de lei, e ao Governo, através de propostas de lei.
2. A iniciativa legislativa poderá pertencer também às organizações populares referidas no artigo 61.º, nos termos e com os efeitos previstos na respectiva lei.
3. O Governo, poderá requerer à Câmara dos Deputadas prioridade na discussão das suas propostas de lei, que só poderá ser recusada no caso de estar já em discussão algum projecto de lei sobre a mesma matéria.

ARTIGO 104.º

(Discussão pública)
Os projectos e propostas de lei poderão ser submetidos a discussão pública ou a o parecer das organizações populares referidas ano artigo 61.º, devendo a Câmara dos Deputados tomar em consideração os resultados do debate público ou os pareceres na redacção definitiva da lei.

ARTIGO 105.º

(Promulgação, referenda e publicação)

1. As leis do Conselho da Revolução e da Câmara dos Deputados e os decretos-lei e decretos regulamentares do Governo serão enviados ao Presidente da República para serem promulgados nos trinta dias seguintes ao da sua recepção.
2. As leis da Câmara dos Deputados que não tenham obtido a necessária sanção do Conselho da Revolução poderão ser promulgadas na sua forma inicial se em segunda votação obtiverem aprovação por uma maioria de dois terços do número total de Deputados.
3. A promulgação das leis da Câmara dos Deputados e dos decretos-lei e decretos regulamentares do Governo carece da referenda do Primeiro-Ministro e do Ministro ou Ministros competentes. A promulgação das leis do Conselho da Revolução carece de referenda do Primeiro-Ministro apenas quando elas envolverem aumento de despesas não comportáveis pelo orçamento.

ARTIGO 106.º

(Inconstitucionalidade das leis)

1. O Conselho da Revolução decidirá com força obrigatória geral, por sua iniciativa ou a requerimento dos tribunais, sobre a constitucionalidade das leis e de outros diplomas com força de lei.
2. Nos casos submetidos a julgamento, os juízes poderão deixar de aplicar um diploma legal que julguem viciado de inconstitucional idade formal.
3. A lei regulará os trâmites a seguir quando se levantar o incidente da inconstitucional idade perante os tribunais.

ARTIGO 107.º

(Recepção do direito internacional)

1. As normas convencionais do direito internacional vigoram na ordem interna desde que constem de tratado ou qualquer outro acto aprovado pelo Conselho da Revolução, pela Câmara dos Deputados ou pelo Governo e cujo texto haja sido devidamente publicado.
2. As normas de direito internacional universalmente reconhecidas, nomeadamente as que servem a paz e a cooperação pacífica entre os povos, e as normas geralmente reconhecidas relativas aos crimes de guerra, contra a paz e contra a Humanidade são imediatamente aplicáveis no direito interno português, vinculando o Estado e cidadãos.

CAPÍTULO X

Eleições e sistema eleitoral

ARTIGO 108.º

(Liberdade eleitoral)

1. É assegurada a liberdade eleitoral e da expressão eleitoral da vontade popular.
2. O Estado garante a liberdade eleitoral para as massas populares e as suas organizações e a rigorosa seriedade e fiscalização do recenseamento, do acto eleitoral e do apuramento dos resultados, assim como a liberdade de propaganda dos candidatos onde quer que se apresentem, impedindo as pressões, ameaças e agressões internas e as ingerências externas, o caciquismo e a propaganda fraudulenta, e criando as condições materiais, sociais, políticas e jurídicas da autodeterminação consciente da vontade popular.
3. A fim de garantir a expressão livre e fies da vontade revolucionária e dos interesses do povo, o Estado tomará as medidas necessárias, em cooperação comas organizações populares, para que os processos eleitorais se integrem conscientemente no processo revolucionário.

ARTIGO 109. º

(Responsabilidade dos representantes eleitos)

Os Deputados e outros representantes eleitos não podem desenvolver acção política que esteja em con-

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24 DE JULHO DE 1975 358-(53)

tradição com as promessas e compromissos político constantes do seu programa eleitoral.

ARTIGO 110.º

(Sistema eleitoral)

A lei regulará o sistema eleitoral e o processo das eleições para a Câmara dos Deputados e para os órgãos da administração local e regional, observados os limites dos artigos seguintes.

ARTIGO 111.º

(Capacidade eleitoral)

1. Para ser eleitor é necessário ter. 18 anos de idade, para ser elegível é necessário ter atingido a maioridade.
2. Nas primeiras eleições para a Câmara dos Deputados e para os órgãos locais e regionais não poderão ser eleitores nem elegíveis os indivíduos a quem, por desempenho de certos cargos durante o regime fascista, não foi atribuída capacidade eleitoral activa e passiva nas eleições para a Assembleia Constituinte.

ARTIGO 112.º

(Candidaturas)

Poderão apresentar candidatos às eleições para a Câmara dos Deputados e para os órgãos de administração local e regional os partidos políticos e outras organizações políticas e sociais, associações cívicas e movimentos unitários, isoladamente ou em coligação.

ARTIGO 113.º

(Representação proporcionai)

A conversão dos votos em mandatos far-se-á através do sistema de representação proporcional.

CAPÍTULO XI

Aparelho administrativo do Estado

ARTIGO 114.º

(Reestruturação)

O aparelho administrativo do Estado será reestruturado de modo adequado à natureza democrática revolucionária do Estado e à dinâmica do processo revolucionário, devendo completar-se o processo de saneamento do funcionalismo público e assegurar-se a colocação em todos os postos importantes de responsabilidade política, económica, diplomática e administrativa de pessoas inequivocamente integradas no processo revolucionário.

ARTIGO 115.º

(Responsabilidade dos funcionários e do Estado)

1. Os funcionários ou agentes do Estado e demais pessoas colectivas de direito público são responsáveis segundo as leis penais, civis ou administrativas pelos actos ilegais cometidos no exercício das suas funções.
2. O Estado e demais pessoas colectivas civilmente responsáveis perante os cidadãos, pelas ofensas resultantes de actos ilícitos praticados pelos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício, têm direito de regresso contra os titulares do órgão ou agentes culpados, se estes houverem procedido com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se achavam obrigados em razão do cargo.

ARTIGO 116.º

(Acção popular)

As organizações populares e os cidadãos têm o direito de acusar os funcionários ou agentes do Estado e demais pessoas colectivas de direito público por crimes de corrupção ou peculato.

CAPÍTULO XII

Forças armadas

ARTIGO 117. º

(Funções)

Além da sua missão específica de defesa da integridade e independência nacionais, as forças armadas participam no desenvolvimento económico, social, cultural e político do País, no âmbito do MFA.

ARTIGO 118.º

(Organização)

1. A organização das forças armadas é da exclusiva competência legislativa do Conselho da Revolução.
2. O comandante-chefe das Forças Armadas é o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, que depende directamente do Presidente da República.
3. O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas pode ser assistido por um Vice Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, que o substituirá nos seus impedimentos.
4. Cada um dos ramos das forças armadas será chefiado por um Chefe de Estado-Maior.
5. O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e os Chefes dos Estados-Maiores dos três ramos das forças armadas terão competência ministerial.

TITULO V

Disposições finais e transitórias

ARTIGO 119.

(Entrada em vigor da Constituição)

1. A presente Constituição entrará em vigor na data da publicação no Diário do Governo, após a sua promulgação pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução.
2. As eleições para a primeira Câmara dos Deputados terão lugar em data a fixar pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, segundo lei eleitoral a elaborar pelo Governo e sancionada pelo Conselho da Revolução.

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358-(54) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

3. A Câmara dos Deputados reunir-se-á, sob convocação do Presidente da República, e de acordo com regimento provisório elaborado pelo Conselho da Revolução, a fim de verificar os poderes dos Deputados, eleger a presidência e elaborar o seu próprio regimento.
4. Nos trinta dias seguintes à convocação da Câmara dos Deputados reunir-se-á, sob convocação e presidência do Presidente da República, o colégio eleitoral que procederá à eleição do Presidente da República, o qual tomará posse nos cinco dias seguintes.
5. Nos trinta dias seguintes à sua tomada de posse o Presidente da República nomeará o Governo, que se apresentará perante a Câmara dos Deputados para obter a sua confiança.
6. Enquanto não entrarem em funções, de acordo com os números anteriores, a Câmara dos Deputados, o Presidente da República e o Governo, manter-se-ão em vigor as actuais leis constitucionais que regem os órgãos de Soberania.

ARTIGO 120.º

(Revisão da Constituição)

1. Até ao termo do prazo referido no n.º4, a Constituição poderá ser revista a todo o tempo por iniciativa do Conselho da Revolução.
2. Quando forem propostas alterações à Constituição, o Conselho da Revolução investirá de poderes constituintes a Câmara dos Deputados.
3. AS alterações à Constituição propostas pelo Conselho da Revolução carecem para a sua aprovação da maioria absoluta de votos do número legal de Deputados.
4. No termo do quinto ano após a entrada em vigor da presente Constituição será dissolvida a Câmara dos Deputados que estiver em funções e realizar-se-ão, nos três meses seguintes, eleições para uma nova Câmara, que nos trinta dias seguintes se reunirá com poderes para rever a presente Constituição, devendo as alterações ser aprovadas por, pelo menos, dois terços dos Deputados.

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PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELO PARTIDO SOCIALISTA (PS)

SUMÁRIO

Preâmbulo.

Título I - Disposições gerais.
Título II - Direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão.
Título III - Direitos e deveres económico-sociais.
Capítulo I - Direito e organização do trabalho.
Capítulo II - Socialização e propriedade.
Capítulo III - Cultura e ensino.
Capítulo IV - Segurança social e saúde.
Capítulo V - Habitação e meio ambiente.

Título IV - Da organização económica.

Capítulo I - Princípios gerais.
Capítulo II - Propriedade.
Capítulo III - Do plano.
Capítulo IV - Reforma agrária.
Capítulo V - Circuitos de distribuição e comércio externo.

Título V - Órgãos de Soberania.

Capítulo I - Do Presidente da República.
Capítulo II - Do Conselho da Revolução.
Capítulo III - Do Governo.
Capítulo IV - Da Assembleia do MFA.
Capítulo V - Da Assembleia Legislativa Popular.
Capítulo VI - Dos tribunais.

Título VI - Madeira e Açores.
Título VII - Comunidades locais.

Capítulo I - Definição e atribuições.
Capítulo II - Órgãos das comunidades locais.
Capítulo III - Associações de moradores.

Título VIII - Disposições finais e transitórias.

Preâmbulo

Coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, o Movimento das Forças Armadas, a 25 de Abril de 1974, derrubou o regime fascista.
A acção empreendida pelo Movimento das Forças Armadas representa uma viragem histórica e o início de um processo revolucionário de transformação da sociedade portuguesa.
As eleições para a Assembleia Constituinte, que decorreram com elevado sentido cívico, altíssima consciência e participação do povo português, .foram a expressão da vontade popular, fonte suprema do Poder. Os resultados dessas eleições definiram como objectivos finais a atingir pelo processo revolucionário em curso:
1 - A restituição plena ao povo português dos seus direitos e liberdades fundamentais;
2 - A conclusão do processo de descolonização;
3 - A construção, por via pluralista e no respeito pela vontade popular, do socialismo, entendido este como poder democrático dos trabalhadores, no quadro da colectivização progressiva dos meios de produção e de um regime de democracia política, com vista à instauração de uma sociedade sem classes;
4 - A defesa intransigente da independência nacional.

Para prosseguir estes objectivos, a experiência histórica entretanto decorrida mostra ser indispensável a aliança entre o Movimento das Forças Armadas e o povo português, representado pelos seus partidos políticos.
Assim, no respeito pelo pacto firmado entre o Movimento das Forças Armadas e os partidos políticos mais representativos da vontade popular, a Assembleia Constituinte, reunida na sua sessão plenária de... de ... de ..., aprovou a seguinte

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA

TITULO I

Disposições gerais

ARTIGO 1.º

Portugal é uma República soberana, em transição, por via pluralista e no respeito pela vontade popular, para o socialismo, entendido este como o poder democrático dos trabalhadores, com vista à instauração de uma sociedade sem classes.

ARTIGO 2.º

A soberania reside no povo e é exercida pelas formas contidas na Constituição.

ARTIGO 3.º

A formação, a composição e a competência dos órgãos de soberania são as fixadas e as definidas na presente lei constitucional.

ARTIGO 4.º

Os partidos políticos concorrem para a expressão da vontade popular, organizando-se e exercendo a sua actividade livremente, desde que respeitem as princípios da soberania nacional e da democracia.

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358-(56) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

ARTIGO 5.º

1. Portugal é constituído pelo território situado no continente europeu, no quadro das actuais fronteiras, e pelos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
2. Considera-se igualmente território nacional o que como tal for definido nos termos da lei interna e das convenções internacionais.

ARTIGO 6.º

1. A bandeira nacional é composta das cores verde e encarnada, com a esfera armilar em amarelo e as cinco quinas em azul.
2. 0 hino nacional é A Portuguesa.

ARTIGO 7.º

1. A República Portuguesa preconiza a solidariedade e a cooperação internacionais entre todos os povos do Mundo e declara-se contrária a todas as formas de imperialismo e de agressão, bem como à política de blocos, entendendo que as negociações directas e a arbitragem são o meio adequado e eficaz para resolver os conflitos entre os povos e as nações.
2. A República Portuguesa opõe-se a todas as formas de colonialismo, solidarizando-se com todos os povos que lutam pela sua libertação e independência.
3. A República Portuguesa aceita, em reciprocidade com os outros Estados, os princípios de direito internacional necessários à criação de uma ordem jurídica colectiva capaz de assegurar a paz e a justiça entre as nações.

ARTIGO 8.º

A soberania da República Portuguesa só sofre, na ordem interna, as limitações derivadas dos tratados e convenções internacionais válida e livremente celebrados.

TITULO II

Direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão

ARTIGO 9.º

1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado ou privado de um direito em razão do sexo, ascendência, raça, língua, origem, religião, convicções políticas, instrução ou condição social.
3. É abolida a distinção entre filhos legítimos e ilegítimos.

ARTIGO 10.º

1. Todas têm direito a tomar parte na direcção dos negócios públicos do País, directamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos.
2. Qualquer pessoa tem direito ao acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do País.
3. A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos Poderes Públicos: essa vontade deve ser expressa mediante eleições livres, a realizar periodicamente por sufrágio universal igualitário e escrutínio secreto.
4. Assim, assiste aos cidadãos o direito de se associarem em partidos, através deles concorrendo democrática e colectivamente para o desenvolvimento político, económico, social e cultural da comunidade.

ARTIGO 11.º

1. É garantido o direito à vida e à integridade física.
2. Não haverá pena de morte.

ARTIGO 12.º

1. Ninguém pode ser condenado por acção ou omissão que no momento em que haja sido cometida não constituísse infracção segundo o direito nacional ou internacional. Do mesmo modo não lhe poderá ser infligida uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que à infracção haja sido cometida.
2. O presente artigo não impede o julgamento e a punição de pessoa culpada por acção ou omissão que no momento em que haja sido cometida fosse criminosa segundo os princípios gerais de direito comummente reconhecidos pelo direito internacional
3. Não haverá penas ou medidas de segurança privativas ou restritivas de liberdade pessoal com carácter perpétuo, com duração ilimitada ou estabelecidas por períodos indefinidamente prorrogáveis, salvo o caso de anomalia psíquica perigosa, se porventura forem ineficazes os meios terapêuticos e não for aconselhável o tratamento em meio aberto.
4. Não haverá medidas de segurança de qualquer natureza para delitos políticos ou sociais.
5. As penas são insusceptíveis de transmissão.
6. Ninguém pode ser julgado, ou condenado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime.

ARTIGO 13.º

1. Todos têm direito à liberdade e à segurança. Ninguém pode ser privado da liberdade, salvo nos casos seguintes e observadas as formalidades legais:
a) Se estiver preso regularmente após condenação por tribunal competente;
b) Se tiver sido objecto de prisão ou detenção regulares por insubmissão a uma decisão proferida, de acordo com a lei, por um tribunal ou a fim de garantir a execução de uma obrigação prescrita por lei;
c) Se tiver sido preso ou detido a fim de ser conduzido perante a autoridade judiciária competente, quando existam razões plausíveis para suspeitar de que cometeu uma infracção ou motivos razoáveis para crer na necessidade de o impedir de cometer uma infracção ou de fugir após a comissão dela;
d) Se se tratar da detenção regular de um menor decidida para o submeter a educação vigiada, ou de detenção regular destinada a fazê-lo comparecer perante a autoridade competente;
e) Se se tratar da detenção regular de pessoa susceptível de propagar doença contagiosa ou de alienado, alcoólico, toxicómano, vadio ou equiparado;
f) Se se tratar da detenção ou prisão regulares de uma pessoa pára a impedir de penetrar irregularmente no território ou contra a qual esteja em curso um processo de expulsão ou de extradição.

3. Toda a pessoa presa deve ser informada, no mais curto prazo e em língua que entenda, das razões da sua prisão e da acusação sobre ela pendente.

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3. Qualquer pessoa presa ou detida nas condições previstas no n.º 1, alínea c), do presente artigo deve ser levada, no prazo de vinte e quatro horas, perante um juiz ou outro magistrado habilitado por lei a exercer funções judiciárias, e tem o direito de ser julgada num prazo razoável. A restituição à liberdade pode ficar dependente de condições adequadas à segurança processual ou social.
4. Haverá habeas corpus contra o abuso de poder em caso de detenção ilegal, a interpor perante o tribunal comum ou militar, consoante os casos.

ARTIGO 14. º

1. Todo aquele que foi, acusado de infracção se presume inocente até ao momento em que a culpabilidade haja sido legalmente definida por condenação transitada em julgado.
2. Todo o acusado tem, em especial, direito a:
a) Ser informado, no mais curto prazo, em língua que entenda e de maneira pormenorizada, da natureza e da causa da acusação contra ele formulada;
b) Dispor do tempo e das facilidades necessárias à preparação da sua defesa;
c) Defender-se por si ou ter a assistência de defensor da sua escolha ou, se não tiver meios para remunerar um defensor, ser assistido gratuitamente por um defensor oficioso, quando os interesses da justiça o exijam;
d) Interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação e obter a convocação e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições das primeiras;
e) Fazer-se assistir gratuitamente por um intérprete, se não entender ou não falar a língua usada na audiência.

ARTIGO 15.º

1. Todo aquele cujos direitos e liberdades reconhecidos constitucionalmente hajam sido violados tem o direito a usar de recurso efectivo perante o tribunal competente mesmo quando a violação tenha sido cometidas por pessoas que agissem no exercício das suas funções oficiais.
2. No caso de não estar legalmente definida a competência de nenhum tribunal para conhecer da arguida violação, terá competência para dela conhecer o Conselho da Revolução.

ARTIGO 16.º

1. Todos têm direito a que seja respeitada a sua vida privada e familiar, o seu domicílio e a sua correspondência.
2. Só pode haver ingerência da autoridade pública no exercício deste direito na medida em que tal ingerência esteja prevista por lei e em que constitua medida necessária à segurança nacional numa sociedade democrática, à segurança pública, ao bem-estar económico do País, à protecção da saúde e da moral ou à protecção dos direitos e liberdades de outrem.
3. São proibidas as escutas e gravações que violem a vida íntima, às quais é recusado qualquer valor probatório.

ARTIGO 17.º

1. É garantido a todos os cidadãos o direito de tomar conhecimento do que a seu respeito constar dos ordenadores informáticos e do fim a que se destinam as informações, bem como o direito à rectificação dos dados errados e à eliminação dos que violem a intimidade da sua vida privada.
2. A informática não poderá ser usada como registo de dados respeitantes a convicções políticas, fé religiosa e vida privada.
3. É proibida a atribuição de um número aos cidadãos em substituição do nome para fins repressivos ou de identificação.

ARTIGO 18.º

1. A todos os cidadãos da República Portuguesa é garantido o direito de se deslocarem e fixarem livremente em qualquer parte da território nacional, salvos os limites estabelecidos por lei, em razão de salubridade e de segurança física.
2. Todo o cidadão é livre de se deslocar ao estrangeiro e de emigrar, só ou acompanhado pela sua família, temporária ou definitivamente.

ARTIGO 19.º

Os cidadãos da República Portuguesa têm o direito de se reunir pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.

ARTIGO 20.º

1. É garantida a liberdade de associação, sem dependência de qualquer autorização, e desde que não se destine a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal e à ordem constitucional.
2. A lei reguladora deste direito apenas poderá fazer depender a constituição ou funcionamento da associação da obrigatoriedade de fazer inscrever num registo de associações a denominação, o local da sede e a identificação dos corpos sociais que a dirijam e de depositar um exemplar dos respectivos estatutos, os quais deverão ser aprovados em assembleia geral ou congresso dos associados, garantindo, na vida interna, a liberdade de expressão e de crítica e ainda a eleição, por sufrágio direito e secreto de todos os associados, dos corpos ou quadros sociais.
3. Ninguém poderá ser obrigado a fazer parte de uma associação, seja ela de que natureza for.

ARTIGO 21.º

Não serão consentidas associações de tipo militar, militarizado ou paramilitar fora do Estado ou das Forças Armadas, nem organizações que difundam ou pratiquem a ideologia fascista.

ARTIGO 22.º

1. A prática da religião e a liberdade de consciência são invioláveis, ninguém podendo por causa delas ser perseguido, privado de direitos ou isento de quaisquer obrigações ou deveres cívicos.
2. As igrejas ou comunidades religiosas estão separadas do Estado e são livres no exercício das funções religiosas e do culto.
3. Fica garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão.

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358-(58) DIARIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

ARTIGO 23.º

1. A todos os cidadãos e garantida u liberdade de expressão de pensamento sob qualquer forma e o direito à informação livre e verídica, com a abolição de todo e qualquer tipo de censura, sendo da competência dos tribunais comuns de jurisdição ordinária a apreciação das infracções e desvios cometidos.
2. As publicações periódicas e não periódicas poderão ser propriedade de quaisquer pessoas colectivas sem fins lucrativos e de empresas jornalísticas e editoriais sob a forma societária ou de pessoas singulares de nacionalidade portuguesa.
3. É livre a fundação de empresas jornalísticas e editoriais.
4. O controle dos órgãos de informação estatizados competirá à Assembleia Legislativa Popular, pendo 0 seu pluralismo e independência garantidos através de um estatuto da informação.
Para assegurar esse pluralismo, em cada órgão de informação estatizado será criado um conselho integrado proporcionalmente por representantes indicados pelos partidos políticos com representação não inferior a 10 % na Assembleia Legislativa Popular.
5. Nos órgãos de comunicação social estatizados, os trabalhadores do sector não terão direita a intervir na sua orientação ideológica, isto sem prejuízo da sua liberdade de criação. Nas publicações periódicas doutrinárias, o controle ideológico pertencerá exclusivamente à respectiva empresa. Nas demais, os jornalistas intervirão na orientação redactorial do jornal e os outros trabalhadores intervirão no sector próprio da sua actividade.

ARTIGO 24.º

A investigação científica e a criação artística e intelectual são livres.

ARTIGO 25.º

1. A tudo o cidadão é assegurado o direito de representação ou de petição, de reclamação ou de queixa, perante os órgãos de soberania ou quaisquer autoridades, em defesa dos seus direitos ou do interesse geral, e bem assim o de requerer, sem necessidade de autorização, perante a autoridade competente, a responsabilização dos infractores e a consequente reparação de toda a lesão efectiva.
2. Do mesmo modo, fica assegurado o direito de resistir a quaisquer ordens que infrinjam as garantias individuais, se não estiverem legalmente suspensas, e o de repelir pela força qualquer agressão à integridade física ou às liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.
3. Todos os trabalhadores da função pública são directamente responsáveis, de acordo com a lei penal, civil e administrativa, pelos actos cometidos em violação das garantias individuais dos cidadãos.
4. Em tais casos, sempre que se prove que o funcionário agiu por ordem superior ilegítima, a responsabilidade civil será, extensiva ao seu superior que deu a ordem, ao organismo respectivo e ao próprio Estado, que por ela responderão solidariamente com o funcionário, se este não reagir contra aquela ordem ilegítima.

ARTIGO 26.º

Todo o cidadão tem o direito e o dever de pôr as suas capacidades ao serviço da defesa da República Portuguesa, prestando serviço militar efectivo. Todavia, em casa de objecção de consciência, o cidadão prestará serviço cívico, depois de concluído inquérito judicial aos fundamentos invocados, sem prejuízo do dever que a todos incumbe de defender a Pátria.

ARTIGO 27º

Todos, os cidadãos da República Portuguesa gozam no estrangeiro da protecção do Estado na preservação dos seus legítimos direitos e interesses e naquilo em que não colidam com o interesse nacional.

ARTIGO 28.º

1. É garantido 0 direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos em consequência da sua actividade em favor da democracia, da libertação social e nacional, da liberdade e dos direitos da pessoa humana ou da liberdade de criação científica ou artística.
2. Em nenhum caso poderá haver extradição por motivos políticos.

ARTIGO 29.º

1. Haverá dois Provedores de Justiça, um para o sector da Administração a cargo do Governo e o outro para as Forças Armadas.
2. O primeiro será designado pela Assembleia Legislativa Popular e o segundo será designado pelo Conselho da Revolução.
3. Um e outro terão por função receber as queixas dos cidadãos relativamente à Administração e aos Poderes Públicos e de, depois de as apreciarem, apresentarem as recomendações para as reparar e prevenir de futuro.
4. Os Provedores de Justiça não terão poderes decisórios.

TITULO III

Direitos e deveres económico-sociais

CAPÍTULO I

Direito e organização do trabalho

ARTIGO 30.º

1. Todos têm o direito e o dever de trabalhar e o direito à livre escolha da profissão ou género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse colectivo ou inerentes à sua própria capacidade, competindo ao Estado assegurar:

a) O pleno emprego;
b) O estabelecimento e actualização do salário mínimo nacional e a fixação de um vencimento máximo nacional;
c) Afixação de um horário de trabalho nacional;
d) A formação cultural, técnica e profissional dos trabalhadores, combinando o trabalho manual e intelectual;
e) A consagração na lei da especificidade do trabalho das mulheres e menores.

2. É ainda assegurado aos trabalhadores:

a) O direito a uma retribuição segundo a sua integração útil no processo produtivo, com

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observância do princípio «para trabalho igual salário igual», garantindo uma existência digna, sem distinção de idade, sexo, raça, religião e ideologia;
b) O direito à prestação do trabalho em condições de segurança, higiene e realização pessoal;
c) O direito ao repouso e aos lazeres, a um limite da jornada de trabalho e a férias periódicas;
d) A segurança no emprego, tendo os despedimentos de ser sancionados pelas organizações representativas dos trabalhadores e não podendo ser invocados motivos políticos ou ideológicos, sendo proibidos os despedimentos sem justa causa;
e) O direito ao seguro obrigatório de desemprego, integrado no esquema de segurança social.

ARTIGO 31.°

1. Aos trabalhadores é assegurada a liberdade de fundarem associações sindicais.
2. Compete às associações sindicais defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representem.
3. Nenhum trabalhador poderá ser obrigado a inscrever-se ou pagar quotização para um sindicato no qual não deseje inscrever-se.
4. Os sindicatos são independentes do Estado, partidos políticos, igrejas e patronatos.
5. As organizações sindicais têm o direito de participar na elaboração da legislação do trabalho e o de serem ouvidas e dar parecer sobre os planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector.
6. As eleições para os diferentes cargos da estrutura sindical devem obedecer aos princípios democráticos como expressão da vontade dos trabalhadores inscritos.

ARTIGO 32.°

1. O direito dos trabalhadores elegerem comissões de trabalhadores para defesa dos seus interesses e uma intervenção democrática na vida da empresa.
2. As comissões de trabalhadores são eleitas em plenário de trabalhadores da empresa por voto directo e secreto.
3. O estatuto das comissões de trabalhadores deverá ser aprovado em plenário de trabalhadores da empresa.
4. Os membros das comissões de trabalhadores gozam da protecção legal que for reconhecida aos delegados sindicais.
5. As comissões de trabalhadores têm o direito de receber todas as informações necessárias ao exercício da sua actividade.

ARTIGO 33.°

As comissões de trabalhadores têm o direito de participar na elaboração da legislação do trabalho e o de ser ouvidas e dar parecer sobre os planos económico-sociais que contemplem o respectivo sector.

ARTIGO 34.°

É garantido o direito à greve.

ARTIGO 35.°

É proibido o lock-out.

CAPÍTULO II

Socialização e propriedade

ARTIGO 36.°

1. O direito à propriedade privada e sua transmissão para cônjuge, ascendentes e descendentes ficam garantidos, ainda que subordinados ao interesse colectivo e à construção do socialismo, bem como às limitações que a lei estabelecer, tanto no que concerne às dimensões e natureza da propriedade como ao exercício da sua gestão.
2. A lei definirá a forma e as etapas a que deverá obedecer a socialização dos meios de produção, circulação e distribuição do solo e dos recursos naturais.
3. A lei deverá fixar o âmbito em que a iniciativa privada poderá exercer-se e salvaguardar os interesses dos pequenos e médios produtores.

ARTIGO 37.º

Nas empresas nacionalizadas deverá proceder-se à sua socialização através de uma progressiva participação e intervenção na gestão por órgãos eleitos em plenário de trabalhadores.

CAPÍTULO III

Cultura e ensino

ARTIGO 38.°

1. Ao Estado compete assegurar e defender a promoção e a democratização da cultura.
2. Compete também ao Estado assegurar as condições práticas em que a cultura possa ser posta em comum e integrada no trabalho da sociedade.
3. O Estado não pode atribuir-se o direito de programar a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
4. Deve proceder-se à transformação do ensino e à integração da escola na vida social de modo a eliminar a sua função como meio gerador e reprodutor da divisão social do trabalho para que a diversificação profissional não corresponda a uma estratificação das hierarquias sociais.
5. O Estado reconhece e garante a todos os cidadãos o direito ao ensino e a iguais oportunidades de formação intelectual e física, com respeito pelas aptidões individuais, incumbindo-lhe:
a) Assegurar o ensino básico obrigatório e gratuito com a sua extensão progressivamente alargada e de harmonia com as possibilidades humanas e económicas;
b) Garantir a todos os cidadãos, em igualdade de oportunidades e segundo as suas capacidades, possibilidades de ascender aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística;
c) Promover gradualmente, e de acordo com as possibilidades, a gratuitidade de todos os graus de ensino.

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358-(60) DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

6. Todo o ensino oficial será laico. Não serão admitidas quaisquer discriminações de carácter religioso, étnico ou linguístico.
7. O Estado procederá à progressiva integração dos estabelecimentos do ensino particular no ensino oficial, salvaguardando os interesses de quantos neles trabalham.

CAPÍTULO IV

Segurança social e saúde

ARTIGO 39.º

1. Todo. o cidadão deve estar integrado num sistema de segurança social que o proteja na doença, na velhice, no desemprego e contra todos os riscos de perda ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho.
2. Compete ao Estado promover, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social unificado e descentralizado.

ARTIGO 40.º

1. Todos os cidadãos têm direito à saúde.
2. Constituem obrigações do Estado:
a) Promover e defender a saúde, através do Serviço Nacional de Saúde;
b) Disciplinar todas as formas de medicina, enquanto subsistirem, tendo em vista a sua socialização;
c) Controlar progressivamente o fabrico, a propaganda, a comercialização e o preço das produtos químico-farmacêuticos, até à sua nacionalização

3. O Serviço Nacional de Saúde coordenará a medicina escolar, desportiva e de trabalho.

CAPÍTULO V

Habitação a meio ambiente

ARTIGO 41.º

1. Toda o cidadão tem direito a uma habitação em condições de higiene e conforto, que preserve a intimidade pessoal e familiar, inserida numa organização habitacional e de transportes devidamente planificada.
2. Compete ao Estada e às comunidades locais:
a) A exclusiva definição dos limites e forma de aproveitamento dos solos urbanos;
b) Proceder à nacionalização e municipalização dos solos urbanos, à criação de empresas públicas para construção de habitações sociais e ainda a um contrôle do parque imobiliário existente;
c) Promover e apoiar a autoconstrução e as cooperativas de habitação.
3. Em todas as áreas onde se verifique o desenvolvimento industrial - ou urbano deverá procura.- manter-se o equilíbrio biológico e a estabilidade ecológica, bem como a valorização da paisagem, em orcem a assegurar a qualidade da vida.
A política de criação de parques e reservas naturais deverá ser incrementada, completada por redes de corredores, ecológicos que compartimentem a paisagem rural e se estendam até aos espaços urbanos e industriais, de molde a garantir a preservação da fauna e da flora.

TITULO IV

Da organização económica

CAPÍTULO I

Princípios gerais

ARTIGO 42.º

A organização económico-social da República Portuguesa assenta no desenvolvimento das relações de - produção socialistas, mediante a progressiva apropriação pela colectividade dos meios de produção e o exercício do .poder democrático dos trabalhadores.

ARTIGO 43.º

Os meios de produção, bem como os recursos naturais e os solos, estão subordinados à dinâmica da construção da sociedade socialista.

CAPÍTULO II
Da propriedade

ARTIGO 44.º

1. Todas as nacionalizações levadas a cabe depois do 25 de Abril de 1974 nos sectores básicos da economia e dos serviços colectivos constituem conquistas irreversíveis do povo português.
2. As empresas e outras entidades de natureza privada é vedada a actividade nos sectores básicos da economia, cuja definição compete à Assembleia Legislativa Popular.

ARTIGO 45.º

Na fase de transição para o socialismo haverá três sectores da propriedade:
I - Sector da propriedade estatal.
2 - Sector da propriedade social que engloba as unidades de produção colectivamente geridas pelos trabalhadores, nomeadamente empresas em regime de autogestão e cooperativas.
3-Sector da propriedade privada limitado nos termos da lei e sempre subordinado ao plana económico.

ARTIGO 46.º

O Estado deverá fomentar a criação de cooperativas e assegurar os meios necessários ao seu desenvolvimento.

CAPÍTULO III

O plano

ARTIGO 47.º

1- O desenvolvimento do sistema económico e social assenta na transformação das relações de produção e de acumulação capitalistas em ordem à criação de uma economia socialista planificada.

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O sistema de planeamento, cuja aprovação compete à Assembleia Legislativa, compõe-se de:
a) Plano a longo prazo, onde são definidos os grandes objectivos da sociedade portuguesa e os meios para os atingir;
b) Plano a médio prazo, cujo período de vigência deve ser o da Assembleia Legislativa, e que deverá conter os programas de acção sectoriais e regionais para esse período;
c) Plano anual, que deverá integrar o Orçamento do Estado para. esse período. Este plano constituirá a base fundamental da actividade do Governo.

2. O plano tem carácter imperativo para os departamento governamentais e empresas nacionalizadas e define ainda o enquadramento a que hão-de submeter-se as actividades das outras empresas colectivas, bem como das que actuem na esfera privada.
3. O plano garante que o desenvolvimento dos sectores produtivos preserve o equilíbrio ecológico, assegurando a qualidade de vida dos trabalhadores portugueses e a defesa de meio ambiente.

ARTIGO 48.º

1. A elaboração :do plano é coordenada pelo Conselho Nacional do Plano e requer uma profunda descentralização regional e sectorial, integrando a participação das comunidades locais e de todas as organizações representativas das classes trabalhadoras, por forma a garantir um desenvolvimento harmónico da produção nacional e a sua justa repartição, quer entre os cidadãos, quer entre as diversas regiões do País, assegurando a expansão dos sectores sociais.
2. À Assembleia Legislativa Popular compete definir os termos a que obedecerá a composição do Conselho Nacional do Plano.

ARTIGO 49.º

O País será dividido em regiões-plano com base nas potencialidades e nas características geográficas, naturais, sociais e humanas dos concelhos, para o efeito agrupados, com vista a um equilibrado desenvolvimento do território nacional e tendo em conta as carências e interesses das respectivas populações.

ARTIGO 50.º

Para a concretização destes objectivos haverá em cada região-plano os seguintes órgãos: o Conselho Regional do Plano e o Comissariado Regional do Plano.

ARTIGO 51.º

O Conselho Regional do Plano é um órgão consultivo, competindo-lhe dar parecer sobre as linhas de orientação do plano a nível regional e dele farão parte representantes das actividades económicas: sociais e culturais e representantes das assembleias municipais designados pela forma que a lei fixar.

ARTIGO 52.º

O Comissariado Regional do Plano é o órgão executivo do plano e será constituído por um comissário a designar pela Administração Central e por órgãos técnicos a ele subordinados.

ARTIGO 53.º

Compete ao Comissariado Regional do Plano elaborar, com base em estudos especializados e dentro das linhas de orientação do Plano Nacional, o plano de desenvolvimento regional, os respectivos planos de execução e superintender na respectiva concretização.

ARTIGO 54.º

Será da competência da Assembleia Legislativa Popular determinar as regiões-plano e definir o estatuto orgânico dos órgãos que a integram, sem prejuízo do disposto na Constituição.

CAPÍTULO IV

Reforma agrária

ARTIGO 55.º

A reforma agrária será um dos instrumentos fundamentais do plano com vista à construção da sociedade socialista e terá como objectivos:
a) Promover a melhoria da situação social e económica dos trabalhadores rurais e pequenos agricultores pela transformação das estruturas da propriedade e transferência da posse útil da terra para aqueles que nela trabalham como primeiro passo para a criação de novas relações de produção na agricultura;
b) Dotar a agricultura de meios técnicos, humanos e financeiros por forma que possa desempenhar o papel que lhe cabe no desenvolvimento económico e social do País;
c) Criar as condições necessárias para que a agricultura não seja um mero suporte do desenvolvimento dos outros sectores de economia, tornando-se num sector dependente e dominado através de um sistema de trocas intersectoriais desiguais, que se traduzirá numa mais baixa remuneração do trabalho agrícola.

ARTIGO 56.º

A transferência da posse útil da terra para aqueles que a trabalham será obtida através da expropriação dos grandes proprietários agrícolas e da entrega da exploração das respectivas propriedades a pequenos agricultores ou a cooperativas de trabalhadores rurais.

ARTIGO 57.º

A organização cooperativa dos pequenos agricultores constituirá o instrumento privilegiado da reforma agrária em relação às pequenas explorações.

ARTIGO 58.º

A lei deverá assegurar a participação dos trabalhadores rurais e pequenos agricultores, através das suas organizações próprias, na definição e execução da reforma agrária.

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CAPÍTULO V

Circuitos de distribuição e comércio externo

ARTIGO 59.º

O Estado deverá intervir nos circuitos de distribuição de forma a racionalizá-los, nomeadamente na formação dos preços e no eficaz abastecimento da população.

ARTIGO 60.º

O Estado deverá promover o contrôle das operações de comércio externo, disciplinar e vigiar a qualidade e preço das mercadorias importadas e exportadas.

TÍTULO V

órgãos de soberania

ARTIGO 61.º

São órgãos de soberania da República Portuguesa:
a) O Presidente da República;
b) O Conselho da Revolução;
c) A Assembleia do Movimento das Forças Armadas;
d) A Assembleia Legislativa Popular;
e) O Governo;
f) Os Tribunais.

CAPÍTULO I

Do Presidente da República

ARTIGO 62.º

O Presidente da República será um cidadão português, maior de 35 anos de idade, no gozo de todos os direitos civis e políticos.

ARTIGO 63.º

1 - O Presidente da República será eleito por cinco anos, par sufrágio secreto de um Colégio Eleitoral constituído pela Assembleia do Movimento das
Forças Armadas e pela Assembleia Legislativa Popular.
2 - As candidaturas deverão ser subscritas por um mínimo de oitenta eleitores do colégio eleitoral.
3 - A eleição será feita por maioria absoluta à primeira volta cru por maioria. simples à segunda, sendo a esta admitidos apenas os candidatos que tiverem obtido mais de 20 % dos votos no primeiro escrutínio.

ARTIGO 64.º

No caso de morte ou impedimento Permanente do Presidente da Republica, assumirá as suas funções quem o Conselho da Revolução designar, devendo proceder-se a nova eleição no prazo de sessenta dias.

ARTIGO 65.º

O Presidente da República será, por inerência, o presidente do Conselho da Revolução e o comandante supremo das Forças Armadas.

ARTIGO 66.º

São atribuições do Presidente da República Portuguesa:
a) Representar a Republica Portuguesa;
b) Presidir ao Conselho da Revolução;
c) Exercer o cargo de comandante supremo das Forças Armadas;
d) Escolher o Primeiro-Ministro, ouvido o Conselho da Revolução, forças políticas e partidos que entender por conveniente;
e) Nomear e exonerar os membros do Governo, de acorda com proposta dó Primeiro-Ministro
f) Promulgar e fazer ,publicar as leis do Conselho da Revolução e da Assembleia Legislativa Popular, bem como os decretos-leis do Governo;
g) Dissolver a Assembleia Legislativa Popular, sob deliberação do Conselho da Revolução, marcando a data para novas eleições, a realizar no prazo de noventa dias;
h) Fazer a guerra, em caso de agressão efectiva ou iminente, e fazer a paz, mediante autorização do Conselho da Revolução;
i) Declarar a estado de sitio, mediante autorização do Conselho da Revolução;
j) Indultar e comutar penas.

ARTIGO 67.º

1 - O Presidente da República não poderá ausentar-se da território nacional sem autorização da Assembleia Legislativa Popular, ouvida o Conselho da Revolução.
2 - Quando a :Assembleia Legislativa Popular não se encontrar em funcionamento, aquela autorização incumbirá ao Conselho da Revolução, ouvido o Governo.

ARTIGO 68.º

O Presidente da República só poderá renunciar ao seu cargo perante o Colégio Eleitoral referido no artigo 63.º e que reunirá para o efeito.

ARTIGO 69.º

Junto do Presidente da República funcionará o Conselho de Defesa das Liberdades e de Garantia Constitucional, presidido pelo Presidente da República e constituída por oito vogais, dos quais quatro serão designados pela Conselho da Revolução e quatro apela Assembleia Legislativa Popular.

ARTIGO 70.º

Ao Conselho competirá:
a) Dar conselho ao Presidente da República em todos os assuntos em que este lho solicitar;
b) Dar parecer sobre o pedido de dissolução da Assembleia Legislativa Popular, solicitado pelo Presidente da República;
c) Dar parecer seguindo leia publicar, sobre a constitucionalidade de qualquer projecto de lei ou decreto-lei a publicar.

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CAPITULO II

Do Conselho da Revolução

ARTIGO 71.º

1 - A constituição do Conselho da Revolução será a que se encornara definida na Lei Constitucional n.º 5/75, de 14 de Março.
2 - Qualquer alteração à composição do Conselho da Revolução só poderá ser feita por legislação do próprio Conselho, de acordo com deliberação da Assembleia do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 72.º

São atribuições do Conselho da Revolução:

a) Definir, dentro doo espírito da Constituição, a necessárias orientações programáticas da política interna e externa e velar pelo seu cumprimento;
b) Decidir, com força obrigatória geral, sobre a constitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, sem prejuízo da competência dos tribunais para apreciar a sua inconstitucionalidade formal;
c) Apreciar e sancionar es diplomas legislativos emanados da Assembleia ou do Governo, quando respeitem às matérias seguintes:
1-Linhas gerais da política económica, social e financeira.
2-Relações externas, em especial com os novos países de expressão portuguesa e com os territórios ultramarinos em que ainda se mantenha a administração portuguesa.
3-Exercício de liberdades e direitos fundamentais.
4-Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes.
5-Regulamentação de actividade política, em especial as relativas a actos eleitorais.

d) Exercer a competência legislativa sobre matérias de interesse nacional de resolução urgente, quando a Assembleia Legislativa ou o Governo o não puderem fazer;
e) Vigiar pelo cumprimento das leis ordinárias e apreciar os actos do Governo e da Administração;
f) Propor à Assembleia Legislativa alterações à Constituição em vigor;
g) Exercer a competência legislativa em matéria militar, devendo os respectivos diplomas, se envolverem aumento de despesas não comportáveis pelo orçamento aprovado, ser referendados pelo  Primeiro-Ministro;
h) Conceder a autorização prevista na alínea i) do artigo 66.º;
i) Pronunciar-se junto do Presidente da República sobre a escolha do Primeiro-Ministro e dos Ministros que devem ser da confiança do Movimento das Forcas Armadas;
j) Deliberar sobre a dissolução da Assembleia Legislativa, quando o considere necessário à resolução de situações de impasse político;
l) Conceder a autorização prevista na alínea j) do artigo 66.º e pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação;
m) Pronunciar-se sobre a incapacidade física, temporária ou permanente, do Presidente da República;
n) Designar, em caso de morte ou impedimento do Presidente da República, quem desempenhará interinamente as suas funções.

ARTIGO 73.º

O Conselho da Revolução funcionará em regime de permanência, segundo regimento próprio, que elaborará.

CAPITULO 111
Do Governo

ARTIGO 74.º

1. O Governo é presidido pelo Primeiro-Ministro e é constituído pelos Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado.
2. O primeiro-ministro será escolhido pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, forças políticas e partidos que entender por conveniente.
3. O Governo será escolhido pelo Primeiro-Ministro, tendo em atenção a representatividade dos partidos na Assembleia Legislativa Popular e as possíveis coligações, e empossado pelo Presidente da República.
4. Serão obrigatoriamente da confiança do Movimento das Forças Armadas os Ministros da Defesa, Administração Interna e Planeamento Económico, pelo que a sua nomeação não deverá ser feita antes de ouvido o Conselho da Revolução.

ARTIGO 75.º

Nos casos de formação inicial ou de recomposição ministerial que abranja pelo menos um terço dos Ministros, o novo Governo deverá ser submetido a voto de confiança da Assembleia Legislativa na sua primeira sessão.

ARTIGO 76.º

1. O Governo terá competência para:
a) Legislar por decretos-leis sobre matérias não reservadas ao Conselho da Revolução ou à Assembleia Legislativa Popular;
b) Estatuir por decretos regulamentares os princípios definidos nos diplomas emanados destes dois órgãos referidos na alínea a);
c) Apresentar, por sua iniciativa, propostas de lei à Assembleia Legislativa Popular;
d) Assegurar a execução dos diplomas legislativos emanados dos vários órgãos com poderes legislativos, superintendendo no conjunto da administração pública;
e) Nomear e demitir os governos e as administrações dos territórios ainda sob administração portuguesa.

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358-(64)DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º16

2. O Governo delibera colegialmente em Conselho de Ministros pleno, salvo no caso da alínea c), em que bastará a intervenção do Primeiro-Ministro e do Ministro ou Ministros respectivos.

ARTIGO 77.º

O Governo obriga-se a apresentar à Assembleia Legislativa um programa de acção até vinte dias após a sua tomada de posse. Esse plano de acção será sujeito ao voto, de confiança da Assembleia Legislativa Popular.

ARTIGO 78.º

O Primeiro-Ministro é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Assembleia Legislativa Popular.

CAPÍTULO IV

Da Assembleia do Movimento das Forças Armadas

ARTIGO 79.º

1. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas será constituída por 240 representantes das forças armadas, sendo 120 do Exército, 60 da Armada e 60 da Força Aérea, sendo a sua composição determinada por lei do Conselho da Revolução.
2. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas, da qual faz parte integrante o Conselho da Revolução, será presidida por este, através do seu próprio presidente ou de quem as suas vezes fizer.
3. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas faz parte, com a totalidade dos seus membros, do Colégio Eleitoral para a eleição do Presidente da República.
4. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas funcionará em regime de permanência e segundo regulamentação própria, que será da competência legislativa do Conselho da Revolução.
5. As sessões da Assembleia do Movimento das Forças Armadas funcionando como órgão de soberania são públicas, salvo deliberação sua em contrário, devendo as actas das respectivas sessões ser publicadas.

CAPÍTULO V

Da Assembleia Legislativa Popular

ARTIGO 80.º

1. A Assembleia Legislativa Popular será eleita por sufrágio universal directo e secreto de todos os cidadãos maiores de 18 anos.
2. Só poderão ser eleitos Deputados os cidadãos maiores de 21 anos no gozo de todos os direitos civis e políticos.
3. A Assembleia Legislativa Popular será constituída no máximo de 250 Deputados, que assegurarão a representação proporcional dos eleitores inscritos em todos os círculos eleitorais, sendo, todavia, representantes do todo a povo português, e não das colégios eleitorais por que foram eleitos.
4. Os Deputados serão eleitos por listas apresentadas pelos partidos políticos concorrentes em cada circulo eleitoral. Ao apuramento dos resultados aplicar-se-á o método de Hondt.

ARTIGO 81.º

A Assembleia Legislativa Popular termina o seu mandato em 25 de Abril de 1980.

ARTIGO 82.º

A Assembleia Legislativa Popular verificará os poderes das Deputados, elegerá a sua Mesa e elaborará o seu Regimento.

ARTIGO 83.º

1. Os Deputados gozam das seguintes imunidades, regalias e direitos:
a) Os Deputados à Assembleia Legislativa Popular não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções ou por causa delas;
b) Nenhum Deputado poderá ser sujeito a prisão preventiva, a não ser em virtude de crime punível com pena maior e mediante autorização da Assembleia Legislativa Popular;
c) Movido procedimento criminal contra algum Deputado e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente fora do caso previsto na alínea anterior, a Assembleia decidirá se o Deputado deve ou não ser suspenso, para efeito da seguimento do processo;
d) Não podem ser jurados, peritos ou testemunhas sem autorização da Assembleia, que será ou não concedida após a audiência do Deputado;
e) Ficam adiados do cumprimento do serviço militar ou da mobilização civil;
f) Têm direito de livre trânsito e direito de passaporte especial nas soas deslocações oficiais ao estrangeiro;
g) Têm direito a cartão especial de identificação;
h) Têm direito aos subsídios que a lei prescrever.

2. Os Deputados não podem ser prejudicados na sua colocação, benefícios sociais ou emprego permanente por virtude no desempenho do mandato.
3. A falta dos Deputados, por causa rias sessões da Assembleia Legislativa Popular, a actos ou diligências oficiais estranhos àquela, a que devessem comparecer, constitui fundamento do respectivo adiamento, sem qualquer encargo.

ARTIGO 84.º

Perde o mandato o Deputado:
a) Que se venha a verificar estar incurso em qualquer das inelegibilidades ou das incompatibilidades previstas na lei eleitoral;
b) Que deixe de pertencer ao partido político pelo qual foi apresentado ao sufrágio;
c) Que tenha sido judicialmente condenado por participação em actividades ou conspirações contra-revolucionárias;
d) Que aceite de governo estrangeiro qualquer situação de subordinação ou dependência, proventos ou regalias.

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ARTIGO 85.º

1. A Assembleia Legislativa Popular reúne-se, independentemente de convocação, no primeiro dia útil do mês de Janeiro de cada ano e funcionará pelo menos durante seis meses em cada ano.
2. A Assembleia pode ser sempre convocada extraordinariamente por solicitação do Presidente da República.

ARTIGO 86.º

1. No início de cada legislatura, a Assembleia elegerá, de entre os seus membros, uma Comissão Permanente, composta pelo Presidente da Assembleia, que preside, e por 24 deputados representantes dos partidos políticos com assento na Assembleia, em proporção da sua representação numérica.
2. A Comissão Permanente tem como função especial acompanhar a actividade do Governo nos intervalos das sessões legislativas, podendo convocar a Assembleia sempre que o julgue necessário ou que o Governo o solicite.

ARTIGO 87.º

As sessões plenárias da Assembleia Legislativa Popular são públicas, devendo as actas das respectivas sessões ser publicadas.

ARTIGO 88.º

1. Os Deputados têm o direito a obter, mediante requerimento, as elementos, informações e publicações oficiais que considerem indispensáveis para o exercício do seu mandato.
2. O Governo poderá fazer-se representar por quaisquer dos seus elementos em todas as sessões plenárias, para efeitos de apresentar comunicações ou prestar esclarecimentos à Assembleia.

ARTIGO 89.º

São atribuições da Assembleia Legislativa Popular:
a) Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, salvo sobre matéria exclusiva do âmbito militar e sem prejuízo do disposto na alínea c) do artigo 70.º;
b) Apreciar os actos do Governo e da administração pública, podendo apresentar moções de desconfiança contra aquele;
c) Participar no Colégio Eleitoral previsto no n.º 1 do artigo 3.º para a eleição do Presidente da República;
d) Proceder à revisão constitucional, quando pelo Conselho da Revolução lhe sejam propostas alterações à Constituição;
e) Ratificar a composição do Governo no caso de formação inicial deste ou de remodelação ministerial que abranja pelo menos um terço dos Ministros, nos termos do artigo 73.º;
f) Autorizar que o estado de sítio se prolongue além de trinta dias;
g) Aprovar, em segunda votação e mediante maioria de dois terços do número total de Deputados, diplomas legislativos emanados da própria Assembleia que não tenham sido sancionados pelo Conselho da Revolução.

ARTIGO 90.º

A aprovação de duas moções de desconfiança ao Governo, com, pelo menos, trinta dias de intervalo, obrigará a recomposição ministerial.

ARTIGO 91.º

Será competência da Assembleia Legislativa Popular:
a) Aprovar o Orçamento Geral do Estado;
b) Aprovar as contas gerais do Estado;
c) Criar novos impostos;
d) Aprovar as alterações à organização judiciária;
e) Ratificar os tratados e as convenções internacionais negociados pelo Governo, sem prejuízo no disposto na alínea i) do artigo 66.º;
f) Legislar em todas as matérias que respeitem ao exercício das liberdades e direitos fundamentais.

ARTIGO 92.º

Sempre que 50000 eleitores subscrevam um projecto de lei e o entreguem à Assembleia Legislativa Popular, esta terá de sobre ele pronunciar-se, discutindo-o e votando-o dentro dos sessenta dias posteriores à sua entrega.

CAPITULO VI
Dos tribunais
ARTIGO 93.º

I. Os tribunais são órgãos de soberania, e são compostos por juízes, que são independentes, vitalícios e inamovíveis.
2. Aos tribunais incumbe reprimir as violações da legalidade e dirimir os conflitos de interesse públicos e privados, em ordem a restabelecer e assegurar a normalidade da vida comunitária.

ARTIGO 94.º

Será instituído o júri, para o julgamento dos crimes mais graves, que funcionará se alguma das partes o requerer.

ARTIGO 95.º

A lei dal organização judiciária é da competência reservada da Assembleia Legislativa, pela que todas as leis até então publicadas sobre esta matéria terão de ser por ela revistas.

ARTIGO 96.º

Os juízes serão irresponsáveis nos seus julgamentos, salvo as excepções consignadas na lei.

ARTIGO 97.º

1. Os tribunais submeterão ao Conselho da Revolução; que decidirá, qualquer diferendo sobre a legitimidade constitucional de fundo de algum diploma legal suscitado pelas partes e cuja resolução seja necessária para a decisão da causa. Os tribunais também poderão suscitar oficiosamente o mesmo incidente junto do Conselho da Revolução, quando tiverem dú-

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358-(66) DIARIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

vidas sobre a legitimidade constitucional de diploma legal nas condições apontadas.
2. Os tribunais deverão recusar a aplicação de diploma formalmente inconstitucional

ARTIGO 98.º

A organização judiciária deve inspirar-se nos princípios gerais, éticos e jurídicos consignados na Declaração Universal dos Direitos do Homem e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

TÍTULO VI

Madeira e Açores

ARTIGO 99.º

Serão conferidas formas especiais de autonomia aos arquipélagos da Madeira e dos Açores, através de estatutos próprios a elaborar pela Assembleia Legislativa Popular.

TITULO VII

Comunidades locais

CAPÍTULO 1

Definição e atribuições

ARTIGO 100.º

As comunidades locais são as freguesias e os concelhos.

ARTIGO 101.º

As comunidades locais possuem órgãos administrativos adequados à satisfação das, necessidades e à defesa dos interesses dos respectivos agregados populacionais, dispondo, para tanto, de personalidade jurídica.

ARTIGO 102.º

1. As comunidades locais terão autonomia administrativa e financeira.
2. Para tanto, possuirão recursos financeiros próprios e participarão nas receitas cobradas, na respectiva área territorial, através dos impostos e contribuições gerais.

CAPÍTULO II

Órgãos das comunidades locais

ARTIGO 103.º

O órgão deliberativo da freguesia é a assembleia de freguesia.

ARTIGO 104.º

1. A composição da assembleia de freguesia será determinada pelo estatuto orgânico das comunidades locais, proporcionalmente ao número de eleitores da freguesia, e tendo em conta a diversidade de características dos agregados populacionais e das respectivas áreas territoriais.
2. O número de membros da assembleia de freguesia nunca será inferior a dezoito.

ARTIGO 105.º

Serão eleitores da assembleia de freguesia os recenseados na área da freguesia para efeitos da eleição dos órgãos de Soberania.

ARTIGO 106.º

A eleição da assembleia de freguesia será feita por escrutínio secreto, através de listas abertas, e ao apuramento dos resultados aplicar-se-á o sistema proporcional de Hondt.

ARTIGO 107.º

O mandato da assembleia de freguesia terá a duração de três anos.

ARTIGO 108.º

O órgão executivo da freguesia é a junta de freguesia, cuja composição será fixada de acordo com os critérios enunciados no artigo 104.º

ARTIGO 109.º

1. O presidente da junta de freguesia será o cidadão cujo nome for apurado em primeiro lugar nas listas de eleição da assembleia de freguesia ou aquele cujo nome encabeçar a lista única.
2. Os restantes membros serão eleitos pela assembleia de freguesia entre os seus membros, por escrutínio secreto e através de listas abertas.
3. Se tiverem concorrido várias listas, será eleita a que obtiver, na primeira volta, maioria absoluta de votos do número total dos membros da assembleia de freguesia.
4. Caso esta hipótese se não verifique, será eleita, na segunda volta, entre as duas listas mais votadas na primeira volta, a que obtiver maior número de votos.

ARTIGO 110.º

O órgão deliberativo do concelho é a assembleia municipal.

ARTIGO 111.º

A composição da assembleia municipal será determinada pelo estatuto orgânico das comunidades locais, proporcionalmente ao número de eleitores de cada concelho, e tendo em conta a diversidade de características dos agregados populacionais e . das respectivas áreas territoriais.

ARTIGO 112.º

Serão eleitores da assembleia municipal os recenseados na área do concelho para efeitos da eleição dos órgãos de Soberania.

ARTIGO 113.º

A eleição será feita por escrutínio secreto, através de listas abertas, e ao apuramento dos resultados aplicar-se-á o sistema proporcional de Hondt.

ARTIGO 114.º

O mandato da assembleia municipal terá a duração de três anos.

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ARTIGO 115.º

O órgão executivo do concelho é a câmara municipal, eleita pela assembleia municipal em escrutínio secreto.

ARTIGO 116.º

Junto da assembleia municipal e câmara municipal funcionará um órgão consultivo, denominado conselho municipal, constituído por delegados eleitos de organismos representativos dos interesses económicos, sociais e culturais.

ARTIGO 117. º

1. Terão o direito de se fazer representar nos termos que forem fixados pelo estatuto orgânico das comunidades locais, no conselho municipal, os seguintes organismos, desde que se encontrem implantados na área do respectivo concelho: uniões sindicais ou sindicatos, comissões de trabalhadores ou de seus organismos coordenadores, cooperativas, unidades de produção e distribuição socializadas e associações de pequenos e médios agricultores, industriais e comerciantes, comissões de moradores, estabelecimentos de ensino e saúde e associações de carácter cultural e desportivo.
2. O Movimento das Forças Armadas poderá fazer-se também representar no conselho municipal, se assim o entender.

ARTIGO 118.º

É da competência do conselho municipal dar parecer sobre o plano de actividades da câmara municipal.

CAPITULO III

Associações de moradores

ARTIGO 119.º

As associações de moradores são as que, representando sectores significativos da população de cada freguesia, visam colaborar na resolução de problemas sociais da respectiva zona de actuação, sem poderes administrativos.

ARTIGO 120.º

São órgãos das associações de moradores os seguintes:
Plenário de moradores.
Comissão de moradores.

ARTIGO 121.º

1. O plenário de moradores é a assembleia dos moradores da zona respectiva que fiscaliza o trabalho da comissão de moradores.
2. A comissão de moradores é o órgão executivo colegial permanente do plenário de moradores, eleito após convocação pública, por sufrágio directo e escrutínio secreto, entre todos os recenseados, moradores na zona respectiva, por listas concorrentes. O apuramento faz-se pelo método proporcional.

ARTIGO 122.º

Para a concretização dos seus objectivos poderão as associações de moradores prestar e receber colaboração dos órgãos executivos e técnicos da freguesia e do concelho.

TÍTULO VIII

Disposições finais e transitórias

ARTIGO 123.º

1. A presente Constituição entrará em vigor depois de promulgada pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução, e terá um período de vigência igual ao do período de transição fixado em cinco anos.
2. A promulgação da Constituição terá de se verificar no prazo máximo de quinze dias a partir da sua aprovação pela Assembleia Constituinte.

ARTIGO 124.º

Até à entrada em funcionamento dos novos órgãos de soberania definidos nesta Constituição Política, manter-se-ão com as suas actuais funções o Conselho da Revolução, a Assembleia do MFA e o Governo Provisório.

ARTIGO 125.º

Até à eleição da Assembleia Legislativa Popular e à consequente formação do Governo, as eventuais alterações à composição do Governo Provisório competirão somente à iniciativa do Presidente da República, ouvido o Primeiro-Ministro e o Conselho da Revolução.

ARTIGO 126.º

1. No fim do período de transição, a Assembleia Legislativa Popular será dissolvida e eleita nova Assembleia, que iniciará c seu mandato com poderes constituintes, procedendo então à revisão da Constituição.
2. Só quando esta Constituição revista entear em vigor se considerará terminado o período de transição.

ARTIGO 127.º

1. No prazo de noventa dias a contar da publicação da presente Constituição no Diário do Governo, efectuar-se-ão as eleições para a Assembleia Legislativa Popular, bem como as eleições para os órgãos das comunidades locais.
2. Se, entretanto, não tiver sido publicado o estatuto orgânico das comunidades' locais, a composição dos órgãos destas e o processo da eleição serão regulados por lei eleitoral, sem prejuízo do disposto na Constituição.

ARTIGO 128.º

O Presidente da República será eleito no prazo de trinta dias após as eleições referidas no artigo anterior e será investido pelo Presidente da Assembleia Legislativa Popular nas quarenta e oito horas imediatas à sua eleição.

ARTIGO 129. º

1. Os arquivos das extintas organizações fascistas ficarão sob a fiscalização de uma comissão mista composta por elementos do MFA designados pelo Con-

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se lho da Revolução e por uma comissão parlamentar composta por representantes dos partidos políticos com assento na Assembleia Legislativa Popular.
2. Essa comissão providenciará no sentido de serem destruídos esses arquivos, salvo na medida em que os documentos em causa tiverem interesse histórico ou forem necessários pára o desmantelamento da organização fascista e só enquanto o forem.
3. É proibida a utilização ou divulgação de quaisquer informações constantes desses arquivos fora dos limites apontados, sob pena de prisão de um a dois anos, a aplicar pelos tribunais imediatamente.
4. Até à eleição da Assembleia Legislativa Popular, ,desempenhará as funções da comissão parlamentar referida no n.º 1 uma comissão eleita pela Assembleia Constituinte e que se deverá manter em exercício até à posse daquela.

ARTIGO 130.º

Em lei ordinária será regulada a responsabilidade criminal dos membros das organizações repressivas do aparelho fascista, os quais não terão direito ao habeas corpus.

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PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELO PARTIDO POPULAR DEMOCRÁTICO (PPD)

SUMÁRIO

Preâmbulo.
Princípios fundamentais.
Parte I - Dos direitos e deveres fundamentais da pessoa:
Título I - Princípios gerais.
Título II - Dos direitos c deveres pessoais.
Título III - Das direitos e deveres sociais.
Título IV - Dos direitos e deveres políticos.
Parte II - Dos princípios fundamentais da - organização económica:
Título I - Da propriedade dos meios de produção.
Título II - Da estrutura da empresa.
Título III - Do plano.
Título IV - Da organização territorial da economia.
Título V - Do sistema tributário.
Parte III - Da organização da República:
Título I - Do Presidente da República.
Título II - Do Conselho da Revolução.
Título III - Da Assembleia do Movimento das Forças Armadas.
Título VI - Dos tribunais.
Título VII - Da administração pública.
Titulo VIII - Das forças armadas.

Disposições finais e transitórias.

Preâmbulo

A Assembleia Constituinte, eleita livremente pelo povo português no dia do 1.º aniversário da Revolução que o libertou da ditadura, da opressão e do colonialismo:
Proclama a identificação dos objectivos desta Revolução com os mais profundos anseios de liberdade política, d.e igualdade, de justiça e de processo social por que se bateram ao longo dias décadas tantos portugueses das mais diversas formações e ideologias;
Afirma a vontade do povo português de construir uma sociedade mais justa, mais livre, mais fraterna, da qual sejam abolidas todas as formas de opressão, de exploração e de privilégio, correspondente aos idearas do socialismo personalista;
Exige o mais absoluto e permanente respeito petos direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana, tais como são reconhecidos pela consciência universal dos povos;
Declara irreversíveis as legítimas conquistas alcançadas ,peta vitória do Movimento das Forças Armadas e pelo esforço dos trabalhadores e do povo em geral. E para que:
A Revolução Portuguesa siga o seu curso libertador no respeito da eminente dignidade da pessoa humana;
Não mais reine em Portugal o arbítrio das polícias e dos detentores do poder político ou económico, e, antes, impere a justiça e o direito;
Aos homens e mulheres de Portugal seja assegurado um presente e um futuro de verdade, de convivência democrática, de paz e justiça social; aprova e decreta a seguinte Constituição Política da República Portuguesa.

Princípios fundamentais

ARTIGO 1.º

1. Portugal é uma República independente e democrática, que se baseia na dignidade da pessoa humana, na solidariedade e no trabalho para construir uma sociedade socialista.
2. A República reconhece e garante os direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana como indivíduo e como membro das organizações sociais e exige a observância dos deveres .de solidariedade política, social e económica impostos pela justiça e definidos pela Constituição e pelas leis.
3. A soberania, una e indivisível, e no povo, que a exerce segundo as formas previstas por esta Constituição e nos limites da moral e do direito.
4. A República é um Estada de Direito, organizado segundo o princípio da separação e interdependência dos órgãos de Soberania e com directa subordinação de todos eles à Constituição. Os tribunais e a administração pública devem obediência às leis.
5. A vida pública desenvolve-se na livre expressão e discussão das ideias garantidas através do pluralismo, dais associações e dos partidos políticos.

ARTIGO 2.º

Incumbe primordialmente ao Estado:
1.º Orientar a evolução da sociedade portuguesa, mediante permanente respeito pelos princípios da democracia. política, para uma democracia social e económica aberta aos idearas da igualdade e da fraternidade de todos os homens;

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2.º Promover a socialização da riqueza e dos meios de produção, sem prejuízo da iniciativa privada inerente à realização pessoal dos cidadãos e ao desenvolvimento da sociedade;
3.º Promover o bem-estar e qualidade de vida de todos os portugueses, com prioridade para as camadas da população mais desfavorecidas, mediante a criação de condições culturais, sociais e económicas que permitam à pessoa humana a sua plena realização

ARTIGO 3.º

1. Constituem o povo todos os cidadãos portugueses residentes dentro ou fora do território de Portugal, cabendo à lei determinar como se adquire e coma se perde a cidadania, portuguesa.
2. Os estrangeiros que residam ou se encontrem em Portugal estão sujeitos à ordem jurídica portuguesa, mas não gozam de direitos políticos, salva quanto ao exercício de funções públicas de carácter predominantemente técnico.
3. Sob reserva de igual tratamento em favor das Portugueses, os cidadãos dos Estados de língua portuguesa podem, mediante tratadas internacionais ser equiparadas aos nacionais para o efeito do gozo de direitos políticas; o exercício de tais direitos, porém, só será permitido aos cidadãos desses Estadas que tenham a sua residência principal e permanente em
território português.

ARTIGO 4.º

1. O território de Portugal abrange o continente e as arquipélagos da Madeira e das Açores.
2. O Estado .não aliena par nenhum modo qualquer parte do território português ou dos direitos de soberania que sobre ele exerce, sem prejuízo da rectificação de fronteiras.
3. A proibição estabelecida no número anterior não abrange as alienações de território a Estado estrangeiro para instalação das suas representações diplomáticas e consulares, desde que exista reciprocidade em favor do Estado português.
4. Cabe à lei definir os limites do mar territorial e os direitos de Portugal aos fundos marinhas contíguos.
5. O território de Macau, sob administração portuguesa, terá um estatuto especial adequado à sua situação.

ARTIGO 5.º

1. A Bandeira Nacional é a adoptada pela República instaurada em 1910.
2. O Hino Nacional é A Portuguesa.

ARTIGO 6.º

1. Portugal rege-se nas relações internacionais pelas princípios da independência nacional, da não ingerência, da igualdade entre os Estados e da promoção e defesa da paz, mediante a cooperação para o progresso moral e material da humanidade.
2. Portugal aceita as restrições de soberania decorrentes da sua participação voluntária em organizações supranacionais e preconiza a negociação e a arbitragem como meios de dirimir os Litígios internacionais.

3. Portugal manterá laços especiais de amizade e de cooperação com os Estados de língua portuguesa.
4. As normas e princípios de direito internacional gerai fazem parte integrante do direito português, possuem autoridade superior à das leis e .são fonte directa de direitos e obrigações para as habitantes do território português.
5. As normas constantes de travados ou acordas internacionais regularmente ratificados ou agravadas têm plena vigência na ordem jurídica portuguesa após a sua publicação no Diário do Governo, salvo se não forem, ou deixarem de ser, aplicadas pela outra ou outras partes contratantes.

ARTIGO 7.º

1. O Estado Português é unitário e organiza-se no respeito pelos princípios da autonomia das comunidades locais e da descentralização democrática dos serviços públicas.
2.Constituem autarquias locais os concelhos e as freguesas, devendo a lei criar, ainda, regiões administrativas, em função das afinidades geográficas, dos factores históricos e culturais e da estrutura social e económica das populações.
3. Os órgãos representativos das autarquias locais e das ,regiões .são eleitos por sufrágio universal, igual, directo e secreto, dos cidadãos residentes e terão competência, definida por lei, ,para promover e regular, sob sua responsabilidade e em obediência às leis, os interesses comuns à população da respectiva autarquia ou, região.

ARTIGO 8.º

1. Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas, dotadas de estatutos políticos-administrativos adequados às suas condições geográficas, económicas e saciais.
2. A autonomia regional não afectará a integridade da soberania do Estado, nem a solidariedade entre as várias parcelas de território português. A República assegurará a integração das regiões no processo de desenvolvimento económico-social do País.
3. A soberania do Estado é especialmente representada, em cada uma destas regiões, por um comissário da República, nomeado pelo Presidente da República, sob ,proposta do Primeiro-Ministro, ouvida a assembleia regional competente. O comissário, assistido pelo conselho regional, superintende nas funções administrativas exercidas na região pelo Estado e coordena-as com as exercidas pela própria região. Cabe-lhe ainda a coordenação da actividade dos serviços centrais do Estado rio tomate aos interesses da região, dispondo para isso de competência ministeriale tendo assento no Conselho de Ministros.
4. A autonomia regional compreende:
a) A existência de uma assembleia regional, eleita por sufrágio universal, directo e secreto, e de um conselho regional perante ela responsável;
b) O poder de legislar, com respeito pelas normas constitucionais e pelas leis de alcance geral emanadas dos órgãos de Soberania, sobre as matérias de interesse exclusivo da respectiva região;
c) Poder executivo próprio;

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d) O poder de dispor das receitas nelas cobradas e de as afectar às despesas públicas, de acordo com a autorização votada pelas assembleias regionais, e de administrar o seu património;
e) O poder de tutela sobre as autarquias locais e os institutos públicos com actividades exclusivas na região;
f) O direito de serem consultadas pelos órgãos de Soberania relativamente às questões da competência destes respeitantes às regiões.

5. A elaboração aos estatutos político-administrativos próprios destas regiões compete à Câmara dos Deputados, sob proposta das respectivas assembleias regionais.

PARTE I

Dos direitos e deveres fundamentais da pessoa

TITULO 1

Princípios gerais

ARTIGO 9.º

1. Todos os cidadãos portugueses gozam dos direitos, liberdades e garantias consignados na Constituição, salvas, quanto aos que não sejam cidadãos originários, as restrições na mesma estabelecidas.
2. Os estrangeiros terão os direitos, liberdades e garantias que não forem reservados exclusivamente aos cidadãos portugueses.
3. As pessoas colectivas só não gozam dos direitos, liberdades e garantias fundamentais incompatíveis com a sua própria natureza.

ARTIGO 10.º

1. As disposições constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias fundamentais são preceitos jurídicos directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e os particulares.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias fundamentais nos casos em que a Constituição expressamente o admitir.
3. As leis restritivas dos direitos, liberdades e garantias fundamentais terão de revestir sempre carácter geral e abstracto e nunca poderão prejudicar o conteúdo essencial dos mesmos.
4. É vedado aos órgãos de Soberania, conjunta ou separadamente. suspender os direitos, liberdades e garantias constitucionais, salvo em caso de estado de sítio declarado na forma prevista na Constituição.

ARTIGO 11.º

1. A declaração de estado de sítio deverá ser suficientemente fundamentada e conter a especificação dos direitos que ficam suspensos.
2. O estado de sítio não pode, em caso algum, afectar o direito à vida e integridade pessoal e confere às autoridades competência para tomarem apenas as providências necessárias e adequadas ao restabelecimento da normalidade constitucional.

ARTIGO 12.º

Cada pessoa deve exercer sempre os seus direito, liberdades e garantias fundamentais sem ofensa dos direitos das outras pessoas nem lesão da ordem constitucional democrática ou dos princípios da moral.

ARTIGO 13.º

1. É reconhecido a todos o direito de recorrer aos tribunais em defesa dos seus direitos e liberdade, fundamentais violados ou seriamente ameaçados pelos poderes públicos ou pelos particulares, cabendo a jurisdição aos tribunais judiciais.
2. A qualquer pessoa é lícito resistir a quaisquer ordens que infrinjam as direitos e liberdades fundamentais, se não estiverem suspensos, bem como repelir peia força a agressão particular, quando não seja possível recorrer à autoridade competente.

ARTIGO 14.º

A especificação dos direitos, liberdades e garantias feita na Constituição não exclui quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional ou decorrentes da inviolabilidade da pessoa humana.

ARTIGO 15.º

1. A lei é igual para todos.
2. Ninguém pode ser prejudicado ou favorecido em virtude do sexo, nascimento, raça, território de origem, religião, convicção política ou ideológica.

ARTIGO 16.º

Portugal dá asilo aos estrangeiros que estejam a sofrer perseguição por motivos políticos e ameaçados de perda ou privados de qualquer dos direitos fundamentais enunciados na Declaração Universal dos Direitos do Homem.

TITULO II

Dos direitos e deveres pessoais

ARTIGO 17.º

1. O direito à vida e integridade pessoal é - inviolável. Em caso algum será admitida a pena de morte.
2. Ninguém será submetido a tortura, penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

ARTIGO 18.º

1. A todos são reconhecidos o direito à identidade pessoal, o direito ao bom nome e reputação e o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada e familiar.
2. Incumbe, em especial, à lei estabelecer garantias efectivas contra qualquer utilização abusiva, ou contrária à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.

ARTIGO 19.º

1. O domicílio e o sigilo da correspondência e dos outros meios de comunicação privada são invioláveis.

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

2. É proibida, designadamente, toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência e nas telecomunicações.
3. A entrada no domicílio dos cidadãos contra sua vontade só pode ser ordenada pela autoridade judicial competente, nos casos e segundo as formas previstos na lei. De noite ninguém pode entrar no domicílio senão com consentimento de pessoa aí domiciliada, eu em caso de reclamação feita de dentro ou para o defender de incêndio, inundação ou outra calamidade.

ARTIGO 20.º

1. Todos têm o direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião ou de crença, bem como à liberdade de manifestar a própria religião ou crença, individual ou colectivamente, em público e em privado, através do ensino, da prática e do culto.
2. A liberdade de culto a prática religiosa está sujeito às limitações, prescritas pela lei, necessárias, segundo a ordem democrática, para a protecção da saúde ou moral públicas.
3. Ninguém pode ser obrigado a declarar a religião ou crença que professe, a não ser em inquérito estatístico anónimo ordenado por lei.
4. Ninguém pode ser obrigado, contra a sua consciência ao serviço militar com armas. A lei regulamentará as condições e modos de exercício deste direito, não podendo impor, porém, um serviço de substituição, por tempo superior á normal duração do serviço militar com armas.
5. Além dos direitas fundamentais dos cidadãos são reconhecidos especificamente às confissões religiosas, em condições de igualdade:

a) O direito de constituição e manutenção de estabelecimentos de educação e de utilização de meios de comunicação social próprias para o prosseguimento das suas finalidades;
b) O direito de dar assistência aos seus fiéis, incluindo os que se encontrem em estabelecimentos hospitalares e, penais ou em serviço nas forças armadas, e de lhes dar enterramento nos cemitérios públicos;
c) O direito de comunicar livremente com as autoridades religiosas de dentro ou fora do País.

6. As ralações do Estada com as confissões religiosas regem-se pela princípio de separação, sem prejuízo da possibilidade de celebração de tratadas ou acordos entre um e outras.

ARTIGO 21.º

1. Todos têm o direito de expressar e divulgar livremente os seus pensamentos, ideias ou informações, por meio da palavra, por escrito e pela imagem, e bem assim a direito de se informar sem impedimentos nem discriminações junto das fontes de acesso geral.
2. Em caso algum o exercício deste direito pode ser limitado por qualquer forma de censura.
3. As infracções decorrentes do exercício deste direito são apenas as previstas na lei penal geral.

ARTIGO 22.º

1. A liberdade de imprensa inclui o direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independente mente de autorização administrativa ou de caução ou habilitação prévias.
2. A censura prévia, sob qualquer forma ou designação, não será admitida, sendo a julgamento das infracções cometidas da competência dos tribunais judiciais.
3. O acesso às fontes de informação e a protecção do sigilo e independência profissionais constituem direitos inalienáveis dos jornalistas.
4. Ninguém poderá, sob qualquer pretexto ou razão, apreender ou por outra forma embaraçar a composição, impressão, distribuição e livre circulação de quaisquer publicações.
5. Será assegurada à imprensa uma função pública independente do poder político e do poder económico procurando, nomeadamente, impedir a concentração de empresas jornalísticas e noticiosas e promovendo medidas de; apoio imparcial às pequenas empresas especialmente às da imprensa regional.

ARTIGO 23.º

O estatuto regulador das emissoras de televisão e radiodifusão garantirá a sua utilização pelas entidades públicas e privadas representativas de interesses colectivos e correntes de opinião, salvaguardando o pluralismo das ideias e das confissões.

ARTIGO 24.º

Relativamente aos meios de - comunicação social pertencentes ao Estado, ou a entidades, directa ou indirectamente sujeitas ao seu controle económico, a sua independência perante o Governo e a administração pública será garantida pelo Conselho de Comunicação Social e por um estatuto especial a definir por lei.

ARTIGO 25.º

1. A todas é reconhecido o direita de liberdade de ensino, de investigação e da criação intelectual e artística, incluindo a faculdade de constituir, manter e orientar, sem ingerência das autoridades públicas, instituições educativas, científicas e artísticas.
2. A liberdade de ensino compreende o direita de escolher o ramo, tipo e orientação do ensino que se queira frequentar, cabendo primariamente aos pais ou encarregados de educação a dever de garantir a autenticidade da escolha durante a menoridade escolar das filhos ou educandos. Este direita não fica prejudicado pela escolaridade obrigatória durante tempo determinado.
3. A lei fixará os direitos e obrigações das escolas privadas, procurando assegurar a igualdade de tratamento dos senis alunos relativamente aos das escolas públicas correspondentes e integrando-as no sistema nacional de ensino, sem prejuízo da autonomia da sua orientação
4. O direito de liberdade de criação intelectual e artística compreende o direito à invenção, produção ou obra científica, literária ou artística, incluindo, a protecção legal dos interesses morais ou materiais do autor.

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ARTIGO 26.º

1. Os homens e as mulheres, a partir da idade núbil, têm direito, sem qualquer restrição por motivos de raça, cidadania ou religião, de casar e constituir família, gozando de direitos iguais relativamente ao matrimónio, durante o matrimónio e em caso de dissolução do matrimónio.
2. Sem prejuízo do registo civil, a lei faculta a celebração do casamento por forma religiosa ou civil, com respeito pela religião ou palas convicções dos nubentes.

ARTIGO 27.º

1. Os cidadãos têm o direito d.e circular livremente e de escolher a sua residência .em qualquer parte do território português, salvas as restrições legais determinadas por razões. excepcionais de segurança, de saúde pública ou de prevenção criminal.
2. Ninguém pode ser impedido de emigrar ou sair do território português e de a ele regressar.
3. Só os estrangeiros, e observado o processo legalmente previsto, podem ser expulsos do território português.
4. Incumbe ao Estado proteger os cidadãos portugueses residentes no estrangeiro, em especial aqueles que saíram de Portugal por razões de trabalho.

ARTIGO 28.º

1. Os cidadãos têm o direito de se reunirem pacificamente e sem armas, independentemente de autorização prévia.
Z. Para as reuniões em lugar público a lei poderá tornar necessária urna comunicação prévia à autoridade competente e dar a esta competência para de por razões de ordem pública ou saúde pública, um local para a reunião, contanto que, assim procedendo, a não frustre ou impossibilite.
3. A lei pode sujeitar a realização de cortejas, desfiles ou manifestações às restrições decorrentes da normal utilização das vias públicas para o trânsito das pessoas e dos veículos. As contramanifestações são sempre proibidas.

ARTIGO 29.º

1. Os cidadãos têm a direito de se associarem livremente, sem necessidade de autorização prévia, para quaisquer fins não contrários à lei penal ou à ordem constitucional democrática, bem como o direito de pertencer ou deixar de pertencer a qualquer associação.
2. As associações prosseguirão livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas, não podendo ser dissolvidas pelo Estado senão nos casos previstas na lei e mediante decisão dos tribunais.
3. São proibidas as associações secretas, as associações armadas e as que prossigam fins declarados ilícitos pela lei penal.

ARTIGO 30.º

1. A liberdade de associação compreende o direito de constituir e participar em associações e partidos políticos para formação da vontade política do povo.
2. Os requisitos formais de constituição 'de associações e partidos políticos serão definidos por lei especial.
3. A dissolução ou a suspensão de qualquer associação ou partido político, bem como a limitação dos seus direitos, só podem ser decretadas, nos casos e com os fundamentos previstos na lei, pelo Supremo Tribunal de Justiça.

ARTIGO 31.º

1. A liberdade de associação compreende para os trabalhadores o direita de liberdade sindical.
2. O direito de liberdade sindical compreende:
a) A liberdade de constituição de sindicatos e de associações profissionais, bem como de uniões, federações e confederações de sindicatos ou de associações profissionais;
b) A liberdade de os sindicatos se estruturarem com o âmbito que os trabalhadores decidirem como mais adequada à defesa dos respectivos interesses;
c) A liberdade de organização e de criação dos respectivos estatutos e regulamentos internos;
d) A liberdade de filiação e de não filiação dos trabalhadores nos sindicatos;
e) A liberdade de acção sindical independente em face do Estado, das entidades patronais, dos partidos políticos e das confissões religiosas;
f) A liberdade de os sindicatos estabelecerem relações com organizações sindicais internacionais.

3. A organização interna das associações sindicais deve ser democrática, baseada na eleição periódica dos dirigentes e responsáveis por escrutínio secreto e sem sujeição a homologação do Governo ou de qualquer outra autoridade ou instituição.
4. É garantida a acção sindical na empresa, de acordo com a lei.
5. A lei estabelecerá as garantias necessárias à não discriminação contra os dirigentes e responsáveis sindicais.

ARTIGO 32.º

1. Todos têm o direito de escolher livremente a sua profissão ou género de trabalho, bem como o lugar de trabalho.
2. Ninguém pode ser constrangido a executar trabalhos ou serviços determinados, a não ser em cumprimento de penas e medidas de segurança, em cumprimento das leis da serviço militar, em caso de perigo ou calamidade que ameace a vida ou o bem-estar da comunidade ou no cumprimento de deveres gerais, de carácter público, iguais para todos.
3. Ninguém pode ser impedido de trabalhar por estar ou deixar de estar inscrito num sindicato.

ARTIGO 33.º

1. Ninguém pode ser obrigado a prestações pessoais nu patrimoniais em favor do Estado ou outros entes públicos, a não ser em virtude da lei.
2. Todos são obrigados a concorrer para as despesas públicas, em harmonia com a sua capacidade de contribuição.
3. Em matéria de impostos a pagar ao Estado, a lei determinará: a incidência, a taxa ou os seus limites, as isenções a que passa haver lugar, as reclamações e recursos admitidos em favor do contribuinte.

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ARTIGO 34.º

1. Não é admitida a extradição de cidadãos portugueses.
2. A extradição de estrangeiros por crimes políticos é proibida.
3. Não haverá lugar a extradição de estrangeiros por crimes a que corresponda pena de morte ou prisão perpétua segundo o direito do Estado requisitante.

ARTIGO 35.º

1. Qualquer pessoa tem o direito de ser ouvida, em condições de plena igualdade, por um tribunal independente e imparcial sobre a determinação concreta dos seus direitos ou deveres, ou para exame de qualquer acusação em matéria penal.
2. Nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal competente, sendo proibido a qualquer autoridade avocar as causas pendentes, suspendê-las ou fazer reabrir os processos findos, a não ser nos casos especificados expressamente em lei anterior.

ARTIGO 36.º

1. Ninguém pode ser sentenciado criminalmente senão em virtude de lei anterior que declare puníveis o acto ou omissão.
2. Não podem ser aplicadas penas ou. medidas de segurança que não estejam expressamente cominadas cm lei anterior.
3. Aplicar-se-ão sempre retroactivamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido.
4. A lei não pode estabelecer penas privativas ou restritas da liberdade com carácter perpétuo ou duração ilimitada.
5. As medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade não podem ter carácter perpétuo ou duração ilimitada nem ser prorrogadas indefinidamente, salvo tratando-se de inimputáveis, e sempre mediante decisão judicial.
6. Em caso algum será admitida a transmissão de qualquer pena da pessoa do delinquente.
7. Não há pena de prisão por dívidas.
8. Ninguém pode ser privado, por delitos políticos da cidadania portuguesa, da capacidade civil ou do nome.

ARTIGO 37.º

1. É proibida a prisão sem culpa formada, excepto em flagrante delito ou por crime doloso a que corresponda pena maior e mediante ordem escrita devidamente fundamentada do juiz competente.
2. A prisão sem culpa formada será sempre submetida, sem demora é o mais tardar até vinte e quatro horas, a decisão judicial de manutenção e revalidação, devendo o juiz conhecer e comunicar ao detido as causas da detenção, interrogá-lo e dar-lhe oportunidade de defesa.
3. A prisão preventiva só se aplicará nos casos em que não for substituível por caução ou por qualquer forma de liberdade condicionada, cabendo à lei indicar os casos em que tal substituição não é possível.
4. A prisão preventiva, antes e depois da formação da culpa, está sujeita a prazos estabelecidos na lei e só pode ser ordenada ou mantida havendo forte suspeita da prática do crime e se a este for aplicável rena de prisão.
5. Qualquer decisão judicial que ordene ou mantenha uma medida dê privação de liberdade deve ser comunicada imediatamente a parente ou pessoa de confiança do detido.

ARTIGO 38.º

1. A providência de habeas corpus pode ser judicialmente requerida, pelo próprio ou qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, em caso de prisão sem fundamento legal.
2. O juiz decidirá sem demora o pedido de habeas corpus em audiência contraditória, dando a conhecer ao requerente as razões invocadas pela autoridade e garantindo-lhe a possibilidade de as impugnar.

ARTIGO 39.º

O processo criminal assegurará todas as garantias de defesa, nomeadamente:

1.º Todo o arguido se presume inocente até à sentença definitiva de condenação;
2.ºO arguido tem direito à assistência de defensor em todas as fases do processo, cabendo à lei especificar os casos e as fases em que ela é obrigatória;
3.º Toda a instrução será da competência de um juiz ou estará a ele submetida, cabendo à lei indicar os casos em que ela deve assumir forma contraditória;
4.º O processo criminal terá estrutura acusatória, devendo a audiência de julgamento ser plenamente contraditória;
5.º Serão proibidas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção grave, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, na correspondência, comunicações telefónicas ou no domicílio.

TÍTULO III

Dos direitos e deveres sociais

ARTIGO 40.º

As crianças têm direito a especial protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu pleno desenvolvimento físico e cultural e ao desaparecimento de todas ás formas de discriminação social.

ARTIGO 41.º

Os jovens têm direito a:

a) Igualdade de oportunidades no acesso ao ensino, à cultura e, ao emprego;
b) Livre associação para a resolução dos seus problemas;
c) Formação profissional e protecção especial no seu trabalho;
d) Condições favoráveis à educarão física e a práticas desportivas.

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ARTIGO 42.º

A política da juventude deverá ter como finalidades específicas o desenvolvimento da personalidade, o gosto pela criação livre e o sentido de serviço à comunidade.

ARTIGO 43.º

A política da terceira idade deverá ter como finalidades específicas garantir a segurança económica das pessoas idosas, proporcionar-lhes as condições de habitação e convívio que superem ,o seu isolamento ou desinserção social e oferecer-lhes as oportunidades de criarem e desenvolverem formas de realização pessoal no serviço à comunidade.

ARTIGO 44.º

Os diminuídos físicos, sociais ou mentais têm direito a receber o tratamento e a educação e cuidados especiais que os seus casos particulares requererem.

ARTIGO 45.º

A família, como elemento natural e fundamental da sociedade, assenta no casamento e tem direito à protecção da sociedade e do Estado, devendo este:
1.º Favorecer a constituição de lares independentes;
2.º Proteger a maternidade e proporcionar à mãe a sua realização profissional e participação na vida cívica do País;
3.º Cooperar com os pais na instrução dos filhos;
4.º Regular os impostos, os salários e as prestações sociais de harmonia com os legítimos encargos da família.

ARTIGO 46.º

Não haverá qualquer distinção legal entre os filhos legítimos e os ilegítimos.

ARTIGO 47.º

1. Todos têm direito à educação e a participar da vida cultural.
2. Incumbe em especial ao Estado:
a) Promover a educação pré-escolar e uma escolaridade obrigatória por um período determinado;
b) Criar e manter escolas dos diversos graus e ramos de ensino em todo o território;
c) Assegurar a gratuitidade do ensino, promovendo as medidas tendentes à igualdade efectiva de acesso e aproveitamento escolar;
d) Estabelecer serviços de orientação escolar;
e) Garantir a educação permanente e promover a eliminação do analfabetismo.

ARTIGO 48.º

O direito de defender os seus interesses materiais e morais em juízo é independente da situação económica dos cidadãos, devendo ser assegurado por meio da assistência judiciária ou de outros serviços sociais.

ARTIGO 49.º

1. Todos têm o direito ao alojamento adequado para si e para as suas famílias e a um ambiente urbano e natural equilibrado.
2. Incumbe especialmente ao Estado e às autarquias locais:
a) Promover o acesso de cada família a uma habitação condigna própria;
b) Definir as linhas gerais de ordenamento do território;
c) Defender o ambiente, preservar a paisagem, proteger os valores nacionais e históricos, combater as formas de erosão e poluição, tendo em vista a melhoria dá qualidade de vida dos habitantes;
d) Promover o racional aproveitamento dos recursos hídricos nacionais;
e) Promover a transformação da condição de inquilino na de proprietário da habitação.

ARTIGO 50.º

1. Todos têm o direito à saúde e o dever de a defender.
2. Incumbe ao Estado:
a) Promover a saúde pública e educação sanitária;
b) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação, e à assistência na velhice;
c) Assegurar a cobertura médica e hospitalar de todo o País, mediante a criação de um serviço nacional de saúde.

ARTIGO 5i.º

1. Todas as pessoas, como membros da colectividade, têm direito à segurança social.
2. O Estado organizará um sistema nacional que, no respeito pela liberdade das pessoas, torne efectivo o direito de todos à segurança social.

ARTIGO 52.º

1. Todos os cidadãos têm direito ao trabalho e o dever de trabalhar, contribuindo para o progresso moral e material da sociedade.
2. Incumbe ao Estado, em especial:
a) Promover a orientação profissional e desenvolver a formação técnica e profissional dos trabalhadores;
b) Manter serviços de colocação dos trabalhadores;
c) Definir e praticar políticas de pleno emprego.

ARTIGO 53.º

1. Constituem direitos dos trabalhadores:
a) O direito a um salário mínimo
b) O direito à justa remuneração correspondente ao trabalho prestado e à atribuição de salário igual a trabalho igual;

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c) O direito a um adequado horário de trabalho;
d) O direito à higiene e segurança no trabalho e a seguros suficientes contra as doenças e acidentes profissionais;
e) O direito a uma organização do trabalho humano e socialmente digno;
f) O direito a descanso semanal e a férias anuais pagas;
g) O direito ao não despedimento sem justa causa;
h) O direito a uma actualização salarial em correspondência com as variações do custo de vida.

2. Pertence aos trabalhadores o direito de participar em todas as decisões da empresa, através de representantes livremente eleitos em sufrágio secreto, bem como o direito de participar nos lucros e aumentos de capital.
3. A co-gestão aplicar-se-á imediatamente nas empresas públicas, nas empresas nacionalizadas e nas empresas de capital predominantemente público, e estender-se-á progressivamente às empresas privadas em condições a determinar por lei e de acordo com a vontade dos trabalhadores.
4. As experiências viáveis de autogestão serão estimuladas e apoiadas pelo Estado.

ARTIGO 54.º

1. Aos trabalhadores é reconhecido o direito de informação colectiva sindical para estabelecimento das condições de trabalho.
2. A lei regulará as formas de intervenção sindical no estabelecimento das condições de trabalho dos trabalhadores da função pública.
3. Aos trabalhadores é garantido o direito à greve.
4. A participação dos trabalhadores no planeamento da política social e económica será garantida em legislação adequada.

ARTIGO 55.º

1. O direito de propriedade e a sua transmissão em vida ou por morte, enquanto instrumento de realização da pessoa humana e do progresso social, são reconhecidos a todos nas condições que a lei determinar.
2. A nacionalização, a expropriação ou requisição por utilidade pública serão previstas por lei e conferem o direito a justa indemnização.
3. Não haverá confisco de bens, salvo como sanção penal a aplicar pelos tribunais para punir a corrupção no exercício de funções públicas ou crimes contra a economia nacional, e só relativamente a bens adquiridos através dessas actividades criminosas.

TITULO IV

Direitos e deveres políticos

ARTIGO 56.º

1. Os cidadãos gozam do direito de participar nas decisões políticas, directamente ou por meio de representantes eleitos.
2. O direito de sufrágio é reconhecido a todos os cidadãos maiores de 18 atros, exceptuando-se apenas os que dele forem privados, nos termos da lei, em virtude de incapacidade civil ou de sentença penal com trânsito em julgado. A lei regula o seu exercício pelos cidadãos residentes no estrangeiro.
3. O voto é pessoal e igual, livre e secreto. O seu exercício é sempre um dever cívico.
4. São elegíveis os cidadãos eleitores, observados os, requisitos fixados nesta Constituição e na lei. As candidaturas não dependem de autorização.
5. Ninguém pode ser prejudicado no seu trabalho ou emprego permanente em virtude do exercício de cargos políticos.

ARTIGO 57.º

1. Os cidadãos têm o direito de se inscrever em qualquer partido político, independentemente da sua raça, sexo, religião ou condição social e económica.
2. Ninguém pode estar inscrito simultaneamente em mais de um partido político, nem ser impedido de exercer um direito político por estar ou ter deixado de estar inscrito em qualquer deles.
3. É vedada qualquer forma de organização ou actuação tendente .à subordinação da vida política, directa ou indirectamente, a um só partido.

ARTIGO 58.º

Qualquer cidadão, individual ou colectivamente, pode apresentar por escrito aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades representações, reclamações ou queixas, em defesa dos seus direitos ou do interesse geral, expor qualquer infracção da Constituição e, sem necessidade de prévia autorização, requerer perante a competente autoridade a responsabilidade dos infractores.

ARTIGO 59.º

Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos objectivamente sobre os actos do Estado e de ser mantidos informados pelo Governo e demais autoridades sobre a gestão dos assuntos públicos.

ARTIGO 60.º

1. Em cada freguesia, zona de freguesia ou grupo de freguesias ,podem os cidadãos reunir-se em assembleia geral para discutir assuntos de interesse público, formular perguntas ou recomendações aos órgãos do Estado, das autarquias locais ou de institutos públicos em acção na respectiva área, e constituir associações ,de moradores para promover a resolução de problemas específicos.
2. Nenhuma autarquia local pode ser extinta, nem a sua circunscrição modificada, a não ser com a concordância das populações interessadas.

ARTIGO 61.º

É reconhecido aos cidadãs o direito de acesso, em condições de igualdade e nos termos da lei, aos cargos públicos.

ARTIGO 62.º

1. A defesa da pátria é uri dever para todo o cidadão.
2. O serviço militar é geral e obrigatório, não podendo ninguém ser prejudicado no seu posto de trabalho em virtude da sua prestação.

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3. O serviço militar pode ser substituído por um serviço cívico a realizar em Portugal ou, mediante convenção internacional, nos novos países de língua portuguesa.

ARTIGO 63.°

1. Todos os cidadãos têm o dever de ser fiéis à Pátria e de observar a Constituição e as leis.
2. Os cidadãos têm o dever de colaborar com os órgãos e agentes do Estado e das autarquias locais para a melhor prossecução das respectivas atribuições.

PARTE II

Da organização económica e social

TITULO I

Princípios gerais da organização e da política económica

ARTIGO 64.°

1. A organização sócio-económica da República Portuguesa visa a construção do socialismo, com eliminação da exploração do homem pelo homem e com abolição das classes privilegiadas, mediante a livre associação do trabalho com os meios de produção estaduais, sociais ou privados.
2. A organização sócio-económica, dentro do processo de construção democrática do socialismo, obedecerá sempre à vontade expressa do povo português, subordinando a actividade económica ao poder político democrático e respeitando os direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana.

ARTIGO 65.°

O contrôle democrático da actividade económica exercer-se-á através do Estado e da participação dos trabalhadores nos vários níveis de decisão da actividade económica, particularmente nas unidades de produção.

ARTIGO 66.°

Os principais objectivos a atingir pelo Estado, através do plano económico e social e dos demais meios de intervenção, são:
a) Promover o aumento do bem-estar social e económico do povo português, em especial das classes desfavorecidas;
b) Promover a igualdade entre os cidadãos, designadamente através de correcções a operar na distribuição da riqueza e dos rendimentos;
c) Orientar o desenvolvimento económico e social no sentido do equilíbrio entre todas as regiões do País;
d) Estreitar as relações económicas com todos os povos do mundo, salvaguardando sempre a independência nacional e os interesses legítimos do povo português;
e) Realizar o pleno emprego e assegurar a estabilização da conjuntura;
f) Eliminar ou impedir a formação de monopólios privados e reprimir os abusos do poder económico e outras práticas lesivas do interesse geral;
g) Promover a iniciativa e a concorrência entre as empresas, como forma de incentivar o progresso económico nos sectores de economia livre, com especial protecção para as pequenas e médias empresas economicamente viáveis;
h) Promover a democratização do capital e da propriedade, respeitando-os enquanto expressão do trabalho e do legítimo aforro e associando-os progressivamente ao trabalho;
i) Proteger o consumidor.

ARTIGO 67. °

1. Para a prossecução destes fins, o Estado e outras entidades públicas, na fase de transição para o socialismo, devem controlar gradualmente as instituições financeiras, os solos e outros recursos naturais, as indústrias fundamentais para a defesa nacional, ás actividades de carácter monopolista e as sectores básicos da economia nacional, designadamente através da nacionalização ou apropriação pública das unidades produtivas.
2. A Câmara dos Deputados determinará os meios de contrôle da economia pelo Estado e outras entidades públicas, os critérios de fixação das indemnizações e as formas de participação dos trabalhadores a gestão das empresas controladas.
3. Os meios de produção em abandono podem ser apropriados pelo Estado, em condições a fixar em lei especial, que ressalvará sempre a propriedade dos trabalhadores emigrantes.
4. Para efeito de socialização, os municípios apropriar-se-ão progressivamente dos solos urbanos e urbanizáveis, definidos através de planos de ordenamento do território. Esta apropriação será definitiva e com cedência do direito de superfície.
5. Consideram-se irreversíveis as expropriações das instituições financeiras e de .empresas integradas nos sectores básicos da economia, efectuadas após o 25 de Abril de 1974.

ARTIGO 68.º

1. No sector da propriedade social será incentivada a criação e a actividade de cooperativas de produção, de crédito ou de consumo, designadamente as cooperativas agrícolas e de habitação.
2. As cooperativas poderão agrupar-se em uniões e federações, que, por sua vez, poderão formar confederações.
3. Em legislação especial serão definidos os benefícios fiscais e financeiros das cooperativas, bem como condições mais favoráveis de obtenção de crédito e auxílio técnico.

ARTIGO 69. °

1. Nos quadros definidos pela Constituição, pela lei e pelo plano é livre a iniciativa económica privada, enquanto instrumento de realização humana e do progresso social.
2. O Estado fiscalizará o respeito da Constituição, da lei e do plano pelas empresas privadas, podendo intervir transitoriamente na sua gestão ou assumir participação nó capital para assegurar o interesse geral e os direitos dos trabalhadores, em termos a definir pela lei.

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ARTIGO 70. °

1. A reforma agrária será um meio fundamental da instauração da sociedade socialista, enquanto deve assegurar condições de igualdade efectiva no meio rural e pôr a terra e a produção agrícola ao serviço do povo português.
2. A reforma agrária promoverá o acesso dos trabalhadores rurais à propriedade da terra e efectuar-se-á com total respeito pela propriedade das terras dos pequenos e médios agricultores, como instrumento e resultado do seu trabalho.
3. A realização dos objectivos da reforma agrária implica a constituição, com o apoio do Estado, de cooperativas de trabalhadores rurais, a formação de cooperativas de comercialização e produção dos pequenos e médios agricultores e a entrega da exploração dos latifúndios socialmente mal aproveitados ou nocivos a pequenos agricultores ou trabalhadores rurais.
4. Na gestão das unidades de produção e suas organizações complementares, bem como na elaboração e execução da reforma agrária, assegurar-se-á permanente participação dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores.
5. Lei especial definirá os critérios e a orgânica de elaboração e execução da reforma agrária.

TITULO II

Do plano económico e social

ARTIGO 71.º

1. A economia portuguesa será orientada e disciplinada por um plano económico e social com vigência plurianual.
2. Além dos objectivos definidos no artigo 66.º o plano deve assegurar a coordenação da política de desenvolvimento económico com a política social, educacional e cultural, prosseguir a defesa do meio ambiente e promover a qualidade de vida do povo português.
3. O plano é imperativo, nos seus objectivos e medidas, para o sector público estadual e para as autarquias locais e empresas públicas, e obrigatório, por força de contratos-programas, para outras actividades de interesse público primacial. Definirá ainda o enquadramento geral das actividades das cooperativas e outras entidades sociais e das empresas privadas.

ARTIGO 72.º

1. A elaboração do plano deve ser amplamente participada pelas populações, através das autarquias locais, dos organismos regionais, das associações sócio-profissionais e outras entidades representativas.
2. A execução do plano deve ser amplamente descentralizada, sendo também participados as suas revisões e ajustamentos.

ARTIGO 73.°

1. A Câmara dos Deputados definirá, em lei especial, a orgânica do planeamento e o sistema de planeamento, assegurando a concretização dos princípios consignados na Constituição.

2. Compete à Câmara dos Deputados aprovar os planos a longo e médio prazos, e suas revisões, e o plano anual, que, com o Orçamento do Estado, constituirão a base fundamental da política económica e financeira do Governo.

ARTIGO 14.°

A coordenação, a orientação e o controle da execução do plano competem ao Conselho Económico e Social, que funcionará junto do Governo.

ARTIGO 75.°

Os limites das zonas regionais de planeamento devem coincidir com os das regiões administrativas, competindo à Câmara dos Deputados defini-los e regular as atribuições e competência das comissões regionais de planeamento.

TITULO III

Da empresa

ARTIGO 76.°

A empresa é uma comunidade de pessoas que colaboram numa actividade de produção de bens e serviços para utilização exterior. Todos acederão à sua gestão e propriedade, acentuando-se o predomínio progressivo dos trabalhadores, como via para a autogestão, de acordo com a sua dimensão, o ramo de actividade, a formação dos trabalhadores e outras circunstâncias socialmente relevantes.

ARTIGO 77.º

A empresa terá como objectivo primordial a satisfação das necessidades dos consumidores, com obtenção de receitas que permitam uma justa remuneração dos factores produtivos, e particularmente do trabalho.

TÍTULO IV

Do sistema financeiro e fiscal

ARTIGO 78.°

O sistema financeiro, especialmente o sistema fiscal, será estruturado pela lei de forma a prosseguir as finalidades da socialização da economia, com mais justa repartição da riqueza e dos rendimentos, nos moldes definidos pelo Plano.

ARTIGO 79.°

1. O imposto sobre o rendimento pessoal será único e progressivo e terá em conta as necessidades do agregado familiar.
2. A tributação que incide sobre a produção das empresas públicas, sociais e privadas, beneficiará as pequenas empresas, sem embargo do dever de todas participarem na cobertura dos encargos públicos.
3. O imposto progressivo sobre as sucessões e, doações, tendo em conta a transmissão por herança dos frutos dó trabalho, visará prosseguir a igualdade e limitar a transmissão de grandes fortunas.

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4. A tributação do consumo visará adaptar a estrutura do consumo às necessidades da socialização da economia, isentando-se dela os bens necessários à subsistência dos trabalhadores e suas famílias e onerando-se os consumos de luxo.

ARTIGO 80.º

1. A Câmara dos Deputados compete, além da aprovação das leis fundamentais relativas à estrutura do sistema financeiro, aprovar anualmente o Orçamento do Estado, incluindo o orçamento da segurança social e o orçamento anual do sector público, que agregará os orçamentos das empresas públicas; estes poderão ser provisoriamente postos em execução se a demora na aprovação prejudicar a prossecução do interesse público ou a sua regular actividade.
2. A Câmara dos Deputados compete ainda votar as leis que regem o sistema tributário, autorizar anualmente a cobrança de impostos e a realização de despesas, tendo em conta as obrigações decorrentes da lei ou' de contratos, aprovar o regime legal dos impostos das autarquias locais, autorizar anualmente a respectiva cobrança e coordenar a sua autonomia financeira com o interesse geral e os princípios globais do sistema tributário.

PARTE III

Da organização da República

TITULO I

Do Presidente da República

ARTIGO 81.º

1. Durante o período de transição, o Presidente da República é eleito por um colégio eleitoral constituído pelos membros da Assembleia do Movimento das Forças Armadas e da Câmara dos Deputados.
2. Só pode ser eleito Presidente da República o cidadão português maior de 35 anos, no pleno gozo dos seus direitos civis e políticos, que tenha tido sempre a cidadania portuguesa.
3. A eleição recairá em candidatos propostos por um mínimo de oitenta membros do colégio eleitoral e far-se-á, sem debate, por escrutínio secreto.

ARTIGO 82.º

1. Para efeito de eleição, o colégio eleitoral reúne-se por direito próprio sob a presidência do Presidente da Câmara dos Deputados no décimo quinto dia posterior ao da constituição desta.
2. Se algum candidato obtiver no primeiro escrutínio a maioria dos votos do número legal dos membros do colégio eleitoral será, desde logo, considerado eleito.
3. Não se verificando a hipótese prevista no número anterior, haverá segundo escrutínio apenas entre os candidatos que no primeiro alcançaram mais de 20 % dos votos, ficando eleito aquele que obtiver a maioria dos votos validamente expressos.
4. Havendo necessidade de terceiro escrutínio, só concorrerão os dois candidatos mais votados no anterior e será eleito o que obtiver o maior número de votos.

ARTIGO 83.º

O Presidente eleito assume as suas funções no dia imediato ao da eleição e toma posse perante a Assembleia do Movimento das Forças Armadas e a Câmara dos Deputados reunidos conjuntamente, usando a seguinte declaração de compromisso:
Juro por minha honra manter e cumprir com lealdade a Constituição da República, salvaguardar os direitos e liberdades dos cidadãos, observar as leis, promover o bem geral do povo, sustentar e defender a .integridade e a independência da Pátria Portuguesa.

ARTIGO 84.º

1. O Presidente dá República só pode ausentar-se do País com assentimento da Câmara dos Deputados e do Conselho da Revolução. Este assentimento é desnecessário nos casos de simples passagem ou de viagem sem carácter oficial de duração não superior a cinco dias.
2. A inobservância do disposto no número anterior envolve, de pleno direito, a perda do cargo.

ARTIGO 85.º

1. O Presidente da República responde perante o povo português pelos actos praticados no exercício das suas funções.
2. A Câmara dos Deputados e a Assembleia do Movimento das Forças Armadas podem tomar, cada uma de per si, a iniciativa para a destituição do Presidente da República com fundamento na prática de qualquer dos crimes referidos no artigo 128.º, mas em qualquer dos casos o processo não seguirá sem a anuência do outro destes dois órgãos de Soberania.
A proposta deverá ser apresentada, pelo menos, por um terço do número legal dos membros do órgão que tomar a iniciativa e terá de ser aprovada pela maioria qualificada de dois terços dos seus membros. A deliberação será imediatamente comunicada ao outro órgão de Soberania e o processo só seguirá se aí for confirmado por metade, pelo menos, do número legal dos seus membros.
A acusação será feita perante o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em pleno, pelo órgão de Soberania que tomar a iniciativa e o Supremo Tribunal de Justiça, se a julgar procedente, decretará a destituição do Presidente da República.
3. Por crimes estranhos ao exercício das suas funções, o Presidente da República responderá perante os tribunais comuns, mas só depois de findo o mandato.

ARTIGO 86.º

O Presidente da República pode renunciar ao cargo em mensagem dirigida ao País, que será publicada no Diário do Governo.

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ARTIGO 87.º

1. Em caso de vagatura do Presidente da República, por morte, renúncia, perda de mandato ou impossibilidade física permanente, o novo Presidente será eleito, no prazo de sessenta dias, em data fixada por' acordo entre os Presidentes da Assembleia do Movimento das Forças Armadas e da Câmara dos Deputados.
2. A impossibilidade física do Presidente da República deve ser reconhecida pelo Conselho da Revolução, o qual fará publicar no Diário do Governo a declaração de vagatura da Presidência. Uma impossibilidade física com duração superior a sessenta dias equivale a impossibilidade, física permanente.
3. Enquanto se não realizar a eleição de novo Presidente durante os impedimentos temporários, as funções do Presidente da República serão interinamente desempenhadas por quem o Conselho da Revolução designar.

ARTIGO 88.º

1. O Presidente da República exercerá o seu mandato por três anos.
2. No caso de vagatura do cargo por qualquer causa, o novo Presidente completará o mandato do seu antecessor.

ARTIGO 89.º
Compete ao Presidente da República:

1.º Presidir ao Conselho de Revolução;
2.º Exercer o cargo de Comandante Supremo das Forças Armadas;
3.º Designar o Primeiro-Ministro, ouvido o Conselho de Revolução;
4.º Nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do Primeiro-Ministro;
5.º Convocar e presidir ao Conselho de Ministros, quando o julgar conveniente;
6.º Submeter à Câmara dos Deputados as propostas de alteração à Constituição que lhe houverem sido apresentadas pelo Conselho de Revolução;
7.º Marcar, de harmonia com a lei eleitoral, o dia das eleições dos Deputados;
8.º Abrir a primeira sessão da legislatura e dirigir mensagens à Câmara dos Deputados;
10.º Dissolver a Câmara dos Deputados, precedendo deliberação do Conselho da Revolução, e marcar novas eleições a realizar no prazo de noventa dias;
11.º Representar o povo português, dirigir a política externa e ratificar os tratados internacionais depois de devidamente aprovados;
12.º Indultar e comutar penas;
13.º Promulgar e fazer publicar as leis e resoluções da Câmara dos Deputados, bem como os decretos-leis do Conselho da Revolução e do Governo e os decretos regulamentares, e assinar os restantes decretos, sem o que tais actos serão juridicamente inexistentes;
14.º Declarar o estado de sítio, ouvido o Conselho de Revolução.

ARTIGO 90.º

1. Os actos do Presidente da República devem ser referendados pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro ou Ministros competentes, sob pena de inexistência.
2. Não carecem de referenda:

a) A nomeação do Primeiro-Ministro;
b) As mensagens dirigidas à Câmara dos Deputados;
c) A mensagem de renúncia.

TITULO II

Do Conselho da Revolução

ARTIGO 91.º

1. A constituição do Conselho da Revolução será a que se encontra definida na Lei Constitucional n.º 5/75, de 14 de Março.
2. Qualquer alteração à composição do Conselho da Revolução s6 poderá ser feita por legislação do próprio Conselho, de acordo com a deliberação da Assembleia do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 92.º

Compete ao Conselho da Revolução:

1.º Definir, dentro do espírito da Constituição, as necessárias orientações programáticas da política interna e externa e velar pelo seu cumprimento;
2.º Apreciar e sancionar ás leis da Câmara dos Deputados ou do Governo que respeitem às matérias seguintes:
a) Linhas gerais de política económica, social e financeira;
b) Relações externas, em especial com os novos países de língua portuguesa e com os territórios ultramarinos em que ainda se mantenha a administração portuguesa;
c) Exercício das liberdades e direitos fundamentais;
d) Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes;
e) Regulamentação de actividade política, em especial a relativa a actos eleitorais.

3.º Exercer a função legislativa nas matérias que respeitem à estrutura e organização das forças armadas, bem como a assuntos internos das mesmas ou de que sejam destinatários unicamente militares ou civis integrados na organização militar, devendo os respectivos decretos-leis ser ratificados pela Câmara dos Deputados quando contenham normas que afectem os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos;
4.º Vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar as actos da Governo e da Administração;

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5.º Declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade das leis e outros diplomas legislativos, mas ressalvando sempre as situações criadas pelos casos julgadas;
6.º Autorizar o Presidente da República afazer a guerra em caso de agressão efectiva ou iminente e a fazer a paz;
7.º Autorizar o Presidente da República a declarar o estado de sítio e a pronunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da Nação;
8.º Pronunciar-se, junto do Presidente da República, sobre a escolha do Primeiro-Ministro e dos Ministros da Defesa, da Administração Interna e do Planeamento Económico;
9.º Deliberar, mediante proposta do Presidente da República, sobre a dissolução da Câmara dos Deputados;
10.º Pronunciar-se sobre a impossibilidade física, temporária ou permanente, do Presidente da República;
11.º Designar, em caso de morte ou impedimento do Presidente da República, quem desempenhará interinamente as suas funções;
12.º Exercer competência legislativa .sobre matérias de interesse nacional de resolução urgente, quando a Câmara dos Deputados ou o Governo estiverem impedidos de a fazer;
13.º Conferir poderes constituintes à Câmara dos Deputados, apresentando-lhe a respectiva proposta de alteração à Constituição.

ARTIGO 93.º

O Conselho da Revolução funciona em regime de permanência., segundo regimento próprio que elaborará.

TITULO III

Da Assembleia do Movimento das Forças Armadas

ARTIGO 94.º

A Assembleia do Movimento das Forças Armadas é o órgão representativa do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO 95.º

1. A Assembleia do Movimento das Forças Armadas é constituída por um total de 240 representantes dos três ramos das forças armadas, sendo 120 do Exército, 60 da Armada e 60 da Força Aérea.
2. Os lugares de .representantes das Forças Armadas na Assembleia do Movimenta das Forças Armadas serão atribuídos, dentro de cada ramo das forças armadas, de acordo com critérios a estabelecer por cada ramo, tendo em atenção as respectivas especialidades de estrutura, devendo, contudo; incluir oficiais, sargentos e praças dos quadros permanente e de complemento.
3. No número de representantes fixados no n.º 1 consideram-se incluídos os membros do Conselho da Revolução em exercício.

ARTIGO 96.º

Compete à Assembleia do Movimento das Forças Armadas:
1.º Elaborar, discutir e aprovar propostas a apresentar ao Conselho da Revolução sobre as matérias da competência deste;
2.º Analisar a evolução política da vida nacional e sobre a mesma emitir pareceres;
3.º Apreciar os actos do Conselho da Revolução praticados no exercício das suas atribuições;
4.º Elaborar e aprovar o seu regimento interno;
5.º Retirar o mandato a qualquer dos seus membros, exceptuando o Presidente da República, nos termos do regimento que vier a ser aprovado.

ARTIGO 97.º

1. A Assembleia da Movimento das Forças Armadas funciona em regime de permanência e é presidida pelo Conselho da Revolução, através do seu próprio Presidente ou de quem as suas vezes fizer.
2. A Assembleia da Movimento das Forças Armadas reúne ordinariamente todos os meses, mediante convocação do Conselho da Revolução, e extraordinariamente sempre que for convocada pelo Presidente da República, pelo Conselho da Revolução ou par qualquer dos ramos das forças armadas, através do respectivo chefe do estado-maior.

ARTIGO 98.º

A estruturação do Movimento das Forças Armadas ao nível interno de cada um dos ramos das forças armadas será efectuada através da criação de uma assembleia representativa e de um órgão central de coordenação, cujas composições e competência serão regulamentadas por portaria do respectivo chefe do estado-maior.

TITULO IV

Da Câmara dos Deputados

ARTIGO 99.º

A Câmara dos Deputados é a assembleia representativa do povo português e compõe-se de Deputados eleitos por três anos em sufrágio universal, directo e secreto.

ARTIGO 100.º

1. Os Deputados são eleitos em círculos eleitorais correspondentes aos distritos administrativos, cabendo a cada círculo um deputado por 25 000 eleitores recenseados ou resto superior a 12 500.
Os eleitores residentes no estrangeiro pertencerão aos colégios eleitorais dos círculos por onde se recensearem e poderão exercer o seu voto por correspondência, nos termos do direito eleitoral.
2. Nos círculos com mais de 37 500 eleitores recenseadas, a eleição, for-se-á por listas plurinominais, contendo um número de. candidatos igual ao dos mandatos atribuídas ao circulo, segundo o sistema de representação proporcional e pelo método da média mais alta de Hondt. Os mandatos que couberem

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a cada lista serão conferidos aos respectivos candidatos pela ordem da precedência indicada na declaração de candidatura.
Nos círculos com menos de 37 500 eleitores recenseados, a eleição for-se-á por listas uninominais, com indicação de um candidato suplente, cabendo ó mandato à lista concorrente que obtiver. maior número de votos.
3. Em caso de dissolução da Câmara dos Deputados, as eleições para a nova Câmara regular-se-ão pelo direito eleitoral vigente ao tempo do decreto de dissolução.

ARTIGO 101.º

1. As vagas que ocorrerem na Câmara dos Deputados serão preenchidas pelo primeiro candidato não eleito, na respectiva ordem precedência da lista a que pertencia o titular do mandato vago, ou, nas listas uninominais, pelo respectivo suplente.
2. Se na lista já não houver. mais candidatos, a vaga não será preenchida.

ARTIGO 102.º

I. A Câmara dos Deputados reunirá, par direito próprio, no décimo dia posterior ao apuramento dos resultados gerais das eleições.
2. Recaindo aqueda data fora do período normal de funcionamento da Câmara, haverá uma sessão legislativa extraordinária com a duração de quinze dias.

ARTIGO 103.º

Os Deputados são representantes de todo o povo português, e não dos colégios eleitorais por que foram eleitos.

ARTIGO 104.º

Os Deputados, além de outros estabelecidos no Regimento, têm os poderes de:
1.º Apresentar projectos de leis e de resoluções ou propostas de deliberação e fazer requerimentos;
2.º Usar da palavra;
3. º Participar nas votações;
4.º Apresentar reclamações e protestos;
5.º Requerer às entidades públicas os elementos, informações e publicações oficiais que considerem indispensáveis ao exercício do seu mandato;
6.º Fazer perguntas ao Governo.

ARTIGO 105.º

1. Os Deputados não respondem civil, criminal ou disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções ou. por causa delas.
2. Nenhum Deputado poderá ser sujeito a prisão preventiva, excepto em virtude de crime punível com pena maior e mediante autorização da Câmara.
3. Movido procedimento criminal contra algum Deputado e indicado este por despacho de pronúncia ou equivalente, fora do caso previsto no número anterior, a Câmara decidirá se o Deputado deve. ou não ser suspenso, para o efeito do seguimento o processo.
4. A falta dos Deputados a actos ou diligências oficiais estranhos à Câmara por causa do funcionamento desta considera-se sempre justificada.
5. Os Deputados não podem ser jurados, perito ou testemunhas sem autorização da Câmara.
6. Os Deputados têm direito a livre trânsito, à passaporte especial nas suas deslocações oficiais ao estrangeiro, a cartão especial de identificação e aos subsídios que a lei determinar.

ARTIGO 106.º

1. Perdem o mandato os Deputados que:
a) Incorram em qualquer das incapacidades ou incompatibilidades previstas na Lei Eleitoral;
b) Sem motivo justificado, não tomem assento na Câmara até à décima reunião ou deixem de comparecer a dez reuniões consecutivas do plenário ou das comissões ou dêem quinze faltas interpoladas na mesma sessão legislativa;
c) Se inscrevam em partido diverso daquele por
que foram eleitos.

2. A perda do mandato será declarada pelo Presidente da Câmara dos Deputados, ouvida a Mesa, sem prejuízo do direito de recurso para o Plenário.

ARTIGO 107.º

1. Os Deputados poderão renunciar ao mandato.
2. A renúncia deve ser fundamentada e apresentada por escrito, dependendo de aceitação da Câmara dos Deputados.

ARTIGO 108.º

Compete à Câmara dos Deputados:
1.º Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las, salvo o disposto no n.º 3.º do artigo 92.º;
2.º Aprovar os tratados internacionais que versem matéria da sua exclusiva competência, envolvam compromissos político-militares de Portugal em organizações internacionais e os tratados de rectificação de fronteiras e de arbitragem;
3.º Conferir ao Governo autorizações legislativas;
4.º Ratificar os decretos-leis do Governo e os do Conselho da Revolução, nos casos previstos nesta Constituição;
5.º Discutir e votar os planos económicos;
6.º Votar a confiança ou a desconfiança ao Governo;
7.º Vigiar pelo cumprimento da Constituição e das leis e apreciar os actos do Governo e da administração pública;
8.º Ratificar a declaração do estado de sítio;
9.º Aprovar o Orçamento Geral do Estado; cujo projecto lhe será submetido até 1 de Novembro de cada ano, autorizando o Governo a .cobrar as receitas e a fazer as despesas da gerência futura;
10.º Autorizar o Governo a realizar empréstimos e outras operações de crédito que não sejam de dívida flutuante, estabelecendo as condições gerais em que podem ser feitos;

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11.º Tomar as contas dó Estado e dos institutos públicos respeitantes a cada ano económico, que lhe serão apresentadas com o relatório e decisão do Tribunal de Contas e os demais elementos que forem necessários para a sua apreciação;
12.º Definir os limites do território nacional e das circunstâncias judiciais e das autarquias locais;
13.º Conceder amnistias;
14.º Deliberar sobre a alteração da Constituição nos termos do n.º 13 do artigo

ARTIGO 109.º

É da exclusiva competência da Câmara dos Deputados legislar sobre as seguintes matérias:

a) Estado e capacidade das pessoas e aquisição ou perda da cidadania portuguesa;
b) Direitos fundamentais pessoais e políticos;
c) Definição dos crimes, penas e medidas de segurança, processo penal e habeas corpus
d) Eleição da Câmara dos Deputados e dos órgãos das autarquias locais e regiões autónomas;
e) Organização regional e administração local;
f) Organização e competência dos Tribunais e do Ministério Público e estatuto dos respectivos magistrados;
g) Estatutos dos funcionários civis do Estado e responsabilidade civil da Administração;
h) Organização da defesa nacional e definição dos deveres desta decorrentes;
i) Impostos;
j) Regime geral da propriedade, expropriação e requisição por utilidade pública, nacionalizações e municipalizações, bem como gestão das empresas nacionalizadas e municipalizadas;
l) Reforma agrária;
m) Planeamento económico;
n) Sistema monetário, criação e extinção de institutos de emissão e padrão de pesos e medidas.

ARTIGO 110.º

1. A Câmara dos Deputados pode autorizar o Governo a emitir decretos-leis sobra matéria da sua exclusiva competência, devendo, na respectiva lei, definir o objecto e a extensão, bem como a duração da autorização.
2. Nenhuma autorização legislativa poderá ser exercida mais de uma vez mas admite-se a sua execução parcelada.
3. Determinam a caducidade de todas as autorizações concedidas ao Governo a demissão deste, o termo da legislatura ou a dissolução da Câmara dos Deputados.

ARTIGO 111.º

1. Em caso de urgência e de necessidade nacional, poderá o Conselho da Revolução, independentemente de autorização legislativa e fora do funcionamento efectivo da Câmara dos Deputados, legislar em matéria da exclusiva competência desta última, devendo, porém, o decreto-lei em que o fizer ser ratificado durante a sessão legislativa que se seguir à publicação, sob pena de caducidade.
2. Para efeito do disposto na parte final do número anterior, logo que a Câmara dos Deputados retome o seu funcionamento, será inscrita na ordem do dia das reuniões necessárias para o efeito a apreciação dos decretos-leis publicados pelo Conselho da Revolução.

ARTIGO 112.º

1. Todos os decretos-leis publicados pelo Governo estão sujeitos a ratificação pela Câmara dos Deputados.
2. A ratificação dos decretos-leis publicados pelo Governo no intervalo das sessões legislativas e dos decretos-leis publicados no uso de autorizações legislativas considerar-se-á concedida se, nas primeiras cinco reuniões plenárias posteriores à sua publicação, quinze deputados, pelo menos, não requererem a sua apreciação pela Câmara.
3. A ratificação dos decretos-leis publicados durante a sessão legislativa será considerada não concedida se a Câmara a não tiver votado até à décima reunião posterior à sua publicação.
4. A ratificação podará ser concedida com emendas e, neste caso, o decreto-lei ficará alterado nos termos da lei que a Câmara então votar. Se a ratificação tiver sido recusada pela Câmara, o decreto-lei deixará de vigorar desde o dia em que for publicado no Diário do Governo o respectivo aviso.

ARTIGO 113.º

1. Compete à Câmara dos Deputados eleger, para a duração da legislatura, o seu Presidente e os demais membros da Mesa, elaborar e aprovar o seu Regimento e regular a sua policia.
2. A Câmara dos Deputados terá as comissões permanentes previstas no Regimento e poderá constituir comissões eventuais de inquérito ou para qualquer outro fim determinado, umas e outras formadas em correspondência com a representatividade dos diferentes grupos parlamentares.
3. As comissões podem solicitar a presença nas suas reuniões de membros do Governo e de técnicos.
4. As comissões continuam em exercício nos intervalos dos períodos das sessões legislativas.

ARTIGO 114.º

1. Junto dá Câmara dos Deputados funcionarão o Comissário Parlamentar dos Interesses dos Cidadãos e o Conselho da Comunicação Social.
2. Ao Comissário Parlamentar dos Interesses dos Cidadãos, eleito por três anos pela Câmara dos Deputados, competirá indagar das queixas dos cidadãos contra actos ilegais ou injustos da Administração e propor à Câmara e ao Governo as providências adequadas.
3. A composição do Conselho da Comunicação Social será definida por lei, devendo dele fazer parte necessariamente Deputados em correspondência com a representatividade dos grupos parlamentares, e tra-

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balhadores da informação. Incumbe-lhe velar pita objectividade da informação e pelo pluralismo dos meios de comunicação social e terá poderes de superintendência sobre os meios de comunicação social pertencentes ao Estado.

ARTIGO 115.º

1. A sessão legislativa decorre de 15 de Outubro a I5 de Dezembro e de 15 de Janeiro a 15 de Junho.
2. A Câmara pode adiar ou prorrogar os períodos referidos no número anterior e pode ser convocada extraordinariamente pelo Presidente da República ou pelo seu Presidente, a solicitação do Governo ou a requerimento de um quarto dos Deputados, para deliberar sobre assuntos especificados na convocatória.

ARTIGO 116.º

1. A Câmara dos Deputados funciona em reuniões plenárias e em comissões e as suas deliberações são tomadas à pluralidade absoluta de votos, achando-se presente a maioria do número legal dos seus membros.
2. As reuniões plenárias são públicas.

ARTIGO 117.º

1. A ordem do dia será fixada pelo Presidente da Câmara dos Deputados segundo a prioridade temporal das matérias apresentadas. Mas o Primeiro-Ministro e a Oposição poderão requerer ao Presidente a fixação da ordem do dia de três reuniões plenárias em cada mês.
2. A ordem do dia terá de ser anunciada com vinte e quatro horas, pelo menos, de antecedência.

ARTIGO 118.º

1. Os membros do Governo têm assento nas reuniões da Câmara dos Deputados e o direito de usar da palavra.
2. Uma reunião plenária em cada semana será prioritariamente reservada às perguntas orais dos Deputados ao Governo e às respostas deste.

ARTIGO 119.º

1. A iniciativa da lei compete aos Deputados e ao Governo.
2. Os projectos e propostas de lei serão primeiramente examinados em comissão, podendo esta sugerir novo texto e sobre ele incidir a discussão e votação no plenário, se este assim o deliberar.
3. A Câmara dos Deputados pode, por sua iniciativa ou por solicitação do Governo, declarar a urgência de qualquer projecto ou proposta de lei, que ficará submetido a tramitação especial a definir pelo Regimento.
4. Os projectos e as propostas de lei definitivamente rejeitados não poderão ser renovados na .mesma sessão legislativa, salvo o caso de dissolução.

ARTIGO 120.º

1. No caso do n.º14.º do artigo 108.º, proceder-se-á à revisão da Constituição desde que, recebida a proposta, assem o entenda a maioria absoluta dos membros da Câmara dos Deputados.
2. Os Deputados têm direito de apresentai emendas à proposta de alteração do Conselho da Revolução, devendo, porém, fazê-lo antes de se iniciar o seu exame em comissão.

ARTIGO 121.º

1. Os projectos e propostas aprovados pela Câmara dos Deputados denominam-se decretos da Câmara dos Deputados e são enviados ao Presidente da República para serem promulgados como lei.
2. Tratando-se de decretos nas matérias abrangidas pelo n.º 2.º do artigo 92.º, o Presidente ela República submetê-los-á, previamente, à sanção do Conselho da Revolução; o qual deverá pronunciar-se no prazo. de quinze dias.
3. Se o Conselho da Revolução recusar a sanção, o decreto voltará à Câmara dos Deputados acompanhado dos fundamentos da recusa; se então for aprovado por maioria de dois terços do número legal de Deputados, - será enviado de novo ao Presidente da República para promulgação.
4. No caso de o Conselho da Revolução haver sugerido quaisquer alterações, a Câmara dos Deputados poderá tomá-las em conta, seguindo-se o disposto no n.º 2.

TITULO V

Do Governo

ARTIGO 122.º

1. O Governo é constituído pelo Primeiro-Ministro, pelos Ministros e pelos Secretários e Subsecretários de Estado.
2. O Primeiro-Ministro é designado pelo Presidente da República, ouvido o Conselho da Revolução e forças políticas e partidos que entender por conveniente.
3. Os Ministros, Secretários e Subsecretários de Estado são da escolha d.o Primeiro-Ministro, tendo em atenção a representatividade dos partidos na Câmara dos Deputados e as possíveis coligações. Serão obrigatoriamente da confiança do Movimento das Forças Armadas os Ministros da Defesa, da Administração Interna e do Planeamento Económico, pelo que a sua nomeação não deverá ser feita antes de ouvido 0 Conselho da Revolução.

ARTIGO 123.º

1. Nos casos de formação inicial ou de recomposição ministerial que abranja, pelo menos, um terço dos Ministros, o novo Governo deverá ser submetido a veto de confiança da Câmara dos Deputados na sua primeira sessão. Se a Câmara não se encontrar em funcionamento, será convocada extraordinariamente para este efeito.
2. Após deliberação em Conselho de Ministros, o primeiro-ministro pode solicitar um voto de confiança da Câmara dos Deputados sobre uma declaração de política geral ou sobre qualquer texto que nela esteja em apreciação.
3. Por iniciativa de um quarto dos seus membros, a Câmara dos Deputados pode recusar a confiança ao Governo, votando moções de desconfiança; mas as

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propostas não poderão ser discutidas e votadas antes de decorridas quarenta e oito horas sobre a sua apresentação.
4. A recusa da aprovação de propostas de lei do Governo não implica de per si a recusa de confiança.

ARTIGO 124.º

1. O Primeiro-Ministro é politicamente responsável perante o Presidente da República e perante a Câmara dos Deputados.
2. A aprovação de duas moções de desconfiança feita com, pelo menos, trinta dias de intervalo obrigará a recomposição ministerial.

ARTIGO 125.º

1. Compete ao Governo:

1.º Conduzir a política do País, de acordo com as orientações definidas pelo Conselho da Revolução e o programa submetido ao voto de confiança da Câmara dos Deputados;
2.º Referendar os actos do Presidente da República;
3.º Fazer decretos-leis que não versem matéria de exclusiva competência do Conselho da Revolução e da Câmara dos Deputados, excepto, quanto à última, precedendo autorização legislativa;
4.º Negociar e ajustar tratados e acordos internacionais e aprovar aqueles que não sejam da competência da Câmara dos Deputados;
5.º Elaborar os regulamentos necessários à boa execução das leis;
6.º Superintender no conjunto da administração pública, geral e local;
7.º Praticar todos os actos respeitantes à nomeação, transferência, exoneração, reforma, aposentação, demissão ou reintegração dos funcionários civis do Estado e das autarquias locais;
8.º Definir, nos limites da Constituição, a .sua organização própria.

2. Os actos do Presidente da República e do Governo que envolvam diminuição de receitas ou aumento de despesas são sempre referendados pelos Ministros das Finanças e do Planeamento Económico.

ARTIGO 126.º

1. O Conselho de Ministros reúne-se obrigatoriamente para:
1.º Autorizar o Primeiro-Ministro a pedir a confiança da Câmara dos Deputados;
2.º Aprovar propostas de lei e resolução;
3.º Aprovar o plano;
4.º Aprovar os decretos-leis:
5.º Autorizar a abertura de negociações de qualquer tratado;
6.º Manter os actos administrativos a que o Tribunal de Contas haja recusado o visto;
7.º Desempenhar as demais funções que a lei lhe atribuir.

2. Poderá haver Conselhos de Ministros restritos especializados em razão da matéria.

ARTIGO 127.º

1. Cada Ministro é responsável política, civil e criminalmente pelos actos que legalizar ou praticar.
2. Movido procedimento criminal contra algum Ministro e indiciado este por despacho de pronúncia ou equivalente, o Supremo Tribunal de Justiça, em sessão plenária, decidirá te o Ministro deve ser imediatamente julgado ou se o julgamento deve realizar-se depois de terminadas as suas funções.
3. Se for decidido o julgamento imediato, o Ministro ficará suspenso das suas funções.

ARTIGO 128.º

1. São crimes de responsabilidade e na forma tipificada na lei:
1.º A traição;
2.º A peita, suborno, peculato ou concussão;
3.º As violações dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos reconhecidos pela Constituição;
4.º Os actos que importem dissipação dos dinheiros' e bens públicos.

2. A condenação por qualquer destes crimes importa a perda do cargo.
3. O disposto nos dois números anteriores aplica-se aos titulares de quaisquer funções políticas ou públicas.

ARTIGO 129.º

1. Junto do Governo funciona o Conselho Económico e Social.
2. O Conselho Económico e Social será organizado por lei e compreenderá representantes das forças armadas, dos órgãos das autarquias locais e das regiões democraticamente eleitos, dos sindicatos e outros organismos sócio-profissionais e das associações de defesa dos consumidores.

TITULO VI

Dos tribunais

CAPÍTULO I

Princípios gerais
ARTIGO 130.º

1. O poder judicial pertence aos tribunais.
2. Só os tribunais podem exercer funções, materialmente jurisdicionais.
3. No exercício dos seus poderes, os tribunais São independentes de todos os outros órgãos do Estado, agindo segundo a Constituição, a lei é a justiça.

ARTIGO 131.º

A lei regula o instituto do júri e define os juízes de paz e as outras formas de participação directa dos cidadãos na administração da justiça;

ARTIGO 132.º

1. As sentenças e ordens dos tribunais são obrigatórias para todas as autoridades e pari os cidadãos.

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2. As sentenças e ordens dos tribunais são executadas por oficiais judiciários, aos quais as outras autoridades e agentes prestarão a cooperação e o auxílio que aqueles solicitarem.
3. As decisões judiciais com trânsito em julgado prevalecem sobre as decisões de quaisquer autoridades, sem prejuízo do recurso de revisão previsto na lei.

ARTIGO 133.º

1. Junto dos tribunais funciona o Ministério Público, ao qual compete a representação dos interesses do Estado e das autarquias locais e a defesa dos interesses públicos que a lei lhe cometer.
2. O Ministério Público é independente de todos os outros órgãos do Estado é organiza-se na Procuradoria Geral da República em termos a regular por lei especial.

ARTIGO 134.°

As audiências dos tribunais serão públicas. O próprio tribunal, em decisão fundamentada, pode determinar o contrário para salvaguarda da dignidade das pessoas ou da independência de julgamento.

CAPITULO II

Da organização judiciária

ARTIGO 135.°

1. Não poderá haver tribunais com competência específica para o julgamento de crimes contra a segurança do Estado.
2. Todos os tribunais, com excepção do Tribunal de Contas e dos tribunais militares, são tribunais judiciais.
3. Os juízes dos tribunais judiciais serão sujeitos ao mesmo estatuto e carreira, sem prejuízo das convenientes especializações.

ARTIGO 136. °

1. Os tribunais de comarca são os tribunais comuns.
2. Haverá tribunais de menores, tribunais do trabalho e auditorias administrativas, compreendendo estas secções de contencioso administrativo e de contencioso tributário.
3. Os tribunais de Relação são os tribunais comuns de 2.ª instância e compreendem secções cíveis, criminais e do trabalho.
4. O Supremo Tribunal de Justiça é o tribunal de revista e compreende secções cíveis, criminais, do trabalho, de contencioso administrativo e de contencioso tributário.
5. O presidente do Supremo Tribunal de Justiça e os presidentes das Relações são eleitos por quatro anos, pelos juízes dos respectivos tribunais.

ARTIGO 137.º

O Supremo Tribunal Militar e os demais tribunais militares têm jurisdição apenas nos crimes essencialmente militares

ARTIGO 138. °

O Tribunal de Contas fiscaliza preventivamente a legalidade das despesas públicas, julga as contas dos entes públicos e dos partidos políticos que a lei lhe mandar submeter e dá parecer sobre a Conta Geral do Estado.

ARTIGO 139.°

As circunscrições judiciais são definidas por lei.

CAPÍTULO III

Do Conselho Superior Judiciário

ARTIGO 140.°

Compete ao Conselho Superior Judiciário:
1.° Praticar todos os actos respeitantes à situação e movimento dos juízes;
2.° Exercer o poder disciplinar sobre os juízes e funcionários judiciais;
3.° Exercer as demais funções atribuídas por lei;
4.° Elaborar e aprovar o seu regimento.

ARTIGO 141.°

O Conselho Superior Judiciário é composto por:
1.° Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o qual servirá de presidente;
2.° Um vice-presidente nomeado pelo Presidente da República, sob proposta do Primeiro-Ministro;
3.° Seis juízes de todos os graus da magistratura eleitos pelos seus .pares;
4.° Três Deputados eleitos pela Câmara dos Deputados;
5.° Um vogal nomeado pelo Ministro da Justiça.

CAPÍTULO IV

Dos juizes

ARTIGO 142.°

1. Os juizes são independentes, irresponsáveis pelos seus julgamentos e vitalícios, salvo, quanto à responsabilidade, em casos de sentença dolosamente injusta e de denegação de justiça.
2. Os juízes não podem ser transferidos, suspensos, colocados na inactividade, aposentados ou demitidos senão nos casos expressamente previstos na lei e com total garantia da sua independência.

ARTIGO 143. °

1. A magistratura judicial compõe-se de juízes do Supremo Tribunal de Justiça, juízes das Relações e auditorias administrativas e juízes de direito.
2. As nomeações dos juízes de direito são feitas mediante concurso público e as suas promoções efectuam-se por mérito e antiguidade.
3. Os juízes dos tribunais superiores serão designados metade por eleição dos seus pares e metade por antiguidade.

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ARTIGO 144.º

Os juízes não podem exercer qualquer outra actividade pública ou privada remunerada, nem ser nomeados ou requisitados para comissões de serviço.

TITULO VII

Da administração pública

ARTIGO 145.º

1. Os funcionários, agentes ou empregados do Estado, das autarquias locais e demais entes .públicos estão ao serviço da comunidade, e não de qualquer partido político ou organização de interesses particulares, devendo actuar sempre com justiça e imparcialidade no cumprimento das suas funções.
2. Não é permitida a acumulação de empregas ou cargos públicos, salvo nos casos expressamente admitidos por lei.
3. A lei estabelecerá o regime das incompatibilidades dó exercício de empregos ou cargos públicos com o exercício de outras profissões.

ARTIGO 146.º

1. Os órgãos e agentes da administração pública, quer geral, quer local, não podem actuar senão de harmonia com a lei.
2. É sempre garantido aos interessados recurso contencioso ,contra actos administrativos definitivos e executórios com fundamento em violação da legalidade.

ARTIGO 147.º

1. Os serviços ou repartições oficiais têm o dever de informar os interessados que o requeiram sobre o andamento dos seus processos e o dever de lhes comunicar as resoluções definitivas que forem tomadas.
2. Os factos e opiniões que os interessados levarem ao conhecimento das autoridades administrativas devem ser devidamente considerados nas suas decisões ou deliberações.
3. O processamento da actividade dos serviços ou repartições oficiais será objecto de uma lei especial que garantirá a racionalização dos meios administrativos em geral e a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes digam respeito.
4. Em processo disciplinar são sempre garantidas ao arguido á sua audiência e defesa.

ARTIGO 148.º

Sem prejuízo da sua unidade, os serviços do Estado estruturar-se-ão segundo os princípios da descentralização e desconcentração, de forma a garantir a comodidade das utentes e a maleabilidade e rapidez da actividade administrativa.

ARTIGO 149.º

1. Sem prejuízo da sua autonomia, as autarquias locais e regiões estão sujeitas a fiscalização do Governo.
2. As deliberações dos órgãos representativos das autarquias e das regiões podem ser dependentes, por força de lei, de referendo dos cidadãos residentes e de autorização ou aprovação do Governo.
3. Os órgãos representativos das autarquias locais e das regiões só podem ser dissolvidos nos casos nos termos estabelecidos nas leis administrativas.

ARTIGO 150.º

Os distritos; além de circunscrições eleitorais, serão circunscrições administrativas para efeitos de representação do Governo junto das comunidades letais.

ARTIGO 151.º

1. Os funcionários e demais agentes do Estado e dos entes públicos são directamente responsáveis, penal, civil e disciplinarmente, pelos actos ou omissões praticados por causa do exercício das suas funções.
2. O Estado e os entes públicos, nos casos de responsabilidade civil por causa do exercício das funções, respondem solidariamente cem os seus funcionários e agentes.

TITULO VIII

Das forças armadas

ARTIGO 152.º

1. Até à data referida no artigo IV das Disposições Finais e Transitórias, as forças armadas, sem prejuízo da unidade de acção do Estado, serão independentes da Câmara dos Deputados e do Governo.
2. As forças armadas serão o garante e motor do processo revolucionário, conducente á construção de uma verdadeira democracia política, económica. e social.
3. Além da sua missão específica de defesa da integridade e independência nacionais, as forças armadas participarão no desenvolvimento económico, social, cultural e político do País no âmbito do seu Movimento.

ARTIGO 153.º

1. O comandante-chefe das forças armadas é o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, na dependência. directa do Presidente da República.
2. O Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas será assistido por um Vice-Chefe do Estado das Forças Armadas, que o substituirá nos seus impedimentos.
3. Cada um dos três ramos das forças armadas será chefiado por um Chefe do Estado-Maior.
4. O Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Vice-Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas e os Chefes do Estado-Maior dos três ramos das forças armadas terão competência ministerial

Disposições finais e transitórias

ARTIGO I

1. Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto nesta Constituição ou ofendam os principias nela consignados.

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2. Caso o tribunal entenda que uma lei, decreto-lei ou outro diploma legislativo, aplicável no feito submetido a julgamento, viola a Constituição ou os seus princípios, deverá suspender o processo e fará subir, em separado, ao Supremo Tribunal de Justiça a questão de inconstitucionalidade para efeito de apreciação.
O Supremo Tribunal de Justiça decidirá em sessão plenária. Se concluir pela existência de inconstitucionalidade, submeterá o acórdão ao Conselho da Revolução para homologação. Concedida a homologação, a norma legislativa deixará de vigorar, nos termos do n.º 5.º do artigo 92.º da Constituição, após publicação no Diário do Governo da respectiva declaração.
3. O regime previsto no artigo anterior entende-se sem prejuízo da competência de qualquer tribunal para reconhecer e declarar, com efeitos restritos ao caso, a inconstitucionalidade formal ou orgânica de qualquer lei, decreto-lei ou diploma legislativo.

ARTIGO II

1. O decreto da Assembleia Constituinte contendo a presente Constituição será enviado ao Presidente da República para promulgação, ouvido o Conselho da Revolução.
2. A constituição, depois de promulgada, será publicada no Diário do Governo e entrará em vigor no décimo quinto dia posterior ao da publicação.

ARTIGO 111

1. O Presidente da República marcará eleições para a Câmara dos Deputados, a realizar até noventa dias após a aprovação da presente Constituição pela Assembleia Constituinte e de harmonia com as leis eleitorais aplicadas nas eleições de 25 de Abril de 1975.
2. Até à posse do novo Presidente da República eleito nos termos dos artigos 81.º e seguintes manter-se-á em funções o Governo Provisório constituído de acordo com o Programa do Movimento das Forças Armadas.

ARTIGO IV

A presente Constituição será obrigatoriamente revista ao fim de três anos após a sua entrada. em vigor, tendo, poderes constituintes a Câmara dos Deputados a eleger para a nova legislatura.

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PROJECTO DE CONSTITUIÇÃO APRESENTADO PELA UNIÃO DEMOCRÁTICA POPULAR (UDP)

Introdução.

SUMARIO

1- Preâmbulo. 2 - Princípios gerais. 3 Direitos e deveres dos cidadãos. 4 Política interna. 5 - Política externa.

Introdução

A classe operária, aos trabalhadores, a todo o povo português

O projecto de Constituição que a UDP aqui apresenta tem o carácter de um programa imediato de luta, que, consagrando as conquistas já alcançadas pelas lutas das massas populares, como as liberdades para o povo de reunião, associação, manifestação, etc., define as mais profundas aspirações do povo português, já manifestadas em tantas e tantas lutas, como o esmagamento total da fera fascista, a nacionalização de todo o grande capital e dos capitais imperialistas, a proibição de bases estrangeiras no nosso país, etc.
É neste sentido que a proposta da UDP apresenta as questões gerais resumidas em quarenta e quatro artigos, baseados no princípio da máxima liberdade de organização e iniciativa revolucionária das massas populares que decidirão das resoluções a adoptar perante cada problema concreto. _
Apresentar-se um . projecto de Constituição com mais de cento e tal artigos, como todos os outros partidos fizeram, é querer estar a legislar tudo e mais alguma coisa, querendo deste modo impedir a iniciativa revolucionária das massas populares. Essas Constituições serão tão ultrapassadas pela luta do povo como já .ó foi a lei da greve há muito tempo pelos próprios trabalhadores que nas suas lutas pura e simplesmente levaram á prática as decisões das suas assembleias, sem estarem preocupados se essa lei permite ou não permite.
O projecto da UDP não se pronuncia directamente sobre os órgãos de poder e de soberania, uma vez que esses órgãos já estão definidos através do pacto do MFA com os partidos políticos, pacto esse a que também a maioria da Assembleia Constituinte está vinculada. Já estão, portanto, definidos os órgãos de poder, deixando de ter qualquer significado apresentar projectos sobre essa questão.
A UDP não assinou o pacto com o MFA, em nome de outro pacto que contraiu com as massas populares, de lutar sempre a seu lado pela conquista de um Estado de Democracia Popular. A UDP não assinaria um pacto que reconhecia um partido fascista como o CDS, e que hoje lhe permite estar assente na Assembleia Constituinte.
Camaradas:
Ao apresentarmos a nossa proposta de Constituição pômo-la à discussão das massas populares, paga que seja possível apresentar no decorrer dos trabalhos da Assembleia Constituinte todas as alterações, emendas e acrescentos que forem propostos por reuniões de trabalhadores.
Façamos reuniões de trabalhadores para discutir o projecto de Constituição.
Façamos do nosso camarada Deputado o porta-voz, ria Assembleia Constituinte, das reivindicações, problemas e anseios concretos de todos os trabalhadores explorados, de todo o povos enviando para a sede da UDP ou para o gabinete da UDP na Assembleia Constituinte todas as propostas que considerem justo serem ali apresentadas.
Viva a democracia popular!
Viva o socialismo!

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.O 16

Preâmbulo

1. Em Portugal abriu-se uma fase de avanço do movimento popular graças à vitória dos povos das colónias sobre o Estado fascista português, conquistada em treze anos de guerra popular.
Para a derrota do fascismo contribuiu em segundo lugar a luta da classe operária e das massas trabalhadoras de Portugal, que sempre resistiram à opressão fascista e à exploração capitalista por todas as formas.
O derrube final do fascismo pelos oficiais progressistas do MFA gerou um processo de transformações revolucionárias que desde o 25 de Abril não cessou de avançar porque o povo já não quer viver como dantes e a burguesia já não pode governar como no passado. A luta da classe operária e das massas trabalhadoras pelo Pão, Paz, Terra, Liberdade e Independência Nacional colocou-se na ordem do dia.

2. Os quarenta , e oito anos de fascismo lançaram o nosso país numa profunda crise económica, política e social, cuja solução exige mudanças radicais de acordo com as mais profundas aspirações das massas trabalhadoras.
A esta crise o Governo tem respondido de forma hesitante, sendo levado a tomar medidas progressistas quando o movimento de massas empurra. Só assim se compreende que tome medidas antifascistas e progressistas, como as nacionalizações, a prisão de conspiradores e sabotadores, mas também medidas antipopulares, como a lei da greve e lei contra as ocupações, que entravam iniciativas revolucionárias das massas.
O desenvolvimento do processo em Portugal e. a experiência histórica mundial mostram-nos que a força motora das transformações revolucionárias é a classe operária. Só a classe operária encabeçando um amplo movimento das massas populares tendo por base a aliança dos operários com os camponeses pode assegurar o avanço nas conquistas revolucionárias do povo, levando a luta contra o fascismo até às últimas consequências e tomando em mãos a luta pela Independência Nacional e pelas mais amplas liberdades para o povo a que as massas trabalhadoras muito justamente aspiram.
Por isso, é necessário assegurar a mais amplas liberdades de organização revolucionária das massas populares.

3. Derrubado o fascismo, é tarefa fundamental de todos os explorados e oprimidos, de todos os verdadeiros patriotas e antifascistas do nosso país, a luta pela Independência Nacional.
Cada vez é mais aguda a luta entre as duas superpotências, que procuram colonizar economicamente o nosso país e dominá-lo politicamente devido à sua importância estratégica como porta para o Atlântico e o Mediterrâneo. Desde o 25 de Abril que as duas superpotências EUA e URSS não cessaram de intrigar, planeai golpes de palácio, ameaçar com invasões, fazer boicote económico ou oferecer a sua interessada «ajuda», procurando submeter o Povo Português aos. seus objectivos imperialistas.
O avanço numa via revolucionária passa por uma política de luta pela Independência Nacional. O Povo Português deve unir-se numa frente única anti-imperialista que seja uma barreira intransponível para os inimigos externos e aliar-se com os povos do Terceiro Mundo que fazem frente decididamente aos supergrandes.

4. É tarefa inadiável o esmagamento completo do fascismo e dos seus principais sustentáculos, o grande capital e os latifundiários. Embora enfraquecidos pelas medidas antimonopolistas das nacionalizações, estes inimigos mortais do povo estão longe de estar destruídos e, apoiados no imperialismo americano, reorganizam-se e preparam o golpe fascista.
A coexistência e tolerância com os fascistas é um suicídio. É necessário cortar de vez a cabeça ao fascismo com medidas revolucionárias, como a dissolução dos partidos fascistas, julgamento dos pides em tribunal revolucionário popular. e uma política de dura repressão de todas as actividades fascistas. É também necessário arrancar todo o poder económico que o grande capital e latifundiários ainda detém, avançando com uma ousada política de nacionalizações sem indemnização, nacionalizando os bens do povo que estão em mãos imperialistas e realizando uma reforma agrária radical, seguindo a linha que os camponeses já começaram a traçar com as ocupações de terras.
S. De acordo com a presente situação que se radicaliza constantemente com o avanço da luta das massas populares, esta Constituição tem o carácter de um programa imediato de luta e é claramente Transitória, devendo ser revogada logo que o processo revolucionário a ultrapasse e o povo exija.
Esta Constituição garante na lei a repressão severa dos inimigos internos e externos do povo, estabelece as mais amplas liberdades. de organização e iniciativa revolucionária das massas populares e assegura uma política intransigente de defesa da Independência Nacional.
O essencial nesta Constituição está na consagração da iniciativa das massas populares com a classe operária à cabeça como forma fundamental de traçar a via que temos de seguir.

PRINCÍPIOS GERAIS

ARTIGO 1º

(Território)

O território da República Portuguesa é constituído pelo território continental, na Europa, pelas ilhas dos Açores e da Madeira e pelas águas territoriais com uma extensão de duzentas milhas.

ARTIGO 2.º

(Carácter da República)

A República Portuguesa é um Estado Democrático que assegura as mais amplas liberdades para o povo. O motor fundamental do avanço da luta revolucionária é a aliança operária-camponesa, que é a base da vasta corrente popular revolucionária das massas trabalhadoras, sob a direcção da classe operária.
A República Portuguesa expropriará o capital monopolista e latifundiário, orientando a sua política económica no sentido de . transformar Portugal de povo pobre e dependente em povo próspero e independente.

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A República Portuguesa é um país independente hostil ao imperialismo e ao social-imperialismo, quer estes assumam uma forma expansionista e agressiva, quer se apresentem sob formas da falsa amizade e da falsa cooperação, que abrem igualmente o caminho à dependência.

ARTIGO 3.º

(Papel das massas populares)

A República Portuguesa e todos os seu órgãos assumem a responsabilidade de por nenhuma forma impedirem o avanço das massas populares na luta pelo Pão, pela Paz, pela Terra, pela Liberdade e pela Independência Nacional. O conjunto de leis e instituições da República Portuguesa não poderá, consequentemente, criar obstáculos ao desenvolvimento da luta que a classe operária encabeça com o objectivo da emancipação total e completa das massas exploradas. .

ARTIGO 4.

(Política imperialista, anticapitalista e antilatifundiária)

A República Portuguesa tem por dever patriótico a abolição de todos os privilégios adquiridos pelos imperialistas em Portugal; confiscará todos os bens e fortunas dos capitalistas monopolistas, grandes capitalistas, colocando-os ao serviço do povo; fomentará a transformação radical das condições de vida nos campos, através da confiscação de todas as fortunas dos latifundiários e grandes agrários, colocando-as ao serviço do povo dos campos; defenderá os bens do Estado e o património de todas as associações e formas colectivas de produção que visem a defesa do emprego e a elevação das condições de vida do nosso povo; protegerá os interesses económicos e bens-pessoais dos operários e camponeses e demais classes e camadas exploradas e desfavorecidas.

ARTIGO 5.

(Liberdade do povo)

A República Portuguesa garante a total liberdade de o povo se organizar e lutar pelo esmagamento das forças fascistas, reaccionárias, imperialistas, monopolistas e latifundiárias. Consequentemente, o Estado reconhecerá poder deliberativo, executivo e de decisão às organizações que unam as massas populares sem restrições nem limitações, e por elas sejam democraticamente constituídas, tais como assembleias plenárias de fábrica, assembleias plenárias de trabalhadores rurais, assembleias plenárias de camponeses, assembleias plenárias de quartéis e de ramos das forças armadas, assembleias plenárias de empresas públicas ou privadas, assembleias plenárias .de moradores de bairros ou localidades, assembleias plenárias de estudantes, assembleias culturais e desportivas, assembleias de controle, vigilância e autodefesa populares. Estas assembleias são proclamadas representantes legítimos da vontade popular, nas quais todo o povo tetri o direito e o dever de participar; constituem formas directas de exercício da democracia, e só aos nela participantes compete a respectiva regulamentação.

ARTIGO 6.º

(Relações com os povos, nações, países e Estados)

A República Portuguesa mantém relações de amizade e cooperação mútuas com todos os povos, nações, países e Estados do Mundo.
Nas suas relações externas, a República Portuguesa guiar-se pelos seguintes princípios:
Respeito mútuo pela integridade territorial e soberania nacional;
Não ingerência nos negócios internos dos outros Estados;
Não agressão mútua;
Igualdade nas relações e estabelecimento de relações que visem vantagens recíprocas;
Coexistência pacífica entre Estados.
A República portuguesa não terá relações diplomáticas com os Estados que possuam colónias, nem com Estados onde se pratique o apartheid.

ARTIGO 7.º

(Política internacional anti-imperialista)

A República Portuguesa opõe-se a qualquer espécie de agressão imperialista ou de um bloco militar expansionista, lutando por uma paz mundial justa e duradoura.
A República Portuguesa defende o princípio da destruição total e completa dos arsenais atómicos, a realizar sob o controle de todos os Estados, grandes ou pequenos, poderosos ou fracos.
A República Portuguesa pronuncia-se contra a política falsa e enganadora de «congelamento» dos arsenais atómicos e contra a política de só as duas grandes potências nucleares decidirem as questões que dizem respeito a toda a Humanidade.
A República Portuguesa defende a transformação do Atlântico e do Mediterrâneo em zonas desnuclearizadas e de paz.
A República Portuguesa rejeita as organizações ditas de defesa colectiva destinadas a servir os interesses particulares das duas superpotências e recusa a protecção nuclear de qualquer das grandes potências, EUA e URSS.

ARTIGO 8.º

(Proibição de tratados militares imperialistas)

A República Portuguesa denunciará todos os acordos e alianças militares celebrados durante o regime fascista.
A República Portuguesa, de acordo com este princípio e com os consignados nos artigos anteriores, abandonará a Organização do Tratado do Atlântico Norte e. o Pacto Ibérico e não celebrará qualquer tratado ou acordo com potências pertencentes aos dois grandes blocos militares, nomeadamente o Pacto de Varsóvia, prosseguindo deste modo uma verdadeira política de Independência Nacional, face às superpotências e aos imperialismos.

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N º 16

ARTIGO 9.º

(Política de paz)

A República Portuguesa renuncia à força e à violência para a resolução de diferendos internacionais, só a elas recorrendo em caso de legitima defesa.
A República Portuguesa, interpretando os sentimentos do povo acabado de sair de uma guerra colonial assassina, agressiva e expansionista, declara solenemente que não empreenderá qualquer guerra de conquista, que não utilizará as suas forças contra a liberdade de outro povo ou nação e que jamais se aliará a qualquer Estado ou bloco imperialista em acções visando a agressão ou à opressão de povos ou nações.

ARTIGO 10.º

(Política de Independência Nacional)

A República Portuguesa, de acordo com os objectivos enunciados de Independência Nacional, aplica, na sua política económica, o princípio de contar prioritariamente com as nossas próprias forças e secundariamente com as forças e auxílios externos.
A República Portuguesa apoia e integra-se , na frente unida mundial contra o domínio das superpotências.
Para desenvolver a economia nacional, a República Portuguesa eliminará o controle e pilhagem exercidos sobre os seus recursos naturais pelos imperialistas e sobretudo pelas superpotências.
A República Portuguesa estabelecerá relações económicas e comerciais . com os países do Terceiro Mundo em bases igualitárias e dentro de uma linha de solidariedade e cooperação com os países em. vias de desenvolvimento.

ARTIGO 11.º

(Descentralização político-administrativa)

A República Portuguesa aplicará o princípio justo da descentralização política, administrativa e financeira tendo em conta as aspirações da população de cada província e região, de modo a progressiva, mas aceleradamente, diminuir as diferenças entre a cidade e o campo, entre as grandes cidades e as pequenas cidades, entre o litoral e o interior, entre a capita) e a província.

ARTIGO 12.º

(Relações com Instituições religiosas)

Na República Portuguesa existe separação total entre o Estado e a Igreja e outras instituições religiosas.
Nenhum privilégio especial será concedido a qualquer religião, igreja ou instituição religiosa.

ARTIGO 13.º

(Solidariedade militante com os exilados políticos)

A República Portuguesa concede protecção e direito de asilo aos estrangeiros perseguidos em razão da sua luta contra o fascismo e a opressão e pela libertação e independência dos seus países.
Na República Portuguesa, os exilados políticos gozam de toda a solidariedade militante do Povo Português.

ARTIGO 14.º

(Recurso à violência)

A presente Constituição, interpretando os ensinamentos populares colhidos na luta contra o fascismo, declara legal o direito do Povo à rebelião e à resistência, sempre que o Governo ou outros órgãos do Estado não procedam de acordo com as aspirações mais profundas do Povo Português, a Independência; a Liberdade, a Paz e a Prosperidade.

ARTIGO 15.º

(Revogação das leis anteriores ao 25 de Abril de 1974)

A presente Constituição revoga totalmente a Constituição fascista de 1933 e todas as leis, decretos-leis e regulamentos anteriores ao 25 de Abril de 1974 que sejam fascistas e antidemocráticos.
Os órgãos de administração e os tribunais só aplicarão leis, decretos-leis e regulamentos anteriores à entrada em vigor desta Constituição quando não revogados.

DIREITOS E DEVERES DOS CIDADÃOS

ARTIGO 16.º

(Igualdade dos cidadãos)

Todos os cidadãos, maiores de 18 anos, independentemente do sexo, raça, religião ou grau de instrução, têm direito de eleger e ser eleitos para cargos.
Não é permitida qualquer espécie de distinção ou discriminação fundada no sexo, na raça, na religião ou grau de instrução, sendo punidas todas as acções que visam semear o ódio e a discórdia com tais fundamentos.

ARTIGO 17.º

(Direito ao trabalho)

Os cidadãos têm o direito ao trabalho e ã educação. Os trabalhadores têm direito ao descanso e à assistência na velhice, no desemprego e na incapacidade.
Os trabalhadores têm o direito ao repouso, sendo-lhes concedidas férias anuais pagas.
O Estado promoverá a criação de centros de repouso para os trabalhadores.

ARTIGO 18. º

(Igualdade da mulher)

As mulheres têm os mesmos direitos que o homem em todos os domínios da vida privada, política e social. Para um trabalho igual a mulher tem direito ao mesmo salário que o homem, gozando dos mesmos privilégios em matéria de previdência social. O Estado protege em especial a mãe e a criança através de férias para as mulheres grávidas, antes e depois do parto, criando maternidades e instituições destinadas ao alojamento e à educação das crianças.

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ARTIGO 19.°

(Família)

O casamento e a família estão sob a protecção do Estado.
O casamento legal só pode ser contraído perante os órgãos competentes do Estado.
Após o casamento civil, os cônjuges são livres de celebrar o casamento religioso.
A lei reconhecerá o direito ao aborto como meio de defesa da família.
É reconhecido o direito ao divórcio.
Os pais têm para com as crianças nascidas exteriormente ao casamento as mesmas obrigações e os mesmos direitos que têm para com as crianças nascidas do casamento.
É abolida a distinção entre filhos ilegítimos e filhos legítimos.

ARTIGO 20.°

(Liberdades sociais)

Os cidadãos gozam de liberdade de associação, de expressão, de reunião, de concentração e de manifestação públicas.

ARTIGO 21.°

(Liberdade religiosa)

O Estado reconhece a liberdade de religião, a liberdade de propaganda da religião e a liberdade de propaganda do ateísmo.
As comunidades religiosas são livres de se organizarem e praticarem publicamente as respectivas crenças.
É absolutamente vedada a utilização política da religião, sendo proibidas as organizações políticas inspiradas em princípios religiosos ou fomentadas por igrejas.

ARTIGO 22.°

(Direitos Individuais)

A todos os cidadãos é garantida:
A inviolabilidade da pessoa, não podendo ser submetido a qualquer tipo de tortura;
A inviolabilidade do domicílio;
O segredo de correspondência.

Ninguém pode ser preso sem culpa formada, excepto nos casos de flagrante delito. Todo o cidadão suspeito da prática de um crime é considerado inocente até que a sua culpabilidade seja provada no decurso de um processo público em que lhe sejam asseguradas todas as possibilidades de defesa.

ARTIGO 23.°

(Perda dos direitos políticos)

Serão privados dos direitos políticos, nomeadamente dos previstos neste capítulo, todos os responsáveis do Estado fascista, os membros de organizações terroristas fascistas (PIDE/DGS, Legião Portuguesa e outras), os implicados em golpes e acções fascistas, os implicados em acções imperialistas, bem como todos os inimigos irredutíveis do povo.

POLÍTICA INTERNA

ARTIGO 24.°

(Repressão aos reaccionários)

Aplicando o princípio da máxima liberdade e democracia para o povo e da máxima repressão para os reaccionários, na República Portuguesa:
a) São proibidos todos os partidos e organizações fascistas;
b) São proibidas reuniões, agrupamentos e manifestações fascistas;
c) É proibida a imprensa fascista e a utilização pelos fascistas dos órgãos de informação;
d) Não será permitida qualquer nova polícia política;
e) São extintas a PSP e a GNR, enquanto forças de repressão do povo.

ARTIGO 25.°

(Julgamento dos fascistas)

O Governo procederá rapidamente ao julgamento revolucionário, com participação popular, de todos os implicados na ditadura fascista, promulgando para isso leis especiais, com efeito retroactivo, que os incriminem enquanto membros de organizações fascistas.
A República Portuguesa reprimirá severamente todas as actividades fascistas e reaccionárias, assim como todos os que se oponham à ampla democracia das massas. Os fascistas, reaccionários e todos os inimigos do povo serão julgados em tribunais revolucionários populares, de acordo com legislação revolucionária apropriada a fixar.

ARTIGO 26.°

(Organizações populares)

A República Portuguesa reconhece ao povo o direito de se dotar de todo o tipo de organizações próprias: Partido, Frente, associações, comissões, órgãos de imprensa, etc., sem qualquer limite. A imprensa popular é protegida e isenta de impostos e encargos fiscais.

ARTIGO 27.°

(Milícias populares)

A República Portuguesa reconhece ao povo e só ao povo o direito de formar milícias populares armadas de autodefesa nas fábricas, nas empresas, nos campos, nos bairros e nas localidades, directamente dependentes das assembleias que as criarem e em íntima ligação com os quartéis, para. defesa de todas as conquistas populares e salvaguarda dos interesses das massas.

ARTIGO 28.°

(Controle da classe operária e camponesa)

Na República Portuguesa a classe operária e camponesa e todos os trabalhadores têm direito de exercer vigilância e controle nas respectivas empresas, fábricas, estabelecimentos e campo para a defesa dos seus interesses de classe.

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POLÍTICA EXTERNA

ARTIGO 39.º

(Defesa da independência nacional)

A política externa da República Portuguesa terá como objectivos fortalecer a independência e defender a integridade territorial e a soberania nacional.

ARTIGO 40.º

(Relações com os outros Estados)

Nas suas relações com os outros Estados, a República Portuguesa praticará uma política de coexistência pacífica, assente nos seguintes princípios:
1) O respeito pelos direitos fundamentais do homem, pelos fins e pelos princípios da Carta das Nações Unidas;

2) O respeito pela soberania e pela integridade territorial de todas as Nações;

3) O reconhecimento da igualdade de todas as raças e de todas as Nações, grandes ou pequenas;

4) A não ingerência nos assuntos internos;

5) O direito de cada nação a defender-se só ou em conjunto, conforme a Carta das Nações Unidas;

6) Anão utilização das organizações de defesa colectiva para servir os interesses particulares de uma grande potência;
A) O não exercício de pressão de um país sobre os outros;
B) A não utilização de acto ou de ameaça de agressão ou da força contra a integridade territorial ou independência política de outro país;

8) A solução de todos os conflitos internacionais por meios pacíficos, tais como: a negociação, a conciliação, a arbitragem ou a solução judicial, assim como todos os. outros meios pacíficos escolhidos pelas partes e conforme a Carta das Nações Unidas;

9) Promoção do interesse e da cooperação mútuas;

10) O respeito da justiça e das obrigações internacionais.

ARTIGO 41. º

(Revisão dos tratados internacionais)

A República Portuguesa reexaminará todos os tratados e acordos culturais, económicos e de cooperação celebrados pelo regime fascista, submetendo-os a um amplo debate e exame populares, cabendo ao povo decidir a sua denúncia, revisão ou confirmação.

ARTIGO 42.º

(Celebração de novos tratados)

Todos os tratados e acordos celebrados com Estados estrangeiros deverão, obrigatoriamente, sê-lo à luz dos princípios acima enunciados.
Fica proibida a cedência a Estados estrangeiros ou a organizações internacionais de bases militares em território português.

ARTIGO 43.º

(Defesa dos cidadãos portugueses no estrangeiro)

A República Portuguesa obriga-se a empreender todos os esforços diplomáticos junto dos Governos estrangeiros na resolução dos problemas apontados pelas assembleias de trabalhadores emigrados.
A República Portuguesa obriga-se a pedir o repatriamento dos portugueses presos e condenados no estrangeiro pela acção desenvolvida em favor da democracia e da defesa dos direitos do povo trabalhador.

ARTIGO 44.º

(Independência total e absoluta para as colónias)

A República Portuguesa reconhece o direito à independência total e absoluta de todos os territórios ainda sob administração colonial portuguesa, subordinando-se à vontade dos respectivos povos, expressa através das suas organizações de libertação nacional.
A República Portuguesa compromete-se a respeitar na íntegra todos os acordos com esses movimentos e a seguir uma política de não ingerência por qualquer forma nos assuntos internos desses povos.

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POLÍTICA EXTERNA

ARTIGO 39.º

(Defesa da independência nacional)

A política externa da República Portuguesa terá como objectivos fortalecer a independência e defender a integridade territorial e a soberania nacional.

ARTIGO 40.º

(Relações com os outros Estados)

Nas suas relações com os outros Estados, a República Portuguesa praticará uma política de coexistência pacífica, assente nos seguintes princípios:
1) O respeito pelos direitos fundamentais do homem, pelos fins e pelos princípios da Carta das Nações Unidas;
2) O respeito pela soberania e pela integridade territorial de todas as Nações;
3) O reconhecimento da igualdade de todas as raças e de todas as Nações, grandes ou pequenas;
4) A não ingerência nos assuntos internos;
5) O direito de cada nação a defender-se só ou em conjunto, conforme a Carta das Nações Unidas;
6) Anão utilização das organizações de defesa colectiva para servir os interesses particulares de uma grande potência;
7-A) O não exercício de pressão de um país sobre os outros;
B) A não utilização de acto ou de ameaça de agressão ou da força contra a integridade territorial ou independência política de outro país;
8) A solução de todos os conflitos internacionais por meios pacíficos, tais como: a negociação, a conciliação, a arbitragem ou a solução judicial, assim como todos os outros meios pacíficos escolhidos pelas partes e conforme a Carta das Nações Unidas;
9) Promoção do interesse e da cooperação mútuas;
10) O respeito da justiça e das obrigações internacionais.

ARTIGO 41.º

(Revisão dos tratados internacionais)

A República Portuguesa reexaminará todos os tratados e acordos culturais, económicos e de cooperação celebrados pelo regime fascista, submetendo-os a um amplo debate e exame populares, cabendo ao povo decidir a sua denúncia, revisão ou confirmação.

ARTIGO 42.º

(Celebração de novos tratados)

Todos os tratados e acordos celebrados com Estados estrangeiros deverão, obrigatoriamente, sê-lo à luz dos princípios acima enunciados.
Fica proibida a cedência a Estados estrangeiros ou a organizações internacionais de bases militares em território português.

ARTIGO 43.º

(Defesa dos cidadãos portugueses no estrangeiro)

A República Portuguesa obriga-se a empreender todos os esforços diplomáticos junto dos Governos estrangeiros na resolução dos problemas apontados pelas assembleias de trabalhadores emigrados.
A República Portuguesa obriga-se a pedir o repatriamento dos portugueses presos e condenados no estrangeiro pela acção desenvolvida em favor da democracia e da defesa dos direitos do povo trabalhador.

ARTIGO 44.º

(Independência total e absoluta para as colónias)

A República Portuguesa reconhece o direito à independência total e absoluta de todos os territórios ainda sob administração colonial portuguesa, subordinando-se à vontade dos respectivos povos, expressa através das suas organizações de libertação nacional.
A República Portuguesa compromete-se a respeitar na integra todos os acordos com esses movimentos e a seguir uma política de não ingerência por qualquer forma nos assuntos internos desses povos.

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

PROPOSTAS DE SISTEMATIZAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO

PARTIDO COMUNISTA PORTUGUÊS (PCP)

Preâmbulo:
(Enquadramento histórico-político da Constituição.)

Título I - Princípios fundamentais:
(Definição jurídico-formal e político-material do Estado; regime político, económico e social; funções do Estado; relações internacionais.)

Título II-Organização económica:
(Propriedade dos meios de produção; iniciativa económica; planificação da economia; reforma agrária; cooperativas; gestão das empresas; actividades antieconómicas.)

Título III - Direitos, liberdades e deveres fundamentais:
Capítulo I - Princípios gerais:
(Princípio da igualdade; âmbito e limites dos direitos e liberdades fundamentais.)

Capítulo II-Direitos e liberdades pessoais:
Direito à vida e à integridade física e moral; liberdade pessoal, vida privada; família.)

Capítulo III - Direitos, liberdades e deveres económico-sociais:
(Direito ao trabalho, sindicatos, greve; direito à saúde, habitação, segurança social, educação e cultura; propriedade e herança, escolha de profissão.)
Capítulo IV - Direitos, liberdades e deveres cívicos e políticos:

(Liberdade de expressão, reunião e associação; liberdade religiosa; direitos políticos; deveres e obrigações cívicas e políticas.)

Capítulo V - Tutela dos direitos e liberdades fundamentais:
(Direito de reclamação e recurso jurisdicional; indemnização.)
Título IV-Estrutura e organização do Estado: Capítulo 1-órgão, de soberania:
(Princípio da organização do poder político; órgãos de soberania.)

Capítulo II-Presidente da República:
(Eleição, exercício do cargo, funções, etc.)

Capítulo III - Conselho da Revolução:
(Composição, funções, funcionamento.)

Capítulo IV - Assembleia do MFA:
(Composição, funções, funcionamento.)

Capítulo V-Câmara dos Deputados:
(Composição, eleição, duração e funcionamento; estatuto dos Deputados; atribuições.)

Capítulo VI - Governo:
(Composição, formação e funcionamento; responsabilidade política.)

Capítulo VII - Tribunais:
(Justiça; organização e competência dos tribunais.)

Capítulo VIII- Administração local e regional:
(Estrutura e atribuições.)

Capítulo IX - Competência e processo legislativo:

(Competência legislativa do Conselho da Revolução, da Câmara dos Deputados e do

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24 DE JULHO DE 1975

Governo; iniciativa legislativa; promulgação e publicação; inconstitucionalidade das leis; vigência interna do direito internacional.)

Capítulo X - Eleições e sistema eleitoral:
(Liberdade eleitoral; capacidade eleitoral; candidaturas; sistema eleitoral.)

Capítulo XI - Administração pública e aparelho administrativo do Estado:
(Administração pública; funcionários; responsabilidade do Estado.)

Capítulo XII - Forças armadas:

(Atribuições e organização.)

Título V - Disposições finais e transitórias:

(Entrada em vigor da Constituição; revisão da Constituição.)

 

PARTIDO SOCIALISTA (PS)

Preâmbulo de justificação e de enquadramento histórico do texto constitucional.

Título, que se numera com o número primeiro, contendo « Disposições gerais» sobre definição da comunidade portuguesa, soberania nacional, território, símbolos e integração de Portugal na comunidade internacional.

Título, que se numera com o número segundo, subordinado ao tema «Direitos, liberdades e garantias fundamentais do cidadão, contemplando as seguintes matérias:
Igualdade perante a lei, direito à vida, à segurança pessoal, à intimidade da vida privada, liberdade de deslocação, de reunião e de associação, liberdade religiosa e de expressão de pensamento, direito de participação na vida política, de representação e de petição, de legítima defesa, prestação de serviço militar e protecção extraterritorial dos cidadãos.

Título, que se numera com o número terceiro, subordinado ao tema « Direitos e deveres económico-sociais», subdividido em cinco capítulos, contemplando as seguintes matérias:
a) Direito ao trabalho;
b) Organização do trabalho, comissões de trabalhadores e associações sindicais;
c) Direito à grave e proibição do lock-out;
d) Direito à propriedade privada e seus limites;
e) Direito á cultura e ao ensino;
f) Direito à saúde e à segurança social;
g) Direito à habitação e protecção do ambiente.

Título, que se numera com o número quarto, subordinado ao tema «Da organização económico-social», subdividido em quatro capítulos, contemplando as seguintes matérias:
a) Base da organização sócio-económica da República Portuguesa;
b) Nacionalização e socialização dos meios de produção;
c) Formas de propriedade na transição para o socialismo;
d) Planificação económica ou social;
e) Reforma agrária e seus objectivos;
j) Circuitos de distribuição: comércio interno e externo;
g) Banco de Portugal.

Título, que se numera com o número quinto, subordinado ao tema «Dos órgãos de soberania», subdividido em seis capítulos, contemplando:
a) A integração da matéria do pacto-plataforma, com a enumeração dos órgãos de soberania e suas funções;
b) Organização judiciária.

Título, que se numera com o número sexto, subordinado ao tema «Da regionalização e das instituições locais administrativas».
Título, que se numera com o número sétimo, integrando matéria sobre < Disposições finais e transitórias».
Em anexo:
Texto integral do pacto-plataforma.

O plano de Constituição apresentado obedeceu a alguns critérios de ordem formal e material, que se passam a enumerar e a justificar:

1 - Conciliação das disposições vinculativas contidas no pacto-plataforma MFA/partidos e sua integração no corpo da Constituição, a definir e a consagrar numa Assembleia Constituinte livremente eleita, cuja função específica não se pode divorciar da dinâmica do processo revolucionário português.

Neste ponto, opta-se por questões de maior regularidade formal e ainda pelos fundamentos e finalidades do pacto-plataforma, pela incorporação das disposições daquele no articulado constitucional, julgando-se ainda conveniente e útil que se anexe à Constituição o texto do pacto.
2 - Opta-se ainda, e por razões semelhantes, pela solução de fazer anteceder o texto constitucional de um preâmbulo de justificação e de enquadramento histórico da Constituição, definidor dos condicionalismo políticos resultantes da Revolução do 25 de Abril e dos objectivos a atingir no decurso do processo revolucionário português, sem perder de vista a exequibilidade das soluções em período de transição.
3 - Finalmente, para além da consagração clássica de disposições gerais concernentes à definição do território, símbolos e à integração do País na comunidade das nações, procurou-se, sem qualquer objectivo ou intuito de prioridade, mas por harmonia dos elementos integradores da verdadeira e profunda democratização de Portugal, alinhar, numa fórmula ampla e o mais possível exaustiva, a enumeração e a definição das liberdades fundamentais do cidadão integrado numa sociedade em transição para o socialismo.

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DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 16

4 - Por isso, disposições relativas aos direitos e deveres económico-sociais e à organização económico-social têm um desenvolvimento sistemático, tendo em vista assegurar as condições materiais e colectivas da transição para a sociedade socialista.

5 - Entende-se ainda que o texto constitucional deve consagrar não tanto a enunciação de meros princípios programáticos, mas sobretudo a formulação de regras imperativas que condicionem toda a regulamentação da vida política e económico-social da comunidade portuguesa.

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