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REPÚBLICA PORTUGUESA

SECRETARIADO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

QUARTA-FEIRA, 3 DE SETEMBRO DE 1975 * NÚMERO 41

SESSÃO N.º 40, EM 2 DE SETEMBRO

Presidente: Ex.mo Sr. Henrique Teixeira Queiroz de Barros

Secretários: Ex.mos Srs. António Duarte Arnaut
José Manuel Maia Nunes de Almeida
Sebastião Dias Marques

SUMÁRIO: - O Sr. Presidente declarou aberra a sessão às 15 horas e 35 minutos.
Antes da ordem do dia: - Deu-se conta do expediente.
O Sr. Deputado Fernando Roriz (PPD) pronunciou-se sobre algumas das consequências da descolonização portuguesa e sobre a maneira irrealista como tem sido conduzida, nomeadamente no caso de Angola.
O Sr. Deputado Melo Biscaia (PPD) solicitou um inquérito sobre as causas dos fogos que ultimamente vêm devastando as matas do País, ao ponto de correrem boatos sobre eventuais responsabilidades de algumas organizações partidárias.
O Sr. Deputado Vasco da Gama Fernandes (PS), invocando a qualidade de administrador por parte do Estado do Banco de Angola, neste momento não em exercício, fez considerações acerca dos motivos que estarão na origem da ocupação da referida instituição bancária por um grupo de deslocados daquele território.
O Sr, Deputado Carlos Candal (PS), depois de evocar as tradições democráticas da sua terra, Aveiro, e algumas das suas mais destacadas figuras políticas, como José Estêvão e Mário Sacramento, referiu-se aos erros praticados em Timor que levaram à luta fratricida que ali se está travando, acabando por apelar para os timorenses e para as instâncias nacionais e internacionais no sentido de se negociar a maneira de pôr termo ao conflito.

Ordem do dia: - Continuou o debate na especialidade e votação do articulado apresentado pela Comissão dos Direitos e Deveres Fundamentais (títulos t e n), concluindo-se a apreciação do artigo 26.º, aprovado com alterações, e sendo ainda aprovados os artigos 27.º a 33.º, inclusive (com introdução de alterações nos artigos 31.º e 32.º).
No debate intervieram os Srs. Deputados Teodoro da Silva (PPD), Álvaro Monteiro (MDP/COE), Sousa Pereira (MDP/CDE), Freitas do Amaral (CDS), Vital Moreira (PCP), José Luís Nunes (PS), Lopes Cardoso (PS), para pedir a antecipação do habitual intervalo para deliberação do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, Barbosa de Melo (PPD), Carlos Candal (PS), Jorge Miranda (PPD), Sophia de Mello Breyner (PS), José Augusto Seabra (PPD), Manuel Moura (PS) e Vital Moreira (PCP), que pediram esclarecimentos ao orador anterior, Romero Magalhães (PS), Francisco Miguel (PCP), Agostinho Domingues (PS), Freitas do Amaral (CDS), que pediu esclarecimentos sobre uma intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira (PCP), Coelho dos Santos (PPD) e Mota Pinto (PPD).
Durante o debate fizeram declarações de voto os Srs. Deputados Vital Moreira (PCP), José Luís Nunes (PS). Mota Pinto (PPD), Freitas do Amaral (CDS), Leite de Castro (PPD), Pedro Roseta (PPD), Barbosa de Melo (PPD), Oliveira e Silva (PS), Álvaro Monteiro (MDP/CDE)e Jorge Miranda (PPD).
No decorrer do debate, uma proposta do PCP para aditamento de um novo número ao artigo 27.º baixou à Comissão para obtenção de parecer.
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 19 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à chamada.

Eram 15 horas e 15 minutos.

Fez-se a chamada, à qual responderam os seguintes Srs. Deputados:

ADIM - MACAU

Diamantino de Oliveira Ferreira.

CDS

António Francisco de Almeida.
António Pedreira de Castro Norton de Matos.
Diogo Pinto de Freitas do Amaral.
Domingos José Barreto Cerqueira.
Francisco Luís de Sá Malheiro.
Francisco Manuel Lopes Vieira de Oliveira Dias.
Manuel José Gonçalves Soares.
Manuel Raimundo Ferreira dos Santos Pires de Morais.
Maria José Paulo Sampaio.

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MDP/CDE

Manuel Domingos de Sousa Pereira.

PCP

Avelino António Pacheco Gonçalves.
Hilário Manuel Marcelino Teixeira.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.

PPD

Abel Augusto de Almeida Carneiro.
Abílio de Freitas Lourenço.
Afonso de Sousa Freire Moura Guedes.
Alfredo Joaquim da Silva Morgado.
Amândio Anes de Azevedo.
Amélia Cavaleiro Monteiro de Andrade de Azevedo.
Antídio das Neves Costa.
António Joaquim da Silva Amado Leite de Castro.
António Júlio Simões de Aguiar.
António Maria Lopes Ruano.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho.
Artur Morgado Ferreira dos Santos Silva.
Carlos Alberto Branco de Seiça Neves.
Carlos Alberto da Mota Pinto.
Carlos Francisco Cerejeira Pereira Bacelar.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Eduardo José Vieira.
Emanuel Nascimento dos Santos Rodrigues.
Emídio Guerreiro.
Fernando Adriano Pinto.
Fernando Alberto Matos Ribeiro da Silva.
Fernando Barbosa Gonçalves.
Fernando José Sequeira Roriz.
Fernando Monteiro do Amaral.
João António Martelo de Oliveira.
João Baptista Machado.
João Manuel Ferreira.
Joaquim Coelho dos Santos.
Joaquim da Silva Lourenço.
Jorge Manuel Moura Loureiro de Miranda.
José Ângelo Ferreira Correia.
José António Camacho.
José António Nunes Furtado Fernandes.
José Augusto Seabra.
José Carlos Rodrigues.
José Casimiro Crespo dos Santos Cobra.
José Ferreira Júnior.
José Francisco Lopes.
José Gonçalves Sapinho.
José Manuel Afonso Gomes de Almeida.
José Manuel Burnay.
José Manuel da Costa Bettencourt.
José Theodoro de Jesus da Silva.
Luís Fernando Argel de Melo e Silva Biscaia.
Manuel Joaquim Moreira Moutinho.
Maria Élia Mendes Brito Câmara.
Mário Campos Pinto.
Nicolau Gregório Martins.
Nívea Adelaide Pereira e Cruz.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Nuno Guimarães Taveira da Gama.
Olívio da Silva França.
Rúben José de Almeida Martins Raposo.
Sebastião Dias Marques.

PS

Afonso do Carmo.
Agostinho de Jesus Domingues.
Agostinho Martins do Vale.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques Antunes.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alfredo Fernando de Carvalho.
Alfredo Pinto da Silva.
Álvaro Monteiro.
Álvaro Neto Órfão.
Amarino Peralta Sabino.
Amílcar de Pinho.
António Alberto Correia Mota Prego Faria.
António Alberto Monteiro de Aguiar.
António Duarte Arnaut.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António Jorge Oliveira Aires Rodrigues.
António José Gomes Teles Grilo.
António José Sanches Esteves.
António José de Sousa Pereira.
António Mário Diogo Teles.
António Miguel de Morais Barreto.
António Poppe Lopes Cardoso.
António Riço Calado.
Armando Assunção Soares.
Artur Manuel Carraca da Costa Pina.
Aquilino Ribeiro Machado.
Carlos Alberto Andrade Neves.
Carlos Alberto Leitão Marques.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Natividade da Costa Candal.
Carmelinda Maria dos Santos Pereira.
Domingos do Carmo Pires Pereira.
Emídio Pedro Águedo Serrano.
Etelvina Lopes de Almeida.
Eurico Faustino Correia.
Eurico Manuel das Neves Henriques Mendes.
Eurico Telmo de Campos.
Fernando Alves Tomé dos Santos.
Fernando José Capêlo Mendes.
Francisco Carlos Ferreira.
Francisco Manuel Marcelo Monteiro Curto.
Gualter Viriato Nunes Basílio.
Henrique Teixeira Queiroz de Barros.
Isaías Caetano Nora.
Jerónimo Silva Pereira.
João Alfredo Félix Vieira Lima.
João Joaquim Gomes.
João Pedro Miller de Lemos Guerra.
João do Rosário Sarrento Henriques.
Joaquim Antero Romero Magalhães.
Joaquim Laranjeira Pendrelico.
Jorge Henrique das Dores Ramos.
José Alfredo Pimenta Sousa Monteiro.
José Augusto Rosa Courinha.
José Fernando Silva Lopes.
José Luís de Amaral Nunes.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Ladislau Teles Botas.
Laura da Conceição Barraché Cardoso.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Manuel Cidade Pereira de Moura.
Luís Patrício Rosado Gonçalves.

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Manuel de Brito de Figueiredo Canijo.
Manuel Ferreira Monteiro.
Manuel Ferreira dos Santos Pato.
Manuel João Vieira.
Manuel Joaquim de Paiva Pereira Pires.
Manuel da Mata de Cáceres.
Manuel Pereira Dias.
Manuel de Sousa Ramos.
Maria Emília de Melo Moreira da Silva.
Maria Fernanda Salgueiro Seita Paulo.
Maria Teresa do Vale de Matos Madeira Vidigal.
Mário António da Mota Mesquita.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário de Castro Pina Correia.
Mário de Deus Branco.
Nuno Maria Monteiro Godinho de Matos.
Pedro Manuel Natal dá Luz.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Rosa Maria Antunes Pereira Rainho.
Rui António Ferreira da Cunha.
Rui Maria Malheiro de Távora de Castro Feijó.
Sophia de Mello Breyner Andresen de Sousa Tavares.
Vasco da Gama Fernandes.
Vítor Manuel Brás.
Vitorino Vieira Dias.

O Sr. Presidente: - Responderam à chamada 160 Srs. Deputados. Portanto, posso declarar aberta a sessão.
Está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 35 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Pelas razões por todos conhecidas, não temos neste momento para ser posto ã aprovação o Diário n.º 38. Temos de aguardar não sei bem quanto tempo.
Vamos proceder à leitura do expediente.

Expediente

O Sr. Secretário: - Telegrama da Associação Portuguesa de informática que, por se referir a um artigo já aprovado na nossa Constituição, vou ler na íntegra:
Tendo tido conhecimento jornais intervenção Deputada Emília Melo sobre informática lamentamos inclusão sob forma indicada artigo 22.º Constituição sem estudo profundo consequências nível informática nacional e não só que não temos conhecimento ter sido efectuado solicitamos sua intervenção Deputada discuta assunto nível profissional intermédio desta Associação com trabalhadores sector visto discussão assunto Assembleia enfermar desconhecimento informática pela Assembleia e pessoas em geral reservamos direito Associação efectuar parecer final sobre este assunto e aprovação dada artigo.
Presidente direcção Porto.
Presidente direcção Lisboa.
Associação Portuguesa Informática.

Carta do Sr. António Gouveia, da comissão organizadora do Partido Mutualista Democrático, preso ou detido sem averiguação, há dois meses na cadeia
penitenciária de Coimbra. Diz entre outras coisas: «Os clamores que se levantam dentro e fora da Assembleia, são mais um fruto da demagogia daqueles que julgaram receber a confiança do povo da Madeira, através do sofisma do melhor partido ter as setas a indicar o céu. Esse fruto revela-se amargo e não autoriza os Deputados a lamentarem-se contra terceiros». Diz mais que: «O povo da Madeira sempre foi enganado nas eleições, que a grande maioria dos emigrantes não foi recenseada».
Diz que a Madeira espera melhores dias e, finalmente, pede a reflexão dos Deputados para os problemas inerentes à Madeira, passo a citar: «não tenhamos próximo de Lisboa coisas semelhantes a Timor».
Da Sr.ª Elvira de Jesus Teixeira, de Guimarães, que diz que escreve esta carta para dizer o que pensa acerca dos sociais-fascistas, do PS, PPD e CDS.

Risos.

Diz também que não é com sociais-democratas que se consegue levar este país para um socialismo verdadeiro. Não diz o que é o socialismo verdadeiro, evidentemente.
Finalmente, diz o seguinte: «também aqui vai uma palavra para o Américo da UDP. Desde que o fascista Galvão de Melo lhe disse que ele tinha feito parte da PIDE, este senhor virou completamente para as direitas».

Risos.

Do Sr. Joaquim Ferreira, dando o seu apoio à Assembleia Constituinte, e apreciando bastante o senso que nela se manifesta. Faz mais algumas considerações sobre o Governo, dizendo que estamos saturados com tudo isto e que queremos pessoas de juízo.

Risos.

Uma voz: - Tem razão!

O Sr. Secretário: - Do Sr. António dos Santos Ferreira, dando também o seu total apoio à Assembleia Constituinte, e diz que sempre considerou o falecido 5.º Governo como uma praga e uma peste para Portugal.
Uma carta de uma senhora. Rosalina da Conceição Fernandes, em linguagem de alfurja, e que por isso não se lê. Embora haja o direito de transmitir à Assembleia a opinião de cada um, pelo menos exige-se que a correspondência venha em linguagem decente. E, trata-se de uma senhora, como disse.
Do Partido Trabalhista Democrático Português, o seguinte ofício:
«Sr. Presidente da Assembleia Constituinte: Com o pedido de ser dado conhecimento à Assembleia, dentro do antes da ordem do dia, junto remetemos o comunicado de 19 do corrente, sobre a actual crise económica e política, entregue às 17 horas do dia 20 na Presidência da República, que os órgãos da comunicação oficiais, nacionalizados, não noticiaram. Permitimo-nos juntar 150 exemplares destinados aos Srs. Deputados que neles estiverem interessados.
É assinado pela comissão política, mas a assinatura está ilegível. Traz o selo branco do Partido Trabalhista Democrático Português e as respectivas insígnias.

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As circulares que foram enviadas com este ofício, estão ao dispor dos Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Vamos dar a palavra aos Srs. Deputados inscritos no período de «antes da ordem do dia».
O primeiro é o Sr. Deputado Fernando Roriz.

O Sr. Fernando Roriz (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A descolonização foi, para a revolução portuguesa, e no momento da sua definição, o testemunho maior de profundidade e coragem de que o movimento de 25 de Abril careceria para se impôr, sem reservas, ao respeito de Portugal e do mundo.
Agora, porém, precisava ser alguma coisa mais: uma afirmação de eficiência, sensatez e equilíbrio. E não é!
Ninguém contesta, naturalmente, que a superação de cinco séculos de colonialismo e, a par disso, a reparação de uma guerra injusta de treze anos, teria de ter o seu preço, inevitavelmente elevado. Acontece, no entanto, que esse preço está a ser ultrapassado. E, o que é pior, a ser pago numa moeda que não entrou nos nossos cálculos, feita de sangue e sofrimento.
Porquê?
Importa procurar na ferida que todos os dias supura dramas e dores inenarráveis de milhares de portugueses, a lição que ela esconde. Por respeito ao povo que paga os seus efeitos; por amor da revolução que nela se pode atardar perigosamente, ao invés de se projectar firmemente para o futuro.
Na descolonização, a revolução portuguesa repetiu os erros e vícios que fizeram aqui, neste recanto da Europa, as suas comprometedoras contradições.
Em África, como em Lisboa, a nossa revolução ignorou o cuidado elementar de evitar a tentação de substituir a «verdade única» que derrubou em 25 de Abril, por uma outra forma de dogmatismo. E na voragem dessa irrefreada tendência, se perdeu, também ali, a preciosa dinâmica democrática de um confronto de opiniões e experiências diversificadas, indispensáveis ao aprofundar de problemas e situações que envolviam centenas de milhares de portugueses. Na falta desse diálogo, calaram-se vozes legítimas; ignoraram-se interesses dos mais ponderáveis; calcaram-se, em suma, os princípios mais elementares do movimento libertador das Forças Armadas, porque o delírio partidário comunista esqueceu que a descolonização não podia fazer-se sem respeito por impostergáveis exigências da moral e pelos dados do realismo político.
A nossa revolução transportou para África, de facto, a sua vinculação partidária e ao seu peso se vergou, a preconceitos que não lhe deixaram ver claro esta realidade fundamental: a de que só um muito escasso número de portugueses brancos teria responsabilidades no passado a reparar, enquanto a esmagadora maioria desses homens era perfeitamente adaptável ao futuro livre dos novos países de expressão portuguesa e neles teria um lugar de pleno direito.
A história da redenção portuguesa em relação ao nosso passado africano teria de fazer-se nesta perspectiva, que incluía, naturalmente, medidas concretas e prudentes de defesa do cidadão africano branco. Mas fez-se no pressuposto, implícito em muitas atitudes de pura demagogia ideológica, de que milhares de portugueses que em África ganharam o seu pão com sofrido suor e em total desconhecimento teórico e responsável do colonialismo, seriam, tout court, cúmplices efectivos da política colonialista de Salazar e Marcelo Caetano.
Esta é uma realidade que está dolorosamente inscrita em conflitos do quotidiano de Angola, por exemplo, e que ali despoletou, em momentos cruciais, a violência cega que hoje todos lamentamos. Quem disso tiver dúvidas dê-se ao cuidado de ouvir a experiência dos portugueses que dali estão a regressar. Saberá, então, que logo nos primeiros actos de puro vandalismo desencadeados em Luanda, e quando perante eles, perante assaltos a residências de portugueses que punham em risco os seus haveres e vidas, a reacção das forças de ordem portugueses perante os mais angustiantes apelos não raras vezes era esta: «Estão a ser roubados? Mas vocês passaram toda uma vida a roubar aos negros. É altura de estes acertarem contas! »...
Poderá dizer-se, a este propósito, que, depois de treze anos de violência militar em África, seria como que intuitivo e incontrolável o repúdio liminar dos militares a repetir o uso da sua força contra um povo a caminho da justa liberdade.
Entretanto, o argumento perderá sempre por ignorar que o que os portugueses de África pediam não era a violência, mas a defesa da disciplina, isto a par de também lhes caber a eles o mesmo direito à liberdade que ninguém recusa à comunidade negra.
A descolonização sofreu, de facto, os erros da nossa revolução. Sobretudo o de ter ignorado toda a filosofia da prudência sócio-política que aponta como único caminho racional para o desenvolvimento de qualquer processo revolucionário o de avançar no futuro com o povo, moldando-o aos imperativos da ordem nova, e nunca à margem do povo, como réu de um passado que na sua esmagadora maioria ele sempre repudiou.
Faltou à nossa descolonização, sem dúvida, a sensatez diplomática onde lhe sobejou o afã incontido de redenção militar. E isto não é uma dedução puramente especulativa, porque o seu fundo real está aí confirmado, na história singular da nossa revolução, em elucidativo episódio do desfasamento de actuação verificado entre o nosso primeiro Ministro dos Negócios Estrangeiros depois do 25 de Abril e um dos mais qualificados membros do MFA, jubilosamente confessado por este em declarações públicas.
Ganhou por essa via a história da nossa descolonização uma celeridade porventura ímpar no mundo e o acréscimo de algumas páginas a ilustrar com imagens militares de invulgar garbo e euforia?
Talvez. Mas ao preço de um bem maior número de capítulos de dor humana cuja economia perfeitamente justificaria algum atraso nessa celeridade e a perda daquelas imagens. Justificaria, sem dúvida, por nós, portugueses, e pelos nossos irmãos de África, que também eles estão a sofrer o ódio a que se votaram e sofrerão atrasando-se no longo trajecto que os separa do futuro a que justamente aspiram.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: ... E agora? ...
E agora que regressam a Portugal três centenas e meia de milhares de portugueses, sem lar, sem pão e sem horizonte?

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Não podemos dizer-lhes, naturalmente, que a culpa não foi nossa - nossa, do povo que não quis a sua revolução inquinada da demagogia partidária cega a que já aludi.
Se a Revolução é de todos nós - e ela não pode deixar de ser de todos os portugueses -, então a tarefa de dar a esses homens um lugar no Portugal que temos pertence à força colectiva que somos, pertence, em suma, à Revolução.
Mas a Revolução, para ser capaz de rasgar o futuro dos desalojados de África, tem de ser capaz, antes disso, de se salvar a si própria.
Só um futuro imediato de prosperidade em Portugal pode dar a esses nossos irmãos alguma coisa mais do que a caridade de emergência, capaz de lhes garantir transitoriamente a subsistência, mas impotente para lhes garantir a dignidade a que não podem renunciar.
Mais uma razão, portanto - e que decisiva razão! -, para reforçarmos a nossa determinação, de lutar pelo regresso do 25 de Abril à dinâmica de eficiência de que se perdeu.
Entretanto, que meditem na lição que fica da descolonização aqueles que nela, como aqui, esqueceram que nenhum conceito revolucionário é legítimo e proveitoso quando esquece o povo real a quem tem de servir e no qual não pode deixar de estruturar-se.
Tenho dito.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Deputado Melo Biscaia.

O Sr. Melo Biscaia (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acerca dos numerosos fogos que têm devastado as matas em vários pontos do País correm os boatos e avolumam-se as notícias dos jornais, lançando, inclusivamente, a suspeita da responsabilidade a elementos de certas organizações partidárias.
Até já a Comissão do MDP/CDE de Amarante se viu na necessidade de divulgar um comunicado em que tenta isentar de culpa alguns dos seus chamados «vigilantes revolucionários, que, há dias, foram detidos por populares e entregues ao poder policial, em virtude de estarem armados e terem dado ocasião a tornar-se suspeitos.
Não vamos, evidentemente, acusar aqui ninguém, nem sequer fazer conjecturas.
O que não podemos é deixar de lamentar, profundamente, que haja quem se disponha, nesta altura, a praticar actos de vandalismo com sérias repercussões na já tão grave crise económica que atravessamos.
Uma pergunta baila no espírito de todos: a quem interessa esta «política de terra queimada?»
O que se está a passar será apenas o resultado de uma anormal frequência estatística de pirómanos a actuar, sobretudo, no Norte do País?
Ou estaremos perante um execrável plano organizado?
De qualquer modo, o povo tem o direito de obter uma resposta clara a estas perguntas.
Por isso, daqui exigimos ao Governo que proceda imediatamente a um rigoroso inquérito, que esclareça cabalmente as causas desta calamidade nacional.
Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a paz cívica passa necessariamente pela transparência da política e pelo consequente esclarecimento do povo.
Tenho dito.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Deputado Vasco da Gama Fernandes.

Vozes: - Força, força, Vasco...

O Sr. Vasco da Gama Fernandes (PS): - O País ficou surpreendido com a notícia de que um grupo de deslocados de Angola havia tomado de assalto o Banco de Angola e ali se instalaram, como continuam instalados. As circunstâncias que rodearam e que, decerto, podem explicar esta atitude impõem o meu dever, como Deputado, de trazer ao conhecimento da Assembleia alguns factos cuja origem, parte deles, resulta de circunstâncias de eu ser administrador por parte do Governo junto dessa entidade bancária. Seria, efectivamente, o momento, aliás já aflorado pelo Deputado do PPD que me antecedeu, de fazer uma curta história progresso dos acontecimentos depois da descolonização. O que representou para o País certas precipitações do Acordo de Alvor; as circunstâncias, algumas previsíveis, outras perfeitamente imprevisíveis, transformaram a então província de Angola, e hoje a caminho da independência, num autêntico pandemónio. Deixou de haver ordem, deixou de haver disciplina, os representantes do Estado Português viviam horas naturalmente amargas. Acontecia que, no mesmo território de três exércitos, pelo menos dois deles, aparentemente em desacordo profundo, conseguiram estabelecer um clima de pânico perfeitamente indesejável e altamente perigoso não só para Angola como para o próprio Portugal. Tenho por hábito preocupar-me menos com o que se passou, e, assim, vou encarar com realismo, tanto quanto é possível, nos meus conhecimentos a dar a esta Assembleia a informação que eu repito é meu dever dar. Pelo facto de ser Deputado e de harmonia com o dispositivo legal, deixei de tomar parte no conselho de administração do Banco. Tenho as minhas funções suspensas até ao fim deste mandato e, portanto, não intervim, desde a abertura da Assembleia Constituinte, na administração do Banco de que sou administrador. No entanto, a minha passagem por lá no período que antecedeu esta situação criada pela circunstância de ser Deputado trouxe-me logo a ideia que estava na presença de um facto muito grave e que coisas muito calamitosas estariam guardadas para nós se. porventura, não houvesse uma concepção, uma reconsideração, no ajuizamento do circunstancialismo do problema de Angola. Sentia já durante esse tempo as aflições tremendas das pessoas. Já se advinhava ou se pressentia o afluxo extraordinário que se vai dar e que hoje atinge cerca de 40 000 pessoas para Portugal.
Eu via tudo isso à minha volta, e ao mesmo tempo a mim próprio perguntava que Governo havia neste país que não se preocupava como devia, como era seu dever, não só com os factos concretos já actuais, como, sobretudo, em matéria de previsão.
O que aconteceu não excedeu em muito, ou pelo menos excedeu em parte as minhas previsões, mas confirmou em grande parte muitas delas.

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Às 9 horas e 30 minutos do dia de ontem, o grupo de desalojados de Angola, instalou-se dentro do Banco de Angola, e neste momento, não sei, procurará instalar-se nas suas dependências espalhadas por Lisboa. A situação é extremamente grave, porque ela representa efectivamente e de certo modo o reflexo de uma outra situação criada, a meu ver pelas circunstâncias, em parte, mas também pela inépcia governativa, e estamos, portanto, Srs. Deputados, Sr. Presidente, na presença de um facto que, repito e torno a dizer, extremamente grave.
Cerca de 40 mil pessoas entraram em Portugal e prevê-se a solidariedade internacional nesta matéria dos deslocados. O caso da França; o caso dos Estados Unidos, e, de certo modo, a despeito da África do Sul ter estabelecido, e é natural, grande confusão sobre o que se está a passar efectivamente nessa matéria; continuamos sem notícias, mas, de resto, já estamos muito habituados a isso. Posso trazer a informação de que as notícias que chegam de Luanda são mais tranquilizadoras, supõe-se que se trata simplesmente de uma operação Cunene, no desejo de se apoderarem ou de firmarem as suas posições nas margens do Cunene. Mas seja o que for, estranho como indesejável que o País e todos nós não tivéssemos de ter até agora uma informação mais concreta sobre o problema da África do Sul.
Mas o movimento internacional que se processou, que vem da França, dos Estados Unidos e da própria África do Sul, dá-nos a convicção segura de que dentro de pouco tempo nesta pequena terra portuguesa, já tão atormentada por muitos e grandes problemas, vão instalar-se cerca de 200 mil pessoas.
É preciso não esquecer que já em Junho de 1975, o Sr. Saidy Mingas, Ministro das Finanças do Governo de Angola, nos avisava solenemente e claramente: «E se este é um problema claramente humano ou que nós que iríamos ver de um ponto de vista puramente humanístico, certo é, que, do ponto de vista político, o responsável pelos desalojados de Angola deve ser o Governo Português».
Mais adiante diria: «Ora, uma vez que eles descobrem que são portugueses, a responsabilidade cabe única e simplesmente ao Governo Português».
Quer dizer nós somos avisados em Junho, deste ano pela voz autorizada do Ministro das Finanças de que o Governo de Angola nos passava a abatata quente» sem mais outra preocupação «carrement» de uma forma absolutamente clara.
Como se reagiu contra esta situação? O que se pretendeu fazer, ou o que se pretendeu remediar? À medida que os deslocados chegavam a Portugal eram recebidos por uma entidade chamada IARN - Instituto de Assistência aos Retornados Nacionais -, que lhes entregavam a importância só suficiente para se deslocarem para as suas terras onde iriam procurar trabalho ou procurar modo de vida. Mais tarde, numa outra contingência governativa, passou-se a comparar, a igualar a situação das pessoas chegadas de Angola e necessitadas, à situação dos nossos desempregados, o que daria 2600$ por cada adulto, mais 2000$ na eventualidade de haver uma mulher trabalhadora e mais 50$ por cada filho.
Paralelamente com isso instalava-se no Aeroporto de Lisboa uma repartição improvisada que faria os descontos até 5000$, trocas até 5000$ de dinheiro angolano mediante a apresentação do bilhete de passagem das pessoas que chegavam a esse Aeroporto. Fatalmente, Srs. Deputados, que esse problema não podia ser resolvido, nem pode ser resolvido desta forma. Não é com 2600$, com os eventuais 2000$ para uma mulher trabalhadora ou mais 50$ para os filhos, nem a igualação com os nossos desempregados que se pode resolver o problema dramático de dezenas de milhares de pessoas .que se estão a aproximar, cada vez mais aflita da terra donde partiram na ilusão de que poderiam ter uma melhor vida, e poderiam regressar a ela em situação diferente.
Houve aqui, a meu ver, uma falta de presciência política, o País passou longos meses a falar mal do Sr. General Vasco Gonçalves. Toda a gente preocupada com os problemas de natureza política e era raro encontrar-se mesmo entre nós, porque não dizer a verdade, quem estivesse profundamente sensibilizado, como era seu dever, com a situação agónica dos nossos compatriotas de Angola.
Estabeleceram-se, com arame, farpado à sua volta, na Caparica, grupos de senhoras do Partido Socialista e, creio, que o PPD também, começaram a interessar-se marginalmente pela situação dramática de um ou de outro caso e o problema pôs-se, portanto, de uma forma aparentemente irresolúvel, como se houvesse coisas irresolúveis neste mundo.
É dentro deste condicionalismo que deflagrou este acontecimento grave, tão grave que é um espectáculo perfeitamente desumano aquilo a que se está a assistir na Rua da Prata nesta altura, com uma multidão à porta do Banco e as pessoas lá em cima a gritar por pão, por liberdade e por justiça, instalados e fechados dentro do próprio Banco e, segundo creio, já no seu desespero, praticando alguns actos indesejáveis.
Tive de repente a ideia de me apresentar junto desses senhores para falar com eles, dizer-lhes que queria fazer esta comunicação à Assembleia, que era a única contribuição que poderia dar, já que como administrador do Banco não poderia fazer outra coisa. Pessoas mais prudentes aconselharam-me que não o fizesse, porque o mais que me podia acontecer se o fizesse, nesta altura não estaria aqui, estaria como refém.
A exaltação é enorme; foram assaltados alguns autocarros da Carris, na intenção de trazer as pessoas que se encontravam na Caparica, quer dizer, estamos a viver um momento que pode dizer-se revolucionário sob o ponto de vista de posse e de domínio do Banco de Angola, e foi mercê disso que entendi que era meu dever trazer ao conhecimento dos Srs. Deputados o caderno de reivindicações apresentado por esse grupo de pessoas que se encontra no Banco de Angola, da cruel situação em que vivia e continua a viver essa gente. E isto não falando já da parte, mais dramática ainda, dos assassinatos, das depredações, dos genocídios. A origem, a meu ver, é a grande responsabilidade de não ter havido a presciência de, pelo menos, formular ou de apresentar propostas ou sugestões capazes de enfrentar essa realidade cruel; isso deve-se à inoperância dos Governos, à falta de sensibilização por .parte das pessoas responsáveis, não digo de todas, mas da sua maioria. E parece-me que se impõe que pelo menos esta Câmara, na medida das suas possibilidades, se deixe sensibilizar, como é seu dever, por este ambiente de

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crueldade dramática que estão a viver, neste momento, as pessoas em Angola e cujos reflexos é aquilo que eu acabo de narrar.
Perguntam muitas pessoas como resolver este problema? Como sair deste impasse? Muitas perguntam a si próprias como é possível, com o esquema que eu acabei de apresentar, resolver um problema que necessita de muita imaginação, de muita coragem, de muita decisão e alguma competência?
Entrevistado há meia dúzia de dias pelo jornal A Luta e bem longe ainda de supor que iria assistir, no dia de ontem, à ocupação do Banco de que sou administrador. E quero aqui afirmar que esta circunstância não me perturba coisa alguma, porque verifico que as pessoas que nele se instalaram, na maioria dos casos, têm total razão para reagir virilmente e valentemente contra o desprezo e contra a inépcia dos governantes. Não estou a critica-los, estou a pretender compreendê-los e estou a tentar ajudá-los. Mas, dizia eu, que, entrevistado pelo jornal A Luta e longe ainda de supor o que iria acontecer, alinhei meia dúzia de sugestões, que sintetizei, simplesmente, nisto: a possibilidade de um empréstimo internacional face à tesouraria do Banco de Angola e à própria tesouraria e de que o Governo teve já conhecimento.
«Exigimos - dizem eles- a troca imediata da moeda de Angola emitida pelo Governo Português em moeda portuguesa. Essa troca imediata limita-se por pessoa adulta até ao montante de 300 000$ contra a apresentação do bilhete de passagem ou do documento comprovativo da mesma e, bem assim, documento comprovativo da respectiva identificação. O excedente a este montante será transferido ou trocado, consoante as necessidades dos fundos depositados, em qualquer banco do ultramar. Exigimos igualmente que os bens que eventualmente possam ficar em depósito nos bancos do ultramar sejam devidamente acautelados e sob a responsabilidade do Governo Português.
O Banco de Angola e os respectivos departamentos encontram-se ocupados pelos deslocados do ultramar e essa ocupação só será levantada logo e que de imediato esta justa reclamação seja atendida.»
Foram estas as reclamações apresentadas por essas pessoas e que estarão a ser estudadas neste momento pelo Governo.
Tudo isto, Srs. Deputados, tem uma origem, uma origem desoladora: é que durante longos meses este país não teve Governo; o Governo, se reunia, não operava e se operava, muitas vezes era sem reunir. Estivemos desgovernados. O problema de Angola é dos problemas mais aflitivos, talvez o mais dramático problema do nosso tempo. Nunca tivemos conhecimento, nem nós Deputados, nem as pessoas que não são Deputados e fazem parte do povo português, da verdade nacional. Compreendo as grandes dificuldades que neste momento o nosso Tesouro terá para proceder desta maneira, não esquecendo que esta igualação de circunstância de ser deslocado é igual a desempregado, qualquer vicissitude ou privilégio poderia constituir para os primeiros, ou seja, para os desempregados, uma situação também difícil e merecedora de protesto. A despeito de tudo isto, não quero acreditar que não haja imaginação neste país, que não haja competência neste país, que não haja força de vontade neste país, capazes de arranjar uma solução, não digo uma solução total, mas uma solução razoável, para a gravíssima situação em que nos encontramos.
Preconizo então, e volto a fazê-lo, a necessidade de um grande empréstimo e de solidariedade internacional que seria amortizado pelo lançamento de um imposto moderado sobre alguns rendimentos mais vultosos.
Esse grande empréstimo internacional, seria, por assim dizer, a base capitalista, no bom sentido da palavra, donde podíamos arrancar para acorrer de imediato às situações mais emergentes e mais graves.
Tudo isto será possível?- Eu creio que sim!
Uma solidariedade internacional que acaba de se manifestar ao ponto de a própria França oferecer gratuitamente os aviões de transporte para os deslocados de Angola virem para Portugal.
O movimento internacional que se faz em várias escalas, que vem do Norte da Europa e atinge os próprios Estados Unidos, será fatalmente acessível, compreensível e sensibilizado por uma ajuda nestes termos.
Não vejo outra forma. Mas, para isso, é indispensável, Srs. Deputados, que Portugal tenha um Governo estável, tenha um Governo democrático, um Governo pluripartidário, um Governo que dê segurança à ordem internacional . ..

O Sr. Emídio Guerreiro (PPD): - Um Governo que dê confiança.

O Orador: - ... um Governo que dê confiança às pessoas que nos podem ajudar. Não há investidores que sejam capazes de pensar sequer um momento, em investir capitais em Portugal sabendo da situação em que nos encontramos. Precisamos, afinal, de um Governo, o tal Governo, a tal solução política pela qual esta Câmara se tem batido sempre.
Estou convencido, Srs. Deputados, que uma vez instalado um Governo desse tipo, e oxalá que ele venha depressa, e tudo indica que isso virá a acontecer; que regularizada a vida nacional, estabelecido o equilíbrio político, restabelecidas as liberdades, dando-se a voz às maiorias representadas e reflectidas no acto eleitoral de 25 de Abril de 1975, reintegrado Portugal na senda da democracia política, com a sua futura democratização económico-social, uma ver feito isso, podemos estar tranquilos, as razões por que eu nesta mesma tribuna me dirigi ao Sr. Presidente da República e lhe pedi encarecidamente que não fosse o coveiro da Nação.
Efectivamente, Srs. Deputados, já nos habituámos a ter a certeza de que sem um Governo estável, politicamente viável e procedente, Portugal não tem possibilidades nem de resolver os problemas internos do seu continente, quanto mais os problemas aflitivos da população angolana.
O orador fez a sua intervenção na tribuna.

Vozes: - Muito bem!
Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Candal.

O Sr. Carlos Candal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como militante de base que sou, quisera vir a terminar o meu mandato à Constituinte sem

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qualquer intervenção individual, quedando-me no trabalho colectivo do Grupo Parlamentar a que pertenço. Essa a razão por que não vim ainda aqui dar-vos conta da maneira de pensar e de sentir política das gentes da minha terra, que represento por força dos votos e por força da coerência de longos anos de luta antifascista. A minha terra é Aveiro, a cidade dos congressos oposicionistas, onde aprenderam o ABC da política muitos dos actuais pseudo-revolucionários da revolução impossível.
A terra do tribuno José Estêvão, cuja estátua jaz no rés-do-chão desta Casa, em lugar esconso, para onde foi remetida pelo fascismo, que a retirou do lugar público que ocupava na frontaria deste Palácio. Aveiro de Mário Sacramento, um comunista ...

Aplausos.

... um comunista de vistas largas, intransigente lutador que pode congregar à sua volta todos os democratas e impor-se como leader livremente aceite, aos comunistas, aos socialistas, aos sociais-democratas e mesmo aos liberais daquela terra de tradições políticas.
Se excepciona agora essa minha disposição, vindo aqui, não o faço por vanglória pessoal, mas porque o tema é inadiável e porque esta tribuna é o local adequado para se falar de assuntos com a gravidade e com a dignidade daquele que aqui me traz.
Venho falar dos homens que morreram em Timor.
Para a maioria dos portugueses, Timor vem sendo, não é de agora, é de há muitos anos, uma parcela longínqua, uma zona com o seu quê de místico e de exótico, a terra do Tata-Mai-Lau, o local mais alto do império português, do Jaco, o ponto final de Portugal no Mundo, a terra extravagante onde os camarões nascem nos lagos da montanha e há jacarés no mar, a terra do Sândalo dos Lusíadas ou, muito prosaicamente, a terra do bom café.
A maioria dos portugueses esqueceu, esquecia que em Timor existia um povo com uma cultura própria, com um elevado coeficiente de inteligência, com um alto sentido da justiça, um povo que sempre primou pela frontalidade, pela coragem e pela dignidade, um povo que, ao longo dos tempos, vem sendo vítima de sucessivos massacres, o mais relevante dos quais foi cometido pelo imperialismo, pela besta-fera japonesa, durante a última guerra.
É esse povo, é essa gente, remota, sim, mas, como toda a gente, com dignidade humana, que nasce, que sente, que ri, que sofre, que tem filhos, que morre; é essa gente que atravessa uma fase de violenta tragédia. Os povos de Timor foram lançados uns contra os outros e estão a ser vítimas de erros políticos, porque designadamente se não contou com o factor decisivo. É que os povos de Timor são, por atavismo, por tradição, povos guerreiros. Não sei onde, nem quando, parará a luta fratricida em Timor.
Não interessa agora saber de quem é a culpa, se do fascismo, se da Revolução, se do último ou do penúltimo Governador. Não interessa saber qual o melhor destino para o Timor português, se a integração na Indonésia, se a independência absoluta, se a confederação com Portugal. Tão-pouco interessa apurar quem desencadeou o conflito, qual dos partidos é o principal responsável. Não interessa saber qual dos partidos é calculista ou idealista ou sectário. Queremo-nos na objectividade. Morre gente em Timor por culpa dos homens, e nesses homens estão incluídos os portugueses.
Todos nós temos uma comparticipação de culpa nas dezenas, centenas, milhares de timorenses que morrem nessas paragens longínquas.
Venho aqui fazer um apelo às instâncias oficiais, ao Governo de Lisboa, ao Governo de Timor, às entidades internacionais, para que ponham termo à luta que mata, à luta em que se matam os timorenses. E aos próprios timorenses lanço aqui um apelo no sentido de que deponham as armas, que parem de se matar, porque a morte raramente é remédio para qualquer mal. O meu apelo aos timorenses de Bobonaro, de Atsabe, de Laga, de Baguia, aos meus amigos de Lacluta. Apelo para que deponham as armas e resolvam os seus problemas políticos à mesa das negociações.
Bem sei que este apelo tem o seu «quê» de utopia, mas faço-o como um náufrago perdido, que mete a derradeira mensagem na garrafa que atira ao mar na esperança de que o seu pedido de socorra seja ouvido por alguém.
Camaradas, colegas: Termino estas palavras, que são como que uma oração laica, que rezo por aqueles que tombaram em Timor, e por aqueles que tombam ainda em Timor. É uma oração que rezo deste altar cívico onde subi, na esperança de que não continuem a cair feridos de morte, ensopando o chão da ilha-verde-e-vermelha com o seu sangue, mais homens, mulheres e crianças de pele bronzeada de Timor.
Agradeço a vossa atenção; e se entenderem que numa assembleia como esta importa tirar uma qualquer conclusão política ou moral que interesse à Constituição que estamos encarregados de elaborar, ou que possa valer à grave crise que nós próprios portugueses vivemos, aqui vos deixo um apontamento à maneira de remate: não é com o sangue do povo que se demonstram teorias políticas.

Aplausos.

O Sr. Secretário: - Atenção. Por se encontrar mal estacionado, porque impossibilita a saída de outros carros, pedia-se ao proprietário do Renault vermelho CS-38-39 que o retirasse do local onde o colocou.
O Renault vermelho CS-38-39.

O Sr. Presidente: - Não está mais ninguém inscrito par falar antes da ordem do dia e se ninguém deseja inscrever-se entraremos com algum avanço em relação ao tempo marcado no período da

ORDEM DO DIA

Ora, se bem me recordo, estávamos tratando do artigo 26.º Tínhamos votado os cinco primeiros pontos e havia agora um texto relativo ao ponto n.º 6. Um texto de substituição. O Sr. Deputado José Luís Nunes creio que pediu a palavra sobre isso. Tenha a bondade.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na esteira da proposta feita pelo nosso colega Igrejas Caeiro, nós retiramos a redacção proposta para n.º 6 do artigo 26.º e propomos uma nova redacção que está na Mesa, que pedia o favor de ler.

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O Sr. Presidente: - Está na Mesa. Vai ser lida a nova redacção proposta para n.º 6.
Foi lida. É a seguinte:
6.º Nos períodos eleitorais os partidos políticos concorrentes têm direito na rádio e televisão a tempos de antena regulares e equitativos;
7.º Fora dos períodos eleitorais os partidos políticos e as organizações sindicais e profissionais terão direito a tempos de antena na rádio e na televisão de acordo com a sua representatividade segundo critérios a definir no Estatuto da Informação.

O Sr. Secretário: - Esta proposta, apresentada pelo Partido Socialista, é subscrita pelos Srs. Deputados Oliveira e Silva, Mário Mesquita, Romero de Magalhães e mais duas assinaturas que eu peço desculpa de não poder ler por estarem indecifráveis. Vamos mandar tirar cópia para ser distribuída aos diversos Grupos Parlamentares e Grupo de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: - Portanto, o texto proposto para n.º 6 seria substituído por um texto correspondente a dois números: um 6.º e um 7.º
Vamos mandar tirar cópias. Por enquanto dou a palavra a quem desejar ocupar-se da proposta apresentada.

Pausa.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Ramos pediu a palavra.

O Sr. Manuel Ramos (PS): - Era só para sugerir que os trabalhos não prosseguissem sem entrarem na sala os nossos camaradas do Partido Comunista e do MDP/CDE.

Vozes: - Não apoiado!

O Sr. Presidente: - Estamos informados de que está iminente a chegada desses colegas.
Burburinho.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Peço a atenção da Assembleia. Está em apreciação o texto proposto.

Estabelece-se troca de palavras entre os Srs. Deputados Manuel Ramos e Emídio Guerreiro que não foi possível registar.

O Sr. Presidente: - Eu peço ao Sr. Deputado Manuel Ramos para que não estabeleça diálogo, que não vem agora nada a propósito.
Pausa.

Vamos ler novamente a proposta apresentada enquanto se procede à distribuição, visto que não foi ouvida por todos os Deputados por não estarem na altura presentes.
Já vejo nas bancadas os Deputados do PCP, mas não vejo ainda os do MDP.
O Sr. Secretário: - O Sr. Manuel Ramos podia deixar de ler o seu jornal, porque vou ler a proposta novamente.
Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Portanto, esta proposta está em apreciação; desdobra-se em dois números, mas estão estreitamente relacionados, pelo que se justifica a sua apreciação em conjunto.
Alguém gostaria de usar da palavra sobre a proposta?

O Sr. Eurico Correia (PS): - Sr. Presidente: É apenas para dar um pequeno esclarecimento. O que o nosso colega Manuel Ramos estava a ler era o Diário da Assembleia, e não o jornal.

O Sr. Manuel Ramos: - Eu disse-o.

O Sr. Presidente: - Bem, isso foi um apare aqui do nosso secretário, que não creio que mereça referência.

O Sr. Secretário: - De qualquer forma estava a ler uma proposta, e parece-me que os Srs. Deputados deveriam estar atentos para votar nela conscientemente.
De resto o Sr. Deputado Manuel Ramos já tinha conhecimento desta proposta e poderia votar nela conscientemente, como, aliás, é timbre deste Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação a proposta que acaba de ser lida e que está a ser distribuída.

Pausa.

Alguém deseja usar da palavra sobre esta proposta? Se ninguém pedir a palavra procederemos à votação número por número.

Pausa.

Ninguém pediu a palavra. Vamos pôr à votação o n.º 6. Já agora, embora seja a terceira vez que isso se passa, pedirei mais uma vez que seja lido.
Foi lido de novo.
Submetido à votação. ,foi aprovado por unanimidade. ..

O Sr. Presidente: - Alguém pede a palavra para declarações de voto?

Pausa.

Não há ninguém. Vamos proceder à nova leitura do n.º 7 para pôr à votação.
Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.
Se ninguém pede a palavra vamos proceder à votação deste n.º 7.

Submetido à votação, foi aprovado com 22 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira para uma declaração de voto.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente: Pressuponho que não há mais qualquer proposta respeito do artigo 26.º?

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O Sr. Presidente: - A Mesa não recebeu mais qualquer proposta.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao ser dada por concluída a discussão e votação dos artigos sobre a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa, entende o Grupo de Deputados do PCP chamar a atenção para o significado das disposições aprovadas.
O PCP saúda a consagração constitucional da liberdade de imprensa e as suas necessárias consequências, entre as quais a proibição da censura.
O PCP vê entretanto com preocupação a aprovação de certas disposições do articulado proposto:
Ao recusar-se a proibir constitucionalmente a propaganda fascista, colonialista, racista e belicista;
Ao recusar-se a admitir a qualificação especial dos crimes de imprensa;
Ao retirar aos jornalistas a possibilidade de intervenção nos órgãos de comunicação nacionalizados;
Ao negar aos restantes trabalhadores a possibilidade de intervenção nos jornais em cuja produção participam;
Ao retirar ao Estado a direcção dos órgãos de comunicação que lhe pertencem;
Ao entregar a direcção desses órgãos de comunicação a comissões interpartidárias, constituídas proporcionalmente por todos os partidos representados na Assembleia dos Deputados, incluindo os partidos reaccionários;
A estabelecer a «independência» dos órgãos de comunicação pertencentes ao Estado perante o Governo, perante o MFA, em suma, perante a Revolução;
Ao consagrar o direito de expressão de todas as correntes de opinião - incluindo as antidemocráticas e contra-revolucionárias nos órgãos de comunicação social pertencentes ao Estado;
Ao recusar-se a afirmar a necessidade de uma política de informação visando a mobilização e consciencialização revolucionárias;
Ao aprovar ou ao recusar a aprovação a tais disposições a Assembleia não prestou qualquer serviço à Revolução. Pelo contrário: desserviu-a. Abriu margem à utilização contra-revolucionária da liberdade de imprensa. Permite o ressurgimento impune dos Bandarras e dos Tempos Novos que em boa hora a Revolução ilegalizou. Perfeitamente obcecada por circunstâncias conjunturais a Assembleia Constituinte eximiu-se a tomar as providências que o simples bom senso aconselharia.
A Assembleia Constituinte inconstitucionalizou uma parte essencial da Lei de Imprensa vigente. Ignorou o Plano de Acção Política do CR, aqui tão celebrado na altura do seu aparecimento pelos partidos que agora se aprestaram tão ligeiramente a violá-lo. Pisou aos pés conquistas democráticas estabelecidas, como a do direito dos jornalistas a intervirem na orientação dos jornais em que trabalham. Enfim, ignorou a Revolução e os mínimos requisitos da sua defesa.
Violando as regras mínimas da qualificação constitucional, a Assembleia dedicou três longos artigos à liberdade de expressão e à liberdade de imprensa, dando lugar constitucional. às matérias cujo lugar adequado seria a lei. Levando até ao absurdo a sua concepção das liberdades fundamentais - como simples defesas perante o Estado -, a Assembleia Constituinte retirou ao Estado a direcção da sua própria televisão, da sua própria rádio, dos seus próprios jornais.
O PCP, por seu lado, lutou pela correcção destes pontos. Foi vencido mais uma vez sem que contra os seus argumentos tenham sido invocados argumentos de valia. (E em alguns casos nem sequer foram produzidos argumentos.)
Ao contrário do que afirma um hebdomadário especializado na calúnia contra o PCP, não é o PCP que sai malferido desta contenda. Quem sai malferida é a Revolução. Quem vai beneficiada é a reacção.

Aplausos do sector do PCP.

Manifestação de desacordo de outros sectores.

O Sr. Presidente: - Mais alguém deseja usar da palavra para declarações sobre esta votação?

Pausa.

Então vamos proceder à apreciação do artigo 27.º

O Sr. José Luís Nunes: - Queria usar da palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - O Partido Socialista votou a favor do estatuto e dos mais corolários da liberdade da imprensa em Portugal.
Congratula-se com a extinção da censura para sempre, dado que, sempre coerentemente com aquilo que defendeu no período da legalidade, também coerentemente neste hemiciclo defendeu a extinção da censura.
Da mesma forma se congratula pela extensão ao povo português dos mais amplos princípios no que se refere ao capítulo da liberdade de imprensa, certo de que a liberdade só se pode defender em liberdade e não através das imposições de quem quer que seja.
O Partido Socialista congratula-se, finalmente, com a aprovação de todos estes princípios, certo de que, para além da mera conjectura política, eles perdurarão nos hábitos, na legislação do povo português, constituindo assinalável contributo para a manutenção e o fortalecimento do pluralismo político e ideológico, que se deseja vigente para sempre em Portugal.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Se ninguém mais pede a palavra, entramos na apreciação do artigo 27.º, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 27.º

1 - A liberdade de consciência, religião e culto é inviolável, ninguém podendo por causa dela ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos;
2 - As igrejas e comunidades religiosas estão separadas do Estado e ,são livres na sua organização e no exercício das suas funções e do culto;

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3 - É garantida a liberdade de ensino de qualquer religião praticado no âmbito da respectiva confissão e a utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas actividades;
4 - É reconhecido o direito à objecção de consciência, ficando os objectores obrigados à prestação de serviço não armado com duração idêntica à do serviço militar obrigatório.

O Sr. Presidente: - Há uma proposta na Mesa sobre este artigo, que vai ser lida.

O Sr. Secretário: - Proposta de emenda do Deputado Luís Catarino, do MDP/CDE, que já foi distribuída no hemiciclo:

O n.º 2 deve ter a redacção seguinte:
A liberdade religiosa implica a direito de professar, de não professar ou de não aceitar qualquer religião ou opinião religiosa, o direito de difundir doutrinas religiosas e, bem assim, o direito de os cidadãos organizarem comunidades, associações ou outros institutos com fins religiosos.
O n.º 2 passaria a n.º 3.
O n.º 3 passaria a n.º 4.
O n.º 4 deve ter a redacção seguinte:
Não é permitida a invocação da liberdade de crença e prática religiosa para manifestar ideias ou atitudes contrárias à ordem democrática e ao processo revolucionário de construção do socialismo.

Proposta de eliminação e de aditamento do Grupo de Deputados do PCP:

Relativamente ao artigo 27.º propomos:
a) Eliminação deste artigo do actual n.º 4:
b) b) Aditamento de novo número, com a seguinte redacção:
É proibida a utilização da religião ou dos estabelecimentos, instituições ou cerimónias religiosas para fins de política partidária ou anticonstitucionais.

O Sr. Presidente: - Não temos nenhuma proposta relativa ao n.º 1, pelo que está em apreciação.
O Sr. Deputado Theodoro da Silva tem a palavra.

O Sr. Theodoro da Silva (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos perante o artigo do projecto de Constituição da República Portuguesa em que se consagra a inviolabilidade da liberdade de consciência, religião e culto e do exercício das suas funções, e a garantia da liberdade de ensino, bem como dos meios de comunicação social para a expressão das actividades relacionadas com o seu exercício.
Este artigo exprime o conteúdo do artigo 18.º do capítulo relativo aos direitos civis e políticos da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Permitam-me, Srs. Deputados, a leitura desse artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem:
1. Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de ter ou de adoptar uma religião ou uma convicção de sua escolha, assim como a liberdade de manifestar a sua religião ou a sua convicção, individualmente ou em comum, tanto em público como em privado, pelo culto e o cumprimento dos ritos, das práticas e do ensino.
2. Ninguém será constrangido na sua liberdade por ter ou adoptar uma religião ou uma convicção à sua escolha.
3. A liberdade de manifestar a sua religião ou as suas convicções só pode ser objecto das restrições previstas pela lei e que sejam necessárias à protecção da segurança pública, da ordem e da saúde pública, ou da moral ou das liberdades e direitos fundamentais de outrem.
4. Os Estados Partes no presente Pacto comprometem-se a respeitar a liberdade dos pais e, se se der o caso, dos tutores legais, de fazer assegurar a educação religiosa e moral dos seus filhos, em conformidade com as suas próprias convicções.

Estes direitos inserem-se «no conjunto do pensamento actual democrático» e, como diz Sottomaior Cardia na introdução a uma edição portuguesa daquela Declaração Universal: «A luta pela democracia tem de considerar-se como luta pela totalidade dos direitos; no quadro das instituições burguesas, a luta pela conquista dos direitos económicos, sociais e culturais não é nesses casos separável da luta pelos direitos políticos e civis e vice-versa.»
A Constituição Portuguesa passará, portanto, a registar no título referente aos direitos, liberdades e garantias do cidadão princípios que, apesar de consagrados pelos povos livres, ainda hoje são violados por muitos Estados.
Sendo o povo português essencialmente religioso. a liberdade de religião assume uma importância muito grande numa Constituição Política verdadeiramente dirigida para o povo real que somos.
O homem real e concreto, para além da sua qualidade física, é também um ser profundamente espiritual. A liberdade religiosa consiste na imunidade a coacções por parte de indivíduos de Poderes Públicos ou grupos, de forma que «em matéria religiosa ninguém seja obrigado a agir contra a sua consciência, nem impedido de actuar de acordo com ela, privada ou publicamente, só ou associado a outros, dentro dos devidos limites».
A liberdade do homem é expressão da sua dignidade pessoal e só como pessoa livre pode desempenhar realmente o papel de protagonista no mundo político, isto é, nas decisões políticas - aquelas que dizem respeito à comunidade humana, onde se joga o destino último dos homens.
«Crentes e não crentes estão geralmente de acordo num ponto: tudo o que existe na Terra deve ser ordenado para o homem como seu centro e vértice.»
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Constituição Portuguesa não violará, certamente, os direitos do homem!
O direito dos cidadãos. de, individualmente ou em grupo, utilizarem os meios de comunicação social é neste projecto do artigo especificamente relacionado com as igrejas. E bem preciso é, como comprova o que para aí se tem feito!

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A nossa Constituição terá de garantir a não repetição dos casos «Rádio Renascença» e do jornal República.
Ora, sendo a missão das religiões essencialmente apostólica, não se compreenderia que lhes não fosse garantido o livre acesso aos meios de comunicação social para exercício do seu múnus.
A não ser assim, dificilmente se compreenderia a garantia de exprimir a liberdade religiosa através dos meios humanos como forma de contributo para o convívio e diálogo entre os homens de uma sociedade pluralista.
O povo português possui um património cultural adquirido por gerações, que temos o dever de preservar e orientar no sentido do convívio dos homens à luz da busca da verdade - pois «só a verdade nos libertará».
Termino com as palavras de Berngard Häring: «A sociedade moderna pluralista exige que os homens, para além das suas divergências no campo religioso, saibam tomar a sério os problemas da vida quotidiana e instaurem um diálogo verdadeiro, para encontrar soluções aceitáveis para todos. Para um diálogo fecundo é necessário evitar qualquer discriminação no plano da vida civil entre crentes e não crentes.»
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação. Vamos agora, então, proceder concretamente à apreciação do ponto n.º 1. Ninguém pede a palavra? Vamos passar à votação.
Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Relativamente ao n.º 2, há propostas na Mesa. Vão ser recordadas.

O Sr. Secretário: - Há uma única proposta do Sr. Deputado Luís Catarino, que vou ler.

Foi lida de novo.

O Sr. Álvaro Monteiro (MDP/CDE): - Não é proposta de emenda, mas sim de aditamento, sobre o ponto n.º 2. A outra é que é realmente de emenda.

O Sr. Presidente: - Está escrito « emenda», por isso é que nós lemos «emenda».

O Sr. Álvaro Monteiro: - Pois, mas naturalmente isso devia ter sido escrito pela Mesa.

O Sr. Presidente: - Possivelmente! Não o contesto.

O Sr. Secretário: - A Mesa classificou esta proposta de emenda e não de aditamento. Se verificar o Regimento, certamente concluirá que a Mesa tem razão. Em todo o caso, dirá de sua justiça.

O Sr. Sousa Pereira (MDP/CDE): - Não, não é assim, porquanto só sendo consideradas propostas de emenda é que podia à frente dizer que o n.º 2 passaria a n.º 3 e o n.º 3 a n.º 4.
Na verdade, há uma proposta de aditamento e, a seguir, uma proposta de ordenação.

O Sr. Presidente: - Vamos ver se nos conseguimos entender. O Sr. Deputado desculpe. É uma pergunta que vou fazer:
A vossa opinião seria de que este n.º 2 seria como está e seria acrescentado o texto proposto?

O Sr. Sousa Pereira: - Não, era o contrário. Nós aditávamos um novo número, o n.º 2, o n.º 2 da proposta existente passaria a n.º 3, o n.º 3 passaria a n.º 4 e o n.º 4 da actual proposta seria emendado, passando a n.º 5.

O Sr. Secretário: - A proposta é antecedida desta expressão.
O n.º 2 deve ter a redacção seguinte.

Propõe-se, portanto, uma nova redacção para o n.º 2.

O Sr. Sousa Pereira: - Bem, isso é uma interpretação da Mesa. De facto, a seguir diz: «O n.º 2 (e entende-se o n.º 2 da proposta) passa a n.º 3, o n.º 3 passa a n.º 4, o n.º 4 passa a n.º 5 ...»

O Sr. Presidente: - A questão está esclarecida. Só houve aqui uma certa confusão, aliás natural, mas creio que está esclarecida.
Há uma proposta de um novo número, que se seguiria ao n.º 1, obviamente. Mas é claro que havia motivo para a dúvida, visto que interpretámos como sendo substituição ao n.º 2.
Está, portanto, em apreciação.
Talvez seja melhor voltar a ler o que, portanto, seria um novo número.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação este novo número.
Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral (CDS): - - Era para dizer que, por nossa parte, não concordamos com este número, pelo facto de nele se incluir a expressão «direito de não aceitar qualquer religião ou opinião religiosa».
Entendemos que esta expressão, com a formulação que lhe é dada na proposta, se presta a ser invocada pelo Governo, ou pelas autoridades, como fundamento constitucional da propaganda do ateísmo, doutrina oficial do Estado.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação.
Vamos proceder à votação.
Submetido à votação, foi rejeitado, com 16 votos a favor e 7 abstenções.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Votámos a favor desta proposta de aditamento do MDP/CDE por duas razões: em primeiro lugar, por não nos convencermos, não vermos qualquer razão para a possibilidade da intervenção referida pelo Sr. Deputado Freitas do

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Amaral, do CDS, que a aditou como perigosa. Em segundo lugar, porque nos parece que o preceito proposto para aditar continha uma elemento importante, que era-a liberdade de não professar qualquer religião. Sabemos como a liberdade de religião é violada, e não só quando se impede alguém de praticar a sua religião, mas também quando se obriga alguém a praticar a religião que não tem.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes,(PS): - O Partido Socialista votou contra esta proposta, dado o facto de considerar que o seu conteúdo se encontra previsto no n.º 1 do artigo 27.º, onde se fala em liberdade de consciência. Em segundo lugar, por considerar que, no esquema desta Constituição, tudo aquilo que não é proibido é efectivamente permitido. Em terceiro lugar, não pode deixar de sublinhar a interpretação dada pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral, porque não vê, embora efectivamente tenha votado contra, como é que a partir daquele articulado é possível impor o ateísmo como filosofia oficial do Estado.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Pinto.

O Sr. Mota Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votei a favor, juntamente com alguns Deputados do Grupo Parlamentar do PPD, este aditamento, primeiro, porque nos pareceu existir na parte final um aditamento útil, quando se refere o direito de os cidadãos organizarem comunidades ou associações ou outros institutos com fins religiosos, que não está contido no texto do articulado da Comissão, ou pelo menos não está contido explicitamente. Creio que não estará mesmo contido de todo em todo. Por outro lado, na primeira parte entendo que a explicação aí feita, se pode, efectivamente, considerar contida na forma - liberdade de consciência ou religião -, só favorece a determinação concreta dos vários momentos que integram a liberdade de consciência e religião.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Está agora em apreciação o n.º 2 do texto proposto pela Comissão. Não há propostas na Mesa.
Vai ser posto à votação.
Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.
O Sr. Presidente: - Sobre o n.º 3 não temos propostas na Mesa.
Vai ser lido.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.

Pausa.

Vamos passar à votação.
Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Sobre o n.º 4 temos propostas na Mesa.

O Sr. Secretário: - Como não está o Sr. Deputado Luís Catarino, pergunto ao Sr. Deputado Sousa Pereira se também é aditamento.

O Sr. Álvaro Monteiro: - Esta proposta é de emenda.

O Sr. Secretária: - É de aditamento, portanto, de um novo número.

O Sr. .Avaro Monteiro: - Não, não. É emenda.

O Sr. Secretário: - É então uma proposta de emenda. É que, como esta redacção é idêntica à referida ao n.º 2, por isso, eu tinha dúvidas. Proposta de emenda do n.º 4.
Vai ser lida.
Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Trata-se de ura artigo novo.

O Sr. Secretário: - Na vossa opinião, o n.º 4 da proposta da Comissão continuaria ou seria substituído por este? Então, é emenda mesmo?
Pausa.

O Sr. Presidente: - Chamo a atenção dos Srs. Deputados do MDP/CDE para esta dúvida que vai ser posta agora.

O Sr. Secretário: - É que no final desta proposta continha-se a seguinte referência:
«O n.º 4 da proposta da Comissão passaria a n.º 5.> Dava, portanto, a ideia de que o MDP/CDE, aceitaria que fosse discutido e votado o n.º 4.

O Sr. Sousa Pereira: - Não. É que se tivesse sido aprovado o nosso aditamento, ponto 2, o n.º 2 da Comissão passaria a ser o n.º 3, o n.º 3 o n.º 4, etc.
Portanto, há mais um número.

O Sr. Secretário: - Mas então o n.º 4 não seria proposta da Comissão, como aqui se diz. Seria proposta do MDP/CDE.
Outro n.º 4.

Pausa.

O Sr. Presidente: - Portanto, então consideramos esta proposta como proposta de emenda ao texto proposto pela Comissão respeitante ao n.º 4 e é nessas condições que a proposta foi apresentada.
Está em apreciação.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente: Nós temos, respeitante ao n.º 4, uma proposta de eliminação. Se a Mesa for da mesma opinião, nós achamos que deve ser votada e discutida primeiro a proposta de eliminação.

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O Sr. Secretário: - A Mesa já discutiu esse problema, mas a eliminação que o Grupo de Deputados do PCP propõe é do actual n.º 4. É, portanto, do texto apresentado pela Comissão e não deste.
Dá a impressão que a introdução de uma nova proposta, com uma redacção diferente, prejudica para já a votação da nossa proposta de eliminação. Se a proposta do MDP/CDE não for aprovada, subsiste então o texto da Comissão e, nessa altura, será votado previamente a nossa proposta de eliminação.

O Sr. Vital Moreira: - Bom, a minha ideia era a seguinte: É de que há um erro de qualificação da proposta do MDP/CDE que é de eliminação do tal n.º 4 e do aditamento de um novo número. Mas de qualquer modo ...

O Sr. Presidente: - De qualquer modo foi indicado que era uma proposta de emenda.
Portanto, é nessas condições que é posta à votação.
Vai votar-se. É no sentido de substituição do n.º 4 proposto pela Comissão.

Submetida à votação, foi rejeitada, com 3 votos a favor e 21 abstenções.

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar a proposta no sentido de ser eliminado o n.º 4 proposto pela Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de eliminação não visa qualquer apreciação ou juízo acerca da doutrina consagrada nessa proposta da Comissão. Apenas entendemos que o seu lugar próprio é na disposição que era consagrar o dever do serviço militar. Até porque entendemos que a objecção «consciência», a ser consagrada, pode não respeitar estritamente a matéria religiosa, mas objecções de consciência que não sejam relacionadas estritamente com a matéria religiosa. A nossa proposta é, não de eliminação da doutrina, mas de eliminação desta disposição neste lugar, passando a respectiva discussão de consideração e votação para lugar próprio, que, a nosso ver, é a matéria de consagração do dever do serviço militar.
(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Está em apreciação a proposta. Ficou esclarecido que não há qualquer oposição â doutrina nela contida no artigo proposto pela Comissão, mas sim uma questão de oportunidade. O seu lugar seria noutro local.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só duas palavras para dizer que o artigo 27.º diz respeito não só à liberdade de religião. Diz também à liberdade de consciência. Como se costuma dizer, a objecção de consciência é a concretização e a afloração prática de um princípio de liberdade de consciência.
Portanto, afigura-se aqui assim o seu lugar próprio.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação. Vamos proceder à votação desta proposta de eliminação do n.º 4 proposto pela Comissão.
Submetida à votação, a proposta foi rejeitada, com 24 votos a favor.

O Sr. Freitas do Amaral: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Freitas do Amaral: - Sr. Presidente, eu queria fazer uma declaração de voto respeitante à votação dos vários números do artigo 27.º Não sei se é agora o momento.

O Sr. Presidente: - Se é respeitante aos vários números, seria melhor fazê-la, então, no fim. Não se esqueça de me chamar a atenção.
Agora vamos proceder à votação do n.º 4 do texto proposto pela Comissão.
Convinha tornar a ler.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Vai votar-se.

Submetida à votação, a proposta foi aprovada, com 3 votos contra e 21 abstenções.

O Sr. Presidente: - O n.º 4 proposto pela Comissão foi aprovado. Agora temos uma proposta de introdução de um novo número. Portanto, trata-se de um aditamento a este artigo. É do Grupo de Deputados do PCP. Vai ser lido.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.

O Sr. Vital Moreira: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O objectivo deste aditamento visa, entre outros, salvaguardar a constitucionalidade e a Lei Eleitoral, na parte em que ela proíbe que os ministros de qualquer culto participem na propaganda partidária, nessa qualidade etc. ministros de culto, seja em cerimónia religiosa, seja fora dela, mas nessa qualidade. Porque concordamos com essa solução, e porque nos parece importante que a Constituição salvaguarde a sua constitucionalidade, propusemos tal aditamento.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Está em apreciação o aditamento proposto.

O Sr. Lopes Cardoso (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Lopes Cardoso: - Sr. Presidente: O Partido Socialista pedia uma interrupção dos trabalhos. Como estamos próximos da hora habitual do intervalo, e

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por forma a não prejudicar, portanto, os trabalhos com duas interrupções, eu pedia a interrupção neste momento. Se o Sr. Presidente estivesse de acordo em conceder o intervalo habitual neste momento, também por forma a nós beneficiarmos da interrupção que pretendíamos, sem prejudicarmos o andamento dos trabalhos. Creio que todos os colegas estarão de acordo com esta fórmula.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Reabrimos a sessão às 17 horas e 30 minutos.
Está suspensa a sessão.
Eram 17 horas.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão, com um ligeiro atraso ao que tínhamos previsto.

Eram 17 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Prosseguimos na apreciação da proposta de aditamento que estávamos a discutir.
Alguém deseja usar da palavra?
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Até agora, ao discutir e aprovar os vários textos que compõem a Carta dos Direitos, Liberdades e Garantias Fundamentais dos Portugueses, esta Assembleia Constituinte não introduziu, em relação a nenhum deles, quaisquer limites expressos que pudessem porventura constar de uma cláusula mais geral. É certo que o PCP, coerentemente, tem proposto, em relação a muitos desses textos, cláusulas expressas, limitativas. Mas o facto é que a maioria da Assembleia Constituinte tem rejeitado uma tal técnica de formulação nos direitos e liberdades fundamentais dos Portugueses. Nesta conformidade, penso que nesta liberdade fundamental, que é a liberdade de consciência. de religião, não deve haver desvios à técnica seguida até agora. Esses desvios poderiam ter uma de duas interpretações. Poderiam significar que a Assembleia Constituinte se teme das religiões e tem uma atitude anti-religiosa, e isso seria mau, ou pode significar que a Assembleia Constituinte memoriza esta liberdade, que para nós é essencial também ao homem e ao cidadão.
Nestes termos, e tendo em conta, aliás, que a proposta apresentada pelo PCP é excessivamente fluida, fala-se aqui em política partidária, e o outro limite, aliás, é evidente, pois nenhuma liberdade pode ser exercida contra a Constituição, tendo em conta que o sentido da proposta e os termos ambíguos em que ela vem formulada, penso que é de rejeitar uma tal proposta.
(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral: - A nossa posição em relação à proposta apresentada pelo Partido Comunista Português é negativa. Em primeiro lugar, pelas razões que acabam de ser apresentadas pelo Sr. Deputado Barbosa de Melo e que nós também perfilhamos.
Em segundo lugar, porque é com base em formulações daquele tipo que nalguns países do Leste Europeu se têm aproveitado redacções aparentemente inofensivas para consumar verdadeiros atentados contra a liberdade religiosa.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem, a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há bocado, quando pedi a palavra, era para pedidos de esclarecimento. Não foi concedida na altura própria e no momento oportuno.
Aproveito, pois, para uma intervenção de resposta às intervenções que acabam de ser feitas.
Em resposta à intervenção do Sr. Deputado Barbosa de Melo, não cheguei a compreender se a sua oposição a este aditamento é apenas de técnica jurídica; e, nesse caso, eu perguntaria se, sim ou não, o PPD concorda com a doutrina contida no aditamento. E, se concorda, onde é que acha que ele esteja contemplado na Constituição.
Em relação à intervenção do Sr. Deputado Freitas do Amaral, como ela é coerente com outras posições de dizer nada sobre o assunto em causa, também não vou eu dizer nada sobre a intervenção do Sr. Deputado.
De qualquer modo, o que interessa saber é o seguinte:
É se sim ou não, se concorda com a doutrina aqui exposta.
Se sim ou não, se concorda com a doutrina consagrada na Lei Eleitoral, que diz expressamente que os ministros de qualquer culto não podem, nessa qualidade, intervir na campanha eleitoral.
O que se trata é de saber se a liberdade religiosa, sendo uma liberdade essencial, como é, pode ou não ser mal utilizada, em termos de deixar de ser liberdade religiosa para passar a ser, a coberto dessa liberdade, a violação de outras liberdades.
Este é que é o problema essencial: é de saber se sim ou não, se está de acordo com a doutrina e, estando-se de acordo, se se está de acordo ou não com a sua formulação constitucional. Nós não teríamos objecções em relação ao Sr. Deputado Barbosa de Melo se ele, em substituição da nossa redacção, propusesse uma redacção semelhante à da Lei Eleitoral, alargando-a para os períodos extra-eleitorais.
O Sr. Deputado Barbosa de Melo preferiu não propor essa substituição e argumentar, por razões de técnica jurídica, que isto não deveria ficar aqui.
Mas mantém-se o problema essencial: se sim ou não, à sombra da liberdade religiosa, e não tendo nada com a liberdade religiosa, se pode utilizar essa liberdade para violar outras liberdades.
Esta é que é a questão essencial.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Barbosa de Melo quer responder? Tem a bondade.

O Sr. Barbosa de Melo (PPD): - Quanto à pergunta que está feita, eu dar-lhe-ia uma pequena volta.
Não se trata de um problema de técnica jurídica pura. O problema está também em saber - e este já

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é um problema político - se a Constituição pode entrar neste domínio. É para mim evidente que há muitas pessoas que, em virtude do seu cargo na sociedade, se devem abster de usar as posições que têm na sociedade para intervir numa campanha eleitoral. Mas nem por isso está justificado que o diga expressamente na Constituição. Deixo isso à liberdade de cada qual e à consciência cívica de cada um.
Não são só os padres, que podem usar de uma posição relativamente influente na sociedade, que podem eventualmente condicionar um ou outro eleitor. São os professores, são os magistrados, são os militares. Quero dizer, há muitas e diversas situações na sociedade em que isso se pode verificar. Isolar aqui, e tratar aqui só dos problemas dos ministros das religiões, parece-me uma discriminação, que atenta contra o princípio da liberdade religiosa.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Carlos Cendal tem a palavra.

O Sr. Carlos Cendal (PS): - O Grupo Parlamentar do Partido Socialista debruçou-se na análise desta proposta e teve em conta, praticamente, todos os argumentos que aqui foram apresentados.
Desde logo entende que a proposta do Partido Comunista contém determinadas, passe a expressão, excrescências que seriam de eliminar.
Quanto ao seu núcleo principal, pode entender-se que se trata, não de uma limitação à liberdade religiosa, mas uma cautela quanto ao uso, quanto ao abuso da liberdade religiosa.
É certo que seria preciso acautelar outros abusos, os abusos, por exemplo, de determinados tipos de funcionários, que se poderiam servir tal e qual, como os ministros das religiões, se poderiam servir das suas funções para, abusando da sua posição, fazerem ilegítima propaganda partidária. Assim sendo, é pensável que esta proposta do Partido Comunista Português seja reformulável, restringindo-a, por um lado, e ampliando-a, por outro, vindo a constituir uma disposição inteira e autónoma deste artigo, que estamos agora, concretamente, a analisar.
É por isso que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista propõe e requer que a proposta do Partido Comunista, acompanhada destas diversas considerações, que aqui foram tecidas, baixe à Comissão para, em elenco restrito, ser devidamente analisada e ser devidamente reformulada, em termos de restrição ou em termos de ampliação ou em termos para pura e simplesmente de não aceitação pela Comissão, sem prejuízo de vir a ser reposta pelo Partido Comunista ou por outro partido qualquer tal e qual ou com alterações.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Miranda tinha pedido a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os pontos essenciais da questão já se encontram suficientemente discutidos. Já foi dito que, por um lado, o aditamento deste. número joga contra o sistema adoptado por esta Assembleia, ao regulamentar os direitos fundamentais. Já foi dito também que esse aditamento peca por defeito. Não são apenas os ministros da religião, e em largas zonas do nosso país isso cada vez mais se verifica, que podem pôr em causa o exercício concreto da liberdade política. Também podem ser os militares, também podem ser os dirigentes sindicais, também podem ser os dirigentes partidários, também podem ser numerosas categorias de funcionários. Eu pedi a palavra, no entanto, apenas para chamar a atenção para mais dois outros pontos: o primeiro é que muitas vezes se diz que, a pretexto da liberdade religiosa, se quer pôr em causa a liberdade política. Mas nós temos assistido no nosso país, e não- só agora, a certas tendências, ou certas tentativas, no sentido de dizer que não há questão religiosa, ou que não há problemas relacionados com a liberdade religiosa, com a intenção de remeter a religião para a sacristia e para ir atingindo, pouco a pouco, elementos essenciais dessa liberdade religiosa.
Pode dizer-se, assim, que muitas vezes, ao pretender-se negar certas manifestações da liberdade religiosa, apenas se pretende destruir certas manifestações da liberdade humana. Por outro lado, quando se diz, como foi dito, que a ausência desta disposição constitucional, proposta pelo Partido Comunista, inconstitucionalizaria a disposição da lei eleitoral, é fácil responder que tal não se verifica, que não é pelo facto de na Constituição não estar prevista uma disposição desse género que a disposição da lei eleitoral, cuja doutrina ninguém contestará, fica inconstitucional. Nem tudo o que não se encontra na Constituição é apenas por esse facto uma disposição contrária à Constituição, como é evidente.
(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Está na Mesa uma proposta no sentido de baixar à Comissão a apreciação desta proposta apresentada pelo Partido Comunista.
Vai submeter-se à votação a proposta, que diz que a proposta do Partido Comunista deverá baixar à Comissão.

Submetida à votação, foi aprovada, verificando-se 119 votos a favor, 68 votos contra e 1 abstenção.

O Sr. Presidente: - Portanto, a proposta vai ser enviada à Comissão, assim como se fez para os artigos 8.º e 9.º, e agradecia-se à Comissão que fizesse diligência para não demorar muito a apresentação do seu parecer.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Pinto.

O Sr. Mota Pinto (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É para uma breve declaração de voto. Votámos contra a baixa à Comissão deste artigo porque entendemos que ele devia ser imediatamente votado e no sentido da eliminação da proposta de aditamento apresentada.
Com efeito, a lei consagra a liberdade religiosa, a liberdade de consciência, e, por isso, põe-se aqui um problema a este propósito. É o problema de saber se as liberdades consagradas na Constituição devem ser limitadas. Tem entendido a maioria desta Assembleia que não se devem formular, especificamente, limitações aos vários direitos e liberdades, por se temer que a enunciação genérica e vaga dessas limitações venha

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a funcionar, na sua aplicação prática, como uma efectiva supressão das liberdades.
Poderia pensar-se na específica limitação da liberdade religiosa pelo impedimento da invasão do terreno político.
Já o meu colega Barbosa de Melo salientou que há outras posições de poder para além das entidades religiosas: organizações filosóficas, grupos de opinião, etc., constituídos para fins não imediatamente políticos, que podem desfrutar de uma apreciável influência política, e então, logicamente, também essas deveriam padecer da mesma restrição.
Em todo o exercício da liberdade religiosa há conotações políticas, e procurar efectivamente detectar todas as conotações políticas, todas as implicações políticas do exercício da liberdade religiosa para restringir esta, poderia, na prática, significar uma apreciável restrição dessa mesma liberdade.
O problema que se põe é apenas este: é o problema da limitação geral das liberdades consagradas na Constituição. Nós (PPD), no nosso projecto constitucional, tínhamos proposto uma limitação do exercício das liberdades pelo princípio do respeito pela ordem democrática.
Nós propusemos uma norma a inserir neste título constitucional, segundo a qual o exercício de todos os direitos e liberdades devia ser limitado pelo respeito da ordem democrática. Essa proposta, que estava no nosso projecto de Constituição, não está no articulado da Comissão. Mas nós entendemos que uma limitação geral neste sentido resulta da Constituição. Está imanente e emerge nas várias fórmulas que foram consagradas, sobretudo na parte preliminar da Constituição. Aí se diz várias vezes que a República Portuguesa assenta na soberania popular, no respeito pelos direitos e liberdades fundamentais, no pluralismo de expressão, que está baseada na soberania popular, que é um Estado democrático, etc.
Para nós existe no texto constitucional, expressamente e como resultado dos princípios imanentes aos preceitos constitucionais, uma limitação geral - de defesa da ordem democrática - a todas as liberdades, e para nós a limitação que deve haver à liberdade religiosa é esta limitação geral. Ela não pode ser exercida, tal como as outras liberdades, em termos de ofender a ordem democrática.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimento, pediu a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira: - Não foi para esclarecimento, Sr. Presidente, a não ser para pedir um esclarecimento à Mesa. A Assembleia acaba de votar que esta matéria seja baixada à Comissão, mas parece-nos que a intervenção do Deputado Mota Pinto teria imenso interesse feita na Comissão, ou posteriormente, se o problema aqui fosse novamente trazido. Não sei a que propósito foi produzida agora, depois de a Assembleia ter votado que o assunto volte á Comissão.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Houve uma votação e, portanto, houve uma declaração de voto. É perfeitamente normal.

O Sr. Mota Pinto: - Sr. Presidente: É para esclarecer que considero inexplicável esta intervenção, porquanto o uso da palavra foi por mim requerido para fazer uma declaração de voto, faculdade regimental que nada nem ninguém me poderá retirar.

O Sr. Presidente: - E assim foi considerado. Vamos, portanto, prosseguir a discussão; deixamos este aditamento para outra oportunidade, porque o artigo está aprovado, com exclusão do aditamento, de momento.
Vamos passar à apreciação do amiga 28.º, que vai ser lido.

Pausa.

Qual é o problema?

O Sr. Barbosa de Melo: - Faltam as declarações de voto sobre o conjunto dos números do artigo 27.º

O Sr. Presidente: - Efectivamente. Até tinha havido um pedido do Deputado Freitas do Amaral, no sentido de fazer uma declaração geral de voto sobre todo o texto do artigo. Até lhe tinha pedido que não deixasse de chamar a atenção. Portanto, há declarações de voto ainda pendentes a respeito da votação do artigo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral: - Eu tinha deixado essa declaração para quando votássemos o último ponto relativo a este artigo, mas não vejo qualquer inconveniente em o fazer já.
O CDS votou a favor dos preceitos do artigo 27.º, na certeza de que eles constituem uma pedra branca no texto desta Constituição, consagrando, no mais lato sentido, o princípio fundamental da liberdade religiosa. O CDS está certo de que, com base neste artigo - de redacção ampla, de espírito democrático, de horizonte aberto -, não será possível nem legítimo publicar leis em Portugal que coarctem ou cerceiem a independência das igrejas e comunidades religiosas, na sua personalidade jurídica, na sua autonomia de organização e funcionamento, nas suas liberdades de culto e de formação e constituição dos seus ministros, no seu direito de comunicação com as respectivas autoridades, nas seus poderes de construção ou levantamento de edifícios religiosos e, enfim, na sua capacidade de aquisição e utilização dos bens convenientes à prossecução dos seus fins.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Leite de Castro.

O Sr. Leite de Castro (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Declarações de voto - artigo 27.º:

O Grupo Parlamentar do Partido Popular Democrático votou os pontos do artigo 27.º do projecto proposta pela Comissão por entender que nele se sintetiza, claramente e sem lugar para subterfúgios, um regime jurídica fundamental para a liberdade de consciência, religião e culto em

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correspondência com o respeito devido pelo Estado a esta dimensão essencial da pessoa humana. O n.º 1 deste preceito declara a inviolabilidade da consciência,, da religião e culto em cada uma das pessoas, individualmente consideradas, incluindo obviamente o direito à liberdade de não professar qualquer religião e de manifestar isso mesmo.
O n.º 2 e o n.º 3 reconhecem às igrejas, comunidades e confissões religiosas em geral, em pé de igualdade, a liberdade de acção e de organização perante o Estado para o culto, para a formação dos respectivos ministros, para o ensino e para a difusão, por meios de comunicação social próprios, das respectivas doutrinas. Reafirma-se assim claramente o princípio da separação de poderes entre o Estado e as confissões religiosas, assegurando uma forma institucional que a experiência mostra ser o meio adequado para se evitarem as influências nefastas do poder civil sobre as igrejas e as influências nefastas das igrejas sobre o poder civil.
Dizemos no n.º 5 do artigo 20.º do nosso projecto de Constituição que «são reconhecidos especificamente às confissões religiosas, em condições de igualdade:
a) O direito de constituição e manutenção de estabelecimentos de educação e de utilização de meios de comunicação social próprios para o prosseguimento das suas finalidades;
b) O direito de dar assistência aos seus fiéis, incluindo os que se encontrem em estabelecimentos hospitalares e penais ou em serviço nas forças armadas, e de lhes dar enterramento nos cemitérios públicos;
c) O direito de comunicar livremente com as autoridades religiosas de dentro ou fora do País.»
Ora, o texto aprovado, nas suas fórmulas sintéticas, inclui todos estes direitos que nós tínhamos especificado - e aliás não só esses -, pelo que satisfaz as exigências que reputamos essenciais para uma correcta organização da comunidade política portuguesa.
Não quereria deixar também de declarar que votámos a particular especificação do direito à objecção de consciência prevista no n.º 4 deste artigo na certeza de que tal especificação em nada prejudica o princípio geral consagrado no n.º 1 deste artigo, que garante a todos a inviolabilidade de consciência. A chamada especial feita quanto ao problema do serviço militar explica-se par razões históricas conhecidas e pela circunstância de ser um caso exemplar de garantia da inviolabilidade de consciência.
Tenho dito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Embora a título exclusivamente pessoal, não posso, em consciência, deixar de fazer a seguinte declaração de voto sobre o conjunto dos números deste artigo.
A aprovação deste artigo marca mais um importante ponto de viragem na vida da comunidade portuguesa,
ao estabelecer uma independência real e recíproca entre o Estado e as igrejas.
Há muitos séculos que era tradição portuguesa tristíssima tradição, aliás - a intervenção constante do poder político na vida das comunidades religiosas e a inexistência de liberdade religiosa. Sem falar já das outras comunidades religiosas, a própria igreja católica foi utilizada através dos tempos pelos detentores do poder para atingir os seus objectivos - e quase todos eles pretendendo que as intervenções abusivas praticadas tinham em vista a defesa da mesma igreja.
Este regalismo começou na monarquia absoluta, na época da centralização do poder real, e manteve-se ou até mesmo se agravou na monarquia constitucional, em que a intervenção estatal na vida da igreja católica foi ao ponto de transformar praticamente os membros do clero em funcionários públicos e de proibir a circulação de documentos pastorais sem o beneplácito do Governo.
Embora a I República tivesse posto termo a esta situação, não se coibiu, no entanto, de limitar por outras formas alguns direitos da Igreja: lembremos apenas a expulsão das ordens e congregações religiosas e a intromissão abusiva na própria organização eclesial, nomeadamente através da imposição e regulamentação das chamadas associações de culto.
Da ditadura salazarista nem vale a pena falar: a Igreja foi instrumentalizada, numa primeira fase do regime; não se negue que, nesta fase, houve ligação recíproca entre a Igreja e o regime, mas não se esqueça que outras forças conhecidas também a mantiveram e vieram a prolongar a sobrevivência do regime opressor até muito mais tarde.
Através da Concordata, o Estado estabeleceu uma situação que, à primeira vista, seria de privilégio para a Igreja mas que, na prática, impedia a sua liberdade critica e criadora.
Assim, o Estado intervinha na nomeação dos bispos residenciais e coadjutores, e verificavam-se diversas outras intervenções que ficaram claramente demonstradas ao longo do tempo.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a partir da aprovação deste artigo marca-se um ponto de viragem fundamental: a Constituição vai consagrar uma nova era de real independência recíproca entre o Estado e as igrejas, nomeadamente a igreja católica. Resulta do texto aprovado que nunca mais será lícito ao Estado impor aos cidadãos por força, medo, ou qualquer outro meio, a profissão ou rejeição de determinada religião nem recorrer por qualquer modo à força para destruir ou dificultar a religião, mesmo que só em determinada região ou a grupo determinado da sua população.
Nunca mais impedirá quaisquer comunidades religiosas de se regerem segundo as suas próprias normas; não evitará a escolha, formação, nomeação e transferência dos próprios ministros; não impedirá a comunicação com as autoridades e comunidades religiosas de outras partes do mundo; não impedirá a construção de edifícios religiosos ou outros e a aquisição dos bens julgados convenientes; não impedirá o ensino e o testemunho público por palavra e por escrito da sua fé e certamente que também não virá a impedir a explicitação da eficácia especial das suas doutrinas

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para ordenar a sociedade humana e vivificar toda a actividade dos homens.
Quero também congratular-me com o facto, já aqui apontado, de não se entender a liberdade religiosa como o ditador Salazar e todos os outros ditadores, sejam eles quais forem, a entendem e como é, portanto, entendida em todos os Estados totalitários: a simples liberdade de culto ou de prática.
Com efeito, consagra-se, e bem, embora não com a redacção mais pormenorizada do projecto do meu partido, mas, como já foi dito pelo meu companheiro Leite de Castro, numa redacção que inclui a liberdade religiosa na sua plenitude, incluindo a liberdade de as confissões religiosas livremente se organizarem, ensinarem e disporem de meios de comunicação social.
Finalmente, penso que o reconhecimento da objecção de consciência é uma inovação relevantíssima e é mais um marco na construção de uma sociedade assente na pessoa humana, respeitadora da sua eminente dignidade, dos seus direitos e das suas liberdades fundamentais:
Tenho dito.

(O orador não reviu.)
Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Vamos passar então à apreciação do artigo seguinte, que vai ser lido.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 28.º

1 - É livre a criação intelectual, artística e científica.
2 - Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a protecção legal dos direitos de autor.

O Sr. Presidente: - Não temos propostas na Mesa relativas a este artigo, pelo que ponho em apreciação a texto proposto gela Comissão. Alguém deseja usar da palavra?
Tem a palavra a Deputada Sophia de Mello Breyner.

A Sr.ª Sophia de Mello Breyner (PS): - Peço a palavra para dar o meu apoio ao artigo 28.º e ao artigo 29.º.
Num país e num mundo onde há famílias sem casa e doentes sem tratamento e sem hospital a questão da liberdade de criação artística e intelectual pode parecer uma questão secundária.
Mas sabemos que a cultura influi radicalmente a estrutura social e a estrutura política.
E por isso a questão da liberdade da cultura é uma questão primordial.
E sabemos que toda a cultura real trabalha para a libertação do homem e que por isso toda a «cultura real é, na sua raiz, revolucionária.
E sabemos que não poderemos construir de facto o socialismo se não ultrapassarmos o uso burguês da cultura.
Pois a cultura não é um luxo de privilegiados, mas uma necessidade fundamental de todos os homens e de todas as comunidades.
A cultura não existe para enfeitar a vida, mas sim para a transformar - para que o homem possa construir e construir-se em consciência, em verdade e liberdade e em justiça. E, se o homem é capaz de criar a revolução, é exactamente porque é capaz de criar cultura.
Como disse Amílcar Cabral, na frase há dias citada por Manuel Alegre, «a revolução é um acto de cultura».
E é por isso que existe sempre uma profunda unidade entre a liberdade de um povo e a liberdade do intelectual e do artista.
Não é por acaso que o Chile é neste momento o país do Mundo onde há mais intelectuais presos.
No princípio da guerra de Espanha, na Universidade de Salamanca, o general Milan Astray gritou: «Morra a inteligência.» Este grito pertence à essência do fascismo.
Durante quarenta e oito anos a maioria dos escritores, artistas e intelectuais portugueses lutaram contra o fascismo. E ao lutar sabiam que não lutavam apenas pela sua liberdade, que não lutavam por uma «liberdade especializada», mas que lutavam pela libertação do povo a que pertencem e pela justiça e pela verdade da vida.
E a liberdade de expressão e de cultura, e nomeadamente a liberdade de crítica, é intrinsecamente necessária à busca e à construção da justiça. A justiça não se constrói com dogmatismos indiscutíveis, nem com maximalismos irreais, nem com demagogia, nem com cabotinismo cultural.
Precisamos de uma revolução culturalmente apta a fazer constantemente o seu exame de consciência. A verdadeira vigilância revolucionária é a lucidez revolucionária. Sem liberdade de crítica nunca se pode aprender verdadeiramente «a lição do errou. Sem liberdade crítica não há cultura verdadeiramente participante. A crítica é orgânica.
Somos um país que tem às costas séculos de inquisição e meio século de fascismo, com censura, prisões, escritores e pintores e intelectuais exilados, livros proibidos, exposições proibidas, projectos que nunca se ergueram.
E vivemos num tempo em que nos países totalitários do Leste e do Ocidente aqueles intelectuais que têm a coragem de falar têm expiado e expiam essa coragem nos campos de concentração, nas prisões, nos asilos psiquiátricos.
De tudo isto queremos emergir.
Queremos uma relação limpa e saudável entre a cultura e a política. Não queremos opressão cultural. Também não queremos dirigismo cultural. A política, sempre que quer dirigir a cultura, engana-se. Pois o dirigismo é uma forma de anticultura e toda a anticultura é reaccionária.

Vozes: - Muito bem!

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A Oradora: - O poder totalitário persegue o intelectual e procura manipular a cultura. A sociedade burguesa marginaliza a cultura, transformando-a em luxo.
Não aceitamos a cultura como luxo de privilegiados nem como superioridade de eleitos. O lugar da cultura é a comunidade. Ultrapassar o uso burguês da cultura e pôr a cultura em comum é uma tarefa essencial do socialismo. Mas esta tarefa é uma tarefa de invenção. E inventar é uma tarefa da liberdade.
Por isso, toda a população tem direito à inviolabilidade e à livre expressão das formas de cultura que lhe são próprias. Nenhuma forma de cultura se pode atribuir o direito de destruir ou menorizar outras formas de cultura.
Não podemos aceitar o paternalismo cultural.
A cultura dos trabalhadores rurais, dos pescadores, a cultura das aldeias longínquas, não é uma cultura menor. E se essa cultura está paralisada pelo isolamento, esmagada e traumatizada pela pobreza e em muitos aspectos mesmo já semidestruída, no entanto, ela permanece, na sua raiz, uma semente de revolução, pois é uma cultura não burguesa, uma cultura integrada no trabalho e na vida, uma cultura do comportamento humano. E o encontro com essa cultura nos ajudará a ultrapassarmos o uso burguês da cultura.
No artigo intitulado «Gente da esquerda, renovai-vos», Jean Marte Domenach, ao falar da renovação da esquerda, escreve:

Eu mantenho que este projecto exige uma conversão intelectual. Não se trata de opor um novo obscurantismo à ciência e à técnica, mas sim de nos subtrairmos ao seu domínio e às suas fatalidades. Pois não é só o capitalismo que devemos condenar, mas também a cultura que o propôs.

Dou igualmente o meu apoio ao artigo 29.º, pois o considero o corolário do artigo 28.º
A liberdade de ensinar e de aprender decorre naturalmente da liberdade de inventar e criar e divulgar. Aliás, aprender e ensinar não são apenas direitos, mas também deveres.
E, paralelamente, ensinar é pôr a cultura em comum, e não apenas a cultura já catalogada e arrumada do passado, mas também a cultura em estado de criação e de busca.
E numa época em que o ensino oficial é constantemente e justamente posto em causa é preciso que novas formas de ensino possam procurar, ensaiar e inventar.
E se queremos que o lugar da cultura seja a comunidade, temos de defender um ensino livre onde nenhuma iniciativa seja desperdiçada.
Não devemos temer os perigos da liberdade. O temor dos inimigos da liberdade e do uso que da liberdade possam fazer não pode levar-nos a destruir à partida a nossa pobre liberdade de inventar, imaginar, participar.
O socialismo será construído através da união entre intelectuais com todos os trabalhadores. Através de uma revolução cultural, que nos pede toda a nossa imaginação, que nascerá de formas de criação livremente críticas e, por isso, livre na sua participação.
Tenho dito.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação o texto proposto pela Comissão.
Ninguém pede a palavra?

Pausa.

Vamos proceder à votação do n.º 1.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o n.º 2.
Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Declarações de voto?

Pausa.

Excepcionalmente, não houve.

Risos.

Vamos proceder à leitura do artigo 29.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 29.º

É garantida a liberdade de aprender e ensinar.

O Sr. Presidente: - Vamos também ler uma proposta a seu respeito do Sr. Deputado José Augusto Seabra, do PPD. É uma proposta de substituição.

Foi lida. É a seguinte:

Proponho que o artigo 29.º passe a ser assim redigido:

São garantidos o direito e a liberdade de aprender e ensinar.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Augusto Seabra.

O Sr. José Augusto Seabra (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A modificação que eu introduzi, através de uma proposta, visa dar uma maior garantia, não só à liberdade, mas ao direito de aprender e ensinar. É que não basta querer a liberdade de aprender e ensinar, é também preciso que seja reconhecido o direito de cada qual poder aprender e poder ensinar.
Esse direito não se traduz apenas numa potencialidade formal, mas numa concretização dos meios aptos a permitirem, sobretudo àqueles que no nosso povo têm estado afastados da cultura, o acesso a todas as formas de conhecimento, a todas as formas de criação.
Acresce que se pode verificar por vezes que a liberdade de aprender e a liberdade de ensinar sejam coarctadas através do exercício de certos poderes do Estado.

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Para já não falar através de monopólios que dependam essencialmente de grupos culturais e sociais e até, evidentemente, de classes.
Eu queria, por exemplo, citar aqui um caso muito recente, em que a liberdade de aprender já está limitada no nosso país.
Essa liberdade por que nós lutámos cá dentro e lá fora.
O Ministério da Educação, da Investigação e da Cultura, creio que é assim que se chama agora, publicou recentemente um comunicado em que diz que não poderá dar o parecer favorável à frequência de cursos no estrangeiro, por certas razões, entre elas o facto de faltar ainda uma planificação das nossas necessidades. De tal modo que, alegando alguns candidatos a estudo no estrangeiro que não há cursos correspondentes em Portugal, o Ministério não é capaz de poder dar uma resposta, porque não sabe se, efectivamente, esses domínios interessam ou não ao povo português.
Mais. Alega-se que a saída para o estrangeiro acarreta um «prolongado afastamento das realidades sócio-políticas nacionais, o que representa uma importante lacuna para a posterior adaptação à nossa sociedade».
Srs. Deputados, Sr. Presidente: Que longe nós estamos de António Sérgio, que quando propunha uma Junta para promover os estudos no estrangeiro estava a permitir que se tivesse, talvez, evitado a implantação do fascismo no nosso país. Que longe estamos, efectivamente, dessa abertura ao mundo contemporâneo, em todos os aspectos em que hoje se está a verificar uma renovação no domínio científico, no domínio literário e no domínio artístico.
Posso dar um testemunho. Beneficiei indirectamente - foi o único benefício que tirei do meu exílio - do acesso a certos domínios que ainda hoje em Portugal, no plano, por exemplo, da linguística e da semiologia, não têm no nosso ensino um tratamento moderno, um tratamento aberto ao presente e ao futuro.
Por que é que se vem agora impedir, sob o pretexto de que ainda não há um planeamento, certos investigadores, certos dos nossos pintores, eventualmente certos dos nossos músicos, de irem ao estrangeiro buscar aquilo que nós, devido ao nosso subdesenvolvimento, ainda não lhes podemos dar?
Se nós não consagrarmos, ao lado da liberdade de aprender, o direito de aprender, que inclui, evidentemente, o direito de poder aprender em Portugal e no estrangeiro (porque a cultura não tem lugar, a cultura é universal), se nós não reconhecermos, de uma maneira clara, esse direito, estaremos a permitir, talvez, que um qualquer poder que se arrogue o monopólio da orientação, do dirigismo cultural no nosso país; venha a exercer a sua implacável lei sobre todos aqueles que aspiram à liberdade de aprender e, evidentemente, à liberdade de ensinar.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Manuel Moura.

O Sr. Manuel Moura (PS): - Sr. Presidente: Era só um pedido de esclarecimento ao orador. Eu queria perguntar ao Sr. Deputado José Seabra se entende que, portanto, esta liberdade que está aqui consagrada é para si o exercício de uma liberdade? Se isso não se pressupõe já, portanto, da liberdade de existir alguma coisa, que talvez um direito?

(O orador não reviu.)

O Sr. José Augusto Seabra: - Evidentemente! Mas eu quero ainda acrescentar um outro argumento. É que toda a gente sabe que em certos países, particularmente em países laicos, tem havido uma utilização da expressão «liberdade de ensinar» (por exemplo, o enseignement libre, em França) que tende a introduzir, efectivamente, uma defesa de privilégios por parte, até, de certas conversões religiosas, como poderá acontecer, também, no caso de certas opções ideológicas. Por isso, se nós, além do termo «liberdade de aprender e de ensinar», incluirmos o termo «direito», estamos, efectivamente, a defender também uma igualdade de todos os cidadãos no acesso ao ensino. Uma igualdade, pelo menos, potencial, porque, evidentemente, as condições económico-sociais que existem ainda não permitem essa igualdade, e ela não existe hoje, propriamente, em nenhum país, o que existe é uma tendência para essa igualdade. Portanto, nós teremos também que consagrar o direito, por exemplo, dos analfabetos a terem acesso à alfabetização, o direito dos trabalhadores a poderem ter acesso não só ao ensino primário e secundário, mas à Universidade. Teremos, portanto, através dessa formulação, não apenas um reconhecimento de uma liberdade, mas também um reconhecimento de um direito, que tenderá a concretizar-se cada vez mais.

O Si. Presidente: - O Sr. Deputado Vital Moreira pediu a palavra para esclarecimentos.

O Sr. Vital Moreira: - Dois pedidos de esclarecimento ao Sr. Deputado Seabra. O primeiro é o seguinte:
O Sr. Deputado considera que um decreto do Governo que estabeleça normas gerais, estabelecendo condições para a concessão de bolsas de estudo, para estudos no estrangeiro, considera que isso seria inconstitucional à base deste artigo, se fosse aprovado?
Segunda pergunta:
Pareceu-me deduzir das palavras do Sr. Deputado, nomeadamente da proposta de alteração ou de substituição, que considera que não basta ter a liberdade para ter o direito. É isso que o Sr. Deputado pensa?

(O orador não reviu.)

O Sr. José Augusto Seabra: - Quanto à necessidade de um planeamento no que diz respeito ao ensino, no que diz respeito à investigação, eu reconheço-a efectivamente, e essa necessidade impõe-se num país que tem certas prioridades fundamentais. Mas o que eu quis acautelar, através do reconhecimento constitucional de um direito, foi a utilização dessa forma de planeamento para impedir quem quer que seja de se deslocar ao estrangeiro com meios

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próprios ou fornecidos pelo Estado Português ou até pelo Estado que o convida. O que eu quis foi, portanto, evitar que o planeamento se transformasse em cerceamento da liberdade e do direito de aprender e, eventualmente, de ensinar, porque pode haver professores portugueses que também tenham necessidade, até pedagógica, de irem ensinar no estrangeiro. Agora o que eu não compreendo é que se venha alegar a falta de planeamento para impedir, efectivamente, alguém de ir especializar-se no estrangeiro. Porque é o que é alegado, nesse comunicado: apela falta, ainda, de uma planificação das nossas necessidades.»
Não se pode vir invocar o facto de não haver ainda um planeamento para impedir alguém que talvez esteja em avanço, em certo domínio, de poder permitir, até, que no futuro esse planeamento se traduza na prática.
No que diz respeito à segunda pergunta, evidentemente que a liberdade inclui o direito, e eu creio que o Sr. Deputado o sabe, pois já defendeu aqui várias vezes que o exercício de uma liberdade implica que essa liberdade seja a concretização de um direito, porque se não, nem é uma liberdade, nem é um direito.
Eu não entrei nesse problema, que deixo, efectivamente, à competência jurídica, eu que sou um simples leigo, apesar de licenciado em Direito, à competência jurídica do Sr. Deputado do Partido Comunista. Mas o que me parece é que a minha proposta de alteração ë positiva, na medida em que para além do reconhecimento de uma liberdade no acesso ao ensino, se reconhece esse direito a todos os cidadãos portugueses. E tal direito implica também meios, que depois poderão ser concretizados pela Comissão que vai apresentar uma proposta sobre os direitos económicos, sociais e culturais. Disso resulta, portanto, o reconhecimento de que é necessário que todos os portugueses tenham o direito de aceder ao ensino.

O Sr. Vital Moreira: - Apoiadíssimo!

O Sr. Presidente: - Para pedido de esclarecimento pediu a palavra o Sr. Deputado Romero Magalhães.

O Sr. Romero Magalhães (PS): - Não era um pedido de esclarecimento Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Não era? Então tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Miguel.

O Sr. Francisco Miguel (PCP): - Eu quero fazer considerações acerca do artigo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto mais simples nos parece uma norma e um artigo, mais problemas eles nos vêm aqui levantar.
Na terminologia da Constituição, nós dizemos em todos os artigos que a liberdade de consciência, religião e culto, como é o caso do artigo 27.º já aprovado, é inviolável, ninguém podendo por causa dela ser perseguido, etc.
Portanto, o que é que isto quer dizer? Quer dizer que nas zonas mais graves, como é o caso da liberdade de consciência, nós por forma nenhuma achamos que devia haver ou existir uma distinção, entre liberdade e direito, porque nos parece que essa distinção entre liberdade e direito é uma distinção completamente ultrapassada.
É uma distinção que vem, eu sei que não é esta a intenção do Sr. Deputado Augusto Seabra, finas de facto vem da Constituição de 33. Quando se dizia: há direito a isto, àquilo e aquele outro, há liberdade disto, daquilo e daquele outro, nos termos que a lei prescrever.
Portanto, havia a liberdade na Constituição e havia depois o direito, que era nos termos que a lei prescrevesse.
Como é que nós obviamos a isto: nós obviamos a isto, e apraz-me reconhecer que foi uma proposta do PPD, muitíssimo correcta, definindo o princípio da aplicação directa das leis.
E agora dirá o Sr. Deputado Seabra: pois muito bem, esta proposta que eu faço é pleonástica ou tem um sentido de expressão de reforço, mas nós já utilizámos várias expressões de reforço e vários pleonasmos na Constituição, e é mais um.
Pois eu devo dizer-lhe que este pleonasmo é perigoso e volta-se contra as concepções que o Sr. Deputado Augusto Seabra defende. Porque o intérprete futuro da Constituição não vai compreender porque é que no artigo 29.º nós falamos em liberdade e direitos e não falamos no artigo 27.º, que era muitíssimo mais importante. Portanto, nós consideramos que esta discussão; não tem razão de ser neste artigo, ou tinha razão de ser em todos os artigos. Isto permitiria, pura e simplesmente, a contrario sensu, dizer-se que no artigo 29.º a liberdade estava mais defendida do que no artigo 27.º, o que é um abuso.
Quanto aos pontos que especificou acerca de uma disposição do Ministério da Educação, Investigação e Cultura, pois se é assim como explica, isso é muito lamentável. Simplesmente, era o assunto talvez melhor para o período de antes da ordem do dia do que nesta altura, em que não vejo como uma norma, com este carácter geral, nós possamos fazer alguma coisa. Esta norma que nós queremos aqui consagrar, conforme ressalva da Constituição, diz respeito ao seguinte: àquele direito ou àquela liberdade de aprender e de ensinar que cabe a cada um de nós, quer sejamos professores, quer não; aquela liberdade que me permite, certamente, conviver com o Deputado Augusto Seabra, e que eu me transmito aos conhecimentos que efectivamente tem, e aquela liberdade que me permite, efectivamente, receber ou transmitir outros conhecimentos que eu tenha fora de instituições, escolas, etc.
Portanto, assim como nós consideramos que o direito de liberdade de consciências está defendido com a simples referência à liberdade, também temos que considerar que a direito de aprender e de ensinar também está absolutamente garantido com a simples conferência à liberdade. Daí que termino como comecei: a proposta do Sr. Deputado Seabra

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afigura-se-me redundante e, no caso concreto, perigosa, dado o facto de não ter sido utilizada idêntica terminologia em casos muito mais graves.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Romero Magalhães.

O Sr. Romero Magalhães: - Eu queria acrescentar apenas alguns aspectos não jurídicos que me parecem subjazer a esta disposição.
Para o Partido Socialista, neste momento, trata-se de liquidar o fascismo e trata-se de evitar toda e qualquer nova forma de totalitarismo, seja ele capital-burocrático ou social-burocrático.
O fascismo nunca permitiu liberdade de criação no ensino, temos vários exemplos, nomeadamente V. Ex.ª, Sr. Presidente, que durante dez anos esteve violentamente afastado da sua cátedra.
Perseguição a professores, que começaram logo em 1935 numa «leva, onde, entre outros nomes, vinha, por exemplo, o de Rodrigues Lapa. Depois foi o «livre, único», esse instrumento de massificação e de estupidificação. Por outro lado, foi a proibição aos professores de indicação de certos livros. Não esqueço, por exemplo, que a História da Literatura Portuguesa, dos Doutores António José Saraiva e Óscar Lopes, não podia ser citada por professores do ensino secundário. Isto era exactamente uma perseguição, uma limitação e uma violência contra a liberdade de aprender e de ensinar.
Mas se nós não queremos a regresso a nenhuma destas violências, também não queremos, de maneira nenhuma, que haja saneamento de alunos, como este ano se verificou, por pertença a um ou outro partido político. Que haja, talvez, anulação de termos de exame, depois de eles já terem sido realizados.
Também não queremos que voltem sobre qualquer forma os «Matosos» ou os «Lisenkos», por imposição e de aprendizagem obrigatória. Fundamentalmente, esta disposição não se destina a precaver os aspectos de organização do ensino, não vai ter qualquer implicação na liberdade de organização da Ministério da Educação e Cultura, ou Investigação, dêem-lhe o nome que venha a ter, mas, pelo contrário, vai apenas reforçar a criatividade, essa criatividade que só na plena liberdade de aprender e de ensinar pode ter sentido.

(O orador não reviu.)

A plausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Francisco Miguel.

O Sr. Francisco Miguel: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estou naturalmente com este artigo - liberdade de aprender e de ensinar. Acho muito interessante que nos ocupemos aqui deste assunto, porque, naturalmente, a liberdade para aprender e ensinar é magnífica, é uma necessidade para todos os homens e para todos os povos.
Mas, diferentemente de alguns Deputados, o que me preocupa a mim mais não é o caso de uma ou mais pessoas serem impedidas, em determinadas circunstâncias, de aprender ou ensinar o que desejam aprender ou ensinar. Eu não estou contra isso também. Não é isso que eu pretendo discutir, mas sim a dificuldade, a impossibilidade de aprender e de ensinar, dos filhos das classes trabalhadoras. Somos uma sociedade de pouca cultura, ainda com muitos analfabetos. E a nossa preocupação, nós que afirmamos aqui que queremos ir para o socialismo, será naturalmente defender os meios práticos de dar liberdade. E eu junto esse direito ao ensino, porque se não pensarmos nesse aspecto a nossa defesa aqui da liberdade de ensinar e de aprender pode converter-se em demagogia. Nós precisamos que o nosso povo aprenda. Precisamos de técnicos, procuramos que cada criança tenha escola, cada jovem tenha escola. Eu gostaria que esta afirmação que pomos aqui nesta Constituição - liberdade de ensinar e de aprender- pudesse vir acompanhada e assegurada da designação dos meios materiais para se poder aprender livremente, para se poder realmente aproveitar todas as pessoas e transformarmos o nosso país, do país mais atrasado da Europa que tem sido até agora por responsabilidade desses dirigentes, transformá-lo num país de cultura. A cultura que aqui tem sido reclamada e evocada justamente deve entender-se como «meios» para nós nos cultivarmos. E não é apenas como brilho, como instrumento que pode ser aproveitado apenas por uma minoria da sociedade portuguesa que a cultura deve interessar. Tenho pena, e não proponho, porque não será aceite, que se acrescente: liberdade e direito de ensinar e aprender garantida por isto, isto e isto, como existência de escolas, existência de bolsas para os filhos de todas os pobres, etc.
De forma que eu queria fazer este reparo e deixar para outros as preocupações de algumas pessoas que queiram aprender isto ou aquilo, no estrangeiro ou algures, pois vejo, momentaneamente, alguma dificuldade, talvez. Se não é no nosso caso, é noutro; a prioridade, o interesse geral, o interesse dos povos, o interesse da classe trabalhadora, se põe em primeiro lugar, às vezes com prejuízo dessas aspirações burguesas individuais, que não contam para o desenvolvimento da sociedade.
Tenho dito.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Romero de Magalhães pediu a palavra para esclarecimentos.

O Sr. Romero de Magalhães: - O esclarecimento apenas que queria dar ao Sr. Deputado era que, no entender do Partido Socialista, todas essas preocupações são as nossas, mas, simplesmente pela sistematização adoptada, terão de vir no título seguinte, e não neste.

(O orador não reviu.)

Uma voz: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

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O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que o Partido Socialista mais uma vez, coerentemente, defendeu que este capítulo das liberdades não deve misturar-se com direitos, pela simples razão que não se devem misturar coisas de qualidade estrutural diferente.
O PPD por vezes esquece-se disto. Esquece-se que a posição que manteve com alguma coerência é a da concepção liberal-burguesa das liberdades, e, portanto, não há que misturar liberdades com direitos.
Sr. Deputado José Seabra, devo prestar-lhe exactamente aqui o meu reconhecimento, por, certamente, descuidada e inconscientemente, ter produzido, ao fim e ao cabo, uma parte a este propósito da liberdade de aprender e do direito de aprender, uma parte da argumentação que, nós aqui, persistentemente também, sem qualquer êxito, temos vindo a produzir, se por o facto de vir da sua parte obtiver êxito, nós não deixaremos de aprovar, só por o facto de vir de quem vem. Aprovaremos, porque achamos que a posição está correcta. Simplesmente, porque achamos que a liberdade de aprender não implica só por si o direito de aprender, achamos que a liberdade de expressão não dá desde logo o direito às massas trabalhadoras de se exprimirem; achamos que a liberdade de reunião não dá desde logo o direito de se reunirem; achamos que a liberdade de manifestação não dá desde logo o direito de se manifestarem; achamos que, em geral, todas as liberdades, só por si, não dão àqueles, para quem não basta ser titular dessas liberdades, a possibilidade de as exercerem.
Estamos de acordo, apenas chamamos a atenção para a incoerência.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues.

O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao consagrarmos na Constituição este princípio genérico da garantia da « liberdade de aprender e ensinar» não posso deixar de, como professor, convidar todos os Srs. Deputados a uma reflexão sobre tão importante matéria. .É de facto apenas um convite à reflexão sem quaisquer pretensões de originalidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Formulo perante VV. Ex.as a pergunta ou perguntas que a mim mesmo me tenho posto centenas de vezes ao deparar com alunos, em diferentes idades e graus de ensino, aparentemente menos dotados. Eis a pergunta: A que se deve o desfasamento de tais alunos?
Vou ocupar-me, Sr. Presidente e Srs. Deputados, sumariamente de duas causas que a minha experiência me tem permitido registar.
A primeira é a pobreza material e cultural do meio sócio-económico de onde o aluno é proveniente. A criança que não teve condições materiais e culturais para o seu desabrochar parte atrasada para o amadurecimento e realização humana. Ora, a sociedade capitalista, para além de profundamente injusta, tem ainda processos requintados para tranquilizar as consciências. Infelizmente, muitos professores, mesmo alguns dos que se reclamam de revolucionários, estão alheios ao problema. É que, partindo-se do princípio simplista de que basta garantir a cada um ir até onde lho permitam as suas faculdades, escamoteia-se o problema fundamental, que é o da desigualdade de faculdades, proveniente, em grande parte, das diferenças económicas, sociais, culturais e outras.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - O programa do Partido Socialista é bem claro neste ponto. Depois de enunciar alguns princípios ideológicos dá educação e da cultura, acentua (passo a citar): «Tendo em conta que um dos objectivos fundamentais de uma revolução socialista é a formação de uma sociedade sem classes, entende o Partido Socialista que, para uma autêntica democratização do ensino, é necessário alterar todo o condicionalismo sócia-económico e sócio-cultural do País» (fim de citação).
Num País como o nosso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, em que as desigualdades sociais são gritantes, é baixíssima a percentagem dos filhos dos trabalhadores manuais que chegam às Universidades. Daí que os professores - falo agora especificamente dos do secundária- provenham, na sua esmagadora maioria, da burguesia. Daqui lanço a todos os meus colegas professores um apelo no sentido de se comprometerem de alma e coração na construção da sociedade socialista portuguesa, para que a autêntica cultura em Portugal não mais seja o privilégio exclusivo dos que nasceram em berços doirados.
Esta a primeira causa que explica muitos dos fracassos escolares. E, se a enunciei em primeiro lugar, foi apenas porque, como socialista, não poderia deixar de ter opções de classe bem definidas e determinadas. Em Portugal, a barreira que separa os privilegiados dos desprotegidos estes em proporção gigantesca em relação àqueles - só dela se não apercebe quem deixou embotar por completo a sua sensibilidade ou padece de gravíssima miopia mental.
E passo à segunda razão. Ao falar acima dos alunos «menos dotados» intencionalmente juntei um advérbio: «aparentemente». É um outro ponto para reflexão de todos nós: a nossa, sociedade tem privilegiado a inteligência teórica sobre a prática, o saber abstracto sobre o concreto. E isso cava um abismo entre o trabalho intelectual, considerado mais digno, e o trabalho manual, ainda quase menosprezado. Em vez de o trabalho ser tomado em si mesmo, como fonte de realização da pessoa e do homem colectivo, há tipos de trabalho: o trabalho nobilitante, que confere categoria social - é õ trabalho dos «doutores» -, e o trabalho desprestigiado socialmente - é o trabalho dos operários e camponeses.
Só abatendo as estruturas da sociedade capitalista, desaparecerá a distinção entre o saber teórico e o saber prático, entre o trabalho intelectual e o trabalho manual. Mas essa actuação ao nível das estruturas sócio-económicas tem de ser acompanhada desde já ao nível do ensino, do desabamento dessa falsa barreira. Só assim será possível orientar cada aluno para a profissão mais concordante com as suas aptidões intelectuais, possibilitando-lhe a cabal realização da personalidade individual no desempenho das tarefas sócio-profissionais ao serviço da colectividade.

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Vou terminar por um voto:
Que o ensino em Portugal passe a ser de facto para todos os portugueses e para cada português todo, isto é, que vise a criação de um homem novo, bem diferente do aleijão produzido pela sociedade capitalista.
E remato com mais uma citação do, programa do Partido Socialista:

O ensino tem de ser acção dirigida especificamente à transformação do homem e à conquista por este dos meios que lhe permitem compreender a sociedade que o rodeia e actuar sobre ela.

Tenho dito.
Aplausos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Deputado José Augusto Seabra, para uma segunda intervenção.

O Sr. José Augusto Seabra: - A intervenção do Deputado do Partido Socialista mostrou à evidência, e eu aplaudo-a, que efectivamente é necessário consagrar também o direito ao ensino. Mas, eu, sem entrar em argumentos de ordem jurídico-constitucional, apenas quero lembrar que efectivamente em vários artigos da Constituição há referência ora a direitos ora a liberdades. Por vezes, fala-se mesmo de direito de ter uma certa liberdade, como é o caso da liberdade de expressão. E eu não vejo que, efectivamente, qualquer purismo de linguagem constitucional seja mais forte do que a necessidade de uma clarificação, sobretudo porque a Constituição Política vai ser objecto de leitura de todos os cidadãos e não apenas da exegese dos constitucionalistas ...

Uma voz: - Muito bem!

O Orador: - ... E eu queria mesmo dizer o seguinte: Tenho-me recordado, várias vezes, de um verso de Camões, quando fala de «sofistas que me ensinaram maus caminhos por direitos». A mim não me interessam, efectivamente, problemas de carácter sofístico, a mim o que me interessa é que um direito seja reconhecido aqui. E parece-me que, de facto, a minha proposta acrescenta algo e eu, portanto, não prescindo dela. Mas, se os argumentos do Deputado José Luís Nunes foram pertinentes, e eu até posso aceitar que do ponto de vista da sua lógica eles o são, a verdade é que liberdade aqui engloba o direito e podia, até, ser sinónimo de direito. Simplesmente, os exemplos que eu dei, na minha primeira intervenção, é que vão no sentido de nós reconhecermos, não apenas, efectivamente, as liberdades, não aperras, efectivamente, o direito, mas tanto o direito como a liberdade. Porque os casos que eu citei são casos possíveis que vão contra a liberdade e, portanto, presumo que se podem retirar certas consequências de factos que apenas poderão ser exemplos premonitórios, até, do que se virá a passar no futuro. Eu, tirando as conclusões das possibilidades de limitações, quer ao direito quer à liberdade, penso que ficaria mais claro o artigo, se consagrassem simultaneamente os direitos e as liberdades, independentemente do facto de as liberdades se poderem subsumir nos direitos ou os direitos nas liberdades.

O Sr. Presidente: - Ninguém está inscrito. Vamos, portanto, proceder à votação desta proposta de substituição.
Vamos lê-la outra vez.

Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Portanto, vamos pôr à votação esta proposta de substituição do artigo 29.º
Submetida à votação, não obteve o quórum indispensável, verificando-se 81 votos a favor e 2 abstenções.

O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à votação do artigo tal como foi proposto pela 2.ª Comissão.
Submetido à votação, foi aprovado, com 1 abstenção.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo para uma declaração de voto.

O Sr. Barbosa de Melo: - No momento da aprovação do artigo 29.º do projecto da 2.ª Comissão, o Grupo Parlamentar do Partido Popular Democrático não quer deixar de sublinhar o alto significado político do princípio que passou assim a constar da carta dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos portugueses.
O texto constitucional agora aprovado constitui, no quadro de uma concepção democrática da sociedade e do Estado, um natural corolário da doutrina que foi consagrada no n.º 1 do precedente artigo 28.º Se a liberdade de criação intelectual, artística e . científica torna absolutamente ilegítimas restrições, ameaças, coacções e violências sobre a pessoa humana no que concerne-à sua vocação essencial de interrogar, pesquisar e dominar pela razão e pela arte o mundo e a vida, a liberdade de ensinar e aprender garante que esse mesmo princípio seja o axioma primordial das relações entre os que ensinam e os que aprendem no nosso país. Deste modo serão definitivamente expulsos do horizonte da nossa comunidade política certos «Adamastores» que, ao longo dos tempos e tolhendo a vista aos gajeiros da caravela portuguesa, teimam em embaraçar a nossa descoberta maior - e é a descoberta de nós mesmos, como povo que vai, livre de maquinações e alheio a favores, por uma rota própria e autónoma na caminhada moral e intelectual da humanidade. Quisemos hoje solenemente pôr fim aos dogmatismos de todas as raízes, às verdades feitas em cima e de cima impostas, às ortodoxias vigilantes, aos monopólios do saber, aos farisaísmos e às bíblias de qualquer procedência, proclamando o princípio activo da liberdade no inquirir e ensinar, no interrogar e aprender de todos os portugueses, proclamando que a nossa história viva se tem de fazer e refazer na livre criação e transmissão das ideias, pela livre investigação e invenção do nosso destino, através de uma

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liberdade de discussão e de crítica que há-de ir de homem para homem, de grupo para grupo, de geração para geração.
Os representantes do povo na Assembleia Constituinte acabam de dizer solenemente, numa palavra, que não querem entre nós mais «Galileus» humilhado, seja qual for a arte, ciência nu saber que cultivem e ensinem, seja qual for a mesa censória que ouse decretar que «o sol anda e a terra está parada».
O Grupo Parlamentar do Partido Popular Democrático faz neste momento também um voto - o voto de que os responsáveis pela educação, pela investigação e pela cultura no nosso país se apressem a tirar todas as consequências da declaração solene que os representantes do povo acabam de fazer na Assembleia Constituinte. É urgente, urgentíssimo, sobre tudo que o Ministério da Educação e Investigação Científica honre esta declaração e faça entrar o princípio da liberdade de espírito nas instruções e circulares que difunde, nos programas e livros que aprova ou recomenda, nos critérios por que recruta os professores das escolas e por que selecciona ou deixa seleccionar os alunos que as frequentam. Retardar uma emenda destas na política educativa, cultural e científica posterior ao 25 de Abril significa pactuar com um obscurantismo crasso, antes imposto em nome de um nacionalismo estreito e de um cristianismo descristianizado, porque ideológico, e hoje sobrevivo por força de um messianismo «cientista» e anticientífico, por ser dogmático, por ser mágico e oracular.
Retardar uma reforma desta persistente mentalidade governante equivale, numa palavra, a deixar subsistir uma estrutura mental opressora da liberdade pessoal de cada um e, por isso, asfixiante da criatividade do povo português.
Tenho dito.

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Ninguém mais pede a palavra?

Pausa.

Vamos proceder à leitura e subsequente apreciação do artigo 30.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 30.º

1- A todos os cidadãos é garantido o direito de se deslocarem e fixarem livremente em qualquer parte do território nacional.
2 - A todos é garantido o direito de emigrar ou sair do território português e de regressar.

O Sr. Presidente: - Não há na Mesa propostas de alteração, de forma que pomos à apreciação o próprio texto da Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente: Pretendia que um membro da Comissão que elaborou esta proposta feita ao plenário, me esclarecesse se o artigo 30.º,
n.º 2, tem, como consequência, a inconstitucionalização das leis que regulam o direito da emigração.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes: - Pois é evidente que o n.º 2 do artigo 30.º não tem como consequência inconstitucionalizar as leis que regulam o direito da emigração. O n.º 2 do artigo 30.º tem um objectivo, que é o seguinte: é o de permitir que qualquer português possa emigrar para o estrangeiro. Dir-se-á, mas os Portugueses não terão o direito de emigrar para o estrangeiro? Não estará a Europa cheia de portugueses emigrados? Está efectivamente, mas há duas concepções, acerca da emigração, diferentes e contraditórias. Uma, é a de que, para eliminar os males sociais que estão na base da emigração, há pura e simplesmente que proibir a emigração. É essa concepção vigente nos países de Leste, a que nós, neste articulado, nos desejamos opor. Há uma outra concepção que é esta: é que simultaneamente, com a melhoria das condições de vida do povo português, é necessário que cada cidadão saiba que é seu direito, se assim o entender, procurar melhores condições de vida noutras terras, sob outras bandeiras e que a emigração só se combate eficazmente melhorando as condições de vida dos Portugueses e não pondo em causa ou proibindo esse direito. Este é um facto. É evidente que a lei deve determinar aquelas disposições necessárias para que o emigrante não seja objecto de especulação no mercado do trabalho ou de abuso. E é por isso que são legítimas e constitucionais aquelas disposições que visam orientar o emigrante na escolha do país para onde deseja partir, que visam efectivamente, para além de orientar o emigrante, facilitar a emigração com segurança e que visam combater o domínio daqueles homens que caem sob a lei penal e que são a nova forma dos negreiros, que são os engajadores. Portanto, nós temos que ter estas duas ideias com muita clareza. Em primeiro lugar, reconhecer o direito de emigração claramente e sem subterfúgios; depois, que a lei comum estabeleça as normas que, sem porem em causa esse direito, possam defender o emigrante contra todos os abusos de que possa ser vítima.
É este o sentido que eu e os meus colegas da Comissão, de todos os partidos, entenderam dar a esta disposição.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação.

Vamos proceder à votação do ponto n.º 1 deste artigo, que vai ser lido novamente.

Foi lido de novo.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

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O Sr. Presidente: - Vai ser lido o n.º 2.

Foi lido de novo.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos dar agora a palavra para declarações de voto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Oliveira e Silva.

O Sr. Oliveira e Silva (PS): - O Partido Socialista é particularmente sensível à aprovação do n.º 1 e não pode, por isso, deixar de exprimir o seu júbilo pelo consenso que ele obteve deste plenário.
Ao consagrar-se o direito de livre circulação, ficará arredada a eventualidade de que se voltem a opor barricadas à circulação de militantes do Partido Socialista ...

Risos.

... como aconteceu no mês de Julho, quando se dirigiam para o grande comício-manifestação que se realizou na Alameda de D. Afonso Henriques, entre outros, com o fim de obter o respeito pela vontade popular.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, ao fixar-se o direito de livre fixação em qualquer parte do território nacional, ficarão para sempre afastadas medidas repressivas, como aquelas que o Governo fascista adoptou para com o nosso secretário-geral, Mário Soares, ao fixar-lhe residência em S. Tomé.

(O orador não reviu.)
Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Mais alguma declaração de voto?

Pausa.

Sobre o artigo 31.º há uma proposta na Mesa.
Vamos ler o texto do artigo e essa proposta.
O Sr. Secretário: - Vai ser lido o n.º 1 do artigo 31.º

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 31.º

Os cidadãos têm o direito de se reunir pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização, cabendo à lei regulamentar o seu exercício.
O Sr. Presidente: - A proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral é de alteração - de alteração são todas -; vejamos a leitura, pois ainda não foi feita, para se ver qual é a categoria de alteração.

Foi lida. É a seguinte:

ARTIGO 31.º

1. Os cidadãos têm o direito de se reunir pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.
O Sr. Secretário: - Portanto, o n.º 1 eliminava a última expressão do texto que era: «cabendo à lei regulamentar o seu exercício».
Há um novo número, que é o n.º 2:
A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.

O Sr. Freitas do Amaral: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Freitas do Amarai: - Essa proposta tem dois objectivos, ambos de carácter meramente técnico. O primeiro é o de incluir num mesmo artigo duas realidades afins: o direito de manifestação ou é uma pura modalidade ou direito de reunião, ou é qualquer coisa de muito próxima e não se justifica que seja tratado num artigo separado e, muito menos, num artigo tão distanciado, como o era no artigo 35.º da proposta da Comissão. O primeiro objectivo é tratar das mesmas realidades no mesmo preceito. O segundo objectivo é eliminar de ambas as disposições a referência de que cabe à lei regulamentar o exercício destes direitos, liberdades e garantias, tratados nos artigos precedentes, mas não foi expressamente formulada em relação a todos eles.

(O orador não reviu.)

O Sr. Vital Moreira: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Vital Moreira: - Nós concordamos com a reunião do mesmo artigo do direito de reunião e do direito de manifestação, porque a manifestação é uma reunião qualificada. Discordamos, no entanto, de um asserto do Deputado Freitas do Amaral. É que, na realidade, também nos artigos anteriores se propôs idêntico aditamento, cabendo à lei regulamentar o seu exercício, não digo em todos, mas disse em alguns. Esse aditamento foi proposto nomeadamente pelo Partido Comunista Português em relação a dois artigos. Como desde logo foi acusado de querer pôr aqui formulário da Constituição de 1933, o Partido Comunista deixou pura e simplesmente de fazer propostas de aditamento semelhantes. O que acontece é o seguinte: agora vem o Sr. Deputado Freitas do Amaral, coeren-

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temente e logicamente, dizer o seguinte: pois se em relação a artigos que claramente necessitam, como é, por exemplo, o direito de emigração, não se acrescentou isto. A que propósito é que se vem agora pôr esse acrescento a respeito de outros direitos? Mas, entretanto, é preciso dizer o seguinte:
É que lá atrás aprovámos um artigo, segundo o qual «pode ser restringido», se não estou em erro, «excepto nos casos em que a Constituição expressamente o previr».
O que quer dizer que tirámos daqui este aditamento: cabendo à lei que venha dizer, por exemplo, que não se podem fazer manifestações na cidade das 3 às 4 horas da tarde, o que seria inconstituicional.
Tenho dito!

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Freitas do Amaral.

O Sr. Freitas do Amaral: - Eu queria pedir dois esclarecimentos ao Sr. Deputado Vital Moreira. O primeiro é este: Não será verdade que eu não disse que não tinham sido feitas propostas aqui quanto à inclusão de referências à regulamentação do exercício de direitos, mas que disse apenas que, em preceitos anteriores que consagram direitos que é necessário regulamentar, a referência à necessidade dessa regulamentação não foi aprovada pela Assembleia?
Segundo pedido de esclarecimento: Não é verdade que são coisas diferentes a restrição de direitos, liberdades e garantias, efectivamente referida num preceito anterior já aprovado, e a regulamentação do seu exercício pela lei?

(O orador não reviu.)

O Sr. Vital Moreira: - Quanto ao primeiro pedido de esclarecimento, é certo, e a minha objecção visou apenas obter do Sr. Deputado Freitas do Amaral esta concretização.
Quanto ao segundo pedido de esclarecimento, confesso desconhecer tal divisão entre uma coisa e outra.
De qualquer modo, talvez o Sr. Deputado me possa ajudar, dizendo se a actual lei de reunião ficará ou não inconstitucionalizada se retirar daqui o aditamento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o. Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes: - Antes de mais, acho que nos devemos congratular com o método de debate que escolhemos para esta Constituição.
Não há dúvida nenhuma de que as coisas vêm da Comissão devidamente podadas, mas não tão bem podadas que não possam aqui sofrer melhoramentos.
Este é o primeiro ponto que me parece importante sublinhar.
O segundo ponto é este: é que eu fiquei impressionado com a intervenção do Sr. Deputado Vital Moreira, antes desta intervenção, e sossegado, depois desta intervenção. É que se o Sr. Deputado Vital Moreira
não conhece a diferença entre regulamentação e restrição, houve por bem esta Assembleia, e fez muitíssimo bem, em eliminar aquelas propostas de aditamento em que o Sr._ Deputado Vital Moreira propunha a regulamentação.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Este é o outro ponto.
Agora vamos lá ver a proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral.
Nós aderimos à proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral. No entanto desejava dizer algumas palavras acerca dos motivos que levaram a Comissão a pôr em último lugar o artigo 35.º E essas palavras até se podem consubstanciar numa certa autocrítica: a Comissão colocou em último lugar o direito à manifestação, de acordo com aquela concepção de que, hoje em dia, a melhor doutrina começa a autonomizar, efectivamente, o direito de manifestação do direito de associação. O direito de associação será uma forma de discussão e de debate, ou pressuporá o debate; a manifestação pressuporá o acto de vontade.
Ora, é evidente que esta autonomização, que é feita pela doutrina, não entrou de forma nenhuma, ou de forma suficientemente intensa, nos nossos hábitos para que as pessoas não associem associação a manifestação. De modo que é um dos tais casos em que, efectivamente, a proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral tem toda a razão de ser.
Quanto à eliminação, cabendo à lei regulamentar o seu exercício, estamos de acordo também nessa eliminação.
Seja-me permitido também dizer por que é que pusemos esta lei a regulamentar o seu exercício. É que nos debates da Comissão veio ao de cima aquela ideia de que os direitos de manifestação, sobretudo, e de associação seriam aqueles que por sua própria natureza pressuporiam a necessidade de uma maior regulamentação. Mas, na verdade, pois, dado que terá de haver necessariamente uma regulamentação em =relação a outros direitos que não pode pôr em causa ou restringir o conteúdo essencial e o efeito desses direitos, pois, parece que não há dúvida nenhuma, dentro da lógica, terminológica que temos seguido até aqui, em seguir também a proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral e eliminar a expressão «cabendo à lei regulamentar o seu exercício» por meramente redundante.
Portanto, é evidente que aquilo que hoje em dia está vigente em relação ao direito de associação ou de manifestação só será inconstitucionalizado por esta norma na medida em que puser em causa o conteúdo útil de direito ou implicar uma restrição. Neste sentido, parece que as propostas do Sr. Deputado Freitas do Amaral são absolutamente pertinentes e nós damos o nosso apoio.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação.
O Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (PPD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós damos também o nosso apoio à proposta apresentada pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral.

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Não apenas por entendermos que o texto do projecto de Constituição fica substancialmente melhorado com a proposta do Sr. Deputado Freitas do Amaral, como também por entendermos que há toda a razão para remeter para o princípio geral, em matéria de regulamentação, tudo quanto diz respeito à liberdade de reunião e à liberdade de manifestação. Neste sentido, entendemos que se justifica pôr numa única disposição a matéria do direito de reunião e do direito de manifestação e entendemos que não há lugar para aqui, especificamente, dizer que cabe à lei regulamentar essa liberdade de reunião e a liberdade de manifestação. Talvez este artigo da Constituição pudesse ser enriquecido com algumas normas que se encontram na lei da liberdade de, reunião. Mas estamos convencidos de que essa lei, que representa uma importante conquista democrática, continuará a vigorar e, sobretudo, passará a ser aplicada com mais determinação pelas autoridades públicas.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação. O Sr. Deputado Vital Moreira tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi aprovado num artigo, era o 6.º, um articulado proposto pela Comissão, onde se diz que «as leis restritivas das direitos, liberdades e garantias terão de revestir sempre o carácter geral, em abstracto e em caso nenhum poderão diminuir a extenção e o alcance da conteúdo essencial dos preceitos constitucionais». E no número anterior dizia-se: «A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos nesta Constituição». Das duas uma: ou efectivamente é possível restringir os direitos, salvaguardando o seu conteúdo essencial, e para isso de acordo com o artigo que aprovámos e que citei agora, é preciso dizer quais dos direitos é que podem ser restringidos; ou então há que retirar esta norma que diz que «a lei só pode restringir nos casos expressamente previstos na Constituição». Se há uma lei de reunião que diz que eu a certas horas não posso reunir-me ou manifestar-me, isso é, creio eu, restringir o direito de reunião. Se se diz, pura e simplesmente, que os cidadãos têm o direito de se reunir, e se lá atrás se diz que nenhuma lei pode restringir esse direito, a não ser nos casos expressamente previstos, qualquer pessoa de bom senso e que saiba ler fica perante este problema: afinal essa lei é ou não constitucional? É este o problema que os Deputados, que até agora intervieram, nomeadamente o Deputado José Luís Nunes, ao que me parece, esconderam.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Tem apalavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Nunes: - Eu creio que estamos perante um acontecimento nesta Assembleia. É que vejo o Sr. Deputado Vital Moreira, pela primeira vez, aderir à concepção liberal burguesa dos direitos que tanto aqui tem criticado.
Risos.

O Sr. Vital Moreira: - Não é minha, é a que cá está.

O Orador: - Efectivamente, quando nós votamos estes normativos, nós entendemos o seguinte:
Entendemos que podia haver uma regulamentação, mas que não podia haver uma restrição. Ora, trata-se de princípios gerais e só em cada caso concreto é que nós podemos ver se há regulamentação ou se há restrição. Vamos distinguir dois aspectos: em primeiro lugar, a hipótese regulamentar; em segundo lugar - desculpem-me de estar a entrar numa matéria um bocado técnica, mas que é importante -, o poder descricionário dos governadores civis, por hipótese, está ali um sentado, ...

Risos.

... em relação à forma como se autoriza ou não autoriza a manifestação.
Em relação à hipótese, o que é que se vai dizer? Suponhamos, por exemplo, que o Partido Socialista e outra organização política querem fazer no mesmo local e à mesma hora uma manifestação. Suponhamos isto. Pois o que é que vai acontecer? Vai acontecer que a pessoa que foi encarregada da autorização, certamente dentro de acordo com a lei regulamentar, vai dar o direito de manifestação a essa hora e nesse local, de acordo com critérios objectivos. Certamente nesta base: qual foi o pedido que entrou primeiro? Foi o do Partido Socialista. Por hipótese, é ele que tem o direito de fazer a manifestação no local e a essa hora.
E agora pode-se pôr o problema:
Este regulamento restringe em alguma medida o direito de manifestação?
Não só o restringe, como o defende, porque, evidentemente, duas manifestações à mesma hora e no mesmo local, com o mesmo objectivo, iam impedir às duas partes o direito de manifestação, a não ser que se tratasse, hipótese que por absoluto se admite, de provocação, o que efectivamente, em nome do mesmo direito de manifestação, era necessário proibir.
Segundo, admitamos em concreto uma outra hipótese:
Admitamos que há uma determinada norma que diz que o direito da manifestação não pode, por exemplo, fazer-se a tantas horas, etc. Pois é evidente que temos de analisar também em concreto se efectivamente existe um direito ou um motivo que permite essa regulamentação, ou se, efectivamente, se trata de um acto arbitrário do legislador.
Se existe esse motivo que impõe essa regulamentação, pois continua-se a defender o direito de manifestação ao fazer essa proibição.
Se se trata de um acto arbitrário do legislador, pois a disposição será meramente anticonstitucional.
Suponhamos, por exemplo, que havia um legislador que dizia assim: « É proibido fazer manifestações em frente da Calçada da Estrela. Ora, evidentemente, que esta disposição seria uma disposição meramente anticonstitucional.
Suponhamos, por outro lado, que o legislador diz: «As pessoas, para se manifestarem, têm de o

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comunicar à entidade competente com tantas horas de avanço.» Evidentemente que se tratava de um período razoável de tempo. Cá está uma disposição que permite defender o direito de manifestação, porque evidentemente se destina a que a autoridade competente possa tomar as devidas disposições para que esse direito seja efectivamente e eficazmente cumprido.
É evidente que no caso concreto é que a coisa poderá ser efectivamente avaliada. Mas duas ordens de ideias se afiguram necessário sublinhar:
A primeira é que esta Constituição abre o caminho à regulamentação dos direitos, não abre o caminho à restrição ou à anulação dos direitos por via regulamentar. Portanto, caberá aos cidadãos portugueses, através dos seus órgãos democráticos, dizer ao legislador: O senhor exorbitou a regulamentação que fez, vai para além da sua competência, trata-se de uma restrição, é inconstitucional: Não podemos seguir muito daqui para a frente aprovando esses princípios gerais.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Vamos proceder à leitura da proposta de alteração apresentada pelo Sr. Deputado Freitas do Amaral.

Foi lida de novo.

O Sr. Presidente: - Vamos votar o n.º 1 desta proposta.
Submetido à votação, foi aprovado, com 20 abstenções.
O Sr. Presidente: - Vai ser lido o n.º 2 da proposta de alteração.

Foi lido de novo.

Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - O urtiga 31.º foi, portanto, aprovado com esta nova redacção.
Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira, para uma declaração de voto.

O Sr. Vital Moreira: - A diferença de votação nos n.ºs 2 releva apenas de uma incompreensão, quanto à primeira votação relativamente ao que estava em votação. Nós votámos, naturalmente, tal como fizémos em relação ao n.º 2, o conteúdo do artigo; votámos a junção no mesmo artigo das duas matérias, simplesmente parece-nos e não houve qualquer prova em contrário de que a matéria que foi excluída devia continuar e que, em vez de excluí-la aqui, devia ser incluída noutros artigos, onde igualmente se manifesta a necessidade da regulamentação do exercício de direito.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Alguém mais deseja usar da palavra para declarações de voto? Parece-me que mais ninguém.

Vamos proceder ... O Sr. Secretário está a dizer-me que, na sua opinião, não haverá tempo para discutirmos este artigo, que é relativamente extenso. Em todo o caso, pode pelo menos fazer-se a sua leitura.

Foi lido. É o seguinte:

ARTIGO 32.º

1 - Os cidadãos têm direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações desde que estas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.
2 - As associações prosseguirão livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas, não podendo ser dissolvidas pelo Estado senão nos casos previstos na lei e mediante decisão dos tribunais.
3 - Ninguém poderá ser obrigado a fazer parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela.

O Sr. Secretário: - Há uma proposta apenas, do Sr. Deputado Coelho dos Santos, de aditamento ao n.º 2.
«As associações ...» seguiria o texto e seria intercalada a palavra «ou suspensas até às suas actividades».
Portanto seria assim:
«As associações prosseguirão livremente os seus fins sem interferência das autoridades públicas, não podendo ser dissolvidas pelo Estado `ou suspensas as suas actividades senão nos casos previstos na lei e mediante decisão dos tribunais».
É uma proposta de aditamento.

O Sr. Presidente: - Como proposta de aditamento, será discutida no fim, depois da votação do número. Está em apreciação, portanto, o n.º 1.

Pausa.

Vamos proceder à votação do n.º 1.
Submetida à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à apreciação do n.º 2.
Alguém deseja usar da palavra? O Sr. Deputado Coelho dos Santos.

O Sr. Coelho dos Santos: - É apenas para uma explicação muito breve.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Quando se procura limitar os abusos do poder e, nomeadamente, evitar que o Estado possa dissolver uma associação, parece-me que é de acautelar, também, a possibilidade de o Estado poder suspender as actividades dessa mesma associação, o que na prática permitiria que o Estado cometesse o mesmo tipo de arbítrio.

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Portanto, a explicação é muito clara e parece-me que é de evitar que o Estado possa, através de qualquer legislação, suspender as actividades dessas associações. E mesmo perante o perigo dessas associações se estarem a desviar dos fins para que foram constituídas e estarem, nomeadamente, a infringir preceitos do Código Penal. Pois, no caso de ser aprovada esta proposta de aditamento, também fica possibilitado aos tribunais, em processo de providência cautelar, decidir essa mesma suspensão.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Continua em apreciação a proposta.

Pausa.

Vamos. ler o texto do n.º 2 e proceder à sua votação e depois veremos o que se passa com o aditamento.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Vai ser posto à votação.
Submetido à votação, foi aprovado, por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos agora proceder à votação do seu aditamento, talvez convenha voltar a ler para o tornar mais claro.

Foi lido de novo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Deputado Mota Pinto.

O Sr. Mota Pinto: - É para pedir um esclarecimento.
É sobre essa frase que foi intercalada depois da palavra «Estado». V. Ex.ª pensa que o Estado suspende as suas actividades ou não podem ser dissolvidas ou suspensas as suas actividades pelo Estado?

O Sr. Secretário: - Não. Segundo a proposta é depois da palavra Estado. . «não podendo ser dissolvidas pelo Estado ou suspensas as suas actividades».

O Sr. Mota Pinto: - Deixo esta observação à Comissão de Redacção.

O Sr. José Luís Nunes: - É que são duas coisas diferentes. A expressão do Sr. Deputado Mota Pinto tem toda a razão de ser. São duas coisas diferentes.

O Sr. Coelho dos Santos: - Se me permite, Sr. Presidente, eu queria referir o seguinte: Quando digo «não podendo ser suspensas das suas actividades senão pelos tribunais» entendo exactamente que a administração, seja a central ou local, não pode suspender as actividades dessas associações.

O Sr. José Luís Nunes - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a palavra.

O Sr. José Luís Nunes: - Ora isto pode parecer uma questão de «lana caprina» mas não é. Não podem ser dissolvidas ou suspensas as suas actividades pelo Estado. Quando se está aqui a falar em conceito de Estado está-se a falar num conceito suficientemente lato que abarca o poder central e o poder administrativo local. Portanto, é nesta base que nos parece aceitável a proposta que é feita.

(O orador não reviu.)

O Sr. Freitas do Amaral: - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Freitas do Amaral: - Sr. Presidente: Eu suponho que a intenção do autor da proposta (eu depois pedia-lhe que confirmasse) era impedir que estas associações pudessem ser dissolvidas ou suspensas, fosse por quem fosse, a não ser pelos tribunais. Se assim é, creio que a redacção ficaria mais perfeita se suprimisse a expressão «pelo Estado». Então ficava: «dissolvidas ou suspensas senão nos casos previstos na lei, mediante decisão dos tribunais'».

(O orador não reviu.)

O Sr. Coelho dos Santos: - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade.

O Sr. Coelho dos Santos: - Aceito perfeitamente, porque é essa a intenção. Só os tribunais, em processo de «providência cautelar» podem dissolver ou suspender as actividades das associações.

O Sr. Presidente: - Entretanto, eu esclareço que já aprovámos o texto que inclui a palavra Estado. Já o aprovámos o que não quer dizer que não possamos voltar atrás.

O Sr. Mota Pinto: - Eu creio que a referência à palavra «Estado», com um sentido amplo que abrange a administração central ou local é imprescindível

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para, efectivamente, não estar aqui abrangida a dissolução ou suspensão por iniciativa própria. Portanto, tem de haver uma limitação à suspensão ou dissolução coercivas. Parece-me que era mais perfeito, mas, como digo, deixo esta dúvida à consideração da Comissão de Redacção, no sentido de a fórmula ser, não podendo ser dissolvidas ou suspensas pelo Estado. Creio que realmente estarei disposto a fazer uma proposta neste sentido.

(O orador não reviu.)

O Sr. Presidente: - Talvez o Sr. Deputado proponente concorde com esta alteração. Sendo assim teríamos o problema resolvido.

O Sr. Coelho dos Santos: - Desde que a redacção definitiva corresponda exactamente ao espírito que me fez apresentar esta proposta, que é conferir apenas aos tribunais o poder de suspender as actividades das associações, eu estou de acordo com qualquer redacção.

O Sr. Presidente: - Pode então ficar entendido que, parece-me que há acordo sobre o sentido a dar à expressão, a Comissão de Redacção tomará cuidado em deixar isto bem esclarecido.
Vamos então proceder, se ninguém pede a palavra, à votação desta proposta de aditamento por intercalação.
Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Vamos então proceder à apreciação do n.º 3.

Pausa.

Vamos votar, mas antes vai ser lido.

Foi lido de novo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O .Sr. Presidente: - Vamos proceder à leitura do artigo 33.º do texto da Comissão e depois diremos se há ou não tempo para a apreciação.

Foi tido. É o seguinte:

ARTIGO 33.º

1 - A liberdade de associação compreende o direito de constituir e participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para formação da vontade popular e organização do poder político.
2 - Não serão, porém, consentidas associações armadas nem de tipo militar, militarizadas ou paramilitares fora do Estado ou das forças armadas, nem organizações que perfilhem a ideologia fascista.

O Sr. Presidente: - Está em apreciação.
Alguém deseja usar da palavra?

Pausa.

Vai ser posto à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Só nos falta o artigo 34.º, além, claro, dos artigos que ficaram pendentes por terem regressado à Comissão.

O Sr. Álvaro Monteiro (MDP/CDE): - Desculpe, faltam as respectivas declarações de voto.

O Sr. Presidente: - Alguém quer fazer declarações de voto?
O Deputado Álvaro Monteiro tem a palavra.

O Sr. Álvaro Monteiro: - Era para uma declaração de voto.
Nós, Grupo de Deputados do MDP, aprovámos este ponto n.º 2 do artigo 33.º no entendimento de que as organizações a que se refere são as organizações abrangidas pelo ponto n.º 2.3 do Plano de Acção Política do MFA, que diz, expressamente:
A necessidade de reprimir com a necessária dureza a possível acção de grupos ou organizações clandestinas armadas obriga a promulgar uma lei especial que se encontra em preparação e que permitirá punir os participantes em tais organizações contrarevolucionárias com penas pesadas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda: - Era para fazer uma declaração de voto a respeito do artigo 33.º
Nós aprovámos o artigo 33.º e saudamos calorosamente a sua aprovação. O artigo 33.º consagra, como expressão particular da liberdade de associação, a liberdade de associação política, nomeadamente, a liberdade de associação partidária. É a primeira vez que um preceito neste sentido tem consagração no direito constitucional português. E é bom que a Constituição, que vai ser aprovada, garanta o lugar especial que os partidos políticos devem ocupar na organização do poder político no nosso país.

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3 DE SETEMBRO DE 1975 1167

Em segundo lugar, entendemos particularmente importante a aprovação do n.º 2, quando se diz que não são, admitidas associações de tipo militar, militarizadas ou paramilitares, fora do Estado ou das forças armadas, bem como associações que tenham por fim perfilhar a ideologia fascista. Trata-se de um elemento essencial para a construção e consolidação da ordem democrática, que não possa haver nem associações armadas nem associações de carácter fascista.
Queria chamar a atenção, nas actuais circunstâncias em que vivemos em Portugal, para a necessidade de não apenas serem rigorosamente perseguidas associações de tipo fascista, como também associações que, embora dizendo-se revolucionárias, objectivamente servem os fins da ideologia fascista. É necessário para que nós tenhamos liberdade, democracia e socialismo em Portugal, que todas e quaisquer organizações armadas sejam de carácter fascista, sejam de pretenso carácter esquerdista, sejam banidas definitivamente da nossa terra. Em Portugal, só as forças armadas é que poderão ter armas à sua disposição, quaisquer organizações armadas, sejam da direita, sejam de esquerda, constituem um perigo e devem ser prontamente desarmadas.

(O orador não reviu.)

Aplausos.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Luís Nunes pediu a palavra?

O Sr. José Luís Nunes: - Muito brevemente, a seguinte declaração de voto: nós votámos o n.º 2, com a consciência perfeita de que num estado democrático, quaisquer organizações militares, paramilitares ou militarizadas não podem existir fora do Estado, sendo ilícito a esse mesmo Estado emitir juízos de valor sobre o fim que essas organizações pretendem ver executado. De outra forma, ainda este artigo consagra o fim das milícias armadas em Portugal e, neste sentido, é que o saudamos.

(O orador não reviu.)

Vozes: - Muito bem!

Aplausos.

O Sr. Presidente: - Deixaremos para amanhã a apreciação do artigo 34.º, bem como dos artigos 8.º e 9.º e também, se a Comissão tiver possibilidade de o fazer, do texto que foi hoje remetido a essa mesma Comissão.
Está levantada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Rectificação ao n.º 37 do Diário da Assembleia Constituinte, de 27 de Agosto de 1975:
Na p. 1018, Col. 1.ª, l. 20.ª, onde se lê: «Eu desejava dizer no projecto de Constituição, apresentado pelo nosso partido, que o prazo máximo para a prisão preventiva, sem culpa formada, era de vinte e quatro horas», deve ler-se: «Eu desejava dizer que, no projecto de Constituição apresentado pelo nosso partido, o prazo máximo para a prisão preventiva, sem culpa formada, era de vinte e quatro horas».
Na mesma página, mesma coluna, l. 23.ª, onde se lê: «No entanto, na Comissão, foi despendida a argumentação que nos convenceu sobre as deficiências da actual organização judiciária portuguesa ...o, deve ler-se: « No entanto, na Comissão, foi expendida argumentação, que nos convenceu, sobre as deficiências da actual organização judiciária portuguesa ...».
O Deputado, Mário Mesquita (PS).

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

CDS

Vítor António Augusto Nunes Sá Machado.

MDP/CDE

Álvaro Ribeiro Monteiro.
José Manuel Marques do Carmo Mendes Tengarrinha.

PCP

Adriano Lopes da Fonseca.
António Branco Marcos dos Santos.
António Malaquias Abalada.
Eugénio de Jesus Domingues.
Fernanda Peleja Patrício.
Fernando dos Santos Pais.
Francisco Miguel Duarte.
Georgette de Oliveira Ferreira.
Hermenegilda Rosa Camolas Pacheco Pereira.
Hipólito Fialho dos Santos.
Jaime dos Santos Serra.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
Joaquim Diogo Velez.
José Manuel da Costa Carreira Marques.
José Manuel Marques Figueiredo.
Manuel Mendes Nobre de Gusmão.
Maria Alda Nogueira.
Vital Martins Moreira.

PPD

Carlos Alberto Coelho de Sousa.
Francisco.
José Pereira Pinto Balsemão.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Manuel Coelho Moreira.
Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa.

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1168 DIÁRIO DA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE N.º 41

Maria Augusta da Silva Simões.
Maria Helena da Costa Salema Roseta.
Mário José Pimentel Saraiva Salvado.
Miguel Florentino Guedes de Macedo.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Victor Manuel Freire Boga.

PS

Adelino Teixeira de Carvalho.
Alberto Augusto Martins da Silva Andrade.
Alberto Arans Braga de Carvalho.
Florival da Silva Nobre.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Xavier Sampaio Tinoco de Faria.
Jaime José Matos da Gama.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Maria Helena Carvalho dos Santos Oliveira Lopes.
Viário Manuel Cal Brandão.
Raquel Júdice de Oliveira Howell Franco.

Srs. Deputados que faltaram á sessão:

CDS

Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa.
António Pais Pereira.
Basílio Adolfo Mendonça Horta da Franca.
Carlos Galvão de Melo.
Emílio Leitão Paulo.
Manuel Januário Soares Ferreira-Rosa.

MDP/CDE

Luís Manuel Alves de Campos Catarino.
Orlando José de Campos Marques Pinto.

PCP

Américo Lázaro Leal.
António Dias Lourenço da Silva.
Carlos Alfredo de Brito.
Dinis Fernandes Miranda.
José Alves Tavares Magro.
José Carlos.
José Pedro Correia Soares.
José Pinheiro Lopes de Almeida.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.

PPD

Alfredo António de Sousa.
Américo Natalino Pereira de Viveiros.
António Júlio Correia Teixeira da Silva.
Armando António Correia.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Artur Videira Pinto da Cunha Leal.
Eleutério Manuel Alves.
Germano da Silva Domingos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
José António Valério do Couto.
José Bento Gonçalves.
José Manuel Nogueira Ramos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Orlandino de Abreu Teixeira Varejão.

PS

Adelino Augusto Miranda de Andrade.
Alcides Strecht Monteiro.
António Cândido Miranda Macedo.
António Carlos Ribeiro Campos.
Artur Cortez Pereira dos Santos.
Bento Elísio de Azevedo.
José Alberto Menano Cardoso do Amaral.
Júlio Pereira dos Reis.
Luís Maria Kalidás Costa Barreto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Francisco da Costa.
Maria da Assunção Viegas Vitorino.
Rui Manuel Mendonça Cordeiro.

UDP

Américo dos Reis Duarte.

Os REDACTORES: José Alberto Pires - José Pinto.

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IMPRENSA NACIONAL - CASA DA MOEDA

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