O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 913

I Série-Número 22

DIÁRIO da Assembleia da República

15 de Julho de 1983

III LEGISLATURA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 14 DE JULHO DE 1983

Presidente: Exmo. Sr.
José Luís do Amaral Nunes

Exmos. Srs. Leonel do Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Manuel Maia Nunes do Almeida
Francisco Manual de Menezes Falcão

SUMÁRIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 10 minutos.

Ordem do dia.- Foi interposto recurso - que foi rejeitado- por parte do PCP da decisão da Câmara em não aceitar que a apreciação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III, sobre a criação do município de Vizela, fosse discutido primeiro que a apreciação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/III, sobre a extracção e comercialização da cortiça de prédios rústicos sujeitos a medidas da reforma agrária, tendo o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) feito uma declaração de voto.

Seguidamente foi rejeitado o recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/Ill, sobre a extracção e comercialização da cortiça de prédios rústicos sujeitos a medidas da reforma agrária, tendo produzido intervenções, a diverso titulo, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados Rogério de Brito (PCP), Carlos Lage (PS), Marques Mendes (PSD) e Magalhães Mota (ASDI).

Foi igualmente rejeitado o recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III, sobre a criação do município de Vizela. Produziram intervenções, a diverso titulo, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados Carlos Brito (PCP) - que respondeu a protestos dos Srs. Deputados Carlos Lago (PS), Hasse Ferreira (UEDS) e Furtado Fernandes (ASDI) - Hasse Ferreira (UEDS), Carlos Lage (PS) e Narana Coissoró (CDS).

Procedeu-se ainda à apreciação do recurso interposto pelo PCP sobre a admissão da proposta de lei n.º 34/III, que concede ao Governo autorização para, durante o ano económico de 1983, efectuar transferências de verbas, com dispensa no disposto no artigo 20.º da Lei n.º 64/77, de 26 de Agosto, até ao montante global de 5 milhões de contos.

Usaram da palavra, a diverso titulo, além do Sr. Ministro de Estudo e Ministra dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e dos Srs. Secretários de Estado do Orçamento (Alípio Dias) e dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes), os Srs. Deputados José Magalhães (PCP), Narana Coissoró (CDS), Carlos Brito (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), Fernando Condesso (PSD), Luís Beiroco (CDS), Veiga de Oliveira (PCP), Nogueira de Brito (CDS) e Carlos Lage (PS).
O recurso foi no entanto retirado na sequência da apresentação pelo PS e pelo PSD de uma proposta de alteração à proposta de lei, tendo o Sr. Deputado Carlos Brito (PCP) justificado tal atitude.
Entretanto, foram lidos e aprovados dois relatórios e pareceres da Comissão de Regimento e Mandatos sobre a substituição de deputados do CDS e do PCP, tendo a Câmara autorizado também a que o Sr. Deputado Leonel Fadigas deponha como testemunha na Policia Judiciária.
Na segunda parte da ordem do dia procedeu-se à apreciação da proposta de lei n.º 23/III, sobre a criação de uma taxa municipal de transportes, que foi aprovada, tendo intervindo, a diverso título, além dos Srs. Ministros de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e do Equipamento Social (Rosado Correia) e da Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques), os Srs. Deputados Lopes Cardoso (UEDS), Morais Leitão (CDS), Reis Borges (PS), Miguel Anacoreta Correia (CDS), Veiga de Oliveira (PCP), António Taborda (MDP/CDE), Abílio Rodrigues (PSD), Hasse Ferreira (UEDS), João Amaral (PCP), Magalhães Mota (ASDI), Daniel Bastos (PSD), César Oliveira (UEDS), Octávio Teixeira (PCP) e Bagão Félix (CDS).
Produziram ainda declaração de voto os Srs. Deputados António Taborda (MDP/CDE), Veiga de Oliveira (PCP) e Miguel Anacoreta Correia (CDS).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 2 horas e 15 minutos do dia seguinte.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 11 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Acácio Manuel Frias Barreiros.

Página 914

914

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
Aníbal Coelho da Costa.
António Cândido Miranda Macedo.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
António José dos Santos Meira.
António Jorge D. Rebelo de Sousa.
António Jorge Mammerickx da Trindade.
Avelino F. Martins Rodrigues.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Bento Elísio de Azevedo.
Carlos Alberto R. Santana Maia.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Luís Filipe Gracias.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá M. Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo C. Curto.
Frederico Augusto F. Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo C. Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
João Joaquim Gomes.
João Luís Duarte Fernandes.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes
Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.
Jorge Lacão da Costa.
Jorge Manuel A. F. Miranda.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José da Cunha e Sá.
José Luís do Amaral Nunes.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Manuel Torres Couto.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José dos Reis Borges.
Leonel de Sousa Fadigas.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Filipe Pessoa S. Loureiro.
Manuel Sousa Ramos.
Maria Ângela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria de Jesus Barroso Soares.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barral.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rodolfo Alexandrino Suzano Crespo.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Rui Monteiro Picciochi.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Teófilo Carvalho dos Santos.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Amândio S. C. Domingues Basto Oliveira.
Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Amadeu Vasconcelos Matias.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Joaquim Bastos Marques Mendes.
António Maria de Ornelas Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
César Augusto Vila Franca.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José Alves Figueiredo.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Malato Correia.
João Maurício Fernandes Salgueiro.
João M. Ferreira Teixeira.
João Pedro de Barros.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
Jorge Nélio P. Ferraz Mendonça.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José António Valério do Couto.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Luís de Figueiredo Lopes.
José Mário de Lemos Damião.

Página 915

15 DE JULHO DE 1983 915

José Silva Domingos.
Leonardo Eugénio Ramos Ribeiro de Almeida.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Manuel Ferreira.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Raul Gomes dos Santos.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Victor Pereira Crespo.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
Joaquim António Miranda da Silva.
João António Torrinhas Paulo.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Santos Magalhães.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Odete de Jesus Filipe.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.
Raimundo do Céu Cabral.
Raul Jesus Ferreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
Américo Maria Coelho Gomes de Sá.
António Gomes de Pinho.
António J. Castro Bagão Félix.
António Nuno Correia Oliveira.
Basílio Adolfo de M. Horta da Franca.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.
Henrique Paulo das Neves Souto.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João António de Morais Silva Leitão.
João Carlos Dias M. C. de Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
João Lopes Porto.
Jorge Manuel Morais Barrosa.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Luís Nogueira de Brito.
José Miguel Anacoreta Correia.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Tomás Rodrigues Queiró.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
António Monteiro Taborda.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
José António Furtado Fernandes.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.

ORDEM DO DIA

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Já que o Sr. Presidente declarou aberta a sessão, creio que é o momento oportuno de retomarmos uma questão suscitada no termo da sessão de ontem. Fá-lo-ia usando a figura de uma interpelação à Mesa e não a figura da impugnação da ordem do dia.
Ontem, ao tomarmos conhecimento da ordem do dia para hoje, através do anúncio feito pelo Sr. Presidente, objectámos relativamente à ordenação dos dois primeiros pontos da agenda, que são os nossos recursos relativamente ao despacho exarado pelo Sr. Presidente no sentido de indeferir o pedido de agendamento do processo de urgência para os projectos de lei relativos à criação do concelho de Vizela e à extracção e comercialização da cortiça.
Para nós, não se trata de uma questão grave. Trata-se apenas do seguinte: é que o nosso pedido de

Página 916

916

agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei que cria o concelho de Vizela, data do dia 30 de Junho, enquanto o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/III, sobre a extracção e comercialização da cortiça, é muito mais recente. Simplesmente, como o Sr. Presidente retardou o despacho relativamente ao primeiro requerimento, acabou por dar despacho conjunto aos dois requerimentos por nós apresentados.
Em todo o caso, nós, no entendimento de que o primeiro recurso a ser discutido era o relativo ao pedido de agendamento da discussão do processo de urgência mais antigo, organizámos o nosso trabalho tendo em vista essa ordem de precedência.
Aquilo que pedimos à Mesa e ao Plenário é que aceitem alterar a ordem de trabalhos de tal forma que as coisas se processem de acordo com a maneira como nós, com grande lógica e com grande fundamento, organizámos o nosso trabalho. Pedia então ao Sr. Presidente que pusesse esta questão à consideração da Assembleia porque, como todos os Srs. Deputados sabem, se houver consenso, os nossos trabalhos podem iniciar-se desta forma.
Nós preferimos esta solução a suscitarmos agora uma qualquer votação de impugnação, que nos parece deslocada, a propósito de uma questão como esta e que nós próprios não fazemos um empenhamento por aí além. Trata-se apenas de ordenarmos os trabalhos um pouco de acordo com a maneira como os grupos parlamentares organizam o seu próprio trabalho.

O Sr. Presidente: - Sr. Carlos Brito, respondendo à interpelação de V. Ex.ª, pude, através de uma consulta rápida aqui feita, verificar que os recursos diziam respeito, em primeiro lugar, ao projecto de lei n.º 3/III e depois ao projecto de lei n.º 4/III. Fez-se a ordenação sem que se pensasse que isso traria qualquer inconveniente para o Grupo Parlamentar do PCP.
Posteriormente a isto, foi tomada uma decisão de fixação da ordem do dia que, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 26.º e 65.º do Regimento e aplicação do artigo 179 º da Constituição, foi tomada, no exercício da sua competência, por quem a devia tomar, ou seja, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
No entanto, e nos termos do artigo 66 º do Regimento, essa decisão que foi tomada pode ser alterada por deliberação da Assembleia da República, desde que não haja votos contra. É isto que diz a lei. Portanto, Sr. Deputado Carlos Brito, se não houver votos contra e V.Ex.ª desejar que a Assembleia tome a deliberação nesse sentido, a Mesa executará essa deliberação. É só isto que me cumpre dizer em face da sua interpelação.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, muito rapidamente só para dizer que o pedido que fazemos é de alteração sequencial da ordem de trabalhos, e as alterações sequenciais carecem, exclusivamente, de uma deliberação maioritária da Assembleia - salvo erro, isto está no artigo 66.º do Regimento.

O Sr. Presidente: - Exacto, Sr. Deputado. Foi para esse artigo 66 º do Regimento que tive ocasião de chamar a atenção na resposta à interpelação feita à Mesa pelo Sr. Deputado Carlos Brito.
A questão foi suscitada e os Srs. Deputados dos diversos grupos parlamentares devem responder à questão que acaba de ser levantada pelos Srs. Deputados Carlos Brito e Veiga de Oliveira e que se resume no seguinte: há ou não votos contra para que a ordem de trabalhos seja alterada?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa posição é negativa. Votamos contra, portanto não damos o nosso apoio.

O Sr. Presidente: - Desde que há um grupo parlamentar ou um senhor deputado que vota contra, o assunto está resolvido, passamos à ordem de trabalhos, ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - ... a não ser que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira ou algum outro senhor deputado deseje interpor recurso ...

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Simplesmente - e foi por isso que eu disse que íamos passar à ordem de trabalhos - tenho no meu espírito a declaração que foi feita pelo Sr. Deputado Carlos Brito no sentido de dizer que não desejaria interpor recurso. Foi assim que entendi.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Bem, Sr. Presidente, de facto era essa a nossa atitude inicial. Contudo, em face de uma posição tão marcadamente negativa por parte da bancada do Partido Socialista, designadamente da parte do Sr. Deputado Carlos Lage - como o artigo 66.º do Regimento só exige, neste caso, umas deliberação maioritária, não é necessário consenso - recorremos e pedimos ao Sr. Presidente que ponha a questão ao Plenário e que se delibere se sim, ou não, a Assembleia aceita alterar a sequência da ordena de trabalhos relativamente aos 2 primeiros pontos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, nos termos do citado artigo 66.º do Regimento, a fixação da ordem do dia só pode ser alterada desde que não haja votos contra.
Acontece, porém, duas coisas: em primeiro lugar, não houve trânsito em julgado da decisão, porque na altura em que ela foi pronunciada não havia quorum, portanto transitou para hoje; em segundo lugar, o n.º 2 do artigo 66 º do Regimento diz que: «A sequência das matérias fixadas para cada reunião pode ser modificada por deliberação da Assembleia.» Como diz respeito a uma sequência e como não houve trânsito

Página 917

15 DE JULHO DE 1983 917

em julgado da decisão, eu admito o recurso interposto por VV. Ex.as, que é atempado.
Alguns dos senhores deputados do PCP deseja fundamentar o recurso?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - filão, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Alguém deseja dizer alguma coisa sobre esta matéria?

Pausa.

Srs. Deputados, informam-me os Srs. Secretários que neste momento não há quorum para votar.
Assim, permitam-me sugerir-lhes que verifiquem se há senhores deputados que se encontram em reuniões de comissões especializadas ou qualquer coisa do estilo.
Suspendo a sessão por 5 minutos.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Era isso que vocês queriam!

Eram 11 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 11 horas e 25 minutos.

O Sr. Presidente: - Peço o favor aos Srs. Deputados de se manterem sentados para que os Srs. Secretários possam proceder à contagem.

Pausa.

Encontram-se presentes na Sala 110 Srs. Deputados. Como é natural que haja deputados em reuniões de comissões especializadas, agradecia aos presentes o favor de lhes comunicarem para que viessem imediatamente, a fim de podermos continuar os nossos trabalhos.

Pausa.

Encontra-se nos jardins da retaguarda deste Palácio um automóvel dos Serviços de Luta Contra a Tuberculose para fazer o rastreio aos Srs. Deputados que entenderem submeter-se a essa diligência. Como esse serviço não foi ontem utilizado, pedem-me que informe que poderá ser utilizado durante todo o dia de hoje.

Pausa.

Já temos quorum para continuar os nossos trabalhos.
Vamos pôr à votação o recurso interposto pelo PCP. Dispensar-me-ão, certamente, porque o assunto ficou suficientemente esclarecido, de estar aqui a referir novamente qual é o objecto do recurso.
Vamos então votar.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, os votos a favor do PCP e do MDP/CDE e as abstenções do CDS, da UEDS e da ASDI, registando-se a ausência do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta votação vale o que vale, mas não deixa de ter algum significado. A questão que colocámos à Assembleia foi a de que a organização dos trabalhos da Assembleia respeitasse, de alguma maneira, a própria organização dos trabalhos dos grupos parlamentares. Os grupos parlamentares são um factor fundamental no funcionamento da Assembleia e, por isso, na própria Constituição eles têm um estatuto próprio, assim como na nossa vida, ao longo dos anos, têm também sido objecto de respeito, em geral, por parte da Assembleia.
Ora bem, desta vez isso não se verificou. Naturalmente que teremos em consideração a falta de boa vontade que aqui foi manifestada pela maioria governamental.
Não é assim que se melhora o trabalho parlamentar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a nossa ordem de trabalhos com a apreciação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/III sobre a extracção e comercialização da cortiça de prédios rústicos sujeitos a medidas de reforma agrária.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, é o meu camarada Rogério de Brito que fará a apresentação do recurso. Neste momento, ele não se encontra presente na Sala, no entanto já o chamámos e deve estar a chegar.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, vamos esperar um pouco para que o Sr. Deputado Rogério de Brito chegue.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Grave deficiência de organização [...], muito grave. Se a cortiça for extraída assim...

Pausa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, enquanto o Sr. Deputado Rogério de Brito não chega, informo a Câmara de que está marcada para as 11 horas e 30 minutos uma conferência de lideres parlamentares no gabinete do Sr. Presidente da Assembleia. O Sr. Presidente pediu-me que sublinhasse aos Srs. Deputados a importância de estarem presentes às 11 horas e 30 minutos prefixas.
Pedia, portanto, aos - grupos parlamentares que actuassem no sentido de se fazerem representar.
Para fazer a apresentação do recurso interposto pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Depois de ser bombardeado com um lençol imenso de pedidos de autorizações legislativa por parte do Governo, muitas das quais absolutamente dispensáveis, quer pelo conteúdo, quer até pela inconsistência de argumentos, a oposição vê recusados os seus pedidos de prioridade e urgência para 2 projectos de lei do Grupo Parlamentar do PCP, tal como aconteceu em relação a um idêntico pedido por parte da ASDI.

Página 918

918 I SÉRIE - NÚMERO 22

Fazendo uma comparação entre certas urgências solicitadas pelo Governo e que justificam os seus pedidos de autorização e a urgência dos projectos de lei, nomeadamente o projecto de lei sobre a extracção e comercialização da cortiça, estamos certos de que este projecto de lei seria bem mais urgente do que muitos dos diversos diplomas apresentados pelo Governo, por razões objectivas e pelas suas consequências em termos de economia nacional e em termos de afectação de largos sectores da actividade produtiva deste país.
Todos sabemos que Portugal é o primeiro produtor mundial de cortiça, produzindo mais de 50 %. Sabemos que a cortiça contribui com cerca de 7 % para as exportações. Sabemos que as operações de extracção e empilhamento da cortiça ocupam anualmente cerca de 10 000 trabalhadores por campanha e na indústria corticeira trabalham cerca de 16000 operários.
Sabemos também que cerca de 95 % da área dos montados de sobro se situam a Sul do Tejo e que, reportando-nos a 1974, mais de 98 % do montado de sobro era propriedade privada, cabendo apenas a 4 % dos proprietários mais de 40 % da produção da cortiça.
Foi exactamente a elevadíssima taxa de concentração da propriedade do montado de sobro na mão de grandes proprietários que acabou por implicar elevados custos sociais e económicos.
Os elevados rendimentos proporcionados pela cortiça não só foram sistematicamente desviados para fora do sector e da própria região, como acabaram por constituir mais um factor de bloqueio à actividade agrícola, absolutamente secundiarizada ou desprezada por todos aqueles para quem a cortiça era a grande e mais que suficiente fonte de rendimento.
Ó próprio montado, apenas «vigiado» pela legislação de protecção aos arvoredos, acabou por evidenciar, com a passagem dos anos, as carências de um correcto ordenamento. Os recursos potenciais das vastas áreas de sobre coberto, nomeadamente no que respeita a pastagens melhoradas ou à introdução de culturas forrageiras e pratenses ficaram completamente desaproveitadas.
Podemos afirmar que com a Reforma Agrária e a formação das UCPs/Cooperativas se deu a libertação de uma parte significativa das forças produtivas.
Em cerca de um terço do território da região Sul criaram-se as condições objectivas para que o montado de sobro pudesse constituir uma componentes importante no processo de desenvolvimento e social.
Criaram-se condições para executar uma adequada política de fomento suberícola e para que os rendimentos da cortiça fossem investidos, na actividade produtiva, não só nos montados, mas também na própria agricultura e pecuária.
Com efeito, os rendimentos da cortiça contribuíram decisivamente para que, nos latifúndios completamente descapitalizados, os trabalhadores, partindo do nada, tivessem investido nos 3 primeiros anos cerca de 2 250 000 contos em 837 obras de captação de água 190000 contos de desmatagens e despedregas, mais de 600 instalações para gado e outras tantas construções de armazéns oficinas, instalações para máquinas, etc.
Seria, pois, natural que, a partir daqui, a cortiça passasse a ser um factor não de bloqueamento, não de descapitalização do sector agrícola, como era até então, mas uma fonte de incentivo ao desenvolvimento e ao progresso.
Em lugar disto, em lugar de uma política de apoio por parte do Estado, o que se verificou foi uma brutal ofensiva contra a Reforma Agrária e as UCPs/Cooperativas, que, no caso da cortiça, assentou em 7 decretos-leis produzidos em 5 anos, visando no fundamental dar cobertura à apropriação indevida por parte do Estado do produto da cortiça gerado no interior das unidades colectivas.
De decreto em decreto, sucessivos governos desde 1977 foram refinando os mecanismos tendentes a uma crescente ingerência na actividade económica das UCPs/Cooperativas, à sua asfixia económico-financeira, à desafectação de avultadas verbas do sector e à sua consequente descapitalização.
Tudo isto feito com o alibi do fomento suberícola, como se fossem as UCPs/Cooperativas, que detinham inicialmente cerca de 30 % da área de montado e hoje apenas cerca de 10 %, que devessem suportar os encargos de uma acção que incidiria fundamentalmente em mais de 80 % da propriedade privada.
No entanto, a verdade é que mesmo este alibi, na prática, não teve qualquer expressão que, pelo menos, pudesse dar uma certa cobertura aos argumentos utilizados.
As verbas saqueadas às UCP's/Cooperativas foram desviadas para custear as acções de evolução de terras e indemnizações aos grandes agrários, para suportar os encargos da aplicação das próprias leis, para os serviços do Estado adquirirem carros, para os «sacos azuis». E, ao fim e ao cabo, para as tais acções de fomento suberícola e tecnologia da cortiça foram empregues, em 3 anos, 200 contos para investigação do comportamento da rolha de cortiça nos vinhos do Porto. Isto é, no mínimo, caricato. Será, certamente, bem mais grave.
Em resumo, a legislação da cortiça, vulgarmente apelidada pelos trabalhadores como «lei do roubo da cortiça», além de permitir ao Estado a apropriação indevida deste produto, impõe ainda a obrigatoriedade de os trabalhadores cuidarem dos montados, extraírem a cortiça, empilharem-na, segurarem-na e terem-na em depósito. Em «contrapartida», o Estado pagará qualquer coisa, não se sabe o quê, nem quanto, nem como, nem quando, nem por quem. Na prática, o Estado deve hoje às UCP's/Cooperativas milhões de contos, e nos poucos casos em que tem pago alguma coisa tem sido na base de 100$ a 120$ por arroba, o que não cobre sequer metade das despesas relativas à manutenção do montado e às operações de extracção da cortiça.
As consequências desta política, rejeitada não só pelos trabalhadores, mas também pelos industriais, constituem um verdadeiro atentado à economia nacional e comportam elevados custos sociais, sobretudo para os trabalhadores da Reforma Agrária. Ê importante que se tenha presente que esta lei não consegue sequer agradar aos gregos ou aos troianos porque, tanto os gregos como os troianos, estão contra ela, os próprios funcionários do Instituto de Gestão e Estruturação Fundiária e da Direcção-Geral das Florestas estão contra esta lei. No entanto, os governos têm persistido na sua manutenção. É caso para perguntar: para quê e porquê? Argumentos de ordem de racionalidade técnico-económica não podem ser apresentados. Será apenas uma questão de ódio cego contra aquilo que cheira a Reforma Agrária? Será apenas o

Página 919

15 DE JULHO DE 1983 919

objectivo de promover, o mais rapidamente possível, a asfixia económica e financeira das UCP's/Cooperativas? Se é isso, assumam-no na sua plenitude e digam: é essa a finalidade. Se assim o fizerem, então estamos todos sabendo qual é o comportamento e a perspectiva de cada um. Assumam essa responsabilidade.

Na prática, os resultados de uma política, onde a ilegalidade, a corrupção e o arbítrio andam de mãos dadas - e eu repito - a ilegalidade, o arbítrio e a corrupção porque .imensos são os casos de corrupção que atingem inclusivamente funcionários do Estado e industriais - e é bom que isso se tenha presente -, os resultados de uma tal política, repito, têm conduzido à redução drástica da capacidade de autofinanciamento das UCPs/Cooperativas, com reflexos imediatos na própria produção agrícola e no emprego e as fortes perturbações nos circuitos de comercialização, com reflexos directos na actividade da indústria transformadora, a cujas consequências são particularmente sensíveis as pequenas e as médias indústrias, como já o denunciámos noutras oportunidades. Há milhares e milhares de arrobas de cortiça que, mesmo tendo sido tiradas, continuam em pilhas nos montados do Alentejo à espera de serem comercializados. Há milhares de arrobas de cortiça que têm sido roubadas dos montados, sem que sejam atribuídas responsabilidades a quem que seja.
Há uma indústria transformadora que se vê obrigada ao recurso da importação de cortiça quando, simultaneamente, há milhares e milhares de arrobas de cortiça por extrair dos arvoredos do Alentejo.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP)- - Muito bem!

O Orador: - Entre 1978 e 1982 a importação de cortiça atingiu as 78 000 t, com um valor de 4 milhões de contos.
Quando tanto se fala da nossa crise económica, quando tanto se fala na necessidade de desenvolver e aumentar a produção, quando tanto se fala de aumentar a produtividade, é extremamente significativo como um qualquer governo, por pura e simples vendetta contra uma conquista de Abril, que é a Reforma Agrária, compromete os próprios interesses da economia nacional.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Dos direitos inerentes à posse útil da terra conferida às UCP's/Cooperativas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, resulta que o Estado tem apenas direito à propriedade da terra, cabendo àquelas o direito de deterem, cuidarem e extraírem dos bens produzidos todas as utilidades possíveis, com uma única limitação a este direito e que resulta da imposição constitucional de terem de fazer a exploração económica desses bens mediante gestão sua e trabalho seu, repito, todas as utilidades possíveis, com uma única limitação a este direito e que resulta da imposição constitucional de terem de fazer a exploração económica desses bens mediante gestão sua e trabalho seu. E se esta não é a realidade objectiva que decorre dos preceitos constitucionais, então seria bom que o Governo o dissesse!
15to significa que as UCP's/Cooperativas têm o direito de cuidar devidamente dos montados, têm-no, mas também têm o direito à cortiça produzida nas áreas das UCP's/Cooperativas, na terra que se encontra na sua posse útil. Têm direito de a comercializarem livremente e de se disporem do rendimento por ela proporcionado. Esta é, aliás, a via que garante que o sector não é descapitalizado e que os rendimentos obtidos são canalizados para o investimento produtivo e para o progresso social e económico daqueles que trabalham a terra.
É neste contexto ainda que os trabalhadores da Reforma Agrária reconhecem a importância e a indispensabilidade de uma parte dos rendimentos da cortiça, dos montados em sua posse útil, serem canalizados para o fomento suberícola na área das UCP's/Cooperativas. Medida, aliás, que deverá ser entendida a todos os detentores da posse ou propriedade dos montados, tendo em vista os seguintes objectivos prioritários:

1) Adensamento do montado de sobro, dado que mais de 50 % da sua área se encontra subpovoada ou fortemente subpovoada;
2) Ordenamento do montado por forma a regularizar a produção anual, corrigindo as grandes variações que se verificam em cada período de 9 anos;
3) Ampliação da área do montado, através da arborização de novas áreas. (De acordo com o inventário florestal nacional de 19681972 existam, a sul do Tejo, cerca de 60U 000 ha de incultos sem aptidão agrícola).

Levar à prática tais medidas traria como consequências:

A produção média actual de 12 arrobas por hectare/ano subiria para 18 arrobas. Ou seja, verificar-se-ia, com a mesma área, um aumento de 50 % na produção;
A oferta anual deixaria de apresentar acentuadas variações, com reflexos evidentes na estabilidade do emprego, na actividade comercial e fabril;
Preservação e melhor utilização dos recursos naturais;
Aumento do potencial produtivo;
Aumento dos postos de trabalho.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: A política defendida pelos trabalhadores da Reforma Agrária para o montado de sobro defende os interesses nacionais, contribui para o progresso social e económico. E patriótica! Por isso aqui somos seu porta-voz. Por isso a defendemos e por ela lutaremos.
Antes de terminar, gostaria de deixar apenas esta questão: enquanto oposição, o Partido Socialista defendeu, tal como o nosso grupo parlamentar, a correcção desta situação. Através do instituto da ratificação, pretendeu alterar substancialmente a legislação em vigor. Tal não foi possível porque a AD aproveitou-se da ratificação para a agravar ainda mais.
Mas a questão que agora se coloca é esta: como é que o Partido Socialista, hoje no Governo, consegue alhear-se deste problema que afecta não apenas os trabalhadores rurais do Alentejo e Ribatejo, os trabalhadores da Reforma Agrária, mas também a indústria corticeira, que permite a corrupção, que permite a delapidação de recursos naturais, que permite um aten-

Página 920

920

tado permanente aos interesses da nossa economia e passa por cima de tudo isto, e isto já em plena campanha de extracção da cortiça deste ano, como se esse problema não existisse e como se tudo devesse continuar na mesma? Será porque na mesma é que está bem?
Seria bom que estas situações fossem esclarecidas. Que o Partido Socialista assuma a responsabilidade de ter impossibilitado, tal como os restantes grupos parlamentares - não direi todos porque, sinceramente, não sei quais foram, mas sei que o Partido Socialista foi - que aqui nesta Assembleia se pudesse ter corrigido uma situação que não tem qualquer justificação técnica e económica, nem tem qualquer justificação política, e que antes demonstra uma perfeita aberração política, porque não há quaisquer interesses - nem sequer políticos - em manter tal situação. Como é que o Partido Socialista assume a responsabilidade de permitir que mais uma campanha de extracção e comercialização da cortiça vá continuar neste autêntico regabofe que, mais do que atentar contra a economia - e isso é extremamente importante - atenta contra uma outra coisa, que para nós não é tão-pouco importante quanto isso, nem é menos importante do que a economia nacional, que é a dignidade de quem trabalha e de quem produz.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais ninguém inscrito, vamos então passar, de imediato, à votação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/III, sobre a extracção e comercialização da cortiça de prédios rústicos sujeitos a medidas de reforma agrária.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e da ASDI e a abstenção do CDS, registando-se as ausências do MDP/CDE, UEDS e do deputado independente António Gonzalez.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Zita Seabra, quer ter a bondade de dizer para que efeito pretende usar da palavra?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, é para solicitar a contagem dos votos.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr.ª Deputada. Far-se-á a contagem.

Pausa.

Srs. Deputados, verifica-se que não há quorum para se proceder a esta votação.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, neste momento estão a decorrer 2 reuniões: uma de uma comissão especializada e outra da conferência dos líderes parlamentares.
Peço, pois, ao Sr. Presidente que mande avisar os deputados que se encontram nessas reuniões no sentido de virem para a Sala.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado. E evidente que a votação referida há pouco tem de ser repetida.

Pausa.

Srs. Deputados, já temos quorum. Vai ser repetida a votação que há pouco foi efectuada sem quorum.
Pedia aos Srs. Deputados que permitissem que a votação se fizesse em melhores condições.
Vamos então votar o recurso interposto pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI e a abstenção do CDS, registando-se a ausência do deputado independente António Gonzalez.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra o recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 3/III. Esta nossa atitude não contém qualquer juízo de valor sobre o conteúdo e a importância da matéria referida, mas exclusivamente sobre a oportunidade de a apreciarmos neste Plenário da Assembleia da República.
Quando prorrogámos esta sessão legislativa decidimos que ela seria destinada a apreciar e votar autorizações legislativas, a fazer eleições e, a titulo excepcional, a apreciar matérias sobre as quais existisse consenso.
Naturalmente que apreciar o processo de urgência, sem a seguir discutir o projecto de lei, era uma actividade puramente estéril porque se dava urgência ao processo e a seguir não havia ocasião de discutir o diploma.
Daí o nosso voto negativo que, como já assinalei no inicio da minha declaração de voto, não envolve menor apreço por uma matéria tão importante como é a da extracção e comercialização da cortiça, nem pela importante indústria a que essa cortiça serve de matéria-prima.
Sabemos que o sector florestal representa 45 milhões de contos das exportações portuguesas - portanto 18 % - e que a cortiça representa 14 milhões de contos das exportações. Daí o facto de sabermos que é muito importante actuar neste sector.
Estamos convencidos de que o Governo tem vontade política e dispõe de todos os instrumentos para, rapidamente, agir no sector da extracção e comercialização da cortiça, regularizando-o de forma justa e equilibrada, contemplando, quer os interesses do Estado, quer as interesses dos trabalhadores, e dando menor atenção eventualmente a alguns interesses particularistas que possam estar em dúvida nessa matéria..

Página 921

15 DE JULHO DE 1903 921

Entretanto, tomou assento na bancada do Governo o Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias).

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A votação do Partido Socialista trouxe-me à memória as palavras proferidas, aqui há alguns dias, pelo Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares Dizia o Sr. Ministro - e sem querer fazer uma utilização abusiva do que ele disse, mas julgo que o sentido está perfeitamente correcto que na oposição é uma coisa, no Governo é outra. O mesmo é dizer que na oposição dizem-se alhos, no Governo fazem-se bugalhos!
Diz o Sr. Deputado Carlos Lage que a votação do Partido Socialista teve que ver com a matéria em si, mas apenas com uma posição assumida face à decisão do Sr. Presidente da Assembleia da República, enfim às decisões impostas, de qualquer modo - e é bom que isso se tenha presente - pela maioria ao impedir que pudessem ainda ser tratados durante este período de prolongamento dos trabalhos da Assembleia projectos de lei de reconhecida importância e urgência.
Também é um facto que - e eu no inicio da minha intervenção tive oportunidade de o dizer - se gastou tempo nesta Assembleia a discutir e a tratar de pedidos de autorização legislativa bem menos importantes do que, por exemplo, este projecto de lei para o qual solicitámos prioridade e urgência.
A responsabilidade da decisão do Partido Socialista a ele lhe cabe e por ela responderá.
De qualquer modo, ficou-me presente a última afirmação do Sr. Deputado Carlos Lage: a de que o Governo, por certo, irá tomar medidas no sentido de corrigir esta situação. Recordando uma afirmação que o Sr. Deputado fez aqui há uns tempos atrás de que a extracção da cortiça era lá para o mês de Setembro dir-lhe-ei tão somente, Sr. Deputado, que a extracção da cortiça começou há muito e que está a acabar, tanto mais que estamos num ano seco em que a extracção se torna mais difícil, o seu período de extracção reduz-se substancialmente e, neste momento, já larga: áreas do montado não estão em condições para se poderem fazer as operações de extracção.
É caso para perguntar: quando é que o Governo vai legislar sobre uma matéria desta importância? Será que é depois da extracção estar feita e de a própria comercialização estar em andamento? Tudo tem o seu timing na certeza de que, se esta questão não for tratada agora, certamente só o será no próximo ano. Os custos continuarão a ser elevados e certa mente que eles seriam bem menores se esta Assembleia tivesse possibilitado a discussão do nosso projecto de lei e tivesse permitido a correcção das irregularidades e da permissividade que existem em relação à corrupção, ao arbítrio, à delapidação, ao desvio de dinheiros, ao desvio de cortiças, etc., etc., etc.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar de PSD votou contra o recurso do PCP por concordar que o despacho do Sr. Presidente da Assembleia está rigorosamente de harmonia com uma deliberação tomada em 30 de Junho por esta mesma Assembleia, e tomada não apenas pela maioria, mas por todos os grupos parlamentares, apenas com a abstenção do Grupo Parlamentar do Partido Comunista. Aí se indica muito claramente quais as matérias que poderão ser agendadas neste período suplementar e em que condições.
Portanto, como disse - e bem - O Sr. Deputado Carlos Lage, debater e aprovar a urgência, sem depois discutir a matéria de fundo, seria realmente inútil e
não teria o menor sentido.
Daí a nossa votação contra o recurso.
Vozes do PSD e do Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma curtíssima declaração de voto apenas para dizer que, quando se discute um pedido de urgência, está, necessariamente e nos precisos termos regimentais, a discutir-se a inclusão de uma matéria na primeira parte da ordem do dia. Como tal, a deliberação tomada por esta Assembleia, e que diz respeito ao agendamento de propostas de lei e outras iniciativas legislativas que têm a ver com a segunda
parte da ordem do dia, não pode impedir o agendamento de um processo de urgência. Este é o nosso entendimento.
Nem se diga que o pedido de urgência ficaria sem significado pelo facto de não poder ser agendadas, a iniciativa a que dizia respeito porque nem essa
decisão tinha sido tomada - e essa, sim, é que precisaria de consenso. Nem o processo de urgência consiste simplesmente na introdução do processo em Plenário; também consiste, quer pela aplicação da regra supletiva do artigo 246 º do Regimento quer por aplicação da própria deliberação da Assembleia nos termos do artigo 243 º e seguintes, noutras modalidades, como, por exemplo, outros prazos para exame em comissão, outros prazos para funcionamento de todo o processo e até regras de limitação de tempos - de uso da palavra no Plenário.
Há, portanto, uma autolimitação por parte de um grupo parlamentar que requer o processo de urgência para uma sua iniciativa legislativa e esse pedido, no
nosso entendimento, manteria validade mesmo que esta matéria não viesse a ser agendada imediatamente porque também estabeleceria regras para o trabalho em
comissão.
Daí o nosso voto favorável.

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de passar à leitura, discussão e votação de um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos, gostaria de lhes anunciar que na tribuna destinada ao corpo diplomático se encontra um delegado da República da Coreia que visitou o Sr. Presidente da Assembleia da República e contactou com a delegação deste Parlamento à União Interparlamentar.

Página 922

922

A Câmara aplaudiu, de pé.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou dar a palavra ao Sr. Secretário para ler um relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos.

O Sr. Secretário (Maia Nunes de Almeida): - O relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos é do seguinte teor:

Em reunião realizada no dia 14 de Julho de 1983, pelas 10 horas, foram apreciadas as seguintes substituições de deputados:

1) Solicitadas pelo Partido do Centro Democrático Social:

Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por Américo Maria Coelho Gumes de Sá (esta substituição é pedida para o dia 14 de Julho corrente);
Joaquim Rocha dos Santos (círculo eleitoral do Porto) por Manuel Eugénio Pimento; Cavaleiro Brandão (esta substituição é pedida para o próximo dia 15 de Julho corrente).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais o legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

As substituições em causa são de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Presidente, António Cândido Miranda Macedo (PS) - Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretário, José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - António da Costa (PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bustos (PSD) - Fernando José da Costa (PSD) José Mário Lemos Damião (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Francisco Manuel de Menezes Falcão (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, alguém deseja pronunciar-se sobre este relatório?

Pausa.

Como ninguém se inscreve, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Passamos agora ao n.º 1.2 da primeira parte da ordem de trabalhos, que é a apreciação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III (Criação do Município de Vizela).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Orçamento: No dia 12 de Julho de 1983, o Sr. Presidente da Assembleia da República exarou um despacho indeferindo o requerimento de processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III (Criação do Município de Vizela) apresentado por deputados do PCP, nos termos do artigo 243.º e seguintes do Regimento, em 30 de Junho.
Tardou a sair o despacho! É uma observação que salta aos lábios. Mas o mais grave e para mais tratando-se de matéria de tanto melindre é que o despacho do Sr. Presidente não tem fundamento constitucional ou regimental.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O indeferimento fundamenta-se na deliberação da Assembleia de 30 de Junho, sobre o prolongamento dos trabalhos e designadamente na circunstância de não se ter verificado unanimidade na Conferência dos grupos parlamentares para a discussão desta matéria.
Verifica-se, assim, que o despacho do Sr. Presidente não se limita a não ter fundamento constitucional e regimental, vai mais longe, contraria garantias processuais que a Constituição (artigo 173.º) e o Regimento (artigo 243.º e seguintes) asseguram aos deputados no funcionamento da Assembleia da República.
Como ontem ficou demonstrado, e hoje aqui, uma vez mais, foi repetido, a deliberação de 30 de Junho limitou as matérias agendáveis, mas só o fez e só 0 podia fazer em relação à segunda parte da ordem do dia.
Com efeito, o funcionamento democrático da Assembleia ficaria completamente ameaçado se se admitisse que por via de uma deliberação imposta por ume maioria as regras mínimas de funcionamento da Assembleia podiam ser objecto de uma circunstancial sus pensão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Dissemos sobre a deliberação de 30 de Junho que ela visava que se discutisse tudo o que interessa ao Governo e impedir a discussão de tudo que ao Governo não interessa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Agora é a coligação governamental que pede de mais, que pede o impossível, a essa deliberação rolha de 30 de Junho.
Não passa pela cabeça de ninguém que as figuras da impugnação e do recurso - e até a figura da subs-

Página 923

1983 923

tituição de deputados - pudessem ser objecto de suspensão ou de limitação. Pergunta-se então: e a figura do processo de urgência não é também uma figura da, primeira parte da ordem do dia e substancialmente idêntica às demais?

Entende-se perfeitamente que o plenário ou, até só, a maioria governamental recusem o processo de urgência em relação a matérias que não reconhecem nem oportunidade nem urgência.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Agora é absolutamente inaceitável pensar contrariar aquilo que a Constituição e o Regimento estabelecem e violentar o próprio funcionamento democrático da Assembleia da República, impedindo sequer que o Plenário tome conhecimento e que debata e delibere sobre um processo de urgência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Tal é o fundamento formal do nosso recurso para o qual pedimos que os Srs. Deputados tomem a única posição possível, ou seja, a de dar provimento a recurso que apresentamos.

Mas não é menos impressivo o fundamento substancial do nosso recurso.

A Assembleia da República na sua nova composição tem a obrigação política e moral de reparar as ofensas e os erros que foram cometidos pela maioria AD da anterior Assembleia contra as populações de Vizela e de lhes fazer justiça, logo na sua primeira fase de trabalhos. É esta a maneira de honrar a alegre expectativa com que os povos de Vizela saudaram a mudança operada na composição da Assembleia da República pelas eleições de 25 de Abril e de ao mesmo tempo contribuir para o prestígio das substituições democráticas, que a anterior maioria tanto ensombrou na questão de Vizela.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quem não se lembra da operação da retirada do quorum quando a questão foi trazida pela primeira vez ao Plenário?

Quem se esqueceu da promessa ludíbrio da aprovação de uma lei quadro em 60 dias para «permitir a assumpção - com dignidade, sem pressão de rua e sem movimentos passionais - de Vizela à sua dignidade de concelho» com que a bancada do PSD frustou a expectativa das gentes de Vizela quando a questão foi trazida pela segunda vez ao Plenário?

Quem se esqueceu da impermeabilidade do PSD e do CDS às provas mais evidentes da vontade das populações quando a questão veio pela terceira vez ao Plenário?

Mas nesses tempos dizia-se da bancada socialista «não pode o PS deixar de encarar com a maior simpatia a pretensão dos cidadãos da progressiva área de Vizela, com sobejos fundamentos, desejam constituir-se em município».
Nessa altura acusava-se de parte do PS a irresponsabilidade do PSD e do CDS que comprometia o prestígio da Assembleia e do próprio sistema parlamentar e imputava-se aos 2 maiores partidos da AD a responsabilidade no plano ético-político pelos acontecimentos violentos que se tinham verificado.
Nessa altura proclamava-se da parte do PS que «que aqui está em causa é um direito dos povos que um regime autenticamente democrático tem obrigação não só de garantir, como de consolidar e desenvolver».
Que vai dizer agora o PS? Vai também usar o estafado chapéu de chuva da «lei quadro» com que o PSD e o CDS se abrigaram este tempo todo para enganar a vontade da população de Vizela? Vai o PS usar o argumento que já combateu aqui, como consta do Diário? Vai o PS acolher-se à sombra de um argumento que não tem qualquer fundamento constitucional e legal e que só revela incapacidade de ouvir as populações e corresponder às suas aspirações?
A genuína aspiração dos povos de Vizela à criação de um concelho tem-se manifestado com uma verdade tão pungente e com uma profundidade popular tão colectiva que a Assembleia da República só se honraria dando-lhe expressão legal com toda a urgência.

Aplausos do PCP.

Foi por isso que nós apresentamos o projecto de lei n.º 4/III, logo no primeiro dia dos trabalhos da Assembleia e requeremos a urgência para a sua discussão e votação.
Mas as urgências do Governo e da coligação governamental não têm que ver com as urgências do País.
Aquilo que poderia parecer maldosa previsão há 1 mês ou até há 15 dias atrás, fica plenamente comada aqui na Assembleia com este período suplementar de trabalho.
O Governo PS/PSD apresentou no curto espaço de 15 dias, 33 propostas de autorização legislativa - a grande «molhada» que nós prevíamos nos primeiros dias de Junho.
Mas a molhada comporta a agravante de ser caracterizada por 3 traços, qual deles o mais negativo: a imprecisão, isto é ausência de sentido, que desde logo é inconstitucional; a incoerência, isto é, não parece haver qualquer conexão entre os diferentes pedidos de autorização; a precipitação, isto é, as propostas não obedecem a prioridades fixadas ou os membros do Governo que as têm vindo a defender desconhecem-nas. Entretanto, o Governo retirou 5 das propostas apresentadas, o que é significativo e mostra como não era muito lúcida a razão que tinha levado a apresentá-las e 8 delas foram agora objecto de impugnação. A urgência do Governo é: atabalhoamento, irreflexão e muitas vezes incompetência.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E faz pena ver pessoas que estiveram connosco na Assembleia, e a que nos habituámos todos, independentemente das diferenças de opinião política e ideológica, a reconhecer competência e eficácia, atolados neste atoleiro de incompetência e de ineficácia.

Aplausos do PCP.

Algumas das autorizações legislativas marcam nitidamente a rota do Governo.
E assim com abertura ao grande capital da banca, dos seguros, dos adubos e dos cimentos, com a suspensão temporária do contrato de trabalho, a alteração

Página 924

SÉRIE-NÚMERO 82 924

à lei da greve e a lei de segurança interna. E o rumo da restauração monopolista, de ataque aos direitos dos trabalhadores e os dispositivos para a criação de, um aparelho repressivo.
Mas as outras? São apenas a embalagem com que se procura disfarçar o contrabando daquelas medidas atentatórias dos interesses populares?
O recurso aritmético às autorizações legislativas subverte também, o artigo 168.º da Constituição. É como se a nossa Constituição dissesse:

Em relação às matérias k, y e z, a Assembleia da República «fica obrigada» a autorizar o Governo [ ... ] , etc. [

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo e a coligação não conseguem com esta avalanche de autorizações legislativas fazer esquecer que as verdadeiras urgências do País foram ignoradas. Convém lembrar algumas: as taxas sobre a saúde, os salários em atraso, os contratos a prazo, a extracção e a comercialização da cortiça e, naturalmente, a criação do concelho de Vizela.
Quem nega que a questão dos salários em atraso é hoje uma das questões mais urgentes da nossa vida social? Quem não está a ver as implicações de todo o género que a situação dos salários em atraso repercute na nossa vida política?
Quem não conhece os acontecimentos de ontem e desta madrugada verificados na Lisnave? Esta questão precisa rapidamente de medidas democráticas.
O que se passa é que uma figura proeminente da oligarquia financeira dos tempos do fascismo se arroga o direito de atentar da maneira mais brutal contra os direitos dos trabalhadores. IE isso que está a acontecer.

Aplausos do PCP.

Há que repor a legalidade democrática. A maneira de o fazer é obrigar o Sr. Mello a pagar os salários aos trabalhadores. Essa é a maneira de repor a legalidade democrática.

Aplausos do PC`P.

Estas duas últimas semanas da sessão suplementar constituem provavelmente os dias mais caóticas da Assembleia da República. A responsabilidade - cabe por inteiro ao Governo PS/PSD. Nunca a Assembleia foi tão descaradamente regida pela batuta do Governo. Nunca a maioria foi tão atenta, veneradora e obrigada. Nunca foi tão patente a governamentalização do Parlamento.
Constituiria uma saudável maneira de reagir por parte da Assembleia ao propósito governamental de invadir a sua área de competência e de tomar o controle dos mecanismos, do seu funcionamento que o Plenário desse provimento ao nosso recurso e reconhecesse a urgência dos projectos de lei sobre Vitela e sobre a cortiça.
Numa situação tão complexa e tão preocupante que o Governo parece apostado em agravar todos os dias uma tal deliberação representaria uma nota de esperança.
Está nas nossas mãos tomá-la, Srs. Deputados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados. A UEDS apresentou oportunamente na legislatura anterior um projecto de lei visando a criação do concelho de Vizela.
Projecto, aliás, reapresentado nesta legislatura e que mais não fazia do que procurar dar satisfação a uma aspiração das populações do concelho de Vizela. Efectivamente, o movimento para a restauração do concelho de Vizela tem desenvolvido esforços, com o apoio, no âmbito nacional, de vários partidos e da generalidade da população local, visando que sejam satisfeitas as justas aspirações dos povos de várias freguesias, que pretendam a criação do concelho de Vizela.
Não obstante as diferentes iniciativas levadas a cabo na última legislatura, estas aspirações da população vizelense não foram ainda contempladas por via legal.
Assim, embora estando eu de acordo em que estes processos de criação de novos municípios deverão passar a ser submetidos a uma regulamentação tipo lei-quadro, parece-me que casos urgentes, de que o de Vizela é típico, devem ser submetidos a esta Assembleia com alguma urgência.
Neste sentido, o pedido de urgência apresentado pelo PCP tem o apoio da UEDS e, portanto, será favorável o nosso voto quanto ao recurso interposto relativa ao processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como não está mais ninguém inscrito vamos passar à votação do recurso interposto pelo PCP do despacho que indeferiu o pedido de agendamento da discussão do processo de urgência para o projecto de lei n.º 4/III - criação do município de Vizela.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra pede a palavra para que efeito?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Era para solicitar a contagem dos, votos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr.ª Deputada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, é para solicitar que mais uma vez seja comunicado à Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias e à conferência dos líderes parlamentares que se vai votar.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado.

Pausa.

Vamos, então, votar o recurso interposto pelo PCP.

Submetido d votação, foi rejeitado, com 90 votos contra do PS e do PSD, 31 votos a favor do PCP, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI, e 13 abstenções do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage, para uma declaração de voto.

O Sr. Cardos Lage (PS):- Ao contrário do que implicam as diatribes que o Sr. Deputado Carlos Brito resolveu fazer, a propósito deste processo de urgência,

Página 925

DE JULHO 925

contra o Grupo Parlamentar Socialista e o Governo, nós não violentamos nem a Constituição nem o Regimento. Limitamo-nos a apoiar um despacho feito gelo Sr. Presidente da Assembleia da República, no exercício da sua competência, perfeitamente legal e julgamos que as considerações de ordem moral e de ética parlamentar que o Sr. Deputado Carlos Brito fez, não têm qualquer sentido, não têm qualquer fundamento.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Não apoiado!

O Orador: - Por outro lado, a nossa votação foi no sentido de que não se cometesse aqui um acto puramente estéril. Como já disse na declaração de voto que fizemos sobre o recurso anterior, se o processo de urgência fosse aprovado, já que não houve consenso na conferência dos grupos parlamentares para que esta matéria fosse agora agendada, seria um simples voto piedoso ou, fiara usar palavras duras como usou o Sr. Deputado Carlos Brito, uma simples manobra demagógica que o Partido Comunista tentou fazer.

Aplausos do PS e do PSD.

Vozes do PCP: - Não apoiado!

O Orador: - No seu conjunto de diatribes perfeitamente hiperbólicas e que nada tinham a ver com o caso em apreço, o Sr. Deputado Carlos Brito disse que as urgências do Governo não têm a ver com as urgências do País e logo a seguir dá-nos como exemplo doa urgências do PCP, com critérios de objectividade e interesse nacional, criar já o município de Vizela. É curioso este tipo de apreciação das questões nacionais e das urgências nacionais que o Partido Comunista faz. Ou seja, uma política de capela, para não dizer pior.
Quanto às questões da posição do Partido Socialista sobre Vizela, não aceitamos lições nem do Sr. Deputado Carlos Brito nem do Partido Comunista.
Nesta matéria temos tido uma posição tranquila e serena, não temos dramatizado a questão como pretende agora fazer o Partido Comunista tentando substituir agora o PPM na mobilização, na instrumentalização e na arregimentação das pessoas de Vizela.

Aplausos do PS e do PSD.

Terminando para não alongar esta discussão, que o Sr. Deputado Carlos Brito gostaria de ver alongada, dir-lhe-ei que o Partido Socialista se mantém coerente e não defraudará a expectativa das gentes de Vizela.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma vez mais acabamos de assistir e uma votação significativa, em que 96 votaram contra o nosso recurso aqueles Srs. Deputados que estão obrigados por razões de disciplina a dar inteira cobertura às pretensões e aos propósitos do Governo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Protestos do PS e do PSD.

O Orador: - Todos aqueles que puderam optar em função do que está em causa, naturalmente que não deixaram de ter uma posição positiva ou não tiveram uma posição negativa em relação ao nosso recurso.
Quanto às questões que estão em causa, acabamos de ouvir o Sr. Deputado Carlos Lage a encostar-se a justificações de natureza formal, a argumentos de oportunidade, tal qual como fizeram até agora nesta Assembleia todos aqueles que quiseram contrariar as aspirações das populações de Vizela.

Vozes do PCP. - Muito bem!

O Orador: - Nós proclamamos perante a Assembleia da República que não temos pejo de apoiar qualquer causa justa, venha ela de onde vier e de retomas das mãos de qualquer sector uma bandeira justa de luta e de aspirações populares. E o que acontece aqui.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP):- Muito bem!

O Orador: - O PPM apresentou um projecto que apoiámos desde a primeira hora - aliás uma linha d(r) coerência que tínhamos mesmo antes de o projecto ser apresentado na Assembleia da República. Neste momento, nenhuma outra força política revelou interesse em apresentar um projecto de lei para a constituição do município de Vitela. Nós fizemo-lo, orgulhamo-nos !par isso, não temos vergonha de ter retomado das mãos do PPM esse projecto. Estamos orgulhosos disso e pensamos que é a maneira de correspondermos a essa aspiração tão profunda de um sector da população do nosso pais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Mais: pensamos até que a questão de Vizela é uma questão típica, é uma questão essencial para se ver como um partido é ou não capaz de corresponder à vontade das populações expressa das maneiras anais evidentes.
Pensamos que o Partido Socialista comprometido agora no Governo já não é capaz de fazer os reconhecimentos que fazia desta vontade popular tão pungentemente expressa e é, por isso mesmo, que se encosta uma vez mais numa atitude de incoerência e argumentos de natureza formal.

Vozes do PCP - Muito bem!

O Orador: - Não fizemos invectivas em relação ao Partido Socialista. Limitamo-nos a citar algumas afirmações feitas por deputados socialistas em anteriores discussões e fizemos muitas interrogações.

Protestos do PS.

Se interrogas o Partido Socialista agora já é uma invectiva, digo que muito frágil vai a consciência moral do Partido Socialista.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Calos Lage pediu a palavra para que efeito?

Página 926

926 SÉRIE - NÚMERO 82

O Sr. Carlos Lage (PS): - É para um protesto. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Só tenho um comentário, a título de protesto, a fazer à intervenção do Sr. Deputado Carlos Brito.
Só lhe faltam umas asinhas de anjo, para ficar angelical, Sr. Deputado Carlos Brito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Como o Sr. Deputado Carlos Brito manifesta interesse em contraprotestar já, apesar de haver outros Srs. Deputados inscritos para protestar, dou-lhe a palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Deputado Carlos Lage, no que lhe toca o senhor já tem as asinhas de anjo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Hasse Ferreira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Hasse (Ferreira (UEDS): - Era para dar um esclarecimento à Assembleia concernente à declaração do Sr. Deputado Carlos Brito, já que aí foi feita uma afirmação que em relação à UEDS não é verídica.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Eu passava a ler o seguinte:

ARTIGO ÚNICO

É criado o concelho de Vizela, englobando as freguesias de São Miguel das Caldas de Vizela, Santa Eulália de Barrosas, São João das Caldas de Vizela, Santo Adrião de Vizela, Santa Maria das lnfias, Santa Comba de Regilde, São Salvador de Tagilde, São Paio de Vizela e Santo Estêvão de Barrosas.

Dispenso-me de ler o preâmbulo do projecto de lei n.º 168/III, que foi entregue na Mesa desta Assembleia em 23 de Junho de 1983, nesta sessão legislativa por 4 deputados do Agrupamento Parlamentar da UEDS, de que sou subscritor.
Este projecto retoma, aliás, um projecto anterior, o projecto de lei n.º 388/II, entregue em 21 de Dezembro de 1982, pelos então deputados do Grupo Parlamentar da UEDS.
15to tinha, portanto, a ver com afirmações anteriores, designadamente do Sr. Deputado Carlos Brito, feitas certamente por lapso, no sentido de que mais nenhum partido tinha retomado o projecto de criação do concelho de Vizela.
É evidente que nós temos conhecimento da existência do projecto de lei do Partido Comunista, tal como os meus camaradas tinham na altura conhecimento do projecto do PPM.
Ora, o que é verídico é que existem, neste momento dois projectos no mesmo sentido na Mesa da Assembleia da República. Embora não tenhamos pedido prioridade e urgência para o nosso, decidimos votar favoravelmente o pedido de urgência para o projecto de lei do PCP, pelas razões que já expus.
Penso que a afirmação do Sr. Deputado Carlos Brito se tratou de um lapso, mas é bom corrigi-lo nesta altura.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Furtado Fernandes, pois o Sr. Deputado Carlos Brito pretende responder no fim aos protestos.

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A votação que fizemos sobre o recurso do Partido Comunista Português insere-se, apenas, em matéria processual.
A posição da ASDI sobre esta matéria já foi transmitida à Câmara pelo Sr. Deputado Magalhães Mota.
Esta minha intervenção é para protestar em relação aos efeitos políticos da matéria de fundo que o Sr. Deputado Carlos Brito pretendeu retirar.
Queria dizer ao Sr. Deputado que não considero que o Partido Comunista Português lidere nesta Câmara aqueles que pretendem ver reconstruído o município de Vizela. Também não aceito que a propósito de uma matéria adjectiva, processual, o Sr. Deputado Carlos Brito pretendesse retirar esse tipo de ilação.
A posição da ASDI concerne apenas ao aspecto processual, foi tomada em perfeita coerência com posições já assumidas anteriormente e não autorizamos que ninguém, designadamente o Partido Comunista Português, daí pretenda retirar outro sentido.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, tem a palavra para responder.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Começaria por responder ao Sr. Deputado Furtado Fernandes.
O Sr. Deputado esteve ausente da Assembleia durante um período largo e certamente subestima um pouco a inteligência de todos nós. Aquilo que afirmei só vale para a votação processual que fizemos. Acho que toda a Assembleia compreendeu isso, menos o Sr. Deputado pelos vistos.
Repare que ainda ontem fiz uma declaração de voto em tudo semelhante a esta, sobre o sentido da votação relativamente a um recurso do seu partido e também em matéria processual.
Sr. Deputado Furtado Fernandes, fica-lhe muito bem o calor que pôs em toda esta questão, mas guarde esse calor para questões que valha a pena e, sobretudo, para questões que o justifiquem e não para fazer uma declaração sobre uma coisa que toda a gente tinha percebido, talvez com excepção do Sr. Deputado.
Quanto ao Sr. Deputado da UEDS, queria dizer-lhe que foi um lapso. Tinha notícia da retirada do projecto da UEDS no dia da votação do projecto do PPM. Não sabia que os Srs. Deputados já tinham reapresentado o vosso projecto. Portanto, fico muito contente, felicito-me por isso e felicito a UEDS.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró, para uma declaração de voto.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: E apenas para pôr os pontos nos «is».

Página 927

1983 927

O Sr. Deputado Carlos Brito com a habilidade que todos nós lhe reconhecemos, naturalmente que tirou efeitos indirectos da votação processual sobre o processo de urgência.
E para que as coisas fiquem claras temos de dizer que sobre o processo de urgência nos abstivemos, porque não vemos razão para haver esta urgência mas, por outro lado, também não vemos razões para não haver urgência.
Estamos perfeitamente à vontade para votar este projecto, com urgência ou sem urgência, porque a nossa posição não mudou uma vírgula. Havemos de votar como votámos na sessão anterior; as nossas ideias são claras, são coerentes e, por isso, é bom que fique registado que a nossa abstenção agora nada tem a ver com a nossa posição de fundo quanto a Vizela.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar agora à apreciação do recurso interposto pelo PCP sobre a admissão da proposta de lei n.º 34/III, que concede autorização ao Governo para durante o ano económico de 1983 efectuar transferências de verbas, com dispensa do disposto no artigo 20.º da Lei n.º 64/77, de 26 de Agosto, até ao montante global de 5 milhões de contos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, o meu camarada que vai intervir está-me a dizer que a intervenção que tem preparada leva mais do que os 9 minutos que medeiam até ao termo deste período de trabalhos. Ultrapassará, portanto, as 13 horas.
Assim, nós proponhamos que, para não haver depois uma quebra na sequência do debate, fosse interrompida agora a sessão, fazendo-se depois no recomeço a apresentação da impugnação que desse origem à resposta do Governo e dos partidos da coligação governamental.
Parece que este seria o melhor método para o andamento dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, a Mesa cumpre a ordem do dia tal como foi determinada.
Concluo que o Sr. Deputado Carlos Brito fez uma proposta. Se os restantes grupos parlamentares se quiserem pronunciar sobre ela, façam favor.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não nos importamos de prolongar ligeiramente a sessão agora de manhã para que o Sr. Deputado do PCP possa fazer a sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Assim, nessas condições dou a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: já era seguro que a sessão parlamentar em curso sempre ficaria assinalada pelo estilo degradado, confuso, caótico, cegamente autorizativo que o bloco governamental lhe quis imprimir, com a ausência de flexibilidade que acaba de revelar mais uma vez, no incidente que antecedeu esta intervenção. Mas o que dificilmente se imaginaria é que nela se viesse a assistir à apresentação primeiro, à retirada depois e reapresentação finalmente de propostas de lei como aquela que o PCP agora impugna e que ficarão inevitavelmente inscritas entre as maiores aberrações de toda a história orçamental e parlamentar portuguesa.

Vozes do PCP. - Muito bem!

O Orador: - Não é habitual que um Governo chegue ao Parlamento e pouse na Mesa um papel em que diz aos deputados que façam o favor de autorizar os seus ministros a agir em prejuízo de leis da República.
Também não é frequente que um Governo faça este estranho pedido e lhe acrescente a exigência de que a autorização para violar a lei se prolonga e se estenda por 6 longos meses.
O que nunca se conceberia, em qualquer caso, Srs. Deputados, é que um Governo viesse pedir à Assembleia da República para lhe outorgar plenos poderes em matéria orçamental, isto é, em matéria em que a Constituição não admite qualquer delegação.
Pois o Governo PS/PSD conseguiu o prodígio de vir a esta Assembleia por duas vezes em menos de 48 horas pedir isto que nenhum governo pode pedir e a Assembleia está impedida de conceder, ainda que o desejasse fazer. E, fê-lo entre peripécias e equívocos que revelam bem o estilo e a natureza da coligação e a sua atitude perante o Parlamento.
Vale a pena relembrar como foi, para ponderar em que ficamos.
No dia 11, através da proposta de lei n.º 26/III o Governo veio pela primeira vez propor que a Assembleia da República o autorizasse a efectuar, durante o resto do ano económico de 1983, transferências de verbas com prejuízo do disposto no artigo 20 º da Lei do Enquadramento do Orçamento Geral do Estado, a Lei n.º 64/77, de 26 de Agosto.
Sabendo-se que esse artigo 20 º se limitou a interpretar sem qualquer inovação o artigo 108 º da Constituição, desde logo o Grupo Parlamentar do PCP impugnou a admissibilidade uma vez que a proposta, de forma confessa, visava atribuir ao Governo a possibilidade de agir em prejuízo da Constituição (e o mesmo fez a ASDI). Ontem mesmo, porém, às 16 horas e 55 minutos, pouco tempo antes do debate, um ofício ministerial vinha retirar a proposta de lei n.º 26/III. As impugnações não se realizaram e as bancadas governamentais respiraram de alívio! Pela nossa parte assinalámos o recuo governamental e a necessidade da Assembleia da República se debruçar, a sério, sobre a situação orçamental do país e chegamos a propor um debate prévio da matéria em conferência de presidentes.
Qual o nosso espanto porém quando às 22 horas e 40 minutos de ontem, vimos entrar na Mesa uma nova proposta governamental sobre a mesma matéria e de substância em tudo idêntica à anterior! Cotejados os textos só vimos duas inovações.
Em primeiro lugar, o Governo pede, como pedia, para ser autorizado a transferir livremente todas as verbas do OGE. Confessa que pretende mexer naquilo em que só a Assembleia da República pode mexer, mas acrescenta agora que a usurpação se fará, mas não poderá exceder o montante global de 5 milhões de contos! Mas isto, Srs. Deputados, é como se alguém nos viesse cá pedir autorização para esfaquear por aí honestos cidadãos até ao limite de 5 facadas per capito! É um absurdo!

Página 928

928 SÉRIE - NÚMERO 22

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A segunda inovação é que o Governo confessa agora no articulado aquilo que antes dizia só na exposição de motivos. Confessa no articulado que pretende ser autorizado a transferir verbas de uma classificação orçamental para outra, dentro do mesmo ministério, ou a transferir dotações de um ministério para outro com ou sem mudanças de classificação. Por fim anuncia generosamente que está disposto a em regra não mudar classificações funcionais. E já está!
15to é, há 24 horas o Governo pedia uma descaradíssima autorização para obter uma gazua orçamental. Deduzida a impugnação, recuou.
Julgar-se-ia que tinha recobrado o bom senso, que tinha lido a Constituição, que tinha tropeçado em 4 ou 5 normas que entram pelos olhos dentro de qualquer pessoa regularmente alfabetizada. Não aconteceu. 24 horas depois o Governo volta à carga para pedir a mesmíssima coisa, a mesmíssima gazua orçamental, mas agora promete que só vai arrombar até ao limite de 5 milhões de contos. Não pode ser, pura e simplesmente!
Só que qualificar isto é muito difícil.
Na exposição de motivos, e agora no articulado, o Governo confessa abertamente o que pretende. Na p. 2 escreve-se com muita franqueza que «do que se trata é de proceder a um ajustamento do Orçamento de Estado para o ano corrente». Mas . segundo o Governo «importa evitar que esse reajustamento se realize, sob a forma de uma revisão orçamental».
Ora, a grande pergunta que surge é desde logo esta: porquê tudo isto? O que é que leva o .Governo a vir duas vezes pedir à Assembleia da República que abdique das suas prerrogativas orçamentais, que como toda a gente sabe são indesejáveis, e as transfira em bloco para um Executivo que ficaria com poderes para talhar e retalhar o Orçamento de Estado em vigor, durante 6 meses inteiros, a maior parte dos quais a Assembleia da República estará a funcionar plena e regularmente.
O que é que isto quer dizer Srs. Deputados governamentais? Alguém é capaz de esclarecer!?
Ainda há pouco foi lembrado pelo meu camarada Carlos Brito que durante estes dias o Governo infligiu à Assembleia da República verdadeiros tratos de polé. Inundou-a de autorizações descabidas, acintosas, mal fundamentadas, baralhou. tudo, pediu cheques em branco, vangloriou-se de não dar explicações, recusa-se a revelar articulados, chegou a mandar aqui Secretários de Estado não mandatados, desacompanhados, para defenderem pedidos do Governo perfeitamente em branco, o que contraria disposições constitucionais múltiplas que me dispenso de referia. Fez o que nunca tinha sido feito aqui, pelos que fizeram do pior que nós já vimos fazer.
É nessa orientação que a proposta de lei n.º 34/III e a sua antecedente se inserem e é essa orientação que levam ao extremo, numa matéria que, no entanto, não consente a mínima beliscadura ao principio da legalidade e se prende com o poder orçamental, que é uma das competências parlamentares por excelência, indelegável, fundamental, absolutamente reservada, um dos actos de direcção política que os parlamentos - e só os parlamentos - podem praticar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Este Governo não hesita em propor duas vezes seguidas a violação da Constituição financeira, com o mesmo à vontade com que há dias propôs e viu aprovada a violação da Constituição económica, com a inconstitucional abertura dos principais sectores básicos ao grande capital.
E o mesmo espírito, é a mesma atitude, mas agora em matéria orçamental, em matéria financeira, o que nos levou, de pleno, à questão de inconstitucionalidade que motivou a impugnação, agora apresentada pelo meu Grupo Parlamentar.
A questão é esta: o Governo pede poderes atómicos, verdadeiramente atómicos numa área em que só a Assembleia da República pode carregar no botão.
A Constituição, antes e depois da revisão, estabelece regras precisas sobre a elaboração, aprovação, revisão e execução do OGE.
Nos termos do artigo 108.º, o Orçamento discrimina receitas e despesas e reparte-as segundo uma classificação orgânica e funcional que uma vez aprovada não pode ser alterada, salvo em estritos termos que salvaguardem os contornos do Orçamento e a prerrogativas da Assembleia.

Ora isto, que consta claramente do artigo 108 º da Constituição que foi desenvolvido, explicitado e sem inovação no artigo 20 º da Lei de Enquadramento do Orçamento Geral do Estado, constitui um obstáculo inultrapassável.

Em segundo lugar, Srs. Deputados, a Constituição .é inequívoca quanto às competências orçamentais. O artigo 164 º ao disciplinar a competência política da Assembleia da República inclui nela a aprovação orçamental. E isto significa que o acto orçamental constitui reserva absoluta e intransponível do Parlamento, indelegável de forma alguma.

Nem até 5 milhões nem até 5 tostões. 15to é o que decorre, rigorosamente, da Constituição.

Aplausos do PCP.

Aprovado através de lei, o Orçamento de Estado, no seu cerne, só por lei pode ser alterado. Há aqui uma reserva absoluta de lei formal. E, por isso, é formalmente inconstitucional um orçamento que seja alterado por acto que não seja por lei do Parlamento e é organicamente inconstitucional se não emanar do próprio Parlamento e é materialmente inconstitucional tudo o que viole o artigo 108 º da Constituição. Acresce que, ainda que nada disto sucedesse, e sucede, nenhuma lei poderia suspender ou permitir que um acto governamental suspendesse ou violasse a Constituição, por 2 dias, por 1 dia, por 5 minutos ou por 6 meses, como o Governo agora quer fazer, ou uma lei da República vigente. É o que determina o novo artigo 115.º da Constituição, se os Srs. Deputados governamentais bem o leram. A Constituição não se suspende e o Governo não pode vir aqui pedir, como já fez por duas vezes - e é escandaloso - que nós anunciemos ao país que em matéria financeira a Constituição «segue dentro de momentos» ou, melhor, daqui a 6 meses.

Tudo isto é sabido, o Governo não pode ignorá-lo, pois foi amplamente discutido no quadro da revisão constitucional. Os poderes e as prerrogativas da Assembleia foram, inclusivamente, ampliadas; o conteúdo e implicações da Constituição e em particular da Constituição financeira neste ponto são claros. A dou-

Página 929

15 DE JULHO DE 1985 929

trina portuguesa é inteiramente unânime quanto a tudo isto.
A ruptura constitucional com a Constituição de 1933 neste ponto é cabal e completa. As leis de meios, Srs. Deputados da maioria, acabaram para sempre, nem há delegações parlamentares dos poderes orçamentais da Assembleia da República.
Sabendo o Governo tudo isto, ou não lhe podendo aproveitar ignorância tal como não aproveita aos cidadãos, chegou aqui por duas vezes, é o que sabemos, e singelamente disse-nos, depois de retirar e de repor, Srs. Deputados tenham paciência mas «torna-se necessário que a Assembleia da República autorize o Governo a proceder a alterações orçamentais, com prejuízo do artigo 20.° da Lei de Enquadramento do Orçamento Geral do Estado».
Mas, Srs. Deputados, dizer «com prejuízo do artigo 20.° da Lei de Enquadramento do Orçamento Geral do Estado» é o mesmo que dizer com prejuízo do artigo 108.° da Constituição, e dizer isto é vir aqui, de forma crua e nua, propor e repropor à Assembleia uma inconstitucionalidade perfeitamente grossa, perfeitamente inacreditável, agravada pela confissão de que a prevaricação não vai exceder nunca os tais famosos 5 milhões.
E perguntamos: como é que é possível que um Governo com um mínimo de responsabilidade, de bom senso ou de alfabetização constitucional venha por 2 vezes pedir à Assembleia da República que seja cúmplice de uma barbosada destas?
E coloca-se uma outra interrogação: o que é que impediu o Governo de vir aqui propor concreta e fundamentadamente uma simples, uma honesta, uma muito constitucional revisão do Orçamento de Estado em vigor? Por que é que preferiu vir aqui pedir por 2 vezes aquilo que não passa de uma revisão encapotada e logo inconstitucional do OGE em vigor?
As iniciativas desencadeadas pelo Grupo Parlamentar do PCP face às propostas governamentais visaram também contribuir por dilucidar e esclarecer este ponto. Quisemos contribuir para colocar, finalmente, em termos sãos a questão orçamental que neste ano de 1983 está francamente resolvida em termos que são distantes daquilo que seria desejável em termos constitucionais no nosso país.
E vale a pena reflectir um pouco sobre essa patologia, contra a qual nos temos batido constantemente ao longo destes meses e destes anos.
Não é novidade para nenhum dos Srs. Deputados que apesar das disposições legais e constitucionais os governos têm gozado de uma discricionaridade quase incontrolada na chamada administração dos fundos públicos. Muito correctamente a Lei de Enquadramento do Orçamento Geral do Estado veio conferir aos governos apenas o poder de praticar certas e limitadas alterações orçamentais: em primeiro lugar, alterações de despesas incluídas em contas de ordem (sendo as contas de ordem de despesas apenas o reflexo das contas de ordem das receitas, justifica-se que sejam excluídas da reserva parlamentar no caso de haver excesso de cobrança de receitas), o que não constitui uma real alteração; em segundo lugar, o Governo pode mexer nas despesas cobertas com saldos de dotações dos anos anteriores que por serem dos anos anteriores já foram autorizadas afinal pela Assembleia; em terceiro lugar, o Governo pode enfrentar despesas não previstas e inadiáveis, usando para o efeito a dotação provisional, inscrita para isso mesmo no OGE como uma espécie de verba em branco, cuja redistribuição não afecta a repartição funcional do OGE na sua globalidade.
Só que, Srs. Deputados, excedendo em muito este regime, as leis do OGE dos governos do PSD e do CDS nunca se esqueceram de autorizar os governos a transferir, mediante concordância do Ministro das Finanças e do Plano, de um ministério ou departamento para outro ou dentro do mesmo orçamento as verbas respeitantes a investimentos do Plano, independentemente da respectiva classificação funcional e a ajustar da mesma forma as dotações respeitantes aos subsídios às empresas públicas e aumentos de capital constantes do orçamento do Ministério das Finanças e do Plano.
Este abuso foi consagrado legalmente e repetiu-se pelo que nunca foram fiscalizadas as contas públicas.
Mas em 1983 - e é para este aspecto que alertamos a Câmara - tudo isto foi subitamente agravado com a aprovação dessa bizarria que dá pelo nome de «OGE para 1983 provisório».
Ora, é inteiramente exdrúxulo e impensável que logo no ano em que por contingências da vida política vigora o OGE como vigora, o Governo ponha um ar inocente e venha aqui à Assembleia da República, por duas vezes, pedir uma autorização legislativa para mudar de alto abaixo esse Orçamento dito «provisório», de forma administrativa e total.
Em matéria de fenómenos este Governo acaba, pura e simplesmente, por levar a palma ao governo Balsemão que já nos tinha brindado com um orçamento denominado «provisório».
O que o Governo veio aqui pedir foi, pura e simplesmente, que a Assembleia da República se despojasse das suas competências e declarasse - é preciso dizê-lo - o estado de sítio financeiro, a autonomia orçamental, concedendo ao Governo a ditadura financeira por 6 meses.

Aplausos do PCP.

Só que isto, Srs. Deputados, não pode ser!
A revisão orçamental tem processo próprio quanto à competência, quanto à forma, quanto ao conteúdo. Se um Governo quer fazer uma revisão orçamental tem de fazê-la pelo meio próprio ou então não a faz. O que não pode é fazê-la por vielas e becos e tentar comprometer a Assembleia da República com esses ínvios e obscuros processos que são, pura e simplesmente, inconstitucionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O Governo não pode mandar esta Assembleia para férias e exigir-lhe que antes de sair deste portão se despoje e se dispa das suas competências em matéria orçamental, porque nenhum Governo, nenhum deputado, nenhum grupo parlamentar, nenhum órgão de soberania pode roubar à Assembleia da República as prerrogativas que tem, e só ela, tem, em matéria orçamental.

Aplausos do PCP.

Que o Governo aspire a governar sem fiscalização parlamentar já é muito grave, mas que queira governar usurpando poderes da Assembleia da República em

Página 930

930

matéria orçamental é intolerável, e é preciso dizer aos Srs. Deputados governamentais que se têm essa ideia é de a tirarem da cabeça porque ela é inconstitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando esta proposta de lei deu entrada pela primeira vez e foi lido o respectivo título, ainda admitimos que se tratasse de um lapso e interrogámos até a Mesa no sentido de clarificar esto aspecto. Mas depois das peripécias de ontem e da noite de ontem ficou claro que não é de lapso que se trata. E, sim, de uma opção política do Governo e é a reincidência numa opção inconstitucional que esta Assembleia não pode acolher, sob pena de hipotecar um dos fundamentos da sua própria existência e do seu prestígio.
Muito concretamente esta Assembleia tem um problema grave a resolver. O país vive sob um orçamento dito «provisório» e sem plano anual para 1983. O que se deveria ter feito na abertura dos trabalhos era rever o orçamento sanando-lhe o que houvesse a sanar e alterando-o, compatibilizando-o com um plano para o período curto, como manda a Constituição. Assim se afastaria o espectro da inconstitucionalidade e se reforçaria a segurança jurídica tão necessária neste domínio. Foi pira isto que alertámos durante o debate do Programa do Governo, tendo chegado mesmo a interpelar concretamente o Sr. Ministro das Finanças que pura e simplesmente se recusou a responder nesta sede. Correu para o Ministério e mandou distribuir uma lacónica nota oficiosa em que anunciava como quem debita axioma, que OGE para 1983 não haveria, nem plano, nem coisa nenhuma que não fosse um galope preparatório do OGE para 1984.
As várias vozes que de vários lados se ergueram perguntando como ia ser para controlar certas despesas, reequacionar afectações, etc., o Sr. Ministro das Finanças e o Governo responderam com um silêncio completo e cheio de mistério e proclamaram que estavam concentrados na feitura do OGE de 1984.
Mas ao segundo tiro, o mistério ficou agora decifrado. Está aqui. Traz o n.º 34/III, vai ser presumivelmente defendido por um membro do Governo e ficará como uma das maiores aberrações da história orçamental portuguesa, antes e depois da República.
Os Srs. Deputados terão reparado que ao longo deste discurso não acentuamos sequer, a abstrusidade política que é o facto de um Governo PS ter feito seu um OGE de que o PS disse as últimas quando era oposição, e com muita razão.
A questão que através da impugnação desta proposta de lei quisemos colocar é esta: vai o Governo persistir nesta inconstitucionalidade tão chocante que nem com o guizo dos 5 milhões se imagina que pudesse passar ao crivo do Tribunal Constitucional ou, pelo contrário, vai arrepiar caminho e vai aceitar repor o são, como julgámos que tinha feito, quando ontem retirou a proposta de lei n.º 26/III.

O que vai fazer o Governo e a maioria governamental?
Ao Governo está completamente vedada a revisão orçamental por via administrativa com usurpação das prerrogativas parlamentares. Mas basta-lhe simplesmente cumprir a Constituição para viabilizar as alterações que pretende, designadamente as que constam do actual artigo 3.º da proposta de lei em apreço, através de alterações concretas, fundamentadas, especificadas. autorizadas por esta Assembleia e só por ela.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Basta-lhe para isso cumprir esta Constituição que nos obriga a todos.
E então vale a pena voltar à pergunta inicial: porque tudo isto, porque é que fomos forçados a vir aqui a esta tribuna fazer esta impugnação, depois do Governo ter ontem - julgava-se - retirado esta monstruosidade jurídico-constitucional.
Há, talvez, para isto uma resposta.
Durante o debate do seu Programa o Governo veio aqui anunciar numa «terapêutica dolorosa» ao País, nas palavras do Sr. Ministro das Finanças. Mas furtou-se a compromissos quantitativos e temporais. Da sua política ficou a saber-se, talvez, o como, mas já não o quanto e muito menos o quando. Mas enquanto o Governo recusa fazer Plano para 1983, porque em seu entender «as metas tem de ser maduramente avaliadas» vai deixando cair, como todos estamos a ver, sobre os portugueses os efeitos da desvalorização do escudo, a subida infernal dos preços, com especial incidência nos produtos essenciais, o garrote do crédito, a estagnação do investimento e do crescimento, o aumento do desemprego.
E enquanto leva a Washington informações actualizadas sobre a evolução da economia portuguesa, o Governo PS/PSD recusa à Assembleia da República aquilo que vai rapidamente entregar ao FMI. É essa, talvez, a verdadeira razão porque não quer trazer aqui qualquer proposta concreta, informada, documentada e fundamentada sobre a revisão do OCE em vigor. O Governo não se limita a esconder informações vitais à opinião pública nacional, antes quer sonegá-las à própria Assembleia da República, para que esta, de olhos fechados e sem qualquer informação sobre elementos cruciais, lhe dê uma autorização para se utilizar de tudo aquilo que é prerrogativa exclusiva parlamentar.
Durante o debate do Programa do Governo ficámos todos sem saber um só prazo concreto para os planos governamentais. E o Governo veio agora aqui, por 2 vezes, dizer que lhe concedamos poderes e que vamos para férias porque os planos lá irão sendo executados.
15to não e aceitável, Srs. Deputados!
A Assembleia não foi informada sobre quantos milhões de contos há de empréstimos activos, nem sobre quantos milhões de contos faltam para atingir o limite legal de contracção de crédito, nem sobre as concretas decisões em matéria de revisões e cortes dos programas de investimento do sector público. Mas, em contrapartida, o Governo veio propor e repropor que, às cegas, o autorizemos a cortar aquilo que só a Assembleia da República pode cortar e que, em nosso entender, não deve cortar.
Como há dias lembrava, com felicidade, um camarada da minha bancada, o Governo tem do Parlamento uma tal concepção que só certamente por esquecimento não veio aqui pedir, há umas semanas, uma singela autorização legislativa para aprovar ele próprio o seu Programa e outra autorização legislativa para votar, na intimidade do Conselho de Ministros, uma calorosa moção de confiança, devidamente carimbada às cegas por essa Assembleia.

Página 931

15 JULHO DE 1983 931

Aplausos do PCP.

Não vai nisto o mínimo exagero. Mas como compreenderão os Srs. Deputados governamentais, essa concepção redutora e aviltadora da Assembleia da República é inaceitável.
Permitam-me. uma reflexão final.
Outrora, nos primórdios do constitucionalismo, findos os períodos de ditadura, os governos tinham o costume de vir a este hemiciclo pedir um bill de indemnidade, uma legalização dos actos da ditadura. Nesses tempos prevaricava-se primeiro e pedia-se vénia depois. Este Governo vai mais longe e veio por 2 vezes pedir aqui antecipadamente que lhe concedêssemos indemnidade por 6 meses de ditadura financeira. Não pensem nisso os Srs. Membros do Governo da parte do nosso Grupo Parlamentar ou de qualquer entidade responsável desta Assembleia.
Bom será que o Governo retire de vez esta proposta amonstralhada. Mas se o não fizer sempre poderá esta Assembleia atalhar o mal, dando provimento à impugnação que o PCP apresentou com os fundamentos que acabei de expor.
Se não bastar este debate para dissuadir o Governo e a maioria da inconstitucionalidade que aqui está proposta, estamos certos de que, o regime democrático tem mecanismos perfeitamente aptos a impedir que a aberração se consuma e produza efeitos. Pela nossa parte tudo faremos para que assim suceda.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condenso.

O Sr. Fernando Condenso (PSD): - Sr. Presidente, não sei se a sessão se prorroga ou se faremos agora o intervalo para o almoço.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condenso, há pouco esse problema foi posto da seguinte forma: o Sr. Deputado Carlos Lage afirmou que não haveria oposição para conceder ao Sr. Deputado José Magalhães o tempo necessário para terminar a sua intervenção. Nesse pressuposto concedi ao Sr. Deputado José Magalhães a palavra.
Acontece que este intervalo que vamos agora ter é um intervalo que tem a natureza de um intervalo para descanso e não a natureza de um prolongamento da sessão.
Assim, no seguimento da sua interpelação à Mesa eu ponho a questão aos Srs. Deputados de saber se querem que se faça já o intervalo ou não?

Pausa.

Como a opinião geral é a de que se faça o intervalo, suspendo a sessão.

Eram 13 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 40 minutos.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): - Sr. Presidente, é para, nos termos regimentais, solicitarmos um intervalo de 30 minutos.

O Sr. Presidente: - Com certeza.

Está, pois, suspensa a reunião por 30 minutos.

Eram 15 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Encontrava-se inscrito para intervir o Sr. Deputado Fernando Condesso, que ainda não se encontra presente.

Pausa.

Para que efeito pede a palavra, Sr. Deputado Manuel Moreira?

O Sr. Manuel Moreira (PSD): - Sr. Presidente, é apenas para sugerir que entretanto seja concedida a palavra ao orador que esteja inscrito a seguir ao Sr. Deputado Fernando Condenso.

O Sr. Presidente:- Sr. Deputado, direi a V.Ex.ª que a Mesa também seria capaz de fazer esse tipo de raciocínio, mas não há mais oradores inscritos.

Pausa.

Para que efeito pede a palavra, Sr. Deputado Lopes Cardoso?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, sem querer pôr em causa a capacidade de raciocínio da Mesa - o que não me permitiria fazer - sugeria que se o Sr. Deputado Fernando Condesso não está presente se passasse adiante. Penso ser isso o que normalmente se faz em casos idênticos.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Lopes Cardoso. Simplesmente, usando o princípio da dúvida metódica, está-se neste momento a verificar se há quorum para se poder votar.

Pausa.

Como o Sr. Deputado Fernando Condenso já se encontra presente, concedo-lhe a palavra para uma intervenção.

O Sr. Fernando Condenso (PSD): - Sr. Presidente, dado que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento fez menção de usar da palavra, eu concedo-lhe a minha vez por troca.

Vozes do PCP: - Está bem ensaiado!

Página 932

932

O Sr. Presidente: - Em primeiro lugar, é preciso que a Mesa também tenha visto o Sr. Secretário de Estado a pedir a palavra ...
De facto, o Sr. Secretário de Estado agita-se na sua bancada, o que se pressupõe, pois, queira usar da palavra.

Risos.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, eu vi o Sr. Secretário de Estado fazer sinal nesse sentido, e por isso é que sugeri que ...

O Sr. Presidente: - O Sr. Secretário de Estado goza nesta Casa do benefício de falar na altura em que se inscrever. Pergunto-lhe, pois, se deseja trocar a sua vez com o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Secretário de Estado, para nova intervenção.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ouvi atentamente a intervenção aqui proferida esta manhã pelo Sr. Deputado José Magalhães a propósito desta proposta de lei.
Gostaria de salientar que o Governo tem o maior respeito por esta Câmara e, ao apresentar a proposta de lei em apreço, fê-lo fundamentalmente determinado em obediência à sua política de contenção das despesas públicas e do défice do Orçamento Geral do Estado.
E explico porquê: o Governo tem a consciência de que o défice do Orçamento Geral do Estado tem implicações muito negativas a nível da inflação, do investimento, e até, vamos lá!, de solidariedade entre gerações. Daí que, à medida que têm surgido propostas de reforços, o Governo se tenha vindo a preocupar em conter essas propostas.
E como? Nuns casos, apelando para a solidariedade entre os diversos serviços do mesmo ministério. Quando um serviço do ministério A suscita um pedido de reforço, o Governo, designadamente o Ministério das Finanças, tem pedido a esse Ministério que dentro do seu orçamento encontre a indispensável contrapartida.
Por outro lado, nalguns casos tem-se assistido a uma certa solidariedade entre ministérios, que, apesar dos apertos dos seus orçamentos, sempre lhe é possível dai extraírem algumas verbas para se fazer face as despesas mais prementes, mais urgentes de outro ministério.
Foi, pois, em obediência a estes princípios e motivado por esta ideia de contenção do défice do Orçamento Geral do Estado que esta proposta de lei foi apresentada a esta Câmara.
Gostaria também de salientar um outro ponto. Foi aqui dito hoje de manhã que esta proposta de lei representava uma modificação substancial, uma certa ocultação de verbas e, sobretudo, uma alteração profunda do Orçamento de 83.
A propósito, referiria que o Orçamento de 83 é um orçamento da ordem dos 772 milhões de contos, e o que aqui está em jogo neste momento são alterações orçamentais, sem acréscimo da despesa total, até ao montante de 5 milhões de contos. 15to significa, Sr. Presidente e Srs. Deputados, qualquer coisa como 0/6 %.

Portanto, tirar-se daqui a ilação de que estamos perante uma alteração profunda do Orçamento é um certo exagero de linguagem.
De todo o modo, o Governo está convencido dos méritos da sua proposta de lei e entende que ela deve ser mantida. Todavia, se a Câmara persistir na mesma orientação, o Governo aceita perfeitamente que os artigos 1.º e 2.º caiam e que em data oportuna, provavelmente em Outubro ou Novembro, volte a esta Câmara com propostas de natureza idêntica mas pontualmente definidas como a que consta cio artigo 3.º da proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Secretário de Estado não desconhece a estima que tenho pela pessoa e pela competência de V.Ex.ª, que sempre tenho prezado desde que ocupa funções governamentais.
Por isso mesmo não queria que tomasse o que lhe vou dizer como qualquer remoque ou afirmação de índole pessoal, o que jamais seria possível, mas sim no âmbito das relações existentes entre o Governo e a oposição.
V.Ex.ª, numa segunda edição corrigida, aumentada, mas prejudicada, veio apresentar a esta Câmara uma proposta de lei em que se quer subverter, de forma substancial, todos os princípios basilares em que se define a política do Governo em face do Estado - e digo estado para não empregar a palavra país - e principalmente em face desta Assembleia da República.
Naturalmente que há várias maneiras de olhar para esta questão. Não desconheço, de forma nenhuma, que este Governo entrou em funções depois do Orçamento aprovado; não desconheço que o País está a viver numa situação desesperada sob o ponto de vista económico e financeiro e que todos nós temos de estar conscientes de que devemos contribuir para não dificultar, e, muito menos obstruir, o papel e a acção do Ministério das Finanças nos tempos mais próximos.
Todos nós estamos conscientes de que, pelo menos pela personalidade e vigor das convicções democráticas do Primeiro-Ministro, este Governo não quer destruir o regime constitucional que, com o apoio do Partido Socialista, nós aqui votámos.

Mas leva-nos à perplexidade pensar que tacto isto está a ser esquecido pelo Governo. Não percebo até que o Governo use de uma certa displicência para com o Tribunal Constitucional, porque eu não vejo como é que o Governo, ciente e respeitador desse órgão, pode aqui apresentar, só para ganhar tempo, determinado tipo de autorizações legislativas, o que tem levado os partidos da oposição a terem de recorrer constantemente - o que não constitui prática corrente das democracias ocidentais - ao Tribunal Constitucional, até para que este discuta as propostas de autorização legislativa.
Com efeito, depois do debate que se tem processado nos últimos dias - em que a oposição afirmou, provando-o, que o Governo não está a trabalhar como deveria sob os pontos de vista formal e substancial, depois de ter demonstrado que este trata com ligeireza os seus próprios pedidos de autorização legislativa, depois de o próprio Governo ter reconhecido que

Página 933

15 DE JULHO DE 1983 933

nada está a correr de feição pelas modificações que aqui têm sido feitas e até pelo próprio à-vontade com que o Governo diz "eu trago uma proposta e a maioria que me apoia há-de depois modificá-la para satisfazer os desejos da oposição", como V.Ex.ª, aliás, acaba de dizer que, por exemplo, em relação a uma matéria tão importante, tão fundamental e neste momento tão precisa para o País, vem disposto a deixar cair os l.º e 2.º artigos da presente proposta - estamos a perguntar-nos a nós próprios se estamos ou não aqui para alguma coisa.
Bastava-nos o espectáculo degradante de a própria maioria não conseguir manter permanentemente nesta Câmara um mínimo de assiduidade dos seus deputados...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes):- 0 Sr. Deputado!...

O Orador- - Não somos nós que temos que assegurar o quorum e conceder as autorizações ao Governo, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Pela nossa parte, eu até podia estar sozinho nesta bancada para fazer oposição. Quem tem de ter votos é V. Ex.ª, com aqueles que lhe deram um voto de confiança.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Dizia eu, pois, que esta displicência que o Governo aqui vem mostrar choca-nos e perturba-nos. Choca-nos, em primeiro lugar, porque parece que o Governo aqui vem absolutamente confiante de que vai levar uma autorização legislativa no bolso dado que dispõe da maioria atenta, veneradora e obrigada; em segundo lugar, comporta-se com displicência, como quem diz "eu apresentei isso, mandei para cá e depois vou retirar tudo quanto quero" - isto, sob o ponto de vista das relações do Ministério das Finanças com a Assembleia da República.
Diz V. Ex.ª que os três pontos fundamentais são: a contenção de despesas, a solidariedade entre os ministérios e os 0,6 % que a propostas agora apresentada representa em face do volume total do Orçamento.
Dá a impressão. Sr. Secretário de Estado, que são coisas novas que VV. Ex.as descobriram agora nestes últimos 40 dias. Ora, nunca me constou que o Ministério das Finanças não quisesse conter as despesas. Uma das leis basilares do Ministério das Finanças é conter as despesas dos últimos anos. Portanto, a preocupação de conter as despesas como princípio basilar que enforma este pedido de autorização parece ser mera conversa e pura perda de tempo.
Referiu-se também à solidariedade entre os ministérios. O que é que isso significa? Quer V.Ex.ª dizer que depois da muita discussão que houve entre o PS e o PSD eles não se entendem no Conselho de Ministros e que só nesta autorização ministerial, e pela primeira vez, se vem dizer à Câmara que ela é um exemplo de solidariedade ministerial? 15to significa que. V.Ex.ª pretende declarar que depois de 40 dias de tomada de posse este é o primeiro exemplo e que quanto a outros aspectos não se entendem?
Nós já sabíamos isso, mas queríamos que explicitasse melhor o que é que essa solidariedade significa.
Perguntava-lhe ainda: os princípios constitucionais estão dependentes de percentagem? 15to é, se for de 0,6 % eles confirmam ou infirmam o respeito que o Governo deve ter pela Constituição?
Em outras palavras: pelo facto de o valor incluído na autorização que VV. Ex.as pedem corresponder apenas a 0,6 % dá-vos o direito de pontapear a Constituição a vosso bel-prazer? Só com um volume de verbas é que é necessário respeitar a Constituição?
Estes são os primeiros comentários àquilo que V. Ex.ª acabou de dizer; e nada disse, porque os três princípios que enunciou de nada podem justificar a autorização que o Governo aqui veio pedir.
Eu perguntava ao Sr. Secretário de Estado se esta transferência de verbas significa ou não uma modificação estrutural e substancial na política orçamenta (do Governo, isto é, se a política orçamental do Governo continua a ser a mesma da AD e se agora se trata unicamente de flutuações de proa, mantendo o bojo do navio exactamente igual àquilo que nós votámos meses atrás.
Sem menosprezo pela sua pessoa e pela sua competência técnica, tratando-se de assunto de tanto melindre e importância política - e não me venham dizer que pelo facto de vir do Partido Comunista isto não tem importância e que só aquilo que a maioria vota é que representa a Assembleia da República - gostaria de perguntar se não acha que durante a discussão de um assunto como este, em que se trata de discutir a manutenção ou não da política orçamental do Governo, não devia aqui estar presente o Sr. Ministro das Finanças. Ou o Sr. Ministro entende que deve estar fora de todos os debates parlamentares, ser o homem que sabe e não discute porque o poder manda e não dialoga?
Queríamos ainda saber se não é o Sr. Ministro das Finanças o homem forte deste Governo e se não era ele que deveria estar presente para dar todas as explicações à Câmara sobre esta autorização legislativa que, substancialmente, modifica o voto desta Assembleia da República.
A maioria que hoje vai votar esta autorização legislativa - que modifica o Orçamento por completo é uma maioria completamente diferente daquela que votou o Orçamento que está na base desta autorização.
Não devia, pois, o Sr. Ministro das Finanças - já não digo o Sr. Primeiro-Ministro - preocupar-se pela alteração qualitativa do voto que subjaz ao Orçamento que VV. Ex.as vão executar até Dezembro de 1983?
V. Ex.ª dirá: "isto de nada interessa porque se trata de perguntas meramente formais, meramente palavrosas, porque o que está em causa é o Governo ter o dinheiro, e tudo o que a oposição faz é a obstrução a este desejo do Governo"!
Nós já aqui dissemos que a nossa oposição não de obstrução ao Governo porque nós compreendemos que algumas alterações são necessárias, embora pensemos que o modo de as introduzir não seja este e estejamos contra a maneira formal e processual de as fazer.
Perguntava, pois, a VV. Ex.as se não querem discutir esse problema como deve ser, dentro das regras normais de um Estado de Direito ou se, como um grande bulldozer, com uma maioria esmagadora, no sentido literal do termo, pretendem esmagar tudo e todos para fazer tudo quanto querem.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Página 934

934 I SÉRIE - NÚMERO 22

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos à intervenção proferida há pouco pelo Sr. Secretário de Estado os Srs. Deputados José Magalhães e Carlos Brito.
E o Sr. Deputado Lopes Cardoso para que efeito pediu a palavra?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - É para formular um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Com uma candura constitucional verdadeiramente tocante, o Sr. Secretário de Estado veio aqui confessar aquilo que já constava da exposição de motivos da proposta de lei apresentada pelo Governo por duas vezes. Isto é, o Governo quer alterar a repartição orgânica e funcional de despesas que hoje consta do Orçamento Geral do Estado.
O Sr. Secretário de Estado disse que se trataria de conter o défice, de evitar propostas de reforços que a Administração Pública vem fazendo, mas o que confessa no fundamental é que quer alterar o Orçamento em vigor para além daquilo que o artigo 20.º da Lei do Enquadramento permite porque, de contrário, não estaria aqui e a proposta seria um absurdo.
Trata-se, portanto, de alterar, para além do artigo 20.º - e este artigo reproduz o artigo 108.º da Constituição, logo trata-se também de alterar para além deste artigo, logo trata-se de uma inconstitucionalidade.
Isto é evidente e acaba de ser confessado mais uma vez pelo Sr. Secretário de Estado.
Da sua descrição conclui-se que os ministérios estão solidários, estão pranhos de solidariedade, querem intercambiar despesas, estão dispostos a repartir verbas...!

Grassa uma solidariedade terrível!...
Só que há coisas, chamadas Constituição e Lei do Enquadramento, que não permitem que essa solidariedade se exprima por outra forma que não seja a de pedir à Assembleia da República que converta essa solidariedade numa Lei da República. Não há outra forma, Sr. Secretário de Estado e Srs. Deputados!
Num segundo aspecto, de nada adianta dizer que o Governo quer fazer alterações até 5 milhões, isto é, até 0,6 %. Ora, não há pequenas e médias inconstitucionalidades, há inconstitucionalidades que são chapadíssimas, sejam de 0,6%, sejam de 96 %, sejam do que for. E o Governo insiste em confessar que quer fazer uma revisão orçamental inconstitucional, isto é, fora daquilo que é permitido pela Constituição.
Um outro aspecto surpreendente: o Sr. Secretário de Estado confessa que aceita que caiam os artigos 1.º e 2.º e que, depois do almoço, o Governo se satisfaz com o artigo 3.º!
Importa perguntar que Governo é este que num dia propõe a proposta de lei n.º 26/III, que depois a retira, que depois apresenta a proposta de lei n.º 24/III, que logo a seguir aceita amputar a proposta de lei n.º 34/III e manter o artigo 3.º, artigo este que também não pode ficar como está! Se apercebeu da sua redacção verá que esse artigo também é genérico, também não especifica e contém no fim a mesma coisa que o artigo 1.º que a actual proposta de lei permite.
Portanto, Sr. Secretário de Estado, não pode vir aqui propor a mesma coisa, residualmente ainda de uma forma imperfeita, mas que é o arrombar das competências e das prerrogativas indelegáveis da Assembleia da República. Pense melhor na questão e talvez ainda chegue a uma solução razoável, talvez ainda chegue a uma solução constitucional.
Uma última pergunta: por que é que o Governo não propõe, muito calmamente, uma revisão orçamental nos termos previstos na Lei do Enquadramento, em termos constitucionais?
Como é que o Governo ousa tratar uma questão deste tipo com esta ligeireza, com esta candura, e por que é que o Sr. Secretário de Estado, pura e simplesmente, pretende manter o artigo 3.º a usurpar, durante 6 meses porque não altera esse prazo -, as competências e as prerrogativas indelegáveis?
Porque é que o Sr. Secretário de Estado não pede uma interrupção da sessão para colocar a questão ao Governo a fim de discutirmos aqui isto em termos constitucionais, repondo no são um processo que está inquinado e que está a ser tratado de tal forma confusa e aberrante que a aberração da proposta se soma à aberração do comportamento da maioria governamental?
Meus senhores, ainda é tempo de arrepiarem caminho! É esta a nossa proposta!

Aplausos do PCP:

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - O Sr. Presidente referiu que esta minha inscrição para pedir esclarecimentos foi tardia. Assim aconteceu, na verdade!
Ora, eu fiquei com a ideia de que a intervenção do Sr. Secretário de Estado era apenas a primeira parte de uma certa encenação que havia sido combinada durante o almoço entre o Governo e a maioria governamental. Tanto assim, que o Sr. Deputado Fernando Condesso prescindiu da sua vez de usar da palavra para aceder ao Sr. Secretário de Estado. Pensei, pois, que, a seguir, o Sr. Presidente daria a palavra ao Sr. Deputado Fernando Condesso, mas pelos vistos prescindiu de a usar e eu fiquei a aguardar o que se iria passar. Isto, porque me pareceu que o Sr. Secretário de Estado tinha usado uma linguagem um tanto decifrada.
Na verdade, o Governo reconhece que o seu pedido de autorização legislativa é, pelo menos, passível da suspeita de ser inconstitucional, está na disposição de retirar parte desse pedido - os artigos 1.ª e 2.ª -, confessa que só faz questão do artigo 3.º e diz que fará tudo isto se a Assembleia da República persistir nesta orientação.
Que orientação, Sr. Secretário de Estado? Até agora houve uma intervenção da minha bancada de fundamentação da impugnação. O Sr. Secretário de Estado toma essa intervenção como orientação da Assembleia da República ou há outros eventos que a minha bancada desconhece? Era de todo importante que isto fosse esclarecido.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nós estamos aqui há uns dias à volta deste pedido de autorização legislativa do Governo

Página 935

JULHO 1983 935

para fazer o Orçamento, ofendendo as regras mais básicas da democracia representativa, da democracia parlamentar, e o Governo não se dá conta de que a ataca nos seus próprios alicerces. O Parlamento existe, antes de tudo, para controlar e fazer o Orçamento. Então como é que sobre uma matéria destas há estas exitações, estes avanços, este recuo?
Sr. Secretário de Estado, eu insistia na recomendação que já foi feita pelo meu camarada José Magalhães: por que é que não pede uma suspensão dos trabalhos e não apresenta a seguir uma proposta de lei material com o que é essencial e para ver - como diz o nosso povo - se às três é de vez? 15to é, se às três vão mesmo provar qualquer coisa que permita reformular o Orçamento e atender às razões que existem e que nós reconhecemos.

Risos do PCP e do CDS.

Esta é a nossa proposta. Vamos ver, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados da maioria governamental, se não será possível pedirem uma suspensão da sessão, entenderem-se e irmos para uma coisa séria que um problema tão delicado como este exige e como o nosso país e nosso povo esperarão de nós.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado, para responder às interpelações que lhe foram feitas.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de justificar a ausência do Sr. Ministro das Finanças que, por motivos muito ponderosos, o impossibilitam de estar hoje aqui presente.
Gostaria também de salientar de novo que quando citei a percentagem de 0,6 % não quis propriamente referir que estávamos perante grandes ou pequenas inconstitucionalidades. Se de facto o Governo pensasse que poderia haver inconstitucionalidade, obviamente que não teria avançado com a proposta de lei.

O que eu quis significar, outros sim, quando referi os 0,6 %, é que não estávamos a pretender nova autorização da Assembleia para alterar profundamente o Orçamento Geral do Estado. Essa foi, pois, a razão que me levou a citar os 0,6 %.
Para nós não existe essa inconstitucionalidade e daí que apresentássemos a proposta.
Entretanto, posso precisar que ao referir o artigo 3 º gostaria que apenas aqueles 2 casos concretos ficassem pontualmente referidos. Penso que desta forma há uma perfeita satisfação perante a Câmara quando referimos esses dois casos concretos de alterações de verba, havendo aqui uma alteração da classificação funcional.
São estas as explicações que no essencial entendo dar neste momento à Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso, para protestar em relação à intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, se me permite queria antes disso, interpelar a Mesa no sentido de saber se há alguma inscrição para intervenção.

O Sr. Presidente: - Há sim, Sr. Deputado. Estão inscritos os Srs. Deputados Fernando Condesso e Veiga de Oliveira.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Usarei então a figura de protesto, que é a única de que me posso socorrer neste momento.
Para começar, diria que, embora formalmente o protesto seja dirigido à intervenção do Sr. Deputado Narana Coissoró, eu pretendo alargar-lhe o âmbito.
E qual é o meu protesto? Nós temos sucessivamente vindo a ver, e do nosso ponto de vista com fundadas razões, o Governe ser aqui criticado por um certo comportamento fechado em relação à Assembleia e por uma certa tendência de chegar aqui e fazer funcionar a sua maioria, independentemente das vozes que aqui se levantam para contraditar os seus argumentos.
Desta vez, nós vemos da parte do Governo a abertura total para escutar as críticas destas bancadas e passa a ser acusado de confucionismo, de não saber o que quer e de, ao fim e ao cabo, não ter ideias claras.

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD e da ASDI.

Uma tal atitude não pode fundamentar-se numa posição que se reivindica de oposição não sistemática ao Governo. Creio, pois, que este é o exemplo mais claro de oposição sistemática e de obstrução ao Governo.
Pela nossa parte. não pouparemos as críticas, como não as poupámos até agora, sempre que entendamos que o Governo as merece.
Simplesmente, não reclamaremos para que o Governo seja preso "quer tenha cão, quer não tenha cão". como fazem outras bancadas.

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso está equivocado quanto à nossa posição.
O Sr. Deputado deve ter pensado na Constituição, quando ela diz claramente que qualquer alteração e distribuição orgânica e funcional das verbas orçamentais tem de ser feita através de lei da República. E até agora o Governo não mostrou a mínima disposição em substituir uma autorização legislativa por uma proposta de lei que transforme em lei da República aquilo que quer fazer através de decreto-lei.
Diz também o Sr. Deputado que nós queremos fazer uma oposição sistemática. V.Ex.ª diz isso porque nós pedimos que o Sr. Ministro das Finanças estivesse aqui presente? Não foi a bancada do Sr. Deputado que s: retirou - e outras bancadas adjacentes - porque um senhor secretário de Estado não estava presente para responder às suas perguntas? Ou V.Ex.ª, esmagado pelo voto do Partido Socialista, também quer dar agora estas pequenas cambalhotazinhas?

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, para que efeito pede a palavra?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, eu não estava certo de qual a figura que tinha sido usada pelo Sr. Deputado Lopes Cardoso, e tencionava

Página 936

936

fazer-lhe um pedido de esclarecimento. Sei agora que utilizou a figura do protesto pelo que utilizarei uma outra fala para lhe colocar nova pergunta.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado Carlos Brito.
E o Sr. Deputado Lopes Cardoso, para que efeito pede a palavra?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para usar do direito de defesa, Sr. Presidente, em relação à resposta do Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Só V.Ex.ª é que é juiz nessa matéria, pelo que tem a palavra.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Queria apenas dizer ao Sr. Deputado Narana Coissoró que há uma coisa em relação à qual eu poderia ter a presunção de o bater se não tivesse visto a sua actuação de há 3 semanas a esta parte.
Em matéria de cambalhotas o Sr. Deputado é imbatível. Seria demasiada presunção da minha parte pretender batê-lo nessa matéria!

Aplausos da UEDS, do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para dar explicações.

O Sr. Presidente: - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É só para dizer que o Sr. Deputado Lopes Cardoso entende que a defesa da Constituição é dar cambalhotas. E lá com ele!

Risos da UEDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Condesso, para uma intervenção.

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trouxe o Governo a esta Câmara uma proposta de lei em cujos termos se procederia a alterações orçamentais através de expediente que, por vozes da oposição, poderiam bulir com a norma do artigo 108.º da Constituição já revista, mas que, por força do artigo 239.º da Constituição actual, se mantém em vigor.
E fácil às oposições clamar continuamente - algumas vezes com razão, outras com expediente de obstrução - por inconstitucionalidades. Mais difícil é às maiorias, sobretudo quando as oposições usam e abusam, ponderar calmamente e admitir alguma dúvida.
Ouvimos a exposição do Sr. Secretário de Estado e constatámos que o interesse do Governo se prende com a necessidade de se proceder a ajustamentos do Orçamento Geral do Estado para o ano corrente em vários domínios, desde já apontando-se, conforme consta do artigo 3 º da proposta de lei, as situações aí discriminadas.
Constatámos também que o Governo pretenderia munir-se de um instrumento que lhe permitiria posteriormente vir mesmo a proceder a outras transferências, mas constatámos, pelas palavras do Sr. Secretário de Estado, que, para já, as transferências que vê referidas no artigo 3 º resolvem, nos próximos tempos, os problemas a que o Governo tem de fazer face. Outros poderão existir, mas o Governo, na reabertura dos trabalhos da Assembleia, poderá aqui voltar e pedir novamente, através de revisão, autorização para transferências de outras verbas.
Ouvimos a disponibilidade manifestada pelo Sr. Secretário de Estado para alterar o articulado da proposta de lei e temos de dizer que é com apreço que o vemos a colaborar com esta Câmara, em face das considerações que aqui sejam feitas de forma a que se obtenha um texto que no fundo corresponda às necessidades do Governo e ao pensamento da Câmara e por isso nós ousamos propor - e já se encontra na Mesa a nossa proposta - a eliminação dos artigos 1.º e 2.º e que o artigo 3.º passe a artigo 1.º com a seguinte redacção:

E o Governo autorizado a operar transferências de verbas do Gabinete do Ministro da Indústria para o Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial e da Direcção-Geral do Património do Estado para o Instituto Português do Património Cultural.

O artigo 4.º, que diz respeito à entrada em vigor da lei, passaria, obviamente, a artigo 2.º

Srs. Deputados, ouvimos aqui considerações que não compreendemos. Compreendemos perfeitamente que a bancada do CDS quase reivindicasse a presença do Sr. Ministro das Finanças; congratulamo-nos até com isso, pois demonstra apreço por um ministro desta coligação. Constatamos, de qualquer maneira, que, constitucionalmente, o ministro pode fazer-se substituir pelo Sr. Secretário de Estado, o que mostra a sua confiança nele.
O Governo está aqui representado, e bem representado.

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.

Mais: porquê ventilar questões que não estão em causa, porquê tentar confundir tudo, dizendo que o Governo pretende fazer uma revolução, pretende alterar toda a política orçamental, quando ele, pura e simplesmente, vem dizer que pretende resolver problemas transferindo verbas que é indispensável transferir de umas áreas para outras?
O Governo não pretende esmagar ninguém, pretende governar eficazmente!

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.

A nossa proposta será decerto acolhida por esta Câmara. O Governo não a configurou tal qual. nós a configurámos neste momento, embora a aceite.
Mas, Srs. Deputados, porquê tanto barulho acerca de uma questão tão simples?
O Governo apresenta uma proposta de lei, esta Câmara, que tem o poder decisório final, configura-a em colaboração com ele de modo a satisfazer as necessidades apresentadas numa altura em que, precisamente, há dificuldades em configurar algo que diz respeito a um regime concreto, que é o regime orçamental, que está em mudança, em tramutação, por-

Página 937

13 DE JULHO DE 1993 937

que sabemos que a revisão constitucional alterou um certo sistema orçamental, sistema esse que uma nova lei de enquadramento terá de efectivar através de alterações que não poderão deixar de praticar-se.

Porquê esta intolerância da Câmara? Porquê este extrapolar, este extremar de posições, este procurar, a pretexto de tudo e de nada, mesmo quando há boa vontade em alterar e em configurar as coisas da melhor maneira, protelar os problemas, porquê transformar sempre tudo em comício?
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nós maioria apoiante do Governo, configuraremos as necessidades do Governo na melhor maneira de as resolver e continuaremos em colaboração com ele, a procurar resolver os problemas dos Portugueses o mais rapidamente possível, com a eficiência que se impõe.
Este o sentido da minha intervenção, este o 'sentido da intervenção do Sr. Secretária de Estado, este o sentido das propostas que apresentámos
Mesa e que por certo esta Câmara não deixará de aprovar.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos ao orador que acabou de intervir, os Srs. Deputados Luís Beiroco e Veiga de Oliveira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - O Sr. Deputado Fernando Condesso fez uma longa intervenção em que proeurou estigmatizar as oposições sobre a forma como se comportavam nesta Câmara.
Creio que o problema que está em debate não é o de avaliar substancialmente as propostas que o Governo aqui traz; creio mesmo que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tem razão quando diz que elas são de montante modesto em termos do volume do Orçamento Geral do Estado; creio ainda que, substancialmente, não levantariam grandes problemas.
O que se trata de saber é a forma que o Governo utilizou para fazer as propostas de lei e se ela é compatível com as disposições constitucionais e legais em vigor.
Nós sabemos que a Constituição revista não está ainda em vigor em matéria respeitante ao Orçamento Geral do Estado; só entrará em vigor a partir da elaboração do Orçamento de 1984. Penso, portanto, que estaremos todos de acordo que neste momento esta matéria é regida, por um lado, pelos artigos constitucionais aplicáveis antes da revisão constitucional, e, por outro lado, pela Lei de Enquadramento do Orçamento.
Ora, o que se trata de saber é se, face à Lei de Enquadramento do Orçamento, pode haver uma proposta de lei de autorização legislativa nesta matéria ou se as transferências de verbas, salvo nos casos directamente exceptuados pelos n.ºs 2 e seguintes do artigo 20.º, não têm de ser feitas por lei da Assembleia da República.
Se o Sr. Deputado Fernando Condesso defende que podem ser feitas sem ser por lei da Assembleia da República, isto é, por autorização legislativa e posteriormente por decreto-lei, gostaria que o dissesse claramente e que ao menos assumisse a responsabilidade da sua interpretação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condesso, pretende responder já ou no fim dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, respondo no fim. Pressuponho que algumas outras intervenções poderão abordar o mesmo tema.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Fernando Condesso, dando explicações - que nós não comentaremos agora, vamos fazê-lo daqui a pouco - anunciou que apresentou propostas que, segundo suponho, são de substituição à proposta de lei de autorização legislativa do Governo, que iriam mutilar enormemente, por um lado, a proposta de lei do Governo, na medida em que lhe retiravam o núcleo essencial, e, por outro, iriam reduzir essa autorização legislativa àquilo que, no fundamental, é o artigo 3.º.
Suponho que o Sr. Deputado, por lapso, não leu - esta é a primeira pergunta que lhe faço - a parte final do papel que mandou distribuir, isto é, a fixação do máximo global das transferências. Pergunto: existe ou não montante global?
A segunda pergunta é muito simples: o Sr. Deputado sabe ou não sabe que a matéria relativa às alterações ao OGE, quer seja pela Constituição antes de revista, quer seja pela Constituição depois de revista, exige uma lei de alteração, não podendo ser concedida através de um pedido de autorização do Governo? Sabe ou não sabe que essa matéria está completamente vedada a qualquer autorização através do artigo 164.º da Constituição? Como é que o Sr. Deputado comenta o que se diz no artigo 164.º da Constituição, que diz que é competência político/legislativa da Assembleia, designadamente tudo o que diz respeito ao OGE?
Gostaria, pois, que esclarecesse estas questões.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para um protesto, o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vamo-nos habituando às intervenções do Sr. Deputado Fernando Condesso ...

O Sr. Fernando Condesso (PSD): - Só agora?

O Orador: - ... e o Sr. Deputado Fernando Condesso habituou-se a dizer, ou vai-se habituando, que tudo o que a oposição diz é barulho. Naturalmente que ele não gostaria de ouvir este tipo de barulho, mas sim que tudo se passasse unicamente entre o Governo e a maioria de que ele faz parte, mas, Sr. Deputado, nós não estamos habituados a este tipo de linguagem característico e popular.
Aquilo que nós dizemos não é barulho, aquilo que nós dizemos é o exercício dos nossos direitos de oposição. Mesmo que isto possa punir os seus ouvidos puritanos pertencentes a um partido que gostaria de ser único para fazer tudo o que quisesse aqui no Parlamento, V.Ex.ª terá sempre este barulho à sua perna todas as vezes que nós desejarmos usar da palavra.

Vozes do CDS: - Muito bem!

Página 938

938

O Orador: - Digo-lhe mais uma coisa: foi por causa deste barulho que o Governo se viu obrigado a modificar a sua proposta, se não fosse este barulho VV, Ex.as teriam feito passar tudo o que queriam ...

Aplausos do CDS.

... e nesta altura estávamos completamente governamentalizados.

Protestos do PSD.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para protestar em relação à intervenção do Sr. Deputado Fernando Condenso.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, a palavra vai-lhe ser concedida para formular um protesto. No entanto, gostaria de sublinhar que esse tipo de palavra se deve fazer imediatamente a seguir à intervenção.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: O nosso protesto vai neste sentido: todas as observações feitas pelo Sr. Deputado Fernando Condenso, em relação a alegadas atitudes de obstrução desta bancada nesta matéria, são inteiramente despropositadas e profundamente chocantes.
Aquilo que nós fizemos no exercício de um direito constitucional, que, como é óbvio, não abdicamos, foi impugnar uma proposta governamental que era uma enormidade tal que o Sr. Deputado Fernando Condenso subscreveu uma proposta que a desfaz, que a despe de alguns dos seus aleijões mais patentes, mas que lhe mantém algumas das inconstitucionalidades que lhe tínhamos apontado. É uma confissão que se tratava de uma enormidade e que foi justo, adequado e necessário que nós a impugnássemos, aliás, impugnaremos toda a matéria apresentada pelo Governo que for inconstitucional.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo aspecto: aquilo que aqui tem acontecido é profundamente patológico. Estamos a discutir uma impugnação do PCP e enxertou-se nessa impugnação o debate acerca do fundo da matéria, acerca da proposta governamental, facto que traduz o atabalhoamento com que a maioria conduz os negócios parlamentares e toda a vida política portuguesa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro aspecto: a maioria ao exibir esta atitude revela uma profunda desorientação. Primeiro, queriam tudo, todos os poderes orçamentais por 6 meses; daí a um bocado queriam tudo até 5 milhões; daí a uns minutos já queriam alguma coisa até 150 000. Srs. Deputados, o que é que vão querer daqui a 15 minutos?
Por estes motivos dizemos: repensem tudo isto, dêem ocasião ao Conselho de Ministros para repensar, também ele, aquilo que lhe cabe nesta matéria e que se acabe com este incidente - que é um incidente de impugnação e nada mais - para que os Srs. Deputados da maioria não exibam mais do que aquilo que já exibiram em matéria de descoordenação, distribuindo a esmo acusações que recaem por inteiro sobre as suas cabeças em matéria de obstrução, incapacidade e irresponsabilidade parlamentar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder. o Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Fernando Condesso (CDS) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto à intervenção feita pelo Sr. Deputado Luís Beiroco, devo dizer que ele tem razão, é óbvio que tem razão! Provavelmente fez o pedido de esclarecimento porque eu não consegui expressar-me no sentido rigoroso daquilo que era o meu pensamento.
As propostas que apresentei acabam por não dar ao Governo nenhuma autorização para alterar uma lei.
Portanto, os argumentos à base do artigo 239 % do artigo l08.º, do artigo 115.º, da Constituição não têm qualquer fundamento.
A proposta de alteração que apresentámos ao artigo 3.º significa - não interessam os considerandos da proposta de lei que não fazem vigor- uma autêntica proposta que, uma vez aprovada, será, não uma lei de autorização para o Governo, mas uma autêntica lei de alteração.

Risos do PCP e do CDS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - O quê?! Que enormidade!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - É um espanto!

O Orador- - No fundo, o significado prático é esse! Não estamos a conceder uma autorização para alterar qualquer tipo de legislação.

Protestos do PCP e do CDS.

Será a maneira prática de resolver esta questão em concomitância com os interesses que o Governo, no fundo, tem sobre a matéria.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira refere-se à questão do montante global. Nós, na nossa proposta, que já foi distribuída, naquilo que será o nosso artigo 1.º, indicamos esse montante.
Em relação ao proposto do Sr. Deputado Narana Coissoró deixe-me dizer-lhe o seguinte: nós não acolhemos barulho, não é devido ao barulho que passamos a estar predispostos a alterar, ou a melhorar, algo. Nós acolhemos e ouvimos as razões, estejam elas onde estiverem.
Em relação ao Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer que o enxerto que aqui é feito é um enxerto relativo à proposta do Governo, que pareceu oportuno desde já revelar à Câmara na medida em que, feito ele, muito daquilo que seriam considerações a fazer durante o debate caem por base e não têm de ser consideradas. Entretanto VV. Ex.as sabem que o Governo, através da abertura revelada, e nós, através da proposta feita, fizemos cair por base muitas das considerações que V.Ex.as iriam defender se a proposta, tal como está, se mantivesse, na intenção do Governo ou da maioria, até ao fim.

Página 939

DE 1983 939

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto em relação às palavras do Sr. Deputado Fernando Condenso.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado Fernando Condenso, sob a forma de protesto, que é a forma regimental aplicável, queria dizer-lhe que o Sr. Deputado começou por dizer que eu tinha razão para depois destruir, sem sequer ter argumentado, aquilo que eu tinha dito na minha intervenção durante o pedido de esclarecimento.
É evidente que aquilo que está em causa é saber se as alterações que o Governo pretende introduzir no Orçamento Geral do Estado podem ser feitas através de uma autorização legislativa ou se têm de ser feitas através de uma proposta de lei a esta Assembleia. Se estivéssemos a discutir uma proposta de lei não teria havido toda esta discussão, o pedido do Governo era razoável e a minha bancada ter-lhe-ía dado rapidamente a sua aprovação.
O problema que se coloca é de forma e não é pelo facto de o Sr. Deputado Fernando Condesso introduzir propostas de alteração que limitam a extensão do pedido de autorização legislativa, que o documento deixa de ser um pedido de autorização legislativa e deixa de ser inconstitucional.

Vozes do CDS: - Muito bem!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Claro!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condenso, deseja responder já ou no fim dos pedidos de palavra?

O Sr. Fernando Condenso (PSD): - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto relativo às palavras do Sr. Deputado Fernando Condesso.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu protesto é muito simples.
O Sr. Deputado Fernando Condenso respondeu-me em relação ao montante, mas nada disse relativamente ao que eu insisti mais. A minha insistência é só esta: à face da Constituição, antes e depois da revisão, não pode haver alterações no Orçamento que dependam da Assembleia, isto é, que sejam susceptíveis de ser feitas directamente peto Governo, não pode haver essas alterações a não ser que seja apresentada uma proposta de lei à Assembleia nessa forma e com outras coisas - que daqui a um bocado lhe direi - que permita à Assembleia votar essas alterações.
Sabe ou não sabe que isto é assim, sabe ou não sabe que não há possibilidades de autorizar o Governo a fazer quaisquer alterações por que o artigo 164 º da Constituição o impede frontalmente?
Não é matéria autorizável, é matéria da competência política e legislativa da Assembleia. Nem sequer e da reserva absoluta de competência, é mais do que isso, está acima disso, é cerne da própria Assembleia. Sabe ou não sabe isso, Sr. Deputado?
Responda-me por favor.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr Deputado Fernando Condenso.

O Sr. Fernando Condenso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para terminar, devo acrescentar, em relação às intervenções dos Srs. Deputados do CDS e do PCP, que as alterações a esta matéria não se farão por autorização dada ao Governo, fazem-se através de uma proposta de lei. O que está em causa é uma proposta de lei ...

Protestos do PCP.

... e o que eu pergunto - a minha resposta vai em jeito de pergunta - o seguinte: se for aprovada por esta Assembleia a proposta de lei que aqui está em apreço com o conteúdo final das alterações por nós propostas, resulta ou não uma lei da Assembleia da República, através da qual se poderá proceder às transferências que o Governo necessita efectuar?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, estou inscrito para uma intervenção e não me parece que seja vantajoso continuar num "diz tu, direi eu" sem que, por uma vez, se procure introduzir o debate numa via um pouco mais finalizante.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira, como sabe a Mesa não dispõe de meios regimentais para evitar o uso das figuras previstas no Regimento.
Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As alterações propostas pelos grupos parlamentares do PS e do PSD nada vieram alterar porque são alterações a um pedido de autorização legislativa.
O que acontece, na sequência daquilo que foi alterado e que substancialmente dá satisfação à Câmara - neste aspecto que estivemos a discutir até agora é que o Governo vai legislar sobre esta matéria sob a forma de decreto-lei.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - E isso!

O Orador: - Para que o Governo não legisle nobre esta matéria, sob a forma de decreto-lei, é preciso que ele tome a iniciativa de ele próprio, com este conteúdo - que foi dado pelos dois partidos da coligação governamental - fazer uma proposta de lei que ainda poderá ser aprovada por esta Assembleia entre hoje e amanhã. 15so é que parece fundamental.

Página 940

940

A questão não é formal, Sr. Deputado, a questão é substancial, é uma regra de bronze do funcionamento do Parlamento: «se nesta matéria é o Parlamento que autoriza, é o Parlamento que se pronunciar.
Embora estejamos substancialmente satisfeitos - é bom sublinhá-lo- com as explicações do Sr. Secretário de Estado, com os aditamentos que VV. Ex º' acabaram de formular, se a matéria for legislada por decreto-lei está quebrada uma regra de bronze deste Parlamento e é para isso que, com todo o barulho que temos vindo a fazer, com toda a oposição - que já foi classificada de sistemática -, queremos chamar a atenção desta Câmara.

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Fernando Condesso, deseja usar da palavra?

O Sr. !Fernando Condesso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputadas: Nada mais tenho a acrescentar ... apenas que, em concordância com aquilo que já foi por mim afirmado, o que está em causa é uma proposta de lei e que, a ser aprovado o conteúdo das alterações apresentadas, o que estará em causa é uma proposta de lei da qual sairá uma lei. Uma lei que não será catalogável em termos técnicos, uma lei de autorização que é, no entanto, uma lei que permite ao Governo resolver os problemas que o fez trazer a esta Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra porque sinto necessidade de fazer um esforço de clarificação de toda esta situação.
Entretanto chamo a atenção do Sr. Presidente da Assembleia da República, neste momento o Sr. Vice-Presidente José Luís Nunes, para o facto de não estar presente o Governo. Aquilo que eu vou dizer, que pretende encontrar uma saída justa, constitucional, correcta e rápida para todo este problema, tem interesse para a Governo. Nesse sentido, pedia ao Sr. Presidente que envidasse os esforços possíveis para que um membro do Governo pudesse assistir à minha intervenção.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, em primeiro lugar, direi que V. Ex.ª tem efectiva razão, pois não está presente nenhum membro do Governo.

Risos.

Em segundo lugar, o Governo está aqui presente na base de um direito próprio. Nesse sentido, e como é nossa convicção que o Governo gostará de estar presente, já estão a ser feitas diligências pelo Sr. Secretário da Mesa para transmitir aos Srs. Secretários de Estado que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira pretende intervir da forma que há pouco expressou.

Pausa.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - V. Ex.ª deseja intervir neste momento e nestas circunstâncias?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, para não perdermos tempo e como a minha intenção é, no fundo, mais dirigida, ou substancialmente dirigida, às bancadas do Partido Socialista e do PSD - em especial do PSD, como subscritores das propostas de alteração que nos foram submetidas -, enquanto se aguarda a presença do Governo, se me permitisse, usaria da palavra se o Sr. Deputado Veiga de Oliveira não se importar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, vê algum inconveniente em trocar com o Sr. Deputado Lopes Cardoso?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, não vejo inconveniente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. (Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que eu queria chamar a atenção, em especial das bancadas do PSD e do Partido Socialista, era para o facto de estarmos formalmente confrontados com um pedido de autorização legislativa e que não pode ser concedida ao Governo autorização legislativa para alterar o Orçamento.
Mais: estamos confrontados com um pedido de autorização legislativa que não tem sentido nem conteúdo face às propostas de alteração que foram agora apresentadas, propostas que configuram muito mais claramente uma proposta de lei.
Se há dúvidas nessa matéria, pergunto: por que é que não se transforma o pedido de autorização legislativa numa proposta de lei com o conteúdo dessas alterações, sanando-se todas as eventuais dúvidas que, para mim, são certezas, embora admita que para os outros sejam dúvidas, visto não ter a verdade «agarrada a uma perna»? 15to pode ser feito por iniciativa dos próprios deputados desta Assembleia, que podem apresentar um projecto de lei com este conteúdo ...

Vozes do PCP: - Não podem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Tem de ser o Governo a apresentar!

O Orador: - Dizem-me que não podem - não vi a questão com atenção -, mas se não podem ...
Penso que de hoje para amanhã se poderia suprir - desde que houvesse o compromisso da Câmara que isto seria admitido e aprovado amanhã- o problema, criando-se e trabalhando-se em condições de perfeita limpidez, arredando toda a espécie de dúvidas nesta matéria.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito Sr. Deputado?

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Lopes Cardoso, de alguma forma, solicitou a nossa opinião acerca da sugestão

Página 941

15 DE JULHO DE 1983 941

que deu e, por isso, muito rapidamente tenho a dizer-lhe o seguinte: ...

O Sr. Presidente: - Portanto, o Sr. Deputado Carlos Laje pede a palavra para dar esclarecimentos ao Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Exacto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Em primeiro lugar, as bandidas do PS e do PSD não podem tomar uma iniciativa nesta matéria, mas, naturalmente, acolheriam com simpatia uma iniciativa do Governo, sob a forma de proposta de lei, que pudesse suprir as dificuldades.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Somente isso não foi feito até à data porque caso aparecesse agora uma proposta de lei, se lhe fosse exigida toda a terminação normal, era muito difícil ser discutida neste período. Por isso, de alguma forma, nós não advogámos, ou optámos, por semelhante solução. São questões de natureza processual que aqui se levantam.

Entretanto, somaram assento na bancada do Governo, o Sr. Secretário ele Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Depois de todas estas intervenções e achegas dadas pelos Srs. Deputados, parece que começa agora a estar claro qual é o único caminho certo para sair deste impasse.
Queria antes de tudo dizer o seguinte: apesar de estarmos formalmente na discussão da impugnação, por consenso da Câmara, incluindo o do partido impugnante, acabámos por discutir o mérito da questão e a forma de sair do impasse em que estávamos. Não vale a pena estarmos a querer retroceder e, por isso, vou fazer a seguinte sugestão: é evidente que, em matéria orçamental, só a Assembleia da República pode legislar e quando se trata de alterações ao Orçamento há alterações que cabem no poder e competências do Governo - são alterações que não implicam, por exemplo, nem a classificação funcional, nem a classificação orgânica - e há alterações que ultrapassando essas classificações, não cabem nas competências do Governo. Quando se trata de alterações deste segundo tipo terá sempre de ser feita, como aliás esta Assembleia já fez várias vezes, uma lei de alterações e tanto bonda que se tenha em conta o artigo 108 º da Constituição, antes da revisão, como o artigo 108.º da Constituição, depois da revisão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O que vai estar sempre em causa é saber qual é a desagregação das verbas orçamentais que são votadas pela Assembleia. Antes, pelo artigo 108 º, antes da revisão, essa desagregação ia até às Secretarias de Estado, no futuro irá até onde for definida, porque ainda não o está e, para isso, terá de haver uma lei desta Assembleia. Em todo o caso, o que importa reter é que, quando as alterações ao Orçamento não caibam nas competências do Governo, terá de haver uma lei de alterações ao Orçamento - não lei de autorização legislativa - que permita fazer essas modificações. 15to parece-me ser um dado, desde já, adquirido.
E também adquirido que a proposta de lei do Governo, tal como foi feita e com todas as modificações que já foram sugeridas, se mantém como proposta de lei de autorização legislativa, fastio que implica um decreto para a executar.
Sendo assim, a única maneira de repor tudo dentro dos precisos termos constitucionais, que neste caso são extremamente importantes - tão importantes que poderiam, se não fossem cumpridos, criar situações, inclusivamente, de recusa de pagamento de impostos, por haver inquinamento da lei do OGE em vigor e isto e uma coisa que os Srs. Deputados e o Governo devem pensar com muita meditação, já que o tribunal Constitucional dificilmente deixaria passar esta lei mesmo com esta variante que aqui foi proposta por alteração dos Srs. Deputados - é o Governo retirar esta sua proposta de lei e que amanhã seja presente à Assembleia uma proposta de lei de alterações no OGE com as matérias que o Governo entender dever apresentar.
Pelo nosso lado estamos sempre dispostos no sentido de viabilizar a Administração Pública e por isso faremos todos os esforços para que a proposta seja votada amanhã.
Assim é a única maneira disto estar certo, é o único percurso que é correcto.
Chamo ainda a atenção do seguinte para alguns senhores deputados que queiram entrar mais a fundo na questão: uma proposta de lei de alterações comporta, por exemplo, os anexos de classificação funcional e os da classificação orgânica. Onde é que eles estão?
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: esses anexos não se encontram na proposta porque ela não era mais do que; um disfarce de uma autorização legislativa autorização que não é permitida. A Constituição é taxativa - artigo 164.º, competência política e legislativa da Assembleia da Republica - reparem, Srs. Deputados, não se trata de competência "absolutamente reservada", é uma coisa que está para além disso, é uma competência que nem sequer é susceptível de poder ser discutida a sua autorização visto que não é competência reservada, mas competência política e legislativa da Assembleia. E o cerne da Assembleia da República!
Por isso, mais uma vez, insisto, repetindo simplesmente aquilo que o meu camarada José Magalhães disse à coisa de três quartos de hora, que o Governo deve retirar a proposta. Esta nossa sugestão mostra que não estamos com nenhuma posição cega contra o Governo - embora pudéssemos ter razões para isso - nós propomos claramente a saída para todo o problema: o Governo retira a proposta e apresenta aqui amanhã uma proposta de lei de alteração com os quadros anexos - é fácil, saberem o que é que tem de mexer visto que sabem o que é que querem mexer - e nós, pelo nosso lado, viabilizaremos a discussão, rápida, e a votação para que o Governo,

Página 942

942

SÉRIE-NÚMERO 87

depois de amanhã, tenha a alteração que pretende do Orçamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso fez um determinado tipo de pergunta e o Sr. Deputado Carlos Lage respondeu-lhe. V.Ex.ª, como não fez nenhuma intervenção nesse debate, não tem figura regimental ...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Inscrevo-me para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Ser-lhe-á dada a palavra para uma intervenção na altura oportuna, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, o meu pedido de esclarecimento destina-se fundamentalmente a precisar as propostas contidas na sua intervenção.
Quando há pouco respondi ao Sr. Deputado Lopes Cardoso apenas sublinhei obstáculos de natureza processual para que a proposta de autorização fosse convertida em proposta de lei, na medida em que, como o Sr. Deputado Veiga de Oliveira sabe - tem sido reiteradamente utilizado o Regimento e os aspectos processuais da. Constituição - se a proposta de lei entrasse de novo na Mesa várias disposições regimentais e constitucionais podiam ser invocadas para que ela não fosse discutida. Como está aberto a um consenso para que a proposta - cujo teor já é conhecido - entre na Mesa e seja discutida amanhã, se bem entendi as suas palavras, o Sr. Deputado não se oporá que isso aconteça, ou seja, não se oporá que a proposta seja apresentada hoje ou amanhã com o teor reformulado. Pergunto: é isso que se pode entender das suas palavras?
Penso que o CDS já teve uma atitude equivalente e, assim, aqueles obstáculos processuais, que poderiam ser invocados para inviabilizar a discussão e aprovação desta importante proposta de lei para o Governo, estão superados.
Penso que os Srs. Deputados da UEDS e da ASDI estão igualmente numa atitude cooperante e colaborante.
Não queremos deixar de agradecer e sublinhar este gesto construtivo de todos os partidos com assento nesta Câmara.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Deputado Carlos Lage, sabemos todos que qualquer proposta de lei do Governo tem de ser aprovada em Conselho de Ministros. Simplesmente, "Conselho de Ministros" não significa que o Conselho de Ministros tenha de reunir com todos os Ministros e na sala da Gomes Teixeira ou "ali em cima" e por isso este governo, se quiser, pode aqui apresentar amanhã, ou hoje mesmo, uma proposta de lei.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares (Armando Lopes): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, queria dar-lhe um esclarecimento que, penso, mata muitos destes problemas.
E que há em tudo isto um lamentável equívoco que resulta de uma leitura um pouco cuidada daquilo que o Governo ontem apresentou.
O Governo apresentou ontem uma proposta de lei - é assim que é chamada - fundamentada no n.º 1 do artigo 170.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 200 º da Constituição, ou seja, estamos a discutir uma proposta de lei e não uma proposta de lei de autorização legislativa. Estamos, assim, dentro do esquema legislativo constitucional que permite as alterações que estão a ser feitas.

O Orador: - O problema, Sr. Secretário de Estado, é que não basta que o Governo chame proposta de autorização legislativa, ou não lhe chame, é preciso que o seja ou não seja, e também não basta ter invocado, certa ou erradamente, o artigo da Constituição ao abrigo da qual apresenta a proposta. 15so é uma outra questão.
Esta não é uma proposta de lei de alterações ao Orçamento porque essa proposta comporta, entre outras coisas, quadros de classificação funcional e orgânica - o Sr. Secretário de Estado do Orçamento está aí e está a ouvir-me e sabe que eu estou a dizer a única verdade que há em matéria de Orçamento e em matéria constitucional. Se o Sr. Secretário de Estado invocou mal o artigo da Constituição ao abrigo da qual o Governo o mandou cá é outra questão, mas que a proposta, tal como se apresenta, é uma proposta de lei de autorização legislativa, nisso não há qualquer dúvida.
Sr. Deputado Carlos Lage, nós sabemos que há exigências formais e sabemos também como ê que o Governo pode rodeá-las.
Segundo, sabemos, que amanhã, se o Governo aqui apresentar uma proposta de lei de alteração ao Orçamento, é possível supondo nós que ela virá constitucional, que não terá nenhum vício de constitucionalidade - discuti-la e aprová-la.
Chamo, no entanto, a atenção para o seguinte: em matéria de orçamento há uma outra preciosidade, ou seja, só a Assembleia pode aprovar alterações que excedam certos limites e só o Governo pode propor leis de alteração. É por isso que os Srs. Deputados não podem apresentar propostas de alteração, não podem converter aquela lei de autorização numa lei que não fosse de autorização. Portanto, só o Governo

Página 943

DE JULHO DE 1983 943

pode propor em matéria de orçamento, e só a Assembleia pode aprovar em matéria de alterações ao orçamento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Interessa ainda saber se alguma dessas alterações cabe ou não na competência do Governo, porque se couber estamos a discutir nada!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não cabe!

O Orador: - Não cabe, eu sei que não cabe, e por isso é preciso fazer uma lei de alterações ao Governo. Ora, o que eu pedia ao Sr. Secretário de Estado é que envidasse os seus melhores esforços para que amanhã a uma hora conveniente - até pode: ser na madrugada de sábado- esteja aqui uma proposta de lei com cabeça, tronco e membros, dizendo o que é que o Governo quer e que se conforme exactamente com a Constituição. Nós discutiremos e votaremos essa proposta de lei.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos, para usar da palavra, os Srs. Deputados Narana Coissoró, Luís Beiroco e Zita Seabra.
Como são 18 horas e 40 minutos estamos na hora do nosso intervalo regimental e, portanto, pergunto ao Sr. Deputado Luís Beiroco para que efeito é que quer usar da palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
E a Sr.ª Deputada Zita Seabra, para que efeito é que também pretende usar da palavra?
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Para formular um curto pedido de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado que acabou de dar um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, como sabe, não existe a figura de pedir esclarecimentos aos esclarecimentos. Não lhe posso conceder a palavra para esse
efeito.
A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Não sei...

O Sr. Presidente: - Se V. Ex.ª quiser inscrever-se para fazer uma intervenção, dar-lhe-ei a palavra na altura própria.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Sr. Presidente, era uma brevíssima pergunta, uma vez...

O Sr. Presidente: - Como V.Ex.ª muito bem sabe, não há pequenas e médias inconstitucionalidades e, por isso, não há pequenas e médias medidas anti-regimentais.

Risos.

Aplausos do PS, do PSD e do CDS.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Inscrevo-me então para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de iniciarmos o nosso intervalo regimental, peço-vos o favor de aguardarem um momento para se proceder à leitura de 2 documentos da Comissão de Regimento e Mandatos.
O primeiro é um ofício dirigido ao Sr. Presidente da Assembleia da República, que é do seguinte teor:

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República:

De acordo com o solicitado no ofício n.º 1698 (Processo n.º 3855/82, Secção 4ª-1.ª), da Polícia Judiciária, de 11 de Janeiro de 1983, tenho a honra de comunicar a V.Ex.ª que esta Comissão Parlamentar deliberou emitir parecer no sentido de ser concedida autorização para que o Sr. Deputado Leonel de Sousa Fadigas depunha como testemunha no processo supra-indicado.

Com os melhores cumprimentos.

Palácio de São Bento, 14 de Julho de 1983. O Vice-Presidente da Comissão de Regimento e Mandatos, Mário Júlio Montalvão Machado.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Como ninguém se inscreve, vamos votar o ofício que acaba de ser lido.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o segundo documento é um relatório e parecer, que vai ser lido pelo Sr. Deputado Daniel Bastos.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É do seguinte teor o relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos:

Em reunião realizada no dia 13 de Julho de 1983, pelas 15 horas e 30 minutos, foi apreciada a seguinte substituição de deputados:

1) Solicitada pelo Partido Comunista Português:

Maria Odete Jesus Filipe (círculo eleitoral de Lisboa) por José Manuel Santos Magalhães (esta substituição é pedida por um período não superior a seis meses).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado e realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

Página 944

944

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos deputados presentes.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - António da Costa (PS) - Bento Elísio de Azevedo ( PS) - Carlos Cardoso Lage (PS) - José Maria Rogue Lino (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - Raúl Fernando Sousela da Costa Brito (PS) - Adérito Manuel Soares Campos (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - José Mário Lemos Damião (PSD) - Maria Margarida Salema Moura Ribeiro (PSD) - Álvaro Augusto Veiga de Oliveira (PCP) - João António Gonçalves do Amaral (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Manuel António de Almeida de A. Vasconcelos (CDS) - João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE) - António Manuel de Carvalho F. Vitorino (UEDS) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão.

Pausa.

Como ninguém deseja usar da palavra, vamos votar

Submetido à votação. foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 45 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 40 minutos.

Após o intervalo, tomaram assento na bancada do Governo o Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, o meu querido amigo Carlos Lage está a pedir-me que deixe o Sr. Ministro de Estado intervir.

Risos.

Tenho muito prazer em ouvir o Sr. Ministro de Estado que naturalmente vai pôr "água na fervura" e facilitar a nossa vida.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro de Estado, V.Ex.ª pediu a palavra?

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Pedi sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então tem a palavra, por troca com o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, tinha pedido a palavra para usar em nome da minha bancada, mas é o Sr. Deputado Luís Beiroco quem vai fazer a intervenção na minha vez. Todavia, sem prejuízo desta intervenção, gostava para já de dar a precedência ao Sr. Ministro de Estado, desde que V. Ex.ª permita, pois é ao Sr. Presidente a quem compete decidir.

O Sr. Presidente: - Permito com certeza. Só que há a seguinte questão: o Sr. Deputado Narana Coissoró prescinde da sua intervenção em favor do Sr. Deputado Luís Beiroco, que, por sua vez, dá a precedência ao Sr. Ministro de Estado. Mas a questão não é regimental porque ainda há Srs. Deputados inscritos.
A Sr.ª Deputada Zita Seabra estaria de acordo em que o Sr. Ministro do Estado falasse imediatamente?

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Com certeza, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Ministro de Estado.

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito obrigado, Sr. Presidente e Srs. Deputados, especialmente aqueles que tiveram a gentileza de me ceder a palavra.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, tive toda a manhã ocupado com o Conselho de Ministros, razão porque não pude estar presente, e agora, quando aqui cheguei, aliás um pouco tarde também, tive conhecimento de que, por responsabilidade nossa, houve aqui um erro induzido que depois se colectivizou.
O caso é este: em meu entender parece claro que esta proposta de lei é mesmo uma proposta de lei e não uma proposta de autorização legislativa. Só que, como veio apresentada e introduzida como uma proposta de autorização legislativa e temos estado a discutir um pacote de autorizações legislativas, é razoável e normal que os Srs. Deputados fossem induzidos a considerar que se tratasse de uma proposta de lei da autorização legislativa, até porque no artigo 1 º se diz "Fica o Governo autorizado...".
Mas peço licença para realçar o seguinte: em parte nenhuma se diz tratar-se de uma proposta de lei de autorização legislativa - fala-se só em proposta de lei - e a autorização que se pede não é para legislar, mas para operar determinadas transferências de verbas no Orçamento. Por outro lado, como hão-de ter reparado, não foi incluído o artigo que normalmente aparece - e que tem sempre que aparecer nas autorizações legislativas - e que se refere à duração da utilização dessa autorização.
Portanto, por infelicidade da redacção do ofício que apresentou a proposta, ela foi rotulada daquilo que não é.

Só que as coisas são o que são e não aquilo que se lhes chama, pelo que pedia aos Srs. Deputados que tivessem a gentileza de, pelo menos a partir deste momento, argumentar e de raciocinar com base na consideração de que se trata de uma proposta de lei

Página 945

15 DE JULHO DE 1983 945

e não de uma proposta de autorização legislativa. 15to parece-me claro.
Lamentamos a indução em erro e peço aos Srs. Deputados que, na medida do possível, corrijam o vosso erro induzido.
Por outro lado, queria dizer que, tratando-se de uma proposta de lei e não de uma proposta de lei de autorização legislativa, provavelmente as reservas deste Parlamento à possível inconstitucionalidade dos artigos 1.º e 2.º teria sido vista a outra luz. Admito, apesar de tudo, que os artigos 1.º e 2.º sejam ainda de duvidosa constitucionalidade, mas não tão clara como seria se se tratasse de uma proposta de autorização legislativa. 15to é óbvio.
O Ministério das Finanças contou um pouco com a tolerância dos Srs. Deputados e a compreensão de que, nesta matéria, o Governo vai precisar, com certeza, de instrumentos que neste momento não conhece no seu pleno rigor - durante as férias vai precisar de transferir verbas que ainda não conhece concretamente. Daí a tentação de fazer uma proposta de lei que, no fundo, é uma proposta de lei de correcção ou de aditamento à proposta de lei do próprio Orçamento.

No sentido de eliminar qualquer dúvida, e porque o Sr. Secretário do Orçamento acha que as verbas que estão referidas no artigo 3.º são do momento aquelas de que mais carece, nós estaríamos de acordo em que fossem suprimidos as artigos 1 º e 2.º e que ao artigo 3 º, para poder ir ao encontro de algumas críticas aqui feitas e que julga fundamentadas, se fizesse a inclusão (terá qualquer bancada que chamar a si a iniciativa de o propor) da classificação, funcional das verbas e não apenas orgânica tal como aqui se refere. Trata-se de verbas pequenas, mas de qualquer modo ainda assim globais. A classificação orgânica está perfeita; a classificação funcional não está, e aí nos julgámos que a vossa compreensão pudesse suprir essa deficiência.

Pedia-vos, portanto, um esforço de boa vontade no sentido de consentirem em que esta proposta de lei passe a ser aquilo que é e não aquilo que se lhe chamou; que os artigos 1.º e 2.º desaparecessem para não termos que discutir a possível arguição de inconstitucionalidade desses 2 artigos; e quanto ao artigo 3.º, para reduzir ou mesmo eliminar a possibilidade dessa arguição, que se aditasse, por proposta de qualquer grupo parlamentar ou Sr. Deputado que queira chamar a si essa tarefa, a classificação funcional destas verbas que o Sr. Secretário de Estado prometeu dentro de curto espaço de tempo.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É para pedir um esclarecimento ao Sr. Ministro de Estado.

O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado José Magalhães, V.Ex.ª pode fazer uma intervenção porque ainda tem tempo para isso. Não precisa, pois, de fazer nenhum pedido de esclarecimento ao Sr. Ministro de Estado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Então agradecia que considerasse a minha inscrição, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
E o Sr. Deputado Veiga de Oliveira pede a palavra para que efeito?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Também para fazer uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado. Fica inscrito.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: A intervenção do Sr. Ministro de Estado que acabou de ter lugar vem clarificar um pouco esta situação.
O Sr. Ministro de Estado pediu a boa vontade da Câmara no sentido de se encontrar uma solução que, sendo conforme às normas constitucionais e legais aplicáveis, permita ao Governo deter o instrumento de que necessita.
Haverá toda a boa vontade da minha bancada, como aliás já tinha sido anunciado.
Apenas quereria dizer ao Sr. Ministro de Estado que não se tratou somente de uma errada qualificação da iniciativa legislativa feita no ofício que endereçou ao Sr. Presidente da Assembleia da República porquanto mesmo no próprio texto do artigo 1.º, ao referir-se a dispensa do estipulado no artigo 20.º, se inculcava claramente que se tratava de um pedido de autorização legislativa.
A não ser assim, não faria sentido invocar a dispensa constante do artigo 20.º, o qual dizia exactamente que as alterações ao Orçamento se teriam que processar através de lei da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Prescindo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A intervenção que sobre esta matéria o Sr. Ministro de Estado veio fazer corrobora muito daquilo que tinha sido aduzido durante o debate que tivemos ocasião de travar. 15to é, o Governo veio, através de uma proposta de lei, pedir autorização, porque de autorização se tratava (a sua qualificação veremos depois), para, com prejuízo do artigo 20 º da Lei de Enquadramento, proceder a determinadas transferências de verbas.
Retirou depois essa proposta, reapresentou-a mais tarde. Dispenso-me de resumir as peripécias que preencheram esta reunião parlamentar.
Em todo o caso, tal como mais uma vez acaba de sublinhar o Sr. Ministro, o Governo vai precisar de transferir verbas, não sabe bem quais, precisa de uma revisão orçamental e, face à situação criada pela sua proposta, está disposto a reduzir-lhe os termos por forma a evitar os escolhos da inconstitucionalidade.
Pois bem, não quisemos nós ao longo do debate que acontecesse outra coisa que não a reposição no são

Página 946

946 I SÉRIE - NÚMERO 22

de um processo que começara no péssimo do ponto de vista constitucional.
Sobre este ponto valerá a pena determo-nos mais algum tempo.
Realmente, não é possível chegar aqui e, com seriedade, que é sempre boa conselheira, dizer que era dúbia a natureza inconstitucional da autorização pedida. E isto porque não se tratava -este problema e, como todos os Srs. Deputados certamente sabem, muito discutido na doutrina - de outra coisa que não a de pedir ao Parlamento que permitisse ao Governo fazer aquilo que só o Parlamento pode fazer.
O Governo erradamente utilizou a expressão «autorização legislativa». Mas, ainda que não o tivesse feito, de uma autorização se tratava sempre. E, como sabem, em matéria orçamental, financeira, em matéria de direito financeiro e, em particular, de direito constitucional financeiro é muito discutível a natureza dessas autorizações.
Em todo o caso, por grande que seja a controvérsia de qualificação, não conheço nenhum tratadista ou ninguém a sustentar que a competência que o artigo 164.º da Constituição refere à Assembleia da República seja delegavel. A competência para a aprovação orçamental é da Assembleia da República. Está inserida num artigo cuja epígrafe é «Competência política e legislativa», mas é uma competência por excelência indesejável. Daí que nenhum governo possa vir pedir à Assembleia da República que lhe conceda poderes para durante o resto do ano económico ou durante qualquer período fazer aquilo que só a Assembleia da República, mediante lei formal, pode fazer.
Este é um ponto em que há uma tal unanimidade na doutrina do direito financeiro que nós não concebemos - e por isso apresentámos a impugnação - como é que foi possível o Governo ter apresentado uma proposta de lei (é óbvio que tinha que ser uma proposta de lei!) pedindo autorização para praticar aquilo que só a Assembleia pode praticar. Isto surpreendeu-nos profundamente e, por isso, deduzimos a impugnação respectiva.
Muito bem, o Governo reconsiderou (nós tínhamos julgado que ontem, quando retirou a proposta, já tinha reconsiderado, mas pelos vistos não o fez, porque, com surpresa, verificámos, por volta das 22 horas, que o Governo repunha exactamente aquilo que julgávamos que tinha retirado por ter compreendido ser irrazoável e inconstitucional aquilo que estava a pedir), e agora dispõe-se e isso é razoável e não queríamos outra coisa- a apresentar uma proposta que parece ser agora, finalmente, à terceira vez, como dizia o meu camarada Carlos Brito, constitucional. A terceira encontrámos o caminho constitucional.
Trata-se agora de saber se isso vai ser conseguido.
Pela nossa parte expusemos já as condições que consideramos necessárias para o efeito e mostrámos a nossa disponibilidade.
Mas importa fazer 2 providos. O Governo diz que vai precisar de fazer transferências. No fundo, vai precisar de fazer uma revisão orçamental mas diz não querer fazer uma revisão orçamental. Lá terá as suas razões. Pela nossa parte, esta não é uma questão despicienda e é estranho o silencia que o Governo guarda sobre a matéria.
Segundo aspecto: a proposta que agora vai ser considerada representará uma restrição drástica, pelo que o Governo fica obviamente inibido de executar qualquer dos actos que tinha pedido à Assembleia da República que o autorizasse a executar. Esta conclusão é particularmente importante.
É nestes termos e com estes considerandos que o nosso grupo parlamentar se mostra disposto a participar em tudo que seja necessário para repor no são e dentro dos limites constitucionais um processo que começou pessimamente e que importa que, pelo menos, não acabe tão mal como começou.
São estes os nossos votos e para isso contribuiremos na medida das nossas possibilidades.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro de Estado: Não é particularmente útil, embora pudesse ser interessante, voltarmos à questão de saber do que é que se tratava.
Gostava de fazer apenas 2 notas.

Para efeitos de esclarecimento da questão, posso até dar como bom que o envelope era errado, isto é, que o ofício que acompanhava a lei, por lapso, lhe chamava lei de autorização legislativa. Mas vamos então ao que lá estava dentro. Quais as diferenças entre o segundo texto e o primeiro (lembro que o primeiro é reconhecido pelo Governo como proposta de alteração legislativa)? Diz o Sr. Ministro de Estado que o artigo do prazo desapareceu. Mas o prazo está expresso de uma maneira claríssima: diz-se no artigo 1.º: «Fica o Governo autorizado, durante o ano económico de 1983 ...».
O prazo está aqui e clarinho. Tirado o artigo do prazo o prazo ficou aqui bem claro - não há diferença!
E, Sr. Ministro, qual é a outra diferença? Eu digo: a outra diferença é que onde se pedia sem qualquer limite de verba, com prejuízo do artigo 20.º da Lei de Enquadramento, Lei n.º 46/77, salvo erro, passou-se a pedir com um limite. Donde, a diferença entre a primeira e a segunda versão é simplesmente a seguinte: num caso não havia limite para as transferências, prejudicando-se assim o artigo 20.º da Lei n.º 46/77, e no outro caso passava a haver limite para essas transferências.
Sr. Ministro: a diferença entre uma proposta e a outra talvez seja só no envelope, porque no seu conteúdo não havia diferença, excepto o quantitativo: em vez de ser um qualquer número de milhões de contos que poderiam ser transferidos, prejudicando assim o referido artigo 20.º, passou a ser 5 milhões de contos.
Não vou reincidir nos argumentos já produzidos pelo meu camarada José Magalhães, mas ia só pedir, no sentido de facilitar a vida da Assembleia e os seus trabalhos, que então, para que tudo fosse normal, surgisse uma proposta formal de Srs. Deputados que apoiam o Governo (naturalmente que são os mais indicados) no sentido de serem suprimidos os artigos 1.º e 2.º da proposta de lei que o Governo apresentou, e que surgisse outra proposta formal, que parece já existir, para que o artigo 3.º tenha outra redacção. E é indispensável que haja um completamento do quadro,

Página 947

15 DE 1983 947

necessário para que tudo isto seja de facto uma proposta de lei de revisão do OGE (aquilo a que o Governo pretende reduzir a sua proposta), acrescentando-se os elementos que o Sr. Ministro já referiu e que são os elementos que dizem respeito à classificação funcional. Na verdade, enquanto que a classificação orgânica resulta, embora não esteja expresso, da menção dos órgãos de que se transferem verbas e dos órgãos para que são transferidas verbas, já a classificação funcional não resulta tão claramente assim, razão por que se pediria que fosse junto o esclarecimento necessário.
A partir daí, então sim!
No entanto, lembro que realmente acabou por ser muito útil, extremamente útil, a impugnação e até a discussão, porque desta forma evitamos que o Tribunal Constitucional venha amanhã a chumbar esta lei através, por exemplo, da verificação abstracta da constitucionalidade, criando assim problemas graves, inclusivamente, como lembrei há pouco, em relação à cobrança de impostos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, é para, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, pedir uma interrupção da sessão por 15 minutos.

O Sr. Presidente: - Por ser regimental, é concedida a. interrupção por 15 minutos, recomeçando a sessão às 19 horas e 15 minutos.
Está interrompida a sessão.

Eram 19 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 19 horas e 20 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não estando ninguém inscrito para usar da palavra, teremos que passar imediatamente à votação.
Vamos proceder à contagem para efeitos de determinação do quorum.

Pausa.

Srs. Deputados, ainda não há quorum para a votação.
Entretanto, informo que deu entrada na Mesa uma proposta de alteração à proposta de lei n.º 34/III, subscrita por deputados do PS e ao PSD, com o seguinte teor:

Propõe-se que a proposta de substituição relativa ao conteúdo do artigo 3.º da proposta de lei n.º 34/III, que passará a ser o artigo 1.º, passa a ter a seguinte redacção:

E o Governo autorizado a operar transferências de verbas do Gabinete do Ministro da Indústria para o Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial e da Direcção-Geral do Património do Estado para o Instituto Português do Património Cultural, respectivamente nos montantes de 45 000 contos e de 37 261 contos, sendo a transferência desta última, segundo a classificação funcional, de 5.03 para 8.10.0.

Srs. Deputados, sobre esta proposta de alteração, que deu entrada às 19 horas e 20 minutos, foi dado despacho pelo Sr. Secretário no sentido de ser fotocopiada, publicada e distribuída aos grupos parlamentares. Portanto esta proposta irá ser incorporada e votada no momento em que se discutir a proposta de lei n.º 34/III.
Presentemente estamos a discutir o recurso interposto pelo PCP e, não havendo mais ninguém inscrito, vamos passar à votação.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados e Srs. Membros do Governo: Em face da proposta de alteração que acaba de ser lida gela Mesa, e muito embora gostássemos de ter o texto na nossa mão, podemos considerar prejudicada a impugnação que apresentámos em relação à proposta de autorização legislativa do Governo.
Na verdade, estão atingidos os nossos objectivos: foram sanadas as inconstitucionalidades frontais que a proposta do Governo comportava. Por isso mesmo consideramos prejudicada a nossa interpelação, razão pela qual não haverá motivo para a sua votação.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Carlos Brito, se bem entendi o Grupo Parlamentar do PCP retira o seu recurso, que estruturalmente não está prejudicado mas que tem que ser retirado.
VV. Ex.as retiram o recurso, não é verdade?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça o favor.

O Sr. Carlos leito (PCP): - Evidentemente que é isso. Como nós consideramos que está prejudicada, retiramo-la, mas na base desta garantia: o Governo, através da proposta de alteração que foi enviada para a Mesa, compromete-se a retirar os artigos 1 º e 2.º da proposta de autorização legislativa que enviou, a apresentar o artigo 3 º com a redacção que acabou de ser anunciada pelo Sr. Presidente e dar a tudo isso a forma de uma proposta de lei material.
E este o entendimento que fazemos e é nessa base que consideramos prejudicada a impugnação e a retiramos para que não haja uma votação, agora sem sentido.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado pelo seu esclarecimento, Sr. Deputado. A minha pergunta ia só no sentido de se respeitar formalmente o que está determinado, na medida em que o considerar-se precludido implicava até um julgamento da própria Mesa quanto à prática dos actos inúteis, o que não era manifestamente o caso.

Página 948

948

Srs. Deputados, deu entrado na Mesa um requerimento subscrito por deputadas do PS e do PSD, do seguinte teor:

Os deputados abaixo-assinados propõem, ao abrigo do n.º 2 do artigo 66 º do Regimento da Assembleia da República, a alteração da sequência das matérias agendadas para a segunda pai da reunião plenária de hoje, passando as mesmas a ficar ordenadas do seguinte modo:

1.4 - Proposta de lei n.º 23/III;
1.5 - Proposta de lei n.º 25/III;
1.6 - Proposta de lei n.º 27/III;
1.7 - Proposta de lei n.º 32/III;
1.8 - Proposta de lei n º 29/III;
1.9 - Proposta de lei n º 21/III;
1.10 - Proposta de lei n.º 33/III;
1.11 - Proposta de lei n.º 28/III;
1.12 - Proposta de lei n.º 30/III;

Srs. Deputados, vamos passar à sua votação.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente peço desculpa, mas por vezes aqui na primeira fila não se percebe o que se diz.
Torna-se necessário que, tal como existem nas outras bancadas, à excepção da do CDS, sejam rapidamente instalados altifalantes!
Peço, portanto, que o Sr. Presidente faça o favor de repetir o que vamos votar.

Protestos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nós vamos votar um requerimento apresentado por Srs. Deputados do PS e do PSD que pretende alterar a ordem pela qual vão ser tratados os pontos da segunda parle da ordem de trabalhas.
Este requerimento é apresentado ao abrigo do artigo 66.º, n.º 2, do Regimento da Assembleia. Como V.Ex.ª sabe os requerimentos que fixam os termos do debate não têm discussão, pelo que são apresentados imediatamente à votação.
Nesse sentido, e depois de ter sido lido, vamos passar à votação.

Submetido d votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da ASDI e do MDP/CDE, e as abstenções do PCP e da UEDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a segunda parte da ordem de trabalhos pela discussão da proposta de lei n.º 23/III, que autoriza o Governo a legislar sobre a criação de uma taxa municipal de transportes destinada ao funcionamento dos transportes colectivos, urbanos e suburbanos, em municípios cuja população seja igual ou superior a 50 000 habitantes.

O Sr. Carlos Lage(PS): - Dá-me licença Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Lage (PS):- Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os responsáveis governamentais por este sector desde ontem que aguardam pacientemente no Parlamento a oportunidade de intervir sobre esta matéria.
Mas neste momento não estão presentes porque nós próprios lhes dissemos que não sabíamos qual a hora a que deviam estar presentes.
Por isso, em vez de esperarmos pela sua chegada, parece que teremos de iniciar o debate sem a intervenção inicial e introdutória dos representantes do Governo.
Pela nossa parte gostaríamos de nos inscrever ...
O Sr. Deputado Almeida Santos pediu ...

Risos.

Desculpe, o Sr. Ministro Almeida Santos pediu e palavra. É com certeza para falar sobre esta matéria, pelo que, com todo o gosto, lhe dou a palavra.

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Era para dar uma breve explicação ...

O Sr. Presidente: - Um momento, Sr, Ministro.
Dou a palavra ao Sr. Ministro de Estado, porque não considero que o Sr. Deputado Carlos Lage seja a pessoa indicada para conceder a palavra.

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
A Sr.ª Secretária de Estado, Helena Torres Marques, embora não se encontrando aqui, está preparada para fazer uma intervenção explicativa dos objectivos que se pretendem com esta proposta de lei.
Não obstante, estando eu presente poderei dizer o mínimo dos mínimos e que é o seguinte: esta proposta de lei tende, no fundo, à consagração de uma taxa municipal que faça com que os transportes de determinadas cidades, que tenham um número de habitantes superior ao que se encontra fixado na proposta de lei, possam ser pagos o mais possível pelos próprios utentes.
Acha-se que é um pouco injusto - bastante injusto até - que as pessoas das mais remotas paragens do País paguem, por exemplo, os transportes de Lisboa, que não utilizam. Na medida do possível deve distribuir-se este encargo por aqueles que utilizam o correspondente serviço. Daí a natureza de taxa, daí a circunstância de vir balizada nos termos em que vem balizada.
Os Srs. Deputados tiveram a oportunidade de ler, na devida altura, um projecto de lei com o mesmo sentido que foi apresentado por deputados, salvo erro, só do Partido Socialista. A ideia é a recuperação desse projecto, e se ele não veio a acompanhar a proposta de autorização foi porque o Sr. Ministro da Administração Interna encarou a possibilidade de o melhorar em alguns aspectos.
Esta é, portanto, a finalidade, a filosofia, como agora se diz, da proposta de lei.
Relativamente a outros pormenores e a outras justificações, a Sr.ª Secretária de Estado Helena Torres Marques fará uma intervenção justificativa e explicativa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

Página 949

DE 1933 949

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro de Estado.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Permita-me, Sr. Ministro, que desde já lhe diga que estamos totalmente de acordo com este pedido de autorização legislativa, não só no fundo como na forma.
No entanto, pretendia ser esclarecido sobre um termo usado no articulado da proposta de autorização legislativa.
No artigo 8.º, quando se fala "nos respectivos utentes", creio que valia a pena fazer uma distinção porque, apesar da palavra utentes ter um significado vulgar, penso que aqui quem se pretende obrigar, de algum modo, ao contributo são os utentes indirectos - aqueles que beneficiam indirectamente desse serviço.
Ora, pode surgir a ideia de que se trata de sobrecarregar o utilizador normal do transporte colectivo, quando o que se pretende não é obviamente isso.
Há 2 formas de utilizar e de beneficiar dos transportes, mas o termo utente tem, na linguagem corrente, um significado que pode induzir em erro.

O Sr. Presidente: - Para responder ao Sr. Deputado Lopes Cardoso, tem a palavra, se desejar, o Sr. Ministro de Estado.

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntes Parlamentares: - Sr. Deputado Lopes Cardoso é óbvio que o sentido é esse até porque a incidência vai ser, como sabe, sobre a massa salarial das empresas.
Mas se entenderem que é necessária uma clarificação, não pomos qualquer objecção a que façam uma proposta.
De qualquer modo, na lei ter-se-á o cuidado de que isso fique bem claro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Morais Leitão, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Morais Leitão (CDS): - E para pedir um esclarecimento ao Sr. Ministro de Estado.

O Sr. Presidente: - Como sabe, Sr. Deputado, os esclarecimentos são pedidos imediatamente após as intervenções ...

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Mas, Sr. Presidente, eu já tinha pedido a palavra.

O Sr. Presidente: - ..., mas de qualquer forma, em face da praxis seguida nesta Casa vou dar-lhe a palavra.
Tem a palavra Sr. Deputado Morais Leitão.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro de Estado, para esclarecer o conteúdo deste debate, queria dizer a V. Ex.ª que concordamos inteiramente com o princípio de que devem ser os utentes a pagar os transportes.
A pergunta que faço é a seguinte: porque é que o Governo entende preferível criar uma taxa municipal para cobrir as indemnizações compensatórias em vez de proceder a uma actualização regular dos preços dos transportes que é a melhor forma de serem os utentes a suportá-los?
Segunda questão: se a taxa visa levar os utentes a satisfazer os transportes, como os custos dos transportes, na parte em que se trata de indemnizações compensatórias, tem vindo a ser suportado pelo OGE, significará isso que vai haver uma redução de impostas para expressar o alívio que esta taxa vai representar para os outros utentes? Ou, pelo contrário, esta taxa municipal mais não é do que uma forma escondida de aumentar a carga fiscal?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro de Estado, se desejar responder, tem V. Ex.ª a palavra.

O Sr. Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Deputado, não seria sério se lhe garantisse que vai haver uma redução de imposta em razão desta proposta de lei. É obvio que não vai haver.
De qualquer modo, o que queremos é que precisamente não seja o contribuinte geral a ser cada vez mais onerado com o aumento do custo dos transportes, mas que aqueles que mais utilizam os transportes paguem mais do que aqueles que utilizem menos. Por isso a proposta vem circunscrita à área das grandes cidades onde, na verdade, o problema dos transportes se põe com mais acuidade.
Mas é claro que a resposta honesta que tenho de lhe dar é a de que provavelmente não vai haver nenhum reflexo ao nível dos impostos que hoje são exigidos ao comum dos portugueses.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputadas: Solicita o Governo autorização legislativa desta Assembleia com vista a instituir uma taxa municipal de transportes, alterando, deste modo, o actual quadro de financiamento dos transportes públicos urbanos e suburbanos de passageiros. Recorda-se que a matéria em apreço fora já objecto, na legislatura anterior, do projecto de lei n.º 389/II, da iniciativa do Partido Socialista.
Não se estranhará, portanto, que a nossa bancada vote, favoravelmente e sem reservas, um tal pedido de autorização legislativa, cujo objecto é preciso e suficientemente claros são a exposição de motivos que a fundamenta e o articulado que lhe conforma o sentido e a extensão.
Mas, independentemente da indicação do seu voto, o grupo parlamentar do Partido Socialista entende dever expressar perante esta Câmara a especial importância que atribui à medida ora em discussão, importância que releva de dois conjuntos de razões simples, mas especialmente significativas: se a medida, por um lado, é susceptível de contribuir para a necessária desdramatização do financiamento dos transportes públicos de passageiros, por outro, potência acções concretas e subsequentes do Governo no domínio da descentralização das estruturas, em cumprimento, aliás, do Programa aprovado nesta Assembleia da República.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Em toda a Europa, e para além dos respectivos regimes políticos, tornou-se de há muito aceitação pacífica de que a deslocação de pessoas - designada-

Página 950

950 I SÉRIE - NÚMERO 22

mente nos trajectos domicílio trabalho constitui uma autêntica função social e como tal os respectivos custos são assumidos, pelo menos parcialmente, pela colectividade. Deste modo, não há preços porque não há propriamente mercado de transportes: os transportes individuais não são vendidos e os transportes colectivos são administrados através da fixação de um preço político (tarifa) compensando o custo social.
Há muito que assim é. Só que até ao primeiro «choque petrolífero» as tarifas (mesmo políticas) iam dando para custear as despesas. Mas a partir da década de 70 o agravamento brusco dos custos dos factores de produção desequilibrou irremediavelmente os custos do sistema, obrigando não só a cada vez maiores chamadas financeiras por parte das colectividades públicas, como ainda à implementação de medidas tendentes a reforçar a eficacidade das empresas de transportes. Simultaneamente, o quadro económico-institucional foi alterado com vista a uma maior participação do poder local na gestão do sistema de transportes urbanos e suburbanos. Mas ninguém dramatizou os custos que uma tal função social inevitavelmente engendra.
Todavia, entre nós a situação - que é semelhante à dos outros países europeus- tem servido de pretexto para desenfreados ataques ao sector público dos transportes, incluído como está no sector produtivo, sem que se lhe tivessem sido ressalvadas nem a missão de serviço público que o legitima nem a especificidade que o distingue.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Daí dramatizar-se, até à exaustão, os chamados «prejuízos» dos transportes públicos. Mas não se diz que a contribuição pública, em suporte do custo social, é incomensuravelmente mais baixa que na generalidade dos países europeus. Mesmo tendo em conta as paridades do poder de compra.
Em França, desde 1971 e com vastíssimo consenso, foi aplicado um contributo Gyersement, na expressão original) com a fundamentação de que: são as horas de ponta (correspondentes ao maior afluxo das deslocações casa-trabalho) as que mais penalizam a exploração dos operadores de transporte, como é evidente; são os empregadores grandemente beneficiados pela circunstância de localizarem as suas actividades económicas em zonas tributárias de uma desenvolvida rede de transportes públicos. Daí o contributo aplicado a todas as entidades, sejam públicas, sejam privadas, com mais de 10 trabalhadores. Semelhante procedimento foi utilizado na Áustria para o financiamento do «metro» de Viena.
Ora é precisamente este o sentido da medida que ora se discute. Alterando o quadro de financiamento dos transportes públicos urbanos e suburbanos libertar-se-á o OGE de encargos significativos, esperando-se, assim, que contribua de facto para a desdramatização da questão transportes, questão simples. A título de exemplo, diria que se uma tal medida tivesse sido eventualmente aplicada na Região de Lisboa, por exemplo em 1978, os défices do respectivo sistema teriam sido absorvidos na prática na totalidade - 100 %; na aglomeração parisiense e no mesmo ano a mesma medida não cobriu os 21 % dos custos de exploração. Por este. exemplo vê-se quão baixo é o grau da nossa comparticipação pública.
Mas a medida que se propõe permite também uma maior justiça e equidade na repartição de encargos decorrentes da existência de uma rede de transportes públicos, desonerando os que dela não beneficiam.
O segundo conjunto de razões, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, prende-se com o carácter descentralizador desta medida.
Somos dos que acreditam que a descentralização administrativa é a vertente através da qual poderão ser operadas as grandes transformações estruturais de que o País carece. Somos dos que sustentam que tais transformações deverão submeter-se ao tríptico planeamento descentralização ordenamento: organização do nosso futuro no tempo (plano) e no espaço (ordenamento) através de uma descentralização progressiva. E o certo é que o Governo começa a assumir esta descentralização na prática, recordando-se que a medida em discussão pressupõe um novo quadro institucional (no seguimento da delimitação de competências entre os órgãos da administração central, regional e local) com uma maior intervenção destes últimos quer «no planeamento, quer na gestão do sistema de transportes». Ou seja, aponta-se no sentido de uma progressiva municipalização, o que permitirá assegurar a relação dialéctica (que entre nós nunca existiu, nem existe) entre o urbanismo e os transportes. Porque estes, nas zonas urbanas, são parte integrante da respectiva estrutura.
Compreender-se-á assim porque é que a bancada socialista encarece especialmente esta medida simples, objecto do pedido de autorização legislativa do Governo.

Aplausos do PS, PSD, UEDS e ASDI.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - O Sr. Deputado Reis Borges fez há pouco uma declaração no sentido de que se se tivesse adoptado a taxa municipal de transportes em Lisboa, em 1978, teriam sido cobertos os défices das empresas públicas de transportes na região de Lisboa. Isto deixa-me entender que o Sr. Deputado Reis Borges teve possibilidade de fazer determinado número de contas que eu não tive e, assim, atrevo-me a fazer-lhe algumas perguntas que tinha destinado para o Membro do Governo que aqui viesse fazer a exposição de motivos desta proposta de autorização legislativa.
Qual a população portuguesa que está englobada nos municípios com mais de 50000 habitantes a que se prevê que venha a ser adoptada a taxa municipal de transportes? Em valores aproximados, quantos trabalhadores e quantas empresas serão abrangidas por esta taxa e qual se prevê que seja a redução do défice ou, neste caso, das subvenções ou indemnizações compensatórias que o Estado irá pedir ou irá poupar, através da introdução da taxa municipal de transportes?
Finalmente, o Sr. Deputado Reis Borges, referindo-me concretamente ao exemplo que deu, como sabe a proposta de autorização legislativa do Governo fala em que a taxa municipal de transportes se situará no intervalo a ser fixado pelas assembleias municipais, entre os 0,5 % e os 2,5 %.
Em França, o versement de transportes é de 1 % e de 1,5 % no caso dos municípios onde o Estado com-

Página 951

15 DE JULHO DE 1983 951

participe em obras de infra-estruturas. Comparando os casos da aglomeração de Lisboa e da aglomeração parisiense, gostaria de saber de que valor partiram para a taxa adoptada pelo conjunto das assembleias municipais da grande Lisboa isto é, se de 0,5 %, 1 %, 1,5 %, 2 %, ou 2,5 %. Foi da base de Paris, que é 1,5 %? Pergunto isto para estabelecermos as comparações.
Quero também dizer-lhe que como ex-responsável por um sector dos transportes não partilho dos ataques, muitas vezes injustos, para com as empresas públicas de transportes. Mas gostaria de deixar bem claro que não nos devemos iludir também com alguns indicadores e que a nossa taxa de cobertura dos transportes públicos, pela parte que é paga pelos utentes, se deve em grande parte ao inconforto com que os utentes são obrigados a ser transportados nos nossos transportes públicos, que não têm paralelo com os transportes públicos de outros países.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para pedir esclarecimentos o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Deputado Reis Borges, como daqui a pouco suspenderemos os trabalhos para ir jantar estava tentado a contar-lhe uma história e a fazer-lhe uma pergunta.
A história que é obviamente passada num lugar e tempo incertos, é a seguinte: um dia um membro de um governo, a instância de um sector laboral que são os tripulantes dos petroleiros, levou a Conselho de Ministros uma proposta de incluir na tripulação dos petroleiros - consoante a classe dos referidos petroleiros - 1 ou 2 bombeiros. E depois de estar praticamente aprovada a proposta e de os Srs. Ministros terem discutido tudo, descobriu que eles julgavam que se trataria de bombeiros de apagar fogo e não era, eram bombeiros de abrir bombas!

Risos.

E isto é para evitar que aqui haja confusões na sala!...
Bom, e agora a pergunta: o Sr. Deputado falou em desonerar aqueles que não utilizam os transportes, mas, Sr. Deputado, há muitas outras razões que podem militar em favor de uma taxa como esta que é proposta. Daqui a pouco, em intervenção própria, abordarei alguns desses aspectos.
O Sr. Deputado sabe ou não - e era essa resposta que queria ouvir de si - que qualquer que seja a taxa imposta a uma empresa de 10, 15, 20, 100 ou 1000 trabalhadores, taxa, por exemplo, sobre o volume de salários pagos, ela obviamente será transferida por inteiro para os preços que essa empresa produz?
O Sr. Deputado não acredita que será o capital da empresa que vai pagar esse 1 % ! Por isso, a pergunta reconverte-se um pouco numa que já lhe foi feita: em que medida é que isto significa o desonerar de portugueses que não utilizam transportes nas grandes regiões urbanas?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Começando pelo Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, referirei que o exemplo citado em relação a 1978 correspondeu, efectivamente, a uma análise feita na base de 1 %. Aliás, fiz até uma comunicação no Laboratório de Engenharia Civil sobre o efeito, no Simpósio da Década de 80, que V.Ex.ª conhecerá com certeza. Foi, pois, na base de 1 % que foi feita e essa base já dava, digamos, uma comparação que era extremamente desfavorável ao quantitativo das nossas contribuições públicas. Ora, acontece que em relação à aglomeração parisiense não precisava de fazer contas, porque o valor existe. E, efectivamente, foi de 27,7 %, em 1978 a percentagem que foi coberta.
O aspecto que .º Sr. Deputado focou em relação à área de cobertura quanto à região da grande Lisboa, devo dizer que toda ela corresponde praticamente ao estudo de transportes de Lisboa, como aliás conhece. Do sector público era qualquer coisa como duzentos e tal mil trabalhadores e do sector privado seiscentos e tal mil.
Sei que o Sr. Deputado não partilha, de facto, dos ataques às empresas de transportes - mal fora! O Sr. Deputado era um homem dos transportes e de resto trocou impressões comigo sobre isso. Mas, Sr. Deputado, quero dizer-lhe que todos esses indicadores têm normalmente que ser cortejados com iguais níveis de qualidade de serviço, e V.Ex.ª º conhece um estudo que fiz em que até procurei cotejar o que se passava no sistema de transportes de Lisboa, com os outros países europeus, introduzindo até os níveis de qualidade de serviço. 15to para dizer que essa observação que V.Ex.ª fez é perfeitamente pertinente e o que desejaríamos era que, de facto, os transportes pudessem ter os níveis de conforto que normalmente são assegurados em outros países europeus. Mas não há dúvida de que primeiro há que resolver um problema de capacidade, para que pelo menos se possa satisfazer a procura! E só depois, é que, através de melhoramentos introduzidos, poderemos garantir que a viagem, que já de si é penosa, tenha o menor desconforto possível. Creio que isso é uma desideratum que estará na mente do Governo e que estará na mente de qualquer responsável que sobre o problema se debruce.
Perguntou-me quais as cidades ou as aglomerações que eram abrangidas. Permitir-me-ei chamar a atenção do Sr. Deputado para o facto de que a taxa municipal de transportes, conforme está redigida, funciona, ao fim e ao cabo, em termos de aglomeração, portanto, ao nível de municípios e de associações de municípios. E embora sela discutível se a base deve ser de 50 000 habitantes se, por exemplo, de 25 000, dado o tamanho especial das nossas aglomerações e na medida em que as iniciativas devem ser conformadas com s nossa própria realidade social, o aspecto dos 50 000 poderia até ser equacionados em termos de ser outro o plafond. Recordo que em França, neste momento, o versement creio que atinge os 50 000. Começou na base dos 300 000, passou para os 100 000 e agora creio que está nos 50 000. Mas o tipo de aglomeração francesa é, de facto, mais densa do que a nossa.
Quanto ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira direi que ontem era a história do bombeiro voluntário, hoje é a do bombeiro da bomba! ...
Sr. Deputado, ficou claro na minha exposição que ao referir o aspecto de uma maior equidade na distribuição dos encargos, isso era pura, simples e exclusivamente em relação às pessoas do interior para com, ás quais a solidariedade nacional deve funcionar noutros

Página 952

SÉRIE - NÚMERO 952

moldes e não concretamente na questão de transportes. Quanto ao problema da taxa o que se poderá dizei é que é um novo quadro de financiamento do sistema de transportes!
E se fizer as contas verá que os valores são até relativamente baixos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, são 20 horas e 5 minutos, mas antes de interromper a sessão informo que deu entrada na Mesa um requerimento assinado por 10 Srs. Deputados, do qual o primeiro signatário é o Sr. Deputado Carlos Lage, que diz o seguinte:
Os Deputados abaixo assinados requerem o prolongamento da sessão de hoje até à 1 hora da madrugada.

Vamos votar este requerimento.

Submetido d votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS, do MDP/CDE, da UEDS e da ASDI, e a abstenção do PCP

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, suspendo a sessão, que recomeçará às 22 horas.

Eram 20 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão

Eram 22 horas e• 30 minutos.

Entretanto, tomaram assento na bancada do Governo os Srs. Ministros da Indústria e Energia (Veiga Simão) e do Equipamento Social (Rosado Correia), e os Srs. Secretários de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques), dos Transportes (Murteira Nabo), do Desenvolvimento Regional (Joaquim Fernando Nogueira), e do Tesouro (António de Almeida).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, penso que a Sr.ª Secretária de Estado está inscrita para falar e, de bom grado, cedo-lhe a minha vez. Intervirei, portanto, a seguir à Sr. Secretária de Estado.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica (Maria Helena Torres Marques): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O assunto que hoje me traz perante vós é a defesa de um pedido de autorização legislativa que permita a criação de uma taxa municipal de transportes.
Este tema não é completamente novo para a Assembleia da República, pois o Partido Socialista, no final da última legislatura, apresentou com esse objectivo o projecto de lei n.º 389/II. Também não o será, certamente para muitos de vós, que são especialistas nesta matéria.
O objectivo que se pretende atingir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é o da elaboração de uma lei quadro relativa à criação de uma taxa municipal de transportes (TMT) que autorize os municípios, suas associações e federações a decidirem da aplicação de uma taxa destinada ao financiamento dos transportes públicos colectivos.
Esta medida, já largamente testada no estrangeiro, resulta de o Governo considerar que também em Portugal o estabelecimento e a exploração das redes urbanas e suburbanas de transporte público envolvem custos que devem ser suportados pelos vários beneficiários da sua existência.
No passado, o peço de venda dos serviços prestados pelos transportadores era de molde a cobrir todos os custos suportados pelos mesmos, sendo assim habitual a exploração dos transportes públicos por empresário privados.
Porém, o contínuo acumular de erros em matéria da planeamento físico, planeamento urbanístico e de gestão da via pública, a par do aumento real dos custos dos factores de produção, nomeadamente da mão-de-obra, energia e equipamento, levaram a que as condições de exploração se tivessem agravado progressivamente, tendo como consequência que, para determinados serviços, o preço de venda comercialmente praticável passou a não cobrir os custos de produção, o que levou os empresários privados a abandonarem progressivamente a prestação desses .serviços.
Actualmente, como se sabe, os custos de exploração das redes de transportes públicos só em parte são pagos pelos utentes, aceitando-se que o Estado, no âmbito de uma política de interesse social, suporte a diferença entre o custo real e as receitas directas obtidas na exploração.
Assim, pode dizer-se que, actualmente, os custos de produção dos transportes públicos são suportados:
Em parte pelos utentes através do pagamento das tarifas (bilhetes, passes, etc.);
Em parte pelo Estado através de transferências de subsídios, a cargo do OGE.

Esses subsídios concedidos pelo Estado, a título de indemnização compensatória ao serviço de transportes públicos, representam hoje a mobilização de mais de 10 milhões de contos por ano, de recursos obtidos através dos impostos gerais do País.
Na prática todo o contribuinte, qualquer que seja a região onde resida, paga a existência de transportes públicos abaixo do seu custo de produção, quando na realidade os principais beneficiários - os utentes e as entidades empregadoras - se circunscrevem aos grandes centros urbanos.
Ou, dito de outro modo, os habitantes, em especial dos grandes centros urbanos, de Lisboa e Porto, têm os transportes mais baratos, porque estes são subsidiados, embora de forma indirecta, pelos cidadãos de Bragança, de Viseu ou do Algarve, que só muito raramente os utilizam.
Importa, pois, alterar esta situação, criando condições de maior justiça e equidade na repartição de encargos decorrentes da existência de redes de transportes públicos.
Assim, considera-se que a atribuição de indemnizações compensatórias aos transportes públicos e urbanos deve passar a ser da competência dos municípios onde. existam ou venham a existir essas redes de transportes, criando-se, para o efeito, uma taxa municipal de transportes a ser suportada pelos empregadores toda

Página 953

DE JULHO DE 1983 953

qualquer entidade pública ou privada, com mais de 10 empregados ou funcionários. A taxa poderá situar-se entre 0,5 % a 2,5 % do valor da massa ou custo salarial de cada entidade empregadora e será aplicada nos municípios ou associações de municípios com mais de 50 000 habitantes e que disponham de redes de transportes públicos podendo este limite em casos especiais ser reduzido.
Com a criação desta taxa, pretende-se, assim, e em primeiro lugar, libertar o cidadão em geral de uma imposição fiscal injusta e inadequada ao fim em causa. Pretende-se, em segundo lugar, transferir o pagamento de parte dos recursos necessários ao equilíbrio dos custos dos transportes públicos para as entidades empregadoras situadas nas áreas municipais servidas por transportes públicos, "localizando", assim, de forma mais justa e criteriosa, o custo social decorrente da existência de transportes públicos.
Deste modo, redistribui-se a carga fiscal geral, ao mesmo tempo que se transferem para o poder local atribuições e recursos que lhe devem competir, no âmbito da gestão do quadro de vida em que se insere a existência de transportes públicos.
Assim, propõe-se Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o custo dos serviços de transportes públicos passe a ser financiado:

Pelos utentes na parte que for suportável pelo rendimento disponível e de acordo com uma política nacional de rendimentos e preços (estima-se que aquela parte não deverá ser inferior a 60 % dos custos);
Pelos Municípios, através dos recursos obtidos com a criação da taxa municipal de transportes (TMT), a ser suportada pelos empregadores;
Pelo Estado, em casos excepcionais, em que o interesse geral e colectivo justifique uma contribuição directa do OGE (para compensação do ónus de serviço público imposto pelo Estado que não tenha possibilidade de ter outra cobertura).

Para que fiquem perfeitamente claros o âmbito e u sentido desta autorização legislativa, direi, ainda, se o Sr. Presidente e os Srs. Deputados, me permitirem que:

1) A taxa municipal de transportes aplica-se nos municípios ou associações com população igual ou superior a 50 000 habitantes, podendo, em casos a regulamentar, ser baixado este limite;

2) Ficarão sujeitos à taxa municipal de transportes as pessoas colectivas de direito público, bem como as empresas privadas, desde que o número de trabalhadores ao seu serviço seja igual ou superior a 10;

3) Competirá às assembleias municipais deliberar o lançamento e estabelecer o quantitativo da taxa municipal de transportes;

4) A percentagem global de cobertura tarifária do custo de produção a satisfazer pela taxa municipal de transportes não deve ser inferior a 60 % daquele custo;

5) O valor da taxa municipal de transportes poderá oscilar entre um mínimo e um máximo de, respectivamente, 0,5 % e 2,5%dos salários pagos pela entidade empregadora;

6) A taxa municipal de transportes deverá ser obrigatoriamente afectada a:

a) Indemnizações compensatórias, pela prestação de serviços públicos a custos não integralmente coberto pelas tarifas;
b) Investimentos necessários à expansão e melhoramento do sistema de transporte;

7) Os operadores de transporte que actuem exclusivamente em áreas de jurisdição municipal, de associações ou federações de municípios, ficarão impossibilitados de auferir quaisquer subsídios do Orçamento do Estado, ou do Fundo Especial de Transportes Terrestres, caso os municípios respectivos não hajam adoptado o recurso à taxa municipal de transportes;

8) As entidades empregadoras poderão ser isentas da taxa municipal de transportes, quando provem ter assegurado aos seus trabalhadores:

a) A disponibilidade de habitação junto ao local de trabalho;
b) O transporte domicílio-local de trabalho, por sua conta.

Poderão ainda ser isentas da taxa municipal de transportes, temporariamente as entidades empregadoras que venham a realizar as suas actividades no interior de determinados perímetros urbanos, definidos previamente pelas competentes autoridades autárquicas, designadamente em casos de lançamento ou recuperação de actividades habitacionais, comerciais, industriais ou mistas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, a proposta de lei autorizando o Governo a criar a taxa municipal de transportes não deve ser dissociada da elaboração de uma lei quadro relativa à organização dos transportes regionais e locais - que o Governo se propõe apresentar a curto prazo - a qual visa conferir aos municípios poderes próprios de criação, organização e enquadramento tutelar dos sistemas de transportes que servem a área da sua jurisdição.
Ao conferir aos municípios o exercício de poderes públicos hoje em dia concentrados na esfera do poder central, criam-se os mecanismos de ordem financeira susceptíveis de dar corpo às novas competências que lhe serão outorgadas, no quadro do projecto de descentralização prosseguido pelo Governo.
Assim, a criação desta lei sobre a taxa municipal de transportes virá dar resposta a 3 tipos de problemas:

1) Por um lado os que resultam dos défices de funcionamento e das carências de investimento das empresas de transporte público urbano;
2) Por outro lado, criará os meios que permitirão aos municípios e suas associações avançar ainda mais no sentido de solucionar o problema dos transportes urbanos, nomeadamente na gestão de via pública ou, pela criação e exploração dos serviços de trans-

Página 954

SÉRE - NÚMERO 954

portes urbanos que até aí não tinham tido capacidade financeira de lançar;
3) Finalmente;. vai dar a resposta que o Governo considera mais adequada a uma situação de grave injustiça que a Lei das Finanças Locais criou.

Como vos disse, aquando da discussão de autorização legislativa sobre autarquias, a Lei das Finanças Locais é um diploma notável, mas enferma de certos erros técnicos que urge corrigir.
Corrigir para melhorar, não corrigir para estragar ou tornar discricionário o que deve ser objectivo.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Que situação de injustiça é essa? Como todos se recordam, a Lei das Finanças Locais, no n.º 1 do seu artigo 16.º, proíbe quaisquer formas de subsídios e comparticipações às autarquias locais.
A única excepção permitida é a declaração de calamidade pública e se o Governo não viesse agora a legislar rapidamente sobre esta matéria, correríamos o risco dos transportes públicos municipais dentro de dias poderem vir a estar mesmo em situação de calamidade pública!

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Com efeito, enquanto as empresas públicas e privadas continuaram a beneficiar de subsídios atribuídos pela Secretaria de Estado dos Transportes, através do Fundo Especial dos Transportes Terrestres, a título de indemnizações compensatórias, as câmaras municipais ficaram proibidas de ter acesso àquele Fundo.
Ora este não era necessariamente o espírito da Lei das Finanças Locais. O objectivo era certamente o de permitir aos municípios ter mais recursos e mais competências.
Com esta proposta de lei que será articulada com a revisão que faremos da Lei das Finanças Locais - e aqui peço aos Srs. Deputados da bancada comunista que ao menos dêem às pessoas que os senhores gostam de citar, o benefício da dúvida - com esta legislação, dizia eu, conseguiremos criar as condições para resolver simultaneamente vários problemas:

Obtenção de novos recursos financeiros destinados ao financiamento do funcionamento e dos investimentos das empresas públicas de transportes municipais. ou não;
Possibilidade dos municípios obterem, em condições a definir na lei regulamentadora, subsídios nestes domínios como normalmente obtêm a generalidade das empresas públicas, o que até agora é proibido;
Redução das necessidades financeiras da administração central, que deixa de ter de suportar os enormes encargos que representam o financiamento das empresas públicas de transportes urbanos;
Libertação de verbas que assim ficarão disponíveis para serem distribuídas pelas autarquias locais, no âmbito da Lei das Finanças Locais, sem que para tal se tenha de aumentar o défice do Orçamento Geral do Estado.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Passou-se assim de um problema de financiamento de transportes para um problema de finanças locais.
Esta possibilidade de libertar recursos que o Estado tem vindo a aplicar em empresas de transporte localizadas em determinados municípios que serão, de futuro, redistribuídos por todas as câmaras, faz com que a totalidade dos municípios veja os seus recurso acrescidos em virtude de alguns aplicarem a taxa municipal de transportes. Esta será, pois, mais uma via de dar cumprimento ao espírito e à letra da Lei das Finanças Locais.

Aplausos do PS, do PSD, da ASDI e da UEDS

Se me permitem, Sr. Presidente e Srs. Deputados. gostaria de terminar evidenciando que esta é uma dai demonstrações do modo como este Governo quer governar: com imaginação, com realismo, com o conhecimento das soluções possíveis e passando, tão rapidamente quanto possível, da palavra à lei e da lei à acção.

Aplausos do PS, do PSD, da UEDS e da ASDI

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr.ª Secretária de Estado, terei oportunidade, dentro de momentos certamente, de em intervenção autónoma exprimir mais claramente algumas ideias que v meu grupo parlamentar tem sobre este assunto. Em todo o caso, não gostaria de deixar de fazer-lhe algumas perguntas que ajudarão a esclarecer a matéria e a traduzi-1a às devidas proporções.
Não vale a pena repetir a pergunta que fiz há pouca a um seu camarada de partido a respeito da transferência da taxa para os preços, mas é óbvio, Sr.ª Secretária de Estado, que os produtos da Petroquímica, os adubos, a electrónica, a metalurgia, etc., são consumidos por todos. Também em Trás-os-Montes, lá na minha zona, se consomem produtos desses, que naturalmente vão ser encarecidos pela taxa. Mas por acréscimo vão levar algo mais. Digo-lhe isto com conhecimento de facto. Se tiver que pagar mais 1 % de encargos por uma empresa de que eu seja detentor do capital, pago esse mais 1 % e fico por acréscimo com mais alguma coisa para mim. A parte isto, Sr.ª Secretária de Estado, as questões que gostava de colocar-lhe são outras.
Fala-se no financiamento pelos utentes e fala-se na grave injustiça da Lei das Finanças Locais, Lei n.º 1/79 - aliás eu gostaria depois de analisar melhor essa grave injustiça!...
A Sr.ª Secretária de Estado entende ou não que a proibição terminante de subsídios do Governo às autarquias é condição indispensável da sua verdadeira autonomia? E que vale mais ser pobre mas honrado, minha senhora!... E os subsídios são sempre a via, da conquista das boas graças!
Falou a Sr.ª Secretária de Estado das indemnizações compensatórias e da garantia que elas dariam para uma política de transportes que neste momento é vária, tal como falou do facto de se passar a taxar aqueles

Página 955

1983 955

que são os grandes consumidores do transporte público e privado, nas horas em que ele se efectuar. 15to é, os grandes consumidores são, de facto, aqueles que usam o transporte público para receber à hora, todos os dias, a mão-de-obra que é, como a Sr? Secretária de Estado sabe, uma mercadoria como outra qualquer neste mundo, e peço desculpa da expressão, cão em que vivemos.
Nas áreas dos municípios com mais de 50 000 habitantes, por hipótese, que é a proposta que fazem, há além de empresas públicas e empresas privadas outras entidades: há, por exemplo, a administração central, grande consumidora de transportes públicos; há, por exemplo, os Institutos Públicos, grandes consumidores de transportes públicos; há a administração autónoma do Estado, grande consumidora do transporte público.
A pergunta que lhe faço é se não será correcto incluir na vossa proposta, além das empresas públicas e privadas, as entidades que referi, isto é, a administração central, a administração local, quando seja o caso, a administração autónoma do Estado, os Institutos Públicos, porque eles também são grandes consumidores do transporte público e pela mesma razão que as empresas privadas e públicas também eles deverão pagar o facto de receberem mão-de-obra à porta - transportada fresca - se o transporte for bom, cansada, se não for - também eles deverão pagar uma parcela desse transporte.

Entretanto assumira a presidência o Sr. Presidente Tito de Morais.

O Sr. Presidente: - Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Antes de mais queria dizer que esta proposta de lei n.º 23/III, no entendimento do meu grupo parlamentar, é possivelmente aquela que traz melhor explicitado o sentido em que o Governo vai legislar e que melhor se enquadra no espírito e na letra do n.º 2 do artigo 168 º da Constituição.
De resto, a Sr.ª Secretária de Estado habituou-nos a clarificar um pouco estes problemas, já na anterior proposta de lei.
Passando concretamente aos pedidos de esclarecimento que desejava fazer, começo por perguntar-lhe se esta taxa municipal de transportes - que existe já em quase todos os países da Europa há muitos anos, havendo até um regulamento nos países da CEE desde 1969, que existe em Paris pelo menos desde 1971 e que existe na América, pelo menos nos Estados Unidos, e que vai ser, parece-me, introduzida agora em Portugal - reverte só, nos termos desta proposta, para as empresas públicas ou se também reverte para empresas privadas que explorem transportes públicos.
Neste segundo caso, se a taxa viesse a reverter para empresas privadas, qual o modo de controlar a aplicação desta taxa por estas empresas?
O Governo contempla a hipótese de isentar desta taxa as empresas em situação económica e financeira difícil?
Como V.Ex.ª sabe, talvez melhor do que eu, a situação económica e financeira em que o País vive não é das melhores - há muitas empresas em crise, pequenas, médias e até grandes. Ora tratando-se de mais uma taxa, é mais um imposto, pergunto se no artigo 6.º da proposta de lei o Governo pretende ou não introduzir mais uma alínea das isenções, quanto a estas empresas em situação económica difícil.
Gostaria ainda de saber se o Governo pensa, depois aplicada esta taxa, cortar as indemnizações compensatórias. Não falo, é evidente, em empresas como a CP, por exemplo, que é uma empresa que faz transportes através de todo o território nacional e portanto não tem um transporte urbano local, mas noutras empresas.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Abílio Rodrigues, também para pedir esclarecimentos.

O Sr. Abílio Rodrigues (PSD): - Sr.ª Secretária de Estado, eu percebi mal ou houve qualquer confusão no que afirmou quanto ao problema das indemnizações compensatórias. Que eu saiba, nunca se atribuíram indemnizações compensatórias a privados.
Elas foram sempre, e só, atribuídas a empresas públicas. Também queria precisar que os subsídios frete a privados foram sempre subsídios reembolsáveis ao passo que esses subsídios frete para os serviços municipalizados foram subsídios reembolsáveis e não reembolsáveis. Donde a pergunta que lhe faria concretamente ir no sentido de saber se de facto foi isto que afirmou ou se foi outra coisa qualquer que ouvi e que não estaria correcta.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em primeiro lugar faço minhas as palavras do Sr. Deputado do MDP/CDE que registou que este foi talvez o pedido de autorização legislativa apresentado pelo Governo melhor fundamentado.
Apesar de tudo, gostaria de fazer uma ou duas perguntas relativamente às exposições que foram feitas hoje por parte do Sr. Ministro Almeida Santos e por parte da Sr.ª Secretária de Estado Helena Torres Marques.
O Sr. Ministro Almeida Santos disse que este pedido de autorização legislativa resultava, no fim de contas, da repescagem de um projecto de lei que havia sido apresentado pelo PS em Janeiro deste ano.
No preâmbulo, ou melhor, na exposição de motivos desse projecto de lei afirmava-se que com a criação da taxa municipal de transportes se reduziria a carga fiscal geral.
O Sr. Ministro Almeida Santos já tranquilizou hoje esta Assembleia dizendo que não se pretende reduzir a carga fiscal geral e que não haverá reduções de impostos. Assim, eu gostaria de saber, dentro desta questão e uma vez que a criação da taxa municipal de transportes não vai transferir todas as responsabilidades, actualmente da administração central, para a administração municipal, quais os estudos do Ministério dos Transportes e do Ministério da Administração Interna e qual a percentagem aproximada de subsídios ou de indemnizações compensatórias, actualmente atribuídas por parte do OGE, que passarão a ser cobertas por esta taxa municipal. 15to era algo que eu gostava de saber.

Página 956

956

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira há pouco pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, pedi a palavra para, daqui a pouco, produzir uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Sr.ª Secretária de Estado, se V.Ex.ª desejar responder, faça favor.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Sr. Presidente, nós responderemos a tudo no fim. Responderei a estas perguntas e a todas as outras que entenderem fazer, bem como o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado, no fim.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para um protesto, porque a Sr.ª Secretária de Estado usou da palavra, teve aquilo que se chama, em linguagem parlamentar, uma "fala".

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): -- O meu protesto será muito curto.
Sr.ª Secretária de Estado, não é bom para a Câmara, não é bom para o Governo, nem é bom para a discussão, que a Sr.ª Secretária de Estado se reserve para explicar o que tiver a explicar no fim. E, ainda por acréscimo, nunca será no fim porque depois da Sr.ª Secretária de Estado falar nós ainda falaremos as vezes que forem necessárias. Portanto, V.Ex.ª nunca falará no fim!
Era preferível que desse agora as explicações que entende dever dar para que os Srs. Deputados, nas intervenções que queiram fazer, não tenham que repetir desnecessariamente aquilo que não seria de repetir, ou invocar argumentos que já não seriam de invocar, porque já estão completamente esclarecidos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado, para contraprotestar, se o desejar.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Era só para dizer que essa é a opinião do Sr. Deputado. Tenho o maior respeito pela Câmara e responderei a tudo, mas no fim.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Magalhães Nota (ASDI): - Muito mal!

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - No fim não. No fim falo eu!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a Sr.ª Secretária de Estado está no seu direito de não responder.
Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDII): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Lasse Ferreira estava inscrito antes de mim e cedeu a sua vez à Sr.ª Secretária de Estado. Penso que agora deveríamos regressar à ordem das inscrições e, portanto, eu cederei também a minha vez ao Sr. Deputado Hasse Ferreira, falando a seguir a ele. Aliás, esta é que é a ordem das inscrições.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado. Como sabe, eu não estava presente quando isso sucedeu, mas, de imediato, darei a palavra ao Sr. Deputado Hasse Ferreira.
Tem V. Ex.ª a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado: Queria, em primeiro lugar, saudar aqui apresentação desta proposta de autorização legislativa, que visa essencialmente onerar com o custo de determinada rede de transportes os agentes económicos, empregadores dos utentes dessa rede, desonerando, em contrapartida, dos correspondentes encargos aqueles que não a utilizam habitualmente.
Efectivamente, não nos parece justo que façamos recair como actualmente acontece, por exemplo, sobre os pequenos rendeiros e jornaleiros do interior o custo social dos já relativamente complexos sistemas de transporte das zonas urbanas de Lisboa, Porto e outras cidades de certa dimensão.
Em contrapartida, parece-me legitimo que façamos recair sobre as unidades económicas, sobre empresas privadas e pessoas colectivas de direito público, de carácter não artesanal, o custo social dos transportes, já que boa parte das deslocações serão ocasionadas, efectivamente, pela necessidade de colocar a denominada mão-de-obra - ou sejam os trabalhadores - nos locais onde tem lugar a produção de bens e serviços. Neste sentido e conforme o meu camarada Lopes Cardoso já disse, o artigo 8.º desta proposta de autorização legislativa mereceria uma alteração formal, com a substituição do termo "utentes" por outro que fosse mais adequado à intenção dos autores da proposta, conforme transpareceu da intervenção da Sr.ª Secretária de Estado e do Sr. Ministro Almeida Santos.
Obviamente que, em meu entender, é positiva m adopção, por via legislativa, desta taxa municipal e a própria marcha no sentido da articulação mais perfeita entre os sistemas de transportes e as comunidades urbanas e suburbanas que elas servem; articulação sistema-comunidade que implica aspectos diversos, em que os financeiros e os de planeamento assumem grande relevância, cabendo, em nosso entender, às autarquias respectivas, isoladas ou associadas, consoante a amplitude dos sistemas, um papel determinante na coordenação e gestão de todo o sistema.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo; Penso, pois, que as receitas provenientes da cobrança desta taxa serão extremamente importantes na constituição de fundos integrantes das indemnizações compensatórias a atribuir aos operadores de transportes colectivos actuantes nos respectivos municípios ou grupos de municípios.
E aproveito, porque se relaciona com este ponto, para dar o meu acordo à alteração formal do artigo 7.º, apresentada pelos Deputados Vítor Crespo, José Niza e outros, que visa adequar esta autorização à legislação em vigor.
Só deixaria aqui um alerta, que não seria teoricamente necessário mas que na prática o é, se atentarmos ao menos nos últimos anos. A nossa preocupação vai no sentido de não se vir, por qualquer motivo, a criar situações embaraçosas, de um ponto de vista

Página 957

DE JULHO 957

financeiro e de tesouraria, às empresas/operadores de carácter público ou municipalizado actuantes na área dos transportes, colectivos.
O facto de o produto da taxa municipal de transportes constituir receita municipal serão, esperamo-lo, uma garantia suplementar de que este dinheiro será efectivamente aplicado, e em tempo devido, nos objectivos claramente expressos nesta proposta de autorização legislativa e na legislação que será promulgada.
A alteração proposta ao artigo 5 º pelo mesmo grupo de deputados já citado constituirá, penso, uma garantia suplementar de correcta aplicação destes fundos e de adequado encaminhamento das indemniza0es compensatórias.
Em sentido paralelo, a revisão das relações existentes entre empresas/operadores de transporte e municípios, por exemplo, no caso de Lisboa, parece-me importante para um funcionamento mais correcto de todo o sistema. É necessário que, em caso nenhum, as autarquias estejam impedidas ou tenham dificuldade em actuar directamente em relação às empresas transportadoras actuantes nos municípios respectivos. Por isso parece-nos que a lei quadro, cuja intenção aqui foi anunciada, pode ter um papel relevante.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Governo: Porque vem de certa forma a propósito, lembraria algo já aqui referido por altura da discussão do Programa do Governo, ou seja, a necessidade urgente de encarar de frente e com espírito de decisão a degradada situação financeira de algumas empresas transportadoras pertencentes ao sector público que não se poderá resolver, contrariamente ao que o Sr. Deputado Morais Leitão terá insinuado - se entendi bem - apenas pelo aumento do preço dos transportes urbanos e suburbanos. Esse tipo de medidas - que não irá ser adoptado certamente - não podia ter o nosso acordo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Deixo aqui algumas breves questões aos distintos representantes do Governo.
A primeira pergunta refere-se aos motivos pelos quais foi fixado em 10 trabalhadores o número limite a partir do qual as empresas passam a pagar este taxa municipal de transporte.
A outra pergunta refere-se à explicação mais detalhada das razões pelas quais foi fixado em 50 000 habitantes o limite abaixo do qual esta taxa não é cobrada. Apesar da clareza das exposições proferidas, quer pelo Sr. Deputado Reis Borges, quer pela Sr.ª Secretária de Estado, solicitava ao Governo que produzisse mais alguns esclarecimentos sobre esse ponto.
Haveria uma terceira questão, de abordagem necessariamente mais complexa, já aqui referida por bancadas opostas do hemiciclo e que eu, resumidamente, enunciaria assim: não irá esta taxa municipal de transportes, aumentando os custos totais das empresas, contribuir para, a prazo, agravar a já elevada inflação, quando as empresas que puderem fizerem repercuti os seus agravamentos de custos no preço de venda dos seus bens ou serviços. Deixo esta questão apensa enunciada e reconheço a dificuldade da sua resolução.
Para terminar como comecei, saudaria esta autorização legislativa, que vai no bom caminho, no caminho do cumprimento de promessas eleitorais do PS, que nós, deputados da UEDS, subscrevemos, no caminho da resolução do problema das indemnizações compensatórias, o que nós achamos bem, no caminho de uma mais equilibrada repartição de custos sociais, o que nós pensamos legítimo e justo.
Tudo isto e a correcta concepção global deste pedido de autorização legislativa, onde vem claramente expresso o seu sentido e objecto, justificam o nosso apoio a este pedido. Assim ele seja eficaz a curto prazo, assim possamos contribuir para uma mais justa equilibrada repartição dos custos dos transportes!

Aplausos da UEDS, do PS e da .ASDI.

O Sr. João Amaral (PCP): - Peço a palavra, paga pedir esclarecimentos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - Vou ser muito breve.
Ouvi a intervenção do Sr. Deputado .Reis Borges, do PS, que invocou uma linha de defesa do sector público - que, no contexto da autorização legislativa sobre a delimitação de sectores não tem nenhum cabimento- que foi, e bem, abandonada pela Sr.ª Secretária de Estado.
Mas depois a Sr.ª Secretária de Estado invocou uma linha de justiça para além da que está na Lei das Finanças Locais e pensei que talvez o Sr. Deputado Hasse Ferreira abandonasse essa linha de defesa ora de argumentação em torno desta proposta de lei, na questão da justiça social.
Devo dizer que esta proposta de lei tem a justificação que tem, nomeadamente técnica; essa é uma justificação que deve ser ponderada por esta Assembleia e sê-lo-á, designadamente numa intervenção que o meu camarada Veiga de Oliveira vai fazer.
Mas o que lhe pergunto, Sr. Deputado, é o seguinte: já que se repete a situação de invocação, pela terceira vez, de razões de justiça, de que justiça se está a falar?
Então, Sr. Deputado, qual a justiça, por exemplo, destas situações: um trabalhador de uma empresa metalomecânica vive em Mirandela, a 100 m da sua empresa, e não paga transportes, se ' viver em Belém, a 100 m da sua empresa, também não paga transportes, mas se estiver em Lisboa, a 5 km da sua empresa, tem que comprar o passe, que lhe custa cerca de 1000. Em que é que esta taxa municipal resolve esta questão central de justiça quanto ao utente, a essa trabalhador que tem que pagar o se passe social e que não tem outro remédio para ir para o seu emprego, para aquilo que lhe dá o rendimento diário para pagar o passe social?
Outra questão ainda relacionada com a justiça, porque, realmente, colocado o problema nestes termos, todas as questões se confundem.
Sr. Deputado, explique-me qual é a justiça que há quando o trabalhador de Lisboa de que eu falei, e que paga o passe social, paga também, através dos impostos - e deste modo através das indemnizações compensatórias à CP - o que custa transportar, de Mirandela, por exemplo, aquilo que alguma entidade patronal ou empresário dessa zona manda para Lisboa via comboio [...] ou mesmo adubos que vão daqui para lá, como refere o meu camarada Carlos Carvalhas.
15to para dizer que, realmente, colocar as questões em termos de justiça pode ser uma maneira curiosa de fazer algumas louvaminhas em torno de uma questão que é realmente séria e que merece uma análise

Página 958

958

técnica a outro nível, a um nível muito diferente daquela em que se pretende situar.
No fundo, o esclarecimento que lhe peço é este, Sr. Deputado: as considerações reais de técnica fiscal, de saber como é que se organiza, no seu conjunto, a parte do rendimento que vai, por exemplo, para os transportes, aos seus vários níveis, estiveram presentes na sua intervenção?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Hasse Ferreira, tem V.Ex.ª a palavra para contraprotestar.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Deputado João Amaral, ou não me conhece ou me conhece mal, senão não empregaria termos como os que empregou.
Não estou aqui para fazer louvaminhas, como tenho mostrado nesta Assembleia desde que cá estou e sou tão capaz de votar a favor como contra ou abster-me quanto às propostas de autorização legislativa que o Governo apresente, de acordo com a independência que tem pautado o comportamento dos Deputados da UEDS. Portanto, Sr. Deputado, desculpe-me mas pareceu-me despropositado o termo que utilizou.
Quanto à análise a outro nível, pois, de facto, espero que as suas intervenções e as do seu grupo parlamentar se coloquem a outro nível. Mas, a maneira como o Sr. Deputado interveio dá origem a que se lhe responda com as suas próprias palavras. Intervir como V.Ex.ª interveio ilustra o facto de, quando se intervém de certa forma, todas as questões se confundirem.
Queria dizer-lhe o seguinte: se há um determinado tipo de raciocínio utilizado por dois deputados e por um membro do Governo - e ainda pode haver mais deputados que o utilizem - se calhar não é por coincidência ou por qualquer conspiração maquiavélica que isso acontece. Se calhar é porque esse tipo de raciocínio tem alguma validade, ou é, efectivamente, um ponto de vista sobre esta questão...

Aplausos do PS.

... que não tem nada a ver com outro tipo de actuação. Vamos à questão dos impostos. É evidente que este tipo de questões tem que funcionar por aquilo que, neste caso, eu chamaria uma técnica de aproximação.
Considero que o sistema que aqui é proposto é mais aperfeiçoado e mais justo do que o sistema que está em vigor.
O Sr. Deputado fala na CP, nos transportes dos adubos, que é, efectivamente, uma questão interessante, mas que não é aquela que estamos a analisar quando falamos dos sistemas de transportes ligados com as autarquias e com os grupos de autarquias. É uma questão interessante, importante, etc., e se tivéssemos tempo suficiente poderíamos discuti-la.
Mas neste momento o problema que se põe é o seguinte: a diferença entre o preço que o utente do transporte paga e o custo desse transporte está, neste momento, a ser suportada par indemnizações compensatórias que vêm, efectivamente, do OGE. O fazer-se com que essas indemnizações compensatórias sejam total e parcialmente pagas pelas unidades económicas e pessoas colectivas de direito público empregadoras numa certa zona vai deslocar parcialmente a carga fiscal.
O Sr. Deputada diz: mas a outra mantém-se neste momento. Penso que é lógico que haja uma evolução, na medida em que o OGE deixa de ter de suportar, em orçamentos seguintes, este tipo de carga, e, a prazo, isto virá a traduzir-se numa diminuição dos encargos a um nível geral. Parece-me que isto é relativamente claro até este ponto.
O Sr. Deputado insinua que seria melhor que os transportes fossem gratuitos ou quase, mas isso é outra questão; é a tal questão, que ainda aqui não foi analisada em profundidade, do balanço entre qual deve ser a parte suportada por estas indemnizações e a parte suportada pelo utente directo.
Mas o que eu aqui manifestei ao nível e no âmbito em que o debate se está a processar foi uma discordância - talvez por ter percebido mal, ou bem, não sei - em relação a qualquer critério que visasse fazer repercutir unicamente sobre o utente directo desse serviço de transporte o aumento do seu custo. Portanto, penso que o criar-se um outro sistema, que não o actual, que permita efectivamente que uma parte, ou mesmo a totalidade, desse custo social seja paga pelas unidades económicas é um progresso.
O Sr. Deputado diz que isto não resolve tudo, e aí estou de acordo consigo. Diz que os problemas não estão suficientemente analisados, e também aí estou de acordo consigo. Mas se tivermos tempo, aqui ou noutro sítio, continuaremos a analisar estas questões.
De qualquer modo, insisto, penso que esta taxa municipal de transportes não é um "ovo de Colombo" nem a salvação do mundo; trata-se, isso sim, de um progresso em relação ao sistema existente. Era tão-somente isto o que eu queria dizer com a minha intervenção.

Aplausos da UEDS e do PS.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para protestar.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - É evidente que não nos conhecemos e se de alguma forma o Sr. Deputado ficou ofendido por eu ter utilizado a expressão "louvaminhas" socorra-se do facto de não nos conhecermos e, portanto, de não saber que eu estava unicamente a argumentar.
Por outro lado, é evidente que os aplausos e a coincidência de posições são o que são e se há uma coincidência é porque, enfim, aqui foi dito "todos temos nariz": A questão está posta, mas há outros argumentos.
Em terceiro lugar, a única questão que lhe pus - e parece-me que esta é questão central - foi a de que me parece que se reduzimos o problema a uma questão de justiça, então, realmente, não conseguimos aprovar esta proposta de lei nem sequer discuti-la aprofundadamente, como ela merece e deve ser discutida.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira, para contraprotestar.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Muito rapidamente, digo-lhe que aplaude quem quer e espero que no dia em que os senhores da bancada comunista concor-

Página 959

5 DE JULHO DE 1983 959

dem com uma intervenção minha sejam capazes de a aplaudir aqui.
A segunda questão é a seguinte: de facto o Sr. Deputado diz que eu apenas abordei alguns dos aspectos desta questão e eu estou perfeitamente de acordo consigo. Nem eu tencionava esgotá-la, pois penso que há aqui deputados mais qualificados e especialistas no assunto que querem abordar diferentes pontos de vista.
Eu quis exprimir tão-só a opinião do meu grupo parlamentar sobre esta proposta. Mas há aqui especialistas em transportes que são muito mais capazes do que eu para abordarem esta matéria aprofundadamente.
Mas, Sr. Deputado, mesmo assim, se o senhor me desse tempo ou se a Assembleia tivesse tempo para nos escutar, eu estaria disposto a retomar a matéria mais aprofundadamente do que o fiz agora.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Magalhães Mota, tem V. Ex.ª a palavra para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitir-me-ia começar esta intervenção por um apelo dirigido à bancada do Governo no sentido de modificar a sua posição em relação à sua intervenção no debate e não nos prestar apenas esclarecimentos no final, mas prestá-los e intervir sempre e ao longo do próprio debate.
Creio que será esse o contributo mais importante que o Governo pode dar em qualquer debate. E se me permitem frisar este ponto e exprimir neste caso particular uma exigência que poderá parecer excessiva, eu diria que todos nós estamos no começo da nossa actividade legislativa e é importante que todos nós assumamos uma verdade democrática. É que em democracia nenhum de nós tem a verdade no bolso e, portanto, nenhum de nós poderá esperar, nem deve esperar, ter a última palavra, tirar conclusões, encerrar um debate.

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Creio que o contributo de todos nós é extremamente importante e a Sr.ª Secretária de Estado já demonstrou pela sua intervenção que pode, ajudar este debate intervindo ao longo dele.

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Posto isto - que, repito, é um apelo - e entrando na questão que nos ocupa, eu diria que também valerá a pena termos a consciência daquilo que estamos realmente a discutir.
Não estamos a discutir todo o problema dos transportes do País, não estamos a tratar de todo o problema da justiça social, do desenvolvimento do País, estamos apenas, dentro da medida das nossas possibilidades - e por isso apoiaremos e votaremos favoravelmente este pedido de autorização legislativa - a tentar melhorar ou resolver alguma coisa que achamos que está mal.
15to vale a pena, isto é suficientemente importante e merece ser reflectido!
Na verdade, a primeira distinção que importa aqui colocar é que o âmbito desta proposta não é coloca-lo no âmbito dos transportes em geral, mas exclusivamente naquilo que se refere aos transportes de pessoas. ,
Estamos arredados, pelo próprio âmbito da matéria que nos ocupa, dos transportes de mercadorias. Não vamos, portanto, falar disso, está fora do objecto dos nossos trabalhos.
E assim, estando delimitado o âmbito daquilo que nos ocupa, também importa considerar que não são sequer todos os transportes de pessoas que são objecto da proposta de autorização que o Governo nos propõe, mas principal e até exclusivamente os transportes de pessoas dentro dos aglomerados urbanos de uma certa dimensão.
E, portanto, dentro deste objecto concreto e bem delimitado que temos que apreciar a situação existente e as melhorias que, do nosso ponto de vista, esta proposta apresentada pelo Governo permite introduzir.

Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que todos nós temos consciência de uma situação que é hoje não só a dos grandes centros urbanos como também a de muitos centros de média dimensão ao longo do País, ou seja, que introduzimos uma variação essencial na óptica do transporte de pessoas dentro desses meios urbanos.
E essa variação de óptica foi a seguinte: por imposição de uma política, repito, por imposição de uma política, deixamos de considerar exclusivamente a existência de um transporte privado para admitir, em coincidência, um transporte público e um transporte privado - nalgumas regiões do País temos apenas um transporte público - e, ainda mais, aplicarmos a esse conjunto de transportes - seja ele público ou privado - uma obrigação, qual seja a de considerar o transporte como uma obrigação e, portanto, consequentemente, um custo social.

Ou seja, o preço pago pelo utente do transporte ficou, por imposição de uma política que escolhemos e pela qual optámos, em vários casos, aquém do custo indispensável para rentabilizar a empresa, seja ela pública ou privada, e para lhe conceder até aquilo que, conforme as terminologias, poderemos designar por lucro, mais-valia ou o que quiserem.

Ora bem, é dentro deste conjunto que temos que considerar a proposta de autorização apresentada pelo Governo.
E ela traduz-se não numa modificação do custo de transporte suportado pelo utente mas na substituição da compensação do custo social imposto às empresas - repito, públicas ou privadas - que advém da função social transportadora que desempenham, na repercussão desse custo, não em termos do OGE e, portanto, não em termos da repercussão por toda a colectividade, mas exclusiva e directamente sobre o próprio âmbito geográfico da área em que esse transporte se situa.

Pensamos que esta é uma boa opção que o Governo nos propõe, e não exclusivamente em termos fiscais ou em termos de economia fiscal. Também nós não pensamos que seja possível - e o Sr. Ministro de Estado disse-o há pouco - que esta medida permita diminuir este ano os impostos pagos pela colectividade. Porém, pensamos que esta medida permitirá certamente que os impostos arrecadados este ano e nos anos futuros tenham aplicações diferentes, em termos da comunidade social que somos, e essa é, naturalmente,

Página 960

960

uma vantagem importante da proposta de lei que o Governo nos apresenta.
Por outro lado, essa proposta de lei tem ainda uma segunda e importante vantagem. É que ela faz repercutir directamente sobre a comunidade mais próxima em que o transporte se situa as vantagens da utilização desse transporte e isso tem algum significado em termos de solidariedade de uma comunidade nacional.
E evidente para qualquer olhar, por mais desprevenido que ele seja e por menos rigoroso que seja na análise daquilo que é o conjunto deste país, que estamos a fazer com que o cidadão de Trás-os-Montes ou o cidadão do Algarve ou o cidadão do Alentejo não pague também os custos sociais do Metropolitano de Lisboa.
Para empregar um exemplo ainda mais esclarecedor dos próprios custos do transporte ferroviário, direi que o transporte urbano tem um peso particular, específico, nas áreas da grande Lisboa ou do grande Porto, em comparação com o transporte de mercadorias mais rentável no conjunto do País - e também isso é uma diferenciação. Ora, parece evidente, aos olhos de qualquer observador por mais desprevenido que seja, que estamos aqui a aplicar critérios que são necessariamente - e também eu repito a palavra tantas vezes já usada ao longo deste debate - de maior justiça social (e sublinho a expressão).

O Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Por último, creio que ainda vale a pena destacar mais um aspecto. Todos sabemos que o urbanismo que temos, que a concentração urbana que temos, é não só a consequência de um desenvolvimento económico desorganizado, mas também a consequência de uma concepção de vida, de uma política e de uma economia que fizeram concentrar nas grandes cidades a maior parte dos empreendimentos.
Ora, tudo isto afastou para a periferia dessas grandes cidades e desses grandes centros urbanos as pessoas de menores recursos e de menores capacidades, que foram afastadas por um sistema económico que concentrou nas grandes urbes a actividade económica fundamental, que fez com que tivéssemos o País desordenado territorialmente que hoje temos e que fez as camadas populacionais com menores recursos suportarem os custos da distância, da incomodidade e da própria necessidade de se fazer transportar, em distâncias por vezes longas, do local de residência para o local de trabalho.
Também neste aspecto a proposta do Governo tem uma dupla vantagem, na medida em que melhora esta situação e em que, inclusivamente, constitui um desincentivo - e um desincentivo cuja importância me cumpre assinalar- em relação a essa grande concentração urbana.
O facto de se penalizarem, nos seus custos, as empresas concentradas nos grandes centros urbanos e, portanto, de as fazer pagar uma taxa nova, fará, naturalmente - como resultado indirecto mas importante - com que essa medida surja como incentivo ao desenvolvimento regional e à implantação dessas empresas noutras zonas do País menos povoadas e menos dotadas de estabelecimentos industriais e fabris.

0 Sr. Furtado Fernandes (ASDI): - Muito bem!

O Orador: - Por tudo isto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, a proposta de autorização que o Governo nos propõe merece não só a nossa aprovação, mas também, mais do que isso, a nossa adesão.
Pensamos que ela é um avanço importante numa situação de um sector e na situação geral de desenvolvimento do País, que ela pode representar uma viragem importante em relação à situação que temos, que representa uma nova óptica e um novo modo de considerar as realidades do quotidiano das populações. Por isso, repito, a proposta merecerá a nossa votação positiva e o nosso aplauso.

Aplausos da ASDI, do PS, da UEDS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Deputado Magalhães Mota, há pouco ouvi aqui falar em vários conceitos de justiça social, por isso gostava de lhe fazer a seguinte pergunta: acha justa que os cidadãos de Mirandela, os cidadãos de Trás-os-Montes, onde se produz a energia, a electricidade, a paguem ao mesmo preço que os cidadãos de Lisboa, sem que estes paguem o transporte dessa energia?
Por outro lado, sendo os cimentos produzidos em Setúbal ou nas redondezas de Lisboa pagos em Mirandela ou em Trás-os-Montes por um preço mais elevado, ...

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - ... gostaria de perguntar ao Sr. Deputado se acha que seria de justiça social que esses cidadãos transmontanos estivessem a pagar as comparticipações nos prejuízos dos transportes dos cidadãos de Lisboa?
Eram só estas as perguntas que lhe gostaria de fazer.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota, para responder.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que, pelo próprio espírito de intervenção que produzi, ficou claro que os objectivos que defendo são objectivos de equilíbrio e de justiça social entre todos os cidadãos do País.
Aliás, o Sr. Deputado poderia recordar que esta opinião não é de agora mas de há bastante tempo. E se, por exemplo, eu tentei sustentar ingloriamente que o preço do cimento fosse uniforme para todo o País, também sustento que o preço da electricidade seja uniforme para todo o País, ou seja, que o acesso aos bens essenciais seja garantido em igualdade para todos os portugueses.

O Sr. João Amaral (PCP):- Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um protesto em relação à resposta do Sr. Deputado Magalhães Mota.

Página 961

15 DE JULHO DE 1983 961

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Deputado Magalhães Mota na sua resposta não referiu a pergunta que lhe foi feita em concreto e que se reportava aos cidadãos de Mirandela.
E não o fez muito bem porque a pergunta que lhe foi feita pelo Sr. Deputado do PSD não lhe era endereçada. Não tinha aquele endereço, tinha este endereço.
E eu devo dizer o seguinte: a pergunta que foi feita - e é nesse sentido que protesto em relação ao Sr. Deputado Magalhães Mota - revela que eu tinha toda a razão. Introduzida a questão da justiça social como ponto central, está estabelecida a confusão em torno desta questão e do aqui estamos a tratar.
Não é a questão da justiça social que estamos a tratar; é de uma questão de técnica fiscal, e é disso que vamos tratar na intervenção de fundo que produziremos nesta matéria.

Aplausos do PCP.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, peço a palavra para contraprotestar.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - O Sr. João Amaral enganou-se na figura regimental que quis usar.
Na verdade, penso que o Sr. Deputado que fez o pedido de esclarecimento -e que conheço há bastantes anos - não solicitou nem solicitaria o protesto do Sr. Deputado João Amaral.
Mas abstraindo desse aspecto, e uma vez que o Sr. Deputado João Amaral quis protestar quanto àquilo que referi em relação à justiça social, é evidente que de justiça se trata e continuo a insistir na palavra.
Ó que nós vivemos neste País e neste momento é, realmente, uma situação de injustiça e corrige-se pelas actuações que vamos desenvolvendo.
Não se corrigirá, possivelmente, pela mera utilização de palavras ou pela invocação, mais ou menos demagógica, de noções.
Corrige-se no dia-a-dia.
Corrige-se no concreto.
Corrige-se naquelas aplicações em que ela é mais directamente sentida.
E aquilo que o Sr. Deputado precisaria naturalmente de fazer e de desenvolver não era propriamente de tratar neste momento do problema das taxas municipais de transportes, que representam uma correcção do sistema existente e uma melhoria no sentido da justiça social, mas provavelmente - e eu ficarei à espera dessa intervenção - das condições de assegurar à população de Mirandela a justiça a que tem direito em todos os aspectos.

O Sr. João Amaral (PCP): - Vamos a isso! Vamos ao fundo da questão!

O Orador: - E aí eu aguardarei com muito gosto a sua intervenção e aí, com certeza, se o Sr. Deputado for pela justiça social como esta proposta de lei, terá certamente o meu apoio.

O Sr. João Amaral (PCP):-Vamos ao fundo da questão!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta de autorização legislativa apresentada pelo Governo respeita a uma matéria que altera as relações entre o Governo, as autarquias, as empresas públicas e privadas de transportes de passageiros, grande parte das empresas de todo o País e os próprios utentes dos transportes públicos urbanos e suburbanos de passageiros.
É, portanto, natural que matéria tão vasta mereça ser apreciada sob diversos prismas e é isso que tentaremos fazer, nos planos dos princípios técnicos, das relações entre a administração central e administração local e as empresas transportadoras e, finalmente, das repercussões financeiras.
No plano dos princípios técnicos devo dizer que a proposta apresentada é compreensível.
Com efeito, ninguém pensa hoje que o transporte público, principalmente nas aglomerações urbanas de média e grande dimensão, possa ser sustentado pelas receitas directas dos utentes, obtendo-se um equilíbrio financeiro.
Os transportes sofreram nos últimos anos um grande agravamento das condições de exploração na mão-de-obra, nos custos de material, nos custos energéticos, nos custos financeiros e, sobretudo, nas grandes manchas urbanas, os transportes colectivos são chamados a colmatar os erros do desenvolvimento urbanístico.
Isto sucede em todo o Mundo. Em Portugal, a situação é agravada ainda, e em muito maior escala do que possa supor-se, pelo facto de os locais de residência pouco terem a ver com os locais de trabalho. Dadas as especiais características do nosso mercado habitacional, como resultado da política de rigidez de rendas, as pessoas são de todo em todo cativas do local de residência em razão da estabilidade dos seus custos nominais.
Por outro lado, a rarefação da oferta do mercado habitacional verificada nos últimos anos leva a que se procure, quase que com uma candeia na mão, uma casa, qualquer casa, em qualquer lugar.
Como consequência, verificamos nas nossas aglomerações urbanas mais deslocações e mais longas, maior congestionamento, mais tempo gasto, mais cansaço, muito maiores custos de produção para muito piores transportes.
E porque me recuse a um debate de características regionalistas, como se o nosso país fosse dividido em fatias, gostaria apenas de lembrar que, mais do que as discriminações que se verificam entre, diferentes regiões do nosso país, as grandes discriminações verificam-se exactamente nas nossas áreas urbanas de Lisboa e Porto, nas áreas metropolitanas, porque hoje as discriminações dos Portugueses, mais do que ao nível salarial, se chamam acessibilidade e renda de casa.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - A situação é difícil e não a podemos impedir.
E isto tem levado a crescimentos de custos que levam a défices, que são cobertos na quase totalidade pelo Estado, que na sua atribuição tem naturalmente privilegiado as empresas públicas.

Página 962

962 I SÉRIE - NÚMERO 22

O Estado tem crescentemente dificuldades em satisfazer os seus compromissos em matéria de indemnizações compensatórias e pode até pensar-se que o recurso intensivo ao OGE cria discriminações entre os cidadãos, porque são chamados a participar na cobertura dos défices dos transportes os cidadãos de todo o País, quando só uma parte utiliza, ou pode utilizar com intensidade, esses serviços. Mas o regime fiscal português invalida parte desses argumentos, e talvez até, pela Lei das Finanças Locais, se pudesse encontrar uma solução sem a necessidade da criação de mais esta barreira fiscal.
Sr. Presidente. Srs. Deputados: Esta proposta, que tenta colmatar parte das deficiências apontadas, tem já uma história e tem raízes directas no projecto de lei n.º 389/II (lei-quadro relativa à criação de uma taxa municipal de transportes), apresentada pelo Partido Socialista em Janeiro. Foi uma promessa feita ao eleitorado pelo Partido Socialista (é a n.º 47 das 100 medidas apresentadas ao eleitorado). Foi também referida no Programa do Governo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, desculpe a interrupção, mas eu queria pedir à Assembleia um pouco de silêncio.

Pausa.

Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente. Ê uma proposta que é inspirada no modelo francês, que também tomaremos por referência nalgumas das nossas observações.
Como já referimos, consideramos que esta proposta é tecnicamente compreensível na tentativa de ultrapassar as dificuldades e distorções existentes, mas esta posição não obvia porém a discordâncias profundas que adiante referirei.
Ainda no campo dos aspectos técnicos, um dos assuntos mais importantes é precisamente o da delimitação do campo de aplicação, ou seja, do limiar de aplicação, ou seja, do limiar da população a que se destina esta proposta.
No âmbito das propostas e propósitos que estiveram na génese desta proposta não se compreendem certas hesitações - talvez fruto da existência de estudos de base defeituosos-, pois que na proposta de limiar populacional se notam algumas opiniões que não são concordantes.
Assim, o projecto de lei apresentado pelo PS em Janeiro aponta como limiar 50000 habitantes, podendo ser diminuído para 25000. A medida 47 das «100 medidas» do PS refere que a taxa municipal de transportes seria aplicada a municípios de mais de 100000 habitantes - e cita-os até: Lisboa, Porto, Setúbal, Braga e Coimbra. Abandonava-se assim a figura da federação ou associação de municípios e deixaram-se de fora municípios tão importantes das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto como Almada e Vila Nova de Gaia. Finalmente, no Programa do Governo referem-se desta vez 30000 habitantes. E, por agora (e é bom notar que estas diferenças de critérios ocorreram em meio ano), parece que se cristaliza finalmente nos 50000 habitantes.
Estas hesitações, que podem parecer de pormenor, não prestigiam a adopção de uma medida de tão grande alcance político e que envolverá largos milhões de contos de agravamento fiscal.
Quando comparamos com o modelo francês, vemos que o versement começou por se aplicar a estruturas urbanas de 300000 habitantes e depois a 100000. Finalmente está em vias de ser diminuído.
E se pensarmos na realidade portuguesa, entendemos que o limiar populacional não deveria nunca baixar dos 50000 habitantes.
No que se refere ao campo das relações da administração central, da administração local e das transportadoras, conviria referir que, mercê de alterações que ocorreram nos últimos anos que tiveram raras vezes fundamento técnico- e, sobretudo, mercê das nacionalizações ocorridas após o 11 de Marco no sector, temos uma situação profundamente distorcida.
Temos municípios que não têm encargos obrigatórios com a exploração das suas redes de transporte público (é o caso de Lisboa, Porto, Almada, Setúbal, Évora, Beja, Faro, etc.).
Há municípios que têm serviços municipalizados de transportes. É o caso de Aveiro, Barreiro, Coimbra e outros e que vivem permanentemente na expectativa - quase que diria angustia- de um subsídio, atribuído a título excepcional, que lhes resolva os problemas prementes com que se debatem.
E aí, porque não existe a tutela ou o abraço amigo da administração central ou da administração local, temos como consequência redes de serviço menos densas, tarifas mais caras, serviços que acusam degradação e empresários que começam a acusar desmotivação.
Quanto às empresas públicas, temo-las operando em diferentes quadros urbanísticos: temos empresas públicas cujo âmbito é abertamente municipal, como o caso do Metropolitano de Lisboa; temos empresas públicas cujo âmbito é predominantemente municipal e actuam perifericamente noutros municípios, como o caso da Carris e dos STPC no Porto; temos empresas que actuam num grupo reduzido de municípios, como a Transtejo; finalmente, temos empresas públicas que actuam em todo o País e não apenas na área dos passageiros, como seja a CP e a Rodoviária Nacional.
Por fim temos municípios onde actua um só operador público de transportes e outros onde actuam vários.
Esta breve descrição não exaustiva deixa supor um quadro complexo de relações dos municípios com as empresas públicas e com as empresas privadas. Em nossa opinião esta taxa não deverá nunca entrar em funcionamento sem um conjunto de situações estarem reequacionadas a montante. A mais importante parece-me ser uma nova definição da lei das competências dos municípios.
Os municípios terão de ser responsabilizados ou co-responsabilizados (nesse caso tendo o OGE um papel supletivo) na atribuição das indemnizações compensatórias, como se previa, aliás, no preâmbulo do projecto apresentado em Janeiro pelo PS.
Sem este instrumento estar criado é óbvio que as assembleias municipais não activarão o mecanismo da taxa municipal de transportes e correr-se-á, por indefinição, por se atirar a bola de um lado para o outro, o risco de degradação de sistemas de transportes, com todos os prejuízos daí decorrentes para as populações.

Página 963

DE JULHO DE 1983 963

Consideramos que esta é de todas a mais importante das alterações que é preciso introduzir a montante na efectivação da taxa municipal de transportes, porque também acredito, como ontem foi aqui referido pelo Sr. Secretário de Estado, que o dinheiro na mão dos autarcas cresce.
Em segundo lugar, será necessário introduzir alterações no regime de gestão das empresas públicas. Os municípios terão que ter uma palavra na gestão ou controle das empresas públicas ou no segmento que opera no seu território.
Este estilo de actuação, este maior entrosamento com a administração local, terá contrapartidas na racionalização da gestão dos sistemas de transportes, como sejam: outra compreensão pela importância da gestão da vida pública, prioridade devida aos transportes públicos, melhoria da velocidade comercial da elaboração dos planos de urbanização elaborados pela própria câmara, que tem que ter em conta a especificidade da exploração das redes de transportes públicos e correcções - principalmente nas áreas metropolitanas que têm que ser efectuadas ao nível fiscal entre os municípios dormitórios e os municípios que fornecem serviços, pois estes terão receitas, segundo o articulado que e proposto, bastante diferentes e provavelmente idênticas necessidades.
Ficam ainda em aberto neste campo das relações da administração central com a administração local e com os transportadores muitas outras questões, uma das quais é a de saber se não será de encarar de frente, e desde logo, a passagem de certos sectores de actividades das empresas públicas para empresas municipais ou para empresas mistas de capital público e de capital municipal.
Embora não exaustivamente, estão enunciadas umas tantas questões das muitas que se levantam e a nossa convicção é a de que ou são claramente definidos os critérios de relacionamento ou vamos ter, permanentemente - áreas de conflito entre a administração central - a administração local.
Por isso, em certa medida não compreendemos a pressa com que foi pedida esta autorização legislativa.
No que se refere às repercussões financeiras, esta terceira via de financiamento (fazendo participar no seu custo as empresas beneficiadas por uma rede de transporte e não os utentes, como é referido no preâmbulo do pedido de autorização) é, na prática, um imposto, mais um imposto sobre as empresas.

O modelo francês - criado, aliás, em época de prosperidade económica pré-Miterrand - apontava como valor máximo da participação das empresas no versement 1 % da massa salarial e até 1,5 % quando estivessem em curso de realização infra-estruturas subvencionadas pelo poder central, tendo sido posteriormente elevado para 2 % na aglomeração parisiense.

Entre nós o limiar máximo proposto é de 2,5 da massa salarial.

É claro que não acreditamos - como se referia na exposição de motivos do projecto de lei apresentado pelo PS em janeiro último- que a introdução desta taxa leve a uma redução da carga fiscal geral.

Deixar a porta aberta aos 2,5 % é deixar ao poder central a faculdade de, nos casos em que o OGE deve exercer, através das indemnizações compensatórias, um papel supletivo, reduzindo as indemnizações compensatórias, obrigar as assembleias municipais a ter que adoptar o máximo permitido, o que é perfeitamente incomportável para as empresas portuguesas no momento em que se atravessa um período extremamente difícil e se fala já noutros aumentos, como 0 dos descontos para o Fundo de Desemprego.
E sobretudo é preciso moralizar os sacrifícios pedidos; não se pode ser draconiano para as empresas em geral quando, simultaneamente, no sector dos transportes, se é tão liberal ao praticarem-se aumentos salariais acima das possibilidades das empresas públicas tão deficitárias.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Descoordenações destas provocarão a perplexidade, a indignação e a incompreensão dos contribuintes para medidas deste tipo e poderão, ao invés, criar noutros sectores a ilusão de que agora não vai faltar dinheiro e não vai ser preciso economizar.
Por tudo isto entendemos, de forma muito clara, e dadas as intenções de voto favorável já manifestadas por diversos agrupamentos parlamentares, que, a ser aprovado nesta Assembleia este pedido, a bem de todos, o valor da taxa municipal de transportes não deveria nunca ultrapassar os 1 %, quando muito, em casos excepcionais, os 1,5 %, dadas as circunstâncias actualmente vividas pelas empresas. De resto, os cálculos hoje à tarde apresentados pelo Sr. Deputado Reis Borges, que defendeu a proposta apresentada pelo Governo, mostram que nos casos mais dramáticos estes quantitativos são perfeitamente suficientes para satisfazer o grosso das necessidades.
Procurei analisar nas linhas essenciais e suas implicações esta proposta de autorização legislativa.
Entendemos que o princípio preconizado é tecnicamente justificável principalmente nos aspectos de um relacionamento novo entre a administração central e a administração local.
Não entendemos certas hesitações já referidas, que deixam supor que os impactes desta medida, que envolve muitos milhões de contos, não foi estudado nos seus múltiplos aspectos.
Não compreendemos a razão de ser desta urgência, quando todo um conjunto de alterações estruturais tem de ser preparado a montante.
E, por fim, rejeitamos em absoluto 2,5 % como o montante máximo que a taxa municipal de transportes possa atingir. Este montante não é adequado ao actual momento vivido pela actividade económica portuguesa - aliás mantém-se a questão de saber se não será possível resolver este problema pela via da Lei das Finanças Locais!...
Sr. Ministro dos Transportes, gostaria finalmente de ser informado apenas sobre um pequeno pormenor: tenciona o Ministério iniciar um diálogo com os municípios no sentido da transformação de empresas públicas, ou segmentos de empresa pública operando numa determinada área, em empresas municipais ou mistas, na busca da simplificação do papel da administração central e com o objectivo do aumento de produtividade e redução de custos?
Creio que deixei bem claro que as nossas principais objecções se situam no campo da oportunidade desta medida face à situação que vivem as empresas portuguesas neste momento e também sobre a dúvida de saber se a Lei das Finanças Locais não poderá dar

Página 964

964

satisfação a este desiderato, principalmente no que se refere às discriminações que existem entre os municípios que têm a responsabilidade da gestão de serviços municipalizados e os municípios do pais que beneficiam de redes de transportes financiados pelo Orçamento Geral do Estado.

Aplausos do CDS.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento,

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS):- Referiu o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia a rarefacção do mercado habitacional verificada nos últimos anos.
Por que pensa o Sr. Deputado que se terá verificado tal rarefacção nos últimos anos?
Disse ainda o Sr. Deputado que não deveria nunca descer abaixo de 50 000 0 limiar do número de habitantes de aglomerados urbanos onde fosse aplicada esta taxa municipal de transportes.
Eu, que também solicitei ao Governo explicações mais detalhadas sobre as razões que motivaram esse limiar, solicitaria agora ao Sr. Deputado Miguel Anacoreta Carreia a bondade de me dar explicações sobre as razões por que defendeu nunca se dever descer abaixo dos 50 000 habitantes na aplicação desta taxa.
Ficou-me ainda uma dúvida, na parte final da sua intervenção, sobre se o Sr. Deputado estaria de acordo com a prossecução das greves nos transportes e a continuidade da chamada solução dos "alternativos".
Como questão final perguntaria, pois não consegui ouvir bem o fim da sua intervenção, se se fixasse o montante da taxa municipal de transportes em 1 ou 1,5 %, em vez de 2,5 %.
O Sr. Deputado estaria de acordo com este projecto.

O Sr. Presidente: - Para o mesmo efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia, depois da sua exposição ficou no meu espírito que V.Ex.ª adere de fundo à iniciativa feita pelo Partido Socialista, mas põe reservas não só no que concerne à situação económica de certas empresas, ou do País em geral, mas também quanto ao valor da taxa que está fixada.
Creio mesmo ter entendido que terá implicitamente sugerido um abaixamento da taxa para 1,5 %. De resto permitir-me-ia recordar que a variação de 0,5
a 2,5 % apontaria naturalmente para um valor médio que se aproximaria do valor que indicou e que eram aspectos que considerava importantes e que reforçariam essa sua adesão implícita à proposta do Partido Socialista.
Tanto assim é que as considerações que fez relativamente ao enquadramento a montante da iniciativa em apreço são aquelas que efectivamente se apontam ao Programa do Governo.
O Sr. Deputado, ao ter sublinhado exactamente que tais medidas constituíam um caminho para o municipalismo, estava a vectorizar o problema nos aspectos que focalizou.

Este meu pedido de esclarecimento era apenas para saber se ouvi bem ou se não ouvi bem, se entendi bem ou se não entendi bem o teor da sua intervenção.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Respondendo. às questões que me foram postas pelos Srs. Deputados - Hasse Ferreira e Reis Borges, queria dizer o seguinte: é evidente que o problema da rarefacção do mercado poderia - tal como há pouco o Sr. Deputado Hasse Ferreira afirmou em resposta ao Sr. Deputado João Amaral - ser levado para um debate mais prolongado. As causas são múltiplas e vão desde o problema dos desincentivos criados à posse da habitação à desconfiança que existe pela parte da aplicação de capitais no mercado imobiliário para rendimento. Por isso, a minha bancada espera com bastante expectativa que, de acordo com o Programa do Governo que dá a este assunto da definição da renda justa de habitação uma prioridade igual ao da taxa municipal de transportes, o Governo defina isso em critérios perfeitamente claros porque estamos convencidos de que isso vai desbloquear o mercado habitacional.
São múltiplas as causas, inclusivamente algumas relacionadas com o período agitado da vida política que vivemos, mas não gostaria de estar aqui a referi-lo, porque, para além de não o conseguir fazer em dois ou três minutos, é qualquer coisa que virá a ser discutida em breve, de acordo com as promessas feitas pelo Governo a esta Assembleia, e nessa altura teremos ocasião de expor o nosso ponto de vista sobre o porquê da rarefacção do mercado habitacional.
Nó que diz respeito ao problema dos 50 000 habitantes, devo dizer ao Sr. Deputado Hasse Ferreira que esta proposta de alteração legislativa fala em municípios, em federações e em associações de municípios com mais de 50 000 habitantes, o que permite um quadro já suficientemente largo para cobrir a totalidade do país onde se verifica a necessidade de transportes públicos regulares de passageiros de tipo quotidiano.
Por outro lado, o Orçamento Geral do Estado e o próprio Estado não retiram as suas responsabilidades do financiamento do transporte público e entendo que, dentro de uma política de descentralização que aqui já várias vezes foi referida, e da mesma maneira que dá incentivos fiscais, o Estado deve financiar esses transportes públicos quando existirem casos residuais em que Haja a necessidade de implementação do transporte público de passageiros em zonas que, por exemplo, venham a ser consideradas pólos de desenvolvimento.
Em terceiro lugar, queria dizer-lhe, Sr. Deputado Hasse Ferreira, que não manifestei qualquer opinião relativamente aos transportes "alternativos". Creio que em momento nenhum da minha intervenção se falou nesse caso, embora entenda que as pessoas que pagaram o seu passe social têm o direito de ser transportadas ou de ser reembolsadas nos dias de greve, pois compraram um direito a que corresponde uma obrigação que não está a ser cumprida por parte das empresas quando essas greves se dão. Portanto, embora não tenha manifestado qualquer opinião sobre os alternativos, aproveito para emiti-la.

Página 965

15 DE JULHO DE 1983 965

Pergunta-me o Sr. Deputado Reis Borges se adiro de fundo a esta questão. Ê um problema que me põe em termos pessoais e o Sr. Deputado, que teve ocasião de trabalhar comigo, sabe perfeitamente que esse problema faz parte de uma matéria que pedi para ser estudada, porque me preocupavam fundamentalmente duas questões: primeira, a da incerteza que as empresas têm quanto aos montantes de indemnizações compensatórias que lhes são atribuídas pelo Estado, quando o mesmo Estado é certo na imposição de tarifas; segunda, a resolução do problema da discriminação entre os municípios, porque considero perfeitamente imoral a situação que se verifica entre os municípios que têm serviços municipalizados -como Aveiro, Coimbra, Barreiro, Braga e Portalegre - e a situação dos outros municípios, que não dispendem um tostão com os seus transportes.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Daí haver também uma terceira questão que me preocupa: o problema da necessidade de responsabilizar o poder local na questão dos transportes municipalizados. É muito fácil às câmaras reivindicarem esta e mais aquela carreira de autocarros - ou mais horas - por vezes sem qualquer tipo de procura, provocando défices tremendos, quando as câmaras são completamente desconhecedoras do mecanismo de formação dos preços.
Portanto, o que me parece essencial é as empresas saberem qual o horizonte financeiro com que contam, terminar com as discriminações entre os diferentes municípios e responsabilizar o poder local pelas questões. Estas são as minhas preocupações nesta matéria.
Penso que seria mais correcto o mecanismo da Lei das Finanças Locais do que a introdução de um novo imposto, como é a taxa municipal de transportes. Julgo, assim, ter respondido à sua pergunta.
Finalmente, queria dizer-lhe que fico satisfeito por que no programa do Partido Socialista venha uma série de considerações, que também já hoje aqui referi, sobre a articulação entre o poder central e o poder local. São questões por que me venho batendo há muitos anos e que não são património do PS, tal como não são património do CDS. São património conjunto dos técnicos de transportes que estudam honestamente estas questões e que sabem que, nestas como noutras áreas, é possível haver consenso entre as diferentes ideologias políticas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pretendia, antes de tudo, reduzir a questão aos termos precisos em que ela deve decorrer. Nesse sentido, em nossa opinião, qualquer lei, qualquer autorização legislativa, decreto-lei, portaria ou despacho, em princípio, deve visar a justiça social. Donde não há nenhum mérito numa autorização legislativa, num decreto-lei, portaria ou despacho pelo facto de visarem essa justiça social. Isto é, não pode ser essa a questão que distingue uma lei boa de uma lei má. Não é essa a questão que se vai discutir, porque essa está precisamente suposta, pelo menos para nós. Não podemos, de fornia nenhuma, entrar nesse mérito.
Mas, mais do que isso, se fôssemos a debruçar-nos sobre a questão da justiça social, para além daquilo que foi aqui afirmado, seria estranha a forma encomiástica como certos deputados e também um membro do Governo apelou para esse aspecto da sua proposta de autorização legislativa. É que, em muitos outros aspectos da vida social do País, problemas deste tipo se põem e, por outro lado, não nos parece que esta nova taxa possa contribuir, de facto, para uma maior justiça social. Por si só, não contribuirá. Do que se trata, Srs. Deputados, é de saber quais são as melhores formas fiscais para garantir que as indemnizações compensatórias sejam pagas a tempo e horas.
Devo dizer, e os Srs. Deputados e os Srs. Membros do Governo também o devem saber, que esta técnica das taxas é uma técnica muito velha.

Pausa.

Sr. Presidente, peço um pouco mais de silêncio porque gostaria, ao menos, de me ouvir a mim mesmo.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado, Peço novamente à Câmara para manter o silêncio que é necessário e para não perturbar os trabalhos. Compreendo que os Srs. Deputados tenham necessidade de trocar impressões entre si sobre a matéria em discussão, mas podem fazê-lo sem perturbar a ordem dos trabalhos da Assembleia.

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Como ia dizendo, a técnica das taxas é uma técnica muito velha e nem vale a pena ir buscar exemplos no estrangeiro. Vem-me à memória um grande escritor português, o Aquilino Ribeiro, que falava de um notável político -notável, apesar de tudo - e que chamava de «o mais possidónio do Universo», porque ele tinha a concepção da economia nacional nestes termos: era preciso aumentar as receitas e diminuir as despesas! Por isso, era um «possidónio»!

Risos.

Mas também, e nesse mesmo autor, se podem encontrar cominações como a dos «mestres mais aboirados do Universo» - referia-se não a todos, mas a alguns mestres de Coimbra e ainda o visado era o mesmo político notável, o «Possidónio».
Ora, o problema que temos diante de nós é, simplesmente, este: trata-se de uma proposta de autorização legislativa que visa aumentar as receitas, por um lado, e que visa diminuir certas despesas, por outro. Tão-só, Srs. Deputados! E não se iludam, porque se se iludirem acordarão com um pesadelo.
Já aqui ficou demonstrado, aliás o Sr. Ministro Almeida Santos foi claro nisso, que o facto de se aplicar esta nova taxa, que pode ir de 0,5 % a 2,5 %, não vai produzir nenhuma diminuição da carga fiscal. Isto é, o pagante, os portugueses, vão pagar tudo o que já pagavam e ainda mais estes 2,5 %! Uns directamente, diria - e os que pagam directamente, não pagam nada - e outros indirectamente que pagam sempre.

Página 966

966 SÉRIE-NÚMER0 22

E quem paga indirectamente são todos os consumidores, que utilizam os produtos das empresas que vão ter que meter nos seus custos mais este, o de uma taxa de 0,5 % a 2,5 %.
Bom, mas sempre sobrarão questões e entre elas a de saber se, pelo lado da técnica de recolha dos impostos e do pagamento das indemnizações compensatórias, esta proposta de lei de autorização legislativa poderá ser concretizada num decreto-lei que tenha méritos.
É nesta questão que nos devemos deter, porque em matéria de justiça social, de carga fiscal, etc., já vimos que, ou não há nem positivo nem negativo, ou até há negativo!
A Sr.ª Secretária de Estado, aliás, foi muito clara quando disse que se tratava de um novo quadro de financiamento das empresas de transporte. É disto que se trata e de nada mais. É o novo quadro de financiamento das empresas de transporte. Que é preciso financiá-las, estamos todos . de acordo, mas haverá que ter em conta alguns aspectos e algumas diferenças, porque, por exemplo, não são só os transportes urbanos que existem; há que atender, também, aos transportes interurbanos e entre empresas públicas e empresas privadas à diferenças substanciais. Chamo a atenção para o facto de que as empresas privadas e públicas não são obrigadas ao mesmo título à prestação de serviços - enquanto as empresas públicas são obrigadas a certo tipo de encargos, as privadas não o são. Por isso, desde logo, o pagar pura e simplesmente por oferta de passageiro/quilómetro pode não ser correcto e, para usar a vossa muito usada expressão de justiça, pode não ser justo. Por outro lado, sempre sobrarão os transportes interurbanos de passageiros.
Esta proposta de lei de autorização legislativa é, manifestamente, a tentativa de com uma grande urgência, pôr em decreto-lei aquilo que foi o projecto' de lei n.º 339/II, assinado pelo então Deputado António Sousa Gomes do Partido Socialista.
Entretanto, conviria saber, da parte do Governo, a resposta a algumas questões, para que nos possamos pronunciar com um mais cabal conhecimento. Em primeiro lugar, a proposta de lei menciona câmaras municipais onde no projecto de lei do Partido Socialista se referia assembleias municipais.
A proposta de lei estabelece normas sobre cobertura tarifária diversas daquelas que se podem encontrar no projecto-lei do Partido Socialista que referi. Por outro lado, a proposta de lei fala de normas de repartição que são também diversas daquelas que se podem encontrar no referido projecto de lei. Conviria, também, que o Governo nos dissesse algo mais sobre a forma como estabeleceu o limiar do número de trabalhadores, a partir do qual as empresas devem pagar. Não vou repetir a pergunta que fiz há pouco e que não foi respondida, mas suponho que os Srs. Membros do Governo irão responder a uma e outra. Portanto, não se trata só de saber quais foram os critérios que estabeleceram o limiar do número de trabalhadores das empresas que devem pagar esta taxa, mas também de saber porquê empresas públicas e privadas e porque não a administração central e social e a administração autónoma do Estado. Por que é que estas não pagam essa taxa?
Esta autorização legislativa, tomada assim à primeira vista e superficialmente, é porventura a menos mal fundamentada ou, se quisermos, a melhor fundamentada que foi apresentada à Assembleia da República - e digo melhor fundamentada e não "mais bem" fundamentada, como já aqui ouvi dizer! Mas, não basta! Neste caso, com algum rigor se pode dizer uma de duas coisas: ou que não se justifica a urgência com que aqui nos foi presente esta autorização, ou então que o Governo bem podia ter-nos feito o favor de entregar o projecto de decreto-lei que pensa publicar com esta autorização. Porque isso pouparia elogios, mais ou menos justificados, à autorização legislativa por parte de quem a apoia, e pouparia também críticas, mais ou menos justificadas, por parte de quem não a apoia.
Em todo o caso, do nosso lado, há uma outra questão que queríamos pôr ao Governo e que nos parece preocupante. Esse sistema de taxa é muito conhecido em certos países, designadamente em França. Aliás, neste país, não se usa taxas deste tipo só para os transportes mas também para a habitação social, como e conhecido de todos. Sobre isto a questão que podemos pôr, e que é importante que o Governo tenha em conta, é que em qualquer caso e supondo que os limiares estão bem definidos - isto é, os limiares do número de trabalhadores das empresas a partir do qual elas são obrigadas ao pagamento da taxa e, por outro lado, o limiar do número de habitantes do centro urbano a partir do qual essa taxa é possível - independentemente, como digo, da justa ponderação destes limiares, é muito importante saber quais são as consequências que podem advir de uma passagem brusca de um sistema ao outro. Quer dizer, a passagem do actual sistema em que as indemnizações compensatórias são mal pagas, pagas tarde de mais ou fora de tempo, às empresas transportadores - e que eu saiba só às públicas, pelo menos legalmente, assim é - para o sistema em que tudo fica dependente das actividades municipais, não importando agora e para já saber se são as assembleias municipais a decidir ou se são as câmaras - embora, pela nossa parte, entendamos que a solução assembleia municipal sempre será preferível à solução câmara municipal.
Importa, sobretudo, reter que a transferência deste encargo das indemnizações compensatórias para os municípios, para além das objecções já aqui levantadas por vários Srs. Deputados e que têm inteiro cabimento, sempre será - e o Governo sabe certamente isto a transferência do odioso para os municípios. Odioso, por aquilo que seja impossível nesta altura satisfazer, não por razões do próprio município ou da vontade municipal, mas por razões de atraso ou de dificuldades económicas que são de todo o País.

Uma voz do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Para melhor definirmos uma posição, aguardaremos a intervenção dita final - que não será final mas quase final - da Sr.ª Secretária de Estado sobre este assunto, esperando que, tal como disse, procure responder às questões que lhe foram postas.
Mas, não queremos terminar sem mais uma vez insistir em pedir respostas às questões concretas que colocamos. Não pedimos que nos falem em justiça social ou de harmonia entre o poder local e central, nem que nos falem de solidariedade porque, sobre essas questões, certamente que os Srs. Deputados não duvidam que podíamos aqui apresentar inúmeros exemplos que provam que os habitantes da minha

Página 967

15 DE 1983 967

aldeia não têm o tratamento que têm os habitantes de Lisboa mas não há nenhuma lei que possa resolver esse problema! Tenho à minha disposição mais quilómetros de asfalto do que têm os habitantes de Trás-os-Montes; tenho a possibilidade de me transportar em veículo próprio e os habitantes de Trás-os-Montes - por razão até do destino- não têm muitas vezes essa possibilidade; tenho o cimento a preço mais baixo e a gasolina pago-a ao mesmo preço, mas o quilowatt também é ao mesmo preço.
Não falemos de justiça social, Srs. Deputados! Tenho aqui dezenas de cinemas, a Biblioteca Nacional, inúmeras bibliotecas, as Faculdades todas, a Universidade ...
O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Então estude!

O Orador: - Tenho aqui a assembleia da República, o centro político do País, portanto, não falemos em termos demagógicos de justiça social! Atenhamo-nos tão-só à especificidade desta proposta que, quanto a mim, foi rapidamente definida - honra lhe seja - pela Sr.ª Secretária de Estado quando disse que se tratava de um novo quadro de financiamento das empresas de transporte. E tão-só nesta matéria que devemos ater-nos e é nela que esperamos as explicações e as respostas às perguntas que colocámos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado César de Oliveira pediu a palavra para que efeito?

O Sr. César de Oliveira (UEDS):- Para pedir um esclarecimento ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Ó Sr. Deputado, desculpe lá, mas não correspondo ao seu apelo.
E que é sobre justiça que quero falar!
Tenho ouvido várias coisas, neste país, e há algumas que já não me admiro de ouvir, mas há uma que me espanta vinda da bancada do Partido Comunista
Português. Então o Sr. Deputado - e queria dizer que tenho procurado seguir com atenção este debate, sobretudo na parte concernente à justiça social -
vem afirmar que uma lei, uma autorização legislativa, qualquer diploma, não tem projecção social? Então o Sr. Deputado vem defender uma concepção tecnocrática da legislação? Onde é que está o marxismo e o marxismo-leninismo do Sr. Deputado Veiga de Oliveira?

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Essa não percebo!

O Sr. João Amaral (PCP): - Nunca perceberá!

O Orador: - Sei que os senhores têm as verdades da justiça guardadas num cofre forte e só VV. Ex.as é que as usam, mais ninguém as pode usar.

Risos.

Aplausos da UEDS, do PSD e do CDS.

Se calhar é por isso! O Sr. Deputado disse também (e vou citar as suas palavras) que "se trata de uma autorização legislativa com incidência no quadro do financiamento das empresas de transportes". Então o financiamento dessas empresas não tem uma projecção social eminentíssima? O Sr. Deputado, então a sua linha de defesa é das empresas públicas, e, consequentemente, na óptica que muitas vezes tem tentado defender correctamente o sector público, uma autorização legislativa que visa o seu financiamento não tem incidência na justiça social?
Então em que é que ficamos? O sector público, no caso concreto dos transportes, é ou não é uma linha da defesa da justiça social, dos postos de trabalho, do serviço aos utentes, etc., etc.? Em que ficamos, então o Partido Comunista agora virou tecnocrata?

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ah, grande César!

O Orador: - Ou não será, no fundo, esta questão muito simples, e desculpará a franqueza com que a ponho: V.Ex.ª têm muitas vezes acusado o Governo de estar ao reboque dos interesses do grande capital, mas aqui, nesta proposta de autorização legislativa, não o podem dizer. Daí, refugiam-se dizendo que se trata de uma mera medida técnica e que não tem nada a ver com a justiça. Essa a razão fundamental por que os senhores nesta matéria, não podendo invocar que se está a defender o grande capital, acabam por argumentar assim.
Eu, em relação ao Governo, estou tranquilo e calmo porque não votei a seu favor. Mas, nesta matéria, "o seu a seu dono"! Esta é uma medida, embora não seja técnico de transportes nexo nunca tenha sido ministro dos transportes ...

Vozes do PCP: - Para nosso bem. Para nosso bem!

O Orador: parece-me que lá ter projecção social, tem!
Terminava por dizer o seguinte: há um provérbio espanhol que diz "no me creo las brujas, mas las hay, las hay".

Risos.

Aplausos da UEDS, do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Antes de tudo, agradeço o momento de bom humor que o Sr. Deputado nos proporcionou. Só fico com uma dúvida: o Sr. Deputado estava cá quando comecei a intervenção ou não? Estava! Então não estava a ouvir!

Risos do PCP.

Uma voz do CDS: - Estava a jantar!

O Orador: - E digo que não estava a ouvir porque aquilo que eu disse foi uma coisa muito diversa. Disse

Página 968

968

que todas as leis, Decretos-Leis, portarias, despachos, enfim, todos os actos administrativos, obviamente, visam a justiça social, porque se não valem! Porque se não sou contra eles! Portanto, não é nesse ponto que há o critério para distinguir, porque aqui o critério é de tudo ou nadai Tem de ser para além disto que vamos discutir, entendido?

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Faça favor!

O Sr. César Oliveira (UEDS): - Então, para aferir uma política que critérios temos senão aqueles que favorecem a liberdade, avaliando se essa política d contra, etc., uma série de critérios desse tipo? Que critério é que concretamente o Sr. Deputado tem para aferir a bondade ou a maldade desta autorização legislativa?

O Orador: - 0 Sr. Deputado, o que eu disse a seguir foi que teríamos que "baixar um pouco à terra", "pôr os pés no chão" e examinarmos uma coisa muito mais simples, que era um quadro de financiamento das empresas de transporte, que foi como, aliás, a Sr. Secretário de Estado definiu por várias vezes o que orientou esta proposta de autorização legislativa. 15to é, não estamos no domínio dos grandes feitos históricos e legislativos, trata-se de uma coisa bem comezinha e que antes de tudo tinha que responder a esta questão: porquê a urgência?
Se estivesse naquela bancada do Governo eu até era capaz de explicar várias razões para a urgência ...

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - ..., mas não quero dizer que essas razões sejam por si próprias definitivas. A verdade é que nesta matéria, como talvez em nenhuma outra, o Governo tinha a oportunidade de nos ter presenteado com uma autorização legislativa e com o decreto, ou pelo menos com o projecto de decreto, que iria propor para aprovação e publicação, e não o fez. Teve a melhor oportunidade, porventura, em todo este manancial de autorizações legislativas de fazer um gesto bonito, mas não o fez.
Voltando às suas questões, Sr. Deputado, o que se trata não é, nem pode ser, da discussão da justiça em geral, da grande justiça social, porque é uma coisa pequenina que estamos a tratar, tão pequenina como isto: saber se os contribuintes portugueses - e o Sr. Deputado também, não julgue que fica de foral vão pagar mais 2,5 % em todos os produtos que compram. Ou o Sr. Deputado julga que o merceeiro não os vai cobrar? Vai cobrar, vai, Sr. Deputado!

Risos do PCP.

E o supermercado vai cobrar, e o mesmo se passará com os adubos. O Sr. Deputado não é agricultor, mas depois paga no feijão-verde que come.

Risos.

O Sr. Deputado julga que isto é uma coisa muito simples e que só paga quem paga, mas a única coisa que lhe posso dizer é que as únicas pessoas que não pagam são justamente os titulares do capital das empresas que vão ser taxadas!

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Porque esses transferem, obviamente, a taxa que lhes impõem para o preço dos produtos! Se não o fizessem eram tontos, Sr. Deputado!

Vozes do PCP: - Eram parvos!

O Orador: - 15to não é tecnocracia é simplesmente conhecer o mundo e saber em que mundo estamos "mundo cão", como disse há pouco!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, não é um problema de tecnocracia nem de técnicas de justiça. 15so é tudo uma "onda muita alta" onde não vale a pena entrarmos! O Sr. Deputado só vê a maré, mas também há ondas no mar, e se é perigoso só ver as ondas e não saber que há marés é igualmente perigoso só ver a maré e não ter em conta as ondas, porque pode correr o risco de morte por afogamento, sobretudo se é próximo da praia.

Risos do PCP.

Finalmente, queria dizer-lhe para estar tranquilo, pois a questão que se trata é de saber a resposta a algumas das perguntas que não só esta bancada colocou mas que outras bancadas - até a sua, suponho - como a da ASDI - embora falando em demasia na justiça social, mas, enfim, isso é um problema que cada um trata como entende - como a do CDS e a do PS, embora defendendo a lei, também colocaram. A questão que se trata é a de saber as respostas da Sr.ª Secretária de Estado e depois, serenamente, cada um dizer aquilo que tem a dizer e votarmos, até porque a hora já é tardia e devíamos ir mais adiantados na matéria.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pede a palavra para que efeito?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Não obstante o adiantado da hora, tenho o defeito de gostar de ser esclarecido, e peço desculpa, mas insisto.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira disse, se bem entendi, 2 vezes, que todos os diplomas, todas as leis, todas as portarias, todos os despachos visam a justiça social ou que devem visar a justiça social e que se não a visam não têm o seu acordo, mas, sim, a sua clara denúncia de um fim que é contrário à justiça social. Convenhamos que a partir do momento em que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira arreda a questão da justiça social em torno desta autorização

Página 969

969

legislativa reconhece implicitamente que esta proposta dá um contributo para essa justiça social, por muito pequeno que seja. Portanto, ganhámos já alguma coisa, ganhámos esse reconhecimento da sua parte.
Depois disse - e de novo se referiu em resposta ao meu camarada César Oliveira - que tudo isto era muito simples. Tratava-se, afinal, de o meu camarada e de todos os portugueses tomarem cautela para não terem amanhã de pagar os 2,5 % que os municípios irão arrecadar das empresas! Mas, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, não estará a confundir um problema simples com uma forma simplista de abordar o problema?
É evidente que a questão da repercussão desta taxa nos preços e nos custos é um problema que tem de ser encarado, mas não com essa simplicidade, pois se a questão está em que cada taxa, cada imposto, se repercute liminarmente nos preços, teremos, provavelmente, amanhã o PCP aconselhando os seus militantes e os trabalhadores portugueses a manifestarem-se em frente de São Bento, pedindo ao Governo que isente as empresas de taxas e de impostos para finalmente termos os produtos mais baratos.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - 15so foi muito mau!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Abílio Rodrigues pretende usar da palavra?

O Sr. Abílio Rodrigues (PSD): - Sim, Sr. Presidente, para fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Abílio Rodrigues (PSD): - O Sr. Deputado Veiga de Oliveira, tem-nos oferecido algumas argumentações brilhantes e habilidosas que aprecio. Por isso, tinha alguma expectativa de ver como ia abordar este problema da taxa municipal de transportes mas fiquei um pouco perplexo, pois penso que não teve a coragem de a abordar e de a criticar abertamente refugiando-se num coisa que esta Câmara agora tem estado a discutir, isto é, se há ou não justiça social, sem se atacar o problema de uma forma aberta.
Queria pôr-lhe 2 questões muito simples, porque penso que elas foram postas por si de forma habilidosa. A primeira decorre da sus afirmação de que as taxas aumentam as receitas mas não diminuem a carga fiscal. É óbvio que assim é! Simplesmente, interrompeu a frase, ela não terminava aí, e devia dizer que as taxas irão permitir com certeza que a carga fiscal não aumente naquilo que deveria aumentar para tapar os buracos que daqui a pouco na minha intervenção farei sobressair. Gostava de saber, portanto, se é assim ou não.
O outro ponto parte de uma sua afirmação, que julgo estar errada. Disse que havia empresas públicas que asseguravam o transporte interurbano com várias obrigações que não eram impostas ...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Urbano, urbano!

O Orador: - Então retiro esta segunda questão, pois percebi que tinha dito transporte interurbano.

Gostaria, portanto, que me respondesse à primeira das questões.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra; também para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, todos os partidos políticos, da direita à esquerda, adoptaram no seu discursa a palavra descentralização.
Confesso que tenho uma dúvida terrível, pois não percebo como é que partidos com diferentes práticas e com ideologias diferentes têm quase como que o mesmo discurso, uma vez que toda a gente fala em descentralização. No entanto, quando aparece uma medida de cunho verdadeiramente descentralizador, quando o que está subjacente a tudo isto é devolver o poder às populações - o que está na base, digamos, de uma nova conformação em termos de ordenamento do território - quando tudo isso se dá, quando passamos do verbo à prática, confesso, Sr. Deputado Veiga de Oliveira, que é de certo modo decepcionante verificar que - numa medida que não se confina apenas à taxa (e não falo em justiça social, nem em mais nada), mas que tem subjacente um novo quadro de relacionamento, qual visa determinar até as transformações de estrutura- se encare, de facto, esta questão da forma como se tem verificado até agora.
Gostaria que a estas medidas se lhes desse o devido lugar e se lhes faça a devida justiça.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - O Sr. Deputado Lopes Cardoso falou mais uma vez da justiça social, desta vez, suponho, sobretudo para sacar a conclusão brilhante de que eu, ao arredar in limine o problema de justiça social, estava a reconhecer implicitamente que a lei, sob esse ponto de vista, era correcta.
Sr. Deputado, isso é um pouco precipitado, em primeiro lugar porque não estamos perante a concreta lei, que há-de ser um decreto-lei do Governo, e, em segundo lugar, porque o que eu quis dizer foi que esta matéria não poderia ser apreciada sob esse ponto de vista, já que não tinha grande relevância nesse aspecto.
Naturalmente que tinha alguma relevância. No entanto, há matérias que têm grande relevância sob esse ponto de vista e outras que têm menos. Pois bem, o que eu quis dizer - e por isso é que disse que era preciso "por os pés no chão" - foi que nesta matéria esse problema não era essencial.

É claro que se trata de um ponto de vista, que certamente não será subscrito por si, mas foi só isto que eu quis dizer. Suponho que mais do que eu, nesta Sala outros deputados e Membros do Governo perceberam o que eu quis dizer.

O que eu quis dizer foi no sentido de não se apelar para aquela "corda" portuguesa do coração no sentido de se fazer passar a lei. 15so não. Não vale. Trata-se de um argumento que, além do mais, me ofende. Ofende-me porque não gosto que "puxem" pelo meu sentimento para obterem a minha concordância.

Página 970

970

Risos do PS e do PSD.

Espero que "puxem" pela minha razão para que dê a minha concordância ou discordância.

Nozes do )PC?: - Muito bem!

O Orador: - Quanto à repercussão dos impostos nos preços, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que, sinceramente, não quero entrar nessa questão. No entanto, fique com esta: todos os impostos, todas as taxas que não sejam as que são quase estritamente aplicadas sobre os rendimentos do trabalho são transferidas. Aliás, mesmo alguns dos rendimentos do trabalho são também transferidos.
Se o Sr. Deputado não sabe isto ou se julga que não é assim, posso em outra altura, com mais temem, mostrar-lhe ponto por ponto por que é assim e como é assim.
Não se iluda, Sr. Deputado, perdoa quem paga os impostos, em definitivo, é o senhor enquanto consumidor, isto é, enquanto trabalhador, visto que, supostamente, para consumir trabalha, já que se para consumir não trabalha, não paga, de facto, impostos nenhuns.

Risos do PS, do PSD e do PCP.

O Sr. Deputado Abílio Rodrigues disse-me que não tive a coragem de abordar abertamente o problema. Não sou daqueles que se ufanam de ser muito corajoso mas olhe que talvez tivesse . motivos para o fazes. Em todo o caso, deixemos a coragem de lado, porque mais uma vez estamos no domínio dos sentimentos, das reacções das pessoas, e não no domínio da razão.
A razão é outra: trata-se de saber se, habilidosamente como o Sr. Deputado disse, eu coloquei ou não alguns problemas pertinentes e concretos a propósito desta questão. Até o ajudo, Sr. Deputado, mais do que habilidosamente, se quiser, pode considerar ter sido ardilosamente.

Risos do PCP.

Que eu seja ardiloso, concebo. Todavia, Sr. Deputado, aqui, aqueles que não são ardilosos, aqueles que sejam ingénuos, devem começar a habituar-se a não o ser...

O Sr. Angelo Correia (PSD): - Muito bem!

Risos do PS e do PSD.

O Orador: - ..., já que estamos a tratar de interesses concretos, de interesses de camadas sociais, interesses vários - do grande, pequeno e médio capital - enfim, de todos os interesses que V.Ex.ª invente e, sobretudo, de interesses dos trabalhadores e do povo português.
Para se tratar destes interesses não se pode ser ingénuo, Sr. Deputado.

Risos do PS e do PSD.

Vemos de ser habilidosos e muitas vezes, mais do que isso, temos de saber suscitar a palavra que se "encolhe", a palavra que, não por falta de coragem mas muitas vezes até por muita coragem e muita inteligência, não nos é revelada, sendo preciso suscitá-la. Foi isso que tentei fazer, Sr. Deputado.
Voltamos mais um vez à questão do aumento das receitas e da diminuição da carga fiscal, O Sr. Deputado diz que vai fazer uma brilhante intervenção sobre o assunto. Fico à espera. Ficamos todos à espera.

Risos do PCP.

Confiamos em que seja brilhante. No entanto. Sr. Deputado, não se iluda, isto é, vamos ter, de momento, um aumento de carga fiscal.
Se o Sr. Deputado quer argumentar que os impostos aplicados através da administração central são mais caros na sua aplicação do que aqueles que são aplicados através da administração local, isto é, através dos municípios e das autarquias, estamos de acordo. 15so só não chega, no entanto, para invalidar o que eu disse, ou seja, que estávamos, pura e simplesmente, perante um aumento da carga fiscal.
Respondo, finalmente, ao Sr. Deputado Reis Borges a quem queria dizer algo a respeito da descentralização, pois o Sr. Deputado espanta-me que todos falemos, em palavras, quase a mesma linguagem.
E caso para reflectir. No entanto, devo dizer-lhe que também todos nós falamos em português.

Risos do PCP.

E também caso para reflectir. Nós somos um país com uma individualidade própria e o Sr. Deputado sabe que o municipalismo tem razões e tradições muito profundas no nosso país. .
Não o queria dizer porque era capaz de ser condenado pelo meu grupo parlamentar, mas o Sr. Deputado sabe que nós somos um pouco municipalistas. Não ponho outro adjectivo.

Risos do PS e do PSD.

Somos um pouco municipalistas. E a nossa forma de ser. 15to é: entendemos - e bem! - que é ao nível dos directamente interessados que as questões se devem resolver. Não espanta que todos usemos a mesma linguagem. Acrescento só uma coisa: é que alguns o farão por demagogia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

Risos do PS e do PSD.

O Orador: - Quem quiser que "enfie" a carapuça. On y soit qui mal y pense.

Risos do PS e do PSD.

Quanto à questão de ser esta taxa uma forma de devolver o poder às populações, aí, Sr. Deputado, não estou de acordo.
O que o senhor devolve aos municípios é odioso; o que o senhor devolve aos municípios é o encargo, é a responsabilidade pelo funcionamento dos transportes urbanos.
O que o Sr. Deputado pode dizer concomitantemente é o seguinte: mas também lhe dou a possibili-

Página 971

15 DE JULHO DE 1983 911

dade de onerar as empresas, cuja sede se situa no seu território, de 0,5 % a 2,5 %. É um belo presente, que não é totalmente envenenado mas, olhe, que pode tornar-se!...
O importante não está tanto em falar-se em descentralização mas em se examinar -e volto à questão -, em concreto, se o novo quadro de financiamento das empresas de transportes é melhor ou pior que o anterior.
O que é que sabemos do anterior?
Sabemos tão-só isto: por fase por nelas, as indemnizações compensatórias não eram atribuídas com o valor devido e não eram pagas a tempo.
Isto passou-se com vários governos. Não quero agora acusar ninguém em especial que é para não estar a questionar. Interessa-me mais a verdade do que saber quem é a «mãe do filho em discussão».
O que se tratava, realmente, era que tais indemnizações eram muitas vezes pagas em atraso ou não eram pagas na totalidade que era devida.
Esta técnica de garantia das indemnizações compensatórias poderá, virtualmente, ser melhor. A questão está, no entanto, dependente de ouvirmos as respostas às perguntas que colocamos.
Diria ainda o seguinte: Como sabe, há muitas empresas em dívida para com a segurança social. Há milhões de contos em dívida. A segurança social resulta, em parte, de uma taxa que a empresa paga sobre os salários pagos aos trabalhadores.
Já não quero agora suscitar aqui bruxas ou feiticeiras falando, por exemplo, em salários em atraso. Deixemos isso, porque se trata de uma questão muito grave, grave de mais para o que estamos a tratar e essa gravidade é, mais uma vez, completamente desproporcionada para matéria «pequenina» que estamos a discutir.
Sempre lhe direi, no entanto, que as dívidas a Previdência existem. Quem lhe garante, Sr. Deputado, que esta taxa vai ser paga? Quem lhe garante que os mesmos que não pagam a outra vão pagar esta? Repare-se que, só neste momento, estão em dívida 40 milhões de contos.
Tudo isto deve, portanto ser sopesado com seriedade, como pensamos que todos estão a querer fazer, mas sem recorrermos nem a grandes palavras de descentralização, nem a grandes palavras de justiça social, porque não é isso que está em causa.
Infelizmente (ou felizmente, diria eu), não é isso que está em causa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Abílio Rodrigues.

O Sr. Abílio Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Hoje há transportes urbanos só subsidiados por autarquias e outros só subsidiados pelo Estado. Há, ainda, transportes urbanos assegurados por operadores privados, sem direito a qualquer subsídio à exploração.
Quanto ao transporte suburbano, as empresas nacionalizadas recebem indemnizações compensatórias do Estado, enquanto os operadores privados de transporte suburbano sem poderem praticar tarifas livres- nada, praticamente, recebem do Estado como contrapartida.
Existe, assim, uma diversidade de situações, algumas com aspectos da injustiça evidente, que convirá resolver - se possível em simultaneidade (ou em avanço) em relação à entrada em vigor da «taxa municipal de transporte» para o qual o Governo pede a necessária autorização legislativa.
A nosso ver, seria esta uma boa oportunidade para começar a resolvei alguns dos problemas existentes, nomeadamente transformando os serviços municipalizados de transportes, a Carris, o Metropolitano e os serviços de transportes colectivos do Porto em empresas de capitais públicos ou mesmo em empresas de capitais mistos.
O esforço de subsidiarão poderia, assim, ser repartido por autarquias e Estado conforme a composição do capital, ganhando-se co-responsabilidade de gestão, sobretudo necessária nos grandes aglomerados populacionais, e ganhando a implantação da referida «taxa municipal de transporte» perfeita coerência e consonância com os estatutos que preconizamos para aquelas empresas.
Com as acções mais de fundo que acabamos de preconizar - e que achamos indispensáveis - ou mesmo sem elas, a verdade é que a situação económico-financeira das empresas de transporte urbano e suburbano exige medidas corajosas e sobretudo pragmatismo e realismo na acção. Ê certo que não será só com a criação desta nova «taxa» que os problemas existentes se resolverão, mas quer se goste ou não este imposto é a nosso ver necessário neste momento.
Momento em que o Estado terá de contribuir até ao fim do ano, em indemnizações compensatórias e subsídios não reembolsáveis, para o sector de transporte, com cerca de 13 milhões de contos - apresentando, mesmo assim, provavelmente, os exercícios das empresas daquele sector, no fim do ano em curso, défices (agravados pelos recentes aumentos salariais) que rondarão os 9 milhões de contos.
Os graus de cobertura entre proveitos e despesas com os actuais aumentos da massa salarial apresentam-se, obviamente, mais deteriorados.
Ora, a verdade é que neste contexto não há outras medias de curto prazo que minimizem as rupturas de tesouraria que se fazem sentir se não a de se aumentarem as receitas - quer através de reajustamentos tarifários, quer através da concessão de maiores subsídios por parte do Estado (o que agravará o défice do Orçamento Geral do Estado), quer através do recurso a novas fontes de financiamento, nas quais se insere a criação da nova taxa que o Governo pretende lançar.
Esta taxa, já em uso em França desde 1971, onde é conhecida como versement-transport, financia já hoje mais de 25 % dos encargos totais com os transportes da região de Paris.
Ela fundamenta-se no facto de ser a deslocação «domicílio/emprego» a que mais penaliza o transporte público, obrigando este a dispor de material circulante em quantidade e qualidade suficientes para assegurar a procura nas horas de ponta (manhã e tarde) e no princípio de que os transportes urbanos e suburbanos deverão ser subsidiados, preferencialmente, por quem deles mais beneficia.
Daí ter-se entendido justo que os organismos públicos, empresas públicas e privadas, a partir de determinada dimensão, contribuam para o financiamento do

Página 972

972 SÉRIE - NÚMERO 22

transporte público na base de uma percentagem da respectiva massa salarial.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A aplicação desta taxa levanta, contudo, alguns aspectos para os quais em nome da minha bancada me permito chamar a atenção do Governo.
O primeiro refere-se ao valor da taxa municipal de transporte (TMT) a cobrar. Julgamos prudente e mais justo apertar o leque apresentado na proposta de lei do Governo para: 0,5 % a 1,5 %. De qualquer forma, entendo que o arranque desta taxa não deverá situar-se, em nenhum caso, acima de 1 % o que permitirá arrecadar, por exemplo, só para a área da região de Lisboa, mais de 3 milhões de contos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O segundo diz respeito à repartição do produto da TMT que, em nosso entender, deverá ser mais explicitada, para evitar um desvirtuamento, a prazo, da referida taxa. Com efeito, julgamos útil que seja fixada uma percentagem mínima de cobertura tarifária do custo de produção do lugar/quilómetro (ou passageiro/quilómetro), conforme previa o projecto de lei n.º 389, apresentado em 4 de janeiro de 1983 por alguns deputados do Partido Socialista, e isto para evitar que esta nova taxa dê mais fôlego àqueles que, em algumas autarquias ou melhor, em algumas assembleias municipais em posição escandalosa de captação de clientela, têm impedido, demagogicamente, a necessária actualização tarifária (que, alguns casos se tem situado a níveis mais baixos do que os praticados em empresas públicas do sector de transportes), com as consequências gravíssimas que se conhecem.
Por outro lado, parece-me justo defender uma afectação mínima do valor da TMT ao investimento, para não se correr o risco de vir, amanhã, só subsidiar-se a exploração, em detrimento da melhoria da oferta e da preparação do futuro.
Também me permito alertar o Governo para que a repartição do produto da TMT não se baseie em critérios de avaliação dos veículos/quilómetro produzidos, como tem sido prática seguida no passado para medida da "produção/versus atribuição de indemnizações compensatórias", já que insistir nesse parâmetro será o mesmo que correr o risco de se estar a atribuir mais subsídios a quem, eventualmente, faça circular veículos sem clientela, isto é, a quem transporte mais ar. Há outros critérios mais racionais ligados ao lugar/quilómetro ocupado ou ao passageiro/quilómetro efectivamente transportado, que deverão ser utilizados.

Voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O terceiro aspecto que reputamos, também, de grande importância é o de evitar que esta lei se transforme num incentivo ao aparecimento (a despropósito, quer sob o aspecto económico, quer sob o aspecto social) de empresas municipalizadas (ou de capitais públicos) para o transporte urbano ou suburbano, em detrimento ou asfixiando, os operadores de transporte privado.

15to é, a arquitectura do articulado da lei ou dos seus decretos regulamentares deverá impedir que tal se verifique, pois, óbvia e claramente, nunca poderemos estar de acordo com o alastramento (encapotado ou não) de "empresas públicas" neste sector.
O quarto aspecto refere-se ao facto de o projecto de lei apresentado não referir algumas isenções de pagamento da TMT que julgamos pertinentes, tais como os que dizem respeito a fundações, associações de reconhecida utilidade pública sem fins lucrativos e representações de Estados estrangeiros, o que estava, aliás, no projecto de lei apresentado em janeiro.
O quinto aspecto tem a ver com o facto de o projecto de lei apresentado pelo Governo nada dizer quanto a limitações à concessão de outros subsídios (OGE e do FETT) para os operadores municipalizados de transporte, no caso das respectivas autarquias que, estando nas condições previstas na lei não tenham adoptado a TMT. 15to também estava no projecto de lei apresentado em janeiro de 1983.
A nosso ver esta limitação não será descabida, pois prevenirá tomadas de posição menos convenientes por parte de algumas assembleias municipais - o que não será de excluir face ao comportamento que se tem verificado no passado.
Ora isto que aqui se deixa à consideração do Governo não é o mesmo que se poderá deduzir da redacção do artigo 8 º do projecto de lei n.º 389, de 4 de Janeiro de 1983, da qual se poderia tirar conclusões mais vastas, como seja a de um operador privado actuando numa zona urbana não ter direito a subsídios, do OGE ou do FETT; pelo simples facto de a autarquia não ter querido recorrer à implantação da TMT (o que seria manifestamente injusto e não estaria, certamente, na intenção dos proponentes).
O sexto e último aspecto tem a ver com o facto de a proposta de lei, tal como nos é apresentada, não responder a uma hipótese que pode surgir: a de uma determinada assembleia municipal não querer implantar a TMT.
Ora, neste caso, 2 situações poderão surgir: ou nessa autarquia existem serviços municipalizados de transporte ou, então, existem empresas, ditas nacionalizadas, operando na área urbana e suburbana - e isto para não falarmos já de uma outra situação que ainda iria implicar mais: a de existirem operadores privados operando em regime de concessão.
No primeiro caso, as consequências da decisão da não opção da TMT cairão inteiramente sobre os seus próprios serviços, o que não merece qualquer contestação.
No segundo caso, julgo que não haveria outra saída se não a de o OGE continuar a ter de suportar, na totalidade, as indemnizações compensatórias, défices de exploração e a maior parte do investimento, o que renegaria e contrariaria os objectivos que a própria lei visa alcançar. De onde a lei, em meu entender, dever ter dispositivos que possam superar esta última situação, até porque no caso concreto de Lisboa e Porta não sei o que sucederia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Por desagradável que politicamente esta taxa possa ser considerada por uns quantos - e bem sabemos que a carga fiscal já está muito pesada - a realidade obriga a que ela seja tomada - a menos que preferencialmente se deseje ver as tarifas ainda mais agravadas ou o OGE mais sobrecarregado.

Página 973

973

Aqueles que dela discordarem devem, de forma concreta e construtiva, explicar como se pode no contexto actual, repito, no contexto actual do sector empresarial do Estado e dos serviços municipalizados no domínio dos transportes, aumentar salários sem aumentar receitas - a não ser que entendam que é possível conter ou diminuir as despesas globais a curto prazo. Nesse caso deverão explicitar como.
Por tudo isto, e suponho que o Governo não deixará de ter em conta as reflexões construtivas que aqui lhe deixamos - e que sobre elas saberá encontrar as opções mais convenientes - o meu grupo parlamentar irá votar favoravelmente a autorização legislativa em apreciação.

Aplausos do PSD, do PS e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrou na Mesa um requerimento que vai ser lido e imediatamente votado.

Foi lido. É o seguinte:

"Os Deputados, abaixo assinados, requerem o prolongamento da sessão até à conclusão da discussão e votação na generalidade e na especialidade da proposta de autorização legislativa sobre taxas municipais de transporte."

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação deste requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, do CDS, da UEDS, da ASDI, do MDP/CDE e do deputado independente António Gonzalez e com a abstenção do PCP.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto em relação à intervenção do Sr. Deputado Abílio Rodrigues.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Deputado Abílio Rodrigues: Pretendo fazer um protesto não sobre a matéria de fundo que aqui está a ser discutida - o meu camarada Veiga de Oliveira já por de mais tornou claro o que está em jogo e o que se está a discutir - mas porque o Sr. Deputado na intervenção que teve oportunidade de fazer, por várias vezes, capciosamente, tentou lançar a "chaga" do aumento dos transportes para os aumentos salariais.
O Sr. Deputado começou assim e assim acabou a sua intervenção. E da sua responsabilidade. E consigo o ódio maior ou menor que possa ter ao mundo do trabalho e aos trabalhadores.
Não posso, no entanto, deixar sem protesto essas suas capciosas afirmações. 15to pelo seguinte: ao lançar para cima dos aumentos salariais os aumentos das custos dos transportes está a escamotear, a quem não está minimamente ligado aos números relacionados com os transportes, que os salários são apenas 40 % do valor bruto de produção do sector dos transportes.
15to é: há uma percentagem muito maior que não tem nada a ver com salários. Concretamente, 50 % desse valor da produção corresponde aos consumos intermédios, por exemplo, aos combustíveis. Porque é que o Sr. Deputado não referiu o aumento dos combustíveis? Porque não se referiu à desvalorização do escudo, que vai aumentar o preço dos equipamentos? Etc., etc., etc.
Por outro lado, o Sr. Deputado referiu, para tentar lançar uma "vaga de fumo", o número "pesado" dos 13 milhões de confins dos subsídios, de compensações monetárias, para este ano.
Esqueceu-se de dizer que nesses 13 milhões de contos estão 50 % para a CP, que não está abrangida, e estão as indemnizações compensatórias para a TAP, que não está também abrangida por este protesto.
Foi por essas afirmações capciosas, que têm um objectivo político muito claro mas completamente arredado da proposta que aqui se está a discutir, que eu senti necessidade de protestar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para contraprotestar, o Sr. Deputado Abílio Rodrigues.

O Sr. Abílio Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece que respondi capciosamente, o que quer dizer que aprendi alguma coisa com a recomendação que o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, me fez há bocadinho. 15so só abona em meu favor.

Risos do PSD.

Quanto ao facto de eu falar nos aumentos salariais, se o fiz é porque isso é, obviamente, verdade. As pessoas não devem ter medo de dizer aquilo que é verdade.
15so é verdade, assim como é verdade que houve outros factores de custos que aumentaram. E óbvio que sim! Porque é que não hei-de reconhecer isso?
E claro que tudo aumentou. 15so só quer dizer que se as despesas aumentam ...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Deputado, só queria dizer que o problema não é o de saber se é ou não verdade. O problema que coloquei e contra o qual protestei é esse que o senhor agora reconhece, só tendo falado nele, ao fazer a sua intervenção. Nos outros não falou apesar de terem maior peso na formação do custo dos transportes do que os salários.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado, aquilo que afirma dava uma longa conversa porque talvez isso não seja verdade para todo o tipo de empresas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP) : - Mostro-lhe os números!

O Orador: - Sr. Deputado, tenho também aqui números. Se o senhor tem números, também os tenho. Aliás, os números são facilmente trabalháveis, quer por si quer por mim, e a gente utiliza aqueles que quiser.

Página 974

974

Dizia eu que o que interessa aqui para o caso é que as despesas aumentam. Se as despesas aumentam é óbvio que as receitas têm de aumentar. A gente não pode ir buscar dinheiro onde não há. Tem de o ir buscar como pode e onde o há.
Foi também aqui dito que a CP não estava abrangida. Aliás, o Sr. Deputado fez uma série de confusões e estas coisas são muito difíceis de serem faladas entre pessoas que as abordam superficialmente e que não estão, às vezes, minimamente metidas nos problemas.
A CP não está metida? É óbvio que a CP está metida e, até, está-o neste tipo de transporte de que estamos a falar, isto é, no transporte suburbano. Ora, quanto à CP é o transporte suburbano que tem peso e que justifica muito as indemnizações compensatórias a essa empresa. Muito desta nova taxa deverá reverter, portanto, para a CP. Até porque, por exemplo, em França existe um decreto-lei próprio para a CNCF, tal como em Portugal terá de haver um decreto-lei eu um decreto regulamentar, consequente com esta lei, em que a CP seja o seu objecto. A CP tem, portanto, mesmo que ver com isto.
Não vale a pena estarmos a entrar mais em polémica. De facto, eu não disse porque não calhou dizer.
No entanto, gostava que o Sr. Deputado me dissesse concretamente o seguinte: se as despesas aumentam, têm ou não as receitas de aumentar? E se as receitas têm que aumentar. o senhor faça o favor de me dizer onde é que elas se vão buscar:
Era só este o problema. É tão simples como isto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra, invocando o direito de defesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, creio que não foi infringido o artigo 3.º e 8. º do Regimento, que permitem invocar o direito de defesa. Não poderei, portanto. conceder-lhe a palavra.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, desculpe mas tem sido norma nesta Casa que cada um é juiz de si próprio e, muito sinceramente, quero utilizar agora o direito de defesa. Serei o juiz de mim próprio

Protestos do PS e do PSD.

O Sr. Raul Rego (PS): - 15to não pode ser assim!

O Orador: - Tenha calma, Sr. Deputado.
Posso dizer-lhe, Sr. Presidente, que o Sr. Deputado Abílio Rodrigues, capciosamente, mais uma vez, tentou dizer que eu era estúpido. É por isso que quero utilizar o direito de defesa

Risos do PS, do PSD e da UEDS.

Uma voz do PSD: - Essa não pega!

O Sr. Presidente: - O direito de defesa, conforme está inscrito no Regimento, que poderá ser lido pelo Sr. Deputado, é só concedido para defesa de uma situação prevista nos artigos 3 º e 8 º desse mesmo Regimento, que dizem respeito à perda do mandato dos deputados.

Nessa qualidade, portanto, o Sr. Deputado não pode falar.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, inscrevo-me para uma intervenção.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, isso é outra coisa.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, desejo interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente:- Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa destina-se a que não fique algum "nó" no meio disto tudo.
Suponho que temos estado a praticar o direito de defesa por ofensa à honra do deputado - e até do grupo parlamentar - por uma forma muito diversa daquela que o Sr. Presidente agora estipulou.
Sem querer que o Sr. Presidente "regresse" da sua decisão, só pedia era para que isso não "fizesse lei".
De facto, sempre que um senhor deputado se sente ofendido pela fala de um outro deputado - ou é referido nessa fala - tem invocado o direito de defesa e tem-lhe sido dado esse direito.
Esse outro direito de defesa que o Sr. Presidente refere também existe, mas não tem nada a ver com a figura que tem sido utilizada até aqui e que, suponho, se deve continuar a utilizar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é evidente que fiz esta observação porque, como todos os Srs. Deputados sabem, se tem abusado do pedido do chamado direito de defesa para se efectuarem protestos ou outras intervenções. Foi por isso. Aliás, eu até fui ler o Regimento. Aí há, realmente, um artigo que permite ao deputado que se sente atingido na sua honra fazer um protesto nesse sentido. No entanto, não se trata do direito de defesa.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, não quero, neste momento, contestar isso. O que quero afirmar - e o Sr. Presidente é testemunha porque também está aqui há muitos anos - é que sempre que se utiliza esse direito ele é utilizado sob a forma de defesa.
Se o Sr. Presidente quer que lhe dê outra designação, dou-lhe outra designação. No entanto, tem sido prática nesta Assembleia, diariamente e desde há longos anos, que ao utilizar-se esse direito de defesa da honra não se diga defesa da honra mas sim direito de defesa.
Sr. Presidente, julgo que deverá ter percebido. Se não percebeu qual era o direito sob o qual eu queria usar da palavra, julgo que agora o percebeu e que me pode conceder a palavra.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só lhe concedo a palavra se invocar no Regimento a fórmula que lhe permite usar da palavra com esse efeito.
O Sr. Deputado fará o favor de ler o Regimento. Está agora já inscrito para uma intervenção, o que lhe dará muito mais ocasião, enfim, para expor as suas

Página 975

DE JULHO DE 1983 975

razões. Daí que eu pense não precisar de dar mais explicações.

O Sr. José Luís Munes (PS): - Sr. Presidente, desejava interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Nunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há certas fórmulas de cortesia que não são só de cortesia e que são de uso nesta Assembleia e em qualquer Assembleia do mundo civilizado.
Não é admissível que alguém se dirija ao Presidente desta Casa dizendo: "Se V.Ex.ª não percebeu, espero que perceba agora."

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não me senti ofendido pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, desejo fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - O Sr. Presidente acabou de referir que não se sentiu ofendido pelas minhas palavras.
Julgo que ninguém, a não ser talvez o Sr. Deputado José Luís Nunes, poderia interpretar aquilo que eu referi em termos de ofensa ao Sr. Presidente.
O que referi precisamente foi que, se o Sr. Presidente não tinha percebido qual era o regime real sob o qual eu gostaria de usar da palavra, naquele momento, depois de lhe explicar, tinha ficado claro que não se tratava daquele artigo que o Sr. Presidente invocara, mas de outro, salvo erro, o da defesa de honra.
Julgo que nesta Casa só o Sr. Deputado José Luís Nunes poderia perceber que havia intenção ofensiva da minha parte.

Protestos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. José Luís Munes (PS): - Sr. Presidente, desejo interpelar novamente a Mesa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dado o adiantado da hora, peço o favor de não se prolongar este incidente.
Os Srs. Deputados têm toda a faculdade de lerem o Regimento e, aliás, sabem que o que lá esta escrito é aquilo mesmo que lá está escrito.
Aproveitei esta ocasião simplesmente para chamar a atenção dos Srs. Deputados no sentido de que sobre o facto de invocar aquela fórmula para prolongar os debates noutros termos, que já não eram regimentais, deveria haver uma certa contenção, chamemos-lhe assim.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Nunes.

O Sr. José Luís Munes (PS): - Sr. Presidente, era muito simplesmente para dizer a V. Ex.a, à Mesa, que quando me referi às expressões citadas não falei em ofensa, mas sim em simples uso de fórmulas de cortesia. Nada mais.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputados

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, era precisamente para que a questão não se alongue.
De facto, Sr. Presidente, o artigo 97.º do Regimento, sob a epígrafe. "Uso da palavra para explicações", tem o seguinte conteúdo:

A palavra para explicações poderá ser pedida quando ocorrer incidente que justifique a defesa da honra e dignidade de qualquer deputado.

O incidente deve ser resolvido com simplicidade. Suponho, até, que já está resolvido a partir do momento em que o meu camarada Octávio Teixeira se inscreveu para uma intervenção.
Da nossa parte, Sr. Presidente, não há a mais pequena intenção de o prolongar. É nesse sentido que me dirigia ao Sr. Presidente, a fim de que os trabalhos prosseguissem.

Uma voz do PS: - Não é o que estás a fazer!

O Orador: - Gostaria, de qualquer maneira, que ficasse claro que a expressão que teria sido, de facto, usada é a do direito de defesa.
Se o Sr. Presidente entender que a partir daqui é assim que se deve fazer, que é a figura do artigo 97 º que se deve usar (uso da palavra para explicações, para defesa da honra), é assim que faremos.
Entretanto, em relação a este incidente façamos um parêntesis e consideremo-lo terminado.

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado. De qualquer forma, não sou eu que entendo, é o Regimento, o qual, penso, deve ser cumprido o mais possível.
Tem a palavra para uma intervenção, o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Esta taxa municipal que se pretende criar é praticamente uma cópia da que existe em França desde 1973 (1971 em Paris). É uma medida que nós defendemos por ser, em princípio, correcta, desde que se salvaguarde que a sua aplicação não venha a ter consequências desastrosas para algumas unidades empresariais que se encontram em situação económico-financeira desesperada.
Daí que defendamos que a autarquia possa vir a isentar empresas nestas condições, segundo critérios que venha a fixar. Mas, tal como está formulada, esta proposta de lei não admite esta possibilidade de isenção, pois ela não está contemplada no seu artigo 6.º.
Esta taxa deveria apenas tentar compensar uma parte da "obrigação de serviço público" das empresas de transporte, que é a que diz respeito à imposição de preços abaixo daqueles que a empresa gostaria de poder praticar.
Porém, existe uma outra parcela (considerada até no regulamento n.º 1191/69 da CEE) que diz respeito à "obrigação de transportar", isto é, à imposição que é feita à empresa de explorar serviços que nunca poderão ser rentáveis, qualquer que seja o preço a cobrar pelo transporte.

Página 976

976

Por isso, o estabelecimento desta taxa não isenta o Estado de atribuir, complementarmente, indemnizações compensatórias às empresas públicas de transporte, porque aquela taxa apenas se destina a compensar uma parte da redução dos preços (preços sociais), a qual, possivelmente, nem virá a ser suficiente para cobrir a diferença resultante da existência de passes sociais.
Por outro lado, o limite máximo de 2,5 % parece exagerado e pode vir a ser utilizado no sentido de contrapor, sobretudo aos serviços que são explorados "directamente" pelas Câmaras (Aveiro, Barreiro, Braga, Coimbra e Portalegre), que aumentem o valor da taxa, em vez de insistirem na existência de indemnizações compensatórias ou entradas de capital ou financiamento do investimento. Contrariamente ao que parece à primeira vista, não é o passageiro que é transportado o único que extrai vantagens da existência de um sistema de transportes públicos.
Vejamos, então, quem beneficia com estes transportes e porquê:
Em primeiro lugar, o passageiro que é transportado é, naturalmente, quem beneficia mais visivelmente com a existência do transporte, porque assim se lhe torna possível satisfazer a sua necessidade de transporte. Porém, do facto de ser utente directo do serviço parece justificar que pague por isso, nem sempre acontece ser ele que financia a maior parte do custo do seu transporte. Com efeito, e apenas a título de exemplo, poderemos citar os seguintes casos, relativas ao ano de 1979:
Em cidades como Helsíquia, a taxa de cobertura dos custos correntes pelas receitas cobradas aos utentes é de 49 %, em Paris, 44 %, em Estocolmo, 43 %, em Barcelona 38 % em Bruxelas 30 %, em Roterdão 28 %, e em Lisboa 68 %.
Aliás, até nos Estados Unidos da América, no ano económico terminado em 30 de Setembro de 1980, o valor desta taxa pura a totalidade dos serviços urbanos e regionais não chegou a atingir 50 %.
Em segundo lugar, todas as entidades empregadoras de mão-de-obra que utiliza os transportes públicos na sua deslocação casa/trabalho beneficia com a existência de tais transportes, visto que se eles não existissem não poderia ter ao seu serviço, pelo menos com o nível de remuneração que pratica, quem não residisse muito perto. Por outro lado, a existência' de preços de transportes baixos (em especial de passes sociais) possibilita-lhe alargar o seu mercado de mão-de-obra porque a extensão da deslocação casa/trabalho pouco ou nada afectará o dispêndio em transportes do trabalhador. Por isso é justa a criação de uma taxa municipal de transportes, particularmente onde existam passes sociais.
Em terceiro lugar, existem ainda outros "utentes indirectos" para além destes. E o caso, por exemplo. dos proprietários de empreendimentos imobiliários que são valorizados pelos transportes que o servem. E é até o caso dos automobilistas que, apesar de não usarem directamente o sistema de transportes públicos, dele extraem a vantagem de ainda poderem circular porque se esse sistema não existisse as vias estariam de tal forma congestionadas que, no mínimo, o seu tempo e custo da deslocação seria superior. Existem, como se vê, ainda outras possibilidades a explorar em matéria de angariação de mais receitas para os transportes públicos.

Em quarto lugar, toda a colectividade nacional acaba por lucrar com a existência de qualquer sistema de transportes urbanos. De facto, basta lembrar que da existência e utilização dos transportes públicos resultam economias em combustível (e consequentemente em divisas) resultado da não utilização de automóvel, sabido que este tipo de transporte apresenta, invariavelmente, um consumo por passageiro muito superior.
Esta é uma das razões que justifica que mesmo que existam prestações para os transportes como a taxa municipal não deixem de existir auxílios de natureza financeira atribuídos pelo Estado.
Para além disso, o Estado tem a obrigação de indemnizar as empresas de transporte público pelos danos, entre aspas, que lhes causa, directa ou indirectamente, seja porque a colectividade nacional acaba por beneficiar com tal política, seja porque o Estado não tenha, como lhe competia, superar as causas do "dano". No primeiro caso estão as obrigações de serviço público (obrigação tarifária e obrigação de transportar). No segundo caso situam-se as responsabilidades do Estado na criação de condições razoáveis para u processamento da exploração dos serviços. Aqui se incluem as condições de circulação rodoviária e de planeamento urbano, por exemplo. Foram feitas por mim algumas perguntas à Sr." Secretária de Estado. Espero as suas respostas. Entretanto o meu grupo parlamentar dá a ela e ao Governo o benefício da dúvida.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Como há pouco referi, a minha intervenção vai ser muito rápida e muito breve.
Gostava de dizer primeiro ao Sr. Deputado Abílio Rodrigues que quando falei no que falei tinha conhecimento de causa.
Em segundo lugar, quando o Sr. Deputado refere que todos nós temos números e podemos usá-los como quisermos, digo-lhe - e gostaria de o afirmar pari que não haja dúvidas - que não manipulo números: utilizo números, mas não os manipulo.
Em 1981 o valor bruto de produção foi de 126 milhões de contos, os salários foram 51 milhões e os consumos intermédios e encargos financeiros 74 milhões.
Foi isto que eu lhe disse. E isto que está nos número e deste ponto de vista é impossível manipulá-los.
O terceiro aspecto que queria referir, e como irá ver é muito breve, é que afinal o Sr. Deputado Abílio Rodrigues acabou, no fim da sua resposta, por afirmar aquilo que a minha bancada tem afirmado toda a noite. O que está em causa é pura e simplesmente criar uma taxa para aumentar as receitas do Estado. Era isso que eu lhe queria dizer há pouco e que não me foi permitido pelas razões conhecidas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica.

A Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começo pe-

Página 977

DE JULHO DE 1983 977

dindo desculpa por não ter respondido às pergunta à medida que me as foram fazendo.
O objectivo era efectivamente tentar acelerar a discussão e, realmente, nunca pensei que o assunto se prolongasse tanto e a minha resistência fosse tão posta à prova. Espero ainda ter capacidade para responder e, sobretudo, que os Srs. Deputados tenham pachorra para me ouvir.
Para começar gostava de dizer que nunca esperei que a taxa municipal de transportes fosse um assunto susceptível de "puxar ao sentimento". Eu não sou capaz de o tratar assim e vou tentar responder o melhor que sei àquilo que penso ser mais importante.
Não dei muitas das respostas até porque muitas das intervenções responderam a quase todas as perguntas postas.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira começou por perguntar se esta taxa não iria aumentar os preços. Ora, o Sr. Deputado Lopes Cardoso já respondeu a isto. Efectivamente a taxa municipal de transportes reflecte-se nos preços como qualquer outro imposto e se tivéssemos isto em conta nunca se lançariam impostos.
Mas a alternativa qual era?
Se não se lançar este imposto aumenta-se o défice do Orçamento Geral do Estado. O Sr. Deputado sabe tão bem como eu que aumentar o défice do Orçamento Geral do Estado significa aumentar a inflação.
Em relação à Lei das Finanças Locais, foi-me perguntado se estou ou não de acordo em que se dêem subsídios por casos concretos. É óbvio que o que eu acho é que é preciso encontrar soluções que respondam de forma objectiva e não de forma casuística às necessidades.
O Sr. Deputado Abílio Rodrigues perguntou-me se a sua interpretação correspondia à minha em relação aos subsídios reembolsáveis. É óbvio que corresponde
Penso que o problema de fundo que está aqui assim em causa é este: lançarão ou não as câmaras esta taxa para resolver o problema das empresas de transportes?
Penso que em relação aos municípios onde os transportes são municipalizados isso está fora de causa. com certeza que as câmaras estarão interessadas em lançar esta taxa. Em relação aos municípios onde existem transportes não municipalizados - e o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia pôs esse problema - eu disse que o Governo vai criar uma lei quadro dos transportes regionais e locais e, portanto, insere-se dentro dessa política, como também se insere na política de finanças locais - para cuja modificação nós pedimos autorização legislativa - e da lei de delimitação.
Portanto, a vossa preocupação é também uma preocupação nossa.
Estas leis, como eu referi, vão ser feitas de forma articulada e penso que não devem os Srs. Depurados ter este tipo de preocupações.
Em relação ao leque, ou seja, se a taxa deve ser de 0,5 % a 2,5 % ou se deve ser mais apertada os grupos parlamentares já apresentaram uma proposta no sentido de apertar o leque e o Governo está de acordo.
Portanto não é por aí também que vão haver problemas.
O que nós queríamos, sobretudo, com esta taxa municipal de transportes - e foi essa a lógica que tentei introduzir- era o seguinte: se o fundo especial de transportes terrestres não necessitam de financiar as empresas públicas de transportes no volume que agora financia libertam-se fundos que podem ser aplicados no financiamento da Lei das Finanças Locais e isso pode fazer-se sem aumento do défice do Orçamento Geral do Estado.
Desta forma conseguimos, por esta via, aumentar as receitas de todas as câmaras. Penso que isto é uma vantagem que todas as câmaras reconhecerão.
Não sei se respondi às perguntas mais importantes, mas, pelo menos, penso que respondi àquelas que, do meu ponto de vista, eram mais importantes.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix, para uma intervenção.

O Sr. Bagão Félix (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Secretária de Estado: A proposta de autorização legislativa apresentada pelo Governo, este debate e as explicações há pouco e agora dadas pela Sr.º Secretária de Estado vem confirmar que a proposta apresentada sob a capa de aparente justificação técnica e de uma ideia aparentemente sedutora de justiça social traduz-se fundamentalmente num aumento, num acréscimo indiscutível da carga fiscal. E que fique claro que, da parte do CDS, nós entendemos que este problema não se deve resolver apenas ou exclusivamente pelo aumento dos preços, mas também através da repartição dos custos pelas comunidades.
Simplesmente, à boa maneira socialista, para financiar mais despesas o Governo acaba de inventar um novo produto fiscal: uma taxa municipal de transportes.
Aliás, é curioso verificar que o Ministro das Finanças e do Plano não assina a proposta de autorização legislativa, o que, desde logo, insere esta taxa num quadro pouco coerente de política fiscal e de política orçamental.
Trata-se, enfim, de uma "metástase fiscal" introduzida pelo Governo e cujas consequências - para ser muito breve- sintetizarei em 5 ou 6 grupos.
Indiscutivelmente, em primeiro lugar, agrava a carga fiscal.
Em segundo lugar, introduz um princípio aparente de co-respectivìdade entre receitas e despesas que na boa técnica fiscal não tem nada a ver com este problema e que, aliás, só existe nos sistemas de segurança social e, mesmo assim, apenas em parte.
Em terceiro lugar, asfixia as empresas. Quando o Governo refere a defesa do autofinanciamento das empresas vai-lhe introduzindo novos agraves, novos impostos, e torna também mais opaco o sistema de responsabilização no sistema de transportes entre, por um lado, a tutela institucional das empresas públicas e, por outro, a entidade que pode aumentar a carga fiscal, que não são os municípios.
Finalmente, torna pouco neutral o sistema fiscal. E torna pouco neutral porquê? Porque acaba, mais uma vez, por introduzir um factor de encarecimento das empresas de mão-de-obra intensiva em favor das empresas de capital intensivo, quando o mesmo Governo, e designadamente o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, fala no combate ao desemprego e ao défice da balança de pagamentos.
Como já não terei muito tempo, gostaria de perguntar concretamente à Sr.ª Secretária de Estado - e porque foi dito pelo Governo que não há um alívio

Página 978

978

da política fiscal e como parece ao CDS que não sé está em: tempo de aumentar as receitas para aumentar ou financiar mais despesas, mas que, pelo contrário, é preciso racionalizar as despesas para sobrecarregar menos os contribuintes - como é que o Governo pensa, perante a crise económica, conciliar as medidas requeridas pela exigência da protecção social, que são indiscutíveis, com o respeito pelo princípio do equilíbrio básico da economia de mercado e da salvaguarda do estímulo para o - progresso e para o desenvolvimento.

Aplausos do CDS.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra para pedir um esclarecimento.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr.ª Secretária de Estado, compreendo perfeitamente que esteja maçada em virtude do adiantado da hora, simplesmente eu tinha feito aqui uma série de perguntas e V.Ex.ª não chegou a responder a nenhuma.
Interessava-me fundamentalmente este tipo de resposta: as - taxas revertem só para empresas públicas ou - também para empresas privadas?
E neste caso o controle que o Estado terá sobre a utilização destas taxas?
Mas, principalmente, queria saber se se contempla a hipótese de isentar da taxa municipal de transportes as empresas em situação financeira difícil.
Ainda gostava que me dissesse se a introdução desta taxa não poderá ter a faculdade de não aumentar tanto o preço dos transportes.

O Sr. Presidente: - Se a Sr.ª Secretária de Estado da Administração Autárquica deseja responder, tem a palavra

A Sr.ª Secretária de Estado da administração Autárquica: - Penso que a - pergunta que me foi feita pelo Sr. Deputado Bagão Félix exorbita um pouco da órbita que aqui estamos a tratar. No fundo, o problema é este: V.Ex.as entendem que o défice do Orçamento Geral do Estado não deve ser aumentado, que ' não deve aumentar a carga fiscal, portanto,, do ponto de vista do CDS, deve fazer-se repercutir sobre os utentes, exclusivamente, o aumento dos custos.

O Sr. Carlos Lage (PS): - É evidente!

A Oradora:- Quanto às questões postas pelo Sr. Deputado António Taborda, elas serão respondidas pelo Sr. Ministro do Equipamento Social.

O Sr. Ministro do Equipamento Social (Rosado Correia): Foram feitas realmente algumas perguntas, mas não há uma incidência real no âmbito desta proposta de lei, pois ela visa, sobretudo, dar o poder às autarquias locais e avançar pára o caminho da descentralização. Ora, não é isso que tem sucedido. E pela primeira vez que vem a esta Assembleia uma proposta que visa, realmente, avançar para um poder local efectivo, verificamos que 2 extremos - se encontram em ó posição a esta mesma proposta. E efectivamente estranho! A não ser que haja, de facto, um desejo de que o poder central continue, ele só, a lançar taxas e a praticar os impostos. Não é isso que o Governo pretende com a apresentação desta proposta.
As perguntas do Sr. Deputado António Taborda são, realmente, pertinentes. Considero-as praticamente todas aceitáveis, pois as taxas visam também incidir sobre transportes de natureza social. E, assim, julgo que respondo à sua pergunta. Por outro lado, a isenção de empresas em situação económica difícil deve ser ponderada, por forma a que a regulamentação contemple também essas situações.
Esta lei tem ainda mais um objectivo: o de permitir às próprias autarquias locais que visem uma distribuição de apoio, por exemplo, a deficientes: Consideramos que o deficiente deve ter um apoio deste género em termos de deslocação e não há dúvida que a, autarquia, recebendo ela própria as. receitas pela aplicação de uma taxa, poderá contribuir nesse campo, o que presentemente não sucede...

Vozes do PSD: Muito bem!

O Sr. Presidente: - O: Sr. Deputado Veiga de, Oliveira pediu a palavra para quê efeito?

O Sr. Veiga de. Oliveira (PCP): - Sr. Presidente se o Sr. Ministro do Equipamento Social esteve a fazer. uma intervenção, como parece ter estado, pedia um esclarecimento. Se o Sr. Ministro esteve a - responder a .perguntas, o quê parece ser duvidoso peço para intervir.

O Sr. Presidente: - Em resumo, o Sr. Deputado Veiga de Oliveira deseja falar.

Risos

Aplausos do PS e, do PSD .

Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr: - Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, não cometerei agora, depois do bom humor do Sr. Presidente, a indelicadeza de lhe perguntar, finalmente,
A que titulo é que vou falar. Agradeço-lhe ter-me concedido a palavra, Sr. Presidente.

Risos.

Sr. Ministro do Equipamento Social, como apesar das omissões e dos silêncios todos ficámos a saber do que é que se trata, não quero repisar argumentos, nem repetir perguntas que de todo são já descabidas Queria simplesmente fazer-lhe esta observação: se isto não é só a criação de uma taxa municipal de transportes e se se ,trata, como agora disse, de transferir poder para as autarquias ou, interferir com a Lei das Finanças Locais, então, Sr. Ministro alguma coisa mais está errada. Portanto, o melhor é não mexermos nisso porque a matéria dos poderes das autarquias teria de ser tratada noutra sede que é ,á Lei, das Competências e Atribuições, isto c, atribuições das autarquias e competências dos órgãos; se se trata da questão das finanças locais, também e nessa sede - Ora, não estamos a tratar de nenhuma dessas coisas; como também pão estávamos a tratar de justiça social!, Estamos a tratar tão-só de saber se vamos autorizar o

Página 979

15 DE JULHO DE 1985 979

Governo a criar uma nova taxa, um novo objecto fiscal, ou não. É tudo e só tudo. O resto, Sr. Ministro, são argumentos bons ou maus, onde uns propenderão para defender a proposta, outros não concordarão, mas não É o seguinte: vale a pena é confundirmos a questão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não há mais inscrições, pelo que declaro encerrado o debate. Vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 23/III, que acabámos de apreciar, e que autoriza o Governo a legislar sobre a criação de uma taxa municipal de transportes colectivos urbanos e suburbanos em municípios, associações e federações de municípios, cuja população seja igual ou superior a 50 000 habitantes.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e votos contra do PCP e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, segue-se agora à votação na especialidade desta proposta de lei.
O Sr. Deputado Veiga de Oliveira pretende usar da palavra?

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, é apenas para informar que dispensamos a leitura do articulado, pois sabemos exactamente o que vai ser
votado.

O Sr. Presidente: - Como parece haver consenso nesse sentido, vamos proceder de acordo com a sua sugestão, Sr. Deputado Veiga de Oliveira.
Está em discussão o artigo 1.º

Pausa.

Como ninguém pede a palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e votos contra do PCP e do CDS.

É o seguinte:

ARTIGO 1.º

É o Governo autorizado a legislar sobre a criação de uma taxa municipal de transportes, destinada ao funcionamento dos transportes colectivos, urbanos e suburbanos, em municípios, associações e federações de municípios cuja população
seja igual ou superior a 50 000 habitantes.

O Sr. Presidente: - Passamos ao artigo 2.º Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e votos contra do PCP e do CDS.

ARTIGO 2.º

Ficarão sujeitas à taxa municipal de transportes as pessoas colectivas de direito público, bem como as empresas privadas cujo número de trabalhadores seja igual ou superior a 10.

O Sr. Presidente: - Seguidamente vamos discutir e votar o artigo 3 º da proposta. Há uma proposta de alteração, a qual cuja leitura me parece ser também dispensada.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço desculpa de não dispensar a leitura, mas não recebemos aqui cópia da proposta. Ouvi falar nela, tenho uma ideia do que seja, mas não conheço exactamente a proposta de alteração.

O Sr. Presidente: - Então, vai ser lida a proposta de alteração ao artigo 3.º, Sr. Deputado.

Foi lida. É a seguinte:

O valor da taxa municipal de transportes poderá oscilar entre um mínimo de 0,5 % e um máximo de 1,5 % dos salários pagos pela entidade empregadora.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos passar à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e votos contra do PCP e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o artigo 4.º está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e votos contra do PCP e do CDS.

É o seguinte:

ARTIGO 4.º

O produto da taxa municipal de transportes constitui receita municipal e deve ser obtido através dos mecanismos de colecta actualmente utilizados para as prestações da segurança social.

Página 980

980 I SÉRIE - NÚMERO 22

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está na Mesa uma proposta de substituição da alínea á) do artigo 5.º Vamos votar, primeiro, o corpo do artigo 5.º e a alínea a) e depois votaremos a proposta de substituição da alínea a).

Está em discussão.

Não havendo inscrições, vamos passar a votar o corpo do artigo 5.º e a alínea b) do mesmo artigo.

Submetidos à votação, foram aprovados, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonçalves e os votos contra do PCP e do CDS.

São os seguintes:

ARTIGO 5.º

O produto da cobrança da taxa municipal de transportes deverá ser obrigatoriamente afectado:

a) A investimentos necessários à expansão e melhoramento dos sistemas de transportes públicos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar agora a proposta de substituição da alínea a) do artigo 5.º, que vai ser lida.

Foi lida. É a seguinte:

a) Às indemnizações compensatórias devidas a transportadoras pela prestação de serviços públicos por preços inferiores aos custos respectivos que forem fixados por lei.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos passar à votação.

Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor ao PS, do PSD, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez, os votos contra do PCP e do CDS e a abstenção do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passaremos ao artigo 6.º, que está em discussão.

Pausa.

Como não há inscrições, vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez, os votos contra do CDS e as abstenções do PCP e do MDP/CDE.

Ê o seguinte:

ARTIGO 6.º

Poderão ser isentas do pagamento da TMT as entidades empregadoras referidas no artigo 2.º que tenham assegurado aos seus trabalhadores:

a) A disponibilidade de habitação junto ao local de trabalho;
b) Transporte entre o domicílio e o local de trabalho por conta da entidade patronal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o artigo 7.º tem uma proposta de alteração, que vai ser lida.

Foi lida. Ê a seguinte:

ARTIGO 7.º

Compete às assembleias municipais que reunam os requisitos previstos no artigo 1.º deliberar sobre o lançamento e o quantitativo da taxa municipal de transportes dentro dos limites fixados pelo artigo 3.º

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e os votos contra do PCP e do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão o artigo 8.º

Pausa.

Não havendo inscrições, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e os votos contra do PCP e do CDS.

Ê o seguinte:

ARTIGO 8.º

A presente autorização tem o alcance de permitir que o custo dos transportes de determinada área seja tanto quanto possível suportado pelos respectivos utentes.

O Sr. Presidente: -Está em discussão o artigo 9.º
Pausa.

Vamos passar à votação.

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e os votos contra do PCP e do CDS.

Ê o seguinte:

ARTIGO 9.º

A presente autorização caduca se não for utilizada dentro do prazo de 90 dias, a contar da entrada em vigor da presente lei.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar ao artigo 10.º, que está em discussão.

Pausa.

Vamos votar.

Página 981

15 DE JULHO DE 1983 981

Submetido à votação, foi aprovado, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do deputado independente António Gonzalez e os votos contra do PCP e do CDS.

É o seguinte:

ARTIGO 10.º

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder agora à votação global da proposta de lei n.º 23/III.

Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PS, do PSD, do MDP/CDE, da UEDS, da ASDI e do 'deputado independente António Gonzalez e os votos contra do PCP e do CDS.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado António Taborda, pediu a palavra para que efeito?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Para uma curtíssima declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O MDP/CDE absteve-se quanto à votação do artigo 5 º por entender que ele não era totalmente claro quando refere se os "preços forem fixados por lei" e absteve-se quanto ao artigo 6.º por não estarem expressamente isentas as empresas em situação económica difícil, embora registe a intenção do Sr. Ministro de incluir essa isenção.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O nosso voto contra esta proposta de autorização legislativa conforma-se com a defesa dos interesses daqueles que aqui representamos, aqueles que, em definitivo, vão ter de pagar mais este acréscimo de carga fiscal, isto é, os que tudo produzem porque são aqueles que trabalham.
Finalmente, uma pequena nota: a nossa posição em relação a esta matéria coincidiu - embora por razões opostas, talvez, ou pelo menos por razões muito diversas - com a posição do CDS. Mas os Srs. Deputados que se riram com grande gáudio e que até se manifestaram um pouco nervosos com a coincidência deverão lembrar-se que, se coincidirmos na oposição por razões diversas, os deputados do PS e do PSD já coincidiram com o CDS no Governo e certamente não por razões diversas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia pretende usar da palavra também para uma declaração de voto?

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS): - Sim, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado. Risos.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS) - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O CDS considera que o poder dos municípios na gestão dos sistemas de transportes urbanos e suburbanos deve ser reforçado, tal como também entende deverem acabar as discriminações de que são alvo os municípios que possuem serviços municipalizados de transportes, e pensa que o instrumento adequado para a resolução destes problemas é a Lei das Finanças Locais.
A proposta apresentada pelo Governo não é uma medida de descentralização da fiscalidade e por ser apenas uma medida que se traduz no reforço da fiscalidade, já sufocante para as empresas, o CDS votou contra esta proposta do Governo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deu entrada na Mesa um ofício do Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares que diz o seguinte:
O Governo comunica à Mesa que retira a proposta de lei n.º 18/III sobre a autorização legislativa para elaboração do estatuto da Guarda Nacional Republicana.

Entrou igualmente, na Mesa um pedido de inquérito parlamentar apresentado pelo Partido Comunista Português sobre as alterações do Governo e de outras entidades públicas que conduziram à extinção da SNAP - Sociedade Nacional dos Armadores de Pesca de Arrasto, S. A. R. L., bem como às actuações do anterior conselho de gerência e da comissão liquidatária nomeada nos termos do Decreto-Lei n.º 161/82, de 7 de Maio.
Foram também admitidos na Mesa o projecto de lei n.º 199/III, do Sr. Deputado João Morais Leitão e outros, do CDS, sobre baldios; o projecto de lei n.º 198/III, do Sr. Deputado Adérito Manuel Soares Campos, do PSD, sobre a elevação da vila de Ovar à categoria de cidade; o projecto de lei n.º 197/III, dos Srs. Deputados Tomás Espírito Santo e Eugénio Anacoreta Correia, do CDS, sobre urgência nacional de gestão de recursos hídricos; o projecto de lei n.º 196/III, do Sr. Deputado Lopes Cardoso e outros, da UEDS, sobre amnistia às infracções disciplinares nos órgãos de Comunicação Social; o projecto de lei n.º 195/III, do Sr. Deputado Adriano Moreira e outros, do CDS, regime de seguro dos descentes universitários; o projecto de lei n.º 194/III, do Sr. Deputado João Evangelista Rocha de Almeida e outros, do PSD, sobre a criação da freguesia de Carapelhos, no concelho de Mira, e o projecto de lei n.º 193/III, do Sr. Deputado João Evangelista Rocha de Almeida e outros, do PSD, sobre a criação da freguesia de Seixo, no concelho de Mira.

Srs. Deputados, vamos proceder à leitura da ordem do dia para amanhã. Não sei se o Sr. Deputado Carlos Lage deseja, à semelhança do que tem feito até agora, referir-se ao início dos trabalhos ou se desta vez não o faz.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Sr. Presidente, tenho todo o gosto de corresponder à sua expectativa.

Página 982

PREÇO DESTE NUMERO 140$00

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×