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I Série - Número 51

Quarta-feira, 23 de Novembro de 1983

DIÁRIO da Assembleia da República

III LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1983-1984)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 22 DE NOVEMBRO DE 1983

Presidente: Exmo. Sr. José Luís do Amaral Nunes

Secretários Exmos. Srs. Leonel de Sousa Fadigas
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 11 horas e 10 minutos.
Prosseguiu a discussão, na generalidade, das propostas de lei n.º 46/III e 47/III, respectivamente sobre as Grandes Opções do Plano e Orçamento do Estado para 1984.
Produziram intervenções, a diverso título, alam do Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação (Soares Costa) e do Sr. Secretário de Estado do Planeamento (Mário Cristina de Sousa), os Srs. Deputados Magalhães Mota (ASDI), João Amaral e Octávio Teixeira (PCP), Almerindo Marques (PS), Leonel Fadigas (PS), Rogério de Brito (PCP), Soares Cruz (CDS), Margarida Tengarrinha (PCP), António Taborda (MDP/CDE), Custódio Gingão (PCP), Lopes Cardoso (UEDS), João Abrantes (PCP), António Gonzalez (Indep.), Azevedo Soares (CDS), José Vitorino (PSD), Eurico Correia (PS), Álvaro Brasileiro (PCP), Gaspar Pacheco (PSD), Vasco Miguel (PSD), Pinheiro Henriques (MDP/CDE), Nogueira de Brito (CDS), Jorge Lacão (PS), Luís Beiroco (CDS), Silva Domingos (PSD) e Ilda Figueiredo (PCP).
A propósito de uma questão suscitada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos (PCP), relativa à transmissão televisiva dos debates e à presença do Sr. Ministro das Finanças a do Plano (Ernâni Lopes), no programa televisivo 1.ª página, produziram intervenções, além do Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos), os Srs. Deputados Nogueira de Brito (CDS), Jorge Lacão (PS), Narana Coissoró e Gomes de Pinho (CDS) e José Vitorino (PSD).
Finalmente, o Sr. Presidente encerrou a sessão eram 21 horas.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 11 horas e 10 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Socialista (PS):

Abílio Aleixo Curto.
Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Rodrigues Ferreira Gamboa.
Alexandre Monteiro António.
Almerindo da Silva Marques.
Amadeu Augusto Pires.
Américo Albino da Silva Salteiro.
Aníbal Coelho da Costa.
António da Costa.
António Domingues de Azevedo.
António José dos Santos Meira.
Beatriz Almeida Cal Brandão.
Carlos Augusto Coelho Pires.
Carlos Cardoso Lage.
Dinis Manuel Pedro Alves.
Edmundo Pedro.
Eurico Faustino Correia.
Ferdinando Lourenço de Gouveia.
Fernando Fradinho Lopes.
Francisco Augusto Sá Morais Rodrigues.
Francisco Igrejas Caeiro.
Francisco Lima Monteiro.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Frederico Augusto Handel de Oliveira.
Gaspar Miranda Teixeira.
Gil da Conceição Palmeiro Romão.
Henrique Aureliano Vieira Gomes.
Hermínio Martins de Oliveira.
João de Almeida Eliseu.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João do Nascimento Gama Guerra.
Joel Maria da Silva Ferro.
Joaquim José Catanho de Menezes.
Joaquim Manuel Leitão Ribeiro Arenga.
Jorge Alberto Santos Correia.

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Jorge Lacão da Costa.
José de Almeida Valente.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Carlos Pinto Bastos Torres.
José da Cunha e Sá.
José Luís Diogo Preza.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Nunes Ambrósio.
José Maria Roque Lino.
José Martins Pires.
José António Borja S. dos Reis Borges.
Leonel de Sousa Fadigas.
Litério da Cruz Monteiro.
Luís Abílio da Conceição Cacito.
Luís Silvério Gonçalves Saias.
Manuel Alfredo Tito de Morais.
Manuel Filipe Pessoa Santos Loureiro.
Manuel Fontes Orvalho.
Maria Angela Duarte Correia.
Maria do Céu Sousa Fernandes.
Maria da Conceição Pinto Quintas.
Maria Luísa Modas Daniel.
Maria Margarida Ferreira Marques.
Nelson Pereira Ramos.
Paulo Manuel de Barros Barrai.
Raúl d'Assunção Pimenta Rêgo.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rosa Maria da Silva Bastos Albernaz.
Rui Fernando Pereira Mateus.
Rui Joaquim Cabral Cardoso das Neves.
Silvino Manuel Gomes Sequeira.
Victor Hugo Jesus Sequeira.
Walter Ruivo Pinto Gomes Rosa.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Abílio Gaspar Rodrigues.
Abílio Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Agostinho Correia Branquinho.
Amadeu Vasconcelos Matias.
Amândio S. Domingues Basto Oliveira.
António Augusto Lacerda de Queiroz.
António Maria de Orneias Ourique Mendes.
António Nascimento Machado Lourenço.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Arménio dos Santos.
Carlos Miguel Almeida Coelho.
Cecília Pita Catarino.
César Augusto Vila Franca.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Eleutério Manuel Alves.
Fernando José da Costa.
Fernando José Roque Correia Afonso.
Fernando Monteiro do Amaral.
Fernando dos Reis Condesso.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco Jardim Ramos.
Gaspar de Castro Pacheco.
Guido Orlando Freitas Rodrigues.
Jaime Adalberto Simões Ramos.
João Evangelista Rocha de Almeida.
João Luís Mal aio Correia.
João Maurício Fernando Salgueiro.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Eduardo Gomes.
Joaquim Luís Esteves Pinto Monteiro.
Joaquim dos Santos Pereira Costa.
José Adriano Gago Vitorino.
José de Almeida Cesário.
José Ângelo Ferreira Correia.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Bento Gonçalves.
José Mário de Lemos Damião.
José Silva Domingos.
José Vargas Bulcão.
Leonel Santa Rita Pires.
Luís António Martins.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Manuel Maria Portugal da Fonseca.
Mário Martins Adegas.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Nuno Aires Rodrigues dos Santos.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Pedro Paulo Carvalho Silva.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio Higino Gonçalves Pereira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António Dias Lourenço.
António Guilherme Branco Gonzalez.
António José de Almeida Silva Graça.
António José Monteiro Vidigal Amaro.
António da Silva Mota.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto da Costa Espadinha.
Carlos Alberto Gomes Carvalhas.
Carlos Alfredo de Brito.
Custódio Jacinto Gingão.
Francisco Miguel Duarte.
Georgete de Oliveira Ferreira.
João António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim António Miranda da Silva.
Jorge Manuel Abreu de Lemos.
Jorge Manuel Lampreia Patrício.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitorino.
Manuel Gaspar Cardoso Martins.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria Alda Barbosa Nogueira.
Maria Ilda Costa Figueiredo.
Maria Margarida Tengarrinha.
Mariana Grou Lanita.
Octávio Augusto Teixeira.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes Almeida.
Alfredo Albano de Castro Azevedo Soares.
António Gomes de Pinho.
António José de Castro Bagão Félix.
Armando Domingos Lima Ribeiro Oliveira.
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca.
Eugénio Maria Nunes Anacoreta Correia.
Francisco Manuel de Menezes Falcão.
Henrique Manuel Soares Cruz.

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João Carlos Dias M. Coutinho de Lencastre.
João Gomes de Abreu Lima.
José Luís Nogueira de Brito.
Luís Filipe Paes Beiroco.
Narana Sinai Coissoró.
Tomás Rebelo Espírito Santo.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

António Monteiro Taborda.
José Gonçalves Pinheiro Henriques.
Helena Cidade Moura.

Agrupamento Parlamentar da União da Esquerda para a Democracia Socialista (UEDS):

António César Gouveia de Oliveira.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Poppe Lopes Cardoso.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.

Agrupamento Parlamentar da Acção Social-Democrata Independente (ASDI):

Joaquim Jorge de Magalhães Mota.
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho.
Ruben José Almeida Raposo.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos entrar directamente no período da ordem do dia para continuar a discutir as propostas de lei n.ºs 46/III e 47/III, respeitantes às Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado.
Durante o debate permaneceram na bancada do Governo, além dos Srs. Ministros de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos) e das Finanças e do Plano (Ernâni Lopes), diversos Srs. Ministros e Secretários de Estado.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, V. Ex.ª sabe que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentou ontem uma proposta de resolução que tem um grande carácter de urgência, dada a situação dramática que se vive no país como resultado das cheias e inundações, parecendo haver um consenso no sentido de esta ser votada rapidamente, em virtude dessa mesma urgência.
Era esta questão que queria pôr à mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o período da ordem do dia é fixado de acordo com o Presidente e ouvidos os grupos parlamentares.
Quando os grupos parlamentares forem ouvidos sobre essa matéria será fixada a ordem do dia.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Silva Graça (PCP): - Sr. Presidente, face à urgência da situação e à necessidade de se tomar uma decisão muito rápida sobre este assunto, sugeríamos à Mesa que convocasse uma reunião urgente de líderes para agendamento da nossa proposta de resolução, ainda durante a discussão do Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não tenho dúvida nenhuma em convocar uma reunião de líderes parlamentares sobre essa matéria ou outras.
Simplesmente, o que acontece é que neste momento não tenho condições para a convocar, porque às 15 horas e 30 minutos tenho uma reunião com o Sr. Presidente da República e não sei a que horas termina.
Portanto, logo que chegue, se cá estiver o Sr. Presidente Tito de Morais, comunicar-lhe-ei o seu pedido para que ele convoque uma reunião sobre essa matéria.
Prosseguindo agora o debate das propostas de lei em apreço, tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota para uma intervenção.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que todos nós, todos os que nos preocupamos com a futuro da democracia em Portugal, não podemos deixar de nos sentir de algum modo entristecidos com o facto de ontem as bancadas do Plenário apresentarem um aspecto pouco mais do que vazio.
É uma responsabilidade colectiva e creio que merece bem a nossa reflexão inicial.
Será o Plano tão pouco importante ou serão os deputados que o minimizam?
Este é um ponto de partida sobre o qual valerá a pena estarmos atentos, porque por ele passam coisas extremamente sérias e importantes, para não falar na responsabilidade de cada um de nós perante os eleitores que aqui nos trouxeram para exercermos a nossa tarefa, a nossa função.
Creio que a questão do Plano começa por ser aquilo que costuma considerar-se como o Plano como produto.
Na verdade, os estudos preparatórios a que se refere o n.º 2 do artigo 94.º da Constituição acabam por ser um trabalho cuja qualidade é inegável, mas que não são realmente, mui to mais do que um produto acabado e que corresponde ao planeamento tal como era feito, tradicionalmente, em Portugal: um relatório, mais ou menos discursivo, com umas quantas opções, algumas quantificadas e outras não, e tudo isto já feito, terminado e acabado é apresentado ao Conselho Nacional do Plano.
Quero, dizer, portanto, que não há participação na elaboração do Plano. Não há participação por via do respectivo Conselho Nacional mas há, antes, e apenas a crítica a um produto recebido como produto final, como produto terminado.
Os técnicos de planeamento trabalharam hipóteses de acordo com orientações políticas recebidas. Por sua vez o Conselho Nacional do Plano parece actuar no pressuposto de que os problemas portugueses são conhecidos de todos, por todos vividos diariamente, pelo que se alcançarão boas decisões buscando um denominador comum entre os vários interesses em presença.

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A verdade é que não é bem assim. A imperfeição das representações da .realidade social de que dispõem os participantes na vida política, a sua imperfeita percepção dos objectivos que perseguem e dos efeitos das medidas possíveis na realização de objectivos torna difícil decidir bem.
A procura de um compromisso pode levar a acordos sobre soluções pouco satisfatórias, sendo negligenciadas soluções com maior interesse.
A lucidez de um conjunto nunca é maior do que a dos seus componentes.
A composição do Conselho Nacional do Plano agrava tudo isto.
A criatividade social - tenhamos a coragem de o reconhecer - foi, em Portugal, limitada, porque tudo, ou quase tudo, se partidarizou e porque as forças sociais surgiram com forte marca partidária, actuam mais por formas próprias de partidos ou grupos de pressão política e os próprios interesses de classe só aparecem ou só vêm ao de cima quando politicamente convém.
Isto é ainda mais sério quando são modificações estruturais que estão em causa e que importa fazer. Não só há interesses que importa tocar, que importa atingir, como quando se procura inovar e quando há alterações estruturais a fazer se toca em muita coisa, inclusivamente no próprio apego mais ou menos sentimental e psicológico ligado a tudo quanto foram as realizações do passado. E tudo isto, que é a composição do Conselho Nacional do Plano, o modo como este aprecia as propostas que lhe são feitas e o modo como a própria proposta é elaborada, traduz-se numa crescente distanciação entre a vida quotidiana e a vida política.
Não há maiorias formadas no sentido de um pacto do progresso ou de um projecto de futuro.
Por isso, os cidadãos, e também os deputados, desinteressam-se das controvérsias que lhes parecem longe das suas preocupações.
Creio que seria importante que tudo isto pudesse ser modificado, que o processo de elaboração do Plano fosse real e autenticamente participado, tal como se dispõe constitucionalmente, com a participação das populações através das autarquias e comunidades locais, das organizações representativas dos trabalhadores e das organizações representativas das actividades económicas. Mas participação não significa uma, ou duas, ou três reuniões ocasionais do Conselho Nacional do Plano para apreciar aquilo que lhe é proposto. Significa, muito pelo contrário, que ao longo de todo o trabalho de elaboração do Plano são canalizadas sugestões, são apresentadas alternativas, são introduzidas hipóteses de trabalho.
Isso é que deveria ser a participação na elaboração do Plano.
Uma outra questão entronca directamente com esta: Também só vale a pena discutir, na medida em que depois, com rigor, se há-de atender à avaliação de resultados. E neste aspecto a Assembleia da República nunca conseguiu o disposto no n.º 1 do artigo 94.º da Constituição, ou seja, nunca apreciou um relatório de execução de um Plano.
Creio que só um Plano autenticamente participado se pode transformar num lugar de consenso. Isso implica, já o disse, a profunda reestruturação do Conselho Nacional do Plano e também - e será bom não o esquecer - do próprio Departamento Central de Planeamento, a quem deverá passar a competir a análise precisa dos problemas, a actualização dos objectivos, o exame dos meios alternativos que permitam alcançá-los, o pôr em causa uma série de ideias feitas.
Creio que se o Plano for assim elaborado, se for um lugar e uma forma de participação, poderá então ser também um lugar de debate democrático, um elemento de coerência económica, a base de contratos sociais e, naturalmente, um instrumento para dominar o futuro. E não se duvide sobre esta possibilidade de o Plano poder ser um lugar de consenso. As sociedades, por mais divididas que sejam, têm sempre pontos consensuais. Quanto mais não seja une-os a vontade de continuar a viver juntos e de encarar conjuntamente uma aventura que é sempre um futuro colectivo.
Creio que isso, por si só, é suficiente para encontrar esses pontos consensuais. E diria ainda que, para nós e para aqueles que pensam como nós, não se torna necessário, nem útil, nem desejável, refazer uma sociedade de acordo com um projecto abstracto, mas trata-se de libertar uma sociedade de um poder que por ser monopolizado por potências económicas se opõe ao desenvolvimento da diversidade das aspirações sociais.
O Plano tem a ver com isto porque foi definido constitucionalmente por nós, nos termos do n.º 2 do artigo 91.º, como algo que deve garantir o desenvolvimento harmonioso dos sectores e regiões, a eficiente utilização das forças produtivas, a justa repartição individual e regional do produto nacional, a coordenação da política económica com a política social, educacional e cultural, a preservação do equilíbrio ecológico, a defesa do ambiente e a qualidade de vida do povo português.
Creio que talvez não seja inútil lembrar este preceito constitucional, recordá-lo aqui e agora e pensar na responsabilidade que atribuímos ao Plano.
Ora bem, porque é que nós, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pensamos que é necessário que o Plano seja assim elaborado e participado?
É porque acreditamos que a primeira prioridade é modificar as prioridades actuais, isto é, subalternizar, como merecem, as discussões estéreis para, com realismo e eficácia, se resolverem os problemas portugueses; é, ainda, porque pensamos que o esforço dos portugueses deverá orientar-se para a elaboração de um Plano que contenha as medidas prioritárias para resolver os mais urgentes problemas do país, aberto à discussão de todos os grupos e forças sociais, para recolher o mais amplo consenso nacional.
Isso implica, já o dissemos; uma metodologia de trabalho totalmente nova, capaz de facultar a compreensão, a adesão, a mobilização activa dos portugueses num clima de liberdade, de trabalho, de entendimento e de apaziguamento político e social.
Temos que aproveitar todos os meios para interessar e fazer participar os diversos extractos e classes da sociedade portuguesa na determinação positiva dos seus problemas, na busca das suas soluções, aceitando as limitações e constrangimentos que às soluções desejáveis para cada classe são impostas por uma visão global dos problemas.
Fala-se muito na criação ou na reformulação daquilo que foi o Conselho Nacional de Rendimentos e Preços. Creio que o lugar mais certo para procurar

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esses consensos entre as forças sociais é a planificação democrática. É aí que as várias forças sociais devem pôr-se de acordo em relação aos projectos que consideram desejáveis para a colectividade onde se inserem.
Precisamos de chamar em apoio do Plano, da sua elaboração e, depois, da sua execução, em particular, os meios de comunicação social, os técnicos, os quadros e os jovens, para além das forças sociais e das instituições políticas e administrativas.
Precisamos, também, de procurar celebrar compromissos ou acordos, sem discriminações acerca do conteúdo de programas sectoriais ou de projectos relevantes, e integrá-los neste Plano, de modo a obter o empenhamento e garantir mais condições de eficácia executiva desses projectos.
Precisamos, ainda, de corrigir as anomalias mais gritantes e de lançar as bases do desenvolvimento e da democratização efectiva da sociedade portuguesa.
Isto tudo corresponde a reformas sociais ousadas e a uma política económica que é, não só, de imediata estabilização, como também de desenvolvimento global e que precisa, portanto, de programar e promover as mais importantes reformas institucionais.
Se não fizermos isto assistimos e assistiremos cúmplices a uma acelerada acentuação das condições de arcaísmo, de anarquia, de burocratização, de ineficiência e de injustiça na sociedade portuguesa.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que poderemos certamente fazer isto já para 1985 e até lá poderemos pelo menos, discutir as Grandes Opções do Plano para 1984, que nos é proposto, de forma um pouco diferente.
É que, tal como nos são colocadas, as questões não são muitas.
Nenhum de nós terá, certamente, a pretensão de introduzir modificações pontuais nas variáveis contidas no modelo do Plano sem dominar ou conhecer sequer os resultados dessas alterações.
Não é este, certamente, o lugar próprio para esse tipo de questionamento.
O que importaria aqui era debruçarmo-nos sobre algumas interrogações essenciais. Por exemplo, o que está em causa e o que nos é proposto como estratégia económica é uma política marcada por uma opção conjunturalista em que os aspectos relativos à tomada de medidas pontuais ditadas pelas alterações conjunturais dominam ou, pelo contrário, é uma política que ultrapassa a conjuntura para estabelecer bases em relação ao futuro?
Uma política monetária restritiva, segundo a interrogação provocada por este Plano, conduz necessariamente a uma política salarial restritiva e isto traduz-se, em termos de Plano, em adiarmos um problema de fundo da nossa economia e que é o da elevação do nível de vida.
Haverá alternativas para esta hipótese?
Nas empresas o capital próprio tem cada vez menos peso, os riscos são cada vez menos assumidos, o autofinanciamento é cada vez mais baixo, à substituição do crédito barato - que dantes houve em Portugal - levou as empresas a pressionarem sistematicamente no sentido da alta de preços, para que a inflação recupere a rentabilidade ameaçada pelas altas taxas de juro nominais.
Sabemos que assim é.
Como responde o Plano a este tipo de situação?
A política permanentemente altista das taxas de juro para travar ou compensar fugas de capitais penaliza o investimento.
Há alternativa?
É ainda outra questão que o Plano nos coloca.
A desvalorização feita com o objectivo de concentrar rendimentos na exportação terá tido efeitos, sabendo-se que muitas das nossas empresas aceitam preços que lhes são fixados internacionalmente?
Creio que este tipo de questões, e não pretendo de modo algum ser exaustivo, deveriam merecer a nossa atenção neste debate.
Mas creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que a estratégia que nos é apresentada existe (e tem esse mérito) e além disso, oferece alguns pontos que interessa também pôr em evidência e salientar.
Em primeiro lugar essa é uma estratégia que pretende inverter o círculo vicioso entre a desvalorização, a subida das taxas de juro, a inflação e nova desvalorização. E procura fazê-lo criando condições para reduzir a inflação. Ora, isto passa mais por uma aposta no controle da formação dos preços e dos rendimentos do que pelo controle final dos preços e rendimentos.
Esta é a estratégia que nos é proposta nas Grandes Opções do Plano que temos à nossa frente.
Penso que o que compete a cada um de nós é dizer se está ou não de acordo com ela.
Acentua-se, segundo a linha estratégica, que nos é posta a competitividade externa não artificial, isto é, não garantida exclusivamente por taxas de câmbio, mas por aumentos de produtividade e por um desenvolvimento científico e tecnológico aplicado à produção.
Estamos de acordo com isto ou não?
Acentua-se ainda que a competitividade interna pode ser tão importante como a externa e que há muita coisa a fazer em relação aos mercados nacionais.
Ainda ontem um deputado desta Câmara nos chamava a atenção para a importância, em termos portugueses e em termos europeus, das pequenas e das médias empresas.
Finalmente, estamos a permitir ou não a criação de condições para o desenvolvimento?
São estas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, não só as interrogações que as Grandes Opções do Plano nos colocam, como também a estratégia essencial que cias definem e em relação à qual cumpre a esta Câmara tomar posição.
É por isso que pensamos que o debate das Grandes Opções do Plano também deveria ser diferente. Deveria partir de um diagnóstico incontestável da situação e para isso é absolutamente necessário, é da mais extrema prioridade, que o sistema estatístico nacional seja reformulado, que não tenhamos informações mais ou menos pelo nosso palpite ou pela nossa ideia sobre determinado fenómeno, mas sim que as tenhamos certas e a tempo e a horas.
Esse é um esforço ingente que e necessário desenvolver, sob pena de não dispormos de elementos e de instrumentos necessários para trabalhar.
Em segundo lugar, trata-se da discussão política de uma estratégia cujas alternativas foram equacionadas e quantificadas em termos da discussão operada no Conselho Nacional do Plano - ou que pelo menos deveria ter existido -, mas que este ano ainda o não foi.

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Depois, trata-se de discutir a conformação desta estratégia política-económica com o Orçamento do Estado.
Creio, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que ainda hoje continua a ser válida aquela afirmação de Pierre Massé, que dizia que "hoje o Homem quer-se colectivamente sujeito activo do seu destino". A questão é saber se estamos preparados para escolhas colectivas.
Muitos de nós tivemos uma formação que apenas nos ensinou as escolhas pessoais. Mas numa sociedade como a nossa em que há enormes distorções económicas e sociais, a questão não é apenas de apontar essa desordem e essa injustiça, mas também o apontar de uma ordem que se edifica "debaixo dos nossos olhos", pela escolha de decisões que limitam mais ou menos o campo de evolução.
A ética liberal, distinguia as zonas de "liberdade protegida", ligadas à comunidade, e criticava a desordem e a injustiça. Numa sociedade sem perspectiva e sem plano, é que a liberdade de iniciativa e as regras de mercado - o modelo liberal integral - se articulam com a fatalidade, cujo mecanismo não é compreendido nem dominado.
Ontem mesmo, pela voz do Sr. Presidente da Assembleia da República, tomámos conhecimento directo com a realidade das cheias e das inundações. Aí estão consequências dramáticas da falta de planeamento. Aí estão as consequências dramáticas demonstrando que, quando uma sociedade não sabe prever nem prover o seu futuro, a realidade vem ter com ela - e a realidade nunca é fácil, mas algo que nos chama sempre à responsabilidade pelos nossos erros. A falta de coragem de um tempo, paga-se sempre e com juros, tempo depois. E este é, também, o problema que temos de decidir e de resolver.
O Plano é para nós e para aqueles que pensam como nós, também a renovação da ideia de solidariedade, encarnada de modo compatível com os comportamentos e atitudes da nossa época. É uma forma de aprofundamento da democracia e, em particular, uma fornia de aprofundamento da democracia económica.
Por isso, este debate é importante; por isso, não nos dispensámos de participar nele; por isso, pensamos que, mesmo enquanto não podemos fazer um debate nos termos em que aqui o delineámos e sugerimos, este de 1984 é já importante, na medida em que chama à responsabilidade cada um de nós. Pela nossa parte não nos furtámos a intervir.
E direi, em resumo e conclusão, que tal como delineámos a estratégia do Plano, ou seja, tal como a vimos, pensamos que se trata de uma estratégia correcta e, como tal, merece a nossa aprovação.

Aplausos da ASDI, do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral pede a palavra, suponho que para um pedido de esclarecimento.

O Sr. João Amaral (PCP): - De facto, não é para um pedido de esclarecimento, mas para um protesto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Amaral, como vê quando nos baseamos em suposições e não em realidades, como as da planificação, também cometemos erros.

Risos gerais.

Para um protesto, tem a palavra, o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Magalhães Mota, dirijo-lhe um curtíssimo protesto, pois penso ser esta a forma mais adequada, uma vez que nada tenho a perguntar-lhe.
Ele refere-se ao início da sua intervenção e à parte em que exarou uma espécie de crítica à Assembleia, aflorando a ideia de que haveria uma responsabilidade colectiva, nomeadamente na questão da falta de quórum. É sobre esta questão que, com muita brevidade, me queria pronunciar.
As coisas são o que são e a responsabilidade não é colectiva, mas de cada força política que aqui está. O Sr. Deputado fez mesmo uma referência concreta a isso, dizendo que o debate era importante e que cada um assumia as respectivas responsabilidades, lendo afirmado que pela sua parte assumia as suas.
Ora, quero dizer-lhe que pela nossa parte, também as assumimos, participámos com empenhamento neste debate e assegurámos o quórum permanentemente, pelo que a questão não é, obviamente, de responsabilidade colectiva, mas de cada força política e ê por isso que não posso deixar de exarar este brevíssimo protesto.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Magalhães Mota deseja usar da palavra para que efeito?

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): - Sr. Presidente, creio que não se trata de um contraprotesto porque, na verdade, também não posso considerar como protesto a intervenção do Sr. Deputado João Amaral. Tratou-se mais de uma intervenção para dar explicações à Câmara e para dizer que, da parte da sua bancada, estavam alguns deputados presentes. Creio, porém, que igualmente havia bastantes falhas na vossa bancada e daí ter falado em responsabilidade colectiva. Eu também estava aqui e não renunciei a essa posição.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputados, Srs. Membros do Governo: A proposta de lei do Orçamento do Estado para 1984 pode ser, como é, a efectiva expressão financeira da política económica do Governo. Mas o que não é, certamente, é a expressão financeira do Plano, como o exige a Constituição. Na verdade, tudo o que na proposta de lei das Grandes Opções do Plano ultrapassa a política recessiva, não passa de meras declarações de intenção totalmente desmentidas pelo Orçamento do Estado.
No Orçamento para 1984 apenas existe uma preocupação, erigida a objectivo único do Governo: a redução cega e brutal do défice orçamental assente no agravamento das injustiças fiscal e social, do desemprego, da miséria, da recessão económica.

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O Governo recusa qualquer combate ao esbanjamento de capitais, às transferências ilícitas para o estrangeiro, à fraude e à evasão fiscais; nega-se a cortar as benesses fiscais e financeiras ao capital, lança-se desalmadamente na amputação geral dos rendimentos populares e na redução das dotações para despesas de natureza social, trava drasticamente investimentos absolutamente necessários ao País.
Vejamos o que se passa no campo das receitas. Desde logo, as receitas fiscais do Estado, que no consulado da AD haviam passado de 14 % para 18 % do PIB, aumentarão em 1984, tal como em 1983, para 19 %. E à custa de quem? À custa do agravamento da carga fiscal sobre os trabalhadores e outras camadas populares! Assim, e para além do aumento da receita do imposto de capitais, explicável pelo aumento das taxas de juro, os impostos cujas receitas mais sobem - ou, melhor, os impostos cujas receitas registam aumentos reais - são o profissional, o complementar, as estampilhas fiscais e o imposto de selo. Inversamente, registam-se diminuições reais na contribuição industrial (- 2 %), no imposto sobre sucessões e doações (- 12 %) e nos impostos aduaneiros (- 27,5 %) apesar da diminuição nominal verificada em 1983.
O caso do imposto profissional é bem significativo. O Governo afirma expressamente que em 1984 os salários reais registarão nova e acentuada quebra e que o emprego diminuirá. E, mesmo assim, não tem qualquer pudor em pretender que a receita do imposto profissional aumente 27 %! Mais. Informações adicionais prestadas pelo Governo à Comissão de Economia, Finanças e Plano mostram que o Governo prevê que a receita do imposto profissional aumente a uma taxa quase dupla da taxa de crescimento nominal da massa salarial: em contraste, é inversa a evolução prevista para o imposto sobre lucros. Por outro lado, as acentuadas diminuições reais previstas para as receitas dos impostos aduaneiros e do imposto de transacções, não só desmentem a demagogia do pretenso combate à fraude e evasão fiscais, como confirmam o agravamento da situação actual.
Outro tanto se passa com as despesas orçamentais. Reduzem-se drasticamente as dotações sociais, mais uma vez incidindo fundamentalmente sobre os trabalhadores e outras camadas desfavorecidas do nosso povo. Em termos reais diminuem as verbas para a educação (-16%), saúde (-11 %), segurança e assistência sociais (- 13 %), para os transportes e comunicações (-14 %), para a habitação e equipamentos urbanos (-47 %). As transferências para o Fundo de Abastecimentos, visando o subsídio de bens alimentares essenciais, diminuem 85 %, as destinadas à acção social escolar são reduzidas em um terço, e os subsídios aos transportes públicos são praticamente nulos. Para os trabalhadores da função pública prevê o Governo, na melhor das hipóteses, um aumento da massa salarial de 15 %, enquanto aos pensionistas e reformados é atribuída uma verba inferior à de 1983!

Vozes do PCP: - É um escândalo!

O Orador. - Por outro lado, em nome de uma cega política recessiva, o Governo reduz em mais de 25 % os investimentos do Estado, em áreas de componente importada reduzida e de grande importância, quer do ponto de vista económico, quer na perspectiva da diminuição do desemprego, quer para a melhoria das condições de vida dos portugueses. Os exemplos da Habitação e Equipamento Social, e da Agricultura e Florestas, não sendo únicos, são exemplos gritantes e inaceitáveis desta desastrosa política.
Aliás, Ministros há que ainda não sabem quais os investimentos que prosseguirão em 1984 no âmbito dos seus ministérios. Ainda não lhes chegou a última palavra na escolha concreta dos investimentos que cabe, parece, ao Ministro das Finanças. É um notável avanço em relação a anos anteriores: então, só os deputados não sabiam que investimentos estavam a aprovar quando votavam o Orçamento. Agora, aos deputados, juntam-se os Ministros!

Risos do PCP.

E que razões apresenta o Governo para um tal Orçamento? O Governo diz: é preciso reduzir os défices orçamental e externo e privilegiar o investimento em detrimento do consumo. Puros sofismas! Não está em causa a necessária redução do défice orçamental corrente - pois é este que deve estar em causa e não o défice de capital - e dos défices externos. O que está em causa é a eficácia das políticas escolhidas e os seus efeitos em termos de justiça social e de desenvolvimento económico. Em primeiro lugar a questão é de saber se o défice está inserido num processo de desenvolvimento que permita a sua redução progressiva a médio prazo ou se faz parte de um processo recessivo de que resultará o seu agravamento. O Governo optou, em acordo com o FMI, pela redução brutal do défice global acompanhada da recessão económica. No imediato o Governo pode reduzir o défice à custa dos trabalhadores e outras camadas laboriosas. Mas a prazo, e qualquer que seja o Governo, não 6 possível continuar a aumentar os impostos sobre os que trabalhara, nem continuar a diminuir drasticamente as despesas sociais. Há limites para a miséria. Sr. Ministro das Finanças!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Como a política recessiva reduz, ela própria, a capacidade de o Estado obter novas receitas fiscais, a curto prazo surgirá novo agravamento do défice. É mais um círculo vicioso em que a política de direita vai enredando o país.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Em segundo lugar, há que saber se as receitas fiscais podem aumentar, reduzindo o défice corrente sem que se agravem as injustiças fiscal e social, e sem que se impeça o desenvolvimento. E a verdade é que em Portugal, em 1984, tal é absolutamente possível. Possível e necessário! E para tanto nem sequer é necessário criar novos impostos ou aumentar as taxas actuais. O necessário é criar os instrumentos, e dotá-los dos meios indispensáveis, que permitam a plena eficácia na liquidação e cobrança dos impostos existentes. Isto é, o essencial é, no imediato, combater a fraude e a evasão fiscais, não com declarações gongóricas, mas com acções eficazes.

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - Hoje, só os contribuintes que trabalham por conta de outrem são objecto de tributação rigorosa. A fuga ao fisco aumenta em progressão geométrica, e ultrapassa já, largamente, os 100 milhões de contos anuais. Não há legislação que puna a fraude e a evasão fiscais, não há fiscalização nem tribunais fiscais convenientemente apetrechados nem meios humanos e técnicos. Mesmo mantendo o nível de fuga ao fisco existente em 1982, o imposto de transacções deveria render ao Estado mais de 16 milhões de contos em 1984. A manutenção da actual sobretaxa de importação permitiria arrecadar mais 24 milhões de contos, tal como, e apenas partindo do nível de 1983, a contribuição industrial deveria render mais alguns milhões de contos no próximo ano.
Mas também se impõe acabar com o banquete do grande capital à custa do Orçamento. Em tempos de austeridade não há lugar para banquetes!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Porque se não reduzem substancialmente os benefícios fiscais, que em 1982, e numa primeira aproximação, ultrapassaram os 25 milhões de contos? Porque se não reduzem os chamados incentivos financeiros que, incluindo os concedidos pelo Banco de Portugal e pela Caixa Geral de Depósitos rondam os 30 milhões de contos anuais? Para quando o fim do chorudo negócio das garantias bancárias para efeitos de pedidos de isenção de direitos de importação, que lesa o Estado em milhões de contos por ano?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, é necessário combater o crescimento incomportável da parcela maior das despesas correntes: os juros da dívida pública. O que passa, necessariamente, por uma política de redução das taxas de juro com efeitos benéficos em toda a economia e em todas as formações económicas e não pelo seu aumento como o Governo promete na carta de intenções ao FMI.
Finalmente, Srs. Deputados, o Governo diz que para reduzir o consumo privado e os défices externos é preciso reduzir os salários. Mas a relação entre a massa salarial e o consumo privado baixou de 61,5 % em 1980, para 57,5 % em 1982, e baixará, com a política deste Governo, para 54 % ou menos, em 1984. Isto é, cada vez aumenta mais o consumo privado que não decorre dos salários. Mas a obsessão do Governo são os salários! Não o preocupa os consumos desnecessários provenientes do desperdício de recursos, das meras aplicações financeiras e da especulação. O Governo recusa-se a tomar medidas eficazes contra a fuga de capitais, contra as aplicações crescentes em metais preciosos e em moeda estrangeira - que, aliás, o Governo se propõe incentivar nas grandes opções do Plano - contra as aplicações especulativas que descapitalizam as empresas em benefício pessoal dos capitalistas, que aumentam os custos de produção, que se opõem ao investimento produtivo que defraudam o fisco e o país. Em nome da liberdade de empresa o Governo protege o grande capital, protege as fugas de capitais, a fraude fiscal e a acumulação financeira. Em nome da austeridade promove o aumento da exploração dos trabalhadores, a degradação do seu nível de
vida, a falência de milhares de pequenas e médias empresas e o atraso económico do País.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Os sofismas não conseguem ocultar a realidade da política e do Orçamento do Estado para 1984. Ao grande capital o Governo oferece mais lucros, subsídios e isenções, menos impostos, nenhum combate à fraude e à corrupção, muitos milhões de contos de indemnizações. Às pequenas e médias empresas o Governo reserva a redução da actividade económica e o aumento das falências. Aos trabalhadores, às camadas laboriosas, o Governo ataca-os com o aumento dos preços, do desemprego e dos impostos, com a diminuição dos salários reais e das prestações sociais. É esta a grande opção do Governo. Nós recusámo-la.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Almerindo. Marques deseja usar da palavra, para que efeito?

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Para um breve pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Octávio Teixeira, é fácil fazer um discurso criticando o Orçamento ou as Grandes Opções do Plano, neste caso. num momento de conjuntura como aquele que se vive. Francamente, não é nada difícil! Pelo contrário, é bem fácil e o Sr. Deputado fez algumas considerações que se entendem, só que escusaria de ocultar duas ou três questões a que agora gostaria que me respondesse.
As questões são só estas: qual é, de facto, a evolução dos aumentos das receitas desde o ano de 1983, para o Orçamento de 1984? O que é que isso representa em relação ao produto interno e qual é a evolução que se verifica? Por último, em relação às considerações que fez sobre as drásticas reduções de investimento - que não comentou se são feitas ou não com o cuidado devido, nomeadamente para lhe diminuir os efeitos em termos do desenvolvimento do País - diga só qual é a percentagem, em termos de despesa interna, que representa o número inscrito e compare-o, seguidamente, com outros valores doutros países! Dir-lhe-ei que é um número razoável, e não fora a circunstância grave do nosso estádio de desenvolvimento estaríamos com uma percentagem que não nos envergonharia.
Antes de terminar, só mais uma nota para perguntar ao Sr. Deputado Octávio Teixeira se todas as considerações que fez acerca das consequências de um orçamento de austeridade têm em conta um projecto global, completo e coerente da parte do Partido Comunista, que tenha em conta a conjuntura em que o País vive e que, simultaneamente, atenue os efeitos que acabou de expor.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Octávio Teixeira deseja responder?

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O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Antes porém, gostaria de esclarecer o Sr. Deputado Octávio Teixeira que não está mais ninguém inscrito para usar da palavra, relativamente à intervenção que produziu.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Responderei, então, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Almerindo Marques, com bastante gosto.
Queria dizer-lhe, desde já, que não escondi nada, não ocultei nada! Referi alguns números globais, pois estamos a discutir grandes opções e tentei analisar a grande opção inserta neste Orçamento. O Sr. Deputado põe-me a questão de saber qual é a evolução das receitas. Eu disse-lhe, Sr. Deputado, e expressei o número exacto: as receitas do Estado em relação ao produto interno passam de 18 % para 19 %. Mas acrescentei: aumenta a carga fiscal sobre quem? É que, enquanto reduzem os impostos que incidem sobre o capital - contribuição industrial, direitos aduaneiros, fundamentalmente estes dois - aumenta a carga fiscal sobre os trabalhadores. Isto é, se em relação ao PIB temos a passagem das receitas de 18 % para 19 %, a incidência que esse aumento tem sobre os trabalhadores, em termos do seu crescimento, é muito maior. Essa é que é a questão que se põe em termos de opção.
O segundo problema que colocou relaciona-se, segundo creio, com a questão das despesas. Sinceramente, Sr. Deputado, não percebi bem a questão que me pôs. No entanto, julgo que considera que as despesas globais do Orçamento em relação ao PIB se comparam com as de outros países. Se foi essa a sua intenção gostaria de dizer-lhe que, realmente, é capaz de não andar longe da verdade. Só que se esquece que mais de um terço dessas despesas são encargos com a dívida pública!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É isso que é preciso não ocultar, Sr. Deputado! É isso que é precisar atirar cá para fora! As despesas que servem para prestações sociais e para investimento, essas são muito inferiores àquilo que poderiam e deveriam ser!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sobre a questão de este se tratar de um Orçamento de austeridade, é evidente que não está nem nunca esteve em causa, pela nossa parte, a apresentação de um orçamento que, na situação actual, não fosse de austeridade e de rigor. O que está em causa é saber: austeridade para quem? Austeridade para todos, ou apenas, como aparece no Orçamento, para os trabalhadores?

Aplausos do PCP.

É isso que não aceitamos! Não aceitamos, pois, o agravamento da injustiça! A austeridade tem de ser, fundamentalmente, para aqueles que mais têm, para aqueles que esbanjam! E aí o Governo não vai e aí, pelos vistos, a bancada do Partido Socialista também não quer ir.
Sobre as nossas propostas alternativas, e para além daquilo que temos referido várias vezes, o Sr. Deputado não pretenderá que em 3 minutos de uma resposta a um pedido de esclarecimento lhe relembre todas as nossas propostas concretas. Na questão do Orçamento referimos algumas sobre a questão orçamental a curto prazo, onde pode ir buscar receitas substanciais. Sobre questões globais, para não ir muito atrás, remeto-o para os debates por ocasião da interpelação que fizemos ao Governo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Almerindo Marques pediu a palavra?

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Não, Sr. Presidente.

Risos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação.

O Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação (Soares Costa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nesta minha intervenção irei abordar, fundamentalmente, as Grandes Opções do Plano para o sector da Agricultura com menção apenas de passagem a alguns aspectos do Orçamento, já que outros pontos relevantes do mesmo Orçamento serão apresentados a esta Assembleia da República num dos próximo dias pelo Sr. Secretário de Estado da Agricultura.
O Sr. Ministro das Finanças e do Plano apresentou, na sessão de ontem, o quadro de referências que presidiu à elaboração das Grandes Opções do Plano e do Orçamento, tendo acentuado a necessidade de proceder à redução do défice da balança de transacções correntes, à redução do défice do Orçamento e, também, à necessidade de evitar as alternâncias de arranque e de paragem da economia portuguesa. Mas também não deixou de referir que o Governo não deixa de ter em mente, mesmo em 1984, a realização de algo do que for possível, na perspectiva do Orçamento em que temos de viver, e de proceder a acções de desenvolvimento e de preparação do relançamento da economia do país.
É conhecido que, normalmente, não há países ricos sem agricultura rica. Mas todos sabemos que não é esse, infelizmente, o quadro em que temos de nos mover.
Gostaria de fazer, perante esta Câmara e sobre esta matéria, duas reflexões.
Em primeiro lugar diria que, ao reconhecimento generalizado do papel do sector agrícola e agro-alimentar no desenvolvimento global e, de modo mais directo, na redução dos desequilíbrios que afectam a economia portuguesa, não correspondeu, no passado, uma atribuição efectiva das prioridades e dos recursos indispensáveis à sua dinamização. Disso está, naturalmente, consciente o Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação e, por isso, não serei eu a deixar por mãos e consciências alheias o natural anseio de ver ampliados esses recursos. Só que as Grandes Opções do Plano para 1984 e o Orçamento, com o qual ne-

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cessariamente tem de se compatibilizar, tiveram de ser elaborados no quadro de referências que apontei anteriormente e que é de uma feição global restritiva, para que seja possível gerir, no seu conjunto, a economia em período de crise e de estabilização financeira, como aquele em que vivemos.
O investimento no sector é necessário, naturalmente, em capital, mas é também igualmente necessário em formação e apoio técnico. E esse investimento tem-se mantido a níveis insuficientes para alterar o quadro de ineficiência relativa e de fracos rendimentos que caracterizam uma agricultura frágil como é a nossa.
É um facto conhecido, com o qual temos vivido, e para o qual temos de apontar as soluções adequadas para a respectiva alteração. Até agora tem-se assistido a algumas acções dispersas e a medidas sem continuidade que não constituem no todo uma política de desenvolvimento agrícola e que têm, de facto, reduzido ou limitado os efeitos e o impacto esperado de alguns esforços de desenvolvimento que foram efectuados.
A segunda reflexão que queria fazer, diz respeito a uma matéria que considero importante, para que no futuro possamos perspectivar o desenvolvimento da agricultura na implicação que nisso pode ter a política orçamental do Governo. Com isto quero significar que é difícil no caso da agricultura, mais do que em qualquer outro sector, trabalhar com planos anuais. Seria desejável e preferível trabalhar com orçamentos programas de tipo plurianual. Mas o Plano para 1984 não pode ainda orientar-se por esta perspectiva e teve, acima de tudo, que orientar-se em função de um objectivo principal, já fixado no Programa do Governo, que é o do aumento da produção agrícola, prosseguindo-se também algumas das acções adequadas para melhorar a eficiência global do .sector e realizar os ganhos de produtividade que estiverem ao alcance. Ao mesmo tempo, poderão prosseguir ou ser lançados os trabalhos preparatórios de modernização e reconversão que o sector exige, em harmonia, aliás, com os anunciados programas de recuperação financeira e económica e de modernização da economia portuguesa.
Na estratégia que iremos adoptar serão privilegiados os seguintes princípios de actuação.
Em primeiro lugar, criar condições para uma maior mobilidade interna dos meios materiais e humanos disponíveis e facilitar a sua reafectação de acordo com ar. prioridades estabelecidas no planeamento sectorial. No domínio dos meios materiais, procedeu-se no Orçamento, já este ano, a uma tentativa nesse sentido, procurando afectar uma maior percentagem dos recursos aos serviços periféricos do que aos serviços centrais, em comparação com o que aconteceu no Orçamento do ano anterior. Também no que diz respeito ao problema da mobilidade interna dos meios humanos, está o Ministério a trabalhar no levantamento, aliás praticamente concluído, da situação exacta do seu pessoal e da forma de encarar os estrangulamentos que existem à sua mobilidade para, de algum modo, corresponder à necessidade de afectar esse pessoal às necessidades de actuação periférica.
Em segundo lugar, trata-se de concentrar esforços no acompanhamento dos principais projectos ou programas do Ministério, de preferência naqueles que obrigam a uma acção conjugada dos diversos serviços, de forma concertada com o planeamento e com as linhas gerais de programação estabelecidas.
Em terceiro lugar, introduzir os dispositivos de gestão que melhorem a eficiência dos programas e projectos de desenvolvimento e ajudem o processo de tomada de decisão a nível regional e a nível central. Aí. é importante a informatização progressiva dos serviços e é importante a instalação em curso, com a respectiva institucionalização, de um serviço de informações e mercados agrícolas, assim como da rede de contabilidades agrícolas.
Em quarto lugar, trata-se de promover o diálogo permanente dos serviços com as associações profissionais e, em geral, com os agentes económicos com influência directa ou indirecta no sector agrícola e agro-alimentar.
Em quinto lugar, melhorar a circulação da informação entre os departamentos oficiais e, sobretudo, rentabilizar os conhecimentos técnicos adquiridos através da sua divulgação junto dos agentes produtivos, tendo aí o aperfeiçoamento do serviço de extensão agrária um papel fundamental.
Finalmente, proceder à adequação das estruturas e dos objectivos dos mercados agrícolas às regras decorrentes do processo de adesão às Comunidades Europeias.
Indicarei, seguidamente, alguns dos domínios concretos onde se justifica atenção maior e onde se poderão aplicar, com maior ou menor intensidade, os princípios acima enunciados e dir-me-ão que, naturalmente, consubstanciam as Grandes Opções do Plano para 1984 no sector agrícola.
É conhecido que se podem alcançar, mesmo a curto prazo, progressos sensíveis na produção e produtividade, através da introdução de tecnologias comprovadas e adaptadas às condições reais de produção, desde que, para tal, se assegure um aumento de receptividade à inovação e à capacidade técnica dos agricultores. É por esta razão que a extensão rural e a Formação profissional se impõem como o primeiro domínio fundamental de actuação. Nesse sentido, prevemos intensificar o aproveitamento das estruturas periféricas do Ministério e a aplicação de processos mais ajustados de penetração no meio rural. Cabe aqui reiterar a importância dos esforços a desenvolver no âmbito do fortalecimento das organizações produtivas da lavoura, aliadas a uma acção de promoção de empresas familiares, técnica e economicamente viáveis. Da estratégia a adoptar é ainda de referir a importância atribuída aos jovens agricultores e aos elementos mais dinâmicos do tecido social agrícola, por serem precisamente eles que poderão rentabilizar os investimentos feitos na formação.
O segundo domínio que constitui grande opção do Plano para o Ministério é o do desenvolvimento e aproveitamento racional dos nossos regadios, o qual representa um conjunto de actividades ricas e diversificadas, com boa capacidade de resposta a estímulos apropriados e de considerável efeito multiplicador sobre os diversos pontos de vista, relativamente às diferentes cadeias do domínio agro-alimentar a que estão associados às várias produções.
Ressalto a produção de cercais, nomeadamente do milho, das oleaginosas, das forragens, da pecuária, das hortícolas e de outras culturas industriais.
É, por isso, que deverão prosseguir as pequenas obras de hidráulica agrícola bem como as grandes obras em curso de interesse reconhecido, no sentido de se tirar pleno partido dos investimentos hidro-agrícolas já

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efectuados e de se explorarem as enormes possibilidades decorrentes do melhor uso da água. Esta é outra matéria extremamente relevante, isto é, a utilização com eficiência da água de que dispomos.
A este propósito, referirei que estão incluídos no Plano, nomeadamente no PIDDAC, a continuação das obras de regadio do Mondego, da Cova da Beira e de Trás-os-Montes, as quais estão dotadas de meios, aliás em consonância com o estabelecido no respectivo cronograma de realização.
É assim para o caso do Mondego - e só me refiro, evidentemente, àquilo que diz respeito ao Ministério da Agricultura, omitindo por isso o que diz respeito ao Ministério do Equipamento Social - que está dotado para o ano de 1984 com cerca de 368 000 contos, para a Cova da Beira dotada com cerca de 355 000 contos, para Trás-os-Montes dotados com cerca de 125 000 contos, havendo ainda uma dotação de 59 000 contos para Macedo de Cavaleiros para os regadios tradicionais.
Para além disso, estão inscritos no Orçamento para o IGEF verbas consideráveis com o objectivo da sua aplicação no emparcelamento destes perímetros de rega e de outras acções decorrentes da necessária estruturação fundiária.
A actividade agro-industrial, particularmente a que se processa por estruturas cooperativas, será também objecto de especial atenção em áreas de significativo impacto sobre a agricultura e onde as vantagens comparativas, em termos internacionais, realmente existam.
O incremento do abastecimento às indústrias de transformação do sector agro-alimentar obrigará ao desenvolvimento e aperfeiçoamento das técnicas de produção com a garantia contratual do escoamento dessa mesma produção. É desnecessário acentuar perante esta Câmara, a importância que o sector das agro-indústrias já hoje assume na nossa componente de exportação da balança comercial agrícola. Com efeito, o ano de 1982 revela que as agro-indústrias contribuíram com cerca de 36 milhões de contos para a exportação, com cerca de 18 % do valor da produção da indústria transformadora e que são responsáveis por cerca de 13 % do emprego. Acrescento, ainda, um aspecto curioso e extremamente aliciante, que é o de este sector ser um sector líder dentro das indústrias transformadoras no que se refere ao valor acrescentado que, como os Srs. Deputados provavelmente saberão, é de cerca de 14 %.
É evidente que a dinamização do sector agrícola e agro-alimentar exige acções, tais como as de formação e de vulgarização a que atrás me referi, para que os seus efeitos sejam efectivos e duradouros. Porém, estas acções deverão ser acompanhadas de reformas estruturais cuja realização exceda, obviamente, o horizonte anual, mas que não deverão deixar de ser consideradas em 1984. É assim que no caso dos trabalhos de reestruturação fundiária, deverão continuar a ser beneficiadas em primeiro lugar, as zonas de implantação dos principais programas, como acontece no âmbito de alguns projectos hidro-agrícolas e dos projectos de desenvolvimento rural integrado. É também o caso da criação ou reforço das condições de captação e de acolhimento de novas iniciativas, de acordo com uma política de rejuvenescimento da população activa agrícola, já que temos de procurar fixar na agricultura a nossa juventude rural.
Mas a política relativa ao sector agro-alimentar exige uma profunda alteração da malha do tecido comercial, que até aqui tem estado limitado com circuitos e agentes rígidos - direi mesmo anti-económicos - com infra-estruturas deficientes, baseadas em economias artificiais, sustentadas por subsídios e por uma ampla panóplia de controle administrativo dos preços e das margens de comercialização e industrialização.
A gradual transformação da estrutura institucional do sistema, atingindo as causas profundas do tradicional e crónico atavismo da nossa agricultura, permitirá criar condições de estímulo à produção e atingir os objectivos a que atrás me referi, ou seja, o aumento da produção nacional e a melhoria do índice de cobertura da balança de transacções correntes.
Finalmente, a promoção de uma política florestal de uso múltiplo é outra das prioridades do Governo e, portanto, uma das Grandes Opções do Plano. A valorização dos nossos espaços silvestres e dos seus patrimónios vivos será promovida através de instrumentos que permitam organizar a produção e a protecção das matas, fomentando e ordenando a silvo-pastorícia, os recursos energéticos, aquícolas e apícolas, aproveitando devidamente os factores básicos da vida que são a energia, a água e o solo, hoje desperdiçados em áreas imensas. E tudo isto será conseguido através do lançamento do programa de florestação que consta do Programa do Governo e que tem sido anunciado ao País.
Efectivamente, trata-se de um sector que, sem entrar em competição com a produção dos alimentos, representa, de facto, uma riqueza considerável, dispondo de mercado assegurado para os seus produtos. Ao mesmo tempo, a concretização desta política florestal constituirá componente indispensável para o ordenamento agrário do país, para a preservação dos recursos naturais e para a protecção ecológica.
Assim, conciliando as dificuldades do presente com o horizonte do médio e do longo prazo, o sentido de acção do Ministério é o de concretizar a urgência, estimular e remunerar devidamente a actividade empresarial do agricultor, como única via para o aumento da produção e a melhoria das condições do abastecimento interno.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Durante o ano de 1984, o desenvolvimento e execução dos programas enunciados, a alteração das condições de comércio, o aumento da transparência das operações, o estabelecimento de preços institucionais remuradores e o progressivo alinhamento do equilíbrio do mercado em favor da produção, concretizar-se-ão através da rotura deste ciclo vicioso e da abertura de condições de produção e de progresso.
A acção ao nível do abastecimento e dos preços é, pois, o eixo de uma política que contempla o lançamento de uma série de programas que vão desde o programa florestal de uso múltiplo à extensão rural, à formação profissional. Nestes casos, os serviços do Ministério actuarão, acima de tudo, como agentes efectivos de superação social do homem do campo. Assim, vão apoiar uma agricultura associada, o desenvolvimento da agro-indústria dentro dos limites do possível e, sobretudo, apoiarão uma agro-indústria de base contratual com a produção. Vão, também, apoiar os pró-

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gramas de melhoramento e desenvolvimento da hidráulica agrícola e de aproveitamento dos recursos hídricos. Vão, finalmente, dar apoio aos programas verticais que incidirão sobre as estruturas produtivas fundamentais na nossa produção e actividade agrícola, como são, por exemplo, os programas verticais para a vitivinicultura, para a produção leiteira, para os cereais, para a batata e para a olivicultura.
Para concluir, quereria fazer uma menção especial aos programas de desenvolvimento rural integrados, modelo a que tive oportunidade de me referir nesta Assembleia e que este Governo privilegia. Isto mesmo se verifica já com o programa de desenvolvimento rural integrado de Trás-os-Montes, que está dotado para o ano de 1984 com mais de meio milhão de contos.
Mas, para além disso, o Ministério tem de preparar também o futuro e o arranque de outros programas. Aí, há trabalho a realizar e refiro, por exemplo, o trabalho que neste momento está em marcha relativamente ao vale do Lima e ao vale do Vouga.
Também quero fazer uma breve referência aos programas e projectos incluídos no Orçamento e que têm componentes de ajuda de pré-adesão. São vários e estão neste momento já em situação de execução, como acontece com o projecto RICCA, já em situação de execução de financiamento. Vai também arrancar com a institucionalização a que me referi, o projecto SIMA, ou seja, o Serviço de Informações e Mercados Agrícolas.
Mas, para além disto, há todo um conjunto de projectos em estado mais ou menos avançado, sobretudo projectos de aprovação pela parte das Comunidades Económicas Europeias, que têm a ver com programas de apoio à produção animal, à horticultura e à citricultura no Algarve e noutras regiões do País, e também cora programas de reestruturação da produção leiteira, nomeadamente na zona de Entre Douro e Minho, na Beira Litoral, etc.
Finalmente, quero fazer uma referência também aos programas de transformação estrutural, alguns dos quais estão já era curso.
Alguns desses programas irão ter consubstanciação no ano de 1984 e eles são a base da instalação do nosso sistema de extensão rural. Mencioná-los-ei apenas de passagem: O projecto florestal em curso, o programa Procalfer e o programa do aproveitamento hidráulico do nordeste transmontano com algumas componentes, nomeadamente a instalação do serviço de vulgarização no perímetro de Macedo de Cavaleiros e o aumento da área regada dos pequenos regadios e respectiva beneficiação na região do nordeste transmontano.
Finalmente, o quarto programa a que me referi, o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Agrário Regional - o programa PADAR - que é, efectivamente, um programa estruturante e no qual o Ministério deposita grandes esperanças para, através do seu contributo, incrementar o desenvolvimento regional da agricultura portuguesa numa perspectiva integrada, numa perspectiva apoiada sobretudo pelo vector da extensão rural.
Julgo ter dado a esta Assembleia, em matéria de agricultura, aquilo que mais relevante poderia entender-se como explicação das Grandes Opções do Plano para o ano de 1984.
Dir-me-ão os Srs. Deputados que outras opções, talvez mais diversificadas, se poderiam ter tomado.
Serei o primeiro a reconhecê-lo. Com efeito, como Ministro da Agricultura gostaria de poder encarar e desenvolver mais opções. Mas o quadro de referência que tracei no início desta minha intervenção, não permitia que pudéssemos ter uma ambição maior ou sermos mais ousados. Mais vale realizar consistentemente, nesta matéria, aquilo que é possível, que ambicionar realizar muito e ficarmos pelo caminho.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, vários Srs. Deputados.
Há, ainda, mais alguns Srs. Deputados que desejem inscrever-se para pedidos de esclarecimentos?

Pausa.

Vou, então, ler o nome dos Srs. Deputados inscritos, para que no caso de ter havido omissões estas se rectificarem, advertindo que depois desta leitura serei absolutamente rígido quanto às inscrições relativas a pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da Agricultura.
Estão inscritos para pedidos de esclarecimentos, os Srs. Deputados Leonel Fadigas, do PS, Rogério de Brito, do PCP, Soares Cruz, do CDS, Margarida Tengarrinha, do PCP, António Taborda, do MDP/CDE, Custódio Gingão, do PCP, Lopes Cardoso, da UEDS, João Abrantes, do PCP, António Gonzalez, independente do Partido "Os Verdes", Azevedo Soares, do CDS, José Vitorino, do PSD, Eurico Correia, do PS, Álvaro Brasileiro, do PCP, e o Sr. Deputado Gaspar Pacheco, do PSD.
Srs. Deputados, enunciei o nome de todos os Srs. Deputados inscritos?
Mais algum Sr. Deputado deseja inscrever-se?

Pausa.

Concluo do silêncio da Câmara que a Mesa não cometeu qualquer omissão nem há mais pedidos de inscrição.
Assim, e nos termos regimentais, estão encerradas as inscrições para interpelar o Sr. Ministro da Agricultura.
Tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Ministros: O Sr. Ministro da Agricultura disse que não há países ricos sem uma agricultura rica. Eu diria que não pode haver um ministério rico com uma agricultura pobre.
Isto tem a ver com duas questões que gostaria de colocar ao Sr. Ministro da Agricultura, para além de aproveitar a oportunidade de fazer aqui um alerta ao Governo e, nomeadamente, ao Ministério da Agricultura. Este alerta diz respeito à gestão das suas próprias verbas e, especialmente, no que concerne ao que tem sido a prática - que todos nós conhecemos - quanto a ajudas de custos, utilização de viaturas do Estado em fins-de-semana e noutros períodos em que se justifica muito pouco a utilização das viaturas dos serviços da agricultura, especialmente em praias. Esta é uma questão que quero colocar, porque me parece que, tendo nós meios muito reduzidos - e não estamos a pôr aqui em causa nem o Plano nem o Orçamento do Mi-

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nistério que merecem o nosso apoio -, nos compete fazer uma chamada de atenção e dizer que a austeridade deve começar por nós e, neste caso concreto, pelo Ministério da Agricultura.
Depois desta pequena introdução, coloco ao Sr. Ministro duas questões, de certo modo relacionadas com o que acabo de referir.
Uma tem a ver com a investigação e a sua relação com a extensão rural. É que me pareceu poder deduzir das palavras do Sr. Ministro que, a partir daqui, vamos assistir a uma maior articulação entre a investigação e a extensão rural, em vez de continuarmos, como tem acontecido até agora, a assistir a uma investigação que envolve meios muito vultuosos e que, na maior parte dos casos, apenas interessa a quem a faz. Isto acontece porque na agricultura se faz a investigação desligada dos agricultores, dos problemas concretos e apenas com o objectivo de aumentar as páginas dos currículo de alguns investigadores e de algumas instituições que existem à margem de todo um processo que nós queremos e desejamos transformar.
Pareceu-me ver nas palavras do Sr. Ministro essa indicação. Gostaria de saber se é ou não verdadeira a ilação que tirei delas.
Gostaria também de saber se as leis orgânicas dos serviços do MAFA e a própria lei orgânica do MAFA irão reflectir, na sua estrutura e na definição das respectivas linhas de trabalho, estas mesmas preocupações.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, deseja responder imediatamente ou prefere responder no fim dos pedidos de esclarecimento?

O Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação: - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito.

O Sr. Rogério de Brito (PCP): - Sr. Ministro eu diria que fez um esforço - o que é louvável - de tentar defender algo que é indefensável, ou seja, este Orçamento para a agricultura.
V. Ex.ª disse bastantes coisas. Contudo, o que disse não passou de uma série de enunciados que sucessivos governos, uns após outros, têm de algum modo repetido, com esta ou aquela frase diferente mas sempre com a mesma perspectiva.
Sr. Ministro, de palavras está o mundo cheio. Os actos são mais complicados.
O Sr. Ministro reconheceu que o investimento para a agricultura tem sido insuficiente. É bom que o tenha reconhecido. Contudo, é curioso que o investimento previsto neste Orçamento do Estado e no que se refere ao investimento do Plano, se reduz em relação a 1983 em 1 milhão e tal de contos. Ora, se o investimento era insuficiente mais insuficiente passou a ser.
Falou-se no aumento da produção e em ganhos de produtividade. Aí está uma pretensão louvável. Resta saber como é que, com os meios disponíveis, isso se conseguirá. Refiro-me, por exemplo, à extensão rural - que é um factor importante -, quando se verifica que a dotação orçamental para esta área é extremamente diminuta.
Pergunto se ela dará, ao menos, para pôr a funcionar capazmente 7 ou 8 núcleos de extensionistas.
Quanto à questão do desenvolvimento das produções, foi agradável ouvir o Sr. Ministro referenciar como prioritárias as produções de cereais, de oleaginosas, de milho e de forragens.
Afinal, Sr. Ministro, isso significa que, mesmo numa economia aberta como aquela era que pretendemos inserir-nos, sempre são importantes as tais culturas estratégicas com as quais podemos diminuir o nosso grau de dependência externa!
Neste aspecto, fiquei com a sensação de que o Sr. Ministro evoluiu quanto ao critério que anteriormente aqui manifestou. De facto, V. Ex.ª disse então que isso não era, propriamente, importante.
Finalmente, ainda gostaria de abordar um outro aspecto que me parece ser suficientemente explícito quanto ao realismo e à objectividade com que o Sr. Ministro abordou algumas questões. Refiro-me à política florestal e de uso múltiplo.
Em primeiro lugar, pergunto-lhe, Sr. Ministro: será que é o financiamento do Banco Mundial no programa de florestação que vai possibilitar a utilização múltipla da floresta?
Tudo indica que não, tanto mais que é a própria experiência que o demonstra.
Por outro lado, falou-se, por exemplo, na florestação no Algarve e em dar-se para isso uma dotação de 15000 contos. Gostaria de saber se este quantitativo daria, ao menos, para adquirir as máquinas necessárias a tal florestação, quanto mais para florestar as áreas referidas.
É importante também referir que o orçamento ordinário para as florestas, agora apresentado a esta Câmara, é idêntico ao apresentado no orçamento de 1983. Portanto, há aqui uma evidente retracção.
Por outro lado, verifica-se que foram anulados os três principais programas referentes a esta matéria, dois dos quais eram fundamentais à intervenção nas matas do sector público.
Constata-se, ainda, que a ex-Direcção-Geral do Ordenamento Florestal ficou reduzida a cerca de 10 % da verba libertada, sendo esta já a fixada com um plafond idêntico ao do PIDDAC de 1983, havendo ainda a considerar que o principal programa - o tal do Banco Mundial -, também fica reduzido a cerca de 60 % da verba proposta, apesar de esta ser consignada em lei no Diário da República.
Tudo isto dá ideia do rigor com que estas questões são abordadas.
Finalmente, colocou-se o problema dos mercados agrícolas e da adesão à CEE. Não vou pronunciar-me muito aprofundadamente sobre esta questão pois o tempo não mo permite. Diria apenas que ficou por esclarecer qual a política que, no fim de contas, o Ministro e o Ministério da Agricultura pretendem aplicar para corrigir todas as distorções dos circuitos comerciais, responsáveis - esses sim - pelos graves problemas que se colocam, quer ao nível dos preços à produção, quer ao nível dos preços ao consumo.
Para terminar, diria apenas que nesta situação, para lá da preocupação quanto a uma eventual adesão à CEE, fica também uma outra grande preocupação: é que dá a sensação de que este governo pretende teimar na entrada para a CEE e é nosso receio que, a verificar-se a nossa entrada na CEE - cremos bem

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que tal não acontecerá -, ela se fará certamente "a cavalo do burrinho e de enxada às costas", o que me parece ser extremamente negativo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, também para um pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, não fora a longa extensão da sua intervenção e quase me apetecia pedir-lhe que fizesse nova leitura dela. É que tive uma tremenda dificuldade em aperceber-me de algo de concreto na exposição que acabou de proferir.
Quando abordou as generalidades, referiu que só em 1984, e se possível, poderíamos cuidar de lançar algum programa voltado para a produção e para o investimento.
Custa-me conciliar isso com a afirmação que o Governo proferiu de que o sector agrícola era prioritário em termos de desenvolvimento económico.
Como e possível pensar em desenvolver uma economia sem investir num sector considerado prioritário?
Depois, e ainda nas generalidades, teceu algumas críticas, ainda que veladas e de uma forma educada, como V. Ex.ª é capaz de fazer. Mas não deixou de tecer essas críticas. Não deixou de considerar que, até aqui, pouco ou nada se tem feito, para além de algumas medidas dispersas.
V. Ex.ª considera medidas dispersas o lançamento para discussão pública, para discussão nacional, do plano de mudança para a agricultura - ele próprio carregado de erros, como todos sabem? Mas este documento não será aproveitável em alguns dos seus aspectos? Não será um bom documento de trabalho, no qual V. Ex.ª, sem qualquer pejo, possa pegar e lançar, a partir dele, as grandes medidas para a agricultura futura?
A seguir, quando V. Ex.ª tentou abordar os aspectos concretos, tive a esperança de que, para além daqueles cinco objectivos focados nas Grandes Opções do Plano, pudesse vir a falar nalguns outros considerados bem mais importantes, não só pelas bancadas do CDS mas por todas as bancadas deste Plenário.
Mas não se ouviu uma única palavra em relação à reestruturação fundiária, quer no que diz respeito à zona do minifúndio, quer à zona do latifúndio.
Como é que V. Ex.ª admite desenvolver a agricultura, criar confiança no investidor sem que, minimamente, lhe garanta a posse da terra?
Por outro lado, o Sr. Ministro referiu alguns aspectos que têm a ver com o desenvolvimento da extensão rural.
Acredita que, com o orçamento de que dispõe, seja possível fazer alguma obra no domínio da extensão rural?
Sabemos que os técnicos e os seus auxiliares se concentram e amontoam, não só nos serviços centrais, como também nas direcções regionais, sem que tenham, sequer, hipótese - podem ter vontade, mas não tem qualquer hipótese - de fazer trabalho de campo, pois não há verbas para o pagamento de ajudas de custo, não há dinheiro para os combustíveis e, muitas vezes, nem sequer existem viaturas para as deslocações.
Por outro lado, e articulando com a extensão rural, o Sr. Ministro falou-nos em formação técnica. Será possível pensar em formação técnica sem que se faça uma íntima articulação com o Ministério da Educação, sem que de alguma forma se consiga fazer substituir a falta dos regentes agrícolas, extintos do quadro técnico do Ministério da Agricultura pela extinção das respectivas escolas?
Será possível pensar em extensão agrária sem implementar de uma forma muito vigorosa a instalação dos jovens agricultores, que está prevista "no papel", más a que muito poucos têm recorrido pelas tremendíssimas dificuldades que o processo determina?
Há muitos outros aspectos que gostaria de referir agora. Terei, com certeza, oportunidade de me debruçar sobre eles na intervenção que pretendo proferir dentro de momentos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Dirijo-me ao Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação para abordar algumas questões já citadas pelo Sr. Ministro.
O Sr. Ministro fala no melhor uso da água e na utilização com maior eficiência dos recursos hídricos, em termos que nós subscreveríamos se a realidade não os desmentissem. O Sr. Ministro sabe melhor do que nós que a Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Agrícolas cortou verbas essenciais para projectos hidro-agrícolas prioritários, como sejam os do Vale do Tejo, do Alqueva, das obras incluídas no Plano de Rega do Alentejo, como a barragem de Monte Novo e o aproveitamento hidráulico da Vergia, não se dando, ainda, cobertura ao aproveitamento das bacias hídricas do Algarve, cujo avanço imediato é promessa recente do Ministro Rosado Correia, tendo também, recentemente, o Sr. Ministro das Finanças "chumbado" o Plano Nacional de Água que constava do Programa do Governo.
Assim, os pontos de vista do Sr. Ministro sobre uma gestão correcta dos recursos hídricos, são desmentidos pelos números, pela realidade. Ficam verbas para algumas pequenas barragens na serra, o que até é correcto, já que se tratam de pequenas barragens onde não existem os recursos hídricos de superfície. Queria, no entanto, deixar aqui expresso o nosso ponto de vista de que não haverá correcta gestão dos recursos hídricos, enquanto não se fizer uma gestão planificada e integrada de recursos hídricos subterrâneos e de superfície.
Sr. Ministro, choveu muito nestes dias, mas podemos dizer que a maior parte da água se perdeu, literalmente, no mar. Enquanto não houver regularização das linhas de água, enquanto não houver uma política para aproveitamento da água existente, a agricultura, Sr. Ministro, não pode desenvolver-se e isto e uma realidade que escuso de desenvolver.
Criticamos, por isso, o facto de não terem sido geridos os recursos materiais para que uma gestão correcta dos recursos hídricos se possa fazer o mais depressa possível.
Dentro de 2 anos, os recursos hídricos subterrâneos do Algarve, ao limite do litoral, estarão esgotados.

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Este é, por exemplo, um problema que nos interessa como deputados do Algarve. Ora, não se tomam medidas a tempo, são "chumbados" planos que poderiam resolver alguma coisa nesse campo, e daqui a pouco a própria agricultura do litoral algarvio sofrerá o que sofre a agricultura de algumas zonas do Norte de África que se tornou impossível de praticar devido à salinização dos terrenos.
Disse também o Sr. Ministro que se proeurou afectar maiores verbas aos serviços periféricos do que aos serviços centrais. Pergunto-lhe, então, por que razão só 24 % dos 7,2 milhões de contos destinados ao MAFA se referem a serviços regionais e a direcções regionais, quando o Gabinete do Sr. Ministro dispõe de 511 000 contos.
Falou ainda do programa RICCA. Independentemente dos critérios diferentes que possamos ter, quanto ao desenvolvimento da rede de contabilidades agrícolas - e parece que em Portugal anda por cerca de 1000 o número de empresas contabilizadas - o orçamento que em 1980 era de 1510 contos, passou para 250 contos em 1982 ao nível da Estação Agronómica Nacional, isto é, faz parte do PIDDAC do INIA. Ouvi dizer que para este ano ainda estão mais reduzidas as verbas. Como e que se pode dizer que vamos desenvolver a RICCA em Portugal?
Mesmo sem estar de acordo digo, Sr. Ministro, que estas verbas não se compadecem com os projectos que aí são enunciados.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Ministro da Agricultura, ouvi atentamente a sua exposição, mas verifiquei que V. Ex.ª não tinha tido uma palavra para a participação dos agricultores na definição da política agrícola de desenvolvimento do sector, o que quanto a nós se torna indispensável para a sua adesão ao Plano. Sem a sensibilização dos agricultores, que neste país são, como V. Ex.ª sabe, uma percentagem muito grande, não me parece que seja possível implementar todos os programas que V. Ex.ª anunciou.
Sendo os Ministérios da Agricultura e do Equipamento Social os Ministérios que levaram maiores cortes orçamentais, temos fundadas dúvidas de que V. Ex.ª possa concretizar os planos que anunciou.
A primeira pergunta refere-se à existência ou não de planos quanto à hidráulica agrícola.
Em seguida, gostaríamos de saber o que é que o Ministério da Agricultura pensa quanto aos planos do Alqueva e hidráulico do Algarve.
No que respeita os planos integrados, há uma contradição que gostaria de ver esclarecida nesta Câmara. V. Ex.ª disse que havia uma verba de meio milhão de contos para implementar o Plano integrado de Trás-os-Montes e que havia uma verba de 350 000 contos para o Plano da Cova da Beira. Ora nós, deputados, não temos acesso ao orçamento desenvolvido do PIDDAC e, por outro lado, fomos informados em Comissão, por perguntas postas por mim próprio e por outros deputados ao Sr. Secretário de Estado do Planeamento, que teria havido um estrangulamento muito grande do PIDDAC e que, possivelmente, não se poderia continuar a implementar estes planos integrados e outros, já que a contribuição exterior não pode ultrapassar, em muitos casos, mais de 30 %, tendo o resto que ser orçamentado pelo Governo português.
Gostaria que V. Ex.ª esclarecesse bem o caso do Plano da Cova da Beira, que é já um escândalo nacional e internacional, como V. Ex.ª sabe.
Um outro tipo de perguntas refere-se à nossa dependência externa de produtos agrícolas alimentares. Gostaria de saber, concretamente, qual a percentagem, dentro da exposição que V. Ex.ª fez, que poderíamos recuperar, pois estamos dependentes do exterior em 70 % de cereais, 90 % de oleaginosos e 100 % de açúcar.
Uma última pergunta relaciona-se com um comunicado do Conselho de Ministros, de 30 de Agosto de 1983, que diz que o Governo emitiu orientação no sentido de reexame dos célebres acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo que nunca foram cumpridos por governo nenhum, designadamente com vista à correcção de vícios meramente formais ou à reconsideração de eventuais vícios de fundo, repondo em todos os casos a legalidade e a justiça.
Gostaria de saber, em concreto, quais os processos que o Governo já reexaminou ou está a reexaminar? Quais os actos e operações materiais que o Governo pensa praticar para integrar a execução dos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, nos casos em que estes acórdãos anulam os despachos de entregas das reservas por violação de lei ou outro vício de fundo?
No reexame dos processos em que foi proferido acórdão anulatório com fundamento em vício de forma, está o Governo a reexaminar todos os vícios de fundo igualmente alegados pelos recorrentes UCPs e Cooperativas? Quais exactamente os acórdãos anulatórios ou de suspensão de executariedade dos despachos que mandaram entregar reservas até agora proferidas pelo Supremo Tribunal Administrativo?
Sr. Ministro da Agricultura, gostaria de ouvir a resposta de V. Ex.ª a este último tipo de questões que suponho ser extremamente importante para o seu sector.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP): -Sr. Ministro, é espantoso ouvir V. Ex.ª falar durante vários minutos e não falar na Reforma Agrária, uma realidade concreta criada pelo 25 de Abril,...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: -... onde estão empregados mais de 25 000 trabalhadores e onde mais de duas centenas e meia de cooperativas laboram e produzem para este país.

Aplausos do PCP.

Ouvimos o Sr. Ministro falar no aproveitamento da água. Não vou falar daquela que não temos e que podíamos ter, mas da que temos. Durante os últimos anos várias barragens ficaram por aproveitar para fazer regadios. Como pensa o Sr. Ministro aproveitar esta água em 1984? Os proprietários que não a aproveitam são penalizados ou são beneficiados?
O Sr. Ministro falou muito dos jovens agricultores, mas aquilo que este Governo tem estado a fazer é atirá-los para a mina. e para a miséria como, por exem-

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plo, através dos últimos aumentos - e outros já se adivinham - dos factores de produção. É assim que o Sr. Ministro em 1984 vai tratar os jovens produtores e os agricultores em geral?!
O Sr. Ministro falou, também, nas florestas e nelas cabe, certamente, o montado de sobro. Sendo o montado de sobro uma das maiores riquezas nacionais vemos, mesmo aqui ao sair de Vila Franca, o montado de sobro num estado degradante. Os proprietários continuam a tirar a cortiça, a tirar a mais-valia e a terem as terras ao abandono. Estes senhores continuam a levar todo o dinheiro da cortiça enquanto nas Unidades Colectivas de Produção o montado de sobro se encontra totalmente preparado e arranjado e o Estado tira-lhes praticamente todo o dinheiro. Como é que o Sr. Ministro resolve a questão de obrigar os montados de sobro a estarem preparados?

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lopes Cardoso.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, o tempo é muito pouco, vamos passar por cima do vazio que é o capítulo da agricultura constante das Grandes Opções do Plano e do esforço inglório feito pelo Sr. Ministro para preencher esse vazio.
Diria que o Sr. Ministro na sua intervenção, e que está, aliás, também subjacente nas Grandes Opções do Plano, reconhece um facto: é que na agricultura, como nos outros sectores da economia portuguesa, há um problema de fundo, há um problema estrutural, que carece de resolução e sem o qual não será possível entrarmos num processo de desenvolvimento na nossa agricultura.
É evidente que este facto não exclui a necessidade de que se tomem medidas de natureza conjuntural e medidas imediatas, mas é o próprio Sr. Ministro que reconhece, nomeadamente nas Grandes Opções do Plano, que os programas anuais devem ter em conta, necessariamente, os projectos plurianuais, os planos a médio e a longo prazo.
Como nós carecemos desses planos, como ignoramos se o Governo os tem e qual o pensamento e a política do Governo a médio prazo, ficamos sem saber da compatibilização entre as medidas que nos são propostas e aquilo que se pensa no futuro, nomeadamente se é necessário introduzir medidas conjunturais, pois sendo as medidas estruturais indispensáveis, ignoramos o que pensa o Governo em matéria de reestruturação das explorações agrícolas, em matéria de reestruturação fundiária, no capítulo do arrendamento, no capítulo do emparcelamento e, sobretudo - e faço aqui também eco do espanto já manifestado por outras bancadas - da total ausência de pronunciamento por parte do Governo em relação à situação que se vive na chamada zona de intervenção da Reforma Agrária.
Considera o Governo que está tudo bem, que não há nada a fazer?
Qual é a posição do Governo em relação a esses aspectos?
O tempo é muito pouco, mas quanto aos regadios há um aspecto que infelizmente não vi tocar. Sabe o Sr. Ministro que muitos dos antigos aproveitamentos hidro-agrícolas são explorados em condições de extrema deficiência, que é fundamental proceder a uma reconversão de grande parte desses regadios, e que essa reconversão, exigindo investimentos por vezes bastante mais reduzidos em relação aos investimentos requeridos por novos regadios, poderia ser feita e dar resultados rápidos importantes. Mas nem uma palavra sobre essa matéria.
A questão que colocava ao Sr. Ministro em relação à Cova da Beira era esta muito simples! Como o Sr. Ministro sabe há 3 barragens; a Capinha que se destina apenas a consumo humano; a barragem da Meimoa que está em construção, mas que permitirá irrigar, se a memória não falha, cerca de 3000 ha dos cerca de 15 000 ha que prevê o regadio da Cova da Beira - isto é uma parcela insignificante e está por construir e não foi sequer ainda lançado o concurso para a barragem-chave de todo o aproveitamento, que e a barragem do Sabugal.
Isto para além das questões de quando, como, em que datas, com que horizonte pretende o Governo lançar o concurso e implementar a construção da barragem do Sabugal?
Por outro lado, ainda, que resultados têm sido obtidos até hoje, com que instrumentos legais, com que instrumentos económicos e com que estímulos, no sentido de promover a reestruturação fundiária da exploração agrícola nos 2 perímetros mais importantes neste momento em construção e que são o aproveitamento do Mondego e o aproveitamento da Cova da Beira, sabendo o Sr. Ministro que com a actual estrutura da exploração e com a actual estrutura fundiária não é possível rentabilizar minimamente estes aproveitamentos.
Pensa, ainda, o Sr. Ministro que se deve manter a estrutura introduzida com a supressão na Direcção-Geral de Extensão Rural e a sua integração no INIA? Os resultados desta fusão são positivos?
Concordará o S. Ministro que o problema do Ministério da Agricultura é muito menos, neste momento, um problema de pessoal - o que não quer dizer que o pessoal seja suficiente -, é muito menos um problema de não dispor das infra-estruturas necessárias, nomeadamente no que diz respeito a transportes, verbas, etc., mas não é antes, sim, o resultado da forma como esse pessoal é utilizado, da forma como essas viaturas são usadas, da forma como esse dinheiro é gasto? Mais importante do que reforçar esse pessoal, não será rentabilizá-lo?
Falou o Sr. Ministro que o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, ia, dentro em breve, concluir um levantamento. Espero que não seja tão inglório esse trabalho como aquele que foi realizado em 1976, porque em 1976 havia o levantamento do pessoal do Ministério. Desde aí até hoje o pessoal duplicou e está a fazer-se, novamente, um levantamento. O levantamento é importante, mas o que pergunto é que medidas vai tomar o Sr. Ministro e o Governo para impedir que a seguir se continuem a processar de forma anárquica as admissões de pessoal no Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, de tal modo que um outro ministro daqui por 2 ou 3 anos nos venha dizer "esperem um pouco, estamos a concluir o levantamento do pessoal do Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação", que já não é de 20000, mas será de 30 000 nessa altura e ninguém sabe como nem ninguém e capaz de explicar esta situação. Finalmente, Sr. Ministro, em relação aos circuitos comerciais. Diz

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o Sr. Ministro que é necessário criar mecanismos que assegurem uma maior transparência das operações e que previligiará os investimentos nesse sector. Diria que tal como isto está dito, me faz recordar uma expressão de um professor seu e meu que usava frequentemente esta expressão: "isto é pura música celestial". Em que aspectos concretos serão feitos esses investimentos? Que investimentos se propõe realizar o Governo para tornar mais transparentes as operações de mercado? Considera o Sr. Ministro que é possível deixar jogar uma pretensa lei da oferta e da procura, com a actual estrutura da nossa agricultura, com a actual estrutura dos nossos circuitos comerciais, sem que isso acabe por se repercutir de forma insuportável, sobretudo, em relação ao consumidor? Já tive ocasião de aqui dizer: se o Sr. Ministro o fizer acabará com as bichas em todos os estabelecimentos comerciais que vendam produtos agrícolas e haverá fartura, pela razão simples que não haverá dinheiro para comprar os produtos oferecidos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP):- Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, é principalmente do plano do Mondego que lhe vou falar, porque V. Ex.ª veio aqui falar das Grandes Opções do Plano, enquanto reservou para o Sr. Secretário de Estado a parte do Orçamento.
É directiva deste Governo reduzir drasticamente a área do arroz no vale do Mondego, isto é, 9000 ha dos 15 000 ha do aproveitamento estão, actualmente, ocupados com arroz e pretende-se reduzir essa área para cerca de metade, ou seja, para 4500 ha a 5000 ha de arroz. Quer-se, portanto, substituí-lo por culturas alternativas mas, entretanto, os campos de ensaio do INIA, vão este ano terminar por falta de verbas - é a informação que temos. Ora, durante os 3 anos fizeram ensaios, mas não divulgaram uma única linha à agricultura regional.
Como quer o Sr. Ministro que os agricultores, os orizicultores do Vale do Mondego, vão enveredar por culturas alternativas sem terem ninguém que lhes indique qual o caminho a seguir.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Outra questão ainda relativa ao vale do Mondego. Estão previstos aqui 368 000 contos para a rede de rega, sendo o resto para uma pequena parcela para investigação agrária e emparcelamento. Sr. Ministro, e a rede de enxugo? Como sabe a obra hidráulica relativa ao leito central está praticamente concluída para se começar a meter água nos campos. E como é que a tiramos? Relativamente ao problema da rede de rega, o Sr. Ministro certamente não pensou dar início aos trabalhos, porque o sistema não é o mesmo que está a ser feito na Cova da Beira, que é uma rede de rega fixa. Existem apenas estudos da rede de rega, estando a ser o pagamento de verbas a técnicos alemães e holandeses, e para além disso, nada está feito, apesar de haver um grande batalhão de gente a trabalhar no vale do Mondego onde só se vêem os célebres carros verdes a passear para baixo e para cima.
O canal para meter água nos campos ainda não está feito, embora admitamos que possa já existir em algum lado, mas vamos meter a água nos campos e não a tiramos? Não há enxugo dos campos?

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ainda relativamente à rede de rega, Sr. Ministro, esta rede estudada pela Direcção-Geral de Hidráulica do Ministério das Obras Públicas, estava pronta em mais de 50 %, ou seja, 18000 ha. Com a criação da Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola, essas funções passaram para a DGAE. O que aconteceu foi deitarem fora os estudos de 8000 ha. baseando-se apenas num coeficiente volumétrico que não estaria bem estabelecido, o que implicou andarem há 3 anos à procura de um coeficiente volumétrico, sem entretanto estar estudada a rede de enxugo.
Sr. Ministro que moral é esta, que estudos é que vão ser feitos, como é que vão ser articuladas estas questões?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (INDEP.): - Sr. Ministro, ouvi com agrado a parte referente à atracção e fixação da nossa juventude em torno das unidades agrícolas, mas isso só não é suficiente. Ë necessário que sejam dadas aos jovens, por exemplo, condições que vão desde a habitação às actividades culturais. Não se pode continuar a pensar em termos agrícolas, como até há uns anos atrás. Em termos do trabalho agrícola não se pode só pensar em juventude, temos que pensar também em todos aqueles já de avançada idade que neste momento a trabalham.
Em relação às florestas, Sr. Ministro, qual vai ser a extensão de florestação a levar a cabo, qual o critério de escolha das espécies a plantar, qual a produtividade lenhosa e qual a acção sobre o solo e sobre as toalhas aquíferas? Em termos proporcionais, qual o controle que o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação pode exercer?
Em terceiro lugar, qual o controle sobre a arborização para corte, para pasta de papel, a levar a cabo por empresas como a Portucel, a Socel, etc.?
Em relação à agricultura alternativa, pergunto: que apoio à agricultura biológica, nomeadamente às cooperativas que se dedicam a este tipo de produção alimentar racional que normalmente carecem de apoio?
Estão previstos projectos de investigação virados para a substituição de insecticidas e adubos químicos por alternativos biológicos, como já se faz noutros países?
E que há sobre projectos de aproveitamento de reciclados, nomeadamente de lixos urbanos, águas residuais e, por exemplo, espécies vegetais como os jacintos de água, que são uma praga para muitos rios?
A Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, e não só ela, falou sobre um problema candente que é a água. A água é a seiva, é o sangue deste país, pois sem água nada sobrevive e nós sabemos por estudos internacionais que estamos a entrar numa fase de rarefacção de chuvas - apesar de casos pontuais como as chuvas que agora temos -, numa fase de seca que se prolongará, porventura, por dezenas de anos. E, pois, urgente reter água doce sobre os solos.
Portanto, em relação a isso, é extremamente importante que se façam por todas as zonas montanho-

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sas e de interior, onde sé veja que é necessário, pequenas e médias barragens de terra para fins não só de retenção de águas, como também para controle dos caudais.
Pergunto ao Sr. Ministro que financiamento está destinado para a construção e reparação de tantas pequenas e médias barragens, nomeadamente no Alentejo e no Algarve?
Essas pequenas barragens têm um efeito também ecológico importante, por permitirem a vida vegetal e animal em zonas onde hoje, na época seca, apenas se vêem pedras.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Azevedo Soares.

O Sr. Azevedo Soares (CDS): - Sr. Ministro da Agricultura, da intervenção de V. Ex.ª retive como partes mais imprecisas a abertura e o fecho. O resto pareceu-me mais uma exposição de V. Ex.ª no Conselho de Directores-Gerais do seu Ministério.
Brindou-nos, mais uma vez, com o discurso da crise, com a necessidade de contenção do défice orçamental e do défice da balança de transacções correntes, objectivos de política económica que já tem sido sobejamente expandidos. Referiu depois, entre esses dois momentos altos da sua intervenção, um conjunto de ideias que necessariamente decorrem da publicamente reconhecida competência técnica de V. Ex.ª, mas mais uma vez me pareceu estarmos aqui a tentar viver com ideias inexequíveis e veio-me à memória um pré-aviso que, na altura da discussão do Programa de Governo, coloquei e que era exactamente a de que iríamos assistir sistematicamente ao combate, dentro do Governo, entre aqueles que sentem a necessidade de reduzir e aqueles que sentem a necessidade de apresentar obra feita.
Não entrarei também aqui no sistema que alguns Srs. Deputados usam, no sentido de perguntarem o que é que o Sr. Ministro vai fazer. O Sr. Ministro não vai fazer nada, e ainda bem, porque enquanto não acabarmos com esta obcessão de pedir que sejam os ministros a fazer tudo, continuaremos ciclicamente a ouvir discursos de meia hora sobre o que é que os ministros vão fazer e depois a própria sociedade não tem possibilidades de fazer nada. Este é também um aspecto que julgo deveremos ter em atenção.
A questão que queria colocar, Sr. Ministro, é essencialmente esta, atendendo a que V. Ex.ª falou sempre no Governo, aliás na sequência das precauções do Sr. Ministro das Finanças ontem aqui expandidas, porque estamos aqui a debater as Grandes Opções do Plano, qual é no plano do Governo a prioridade atribuída à agricultura?
Logicamente deveríamos dizer que a política das pescas e do mar é, digamos, a primeira prioridade - e tanto assim é que o Governo criou um Ministério para isso -, deveríamos dizer que a prioridade é aquela que for ditada pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento - é uma outra perspectiva -, mas de todo o discurso de V. Ex.ª resulta a ideia de que é preciso fazer muitas coisas, mas como pré-aviso de que nada pode ser feito em função das condições económicas e financeiras que o País atravessa.
É evidente que nós temos considerado necessária a redução desses défices, mas nem sempre temos estado de acordo com os instrumentos da política económica utilizados. O que nos parece fundamental em sede de discussão de Grandes Opções do Plano é saber o que é que o Governo pensa em termos de prioridade de afectação de recursos. Os recursos são escassos, nós sabemo-lo, mas, Sr. Ministro da Agricultura, o que não podemos é assistir hoje a um discurso de meia hora sobre política agrícola, logo à tarde, porventura, assistir a um discurso sobre a grande revolução industrial, baseada na crise e importada de países que venceram a crise sem terem necessidade de grandes parangonas de revolução industrial, correndo o risco de chegarmos ao fim deste debate e o Sr. Ministro das Finanças ter que rever rapidamente o Orçamento, porque todos os outros ministros declararam intenções desenvolvimentistas em manifesta contradição com a sua política restritiva.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estamos um pouco acima da 1 hora e ainda estão inscritos, para interpelar o Sr. Ministro, os Sr. Deputados José Vitorino, Eurico Correia, Álvaro Brasileiro e Gaspar Pacheco.
Desejava pôr à consideração dos Srs. Deputados o seguinte: creio que com um pequeno esforço seria possível dar a palavra ainda neste período da sessão a estes Srs. Deputados, permitindo ao Sr. Ministro que aproveitasse o tempo que medeia entre a suspensão da sessão e a continuação dela depois do almoço para preparar a sua resposta. Os Srs. Deputados vêem algum inconveniente em que se proceda assim?

Pausa.

Portanto, creio quo está tudo de acordo, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, mais do que fazer diagnósticos, desde há largos anos repetidos e que o próprio Plano refere, interessa ir de encontro às soluções possíveis, fazer face aos problemas e utilizar os meios disponíveis.
A agricultura em Portugal tem profundas distorções de ordem fundiária, de circuitos de comercialização, de industrialização, etc. O Sr. Ministro foi claro na sua exposição e convirá também dizer que da parte da bancada social-democrata entendemos que aquilo que mais caracteriza a acção do Sr. Ministro é ser profundamente eficiente e discreto, dentro das linhas de acção governativa do Governo, em termos globais para todos os ministérios e sectores.
Sobre aquilo que o Sr. Ministro disse e com o qual estamos de acordo, há alguns esclarecimentos adicionais que queríamos solicitar.
Em primeiro lugar, a questão da extensão e da formação. É sabido o que se passa e é sabido que cada vez, em teoria, há mais extensão, mas os agricultores continuam a não encontrar um técnico, ou melhor, os técnicos continuam a não aparecer. Pergunta-se: quais são as medidas previstas para que os técnicos sejam mais técnicos e cada vez menos administrativos?
Em segundo lugar, que meios é que podem ser afectados, designadamente às direcções regionais, para que essa acção possa efectivamente ser concretizada?

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Um outro domínio fundamental tem a ver com a correcção das distorções dos circuitos comerciais, pois, para além de se falar na parte comercial propriamente dita, julgo que interessa, acima de tudo, criar as condições para que aqueles que produzem possam concorrer e disputar a acção comercial dos intermediários que nada produzem, mas que muito beneficiam e que, por incrível que pareça, são necessários face à estrutura existente. Neste domínio e face também à adesão à CEE, quais são as medidas, designadamente de carácter fiscal ou creditício, para favorecer ou incrementar as associações de produtores?
Em termos de hidráulica agrícola já aqui foram feitas hoje algumas considerações, mas o problema é que podemos ter a catástrofe por excesso de água e podemos ter a catástrofe por falta de água!
Para além desta constatação, mais ou menos cíclica, o problema que se põe é o de saber, dado que se tem conhecimento que instituições internacionais estariam dispostas a financiar grandes obras de hidráulica agrícola, quais são as previsões para o próximo ano, designadamente no Sul do País, nomeadamente quanto ao plano de barragens do Algarve e quanto ao plano de barragens do Alqueva?
Em termos de florestação é sabido que os acordos com o Banco Mundial favorecem os projectos de florestação nas zonas Centro e Norte do País. Como é que se poderá garantir que também a zona Sul do País -parte do Alentejo, Setúbal e Algarve - poderá beneficiar de iguais regalias, designadamente na parte que respeita a florestação decorrente de incêndios - recordo que além dos incêndios ocorridos em Monchique, Portimão e Silves, no corrente ano, tivemos também o caso do Barão de São João, no concelho de Lagos, em que há 3 anos ocorreu um violento incêndio e desde aí nunca mais se fez nada. Penso que isso poderia ser incluído no estudo e na inventariação que está a ser feita em relação ao último incêndio.
A industrialização constitui também um elemento fundamental para corrigir os próprios circuitos comerciais, para aumentar a rentabilidade dos produtores e ainda para regular o próprio consumo.
Como e que se incrementa essa industrialização de que se fala, e com a qual estamos de acordo?
Consideramos ainda fundamental, e o Sr. Ministro referiu-o, o prosseguimento e o incremento dos planos de desenvolvimento integrado que têm a ver com a agricultura e que são normalmente identificados com interesses de ordem agrícola, sobretudo nas zonas deprimidas da serra e do interior.
Mas pergunta-se, para além daqueles exemplos que o Sr. Ministro da Agricultura referiu, que outros estão em marcha e se, realmente, isso é, na perspectiva global da acção governativa, uma acção a prosseguir.
Foi aqui focado o problema dos chamados latifúndios da também chamada zona da reforma agrária.
Queria perguntar, quanto a este aspecto, qual é a situação concreta quanto ao estatuto das UCPs e as suas relações financeiras com o Governo e com todas as instituições.
Isto é, quais são as relações creditícias, neste momento, entre as UCPs e as instituições do Estado?
E ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social queria dirigir-lhe esta pergunta: quais são, neste momento, as relações entre as UCPs e as instituições
de segurança social, designadamente a nível de descontos que a lei prevê?
Finalmente, Sr. Ministro da Agricultura, quais são as medidas que o Governo pensa tomar, em termos de concretizar a lei de bases, no que respeita ao que está estabelecido para impedir que proliferem por esse país fora os terrenos incultos?

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Deputado Eurico Correia para interpelar o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação.

O Sr. Eurico Correia (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro: Embora o assunto já tenha sido objecto de algumas intervenções, não queria deixar de manifestar a minha preocupação pela não referência ao problema das águas no Algarve, no sentido da sua utilização para a agricultura, mas também, quanto às consequências que tem no abastecimento às populações e para a indústria mais importante do Algarve que é a indústria turística.
De facto, tem-se falado muito nas barragens do Algarve, mas até aqui continuamos à espera de uma definição, quer quanto às barragens públicas, quer quanto às barragens privadas, isto é, as barragens construídas pelos próprios agricultores, que são melhoramentos necessários.
O Algarve tem uma agricultura, em que a parte mais importante, a parte mais rica, é a agricultura de regadio e, como tal, ela é necessária para obter boas colheitas e para o êxito do regadio algarvio.
Aquilo que eu dizia que era uma consequência secundária - a deficiência de abastecimento de água às populações - vai ser condicionada pela exploração dos recursos hídricos, pela utilização das águas.
Neste momento, as capturas são quase todas subterrâneas e creio que apenas as barragens do Odiáxere e, da Bravura é que dão alguma contribuição para o abastecimento das populações, sendo evidente que a utilização dos recursos hídricos vai afectar todo o conjunto da província.
Como V. Ex.ª sabe o subsolo da província é calcário, havendo, por isso, uma interligação de toda a toalha aquífera, pois quando se bombeia num lado é evidente que outros lados se vão ressentir.

ala-se muito, também, na captura das águas, mas esquece-se uma coisa importante e que é a sua utilização racional. Continua a utilizar-se água no Algarve através de alagamento, que traz um consumo de água desproporcionado em relação à água existente.
Passando do problema das barragens, que eu penso que e necessário encarar, deixamos uma sugestão ao Sr. Ministro, no sentido de que seja possível criar uma linha de crédito bonificado, à semelhança da que se utiliza para as novas fontes de energia, de forma a permitir que os agricultores construam barragens individuais.
Lembro, também, a V. Ex.ª, que foram encontrados novos recursos aquíferos nas dolomias do Algarve e essas existências ainda não foram trabalhadas nem aproveitadas.
O tempo escasseia, mas queria dizer ainda uma pequena palavra sobre a comercialização e sobre a industrialização das produções algarvias - sobretudo dos primores e das produções mais ricas - que nor-

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malmente não são racionalizadas, pois, não há, praticamente, industrialização das culturas algarvias.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro.

O Sr. Álvaro Brasileiro (PCP): - No Orçamento do Estado para 1984 não estão incluídas verbas para os projectos considerados prioritários, entre os quais se conta o do vale do Tejo. Este corte de verba, cuja inoportunidade as recentes cheias vêm comprovar, terá graves consequências como, de resto, já sentem as populações ribeirinhas do Tejo. Será, Sr. Ministro, que o grave problema do vale do Tejo vai ser esquecido no Orçamento de Estado? Que espera, Sr. Ministro, para levar para a frente os processos referentes aos diques de Meia Postinha, ao revestimento do dique de Vaiada, reparação do dique de Omnias, Caminho de Meias, S. João, Tapadinha e outros? Não acha, Sr. Ministro, que quanto mais tempo passa, mais iminentes se tornam os perigos, os receios das gentes - como é óbvio - e o agravamento dos custos dos trabalhos que venham a ser realizados? É que se não se tomarem medidas, poderão dar-se novas tragédias como a de 1979.
Outra questão, Sr. Ministro: tem conhecimento da luta que os produtores de tomate travaram contra os aumentos dos custos de produção e tem conhecimento dos preços que reivindicavam? Tem o Sr. Ministro conhecimento da esmola - sim, da esmola! - de $20 que o Governo prometeu aos agricultores para minimizar os aumentos dos custos dos factores de produção? Ë que os agricultores queixam-se que algumas fábricas não lhes querem pagar e que só o farão se o Governo as subsidiar. Consta, e dizem pela parte de algumas fábricas, que este subsídio se fosse entregue rondaria os 110 000 contos. Que diz disto, Sr. Ministro?
Finalmente, sobre o problema da beterraba sacarina. Que pensa o Sr. Ministro desse projecto? Está posto de lado ou qual é a ideia que, tem sobre esta questão?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, tem a palavra o Sr. Deputado Gaspar Pacheco.

O Sr. Gaspar Pacheco (PSD): - O Sr. Ministro falou sobre o PADAR e gostaria que explicitasse melhor o que é que é esse programa, em que zonas será implantado e se já está alguma coisa feita sobre ele.
Por outro lado, V. Ex.ª refere sempre que 70 % dos funcionários do Ministério da Agricultura estão sediados em Lisboa. Gostaríamos de saber se isso é verdade ou não.
Noutro ângulo, pergunto-lhe para quando é lançado o instituto de denominação de origem? Estamos a assistir, no tocante aos vinhos, à rotulagem deficiente, em que cada uma das regiões rotula como quer. O Instituto do Vinho do Porto tem um determinado tipo de rótulos, a Comissão de Viticultura tem outros e a Junta Nacional dos Vinhos tem outro. Para quando um organismo central, a fim de uniformizar a rotulação e toda a problemática de exportações?

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminaram as interpelações ao Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação.
O Sr. Deputado Soares Cruz pretende usar da palavra?

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, pretendia fazer uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado, tem a palavra.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Pretendia uma interpelação, apresentando uma proposta.
Julgo que para o bom funcionamento dos trabalhos, seria importante que a Mesa fizesse um esforço para recolher todas as intervenções que, eventualmente, tratem sobre o tema da agricultura, para que, no início dos trabalhos da parte da tarde, fossem feitas em conjunto, aproveitando a presença do Sr. Ministro. A discussão ganharia assim mais interesse, pois todas elas se conjugam no mesmo objectivo.

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas V. Ex.ª pretende que a Mesa recolha as interpelações já feitas?

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Não, Sr. Presidente. Pretendo que a Mesa recolha as intervenções de fundo que se vão fazer acerca do tema da agricultura e que estão na intenção de muitos dos Srs. Deputados presentes.

O Sr. Presidente: - Estão previstas as seguintes intervenções: do Sr. Deputado António Gonzalez; do Sr. Deputado Pinheiro Henriques; do Sr. Ministro do Mar; do Sr. Deputado Soares Cruz; do Sr. Deputado Jorge Lacão; da Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha e do Sr. Ministro da Indústria e Tecnologia.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Desculpe-me, Sr. Deputado, mas as "Mesas", como os homens, têm sempre momentos infelizes de incompreensão e eu estou num desses.

Risos.

V. Ex.ª deseja que estas intervenções sejam feitas imediatamente a seguir ao início dos trabalhos, para depois o Sr. Ministro da Agricultura responder a tudo globalmente? É isso?

O Sr. Soares Cruz (CDS):- Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Então, Sr. Deputado, peço-lhe imensa desculpa, mas não percebi. Tenha V. Ex.ª a bondade de me esclarecer.

O Sr. Soares Cruz (CDS):- Sr. Presidente, quem tem a pedir desculpa sou eu, porque com certeza fui eu próprio que não me consegui fazer perceber,

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até porque o espírito esclarecido de V. Ex.ª não permitia de maneira nenhuma deturpar aquilo que quis dizer.

Vozes do PS e do PCP: - Eh lá! Grande tirada!

O Orador: - O que propunha, muito concretamente, era que as intervenções que estivessem para ser feitas sobre agricultura se fizessem todas seguidas, para que, aproveitando a presença aqui da parte, da tarde do Sr. Ministro da Agricultura para responder às interpelações agora feitas, todas elas pudessem ser ouvidas pelo Sr. Ministro.

O Sr. Presidente: - Pronto, Sr. Deputado, agora compreendi perfeitamente. Gostaria de sublinhar só que há pouco o Sr. Deputado José Vitorino fez uma interpelação neste debate directamente ao Sr. Ministro do Trabalho e Segurança Social. Isto para explicar que a Mesa não dispõe do conteúdo das intervenções que vão ser feitas, portanto, nada impede que qualquer destes Srs. Deputados, o Sr. Ministro da Indústria e Tecnologia ou o Sr. Ministro do Mar, tratem de problemas directamente relacionados com a agricultura.
De qualquer forma, desejava advertir o Sr. Deputado de que a colocação dos intervenientes na pauta das inscrições depende dos próprios intervenientes. Trata-se de um apelo do Sr. Deputado que os intervenientes poderão aceitar ou não, mas que a Mesa manifestamente não pode impor.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Apenas para dizer, Sr. Presidente, que em devido tempo pedimos a inscrição dos Srs. Deputados Silva Domingues e João Salgueiro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Antunes da Silva, vou anotar essas inscrições e quero sublinhar que a sua não indicação não é culpa da Mesa, pois tratou-se de um lapso na pauta de inscrições. Como dizia o meu distinto e, infelizmente, falecido mestre de Direito Constitucional, Prof. Carlos Moreira, trata-se de erros "filhos da pauta" de que não temos evidentemente culpa!

Risos gerais.

O Sr. Deputado Lopes Cardoso pretende usar da palavra?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, era para interpelar a Mesa, muito rapidamente e sem querer complicar os trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Creio que, pelo menos no domínio puramente teórico, nada impediria que os Srs. Deputados que estão inscritos comunicassem à Mesa sobre que matéria versaria as suas intervenções.
Assim, e se houvesse consenso, reunir-se-iam as intervenções que versassem questões agrícolas e só a seguir se passaria a outro assunto. Desconfio, pela ordem que o Sr. Presidente acabou de ler, que o Sr. Ministro do Mar irá intervir, obviamente, sobre matérias do seu pelouro e que haverá pelo menos uma ou duas intervenções que irão versar sobre agricultura. Será talvez um pouco abusivo da minha parte, mas conhecendo já de há muito tempo os Srs. Deputados e os assuntos para os quais estão mais vocacionados, receio que isto vá acontecer. E tudo isso seria, de certo modo, baralhar este debate, quando o mais lógico era que houvesse uma sequência nestas intervenções.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lopes Cardoso, a Mesa vai seguir a sua sugestão.
Sr. Deputado António Gonzalez, V. Ex.ª vai falar sobre agricultura, ou melhor, predominantemente sobre este assunto?

O Sr. António Gonzalez (INDEP.): - Sr. Presidente, na minha intervenção também falarei sobre agricultura. De qualquer modo, dispenderei no máximo 6 minutos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pinheiro Henriques, dirijo-lhe a mesma pergunta.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE):- Não, Sr. Presidente, a minha intervenção não versará sobre agricultura.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pinheiro Henriques vê algum inconveniente em que seja alterada a ordem da sua inscrição, na esteira das sugestões dos Srs. Deputados Soares Cruz e Lopes Cardoso?

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Não vejo qualquer inconveniente, Sr. Presidente. Aliás, concordo com essa opinião.

O Sr. Presidente: - O Sr. Ministro do Mar está inscrito, mas não se encontra, neste momento, na Sala.
Sr. Deputado Soares Cruz, V. Ex.ª vai falar sobre agricultura?

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, dirijo-lhe a mesma pergunta.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não vou falar sobre agricultura, Sr. Presidente, e não vejo nenhum impedimento para que outras intervenções sobre a matéria possam passar à frente da minha.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, na ausência da minha camarada Margarida Tengarrinha posso informar a Mesa que a intervenção que ela vai fazer é sobre o tema da agricultura.

O Sr. Presidente: - Seguidamente, e pela ordem de inscrição, está o Sr. Ministro da Indústria e Tecnologia.

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O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares (Almeida Santos): - Sr. Presidente, os Srs. Ministros que estão inscritos não se encontram presentes, mas por eles próprios dou o seu assentimento.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Silva Domingues não está?

O Sr. Antunes da Silva (PSD):- Sr. Presidente, não estando presente os Srs. Deputados Silva Domingues e João Salgueiro, posso adiantar que não será sobre agricultura a intervenção desses Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - E poderá V. Ex.ª dar o seu assentimento a que sejam preteridos na ordem de inscrição, de harmonia com o que foi sugerido?

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, relativamente à intervenção da minha camarada Ilda Figueiredo, que se encontra ausente, poderei adiantar que não é sobre agricultura. Podemos igualmente dar o nosso assentimento à mudança da ordem de inscrições.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lopes Cardoso pretende usar da palavra?

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, era apenas para solicitar à Mesa a minha inscrição para uma eventual intervenção, ponderada a questão do nosso tempo, sobre agricultura.

O Sr. Presidente: - Fica inscrito, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, as intervenções far-se-ão sobre agricultura numa primeira fase e depois sobre as outras matérias, pela ordem que estava determinada com a modificação introduzida por sugestão do Sr. Deputado Soares Cruz.
Sobre agricultura a ordem será a seguinte: Srs. Deputados António Gonzalez, Soares Cruz, Margarida Tengarrinha e Lopes Cardoso. Depois intervirão o Sr. Deputado Pinheiro Henriques, o Sr. Ministro do Mar, o Sr. Deputado Jorge Lacão, o Sr. Ministro da Indústria e Tecnologia, o Sr. Deputado Silva Domingues, a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo e o Sr. Deputado João Salgueiro.
Antes disso, evidentemente, o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação intervirá, respondendo às interpelações que lhe foram dirigidas.
Srs. Deputados está suspensa a sessão.

Eram 13 horas e 35 minutos.

Após o intervalo, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Fernando Amaral.

O Sr. Presidente: - Está reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Para responder às perguntas que lhe foram formuladas, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação.

O Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de manifestar à Assembleia da República a natural satisfação do Ministro da Agricultura pelo interesse suscitado esta manhã pela intervenção que aqui fiz em relação às Grandes Opções do Plano, consubstanciada nas inúmeras intervenções dos Srs. Deputados, o que, para além desse interesse, também dignifica extraordinariamente esta Câmara em relação a um problema tão importante para o País como é o da agricultura.
Naturalmente que os Srs. Deputados não me levarão a mal se não puder abordar todas as questões que aqui foram levantadas durante 50 minutos, pois disponho de escasso tempo para responder.
A primeira questão que o Sr. Deputado Leonel Fadigas colocou diz respeito ao problema da gestão das verbas do Ministério. A este respeito, devo dizer que do que se trata é de racionalizar a gestão das verbas. Muitas vezes é preferível ter pouco e geri-lo bem, do que ter muito e gastá-lo mal. Como sou filho de pais pobres e sempre me acostumei a viver com pouco, estou habituado a gerir as minhas economias dentro dessa óptica e julgo que alguma coisa dessa experiência poderá também ser utilizada na gestão das verbas deste Ministério..
Evidentemente que há algumas distorções. O Sr. Deputado referiu-se ao problema das ajudas de custo na utilização de viaturas. Gostaria, pois, de lhe dizer que há um despacho meu sobre esta matéria, que provavelmente o Sr. Deputado não conhece, porque é um despacho interno. Ora, em relação ao problema das ajudas de custo, a questão é bem mais complicada porque isso passa pela reformulação de todo o sistema de remunerações complementares dos funcionários do Ministério, sobretudo em relação àqueles que se encontram na periferia. Portanto, essa é uma matéria que a Direcção-Geral de Organização e Recursos Humanos está neste momento a abordar com toda a profundidade. Também eu estou de acordo com o Sr. Deputado, quando diz que a austeridade deve começar por nós próprios.
O Sr. Deputado também se referiu à questão da investigação e da sua articulação com o sector da extensão. Tenho-me referido várias vezes à importância que para mim tem o problema do binómio investigação/extensão. Abordámo-lo no Ministério dentro de uma perspectiva materialista e muito pragmática, e pensamos que, acima de tudo, as transformações da agricultura portuguesa hão-de resultar em boa parte da transferência dos conhecimentos que nos vêm da própria investigação, da transferência da inovação para o próprio utilizador, que é afinal o agricultor. E isto tem a ver com a estrutura que pretendemos dar ao organismo que se responsabiliza pela investigação, assim como a sua articulação com as direcções regionais do Ministério, porque elas serão afinal o braço estendido da extensão rural junto do agricultor.
No entanto, isso não significa que não seja necessário haver um órgão coordenador da actividade da extensão. Ora, convém que esse órgão coordenador esteja, ele próprio, integrado numa perfeita articulação para formular o binómio e proceder ao feed back com os organismos de investigação, nomeadamente nas grandes extensões nacionais.

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Por esta forma e com esta articulação, pretendemos Fazer a ruptura do ciclo vicioso que existe ao nível da própria extensão rural, ou da vulgarização, porque até aqui não tem havido verdadeiramente extensão. O que pretendemos é que a investigação seja orientada a partir das próprias necessidades dos utilizadores, isto é, será a própria extensão rural, no seu contacto com os agricultores, que há-de despistar as necessidades da investigação, que a há-de trazer ao órgão coordenador da extensão e, por essa via, levá-la à investigação. Isto significa que não queremos uma investigação feita de dentro para fora dos organismos de investigação, mas sim uma investigação programada de fora para dentro dos organismos de investigação. Julgo que esta é também a concepção que o Sr. Deputado gostaria de ver implementada. Portanto, estamos naturalmente de acordo em relação a este aspecto.
O Sr. Deputado Rogério de Brito disse que eu teria feito um esforço louvável para tentar defender este Orçamento do Estado e que não o teria conseguido. Compreendo esta posição do Sr. Deputado Rogério de Brito porque ele, tal como eu, também é um técnico.
E, normalmente, são sempre os técnicos os que se preocupam em ter recursos para os poder utilizar na dinamização do processo de desenvolvimento e são, por outro lado, como regra, os administrativos que procuram cortar-nos essas possibilidades.
Aliás, e de uma forma curiosa, esta maneira de sentir não está muito longe daquela que também o Sr. Deputado Azevedo Soares aqui colocou quando referiu que "afinal o que parece existir é um conflito entre aqueles que querem gastar e aqueles que querem economizar". O Sr. Deputado também disse que em relação a esta questão será difícil que se vá realizar muito e que, por força de um orçamento limitado, não se poderá esperar que haja uma grande realização em termos de desenvolvimento.
Julgo, pois, que esta intervenção do Sr. Deputado Azevedo Soares teve o mérito de nos alertar para uma grande realidade, sobre a qual me tenho algumas vezes debruçado, em outras oportunidades, quando tenho dito que temos de ter a consciência de que O desenvolvimento na agricultura portuguesa tem, acima de tudo, de ser obra dos agricultores, dos empresários agrícolas, e que a função do Estado não é mais do que a de ser o motor desse desenvolvimento.
Isto representa que, no modelo de agricultura e no modelo de sociedade europeia ocidental em que pretendemos inserir-nos, é da iniciativa dos agricultores que terá de partir a realização das tarefas, enquanto ao Estado cumpre apoiar, cumpre ser o motor. E é por isso que acreditamos que, mesmo com este Orçamento, que é um orçamento de rigor, não será impossível, se soubermos enquadrar bem as actividades agrícolas, que os próprios agricultores, usando a sua iniciativa, possam dar o seu contributo válido e positivo para o desenvolvimento da nossa agricultura.
O Sr. Deputado Rogério de Brito também referiu que o investimento na agricultura não tem sido suficiente, e estranha como é que com um orçamento restritivo venha a ser possível avançar nesta matéria. Ora, a resposta entronca exactamente naquilo que acabou de dizer: é que não temos que confundir investimento na agricultura com Orçamento do Estado, já que só se vivêssemos num sistema de economia planificada e centralizada é que talvez pudéssemos estar à espera do Orçamento do Estado para realizar todos esses investimentos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, não é esse o modelo que perfilhamos. Por consequência, não posso estar de acordo com o Sr. Deputado.
Ainda a respeito das verbas, o Sr. Deputado referiu que elas são diminutas para & extensão rural. Ora, nunca estaríamos satisfeitos porque também somos técnicos e gostaríamos de poder dispor de mais recursos. No entanto, a verdade é que vale a pena analisar com cuidado o Orçamento e, sobretudo, conhecer os elementos do PIDDAC, porque o que se passa é bem diferente. Na realidade, só as Direcções Regionais de Agricultura têm cerca de 1 050 000 contos e aí, de preferência, a aplicação das verbas é naturalmente para a extensão no apoio directo aos agricultores. Todavia, não nos podemos esquecer que uma grande parte dos quadros das Direcções Regionais de Agricultura não recebem por verbas que estejam adstritas a essas direcções regionais, mas sim à Direcção-Geral de Administração e Orçamento, e aí, por uma estimativa que podemos fazer, andará à volta de outro milhão de contos.
Para além disso, temos os projectos integrados. Ora, dentro dos projectos integrados - e refiro-me, por exemplo, ao projecto integrado de Trás-os-Montes, mas também há o projecto integrado do Algarve e outros - há o programa PADAR, onde estão inscritos mais cerca de 450 000 contos que são também, basicamente, para a extensão. Isto para não referir ainda que para os centros de formação profissional - embora aqui se trate de uma parte de investimento para completar a nossa Rede Nacional de Centros de Formação Profissional -, iremos contar com cerca de 200 000 contos.
Disse o Sr. Deputado que eu evoluí no novo critério de avaliação das culturas a que chamou estratégicas. Julgo que aqui há uma enorme confusão. Na realidade, nunca disse que não considerava importantes estas culturas. Antes pelo contrário, julgo que estamos em sintonia nessa matéria, isto é, as culturas como os cereais, as forragens, as hortícolas, assim como outras culturas industriais, são extremamente importantes para a própria balança alimentar e satisfação do abastecimento das necessidades do País. Tanto é assim que o Governo, com a nova política de preços, as proeurou incentivar. Só que tais incentivos não foram mais feitos através de subsídios, mas sim através de preços reais à produção para que, de facto, consigamos atingir o grande objectivo que é o do aumento da produção.
Em relação à política florestal, é verdade que há uma redução do investimento florestal. Contudo, não é só por aí que a política florestal pode avançar. Julgo que nesta matéria há que ter alguma criatividade e sei que o Sr. Secretário de Estado das Florestas tem preparado um diploma para apresentar nesta Assembleia que lhe permitirá dinamizar a criação de receitas próprias para que um Fundo de Fomento Florestal possa ser constituído, para além de que com uma gestão correcta e com um aumento dos recursos técnicos

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dos serviços inscritos em contas de ordem seja possível utilizar para o financiamento do próprio sector mais algumas acções.
Uma pequena correcção em relação ao problema da rubrica para a beneficiação das matas do Estado. Não é exactamente correcto que tenha sido contada, pois devo dizer que no Orçamento do PIDDAC temos tido uma compreensão muito grande por parte do Sr. Secretário de Estado do Planeamento e, dentro do Ministério da Agricultura, temos tido uma liberdade bastante grande para fazer o arranjo das verbas dentro do plafond que nos foi concedido. Posso dizer ao Sr. Deputado que esse sector da beneficiação das matas do Estado está contemplado, aproximadamente - não tenho aqui o número exacto -, em cerca de 100 000 contos no PIDDAC para este ano.
Em relação ao problema da entrada na CEE, teve o Sr. Deputado uma frase curiosa, dizendo que poderíamos "entrar de burro e de enxada nas costas". Ora bem, não é nada disso do que se trata, e não é nessa perspectiva que o Governo joga. Por isso, estamos a elaborar com muito cuidado - e devo dizer com um grande empenhamento da minha parte - um dossier da adesão às comunidades. Trata-se, pois, de rodear essa dificuldade através de uma negociação bem feita, que nos permita uma adesão por fases e que nos permita beneficiar da política sócio-estrutural da comunidade e das ajudas de adesão, para com o tempo que nos será dado, conseguiremos uma modificação sócio-estrutural que nos permita que, de facto, os nossos agricultores não venham a entrar na comunidade "de burrinho", mas possam apresentar-se lá de tractor. É, pois, nessa perspectiva que este governo se coloca ao querer inserir a sua agricultura numa economia aberta, como é a economia da Europa Ocidental.
O Sr. Deputado Soares Cruz colocou-lhe uma questão que, no fundo, se traduziria por estas palavras: "está o PNA metido na gaveta?" -julgo que o sentido da sua intervenção é este. Ora, devo dizer-lhe que não, Sr. Deputado, pois o PNA representa um longo trabalho de funcionários do Ministério que continuam, eles próprios - sobretudo no Gabinete de Planeamento -, a executar essas tarefas, assim como outras equipas mistas de funcionários de boa craveira do nosso Ministério que o elaboraram. Mas o trabalho está feito e o que importa neste momento é, a partir dele - porque acima de tudo foi um trabalho de diagnóstico e um princípio de planificação -, lançar programas realizáveis, e realizáveis sobretudo no contexto actual em que vivemos.
Em relação a este aspecto não me irei alongar, porque aquando da interpelação ao Governo já expliquei com algum pormenor que passamos do PNA para a realização, através de programas horizontais e verticais, e também referi hoje na minha intervenção quais são os programas verticais que vamos privilegiar durante o ano de 1984. Portanto, não irei perder mais tempo com esse assunto.
O Sr. Deputado disse ainda que eu tinha indicado 5 objectivos fundamentais, ou 5 grandes opções, e perguntou-me por que é que eu não indiquei outras opções. Sr. Deputado, efectivamente seria desejável avançar com outras opções, mas, na realidade, não podemos fazer tudo e, sobretudo, não podemos arrancar com tudo no ano de 1984.
Contudo, não deixarei de dizer que em matéria de reestruturação fundiária nas zonas de minifúndio, sobretudo aquelas que se inserem dentro dos perímetros de rega, vamos mesmo no ano de 1984 prosseguir com um esforço considerável. Tive oportunidade de indicar, por exemplo, quais são as verbas que vamos utilizar este ano para a reestruturação fundiária em relação ao vale do Mondego e à Cova da Beira. Aliás, se o Sr. Deputado comparar essas verbas com as do ano passado, verificará que elas, praticamente duplicam: em relação ao Mondego, em 1983 nós tínhamos orçamentados 36 400 contos e para 1984 temos orçamentados 87 000 contos, para operações de reestruturação fundiária; na Cova da Beira tivemos 24883 contos em 1983 e agora temos 46 000 contos orçamentados. O Sr. Deputado dir-me-á que não é o suficiente, que é pouco. No entanto, Sr. Deputado, é o possível.
Em relação à questão que levantou em matéria de extensão rural, julgo que os elementos que forneci já satisfizeram a sua dúvida.
Contudo, em relação ao problema dos jovens agricultores, queria dizer-lhe que temos prosseguido - e temos prosseguido de forma mais acelerada sobretudo na apreciação dos processos e na concessão dos benefícios de instalação - todo o programa dos jovens agricultores que vinha do governo anterior. Devo comunicar à Câmara que quase não há semana nenhuma em que eu não assine uma série de contratos para os jovens agricultores. Vejo com muita satisfação esses processos afluírem e a aumentarem de número com uma certa rapidez, e verifico que a apreciação a nível dos serviços regionais está neste momento muito mais agilizada, aliás, como acontece em relação a muitos outros aspectos no nosso Ministério.
O problema da formação técnica em colaboração com o Ministério da Educação não está referido nas Grandes Opções do Plano, mas sim no Programa do Governo. Tenho tido algumas conversas com o Sr. Ministro da Educação em relação a essa matéria, e ele está, tal como se sabe, a implementar o ensino profissional e o ensino profissionalizante a nível do secundário, e já há algumas escolas com componente agrícola no ensino secundário.
Um outro problema que o Sr. Deputado colocou em relação aos engenheiros técnicos agrários, julgo que ele tem de ser resolvido pela via da dinamização e ampliação do ensino politécnico. Julgo que não se trata de novo de ter escolas de regentes agrícolas, mas sim de ter um ensino politécnico na área da agricultura.
Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, antes de mais, queria cumprimentá-la pela sua intervenção, sobretudo no que diz respeito à sua preocupação em matéria de utilização e gestão dos recursos hídricos. Aflorei muito brevemente esse problema na minha intervenção, e a Sr.ª Deputada quis-lhe dar a extensão e a largueza que eu não lhe tinha dado, porque apenas quis mencionar o tema.
Ora, é evidente que o que nós pretendemos e temos de fazer é, sobretudo, saber gerir a água. Gerir a água representa não só saber gerir a água na sua utilização para regar com economicidade de utilização da água, mas também gerir os recursos de superfície.
Por isso, quando o Governo aprovou o projecto integrado de aproveitamento dos recursos hídricos do Algarve, o Ministério da Agricultura pôs a ênfase na

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construção das pequenas barragens de montanha que representam não só as 57 que estão identificadas - e não digo que se vão todas construir -, mas também um número muito considerável de barragens ainda mais pequenas realizadas pelos próprios agricultores e nalgumas destas que com fichas já foram construídas utilizaram-se fichas do PIDDAC. Julgo que é, sobretudo, a este número considerável de pequenas barragens do Algarve que a Sr.ª Deputada se queria referir.

A Sr.ª Deputada fez uma pequena referência a um pequeno problema ...

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - No fim, se faz favor.
A Sr.ª Deputada fez uma pequena referência à gestão das verbas no Ministério, referindo-se às verbas que estão inscritas para o Gabinete do Ministro. Suponho que esse assunto foi já explicado na Comissão de Agricultura, mas, muito brevemente, irei citá-las. Efectivamente encontram-se lá inscritos cerca de 500 000 contos ou 511 000 contos -não tenho aqui número exacto -, mas dir-lhe-ei que 200 000 contos são para o seguro de colheitas - e a Sr.ª Deputada sabe o que é que isto significa -, 100 000 contos para a viabilização de cooperativas e 150000 contos para acções diversas de apoio também a cooperativas e à agricultura - e aqui inclui-se um certo número de acções e muitas vezes até o problema de resolver algumas situações de calamidades, como a Sr.ª Deputada sabe.
Em relação ao RICCA, referiu um aspecto muito particular: o problema da verba para o RICCA na situação económica nacional. Com a institucionalização que, neste momento, estamos a fazer do RICCA, o problema põe-se numa base completamente diferente. O que importa agora é a verba global para o RICCA e posso dizer-lhe que as verbas de que dispomos para o RICCA, em 1984, são ligeiramente superiores às que dispúnhamos em 1983: 29 555 contos para despesas gerais e 19875 para financiamentos de pré-adesão.

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Mais uns trocos!

O Orador: - "Mais uns trocos". De trocos também se vive, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Lá isso é verdade!

O Orador: - Quanto à importância que a extensão tem para a sensibilização e adesão dos agricultores - uma pergunta feita pelo Sr. Deputado António Taborda -, julgo que já respondi a essa questão, e as nossas preocupações penso que estão bem claras.
Quanto ao aproveitamento dos recursos hídricos no Algarve, não direi mais nada, pois é conhecido o que o Governo pensa sobre essa matéria e o que já foi aprovado. Não estranharão os Srs. Deputados que no orçamento do Ministério da Agricultura não esteja uma grande verba para 1984, porque as obras a realizar são, isso sim, nesta fase do orçamento do Ministério do Equipamento Social.
Ao Sr. Deputado Lopes Cardoso ...

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - O Custódio Gingão, sobre a Reforma Agrária, o Ministro nada diz!

O Orador: - Queria dizer ao Sr. Deputado Lopes Cardoso que, em relação ao problema do arrendamento e do emparcelamento rural, estão praticamente concluídas as propostas de lei - aliás, eu já tive oportunidade de dizer isso aqui, na Assembleia -, pelo que, brevemente, a Assembleia terá conhecimento delas quando aqui entrarem. Mas, neste momento, não gostaria de me alongar nessa matéria.
Quanto à posição do Governo em matéria da zona da Reforma Agrária, já durante uma interpelação aqui feita respondi a essa questão com palavras muito simples: "o que se trata é de cumprir e viver no quadro legal que temos".

O Sr. Vidigal Amaro (PCP): - Não parece!

O Orador: - É essa a posição do Governo.
Diz ainda o Sr. Deputado que é fundamental proceder à reconversão dos regadios existentes. Certo, Sr. Deputado. Não referi isso hoje de manhã na minha intervenção, mas devo dizer que a Direcção-Geral de Hidráulica Agrícola continua a ter incluído no PIDDAC uma verba de 35000 contos para as obras complementares no aproveitamento de regadios. Dir-me-á o Sr. Deputado que tal verba não é suficiente para prosseguir no ritmo necessário, mas dir-lhe-ei que é a possível.
Em relação à Cova da Beira, é certo que o fundamental - todos o sabemos - é a barragem do Sabugal. Dir-lhe-ei que, em relação ao cronograma que está aprovado, para a barragem do Sabugal, que está prevista para começar em 1986, está inscrita uma verba de 300 000 contos e mais 140 000 contos para a ligação entre a do Sabugal e a de Meimoa. Ë isso que está no cronograma.
Quanto à integração de extensão rural do INAER, suponho que a resposta que dei ao Sr. Deputado Leonel Fadigas lhe dará satisfação.
No que diz respeito ao reforço do pessoal, penso que mais importante do que reforçar o pessoal é rentabilizar as verbas e racionalizar os serviços. É certo que se trata de um problema de gestão, mas é nisso que estamos empenhados. Do que se trata é de, mesmo com menores recursos, conseguir realizar essa obra.
Quanto a medidas para impedir a admissão de pessoal, não vou dizer-lhe as que tomei, mas há um célebre despacho - o Despacho n.º 45 - assinado por mim, despacho esse que tem feito um certo furor no Ministério. Se o Sr. Deputado quiser, posso-lhe mandar uma cópia. Trata-se de fechar a porta e pôr a chave no cesto, porque neste momento não é naturalmente essa a política.
O Sr. Deputado João Abrantes pôs questões em relação ao vale do Mondego. A posição do Governo nessa matéria é clara, ela é coincidente com aquilo que está previsto no projecto. O Sr. Deputado fez uma crítica, que tem alguma razão de ser, sobre o facto de os resultados de investigação do INAER não terem sido ainda publicados. Posso dizer-lhe que estive recentemente com o engenheiro-chefe do projecto e ele disse-me que tem os resultados para publicar, estando, neste momento, apenas a ajustá-los à nova situação de preços e à nova situação de preços dos factores de produção. Trata-se, pois, de um problema de ajustamento desses resultados.
Sr. Deputado António Gonzalez, suponho que o problema principal que focou é em relação à fixação dos

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jovens. É evidente que temos de pensar na sua instalação e nós temos uma política que tem estado a ser executada.
Em relação à floresta, se privilegiamos a cultura do lenho de rápido crescimento ou as acções de protecção, permito-me não lhe responder; pois, se o fizesse, levar-nos-ia muito longe. Seria quase uma lição de silvicultura. Se quiser, podemos conversar sobre isso e; penso que não se trata de uma matéria em que estejamos em desacordo, nem eu nem o próprio Sr. Secretário de Estado das Florestas.
Quanto aos projectos de investigação sobre os pesticidas, é claro que esses projectos não estão bem identificados no Orçamento, mas os serviços competentes têm "coisas" em marcha. Trata-se, no fundo, de pequenos projectos, embora importantes. Acima de tudo, a nossa visão é, como sabe, a da utilização de concepções de luta integrada em defesa da protecção às plantas.
Sr. Deputado Azevedo Soares, suponho que o essencial do seu comentário foi aquele alerta que nos lançou. É possível que não se vá fazer nada - e ainda bem! ... E ainda bem, porque certamente está a pensar que são os agricultores, por sua própria iniciativa, que hão-de ser a mola real do desenvolvimento. Essa é uma perspectiva que, em boa parte, comungamos, sem deixar de acentuar que o Governo tem a sua função a desempenhar como motor desse próprio desenvolvimento.
Pergunta também o Sr. Deputado quais são as prioridades de afectação dos recursos. Julgo que deixei dito, de forma bem clara, que a primeira prioridade é a da extensão e formação profissional. Precisamos de ter agricultores preparados para aceitar a inovação, ou então não temos desenvolvimento. A segunda prioridade é a dos recursos hídricos pelo efeito multiplicador que têm as culturas de regadio. A terceira prioridade é a da florestação. Finalmente, a quarta prioridade é a das agro-industrias, embora aí o problema seja bem mais de actuar como motor do que actuar como investidor pela via do Orçamento. Não é naturalmente essa a perspectiva do Governo.
O Sr. Deputado José Vitorino falou ha extensão rural e na formação profissional. Suponho que o que eu disse satisfaz a sua curiosidade.
Em relação à correcção dos circuitos comerciais - um problema que muito preocupa sobretudo o Algarve como zona de agricultura intensiva e de horto-fruticultura -, o Sr. Deputado sabe o que pensamos sobre essa matéria, conhece o apoio que, neste momento, está a ser dado a empresas - e duas delas são do sector cooperativo - para o desenvolvimento e instalação de centros de concentração da oferta que é, digamos, uma ponte importante, e no Algarve até pode ser coincidente com a própria existência do mercado abastecedor para aquela zona. Ê nessa perspectiva que estamos.
Quanto à água, pedia-lhe o favor de não nos determos com esta questão. Passámos um dia, no Algarve, a falar sobre esta matéria. O Sr. Deputado conhece bem o que eu penso e, em linhas gerais, já hoje aqui referi o que o Governo pensa em relação aos recursos hídricos.
Sei que o problema da florestação é importantíssimo para o Algarve. Para além de uma verba que este ano temos disponível no Orçamento de 15 000 contos, o que nos permitirá dar alguma ajuda em matéria de florestação no Algarve, o que lhe posso dizer é que irei fazer todo o possível para que, na extensão ou na segunda fase do projecto florestal, esse projecto possa ser alargado ao resto do País, como é necessário, para que possamos avançar em matéria de floresta de tipo mediterrânico, que é, afinal de contas, o que precisamos de implantar no Algarve.
Quanto a projectos de desenvolvimento integrado, devo dizer-lhe que temos um no Algarve. É um projecto modesto - o projecto de desenvolvimento integrado do Nordeste do Algarve - que, este ano, está dotado com uma verba inicial que se destina sobretudo a aspectos de rede viária e algumas "coisas" adicionais para, no ano seguinte, se poder prosseguir e avançar com esquemas da silvopastorícia, eventualmente também os problemas de caça turística que o Sr. Deputado conhece.
Quanto à proliferação de terrenos incultos, como certamente sabe, visto eu já o ter anunciado outro dia, está pronta a revisão do decreto-lei sobre os mínimos de utilização da terra. Aliás, o problema não é, como tantas vezes acontece em Portugal, o de haver ou não lei, mas o de fazê-las cumprir. É essa, naturalmente, a política do Ministério.
Ao Sr. Deputado Álvaro Brasileiro, queria dizer-lhe que, em relação ao vale do Tejo, o problema é do sector do Ministério do Equipamento Social. Não tenho comigo o orçamento desagregado do Ministério do Equipamento Social, pelo que não lhe posso dizer que verba está inscrita este ano. Não é, nesta fase, um problema de inscrição do Ministério da Agricultura.
Quanto ao Alqueva, já outro dia o Sr. Ministro de Estado disse qual é a posição do Governo nesta matéria. Trata-se de um dos quatro ou cinco grandes projectos nacionais, sobre os quais o Governo irá, brevemente, tomar uma posição. Tenho, naturalmente, um pensamento sobre isso, mas neste momento não interessa avançar nessa matéria. Mas o processo, como e evidente, não está esquecido e tem de ser visto no contexto dos grandes projectos nacionais.
O mesmo podia dizer em relação ao projecto da beterraba sacarina, apesar de esta questão ser um pouco mais complexa, porque tem a ver com a estratégia a adoptar na negociação do dossier de agricultura.
Pergunta o Sr. Deputado Gaspar Pacheco o que é o PADAR. Sr. Deputado, levaria muito tempo a explicar-lhe todo o projecto PADAR. Neste momento, apenas queria dizer-lhe que ele é, acima de tudo, a grande base do nosso projecto de extensão rural. É sobretudo para esse projecto que queremos fazer incidir e utilizar as verbas consignadas.
Pergunta também onde e que ele está implantado. Devo dizer-lhe que está implantado um pouco - e disperso - por zonas agrárias, sobretudo nas regiões de Entre-Douro e Minho, Beira Litoral e Trás-os-Montes. A pouco e pouco, as zonas agrárias irão sendo preenchidas, aliás na sequência da publicação da nova lei orgânica dos Serviços Regionais de Agricultura.
Voltou o Sr. Deputado a referir a questão dos 70 % dos funcionários do Ministério que estão concentrados em Lisboa. Já outro dia falei aqui nisso. Recordo-me de alguns números que poderei revelar à Câmara, pois a realidade e bem outra: nós temos cerca de 25,5 % dos funcionários do Ministério em Lisboa, 37,5 % ads-

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tritos aos serviços centrais, mas estão dispersos pelo País em instituições dos serviços centrais e o restante são funcionários que estão colocados nas direcções regionais. A perspectiva é bem outra daquela que o Sr. Deputado aqui levantou.
Há outras questões interessantes sobre este aspecto da estrutura de funcionários do Ministério mas, como há pouco disse, ela está levantada, havendo apenas duas ou três questões que ainda necessitamos de trabalhar para poder tirar as conclusões correctas.
Para quando o instituto dos vinhos de denominação de origem, foi outra pergunta que o Sr. Deputado fez. Sr. Deputado, o projecto de diploma legal para a institucionalização do instituto dos vinhos de denominação de origem está praticamente concluído, indo agora iniciar-se a fase de circulação pelos Ministros interessados para poder ir a Conselho de Ministros. Isso tem naturalmente a ver também com o problema da disciplina de rotulagem. Mas sobre isso temos um outro diploma legal que foi preparado na Secretaría de Estado da Alimentação que está também para agendamento em Conselho de Ministros.
Suponho que, mais ou menos, consegui cobrir, no essencial, as intervenções dos Srs. Deputados. Tenho pena que em 50 minutos de perguntas não tenha sido possível responder com mais detalhe, mas espero que relevem essa falta, porque afinal essas perguntas decorrem do enorme interesse que os Srs. Deputados manifestaram quanto à intervenção sobre agricultura, e isso naturalmente muito honra o próprio Ministro da Agricultura.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, é para um protesto visto que essa é a única figura regimental que posso usar.

O Sr. Presidente: - Continuamos a usar do protesto como figura regimental para um fim que não é aquele que regimentalmente está previsto.
Mas tem V. Ex.ª a palavra, em função dos hábitos adquiridos.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Abone em meu benefício, ao menos, a sinceridade com que recorro a esta figura regimental.
O Sr. Ministro da Agricultura começou por congratular-se, e terminou congratulando-se, pelo enorme interesse que a sua intervenção tinha despertado. Eu, na sua posição, Sr. Ministro, seria mais prudente porque as muitas perguntas podem ser suscitadas por dois motivos: ou é, de facto, uma intervenção riquíssima de elementos novos, suscitando múltiplas interrogações; ou é uma intervenção que deixou os deputados completamento sequiosos, porque nada disse daquilo que eles gostariam de ouvir e, portanto, obrigou-os a colocar as questões. E devo dizer-lhe que, nas suas respostas, Sr. Ministro, muito pouco adiantámos.
Eu sei que tem dificuldades de tempo e, portanto, não lhe irei fazer muitas perguntas, apenas uma ou duas, dizendo, desde já, que o meu partido estará à disposição de ceder ao Governo, na pessoa do Sr. Ministro da Agricultura, d tempo necessário para me poder responder, esperando que o Sr. Ministro - que invocou as suas capacidades de economia - saiba gerir esse tempo com um pouco mais de eficácia do que geriu o tempo das suas respostas.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro disse-nos, em matéria de arrendamento e de emparcelamento, que o Governo tem já prontas as propostas de lei. Óptimo. Mas justamente por isso - e tal era importante para podermos ajuizar do real sentido que nos é proposto nas grandes opções do Plano -, gostaria de saber qual e a filosofia que enforma essas propostas de lei. Como é encarado, de facto, o fenómeno do arrendamento e o do emparcelamento e, nomeadamente, o do emparcelamento? O Sr. Ministro sabe, tão bem como eu, que o problema do emparcelamento não se pode resolver apenas por dotações orçamentais e pela pura e simples intervenção do Estado no mercado fundiário. O único resultado seria o de favorecer a especulação fundiária, aumentar os gastos, o que não nos levava a lado nenhum. Ora, a resposta que nos deu nada nos adiantou. A única coisa que sabemos é que o Sr. Ministro e o Governo têm uma proposta de lei a apresentar a esta Assembleia.
Perguntei-lhe, concretamente, Sr. Ministro, que investimentos propõe o Governo fazer para contribuir para a tal transparência de mercados de produtos agrícolas. Continuo sem saber, concretamente, que investimentos propõe o Governo fazer. Isto não é apenas um voto pio.
Para terminar, apenas uma questão relativa à Zona de Intervenção da Reforma Agrária. O Sr. Ministro repeliu - é verdade que já o tinha dito aqui - que nessa matéria o Governo não tem nada a acrescentar porque se limitará a cumprir a legislação vigente. Muito bem. Mas então eu penso que o Governo teria mais alguma coisa a acrescentar, já que discutimos as grandes opções do Plano para 1984, e nomeadamente, o Orçamento do Estado. Devia responder-nos a esta pergunta que lhe vou fazer: sendo assim, qual é a superfície que o Governo, de acordo com a legislação vigente, pensa expropriar em 1984? Quais são as verbas inscritas no Orçamento para o pagamento das indemnizações correspondentes a essas expropriações que, no quadro da legislação vigente, o Governo deverá implementar?

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, há mais oradores inscritos. Deseja responder já ou no fim?

O Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação: - Respondo no fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, é para um protesto regimental e stricto sensu.
Protesto porque o Sr. Ministro não respondeu praticamente a nenhuma das perguntas que lhe fiz, designadamente quanto ao plano integrado de Trás-os-

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- Montes, ao plano da Cova da Beira, à dependência externa dos produtos agrícolas e alimentares, tais como, cereais, oleaginosas e açúcar, assim como também não respondeu a uma única das quatro perguntas que fiz sobre o cumprimento dos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, pelo que deduzo que a resolução do Conselho de Ministros, de 30 de Agosto de 1983 - que tão publicitada foi -, sobre a intenção do cumprimento de tais acórdãos não passou, também neste caso, «de música celestial».
De todo o modo, nós e a Câmara tiramos as conclusões políticas que se impõem desta recusa por parte do Governo em dialogar connosco e deste silêncio governamental.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Custódio Gingão.

O Sr. Custódio Gingão (PCP):- Protesto porque, mais uma vez, o Sr. Ministro omitiu não só as perguntas que lhe fiz como a questão da reforma agrária. Limitou-se a responder que tinha respondido aquando da interpelação do PCP. Daqui por uns dias, o Sr. Ministro vem aqui e diz: «eu respondi a essa questão aquando da discussão do Orçamento do Estado». Desta forma o Sr. Ministro vai-se desculpando, não respondendo nunca a uma questão tão concreta.
A primeira pergunta que lhe pus, à qual o Sr. Ministro não respondeu, foi a da sabotagem que é feira no Alentejo relativamente à água que temos nas barragens e que não é aproveitada. O Sr. Ministro omitiu essa questão.
Uma outra questão que lhe pus, e à qual o Sr. Ministro também não respondeu, diz respeito aos montados de sobro, uma riqueza nacional. Nós sabemos como e onde é que o dinheiro está a ser gasto: ele é desviado precisamente da agricultura.
Também não respondeu a uma pergunta, que não feita por mim, mas por um camarada meu - o Sr. Deputado Álvaro Brasileiro -, sobre a questão dos $20 para o tomate, questão que os agricultores reclamam e que o Ministério disse que ia aceder. A essa questão, o Sr. Ministro também não respondeu.
Quanto à Reforma Agrária, o Sr. Ministro apenas disse que o Ministério se rege pela lei vigente. Fica esta Câmara a saber que o Ministério se rege pela «lei do funil». E rege-se pela «lei do funil» porque, dos 200 Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, 199 são das unidades colectivas de produção. O Ministério não cumpriu um único desses 199, mas um deles, que é a favor dos agrários, o Ministério cumpriu. Ficamos a saber qual é a política do Ministério no que diz respeito aos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação.

O Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação: - Serei breve, Sr. Presidente.
Algumas das questões que voltaram a ser postas não são questões relacionadas com as Grandes Opções do Plano e por isso não utilizarei muito mais do tempo de que disponho, não porque elas não tenham importância mas porque realmente não disponho de muito tempo.
O Sr. Deputado Lopes Cardoso volta a pôr-me a questão do arrendamento e do emparcelamento e pergunta qual é a filosofia. Não creio que seja correcto, havendo duas propostas de lei para entregar na Assembleia, que elas sejam anunciadas antes de serem entregues aos respectivos grupos. parlamentares, tal como é a sua filosofia.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Ora essa!

O Orador: - Sobretudo no caso do emparcelamento, sabemos que fazer hoje totalmente por intervenção do Estado, emparcelamento, tem riscos. Evidentemente que nos tempos que correm - embora precisemos de uma nova lei de emparcelamento pois a outra era, salvo erro, de 1962 -, a verdade é que o processo tem de fluir por mecanismos diversos de intervenção directa do Estado no mercado fundiário: tem de fluir por acções paralelas, tais como o próprio crédito PAR, através do regime de tornas, do regime de emparcelamento que está nele previsto e, enfim, através de outras acções desse tipo.
Por outro lado, no que se refere aos perímetros de regra, há um outro aspecto que é o da declaração das zonas piloto e respectiva legislação. Esse é um outro bloco de legislação que estamos a concluir e que também tem a ver com isto.
Quanto aos investimentos que o Governo se propõe fazer para contribuir para a transparência do mercado. Suponho que o que está na ideia do Sr. Deputado Lopes Cardoso é o problema do Mercado Abastecedor de Lisboa. Evidentemente que essa não ê uma questão para 1984, mas poderá ser para 1985 ou 1986...

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Ministro, o que está por trás da minha intervenção é, pura e simplesmente, o que vem declarado nas Grandes Opções do Plano, onde se diz que é necessária uma maior transparência no mercado e que o Governo privilegiará os investimentos nesses sector.
Já agora registo que vamos esperar mais 2 anos para que o Governo ponha cobro a uma situação reconhecidamente ilegal, que dura desde 1977.

O Orador: - Essa é outra questão. Uma questão é a resolução da situação actual -já noutra ocasião lhe dei uma resposta sobre este assunto - e outra questão é o problema do novo mercado de Lisboa. São duas coisas distintas.
Quanto à zona de intervenção, é verdade que não há verbas inscritas para expropriações. Suponho que isto responde à pergunta do Sr. Deputado. Na realidade, a perspectiva do Governo neste momento não é essa, para além de alguns casos em que há necessidade de expropriar para resolver a situação de pequenos agricultores, que ocupam terras que não foram expropriadas.

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O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Mas vão expropriar?

O Orador: - O Sr. Deputado António Taborda ...

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Posso interrompe-lo novamente, Sr. Ministro?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Sr. Presidente, peço que o tempo que eu utilizar seja descontado no tempo de que a UEDS dispõe.
O Sr. Ministro disse-me que não estavam inscritas verbas neste Orçamento destinadas a indemnizações. Devo concluir daqui que o Governo não prevê expropriar. Trata-se de uma interpretação sui generis de respeitar a legislação em vigor e dentro da qual diz o Governo pretender actuar.

O Orador: - O Sr. Deputado é livre de tirar as conclusões que entender das minhas palavras.

O Sr. Lopes Cardoso (UEDS): - Mas vão expropriar?

O Orador: - Em relação ao plano integrado de Trás-os-Montes, Sr. Deputado António Taborda, é certo que não respondi a essa questão porque referi esse assunto na minha intervenção. Com efeito, disse que o plano integrado de Trás-os-Montes estava este ano dotado de uma verba superior a 500 000 contos.
Quanto ao Sr. Deputado Custódio Gingão, que me perguntou que medidas pensa o Governo tomar relativamente à sabotagem nas barragens, devo dizer-lhe que a maior parte destas barragens estão hoje a ser administradas pelas Associações dos Legantes.

Vozes do PCP: - Não, não!

O Orador: - Creio que estas associações têm alguma coisa a dizer.
Quanto aos problemas dos montados de sobro, devo dizer-lhe que por iniciativa do Sr. Secretário de Estado das Florestas está nomeado um grupo de trabalho, onde participam elementos de outros ministérios, para se estudar todo o problema da cortiça e respectivo circuito.
Diz o Sr. Deputado que este Governo se rege pela lei de funil. Direi que não, que estamos numa perspectiva diferente. O ponto de vista do Governo em relação aos Acórdãos do Supremo Tribunal - embora isto não seja matéria em discussão - é conhecido: trata-se de reinstruir os processos e, uma vez reinstruídos, serão esses processos enviados ao Supremo Tribunal e o Governo cumprirá o que for decidido pelo Supremo Tribunal, uma vez que o Governo actua numa perspectiva legal.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não fiz esta interpelação mais cedo porque aguardava que o Sr. Presidente da Assembleia da República estivesse a presidir a esta sessão. Contudo, pelas informações que tenho da Mesa, razões ligadas à Presidência não lhe permitirão ocupar essa função até ao final desta sessão.
Sendo assim, aproveitarei este momento para colocar esta questão, que está a preocupar o meu grupo parlamentar.
Em conferência dos presidentes dos grupos parlamentares, realizada na última semana, a Assembleia da República e o Governo concordaram com a Radiotelevisão num esquema de cobertura dos debates das Grandes Opções e do Orçamento, tendo sido acordado um calendário de distribuição de tempos em que nem o Governo, nem os partidos da maioria, teriam mais tempo do que os partidos da oposição.
Sucede que ontem foi anunciado pela Radiotelevisão que hoje o Sr. Ministro das Finanças e do Plano seria entrevistado no programa «1.ª Página», precisamente sobre a matéria aqui em discussão, ou seja, as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1984.
Este assunto já tinha sido tratado em anterior conferência de líderes dos grupos parlamentares, tendo-se chegado a um consenso, estabelecido, portanto, entre partidos da oposição e partidos do Governo, no sentido de que o Governo se deveria abster, durante o período em que a Assembleia discutia as Grandes Opções e o Orçamento, de levar Ministros ligados a estas áreas a debaterem estas matérias na televisão. Inclusivamente, Sr. Presidente, nessa mesma conferência estava presente o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, que tomou nota das razões aduzidas pelos diferentes partidos e não contraditou as informações produzidas ou o consenso a que se chegou, tendo mesmo manifestado a vontade de informar o Governo do consenso a que se havia chegado e de que iria actuar em conformidade.

m face do anúncio de ontem na RTP da manutenção do programa com a presença do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, gostaria de interpelar a Mesa.
Em primeiro lugar, tem a Mesa da parte da RTP alguma informação sobre o referido debate?
Em segundo lugar, tem a Mesa alguma informação ou tenciona actuar no sentido do cancelamento desse debate, como resultava do consenso estabelecido na já referida conferência?
Em terceiro lugar, caso a Mesa não disponha dessas informações, requeremos de imediato uma conferência dos grupos parlamentares para que pudéssemos, ainda a tempo, impedir que por uma manobra dilatória se tentasse atribuir ao Governo, de uma maneira escandalosa - e já se tinha acordado num esquema de cobertura -, tempo de antena sobre esta matéria durante a discussão das Grandes Opções do Plano e do Orçamento para 1984.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: A intervenção televisiva de hoje do Sr. Ministro das Finanças

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e do Plano também foi por nós questionada na reunião dos líderes dos grupos parlamentares.
Nessa altura registámos que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares tomou nota das nossas objecções. Nessa altura, ficámos com a ideia de que o Sr. Secretário de Estado concordava inteiramente com as nossas objecções no sentido de que não era conveniente que nesta altura o Sr. Ministro participasse no programa «1.ª Página», precisamente na altura em que ia ser transmitido o debate- sobre as Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado.
Mas não é esta a questão que aqui queremos levantar.
A questão que queremos aqui levantar foi-nos suscitada pelo Sr. Deputado Jorge Lemos. Na verdade, a propósito da transmissão televisiva deste debate, levantámos outras questões e nunca demos o nosso acordo ao esquema que foi proposto na reunião dos líderes parlamentares. Ficou estabelecido nessa reunião que a ordem de intervenção dos grupos parlamentares nas transmissões televisivas era inversamente proporcional à sua representação parlamentar. Entendemos que esta ordenação das intervenções não era susceptível de fielmente reflectir o que se passava na Assembleia e, por outro lado, privilegiava os grupos parlamentares da maioria, que teriam tempos de antena mais alargados e mais próximos do Telejornal das 20 horas e, como tal, com maior audiência.
Lavrámos nessa altura o nosso protesto, mas não conseguimos o vencimento da nossa posição. Contudo, conseguimos apenas da parte do Governo uma aceitação relativamente ao princípio de que o Governo não deveria intervir sempre no final dos debates, mas deveria alternar a sua posição.
Como é lógico, de acordo com a nossa posição, o Governo deveria intervir no primeiro dia a abrir a cobertura televisiva - visto que ele é o autor das propostas em discussão - e no final da mesma, respondendo à interpretação e às questões que no decurso destes debates lhe são colocadas.
Quanto aos grupos parlamentares da maioria, não conseguimos demovê-los da sua posição, isto é, no sentido de que a ordem de intervenção seria sempre inversamente proporcional à representação parlamentar dos vários partidos.
Sr. Presidente, é lamentável esta situação. Aproveitamos a questão colocada pelo PCP para levantar esta questão, pois não demos o nosso acordo e entendemos, em última análise, que a questão ainda não está decidida. Como tal, deve ser remetida para a RTP a responsabilidade de decidir qual a ordem de intervenção dos vários partidos.
O que nós pretendíamos com as nossas propostas não era obter melhor e mais privilegiado tempo de antena. Pretendíamos apenas tornar menos fastidiosa a transmissão do debate, tornando-o mais próximo da realidade do debate nesta Assembleia.
É essa posição que aqui queremos deixar bem expressa, no sentido de que os problemas que se põem com as transmissões televisivas não sejam limitados àquele que foi colocado pelo PCP, pois são mais vastos na sua própria natureza e no seu próprio âmbito.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pedi a palavra para dar uma breve informação. O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares não vinculou - nem podia vincular - o Governo na reunião dos líderes parlamentares, até porque se pronunciou sobre matéria sobre a qual não tinha orientação antecipada do Governo.
O Sr. Secretário de Estado fez chegar ao meu conhecimento o que se tinha passado, tal como o Sr. Deputado Nogueira de Brito. Eu comuniquei ao Governo o consenso a que os partidos tinham chegado, no sentido de o Sr. Ministro das Finanças e do Plano não ir - como estava previsto - participar no programa televisivo para que fora convidado, uma vez que estava a decorrer a discussão dessas matérias nesta Assembleia. O Governo entendeu que se tratava de um convite há muito tempo aceite, já anunciado pela RTP aquando da entrevista do Secretário-Geral do PCP, Dr. Álvaro Cunhal, que se tratava de uma sequência de entrevistas a líderes partidários e que não havia nenhuma razão para se alterar essa sequência.
Por outro lado, entendeu o Governo que o convite não tinha sido feito para se debater expressamente as Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado, mas sim para se debater a política económica do País.
Foi esta a razão que determinou a posição do Governo, que lhe pareceu - e eu pessoalmente concordo - acertada. Não haja dúvidas que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano não vai repetir na televisão o debate feito nesta Assembleia sobre esta matéria. O Sr. Ministro irá certamente pronunciar-se em matéria de política económica e financeira do País.
Isto quanto ao primeiro aspecto, que nada tem, portanto, de escandaloso.
Quanto ao segundo problema, que nada tem também de lamentável, é exacto que o Sr. Deputado Nogueira de Brito me fez sentir o seu ponto de vista contrário à ordem que tinha feito prevalência - embora me pareça que não está nada decidido em definitivo - na conferência a que fez referência. Simplesmente, objectei ao Sr. Deputado que a ordem com a qual o Sr. Deputado discorda é a ordem tradicional neste Parlamento. Se sairmos desta tradição, nunca mais ninguém se entende e entramos na confusão ou no domínio das minorias pelas maiorias.
Portanto, pareceu-nos que, enfileirando pela tradição nesta Casa - e que é, apesar de tudo, lógica -, em que os partidos maioritários têm o direito normal de se pronunciarem depois de terem ouvido os partidos minoritários, estávamos a ser mais lógicos do que se optássemos pelo inverso.
Em todo o caso, aceitei espontaneamente que o Governo não deveria encerrar sistematicamente as comunicações televisivas, mas que deveria alternar, ora sendo o primeiro ora sendo o último. Parece-me que foi perfeitamente razoável - e ainda agora me parece.
Esta é, portanto, a posição do Governo e não me parece que valha a pena pô-la de novo em causa.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa foi interpelada, pelo que presumo que importa dar a resposta. Assim, a Mesa não aceitará mais pedidos de palavra, pois caso contrário entraríamos numa espiral de novas intervenções, fugindo do fulcro do tema que justifica a nossa presença aqui neste momento.

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Quanto à interpelação que foi feita, devo dizer que a Mesa não está em condições de dar uma resposta pronta e imediata sobre o consenso que foi fixado, tal como o PCP o entende, bem como às questões levantadas pelo CDS.

enso que poderei durante o intervalo regimental contactar o Sr. Presidente da Assembleia, para melhor nos esclarecermos sobre este problema e, porventura, promover de imediato uma reunião com os líderes parlamentares para em definitivo se definir a situação.
Se não me levarem a mal, pelo menos aqueles que ainda pretenderiam usar da palavra, vamos retomar os nossos trabalhos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, em primeiro lugar para sublinharmos que, pela nossa parte, há disponibilidade para desde já reunirmos em conferência dos grupos parlamentares para resolvermos este problema.
Em segundo lugar, quase gostaria de dizer «milagre, milagre, eis que o Ministro das Finanças, independente, foi promovido a líder partidário neste momento», ou seja, precisamente na altura em que se discutem as Grandes Opções e o Orçamento.
Em terceiro lugar, gostaria de sublinhar o seguinte: saibamos, de uma vez por todas, as linhas com que nos cosemos, para que não venha a RTP dizer aos líderes parlamentares que deve ser a Assembleia da República a dizer como deve ser feita a cobertura destes debates e, nas costas desta Assembleia, organize debates precisamente com o responsável pela pasta governamental responsável por este debate.
Era só isto o que eu queria dizer, Sr. Presidente, e vamos reunir a conferência dos líderes parlamentares.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Jorge Lemos disse que era só isso e disse muito, o que agora implica que, com toda a justificação, seja concedida a palavra a outros Srs. Deputados que se inscreveram, apesar de cairmos neste círculo vicioso e de nos perdermos com estas pequenas coisas, que apesar de terem muito interesse, estão fora do debate.
Aliás, eu já tinha pedido quo abordássemos este problema durante o intervalo numa reunião dos líderes dos grupos parlamentares.
V. Ex.ª, Sr. Deputado Jorge Lemos, não quis aceitar esta posição, tendo novamente solicitado o uso da palavra, facto que agora me obriga a justificar, de algum modo, a concessão da palavra aos demais oradores inscritos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Achamos inteira estranheza na posição defendida pelo Sr. Deputado Jorge Lemos. Desde logo, essa estranheza advém da circunstância de no programa «1.ª Página» da passada semana o líder partidário entrevistado ter sido o Secretário-Geral do partido do Sr. Deputado Jorge Lemos.
Com efeito, deveria o Sr. Deputado estar muito distraído - e muito estranharíamos nós se não tivesse visto esse programa -, uma vez que não foi ontem que a RTP anunciou um programa com o Sr. Ministro das Finanças e do Plano. Tal anúncio foi feito há 8 dias, na imediata sequência do programa em que foi entrevistado o Secretário-Geral do seu partido.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Leia o que eu disse!

O Orador: - Srs. Deputados, consideramos uma estranha preversão esta de pretender que seja a Assembleia da República a determinar os critérios dos programas da RTP, nomeadamente em relação a um programa que tem o seu próprio ritmo e o seu próprio enquadramento. Já estiveram nesse mesmo programa representantes e líderes da oposição, pelo que muito seria de estranhar que por causa deste debate pretendêssemos sonegar ao País a possibilidade de os Membros do Governo se explicarem a esse mesmo país sobre matérias tão essenciais e que ultrapassam este próprio debate.
Quanto à questão levantada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, queremos dizer - reafirmando, aliás, a posição já salientada pelo Sr. Ministro Almeida Santos - que, sendo tradição nesta Casa que a ordem de intervenção na cobertura televisiva dos debates parlamentares se faça pela ordem inversa da representação proporcional dos partidos, não fizemos nada de novo. Inclusivamente, limitámo-nos a sustentar um critério que já foi no passado o critério do CDS. Portanto, nesta matéria não fomos nós que mudámos por sermos agora maioria; foi o CDS que mudou por ser agora minoria.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Assim, não temos de alterar uma posição que é desde o início coerente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A substância da pergunta que eu pretendia fazer ao Sr. Ministro Almeida Santos já está coberta pela intervenção do Sr. Deputado Jorge Lemos.
Na verdade, o Sr. Ministro disse que o programa televisivo em causa era dedicado aos líderes partidários e, nessa qualidade, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano tinha sido convidado. Gostaria apenas de saber se o Sr. Ministro das Finanças e do Plano já substitui o Secretário-Geral do PS ou o Presidente ou um Vice-Presidente do PSD, para que possa agora ser considerado líder partidário, visto que não nos consta que ele tenha um partido, pois sempre nos foi apresentado como independente.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Trata-se apenas de uma curiosidade que temos, mas que gostaríamos de saber. Pode ser que tenhamos entendido mal, pois verifiquei que o Sr. Ministro Almeida Santos tinha já pedido a palavra para responder. Certamente irá dizer que a Câ-

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mara interpretou mal a expressão que utilizou, no sentido de que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano estaria hoje no debate televisivo a que se tem feito referência na qualidade de dirigente partidário.
Em segundo lugar, diz o Sr. Deputado Jorge Lacão que não se deve coibir um Membro do Governo de explicar ao País o que é o Orçamento. Pergunto: visto que este Parlamento está a exercer o seu direito de crítica em relação ao Orçamento apresentado pelo Governo, da responsabilidade do Sr. Ministro das Finanças e do Plano, compreender-se-á que ao mesmo tempo o Sr. Ministro das Finanças e do Plano queira abrir uma outra frente directamente com o País? Será que o Sr. Ministro não acredita que os deputados aqui presentes são legítimos representantes do povo português e que estão a exercer o direito institucional e constitucional de criticar, censurar, fiscalizar ou louvar o Governo pelas medidas que toma? Será que o PS entende que, independentemente deste direito dos deputados, deve o Sr. Ministro abrir um outro debate com o País, sem a mediação desta Casa, que é a Câmara onde o povo português está representado?
Gostaria ainda de perguntar se será eticamente recomendável que, enquanto a Assembleia fiscaliza e censura, no bom sentido da palavra, o Orçamento apresentado pelo Governo, o Governo vá à televisão dar a sua versão, sem que os representantes dos partidos da oposição - visto que os partidos da maioria carimbam de chancela tudo o que vem do Governo - possam participar deste programa. Se o povo português precisa de ouvir o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, também é certo que precisa, democraticamente, de ouvir os partidos da oposição.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, reivindicamos o direito de ir com o Sr. Ministro das Finanças e do Plano à televisão debater diante do povo português aquilo que está neste momento a ser aqui debatido. É que não iremos dizer coisas diferentes, tal como o Sr. Ministro não irá com certeza dizer coisas diferentes daquelas que aqui diz. Como tal, os partidos da oposição - o CDS pelo menos - reivindicam o direito de acompanharmos o Sr. Ministro das Finanças e do Plano ao programa «1.ª Página» para, diante do povo português, uma vez que o PS entende que só o debate travado na televisão é que é feito diante do País e que nesta Assembleia estamos de costas voltadas para o País.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que estamos a ferver em pouca água, se me permitem esta observação brejeira.
Antes de mais, gostaria de lembrar ao Sr. Deputado Jorge Lemos que não houve qualquer espécie de organização de programas entre um Ministro deste Governo e a Radiotelevisão. Se o Sr. Deputado fez esta afirmação fê-la gratuitamente. Caso contrário, deve retratar-se e dirá de onde lhe vem o conhecimento desse facto. Nenhum Ministro deste Governo, falou com a Radiotelevisão sobre a organização deste programa.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Posso interrompê-lo. Sr. Ministro?

O Orador: - Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro, há cerca de uma semana o Governo foi alertado para esta situação. Com efeito, o Governo foi informado de que, por consenso...

O Orador: - Já lhe disse, Sr. Deputado, que o Governo foi alertado por mim próprio, mas manteve a sua posição,

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Um momento, Sr. Ministro. Eu não estou aqui a atacar a RTP, nem a atribuir intenções ao Governo.

O Orador: - Desculpe, mas está!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - O que eu estou a dizer é que, curiosamente, no momento em que se está a debater na Assembleia da República as Grandes Opções de Plano e o Orçamento do Estado, ou seja, a política económica e financeira deste Governo e que vai ser imposto ao País em 1984, a RTP convida o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.
Aliás, não é por acaso que este Sr. Ministro, que sempre tem estado presente a este debate, não esteja hoje presente. Será que quando ele vai responder à televisão não responde ao Pais? Ou será que considera de menor importância responder aos deputados? Não estará o Sr. Ministro a preparar o debate na televisão?

O Orador: - O Sr. Deputado está a fazer outra intervenção ou a pedir esclarecimentos à minha intervenção?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Estou a pedir esclarecimentos.

O Orador: - Não. O Sr. Deputado está a somar elementos novos. Para isso, não autorizo que me interrompia. Para isso, peça a palavra à Mesa.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não ferva em pouca água!

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Ministro...

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro e Sr. Deputado Jorge Lemos, agradeço o favor de não estabelecerem diálogo.

O Orador: - Sr. Presidente, nós permitimos que nos interrompam, mas não para se fazerem novas intervenções, como é tradição nesta Casa.
Sr. Deputado Jorge Lemos, o que eu ouvi da sua boca foi um protesto contra o facto de o Governo - e até falou no representante do Governo para a Comunicação Social - ter organizado o programa com a RTP. O esclarecimento que lhe dei foi que nenhum Membro do Governo, nomeadamente esse

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que referiu, organizou programa algum. Assim, se o Sr Deputado tem elementos para fazer a afirmação que fez, faça favor de dizer à Câmara quais são. Se não tem esses elementos, faça favor de se retratar, pois fez uma afirmação que não podia ter feito e fê-la gratuitamente e menos honestamente.

Aplausos do PS e do PSD.

Desculpará que lhe diga isto, mas é isto o que este em causa.
Queria ainda dizer que o Governo tomou a posição que entendeu que devia tomar, aceitando um convite da televisão - não foi o Governo que pediu à televisão que convidasse o Sr. Ministro das Finanças e do Plano.
Quando eu referi que se tratava de líderes partidários, fi-lo porque até então só tinham estado presente líderes partidários. Se a RTP entendeu que a partir de certa altura devia passar a ir não apenas líderes partidários, esse problema é com a RTP.
Quero dizer que o Governo não manda na programação da RTP. Se esta fizer programações que não agradam ao Governo poderá não ter a colaboração de Membros do Governo para essa mesma programação. O Governo reserva-se o direito de estar ou não presente quando é convidado. Esta Assembleia e os partidos farão o mesmo.
De qualquer modo, não queira esta Assembleia substituir-se ao Governo naquilo que ele não quer fazer, ou seja, mandar na programação da RTP. A RTP faz o que entender, o Governo deu a sua opinião e se ela não estiver de acordo com o que a RTP decidir o Governo reserva-se o direito de não comparecer.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, o meu nome foi referido pelo Sr. Ministro acho que tenho, pelo menos, se não for outra a figura, o direito de me defender.

O Sr. Presidente: - Bom, é um aproveitamento que faz dessa figura regimental e porque, infelizmente, caímos nesse hábito. Tenha a bondade, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, não é qualquer tipo de aproveitamento desta figura regimental uma vez que foi pedido pelo Sr. Ministro que me retratasse.
Considero que não tenho que me retratar, trouxe a esta Assembleia com toda a frontalidade um problema que preocupa o meu partido e que resultou, aliás, de um consenso estabelecido entre todos os partidos em reunião de líderes de grupos parlamentares. O que eu queria dizer, Sr. Ministro, é o seguinte: não estou a criticar a RTP, a RTP tem os seus critérios e convida quem quiser, estou a criticar o Governo porque neste quadro, sabendo da opinião unânime dos partidos na Assembleia da República, aceitou um convite da RTP para participar num debate com as características que já aqui foram evidenciadas e no âmbito em que se vai travar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A minha crítica é tão-só e simplesmente esta. É uma crítica ao Governo e não, logicamente, à RTP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Ministro do Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Ministro? Para dar explicações à Câmara?

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, foi invocado o direito de defesa e, por isso, necessariamente tem de haver uma resposta. Como, no entanto, o Sr. Deputado Gomes de Pinho se inscreveu para, penso, me colocar uma pergunta, responderia em conjunto às duas intervenções.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, durante a fase final da intervenção do Sr. Ministro Almeida Santos tinha-lhe pedido uma interrupção que, aliás, me foi concedida. Era, portanto, na sequência dessa intervenção que gostaria de colocar duas questões que, penso, são vitais para o esclarecimento deste problema.
A primeira questão é a seguinte: o Governo aprova a atitude da Televisão de convidar neste momento o Sr. Ministro das Finanças e do Plano para participar no programa 1.ª Página?
A segunda questão é esta: o Sr. Ministro Almeida Santos está em condições de nos garantir que a Televisão não alterou os critérios que tinham presidido inicialmente à realização de uma série de programas. 1.ª Página para, a partir dessa alteração, poder incluir a entrevista com o Sr. Ministro das Finanças e do Plano?
Gostaria de lembrar a esta Câmara - penso que todos podemos dispor deste documento - que na altura em que foi entrevistado o líder do CDS, no início desta série de debates, foi anunciado publicamente pela responsável do programa que se tratava de uma série de entrevistas aos líderes das quatro principais forças políticas do País. De facto, só por lapso, creio eu, é que o Sr. Ministro referiu o Sr. Ministro das Finanças e do Plano como um líder partidário ou parlamentar, visto que, obviamente, o não é.
Estas duas circunstâncias deixam-nos antever - era esse o problema que do nosso ponto de vista aqui devia ser esclarecido - que houve uma alteração de critérios, facto que se nos afigura grave.
Para nós é salutar, é extremamente útil, que o Sr. Ministro das Finanças e do Plano diga ao País o que é que pensa do Orçamento, entendemos, no entanto, que deviam sor dadas condições de igualdade aos representantes, pelo menos, da oposição. Recordamos, apesar de tudo, uma diferença substancial de procedimentos que aconteceu quando era Ministro das Finanças o Dr. Morais Leitão, nessa altura, convidado pela Te-

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levisão em circunstâncias bem diferentes, o Dr. Morais Leitão recusou debater na Televisão o Orçamento enquanto não fossem concluídos na Assembleia os debates.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem agora a palavra o Sr. Ministro Almeida Santos.

O Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares: - Começarei pelo fim, Sr. Presidente, para dizer o seguinte: o Governa não poderia concordar se o convite fosse feito agora. O Governo, como disse, não viu mal que esse convite tivesse sido feito há cerca de 10 dias. É completamento diferente! Não se trata de um convite feito por causa deste debate, mas sim de um convite que já está feito, com meu conhecimento, há cerca de 10 dias.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Se nessa altura já se sabia ou não que o debate calhava hoje? Não sei, sinceramente não posso responder-lhe.

Protestos do deputado do PCP João Amaral.

Oh, Sr. Deputado, aceite a boa-fé dos outros já que, ao que parece, lhe custa tanto aceitar a sua!

Aplausos do PS e do PSD.

Quanto a saber, Sr. Deputado, se a Televisão mudou ou não de critérios, não sei. Efectivamente, durante duas vezes foram ao programa líderes partidários o que me levou a cometer o tal lapso que referiu, penso, no entanto, que a partir de certa altura deixaram de ser convidados unicamente líderes partidários tendo sido feito convites a figuras políticas. Não lhe posso responder se é assim ou se a presença do Ministro das Finanças e do Plano será uma excepção ao convite feito aos líderes partidários.
Quanto ao Sr. Deputado Jorge Lemos quero dizer-lhe o seguinte: que o Sr. Deputado ache que a simples invocação do seu nome necessita de defesa é consigo - não tenho nada com isso e é um problema do seu foro pessoal - agora que faça uma acusação tão grave como a que fez, isto é, que o Governo organizou este debate com a Televisão, tendo, até, responsabilizado um ministro ou o chefe do departamento que tem tutela sobre a comunicação social ...

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não falei nada disso.

O Orador: - .... isso é grave! Pergunto-lhe: se tem elementos para fazer essa acusação diga quais são, se não tem, por favor, retrate-se.

Protestos do PCP.

Era o que eu faria no seu caso, diria «de facto não tenho elementos para ter feito esta afirmação, foi uma suspeição, foi um processo de intenção». Talvez lhe pedisse desculpa, Sr. Deputado Jorge Lemos.

Protestos do deputado do PCP Jorge Lemos.

O Sr. Deputado entende que não deve fazê-lo, é consigo, simplesmente é connosco ajuizar sobre a sua conduta!
O problema é esse!

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PCP levantou uma questão que está neste momento a ser debatida, penso, no entanto, que aquilo que se está a passar não dignifica este debate e não dignifica a democracia. A nossa proposta vai no sentido do Plenário aceitar a proposta do Sr. Presidente, feita já há algum tempo atrás, para se efectuar uma reunião de líderes para esclarecer este assunto e sem interromper o normal curso deste debate.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, pedi a palavra para dizer que aceitamos a realização da reunião de líderes. O CDS aceita sempre as deliberações das reuniões de líderes muito embora algumas delas se tenham traduzido no nosso esmagamento pela vontade dos partidos da maioria.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Sr. Carlos Lage (PS): - É falso.

O Orador: - Queríamos dizer, Sr. Presidente, o seguinte: nós não admitimos nesta Câmara processos de intenções e, por isso, não fazemos processos de intenções a ninguém.
Congratulamo-nos com a invocação da tradição, que foi feita pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, e queremos dizer que a tradição do CDS é outra e bem diferente ... é aquela que foi referida aqui pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho no sentido da atitude que foi tomada pelo nosso deputado, actual vice-presidente do Grupo Parlamentar e então Ministro das Finanças, Morais Leitão que adiou uma intervenção num programa, do mesmo tipo do programa 1.ª Página, porque ele coincidia com uma transmissão dos debates do Parlamento sobre a discussão do Orçamento.

Aplausos do CDS.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Tão-só, Sr. Presidente, para dizer que aceitamos a sugestão do Sr. Deputado José Vitorino - fomos, aliás, os primeiros a propor a sua realização - no sentido de que se reúna, desde

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já, uma conferência de líderes de grupos parlamentares para se discutir esse problema.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Estamos de acordo!

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Taborda (MDP/CDE): - Sr. Presidente, era só para dar o nosso acordo à imediata realização da reunião.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito. Sr. Deputado?

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Sr. Presidente, era unicamente para dizer que estamos de acordo.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, queria transmitir à Mesa o nosso propósito de solicitar que a responsável pelo programa 1.ª Página possa eventualmente ser requisitada para dar informações à conferência dos líderes parlamentares.

Protestos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, não sei se isso será possível!
Srs. Deputados, com a preocupação de ganhar-mos tempo convidava os líderes dos grupos e agrupamentos parlamentares para uma reunião a realizar imediatamente no gabinete do Sr. Presidente da Assembleia da República. Entretanto, para que os trabalhos prossigam normalmente, peço ao Sr. Vice-Presidente Basílio Horta que me substitua na Mesa enquanto decorrer a reunião que referi.

Assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Basílio Horta.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Gonzalez.

O Sr. António Gonzalez (IND): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É o nosso país um exemplo de desequilíbrio na ocupação humana e na má gestão dos recursos naturais, seja comparando a costa com o interior, o campo com a cidade, dentro desta, bairro com bairro ou o norte com o sul.
São estas assimetrias, resultantes de um desenvolvimento caótico e lucrativista imediato, que criam as situações de ruptura que hoje estamos a pagar, e continuaremos a pagar, se não se fizer algo que as vá reduzindo. Assim, a maior parle dos problemas com que nos debatemos, desde os transportes urbanos, a alimentação, a habitação, o abastecimento de águas, e tratamento dos esgotos e lixos e os problemas da saúde e poluição em geral, têm as suas raízes e continuarão a ter, na má gestão do espaço e das potencial idades nacionais.
A ocupação intensiva do solo, pela habitação e indústria, na maior parte das vezes em más condições, em torno das grandes cidades criam problemas às autarquias e ao Governo Central, com que todos só faremos, como, por exemplo, as dramáticas e previsíveis situações actuais devidas às fortes chuvas que se abateram, um pouco por toda a parte, sobre o nosso país.
Sem um desenvolvimento regional, estaremos sempre a remediar as consequências e nunca a atacar as causas!
Paralelamente à decisão de regionalizar, de descentralizar o planeamento do nosso país, é importante pensar no património a gerir, ou seja:

1) Recursos hídricos - se não for acautelada a situação actual, voltaremos brevemente a estar a braços com a falta de água doce, que agora cai em torrentes sem estruturas que a retenham, nas áreas do interior e de montanha, beneficiando de imediato essas zonas e indo posteriormente alimentar toalhas aquíferas subterrâneas que são intensamente exploradas a menor cota.
Nas Grandes Opções afirma-se de forma ligeira sem qualquer expressão orçamental que haverá obras públicas. Que financiamento está destinado para a construção e reparação de pequenas e médias barragens, para controle de caudais e armazenamento para fins agrícolas e onde for possível para fins hidroeléctricos? E em relação ao Alqueva e rede de barragens a ela ligada e dela dependente, que decisão vai ser tomada?
2) Solos de aptidão agrícola - como protegê-los - na realidade e não só no papel - da especulação imobiliária do empobrecimento, da salinização e da desertificação final?
3) Recursos naturais - como vamos proteger as zonas ribeirinhas no seu todo, as jazidas minerais, as florestas e as espécies animais e vegetais - importante património genérico a preservar- se as verbas a elas atribuídas muitas vezes nem sequer são de manutenção de uma situação já deficiente?

Por exemplo, o Ministério da Qualidade de Vida para as suas diversas rubricas dispõe de 1,4 milhões de contos, mais destinados a gastos administrativos e informativos do que a investimentos na investigação e em estruturas de correcção e vigilância.
O Ministério do Mar, com responsabilidades enormes e complexas que abrangem ainda as praias e arribas de grande valor ecológico, científico e económico, de que verbas dispõe, nominal e comparativamente ao ano passado, para fazer frente a uma situação calamitosa ao longo da nossa costa?
E que colaboração com autarquias, associações e instituições científicas e culturais neste campo? Pensa o Governo considerar como parceiro social o colectivo destas organizações de protecção do património natural e cultural?
Por outro lado, qual o papel reservado por este Governo ao movimento cooperativo e autogestionário

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na redução dos problemas sentidos nas áreas da habitação, transportes, agricultura, metalomecânica, cultura, educação, etc.?
Que apoio técnico e de financiamento às associações deste sector que se vão tornando mais e mais necessárias, representando um poder cultural produtivo e democrático profundamente enraizado e espalhado pelo país e que poderiam ser núcleos de desenvolvimento regional se para tal fossem apoiados.
Hoje os ecologistas têm um projecto de sociedade e uma visão diferente dos centros urbanos futuros que não serão degradantes do mundo que os rodeia e que não constituirão, para os seres humanos que neles vivem, máquinas destruidoras do seu corpo e mente.
Assim, e a par de uma regionalização que irá esvaziar e aliviar as actuais cidades das pressões de toda a ordem que dentro delas se criam, as opções que defendemos para uma urbe humanizada são, numa 1.ª fase:

1) Aumento da rede de transportes públicos urbanos (de preferência eléctricos) e construídos pela indústria nacional;
2) Encerramento de grandes áreas centrais das cidades ao transporte privado, com excepção de bicicletas para as quais haveria faixas próprias assim como nas estradas, tal como acontece em diversos países;
3) Projectar e levar à prática planos directores municipais em que se privilegiariam as zonas verdes e as áreas habitacionais limitando a construção de edifícios para serviços ou indústrias, que teriam as suas zonas próprias na periferia, travando-se assim, invertendo-se mesmo, o gigantesco afluxo humano às cidades, que atingem níveis de ruptura a certas horas.

E muito se poderia dizer ainda em relação aos tempos livres, ao desporto, à cultura, à alimentação e, por último, à saúda, reflexo de uma vivência equilibrada e feliz que só se obtém através da satisfação das necessidades atrás referidas.
Porém, para racionalizar e utilizar soluções adaptadas a esse novo tipo de vida torna-se necessário estudar novas técnicas, novas alternativas, e nesse campo as instituições de investigação portuguesa têm dado provas de que podem resolver muitos problemas que vão da política e forma de desenvolvimento urbano, ao planeamento municipal, aos métodos de cálculo de drenagem pluvial, aos estudos sobre poluição atmosférica, como é o caso do LNEC que tem em curso 220 processos de estudo de investigação programada.
Porém, o que vemos no apoio ao LNEC, por exemplo, do qual muito se poderia dizer mesmo no tocante à cooperação e contratos internacionais?
A direcção do LNEC foi informada de que por despacho do Sr. Secretário de Estado do Orçamento, de 20 de Setembro de 1983, caberiam àquele Laboratório apenas 135 139 contos (cerca de 75 % menos do que o considerado necessário), em vez dos 477 600 contos pedidos. Era a inviabilização da própria instituição! Posteriormente, devido às acções desenvolvidas pelos seus trabalhadores, foi aquela direcção informada pelo Sr. Ministro do Equipamento Social que o Conselho de Ministros teria decidido alterar aquela verba para cerca de 395 000 contos (igual à que lhe coube em 1983).
Gostaria pois de saber se sempre foi inscrita esta última verba, que mesmo assim é inferior em 80 000 contos ao previsto na lei [(alínea 6), do artigo 97.º, do Decreto-Lei n.º 519-D1/79, de 29 de Dezembro (Lei Orgânica do LNEC)] ?
Apoiar a investigação que tem dado provas é uma opção prioritária que não nos parece estar a ser tomada integralmente. Aliás, como em relação à juventude, à habitação, aos transportes, aos recursos naturais, etc.
Espero que, com mais informações, o pessimismo, que não é só meu, em relação às Grandes Opções e a este Orçamento possa ser reduzido e que a passagem à prática não me desiluda ainda mais.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tara uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao subir a esta tribuna não podemos deixar de confessar que fomos assaltados pela tentação de felicitar a Câmara e todos os seus membros pela circunstância de, pela primeira vez, serem os deputados chamados a participar activamente na feitura do Orçamento do Estado. Tal facto deve-se à nova forma constitucional que após a sua revisão, proeurou colocar o Parlamento na sua verdadeira dimensão, passando a considerá-lo uma instituição verdadeiramente actuante nos grandes momentos da vida nacional.
Tal tentação de imediato se esfumou, o que para tal bastou ouvir o Sr. Ministro das Finanças e do Plano, com um discurso morno, em que foi evidente a falta de convicção na sua própria doutrina, escutado por uma maioria governamental ausente, fria e apática, em que o apoio aos documentos que ora apreciamos nos parece muito hesitante e cheia de reticências.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): - Não apoiado!

O Orador: - Também o CDS entende que na actual conjuntura é necessário seguir uma política orçamental restritiva, em que a contenção das despesas é inevitável. Parece-nos, no entanto, que a orientação seguida não foi a melhor, manifestando ela própria desconfianças, a ponto de se autoliquidar, uma vez que mostra à evidência uma total desarticulação entre o que se propõe fazer nas Grandes Opções do Plano e a forma como o vai pôr em prática no Orçamento do Estado.
A este propósito convém chamar a atenção para a modéstia progressiva dos planos deste Governo com especial relevo para o sector agrícola.
Apresentou-nos um Programa do Governo que só por mero acaso tinha alguma coisa a ver com o ambicioso programa eleitoral, que em 100 dias se propunha resolver todos os problemas que afligiam os portugueses. Para agora nos surgir com as Grandes Opções do Plano sustidas por um Orçamento, que de uma forma deficiente, apenas nos garante a manutenção da porta aberta, mas de prateleiras vazias. Concretizamos esta afirmação fazendo uma breve análise aos diplomas em discussão.

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Considerando este Governo a agricultura como a «primeira prioridade na planificação do desenvolvimento, em sintonia com a sua importância fulcral», perspectiva que aceitamos como correcta, como a concilia com os 5 famélicos objectivos que aponta nas Grandes Opções do Plano?
Renovando a nossa discordância pelo critério seguido na selecção dos objectivos, achamo-los definidos de uma forma vaga e imprecisa, em que as omissões são encontradas amiúde. Promove-se a valorização dos espaços silvestres (não agricultados) através da implementação de uma política florestal de uso múltiplo.
Como é possível pôr em prática uma política florestal, se até à data nada se fez em relação à regulamentação da legislação que cria empresas privadas de florestação, se não existe legislação sobre arrendamento florestal e sobre o ordenamento da floresta portuguesa, se nem sequer se tem cumprido na íntegra os programas de florestação contidos no Projecto Florestal Português?
Promete-se especial atenção à actividade agro-industrial, com especial relevo para aquela que se processa através de estruturas cooperativas. Sendo conhecidas as dificuldades com que permanentemente vive o sector cooperativo, nomeadamente na área financeira, verificando a exiguidade do Orçamento por um lado - que para este capítulo reserva parte desconhecida da verba que se encontra afecta ao gabinete ministerial - e, por outro lado, conhecendo a tradicional barreira de acessos ao crédito, como se poderá operar a inevitável modernização do sector, em termos que a sua competitividade lhe permita o desenvolvimento desejável?
Aponta-se, como grande eixo para o desenvolvimento da produção e o consequente progresso do empresário agrícola, o trinómio extensão rural - formação profissional - associativismo.
Como pode um eixo sem apoio animar o que quer que seja?
Independentemente das verbas orçamentais serem imperativas de múltiplos despedimentos no pessoal tarefeiro e serem restritivas de meios (combustíveis, viaturas, ajudas de custo, etc.), nem um só passo foi ensaiado no sentido da colocação conveniente do pessoal que superocupa os serviços centrais e direcções regionais do MAPA, ou seja, nada foi feito em relação ao ordenamento orgânico dos serviços do Ministério, de modo a que os técnicos fossem postos ao alcance dos agricultores.
Considera-se o melhoramento e o alargamento da rede de regadios, bem como a criação de novos, como uma das formas de contribuir para a intensificação da exploração cultural.
Referem-se concretamente os programas hidroagrícolas de Trás-os-Montes, Cova da Beira e Baixo Mondego. Como encarar a concretização de tais projectos perante as disponibilidades orçamentais? Sabe-se, aliás, que nomeadamente o programa de hidroagrícola da Cova da Beira está destinado a esperar por melhores dias, em consequência da falta de verbas para instalação do canal principal, ficando assim a rede secundária a aguardar ligação, com inevitável deterioração.
A propósito, não queremos deixar de registar que nem uma palavra se ouve acerca da regularização do Vale do Tejo, a qual na actualidade tem especial acuidade! Apesar dos longos, exaustivos e dispendiosos estudos já feitos de há dezenas de anos para cá, eles continuam a apodrecer nos gabinetes, votando ao esquecimento a defesa da fertilidade da mancha de solos mais ricos do nosso País. Uma vez mais a água invadiu os campos que marginam o Tejo, o que em tempos foi um factor de riqueza, hoje, é causa de empobrecimento por razões já sobejamente conhecidas.
O quinto objectivo propõe-se moralizar o circuito comercial dos produtos agrícolas, apontando para isso duas vias: uma que torna actuantes os organismos de intervenção; a outra que assegura a actuação de operadores privados, públicos e cooperativos.
É de todos conhecida a posição do CDS em relação a esta matéria. Desde há muito que nos batemos pela real moralização dos circuitos comerciais em termos que o agricultor possa ver garantido o preço justo para os seus produtos e não veja sistematicamente o esforço do seu trabalho ser lucro fácil para o intermediário menos honesto.
Todavia não acreditamos que haja disponibilidade de meios financeiros, nem tão-pouco, vontade política em termos que seja possível promover uma tão complexa modificação estrutural.
Ao atendermos nos 5 objectivos prioritários verificamos que aspectos de fulcral interesse para a agricultura ficaram esquecidos.
Como será possível projectar um aumento de produção agrícola satisfatório sem que seja encarada e resolvida de uma vez por todas, a situação de injustiça gritante ainda existente na zona de intervenção da Reforma Agrária, onde os direitos privados são cilindrados quotidianamente, onde reina o subaproveitamento dos recursos e o caos administrativo, onde a hipótese de semelhança com os agricultores da CEE cada vez está mais longínqua?
Como pode o Governo ignorar o actual esquema de crédito, que carece de urgente reformulação, pois a continuar como está é completamente inacessível aos empresários agrícolas?
O apoio creditício terá que urgentemente tornar-se selectivo, assistido, desburocratizado e rápido, sem esquecer o seu integral acompanhamento.
Quanto ao seguro agrícola também nada se diz. Estará o Governo satisfeito com o actual esquema de seguro de culturas? Não entende que o mesmo deverá ser rapidamente readaptado às realidades, de molde que os agricultores o vejam como uma «ferramenta» indispensável à sua exploração?
Apenas focámos três dos múltiplos aspectos que as Grandes Opções do Plano abandonam inexplicavelmente, pois consideramo-las as prioridades das prioridades.
Manifesta o Governo intenções de apoiar o sector cooperativo, tendo para isso consignado uma verba ao gabinete do Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação. Como se vai processar esse apoio? Vai ser utilizado apenas em unidades economicamente viáveis? Que regras disciplinarão a sua aplicação?
Muitas e muitas mais questões haveria que levantar, pois os diplomas que agora analisamos são vagos e fechados, dificultando qualquer boa vontade para uma análise de pormenor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por tudo aquilo que já dissemos será fácil concluir que coube mais uma vez aos agricultores a triste sina de suportarem o crescente endividamento do sector empresarial do Estado. Este Orçamento do Estado contempla a agricultura com uma verba inferior à atribuída globalmente em 1983,

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penalizando um sector que há décadas vem sendo esquecido, aproveitando-se do suor dos agricultores para pagar as horas de greve dos senhores funcionários das empresas públicas!
Aqui renovamos a posição assumida na Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar, que unanimemente se pronunciou pela rejeição tácita dos diplomas em apreço, ao considerá-los com sérias reservas, empeditivos mesmo do desenvolvimento do sector.
A política orçamental proposta pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano apenas parece ter um objectivo, que é o de escrever o epitáfio: «Portugal morreu, honesto e sem dívidas.» Nós rejeitamo-lo, preferindo a exaltação: «Portugal vive laborioso ainda que com dívidas!»

Aplausos do CDS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Deputado Soares Cruz, ouvi atentamente a sua intervenção que me suscitou um conjunto vago de dúvidas.
Gostaria, Sr. Deputado, de, para já, lhe dizer o seguinte: esta maioria não está apática a apoiar o Governo. Para apoiarmos o Governo não precisamos de gritar nem de fazer muito barulho, apoiamo-lo com serenidade e firmeza, não temos dúvidas em dizê-lo e de repeti-lo as vezes que for preciso.
Ouvi a sua intervenção onde disse que o Ministério nada fez, que o Governo não se mexeu, que o Governo não transformou, que o Governo não actualizou, falou de várias coisas que era preciso mudar, que estavam erradas, e que exigia que o Governo fizesse essas mudanças no sentido da viabilização da nossa agricultura. Disse, também, que não havia verbas no Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação para o desenvolvimento do sector.
Ora o que me parece - aqui está a minha dúvida - é que o antecessor do actual Ministro era um militante do CDS que, deduzimos da sua intervenção, deixou o sector em muito mau estado. Se está assim tão mau e se o Governo nada fez para mudar o que está tão errado, pergunto ao Sr. Deputado Soares Cruz o seguinte: os problemas que hoje se vivem no sector agrícola não são o resultado da herança que o Governo foi encontrar?
Pergunto-lhe também o seguinte, Sr. Deputado: sendo o CDS tão defensor da iniciativa privada como é que é possível ouvir aqui - confesso que um pouco espantado - a sua intervenção a dizer que é preciso que o Estado faça, que o Estado dê o dinheiro, que o Estado vá fazer o desenvolvimento da agricultura? Não serão, de facto, mais importantes as iniciativas de correcção estrutural do sector que possibilitem uma intervenção activa, eficaz e participada dos agricultores nessa mudança ou o CDS acredita piamente nas vantagens do colectivismo descansando sereno na intervenção do Estado?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel.

O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muitas das questões que queria colocar ao Sr. Deputado Soares Cruz foram feitas pelo Sr. Deputado Leonel Fadigas, no entanto, gostaria, muito sinteticamente, de lhe fazer duas perguntas.
Primeira: o que é que o leva a ter tanta preocupação acerca das ajudas de custo aos técnicos sabendo-se - como o Sr. Deputado sabe - que neste momento existem largas percentagens de técnicos que residem no local onde exercer, as suas funções e que estão a receber ajudas de custo?
Segunda: o Sr. Deputado disse que o projecto da Cova da Beira não está a ser incentivado pelo Governo mas, certamente, não viu os números! Posso dizer-lhe concretamente que o projecto da Cova da Beira receberá este ano maior apoio do que aquele que recebeu o ano anterior. Gostaria que me dissesse o que pensa sobre o assunto.
Seria útil para o debate, que esclarecesse estes aspectos e que, se possível, explicitasse igualmente as questões que o Sr. Deputado Leonel Fadigas colocou com toda a pertinência e que eu fazia igualmente intenção de formular.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - O Sr. Deputado Leonel Fadigas começou por dizer que tinha ficado com uma série de ideias vagas. Certamente não escutou com a atenção devida a minha intervenção visto que, se assim fosse, teria ficado com algumas dúvidas concretas e não com dúvidas vagas.
Respondendo, com muito gosto, às questões que me colocou devo dizer-lhe o seguinte: em relação ao comportamento da maioria relativamente ao Governo, deixe-me dizer-lhe que é perfeitamente indesmentível o facto desta maioria estar fria e apática. Nota-se, não só no comportamento que têm tido nalgumas sedes, como no próprio Plenário ...

Uma voz do PSD: - Olhe que não!

O Orador: - ..., que a interrogação perpassa sistematicamente pelos vossos rostos sendo sintoma disso as questões que levantam à bancada governamental.
O Sr. Deputado afirmou que eu disse que este Ministério nada fez. Não disse isso, o que eu declarei foi uma coisa muito diferente, isto é, que este Ministério - considerando ser a agricultura fulcral para o desenvolvimento da economia portuguesa -, ao apresentar as Grandes Opções do Plano, coloca-se numa posição que, para mim, oferece muitas dúvidas. Por outro lado, elenca uma série de grandes objectivos que, quanto a mim, não são os mais prioritários e, por outro, para cumprir esses objectivos não possui um orçamento que possa dar cabal resposta às ansiedades que diz ter.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Em relação ao eventual caos em que este Governo encontrou o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação, é um ponto em que V. Ex.ª
- pela informação que sei que possui - não pode, de maneira nenhuma, fazer essa afirmação sem ser com

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a eventual intenção de me embaraçar relativamente a um meu colega de bancada. O Sr. Deputado pode estar tranquilo que não me embaraço nada. Estou perfeitamente tranquilo relativamente ao trabalho que o Ministro da Agricultura de então, Dr. Basílio Horta, desenvolveu no seu Ministério, posso, inclusivamente, dizer-lhe que desde 1974 até agora, foi dos ministros que mais contribuiu para o desenvolvimento da agricultura e que mais abriu o sector à iniciativa privada - nosso grande objectivo e projecto.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Quanto aos meus pedidos - pedir isto, pedir aquilo - para a agricultura e para os agricultores, V. Ex.ª continua enganado. Não quero que o Ministério, o Governo ou o Estado, tutelem a agricultura, sou rigorosamente contra essa ideia, o que quero é que o Governo não impeça o desenvolvimento da agricultura, o que quero é que o Estado coloque à disposição do sector meios para que os agricultores possam acreditar no investimento, possam tranquilizar-se e possam considerar que a agricultura é uma actividade rentável.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Se o Governo consegue tirar todas as hipóteses ao desenvolvimento do sector, se não consegue apoiar - como é sua obrigação - o sector de uma forma indirecta, dotando-o de estrutura, não haverá certamente possibilidade de aguentar o aspecto anímico dos agricultores para continuarem a sua actividade.
Relativamente às questões colocados pelo Sr. Deputado Vasco Miguel, parece-me que V. Ex.ª continua a estar distraído. Então V. Ex.ª não estava numa reunião da Comissão de Agricultura e Pescas quando uma colega nossa das bancadas do Partido Socialista afirmou que, muitas vezes, era obrigada a sair aos sábados e domingos, com sacrifício da sua vida pessoal e familiar, para levar as informações aos agricultores e que muitas dessas viagens eram feitas sem qualquer espécie de auxílio por parte do Estado, isto é, sem ajudas de custo porque os serviços não estavam dotados financeiramente para lhe pagar?
Se V. Ex.ª me vem dizer que há técnicos que estão em casa e que junto da sua casa está o seu local de trabalho e que recebem ajudas de custo, não me deve dizer isso a mim, diga, se faz favor, ao Sr. Ministro da Agricultura, Florestas e Alimentação, que está aqui presente, para que ele de imediato lhes levante um inquérito e que os penalize. Não me coloque a mim o problema porque eu desconheço-o e se o soubesse já tinha tomado essa atitude em tempo.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Por outro lado, relativamente ao projecto da Cova da Beira, pareceu-me que não ouviu muito bem aquilo que eu disse. O que eu disse foi que a rede secundária da Cova da Beira estava em riscos de se deteriorar por falta de verbas para construir o canal primário. Essas verbas não estão consignadas no Orçamento para o Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação mas sim no Ministério do Equipamento Social e tanto quanto eu sei, dito por um dos responsáveis deste sector, o Ministério do Equipamento Social informou esse responsável que não teria verbas disponíveis para a construção do canal primário. Tenho a fonte como fidedigna e, por isso, estou perfeitamente à vontade para a trazer a esta Câmara.

Aplausos do CDS.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para formular um protesto.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Queria, sob a forma regimental de um protesto, pedir ao Sr. Deputado Soares Cruz que, uma vez que afirmou que estavam errados os objectivos das Grandes Opções do Plano para o sector agrícola e que não eram estes os prioritários, me dissesse quais são, na sua opinião, os aspectos prioritários que deveriam constar das Grandes Opções do Plano.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Deputado Soares Cruz.

O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Deputado, podia responder-lhe muito comodamente que as Grandes Opções do Plano não são da nossa responsabilidade, mas não o faço porque V. Ex.ª me merece toda a consideração.
Para não lhe ocupar muito tempo vou adiantar duas prioridades que considero serem muito mais importantes do que aquelas que estão expressas nas Grandes Opções do Plano.
A saber: definir, de uma vez por todas, a política de reestruturação fundiária, quer a sul, quer a norte. A norte para resolver o problema do minifúndio, a sul para resolver o problema da zona de intervenção da Reforma Agrária que ainda hoje não tem destino certo. E reformulação de todo o crédito consignado à agricultura. Sabe V. Ex.ª, certamente tão bem como eu, quanto difícil é para um agricultor, muitas vezes com dificuldade em desenhar o próprio nome, recorrer a um mísero crédito e quando precisa de uma solução imediata demora meses e meses, se não anos, até ser resolvido o seu problema, sujeitando-se, por vezes, a ter que largar parte dele para pagamento a quem lho faça e peça.
Aqui tem V. Ex.ª duas questões que considero altamente prioritárias, não só na minha perspectiva, como - vou mais longe e digo-lhe - certamente na sua.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder de seguida ao nosso intervalo regimental até às 18 horas e 5 minutos.

Está suspensa a sessão.

Eram 17 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 25 minutos.

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em matéria agrícola, verifica-se que do Programa deste Governo para as Grandes Opções agora em discussão foi feita uma grande monda, infelizmente não das ervas daninhas, mas sim dos propósitos e objectivos que o Governo preferiu deixar no esquecimento, perante um Orçamento de Estado que os não contemplava.
Isto é de tal maneira flagrante, que aparece claramente expresso no parecer da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar.
Este parecer, aprovado por unanimidade, apresenta as conclusões que passo a citar:

Se articularmos o Orçamento proposto para 1984 com a doutrina defendida nas Grandes Opções do Plano, já de si excessivamente modestas para as carências manifestadas pelos sectores, verificamos que a impossibilidade de cumprimento é patente.
Analisando em termos globais os orçamentos dos Ministérios da Agricultura, Florestas e Alimentação e do Mar (Pescas), verificamos que a área de manobra para o desenvolvimento das suas políticas encontra-se consideravelmente espartilhada, afigurando-se-nos assim, manifestamente insuficientes as dotações atribuídas é, consequentemente impeditivas de prossecução dos objectivos anunciados.
Concretamente, temos como adquirido que o modo de organização do Orçamento, bem como as insuficiências apontadas e bem patentes nos diplomas em apreço, nos colocam sérias reservas em relação ao futuro da agricultura e das pescas, levando-nos a concluir que, deste modo, não se promoverá o desenvolvimento dos sectores em causa.
Esta crítica severa da Comissão Parlamentar deverá fazer pensar seriamente o Governo e particularmente o Sr. Ministro da Agricultura.
A gravíssima crise económica que vivemos e particularmente a dependência externa em produtos alimentares quando dispomos de reconhecidos recursos e potencialidades naturais, são fortíssimas razões para que a agricultura portuguesa seja chamada a constituir um dos factores determinantes para a saída da crise e o desenvolvimento económico do país.

Aplausos do PCP.

Mas para tal seria necessário que o Orçamento traduzisse esta perspectiva. Ora, não o faz. E, pelo contrário, as retracções orçamentais reflectem uma total falta de perspectivas, comprometendo seriamente o futuro da agricultura. Neste Orçamento, ela nem é sequer tratada em pé de igualdade com outros sectores. Se tal se verificasse, em vez dos 15,5 milhões de contos orçamentados para 1984, deveriam ser 19,3 milhões de contos; pelo menos, atribuídos à agricultura e respectivos organismos estatais.
Enquanto em 1983 as verbas para a agricultura representavam 1,98 % do total do Orçamento do Estado, em 1984 esta relação desce para 1,59 %, o que é mais um indicador da substimação a que o sector agrícola é votado pelo Governo.
Comparando com 1983, a redução de verbas nos investimentos do plano (PIDDAC) aponta para mais de 20 % em termos nominais. Mas tendo em conta a inflação, a redução real é muito superior a 40 %, andando por cerca de metade das verbas deste ano.
Este é um dos aspectos mais graves e tanto mais grave porquanto, segundo afirmaram os próprios membros do Governo que reuniram com a Comissão Parlamentar de Agricultura, os actuais 3,4 milhões de contos representam um corte de 2 milhões de contos em relação ao PIDDAC inicialmente proposto. O Sr. Ministro vem dizendo que «é necessário suster o défice da nossa balança comercial agrícola» e que tal implica «o aumento da produção e da produtividade, aliada à melhoria da qualidade e ao aumento do valor acrescentado pela transformação dos produtos do agro em que temos vocação exportadora tradicional, ou em relação aos quais novas perspectivas de exportação possam vir a ser abertas (palavras textuais). E até acrescenta que estão neste caso os produtos florestais, os produtos de produção precoce, nomeadamente os hortícolas e frutícolas, os vinhos de qualidade ...».
Ouvimos o Sr. Ministro afirmar que «aumentar a produtividade exige criatividade e inovação tecnológica». E tudo isto na perspectiva da evolução para uma agricultura que definiu como de «perfil europeu».
Mas será que é possível atingir tais objectivos com este «orçamento de manutenção, com verbas reduzidas», como se lhe referiram os próprios responsáveis do Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação quando da reunião com a Comissão Parlamentar?
Não nos foi fornecido o PIDDAC para o INIA, que aliás parece nem estar ainda claramente definido, a não ser no que toca aos cortes sofridos em relação ao solicitado pelos respectivos serviços, que rondam os 40 % a 50 % e até mais.
Citamos a Estação Agronómica Nacional, a Estação Florestal, a Estação Vitivinícola, a Estação Nacional de Fruticultura e a Estação Nacional de Tecnologia dos Produtos Agrários e as outras unidades, que de 1980 para 1982 viram diminuído o seu orçamento para cerca de metade, que durante este ano têm vivido precariamente, e já estão avisadas de que sofrerão novos cortes no PIDDAC de 1984.
Será então este o caminho para conseguir os tais hortofrutícolas o vinhos de qualidade, a tal inovação tecnológica, o aumento dos rendimentos unitários agrícolas, a tão falada agricultura de «perfil europeu»? Não, Sr. Ministro, não é assim que se chega lá!

Aplausos do PCP.

No campo das actividades transformadoras agro-industriais em que os Ministérios da Agricultura, Florestas e Alimentação e o da Indústria e Energia têm papel preponderante (embora com relações de fronteira nem sempre pacíficas), quer as unidades transformadoras pertençam ao sector primário (adegas cooperativas, cooperativas leiteiras, etc.), quer pertençam ao sector secundário (pequenas e médias empresas na sua maioria), não poderão corresponder às propostas das Grandes Opções do Plano. Para tal

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precisariam de apoio que o aparelho de Estado, à vista do Orçamento projectado, não tem condições para dar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Os cortes em investimentos virados para a produção, se de momento e aparentemente podem diminuir o défice do Orçamento do Estado, acabarão necessariamente por provocar aumentos dos défices nacionais (défice da produção em relação ao consumo, défice da balança comercial, etc.) e do próprio défice de futuros orçamentos do Estado, na medida em que diminuirão as suas fontes de receitas reais.
Defendemos, como muito mais racional, a implementação de investimentos produtivos e que, não só não têm praticamente componente importada, como permitiriam poupar milhões de contos em divisas, substituindo importações por produção nacional.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Neste sentido, criticamos veementemente a miopia que levou ao corte de grandes projectos nacionais como o Alqueva e as obras complementares do Plano de Rega do Alentejo, o Plano Nacional da Agua que constava do Programa do Governo e o projecto da beterraba sacarina, entre outros. Este último, que antes do 25 de Abril não avançou, porque se chocava frontalmente com os interesses dos grupos monopolistas nacionais e internacionais, que exploravam então as grandes plantações de cana em Angola e Moçambique, tem mau fado, porque agora está de novo congelado em nome e em função das negociações para a adesão ao Mercado Comum, pelo que continuamos a importar 100 % do açúcar que consumimos e pagamos ao preço mais caro da Europa.
Isto é um escândalo, Srs. Ministros e Srs. Deputados! E é bom que tenhamos consciência das submissões e dos graves riscos económicos que tais submissões implicam.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É altura de falarmos aqui daqueles de que depende, realmente, o futuro da agricultura portuguesa. Os que por ela de facto se sacrificam e que as restrições deste Orçamento, na linha de opções da política agrícola do Governo PS/PSD, mais vão sacrificar: os operários agrícolas, os trabalhadores da Reforma Agrária, os pequenos e médios agricultores. Sofrendo já durante as consequências da crise da agricultura e da ofensiva dos sucessivos governos contra a Reforma Agrária, os trabalhadores agrícolas, quer os que trabalham nas empresas privadas, quer o das UCPs/Cooperativas, são atingidos pelo desemprego e pela miséria e os pequenos e médios agricultores vêem agravar-se duramente as suas condições de vida.
Num clima de insegurança e de graves interrogações quanto ao futuro, atiram-se ao trabalho com coragem e é bom que se diga que, mau grado as restrições orçamentais aqui em discussão, ao seu heróico esforço se deve, e deverá, o aumento da produção e da produtividade indispensáveis para fazer sair da crise este país.

Aplausos do PCP.

Uma faceta pouco conhecida da resistência e da luta dos trabalhadores das UCPs/Cooperativas é o seu esforço constante pela melhoria e aumento da produção e dos rendimentos unitários, segundo planos de produção discutidos e aprovados democraticamente em encontros bianuais, antes das épocas das sementeiras de Outono, Inverno e Primavera. Os resultados positivos alcançados, testemunhando o papel da Reforma Agrária na agricultura nacional, mereceriam que o Sr. Ministro da Agricultura e outros membros do Governo se despojassem de preconceitos sectários e observassem e reconhecessem as UCPs/Cooperativas como das poucas empresas agrícolas deste país com boas condições de gestão e rentabilidade. Dar-lhes apoio técnico e financeiro seria um imperativo para qualquer Governo verdadeiramente patriótico.

Aplausos do PCP.

Quanto aos pequenos e médios agricultores, não só do seu trabalho e dos seus sacrifícios, mas também do seu despertar de consciência para a defesa dos interesses de classe, podemos aqui dar testemunho do grandioso III Encontro da Lavoura - Assembleia Geral da CNA, realizado em 13 de Novembro, em Coimbra, a que assistimos com outros membros da Comissão de Agricultura deste Parlamento, que ali se fez representar.
Foi importante o que lá se disse e permitam-me que vos aconselhe, sem professorismos, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, a lerem o caderno reivindicativo ali aprovado. Na proclamação deste encontro, aprovada pelos mais de 5000 participantes, representando 600 organizações da lavoura, diz-se:

A lavoura portuguesa está esmagada, arruinada, penhorada. Ê necessário que todo o país saiba que nós não podemos aguentar mais.

Isto disseram eles em Coimbra - ouvimo-lo nós, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo.
Permitam-me que termine esta intervenção com palavras que muito mais força aqui terão do que as minhas, palavras que ouvi nesse encontro:

A lavoura precisa que os agricultores portugueses sejam moralmente dignificados e materialmente recompensados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Leonel Fadigas e Marques Mendes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): - Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, ouvi com bastante atenção a sua intervenção e gostaria de lhe colocar duas simples questões. Uma é referente aos grandes projectos nacionais que referiu: o do Alqueva e o da beterraba sacarina.
Pareceu-me ver perpassar na sua intervenção uma ideia desenvolvimentista em relação à possibilidade de, no actual momento, se poderem fazer os grandes investimentos no sector agrário. Entende V. Ex.ª que é possível, na actual situação económica do país, fazer

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essa política desenvolvimentista dos grandes investimentos de obras públicas no sector agrícola?
Entende também V. Ex.ª que é possível desde já - e no caso afirmativo com que custos - fazer a opção péla produção de beterraba sacarina em Portugal?
A outra questão tem a ver com a parte final da sua intervenção, quando refere - e estou de acordo consigo - que os agricultores necessitam de ver recompensado o seu esforço. No entanto, não consegui ver nas suas palavras - ou talvez tenha ouvido mal - de que forma é que entende que os agricultores poderão ser recompensados. E como eu não vi que V. Ex.ª tivesse definido uma política de preços nem sequer que tivesse posto em causa a que está a ser seguida - e quanto a mim bem - pelo Governo, gostaria de saber se isso significa que para a Sr.ª Deputada esta política de incentivo ao estabelecimento prévio de preços é o caminho certo para atingirmos o objectivo da remuneração e recompensa da actividade dos agricultores.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): - Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha, uma das duas questões que lhe quero colocar vem no seguimento do que acaba de lhe ser formulada pelo Sr. Deputado Leonel Fadigas.
Tem-se falado sempre e muito, no projecto da beterraba sacarina e, já que V. Ex.ª diz que estamos a pagar o açúcar mais caro da Europa, gostava de lhe perguntar se por acaso nos poderá fornecer alguns elementos, com base em estudos já elaborados, acerca dos custos desse projecto e das áreas em que poderia ser desenvolvido.
Por outro lado, quero perguntar-lhe se considera que o aumento da produção e o fomento agrícola dependem apenas de subsídios, de empréstimos, ou se haverá também outras políticas passíveis de serem postas em prática no sentido de fazerem aumentar a produção e a produtividade agrícolas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Margarida Tengarrinha.

A Sr.ª Margarida Tengarrinha (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Porque tenho de ser muito breve para poupar o nosso tempo, direi ao Sr. Deputado Leonel Fadigas que a ideia por mim expendida sobre os projectos do Alqueva e da beterraba sacarina não é uma ideia desenvolvimentista. Aliás; eu expliquei a prioridade que damos aos investimentos produtivos. No entanto, digo-lhe que aqui mesmo o Sr. Ministro de Estado e dos Assuntos Parlamentares, Dr. Almeida Santos, não pôs nenhuma reserva nem fez tanto espanto como o Sr. Deputado acaba de mostrar a uma pergunta que aqui lhe foi colocada sobre esta matéria. Pelo contrário, até respondeu textualmente o seguinte (veja-se o Diário da Assembleia da República, 1.ª série, n.º 39, de 26 de Outubro de 1983, p. 1697):

[...]

Devo dizer-lhe Sr. Deputado Carlos Carvalhas que o Governo prometeu no- seu Programa que dentro de 6 meses tomaria uma decisão sobre os grandes projectos nacionais, incluindo o do Alqueva e o da beterraba sacarina. Ainda não passaram 6 meses e dentro desse prazo o Governo pronunciar-se-á sobre isso.

O que é que V. Ex.ª deduz desta resposta, Sr. Deputado Leonel Fadigas? Deduz naturalmente que não somos apenas nós que vemos o problema, só que no Orçamento essas verbas estão cortadas.
Em segundo lugar, o Sr. Deputado perguntou-me de que forma verão os agricultores a política de incentivos ao estabelecimento prévio de preços. Sr. Deputado, o estabelecimento prévio de preços, desde que haja garantias de escoamento - e isso não tem acontecido -, é realmente uma forma de incentivar a produção. Por isso não estivemos contra ela, só que o círculo vicioso do aumento dos factores de produção e do aumento de preços é um problema gravíssimo.
Em estudos que recentemente fizemos sobre questões agrícolas, vimos que o valor criado no sector agrícola é sacado para outros sectores da economia, o que anualmente se traduz num montante de cerca de 52,5 milhões de contos, grande parte do qual vai para os intermediários. Ora eu pergunto-lhe se os organismos de coordenação económica, como a EPAC, o IAPE, a AGA, vão ser desmantelados, como ainda se leu no último número do Expresso, e se esse desmantelamento incide sobre os produtos estratégicos fundamentais - como os cereais e as oleaginosas -ficando nessa altura os agricultores desprevenidos e na mão dos monopólios nacionais e estrangeiros, diga-me, Sr. Deputado, se só a política de preços resolve o problema!? ... Além disso e para lhe responder a toda uma série de questões em relação ao quo os pequenos e médios agricultores propõem para a sua própria defesa - porque eles sabem muito bem defender-se! -, empresto-lhe com muito gosto o documento da CNA, onde se encontra aquilo que eu estudo. É porque eles já têm cabeça para pensar! Portanto eu ponho-lhe o documento à disposição para V. Ex.ª não perder tempo.
Aqueles de nós que estivemos presentes aprendemos muito e julgo que também os deputados do Partido Socialista gostaram de lá estar e de ouvir o que os agricultores reivindicam.
E não é só uma política de preços que eles exigem. Sr. Deputado. Por exemplo, exigem também uma política de apoio técnico que este Orçamento não permite dar-lhes em condições consideradas satisfatórias pelos próprios dirigentes do Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação que estiveram a conversar connosco aqui na Comissão.
Portanto, creio que já respondi às questões levantadas pelo Sr. Deputado Leonel Fadigas.
Em relação ao Sr. Deputado Marques Mendes e ao problema da beterraba sacarina, dir-lhe-ei que li os estudos porque senão não teria falado neles. Obviamente não fixei números, mas certamente que estão à sua disposição, como à de qualquer deputado, os estudos que o MAP fez com equipas de técnicos, nomeadamente até com uma equipa de técnicos holandeses a estudar nas áreas de regadio o problema da beterraba sacarina e das valias desse projecto.
É estranho que o Sr. Deputado Marques Mendes me venha interpelar a mim sobre esse problema, porque qualquer dos Srs. Deputados que aqui estão, e que até são deputados há mais tempo do que eu, o estudaram como eu. No entanto e se quiser, posso mandar-lhe uma fotocópia dos arquivos dos meus estudos.

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O Sr. Carlos Brito (PCP): - Bem precisa!

A Oradora: - Quanto à questão do aumento da produção e da produtividade agrícolas e às formas de conseguir o seu aumento na zona de pequenos e médios agricultores, dir-lhe-ei, Sr. Deputado Marques Mendes, que nós sempre defendemos - e infelizmente não têm sido defendidas como deve ser! - as formas de associativismo e de cooperativismo agrícola na zona de pequenos e médios agricultores, começando pelas cooperativas agrícolas de comercialização, de transformação, as cooperativas agrícolas com apoio estatal. E nelas nos empenhámos tanto quanto pudemos.
Esta é uma forma de aumentar a produção e a produtividade.
Quanto no emparcelamento de que se fala - e que é uma outra forma de alteração das estruturas agrárias -, esse é um problema que teremos de estudar a fundo e que, de resto, ale já hoje aqui foi discutido. Podemos não estar em desacordo com certas formas de emparcelamento e podemos estar profundamente em desacordo com outras, mas que um emparcelamento feito em termos correctos poderá resolver problemas de produtividade e de aumento da produção nas zonas de pequena exploração agrícola extremamente pulverizada é também a nossa ideia. Só que temos de saber como fazê-lo.
E creio que estão respondidas as suas questões, Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate que aqui se trava, a propósito das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado para 1984, acaba por abranger tudo o que em matéria de política económica o Governo foi capaz de definir até agora.
Com efeito, para além destes documentos e da Carta de Intenções endereçada ao FMI (que por trás deles espreita), apenas o Programa do Governo aprovado nesta Assembleia versa esta matéria mas, em qualquer caso, nunca ultrapassando a perspectiva conjuntural. Este é já um sinal inequívoco de que a visão de curto prazo se encontra sobrevalorizada relativamente à de médio/longo prazo. Esta é, na verdade, a orientação do Governo, aqui claramente assumida pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano, que embora considerando mais importante o objectivo (que identificou como tendencial relativamente a estas Grandes Opções do Plano) de reformulação e modernização da estrutura produtiva, o considerou não tão premente como os de estabilização financeira que, esses sim, «são objectivos prioritários para a política económica em 1984: a redução do défice da balança de transacções correntes para 1250 milhões de dólares e a redução do défice do sector público administrativo para cerca de 6,5 % do PIB».
Assim se estabelece, sem dúvida, o primado da política conjuntural sobre a de natureza estrutural, bem patente na seguinte passagem das Grandes Opções do Plano:

[...| o Plano para 1984 será orientado para a estabilização financeira, embora condicionada por um horizonte mais vasto de reformulação da estrutura produtiva no sentido de uma menor dependência do exterior.

Esta troca de posições entre objectivos e condicionantes de política económica é tão mais incompreensível quanto é o próprio Governo que, nestas mesmas Grandes Opções do Plano, afirma entender que só através da concretização de transformações estruturais na economia portuguesa «será possível, a médio/longo prazo, criar condições para que Portugal deixe de estar ciclicamente exposto a enormes défices da balança de transacções correntes e, em consequência, a actuações restritivas de curto prazo. O Governo está firmemente convicto de que é esse o caminho pelo qual o país pode encontrar uma via de desenvolvimento não sujeita a constantes retrocessos».
Haverá talvez quem pense que uma estratégia de estabilização prévia ao relançamento da economia (que esta é, de facto, embora pretenda não se assumir como tal) apenas terá como consequência negativa, para além dos custos sociais elevados, o adiamento de tal relançamento por um período igual ao da aplicação da política de estabilização.
Mesmo que assim fosse, os custos sociais são de tal ordem que inclusivamente levaram a AIP, na sua «proposta para uma acção concreta de desenvolvimento económico global», datada de 6 de Outubro passado, a «alertar para o ponto de ruptura social que a generalização indiscriminada da situação do desemprego envolve. Na verdade, só países muito ricos, tanto no nível global como nos padrões de consumo individual; países com uma sólida estrutura orgânica de solidariedade social; ou países de total ausência de liberdade aguentam, por muito tempo, tal situação.»
Mas não são os custos sociais as únicas implicações negativas imediatas do adiamento das necessárias alterações estruturais da nossa economia. É que estas medidas de política conjuntural não se limitam a adiar a superação da crise porque, tendo consequências que perduram e que, por conseguinte, têm incidência destrutiva de natureza estrutural, comprometem processos possíveis de adoptar para promover o desenvolvimento.
Na verdade, uma política que, num só ano, reduz o nível de investimento global em 11,9 % (9,2 % em termos de FBCF), colocando-o a um nível inferior a 80 % do valor do ano passado, corte que, abrangendo todos os sectores, se sentirá imensamente mais no sector público, não poderá deixar de ter reflexos intensos sobre o aparelho produtivo quando, ainda por cima, o sector empresarial do Estado (SEE) domina os sectores fundamentais da economia. Assim se agravará inevitavelmente, a degradação tecnológica e da produtividade do nosso aparelho produtivo, por mais planos tecnológicos que se façam e se procurem implementar. E assim se farão desaparecer milhares de unidades produtivas, que poderiam ser viáveis, deitando a perder, com a sua falência, a experiência da produção e os hábitos de trabalho das suas forças produtivas e apenas deixando atrás de si o desespero do desemprego, a desvalorização da mão-de-obra, a descrença e desconfiança agravadas, não só de quem trabalha, mas também de quem é ou poderia pretender ser investidor.

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E é também assim que se fomenta a marginalidade a todos os níveis desde a criminalidade das ruas até à dos crimes contra a economia.
Neste capítulo, aliás, não se nota a preocupação de combate à economia paralela e clandestina, que se regista, impunemente, particularmente no sector exportador, que tão acarinhado e descontrolado continua a ser, presumindo-se, pois, que continuem a crescer as várias dezenas de milhões de contos anuais de capitais que, provavelmente, são ilicitamente exportados anualmente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Uma outra consequência a merecer realce diz respeito à evolução dos preços no consumidor. Numa situação em que:

1) Se «prosseguirá a orientação, já iniciada, de aplicação mais liberalizante dos regimes legais de preços ...», apontando-se como objectivo, nesta área, «a formação de preços reais e mais correctos, mediante o funcionamento transparente dos mercados ...»;
2) Se forçará o autofinanciamento das empresas públicas e se reduzirão drasticamente os subsídios;
3) Tudo aponta para nova subida a curto prazo das taxas de juro, é de temer que se possa perder o controle da inflação.

Finalmente, todo este conjunto de circunstâncias indica a forte possibilidade de agravamento da perda de razões de troca, o que, a verificar-se, viria complicar mesmo a prossecução do «objectivo prioritário» de redução do défice da balança de transacções correntes.
E disse aqui o Sr. Ministro das Finanças que este «é, de facto, o caminho de menores custos globais».
Mas o Governo não reconhece que, com a sua política, esteja a adiar o desenvolvimento. Muito pelo contrário, consta das Grandes Opções do Plano que «... o Governo não vai, em 1984, ocupar-se exclusivamente com a gestão da conjuntura; e por isso se dedicou uma fracção significativa do documento à apresentação sumária de um certo número de políticas e programas de acção, prontos a ser lançados no próximo ano, e basicamente orientados para a concretização de transformações estruturais na economia portuguesa.
Perante a ausência de indicações concretas relativamente a projectos e acções concretas a desenvolver em 1984, agravada pela recusa de resposta por parte do Sr. Ministro das Finanças quando por nós instado a fazê-lo, não pode deixar de se encarar este tipo de afirmações como meras declarações de intenções, até porque o quadro da evolução que se apresenta contempla uma situação gravemente recessiva e restritiva a nível de investimento.
Não nos restam pois ilusões. Por este andar, no fim do próximo ano, viveremos pior, produziremos menos e pior, deveremos mais ao estrangeiro e teremos de voltar a negociar empréstimos externos para conseguirmos pagar o serviço da nossa dúvida.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Muito bem.

O Orador: - Como se fará, então, a transformação da «actual política de estabilização num instrumento de modernização» que o Sr. Ministro das Finanças identificou como sendo, na área económica, «o verdadeiro desafio que se coloca à actual coligação (...) uma das mais importantes tarefas que o país exigirá a este Governo».
Decididamente, para nós, este não é o caminho certo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: a política económica que o MDP/CDE defende, cujas coordenadas estão claramente expressas no nosso programa, é radicalmente diferente desta.
Em primeiro lugar, contando entre as linhas de força da orientação política que defendemos, as seguintes:

Defesa da independência nacional e da nossa autonomia de decisão;
Valorização das potencialidades do país nos seus aspectos humanos, naturais e produtivos,

entendemos que:

A opção fundamental é a de criar condições para aumentar a produção nacional e reduzir o défice da nossa economia, numa perspectiva de reforço do aparelho produtivo, por um lado, que faça face ao alargamento do mercado interno, e, por outro, que contemple a especialização necessária, no quadro da revolução tecnológica em curso e de um novo posicionamento de Portugal na divisão internacional do trabalho.

A carência de meios para fazer face ao aumento do investimento, que preconizamos, e ao endividamento externo não é, para o MDP/CDE, mais do que um condicionamento específico que se confronta a consecução da nossa opção fundamental. Não é nem intransponível nem o único obstáculo a vencer. Com efeito, já aqui o dissemos, consideramos que o recurso ao FMI, nos termos em que foi feito, veio comprometer seriamente a aplicação da política económica que entendemos correcta.
Deixamos, então, expressa a nossa opinião de que haveria forma de evitar este acordo com o FMI, e de que é dever do Governo divulgar porque não utilizou, por exemplo, as reservas de ouro que o País dispõe para angariar os meios financeiros de que carecíamos.
Mas agora, dir-se-á, o acordo está subscrito e isso são águas passadas. Não é tanto assim, na nossa opinião. Quanto mais não fosse, sempre valia a pena analisar factos passados em ordem a preparar o futuro. E o que é certo é que, continuando a nossa dívida externa a aumentar, como ninguém põe em dúvida, e degradando-se a nossa capacidade produtiva, ao menos no curto prazo, muito naturalmente se poderá voltar a ter de enfrentar uma situação de iminente rotura cambial.
Há, então, que procurar, por um lado, tentar minimizar essa possibilidade e os seus efeitos e, por outro, preparar soluções para a enfrentar quando ela surgir.
É nesta conformidade, Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, que nós alertamos para a necessidade urgente de diversificar o nosso comércio externo, nomeadamente através da negociação de linhas de crédito à exportação e à importação e do estabelecimento de acordos de compensação, particularmente com os países africanos de expressão portuguesa e com os países árabes, especialmente aqueles que são produtores de petróleo. Por outro lado, há que programar a utilização das nossas reservas de ouro disponíveis, no sentido de através delas conse-

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guirmos obter, em tempo oportuno, a capacidade de, solvendo os nossos compromissos da dívida, arrancar decididamente com o processo de recuperação da nossa economia, o que, passando necessariamente pelo aumento do volume de investimento, envolverá inevitavelmente um concomitante crescimento das importações.
É evidente que esta opção pressupõe uma prévia definição, muito clara, das linhas de orientação relativas à aplicação dos recursos em investimento, e a existência de uma bateria de projectos suficientemente estudados de forma a poderem ser implementados a curto prazo.
E aqui, também se deve salientar que, num tal processo, ao sector público - particularmente ao SEE - cabe um papel primordial, como instrumento de política económica nas mãos do Estado.
Ao Estado competirá, igualmente, apoios em termos efectivos e decididos ao desenvolvimento das PMEs (que tão esquecidas foram nestas Grandes Opções do Plano), sector igualmente indispensável na recuperação económica.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Programar o desenvolvimento não pode deixar de ser, no momento presente, a tarefa mais ingente que se deve colocar ao Governo português, porque cada dia que passa agrava as condições de vida do nosso povo, arrasta para a miséria cada vez maior número de cidadãos, acelera a degradação da nossa economia, torna mais difícil a recuperação, faz crescer a ameaça da subversão do regime democrático.
Por isso, o MDP/CDE considera que a mudança de perspectiva na política económica, voltando-a para o aumento da produção, o reforço do aparelho produtivo, a melhoria do nível de vida da população, sobretudo das camadas mais desprotegidas, é um imperativo que ultrapassa os limites da área económica e deve congregar todos aqueles que se reclamam defensores das liberdades e do regime democrático saído do 25 de Abril.

Aplausos do MDP/CDE e PCP.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Pinheiro Henriques: ouvi obviamente, como me cumpria, com atenção, a sua intervenção, e, na realidade, fico surpreendido porque não vejo como é que pode compatibilizar - e eu aqui sublinho compatibilizar -, no curto prazo - fez considerações com as quais eu poderia estar um pouco de acordo se raciocinarmos no médio prazo -, isto é, no ano de 1984, as suas ideias de relançamento com os reflexos que sabe terem na balança de transacções correntes. E, depois, como relaciona isto com a contenção da dívida pública e, simultaneamente, com faz todo este puzzle, propondo claramente uma política de relançamento, com mobilização de recursos, referindo inclusivamente o ouro. Concretamente, a pergunta, Sr. Deputado: pensa, mas fundamentando, que é possível o relançamento da economia partindo dos actuais desequilíbrios, nomeadamente da balança de transacções correntes, e da dívida pública já acumulada, sem previamente fazer a política de estabilização e de recuperação que o Governo considera previamente necessárias?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Nogueira de Brito pede a palavra para que efeito?

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É para um pedido de esclarecimento, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado Pinheiro Henriques: O Sr. Deputado Pinheiro Henriques falou de programação das reservas disponíveis, com vista a um desenvolvimento harmónico que pudesse sustentar correctamente a política económica nacional. Eu pergunto: o Sr. Deputado Pinheiro Henriques defende a alienação das reservas de ouro? É preciso realmente explicitar isto perante a Câmara, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Deseja responder, Sr. Deputado Pinheiro Henriques?

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Desejo sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Pinheiro Henriques (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começarei por responder a esta segunda pergunta, em primeiro lugar, visto que e uma pergunta de quase «sim ou não», portanto, muito mais rápida, e a questão ficará, desde logo, solucionada. E a resposta é: não! De facto, não defendo a priori a alienação das reservas de ouro. Aquilo que eu entendo que deveria ser possível é utilizar estas reservas no sentido de, com elas, se angariarem esses meios, através de, por exemplo - digo a título de exemplo -, acordos de concessão de crédito ao País com a garantia do nosso ouro. Isto só fará sentido desde que, do nosso ponto de vista, isto é, do ponto de vista do país que vai recorrer a esse recurso - passe o pleonasmo -, haja a capacidade - e, portanto, tenha feito a programação necessária - para conseguir evitar a alienação dessa parte do ouro.
Penso que - e isto agora entronca na pergunta do Sr. Deputado Almerindo Marques -, dado o montante das reservas em ouro de que o nosso país dispõe, é possível estudar essa aplicação no sentido de acordos que se façam em relação à nossa dívida ou em relação a um relançamento possível - que teria evidentemente que ser programado, aliás, como consta da minha intervenção. É possível, portanto, utilizar, nesse sentido, a nossa capacidade de endividamento externo, que, na minha opinião e dadas as circunstâncias presentes em termos, não só de ouro, mas fundamentalmente de reservas de ouro, não está totalmente utilizada, esgotada.
Por outro lado, para além desta capacidade de endividamento, que poderia obviamente ser utilizada no sentido do investimento, penso que haveria outras medidas, que também referi durante a minha intervenção, nomeadamente ao nível do estabelecimento de acordos de compensação com outros países. Portanto, poderá haver a possibilidade de aumentar a nossa capacidade de importação a curto prazo e,

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obviamente, de importação de produtos necessários para a promoção do desenvolvimento, isto é, bens de investimento.
São estas as duas coordenadas que eu aponto, em relação às possibilidades presentes, que obviamente leriam que ser dimensionadas Portanto, na minha opinião, não foi feito - pelo menos não foram divulgadas as conclusões - um estudo sobre qual é a nossa capacidade de endividamento e qual é a possibilidade que nós teríamos de, com essa capacidade de endividamento, promover um certo -pelo menos, direi «um certo» - relançamento da nossa economia.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Peço a palavra. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito deseja a palavra Sr. Deputado?

O Sr. Almerindo Marques (PS): - É só para pedir um breve esclarecimento ao Sr. Deputado Pinheiro Henriques.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado, mas sob a forma de protesto.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Sr. Deputado Pinheiro Henriques: ouvi-o mais uma vez, com atenção, e só queria acrescentar o seguinte: infelizmente para os países que disto precisam, não interessa fazer a análise da capacidade de endividamento por quem, pede emprestado, mas infelizmente - sublinho outra vez - também é necessário saber quem faz a capacidade de endividamento por parte de quem empresta.

O Sr. Presidente: - Seguidamente encontrava-se inscrito o Sr. Ministro do Mar. Uma vez que o Sr. Ministro não se encontra presente, vou dar a palavra ao orador inscrito a seguir.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O debate em curso sobre as grandes opções do Plano e o Orçamento para 1984, representa - é justo realçá-lo - uma prova de que o IX Governo veio para cumprir os compromissos assumidos no seu Programa. A apresentação e votação, em tempo oportuno, e pela primeira vez, de instrumentos de política económica fundamentais à acção governativa e às decisões dos agentes produtivos é um sinal positivo da capacidade de quem, com rigor e sem demagogia, se propõe regularizar as finanças públicas e concretizar as condições da modernidade.
Mas o presente debate exprime também, como já aqui foi salientado, o funcionamento pleno das instituições democráticas e o reforço do papel da Assembleia da República - com ele se fecha um ciclo de má memória aberto com a introdução, pela ditadura, da Lei de Meios, visando sonegar aos seus próprios epígonos o controle orçamental. Pondo termo ao dualismo orçamental vigente, a Constituição revista veio atribuir ao Parlamento plena responsabilidade na apreciação e aprovação de tão importante lei.
Os direitos parlamentares foram reforçados, sem prejuízo da eficácia dos executivos. Assim, ganha a democracia em transparência, ganhará o País em melhor informação sobre a natureza autêntica dos problemas nacionais e a melhor maneira de os enfrentar.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: As grandes opções do Plano para 1984 são o espelho da situação de encruzilhada em que se encontra a vida financeira e económica do País. É legítimo discutir, e devemos discutir, quais as vias mais adequadas a trilhar no futuro. Mas o debate sairá frustrado se nos recusarmos a compreender as verdadeiras razões das dificuldades ou se nos limitarmos a mistificá-las com o manto diáfano das fantasias ideológicas. Qualquer crítica consistente deve, em nosso entender, situar-se no quadro do sistema económico existente ou, então, denunciar-se a si própria, não como uma crítica aos critérios de escolha e de decisão do IX Governo, mas como um ataque ao próprio sistema de enquadramento jurídico-constitucional da economia portuguesa.
Este ponto de partida afigura-se-nos necessário para situar bem o que queremos e, em consequência, podermos escolher os meios adequados e possíveis à satisfação dos objectivos finais. No plano político, o que queremos é defender a existência de uma sociedade aberta e pluralista em Portugal. Por isso somos, no plano económico, contra todas as propostas de solução - que nenhuma solução seriam - que comprometam a existência do mercado; visem dificultar o normal desenvolvimento da iniciativa privada no quadro de um sistema produtivo onde o sector público desempenhe uma função estratégica; ou, ao invés, procurem regressar a um liberalismo desconhecedor das lições do pós-guerra e do papel activo do Estado na regulação da vida económica.
Eis porque tais afirmações de princípios se nos afiguram ajustadas ao momento: desde logo, por não ser intenção do PS deixar ao PCP, sem o denunciar, o álibi grosseiro de que soluções de fundo há a que o Governo lança mão apenas por virtual dependência do Fundo Monetário Internacional.
Confundindo as manifestações da crise que nos é própria, mas não exclusiva, com as suas causas, o PCP reivindica, em simultâneo, e sem cuidar de saber como tal seria possível: menor endividamento externo, mas mais investimento interno; maior abertura do crédito, mas menos inflação; contracção do défice orçamental, mas pagamento pelo Estado dos salários em atraso; combate ao défice da balança comercial pela competitividade externa das nossas mercadorias, mas contingen- tação das importações; denúncia das fugas de capitais, mas oposição às taxas de juro. Tudo numa amálgama indiferente aos factos reais da situação económica portuguesa e das suas condicionantes externas. Na verdade, os factos não penetram no mundo onde só vivem as convicções. E o que nós sabemos é que as convicções do PCP não se ajustam ao modelo económico português tal como não se ajustam ao modelo ocidental europeu, na economia como na política, na política como na economia.
Não temos, pois, Srs. Deputados, nenhumas razões para acompanhar as teses do PCP que levariam, inevitavelmente, à falência do Estado. Seria oferecer-lhe de bandeja o melhor dos pretextos para a formulação das suas teses do Governo de salvação nacional. Só que, em tais circunstâncias, tal Governo não seria outro que não um qualquer executivo em regime de excepção - de excepção à democracia, naturalmente.
Como vê, entretanto, a outra vertente da oposição - o CDS - a situação do País e a terapêutica do

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Governo? Pela voz prudente do Sr. Deputado Morais Leitão, ficámos a saber, durante a interpelação de política económica, aqui recentemente realizada, que cedo era ainda para que o CDS pudesse formular um juízo definitivo sobre a acção do Governo. Foi, então, a coligação alvo de um desafio claramente medido: que se não desviasse, por circunstâncias menores, da fundamental responsabilidade de governar o País.
Ficámos assim a saber que, para o CDS, ao contrário do PCP, o objectivo político não é derrubar este Governo - é criticá-lo para que, na sua óptica, governe melhor.
São, portanto, outros os termos da crítica e outros podem ser os termos do diálogo. Esperemos, em consequência, que a crítica do CDS às opções do Plano e ao Orçamento possa ser algo mais que uma crítica ideológica. É que, perante estas opções e este Orçamento, não parece possível desenvolver os tradicionais reparos do CDS à contenção das despesas públicas, salvo se, de barato, se quiser hipotecar a prestação de serviços públicos tão essenciais como a saúde e a educação ou as prestações não contributivas da segurança social, se se quiser renunciar ao mínimo possível de investimentos na área dos equipamentos sociais, à continuidade do poder local e dos projectos integrados de desenvolvimento regional ou, em definitivo, se se quiser estrangular o sector público da economia.
Para os socialistas, o Estado não é um perigoso Leviatã que urge combater em nome das fórmulas desactualizadas dos economistas clássicos. A superação da crise não está, para os socialistas, na revisão milagreira do sector económico da Constituição, mas está na potenciação de uma economia de mercado, aberta aos vários sectores da actividade económica, com clarificação do papel que a cada qual incumbe no sistema produtivo.
Com base neste pressuposto avançaremos, mais de perto, algumas considerações directamente suscitadas pelas grandes opções do Plano para 1984.
Uma primeira consideração, para sublinhar a principal condicionante ao desenvolvimento: o desequilíbrio externo. A espiral do endividamento, cuja soma representa mais de metade do PIB e implica custos que o Orçamento prevê em 35,7 % do total da despesa em 1984, impõe uma corajosa operação de travagem no seu ritmo de crescimento. É o Governo, aliás, o primeiro a reconhecer que as medidas restritivas em aplicação são um obstáculo, no curto prazo, ao crescimento do PIB. Daí a pergunta: não estão as dificuldades enunciadas, elas mesmas, e como alguns pretendem, a exigir uma política abertamente desenvolvimentista? Mas como, se, mesmo com carácter restritivo e com as limitações conhecidas ao investimento, o Orçamento para 1984 prevê ainda um défice de 1,25 biliões de dólares? É a quadratura do círculo.
Em face das fortes componentes de importação tecnológica, de energia e de matérias-primas, o investimento terá de ser, como se diz nas opções do Plano, além de moderado, prudentemente seleccionado. Ora, não deixa de ser curioso ver os críticos desta política atacar o Governo pela contenção dos investimentos do PIDAAC e do PISEE, quando não foram capazes de apresentar ao País uma só alternativa - uma só - para o financiamento do défice orçamental. Gostaria certamente o PCP de ver este Governo e esta maioria fazer a figura da vicentina Maria Parda, quando tivesse que dar contas dos bens que lhe estão confiados. Não daremos esse gosto ao PCP nem defraudaremos a confiança dos que nos elegeram.

Uma voz do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nos dias que correm e nos dias que essencial é, como bem salientou o Sr. Ministro das Finanças, prevenir as situações de rotura e garantir, o normal funcionamento da vida do País.
Teremos, por força dos constrangimentos que o endividamento nos impõe, que diminuir o ritmo dos investimentos e da formação bruta de capital fixo? Teremos que conter o consumo interno com reflexos negativos no nível de vida da população? Infelizmente, vai ser assim. E, sendo assim, não será de concluir. Srs. Deputados, que, de um ponto de vista egoísta, é muito mais cómodo ser deputado da oposição, não ter responsabilidades de Governo?
Perante uma tradição de dependência pública que vem de longe - que já fazia Oliveira Martins criticar o que chamava «comunismo de Estado» ou Bordalo Pinheiro figurar a «burra do orçamento», que atingiu o auge com o proteccionismo corporativo e que, após o 25 de Abril, fez esperar do Estado o milagre da transformação não das rosas mas dos cravos em bem-estar para todos, de uma só vez-, perante uma certa psicologia do instalamento e do comodismo, convenhamos que não é fácil pilotar a barca da crise.
Todavia, se as crises são propícias à circulação dos demagogos, elas são também, como a história o demonstra, momentos em que, pelo despertar das consciências e pelo unir das vontades, se tornam possíveis os grandes desafios.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem! Muito bem!

O Orador: - É a segunda referência que as GOPs nos merecem - dado que não basta enunciar os antecedentes que explicam os sacrifícios do presente, aí se apontam as metas do futuro.
Para que não perpetuemos, com os desmandos de hoje, a situação que fazia desabafar Raul Proença perante os desacertos da I República:

O mal da República - dizia ele - está em que prometemos mais rigores do que o permitem os princípios para, afinal, termos sempre menos do que o exige a prudência.

Consciente de tal mal, o IX Governo, de acordo com o seu Programa, assume o compromisso de apresentar, até ao final do 1.º semestre de 1984, um Programa de Recuperação Económica e Financeira e, até ao final do ano, um Programa de Modernização da Economia Portuguesa. Um e outro programas só serão possíveis se o Plano de Gestão Conjuntural de Emergência obtiver resultados positivos. A austeridade importa sacrifícios, mas os sacrifícios valem a pena quando contribuem para alcançar resultados positivos. A melhoria da balança comercial e a redução acentuada do défice da balança de transacções correntes são, desde já, indicadores positivos que nos habilitam a esperar que o ano de 1984 possa representar um ano de viragem no círculo vicioso das nossas dificuldades. Não queremos fazer uma simples navegação à vista, queremos percorrer uma rota de segurança.

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Daí que o terceiro comentário que as GOPs nos suscita se refira ao sentido dessa rota, ao equacionar, desde logo, perante a problemática da adesão de Portugal à CEE.
Uma economia cujos termos de troca largamente se fazem com os países do mercado comum carece de conhecer, tão depressa quanto possível, se vai ou não haver adesão. Deve, por isso, realçar-se com inteiro aplauso, a decisão do Governo de lançar uma verdadeira ofensiva diplomática com vista à entrada de Portugal no Mercado Comum Europeu, de empenhar no processo todos os que, mesmo na oposição, comungam de idêntico objectivo, incluindo até os parceiros sociais para quem a Europa das comunidades não é uma cortina de ferro. As grandes opções do Plano reconhecem a importância da adesão à CEE nas opções da modernização da nossa estrutura produtiva, desde logo no sector primário, com a possibilidade de participação dos Fundos Europeus de Orientação e Garantia Agrícola e de Desenvolvimento Regional. Mas é no sector industrial que mais rapidamente se fará sentir o impacte de qualquer política económica, face à importância do sector na formação do PIB, mais rápido no desenvolvimento do emprego e da exportação. O programa de política industrial portuguesa para a próxima década, anunciado pelo Sr. Ministro da Indústria para Abril do próximo ano, a par do Plano Energético Nacional, devem constituir peças de elevada importância na estratégia do desenvolvimento industrial. A Lei do Desenvolvimento Industrial, o Plano Tecnológico de Apoio à Indústria Transformadora, uma agência para a inovação tecnológica, serão outros tantos instrumentos de suporte a um programa de desenvolvimento e modernização.
De imediato, impõe-se uma acção enérgica - ainda na palavra do Sr. Ministro da Indústria, «prioritária e inadiável» - de saneamento financeiro das empresas que demonstrarem viabilidade económica e sé inscrevam no quadro prioritário da melhoria da balança comercial e da formação do valor acrescentado nacional. Quando o Sr. Ministro da Indústria afirma a urgência de «definir um projecto nacional, traduzido na crescente mobilização da inteligência ao serviço do progresso social e económico» encontra todo o apoio na bancada do PS.
Eis o quarto e último apontamento referido às grandes opções: o reconhecimento da imprescindível mobilização nacional. Sabemos que não é popular estar no Governo, quando decresce o nível de vida da população em geral e dos trabalhadores em especial. Mas não é a política do Governo que o impõe: são os factos económicos que outra coisa não permitem. Não é a política do IX Governo que condena Lázaro, mas pode ser a sua política que o ressuscite. Tenhamos, então, a coragem de atravessar o inverno do nosso descontentamento sem perder de vista que só lograremos ultrapassá-lo num clima de grande concertação nacional. Tem, por isso, o Governo o dever de manter sempre actuantes os mecanismos do diálogo e é legítimo esperar dos parceiros sociais a sua contribuição para a superação da crise.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A participação construtiva dos parceiros sociais não poderia, todavia, pedir-se, com fundamento, se a coligação PS/PSD abandonasse, em qualquer momento do percurso, o sentido fundamental que esteve na sua origem: evitar a rotura financeira, combater a crise económica e social e, assim, salvar a democracia.
Com desespero de alguma oposição, os objectivos iniciais da maioria mantêm-se inalteráveis e agora uma vez mais se concretizam na fase de discussão e aprovação das grandes opções do Plano e do Orçamento para 1984. Conscientes de tais objectivos, não desertaremos das nossas responsabilidades, mas estamos abertos a partilhá-las com quem saiba pôr o patriotismo e sua acção política acima da visão estreita dos seus interesses de grupo ou de partido.

Aplausos do PS, do PSD e da ASDI.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lacão, na sua intervenção disse a certa altura que não era com revisões milagreiras da Constituição Económica que se resolvia os problemas da economia portuguesa e do desenvolvimento económico.
Devo dizer, Sr. Deputado, que o CDS nunca teve a concepção de que a revisão da Constituição Económica só por si resolvia todos os problemas da economia portuguesa, mas ela pode contribuir para ultrapassar a crise em que o País se encontra mergulhado.
Pelo contrário, temos a consciência plena de que há muita coisa que se pode fazer no quadro institucional vigente e estamos à espera de ver o que e que o Governo faz e o que não faz. Mas não temos dúvidas de que a Constituição Económica, pelo menos em dois pontos - por um lado, quanto à irreversibilidade das nacionalizações e, por outro, quanto à impossibilidade de distribuir a terra expropriada ou nacionalizada em propriedades - constitui um claro limite à acção dos governos em Portugal, quer fosse um governo de que o CDS fizesse parte, quer fosse um governo como aquele que é apoiado pelo chamado «bloco central».
Neste sentido gostaria de perguntar se, numa concepção não dogmática do socialismo - que é aquela em que creio que o Sr. Deputado Jorge Lacão se insere -, não considera que a irreversibilidade das nacionalizações que foram decretadas em Portugal, sem obediência a qualquer lógica económica mas com o claro propósito político de desmantelamento de um determinado aparelho produtivo, se essa irreversibilidade das nacionalizações não pode constituir um limite grave para a acção de um governo, um limite tão grave e tão absurdo como seria, afinal, escrever-se o contrário na Constituição e dizer-se que o Governo não pode nacionalizar nada ou não pode nacionalizar determinados sectores da economia.
Por outro lado, pergunto também se não considera que a proibição da distribuição em propriedades da terra nacionalizada ou expropriada não constitui um limite para a acção do Governo e não vai contribuir para que, na prática, se procurem criar regimes de arrendamento com prazos tão longos que, no fundo, se pretende dar a sensação aos arrendatários de que têm a propriedade plena.

O Sr. Presidente: - Está ainda inscrito para pedir esclarecimentos o Sr. Deputado Nogueira de Brito. O Sr. Deputado Jorge Lacão pretende responder já ao Sr. Deputado Luís Beiroco ou no final, em conjunto.

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O Sr. Jorge Lacão (PS): - No final. Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - O Sr. Deputado Jorge Lacão a certa altura da sua intervenção afirmou que, na perspectiva do CDS, não. via que houvesse razões para criticar a política de contenção de despesas enunciada nestas grandes opções do Plano e executado através do Orçamento do Estado a não ser que o CDS pretendesse, em última análise, que esta contenção incidisse sobre o orçamento social.
Esta afirmação do Sr. Deputado Jorge Lacão é simultaneamente uma antecipação e uma insinuação. É uma antecipação porque o Sr. Deputado Jorge Lacão pretende que nós desta vez não teremos possibilidade de criticar a política económica do Governo expressa nas grandes opções do Plano e no Orçamento. E neste aspecto pergunto ao Sr. Deputado Jorge Lacão com que base é que podemos acreditar nesta política de contenção quando ela não é fundamentada em quaisquer anúncios de reformas estruturais do sector administrativo do Estado que permitam acreditar que essa política de contenção de despesas seja viável.
Em segundo lugar, como já referi, trata-se de uma insinuação porque o Sr. Deputado Jorge Lacão diz que levaremos a tal ponto a defesa de uma política de contenção que nos arriscamos mesmo a que essa contenção atinja a despesa social do Orçamento. Quanto a isto, pergunto: Sr. Deputado, como é que os grupos apoiantes do Governo podem fazer esta insinuação, sendo certo que nós apresentámos um projecto de lei de bases da segurança social nesta Assembleia antes da discussão das grandes opções do Plano e do Orçamento do Estado e sendo certo também que não vemos nas grandes opções do Plano e do Orçamento uma política social que seja realmente uma alternativa aos sacrifícios que a política de restrição vai impor aos Portugueses, no campo da economia?
São estas as questões que queria pôr ao Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado para responder, se assim o entender.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Luís Beiroco, agradeço-lhe os termos em que colocou a sua pergunta porque me deu a sensação de que o Sr. Deputado compreendeu bem o sentido da minha intervenção. Ou seja, eu pretendi dizer que se o CDS não parte do princípio de uma oposição global e sistemática com vista ao derrube deste Governo, a política do CDS, por ele próprio enunciada, é, digamos assim, uma política de oposição selectiva.
E sendo a política do CDS uma política de oposição selectiva, o que eu pretendi com a minha intervenção foi desafiar o CDS a que demonstrasse neste debate quais são as alternativas em concreto que o CDS, ele próprio, tem para propor a estas opções e a este Orçamento, se é que as tem e acrescentei isto para que não fiquemos apenas num debate meramente redundante, em termos da simples questão ideológica.
Reconheço com prazer que o Sr. Deputado é o primeiro a admitir que a revisão da parte económica da Constituição, mesmo do ponto de vista do CDS, não resolve por si as questões da economia nacional. Essa c. naturalmente, a posição do PS.
O Sr. Deputado pergunta-me quais são os meus pontos de vista relativamente a duas questões: à irreversibilidade das nacionalizações, e à impossibilidade da distribuição da terra nacionalizada em plena propriedade. Quero dizer ao Sr. Deputado que há certas questões que devem ser colocadas na altura adequada e, em primeiro lugar, é facto que não estamos neste momento em tempo adequado para discutir essa temática em sede de revisão constitucional.
A revisão constitucional fez-se não há ainda muito tempo e nessa altura o PS teve oportunidade de exprimir os seus pontos de vista e estas duas questões mantêm-se nesta Constituição porque entendemos que, do ponto de vista da própria Constituição, seria inconstitucional a sua revisão.
Entretanto, estas questões só se voltarão a pôr na altura em que, nos termos normais, entramos novamente na revisão constitucional e o que o Sr. Deputado não poderá esperar da minha bancada ...

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Posso, portanto, concluir que para além das questões da inconstitucionalidade que o Sr. Deputado coloca, V. Ex.ª não tem realmente objecções de fundo quanto às questões que coloquei?

O Orador: - Eu ia responder a isso, Sr. Deputado, e dir-lhe-ei o seguinte: relativamente a qualquer desses dois aspectos, o que para nós é essencial não é a temática em termos de sede de revisão constitucional, é, digamos assim, a temática, em termos programáticos, da estruturação do sector público da economia. E estamos crentes que no âmbito do plano da recuperação económica e no âmbito do próprio programa de modernização económica, esta estruturação no sector público da economia - como aliás, a estruturação do sector produtivo nacional - são possíveis sem necessidade de recurso à revisão da Constituição nesse ponto.
Pensamos, portanto, que é possível reestruturar, sem necessidade de desnacionalização, as empresas que se encontram nacionalizadas. ...

O Sr. Carlos Lage (PS): - Muito bem!

O Orador: - ... como também, do nosso ponto de vista, é possível fazer política de reestruturação fundiária sem que seja necessário alterar o dispositivo constitucional e da Lei da Reforma Agrária sobre essa matéria.
Pensamos que a distribuição da terra em direito de superfície resolve o problema que o Sr. Deputado me colocou em termos de saber se não seria mais adequado resolvê-lo em termos de plena propriedade.
Naturalmente que ele pode ser resolvido através da plena propriedade em zonas não intervencionadas pela Reforma Agrária e em termos de distribuição do direito de superfície nas zonas de intervenção da Reforma Agrária. É esta a posição do PS e a minha própria.
Relativamente à questão que levantou o Sr. Deputado Nogueira de Brito, tenho a impressão que ela nos colocaria numa espécie de petição de princípios. Ou

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seja, V. Ex.ª diz que não faz sentido haver uma política coerente de restrição das despesas públicas como o Governo pretende na medida em que não está feita a reestruturação administrativa, mas, Sr. Deputado, será que para fazer a contenção das despesas públicas seria necessário fazer previamente e por inteiro a reforma administrativa? Nessa altura, seria dar o álibi privilegiado ao CDS, que diria que este governo não fazia nem uma coisa nem outra!
Como o Governo está a governar há 4 meses e como durante o tempo em que o seu partido esteve no Governo não foi feita esta reforma administrativa e ainda como nós temos problemas ingentes, problemas de défice orçamental que não nos poupam, como o Sr. Deputado sabe, é óbvio que a primeira das soluções seja fazer a restrição das despesas onde ela se afigura possível, sem prejuízo de, em tempo oportuno, se fazer como deve ser feita, a reforma administrativa do nosso país.
Relativamente à questão da segurança social, como o Sr. Deputado sabe, há este ano uma dotação do Orçamento do Estado mais significativa quanto ao Orçamento da Segurança Social do que houve anteriormente. E isto não tem propriamente que ver com a definição do quadro jurídico global das bases da segurança social! Em matéria de Orçamento, a dotação da Segurança Social é maior e a minha dúvida é saber se, porventura, o CDS acha que ela é de mais!

Aplausos do PS e de alguns deputados do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um protesto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Jorge Lacão, não considero necessário que a reforma administrativa preceda o anúncio das grandes opções do Plano e do Orçamento do Estado. O que eu esperava era encontrar anunciadas nas grandes opções do Plano e na proposta de Orçamento medidas de reestruturação administrativa que tornassem credível a contenção da despesa porque, de contrário, hão a considero credível, e ainda mais tendo em conta a revisão do Orçamento provisório para 1983.
A comparação entre a revisão do Orçamento provisório para 1983 e o Orçamento do Estado para 1984, foi feita aqui, em termos particularmente elucidativos neste domínio, pelo meu colega de bancada Morais Leitão quando se discutiu o Orçamento suplementar, ou melhor, a alteração do Orçamento para 1983.
O Orçamento da Segurança Social aparece reforçado mas, em compensação, aparece diminuído o Orçamento do Fundo de Desemprego e, por outro lado, não aparecem quantificadas minimamente as perspectivas quanto à evolução do emprego em 1984.
Portanto, ficamos perplexos pela maneira como o Governo pretende fazer face às consequências que, no domínio do emprego, vai ter a sua política restritiva e ficamos ainda mais perplexos quando sabemos que as dotações do Fundo de Desemprego são diminuídas em favor do Orçamento Geral do Estado, sem sabermos com que finalidade!
Com uma grande candura diz-se no orçamento que o reforço de 14 milhões de contos - que é superior em 50 % ao volume das transferências que foram feitas em 1983 - se destina a empreendimentos produtivos criadores de emprego, mas nós ficamos sem saber como! Ficamos sem saber como é que com um Orçamento do Fundo de Desemprego extremamente limitado se vai fazer face às consequências de uma política restritiva e é neste domínio que nós queríamos encontrar respostas. Aliás, era neste domínio que a Lei de Bases da Segurança Social, ao integrar o seguro de desemprego no esquema da segurança social, continha respostas imediatas e concretas às consequências da política restritiva da nossa economia.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão, para contraprotestar.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado, V. Ex.ª acusou-me de ter feito uma intervenção por antecipação e por insinuação mas eu diria que a sua intervenção de agora peca pela mesma pecha, se é que a minha pecou por isso! Ou seja, o Sr. Deputado peca por antecipação e por insinuação relativamente a áreas sobre as quais o Governo ainda não teve hipóteses de se explicar aqui e o Sr. Deputado sabe que está previsto que ele se venha explicar sobre essas áreas!
Apenas mais um apontamento: o Sr. Deputado diz que não acredita na quantificação deste orçamento porque o Orçamento para 1983, falhou nas suas previsões. Mas, Sr. Deputado, nós somos responsáveis exclusivamente por este orçamento, não o somos pelo orçamento anterior!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Planeamento.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento (Mário Cristina de Sousa): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na sua exposição de ontem, o Sr. Ministro das Finanças e do Plano traçou as linhas gerais das grandes opções do Plano para 1984, e pôs em relevo os seus pontos essenciais, designadamente quanto aos seguintes aspectos, que me parece conveniente sublinhar com alguma ênfase.
Em primeiro lugar, justificação do cenário macroeconómico escolhido para 1984: os objectivos estabelecidos para a política económica de curto prazo - e, designadamente, o objectivo de contenção do défice externo - combinados com as perspectivas que é legítimo assumir, nesta altura, para a evolução da procura externa, conduzem inevitavelmente ao cenário apresentado.
Em segundo lugar, a opção clara por uma política de transformação estrutural, a iniciar ainda em 1984; apesar das restrições orçamentais necessárias à consecução dos objectivos fixados, é possível, mediante escolhas criteriosas na utilização de recursos escassos, desencadear em 1984 um conjunto de programas de transformação estrutural, que incidirão sobre os sectores mais vocacionados para á recuperação, a médio/longo prazo, do problema estrutural da balança de pagamentos que o país ciclicamente defronta.
Esses sectores serão essencialmente a agricultura e florestas, a indústria e energia, a marinha mercante e as pescas. É aí, com efeito, que actuações desse tipo maiores ganhos podem trazer, no futuro, em matéria de redução de importações - por aumento de produ-

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cão nacional - ou de expansão de exportações, baseada numa maior capacidade competitiva da indústria portuguesa obtida pela via da modernização e racionalização produtiva e não como simples reflexo de uma desvalorização do escudo.
No Plano para 1984, presentemente em preparação, e no qual se dará conteúdo às linhas gerais de política económica delineadas nas grandes opções do Plano - uma vez que estas não são mais que directrizes para o plano e não o plano propriamente dito - no Plano, dizíamos, retomar-se-á com o maior destaque o tema dos «programas de transformação estrutural». Os programas serão seleccionados com algum cuidado, obedecendo à regra básica de se tratar de actuações ou já iniciadas ou em estado de preparação suficientemente avançado para que possam entrar em execução no ano de 1984. Nessa perspectiva, serão cuidadosamente ponderadas as condições de financiamento de cada programa, por forma a que só se escolham programas cuja exequibilidade financeira ofereça garantias mínimas.
Para cada programa, que será necessariamente muito concreto, especificar-se-ão:

Os objectivos para todo o seu horizonte temporal - que, por se referir a mudanças estruturais, obviamente excederá o horizonte anual;
Os objectivos a serem alcançados em 1984;
As acções a desenvolver em 1984, indicando, designadamente, as entidades responsáveis e as fontes de financiamento.

Explicitado nestes termos, cada programa poderá ser objecto de controle regular ao longo da sua execução, preocupação que o Governo assume e executará por intermédio da Secretaria de Estado do Planeamento.
A questão dos programas de transformação estrutural liga-se, naturalmente, com problemas de investimento e entronca, em consequência, na área da política de investimento. Trata-se de questão já ontem aflorada pelo Sr. Ministro das Finanças e do Plano, mas pareceu-me conveniente nesta exposição quanto mais não seja porque se trata de área bastante sensível, onde as opções de política económica mais claramente se manifestam. E a questão assume particular delicadeza por se prever, em 1984, uma quebra significativa na formação bruta de capital fixo global, a qual incide mais fortemente sobre o investimento público. Sc o comportamento global da formação bruta de capital fixo é o que resulta de um cenário de evolução da economia portuguesa em 1984, que se configura como o mais adequado aos objectivos escolhidos, a sua desagregação por componentes envolve algumas opções que o Governo tem obrigação de explicitar e justificar.
A evolução prevista para o investimento do sector público administrativo - no qual se inclui não só o investimento da administração central mas também o da administração local - é, naturalmente, muito influenciada pela evolução das dotações do Orçamento do Estado reservadas a investimentos. A necessidade de contenção do défice orçamental obrigou, como já se assinalou aqui por mais de uma vez, a uma restrição séria na área das despesas de investimento - indesejável, é certo, mas apesar de tudo preferível à paralisação de serviços essenciais que uma mais severa contenção das despesas de funcionamento certamente arrastaria - e vai, em consequência, exigir um extremo cuidado e rigor nos critérios de escolha de programa e projectos a executar em 1984.
Com efeito, a contracção de dotações não implica por si só a ineficácia das intervenções da Administração Pública enquanto agente de política económica. Já houve ocasiões de maior largueza na atribuição de dotações para investimentos do Plano, e não me parece evidente que daí tenha resultado uma eficácia acrescida. O que é necessário é que a Administração Pública faça um enorme esforço de racionalização e rigor na administração das dotações de que dispõe para despesas de investimento.
A prioridade terá de ser atribuída, naturalmente, a programas e projectos em curso. Nos casos em que existam dúvidas quanto à sua real prioridade, a orientação estabelecida, e que o Ministério das Finanças e do Plano defenderá a todo o custo, é a de cumprir estritamente as obrigações contratuais já existentes - por forma a acautelar os interesses de empreiteiros e fornecedores com os quais o Estado tenha celebrado contrato válido. Verificada essa condição, os projectos serão, se necessário, interrompidos, afectando-se as verbas disponíveis a acções de mais evidente prioridade, designadamente à luz das orientações de política geral traçadas nas grandes opções agora em discussão.
Nesta perspectiva, assumem particular relevo dois tipos de critérios de prioridade:

A prioridade às acções de transformação estrutural. Como atrás referi, o lançamento de programas de transformação estrutural reflecte-se quase sempre em algum esforço de investimento do sector público administrativo, seja de formação de capital, seja de apoio indirecto sob a forma de subsídios ou bonificações; procurar-se-á, em consequência, que tais programas disponham de elevado grau de prioridade na afectação das dotações disponíveis;
A prioridade às acções de desenvolvimento regional. O Governo já reafirmou, por mais de uma vez, a sua opção clara por uma política de desenvolvimento regional que, neste caso concreto, se irá reflectir na transferência, para as regiões menos desenvolvidas, de acções de investimento em infra-estruturas, capazes de dar apoio a actividades directamente produtivas e de contribuir para a melhoria efectiva das condições de vida das populações. Neste sentido, reservou-se uma parcela do PIDDAC para os chamados «programas integrados de desenvolvimento regional», ou seja, conjuntos de acções de investimentos desenvolvidos por vários departamentos sectoriais, orientados para a melhoria das condições da actividade produtiva ou do nível de vida em certa região. Dar-se-á continuidade aos programas em curso (Trás-os-Montes, Cova da Beira e Baixo Mondego), e lançar-se-ão novos programas no Alentejo e Algarve.

A preparação do programa de investimentos do sector empresarial do Estado está a ser rodeado de particular cuidado. Várias empresas no sector exibem situações económicas e financeiras de diferentes graus de gravidade, compondo um quadro que preocupa seriamente o Governo. Já foi encetada uma análise dos casos mais graves, para os quais se porão em prática as necessá-

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rias medidas de saneamento, adequadas à natureza específica de cada problema.
Um cenário deste ripo não convida, porém, a excessivo entusiasmo na programação dos investimentos do sector empresarial do Estado. O objectivo de contenção do défice orçamental impede que se possa dedicar este ano uma dotação para aumentos de capital capaz de repor as insuficiências de capitais próprios acumuladas nos últimos anos e que são uma das mais importantes causas da grave situação financeira a que algumas das empresas entretanto chegaram. Deste modo, e com excepção dos casos em que as empresas sejam capazes de gerar um autofinanciamento significativo, a autorização de cada programa de investimento ficará dependente de uma cuidadosa análise das suas consequências previsíveis sobre a situação financeira da empresa. É assim, e não através de programas expansionistas lançados a qualquer preço, e com a exclusiva preocupação do seu efeito conjuntural, que se defende o sector empresarial do Estado.
Não é de esperar, em consequência, o lançamento de um número muito significativo de novos projectos em 1984. Todavia, o Governo irá cumprir a sua promessa de tomada de decisão sobre os grandes projectos cujo lançamento firme tem vindo a ser adiado - refiro-me a casos como o Alqueva ou o plano siderúrgico. Recordo que o projecto de Alqueva é um projecto que aparece no quadro do sector empresarial do Estado porque se inicia com a construção de uma central hidroeléctrica da EDP.
Gostaria também de referir ao problema do sistema incentivos. A revisão do sistema de incentivos em vigor, para o qual o Governo pede, na proposta de lei do Orçamento a necessária autorização legislativa, configura-se como uma necessidade absoluta face à evidente inadequação do sistema presentemente em vigor à política económica que se pretende implementar a partir do próximo ano.
Desde logo, o custo do sistema - traduzido em pagamento de bonificações e perdas de receita fiscal -, não é suportável face a um objectivo de contenção do défice orçamental e nem sequer há indícios claros de que se trata de despesa útil. Tal como foi lançado em 1980, o sistema terá tido alguma vantagem enquanto instrumento de uma política de expansão generalizada do investimento privado. Mas esgotou-se aí. Mesmo na versão revista, que está presentemente em vigor, o sistema é pouco selectivo, e claramente ineficaz enquanto instrumento de transformação estrutural da indústria. Tal facto resulta, provavelmente, de se ter tentado conjugar no mesmo sistema um número excessivo de critérios de apreciação, aos quais foram atribuídas ponderações cuja adequação é naturalmente impossível de demonstrar. Um sistema deste tipo está sempre exposto a resultados imprevisíveis, que podem nada ter a ver com as intenções iniciais.
Por outro lado, um dos critérios usados - o chamado critério da produtividade - conduz a que os incentivos tendam a ser tanto maiores quanto mais rentáveis os projectos se apresentem. Trata-se de um evidente paradoxo, pois são esses precisamente os projectos que não precisariam, em regra, de incentivos: o próprio funcionamento do mercado justifica a sua realização, pelo que atribuir-lhes incentivos pode corresponder, na realidade, a uma transferência de rendimentos inútil e injusta.
A concessão de incentivos só se justifica, com efeito, nos casos em que o normal funcionamento do mercado oferece, ao investidor privado, perspectivas de rentabilidade normalmente consideradas insuficientes para projectos que, numa óptica macroeconómica, se configurem como de alta prioridade; nesses casos, faz sentido que o Estado conceda ao empresário um conjunto de benefícios através dos quais este obtenha o diferencial de rentabilidade suficiente para o levar a investir.
A conversão do sistema de incentivos em instrumento eficaz de uma política de transformação estrutural da indústria portuguesa - ou, pelo menos, de alguns dos seus sectores - exige, em consequência, que na sua concepção se tenham em conta 2 requisitos essenciais:

A definição, clara e inequívoca, dos objectivos pretendidos;
A escolha criteriosa das situações em que a concessão de incentivos é de facto indispensável à consecução daqueles objectivos.

Daqui resultará uma enorme preocupação da selectividade na concessão de incentivos, que ficarão reservados para projectos claramente enquadrados em programas de reconversão ou modernização ou para projectos de que resulte a introdução de inovações tecnológicas úteis.
É, pois, nesta perspectiva que o Governo irá proceder à revisão do sistema de incentivos em vigor.
A revisão deste sistema de incentivos dará, igualmente, oportunidade a que em paralelo, se passe a dispor de um instrumento adicional de política regional. Não de forma híbrida, como o sistema actual prevê, mas por autonomização de um sistema de base estritamente regional. Será possível, neste caso, atingir um elevado grau de objectividade na concessão de incentivos, embora, as condições de acesso devam ser estabelecidas com cuidado e rigor.
Combinado com o conceito de Programas Integrados de Desenvolvimento Regional (PIDRs), este será um outro instrumento de política regional que estará em vigor em 1984. Uma política de desenvolvimento regional não se lança de um dia para outro: avança em sucessivos passos, e em cada ano se vai consolidando a experiência adquirida e dela retirando ensinamentos. O que é preciso - e é isso que o Governo irá fazer em 1984 - é não ficar por ideias gerais, é avançar para a sua concretização mesmo que se saiba que ainda vai ficar disponível margem para aperfeiçoamentos.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Morais Leitão.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Planeamento: Ouvi com atenção a sua intervenção porque o Sr. Secretário de Estado não acusou a Câmara de declarações gongóricas nem tão-pouco as fez. Proeurou descer ao concreto e transmitir à Câmara, um pouco desatenta, as opções do Governo em matéria de política de investimentos. E é nesse sentido que gostaria de lhe fazer duas perguntas muito concretas.

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Em primeiro lugar, é sabido que em tempo de austeridade e dada a rigidez dos consumos e o facto de que a variável externa, o comércio externo, está dependente de factores exógenos nem sempre na nossa mão, a política de investimento é aquela que tem de sofrer e suportar uma maior atenção por parte do Governo, com opções mais efectivas e mais concretas em nome de um princípio que este Governo vem anunciando, o de garantir ao País que com os poucos recursos que temos as opções em matéria de investimentos vão ser o mais eficientes possível. Vamos deixar-nos de demagogia barata, dos efeitos sociais, das pressões dos grupos de interesses e vamos optar segundo critérios de rentabilidade.
Ora, o plano de investimentos do sector empresarial do Estado que o Governo publicou em 1 de Setembro, revisão do de 1983, constituiu, salvo o devido respeito, um exemplo de como a tal eficiente alegação de recursos não é feita. Porque, salvo leitura desatenta da minha parte - e li-o já duas vezes -, nesse plano verifica-se uma «divisão do mal pelas aldeias». Todos os projectos se mantêm em curso ou em vigor: o plano siderúrgico, o Alqueva ... enfim, tudo aquilo que constitui a lista de reivindicações do Partido Comunista e que nos habitua a uma grande falta de rentabilidade.
A minha pergunta concreta é a seguinte: o Governo já recusou, dentro do critério de eficiente alegação de recursos, algum projecto de investimento apresentado por uma empresa pública?
Segunda pergunta: é sabido que - e agora vamos entrar na questão aqui aflorada tantas vezes e sempre escondida, da taxa de desemprego - nas grandes opções o Governo evita falar em duas variáveis fundamentais: na produtividade e no emprego na nossa economia.
Em relação ao emprego aponta umas medidas que vai tomar mas, nada se diz quanto à previsível variação da produtividade. É sabido que nos últimos anos a produtividade tem aumentado a uma taxa média de 3 %. Sendo certo que, a taxa de crescimento negativa do produto é de 1,4 % e que não é, a meu ver, previsível que a taxa de aumento de produtividade deixe de ser os habituais 3 % ou 4 %, porque é que o Governo não assume claramente a afirmação de dizer, que a taxa de aumento de desemprego vai ser de, pelo menos, 4,4 % - são certas estas variáveis - e que, em consequência, essa taxa de desemprego tem de ser assumida como factor social que temos de combater, mas que temos de combater na base da criação de novos empregos produtivos? Porque é que o Governo, com a falta de afirmação desta identidade, está a tentar, salvo erro, esconder à Câmara ou esconder à opinião pública, esta realidade que é triste mas que tem de ser assumida e para a qual ainda mais exigente se torna a política de investimentos que o Governo deve adoptar?
Eram estes 2 comentários que gostaria de receber da parte do Sr. Secretário de Estado do Planeamento que, repito, fez um esforço para descermos ao concreto e entrarmos no debate substancial.

O Sr. Presidente: - Encontram-se inscritos para pedidos de esclarecimento ao Sr. Secretário de Estado mais 2 Srs. Deputados, pelo que desejaria saber se V. Ex.ª pretende responder já ou apenas no fim.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: - No fim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Taborda.

O Sr. António Taborda (MDP/CDE):- Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado do Planeamento: V. Ex.ª disse que o Governo tinha em preparação o Plano para 1984 e que, dentro desse plano, se estava a fazer programas de reestruturação estrutural. Falou em Programas Integrados de Desenvolvimento Regional, designadamente o Plano Integrado de Trás-os-Montes e o da Cova da Beira. Disse, também, que se tinha reservado uma fatia do PIDDAC para estes planos mas que, dada a política de austeridade que não convida a excessivo entusiasmo, apenas se pretenderia repor as insuficiências de capital de anos anteriores.
Dentro deste quadro, perguntaria ao Sr. Secretário de Estado se, efectivamente, já existem verbas, porque o Sr. Ministro da Agricultura falou aqui em verbas tanto para o Plano Integrado de Trás-os-Montes como para o da Cova da Beira, e se essas verbas são para desenvolver normalmente os programas ou se se destinam simplesmente ao arranque que, em muitos casos, ainda não está feito.
A segunda e última pergunta era a de saber dentro desses programas o que é que acontece, em termos de Grandes Opções e do Plano, com a via rápida Bragança-Porto.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Sr. Secretário de Estado do Planeamento fez-nos uma leitura das Grandes Opções, falou nos diversos projectos que aí se encontram mencionados, mas fê-lo, no nosso entender, sem ter em atenção o Orçamento do Estado que é a tradução financeira daquelas. E alguns dos diversos ministros e secretários de estado que por aqui passaram disseram mesmo: «nós não sabemos o que vai ser o PIDDAC.
E o PIDDAC e o PISEE encontram-se entrelaçados, portanto, não vale fazer esta distinção em relação ao Alqueva, que será para 1986, apesar de poder estar inscrito no PISEE numa empresa pública.
E tanto é assim, que na p. 51 se diz mesmo: «neste sector ... (em relação ao investimento) «... quase só se permitirá a continuação de programas em curso e, mesmo assim, ajustados aquele nível de financiamento». Portanto, isto significa que a maior parte destes grandes projectos que aqui se encontram, não vão ter início nem sequer em 1984. O que vamos ter em 1983 e 1984 é a continuação da recessão, sem qualquer perspectiva. E isto traduz-se em dinheiro. Aquilo que o Sr. Secretário de Estado nos poderia dizer era, que verbas é que estão dotadas para estes projectos concretos que mencionou.
Quanto à lista de projectos que o CDS diz ser reivindicação do Partido Comunista Português, nós, de facto, do CDS não conhecemos lista de projectos. Os únicos projectos do CDS dizem respeito à banca, aos seguros ... mas isso o PS lá vai dando!

Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Orador: - A pergunta concreta que lhe queria fazer é, efectivamente, esta: algumas grandezas macroeconómicas encontram-se explicitadas nas Grandes Opções, algumas erradas porque já houve a revisão do Orçamento que não foi feita nestas Grandes Opções, mas a grandeza macroeconómica que é o desemprego não se encontra quantificada. E segundo os nossos cálculos, ela não é de 4,4 % mas sim de 4,6 %. Gostaríamos que confirmasse isto.

O Sr. Presidente: - Sr. Secretário de Estado do Planeamento, tem V. Ex.ª a palavra para responder, se assim o entender.

O Sr. Secretário de Estado do Planeamento: - Começando pelas questões postas pelo Sr. Deputado Morais Leitão, a quem agradeço a referência à natureza concreta da minha intervenção, começaria por lhe dizer que a revisão efectuada ao PISEE 83, não pode ser escolhida como exemplo da capacidade de programação deste Governo em matéria de investimento do sector empresarial do Estado.
O Governo encontrou-se com um programa que já estava em execução, com um conjunto de situações praticamente irreversíveis e, por razões de natureza conjuntural, entendeu que devia proceder a uma contracção do montante global de formação bruta de capital fixo envolvido no programa. Mas, por consequência, a margem de manobra naquela altura era mínima e, portanto, daí resultaram provavelmente as consequências que assinalou.
No entanto, posso dizer-lhe que, mesmo nessa fase - não me peça para citar casos, por razões que compreenderá - houve pelo menos um ou dois casos de projectos que foram recusados. Não tenho dúvidas em lhe dizer que essa situação poderá repelir-se em relação a 1984. Reafirmo, efectivamente, o que disse há pouco na minha exposição, de que existe uma extrema preocupação em não aprovar projectos sem ter em conta as consequências sobre a situação financeira das empresas, que daí resultarão. Essa é, neste momento, uma preocupação do Governo e não será, em nenhum caso, posta de parte.
De resto, chamo-lhe a atenção que, o que encontrou inscrito como plano siderúrgico e Alqueva no PISEE 83, e no caso do plano siderúrgico, corresponde, exclusivamente, a compromissos assumidos há cerca de 2 anos. Portanto, trata-se de compromissos que a empresa assumiu em contratos validamente celebrados e, por consequência, havia que lhe dar cobertura, sob pena de a empresa entrar em situações de incumprimento.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Mas não autorizados pelo Governo, não é verdade?

O Orador: - Bom, não creio que este seja o local oportuno para fazermos o processo do que é o plano siderúrgico. De qualquer maneira, há um ponto que é evidente: a partir do momento em que uma empresa pública celebra um contrato válido com fornecedores estrangeiros e que existem contratos de financiamento ligados, não parece muito cordial que o Governo português tome posições no sentido de a empresa não cumprir esses compromissos. Isso é uma coisa. Outra, é a continuação do plano siderúrgico e é sobre isso que se espera que o Governo venha a tomar, posição até ao fim do ano. Chamo a sua atenção porque, efectivamente, o que há neste momento é um conjunto de compromissos que a empresa assumiu e que estão a corresponder a entrega de equipamento. Para além disso, há todo um conjunto de fases subsequentes de investimento e é sobre esses que o Governo tem, sim, obrigação de tomar uma decisão e que a tomará no âmbito da elaboração do PISEE 84 porque, naturalmente, isso terá de ficar inscrito no PISEE 84.
Quanto ao Alqueva, o que o Sr. Deputado viu no PISEE 83 foi, digamos, uma pequena verba correspondente a despesas residuais que ainda vêm do período em que a EDP teve «luz verde» para iniciar o projecto, projecto esse que, como sabe, foi interrompido de uma forma não inteiramente clara.
É, portanto, em relação ao relançamento efectivo do Alqueva que o Governo se irá pronunciar até ao fim do ano.
Relativamente à questão do emprego, suponho que aqui posso responder, simultaneamente, à pergunta feita pelo Sr. Deputado Carlos Carvalhas. O problema fundamental com que o Governo se defrontou nesta área, e razão pela qual não apresentou quantificações, é porque quis ser sério. E quis ser sério, como tentou sê-lo, de resto, ao longo de todo o documento das Grandes Opções do Plano, na medida em que se defrontou com uma situação de inexistência de informação estatística. Nem boa nem má, inexistência pura e simples, de informação estatística. Com efeito, no início deste ano houve uma opção no sentido de mudar o inquérito ao emprego, opção que, portanto, não foi deste Governo.
Lançou-se um processo de recolha totalmente diferente, a que se segue um processo de tratamento de informação, que é também novo, muito complexo e em que o INE está, neste momento, profundamente envolvido, tendo instruções minhas -suponho que no jornal Expresso do último sábado havia uma referência a isso, com a qual, acrescento, nada tenho a ver- no sentido de ser dada toda a prioridade à preparação do tratamento informático dos dados, por forma a se obterem, rapidamente, os elementos.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Morais Leitão (CDS): - Peço-lhe desculpa, Sr. Secretário de Estado, mas V. Ex.ª está a dizer que o Governo não previu, quando o ele o fez, por exemplo, no orçamento da segurança social, quando previu que o subsídio de desemprego passaria de 5,2 para 12 milhões de contos. E isto, sem o lay off, sem nada dessas coisas. Isto significa uma previsão.
O que eu pergunto é se com base numa previsão que leva o subsídio de desemprego a passar de 5,2 para 12 milhões de contos, e se é certa esta identidade que eu referi e que o Sr. Secretário de Estado bem conhece, por que é que o Governo não assume declaradamente em termos de convicção e está a escamotear o problema? É isso que me custa! Não quero condenar o Governo nem criticá-lo pelo facto de haver maior ou menor desemprego. Sabemos as dificuldades em que nos encontramos. Mas, há aqui uma tentativa de escamoteamento.

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O Orador: - Bom, chamar-lhe-á como entender.
O que quero assinalar é que em nenhuma circunstância se tentou dizer que não ia haver aumento do desemprego para o próximo ano. Suponho que o Sr. Ministro das Finanças foi, ontem, bem claro a esse respeito. O que não se quer, é proceder a uma quantificação para a qual não se dispõe de bases sérias. É este ponto que eu gostaria de acentuar.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Então, tem bases para calcular a quantificação da produção e não tem bases para calcular a quantificação do emprego?

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Como o Sr. Secretário de Estado sabe, não são necessárias estatísticas nem inquéritos em relação à questão que lhe colocámos. Porque, o Sr. Secretário de Estado conhece a produtividade, conhece o produto, mesmo nessas contas mal feitas, e, portanto, o cálculo é fácil. O que nós estamos a calcular é a variação e podemos dizer que, pelos nossos cálculos, feitos aqui com uma pequena máquina, é de, pelo menos, 4,6 %.
Se estas Grandes Opções fossem sérias, deviam trazer esta grandeza macroeconómica que não é de somenos importância.

O Orador: - Nada o impede de fazer essas contas, Sr. Deputado.

Risos do PCP.

Mas, continuo a insistir, gostaria de dispor efectivamente, de uma base segura, para poder apresentar estimativas sobre o que será o volume de desemprego para o próximo ano o que, infelizmente, não dispomos neste momento.
Passando à questão colocada pelo Sr. Deputado António Taborda sobre os Programas Integrados de Desenvolvimento Regional, posso dizer-lhe que, embora o PIDDAC não esteja ainda totalmente elaborado, em relação aos programas mencionados estão atribuídas verbas que garantem a sua continuidade. Não tenho qualquer dúvida em o afirmar.
Quanto à questão específica que me põe sobre a via rápida Bragança-Porto, não estou, neste momento, era posição de lhe dar uma resposta definitiva, uma vez que o assunto está ainda a ser analisado pelo Ministério do Equipamento Social, no quadro da preparação do seu PIDDAC para 1984. Naturalmente que há um problema complicado de distribuição e de afectação de verbas e, por consequência, só quando essa elaboração estiver terminada é que se poderá dizer com segurança e seriedade se, realmente, será possível ou não lançar esta obra em 1984. Posso dizer-lhe, no entanto, que ela assume do ponto de vista do Governo, e designadamente numa óptica de política regional, elevada prioridade.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas pôs-me ainda a questão da verosimilhança de se falar em poder lançar os projectos de Alqueva e do plano siderúrgico em 1984. Gostaria de assinalar que, efectivamente, qualquer desses projectos em relação a 1984, são projectos a enquadrar no âmbito do sector empresarial do Estado. Porque, como disse, embora seja um aproveitamento de fins múltiplos, em termos de faseamento temporal Alqueva começará por ser um projecto da EDP e, portanto, não há à partida motivo para que não se possa encarar a possibilidade de enquadrar estes dois projectos no PISEE para 1984. O que não se pode é fazer isso sem entrar, seriamente, em conta com as consequências financeiras daí resultantes e aí, naturalmente, liga-se a observação que fiz há pouco sobre os limites que a contenção do défice orçamental exige para o aumento de dotações de capital às empresas públicas. É nessa perspectiva que, efectivamente, existe uma relação entre a questão do Orçamento do Estado e este problema que levantou.

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Não fica nada feito, não se faz nada!

O Orador: - Eu não disse isso, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Domingos.

O Sr. Silva Domingos (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: É entendimento pacífico que é nas épocas de crise que se deverão iniciar as grandes reformas estruturais. É o que penso dever ser feito na marinha mercante e nas pescas. É o que parece ser a filosofia de base das Opções do Plano nestes sectores.
Começámos pela marinha do comércio, de que muito se tem falado e, bastas vezes, sem profundo conhecimento da sua problemática! Ë conhecida a gravíssima crise que a afecta e nem o sector público, amparado fortemente pelos governos, nem o sector privado, quase sempre entregue a si próprio, tem escapado ao que será a mais grave crise da história da marinha mercante nacional e, também, internacional. A situação é de frequente suspensão de pagamentos que só se retomam com novas injecções de dinheiro dos contribuintes ou dos accionistas. Só a Soponata e a Sacor marítima escapam a esta situação, mercê do regime de preferência de bandeira e fretes administrativos de que beneficiam.
Mas não se pense que se trata de uma crise conjuntural. Ela é, especialmente, estrutural e já vem de há muito. Façamos, pois, uma viagem ao passado para tirarmos ensinamentos para o futuro.
A crise da marinha mercante tem as suas raízes antes do «25 de Abril» e é disso manifestação clara a não apresentação de lucros significativos de exploração, pelas várias empresas nos anos de 1971, 1972 e 1973, a redução do esforço de investimento ao mínimo e a timidez evidente do investimento e da reconversão tecnológica e na entrada em mercados novos. No início da década de 70 sucedem-se as fusões na busca de maior dimensão e de partilha melhorada dos mercados coloniais, explorados em monopólio.
Houve grupos que aproveitaram para reduzir a sua participação directa no sector, já que a rendibilidade decrescente, a dependência asfixiante do monopólio colonial que se sabia que terminaria em breve e uma intervenção tutelar do Estado que tudo condicionava e determinava - investimentos, nível de

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fretes, divisão de mercado, programas de exploração - aconselhavam a encarar com prudência o investimento no sector.
Já nessa época havia excesso de pessoal em terra, por organização deficiente, que só timidamente foi tentada corrigir e mesmo assim defrontando com hostilidade manifesta do seu pessoal, pela paragem e desarmamento e venda dos grandes paquetes e por uma reduzida mobilidade do pessoal.
Com a descolonização e a queda brutal dos fluxos de mercadorias nos tráfegos das ex-colónias, que se lhe seguiu, com o aumento das lotações dos navios e a admissão de pessoal de mar nas empresas, especialmente em 1974 e 1975, determinada por pressões sindicais, com as perturbações da gestão características dessa época, agravadas, ainda, pela nacionalização dos principais operadores sem qualquer estudo e programa devidamente delineado que considerasse alternativas, o sector da marinha do comércio resvalou definitivamente para o descontrole e crise que ainda hoje vive.
A crise internacional e o excesso de tonelagem encomendada nos princípios da década de 70 e agravada com novas encomendas para salvar a indústria de construção naval de alguns países, destinados a um mercado em que já era excessiva a oferta de tonelagem, dão uma machadada gravíssima no sector ao nível mundial com quebras nos fretes que os colocam ao nível dos seus custos variáveis e com milhões de toneladas desarmadas.
Têm-se salvo, somente, as empresas que, sendo sólidas financeiramente, souberam e puderam investir com oportunidade e que se suportaram em contratos de transporte a longo prazo, bem negociados e continuaram operando em segmentos de mercado rendíveis. Como se sabe e se lamenta, as empresas nacionais não estavam nessa situação favorável.
Os sucessivos governos tentaram encarar o problema. Mas as opiniões eram muitas e às vezes contraditórias, o manobrismo político encontrou campo fértil e, lamentavelmente, ficou-se por tentativas falhadas de alteração de estruturas empresariais. Até o esforço meritório de 1977, de dotar o sector de protecção eficaz, relativamente à marinha mercante estrangeira, não resultou, como se desejava, devido à paixão com que se viviam então os problemas da marinha mercante e de que tudo se gaba.
Deu-se prioridade às tentativas de fundir a CNN com a CTM e, mais tarde, tentou-se a sua gestão integrada através da NAVIS. Foram projectos falhados, não porque eles fossem intrinsecamente maus, tinham até lógica e aparente viabilidade, mas porque não havia condições sociais e políticas para os executar.
O pessoal das empresas não estava receptivo a novas fusões, quando as anteriores não se haviam ainda consolidado, nem predisposto a viver a perturbação que sempe acompanha um processo de integração empresarial.
Por outro lado, as vantagens não pareciam evidentes. De facto, tendia-se para situações de monopólio, sempre temidas e rejeitadas pelo mercado interno, estreitava-se o campo de manobra comercial no mercado externo e a maior dimensão não parecia vir trazer economias de escala, nem maior eficiência produtiva, nem melhor controle de gestão - antes pelo contrário, era a experiência passada que nos aconselhava a preferência por unidades de menor dimensão num sector onde todos os dias nascem miríades de empresas para explorar um único navio.
Não houve receptividade nem identificação com estes projectos, mas valha a verdade dizer que também não havia condições mínimas para proceder a grandes transformações estruturais na organização destas empresas.
A tentativa de gestão conjunta e integrada também falhou porque as unidades continuavam concorrentes, mantinham a sua individualidade e estavam sujeitas à sua própria sorte e tinham uma situação económica e financeira de partido naturalmente diferente.
Seguidamente e durante os governos AD, foi tentada a viabilização de cada unidade empresarial de per si, aplicando-se a cada caso a terapêutica mais adequada, isto é, a cada uma, a sua sorte.
Para o efeito, foram decididas as opções políticas consideradas correctas para a prossecução deste objectivo mas não foi possível a sua concretização devido às contingências políticas conhecidas vividas nos últimos meses da governação AD e às dificuldades de negociação com a banca nacional da consolidação de passivos e da eventual transformação de passivos em capital das novas empresas que se viessem a criar a parir da CTM.
A situação da CNN e da CTM pode caracterizar-se como segue:

Situação líquida negativa de mais de 5 milhões de contos na CNN e de mais de 12 milhões de contos na CTM, apesar de um esforço financeiro do Estado de 1977 -1983, de cerca de 5 milhões na CNN e de 8 milhões na CTM, a preços correntes;
O prejuízo esperado da CNN em 1983, é de 3 milhões, dos quais 22 milhões de contos correspondem a encargos financeiros e desvalorizações cambiais, não tendo estimativas para a CTM;
A CNN terá um excedente de pessoal de mais 500 trabalhadores e a CTM mais de 1500 trabalhadores.

A frota não é ainda adequada, embora se tenham zir as lotações dos navios, os quais se defrontam com a oposição dos sindicatos, o armamento português tem unidades em que o excesso de tripulantes ultrapassa os 20%.
As empresas não podem pagar o passivo acumulado e os respectivos encargos, mesmo que o mercado melhore.
A frota não é ainda adequada, embora se tenham vindo a fazer os esforços possíveis no sentido dessa adequação.
No exercício da sua actividade de transportadora a CNN e a CTM irão despender em divisas, no afretamento de navios estrangeiros durante 1983, cerca de 6 milhões de contos, defrontando-se, portanto, com evidentes insuficiências de tonelagem própria.
Todavia, nem tudo é sombrio. Temos tripulações experientes e competentes com custo por pessoa razoável, algum prestígio do nosso armamento persiste nos mercados externos, temos quadros técnicos de boa qualidade e um mercado interno potencial com suficiente dimensão.

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Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos uma balança de transportes deficitária em que a rubrica «Fretes» deverá contribuir com 50 milhões de contos de saldo negativo, no corrente ano. Temos estaleiros navais desocupados que, apesar de tudo, nos custam muito dinheiro. Penso que se deve garantir um mínimo de independência nacional no transporte de abastecimento ao país. Os fretes no mercado internacional, estou certo, hão-de subir fortemente a médio prazo.
O nosso mercado de importações de graneis sólidos - carvão, minério, cereais, oleaginosas - valerá 7,7 milhões de toneladas em 1985 e 10,3 milhões de toneladas em 1988. Seriam necessários cerca de 25 navios de 38 500 t para fazer o seu transporte. A fretes ao nível de hoje tal mercado vale mais 16 milhões de contos para 1985. Pode valer amanhã o dobro ou o triplo.
Dizem algumas forças políticas e sindicais que já devíamos ter os navios necessários e montados em Portugal. Mas isso não é fácil nem possível. Neste como noutros casos em que há interesses conflituais, ternos de ter uma perspectiva global e não somente sectorial. Temos de encarar uma política de contenção e, também, a dura realidade de que o investimento na marinha mercante é capital intensivo. Como exemplo: cada um dos navios de 38 500 t que estão em construção na Setenave custará a este estaleiro cerca de 5 milhões de contos; à CNN, seu futuro proprietário, custará cerca de metade e, mesmo assim, o frete poderá vir a ter de ser subsidiado e o armador necessita de um financiamento para o navio a 10 anos e a 8%.
A outra metade, 2,5 milhões de contos, assim como subsídios e bonificações de juro são da conta do Estado. }á que entendemos que a marinha mercante nacional não poderá adquirir navios em condições piores do que aquelas que encontra no mercado internacional. Exige-o a sua capacidade de concorrência no mercado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É, pois, evidente que o cenário que tracei justifica o apoio que dou à política do Governo, para a marinha do comércio, expressa nas Grandes Opções do Plano.
Assim, haverá que fazer reformas estruturais nestas duas empresas mas, cuidado, não deverão, a meu ver, ser de novo experimentadas hipóteses de solução que já falharam. Haverá que preparar uma situação de partida forte para um desenvolvimento são, no futuro.
Haverá que encontrar os meios financeiros mínimos para o arranque destas reformas. Hoje já será tarde, amanhã poderemos ficar numa situação irrecuperável.
Haverá que tomar medidas que evitem uma concorrência desregrada entre os operadores nacionais patrocinando joint ventures nos tráfegos comuns e outros tipos de cooperação comercial, repartindo quantitativamente os mercados de importação, pela atribuição de quotas.
Sem a sã e necessária concorrência não haverá, certamente, melhoria de eficiência.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Distribuam-se as quotas que o preço de venda uniformizar-se-á e as empresas tenderão a maximizar os resultados pela gestão certa da sua despesa.
Haverá que porfiar na obtenção de um acordo laboral no sector como base indispensável para a sua viabilização económica e financeira.
Haverá que desenvolver a cooperação com os países africanos de expressão portuguesa mas haverá, também, que procurar internacionalizar claramente a nossa marinha mercante, sem timidez, pela associação cora armadores estrangeiros para investimento ou exploração de tráfegos triangulares ou, mesmo, para acesso a novos mercados, pelo desenvolvimento da actividade do armamento de navios estrangeiros, ocupando mão-de-obra e estaleiros nacionais, pelo investimento em terminais portuários nacionais, etc.
Haverá que melhorar as condições de exercício do tráfego marítimo com as regiões autónomas, de forma a obter melhorias de qualidade com custos controlados.
Haverá que viabilizar os contratos de transporte cora os importadores e exportadores nacionais, os quais poderão servir de garantia para os contratos de construção naval. Sabemos ser tarefa difícil, mas acreditamos ser possível a solidariedade intersectorial para viabilização da nossa economia.
Haverá que proteger, também, a nossa marinha mercante. Quase todos os países do mundo a protegem mais ou menos, administrativamente ou por mecanismos financeiros.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Também os grandes objectivos e as medidas de política na área das pescas merecem o nosso apoio.
Todos estaremos de acordo que haverá que aumentar a produção de pescado para reduzir a nossa dependência externa e aumentar as exportações.
Mas teremos de ser prudentes para não exagerar o esforço de pesca nos nossos pesqueiros tradicionais. Haverá, pois, que desenvolver o aproveitamento da nossa zona económica exclusiva, e para isso é necessário a reconversão da frota pesqueira nacional, através do apoio aos armadores públicos e privados, recorrendo, naturalmente, aos nossos estaleiros navais, impõe-se ainda melhorar a nossa tecnologia pela associação eventual a armadores estrangeiros ou, mesmo, pela aquisição das técnicas que nos faltem.
É fundamental melhorar o ensino da pesca a todos os níveis, para que se obtenha um melhor rendimento dos portos, da frota e do equipamento disponíveis que têm um valor incalculável.
Haverá que melhorar a fiscalização da Zona Económica Exclusiva e para isso é, também, necessário dotar a armada e a força aérea dos meios e equipamentos necessários.
Haverá que prosseguir a negociação de acordos de pesca com outros países, que sejam equilibrados e de claro interesse para o nosso país e que nos permitam, também, utilizar eficazmente a frota disponível. Em particular, haverá que melhorar a nossa cooperação com os países africanos de expressão portuguesa, onde me parecem existir possibilidades de negociação frutuosa.
Haverá, ainda, que melhorar o funcionamento dos órgãos da Administração Pública, em especial, haverá que rever, com urgência o regime jurídico do Serviço de Lotas e Vendagens, procedendo a uma profunda reestruturação destes serviços.
Haverá que defender os produtores e consumidores das actividades de intermediários especuladores e a anunciada criação de um Fundo de Intervenção e

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Regularização do Mercado de Produtos de Pesca poderá vir a ser uma acção útil e eficaz.
Haverá que apoiar por todos os meios disponíveis, os bons projectos que contribuam para o desenvolvimento das nossas pescas.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Os problemas ligados à marinha de comércio e às pescas merecem ser objecto de um largo debate nesta Câmara e mesmo na opinião pública para que renasça a vocação do mar neste país de marinheiros.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - Ouviu-se melhor a sua intervenção do que a anterior, feita pelo Sr. Secretário de Estado do Planeamento. E, se bem entendi, V. Ex.ª disse que concorda com as orientações das medidas propostas nas Grandes Opções do Plano. No entanto, V. Ex.ª tinha focado antes uma série de dificuldades que tinham impossibilitado o Governo anterior - e se bem entendi referiu-se mesmo a outros Governos - de tomar um certo número de medidas, entre as quais a reestruturação de empresas do sector da marinha mercante. Portanto, V. Ex.ª pensa que as dificuldades que focou poderão ser agora ultrapassadas. E a minha pergunta é a seguinte: porquê agora?
Ou será exagero, forçando a interpretação, perguntando se o Sr. Deputado pensa que este Governo tem melhores condições do que o anterior, ou alguns dos anteriores, para reestruturar as empresas do sector da marinha mercante? E se esta interpretação é correcta, porque motivo é?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Silva Domingos.

O Sr. Silva Domingos (PSD): - O Sr. Deputado entendeu bem. De facto, referi-me às dificuldades que todos os Governos têm encontrado ao defrontar este problema. Creio mesmo que a razão principal que levou ao falhanço de muitas tentativas foi a enorme carência de informação e de consciencialização, não só dos trabalhadores como da opinião pública, sobre a realidade que se vivia nas empresas e sobre a necessidade imperiosa de encontrar as soluções mais eficazes.
Nos últimos anos foram tentadas várias soluções. Travou-se um amplo diálogo, numa discussão o mais alargada possível, que envolveu não só o Ministério tutelador do sector como também outros ministérios e outras entidades. Assim, foi possível obter a compreensão dos problemas, o que, creio, poderá agora facilitar a implementação das soluções correctas para este sector.
Penso mesmo que no Governo anterior já teria sido possível implementar algumas destas soluções se não tem sido a crise política que estalou no final de 1982.
Quanto à pergunta que me fez sobre se este Governo terá melhores condições que o anterior, direi que sim, porque estamos perante os primeiros tempos de actuação de um Governo, o qual beneficia ainda de um quociente de esperanças muito elevado junto dos eleitores portugueses. Penso, ainda, que a situação de crise, que é hoje mais sentida do que nunca, ajudará os trabalhadores das empresas a compreenderem os sacrifícios que lhes são pedidos e também a colaborarem nas soluções correctas que lhes são propostas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O debate que se está a realizar sobre as Grandes Opções para 1984 da política económica, financeira, fiscal e social, está a demonstrar que a concretização de tais políticas governamentais teria duas consequências altamente gravosas para o povo português: o agravamento do desemprego para níveis incompatíveis e a queda dos rendimentos reais para níveis insuportáveis, em muitos casos inferiores ao nível de subsistência.
De facto, quando se sabe que Portugal é o país da Europa com mais baixo rendimento per capita, quando não se desconhece que os diferentes sectores da actividade económica desde a agricultura e pescas, à construção civil, passando pelo comércio e certos ramos da indústria se encontram numa conjuntura negativa, com quebras de produção e consequentes agravamentos de níveis de desemprego, apresentar como objectivo para o próximo ano a diminuição da produção nacional em 1,4 %, acompanhado de enormes cortes orçamentais nos investimentos públicos, nas verbas para a agricultura, construção civil e obras públicas, habitação e indústria, é condenar o País à dependência externa em bens essenciais e desprezar as riquezas nacionais, os recursos disponíveis, nomeadamente os recursos colossais que são cerca de 500 000 trabalhadores desempregados com a sua capacidade e energia criadora que pode (e devia estar!) ao serviço do desenvolvimento económico e social do País.

Aplausos do PCP.

A concretização de tais propostas iria implicar que no próximo ano o desemprego ultrapassasse os 700 000 desempregados, ou seja, atingisse 17 % da população activa, tornando assim Portugal dramaticamente o campeão do desemprego na Europa. Entretanto, o Orçamento do Estado prevê o pagamento do subsídio de desemprego a pouco mais de 70 000 trabalhadores desempregados, ou seja, ficariam sem apoio 90 % dos desempregados.
Este volume de desemprego e a recessão criam uma situação dramática no presente e comprometem a futura criação de emprego: os dados oficiais comprovam que mesmo um pequeno aumento na produção global já não tem impacte na criação de empregos, devido ao facto das empresas se encontrarem a laborar abaixo do montante de produção que o dimensionamento de efectivos permitiria.
Entretanto, a actual situação tem facilitado a proliferação de contratos a prazo. Até um organismo oficial, o Instituto de Análise de Conjuntura e Estudos e Planeamento calcula que o número de contratados a prazo e hoje superior a 11 % do número de pessoas ao serviço com destaque para os sectores da constru-

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cão civil com mais de 40 %, dos serviços pessoais e comércio, restaurantes e hotéis.
Isto significa que neste momento cerca de 1 milhão de trabalhadores portugueses, na sua maioria jovens e mulheres, mas também já muitos homens, ou está no desemprego ou vive na insegurança de um contrato a prazo, de um trabalho incerto, o que facilita, por um lado o aumento da repressão e exploração dos trabalhadores - a que o Governo chama «acréscimos de produtividade» - e por outro a reconstituição das grandes fortunas e grupos económicos, a acumulação capitalista.
Se a tudo isto acrescentarmos cerca de 120 000 trabalhadores com salários em atraso, milhares de outros ameaçados de desemprego, pelas falências em série de muitas empresas dos mais variados sectores de actividade, com ou sem cobertura legal do famigerado lay-off ou de outra qualquer lei de despedimentos, fica clarificado que a opção governamental é o ataque frontal aos direitos laborais, deixando campo aberto ao reforço do poder patronal e abrindo caminho para a liquidação no plano prático de todos os direitos constitucionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Oradora: - Na Administração Pública o corte de investimentos, a baixa da produção geram uma situação que, não só impede a satisfação das necessidades colectivas, como visa criar artificialmente mão-de-obra dita excedentária. Isto é gravíssimo, Srs. Deputados! Não se pode ignorar que a oferta de serviços por parte das empresas do sector público e da administração central é largamente insuficiente face às solicitações da procura e às necessidades das populações. Perante isto, o Governo chega ao ponto de utilizar o aumento exagerado do preço de algumas tarifas de serviços públicos para tentar reduzir as listas de espera, as bichas. É uma forma brutal de desencorajar e até de estabelecer o racionamento da procura!
Os cortes previstos no investimento público para o próximo ano são de tal ordem que levam à paralisação e congelamento de projectos de construção de vias de comunicação, hospitais, centros de saúde e escolas.
Com tais cortes poderá criar-se artificialmente o subaproveitamento das potencialidades dos serviços, aparecendo assim a justificação para despedimentos de trabalhadores. Quando o Secretário de Estado do Orçamento tenta justificar os cortes orçamentais nos montantes atribuídos aos Ministérios fá-lo dizendo que se podem dispensar tarefeiros no Ministério da Agricultura e congelar a admissão de pessoal, nomeadamente professores no Ministério da Educação, já que afirma que tudo é uma questão de organização de horários.
Só que as famílias sabem que em muitos casos os seus filhos não têm aulas por falta de professores ou de trabalhadores auxiliares nas escolas. Escolas que em muitos casos têm péssimas instalações e equipamentos, quando os têm.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Num domínio crucial como a educação este Governo averba um recorde memorável: o valor do investimento para o Ministério da Educação representa 4 % do valor global previsto para investimentos da administração central e é o valor relativo mais baixo da última década, sendo inferior era cerca de 42 % à dotação inicial do Orçamento Geral do Estado para este ano.
Num sistema que rebenta pelas costuras o Governo prevê diminuições de mais de 50 % das verbas para a instalação e equipamento do ensino preparatório e secundário, da educação de adultos, dos centros de investigação e do ensino superior.
Quanto ao tão badalado ensino «técnico profissional» não se conhece ao certo a respectiva cobertura orçamental. A menos que se assista ao despudor de ser o Fundo de Desemprego a subsidiar tal projecto, enquanto milhares de desempregados e de trabalhadores com salários em atraso continuam sem qualquer apoio que o Fundo de Desemprego lhes deveria prestar.

O Sr. João Amaral (PCP): - Que escândalo!

A Oradora: - No Ministério do Equipamento Social há reduções que atingem cerca de 50 % em alguns serviços prevendo-se somente cerca de 25 milhões de contos para obras públicas e apenas 4,5 milhões de contos para a habitação, isto quando nas Grandes Opções do Plano se prevê que um terço dos fogos a construir deveriam ser habitação social e quando se sabe que as carências ultrapassam meio milhão de habitações.
Aqui está uma opção que conduz a cortes e atrasos, atrasos que se irão verificar também nos projectos públicos e irão onerar bastante os empreendimentos previstos, além de atrasar por vários anos o início de obras essenciais para o desenvolvimento nacional e regional do País e impedir a satisfação de necessidades básicas da população.
A tudo isto há que somar o facto de os rendimentos reais da maioria da população continuarem a baixar por força da diminuição dos salários reais, das dificuldades crescentes na contratação colectiva, do aumento do desemprego, do agravamento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e dos cortes orçamentais que referi em sectores sociais como a habitação, educação e pensões e reformas. Quanto a estas, o Governo chega ao cúmulo de inscrever no Orçamento do Estado para 1984 verbas globais para pensões e reformas que são inferiores aos montantes efectivamente pagos em 1983, enquanto, como todos sabemos, permite que as dívidas do patronato à segurança social atinjam largas dezenas de milhões de contos.
Apesar de se saber que a inflação ultrapassará os 24 %, com os preços dos bens alimentares a subir mais de 30% - principal despesa da maioria dos agregados familiares -, o Governo não fala de aumentos do salário mínimo nacional e prevê para os trabalhar dores da função pública uma enorme redução dos seus salários reais: menos 9%, 10% ou 11%!
E quando o Governo insiste na necessidade de diminuir o consumo, refere-se tão-só aos trabalhadores e suas famílias, aos reformados e pensionistas. De facto, as estatísticas confirmam que há uma acentuada contracção de consumos, mas confirmam igualmente que se mantém uma procura elevada de automóveis, nomeadamente marcas de preços elevados, de bens supérfluos, de apartamentos e andares de luxo. A austeridade não é para todos, Srs. Membros do Governo!

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Austeridade para o Governo significa acabar com os subsídios e indemnizações compensatórias aos bens alimentares e serviços públicos essenciais reduzindo as verbas a atribuir pelo Fundo de Abastecimento de 15,8 milhões de contos em 1983; para somente 3 milhões de contos em 1984, e reduzindo para 13 milhões de contos as indemnizações compensatórias a atribuir às empresas públicas produtoras de bens e serviços essenciais, enquanto prevê atribuir em benesses e incentivos ao capital privado mais de 55 milhões de contos.
Ao fomentar a injustiça social mais gritante, o Governo assume a responsabilidade da instabilidade social.
É em defesa da estabilidade e da recuperação económica que se erguem todos os que por todo o país vêm dizendo não a esta política de ruína. São cada vez mais, são a esmagadora maioria do povo português. É bom que se lembrem disto, Srs. Deputados, quando votarem estas Grandes Opções do Plano e o Orçamento do Estado para 1984.

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - O meu pedido de esclarecimento é muito curto, admitindo eu, obviamente, que a resposta possa ser um pouco mais longa.
A Sr.ª Deputada referiu, por um lado, o problema da redução do Fundo de Abastecimento e, por outro, o problema da diminuição das indemnizações compensatórias.
Para o pensamento da Sr.ª Deputada ficar mais claro, pelo menos para mim, faria a seguinte pergunta: qual seria o critério de fixação das indemnizações compensatórias que a Sr.ª Deputada proporia para as empresas públicas que fornecem bens ou serviços, as quais se pensa deverem ser um pouco abaixo do preço que resultaria, ou das leis de mercado, ou do cálculo dos seus custos?
Em relação ao Fundo de Abastecimento, pergunto que critério proporia em relação ao tipo de redução - até se não aceita qualquer redução - de verbas a utilizar.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - Já hoje tive oportunidade de pedir a um camarada de bancada da Sr.ª Deputada que esclarecesse algumas ideias/força no sentido de justificar as vossas críticas.
Volto a referir que, no momento que vivemos em Portugal, é muito fácil fazer um levantamento das dificuldades de um Orçamento do Estado - aliás, foi, de facto, do que esteve a falar - e das Grandes Opções do Plano. É fácil, sobretudo se dermos a isso um ar de inventário tipo comício. É fácil e não dará mérito a ninguém.
Através das dificuldades que existem - que não serão estas, porque estão, naturalmente exageradas, mas que infelizmente existem - o importante seria dizer
que despesas cortavam e que receitas aumentavam, no curto prazo, Sr.ª Deputada, pois o problema põe-se para 1984. Isto, sendo certo que aceitam a necessidade de reequilíbrios do Orçamento do Estado.
A Sr.ª Deputada terá que me explicar, bem como à Câmara, que opções tem o seu grupo parlamentar, o seu partido, para, a partir da realidade, passar da simples enumeração da lista das dificuldades, que todos os portugueses conhecem - alguns deles provavelmente melhor do que nós - para a efectiva demonstração de outras alternativas e de outras opções.
Volto a sublinhar que a lista peca por exagero, mas que é normal que o faça com esse exagero.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Em relação às questões que me foram postas pelo Sr. Deputado Hasse Ferreira, refiro que, de facto, há uma baixa muito grande, como aliás pode ver no Orçamento do Estado para 1984, nas contribuições do Fundo de Abastecimento. Passou-se de uma verba de cerca de 16 milhões para este ano para se preverem apenas 3 milhões de contos para o próximo ano. Aliás, é a continuação da política que o Governo actual tem vindo a seguir, à qual o Governo chama de preços reais, ou seja, obrigar as populações de menor recursos a suportar preços impraticáveis, mesmo quando se trata de bens alimentares de primeira necessidade, como o açúcar, que já aumentou este ano mais de uma vez, e o leite e o pão que, pelo menos, já aumentaram duas vezes.
Através deste processo é claro que para o ano teremos um agravamento muito sério dos preços alimentares, que são exactamente aqueles que mais pesam nos orçamentos das famílias de menores recursos, nomeadamente, de cerca daquele milhão de trabalhadores que está ou no desemprego ou que vive na incerteza do futuro, dado o trabalho incerto de presente.
Em relação à questão que o Sr. Deputado colocou das indemnizações compensatórias, refiro que o problema é idêntico. O que eu defendia é que não houvesse nos subsídios a diminuição que se prevê para 1984, quer para os preços, quer para os bens alimentares, quer ainda para as empresas que prestam serviços colectivos. Essa seria a minha opção, a qual acho que poderia ser praticada por este Governo.
Tendo em conta as questões levantadas pelo Sr. Deputado Almerindo Marques, sobre a questão de se saber quais as receitas que iríamos buscar para fazer face a estas questões e atendendo às propostas que defendemos, digo-lhe que certamente os Srs. Deputados sabem que há, por ano, cerca de 100 milhões de contos de fugas aos impostos e evasão fiscal. Essa verba daria para isto e para muito mais.
E os Srs. Deputados também sabem, por exemplo, que só a sobretaxa de importação - que vai baixar de 30 % para 10 % - se se mantivesse nos 30 % permitiria ao Estado recolher no próximo ano mais 24 milhões de contos. Também isso daria para o Fundo de Abastecimento e para as indemnizações compensatórias.
Gostaria também de lhe dizer que quando às despesas também poderia haver um critério diferente. Em vez de se prever a atribuição de cerca de 55 milhões de contos em benesses e incentivos ao grande capital essa verba poderia ser bastante reduzida. Assim,

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certamente que se poderiam manter os 16, ou até 20 milhões de contos para o Fundo de Abastecimento e haveria verbas para as indemnizações compensatórias. As nossas opções passam, de facto, por aqui. Passam por uma justiça social e não pelo agravamento da injustiça social que os Srs. Deputados defendem. Essa, aliada ao aumento da produção e ao combate ao desemprego, é a opção fundamental, da qual já várias vezes apresentámos alternativas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Hasse Ferreira.

O Sr. Hasse Ferreira (UEDS): - É um protesto, por um lado, no sentido de agradecer o esclarecimento já dado; por outro lado, como a resposta não foi completa, faria ainda algumas perguntas.
Se bem entendi, a Sr.ª Deputada procuraria, essencialmente, manter os mesmos valores, a preços constantes, quer no Fundo de Abastecimento, quer no que refere as indemnizações compensatórias. Concretamente, o que eu estava a perguntar era se haveria alguma proposta de alternativa ou sugestões de alteração de política quanto aos critérios a seguir. Isto, porque, por exemplo, no caso do Fundo de Abastecimento poder-se-ia reduzir o número de produtos subsidiados. Produzindo o número de produtos abrangidos poder-se-ia aumentar o valor noutros casos.
Há aqui várias possibilidades de utilização disto que me parece não foram exploradas.
No fundo, o meu protesto, embora seja um protesto da maior consideração, vai no sentido de pensar que este assunto terá efectivamente de ser debatido, ultrapassando o espaço, apenas de um protesto. Se o Governo cortar verbas, teremos de lhe dizer: não corte aí, ou corte menos. Ou então, dizer de que outra maneira é que deve cortar. Pelo menos, fazer sugestões ao Governo para ver se ele está de acordo ou não. Ele faz como entender, enquanto a Câmara o autorizar nesse sentido, mas nós temos o direito de ir sugerindo e fazendo propostas de alteração.

O Sr. Presidente: - Para protestar, tem a palavra o Sr. Deputado Almerindo Marques.

O Sr. Almerindo Marques (PS): - O Sr. Presidente saberá que não é um protesto. É, aliás, um agradecimento que vai ter a forma de um protesto. E agradeço porque a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo me esclareceu realmente. E penso que aquilo que a Sr.ª Deputada disse foi importante, porque quando se passou da simples enunciação de ideias, lamentavelmente com algum fundamento de verdade, para a realidade prática e para a resolução dos problemas do país, ou seja, quando passou de um certo folclore teórico para a realidade, teve muito pouca imaginação nas medidas que propôs.
Ao contrário do que poderia parecer, eu estava atento e a Sr.ª Deputada referiu a luta contra a fuga aos impostos, etc. Essa é uma medida que é conhecida, está escrita ...

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Está escrita, mas não está feita!

O Orador: - ... está em curso e o Governo está a praticar o que pode, o que deve, e já pela parte do próprio Partido Socialista se pediu que faça mais.
Em relação à redução da sobretaxa, a Sr.ª Deputada sabe muito bem o efeito perverso que estas coisas têm e sabe que isso é, apenas, uma mera enunciação. Eventualmente poderá dar alguma receita, mas não tem o significado que a Sr.ª Deputada lhe quis dar. Sinceramente, prefiro não voltar a este tema.
Quanto às despesas, falam-se em 55 milhões de contos para o grande capital. Francamente, confesso grande dificuldade quando se me apresentam estes mecanismos agregados, como o grande capital, etc. Gostaria de saber efectivamente o que está no espírito da Sr.ª Deputada.
Se se refere à revisão global de todos os subsídios, etc., etc, refiro que sim, com certeza: Têm sido atribuídos, nalguns casos com muito discutível critério, mas a verdade é que o Governo diz que está a rever os subsídios, Sr.ª Deputada.
Isso está escrito e aliás já foi aqui objecto de intervenção de outros senhores deputados, que perguntaram em que sentido é que se revêem os subsídios, nomeadamente o chamado o SIII, etc. Suponho que é este o tal número dos 55 milhões de contos para o grande capital ...
Mas isto não significa, de modo algum, que eu esteja de acordo com a afirmação de que qualquer subsídio no Orçamento do Estado implica subsídios para o grande capital. A Sr.ª Deputada sabe muito bem que há subsídios para pequenas e médias empresas, há subsídios para empresas ...

O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): - Nem sequer é música celestial ...

O Orador: - O Sr. Deputado tem muito pouca graça!
Portanto, queria dizer à Sr.ª Deputada que foi muito pouco original quando passámos à fase da terapêutica.

O Sr. Presidente: - Para contraprotestar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - É para um breve protesto, já que o meu tempo é muito curto e os Srs. Deputados, certamente, não querem que eu vá aqui repetir em 2 minutos aquilo que dissemos durante largas horas e já aqui repetimos por diversas vezes.
Se os Srs. Deputados quiserem posso remeter-lhes as intervenções que já aqui fizemos sobre a alternativa que defendemos.
Em relação ao Sr. Deputado Hasse Ferreira, queria dizer o seguinte: estou de acordo com o Sr. Deputado e só por falta de tempo é que não especifiquei melhor o meu pensamento acerca do assunto. Naturalmente que é preciso ter em conta a taxa de inflação. Isso estava subjacente naquilo que eu disse.
Em relação ao Sr. Deputado Almerindo Marques, queria só perguntar-lhe porque é que o Governo, então, prevê para o próximo ano uma baixa no montante da receita do imposto de transacções se, de facto, está disposto a combater a fraude e a evasão fiscais.

Aplausos do PCP.

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O Sr. Presidente: - Não havendo mais inscrições, conseguimos acabar os nossos trabalhos na hora inicialmente prevista.
Amanhã pelas 11 horas realiza-se a recepção à Sr.ª Presidente da República da Islândia e a sessão do Plenário inicia-se às 15 horas.
Está encerrada a sessão.

Eram 21 horas.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa.
Avelino Feliciano Martins Rodrigues.
Bento Elísio de Azevedo.
Bento Gonçalves da Cruz.
Custódio das Neves Lopes Ramos.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
João Luís Duarte Fernandes.
Jorge Manuel Aparício Ferreira Miranda.
José Luís do Amaral Nunes.
Raúl Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui Monteiro Picciochi.
Teófilo Carvalho dos Santos.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

António Joaquim Bastos Marques Mendes.
Domingos Duarte Lima.
Fernando Manuel Cardoso Ferreira.
João Domingos Abreu Salgado.
João Pedro de Barros.
José António Valério do Couto.
Manuel António Araújo dos Santos.
Manuel Ferreira Martins.
Maria Margarida Salema Moura Ribeiro.
Mariana Santos Calhau Perdigão.
Marília Dulce Coelho Pires M. Raimundo.
Rui Manuel de Oliveira Costa.

Partido Comunista Português (PCP):

Maria Odete Santos.

Centro Democrático Social (CDS):

António Bernardo Lobo Xavier.
Hernâni Torres Moutinho.
Horácio Alves Marçal.
João António de Morais Silva Leitão.
João Lopes Porto.
José António de Morais Sarmento Moniz.
José Miguel Anacoreta Correia.
Manuel António de Almeida Vasconcelos.
Manuel Jorge Forte Goes.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António Cândido Miranda Macedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Gonçalves Janeiro.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Eurico José P. Carvalho Figueiredo. João Joaquim Gomes.
José Manuel Torres Couto.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel Laranjeira Vaz.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Rodolfo Alexandrino Susano Crespo.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Social-Democrata (PSD/PPD):

Amélia Cavaleiro Monteiro A. Azevedo.
Fernando José Alves Figueiredo.
José Luís de Figueiredo Lopes.

eonardo Eugénio Ramos Ribeiro Almeida.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Pereira.
Rui Manuel de Sousa Almeida Mendes.
Victor Pereira Crespo.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Augusto Veiga de Oliveira.
Domingos Abrantes Ferreira.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Torrinhas Paulo.
Joaquim Gomes dos Santos.
Lino Carvalho de Lima.
Manuel Correia Lopes.
Maria Luísa Mesquita Cachado.
Octávio Floriano Rodrigues Pato.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Francisco António Lucas Pires.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Augusto Gama.
José Vieira de Carvalho.
Luís Eduardo da Silva Barbosa.

Perguntas ao Governo enviadas à Mesa pelo MDP/CDE, para publicação e relativas ao debate das propostas de lei n.º 46/III e 47/III.

1 - Se a inflação for superior ao previsto (tiver desde o início uma evolução que, inequivocamente, aponte para valores nitidamente superiores) todos os valores reais que se apresentam como previsão para alguns indicadores serão ultrapassados, bem como o valor do défice orçamental em termos nominais. Encara o Governo a hipótese de, em tal caso, proceder à revisão do orçamento ou à apresentação de novo orçamento suplementar?
2 - É sabido que práticas como as de subfacturação nas exportações e sobrefacturação nas importações têm drenado para o exterior meios financeiros de que tanto estamos carecidos. É de prever que a política de fomento de exportações que se pretende seguir vá favorecer o aumento e valor da subfacturação, até porque a política económica enunciada pelo Governo não é de molde a tornar atractivo o investimento de nacionais em Portugal (aliás prevê-se que o investimento privado decaia em 3,5 %).
Nestas condições pergunta-se:

Considera o Governo irrelevante ou pouco significativa a questão da exportação ilícita de capitais?

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Que medidas concretas tem o Governo preparadas para impedir ou dificultar a fuga de capitais para o estrangeiro?

3 - Nas Grandes Opções do Plano afirma-se que:

... o Governo evitará que se agravem as disparidades na distribuição de rendimentos, o que será conseguido através da política fiscal e de segurança social.

Tal afirmação não parece muito consentânea com o conteúdo do Orçamento Geral do Estado, não só pelos montantes aí considerados como porque também se não consignam significativas alterações no regime fiscal para 1984.
Assim sendo, pergunta-se que medidas concretas de política fiscal e de segurança social tenciona o Governo adoptar em 1984 no sentido de procurar evitar «que se agravem as disparidades na distribuição de rendimentos»?

4 - Nas Grandes Opções do Plano refere-se que:

... o Governo tenciona lançar ou acelerar, no próximo ano um conjunto de programas de modernização das estruturas produtivas, predominantemente orientadas para a redução da dependência do exterior.

Esta intenção parece, por um lado, dificilmente realizável dado o baixo volume que o Orçamento do Estado contempla para investimento, particularmente a nível do PIDAC. Por outro lado, só será possível desde que tais programas, que noutra passagem das Grandes Opções do Plano se afirma estarem «prontos a serem lançados no próximo ano», contemplem projectos cujo estudo esteja ou concluído ou em fase de conclusão.
Nesta conformidade pergunta-se ao Governo a que programas se refere, quais os projectos de investimento que se iniciarão ou prosseguirão em 1984 e quais as suas fontes de financiamento.

Lisboa, 22 de Novembro de 1983. - Os Deputados do Grupo Parlamentar do Movimento Democrático Português (MDP/CDE): Helena Cidade Moura - António Taborda - Pinheiro Henriques.

Relatório e parecer da Comissão de Regimento e Mandatos enviado à Mesa para publicação

Em reunião realizada no dia 22 de Novembro de 1983, pelas 12 horas, foi apreciada a seguinte substituição de Deputados:

1) Solicitada pelo partido do Centro Democrático Social:

Manuel Tomás Cortez Rodrigues Queiró (círculo eleitoral de Coimbra), por António Bernardo da Gama Lobo Xavier (esta substituição é pedida para os dias 22 a 24 de Novembro corrente, inclusive).

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que o substituto indicado é realmente o candidato não eleito que deve ser chamado ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência da respectiva lista eleitoral apresentada a sufrágio no concernente círculo eleitoral.
Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:

A substituição em causa é de admitir, uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O presente relatório foi aprovado por unanimidade dos Deputados presentes.

A Comissão: Vice-Presidente, Mário Júlio Montalvão Machado (PSD) - Secretários: José Manuel Maia Nunes de Almeida (PCP) - Armando Domingos Lima Ribeiro de Oliveira (CDS) - António da Costa (PS) - Luís Silvério Gonçalves Saias (PS) - António Roleira Marinho (PSD) - Cristóvão Guerreiro Norte (PSD) - Daniel Abílio Ferreira Bastos (PSD) - Leonel Santa Rita Pires (PSD) - Octávio Augusto Teixeira (PCP) - Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP) - Francisco Menezes Falcão (CDS) - António Monteiro Taborda (MDP/CDE) - Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

Os Redactores de l.ª classe: José Diogo - Noémia Malheiro.

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