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DIÁRIO da Assembleia da República

I Série - Número 47

Quinta-feira, 20 de Março de 1988

IV LEGISLATURA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA (1985-1986)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 19 DE MARÇO DE 1986

Presidente: Exmo. Sr. Fernando Monteiro do Amaral

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes

Aloísio Fernando Macedo Fonseca

António Eduardo de Sousa Pereira

José Manuel Maia Nunes de Almeida

SUMARIO. - O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas e 40 minutos.
Prosseguiu a discussão, na generalidade, dos propostas de lei nº 13/IV grandes opções do Plano para 1986 - e 16/IV Orçamento do Estado para 1986. Intervieram a diverso título, além dos Srs. Ministros do Plano e da Administração do Território (Valente de Oliveira), da Agricultura, Pescas e Alimentação (Álvaro Barreto), Educação e Cultura ( João de Deus Pinheiro) e dos Srs. Secretários de Estado da Juventude (Couto dos Santos) e da Cultura (Maria Teresa Gouveia), os Srs. Deputados Guido Rodrigues (PSD), José Gamo (CDS), Eduardo Pereira (PS). Correia Gago (PRD), Horácio Marçal (CDS), Daniel Bastos e Roleira Marinho (PSD), Raul Junqueira (PS), Barbosa da Costa (PRD), Maria Santos (Indep.), João Amaral (PCP), José Carlos Lilaia (PRD), João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE), Ilda Figueiredo (PCP), Andrade Pereira (CDS), Mário Maciel (PSD), Octávio Teixeira (PCP), Francisco Teixeira (CDS), Victor Ávila (PRD), Próspero Luís (PSD), Zita Seabra e Rogério de Brito (PCP), Magalhães Mota (PRD), Raul Castro (MDP/CDE), António Barreto (Indep.), Neiva Correia (CDS), Armando Fernandes (PRD), Joaquim Luís (PSD), Ana Gonçalves (PRD), António Tavares (PSD), Jorge Patrício (PCP), Miguel Relvas (PSD), José Apolinário (PS), Carlos Coelho e Álvaro Figueiredo (PSD), Raul de Brito (PS), Cristina Albuquerque (PRD), José Manuel Casqueiro e Carlos Pinto (PSD), Jorge Lemos (PCP), Gomes de Pinho (CDS), Fillol Guimarães e Agostinho Domingues (PS), Fernando Conceição (PSD), Vasco de Melo (CDS), António Osório (PCP), Carlos Ganopa (PRD) e Vasco Miguel (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão às 21 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 40 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata(PPD/PSD):

Alberto Monteiro Araújo.
Álvaro Barros Marques de Figueiredo.
Amélia Cavaleiro Andrade Azevedo.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Eduardo de Sousa Pereira.
José Manuel Mala Nunes de Almeida.
António d'Orey Capucho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Paulo Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
Adindo da Silva André Moreira.
Arnaldo Ângelo de Brito Lhamas.
Aurora Margarida Borges de Carvalho.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Miguel Maximiano Almeida Coelho.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Domingos Silva e Sousa.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando José Próspero Luís.
Fernando Monteiro do Amaral.
Francisco Mendes Costa.
Francisco Rodrigues Porto.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Henrique Luís Esteves Bairrão.
Henrique Rodrigues Mata.
João Álvaro Poças Santos.
João Domingos Abreu Salgado.
João Luís Malato Correia.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
Joaquim Carneiro de Barros Domingues,
Joaquim da Silva Martins.
José de Almeida Cesário.
José Assunção Marques.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.

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José Luís Bonifácio Ramos.
José Mendes Melo Alves.
José Pereira Lopes.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capoulas.
Luís Jorge Cabral Tavares Lima.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel João Vaz Freixo.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Maria Antonieta Cardoso Moniz.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Miguel Fernando Miranda Relvas.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Alberto Limpo Salvada.
Virgílio de Oliveira Carneiro.
Vítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Agostinho de Jesus Domingues.
Alberto Manuel Avelino.
Aloísio Fernando Macedo Fonseca.
António Almeida Santos.
António Cândido Miranda Macedo.
António Frederico Vieira de Moura.
António Miguel de Morais Barreto.
Armando dos Santos Lopes.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Luís.
Carlos Manuel N. Costa Candal.
Carlos Manuel Pereira Pinto.
Francisco Manuel Marcelo Curto.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Fernando Henriques Lopes.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
Jorge Lacão Costa.
José Augusto Fillol Guimarães.
José Barbosa Mota.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José dos Santos Gonçalves Frazão.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cardia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Mário Nunes da Silva.
Raúl da Assunção Pimenta Rêgo.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Raul Manuel Gouveia B. Junqueiro.
Ricardo Manuel Rodrigues de Barros.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Victor Hugo de Jesus Sequeira.
Victor Manuel Caio Roque.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Agostinho Correia de Sousa.
Alexandre Manuel da Fonseca Leite.
Ana da Graça Gonçalves Antunes.
António Eduardo A. de Sousa Pereira.
António Lopes Marques.
António Magalhães de Barros Feu.
António Maria Paulouro.
Arménio Ramos de Carvalho.
Bártolo de Paiva Campos.
Carlos Alberto da S. Narciso Martins.
Carlos Alberto Rodrigues Matias.
Carlos Artur Trindade Sá Furtado.
Carlos Joaquim de Carvalho Ganopa.
Carlos Jorge Mendes Correia Gago.
Fernando Dias de Carvalho.
Francisco Armando Fernandes.
Francisco Barbosa da Costa.
Ivo Jorge de Almeida dos Santos Pinho.
Jaime Manuel Coutinho da Silva Ramos.
João Barros Madeira.
Joaquim Carmelo Lobo.
José Alberto Paiva Seabra Rosa.
José Caeiro Passinhas.
José Carlos Torres Matos de Vasconcelos.
José Carlos Pereira Lilaia.
José Maria Vieira Dias de Carvalho.
José da Silva Lopes.
José Rodrigo da Costa Carvalho.
Maria Cristina Albuquerque.
Roberto de Sousa Rocha Amaral.
Tiago Lameiro Rodrigues Bastos.
Vasco Pinto da Silva Marques.
Vitorino da Silva Costa.
Victor Manuel Ávila da Silva.
Victor Manuel Lopes Vieira.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Anselmo Aníbal.
António da Silva Mota.
António Manuel da Silva Osório.
António Vidigal Amaro.
Belchior Alves Pereira.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Carlos Manafaia.
Cláudio José Santos Percheiro.
Custódio Jacinto Gingão.
Domingos Abrantes Ferreira.
Francisco Miguel Duarte.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
José António Gonçalves do Amaral.
João Carlos Abrantes.
Joaquim Gomes dos Santos.
Jorge .Manuel Abreu de Lemos.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia.
Nunes de Almeida.
José Manuel dos Santos Magalhães.
José Rodrigues Vitoriano.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Rogério de Sonsa Brito.
Maria Ilda da Costa Figueiredo.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Rogério Paulo Sardinha de S. Moreira.
Zita Maria de Seabra Roseiro.

Centro Democrático Social (CDS):

Abel Augusto Gomes de Almeida.
Adriano José Alves Moreira.
António Filipe Neiva Correia.
António José Tomás Gomes de Pinho.
António Vasco Mello César Menezes.
Francisco António Oliveira Teixeira.
Hernâni Torres Moutinho.

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Horácio Alves Marçal.
João Gomes de Abreu Lima.
Joaquim Rocha dos Santos.
José Maria Andrade Pereira.

Movimento Democrático Português (MDP/CDE):

José Manuel do Carmo Tengarrinha.

Deputados independentes: António José Borges de Carvalho.
António Poppe Lopes Cardoso (UEDS).
Maria Amélia Mota Santos
(Verdes).

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de entrarmos na ordem do dia de hoje, queria agradecer a todos os grupos parlamentares, a todos os deputados e a este Plenário, que tanto prezo, a solidariedade que quiseram manifestar-me no transe difícil por que passei.
A todos, a minha sentida gratidão e um muito obrigado.
Na continuação do debate, na generalidade, das propostas de lei do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano, tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Guido Rodrigues.

O Sr. Guido Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: As grandes opções do Plano manifestam uma justa preocupação com a formação bruta de capital fixo (FBCF), isto é, com o investimento.
Na realidade, o que se verificou nos anos anteriores com o investimento foi extremamente preocupante: queda enorme em 1983-1984 e em 1985 um decréscimo; em volume, de 5 %. Os equipamentos do nosso aparelho produtivo estão velhos, as tecnologias ultrapassadas e a produtividade necessariamente reduzida.
Por outro lado, as carências em infra-estruturas são enormes, o que reproduz no âmbito do sector público administrativo o reduzido investimento realizado. É, portanto, lógica e merece todo o nosso apoio, a aposta das grandes opções do Plano no desenvolvimento e no investimento, como factor básico de desenvolvimento, enquadrado numa estratégia de progresso controlado que permita criar empregos, aumentar o nível de vida da população, enfim, criar riqueza sem promover desequilíbrios na balança de transacções correntes e trazendo a inflação para níveis aceitáveis (14%, em 1986).
Está subjacente às grandes opções do Plano e ao seu instrumento operacional, que é o Orçamento do Estado para 1986, um esforço significativo de investimento no sector público-administrativo e a aposta de igual resposta do sector privado, consciente da necessidade de modernização, disposto a aproveitar a conjuntura internacional favorável e confiante na actuação e na credibilidade de um governo que governa linearmente. As grandes opções do Plano prevêem uma evolução real do investimento no sector público administrativo de 20% em 1986, relativamente a 1985, no sector público empresarial de 2,8%, bem como o aumento real do investimento privado de 10%, como primeira reacção aos impulsos de crescimento da economia contidos nas propostas de lei em apreço.
Só em anos ulteriores, a partir de 1987, se verificará o efectivo e consequente crescimento do investimento privado que todos esperamos.
As taxas de crescimento indicadas, se por si próprias são significativas, ficam aquém do impacte que a menção dos valores absolutos da FBCF, em 1986 a preços correntes, representa: 142 milhões de contos no sector público administrativo, 164 milhões de contos no sector empresarial do Estado e uma expectativa de 643 milhões de contos como resposta do sector privado. Havemos realmente de convir que se trata de um enorme esforço de crescimento dentro dos constrangimentos macroeconómicos que caracterizam a nossa economia actual, nomeadamente o peso do serviço da dívida, as despesas com o pessoal e a necessidade de manter o défice orçamental em nível aceitável e financiável.
O Plano de Investimento da Administração Central atinge cerca de 134 milhões de contos, dos quais cerca de 121 milhões são financiados por receitas gerais do Estado, transferências para o Orçamento e créditos externos. Trata-se da criação de infra-estruturas de transportes e comunicações, de habitação e saneamento básico, de educação e saúde: as infra-estruturas fundamentais e indispensáveis a um país que se quer aproximar do nível de vida dos seus parceiros da CEE. De notar a figura dos Planos Integrados de Desenvolvimento Regional, com investimentos multidisciplinares, cujo êxito é fundamental para o desenvolvimento das zonas mais carenciadas do País.
O Plano de Investimentos do Sector Empresarial do Estado atinge cerca de 40 milhões de contos, destinados a dotações de capital para investimento e saneamento financeiro das empresas públicas. Nesta área, impõe-se a tomada de decisões que foram, no passado e por diversas razões, sistematicamente adiadas, e que não o poderão ser mais: conhecem-se numerosos diagnósticos e igual número de estudos de viabilidade técnico-económico-financeira das nossas empresas públicas.
O Estado tem obrigação de conhecer já, bem, os pontos fracos e fortes de cada uma das suas empresas públicas. Algumas são autênticos sorvedouros das receitas públicas. Outras, pelo contrário, operam com rentabilidade dentro de sãos princípios de gestão. Chegou o momento de separar as águas e tomar decisões. Estamos confiantes e espectantes de que assim o Governo fará. O investimento privado só indirectamente tem a ver com o Estado.
O Governo define os objectivos, fixa a estratégia de desenvolvimento económico e cria os instrumentos que julga adequados para fomentar o investimento privado, para criar a apetência do investidor privado. Todo este mecanismo de desenvolvimento é indicativo, nada tendo de imperativo. Os graus de liberdade são, portanto, numerosos. Alguns deles têm mais a ver com a confiança, sensibilidade, sentido de oportunidade e outras características subjectivas do que com estudos de mercado, análises financeiras previsionais e outras ferramentas do âmbito concreto da economia.
A actuação do Governo, de forma a produzir no sector privado as reacções de investimento que deseja e que irão concretizar os objectivos nacionais a curto e médio prazo, reveste assim duas actuações perfeitamente distintas: uma de fomento e mentalização, outra de colocação à disposição dos investidores de instrumentos concretos, ou seja, incentivos fiscais, financeiros ou outros.

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No que toca ao primeiro aspecto há uma convergência favorável de factores criadores de confiança:

O Governo, como a grande maioria do povo português reconhece, governa bem, afrontando os problemas e resolvendo-os, não os adiando;
O custo do dinheiro é sensivelmente menor e o acesso das empresas ao crédito mais fácil;
As perspectivas de competitividade dos produtos portugueses no mercado estrangeiro são, de uma forma geral, animadoras;
Existe uma comprovada desaceleração dó crescimento dos preços.
No que respeita à criação de incentivos ao investimento privado, o Governo põe b acento tónico nos incentivos fiscais, sublinhando a figura dó «crédito fiscal ao investimento», que permitirá às empresas a dedução na contribuição industrial de uma fracção do montante do investimento em capital fixo realizado, fracção essa que é estabelecida de acordo com a correspondência do investimento aos objectivos da política industrial do País.
O Governo privilegia, assim, os incentivos fiscais face às bonificações e aos variadíssimos incentivos financeiros até agora existentes.
Esta definição das regras de jogo é de aplaudir e permitirá necessariamente tornar mais transparentes os apoios do Estado ao sector privado.
No entanto, não é possível ignorar completamente o papel que desempenham os incentivos financeiros, até porque o País terá de aproveitar ao máximo os fundos comunitários e os apoios financeiros ao desenvolvimento industria] que podem integrar sem grande esforço programas financiáveis pela Comunidade.
Em nosso entender, há duas áreas fundamentais 'em que a utilização dos incentivos financeiros é desejável: e necessária: a base regional e a base inovadora.
Os incentivos de base regional visam a correcção das assimetrias regionais e a criação de desenvolvimento nos locais do País onde o tecido industrial é inexistente ou extremamente frágil: em termos gerais, no interior.
Mais do que fomentar o investimento nestas áreas visa-se criar embriões industriais que sejam catalisadores de futuros investimentos. Em locais de 'tradição agrícola, só a concessão de incentivos financeiros atrairá o investimento industrial. Os incentivos fiscais seriam diminutos, burocráticos e a destempo, não provocando a motivação desejável.
Há, aliás, experiência anterior de programas deste tipo que obtiveram grande êxito, tendo suscitado o aparecimento de numerosos projectos de investimento.
Os incentivos de base inovadora visam fomentar e apoiar projectos de investimento na área das novas tecnologias, novos produtos ou novos projectos. Este tipo de investimento, generalizadamente diferente do investimento tradicional em Portugal, contém em si um risco acrescido, mas o seu êxito é determinante do nosso futuro a médio prazo, não só na transformação da nossa estrutura industrial como na mudança das nossas exportações dos produtos tradicionais, para os produtos inovadores.
Neste caso, consideramos que, dado o elevado risco existente e a reacção natural à mudança; não será possível a sua concretização sem a concessão de incentivos financeiros adequados.
Queremos ainda salientar a importância para a criação de empresas de tecnologia inovadora das chamadas: «sociedades da capital de risco», a primeira das quais foi recentemente constituída no nosso pais, e das quais muito há a esperar.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O PSD considera que as metas estabelecidas nas grandes opções do Plano para a formação bruta de capital fixo são adequadas e realistas, traduzindo uma política de crescimento controlado que merece o nosso apoio.
Louvamos o Governo pelo esforço de investimento que dedica ao sector público administrativo.
Exortamo-lo a concretizar imediatas tomadas de decisão no sector público empresarial, sem o que será impossível dar seguimento real a novos investimentos.
Esperamos que o Governo ponha em vigor rapidamente o sistema coerente e global de incentivos ao investimento privado e que inclua também, em casos perfeitamente definidos, incentivos financeiros.
O êxito da política económica do Governo conduzirá, num futuro que desejamos muito próximo, à reanimação dó investimento, à modernização do tecido industrial, ao desenvolvimento, ao emprego, à criação da riqueza.
Daremos todo o apoio ao Governo do Prof. Cavaco Silva, para quê possa prosseguir na concretização dos objectivos nacionais que se propôs.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Gama.

O. Sr. José Gama .(CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Passar a discussão do Orçamento sem trazer aqui a voz da emigração seria, de alguma forma, dar razão aqueles para quem os emigrantes são tema de referência obrigatória nos discursos de Ano Novo, nas horas de ponta das férias e do Natal ou, mais frequentemente, quando se olha o fiel da balança de pagamentos.
Sob pena de haver uma quebra de continuidade na nossa coerência e 'menos seriedade na campanha eleitoral que promovemos junto dos emigrantes, não podemos deixar dê olhar, a verba atribuída à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas sem amargura e inconformismo.
Dê-se o jeito que se quiser dar às palavras, a verdade é que a emigração continua a ser o parente pobre do Orçamento. Hoje, como ontem, a voz unânime de todos os deputados da subcomissão da emigração ao pedirem um reforço de 90 000 contos foram vozes que clamaram do deserto.
Os ventos do Terreiro do Paço não correm de feição para a emigração:
Houve, um corte substancial de cerca de 200 000 contos, em números reais; em relação ao Orçamento anterior. Não vamos esperar, por isso, que os emigrantes batam palmas confiados a este facto. E ninguém nesta Sala, Sr. Presidente e Srs. Deputados, pode esperar o meu silêncio, sob pena de ser confundido com cumplicidade:
Esta discussão acaba por ter. lugar quando se desconhece o destino do sistema da poupança-crédito suspenso há poucos dias Milhares de emigrantes com as vidas programas são vítimas desta medida radical. Não queremos com isto significar que não louvemos a atitude do Governo quando decidiu declarar a guerra aos

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abusos, só que em vez de se criar uma alternativa que distinguisse o justo do infractor, meteu-se tudo no mesmo saco, dando-se o mesmo tratamento ao vício e à virtude. E prevaleço-me desta oportunidade para questionar o Sr. Ministro sobre o seguinte: diz-se que há abusos na concessão do crédito comercial, pelo que pergunto ao Sr. Ministro se este facto leva, pura e simplesmente, à suspensão de todo o crédito comercial.
Sabe-se também que há excessos de velocidade nas estradas de Portugal. Sr. Ministro, este facto leva a que se paralise todo o trânsito em Portugal?
Julgo, portanto, que esta medida foi radical e deveria ter sido criada uma outra em alternativa.
Como pode este Orçamento acudir às promessas eleitorais feitas generosamente aos emigrantes em plena campanha eleitoral?
Recorde-se, a título de exemplo, a apologia feita à «difusão da língua e da cultura portuguesas», vedeta nos palcos dos comícios e que continua sem sair dos vestiários quando as verbas orçamentais se distribuem. O Conselho das Comunidades continua a ser bandeira ciosamente exibida pelos autores da sua criação. As verbas que lhe estão destinadas, ao limitarem fortemente a sua acção, condenam-no cada vez mais a ser apenas um mero símbolo, um emblema.
Como pode um delegado do Cabo ou de Paris, de Toronto ou Nova Iorque, do Norte do Brasil ou da Austrália ser o porta-voz de portugueses, dispersos por milhares de quilómetros, e a quem não são facultados os meios mínimos para o fazer?
Sem uma democraticidade rigorosa na eleição dos seus delegados, e sem meios para estes se movimentarem, o Conselho das Comunidades corre o risco de ser divisionista das comunidades e ineficaz nos seus objectivos. Os cerca de 20 000 contos que custou a sua última realização em Porto-Santo correspondem a uma verba superior àquela que a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas prevê para a aquisição de livros - oxalá, que tenham a ver com as raízes da nossa cultura -, que tanta falta fazem nas milhares de associações e às centenas de centros paroquiais espalhados por este mundo fora. O recenseamento dos emigrantes ou é obra de voluntários ou está condenado a consumir-se em fogo lento, dando uma imagem irreal do interesse dos emigrantes em participarem na vida política nacional.
Sem meios para o dinamizarem, os consulados, pesem as boas vontades, assistem de braços cruzados ao desinteresse, crescentemente manifestado, pois não têm nem meios nem pessoal para lhe acudirem. Magro no seu montante, e discutivelmente distribuído, o orçamento da Emigração desmistifica os discursos laudatórios com que se incensam aqueles que se não reclamam favores não consentem esquecimentos.
E este orçamento da Secretaria de Estado das Comunidades é estrada para o esquecimento.
Daí os nossos reparos.

Aplausos do CDS e de alguns deputados do PS e do PRD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território.

O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Conhecem VV. Exas. os textos que hoje estão em debate, de modo que não vou repetir o que neles se contém, nem retomar a análise da lógica da sua construção.
Não vou também referir de novo os princípios orientadores da nossa acção porque eles constam do Programa do Governo e foram comentados, em devido tempo, por mim próprio, no que respeita aos sectores que me estão atribuídos, e discutidos com os Srs. Deputados.
Limitar-me-ei, assim, a focar com maior atenção alguns dos pontos que, durante as discussões no seio das diversas comissões parlamentares, mereceram reparo por parte de VV. Exas.
Antes, porém, permitir-me-ão que sublinhe alguns aspectos do modo como decorreu a preparação dos dois documentos que formam o conjunto hoje em discussão. Não pode o Governo deixar de ficar sensível aos comentários positivos recebidos do Conselho Nacional do Plano em relação ao conteúdo e à forma das grandes opções do Plano.
Fizemos o que pudemos, no tempo escasso de que dispúnhamos; a verdade é que nenhum dos intervenientes regateou tempo e esforços para que tudo ficasse pronto oportunamente e que se verificasse um aumento substancial da qualidade do documento apresentado.
Como fui seguramente dos que menos tempo e energias devotou à preparação do documento, estou à vontade para afirmar à Assembleia que, ao contrário do que muitas vezes se diz, existem na administração pública bolsas de funcionários muito competentes e dedicados que merecem o respeito e a consideração de todos nós.
A eles quero neste lugar prestar a minha homenagem.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O parecer genericamente positivo do Conselho Nacional do Plano, mais do que um conforto, constitui para nós um incentivo. O processo de planeamento, no quadro do actual sistema, está em vias de experimentar acréscimos substanciais de operacionalidade e de eficiência, esperando-se naturalmente que isso se reflicta na eficácia do trabalho desenvolvido.
É esta que os Portugueses avaliarão.
Devo dizer, por outro lado, que o trabalho nas comissões parlamentares, com os Srs. Secretários de Estado e comigo próprio, foi estimulante e útil.
Cumpre-nos agradecer aos Srs. Deputados que nele participaram, a frontalidade dos comentários, a vivacidade da discussão e o reconhecimento patenteado em numerosas notas inseridas nos relatórios das comissões, da cooperação pronta, por parte do Governo, no fornecimento dos necessários elementos de informação e no esclarecimento dos pontos que reclamaram justificações complementares. Foi particularmente gratificante para nós ter-se verificado e registado que, no que respeita ao gasto de dinheiros públicos, está o Governo a desenvolver uma acção tenaz no sentido da transparência de processos e da racionalização das escolhas.
Não fazemos com isso senão a nossa obrigação; mas é reconfortante e estimulante verificar que esse esforço é reconhecido como positivo por VV. Exas. porque nos compensa de alguns custos políticos que o rigor nos impõe.
Os comentários que se seguem estão arrumados em quatro capítulos correspondentes às Secretarias de Estado que tenho a honra de coordenar.

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Planeamento e Desenvolvimento Regional

A estratégia de progresso controlado adoptada pelo Governo na preparação das grandes opções do Plano tem tradução na vertente que se refere ao significativo aumento do investimento da responsabilidade directa do Estado, relativamente a 1985 e mesmo relativamente à tendência que se vinha verificando nos últimos anos.
Com efeito, entre 1981 e 1985 a taxa de evolução real média anual foi de -5,8%, atingindo em 1984 o valor de 23,2%.
Portanto, a primeira nota que gostaria de sublinhar tem a ver com a base extremamente baixa de que se partiu. Foi-se até onde era possível na canalização de meios financeiros para a componente de investimento. E assim, apresenta-se um PIDDAC com uma taxa de crescimento real, relativamente a 1985, de 39,7%.
O crescimento para cada um dos sectores não apresenta as mesmas taxas de variação, o que quer dizer que há claramente nesta proposta uma hierarquização de prioridades: Assim, é o sector da Agricultura e Pescas o que representa a variação mais significativa (54,7 %, em termos reais).
Seguem-se os sectores da Educação com 41,1%; Obras Públicas, Transportes e Comunicações com 37,3% e o Plano com 36,8%.
No caso da Agricultura e Pescas o aumento referido justifica-se pelo enorme esforço que há afazer na adaptação estrutural do sector, exigência que se impõe especialmente num tempo em que Portugal pode beneficiar de vantagens transitórias no quadro da CEE. São vários os regulamentos a aplicar em Portugal decorrentes do processo de integração, alguns deles tendo como pressupostos o envolvimento activo de agentes privados. Por isso, o carácter de estimativa dos valores que correspondem ao esforço financeiro do Estado Português deve ser realçado.
Todavia, quero aqui deixar expressa uma palavra de garantia: não poderá acontecer que um só projecto proposto para co-financiamento à CEE não avance por razões que se prendam exclusivamente com a ausência da comparticipação do Estado Português.
Poderá sê-lo por outras razões, mas seria muito inconveniente que fosse por esta. O sector da Educação foi dos mais penalizados nos anos transactos. A inversão da tendência que se vinha verificando tem a ver com os recursos destinados à construção de estabelecimentos do ensino secundário e à realização de obras inadiáveis em estabelecimentos do ensino superior, cujas condições de trabalho atingem hoje situações de ruptura conhecidas de todos. Por isso, se orientou para esses edifícios uma parte importante do nosso esforço financeiro.

Uma voz do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A acessibilidade, juntamente com os recursos hídricos, são dois domínios que foram considerados prioritários na preparação das grandes opções do Plano para 1986.
Daí que a repercussão dessa opção se faça sentir nos ministérios respectivos.
Sublinha-se o impacte destes dois sectores, não só no crescimento mas também no desenvolvimento do País. Eles potenciam tanto a criação de riqueza como a sua distribuição.
Como pilar fundamental no processo do desenvolvimento, que queremos encetar, encontra-se a investigação cientifica. Se bem que não podem ser só os indicadores de natureza quantitativa os únicos que podem garantir se o caminho a percorrer é ou não correcto, o significativo aumento das verbas para este domínio da Administração terá de ser enquadrado num conjunto de reformas, algumas das quais já concretizadas, outras em avançado estado de preparação.
Foi dedicada uma atenção muito especial aos programas integrados de desenvolvimento regional. Tive ocasião, aquando da apresentação do Programa do Governo, de referir que iríamos aproveitar todas as oportunidades possíveis de fazer sínteses das actuações da Administração Pública.
Por outras palavras, é firme propósito do Governo aproveitar todas as vantagens que podem advir do recurso a métodos e modelos que permitam esforços convergentes em torno de objectivos bem definidos. Ao fim e ao cabo, um programa integrado de desenvolvimento regional é disso que cura: áreas territoriais com problemas complicados, cuja resolução não passa pela actuação mais diligente de um ou outro sector da Administração, mas antes por uma acção convergente e negociada de vários sectores e também de vários níveis da administração: A forma como o nosso sistema de administração pública está montado não facilita este tipo de abordagem, mas a forma como foram preparados os PIDR que constam das grandes opções do Plano para 1986 permitem-nos ter boas razões para continuar, de forma persistente, neste caminho.
Cada um dos programas integrados de desenvolvimento regional a prosseguir terá de conter ingredientes cada vez mais complexos. Um PIDR não é seguramente e apenas um somatório de infra-estruturas. Elas são necessárias, mas à luz de objectivos bem mais ambiciosos e que têm a ver com a animação da actividade económica e a criação do emprego.
Hoje, a concretização de uma política regional não se justifica apenas porque urge corrigir as assimetrias regionais. A razão é mais profunda e mais urgente: do que se trata é do robustecimento do tecido produtivo, do aproveitamento inteligente dos recursos que possuímos, da dinamização das muitas energias adormecidas da periferia. Por outras palavras, temos de aproveitar o crescimento e o desenvolvimento de cada uma das partes para que o desenvolvimento do todo seja uma realidade.
Gostaria de deixar uma palavra em relação à metodologia seguida na preparação dos aspectos quantitativos do PIDDAC/86.
Procurou-se atingir um nível que consideramos satisfatório de compatibilização entre sectores. Todavia, muito há a fazer no que respeita à preparação de idêntica tarefa para o futuro. Refiro-me, especialmente, à necessidade de um maior cruzamento de informação entre sectores e, entre estes e as regiões, fundamentalmente, à urgente concretização de métodos que permitam uma avaliação contínua dos investimentos que se vão realizando.
Com efeito, mostra a experiência que não basta a análise exclusivamente financeira que revele a maior ou menor capacidade de execução dos serviços. É preciso ir mais longe e curar de avaliar o verdadeiro impacte, em termos de desenvolvimento, das acções que se vão realizando. Tem sido recentemente referida, de forma que considero menos correcta, a questão referente às verbas provenientes do FEDER e destinadas às câmaras
municipais.

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Durante a vigência do anterior governo, o Estado Português apresentou às competentes instâncias comunitárias um conjunto de projectos susceptíveis de virem a ser financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, em montante correspondente a um compromisso global comunitário de 70,2 milhões de contos.
Na altura da apresentação do referido conjunto de projectos não foi solicitada qualquer tipo de orientação no sentido de a apreciação dos projectos vir a ser feita pelas instâncias comunitárias de acordo com uma hierarquização de prioridades que correspondesse a qualquer tipo de equilíbrio entre os vários potenciais utilizadores do Fundo.
Entretanto, a Comunidade fixou para Portugal, para o ano de 1986, uma quota variável entre 10,65% e 14,2% do montante global do FEDER, a que correspondem 46,2 e 61,5 milhões de contos de compromisso. Numa hipótese realista - que seria Portugal atingir 12% - concretizar-se-ia um crédito de compromissos no valor de 52,05 milhões de contos, o que poderá corresponder, em termos globais, a um saque que em 1986 rondará os 36 milhões de contos. Em 26 de Novembro de 1985 (e lembro que este Governo apresentou aqui o seu programa em 15 de Novembro e o viu aprovado em 20 de Novembro), a Comunidade apreciou e aprovou os projectos de montante superior a 5 milhões de ECUS, propostos pelo Estado Português.
Daqui decorre que, com aquela aprovação, comprometeram-se, da quota a que Portugal tem acesso, 34 milhões de contos, dos quais 25,8 milhões de contos serão transferidos em 1986. Neste momento está em fase de apreciação todo um vasto conjunto de projectos respeitantes, designadamente, às regiões autónomas e às autarquias locais, os quais, a serem aprovados, esgotarão a quota para 1986. Caberá referir que num processo desta natureza a decisão final não pertence ao Estado Português, mas sim às instâncias comunitárias competentes, pelo que o valor que se pode estimar para saque em 1986 estará sempre dependente de decisão autónoma da CEE. Quando muito, e isso tem sido assegurado, é o interesse e o acompanhamento permanente com que o Estado Português, através do Governo, vem seguindo todo o processo de apreciação dos projectos por parte da Comunidade.
Dada a excelente qualidade e, rigor com que os projectos foram apresentados não se espera sobressaltos de maior. Todavia, uma coisa é certa: pelas contas feitas poder-se-á estimar, mas nunca garantir, o valor para as autarquias locais do continente oriundo do FEDER em 1986 de cerca de 7 milhões de contos, num total de compromissos de 9,2 milhões de contos. Está em fase de apreciação, quer pelos governos regionais quer pela Associação Nacional de Municípios Portugueses, um regulamento interno de apresentação de candidaturas ao FEDER, que definirá, de forma clara, as regras e os procedimentos a adoptar pelas diferentes entidades relativamente aos projectos a serem submetidos a candidatura ao FEDER.
Nesse mesmo regulamento definem-se intervalos quantificados das percentagens que devem caber a cada um dos potenciais utilizadores. Assim se evitará que grande parte das decisões venham a ser tomadas em Bruxelas ou, dito doutro modo, com este regulamento assegurar-se-á que tudo o que for possível ser decidido pelo Estado Português sê-lo-á. Nesse sentido, não voltará a acontecer o envio de nova remessa de projectos sem indicação de qualquer tipo de hierarquização.

Administração Local

O reforço do poder local constitui um objectivo indiscutível do Programa do Governo, oportunamente presente a esta Assembleia. Daí que não possa constituir surpresa que tal orientação enforme a proposta que hoje aqui debatemos. O reforço do poder local não se esgota nas transferências orçamentais; antes se revela em toda a sua plenitude na participação efectiva das autarquias no esforço de desenvolvimento, a que se assiste em todo o País.
O reforço do poder local significa também um diálogo profundo e responsável com os municípios e a sua associação representativa, tal como vem acontecendo desde a posse do Governo. Devo esclarecer a Assembleia que, na preparação deste Orçamento e destas grandes opções do Plano, o Governo ocupou 14 horas em consultas com membros do conselho directivo da Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
Encontra-se no primeiro caso a apresentação à Assembleia da República da proposta de Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano, com incidência, nesta circunstância, na esfera autárquica.
Temos, no segundo caso, os aspectos regulamentares, o apoio às autarquias a vários níveis, a transmissão da informação, o desenvolvimento de acções de formação, bem como a melhoria do ambiente autárquico e a dinamização da cooperação interna ou no seio de organismos internacionais, como é o Conselho da Europa.
Fixemo-nos, por enquanto, nas questões financeiras, porventura, as mais sensíveis no estádio de desenvolvimento local em que nos situamos. Das transferências do Orçamento do Estado para as autarquias locais avulta o Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF), não só pela sua expressão em valor mas pela importância dos objectivos de distribuição que persegue.
Desde 1981 que, não obstante os acréscimos nominais, se têm verificado sucessivos decréscimos reais do Fundo de Equilíbrio Financeiro, à excepção do ano de 1985. Em 1984 verificou-se mesmo um severo decréscimo real das transferências (- 18%).
Na presente proposta prevê o Governo, para o ano de 1986, um aumento real de 1%, tendo em conta a taxa esperada de inflação de 14%. Se, conforme tudo indica, a taxa de inflação vier a registar um nível mais baixo do que 13,8% pode-se afirmar que estaremos perante o maior aumento real de sempre do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
As transferências para as assembleias distritais têm tendência para baixar, muito embora se tivesse considerado verba idêntica à de 1985, de forma a contemplar todas as eventualidades. De facto, o Decreto-Lei n.º 288/85, de 23 de Julho, em processo de ratificação nesta Assembleia, vem possibilitar a absorção do pessoal excedente nestes organismos e a transferência da prestação de alguns serviços para as entidades competentes para o efeito.

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Utilizando as economias realizadas nesta rubrica, propõe-se o Ministério do Plano e da Administração do Território promover o reforço da verba destinada à construção de sedes de juntas de freguesia.
Os reparos desta Assembleia, manifestados nomeadamente pela Comissão da Administração Interna e Poder Local, que este procedimento parcialmente minimizará, serão sobretudo atendidos pelo propósito do Governo de lançar um plano para um horizonte temporal correspondente ao mandato dos actuais eleitos locais, em que se procurará, resolver a generalidade das situações de carências de sedes de juntas de freguesia. Nesta solução, não interessam apenas os quantitativos financeiros propostos pelo Orçamento do Estado, mas, sobretudo, o modo como o problema passa a ser equacionado e resolvido, garantindo à partida que serão os eleitos locais interessados que em sede própria, (em assembleia municipal), hão-de contribuir directamente para a elaboração desse plano, que não comportará, assim, procedimentos arbitrários.
Considera o Governo, que, qualquer que seja a verba a inscrever no Orçamento de Estado destinada ao apoio financeiro às autarquias afectadas por quaisquer das circunstâncias previstas na actual Lei das Finanças Locais, em especial as chamadas calamidades, ela será sempre difícil de prever. Caso ocorram em termos localizados ou na generalidade do território as circunstâncias aduzidas, recorrer-se-á à abertura de linhas de crédito especiais ou à utilização da «dotação provisional». No que se refere à renovação urbana inscreve-se a verba de 180 mil contos do PIDDAC através da DGERU e de 125 mil contos através da DGPU. É nossa intenção proceder, neste particular, a uma maior articulação dos programas da administração central, entre si, e com os municípios.
No que respeita a transferências, resta referir o financiamento das comissões instaladoras defuntas de freguesia que, eventualmente, venham a ser criadas. Trata--se de uma verba indeterminada, dependente das resoluções da Assembleia da República, preferindo-se deixar a sua inscrição para decisão orçamental posterior, em sede e momento próprio, caso ocorram factos que a justifiquem: Não posso, no entanto, deixar de referir que a divisão administrativa levada ao extremo só pode gerar uma diminuição do poder local, que todos nós estamos empenhados em sedimentar e desenvolver, considerando ainda que o, município é, e foi historicamente em Portugal, a colectividade de base territorial mais proeminente e que melhor corresponde aos desígnios de autonomia e do sentir das populações.
No âmbito do PIDDAC contam ainda as autarquias com uma verba de 300 000 contos, que permitirá executar e terminar os empreendimentos: intermunicipais em curso.
Se não fomos mais além na proposta de meios financeiros para novos empreendimentos é porque se quer apreender o modo de aplicação dos fundos comunitários, pretendendo-se assim minimizar eventuais perturbações no sector das infra-estruturas e avaliar até que medida o FEF, a cooperação com os municípios e as dotações FEDER podem ser compatibilizadas e as intervenções deste fundo complementadas e apoiadas pelo Estado.
Perante a experiência que se for colhendo será preparada uma proposta de revisão da actual Lei das Finanças Locais, que se pretende estabilizar não só no regime geral mas também pela adopção de critérios de natureza estrutural que utilizem indicadores com carácter de perenidade, sem prejuízo do recurso a algumas inovações, nomeadamente pela consideração de especificidades regionais e não apenas de índole local.
De salientar, porém, que os recursos FEDER, cuja transferência da Comissão das Comunidades para as autarquias se aguarda, atingem cerca do triplo da dotação para empreendimentos intermunicipais de 1985.
Em termos realistas, e com dispêndios efectivos, em 1986, as autarquias poderão vir a dispor de um. montante FEDER de cerca de 7 milhões de contos, correspondente a um total de «compromisso» de 9,2 milhões de contos.
Na via de financiamento, através do PIDDAC, devem relevar-se os programas inscritos através da Direcção-Geral do Equipamento Regional e Urbano, que embora comparticipando empreendimentos lançados por instituições particulares, contribuem para a construção de equipamentos da maior importância na esfera local, complementando assim potenciais realizações municipais. Também neste sector o Governo está a inovar, definindo critérios objectivos de financiamento e regras de acesso às comparticipações e clarificando intervenções do Estado, bem como das necessárias contrapartidas, numa rigorosa gestão dos dinheiros públicos. A este propósito estão já publicados despachos orientadores, sem prejuízo de se dar resposta a obras que se encontram em curso ou a compromissos escritos assumidos no passado.
A este respeito, o Governo constata com satisfação que as comissões parlamentares registam o esforço realizado, no sentido da transparência e objectividade.
Na intersecção da esfera autárquica confluem ainda os Planos Integrados de Desenvolvimento Regional, que incluem acções integradas em termos de projectos multissectoriais envolvendo várias entidades, nas quais avultam os municípios. Também aqui existem situações de apoio no que diz respeito a componentes como as infra-estruturas económicas e certos equipamentos sociais.
Merece aliás a pena referir que a cooperação entre os municípios e a administração central não é, muitas vezes, quantificável financeiramente de um modo aparente. Refiro-me, por exemplo, aos serviços prestados pelo Centro de Estudos e Formação Autárquica no domínio da formação, aos protocolos realizados com outras entidades, cujo resultado aproveita aos municípios, ao trabalho desenvolvido pelas Comissões de Coordenação Regional e o apoio técnico prestado com carácter de continuidade.

s receitas municipais não se esgotam nas transferências do Orçamento do Estado e do Orçamento Comunitário. Como princípio da autonomia financeira é imprescindível aumentar as receitas próprias, funcionando as transferências do Estado como equilibradoras de situações díspares.
Considerando as disposições tomadas por esta Assembleia aquando da aprovação do Orçamento Suplementar para 1985, quanto à afectação de receitas do IVA às câmaras municipais, na área do turismo e a evolução previsível dos impostos «locais», estima-se que estes atinjam um acréscimo muito significativo em 1986.
O Governo propõe também à Assembleia da República um aumento significativo do imposto sobre veículos que, sendo uma receita municipal, não era actualizado desde 1980.

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Dispõe-se o Ministério do Plano e da Administração do Território, em cooperação com o Ministério das Finanças, a desenvolver acções de luta contra a fraude e a evasão fiscais, assegurando o mesmo zelo na cobrança de receitas municipais e estatais. Sem perder de vista que será sempre necessário um fundo de perequação na distribuição de recursos financeiros pelos municípios, pensa o Governo que a autonomia do poder local será tanto maior quanto maiores forem as suas receitas fiscais e correlativamente menores as transferências orçamentais. Aproveito para referir que o Governo estuda a transferência de 2% do produto da cobrança da taxa devida pela primeira venda do pescado, nunca concretizada até ao momento. Não tendo ainda o Governo tido a oportunidade de propor à Assembleia da República a revisão da actual Lei das Finanças Locais, houve que obedecer escrupulosamente às suas disposições, aceitando os critérios de repartição do FEF, mas procurando a actualização e a melhoria de indicadores que mais críticas vinham suscitando, como era o caso do turismo, da orografia e da emigração.
Procurando não introduzir elevadas flutuações que quebrassem a continuidade de actuação dos municípios e, no estrito cumprimento do quadro legal, não foi possível ir mais longe. Teria sido desejável que, na altura em que tomou posse, já estivessem estruturados os indicadores que intervêm na determinação da distribuição financeira do FEF para 1986, a tempo de serem utilizados na proposta de Orçamento, como prevê a Resolução de Conselho de Ministros reguladora do seu calendário de preparação. Não tendo sido assim, houve apenas oportunidade de melhorar alguma informação e utilizar indicadores mais conformes com o previsto na lei. No que se refere ao indicador da orografia, eliminaram-se algumas discrepâncias mais gritantes e ponderou-se mais a área de montanha. Evidentemente que o governo está consciente, que o que deveria estar em causa seria mais o grau da «rugosidade» e a natureza geológica do solo, e menos a consideração da actividade produtiva dominante ou os factores que interessam à aplicação das Políticas Comunitárias.
Mas estes eram os elementos disponíveis. Há, pois, que executar sem demora um trabalho técnico que, em próximo Orçamento, possa corresponder aos anseios de todos nós. Uma consideração fica porém exposta: é a de que o legislador deverá cuidar de estatuir figurinos legais compatíveis com as nossas actuais possibilidades estatísticas, pouco valendo a generosidade dos princípios que enformam as leis enquanto se mantiver a parcimónia da produção de alguns dados estatísticos e de trabalhos de campo. Este governo proporá modificações profundas nesta lei, mas por enquanto e, neste caso, apenas pôde alterar politicamente a ponderação da área de «montanha» relativamente à área total, de uma proporção de 2 para 1 para a uma relação de 5 para 1.
E, de facto, a lógica assim obrigava pois, caso contrário, seria ponderar novamente o critério da «área», que já aparecia por direito próprio, tornando desprezível a consideração do critério da orografia. Se tivéssemos entendido que os dados actuais eram inaplicáveis à situação concreta das autarquias locais, cairíamos no não cumprimento da lei, sem a possibilidade de modificar em tempo útil o indicador utilizado.
Mas caso tivéssemos aplicado os valores de 1985, ficariam por corrigir injustiças ainda de maior gravidade e para as quais rapidamente e de muitos quadrantes viriam chamadas de atenção. O critério do turismo, pese o seu fraco significado no contexto geral da lei, não poderia continuar a basear-se no número de hóspedes, tendo-se preferido o número de dormidas, sob pena de penalizarmos os municípios com grandes fluxos de turismo, solicitados a uma prestação intensa de serviços, relativamente àqueles cujas estruturas são utilizadas de passagem.
No que se refere à emigração, procedeu-se nesta proposta ao alargamento do número de anos em consideração, abrangendo toda a informação disponível, ao nível concelhio. Não tem o Governo a intenção de transferir, este ano, novas competências para os municípios, pois entende que tal operação tem de rodear-se dos indispensáveis cuidados em matéria financeira, de molde a obter soluções de consenso técnico e político. Porque as questões nesta matéria não estavam suficientemente clarificadas, entendeu o Governo apreciar com toda a minúcia o decreto-lei de Setembro de 1985 que procedia à desclassificação de 12 000 Km de estradas nacionais. Embora pensando que as autarquias podem, com vantagem, assumir a gestão de parte substancial da rede viária, considera o Governo fundamental que esta transferência tenha de ser acompanhada por um estudo muito profundo da complexidade das situações bem como de um diálogo franco com as autarquias, já iniciado por este governo.
Quanto à questão polémica dos transportes escolares, optou o Governo por incluir a respectiva verba no cômputo geral do Fundo de Equilíbrio Financeiro, (FEF).
Tem-se verificado um consenso generalizado em relação à inadequação dos valores utilizados nos dois últimos anos e não havendo disponibilidade de um indicador que, com transparência e objectividade, reflicta a realidade, preferiu-se juntar esta competência às restantes, deixando aos critérios gerais de distribuição a responsabilidade de afectação de recursos. Em suma, considera o Governo que, face ao enquadramento geral do Orçamento de Estado, as verbas destinadas às autarquias, embora não permitam recuperar os fortes decréscimos registados no passado, asseguram um acréscimo real de recursos e contribuem para a dignificação do poder local.
O Governo fará tudo quanto estiver ao seu alcance para, além das transferências de ordem financeira, contribuir para tal dignificação. E sabe que as autarquias estão também disponíveis para responder ao desafio do desenvolvimento, visto que este é o objectivo que nos une a todos.

Ambiente e recursos naturais

O desenvolvimento económico do País e a intensa e pouco ordenada exploração dos recursos naturais têm vindo a ser acompanhados por repercussões nefastas na natureza e nas suas condições ambientais. A ausência total de sistemas de gestão de recursos naturais, nas suas componentes de inventariação de necessidades e de disponibilidade de recursos e a sua articulação com os mecanismos financeiros indutores de internalização dos custos da sua exploração, conju-

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gados com a carência de estruturas regionalizadas abertas à participação dos utentes e das autarquias locais, são as principais condicionantes que se põem actualmente à utilização eficiente dos recursos naturais. O anquilosamento do quadro legal e normativo, no que respeita estritamente ao ambiente e defesa do consumidor, coloca os cidadãos à mercê de toda a qualquer acção especulativa, abusiva ou, degragadora do ambiente como consequência desta realidade verifica-se uma sucessão de situações de ruptura, nomeadamente nos domínios do saneamento básico, abastecimento de água, destruição do solo agrícola, poluição pontual por substâncias tóxicas perigosas, iminência permanente de cheias e fogos florestais.
Estas situações, até pelo seu carácter de manifesta urgência, têm absorvido as energias e recursos que deveriam ser canalizados para a resolução efectiva dos problemas de fundo.
A actuação da máquina do Estado, com intervenção pontual no território, e sem qualquer lógica de integração sectorial ou regional, em termos de desenvolvimento, para além de não potenciar o melhor aproveitamento dos recursos, contribui, muitas: vezes, para o agravamento dos desequilíbrios espaciais e para a deterioração da qualidade ambiental.
A concentração, pela primeira vez, na Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais dos departamentos da Administração Pública responsáveis pela gestão dos recursos hídricos, da política de saneamento básico, da qualidade do ambiente, da conservação da natureza e da defesa do consumidor, permite, a definição de políticas concertadas, o acompanhamento permanente da eficácia dos seus instrumentos e a progressiva
introdução das reformas institucionais necessárias.

Objectivos e principais orientações da política sectorial

Os objectivos gerais da política de defesa e protecção do ambiente e de conservação dos recursos naturais são comummente conhecidos e aceites, tendo consagração no próprio normativo constitucional. Tal como consta da proposta de lei de bases do ambiente já apresentada à Assembleia da República, visam a salvaguarda do homem e das outras formas de vida e seus habitates, designadamente, compreendem:
A gestão racional dos recursos naturais;
A preservação da qualidade dos componentes do ambiente;
A defesa dos valores naturais e culturais relevantes;
A promoção da participação das populações na formulação e execução da política de ambiente.
É também claro que a concretização destes objectivos passa pela compatibilização do desenvolvimento económico e social, com a salvaguarda dos recursos naturais e património cultural.
O ordenamento do território será o elemento estruturante da execução de uma política do ambiente de carácter antecipativo, enquanto que a prossecução de estratégias nacionais de conservação da natureza e de gestão dos recursos naturais mais sensíveis representam os instrumentos sectoriais a utilizar prioritariamente.
A aprovação da lei de bases do ambiente permitirá dispôs de um elemento essencial à existência de um normativo integrado e coerente.
Entretanto, serão publicados os diplomas de todo um conjunto de instrumentos que visam a, intervenção correctiva ou preventiva junto da fonte poluidora,- o exercício, na actividade licenciadora, de uma avaliação prévia ambiental e a adopção de medidas imediatas de protecção de recursos naturais potencialmente afectados.
No quadro institucional, promover-se-á a regionalização da gestão dos parques naturais e dos departamentos de vigilância e controle da qualidade do ambiente; Prevê-se, igualmente a criação dos órgãos gestores das bacias hidrográficas, a instalação da rede automática de informação sobre o ambiente e a articulação com as, autarquias locais para a constituição de gabinetes de ambiente.

Ciência e tecnologia

O Programa do Governo considera o desenvolvimento da ciência e tecnologia portuguesas como uma das suas prioridades.
Documentos relativamente recentes, entre os quais assume especial significado o resultado do exame à política científica, nacional realizado pela OCDE, podem dar quem os lê uma ideia relativamente realista do sistema científico-tecnológico nacional e permitir comparações internacionais que, em regra nos são desfavoráveis.
Isto não significa que as deficiências de ordem institucional e a exiguidade dos meios humanos e materiais disponíveis tenham sido aceites como fatalidades por uma comunidade científica e tecnológica, a cuja persistência se devem já conquistas importantes que tornarão possível um rápido progresso.
A adesão à Comunidade Europeia, com as oportunidades que esta nos oferece, não só como mercado económico mas como espaço de competição científica e tecnológica, constitui simultaneamente um desafio que torna tal progresso condição de sobrevivência. Dado que o Governo tomou posse em data tardia no ano de 1985, não foi possível à Secretaria de Estado da Investigação Científica participar já este ano na definição das dotações globais dos organismos executores de investigação e desenvolvimento, tanto ao nível do orçamento de funcionamento como do PIDDAC. No entanto, foi possível ao Secretário de Estado receber os presidentes ou directores dos mais importantes desses organismos para apresentação dos respectivos programas.
Desses e de outros, contactos resultou a elaboração, pela primeira vez, de um quadro-síntese de onde constam as dotações propostas pelo Governo para os diferentes organismos pelos respectivos ministros de tutela.
Esse quadro permite ter uma visão global de uma parcela importante do sistema, através do seu financiamento público. Numa segunda fase, e após a aprovação do Orçamento do Estado pela Assembleia da República, o Secretário de Estado da Investigação Científica apreciará, no exercício das suas funções de coordenação, todos os programas e projectos inscritos no PIDDAC, permitindo que, através do seu visto nesses programas, o Governo exerça uma acção efectiva e coerente com as prioridades de uma política científica e tecnológica nacional.
Para a definição dessa política contará com o apoio do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia, órgão para cuja criação foi já aprovado pelo Conselho de Ministros o decreto-lei respectivo.

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A terminar os meus comentários em relação a este capítulo, quero sublinhar o apoio dado pela generalidade dos senhores deputados que, na respectiva Comissão Parlamentar, se pronunciaram a respeito das verbas destinadas à ciência e tecnologia e que saudaram o substancial aumento que elas experimentarem na proposta apresentada.
O Governo aposta na «inteligência» portuguesa e quer preparar o futuro investindo nela o mais que puder.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É óbvio que nunca nenhum ministro se considera satisfeito pelas verbas que vê atribuídas ao seu departamento. Por um lado as necessidades são muitas e, por outro, existe felizmente uma grande vontade de realizar obra e de corresponder aos anseios de progresso dos Portugueses. E, também felizmente, e ao contrário do que muitas vezes se propala por aí, existem projectos escorreitos, preparados e avaliados com cuidado e rigor técnico. Mas um orçamento e um plano têm de apresentar coerência interna. Se puxarmos para cima uma das componentes, isso fará arrastar multas outras, algumas delas com limitações de manobra muito severas.
Não vou retomar aqui a argumentação do Ministro das Finanças, para justificar em pormenor as inter-relações das variáveis macroeconómicas. Retenho só que nós não podemos fazer o que queremos mas temos de querer o que podemos. E, dentro disto, quero reafirmar à Câmara que não estão a ser poupados esforços para melhorar os processos de decisão, garantindo a melhor afectação dos meios disponíveis, tirando partido do devotamento dos numerosos agentes potencialmente intervenientes e assegurando a maior transparência a todas as decisões. Só desse modo se conjugará o desenvolvimento com a democracia.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: Para formular pedidos de esclarecimento inscreveram-se os Srs. Deputados Eduardo Pereira, Correia Gago, Horácio Marçal, Daniel Bastos, Roleira Marinho, Raúl Junqueiro, Barbosa da Costa, Maria Santos, João Amaral, Carlos Lilaia, João Corregedor da Fonseca, Ilda Figueiredo, Andrade Pereira e Mário Maciel.
Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.

O Sr. Eduardo Pereira (PS): - Sr. Ministro, sendo V. Ex.ª um técnico brilhante e um profundo conhecedor destes problemas, não há, no entanto, na sua intervenção, novidade nenhuma.
Nestes seis meses que leva de Governo, V. Ex.ª não criou nada, não modificou nada, não apresentou nada de novo.
Fez alguns cortes e foi tudo.
Com a experiência que V. Ex.ª tem, não compreendo que pense que o que se tem de fazer para o desenvolvimento regional, num país como Portugal, seja aproveitar as energias das regiões. Sr. Ministro, andamos a aproveitar as energias das regiões deste o princípio do século, pelo menos. Julguei que V. Ex.ª ia indicar algo para a criação das condições que permitam aproveitar as energias das regiões.
V. Ex.ª não conseguiu responder a cerca de metade das questões que constavam da minha intervenção...

0 Sr. António Capucho (PSD): - Era o que faltava!

O Orador: - ... , e teve todo o tempo para o fazer. Não disse uma palavra sobre o reforço do poder local. Falou de verbas, mas o poder local não se reforça só com o envio de dinheiro - embora isso seja importante -, mas sim com uma vontade política e descentralizadora que eu não encontro no discurso deste governo. Não disse uma palavra sobre a discricionariedade que hoje V. Ex.ª pode ter para resolver como entender as questões. Não falou dos 5 milhões de ECUS nem da resposta que deu às Comunidades, quando fez uma opção por planos vultosos, centrais.
Disse V. Ex.ª, por exemplo, o seguinte: «Se o FEDER nos der dinheiro, o Estado Português colocará a sua quota-parte.» Onde?
Com que autorização?
Onde está inscrito e qual o valor?
A isso V. Ex.ª não se referiu! O que nós estamos a analisar é este Orçamento e não um orçamento suplementar que V. Ex.ª vai ter de apresentar antes do fim do ano.
Contudo, para que a Câmara e V. Ex.ª possam reflectir devidamente, gostaria de chamar a atenção para algumas questões, às quais V. Ex.ª já se referiu, quanto a mim não muito bem! O Sr. Ministro não disse como é que se iam financiar os 300 mil contos de obras por terminar nas juntas de freguesia, disse que para os cataclismos há uma verba provisional.
Há uma verba provisional e há sempre um ministro das Finanças em cada governo. Gostava era de saber como é que V. Ex.ª vai resolver as duas coisas. Não disse uma palavra sobre novos investimentos intermunicipais. Falou do imposto de veículos como se isso fosse uma grande coisa. São apenas umas centenas de contos para as grandes cidades e não há terra nenhuma do interior que beneficie com o aumento desses selos.
Falou da orografia. Disse que tinha mudado um coeficiente de 1-2 para 1-5. V. Ex.ª talvez não tenha percebido que ao passar de 1-2 para 1-5 transformou todo o Alentejo em aumentos inferiores a 5 % e aumentou muitos dos pontos do litoral em 36 %. Quando mudou esse coeficiente, o Sr. Ministro ou não deve ter reparado nos resultados ou então fê-lo para alcançar os mesmos. Falou dos transportes escolares e disse que os valores estavam juntos. Ora, legalmente não podem estar, V. Ex.ª tem de indicar o valor dos transportes escolares.
Relativamente ao FEDER, gostaria de dizer ao Sr. Ministro o seguinte: não esqueça que o Orçamento do Estado tem de individualizar a verba de contribuição do Estado Português para as verbas do FEDER.

O Sr. Presidente: - Sr. Ministro, V. Ex.ª deseja responder já ou pretende responder no final, em conjunto, a todos os pedidos de esclarecimento?

O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território (Valente de Oliveira): - No final, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Correia Gago.

O Sr. Correia Gago (PRD): - Sr. Ministro do Plano, pedidos de esclarecimento concretos tenho apenas um a fazer-lhe. Não queria, no entanto, deixar de

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assinalar, com agrado, o que, em minha opinião, foi uma exposição frontal, clara, bem estruturada, e relativamente completa. É certo que terá substituído o grande rasgo inovador e criador pela sensatez, mas em matérias desta natureza é uma postura à qual eu adiro.
Desejo assinalar, em especial, a minha aderência às considerações que fez sobre a natureza do poder local. Nesse ponto não acompanho o colega que me precedeu, já que julgo que V. Ex.ª não a reduziu à expressão financeira das verbas. Acompanho-o também nas considerações que fez relativamente ao papel das transferências orçamentais versus receitas fiscais próprias dos municípios, bem como nos cuidados que manifestou na progressividade das sucessivas transferências de responsabilidade para os municípios.
Dito isto, queria pedir a V. Ex.ª que tivesse a bondade de esclarecer à crítica aqui feita por vários Srs. Deputados sobre a envergadura do crescimento das verbas votadas ao PIDDAC, já que V. Ex.ª confirmou que o critério fundamental adoptado para isso foi o dos recursos financeiros mobilizáveis. Tendo em conta a altura do ano em que estamos a proceder a este debate, tendo em conta o tempo que ainda vai decorrer para completar projectos, para que decorram às processo de adjudicação, de lançamento de cursos, etc., e tendo em conta o que tem sido a capacidade realizadora dos serviços para PIDDAC anteriores, financeiramente muito menos ambiciosos, Sr.- Ministro do Plano, não estará, de facto, a criar-se aqui, em termos orçamentais, uma muito considerável reserva oculta em resultado de dificuldades de execução material por parte dos serviços?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Horácio Marçal.

O Sr. Horácio Marçal (CDS): - Sr. Ministro, ouvi com muita atenção a exposição de V. Ex.a, a qual, na generalidade, me agradou. Dela ressaltam não só os aspectos positivos relativos aos aumentos das verbas para a ciência e tecnologia mas também a taxa do crescimento real do PIDDAC, que se cifra em 39,7 %.
No entanto, tenho uma pequena preocupação - a qual também já aqui foi suscitada - que diz respeito à contestação quase permanente das autarquias que vêm reclamando porque as verbas que lhes são atribuídas pelo FEDER e pelo FEFE - a Associação Nacional de Municípios confirma-o são menores do que as dos anos anteriores. V. Ex.ª disse que as coisas não se passam realmente assim, contudo gostaria que V. Ex.ª informasse em concreto esta Câmara do que se passa porque, na realidade, a opinião pública encontra-se confrontada com duas posições: a Associação Nacional de Municípios diz que este ano a verba a atribuir é menor do que a dos anos anteriores enquanto o Governo afirma que o seu valor é superior.
Disse também que não cabe ao Estado, mas sim à CEE, a decisão quanto ao FEDER.
Parece-me, porém, que também ao Estado cabe essa decisão, já que este órgão tem de insistir, perante a CEE, com a apresentação de programas para a concessão de determinadas verbas.
Já se falou aqui da revisão da Lei das Finanças Locais, contudo gostaria que V. Ex.ª explanasse melhor quais os pormenores que propõe para essa revisão.
V. Ex.ª falou no ambiente e recursos naturais. Tendo o nosso país um desenvolvimento de certo modo anárquico do parque industrial, em que se localiza uma fábrica quase a bel-prazer do investidor pergunto a V. Ex.ª se não haverá necessidade urgente em reorganizar todo esse planeamento e em atribuir verbas mais substanciais para o combate à poluição.
Por exemplo, em relação ao distrito de Aveiro sei bem o que se passa com a poluição permanente do rio Vouga, da ria de Aveiro, da Pateira de Fermentelos e, até, no caso do Algarve, com a ria Formosa, tantas vezes já aqui focada. Não deveria o Estado preocupar-se mais com estes aspectos para os evitar e para corrigir os locais que estão a ser altamente poluídos?
Uma última questão: não vi V. Ex.ª insistir muito com os investimentos no campo da saúde. As carências ao nível dos hospitais são enormes. Lembro, por exemplo, o caso do hospital do meu distrito - o Hospital da Feira - cuja construção, na altura das campanhas eleitorais, se inicia todos os anos e o mesmo se pode dizer em relação aos Hospitais de Águeda e de Ovar.
Agradecia que V. Ex. a me dissesse se o Estado não pode reforçar estas verbas. Numa altura em que o défice do Fundo de Abastecimentos está a ser diminuído, não se poderiam privilegiar os investidores nesse sector?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Daniel Bastos.

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Sr. Ministro, na qualidade de autarca, participei no último congresso da Associação Nacional de Municípios, no qual o Sr. Ministro e o Governo foram acusados publicamente de falta de diálogo quanto à discussão do Orçamento do Estado e no que se refere, de entre outros factos, às dotações para as autarquias.
Na sua intervenção, o Sr. Ministro aludiu a que teria tido várias horas de diálogo com a Associação Nacional de Municípios.
Pretendo saber se tais conversações foram somente realizadas com o presidente dessa associação ou se nessas reuniões estavam também presentes outros elementos do respectivo conselho directivo.
Aproveito, entretanto, a oportunidade para felicitar o Sr. Ministro pela decisão - que creio ter referido na sua intervenção - de alterar os critérios de distribuição do FEF, no sentido de serem mais equilibrados e correctos, especialmente para beneficiar as zonas mais desprotegidas do interior do País.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Roleira Marinho.

O Sr. Roleira Marinho (PSD): - Sr. Ministro, como de costume, V. Ex.ª brindou-nos com um brilhante discurso e com ideias sempre oportunas sobre estas matérias.
Quero, no entanto, colocar algumas questões ao Sr. Ministro.
Relativamente aos recursos hídricos, que projectos em concreto se pensa implementar para aproveitamento e uso criterioso dos mesmos, particularmente naquilo que se designa por «regadios tradicionais»?
Numa outra área suspendem-se os investimentos inter-municipais e podemos considerar que, em alternativa, surgem os Programas Integrados de Desenvol-

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vimento Regional. A minha pergunta é sobre qual a correlação que se pode estabelecer entre eles e qual a vantagem de um sistema em relação ao outro. Na perspectiva do Governo, e particularmente na perspectiva do Sr. Ministro, entende-se que as assimetrias regionais poderão resolver-se com o actual tecido administrativo, nomeadamente no seu recorte geográfico?
Deverá haver uma maior concentração político-administrativa ou uma maior dispersão em todos os níveis da administração?
Ontem um Sr. Deputado adiantou aqui que o montante do FEF poderia ser aumentado com a simples transferência de verbas daquilo que são os investimentos do PIDDAC. Por esta via, suponho que também teriam de se transferir outras competências para as autarquias.
Que comentário pode o Sr. Ministro fazer sobre este assunto?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Junqueiro.

O Sr. Raul Junqueiro (PS): - Sr. Ministro, V. Ex.ª tem no seu Ministério uma área que todos consideramos de importância fundamental para o desenvolvimento do País, que é a da Ciência e Tecnologia.
Começo por saudar a decisão do Governo em criar uma Secretaria de Estado da Investigação Científica, o que me parece ser um instrumento extremamente importante para a promoção dessa política de desenvolvimento e modernização.
No entanto, a circunstância de essa Secretaria de Estado não depender do Sr. Primeiro-Ministro, mas sim do Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, pode comprometer a sua eficácia, na medida em que a sua actuação é essencialmente horizontal. Hoje, no nosso país, residindo nas universidades a força essencial da ciência e da tecnologia, quer nas novas universidades como nas clássicas, ou seja, residindo nas nossas universidades o fulcro em matéria de investigação e de desenvolvimento, como é possível coordenar os projectos levados a cabo pelos laboratórios de Estado com os levados a cabo pelas universidades, muitos dos quais estão em estreita ligação com o sector industrial?
Por outro lado, reconheço ter havido, de facto, um aumento significativo de verbas destinadas aos laboratórios de Estado, mas penso haver uma situação extremamente preocupante nesses laboratórios, para a qual gostaria de chamar a atenção de V. Ex.ª, Sr. Ministro, situação essa que reside, fundamentalmente, nos poucos recursos humanos e no envelhecimento progressivo desses laboratórios de Estado.
A decisão governamental de congelar indiscriminadamente as admissões na função pública poderá comprometer de uma forma definitiva o trabalho positivo e altamente relevante que está a ser desenvolvido por esses mesmos laboratórios.
Sr. Ministro, da leitura das grandes opções do Plano e da própria intervenção de V. Ex.ª, não fiquei elucidado sobre quais os projectos que o Governo considera prioritários em matéria de ciência e de tecnologia. Um país como o nosso naturalmente que não se pode candidatar a todas as áreas da ciência e da tecnologia, pelo que tem de apostar nalgumas em particular.
Pergunto, pois, ao Sr. Ministro quais são essas áreas e quais os projectos em que o Governo se vai empenhar.
Finalmente, qual o esforço, o grau de participação que, na área da ciência e da tecnologia, o Governo está disposto a fazer no que toca aos projectos da Comunidade Económica Europeia?
Refiro-me concretamente a projectos como o Esprit, o Eureka e o Race, projectos fundamentais que podem contribuir para o reforço da ciência e da tecnologia nacional, bem como para o reforço da iniciativa empresarial portuguesa e para o aparecimento de novas iniciativas empresariais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa da Costa.

O Sr. Barbosa da Costa (PRD): - Sr. Ministro, retomarei a questão que já lhe foi formulada relativamente aos transportes escolares. Entendo ser da maior necessidade que seja distinto da verba transferida do FEF para as autarquias o que corresponde aos transportes escolares.
Se hoje é possível ver o quantitativo relativamente a uma e outra coisa, daqui a uns anos talvez não o seja. Além disso, isso vai manter e aumentar as assimetrias existentes, porque não é irrelevante o facto de haver transportes escolares nos meios urbanos ou rurais. Importaria esclarecer essa matéria e fazer essa distinção que é fundamental realizar.
Por outro lado, creio não ser da competência do Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, mas sim do Sr. Ministro da Educação, a necessidade de elaborar a portaria regulamentadora do apoio aos alunos do ensino secundário, conforme previsto no decreto-lei que o anterior Governo emitiu. Sem isso, os alunos do ensino secundário estão sujeitos à bondade das câmaras municipais, dado Pão existir qualquer diploma normativo que regule essa matéria. Daí a necessidade em fazer sair a referida portaria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Santos.

A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Ministro, quando V. Ex.ª fez a abordagem dos aspectos relativos à Secretaria de Estado do Ambiente e Recursos Naturais referiu que o iria fazer muito rapidamente e como deve compreender, isso preocupa-me. Entendo que a política ambiental assenta fundamentalmente num desenvolvimento sustentado e na conservação.
Parece-me que deveriam ser tidos em conta problemas de importância global, como os da abrangência, da formação, de uma política antecipativa, que envolvessem toda a dinâmica social, cultural e económica do País.
Uma política ambiental deveria ser aquela que, de forma abrangente, traçaria toda uma política de intervenção aos diferentes níveis da dinâmica social, política e económica e, nesse sentido, fiquei um pouco preocupada com o tipo de apreciação que V. Ex.º fez. A seguir, o Sr. Ministro fez uma apreciação que foi, quanto a mim, um pouco generalista e teórica. Também a primeira parte do próprio documento que o Sr. Secretário de Estado do Ambiente teve a amabilidade de fazer chegar à Comissão de Equipamento Social e Ambiente é extremamente teórica, tratando-se de uma série de previsões. Aliás, nestes últimos tempos a ecologia em Portugal tem servido muito para uma série de discursos de carácter teórico e a acção concreta, o agir efectivamente para a resolução dos problemas não tem sido muito cuidado.
Por outro lado, quero colocar algumas questões que se prendem com os aspectos normativos que normal-

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mente costumamos referenciar como significativos. É claro que os aspectos normativos são importantes, mas também o são as verbas concretas para se investir na resolução dos problemas que existem. É preciso corrigir situações degradantes e, quanto a mim, este Plano, que apresenta na sua primeira parte considerações de carácter teórico e científico, não faz, depois, uma correspondência efectiva em termos de articulação e de uma estruturação global e abrangente deste tipo de problemáticas. Isto tem que ver com as propostas que são colocadas relativamente à pedagogiac ecologista que aqui se apresenta.
Evidentemente que se avança com uma série de projectos e programas que têm a ver com o atlas nacional, com a história natural, com uma série de questões ligadas à educação e, depois, digo que a articulação existe com o Ministério da Educação, para que seja efectivamente vivenciado este tipo de preocupações de carácter pontual, portanto, com a vivência pedagógica do quotidiano dos alunos das escolas portuguesas. Por outro lado, penso que não estão muito claros os critérios que conduziram aos projectos de estudo e impacte ambiental aqui propostos. Não é claro como foi feito este tipo de selecção.
Em termos da defesa do consumidor, avançou-se algumas propostas, no entanto pergunto se existe uma campanha nacional de defesa do consumidor que, por exemplo, envolva os órgãos de comunicação social, nomeadamente a televisão. Sabemos que a situação é grave por aquilo que já existe em termos de degradação e pergunto se a existência de um conjunto de associações ecologistas não deveria fazer contemplar neste Orçamento, por exemplo, isenções fiscais para essas mesmas associações., Não devemos esquecer que é necessário a envolvência das estruturas existentes até para a correspondente e eficaz intervenção de política ambiental. Porque não avançar-se para a isenção fiscal relativamente às associações ecologistas?
Sr. Ministro, para além dá questão das verbas há um aspecto central e que é o da distribuição interna das mesmas. A esse respeito disso o Sr. Ministro que se pautou pela aplicação rigorosa da lei, mas V. Ex.ª tem consciência que isso não pode ser pois sabe que não há aplicação rigorosa da lei quando faz catorze ensaios e só ao décimo quarto é que acerta, ou talvez tenha acertado com um valor que lhe pareceu razoável para si e para todo o Governo.
Portanto, não pode haver aplicação rigorosa da lei quando se anda a fazer experiências para a aplicar. Sr. Ministro, não há aplicação rigorosa da lei quando, por exemplo, se atribui a Mesão Frio 0% de orografia. Não há aplicação rigorosa da lei quando Aljezur, com as praias de Vale do Homem, Odeceixe, Carriagem, Praia Amoreira, Monte Clérigo, Arrifana, Bordeira, Amado, Vale Figueira, com um empreendimento de Vale da Telha com 530 casas e 132 apartamentos, com um parque de campismo com capacidade para 5 mil pessoas, com pensões e casas de hóspedes, tem um valor de 0% de turismo.
Então, Sr. Ministro, num caso como este há aplicação rigorosa da lei?
Sr. Ministro, não há aplicação rigorosa da lei nem há resposta às perguntas centrais que foram colocadas. A certa altura o Sr. Ministro disse aqui uma coisa espantosa: que o Governo tinha gasto catorze horas a negociar com a Associação Nacional de Municípios, mas não compatibilizou o número de cigarros que fumaram durante essas 14 horas nem contou as palavras que foram ditas.
Apesar de tudo, há uma coisa que vale á pena perguntar ao Sr. Ministro: não teria valido a pena ter gasto quinze horas nessas negociações e ter chegado a acordo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Silva Marques (PSD): - Imagine que a negociação continuava ainda hoje. Nesse caso, não poderíamos estar a realizar, hoje este debate.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Ministro, suponho que o que todos esperávamos da intervenção que produziu era que ela contivesse a resposta a uma pergunta que todos fazemos e que é a seguinte: porque é que este ano são tão exíguas as verbas para as autarquias locais? O Sr. Ministro teria de nos explicar por que é que; com que base, com que critérios e por que razões o Governo fez a opção de privilegiar os investimentos da administração central e de prejudicar os das autarquias locais.
V. Ex.ª sabe perfeitamente - não o pode negar - que o valor transferido a título do FEF para as autarquias locais é significativamente inferior ao valor de acréscimo dos investimentos do Plano;. sabe que diminui o valor do FEF em termos de despesa pública total e que esse valor diminui em termos de despesa pública mesmo se não considerarmos os encargos da divida.
Por todas essas razões, na decisão do Governo está clara uma opção centralizadora. Pergunto-lhe se é ou não legítima a conclusão de que o Governo encara o desenvolvimento regional da seguinte forma: «nós, cá na administração central, decidimos o que é regional e em que é que se deve investir: o dinheiro» ou, de outra forma, «às autarquias vão-se diminuindo as verbas, mas isso pouco interessa»:

O Sr. Carlos Lilaia (PRD): - Sr: Ministro, ouvi com bastante atenção a sua exposição e tive oportunidade de constatar que também o Governo reconhece a necessidade de revisão urgente da Lei das Finanças Locais.
Tem sido essa também a posição do Partido Renovador Democrático e por, isso mesmo quero perguntar ao Sr. Ministro qual o alcance e a profundidade dessa mesma revisão, procurando esclarecer-me também acerca dos trabalhos que neste momento estão já em curso relativos, à revisão da referida lei.
Por outro lado, não posso estar de acordo com a parte da intervenção do Sr. Ministro relativa à aplicação, ainda este ano, dos critérios relativos à distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro, pois ao reconhecer-se que os critérios actualmente utilizados para distribuição desse fundo merecem grandes críticas as quais levam ao reconhecimento da necessidade de revisão da referida lei - e uma vez que as únicas alterações feitas se, reportaram, como V. Ex. referiu, a dois casos pontuais - o da orografia e o do turismo - ficam-nos certas dúvidas sobre se as alterações feitas terão mesmo levado a um acentuar das disparidades existentes entre os diferentes municípios.
Por isso, talvez tivesse sido preferível que neste ano de 1986 se optasse por não se aplicar directamente os

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critérios do FEF, uma vez que se pensa na necessidade de revisão da Lei das Finanças Locais e em aplicar uma solução mais equitativa, evitando o aprofundamento das assimetrias já existentes na distribuição das verbas daquele fundo pelas diferentes autarquias do País.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Ministro, não tive oportunidade de ouvir a intervenção de V. Ex.a, mas vou colocar-lhe algumas questões. Se o Sr. Ministro entender que já respondeu através da sua intervenção, remeta-me para ela pois tenciono lê-la. Em relação ao ambiente e aos recursos naturais temos algumas preocupações e a principal observação que nos sugere a leitura deste capítulo é a de que a expressão «recursos naturais» não tem o seu âmbito muito bem definido. Assim, que recursos naturais se pretende abranger dentro dos objectivos a prosseguir e nas acções a pôr em prática?
Tanto quanto se pode depreender, os recursos naturais que estão fundamentalmente nas preocupações do Governo são os recursos hídricos e, só de passagem, o solo agrícola e as florestas e em relação a estas últimas, essa preocupação deve-se à referência aos fogos florestais. Confirma-se isso pelo facto de as acções a empreender apenas se referirem à realização sobre fogos florestais - e isto diz tudo -, para além de uma extensa enumeração de acções no domínio do ambiente e dos recursos hídricos.
Em relação à questão das bacias hidrográficas, fala-se na criação dos órgãos gestores das bacias hidrográficas.
É evidente que isto é extremamente importante mas gostaria de lhe perguntar se para cobrir o País com esses órgãos gestores não é necessário um estudo extremamente aprofundado e a preparação de infra-estruturas capazes de proporcionar a criação desses órgãos. Como é que isso vai ser feito e em que prazo, uma vez que todos sabemos que nesse capítulo Portugal está, infelizmente, no ponto zero?
Uma última questão que lhe quero colocar, e que já lhe coloquei quando V. Ex.ª esteve presente na reunião da Comissão Parlamentar, diz respeito a um aspecto que nos preocupa bastante e que se refere à ausência de orientações quanto à «defesa» do País, nomeadamente dado o processo de integração na CEE. Como todos sabemos, há uma tentativa de divisão internacional de trabalho e de lançar para países periféricos, como é o caso de Portugal, indústrias poluentes ou fortemente desgastantes dos recursos naturais.
Perante isto e o facto de todos sabermos as tendências que sobre este aspecto existem na Europa, que defesa pode Portugal ter para impedir que se implantem cá indústrias desse tipo, e, assim, defendermos melhor o nosso país?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.ª lida Figueiredo (PCP): - Sr. Ministro, relativamente às questões de ambiente de que falou quero dizer-lhe que mais importante do que enunciar princípios de defesa do ambiente é estabelecer prioridades de acordo com as carências do País e, acima de tudo, inscrever verbas no Orçamento para que, de facto, seja possível resolver alguns dos mais graves problemas sentidos pelas nossas populações.
Neste Orçamento o que mais falta é essa inscrição de verbas para fazer face e resolver alguns desses mais graves problemas, como sejam o do combate à poluição e o do combate às gravíssimas carências de saneamento básico, nomeadamente nas zonas urbanas.
O Sr. Ministro, por exemplo, conhece a zona do Grande Porto e sabe as enormes carências que existem neste campo e as dificuldades tremendas com que as autarquias se têm debatido para, de alguma forma, as tentarem minorar. No entanto, no Orçamento o que mais falta é a inscrição de verbas para esses problemas.
Tão grave como isso foram as promessas feitas no ano passado, nomeadamente em campanha eleitoral, e aquilo que através das comissões de coordenação regional - inclusive, à Comissão de Coordenação Regional da Região Norte - foi prometido às autarquias através dos possíveis fundos do FEDER para a resolução de alguns desses problemas. Veja-se agora o que se está a passar: situações de autarquias que dizem terem iniciado obras por lhes terem sido prometidas pelas comissões de coordenação regional e também pelo Governo, verbas, nomeadamente do FEDER, para levar essas obras por diante. Neste momento as verbas não existem e essas autarquias não têm possibilidade de continuar as obras.
Como vão ser resolvidos estes problemas?
Ainda recentemente as autarquias do Vale do Sousa tomaram posição sobre esta questão. Como sabe, os presidentes das Câmaras de toda essas região alertaram o Governo para esta situação. Que resposta lhe vai ser dada, Sr. Ministro?
Que resposta vai ser dada para o grave problema como é o do abastecimento de água à zona do Grande Porto?
Não é com aquela pequena verba que está inscrita através do FEDER que esse problema vai ser resolvido. A solução continua a ser o endividamento das autarquias da região. Como vão ser resolvidos os graves problemas de saneamento e as carências que, de alguma forma, se fazem sentir na zona dos municípios a sul do Douro?
Como bem sabe, Sr. Ministro, não é com a diminuta transferência de verbas para as autarquias que o Governo pretende fazer através do FEF que estes problemas podem ser encarados de frente.
Então, Sr. Ministro, que verbas vão ser afectas a estas zonas para encarar de frente este problema?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade Pereira.

O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr. Ministro, ainda recentemente nesta Câmara manifestei a minha angústia face ao problema das assimetrias do desenvolvimento regional existentes no nosso país. É um problema que me preocupa, não só por eu ser oriundo de um dos distritos mais atrasados do País mas também porque pertenço a uma bancada cujos princípios são preocupadamente iluminados pela doutrina social da Igreja, à luz da qual importa que os pobres sejam cada vez menos pobres mas, também, que as regiões atrasadas o sejam cada vez menos. Foi pois com lógico aplauso que, aquando da discussão do Programa do Governo, registei que este se propunha definir um conjunto de medidas de política susceptíveis de contribuírem para a atenuação das assimetrias regionais.
Porém, se bem percebi, o Sr. Ministro acaba de referir que havia, pelo menos para já, que sacrificar esse objectivo. Realmente, no Orçamento que apreciamos

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nada revela qualquer tipo de preocupação relativamente; à minimização dos atrasos da região interior do País. O Governo demite-se, realmente, de prosseguir aquele objectivo programático?
Sr. Ministro, o montante de verbas previsto no orçamento para o PIDDAC foi consideravelmente acrescido, permitindo assim um aumento significativo do investimento público o que, pela nossa parte, é louvável por permitir o relançamento da nossa economia. Não tendo, porém, havido alterações no aparelho de Estado, coloca-se-nos a dúvida de saber em que medida é que o Estado estará em condições de aproveitar em tempo útil aquelas dotações orçamentais. Concretamente, está o Sr. Ministro seriamente convencido de que, face às limitações de tempo e de meios humanos,, há garantia de execução orçamental naquele domínio? Pelo contrário, e como já lhe foi aqui perguntado, não está antes a criar-se um grande défice oculto?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.

O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território, teceu V. Ex.ª algumas considerações, necessariamente superficiais, mas, oportunas, acerca da problemática do ambiente em Portugal.

Gostaria de lhe fazer uma pergunta breve, mas, antes disso, não queria deixar de explicar porque é que as suas considerações foram oportunas. Porque esta Assembleia se prepara para debater quatro projectos de lei de base do ambiente e este momento será, certamente, muito importante - e até histórico,- para que Portugal venha a conseguir uma verdadeira política de ambiente adaptada à Europa onde já nos inserimos.
A questão que gostaria de lhe pôr é a seguinte: considera o Sr. Ministro que a adaptação da legislação portuguesa, evidentemente indispensável ao direito Comunitário em matéria de ambiente - que é um direito exigente e responsabilizante -, passa inevitavelmente pela consagração, numa lei quadro do ambiente, do princípio, que reputamos de fundamental do, poluidor/pagador? Lembro ao Sr. Ministro que, dos quatro projectos entrados nesta Casa; só há um, - precisamente o do PSD - que defende esse princípio.
Gostaria de saber a sua opinião, certamente autorizada, sobre a matéria e se se justifica e se é indispensável que uma lei de bases - no prisma da tal adaptação da legislação portuguesa ao direito comunitário - tenha de consagrar o princípio do poluidor/pagador. Tenho a minha opinião formada, Sr. Ministro, mas gostaria de a reconfirmar e de a consolidar com a sua opinião.

Uma Voz do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Ò que é que isso tem a ver com o Orçamento?

O Sr. António Capucho (PSD): - Não percebes?

O Sr. Presidente: - Para responder, tem ,a palavra o Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território V. Ex.ª dispõe de 15 minutos.

O Sr. Ministro do Plano e da Administração do Território: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço muito o interesse da Câmara, demonstrado pelas, numerosas e interessantes perguntas que me foram colocadas, e vou tentar responder à maior parte - em 15 minutos vai ser muito difícil fazê-lo em relação a todas -, mas, de qualquer forma, vou começar por algumas que me foram ontem colocadas na intervenção do Sr. Deputado Eduardo Pereira e que hoje foram retomadas.
Começaria pela que se refere à forma como este governo se propõe aplicar uma política de desenvolvimento regional, onde fui acusado de não ter vindo dizer novidade nenhuma relativamente ao aproveitamento das energias latentes da periferia.
Está enganado, o Sr. Deputado Eduardo Pereira, pois o instrumento «programas integrados» é um instrumento vital e que está a ser implementado com rigor. Já tomaram posse alguns dos administradores dos gabinetes desses programas, com instruções muito severas acerca do calendário que têm que cumprir relativamente a toda uma série de acções, e é evidente que, com o tempo de que aqui disponho para expor tudo isto, não poderia elaborar sobre a mecânica de o fazer em relação a cada um.
Devo dizer que estamos a tentar fazê-lo com toda a economia de meios, mobilizando a inteligência que está também na periferia. Tal é o caso dos Institutos Universitários de Trás-os-Montes e da Beira Interior, o caso do Projecto Integrado de Trás-os-Montes e o Projecto da Cova da Beira. Tudo isso, no que diz respeito à parte que parece mais fulcral da sua intervenção, está a ser associado. Mas não chega.
Como ontem foram feitos também alguns reparos acerca de participação das populações, devo dizer que não há nenhum destes programas que não tenha o conselho dos autarcas a apoiá-lo e a intervir directamente na sua elaboração. Eles existem, e a sua mobilização, ou a falta dela, está, em boa parte, tanto nas mãos dos autarcas como nas da administração central que têm desconcentrado os elementos para os levar por diante.
Um outro ponto, que foi referido ontem e que hoje voltou a sê-lo, visa a questão dos investimentos intermunicipais. Acho interessante que esta questão tenha vindo da parte do Sr. Deputado Eduardo Pereira porque, apesar de o PS ter criticado fortemente o aparecimento dos investimentos intermunicipais em 1980, depois, quando foi Governo, estimulou-os, e vem agora dizer outra vez que gostaria de os ver renascer. Deve ter modificado bastante a sua posição inicial pois agora considera bons esses investimentos.
Os investimentos intermunicipais, na ocasião, respondiam a uma, necessidade evidente: a de ser preciso dar escala a certos investimentos e a de conciliar as vantagens da participação local com a economia de uma certa escala para certos tipos de investimento. Assim sendo, foi por aí que se juntaram, num esquema conjunto, várias autarquias para levar a cabo, com o estímulo do Governo, um certo número de realizações.
Agora; é exactamente no quadro de programas de desenvolvimento regional que se pode ir buscar essa mesma figura, renascendo-a, com um benefício manifesto para as autarquias porque estas agora têm fundos da CEE e quiçá da administração central, que os podem estimular, embora se tenham que fazer sínteses - tal como dizia na minha exposição e tal como disse aqui aquando da apresentação do Programa do Governo - a todos os níveis em que estas possam ser feitas, neste momento há uma necessidade enorme de as

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fazer ao nível supramunicipal, que não seja ainda o regional, para fazer face a múltiplos destes investimentos que aqui foram referidos: são as bacias hidrográficas que precisam de abastecimento de água, ele., etc. Assim, tudo isso deve adquirir uma nova perspectiva no quadro do plano de desenvolvimento regional ou no de programas sub-regionais em que se vai retomar, sob outra forma, a figura. Ter muitas figuras ao mesmo tempo é que me parece inconveniente e perturbador, até das próprias autarquias.

O Sr. António Capucho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em relação a uma outra questão aproveito já para referir um ponto retomado por vários senhores deputados. Dá ideia, na discussão, de que há dois países: o país das autarquias e o país do PIDDAC, quando tenho até referências de autarcas com quem tenho falado que me dizem o seguinte (neste extremo de forma): «Eu não me importava nada da alteração das transferências do FEF desde que me fizessem a estrada não sei quantas... »

O Sr. Daniel Bastos (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Isto é respeitante aos I.P. - N.ºs 3, 4 e 5, que são as grandes infra-estruturas. Assim, devolvo a pergunta e pergunto: então as grandes obras estruturantes do espaço não são também obras que vão para as autarquias? Aplausos do PSD. Como é que se pode estar a fazer, em antinomia, o PIDDAC, que se calcula de uma certa maneira para mostrar que ele está a crescer muito, e se minimiza o outro crescimento, quando, ao fim ao cabo, é da articulação dos investimentos da administração central e da administração local que se obtém o desenvolvimento do País?
Não é, de maneira nenhuma, pondo em antinomía os dois universos que se chega à coordenação e àquilo que é propósito do Governo, isto é, fazer coordenação e sínteses em todos os momentos em que seja possível fazê-lo e onde seja também possível fazê-lo, porque só assim garantiremos a melhor aplicação dos dinheiros públicos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Passando a uma outra questão, o Sr. Deputado Eduardo Pereira - estou a responder-lhe a propósito de perguntas por si feitas que, sob uma forma ou outra, foram retomadas por outros Srs. Deputados -, diz que não fomos nós a fazer a escolha dos projectos para Bruxelas.
Não tenho culpa que o Governo anterior não tenha apresentado projectos hierarquizados nessa escolha. E exactamente por essas razões - e volto a dizer que a primeira sessão de avaliação, no Comité de política regional em Bruxelas, foi feita no dia 26 de Novembro e que tivemos o nosso Programa de Governo aprovado nesta Câmara no dia 20 de Novembro - que não temos nada a ver com essa falta de hierarquização dos projectos anteriores.
Devo dizer, desde já, que vamos, naturalmente, curar - e temos tentado fazê-lo - do equilíbrio daqueles projectos que estão agora a ser analisados, e para a ano irão com certeza para Bruxelas as prioridades por nós defendidas para não deixarmos nas mãos de outros aquilo que possa ser feito por nós. Quanto aos critérios de distribuição do FEF, eles são sempre muito criticados. Devo dizer que se tivéssemos aplicado esses critérios tal como foram aplicados no ano anterior estaríamos aqui hoje a justificar a razão de não termos feito nenhuma adaptação e nenhuma melhoria. As críticas, relativamente a três dos indicadores, eram muito severas: o número de camas e o número de utentes -- e deve estar aí a insatisfação relativamente a Aljezur -, a questão da orografia e a questão dos emigrantes.
Quanto a esta última foi-se tão longe quanto era possível, buscando as estatísticas existentes a nível concelhio. Nos outros indicadores servimo-nos do que havia e pareceu-nos que a intensificação da utilização das infra-estruturas turísticas era mais adequadamente traduzida pelo número de dormidas do que, propriamente, pelo número de camas existentes. É evidente - e agora não vamos encetar uma discussão, que nos levaria dias, acerca da correcção de cada um dos indicadores - que o que é importante é o seguinte: temos de montar um observatório que nos diga continuamente qual é a justeza de cada um dos indicadores.
Nunca teremos as autarquias satisfeitas porque é evidente que se há umas que ganham há outras que perdem, e aquelas que este ano ganham muito com o indicador do número de dormidas em vez do número de camas é evidente que não protestam; mas foram essas que protestaram no ano passado. Do que esta Câmara tem de ficar consciente é que temos todos de montar um observatório de dados para ir afinando continuamente estes critérios porque nunca haverá - e digo isto numa procura de situações equitativas - uma total concordância acerca dos resultados.
Quanto à questão referente aos transportes escolares, devo dizer que a ser respeitada a sugestão feita no sentido de distinguir os transportes escolares o mesmo valeria para as estradas, para o saneamento básico, etc., e queria dizer que foi acordado com a Associação Nacional dos Municípios que se distribuíssem os fundos pelos critérios gerais do FFF, ficando o propósito de vir a incluir um indicador apropriado em próxima revisão da Lei das Finanças Locais.
Como a este propósito me foi posta uma outra questão - embora com críticas - relativa ao número de horas das reuniões havidas, da sua distribuição e de saber com quem foram, devo dizer que essas reuniões foram as seguintes: uma reunião de duas horas, em 27 de Dezembro, com o Ministro e com o Secretário de Estado, em que as questões analisadas foram a de satisfazer a pretensão da Associação Nacional de Municípios quanto ao mínimo de 20% do FEF, a substituição do imposto de turismo e os transportes escolares; uma reunião de 3 horas, no dia 21 de Janeiro, com o Secretário de Estado da Administração Local; uma reunião de 2 horas, no dia 30 de Janeiro, outra vez com o Secretário de Estado da Administração Local; uma reunião de 2 horas, no dia 4 de Fevereiro, comigo próprio e com o Secretário de Estado; mais uma reunião de 2 horas, desta vez em Coimbra, comigo próprio e com os Secretários de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional e da Administração Local; uma reunião de 1 hora e meia, com o Primeiro-Ministro e comigo próprio, no dia 13 de Dezembro e mais uma outra reunião, no dia 1 de Março, com

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o Primeiro-Ministro e com o Secretário de Estado do Planeamento. Não houve, portanto, falta de atenção - e não estou aqui a contabilizar as entrevistas particulares que tive com alguns dos membros nomeadamente, com o presidente da Associação Nacional de Municípios.
Quanto à intervenção do Sr. Deputado Correia Gago, que depois foi retomada a propósito do «colchão» que sé estaria a criar com a falta de utilização das verbas porque já não se vai a tempo, devo dizer que, dentro do processo que vamos utilizar e na reformulação da Lei Orgânica do Ministério do Plano está incluída uma coisa que se faz pela primeira vez: vai ser constituída uma unidade de acompanhamento e avaliação que se irá encarregar do acompanhamento e realização física e financeira de todas as obras. De maneira que não estaremos só no final do ano a constatar que houve uma falta de compasso entre as realizações e que estamos sentados em cima de meios financeiros não utilizados.
Isto vai ser como espero, e a lei orgânica está já em circulação para apreciação e aprovação em Conselho de Ministros. Nesta unidade de avaliação os termos «acompanhamento» e «avaliação» são traduções de dois termos ingleses que se sabe muito bem na profissão o que significam - monitoring e evaluation. O monitoring é o acompanhamento físico e financeiro do, que se está a passar resultando a sua análise da eficiência dos métodos postos à disposição e o termo evaluation respeita à eficácia dos meios, e temos a ambição de fazer as duas coisas.
Como o tempo de que disponho para responder é muito limitado, vou-se referir agora à ciência e tecnologia.
O Conselho Superior de Ciência e Tecnologia está constituído e nele se reflectirá, naturalmente, grande parte daquilo que vem a ser o sentir de dois tipos de membros: os que podem dar e aqueles que querem receber.
A este respeito, Sr. Deputado Raul Junqueiro, não me parece tão desadequada a inserção da Secretaria de Estado de Investigação Científica no Ministério do Plano por muitas razões. Em primeiro lugar, como costumo dizer, quando se penduram demasiados brincos no Primeiro-Ministro ele não tem tempo para curar deles de forma que devem ficar sob a sua alçada apenas aqueles para os quais é indispensável a sua actuação englobadora. Há uma grande lógica para que a Secretaria de Estado da Investigação Científica esteja no Ministério do Plano pois este Ministério tem a pretensão de ser o Ministério do desenvolvimento e a nossa investigação tem de ser feita orientada não para aquilo que vêm a ser necessidades exteriores ou necessidades individuais de cada um dos investigadores, mas sim para as necessidades do Pais.
Portanto poderia dizer aquilo que penso e que vou submeter ao Conselho: a biotecnologia, a informática os recursos naturais, alguma parte da língua portuguesa e por estes exemplos se pode ver que abrangeremos de sectores técnicos a sectores que habitualmente são do domínio da cultura, pois tudo isso nos parece muito importante.
Esta é a minha opinião pessoal e é aquela que vou transmitir ao Conselho, embora este tenha sido criado, exactamente, para auscultar quais são as necessidades nacionais. Esperemos que o trabalho do Conselho, que vai reunir dentro de três semanas, logo, a seguir à Páscoa, seja frutuoso. Peço desculpa aos Srs. Deputados por muitas das perguntas terem ficado por responder.
Lamento e volto a agradecer o interesse que este sector mereceu a esta Câmara.
Para a outra vez teremos de arranjar mais tempo para o Ministro do Plano responder a tanto interesse.

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): É pena que não tenha tempo para responder!

O Sr: Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira:

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Contraria ao proclamado pelo Governo, e ontem aqui mesmo referido pelo Ministro das Finanças, o Orçamento do Estado apresentado à Assembleia da República depois de esgotados os prazos legais e os que o Governo dizia ter imposto a si próprio não é um orçamento de rigor, não é um orçamento de verdade ou de disciplina das finanças públicas, nem é um orçamento de desagravamento fiscal dos rendimentos do trabalho e dos rendimentos familiares, nem tão-pouco é um «passo na estratégia gradualista de redução do peso do défice orçamental».
É sim um orçamento classista que sobrecarga os portugueses de menores recursos e não dá reposta às carências sociais com que se debatem, e que por isso se vão agravando um orçamento que não tem por objectivo resolver a prazo aos problemas económicos e financeiros do País antes visa os imediatos interesses políticos do Governo.
Não é um orçamento de rigor.
Cinco dias após a sua entrega na Assembleia da República já o Governo estava a substituir mapas e quadros, e outros foram sendo substituídos ao longo do tempo entretanto decorrido.
Como se afirma no relatório da Comissão de Economia ainda hoje continuam a verificar-se divergências em diversos dos valores apresentados, permanecem as imprecisões, cálculos há que não correspondem às premissas enunciadas, em alguns casos a evolução das receitas e despesas propagandeada diverge substancialmente da realmente constatada. Não é por, acaso ou por mera incompetência que tal sucede. Nota-se aqui, na verdade, a tal «ginástica orçamental» de que ontem falava o Ministro das Finanças: a ginástica para lançar a confusão que tão bem serve os propósitos da propaganda.

A Sr. Ilda Figueiredo. (PCP): - Muito bem!

O Orador: As previsões de receitas do imposto de capitais, do imposto complementar e do imposto extraordinário têm erros de cálculo, estão subavaliadas. As despesas correntes, excluídos os juros e os encargos com pessoal, não foram contidas, antes apresentam um crescimento real.
O défice orçamental para 1986 não é inferior em 1,7 milhões de contos ao de 1985, como foi escrito pelo Governo e ontem afirmado pelo Ministro das Finanças.
Antes apresenta um agravamento na ordem dós 60 milhões de contos. Como não é manifestação de rigor dizer, como o disse o Ministro das Finanças, que «havia que aumentar o investimento do SPA», quando se sabe que isso encobre a diminuição do investimento das autarquias locais, financiado pelo Orçamento do Estado. E muitos outros exemplos poderiam ser dados sobre a falta, de rigor que caracteriza a proposta de orçamento e o verbo dos Ministros.

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20 DE MARÇO DE 1986 1629 Também não é um orçamento de verdade, de disciplina e clarificação das finanças públicas.
Aliás, não é por acaso que o Governo continua a sonegar elementos informativos requeridos há dois meses por uma
subcomissão da Comissão de Economia, Finanças e Plano no cumprimento de uma deliberação tomada pelo plenário desta
Assembleia que visava expressamente «assegurar que o Orçamento para 1986 assuma as características de rigor e
transparência que se desejam». Vozes do PCP: - Muito bem! O Orador: - Não é manifestação de verdade e disciplina
orçamentais continuar a não inscrever no orçamento receitas efectivas do Estado, como as decorrentes da utilização da Base
das Lajes pelos EUA e de outras bases pela RFA e França, e que atingem as dezenas de milhões de contos. Não é uma prova
de verdade orçamental continuar a recusa de envio das contas e orçamentos do Fundo de Garantia de Riscos Cambiais e de
elementos informativos sobre a economia de combustíveis requeridos pela Comissão de Economia. Nada tem a ver com a
disciplina financeira e a verdade orçamental inscrever dotações insuficientes para o Serviço Nacional de Saúde, para as
pensões e reformas da função pública e para a ADSE, para a Acção Social Escolar, ou para os encargos com pessoal na PSP
e na GNR, como consta do relatório da Comissão. Não há disciplina financeira quando o real aumento das receitas fiscais do
Fundo de Abastecimento não são objecto de inscrição orçamental. Não há clarificação das finanças públicas quando se
mantém a prática das operações de tesouraria para escamotear efectivas despesas orçamentais. O que há, isso sim, é a
intenção de subavaliar contabilística e artificialmente o défice orçamental e criar «almofadas» e «sacos azuis» para uso do
Governo, ao arrepio de qualquer controle da Assembleia da República. Vozes do PCP: - Muito bem! O Orador: - E, Sr.
Presidente e Srs. Deputados, muito menos deparamos com um orçamento que vise «o desagravamento dos rendimentos do
trabalho» e «dos rendimentos familiares». Ontem, o Sr. Ministro das Finanças atingiu as raias do fantástico, arriscando-se a
entrar para o Guiness Book, ao tentar demonstrar que não havia aumento da carga fiscal. Chama um equívoco ao facto
incontroverso de o peso dos impostos passar de 28,8% do PIB para 31,5%a, ou para 31% se excluirmos a cobrança de
atrasados. E argumentava: se os senhores deputados não incluírem o aumento de cobranças decorrentes do IVA e não
considerarem os efeitos dos aumentos reais das taxas de outros impostos, chegarão à conclusão de que «é praticamente nulo o
aumento da carga fiscal no final de 1986»! O senhor de La Palisse certamente que corou no túmulo. Risos do PCP. A verdade
é que a carga fiscal aumenta e que esse agravamento se verifica fundamentalmente nos impostos indirectos, em especial nos
impostos sobre consumo. Pelo que se agrava também a distribuição da carga fiscal pelas diversas camadas da população, com
sobrecarga acrescida das camadas sociais de menores recursos. A realidade, que nenhuma ginástica consegue escamotear, é
que as receitas dos sete principais impostos indirectos, designadamente o IVA, o IT e os impostos sobre o consumo de
tabacos, bebidas alcoólicas e cerveja, aumentam 46% nominais e mais de 24% em termos reais. E mesmo na óptica estrita dos
impostos directos, é falso que se verifique «um desagravamento fiscal dos rendimentos do trabalho». Certo que há um
desagravamento efectivo em imposto profissional para os rendimentos superiores a 1750 contos anuais, e um desagravamento
em imposto complementar para os rendimentos colectáveis superiores a 1900 contos (casados) ou 1560 contos (solteiros).
Não sei quantos serão os beneficiados em imposto profissional, quantos têm salários superiores a 1750 contos anuais. Mas sei
que em imposto complementar serão beneficiados pouco mais de 2000 dos mais de 250 mil contribuintes. E sei que desses
2000, com benefício médio de 140 contos, 51 contribuintes pouparão em média mais de 1300 contos, e outros 102
contribuintes mais de 800 contos. Cada um! Mas, se fossem aprovadas as propostas do Governo, a grande maioria dos
trabalhadores portugueses sofreria um agravamento real de 0,5 pontos percentuais em imposto profissional, que na melhor das
hipóteses poderá ser compensado com o Fundo de Desemprego, e que seria tributada mais pesadamente em imposto
complementar com a mudança de escalão por efeito do imposto inflação. Vozes do PCP: - Muito bem! O Orador: - Esta é a
verdade dos números, e dos factos. Quando fala de «desagravamento fiscal», quando fala em trabalhadores, o Governo apenas
está a pensar numa pequena minoria. Tal como apenas pensa nos empresários com lucros superiores a 3 mil contos, aos quais
baixa a taxa de contribuição industrial em 5 pontos percentuais, isenta de imposto de capitais os respectivos dividendos e lhes
reduz em 5007o a taxa de imposto complementar. Mas esquece a grande maioria dos pequenos e médios comerciantes e
industriais. A realização social do País é muitíssimo diferente da visada pelo Governo. E é ela, fundamentalmente, que necessita
de ser beneficiada, pois é ela que mais tem sido, e continua a ser, duramente sacrificada. Há aqui, sem dúvida, divergências, Sr.
Ministro das Finanças. E a maior dessas divergências é que os senhores defendem os interesses do grande capital, e nós
lutamos peia resolução dos problemas da maioria dos portugueses. Vozes do PCP: - Muito bem! O Orador: - Finalmente, Sr.
Presidente e Srs. Deputados, este orçamento não é um passo para a redução do peso do défice orçamental. Bem pelo
contrário, contém em si o gérmen de novos agravamentos do défice nos próximos anos. O elevado aumento de receitas
decorrente da conjugação de uma série de factores, da ordem dos 160 milhões de contos, é de natureza excepcional e não terá
paralelismo nos anos seguintes. E no entanto o Governo manteve o défice orçamental ao nível real do de 1985, criando
pressões para o seu agravamento futuro, já que o crescimento das receitas, a partir do novo patamar, apenas acompanhará
mais ou menos proporcionalmente a evolução da actividade económica.

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1630 O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): -Muito bem! O Orador:. - A quese soma a rigidez das receitas fiscais, que este
orçamento prossegue, resultante da crescente concessão de isenções e reduções fiscais que, surgindo como temporárias, se
vão tornando progressivamente permanentes. E depois assistimos ao recurso contínuo ao agravamento das taxas reais dos
impostos. Aliás, é nesta linha, nesta política nefasta, que o actual governo avança já com a sua proposta de agravamento real
dos impostos indirectos de 1% ao ano.:: Acresce que o Governo compromete já verbas elevadas para os próximos anos,
designadamente no PIDDAC. Por exemplo, o Governo prevê para este ano :gastos de 101 milhões de . contos em projectos
plurianuais que geram compromissos para 1987 superiores a 120 milhões de contos. Não é o lançamento de projectos
plurianuais que está em causa. O que está em causa é a sobreavaliação da capacidade de execução financeira, visando por um
lado criar «almofadas» ou «colchões», como disse agora .º Sr. Ministro; para este governo e, por outro lado,, comprometer
futuros orçamentos e futuros governos. O que se questiona, pois, é o excessivo valor de compromissos assumidos e, mais do
que isso, a natureza eleitoralista que em muitos casos lhe está subjacente. Uma voz do PCP: - Muito bem!'.- O Orador: -
Um exemplo por todos: os projectos por desagregar no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, os tais
projectos quê o Governo diz serem pequeninas obras sem grande significado, atingem este ano apenas 704 mil contos. Mas
comprometem .para 1987 cerca. de 9,5 milhões, de contos! É a política de «lançamento da primeira pedra», que nada tem a
ver com os interesses do País e das populações e que apenas serve os interesses da sobrevivência política do Governo. Srs.
Deputados, o Governo quer este orçamento para si. À Assembleia da República compete transforma'-1o num Orçamento para
Portugal.º Aplausos do PCP e do MDP%CDE. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados,, penso terem chegado a acordo quanto à
transferência de posições e às prioridades estabelecidas. Teria agora a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila, mas julgo que
trocou com o Sr. Deputado... : . , . O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, dá-me licença? O Sr. Presidente: - Faça
favor, :Sr. Deputado. . O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, a troca era na pressuposição de que o Sr. Deputado
Victor Ávila falaria no início da sessão da tarde. Se ainda for possível falar cie manhã, pela nossa parte manteríamos então a
primeira intervenção da tarde... , O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vou perguntar ao Sr. Deputado Victor Ávila quanto tempo
demorará a sua intervenção O Sr. Victor Ávila (PRD): - Penso que cerca de 20 minutos,. Sr.
Presidente. O Sr. Presidente: - Então ficará, para a parte da tarde... , Srs. Deputados, chegados à hora regimental, vamos
suspender os nossos trabalhos que recomeçarão às 15 horas.: .. ' Eram !2 horas e 50 minutos. ' O Sr. Presidente: - Srs.
Deputados, está reaberta a Eram IS horas e 20 minutos. ' Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco
Teixeira. O Sr. Francisco Teixeira (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: No seguimento do parecer da Comissão de
Agricultura e Mar sobre as grandes opções do Plano e Orçamento do Estado para 1986, a que tenho a honra de pertencer, é
no qual, embora tenhamos dado a nossa concordância na generalidade, não deixamos de expressar algumas reservas quanto
ao modo como irão ser aplicados os recursos comunitários, gostaria de tecer algumas considerações sobre certos temas que
julgo da maior importância. Reconhecemos, desde logo, com agrado a forma construtiva como têm decorrido com o Sr.
Ministro da Agricultura os encontros que, com frequência, se têm realizado nos últimos tempos e que desejamos ver
prosseguidos num clima de diálogo sincero e construtivo entre o Ministério da Agricultura e esta Comissão. Entendemos que a
abertura que se tem verificado deverá prosseguir garantindo um permanente acompanhamento das acções que permitam
aproveitar os fundos que a Comunidade vai pôr à disposição com vista a um desenvolvimento sério, moderno e eficaz dos
nossos recursos agrícolas. Não basta programar actividades avulsas, quer a nível do FEOGA, quer a nível do FEDAP, é
necessário pensar desde já e com muito interesse na forma de sensibilizar' o agricultor a enquadrar-se nesses planos. Por
conseguinte , impõe-se o reforço das acções de extensão dos serviços do Ministério da Agricultura, bem como a intensificação
dos recursos de aprendizagem agrícola. Todos sabemos que durante os últimos anos se aumentaram os cursos de ensino
superior mas descuraram-se os de índole elementar, correndo assim o risco de não termos executores de base, lacuna essa que
tem vindo a ser preenchida' pela direcção e esforço sério dos técnicos da extensão rural. A estes serviços deverá ser conferida
prioridade de modo que a sua acção mais eficaz, quer no que respeita à divulgação de técnicos que permitam ó aumento de
produtividade das culturas tradicionais, quer no que respeita à inovação de culturas que poderá ser uma forma de atrair. e fixar
o agricultor e aumentar os seus rendimentos, nomeadamente guando se trata de jovens agricultores, por natureza, mais
receptivos a novas técnicas ou inovações. .:. O aumento da produtividade agrícola e a correcta utilização dos solos são
condições essenciais para a resolução de um dos estrangulamentos fundamentais da nossa economia sem a qual não é possível
conhecer um verdadeiro plano de desenvolvimento nacional.

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20 DE MARÇO DE 1986 1631 Mas trata-se de uma área em que temos consciência do risco da pura tecnocracia, constituída
nos gabinetes, com ausência de realismo e sem uma presença no terreno junto dos interessados. Onde está o Ministério da
Agricultura? No Terreiro do Paço e nos serviços centrais, onde se acoutaram alguns milhares de funcionários, ou nos campos
junto dos agricultores que necessitam? Este risco verifica-se analisando o que se passa com alguns planos integrados existentes
em certas regiões que, apesar de serem recentes, carecem já de actualização. Verifica-se isto, por exemplo, com o problema
de produção da batata em Trás-os-Montes. As rotações definidas no plano de desenvolvimento integrado de Trás-os-Montes
(PDRITIM), embora mais longas e com menos incidência naquela cultura, não possibilitam uma produção de forma
suficientemente compensadora, pela falta de produtividade de muitos terrenos nele abrangidos. Trata-se de um caso exemplar,
que demonstra que um mau plano pode debilitar em vez de fortalecer a nossa agricultura. A seguir este caminho concreto
estaríamos a diminuir a nossa reduzida competitividade. Também num domínio fundamental parecem ser os diplomas em anexo
pouco menos que omissos. Refiro-me ao emparcelamento da terra ri ás zonas de minifúndio em que a reestruturação da
propriedade seria tão importante, no Norte como no Sul, para se alcançarem áreas ideais para a mecanização. Sr. Presidente,
Srs. Deputados: Preocupa-me sobremaneira verificar que, devido à falta de interesse pela terra, existem já muitas propriedades
abandonadas. Ao prejuízo económico causado pela falta da sua produção junta-se a degradação a níveis quase irrecuperáveis
e o empolamento de populações que não têm outras alternativas de ocupação nem de desenvolvimento. Sabemos que há
instrumentos que sancionam os proprietários cujas terras não estão a ser devidamente exploradas. Infelizmente tem faltado uma
actuação concreta neste domínio, sendo, por isso, urgente que tomem providências para impedir tal estado de coisas, não
apenas pela via repressiva, mas, e sobretudo, pela via da persuasão e da mudança de mensalidades. A aquisição dessas
propriedades pelo Estado, quer por arrendamento, quer por compra, poderia servir de base à criação de um «banco de terras»
que os empresários interessados poderiam explorar. Empresários com nova mentalidade, capazes de responder aos desafios
que a integração europeia coloca à nossa agricultura. No que concerne à transformação e comercialização dos produtos
agrícolas, e com uma maior divulgação dos objectivos que presidiram à criação das cooperativas de frutos, a que tenho estado
ligado, reconhecemos a necessidade do seu saneamento financeiro, pois, salvo raras excepções, foram inicialmente mal
estruturadas, daí decorrendo muitas das suas actuais dificuldades. Não podemos ignorar a apreciável capacidade frigorífica de
algumas delas como a de Vila Real, Viseu, Guarda, Cova da Beira, entre outras, que dispõem de armazéns anexos. Fomentada
que fosse a produção de fruta de Verão de produtos hortícolas, estas instalações, devidamente reestruturadas e ampliadas,
poderiam servir de base à criação de bons entrepostos frigoríficos, justificando-se assim o prévio saneamento financeiro
daquelas cooperativas. Na realidade aqueles entrepostos serviriam ainda para conservar outros produtos alimentares, como
carnes, peixes e ovos, entre outros, melhorando assim a cadeia de distribuição de produtos alimentares. Para se atingir uma
boa comercialização, a nível interno, supõe-se não só a ampliação do mercado abastecedor do Porto, mas também o tão
discutido e sonhado mercado abastecedor de Lisboa e do Algarve. Sr. Presidente, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Este
Orçamento não é ainda o ideal, nem mesmo aquele que a agricultura portuguesa exige, mas corresponde a um esforço sério de
aproveitamento de recursos internos e externos, designadamente dos fundos comunitários, para a utilização dos quais se exige
maior eficácia da Administração Pública e maior iniciativa dos próprios agricultores. Daí que nos pareça que deva ser conferida
prioridade absoluta à sua formação e informação como garantia mais segura de que esta nova era, que se abre à agricultura
portuguesa com a adesão à CEE, seja aproveitada. Só assim estaremos a fazer das nossas terras uma fonte de riqueza.
Aplausos do CDS. O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila. O Sr. Victor Ávila
(PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Não seria curial uma análise ao Orçamento de 1986, no
que respeita à previsão das receitas e sua composição, sem uma breve referência à situação actualmente existente no nosso
pais no campo do 'sistema fiscal que afecta os contribuintes, sobre a sua eficácia, e efeito redistributivo do rendimento nacional.
Os deputados do PRD assumiram perante o eleitorado, aquando das eleições de 6 de Outubro, o compromisso solene de
pugnar por uma política fiscal eficaz, por uma maior justiça distributiva, com menor penalização da produção e do trabalho e
por uma decidida actuação contra a fraude e evasão fiscais. O sistema fiscal português já se encontra estudado, e a Comissão
de Economia, Finanças e Plano teve oportunidade de ouvir várias críticas ao mesmo, mas considera-se pertinente a referência
às suas principais características, a fim de que se possa analisar até que ponto a proposta de orçamento resolve ou não, na
generalidade, os principais problemas fiscais com que se defronta o País. O nosso sistema fiscal é muito disperso e o número
de impostos, excessivo, existindo actualmente cerca de 80 tributos. Em 1982 cerca de dezoito impostos tendiam perto de 98,6
0lo das receitas fiscais, quando em 1970 esse peso era de 88 %, verificando-se assim que existe uma cada vez maior
concentração de receitas em menos impostos, pelo que muitos deles poderão já considerar-se ineficazes e geradores de
burocracia evitável. Outra característica do nosso sistema fiscal é a sua desactualização e distorsão da base tributável, como se
verifica nos rendimentos prediais onde os valores matriciais já não são alterados desde 1975, e uma correcção aos mesmos, de
acordo com a inflação verificada desde 1963, faria passar a base tributável de 4 milhões de contos para 30 a 35 milhões de
contos. Neste caso da contribuição predial o sistema é iníquo quando se trata de comparar a contribuição predial rústica com a
urbana,

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1632 pois naquela sempre, há uma actualização do rendimento enquanto nesta estes ainda se encontram na prática,
congelados. O imposto de capitais tributa rendimentos nominais e não reais visto que a taxa de juro tem sido sempre negativa
face à inflação. A não reavaliação do valor das existências produz lucros nominais e a sua distribuição, e subsequente
tributação em contribuição industrial, contribui para a descapitalização das empresas. Outra característica do nosso sistema
fiscal é a de ocorrerem tributações sucessivas sobre a mesma base de rendimento. Esta situação tem lugar visto que existe uma
multiplicidade de impostos parcelares, a que ainda vem juntar-se o imposto complementar. É o que se passa com os impostos
que incidem sobre o trabalho e sobre a sociedade/sócio. O imposto profissional é fortemente progressivo è, como em 1984,
cerca de 95 %,das receitas fiscais do imposto complementar foram cobradas sobre rendimentos do trabalho, menos de 4%
sobre os rendimentos da contribuição predial e menos de 1 % sobre os rendimentos da contribuição industrial, então
poder-se-á afirmar que este imposto, que deveria ter um efeito redistributivo, se traduz actualmente num adicional do imposto
profissional, o que é uma situação iníqua. Se tivermos em atenção todas as contribuições e impostos a suportar pelas
remunerações de trabalho a preços de1963 verifica-se que, para um salário anual de 1000 contos, os trabalhadores, tinham um
rendimento disponível de 777 contos naquele ano e, prevê-se que tenham, em 1986, de acordo com a proposta do 0rçamento,
apenas 415 contos. Para esse mesmo escalão de rendimento a carga fiscal cresceu cerca de 190 % entre 1963 e1983. Outro
exemplo da tributação sucessiva é o que incide sobre a sociedade e o sócio. Para um lucro de 10 000 contos, antes de
impostos, depois. de deduzida carga fiscal o valor do dividendo é de 2150 contos. O agravamento da carga fiscal sobre os
lucros/dividendos no escalão de 1000 contos, entre 1963 e 1983, foi de 123 %.Qualquer política de incentivos ao mercado de
capitais, terá de ter em conta esta realidade. Outra característica do sistema fiscal ,é a concentração da tributação sobre certos
extractos de rendimentos e sobre certo tipo de bens patrimoniais. Assim verifica-se que o contributo do factor trabalho para a
formação das receitas fiscais directas, do SPA é largamente predominante, representando cerca de 75% do respectivo
montante dos últimos anos e o conjunto lucros/dividendos, juros e rendas prediais, cerca de 25% . Se tivermos em atenção que
a participação dos salários dos trabalhadores por conta de outrem no rendimento nacional, onde aqueles representavam em
1983, 37,9 %, poder-se-á verificar até que ponto a carga fiscal que incide sobre o factor trabalho é desproporcionada. Outro
exemplo de concentração tributária é o que se passa com o imposto sucessório onde cerca de 75% do imposto arrecadado
provém dos imóveis, fugindo ao imposto todos os outros tipos de bens. Pode-se concluir que o imposto sucessório penaliza os
seus imobiliários, por serem os de fuga menos fácil. A base tributável do nosso país é muito reduzida por via legal chegando-se
à conclusão que em 1980 só 56 % 1 SÉRIE - NUMERO 47 do rendimento nacional teria ficado sujeito a tributação o que não
quer dizer, que tenha sido, efectivamente tributado. Este facto deve-se ao regime de isenção e benefícios fiscais concedidos
pelo estado, o que contribui para o agravamento da carga fiscal que incide sobre os que já pagam impostos, e nomeadamente
sobre aqueles onde se concentra; a sua maior ,incidência, ou seja nas remunerações do trabalho. O alargamento da base
tributável é um imperativo urgente por razões de justiça e de igualdade horizontal, de que o alargamento do imposto à indústria
agrícola e a revisão dos benefícios concedidos por legislação dispersa, são exemplos concretos. O combate à fraude e evasão
fiscais deve ser de natureza preventiva, isto é, com a introdução desde já de algumas reformas do sistema fiscal e pela redução
das despesas públicas para valores compatíveis com o rendimento fiscal de acordo com a capacidade da nossa economia e
com a moralização da Administração Pública. Para se ter uma noção do que representa a fuga aos impostos no âmbito da
contribuição industrial, no imposto sucessório ou no imposto complementar, basta atentar nos seguintes elementos: No imposto
complementar só 10% do rendimento nacional é abrangido por este imposto e as receitas representavam em 1984, 0,42% do
PIB destes valores, como já dissemos, 95% provêm do rendimento do factor trabalho. No imposto sucessório só 3% a 4%
das transmissões são tributadas e dos 100 000 óbitos anuais, 90% não produz qualquer liquidação de imposto. Em perto de 2
700 000 transmissões ocorridas entre 1976 e 1980 só 4,5% eram de valor superior a 1000 contos. O trabalho administrativo
com o imposto sucessório não é compensado pelas arrecadações efectuadas pelo que se justifica a sua suspensão para revisão
das condições de aplicação. É de referir que a taxa máxima de1985 do imposto sucessório era de 86,25% o que é um factor
altamente remunerador do risco que os contribuintes correm com a fraude e a evasão a este imposto. Quanto à contribuição
industrial a situação actual é a da desaceleração do acréscimo das cobranças a partir de 1980 tendo entre o ano de
1983-1982 sido somente de 3%. A prevalência de taxas elevadas é incentivadora da fuga e evasão fiscais como fica
demonstrado. O alargamento da base tributável é essencial no âmbito das contribuições prediais pela inscrição de prédios nas
matrizes e pela revisão destas naqueles que aí já se encontram inscritos do imposto sobre a indústria agrícola e no imposto
sucessório afim de que o imposto profissional não permaneça o único pilar dos impostos directos. Tornou-se necessária a
introdução de uma lógica na hierarquia das taxas, que resulte no estímulo para o trabalho, o risco e a poupança, que, por esta
ordem, são os sectores que se encontram mais desfavorecidos pelo actual sistema. O sistema, conforme ficou demonstrado, é
ineficaz como instrumento de política quer económica, quer financeira, quer social. Não produz um volume de receitas que
façam face ao volume dos gastos públicos, nem mesmo os correntes não serve objectivos de carácter económico, como o
incentivo ao trabalho, à poupança e ao investimento e o combate à inflação e não fornece o mínimo con-

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20 DE MARÇO DE 1986 tributo para a realização de objectivos de redistribuição do rendimento, estando a favorecer
crescentes desigualdades económicas à custa de práticas ilícitas e imorais. O sistema é também ineficaz porque improdutivo, e
improdutivo em consequência do estreitamento dos valores e contribuintes sujeitos a imposto. O sistema é iníquo porque não
existe igualdade horizontal; porque, como se demonstrou, há pessoas que a lei dispensa de pagar impostos por isenção ou
suspensão; porque obriga a pagar imposto sobre ganhos reais que não existem; porque, ao criar condições de generalizada
prática fraudulenta, muitos milhares de portugueses auferem proventos sem tributação, enquanto outros, com ganhos iguais,
suportam impostos. O sistema é iníquo porque a progressividade não funciona no imposto complementar e no sucessório. A
fuga é tão importante, em qualquer deles, que qualquer objectivo de progressividade fica desde logo comprometido. Só os
rendimentos do trabalho têm dois impostos onde a progressividade se faz sentir, o que constituí um desicentivo ao trabalho e o
empobrecimento dos extractos médios da sociedade. O aumento sistemático das taxas da contribuição industrial faz com que o
peso nas receitas fiscais tivesse passado de 7 % em 1970 para cerca de 4 0lo em 1972. No âmbito do imposto de capitais o
valor produzido representava 6,28 %o das receitas fiscais em 1970 e somente 3,57 %o em 1980. Os manifestos exageros da
carga fiscal conjugados com a incapacidade para se enfrentar a evasão determinaram nestes dois impostos a inoperância do
objectivo do acréscimo por esta via, e as receitas fiscais ao longo dos últimos vinte anos. O financiamento do investimento com
recurso ao mercado de acções é neste momento uma das possibilidades que se poderão colocar a algumas empresas,
atendendo à baixa das taxas de juro e à redução da inflação, mas tal desiderato só poderá ser aceitável se o accionista puder
desfrutar de um rendimento aceitável, o que implica que o conjunto lucro/dividendo seja desonerado no âmbito da contribuição
industrial o que não se repercutirá muito nas receitas fiscais, visto que representam somente 1,51 % do PIB em 1984. Esta
desoneração deverá no entanto ser articulada com as políticas tributárias que incidam sobre os juros das obrigações e juros de
depósitos a prazo. Sobre o Orçamento de 1986, e face à descrição que fazemos do sistema fiscal e seus principais
bloqueamentos do trabalho e do investimento produtivo, verifica-se que não se encontra suficientemente atenuada a alta
progressividade e as distorções acumuladas em desfavor do trabalho. O valor a cobrar no imposto profissional será de 78,1
milhões de contos quando em 1985 foi de 71,2 milhões de contos e poder-se-ia ter ido mais longe. Outra característica do
Orçamento quanto ao sistema fiscal é a não eliminação de um elevado número de tributos sem qualquer utilidade. O nível de
fiscalidade, sobe de 17,8 % para 18,2 %. Não modifica a má distribuição da carga fiscal, mantém a manipulação parcial das
taxas e nem ensaia qualquer tentativa de evitar a pluralidade de impostos sobre o mesmo rendimento. 1633 Poder-se-á referir
que o Orçamento tem pontos positivos como os de redução das taxas que incidem sobre a contribuição industrial em 5 pontos
percentuais e de 1,5 pontos percentuais no imposto profissional. No entanto, a redução sobre o imposto profissional é
aparente, na medida em que a elevada progressividade do imposto conduz a que, a um mesmo rendimento real de 1985,
corresponda a uma taxa agravada em, pelo menos mais 0,5 pontos percentuais. 15to associado à progressividade do imposto
complementar torna os rendimentos do trabalho ainda os mais afectados pelo acréscimo da carga fiscal dos últimos anos. A
instituição da taxa social única foi um passo positivo, mas não se deve perder de vista a criação futura de um imposto único
sobre o rendimento. A concessão de benefícios à difusão cultural e o anúncio de tributação dos titulares de cargos públicos são
outras medidas positivas, contribuindo esta última medida para o alargamento da base tributável, mas que só poderá ter efeitos
benéficos sobre os contribuintes desde que o imposto único possa ser a uma taxa inferior à que resultaria se a base tributária
não fosse alargada e se isto não se transformasse num dos titulares dos cargos públicos. Face à evolução dos condicionantes
externos da nossa economia, nomeadamente à quebra do preço do petróleo para US$ 14 o barril, prevendo alguns
especialistas que possa vir a baixar para US$ 7, e mesmo que o preço do petróleo se fixe em cerca de US$ 15 o barril, a
economia do País na importação desta fonte de energia situar-se-á em cerca de US$ 650 000 000 equivalentes a 102 milhões
de contos, o que é muito diferente dos US$ 300 milhões previstos pelo Governo, aquando da apresentação da proposta de
orçamento, é equivalente a 47,1 milhões de contos. Se atendermos a que a descida do preço do petróleo irá influenciar
significativamente o preço de outros produtos derivados e que Portugal importa produtos químicos no valor de 200 milhões de
contos, então a economia para o País, derivada directa e indirectamente da quebra do preço daquela fonte de energia, poderá
ascender a cerca de 1 bilião de dólares, ou sejam, 157 milhões de contos. Nesta perspectiva, o Governo não tem qualquer
justificação conjuntural para manter o excesso de peso da carga fiscal, nomeadamente sobre os rendimentos do trabalho,
conforme decorre da proposta de orçamento. As reduções na carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho podem também
ser compensadas pelo alargamento da base tributável sem quebra das receitas fiscais, fazendo com que todos os Portugueses
participem no esforço fiscal, mas aqui também de uma forma mais moderada, não se perpetuando situações em que só 56% do
rendimento nacional dos Portugueses esteja sujeito a imposto, o que é também, por esta via, uma situação de manifesta
desigualdade. O Governo, na proposta de orçamento, não demonstrou vontade política para resolver os principais
bloqueamentos do nosso sistema, que se caracteriza por uma exagerada penalização das remunerações do trabalho. Quanto
aos incentivos ao investimento, na proposta de orçamento continua-se a adoptar uma política parcelarizada de concessão de
benefícios e não se propõe a revisão de uma forma global do regime da tributa-

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ção do capital risco, medida prévia a quaisquer incentivos ao mercado de capitais, o que poderá tornar ineficaz a criação
daqueles incentivos. Aplausos do PRD e de alguns deputados do PCP. O Sr. Presidente:- Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Próspero Luís. O Sr. Próspero Luís (PSD):- Sr. Deputado Victor Ávila, queria apenas fazer-lhe duas
simples perguntas: se não acha perfeitamente natural que, face à evolução que se verificou na economia portuguesa desde o 25
de Abril até este momento, a evolução do peso dos impostos parcelares no imposto complementar tenha evoluído como evolui
e se não é natural que, após os aumentos significativos dos salários depois do 25 de Abril e a quebra imensa dos lucros das
empresas, o peso do imposto profissional tenha de subir no conjunto do imposto complementar. A segunda pergunta que
queria fazer-lhe, Sr. Deputado, é a seguinte: face ao facto de as rendas dos prédios urbanos, nomeadamente os de 'Lisboa e
Porto, terem estado fixas até ainda há relativamente pouco tempo, não acha natural que a evolução do peso da contribuição
predial urbana tenha evoluído como evoluiu? O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Victor Ávila. O
Sr. Victor Ávila (PRD): - Sr. Deputado Próspero Luís, quanto ao peso do imposto profissional, o que acontece é o seguinte:
neste momento cerca de três quartos dás receitas fiscais do sector público administrativo provêm do trabalho. Se é natural ou
não, o que acho é que isto é exagerado e que, portanto, este peso devia ser corrigido. Quanto à questão das contribuições
prediais, existe um sistema de iniquidade - penso - entre os contribuintes da contribuição predial rústica e os da contribuição
predial urbana. Estou de acordo consigo em que os contribuintes da contribuição predial urbana estão desfavorecidos
relativamente aos da contribuição predial rústica, uma vez que, nas rendas agrícolas, o contribuinte tem possibilidade de cobrar
mais rendas, porque essas rendas estão indexadas ao valor dos produtos perdidos pela terra, enquanto na contribuição predial
urbana há um congelamento sendo os respectivos contribuintes mais prejudicados. No entanto, à partida, qualquer das
matrizes está congelada. O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lobo Xavier. O Sr. Gomes
de Pinho (CDS): - Sr. Presidente, dá-me licença? O Sr: Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado: O Sr. Gomes de Pinho
-(CDS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Lobo Xavier não se encontra, neste momento, presente na sala porque não
prevíamos que a sua intervenção fosse feita agora, uma vez que acabámos de fazer uma outra intervenção acerca de um quarto
de hora. O Sr. Presidente: - Nesse caso, para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Zita Seabra. 1 SÉRIE -
NÚMERO 47 A Srª Zita Seabra (PCP): -.Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: O Orçamento da
Segurança Social, em debate conjunto com o Orçamento do Estado, merece a devida atenção da Assembleia. Trata-se, antes
de mais, de um Orçamento que acentua a caminhada para a rotura financeira do sistema: Em 1983 a transferência do
Orçamento dó Estado para a Segurança Social foi de 8,3 milhões de contos, em 1985 já foi de 30,8 milhões de contos, para
este ano vai ser de 32,7 milhões! Mas é importante dizer que estas transferências não se traduziram em nenhuma melhoria dos
:direitos sociais dos Portugueses, em nenhum aumento significativo das reformas, por exemplo, mas antes resultam da ineficácia
do sistema e dos responsáveis políticos por ele. Esta crescente transferência de milhões de contos do Orçamento resulta
simplesmente de uma acentuada quebra de receitas. O Governo não tomou nenhuma medida tendente ao saneamento
financeiro do sistema mas, ao contrário, aquelas que vêm enunciadas no Orçamento agravarão a situação. Os trabalhadores do
regime geral continuam assim a financiar com os seus descontos, em grande medida, os regimes não contributivos ou
reduzidamente contributivos e continuam a financiar (2 milhões e 200 mil contos) - o PIDDAC da Segurança Social. A
manter-se tal situação, e sabendo nós que neste momento em Portugal existe uma relação de um trabalhador activo para cada
dois inactivos, nunca os Portugueses poderão ter na velhice, na doença ou no desemprego a certeza de o Estado, através da
solidariedade social, lhes assegurar a dignidade mínima de vida. Mas este Orçamento é também um orçamento que revela a
mais profunda e descarada injustiça social. Os patrões que devem milhões de contos à Segurança social são amnistiados. É
importante dizer-se que com este Governo as dívidas do patronato atingiram não só os maiores valores de sempre como o
maior ritmo de crescimento. Os patrões devem presentemente mais de 125 milhões de contos à Segurança Social (e não
adianta o Sr. Ministro tentar não contabilizar como dívidas as letras que estão para desconto na banca). Mas o Governo, em
vez de tomar medidas concretas para cobrar as dívidas, e premeia os patrões devedores com uma amnistia dos juros da dívida
e premeia os patrões devedores todos - e não só aqueles das empresas que se encontram numa situação muito difícil. São
amnistiados mesmo aquelas entidades patronais que dolosamente desviam dinheiro da Segurança Social para
autofinanciamento. Um prémio à fraude, um convite ao dolo, eis a política do Governo! Mas um prémio, e isto tem de ser dito,
dado à custa dos reformados, dos deficientes, dos desempregados, das creches e dos lares da terceira idade que não se
constróem. Mas não se fica por aqui. O Governo vai mais longe e além de premiar os patrões que não pagam, penaliza os
trabalhadores e precisamente os trabalhadores que têm os salários em atraso. Um despacho publicado no Diário da República
no dia 15 deste mês de Março veio estabelecer que as entidades patronais deixam de entregar a folha de pagamento dos
trabalhadores com salários em atraso. 15to é, o Governo corta um direito até agora existente aos trabalhadores com salários em
atraso, o direito de manterem todos os benefícios da Segurança Social. Tira-lhes, por exemplo, o subsídio de doença, o abono
de

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20 DE MARÇO DE 1986 família e restringe-lhes o valor da reforma. Dirá certamente o Ministro que não é assim, porque
nesse caso aplica-se o Decreto n.º 7-A/86, equiparando-os a desempregados. Mas este decreto só existe para os
trabalhadores que se inscreverem até ao próximo mês de Abril, e nesse caso têm de aceitar equipararem-se a desempregados,
para receberem o subsídio de desemprego durante seis meses. E depois? E depois dos seis meses? E os que não se
inscreverem na esperança de que os seus salários sejam regulados? E os que não sabem que, na 2. º série do Diário da
República, o Governo lhes lançou esta armadilha? Passados seis meses, os trabalhadores com salários em atraso que optarem
por este regime ou continuam com vínculo laboral, e perdem a Segurança Social, ou vão para o desemprego, recebem o
respectivo subsídio por um prazo máximo de dois anos e perdem o vinculo laboral ... O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um
escândalo! A Oradora: - Tais medidas são inaceitáveis quando no País existem mais de 100 mil trabalhadores nesta situação.
Mas este despacho tem ainda uma outra consequência: é que os patrões recebem outro prémio, pois deixam assim de dever à
Segurança Social, uma vez que não há folha de salários. Tais medidas só não nos espantam porque conhecemos de há muito a
política do PSD e a quem ela serve. Por fim, diríamos que ò Orçamento da Segurança Social não contém nenhuma medida que
venha melhorar a vida de todos aqueles que estão em situação de precaridade ou porque são reformados, doentes, deficientes
ou famílias carecidas, ou simplesmente porque passem fome. A despesa com as reformas ascende a cerca de 250 milhões de
contos, no entanto o valor da imensa maioria das reformas não reúne condições mínimas de sobrevivência. O Governo, que é
tão lesto a isentar e amnistiar os patrões, que baixa a taxa de descontos, como encara efectivamente a situação dos
reformados? A OIT e o Conselho da Europa recomendam que a pensão mínima seja igual a 50% do salário mínimo nacional.
No entanto, em Portugal mais de 800 mil reformados agricultores têm uma pensão de 49005. O Sr. António Mota (PCP): - É
uma vergonha. A Oradora: - A mínima do regime geral é de cerca de 30 % do salário mínimo nacional (SMN)! Foi
exactamente a equiparação da pensão mínima a 50º70 do salário mínimo nacional que o PCP propôs nesta Assembleia um
projecto de lei cuja urgência já foi votada. Não venha o Governo dizer que não há meios para os reformados quando não só
não cobra as dividas do patronato à Segurança Social como ainda por cima os isenta de taxas e amnistia. Sr. Presidente, Srs.
Deputados: Este Orçamento da Segurança Social não conduz, pois, nem à racionalização do financiamento, nem à correcção
das graves distorções existentes, nem ao bem-estar dos Portugueses. Para. isso era necessário: a) A uniformização das taxas
de contribuições relativas a esquemas iguais; b) A revisão das bases da incidência das contribuições sempre que se não
identifiquem com os salários efectivos; 1635 c) A contabilidade autónoma que dos regimes com taxa diferenciada que, em
resultado do maior envelhecimento, sejam presumivelmente deficitários; d) A cobertura pelo Orçamento do Estado dos
encargos com regime não contributivo e acção social e a dos défices dos regimes não contributivos e com despesas de
administração; e) A adopção de medidas tendentes à efectiva recuperação das dividas de contribuição, actuando
prioritariamente sobre os grandes devedores. Estas são, no entendimento do PCP, algumas das linhas que deveriam presidir à
elaboração do orçamento da Segurança Social. O Governo, esse optou por manter tudo o que vinha de trás, acrescentando
apenas diversas medidas avulsas de pequenas, médias e grandes benesses ao patronato. Nós consideramos que a prioridade
devia ser outra; deviam ser os trabalhadores quando desprotegidos na velhice, na doença ou na deficiência. Aplausos do PCP,
do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos. O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr.
Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação. O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação (Álvaro Barreto): - Sr.
Presidente, Srs. Deputados, Minhas Senhoras e Meus Senhores: Está esta Assembleia a fazer a análise e a apreciação do
Orçamento do Estado para 1986. Trata-se do primeiro Orçamento do Estado que é estudado, analisado e votado após a
adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia, o que, como todos sabemos, teve efeito no passado dia 1 de Janeiro
de 1986. Se esta adesão tem impacte nos diversos sectores da actividade económica do nosso país, tem certamente um
impacte muitíssimo mais importante no sector agrícola, que, a nível comunitário, é o único sector onde existe desde já uma
política comum extensível e aplicada em todos os países da CEE. Deste modo, é evidente que o orçamento do Ministério da
Agricultura, Pescas e Alimentação para 1986 não poderia deixar de ter em linha de conta - e, penso, ainda bem que assim é -
as condicionantes que advêm deste processo de adesão. E basta começar por fazer uma comparação das verbas globais que
estão previstas para o meu Ministério no ano de 1986 com os mesmos valores de 1985. Trata-se de um aumento substancial -
como, aliás, a própria Comissão de Agricultura e Mar da Assembleia da República reconheceu -, em especial no sector de
investimento, porque se na realidade compararmos somente as despesas correntes o aumento não é significativo dentro da
política, que todo o Governo seguiu unanimemente, de contracção das despesas correntes, mas há um aumento substancial nas
verbas que estão previstas para os investimentos. Mas mesmo já na apresentação do orçamento corrente do Ministério se
deram passos, que consideramos importantes, embora ainda não suficientes, no sentido, que pensamos ser o correcto, da
reorganização do próprio Ministério. Fez-se a separação das verbas por cen-

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tros de decisão, deixando estes de, como no passado, estar aglutinados numa única verba, atribuindo portanto
responsabilidades e objectivos bem claros aos diversos centros de decisão, que passam a ser responsáveis pelos seus
próprios orçamentos e pela gestão do seu próprio pessoal. Se também olharmos para as despesas correntes, verificamos que
elas não seguiram a regra dá contenção nas despesas administrativas somente nos dois casos dos gabinetes de planeamento do
Ministério, isto é, da parte do sector agrícola e do sector das pescas, uma vez que são estruturas que, devido ao processo de
adesão, vão ser chamadas a uma actuação muitíssimo mais importante. Mas, deixando o problema do orçamento corrente por
nos parecer de menor importância, debrucemo-nos agora na restante parte do Orçamento do Estado do Ministério da
Agricultura e da repercussão que a política agrícola comum teve na elaboração desse orçamento. Como sabem, há dois
sectores diferenciados na política agrícola comum - o sector dos preços e mercados e o das estruturas. Em relação ao sector
dos preços e mercados, embora aparentemente ele não saia evidente da implicação que tem na proposta do Orçamento, não
há dúvida nenhuma de que as negociações que tivemos em Bruxelas - e que permitiram fixar os preços em moeda europeia
(ECU) para a campanha de 1985-1986, ou seja, para a campanha que, embora já tenha corrido no ano passado, foi um
marco indispensável porque será a partir da fixação desses preços que toda a evolução dos preços dos produtos agrícolas se
vai processar nós próximos anos - foram concluídas com total êxito. Ultrapassaram-se os diversos obstáculos que tiveram a
ver com políticas monetárias, inclusive com o problema da paragem na desvalorização do escudo face ao ECU durante seis
meses do ano passado, e hoje estamos em posição de, desde já, prever que, independentemente dos preços que venham a ser
fixados para os produtos agrícolas na Comunidade, poderemos antes do dia 1 ,de Abril, portanto ainda antes da data prevista
para esse, fim, vir. a fixar para os, agricultores portugueses os preços dos produtos agrícolas para as campanhas de
1986-1987. , ... 1 , , . E podemos fazê-lo, não só atendendo às condicionantes da Comunidade, mas, acima de tudo, seguindo
o objectivo, que desde o primeiro dia o Governo estabeleceu a si próprio, de fixar os preços da produção de valores entre
10% e 12%, ou seja, valores compatíveis com a desaceleração da inflação, que hoje já é um facto na vida nacional. Inclusive,
para, grande parte dos produtos que iremos anunciar, já constatámos que, em relação àquilo que foi a nossa previsão feita em
Agosto passado quando, no sentido de darmos indícios aos agricultores, estimámos quais deveriam ser os preços da próxima
campanha - pois os preços que serão fixados após a próxima reunião em Bruxelas, na semana que se segue, deverão ser da
mesma ordem de grandeza, daquilo que tínhamos fixado inicialmente - foram ultrapassados obstáculos muitíssimo importantes
que já tive a ocasião, de explicitar mais em pormenor, na reunião da Comissão de Agricultura e Mar desta Assembleia. .. , .-
Mas, também no que diz respeito à política de mercados, existe uma ferramenta que no caso da Comunidade é a ferramenta
principal da actuação da política ! SÉRIE NÚMERO 47 agrícola a garantia de preços. Como sabem, na CEE, o orçamento
para o sector garantia do FEOGA consome perto de 90% de todas as verbas da Comunidade em fins de garantia. _ _
O Orçamento para 1986 é de 22 biliões de ECU, ou seja, perto de 3 biliões de contos. Também nós, em Portugal, e pela
primeira vez de uma maneira concertada entre o Ministério das Finanças e o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação,
estabelecemos as bases e o orçamento, nos quais irá ser seguida a política de intervenção ao longo da campanha de
1986-1987. Tive ocasião de referir na Comissão de Agricultura e Mar, que parecia ser uma peça importante da análise do
funcionamento do Ministério da Agricultura, a existência desse orçamento de garantia de preços de produtos agrícolas que na
sua totalidade, para o ano de 1986-1987, prevê um valor de algumas dezenas de milhões de contos. A previsão é a de que o
orçamento ronde os 36 milhões de contos, o que permitirá que as intervenções passem a ser feitas a tempo e horas, garantindo
assim aos agricultores o suporte que os seus congéneres europeus já 'têm. Já tivemos provas dessa vantagem. Nomeadamente,
a recente intervenção que o Governo fez em relação ao concentrado de tomate já foi feita em consequência dessa orientação e
o pagamento mais rápido que se fez do gasóleo aos agricultores também já adveio desta concertação prévia, que foi feita entre
os dois Ministérios, e que nos permite ter uma ferramenta, que, como já referi, nos restantes países é fundamental. Deste valor
de mais de 30 milhões de contos, prevê-se que perto de 5 milhões de contos venham já de recursos a serem mobilizados da
CEE para intervenção baqueies produtos èm que a transição se fará por etapas, por transição clássica, e que, portanto, já vão
beneficiar das ajudas comunitárias. Vejamos agora o que nos diz o Orçamento e a situação real daquilo a que chamamos o
sector orientação da Comunidade, ou seja, o FEOGA - secção orientação. Temos já negociados e terminados vários
dispositivos, como já tive ocasião de anunciar na devida altura. Em fins de Dezembro ficaram acordados os termos em que se
vai aplicar em Portugal o chamado PEDAP (Programa Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa)., E aí é
importante esclarecer claramente que o PEDAP, como ontem um dos Srs. Deputados aqui dizia, tem uma função estruturante que é a comparticipação, que a Comunidade Europeia põe à disposição de Portugal para comparticipar nas despesas
de estrutura e de investimento básico, que sejam subsidiadas ou pagas pelo Governo Português, e com comparticipações
bastante elevadas, que em grande parte dos sectores irá a cerca de 7501ó. Aprovado em fins de Dezembro, posso hoje
anunciar a esta Câmara que durante o próximo mês de Abril apresentaremos em Bruxelas sete projectos específicos com os
quais nos candidataremos ao apoio da Comunidade: os projectos de reconversão da olivicultura, da construção de regadios
colectivos, de apoio à electrificação rural, das estradas e caminhos rurais, da intensificação das acções da sanidade animal e da
intensificação da florestação do nosso país. Ou seja: passados quatro meses da aprovação desse diploma, estaremos em
posição de iniciar, e possivelmente aprovar, durante o lº semestre do ano um conjunto importante de projectos para incluir no
PEDAP.

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20 DE MARÇO DE 1986 1637 Mas, além desses sectores e desta ajuda especifica para Portugal, temos também de, de
futuro, recorrer aos diversos fundos comunitários com regulamentos próprios. É o caso do Regulamento n.º 355/77 através do
qual Portugal tem acesso aos apoios na área das agro-indústrias. E talvez aqui interesse um pouco relembrar que, embora
muitas vezes se diga que não existem projectos através dos quais sejamos capazes de mobilizar os dinheiros postos à nossa
disposição pela Comunidade, convém olhar um pouco para o passado. E aqui tenho também o prazer de relembrar que - e são
dados que ou já foram fornecidos ou que fornecerei com todo o prazer a esta Assembleia - nas ajudas de pré-adesão foram
aprovados na totalidade os doze projectos que apresentámos. A aprovação efectivou-se durante o 2.º semestre de 1985 e
prevê um investimento total de 7,2 milhões de contos, no qual a Comunidade participará com cerca de 2,5 milhões de contos.
Mas também em relação aos projectos incluídos no Programa de Apoio a Projectos Estruturais (PAPE), outra linha de ajuda
que foi posta à nossa disposição durante o ano passado, foram apresentados cerca de 40 projectos, dos quais já estão
aprovados e com possibilidade de financiamento cerca de 21, enquanto outros dez estão em vias de aprovação e esperamos
que durante o 1.º semestre deste ano tenhamos o total do apoio comunitário a esta linha, que é no valor de 7 milhões de
contos, representando um investimento global de 14 milhões de contos. Também em relação às novas linhas de apoio e,
portanto, ao Regulamento n.º 355/77, até ao passado dia 30 de Janeiro fizemos a entrega em Bruxelas de uma importante
carteira de projectos, quer no sector da agricultura quer no sector das pescas. Apresentámos 25 projectos no sector da
agricultura e cerca de nove projectos no sector das pescas, num total de investimentos previstos de perto de 3 milhões de
contos. Iremos apresentar, até ao fim do mês de Abril, a segunda carteira de projectos do Regulamento n.º 355/77 e posso
desde já adiantar que a reacção que tem havido a essa linha de apoio ao sector agro-industrial é bastante positiva e hoje
prevemos poder apresentar não 34 projectos, como apresentámos até fins de Janeiro, mas, pelo menos, mais do dobro
daqueles que apresentámos nessa altura. E gostaria nesta retrospectiva dos projectos apresentados de realçar que até este
momento de todos os projectos que apresentámos em Bruxelas para apreciação ainda não tivemos um único caso de algum
projecto que tenha sido rejeitado por estar mal preparado ou infundamentado. Tem-nos sido pedido, em muitos casos,
esclarecimentos para completarmos os elementos que entregámos, mas até agora temos um elevadíssimo grau de aprovação
dos nossos projectos. Para além destes regulamentos existem outros aos quais, de acordo com a orientação comunitária, a
nossa agricultura irá ter acesso e um dos mais importantes é, sem dúvida nenhuma, o Regulamento n.º 797, através do qual a
Comunidade apoia e financia projectos de agricultores dos diversos países. Já tive ocasião de dizer que o nosso objectivo
temporal para fazermos o acordo definitivo dos termos deste regulamento era o 1.º trimestre de 1986. E posso dar a
informação de que, por exemplo, ontem mesmo em Bruxelas na comissão especial de agricultura, num ponto que consideramos
de importância fundamental para Portugal, ou seja, a definição do rendimento de referência aplicado a Portugal, que condiciona
imenso a maior ou menor acessibilidade dos nossos agricultores a esses fundos, nos encontrámos numa situação de oposição
idêntica à de alguns países da Comunidade, o que levará a que este ponto venha a ser discutido já no próximo Conselho de
Ministros que terá lugar na próxima semana. 15to para dizer que apesar disso também estou absolutamente convicto de que
vamos ultrapassar essas dificuldades e que no 2.º trimestre do corrente ano iremos na realidade ter esse importante esquema de
apoio. Também já temos acordada a definição das «Zonas Desfavorecidas» do País e, embora não oficialmente ratificado,
tivemos o prazer de ver triunfar o ponto de vista português, de que em vez da solução de cerca de um terço de toda a área
portuguesa ser considerada como «zona desfavorecida», vimos consagrada a proposta de que 8001o de todo o território
nacional será zona desprotegida. E se falo nestes aspectos junto à discussão do Orçamento é porque na realidade o orçamento
do Ministério prevê aquilo que considero um «PIDDAC comunitário» no valor de 4 milhões de contos, que visa garantir a
contrapartida orçamental aos projectos que venham a ser aprovados e suportados pela Comunidade. No artigo 14.º do
próprio Orçamento está prevista a possibilidade de um reforço que poderá ir até cerca de 10 milhões de contos para se
poderem honrar os compromissos que o Pais tenha de tomar caso os projectos apresentados tenham o êxito que, esperamos,
vão ter. No orçamento do meu Ministério, somando a parte das despesas correntes com as de capital, alcança-se a verba de
25 milhões de contos, que é superior aos cerca de 14 ou 15 milhões de contos do ano passado, e a que, penso, temos de
adicionar esses 10 milhões de contos que muito provavelmente, e se realmente se prosseguir no ritmo em que temos vindo a
apresentar os projectos, serão também mobilizáveis para Portugal. Aliás, isto insere-se nas grandes opções do Plano e no
próprio Programa do Governo, onde foi dito que o sector da agricultura tinha de, de uma vez para sempre, passar a ser uma
prioridade na acção e deixar de ser uma prioridade nos discursos. O Orçamento do Estado para 1986 consagra, em minha
opinião, essa orientação. Estou certo de que com a continuação dos trabalhos, os esclarecimentos e as discussões em Bruxelas
iremos certamente remover algumas das dúvidas que o relatório da Comissão de Agricultura e Mar levantou ao nosso
Orçamento quanto à questão de se saber se havia ou não capacidade para mobilizar essas verbas para Portugal. Estou certo
de que, com os resultados já obtidos nos projectos apresentados até agora e com o bom ritmo que se tem imprimido nas
negociações com Bruxelas, vamos certamente obter a possibilidade de canalizar para Portugal essas verbas comunitárias nos
sectores da agricultura e das pescas, onde, de certa maneira, tudo é extensível àquilo que abordei, porque a mesma coisa se
tem passado, não só em relação à própria garantia dos produtos agrícolas, onde perto de 1 milhão de contos está consagrado
para as pescas, como também aos projectos para a frota, onde esperamos entregar projectos de 60 novos barcos e 65
reconversões, num valor total de 5,5 milhões de contos, dos quais cerca de 2,5 milhões pagos pela CEE.

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1 SÉRIE - NÚMERO 47 Com esta simples explicação, Srs. Deputados, penso ter-vos dado a ideia do que foi a filosofia base
do orçamento do Ministério da Agricultura: E agora fico à vossa inteira disposição para responder às perguntas que, por bem,
me queiram fazer. Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e
Alimentação, inscreveram-se os Srs. Deputados Rogério de Brito; Magalhães Mota, Raul Castro, António Barreto, Neiva
Correia, Andrade Pereira e Maria Santos. Tem a palavra o Sr. Deputado Rogério de Brito. O Sr. Rogério de Brito (PCP): -
Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, a sua intervenção suscitou-me duas ou três questões. Sendo inquestionável
o facto de que o Orçamento do Estado revela um aumento substancial das verbas para investimento, o que é positivo, gostaria
de dizer ao Sr. Ministro que o Orçamento vale o que vale. O que é que quero dizer com isto? Quero dizer que tudo depende
da política. Assim, se houver uma má política de nada serve haver muito dinheiro disponível! O Sr. Ministro colocou uma
questão que tem a ver com a capacidade de resposta em relação à apresentação de projectos junto da Comunidade. Se temos
projectos, ainda bem, e se a sua qualidade for boa, tanto melhor! Mas uma coisa é haver capacidade de resposta para
apresentar projectos e outra é haver capacidade de resposta para os executar. Gostaria, pois, que, se fosse possível o Sr.
Ministro me informasse de quais os graus de execução relativos à aplicação dos programas do Programa de Apoio ao
Desenvolvimento Agrário Regional (PADAR) e dos Programas de Investimento e Desenvolvimento Regionais (PIDR). Ao
mesmo tempo, gostaria que o Sr. Ministro me informasse de qual o montante das taxas de penalização que já pagámos pela
não utilização de linhas de crédito concedidas a Portugal, designadamente ao nível dos projectos de desenvolvimento integrado.
Uma outra questão é a que tem a ver com o problema dos preços. O Sr. Ministro manifestou o seu agrado pelos êxitos
alcançados nas negociações com a CEE relativamente aos preços para os produtos agrícolas. De qualquer modo, no
pressuposto de que a taxa de desvalorização do escudo em relação ao ECU se situará na base dos 10% a 12%, temos como
previsível a possibilidade de, em 1986, haver aumentos dos preços dos produtos à produção na mesma ordem dos 10% a
12% . Diria que isto não compensa por absoluto a desaceleração da inflação que poderá ser mais ou menos acentuado, mas
que conduzirá, de qualquer modo, a uma quebra do rendimento real dos agricultores. É porque, dando como boa a taxa de
inflação de 14%, já teremos aqui um diferencial que se traduzirá numa quebra de rendimento. 15to parece-me importante se
tomarmos em conta que, hoje em dia, os consumos intermédios já absorvem provavelmente mais de 50% do valor da
produção efectiva e cerca de 80% do valor acrescentado bruto. Portanto, a margem não é muito grande para poder continuar
a suportar quebras de rendimento. Independentemente disso, vamos admitir a possibilidade de, ao longo do período de
transição, termos a tal margem dos 10% a 12% correspondente à taxa de desvalorização para o aumento dos preços agrícolas.
Mesmo assim, e admitindo que vamos ter a possibilidade, de promover uma melhoria substancial dos rendimentos físicos das
produções, pergunto ao Sr. Ministro se eles serão de modo a, entretanto, compensar o alargamento do diferencial que já hoje
existe entre os preços pagos aos nossos produtores e os preços da Comunidade. O que quero dizer é que se hoje temos, por
exemplo ao nível de cereais, um diferencial da ordem de 30, temos de ter em conta que os aumentos previsíveis para esses
mesmos cereais na Comunidade não ultrapassarão 1,5% e provavelmente nalguns casos até se verificará uma descida de
preços. 15to quer dizer que o diferencial vai aumentar progressivamente e certamente não será compensado pelo crescimento
dos rendimentos físicos. Por fim, terminando o período de transição, gostaria que o Sr. Ministro me explicasse como será:
vamos reduzir, aí necessariamente, os preços dos produtos pagos à produção, e então os agricultores sofrerão nessa altura o
forte impacte dessa acção, ou então o Governo terá de suportar esses diferenciais e pagá-los à Comunidade? Não sei se há
outra saída, mas se existe gostaria que o Sr. Ministro me esclarecesse. O Sr. Presidente: - Deseja responder já ou no final,
Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação? O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação: - No final, Sr.
Presidente. O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota. O Sr. Magalhães Mota (PRD): - Sr.
Ministro, o Tribunal Europeu acaba de reprovar o Orçamento da Comunidade para 1986; que consequências para Portugal e,
designadamente, para a agricultura portuguesa? O segundo problema respeita ao facto de os agricultores portugueses
necessitarem naturalmente de saber as regras e a que locais se devem dirigir para obter os seus pedidos de financiamento. Na
verdade, relativamente ao IFADAP, cuja extinção se anunciou mas está agora em reconversão, gostaria de saber quando é que
essa mesma reconversão estará concluída. Quando é que os agricultores portugueses poderão conhecer as regras do jogo com
que se devem movimentar? O terceiro problema prende-se com a questão de decorrerem negociações em relação à
reconversão da vinha e, naturalmente, que os agricultores portugueses gostariam que essas reuniões, que têm a ver com o seu
futuro, não se realizassem em secretismo, mas tivessem ocasião de as conhecer antecipadamente, atempadamente, bem como
as suas consequências. . No respeitante aos problemas estruturais da nossa agricultura, que tipo de resolução, para quando,
que mobilidade para os nossos técnicos agrícolas, que, ao que penso e pensamos todos, não farão a reconversão da agricultura
portuguesa nem a chamada «extensão rural» se continuarem sediados em Lisboa e no Terreiro do Paço? Não é propriamente
no Terreiro do Paço onde vamos plantar alguma coisa! O ultimo problema relaciona-se com a questão fundamental, que talvez
se esteja a colocar neste momento à Comunidade Económica Europeia, da reconversão de

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20 DE MARÇO DE 1986 uma política agrícola pensada em termos dos agriculturas do Norte, face à adesão de novos países
e, portanto, a toda uma política nova que tem a ver com as agricultores do Sul e, mais, com a reconversão das estruturas do
que com a sustentação de preços agrícolas, sem a qual não haverá modificações a sério na agricultura. Assim sendo, qual é o
pensamento do Governo Português sobre esta questão? O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro. O Sr.
Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Ministro, tem-se designado normalmente como choque da adesão à CEE aquilo a que V. Ex.",
numa linguagem mais suave, chamou o impacte da adesão à CEE na agricultura. Tem-se falado em impacte e em choque por
duas ordens de razões: por um lado, porque o sector da agricultura é o mais crítico da economia portuguesa no que diz
respeito à adesão à CEE, e, por outro lado, porque se passa precisamente o contrário quanto aos outros países que fazem
parte da CEE. Trata-se de países com uma agricultura altamente evoluída e até, em vários casos, com uma produção de
produtos agrícolas que excede as necessidades do consumo interno e que leva ao armazenamento de produtos que não são
abrangidos por esse mesmo consumo. Daí que, naturalmente, esses países pensem em exportar para outros, como o nosso,
produtos que lhes sobram e que tenhamos, embora também com uma agricultura atrasada, alguns produtos agrícolas com
susceptibilidade de exportação - como se sabe -, nomeadamente o caso do vinho e do tomate, não obstante o facto de na
maior parte dos produtos não nos bastarmos a nós próprios. Por conseguinte, em primeiro lugar, pergunto ao Sr. Ministro:
para além dos sete projectos propostos para a CEE apoiar, o que é que o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, no
respeitante à modernização das explorações agrícolas - sabendo-se que a maior parte do País se caracteriza por pequenas e
médias empresas agrícolas com uma técnica agrícola rudimentar e antiquada - decidiu levar a cabo para enfrentar o choque de
adesão? Em segundo lugar, o artigo 100. º da proposta de lei do Orçamento refere que o Governo pretende receber
autorização para extinguir os organismos de coordenação económica, como a Junta Nacional dos Vinhos, a Junta Nacional das
Frutas ou a dos Produtos Pecuários, não garantindo sequer o emprego aos trabalhadores destes organismos. Discordando
frontalmente desta extinção, desejaria perguntar ao Sr. Ministro se o Governo considerou que, através da reestruturação, se
poderia garantir o reforço do papel desses organismos no apoio à produção, no combate à especulação, no abastecimento de
produtos essenciais a preços acessíveis e garantindo simultaneamente a continuidade do emprego dos seus actuais
trabalhadores, visto que eles têm efectivamente desempenhado na economia portuguesa um papel importante, que importava
continuar a assegurar mediante medidas meramente de reestruturação e não da projectada extinção por parte do Governo. O
Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto. 1639 O Sr. António Barreto (PS): - Sr. Ministro, sabe que
me regozijo com a ideia geral do orçamento agrícola; que me congratulo pela quantidade de informação que os parlamentares
receberam relativamente a este tema e, igualmente, com o facto de registarmos neste ano certamente o maior aumento relativo
do orçamento agrícola que a agricultura portuguesa conheceu. V. Ex.º sabe também que tenho sido bastante crítico da sua
acção, sobretudo em matéria de reforma agrária - o que não é assunto de hoje - como o tenho sido igualmente no que toca aos
atrasos na preparação dos agricultores perante o futuro comunitário. Com o mesmo tom o felicito por alguns resultados que
tem obtido nas negociações em Bruxelas e que constituem algumas vantagens para a agricultura portuguesa. Devo acrescentar
que ao acompanhar o que se passa, isto é, a discussão, que desejo seja um dos últimos debates essenciais no que toca ao
rendimento de referência da agricultura portuguesa, dir-lhe-ei que, em nome próprio e espero que em nome da maior parte dos
deputados, V. Ex.ª terá o nosso apoio na defesa dos interesses portugueses e que, como muito bem sabe, a definição última
deste rendimento de referência pode prejudicar ou beneficiar a agricultura portuguesa. Dito isto, vou tentar resumir rapidamente
as três ou quatro perguntas que lhe colocarei. Em primeiro lugar, pergunto se V. Ex. ou o Sr. Ministro da Educação e Cultura,
ou os dois, não têm planos, intervenções, desejos e ideias mais concretos relativamente ao grande desenvolvimento do ensino
médio e técnico agrícola que é necessário em todo o País e em todas as regiões. Em segundo lugar, a meu ver, o que vem na
proposta de lei do Orçamento não chega, pelo que lhe pergunto se V. Ex.º não tem planos mais concretos e mais meios para o
grande desenvolvimento da formação dos agricultores, que é um assunto diferente. Em terceiro lugar, questiono V. Ex.ª sobre
qual é a sua expectativa do que pensará a Comunidade Económica Europeia do acesso das cooperativas da Reforma Agrária
aos fundos comunitários. Uma vez mais não é este o dia para discutir as questões relativas à Reforma Agrária, todavia há um
certo número de dificuldades de carácter jurídico e fundiário que não estão ainda esclarecidas, pelo que receio que possa
alguém pensar que as cooperativas da Reforma Agrária seriam genericamente excluídas dos fundos de investimentos e fundos
estruturais da Comunidade Económica Europeia. Para terminar, V. Ex.º sabe que foram feitos estudos em diversos países
europeus das consequências e dos efeitos da adesão à Comunidade, bem como das consequências em várias regiões rurais
europeias. E verificou-se que, dez ou quinze anos depois do início da Comunidade Económica Europeia e da política agrícola
comum, em certos casos esta última política provocou e aumentou consideravelmente as desigualdades sociais e económicas
entre agricultores e teve, por vezes, nas regiões de pequena agricultura ou de agricultura pouco produtiva consequências sociais
muito graves. Sabendo da tónica exageradamente liberal da política económica deste Governo - liberal do ponto de vista
económico, evidentemente -, receio que, no campo da agricultura, se entregue ao mercado, e apenas a este, os efeitos e as
consequências da adesão à CEE.

Página 1640

1640 1 SÉRIE NÚMERO 47 Penso eu que. deve haver intervenções moderadoras e preparadoras dos agricultores
portugueses, nomeadamente na informação e formação dos agricultores e na elaboração de projectos de enquadramento
infra-estrutural. Julgo que há ainda deficiências nestas matérias nas propostas de lei do Orçamento e das grandes opções do
Plano. O Sr. Presidente: Neiva Correia. Tem apalavra o Sr. Deputado O Sr. Neiva Correia (CDS): - Sr. Ministro, faz parte da
proposta de lei das grandes opções do Plano, como meta da sua política fiscal, o alívio da carga que incide sobre a iniciativa
empresarial, de modo a incentivar o investimento. Contudo, na área das actividades que estão na órbita do seu Ministério, o
que esta proposta de lei do Orçamento contém, no seguimento, de resto, da proposta de lei do Orçamento do ano passado,
não é de molde a afastar graves preocupações quanto aos efeitos dos seus aspectos fiscais sobre os nossos agricultores.
Refiro-me ao facto de a proposta de lei em causa voltar à carga com a cobrança do imposto sobre a indústria agrícola e do
efeito do IVA sobre o vinho. É evidente o impacte negativo que estes aspectos fiscais terão sobre a adaptação da nossa
agricultura às novas condições resultantes da adesão, que tornam necessária uma reconversão, devido ao facto de a estrutura
da nossa agricultura repousar sobre um número muito grande de pequenos agricultores e um número razoável de médios
agricultores, que são aqueles que poderão introduzir, absorver e desenvolver os factores do progresso. Estes agricultores
terão de aguentar e sobreviver ou, mais do que isso, necessitarão de suportar de uma forma saudável as modificações que
essas novas circunstâncias impõem. 15so significa esforços de investimento que devem ter como contrapartida uma capacidade
de reposição desses montantes investidos. Tem, pois, que haver crescimento assente na recuperação dos montantes investidos,
o que não é facilmente compatível com uma atitude de ir nesta fase aplicar o imposto sobre a indústria agrícola. Recordemos
que já no antigo regime o Presidente do Conselho de Ministros, que era uma pessoa que contabilizava muito ciosamente
quaisquer pequenas fontes de recursos, acabou por desistir de algumas tentativas nesse sentido. Temos assistido, ano após
ano, à tentativa de introduzir a cobrança do imposto sobre a indústria agrícola, mas parece-me totalmente inoportuno que isto
seja feito numa fase em que é preciso que os agricultores de progresso possam, por autofinanciamento, ter a sua viabilidade
assegurada. Por outro lado e recordando aquilo que o ano passado já dissemos a respeito do efeito negativo da cobrança do
IVA sobre o vinho a uma taxa diferente de zero temos já este ano problemas graves de escoamento, de preços baixos ao
produtor, que levaram à necessidade de efectuar uma intervenção. Melhor seria que o Governo, em vez de ser obrigado a fazer
uma intervenção tivesse aceite aquilo que no ano passado foi dito, ou seja, que o vinho, à semelhança de outros produtos
agrícolas como os cereais e o azeite, deveria estar na taxa zero. O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Andrade
Pereira . O Sr. Andrade Pereira (CDS): - Sr: Ministro, coloco-lhe duas perguntas muito simples, muito rápidas, cuja resposta,
creio, interessa a milhares de pequenos agricultores portugueses. . A primeira tem a ver com as ajudas da adesão à CEE: V.
Ex.ª deu-nos conta das várias linhas de apoio; deu-nos conta também da capacidade que temos demonstrado para utilizar
essas mesmas ajudas. No entanto, havia um ponto que importava esclarecer, que é o de saber qual a distribuição geográfica
que é feita dessas mesmas ajudas? , Esse volume total das 'diferentes ajudas da CEE é distribuído uniformemente por todo o
País ou mais a sul ou mais a norte? Mais no litoral ou mais no interior? Para grandes empresas, para cooperativas ou, também,
para pequenos agricultores? Os destinatários podem só candidatar-se a grandes projectos ou, igualmente, a pequenos? Creio
que é muito importante que os nossos agricultores, sobretudo os pequenos, pois são os que mais dificuldades têm no acesso à
informação, sejam esclarecidos, sobre esta matéria. A segunda questão é a de saber se o Ministério que V. Ex.ª chefia tem
previstas acções concretas para desenvolver exactamente junto dos pequenos agricultores, no sentido de os aconselhar, de os
persuadir até a. substituírem as culturas tradicionais, que têm vindo a fazer, por culturas alternativas de maior rentabilidade.
Estou a pensar designadamente na cultura da batata, que muito se produz na minha região e que com a adesão à CEE
necessariamente tem de ser abandonada, porque deixa de poder ser praticada em termos de rentabilidade económica. Julgo
que o apego que o pequeno agricultor tem às culturas que tradicional e ancestralmente vem fazendo vai criar obstáculos difíceis
de serem ,ultrapassados e vencidos, se não houver uma acção pedagógica insistente junto deles. Por isso, importava saber se
efectivamente há acções desse tipo programadas pelo Ministério de que V. Ex.ª é titular. O Sr. Presidente: -.Tem a palavra a
Sr.ª Deputada Maria Santos. A Sr.ª Maria Santos . (Indep.):. Sr. . Ministro, V. Ex.ªa produziu uma intervenção que incidiu
fundamentalmente sobre os aspectos da agricultura, nomeadamente sobre aqueles que têm a ver com a dinâmica da
Comunidade Económica Europeia. Ao que sei a Direcção-Geral das Florestas pertenceu ao seu Ministério e como V. Ex.ª não
faz nenhuma referência sobre essa questão, gostaria de saber qual a política florestal que pensa seguir nesse campo, pelo que
lhe colocaria algumas perguntas. Assim, pergunto-lhe se a política- florestal deste governo. pensa contemplar o equilíbrio
ecológico das zonas em harmonia com os interesses dos nossos agricultores, pastores, industriais, nomeadamente de
imobiliários, resineiros, corticeiros entre outros, dos caçadores e de todos aqueles que dependem da floresta. Ou será que
quando se refere à intensificação da florestação - como se vê na p. 79 da proposta de lei das grandes opções do Plano - isso
terá a ver com o problema da eucaliptização indiscriminada, que, de facto,

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20 DE MARÇO DE 1986 1641 está a ocorrer nos nosso país e que coloca em causa muitos solos, fundamentalmente com
aptidão agrícola e muitos antigos bosques? Gostaria de saber o que é que se entende por «intensificação da florestação»,
porque, como sabe, desejaríamos ver os campos e as serras de Portugal mais cheios de sobreiros, de carvalhos, de nogueiras,
de oliveiras, de castanheiros, de cerejeiras, de todas aquelas espécies que fazem parte do nosso natural património florestal.
Nesse sentido, só uma opção contida na proposta de lei n.º 15/IV, relativa às grandes opções do Plano para 1986, que refere,
de facto, o problema florestal da intensificação da florestação. Assim, pergunto-lhe: que florestação e para servir que
interesses? O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, que dispõe
de quinze minutos. O Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação: - Srs. Deputados, tentarei responder sucintamente às
diversas perguntas que me colocaram. Em relação ao Sr. Deputado Rogério de Brito, devo dizer que fez algumas
considerações acerca da matéria em debate, referindo que o que importava era a política subjacente a um orçamento, mas que
a proposta de lei em análise, por si, já a considerava positiva. Quanto a isso, estamos de acordo! Eu não disse que iríamos
apresentar um orçamento positivo - já que está realmente perturbado com essa minha interpretação devo dizer que não disse
isso mas, sim, que se verificava no Orçamento para 1986, pelo menos, um aumento substancial em relação ao do ano passado.
Deste modo, quero dizer-lhe que o Governo, ao apresentar um determinado orçamento para a agricultura, era porque isso
correspondia a uma intensificação do apoio ao sector agrícola como sector prioritário que desde a primeira hora tem sido
estabelecido com a orientação do Governo. Relativamente às considerações quê fez aos atrasos do PADAR e dos PIDR
gostava de dizer-lhe que no respeitante ao primeiro não há qualquer atraso, pois a Convenção de financiamento foi assinada no
dia 16 de Dezembro de 1985 e visa, como V. Ex.º sabe, a montagem de toda a rede de extensão rural no nosso país, que vai
ser lançada ainda este ano. Portanto, não há qualquer atraso. Infelizmente já terei de concordar consigo quando diz que houve
realmente atrasos em alguns PIDR. De facto, houve no passado descoordenação entre serviços que fizeram com que, muitas
vezes, os serviços da agricultura estivessem a preparar obras de regadio sem se prever as ligações dos serviços de
abastecimento a esses regadios. 15so hoje está ultrapassado e embora, reconhecendo que no passado houve atrasos, estou
convencido de que o Governo até pela sua própria estrutura vai conseguir que isso deixe de acontecer. Relativamente ao
problema dos preços agrícolas não vou entrar em pormenores sobre como é que se chegaram aos preços de 1985 e 1986,
mas queria lembrar que não foi só devido à desvalorização. Na realidade, houve problemas mais complexos, como seja o dos
preços de 1985 e 1986, quando comparados com os de 1984 e 1985, situação essa que tivemos de ultrapassar; houve o
problema do congelamento da desvalorização do escudo - se se tivesse realizado o simples congelamento os preços só
aumentavam 4% a 5%. Portanto, os 10% a 12% representam todo um conjunto de renegociações que o Governo realizou e
que já tive ocasião de explicitar em mais detalhe na Comissão de Agricultura e Mar. Perguntou-me ainda se isso representa ou
não uma quebra de rendimento. Devo dizer que estes rendimentos vão aplicar-se, parte deles, já no ano seguinte, pois, como
V. Ex.º sabe, os produtos agrícolas começar-se-ão a receber numa fase em que a taxa de inflação -- estamos convencidos -
estará abaixo já dos 14%. Porém, é evidente nunca o Governo o escondeu - que, para certas produções onde os nossos
preços estão substancialmente acima dos da Comunidade, haverá que fazer a reconversão de muitas áreas, que hoje tem um
certo número de produções que não poderão continuar a fazê-las à luz do novo regime comunitário. Daí a importância que
sempre demos no Ministério ao aspecto estrutural do investimento, a reconversão, para que realmente se possa fazer essa
substituição das produções agrícolas. Há no entanto, um aspecto técnico para o qual gostaria igualmente de chamar a atenção -
sei que o Sr. Deputado o compreende - e que é o de muitas vezes a comparação em Portugal ser feita entre os nossos preços
e os da Comunidade, tomando como referência os nossos preços, que são simultaneamente de intervenção e de mercado, com
os da Comunidade, que são exclusivamente de intervenção. Se V. Ex.º fizer a comparação entre os preços comunitários de
mercado e os nossos, que são simultaneamente de mercado e de intervenção, verá que a diferença não é tão grande como
temos muitas vezes referido e, portanto, que a aproximação não vai ser tão grave como igualmente se diz. Na verdade, no
momento em que essa aproximação dos preços se estabeleça no mercado interno é possível fazer-se o abaixamento do preço
de intervenção e, nessa altura, reduzir substancialmente em muito os problemas com que nos debatemos hoje. A política que
vamos desenvolver relativamente aos preços agrícolas não vai aumentar a diferença no respeitante aos preços da Comunidade.
Vai verificar-se e poderei demonstrar-lhe, que os 10% a 12% de aumento dos preços agrícolas até estão dentro daquilo que
está acordado com a Comunidade. Em ECU a taxa é de 150 355, o que quer dizer que vamos ter uma redução em ECU, pelo
que vamos no caminho dos nossos compromissos comunitários. Desculpe, Sr. Deputado, este aspecto telegráfico mas não
tenho tempo para mais! O Sr. Deputado Magalhães Mota formulou-me cinco perguntas. A primeira relaciona-se com a
redução das verbas decididas pelo Tribunal Europeu. Como V. Ex.º sabe, esta decisão deriva de um contencioso existente
entre a Comissão e o Parlamento Europeu, em que a Comissão assentou os seus orçamentos na base das suas próprias
previsões e foi o Parlamento que votou um aumento. Portanto, o facto de se ter dado razão à Comissão em nada, neste caso
concreto, irá afectar as verbas que virão para Portugal. Agora, isso não retira relevância ao outro problema, que não está
relacionado com essa pergunta, que são as dificuldades orçamentais que a Comunidade tem.

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I SÉRIE - NUMERO 47

E no próprio pacote de preços para 1986-1987 há um pedido de reforço em 740 milhões de ECU que ainda não foi aprovado pelos Ministros das Finanças da Comunidade.
Os Ministros das Finanças, como o Sr. Deputado sabe, têm sempre esta posição em todos os países, eles têm de velar pelos recursos a obter para os respectivos países, pelo que não têm luz verde para esse facto. De qualquer maneira, há dirigentes comunitários que já disseram que os recursos para Portugal, não seriam afectados, possivelmente porque Portugal tem problemas sui generis, pois é um país pequeno. Estou, pois, convicto de que não iremos ser afectados negativamente por essas dificuldades que são reais da parte comunitária.
Em relação ao IFADAP, devo dizer que está em pleno funcionamento e que está já a dar uma resposta excelente na divulgação do Regulamento n.º 355/77. Aliás, ele está igualmente a colher projectos em diversos sectores do País. Assim, mantendo aquilo que na altura disse, isto é, penso que a melhor solução para a agricultura portuguesa foi fazer-se a recuperação do IFADAP, em vez de o termos encerrado para depois criarmos uma estrutura toda nova. Aí, sim, levaríamos vários anos até o conseguirmos pôr a funcionar. O exemplo está à vista: os projectos estão a chegar e o IFADAP está a ser renovado; para já através do Regulamento n.º 355/77.
Em relação aos meios técnicos e aos problemas estruturais, já várias vezes tive oportunidade de dizer, nomeadamente em resposta a uma pergunta há tempos feita pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que este Orçamento é um primeiro passo para a reestruturação do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação. No entanto, embora tenha sido dado este primeiro passo, o Ministério tem de sofrer uma remodelação muito mais profunda, passando, designadamente, pelo redimensionamento dos seus quadros, uma vez que temos uma grande escassez de quadros técnicos, o que nos impossibilita de dar uma assistência real no campo aos agricultores, e um excesso de pessoal administrativo, que não tem a qualificação necessária para dar esse apoio técnico. Vamos tentar resolver essa questão na lei orgânica do Ministério, que está pronta e que esperamos fazer aprovar em breve. Desde já posso dizer que estou de acordo que há que fazer qualquer coisa nesse campo. Relativamente ao problema da reconversão da vinha, gostaria de esclarecer, uma vez que não tive tempo de fazê-lo na minha intervenção, que na passada segunda-feira nos foi entregue a proposta da Comissão para o regulamento a aplicar em Portugal no que respeita à reconversão da vinha.
Trata-se de um programa específico, visto que, em vez da aplicação do Regulamento n.º 797, que prevê o arranque indiscriminado, pressupõe o arranque e a reconversão da vinha, prevendo uma verba total de -75 milhões de ECU só para Portugal - mais uma vantagem de não ficarmos sujeitos aos fundos comunitários comuns a todos os países. Espero dar resposta a esta proposta da Comissão ainda durante o corrente mês e no próximo mês de Abril ter esse regulamento aprovado e em funcionamento. Ele ainda não se encontra aprovado não por atrasos nossos mas porque só agora é que a Comunidade respondeu à proposta inicial que lhe fizemos há vários meses.
No que diz respeito à reconversão da agricultura, trata-se, na realidade, de um verdadeiro problema daí a importância que sempre demos a todos os problemas estruturais da reconversão. Teremos, efectivamente, de deixar de produzir todos aqueles produtos que existem em excesso na Comunidade e relativamente aos quais, portanto, teremos dificuldade em concorrer com os outros países da CEE. Estou a referir-me concretamente aos sectores onde a nossa produtividade é demasiadamente baixa e não tem possibilidades de ser aumentada. Daí a grande importância que damos aos programas estruturais de apoio à reconversão da agricultura.
O Sr. Deputado Raul Castro falou do choque da adesão de Portugal à CEE, mas gostaria de chamá-lo à atenção para um aspecto que nem sempre foi devidamente esclarecido: é que somente cerca de um terço dos produtos agrícolas nacionais tem preços superiores aos da Comunidade. Há, portanto, dois terços desses produtos, desde os frutos, ao azeite, ao girassol, etc., que vão ser beneficiados pela própria adesão à Comunidade.
Portanto, muitas vezes fala-se na agricultura e no impacto da adesão quando se está a referir a apenas cerca de um terço dos produtos agrícolas nacionais. É evidente que são produtos importantes - são os cereais, o leite e a carne bovina -, mas no produto agrícola bruto representam apenas um terço do total. Referi que vamos apresentar em Abril sete projectos, mas muitos . mais vão ser apresentados ao longo do tempo, na medida em que temos projectos de investigação agrícola em muitos outros sectores. O que disse foi que já no próximo mês de Abril iremos apresentar sete desses projectos, mas não esgotaremos, de maneira nenhuma, o número de projectos que iremos apresentar. Relativamente à modernização da agricultura, o próprio Regulamento n.º 797, de apoio às explorações agrícolas, em que a Comunidade dá cerca de 50% a fundo perdido para muitos investimentos, é o instrumento mais. poderoso de ajuda à modernização e à reconversão das próprias explorações agrícolas. Como ,disse, o PEDAP tem uma função estruturante de investimentos base, que, em geral, estão a cargo dos Estados membros, dando a Comunidade uma comparticipação.
Quanto aos organismos de coordenação económica, embora não tenha presente neste momento a redacção actual do texto, posso dizer que aquilo que está na mente do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação é a extinção e ou a reconversão desses organismos. Na realidade, alguns dos organismos de coordenação económica deixaram de ter funções que justifiquem a sua existência.
Posso dar-lhe o exemplo do IAPO, que hoje, com a liberalização das importações de oleaginosas, deixou de ter razão de existir. Contudo, existem outros organismos que têm funções importantes e que não vão ser extintos. Refiro-me, por exemplo, à própria Junta Nacional dos Produtos Pecuários que tem toda uma função na incentivação da rede nacional de abate, tendo mesmo grande parte dos mercados de gado, e que sofrerá uma reconversão e não uma extinção. E quem diz a Junta Nacional dos Produtos Pecuários diz outros organismos, relativamente aos quais não se fará a extinção.

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20 DE MARÇO DE 1986 1643 De qualquer modo, tudo isto será feito planeada e atempadamente e o Sr. Deputado pode
crer que os interesses daqueles que trabalham nesses sectores serão devidamente acautelados, não havendo qualquer ideia de
despedir pessoas nesses sectores, como muitas vezes tem sido propagandeado. Ao Sr. Deputado António Barreto quero
agradecer as referências que fez e, desde já, dizer-lhe que, por me faltar tempo, não irei referir as dificuldades existentes quanto
ao rendimento de referência. Amanhã, na reunião da Comissão de Agricultura e Mar, convocada, a meu pedido, para
discutirmos e apresentarmos a posição que iremos defender em Bruxelas na próxima semana, terei oportunidade de vos
explicar a gravidade do diferendo que, neste momento, existe com a Comunidade a esse respeito. No entanto, estou certo de
que iremos ultrapassar este problema, porque se não o fizéssemos isso seria demasiadamente grave para a agricultura
portuguesa. Já temos ultrapassado problemas tão ou mais complicados do que estes e, portanto, estou perfeitamente optimista
em relação a esta questão. No que diz respeito à formação profissional e ao ensino médio agrícola, posso dizer que, tal como
fizemos no ano passado, estamos neste momento em negociações com o Ministério do Trabalho e Segurança Social para que,
de certa forma, haja uma acção conjunta e coordenada de formação profissional. No ano passado tivemos um apoio de 500
mil contos por parte do Instituto de Formação Profissional daquele Ministério para acções de formação no campo da
agricultura e até a este momento já tivemos várias reuniões. Posso dizer-lhe que iremos intensificar a formação profissional e
que estou 10001o de acordo consigo quando diz que a reconversão da agricultura tem de ser feita com agricultores bem
formados e que isso implica um grande esforço neste sector. Estamos preocupados com isso e temos tido várias reuniões de
trabalho com o Ministério do Trabalho e Segurança Social para resolvermos o problema. Relativamente ao problema das UCP
não há nada que as impeça de terem acesso aos fundos da Comunidade. Os acessos têm de ser feitos em função das empresas
e explorações agrícolas e, à medida que as cooperativas satisfaçam estes requisitos, terão acesso a esses fundos. Se houver
dificuldades, seremos os primeiros a tentar ultrapassá-las. Quanto às consequências da adesão, levaria bastante tempo a falar
sobre essa matéria. Diria apenas que, não sendo excessivamente liberais - e, por princípio, sou um convicto defensor da
economia de mercado no sector da agricultura, montámos, pela primeira vez, em coordenação com o Ministério das Finanças,
um Instituto Nacional de Garantia Agrícola com recursos financeiros muito importantes, exactamente para que o Estado possa
intervir e não deixe o mercado dos produtos agrícolas flutuar ao sabor somente das forças de mercado. Estamos preocupados
com essa situação e não deixaremos de actuar quando necessário. O Sr. Deputado Neiva Correia falou nos incentivos fiscais e
no imposto sobre a indústria agrícola. Posso informá-lo de que a posição que o Ministério da Agricultura, Florestas e
Alimentação tomou no ano passado se mantém na íntegra no corrente ano. Entendemos que não há qualquer razão para que a
actividade agrícola não seja onerada pelo imposto sobre a indústria agrícola, desde que este imposto seja aplicado de acordo
com as características do sector agrícola português. Na proposta que estudámos no ano passado entendemos que aquilo que
tinha sido apresentado não estava adaptado à realidade da indústria agrícola e, por isso, propusemos o seu adiamento. Neste
momento, estamos a trabalhar em conjunto com o Ministério das Finanças para tentarmos encontrar uma fórmula que traduza a
realidade agrícola portuguesa. Se não conseguirmos encontrar essa fórmula, então manteremos a posição que referi de não
estarmos de acordo com a introdução de um imposto que, por ser derivado da contribuição industrial, não tem, muitas vezes,
aplicação, nem correspondência com a realidade agrícola do nosso país. Todavia, quero chamar-lhe a atenção para o facto de
todos estes esquemas comunitários - quer o Regulamento n.º 355/77 quer o Regulamento n.º 497- constituírem um fortíssimo
incentivo financeiro para muitos projectos. Há subsídios de 5001o a fundo perdido que vão permitir uma larga capacidade de
autofinanciamento neste sector que não existia até este momento. Sobre o problema do IVA não vou alargar-me muito. Direi
apenas que já tive ocasião de transmitir ao Ministério das Finanças que, num ou outro produto agrícola, me pareceu que a
aplicação do IVA deveria ser reconsiderada. Refiro-me, por exemplo, ao sector do vinho, onde me parece que a
discriminação, em termos de aplicação do IVA, entre vinho a granel e vinho a não granel, só por si, cria distorções que vão no
sentido contrário daquilo que deve ser a política portuguesa de reforço de qualidade. Digo isto porque é através dos vinhos de
qualidade que temos de concorrer na Europa e a aplicação do IVA, tal como foi feita, vai precisamente no sentido inverso. A
mesma discriminação acontece em relação aos queijos, sendo uns objecto de aplicação daquele imposto e outros não. Estamos
a trabalhar com o Ministério das Finanças sobre estes problemas e não deixaremos de os levar em linha de conta na revisão da
aplicação do IVA. No que diz respeito à intervenção, ela já foi anunciada há cerca de um mês. Trata-se de 500 mil hectolitros
de vinho e, para essa intervenção, o Fundo de Garantia Agrícola irá comparticipar com cerca de 850 mil contos, a fim de se
fazer o suporte dos preços. Ao Sr. Deputado Andrade Pereira quero dizer que, realmente, há critérios de distribuição
geográfica. Tentou-se encontrar uma fórmula que, de certa maneira, entrasse em linha de conta não só com o nível de
ocupação mas também com a taxa de desenvolvimento e com a própria formação dos diversos agricultores. Ainda não
tomámos uma decisão final relativamente a essa fórmula, mas posso dizer-lhe que, simultaneamente com os trabalhos de
afinação do Regulamento n.º 797, temos tido essa preocupação, no que diz respeito não só a este regulamento como também à
própria aplicação do PEDAP. Tratando-se de um trabalho dirigido às infra-estruturas, entendemos que deve ser aplicado nas
zonas mais carenciadas e onde essas infra-estruturas foram durante muito tempo abandonadas. Daí a nossa preocupação, e
pode estar certo de que terei o maior prazer em fornecer à Comissão de Agricultura e Mar os estudos que estão a ser feitos
sobre esses critérios de distribuição e sua aplicação.

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1644 1 SÉRIE - NÚMERO 47






Aplausos do PSD e do CDS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para intervir, o Sr. Deputado Armando Fernandes.
Entretanto, solicito ao Sr. Vice-Presidente Carlos Lage que me substitua na presidência da Mesa e convido os representantes dos grupos parlamentares a dirigirem-se ao meu gabinete, a fim de termos uma breve reunião.

O Sr. Armando Fernandes (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo:
Desde sempre a cultura e tudo quanto lhe está adjacente tem merecido uma, mais que débil atenção por parte do Poder.
Episodicamente, assistimos a um ou outro acto mais relevante no campo cultural, funcionando na maioria das vezes como uma ilustração do próprio Poder, tal como a pluma de um chapéu tirolês, mas, no essencial, a cultura em Portugal fez e faz papel de parente pobre, sendo-lhe atribuído sempre os desperdícios do banquete do Orçamento. E não fugindo à regra do bom andamento apaziguador da má consciência governamentalizante, propõe-se para o ano de 1986 a verba de 5 798 749 contos destinada aos pendões rotos da triste festa da Secretaria de Estado da Cultura, correspondendo a 0,35% do estandarte triunfal do Orçamento do Estado. É a mesma percentagem de 1980 e 1983, é inferior à percentagem dos anos de 1981 e 1982, 0,42 % e 0,41 % do Orçamento do Estado, respectivamente.
Isto é, quanto mais se anda para a frente na cronologia, sempre acompanhada com as taxas de inflação de todos conhecidas, mais se caminha para trás no investimento cultural, o que, numa lógica de ironia, está perfeitamente correcto: com o progredir dos tempos chegar-se-á à não atribuição de qualquer verba à cultura, porque a cultura ... não tem preço.
O respeito pela cultura portuguesa continua a estar em perigo, o que significa que o homem português continua a ser truncado, mormente no momento em que temos de defender a nossa identidade contra os embates da aculturação (como, de resto, a bancada do PRD já lembrou nesta Câmara). . Os desafios são muitos e ou nos capacitamos dessa asserção, e encontramos os mecanismos para combater o estado de crise, ou então esperamos um horizonte onde irremediavelmente seremos um tímido crepúsculo ofuscado por outros países membros da CEE mais poderosos, mais clarividentes e com uma política cultural virada para uma contínua expansão. Vejam-se os exemplos da França e da Espanha. Saiba-se que uma civilização se salva pela cultura, ou não se salva.
Se em relação a 1985 (efectivamente, um ano onde mais um governo continuou a não dar grande relevo à política cultural -0,29% do Orçamento do Estado) pode considerar-se de algum modo significativo o au-

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20 DE MARÇO DE 1986

mento da verba consignada à Secretaria de Estado da Cultura para o ano corrente; o aumento é de 49 % em relação a 1985. Mesmo assim, como é óbvio, estamos longe de atingir o limite mínimo e honrado para se começar a encarar séria e definitivamente o problema cultural português; ou, dito de outra maneira, temos um Orçamento incapaz de corresponder à dinâmica das motivações primeiras para o acesso à cultura e também às justas expectativas dos cidadãos em geral e dos agentes culturais em particular. Com efeito, o Orçamento agora apresentado obriga-nos a tecer algumas considerações.

Primeiro, o problema de maior acuidade prende-se com a defesa e a expansão da língua portuguesa, não só junto das comunidades portuguesas e dos países de expressão portuguesa, como também junto de outros países, especialmente os da CEE.
É a língua o maior e mais poderoso instrumento para definirmos a nossa presença, porque ela é a matriz de mundividência, tradição, e onde ela se falar cumpre-se sempre uma parte de um processo cultural de que ela é o dinamizador contínuo de causa e efeito. A nossa língua está a perder presença na formação dos nossos concidadãos, nas jovens repúblicas africanas de expressão portuguesa e, como caso limite, nos antigos territórios que formavam o Estado da índia.
É de referir ainda a invasão das linguagens da informática, com códigos sincopados e estrangulados, expressando-se unicamente em inglês.
No Orçamento do Estado propõe-se para defesa e expansão da língua portuguesa no País e no estrangeiro a quantia de 61 500 contos. Só um pequeno exemplo demonstra o ridículo desta verba: tomando como preço médio de um livro o valor de 1000$ com 61 500 contos compram-se 61 500 livros.
Se só a população portuguesa é constituída por 10 milhões de habitantes, quantas páginas de um livro cabem a cada cidadão de Portugal?
A frieza dos números é o comentário que chega; outros comentários serão supérfluos.

Segundo, outro problema de grande acuidade, e que vem na sequência directa do enunciado no ponto anterior, prende-se com a leitura pública em Portugal.
É um dado adquirido não ser possível a transformação da mentalidade, e portanto da nação, sem existirem correctos, profundos e arreigados hábitos de leitura; em Portugal, não se lê, ou lê-se mal, ou lê-se pouco e o público leitor tende a ter cada vez mais as características de seita. Não fosse a acção da Fundação Calouste Gulbenkian (que por motivos óbvios não adjectivamos), que criou, mantêm e está a reforçar a sua rede de bibliotecas itinerantes e fixas, e o caos seria completo.
Neste e noutros aspectos, a Fundação Calouste Gulbenkian se é causa do nosso gáudio é simultaneamente vergonha da nossa miséria, já que ela não tem funções de Estado.
Sabem-no os países escandinavos, cuja rede de leitura é exemplo de caminho certo, que não desperdiça recursos nem dinheiro (a não ser que os tecnocratas pensem que os países nórdicos são subdesenvolvidos).
Entre nós só agora a Secretaria de Estado da Cultura fala na criação de um grupo de estudo para a criação de uma rede de leitura pública em Portugal. Se aplaudimos de mãos ambas esta decisão da Secretária de Estado, pessoa preocupada com este e outros problemas de âmbito igual, não podemos deixar de manifestar a nossa estranheza pela verba atribuída para a promoção e difusão do livro e animação de bibliotecas e centros de leitura: 40 000 contos.

Comentários para quê!

Terceiro, na sequência dos pontos anteriormente focados surge a situação deprimente da política do livro.
Enquanto a Espanha, por exemplo, é desde 1981 o 5.º país no mundo no ranking de títulos publicados, com mais de 30 000 títulos/ano e está em 4.º lugar na lista das exportações.
Mas, tendo em conta a relação produto interno bruto/exportações, a Espanha ocupa o 1.º lugar no mundo, conforme relatório n.º 155/85, da Secretaria de Estado da Cultura de 5 de Dezembro. Embora nem sequer se possuam dados rigorosos e actualizados sobre o caso português, sabemos ser a nossa situação descoordenada, nebulosa, enfim, inclassificável. No relatório já citado, rigoroso dentro do possível, e em face dos dados disponíveis, apontam-se soluções capazes de combater a crise editorial vivida em Portugal.
As soluções são de fácil execução, elas podem resolver, em parte, muitos dos problemas que atingem autores, editores, livreiros e cidadãos em geral, mas para isso é necessário que haja vontade. Ora, também neste aspecto se verifica estar orçamentada para o «apoio à edição de reconhecida utilidade literária» e «apoio ao estudo de obras clássicas e contemporâneas» a dotação de 62 000 contos.
Comentário perante esta verba; só caricaturando: se um bolo de arroz custa 30$, a verba para a política editorial dá para comprar 1 860 000 bolos de arroz, o que significa que num dia um décimo da população portuguesa podia comer quase dois bolos de arroz!

O desarmamento cultural é uma realidade e um objectivo deste Orçamento.

Aplausos do PRD, do PS, do PCP, do MDP/CDE e da deputada independente Maria Santos.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Luís.

O Sr. Joaquim Luís (PSD): - Sr. Deputado Armando Fernandes, foi com muito interesse que ouvi a sua intervenção e sobre ela gostaria de lhe colocar a seguinte questão: se bem entendi, globalmente a sua apreciação é extremamente negativa em relação ao capítulo do Orçamento do Estado relativo à cultura. No entanto, tive oportunidade de ler no Jornal de Artes, Letras e Ideias, dirigido por um seu companheiro de bancada, uma apreciação genericamente positiva, pelos menos quanto ao global das verbas atribuídas ao orçamento da cultura. Gostaria que me explicasse se a sua posição é unicamente pessoal ou se traduz a posição do grupo parlamentar em que se integra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Fernandes, para responder.


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1646 1 SÉRIE - NÚMERO 47 cultura, mas que, para atingirmos o limite mínimo de um trabalho profundo e culturalmente
objectivo, não é com cerca de 6 milhões de contos que se vai lá. Foi isso o que disse. Mais a mais, no meu grupo parlamentar
não confundimos o essencial com o acessório, Sr. Deputado? O Sr. Presidente: - Para intervir, tem a palavra o Sr. Deputado
Lobo Xavier... O Sr. Lobo Xavier (CDS): - Sr. presidente, Srs. Deputados, Srs. Membro do Governo: Quando nos detemos
sobre as circunstâncias que rodeiam a discussão deste Orçamento apetece dizer que muita coisa mudou. Mudou, segundo
cremos, a forma de encarar os grandes problemas das finanças públicas e da economia portuguesa. - Por um lado, vimos no
parecer da Comissão de Economia, Finanças e Plano - aliás de um rigor e de uma perfeição técnica que nos apraz registar -
que 'se perderam alguns complexos no tratamento de questões controversas como a da situação do sector empresarial do
Estado. Por outro lado, reparávamos, há pouco, num debate sobre a esquerda portuguesa reproduzido num semanário que ela
própria sente o imperioso de assumir a necessidade do recuo do Estado em matéria de intervenção económica. Não iremos tão
longe como alguns que, perante a aceitação do recuo do Estado por aqueles que sempre defenderam o seu avanço, afirmam
que há uma perda de identidade da esquerda. Diremos simplesmente «bem-vindos» ao campo da livre empresa ,e das
liberdades económicas! Tem sido abundantemente glosada nesta Câmara a questão da conjuntura internacional que envolve
este Orçamento. De facto, para um país pequeno e dependente, com um elevado nível de endividamento, a descida do dólar e
do preço do petróleo são factores altamente estimulantes. Num ponto, no entanto, concordamos com o Governo: é preciso
prudência na gestão deste plus. Sem querermos parecer alarmistas, julgamos que se corre o risco de grandes desestabilizações
da economia internacional, se não mesmo, mais concretamente, de uma grave crise do sistema monetário internacional. Por ser
assim, em lugar de se clamar pela distribuição dos benefícios oriundos daquela conjuntura, o Governo deve optar por libertar a
economia, quer através da redução do nosso endividamento, quer ainda através do afrouxamento da carga que pesa sobre
empresas e famílias. Dir-se-ia, assim, que, enquanto a esquerda se está a tornar liberal, aqueles que defendem as liberdades
económicas estão a tornar-se prudentes. O Sr. Ministro das Finanças falou aqui de rigor. Nós esperamos que o rigor de que
fala se trate de rigor com liberdade económica e que se não trate do rigor socialista que o sector privado teve de pagar. Não
deixa, no entanto, de se revelar como 'assustador o nível previsto de despesas públicas. Nota-se, é certo, uma grande
preocupação com o realinhamento dessas mesmas despesas, como é demonstrado pela intenção de investimento público com
vista ao relançamento do sector privado. Apesar de tudo, no entanto, para além de não absolvermos todo e qualquer
investimento público, as despesas de capital constituem ainda uma percentagem reduzida das despesas totais. Julgamos que
quanto mais se actua sobre o lado das despesas, mais as políticas de relance tradicionais perdem eficácia, quer porque os
impostos se tornam insuportáveis, quer porque os agentes económicos tendem a escapar-se do campo institucional das
políticas económicas. Vemos, assim, apreensivo o crescimento anual das massas orçamentais, que podem transformar os
orçamentos em autênticos instrumentos de agressão, em vez de instrumentos de relance ou de regulação. E não vemos como,
no futuro, esta tendência possa ser invertida pelo carácter cada vez menos elástico de cada nova despesa. Pela nossa parte, já
não acreditamos que a alternativa entre crescimento ou diminuição das despesas públicas corresponde realmente à alternativa
entre igualdade e liberdade. Estamos antes convencidos de que a redução de peso deste «estado permanente» pode, a um
tempo, trazer mais igualdade e mais liberdade. Por outro lado, parece ser importante para o Governo estimular a poupança e o
investimento. Mas a verdade é que quanto mais crescem as despesas públicas, mais têm de crescer os impostos, com a
consequente redução da poupança e do estímulo ao consumo imediato. Do nosso ponto de vista, portanto, o montante do
défice é ainda muito preocupante. É que, embora concordemos com, alguns dos objectivos do Governo e estejamos dispostos
a fazer obstáculo a qualquer aumento deste défice e da despesa global, preferíamos, com certeza, utilizar outros meios.
Preferíamos, de certo - sendo reconhecido, como já foi nesta Câmara, o diminuto multiplicador das despesas públicas em
Portugal -,actuar no sentido da redução da carga fiscal que recai sobre as famílias e as empresas e dos custos de produção
destas últimas, em vez de aumentar a despesa. No domínio das receitas fiscais, há, também, vários comentários a fazer. De
resto, verifica-se aqui um certo círculo vicioso: quanto mais aumentam os impostos mais se desincentiva o trabalho, sendo a
diminuição dos rendimentos fiscais suportada por aqueles que apesar de tudo ainda continuam a trabalhar. Cremos, em
primeiro lugar, que enquanto as receitas de alguns dos impostos directos, segundo parece, se encontram subavaliados, as
receitas previstas quanto ao IVA enfermam exactamente do vício contrário, o que vem aumentar os nossos receios sobre o
futuro agravamento do défice ao longo deste exercício orçamental. Aliás, estas nossas preocupações são acrescentadas pelo
facto de estarem em risco as despesas comunitárias a favor de Portugal. Em. segundo lugar, é bem verdade que seria esperar
muito pensar que, com a aprovação deste Orçamento, grandes melhorias iriam ser introduzidas no sistema fiscal português. Ao
contrário, no entanto, encontramos poucas benfeitorias e notamos a persistência de algumas distorções evidentes. ' Assim,
enquanto o Parlamento se manifesta preocupado com a defesa das suas competências financeiras - como se viu, recentemente,
no caso dos combustíveis -, a correcção proposta pelo Governo dos efeitos da inflação sobre o sistema fiscal será, porventura,
apenas timidamente eficaz, o que nos faz temer que estejamos perante uma autêntica omissão legislativa que diria quase
inconstitucional. . Revoga-se, ainda, a suspensão do imposto sobre 'a indústria agrícola e do imposto complementar

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20 DE MARÇO DE 1986 1647 - Secção B -, tanto num caso como noutro incorrendo em manifesta e insuportável
rectroactividade. Acresce que, no último caso referido, se incide numa dupla tributação que julgávamos definitivamente
afastada. Mantêm-se vários adicionais, altamente distorsores e injustos, que temos sempre combatido nesta Câmara. Persistem
também vários impostos extraordinários - que o eram porque destinados a vigorar apenas num único período orçamental -,
que, no seu conjunto - pasme-se! fornecem mais receitas ao Estado do que o imposto complementar. Entre estes conta-se a
reintrodução do imposto sobre certas despesas das empresas, claramente rectroactivo e inexplicável, pois as despesas - já o
dissemos - ou são custos, não devendo por isso ser tributados, ou não o são, pertencendo à base tributável da contribuição
industrial. A desproporção entre as receitas previstas quanto aos impostos directos e indirectos, favorável a estes últimos,
apesar de justificada pela introdução do IVA, não deixa de ser menos preocupante pela injustiça que fatalmente lhe está
implícita. Finalmente, a alusão à tributação dos titulares de cargos políticos e função pública parece-nos demagógica e mesmo
provocatória se não for acompanhada, obviamente, da explicação das circunstâncias em que ocorrerá. Sr. Presidente, Srs.
Deputados: Reconhecemos, assim, neste Orçamento, vários aspectos louváveis e muitos outros preocupantes. Oxalá o
Governo seja profético no seu optimismo e que tudo quanto aplaudimos se realize, e tudo quanto tememos não venha a
verificar-se. Aplausos do CDS. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, somos chegados à hora regimental para o intervalo, pelo
que declaro suspensa a sessão até às 18 horas. Eram 17 horas e 30 minutos. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta
a sessão. Eram 18 horas e 15 minutos. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de conceder a palavra ao Sr. Secretário de
Estado da Juventude, gostaria de lhes fornecer algumas informações: ontem e hoje já realizámos 9 horas e 15 minutos de
debate, faltando ainda 10 horas. Os trabalhos decorrem em bom ritmo, e é assim possível eliminar o trabalho nocturno previsto
para hoje, prolongando a sessão, ininterruptamente, até às 21 horas. Creio que é uma boa notícia para todos. Tem a palavra
para uma intervenção o Sr. Secretário de Estado da Juventude. O Sr. Secretário de Estado da Juventude (Couto dos Santos):
- Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com regozijo e satisfação que se torna hoje possível reconhecer, no âmbito do Orçamento
do Estado, as principais linhas orientadoras e definidoras de uma política de juventude, que visam consagrar as vertentes mais
importantes para os jovens: informação, participação, cooperação e pragmatismo. A importância crescente desta realidade
social que é a juventude, na verdadeira dimensão dos seus problemas, mas também das suas potencialidades, impõe que se dê
expressão, ao nível do Estado, à preocupação de criar mecanismos enquadradores e reguladores que estejam de acordo com
as expectativas dos jovens. A criação da Secretaria de Estado da Juventude constitui já, em grande parte, essa expressão. Mas
expressa também a convicção de que a problemática da juventude não é susceptível de redução a uma qualquer soma de
políticas sectoriais, tal como se não compadece, pela vastidão das áreas que abrange, com a constituição de qualquer estrutura
vertical ao nível do Estado. A criação da Secretaria de Estado da Juventude reflecte, portanto, a consciência de que o
tratamento da problemática dos jovens, no âmbito de uma política da juventude, tem necessariamente de assumir um cariz
global e integrado, ou seja, horizontal. Estamos certos de que só nesta perspectiva será possível encontrar as melhores
soluções para a diversidade e multiplicidade de problemas que envolvem a condição da juventude. O Sr. Carlos Coelho
(PSD): - Muito bem! O Orador: - Os jovens conhecem hoje novas dificuldades de integração social que derivam grandemente
de conjunturas económicas adversas, mas que decorrem ainda de um conjunto de circunstâncias bem conhecidas. Os
problemas no mercado de emprego, os condicionalismos que se verificam na transição da escola para a vida activa, com
especial incidência na falta de saídas profissionais, ou inclusivamente as insuficiências no domínio da habitação, são realmente
condições negativas à integração social do jovem e que obstam naturalmente à valorização e desenvolvimento das
potencialidades da juventude. E não podemos dissociar esta ideia das próprias necessidades de desenvolvimento do nosso
país. Empenhamo-nos hoje num redobrado esforço de mudança e de modernização que seja capaz de revitalizar o nosso
tecido social e que nos permita acompanhar a senda da evolução das sociedades europeias. E, Sr. Presidente, Srs. Deputados,
não poderemos por isso prescindir ou desprezar aqueles que são um dos nossos melhores recursos humanos. Com efeito, os
jovens constituem um elevado potencial de inteligência, de capacidade criativa e inovadora, que aceita a flexibilidade, a
mobilidade e o risco. Ora são estes precisamente os factores que se perspectivam determinantes na evolução das sociedades
modernas. E aqui reside a importância e a oportunidade de levar à prática uma política global e integrada de juventude. O Sr.
Carlos Coelho (PSD): - Muito bem! O Orador: - Nesta perspectiva, a tradução deste objectivo no Orçamento da Secretaria
de Estado da Juventude encontra-se expressa em algumas linhas de força: A primeira diz respeito à implementação efectiva dos
serviços que a nível do Estado, e de forma continuada, possam garantir a recolha, o tratamento e a divulgação da informação e
dos dados base relativos a questões de juventude. Nesta área, salientamos os projectos relativos à constituição da
Direcção-Geral da Juventude, da Base de Dados de Juventude, dos estudos sociológicos de base já em curso e da
institucionalização de centros de documentação e sistemas de difusão da informação.

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Estes projectos, cujos resultados devem constituir a base sobre a qual lançaremos as acções do futuro, correspondem a
um esforço financeiro de cerca de 450 000 contos, incluídos nas propostas de orçamento e PIDDAC em poder dos Srs.
Deputados. A segunda linha de força, e não obstante as carências de informação de todos conhecidas, respeita aos problemas
mais candentes que hoje afectam a plena realização humana e pessoal dos jovens e que comprometem a sua inserção social.
Estão, neste caso, as medidas muito recentemente tomadas pelo Governo sobretudo no que diz respeito a estímulos ao
primeiro emprego e à habitação para jovens. Em termos efectivos, reflectem esta preocupação o programa O Jovem e as
Tecnologias de Informação e o programa Novas Oportunidades aos Jovens. Estes programas serão acompanhados de alguns
outros que decorrerão sob a tutela dos Ministérios da Educação e Cultura - caso do programa Minerva do Trabalho e
Segurança Social - através de acções em preparação no Instituto do Emprego e Formação Profissional -, e da Secretaria de
Estado da Investigação Científica -, pela imposição de quotas mínimas de projectos de investigação para jovens. Serão
complementarmente lançadas iniciativas de carácter experimental, como é o caso do programa Ateliers para Jovens, sob a
responsabilidade das Secretarias de Estado da Juventude e da Investigação Científica. No plano da agricultura, onde urge
renovar o tecido económico e social, pensa o Governo apoiar a instalação de jovens agricultores através de estímulos de
carácter técnico, financeiro e de formação. O respectivo programa encontra-se nas propostas de orçamento e PIDDAC do
Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, conforme os Srs. Deputados certamente terão visto. Programa similar está
previsto .para o sector industrial com relevo na inserção de jovens quadros e técnicos em pequenas e médias empresas, o que,
para além de constituir uma vertente da política de juventude, contribuirá para a modernização deste sector fundamental para a
nossa economia. . A terceira linha de força do programa a executar em 1986 procura responder à necessidade imediata de
ocupação de tempos livres para jovens, através de duas acções. Uma delas procura proporcionar aos jovens uma experiência
profissional que lhes permita a descoberta de vocações profissionais. A outra, que corresponde mais genuinamente ao conceito
de ocupação de tempos livres, é composta por um conjunto de projectos de que se destacam os levados a cabo no domínio
do ambiente, nomeadamente na animação de parques e reservas naturais e o programa Férias Desportivas. No conjunto destas
iniciativas serão investidos 620 mil contos. Finalmente, está já em preparação um conjunto diversificado de projectos,
procurando responder a algumas solicitações suscitadas pelas associações de juventude, pelas autarquias, e por iniciativas de
cooperação internacional, abrangendo sectores tão diversos como o turismo juvenil, o desporto, o intercâmbio com países de
expressão portuguesa, ou a abertura dos primeiros centros de juventude. Sr. Presidente, Srs.
Deputados: o programa que agora apresentamos é simultaneamente ambicioso e limitado. É ambicioso na medida em que os
programas previstos pressupõem iniciativas em áreas muito diversas, o que aliás se justifica pela própria essência da Secretaria
de Estado da Juventude. B ambicioso ainda porque sendo a primeira vez que tais circunstâncias se verificam não estão ainda
criados nem a estrutura nem os mecanismos necessários à sua implementação. É um programa limitado porque a carência de
dados de base, que ficou demonstrada nos documentos produzidos durante o Ano Internacional da Juventude, impede que se
apresentem a esta Câmara, com realismo e rigor, outros projectos que, embora oportunos, estariam forçosamente carenciados
da indispensável fundamentação. Pensamos que o problema da juventude é uma das mais sérias questões que a sociedade
portuguesa tem de resolver num futuro imediato. O programa que agora é submetido à apreciação dos Srs. Deputados traduz
uma nova visão da política de juventude e constitui o primeiro passo para a sua implementação. Aplausos do PSD. O Sr.
Presidente: - Inscreveram-se para formular pedidos de esclarecimento os Srs. Deputados Ana Gonçalves, António Tavares,
Jorge Patrício, Miguel Relvas, José Apolinário e Carlos Coelho. Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Gonçalves. A Sr.ª Ana
Gonçalves (PRD): - Sr. Secretário de Estado da Juventude, na parte das grandes opções do Plano relativa à juventude
referem-se várias condicionantes que, na opinião do Governo, impedem a definição de uma política de juventude. Considera o
Governo que é necessário esperar por estatísticas completas e análises sociológicas rigorosas para então actuar? Keynes disse:
«a longo prazo os pobres estão mortos». A frase foi glosada em 1968 dizendo-se que «a médio prazo os jovens estão velhos».
Não correremos esse risco, Sr. Secretário de Estado, se o Governo estiver à espera dessas análises sociológicas e dessas
estatísticas? Considera que a falta desses elementos de caracterização do universo dos jovens impede que o Governo enfrente,
desde já, os clamorosos problemas da juventude, nomeadamente o primeiro emprego, o problema da habitação, o baixo
rendimento escolar, o abandono prematuro do sistema escolar, a marginalidade e criminalidade juvenis, a vulnerabilidade à
droga, etc.? Pensa ou não o Governo articular, sob a óptica de uma política de juventude cometida à Secretaria de Estado
respectiva, a gestão de todas as verbas que se encontram dispersas por diversos programas do PIDDAC para, por exemplo, a
formação profissional, a agricultura e o apoio a jovens agricultores, a habitação, etc., que têm directamente a ver com a
juventude? Em relação a este ponto, devo dizer que o Sr. Secretário de Estado nos trouxe elementos novos e que, portanto, já
terá respondido, em parte, a esta questão. Ainda em relação à formação profissional, pode o Sr. Secretário de Estado explicar
como, por quem e com que critérios vão ser geridas as verbas inscritas no Orçamento do Estado?

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Como justifica o Sr. Secretário de Estado as verbas manifestamente exíguas da Secretaria de
Estado da Juventude e a falta de ambição nas opções do Plano? Aquelas que podiam ser verdadeiras opções com alcance
significativo - e refiro-me às medidas no sector do ensino e diminuição do desemprego juvenil são citadas em último lugar nas
grandes opções do Plano, como vagas intenções de estudo e propostas de vagas medidas. Porquê, Sr. Secretário de Estado?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Tavares. O Sr. António Tavares (PSD): - Sr. Secretário de Estado
da Juventude, ouvi com atenção a sua intervenção e gostaria de sublinhar a importância, para este debate sobre o Orçamento
do Estado, de ouvirmos o titular da Secretaria de Estado da Juventude expor as principais linhas orientadoras e definidoras de
uma política de juventude, num tempo em que a componente económica e a integração social tantas dificuldades levantam aos
jovens, em Portugal. Neste âmbito, gostaria de lhe colocar duas questões. A primeira é a seguinte: sabe V. Ex.` que nesta
Câmara nos batemos sempre pela necessidade de existir um programa de ocupação de tempos livres, não só durante o
período de férias escolares, mas, também, durante todo o ano. Se na Comissão Parlamentar de Juventude nos sentimos
esclarecidos quanto às verbas apontadas para este projecto, entendemos, contudo, ser útil à Câmara, que V. Ex.ª nos
esclareça sobre qual o seu âmbito. A segunda questão, Sr. Secretário de Estado, relaciona-se com uma parte do seu discurso
em que V. Ex.º falou do intercâmbio com os países de expressão portuguesa, mas não fez qualquer referência aos programas
da juventude, ao nível da Comunidade Económica Europeia. Gostaria de saber quais os programas consagrados para esse fim
e qual a actuação concreta da Secretaria de Estado da Juventude, neste domínio, no sentido de podermos aproveitar, da
melhor maneira, essas mesma verbas que são colocadas pela CEE ao dispor do nosso país. Vozes do PSD: - Muito bem! O
Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Patrício. O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Sr. Secretário de Estado da
Juventude, antes de lhe colocar as perguntas que pretendo ver esclarecidas gostaria de lhe dizer o seguinte: não é a primeira vez
que, na Assembleia da República, ouvimos membros do Governo subirem à tribuna e falarem sobre as questões juvenis.
Estamos fartos de palavras - não é a primeira vez, repito -, e, certamente, o Sr. Secretário de Estado compreenderá que todas
essas palavras não nos dizem nada. Aquilo que é necessário que se faça é, exactamente, indicar quais são as medidas e, neste
caso do Orçamento do Estado, quais são as verbas que estão inscritas, no sentido de poder ser possível resolver os problemas
juvenis, tal como o Sr. Secretário de Estado da Juventude enunciou. Nestes termos, gostaria de lhe colocar a seguinte questão:
a Secretaria de Estado da Juventude tem afecta a si a verba de 450 000 contos. É evidente que o Sr. Secretário de Estado vai
dizer que existem mais verbas, noutros Ministérios, para dar resposta aos problemas da juventude. Recordo apenas ao Sr.
Secretário de Estado que enviou à Comissão Parlamentar de Juventude um mapa com algumas verbas, que somam cerca de 1
271 000 contos, dos quais 951 000 contos são do Ministério do Trabalho e Segurança Social, para um programa do INATEL
que não é só para a juventude. Podia dizer-me, então, que parte desta verba de 951 000 contos que atinge quase o milhão de
contos - está destinada à juventude, para eu poder ficar esclarecido? Relativamente à formação profissional, não basta ter
verba, é necessário saber quais são as acções, é necessário saber quem organiza a formação profissional e é necessário saber
quantos jovens vão por ela ser abrangidos. Mas isso o Sr. Secretário de Estado da Juventude não o disse. Aliás, ainda ninguém
do Governo nos disse quais são, efectivamente, as acções a tomar. Impõe-se que o Governo explique à Assembleia da
República quais são as acções de formação profissional a implementar, quem as vai organizar e quantos jovens vão ser
abrangidos, para podermos ter uma ideia clara daquilo que o Governo nos transmite. E mais: interessa saber igualmente para
que é essa formação profissional. É que não basta formar. Vão formar-se jovens para o desemprego ou para o em rego? Esta
é outra questão que importa esclarecer. que se se trata de formar para o desemprego, dizem-se palavras mas o problema não
fica resolvido. Neste sentido impõe-se, também, que o Governo explique qual é a política que vai adoptar no sentido de criar
novos postos de trabalho. Quais são e quantos são esses postos? 15so é que é necessário saber. Relativamente ao ensino, por
exemplo, porque razão é que no Ministério da Educação existe um decréscimo de verbas para o Apoio Social Escolar, quando
o Sr. Secretário de Estado da Juventude sabe que um dos problemas de base, no momento, é o de existirem centenas e
centenas, para não falar em milhares, de alunos que abandonam os estudos por incapacidade económica e que necessitam,
efectivamente, de um apoio? Este apoio, no Orçamento de Estado, é reduzido relativamente a 1985, ano em que já não chegou
nem mesmo para corresponder às necessidades. Portanto, falar-se da política de juventude, falar-se de um Orçamento de
Estado para a juventude não é apenas falar de números nem de intenções. É necessário que se explique quais são as acções,
quais são as medidas concretas que vão ser tomadas. O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem! O Orador: - Deixe-me
dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que não é com uma política global para a juventude que o consegue fazer. Ou seja, o Sr.
Secretário de Estado da Juventude daquela Tribuna faz um discurso, mas quem vai gerir as verbas não é o Sr. Secretário de
Estado da Juventude, quem vai gerir as acções não é o Sr. Secretário de Estado da Juventude. Como é que é possível, então,
o Sr. Secretário de Estado da Juventude vir aqui dizer que vai implementar uma política de juventude quando ela não passa
pela sua Secretaria de Estado? Vozes do PCP: - Muito bem!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Relvas. O Sr. Miguel Relvas (PSD):
- Começaria por felicitar o Sr. Secretário de Estado da Juventude pela sua intervenção e, essencialmente, pelo seu conteúdo.
Felizmente, ao contrário do que sucedeu ao Sr. Deputado Jorge Patrício, do PCP, fiquei esclarecido. Vozes de protesto do
PCP. No entanto, há aqui duas questões que gostaria de referir: constato, com agrado, a referência à criação de uma base de
dados de juventude, pois a que existe, neste momento, é escassa e dispersa e aqueles que entre nós mais se interessam sobre
esta problemática deparam-se, várias vezes, com grandes necessidades de informação. Mas não deve esta nova situação
traduzir-se em burocratização de sistemas e, assim sendo, agradecia ao Sr. Secretário de Estado que 'revelasse à Câmara
quais são as conexões que pensa estabelecer com outras instituições, como o Instituto Nacional de Estatística e as
Universidades? Outra questão que me parece ter tido bastante importância na sua intervenção e que gostava que fosse
aprofundada é a da criação da Direcção-Geral de Juventude. " ' Como não foi claro, até agora, qual seria a sua área de
intervenção gostaria que justificasse o investimento (aliás, pequeno) para a sua constituição e que explicasse também quais os
objectivos e o âmbito das competências de tal organismo? O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.
O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Secretário de Estado da Juventude, começo por dizer que; no geral, a sua intervenção não
trouxe nada de novo em relação àquilo que tem sido o discurso e a perspectiva de actuação seguidos pela Secretaria de
Estado; mas gostaria, contudo, de colocar algumas questões encarando o problema na perspectiva de uma Secretaria de
Estado de actividade horizontal em relação à política de juventude. Em primeiro lugar, a questão do emprego. Tem a Secretaria
de Estado programada alguma intervenção no processo de atribuição de apoios por via do Fundo Social Europeu e, assim
sendo, qual é a componente e qual é a percentagem de jovens, envolvidos nesses projectos? ' A segunda questão é a seguinte:
no âmbito - do Governo faz-se, continuamente, uma política de promoção e de propaganda em relação às actividades no
âmbito da juventude. Recentemente falou-se, por exemplo, da ocupação de tempos livres e do fomento ao apoio profissional
em relação aos jovens. A um requerimento que dirigi ao Sr. Secretário de Estado, foi-me respondido que a actividade de
ocupação de tempos livres tem uma verba de 575 OOO contos para movimentar 35 000 jovens e que o incentivo à formação
profissional tem uma verba do Fundo Social Europeu calculada em 180 000 contos, o que me parece, à partida,
manifestamente insuficiente para tanta publicidade e propaganda. Mas, já que o Sr. Secretário de Estado se referiu à conjuntura
económica e à necessidade de ter em atenção aspectos como o do emprego, coloco a seguinte questão: ' d que é que o
Governo pensa em relação à evolução do desemprego juvenil? Pensa o Governo que essa percentagem de desemprego dos
jovens pode baixar? Se sim, como? Por exemplo, pensa o Governo fazer a diminuição da taxa de desemprego dos jovens à
custa' da diminuição do tempo de serviço militar obrigatório, integrando mais jovens nas Forças Armadas? Sr. Secretário de
Estado, coloco ainda uma outras questão: no âmbito do Ministério da Justiça existe um serviço chamado Centro de Estudos e
Profilaxia da Droga que tem como funções a prevenção e a defesa dos jovens em relação à droga. Sabe qual é a verba
prevista segundo o Orçamento? É de 400 contos, Sr. Secretário de Estado. 15to é, perante uma questão social tão importante
em termos de juventude, o Governo- prevê, em termos financeiros, 400 contos para o' Centro de Estudos e Profilaxia da
Droga. Colocarei, finalmente, três questões muito breves: Qual é a política da Secretaria de Estado em relação ao Conselho
Nacional de Juventude? Gostaria de saber quais vão ser os apoios - a nível do FEOGA - em relação aos jovens agricultores,
ou se ficamos, apenas, com 400 contos para 100 jovens? Por último, qual é a perspectiva da Secretaria de Estado da
Juventude em relação à reintegração e ao regresso à Pátria dos jovens emigrantes da segunda geração? O Sr. Presidente: -
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho. O Sr., Carlos - Coelho (PSD): - Sr. Secretário de Estado da Juventude,
começaria por lhe dizer que, ao contrário, daquilo que o Sr. Deputado Jorge Patrício afirmou agora mesmo, não é costume
vermos membros do Governo subir a esta tribuna, falar dos problemas dos jovens e propor mecanismos para a sua resolução.
Assim, começaria por congratular o Sr. Secretário de Estado da Juventude por o ter feito hoje, agora mesmo. Vozes do PSD:
- Muito bem! O Orador: - Não gostaria de enumerar as diversas políticas e propostas que o Sr. Secretário de Estado aqui
expôs, pois já, tive ocasião de o fazer nesta Câmara. Em relação a uma delas, que gostaria de sublinhar e que se refere ao
programa de ocupação de tempos livres, já o meu, colega de bancada, Sr. Deputado António Tavares, lhe formulou alguns
pedidos de esclarecimento. Centrar-me-ei somente na seguinte questão: no nosso entender, na relação Estado-jovens há duas
formas de conceber e executar a política de juventude. . Uma primeira será uma forma paternalista e tutelar que o. Estado
impõe aos jovens. Uma segunda será uma forma na qual o Estado dá voz aos jovens, fazendo-os participar. Julgo que, tanto
quanto entendi das palavras do Sr. Secretário de Estado, é esta última a política que o Governo quer seguir e é esta a política
que tem seguido, nomeadamente com a constituição do Conselho Consultivo de Juventude e com a plataforma de diálogo que
tem estabelecido com o Conselho Nacional de Juventude, o qual a JSD se orgulha de ter ajudado a construir.

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A pergunta muito concreta que gostaria de colocar ao Sr'. Secretário de Estado, porque não
divisamos esse ponto no Orçamento, é a seguinte: qual é o montante do suporte financeiro que a Secretaria de Estado pensa
conceder para apoiar o Conselho Nacional de Juventude? Vozes do PSD: - Muito bem! O Sr. Presidente: - Para responder,
tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Juventude. O Sr. Secretário de Estado da Juventude: Sr.º Deputada Ana
Gonçalves, estou de acordo consigo quando diz que os problemas dos jovens são profundos e graves. Porém, pergunto-lhe,
Srª Deputada, quantos governos se preocuparam até hoje com os problemas da juventude. Quantos? Vozes do PSD: - Muito
bem! O Orador: - A segunda questão que lhe coloco relaciona-se com o facto de que V. Exª não deve ter lido ultimamente os
Diários da República nem acompanhado a própria imprensa. É que o Governo não precisou de se preocupar com as
condicionantes. Quando se fala em condicionantes, tal não quer dizer que elas não se vençam. Deve, somente, assumir-se e
perceber-se que existem esses obstáculos, cabendo aos responsáveis tentar ultrapassá-los. E foi isso que o Governo fez. Nas
medidas que até hoje tomou não existiram condicionantes, tomou-as em tempo oportuno e outras tomará. Vozes do PSD: -
Muito bem! O Orador: - A articulação das verbas do PIDDAC - esta questão prende-se com outras que abordarei mais à
frente - trata-se, necessariamente, segundo a visão que temos, de um assunto de gestão do Estado. Uma Secretaria de Estado
da Juventude não precisa de ser um mini-governo de jovens, com todos os ministérios e com uma pesada estrutura de
funcionários, mas um serviço flexível, com quadros e técnicos que percebam de política de juventude, que proponham e
acompanhem, junto dos respectivos ministérios, as medidas mais adequadas e que dêem resposta aos jovens. Vozes do PSD: -
Muito bem! O Orador: - Sobre a questão que o Sr. Deputado António Tavares me colocou quanto aos tempos livres, gostaria
de lhe dizer que os tempos livres constituíram - os jovens sabem-no um dos programas mais importantes. O que a Secretaria
de Estado fez foi alterar a sua filosofia. Por isso, este ano, os tempos livres funcionam por projectos, ou seja, cada entidade
preenche uma ficha de projecto, onde diz o que cada jovem vai fazer, e, então, o jovem inscrever-se-á de acordo com esse
mesmo projecto. Pretende-se com isto permitir que alguns jovens tenham, pela primeira vez, uma experiência profissional e que
tal contribua para a descoberta de vocações profissionais. i Outra questão que me foi colocada pelo Sr. Deputado, prendeu-se
com os Programas de Juventude da CEE. A Secretaria de Estado tem, efectivamente, três programas que chamou a si na sua
coordenação. Dois deles dizem respeito à Universidade-Empresa-Estudantes - O Comet e o Erasmus e estão,
necessariamente, no Ministério da Educação. Porém, um deles, de extrema importância, inclui a Transição da Escola para Vida
Activa, onde já existem 30 projectos-piloto em execução na Europa. Neste momento, com a Secretaria de Estado da
Juventude, estamos em condições de apanhar o comboio que perdemos há 3 ou 4 anos. Outro programa - o do âmbito da
CEE - é o do Yes à Europa. É um programa que a Comissão aprovou, que o Conselho aprovará muito brevemente e que será
lançado em 1987. A coordenação a nível interno caberá à Secretaria de Estado da Juventude, permitindo que o intercâmbio de
jovens trabalhadores atinja níveis elevados. Aliás, devo desde já dizer que privilegiaria, neste caso, o intercâmbio com Espanha.
Sr. Deputado Jorge Patrício, o documento que lhe enviei foi, efectivamente, através da solicitação da própria Comissão
Parlamentar nesse sentido e nele dei toda a informação necessária aliás como mais tarde o veio a fazer o Sr. Ministro do
Trabalho, que forneceu toda a documentação necessária à autorização das verbas. O Sr. Jorge Patrício (PCP): - Não nos
chegou nada! O Orador: - As verbas do INATEL, no valor de 951 000 contos, correspondem a cerca de 51 000 contos para
as regiões autónomas e a 900 000 contos para o continente, e serão utilizadas em infra-estruturas que já existem hoje para
apoio a jovens e a trabalhadores. Quanto às verbas em outros Ministérios, devo dizer-lhe, Sr. Deputado Jorge Patrício, que
não estou de acordo com à sua visão de Estado. Só pontuo duas posições possíveis daquilo que argumenta: ou diz que a
Secretaria de Estado não deve existir - não sei se é essa a conclusão - ou então pretende dizer-nos que para se ter uma política
global e integrada da juventude, será necessário ter uma estrutura enorme, ou seja, um certo paternalismo de Estado, posição
que não perfilho. É uma questão de concepção de Estado, de filosofia de governação. Quanto à questão colocada pelo Sr.
Deputado sobre uma base de dados, queria dizer-lhe que para a Secretaria de Estado da Juventude o acesso dos jovens à
informação constitui o primeiro passo para garantir a todos a igualdade de oportunidades. Hoje, o fluxo de informação é
extremamente importante nas decisões que tomamos, na maneira como se determinará o nosso futuro. Não se poderá dizer
que o jovem de Bragança estará em igualdade de oportunidades com o jovem de Lisboa se ele não tiver acesso à mesma
informação e ao mesmo tempo. Quanto à Direcção-Geral de Juventude, responderia, muito rapidamente, que este organismo
corresponde exactamente a isto: uma estrutura pequena, flexível e dotada de quadros técnicos, a fim de poder fazer um
acompanhamento, colocando propostas específicas que dêem também respostas específicas e próprias aos problemas que os
jovens enfrentam hoje.

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Sr. Deputado José Apolinário, como sabe, a maioria dos projectos foram apresentados no Fundo Social Europeu, no
departamento respectivo, ainda antes deste Governo. Ao acompanhamento futuro desses mesmos projectos na sua execução,
estará, certamente, a Secretaria de Estado atenta. No entanto, há variáveis que foram condicionadas pelos serviços aquando
da recepção dos próprios projectos. 15to porque não existia, nessa altura, uma Secretaria de Estado que pudesse imprimir uma
dinâmica própria à apresentação desses mesmos projectos, e, como sabe, para os jovens apresentarem projectos é necessário
que tenham uma informação adequada e com tempo útil. No que diz respeito às verbas dos 182 000 contos, gostaria de
esclarecer apenas que elas não se destinam à formação profissional, mas à busca de novas oportunidades - é esse o ponto do
Fundo. Social ,Europeu. É um género de apoio salarial, permitindo, que jovens desempregados trabalhem em actividades que
ainda hoje não se revelaram postos de, trabalho, mas que o poderão ser no futuro. Portanto, tal não constitui uma formação
profissional directa. Quanto ao FEOGA e à CEE, está em elaboração, como sabe, um estatuto do jovem agricultor que, neste
momento, a Secretaria de Estado tem em mãos .e que vai submeter aos parceiros sociais para análise. Tal estatuto constitui um
dos grandes apoios à instalação dó jovem agricultor. Quanto ao CNJ, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que todos nos devemos
regozijar com o aparecimento do Conselho Nacional de Juventude no nosso país. Penso que constitui o acontecimento mais
importante em Portugal, em termos de associativismo juvenil. O Governo está consciente disto e, como sabe, considera o
Conselho Nacional de Juventude um parceiro social. Já agora aproveitava para responder também à pergunta do Sr. Deputado
Carlos Coelho, dizendo-lhe que o Governo, para além de um apoio técnico, tem previsto, neste momento, um apoio de cerca
de 2000 contos ao Conselho Nacional de Juventude para o seu lançamento. O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem! ' O
Orador: - Srs. Deputados, penso que respondi às matérias constantes das perguntas que me colocaram. Vozes do PSD: -
Muito bem! O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Poças. O Sr. Álvaro Poças
(PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Ao usar da palavra em representação dos deputados da
Juventude Social-Democrata, gostaria de recordar as palavras que o meu companheiro de bancada, deputado Carlos Coelho,
aqui proferiu quando, em Novembro passado, se apreciava o Programa do Governo: A nossa contribuição na apreciação
regular da actividade do Governo terá, pois, além da melhoria do presente em que vivemos, que acautelar os horizontes de um
Portugal futuro, mais moderno e europeu, que nós, jovens, queremos ajudar a construir desde já. É
de acordo com esta perspectiva, então enunciada, que agora nos propomos dar a nossa achega na discussão, na generalidade,
das propostas de lei do Orçamento do Estado e das grandes opções do Plano para 1986, que o Governo apresentou a esta
Assembleia. Sr. Presidente, Srs. Deputados: As propostas em análise traduzem a vontade expressa pelo Governo, e que
aplaudimos, de corrigir os principais desequilíbrios que vêm caracterizando a nossa economia e se reflectem negativamente na
situação dos jovens portugueses. Ao apontarem para a eliminação duradoura do desequilíbrio das contas com o exterior, para
a redução da inflação a níveis mais próximos da média europeia e para a redução progressiva do desemprego e aumento do
nível de vida da população constituem um motivo de esperança para os jovens. É certo que o Orçamento apresentado não será
o ideal, mas a situação económico-financeira do País também o não é (antes pelo contrário). Aliás, é para nele se introduzirem
possíveis melhorias, que o debate parlamentar sempre proporciona, que agora o estamos a analisar. Vozes do PSD: - Muito
bem! O Orador: - Mas, sendo o Orçamento, no dizer de conhecido autor, o mais importante instrumento de definição e
execução material de toda a política do Estado», e competindo ao Governo o poder executivo, é lógico e curial que as
alterações a introduzir preservem a coerência global da proposta e mantenha os objectivos gerais traçados. O Sr. Carlos
Coelho (PSD): - Muito bem! O Orador: - Registamos positivamente, como o fez no seu parecer a Comissão de Economia,
Finanças e Plano, que nas grandes opções do Plano se não reduza a política de desenvolvimento a uma política de crescimento.
Apreciamos o esforço do Governo no campo das despesas de pessoal, preconizando o não crescimento do número de
funcionários, com a excepção, que aplaudimos, dos sectores da Saúde e da Educação. Vozes do PSD: - Muito bem! O
Orador: - Concordamos com o Sr. Ministro das Finanças quando afirma que «os défices do Orçamento do Estado não são,
em si mesmos, condenáveis; são-no quando surgem associados à indisciplina orçamental» ou «quando prejudicam as condições
de financiamento do sector produtivo». Quando isto sucede, onera-se o futuro dos jovens e impede-se o desenvolvimento. Se
1986 se tornar no ano em que, como se propõe ó Governo, se dê o primeiro passo na estratégia gradualista de redução do
peso do défice orçamental, serão as novas gerações as mais beneficiadas, visto que será menor a herança, esta sim pesada,
que um dia fatalmente lhes irá parar às mãos. Vozes do PSD: - Muito bem! O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Nos
aspectos que sectorialmente mais interessam à juventude, .têm também as propostas do Governo virtualidades que cumpre
realçar.

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Assim, no campo da educação, deve assinalar-se, como o faz, num parecer que mereceu a unanimidade de todos os grupos parlamentares, a Comissão de Juventude, que houve um acréscimo de verbas orçamentadas, indicador de uma inflexão positiva em relação a anos anteriores, em particular por via dos investimentos previstos no PIDDAC.
São também de louvar os objectivos de iniciar a reforma global do sistema educativo, de consolidar e dignificar o ensino superior politécnico, alargar a rede do ensino técnico-profissional e melhorar a qualidade do ensino.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Na política de juventude traçada nas grandes opções do Plano e que decorre do próprio Programa do Governo, é já bem patente a influência benéfica da criação da Secretaria de Estado da Juventude. A intervenção que me antecedeu, do respectivo titular, demonstra-o claramente.
Os objectivos definidos neste sector revelam que a problemática da juventude está a ser encarada de forma coerente, global e integrada, através de uma perspectiva «horizontal» que harmoniza as acções que visam as camadas mais jovens da população, levadas a cabo pelos diversos Ministérios.
É certo que a Secretaria de Estado da Juventude não terá ainda uma dotação orçamental muito significativa, mas este facto é compreensível se se atender ao carácter ainda recente deste departamento.
No entanto, as iniciativas programadas permitem-nos concluir que se superou a possível insuficiência financeira com um acréscimo de imaginação e criatividade.
Entre aquelas avultam a dinamização do FAOJ, o relançamento do Programa de Ocupação de Tempos Livres, a implementação de uma base de dados sobre questões de juventude, a criação dos primeiros centros de juventude, a continuação do Projecto Inforjovem - revisto e reformulado nos seus objectivos e conteúdo - e o lançamento de programas de intercâmbio juvenil, nomeadamente com os países africanos de expressão portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É importante este momento para a instituição parlamentar, porque é a consagração, que por ser anualmente repetida não deixa de ter o maior significado, de um princípio pelo qual os povos lutaram durante séculos: o da aprovação do Orçamento pelas assembleias representativas.
É igualmente importante este momento, porque estamos a discutir um orçamento que não se limita a enquadrar a situação existente, mas aponta novos rumos às finanças públicas do nosso país.
Todo o Orçamento é uma previsão e, por isso, através dele perspectiva-se a resolução de problemas e apontam-se novos caminhos.
Por se tratar da discussão e aprovação do Orçamento, por se tratar da discussão e aprovação deste Orçamento, é de esperar desta Assembleia, quer apoiemos o Governo - como é o nosso caso - quer estejamos em oposição a ele, a maior seriedade e rigor. Critiquemos o que, em consciência, acharmos poder ser melhorado, mas apoiemos o que estiver correcto, reconhecendo o esforço do Governo nesta matéria.
É isso que, a nosso ver, o País, e especialmente a juventude portuguesa, espera de nós.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Brito.

O Sr. Raul de Brito (PS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Algumas foram as discussões, os debates e as reflexões que, nesta Câmara e por todo o País, se fizeram ao longo dos últimos anos, acerca da integração de Portugal nas Comunidades Europeias. Este tema é inesgotável. O binómio integração/desenvolvimento representa mesmo a linha de política nacional mais fecunda para o progresso e modernização de Portugal.
Conquanto a nossa opção se tenha determinado por razões mais profundas e diversificadas do que as de carácter meramente económico-financeiro, a verdade é que foi a apreciação positiva que ambas a as partes fizeram do impacte e consequências destes dossiers que permitiu o êxito das negociações, traduzido pela assinatura do Tratado de Adesão.
A quantificação dos resultados numa negociação tão complexa como aquela que participámos não é fácil. Se na área financeira é possível estimar os fluxos, já no campo económico a avaliação está dependente de factores tão heterogéneos que qualquer cálculo tem sempre uma grande percentagem de falibilidade.
A leitura do Orçamento de Estado para 1986 permite, desde logo, constatar que a solidariedade intercomunitária funcionou neste primeiro ano após a nossa adesão, já que Portugal irá beneficiar de uma transferência líquida positiva da ordem dos 32,8 milhões de contos, para além da verba de 7,5 milhões de contos de ajudas de pré-adesão.
Contudo, a existência de um saldo positivo para o nosso país, por si só, não mais representa do que isso mesmo, isto é, que há uma transferência positiva, de valor significativo, em benefício da nossa economia.
Importa agora questionar: porquê uma transferência de 32,8 milhões de contos e não uma outra de valor superior?
De facto, esta pergunta é não só pertinente como necessária por, pelo menos, duas ordens de razões:
A primeira delas é porque o acesso aos fundos estruturais comunitários, donde provêm as transferências mais importantes, depende da fixação de uma quota por país, como foi o caso do FEDER, em que a nossa quota oscila entre os 10,65% e 14,2%.
A segunda delas é porque o acesso a esses fundos está dependente da capacidade de cada país em os utilizar: caso do FEDER, FEOGA - Orientação e Fundo Social Europeu.
Por isso nos interrogamos, por que é que sendo Portugal o país menos desenvolvido da Europa teve uma quota bastante inferior a países tais como a Itália, o Reino Unido ou a Espanha?
Por isso inquirimos dos motivos por que as previsões dos fundos a transferir para Portugal, no âmbito do FEOGA - Orientação, se limitam a 1,472 milhões de contos, obtidos, aliás, não propriamente do FEOGA, mas sim do chamado Plano Específico de Desenvolvimento da Agricultura Portuguesa, plano esse que, por si só, irá movimentar, nos termos do Tratado de Adesão, durante os primeiros dez anos, qualquer coisa como 100 milhões de contos. De facto, não só

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aquela verba é exígua, como significa que não fomos capazes de beneficiar das acções específicas da referida secção do FEOGA.
Ausência de projectos dos agricultores ou ineficácia do Ministério? Provavelmente as duas coisas.
Em relação às transferências do FSE, não ignoramos que utilizar 13 milhões de contos em acções de formação profissional será um desafio ciclópico que, se concretizado, merecerá apoio e consideração de todos. A formação representa um eixo essencial do desenvolvimento do País e os investimentos nela realizados são os mais reprodutivos numa perspectiva de médio prazo.
Mas não basta assegurar o acesso ao maior volume de fundos. Importa, igualmente, como atrás dissemos, ter a capacidade para os utilizar e saber garantir a sua melhor e mais adequada distribuição.
Por outro lado, confessamos que estamos apreensivos pelo atraso na publicação e divulgação da legislação comunitária adaptada e pela quase total ausência de informação junto dos interessados mais directos. Esta situação terá de ser rapidamente corrigida, sendo certo que o País não tolerará que, a coberto da mesma, alguns se aproveitem de benefícios que, à partida, devem ser de todos. Infelizmente a proverbial habilidade de muitos portugueses em desviarem os financiamentos dos fins para que foram concedidos pode adulterar todo o processo. Devemos ter em conta que, por exemplo, em Itália, organizações à margem da lei conseguiram obter, por métodos sofisticados, enormes verbas daqueles fundos.
Receio que os pequenos e médios agricultores portugueses vejam passar-lhe ao lado as verbas destinadas à agricultura, em contraste com grandes agricultores e negocistas organizados que, por melhor conhecimento dos mecanismos legais, se podem apropriar da parte maior do bolo. Agrava este meu receio a falta de confiança que me inspira a acção do Ministério da Agricultura - naturalmente que este juízo de valor nada tem de pessoal.
As nomeações para os cargos comunitários, onde é notória a escolha na base da simpatia política, o preenchimento de postos-chaves de administração comunitária, veja-se como, por exemplo, o que se passa com o CÊS e o atraso na regulamentação de legislação importante, como seja, o Plano de Desenvolvimento Regional ou o Sistema de Incentivos de Base Regional, justificam igualmente as nossas reservas à maneira como está a ser conduzida a política de integração.
Dois exemplos flagrantes daquilo que não deve acontecer na nossa política comunitária relacionam-se, o primeiro, com a actuação do Governo no âmbito da renegociação do Acordo Multifibras.
Inabilidade e inexperiência são as expressões mais suaves que encontramos para o comportamento dos negociadores governamentais. As contínuas e propagandísticas intervenções do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros não conseguem evitar o alarme dos nossos exportadores. Portugal, ao levantar a reserva geral, facilitou uma maior liberalização dos mercados comunitários aos têxteis provenientes dos países terceiros no âmbito do AMF, em troca de uma mera declaração de intenções de nove Estados membros da CEE, que apenas aceitaram uma certa flexibilidade no controle do protocolo n.º 17. O resultado é inquietante, até porque um dos países que se mostrou menos flexível na linguagem governamental é nem mais nem menos do que o Reino Unido, país que absorve, actualmente, cerca de 63% das nossas exportações têxteis.
O segundo exemplo relaciona-se com a questão das chamadas «regras de origem aplicáveis» às exportações de produtos industriais para a Espanha. A situação é igualmente penalizante para os nossos exportadores. O impasse nas negociações e o facto de Portugal ter aceite um regulamento transitório, inexplicavelmente mantido secreto, faz-nos temer que os produtos industriais espanhóis estejam a ter facilidades relativas, desde o dia l de Março de 1986, na penetração no mercado português, quando os produtos industriais portugueses têm de provar que possuem, pelo menos, 60º/o do valor acrescentado nacional, para penetrarem no mercado espanhol sem pagamento de direitos.
O mercado ibérico, mais do que os outros mercados comunitários, terá de merecer uma atenção especial deste ou de qualquer governo responsável. A proximidade espanhola, a similitude das línguas, o desenvolvimento da sua indústria e a produtividade da sua agricultura são vantagens do nosso vizinho que não podemos minimizar.
A criação progressiva de um verdadeiro mercado comum ibérico, como consequência da eliminação, no prazo de sete anos, das barreiras à livre circulação de mercadorias, pessoas, capitais e serviços, é um acontecimento histórico.
Vamos deparar-nos com um quadro inédito na Península Ibérica. A preservação da nossa identidade passa pelo que formos capazes de fazer em matéria de penetração no mercado espanhol e da nossa capacidade de competir com as empresas do país irmão.
Penso que o país ainda não tomou consciência total deste desafio - o maior entre todos. E o Governo? Pior ainda. Parece andar constantemente preocupado com a sua imagem e com o seu permanente auto-elogio, descurando o que é essencial.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Cristina Albuquerque e José Manuel Casqueiro.
Tem então a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Albuquerque.

A Sr.ª Cristina Albuquerque (PRD): - Sr. Deputado Raul de Brito, na sua intervenção o Sr. Deputado disse, que considerava uma inexperiência da parte do Governo a sua posição no que respeita ao acordo firmado na CEE, com vista às negociações do Acordo Multifibras n.º 4.
Pergunto-lhe se não acha também uma inexperiência da parte do Governo as posições por ele tomadas relativamente aos protocolos de adaptação, no âmbito do Acordo de Comércio Livre entre a CEE e os países da EFTA.
Gostaria também de fazer aqui um apelo ao Governo, para que esclareça a opinião pública em geral e os agentes económicos em particular sobre a posição efectiva por ele tomada relativamente a estes acordos, no que diz respeito aos têxteis portugueses.
Efectivamente, os nossos industriais estão incorrectamente informados sobre o que se passou e sobre as declarações do Governo, que disse que os mercados comunitários se abriram quase livremente.
Penso que esta afirmação só poderá ser feita baseada num acto de fé, dado que a única coisa que existe são declarações de intenção por parte desses países.

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20 DE MARÇO DE 1986. Relativamente aos acordos com os países da EFTA, penso que o Governo manifestou uma
posição, no sentido de que esses países estavam completamente abertos aos produtos têxteis portugueses, o que,
efectivamente, não é correcto. Assim, gostaria de, mais uma vez, fazer aqui um apelo ao Governo, para que esclareça, de uma
vez por todas, os agentes económicos e os industriais têxteis portugueses. O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado
José Manuel Casqueiro. O Sr. José Manuel Casqueiro (PSD): - O Sr. Deputado Raul de Brito afirmou, na sua intervenção,
que o Governo podia ter por objectivo, na sua acção - e é grave a insinuação que fez -, o desvio dos fundos comunitários para
alguns grupos de agricultores ou de agentes económicos ligados ao comércio. Julgo, Sr. Deputado, que é grave que não tenha
tido o cuidado de ler a regulamentação comunitária, abordando-a aqui, e que tenha admitido que o regulamento n.º 797, que
deve ser utilizado pelos agricultores e que, de forma explicita, define parâmetros máximos, quanto a volume de utilização dos
créditos, do subsídio atribuído pela CEE, possa ser utilizado em benefício de pequenos grupos de grandes agricultores e em
prejuízo dos pequenos agricultores. As regras comunitárias são perfeitamente claras e são para ser utilizadas por todos os
agricultores da CEE, numa legislação perfeitamente clara e na qual o Governo Português tem de, pelo menos, seguir as linhas
orientadoras da regulamentação comunitária. Assim, é lógico, Sr. Deputado, que lhe coloque a seguinte questão: acha que o
Governo Português não vai respeitar as regras comunitárias e que a própria Comunidade vai aceitar que a regulamentação
portuguesa viole a regulamentação europeia na aplicação dos fundos comunitários ligados, concretamente, ao regulamento n. I
797? Se assim é, como é que é possível que se desviem os fundos de um grupo de agricultores extremamente numeroso que,
para terem o direito à utilização dos mesmos, têm que ser agricultores a tempo inteiro e fazer prova dessa sua qualidade? Sr.
Deputado, penso que é importante que se esclareça sobre essa matéria e que não se façam declarações de intenção ao
Governo nesse processo. Vozes do PSD: - Muito bem! O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento ao Sr.
Deputado Raul de Brito, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto. O Sr. Carlos Pinto (PSD): - Sr. Deputado Raul de Brito,
ouvi a sua intervenção sobre política externa, do ponto de vista das relações económicas, e quero reportar-me exclusivamente
ao que referiu sobre os têxteis e as respectivas exportações. Naturalmente que o Sr. Deputado, fazendo as afirmações que fez,
revela que tem estado desatento ao enorme interesse que este Governo colocou nas negociações e nas relações para evitar que
o sector industrial têxtil deparasse com os obstáculos que uma má negociação do Governo anterior proporcionou a esse sector,
E o Sr. Deputado quando, efectivamente, traz a esta Câmara algum alarme sobre a situação do Acordo Multifibras (AMF),
está a cometer uma incorrecção. É que, neste momento, não temos ainda concluído um acordo do ponto de vista bilateral,
temos, sim, negociações concluídas no que respeita à EFTA. E aí, posso afirmar-lhe, porque é do domínio público, que as
negociações constituem uma tremenda vitória para este governo, que talvez não tenha sabido usar devidamente os meios de
comunicação para fazer saber isso ao País e à opinião pública, dado que os resultados obtidos possibilitam inclusivamente que,
neste momento, possamos, em termos de país exportador de têxteis, compensar algumas dificuldades que temos nas
exportações para os Estados Unidos, exactamente com o alargamento, que é possível agora verificar-se, das trocas comerciais
que efectuaremos com os países da EFTA pois, no âmbito do acordo concluído, apenas funcionarão - se o Sr. Deputado não
tem conhecimento, informo-o meros sistemas de informação estatística, por parte do organismo de coordenação económica
nacional, relativamente aos países importadores de têxteis daquela organização. Portanto, e em resumo, queria dizer ao Sr.
Deputado que, na realidade, há um acordo concluído, que é o da EFTA, há um acordo ainda a ser renegociado, que é o
Acordo Multifibras, e no que respeita às negociações com os Estados Unidos julgo que a posição portuguesa, tomada no
âmbito da CEE, isto é, passando para o âmbito desta Comunidade e do seu comité negociador a defesa dos interesses de
Portugal, concluirá e levará certamente a um bom resultado. Por conseguinte, a minha tese central é a de que da forma como o
Governo tem conduzido as negociações no âmbito externo e no campo do sector industrial, estas vão exactamente contra o
que o Sr. Deputado afirmou e constitui a demonstração de que o Governo está atento e que, por esta parte, tem defendido
muitíssimo bem os interesses nacionais. Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: - Para responder aos pedidos de esclarecimento
que lhe foram formulados, tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Brito. O Sr. Raul de Brito (PS): - Sr. Presidente, Srs.
Membros do Governo, Srs. Deputados: Começaria por responder simultaneamente à questão colocada pela Sr.º Deputada
Cristina Albuquerque e pelo Sr. Deputado Carlos Pinto, no que se reporta ao Acordo EFTA. Naturalmente que não subscrevo
a opinião emitida pelo Sr. Deputado Carlos Pinto, quanto ao que considera resultados obtidos pelo Governo Português. Penso
que essa preocupação não é só comungada por mim e as recentes reuniões que se têm realizado, e que o Governo tem
promovido junto das associações patronais para lhe retirar os receios, são uma prova inequívoca desse facto. Porque, Sr.
Deputado Carlos Pinto, contrariamente ao que o Governo diz, que foram eliminadas as restrições quantitativas, isso não é
verdade, não é exacto. O que se verificou é que essas restrições, tendo terminado por parte dos países receptores, foram
introduzidas em termos de país emissor, que é Portugal.

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Portanto, haverá um sistema de controle administrativo das exportações portuguesas para os países da EFTA, sistema
esse que o Governo pensa, segundo declarações prestadas à Comissão de Integração Europeia, ser efectuado através do
Instituto dos Têxteis. Assim, os nossos exportadores não têm mercados abertos automaticamente, o Instituto dos Têxteis
continuará a ter e a fixar os contingentes de exportação para esses países e, se assim não é, o Governo, que está presente, que
explique isso e que justifique as informações que o Sr. Secretário de Estado da Cooperação deu na respectiva Comissão.
Portanto, comungo, de facto, das preocupações que a Sr.º Deputada Cristina Albuquerque também aqui colocou relativamente
ao comportamento do Governo nesta matéria. Quanto às negociações no âmbito do Acordo Multifibras, disse o Sr. Deputado
que elas não estão concluídas. De facto, não estão concluídas, elas vão-se iniciar no próximo dia 4 de Abril. O que acontece é
que por parte do Governo Português já há uma posição, que foi divulgada pelo Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, ou
seja, Portugal retirou a reserva legal que tinha colocado face às negociações e aceitou que houvesse uma maior liberalização
das exportações de países terceiros para a Comunidade, não tendo em contrapartida realizado o seu objectivo, que era a
eliminação do protocolo n.º 17. Na minha intervenção fui claro sobre o que penso nessa matéria e considero que o Sr.
Deputado é que estará mal informado, não eu. Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado José Manuel Casqueiro,
não insinuei nada do que V. Ex.º disse, que o Governo estaria a desviar fundos comunitários. O que eu disse exactamente, e
repito, é que «receio que os pequenos e médios agricultores portugueses vejam passar-lhe ao lado as verbas destinadas à
agricultura, em contraste com grandes agricultores e negocistas organizados que, por melhor conhecimento dos mecanismos
legais, se podem apropriar da parte maior do bolo», e continuo a manter isto. Porque a verdade é esta, Sr. Deputado: o que se
verifica é que o Governo não só não adoptou a maior parte das directivas nem publicou oficialmente a maior parte dos
regulamentos e, não tendo feito isso, muito menos poderia ter promovido a sua divulgação junto da maioria dos agricultores,
sobretudo dos pequenos e médios agricultores. Os meus receios serão fundados ou não e veremos, dentro de dias, quando
tivermos oportunidade de apreciar esta matéria na especialidade, quem são os beneficiários efectivos dos fundos neste primeiro
ano. O Sr. Raúl Junqueiro (PS): - Muito bem! O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da
Educação e Cultura. O Sr. Ministro da Educação e Cultura (João de Deus Pinheiro): - Sr. Presidente, Srs. Membros do
Governo, Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Educação e Cultura para 1986 procura reflectir o sempre difícil
equilíbrio entre aquilo que saudavelmente se tesa como desejável e o que realisticamente se mostra como possível. Desejável, tendo em vista as reconhecidas carências do sector e a vontade repetidamente expressa pelo
Governo de colocar a educação e cultura em lugar de destaque nas suas prioridades. Possível, tendo em atenção os meios
globais limitados, as necessidades noutros sectores importantes da vida nacional e os compromissos assumidos. Trata-se, de
facto, de um orçamento encorajador, que demonstra clara vontade do Governo em inflectir uma prática dos últimos anos de
manutenção da educação e cultura a um nível orçamental modesto. Este Orçamento é, pois, um sinal visível de mudança, como
de mudança e de esperança são outros sinais que se divisam no horizonte próximo. A elaboração e aprovação da tão ansiada
Lei de Bases do Sistema Educativo, a determinação de promover a reforma do mesmo sistema com o sustentáculo na
comissão recém-empossada para o efeito, o novo ímpeto na criação de infra-estruturas, o acrescido apoio à ciência e
tecnologia, a introdução de novas tecnologias nos ensinos básico e secundário, a aceitação crescente de modelos e práticas de
formação contínua, são alguns dos sinais de que o sistema educativo está realmente em fase de mudança. Como característica
importante da proposta do Orçamento para 1986 deverá referir-se a concentração em quatro grandes capítulos: serviços
centrais, estabelecimentos de ensino básico e secundário, estabelecimentos de ensino superior e cultura. Tem esta concentração
como objectivo agilizar a gestão, na medida em que permite a procura de contrapartidas ou ajustes na esfera de cada capítulo,
sempre que a execução o aconselhe. Esta flexibilização é tanto mais necessária quanto se torna difícil quantificar com rigor os
montantes exactos a despender em certas rubricas estimadas por extrapolação da evolução de anos transactos. É convicção
do Governo que esta agilização terá como reflexo a execução do orçamento em valores próximos dos 100%, em vez dos
cerca de 97% verificados em 1985. Este um aspecto a reter na apreciação do orçamento do Ministério para 1986, e na
comparação do mesmo com o equivalente de 1985. Entrando, agora, numa apreciação global da parte referente à educação,
refiro que o montante das dotações atribuídas ao sector em 1986 representa cerca de 4,7 % do PIB, percentagem jamais
alcançada em Portugal. Com efeito, até 1974, o máximo atingido cifrou-se em 2,8 % do PIB, tendo seguidamente, e até 1983,
oscilado entre os 4,1 e 4,3 % , para em 1984 e 1985 cair para valores inferiores a 4%. Assim, em 1986 regista-se não só a
inversão da tendência notada de 1983 para cá, como se atingem valores mais próximos da média dos países da OCDE, e que
se situam entre 5 % e 7 % do PIB. As comparações, embora indicativas, podem na prática vir falseadas pela utilização de
valores afastados da realidade. E, a este respeito, é interessante conhecer os números do Orçamento da Educação em 1985 e
a sua evolução. Assim, a dotação para a educação inscrita no Orçamento do Estado para 1985, tal como apresentado à
Assembleia da República cifrava-se em cerca de 116 milhões de contos. Contudo, logo na própria Lei do Orçamento, e no
decreto de execução orçamental, se impunham cortes no montante aproximado de 5 milhões de contos, ou seja, reduzindo na
prática o orçamento da Educação para 111 milhões de contos.

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20 DE MARÇO DE 1986 Posteriormente, e face às dificuldades verificadas, foi possível reforçar o orçamento do Ministério
em cerca de 25 milhões de contos, correspondentes à actualização de vencimentos e à reposição dos cortes anteriormente
referidos. Somando este reforço ao orçamento inicial, ter-se-ia teoricamente um orçamento corrigido de cerca de 141 milhões
de contos, quando o utilizável, na prática, não se afastava dos 136 milhões. Por outro lado, a rigidez na transferência de valores
entre capítulos diferentes dificultou ou impediu a plena utilização do montante global disponível, tendo o orçamento ficado pelos
97,5 % de execução. Por outras palavras, o montante efectivamente despendido quedou-se próximo dos 133 milhões. Uma
voz do PCP: - Não sabem fazer propostas de alterações orçamentais? O Orador: - Vê-se, assim, que a comparação de 1986
com 1985 poderá conduzir a conclusões diferentes, consoante se tome como base de referência para 1985 os valores globais
inscritos, o utilizável ou o efectivamente utilizado. Relativamente ao orçamento potencialmente utilizável em 1985, que ascendia
a cerca de 136,5 milhões de contos, correspondiam a 114 milhões em pessoal, 19,7 em correntes e 2,8 em capital, o
orçamento proposto para 1986 apresenta um aumento global de cerca de 11 01o, sendo o crescimento real de 7 0lo em
pessoal, 34,5 01o em correntes e 7 01o em capital. Se fosse considerado em 1985 apenas o efectivamente despendido, o
acréscimo global em pessoal subiria para 10,5%, e o acréscimo global do Orçamento em 1401o. Agregando a fatia
correspondente ao PIDDAC, o montante global do sector educação em 1986, também sem aumento de vencimentos, ascende
a cerca de 176 milhões de contos, ou seja, um acréscimo de 25,5 milhões de contos, correspondente a um aumento real um
pouco superior a 1701o, sendo o crescimento do PIDDAC da ordem dos 73,5 01o, assente essencialmente em
infra-estruturas fixas e equipamentos ou reapetrechamento. A afectação de montantes às diferentes instituições e serviços
reflecte naturalmente o compromisso entre a necessidade de não introduzir sobressaltos bruscos no sistema - o que leva a ter
sempre presente os orçamentos anteriores -- e a indispensável injecção de meios financeiros acrescidos, nos segmentos em
desenvolvimento ou com carências mais notórias. Relativamente às grandes rubricas orçamentais, os aumentos mais
significativos verificam-se nos estabelecimentos de ensino básico e secundário mais 26,5 07o, do ensino superior, mais
21,507o, enquanto nos serviços centrais os acréscimos incidem no GEP, por aí se centrar a gestão das despesas com a
reforma do SE e trabalhos conexos, no INIC -Instituto Nacional de Investigação Científica, pelo apoio acrescido à
investigação universitária e ao novo programa de apoio aos jovens investigadores e, nos equipamentos educativos, para acções
no âmbito da segurança de instalações. Diminuem, por outro lado, as verbas dos gabinetes ministeriais e contêm-se os gastos
correntes da Administração. Uma voz do PSD: - Muito bem! 1657 O Orador: - Refiro que, no que respeita à política de
recursos humanos subjacente à proposta do Orçamento, se poderá promover o redimensionamento e revisão dos quadros e
carreiras do pessoal não docente, o alargamento dos quadros de pessoal docente no ensino não superior, e também no
superior, e a actualização do ordenamento de carreiras do pessoal docente, através da revisão do Decreto-Lei n.º 513-M1/79.
No que concerne a infra-estruturas pode dizer-se que o crescimento do sistema educativo verificado na última década tem
colocado graves problemas no âmbito das instalações de todos os níveis de ensino, com maior acuidade no ensino preparatório
e secundário, quer no domínio da construção de novas instalações, quer no que respeita à conservação e reparação das
existentes. A quebra verificada nos dois últimos anos no investimento do Estado não pôde deixar de reflectir-se negativamente
no âmbito das instalações escolares, e por isso os problemas acrescidos com que o sistema educativo se tem debatido nesse
domínio, com especial intensidade nos anos de 1984 e 1985. Para adequada resposta à situação, sucintamente descrita,
prevêem-se no orçamento do Ministério da Educação e Cultura, no âmbito do investimento, verbas significativas que irão
permitir intensificar o esforço de recuperação, e cujo aumento relativamente a 1985 se cifra em 57,60lo, sendo 39,10lo no
ensino preparatório e secundário e 84,1 % no ensino superior. A acrescer ao esforço financeiro que as verbas inscritas vão
permitir, adiciona-se ainda uma maior eficácia da sua utilização e que resulta da fusão numa única direcção-geral das duas
anteriormente existentes e dependentes de departamentos ministeriais diferentes. Os meios financeiros afectos a esta acção no
âmbito das infra-estruturas vão possibilitar que neste ano se construam 107 novas instalações para o ensino preparatório e
secundário, e se lancem 58 para entrarem em funcionamento no ano lectivo de 1987-1988, o que constitui o maior programa
alguma vez lançado em Portugal no âmbito das construções escolares. As 165 novas instalações atingem cerca de 5007o das
249 construídas nos últimos seis anos. De referir ainda que este esforço se prolonga em 1986 no domínio da segurança das
instalações escolares, tendo para o efeito sido consideradas verbas, cujo valor global se cifra na ordem dos 1,5 milhões de
contos. Sublinha-se, também, a atribuição de uma verba próxima do milhão de contos destinada especificamente ao combate
ao insucesso escolar pelo apoio directo aos estudantes com menores condições de sucesso. No ensino superior, o crescimento
médio dos orçamentos das Universidades, relativamente ao orçamento utilizável de 1985, é de cerca de 15 07o, enquanto os
ISE e ISCAS e os politécnicos têm subidas percentualmente maiores, uns em consequência da reestruturação empreendida,
outros por estarem em fase de arranque. Julga-se, assim, que as instituições de ensino superior poderão dispor de orçamentos
de pessoal, de funcionamento, de investimento e ainda de investigação, que lhes permitirá fazer uma utilização mais eficaz dos
meios humanos e materiais de que dispõem. Meios esses que vão induzindo receitas próprias acrescidas, que tendem a
aumentar e a proporcionar meios-extra para reapetrechamento científico das instituições. No sector da cultura, presidiu à
elaboração da proposta orçamental o princípio de que as transformações

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qualitativas da sociedade estão associadas ao desenvolvimento cultural e, nessa óptica, se privilegiaram as acções que
visam o enraizamento na sociedade portuguesa de necessidades e de práticas culturais. Esta preocupação teve como critério o
reforço das verbas de descentralização e de apoio a estruturas e equipamentos na intervenção da Secretaria de Estado da
Cultura, nas várias áreas. A proposta do orçamento para a Secretaria de Estado da Cultura, em 1986, traduz um acréscimo de
3007o no orçamento de funcionamento e de 4607o no, PIDDAC. Interpretemos, de seguida, os aumentos mais significativos:
Na área do património, surge com particular destaque o PIDDAC: 943 000 contos, a que corresponde um acréscimo de 68 %
da dotação e que só por si ultrapassa a totalidade do PIDDAC de 1985. As verbas inscritas visam, por um lado, acorrer à
onerosa conservação do património monumental, isto é, 500 000 contos, cuja rentabilização se procurará fomentar, se possível
valorizando os seus atractivos turísticos, entre outros, mas destinam-se também a dotar os museus, arquivos e bibliotecas,
centrais e regionais, com meios materiais indispensáveis ao seu funcionamento útil e ao preenchimento da sua missão local, na
dupla vertente pedagógica e dinamizadora. .O montante da despesa corresponde aqui a 304 000 contos, ou seja, 32 % do
investimento afecto a esta área. De entre estes meios não se poderão ignorar os meios humanos. Por isso se verifica que, do
aumento global de 36 07o nas verbas de pessoal e de funcionamento, os acréscimos mais significativos incidem na área dos
museus, bibliotecas, serviços de arqueologia e outros serviços dependentes do IPPC, os quais «gastam» 57 % do total das
despesas com pessoal de toda a Secretaria de Estado da Cultura. . O orçamento para 1986 prevê também verbas necessárias
à regionalização dos serviços do IPPÇ, autonomizando-os, para responderem mais eficazmente às necessidades locais. Para
terminar, na área do património, prossegue-se simultaneamente um esforço muito significativo quanto ao aumento de receitas
próprias, demonstrando a rentabilização também económica dos investimentos praticados. A área do livro e da leitura
beneficiou também de aumentos substanciais. No relatório sobre a política do livro de que a Secretária de Estado da Cultura
deu, em primeira mão, conhecimento à Comissão de Educação e Cultura da Assembleia da República, confirma-se a
prioridade, a conferir, ao investimento nas estruturas locais de leitura pública, em acção concertada com as autarquias. Por isso
se encontram inscritos no PIDDAC 66 500 contos, verba que permitirá o início de uma actuação em profundidade, nesta
direcção, dotando o Instituto Português do Livro de meios. que o retiram da paralisia, a que a sua anterior situação financeira o
condenara. No sector musical atender-se-á aos aspectos culturais com prioridade sobre a promoção de manifestações
musicais que devem ser progressivamente encaminhadas para iniciativas descentralizadas, mais adequadas ao carácter
espontâneo que as deverá caracterizar. O principal investimento incidirá na revitalização das duas orquestras sinfónicas
nacionais,. 300 000 contos, proporcionando-lhes uma função pedagógica e de difusão musical; na
valorização das companhias residentes do Teatro Nacional de S. Carlos, TNSC, 480 000 contos, no apoio a actividade
musical amadora, à formação e divulgação musicais, prevendo-se para estas acções uma dotação de 135 000 contos.
Simultaneamente, a Secretaria de Estado da Cultura, através de uma acção concertada com as estruturas educativas,
apresentou uma proposta de reformulação do ensino musical, medida estrutural que permitirá resolver a médio prazo os
problemas com que cronicamente se vem defrontando o sector musical em Portugal e sem a qual os investimentos culturais que
se pretendem desenvolver não terão senão efémeros resultados. Mencionaremos também a previsão de receitas para o Fundo
de Fomento Cultural resultante da aposta mútua, 242 500 contos, que implicaram a elaboração de um plano de afectação
dessas receitas a acções que acompanham rigorosamente os principais projectos em curso na Secretaria de Estado da Cultura,
de acordo com os objectivos prioritários da política definida. Nos três últimos anos o peso relativo do orçamento da Secretaria
de Estado da Cultura nas despesas do Estado tem vindo a decrescer: de 1982 a 1985 esses valores foram, respectivamente,
0,41 %, 0,35 %, 0,31 % e 0,29%. Os acréscimos agora verificados apenas repõem o peso relativo deste sector nos níveis
atingidos em 1983, ou seja, 0,35 % do Orçamento do Estado. Contribui para este peso relativo o aumento significativo, que se
espera vir a obter, com as receitas a cobrar pelos serviços autónomos da Secretaria de Estado da Cultura, o qual, a
verificar-se, fixará o acréscimo do orçamento em 49 %, relativamente a 1985. Entende-se, ainda, ser útil e desejável abrir ao
sector não estatal a participação no processo de fomento cultural do País. Para tal, parece-nos indispensável a adopção de um
conjunto de medidas de incentivo fiscal que venham, não só mobilizar verbas suplementares para este sector, mas também
comprometer camadas tão alargadas quanto possível da sociedade portuguesa na sua própria promoção cultural e, portanto,
no seu desenvolvimento. Registo, a terminar, que se espera poder concluir, no decurso do presente ano civil, a informatização
dos Serviços Financeiros do MEC, que conjuntamente com a modernização no domínio da gestão de pessoal, irá permitir uma
gestão financeira em tempo real e uma aproximação mais rigorosa à orçamentação e acompanhamento de execução do próprio
orçamento. Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: - Inscreveram-se para pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro da Educação e
Cultura os Srs. Deputados Jorge Lemos, Gomes de Pinho, Daniel Bastos, Fillol Guimarães, Maria Santos, Agostinho
Domingues, José Apolinário, João Corregedor da Fonseca e Fernando Conceição. Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge
Lemos. O Sr. Jorge lemos (PCP): - Sr. Ministro da Educação e Cultura, independentemente das questões sobre cultura que
devido à escassez de tempo não colocaríamos neste momento e deixaríamos para o debate na especialidade, gostaria de lhe
apresentar duas ou três questões muito concretas e a primeira tem a ver com o início da sua intervenção.

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Falou-nos V. Ex.ª em mudança. Eu não diria o mesmo, Sr. Ministro, e se há mudança é para
pior porque mudar seria adoptar medidas tendentes a garantir a efectiva democratização do ensino em Portugal e quando
olhamos para o Orçamento do seu Ministério verificamos que sectores carenciados, como o apoio social aos estudantes e às
famílias, recebem neste Orçamento um tratamento inferior ao que receberam no de 1985 e são conhecidos os cortes
orçamentais que em 1985 existiram a tal respeito. Uma segunda questão, que se prende com os aumentos do seu Ministério,
tem a ver, Sr. Ministro, com o facto de este ano virem já inscritos na verba do Ministério da Educação, dotações para pessoal
e respectivos aumentos, que o ano passado vinham inscritos na dotação provisional. É o próprio Governo que o reconhece ao
referir, na p. 17 da justificação da sua proposta de lei, que, expressando-se sobre o Orçamento do Ministério, o aumento se
explica pela variação dos encargos com pessoal que têm grande peso neste organismo. Em terceiro lugar, o Sr. Ministro diz
que - e é algo que V. Ex.º insiste em referir - o ano passado não foi possível, dada a rigidez orçamental, gastar toda a verba
disponível, ou que tinha sido difícil fazê-lo. Mas colocamos uma questão, que é a seguinte: então não teria sido possível ao
Ministério da Educação se estava perante essa situação, apresentar uma proposta de lei à Assembleia da República, para que
tal rigidez fosse quebrada? Se o Ministério da Educação se encontrava perante uma situação difícil a Assembleia da República
decerto não lhe causaria qualquer obstáculo para lhe resolver esse problema. Outra questão que gostaria de lhe referir ainda,
Sr. Ministro, diz respeito aos sectores que no seu Ministério são particularmente esquecidos e que, do nosso ponto de vista,
não podem ser ignorados pois reclamam medidas urgentes. Referiria, em primeiro lugar, o ensino especial. São conhecidas as
carências que as CERCI e as variadas instituições de ensino especial têm feito chegar a esta Assembleia e um pouco por todo
o país, e não se vê reflectido, a nível do Orçamento, qualquer esforço no sentido de dar correspondência a essas mesmas
reivindicações. O mesmo se pode dizer quanto à alfabetização, que sofre um corte em termos de verbas inscritas para o Plano
Nacional de Alfabetização da ordem dos 5001o em relação a 1985. Finalmente, Sr. Ministro, penso que V. Ex.º insiste em
confrontar esta Assembleia com a Comissão da Lei de Bases do Sistema Educativo. Mas creio que também é tempo de lhe
dizer que o Sr. Ministro tem todo o direito de criar os órgãos consultivos que entender, seguir as suas opiniões. 15so é consigo.
Agora, a Assembleia da República tem uma subcomissão criada, definiu um calendário e até Junho vai aprovar uma Lei de
Bases do Sistema Educativo. O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Gomes de Pinho. O Sr. Gomes de Pinho
(CDS): - Sr. Ministro da Educação e Cultura, gostaria de lhe pôr algumas questões sobre a vertente pobre do seu Ministério,
isto é, a cultura. Ela é tão pobre que V. Ex.ª já vem sendo tratado nesta Câmara, aliás sem reacção, por Ministro da
Educação. Sabe V. Ex.ª que, quando da apresentação do Programa do Governo, nos insurgimos contra a extinção do
Ministério da Cultura e prevíamos já que isso iria ter consequências nefastas para a cultura em Portugal, pese embora o seu
esforço pessoal e o mérito da Sr. e Secretária de Estado da Cultura no exercício das suas funções. De facto, o Orçamento que
agora nos é apresentado não invalida essas nossas previsões, antes as confirma, porque aquela recuperação a que se alude
reporta-se àquilo que poderíamos considerar o Orçamento mais atentatório da cultura em Portugal que foi elaborado nos
últimos doze anos da vida nacional e que foi o Orçamento do anterior Governo, isto é, o do Ministério da Cultura elaborado
pelo Partido Socialista. Em relação a isso há realmente alguma recuperação, mas parece-nos que ela é manifestamente
insuficiente e pouco mais resolve do que os problemas de sobrevivência dos serviços que, aliás, por estarem eventualmente
dimensionados para outro tipo de actividades, quer do ponto de vista quantitativo quer qualitativo, absorvem uma parte
significativa desse aumento. Não poderemos, portanto, acompanhar V. Ex.ª quando diz que à prioridade na Educação
correspondeu uma prioridade na Cultura. Julgamos que não é assim. Há de facto uma prioridade na Educação, mas não nos
parece que haja uma prioridade na Cultura. E porquê? Talvez seja uma resposta que nos interesse ouvir, Sr. Ministro. Mas,
mais grave do que isso, do nosso ponto de vista, é que, reconhecendo o Governo (e nós também o fazemos) que é difícil neste
momento encontrar um modelo de financiamento da cultura exclusivamente público, não se vislumbram - ou se assim não é
gostaria que V. Ex.º nos referisse esses aspectos - no Orçamento caminhos no sentido de criar, ou desenvolver, um modelo
alternativo que assente em outras fontes de financiamento que não as do financiamento público. Pensamos que era possível,
desde já, haver uma tradução mais evidente desse novo modelo que nos poria, aliás, no rumo de alguns países da Europa ou
do mundo ocidental. Por outro lado, há uma preocupação suplementar, Sr. Ministro: a integração na Comunidade Económica
Europeia e, sobretudo, o desenvolvimento de técnicas de comunicação de massa e a abertura do nosso país a culturas vem pôr
um claro problema de defesa da nossa identidade cultural. E não vemos, na execução orçamental, qualquer tipo de prioridades
para atender a esses problemas, não apenas do ponto de vista interno reafirmando a capacidade criativa dos nossos artistas e
criando condições para uma protecção cultural mas, sobretudo, no plano externo, permitindo uma afirmação clara da nossa
identidade cultural na Europa em que agora vamos concorrer e não apenas no plano económico. Finalmente, Sr. Ministro da
Educação, gostaria de referir que num Governo que tem - e tão galhardamente assume - as preocupações da tecnocracia, ou
melhor, da competência tecnocrática, talvez não ficasse mal uma certa reverência pela cultura. É que as duas coisas não são
incompatíveis e quando olhamos para este Orçamento e comparamos as várias rubricas, quer do seu Ministério quer dos
outros, com as rubricas do orçamento da Cultura, ficamos, de facto, ainda mais convencidos que a vertente tecnocrática
subverteu completamente a vertente da Cultura, o que, a nosso ver, é não só inadequado como inconveniente para o País.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr.. Deputado Daniel Bastos. O Sr. Daniel Bastos (PSD):
- Sr. Ministro da Educação e Cultura, tem chegado ao meu .conhecimento que os coordenadores concelhios para a educação
física estão totalmente desactivados, sem qualquer verba que possibilite desencadear acções decorrentes da missão para que
foram nomeados. Sendo assim estes professores mantêm-se inactivos há longo tempo, sem que da sua acção haja qualquer.
benefício para a juventude ou para as comunidades locais em que. se inserem. A pergunta que desejaria colocar é a seguinte:
não entende o Sr. Ministro que estes lugares deveriam ser extintos imediatamente e os professores em causa ficarem na
dependência das delegações escolares até ao fim do ano, altura em que deveriam retomar. o seu lugar nas suas próprias
escolas, ou, em caso contrário, serem-lhes dadas condições que possibilitassem a sua acção? O, Sr. Presidente: - Tem a
palavra o Sr. Deputado Fillol Guimarães. . O Sr. Fillol Guimarães (PS): - Sr. Ministro da Educação e Cultura, como disponho
de muito pouco tempo, .colocar-lhe-ia apenas uma pergunta muito concreta. Segundo penso, a política de educação de adultos
deste Ministério é um dos factores que tem merecido maior número de reparos, quer em Comissão, quer no exterior desta
Assembleia, Penso que o Sr. Ministro conhece relativamente bem as carências do sector da educação de adultos neste país
e que tem uma opinião formada a esse respeito, mas penso também que há um aspecto que não foi tido em linha de conta.
É que é precisamente neste ano de 1986 que o CNAEBA efectua uma avaliação do que foi a educação de adultos durante os
últimos 5.anos. Penso que será a partir dessa avaliação dos resultados a ter em conta e de novas reformulações possíveis para
o: plano que poderemos reformular a política de educação de adultos ou continuar a insistir no mesmo aspecto, o que me
parece errado. Dadas estas considerações, perguntaria ao Sr. Ministro se, atendendo à exiguidade da verba que é necessária
para manter em funcionamento o actual plano de educação de adultos e aos trabalhos em curso, não seria possível ainda
inverter-se a tendência para este despir de verbas neste capítulo? O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria
Santos. ' . A Sr.ª Maria Santos (Indep.): - Sr. Ministro . da Educação e Cultura; também tenho muito pouco tempo para falar,
pelo que me irei cingir a alguns dos aspectos que vêm consignados nas grandes opções do Plano. Nomeadamente, o aspecto
da inovação cultural está certo. Porém, lembraria que, há um século atrás, José Leite Vasconcelos referiu que «para que um dia
se possam estudar completamente as nossas tradições populares, é da máxima importância formar colecções parciais
correspondentes às províncias ou aos concelhos». 15to tem a ver com o levantamento cultural do nosso país. Não considera o
Ministério da Educação e Cultura um instrumento fundamental a necessidade do levantamento cultural do nosso país? 15so vem
reforçado depois por Jorge Dias quando diz que «nós, portugueses, estamos não nas vésperas, tuas em plena fase de
perdermos toda essa riqueza do passado». Vamos continuar, pois, apostados na indiferença que os poderes políticos mostram
pela nossa memória colectiva? 15to parece-me extremamente importante quando se avança para o problema da inovação
cultural, o que, como eu disse, está correcto. Não podemos é esquecer a importância do levantamento cultural do nosso país,
que ainda não está feito. Relativamente ao reforço da dimensão cultural da política educativa, também isso está muito bem.
Vamos é' ver o que é que acontece em termos práticos. •! Em termos de opções vocacionais existentes, por exemplo, no
ensino secundário, sabemos que a maior parte das nossas escolas apenas conta com uma turma ou de música, ou de teatro, ou
de outro tipo de área de vocação eminentemente artística e que depois, a partir do 10.º ano, já não há essa componente. Este é
um aspecto que temos de acautelar. Por outro lado, em termos do Conservatório Nacional, as crianças que frequentam o ciclo
preparatório ou as que já frequentam o ensino secundário não têm condições efectivas, porque não existe um plano de ensino
artístico integrado em que elas tenham oportunidade de ter a sua formação normal e académica e uma dimensão artística.
Perguntar-lhe-ia também o seguinte: para quando o plano nacional de educação artística? Parece-me que isso é também outra
pedra basilar, por um lado, na componente cultural e, por outro, na formação, nomeadamente na formação de um povo que
tem tradições em termos musicais extremamente importantes. . Vozes do PCP: - Muito bem! A Oradora: - Falando agora da
questão do patrocínio particular empresarial com que terminou a sua intervenção, esta é, quanto a nós, uma orientação política
que. não nos parece nem capaz de melhorar minimamente a situação nem a mais ajustada à nossa realidade, cultural e
educacional. A lógica particular empresarial, porque baseada no lucro, não pode acautelar de modo eficaz assuntos de natureza
história e cultura, nem corresponder adequadamente a tamanho interesse nacional. Por outro lado, em termos da difusão
cultural que também vem aqui contemplada, também está certo. Então, vamos criar as condições para que os órgãos de
comunicação social, nomeadamente a televisão, adeqúem a sua intervenção no espaço nas noites portuguesas com a
diversidade regional, a nossa cultura, a divulgação dos nossos valores regionais. É isso o que se diz aqui na difusão cultural?
Eram estas algumas das questões que queria colocar. Desejaria colocar mais, mas não disponho de tempo para esse efeito. O
Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Domingues. O Sr. Agostinho Domingues (PS): - Sr. Ministro da
Educação e Cultura, dada a escassez de tempo, vou circunscrever-me a uma única questão. O Sr. Ministro sabe melhor do
que eu que um dos problemas mais graves da educação é o da carência de escolas, nomeadamente ao nível do ensino
preparató-

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70 DE MARÇO DE 1986 1661
rio e secundário. Trata-se de um problema gravíssimo resultante não só da superlotação das
escolas, como também da falta de condições pedagógicas mínimas para o exercício da aprendizagem e da docência. O PSD
tem sido responsável, já há vários anos, pelo Ministério da Educação. Naturalmente, o Sr. Ministro possui dados que permitem
uma calendarização no tempo de soluções para este magno problema. Pergunto concretamente ao Sr. Ministro se está em
condições de fornecer a esta Câmara e ao País alguns dados que nos permitam vislumbrar, em termos de um futuro muito
próximo, as soluções para este problema. Perguntaria ainda ao Sr. Ministro se me pode esclarecer sobre se é ou não possível
ir buscar ao FEDER verbas para a construção de escolas, nomeadamente ao nível do interior. O Sr. Presidente: - Tem a
palavra o Sr. Deputado José Apolinário. O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Ministro da Educação e Cultura, em matéria de
política social no que concerne ao ensino superior, um dos problemas que ciclicamente tem animado os meios estudantis
universitários e a universidade em geral relacionasse com os serviços sociais universitários. Neste sentido, pergunto o seguinte:
quais as perspectivas político-financeiras do Ministério da Educação e Cultura nesta matéria para o ano em curso? Tenciona o
Ministério propor ao CASES alterações no valor das propinas, nos preços dos serviços, designadamente nos preços das
refeições nas cantinas e residências e nas bolsas? Qual a resposta do Ministério em relação às reclamadas alterações ao nível
da gestão dos serviços sociais universitários? O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Ministro da Educação e Cultura, embora o Governo apresente um
Orçamento do Estado para 1986 com um acréscimo positivo das despesas públicas para a educação e tenha definido no seu
Programa este sector como prioritário, o que - não há dúvida - é sempre de saudar, a omissão na proposta de lei de
Orçamento do Estado de alguns sectores prioritários a definir na educação justifica algumas dúvidas. Por exemplo, em termos
reais, parece que o peso da verba para a Acção Social Escolar baixa. Perante isto, coloco-lhe apenas a seguinte pergunta: com
as verbas que este Orçamento atribui à educação, sector que regista o maior aumento relativo, poderá o Sr. Ministro fazer face
a todas as dificuldades enunciadas, a outras específicas, como, por exemplo, as ligadas à Acção Social Escolar e a outras mais
gerais, como a de uma correcta articulação entre o sistema escolar, o desenvolvimento económico e o emprego? O Sr.
Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Conceição. O Sr. Fernando Conceição (PSD): - Sr. Ministro da
Educação e Cultura, em primeiro lugar, gostaria de me congratular com a prioridade dada à educação, que se reveste de duas
vertentes fundamentais: a criação de infra-estruturas, ou seja de escolas, e a formação de professores, para se obter um ensino
de qualidade. É certo que todos lamentamos a insuficiência de verbas. Com certeza que esta Câmara não vai buscar a outros
ministérios verbas para dar à educação nem pensa aumentar a carga fiscal ou a dívida pública. Daí que o Sr. Ministro tenha
naturalmente de procurar racionalizar os gastos. É neste sentido que gostaria de lhe colocar três questões. Uma delas diz
respeito à possibilidade de, para reduzir os gastos, se caminhar para uma efectiva descentralização, isto é, de se criarem nas
diversas regiões órgãos com poderes de decisão para poderem implementar as acções que se tornem indispensáveis. Outra,
ligada a um sector que se diz esquecido, consiste na seguinte pergunta: não seria possível que a educação dos adultos fosse
uma educação integrada - não apenas de alfabetização, chamando em auxílio as autarquias e outras instituições de carácter
privado? Em terceiro lugar, dado, que entrámos na CEE e que regressam cada vez mais jovens portugueses de segunda
geração, que pensa o Ministério fazer em sentido social e educacional e em apoios financeiros a ir buscar algures para facilitar a
integração dos jovens no nosso sistema educacional? O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da
Educação e Cultura. O Sr. Ministro da Educação e Cultura: - Sr. Presidente, começaria por pedir autorização a V. Ex.ª para
que, na parte referente à cultura, pudesse usar da palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Cultura. O Sr. Presidente: - Com
certeza, Sr. Ministro. O Sr. Ministro da Educação e Cultura: - O tempo também é escasso, pelo que vou procurar sei tão
rápido quanto possível. No que diz respeito ao Orçamento proposto pelo Ministério da Educação, diria ao Sr. Deputado Jorge
Lemos que todas as verbas que referi e todas as comparações que foram feitas tiveram como base o Orçamento para 1986 já
deduzido dos aumentos do vencimento. Quanto à questão da lei de bases, não posso deixar de me congratular por a
Assembleia da República a vir a aprovar em Junho, tanto mais que haverá que sintonizar uma série de acções do Governo,
quer no domínio da gestão corrente quer no da criação de infra-estruturas, com aquilo que essa lei de bases vier a propor e a
ser aprovada. A proposta de lei não foi feita para evitar a rigidez. O Sr. Deputado sabe que o Governo mudou entretanto, no
final do ano, o que dificultou, naturalmente, a acção potencialmente possível a esse respeito. No que diz respeito às questões
colocadas pelo Sr. Deputado Daniel Bastos, devo dizer que os serviços de educação física e desporto escolar a que se refere
vão ser integrados na direcção-geral dos Desportos. O objectivo é o de não duplicar estruturas e utilizar o melhor possível os
meios. Não vão ser eliminados todos os cargos concelhios que estavam criados, mas apenas aqueles que se mostravam
supérfluos, o que vai ser articulado num programa que, aliás, já está aprovado neste momento com a Direcção-Geral dos
Desportos.

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No que diz respeito à educação de adultos e à questão levantada pelo Sr. Deputado Fillol
Guimarães, também me congratulo com a reformulação da política que aparentemente o CNAEBA vai fazer. Efectivamente, a
razão custos/benefícios dos programas que têm vindo a ser seguidos nos últimos anos é francamente desanimadora. Daí que,
nos próprios serviços do Ministério, se tenha pedido à respectiva Direcção-Geral que tentasse que os cerca de 800 000
contos imputáveis a essas acções pudessem ter de facto um rendimento acrescido. Relativamente à questão colocada pela Sr.º
Deputada Maria Santos quanto ao ensino artístico e integrado, foi criada já, para esse efeito, uma comissão mista - que julgo
ter referido na minha intervenção - entre o sector da educação e o sector da cultura. É extremamente encorajador o primeiro
relatório preliminar que fizeram e aquilo que vai seguir-se é uma articulação dessa proposta com aquilo que vier a ser a lei de
bases do sistema educativo. Neste momento, posso dizer que é com grande esperança que penso que vai poder ser uma
realidade já a partir do próximo ano. O Sr. Deputado Agostinho. Domingues referiu a carência de escolas. Efectivamente assim
é diria que não só de escolas, mas também de equipamentos educativos, sendo o próprio apetrechamento escasso.
Consideramos que a partir do próximo ano podemos entrar no chamado ritmo de construção normal. Esse ritmo tem a ver já
com uma previsível expansão da escolaridade obrigatória, provavelmente para 9 anos. Aliás, o esforço que o Governo fez este
ano na parte de infra-estruturas tem a ver com a vantagem; que pensamos haver, em antecipar a existência de infra-estruturas
para que essa projectada reforma do sistema através da lei de bases não fique condicionada depois por não haver
infra-estruturas para o efeito. O mesmo se passou no que diz respeito ao estímulo às escolas superiores de educação e aos
CIFOP. O número de escolas que tencionamos construir não sei se já o referi - é de cerca de 40 por ano. Quanto ao apoio do
FEDER, pensamos que ele poderá ser conseguido principalmente para o ensino politécnico. Aliás, isso já está em negociações
e os quatro projectos que apresentámos foram todos aprovados, o que permitirá, naturalmente, libertar algumas verbas para os
segmentos do ensino não superior e poder-se-á ainda, no caso de algum ensino técnico-profissional. de grande impacto
regional ou de grande necessidade, integrar os chamados PIDR. Se assim for isso também poderá ser realizado através do
FEDER. No que diz respeito à questão levantada pelo Sr. Deputado José Apolinário, penso que ela tem de ser colocada ao
contrário: não é o Ministério da Educação e Cultura que propõe ao CASES; o que a lei determina é que o CASES proponha
ao Ministério da Educação e Cultura, aguardando este essa proposta. Os aumentos consignados na Acção Social Escolar
dizem respeito, note-se bem, apenas a 3 meses, Outubro, Novembro e Dezembro - isto porque é a partir do princípio de cada
ano lectivo que são mudadas as condições, pelo que, segundo julgamos, o aumento antecipado através do Orçamento do
Estado contemplará aquilo que for acordado com o CASES. Aliás, relativamente à Acção Social Escolar, será bom dizer que
não houve qualquer diminuição,. antes pelo contrário. A variação de 1985 para 1986 é de qualquer coisa como 2 128 000
contos para 2 700 000 contos. Se isto é uma diminuição, então não sabemos fazer contas. No que diz respeito à questão,
levantada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, da articulação como no emprego e o desenvolvimento económico,
não poderia o Ministério da Educação e Cultura estar mais de acordo. Nesse sentido, é essa uma das vertentes em que a
recém-empossada comissão de reforma está a trabalhar. Finalmente, quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado
Fernando Conceição, penso que a racionalização de gastos se impõe não apenas ao nível do Ministério da Educação e
Cultura, mas também em todo e qualquer serviço público. 15to pela razão de que qualquer escudo gasto a mais ou mal gasto é
um escudo a menos para o investimento. O sector da educação, de que sou responsável, entende que uma das vertentes da
política de defesa da juventude é precisamente a de aumentar o investimento e criar riqueza. O Sr. Carlos Coelho (PSD): -
Muito bem! O Orador: - A descentralização está programada e pensamos poder levá-la a efeito dentro em breve. No que diz
respeito à educação de filhos de emigrantes ou emigrantes de segunda geração, pensamos poder beneficiar de um programa
que existe ao nível da CEE precisamente com esse objectivo. Aliás, ainda hoje à noite vou ter uma reunião precisamente para
esse efeito. O Sr. Presidente: - Julgo que os Srs. Deputados que pediram esclarecimentos ao Sr. Ministro da Educação e
Cultura no âmbito do sector cultural não vêem qualquer inconveniente em que seja a Sr.ª Secretária de Estado da Cultura a
responder a esses pedidos de esclarecimento. Há alguma objecção? Pausa: Não havendo objecções, assim se fará. O Sr.
Gomes de Pinho (CDS): - Peço a palavra, Sr. Presidente. O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado? O Sr. Gomes de
Pinho (CDS): - Sr. Presidente, .como o Sr. Ministro anunciou que o Governo dispunha já de pouco tempo, estamos na
disposição de ceder algum à Sr.ª Secretária de Estado, se dele necessitar, para responder às perguntas que lhe foram
colocadas. O Sr. Presidente: - Certo, Sr. Deputado. Aliás, pelas indicações de que a Mesa dispõe, é natural que o Governo
precise de tempo. Para responder, tem a palavra a Sr.º Secretária de Estado da Cultura. A Sr.º Secretária de Estado da
Cultura (Teresa Patrício Gouveia): - Julgo que não precisarei de muito tempo. Começo por responder às questões que foram
levantadas pelo Sr. Deputado Gomes de Pinho, agradecendo-lhe a sua referência aos meus eventuais méritos:

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20 DE MARÇO DE 1986 1663
Relativamente à extinção do Ministério da Cultura, peço desculpa ao Sr. Deputado, mas
penso que isto é um cliché, um argumento retórico que já foi suficientemente esclarecido, pelo que não vamos agora perder
tempo a rebatê-lo. Efectivamente, as estruturas, tanto financeiras como técnicas e humanas, são as mesmas. Trata-se de uma
questão que pode ser mais simbólica do que efectiva. Quanto aos problemas relacionados com a criação cultural, gostaria de
dizer que no Fundo de Fomento Cultural, existem verbas importantes afectadas directamente ao incentivo à criação, que
representam uns largos milhares de contos que vamos aplicar em pré mios nas várias áreas. Para além de outras medidas, estas
são as mais significativas. Relativamente ao peso do pessoal no orçamento da Secretaria de Estado da Cultura, gostaria de
lembrar que 57 % das despesas de pessoal estão afectas a instituições cuja rentabilidade depende da existência de pessoal. É o
caso dos museus, das bibliotecas, dos arquivos e de outros serviços dependentes, cuja rentabilidade reside justamente na
existência de pessoal que possa atender às exigências dos serviços públicos. Quanto à utilização das tecnologias da
comunicação, gostaria apenas de referir que já existem contactos estabelecidos com a televisão no sentido de se promover um
plano conjunto de produção de programas audiovisuais que, tanto quanto posso dizer, está bem encaminhado. Inclusivamente,
há também verbas no Fundo de Fomento Cultural afectas ã realização de programas para a televisão de divulgação do
património nacional, suportadas, em larga medida, por verbas da Secretaria de Estado da Cultura. Gostaria também de me
referir a uma intervenção, que não ouvi mas de que tive eco, feita pelo Sr. Deputado Armando Fernandes relativamente à
actividade do Instituto Português do Livro. O Sr. Armando Fernandes (PRD): - Eu não falei no Instituto Português do Livro! A
Oradora: - Em todo o caso, relativamente à área da leitura, verificam-se aumentos de 6107o no PIDI3AC para este efeito. A
verba inscrita de 65 500 contos constitui uma verba realista para lançar um programa de leitura pública que a Secretaria de
Estado da Cultura decidiu promover. Essa verba não se dedica, evidente mente, a comprar livros ou páginas de livros para os
10 milhões de portugueses, mas a iniciar uma acção, em profundidade, nesta área que aparentemente, até hoje, ninguém
entendeu necessário promover. É certo que não tem o rendimento a curto prazo mas, mesmo assim, decidimos empreendê-la.
Risos gerais. Relativamente ao que a Sr.ª Deputada Maria San tos disse quanto à questão do levantamento cultural, penso que
ele foi interrompido por excesso de ambição. Foi iniciado há uns anos atrás e penso que estava organizado de maneira a
corresponder a uma espécie de curiosidade universal que só poderia ter um carácter académico. Pretendemos agora promover
algumas acções de levantamento relacionadas com projectos que, efectivamente, queiramos promover. Concretamente, é o
raso do livro - e penso que tem conhecimento das intenções do Governo nesta matéria - e é o caso dos recintos de
espectáculos, porque eles correspondem, efectivamente, a projectos de intervenção. Relativamente aos municípios, falou-se
aqui em fontes alternativas de financiamento. De facto, o orçamento da Secretaria de Estado da Cultura beneficiou de um
aumento de 49 % relativamente ao ano passado. Contudo, este aumento não é suficiente. Aliás, não seria suficiente nem um
aumento de 100% nem, porventura, aumentos ainda maiores. Postas as questões nestes termos, seremos levados a concluir
que a expectativa de resolução de problemas culturais em Portugal não pode dirigir-se exclusivamente à administração central.
Aproveito a oportunidade para pedir aos Srs. Deputados que digam aos vossos constituintes que dirijam também as suas
expectativas para a administração local. Sem querer abdicar das responsabilidades que cabem à administração central, penso
que uma mudança de atitude nesta matéria viria não só provocar porventura um reforço de fontes alternativas de financiamento,
mas também criar progressivamente a possibilidade de uma autonomia relativamente à resolução, necessariamente mais
adequada, de um grande número de problemas. Penso que isto vai, aliás, de acordo com o desejo generalizado de
descentralização. Falando em fontes alternativas de financiamento - e vou já terminar -, sublinha-se a intenção de implicar, não
só a administração central e local, mas a sociedade portuguesa no desenvolvimento da cultura do País e, por isso, foi pedida à
Assembleia uma autorização legislativa para promover acções em matéria de incentivos fiscais. Mais do que medidas de
alcance financeiro, penso que estas medidas poderão ter consequências culturais importantes e profundas na responsabilização
cultural da própria sociedade. Respondendo às reservas que a Sr.º Deputada Maria Santos fez sobre esta eventual demissão -
digamos assim - de responsabilidades por parte do Governo, devo dizer que penso que isso não tem lugar. As fontes
alternativas de financiamento, neste caso as privadas que se poderiam conseguir, pela experiência verificada em muitos países,
aplicam-se, sobretudo, a actividades culturais supletivas e não àquilo que é essencial e que compete ao Estado assegurar,
àquilo que é estrutural. Aliás, isto faz-se há muitos anos na Europa e tem sido especialmente promovida até por governos com
insuspeitas preocupações em matéria social. Aplausos do PSD e do CDS. O Sr. Presidente: - Tal como foi sugerido, o tempo
gasto pela Sr.` Secretária de Estado da Cultura será descontado no tempo de que o CDS dispunha, representando um
verdadeiro tempo cultural do CDS. Para uma intervenção, está inscrito o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
Contudo, ele não se encontra na Sala, mas é natural que não se demore. Pausa. Aliás, Srs. Deputados, a prontidão com que
um funcionário acaba de entrar em contacto com o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca é um exemplo que devemos
seguir para o futuro no Plenário da Assembleia da República. Tem então a palavra, Sr. Deputado João Corregedor da
Fonseca.

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Presidente, antes de mais tenho que
pedir desculpas ao Sr. Ministro da Educação e Cultura, porque, tendo que me deslocar ao meu gabinete, não ouvi a resposta
relativa à pergunta que lhe formulei. Risos do PSD. Os Srs. Deputados do PSD não gostam de atitudes correctas, mas nós
somos bastante educados, Srs. Deputados. Risos do PSD. Gosto muito de ver os Srs. Deputados bem dispostos quando
sentem que as críticas ao Plano e ao Orçamento do Estado para 1986 são cada vez mais rigorosas! ... Risos do PSD. E
podem ir para o futebol; Srs. Deputados!... O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, não estamos
propriamente a travar diálogo. Faça favor de fazer a sua intervenção. O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr.
Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Um debate sobre as grandes opções do Plano e sobre o Orçamento
do Estado tem necessariamente de concitar as atenções gerais, não só desta Assembleia da República, como da própria
população, já que, na nossa opinião, é o principal debate político que decorre no nosso Parlamento. Entendemos no
MDP/CDE que, - numa discussão deste género, em que estão em causa as grandes linhas que podem, ou não, proporcionar o
arranque da nossa economia, o desenvolvimento, ou não, do País, o debate deve ser desdramatizado, pelo que não aceitamos
qualquer tentativa, nomeadamente por parte do Governo, de manipular a opinião pública com afirmações que não concorrem
para a criação de um ambiente propício a uma apreciação serena e rigorosa de propostas de lei tão importantes como as que
neste momento são objecto de análise. Extremar posições, como por vezes acontece, não facilita o relacionamento entre o
Governo e a Assembleia da República. O que nos deve preocupar é a análise dos problemas, é a proposta governamental. O
facto de haver deputados e grupos parlamentares fortemente críticos em relação às intenções governamentais, essas posições
não podem nem devem ser entendidas, como já se propalou, como assim só podemos classificar essa actuação como pouco democrática. Não vamos, por isso, aceitar de bom grado as posições
assumidas por uns quantos, governantes ou não, que, sem aceitarem regras eminentemente democráticas, se situam num
pólo que só visa a propaganda fácil. Quando o Sr. Ministro das Finanças declara, como aconteceu, ontem, aqui, que o que
está em causa é uma «questão de interesse nacional», ligando esta frase à necessidade de se impor a «dignidade das instituições
democráticas», à «solidez do regime» e ao «prestígio dos órgãos de soberania», esta Assembleia da República deve, e, pela
nossa parte, fazêmo-lo sem dificuldade, informar o Governo de que na Assembleia da República esses preceitos são
respeitados e que esta Assembleia da República só espera e exige que o Governo os saiba, também, respeitar. Sr. Presidente,
Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: As linhas de força da política económica que o MDP/CDE defende situam-se
essencialmente no seguinte: no aumento da produção, predominantemente dirigido para a substituição das importações e
valorização dos recursos nacionais; na redução progressiva da dependência tecnológica e na busca de um novo
posicionamento de Portugal na Divisão Internacional do Trabalho; no reconhecimento da imperiosa necessidade de planear o
desenvolvimento económico numa perspectiva de longo prazo. O MDP/CDE considera que o País carece de uma política
económica que tenha como objectivos prioritários: a elevação da qualidade de vida do povo português, particularmente das
camadas mais desfavorecidas, mediante a progressiva melhoria das necessidades básicas; a recuperação do aparelho produtivo
nacional, baseado na resposta ao mercado interno e na diversificação das exportações; a redução da dependência externa,
com particular incidência nos domínios alimentar, energético, dos transportes, dos bens intermédios e de consumo. Poderão
dizer alguns Srs. Deputados, e mesmo o próprio Governo, que também desejam atingir esses objectivos. Não duvidamos. A
questão é a de se saber se, através das grandes opções do Plano e do Orçamento do Estado apresentados, se conseguirão
atingir esses objectivos e melhorar substancialmente as condições de vida dos Portugueses, se a nossa economia vai finalmente
arrancar, se o desenvolvimento e o crescimento do País virão a ser uma realidade, enfim, se aquelas prioridades virão ou não a
ser atingidas. Temos, Srs. Deputados, algumas dúvidas. E a primeira dessas dúvidas reside no facto de o Governo basear toda
a estratégia da sua política de recuperação económica no sector privado, relegando para plano inferior o sector público
produtivo. Será essa uma boa política? Conduzirá a resultados positivos? Quer-nos parecer, Srs. Deputados, que não. Nós, no
MDP/CDE, não temos preconceitos nem complexos de nenhuma espécie. A nós nunca nos repugna aceitar o que, na nossa
óptica, é uma actuação positiva, quer por parte do Governo, quer por parte dos partidos que o apoiam, quer por parte da
oposição. E assim nos manteremos. Por isso, não vamos declarar que tudo nestas propostas de lei é negativo, nomeadamente
quando a margem de manobra é elevada. No entanto, receamos que mesmo medidas correctas enunciadas possam vir a
manifestar-se de forma incorrecta, como, por exemplo, as intenções do Governo de aumentar as infra-estruturas no sector
público administrativo. Receamos, contudo, que as prioridades nem sempre considerem os interesses nacionais pelo simples
facto, bem grave, de tudo poder vir a ser subordinado apenas ao interesse privado. Por outro lado, também temos sérias
dúvidas porque o Governo se mantém muito ligado a sectores privados dos mais retrógrados, o que causará, a breve prazo,
novas e mais acrescidas dificuldades ao País. E porquê, Srs. Deputados? Passemos então a exemplificar os motivos que nos
levam ao nosso cepticismo. Os objectivos apontados pelo Governo para a sua política - eliminação duradoura do desequilíbrio
da balança de transacções correntes, a redução da infla-

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ção para níveis próximos da média da CEE, a redução progressiva do desemprego e o aumento do
nível de vida da população - são, no entendimento do MDP/CDE, perfeitamente correctos. Embora a forma como atingiremos
alguns e em que prazo - a redução do desemprego, por exemplo - seja omissa em toda a explanação das grandes opções.
Não pode, porém, deixar de se levantar mais uma dúvida: como conseguirá o Governo alcançar estes objectivos se, na sua
óptica, o motor do desenvolvimento económico deverá ser o sector privado? Como poderá garantir uma actuação coerente
com os seus objectivos por parte da iniciativa privada? Como conseguirá não só que o sector privado aumente em 10% os
seus investimentos, mas ainda que esses investimentos sejam aplicados nos sectores prioritários e em percentagens correctas,
se o Governo, em relação ao sector privado, tem apenas um poder indicativo? E se esta dúvida se pode sempre pôr, a situação
específica em que se foi formando em Portugal a economia ainda a torna mais fácil. A iniciativa ficará na mão dos empresários.
E ao falar dos empresários portugueses não podemos deixar de os dividir em dois grupos. Destes, o mais poderoso, sem
qualquer dúvida, e que tem como organização representativa a CIP, mantém uma mentalidade profundamente conservadora.
Parece que ainda não se adaptaram ao processo democrático e pretendem o restabelecimento de um Estado autoritário onde
possam ser preponderantes! Tomemos como exemplo a afirmação do presidente da CIP, na qual salienta que a vitória do
Presidente Mário Soares nas eleições presidenciais levará a anular muitos projectos de investimento dos empresários. Aos
aspectos negativos que resultam da sua actuação económica há que adicionar uma actuação política pouco democrática,
defendendo a liberalização dos despedimentos, manifestando-se contra direitos legítimos dos trabalhadores e esperando,
sempre, a muleta dos subsídios estatais. Habituados a desenvolver a sua actividade económica num regime que negava os
direitos elementares aos trabalhadores, não se adaptaram aos processos democráticos, recusam a existência de uma classe
trabalhadora com os direitos que a Constituição garante e sonham com um outro regime que, podendo ter um aspecto formal
de democracia, lhes permita uma liberdade de actuação que não seja limitada pelos direitos dos trabalhadores. Não
conseguimos ver este grupo de empresários preocupado em aumentar o nível de vida da população ou em diminuir
significativamente o desemprego. É evidente que existem empresários com uma mentalidade de raiz democrática que lhes
permite ter uma actuação que, embora tendente a conseguir do poder político as condições o mais favoráveis possível, não são
antagónicas em relação às estruturas democráticas e são capazes de procurar, em conjunto com os representantes dos
trabalhadores e sob a égide interessada do Governo, soluções que sejam globalmente aceitáveis por todos. Mas a sua força
económica e política não lhes garante a possibilidade da superação dos sectores conservadores e autoritários, que continuam a
ter uma importância muito grande. Do que acabamos de referir, não podemos deixar de concluir que a parte mais
conservadora dos empresários só investirá se lhe forem garantidas condições excepcionais, incompatíveis com um
desenvolvimento 1665 harmonioso da nossa economia que, entre outros objectivos, permita o desaparecimento do
desemprego e a melhoria continuada do nível de vida das populações. Outro problema que nos preocupa seriamente é o papel
a desempenhar pelas pequenas e médias empresas industriais e comerciantes. Na proposta de lei há uma omissão grave sob
este sector. Existe ainda um grande número de pequenas e médias empresas que geralmente apresentam uma estrutura
económico-financeira distorcida, gravemente afectada pela política de austeridade, que precisará de uma assistência e apoio
específicos das entidades oficiais para conseguirem ultrapassar as actuais dificuldades e tornarem-se num factor positivo no
processo de desenvolvimento económico que se torna cada vez mais urgente. É notório que uma política económico-financeira
dirigida pelos grupos mais conservadores se oporá, também, a esta recuperação da generalidade das pequenas e médias
empresas. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Não vale a pena tentar especular connosco. Já aqui o
dissemos, desta mesma tribuna, que o MDP/CDE reconhece ao sector privado um papel fundamental no desenvolvimento
económico do País e considera que a política económica e financeira do Estado deve garantir, apoiar e incentivar a
contribuição dos empresários que apostem e se integrem numa actividade empresarial normal, não especulativa nem
fraudulenta». Uma política estável de crescimento económico que, entre outros objectivos, pretende diminuir o desemprego e
aumentar o nível de vida não poderá assentar apenas na actuação dos sector mais conservador e retrógrado dos empresários;
terá de se fazer, apesar da sua existência, reunindo, numa plataforma consensual, os restantes empresários, incluindo os médios
e pequenos empresários e os trabalhadores. Deverá respeitar, no essencial, os actuais sectores da vida económica, ou seja, o
público, o privado e ó cooperativo, bem como os seus limites, e procurar que todos eles se empenhem no processo de
desenvolvimento do País. O sector público, dada a sua importância e o facto de nele o Governo actuar directamente, terá de
ser o motor do processo de desenvolvimento e a sua actividade deverá processar-se de forma a que influencie positivamente
os outros sectores, a quem o Governo crie condições que lhes permitam participar em pleno no processo de crescimento
económico. Esta actuação implica que, no campo político, se procurem e se consigam consensos que abranjam os sectores
democráticos na sua mais ampla definição. A orientação do actual Governo, de novo expressa nos documentos que estão em
apreciação, não é de molde a que possa fomentar esses consensos, tendendo antes a radicalizar oposições e conflitos sociais.
Os interesses nacionais obrigam a que se procurem soluções mais correctas e compatíveis com esses interesses e existem
condições para que esses objectivos sejam alcançados. É nossa tarefa concretizá-los. Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs.
Membros do Governo: O Governo, ao prever apenas um crescimento tão diminuto para o sector público, vai, com certeza,
provocar deliberadamente dificuldades acrescidas ao sector produtivo empresarial do Estado.

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É uma condicionante fundamental para o posicionamento do Governo face ao ordenamento
constitucional da estrutura económica do País a existência de um sector público industrial forte e importante em termos de
integrar as actividades básicas e, por isso, potenciar uma dinâmica de arrastamento de outros sectores de actividade. Esta é
uma forma bem clara de o Governo menosprezar o sector empresarial do Estado, que tem sido, em grande medida,
obstaculizado pelo seu proprietário, que é o próprio Estado, e mal gerido numa perspectiva atomizada de empresas
independentes, em vez de coordenada de modo global e fazendo recair sobre o sector empresarial do Estado o peso das
dificuldades financeiras do Estado, levando ao seu estrangulamento financeiro, como forma de impedir o seu papel de
dinamização económica. Torna-se evidente que o Governo procura dar de si uma imagem de capacidade técnica. A essa
capacidade técnica corresponderá, Srs. Deputados, idêntica capacidade política para resolver os problemas nacionais? E essa
capacidade técnica foi bem expressa nos diplomas em causa? Já aqui outros deputados manifestaram as suas reservas quanto a
alguns aspectos das propostas de lei. É evidente, é público, é manifesto, a enorme carga fiscal que se tem abatido sobre os
Portugueses, nomeadamente sobre os que vivem dos rendimentos do trabalho. Está mais do que clarificado que o Governo não
tinha qualquer razão quando, numa acção de propaganda manipuladora da opinião pública, declarou que os impostos iriam
baixar. Já ontem tivemos oportunidade de, a este respeito, interpelar, o Governo, sem ouvir resposta satisfatória. Mesmo no
imposto profissional não vai haver desagravamento fiscal, a não ser para quem ganhe mais de 1750 contos anuais. Grave,
também, é o facto de o Governo não se, preocupar, ser praticamente omisso no que. se refere à política de emprego. Como
podemos estar tranquilos quando se verifica que este gravíssimo problema não foi devido e exaustivamente equacionado - pelo
Governo? As propostas de lei do Governo, Srs. Deputados, deviam dar resposta urgente à pobreza, ao desemprego, aos
salários em atraso, às pequenas e médias empresas que correm para a falência e abrir caminho à solução dos problemas de
habitação e de saúde. Mas não é_ isto que infelizmente nos é proposto. As propostas de lei das grandes opções do Plano e do
Orçamento do Estado para 1986, Srs. Deputados, suscitam-nos, pois, as mais profundas reservas. Aplausos do MDP/CDE,
do PCP e da deputada independente Maria Santos. O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr.
Deputado Gomes de Pinho. O Sr. Gomes de Pinho (CDS): - Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, já estávamos a ficar
preocupados pela ausência manifesta neste debate do discurso da ortodoxia socialista. Só que, com alguma: surpresa nossa,
ele não veio da bancada do costume, que é a do Partido Comunista Português, mas do Sr. Deputado João Corregedor da
Fonseca. O Sr. Borges de Carvalho (Indep.): - É a mesma coisa! O Orador: Aliás, o Partido Comunista tem estado,
estranhamente, moderado neste debate, regra a que o seu discurso, Sr. Deputado João Corregedor da- Fonseca, não
obedeceu. Dito isto, gostava de lhe fazer uma pergunta breve, porque, com as nossas liberalidades, já não temos muito
tempo. Ora bem, o Sr. Deputado considerou que os empresários portugueses, reunidos na única confederação patronal - a
Confederação da Indústria Portuguesa -,são reaccionários (enfim, qualificou-os, como, aliás, é costume) e considerou que com
eles não é possível fazer qualquer política de desenvolvimento, construir riqueza, promover a justiça social. 1 Pergunto-lhe: tem
ideia do número de empresários portugueses que a Confederação da Indústria Portuguesa representa? Tem alguma indicação
do peso das indústrias representadas na CIP, em termos de criação de emprego, em termos de participação do Produto
Interno Bruto, em termos, ao fim e ao cabo, de criação de riqueza? Pelo contrário, tem alguma ideia do peso relativo daqueles
empresários que chamou de empresários democráticos ou de empresários democratas e da relação que existe entre esses dois
tipos de empresários? O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr: Deputado João Corregedor da Fonseca. O Sr.
João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Sr. Deputado Gomes de Pinho, devo dizer-lhe que gosto sempre de o ouvir,
particularmente quando está bem disposto. Í. V. Ex.` disse que classifiquei certos empresários de reaccionários. Não foi assim.
Chame-lhe como quiser, mas eu chamei-lhes retrógrados e conservadores. V. Exª sabe qual tem sido a posição assumida
pelos empresários que fazem parte da Confederação da Indústria Portuguesa? Com certeza que o mesmo já não poderá V.
Ex.º dizer dos empresários que estão associados na Associação Industrial Portuguesa, que, como sabe, tomam posições
completamente diferentes, ou seja, tomam posições mais avançadas e mais claras, sem nunca deixarem de ser capitalistas, sem
nunca deixarem de ser empresários. Eu disse, Sr. Deputado, que não somos contra o sector empresarial, mas, isso sim, contra
aquele sector mais conservador, que o que deseja é a liberalização dos despedimentos, o avanço claro sobre os trabalhadores
e beneficiar, também, das chamadas muletas dos subsídios estatais. Como o Sr. Deputado sabe, estamos perfeitamente
desconfiados em relação a determinado tipo de empresários. Felizmente que alguns há que têm um cariz claramente
democrático e que favorecem o crescimento do País e o seu desenvolvimento, sem criar qualquer tipo de conflito social, ao
contrário daqueles que V. Ex.ª tanto e. tão bem tenta defender. O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr.
Deputado Vasco de Melo. O Sr. Vasco de Melo (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo Srs. Deputados: Esta é
a rainha primeira intervenção no Parlamento, o que muito me honra, mas também introduz uma certa trepidação, especialmente
depois da intervenção do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. Parece que vem a propósito.

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O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Mas não foi combinado. O Orador: - Não
sei! Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, um dia, quando tiver interesse ou curiosidade, gostava muito de o convidar a
visitar a CIP para verificar o que ela é e o que é que lá está. O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): Lá iremos! O
Orador: - Como deve lembrar-se, fui eu quem criou e presidiu àquela organização durante oito anos e, por isso, conheço-a
razoavelmente bem. O objectivo básico traduzido nas grandes opções do Plano para 1986 consiste na «correcção dos
desequilíbrios fundamentais da balança de transacções correntes» através de «uma estratégia de progresso controlado» que
permita aproximar a nossa economia à dos restantes países da Comunidade Europeia, sem que daí resulte um agravamento
incomportável das contas externas. Assim, espera-se que, durante os próximos quatro anos, se registem taxas de crescimento
do produto interno da ordem dos 4 % a 5 % e que, durante o mesmo período, se atinja o nível de inflação semelhante aos dos
restantes países da Comunidade, ao mesmo tempo que se procura a contenção do défice da balança de transacções correntes,
de modo a que não ultrapasse os 3,5 % do Produto Interno Bruto. A opção afigura-se-nos correcta, tanto mais que a nossa
integração nas Comunidades Europeias exige um esforço considerável de desenvolvimento e de harmonização económica, só
assim sendo possível tirar dividendos do processo de integração, mas não podemos esquecer os estrangulamentos que
caracterizam a nossa economia e que, a não serem atempadamente removidos, poderão inviabilizar todo o processo. Na linha
de «progresso controlado» proposta, pretende o Executivo, em 1986, uma taxa de crescimento do produto interno de cerca de
4 %, através de um aumento da procura interna de cerca de 6 % e de uma contracção do sector externo da ordem dos 2 %
(aumento das exportações e das importações de 5,5 %,e de 10,5 % a 11 %, respectivamente, com um défice da balança de
transacções correntes na ordem dos 700 milhões de dólares, conforme a documentação que nos foi enviada. Qual o realismo
destas previsões? Em primeiro lugar, espera-se que o aumento de 6 % da procura interna venha a ser conseguido pela acção
conjugada de três variáveis: um aumento do investimento da ordem dos 10 %, uma expansão do consumo público de apenas 1
% e um crescimento do consumo privado de cerca de 3,5 %. Se, em relação ao consumo privado, é possível afirmar que os
valores previstos são realistas, uma vez que se prevê um aumento dos rendimentos reais resultante de um abrandamento do
ritmo de crescimento dos preços da ordem dos 3,5 % ou 4 %, o mesmo já não é possível dizer-se quanto ao aumento previsto
do consumo público. De facto, o crescimento de apenas l % deste consumo revela-se demasiado ambicioso, visto que, no
passado, os resultados sempre se afastaram das previsões neste domínio, excedendo-as sensivelmente, pelo que se afigura
indispensável uma extrema disciplina e controlo das despesas públicas para que o défice corrente se mantenha dentro dos
limites previstos. Finalmente, relativamente ao investimento fixo, que se pretende venha a registar um aumento de 10%, o
Governo, no receio de que certas componentes do mesmo, com uma construção habitacional, não respondam de imediato aos
incentivos governamentais, propõe-se realizar um acréscimo substancial do investimento do sector público, que se traduzirá
num défice global que não deverá exceder os 11 % do Produto Interno Bruto. Mas, para além de este valor ser, de per si,
demasiado elevado, há ainda que contar com as necessidades de financiamento do sector empresarial do Estado que, na
hipótese muito optimista de não excederem em termos nominais o valor atingido em 1985, 210 milhões de contos, elevará o
défice do sector público alargado para os 16,5 % do Produto Interno Bruto, ou seja, cerca de 700 milhões de contos. Por
outro lado, é vontade do Governo que o investimento do sector privado atinja um crescimento da ordem dos 10%, o que,
considerando a taxa de crescimento do produto interno prevista para 1986 (4 %), implicará que as necessidades de
financiamento excedam, sensivelmente, a capacidade da poupança interna bruta (cerca de 20 % a 23 % do produto interno
bruto nos últimos anos), De facto, a verificarem-se as taxas de poupança interna bruta registadas nos últimos anos,
restar-nos-ia, apenas, o equivalente a cerca de 6,5 % do produto interno bruto para financiar o investimento de particulares e
empresas, cujas necessidades de financiamento, considerando as taxas de crescimento do investimento e do produto
apontadas, deverão situar-se à volta dos 15,5 % do produto interno bruto. Assim, sendo, pergunta-se: de que modo pretende
então o Governo atingir os objectivos propostos? Basicamente, através da acção conjugada de quatro políticas sectoriais: a
política monetária e orçamental, a política de rendimentos e preços e a política cambial, a política de investimentos e a política
de desenvolvimento regional. Em relação à política monetária e orçamental, o Governo escolheu o volume global de crédito
como o instrumento fundamental de controle da liquidez da economia, estabelecendo uma taxa máxima de crescimento de
cerca de 19%. Trata-se de uma fórmula eficaz de controle de défice externo e do nível de inflação. Na verdade, partindo do
pressuposto de que a taxa média de inflação será da ordem dos 14 % e que a velocidade de circulação da moeda diminuirá de
1 %, então facilmente se atingirá um crescimento de 4 % do produto interno bruto em termos reais. Aliás, esta fórmula de
fixação de limites de expansão do crédito não difere da utilizada nos últimos anos, pelos sucessivos executivos. Mas, apesar de
se ter fixado uma «franja» para a variação do crédito de 19%, se as necessidades de financiamento do sector público forem
superiores ao previsto (o que, como já se referiu, é bastante provável), as disponibilidades de crédito para o sector privado
ficarão bastante reduzidas, fazendo assim perigar o objectivo do Governo de fazer do investimento privado o motor do
desenvolvimento económico do País; a prática demonstra que as necessidades de financiamento do sector público se revelam
normalmente imperativas, arriscando-nos assim, partindo do princípio de que os limites de crédito serão respeitados, a assistir a
uma estagnação, ou mesmo a um decréscimo, em termos reais, do fluxo de crédito ao sector privado.

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É, pois, com algum cepticismo. que se vê o alcance do objectivo do aumento do investimento
privado de 10 %, face a um aumento. do investimento público de 27 % e de um limite de expansão do- crédito de 19 %.
Tem-se, por isso, como indispensável a criação de formas alternativas de financiamento por instrumentos não monetários, tal
como o Governo se propõe desenvolver. Importa, ainda, referir como factor positivo a criação de novas formas de
mobilização de poupança, como seja as recentes contas de «depósito-crédito-habitação», a dinamização. do mercado. de.
títulos, a revisão dos regimes fiscais que incidem sobre a poupança, os estímulos à constituição de esquemas privados
complementares à Segurança Social e a intenção de alargar a parte do financiamento não monetário do défice orçamental,
embora, lamentavelmente, não claramente apontada a forma como o Governo pretende proceder a, essas alterações. Por outro
lado, as implicações negativas da manutenção de taxas de inflação elevadas são - como, aliás, o próprio Governo reconhece -
bem conhecidas, pelo que o Executivo se propõe conseguir uma redução «progressiva e consolidada da taxa de inflação, com
uma quebra sensível, já em 1986, e um alinhamento pela inflação média da Comunidade Europeia, ao fim de três a quatro
anos», e um aumento gradual da produtividade, através de um adequado controle da evolução dos custos. O aumento da
produtividade de forma duradoura é possível, fundamentalmente por duas vias: o aumento do investimento e a melhoria da
organização, o que, no caso português, se deverá traduzir por um aumento de eficiência do sector público e pela reforma das
leis laborais; quanto a este último ponto, o projecto das grandes opções do Plano é totalmente omisso. A política de
rendimentos e preços, a prosseguir pelo Executivo, deverá basear-se numa acção de, persuasão fiscal, o que se afigura
correcto no quadro de um mercado concorrencial, mas é, uma vez mais, de salientar que não são avançadas quaisquer
propostas quanto ao seu conteúdo. Da política cambial proposta, resulta evidente que o Governo está fortemente convicto do.
sucesso dos objectivos propostos quanto aos valores da taxa de inflação e quanto aos aumentos de produtividade da economia
portuguesa, pois só com a verificação simultânea destes dois factores será possível assegurai a redução progressiva da taxa
mensal de depreciação do escudo até 1988, sem por isso pôr em causa a competitividade externa das exportações
portuguesas e o saldo da balança de pagamentos. Quanto à política de investimentos proposta, afigura-se como correcta a
opção de fazer do sector privado o

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do Plano não passa de uma lacónica e tímida expressão, que passo a citar: «estudar e propor
medidas [...]». Para assuntos que, como este, se encontram na primeira linha das preocupações dos jovens, o Governo fica-se
nas meias tintas . .. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto à educação, a análise das grandes opções do Plano é elucidativa. A
política panfletária do Governo visa, com uma fachada pomposa, ocultar a sua incapacidade e falta de vontade política para
resolver os problemas de fundo com que o ensino se debate. Sabendo que a taxa de abandono e insucesso escolar é elevada,
nas grandes opções do Plano não há uma única linha que se refira a este assunto; o valor da taxa de analfabetismo é um
escândalo, as grandes opções do Plano ignoram este problema; o ensino especial debate-se com grandes e graves problemas,
as grandes opções do Plano assim não o consideram. Nada disto constitui prioridade para a acção governativa, no entanto,
considera-se prioridade do Executivo a criação de uma denominada comissão de reforma educativa, cujos objectivos são mais
que duvidosos, em especial na actual situação em que a Assembleia da República já calendarizou o debate de discussão da Lei
de Bases do Sistema Educativo. O Governo não contribui para esse debate com a apresentação de uma proposta de lei, mas
cria uma comissão, cujo fim não se descortina. Sr. Presidente, Srs. Deputados: A política assim definida subverte os preceitos
constitucionais, mormente na consagração do direito à educação e à cultura como garantia do direito à igualdade de
oportunidades de acesso e êxito escolares. Daqui deriva um orçamento do Estado para a educação, tecnocrático mas não
democrático. Vozes do PCP: - Muito bem! O Orador: - Fez-se um grande alarido em torno do aumento de verbas para a
educação. Finalmente, iam-se inverter as tendências que vinham do passado. Nada mais ilusório, como o próprio Governo o
reconhece, quando nos anexos informativos à proposta do Orçamento do Estado justifica o aumento de verbas «pela variação
dos encargos com o pessoal, que têm grande peso nas despesas desse Ministério». Contudo, importa referir que tal aumento
não corresponde ao alargamento dos quadros que a actual situação reclama, mas tão-só ao aumento de despesas resultantes
da progressão na carreira ou da reestruturação das carreiras docentes. Mais: em alguns serviços é inclusive prevista uma
diminuição, em termos reais, das despesas com o pessoal, o que só pode significar a existência de despedimentos. É do
conhecimento público o mau funcionamento das escolas no ano lectivo anterior. Pelo orçamento agora apresentado é de
esperar que elas venham a funcionar ainda pior, já que a verba orçamentada em despesas correntes, para este ano, prevê
crescimentos que estão longe de atingir a taxa de inflação. Esta situação é tanto mais grave quanto é verdade que nesta análise
estamos a comparar a verba gasta em 1985 com a orçada para 1986, porque se compararmos a verba orçada para 1985 com
a de 1986 esses aumentos vêm a transformar-se em diminuições. No que respeita às despesas de capital nem se põe a questão
de qual o método comparativo a utilizar. Qualquer que ele seja permite verificar uma diminuição significativa das despesas de
capital. Sr. Presidente, Srs. Deputados: Poderão alguns pensar que os investimentos previstos no PIDDAC irão resolver todos
esses problemas. Errado! o PIDDAC para a educação é uma mistificação. O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Não é verdade! O
Orador: - Um exemplo só que, pela sua importância, é significativo. Da verba para a Universidade do Porto vai receber, via
PIDDAC, 22% são para pagar dívidas herdadas das construções escolares. A restante verba destina-se, quase
exclusivamente, a assegurar obras de remodelação (vulgo: remendos) no degradado parque de edifícios da Universidade. Para
começar algo de novo fica a reduzida verba de 16 % do total orçado. A política subjacente à proposta de orçamento que
estamos a apreciar é claramente discriminatória e desrespeitadora do normativo constitucional. Quem quer educação pague-a!
Este é o princípio político norteador do Executivo. Não somos nós que o dizemos. São os números que o demonstram.
Enquanto em 1985 as verbas transferidas para o IASE, para apoio às crianças e famílias de menores recursos, representavam
a ridícula percentagem de 1,5 das despesas funcionais com a educação, este ano a situação á bastante mais grave, já que esse
peso desce para 1,2. E não se diga, como há pouco aqui disse o Sr. Ministro, que estas verbas se destinam no próximo ano
lectivo, já que nada o impede, nem ao Governo, de alterar as capitações para este ano. O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito
bem! O Orador: - Chega-se ao cúmulo de inscrever no Orçamento do Estado para o ensino particular (que abrange cerca de
40 000 alunos) uma verba superior a 3 milhões de contos, enquanto que para a Acção Social Escolar (que abrange centenas
de milhares de crianças e de jovens) a verba inscrita se resume a 2 milhões e meio de contos. Sr. Presidente, Srs. Deputados:
Este Orçamento do Estado não visa a democratização do ensino, como a Constituição o determina; bem pelo contrário, aponta
para a sua elitização. Este é o sentir da própria Comissão de Educação, bem patente no parecer que emitiu sobre a proposta
de Orçamento. Cabe agora à Assembleia da República adoptar as medidas correctivas necessárias a atenuar a
discricionariedade que o Governo quer impor. Pelo nosso lado, estamos dispostos a dar o nosso contributo empenhado para
que tal venha a acontecer. Mais do que o imperativo de consciência é uma reclamação do País. Aplausos do PCP e do
MDP/CDE. O Sr. Carlos Ganopa (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Feita uma análise
atenta dos documentos em debate, verifica-se que os projectos de alcance estrutural mormente os que são tributários do
aproveitamento dos recursos naturais, que são indispensáveis para assegurar ò crescimento económico e dotar de maior
coerência o tecido produtivo, não estão devidamente contemplados nas grandes opções do Plano, limitando-se o Governo a
enunciar grandes mas vagas declarações de princípios de boas intenções.

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Nos vários sectores: químico, mineiro, siderúrgico, energético e hidro-agrícola, todos
particularmente importantes para se promover uma política selectiva de substituição de importações, a posição do Governo é
ambígua e contraditória. Por um lado, afirma desinvestir no sector público e, por outro, evidencia o reforço e a preocupação
crescente no relançamento dos vários planos de desenvolvimento para estes sectores. Como é que consegue compatibilizar os
princípios com as acções que preconiza? Como é que em sectores estruturais para o desenvolvimento económico o Governo
não define programas e não estabelece objectivos? Sr. Presidente, Srs. Deputados: Para além dos sectores referidos, há um
outro, de importância crucial para o País, votado ao maior ostracismo em termos de orientações sectoriais do Governo.
Refiro-me ao sector dos transportes marítimos, onde a ausência de uma política sectorial adequada, com os seus reflexos
graves sobre a balança de bens de serviços, provoca um aumento da nossa dependência, externa, devido a uma Pausa.
participação cada vez menor da frota nacional nos transportes de mercadorias que transaccionamos com o exterior. O
conjunto das actividades do transporte marítimo é um elemento fundamental para as diversas políticas sectoriais, (indústria,
comércio, agricultura, etc.) e, por tanto, como tal deve ser tratado. O peso do custo do transporte tem vindo a mostrar-se
fundamental na viabilização de certas importações e exportações, havendo exemplos concretos demonstrativos da
inviabilização de exportações por causa da ineficácia do nosso transporte marítimo. Para que o nosso país fique menos
dependente do exterior no sector dos transportes marítimos, será necessário, desenvolver um esforço sério e profundo e
também vontade política, de modo a levar por diante todas as medidas consideradas necessárias, para que a nossa marinha de
comércio seja reapetrechada, e o sector revitalizado, com todos os benefícios para o País, e nomeadamente para o sector da
indústria de construção e reparação naval, que se debate com gravíssimos problemas económico-financeiros. Os nossos
armadores desde 1980 que não encomendam navios aos estaleiros navais. Torna-se premente alterar a situação existente, que
se vai degradando ano após ano, tornando-se urgente estabelecer e aplicar uma política de viabilização e renovação da marinha
de comércio. O saneamento e a viabilização dos armadores portugueses, a reestruturação da frota, o asseguramento de
condições de financiamento e de exercício de actividade, que garantam uma base sólida de desenvolvi mento a médio e longo
prazos, assim como uma articulação necessária com a indústria de construção e reparação naval, são as orientações que seria
desejável e urgente traduzir em medidas e acções concretas. Ficamos pois surpreendidos com a atribuição de uma verba
incluída no PIDDAC para o ano de 1986, e destinada ao reapetrechamento da frota da marinha de comércio nacional de
apenas 100 000 contos, totalizando conjuntamente com os anos de 1987, 1988, 1989 e 1990 o valor de 1 060 000 contos.
Que reapetrechamento pensa o Governo efectuar com tal verba, quando possuímos uma marinha mercante de ano para ano
mais reduzida, que transporta apenas entre 13 % a 15 % do total do nosso comércio externo, e quando a idade média global
da frota nacional era em 1 de Julho de 1984 de aproximadamente 20 anos? Continuaremos como até aqui a adiar as soluções,
e a não encontrar o caminho adequado para a reestruturação do sector? Esperamos, pois, que o Governo neste debate possa
suprir as grandes lacunas por nós apontadas e nos assegure da sua clara vontade de enfrentar a grave crise que o sector
atravessa. Aplausos do PRD, do PCP e do MDP/CDE. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, apesar de estarmos a
aproximarmo-nos da hora prevista para o término dos nossos trabalhos, penso que o Sr. Deputado Vasco Miguel, que está
inscrito para uma intervenção, poderá usar da palavra, ainda hoje, pois, contando com a brevidade da sua intervenção, em
pouco ultrapassamos as 21 horas. Assim sendo, e se não houver objecções, concederei a palavra ao Sr. Deputado Vasco
Miguel. Tem a palavra o Sr. Deputado Vasco Miguel. O Sr. Vasco Miguel (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do
Governo, Srs. Deputados: A situação de certo modo degradante em que se encontra a agricultura, requer por parte do
Governo, um certo cuidado, direi mesmo, uma dedicação e empenhamento que conduzam a uma correcção gradual da
estrutura fundiária, a um aumento significativo dos índices de produtividade e, ainda, à formação profissional dos agricultores,
de molde a serem introduzidas novas normas culturais, para se fazer face ao contexto criado pela nossa adesão à Comunidade
Económica Europeia, que nos vai obrigar a um conjunto de opções estruturalmente bem definidas, para que possamos usufruir
de todo o apoio que nos é facultado pela Comunidade. Nas grandes opções do Plano estão bem patentes as prioridades
optadas pelo Governo e que considera essenciais para a implementação de uma política agrícola que passa, e muito bem,
segundo o nosso ponto de vista, por uma modernização efectiva de todos os vectores que influem directamente na
rentabilização da empresa agrícola. Merecem especial destaque, por constituírem há já longos anos grande preocupação para o
PSD algumas medidas, para as quais ainda não tinha havido a coragem política suficiente para as pôr em prática, porque
dependem acima de tudo de um acreditar convicto nas suas potencialidades. Refiro-me, precisamente, aos jovens agricultores
e às cooperativas agrícolas, que desta vez vão ser apetrechados dos meios necessários para se constituírem na mola da
dinâmica, se não mesmo na trave mestra da nossa agricultura. Além destas duas opções, que consideramos de importância
vital, muitas outras poderiam ser referenciadas, não só pelo conteúdo técnico que encerram, como também pela clareza como
definem a linha de desenvolvimento e de orientação política que é necessário atingir. A fim de se conseguir o prestígio e a
valorização desta componente económica, de modo a cumprir a missão por que todos anseiam e que se consubstancia numa
redução efectiva da importação de bens alimentares, na estabilidade económica e dignificação das pessoas que nela trabalham.
Um vasto e diferenciado leque de programas acompanham os diplomas que estamos a apreciar, uns envol-

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vendo exclusivamente recursos internos, outros muito concretamente ligados aos fundos
comunitários, embora envolvendo também participação portuguesa. Visto estarmos a tratar de uma discussão na generalidade,
não vos vou maçar com números, pois terei oportunidade de me referir às diferentes verbas orçamentadas aquando da
discussão na especialidade. No entanto, posso desde já adiantar que o PSD irá apresentar algumas propostas de alteração e
uma sugestão a qual tem a ver com a cobrança do imposto de indústria agrícola. Não nos parece pertinente que, numa altura
em que, para além do contributo do Estado e das Comunidades, o agricultor também terá de participar com a sua parte na
efectivação dos projectos ou programas a que se submeter, deste modo precisa de estar capitalizado, de forma a que não
tenha de recorrer à banca. Entendemos que o imposto sobre a indústria agrícola deve ser implementado só em 1987, dando
assim mais algum tempo para que se procedam às grandes modificações estruturais num ambiente de maior estabilidade
económica. Para que efectivamente se ponha em prática tudo o que o Governo nos propõe é necessário um circuito perfeito de
informação e divulgação das diferentes medidas propostas, assim como um acesso fácil dos agricultores aos técnicos e aos
créditos, de modo a evitar que as barreiras burocráticas venham a constituir um obstáculo intransponível que não deixe
concretizar um sonho, uma esperança que poderia ser uma realidade ou então provocando uma desmotivação, uma angústia, se
não mesmo um abandono, dando origem à mais grave de todas as situações - a ruptura entre o agricultor e a terra. Apesar de
constar no relatório da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar, não posso deixar de referenciar nesta minha intervenção, o
aumento significativo das verbas consignadas para a agricultura neste Orçamento do Estado, bem como a quantidade e
qualidade dos documentos que nos foram facultados e que nos facilitaram um estudo mais exaustivo e objectivo do que em
anos anteriores, habilitando todos os membros da Comissão a um parecer muito concreto sobre o que os diplomas nos
propõem. Sendo assim, não nos passa despercebida a reduzida verba do FEOGA que em 1986 a agricultura irá beneficiar.
Sabemos o porquê desta situação e o esforço que o Governo fez para que estes fundos no futuro sejam utilizados
atempadamente, de maneira a proporcionarem mais e melhores benefícios neste sector tão importante e tão carenciado, e que
não se compadece com demoras ou atropelos de qualquer espécie. É necessário também rever ou anular o IVA no que diz
respeito aos vinhos correntes em garrafa e garrafão, de modo a combater o mercado paralelo que neste momento reina e que
põe em causa todas as estruturas comerciais que têm um comportamento correcto em relação ao que está na lei. Merece
também cuidada atenção o alargamento do âmbito do imposto especial sobre consumo de bebidas alcoólicas introduzido pela
Lei n.º 3/86 que, a manter-se, causará uma enorme retracção no consumo de aguardentes e licores nacionais e consequente
aumento de consumo de bebidas estrangeiras, muito particularmente o uísque, conduzindo em cadeia a uma falência das
estruturas comerciais portuguesas e a uma saída substancial de divisas. Nós, social-democratas, acreditamos na capacidade do
Governo para a resolução de todos os problemas que estão inerentes a esta complexa e enorme componente económica. Pela
nossa parte colaboraremos com tudo o que estiver no nosso alcance. Aplausos do PSD. O Sr. Presidente: - Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo, somos chegados ao final da sessão de hoje. A sessão de amanhã terá como ordem de trabalhos a
continuação do debate sobre os diplomas que hoje temos vindo a apreciar e que amanhã serão votados. A sessão inicia-se às
10 horas e prolongar-se-á por todo o dia. É difícil prever a que horas terminarão os nossos trabalhos de amanhã, muito
embora o tempo total de debate para amanhã seja de 7 horas e 45 minutos, sendo os seguintes os tempos disponíveis pelo
Governo e pelos grupos parlamentares: Governo, 67 minutos; PSD, 88 minutos; PS, 84 minutos; PRD, 48 minutos; PCP, 73
minutos; CDS, 67 minutos, e MDP/CDE, 33 minutos. Estão inscritos para produzirem intervenções na sessão de amanhã os
seguintes Srs. Deputados: João Cravinho, Sá Furtado, João Amaral, Próspero Luís, Fernando Dias de Carvalho, Vidigal
Amaro, Amélia de Azevedo, Angelo Correia, Cecília Catarino, Mendes Bota, Luís Martins, Vítor Crespo, Jerónimo de Sousa,
António Guterres e Almeida Santos. O Sr. Soares Cruz (CDS): - Sr. Presidente, dá-me licença? O Sr. Presidente: - Pede a
palavra para que efeito? O Sr. Soares Cruz (CDS): -- Sr. Presidente, presumo que, por lapso da minha bancada, ainda não
promovemos a inscrição do Sr. Deputado Abreu Lima. O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quando outros grupos parlamentares
inscreveram outros Srs. Deputados, naturalmente que será observada a regra da alternância. Srs. Deputados, está encerrada a
sessão. Eram 21 horas e 5 minutos. Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata
(PPD/PSD): Adérito Manuel Soares Campos. Alípio Pereira Dias. António Joaquim Bastos Marques Mendes. Arménio
Jerónimo Martins Matias. Arménio dos Santos. Cândido Alberto Alencastre Pereira. Cecília Pita Catarino. Cristóvão Guerreiro
Norte. Dinah Serrão Alhandra. Domingos Duarte Lima. Fernando José Russo Roque Correia Afonso. Fernando Manuel
Cardoso Ferreira. Francisco Jardim Ramos. João José Pimenta de Sousa. Joaquim Eduardo Gomes.

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1 SÉRIE -
NÚMERO 47 1672 José Ângelo Ferreira Correia. José Filipe Athayde Carvalhosa. José Manuel Rodrigues Casqueiro. José Maria Peixoto
Coutinho. José Mendes Bota. José de Vargas Bulcão.. Luís António Martíns. Luís Manuel Neves Rodrigues. Manuel José
Marques Montargil. Manuel Maria Moreira. Rui Manuel de Oliveira Costa. Rui Manuel Parente Chancerelle Machete.
Valdemar Cardoso Alves. Vasco Francisco Aguiar Miguel. Partido Socialista (PS): Alberto Marques de Oliveira e Silva. .
Américo Albino Silva Salteiro. António Carlos Ribeiro Campos. António Gonçalves Janeiro. António José Sanches Esteves.
António Magalhães Silva.. António Manuel de Oliveira Guterres. Armando António Martins Vara. Carlos Alberto Raposo
Santana Maia. Helena Torres Marques. João Rosado Correia. José Apolinário Nunes Portada. José Carlos Pinto B. Mota
Torres. José Luís do Amaral Nunes. José Manuel Torres Couto. Júlio Francisco Miranda Calha. Manuel Alegre de Melo
Duarte. Manuel Alfredo Tito de Morais. - Rui Fernando Pereira Mateus. Partido Renovador Democrático (PRD): Hermínio
Paiva Fernandes Martinho. Joaquim Jorge Magalhães Mota. José Emanuel Corujo Lopes. José Torcato Dias Ferreira. Maria
da Glória Padrão Carvalho. Paulo Manuel Quintão Guedes de Campos. Partido Comunista Português (PCP): António Dias
Lourenço da Silva. Carlos Alfredo de Bríto. Jorge Manuel Lampreia Patrício. Maria Margarida Tengarrinha. Centro Democrático Social (CDS): António Bernardo Lobo Xavier. Henrique José Pereira de Moraes.
Henrique Manuel Soares Cruz. José Luís Nogueira de Brito. José Miguel Nunes Anacoreta Correia. Narana Sinai Coissoró.
Movimento Democrático Português (MDP/CDE): João Cerveira Corregedor da Fonseca. Raul Fernando de Morais e Castro.
Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD): Amândio Santa Cruz Basto Oliveira.
Manuel da Costa Andrade. Partido Socialista (PS): António Manuel Ferreira Vitorino. Carlos Montez Melancia. Jaime José
Matos da Gama. Teófilo Carvalho dos Santos.- ' Partido Renovador Democrático (PRD): António Alves Marques Júnior. José
Lopes Ferreira Casal. José Luís Correia de Azevedo. Vasco da Gama Lopes Fernandes. Partido Comunista Português (PCP):
Carlos Campos Rodrigues Costa. Octávio Floriano Rodrigues Pato. Centro Democrático Social (CDS): Eugénio Nunes
Anacoreta Correia. João da Silva Mendes Morgado. Manuel Eugénio Cavaleiro Brandão. Deputados independentes: Gonçalo
Pereira Ribeiro Teles. As REDACTORAS: Ana Maria Marques da Cruz Maria Leonor Ferreira - Cacilda Nordeste.

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