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Quinta-feira, 24 de Outubro de 1996 I Série - Número 4

DIÁRIO da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 23 DE OUTUBRO DE 1996

Presidente: Ex.mo Sr. Manuel Alegre de Melo Duarte

Secretários: Ex.mos Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Carlos Manuel Duarte de Oliveira

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 35 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de resolução n.º 31/VII, dos projectos de deliberação n.os 29 a 31/VII, de requerimentos e da resposta a alguns outros.
A Câmara deu assentimento à viagem de carácter oficial do Sr. Presidente da República ao Chile, com escala no Rio de Janeiro, entre os dias 7 a 13 do próximo mês de Novembro.
Foi anunciado o envio de uma proposta aprovada na Câmara Municipal de Gavião contendo um voto de felicitações aos dois galardoados com o Prémio Nobel da Paz, D. Ximenes Belo e Dr. Ramos Horta.
O voto n.º 46/VII - De pesar pelo falecimento de Mário Cal Brandão (Presidente da AR em exercício Manuel Alegre, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes) foi aprovado, tendo proferido intervenções os Srs. Deputados Jorge Lacão (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP). Lino de Carvalho (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e Barbosa de Melo (PSD). No final, a Câmara guardou um minuto de silêncio.
A Assembleia aprovou também os votos n.os 47/VII (PS, PSD e CDS-PP) e 48/VII (Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação) - De congratulação pela eleição de Portugal para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Fizeram intervenções os Srs. Deputados Maria Carrilho (PS), Nuno Abecasis (CDS-PP), Durão Barroso (PSD) e Ruben de Carvalho (PCP).
Foi ainda aprovado um parecer da Comissão dê Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo à retoma de mandato de um Deputado do CDS-PP e à substituição de um Deputado deste Partido e de um outro do PS.
Em declaração política, o Sr. Deputado Durão Barroso (PSD), ao analisar a entrada de Portugal para o Conselho de Segurança das Nações Unidas, salientou o peso que daí advirá para o nosso país face à cena internacional e respondeu a um pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Maria Carrilho (PS).

O Sr. Deputado José Calçada (PCP) considerou fundamental o lançamento de um programa integrado de desenvolvimento para a região do Vale do Sousa.
O Sr. Deputado Joaquim Sarmento (PS) regozijou-se com as obras de restauro do Mosteiro de S. João de Tarouca anunciadas pelo Sr. Ministro da Cultura e respondeu depois a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado José Cesário (PSD).

Ordem do dia. - Procedeu-se à discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 150/VII - Regula a actividade de transporte de doentes por corpos de bombeiros (PCP). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Rodeia Machado, (PCP), Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP), Nelson Baltazar e Aires Carvalho (PS), Jorge Roque Cunha (PSD) e José Barradas (PS).
A petição n.º 96/VI (1.ª)- Requerem que a Assembleia da República tome medidas para que as zonas de mono-indústria de lanifícios do distrito de Castelo Branco sejam contempladas com uma operação integrada de desenvolvimento, apresentada por Luís Pereira Garra e outros, foi apreciada, tendo intervindo os Srs. Deputados Luísa Mesquita (PCP), Carlos Lavrador (PS), Antunes da Silva (PSD), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Moura e Silva (CDS-PP).
Foi também debatida a petição n.º 168/VI (2.ª)- Solicita tomada de medidas, tendo em vista a recuperação do Parque da Pena, apresentada pela Associação de Defesa do Património de Sintra, sobre, a qual intervieram os Srs. Deputados Pinto Simões (PS), Ruben de Carvalho (PCP), António Rodrigues (PSD), Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP) e Isabel Castro (Os Verdes).
Finalmente, foi discutida a petição n.º 298/VI (4.ª). apresentada pelo Sindicato Nacional de Professores Licenciados, na qual solicita que a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, seja alterada em termos que contribuam para o prestígio e dignificação da qualidade do ensino e dos seus agentes, tendo produzido intervenções os Srs. Deputados José Calçada (PCP), António Braga (PS), Sílvio Cervan (CDS-PP) e José Cesário (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 45 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

Acácio Manuel de Frias Barreiros.
Adérito Joaquim Ferro Pires.
Agostinho Marques Moleiro.
Aires Manuel Jacinto de Carvalho.
Alberto de Sousa Martins.
Albino Gonçalves da Costa.
António Alves Marques Júnior.
António Alves Martinho.
António Bento da Silva Galamba.
António Fernandes da Silva Braga.
António Fernando Marques Ribeiro Reis.
António José Gavino Paixão.
António José Guimarães Fernandes Dias.
Arnaldo Augusto Homem Rebelo.
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho.
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos.
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja.
Carlos Alberto Dias dos Santos.
Carlos Justino Luís Cordeiro.
Carlos Manuel Amândio.
Carlos Manuel Luís.
Cláudio Ramos Monteiro.
Domingos Fernandes Cordeiro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião.
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo.
Fernando Alberto Pereira de Sousa.
Fernando Alberto Pereira Marques.
Fernando Antão de Oliveira Ramos.
Fernando Garcia dos Santos.
Fernando Manuel de Jesus.
Fernando Pereira Serrasqueiro.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Francisco José Pereira de Assis Miranda.
Francisco José Pinto Camilo.
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho.
Henrique José de Sousa Neto.
João Carlos da Costa Ferreira da Silva.
Joaquim Moreira Raposo.
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida.
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Manuel Damas Martins Rato.
Jorge Manuel Fernandes Valente.
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro.
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro.
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão.
José Alberto Cardoso Marques.
José António Ribeiro Mendes.
José Carlos Correia Mota de Andrade.
José Carlos da Cruz Lavrador.
José Carlos das Dores Zorrinho.
José Carlos Lourenço Tavares Pereira.
José da Conceição Saraiva.
José de Matos Leitão.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Fernando Rabaça Barradas e Silva.
José Manuel de Medeiros Ferreira.
José Manuel Niza Antunes Mendes.
José Manuel Santos de Magalhães.
José Pinto Simões.
Jovita de Fátima Romano Ladeira Matias.
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria.
Laurentino José Monteiro Castro Dias.
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal.
Luís Filipe Nascimento Madeira.
Luís Pedro de Carvalho Martins.
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira.
Manuel Alegre de Melo Duarte.
Manuel António dos Santos.
Manuel Francisco dos Santos Valente.
Manuel Jorge Pedrosa Forte de Goes.
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves.
Manuel Porfírio Varges.
Maria Amélia Macedo Antunes.
Maria Celeste Lopes da Silva Correia.
Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha.
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira.
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro.
Maria Fernanda dos Santos Martins Catarino Costa.
Maria Helena do Rego da Costa Salema Roseta.
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Jesuína Carrilho Bernardo.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque.
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes.
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro.
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte.
Paulo Jorge dos Santos Neves.
Pedro Luís da Rocha Baptista.
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira Jorge.
Raimundo Pedro Narciso.
Rita Maria Dias Pestana Cachuxo.
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Rui Manuel Palácio Carreteiro.
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva.
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto.
Teresa Maria Gonçalves Gil Oliveira Pereira Narciso.
Victor Brito de Moura.
Vital Martins Moreira.

Partido Social Democrata (PSD):

Adalberto Paulo da Fonseca Mendo.
Adriano de Lima Gouveia Azevedo.
Álvaro dos Santos Amaro.
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
Antonino da Silva Antunes.
António Costa Rodrigues.
António de Carvalho Martins.
António Fernando da Cruz Oliveira.
António Germano Fernandes de Sá e Abreu.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Moreira Barbosa de Melo.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Soares Gomes.

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Arménio dos Santos.
Artur Ryder Torres Pereira.
Bernardino Manuel de Vasconcelos.
Carlos Manuel de Sousa Encarnação.
Carlos Manuel Duarte de Oliveira.
Carlos Manuel Marta Gonçalves.
Carlos Miguel Maximiano de Almeida Coelho.
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho.
Fernando Santos Pereira.
Filomena Maria Beirão Mortagua Salgado Freitas Bordalo.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco José Fernandes Martins.
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres.
Gilberto Parca Madail.
Herminio José Sobral Loureiro Gonçalves.
Hugo José Teixeira Velosa.
João Álvaro Poças Santos.
João Bosco Soares Mota Amaral.
João Calvao da Silva.
João Carlos Barreiras Duarte.
João do Lago de Vasconcelos Mota.
João Eduardo Guimarães Moura de Sá.
Joaquim Manuel Cabrita Neto.
Joaquim Martins Ferreira do Amaral.
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Gama.
José Augusto Santos da Silva Marques.
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha.
José Carlos Pires Povoas.
José de Almeida Cesário.
José Gonçalves Sapinho.
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Macário Custodio Correia.
José Manuel Costa Pereira.
José Manuel Durão Barroso.
José Mário de Lemos Damião.
Lucília Maria Samoreno Ferra.
Luís Carlos David Nobre.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Castro de Almeida.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Maria Moreira.
Maria do Céu Baptista Ramos.
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Si1Ja.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho.
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Sérgio André da Costa Vieira.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS/PP):

António Afonso de Pinto Galvão Lucas.
Augusto Torres Boucinha.
Carlos Manuel de Sá Correia.
Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Ismael António dos Santos Gomes Pimentel.
Jorge Alexandre Silva Ferreira.
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró.
Manuel Fernando da Silva Monteiro.
Maria Helena Pereira Nogueira Santo.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Rui Manuel Pereira Marques.
Silvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan.

Partido Comunista Português (PCP):

António Filipe Gaião Rodrigues.
António João Rodeia Machado.
Bernardino José Torrão Soares.
João António Gonçalves do Amaral.
João Cerveira Corregedor da Fonseca.
José Fernando Araújo Calçada.
Lino António Marques de Carvalho.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá.
Maria Luísa Raimundo Mesquita.
Maria Odete dos Santos.
Octávio Augusto Teixeira.
Ruben Luís Tristão de Carvalho e Silva.

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):

Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia.
Isabel Maria de Almeida e Castro.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta dos diplomas, dos requerimentos e das respostas a requerimentos que foram apresentados à Mesa.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidos, o projecto de resolução n.º 31/VII - Realização de uma auditoria externa à Assembleia da República (Presidente da AR) e os projectos de deliberação n.os 29/VII - Realização de uma auditoria externa para dar cumprimento integral à Deliberação n.º 17-PL/96, de 3 de Agosto (PSD), 30/VII - Alteração à Deliberação n.º 8-PL/95, de 2 de Dezembro (Presidente da AR) e 31/VII - Suspensão dos trabalhos da Comissão Eventual de Inquérito ao Desastre de Camarate (VI) (Presidente da AR).
Na sessão plenária de 16 de Outubro, foram apresentados na Mesa os seguintes requerimentos: à Secretaria de Estado do Tesouro e das Finanças, formulado pelo Sr. Deputado Antão Ramos; ao Ministério do Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Amaro; aos Ministérios para a Qualificação e o Emprego e da Solidariedade e Segurança Social, formulado pelo Sr. Deputado António Rodrigues; ao Ministério da Saúde e à Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, formulados pelo Sr. Deputado Francisco José Martins; ao Ministério da Saúde e à Secretaria de Estado da Saúde, formulado pelo

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146 I Série - NÚMERO 4

Sr. Deputado João Carlos Duarte; à Secretaria de Estado da Habitação, formulados pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado José Calçada; ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulado pelo Sr. Deputado Jorge Ferreira; e ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Entretanto, o Governo, em 17 de Outubro, respondeu a diversos requerimentos apresentados pelos seguintes Srs. Deputados: João Amaral, na sessão de 8 de Março e na Comissão Permanente de 18 de Julho; Sílvio Rui Cervan e Fernando Pedro Moutinho, nas sessões de 21 de Março e 22 de Maio; Francisco José Martins, na sessão de 8 de Maio; Octávio Teixeira, na sessão de 11 de Junho; Arménio Santos, na sessão de 21 de Junho; António Filipe, na sessão de 11 de Julho; Manuel Moreira, na sessão de 12 de Julho; Heloísa Apolónia, nos dias 16 de Julho e 3 de Setembro; Castro de Almeida, no dia 16 de Agosto; e Lino de Carvalho, na Comissão Permanente de 19 de Setembro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, recebi do Sr. Presidente da República Jorge Sampaio um ofício do seguinte teor:

Estando prevista a minha deslocação ao Chile, com escala no Rio de Janeiro, entre os dias 7 a 13 do próximo mês de Novembro, para participar na 6.º Cimeira Ibero-Americana, que se realiza em Santiago do Chile, venho requerer, nos termos do artigo 132.º, n.º 1, e 166.º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.

Para proceder à leitura do respectivo parecer e proposta de resolução, tem a palavra o Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, é do seguinte teor:

A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de Sua Excelência o Presidente da República em que solicita o assentimento para se deslocar em viagem de carácter oficial ao Chile, com escala no Rio de Janeiro, entre os dias 7 e 13 de Novembro, apresenta ao Plenário a seguinte proposta de resolução: Nos termos do n.º 1 do artigo 132.º da Constituição, a Assembleia da República dá o assentimento à viagem de carácter oficial ao Chile, com escala no Rio de Janeiro, entre os dias 7 e 13 do próximo mês de Novembro.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o parecer e proposta de resolução.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura de uma proposta aprovada na Assembleia Municipal de Gavião contendo um voto de felicitações aos dois galardoados com o Prémio Nobel da Paz, D. Ximenes Belo e Dr. Ramos Horta.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Srs. Deputados, é do seguinte teor:

Ao tomar conhecimento, no dia de hoje, do enorme galardão atribuído aos dois maiores paladinos, em liberdade, na luta pela libertação e independência do Povo Maubere - Prémio Nobel da Paz -, não podia a Assembleia Municipal de Gavião, hoje reunida, ficar indiferente a tal distinção. Assim foi proposto:
Um voto de felicitações aos dois galardoados, Dom Ximenes Belo, Bispo de Díli, e Dr. Ramos Horta, representante do Povo Maubere no exterior, esperando que o Prémio Nobel da Paz, que hoje lhes foi muito justamente atribuído, contribua de uma forma decisiva para que a comunidade internacional, de uma vez por todas, perceba a gravidade das atrocidades e atropelos aos mais elementares direitos do homem cometidos sobre um Povo que mais não faz do que lutar pelo direito à autodeterminação e independência.
Mas, nesta hora de alegria, não podemos nem devemos esquecer todos aqueles que sofrem maus tratos e torturas nas prisões indonésias, exigindo para eles, nomeadamente para o grande símbolo do Povo Timorense Xanana de Gusmão, a imediata libertação.
Pelo direito à autodeterminação e independência. Pelo direito à liberdade. Viva Timor Leste livre e independente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, deram ainda entrada na Mesa o voto n.º 46/VII - De pesar pelo falecimento de Mário Cal Brandão e os votos n.os 47 e 48/VII - De congratulação pela eleição de Portugal para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Por consenso estabelecido na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, foi decidido que o voto n.º 46/VII seria apresentado pelo Presidente da Assembleia em exercício e subscrito por todos os grupos parlamentares.
É do seguinte teor:

Quando morre alguém como Mário Cal Brandão, forçoso é que, resistindo à pressão do mediático e do imediato, saibamos parar um pouco para meditar na lição da sua vida e apontar o seu exemplo às gerações vindouras.
A biografia de Mário Cal Brandão confunde-se com a própria história da luta pela Democracia em Portugal. Desde as primeiras greves académicas de resistência ao golpe do 28 de Maio, até aos movimentos de oposição democrática em torno das candidaturas dos Generais Norton de Matos e Humberto Delgado, passando pelo MUD, pelo MUNAF, mais tarde pela fundação da ASP e depois do Partido Socialista, a sua vida foi sempre uma resistência permanente e uma entrega total aos ideais de uma República Livre e Democrática. Várias vezes preso pela polícia política, acolheu em sua casa os perseguidos e defendeu os presos políticos nos Tribunais Plenários.
Foi a imagem viva das mais altas virtudes cívicas. E também a imagem da sua cidade do Porto: homem de um só rosto e de um só parecer, austero, íntegro, sério, republicano, resistente e democrata. Um símbolo de honradez e devoção à coisa pública.
Deputado durante 14 anos, Governador Civil do Porto, Mário Cal Brandão, democrata insubmisso e generoso, que em todas as ocasiões fez frente à tirania e nunca se rendeu, foi um homem que tudo deu e nada quis para si. Um cidadão impoluto, que na sua vida pública e privada foi sempre um exemplo de civismo e probidade moral e política.

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A Assembleia da República testemunha o seu pesar a Beatriz Cal Brandão e a toda a sua família e rende sentida homenagem ao cidadão cuja memória permanecerá entre nós como referência política e afectiva e como exemplo de patriotismo e total dedicação à causa da Liberdade e da Democracia.

Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Morreu Mário Cal Brandão. Morreu uma insigne personalidade de Portugal, que entra, seguramente, no património histórico, na referência espiritual e na página dos grandes exemplos daquilo que foi o espírito e a tenacidade da resistência à adversidade e do combate de toda uma vida pelos valores da liberdade, da solidariedade e da democracia.
Mário Cal Brandão representou para tantos de nós um exemplo vivo daquilo que é o bom cidadão, que, pela causa comum e pelo interesse público, põe acima de tudo uma vida ao serviço de valores, muito mais do que a referência a quaisquer tipo de interesses.
Mais do que alguém que, correligionário, deixa as fileiras do Partido Socialista, Mário Cal Brandão representa, seguramente, para todos nós, o valor e a personalidade de um democrata e de um homem insigne, que será sempre recordado por todos os democratas portugueses, independentemente das suas preferências políticas e ideológicas.
O advogado dos pobres, como era conhecido no Porto aquele que, para além da coerência das ideias, fez da sua vida um testemunho permanente de coerência, Mário Cal Brandão foi tantas vezes para tantos de nós mais eloquente pelo exemplo concreto do que pelas próprias palavras. E até nisso quantas vezes soube ser discreto e chamar a atenção, pelo exemplo tranquilo, mas perseverante, de que, de facto, os valores de uma vida se devem sobrepor às pressões do quotidiano que tantas vezes nos afastam das referências essenciais.
Que com a morte de Cal Brandão fiquemos mais perto daquilo que essencialmente nos liga, o orgulho de, com ele, termos partilhado os valores de uma sociedade livre, de um mundo que queremos cada vez mais fraterno e de uma sociedade que queremos cada vez mais justa, com homens cada vez mais conscientes, socialmente mais conscientes dos seus direitos e dos seus deveres.
Tudo isto, com o exemplo da sua vida, nos legou Mário Cal Brandão. Por isso, Sr. Presidente, é daqui que testemunhamos a nossa profunda emoção e nela evocamos também essa companheira de uma vida ao seu lado, a Beatriz Cal Brandão, a quem publicamente exprimimos, neste momento, a nossa dor, e com ela, ao mesmo tempo, partilhamos esse gesto insigne de um cravo atirado para a companhia eterna de Mário Cal Brandão.
O símbolo da liberdade que Mário Cal Brandão representou permanecerá connosco.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quando os anos vão passando, vai-se adquirindo alguns privilégios, e um deles, que não é motivo de alegria, é o de nos referirmos a figuras com quem convivemos nesta Assembleia. É o caso de Mário Cal Brandão que, ao longo de várias legislaturas, aqui foi também meu companheiro de Parlamento e de quem recebi as maiores atenções. Tive ocasião de observar e apreciar a finura do seu trato e a convicção das suas ideias. É isso que hoje recordamos e homenageamos nesta Assembleia, aproveitando a ocasião para apresentar à sua mulher, também ela Deputada durante longos anos neste Parlamento, os nossos profundos sentimentos de saudade e a nossa lembrança feliz de um homem que honrou esta Casa.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscrevemos e associamo-nos, obviamente, a este voto de homenagem à memória de Mário Cal Brandão, em solidariedade com a sua esposa e, no fundo, com todos os socialistas, a cuja família pertenceu.
Mário Cal Brandão - o resistente, o antifascista e o democrata -, apesar de divergências de percurso, uniu-nos a todos nos valores da liberdade, da democracia e da solidariedade.
Por isso, nesta hora, juntamos também a nossa voz a esta homenagem sentida à memória de uma figura que desapareceu do nosso país.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, muito brevemente, para, em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes, dizer que nos associamos a este voto de pesar no sentido exacto em que a perda e o desaparecimento de Cal Brandão é o desaparecimento de alguém que agiu pela liberdade, que foi claramente um lutador contra o regime fascista. É, portanto, alguém que tem a ver com a nossa história recente e que, por isso mesmo, nesta exacta medida, devemos aqui saudar.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a bancada do Partido Social Democrata associa-se a toda a expressão de pesar que vem narrada no voto que V. Ex.ª, Sr. Presidente, leu à Câmara.
Estamos, na verdade, a homenagear um homem que é, em nosso juízo, um grande exemplo de civismo e de probidade moral e política, cuja biografia está aí plena e claramente retratada.
O nome de família Cal Brandão chegou à minha memória, muito antiga, não através de Mário Cal Brandão mas de Carlos Brandão e de um livrinho que li há muitos anos, Funo ou Guerra em Timor. Um livro onde se narra a saga dos deportados políticos que se uniram e animaram os timorenses na luta contra a ocupação do território de Timor Leste pelas forças japonesas, nos anos 40. É essa a família, é essa a saga de onde vem Mário Cal Brandão.
Ao evocar o irmão, evoco alguém que me prendeu muito fundo na minha juventude, mas quero, aqui, nesta Câmara, referir Mário Cal Brandão por si mesmo.

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Como Constituinte, deu um exemplo vivo de saber lutar, de saber esperar e também de saber transigir. Cal Brandão, como Constituinte, deixou aqui marcada a sua presença pessoal, por ter uma personalidade rica, aberta e combativa.
Neste contexto, Sr. Presidente, renovo, com V. Ex.ª, os votos de pesar à viúva, Beatriz Cal Brandão, e apresento, em nome da minha bancada, votos de pesar ao Partido Socialista.

Aplausos gerais.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - faça favor.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): - Sr. Presidente, quero associar-me ao voto apresentado por V. Ex.ª em nome de todas as bancadas entregando na Mesa um testemunho pessoal a que V. Ex.ª dará o destino que muito bem entender, mas, em todo o caso, eu sugeria que fosse publicado no Diário da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Com certeza, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos passar à votação do voto n.º 46/ VII - De pesar pelo falecimento de Mário Cal Brandão (Presidente da AR em exercício Manuel Alegre, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, seguindo a tradição, peço à Câmara que me acompanhe num minuto de silêncio.

A Câmara guardou, de pé, um minuto de silêncio.

Srs. Deputados, passamos agora à apreciação dos dois votos de congratulação já anunciados sobre a eleição de Portugal para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
O Sr. Secretário vai proceder à leitura dos dois votos.

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o voto n.º 47/VII é do seguinte teor:

O voto de congratulação que propomos hoje refere-se a um acontecimento de excepcional importância para o nosso país: a eleição de Portugal, pelo Grupo Ocidental, enquanto um dos 10 membros não permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, para o biénio de 1997/98.
A presença de Portugal ao longo de dois anos no Conselho de Segurança da ONU permite-lhe participar e agir em conformidade e em favor dos ideais de paz e de convivência entre os povos - que são apanágio da democracia portuguesa.
Com efeito, entre as funções e os poderes que a Carta das Nações Unidas atribui ao Conselho de Segurança (veja-se do Capítulo V ao XI) encontram-se: a manutenção da paz e segurança internacionais de acordo com os objectivos e princípios das Nações Unidas; a investigação de disputas ou situações que possam conduzir ao atrito internacional, a recomendação de métodos de resolução destas disputas ou de soluções; a formulação de planos para o estabelecimento de um sistema para regulamentação em armamentos; a determinação da existência de ameaça à paz ou acto de agressão e recomendar qual a acção a tomar, exigir dos membros a aplicação de sanções económicas e outras medidas que não envolvam o uso da força para a cessação da agressão; desencadear acções militares contra o agressor, recomendar a admissão de novos membros e termos sob os quais se tornem partes do estatuto do Tribunal Internacional de Justiça, exercer as funções de organismo de tutela das Nações Unidas em «áreas estratégicas»; recomendar à Assembleia Geral a nomeação do Secretário-Geral e, juntamente com a Assembleia Geral, eleger os juízes do Tribunal Internacional.
Para além da enorme relevância da missão que Portugal vai assumir, importa sublinhar o seu significado histórico e político, no plano internacional e nacional.
Se a anterior eleição para o biénio 1979/80 significou, de certo modo, o reconhecimento do processo de consolidação da jovem democracia portuguesa, a actual reflecte o respeito e confiança que a comunidade internacional deposita na nossa democracia assim como na maturidade da política exterior do Estado português e da nossa diplomacia.
Por outro lado, o sucesso obtido resulta da acção de governos de diferente orientação, apoiados por partidos entre si concorrentes no plano interno, mas que souberam manter acima de tudo o sentido de Estado e os interesses da Nação portuguesa. O processo de candidatura de Portugal a este cargo foi, como é sabido, iniciado em 1989, e contou com o apoio das máximas autoridades políticas nacionais e com o empenhamento permanente da diplomacia portuguesa.
Nestes termos, a Assembleia da República congratula-se com a eleição de Portugal para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e manifesta a sua confiança em que a República Portuguesa honrará de forma exemplar a missão que lhe foi confiada.

O voto n.º 48/VII, da Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, é do seguinte teor:

A Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, reunida em 22 de Outubro, reunida na Assembleia da República, congratula-se com a eleição de Portugal para membro do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas biénio 1997-1998.
A Comissão de Negócios Estrangeiros espera que esta eleição, obtida após intensa competição, contribua para o reforço de credibilidade externa de Portugal e para uma cada vez maior afirmação do nosso País no plano internacional.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se não houver objecções, faremos a apreciação conjunta destes dois votos de congratulação.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Trata-se, neste momento, de sublinhar uma ocasião duplamente gratificante no plano histórico e no plano político. Em primeiro lugar, dada a importância internacional do acontecimento que hoje nos é dado celebrar.

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Com efeito, Portugal conseguiu obter uma posição de membro não permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, o que ocorreu de uma forma dignificada devido até à importância dos concorrentes que se apresentavam à votação juntamente com Portugal.
Trata-se, portanto, de uma inequívoca vitória de Portugal e da diplomacia portuguesa, que sublinha a maturidade da nossa diplomacia e o reconhecimento internacional da nossa democracia, do ponto de vista da capacidade de conduzir processos internacionais.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Oradora: - Por outro lado, no plano interno, creio que esta será talvez uma das poucas ocasiões que nos é dado sublinhar, mas não devemos, de modo algum, esquecer que é uma ocasião de coroação de uma série de esforços que foram conduzidos por partidos diferentes e concorrentes no plano interno, mas que souberam manter acima de tudo um sentido de Estado e a noção exacta dos interesses da Nação portuguesa.
Aliás, os comentários de variadas personalidades de origem e de extracção política diferenciada vão no sentido de concordar com a importância da ocasião e com a ideia de que Portugal assume neste momento uma missão que vai ser extremamente importante para que o nosso país possa defender internacionalmente os ideais de paz e de convivência pacífica entre os povos que têm guiado a nossa democracia e que certamente irão constituir uma prioridade, apoiados, naturalmente, pelos partidos presentes na Assembleia da República.
Por isso propusemos este voto, que mereceu a concordância de todos os partidos políticos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Abecasis.

O Sr. Nuno Abecasis (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Portugal está, sem dúvida alguma, num momento alto da sua posição internacional. Diria que desde a constituição, ainda este ano, da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, passando pela atribuição, que, não sendo a nós, tanto nos diz, do Prémio Nobel a D. Carlos Ximenes Belo e a José Ramos Horta e agora a eleição de Portugal, de uma forma tão expressiva, para um lugar no Conselho de Segurança das Nações Unidas, tudo isto a par com a presidência que exercemos da Assembleia-Geral das Nações Unidas, de uma forma brilhante, no ano que terminou, mostra bem até que ponto rende internacionalmente o capital de universalidade que este país foi acumulando ao longo dos séculos.
Estou certo de que a isso se deve, em grande parte, esta eleição, que acaba de verificar-se, de Portugal para o Conselho de Segurança da ONU. De facto, as nações reunidas que exprimiram o seu voto não tiveram dúvidas de que este é um país amante da paz e do direito, capaz de dar um contributo válido e de servir como intérprete num mundo cada vez mais complexo.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, seria uma ingratidão esta Assembleia não agradecer, mesmo sem saber quantas e quais as inúmeras entidades que intervieram neste processo, a todos os que, de uma forma ou de outra, neste e em anteriores governos, pertencendo ou não aos quadros da função pública ou do aparelho diplomático, contribuiram, juntaram esforços e obtiveram esta magnífica vitória para Portugal. Sejamos dignos e capazes de, também no Conselho de Segurança das Nações Unidas, nos comportarmos como factores de paz e do desenvolvimento da Humanidade nestes tempos que correm.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Neste momento, pretendo dizer que, estando inscrito para sobre esta matéria fazer uma declaração política, não desenvolverei qualquer dos aspectos aqui já referidos. Friso apenas que, em nome da bancada do Partido Social Democrata, apoiaremos ambos os votos de congratulação, um dos quais foi ontem aprovado por unanimidade na reunião da Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação, a que tenho a honra de presidir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben de Carvalho.

O Sr. Ruben de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao facto de Portugal ter passado a fazer parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o Grupo Parlamentar do PCP entende como inteiramente justas e correctas as saudações à acção dos diplomatas da República que tornaram possível esta vitória da diplomacia portuguesa.
Pensamos, contudo, ser necessário sublinhar que, embora decorridas duas décadas sobre o 25 de Abril, a entrada de Portugal para o Conselho de Segurança das Nações Unidas tem a ver com a situação adquirida pelo nosso país após a revolução ocorrida naquela data Trata-se de uma democracia na qual o povo português vive com plenos direitos e que se construiu também sobre a paz e o final de uma guerra.
Se Portugal é hoje um interlocutor importante que justifica se depositem esperanças no papel que desenvolverá no Conselho de Segurança das Nações Unidas, tal deve-se ao facto de há 20 anos a democracia portuguesa ter começado a ser construída conjuntamente com uma situação de paz que entendemos dever continuar a ser defendida nas Nações Unidas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se estiverem de acordo, vamos proceder à votação conjunta dos votos n.os 47/VII (PS, PSD e CDS-PP) e 48/VII (Comissão de Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação) - De congratulação pela eleição de Portugal para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Submetidos à votação, foram aprovados por unanimidade.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai dar conta de um relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre retoma e substituição de Deputados.

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O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, o relatório e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte teor:

1. Em reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias, realizada no dia 23 de Outubro de 1996, pelas 14 horas e 30 minutos, foram observadas as seguintes retoma de mandato e substituição de Deputado:
a) Retoma de mandato de Deputado nos termos do artigo 6.º, n.os 1 e 2, do Estatuto dos Deputados.
Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS/PP): Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho (Círculo Eleitoral do Porto), em 17 de Outubro corrente, inclusive, cessando Fernando José de Moura e Silva.
b) Substituição nos termos do artigo 5.º, n.º2, alínea b) do Estatuto dos Deputados.
Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS): António Jorge Mammerickx da Trindade (Círculo Eleitoral da Madeira), por Rita Maria Dias Pestana Cachuxo, com início em 23 de Outubro corrente, inclusive.
c) Substituição nos termos do artigo 7.º do Estatuto dos Deputados.
Grupo Parlamentar do Partido Popular (CDS/PP): Manuel Maria Mendonça da Silva Carvalho (Círculo Eleitoral do Porto), por Fernando José de Moura e Silva, com início em 17 de Outubro corrente, inclusive. Na mesma data, em consequência desta renúncia, assume o mandato em regime de efectividade o Deputado Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan, que já exercia funções em regime de substituição, conforme Relatório n.º 1 da Comissão Eventual de Verificação de Poderes, de 27 de Outubro de 1995.
2. Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais.
3. Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
4. Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
A retoma do mandato e as substituições em causa são de admitir uma vez que se encontram verificados os requisitos legais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo inscrições, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Informo a Câmara de que, nas galerias, assistem à sessão um grupo de 52 alunos da Escola n.º 1 de Belas, um grupo de 50 alunos da Escola n.º 4 do Fogueteiro e um grupo de 75 alunos do Colégio da Imaculada Conceição de Coimbra. Seguindo uma velha tradição, saudemos estes cidadãos do futuro.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Constitui para mim um grato prazer tomar a palavra perante esta Câmara por ocasião da eleição de Portugal para o Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Acabámos de aprovar por unanimidade e aclamação dois votos de congratulação. De qualquer modo, penso que poderá ter interesse reflectirmos sobre três aspectos relevantes associados a este voto.
Em primeiro lugar, sobre o que representa em termos da credibilidade do nosso país. Hoje, somos uma democracia respeitada e um país com uma credibilidade internacional indiscutível; um país que respeita a paz e tem reputação de promover os consensos; um país que, estando muito orgulhosamente integrado no espaço ocidental, sabe contudo manter e reforçar a ligação e a inclinação da Europa e do Ocidente a outras partes do mundo; um país que tem vindo, sem dúvida, a fazer subir a sua reputação no espaço internacional; um país que se tem notabilizado por posições corajosas na defesa dos Direitos do Homem; um país que quer manter esta sua inclinação para o grande largo; um país que quer manter e reforçar a sua natural ligação a África.
Permitam-me, Sr. Presidente è Srs. Deputados, que a este respeito saliente o apoio que sempre tivemos dos países de língua oficial portuguesa. Reconheço aqui, na tribuna de honra, o Secretário-Geral Adjunto da CPLP, Embaixador Rafael Branco, a quem peço para transmitir aos governos da nossa Comunidade o grande apreço pelo apoio que sempre merecemos dos países africanos de expressão portuguesa.

Aplausos gerais.

A eleição foi obtida em condições difíceis pois disputávamos um lugar no Conselho de Segurança contra dois países. Ainda Portugal estava praticamente no banco dos réus da comunidade internacional por causa da sua política colonial, já tinha um perfil extremamente elevado nas Nações Unidas enquanto a reputação dos outros dois países era de grande actividade e dinamismo no plano multilateral. Isso demonstra que hoje dispomos daquilo a que, numa linguagem talvez não muito apropriada, se chama um extraordinário good will (uma boa vontade de que Portugal dispõe) e que é necessário sabermos utilizar no plano internacional.
Mas tratou-se também, e este era o segundo aspecto que gostava de referir, de uma questão de atitude e de vontade porque esta eleição, como tudo na vida, aliás, tem uma história. Os Srs. Deputados deverão, sem dúvida, recordar-se de que quando Portugal apresentou a candidatura à presidência da 50.ª Assembleia Geral foi-nos desde logo dito por muitos que era um mero movimento táctico, que Portugal não podia, de maneira alguma, obter a eleição para a presidência da 50ª Assembleia Geral e ambicionar igualmente ser membro do Conselho de Segurança. E, quando se concretizou a eleição para a 50.ª Assembleia Geral na pessoa do Professor Freitas do Amaral, foi-nos dito por muitos, incluindo os nossos parceiros, que agora só tínhamos de desistir e que Portugal não podia ter mais «olhos do que barriga» e até houve algumas vozes em Portugal que chegaram a pensar que essa era de facto a nossa ideia.
Perante isto, ganhou a atitude de vontade e confiança e penso que a lição que temos de tirar para o futuro está relacionada com o abandono de um complexo atávico de inferioridade, aquilo a que, às vezes, tenho chamado o «complexo do Festival da Eurovisão», a ideia segundo a

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qual está tudo feito e há outros mais poderosos ou mais ricos que mandam, a ideia fatalista de que nada podemos fazer. Penso que esta é uma lição que, a partir das questões internacionais, podemos tirar para a nossa cultura cívica e política interna, a de termos de abandonar definitivamente o nacional masoquismo com que tantos gostam de alimentar-se.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - A terceira questão, Sr. Presidente e Srs. Deputados, tem a ver com o que vamos fazer com este lugar. Foi uma vitória sem dúvida possível também pelo extraordinário empenhamento da nossa diplomacia, que aproveito a ocasião para saudar. Alguns grandes quadros da nossa diplomacia acreditaram sempre que tal era possível e lutaram mesmo quando as dificuldades pareciam maiores do que as possibilidades. Mas, agora, temos este lugar no Conselho de Segurança durante dois anos e a verdade é que, por vezes, quando Portugal tem sido chamado a cargos de responsabilidade, como os mesmos têm a ver com a presidência, procura exercê-los respeitando escrupulosamente o princípio da objectividade, da insenção e da imparcialidade. Neste caso, não se trata de uma presidência embora, também numa base rotativa, nos venha a caber durante algum tempo essa presidência. Neste caso, trata-se de Portugal exprimir, no mais alto órgão das Nações Unidas, as suas posições sobre as questões que nos dizem respeito a propósito da nossa visão do mundo: sobre o problema da ajuda ao desenvolvimento, procurando que se acabe com o desprezo a que tem sido, de algum modo, votada África, sobre as questões dos direitos humanos e sobre tantas outras que dizem respeito a Portugal e aos países que nos estão próximos.
Há dois dossiers, que penso merecerem de Portugal, durante este próximo biénio, um empenhamento muito especial no Conselho de Segurança. Desde logo, a questão de Angola. Permitam-me, Srs. Deputados, uma referência breve e pessoal. Cheguei há pouco tempo de Sarajevo, na Bósnia, e uma das conclusões ou interrogações que trouxe foi a seguinte: o que teria acontecido se a comunidade internacional, nomeadamente os mais ricos e os mais poderosos, tivessem investido na paz de Angola um centésimo, nem mais nem menos, daquilo que investiram na Bósnia? O que teria acontecido se tivessem sido canalizados para Angola e para o seu martirizado povo os recursos extraordinários que foram, e bem, canalizados para e Bósnia, talvez porque a Bósnia fica na Europa? Pois Portugal tem agora, no Conselho de Segurança das Nações Unidas, a oportunidade de usar a sua influência, de usar o acesso especial conferido pelo Conselho de Segurança, para mobilizar de forma mais determinada a comunidade internacional, ajudar a consolidar a paz em Angola e a impedir de todo a possibilidade de um regresso da guerra naquele país. Este julgo que será um primeiro objectivo.
Outra questão, Sr. Presidente, Srs. Deputados, diz respeito a Timor. Também aqui houve recentemente uma belíssima notícia: a atribuição do Prémio Nobel a D. Ximenes Belo e a Ramos Horta.
É importante que o lugar que agora vamos ter no Conselho de Segurança das Nações Unidas não seja usado para nele nos sentarmos comodamente mas para nos erguermos com força, em nome e a favor do povo martirizado de Timor Leste.

Aplausos do PSD e do PS.

Julgo que esta eleição do nosso país poderá ser utilizada, com competência, com vontade, para traduzir-se em vantagens reais no que diz respeito a estes e outros problemas que tanto preocupam Portugal e a diplomacia portuguesa. Por estas razões, pelas razões de credibilidade do País, de atitude e de vontade e também de competência e de capacidade, julgo que o País está de parabéns porque isto mostra, mais uma vez, que quando Portugal quer, Portugal pode.

Aplausos do PSD e do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Carrilho.

A Sr.ª Maria Carrilho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Durão Barroso, vou fazer-lhe uma pergunta muito breve, aproveitando de alguma forma para sublinhar a importância destas ocasiões em que os partidos convergem em objectivos nacionais comuns.
O Sr. Deputado falou nos dois dossiers que considera fundamentais: Angola e Timor Leste. Gostaria de saber se tem alguma ideia quanto a um programa de acção a implementar relativamente a estas matérias. Para além disso, gostaria de saber o que pensa quanto à participação de Portugal nas forças de manutenção de paz na Bósnia.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Durão Barroso.

O Sr. Durão Barroso (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria Carrilho, neste momento, não tenho qualquer programa já estabelecido nem penso que me compita apresentá-lo.
De qualquer maneira, devo dizer que, pelo conhecimento que tenho das Nações Unidas, é, de facto, muito importante a capacidade de manobra acrescida que nos é conferida pelo facto de fazermos parte do Conselho de Segurança. É que, como a Sr.ª Deputada bem sabe, há uma negociação permanente, no que toca a votos e a trocas de apoio, e, portanto, utilizando o Conselho de Segurança, Portugal pode chamar a atenção, por exemplo, para a necessidade de se manter o apoio a Angola. Aliás, esta é uma matéria que os governos portugueses várias vezes discutiram com o Secretário-Geral das Nações Unidas e ele próprio já fez um apelo especial em relação a Angola.
Só que, como há pouco referi, a verdade é que Angola apenas dispôs de uma ínfima parte do apoio recebido, por exemplo, pela Bósnia-Herzegovina. Note que não estou a contestar o apoio, financeiro e de outra ordem, recebido pela Bósnia-Herzegovina, mas lamento que Angola, talvez por situar-se em África, talvez por estar mais distante do que são considerados os grandes do mundo; não tenha recebido idêntico apoio.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Por isso, penso que devemos usar sem complexos esta nossa participação no Conselho de Segurança. Às vezes permitam-me esta observação -, julgo que nós, portugueses, na expressão da nossa cultura cívica normal, pecamos por excesso de timidez, por não querermos levar adiante um dossier porque nos diz demasiadamente respeito. Ora, temos de perder essa timidez no que ela tem de negativo. Assim, devemos usar agora a participação do País no Conselho de Segurança

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para colocarmos mais alto as questões de Angola e de Timor Leste nas prioridades das Nações Unidas.
Relativamente a Timor Leste, ainda há dias me pronunciei publicamente sobre uma via que me parece possível mas, dado o tempo limitado de que disponho, não vou enveredar agora pela explicação. No entanto, sempre digo que julgo que Portugal tem de aproveitar este facto extraordinário e relevantíssimo que é a concessão do Nobel da Paz a D. Ximenes Belo e a Ramos Horta, não apenas para nos congratularmos mas para fazermos propostas construtivas, sem quebrarmos os princípios que sejam susceptíveis de granjear o apoio da comunidade internacional, para, de uma vez por todas, fazer com que Timor Leste deixe de figurar no lote daqueles assuntos que muitos consideram sem resolução possível.
Quanto à última questão que a Sr.ª Deputada colocou, respondo-lhe que é bem conhecida a posição do meu partido e a minha própria quanto a isso. Penso que Portugal tem um dever de solidariedade em relação à Bósnia, penso que Portugal, membro da União Europeia e da NATO, não pode dissociar-se do que se passa no nosso próprio continente. Como tal, não me parece ser essa uma questão para a qual Portugal tenha uma vocação específica, ou seja, essa questão não será talvez a mais especializada para Portugal tratar e eu relevaria mais as questões de Angola e de Timor Leste.
No entanto, visto que a Sr.ª Deputada me perguntou, amavelmente, qual seria a minha sugestão, respondo-lhe que, pela minha parte, recomendaria que a nossa orientação continuasse idêntica, agora que temos assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O Vale do Ave tem vindo a ser insistentemente citado nesta Assembleia. Mas, hoje, não vimos falar-vos do Vale do Ave e sim de um outro, o Vale do Sousa.
Se, em traços muito gerais, pretendermos caracterizar a sub-região do Vale do Sousa, poderemos desde logo dizer que ela abrange cinco municípios (Felgueiras, Lousada, Paços de Ferreira, Paredes e Penafiel) e ainda Castelo de Paiva, no âmbito da respectiva associação de municípios, que possuem traços dominantes comuns, a saber: uma população que se defronta com enormes carências em infra-estruturas e em equipamentos sociais colectivos e organizada num mesmo tipo de povoamento; trabalhadoras e trabalhadores muito jovens, pouco qualificados e muito mal pagos; e uma deficiente organização empresarial onde predominam as pequenas, e por vezes muito pequenas, e médias empresas, dos sectores do calçado, do têxtil e do vestuário, do mobiliário e da madeira.
A população do Vale do Sousa é uma população jovem (cerca de 47% tem menos de 24 anos e 26% menos de 15 anos), mas é igualmente pouco escolarizada e pouco qualificada (87% da população possui nove ou menos anos de escolaridade).
No seu conjunto, a área do Vale do Sousa apresenta uma estrutura de actividades económicas em que a indústria detém a quota principal, quer em termos de emprego quer em termos de produção, sendo este o sector de maior dinamismo nos anos mais recentes. Assim, o total de trabalhadores por conta de outrem praticamente duplica no decurso dos últimos 10 anos, concentrando-se, nomeadamente, nos sectores do têxtil, vestuário e calçado, no mobiliário e nas madeiras mas também na construção civil e obras públicas. É claro que, neste momento, predominam no Vale do Sousa os sectores da indústria que se encontram em piores condições para resistir ao impacto do Mercado único, quer pela escassa modernização das empresas quer pela débil organização empresarial, a que se adiciona a falta de um sector de serviços virados para a comercialização directa, o marketing e a melhoria da qualidade. Estas nossas preocupações redobram quando temos em conta que a competitividade das nossas empresas não pode de modo algum assentar numa prática de baixos salários.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se fosse este o segredo, já seríamos há muito os mais competitivos da Europa...
A verdade é que no Vale do Sousa se verificam os mais baixos níveis de escolaridade do distrito do Porto, com destaque para o sector da indústria. Isto significa que continuam a registar-se enormes taxas de abandono da escolaridade básica, seja como consequência dos baixos rendimentos das famílias, seja por não existirem alternativas de emprego para quem possui habilitações superiores, seja porque as. escolas não são atractivas ou não funcionam nas melhores condições. Apresentando as maiores taxas de abandono escolar do País, esta situação gera graves dificuldades para o desenvolvimento futuro, exigindo desde já a tomada de medidas de modo a promover a indispensável formação e qualificação dos jovens trabalhadores. Na sequência do tipo de indústria dominante - cerca de 80% são muito pequenas empresas, com menos de 10 trabalhadores -, assim como das fracas qualificações e dos baixos níveis de habilitações, as remunerações salariais de base são também baixíssimas e inferiores à média do distrito do Porto, a qual, por sua vez, já é inferior à média nacional.
No domínio dos equipamentos de ensino e formação profissional, há grandes carências, sobretudo ao nível dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do secundário, verificando-se elevados índices de ocupação das escolas na generalidade dos casos e dos concelhos. Quanto à educação pré-escolar pública, continua muito longe de responder às necessidades das populações. Dado o perfil industrial desta zona, o baixo nível de escolaridade e as fracas qualificações profissionais, é particularmente preocupante o facto de existirem apenas duas escolas profissionais (Seroa-Paços de Ferreira e Felgueiras), com poucos alunos e escassa diversidade de opções, embora existam ainda outros dois centros de formação profissional, pouco dinâmicos e mal, muito mal rendibilizados.
Há igualmente grandes carências em termos de médicos e pessoal de enfermagem na área e registam-se fracas coberturas nos cuidados primários. Mas o maior problema no âmbito da saúde pública relaciona-se com os cuidados especializados, já que toda a área depende de um único centro hospitalar, que é insuficiente para as necessidades, dependendo do Porto na maior parte dos serviços. É, assim, urgente a construção do novo centro hospitalar do Vale do Sousa. As carências no campo da saúde, aliadas às deficientes condições de vida, são dramaticamente visíveis nas taxas de mortalidade infantil, as quais cresceram nos

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últimos anos em Penafiel e Paços de Ferreira e se mantêm em níveis muito altos: segundo dados de 1991, 21/1000 em Penafiel, 16,9/1000 em Paços de Ferreira, 16,6/1000 em Lousada, quando a média do distrito do Porto é de 13/1000 e a do País é de 11/1000.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Se não pretendermos que a área do Vale do Sousa se torne a curto prazo tão conhecida como a do Vale do Ave - isto é: conhecida não necessariamente pelas melhores razões! -, é fundamental e inadiável o lançamento de um programa integrado de desenvolvimento para a região, antes que seja tarde. Todos estamos fartos do «casa roubada, trancas à porta»! A própria Associação de Municípios do Vale do Sousa tem vindo a alertar os sucessivos governos para a necessidade urgente desse programa integrado, mas, até ao momento, sem sucesso visível. Operação integrada de desenvolvimento que passe pelos seguintes vectores, entre outros: pela exigência para a indústria têxtil e de vestuário do mesmo tipo de apoios e incentivos aplicados ao Vale do Ave, nomeadamente no apoio à modernização, à reestruturação e à diversificação industrial, de forma a garantir o emprego na zona; pela defesa de um programa único de apoio à modernização das indústrias das madeiras e do mobiliário, e à criação de estruturas de comercialização directa e de valorização da produção; pela defesa do aumento dos salários e da melhoria da qualificação dos trabalhadores e das condições de trabalho, assim como da manutenção e valorização do emprego; pela existência de apoios mais personalizados aos agricultores do Vale do Sousa, tendo em conta as características específicas da pequena agricultura da zona, em geral de tipo familiar; pelo reforço e modernização das infra-estruturas de transportes e comunicações, ambiente e saneamento básico e dos equipamentos colectivos (na educação, na formação profissional, na saúde, na segurança social, na cultura).
A região do Vale do Sousa não pode continuar a ser falada apenas quando a vergonha e o drama do trabalho infantil nos incomodam, nos nossos sofás, através da televisão; a região do Vale do Sousa não pode continuar a ser falada apenas por causa das estatísticas negras do abandono escolar: a região do Vale do Sousa não pode continuar a ser falada apenas por possuir um dos mais altos índices do País, se não do mundo, de Ferrari por km2;...

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador:-... a região do Vale do Sousa não pode continuar a ser falada apenas por possuir um gigantesco número de patrões e um diminuto número de empresários; a região do Vale do Sousa não pode continuar a ser falada apenas quando é preciso tipificar situações de trabalho precário, de salários baixíssimos ou de desrespeito pelos direitos dos trabalhadores.
Para se inverter está situação é incontornável a responsabilidade política do Governo do Partido Socialista. Basta de desculpas, basta de adiamentos, basta de alibis com a «herança»!

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente Sr.as e Srs. Deputados: A memória dos povos cintila, fundamentalmente, no seu património monumental. E todo o processo de animação urbana, cultural, turística, científica e tecnológica anda, indelevelmente, associado à preservação e recuperação do património.
É, pois, gratificante constatarmos que uma das grandes apostas do Ministro da Cultura reside, essencialmente, nessa vertente.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro da Cultura, ao anunciar um plano para três anos da defesa do património, estando previsto canalizar, em prol dessa política, até 1999, cerca de 20 a 22 milhões de contos, está a dar um contributo muito positivo para a consolidação da memória cultural portuguesa.
Esse plano passa, naturalmente, pelo saneamento financeiro do IPPAR, com um deficit herdado da responsabilidade do governo anterior que ultrapassa 1 milhão de contos, pela feitura de uma lei orgânica para este organismo, a ultimar até ao fim do ano, pela autonomização do Instituto de Arqueologia e pela concretização de um pacto patrimonial que consubstancie o diálogo e cooperação com diversos agentes, como a Igreja Católica, as Misericórdias, a Associação Nacional de Municípios, componentes e parceiros decisivos para o êxito desse plano.
Em 1997, irão ser gastos 6 a 7 milhões de contos no restauro do Mosteiro de Alcobaça, Tibães, Santa Clara, Pombeiro, Torre de Belém e Mosteiro de S. João de Tarouca. Outros espaços estão a ser ou virão a ser brevemente recuperados, como são os casos do Convento de Mafra; Batalha, Palácio da Ajuda, Palácio da Pena, Fortaleza de Sagres.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Na passagem do «Governo em Diálogo» pelo distrito de Viseu, mais concretamente na passagem por Lamego e Tarouca, anunciou o Sr. Ministro da Cultura, na presença do Sr. Primeiro-Ministro, do Presidente do IPPAR e de autoridades locais, o restauro do Mosteiro de S. João de Tarouca, sendo desbloqueada a verba necessária, no valor de 500 000 contos, para a prospecção arqueológica do convento, a segurança da torre, a integração das capelas numa paisagem integrada, acompanhada de engenharia hidráulica necessária para suster as águas que se infiltram no monumento.
Lamego e Tarouca constituem uma rota de esplendorosa paisagem cultural, sendo o pólo irradiador dum vasto património arquitectónico e urbanístico que lhe conferem uma imagem muito forte e consolidada.
Em tal centro urbano, componente essencial duma antiquíssima e prestigiada diocese - a diocese de Lamego -, pontuam importantes exemplares do património monumental de relevância nacional, como são os casos do aludido Mosteiro de S. João de Tarouca, o Convento de Balsemão, a Ponte de Ucanha, a Sé Catedral de Lamego, o museu nacional desta cidade, o Teatro Ribeiro Conceição, o paço episcopal e núcleos históricos com forte equilíbrio morfológico, como são os casos do Bairro do Castelo e do Bairro da Ponte, elementos estruturantes da sua imagem identitária.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

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O Orador: - A estes monumentos acrescentam-se os conventos de Ferreirim e Salzedas, também visitados pelo Sr. Ministro da Cultura e a serem objecto de restauro próximo, o primeiro, ao nível das pinturas e, o segundo, ao nível da recuperação do património móvel.
A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), ao projectar instalar-se, já a partir do ano lectivo 1997-1998, com um pólo de extensão, em Lamego, com os cursos de licenciatura nas áreas de Teatro, Música e Património, vem valorizar consideravelmente esta rota de cultura secular que rodeia o Douro, jóia do património da Humanidade e em relação à qual se podem, e devem, forjar circuitos turísticos de qualidade.
Ao avançar com o restauro do Mosteiro de S. João de Tarouca, concretizando uma promessa eleitoral do Sr. Primeiro-Ministro, Engenheiro António Guterres, deu o Sr. Ministro da Cultura um abraço afectuoso aos durienses, que se orgulham da sua história e do seu passado.
No Mosteiro de S. João de Tarouca, primeiro mosteiro da Ordem de Cister em Portugal (1143 ou 1144), está sepultada uma das referências da cultura da nossa história, o Conde de Barcelos, D. Pedro Afonso, filho de D. Dinis, que passou grande parte da sua vida em Lalim, freguesia do concelho de Lamego. Nele são notáveis os retábulos de S. Pedro e S. Miguel e políptico de Nossa Senhora.
Encontra-se esta preciosidade monumental intimamente ligada à história de Portugal. Aliás, «Portugal é o único país da Europa, cuja história, durante, os três primeiros séculos, anda intimamente ligada à Ordem de Cister no seu território». Também é, infelizmente, o único ao qual os cistercienses não voltaram. E não voltaram, quiçá, pelo nosso desinteresse.
Passaram-se muitos anos de negligência e de falta duma política cultural, em prol da preservação do património. Os anos que antecederam o Governo de António Guterres expressaram um ciclo de imobilismo total nesta matéria.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Com o Sr. Ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, abriu-se um novo ciclo, o do triunfo da cultura e do património sobre o betão, bem patente na recuperação das gravuras rupestres de Foz Côa e das decisões corajosas com estas relacionadas que prestigiaram o País e que têm tido a cobertura elogiosa dos principais jornais europeus.

Aplausos do PS.

Não só no património como noutros sectores, o dinamismo do actual Ministro da Cultura tem credibilizado esta componente essencial da nossa vida colectiva.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Chegou o momento de pensarmos maduramente a nossa história, de a retirarmos do sótão de valores em que a quiseram colocar os tecnocratas e os arautos do cinzentismo e da opacidade ideológica.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Exactamente!

O Orador: - Sem cultura, o homem fica completamente à deriva, não se transcende nem ultrapassa os seus limites.
«L'Homme passe L'Homme» - o homem não cabe nos seus próprios limites, dizia Pascal. Foi na busca do absoluto e ultrapassando esses limites que os nossos antepassados nos legaram obras-primas de criatividade e talento. Saibamos ser dignos dessa herança e dessa memória.
Os socialistas e o seu Ministro, que cultivam no seu ideário o primado do homem e da cultura, estão solidários com esse desafio.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, permita-me que o felicite, porque é a primeira vez que o ouço intervir nesta Câmara sobre questões do nosso distrito, o distrito de Viseu. Não posso, pois, deixar de me regozijar por tal tacto, porque é sempre bom ouvir falar das nossas terras.
Todavia, já não o felicito pelo conteúdo da sua intervenção, por vários motivos. Em primeiro lugar, julgo que lhe saiu «a fava do bolo rei», daí que lhe tenha sido destinada a tarefa de se regozijar pela política de cultura do Governo. Aliás, só se for a cultura da palavra pela palavra, porque em termos concretos, até hoje, nada se viu da política cultural desenvolvida para e com os agentes culturais, pelo que dificilmente consegue apresentar um exemplo concreto de tal facto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É lamentável que se refugiem, uma vez mais, nas críticas relativamente ao passado porque, pelo menos no que diz respeito ao nosso distrito, o Sr. Deputado deveria lembrar-se, e lembrar-se bem, que se é verdade que há muito por fazer, também é verdade que houve investimentos sérios.

Protestos do PS.

Aproveito para lhe lembrar a criação, em Viseu, do Centro de Restauro de Talha Dourada, com toda a importância que ele tem para o norte do País e que, por si só, seria suficiente para elucidar mesmo os observadores mais desatentos sobre a política cultural do anterior governo.
Mas quanto a este Governo, e porque falou de Viseu, o Sr. Deputado não acha estranho que o Sr. Primeiro-Ministro António Guterres, dando satisfação a uma promessa eleitoral, tenha ido a S. João de Tarouca - e bem, no meu entender - anunciar um investimento de 500 000 contos, a realizar ao longo destes três anos, e depois no Orçamento do Estado e no PIDDAC para 1997, a primeira oportunidade em que tais intenções iam ser postas à prova, nem um tostão esteja referido para essas obras?!
Esta não é a demonstração mais cabal da incapacidade do Governo para dar resposta, na prática, àquilo que são as suas intenções nas palavras?

O Sr. Eurico Figueiredo (PS): - Mas vem lá!

O Orador: - Se vem, está dissimulado, oculto é não traduz um compromisso político perante esta Assembleia, Srs. Deputados! Essa é a questão mais séria, porque os senhores andam por este país a vender promessas e a criar ilusões, mas quando se trata de consubstanciar essas promessas em actividade e obra concreta, tornam-se perfeitamente incapazes.

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Termino, Sr. Deputado, renovando as solicitações pela intervenção que fez, mas lamentando totalmente o conteúdo da mesma.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Cesário, não fico surpreendido com a sua intervenção, porque ela não tem nada a ver com cultura e foi sobre cultura que estivemos a tentar discutir.

O Sr. Baltazar Mendes (PS): - Muito bem!

O Orador: - Foi esse o esforço que desenvolvi na minha intervenção,...

Aplausos do PS.

... no sentido de prestigiar a Assembleia da República e de a transformar no areópago de cultura que é ou, pelo menos, deve ser.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado José Cesário fez apenas chicana política, que devolvo claramente à procedência!
Sr. Deputado, falei da política do Sr. Ministro da Cultura em relação à preservação do património em termos genéricos e referi alguns casos concretos que passam por algum miserabilismo patente na governação do PSD, ao longo de muitos anos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O ano de 1995-1996 foi um período de grande tranquilidade positiva que só prestigia o País.
Falei, designadamente, do caso das gravuras rupestres de Foz Côa, do parque arqueológico que foi restaurado e, Sr. Deputado José Cesário, posso acrescentar o seguinte dado concludente: só após a inauguração do parque, no dia 10 de Agosto, mais de 5000 visitantes individuais já passaram por lá, para além das visitas e das viagens de grupo que se devem somar a esse número individual que citei.
Esta é a grande vitória da cultura socialista em Portugal, o que representa, como referi na minha intervenção, a vitória da cultura sobre o betão. Os senhores representaram a política da tecnocracia, da opacidade ideológica - e não diria da ignorância, porque gosto de ser elegante nas palavras. Mas o povo que julgue com os termos mais populares que entender por convenientes.
No entanto, Sr. Deputado José Cesário, em relação ao distrito de Viseu, pelo qual ambos fomos eleitos, tenho de avivar-lhe a memória e, para além do restauro do Convento de S. João de Tarouca e dos Conventos de Ferreirim e de Salzedas, falar-lhe no anúncio feito pelo Sr. Ministro da Cultura, que V. Ex.ª não desconhece, em relação ao projecto de remodelação do Museu Grão Vasco, da intervenção na sede de Viseu,...

Vozes do PS: - E esta!

O Orador:-... do contributo para a viabilização do Conservatório de Música Azeredo Perdigão e...

Vozes do PS: - Bem lembrado!

O Orador: - ... do centro cultural distrital que se encontra numa situação financeira de falência.
Sr. Deputado José Cesário, só estes dados comprovam e expressam a vossa incúria e negligência no que diz respeito à política cultural, não só a nível nacional como a nível distrital.

O Sr. Presidente: - Queira abreviar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente.
Gostaria que este fosse um debate de ideias, de valores e de convicções e que, efectivamente, definíssemos um ideário, porque aquilo que o Presidente do seu partido fez, durante muitos anos, foi provar à sociedade, sem glória e sem proveito, que não existem ideias, nem valores e que só devemos pugnar e zelar pelo triunfo e pela competição do dinheiro. Repudiamos essa política porque estamos com o primado do homem e da cultura.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração pessoal, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cesário (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Joaquim Sarmento, julgo que é a primeira vez que uso esta figura nesta Casa, mas vejo-me obrigado a isso, em virtude dos termos usados pelo Sr. Deputado na resposta ao meu pedido de esclarecimento.
Também desejaria que este fosse um debate de ideias e de valores, mas é profundamente lamentável ouvir o Sr. Deputado dizer que o meu pedido de esclarecimento não teve nada a ver com cultura. Digo-lhe mais: como o Sr. Deputado foi meu professor, tudo o que possa aqui fazer tem a ver, com certeza, com o exemplo que o senhor me transmitiu.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. José Junqueiro (PS): - Só quer dizer que o Sr. Deputado foi mau aluno!

O Orador: - E não basta referir aqui exemplos, porventura positivos, da passagem do Sr. Ministro da Cultura por Viseu. Recordo-lhe, aliás, uma cena caricata, que foi a de ver o Sr. Ministro desafiar a Câmara de Viseu para uma candidatura de algo que já tinha sido aprovado no próprio ministério que ele tutela. Francamente, Sr. Deputado!
Lembre-se também das distracções dos membros do Governo, do Governo que o Sr. Deputado aqui vem enaltecer!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Sarmento.

O Sr. Joaquim Sarmento (PS): - Sr. Presidente, chego à conclusão de que o Sr. Deputado José Cesário foi um mau aluno, não aprendeu bem a lição!

Aplausos do PS.

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E lamento profundamente o facto. Mas, para além disso, somos amigos e vamos continuar a sê-lo depois deste debate.
Tenho a dizer-lhe, Sr. Deputado, que as minhas palavras foram apenas um light motiv para uma discussão interessante; tem havido poucas discussões sobre cultura neste espaço da Assembleia e faço votos para que nos encontremos mais vezes, noutro cenário, com o Sr. Deputado José Cesário mais convencido e mais rendido aos méritos do Sr. Ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 55 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos iniciar a discussão, na generalidade, do projecto de lei n.º 150/VII - Regula a actividade de transporte de doentes por corpos de bombeiros (PCP).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei que hoje sobe a Plenário da Assembleia da República, da iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, visa toda uma problemática do transporte de doentes em ambulâncias pelas instituições dos bombeiros, instituições essas que são das mais antigas organizações de socorrismo e solidariedade humana em Portugal.
Os bombeiros portugueses comemoraram há bem pouco tempo os seus 600 anos de existência e foram por isso justamente homenageados por todo o País, quer pelas populações que na sua área de acção lhe reconhecem o mérito, quer igualmente pelas entidades oficiais que superintendem nos bombeiros, culminando na sala do Senado com a cerimónia de encerramento dos 600 anos, presidida pelo Sr. Presidente da Assembleia da República.
Estas instituições, as mulheres e os homens que a elas se sentem ligados por fortes laços de solidariedade humana, fazem hoje parte da nossa memória colectiva.
Desde os tempos mais recuados até à actualidade, os bombeiros em Portugal sempre transportaram doentes, procurando fazê-lo da melhor forma, e sempre encontraram meios e métodos para alcançar tal desiderato.

O Sr. João Amaral (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É preciso entender que os bombeiros voluntários, em Portugal, foram e continuam a ser os parentes pobres da protecção civil, com poucos meios e fracos recursos para poderem fazer face às dificuldades do dia-a-dia, mas que com bastante engenho e arte souberam e sabem vencer as dificuldades e encontrar soluções para apoiar as populações em caso de sinistros, quer sejam incêndios, inundações ou transporte de sinistrados.
A atestar este esforço e esta abnegação em prol das populações estão os inúmeros casos em que os próprios bombeiros transformaram centenas de viaturas doadas pelo exército, consideradas inoperacionais, que colocaram, já depois de transformadas em autotanques, em prontos-socorros ligeiros e, em alguns casos, em ambulâncias, de tipo todo-o-terreno, de apoio às populações rurais.
É verdade que a realidade de hoje é outra, já existe alguma capacidade mesmo em meios técnicos, mas continua a ser manifestamente insuficiente.
Na área que hoje aqui detalhadamente debatemos, o transporte de doentes em ambulâncias, têm sido feitos esforços acrescidos para dotar este serviço de meios, isto é, de ambulâncias devidamente equipadas, aumentando a qualidade do serviço prestado e criando condições nas áreas de formação para que as tripulações das ambulâncias tenham cada vez mais conhecimentos técnicos, de modo a habilitá-los para uma maior e melhor eficiência nos cuidados aos sinistrados.
Tal formação tem sido dada a monitores na Escola Nacional de Bombeiros e no Instituto Nacional de Emergência Médica, e através destes ao pessoal que faz parte da tripulação de ambulâncias, quer sejam meras ambulâncias de transporte, quer sejam ambulâncias de emergência médica. E não podemos nem devemos deixar de realçar o enorme esforço humano que os bombeiros dedicam nesta área.
Segundo os dados disponíveis, publicitados pelo Serviço Nacional de Bombeiros, dos mais de 2,5 milhões de serviços efectuados por corpos de bombeiros anualmente, cerca de 1,8 milhões foram-no na área de transporte de doentes e sinistrados, utilizando para o efeito mais de 3000 ambulâncias e envolvendo milhares de homens e mulheres que, com carácter basicamente voluntário, prestam às populações, em especial aos doentes e sinistrados envolvidos, um relevante papel de socorrismo e de solidariedade.
O País dispõe hoje de cerca de 470 associações e corpos de bombeiros que envolvem mais de 40 000 cidadãos (homens e mulheres) que, com carácter voluntário e permanente, se dispõem a prestar ajuda ao seu semelhante, sendo que destes apenas 3600 têm vínculo de assalariados, mas continuam por opção auto-assumida a sua condição de voluntários. Mas é igualmente verdade que o esforço que vêm fazendo, ao longo dos anos, não tem sido reconhecido por parte de algumas entidades oficiais, nomeadamente o Ministério da Saúde, do governo do PSD, que ao promulgar o Decreto-Lei n.º 38/92 de 28 de Março, colocou em pé de igualdade, quer os bombeiros, quer outras entidades privadas que se viessem a criar na área de transporte de doentes, exigindo para ambos o mesmo tratamento na concessão de alvará. Isto é, para o Ministério da Saúde de então, os bombeiros com capacidade e provas demonstradas ao longo de várias gerações ficaram sujeitos a igual tratamento ao de uma entidade privada que ora se constituía, ou seja, sem tradições no sector e muito menos sem provas dadas, quer ao nível de capacidade operacional quer ao nível de conhecimentos técnicos adquiridos.
Esqueceram, deliberadamente, que os bombeiros são entidades privadas sem fins lucrativos, isto é, são associações humanitárias de carácter eminentemente solidário, onde a sua acção visa tão-só o apoio às populações, enquanto que as entidades privadas, que um pouco por todo o País foram surgindo, visam o lucro ou têm como fim a actividade lucrativa do transporte de doentes em ambulâncias.
Por outro lado, não se desconhece que esta actividade traga também alguma mais-valia aos bombeiros, mas essencialmente será para financiar outras áreas onde os

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bombeiros têm maiores dificuldades. Por isso, não só devem ser defendidos mas essencialmente apoiados.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mas mais grave ainda do que não querer compreender esta realidade é a facilidade com que foram passados alvarás a entidades privadas que não detinham, e ainda hoje não detêm, os requisitos essenciais para possuírem tais alvarás. Não são possuidores de capacidade de recolha de veículos, nem de lavagem e desinfecção dos mesmos, nem de pessoal em número quantitativo e qualitativo para desempenharem tais missões, agravando por isso mesmo as condições de transporte de doentes na qualidade dos serviços prestados.
É preciso que fique bem claro que nada temos contra a actividade de transportes particulares no sector, mas é necessário que fique bem claro também que os operadores privados nada têm que se assemelhe aos bombeiros, quer na sua motivação, quer na sua essência e quer mesmo na capacidade e operacionalidade.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Vector igualmente importante é ainda a total disponibilidade que os bombeiros detêm, estando permanentemente ao serviço das populações, seja de noite ou de dia, feriado ou dia festivo, o que não acontece com os operadores privados.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O que atrás fica dito é motivo por si só mais do que suficiente para que o governo do PSD tivesse tido o cuidado necessário para reconhecer que os bombeiros são entidades totalmente diferentes dos operadores privados e lhes tivesse concedido os alvarás de transporte de doentes em moldes totalmente diferentes.
Senão vejamos, o Decreto-Lei n.º 407/93, de 14 de Dezembro, inclui expressamente no seu articulado «o socorro a doentes e sinistrados como uma das missões dos corpos de bombeiros», e o preâmbulo do Decreto-Lei n.º,38/92, de 28 de Março, reconhece também «o relevante papel que as corporações de bombeiros têm desempenhado neste âmbito, voluntariamente e de modo duradouro, impõe, a justo título, algumas especificidades de regime».
Tal arrazoado de palavras não se traduziu no corpo do decreto em regime especial ou facilidades para as associações e corpos de bombeiros. Antes pelo contrário, às associações, que são legalmente a base jurídica e de suporte de um corpo de bombeiros, foram criadas imensas dificuldades, exigência de documentação, atestados de robustez física do pessoal que compõe as tripulações, como se tudo isto não fosse já devidamente exigido a todo o pessoal voluntário e assalariado que fazem parte de um corpo de bombeiros, relegando para plano secundário, senão mesmo ignorando, todas as estruturas representativas dos bombeiros, nomeadamente o Serviço Nacional de Bombeiros, entidade oficial que fiscaliza e coordena toda a actividade ,de bombeiros a nível nacional.
Significa dizer que os atestados que são reconhecidos pelo Serviço Nacional de Bombeiros em relação à robustez física do pessoal são «letra morta» para o reconhecimento, junto do Instituto Nacional de Emergência Médica, de certificação dessa mesma capacidade.
Assim, para além do regime próprio de criação de corpos de bombeiros que exige a homologação pelo Serviço Nacional de Bombeiros, precedida de parecer da Liga dos Bombeiros Portugueses; para além da sujeição, óbvia, a toda a regulamentação atinente às ambulâncias e ao respectivo licenciamento, carecem ainda os corpos de bombeiros de obter do Instituto Nacional de Emergência Médica, em pé de igualdade com quaisquer entidades privadas, a concessão de alvará para o exercício da actividade de transporte de doentes.
Para além de não ter qualquer justificação exigir aos corpos dos bombeiros a sujeição à autorização do INEM para o cumprimento das missões que são suas e que sempre cumpriram, a aplicação do regime instituído contém outros aspectos agravantes: o Decreto-Lei n.º 38/92 considera, entre os critérios para a atribuição de alvarás, «a verificação da necessidade de mais operadores na respectiva área». Porém, o que se verifica é que o INEM tem atribuído alvarás a operadores privados em áreas onde se sediam corpos de bombeiros sem alvará definitivo para o transporte de doentes.
A frota de ambulâncias, o equipamento e o pessoal que até aí eram reconhecidos para efectuar o transporte de doentes e sinistrados, passaram de um dia para o outro, como se de um passe de mágica se tratasse, mas no mau sentido, a já não servirem e não serem reconhecidos, tudo em nome do direito do mercado privado, tudo em nome do direito de exploração lucrativa do transporte de doentes em ambulâncias.
O PCP, reconhecendo as justas aspirações das associações e corpos de bombeiros, apresentou, na legislatura anterior, mais concretamente a 3 de Fevereiro de 1995, um projecto de lei que visava resolver a situação, mas o PSD impediu, na prática, que tal situação ficasse resolvida na altura, tendo criado, no âmbito das Secretarias de Estado da Saúde e Administração Interna, um grupo de trabalho que se dizia iria resolver a situação.
O tempo veio dar razão ao PCP. Até hoje, tal grupo de trabalho, mais não tem feito do que prorrogar o prazo de entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 38/92, sem propor qualquer solução.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O projecto de lei n.º 150/ VII, que o PCP apresentou e está hoje em debate, visa resolver em definitivo tal situação, que tem causado o justo descontentamento e o natural protesto por parte dos bombeiros portugueses, fazendo votos para que a Assembleia o vote favoravelmente, pelo que, desde já, afirmamos que estamos disponíveis para que, em sede de especialidade, lhe possamos introduzir alterações no sentido de o melhorar.

Aplausos do PCP.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Maria José Nogueira Pinto e Nelson Baltazar.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, não fica claro, do meu ponto de vista, qual é o objectivo principal do projecto do PCP, se é vedar à iniciativa privada o sector de transporte de doentes ou se é retirar da orientação ou da coordenação do Instituto Nacional da Emergência Médica o transporte de doentes efectuado pelos bombeiros.
Gostaria, pois, que me esclarecesse. Até porque, considerando a importância do Instituto Nacional de Emergência Médica e a importância de uma coordenação

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efectiva feita por esse instituto numa área que é tão relevante, e tendo em conta a grande sinistralidade que existe em Portugal, como é que veria a possibilidade de retirar uma parcela importante de transporte de doentes dessa coordenação? Pergunto se isso não significaria piorar e até mesmo contrariar o espírito do INEM, enquanto instituto que tem essa função coordenadora.
Em relação a fechar este sector à iniciativa privada, pergunto-lhe por que razão não insistir antes naquilo que é uma obrigação óbvia do Estado, que é a fiscalização das condições em que efectivamente se processam esses transportes em ambulâncias privadas. Ou seja, o alvará é concedido e tal como é concedido pode ser retirado, devendo essa avaliação ser feita periodicamente.
Portanto, uma coisa é não estar a ser feita essa fiscalização, o que é muito errado; outra coisa é saber se, com ou sem fiscalização, o Sr. Deputado considera que é um sector que pela sua natureza - e poderia considerá-lo - deveria ser vedado à iniciativa privada.
Penso que são duas questões que estão bastantes confusas no projecto do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr. Deputado Rodeia Machado, havendo outro pedido de esclarecimento, pretende responder de imediato ou no final.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - De imediato, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem, então, a palavra Sr. Deputado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, agradeço as questões que colocou, mas gostaria de lhe dizer, para clarificar, que o projecto de lei do PCP não tem em mente nem uma coisa nem outra. Não tem em mente retirar nada disso. O que pretendemos com o nosso projecto é legitimar uma coisa que já existe há muito, ou seja, não é necessário, em nosso entender, que o Instituto Nacional de Emergência Médica tenha de concessionar o alvará aos bombeiros. Os bombeiros sempre detiveram o transporte de doentes em ambulâncias. Era a única entidade, para além da Cruz Vermelha e para além dos próprios serviços dos hospitais que também tinham ambulâncias para transporte de doentes.
Agora, o que queremos precisar é que os privados fiquem a reger-se pelo Decreto-Lei n.º 38/92 e a concessão de alvará das ambulâncias aos bombeiros seja isentada, na medida em que os bombeiros já estão instituídos no terreno. Como lhe disse, são 470 associações que existem em Portugal, que estão legitimadas, quer pelo Serviço Nacional de Bombeiros quer pela própria Liga dos Bombeiros Portugueses, pelo que não há necessidade de ter um alvará com toda a especificidade de entrega de documentação, duplicando inclusivamente a documentação que já existe e que está certificada junto do Serviço Nacional de Bombeiros, designadamente junto do INEM.
Como sabe, a maioria dos bombeiros em Portugal têm no seu seio as ambulâncias de transportes do INEM, mas essas ambulâncias são de transporte para socorrismo, cuja actividade é confiada, apenas e tão-só, a bombeiros e à Cruz Vermelha Portuguesa. Portanto, quanto a essa não há dúvidas absolutamente nenhumas! E se o INEM já reconhece aos bombeiros portugueses que têm toda a facilidade para ter no seu seio ambulâncias de socorrismo de emergência médica, situações muito mais graves do que o transporte normal de doentes, menos sentido fará que tenhamos de ser portadores de um alvará, que, desde há muito, já detemos.
É, pois, esta a situação, concretamente em relação aos bombeiros, que este nosso projecto de lei visa. Nada retiramos em relação aos privados, pelo contrário, mantém-se efectivamente em relação ao Decreto-Lei n.º 38/92 toda a legislação de concessão de alvará aos privados, mas exigimos uma questão, isto é, que nessa concessão haja uma fiscalização cuidada e atempada sobre a concessão de alvará aos privados, porque conhecemos o que, no terreno, está a ser feito. Posso citar-lhe, embora não valha a pena, nomes de entidades que actuam nesse sentido e que não têm as mínimas condições para transportar doentes. Repito, não têm as mínimas condições! Não têm casas de recolhas de ambulâncias, não têm tratamento sequer de desinfecção das próprias ambulâncias, não têm acordo especializado de transporte, não têm tripulações à altura, quer qualitativa, como ele disse, quer quantitativamente, porque não têm pessoal suficiente para trabalhar 24 horas por dia.
Muitas vezes é com prejuízo e cansaço das próprias pessoas que estão nessas entidades privadas que se fazem os transportes de doentes. E isso não pode continuar a acontecer, em Portugal, para bem do serviço que, de qualidade, se quer prestar aos sinistrados!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, o PS reconhece o importante papel que os bombeiros têm desempenhado e continuam a desempenhar na sociedade portuguesa. De tal forma que, no seu programa, se afirmava que a política de apoio aos bombeiros será alargada, em diálogo com as suas estruturas representativas, em novos domínios, nomeadamente na área das comunicações, na formação, na regulamentação de apoio social a bombeiros e seus familiares.
Isentar os bombeiros do respectivo alvará para o exercício de actividade de transporte de doentes mais não significa do que eliminar requisitos desnecessários e o justo reconhecimento do seu papel, exercido ao longo destes anos todos.
Em suma, o projecto de lei do PCP parece-nos meritório. Em todo o caso, o que é que o Sr. Deputado me dirá relativamente à extensão do vosso projecto de lei relativamente a outras, instituições de interesse público, que também estão credenciadas, que são de interesse público e estão a fazer credenciadamente transporte de doentes?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Baltazar, começando por agradecer a pergunta que me fez, gostaria que me referisse exactamente quais são essas entidades, porque, para além da situação que colocou, não as especificou. Se se trata da Cruz Vermelha Portuguesa, é natural que, se essa lacuna está no nosso projecto de lei, poderemos, a todo o tempo, como eu disse, em sede de especialidade, estendê-la tam-

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bém à Cruz Vermelha Portuguesa, embora seja reconhecido que a CVP presta, juntamente com os bombeiros, um serviço de apoio à população que é altamente meritório.
Não temos qualquer rebuço em dizer que se o nosso projecto não contempla - e creio que não! - a Cruz Vermelha Portuguesa, também pode vir a ser contemplada, em sede de especialidade, quando o votarmos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Aires de Carvalho.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: Passo, em primeiro lugar, a ler o relatório e parecer da Comissão Parlamentar de Saúde, sobre o projecto de lei n.º 150/VII, que regula a actividade de transporte de doentes por corpos de bombeiros.
O projecto de lei n.º 150/VII, da iniciativa do Partido Comunista Português, identifica na exposição de motivos a necessidade de isentar os corpos de bombeiros, legalmente constituídos, da tramitação legal a que se encontram sujeitas as demais entidades que pretendam adquirir o alvará para o exercício de actividade de transporte de doentes.
Este diploma não encontra justificação para a exigência que hoje é feita aos corpos de bombeiros, sujeitando-os à autorização do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), para o cumprimento das missões que entende ser dos corpos de bombeiros e que aqueles sempre cumpriram.
Por outro lado, o Decreto-Lei n.º 38/92, de 28 de Março, considera entre os critérios para a atribuição de alvarás a «verificação de necessidade de mais operadores na respectiva área». Contudo, constata que o INEM tem atribuído alvarás a operadores privados nas áreas onde se sediam corpos de bombeiros sem alvará definitivo para o transporte de doentes.
O projecto-lei n.º 150/VII justifica a sua apresentação, exemplificando, segundo dados de 1993, publicitados pelo Serviço Nacional de Bombeiros, que de entre 2 440 467 intervenções efectuadas por corpos de bombeiros, 1 750 000 foram precisamente intervenções de transporte de doentes ou sinistrados, utilizando para o efeito 3000 ambulâncias.
O Grupo Parlamentar do PCP já havia apresentado, em 4 de Junho de 1986, um projecto de lei sobre a obrigação do pagamento pelo Estado do serviço de transporte de doentes, prestados por bombeiros. Igualmente, em 3 de Fevereiro de 1995, a mesma força política apresentou um projecto de lei que regula a actividade de transporte de doentes por corpos de bombeiros, sem que, no entanto, ambos os projectos de lei tenham subido a Plenário.
Este documento foi aprovado por unanimidade na Comissão Parlamentar de Saúde, tendo, então, os diversos grupos parlamentares reservado as suas posições para este debate.
Para nós, reveste-se de um especial significado o facto de, após a apresentação de outros dois documentos sobre esta matéria, que não chegaram a subir a Plenário, podermos, hoje, aqui, discutir e debater o regulamento da actividade de transporte de doentes por corpos de bombeiros. Por outro lado, o significado é duplamente maior se tivermos em conta que a discussão desta matéria, nesta Câmara, tem lugar, precisamente, no dia em que se inicia o 36.º Congresso Nacional da Liga dos Bombeiros Portugueses.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - É neste contexto que saúdo, também daqui, todos os bombeiros portugueses, com particular destaque para os mais de 40 000 representados pela Liga, reafirmando-lhes que o PS tudo fará para um alargamento, cada vez maior, da política de apoio aos bombeiros, em diálogo com as suas estruturas representativas e nos mais diversos domínios, tal como ainda há pouco foi referido, na área das comunicações, na formação e na regulamentação de apoio social aos bombeiros, bem como aos seus familiares.
O projecto de lei em discussão pode vir a dar resposta a uma justa reivindicação dos bombeiros portugueses. Com efeito, a isenção de alvará, por parte dos corpos de bombeiros, para o exercício da actividade de transporte de doentes, pretende colocar ponto final a um processo que tem sido até aqui meramente administrativo e claramente burocratizante.
Na verdade, não faz sentido que, sendo o transporte de doentes, tradicionalmente, uma atribuição dos corpos de bombeiros, estes, após a sua constituição, tenham ainda de solicitar o alvará para o exercício da actividade, tanto mais que os últimos dados disponíveis apontam para que o transporte de doentes por bombeiros representem já 85% do total da sua actividade operacional e, também, a sua maior fonte de financiamento.
Posso adiantar-vos, com base nos dados fornecidos pelo Serviço Nacional de Bombeiros (SNB) e relativo ao ano de 1995, que, para 485 310 saídas de emergência médica, se utilizaram 4500 viaturas e milhares de operacionais a nível nacional.
O quadro jurídico em vigor, que regulamenta a actividade de transporte de doentes, reconhece já o papel desenvolvido pelos bombeiros neste domínio: consagra já algumas especificidades de regime e isenta-os da apresentação de uma série de documentos para a autorização da actividade. Contudo, não obvia o excessivo peso dos condicionalismos legais impostos, tanto mais se tivermos em atenção que esta actividade, levada a cabo por todas as cerca de 470 corporações de bombeiros, só viria a ser alargada aos operadores privados há cerca de três anos.
Tal facto representa, também já, a incapacidade para dar resposta a todas as solicitações que os bombeiros recebiam, sobretudo em certas áreas e a certas horas do dia.
O projecto de lei hoje em debate é, para nós, claramente meritório. Existem, no entanto, algumas situações que deverão ser sublinhadas, com vista a que uma eventual aprovação deste diploma garanta: primeiro, a diminuição dos requisitos meramente administrativos e burocráticos; segundo, o aumento da qualidade do transporte de doentes, traduzido na melhoria da qualidade de serviço prestado; terceiro, o reconhecimento de que os operadores privados continuarão a ser necessários no desenvolvimento desta actividade, sobretudo porque os Corpos de Bombeiros - não conseguem responder às solicitações do mercado de transporte de doentes.
Nós defendemos que, para situações iguais, deverão existir tratamentos iguais. Neste contexto, não faz sentido colocar os Corpos de Bombeiros ao mesmo nível dos operadores privados, no que respeita à tramitação necessária para o exercício de transporte de doentes. Da mesma forma que defendemos que a isenção de alvará para o exercício desta actividade se deve alargar, também, às Misericórdias e à Cruz Vermelha, designadamente.

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Continuamos a defender que, para situações iguais, deverão existir tratamentos iguais.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Contribuiremos, sempre, para desburocratizar, mas com eficácia. Claramente, no sentido de melhorar a qualidade da prestação de serviços. Claramente, num acompanhamento para uma maior qualificação de pessoal, entenda-se tripulação das ambulâncias. Se, por um lado, a solicitação de alvará poderá ser dispensada e substituída por uma mera autorização passada pelo Serviço Nacional de Bombeiros, entendemos, também, que é necessário um acompanhamento e uma fiscalização efectiva, por parte, quer do Serviço Nacional de Bombeiros, quer do INEM, e que resulte do esforço conjunto, em dois aspectos claros e muito concretos: primeiro, na participação e definição dos requisitos a preencher pelo pessoal afecto aos Corpos de Bombeiros, bem como a sua formação técnica; segundo, na definição das características específicas dos veículos e equipamentos utilizados nos transportes de doentes. É neste contexto, e numa perspectiva construtiva, de suprir lacunas, de corrigir e aperfeiçoar, que procuraremos introduzir algumas alterações em sede de discussão na especialidade.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Aires de Carvalho, quero dizer que concordo com a generalidade da sua intervenção, que me pareceu correcta e bem enquadrada. No entanto, há duas questões que, talvez por deficiência de atenção da minha parte, não entendi bem - têm a ver com o assim intitulado excessivo peso dos requisitos em relação à atribuição dos alvarás aos bombeiros.
Gostaria que, se fosse possível, o Sr. Deputado pudesse precisar quais é que são, se são exclusivamente de índole burocrática, já que também concordo que pode e deverá haver uma fiscalização a posteriori pelas entidades que referiu, mas não percebi exactamente isso. Por outro lado, também me pareceu - apesar de ter falado em não haver dois pesos e duas medidas em relação a instituições que, em relação aos privados, o nível de exigências deveria ser muito superior àquele que é pedido em relação aos bombeiros e às instituições que têm este tipo de trabalho. Portanto, gostaria - cumprimentando-o pela sua intervenção - que me pudesse esclarecer em relação a estes dois pontos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Aires de Carvalho.

O Sr. Aires de Carvalho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, creio que, de facto, é capaz de não ter tomado atenção à primeira parte da minha intervenção, e isto não significa qualquer crítica. Quero dizer-lhe, em primeiro lugar, que a questão que se põe, quando falo em burocracia, tem a ver necessariamente com a necessidade, que entendemos meramente burocrática, de as associações, nomeadamente as corporações de bombeiros que, no nosso ver, devem estar dispensadas de tal, requererem autorização para efectuar um serviço que, à partida, lhes é consignado já, antecipadamente, por decreto-lei.
Esta é a primeira questão. Relativamente aos privados, tive o cuidado, na intervenção que proferi, de referir precisamente o contrário. E, aliás, o próprio Serviço Nacional de Bombeiros entende por conveniente a manutenção e a coexistência dos serviços privados, dos operadores privados.
Entendemos que não há qualquer tipo de discriminação relativamente a operadores privados porque também entendemos que, para questões iguais, tratamentos iguais, e, de facto, não podemos colocar no mesmo peso da balança o operador privado e o Corpo Nacional de Bombeiros, visto que o operador privado tem como objectivo também rentabilizar, naturalmente, a sua actividade enquanto que o Corpo Nacional de Bombeiros não tanto.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Filomena Bordalo.

A Sr.ª Filomena Bordalo (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei hoje em discussão visa regular a actividade de transporte de doentes por Corpos de Bombeiros. No essencial, o presente projecto de lei pretende que as Corporações de Bombeiros, legalmente constituídas, fiquem isentas de requerer alvará para o exercício da actividade de transporte de doentes e que a concessão de alvarás a novos operadores seja precedida de parecer do Serviço Nacional de Bombeiros.
O transporte de doentes, independentemente de quem o exerce, tem relevância no sistema de prestações dos cuidados de saúde, e por isso tal actividade está legalmente regulamentada. Como ouvi há dias no Instituto Nacional de Emergência Médica, todo o doente é um VIP e, como tal, exige e merece condições dignas, meios tecnologicamente fiáveis e pessoal qualificado tanto afectiva como tecnicamente. Relevante papel tem sido desenvolvido nesta, como noutras áreas, pelas Corporações de Bombeiros que, de um modo voluntário e contínuo, têm prestado um serviço cuja utilidade pública nunca é demais reconhecer.
O PSD não pode deixar de aproveitar esta oportunidade para nesta Assembleia expressar tal reconhecimento e cumprimentar a Liga Nacional dos Bombeiros, reunida em congresso.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Parece-nos que, por um lado, a idoneidade e a prática das Corporações de Bombeiros, e, por outro lado, a necessidade de simplificação processual justificam a isenção de requerer autorização para o exercício da actividade de transporte de doentes.
Terão, no entanto e no nosso entender, de ficar acauteladas tanto a função de coordenação global do sistema integrado de emergência médica, que cabe ao INEM, como a segurança e qualidade das ambulâncias, como também a formação inicial e contínua dos prestadores daquela actividade.
Nesta matéria, papel digno de referência é o que vem sendo desempenhado com o apoio do INEM pela Escola Nacional de Formação do Serviço Nacional de Bombeiros, quer na formação de formadores, quer na reciclagem dos voluntários já formados.
Assim, a comprovação da frequência, com aproveitamento, de curso reconhecido pelo INEM, conforme o tipo de ambulância, terá de ser uma exigência.
Para além das Corporações de Bombeiros, também o INEM, a PSP, a GNR e a Cruz Vermelha Portuguesa, nos

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seus âmbitos específicos, assumem actividades de transporte de doentes. Por isso, entende o PSD ser uma questão de equidade e justiça, que a isenção de alvará, prevista no projecto de lei em discussão, seja extensiva à Cruz Vermelha Portuguesa.
No que respeita à verificação da necessidade de mais operadores numa área, conforme prevê o Decreto-Lei n.º 38/92, na alínea c) do artigo 4.º, fazer depender tal verificação de parecer exclusivo do Serviço Nacional de Bombeiros, como propõe o projecto em causa, é, no nosso entender, redutor da competência do INEM como entidade coordenadora das actividades desenvolvidas neste âmbito pelos Bombeiros, PSP, GNR e Cruz Vermelha Portuguesa.
Entendemos que importa salvaguardar a coordenação eficaz dos meios humanos e técnicos neste domínio e reconhecer o papel e dignidade de todas as instituições. Por isso, o PSD reserva-se - embora votando favoravelmente este projecto de lei na generalidade - para, em discussão na especialidade, apresentar as propostas que considera salvaguardar aqueles princípios.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): - Sr. Presidente, pedi a palavra não pensando pedi-la, porque penso que não estamos aqui a centrar o debate no ponto essencial e, do meu ponto de vista, isso é grave.
Não estamos aqui a discutir os bombeiros; não estamos a discutir a acção meritória dos bombeiros, que ninguém põe em causa; não estamos sequer a discutir aqui uma tradição dos bombeiros, de transportarem doentes.
Estamos a discutir aqui, do meu ponto de vista, e as consequências da aprovação do projecto de lei apresentado pelo PCP apontam nesse sentido, se queremos ou não um Serviço Nacional de Emergência Médica; se o queremos coordenado e se o queremos integrado; se o queremos hão como ele é neste momento, em que está muito aquém daquilo que é necessário, mas melhorado e modernizado.
Certamente porque os bombeiros são muitos e ninguém é indiferente à questão eleitoral, por variadíssimas razões, podemos estar hoje, aqui, a fazer andar para trás aquilo que, do meu ponto de vista e não só, é essencial - que é um Serviço de Emergência Médica - e eu não poderia deixar de o dizer aqui.
Gostaria também de chamar a atenção para o seguinte: hoje, o transporte é feito em ambulâncias diferentes, todos sabem isso. Aliás, quando falamos em transportes, já falamos, de certa forma, encapotando as questões porque há transportes e transportes, há doentes e doentes, e há hoje ambulâncias com uma grande complexidade, que desejaríamos ter em maior quantidade porque desejamos a complexização do sistema. Este é um aspecto que tem de ser referido.
Ora, para que essas ambulâncias sirvam para alguma coisa, elas têm de ter pessoal com a formação devida. Aliás, para que o sistema funcionasse como deveria ser, ele devia estar medicalizado. Este é um nível acima, para o qual temos de caminhar e até penso que será necessário começar a falar, como já se começou, em transportes aéreos.
Assim, esta questão tem de ser vista na fase em que já está e na fase para a qual tende a caminhar. Os bombeiros têm de se inserir, juntamente com outras entidades, neste sistema, não porque tenhamos alguma dúvida sobre a bondade da sua acção e das suas intenções mas porque aquilo que lhes vai ser pedido, será cada vez mais complexo; os bombeiros não podem ter formação se não for ligada ao INEM; os bombeiros não podem ter ambulâncias medicalizadas se não estiverem ligados ao INEM e o mesmo sucede com outras entidades, o mesmo sucederá certamente com entidades privadas.
Portanto, considerar que os bombeiros podem recomeçar a fazer um transporte numa fase, em 1997, desligados do INEM, de uma, duas: ou estamos a dizer que os bombeiros podem transportar doentes que vão, por exemplo, fazer meios auxiliares de diagnóstico e que estão em perfeito estado de saúde (e esta discussão não tem grande relevância, como certamente o Sr. Deputado Rodeia Machado sabe, se estamos só a pensar nos doentes que vão para a hemodiálise ou que vão fazer o TAC) ou estamos a pensar no transporte de doentes, no seu conjunto considerado, e não podemos, por uma questão de lógica, por uma questão de eficácia, por uma questão de consciência, desligar este transporte feito pelos bombeiros do INEM.
Não podemos fazê-lo sob pena de não termos a formação devida das pessoas, de não podermos, progressivamente, aumentar o número de ambulâncias do INEM que estão sediadas, neste momento, nos bombeiros e que são 155, se a memória me não falha, mas deveriam ser mais. Substituir progressivamente as ambulâncias tradicionais dos bombeiros que não servem, muitas 'vezes, para aquilo que é necessário, por outras ambulâncias e conseguir um sistema, de facto, integrado.
Não posso deixar de referir, até vou ler, no tempo de que disponho (aproveito e incomodo os Srs. Deputados), o preâmbulo de um diploma que foi feito pelo PSD (o que não significa que não esteja bem feito...) onde está dito algo que considero muito importante: «o reconhecimento, universalmente aceite, da importância dos acidentes, principal causa de morte, invalidez e ocupação hospitalar entre os 3 e os 65 anos, fez com que a maioria dos países b considere como fundamental problema de saúde pública». Nós estamos a discutir um problema de saúde pública, não estamos a discutir os bombeiros. E continua-se: «por outro lado, um sistema integrado de emergência médica pode fazer baixar em 20% aqueles níveis de morbilidade e mortalidade». É disto que estamos a falar e não de outra coisa.
Continuando: «o INEM constitui um organismo coordenador das actividades da emergência médica a executar pelas diversas entidades intervenientes no sistema» (podem ser privados, a Cruz Vermelha, as Misericórdias, os bombeiros- respeito-os a todos da mesma maneira e, mais, fiscalizava-os a todos da mesma maneira, a começar pelos serviços públicos, que também precisam de ser fiscalizados, como todos nós sabemos) «e cuja actuação se desenvolverá segundo um determinado esquema».
Neste momento, o que estamos a votar, não é uma questão de bombeiros mas de saúde pública, não é andar para a frente mas andar para trás. Os bombeiros certamente compreenderão que só terão vantagens em estar articulados com o INEM porque aquilo que lhes vai ser pedido - se desejamos, como certamente desejamos, que eles mantenham uma intervenção como a que têm tido até aqui, e acrescida, e qualificada, no transporte de doentes - só é possível se estiverem realmente integrados neste sistema a menos que estejamos aqui a' tratar de um outro tipo de transporte de doentes, que é pago.

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Como os senhores sabem, é pago pelo Serviço Nacional de Saúde e é facturado pelos bombeiros. Não é feito gratuitamente, não devemos dar essa ideia porque tal não corresponde à verdade. É feito e é facturado, embora seja pago com muito atraso pelo Ministério da Saúde, com grande prejuízo para as corporações de bombeiros. Esse transporte, penso eu, também vai ter de ser racionalizado, mas não é certamente disso que estamos a falar. Se estamos a falar da emergência médica, se estamos a falar de transporte de doentes, eu faria aqui, para terminar, mais um apelo para destacar que estamos a falar de saúde pública e não de outra coisa.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, os Srs. Deputados Nelson Baltazar, Rodeia Machado e Jorge Roque Cunha.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nelson Baltazar.

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, quero colocar-lhe uma questão simples, que se baseia no seguinte critério: não é possível, com base neste projecto de lei, trazermos aqui também a discussão sobre ,a assistência e emergência médica, além do transporte de doentes. Devemos trazer estas questões em termos de debate, mas não podemos confundir as coisas. Por isso, há pouco perguntei ao Sr. Deputado Rodeia Machado se ele considerava que, em debate na especialidade, deveríamos ou não atribuir, em determinadas circunstâncias, credenciações específicas a outras entidades e, naturalmente, também aos bombeiros, na medida em que se enquadram nesta perspectiva.
Sr.ª Deputada devemos ou não fazer esta discussão, claramente, na especialidade e não na generalidade? Porque, relativamente ao exercício de actividade de transporte de doentes, o que interessa para o alvará é a área territorial onde se exerce a actividade, e os bombeiros têm essa definição bem clara no Serviço Nacional de Bombeiros, e a natureza, dos transportes a realizar. Quanto a isto certamente que estou de acordo com V. Ex.ª e, mais, estou de acordo que o INEM referencie, e bem, a questão da emergência médica. Portanto, não precisamos de dizer mais nada, estamos de acordo que o INEM deverá continuar a controlar este processo.
Quanto ao número e características dos veículos a utilizar, o SNB está credenciado e está fiscalizado. Também no que se refere à certidão da qualidade de pessoa colectiva, de acordo com o que sabemos, os bombeiros não precisam sequer de a obter, porque já a têm, há muitos anos, felizmente para nós.

O Sr. Presidente (Mota Amaral):- Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Nelson Baltazar, quanto ao transporte de doentes e à concessão do alvará, há aqui uma alínea, que é a que interessa quando estamos a discutir os bombeiros, que se refere à capacidade profissional do responsável pela frota de transportes afecta ao transporte de doentes. Acha que não é preciso verificá-la no caso de serem bombeiros e por serem bombeiros?

O Sr. Nelson Baltazar (PS): - É.

A Oradora: - E como é que ela se verifica se não há alvará? Não havendo necessidade de pedir alvará, este requisito é verificado onde, em que sítio, em que decreto-lei, em que Diário da República?

O Sr. Nuno Baltazar (PS): - Na discussão na especialidade se verá.

A Oradora: - Sr. Deputado, isso não está lá e, normalmente, na especialidade não fazemos projectos de lei, remodelamos, retocamos, mas não os fazemos de raiz.
Portanto, isso significa que o Sr. Deputado pensa que, na especialidade, vai fazer constar do projecto de lei coisas que lá não estão? É que, na medida em que retira a concessão do alvará, retira esta alínea c) e, mais, retira uma outra que me parece muito importante, a alínea d) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 38/92, de 28 de Março, sobre avaliação das condições técnicas, considerando a natureza dos transportes que a entidade se propõe realizar, designadamente respeitante a meios humanos e materiais.
Os bombeiros, por serem bombeiros, têm isto?!

O Sr. Nuno Baltazar (PS): - No Serviço Nacional de Bombeiros.

A Oradora: - Mas eu não quero o Serviço Nacional de Bombeiros, quero o INEM e já expliquei porquê! E o Sr. Deputado também terá ideia da razão por que isso é importante.
Portanto, não estando neste momento em discussão a concessão do alvará, como é que o requisito da alínea c) passa a ser comprovado?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para apresentar o seu pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, creio que há uma enorme confusão da sua parte em relação a isto.
Por um lado, comungo da sua opinião em relação ao INEM, sejamos claros, não tenho qualquer problema em considerar que os bombeiros não querem sair da esfera do INEM em relação à verificação de algumas situações, mas.
por outro, o problema fundamental que aqui se põe é que a o INEM não tem sequer, neste momento, capacidade de certificar o que quer que seja, nomeadamente em relação a essa questão. Ora, se o INEM não tem capacidade para os privados - e nós sabemos que assim é - muito menos a terá para os bombeiros. Além disso, estes têm já um organismo que efectivamente certifica a sua actividade, o Serviço Nacional de Bombeiros, que tem efectivamente, na esfera técnica e na esfera operacional, gente com capacidade para verificar se há ou não capacidade da parte dos bombeiros para desenvolverem esta actividade.
Portanto, os bombeiros não querem sair desta esfera nem nós o propomos. Nós, Partido Comunista Português, no nosso projecto de lei, não propomos que os bombeiros saiam da área do INEM, tanto mais que até dizemos que o socorrismo está efectivamente confiado a bombeiros.
Aliás, é o que está na lei, porque nem sequer os privados podem praticar socorrismo em Portugal, só a Cruz Vermelha Portuguesa e os bombeiros, voluntários, sapadores ou municipais, é que podem actuar nessa área, para a qual está mais vocacionado o INEM.

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Porém, não é só socorrismo que existe em Portugal, existe também transporte de doentes em ambulâncias, que tem de ter capacidade e qualidade. Pensamos que os bombeiros se têm apetrechado devidamente para dar essa resposta qualitativa no transporte de doentes, hoje, como no passado, e a actualidade demonstra-o perfeitamente. Portanto, não tem justificação nenhuma, em nosso entender, proceder de outra maneira.
Por outro lado, quero dizer-lhe, Sr.ª Deputada, que certamente não desconhecerá que existe uma Escola Nacional de Bombeiros onde são ministrados cursos de formação, quer em tripulação de automacas de transporte quer nas chamadas TAEM (tripulação de ambulância de emergência médica), qualquer deles já hoje ministrado na referida escola e no INEM e naturalmente que essa formação «desce» depois até aos bombeiros. Melhor seria, e todos nós estaremos de acordo com isso, que houvesse mais e melhor formação.
Todavia, a minha pergunta é a seguinte: no pressuposto de que este projecto irá baixar à comissão respectiva, como entendemos das palavras do Partido Socialista e do Partido Social Democrata, não entende dar o seu contributo real para o melhorar?

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para formular o seu pedido de esclarecimento, o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha. Posteriormente, a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto responderá conjuntamente aos dois, em 3 minutos cedidos pela Mesa.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, do Partido Social Democrata também terá todo o gosto em ceder tempo à Sr.ª Deputada para responder.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sendo assim, o tempo será descontado ao Partido Social Democrata.

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto, reafirmo tudo o que foi dito pela minha colega Filomena Bordalo sobre a importância do INEM na questão da emergência médica. Porém, não estamos a discutir aquilo que é emergência médica e a sua importância, que, na nossa opinião e vamos ter oportunidade de a discutir na especialidade, terá de continuar a existir, aliás, como está previsto na lei, na coordenação e na formação de formadores, na Escola Superior de Formação de Bombeiros, e até na própria fiscalização.
Portanto, sendo esta mais uma intervenção do que um pedido de esclarecimento, quero dar à Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto a garantia que estamos profundamente preocupados, tal como referiu, em relação à manutenção da qualidade da nossa emergência médica. Aliás, também e contrariamente aquilo que aqui foi dito pelo nosso colega do Partido Comunista Português, não se trata de falta de capacidade do INEM porque se o INEM não tem capacidade para fiscalizar os privados, então, aproveitando agora o Orçamento do Estado, teremos de lhe dar essa capacidade e essa faculdade.
O PSD tem algumas ideias sobre isso mas que fique aqui claro que, na nossa opinião, este projecto de lei apresentado pelo PCP não vai criar entropias maléficas no sistema de emergência médica e, portanto, o nosso acordo na generalidade, já que na especialidade teremos oportunidade de aprofundar estas questões.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para responder aos pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto.

A Sr.ª Maria José Nogueira Pinto (CDS-PP): Sr. Presidente, Sr. Deputado Rodeia Machado, em relação ao INEM não ter capacidade, devo dizer que se não a tem terá de a arranjar, pois penso que não podemos modificar as leis só porque os serviços ou os institutos não têm capacidade.
Porém, o que lhe queria dizer é que a formação que referiu é feita nos bombeiros, porque já os formadores foram formados pelo INEM e, por conseguinte, estamos a falar da mesma formação; o local onde é feita não me interessa, porque estamos a falar da mesma linha de formação.
Relativamente ao transporte de doentes, porque penso que é um aspecto importante, quero dizer-lhe o seguinte: o Serviço Nacional de Saúde é o principal comprador destes transportes e já aqui ouvimos o Sr. Secretário de Estado da Saúde, certa vez, referir que, eventualmente, vai abrir um concurso público para estes serviços.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Já houve!

A Oradora: - Não sabia que já tinha havido. No entanto, ele colocou este serviço na linha de uma prestação de serviços que o Ministério da Saúde procurará comprar ao melhor preço e com a melhor qualidade. Ora, se assim for, reconhece que o Ministério da Saúde terá de ter alguma palavra a dizer na parte da oferta, ou seja, será complicado, se estamos a pensar só neste transporte, do meu ponto de vista, estarmos a fomentá-lo e, de hoje para amanhã, o Ministério da Saúde abrir um concurso público.
Dito de outro modo, só faz sentido fomentar este serviço se o Ministério da Saúde comprar sempre transporte de doentes aos bombeiros, o que penso não estar em causa. Por isso, referia emergência, porque estou a ver o sistema de emergência e não o simples transporte. Aliás, este simples transporte, de hoje para amanhã, pode não ter sentido, basta que o principal comprador o queira e todo este discurso, do meu ponto de vista, já nem sequer faz sentido. É ou não verdade, Sr. Deputado Rodeia Machado? Alias, não estou sequer a dizer que sou contra mas apenas que é tão precário quanto isto.
Sr. Deputado Jorge Roque Cunha, sei que está tão preocupado como todos nós em relação ao INEM mas digo-lhe a mesma coisa: se estamos apenas a tratar de uma mera compra de serviços de transporte, terá de se opor a qualquer medida vinda do Ministério da Saúde para esses serviços serem comprados através de um concurso público a que possam concorrer ambulâncias privadas. Esta é a minha opinião.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado José Barradas.

O Sr. José Barradas (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: De uma forma muito sintética, quero dizer-vos o que esperamos e pensamos que pode ser uma mais valia nesta discussão. Achamos que todos os diplomas, e este concretamente, devem fazer com que a oferta deste serviço de transportes aumente, ao mesmo temo que queremos que seja garantida a qualidade dos serviços prestados e a articulação de todos os serviços que, neste momento, fazem o transporte de doentes.

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Assim, do meu ponto de vista, este diploma deve reflectir isso, quer aqui quer na discussão na especialidade, e julgo que ele o conseguirá, valorizando o trabalho dos bombeiros, que não servem só para apagar fogos mas para muitas outras coisas, pois prestam muitos outros serviços à comunidade e tudo o que seja valorizar essa instituição é, para nós, importante. Ora, este diploma também vai nesse sentido.
Por último, quero dizer claramente que defendemos a credenciação pelo SNB e que a formação seja feita pelo INEM, devendo ser apoiada pela Cruz Vermelha Portuguesa, como acontece actualmente. Julgo, assim, que da discussão em conjunto - no fundo, todos estamos de acordo em determinado tipo de matérias, ou no essencial deste diploma, - e na mais-valia que todas as bancadas podem trazer na discussão na especialidade -, se pode perspectivar um diploma que responda às questões com as quais todos nós concordamos.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Sr.ªs e Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrado o debate sobre o projecto de lei n.º 150/VII. A sua votação realizar-se-á, nos termos regimentais, no dia marcado para as votações.
Passamos agora à discussão da petição n.º 96/VI (1 º) Requerem que a Assembleia da República tome medidas para que as zonas de mono-indústria de lanifícios do distrito de Castelo Branco sejam contempladas com uma operação integrada de desenvolvimento (Luís Pereira Garra e outros).
Foi estabelecido na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares que cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Temos hoje para apreciação em Plenário a petição n.º 96/VI (1.ª), da iniciativa da União dos Sindicatos de Castelo Branco e datada de Outubro de 1991.
A primeira reflexão que urge fazer é a de que, decorridos cinco anos, as razões que justificaram a sua apresentação não são exactamente as mesmas.
Afirmavam na altura os seus subscritores que «desde 1980, e principalmente a partir da entrada em vigor da portaria de reestruturação da indústria de lanifícios, tem-se verificado o progressivo e preocupante encerramento de empresas deste sector, o que representa cerca de 4000 postos de trabalho».
Mais adiante, consideravam a necessidade de «implementar medidas urgentes que visem a resolução dos problemas nas vertentes económica, social, industrial, regional, cultural e ambiental».
Hoje, qual é a situação dos sectores dos lanifícios e vestuário do distrito de Castelo Branco?
Sintetiza-se em três afirmações: salários em atraso; encerramento e falência de empresas; desemprego.
Em relação aos salários em atraso, a situação é cada vez mais preocupante. De 1989 a 1993, 14 das empresas encerradas ficaram a dever aos trabalhadores 185 000 contos, não incluindo as indemnizações. De 1993 a 1996, 16 das empresas encerradas ficaram a dever 139 000 contos de salários a 780 trabalhadores. De Dezembro de 1995 a Setembro de 1996, em sete empresas ainda a laborar, o valor dos salários em atraso é já de 90 000 contos.

Quanto às empresas, continuam a encerrar e os postos de trabalho a desaparecer. Só este ano, em 1996, fecharam as portas oito empresas, com incidência preocupante nos concelhos da Covilhã e de Castelo Branco.
Paralelamente ao encerramento das empresas, assiste-se à redução sistemática de postos de trabalho e ao recurso à redução de horário, agravando-se assim, se possível, a situação de muitos trabalhadores que, com idade superior a 45 anos, são considerados «velhos» para trabalhar e novos para serem reformados.
Os dados oficiais de desemprego no distrito são demasiado evidentes e dispensam qualquer comentário. Em Junho de 1996 havia 8423 desempregados, verificando-se um crescimento de 15% relativamente ao mesmo mês do ano anterior.
É devido a estes dados acabados de enunciar que dizemos que são diferentes, porque mais agravadas, as razões que levaram à apresentação desta petição em Outubro de 1991.
Os peticionários não só caracterizavam as dificuldades que enquadravam a estrutura produtiva industrial do distrito como alertavam para a urgência de medidas que pudessem atrair novos investimentos, no sentido de melhorar o nível de vida na região e de, simultaneamente, travarem o êxodo populacional, de que o censo de 1991 era claro testemunho.
Mas nada foi nem está a ser feito, no sentido de inverter esta situação, antes pelo contrário.
Em 10 de Outubro, nesta Assembleia, o meu camarada Lino de Carvalho, a propósito dos problemas do sector e das regiões da mono-indústria têxtil, afirmou que também este Governo, na continuidade do modelo anterior, subordinava os «interesses estratégicos do País à miragem da construção de uma Europa onde a nossa economia e o nosso emprego são sacrificados».
O debate de urgência suscitado pela nossa bancada evidenciou os perigos que pairam sobre a indústria têxtil portuguesa.
As negociações do GATT, em 1994, já pré-figuravam o desaire dos têxteis portugueses. A segunda fase de integração dos produtos têxteis e de vestuário nas regras do GATT, a iniciar-se em Janeiro de 1998, em relação à qual se prevê uma liberalização das trocas que corresponderá a 17% do volume das importações comunitárias em 1990, trará, mais urna vez, a chancela da ameaça à já debilitada indústria têxtil nacional.
O jornal Povo da Beira, datado de 15 do mês em curso, definia, num artigo intitulado «Cebolaís em Agonia», esta freguesia como «(...) terrenos ao abandono. Ruas desertas. Fábricas encerradas. Casas devolutas. Indústria inerte. A vida fabril e agitada que se vivia outrora deu lugar à modorra, à apatia, ao imobilismo. (...) Eram 22 fábricas de lanifícios, sem falar nas inúmeras indústrias caseiras que matraqueavam incessantemente e empregavam cerca de 2000 operários».

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, queira terminar, pois já esgotou o tempo de que dispunha.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É este o País que se deseja? É este o desenvolvimento e a modernização em que ontem apostou o PSD e hoje o PS continua a apostar? E esta a Europa de solidariedade e coesão que alguns defendem?

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São já tardias, e por isso mais urgentes, as medidas que as zonas de mono-indústria de lanifícios de Castelo Branco exigem.
Nesse sentido, e com o objectivo de corresponder às legítimas expectativas presentes no texto da petição, iremos apresentar a esta Assembleia um projecto de resolução que contemple, no âmbito de um programa integrado de desenvolvimento, um conjunto de acções estratégicas que articulem todos os instrumentos disponíveis e, consequentemente, viabilizem a resolução dos problemas e das carências enunciadas.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lavrador.

O Sr. Carlos Lavrador (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição que agora sobe a Plenário data de 20 de Abril de 1992. Pese embora o tempo decorrido desde então, as medidas solicitadas mantêm toda a pertinência e actualidade.
De há vários anos a esta parte, o sector - dos têxteis e vestuário da zona da serra da Estrela vem enfrentando uma séria situação de crise, a que o governo de Cavaco Silva e do PSD não soube ou não quis pôr cobro, antes contribuindo, por acção ou omissão, para o seu agravamento.
Taxas de juro elevadas, escudo caro, indefinição quanto à política de incentivos e financiamento à modernização e competitividade das empresas foram factores determinantes para o agudizar dos problemas.
Grave foi também a insensibilidade dos governos do PSD quanto à situação social insustentável de numerosas famílias atingidas pelo desemprego, para as quais não foi criado socorro social de emergência. Tão pouco foi acautelada a requalificação de mão-de-obra entretanto no desemprego.
O Governo do Partido Socialista herdou esta situação e, em conformidade com o seu ideário, o seu Programa de Governo e os seus compromissos eleitorais, resolveu atacar de frente esta situação, demonstrando a sensibilidade e determinação que ao PSD faltaram.
Foram e estão a ser tomadas medidas de âmbito nacional de forte incidência na região da serra da Estrela, de que são exemplos o rendimento mínimo garantido, que, e não por acaso, vai ser implementado na freguesia de Boidobra, concelho da Covilhã, localidade onde o desemprego emergente do sector têxtil se faz sentir de modo mais acutilante.

O Sr. João Carlos da Silva (PS): - Bem lembrado!

O Orador: - O Plano Mateus, cuja aplicação esperamos para breve, irá permitir a requalificação e rentabilização de empresas da região, que por certo irão ser fonte de acréscimo de emprego.
Mas o Governo, assumindo as suas responsabilidades, vai mais longe e vem elaborando um plano de desenvolvimento integrado para a serra da Estrela que não se resume a uma piedosa colecção de intenções mas se assume de modo concreto nas Grandes Opções do Plano para 1997.
Para já, e por decisão governamental, existirá uma majoração de 10% nos incentivos às empresas que invistam na região.

A prioridade dada ao PIDDAC para a região da serra da Estrela permitiu e permite a canalização de vultuosos investimentos, como os do hospital da Cova da Beira, os da construção do IP 2, os da modernização da linha da Beira Baixa, os da barragem do Sabugal, que irão ajudar à criação de postos de trabalhos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - É de prever que as próximas medidas no âmbito deste programa sejam a discriminação positiva das empresas da região no que toca a incentivos, financiamentos e desagravamento fiscal. Serão ainda implementadas medidas de atracção de capitais exteriores, encorajamento à modernização e diversificação de empresas e um maior empenhamento na requalificação e formação profissionais.
Está desde já constituída no âmbito da CCRC uma equipa que acompanhará a aplicação do programa.
Este conjunto de medidas, por si, não será a panaceia que resolverá os problemas que afectam a região mas será, seguramente, uma boa ajuda.
O Governo do PS assume assim as responsabilidades de progresso, justiça e solidariedade social que outros enjeitaram no passado.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): - Sr: Presidente, Srs. Deputados: Se qualquer um de nós tivesse estado fora do País e sem qualquer relação com o mesmo durante mais de um ano, ficaria com a sensação, depois de ouvir o Sr. Deputado Carlos Lavrador, de que o Governo do Partido Socialista havia tomado posse ontem. Lembro ao Partido Socialista que já lá vai um ano.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pela via da figura da petição, a União dos Sindicatos do Distrito de Castelo Branco vem salientar junto desta Câmara, por um lado, o peso e o significado da indústria de lanifícios e vestuário na região centro e, por outro, o facto de essa indústria estar concentrada particularmente no concelho da Covilhã e em outros pólos do distrito de Castelo Branco.
Vem ainda a mesma entidade chamar a atenção para as dificuldades que o sector tem vivido, as quais, em alguns casos, se têm agravado, e fá-lo de tal forma ou em tais termos que considera mesmo o sector de lanifícios e vestuário em situação de crise.
Para nós, são afirmações inquestionáveis e, por isso, reconhecemos toda a legitimidade e fundamento das preocupações expressas na petição. Porque assim é, comungamos inteiramente dessas preocupações e porque comungamos dessas preocupações, coerentemente, apoiamos e concordamos com os peticionários quanto à necessidade de aplicação de mecanismos que visem o apoio a este sector.
Quando falamos no apoio a este sector, estamos não só a pensar em mecanismos específicos para esta indústria mas também em mecanismos de apoio de outra natureza, que reflexamente possam influenciar, de modo positivo, a sua actividade.
Contudo, já algumas dúvidas manifesto quanto ao método de actuação. Ou seja, a União dos Sindicatos do

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Distrito de Castelo Branco vem propor-nos a criação de uma OID para satisfação destas necessidades. Entende, portanto, que a indústria deve ser contemplada com uma OID. Mas, como todos os Srs. Deputados reconhecem, estas operações integradas de desenvolvimento constituíam, ao tempo do antigo Quadro Comunitário de Apoio, um instrumento de intervenção dos fundos comunitários. Esses fundos comunitários, que se regiam pelo Regulamento 4253/88, foram alterados, tendo sido aprovado um novo regulamento, que já não prevê a figura da operação integrada de desenvolvimento.
Feitas estas considerações de natureza mais formal, retomemos a nossa questão central, que tem a ver com a necessidade de apoios a este sector. Aí, repetimos, estamos de acordo com a aplicação de mecanismos, quer de natureza específica, quer outros, que se possam, conjugadamente, reflectir-se em benefícios para o sector, aplicação essa que, como já foi aqui lembrado pela Sr.ª Deputada do PCP, poderá ser feita articuladamente.
Por isso, concluindo, a nossa posição é claramente de defesa da implementação de medidas que cumpram este objectivo da petição, ou seja, a defesa do sector dos lanifícios e vestuário, atenta a importância e o significado de que se reveste no distrito de Castelo Branco.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos a discutir, hoje, em Plenário, uma petição entregue na Assembleia da República na 1.ª Sessão Legislativa da anterior Legislatura.
O atraso na análise e discussão das petições entregues por grupos de cidadãos na Assembleia da República pode causar situações ridículas, como a de chegarmos a discutir matérias já desactualizadas, que já não fazem sentido, ou que já não são assim na sua globalidade.
Esta é a primeira nota que gostaria de expressar aqui.
Sobre a petição n.º 96/VI (1.ª), em concreto, são levantadas questões como a importância do sector dos lanifícios na estrutura produtiva industrial do distrito de Castelo Branco: o constante encerramento de empresas nesta área, com a consequente perda de postos de trabalho na região; o aumento do número de desempregados; a constante e acentuada desertificação da região e dificuldade de fixação das populações, por razões de falta de emprego conjugadas com um conjunto de grandes outras carências.
Estes factos levaram os subscritores a considerarem urgente a implementação de medidas que visem a resolução dos problemas da região nas vertentes económica, social, industrial, regional, cultural e ambiental.
A actualidade destas questões é óbvia, apesar dos anos que já decorreram, da mudança do governo e das expectativas criadas. É evidente que é o desenvolvimento regional que está em causa.
O Partido Ecologista Os Verdes considera que a regionalização tem um papel fundamental na vertente do desenvolvimento regional, na elaboração de planos de desenvolvimento e, nesta situação em concreto, de um plano integrado para a Beira Interior, que tenha em conta a especificidade da região, promovendo e implantando um desenvolvimento sustentável e equilibrado, tendo em consideração os sectores produtivos onde os lanifícios devem ocupar um lugar privilegiado e central.

Não havendo regiões administrativas, continuando a ser eternizada e adiada a criação e instituição das regiões, conflituando este facto com promessas eleitorais do actual Governo, cabe por inteiro a responsabilidade ao Governo de urgentemente criar condições e promover o desenvolvimento da região em causa e a solução dos problemas estruturais com os quais a população se confronta.
Consideramos, tal como os cidadãos que subscrevem esta petição, os trabalhadores, os autarcas, os sindicalistas e os dirigentes associativos, que urge tomar medidas de criação de postos de trabalho, de promoção de emprego na região, de fixação das populações, combatendo a desertificação do interior do País, tornando aprazível a vivência no interior, combatendo o sempre mais acentuado isolamento de certas zonas do interior e da zona de Castelo Branco, em particular.
Queremos afirmar aqui, claramente, a legitimidade das reivindicações dos subscritores da petição n.º 96/VI (1.ª), manifestar a solidariedade do Partido Ecologista Os Verdes e apoiar a iniciativa destes cidadãos trabalhadores.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Moura e Silva.

O Sr. Moura e Silva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lamentavelmente, só hoje, cinco anos depois - repito, exactamente cinco anos depois - de ter sido apresentada, vai esta Assembleia pronunciar-se sobre a petição n.º 96/VI (1.ª), em que os proponentes sentiam existir, em 1991, problemas concretos de enfraquecimento da indústria de lanifícios, a qual, a par do sector do vestuário, representa a maior fatia da estrutura produtiva e industrial do distrito.
A destruição económica gradual deste sector tem levado para o desemprego milhares de trabalhadores, com maior incidência no concelho da Covilhã.
Importa referir que desde sempre o CDS-PP se mostrou preocupado com este sector, tendo em consideração o que ele significa para a economia e as exportações portuguesas.
Recordo que, no dia 13 de Abril, o Partido Popular trouxe a esta Câmara as suas preocupações sobre este sector, caracterizou e apontou caminhos para resolver ou atenuar os problemas que resultam da falência de muitas empresas e do aumento do desemprego.
Concretamente em relação à região a que esta petição se refere, o Partido Popular esteve lá, visitou fábricas, reuniu com os trabalhadores e com associações empresariais e o conhecimento que temos permite-nos dizer que hoje os problemas são ainda mais graves.
Para o Partido Popular, a situação que vivemos deve-se, em grande medida, ao resultado de erradas estratégias macroeconómicas e de sucessivos erros de gestão por parte dos nossos governos e à postura de timidez e submissão aos interesses e orientações emanadas da União Europeia.
Nesta região, a não serem tomadas medidas concretas de inversão da perda de competitividade da indústria de lanifícios, vamos continuar a assistir ao encerramento contínuo e progressivo das nossas fábricas, e, como consequência, o desemprego não vai parar de aumentar.
Tem agora o Governo a oportunidade de fazer algo de concreto por esta região, se com firmeza e determinação impedir que os tecidos de lã não incluam o cabaz dos produtos a liberalizar no âmbito da Organização Mundial do Comércio, como pretende a Comissão Europeia.

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Deve ainda o Governo incentivar medidas de controlo prévio e fiscalização aos produtos que entram no nosso país, provenientes de países terceiros à Comunidade.
Para o PP, importa ainda: promover programas de incentivos à modernização das nossas industrias e à criação de condições de internacionalização, através de linhas de financiamento sempre reembolsáveis, com taxas de juro mais baixas; reforçar os programas de formação e reconversão profissional destinados aos trabalhadores no activo e aos que estão em vias de perder ou perderam o seu emprego; criar condições efectivas para a exequibilidade de alguns programas que visam a criação de emprego em pequenas actividades económicas e outros; adoptar políticas de desenvolvimento económico e a criação de um sistema de incentivos fiscais que privilegie as pequenas e médias empresas; criar de infra-estruturas de apoio e melhoria das condições de acessibilidade; diminuir o custo de energia e criar condições de inserção aos desempregados de longa duração.
Termino dizendo que a petição merece a aceitação do PP, porque contém preocupações que também a nós nos unem.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, está encerrado o debate da petição n.º 96/VI (1.ª). Lembro que não chegou à Mesa qualquer projecto de resolução, embora o PCP tenha anunciado a sua apresentação futura. No que toca ainda a esta petição, será dado conhecimento ao primeiro dos peticionários, como o desejo de que se encontre ainda, passados cinco anos, vivo e de boa saúde, do teor das intervenções produzidas.
Vamos passar à apreciação da petição n.º 168/VI (2.ª) Solicita tomada de medidas, tendo em vista a recuperação do Parque da Pena (Associação de Defesa do Património de Sintra).
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pinto Simões.

O Sr. Pinto Simões (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo sido apresentada e agendada para discussão em Plenário a petição n.º 168/VI (2.ª), na qual se solicita a urgente tomada de medidas para a recuperação do Parque da Pena, algumas considerações não posso deixar de fazer.
A primeira diz respeito ao tempo excessivo que esta petição - entregue na Assembleia da República, em 12 de Novembro de 1992, levou para chegar, hoje, volvidos cerca de quatro anos, a este Plenário.
É, pois, de lamentar a falta de sensibilidade manifestada na anterior legislatura para com a adopção de medidas de recuperação de um património cultural e natural inestimável como é o Parque da Pena e cuja omissão terá importado maiores custos ambientais e económicos na sua recuperação.
O anterior governo manifestou também pouco apreço na salvaguarda deste importante património da vila de Sintra e de todos nós. Na verdade, durante o período em que este parque esteve sob a gestão do Ministério da Agricultura e da Direcção-Geral de Florestas muito pouco foi feito nesse sentido e a sua degradação foi-se acentuando ao longo da última década.
Só desde 1994 se vislumbra alguma preocupação na modificação deste estado de coisas e, assim, em Abril desse ano, foi o Parque da Pena transferido do Instituto das Florestas para o Instituto da Conservação da Natureza, ficando a sua gestão a cargo do Parque Natural Sintra-Cascais.

Compreendendo a necessidade de inverter o estado de degradação atingido, em Maio de 1995, foi assinado um protocolo com a Universidade de Aveiro e o Instituto Superior Técnico para a elaboração um plano de recuperação, reflorestação e gestão.
Foram realizados trabalhos de limpeza dos principais caminhos da Tapada do Mouco e lançadas mais duas empreitadas, uma delas na zona circundante do Palácio, e a inclusão, no próximo Orçamento do Estado, das verbas necessárias para assegurar a recuperação deste parque e a sua manutenção deverá ter em conta os compromissos assumidos pela Câmara Municipal de Sintra e o próprio Ministério do Ambiente, aquando da atribuição da classificação, em Dezembro de 1995, de Paisagem Cultural-Património da Humanidade.
Correspondendo, aliás, à importância desta classificação, foi assinado, em Julho deste ano, um protocolo entre a Câmara Municipal de Sintra e o Fundo de Turismo, o qual permitirá um investimento superior a 10 milhões de contos até ao ano 2001, sendo 2,5 milhões de contos financiados pelo Fundo de Turismo.
É, assim, urgente que todo este esforço não seja em vão e a recuperação do Parque da Pena, como de outras áreas de interesse nacional na mesma zona, seja compreendida - como não aconteceu anteriormente - como um investimento no nosso património cultural e humano, digno do maior cuidado.
Não quero terminar sem uma última palavra de apreço pela Associação de Defesa do Património de Sintra, pela sua preocupação e a sua intervenção atempada junto desta Assembleia.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Ruben de Carvalho.

O Sr. Ruben de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há assuntos e petições que quase não carecem que se diga que são justas e deverão ser tidas em conta e esta é uma delas.
Gostaríamos, além de manifestar o nosso empenho em que o que é solicitado pelos peticionários tenha correspondência por parte do executivo, de acrescentar apenas duas coisas.
O património do Parque da Pena e da Serra de Sintra não é exclusivamente de carácter estético mas também de carácter científico. O Parque da Pena foi, durante muitos anos, um dos maiores viveiros de fetos da península e, hoje, está praticamente destruído e possivelmente sem condições para ser recuperado.
Este problema foi já, aliás, colocado pelo nosso grupo parlamentar, aquando de uma sessão de perguntas ao Governo, e, nessa altura, ouvimos aqui, neste Hemiciclo, o Sr. Secretário de Estado manifestar-se, ele próprio, ofendido e preocupado com a situação do Parque da Pena, sem que, até à data, que se saiba, tenham sido tomadas quaisquer medidas.
Parece, portanto, que não é apenas necessário que haja a vontade expressa dos cidadãos, através de petições, e que a Assembleia da República manifeste o seu empenho na resolução do problema, mas haverá que tomar quaisquer outras medidas.
Penso que se deverá dar um prazo razoável para que o Executivo tome medidas em relação a esta situação e, se assim não acontecer, o problema deverá voltar à

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Assembleia da República e os grupos parlamentares deverão ser chamados a encarar medidas de carácter mais concreto, que obriguem o Governo de outra forma e não apenas através da manifestação de intenções.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Rodrigues.

O Sr. António Rodrigues (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que este assunto merece a unanimidade de todos os grupos parlamentares, atendendo não só àquilo que está em causa mas particularmente porque Sintra foi declarada património mundial há bem pouco tempo e todos nós nos congratulámos com essa decisão aqui nesta Câmara.
Acontece, porém, que não basta todos nós dizermos que gostamos de Sintra e, particularmente, do património e que vamos gastar outros tantos milhões de contos com esse mesmo património.
Foram feitos estudos, como já aqui foi recordado, ainda no tempo do anterior governo - e chamo particular atenção para o facto de a equipa que procedeu a esses estudos ter sido coordenada pela actual presidente do Instituto de Conservação da Natureza -, pelo que não há razões para que não se adoptem medidas rápidas e urgentes para a recuperação daquele espaço e, mais do que isso, que se tomem medidas não só no domínio do património mas também no da salvaguarda das próprias pessoas que utilizam aquele património.
É que o problema é não só o de recuperar o património natural mas também o de manter a segurança dentro daquele parque. De facto, há muito que as pessoas que utilizam aquele parque não podem circular livremente sem verem o seu próprio património assaltado por alguns marginais que por ali circulam. O problema ali, tal como nos recorda a própria petição, é essencialmente de falta de pessoal, que, por um lado, mantenha o próprio património e, por outro, o guarde, de forma a que todos nós possamos usufruir dele.
Não basta dizer, apesar daquilo que nos recordou o Sr. Deputado do PS, que foram feitos protocolos; não basta dizer que o anterior governo elaborou projectos e que eles estão em condições de ser executados. O que é preciso, acima de tudo, é que todos nós possamos utilizar aquele espaço e utilizá-lo de uma forma recuperada para o futuro, sendo a responsabilidade de todos nós.
Acrescentaria, mais, que a responsabilidade não é só imputável a este Governo. Recordo que a autarquia local também tem particulares responsabilidades nesta matéria. A actual presidente da Câmara, durante muito tempo, quis fazer do Parque da Pena, como fez de Monserrate ou da Peninha, uma bandeira contra o anterior governo. Curiosamente, desde que o actual Governo tomou posse, a autarquia sintrense, pura e simplesmente, calou-se relativamente à degradação do Parque da Pena.
Por isso, é importante que a autarquia sintrense e, nomeadamente, a sua presidente voltem a olhar para o Parque da Pena e reclamem também deste Governo as medidas consideradas urgentes, sob pena, tal como foi também aqui dito, de esta Assembleia ter de voltar a pronunciar-se sobre esta matéria e a assumir este problema não só como do concelho de Sintra mas, acima de tudo, como um problema a resolver integrado no património nacional e, sobretudo, no património mundial, que Sintra já é.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.

O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos aqui a discutir uma petição que já deu entrada na Assembleia há mais de quatro anos e meio. Este facto tem necessariamente um significado político, o da pouca atenção que a Assembleia e quem detinha a anterior maioria nesta Casa dava a este tipo de vontades manifestadas por um conjunto de cidadãos.

O Sr. José Calçada (PCP): - Não estava cá o Partido Popular! Era lento!

O Orador: - Mas tem também um outro significado, que é este: ao longo dos últimos anos, pode ter havido - houve, com certeza - acções de defesa e promoção do Parque da Pena e pode-se ter gasto muito dinheiro nele. A única coisa que não houve, pelos vistos, foi sensibilização da população ou, pelo menos, essas acções não foram por ela sentidas, pelo que não se conseguiu conquistá-la nesse sentido. É que, se de outra forma tivesse sido, não estaríamos hoje aqui a discutir esta petição.
É certo que os governos têm sempre muitos argumentos para justificar aquilo que fizeram e o que não fizeram, mas a existência desta petição é prova suficiente de que os cidadãos que se interessam por esta temática na zona de Sintra não se aperceberam das acções desenvolvidas nesta matéria.
No entanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta petição, com este atraso todo, dá-nos uma oportunidade para responsabilizar o actual Governo, de forma a que, daqui a alguns anos, não estejamos a discutir outra petição, subscrita pelos mesmos cidadãos, sobre o mesmo tema e queixando-se das mesmas coisas. Ou seja, aquilo que, de hoje em diante, for feito, tem de o ser no sentido de conquistar e sensibilizar as populações, de modo a que estas sintam que algo está a ser feito, não tendo, portanto, a necessidade de recorrer à Assembleia para protestar por factos em relação aos quais, no fundo, acabam por ter razão.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero registar aquilo que, de algum modo, já foi aqui referido, que é o atraso, de mais de quatro anos, com que a petição sobe a Plenário, evidenciando que a figura regimental da petição é menosprezada. Aliás, o facto de este Hemiciclo, neste momento, estar quase vazio tem uma leitura política: a apreciação das petições é considerada uma discussão árida, sendo elas mesmas desvalorizadas pelo Parlamento. E, provavelmente, não será indiferente a isso a conclusão que daí podem resultar, isto é, o desinteresse dos cidadãos em participarem mais da vida pública e o descrédito que o próprio Parlamento tem junto da opinião pública.

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O segundo aspecto que refiro relativamente a esta petição, apresentada pela Associação de Defesa do Património de Sintra, é o seguinte: se, por um lado, estamos a falar de um problema velho de anos, por outro, ele mantém a sua actualidade. Assim, a primeira conclusão é que a capacidade de resposta da Administração e dos governos é mínima e a ineficácia para encontrar soluções é óbvia.
Julgo que isto é particularmente grave quando estamos a falar de um concelho que foi, com o agrado de todos as bancadas, considerado, em 1995, precisamente pela sua mais-valia patrimonial e cultural, património da Humanidade e que desse património mais não mantém do que a defesa de uma fachada para os turistas, pois ele continua a ser degradado.
Recordo que, no ano passado, apresentámos uma proposta, designadamente em relação ao Convento dos Capuchos, que estava degradado, mas essa proposta foi recusada, tendo, entretanto, durante este ano, ruído os seus telhados. Este mais não é do que um outro exemplo do estado de abandono do nosso património.
Julgo que a reflexão que importa fazer, no momento em que se quer alargar - e não estamos contra isso - a conservação e a protecção dos bens patrimoniais deste país a uma outra escala, para os englobar numa rede europeia, é esta: é bom que o façamos, mas também é bom que não esqueçamos a pequenez dos meios que evidenciam, preto no branco, a importância ou a não que à defesa deste património se dá.
Em nossa opinião, nunca lhe foi dada importância no passado e continua a não ser dada no presente. É que se não há meios financeiros, humanos e técnicos para preservar o nosso património - e estamos a falar de uma zona com a particular riqueza que o Parque da Pena tem -, algo vai mal neste «reino» e esta petição, com o atraso que tem, mais não faz que colocar na ordem do dia o desprezo e a menorização que aos valores ambientais continua a ser dada, ontem como hoje.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate sobre a petição n.º 168/VI (2.ª), apresentada pela Associação de Defesa do Património de Sintra, na qual solicita a tomada de medidas, tendo em vista a recuperação do Parque da Pena.
Tal como foi referido em relação à petição anterior, será dado conhecimento ao primeiro dos peticionários do teor das intervenções produzidas, sendo-lhe enviado um exemplar do Diário da sessão em que foi discutida a petição.
Srs. Deputados, passamos, agora, a discussão da petição n.º 298/VI (4.ª), apresentada pelo Sindicato Nacional de Professores Licenciados, na qual solicita que a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, seja alterada em termos que contribuam para o prestígio é dignificação da qualidade do ensino e dos seus agentes.
Conforme estabelecido na Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares, cada grupo parlamentar dispõe de 5 minutos para intervir.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Calçada.

O Sr. José Calçada (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: A petição n.º 298/VI (4.ª), remetida pelo Sindicato Nacional de Professores Licenciados e subscrita por 4437 cidadãos, solicita a alteração da Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, de molde a «contribuir para o prestígio e dignificação da qualidade do ensino e dos seus agentes», no dizer dos peticionários.
Este é um objectivo nobre, embora enunciado de um modo impreciso, lacunar e redutor. Na verdade, olhar para os educadores e professores como meros agentes denuncia uma perspectiva de tal modo empobrecedora da função docente que, na circunstância em apreço, nos surge como inacreditável.
Por outro lado, a ênfase aqui dada à qualidade do ensino soa a um tempo em que a qualidade do aprender era manifestamente secundarizada e quase exótica. Eis, pois, como as melhores intenções e das mais nobres podem aparecer inquinadas logo à nascença!
Porque, Sr. Presidente e Srs. Deputados, do que aqui se trata e o que se pretende com a presente petição é a alteração da Lei n.º 50/90; de 25 de Agosto, aprovada por unanimidade nesta Assembleia e que, em si mesma, se mantém, hoje, correcta e justa, permitindo e potenciando, de acordo com o normativo legal, «o prosseguimento de estudos superiores por professores do ensino primário e educadores de infância».
Quem, em rigor, pode estar contra este desiderato? Afinal, a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, não fez outra coisa se não assumir-se como um instrumento de dignificação de um sector da docência sistematicamente humilhado e ofendido, particularmente no decurso dos 48 anos da ditadura. E se ofensas e humilhações há, como é o caso destas, que dificilmente poderemos reparar, não podemos, levados pelas circunstâncias, confundir o essencial com o acessório, o estrutural com o conjuntural.
Mau grado as boas intenções que enformam a presente petição, o seu grande equívoco reside, afinal, no facto de os peticionários errarem o alvo. O alvo não é, ou não deveria ser, a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto. Os alvos deveriam ser aquelas universidades ou aqueles centros de formação ditos superiores, aos quais, noutros tempos, já chamámos de «universidades T-2». Demos-lhe esse nome, porque, como sabem, geralmente, no salão de entrada, têm a sala de reitores; nas cozinhas têm aquilo a que pomposamente chamam laboratórios, porque têm água, o que já não é mau; e, depois, numa outra sala, em regime mais ou menos rotativo, semelhante a outras coisas que aqui não cito, por uma questão de pudor, têm aquilo a que pomposamente chamam aulas.
Esse é que é o verdadeiro problema e não a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto. O verdadeiro problema reside no facto de sucessivos governos, ao longo de, pelo menos, uma década, para ser simpático, não terem sido capazes de dar resposta à procura, na área do ensino superior público e, assim, por ricochete, terem se não provocado pelo menos potenciado o aparecimento, completamente desregrado e à margem de quaisquer normas não digo pedagógicas mas éticas, daquilo a que pomposamente chamam cursos superiores, defraudando, naturalmente, as aspirações legítimas - essas perfeitamente legítimas - de um sector sócio-profissional que merece toda a nossa consideração.
Esse é que é o problema! Esse é que é o alvo! E o grande erro aqui, em nossa opinião, mau grado as boas intenções da presente petição, é que, pura e simplesmente, erra o alvo. Quando o alvo for esse, cá estaremos para dar razão aos peticionários.

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170 I SÉRIE - NÚMERO 4 

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Braga.

O Sr. António Braga (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Está caracterizado o objecto desta petição e eu gostaria também de sintetizar o essencial, que seria alterar a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, justamente no sentido de impedir que os professores do l.º ciclo e os educadores de infância pudessem realizar estudos superiores, justamente na base da equiparação que lhes é concedida para esse efeito.
Ora bem, essa lei foi aprovada, por unanimidade, na Assembleia da República; e não devemos ser parcos nessa afirmação, tendo justamente em atenção a própria Lei de Bases do Sistema Educativo e a ideia de dignificar os professores deste grau de ensino. O essencial que aqui colocámos tem a ver não com a lei em si mas com a leitura e com a aplicação que dela tem sido feita numa espécie de «escolas de vão de escada», onde, com a agregação de um currículo desorganizado e, muitas vezes, incompleto, têm sido feitas equiparações e atribuições que não constam nem no espírito nem na letra da lei. Claramente já o dissemos em várias ocasiões e mantemo-lo.
Assim, estou de acordo com a ideia dê que o alvo não é nem a Lei n.º 50/90 nem a Assembleia da República, em sede de petição, será naturalmente no âmbito da própria autonomia universitária e na ideia que temos sobre 'o ensino particular e o ensino privado em geral e sobre a homologação que tem sido dada a muitos cursos que nestas escolas proliferam, que, deve dizer-se, pretendendo responder a esta ânsia deformação por parte dos professores do 1.º ciclo e dos educadores de infância e gerindo essas expectativas, têm até explorado, do ponto de vista financeiro, na frequência desses cursos, os professores deste grau de ensino, que consagrámos na Lei n.º 50/90.
Portanto, não se trata, do nosso ponto de vista, de alterar esta lei, que, a meu ver, contribui para a dignificação e formação docente que todos nós, aqui, temos assinalado como importante e decisiva para melhorar a qualidade do ensino e dignificar a função docente. Dissemo-lo várias vezes e temo-lo afirmado aqui, nas discussões que temos tido sobre este tema, que, para nós, o ideal seria inclusivamente a formação ao nível da licenciatura para todos os professores, de todos os graus de ensino. Temo-lo afirmado e a lei de bases, inclusive, aponta nesse sentido.
Portanto, a Lei n.º 50/90 veio preencher uma lacuna, permitindo aos professores que não tiveram oportunidade de realizar essa habilitação, porque não lhes era exigida nessa época, de, em vez de fazerem o «calvário», passe a expressão, de acesso ao ensino superior, a poderem obter com uma regra de excepção, que é esta lei, pois permite que adquiram esta formação estando no exercício das funções docentes, como sempre o dissemos e consta da própria lei.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, sobre o conteúdo e o objecto desta petição, que pretende a alteração da lei nestes termos, retirando a ideia de poder progredir na formação e, portanto, na aquisição de novos conhecimentos e de uma formação superior, o Grupo Parlamentar do PS não vê que seja esta lei que, na sua vertente de permitir essa formação, possa causar alguma perturbação ou algum distúrbio, inclusivamente na progressão na própria carreia docente. Neste sentido, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o nosso entendimento vai no sentido de pedir rigor e exigência ao Governo na homologação, verificação e fiscalização dos cursos leccionados nessas escolas, que, como já referi, muitas são em «vãos de escada», por forma a não poder ser homologado nem reconhecido o valor académico que muitos deles não possuem.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Sílvio Cervan.

O Sr. Sílvio Cervan (CDS-PP): - Sr. Presidente. Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras nesta curta intervenção são para dar um elogio ao bom e íntegro movimento sindical.
Como é construtivo, positivo e útil debatermos as propostas sérias que, sistematicamente, nos são apresentadas pelo Sindicato Nacional dos Professores Licenciados! Une-nos, Partido Popular e este Sindicato, uma continua exigência pelo maior rigor e exigência no ensino e na educação em Portugal.
Somos a favor dos princípios desta petição, porque queremos que sejam reconhecidos aos antigos educadores de infância e aos professores profissionalizados pelas ex-escolas de educadores de infância e pelo Magistério Primário os mesmos direitos dos bacharéis, diplomados pelas Escolas Superiores de Educação, no que concerne ao posicionamento da carreira. Aceitamos que haja equiparação para trabalho igual, mas já. não aceitaremos da mesma forma que, de um momento para outro, a lei invente graus académicos, invente graus superiores, para quem nunca frequentou o ensino superior.
A batalha do Partido Popular é por dois princípios fundamentais: o princípio da justiça e o princípio da exigência, embora tenhamos consciência que a maior parte deste problema radica na forma como os sucessivos governos vêm regulamentando a aplicação prática destas questões.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Cesário.

O Sr. José Cenário (PSD): - Sr. Presidente, de acordo com o artigo 27.º do Estatuto dos Deputados, permita-me que, atendendo à minha situação profissional, declare a existência de interesses particulares sobre esta matéria.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 298/ VI (4.ª), ao trazer para discussão na Assembleia da República a Lei n.º 50/90, de 25 de Agosto, obriga-nos a reflectir sobre um conjunto de questões muito sérias que marcam o nosso sistema educativo.
Em primeiro lugar, cumpre que se diga que esta lei surgiu nesta Assembleia para fazer justiça a um grupo de docentes, os então chamados professores do ensino primário, que, durante décadas, foram considerados professores de segunda, menorizando-se este sector de ensino, postura essa que indiscutivelmente ainda hoje está na origem de uma boa parte do insucesso escolar que se verifica.
Tal lei resultou assim de uma intenção nobre e inatacável, a de dar mais dignidade a este grupo de professores, chamando-os, correctamente, professores do l.º ciclo do ensino básico e permitindo-lhes, a todos, hipóteses

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24 DE OUTUBRO DE 1996 171

iguais de acesso a essa formação académica superior com evidentes vantagens para o sistema educativo, em tese.
Em segundo lugar, suscita-se a questão do rigor em educação. Aqui, cumpre que se diga que o PSD não abdica de uma posição exigente face a toda a formação a adquirir pelos professores, seja ao nível da formação contínua, seja ao nível da formação inicial, lamentando-se alguns passos dados até hoje que nem sempre salvaguardaram tal princípio.
Porém, continuamos a pensar que o reforçada qualidade no sistema educativo passa indiscutivelmente por permitir a todos os professores, sem excepção, um permanente complemento de habilitações, caminhando-se desejavelmente para uma situação em que, a nível do ensino básico, toda a formação tenha idêntico peso.

O Sr. Carlos Coelho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Em terceiro lugar, coloca-se o problema da progressão na carreira docente e das consequentes habilitações para tal.
Ora, neste campo, não temos dúvidas que o actual sistema não serve, sendo fundamental que, por um lado, qualquer professor possa progredir na carreira, atingindo o seu topo sem ser obrigado a sair do seu sector de ensino mas, por outro lado, cumpre que se encontre um modelo de habilitações para a docência que salvaguarde claramente as componentes pedagógica e científica de cada ciclo de escolaridade, facilitando-se a mobilidade dos docentes sem quebra da qualidade do ensino ministrado. Ou seja, é igualmente indispensável corrigir alguns aspectos menos cuidados na fase de regulamentação desta lei, sem pôr em causa as suas intenções, aspectos esses que originaram situações que, de forma alguma, queremos ver repetidas.
Finalmente, consideramos importantíssimo que este debate não termine aqui, uma vez que passa indiscutivelmente pelo futuro da educação em Portugal, razão pela qual agradecemos ao Sindicato Nacional de Professores Licenciados ter vindo despoletar esta discussão.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Mota Amaral): - Srs. Deputados, não havendo mais oradores inscritos, declaro encerrado o debate.
A próxima reunião plenária realiza-se - amanhã, às 15 horas, e terá período de antes da ordem do dia, sendo a ordem do dia preenchida com a discussão dos projectos de deliberação n.ºs 30/VII e 31/VII e das petições n.ºs 2407 VI (3.ª) e 288/VI (2.ª), havendo ainda votações à hora regimental.
Está encerrada a sessão.
Eram 18 horas e 45 minutos.

Intervenção enviada à Mesa para publicação relativa ao voto n.º 46/VII

Morreu Mário Cal Brandão. A notícia surge-me, de repente, pela rádio e não pode deixar de me impressionar e perturbar.
Poucos dias antes, tinha combinado com amigos comuns uma visita ao Mário. Bem que eles me alertaram: apressa-te pois corres o risco de chegar tarde.
Conhecedores da doença que o minava, foram mais cautelosos que eu próprio.
Conheci o Mário Cal Brandão e a sua mulher Beatriz no dia 17 de Setembro de 1973, em Paris. Passavam poucos dias da morte de Salvador Allende, no Chile, e faltavam poucas semanas para a última farsa eleitoral do marcelismo.
A ponte que me pôs em contacto foi, como em tantas outras e similares situações, o António Macedo. Nessa semana do longínquo Setembro de 1973, decidi pertencer à família socialista. Para isso contribuiu o Macedo, mas também muito o Cal Brandão e a sua mulher.
Não foi sempre fácil o meu relacionamento pessoal com o Mário Cal Brandão. Recordo-me, nomeadamente, de alguma tensão pessoal quando exerci as funções de Presidente do PS/Porto e um pouco depois quando nos dividiu a opção nacional conhecida como a crise do ex-secretariado.
Mas nos momentos mais difíceis sempre nos respeitámos e admirámos. O entusiasmo (e porque não a ilusão) era muito e o trabalho era intenso, o que provocava a discussão e alguma controvérsia.
Mas foi então e junto do casal Cal Brandão, que eu vi as minhas filhas fazerem o primeiro contacto com o PS e aprenderem com eles a tolerância, a solidariedade e a amizade.
Tudo isto porque Cal Brandão era um homem bom.
Nas sucessivas eleições da década de 70 e início da década de 80 privámos, naturalmente, muito.
Era costume e tradição dos socialistas do Porto elaborarem sempre o seu próprio manifesto eleitoral. Já então dávamos provas de inconformismo, de identidade e de inquietação, sempre, contudo, em plena solidariedade com o PS nacional.
Os habituais escribas dos documentos em causa eram o Carlos Lage e eu próprio. De um e outro se aproveitava a capacidade intelectual, o voluntarismo e generosidade e, porque não, o inconformismo e as ilusões. O Mário Cal Brandão aparecia sempre para ajudar e fazia-o, efectivamente, pois a sua simples presença era desde logo condição de temperança e moderação.
Foram tempos complexos os que vivemos quando da crise do ex-secretariado no início da década de 80. Recordo a Comissão Política e, sobretudo a Comissão Nacional, onde foi conhecida a opção definitiva de Mário Soares quanto ao não apoio à candidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República, e sobretudo, recordo-me bem da atitude prudente, racional e moderada que, nessa altura, o Mário Cal Brandão assumiu. Os inquietos do partido, nós próprios, chegámos a pensar nele como alternativa à candidatura presidencial.
Posteriormente combateu-nos. Fê-lo por solidariedade com o seu amigo de sempre: o Mário Soares. Fê-lo bem e, mais uma vez, fez o que devia.
O Mário Cal Brandão contactou-me pela última vez em Maio deste ano. Fê-lo por escrito e quis manifestar-me a sua solidariedade pessoal e o seu agradecimento por aquilo que ele dizia ser a minha acção no Governo em favor dos mais pequenos, dos mais pobres e, sobretudo, dos socialistas.
Manifestou, em consequência, apreço pela candidatura que eu próprio protagonizava à liderança dos socialistas do Porto, sem querer imiscuir-se na disputa.
Nunca usei esse documento, simples no seu discurso formal, mas complexo e profundo na sua mensagem política, que guardarei como testemunho indelével e imorredoiro da personalidade, do carácter e da pessoa de bem que foi o meu irmão mais velho Mário Cal Brandão.

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172 I SÉRIE - NÚMERO 4

O Mário não nos deixou, porque não pode deixar-nos. Está ao nosso lado, nos Passos Perdidos, da nossa vida feita de sonhos e dos ideais que ele nos contou e ensinou.

O Deputado do PS, Manuel dos Santos.

Entraram durante a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

José Manuel Rosa do Egipto.

Partido Social Democrata (PSD):

Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS):

António de Almeida Santos.
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes.
João Rui Gaspar de Almeida.
Joel Maria da Silva Ferro.
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro.
Mário Manuel Videira Lopes.
Raul de Assunção Pimenta Rego.
Sérgio Humberto Rocha de Ávila.

Partido Social Democrata (PSD):

Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto.
Carlos Alberto Pinto.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
José Mendes Bota.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira.
Pedro Augusto Cunha Pinto.
Rui Fernando da Silva Rio.

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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