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Sexta-feira, 5 de Fevereiro de 1999 I Série-Número 44 1617

DIÁRIO Da Assembleia da República

VII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1998-1999)

SESSÃO SOLENE COMEMORATIVA DOS 200 ANOS DO NASCIMENTO DE ALMEIDA GARRETT

SESSÃO SOLENE DE BOAS-VINDAS A S. EX.ª

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA FRANCESA,

JACQUES CHIRAC

REUNIÃO PLENÁRIA DE 4 DE FEVEREIRO DE 1999

Presidente: Exmo. Sr. António de Almeida Santos

Secretários: Exmos. Srs. Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Maria Luísa Lourenço Ferreira
João Cerveira Corregedor da Fonseca
José Ernesto Figueira dos Reis

SUMARIO

1.ª Parte. Ás 10 horas e 30 minutos, e dando inicio à sessão solene comemorativa dos 200 anos do nascimento de Almeida Garrett. entrou na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Si Presidente da Assembleia da República (Almeida Santos) que mandou, com uma vénia, os membros do Corpo Diplomático presentes a Sr. Ministro da Cultura (Manuel Maria Carrilho)a Secretária-Geral da Assembleia da Republica, o Chefe e os Secretários do Protocolo do Estado.
O hemiciclo encontravam-se já além dos Deputados, os Srs. dirigentes do Supremo Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Contas, o Ministro da República para os Açores, o Procurador-Geral da República, o Protocolo de Justiça os Chefes dos Estados-Maiores da Armada, do Exercito e da Forca Aérea, os Presidentes da Assembleia Legislativa Regional e do Governo Regional dos Açores, Juízes do Tribunal Constítucional, o Presidente da Alta Autoridade para a Comunicação Social, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, o Presidente da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, o Comandante \aval do Continente e o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros
Encontravam-se ainda presentes nas tribunas e galerias os ex-Presidente da Republica Mano Soares e Francisco Costa Gomes a Sr.ª Dr.ª Maria de Jesus Barroso, membros do Governo e membros do Corpo Diplomático
Seguiram-se os discursos dos Srs Deputados C armem Francisco (Os Verdes), Luisa Mesquita (PCP), Francisco Peixoto (CDS-PP), Reis Leite (PSD) e Manuel Alegre (PS) e do Sr Presidente da Assembleia da República.
Eram 12 horas e 5 minutos quando a sessão foi interrompida.
2.ª Parte.-Ás 16 horas e 10 minutos, e dando inicio à sessão solene de boas-vindas ao Presidente aã Republica Francesa (Jacques Chirac), entrou na Sala das Sessões o cortejo em que se integravam o Sr. Presidente da Assembleia da República (Almeida Santos), Sr. Presidente da República Francesa, o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros (Jaime Gama), o Sr. Presidente do Supremo Tribunal Constítucional, o Sr Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, os Secretários da Mesa, a Secretária-Geral da Assembleia da República, o Chefe do Protocolo do Estado, o Director do GAREPI, o Adjunto do Presidente da Assembleia da República da República para os Negócios Estrangeiros e os Secretários do Protocolo do Estado.
No hemiciclo encontravam-se já, além dos Deputados, o Sr. Procurador-Geral da República, Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, os Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Contas, o Provedor de Justiça, os Chefes dos Estados-Maiores do Exército e da Força Aérea, os Presidentes da Assembleia Legislativa Regional e do Governo Regional dos Açores, os Conselheiros de Estado Maria de Jesus Serra Lopes e Vítor Constâncio, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constítucional Maria Helena Brito, Maria dos Prazeres Beleza e Artur Maurício, o

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Presidente da Alta Autoridade para a Comunicação Social, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais Informatizados, o Presidente da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Comandante Naval do Continente, o Governador Militar de Lisboa e o Comandante-Geral da GNR
Encontravam-se ainda presentes nas tribunas e galenas o ex-Presidente da República Francisco Costa Gomes, membros do Governo, membros do Corpo Diplomático e convidados
Constituída a Mesa, na qual o Sr Presidente da Republica Francesa tomou lugar a direita do Sr Presidente da Assembleia da Republica, seguiram-se as intervenções do Sr. Presidente da Assembleia da Republica e do Sr Presidente da Republica Francesa.
Eram 16 horas e 50 minutos quando a sessão foi interrompida.

3.ª Parte. - O Sr Presidente reiniciou a sessão às 17 horas e 50 minutos

Antes da ordem do dia -Deu-se conta da entrada na Mesa de requerimentos e da resposta a alguns outros.
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo CDS-PP sobre a situação do sector suínicola em Portugal, tendo intervindo, além do Sr Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos), os Srs Deputados Helena Santo (CDS-PP), Antónia Martinho (PS) Carlos Duarte (PSD). Rodeia Machado (PCP) e Carlos Amândio (PS)

Ordem do dia - Foram aprovados os n.ºs 24 a 28 do Diário.
Entretanto, foram aprovados na generalidade, as propostas de lei n.ºs 222/VII - Estabelece o regime e forma de criação das policias municipais e 191/Vil -Regula a identificação civil e a emissão do bilhete de identidade de cidadão nacional e o projecto de lei n.º S96/VII - Cria um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor (PS).
Na generalidade, na especialidade e em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n º 196/VII -Autoriza o Governo a legislar sobre a dissecação licita de cadáveres e extracção de peças tecido ou órgãos para fins de ensino e de investigação cientifica, tendo sido também aprovada a proposta di alteração, subscrita pelo PS, PSD. CDS-PP e PCP, do n.º l do artigo 2.º da referida proposta de lei.
Foi aprovado um requerimento, subscrito pelo PS, no sentido da proposta de lei n.º 215/VII -Autoriza o Governo a legislar sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado baixar, antes da votação na generalidade, à Comissão de Economia. Finanças e Plano, pelo prazo de duas semanas.
Mereceram ainda aprovação o texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos, Liberdades e Garantias relativo à proposta de lei n.º 205/VII - Estabelece o novo regime jurídico do recenseamento eleitoral e ao projecto de lei n.º 594/VII - Regula a certificação do tempo mínimo de residência dos cidadãos estrangeiros para efeitos eleitorais (PCP) e o texto final da Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente relativo aos projectos de lei n.ºs 532/VII - Reajustamento da área administrativa da cidade de Viseu (PS) e 537/VII -Alteração da área administrativa da cidade de Viseu (PSD)
Foi rejeitado o projecto de resolução n.º 111/VII (PCP) -Cessação da vigência do Decreto-Lei n º 404/98, de 18 de Dezembro, que cria, por cisão da Empresa Publica Aeroportos e Navegação Aérea, ANA, E P, a Empresa Pública Navegação Aérea de Portugal, NAV, EP, e procede á transformação da Empresa Pública Aeroportos e Navegação Aérea, ANA, EP, resultante da cisão em sociedade anónima com a denominação ANA -Aeroportos de Portugal, SÁ Aprova os Estatutos da NAV. E P. e da ANA, SÁ [apreciação parlamentar n.º 74/VII (PCP)) e foi aprovado um requerimento, subscrito por Os Verdes e PCP, no sentido de o projecto de lei n.º 588/VII - Torna obrigatória a afixação do preço dos produtos em dígitos baixar à Comissão de Assuntos Constitucionais. Direitos. Liberdades e Garantias, por um prazo de 30 dias, antes da respectiva votação na generalidade
A Câmara apreciou ainda, na generalidade, a proposta de lei n.º 183/VII -Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, bem como os serviços internacionais com origem ou destino no território nacional, tendo usado da palavra, a diverso titulo, a Sr.ª Secretaría de Estado da Habitação e Comunicações (Leonor Coutinho) e os Srs Deputados Joaquim Matias (PCP). Antónia Brochado Pedras (CDS-PP), Antónia Barradas Leitão (PSD) e Fernando Serrasqueiro (PS)
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 25 minutos.

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O Sr Presidente - Sr Ministro da Cultura, Ilustres Autoridades, Srs. Convidados, Srs. Deputados, declaro aberta a sessão comemorativa dos 200 anos do nascimento de Almeida Garrett.
Eram 10 horas e 30 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto de Sousa Martins
Aníbal Marcelino Gouveia
António Alves Marques Júnior
António Alves Martinho
António de Almeida Santos
António Fernando Marques Ribeiro Reis
Armando Jorge Paulino Domingos
Artur Clemente Gomes de Sousa Lopes
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Carlos Alberto Cardoso Rodrigues Beja
Carlos Alberto Dias dos Santos
Carlos Justino Luis Cordeiro
Carlos Manuel Amândio
Carlos Manuel Luís
Casimiro Francisco Ramos
Eurico José Palheiros de Carvalho Figueiredo
Fernando Antão de Oliveira Ramos
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco Fernando Osório Gomes
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Francisco José Pinto Camilo
Francisco Manuel Pepino Fonenga
Gonçalo Matos Correia de Almeida Velho
Henrique José de Sousa Neto
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira

orge Lacão Costa
Jorge Manuel Damas Martins Rato
Jorge Manuel Fernandes Valente
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Afonso Teixeira de Magalhães Lobão
José António Ribeiro Mendes
José Carlos Lourenço Tavares Pereira
José Ernesto Figueira dos Reis
José Fernando Rabaça Barradas e Silva
José Manuel de Medeiros Ferreira
José Manuel Rosa do Egipto
José Manuel Santos de Magalhães
José Mana Teixeira Dias
Jovita de Fátima Romano Ladeira
Júlio Manuel de Castro Lopes Faria
Júlio Meirinhos Santanas
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Luís António do Rosário Veríssimo
Manuel Afonso da Silva Strecht Monteiro
Manuel Alberto Barbosa de Oliveira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António dos Santos
Manuel Ferreira Jerónimo
Manuel Martinho Pinheiro dos Santos Gonçalves
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria do Carmo de Jesus Amaro Sequeira
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel Ferreira Coelho de Sena Lino.
Maria Manuela de Almeida Costa Augusto.
Martim Afonso Pacheco Gracias.
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Natalina Nunes Esteves Pires Tavares de Moura.
Nelson Madeira Baltazar.
Paula Cristina Ferreira Guimarães
Duarte Paulo Jorge dos Santos Neves
Pedro Luís da Rocha Baptista
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz.
Rui Manuel dos Santos Namorado

Partido Social Democrata (PSD)

Adriano de Lima Gouveia Azevedo
Amândio Santa Cruz Domingues Basto Oliveira.
António Costa Rodrigues
António de Carvalho Martins
António dos Santos Aguiar Gouveia
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António José Barradas Leitão.
António Manuel Taveira da Silva
António Moreira Barbosa de Melo.
António Roleira Marinho
Artur Ryder Torres Pereira
Carlos Eugénio Pereira de Brito
Carlos Manuel de Sousa Encarnação
Carlos Manuel Duarte de Oliveira
Carlos Manuel Marta Gonçalves
Domingos Dias Gomes
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco.
Eduardo Eugénio Castro de Azevedo Soares
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
João Calvão da Silva.
João do Lago de Vasconcelos Mota
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
Joaquim Manuel Cabrita Neto
Jorge Paulo de Seabra Roque da Cunha.
José Augusto Gama.
José Carlos Pires Póvoas
José de Almeida Cesário
José Guilherme Reis Leite.
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Costa Pereira
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes.
Manuel Acácio Martins Roque.
Manuel Alves de Oliveira.
Manuel Filipe Correia de Jesus.
Manuel Mana Moreira
Maria Eduarda de Almeida Azevedo.
Maria Fernanda Cardoso Correia da Mota Pinto.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Manuela Dias Ferreira Leite.
Mário da Silva Coutinho Albuquerque.
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva.
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas.
Rolando Lima Lalanda Gonçalves.
Rui Fernando da Silva Rio.
Sérgio André da Costa Vieira.
Vasco Manuel Henriques Cunha.

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Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP)

António Carlos Brochado de Sousa Pedras
Augusto Torres Boucinha
Francisco Amadeu Gonçalves Peixoto
Jorge Alexandre Silva Ferreira
Luís Afonso Cortez Rodrigues Queiró
Maria Helena Pereira Nogueira Santo
Rui Manuel Pereira Marques
Rui Miguel Gama Vasconcelos Pedrosa de Moura
Sílvio Rui Neves Correia Gonçalves Cervan

Partido Comunista Português (PCP)

Alexandrino Augusto Saldanha
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado Bernardino
José Torrão Soares
João António Gonçalves do Amaral
João Cerveira Corregedor da Fonseca
Joaquim Manuel da Fonseca Matias
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Octávio Augusto Teixeira

Partido Ecologista Os Verdes (PEV)

Carmen Isabel Amador
Francisco Isabel Maria de Almeida e Castro

Deputado independente

José Mário de Lemos Damião

O Sr Presidente - Dando inicio as intervenções programadas tem a palavra, em representação do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes», a Sr.ª Deputada Carmen Francisco

A Sr.ª Carmen Francisco (Os Verdes): - Sr. Presidente Ilustres Convidados, Sr.ªs e Srs. Deputados Ao evocarmos hoje, no Parlamento português, o homem, o escritor o político Almeida Garrett, evocamos alguém que, fazendo parte da nossa Historia, não ocupa lugar menor João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett, se pudesse presenciar esta nossa comemoração do segundo século sobre o seu nascimento, neste ano, o vigésimo quinto depois do 25 de Abril de 1974, quereria certamente continuar o seu combate contra os ainda existentes atentados contra a liberdade, mas não menos certamente se orgulharia desta Nação, dos homens e mulheres que fazem hoje Portugal
Saberia que são homens e mulheres de quem se pode continuar a dizer, como ele disse «O povo há-de erguer o braço não o duvidemos, há-de pelejar, e há-de vencer Façamos quanto em nos está para que bem o erga, bem peleje bem vença, e bem saiba usar da vitória»
Garrett deixou a sua marca indelével nas letras, no Teatro na cultura portuguesa Impulsionador inquestionável do Romantismo Literário em Portugal, tem o grande mérito também de ter apoiado definitivamente o teatro, nomeadamente através da produção de peças, da própria formação de autores e de actores, mas, sobretudo, através do seu valioso contributo para a reorganização de organismos votados ao incremento da cultura e do gosto a Inspecção Geral dos Teatros e o Conservatório de Arte Dramática, que acompanharam o projecto de fundação de um Teatro Nacional, o actual Teatro Nacional D. Maria II.
Enquanto estudante, Garrett, já dado às letras, escreveu por então numerosas obras «comprometidas», que acusavam o «obscurantismo» e a «tirania» por atrofiarem a Nação e deformarem o indivíduo e exaltavam a liberdade como promotora de energia, prazer e virtude nos planos individual e cívico
Dele diz José de Arriaga, na Historia da Revolução Portuguesa de J 820, editada em 1889 «Garrett é de todos os jovens poetas deste período o que mais se avantaja pelo fogo inspirado que o abraza, pelo entusiasmo que lhe vibra na alma e pelo sincero amor à liberdade nascente, ao progresso e ao futuro da humanidade
A liberdade, a pátria, a revolução, os seus heroes, a natureza, os direitos do povo e da nação, o futuro da pátria e da humanidade, tudo e cantado em vigorosos versos por este poeta de sentimento e de verdadeira inspiração.
( ) Nós já vimos que a revolução política arrancara os portugueses do velho mundo, e os impelira para as lutas do futuro e para os assumptos da época Faltava, porém, uma inteligência superior, cheia de crenças no porvir e sincero apostolo da liberdade, na qual reverberasse fortemente o espirito da revolução e a alma popular, para no meio da derrocada do velho mundo lançar os primeiros alicerces da poesia moderna e revolucionária Esse grande espírito apareceu logo, foi Garrett, esse entusiástico defensor da revolução de 1820, dos seus heroes e das suas reformas, que ele cantou »
E cantou em obras como Camões ou D.ª Branca, publicadas no exílio Estas obras constituem, no campo literário, os primeiros exemplos, aos quais se seguiram inúmeros outros, de que o exílio, como experiência dolorosa, significou também o contacto com outros ambientes culturais e, simultaneamente, a distância que permite a construção de uma imagem do nosso país correspondente a um ideal
Há uma «consciência, ora agónica ora optimista, do intervalo inevitável entre um mundo que morre (o já não) e um mundo que está para nascer (o ainda-não) O presente será, por excelência, o tempo do exílio, um factor propiciador de uma consciência infeliz, quer pelo nostálgico apelo a um mítico passado de valores e afectos, quer pela saudade da pátria futura».
Garrett, como Herculano, «trovadores do exílio» Em Almeida Garrett, o sentimento de que há uma «pátria de liberdade que seria necessário restaurar para que ser português voltasse a ter sentido ( ) é uma imagem obcecante sempre que o liberalismo se desviou dos seus fundamentos ideológicos e se tornou no reino abjecto dos 'barões' materialistas»
O político Almeida Garrett demonstrou sempre uma grande preocupação com as questões da independência e maior importância da causa pública face a interesses particulares Nesta Casa, será forçoso lembrar aquilo que escreveu na sua Carta de Guia de Eleitores - em que se trata da opinião pública, das qualidades para Deputado e do modo de as conhecer -, editada em Setembro de 1826 «Uma cousa muito essencial é bem distinguir o espírito do partido, do publico ( ) Examinemos dois indivíduos sustentando, na mesma circunstância, opiniões e princípios diametralmente opostos, não há (dizem eles) em seu proceder senão o mesmo movei e causa Mas um deles entra nas discussões sem azedume, conserva toda a phleugma da prudência todo o sangue frio da convicção, se às deliberações do governo dá a sua aprovação im-

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parcial, vê-se que como bom cidadão gosa d'esses mesmos elogios que faz à autoridade, mas também se vê que os sabe suspender no ponto em que eles já não foram senão a expressão deshonrada e deshonradora da baixeza e da adulação, se alguma acção do governo merece censura, faz-me s>m imparcialmente, mas da maneira que o faz um interessado pela salvação do estado, e não pela ruína das pessoas que o administram Vede o outro, quando censura ou quando louva ou satyrisia, insulta, e murmura atrabiliariamente, ou lisonjeia, incensa, adula servilmente, não segundo a acção foi boa ou má, mas segundo a pessoa que a pratica, e ou não do seu partido, cliente ou patrono seu Quem não estremará no discorrer d'estes dois homens o espirito público do espirito de partido? Quem não verá n'um, a expressão da opinião pública, n'outro, a da privada opinião dos interesses pessoais? ( ) o que é necessário para ser bom deputado? ( ) Amor desinteressado da causa publica.
Palavras nas quais podemos e devemos ainda hoje meditar.
Do mesmo modo, são muito actuais, e sê-lo-ão sempre em regime democrático, aquelas outras palavras «Os homens são iguais porque são livres, e são livres porque são eguaes ( ) a natureza que nos doou estes dois preciosos bens, que os ligou intimamente com a nossa essência, que lhes deu uma tal correlação, uma afinidade e união tão reciproca, que um sem outro não podem existir, que um sem outro não podem cabalmente demonstrar-se.
Permito-me discordar apenas do entendimento de que a igualdade e a liberdade nos foram doadas Pelo contrário, foram, são, todos os dias, uma conquista de todos e de cada um de nos
São imensos os desafios que hoje se nos colocam As batalhas por um projecto de sociedade que se quer cada vez mais livre, justa e solidaria e por um modelo de desenvolvimento que não exclua ninguém, que não deixe de fora os fundamentais valores da dignidade da pessoa humana e da vontade popular
Como disse Garrett «Temos estorvos grandes que remover obstáculos imensos que superar, grandes e perplexas e quase inextricáveis dificuldades que debandar e desembaraçar».
Mas, como prosseguiu Garrett, «Não tremamos diante delas não recuemos de cobardes - avante, que já não é decente nem honrado nem possível recuar avante, mas não invistamos em carreiras de cego, arquemos com o inimigo, mas de olhos abertos, de peito a peito Venceremos mas não sem trabalho Havemos de triunfar, mas não sem sacrifício».
Os inimigos hoje serão outros são a injustiça social, a pobreza a exclusão, a fome, o trabalho infantil, o racismo a egoísta divisão dos recursos, a poluição, a destruição de bens e valores património da humanidade Mas são-no ainda infelizmente, o «obscurantismo» e a «tirania», contra os quais Almeida Garrett se bateu.

Aplausos gerais.

O Sr Presidente - Em representação do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luisa Mesquita

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP) - Sr Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs Deputados, Sr.ªs Convidadas, Srs Convidados João Baptista da Silva Leitão, que mais tarde acrescentara ao seu nome os apelidos de Almeida Garrett pelos quais é hoje conhecido, nasce no término de um século que pretende assumir-se como eterno fazedor de certezas intangíveis, aquelas que só moldam homens indistintos e quietos.
O universo que o jovem Garrett conhece é intemporal, silencia as contradições e está ainda muito longe da revolução liberal, dos princípios da liberdade, da igualdade e da fraternidade
Em seu redor, há um mundo de receios, mas nele e com ele o jovem apreende o sentir do ser e do estar, descobre a interpelação e o vassalo dialoga com o tirano em Sonho Profético, perguntando «O supremo poder aos reis proveio/Seus direitos/E Deus, se lhes outorga/Nenhuma obrigação lhe impôs com eles/Aos desgraçados, miserandos povos/Que aos ferros condenou e à desventura,/C'oa eterna obrigação do sofrimento Nenhum direito deu/Altos decretos/Do Eterno examinar, vos é vedado ...»
Mas do saber decretado pelo verbo partirá Garrett para o entendimento entre o passado sem resposta e um futuro grávido de promessas.
E é então que a palavra garrettiana se transmita em acção.
Texto e revolução conjugam-se na procura de um mundo novo que o soldado liberal ajuda a construir e o escritor relata E é neste processo de transformação que se transforma também o homem A sua consciência, vinculada sem reservas ao que se passa fora dela, é causa e efeito de uma sociedade em inquieta e perturbadora mutação É este o jovem que, com menos de 20 anos, reflecte, com uma generalidade universalista, sobre a cultura, a arte e se envolve sem preconceitos na actividade política no meio do povo, numa época de feroz instabilidade e a quem só a compreensão da realidade incomoda Trilha caminhos onde os aplausos são silêncios, entrega-se à aventura revolucionária, embriaga-se na descoberta dos fenómenos sociais e na incerteza das respostas do homem novo
E é esta consciência que leva Garrett, provavelmente, a afirmar na sessão de 9 de Outubro, a propósito da formação da segunda Câmara das Cortes e da posição do homem público, do homem chamado a pronunciar-se sobre questões importantes que a «( ) Mais fácil é seguramente a daquele que levado da torrente de opiniões e cuidando dirigir as turbas, quando não é senão empurrado por elas, imaginando-se forte só porque se pôs do lado de fora, vai com o poder que reina, está pela potencía que impera os aplausos estão em roda d'ela, as recompensas lhe chovem em cima, e coroado há-de ser com certeza».
Garrett excedia o seu próprio tempo e por isso se condena, como afirmou José Gomes Ferreira, «À sua imensa, à sua terrível solidão de homem de génio »
A compreensão e o estudo da produção garrettiana é hoje, mais que ontem, porque também hoje, mais que ontem, Portugal está menos distante deste amante da liberdade, uma permanente fonte de elementos novos que relatam as contradições económicas, políticas, ideológicas e culturais de um momento histórico fundamental para a compreensão de quem fomos, de quem somos e de quem pretendemos ser.
Ler Garrett é, ainda hoje, um trajecto de experiências sempre novas, de constante questionarão de todas as cadeias que coarctam a liberdade do ser humano O escritor gritará contra os tiranos, desafiará todos os poderes e perguntará «Não morre o homem quando vive o escravo?»
Do discurso político ao discurso literário, do discurso do amor ao discurso jornalístico, a palavra desvenda-se e

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revela-se, antes de tudo, como intervenção, como parte de uma autognose que o cidadão, que o escritor, o combatente liberal dirige a si próprio, aos outros e ao País que agora também possui e pelo qual é e quer ser também responsável, e por isso pergunta «( ) Aos economistas políticos, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que e forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, a desmoralização, à ignorância crapulosa, a desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico? ( ) Depois de tantas comissões de inquérito ( )», afirma, «( ) já deve de andar orçado o numero de corpos que se tem de entregar antes do tempo ao cemitério para fazer um rico Cada homem rico, abastado, custa centos de infelizes, de miseráveis »
Se nos disponibilizarmos a viajar hoje, com Almeida Garrett, pela nossa terra, por exemplo, de Lisboa para Santarém, surpreender-nos-emos como, de forma tão natural, a realidade e a ficção se conjugam e servem a sua visão do mundo, de um mundo e de uma escrita avessos a espartilhos escolásticos e abertos à contradição e à reflexão
Diante da estalagem da Azambuja Garrett declara «A sociedade e materialista, e a literatura que é a expressão da sociedade e toda excessivamente, absurdamente e despropositadamente espiritualista Sancho rei de facto Quixote rei de direito»
Diz ainda «( ) E a literatura que é uma hipócrita tem a religião nos versos, caridade nos romances, fé nos artigos de jornal - como os que dão esmolas para pôr no Diário, que amparam órfãos na Gazeta, e sustentam viúvas nos cartazes dos teatros».
Mestre de claridades e da revolução - no pensar, no agir, no sentir, no discutir, no ser artista e homem -, é ele quem realiza a síntese moderna das nossas letras, afirmam no leitores e estudiosos, fascinados com a relação de cumplicidade critica que Garrett ousa manter com aquele ou aquela que percorre o mosaico textual do seu discurso
Orador e poeta, historiador e filósofo, critico e artista, jurisconsulto e administrador, erudito e homem de Estado, o autor do fabuloso e cada vez mais actual texto das Viagens na Minha Terra denuncia o seu profundo conhecimento dos homens e das coisas, que só um verdadeiro homem do mundo pode, como ele próprio afirmou, ao escrevei «Este meu inclassificável livro de viagens »
Armado de um sarcasmo, algumas vezes cortante e destruidor, peleja sem tréguas contra hipócritas e sofistas, respeitando sempre crenças, opiniões e sentimentos
Respondendo a um convite do escalabitano Passos Manuel, Chefe do Partido Setembrista na oposição, Garrett parte para Santarém em Julho de 1853 Na bagagem transportava as diferentes experiências do exílio, os regressos ao Pais liberto do poder absolutista, o combate no exército liberal e as promessas de uma escrita comprometida
Tal como o Arco de Santa Ana havia surgido durante o Cerco do Porto, também Viagens será texto primeiro visto ouvido, pensado e sentido com as gentes que foi encontrando, e só depois escrito
A revolução de Setembro de 1836 havia chancelado a vitoria dos liberais e motivado Garrett para uma intervenção ainda mais ecléctica - do teatro ao Parlamento, do conservatório ao jornal, cidadão e escritor acreditam na construção de uma nova sociedade Mas a guerra civil deixa marcas profundas Os ódios, os interesses individuais, a corrupção, os oportunismos políticos dos barões afastaram o soldado, o Deputado, mas não calaram o escritor que na humildade da palavra, reconhece que errou.
«Errámos e sem remédio A sociedade já não é o que foi, não pode tornar a ser o que era, mas muito menos ainda pode ser o que é» Porque «( ) O povo, o povo está são os corruptos somos nós, os que cuidamos saber e ignoramos tudo».
Entretanto, chega a Santarém, mas, viajante atento, repara que «( ) o livro de pedra em que a mais interessante e a ma. poética parte das nossas crónicas está escrita» foi mutilado, rasgado, arrancadas as folhas, e desabafa «Não se descreve por outro modo o que esta gente chamada governo ( ) está fazendo e deixando fazer.
As ruínas do tempo são tristes mas belas, as que as revoluções trazem ficam marcadas com o cunho solene da história Mas ( ) as mais brutas reparações da ignorância, os mesquinhos consertos da arte parasita, esses profanam a nossa história».
O percurso da visita no presente, revisita, assim, o passado na memória do património degradado e simultaneamente transforma-se em reportagem e reflexão que rompem as referências regionais e se intrometem no País ou irrompem pelo mundo.
Garrett comprometeu-se a ver e a ouvir, a pensar e a sentir e de tudo fazer crónica.
Foi proscrito e exilado mas amou «de um querer bruto e fero».
Foi romeiro num País que queria ver progredir, apesar de reconhecer que Sancho e Quixote «( ) Tão avessos e tão desencontrados, andam contudo juntos sempre, ora um mais atrás, ora um mais adiante »
Sr. Presidente, Sr.ªs Deputadas, Srs. Deputados, Sr.ªs Convidadas, Srs Convidados Porque todo o texto se constrói com outros textos, porque todo o pensamento se enriquece com outros pensamentos, permiti-me que diga com Garrett como curta é a memória dos povos Hão-de se ir educando à sua custa, talvez «O senso comum venha para o milénio Está prometido como el-rei da Prússia prometeu uma constituição, e não faltou ainda, porque porque o contrato não tem dia»

Aplausos gerais

O Sr Presidente: - Em representação do Grupo Parlamentar do Partido Popular, tem a palavra o Sr Deputado Francisco Peixoto

O Sr. Francisco Peixoto (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Convidados, Srs Deputados, Sr Ministro da Cultura Almeida Garrett o homem feito de sentidos, sentidos deambulantes, apaixonados, sonhadores, premonitórios até, contidos, convenientes - em todo o caso contraditórios, mas apaixonantes Talvez por um qualquer desassossego de alma, talvez por um qualquer fatalismo errático, fascinantemente amalgamados por toda uma necessidade de segurança, de reconhecimento, de regresso, possa ser entendido o vértice da personalidade de Almeida Garrett, nascido faz hoje, precisamente, 200 anos
Como conciliar a confissão na línca de João Mínimo, a propósito da arquitectura gótica, onde reconhece que esta lhe absorve os sentidos num indefinível estado de alma «que não sei explicar», mas que lhe enche a alma de «um certo não sei quê entre gozo, respeito, devoção, melancolia e suavidade» e que o leva a estas horas e horas esquecidas sem se lembrar ou sem se importar com mais nada?
Como conciliar a êxtase provocada e descrita nas Viagens na Minha Terra pelo bosque antigo e copado e pela

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charneca alentejana e ainda pelo encantamento silencioso do Louvre, com os Últimos momentos de Camões de Domingos Sequeira? Tudo isto com a rendição ao mundanismo tantas vezes vulgar, com a cedência ao auto-elogio e à necessidade imediatista de reconhecimento
O aparente desconcerto de aspectos marcantes da sua personalidade e da instabilidade da sua própria vida fizeram sobressair a qualidade da sua inteligência vivíssima e as suas exuberância e riqueza íntimas, de forma a criar senão profundíssimas obras de meditação dos diversos campos que abordou pelo menos, mas de forma incontestável, toda uma obra e acção que o tornaram numa das figuras cimeiras da nossa literatura e num exemplo apaixonante de português
Desde muito cedo que se dedicou à arte literária, nela plasmando a sua sensibilidade, satisfazendo a sua curiosidade por tudo e todos quantos o rodeavam, por tudo quanto o fazia sentir, desde logo pelos portugueses, pelos nossos costumes, pelo nosso passado, pelo nosso devir, perscrutando o nosso destino comum Entender-se-á que esta paixão precedeu a sua consciência política e a sua heróica militância
Cedo também, ainda estudante de Direito em Coimbra, com apenas 17 anos, viu já na revolução de 1820 o modo e a forma de processar o renascimento português, precisamente através do domínio cultural
Foi este o maior e mais fecundo estigma de toda a vida de Almeida Garrett Admiravelmente, não confundiu nunca princípios com conveniências, não moldando a certeza das suas convicções a esotéricas aritméticas de circunstância ou de oportunidade Por isso, sofreu dois exílios, seguramente suportados, mas sublimados no seu maior e mais precioso bem a sua sensibilidade e, com ela, o seu poder criativo
Por isso, foi soldado, lutou, integrou o exército liberal, esteve no Mindelo e, depois, no Cerco do Porto Foi nesta primeira fase da sua vida política, de exilado, de lutador - fase de sofrimento, de entrega, de carência, de interrogação e de angústia - que, em manifestação elegante e eloquente da sua riquíssima personalidade, concebe e elabora obras das mais marcantes da nossa história literária como Camões e Dona Branca, obras consideradas justamente como introdutoras, entre nós, do Romantismo literário Mais tarde, alguns anos mais tarde, durante o Cerco do Porto, elabora o Arco de Sant'Ana
Com a derrota de D Miguel e a constituição dos primeiros governos liberais, surge no horizonte, talvez mesmo sem que se saiba (nem mesmo o próprio Garrett o sabia), nova ocasião para a exuberância ímpar da sua personalidade Encarregado de negócios em Bruxelas pelo governo, e a par de um período de particular vigor mundano, sofre a marcante influência de Shiller e, sobretudo, de Gõethe Ganha um estilo mais próprio e mais verdadeiramente original
As vicissitudes políticas nacionais continuarão determinantes na condução, talvez mesmo no sortilégio da coordenação do espirito de Garrett Com a revolução de 1836 e com o governo de Passos Manuel, Almeida Garrett é por este incumbido de propor um plano para a fundação e organização de um teatro nacional Almeida Garrett promove a fundação do Teatro Nacional, a fundação do Conservatório Nacional e ainda a criação dum repertório de peças portuguesas «que formem um publico no amor dos valores castiços, no culto da liberdade e no gosto estético»
Promoveu, de facto, a formação do repertório de petas, mas de uma maneira singular praticamente, foi ele próprio quem o fez, com a criação de obras das mais imortais da nossa literatura e atingindo o auge da sua carreira literária São desta ocasião o Auto de Gil Vicente e Frei Luís de Sousa e, com eles, Garrett tornou-se num mentor de ideias e de conceitos estéticos.
Se o relativo sobressalto da sua vida pessoal, marcado por uniões desfeitas e por alguma intranquilidade, pode testemunhar também a sua sensibilidade criativa em Cartas Dispersas, Flores Sem Fruto e Folhas Caídas, é a vida política, porventura, que constitui um dos principais motores da sua fecunda criação
Depois do cabralismo, que o afasta da vida política, a regeneração, que o recupera para Ministro dos Negócios Estrangeiros, que o honra e que o nobilita em 1854, quando compunha a novela Helena, é surpreendido pela morte que prematuramente, nos seus 55 anos, o leva
Almeida Garrett, pela sua singular riqueza, pontificou não só na história das nossas letras mas também na nossa história cultural, política e social Foi, indisputadamente, o introdutor do Romantismo em Portugal e o grande reformador do teatro português - e isto sempre bastaria para a sua imortalização e para a plena justificação de toda e qualquer homenagem -, mas foi também, permitam-me que aqui o sublinhe, talvez mesmo e sobretudo, o visionário, aqui com verdadeiro génio, que teve a capacidade de entender e de intuir realidades de sempre e ideias de futuro
Antes de mais, teve a capacidade de entender que as diversas manifestações culturais exprimem também, de forma solidária, o mesmo sentido, a mesma história, os mesmos sortilégios, os mesmos encantamentos e o mesmo devir de afirmação plena do individual e do diferente, tanto nos homens, como nas nações
Pôde proclamar, reconhecendo com aguda e rara felicidade, que ambos são entes, são acontecimentos, são fenómenos absolutamente únicos e irrepetíveis e, desta forma, que a verdadeira sabedoria e riqueza consistem na sua preservação, na sua adição com outras realidades e não, de forma alguma, nas suas diluições e obliterações
António Lopes Vieira falava da generalidade de Almeida Garrett muito mais pelo que descobriu e induziu do que pelo realizou.
Possamos, assim, nós, portugueses de hoje e de amanhã, honrar e comemorar Garrett, estando à altura dos desígnios e dos desafios que ele nos indicou

Aplausos gerais

O Sr. Presidente: - Em representação do Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata, tem a palavra o Sr Deputado Reis Leite.

O Sr Reis Leite (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Cultura, Ilustres Convidados, Srs Deputados- É com emoção que venho a esta tribuna para proferir algumas palavras de homenagem a Almeida Garrett, na ocasião em que promovemos uma sessão solene parlamentar, comemorativa do segundo centenário do seu nascimento.
Quis o destino que, passado mais de um século, eu, pobre e obseuro insular, viesse ocupar em São Bento uma cadeira de Deputado pelo mesmo círculo que Almeida Garrett tanto se orgulhava de representar- os Açores.
Mas como abordar o tema fugindo aos lugares comuns e arredando a tentação de vos falar, em termos académicos, do poeta, do prosador ou até mesmo do homem de Estado? Tudo isso foi Almeida Garrett e de todas essas facetas da sua personalidade sabeis vós o suficiente.

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Contudo, há um aspecto em Garrett que me fascina e que ele próprio sintetizou numa pequena passagem do seu justamente célebre Discurso do Porto Pireu Dizia Garrett nessa belíssima peça de oratória, em resposta ao Discurso da Coroa, nos idos do ano de 1840 «Como cidadão nunca renunciei a um direito »
A frase é curta, mas tão densa que se pode bem tomar como um programa de vida, para mais que nesses dias agitados do século XIX, que foram dados viver ao nosso homenageado, tais direitos de cidadania (como ainda hoje, diga-se em abono da verdade) eram bem difíceis de exercer
É de notar que Garrett não fala em deveres de cidadão mas, sim, em direitos, mesmo que não renunciar a esses direitos fosse, como foi para ele e para muitos da sua geração, aceitar um calvário de exílios, perseguições e incompreensões Porque a cidadania impõe aos homens a participação e a doação de seus talentos ao governo da República
Desde sempre, ser cidadão em país com propensão para albergar súbditos foi uma escolha difícil e penosa Escolher os direitos de cidadão e nunca renunciar a qualquer deles só pode ser considerado um programa de vida corajoso
Mas como guardamos nós - acima de tudo nós, que vivemos quotidianamente na mesma Casa que albergou Garrett -, muitos outros que escolheram a cidadania como ideal, como guardamos nós a memória desses homens que são faróis que deviam iluminar a nossa caminhada?
Temo que o façamos tímida e quase envergonhadamente O nosso espaço físico parlamentar, pelo menos, não tem sido pródigo em guardar vivo o espírito democrático daqueles que teimaram em não abdicar dos seus direitos de cidadãos Ao próprio Garrett, não lhe concedemos mais do que uma imagem colectiva com outros vultos do liberalismo e a outros, que o acompanharam nos ideais democráticos, parecemos temer venerá-los como cidadãos que exerceram os direitos De Manuel Passos, recordamos o fundador da nossa biblioteca num belo busto, sem duvida, mas sem outra referência ao esforço de cidadania, nem a uma obra política de denodado esforço de democratização das instituições Aliás, que diria Manuel Passos se visse como tratamos e como usamos a biblioteca que nos legou?
E o próprio Garrett, que, como todos sabemos, resistia dificilmente à lisonja e ao gosto pelo culto pessoal, como nos trataria se soubesse que entre os livros que temos ao nosso dispor como auxiliares e inspiração parlamentar não existe sequer, já não digo uma colecção das obras completas, mas, ao menos, um exemplar dos seus discursos parlamentares? E quanto nos serviria a meditação nas palavras que proferiu com paixão e amor pátrio nesta Casa Mas nós, portugueses, somos assim capazes de idolatrar a memória dos outros e incapazes de vermos a virtude dos nossos Contudo, os erros também se corrigem e não e tarde para arrepiarmos caminho Até ao final da legislatura dá tempo de emendarmos a mão e, ao menos, termos o tribuno Garrett e deixarmos no espaço parlamentar testemunho de preito desta geração
Garrett compreendeu como poucos o seu tempo, lutou e sacrificou-se para o modificar e para deixar conscientemente aos vindouros uma herança de dignidade civil e progresso espiritual, que nós temos o direito de usufruir, mas que parecemos temer toma-la em mãos
Num dos seus ensaios mais justamente celebrados, Portugal na Balança da Europa, cujo tema devia constar hoje na educação da nossa juventude como tema central, deixou Garrett outra reflexão, quase aviso, que muito me tem tocado Dizia ele, logo no prólogo à nação portuguesa «Em dois grandes escolhos se perde a liberdade na tibieza com que se defende, ou na demasia com que dela se goza»
Sábia palavras que hoje, passados mais de 100 anos, vemos todos os dias serem comprovadas no mundo que nos rodeia Usamos com frenesim as liberdades, mas não cuidamos quase nunca com entusiasmo da liberdade Assistimos quase indiferentes ao morrer aos poucos por esse mundo fora da liberdade e protestamos pouco convictamente contra isso É na própria Europa que diariamente assistimos impávidos ao abafar do exercício das liberdades e ao afogar em autêntica barbaridade e despotismo a bela flor da árvore da liberdade que nos orgulhamos de ter feito plantar entre nós Somos demasiado frouxos, a começar aqui no Parlamento, no ardor que nos devia animar pela defesa da liberdade e não damos, estou certo disso, o exemplo de cidadãos que usam com moderação os benefícios das liberdades, das cívicas e das pessoais Ai, como tinha razão Almeida Garrett ao propor que não se esquecesse nunca que está constantemente nas obrigações da cidadania zelar para que não se afunde nos dois escolhos, o da tibieza e o da demasia, a liberdade Demasiado ocupados com as tarefas do imediatismo, descuramos tantas vezes as tarefas inadiáveis do tempo dedicado ao essencial Tarefas que não dão certamente triunfos e que geram tantas vezes a incompreensão, mas que se tornam na pedra angular da nossa obrigação de nunca renunciarmos aos direitos de cidadãos
Almeida Garrett, autodisciplinado na frequência dos clássicos greco-romanos (outro dos bons hábitos que perdemos), cultivou mais uma virtude que é bem de admirar, principalmente entre os políticos muito propensos na aceitação de que a gratidão anda ausente da política Ou até, dito de outro modo, tomando como lição a vulgata de um Maquiavel degenerado, o político faz gala em apregoar que a política real, a política dura, não conhece a gratidão nem a utiliza Pois, Garrett, animal político por excelência, negou sempre que tal aforismo devesse existir e usou da gratidão, abundantemente, tendo com ela despertado a admiração dos seus pares e inúmeros admiradores
Apregoou a gratidão que devia aos seus mestres, àqueles que lhe haviam aberto os caminhos e dado os instrumentos para a aprendizagem e para a formação intelectual, fossem eles os tios ilustres, o Bispo de Angra ou o Juiz de Fora da Junta da Fazenda dos Açores, ou fossem eles os professores régios da escola pública, que frequentou em Angra, provincianos, mas eruditos e sábios Do alto da sua ciência e do seu saber, superiores ao deles, sem dúvida, nunca os esqueceu e sempre os referenciou como marcos indeléveis Até mesmo em casos mais próximos do exercício da função política, sempre recorreu à virtude cívica da gratidão para retribuir, pessoalmente, ou através do Estado, quando o servia, com recompensas e honrarias, os sacrifícios dos cidadãos anónimos que tudo haviam sacrificado para implantar o regime de liberdade em Portugal. Que o fizesse à Terceira e a Angra com o título de Heroísmo e com o colar da Torre e Espada, não seria admiração de espantar, pois sempre encontrou naquela segunda pátria, como dizia, respeito e agradecimento pela sua acção Mas até sobre o ingrato Porto, que nunca aceitou elegê-lo como Deputado, derramou honrarias e gratidão Era esta mais uma maneira de cumprir o seu progra-

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ma cívico, não deixando nunca de exercer um qualquer direito de cidadão
É este, Sr. Presidente e Srs Deputados, o cidadão extraordinário que hoje honramos e recordamos, e só me resta desejar que, amanhã, não o tenhamos de novo esquecido Garrett merece ser, neste Parlamento, uma presença diária e um exemplo de todas as horas, acima de tudo pelo incomensurável legado de virtudes cívicas que nos transmitiu
Tal como ele, não recusemos nunca o exercício de um direito de cidadão Se o fizermos e não esquecermos os nossos direitos de cidadão, engrandecemos a Pátria, a Liberdade e a Democracia

Aplausos gerais

O Sr. Presidente: - Em representação do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente da Assembleia da Republica, Sr. Ministro da Cultura, Ilustres Convidados, Srs Deputados Garrett não foi só um romântico, foi ele próprio um romance, como o demonstra o excelente livro que sobre ele escreveu o embaixador José Calvet de Magalhães Um romance que desmente um dito de Octávio Paz muito em voga nas universidades o de que os grandes poetas não têm biografia, só têm destino A biografia de Garrett confunde-se com a História de um século que ele marcou como ninguém E o seu destino é singularíssimo, porque rima com o destino do seu próprio país A escrita e a vida nele são inseparáveis E ele e, por excelência, o modelo dos poetas e escritores que, em diferentes circunstâncias históricas, fizeram da sua pena uma arma para combater a tirania e lutar pela liberdade
Quando, frequentemente, me perguntam como e possível conciliar a poesia e a política, apetece-me sempre remeter para Garrett - «O Sr. João Baptista (da Silva Leitão) de Almeida Garrett, Deputado da Nação portuguesa, do Conselho de Sua Magestade, fidalgo cavaleiro da casa real, ex cronista mor do remo, bacharel formado em leis pela Universidade de Coimbra, cavaleiro da antiga e mui nobre Ordem da Torre e Espada do Valor, Lealdade e Mento comendador da Ordem de Cristo e oficial da de Leopoldo na Bélgica, Juiz do Tribunal Superior de Comercio, enviado extraordinário e Ministro plenipotenciário de Sua Magestade ex Inspector Geral dos Teatros, sócio de varias academias nacionais e estrangeiras, nasceu na cidade do Porto a 4 de Fevereiro de 1802»
Assim começa a autobiografia pelo seu próprio punho redigida e em que curiosamente, o poeta altera a sua data de nascimento talvez para ficar três anos mais novo

Risos gerais

Guia de uma época, lhe chamou Teófilo Braga Veio o ano de 1820 e com ele a Revolução de 24 de Agosto E logo, no fim desse ano, Garrett, antecipando de um século e tal o nosso Alberto Martins,

Risos gerais

declamou na sala dos Capelos da Universidade de Coimbra «uma espécie de ode ou discurso em verso, saudando e celebrando o triunfo da revolução» «Fiel à causa da liberdade - dirá de si mesmo - tem-na seguido em todas as suas fortunas, escrevendo por ela no gabinete, orando na tribuna, gemendo em voluntário exílio, pelejando, mas cantando-a sempre em seus versos».
Sabe-se que, na sua juventude, foi preso por fazer parte de uma associação secreta que, entre outras coisas, reivindicava a independência do Brasil. E quando esta é proclamada, logo ele a exalta numa ode intitulada O Brasil Liberto, em que escreve estas palavras, verdadeiramente extraordinárias e carregadas de futuro «Lá vai, lá surge em terra, avulta e cresce. A lusa liberdade»
Nos anos 60 deste século ter-lhe-iam, possivelmente, valido outra vez a cadeia
Forma-se em leis em 1822, mas não pode seguir a carreira de magistratura judiciária por ainda não ter a idade requerida. Entra para a Secretaría de Estado, com o intuito de vir a ser, como diz, «empregado na diplomacia» Fixa-se em Lisboa, mas, conforme confessa, «nem as suas novas obrigações, nem as distracções da capital puderam impedi-lo de se ocupar de literatura» Já então havia composto O Retrato de Vénus Em Lisboa, escreverá a tragédia Catão E quando, em 1822, morre Fernandes Thomaz, perda que, segundo Garrett «todos os liberais lamentaram como verdadeira calamidade pública», é ele quem, membro da Sociedade Patriótica, fará, na sessão solene, o elogio fúnebre do revolucionário
Por duas vezes trilhará os caminhos do desterro A primeira em 1823, findo o período constítucional No mesmo dia em que D João VI sai para Vila Franca, Garrett parte para Inglaterra Aí viverá e tornará contacto com os modernos autores ingleses Em 1824, acabados os recursos, consegue um emprego na casa Lafitte e estabelece residência em França, no Havre Compõe o poema Dona Branca e grande parte do Camões, obras que, segundo ele próprio o dirá «nacionalizaram e popularizaram a poesia» Regressado a Portugal, funda um jornal O Português Sem basófia, diz «foi seguramente o mais popular que se tem escrito entre nós» Funda também O Cronista, semanário de literatura e política Redige, por ocasião das eleições, A Carta de Guia para Eleitores Com a sua conhecida modestia, sublinha «Foi outro escrito que lhe granjeou muita reputação naquela época» Mas logo acrescenta «Não era de esperar que tão poderoso antagonista do absolutismo deixasse de ser alvo do ódio desse partido».
É, de facto, não deixou Com o advento do absolutismo miguelista, «Garrett foi dos primeiros que saíram a foz do Tejo em demanda de Londres».
Mas abandonemos por agora esta autobiografia que poderia ser uma espécie de guião, redigido por Garrett, para um filme sobre a sua própria vida. Filme que, aliás, se poderia e falta fazer Como aconteceu com muitos vários outros exitantes, em outras épocas históricas, é no desterro que Garrett e Herculano vão, de certo modo, descobrir, redescobrir e repensar Portugal É aí que, sob a influência do romantismo inglês e das novas ideias, eles fundam o romantismo português E este é, em grande parte, a expressão estética e literária das transformações sociais e políticas então ocorridas Ou, como escreveu Teófilo Braga, fiel ao seu positivismo «Todas as manifestações do grandioso vulto de Garrett são iluminadas pelas crises históricas do seu meio social, cada criação estética do seu génio está ligada às fases da implantação do regime constítucional parlamentar».
«Pode mais que a espada a voz e a pena» - cantará Garrett Mas ele combaterá com todas estas armas Com a pena, com a espada e com a voz.

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Com a pena, através de uma escrita multifacetada, que vai desde a criação poética à refundação do teatro português, passando pelo ensaísmo, a que dará nova dimensão, com, por exemplo, O Tratado da Educação ou Portugal na Balança da Europa, à colaboração directa com Mouzinho da Silveira na redacção das leis que iriam transformar o País e, mais tarde, na elaboração das leis sobre educação e em partes substanciais da própria Constituição Sem esquecer os direitos de autor, de que foi o primeiro a ocupar-se em Portugal
Tinha vocação de legislador Desconfio, até, que, como o nosso Almeida Santos, ele nunca resistiu à tentação de corrigir a gramática e as vírgulas das leis

Risos gerais

Pese embora o seu contributo para a renovação da língua, creio que a sua poesia esta demasiadamente datada e que a sua linguagem poética raramente consegue libertar-se dos arcaísmos do tempo O que de mais fresco e pessoal nos fica e o Romanceiro Português, por ele tão carinhosamente recolhido e coligido, para além do belíssimo poemas As Minhas Asas
Mas a revolução literária haveria ele de fazê-la na prosa e no teatro Com as Viagens na Minha Terra, Garrett reinventa a prosa portuguesa, abre o caminho à modernidade e liberta a língua daquela carapaça «oco-ribomba e freira», de que falava Filinto Elísio Nunca tão certo esteve Garrett como quando escreveu no inicio do capítulo II «Estas minhas interessantes viagens hão-de ser uma obra prima, erudita, brilhante de pensamentos novos, uma coisa digna do século»
Viagens na Minha Terra, note-se, depois de, como assinala, ter viajado no seu quarto É, de certo modo, o cumprimento da palavra de ordem que Garrett formula quando funda o Teatro Nacional «Vamos a ser nós mesmos, vamos voltar a raiz» Enxertar na tradição nacional, reavivando a, o novo estilo e as novas ideias trazidas da errância pela Europa Cosmopolitismo e nacionalismo, tomo haveria de acontecer depois com a geração do Orfeu Mas não foi só com a pena que Garrett lutou pela liberdade na escrita e na vida Como ele próprio diz na sua Autobiografia, «as praias do Mindelo viram-no desembarcar de espingarda ao ombro e mochila as costas» A ele e ao seu amigo Alexandre Herculano Como Byron, também eles empunharam as armas pela liberdade, lutando no cerco do Porto onde apesar da guerra e no meio da guerra, Garrett escreveria ainda O Arco de Santana
Com a pena, com a espada E com a voz Aqui, nesta Casa estão os ecos dessa voz e de alguns dos mais notáveis discursos parlamentares que alguma vê foram pronunciados em Portugal Foi sem duvida o maior tribuno do seu tempo e por certo o maior orador parlamentar de sempre Poeta da liberdade, soldado da liberdade, legislador da liberdade, tribuno da liberdade, jornalista da liberdade Digam ía se não e um destino e se pode haver biografia que se lhe compare
Não posso também esquecer que foi Almeida Garrett quem organizou a homenagem aos mártires da liberdade, decapitados pelos miguelistas na Praça Nova, no Porto, um deles meu tio trisavô Clemente de Mello Freitas O meu antiabsolutismo e por assim dizer, genético E a admiração que tenho por Almeida Garrett é tão antiga como o despertar da minha própria consciência cívica
Deixo para o fim a obra de Garrett que, a par de Viagens na Minha Teria mais indelevelmente me marcou
Refiro-me ao Frei Luís de Sousa E mais exactamente, àquele momento, raro e único, sem dúvida um dos mais altos da nossa literatura, em que o velho aio, que está farto de o saber, pergunta ao Romeiro. Quem és tu? É o Romeiro, apontando o retrato de D. João de Portugal, responde Ninguém.
Nunca consegui ler ou assistir a este episódio sem um arrepio na alma ~ que aquela pergunta àquele romeiro é a pergunta que, de certo modo, em certos momentos, todos fazemos ao grande desconhecido que trazemos dentro de nós E aquele Romeiro ou aquele Ninguém é tudo, é Portugal, é a História, é o povo português, somos nós todos

Aplausos gerais

O Sr. Presidente: - Muito obrigado, Deputado Manuel Alegre, também, grande escritor e poeta.
Sr. Ministro da Cultura, em representação do Sr. Primeiro-Ministro e por si próprio, Srs Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Sr. Procurador-Geral da República, Sr. Ministro da República junto da Região Autónoma dos Açores, Srs Deputados, Srs. ex-Presidentes da República, Ex mos Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo e Tribunal de Contas, Ex.mas Autoridades Civis e Militares, Srs. Convidados Evocamos hoje o bicentenário do nascimento de Almeida Garrett, porventura o cidadão português que, depois de Camões, mais gasto deu ao qualificativo de génio
Não raras vezes, foi entre nós apodado de génio quem esteve longe de o ser Não é esse o caso de Almeida Garrett Muitos dos que do talento quinhoaram, como Herculano, Oliveira Martins, Camilo, Teófilo Braga e Ramalho Ortigão, convergem, em geral, na genial criatividade do político, do dramaturgo, do poeta, do romancista, do orador parlamentar e até do jornalista, como já foi aqui destacado, que Garrett cumulativamente foi
Oliveira Martins considerou-o «o maior poeta e o maior artista que tivemos depois de Camões» Camilo, qualificou-o de «Luís de Camões romântico», a propósito do seu poema em verso branco sobre o épico, que Camilo rotulou de «incomparável maravilha literária» E considerou-o o maior orador parlamentar de sempre, sem excepcionar o próprio José Estevão de Magalhães, seu também imortal contemporâneo nestes cadeirais de São Bento Teófilo Braga considerou-o o fundador do teatro português, que sem dúvida foi, de que Gil Vicente teria sido apenas o grande precursor E opina que, no Frei Luís de Sousa, «a Pátria se encarna no verbo do mais poderoso génio depois de Camões »
Alexandre Herculano, tão parco em elogios, foi seu sincero admirador Quando, já no fim da vida, Garrett escreveu as Folhas Caídas - livro de versos verdadeiramente inovador e irreverente para com os cânones literários do tempo -, o grande historiador, ao lê-lo, terá exclamado «se Camões fizesse versos de amor na idade em que está Garrett, não era capaz de o igualar São belíssimos Aquele diabo não pode com o talento que Deus lhe deu»
Menos generosos nas apreciações que dele fizeram, foram, é sabido, o truculento José Agostinho de Macedo - seu detractor de estimação - e até o próprio António Feliciano de Castilho (o bombo da festa da célebre Questão Coimbrã), que à falta de mais consistentes razões o terá acusado de usar galicismos

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Garrett foi impiedoso «saberá essa gente que m (com todas as letras) também é galicismo»? É claro que se não ficou por aqui, e logo prescreveu a dieta alimentar que se imagina Mas receio estar sendo irreverente demais em razão do lugar aonde o sou.
Invoco apenas a apreciação dos maiores, que é vasta a galeria dos seus encomiásticos biógrafos, à cabeça dos quais figura Gomes de Amorim, que viveu em permanente adoração de Garrett e consagrou os últimos anos da sua vida a coligir e escrever a sua mais completa biografia Outros, além dele, como, o já aqui citado, Embaixador Calvet de Magalhães A estes, em particular, me arrimo no quase retrato de Garrett, que a seguir esboço.
É frequente a invocação de Camões como termo de comparação para aquilatar do génio de Almeida Garrett Tão apenas isso basta para lhe assegurar um lugar no podiam dos mais gemais escritores portugueses Terá decerto contribuído para isso o facto de ter escrito, com tão singular talento, a romanceada biografia poética do grande épico, segundo modelo literário que ele próprio situou «fora das regras», de tal modo, que afirmou «se pelos princípios clássicos o quiserem julgar, não encontrarão aí senão irregularidades e defeitos» Nesse tempo, Garrett dizia de si próprio não ser «nem clássico nem romântico» A verdade é antes que, excepcionando o período puramente arcádico dos seus primeiros escritos, nomeadamente os do tempo de estudante de Coimbra (até este mérito teve ), ele foi o verdadeiro introdutor do romantismo em Portugal, e foi em direcção a ele que a sua obra permanentemente viajou O que ele admitia como defeitos dessa obra monumental eram apenas a expressão da novidade que nela, sem defeito, havia.
Questão diversa é saber até que ponto ele teve consciência disso Chegou a considerar o romantismo um «andaço das bexigas», que nunca teria saído da Península O que, segundo ele, antes, não havia era «a vacina, como a prepararam Gõethe e Scott, essa é que não havia, e creio que fui eu que a introduzi» Encomendo-me uma vez mais ao grande Herculano Qualificou-o ele de «grande reformador da literatura portuguesa e o verdadeiro introdutor do romantismo em Portugal E bem sabemos que Herculano foi também atacado pelo tal «andaço das bexigas»
No Camões, Garrett absorveu muito da luz que vinha do épico Inclusive na formulação da sua ainda epopeica forma de versejar Serve de exemplo esta descrição do Gigante Adamastor «As iras lhe arrostei, ouvi sem medo/Os amarelos dentes a ranger-lhe/Por entre os furacões de atra porcela/Vi a esquálida barba de despeito/Arrepelar-se, e a cor terrena e pálida/Ao clarão dos relâmpagos lu-zir-lhe/De sanguinosa cólera inflamada».
Os elogios aos múltiplos talentos de Almeida Garrett surgem quase sempre acompanhados de um compreensivo sublinhado dos seus defeitos pessoais Que defeitos eram esses?
Desde logo, um incomensurável pendor para o auto-elogio, já aqui refendo A vaidade física, essa incontornável, Garrett juntava uma verdadeira vaidade intelectual Redigia, como se não fossem da sua autoria, as suas próprias referências biográficas Mas era «gato escondido com o rabo de fora» O verdadeiro talento literário é por regra inocultável Inculcava-se «descendente de uma nobre família irlandesa», apesar de oriundo, como é sabido, de uma, alias, honrada família pequeno-burguesa. Em requerimento ao Ministro do Reino, fiel à obsessão de se nobilitar, intitulou-se, sem o ser, «fidalgo da casa real» Viria a sê-lo mais tarde, não nessa altura Nos seus cartões de visita fez inscrever «Lê Chevalier De Almeida Garrett»
Mas, quando por qualquer razão lhe convinha, também se autoqualificava de «simples homem de letras», tendo escrito, com desdém «seja todo o Mundo em Portugal feito barão, conde, visconde, grã-cruz, etc, que isso lhe não disputarei» Mas a verdade é que disputou E acabaria por aceitar o título de Visconde - que esteve longe de lhe ter sido imposto, antes objecto de repetidas diligências propiciatórias -, além de condecorações várias, que lhe alegraram o outono da vida e que, raras vezes, terão sido, tão justa e merecidamente, atribuídas A única que recusou foi por a não julgar ao nível da alta conta em que se tinha Esta fraqueza era aliás bastante mais frequente do que hoje é, embora ainda hoje o seja. É conhecido o corrosivo aforismo da época «Foge cão, que te fazem barão. Mas para onde, se me fazem visconde?»

Risos gerais

No auto-elogio sobre as suas intervenções parlamentares, sem favor notáveis, foi além de todos os limites Atribuiu-se, por exemplo, «o divino dom da eloquência» e considerou o discurso que passou à história como do Porto Pireu, já aqui refendo, «o mais vigoroso e eloquente discurso pronunciado na tribuna portuguesa» Eu também acho. Ele conteria «períodos que não envergonharam a Demóstenes ou a Cícero»
Noutra oportunidade escreveu sobre si mesmo, de novo ocultando a autoria «como obra literária é sem dúvida a oração moderna que mais faz lembrar as declamações clássicas da velha Atenas Em muitos dos seus períodos, recorda os turbilhões de Demóstenes»
Mas a fraqueza da vaidade física sobrepujava decerto esta outra vaidade Garrett era o tipo acabado do dandy, do janota de gosto amaneirado Usava chino para ocultar um defeito na cabeça resultante da queda de um cavalo Vestia com esmero chocante acolchoava as ancas e as bamgas das pernas, à força de espartilhos, adelgaçava a cintura, usava casaca assertoada, calças de quadrados, camisas de seda, coletes de ramagens berrantes, gravatas a condizer, chapéu branco e monóculo de dar nas vistas, que não de ver, charuto à la mode, a rematar.
Assim, mais ou menos, o descreveu a Ramalho! Figura - a seu modo também árbitro de elegâncias - que se não esqueceu de referir ainda os estojos de cosméticos da sua perfumaria, os seus utensílios de toillete, os cofres perfumados das cartas de amor. Mas a desfazer suspeitas que tais usanças sugerem, rematou o retrato descrê vendo--o de chibata em punho para vergastar as orelhas do Velho Mundo Português, obrigando-o a abrir a primeira garrafa de champanhe Acrescentou a isto um saborosíssimo comentário «Nós não éramos todos - disse - senão uns pobres velhotes, uns ginjas, uns chéchés».
Garrett tinha consciência do seu próprio ridículo. E não desconhecia, por certo, o anátema de Voltaire, quando formulou a sua famosa prece - «Senhor, tornai ridículos os meus inimigos»

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Ramalho escreveu a esse propósito «ridículo lhe chamaram pela quantidade dos pequenos defeitos que ele cultivava, e que eram, bem simplesmente, o reverso das suas qualidades encantadoras».

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Garrett, com todo o seu exibicionismo, e a sua permanente preocupação de «ser em todas as circunstâncias o centro das atenções», não fez com isso senão o que hoje se chamaria a publicidade das suas ideias revolucionárias de verdadeiro corifeu do liberalismo político (não confundir com o económico de hoje) de convicto iluminista, de apaixonado pela soberania popular, pela defesa da liberdade e do povo
O remate da tragédia a que deu o nome de Lucrécia, na qual - já se o disse - desabrochou o seu génio de eleição, e bem a prova disso «vivamos livres ou morramos homens». Assim viveu e assim morreu, mesmo quando a heterodoxia dos seus escritos e da suas rebeldias lhe granjeou, por duas vezes, hospedagem no Limoeiro. O Dr. Mário Soares, aqui presente, que saúdo, que bem mais vezes por ía passou, dirá que amam mais a liberdade aqueles a quem os «Limoeiros» desse vasto Mundo privaram dela
Foi assim contraditório efeminado nos gostos, donairoso nos gestos, mentindo sobre a idade que tinha, em contraponto firme nas convicções, bravo na sua defesa, física, psicológica e intelectualmente corajoso Teve sempre detractores, a quem não deu descanso, teve sempre adversários, a quem não recusou combate, quando foi caso disso, aprovou uns murros bem aplicados, em extremo de causa, bateu-se em duelo à pistola, a desafio seu, embora no momento da verdade o adversário o tenha atirado para o ar, em convite a que Garrett o imitasse, o que cavalheirescamente fez E, sobretudo, amou sempre muitas mulheres que facilmente se rendiam à sedução dos seus galanteios encantatórios Amava as todas em cada uma Tinha uma marcada predilecção pelas mais jovens, mesmo tendo em conta que o amor, e ate o casamento precoce, eram frequentes nesse então Separado da primeira e única esposa - que, na altura, era vedado ter mais do que uma, ainda que sucessivamente -,

Risos gerais

a qual lhe deu uma filha, que logo perdeu, não hesitou em coabitar com outra, igualmente jovem, que lhe deu duas filhas e um filho varão, só uma das filhas tendo conseguido sobreviver Cedo falecida a segunda companheira, refugiou se em relações adúlteras que dificultaram e diferiram o seu acesso ao palácio real - a rainha não gostava inicialmente, muito dele Uma bela mulher casada inspirou lhe as Folhas Caídas e deu vida e calor ao seu Outono Viria a morrer quase só, tal como Camões, seu modelo, reduzido às visitas de Gomes Amorim, de Herculano da filha freira e poucos mais Mas não pobre, como o épico Ele próprio tinha restaurado, mobilado e decorrido com requintado gosto (também era dado, de algum modo, ao bricabraque, como o também imortal Junqueiro) a casa em que viveu a dolorosa espera da morte.
O que, porem, pretendo realçar, é que não são lícitas, nem foram sequer tentadas, conclusões apressadas sobre a sua virilidade Amaneirado seria Mas femeeiro sempre!

Risos

Chegou em convívio com uma família inglesa de boa estirpe a namorar ao mesmo tempo três encantadoras irmãs - coleccionava não só bricabraque -, com uma das quais se envolveu a seno Este dado biográfico é por ele próprio reproduzido nas Viagens na Minha Terra, atribuído à figura de Carlos, o tal que conquistou o amor da Joaninha dos olhos verdes, que nesse e, porventura, noutros relatos não é senão o próprio Garrett E tinha ele, pela família, sido destinado a padre, tendo, inclusive, chegou o a receber prima tonsura! Sempre é verdade que Deus não dorme!

Risos gerais

Foi decerto preciso que Garrett tivesse tido o génio que teve, tivesse sido o poeta, o dramaturgo, o romancista, o parlamentar, o jornalista e o resistente que foi, e tivesse vivido a vida inteira em coerência com as suas próprias ideias e convicções, até ao sacrifício do que mais amava, para que os seus veniais pecadilhos fossem afinal sempre perdoados, quando não apoucados, levados enfim à conta do imenso crédito que acumulou na conta-corrente da história, à força de determinação e de talento
Não terá tido, por certo, o carácter sólido e brônzeo de Alexandre Herculano - mas quem teve? Mas não lhe faltou carácter O seu contemporâneo D João de Azevedo, assim o descreve «talento monstro, reputação europeia, primeiro orador português, primeiro poeta peninsular e literato quase enciclopédico» Este hetero-elogio goza tanto da presunção de ser sincero e justo, que provém de quem, do mesmo passo, o considerou «o céptico mais desalmado que seguramente se tem sentado em cadeira de parlamento» Mas o crítico recai em crise de admiração artística e intelectual quando remata «( ) efectivamente é gigante, e talvez precisara curvar-se para atravessar o Colosso de Rhodes» Quem é que já mereceu, em Portugal, este elogio?
Eram, decerto, as suas fraquezas lordbyroneanas a estragar a pintura Porque «céptico» e «desalmado» é que Garrett não foi. Pelo contrário, foi sempre firme na sua fé religiosa, patriota sem mácula e fiel à causa do liberalismo político e da democracia representativa Amou como poucos a liberdade e lutou, inclusive, de armas na mão, como aqui já foi realçado, como simples soldado, pela emancipação da burguesia e do povo A sua vida e a sua obra são o testemunho disso E bem se sabe que viveu por dentro o período politicamente mais descontínuo e instável da história política portuguesa A sua obra -quantas vezes censurada, de autoria oculta ou representação proibida - tem a coerência de um hino aos ideais do vintismo e da liberdade
E convenhamos se a Garrett faltou alma, quem outra mais rica e sensível a teve? Não o considerou Ramalho «um dos maiores poetas deste século»? E pode-se acaso ser tão universalmente grande se a alma for pequena?
Digamos tudo se Garrett foi um «céptico desalmado», quem escreveu por ele as Folhas Caídas, o Frei Luís de Sousa e as Viagens na Minha Terra, para só citar o principal? E quem, por amor do povo, calcorreou o país em recolha dos romances populares, da mais tradicional e genuína poética portuguesa, hoje registada nesse admirável Romanceiro que figura entre as obras-primas, não só de Garrett, mas da literatura portuguesa, senão universal? Mas, hoje e aqui, reveste-se de particular significado a dimensão parlamentar de Almeida Garrett, como Deputado e Par do Remo.
Falemos, pois, desse nosso talentoso «colega» Já referi que Camilo o considerou o maior orador parlamentar de sempre Essa opinião não é isolada E é com frequên-

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cia mantida quando se o compara com esse outro gigante da oratória parlamentar que foi José Estevão de Magalhães, o Cícero de Aveiro Com uma diferença Garrett cuidava mais da forma, como grande escritor que era E teve sempre sobre José Estevão a vantagem de ter sido também um dos mais prolíferos e brilhantes legisladores, dentro e fora do Parlamento Junto dele o Almeida Santos, que o Alegre quis generosamente referir, empalidece, como é óbvio
Antes mesmo de eleito Deputado, foi encarregado de redigir importantes textos legislativos - inclusive de valor constítucional - inspirados pela mística vintista e pela experiência revolucionária da Europa em ebulição Mesmo Mouzinho da Silveira, que goza justamente da fama de primeiro legislador do liberalismo revolucionário, teve em Garrett um precioso colaborador, com a vantagem de este lhe aprimorar tecnicamente a linguagem jurídica, já que a sua não era propriamente famosa
Dotado de voz bem timbrada, sempre teatral, como grande actor que foi, usando com mestria o gesto e colocando com aproposito a voz, declamando com ritmo a frase, apoiado numa invulgar cultura, e temperado por uma riquíssima vivência, Garrett foi decerto, repito, o nosso mais talentoso parlamentar de sempre
Tão só por esse atributo que, bem o sabemos, exige tanto para ser perfeito, bem se justifica esta sinceríssima homenagem Herculano, que lhe conhecia a prontidão e a acidez da replica, quando o Ministro Avila atacou Garrett, fez famoso o seguinte aparte «Se lhe dão tempo para pensar, esmaga-os» Como de facto Dias depois, Avila era feno em estilhas, o que valeu a Garrett, a par de encómios pelo brilhantismo da resposta, a demissão de vários cargos, o que em muitas outras oportunidades lhe aconteceu
Também Sotto Mayor, dirigiu a Garrett, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, esta acusação «Pois o Ministro e tido como o primeiro e maior poeta da Península (...)» - ate aqui não acusação, elogio! - «(...), e em vez de tratar de organizar a sua repartição, que acha mal organizada, trata cuidadosamente de se fazer Balio de Malta»?
Logo José Estevão, em aparte que o relato da sessão regista «Cuidado com ele! Eu conheço-o, já lhe provei a mão! É temível»!
No dia seguinte, deste-lo Era Sotto Mayor, passou a Sotto apenas.

Risos gerais.

Passos Manuel chamou-lhe «pena de oiro» Foi decerto de oiro a sua pena por mais que, materialmente, o não fosse Tivemos, também nos, um «pena de oiro», o nosso querido e já saudoso Raul Rego Talvez não tão genial, mas talentoso, sem duvida E, sobretudo, um carácter de eleição, impermeável as mundanais tentações, e insensível a vaidades e lisonjas Daqui lhe mando um enternecido abraso
Quanto a Garrett, melhor é escutá-lo que julgá-lo Disse ele no celebre Discurso do Porto Pireu, já aqui referido em resposta a uma brilhante intervenção de José Estevão que os arquivos desta Casa registam sob o mesmo titulo «O que hoje e classe media para o povo, foi ao principio a aristocracia Foi-lhe mister lutar com os reis, e o povo a ajudou, venceu e não tardou a abusar da vitoria De protectora e aliada tornou-se senhora, usurpou tudo invadiu tudo, abusou de tudo E o ciúme dos reis primeiro, e a inveja e o ódio dos povos depois, fez justiça ao usurpador Caiu como nós havemos de cair, apedrejada da indignação popular, se não reflectirmos e nos não moderarmos a tempo E mais fácil e mais pronto havemos de cair Que a nossa oligarquia efémera é estátua de pés de barro, aquela (...)» - refere-se à aristocracia - «(...) tinha alicerces de ferro e sangue que iam até às entranhas do país. E caiu! O fanatismo religioso e os preconceitos antigos, e a memória dos serviços prestados, e o lustre das velhas prosápias, e a glória e a vaidade nacional, e a história cheia de seus nomes e que tudo rodeava de prestígios e de força, e de autoridade, a antiga aristocracia histórica.
E caiu, e ela aí jaz por terra Quando veio o dia grande e amargo, quando o povo se ergueu e lhe pediu contas da sua usurpação, ela invocou todos esses prestígios, falou na religião, apelou para a história E nada lhe valeu
Nós, se com os nossos abusos trouxermos esse dia, se fizermos a loucura de tornar obnóxia ao povo a nossa classe que ele ainda ama, que invocaremos nós no dia em que nos pedirem contas? Falaremos na história? Mas nós ainda não a temos! Apelaremos para a gratidão dos serviços prestados? Mas quais fizémos nós, quais que a nosso prol não fossem?
Não podemos, digo, apelar para a gratidão dos povos porque ainda não fizémos nada a favor dos povos.
O povo trabalha e produz, a classe média adquire»
As actas registam débeis «apoiados» de alguns membros do congresso Permitam-me que vos pergunte hoje, aqui e agora, voltariam a ser débeis!
De um outro discurso, proferido já como Par do Reino, retiro o seguinte passo «A sociedade deve esforçar-se por fornecer trabalho ao que precisa de trabalhar para viver, a sociedade tem a obrigação de sustentar o que envelheceu e se impossibilitou ao serviço dela Disse-o o Evangelho antes de o dizer o socialismo».
Em resposta a um dos habituais discursos da Coroa, disse uma dia «Ordem é o fiat da liberdade a luz vai separar-se das trevas, o mal do bem, a monarquia do despotismo, a igualdade civil da demagogia, a religião do fanatismo, e a Liberdade criadora há-de olhar para a sua obra e ver que ela está boa Em o Povo conhecendo bem a Liberdade, em o Povo ouvindo e conhecendo a ordem, há-de ver, há de conhecer, que uma é impossível sem a outra»
Como isto é actual, meus queridos amigos!
Quando preparava a minha tese sobre «Direitos de Autor», enquanto aluno do Curso Complementar de Ciências Jurídicas, deparei, naturalmente, com o famoso projecto de lei sobre a propriedade literária, de que Almeida Garrett foi autor E tomei conhecimento, deslumbrado, da polémica que, sobre esse projecto, travou com o grande Alexandre Herculano Este, numa posição idealista, a recusar que os direitos dos autores sobre as suas obras, pudessem ser qualificados como «uma propriedade como qualquer outra» Impossível reproduzir aqui os argumentos e contra-argumentos desses dois gigantes Mas recordo que Herculano acusava Garrett de «pendurar a ideia no mercado entre o barril de manteiga e a saca de algodão», enquanto que Garrett, mais realista, apesar de mais poeta, lhe retorquia que os escritores e os artistas tinham de almoçar todos os dias, como toda a gente

Risos gerais

Após uma, por vezes, áspera troca de mimos, que os deixou por largo tempo afectivamente frios, Garrett, im-

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placável, acabaria por rematar mais ou menos assim (cito de memória) Deixe-se você de fantasias! Com que é que comprou a quinta de Vale de Lobos? Não foi com os direitos de autor que os editores lhe pagaram?

Risos gerais

Segundo a minha tese, ambos tinham razão O direito de autor é, com efeito, um direito sui generis, revestido de uma dupla natureza material, nessa medida sendo um direito de propriedade como o entendeu Garrett, e intelectual ou moral, nesse aspecto revestindo as características de um direito imaterial, parente próximo dos direitos da personalidade, como pretendia Herculano
Mal eu sabia, então, que viria a ter a possibilidade de determinar, como já determinei, a publicação em livro das intervenções parlamentares do grande Garrett Meu querido Colega e amigo Reis Leite, compreendo também muito mal que essa publicação, acessível a todos, não exista, tal como não existe a divulgação das brilhantes intervenções de parlamentares como Fernandes Thomaz, António Cândido, Alexandre Herculano, António José de Almeida, Cunha Leal e tantos outros Tem sido negado aos portugueses um fácil acesso à história nobilitante do seu Parlamento Vamos corrigir essa lacuna Garrett terá, como outros grandes parlamentares do passado, no futuro jardim, em frente ao edifício que estamos a construir, junto do Palácio de São Bento, a sua estátua de bronze Terão todos eles, como a tem neste momento o José Estevão de Magalhães

Aplausos gerais

Vamos corrigir essas lacunas O próprio José Estevão, que, com o brilho que ninguém lhe recusa, fez questão em replicar ao Discurso do Porto Pireu, da autoria de Garrett, não terá atingido a altura daquela famosíssima oração
Garrett foi, por diversas vezes, eleito Deputado, uma vez como único pela oposição, contra as maquinações empenhadas em mantê-lo afastado de São Bento Só não conseguiu, como já se disse aqui, com mágoa que nunca superou, ter sido eleito pelo Porto, sua terra natal Nessa época, os governos caiam frequentemente (um deles não chegou sequer ao terceiro dia) e as câmaras tinham também duração fuga? Só o talento de Garrett lhe foi permitindo superar o empenhamento dos seus adversários em silenciá-lo.
Coube a Garrett viver num dos períodos de maior instabilidade política da nossa Historia O vintismo libertário encontrou o em Coimbra a escrever e a estudar Direito, ou leis, como se dizia na época Viveu com o entusiasmo da juventude essa aurora de liberdade.
«O entusiasmo da revolução de vinte - escreveu a propósito - que me apanhou em flagrante, rodeado de Enciclopedistas, de Rousseaus e de Voltaires, deitou a perder tudo Atirei com o gorro por cima da ponte e fiz versos» E exclama «Durou-me pouco a embriaguez desta primeira paixão, porque, entrando cedo no mundo e nas cogitações políticas, o ócio das recreações literárias me enfadou logo»
Mas estava escrito que havia de ser um dos gigantes da nossa literatura de sempre Forçado a emigrar para Inglaterra em meados de 1823, após o golpe de Estado absolutista de Vila Franca, viria, apesar das dificuldades económicas com que teve de lutar (chegou a empregar-se como escriturário), a encontrar disponibilidade de tempo e espírito para absorver a influência da nova vaga literária que varria a Europa, para se deixar inspirar pelos grandes sacerdotes dos novos credos (Byron e Scott, entre outros) e para retomar o gosto pela escrita Assim nasceram o Camões e a D Branca, essas maravilhas fatais de todas as idades!
Autorizado a regressar, desde que declarasse por escrito «conformar-se com a ordem legitimamente estabelecida» (que pouco original foi Salazar), recusou nobremente
Mas, logo em Abril de 1926, D Pedro, imperador do Brasil, herdeiro do trono de Portugal por morte de seu pai, promulga a Carta Constitucional e abdica do trono de Portugal a favor da filha D Mana da Glória Garrett regressa então a Lisboa e publica uma «Carta de Guia de Eleitores» que deve ter feito urticária ao absolutista D Miguel No vai e vem do poder que se seguiu, este desembarca em Lisboa em 1929 e Garrett busca de novo o exílio Seis meses depois, o Conde de Vila Flor, futuro Duque da Terceira, à frente das forças liberais, derrota os miguelistas e ocupa a Vila da Praia Em Novembro de 1831, D. Pedro parte para a Ilha Terceira e Garrett alista-se como simples soldado nas suas forças Nos Açores, cai de amores por uns olhos negros de quinze anos de idade, mais uma vez Sempre igual a si próprio! A revolução e o amor nunca foram incompatíveis Pelo menos, para ele!
Foi decerto inspirado neles que mais tarde confessou «Só negros, negros os quero!/Que em lhes chegando a paixão/Se uma vez disserem sim/Nunca mais dizem que não»!
«Um fingidor»! Como bem se compreende. Demais sabemos nós que os quis de todas as cores negros, verdes, azuis e às riscas

Risos gerais

O querer era sempre o mesmo A cor dos olhos é que mudava! Não sei se estão para aí a insinuar que não há olhos às riscas! Posso garantir-vos que ele não deu conta disso!

Risos gerais.

Dá-se o desembarque no Mindelo e a sequência é conhecida Garrett voltará no entanto ao exílio, vítima de perseguições políticas, e regressa após a entrada triunfal em Lisboa do Duque da Terceira Reocupa lugares de que tinha sido banido e é nomeado para outros, entre eles o de Secretário da Comissão da Reforma para a Instrução Pública, tendo desempenhado, como é sabido, um papel do maior relevo na reforma educativa do País O seu texto Da Educação, ainda hoje é de leitura obrigatória
É, então, encarregado da sua primeira missão diplomática no exterior, encarregado de negócios junto do Rei dos Belgas Outras teria embaixador, encarregado de negociar tratados, chegou naturalmente a ser Ministro dos Negócios Estrangeiros, sem significativo acréscimo de glória, diga-se em abono da verdade
Entre as muitas tarefas de que foi incumbido - sobretudo, depois de Sá da Bandeira ter reposto em vigor a Constituição de 1822 -, figuram as ligadas à reforma do teatro, área em que tão particularmente se notabilizou que a história o reconhece como fundador do Teatro Nacional São da sua autoria um Plano de Criação de um Teatro Nacional, um Projecto de Criação da Inspecção-Geral

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dos Teatros e Espectáculos Nacionais, o Projecto da Criação do Teatro Nacional D. Maria II, e a Criação de um Conservatório de Arte Dramática. Recusou por esse então uma pasta no Governo, bem como os lugares de Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça e de Presidente do Tribunal Superior de Comércio. Mas aceitou, modestamente, o lugar de vogal deste Tribunal, e o lugar - sempre a paixão pelo teatro - de Inspector dos Teatros e Espectáculos.

Se a isto juntarmos o mérito excepcional das peças teatrais que escreveu, com destaque para o Frei Luís de Sousa, que António José Saraiva e Oscar Lopes rotulam de «obra solitária na literatura portuguesa e no teatro romântico em geral»; o Alfageme de Santarém, em que ataca a direita eanista; a Sobrinha do Marquês, imbuída de uma certa crítica anticlerical; e Um Auto de Gil Vicente, que marca o ressurgimento de um teatro verdadeiramente nacional, o teatro português foi ele. Ainda é!

Garrett, aliás, viveu o teatro com tão intensa paixão que foi também e muitas vezes actor, encarnando a primor os seus próprios personagens. Em tudo isso, mecenaticamente, ajudado pelo famoso Conde Farrobo, o que com o abundante e fácil dinheiro de África construiu o petit Versailles que pretendia ser o Palácio das Laranjeiras, e junto dele um famosíssimo teatro em que actuaram os melhores actores e as mais famosas divas do canto lírico desse tempo. Até que o fogo o destruiu. Mas Farrobo representava também.

A nova revolução de Costa Cabral, de 1838, não afectou Garrett, que ajudou Cabral a restabelecer a ordem. Jurada um mês depois a Constituição de 1838, Garrett jurou-a a contragosto, dada a sua fidelidade à Carta. Isso não impediu que fosse incumbido de novos e importantes trabalhos, entre eles o de redigir o Código Administrativo. Sem esquecer o Teatro! Criou, por essa altura, prémios do Conservatório para peças originais, fez votar um subsídio para o teatro português, e íomou a iniciativa de constituir a «Sociedade de Autores».

Os golpes políticos não ficaram por aqui. Há a Maria da Fonte, a famosa Patuleia, durante a qual a guerra civil alastrou a quase todo o País; a Regeneração; Costa Cabral; os golpes e os caudilhismos do costume. Tudo isso é conhecido. Garrett, umas vezes na mó de cima, ajoujado de cargos e honrarias; outras, na mó de baixo, disso de pronto despojado. Mas o que deixo dito serve para realçar que enfrentou sempre, com total dignidade, os azares da sorte, sem se bandear, sem se vender por favores de espécie alguma. A beleza e o mérito da sua obra literária não foram atraiçoados, repito, pelo seu carácter e o seu comportamento Os exílios terão sido as menos duras. Chegou a receber ameaças de morte e de fogo posto na sua residência, sem lhe ter dado qualquer chelique.

Pelo contrário, por entre as árduas lutas e as importantes tarefas políticas de que foi incumbido, encontrou sempre ânimo para dar continuidade à exploração do filão inesgotável da sua criatividade artística. São do seu Outono algumas das suas mais belas produções, como o Arco de Sant'Ana, e esse fresco admirável e único, que são as Viagens na Minha Terra. Mas sobretudo, como já disse, os poemas reunidos nesse livro imprevisível da sua vigésima quinta hora, que são as Folhas Caídas. Garrett foi grande até ao fim. Poucos o são. E não apenas grande! Poeta até ao fim. Ele mesmo o disse, a propósito desse livro: «poeta na primavera, no estio, e no outono da vida, hei-de sê-lo no inverno, se lá chegar, e hei-de sê-lo em tudo».

A melhor homenagem que podemos prestar-lhe é reconhecer que com brilho singular o foi.

Aplausos gerais.

Antes de dar por encerrada e^ta memorável sessão, em que homenageámos um dos mais altos espíritos que Portugal gerou, tenho o prazer de convidar todos os presentes e convidados para o Salão Nobre, onde haverá um breve Porto de Honra.

Está suspensa a sessão.

Eram 12 horas e 5 minutos.

O Sr. Presidente: — Sr. Presidente das República Francesa, Ilustres Autoridades, Srs. Convidados, Srs. Deputados, tenho a honra de declarar aberta esta a sessão memorável de recepção do Sr. Presidente da República Francesa, a quem passo desde já a saudar, em breves palavras, para que possamos ouvi-lo durante o tempo que dispuser para se nos dirigir.

Eram 16 horas e 10 minutos.

Sr. Presidente da República Francesa, Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, por si e em representação do Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Sr. Procurador-Geral da República, Srs. Membros do Governo de Portugal e da França, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Contas, Srs. Vice-Presidentes da Assembleia da República e Srs. Deputados, Srs. Representantes do Corpo Diplomático, Excelentíssimas Autoridades Políticas, Civis e Militares portuguesas e francesas, Excelências: A Assembleia da República, reunida em sessão plenária para o efeito convocada, sente-se honrada com a presença do Presidente da República Francesa e com a disponibilidade de Sua Excelência para, como se fosse um de nós, nos dirigir a palavra.

É meu privilégio saudá-lo e conceder-lha, Sr. Presidente.

É grande a expectativa com que aguardamos a visão que queira transmitir-nos sobre o presente e o futuro das relações bilaterais entre os nossos países, da União Europeia e do mundo, numa encruzilhada da história cuja leitura é tudo menos fácil.

Essa expectativa é também justificada. V. Ex." vem precedido de um currículo político de luxo, mesmo entre os mais cotados. V. Ex.º foi tudo o que um grande político pode ser: duas vezes Secretário de Estado; quatro vezes Ministro; duas vezes Primeiro-Ministro; nove vezes eleito Deputado; três vezes Maire de Paris, eco Presidente da França, país que doou ao mundo a mais famosa trilogia de princípios políticos e éticos: a liberdade, a igualdade e a fraternidade.

Por mais que a igualdade e a fraternidade sejam obra inacabada na aventura humana, e por mais que essa utopia, a haver, condicione o triunfo definitivo da própria liberdade, o novo espírito saído da Revolução Francesa continua a constituir a constelação polar do processo histórico. Mesmo quando as suas estrelas mudam de rótulo, e à igualdade se chama, agora, justiça social, ou a fraternidade é rotulada de solidariedade, nem por isso, essas estrelas, perdem o brilho.

Portugal manteve no passado, e prolonga no presente, com a grande naçflo francesa, relações privilegiadas. O nosso mais famoso romancista, Eça de Queiroz - qualifi-

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cativo que o nosso Prémio Nobel da Literatura decerto não rejeita - dizia que a cultura nos vinha de França pelo paquete do Havre Assim foi, e agora, sem paquete, de algum modo continua a ser, apesar de os exclusivos estarem a diluir-se no fenómeno da globalização, que tudo vertiginosamente nivela
Precisamente para disso melhor nos defendermos - até onde a defesa é possível - somos hoje parceiros do exaltante projecto de construção da União Europeia A partir de um projecto inicial de simples unidade económica, estamos hoje edificando, antecipando-nos a todos os restantes espaços regionais, uma ambiciosa unidade política, em que uma comum cidadania ganha progressivamente relevo sobre os demais factores de coesão
Esta ai, in actu, a unidade monetária Vêm ai, em projecto, novas políticas comuns, entre elas uma comum política de relações exteriores e uma comum política de segurança Esta tem estado, bem o sabemos, no núcleo fundamental das preocupações de V. Ex.ª, nomeadamente no que se refere à articulação funcionai entre a União da Europa Ocidental e a Aliança Atlântica Não existem, a esse propósito, como a propósito nenhum, divergências de fundo entre os nossos países, e ambos convergimos na recusa de gendarmes únicos e de tentativas de hegemonia universal fora de época.
Não significa isto que seja total e absoluta - nunca é - a convergência dos nossos interesses em todos os azimutes e domínios Mas esse e o preço da nossa distinta individualidade Para diluirmos o quase nada que nos separa no muito que nos une é que a Europa do presente e do futuro foi concebida como uma união, tendo os princípios da solidariedade e da coesão como principais linhas de força
Portugal viu se condenado a viver meio século na contramão da historia Vem fazendo, há um quarto de século, um notável esforço de recolagem ao pelotão dos países mais desenvolvidos Esse esforço tem sido coroado de êxito, mas continuamos a necessitar da solidariedade dos nossos parceiros europeus A negociação da Agenda 2000 oferece se como oportunidade e plataforma para novos gestos de apreço pela nossa inacabada viagem a caminho de altos níveis europeus de desenvolvimento.
Visita V. Ex.ª Portugal no momento em que a Indonésia da sinais de ceder a pressão da opinião pública internacional e as exigências dos Direitos do Homem, no que diz respeito aos indeclináveis direitos do povo de Timor Leste a autodeterminação e independência Vivemos, a esse respeito, uma hora de esperança e contamos, para traduzi ía em realidade, com a solidariedade do mundo livre, de que a França continua a ser o exemplo mais paradigmático.
Vive e trabalha hoje em França cerca de um quinto da Nação portuguesa a reforçar a nossa gratidão pelo seu grande pais, Sr. Presidente, entre outras razões porque sabemos que, quando regressarem, transportarão dentro de si como nos hoje o temos, o mais entranhado amor à democracia e a liberdade
Esse amor e cada vez mais necessário nestes «dias tumultuosos» - como Van Passen qualificou os do pós-guerra - em que e de novo evidente que, como disse nesta mesma sala um célebre escritor português cujo génio hoje de manha aqui evocámos, «a ordem ( ) é o fiai da liberdade» sendo que «uma e impossível sem a outra» A democracia digo eu, essa, é impossível sem ambas
Esta e, porem uma das muitas reflexões que, em comum, a Europa tem de fazer, por si e pelos que a história colocou a seu reboque, sobre o presente e o futuro do Mundo.
Mas nós estamos aqui para ouvir V. Ex.ª, não para me ouvir a mim Seja bem vindo a Portugal e à sua Assembleia da República, Sr. Presidente Que se sinta bem no meio de nós e que a saudade, sentimento tão português, na forma de saudade das cidades de Lisboa e do Porto, únicas que visita, possa contaminá-lo e obrigá-lo a voltar depressa e muitas vezes.
Muito obrigado por ter vindo, Sr. Presidente.

Aplausos gerais.

Sr. Presidente da República Francesa, tenho a honra de lhe dar a palavra

O Sr. Presidente da República Francesa (Jacques Chirac): - Sr. Presidente da Assembleia da República, Sr.ªs e Srs Ministros, Sr.ªs e Srs. Presidentes, Sr.ªs e Srs. Deputados, Sr.ªs e Srs. Embaixadores, Senhoras e Senhores Quero antes de mais, Sr. Presidente, agradecer a V. Ex.ª, em meu próprio nome e em nome de todos os meus compatriotas, o vosso acolhimento e também as vossas palavras repletas de amizade.
Quero dizer-vos quanto me sensibilizou ter sido convidado a vir hoje a Portugal, Portugal, que foi a primeira Nação europeia a determinar as suas fronteiras Portugal, sentinela avançada da Europa, onde a alma impulsionada pelos ventos e pelas ondas do mar não sonha senão com aventuras
E que aventuras, que destino identificamos em Portugal! Que coragem encontramos nos vossos homens do mar Desafiando as lendas e o medo, eles forçaram o «Mar das Trevas», em que se acreditava que as embarcações desapareciam no equador, onde as serpentes marinhas só espreitavam o momento de engolir os navios mais audaciosos Construíram um dos mais vastos impérios da História Alargaram incessantemente as fronteiras da geografia, ao mesmo tempo que as do espírito humano Portugal com o qual nós, franceses, temos tanto a compartilhar e que, mais do que nosso parceiro, é verdadeiramente nosso irmão na Europa.

Aplausos gerais.

Assim, é para mim uma grande honra e um imenso prazer ser recebido aqui, neste local prestigioso, sede há mais de 160 anos do Parlamento português É uma honra poder expressar-me perante os representantes eleitos pela vossa Nação e poder dirigir-me assim a todo o povo português, ao qual trago as Fraternais saudações do povo francês.

Aplausos gerais.

É uma honra que os senhores me concedem ao reunirem-se em Plenário para acolher o Presidente da República Francesa E é um imenso prazer, para o parlamentar que fui, reencontrar a atmosfera do hemiciclo, este recinto onde palpita o coração da democracia, onde se encarna a vontade do povo, onde se esboça o futuro
Há um quarto de século, os portugueses, rompendo resolutamente com o longo e sombrio período da ditadura, reencontraram a liberdade No mundo inteiro, muitos foram os que, com entusiasmo e simpatia, seguiram o desenrolar da «Revolução dos Cravos» Entre estes, en-

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contrava-se, naturalmente, a França A França, que havia acolhido tantos dos vossos compatriotas compelidos ao exílio

Aplausos do PS e do PSD

Esta ruptura, por tanto tempo esperada, democraticamente realizada produziu os seus efeitos para além das vossas fronteiras Nomeadamente na América Latina, como se várias nações tivessem esperado este sinal, o vosso sinal, para empreender, por sua vez, o caminho da liberdade
Então, integralmente restabelecidos, os valores democráticos, aos quais o povo jamais renunciara, voltaram a vigorar, desta vez para sempre As instituições representativas rapidamente se enraizaram, nutridas pelo pluralismo político, exaltando as liberdades individuais e os direitos fundamentais da pessoa humana, de que os senhores são os eloquentes actores
O vosso país pôde, então, reunir-se naturalmente à sua família, a Europa, retomando o lugar que o seu passado glorioso e a sua poderosa cultura lhe conferem por direito Então, portugueses e franceses reencontraram-se
Foi então reinstaurado o diálogo entre os nossos dois povos, o diálogo de duas grandes Nações, que foram dois berços de civilização, que afirmaram, ao longo da História, com a mesma tenacidade e determinação, o seu carácter singular, que exerceram responsabilidades à escala mundial e cuja cultura continua a brilhar em todos os continentes
Um diálogo nutrido de longa data por centenas de milhares de portugueses presentes no território francês Os vossos compatriotas constituem, em França, uma das primeiras comunidades estrangeiras Aliás, pergunto-me se se pode qualificar de estrangeira uma comunidade que pertence à União Europeia e que tão admiravelmente se integrou enriquecendo a França tanto no plano material como no plano cultural e espiritual

Aplausos do PS e do PSD

Uma comunidade ardente e corajosa, que - repito - tanto tem contribuído para o nosso país Uma comunidade que e também orgulhosa das suas raízes, fiel às suas tradições, legitimamente apegada ao seu país de origem Hoje, neste recinto, desejo prestar-lhe a minha homenagem simultaneamente reconhecida, calorosa e amistosa

Aplausos do PS do PSD, do CDS-PP e do PCP

Doravante, o nosso diálogo é o de dois povos que têm destinos cruzados, porque estão a construir juntos a Europa
Desde os primeiros tempos, a França tem aplaudido e estimulado o vosso empenhamento europeu, manifestado logo após a vossa revolução democrática Que longo caminho foi trilhado em apenas uma geração! Quanto esforço tem sido empreendido desde o pedido de adesão, em 28 de Março de 1977, um dos actos fundadores do primeiro governo constítucional presidido pelo Exmo. Sr. Mário Soares.

Aplausos do PS

Que constância na determinação de acelerar a História para vos alçar ao vosso lugar nas primeiras posições na Europa!
Quero saudar as mulheres e os homens do vosso país que souberam iluminar o caminho que leva ao futuro e manter o leme na direcção certa Aqui, como em outras paragens, e talvez mais do que em outros países, a lembrança de um passado nacional aberto para a imensidão dos mares poderia ter dificultado a aceitação da União Europeia Mas aqui, mais do que em qualquer outro país, a grande maioria dos vossos dirigentes políticos e o conjunto da Nação perceberam que era necessário avançar sem hesitar, que os nossos antigos Estados-nações, para poderem existir no mundo de amanhã, para serem donos do seu destino, têm em primeiro lugar de unir-se.
Os esforços empreendidos por todos, numa admirável continuidade política, produziram os seus frutos O vosso país está a registar um desenvolvimento rápido, constante, excepcional, devendo-o à sua abertura resoluta e, sobretudo, à sua participação na Europa.
Os vossos sucessos são admiráveis Com uma notável actividade industrial e comercial, o crescimento económico de Portugal é impressionante A vossa inflação foi jugulada e os vossos défices controlados, a vossa taxa de desemprego é uma das mais baixas da União Europeia, o vosso país está a tornar-se um dos primeiros destinatários dos investimentos na Europa e as empresas francesas sabem-no muito bera Grandes ou pequenas, elas têm feito de Portugal um parceiro económico primordial para a França
Hoje estamos, pois, empenhados, com nove outros parceiros, no projecto do euro, sem que tenhamos tido de sacrificar as nossas políticas sociais, os nossos interesses nacionais ou a nossa identidade
O ano de 1999 iniciou-se, com efeito, através de um acontecimento considerável pela primeira vez desde a Roma antiga, os europeus têm uma moeda única A sua criação no dia exacto previsto, no término de um longo processo que permitiu a convergência de 11 economias para os mesmos objectivos atingidos no mesmo momento, é a vitória de uma determinação colectiva Quaisquer que sejam as dificuldades, os europeus souberam tomar possível o que era obviamente necessário
O euro, necessário para o crescimento e por conseguinte para o emprego, conduzirá a Europa mais longe na coordenação das suas políticas económicas e sociais Gerará ambições e será um motor de progresso para todos os europeus É também uma boa notícia para o mundo moeda da primeira potencía económica e comercial do planeta, o euro contribuirá para um melhor equilíbrio do sistema financeiro internacional, como, aliás, já o tem demonstrado o acolhimento extremamente positivo que lhe têm reservado as parcas financeiras do mundo inteiro.
Mas, para além das solidariedades concretas de que o euro é a mais forte expressão, portugueses e franceses partilham primordialmente a mesma ideia do homem e a mesma ambição política para a Europa, o mesmo amor pela liberdade, pela democracia, pela solidariedade, pelo progresso e pela paz.
Onde poderiam esses valores ser expressos de maneira mais veemente que aqui, neste Parlamento, onde são pensadas, debatidas e redigidas as leis que se aplicam a cada um para o benefício de todos. Nesta tribuna, onde V. Ex.ª mesmo, Sr. Presidente, lamentava, há algumas semanas, por ocasião do 50 º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que esses direitos, reconhecidos a todos, permaneçam, no entanto, muitas vezes no plano puramente teórico. Nesta tribuna, Sr. Presidente, onde V. Ex.ª apelava para «Um novo pacto, uma nova ordem mundial, que

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permita enfim realizar a mais generosa de todas as utopias a que associa a liberdade à igualdade e à fraternidade».
Como poderia não me emocionar essa referência à divisa da República Francesa, herdada da nossa Revolução? Como se poderia deixar de ver esta comunidade de ideais que nos convida, portugueses e franceses, a lançarmos juntos, na Europa e no resto do mundo, os grandes combates, para abolir, como dizia V. Ex.ª, Sr. Presidente, na «família universal, as fronteiras entre dominantes e dominados, privilegiados e excluídos, ricos e pobres, cultos e analfabetos»?
Portugal presidirá a União Europeia a partir de uma data que marca o imaginário dos povos l de Janeiro do ano 2000 E e a França que lhe sucederá, no segundo semestre desse mesmo ano Pois bem, aproveitemos esse ano 2000 sob a presidência luso-francesa para fazermos progredir a nossa visão comum da Europa!
Como eu já disse, não estamos a construir os Estados Unidos da Europa, mas a Europa unida dos Estados.

Aplausos do PS do PSD e do CDS-PP.

Uma Europa exemplar na pratica da democracia Uma Europa que assegura a justa representação dos seus membros, bem como a tomada em consideraçâo equitativa dos interesses e das preocupações de cada país e de cada povo. E neste espírito que a Europa deverá concluir a reforma das suas instituições antes de se alargar Deverá procurar alcançar a eficácia colegial, sem diluição de identidade, dentro do respeito pelas nossas nações livres, soberanas, orgulhosas da sua história, apegadas às suas tradições e à sua cultura, mas desejosas de construir juntas uma comunidade unida pelo mesmo destino A França e, sei muito bem, Portugal compartilham a mesma preocupação de alcançar este equilíbrio sem precedente na Historia.
Uma Europa democrática, mas também uma Europa solidária, atenta a sorte dos mais fracos Uma Europa generosa, que alie os sucessos económicas e o progresso humano Portugueses e franceses compartilham, também nesta área, a mesma preocupação com a dimensão social da Europa Para Portugal, como para a França, a defesa e ci aprofundamento do nosso modelo social estão entre as nossas maiores prioridades, assim como a nossa determinação em combater por todos os meios os flagelos do desemprego e da exclusão Portugueses e franceses têm militado para a adopção de um pacto europeu para o emprego.
A União Europeia, reforçada pelos seus valores e o seu modelo social, confortada na sua construção económica pelo lançamento bem sucedido do euro, deve agora dedicar se a elaboração de uma política externa e de segurança comum, indispensável ao surgimento de um mundo multipolar harmonioso.
Tendo tido em tantas ocasiões, no decorrer da nossa historia, de lutar pela nossa liberdade, a vossa pátria e a minha conhecem o preço da paz A paz, que está no âmago do projecto europeu A paz, em primeiro lugar, no nosso continente, mas também a paz que devemos ajudar a construir em todo o mundo Por isso, portugueses e franceses desejam dotar a União Europeia dos meios que lhe permitam agir quando julgarem necessário, quando os seus interesses estiverem em jogo, quando os seus ideais humanistas estiverem ameaçados
Sei muito bem que serão necessários tempo e perseverança. Mas este ano, com a implementação do Tratado de Amesterdão e a próxima Cimeira que marcará o cinquentenário da Aliança Atlântica, poderão ser realizados progressos significativos.
No âmbito de uma parceria transatlântica mais forte em virtude de um maior equilíbrio, a Europa da defesa poderá ser construída sobre a pedra fundamental que representa a declaração franco-britânica de Saint-Malo Regozijo-me pelo acolhimento favorável que lhe foi reservado em Lisboa, como nas outras capitais europeias Doravante, deveremos agir todos juntos para que a União Europeia possa desempenhar plenamente o seu papel na solução das crises que a afectam
Compartilhando uma mesma visão de um mundo mais justo e em paz, portugueses e franceses deverão, por fim, trabalhar de mãos dadas no plano internacional
Há mais de cinco séculos, Portugal tem exercido, graças à sua vocação marítima, a sua influência no mundo Ao longo da História, tem tecido laços privilegiados com numerosos países e tem um papel importante a desempenhar no concerto das nações.
Assim, o vosso país tem acolhido e dirigido, nestes últimos anos, grandes encontros internacionais, como a Cimeira da OSCE e a Conferência Ministerial da NATO Assim, 1998 foi um ano marcado, com brilhantismo, pelo vosso interesse pelas questões mundiais A Exposição Internacional de Lisboa constituiu um acontecimento internacional excepcional Para alem do seu tema, o dos Oceanos, sem dúvida crucial para o nosso planeta, constituiu uma ocasião que possibilitou encontros e diálogos políticos, manifestações internacionais, como a primeira Conferência Mundial dos Ministros da Juventude, ou a Reunião de Ministros Europeus do Meio Ambiente, que permitiram que fossem abordados os grandes desafios do futuro.
A vossa voz é ouvida nas grandes instâncias internacionais e nomeadamente nas Nações Unidas A vossa participação nas operações de manutenção da paz e a vossa recente presença no Conselho de Segurança salientam o vosso papel de actor fundamental e dinâmico na gestão das grandes crises com que se depara a comunidade internacional
Em primeiro lugar, nos Balcãs, onde os nossos soldados estão empenhados ombro a ombro, devemos, com todos os nossos parceiros da Europa e da Aliança, unir os nossos esforços, como já fizémos na Bósnia, para extinguir, no Kosovo, um incêndio que ameaça cada vez mais estender-se ao conjunto da região Para que a democracia e o respeito pelos direitos do homem terminem por vencer a agressão e o terror
Em segundo lugar, em África, nesta África que Portugal e França conhecem tão bem e que tão sinceramente amam Como sabem, a França tem-se empenhado, há muitos anos, num esforço de renovação da sua relação com África, para a instauração de uma relação de fidelidade e abertura A época dos territórios isolados pertence ao passado Portugueses e franceses, que exerceram responsabilidades em África e que se preocupam com o seu futuro, devem unir os seus esforços para contribuir para uma maior estabilidade, num continente muitas vezes dilacerado pelos conflitos, pelas lutas étnicas e pela fragilidade dos Estados Preocupa-me em particular a região dos Grandes Lagos, mas também Angola, que havia iniciado o processo de reconstrução nacional, que havia retomado a confiança e que, no entanto, voltou a sofrer a violência dos combates Devemos juntos sustentar com todas as nossas forças o processo de paz angolano, conclamando à estrita observância do protocolo de Lusaka Juntos ainda

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devemos acompanhar os esforços de reconciliação na Guiné-Bissau e a França está determinada a permanecer de mãos dadas com Portugal nesta situação tal como em outras.
A paz, por conseguinte, mas também o desenvolvimento da Afinca Portugal e França estão convencidos de que a solidariedade internacional é mais do que nunca necessária Por esta razão, os nossos respectivos países militam pela manutenção da ajuda publica ao desenvolvimento, sem a qual não pode haver nem justiça nem progresso.
Saúdo a iniciativa tomada pelo vosso Governo de reunir no próximo ano a primeira cimeira entre a África e a União Europeia.

Aplausos do PS e do PSD

A França esta ao vosso lado para o sucesso deste encontro dos nossos dois continentes.
Mas a História propõe um outro grande encontro à União Europeia Desta vez com a América Latina, que está a afirmar se como um dos pólos do mundo de amanhã. Uma América Latina em que Portugal conservá-la os muito estreitos muito fortes ilustrados aquando da recente cimeira do Porto e onde a França está presente, através dos seus departamentos ultramarinos das Caraíbas e da Guiana Por proposta de Espanha, de Portugal e de França será realizada no próximo mês de Junho, no Rio de Janeiro, em terra de expressão portuguesa, a primeira cimeira entre os Chefes de Estado e de Governo da União Europeia, da América Latina e das Caraíbas Preparemos juntos o seu sucesso nas áreas política, económica e cultural!
Na Asia também podemos fazer progredir a solidariedade a justiça e a paz Nesta Asia, em cuja direcção se lançaram outrora os vossos navegadores em que a Franca esteve durante tanto tempo presente e em que Portugal continua a exercer responsabilidades directas Mais do que nunca devemos sustentar os esforços empreendidos, sob a égide do Secretario Geral das Nações Unidas, para que seja enfim dada ao doloroso problema de Timor Leste uma solução aceitável por todos e conforme às aspirações legitimas dos habitantes desse território

Aplausos gerais

E enfim juntos que devemos lutar a escala mundial, em todas as instâncias internacionais contra os grandes flagelos do nosso tempo os ataques ao meio ambiente, as grandes endémicas o terrorismo, o crime organizado, os tráficos de droga o branqueamento de dinheiro Estes males que gangrenam as nossas sociedades, comprometem o futuro dos jovens. É neste espírito que quero saudar aqui em Lisboa os esforços que tem empreendido o Observatório Europeu das Drogas e das Toxicomanias.

Aplausos do PS e do PSD.

No fundo Exmo. Sr. Presidente Senhoras e Senhores, portugueses e franceses assemelham se muito Somos duas velhas Nações vinte as mais antigas da Europa, que muitas vezes lutaram pela sua independência Somos dois povos que sempre combateram pela sua liberdade Somos duas almas irresistivelmente atraídas pela imensidão dos mares e do mundo dois focos de civilização que espalharam pelo mundo.
Compartilhamos esta sensibilidade, este sentimento latino que nos faz amar as mesmas coisas e aspirar aos mesmos ideais Estamos de acordo no que respeita ao essencial o homem, a sua liberdade, a sua dignidade, o seu lugar na nossa sociedade, o seu futuro no âmbito da globalização
Temos a mesma preocupação em fazer com que esta globalização, cujas oportunidades avaliamos bem, mas igualmente os riscos, seja para todos uma grande sorte.
Herdeiros de duas grandes culturas e de duas línguas partilhadas nos cinco continentes, estamos determinados a combater pela diversidade linguística e cultural, face ao perigo da uniformização

Aplausos do PS, do PSD, do CDS-PP e de Os Verdes.

Ora bem, Senhoras e Senhores, Meus Caros Amigos, esta proximidade, esta fraternidade devem ser postas ao serviço das causas que nos são primordiais em primeiro lugar, a da Europa, a Europa dos homens, a Europa dos jovens, a Europa do coração, com este suplemento de alma que queremos lhe conferir Ponhamo-las ao serviço do mundo, no qual devemos agir juntos para que milhões e milhões de mulheres e homens deixem de viver sob o medo, a miséria, a doença e a desgraça
Esta é a minha ambição para a amizade profunda, antiga, permanente entre os nossos dois povos Unidos e mobilizados, Portugal e França devem fazer progredir a sua visão comum da Europa bem como a sua visão comum do homem e do mundo

Exmo. Sr. Presidente, Senhoras e Senhores, muito obrigado.

Aplausos gerais, de pé.

O Sr. Presidente - Muito obrigado, Sr. Presidente, por esta importante intervenção.
Srs. Deputados e Srs Convidados, a nossa sessão solene, que fica memorável, termina aqui Muito obrigado a todos por terem estado connosco
Declaro encerrada a sessão de recepção ao Sr. Presidente da República Francesa.

Eram 16 horas e 50 minutos

Srs. Deputados, vamos reiniciar a ordem de trabalhos de hoje.

Eram 17 horas e 50 minutos.

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, o Sr. Secretario vai proceder à leitura do expediente

O Sr. Secretário (Artur Penedos): - Sr. Presidente e Srs Deputados, foram apresentados na Mesa vários requerimentos No dia 26 de Janeiro de 1999 ao Governo e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, e aos Ministérios do Ambiente e da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Na reunião plenária de 27 de Janeiro de 1999 a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado António.

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Saleiro, ao Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território, formulados pelos Srs Deputados Jorge Valente e Lino de Carvalho, ao Ministério da Educação, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Moreira, aos Ministérios da Saúde e da Educação, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares, aos Ministérios da Defesa Nacional e da Administração Interna, formulados pelo Sr. Deputado João Amaral, e ao Ministério da Justiça, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro
O Governo respondeu aos requerimentos apresentados por diversos Srs Deputados No dia 1 de Fevereiro de 1999 Cláudio Monteiro, na sessão de 27 de Março, Sérgio Vieira, na sessão de 8 de Outubro, Luís Queiró, no dia 20 de Outubro, António Filipe, na sessão de 11 de Novembro, e Bernardino Soares, na sessão de 8 de Janeiro
No dia 2 de Fevereiro de 1999 Octávio Teixeira, na sessão de 18 de Setembro, Isabel Sena Lino, na sessão de 12 de Novembro, Filomena Bordalo, na sessão de 19 de Novembro, e Jorge Valente, na sessão de 2 de Dezembro

O Sr. Presidente: - Srs Deputados, vamos dar início ao debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre a situação do sector suinícola em Portugal, uma vez que não há nem declarações políticas nem pedidos de palavra para tratamento de assuntos políticos relevantes
Para iniciar o debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados O Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas mudou de Ministro, seria, assim, admissível esperar uma mudança de política
Mas se alguém tinha ilusões já as perdeu. No Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas parece que só existem duas mudanças possíveis ou de mal a pior ou tudo fica na mesma.
Disse, há tempos, nesta Assembleia, que o Governo só não extingue a agricultura por decreto porque não o pode fazer, afirmo hoje que, nessa impossibilidade, vai assistindo sem nada fazer para evitar a sua extinção, pelo que o resultado será o mesmo, só que a morte por esta forma e mais lenta e, consequentemente, o processo é mais doloroso para as vitimas - os agricultores
Fui eleita Deputada pelo distrito de Santarém, sou natural e residente no concelho de Rio Maior, onde a suinicultura e, como todos sabemos, a principal fonte de riqueza dos seus munícipes e, por conseguinte, a actividade económica que garante, ou garantia, a sobrevivência de muitas famílias Por isso, desde o início da crise da suinicultura, há mais de seis meses, tenho assistido, naturalmente com maior apreensão do que muitos de vós, à evolução da mesma
A suinicultura representa 18% do PIB agrícola e todas as actividades que a montante e a jusante faz movimentar permite nos afirmar que o sector representa cerca de 12% da economia nacional.
Com uma agricultura totalmente endividada e debilitada, cada dia mais dependente de Bruxelas e cada vez mais ignorada e desprezada, ontem como hoje, seria de esperar que o Governo de Portugal impedisse agora a morte desta actividade estratégica e competitiva do sector, como é a suinicultura Mas, para já, só a fé, a coragem e a persistência daqueles que ainda laboram no sector primário nos resta.
E se assim continuarmos, um dia a história da política agrícola da governação socialista será muito fácil de escrever, bastarão apenas as seguintes duas frases o Sr. Ministro Gomes da Silva comeu mioleira, mas não resolve o problema da BSE, o Sr. Ministro Capoulas Santos assistiu e não impediu à morte de uma das poucas actividades competitivas do sector primário - a suinicultura

Vozes do CDS-PP - Muito bem!

A Oradora - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Sr.ªs e Srs. Deputados: Não podemos, nem queremos, ser coniventes com esta passividade a que assiste, face à crise agrícola nacional, o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e recusamo-nos a assistir a mais uma machadada no sector agrícola português e ao possível aumento dos pedidos de rendimento mínimo garantido a que a falência dos agricultores levará, se nada for feito para o evitar
Solicitámos este debate de urgência, não para ouvir o Sr Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas falar de um país virtual, não para ouvir o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas dizer, como disse, que está tudo resolvido na suinicultura, anunciando alegremente medidas que nada resolvem e deixam cada vez mais tudo na mesma
Solicitámos este debate de urgência porque queremos que ele seja consequente e, por isso, exigimos ao Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas que actue e que mostre o mesmo respeito, a mesma solidariedade e a mesma protecção da produção nacional, tal qual o fazem os seus parceiros europeus
Assim sendo, entregaremos hoje na Mesa um projecto de resolução, para o qual contamos, obviamente, com o apoio de todas as bancadas desta Assembleia, e exortamos o Governo a pô-lo em prática.
Em primeiro lugar, pedimos um apertado sistema de fiscalização permanente, 24 horas por dia, relativamente à entrada em Portugal de porcos vivos, carne e produtos de carne de qualquer proveniência.
É para nós incompreensível, quando somos confrontados com notícias da imprensa estrangeira, nomeadamente francesa e espanhola, que nos dão conta do apertado controlo que está a ser feito à entrada de carne de qualquer proveniência nos respectivos países e que vão ao ponto de nos informar que há ordens governamentais para que esse controlo seja de tal ordem rigoroso que deverá ir ao pormenor da velocidade dos veículos transportadores, enquanto Portugal continua a ser um passador de malha larga onde tudo passa e nada é controlado

Vozes do CDS-PP - Muito bem!

A Oradora: - Por isso, Sr. Ministro, em matéria de fiscalização, o que lhe pedimos é muito simples e muito rosa tolerância zero

Vozes do CDS-PP - Muito bem!

A Oradora: - Em segundo lugar, exortamos o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas a apresentar no próximo Conselho de Ministros da Agricultura um plano de ajuda e relançamento do sector suinícola português
Todos sabemos que Portugal produz menos de 30% da carne de porco que consome Se a crise deriva de uma

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produção comunitária excedentária, por que razão Portugal, que não contribuiu para a crise, está a ser vitima dela e com isso a assistir à ruma de um importante sector produtivo?
Pela mesma razão, exortamos ainda o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas a apresentar junto da União Europeia um pedido de abertura imediata de uma intervenção publica, como está previsto na OCM da carne de porco, e que, apesar da crise, ainda não coaccionado
Finalmente, exortamos o Governo a pôr em prática em Portugal, de imediato, um conjunto de ajudas fiscais, tal como o fizeram os demais países europeus, designadamente a França e a Espanha, e, entre elas, a suspensão da aplicação da taxa social única a todos os suinicultores e trabalhadores do sector, por um determinado período de carência até à superação da crise.
O Governo nem sequer precisa de ter muita imaginação, basta fazer o que fazem os seus parceiros europeus
O sector suinícola português esta a ter um prejuízo mensal da ordem dos 2 milhões de contos, o preço do porco na Bolsa esta muito abaixo do seu custo de produção e, a par de tudo isto, os suinicultores portugueses vêem ainda os seus concorrentes europeus a receber ajudas directas dos respectivos governos
Neste quadro de concorrência desleal, por um lado, e impossível, por outro, só há duas soluções possíveis ou o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas mostra que existe e tem o pulso e a coragem necessária para defender, como é seu dever, os produto rés nacionais, ou, então, diga, cara a cara aos portugueses, aqui e agora nesta Assembleia, que já não manda nada e que o «Governo rosa» não consegue cumprir o que prometeu pelo que a falência do sector e inevitável e, assim sendo o melhor que os suínicultores têm a fazer é irem para casa e «arrumarem as botas».

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Helena Santo deixe me que lhe dê as boas vindas pelo seu regresso a Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas ou as questões de política agrícola E sempre bem vinda!
Mas deixe me também que lhe diga que o agendamento deste debate para hoje da iniciativa aparente do PP, parece me estar na sequência da assinatura do acordo de bases programáticas que o PP e o PSD fizeram recentemente para a constituição da AD

O Sr. Luis Queiró (CDS -PP): - Fale de agricultura!

O Orador: - Ora, isso pode motivar alguma perplexidade!
Quanto a atitudes e a declarações dos lideres desta AD, não restam duvidas do seu cariz demagógico Lembramos a visita do Professor Marcelo a uma exploração de suinicultura no dia 29 de Dezembro o aparato e as declarações, lembramos as afirmações do Dr. Paulo Portas, tempos antes, sobre os problemas da agricultura, quando exigiu 100 milhões de contos mesmo depois de as organizações de agricultores concordarem com a razoabilidade das medidas e dos montantes aprovados pelo Governo.
Apesar das promessas, o PSD não tomou qualquer iniciativa nesta Assembleia, o PP sim, donde concluo que as questões de agricultura, no âmbito da AD, são com o Partido Popular Ora, isto é preocupante! Primeiro, porque não se sabe quem é quem nestas questões No PP, não sabemos quem é quem, quem responde pelas questões de agricultura, no PSD, cada ano temos um porta-voz - o Professor Lynce de Fana o Engenheiro Sevinate Pinto
No que respeita às bases programáticas da AD, ainda é mais preocupante é que a AD esqueceu-se das questões europeias, como diz o Deputado Durão Barroso E, então, sou levado a questionar a Sr.ª Deputada Helena Santo sobre o seguinte sabendo nós que a política agrícola comum e a primeira política comum da Comunidade Europeia, estaremos, então, perante uma AD contrária à PAC?

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - É a favor dos agricultores!

O Orador: - A esta ou a outra? Uma AD a favor da renacionalização da PAC? Uma AD a duas vozes nas questões de política agrícola?
E não apele da tribuna, Sr.ª Deputada, a que tomemos atitudes irresponsáveis Hoje, noticia-se que a Comissão Europeia obriga o Governo português a repor 3 milhões de contos, por irresponsabilidade do PSD num ano de eleições

O Sr. José Junqueiro (PS): - Muito bem!

O Orador: - Nós não vamos por esse caminho! Além disso, Sr.ª Deputada, a esperança mantém-se no sector da agricultura Naturalmente que a fotografia que vou exibir com as palavras «Renovar a agricultura, Modernizar Portugal», na apresentação de um programa para jovens agricultores, é bem a confirmação de que a agricultura e os agricultores ainda podem ter esperança neste Governo e no seu Ministro

Aplausos do PS.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - E a pergunta?!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santos.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado António Martinho, V. Ex.ª deu-me as boas-vindas porque regressei às questões agrícolas. Mas eu nunca saí delas, Sr. Deputado. Não é necessário estar na Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas para falar de agricultura Portanto, o Sr. Deputado ainda, de facto, um pouquinho distraído!
Mas a sua distracção até podia passar despercebida, mas não! O Sr. Deputado falou aqui de tudo menos de um problema muito grave, que é o problema com que se estão a debater os suínicultores. O Sr. Deputado falou, de facto, de coisas, tal como costuma fazer o seu Governo, mas esqueceu-se do essencial, e o essencial é a agricultura e, neste caso, a suinicultura

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Deputado, a situação de que lhe falo e para a qual o seu Governo se tem mostrado impotente e

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por isso vim falar, novamente, sobre agricultura, está bem patente em notícias de jornais, como este que tenho à minha frente e que vou mostrar-lhe, porque este é o país real, é para esse que temos de falar e é com esse que temos de nos preocupar
Sabe o que é que está a acontecer na minha terra, no Ribatejo? O que está a acontecer é que os suínicultores estão a pôr à venda, estão a oferecer a menos de metade do custo de produção as suas explorações suinícolas. E sabe por quê? Porque não têm dinheiro para as alimentar, porque não têm dinheiro para fazer face a esta crise.
De facto, é lamentável que a única preocupação que o senhor tem, como Deputado responsável na Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, sejam questões de natureza política, quando o que está em causa neste momento é uma questão política mas é uma questão da política agrícola do Governo, da política suinícola do Governo, que não tem existido e que está a atirar para a ruína, para a fome e para a miséria um importante sector estratégico, que é a suinicultura em Portugal

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, o senhor não devia ser conivente com isso, devia ter a coragem de erguer a sua voz contra esta política de omissão, porque outros socialistas já o fizeram O Presidente da Câmara de Rio Maior, por exemplo, que é socialista, mostrou-se, esteve na manifestação ao lado dos suínicultores e está preocupado com eles. Sabe por quê, Sr. Deputado? Porque, se calhar, vive lá no seu concelho O Sr. Deputado, mesmo sendo socialista, devia ser essa postura
Como não me fez qualquer pergunta, apenas me limito a enquadrá-lo no problema que estamos aqui a analisar O debate que estamos a levar a cabo é um debate muito seno, e um debate muito preocupante e tivemos de tomar esta atitude porque o Ministério da Agricultura, apesar de ter mudado de ministro, não conseguiu mudar de política E isso que nos preocupa.
Por isso viemos aqui exortar o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas a mudar de política e contamos com a sua colaboração, porque sabemos que o senhor e um homem preocupado com as questões da agricultura, mas talvez ande um pouco distraído neste momento

Aplausos do CDS-PP

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, encontram-se a assistir a esta sessão um grupo de alunos da Escola Secundaria de Viriato, de Viseu, além de um grupo de cidadãos para quem peço a vossa habitual saudação

Aplausos gerais de pé.

Srs. Deputados informo que a Mesa tomou a decisão de diferir para as 19 horas as votações, uma vez que estão ainda a ser preparados os respectivos guiões
Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados. Estamos hoje aqui a discutir um assunto sério e importante para o País O sector agrícola e o mundo rural passam por uma crise gravíssima, de consequências eventualmente desastrosas para o futuro de Portugal E, nós, como câmara política, como órgão de soberania, temos de pensar no Portugal que queremos para o futuro

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Nos últimos três anos, assistimos ao abandono a que este Governo votou a agricultura e o mundo rural, em Portugal O Governo negoceia mal em Bruxelas e não tem política a nível interno

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não apoiado!

O Orador: - Podíamos falar do drama dos produtores de bovinos, que, perante a incapacidade demonstrada e a humilhação sofrida por Portugal, em Bruxelas, em Setembro passado, ficaram sujeitos a um embargo.
Podíamos falar dos produtores de vinho, de cereais, de frutas e legumes, que foram afectados pela calamidade climatérica ocorrida em 1998, causadora de prejuízos na ordem das dezenas de milhões de contos e em relação à qual o Governo não tomou medidas.
O rendimento agrícola dos produtores caiu, em 1997, 13,7% e, em 1998, acresceu uma quebra de 13% É do drama destes cidadãos que temos de falar!
Quanto à suinicultura, reconhecemos a importância estratégica deste sector na economia nacional Conhecemos o esforço de investimento que os suinicultores portugueses fizeram, durante 10 anos, para conseguir ter condições de bem-estar para os seus animais e condições de tratamento dos efluentes, para modernizar as suas explorações e para ser competitivos no mercado europeu e mundial E tudo isto à custa do seu próprio esforço, mas apoiados pelo Governo da altura e pela Comunidade Europeia
Porém, no ano passado, Srs Deputados, assistimos a uma quebra brutal dos preços eles desceram para menos de metade em relação aos que eram praticados no início do ano! E esta situação foi evoluindo, perante a passividade e o silêncio do Governo, que marginalizou este problema

O Sr. José Magalhães (PS) - Não apoiado!

O Orador - Nós fomos alertando o Governo e, como grupo parlamentar, exigindo medidas Exigimo-las, em Outubro, exigimo-las, durante a discussão do Orçamento do Estado, em Novembro, exigimo-las, em Dezembro.
Depois de todas estas reivindicações dos suinicultores, apoiadas por vários grupos parlamentares desta Assembleia, o Governo veio anunciar medidas em Dezembro, que, como todos sabemos, não tiveram qualquer eficácia nem impacto a nível do sector, nem contribuiram para resolver esses problemas
Em relação a algumas dessas medidas, lamentavelmente, nem sequer há impressos para os suinicultores se candidatarem E relativamente a outras, como o crédito, os suinicultores dirigem-se à banca e ao IFADAP e, aí, ninguém lhes sabe dar respostas, mesmo depois de os diplomas terem sido publicados há várias semanas Isto demonstra a desorganização e o caos, mas também que este Governo não olha para a agricultura Este Governo precisa de aumentar as dioptrias dos seus óculos, de forma a conseguir ver, para além do Terreiro do Paço, o País real, o drama por que os portugueses do mundo agrícola e do mundo rural passam, neste momento, e entender que eles precisam de uma palavra e de medidas concretas da parte do Governo

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Aplausos do PSD

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs Deputados O preço da carne de porco caiu brutalmente no ano passado Ora, depois de o Governo anunciar medidas em Dezembro, aconteceu que, devido a uma situação conjuntural - e só a isso - de aumento do consumo e de algum receio por parte de operadores externos de entrar no mercado interno, o preço aumentou conjunturalmente. E, aí, o Governo veio, publicamente, dizer que esses eram os reflexos positivos das medidas tomadas pelo Governo Só que, entretanto, mais precisamente este mês, o preço caiu mais 30%. E esta queda, sim, é fruto daquilo que foi a ineficácia das medidas tomadas pelo Governo
Por isso, é fundamental que sejam tomadas medidas o mais rapidamente possível Já deviam tê-lo sido, há um mês, já deviam tê-lo sido ontem, mas, pelo menos, que o sejam hoje
Em Portugal, as consequências desta crise são mais graves que nos outros países comunitários É que, em Portugal, os produtores de suínos viram aumentar os seus custos de produção, pois, devido ao embargo decretado pela União Europeia, não podem ser incorporadas nas rações para os suínos as farinhas de carne com a proteína dos ruminantes E sendo as rações dos suínos portugueses mais caras que as farinhas dos produtores espanhóis, compreende-se a redução de competitividade da suinicultura nacional.
Mas se o Governo português proibiu a incorporação de farinhas de carne nas rações para os suínos para defender a saúde pública dos portugueses - e julgamo-lo correcto, depois do caso desastroso da BSE -, então, como se compreende que, à entrada da fronteira portuguesa, não exijam que os animais tenham um certificado de que a sua alimentação não teve por base farinha de carne? É que acontece os consumidores portugueses verem, muitas vezes, os seus espaços comerciais inundados de carne de outros países, cujos animais foram alimentados com farinha de carne Essa era uma exigência que deveria ter sido implementada
E importante referir que Portugal produz cerca de 70% do que consome, pelo que não e responsável pelos excedentes criados a nível da Comunidade
Por isso, perante esta situação catastrófica, era importante, era exigível e o bom senso pedia que houvesse medidas concretas!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Não vamos pedir aquilo que era necessário, aquilo que fanamos se fôssemos poder, vamos pedir o mínimo

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - e por isso interpelamos o Governo nesse sentido Srs Membros do Governo, se um produtor de bovinos, ovinos ou caprinos tem, a custa de negociações levadas a cabo pelo Governo anterior, as acções sanitárias comparticipadas por fundos nacionais e comunitários, por que e que o produtor de suínos tem de suportar integralmente os custos inerentes à sanidade animal, custos que rondam os 15 milhões de contos/ano e que poderiam e deveriam ser apoiados por fundos comunitários? Exigimos que sejam criados agrupamentos de defesa sanitária para os suínicultores, de forma a que esses custos sejam reduzidos

Aplausos do PSD

Exigimos que, perante uma situação destas, o Governo tome medidas para manter o potencial genético do nosso efectivo Fruto de um trabalho de longos anos, os nossos suínicultores conseguiram que os seus suínos tenham um potencial genético que lhes permite ser competitivos nos mercados europeu e mundial, mas, se não forem tomadas medidas, esse potencial, porventura, será delapidado. Exigimos, pois, que seja atribuído um subsídio por cada um dos reprodutores, de forma a que esse potencial seja mantido
É importante, Srs Membros do Governo, que haja um plano de fiscalização eficaz - e não o «teleporco», para onde se liga e se fala com um segurança - e articulado com todas as entidades Um plano em que haja um controlo sanitário dos animais e do sémen importados e uma fiscalização das condições de bem-estar no transporte dos animais - se um animal vem de Espanha ou de França, tem de se saber se o transporte foi feito nas condições a que as legislações nacional e comunitária obrigam e, actualmente, isso não se faz

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - É importante que haja também fiscalização em relação às condições de higiene no transporte de carnes para consumo, principalmente das carnes importadas.
É importante que haja cumprimento das regras de classificação das carcaças e um reforço das acções de inspecção sanitária, nomeadamente ao nível da inspecção ante-mortem
É necessário que haja uma revisão das autorizações concedidas a operadores intracomunitários e uma fiscalização das suas actividades
Era importante que fosse exigido, à entrada da fronteira, um certificado, relativamente aos animais para abate, de que foram alimentados com rações que não tinham na sua composição farinha de carne, para defender a saúde pública dos portugueses

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O PSD entende que se deve promover a adopção de medidas, a nível da União Europeia, destinadas à regularização do mercado e recuperação dos rendimentos aos suinicultura, nomeadamente através de uma intervenção pública, prevista na OCM da carne de porco, que o Governo pode imediatamente fazer, mas que, infelizmente, não tem feito Era fundamental a atribuição de um prémio ao abate precoce de leitões
Este é um conjunto de medidas que entendemos necessárias e urgentes e que deixamos ao critério desta Câmara
Apelamos ao Governo para que olhe para o País, olhe para os portugueses, e dê uma resposta a esta situação dramática que existe a nível do país agrícola e do mundo rural.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Satisfazendo as solicitações de alguns Srs. Deputados, as votações realizar-se-ão às 18

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horas e 30 minutos e não às 19 horas, como anteriormente anunciei, pelo que, dentro em breve, accionarei a campainha.
Não sei se todos os Srs Deputados já têm conhecimento de que o nosso colega Deputado Nuno Abecasis teve um grave problema de saúde, que exigiu internamento na Clínica de Santa Cruz, sendo o seu estado clínico reservado.
Creio que interpreto o sentimento de todos vós transmitindo à bancada do CDS-PP, nomeadamente ao seu líder, Deputado Luís Queiró, a nossa apreensão com a saúde do Sr. Deputado Nuno Abecasis e o nosso desejo de um rápido e completo restabelecimento

O Sr. José Magalhães (PS) - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Srs. Deputados Os produtores portugueses, sobretudo os pequenos produtores suinícolas, estão a pagar a factura de uma crise para a qual não contribuiram, mas que os afecta de uma forma dramática.
Com efeito, os excedentes de produção na União Europeia, situados próximo de l milhão de toneladas, tendo como causa próxima, por um lado, a crise asiática e o afundamento do mercado russo, principais clientes da União, e, por outro, os preços atractivos do passado recente que levaram ao aumento da produção, criaram as condições favoráveis para o assalto ao mercado nacional e provocaram uma crise num sector já de si débil, com dificuldades de escoamento e com preços na produção abaixo dos preços de custo - isto apesar de a produção nacional satisfazer apenas 70% das necessidades do consumo.
A produção nacional rapidamente foi substituída por importações sem qualquer controlo, quer de qualidade, quer de condições higio-sanitánas, o que tem constituído um verdadeiro descalabro.
As políticas neste sector e uma visão ultraliberal dos mercados por parte do Governo conduziram, inevitavelmente, a suinicultura, em Portugal, a uma crise profunda, que poderia ter sido minimizada com mecanismos públicos de regulação que o Governo não quis aplicar e cujos resultados são bem visíveis.
Os preços da carne de suíno caíram drasticamente para os produtores, mas os consumidores continuam a comprá-la a preços quase iguais aos que anteriormente eram praticados.
A crise vivida no sector suínicola só agora foi descoberta pelo CDS PP, ao propor este debate,

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - ...mas o PCP desde há muito que alertou para esta situação e propôs uma série de medidas que, se tivessem sido levadas à prática, contribuiriam certamente para uma melhoria das condições no sector

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E aqui, na Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP tez eco dessas mesmas medidas aquando da vinda do Sr. Ministro da Agricultura, do
Desenvolvimento Rural e das Pescas para anunciar as medidas governamentais para o sector.
Afirmámos na altura, e reafirmamos hoje, que as medidas tomadas pelo Governo foram tardias e insatisfatórias e que, na prática, em nada se traduziram para os produtos portugueses não, vejamos.
As ajudas à armazenagem em nada beneficiaram os suinicultores portugueses, porque não somos excedentários na produção.
Os apoios à exportação para a Rússia também não se traduziram em qualquer resultado positivo.
A redução dos custos de alimentação dos suínos, através da transferência para Portugal de 100 000 t de cevada forrageira dos stocks de intervenção comunitária, ainda não foi disponibilizada, mas, mesmo que o fosse, era um apoio reduzido, na medida em que é um componente diminuto na dieta alimentar dos suínos
A linha de crédito ainda não está a funcionar, pois tem a data de relançamento, feito pelo IFADAP, de 15 de Janeiro de 1999, e, por outro lado, a banca quase recusa a negociação com os suinicultores
Podemos perguntar que banco quer emprestar dinheiro a quem não oferece garantias e está quase na falência?
Quanto à fiscalização, que medidas práticas é que têm sido tomadas para evitar a importação sem qualidade ou em deficientes condições?
O único embargo conhecido aconteceu quando o Sr. Ministro esteve presente numa operação de fiscalização.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Depois disso, nada mais se ouviu falar - se o Sr. Ministro tiver números referentes a esta matéria, deverá dá-los a conhecer, porque, até agora, não foram apresentados nem por V. Ex.ª nem pela comunicação social -, isto quando a importação de animais vivos triplicou, atingindo, no período de 14 a 27 de Dezembro de 1998, um pico de 45 759 animais vivos para abate oriundos de Espanha e numa altura em que a bolsa do porco atingiu os preços de 245$/kg
Nessa altura, o Sr. Ministro da Agricultura anunciou, na comunicação social, que o pior tinha passado, mas, afinal, cerca de um mês depois, a situação alterou-se para pior e o preço caiu novamente para 185$/kg

O Sr. Lino de Carvalho (PCP) - Muito bem!

O Orador: - O que o Governo deveria ter feito, mas não fez, era ter a coragem política de promover o apoio directo aos produtores através de políticas concretas, como o fizeram os espanhóis e os franceses, que apoiaram os produtores de suínos com ajudas directas às perdas de rendimento.
Às solicitações dos agricultores o Governo respondeu que estava impedido de o fazer pelos normativos comunitários Mas, então, os espanhóis e os franceses também não estão a isso obrigados?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Srs. Deputados: Os pequenos produtores são os que mais sofrem com esta situação, a que urge pôr cobro rapidamente, porque cada crise grave na suinicultura transforma-se num processo de liquidação das pequenas explorações

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O Governo do Partido Socialista tem particulares rés possibilidades sobre esta matéria, por isso, desafiamos o Sr. Ministro da Agricultura que esta presente, a dizer aqui hoje, quais as medidas urgentes que vai tomar para auxiliar a suinicultura portuguesa nomeadamente as pequenas explorações.
Da parte do Grupo Parlamentar do PCP ontem como hoje estamos disponíveis para encontrar soluções que vão ao encontro das necessidades reais sentidas no sector

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente - Para uma intervenção tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Amândio.

O Sr. Carlos Amândio (PS): - Sr. Presidente, Srs Membros do Governo Sr.ªs e Srs Deputados Em 1998 grande parte do sector suínicola nacional acabava de se recompor do endividamento provocado pela crise do sui no em 1991 e do estorno acrescido provocado pela antecipação em três anos do levantamento das medidas transitórias para adesão a União Europeia.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Apesar de poder beneficiar da generalizada baixa das taxas de juro fruto da política macroeconómica deste Governo o sector apresentava algumas debilidades malgrado os apoios governamentais concedidos desde 1995 e 1996 nomeadamente no âmbito do PROAGRI entre 1995 e 1998 um apoio de 15 milhões de contos aos agrupamentos de produtores, desde 1996, o subsidio em 40% da facturação da electricidade consumida nas explorações também desde 1996 a existência de uma linha de credito de curto prazo com bonificação a 20% e um plafond de 34 contos por porca.
Estas medidas enquadravam se no Programa Eleitoral do PS e no Programa do Governo A estratégia era ajudar o sector a ser forte e competitivo com mecanismos próprios que permitissem suportar as exigências do mercado

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Entretanto o grande aumento na procura de carne de porco verificado nos últimos anos na sequencia da crise da BSE motivou em toda a União Europeia o correspondente incremento da produção
Por outro lado a crise financeira recentemente agudizada na Rússia principal consumidor externo dos produtos derivados dos suínos produzidos na União Europeia provocou a quebra bruta de cerca de 30% no volume das exportações
A crise resultante do excesso de produção veio, assim, apanhar a maioria das nossas explorações em fase de consolidação com escassos fundos de maneio e em grande parte dos casos ainda com enormes carências organizativas e de estratégia
A constante descida dos preços oferecidos a produção respondeu o Governo com as medidas que são já sobeja mente conhecidas contidas na estreita margem de manobra que nos e permitida pelo cumprimento das regras comunitárias
Destas medidas e de relevar o notável esforço feito no aumento da fiscalização A acção levada a cabo por brigadas conjuntas da Direcção Geral de Veterinária e da Direcção Geral da Fiscalização e Controlo da Qualidade.
Alimentar cifra se, nos últimos dois meses, em mais de 1500 operações, incidindo sobre mais de 8*5 000 suínos e 6 000 t de carne, das quais resultaram apreensões de quase um milhar de animais vivos e mais de uma centena de toneladas de carne

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Não atendida pela Comissão Europeia ficou a pretensão do Governo português, que visava accionar o regime de intervenção pública, mecanismo previsto na OCM do sector suínicola.
Estas medidas vieram, no entanto, a mostrar-se insuficientes Apôs uma razoável subida nos preços, que tendia a equilibrar o custo/beneficio, os valores voltaram a cair sendo mesmo assim possível obter, em Portugal, 185$/kg, contra os 142$/kg conseguidos na nossa vizinha Espanha
Sr. Presidente, Srs Membros do Governo, Sr.ªs e Srs Deputados Pelas intervenções produzidas, podemos ver, nesta altura que há partidos que, mesmo na oposição, vêm aqui com uma postura e propostas positivas Outros, pelo contrario, põem se na posição de abutre, sempre interessados em enterrar apressadamente, em cima da carniça,

Aplausos do PS.

... que constitui, muitas vezes, o problema das populações, sem trazer aqui qualquer proposta nova
Por isso, Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados, temos consciência de que o sector suínicola vive, neste momento, horas difíceis A nossa preocupação tem em conta o peso que o sector tem, quer economicamente, garantindo cerca de 80% do auto-aprovisionamento no seu ramo, quer socialmente, onde as pequenas e médias explorações adquirem especial significado
Sabemos no entanto, que o Governo prepara já um conjunto de novas propostas para apresentar no Comité de Gestão Comunitário de 10 de Fevereiro Comungando inteiramente as preocupações daqueles que têm, no sector suínicola, a sua fonte de subsistência, aqui deixar-nos o nosso inequívoco apoio a todas as medidas, quer nacionais quer comunitárias, que o Governo consiga negociar e que visem a salvação deste sector primordial da economia portuguesa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas (Capoulas Santos): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Quero começar por saudar-vos É sempre com profunda satisfação e alguma emoção que participo nestes trabalhos e tenho uma satisfação redobrada por estar presente neste debate. Trata-se de uma questão de enorme importância nacional, diria mesmo que é uma daquelas questões para as quais eu supunha ser possível gizar um amplo consenso nacional, uma vez que o que está em causa é um importante sector da nossa economia e um grande numero de cidadãos portugueses que atravessam uma situação extraordinariamente difícil, para a qual pouco ou nada contribuiram, e que exigem, de Portugal e da União Europeia, a solidariedade que lhes é devida neste

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momento tão difícil, que espero que seja tão curto quanto possível.

O Sr. António Martinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Tendo sido solicitado para participar num debate sobre a situação da agricultura portuguesa, percebo, agora, que o mesmo se pretende centrar exclusivamente na crise da suinicultura de 1998, que se vai prolongando por este mês, Janeiro de 1999.
E, pois, sobre a questão concreta da suinicultura que irei pronunciar-me e não, como pretendia, sobre outras questões mais vastas, que têm a ver com o balanço de três anos da actividade governativa, o grau de execução do Programa do Governo e, sobretudo, a preparação do futuro, que, neste momento, está nas nossas mãos, na fase mais dura da negociação da reforma da política agrícola comum, a qual ocorrerá nas próximas semanas, em Bruxelas.
Sem duvida esta questão tem dignidade e importância para que, sobre ela, façamos um debate muito sério e tão profundo quanto possível A minha satisfação pela realização deste debate é, infelizmente proporcional ao desencanto que sinto neste momento, depois de ouvir as intervenções dos Srs. Deputados que me precederam Esperava que, hoje, aqui, para alem de uma posição de apoio à postura que o Governo terá, nos próximos dias, em Bruxelas, sobre esta matéria, os Srs Deputados - a Sr.ª Deputada do CDS-PP, Helena Santo, que falou em primeiro lugar, os Srs Deputados Carlos Duarte, Rodeia Machado e também os Srs Deputados da bancada socialista como e óbvio -, apresentassem propostas muito concretas para ajudar a resolver este problema No entanto os Srs Deputados não apresentaram uma única proposta.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

a excepção do Sr. Deputado Carlos Duarte.

Vozes do PSD: - Ah!

O Orador: - que apresentou uma proposta que nada tem a ver com o problema concreto com que nos debatemos neste momento.
O Sr. Deputado Carlos Duarte veio falar da genética dos suínos e num hipotético apoio a sanidade animal, esquecendo se que o seu partido esteve 10 anos consecutivos no governo e que teve tempo mais do que suficiente para adoptar medidas desta natureza.

Aplausos do PS.

Protestos do PSD

Sr. Deputado Carlos Duarte, não e sobre a genealogia nem a genética dos porcos que o País e os suinicultores presentes nesta Sala estavam a espera de ouvi-lo, mas, sim, sobre medidas concretas com as quais esta Câmara pode ajudar o Governo para que esta crise possa ser atenuada tão proximamente quanto possível
Srs. Deputados compreendo que, para quem tem um tal vazio de ideias haja uma total incapacidade de apresentar propostas concretas, que, aliás, nunca ninguém ouviu nestes últimos meses Quando a crise começou a revelar se e sobretudo quando ela se agravou, aquilo a que assistimos foi no pico da crise, tentarem politicamente cavalgá-la com intuitos políticos primários e inconfessáveis.

Aplausos do PS.

Srs Deputados, o Governo tem, sobre esta questão, uma postura.

O Sr. Sílvio Rui Cervan (CDS-PP): - Ainda não somos governo. Vamos ser governo, mas ainda não o somos!

O Orador: - Sr. Deputado, por aquilo que ouvi das «próteses» das vossas propostas, mal dos agricultores e da agricultura portuguesa se, alguma vez, esse seu desiderato pudesse vir a concretizar-se.
Srs. Deputados, esta é uma crise europeia - como aqui foi muito bem caracterizada pelo Sr. Deputado Rodeia Machado -, que só no plano europeu pode ter uma resposta adequada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Por isso, o Governo português tem apoiado, em Bruxelas, as medidas que a União Europeia já adoptou, tem criticado a Comissão e tem feito intervenções sucessivas, no Conselho e fora dele, para que medidas mais latas venham a ser aprovadas.
Se vai haver, no próximo dia 10 de Fevereiro, uma reunião do Comité de Gestão Comunitário, em Bruxelas - e não uma reunião do Conselho Europeu, como, certamente por lapso, a Sr.ª Deputada Helena Santo referiu à comunicação social -, muito se deve ao trabalho que o ministro português e outros colegas de diferentes países, entre os quais destaco particularmente o ministro francês, desenvolveram para que a Comissão recolocasse, na agenda, esta proposta
O Governo português irá defender, já no dia 10 de Fevereiro, o aumento das restituições à exportação em 25%,

O Sr. José Junqueiro (PS) - Muito bem!

O Orador: - irá, uma vez mais, exigir uma intervenção pública comunitária para retirar do mercado o maior número possível de carcaças de suínos.
Mas, mais do que isso, Sr.ª Deputada Helena Santo tal como os senhores demonstraram nas vossas intervenções, não estamos apenas preocupados em resolver os problemas da conjuntura, por isso, iremos propor, em Bruxelas, uma reforma da OCM do suíno, por forma a que, para a suinicultura, passem a existir quotas de produção que permitam garantir alguma estabilidade dos mercados nos próximos anos.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP) - Afinal, ouviu as propostas!

O Orador: - Iremos ainda propor uma campanha publicitária de nível europeu, financiada pela União Europeia, de consumo à carne de porco, ao mesmo tempo que, em Portugal, iremos disponibilizar, para os agrupamentos de produtores, meios financeiros para que certifiquem a carne portuguesa - cuja legislação este Governo.

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já concluiu -, porque só desta forma será possível promovê-la, uma vez que fazê-lo agora seria promover o consumo da carne importada, o que, como sabem, no quadro da União Europeia, não podemos impedir, desde que cumpram as regras comunitárias.
Falou-se muito, aqui, de não existir fiscalização e foi proposto, pela Sr.ª Deputada Helena Santo, que se apertasse a fiscalização
Sr.ª Deputada Helena Santo, sabe quantas acções de fiscalização têm sido feitas por dia, desde o dia 20 de Novembro?

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Sabe!

O Orador: - 22 acções diárias, 1566 em apenas 72 dias.

Protestos do CDS-PP.

Sabe quantos animais vivos foram controlados nos últimos 72 dias? 1200 animais por dia.
Sabe quantas toneladas de carne foram verificadas por dia, desde há dois meses e meio? 72 t
Sabe quantos animais vivos foram apreendidos? 888, equivalendo a 101 t, em pouco mais de dois meses.
Sr. Deputado Carlos Duarte, se isto não é fiscalizar, peco-lhe que, relativamente a qualquer momento dos 10 anos de governo do seu partido, apresente os indicadores da fiscalização que foi efectuada, designadamente aquando da crise de 1993.

Aplausos do PS.

Mas há mais.
Não posso deixar de assinalar o que disse quando referiu que é necessário proceder como fizeram, alegadamente, os governos espanhol e francês
Então, Sr.ª Deputada Helena Santo e Sr. Deputado Carlos Duarte, os senhores têm conhecimento, objectivo e concreto, de que há violação das regras da concorrência que prejudicam os nossos suinicultores e nada fizeram para denunciar isso a UCLAF (Unidade de Coordenação da Luta Anti Fraude), para que os prevaricadores pudessem ser penalizados?

Aplausos do PS.

Ou têm conhecimento de que, de facto, assim é ou, então as declarações que produziram nesse sentido não deixam de ser pura demagogia!
O Sr. Deputado Rodeia Machado disse que o governo francês adoptou duas medidas Ora, tenho aqui comigo a notificação enviada pela Comissão as autoridades francesas por incumprimento e violação das regras comunitárias, porque as autoridades francesas fizeram menos do que fez o Governo português com a linha de crédito que instituiu Na verdade, as autoridades francesas limitaram-se a financiar um sistema, o chamado STABIPORC, que é uma formula, quase diria mutuaria, dos produtores, e, mesmo assim, foi imediatamente levantado à França um processo por incumprimento.
O Sr. Deputado Carlos Duarte, que, agora, tanto fala de medidas que deveriam ser preconizadas, mas sem explicita-las, certamente não está esquecido de que, aquando da crise de 1993, que teve menor dimensão do que a actual, a medida mais relevante que o seu governo tomou na altura foi a de uma linha de desendividamento, no valor de 3,6 milhões de contos, que beneficiou 282 suinicultores, tendo-se esquecido, ao contrário do que agora fez este Governo, de discriminar positivamente os mais pequenos Certamente sabe que esta linha de crédito está numa fase de pré-contencioso porque não foi notificada a Bruxelas e, provavelmente, por manifesta incompetência do governo do seu partido, aqueles produtores vão ter de devolver as ajudas que receberam.

A Sr.ª Rosa Maria Albernaz (PS): - Muito bem, Sr. Ministro!

Protestos do Deputado do PSD Jorge Roque Cunha.

O Orador: - Aliás, é importante que lhe diga que, ainda ontem, o actual Governo foi «presenteado» pela Comissão com mais um exemplo concreto do que foi a desgovernação de 1995, pois, porque pagaram ajudas antes das eleições legislativas, obrigam agora os agricultores portugueses a serem penalizados em 3 milhões de contos, para que a «factura» eleitoral de Outubro de 1995 possa ser cumprida.

Aplausos do PS.

Quero reafirmar aqui, com toda a solenidade, que o Governo português e eu próprio tudo faremos, no plano interno e em Bruxelas, para que, rapidamente, os suinicultores portugueses possam ver melhores dias do que aqueles que vivem agora Tenho muita pena que esta postura do Governo português, responsável e de luta no local próprio, em defesa dos suinicultores não possa ser secundada por quem, tanto quanto o Governo, deveria defender os interesses nacionais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos interromper aqui o debate pois chegámos à hora regimental das votações.
Em primeiro lugar, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 222/VII - Estabelece o regime e forma de criação das polícias municipais.
Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes.

Srs. Deputados, esta proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.
Passamos à votação na generalidade da proposta de lei n.º 197/VII - Regula a identificação civil e a emissão do bilhete de identidade de cidadão nacional.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Esta proposta de lei baixa, igualmente, à 1.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 596/VII - Cria um cadastro obrigatório de acidentes de automóveis e motociclos, visando aumentar a segurança rodoviária e a defesa do consumidor (PS).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e abstenções do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes

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Este projecto de lei baixa também à 1.ª Comissão Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 196/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre a dissecação lícita de cadáveres e extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação científica.

Submetida a votação, foi aprovada por unanimidade.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, é para informar que foi apresentada uma proposta de alteração a este texto que acabámos de votar.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, vamos agora passar à votação na especialidade, portanto, será nessa sede que se justifica a contemplação dessa proposta Aliás, acaba de chegar à Mesa.

Trata-se, então, de uma proposta de alteração, subscrita pelo PS, PSD, CDS PP e PCP, do n.º 1 do artigo 2 º da proposta de lei n.º 196/VII
Srs Deputados, verifico que estão de acordo em que façamos a votação conjunta na especialidade dos artigos 1.º e 3.º da proposta de lei, a que se seguirá a votação desta proposta de alteração do n.º 1 do artigo 2.º
Vamos, pois, votar em conjunto, na especialidade, os artigos 1.º e 3.º da proposta de lei n.º 196/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre a dissecação lícita de cadáveres e extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação científica.

Submetidos a votação foram aprovados por unanimidade.

São os seguintes:

Artigo 1.º

Objecto

É concedida autorização ao Governo para legislar sobre as situações em que é licita a dissecação de cadáveres ou de partes deles, de cidadãos nacionais, apátridas ou estrangeiros residentes em Portugal, bem como a extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação cientifica.

Artigo 3.º

Duração

A autorização concedida tem a duração de 60 dias

O Sr. Presidente: - Vamos votar a proposta de alteração, subscrita pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP, do n.º 1 do artigo 2.º desta mesma proposta de lei.
Submetida a votação foi aprovada por unanimidade.

É a seguinte.

1 - Estabelecer que os actos referidos no artigo 1.º só podem ser realizados após a verificação do óbito efectuada por médico nos termos da lei, nas escolas médicas das Universidades nos Institutos de Medicina Legal, nos Gabinetes Médico-Legais e nos serviços de Anatomia Patológica dos hospitais, mediante autorização do responsável máximo do serviço,

O Sr. Presidente: - Vamos, agora, votar em conjunto os restantes números deste artigo 2.º

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): - Sr. Presidente, o meu grupo parlamentar solicita que os n.ºs 5 e 6 sejam votados separadamente dos outros.

O Sr. Presidente: - Assim se fará, Sr. Deputado Vamos, então, passar à votação conjunta, na especialidade, dos n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 2.º da proposta de lei n.º 196/VII.

Submetidos a votação foram aprovados por unanimidade.

São os seguintes:

2 - Prever que é permitida a realização dos actos previstos no artigo I º quando a pessoa tenha expressamente declarado em vida a vontade de que o seu cadáver seja utilizado para fins de ensino e de investigação científica.
3 - Assegurar que a dissecação de cadáveres ou de partes deles, para os fins previstos no artigo 1.º, só é permitida desde que a pessoa não haja manifestado em vida, junto do Ministério da Saúde, a sua oposição e a entrega do corpo não seja, por qualquer forma, reclamada no prazo de 24 horas após a tomada de conhecimento do óbito, pelas pessoas referidas no n.º 5,
4 - Garantir que a extracção de peças, tecidos ou órgãos, para os fins previstos no artigo 1.º, só é permitida desde que a pessoa não haja manifestado em vida, junto do Ministério da Saúde, a sua oposição,

O Sr. Presidente: - Vamos agora votar em conjunto, na especialidade, os n.ºs 5 e 6 do artigo 2.º desta mesma proposta de lei.

Submetidos à votação, foram aprovados, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e abstenções do PCP e de Os Verdes.

São os seguintes:

5 - Prever que têm legitimidade para reclamar o corpo, sucessivamente, o testamenteiro, em cumprimento de disposição testamentária, o cônjuge sobrevivo ou pessoa que vivia com o falecido em condições análogas às dos cônjuges, os ascendentes, descendentes, adoptantes ou adoptados, os parentes até ao 2.º grau da linha colateral,
6 - Quando o corpo for reclamado pelas pessoas que têm legitimidade para o fazer fora do prazo previsto no n.º 3, ou, independentemente do prazo, for reclamado por pessoa diferente das referidas no número anterior, a reclamação só é atendida após a eventual utilização do cadáver para fins de ensino e de investigação científica, devendo as entidades que tiverem procedido aos actos

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descritos no artigo 1.º atenuar, na medida do possível, os sinais decorrentes da sua prática,

O Sr. Presidente: - Passamos à votação conjunta, na especialidade, dos restantes números deste artigo 2.º - n.ºs 7 a 19, inclusive.

Submetidos a votação, foram aprovados por unanimidade.

São os seguintes:

7 - Estabelecer que, nos casos previstos no número anterior, o cadáver não pode ficar retido mais de 15 dias nas instalações das entidades a que se refere o n.º 1,
8 - Consagrar que a oposição a que se referem os n.ºs 3 e 4 e livremente revogável pelo próprio e é formulada em impresso tipo que consta do Registo Nacional de Não Dadores (RENNDA), aplicando se lhe, com as necessárias adaptações, o disposto no Decreto-Lei n.º 244/94, de 26 de Setembro,
9 - Estabelecer que os não dadores inscritos no RENNDA ate à entrada em vigor do presente diploma se presumem não dadores para os fins previstos no artigo 1.º,
10 - Prever que, para os efeitos previstos no artigo 1.º, as entidades referidas no n.º 1 têm acesso, em tempo útil, aos dados constantes do RENNDA,
11 - Estabelecer a proibição da comercialização, para os fins previstos no artigo 1.º, de cadáveres e de peças, tecidos ou órgãos, deles extraídos, bem como da revelação da identidade da pessoa cujo cadáver tenha sido dissecado ou do destino dado a peças, tecidos ou órgãos, dele extraídos,
12 - Assegurar que as entidades previstas no n.º 1 zelem pela conservação e utilização dos cadáveres ou de partes deles, bem como de peças, tecidos ou órgãos, deles extraídos, no respeito que lhes e devido e com o recurso aos meios técnico-científicos mais adequados,
13 - Prever a criação de sistemas de documentação, por parte das entidades autorizadas a proceder aos actos previstos no artigo 1.º, que permitam a identificação destes, procedendo, designadamente, ao registo, em suporte próprio do serviço, dos elementos relativos a identificação do cadáver, da referência a todo o processo de utilização do cadáver desde a sua proveniência até ao seu destino, das peças, tecidos ou órgãos extraídos para fins de ensino e de investigação cientifica e dos actos a que se refere o n.º 16,
14 - Consagrar que o transporte de cadáveres do local em que se encontrem depositados para as instalações das entidades previstas no n.º 1 e a sua posterior devolução devem ser efectuados nos termos da lei, de forma a assegurar o respeito que aos restos mortais humanos é devido, sendo os respectivos encargos suportados por aquelas entidades,
15 - Garantir que a utilização de cadáver ou de partes dele, bem como de peças, tecidos ou órgãos para os fins previstos no artigo 1.º, não pode prejudicar a eventual realização de perícias médico-legais,
16 - Assegurar que os despojos de cadáveres dissecados que não aproveitem a sua reconstituição e as peças, tecidos ou órgãos que não sejam conservados para fins de ensino e de investigação científica são inumados ou cremados, nos termos da lei, pelas entidades que procederam à respectiva dissecação ou extracção,
17 - Prever que os planos de estudos dos cursos do ensino superior na área da saúde devem comportar acções de sensibilização visando o desenvolvimento do respeito pelo cadáver, bem como do significado, em termos de solidariedade, da dissecação de cadáveres ou de partes deles e da extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação científica;
18 - Consagrar quê quem, para os fins previstos no artigo 1.º, comercializar cadáver ou partes dele ou peças, tecidos ou órgãos, é punido com pena de prisão de 2 a 10 anos,
19 - Estabelecer que a pena referida no número anterior é agravada nos seus limites mínimo e máximo em um terço, sempre que a dissecação de cadáver ou de partes dele e a extracção de peças, tecidos ou órgãos seja efectuada em pessoa que tenha manifestado em vida a sua oposição nos termos do n.º 8.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos à votação final global da proposta de lei n.º 196/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre a dissecação lícita de cadáveres e extracção de peças, tecidos ou órgãos para fins de ensino e de investigação científica, com a alteração entretanto aprovada

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Entretanto, deu entrada na Mesa um requerimento, subscrito pelo PS, solicitando a baixa à Comissão de Economia, Finanças e Plano, por um prazo de duas semanas, da proposta de lei n.º 215/VII - Autoriza o Governo a legislar sobre o regime geral das empresas públicas e sector empresarial do Estado, antes da votação na generalidade
Vamos, pois, votar este requerimento.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos passar à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 205/VII - Estabelece o novo regime jurídico do recenseamento eleitoral e ao projecto de lei n.º 594/VII - Regula a certificação do tempo mínimo de residência dos cidadãos estrangeiros para efeitos eleitorais (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PSD e do CDS-PP.

Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, relativo aos projectos de lei n.ºs 532/VII - Reajustamento da área administrativa da cidade de Viseu (PS) e 537/VII - Alteração da área administrativa da cidade de Viseu (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP e a abstenção de Os Verdes.

Vamos votar o projecto de resolução n.º 111/VII (PCP) - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 404/98, de 18 de Dezembro, que cria, por cisão da Empresa Pública Aeroportos e Navegação Aérea, ANA, E.P., a Empresa Pública Navegação Aérea de Portugal, NAV, E.P., e pro-

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cede à transformação da Empresa Pública Aeroportos e Navegação Aérea, ANA, E.P., resultante da cisão em sociedade anónima com a denominação ANA - Aeroportos de Portugal, S.A. Aprova os Estatutos da NAV, E. P., e da ANA, S.A. [apreciação parlamentar n.º 74/VII (PCP)]

Submetido a votação foi rejeitado, com votos contra do PS votos a favor do PSD, do PCP e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado

O Sr. José Junqueiro (PS): - Sr. Presidente, relativamente a este Decreto-Lei n.º 404/98, apresentámos duas propostas de alteração que, depois, gostaríamos que fossem discutidas e votadas

O Sr. Presidente: - Fica feita essa declaração. Depois se verá.
Srs. Deputados, a votação seguinte dizia respeito ao projecto de resolução n.º 120/VII (PSD) - Cessação da vigência do Decreto-Lei n.º 404/98, de 18 de Dezembro [apreciação parlamentar n.º 77/VII (PSD)] Ora, uma vez que o anterior projecto de resolução foi rejeitado, parece--me que este está prejudicado Ou será que este pode ser aprovado, não o tendo sido o outro?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Como esse é do PSD pode ser que aprovem!

O Sr. Presidente: - Tenho dúvidas.

Pausa

Efectivamente, está prejudicado.
Passamos, então, a votação de um requerimento, apresentado por Os Verdes e PCP, no sentido de o projecto de lei n.º 588/VII - Torna obrigatória a afixação do preço dos produtos em dígitos (Os Verdes) baixar a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, por um prazo de 30 dias, antes da respectiva votação na generalidade.

Submetido a votação foi aprovado com votos a favor do PS do CDS PP do PCP e de Os Verdes e a abstenção do PSD

Há pouco, o Sr. Deputado José Junqueiro referiu-se a duas propostas de alteração apresentadas pelo PS, uma, no sentido de aditar dois números - os n.ºs 3 e 4 - ao artigo 10º do Decreto-Lei n.º 404/98, de 18 de Dezembro, e outra no sentido de aditar um n.º 3 ao artigo 19 º do referido decreto lei Entretanto, o Sr. Deputado Luís Queiró informa a Mesa de que há, também, uma proposta de alteração apresentada pelo CDS-PP, no sentido de aditar um n.º 2 ao artigo 25 º desse decreto-lei, passando o corpo desse artigo a n.º 1

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, salvo melhor opinião, estamos em sede de apreciação parlamentar Foram rejeitados os projectos de resolução que propunham a cessação da vigência do decreto-lei O que temos agora são propostas de alteração e penso que, de acordo com o Regimento da Assembleia, descerão automaticamente à respectiva comissão, pois é em sede de comissão que as mesmas têm de ser apreciadas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, se todos os Srs. Deputados estiverem de acordo com a sua sugestão, será até mais cómodo para a Mesa

Pausa.

Dado que não há oposição, o Decreto-Lei n.º 404/98, de 18 de Dezembro, bem como as propostas de alteração baixam a Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente, para que sejam apreciados em sede de especialidade.

Srs. Deputados, chegámos ao fim das votações, pelo que vamos retomar o debate de urgência, requerido pelo CDS-PP, sobre a situação do sector suinícola em Portugal.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, a minha interpelação à Mesa versa dois aspectos.
Em primeiro lugar, o Sr. Ministro queixou-se de que vinha para um debate sobre a situação geral da agricultura portuguesa e encontrou um debate sobre a crise suinícola Pergunto ao Sr. Presidente se, na última reunião da conferência de líderes, foi decidido ou não a realização de um debate sobre a crise do sector suinícola em Portugal, tal como, aliás, se encontrava já ontem inscrito no Boletim Informativo que temos à frente Porque se é assim, o que há aqui é uma manifesta falta de comunicação interna do Governo, sendo certo que já é a segunda vez que isto acontece, ou seja, o Sr. Ministro da Agricultura, quando vem à Assembleia, diz sempre que não se encontra preparado para o debate que está inscrito na ordem do dia.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - Não venho preparado?

O Orador: - Em segundo lugar, peço ao Sr. Presidente para, através dos serviços, entregar ao Sr. Ministro as nossas propostas com vista à resolução da crise do sector suinícola que, em Novembro de 1998, o PCP tornou públicas, que o Sr. Ministro conhece e que, aliás, foram aqui reproduzidas no anterior debate sobre esta matéria. Tudo isto porque o Sr. Ministro veio aqui acusar os partidos de não terem propostas Ora, o Sr. Ministro sabe que, pelo menos desde Novembro de 1998, o PCP tem propostas que foram tornadas públicas em conferência de imprensa

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, como sabe, o que consta do documento que anuncia o que foi agendado é um debate de urgência sobre a situação do sector suinícola em Portugal

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O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Bem me parecia!

O Sr. Presidente: - Portanto, trata-se de um défice de informação do Sr. Ministro da Agricultura.
Quanto ao documento que o Sr. Deputado referiu, agradeço que o faça chegar aos serviços para ser reproduzido e distribuído.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação à Mesa, gostaria que me confirmasse se há um défice de informação do Sr. Ministro, porque o guião é claro ao circunscrever o tema do debate. O Sr. Ministro referiu que nós não tínhamos qualquer proposta quando esta na Mesa uma proposta de resolução exortando o Governo a aplicar um conjunto de medidas concretas De modo que a retórica parlamentar pode ir até ao limite dos factos, mas para além desse limite acho que o Sr. Ministro não devia ir.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a sua interpelação tem significado por si própria, a Mesa não tem de complementá-la.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, o senhor cometeu aqui a indelicadeza de considerar que o CDS-PP não tinha propostas quando sabe perfeitamente que entregámos na Mesa um projecto de resolução Mas a sua indelicadeza - desculpe e permitir que me diga a si nestes termos - foi maior quando posteriormente anunciou algumas das nossas propostas como ideia sua
Sr. Ministro, eu nem sequer reivindico direitos de autor, só lhe peço uma coisa cumpra. Ponha imediatamente em prática as propostas que anunciou e as propostas que o Partido Popular fez e resolva o problema da crise dos suinicultores. Se as propostas são do Sr. Ministro ou se são do Partido Popular, garanto-lhe que isso para mim é completamente indiferente, aquilo que me preocupa seriamente e que o Sr. Ministro da Agricultura venha aqui falar de uma realidade e de uma situação que não existem Isto e o que, de facto, me preocupa, voltando a repetir que não reivindico quaisquer direitos de autor.
Mas digo-lhe mais Sr. Ministro se for necessário, para que o senhor comunique novas medidas - pelos vistos o senhor só actua com debates de urgência -, não tenho qualquer problema em dizer-lhe que na próxima semana ou quando for possível pediremos novo debate de urgência O que para nós está, de facto, em causa é a suinicultura.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - O Sr. Ministro falou na questão da fiscalização. Tem a resposta, não precisa de mais nada. Se o Sr. Ministro, sem fiscalização, consegue anunciar todas as apreensões que fez, imagine-se o que não seria se o senhor fiscalizasse

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Mas fiscalizando tal como fazem os seus parceiros comunitários! Aquilo que lhe pedimos - e nem sequer apelamos à sua imaginação - é que faça exactamente o mesmo que fazem os seus parceiros europeus.
O Sr. Ministro também disse aqui que desconhecia as medidas que estão a ser levadas a cabo pelos seus parceiros europeus Sr. Ministro, tenho todo o gosto em lhe entregar, depois de fotocopiado, um dossier que aqui tenho de um suporte informático que me esclarece perfeitamente sobre aquilo que fazem os seus parceiros europeus Portanto, se o Sr. Ministro não conhece peco-lhe que se informe junto deles porque, de facto, as medidas são boas e ajudam muito os suinicultores portugueses e assim, rapidamente, a nossa suinicultura resolveria o problema e a situação que estamos a viver

O Sr. Luís Queiró (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Mas, queria ainda dizer-lhe o seguinte o senhor falou no problema da revisão da OCM e eu queria alertá-lo para uma situação que certamente conhece e da qual também tenho aqui um suporte que me permite fazer-lhe este alerta.
O senhor sabe perfeitamente que, em França, há ordens para a legalização imediata de todas as explorações suinícolas Por isso - e o Sr. Ministro acusou os partidos de não o encorajarem, de não lhe darem força para o próximo debate que vai ter - digo-lhe por parte da bancada do Partido Popular, tem toda a força e coragem Seja exigente, defenda a produção nacional em Bruxelas e terá toda a nossa força, todo o nosso consenso e todo o nosso apoio.
No nosso projecto de resolução, que o senhor diz não conhecer, propomos em concreto medidas e incentivos fiscais que, tal como sabe, foram postos em prática pelos seus parceiros comunitários, nomeadamente a suspensão da aplicação da taxa social única aos trabalhadores e suinicultores em geral Pergunto-lhe se está ou não disposto ou se acha possível que estas medidas sejam imediatamente postas em prática em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura O Sr. Ministro veio aqui fazer de novo algumas afirmações que levam a concluir que o Governo só aplica os normativos comunicámos quando lhe interessa Em relação a esta matéria, ao apoio concreto aos produtores suinícolas, o Sr. Ministro diz que não pode aplicar nada fora do regulamento comunitário, mas os seus parceiros de Espanha e de França estão a fazê-lo. Daí que, mais do que nunca, se justifique a pergunta que lhe coloquei sobre esta matéria.
Aliás, o Sr. Ministro falou aqui de uma coisa que, em meu entender, é correcta a questão da solidariedade nacional E essa solidariedade nacional deveria manifestar-se do Governo para com os produtores suinícolas, dando-lhes garantias em ajudas concretas às perdas de rendimento que têm tido devido à situação dramática de crise na suinicultura.

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Esperávamos sinceramente que o Sr. Ministro viesse aqui e trouxesse respostas a estas questões urgentes Mas mais uma vez o Sr. Ministro fez «tábua rasa» dessa situação e não disse rigorosamente nada Assim, gostaria que o senhor dissesse, efectivamente, se o Governo tem ou não em carteira alguns projectos, algumas medidas para resolver esta situação.
O meu camarada Lino de Carvalho disse-lhe, há pouco, que tomamos uma posição, que o seu Governo certamente conhece, em relação às propostas que fizémos em concreto para a questão da suinicultura E para lhe avivar a memória vou ler lhe algumas porque parece que hoje o Sr. Ministro não tem tido um dia muito feliz em termos de memória sobre estas matérias E lembrar-lhe ía o seguinte nós propusemos o estabelecimento temporário de uma tabela de preços da carne de porco no consumo pela fixação de uma margem de comercialização ou fixação de preços máximos fazendo reflectir naqueles actuais preços médios a produção A nos parece-nos que era importante que os suinicultores tivessem esta possibilidade porque os apoiaria em concreto.
Propusemos também uma intervenção pública no escoamento da produção das explorações familiares, fixando um preço que cobrisse os custos da produção Essa intervenção viria, também, apoiar os pequenos suinicultores.
Propusemos ainda o alargamento da linha de crédito para as pequenas suiniculturas, que está neste momento em 30 porcas e que poderia ser alargado até às 170.
Foi também por nos proposta a fiscalização rigorosa das importações, porque, apesar dos números que o senhor aqui deixou, não estamos cientes de que as situações sejam tão claras como o senhor pretendeu demonstrar.
E já dissemos que se só na intervenção que o Sr. Ministro fez quando esteve presente numa acção de fiscalização, e que foi embargada carne de porco, como é que se justifica que daí pareça não tenham acontecido mais acções destas Gostava que o Sr. Ministro esclarecesse isto devidamente
Por outro lado, gostaríamos que o Sr. Ministro nos respondesse - da ultima vez que aqui esteve não respondeu a uma pergunta nesse sentido do meu camarada Lino de Carvalho - se as verbas para o funcionamento do Observatório dos Mercados Agrícolas e das importações agro-alimentares já estão devidamente em execução e se o senhor já tem a intenção clara de que compete ao seu Ministério, a si, accionar este mecanismo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder aos dois pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Ministro da Agricultura, concedendo-lhe a Mesa, para o efeito, 4 minutos.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - Sr. Presidente, Srs. Deputados, registo e reafirmo a decepção profunda que tenho relativamente as propostas que foram apresentadas pelo partidos da oposição, começando pela nota que acabou de me chegar de uma conferência de imprensa do Partido Comunista, em 24 de Novembro de 1998. Não costumo assistir as conferências de imprensa do Partido Comunista mas, normalmente, leio a comunicação social sempre que ela as reflecte.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Pode assinar o Avante!

Orador: - Sempre que posso leio, porque tenho uma concepção pluralista da comunicação social.
Mas, Sr. Deputado, uma das medidas aqui propostas, sinceramente, não lembraria ao diabo, que é o tabelamento dos preços da carne! Num País que está há não sei quantos anos na União Europeia! Propor o tabelamento dos preços, Sr. Deputado, já nem na ex-União Soviética se usa! Isso é uma coisa completamente inconcebível! Se estava decepcionado com as propostas que não conhecia, então, conhecendo-as mais decepcionado fico!
O Sr. Deputado Rodeia Machado, tal como a Sr.ª Deputada Helena Santo, propõe a intervenção pública, mas a intervenção, a poder ser efectuada, é uma intervenção comunitária.
A Sr.ª Deputada referiu-se a direitos de autor Posso seguramente demonstrar-lhe que, antes do dia 24 de Novembro, propus isto em Bruxelas. A Sr.ª Deputada apresentou aqui hoje uma proposta nesse sentido e reclama a sua autoria

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Não reclamei nada!

O Orador: - Eu concedo lha de boa vontade, mas Sr.ª Deputada, faço-lhe um repto apresento-lhe um documento oficial, da comunicação social, com a data em que eu próprio tomei essa iniciativa em Bruxelas Será a Sr.ª Deputada capaz de apresentar algum documento, da sua autoria, com uma proposta destas que, aliás, me é completamente irrelevante? Eu aplaudi-la-ei com as duas mãos a toda a velocidade.

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Eu não disse isso! Não é isso que está escrito!

O Orador: - Continuo a pensar que esta é uma crise europeia Só que a União Europeia tinha, no fim de 1997, 120 milhões de porcos Portugal teria, nessa altura, cerca de 2 milhões Ou seja temos 1,9% dos suínos da União Europeia
A Sr.ª Deputada pretende - e com as fronteiras abertas como estão -que sejam medidas do Governo português a resolver o problema dos 120 milhões de porcos da União Europeia Ora, esta é uma proposta que, no mínimo, posso classificar de insensata
O que quis dizer à Sr.ª Deputada é que nas três ou quatro propostas da sua pretensa resolução, que terá sido hoje apresentada - não tive oportunidade de a conhecer -, a senhora propõe um apertado sistema de fiscalização
Peco-lhe meças que apresente dados de qualquer data e de qualquer governo com indicadores de fiscalização desta matéria idênticos àqueles que lhe apresentei Dir-me-á «Não é totalmente suficiente!»
Gostaria muito de poder fazer 44, 88 ou 227 acções de fiscalização por dia, em vez das actuais 22, e até gostaria de poder ter um polícia atrás de cada porco que entra em Portugal! Mas, Sr.ª Deputada Helena Santo, sejamos razoáveis Estamos a fazer um grande esforço neste sentido, esforço esse que é compreendido Aliás, ouvi o próprio Professor Marcelo Rebelo de Sousa elogiar, na televisão, aquando de uma visita fugaz que fez a uma suinicultura no final do ano passado, o esforço de fiscalização que estamos a fazer Na altura, afirmou que a única medida positiva, visível e palpável do Governo era, precisamente, a da fiscalização.
Sr.ª Deputada, não quero lançar qualquer confusão, nem qualquer acha na fogueira no seio da AD em constitui-

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cão, mas parece-me de muito mau gosto essa sua critica tão directa ao líder do PSD.
Srs. Deputados, do ponto de vista do Governo, a resolução, a curto prazo, deste seríssimo problema europeu, que tem enormes repercussões negativas em Portugal, só pode suceder com a adopção de duas medidas fundamentais a intervenção e o estabelecimento de OCM e a política de quotas numa futura reformulação da OCM dos suínos, no plano europeu
Tenho consciência de que as medidas que estamos a adoptar, designadamente as acções de fiscalização, a linha de crédito, as 60 000 t de cevada que virão dos stocks de intervenção comunitária a um preço, sensivelmente, 3$ abaixo do de mercado e que, segundo tudo indica - na fase em que o processo se encontra em Bruxelas -, ficarão disponíveis nos silos de Badajoz e de Salamanca, irão ser um contributo para reduzir os custos das rações
Queremos garantir que os produtores e os industriais possam, eles próprios, ir abastecer-se, e não apenas um grande operador que compre toda aquela quantidade de cereais que - e gostaria de chamar a atenção para este facto - representa o triplo da produção portuguesa do ano passado, que rondou as 20000 t
Estas medidas são importantes, mas o próprio Governo tem consciência de que elas são incapazes de resolver a crise da suinicultura na Europa, onde Portugal se insere. Portanto, neste domínio, e necessário travar uma frente de batalha em Bruxelas.

O Sr. Presidente: - Queira terminar, Sr. Ministro.

O Orador: - Terminarei imediatamente, Sr Presidente Dir-lhe-ei, Sr.ª Deputada, que tenho a grata satisfação de que, se o assunto foi reagendado, eu, enquanto ministro de Portugal, dei algum contributo para isso, porque não era, sequer, intenção da Comissão agendar essa questão como urgente E isso e hoje um dado adquirido.
Espero que para além do agendamento, seja possível obter um consenso maioritário, para que estas importantes medidas comunitárias sejam rapidamente adoptadas

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito regimental de defesa da consideração da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, já estamos habituados a que V. Ex.ª venha aqui responder de uma forma evasiva às questões que lhe são colocadas

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito!

O Orador: - E, mais uma vez, o Sr. Ministro utilizou a mesma estratégia, uma estratégia que é, quanto a nos, desmerecedora, porque V. Ex.ª actuou de má fé ao ler as propostas do PCP, dizendo que tínhamos proposto uma fixação de tabelas O que pretendemos - vou ler, para que não restem duvidas - e o "estabelecimento temporário de uma tabela de preço de carnes de porco (...)"
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - E o que é que isso91

O Orador: - "(...) no consumo, pela fixação de uma margem de comercialização"

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O Sr. Ministro não conhece a lei da concorrência!

O Orador: - O que é permitido pela lei da concorrência!
Se, como Ministro da Agricultura, o senhor não conhece a lei e vem aqui dizer que o PCP propõe soluções contrárias à lei, tenha paciência, deverá reconhecer que está errado.
Por outro lado, o Sr. Ministro continua a não responder à questão do Observatório, e não é por acaso. De facto, o Sr. Ministro respondeu a outras questões, mas em relação ao Observatório dos Mercados Agrícolas disse zero' Será que ainda não tem resposta sobre esta matéria7

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, querendo, tem a palavra o Sr Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas - Sr. Presidente, creio que o PCP já percebeu que o Observatório dos Mercados Agrícolas é presidido pela CONFAGRI e não pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas.
O regulamento do Observatório foi aprovado, bem como o respectivo orçamento - é o Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas que tem esta competência.
Desejo longa vida e bons trabalhos ao Observatório.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Que está na dependência do Sr. Ministro

O Orador: - Está na dependência do Ministro e é presidido pela CONFAGRI Verifico que o Sr Deputado já tem conhecimento disso.

O Sr. Presidente: - Para interpelar a Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Santo Agradeço que respeite a figura regimental, porque dispomos de pouco tempo

A Sr.ª Helena Santo (CDS-PP): - Sr. Presidente, pergunto à Mesa se será possível fazer chegar ao Sr Ministro uma cópia do projecto de resolução do CDS-PP, porque penso que há aqui um equívoco por parte do Sr. Ministro.
O Sr. Ministro acabou de dizer que uma das principais soluções para a resolução deste problema passa por um pedido de abertura imediata de uma intervenção pública, Ora é exactamente isso que está do projecto de resolução do CDS-PP
O Sr. Ministro pediu solidariedade, pediu força para Bruxelas e, como vê, aqui as tem força e solidariedade.
O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Muito obrigado.

A Oradora: - Por último, Sr. Presidente, através da Mesa, queria pedir, uma vez mais, ao Sr Ministro que me esclarecesse - já que não respondeu à pergunta que formulei - se está ou não disposto, se há ou não possibilidades de aplicar, em Portugal, em termos fiscais, as mesmas medidas que estão a aplicar os demais parceiros comunitários

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Vozes do CDS-PP - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, quanto à entrega do documento, necessariamente, tem toda a liberdade de o fazer chegar às mãos do Sr Ministro Já quanto à resposta que solicitou, o Sr Ministro não é obrigado a responder - como sabe, responsabiliza-se pelo silêncio.
O Sr. Ministro pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, pedia a sua especial benevolência para poder prestar um esclarecimento

O Sr. Presidente: - Informam-me que o Grupo Parlamentar do PS cede-lhe 1 minuto para o efeito Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas: - Sr. Presidente, quero apenas responder à Sr* Deputada Helena Santo
Em termos de isenção para a segurança social, pois é a isso que se refere a Sr.ª Deputada, como sabe, o Governo adoptou essa medida para os pequenos produtores, no âmbito das intempéries de 1998 À medida foi aplicada em virtude de acidentes climatéricos, porque a sua aplicação contraria a legislação comunitária
Alem do mais, Sr.ª Deputada, segundo informação que me chegou, os jornais anunciaram que não há qualquer legislação publicada em jornal oficial que comprove que essa medida tenha sido adoptada, tê-lo-á sido em França, pais contra o qual corre, neste momento, um processo da União Europeia, precisamente por a ter adoptado.
Estamos a estudar a aplicação dessa medida em conjunto com o Ministério do Trabalho e da Solidariedade - e reconheço que ela pode ser importante -, porque a questão que se coloca é a de abrir um precedente para uma crise de mercado É que outros sectores da economia também a têm solicitado - é o caso, por exemplo, da hotelaria do Algarve, nos períodos de paralisação, ou da industria têxtil, quando baixam os preços.
Portanto, em nome da solidariedade nacional, esta é uma questão que tem de ser ponderada em termos de constituir um precedente E um assunto que esta a ser estudado e que teria muito gosto, se ultrapassadas as barreiras comunitárias em aplicar neste caso, ainda que temporariamente
Em todo o caso, reconheço que, também essa, sendo, seguramente, uma medida importante, é insignificante para a dimensão da crise, mas funcionaria como mais uma ajuda O Governo não a exclui completamente, mas não estou em condições de dizer, neste momento, se ela poderá ou não ser adoptada

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Duarte.

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados A intervenção que o Sr Ministro aqui proferiu é dificilmente qualificável. Na minha perspectiva, ela é lamentável.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Ministro, o problema da suinicultura existe é um facto, está no terreno - basta ir a Lema, a Rio Maior ou a Setúbal para o constatar Se falar com os suinicultores, com os trabalhadores, saberá que assim é O problema existe e exige medidas As pessoas não estão preocupadas com o que aconteceu no passado, nem em saber quem propôs ou não medidas O que se exigia, perante uma situação destas, é que o ministro do Governo de Portugal viesse aqui, neste debate, anunciar medidas concretas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas o que V. Ex.ª cá veio fazer foi palavreado barato, foi politiquice da mais baixa. E não é isso que as pessoas e o País querem ouvir O que o País quer é que o Governo governe, que o Governo olhe para os portugueses e não para as primeiras páginas dos jornais, que o Governo pense nos portugueses e tome medidas.

O Sr Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Ministro foi hoje, aqui, a cara, a imagem do que é este Governo.
O que queremos, Sr Ministro, é que o Governo, pelo menos durante estes seis meses que lhe restam de mandato, governe e pense nos portugueses, que não destrua mais o País e a economia nacional.
Nesta Assembleia, V. Ex.ª fez um voto de censura, especialmente à bancada do PSD, por não apresentar propostas, nem pensar no país e estar encostado Devo dizer-lhe que apresentámos propostas concretas

Protestos do PS

Acreditamos que V. Ex.ª não tinha hoje condições, porque não fez o "trabalho de casa" para poder fazer aqui a sua avaliação, mas deixo-lhe como mensagem, para pôr o seu gabinete a pensar, a seguinte questão Sr Ministro, deverá ou não o Governo apoiar os custos de sanidade animal nos suínos, tal como faz nas outras espécies pecuárias e tal como fazem os espanhóis, de forma a permitir que o suinicultor português tenha as mesmas condições de competitividade dos suinicultores espanhóis?
O Sr. Ministro está ou não preocupado com o potencial genético da nossa suinicultura9 Ao assistir ao abate de reprodutores e do potencial genético, não lhe parece que estamos a destruir o futuro9 Será que não devemos acautelá-lo, dando condições aos suinicultores para garantirem esses reprodutores e, se eventualmente passar a crise, haver condições de relançamento da actividade?
Em relação à fiscalização, V. Ex.ª falou em muitos números, mas fale antes com as pessoas que telefonaram para o Ministério a denunciar situações, pessoas que assistiram a que ninguém aparecesse, pessoas que testemunharam o não funcionamento das direcções de fiscalização, nem dos agentes Em suma, o Ministério não funcionou perante as denúncias, e os números que referiu são muito bonitos, mas não correspondem à realidade.
Era fundamental, Sr Ministro, que fosse feito um controle sanitário dos animais, do sémen importado.

O Sr. Presidente: - Queira concluir, Sr. Deputado Já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Sr. Presidente, peco-lhe alguma tolerância, apenas 1 minuto para terminar.

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O Sr. Presidente: - Já teve essa tolerância, Sr. Deputado, mas faça favor.

O Orador: - Sr. Ministro, é fundamental a existência de um controle, de uma fiscalização eficaz, a todos os níveis, bem como que, a nível da União Europeia, seja "despoletada" a intervenção pública. Diz V. Ex.ª que já a solicitou, o que demonstra que o Governo português não teve a força política para o conseguir
Esperamos e estamos empenhados em dar-lhe o reforço necessário para que consiga que este mecanismo previsto para a reorganização comum do mercado seja "despoletado" Sr Ministro, é fundamental permitir que um País que não produz aquilo que consome, mas que até produziu para o mercado único, tenha essas funções de produção.
Sr. Ministro, é fundamental olhar para o País, não se atenha ao Terreiro do Paço, não se atenha às primeira página dos jornais. Olhe para os problemas dos portugueses e tome medidas, porque este é um sector que exige medidas que, infelizmente, o Governo ainda não tomou.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para gastar o pouco tempo que lhe resta, com mais alguma tolerância, usando o princípio da igualdade de tratamento, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.

O Sr. António Martinho (PS): - Sr. Presidente, chegamos ao fim de um debate em que o PSD fez uma intervenção da tribuna aí emitiu um improviso, aqui, na bancada, lê um documento!

Vozes do PS: - Uma vergonha!

O Orador: - O PSD põe e repõe a cassette O PSD não tem capacidade de apresentar medidas novas1 O PSD faz hoje, na oposição, o que fez no Governo nada, tanto neste sector, como nos restantes sectores da agricultura!

Vozes do PS: - Muito bem

O Orador: - A prova e esta em 1993,

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Lá vem o passado!

O Orador: - criaram uma linha de crédito e iniciaram um plano de sanidade para o sector, mas não foram capazes de o executar

O Sr. Carlos Duarte (PSD): - Fale de hoje, de agora!

O Orador: - Agora, em alternativa às medidas que o Governo adoptou, mais uma vez, vêm falar desse plano, mas na altura não foram capazes de o executar Reconheça isso Sr. Deputado!
Neste debate e no momento próprio, o PSD não apresentou uma proposta, uma única1 Demagogicamente, no dia 29 de Dezembro, o seu líder foi visitar uma exploração onde fez as afirmações que são do conhecimento publico - aliás, com grande cobertura televisiva No dia seguinte em nome do PS, enviei uma carta ao Professor Marcelo Rebelo de Sousa, dei-lhe nota das medidas tomadas pelo Governo e pedi-lhe algo muito simples que ele, através de um dos seus porta-vozes, nos indicasse quais as propostas do PSD.

A Sr.ª Manuela Ferreira Leite (PSD): - Já cá estão!

O Orador: - Julguei que elas chegassem hoje ao nosso conhecimento. Afinal, é um fracasso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre a situação do sector suinícola em Portugal.
Terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 19 horas e 25 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em aprovação os n os 24 a 28 do Diário, respeitantes às reuniões plenárias dos dias 2, 9, 10, 11 e 16 de Dezembro de 1998.
Não havendo objecções, consideram-se aprovados.
Vamos iniciar a discussão, na generalidade, da proposta de lei n.º 183/VII - Define as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, bem como os serviços internacionais com origem ou destino no território nacional.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações.
A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações (Leonor Coutinho): - Sr. Presidente, Srs. Deputados Aquilo que nos traz aqui hoje é a lei de bases das comunicações postais, portanto, do sector postal Trata-se de legislar sobre uma matéria em relação à qual não existe, neste momento, senão legislação dispersa e de que esta lei de bases virá a constituir uma trave-mestra
Os desafios que se colocam hoje às sociedades como a nossa implicam aceleradas mutações de ordem social e económica, cada vez mais suportadas por comunicações modernas e eficientes Assim, o Governo assumiu, no seu Programa, um conjunto de medidas específicas para transformar o sector postal português
A antecipação das tendências de evolução do sector postal levou à preparação de um plano de mudança que implica, por si só, profundas alterações ao sector A linha de referência para este plano é a prioridade de acelerar a modernização do sector postal e clarificar a sua liberalização parcial visando a introdução de regras claras de concorrência.
As grandes linhas de actuação deste plano passam, seguramente, pelo reforço do investimento, por projectos inovadores e de modernização dos sistemas e processos produtivos e de organização dos CTT, pela melhoria dos sistemas de informação, privilegiando o interface com o cliente, por novas configurações dos serviços prestados pela empresa, nomeadamente no que respeita aos serviços financeiros Este plano implica igualmente que o Estado dê cada vez mais importância à vertente regulamentar.
Com efeito, um dos instrumentos da liberalização consiste no estabelecimento de um quadro legislativo e regulamentar explicitamente adequado à evolução pretendida.

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Sabemos qual é a evolução comunitária Ficou já estabelecido um conjunto de desenvolvimentos neste domínio, nomeadamente os preconizados pela Directiva n.º 97/677 CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de J5 de Dezembro de 1997, relativamente as regras comuns para o desenvolvimento dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço
Até ao ano 2003, decorrerá já uma importante etapa deste processo, com a liberalização das correspondências cujo preço seja superior a 5 vezes a tarifa base nacional e cujo peso esteja acima das 350 gramas
Seguir-se-á uma segunda fase, a partir daquela data, para revisão das condições de concorrência do sector, na qual Portugal está a participar activamente
Reconhecendo as especificidades próprias deste sector em Portugal, e imperioso que se dê um primeiro passo na sua reorganização, dotando o País de uma lei de bases do serviço postal que garanta a existência de um serviço universal, adaptado à satisfação de necessidades de comunicação das actividades económicas e sociais, com níveis de qualidade adequados e a preços acessíveis, e que também consagre explicitamente o princípio da liberalização gradual e controlada dos serviços postais em Portugal
Pretende-se criar os mecanismos necessários para garantir a viabilidade económico-financeira do serviço universal, delimitando-se uma área de serviços reservados, explorados em regime de exclusivo pelo operador do serviço universal
Por outro lado, e sem prejuízo destes serviços reservados, que poderão e deverão ser objecto de revisões periódicas em consonância com os desenvolvimentos a nível comunitário, consagra-se a possibilidade de prestação de serviços postais em regime de concorrência, através da concessão de autorizações gerais e de licenças individuais, que garanta uma efectiva e sã concorrência Aliás, lembro que ate agora essas prestações de serviços não estão regulamentadas em Portugal, apesar de existirem há longos anos
Na prossecução das atribuições do Estado neste processo institui se uma entidade reguladora postal que deverá assumir um papel preponderante na fiscalização da actividade do sector bem como na resolução de litígios que envolvam o prestador do serviço universal, à semelhança, alias do que existe para o sector das telecomunicações Esta lei de bases vem, pela primeira vez, definir que existe uma entidade reguladora Na realidade, como sabem, o Instituto de Comunicações de Portugal (ICP) tem exercido estas funções já ha cerca de nove anos, só que a sua existência não estava prevista na lei dos serviços postais.
Tratando-se, como já refere, de um conjunto de prestações essenciais para o desenvolvimento económico e social harmónico e equilibrado, acautelam-se os mecanismos de audição das organizações representativas dos consumidores, tendo em vista a defesa dos respectivos direitos e interesses legalmente protegidos, nomeadamente no que respeita aos instrumentos fundamentais que enquadram a exploração dos serviços e ainda a fixação do regime de preços.
Seguir se a o estabelecimento de um contrato de concessão para o serviço universal, que definira a exacta medida e alcance em termos de direitos e obrigações próprios do Estado e da empresa concessionária, definindo-se também o quadro jurídico de aplicação do serviço universal.
Serão nessa sequência, regulamentados os aspectos de acesso ao mercado de novos operadores, bem como os da explorarão concorrencial dos serviços não reservados
A aprovação desta lei de bases representa para o Governo uma antecipação adequada das tendências para o sector postal a nível mundial, sem a qual dificilmente se conseguirá assumir um desenvolvimento racional e eficiente de""e importante sector, com tantas e tão nobres tradições em Portugal.
Gostaria apenas de acrescentar que, provavelmente, é menos conhecido do que no sector das telecomunicações, mas assiste-se já a uma tendência de internacionalização dos serviços postais, na qual é importante que Portugal também esteja presente Daí também a importância da consagração, em lei, dos princípios que definem o sector postal em Portugal.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos à Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações, os Srs. Deputados Joaquim Matias e António Brochado Pedras.
Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, ouvi com atenção a sua exposição e quero colocar-lhe três perguntas muito concretas e directas.
O Governo traduziu da directiva comunitária que a Sr.ª Secretária de Estado referiu o nome "serviço universal" e ignorou, a partir daí, o serviço público "correios"
A pergunta que coloco é a seguinte há ou não para o Governo uma parte do serviço postal que é indiscutivelmente serviço público e, nesse caso, qual o procedimento a tomar?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A segunda questão refere-se ao operador público nacional, os CTT-Correios de Portugal, que tem, inclusivamente, uma proposta de modernização, que a Sr.ª Secretária de Estado conhecerá, e a quem, além da obrigatoriedade de manter uma rede pública e o serviço público, algum do qual é deficitário - como a Sr.ª Secretária de Estado sabe -, é garantido um serviço reservado como compensação, sem garantias de tempo e também o recurso a um fundo que não se conhece exactamente qual é, nem em que percentagem vem das outras medidas
A questão é a seguinte como pode um operador público nacional sobreviver, orientar a sua actividade num quadro de instabilidade como o que é proposto nesta proposta de lei de bases?

O Sr Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - A terceira questão diz respeito aos trabalhadores e a uma matéria muito concreta que é o Fundo de Pensões, o qual tem um "buraco" de 95 milhões de contos, que foi contratualizado com a empresa para ser reposto num prazo de 26 anos.
Ora, com um operador público nacional que vai ficar com uma vida extremamente instável e incerta, como é que poderá suportar a sua gestão, cumprindo este contrato com o Fundo de Pensões e ainda participar na concorrência7 Isto, porque não creio que a Sr.ª Secretária de Estado queira retirar os Correios de Portugal de participarem nas actividades concorrenciais

Vozes do PCP: - Muito bem!

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Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente João Amaral.

O Sr. Presidente: - A Sr.ª Secretária de Estado pretender responder em conjunto aos dois pedidos de esclarecimento?

A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações: - Respondo em conjunto, Sr Presidente

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem, então, a palavra, o Sr. Deputado António Brochado Pedras.

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, V. Ex.ª referiu que até 1 de Janeiro do ano 2000 e, depois, em 1 de Janeiro do ano 2003, o Parlamento Europeu e o Conselho deverão tomar decisões no sentido de uma ulterior liberalização gradual e controlada do mercado postal, designadamente no que diz respeito ao correio transfronteiriço, à publicidade endereçada e a revisão dos preços e pesos da correspondência
Mas a directiva comunitária, que foi agora transposta para a ordem interna portuguesa, através desta proposta de lei, diz, a certa altura, no Capitulo 3.º, artigo 7.º, n.º 3 que "estas decisões(...)" - refere-se as decisões do Parlamento Europeu e do Conselho - "(...) assentam numa proposta da Comissão a apresentar antes do final de 1998(...)", pelo que pergunto a Sr.ª Secretária de Estado se tem conhecimento de que a Comissão haja feito qualquer proposta neste sentido.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Secretária de Estado.

A Sr.ª Secretaria de Estado da Habitação e Comunicações: - Sr. Presidente Sr. Deputado Joaquim Matias, em primeiro lugar, quanto a primeira pergunta, o serviço publico de correios e exactamente aquilo que se chama neste momento serviço reservado, como, alias, está expressamente previsto no n.º 1 do artigo 11.º da proposta de lei, que diz que estes serviços reservados constituem um serviço publico de correios referido na lei Trata-se, portanto, de definir com os conceitos correspondentes a directiva europeia e de os transpor para a legislação portuguesa.
No que diz respeito ao operador publico nacional, contrariamente ao que foi afirmado, de facto, esta lei de bases e inteiramente compatível com a directiva, e não poderia ser de outro modo. Mas se os Srs. Deputados leram a directiva sabem perfeitamente que ela da margem de actuação para os Estados e que essa margem foi utilizada por Portugal que tem uma lei de bases, que aqui vos é apresentada diferente da de outros países. E é diferente em vários sentidos por um lado, porque o Governo português aproveitou ao máximo as possibilidades dadas para a definição dos serviços reservados, e, por outro lado, porque utilizou ao máximo as capacidades do Estado de poder apoiar um período de reconversão do operador publico nacional de correios.
Não penso que haja qualquer factor de instabilidade, na medida em que, por um lado o Estado português autorizou essas capacidades com o máximo que era permitido pela directiva e, por outro lado, porque a redefinição dos limites dos serviços que estão vedados à concorrência será revista pela União Europeia e, portanto, é prudente que venha já prevista na lei essa possibilidade, porque se não teria de ser alterada na altura Não me parece, portanto, que advenha daí alguma instabilidade Antes pelo contrário, penso que é salutar que aquilo que já sabemos venha inscrito na lei de modo a sabermos exactamente aquilo de que estamos a falar e também aquilo que temos para discutir no âmbito comunitário Aliás, nesse âmbito, como sabem, esta directiva foi extremamente polémica teve minorias de bloqueio, durante muitos meses, por vários grupos da União Europeia, com posições antagónicas, e nós, muitas vezes, colaborámos nessas minorias de bloqueio que, em todos os casos, sem Portugal não teriam existido
Evidentemente que a Comissão, nessa altura, em 1998, pensava fazer uma directiva, aquela que o Sr Deputado referiu Felizmente essa fase foi ultrapassada e, neste momento, por aquilo que me é dado saber, a Comunidade Europeia não pretende fazer uma directiva sobre essa matéria Adiou essa reunião várias vezes e penso que, amanhã mesmo, os comissários europeus irão realizar uma reunião, mas, pela informação que posso ter - e, obviamente, sem poder dizer-vos qual a decisão que tomarão, por acaso, exactamente amanhã -, a posição da Comunidade Europeia não é a de a Comissão, sobre esta matéria, exercer alguma coacção sobre os Estados mas, pelo contrário, a de manter uma posição mais gradual, mais equilibrada e, portanto, mais conforme com a lei de bases que nós próprios queremos adoptar e que o Governo já havia proposto, aliás, desde Maio do ano passado.
Portanto, neste sentido, acabámos por ter uma boa previsão daquilo que penso que amanhã virá a acontecer na Comunidade Europeia.
No que diz respeito ao Fundo de Pensões dos CTT, agradeço a pergunta formulada pelo Partido Comunista Português, pois, tendo sido Deputada aqui durante muito tempo e tendo acompanhado este sector durante muito tempo, foi uma situação que sempre me preocupou, na medida em que se tratava, de facto, de uma situação em que, com a separação das telecomunicações, não tinha sido precavida pelo Governo anterior uma correcta dotação do Fundo de Pensões E devo dizer-lhe que foi uma das minhas primeiras medidas, logo que tomei posse Logo na primeira semana, contactou-se com empresas especializadas do sector para fazerem um estudo aprofundado sobre o Fundo de Pensões dos CTT, estudo que, aliás, foi relativamente longo, uma vez que a própria identificação de todas as situações pessoais não estava rigorosamente feita Foi necessário coligir muitos ficheiros e o estudo teve como conclusão que as dotações necessárias para o Fundo de Pensões poderiam ser conseguidas de várias formas E aquilo que o Governo fez foi exactamente garantir a dotação necessária ao Fundo de Pensões, de acordo com as recomendações técnicas dos estudos que foram levados a cabo sobre este sector, de forma a garantir que, no futuro, todas estas pensões ficassem, de facto, asseguradas.
Para o efeito, como sabe, no ano passado, houve um compromisso, por parte do Estado, de dotar a empresa com 90 milhões de contos, porque isso era necessário para garantir a viabilidade deste Fundo de Pensões, sendo que o restante da dotação, que, obviamente, como sabe, não é um "buraco" mas, meramente, uma previsão de necessidades no futuro, seria coberto no prazo de 26 anos, na medida em que é o prazo tecnicamente necessário O Sr Deputado Joaquim Matias falou de um "buraco" mas, obviamente, isso não existe, a não ser que a empresa abris-

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se falência hoje e todos os seus empregados fossem para casa, o que não sucede Portanto, trata-se apenas de manter o fundo Aliás, do ponto de vista financeiro, seria até um desperdício de dinheiro fazer isto de outra forma
Trata-se, pois, de um assunto que foi tratado com o maior cuidado e penso que tenho orgulho de, como Secretaria de Estado, ter resolvido um problema que se arrastava há muitos anos,

A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): - Muito bem!

A Oradora: - como sabe, desde sempre, e que, desta vez, foi, efectivamente, resolvido, e de acordo com as recomendações técnicas dos especialistas nesta matéria

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Nestas condições!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Brochado Pedras

O Sr. António Brochado Pedras (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados A proposta de lei ora em discussão, que estabelece as bases gerais dos serviços postais, visa, essencialmente, transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 97/67/CE, de 15 de Dezembro de 1997 Por conseguinte, é esta directiva europeia que hoje, aqui, inatamente, vamos discutir, analisar e votar, em autêntico acto de soberania, num verdadeiro exercício de fiscalização política.
Que razões, que objectivos, que efeitos e quais as soluções adaptadas para aquela directiva9 Para respondermos a estas questões, consideramos útil fazer uma brevíssima reflexão sobre o enquadramento factício e real em que a mesma se processou e analisar, rapidamente, a nova realidade que surgiu nos últimos 10 anos E, neste ultimo decénio, muita coisa vimos um mundo em constante aceleração e mutação, novas tecnologias de informação (fax, computadores telemóveis, Internet, etc ), novos serviços e produtos (express mail, direct mail, correio electrónico), novas formas de concorrência, progressiva liberalização do mercado postal e das telecomunicações, preços mais concorrencial" e clientes mais exigentes, internacionalização da economia e globalização de mercados.
Todas estas circunstâncias e factores conduziram a uma nova visão e a uma nova estratégia do sector postal, traduzidas, designadamente, no seguinte abertura dos mercados postais los grandes operadores privados internacional , que actuam a custos cada vez mais baixos, separação de tacto dos correios das telecomunicações, transformação de operadores públicos em sociedades anónimas, privatizatizações e separação de actividades ou negócios, alianças entre operadores públicos e privados, diversificação de operadores privados de encomendas, crescimento da quota dos operadores privados no segmento do correio internacional.
Perante esta alteração de circunstâncias, que colocou novos problemas, duvidas e desafios, houve necessidade de buscar novas regras de jogo e de harmonizar o mercado interno no sector postal, nomeadamente no serviço posta! universal, dada a diversidade das condições da sua prestai, ao de Estado membro para Estado-membro, tendo em conta que os correios e telecomunicações constituem um verdadeiro sistema nervoso da sociedade e representam um sector vital de progresso e desenvolvimento na Comunidade e no mundo.
No âmbito da União Europeia, elaborou-se um Livro Verde dos Correios, em 1992/93, adoptaram-se resoluções, uma do Parlamento Europeu, outra do Conselho da União Europeia, sobre o desenvolvimento dos serviços postais comunitários e melhor da qualidade de serviços, e, finalmente, surgiu a tal directiva que, há pouco, citei.
Entre os princípios fundamentais desta directiva, há dois que se salientam, um dos quais é o da definição e garantia de um sistema universal em cada um dos Estados-membros. E este princípio é caracterizado pela oferta permanente de um conjunto mínimo de serviços postais com qualidade especificada, prestados em todos os pontos do território, a preços acessíveis a todos os utilizadores, em todos os dias úteis, pelo menos cinco dias por semana.
O segundo princípio é o da liberalização gradual e controlada do mercado postal, propiciador de ganhos de eficácia, de produtividade e de rapidez
Ora, foi justamente para conseguir um justo equilíbrio entre estes dois princípios que os legisladores comunitários tiveram de fazer um exercício complexo mas julgo que conseguiram sintetizar um resultado benéfico para todos os Estados e para a Comunidade em geral.
Por um lado, reservaram-se serviços que temos de reputar de autênticos serviços públicos É uma questão de terminologia, pois chamar-lhes serviços universais ou serviços públicos é uma e a mesma coisa, porque são prestados, essencialmente, pelo Estado ou por pessoas colectivas públicas ou, então, por empresas privadas concessionárias desses serviços
Por outro lado, criaram-se os serviços abertos à concorrência Actualmente, sabemos que estão abertos à concorrência, entre outros, a exploração de centros de troca e o correio expresso, desde que não ultrapasse os limites legais de peso e preço.
Uma das condicionantes deste processo de liberalização, e julgo que uma boa condicionante, é a circunstância de que este processo não deve impedir a prestação contínua de determinados serviços gratuitos E dá-se um exemplo típico os Estados, normalmente, concedem isenções aos invisuais ou a quem tem deficiências desse tipo Ora, mesmo que haja liberalização do sector em relação a alguns aspectos dos serviços postais, entende-se que estas garantias de isenção ou de gratuitidade devem manter-se Por outro lado, a liberalização não deve colidir com os serviços reservados mínimos.
Portanto, parece-me que estes dois condicionamentos são absolutamente essenciais para percebermos que a liberalização nunca será total.
A Sr.ª Secretária de Estado já falou aqui das várias medidas e dos calendários que estão previstos para serem tomadas, no sentido de ultimar e acelerar essa liberalização, pelo que não vou falar dessa questão.
Direi, sim, que entre alguns corolários do serviço universal está, por exemplo, um que julgo essencial o de que o regime dos preços tem de ser orientado para os custos E relacionado com esta medida a questão da contabilidade analítica Impõe-se que quem presta serviços universais possa dispor de contabilidade que permita, em cada ocasião, saber qual é o custo dos serviços públicos e também qual é o custo de cada um dos serviços privados.
É também fundamental o estabelecimento de um fundo de compensação de custos para as empresas prestadoras do serviço universal. É que sabemos que muitas vezes estas empresas prestam serviços quase em condições defi-

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citarias e, portanto, têm de ser compensadas por encargos não razoáveis
Outra medida que me parece importante e que é apontada na directiva, é a da instituição de uma entidade reguladora nacional Pretende-se que haja uma instituição absolutamente independente para decidir com brevidade reclamações feitas pelos utilizadores Na lei portuguesa, felizmente, já havia, desde 1981, e foi depois reforçada em 1987, uma instituição, mais concretamente o Instituto de Comunicações de Portugal, que detinha essas funções Portanto, esta directiva, para Portugal, nesse aspecto, não trouxe qualquer novidade Mas, de qualquer forma, veio, no fundo, sublinhar que é importante que haja uma entidade independente que possa decidir, porque ninguém decide com independência quando é, ao mesmo tempo, prestador de serviços e juiz em causa própria
No âmbito nacional, parece-me que a legislação que tínhamos não foi substancialmente alterada por esta lei de bases Muito do que se estabelece agora, na proposta do Governo, já constava quer do Decreto-Lei n.º 176/88, quer do Decreto-Lei n º 188/81 Em todo o caso, quero aqui registar que há absoluta necessidade de consagrar legislativamente o princípio da liberalização gradual e controlada Julgo que esta foi a grande novidade da directiva e, justamente por isso, havia necessidade de adaptar o regime português a este princípio
Quanto ao mais, o legislador português sempre manifestou, de uma forma inequívoca, que terá de haver sempre um serviço mínimo público postal De resto, posso salientar que a Lei n.º 88-A/97, de 25 de Julho, veio, justamente, vedar às empresas privadas o serviço postal público ou universal postal
Por conseguinte, a lei portuguesa, nesta matéria, não precisou da directiva para prescrever algo que julgamos ser fundamental
Para terminar, diria o seguinte nos termos do artigo 249.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, as directivas comunitárias vinculam os Estados-membros quanto ao resultado a alcançar mas não quanto à forma e aos meios
Quero aqui congratular-me pelo facto de o objectivo, a finalidade desta directiva não ser, felizmente, inconstitucional nem contrariar legislação fundamental portuguesa, porque se contrariasse estávamos atados de pés e mãos
Por isso mesmo, entendo que há razões para estarmos contentes Esta directiva, no que diz respeito aos objectivos.

O Sr Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, peço desculpa, mas tem de terminar.

O Orador: - Vou terminar, Sr Presidente.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Sr. Deputado, tem mesmo de terminar, porque não tenho possibilidade de estar aqui mais tempo.

O Orador: - Termino já, Sr. Presidente Saliento, apenas, que a directiva revela muito bom senso, ponderação, equilíbrio e profundo conhecimento sobre a matéria em causa.
Por isso mesmo, o articulado desta proposta de lei, que se fundamentou justamente na directiva, tem de ter o voto favorável do Partido Popular do CDS PP

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Matias-

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados A proposta de lei n.º 183/VII, que o Governo apresentou a esta Assembleia, pretende definir as bases gerais a que obedece o estabelecimento, gestão e exploração de serviços postais no território nacional, incluindo os internacionais com origem ou destino no território nacional.
No entanto, o seu conteúdo não consegue atingir, a nosso ver, a necessária clarificação dos objectivos que deveriam presidir a matéria de importância fundamental para o País como é a comunicação via postal.
Limita-se o articulado a uma transposição mecanicista para a legislação nacional da Directiva Europeia n.º 97/67/CE, transposição disciplinada, é verdade, mas só de generalidades, ficando o essencial para regulamentação posterior sem definir, como lhe competia, os parâmetros de enquadramento dessa regulamentação
Cheia de fúria liberalizadora e vontade de satisfazer os anseios dos grupos económicos na exploração da parte rentável dos serviços postais portugueses, é evidente, mas esquecendo-se de clarificar as condições para autorizar essa privatização, garantindo a natureza essencial do serviço e a sua especificidade, incluindo a salvaguarda dos direitos de cidadania em matéria de correspondência, da segurança e da protecção de dados pessoais.
Assemelha-se àquele aluno que, sendo capaz de reproduzir num teste teórico qualquer página do manual, que decorou por inteiro, incluindo as vírgulas, não consegue, todavia, executar um único exercício prático, que seja, de aplicação da matéria.
São várias as questões inaceitáveis nesta proposta de lei Em primeiro lugar, o Governo ignorou completamen-te o serviço público de correios, adaptando por tradução, o chamado "serviço universal" que se trata, de facto, de um serviço mínimo garantido até 2003, com qualidade e custos controlados, embora sem parâmetros definidos, ficando todos os outros serviços sujeitos à concorrência Esta situação não pode deixar de nos trazer à memória automaticamente as experiências "brilhantes" das tarifas da electricidade e das chamadas telefónicas locais.
Não é esta seguramente a forma de tratar um serviço de primeira necessidade para os portugueses individualmente, mas também indispensável ao desenvolvimento regional e às actividades económicas, sociais e culturais.
Em segundo lugar, os CTT - Correios de Portugal, operador público português, embora não reconhecido na proposta de lei como tal, ficarão com a incumbência de prestação do tal serviço mínimo e da gestão e exploração da rede pública, sem o reconhecimento de que se trata de um serviço público e sem a garantia de financiamento de actividades que, como já acontece hoje, venham a revelar-se deficitárias.
Poderá ter acesso a um fundo de compensação de custos de serviço universal proveniente dos prestadores de serviços postais, sem qualquer critério definido à partida quando, como é evidente, se deveria basear numa percentagem da facturação efectuada.
Fica ainda com alguns serviços reservados em regime de exclusivo que, a qualquer altura, o Governo poderá retirar, de modo próprio, ou por iniciativa comunitária, no quadro da liberalização progressiva no sector o que não é, de forma nenhuma, tranquilizador para os CTT, que têm apenas 30% do tráfego médio europeu, com tendência para

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crescimento em especial no chamado direct mau que, evidentemente, não resistirá à cobiça privatizador assim que atinja valores interessantes.
Em terceiro lugar, a garantia dos direitos dos trabalhadores dos CTT, designadamente no que se refere a manutenção dos postos de trabalho e ao fundo de pensões com o défice actual de cerca de 95 milhões de contos, contratualizado com a empresa para a sua reposição em 26 anos, contrato que poderá ficar comprometido com a aplicação desta lei, dado que não é tido minimamente em consideração, quer na obrigatoriedade da prestação de serviço deficitário, quer nas condições concorrenciais.
Refira-se ainda que, relativamente as concessões a privados, não e estabelecida a qualidade do serviço a prestar, a forma de concessão, a garantia de meios próprios, a efectividade de fiscalização, o direito dos utilizadores a audição através de um conselho nacional e a clarificação das infracções.
Por outro lado, ao operador de serviço publico não são dadas garantias de um serviço publico e actividades exclusivas de forma estável, bem como um financiamento do fundo de compensação, definido a partida de forma a garantir todos os compromissos dos CTT, incluindo o do Fundo de Pensões.
Obriga se o operador He serviço publico a manutenção e gestão de uma rede publica necessariamente onerosa, que pode-a constituir mais um financiamento indevido do sector privado, se não for definido, como efectivamente não esta neste diploma, que o acesso se faça exclusivamente de forma integrada e a preços de custo.
Sr Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Deputados: A presente proposta de lei não serve as condições concretas do nosso serviço postal, não garante a qualidade e preço que se exige a um serviço publico com a natureza social que lhe é intrínseca, não assegura a defesa dos direitos de cidadania dos seus utilizadores, nem garante os direitos dos trabalhadores dos CTT - Correios de Portugal, pelo que merece a nossa rejeição.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr Deputado António Barradas Leitão.

O Sr. António Barradas Leitão (PSD): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretaria de Estado Srs. Deputados: As comunicações constituem hoje e cada vez mais, uma actividade com enorme impacto no tecido económico e social do Pais.
Desde o inicio dos anos 90 que o sector das comum cações tem vindo a sofrer, ao nível internacional, uma profunda e rápida mudança, com uma agressiva afirmação de concorrência com contornos mundiais.
Portugal usufruía de um sistema de comunicações perfeitamente arcaico e incapaz de lidar com os ventos de mudança internacionais E assim que surge o ICP - Instituto das Comunicações de Portugal e a Lei de Bases das Telecomunicações iniciando-se a reorganização de tão importante infra-estrutura cujo contributo social e económico para o Pais no encurtamento das distâncias internas e na aproximação ao mundo são hoje indesmentível anteciparão em relação aos princípios e orientações que a Comunidade Europeia viria mais tarde a traçar, permitiram a Portugal um pioneirismo, patente, nomeadamente na abei tuia do sector à iniciativa privada, o que, iniciando a salutar concorrência sectorial entre os operadores nacionais numa primeira fase, indiscutivelmente posicionou o sector para a forte concorrência internacional que se avizinha, acautelando riscos desnecessários.
Uma das primeiras opções relevantes foi a separação das actividade de correios das de telecomunicações, e é assim que surge a CN - Comunicações de Portugal, uma holding do Est, o no sector das comunicações A um passo são autonomizadas as empresas prestadoras de serviços complementares de telecomunicações TMN, TELEPAC e TLM, criando-se também a PT - Portugal Telecom, S A , operador único, por fusão da Telecom de Portugal, da TLP e da TDP e que viria, ainda, a aglutinar a MARCONI.
Os serviços submetem-se progressivamente à lógica da qualidade, fomentando-se a aproximação dos preços aos custos reais Os investimentos e os indicadores físicos do sector dizem o resto em relação ao processo modernizativo e espelham hoje o grau de desenvolvimento atingido pelas comunicações nacionais.
A taxa de cobertura postal é muito elevada em Portugal, sendo apenas ultrapassada na União Europeia pelo Reino Unido O tráfego postal veio evoluindo de forma crescente e se em 1990 registava 671 000 expedições, em 1995 esse número era-lhe superior em cerca de 50%, o que diz bem do incremento verificado
Atendendo ao cariz marcadamente social do serviço de correios, o regime que vigorou entre 1987 e 1993, atribuía a fixação das taxas básicas dos serviços a um nível ministerial, acabando esta actividade por ser claramente subsidiada pela actividade que lhe era lateral das telecomunicações
Datam de 1993 as primeiras convenções de telecomunicações e de correios em que a fixação de preços, respeitando determinados princípios e regras passaram a ser negociados no âmbito de uma convenção, envolvendo a Direcção-Geral de Concorrência e Preços, o ICP e os diversos operadores do serviço público de correios e telecomunicações, dispondo de liberdade de fixação de preços exclusivamente no caso de produtos em concorrência Já, então, a estratégia que norteava o percurso dos Correios concedia à empresa autonomizada uma estrutura estável, inserida num quadro institucional definido, segundo uma lógica empresarial de aproveitamento maximizado dos recursos disponíveis Foi prestada especial atenção à diversificação de produtos e serviços oferecidos, de forma a ir ao encontro das novas necessidades dos clientes da empresa.
Esta profunda alteração de estrutura foi acompanhada da criação de uma nova imagem de marca e incluiu a aquisição de sofisticado equipamento ao nível do tratamento e da distribuição postal, para dar capacidade de resposta ao acréscimo e diversificação das actividades.
O próprio projecto de modernização informática foi estendido à colaboração da indústria nacional e dos investigadores do INESC, estando actualmente informatizado todo o tráfego postal, para o que se contou com uma comparticipação a 50 % do FEDER.
Em 1994 procedeu-se a uma reformulação do código postal por fraccionamento dos 20 maiores centros de distribuição, medida que recentemente voltou a ter lugar
A presente proposta de lei resulta, assim, de um longo processo de maturação, decorrente do natural prosseguimento da modernização e reforma do sector das comunicações iniciado no começo desta década, transpondo para o ordenamento jurídico interno vários procedimentos co-

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munitários, visando não só acompanhar a prática europeia em matéria de serviços postais, como tornar competitivos e concorrenciais os serviços postais.
Parece resultar do texto em apreço a obtenção da melhoria da qualidade global do serviço prestado, sem pôr em causa a viabilidade económico-financeira dos serviços postais, garantindo ao mesmo tempo a prestação de um serviço universal que salvaguarde a satisfação da necessidade de comunicação, de qualidade adequada e a preços acessíveis.
Constitui garante do serviço universal a instituir a atribuição de um núcleo de serviços a explorar em exclusividade pelos Correios de Portugal, o que, para nós, é fundamental.
Paralelamente, ao introduzir-se a liberalização gradual e controlada dos serviços postais com abertura progressiva da actividade dos correios à iniciativa privada, visa-se obter ganhos de eficiência acrescida, que não deixarão de se transformar, em última análise, em aumentos de qualidade global.
Apesar da correcção da generalidade das soluções consagradas na proposta do Governo, que, de resto, como atrás afirmei, mais não é que o corolário lógico de todo o processo de restruturação e modernização em curso nos últimos 10 anos, alguns aspectos concretos do diploma poderão receber aperfeiçoamentos, mas sobre eles não nos pronunciaremos neste momento, já que se trata de matéria de apreciação na especialidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Antes de dar a palavra ao próximo orador inscrito, solicito ao Partido Socialista que proceda às diligências necessárias para assegurar o funcionamento desta reunião, visto que há regras que não estão a ser cumpridas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Sr.ªs e Srs. Deputados: Um ano após a publicação da Directiva Comunitária n.º 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno de serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviços, surge a proposta de lei n.º 183/VII que acompanha as orientações comunitárias no domínio do serviço postal.
A intervenção a nível comunitário sobre a actividade postal justifica-se pelos seguintes motivos: má qualidade do serviço intra-comunitário; falta de harmonização de Estado para estado, o que dificulta a disparidade das prestações oferecidas em prejuízo das regiões mais periféricas; distorções quanto ao âmbito dos direitos de exclusividade das empresas operadoras.
No sector das comunicações já este Parlamento tinha dado início à construção do esqueleto legislativo com incidência nesta área. com a aprovação da Lei de Bases das Telecomunicações, sector em rápida evolução e cuja liberalização próxima impunha a definição de regras que todos conhecessem com a devida antecedência. Restava ainda sem um enquadramento legislativo global o sector postal, também ele em fase de liberalização progressiva e num processo de modernização e reorganização.
O serviço postal tem grande peso na Europa, pelo volume de negócios que proporciona, pela população que emprega, pela importância para o desenvolvimento das restantes actividades económicas e pela coesão social que favorece quer entre os cidadãos quer entre estes e as empresas.
Contrariando teses que apontavam o ano 2000 como aquele em que, por evolução tecnológica, se entregaria a última carta, este sector não pára de crescer, tendo acrescentado ao seu portfólio de produtos novos serviços na área da venda por correspondência, marketing directo, distribuição de imprensa, a par de outros na área dos negócios.
A rede dos Correios de atendimento e de distribuição domiciliária constitui, consequentemente, uma estrutura indispensável e, de momento, insubstituível para o quotidiano da vida das famílias e das empresas e, sobretudo, um pressuposto para o desenvolvimento desejado para umas e outras. Daí que a empresa CTT - Correios de Portugal, hoje expressão dos serviços postais no nosso País, assuma um posicionamento decisivo e susceptível de tratamento muito especial no contexto do sector público com incidências nos campos da qualidade e da competitividade, evolução que tende a aprofundar-se e a intensificar-se com as condições subjacentes à edificação do mercado único europeu.
A Comissão Europeia, em face do conhecimento de alguns constrangimentos à natural evolução do sector postal, veio a adoptar, em resultado da publicação do Livro Verde e da sua discussão alargada, um modelo que aceita a abertura progressiva dos mercados com o reforço do serviço universal e a harmonização selectiva.
Esta posição respondia aos seguintes objectivos: assegurar em toda a Comunidade a prestação de um serviço postal universal a preço acessível, conferindo o direito de exploração conjunta de serviços reservados a um ou mais operadores, de modo a garantir os recursos necessários para a execução do serviço público postal nas melhores condições; simultaneamente, abrir à concorrência o sector, na parte possível do mercado; estabelecer as regras e obrigações comuns aos operadores do serviço universal da Comunidade face aos direitos especiais e exclusivos a fim de permitir uma prestação de qualidade dos serviços universais; desenvolver os esforços necessários com vista a uma coesão comunitária.
A proposta de lei n.º 183/VII plasma as grandes orientações comunitárias e assenta nos seguintes princípios: definição de serviços postais e das suas características, textura de rede da oferta face às necessidades do mercado, com normas de qualidade controladas; garantia dum serviço universal acessível e igual para todos; estabelecimento de serviços reservados ao operador a que for
concessionado de serviço público, separação entre funções de regulamentador e operacional; fixação de preço do serviço universal em conexão com os custos a acordar com a entidade reguladora; audição das organizações representativas dos consumidores na fixação dos padrões de qualidade e regime de preço.
Através desta proposta de lei fica o Estado obrigado a assegurar, por via directa ou indirecta, a existência de uma oferta postal permanente, em todo o território nacional, a preços acessíveis, sem discriminação, com carácter de regularidade e em condições de sigilo e segurança.
Definiram-se, com rigor, os serviços básicos a enquadrar neste âmbito e especificou-se a extensão e frequência das recolhas e distribuições domiciliárias, bem como o tipo de objecto postal a que dizem respeito.

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O serviço universal é caracterizado pela sua universalidade, igualdade de acesso, não discriminação dos utilizadores, confidencialidade, continuidade e adaptabilidade às inovações tecnológicas e evolução do mercado
As condições para a prestação daquele serviço seriam a sua qualidade respeitando as normas pré-estabelecidas pelas autoridades reguladoras, a publicação de informação sobre os serviços e procedimentos acessíveis na resolução de litígios, os preços acessíveis e fixados em função dos custos reais, o acesso ao serviço equitativo e não discriminatório e de acordo com as expectativas razoáveis dos utilizadores e a sua frequência, admitindo-se como mínima a existência de recolha e distribuição uma vez por dia útil.
A caracterização do serviço universal, como se estabelece, é clara e sem ambiguidades para evitar abusos e permitir ao órgão regulador agir em conformidade.
Como compensação do serviço nacional surge a fixação de um conjunto de serviços reservados, monopólio da entidade a que for cometida aquela obrigação e cujo conceito tenderá a evoluir por forma a acompanhar a liberalização do mercado postal.
O critério peso/preço foi o encontrado para delimitar o serviço reservado - sendo liberalizado todo o correio com mais de 350 gr e com um peso superior a cinco vezes a taxa base nacional normalizada mais rápida.
Paralelamente e dirigido ao prestador do serviço universal é criado um fundo de compensação de custos, alimentado pelos operadores que prestem serviço na área não reservada mas no âmbito do serviço universal e pelos lucros da actividade filatélica.
Este fundo poderá ser utilizado se a entidade reguladora considerar que os custos originados pela obrigação do serviço universal não são razoáveis.
A proposta de lei remete ao ICP a função reguladora, não só para garantir a defesa dos interesses dos utilizadores mas também por forma a que os operadores tenham um tratamento imparcial.
A independência da função regulamentar é o melhor garante da optimização do equilíbrio entre os operadores privados e públicos e entre fornecedores de serviços reservados e não reservados Cabe também ao ICP monotorizar a eficiência e criar sistemas de controlo para os serviços reservados
Sr Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados Com a aprovação desta proposta de lei, estão criadas as condições para uma melhor harmonização da actividade postal em Portugal onde lá se estabeleceram vários operadores, sendo certo que a solução encontrada nos parece equilibrada, pui que visa concertar vários interesses, apontando-se para a coexistência de um sector de serviços reservados e um sector de serviços liberalizados num quadro geral de livre concorrência
Com a apresentação desta proposta de lei o Governo avança na prossecução do seu programa e dota o País de um instrumento imprescindível para regular a actividade postal e vai provocar a modernização e a reestruturação do operador do serviço reservado e preparar a liberalização e a abertura do mercado, mas sem deixar de dar garantias ao actual operador de capital público, CTT, salvaguardando os seus direitos adquiridos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Esta proposta de lei surge, assim, como primeira etapa de um processo que a Comunidade já aprovou e cuja evolução se espera que em 2003 possa ter novos desenvolvimentos, para os quais temos de estar preparados
Daí que a sua aprovação seja não só urgente como necessária para os diplomas complementares desenvolvam os princípios incorporados neste diploma.
Pela parte do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, entendemos ser nossa obrigação aprovar esta proposta de lei, porque assim viabilizaremos um quadro que nos permite neste sector acompanhar os países mais evoluídos da Europa.

Aplausos do PS.

O Sr Joaquim Matias (PCP): - Como, por exemplo, a França e a Inglaterra, não é verdade?

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Barradas Leitão

O Sr. António Barradas Leitão (PSD): - Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro, nós expressámos claramente a nossa posição de concordância com o diploma, mas há quem não esteja tão tranquilo em relação às consequências que esta proposta de lei pode vir a ter, nomeadamente os trabalhadores da empresa CTT que se queixam de não terem sido ouvidos até agora sobre esta matéria.
Assim, a pergunta que lhe coloco é a de saber se entende ou não que esta matéria deveria ter sido submetida à apreciação dos trabalhadores da empresa pelo Governo Não tendo sido feito isso, pergunto-lhe se o Partido Socialista está ou não disponível para acolher eventuais sugestões que venham a ser apresentadas pelos trabalhadores da empresa em fase de discussão do diploma na especialidade

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Serrasqueiro.

O Sr. Fernando Serrasqueiro (PS): - Sr. Deputado António Barradas Leitão, acolho as suas palavras e, naturalmente, da parte do Grupo Parlamentar do PS estaremos dispostos a analisar aspectos de pormenor, nomeadamente as propostas de alteração que o senhor nos disse aqui que o PSD irá apresentar. Analisá-las-emos a devido tempo e estaremos disponíveis para que este processo seja conforme a possibilidade de haver um grande consenso, porque este procura ser um diploma que quer acolher os maiores contributos possíveis, embora balizado pela directiva comunitária.
Quanto aos trabalhadores - e eu sou trabalhador dos CTT -, devo dizer que, neste processo, a Comissão que analisará na especialidade esta proposta de lei poderá ouvi-los e, se houver algo que possa ser melhorado, teremos toda a disponibilidade para analisar essas propostas e todas as que, eventualmente, cada um dos grupos parlamentares entender conveniente apresentar, balizado, como já disse, pela directiva que todos teremos de aceitar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma última intervenção, tem a palavra a Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações.

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A Sr.ª Secretária de Estado da Habitação e Comunicações: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que se gera um grande consenso em torno deste diploma, o que é importante numa lei de bases. Tenho pena que o PCP não se associe a este consenso e não reconheça que, de acordo com a directiva aprovada, ela veio defender da melhor maneira possível o interesse de Portugal nesta matéria.
Aliás, gostaria de dizer que foram informalmente, no meu Gabinete, contactados os trabalhadores que, nesta matéria, na altura, também fizeram esta mesma leitura. Não terá sido formalmente, mas tenho, por mim, uma grande prática de participação e, portanto, normalmente, não faço as coisas nas costas.
Gostaria de dar três ou quatro pequenos contributos para este debate que aqui se fez Em primeiro lugar, estamos a aprovar esta lei de bases praticamente um ano depois de a Directiva ter sido aprovada Devo salientar que o Governo português foi o primeiro a aprovar, em Conselho de Ministros, esta lei de bases, antes de qualquer outro governo europeu, remeteu-a para a Assembleia da República e apenas o seu agendamento ocorre mais tarde, o que fará com que não sejamos o primeiro país a ter uma lei de bases dos serviços postais Mas o Governo foi, de facto, o primeiro a aprová-la, uma vez que, como sabem, isso já aconteceu há muitos meses.
Em segundo lugar, penso que foi aqui salientada a enorme importância da Directiva e penso que é importante que isso tenha sido feito, não no sentido de que o Governo nada fez para além de traduzir, porque penso que aí havia alguma capacidade de manobra, mas, sobretudo, porque me parece que o Governo português teve, na discussão desta Directiva, um papel extremamente activo. E penso que a Directiva não seria assim se Portugal não tivesse tido este papel activo Aliás, como sabem, não é por acaso que ela foi aprovada num dia complicado (17 de Dezembro, quando decorria uma cimeira entre o Chanceler Helmut Kohl e o Presidente Chirac), uma vez que se tinha entrado numa certa crise, com minorias de bloqueios permanentes, tendo sido necessário trabalhar até altas horas da noite para que, com o envolvimento directo de muitos países - e, neste caso, o envolvimento de Portugal foi, de facto, muito importante, pois acabou por ser o autor de algumas das fórmulas finais que conseguiram esse consenso -, se chegasse, de facto, a uma Directiva relativamente consensual.
Evidentemente, parece-me estranho falar de uma tuna liberalizadora, uma vez que a posição de Portugal - penso - foi sempre bastante equilibrada neste sector e a preocupação, sobretudo com o emprego, esteve sempre extremamente presente, não só da nossa parte mas também da de outros países europeus
Foi, aliás, por isso que se conseguiu um certo número de evoluções e devo dizer que, já depois da Directiva, nas próprias reuniões de Conselho, houve um certo consenso para se falar mais numa necessidade de modernização e de liberalização progressiva do sector, a qual o Sr Deputado disse aqui que nunca será total. Infelizmente, ainda há dois anos, a grande maioria dos países representados na Comunidade tinham como princípio que fosse total e Portugal é capaz de ter sido dos países que fazem com que eu tenha esperança que amanhã, no Conselho de Comissários, essa situação já tenha alguma evolução. Mas penso que não foram "favas contadas"; devo mesmo dizer-lhe que havia uma maioria em sentido contrário, durante longo tempo, na Comunidade Europeia.
No que diz respeito ao direct mau, aqui referido pelo Partido Comunista, devo prestar também algum esclarecimento sobre esta matéria. A não liberalização do direct mau foi um dos pontos em relação aos quais Portugal foi extremamente intransigente e era, aliás, dos pontos que poderiam ter permitido, porque outros países não se importavam com essa liberalização, que isso tivesse acontecido.
Penso que este esforço de Portugal foi importante e veio a ser coroado de êxito. Agora vou dar-vos uma informação que penso que não conhecem porque ainda não é oficial: é que existe, neste momento - e colaborámos neste pedido de parecer - , um parecer do gabinete do Comissário Van Miert sobre a concorrência, que vem fundamentar, pela primeira vez, o afastamento do direct mau das possibilidades de liberalização por considerar que seria uma ingerência no sigilo do serviço postal. Isto significa a existência, pela primeira vez, de um parecer jurídico que vem pôr em causa uma maioria de países europeus, dando razão a uma posição que Portugal, aliás, com o anterior governo, mas, sobretudo, com este Governo, aqui tomou.

Aplausos do PS.

O Sr. Joaquim Matias (PCP): - Mais cuidadoso que a lei de bases, então!

Risos do PCP.

O Sr. Presidente (João Amaral): - Srs. Deputados, dado não haver mais inscrições, terminámos a nossa ordem de trabalhos de hoje. A votação terá lugar à hora regimental da próxima sessão em que houver votações.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, às 10 horas, tendo, como ordem do dia, uma sessão de perguntas ao Governo.
Srs. Deputados, está encerrada a sessão.

Eram 20 horas e 25 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa para publicação e relativa à votação final global do texto final elaborado pela Comissão de Administração do Território, Poder Local, Equipamento Social e Ambiente sobre o projecto de lei n.º532/VII - Reajustamento da área administrativa da cidade de Viseu (PS)

Hoje, a Assembleia da República fez justiça a Viseu se aprovar em votação final global a lei de "Reajustamento da Área Administrativa da Cidade de Viseu", resultante do projecto de lei n.º 532/VII, apresentado pelo PS, secundada, posteriormente, por um outro do PSD no mesmo sentido.
Com a aprovação na Assembleia da República do reajustamento da área administrativa da Cidade de Viseu, apenas com a abstenção de Os Verdes, é eliminado o constrangimento de uma lei de 1 958 e passam a fazer parte da cidade as freguesias de Abraveses, Campo, Coração de Jesus, Santa Maria, São José, Origens, Ranhados, Repeses, São Salvador, Rio de Loba e, parcialmente, as freguesias de Vila Chã de Sá, Fragosela, Mundão e São João de Lourosa.
Esta nova área aumenta oito vezes a da cidade, passando a ser de 91,0 Km2 (17,9% da área do município), triplicando a sua população para cerca de 60 mil habitantes.

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Estamos perante a mais importante reforma administrativa ocorrida no presente século, adequando a cidade de Viseu aos desafios do novo milénio e promovendo a afirmação da cidade no quadro das cidades médias da União Europeia.

desafio estratégico que se coloca a Viseu e o de conciliar o desenvolvimento com a qualidade de vida dos cidadãos, e o de aliar a tradição a modernidade e o crescimento a qualidade ambiental.
O alargamento da cidade impõe novas soluções para problemas que agora têm um novo enquadramento, na medida em que as carências da periferia passaram a ser carências da cidade.
Uma cidade que já não tem os estigmas do interior, mas que não tem ainda os índices de desenvolvimento do litoral, uma cidade que se quer equilibrada, potenciando as parcerias que a sua centralidade regional privilegia na confluência de quatro itinerários em dupla via, o IPS, o IPS, a ligação IP3/IP5, o IC12, a chegada do gás natural, num investimento superior a 30 milhões de contos, a revitalização do comercio tradicional e da zona histórica da cidade, através dos milhões de contos que vêm do PROCOM, a instalação em Viseu de uma Escola Universitária Publica, autónoma a partir da Universidade de Aveiro a instalação de novos serviços regionais, o IPA, o Cerro Regional das Artes do Espectáculo que esta a dinamizar o Teatro Viriato, a Sede Social e a Sede Operacional da BeiraGas, e o Centro de Formalidades de Empresas, são novos instrumentos que o governo considerou para Viseu e que contribuem decisivamente para a afirmação regional da cidade
Contrariamente à descriminação negativa que num passado recente o PSD exercia sobre as autarquias da oposição o Partido Socialista continuara a colocar acima da política partidária os interesses das populações
Srs. Deputados do PS saúdam os viseenses por esta importante conquista e reiteram a sua permanente disponibilidade para concretizar projectos que afirmem positivamente a cidade e a região.

Os Deputados do PS José Junqueiro - Miguel Ginestal.

Faltaram a sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Socialista (PS)

Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Albino Gonçalves da Costa
Ana Catarino Verga Santos Mendonça Mendes
António Bento da Silva Galamba
António Fernandes da Silva Braga
António José Guimarães Fernandes Dias
António Manuel Carmo Saleiro
Arlindo Cipriano Oliveira
Arnaldo Augusto Homem Rebelo
Cláudio Ramos Monteiro
Domingos Fernandes Cordeiro
Eduardo Ribeiro Pereira
Fernando Alberto Pereira de Sousa
Fernando Alberto Pereira Marques
Fernando Garcia dos Santos
Fernando Manuel de Jesus
João Pedro da Silva Correia
Joaquim Sebastião Sarmento da Fonseca Almeida
José Alberto Cardoso Marques
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Carlos da Cruz Lavrador
José da Conceição Saraiva
José de Matos Leitão
José Manuel Niza Antunes Mendes
José Pinto Simões
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Pedro de Carvalho Martins
Mafalda Cristina Mata de Oliveira Troncho
Manuel Francisco dos Santos Valente
Maria do Rosário Lopes
Amaro da Cesta da Luz Carneiro
Maria Eduarda Bento Alves Ferronha
Maria Fernanda dos Santos Martins
Catarino Costa
Maria Jesuína Carrilho
Bernardo Mário Manuel Videira Lopes
Nuno Manuel Pereira Baltazar Mendes
Paulo Jorge Lúcio Arsénio
Pedro Ricardo Cavaco Castanheira
Jorge Raimundo Pedro Narciso
Raul d'Assunção Pimenta Rêgo
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Rui Manuel Palácio Carreteiro
Sérgio Carlos Branco Barros e Silva
Sérgio Paulo Mendes de Sousa Pinto
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Victor Brito de Moura

Partido Social Democrata (PSD)

Alberto Queiroga Figueiredo
Álvaro dos Santos Amaro
Antonino da Silva Antunes
António d'Orey Capucho
António Fernando da Cruz Oliveira
António Joaquim Correia Vairinhos
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Fernando José Antunes Gomes Pereira
Fernando Santos Pereira
Filomena Mana Beirão Mortágua Salgado Freitas Bordalo
Francisco Antunes da Silva
Francisco José Fernandes Martins
Francisco Xavier Pablo da Silva Torres
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
João Álvaro Poças Santos
João Carlos Baniras Duarte
Joaquim Martins Ferreira do Amaral
José Álvaro Machado Pacheco Pereira
José Augusto Santos da Silva Marques
José Bernardo Veloso Falcão e Cunha
José Júlio Carvalho Ribeiro
José Luís de Rezende Moreira da Silva
José Manuel Durão Barroso
Lucília Maria Samoreno Ferra
Luís Carlos David Nobre
Manuel Castro de Almeida
Manuel Joaquim Barata Frexes
Maria de Lourdes Lara Teixeira
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Pedro Augusto Cunha Pinto
Pedro Domingos de Souza e Holstein Campilho
Pedro José da Vinha Rodrigues Costa

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Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Manuel Mamede Passos Coelho.

Partido do Centro Democrático Social - Partido Popular (CDS-PP):

Fernando José de Moura e Silva.
Gonçalo Filipe Ribas Ribeiro da Costa.
Maria José Pinto da Cunha Avilez Nogueira Pinto.
Nuno Jorge Lopes Correia da Silva.
Nuno Kruz Abecasis.
Pedro José Del Negro Feist

Partido Comunista Português (PCP):

António Luís Pimenta Dias.
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas.
Maria Odete dos Santos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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