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Quinta-feira, 5 de Setembro de 2002 I Série - Número 36

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

COMISSÃO PERMANENTE
REUNIÃO DE 4 DE SETEMBRO DE 2002

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões

S U M Á R I O

O Sr. Presidente declarou aberta a reunião às 15 horas e 20 minutos.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação de requerimentos e de respostas a alguns outros, bem como da proposta de lei n.º 23/IX e das propostas de resolução n.os 11 e 12/IX.
A Câmara aprovou um parecer da Comissão de Ética relativo à substituição de Deputados do CDS-PP, PSD e PS.
Foram ainda aprovados três pareceres da Comissão de Ética, autorizando igual número de Deputados do PS e do PSD a depor em tribunal.
O Sr. Deputado José Sócrates (PS) deu conta das razões que levaram o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a pedir o agendamento no período da ordem do dia da portaria que define um novo regime para as isenções fiscais dos bancos sobre lucros resultantes de operações no offshore da Madeira. Respondeu, depois, aos pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Lino de Carvalho (PCP) e da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite), que também exerceu a figura regimental da defesa da honra pessoal. Em interpelação à Mesa, usaram também da palavra os Srs. Deputados Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) e Jorge Neto (PSD).
O Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) chamou a atenção da Câmara para a preparação pelos Estados Unidos da América de uma guerra contra o Iraque, dando conta que o seu grupo parlamentar vai dirigir ao Sr. Presidente e à conferência de líderes um pedido de realização de um debate de urgência sobre esta questão.
O Sr. Deputado Guilherme Silva (PSD), referindo-se à rentrée política, salientou a intervenção do Presidente do PSD, Dr. Durão Barroso, em que este definiu a agenda política dos próximos tempos e a programação e calendarização da acção governativa, e desafiou, ainda, o Partido Socialista a fazer um pacto de regime para a resolução do problema das finanças pública e orçamentais. Respondeu, depois, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Manuel Alegre (PS), o qual, por sua vez, também deu explicações ao Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP), que exerceu a figura regimental da defesa da honra da bancada.
O Sr. Deputado Bernardino Soares (PCP) falou das consequências sociais e laborais do encerramento e falência de empresas e, particularmente, da deslocalização de empresas transnacionais e criticou o Governo por estar a conduzir uma política que vai contra os interesses do País, tendo respondido, depois, ao pedido de esclarecimento do Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP).

Ordem do dia. - Procedeu-se ao debate, por iniciativa do Governo, sobre a execução orçamental de 2001, tendo usado da palavra, a diverso título, além da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes), os Srs. Deputados Francisco Louçã (BE), Lino de Carvalho (PCP), Guilherme d'Oliveira Martins (PS), Jorge Neto (PSD), Diogo Feio (CDS-PP) e Joaquim Pina Moura (PS).
Procedeu-se, ainda, ao debate, por iniciativa do PS, sobre a Portaria n.º 555/2002, da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, referente à imputação de lucro tributável das entidades licenciadas para operar nas zonas francas da Madeira e ilha de Santa Maria. Intervieram, a diverso título, além da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Vasco Valdez), os Srs. Deputados Eduardo Cabrita e José Sócrates (PS), Lino de Carvalho (PCP), Guilherme Silva (PSD), Francisco Louçã (BE), João Cravinho e António Costa (PS), Hugo Velosa (PSD), Diogo Feio (CDS-PP), Joaquim Pina Moura e Guilherme d'Oliveira Martins (PS).
A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza) encerrou a reunião eram 20 horas e 5 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 15 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados presentes à reunião:

Partido Social Democrata (PSD):
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
Arménio dos Santos
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Fernando Santos Pereira
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
João Bosco Soares Mota Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Pedro Miguel de Azeredo Duarte

Partido Socialista (PS):
António Luís Santos da Costa
Ascenso Luís Seixas Simões
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
João Cardona Gomes Cravinho
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
José Manuel Santos de Magalhães
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Paulo José Fernandes Pedroso

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Narana Sinai Coissoró

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Lino António Marques de Carvalho

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Quero, antes de mais, saudar todos, desejando que tenham tido umas férias muito agradáveis, na companhia das vossas famílias, e que venham retemperados para os trabalhos que nos esperam a partir do próximo dia 15. Rigorosamente, o Parlamento já está a trabalhar, com reuniões das suas comissões, mas, a partir do dia 15, recomeçaremos a sessão legislativa e, nessa altura, os nossos trabalhos tornar-se-ão mais intensos.
Quero também estender os meus cumprimentos e fazer votos de um bom regresso de férias e de bom trabalho aos representantes da comunicação social.
Srs. Deputados, o Sr. Secretário vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram apresentados na Mesa vários requerimentos.
Nos dias 12, 15 e 16 de Julho - ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, formulado pelo Sr. Deputado Carlos Luís; ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado José Vera Jardim; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados Luís Carito e Ricardo Gonçalves; aos Ministérios da Saúde e da Justiça, formulados pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Segurança Social e do Trabalho, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; ao Sr. Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Vitalino Canas; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, à Direcção-Geral de Energia e a diversas câmaras municipais, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro; e ao Sr. Primeiro-Ministro, ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, à Ministra de Estado e das Finanças, à Auto-Estradas do Atlântico, S. A. e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba.
Nos dias 17 e 18 de Julho - à Federação Portuguesa de Futebol, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves; ao Sr. Primeiro-Ministro e à Câmara Municipal de Mondim de Basto, formulado pelo Sr. Deputado Ascenso Simões; à Presidência do Conselho de Ministros e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; aos Ministérios da Economia e das Finanças e à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; aos Ministérios da Saúde, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Diogo Feio; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, à Ministra de Estado e das Finanças e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; e ao Governo e ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita.
Na reunião plenária de 19 de Julho - ao Ministério das Finanças e à Caixa Geral de Aposentações, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado

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Fernando Cabral; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e à Câmara Municipal de Faro, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; ao Ministério da Cultura, formulado pela Sr.ª Deputada Manuela Melo; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pelo Sr. Deputado Osvaldo Castro; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Paulo Pedroso; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Cambra; aos Ministérios da Saúde e da Segurança Social e do Trabalho, formulados pelo Sr. Deputado Bruno Dias; ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Honório Novo; e a diversos Ministérios e à Câmara Municipal de Viana do Castelo, formulados pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
Nos dias 22 e 23 de Julho - ao Ministro da Presidência, ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, aos Ministros de Estado e das Finanças e da Defesa Nacional, a diversos Ministérios e à Câmara Municipal das Caldas da Rainha, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Raimundo; ao Ministério da Educação, formulados pelo Sr. Deputado João Pinho de Almeida; aos Ministérios da Economia, das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Justiça e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho; aos Ministérios da Educação e da Defesa Nacional, formulados pelo Sr. Deputado Luís Fazenda; aos Ministérios da Saúde e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulados pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; ao Ministério da Saúde, formulado pela Sr.ª Deputada Odete Santos; e à Federação Portuguesa de Futebol, formulado pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves.
Nos dias 24 e 25 de Julho - ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro, formulado pelo Sr. Deputado Laurentino Dias; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelos Srs. Deputados José Apolinário e Miguel Coelho; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado José Miguel Medeiros; aos Ministérios dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Luiz Fagundes Duarte; ao Ministério da Saúde, formulado pelo Sr. Deputado Álvaro Castello-Branco; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Narana Coissoró; ao Governo e a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; aos Ministérios da Economia, das Obras Públicas, Transportes e Habitação e da Segurança Social e do Trabalho, formulados pelo Sr. Deputado Honório Novo; e aos Ministérios da Educação e das Finanças, formulados pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Nos dias 29, 30 e 31 de Julho - ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação e à BRISA, formulado pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado João Rebelo; aos Ministérios das Finanças, da Segurança Social e do Trabalho e da Defesa Nacional, formulados pelo Sr. Deputado Francisco Louçã; à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulados pelo Sr. Deputado Carlos Luís; aos Ministérios das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulado pelo Sr. Deputado Acílio Gala; a diversos Ministérios, formulados pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; ao Ministério da Educação, formulado pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; à Câmara Municipal de Lisboa, formulado pelo Sr. Deputado António Filipe; ao Ministério da Justiça, formulado pelo Sr. Deputado Almeida Henriques; à REFER, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Oliveira; e ao Ministério da Educação, à Ministra de Estado e das Finanças e à Câmara Municipal de Torres Novas, formulados pelo Sr. Deputado Herculano Gonçalves.
Nos dias 1 e 5 de Agosto - aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pelo Sr. Deputado Gonçalo Breda Marques; ao Ministério dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas e à Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; ao Ministro Adjunto do Primeiro-Ministro e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelo Sr. Deputado António Galamba; ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Bruno Dias; ao Ministério da Economia, formulado pelo Sr. Deputado Bernardino Soares; a diversos Ministérios e ao IDICT, formulados pelo Sr. Deputado Luís Fazenda; ao Governo, formulado pela Sr.ª Deputada Judite Jorge; e à Câmara Municipal de Torres Vedras, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.
No dia 21 de Agosto - ao Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelos Srs. Deputados João Carlos Duarte e José Miguel Medeiros; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia; e ao Ministério da Administração Interna, formulado pelo Sr. Deputado Manuel Oliveira.
No dia 26 de Agosto - aos Ministérios da Defesa Nacional, dos Negócios Estrangeiros e das Comunidades Portuguesas, da Administração Interna, da Saúde e das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Vitalino Canas; e ao Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulado pelo Sr. Deputado Francisco Louçã.
Por sua vez, foi recebida resposta a requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
No dia 29 de Julho - Honório Novo, Luísa Mesquita, Isabel Castro, Maria Manuela Aguiar, Carlos Alberto Gonçalves, Fernando Pedro Moutinho, Carlos Luís, Bernardino Soares, João Teixeira Lopes, José Apolinário, Duarte Pacheco, Basílio Horta, Miguel Coelho, António Galamba, Miranda Calha, Pina Marques, Vitalino Canas, Bruno Dias, Rui Cunha e Odete Santos.
Nos dias 5 e 6 de Agosto - Eduardo Moreira, Fernando Pedro Moutinho, Bruno Dias, Gustavo Carranca, Paula Duarte, Fernando Serrasqueiro, Isabel Castro, João Rebelo, António Galamba, Vítor Ramalho, Helena Roseta, José Apolinário, Vitalino Canas, Carlos Alberto Gonçalves, Luísa Mesquita e Carlos Luís.
No dia 8 de Agosto - Honório Novo, Fernando Pedro Moutinho, Vitalino Canas, António Galamba, António José Seguro, José Apolinário e Heloísa Apolónia.

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Nos dias 13, 14 e 16 de Agosto - Francisco Louçã, Ana Benavente, Luísa Mesquita, Luiz Fagundes Duarte, António Filipe, Rodeia Machado, Renato Sampaio, Carlos Alberto Gonçalves, Ana Manso, Miranda Calha, Pina Marques, António Galamba, Ascenso Simões, Mota Andrade, Odete Santos, Diogo Feio, João Teixeira Lopes, Bruno Dias, José Apolinário, João Cravinho, Bernardino Soares, Manuel Alegre, Fernando Pedro Moutinho, Vitalino Canas, Nelson Correia, Paulo Pedroso, Maria de Belém Roseira, Fernando Cabral, António Braga, Miguel Anacoreta Correia, Isabel Gonçalves, Honório Novo e Herculano Gonçalves.
No dia 20 de Agosto - Fernando Pedro Moutinho, Maria Manuela Aguiar, Luísa Mesquita, Osvaldo de Castro, Isabel Castro, Vitalino Canas, Odete Santos, António Galamba, José Apolinário, Miguel Coleta, Herculano Gonçalves e Paulo Pedroso.
No dia 22 de Agosto - João Teixeira Lopes, Eduardo Moreira, Ascenso Simões, Luísa Mesquita, Rodeia Machado, Fernando Pedro Moutinho, José Apolinário, António Filipe, António Galamba, Isabel Castro, Diogo Feio e Augusto Santos Silva.
No dia 26 de Agosto - Carlos Luís e Fernando Pedro Moutinho.
No dia 27 e 30 de Agosto - Luísa Mesquita, Honório Novo, Francisco Louçã, Carlos Luís, Heloísa Apolónia, Fernando Pedro Moutinho, Isabel Castro, António Galamba, José Apolinário, Paula Duarte, Ascenso Simões, Luiz Fagundes Duarte, Bernardino Soares e Manuel Oliveira.
Foram, ainda, respondidos requerimentos apresentados por vários Srs. Deputados.
Nos dias 26 e 30 de Julho - Álvaro Castello-Branco, Isabel Gonçalves e Isabel Castro.
Nos dias 5, 6 e 8 de Agosto - Ascenso Simões e Isabel Castro.
Nos dias 13 e 16 de Agosto - João Pinho de Almeida e Isabel Castro.
Nos dias 19, 20, 22 e 26 de Agosto - Isabel Castro.
Nos dias 27 e 30 de Agosto - Isabel Castro e José Apolinário.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, a proposta de lei n.º 23/IX - Autoriza o Governo a tipificar como ilícito de mera ordenação social determinadas infracções à legislação da actividade seguradora e as propostas de resolução n.os 11/IX - Aprova, para ratificação, o Acordo-Quadro de cooperação entre a República Portuguesa e a Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, assinada em Macau em 23 de Maio de 2001, que baixou à 2.ª Comissão, e 12/IX - Aprova o Acordo entre a República Portuguesa e a República da Estónia relativo a transportes internacionais rodoviários de passageiros e mercadorias, assinado em Lisboa em 29 de Maio de 2001, que baixou à 9.º Comissão.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, foi também apresentado na Mesa um relatório e parecer da Comissão de Ética sobre substituição de Deputados, do seguinte teor:

1 - Em reunião da Comissão de Ética, realizada no dia 4 de Setembro de 2002, pelas 12 horas, foram observadas as seguintes substituições de Deputados:
a) Substituição nos termos do artigo 5.º, n.º 2, alínea d), do Estatuto dos Deputados (Lei n.° 3/2001, de 23 de Fevereiro), tendo a Comissão considerado motivo relevante o fundamento apresentado nos termos da deliberação já tomada em 18 de Julho de 2002, por um período não inferior a 50 (cinquenta) dias, com início em 16 de Agosto passado, inclusive:
Grupo Parlamentar do Partido Popular - Miguel Anacoreta Correia (Círculo Eleitoral de Viseu) por José Helder do Amaral;
b) Substituições nos termos do artigo 7.º (renúncia ao mandato), do Estatuto dos Deputados (Lei n.° 3/2001, de 23 de Fevereiro):
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata - Gonçalo Reis (Círculo Eleitoral de Lisboa) por João Antóno Pistacchini Calhau, com início em 20 de Julho passado, inclusive;
Grupo Parlamentar do Partido Socialista - Armando Vara (Círculo Eleitoral de Bragança) por Mota Andrade, com início em 12 de Agosto passado, inclusive, o qual já se encontra em exercício, inicialmente por efeito do regime de substituição.
2 - Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispunha, verificou-se que os substitutos indicados são realmente os candidatos não eleitos que devem ser chamados ao exercício de funções, considerando a ordem de precedência das respectivas listas eleitorais apresentadas a sufrágio pelos aludidos partidos nos concernentes círculos eleitorais
3 - Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.
4 - Finalmente, a Comissão entende proferir o seguinte parecer:
As substituições em causa são de admitir.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, vamos ter de discutir e votar este parecer da Comissão de Ética para que se efectivem as substituições em causa.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Se, porventura, algum dos Srs. Deputados em causa faz parte desta Comissão Permanente já poderá participar nos nossos trabalhos.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela Procuradoria da República - Círculo Judicial de Sintra, Inquérito n.º 937/02.2TASNT, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS) a prestar depoimento por escrito, na qualidade de denunciante, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, Processo n.º 12380/99.4TDLSB,

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a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Edite Estrela (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 3.ª secção do 4.º Juízo do Tribunal Criminal de Lisboa, Processo n.º 10501/97.0TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar a Sr.ª Deputada Leonor Beleza (PSD) a prestar depoimento, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.
Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar às intervenções no âmbito do tratamento de assuntos de interesse político relevante.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que não há tema de maior interesse e relevância política do que aquele que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista pediu para agendar no período da ordem do dia e que diz respeito à publicação da portaria que define um novo regime para as isenções fiscais dos bancos sobre lucros resultantes de operações no offshore da Madeira.
Gostaria de dar conta a todos os Srs. Deputados e a si, Sr. Presidente, das razões que levaram o Grupo Parlamentar do Partido Socialista a pedir o agendamento desta matéria na ordem do dia, bem como de deixar claro perante todos VV. Ex.as a importância que o Grupo Parlamentar do PS dá a esta matéria e o significado político que lhe atribui.
Nestes cinco meses - é certo -, o Governo cometeu, em matéria de política económica, vários erros. Cometeu, desde logo, o erro de fazer o discurso negativista e pessimista, o chamado discurso do «país de tanga», que agora parece querer emendar. Cometeu também o erro de aumentar os impostos, e julgo que não houve elemento que mais minasse a confiança do que tal decisão. O aumento do IVA foi uma decisão errada, que, em muito, veio contribuir para o actual clima de estagnação económica. E houve outros erros, nomeadamente aqueles que resultaram dos cortes no investimento público durante este ano e dos anunciados cortes no investimento público para o próximo ano. Há, aliás, quem diga que são muitos erros para um tão curto espaço de tempo. É claro que todos os governos cometem erros, mas é difícil lembrarmo-nos de um governo que em tão pouco tempo tivesse cometido tantos erros na política económica.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas há, porventura, uma medida que o Governo tomou que não é apenas um erro de política económica. Esta portaria que a Sr.ª Ministra das Finanças publicou não é apenas um erro mas muito mais do que isso: é um escândalo político. Porque esta portaria vai muito para além daquilo que é politicamente admissível: esta portaria aumenta, de forma, aliás, muito despudorada, os benefícios fiscais para os bancos que realizam operações através do offshore da Madeira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não sabe ler!

O Orador: - Talvez convenha contar a história.
Antes da publicação desta portaria, os bancos estavam isentos de impostos nos lucros que auferissem de operações feitas no offshore da Madeira, mas havia um limite, e esse limite decorre, aliás, da natureza do próprio offshore. Esse limite resultava do facto de essas operações só serem autorizadas para capitais de não residentes, o que levava a que a maior parte dos bancos, em média, imputasse a operações realizadas no offshore da Madeira cerca de 5% dos seus lucros. Mas este número de 5% é já um número generoso, porque a maior parte dos bancos mais importantes da banca portuguesa, bem entendido, não têm um número de clientes não residentes que justifique esta percentagem de operações que conduzem a 5% de lucros.
Ora bem, esta portaria vem dizer, logo no n.º 1, assumindo um critério de presunção, que os lucros dos bancos que realizem operações no offshore da Madeira estão isentos de impostos até 20%. Independentemente do número de operações que lá realizem, considera-se que 20% dos lucros estão isentos de impostos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não é isso que diz a portaria! Essa é a interpretação socialista!

O Orador: - Não há duas interpretações quanto a esta portaria! A única interpretação possível é que se trata de uma taxa liberatória sobre 20% dos lucros dos bancos!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Acontece, portanto, que, independentemente do volume de operações feitas no offshore da Madeira, os bancos estão isentos de impostos sobre 20%. Quer dizer: basta que um banco realize uma operação no offshore da Madeira ou no offshore de Santa Maria para ser imediatamente isento de impostos em 20% dos seus lucros. Trata-se, portanto, como disse, de uma espécie de taxa liberatória para os bancos - 20% dos seus lucros não pagam impostos.
Ora, isto configura um regime muito sui generis em Portugal. E duvido que haja um outro país desenvolvido que tenha um regime tão favorável aos seus bancos que atribua esta taxa liberatória. Basta que os bancos realizem

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uma operação para lhes atribuir imediatamente uma isenção fiscal sobre 20% dos seus lucros.
O Governo faz, portanto, um grande favor aos bancos, porque multiplica por quatro - quatro baseando-nos, naturalmente, na percentagem de 5% como média da isenção fiscal anterior - esses benefícios fiscais.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, julgo que não há, do ponto de vista económico, qualquer razão que justifique tal medida.
Em primeiro lugar, porque os bancos não necessitam dela. O sector bancário é, porventura, um dos sectores mais dinâmicos, mais capazes, mais competitivos, e não precisam desta ajuda pública, não precisam deste favor.
Mas há uma outra razão: é que esta portaria e o critério da presunção de proveitos atribuídos por operações no offshore da Madeira também não contribui para melhorar e tornar mais competitivo o offshore da Madeira.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Isto porque se, antes, os bancos tinham de procurar, como era seu dever, os capitais não residentes e atraí-los à economia portuguesa, agora, não têm de o fazer, porque basta realizarem uma única operação e a partir daí considera-se que têm 20% dos lucros isentos de impostos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Ora, isto vai, naturalmente, conduzir a que os bancos nem procurem esses capitais não residentes e se limitem a uma gestão corrente do que têm, porque têm sempre seguro que 20% dos seus lucros estão isentos de impostos.
Esta medida é claramente errada do ponto de vista económico, mas não só: como eu já disse, é uma medida escandalosamente tomada com o objectivo de favorecer os bancos. E é escandalosa, desde logo, porque é imoral.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Isso é uma barbaridade!

O Orador: - Isto acontece exactamente no ano em que o Governo aumenta os impostos para todos os cidadãos!…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Que razão haverá para que os cidadãos sejam mais taxados e os bancos sejam beneficiados?
Que razão haverá que leve um governo a aumentar, e a multiplicar por quatro, os benefícios fiscais para os bancos, no mesmo ano em que corta benefícios sociais de enorme importância, como, por exemplo, o crédito bonificado para jovens que compram a sua primeira casa?
Não há a mínima moralidade para tomar esta medida económica! Isto é verdadeiramente a negação do espírito Robin dos Bosques! Isto não é tirar aos pobres para dar aos ricos! É exactamente o contrário: é tirar aos fracos e dar aos fortes!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Porventura, não haverá melhor exemplo que caracterize aquilo que sempre se disse deste Governo: é forte com os fracos, mas é muito fraco quando se trata de enfrentar os fortes!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Mas esta medida é também escandalosa por uma outra razão, que não apenas a imoral: é porque configura a segunda fraude eleitoral.
Na verdade, já sabíamos que o Governo tinha ganho as eleições com base numa mentira, pois disse aos portugueses que ia descer os impostos. No entanto, em vez de os descer, aumentou-os. O que nós não sabíamos era que o Governo tinha ganho as eleições com base não numa mentira mas em duas mentiras. É que o Sr. Primeiro-Ministro não disse apenas que ia baixar os impostos, disse, também, que iria baixar os benefícios fiscais do offshore da Madeira. O célebre «choque fiscal» tinha que ver com essa possibilidade de baixar os impostos e aumentar as receitas fiscais em função da redução dos benefícios fiscais. Porém, não fez nem uma coisa nem outra! O facto de não ter baixado os benefícios fiscais, mas tê-los multiplicado por quatro, configura, pois, a segunda fraude eleitoral deste Governo! E, a partir daqui, não restará a mínima autoridade moral, nem para esta maioria, nem para o Governo, nem para a Sr.ª Ministra das Finanças, nem para o Sr. Primeiro-Ministro, para falar em justiça fiscal enquanto esta situação permanecer!
Vejo nos jornais - com agrado, devo dizer - que o PSD anuncia, para já por fonte anónima (espero que isto se torne um pouco mais oficial!), que admite rever o regime tributário nas zonas francas. Bom, é um primeiro sinal, é um primeiro passo, que saúdo. Mas quero dizer à maioria parlamentar, ao Governo e a si, Sr. Presidente, que o Partido Socialista não vai largar este assunto e que a única forma de restaurarmos uma moralidade no que diz respeito à procura de uma justiça fiscal em Portugal é revogarmos imediatamente esta portaria.
Não nos contentamos com nenhuma mudança. Contentamo-nos, sim - e esse é o único destino -, porque esta portaria é uma medida económica errada, escandalosamente imoral e que contraria as promessas eleitorais, com a sua revogação.

Aplausos do PS.

Entretanto, deram entrada na Sala a Sr. Ministra de Estado e das Finanças e os Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais e do Orçamento.

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, estamos no ponto 1.3 do período de antes da ordem do dia, que se destina a tratar de assuntos de interesse político relevantes, e, que me conste, a questão que o Sr. Deputado José Sócrates agora aqui suscitou - curiosamente sem a presença da Sr.ª Ministra das Finanças! - está prevista no ponto 2.2 do período da ordem do dia.

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O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Foi para desviar a atenção do ponto 2.1 da ordem do dia!

O Orador: - Aí, o Partido Socialista dispõe de 20 minutos para tratar a questão.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É o golpe do baú!

O Orador: - Pergunto ao Sr. Presidente se é regimental que o Sr. Deputado José Sócrates antecipe uma matéria que está expressamente agendada para um ponto da ordem do dia ou, se pelo contrário, porventura, o que pretenderá - mas, neste caso, já terá de ser o Sr. Deputado José Sócrates a responder - é discutir esta matéria sem a presença da Sr.ª Ministra das Finanças, o que, para nós, não faz qualquer sentido.
Porque cumprimos o Regimento, vamos reservar o momento do debate para o tempo oportuno, que é o ponto 2.2 do período da ordem do dia, em que está prevista a discussão desta portaria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vou dar, desde já, a palavra ao Sr. Deputado Jorge Neto para fazer uma interpelação à Mesa e depois responderei às duas interpelações.
Tem a palavra, Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr. Presidente, a razão de ser da minha interpelação é exactamente a mesma da do Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
De facto, há aqui algo de errado nesta intervenção do Sr. Deputado José Sócrates, porque este ponto está agendado, é o ponto 2.2 do período da ordem do dia. Portanto, não faz sentido fazer uso, ou melhor abuso, não é uso, é abuso, do período de antes da ordem do dia para antecipar uma discussão que está agendada, a seu tempo, repito, no ponto 2.2 da ordem do dia. Isto é perfeitamente disparatado. Não faz o menor sentido.
Aliás, o que me parece decorrer desta inopinada intervenção do Sr. Deputado José Sócrates é que ele pretende desnatar a discussão não do ponto 2.2 do período da ordem do dia mas do ponto 2.1.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sobre as interpelações à Mesa, gostaria de dizer o seguinte: os diversos partidos políticos têm um determinado tempo para usar no período de antes da ordem do dia da Comissão Permanente. Portanto, cada um utiliza-o como pretende. Interpretei a atitude do Partido Socialista como pretendendo enfatizar um assunto, que, depois, terá o seu tratamento e o seu debate no momento próprio.

Vozes do PS: - É claro!

O Sr. Presidente: - Quem pretender pode tirar outras conclusões sobre a agenda do Partido Socialista para esta reunião. Parece-me claro!
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado José Sócrates, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a questão que o Partido Socialista, hoje, decidiu aqui trazer-nos em «dose dupla» - não sei mesmo, aliás, o que vai restar ao Partido Socialista para dizer no período da ordem do dia, mas isso é um problema do Partido Socialista! - é, sem dúvida, importante, mas causa-me alguma perplexidade o momento em que ela é trazida.
Sr. Deputado José Sócrates - e esta é a questão que quero colocar muito brevemente -, a portaria foi publicada em Junho. Aliás, ainda antes de a portaria ser publicada em Diário da República, o Partido Comunista requereu uma reunião da Comissão de Economia e Finanças para a discutir, reunião essa que se realizou, salvo erro, no mês de Junho, com a presença da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, e nessa altura o Partido Socialista guardou um relativo silêncio sobre esta matéria.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Completamente falso!

O Orador: - O Sr. Deputado José Sócrates veio agora dizer que esta questão é a mais importante da conjuntura económica e política. Pergunto: por que é que esta questão é a mais importante só três meses depois?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Sócrates, como dispõe de pouco tempo para responder, dou, desde já, a palavra à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças para pedir esclarecimentos e, posteriormente, dar-lhe-ei mais 1 minuto para que possa responder conjuntamente e ser esclarecedor nas suas respostas.
Tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela Ferreira Leite): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, e antes de qualquer outra observação, queria deixar absolutamente claro que não vai haver qualquer alteração à portaria que foi publicada sobre a zona franca da Madeira. Portanto, Sr. Deputado José Sócrates, aquilo que começou por anunciar não tem qualquer espécie de fundamento, pelo que não haverá revogação dessa portaria.

O Sr. António Costa (PS): - Está mal!

A Oradora: - E não haverá porquê? Porque aquilo que o Sr. Deputado acabou de dizer e aquilo que, repetidamente, tem dito na televisão sobre este tema - provavelmente, por ausência de outros temas, admito-o! - é exactamente o contrário. É absolutamente extraordinário que o Sr. Deputado, depois de se ver e ouvir na televisão, depois de ouvir pessoas respeitadas nessas matérias, como é o caso do Dr. Sá Fernandes,…

O Sr. José Sócrates (PS): - Não vá por aí!

A Oradora: - … continue a dizer o que disse. É que o que está a dizer não é verdade, é exactamente o contrário.

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Protestos do Deputado do PS José Sócrates.

Sr. Deputado, se me der licença, e se me quiser ouvir, explico-lhe o seguinte: de acordo com a vossa legislação, todos os rendimentos de não residentes obtidos na zona franca da Madeira estavam isentos.
Antes de mais nada, Sr. Deputado, é bom que perceba o que são rendimentos de não residentes e o que são rendimentos totais, porque o senhor não sabe. A zona franca da Madeira para não residentes não tinha limite de isenção e, de acordo com a portaria, passa a ter um limite. E sabe porquê, Sr. Deputado? Porque havia uma isenção total desses rendimentos e agora ela é apenas parcial.
Quando o senhor, demagogicamente, diz «mas uma instituição que apenas tem uma isenção de 3% passa a ter uma isenção de 20%», fê-lo porque não sabe, efectivamente, o que são rendimentos de não residentes.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não sabe!

O Sr. António Costa (PS): - Então, explique!

A Oradora: - Se soubesse, não tinha dito uma coisa dessas. Isso é de tal forma…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Absurdo!

A Oradora: - Não é bem absurdo, é uma ignorância total, e o senhor não poderia dizer uma coisa dessas!
Portanto, antes, todos os proveitos de não residentes eram passíveis de não pagar impostos, agora, não é assim: apenas 20% desses rendimentos são susceptíveis de não pagar impostos.

O Sr. José Sócrates (PS): - Não, não!

A Oradora: - Sr. Deputado, não diga «não, não», porque é «sim, sim»!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, chamaram-me a atenção para o facto de o esquema de funcionamento da Comissão Permanente não prever a atribuição de tempo ao Governo para formular perguntas, mas se, porventura, foi um erro, já está feito, pelo que não há volta a dar-lhe.
Em todo o caso, havia a necessidade de esclarecer um assunto que é importante, mas o resto do debate será depois.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates para responder e, conforme eu disse há pouco, dar-lhe-ei mais 1 minuto, para que tenha tempo de ser esclarecedor nas suas respostas.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, em primeiro lugar, gostaria de dizer que o objectivo de nos referirmos no período de antes da ordem do dia a esta matéria releva, tal como o Sr. Presidente teve oportunidade de esclarecer, da importância política que nós atribuímos a esta matéria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Agora!…

O Orador: - Em segundo lugar, gostaria de dizer à Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças que é muito feio esse preconceito de superioridade de conhecimento. Eu nunca o utilizei na discussão política, e isso fica-lhe mal.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Mas eu vou responder-lhe apenas com base nos factos e a Sr.ª Ministra livre-se…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - «Livre-se»?!

O Orador: - … de tentar iludir os portugueses,…

Protestos do PSD.

… porque essa perspectiva de ter sobre a portaria uma visão diferente do que lá está… Porque, sabe, eu sou engenheiro e, porventura, os engenheiros são os únicos que acham que na lei conta o que está lá e não o que lá não está.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Vou apenas mostrar-lhe o seguinte: o relatório de contas da Caixa Geral de Depósitos…

O Sr. António Costa (PS): - Oiça, oiça, Sr.ª Ministra!

O Orador: - … mostra que os lucros imputados à offshore da Madeira são da ordem de 1,6%. Ou seja, 1,6% dos lucros da Caixa Geral de Depósitos foram isentos de impostos no ano passado, mas para o próximo do ano vão ser isentos de impostos 20% dos lucros da Caixa.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não é verdade!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - E ele insiste!

O Orador: - O relatório do BPI indica-nos que cerca de 6% dos seus lucros vão ser isentos de impostos, mas, com esta portaria, 20% dos lucros (é o que está lá dito!) vão ser isentos de impostos. E o mesmo se aplica a todos os bancos.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - É mentira!

O Orador: - O que os senhores fizeram foi um acto económico da maior gravidade do ponto de vista político e, até, do ponto de vista moral, e agora não querem assumir essas consequências e responsabilidades! Mas os portugueses cá estarão para vos julgar!
O que os senhores fizeram foi um erro de política económica e financeira, foi um erro que teve como consequência uma imoralidade e foi também um erro que veio mostrar que o Governo actual ganhou as eleições não com base numa mentira mas com base numa dupla mentira. Vocês mentiram duas vezes. E não podem advogar o vosso desconhecimento, porque muitos dos membros deste Governo têm um conhecimento muito pormenorizado dos

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bancos, portanto, não podem invocar que tomaram esta atitude devido ao desconhecimento.
A verdade é que esta portaria cria uma taxa liberatória para 20% dos lucros dos bancos.
E, se querem outro argumento, ler-vos-ei aquilo que disse o Presidente do BCP,…

O Sr. António Costa (PS): - Ouça agora!

O Orador: - … numa entrevista que deu em Julho. Em resposta à pergunta: «Qual a percentagem de lucros que o BCP imputa à offshore da Madeira?», o Sr. Presidente respondeu: «Muito pouco. Creio que por volta dos 4%», ou seja, não tem significado. O que os senhores lhe dão agora é 20%!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O Orador: - Sr.ª Ministra, a isto chama-se uma única coisa: um favor aos bancos, uma «borla» aos bancos! Foi isso que aconteceu, foi isso que a senhora fez, e não quer assumir essa responsabilidade! Pior: tem vergonha dela!

Aplausos do PS.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Um mentira 10 vezes repetida não se torna verdade! É uma vergonha!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças pretende defender a sua honra pessoal, pelo que darei depois a palavra a si.
Tem a palavra, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Sócrates, o senhor faz parte daquele grupo de pessoas que considera que por repetir muitas vezes uma mentira ela passa a ser verdade. Mas não passa, Sr. Deputado!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Sócrates (PS): - Mentirosa é a senhora!

A Oradora: - O Sr. Deputado disse que não era não sei o quê, julgo que disse que não era jurista. Eu sou economista, também não sou jurista, mas os meus fracos conhecimentos jurídicos ainda são suficientes para saber que nunca seria possível essa alteração que o senhor está a dizer através de portaria, teria de ser a Assembleia da República a fazê-la.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É óbvio!

A Oradora: - Portanto, quando o senhor diz, com o máximo dos descaramentos, que introduzimos uma taxa liberatória ou que criámos isenções em relação a determinados impostos, o senhor sabe que a portaria não poderia fazer isso!

O Sr. José Sócrates (PS): - Pois, pois! Mas é o que vocês têm aqui!

A Oradora: - Não é isso que diz a portaria. Diz tanto esta portaria dos proveitos quanto diz a dos custos! Portanto, o senhor sabe que isso não é assim!

O Sr. João Cravinho (PS): - Não deveria mas é isso que faz!

A Oradora: - Mas, Sr. Deputado, o descrédito fica para quem o cultiva e o Sr. Deputado está a cultivar esse descrédito mais do que já o tinha feito.
Mas há um ponto que não queria deixar de lhe dizer: sendo o Sr. Deputado tão defensor desses problemas das receitas, dos impostos, da zona franca da Madeira, foi pena que no seu governo tenha visto o Ministro das Finanças assinar um despacho, em 1999, suspendendo todas as acções de fiscalização na zona franca da Madeira e tenha ficado calado. Nessa altura, não se indignou, achou bem!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Houve uma isenção através de despacho e, lá se sabe porquê, mandou suspender a fiscalização! Dessa situação, sim, o Sr. Deputado dever-se-ia ter envergonhado e falado. Mas ficou calado! Agora, connosco, o senhor vem levantar um problema que não existe,…

Vozes do PS: - Existe!

A Oradora: - … porque sabe que nós, contra a isenção total, impusemos um tecto!
Sr. Deputado, se faz favor, explique-me, e explique ao País, porque razão ficou calado com essa isenção que o seu governo criou e porque razão suspendeu a fiscalização na zona franca da Madeira!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates. Dispõe de 3 minutos.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, pior do que cometer um erro é cometê-lo e não o assumir.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

O que a Sr.ª Ministra exprimiu nesta intervenção foi a cobardia de não querer assumir um erro.

Risos do PSD e do CDS-PP.

O que está escrito na portaria é exactamente o que eu disse…

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - … e esta é a interpretação que todos os bancos fazem e que responsáveis do Ministério das Finanças fizeram, em declarações públicas e em esclarecimentos

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que enviaram sobre esta matéria. E justamente este assunto demorou tantos meses porque se procuraram esclarecimentos na Comissão e nunca a Sr.ª Ministra disse que essa era a sua interpretação, a qual não corresponde ao que está escrito na portaria! O que está escrito é exactamente o que eu disse: trata-se de uma taxa liberatória!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Por portaria?!

O Orador: - Essa era a vossa intenção! Esse era o vosso desígnio! A Sr.ª Ministra não quer assumi-lo, porque tem vergonha desse acto legislativo! E pelo facto de ter vergonha devo dizer-lhe, Sr.ª Ministra, que «é pior a emenda do que o soneto»!
O que a Sr.ª Ministra fez é uma vergonha, mas vergonha suplementar é a Sr.ª Ministra não confessar e cobardemente dizer que fez outra coisa que não aquilo que fez! Isso é que é muito feio em democracia!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não vou alterar nada!

O Orador: - E, depois, vem com essa história dos governos anteriores?! Então, é essa a sua defesa? Sr.ª Ministra, responda pelos seus actos.
O Partido Socialista denunciou uma das operações mais imorais que este Governo fez e um erro económico. Vocês aumentaram os benefícios fiscais para os bancos…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Isso é mentira!

O Orador: - … no mesmo momento em que aumentaram os impostos para os portugueses, ao contrário daquilo que pediram aos portugueses na campanha eleitoral. Foi isto que se passou. Lamento muito que a Sr.ª Ministra não tivesse tido a galhardia de assumir que fez isto e, pior, não o querendo assumir, venha aqui dizer que não o fez, acusando-me de mentiroso.
Sr.ª Ministra, se há alguém que está a mentir é a senhora, porque escreveu uma coisa e está agora a dizer outra! Isso é feio não só do ponto de vista da lealdade para com a Câmara mas também porque a Sr.ª Ministra não tem a coragem de assumir aquilo que fez e agora, de forma cobarde, escuda-se numa interpretação que não tem o mínimo sentido!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Sócrates, em parte, procurou agora responder àquilo a que, certamente por lapso, não respondeu na fase das respostas.
O Sr. Deputado, de certo modo, ainda não respondeu porque razão é que só três meses depois de sair a portaria e dois meses depois da reunião da Comissão de Economia e Finanças o PS descobriu que esta era a questão económica mais importante da conjuntura.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Exactamente!

O Orador: - A questão é, de facto, importante, vamos discuti-la na ordem do dia e nós temos uma opinião clara sobre ela, mas gostaríamos de ver clarificada esta questão que me deixou um pouco perplexo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Lino de Carvalho, obviamente, não me compete dar esse esclarecimento. Se ele não prestado na altura certa, o caso fica assim resolvido.
Quero apelar a todos os Srs. Deputados e Membros do Governo para que este debate decorra com calma, tranquilidade e elevação. As trocas de palavra duras de parte a parte não adiantam para o esclarecimento destes assuntos.
Para uma intervenção, no âmbito do tratamento de assuntos de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Foi justificada a intervenção anterior por uma escolha, certamente subjectiva do ponto de vista político, sobre o que seria o tema dominante da actualidade.
Reconhecendo a importância do mesmo, que, aliás, faz com que haja um ponto próprio na ordem de trabalhos sobre essa matéria, quero chamar a atenção da Câmara para uma matéria que, no âmbito da política internacional, não deixará de condicionar a política e a posição geoestratégica de Portugal, que é a preparação da guerra com o Iraque.
É um segredo de polichinelo que a administração dirigida por George Bush tornou claro que prepara uma guerra, que ocorrerá nos próximos meses com a invasão e ocupação do Iraque e a substituição do regime de Saddam Hussein.
Entre todos aqueles que não têm nenhuma simpatia nem nenhuma proximidade para com este regime, não deixa de se colocar a mesma pergunta a que aqueles responsáveis pelas relações internacionais têm de responder: qual é o propósito que serve esta guerra, qual é o seu sentido e o que é que ela cria na situação de paz do Mediterrâneo, nas relações internacionais e na organização da resolução de conflitos à escala mundial?
Estou justamente, como muitos outros, entre os que temem que as Nações Unidas comecem a ser reduzidas a um estatuto como aquele que teve a Liga das Nações nos anos 30, em que é incapaz de impedir um conflito, em que é incapaz de arbitrar um conflito e em que é incapaz de resolver um problema emergente nas relações internacionais e que é sempre superada pela lógica belicista e pela lógica da guerra, sendo que o que predomina nesta guerra que se anuncia - e que, ontem, o Primeiro-Ministro inglês, Tony Blair, veio reforçar - é a vitória final de Ariel Sharon. Ou seja, esta guerra visa incendiar o Próximo Oriente em nome das necessidades de uma potência que entende que o mundo é uma questão de política interna dos Estados Unidos.
E se nos Estados Unidos a governação é atravessada por escândalos sucessivos que atingem o Vice-Presidente, que atingem a credibilidade da própria Administração e de um presidente que, aliás, ganhou as eleições de uma forma considerada fraudulenta, em todas essas circunstâncias

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não deixa de ser espantoso que a solução possa ser este atear de uma nova fogueira.
Por isso mesmo, o meu grupo parlamentar dirigirá ao Sr. Presidente e à Conferência de Líderes um pedido de realização de um debate de urgência, visto que uma coisa que Portugal não pode fazer é alhear-se da sua responsabilidade para com a paz no Mediterrâneo, para com a existência de uma política coerente de resolução de conflitos no âmbito das Nações Unidas. Portanto, tem de opor-se, deve opor-se, é necessário que se oponha, a esta guerra sinistra que começa a ser anunciada muito antes de ser declarada. Ela é, no entanto, incontornável na política que se aproxima, não deixará de determinar-nos no plano internacional, e sobre isso, portanto, o Parlamento deve dar uma palavra e o Governo, naturalmente, dever dar também as suas respostas e esclarecer o seu ponto de vista.
Portugal deve contribuir, tem de contribuir, para evitar uma guerra que é sinistra e condenável a todos os títulos.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, antes de iniciar propriamente a minha intervenção, duas notas relativamente à questão que se tem levantado sobre o offshore da Madeira.
Primeira, é para chamar a atenção para a circunstância de o Sr. Deputado José Sócrates, do Partido Socialista, fazer uma interpretação «inconstitucionalizante» da portaria em causa. Há uma regra fundamental na interpretação das leis, que é a de que deve ser feita em conformidade com a Constituição. Não se «inconstitucionalizam» disposições legais com uma interpretação. E V. Ex.ª sabe que, se a portaria tivesse o alcance que lhe dá, seria inconstitucional, porque estaria a dar uma isenção que só é possível conferir através de lei da Assembleia da República.
Por outro lado, o Sr. Deputado José Sócrates tinha obrigação de saber a história deste processo.
VV. Ex.as publicaram uma portaria em Abril para regular esta matéria da imputação ao offshore de rendimentos dos bancos para além do que deveria ser admitido, mas fizeram-no apenas na óptica dos custos, dos encargos, e deixaram de fora a questão dos proveitos e das receitas, ou seja, fizeram-no de uma forma incompleta. E foi já o Governo do PSD que teve de regularizar esta matéria publicando a portaria. Ora bem, sabendo que a portaria visa restringir, a interpretação, tipicamente socialista, que V. Ex.ª faz só tem uma explicação: a de dar tudo aos bancos, a interpretação laxista!
V. Ex.ª defende acerrimamente não a interpretação regular e autêntica daquela lei, mas a interpretação socialista da lei! Fique descansado, porque o governo não é socialista, por isso, a portaria não vai ter essa interpretação, não vai ter essa aplicação!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Fique completamente descansado, porque não é preciso alterar lei nenhuma, mas apenas aplicá-la de acordo com a interpretação conforme à Constituição, com a interpretação restritiva que se pretendeu dar com esta regulamentação!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Fique completamente descansado! Graças a Deus, para todos nós, já não são os socialistas que estão no Governo a fazer esse tipo de interpretações e aplicações!

O Sr. José Sócrates (PS): - Vocês estão é com vergonha daquilo que fizeram!

O Orador: - A segunda nota que quero fazer sobre esta matéria é a de que é lamentável que o maior partido da oposição agarre, sistematicamente, as bandeiras do Bloco de Esquerda - VV. Ex.as são liderados pelo Bloco de Esquerda -, agarre tarde e mal uma bandeira do Bloco de Esquerda para fazer aqui esta figura e, mais uma vez, desprestigiar o offshore da Madeira.
VV. Ex.as devem conhecer as limitações das regiões insulares, devem conhecer as dificuldades das regiões ultraperiféricas mas, quando se lança mão de sistemas como este, para potenciar ainda mais o desenvolvimento das regiões, são VV. Ex.as que promovem aqui, sistematicamente, o desprestígio do offshore da Madeira, o que é absolutamente inaceitável. Quando organizações internacionais como a OCDE apontam o offshore da Madeira como um caso exemplar de regularidade na prática deste tipo de operações, pondo em lista negra outros offshore, são VV. Ex.as, o maior partido da oposição, que denegris e desprestigiais uma entidade com prestígio e que é útil e importante para a Região Autónoma da Madeira.
Mas ainda mais interessante e revelador do sectarismo com que VV. Ex.as abordam esta questão é que a portaria trata tanto da zona franca da Madeira como da zona franca de Santa Maria dos Açores e sobre isso V. Ex.ª, Sr. Deputado José Sócrates, nem uma palavra disse.

O Sr. José Sócrates (PS): - Disse, disse!

O Orador: - Não lhe convém, porque é um governo socialista que está nos Açores!
Estamos, pois, entendidos sobre a forma isenta como VV. Ex.as tratam destas coisas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Faz parte do ritual político a realização, pelas diversas organizações partidárias, dos chamados comícios da rentrée, normalmente entre a aproximação do termo do período de férias e o reinício das diferentes actividades, incluindo a parlamentar.
Referi-me propositadamente a «ritual político», porquanto, de uma forma geral, as intervenções nestes comícios de reinício das actividades têm essa marca e ganham forma subalternizante da substância.
Permitam-me, pois, que, sem menosprezo e com todo o respeito pelas iniciativas dos demais partidos, saliente que a intervenção do Presidente do PSD, Dr. Durão Barroso, marcou a diferença e não constituiu um mero ritual, apresentando-se, antes, como um discurso definidor da agenda política dos próximos tempos e da programação e calendarização de uma nova fase da acção governativa, caracterizada pelo reforço da relação de confiança entre a coligação no Governo e os portugueses.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

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O Orador: - E não deixa de ser significativo que, passados apenas quatro meses sobre o início das suas funções, seja possível falar já em nova fase da acção governativa e seja possível também fazerem-se sentir resultados concretos positivos em tão curto espaço de tempo de exercício da acção governativa do actual Executivo.
Aí está uma nova atitude política que em tudo nos diferencia dos governos socialistas. Compreende-se, assim, a dificuldade e a incapacidade que os partidos da oposição têm revelado para acompanhar o ritmo do Governo.
Verdade, rigor e responsabilidade são exigências que introduzimos neste novo ciclo político e de que não abdicamos. E é por isso que não são em vão os sacrifícios que foi necessário pedir aos portugueses, mercê da dificílima situação financeira e económica em que os socialistas deixaram o País, com a maior desordem nas contas públicas e a economia em estagnação e apatia.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Era imperativo e elementar pôr as contas públicas em ordem e introduzir práticas de rigor e de transparência em sede de execução orçamental. E é preciso que se diga que, nesta matéria, não são necessárias mais leis nem resoluções para chamar a atenção do que é incómodo mas, sim, a observância escrupulosa das regras em matéria orçamental e de contabilidade pública, sem manipulações, subavaliação de despesas, empolamento de previsões de receitas que não se arrecadam ou se dão por recebidas sem o terem sido.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Valeu a pena o esforço, a coragem e a frontalidade das medidas que se adoptaram nos últimos quatro meses.
O Estado controla agora as suas contas e as metas propostas vão ser atingidas, designadamente a de um défice orçamental abaixo dos 3% no corrente ano.
Cortar no supérfluo e ser rigoroso na gestão dos recursos públicos é indispensável para libertar meios para o que é essencial.
O próximo Orçamento, tal qual referiu o Primeiro-Ministro, será de rigor mas também de recuperação.
A credibilidade não se ganha com a mentira nem com a ocultação da realidade,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - … ganha-se mostrando que se decide, que se não cede perante interesses de grupos ou de corporações, que se não recua face às pressões, que se não hesita perante as ameaças e as manifestações de rua.
Somos um Estado de direito e, como tal, o direito de manifestação ou o direito à greve ou outras formas legítimas de protesto serão, obviamente, respeitados, no quadro da observância da lei.
Naturalmente, como referiu o Primeiro-Ministro, tudo será feito para que se estabeleçam as necessárias pontes para um acordo social. O diálogo e a concertação, porém, para nós, não são um fim, são um meio que desejamos determinadamente alcançar, face à difícil situação em que o País foi deixado e a uma conjuntura internacional altamente desfavorável.
Consideramos, no entanto, que não há obrigação democrática maior do que a de cumprir os compromissos assumidos para com os portugueses, que, com o seu voto, nos confiaram o Governo do País. E, por isso, essa obrigação prevalecerá no quadro das nossas decisões, não sendo pensável que, à margem dos mecanismos eleitorais e institucionais, o Governo possa ser impedido (e não o será) de executar o seu Programa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E não são apenas os compromissos assumidos para com os portugueses que estão em causa. É que as reformas que temos de prosseguir e concretizar são indispensáveis para inverter o caminho que o País levava, de degradação e de retrocesso. E é nesse sentido, tal qual referiu o Primeiro-Ministro, no seu notável discurso da Póvoa do Varzim, que vamos prosseguir. Na saúde, com a construção de 10 novos hospitais; na gestão hospitalar; na mudança da política do medicamento; no sector laboral, com a aprovação do novo código do trabalho que permita a flexibilização necessária para tornar a nossa economia mais produtiva e mais competitiva, atraindo investimentos e permitindo, com isso, o desenvolvimento económico, o aumento de postos de trabalho e o crescimento da nossa riqueza; e, finalmente, no empenho e reforço no combate à fraude e à evasão fiscais, sector onde, mais do que fazer novas leis, importa fazer cumprir e executar as leis em vigor. Sobre esta questão vital importa, aliás, referir que os governos socialistas deixaram à beira da prescrição, segundo relatório recente da Inspecção-Geral de Finanças, cerca de 650 milhões de euros de impostos em dívida, que o Governo está agora, a todo o custo, a evitar que se tornem incobráveis para o Estado.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria muito que o Sr. Deputado Ferro Rodrigues estivesse aqui presente, pois queria colocar-lhe directamente uma questão. Tenho pena de que aqui não esteja mas, por certo, os seus colegas, designadamente o seu líder parlamentar, lhe transmitirão esta minha preocupação.
Quero aproveitar esta oportunidade para colocar ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues, enquanto líder do maior partido da oposição, com toda a frontalidade e clareza, uma questão que se reveste da maior importância e sobre a qual é essencial saber o que pensa o maior partido da oposição e o seu líder.
Aberto, como parece estar, a pactos de regime, sendo a matéria europeia uma questão de regime e sendo as questões das finanças públicas e orçamentais essenciais à nossa permanência no núcleo duro da moeda única, pergunto-lhe se não se justifica, aí, sim, um pacto de regime. E esta minha pergunta tem ainda maior razão de ser quanto é sabido que o Sr. Deputado Pina Moura, ex-Ministro das Finanças dos governos socialistas, vem publicamente defendendo a celebração de um pacto de regime nesta área, como o fez ainda recentemente em declarações ao Expresso e num artigo que ainda ontem escreveu no Diário de Notícias de Lisboa.
Estranho é que sobre as propostas do Dr. Pina Moura a este respeito, e não obstante a sua relevância, venhamos assistindo a um silêncio ensurdecedor da parte do líder do Partido Socialista e da sua direcção política. E insisto nesta questão e nesta pergunta ao Dr. Ferro Rodrigues, porquanto é importante que o País saiba se o maior partido da oposição se vai manter apenas como responsável pelo estado calamitoso em que deixou as finanças públicas e a economia

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do País, que teima em não ter a coragem de assumir e a humildade para se penitenciar, ou se, antes, está disponível para ajudar na correcção dos erros por si cometidos e na recuperação dos atrasos por si causados.
Da nossa parte, vamos prosseguir, com impulso reformador, sem hesitações e sem recuos, com coragem e firmeza, na construção deste novo ciclo de esperança, sem o que não é possível assegurar ao País um futuro melhor.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Estes quatro meses de Governo e as linhas de actuação e de firmeza que o Primeiro-Ministro traçou, em sintonia com o nosso parceiro de coligação, na sua intervenção da rentrée, confirmam que o País reconquistou um clima de credibilidade e de confiança.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ui!…

O Orador: - Saneadas as finanças públicas e consolidada uma nova atitude política, reforçada está a confiança dos portugueses no Governo, o que basta para que, para além e acima de ruídos de fundo, prossigamos nas reformas e na recuperação económica, para que façamos sair Portugal da cauda da Europa e o coloquemos ao lado dos países mais avançados da União Europeia.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, dois Srs. Deputados do Partido Socialista, mas o Partido Socialista não dispõe de tempo para esse efeito, a não ser que o PSD ceda algum daquele de que ainda dispõe.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Cedemos 1 minuto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Assim sendo, uma vez que o PSD cede tempo, dou a palavra ao Sr. Deputado Manuel Alegre para formular o seu pedido de esclarecimentos, mas peço-lhe para ser breve.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Agradeço ao Sr. Presidente e também ao PSD pelo tempo que me cedeu.
Pese embora a boa vontade do Sr. Deputado Guilherme Silva, creio que o discurso que marcou politicamente a rentrée não foi o discurso do Dr. Durão Barroso mas o do Dr. Paulo Portas. E marcou-a, aliás, negativamente, porque vimos uma coisa extraordinária: vimos um líder de um partido de uma coligação de Governo, um líder de um partido de direita, ainda por cima Ministro de Estado e da Defesa, fazer um discurso que foi um apelo a uma confrontação de rua, um discurso de guerra civil! E vimo-lo também anunciar previamente algo que compete aos sindicatos decidir, que é a questão de haver ou não uma greve geral. Isto é uma visão de confronto na política, é uma visão conflitual da política que, evidentemente, merece a reflexão de todos os democratas e penso que também do PSD, a menos que, como li em alguma imprensa, isto estivesse combinado, ou seja, o Dr. Paulo Portas faria um discurso arruaceiro para, depois, o Dr. Durão Barroso poder fazer um discurso de Estado. Simplesmente, entendo que o Estado, o Estado democrático, não deve funcionar assim.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, pedindo-lhe também para ser breve, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel Alegre tem uma leitura da intervenção do Sr. Presidente do CDS-PP, o Sr. Ministro Paulo Portas, que não coincide inteiramente com a minha.

Vozes do PS: - «Inteiramente»!…

O Sr. António Filipe (PCP): - Na Madeira fazem pior!

O Orador: - Não faço essa leitura de que há um apelo a uma confrontação, creio que há uma coisa diversa que se coloca com toda a regularidade no quadro da democracia de um Estado de direito. Entendo que o que o Sr. Presidente do CDS-PP fez foi uma coisa muito simples: chamar à atenção de que o direito à greve e o direito às manifestações são perfeitamente admissíveis, como acabei, aliás, de dizer na minha intervenção, e não estão nem estarão, naturalmente, em causa, mas idênticas manifestações de sinal contrário são também admissíveis, no quadro de um Estado de direito e da nossa democracia. O que quis o Sr. Dr. Paulo Portas referir foi que a circunstância de poder haver esses movimentos num determinado sentido não impediria que houvesse movimentos de sentido contrário e que o seu partido estivesse disponível para apoiar também esses movimentos, de apoio à linha de orientação do Governo. Isto é perfeitamente normal e, confesso, Sr. Deputado Manuel Alegre, que, tendo uma grande admiração por si e uma grande consideração intelectual e política, lamento que V. Ex.ª não tenha tido esta visão democrática deste discurso.
Não me parece que estejamos numa fase da vida política portuguesa, e consolidada que está a democracia, em que outra leitura possa ser feita da intervenção do Dr. Paulo Portas.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para exercer o direito de defesa da honra da sua bancada, tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. António Costa (PS): - Contra quem?!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero apenas dizer duas palavras em defesa da honra da minha bancada.
Sr. Deputado Manuel Alegre, embora não tenha assumido o que disse como seu mas como tendo-o lido na comunicação social, quem repete aqui, nesta Sala, o que é dito na comunicação social assume a paternidade daquilo que diz, porque se não concordasse com aquilo que diz não viria aqui repeti-lo, dizendo que estava combinada uma divisão de trabalho, no sentido de o Dr. Paulo Portas fazer um discurso arruaceiro e o Dr. Durão Barroso fazer um discurso de Estado.
Pergunto ao Sr. Deputado Manuel Alegre, que, efectivamente, escreve muito bem - aliás, temos o gosto de o

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ler sobre temas políticos na revista do Expresso e nos jornais de futebol -, o que é que encontrou de arruaceiro no discurso da rentrée de Paulo Portas.
Se a esquerda for para a rua, se quiser bloquear a revisão das leis laborais e a reforma da segurança social através de manifestações de rua, é legítimo que aqueles que querem estas reformas também manifestem o seu apoio na rua, se o quiserem fazer. É que o Deputado Manuel Alegre sabe que a manifestação de rua não é um monopólio da esquerda! Pelo menos nos seus artigos e na opinião do Dr. Mário Soares não vi que fosse uma característica da esquerda ou um valor da esquerda cultivar as manifestações de rua. O direito de livre expressão, seja na rua, seja aqui, seja onde for, é um direito de todo o cidadão português.
Se eu, amanhã, quiser apoiar o Governo, uma reforma do Governo ou uma atitude do Governo e se a CGTP for para a rua, se os comunistas forem para a rua, se o Partido Socialista for arrastado para a rua e a UGT for arrastada para a rua por causa da CGTP, eu posso dizer que não vou na enchente mas faço o dique na rua para a enchente ou para a enxurrada do Partido Comunista que arrasta o Deputado Manuel Alegre. Eu posso dizer isto! Agora, diga-me lá onde é que está a arruaça pelo facto de eu ou o Dr. Paulo Portas dizermos isto? Ou será que a arruaça é aquilo que o Sr. Deputado Manuel Alegre está aqui a fazer?! É que as suas palavras é que parecem arruaceiras!
Será arruaça dizer, como fez o líder de um partido da coligação, que a esquerda não tem o monopólio da rua e sentido de Estado e que se a esquerda for para manifestações de rua nós não nos atemorizamos e não nos calamos?! Onde é que está isto escrito?! Qual é o valor das suas palavras?

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se, pelo que lhe peço o favor de concluir.

O Orador: - Desafio-o a dizer uma frase do discurso de Paulo Portas que o Deputado Manuel Alegre possa ter considerado como arruaça.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Alegre.

O Sr. Manuel Alegre (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Narana Coissoró, tive o cuidado de utilizar a expressão «a menos que», porque, realmente, li-o na imprensa, a expressão não foi minha, foi da imprensa.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Quem repete!…

O Orador: - Sr. Deputado, ninguém tem o monopólio da rua. Devo dizer-lhe, aliás, que o Partido Socialista não é arrastado para a rua, o Partido Socialista, em certas ocasiões históricas, foi para a rua e tomou a iniciativa de ir para a rua quando mais ninguém ia.

O Sr. António Costa (PS): - É verdade!

O Orador: - Portanto, o Partido Socialista não é arrastado para a rua. E a luta de rua é legítima! Agora, é estranho que um Ministro da Defesa e de Estado - aliás, houve até televisões estrangeiras que o sublinharam -…

Protestos do CDS-PP.

… quando a esquerda não anunciou qualquer manifestação,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Não anunciou?!

O Orador: - … quando os sindicatos ainda não decidiram se vão ou não fazer greve geral, é estranho, repito, que um Ministro da Defesa e de Estado faça um apelo à rua,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não foi nessa qualidade!

O Orador: - … como se o centro principal da batalha política, numa democracia consolidada, fosse a rua.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Ninguém tem o monopólio da rua, o Dr. Paulo Portas é que parece que, como Ministro da Defesa,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Ele falou como líder partidário!

O Orador: - … quer ter a iniciativa da rua, quer passar a política para a rua. E o Sr. Deputado Narana Coissoró, no seu discurso, quase sublinhou isto.
Foi apenas isso que eu quis aqui frisar. É estranho! A luta política é legítima aqui, é legítima na rua, ninguém tem o monopólio da liberdade das reuniões e das manifestações mas fiz uma apreciação política: é estranho que alguém que tem responsabilidades de Governo, que é Ministro de Estado e da Defesa, faça um apelo dessa natureza, em plena época estival, quando ninguém está na rua, quando ninguém faz apelos à rua.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

É estranho que ele tome a iniciativa de querer trazer a luta política para a rua. É apenas estranho! E é também uma liberdade que tenho, a da apreciação política de um discurso político dessa natureza.

Vozes do PS: - Muito bem!

Vozes do CDS-PP: - Então, assuma-a!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, no âmbito do tratamento de assuntos de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Podíamos, talvez, começar por falar de uma notícia singela publicada ontem num jornal diário,…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - O Diário já acabou!

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O Orador: - … num jornal diário, repito, que tinha apenas como título: «Duas empresas fechadas, 100 trabalhadores no desemprego». A notícia informava que duas empresas do sector têxtil, a fiação Vidal e a Quema, ambas no distrito de Aveiro, tinham encerrado com diferença de poucas horas, deixando, pelo menos uma delas, salários em atraso, para além das indemnizações de que os trabalhadores são credores nestas situações. A notícia informava ainda que na Prequel, do sector eléctrico, em Gondomar, os trabalhadores têm igualmente salários em atraso e temem pelo futuro da empresa, ensombrado por interesses imobiliários sobre as instalações e terrenos. E referia, finalmente, que a Anamaril, fábrica de calçado em Santa Maria da Feira, também encerrou, atirando para o desemprego mais 30 trabalhadores.
Esta podia ser uma síntese do período estival em que tais notícias se repetiram com uma frequência quase diária, atirando para o desemprego milhares de trabalhadores, estando outros tantos com salários em atraso. Multipliquem-se estas dificuldades pelas famílias e não podemos negar que estamos perante um claro agravamento da situação social para muitos milhares de portugueses e uma deterioração do nosso tecido produtivo.
Perante isto, o Governo, que andou a tentar mostrar ao País que não foi de férias, nada disse. Nem sequer esboçou qualquer intenção de averiguar muitas das falências em que o cheiro a fraude é intenso e as suspeitas dos trabalhadores têm a devida fundamentação. Não! Essa não é a preocupação deste Governo.
Ao contrário, o discurso anti-social deste Governo, os prometidos ataques à legislação laboral, abrem caminho a um aumento da arrogância do patronato sem escrúpulos e à impunidade com que atropela os direitos dos trabalhadores. O discurso e a inacção do Governo nesta matéria são a carta branca de que alguns precisam para negar, sem contemplações, os salários e os direitos.
O mesmo se diga em relação aos casos em que o encerramento de empresas se prende com fenómenos de deslocalização. É oportuno lembrar que, em 1999, os partidos da actual maioria apoiaram uma resolução da Assembleia da República que, entre outras medidas, instava o governo a alterar a legislação sobre indemnizações por despedimentos, aumentando os valores a pagar aos trabalhadores, e que defendia também a revelação pública dos contratos e ajudas outorgadas em caso de deslocalização de empresas.
E no debate desta resolução dizia-se, numa acertada intervenção: «(…) associados à globalização das relações económicas estão os processos de deslocalização de empresas, que, em regra, são sempre determinados pela busca de salários baixos, pelas mais altas taxas de produtividade e também pelos países onde há menor respeito pelos direitos dos trabalhadores. Tudo é feito em nome do acréscimo da concorrência e também, quantas vezes, em nome da obtenção de um lucro mais fácil.
Porque é assim, estamos em tempo de tomar algumas medidas que constituam uma acção preventiva que, não sendo capaz de eliminar estas consequências negativas, em todo o caso seja capaz de prevenir alguns dos seus efeitos.» Disse-o o Sr. Deputado Vieira de Castro, da bancada do PSD.
Mas uma outra bancada, no mesmo debate, produziu também uma intervenção, da qual vou citar, porque julgo importante a parte seguinte: «Há uns tempos a esta parte, e este fenómeno não acontece só em Portugal, temos assistido a um espectáculo preocupante e deprimente de decisões por parte de administrações de multinacionais, ao procederem ao encerramento de diversas unidades produtivas, com o único objectivo de se deslocarem para outros países, em busca de condições de laboração e de produtividade que, a maior parte das vezes, vão desde a exploração de mão-de-obra mais barata até à busca de todo o tipo de incentivos e facilidades, deixando um rasto de milhares de desempregados, de miséria e frustrações nos países e regiões que abandonaram, assim como enormes dificuldades para as pequenas e médias empresas subcontratadas a montante e a jusante e que laboram na sua órbita. Isto depois de, avidamente, se terem servido de múltiplos apoios e incentivos.
E quando menos se espera, toca a desandar para outras paragens em busca de mais incentivos, mais apoios e regalias de toda a ordem, sem se preocuparem com tudo o que deixaram para trás (…)» A intervenção foi feita por um Deputado do CDS-PP.
Parece que tais preocupações deixaram de estar presentes nas acções e até nos discursos da maioria assim que se sentaram na cadeira do poder.
A situação sociolaboral exige que o Governo não se exima de cumprir aquilo que os partidos que o apoiam defenderam na oposição, especialmente quando estão em causa as vidas e a subsistência de muitas famílias portuguesas, que o Governo tanto hipocritamente refere no seu discurso político, mas que deixa desamparadas nas questões mais básicas e elementares.
O agravamento da situação social passa, igualmente, pelo aumento do custo de vida. São as consequências do aumento da taxa do IVA, mas também, inegavelmente, da introdução física do euro, que, ao contrário de sucessivas promessas, não deixou de causar uma clara inflação dos preços ao consumidor, como os portugueses sentem no dia a dia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faça favor de concluir.

O Orador: - Vou concluir, Sr. Presidente.
Para além disso, os novos aumentos, decididos pelo Governo, dos preços dos transportes públicos e da água para os consumidores directos vieram onerar os trabalhadores portugueses e as suas famílias.
É este o quadro que o Governo quer ainda agravar, aliás, agravou-se este Verão, conduzindo uma política contra os interesses do País e da população portuguesa. Mas contará o Governo com a luta dos trabalhadores e da população portuguesa face a esta política neoliberal, a qual que vai contra os interesses, que devemos defender, do povo e do País.

O Sr. Presidente: - Inscreveu-se, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Narana Coissoró, mas o Sr. Deputado Bernardino Soares não dispõe de tempo para responder. A não ser que o CDS-PP disponibilize algum tempo.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Com certeza, Sr. Presidente. O CDS-PP cede tempo ao Sr. Deputado Bernardino Soares.

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O Sr. Presidente: - Nesse caso, para pedir esclarecimentos, tem a palavra, Sr. Deputado Narana Coissoró. Peço-lhe que seja breve.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Sr. Presidente, quero só dizer que fez bem o Sr. Deputado Bernardino Soares em recordar as nossas preocupações sobre a deslocalização das empresas. E fez bem porque está na ordem do dia da maioria travar, por vias legítimas, todas as causas que levam a tais deslocalizações, que não são um mal só do nosso país. Sucede apenas que acrescem razões objectivas e razões nacionais. As objectivas são o facto de haver países que oferecem lucros muito melhores às empresas, independentemente dos direitos sociais; as subjectivas são as nossas.
Há dias, o Sr. Deputado António Costa, a seguir à rentrée, quando um comentarista lhe perguntou o que pensava do discurso do Dr. Paulo Portas, disse por acaso uma coisa muito certa,…

O Sr. António Costa (PS): - Devia estar distraído!…

O Orador: - … a de que não devíamos competir, em matéria de legislação social, com os países subdesenvolvidos mas, sim, com os países desenvolvidos. Isto está rigorosamente certo.
Sr. Deputado, não me preocupa nada que do nosso país saiam investimentos para países subdesenvolvidos, porque aí eu não posso fazer nada. Eu não posso colocar o meu país abaixo dos países subdesenvolvidos para que ele seja escolhido entre os piores países subdesenvolvidos!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O que eu posso fazer é que, entre os países desenvolvidos, o meu país tenha legislação laboral e condições de trabalho dignas dos países desenvolvidos. E o código de trabalho que a maioria tem em anteprojecto e que vai submeter à discussão do Conselho Permanente de Concertação Social e vai apresentar na Assembleia exactamente as condições que permitem às empresas não se sentirem na necessidade de sair de Portugal por causa da produtividade, por causa da rigidez de mercado, por causa da nossa estrutura laboral,…

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … por causa da teimosia, da rigidez, do reaccionarismo do Partido Comunista, da CGTP e dos sindicatos,…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se. Faça favor de concluir.

O Orador: - … a fim de que o nosso país esteja em condições de desafiar as condição de desenvolvimento. Porque o que qualquer empresário quer é produzir nos países desenvolvidos e não nos países subdesenvolvidos. Aí os salários podem ser baixos, mas a qualidade do produto é sempre inferior ao produzido num país desenvolvido.
É isto que nós queremos e é isto que o Partido Comunista está a bloquear. E o que o Sr. Deputado veio verter hoje, nesta Assembleia da República, são «lágrimas de crocodilo».

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares. Dispõe também de 3 minutos, cedidos pelo CDS-PP.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, apetecia-me não admitir ao Sr. Deputado Narana Coissoró a afirmação que fez de que as preocupações que aqui trazemos são «lágrimas de crocodilo». Na verdade, isso demonstra uma grande insensibilidade para com a situação destes milhares de trabalhadores…

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Quanto mais miséria, mais feliz fica o Partido Comunista!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Isso é discurso de depois do almoço!

O Orador: - Sr. Presidente, gostaria de continuar, mas parece que as condições não são as melhores. E não tem a ver com o sistema sonoro…

O Sr. Presidente: - Queira continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Sr. Presidente, as preocupações que aqui trazemos são muito sérias e a bancada do CDS-PP, através do Sr. Deputado Narana Coissoró, demonstra uma grande insensibilidade ao dizer que elas são pouco sérias.
Sr. Deputado, vá dizer isso aos milhares de trabalhadores que estão sem emprego e aos que estão constantemente a ser ameaçados por patronato sem escrúpulos, porque o Governo já deu o sinal de que se pode abusar, de que se pode diminuir os direitos dos trabalhadores.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não deu sinal nenhum!

O Orador: - Já deu esse sinal com as propostas que apresentou. Aliás, o Sr. Deputado Narana Coissoró até diz que o diploma está feito, foi apresentado, vai ser discutido, mas vai ser aprovado, porque a maioria, qual rolo compressor, não admitirá grandes derivações em relação ao que propôs.
É esta a política que, a ser aprovada, vai prejudicar ainda mais os trabalhadores e o País.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É como a unicidade!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, peço-lhe o favor de deixar ouvir o orador.

O Orador: - Evidentemente, o Sr. Deputado Narana Coissoró nada disse sobre as intenções da maioria em cumprir aquilo que há pouco citei (e que o Sr. Deputado tanto apoiou) e que constava de uma intervenção feita por um Deputado do seu partido. Aliás, essa intervenção dizia, ainda, que estas empresas iam para outros países «em nome da concorrência, dos custos mais baixos e do lucro

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mais fácil e rápido.» E acrescentava: «'Comida a carne, os outros que comam os ossos', como diz o povo.» Longe vão os tempos destas preocupações!
Ora, o Sr. Deputado Narana Coissoró esqueceu-se de dizer se o Governo que o seu partido apoia vai cumprir aquilo que os partidos da maioria aqui aprovaram, ou seja, a resolução da Assembleia da República proposta pelo PCP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - É que, nessa altura, foi fácil terem boas palavras, mas agora os interesses do grande patronato, os interesses do grande capital especulativo, sobrepõem-se, e é isso que comanda a acção deste Governo e é isso que vai prejudicando os interesses dos trabalhadores e do povo português.
Essa é a voz que o senhor traz à Assembleia da República, essa é a insensibilidade que apresenta a todos aqueles que passam cada vez mais dificuldades nas suas vidas, a quem, hipocritamente, os senhores se referem quando defendem, em discurso, os valores familiares, mas a quem, depois, negam os direitos mais básicos, como o acesso ao emprego e a salários dignos.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não aprendeu nada!

O Orador: - Consigo não!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 45 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia diz respeito ao debate, por iniciativa do Governo, sobre a execução orçamental de 2001.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr. Presidente e Srs. Deputados: O Governo solicitou este debate após a interpelação feita por um Sr. Deputado do Partido Socialista, que se dirigiu ao Governo pedindo explicações sobre uma matéria que, inesperadamente, era da inteira responsabilidade de quem a solicitou. Provavelmente, enganaram-se quando se dirigiram ao Governo pedindo essas explicações!…
Disseram, mesmo, que se podia ter evitado todas as dúvidas suscitadas pelos números publicados caso o Governo, publicamente, tivesse chamado a atenção, no boletim, da contabilidade que fez nessa publicação.
Quer isto dizer que os Srs. Deputados entenderam que o Governo devia ter exposto publicamente aquilo que considerava uma incorrecção, direi assim, dos valores que estavam publicados, que devia ter explicitado tudo e que ficou mal o facto de, discretamente, ter feito essa publicação, publicação essa que, penso, não podia deixar de fazer. Em vez de terem considerado construtiva a atitude do Governo, os Srs. Deputados armaram-se em vítimas e resolveram pedir explicações.
Por isso, devo dizer-vos que parece mentira esta discussão. Mas é verdade!
Na realidade, o que os Srs. Deputados do Partido Socialista quiseram foi que se voltasse ao problema.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - Consideraram pouco o que já tinha sido dito! Criticaram, de resto, o facto de ter sido dito demais, mas agora concluíram que era pouco e quiseram voltar ao assunto.
Vamos a isso, Srs. Deputados! A decisão é vossa! O pedido é vosso!
Claro que fica alguma dúvida em perceber porque razão o Partido Socialista se lembrou de retomar um problema do qual deveria ter vergonha e querer encobrir.

O Sr. José Sócrates (PS): - Francamente!… Vergonha são as expressões que utiliza!

A Oradora: - Provavelmente, porque o défice orçamental se tornou um facto político. E o défice orçamental tornou-se um facto político porque contribuiu decisivamente para o descrédito do País no estrangeiro.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Para além de que este Governo apostou em recuperar esse descrédito que tinha sido perdido. E, ao querer recuperá-lo, gostávamos de não pôr a politiquice acima dos interesses do País, mas os Srs. Deputados do Partido Socialista não querem!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Srs. Deputados, com o vosso desgoverno, apenas o País saiu prejudicado.

O Sr. José Sócrates (PS): - Que linguagem!

A Oradora: - Aos Srs. Deputados, aos Srs. Membros do governo do Partido Socialista, a despeito de uma gestão danosa das finanças públicas, nada aconteceu.
Srs. Deputados, o mesmo vai acontecer com este Governo. Nós temos o objectivo claro de recuperar o crédito para este país e, se não o conseguirmos, pessoalmente, nada nos acontece.
Srs. Deputados do Partido Socialista, quando é que percebem que o que está em causa é o País? Quando é que percebem que isto não é uma luta política mas uma luta pelo crédito do País?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Quando é que percebem que é o país que está em causa?
Se os Srs. Deputados estivessem verdadeiramente interessados no País, não era isto que estavam a discutir. Não eram os números. Não eram as publicações mensais. Não eram os critérios.

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O Sr. José Sócrates (PS): - Que falta de nível! Mantenha alguma classe!

A Oradora: - Se os Srs. Deputados estivessem efectivamente interessados em discutir os problemas do País, a primeira coisa que fariam, com certeza, era acolher um tal «pacto de regime», já sugerido pelo Sr. Deputado Pina Moura - em relação ao qual, há pouco, não responderam ao Sr. Deputado Guilherme Silva, quando questionou as intenções do Partido Socialista -, a fim de nos ajudarem a tomar aquelas medidas que são necessárias para recuperar essa credibilidade. Não, o que os senhores fazem é rigorosamente o contrário, têm estado contra todas as medidas.

O Sr. Machado Rodrigues (PSD): - Exactamente!

A Oradora: - Têm estado contra todas as medidas! O que significa que «pactos de regime» é para quaisquer outras coisas que não se sabe bem o que são. Para resolver os verdadeiros interesses do País não podemos contar com os senhores, porque aquilo que, neste momento, querem e que provavelmente mais desejam é que, por uma questão de descrédito deste Governo, não atinjamos os objectivos. Quando o que está em causa não é o crédito do Governo mas o crédito do País!

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E os senhores não conseguem entender isso.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

E é por não entenderem isso que a vossa falta de sentido de Estado sempre foi uma característica que vos guiou durante o muito tempo que estiveram no governo.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

A Oradora: - Se os senhores estivessem mesmo interessados no problema do País, discutiam o défice, sim, mas no final do ano e não mês a mês, o que não tem qualquer espécie de significado. E mesmo que, mês a mês, vissem algo, o normal seria falarem baixinho, para que ninguém os ouvisse, e saberem o que tinha acontecido. Mas não, convocam conferências de imprensa e ficam todos aos berros a falar de um assunto sobre o qual deveriam estar calados e sobre o qual são responsáveis.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Exactamente!

A Oradora: - E em vez de estarem calados ou de falarem baixinho, porque são os responsáveis e é uma vergonha, convocam conferências de imprensa.
Foram os senhores que levantaram este problema. Estou aqui, porque os senhores levantaram este problema.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

A Oradora: - Eu não o levantei, nem o levantaria. Mas os senhores querem, gostam. Então, vamos continuar.

O Sr. José Sócrates (PS): - Ainda não disse nada sobre os esclarecimentos que lhe foram pedidos!

A Oradora: - Srs. Deputados, uma das questões que levantaram foi no sentido de saber quais os critérios que tinham sido utilizados para os valores que foram publicados, afirmando mesmo, num determinado comunicado, que gostariam de saber se os critérios que estavam a ser utilizados eram aqueles últimos que tinham sido usados, ou se eram novos, ou velhos.
Quero dizer uma coisa muito simples: os critérios que estão a ser utilizados não são novos mas os velhos critérios. São muito velhos, velhíssimos, nunca foram outros! Srs. Deputados, a execução do Orçamento é a execução do Orçamento; ou seja, um pagamento é um pagamento que se faz e um recebimento é uma receita que se recebe. Portanto, um pagamento não é aquilo que se pensa que há-de ser e uma receita não é aquilo que se pensa que há-de um dia cobrar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, os critérios são muito simples e muito velhos. Nada há de novo; nada há a aprender, não há nada de inovador!
Por isso, Srs. Deputados, fiquem tranquilos, porque, em primeiro lugar, vamos utilizar sempre os critérios velhos: só receita cobrada, só despesa paga. Nada de fantasias, de antecipações ou de pensar que a receita é algo que há-de vir. Porque, se assim fosse, pergunto aos Srs. Deputados que defendem essa tese para que é que se publicam informações mensais; só se deviam publicar informações anuais e, então, aí sim, estaria tudo certo.
Outra coisa que faremos, com certeza, é publicar os números que nos são fornecidos pelos serviços. E isto, Srs. Deputados do Partido Socialista, para evitar que haja serviços no Ministério das Finanças que digam que os mapas da receita fornecidos à comunicação social não eram produzidos pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos mas pelo Gabinete do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ou do Ministro das Finanças, pelo que desconhecem eventualmente factos relevantes sobre essa matéria. Devo dizer, Srs. Deputados, que no meu Gabinete ou no Gabinete do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais não se fazem números para publicar em boletins; eles são fornecidos pelos serviços.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Oradora: - Portanto, quanto a este ponto, podem estar absolutamente tranquilos.
Por outro lado, Srs. Deputados, não é completamente indiferente utilizar os critérios que têm estado a ser seguidos. E não vale a pena minimizarem o problema e considerarem que as receitas hão-de um dia entrar, porque não só isso é incorrecto do ponto de vista da análise mensal como ainda por cima há efectivamente receitas que nunca entraram.
Esta situação tem um nome, que não vou dizer para o Sr. Deputado José Sócrates não se escandalizar, mas o senhor calcula o que estou a pensar… É exactamente essa a palavra em que estou a pensar.

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O Sr. José Sócrates (PS): - A senhora sabe em que estou a pensar?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Uma fraude!

A Oradora: - O facto dos Srs. Deputados do Partido Socialista terem decido retomar este tema, não fosse o País estar esquecido, faz-me ponderar o porquê. Porquê? Provavelmente, Srs. Deputados, porque não têm outros temas. Começaram a rebuscar quais seriam os temas para o reinício dos trabalhos e, como não tinham outros, foram buscar aquele que já existia.

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Não pensam noutra coisa!

A Oradora: - Talvez tenha sido por causa dessa ausência de temas que foram buscar novamente o mesmo tema.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Um remorso!

A Oradora: - Srs. Deputados, ao retomarem este tema, há duas coisas que me merecem consideração. Primeiro, os senhores não deveriam falar em rigor, transparência e credibilidade, porque é um pouco a gargalhada geral. Haverá alguém, dentro ou fora deste país, que acredite nas palavras de rigor, transparência, credibilidade ditas pelos socialistas?!

Protestos do Deputado do PS José Sócrates.

E ainda por cima, os senhores, além de socialistas, são masoquistas, porque vão retomar temas que, pura e simplesmente, são da vossa responsabilidade e que nós já tínhamos encerrado. Mas este é um problema vosso!

Protestos do Deputado do PS José Sócrates.

Há ainda um outro ponto que não quero deixar de referir e que, em minha opinião, é de pensar - e foram os senhores que levantarem o problema, não fui eu -, o da receita contabilizada no mês de Julho, aquilo a que chamaram o «apagão».

O Sr. António Costa (PS): - Nós?!

A Oradora: - O Dr. Fernando Gomes também falou nisso.
O que é que significou esse «apagão»? Significou que em Julho havia um volume inusitado de receita. Todos os meses há ajustamentos a fazer e aquilo que foi diferente nesse mês foi o volume dessa receita. E por que razão houve esse volume da receita tão elevado e fantasiado em Julho e não em Setembro, ou em Outubro, ou em Maio? Deve haver várias interpretações para isto, eu tenho a minha. E a minha leva-me a pensar e a admitir que o empolamento da receita havido em Julho foi por ser o mês em que era preciso enviar para Bruxelas o reporte das contas,…

Vozes do PSD: - Claro!

A Oradora: - … e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento afirmou que esteve mesmo para dizer que o défice era de 0,7%, mas, por uma questão de prudência, estabeleceu-o em 1,1%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - À cautela!

A Oradora: - À cautela.

Risos.

Isto tudo se verificou em Julho de 2001. É claro que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não poderia ter tido esta dúvida entre 1,1% e 0,7% se não estivesse bem «recheado» de receita, porque, como é evidente, não era através da contracção da despesa, já que a despesa tinha crescido, e bem, como todos sabemos.
Portanto, Srs. Deputados, era evidente que o mês de Julho era o mês decisivo para tornar compatível a conta com a perspectiva do ano. Pode ser que esta não seja a interpretação - admito que não -, mas também é possível que tenha sido. Porém, se não for esta a interpretação, apesar de pensar que o mais provável é que tenha sido, agradecia muito que os conhecedores profundos desta matéria, os Srs. Deputados do Partido Socialista, dessem uma explicação cabal não só a nós, que, já agora, gostaríamos de saber qual é o segredo desta matéria, mas também ao País, para, mais uma vez, os senhores falarem sobre aquilo que deveriam estar calados.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Leonor Beleza.

A Sr.ª Presidente: - Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento, os Srs. Deputados Francisco Louçã e Lino de Carvalho.
Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças chega a este ponto da ordem de trabalhos divertida e até encantada. É sempre um gosto vê-la divertida e bem disposta, mas creio que, por detrás de um debate frívolo que nos arriscamos a ter aqui, existe uma necessidade de esclarecimento que passa por decisões governamentais importantes sobre matérias que vão pesar no nosso futuro (pois o que já está, já está!) e outras que estão a ser tomadas, e estas são pesadas - Paulo Portas anunciou o novo conceito estratégico de defesa e imediatamente a factura que lhe estava anexa, que é de 150 milhões de contos/ano, e parece que Emídio Rangel recebeu 100 000 contos de indemnização na RTP. Assim, percebo que não haja muito que possa divertir na gestão do Ministério das Finanças e que, por isso, seja melhor procurar algum motivo para este debate.
No entanto, há um ou dois aspectos fundamentais que devemos discutir. Um é o da coerência das contas públicas e de uma política de contas certas.
O seu Governo, quando apresentou a sua candidatura nas eleições legislativas, prometeu mais do que aquilo que deu: prometeu uma auditoria geral. Agora, tem dado uma

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espécie de strip-tease mensal, episódico, sobre as contas públicas.
Nesta bancada, entre muitos outros nesta Assembleia da República, estamos contra qualquer governo que sobreponha, a uma política de contas públicas e de verdade qualquer conveniência e qualquer regime de martelada contabilística.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Foi isto o que dissemos anteriormente e é naturalmente isto que diremos agora. Por isso mesmo, é necessário um debate - não tanto nesta Comissão Permanente mas, porventura, em comissão com conclusões que sejam submetidas à Assembleia - e não uma espécie de show-off, como este, para precisar, se é que há alguma alteração a fazer aqui, que critérios é que podem garantir a confiança pública, nacional e internacional, sobre a coerência das contas.
Há, no entanto, um segundo motivo que importa alguma discussão também neste momento. Estamos em vias de ter aquilo que, verdadeiramente, é o «apagão» da dívida fiscal: 63 000 processos podem caducar nos próximos meses. Podemos e devemos perguntar ao governo anterior em que condições é que chegámos a este montante extraordinário. Mas à Sr.ª Ministra, que hoje é Governo, não devemos deixar de perguntar o que faz contra este facto inadmissível, o de estes processos poderem caducar quando ainda estamos a tempo de o corrigir ou de o impedir.
Deste ponto de vista, uma política de transparência deve ser uma política de contas certas do Estado para com o público e em todo o País, para que se possa confiar nas obrigações e nas responsabilidades. Creio, verdadeiramente, que é aqui que pode estar a vergonha de não sermos capazes de assumir responsabilidades.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, há ainda um outro pedido de esclarecimento. Deseja responder já ou no fim?

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Respondo no fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, nos últimos meses, o País tem assistido, porventura algo já cansado, a um pingue-pongue entre o Governo e o Partido Socialista sobre a responsabilidade em matéria de descontrolo das contas públicas.
Penso que o País, mais do que saber quem é quem neste processo, pretende conhecer as medidas práticas que o Governo entende concretizar para evitar que se prolongue esta discussão pública, que põe em causa a credibilidade do Estado e das Finanças Públicas em Portugal e que nada avança para tomar as soluções, designadamente em matéria de organização e de coordenação dos serviços do Ministério das Finanças, que ponham termo, de uma vez por todas, a estas alterações periódicas dos registos contabilísticos das receitas e da credibilidade das contas que o Estado apresenta.
A Sr.ª Ministra sabe que isto não é só de hoje, não foi do governo do Partido Socialista, já era do governo anterior do PSD e, porventura, continua.
Rapidamente, vou citar-lhe, Sr.ª Ministra, duas passagens do parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta Geral do Estado de 2000, mas poderia fazê-lo relativamente a 1990, 1993, 1994, 1995 ou, se calhar, a 2001 e a 2002, porque no essencial são idênticos.
O que é que diz o Tribunal de Contas? Segundo o Tribunal de Contas «O processo de contabilização das receitas, no âmbito da execução do Orçamento do Estado para 2000, leva o Tribunal de Contas a manter uma posição de reserva sobre a forma como os resultados foram obtidos, não só pela falta de fiabilidade e de consistência que o modelo e os procedimentos utilizados admitem, como pela convicção de que, nestas condições, a única certeza que é possível ter sobre a receita orçamental efectivamente obtida é que o respectivo valor não corresponde ao que se encontra inscrito na Conta Geral do Estado». Mais à frente, num outro ponto, diz que «A cobrança inscrita nas tabelas do serviço administrador dos impostos sobre o rendimento, como obtida pelas tesourarias de finanças, é inferior em 19,8 milhões de contos à cobrança de impostos sobre o rendimento registada nas tabelas das direcções de finanças (…)». Mais à frente volta a reafirmar a ilegalidade da manutenção de contas bancárias não integradas na Tesouraria do Estado.
Ora, todas estas questões são recorrentes. Sabe-se que, hoje, não há um serviço informatizado coerente - a Direcção-Geral do Tesouro tem determinados registos; a Direcção-Geral dos Impostos tem outros registos.
No tempo em que a Sr.ª Ministra das Finanças era a responsável orçamental do então governo do PSD deu um contributo negativo para este processo ao não avançar e ao paralisar os procedimentos de informatização da Direcção-Geral dos Impostos. Esta situação não melhorou com o governo do Partido Socialista. E o que queremos saber é quando é que o Governo, em relação ao Ministério das Finanças, vai tomar medidas concretas de informatização, de organização, de disponibilização de meios para evitar esta discussão recorrente com a qual o País nada ganha.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, quanto à questão da auditoria, devo dizer que considero ter sido feita uma auditoria pelo grupo liderado pelo Banco de Portugal, juntamente com o Instituto Nacional de Estatística e a Direcção-Geral do Orçamento. Considero que a análise pormenorizadíssima que foi feita a todas as contas é muitíssimo completa, para além da que, neste momento, ainda decorre no Tribunal de Contas sobre determinados sectores da Administração Pública, nomeadamente os serviços de saúde.
Por outro lado, os Srs. Deputados Francisco Louçã e Lino de Carvalho falaram sobre o alegado pingue-pongue, sobre este tema recorrente, que, realmente, já é cansativo.
Srs. Deputados, creio que sabem que não foi o Governo que levantou este problema. Pelo contrário, tive o cuidado

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podia deixar de fazer, sem qualquer espécie de comentário. Não foi assim entendido pelo Partido Socialista, que gosta que se debata mais neste tema… Devo dizer que, pela minha parte, considero o assunto encerrado - já o tinha encerrado -, mas nunca ficarei calada cada vez que ele seja suscitado. Isto porque «quem não deve não teme», e, portanto, não temo tratar deste assunto. Assim, cada vez que o Partido Socialista suscitar este problema, virei tratar dele, mas serei tanto menos discreta quanto mais vezes me obrigarem a cá vir para esse efeito.

O Sr. José Magalhães (PS): - Que ameaça…!

A Oradora: - Não é ameaça nenhuma, Sr. Deputado!

O Sr. José Sócrates (PS): - É uma ameaça inqualificável! Se tem alguma coisa a dizer, diga! Nós não temos medo!

A Oradora: - Já percebi que os senhores não têm medo! Os senhores gostam! Os senhores não têm medo, adoram! Os senhores adoram ser criticados, adoram chamar à colação o que fizeram! Gostam! E, portanto, como gostam, vamos continuar! E, de cada vez que os senhores queiram, far-vos-ei a vontade, na certeza, porém, de que há-de ser sempre por iniciativa vossa e não minha, como não foi!
Sr. Deputado Francisco Louçã, sobre o problema da tesouraria do Estado e do descontrolo, devo dizer que, no que respeita à tesouraria do Estado, estamos a fazer a centralização de toda a tesouraria, que, de resto, já estava iniciada, pois não foi iniciada por este Governo, e vamos terminá-la até ao final do mês.
Quanto à questão relativa aos processos fiscais que estão em vias de caducar, informo que os serviços foram notificados para, até ao dia 15 do corrente mês, fazerem a análise de todos estes processos e todos os contribuintes terão de ser notificados até essa data - 15 de Setembro.

O Sr. João Cravinho (PS): - O Benfica também?!

A Oradora: - Devo dizer, ainda, Sr. Deputado, que, cada vez que surja algum processo relativamente ao qual se perceba que resultou de ineficácia por parte da administração fiscal, seremos implacáveis. É tudo quanto posso dizer-lhe sobre esta matéria.
Admito que haja alguns destes processos que, neste momento, já sejam irrecuperáveis, mas irão ser todos notificados, pelo que ficaremos com um retrato completo do que vai passar-se.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Ouvi, com toda a serenidade, a intervenção da Sr.ª Ministra, mas, pode crer, por muita influência que possamos ter, não dominamos os órgãos de comunicação social. E esta questão foi suscitada nos órgãos de comunicação social, e, como tal, tem de ser cabalmente esclarecida.
Sr.ª Ministra, como calculará, está em causa a honra e naturalmente uma dedicação ao serviço público que, com certeza, não contestará. Falo de consciência tranquila.
A questão que nos ocupa tem contornos técnicos, mas é política. Logo, não confundamos os planos.
Tudo começou quando, no Boletim Informativo de Execução Orçamental do mês de Julho deste ano - mas, depois, segundo rectificação do Ministério das Finanças, verificou-se que era relativa a Junho -, o termo de comparação relativamente ao ano anterior tinha sofrido uma alteração e, nesse boletim, não constava qualquer explicação para o efeito. E foi isto que suscitou, da parte dos órgãos de comunicação social, a referência ao tal «apagão», Sr.ª Ministra - esta expressão não foi nossa, não me ouviu usá-la!
Fique claro, porém, que não está em causa, nunca esteve em causa, o princípio da comparabilidade, nem a necessidade de haver ajustamentos, desde que os mesmos sejam claramente explicitados. O certo é que a explicação veio depois e, naturalmente, é importante que tenha surgido.
Este não é, porém, um debate sobre o passado, é um debate sobre o presente. Não podemos voltar interminavelmente atrás. Estou de acordo consigo, Sr.ª Ministra.
Recuso o método! Recuso o tom! Recuso a suspeição e a vozearia que ninguém entende! Quase parece que há verbas escondidas ou mal paradas, mas não há, como é fácil reconhecer.
Os nossos piores inimigos são os profetas da desgraça. Curiosamente, existem e proliferam onde menos se espera. Cultivam a gestão do curtíssimo prazo, as mentiras e as meias verdades e não olham a meios para atingir os fins, só contribuem para que o País fique crispado, dividido, envenenado, em vez de fazermos o que temos para fazer. E o que temos para fazer é, naturalmente, responder aos problemas da economia; é pôr o que nos une acima do que nos divide.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Falo com a consciência tranquila, porque há verdades elementares que não podem sofrer contestação.
É preciso percebermos que o tempo revelará de modo insofismável que o problema do défice e do Pacto de Estabilidade e Crescimento não é só nosso, e não é novo, e não é de um ministro, de um autarca ou de um cidadão, é um problema do País, é estrutural, exigindo o trabalho de todos. Não é uma questão de engano de contas e muito menos de fazer milagres. Trata-se de compreender, ou não, que a economia, o investimento, as contas devem estar ao serviço do desenvolvimento para resolver os problemas das pessoas. Invoco, por isso, o testemunho insuspeito de pessoas como o Professor Sérgio Rebelo, a Dr.ª Teodora Cardoso, ou o relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas, o qual, como se sabe, infelizmente, muito poucos leram. O equilíbrio não é um fim, é um meio. A consolidação das finanças públicas é uma obra de médio

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prazo que tem de envolver todas as instituições - os poderes, o Estado e a sociedade civil. Esta tarefa faz-se a pensar na economia, no investimento, na confiança e, sobretudo, no emprego e na justiça para quem é excluído pelos rendimentos e pelas qualificações.
Falou-se de manipulação das contas públicas. Acabe-se, de uma vez por todas, com dúvidas ou suspeições. Convém explicar, porque não foi dito ainda, que as contas mensais constituem uma síntese da execução orçamental, na qual o Governo e a Administração dão conhecimento público sobre o ritmo de execução do Orçamento do Estado, possibilitando-se um acompanhamento documentado sobre a evolução dos principais indicadores das contas da Administração Central. Trata-se de um trabalho de síntese, no qual são fornecidos elementos de comparação e de análise que possibilitam o acesso a informações provisórias e estimativas.
Sr.ª Ministra, não podemos analisar, mês a mês, a situação do défice, por uma razão simples: o que verificamos, mês a mês, é que as despesas são regulares e as receitas são irregulares. Ora, sendo as despesas regulares e as receitas irregulares, temos de partir dessa mesma situação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Então, não promovam conferências de imprensa!

O Orador: - Por mim, divulguei os números tal como coligidos pela Direcção-Geral do Orçamento, com base nas informações colhidas nos serviços do Ministério das Finanças. Nunca regateei esses valores e lembro-me bem de que os mesmos foram revelando o que o apuramento final das contas demonstrou. Apesar de um esforço muito significativo na redução da despesa pública, que o relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas expressamente reconhece, houve uma quebra da receita, pelo abrandamento económico e pelos efeitos das mudanças no sistema fiscal. Isto está detectado, está nas conclusões da Comissão para a Análise das Contas Públicas, as quais não podem ser esquecidas e têm de ser recordadas aqui.
Sr.ª Ministra, não houve manipulação de contas. As regras são velhas, são muito velhas, de facto. E foi a essas regras, velhas e muito velhas, que o Ministério das Finanças foi e tem de ser fiel.
Para que não houvesse manipulação de contas, não foi dada qualquer orientação para uma mudança de método ou de orientação em relação àquelas velhas regras. A orientação foi clara: deveria haver sempre contas verdadeiras, todos os meses, no mesmo dia 15. Foi assim que os serviços trabalharam. Foram estas as minhas orientações.
Só quem desconhece a lei e os procedimentos pode jogar com as aparências. Os números divulgados corresponderam aos que foram coligidos na perspectiva exacta do ponto que referiu.
Adiantou um critério, o velho critério de Caixa. Naturalmente, é deste critério que temos de partir. Mas sabe a Sr.ª Ministra, sabemos todos, que o Plano Oficial de Contabilidade Pública, no seu ponto 2.3, diz que esse critério de Caixa deve ser objecto de correcção e articulação com contas de receita e contas de despesa. Não estamos em desacordo relativamente a isto.
Neste debate fora do Parlamento houve a ideia de que nós, PS, entendíamos que deveria ser a contabilidade de compromissos contra a contabilidade de Caixa. Não! Usemos o mesmo método! Sejamos claros! Que este método seja comum a todos e que não varie consoante os meses.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Quando eu ainda desempenhava funções no Ministério das Finanças disse, nesta Casa - e a Sr.ª Ministra recordar-se-á certamente -, a propósito de uma iniciativa do Sr. Deputado João Cravinho, que seria indispensável avançar no sentido de uma maior credibilização das contas públicas, designadamente com maior intervenção do Parlamento, com a apresentação mensal das contas e a definição dos critérios.
Preconizei, por isso, e continuo a preconizar, um acordo interinstitucional a envolver o Parlamento, o governo e o Tribunal de Contas, justamente para corresponder àquilo que o Sr. Deputado Lino de Carvalho há pouco invocava, para que não haja mais dúvidas nas Contas Gerais do Estado, para que não haja mais dúvidas relativamente aos números, que é a execução orçamental, que é a contabilidade pública.
Há muitos anos, Sr.ª Ministra, que esta questão me preocupa - e a Sr.ª Ministra sabe-o bem, conhecemo-nos dessas lides - e continua a preocupar-me. Por isso, acabámos de entregar na Mesa uma iniciativa legislativa que aponta para o respeito, o cumprimento das recomendações da Comissão para a Análise das Contas Públicas, presidida pelo Governador do Banco de Portugal, bem como para uma definição clara - envolvendo, repito, o Parlamento, o governo e o Tribunal de Contas - do que é contabilidade pública, para que não haja mais dúvidas, para que não regressemos a qualquer pingue-pongue e para que, Sr.ª Ministra, a sua preocupação, a minha preocupação, a preocupação desta Câmara, a preocupação do País sejam colmatadas.
Credibilizemos as nossas contas. O problema é velho, o problema não pode persistir e é indispensável que, em cada mês que surjam notícias novas sobre «apagões», sobre supostos «apagões», não venhamos sempre referir estas suspeições, estas dúvidas, as referências infelizes que o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares fez na sua carta, falando de fraude - era esta a palavra que a Sr.ª Ministra aqui não quis dizer. Recuso terminantemente, uma vez que, para haver fraude, seria necessário haver intenção de manipular as contas públicas,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi sem querer!

Protestos do Deputado do PS Joel Hasse Ferreira.

O Orador: - … e, naturalmente, que não há, não houve, não pode haver, visto isso seria pôr em causa a própria credibilidade da administração financeira.

Vozes do PSD: - Do PS!

Protestos do PS.

O Orador: - Muitos do responsáveis são os mesmos. Muito bem, são os mesmos! E, como é natural, essa

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credibilidade, essa competência não estão em causa, e é indispensável que elas sejam plenamente salvaguardadas.
Termino, Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Membros do Governo e Sr.as e Srs. Deputados, dizendo que é indispensável um empenhamento maior da Assembleia da República na credibilização dos instrumentos financeiros orçamentais e contabilísticos.
Há muitos anos que defendo esta perspectiva. Logo, é indispensável que verifiquemos que os velhos métodos que foram usados, e foram novamente usados, e que os critérios que a administração financeira usou são critérios que não podem oferecer qualquer dúvida, no presente ou no futuro, e, por não o poderem, é indispensável que nos entendamos.
Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É indispensável que este Parlamento não se alheie desta questão. É indispensável que aprove as contas no tempo próprio. É este o julgamento fundamental, é este o julgamento em que temos de apostar, e não, Sr.ª Ministra, correr atrás de números, esquecendo a regra fundamental: a credibilidade faz-se com a própria administração, com o funcionamento normal da administração, cumprindo os objectivos a que nos propomos.
Estamos ao lado do Governo para garantir que os objectivos das finanças públicas sejam cumpridos, porque é o País, é Portugal que está em causa.

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares inscreveu-se para pedir esclarecimentos, mas como o Governo não dispõe de tempo o PSD cede o tempo necessário.
Tem a palavra, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, ouvi-o, naturalmente, com toda a atenção, e a primeira grande dúvida que se colocou aos Membros do Governo, e julgo que a todos, é a seguinte: ouvindo-o, em particular quando dizia que não era tão importante falar do passado e do presente mas, sobretudo, do futuro, dá a impressão que esta questão, que justifica estarmos hoje aqui, foi suscitada pelo Governo e não pelo Partido Socialista.

Vozes do PS: - Não foi o PS!

O Orador: - Quero recordar, porque às vezes os Srs. Deputados têm tendência a ter memória curta,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Comem muito queijo, queijo Limiano!

O Orador: - … que foi no dia 20 de Agosto que o Sr. Deputado Fernando Gomes, em nome do Partido Socialista e na sede nacional do Partido Socialista, veio dizer que era preciso que a Ministra das Finanças viesse ao Parlamento explicar o alegado desaparecimento de 623 milhões de euros na receita fiscal de Julho de 2001 e prestar informações concretas e fundamentadas sobre a execução orçamental. Foi o Partido Socialista!
O Governo limitou-se a fazer isto: como «quem não deve, não teme!» - já o disse a Sr.ª Ministra - nós dissemos «querem discutir isto em comissão?», «não, porque a questão é política, vamos discutir isto em Plenário, à vista de todos». Ou seja, na origem deste debate, por muito que lhe custe, Sr. Deputado, estão declarações e exigências do Sr. Deputado Fernando Gomes, por acaso hoje ausente desta Sala,…

Vozes do PS: - Está em Joanesburgo!

O Orador: - … e, por isso, como são incómodas, o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, ex-Ministro das Finanças, resolve falar do futuro, porque, obviamente, não lhe dá jeito falar do passado, em particular daquele que o Deputado Fernando Gomes pediu explicações.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como porta-voz do PS!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - É «furta-voz»! Não é porta-voz!

O Orador: - A segunda questão, Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, tem a ver com a carta que escrevi à Assembleia da República onde eu disse que uma das razões que também era importante discutirem não era apenas a situação, já aqui referida, de registos feitos em Julho respeitantes a receitas só entradas efectivamente em Dezembro mas também a de receitas que foram registadas como entradas nos cofres do Estado e que realmente nunca entraram. E a Sr.ª Ministra recusou-se a usar a expressão para catalogar esta situação, mas eu usei-a - e não tenho qualquer problema!
Digo-lhe mais, Sr. Deputado, é verdade que o País já está cansado de ouvir falar das questões de 2001 - é verdade! -, mas, enquanto os Srs. Deputados quiserem, nós viremos cá, hoje, amanhã e sempre.
Mas, em matéria de fraude, deixe-me só que lhe diga que o País já todo percebeu que não é apenas essa situação que é uma fraude, toda a execução orçamental do ano passado foi uma imensa fraude política: previram um défice orçamental de 1,1% e acabou em 4,1%! É um descontrolo, apenas e só, de 750 milhões de contos, o que tem muito a ver com o dia-a-dia e com os impostos que pagam os contribuintes. Uma enorme fraude política!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, termine, por favor!

O Orador: - Terminando, Sr.ª Presidente, faço duas perguntas.
Então, se é assim, como o Sr. Deputado diz, e eu concordo com muito daquilo que hoje aqui disse, que este debate aparentemente estava encerrado em Julho, por que é que o Partido Socialista o voltou a reabrir?
A última questão, também muito prática e muito concreta.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Ministro, tem de concluir.

O Orador: - Termino mesmo, Sr.ª Presidente!

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Diz o Sr. Deputado que todos os dados da execução orçamental foram, timtim por timtim, os vindos da Direcção-Geral do Orçamento. Tenho aqui um documento da Direcção-Geral dos Impostos que já foi lido pela Sr.ª Ministra mas tenho de voltar a lê-lo - é um documento oficial e, se for preciso, distribuo-o -, que diz o seguinte: finalmente, cabe também realçar que os mapas de receita para a comunicação social não eram produzidos pela Direcção-Geral mas pelo Gabinete do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais ou do Ministério das Finanças, pelo que desconhecemos eventualmente factos relevantes sobre a matéria.
O Sr. Deputado importa-se de explicar como é que diz que eram dados contabilísticos da Direcção-Geral quando, aqui, a Direcção-Geral diz serem dados fabricados na Secretaria-Geral dos Assuntos Fiscais ou no Gabinete do Ministério das Finanças. É uma informação oficial que talvez justifique muito toda a manipulação contabilística feita à época, que deu o descontrolo que deu, de 4,1%, no défice orçamental do ano passado.

Aplausos do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Se calhar, não foi sem querer!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, primeiro, eu já disse que a questão foi suscitada na comunicação social,…

Vozes do PSD: - Suscitada na comunicação social?!

O Orador: - … e, uma vez suscitada, não poderia deixar de ter esclarecimento. Ora, como eu próprio referi, a sede adequada para o esclarecimento das questões que têm de ser esclarecidas é este Parlamento. Há, por isso, uma Comissão de Execução Orçamental e há, naturalmente, meios para o fazer.
Segundo, o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares insiste na ilegitimidade de antecipações e na ideia de que houve receitas contabilizadas e que nunca deram entrada. Vamos, naturalmente, às duas situações que estão em causa.
Em primeiro lugar, trata-se da situação de lucros de amoedação. Como o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares sabe, os lucros de amoedação correspondem à diferença entre o custo da emissão monetária e o da circulação, ou seja, o valor que está em circulação. Em 1995, era secretário de Estado o actual Secretário de Estado do Orçamento, foi também considerada uma verba correspondente a lucros de amoedação, exactamente nos mesmos termos que foram previstos para o ano 2001, com uma questão adicional: em 2001, era indispensável imputar esse valor, uma vez que se tratava do último ano da circulação do escudo.
Mas a Comissão, presidida pelo Dr. Victor Constâncio, resolveu esta questão: entendeu que deveria distribuir este valor pelos diversos anos correspondentes ao período que vai desde a última vez em que foi feita a imputação destes lucros de amoedação até ao momento em que ela se realizou. Portanto, foi esta questão.
No que toca às questões fiscais, ao IRS, o Sr. Ministro sabe perfeitamente que, havendo irregularidade quanto às receitas e havendo movimentos em dois sentidos, uma vez que há não só cobranças mas também reembolsos, pode haver sempre situações em que o que vale, o que é importante, como a Sr.ª Ministra disse, é o valor da cobrança efectiva no exercício e não propriamente a previsão ou a estimativa. É isto que está em causa! Não há qualquer má fé! Não há qualquer fraude, como é evidente - e o Sr. Ministro conhece-me há anos suficientes para saber que eu não pactuaria com fraude nem com qualquer situação de inverdade perante os cidadãos, perante os contribuintes.
Última questão…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, por favor.

O Orador: - Termino, Sr.ª Presidente, mas, como compreende, é necessário que isto fique inteiramente esclarecido.
A última questão tem a ver com aquilo que agora a Sr.ª Ministra vem, novamente, invocar quanto aos valores.
Ora bem, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, para que fique claro, as minhas orientações foram sempre no sentido da verdade contabilística e, por isso, relativamente ao relatório do Banco de Portugal, os valores que são apurados são os que correspondem ao valor final, com alterações e ajustamentos que foram feitos e que muitas vezes foram feitos no passado - e a Sr.ª Ministra sabe-o perfeitamente -, porque é normal que isto aconteça. E, se é normal que isto aconteça, o fundamental é o apuramento de um valor final. É isto que está em causa!
Por isso mesmo, fiquei um pouco surpreendido quando a Sr.ª Ministra disse que um senhor secretário de Estado tinha falado na hipótese de pôr 0,7% no reporte para Bruxelas. Ó Sr.ª Ministra, eu nunca ouvi isso, francamente! Mais, se alguém dissesse isso, seria um perfeito despautério, por uma razão simples: a questão fundamental não é essa, Sr.ª Ministra, mas o cumprimento das nossas obrigações.
Sr.ª Ministra, recordo-lhe…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tem de concluir, uma vez que já esgotou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Sr.ª Presidente, agradeço muito a sua complacência e, para terminar, gostaria de dizer à Sr.ª Ministra que, quando se trata de défice, quando há situações difíceis, todos sabemos onde ele começa mas nunca sabemos onde ele acaba. Vejamos a experiência da primeira metade dos anos 90 e as surpresas muito negativas que, nessa altura, ocorreram e que, naturalmente, temos de compreender. É a História!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - É uma pena!

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, o Sr. Deputado António Costa lembrou a Mesa de que o Sr. Deputado Fernando Gomes não está presente por integrar a delegação da UIP, em Joanesburgo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Há dias, a já aqui citada e prestigiada economista Teodora Cardoso, num artigo publicado num jornal diário, dizia que nesta matéria, em sede de questões orçamentais, era tempo de acabar com a imputação da culpa aos pardais. É uma alegação metafórica que repristina a célebre imagem da República Popular da China dos finais dos anos 50, quando, com vista ao incremento da produção de cereais, determinou o extermínio dos pardais, o que se revelou, aliás, um logro manifesto, posto que, como relata a economista Teodora Cardoso, desse extermínio de pardais, não resultou qualquer incremento da produção de cereais mas uma crise de fome, das mais nefastas de que há memória, na República Popular da China.
Estamos de acordo em que, nesta matéria orçamental, a culpa não é de facto dos pardais, mas é bom que se diga que, aqui, a culpa não pode morrer solteira. E ela não pode morrer solteira porque tem um rosto e um nome: Partido Socialista.
É bom não esquecer - e o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares teve oportunidade de o frisar há pouco - que esta questão não surgiu de supetão, de uma forma incidental, por mero acaso em pleno Verão. Não! Esta questão surgiu por iniciativa do Partido Socialista, que, inopinadamente, de uma forma surpreendente, em meados de Agosto, veio com a insinuação de um suposto «apagão» do Orçamento em Julho de 2001. Foi o Partido Socialista - e não foram definitivamente os pardais! - que, nessa altura, lançou a suspeição infundada e o alvitro inconsequente sobre a «falta de transparência e clareza» das informações sobre a execução orçamental e «muitas coisas que o País deveria conhecer e não conhecia» relativamente a matérias orçamentais. E foi ainda o Partido Socialista - e não foram, uma vez mais, os pardais! - que, num cenário perfeitamente especulativo e alarmista, antecipou um mau desenlace para o cumprimento do défice de 2,8% do PIB, anunciado pelo Ministério das Finanças para este ano de 2002.
Sejamos claros e frontais.
Este exercício político do Partido Socialista sobre a história do putativo «apagão» foi um verdadeiro «tiro no pé». Direi, mais: «um tiro de canhão no pé»! Aliás, bastaria uma leitura, mesmo apressada, singela, em diagonal do relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas, presidida pelo Banco de Portugal, para facilmente enxergarmos o dislate desta intervenção do Partido Socialista em pleno Verão. É que o empolamento, o inflacionamento das receitas está plasmado no próprio relatório! E se existe, efectivamente, empolamento e inflação das receitas - veja-se a pág. 10 do dito relatório, nomeadamente no tocante aos lucros de amoedação e à arrecadação de IRS -, e ela está confirmada sem qualquer discrepância pelo Banco de Portugal, naturalmente terá de haver, a montante, correcção da respectiva execução orçamental.
Se houvesse um pouco mais de detença, de estudo, de rigor, de seriedade, de sentido de Estado da parte do Partido Socialista, seguramente esta infeliz atoarda do «apagão» não teria sido suscitada em pleno Verão, criando um alarmismo e uma especulação absolutamente infundadas, completamente arredias da realidade, como, aliás, se veio a demonstrar.
Afinal, o faltor desse suposto «apagão» foi o próprio governo do Partido Socialista de então; foi sob a égide de um governo socialista - e não do actual Governo - que, num procedimento tecnicamente irregular e politicamente abusivo, foram inscritas na execução orçamental de Julho de 2001 verbas, receitas, que não deram entrada nos cofres do Estado nesse período.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Qual é a receita?

O Orador: - E não venham com o argumento de que essas receitas entraram a posteriori, e que, portanto, não é um facto gravoso!
O que funciona em termos orçamentais (e os senhores sabem disso), é a regra da contabilidade Caixa e não a regra da contabilidade de compromissos de exercício e muito menos a contabilidade de base accrual. É a contabilidade Caixa; é a efectividade de receita! E mandam as boas regras da transparência e da verdade contabilística que, nesta matéria, as tais receitas de 370 milhões de euros que foram contabilizadas em Julho de 2000 mas que apenas deram entrada mais tarde, em Julho ou até no final do ano, tivessem sido apenas contabilizadas no efectivo momento em que deram entrada.
Não foi assim que procedeu o Partido Socialista relativamente a essa antecipação da receita. Mas, mais grave do que isto, é aquele procedimento, para o qual, e peço desculpa, não encontro outro nome para o apodar que não seja o de um procedimento fraudulento do ponto de vista político, que é efectivamente a inscrição, em Julho de 2001, de receita que nunca deu entrada nos cofres do Estado.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Já esclareci a questão!

O Orador: - Isto também está plasmado no relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas.
Os lucros da moeda são 100 milhões de euros, montante que não deu entrada nos cofres do Estado em 2001, e há uma arrecadação de cerca de 150 milhões de euros relativa a IRS superior ao efectivamente arrecadado.

Protestos do Deputado do PS Guilherme d'Oliveira Martins.

O Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, se tiver oportunidade de reler uma vez mais, mesmo en passant, a pág. 10 do relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas, certamente confirmará o acerto e a bondade daquilo que agora acabei de dizer.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Já esclareci essa questão!

O Sr. José Sócrates (PS): - Não ouviu!

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O Orador: - Em suma, o dito «apagão» não passou de um fogacho alarmista e especulativo de Verão, e daí não ser de estranhar que o mensageiro de tal nova, num ápice, se tenha eclipsado e apagado a ele próprio. Nunca mais se ouviu falar do Deputado Fernando Gomes! Aliás, ocorre aqui perguntar: onde está o Deputado Fernando Gomes? Foi ele, de facto, o arauto, o mensageiro, o paladino desta atoarda do «apagão» da execução orçamental de 2001. Seria, de facto, de bom tom que aquele que trouxe esse alarmismo para o debate político estivesse aqui, hoje, a dar a cara, a responder, a explicar as razões pelas quais fez aquelas imputações, absolutamente arredias da realidade, relativamente à falta de transparência e de clareza da informação em sede de execução orçamental.
Manda a verdade dizer que o Partido Socialista, a dado passo, apercebeu-se do erro manifesto desta atoarda do «apagão» da execução orçamental, daí que tenha, numa cruzada pretensamente pedagógica e perspectiva - citando palavras expressas pelo Deputado Guilherme d'Oliveira Martins -, um «novo olhar para o futuro, com novas regras ou regras mais claras de apresentação de contas, numa aposta na verdade e na credibilidade», ou, então, numa versão diferente, a do Deputado Joaquim Pina Moura, fazendo jus a um pacto de regime, com um compromisso plurianual nesta matéria. O facto é que tudo isto revela um estratagema claro da parte do Partido Socialista para emendar a mão, corrigir o «tiro», tal é a falácia e o embuste da imputação que foi feita relativamente ao «apagão» orçamental. E daí, enfim, todo este desvio de atenção da questão central, que está, de facto, na ordem do dia desta Comissão Permanente, para matérias absolutamente marginais, como é o caso do offshore da Madeira, aqui suscitado por antecipação no período de antes da ordem do dia, e que vêm apenas, à vol d'oiseau, desviar a atenção daquilo que é um logro manifesto de uma imputação que se revelou fruste e baldada.
Relativamente a este novo discurso pedagógico do Partido Socialista, designadamente do Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, o tal «olhar para o futuro, com verdade e credibilidade», ocorre perguntar: que autoridade e idoneidade pode ter o Partido Socialista em matéria de verdade, de rigor e de transparência quando foi um governo do Partido Socialista o responsável pelo descalabro e desvario orçamental mais gravoso de que há memória na história das finanças públicas em Portugal, ao ponto de ter levado um défice estimado em 1,1% do PIB, no início do ano, para um défice de 4,1%? Que credibilidade pode ter o Partido Socialista nesta matéria? Que legitimidade pode ser atribuída ao Partido Socialista, desta arte arvorado em paladino da verdade e do rigor, para vir agora sugerir a adopção de recomendações em sede de disciplina orçamental e de transparência das contas públicas, quando, no passado, malbaratou, vezes sem conta, a seriedade que deveria subjazer à gestão financeira do Estado? Que confiança pode ser depositada num Partido Socialista que, no passado, fez letra morta das boas e sãs regras contabilísticas, designadamente da efectividade da receita que vigora em sede orçamental, do que concerne ao cumprimento da Lei do Enquadramento Orçamental e do próprio Regulamento n.º 2516, que tantas vezes foi, pura e simplesmente, ignorado pelos governos socialistas?
Aliás, nesta sede, tem o Partido Socialista, e o Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, feito algum finca-pé na questão dos critérios adoptados, e, a este propósito, gostava de chamar a atenção para o relatório da Comissão para a Análise das Contas Públicas, que, a dado passo, cita de uma forma peremptória e quase axiomática a impossibilidade de adopção de outros critérios em sede orçamental que não seja de facto o da contabilidade Caixa, principalmente no que concerne às receitas de impostos e contribuições sociais, sendo que, relativamente ao IVA, se admite o critério de contabilidade Caixa Ajustado. Porquê? Exactamente porque a especificidade do nosso país e das nossas finanças públicas, face à inexistência de estabilidade no domínio fiscal e à impossibilidade da previsão e da improbabilidade das receitas, não permite a adopção de um outro método de apresentação das contas.
Posto isto, Sr.ª Presidente e Srs. Deputados, creio que é tempo de assumirmos que as questões orçamentais têm hoje um enorme relevo face à integração do País na zona euro e aos compromissos resultantes do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Devem, por isso, ser tratadas com seriedade, com clareza, com ponderação, com bom senso, com elevado sentido de Estado, não podem andar a reboque de baixos argumentos políticos, não podem andar a reboque de intrigas partidárias ou de meros arrufos de protagonismo deste ou daquele partido.
Pactos de regime meramente retóricos ou recomendações anódinas, porque já decorrem dos próprios instrumentos legislativos, ou dos valores e princípios que subjazem a esses mesmos instrumentos legislativos, naturalmente não acrescentam um átomo relativamente àquilo que importa: a credibilidade do sistema político, das instituições e da própria democracia, de que a transparência orçamental é, sem dúvida, um instrumento nuclear.
Que o PS aprenda com os erros de palmatória que cometeu nesta sede e que, doravante, no domínio orçamental, tenha uma postura mais responsável e mais sentido de Estado. Se assim for, não será seguramente necessário trazer à liça a responsabilidade dos «pardais», imputar a responsabilidade pelo descalabro orçamental aos «pardais», ou nomear culpados pelo desvario orçamental.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins lembrou há pouco que o problema que aqui estamos a discutir é velho. E é verdade!
A questão que o Partido Socialista suscitou, a reboque da manchete do Diário de Notícias, a propósito da execução orçamental de Julho, poderia ter sido levantada relativamente à execução orçamental de Junho, ou do ano anterior ou, se calhar, infelizmente, do próximo ano! Basta fazer um pequeno exercício de casa: comparar os mapas de execução orçamental publicados num ano com os que, depois, são publicados no ano seguinte referentes ao ano anterior para se verificar que não há em nenhum um número que esteja certo. Todos são alterados!

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Portanto, a questão que se coloca - uma das questões centrais, em minha opinião - é aquela que levantei há pouco e que a Assembleia da República e em particular o Tribunal de Contas há muito têm feito registo, que é haver uma total descoordenação, desarticulação, entre os diversos serviços do Ministério das Finanças, designadamente em matéria de critérios de registo de informação e de uniformização dos sistemas informáticos e dos meios para esse efeito. Ora, a resposta que a Sr.ª Ministra há pouco me deu foi limitada em relação àquilo que há para fazer. É bom que se faça a centralização da tesouraria do Estado, Sr.ª Ministra, mas é preciso avançar mais na uniformização dos sistemas de informação, na uniformização dos sistemas informáticos, na disponibilidade online da execução orçamental, para que todos nós, no Parlamento e o Tribunal de Contas em particular, possamos ter elementos fiáveis em cada momento. Há que dar meios (meios humanos e técnicos) à Direcção-Geral de Finanças, aos serviços do Ministério das Finanças que permitam dar resposta a esta questão, sob pena de, Sr.ª Ministra, independentemente dos conflitos político-partidários de cada momento, estarmos permanentemente neste processo, que, como referi há pouco, seguramente, não serve a ninguém e não nos prestigia, não prestigia o País.
Mas, se tal é verdade em relação a uma parte destes desfasamentos, tenho para mim que há matéria sobre a qual ainda não foram dados esclarecimentos precisos e a qual não se tratará, porventura, somente de desfasamentos entre os sistemas de informação, ou entre o momento em que se regista um Caixa, ou o momento em que se regista o compromisso possível.
Isto é verdade, pode ser verdade e é-o, seguramente, para as receitas fiscais! Mas a minha perplexidade é a seguinte: por que é que em matéria de dividendos, por exemplo, há uma diferença de registo em 2001 e agora em 2002 na ordem dos 106 milhões de euros? Em matéria de dividendos arrecadados pelo Estado não há, em princípio, lugar a diferenças entre estimativas e receita final. Não há lugar a diferenças de sistemas de informação. É um facto que ocorre quando o valor é entregue ao Estado.
Ora, sobre isto não ouvi esclarecimentos, nem da parte do Governo, nem da parte do Partido Socialista, e gostaria de os ouvir, para sabermos e podermos clarificar o que é, por um lado, desfasamento e desarticulação nos sistemas internos do Ministério das Finanças e, por outro, manipulação de registos contabilísticos (porventura, por bons interesses). Mas gostaria de saber onde é que há manipulação destes processos.
Só que estas matérias - não pondo em causa a boa fé de ninguém no plano pessoal, mas este é obviamente um problema político que estamos a tratar - levantam uma questão de fundo que tem a ver com algo a que se vem assistindo há alguns anos a esta parte, não só em Portugal mas também noutros países da União Europeia, que é a engenharia contabilística feita nos processos orçamentais e nas contas do Estado para se poderem apresentar a Bruxelas os valores adequados ao Pacto de Estabilidade e Crescimento que foi assinado e que se verifica agora não terem qualquer relação com a realidade.
Felizmente, verificámos no comício da rentrée que o Partido Socialista já vem ao encontro (e esperemos que seja de forma sincera e não apenas por estar na oposição) daquilo que nós há muito dizemos. Ou seja, é preciso fazer uma reflexão sobre a irracionalidade do Pacto de Estabilidade e Crescimento não só nos critérios, na filosofia e no modelo mas também naquilo que ele ocasiona, e que estamos aqui a discutir, que são os procedimentos de engenharia artificialmente feitos por cada governo para procurar agradar a Bruxelas. Não serve a ninguém! Não serve a uma ideia clara das nossas finanças públicas, do estado da nossa economia, nem nos prestigia, seguramente.
Esta é a questão que este problema arrasta e que deve estar na ordem do dia da nossa discussão.
Porventura, se o Governo aderir a esta nova posição do Partido Socialista, existirão agora melhores condições para que a Assembleia da República aprove, finalmente, aquela que é há muito uma nossa proposta - e ainda no último debate a fizemos -, que é a de levar o Governo a pôr em cima da mesa, em Bruxelas, a rediscussão de todo este processo, dos critérios para o Pacto de Estabilidade e Crescimento que originam as tais operações de engenharia orçamental e financeira e que, seguramente, não dão mais transparência às contas públicas, pelo contrário!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de concluir.

O Orador: - Termino de imediato, Sr.ª Presidente.
Por outro lado, há uma outra questão, que, esta sim, deveria centrar a nossa atenção e que tem sido desviada deste processo, que é, quando estamos todos tão preocupados com o problema da receita, o combate à fraude e evasão fiscais. Aliás, este é um problema que também foi referido pelo Dr. Durão Barroso no comício da rentrée - os comícios da rentrée são sempre muito interessantes, porque estão cheios de novidades! Ora, se assim é, a questão que se coloca é saber que medidas concretas irão ser tomadas para combater o enorme volume de fraude e evasão fiscais que há no País - o que parece reunir o consenso nacional - para que isto termine de uma vez por todas e se aumente as receitas do Estado sem se estar a penalizar os portugueses com cortes nas despesas sociais e de investimento. É esta a questão central que, porventura, nos deveria unir a todos neste debate!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Este debate, que poderia assumir uma natureza técnica, profunda, está, obviamente, marcado pela sua origem de natureza política e partidária. Esta questão, que é, efectivamente, muito importante e que deve ser discutida no Parlamento, está obviamente marcada por uma posição que o Partido Socialista tomou - não sei se a decidiu de dia se de noite, mas sei que é conhecida como o «apagão».
Já agora, quero referir que esta é uma questão que preocupa, desde há algum tempo, o CDS. E, com toda a certeza, puderam ler no programa eleitoral do meu partido que se pedia a instituição de regras claras quanto ao controlo e qualidade da despesa pública. Mas, mais, pedia-se que fossem previstos mecanismos que trouxessem uma

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melhor e mais adequada informação ao Ministério das Finanças.
São óbvios os problemas que, em relação a esta matéria, podem ser colocados, mas tudo isto, nesta situação em concreto, acaba por ficar, infelizmente, para um segundo plano, devido a uma atitude política inaceitável.
O Partido Socialista, sabendo bem da importância que tem a matéria da execução orçamental - ela, por exemplo, vem referida numa nota informativa da Direcção-Geral do Orçamento quanto aos inúmeros pedidos que são feitos relativamente a estas informações -, ao que parece levado pelos elementos disponíveis e pelas recentes notícias veiculadas pela comunicação social, decidiu estranhar aquilo que era conhecido quando à execução orçamental. Mas que estranha atitude toma o partido que fez uma previsão inicial, quanto ao défice, de 1,1%, que veio a provar-se ser de 4,1% do PIB!
Numa primeira análise, até pensei que iriam pedir que fossem chamados a esta Assembleia os Ministros das Finanças e os Secretários de Estado do Orçamento da altura dessa execução orçamental. Pensei até que iriam dar explicações sobre aquilo que vem referido na pág. 1 da síntese de execução orçamental, que é o assunto que aqui nos traz, onde se diz que na alteração à lei do Orçamento do Estado para 2002 são apontadas previsões mais realistas quer de receita quer de despesa. No que diz respeito àquela, à primeira, a execução dos primeiros meses de 2002 mostra que houve uma sobrestimação das receitas fiscais e não fiscais do orçamento inicial - orçamento inicial esse que foi aprovado depois do 11 de Setembro, perante a conjuntura internacional, que tantas vezes foi referida.
Mas, espantosamente, nada disto foi o objectivo do Partido Socialista, que dizia não conhecer os métodos utilizados em relação à matéria da execução orçamental. Talvez tivesse sido interessante que o responsável do Partido Socialista, ou o responsável do Partido Socialista que falou, tivesse lido (e realmente poucos o leram) o relatório do Banco de Portugal, do Instituto Nacional de Estatística e da Direcção-Geral do Orçamento que consagra uma recomendação, a n.º 2, em relação às matérias da cobrança de impostos e das contribuições para a segurança social, no sentido de ser tomado como critério a lógica de caixa e apenas a de caixa-ajustada em relação ao IVA.
Também teria sido interessante que o Partido Socialista tivesse tomado em atenção a crítica que é feita na pág. 16 desse mesmo relatório relativamente à instabilidade legislativa quanto à matéria fiscal. Mas quem criou essa instabilidade legislativa foi, com toda a certeza, o Partido Socialista e aqueles que o apoiaram nas alterações fiscais que pretenderam fazer na altura.
Falaram, quanto à execução de Julho de 2001, numa tentativa de vitimização. A mesma, à altura, não pegou; tiveram, obviamente, de recuar, como se notou, de uma forma clara neste debate, mas tomam uma atitude que, devo dizer, me espanta de uma forma muito profunda, porque põem dúvidas em relação ao objectivo do défice para 2002. E ficamos sem perceber qual é a voz autorizada do Partido Socialista, se aquela que pretende pactos de regime ou aquela que vem dizer: «Não, nada vai ser conseguido. Isto vai ser tudo muito mau para a nossa economia e para a nossa situação orçamental».
O partido que, com toda a certeza, ficará na história por ter apoiado o governo que nos deixou na pior situação orçamental da União Europeia ainda nos veio dizer que o problema estava, fundamentalmente, na receita! É preciso que se chame a atenção para os factos, e os factos, como o Deputado Guilherme d'Oliveira Martins bem sabe, são os seguintes: a previsão orçamental da receita e a previsão da despesa são totalmente distintas, já que uma, a da despesa, tem uma natureza quantitativa e qualitativa e a outra, a da receita, tem uma referência meramente qualitativa.
Por conseguinte, é evidente que os problemas de execução orçamental se referem fundamentalmente à receita. Mas isto em nada invalida que a despesa pública prevista seja uma despesa pública excessiva e que, em relação à mesma, seja preciso tomar medidas, como, e bem - se calhar, já se esqueceram -, a determinada altura foi previsto um conjunto de 50 medidas para diminuir a despesa pública, que ainda hoje não entrou em execução. E quero relembrar que quem tem a responsabilidade relativamente a esta matéria e quem aprovou os Orçamentos foi precisamente o Partido Socialista.
O Partido Socialista, que fez com que Portugal fosse o primeiro Estado da União Europeia, nesta fase, a ultrapassar o défice de 3% do PIB, dava um estranho exemplo para aquilo que já referiu como um pacto de regime ou, como disse hoje nesta reunião, como a necessária defesa do interesse nacional, porque pôs em dúvida o objectivo em relação a 2002. Ou seja, no fundo, critica a única medida que seria possível tomar em relação à receita, para se poder chegar a números aceitáveis do défice; cria medo às pessoas no que toca a alcançar um objectivo, que é um objectivo fundamental! Nós acreditamos que o mesmo vai ser conseguido, e acreditamos também com base nesta síntese, que, na pág. 3, refere precisamente esse aspecto em relação àquilo que são as previsões feitas depois da alteração orçamental e àquilo que é a execução orçamental propriamente dita.
Quando convinha uma mudança de atitude e não uma confusão, é este o espectáculo que o Partido Socialista nos dá: cada um dos seus dirigentes diz sua coisa relativamente a esta matéria!
Se há quem aposte no desastre, nós respondemos com confiança no futuro! Se há quem faça política «espectáculo», nós respondemos com rigor na análise!
Assim faremos, nesta bancada, porque acima de tudo está a nossa imagem como Estado de direito, que, com toda a certeza, não queremos que se apague.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Pina Moura, que dispõe de 1 minuto, tempo cedido pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes».

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estado: Vou ser muito rápido e dirigir a minha intervenção directamente a duas questões suscitadas pelo Deputado Jorge Neto.
Fique claro, de uma vez por todas, que a receita de amoedação é uma receita escritural, não é uma receita fiduciária.

Vozes do PS: - Não sabe!

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Protestos do PSD.

O Orador: - Que fique claro, também, que essa receita teve de ser eliminada no Orçamento do Estado de 2001 depois das decisões e recomendações do relatório elaborado pelo Banco de Portugal.
Pelo mesmo motivo (e tenho a certeza de que não há qualquer intenção dolosa nisto), o actual Governo, tendo inscrito no Orçamento rectificativo uma receita de amoedação para 2002, depois de decisões posteriores do EUROSTAT, vai ter de eliminar também essa receita no ano de 2002. Ela está inscrita! Está no Mapa I!
Portanto, no que respeita à amoedação, fique claro que não só não houve qualquer intenção dolosa como nunca, mesmo que ela contasse, teria entrado nos cofres do Estado um cêntimo ou um tostão, uma vez que na altura ainda era de escudos que se tratava.
Em segundo lugar, há uma outra questão que também é importante anotar na intervenção do Sr. Deputado Jorge Neto.
Ó Sr. Deputado, temos de nos entender sobre uma coisa: os critérios que decorrem do relatório do Banco de Portugal, nomeadamente no que respeita à escrituração de receitas e despesas, são fundamentalmente ligados ao momento em que se assumem os compromissos, e é pela adopção desses critérios que o défice de 2001 assume o valor de 4,1%, porque, conforme se diz a pág. 6 desse relatório do Banco de Portugal -…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, tem de concluir.

O Orador: - … vou terminar, Sr.ª Presidente -, «(…) é conveniente recordar que os quatro pontos de alteração metodológica já referidos contribuíram para um agravamento do défice de 2001 em 1,0% do PIB». Trata-se precisamente de alterações de critérios, com a fundamentação que consta do relatório, e com a qual concordo, que determinaram uma alteração de critérios de registo baseados num critério de Caixa para um registo de compromissos.
Eram estas as observações que queria fazer à intervenção do Sr. Deputado Jorge Neto, e agradeço não só ao Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» a cedência de tempo para eu poder intervir mas também à Sr.ª Presidente pela maior latitude de tempo que me concedeu.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Neto.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Sr.ª Presidente, aquilo que o Sr. Deputado Joaquim Pina Moura acaba de dizer não invalida em nada aquilo que eu disse na minha intervenção inicial. Ninguém fez aqui imputação dolosa a quem quer que seja, o que se constata, de uma forma absolutamente indiscutível…

Vozes do PS: - Falou em fraude!

O Orador: - Fraude política! É uma fraude política, porque há, de facto, uma discrepância manifesta entre aquilo que lá foi inscrito em termos de estimativa e a realidade do apurado, e isso só tem um nome! Por muito criativo que seja o léxico socialista, só pode ter um nome, que é fraude política!
Agora, deixe-me dizer-lhe, Sr. Deputado Joaquim Pina Moura: naturalmente que as suas explicações são bem-vindas, na esteira, aliás, à imagem e semelhança das explicações produzidas e muito doutas do Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, só é pena que os senhores, em sede própria, isto é, na sede do Partido Socialista, no dia 20 de Agosto, antes do Deputado Fernando Gomes ter vindo, com aquela atoarda do «apagão», lançar a especulação e o alarmismo no País, não o tivessem esclarecido de que a realidade era bem diferente daquela que ele transmitiu. Se as explicações que hoje transmitiram aqui ao Parlamento, as tivessem dado na altura em sede própria, isto é, na sede do Partido Socialista, a quem de direito, no caso ao Deputado Fernando Gomes, seguramente que hoje não estaríamos reunidos aqui na Comissão Permanente a discutir uma matéria cuja responsabilidade é exclusivamente dos senhores.
Já aqui foi dito e repito: é um exercício de manifesto masoquismo político trazer aqui à colação matéria de que os senhores são os únicos faltores, os únicos responsáveis.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, dou por encerrado o debate sobre a execução orçamental de 2001.
Vamos, agora, passar, ao segundo ponto da ordem do dia, que é o debate, por iniciativa do PS, sobre a Portaria n.º 555/2002, da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, referente à imputação do lucro tributável das entidades licenciadas para operar nas Zonas Francas da Madeira e ilha de Santa Maria.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Cabrita.

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O candidato Durão Barroso ganhou as eleições, prometendo baixar os impostos, como forma de estimular a economia.
Quando confrontado com as consequências da perda de receita num quadro orçamental condicionado pelas obrigações assumidas no Pacto de Estabilidade, disse, no já longínquo início do ano, que a alteração do regime fiscal aplicado na Zona Franca da Madeira permitiria uma imediata compensação das eventuais reduções na cobrança de impostos.
Hoje, as promessas eleitorais de Durão Barroso estão tão distantes que parecem um sonho de uma noite de Verão. As reduções de impostos estão adiadas para o final da Legislatura.
O PSD prometeu a redução dos impostos sobre o rendimento pessoal, mas os portugueses sofreram um aumento de 2% no IVA; as empresas aguardavam a redução do IRC, mas o Governo oferece-lhes a redução do investimento público e a conjuntura económica mais depressiva desde a adesão à União Europeia, com efeitos já evidentes nos sectores de actividade que mais rapidamente reflectem as alterações de política económica - o «verão sombrio» do turismo, a crise na habitação, a suspensão ou o adiamento de investimentos públicos e a redução de actividade no comércio a retalho.

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Os estímulos ao investimento das empresas foram, mais uma vez, anunciados na Póvoa do Varzim, repetindo o discurso do estado da Nação e o programa de competitividade, sempre prometido, mas ainda à espera de concretização.
Relativamente à Zona Franca da Madeira, todos recordamos o que foi dito, isto é, que seria a panaceia para uma eventual perda de receitas fiscais, mas a realidade, também neste ponto, rapidamente desmentiu as palavras lançadas ao vento antes das eleições.
A Assembleia da República, no final do ano 2000, por iniciativa do Partido Socialista, mas com o acordo e participação activa de Deputados do PSD, designadamente do seu actual líder parlamentar, aprovou a Lei n.º 30-F/2000, de 29 de Dezembro, que procedeu à redefinição dos benefícios fiscais concedidos às instituições financeiras que exercem actividade nas Zonas Francas da Madeira e de Santa Maria.
Estabeleceu-se um conjunto de regras aplicáveis às entidades que exercem em exclusivo a sua actividade nas zonas francas. Quanto aos grupos financeiros nacionais com actividade desenvolvida em todo o território nacional e igualmente nas zonas francas, o princípio fundamental adoptado é o da transparência fiscal.
Estabeleceu-se a obrigatoriedade, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2001, de que as instituições de crédito e as sociedades financeiras que não exercessem em exclusivo a sua actividade nas zonas francas deveriam organizar a contabilidade, de modo a permitir o apuramento dos resultados das operações realizadas no âmbito das zonas francas. Isto é, por imperativo legal, os bancos e demais entidades financeiras deveriam criar as condições que tornassem evidente qual a parcela das suas operações efectivamente desenvolvida nas zonas francas.
A alteração efectuada ao Estatuto dos Benefícios Fiscais, por força desta lei, promoveu a verdade contabilística, defendeu a verdade fiscal e salvaguardou o espaço de intervenção legalmente conferido à actividade financeira desenvolvida em espaço fiscal com tratamento mais favorável.
Previa-se, igualmente, a possibilidade de o Governo, através de portaria, definir os procedimentos adequados ao apuramento dos resultados das operações realizadas no âmbito das zonas francas.
Ora, a Portaria n.º 360/2002, de 5 de Abril, da responsabilidade do governo do Partido Socialista, veio estabelecer os critérios contabilísticos que permitem às entidades financeiras evidenciar os activos, os passivos e os elementos patrimoniais efectivamente afectos à estrutura instalada nas zonas francas e, bem assim, todas as operações aí realizadas, distinguindo os proveitos e os ganhos, os custos e as perdas e as variações patrimoniais positivas e negativas que lhes sejam imputáveis. As normas desta portaria seriam aplicáveis já aos períodos de tributação iniciados após 31 de Dezembro de 2001, isto é, com efeitos no apuramento de resultados para efeitos fiscais em 2002.
Chegou o novo Governo, as prioridades da política fiscal mudaram e são conhecidas: adiamento de qualquer redução de impostos, designadamente do famoso choque fiscal, aumento da taxa normal do IVA de 17% para 19% e eliminação da tributação das mais-valias bolsistas.
Com expectativa, aguardava-se a concretização pelo Governo das ideias do candidato Durão Barroso relativamente à Zona Franca da Madeira, bem como o desenvolvimento, no plano técnico, da posição assumida, em tempo, pelo Secretário de Estado do Tesouro, Dr. Miguel Frasquilho, segundo o qual «não se percebe por que é que a banca paga uma taxa tão baixa».
É neste contexto que é surpreendente a Portaria n.º 555/2002, de 4 de Junho, prioridade assumida pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças logo em 17 de Maio. Esta portaria, em síntese, adia para 2003 a entrada em vigor da portaria anterior, que estabelecia regras de transparência, elaborada pelo governo do PS; reafirma o princípio, mas não integra quaisquer critérios de organização da contabilidade, de modo a permitir o apuramento dos resultados nas zonas francas; e estabelece, de forma indirecta e pouco clara na redacção, uma presunção legal de que 20% da actividade global das entidades financeiras é desenvolvida nas zonas francas, eliminando, assim, o princípio da transparência. Isto é: o apuramento contabilístico rigoroso é substituído pelo palpite legal da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
Todas as indicações apontam que apenas um dos cinco grandes grupos financeiros nacionais teve, uma vez, uma actividade próxima dos 20% nas zonas francas. Assim sendo, isto representa: em primeiro lugar, uma perda injustificada de receitas fiscais; em segundo lugar, uma violação dos princípios consagrados no Estatuto dos Benefícios Fiscais e na Lei n.º 30-F/2000; em terceiro lugar, uma «borla fiscal», injustificada, aos bancos, que têm nas zonas francas uma actividade inferior a 20%, o que acontece, designadamente, com os dois maiores grupos financeiros nacionais - BCP e Caixa Geral de Depósitos -, que afirmaram já ter uma actividade claramente inferior a 5%; e, em quarto lugar, prejudica as zonas francas ao dispensar o exercício efectivo da actividade nesse espaço fiscal privilegiado, não estando, portanto, aqui em causa qualquer ataque à actividade legitimamente aí desenvolvida e salvaguardada na Lei n.º 30-F/2000.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - A comunicação social referiu diversas versões do projecto de portaria (possibilidade de existência de outros limites inferiores de isenção, por exemplo 10%, como vi referido, ou a necessidade de existência de regras de explicitação da actividade efectiva com um limite de isenção). A solução escolhida é a que mais penaliza as receitas públicas, ofende as regras de concorrência e é socialmente injusta no actual contexto económico e orçamental sentido por todos os portugueses.
Finalmente, a portaria é, de facto, como hoje foi referido pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, absolutamente ilegal ao conceder, por esta via, um benefício fiscal que só por lei poderia ser atribuído. O Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Lei n.º 30-F/2000, permitiu ao Governo estabelecer procedimentos contabilísticos que permitissem apurar a verdade fiscal e não a concessão de «borlas fiscais» de milhares de euros, através de portaria.
Recentemente, nas já referidas intervenções políticas que marcaram o reinício do ano político, o Secretário-Geral do Partido Socialista, o Dr. Eduardo Ferro Rodrigues, dirigiu ao Governo um desafio para o estabelecimento de um

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acordo político alargado no combate à evasão e à fraude fiscais.
A justiça fiscal é, hoje, uma prioridade, não só orçamental mas também da credibilidade do nosso sistema político e financeiro. Teria o Governo, porque já disse hoje que não a aproveitaria, a oportunidade de dar um bom exemplo nesta matéria, revogando a Portaria n.º 555/2002 e estabelecendo o princípio da limitação das isenções fiscais das actividades documentadas nas zonas francas dentro dos limites legais, o que ainda pode estabelecer para o Orçamento do Estado para 2003, uma vez que esta portaria vigora apenas para esse ano, restringindo estas vantagens à actividade efectivamente desenvolvida nas zonas francas.
Fazer o contrário do prometido é enganar os eleitores! Errar é humano! Persistir no erro será, neste caso, fiscalmente escandaloso, socialmente injusto e politicamente inaceitável!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Vasco Valdez): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Julgo que esta é, tal como a anterior, uma boa oportunidade para o Governo vir aqui prestar um conjunto de esclarecimentos sobre esta matéria relativa à Zona Franca da Madeira e à Portaria n.º 555/2002, relativamente à qual há um conjunto muito significativo de distorções,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É verdade!

O Orador: - … de inverdades e de situações de confusão por parte do Partido Socialista, que foi quem suscitou a questão.

Protestos do PS.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É melhor ouvirem!

O Orador: - Aliás, devo dizer, com toda a franqueza, que esta é a segunda situação que, do meu ponto de vista, no dia de hoje, vai certamente correr mal ao Partido Socialista, que suscitou o problema do «apagão» e que, agora, suscita o problema da portaria relativa à Zona Franca da Madeira.
Melhor fora, talvez, que o Partido Socialista tivesse obtido alguns esclarecimentos, por exemplo, da parte do Dr. Ricardo Sá Fernandes, que, pública e explicitamente, apoiou a existência desta portaria.

O Sr. José Sócrates (PS): - Não é verdade! É mentira!

Vozes do PSD: - É mentira?!

O Orador: - Relativamente a esta portaria, devo dizer que, do ponto de vista do Governo, nenhuma das asserções que os Srs. Deputados do Partido Socialista apresentaram tem razoabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Vejamos porquê.
Na verdade, o primeiro ponto essencial a referir é o de que a matéria se encontra contemplada no artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais. Como os senhores sabem, ao contrário daquilo que o Sr. Deputado José Sócrates disse inicialmente, o artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não foi alterado; as operações com não residentes continuam a estar explicitamente vedadas e, consequentemente, não há, como não poderia haver, qualquer alteração nesse domínio.
Isto significa objectivamente - este é um ponto nuclear - que, na realidade, não há alteração alguma ao quadro fundamental no que respeita ao funcionamento da Zona Franca da Madeira. As operações só são válidas na medida, e na justa medida, em que sejam efectuadas entre entidades sediadas na Zona Franca da Madeira e entidades não residentes no território português.
Portanto, se me é permitida esta interpretação autêntica, porque, no fundo, foi o Ministério das Finanças que produziu a portaria - e, como jurista, parece-me que podemos avançar no sentido desta interpretação autêntica -, esqueçamos o ruído político que esta matéria tem e assentemos definitivamente naqueles que são os seus aspectos essenciais. E neste tocante eu gostaria de realçar que neste momento não há restrições ou plafond algum em relação ao exercício de actividades e ao lucro tributável apurado na Zona Franca da Madeira.
Por consequência, até 1 de Janeiro de 2003, temos uma situação pela qual qualquer instituição financeira que desenvolva a sua actividade no território nacional pode ter actividade desenvolvida no continente e actividade desenvolvida na Zona Franca da Madeira. Consequentemente, o que é que acontece? Acontece que não há qualquer restrição. Não há qualquer imposição de um tecto ou de um plafond ao lucro tributável apurado na Zona Franca da Madeira, ao contrário do que aqui se preconiza.
Assim, quando o Sr. Deputado José Sócrates apresenta o relatório e contas da Caixa Geral de Depósitos e diz que 1% ou 1,5% - vamos admitir - do seu lucro tributável está afecto à Zona Franca da Madeira, posso garantir-lhe que a interpretação a dar a esta portaria é no sentido de que esta instituição continua a ter 1,5% dos respectivos lucros tributáveis porque as operações com não residentes, que continuam a ser o elemento essencial do quadro legislativo desta portaria, fazem com que não haja mais lucro tributável imputável a essa mesma zona franca.
Deste modo, o que acontece objectivamente é que a Caixa Geral de Depósitos, se, por hipótese, tiver 1,5% do lucro tributável global imputável à Zona Franca da Madeira, de hoje para amanhã não passa a ter automaticamente um forfait de 20% se continuar com o mesmo volume de actividade financeira com não residentes afecta à Zona Franca da Madeira; é esse 1,5% que, evidentemente, será objecto de desconsideração para efeitos de tributação.

Protestos do PS e contraprotestos do PSD.

Peço imensa desculpa, mas é o que está na portaria!

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Vozes do PS: - Não é o que está na portaria!

O Orador: - Aliás, hoje não há limite algum! Quando se diz explicitamente que - como os senhores sabem - não há limite algum a esta actividade que é exercida na Zona Franca da Madeira.
Ora, isto significa, Sr.as e Srs. Deputados, que na realidade, se uma instituição de crédito tiver actividades no seu lucro tributável global que ultrapassem esses mesmos 20% - e há algumas nesta situação, devo dizer… É preciso notar, ao contrário do que os Srs. Deputados afirmam, que, aqui, se está a falar não de actividade mas de lucro tributável; e, por consequência, é preciso distinguir claramente «actividade», como os Srs. Deputados a estão a usar numa linguagem corrente, de «lucro tributável» e pode acontecer que a actividade das instituições de crédito seja menor, em termos percentuais, na Zona Franca da Madeira mas seja, em termos de resultados, significativa.
Portanto, objectivamente, se uma instituição de crédito tiver, por hipótese, 25% ou 30% do seu lucro tributável imputável à Zona Franca da Madeira, significa que só 20% do mesmo é que é desconsiderado e é objecto de isenção.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!

Protestos do Deputado do PS Eduardo Cabrita.

O Orador: - Posso dizer-vos que esta é a interpretação que resulta claramente da conjugação do Estatuto dos Benefícios Fiscais com a Portaria n.º 555/2002. Por consequência, toda esta questão está mal levantada - peço desculpa pela expressão.

Protestos do PS e contraprotestos do PSD.

Na realidade, o objectivo é muito claro! O objectivo foi claríssimo e vai no sentido de limitar os lucros obtidos na Zona Franca da Madeira a uma percentagem que não exceda 20% do total do lucro tributável da actividade bancária. E, por consequência, ao contrário do que os senhores dizem, não há aqui qualquer restrição, não há qualquer alargamento de benefícios fiscais, há, antes, a clarificação de uma situação de estabelecimento de regras claras em relação a este domínio.
Aproveito também para dizer que o Governo - basta ler a Portaria n.º 555/2002 para constatar isso - mantém as razões que determinaram a fixação de tais critérios, não do lado dos proveitos mas do lado dos custos. Portanto, não foi, obviamente, intenção do Governo revogar a portaria do governo anterior, já que essas razões são válidas e se mantêm.
Para finalizar, devo dizer-vos que esta Portaria n.º 555/2002 não é de facto qualquer benesse; é, antes, uma regulação da matéria de imputação dos proveitos, que era algo que o governo socialista não tinha feito…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … e que nós viemos completar através desta portaria. Este foi o objectivo e é o espírito e aquilo que resulta das disposições conjugadas do Estatuto dos Benefícios Fiscais e da Portaria n.º 555/2002.
O Sr. Deputado Eduardo Cabrita disse que, nesta matéria, estávamos a conceder um alargamento dos benefícios fiscais à actividade financeira e também que, neste caso concreto, tínhamos uma lei. É evidente que isso teria de ser feito por lei da Assembleia da República. Com toda a franqueza, não passa pela cabeça de ninguém que possamos alargar os benefícios fiscais através de simples portaria!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - Exactamente!

O Orador: - É verdade, V. Ex.ª concorda! Consequentemente, se é esse o entendimento que V. Ex.ª está a dar a esta matéria, e que a sua bancada, pelos vistos, também corrobora, então, nesse caso, V. Ex.ª certamente subscreverá um requerimento ao Tribunal Constitucional, no sentido de declarar a inconstitucionalidade da respectiva portaria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para formularem pedidos de esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados José Sócrates, Lino de Carvalho, Joaquim Pina Moura e João Cravinho.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Sócrates.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr.ª Presidente, ainda bem que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais usou da palavra, porque, finalmente, passou do riso à palavra. Passou toda a reunião a pretender desqualificar o que se estava a dizer com o riso, e o riso não é sintoma de inteligência, nem é preconceito de superioridade de conhecimento.
Gostaria de tirar a seguinte conclusão, quer das suas palavras quer das da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: o Sr. Secretário de Estado tal como a Sr.ª Ministra foram apanhados, e foram-no já pela segunda vez.

Vozes do PSD: - Essa é boa!

O Orador: - Esta é a segunda vez que são apanhados.
A Sr.ª Ministra já foi apanhada uma primeira vez, foi apanhada na história do Sport Lisboa e Benfica, porque, afinal, sempre havia um despacho. A Sr.ª Ministra sempre tinha feito um despacho, ao contrário do que foi dito a esta Câmara.
Mas, como eu estava a dizer, foram apanhados e agora estão a recuar, e estão a recuar de tal forma que não hesitam em inventar uma nova portaria…

O Sr. António Costa (PS) - Muito bem, mas façam-na!

O Orador: - … e em fazer, como disse o Sr. Secretário de Estado, «a minha interpretação autêntica», porque, «tendo sido o Governo a legislar, nós temos o direito a fazer essa interpretação».
Bom, o que o Sr. Secretário de Estado pretendeu dizer, tal como a Sr.ª Ministra, é que nós estaríamos de má fé…

O Sr. Jorge Neto (PSD): - E estão!

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O Orador: - … e que viemos aqui expor e denunciar, com a consciência de que não é o que cá está escrito, um grande favor aos bancos. Mas vamos tirar isto a limpo. Vamos ver quem está e quem não está de má fé.
Se a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário tinham esta interpretação já a deveriam ter dito na Comissão de Economia e Finanças.

Vozes do PS: - Claro!

O Orador: - Há três meses que se discute o assunto!
Na Comissão, a Sr.ª Ministra poderia ter dito: «Não senhor, não é nada disso que os senhores julgam. Nós temos outra interpretação e o nosso objectivo não é esse, é outro!», porque relativamente a esse objectivo nada temos a objectar. O que temos a objectar é aquilo que está escrito aqui, que é o seguinte: «(…) considera-se que 80% do lucro tributável da actividade global (…)», e isto só tem uma leitura. O que está cá escrito é isto, e esta era a vossa intenção. E de tal forma esta era a vossa intenção que a nossa interpretação coincide com todas as interpretações feitas desta portaria.
Refiro um especialista conhecido por todos, Rogério Fernandes Ferreira - conhece, não conhece, Sr.ª Ministra? -, que diz o seguinte: «Impressiona também a opção arbitrária entretanto adoptada na nova regulamentação sob exame da referida imputação às aludidas zonas francas de 20% no lucro tributável. Nas grandes instituições financeiras em particular, as zonas francas decerto propiciarão muito menos do que um quinto do total do resultado». Portanto, ele teve exactamente a mesma interpretação que nós. E, mais, os bancos também pensam assim,…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não pensam!

O Sr. Eduardo Cabrita (PS): - É uma vergonha!

O Orador: - … porque esta portaria, Sr.ª Ministra -…

Protestos da Ministra de Estado e das Finanças.

… oiça, Sr.ª Ministra, porque ainda vai ouvir muito -, resulta de uma negociação com a Associação Portuguesa de Bancos, e o que eles queriam era isto e foi o que ficou consagrado!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, peço-lhe que conclua, por favor.

O Orador: - Vocês foram apanhados naquilo que se chamou um grande favor aos bancos. A vossa intenção era essa, era a de dar uma grande «borla» e agora estão a recuar, porque são incapazes de sustentar politicamente aquilo que era uma imoralidade e um favor aos bancos, completamente injustificável do ponto de vista económico.
Mas se a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado, em vez de pregarem com gritos o desconhecimento dos outros, quiserem fazer um favor ao País é muito simples, escrevam aquilo que disseram, revoguem esta portaria…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não revogo!

O Orador: - … e publiquem uma portaria constitucional, que faz exactamente aquilo que vocês disseram. E, se não o fizerem, não façam leituras apressadas, nem inventem coisas que não estão cá! Quem andou com má fé nisto foram os senhores, não fomos nós!

Vozes do PS: - Muito bem!

Protestos da Ministra de Estado e das Finanças.

Vozes do PS: - A Sr.ª Ministra não gosta de ouvir!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, se me derem licença, quero fazer uma correcção, que é a seguinte: o Sr. Deputado Joaquim Pina Moura inscreveu-se para uma intervenção e não para um pedido de esclarecimento, pelo que há apenas mais duas inscrições para pedir esclarecimentos.
Sendo assim, o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais pretende responder já ou no fim?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - No fim, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Nesse caso, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, o Governo conhece a nossa posição de fundo sobre a questão das zonas francas e sobre a isenção fiscal que é conferida aos rendimentos apurados pelas actividades aí exercidas. Daqui a pouco, na intervenção que faremos, voltaremos à questão, pois entendemos que não há nenhuma justificação, hoje em dia, para manter essa isenção nos termos em que as zonas francas têm vindo a funcionar.
Mas discutindo a questão no quadro da legislação actual, Sr. Secretário de Estado, a leitura e a interpretação que o Governo aqui faz hoje - devemos dizê-lo com toda a franqueza - não corresponde àquilo que aqui está escrito.
O que está aqui escrito, pura e simplesmente, é, Sr. Secretário de Estado, o seguinte: para efeitos de isenção de IRS ou de IRC às entidades que não exerçam exclusivamente actividade nas zonas francas, considera-se que 80% do lucro tributável da actividade global dessas entidades é resultante de actividades exercidas fora do âmbito institucional daquelas zonas francas.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não sabem o que escreveram!

O Orador: - Isto é, se 80% do lucro tributável é considerado como resultante de actividades realizadas fora do âmbito da zona franca e a ela são imputados 20%, se as actividade realizadas na zona franca estão isentas de IRS e de IRC, daqui se conclui, obviamente, que 20% do lucro tributável está isento de IRS e de IRC.

Protestos do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

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Ó Sr. Secretário de Estado, é o que está escrito aqui, na portaria, em bom português, não há outra volta!

Vozes do PS: - Está escrito!

O Orador: - Portanto, isto sublinha e dá aval àquilo que tem vindo a público em relação ao benefício que isto constitui para a maioria das entidades financeiras que não imputavam à zona franca um valor deste calibre. Até porque, Sr. Secretário de Estado, não está aqui escrito que têm um limite até 20% mas, pura e simplesmente, que 20% são líquidos.
Por isso, não é verdade aquilo que o Sr. Secretário de Estado aqui diz! Isto é, quem tiver mais de 30%, por hipótese, do lucro tributável imputável às zonas francas seguramente vai aos 20%, mas quem tiver 1,5%, como tinha a Caixa Geral de Depósitos, e não sei quantos por cento como o BPI ou BCP, pode, à luz desta leitura, isentar 20% dos seus lucros.
Sr.ª Ministra, faço um desafio ao Governo: se o Governo tem essa interpretação…

O Sr. José Sócrates (PS): - Altere!

O Orador: - Sr.ª Ministra, admitindo, seguramente, e aceitando que a Sr.ª Ministra está de boa fé, então, lanço este desafio ao Governo: altere a portaria e reescreva-a em função dessa interpretação autêntica, para que não haja mais dúvidas sobre a sua leitura.

Vozes do PSD: - Não é preciso alterar nada!

O Sr. Narana Coissoró (CDS-PP): - Vocês é que têm de saber ler!

O Orador: - A segunda questão é a seguinte, Sr. Secretário de Estado: em todo o caso,…

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr.ª Presidente, tem de me descontar o tempo…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, importam-se que o orador se faça ouvir?!

Pausa.

Faça favor de prosseguir, Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Orador: - Obrigado, Sr.ª Presidente.
Uma outra questão, Sr. Secretário de Estado, é esta: o n.º 17 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais aponta uma regra, um caminho claro, que é o de as entidades que exercem esta actividade…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado Lino de Carvalho, já esgotou o tempo de que dispunha, pelo que tem de concluir.

O Orador: - Peço-lhe só mais um pouco de compreensão, Sr.ª Presidente.
Como eu estava a dizer, o Estatuto dos Benefícios Fiscais aponta um caminho claro: as entidades que exercem esta actividade devem organizar a contabilidade de modo a permitir o apuramento dos resultados. Embora tarde e a más horas, já em finais de Março, o Partido Socialista fez uma portaria, publicada em Diário da República em Abril, que abriu o caminho para a organização da contabilidade. Pergunto: por que é que não se foi por esse caminho e, através da organização da contabilidade, se apuraram os resultados e se tributou em função disso? Por que é que não se foi por esse caminho e se foi para uma portaria geral e abstracta?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, para interpelar a Mesa sobre esta matéria.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, há pouco, o Sr. Deputado José Sócrates, interpelando os membros do Governo aqui presentes, disse: «Por que é que não disseram isso na Comissão, quando cá vieram sobre essa matéria?». Ora, para termos aqui a informação do rigor e da idoneidade da intervenção do Sr. Deputado José Sócrates, gostaria que os serviços confirmassem se o Sr. Deputado esteve presente nessa reunião da Comissão de Economia e Finanças. É que o Sr. Deputado fez esta afirmação de uma forma muito segura e, portanto, para sabermos do rigor com que o Sr. Deputado José Sócrates está aqui a intervir nesta matéria, era bom sabermos se ele esteve presente nessa reunião da Comissão e se, realmente, pode pôr aqui em causa o que foi transmitido, nessa altura, pelos Srs. Membros do Governo.
A segunda razão da minha interpelação tem também a ver com a intervenção do Sr. Deputado José Sócrates. Quando há pouco se referiu que o Sr. Dr. Ricardo Sá Fernandes tinha publicamente assumido a defesa da portaria e até acusado o Partido Socialista de não ter usado os meios que devia para regular esta matéria, tendo dito que esta era, realmente, uma boa solução, o Sr. Deputado José Sócrates disse que não era verdade que essa afirmação tivesse sido feita. Assim sendo, vou facultar à Mesa uma cópia das declarações do Sr. Dr. Ricardo Sá Fernandes para que seja distribuída à Câmara.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado Guilherme Silva, neste momento, obviamente, a Mesa não está em condições de responder sobre a presença do Sr. Deputado José Sócrates na referida reunião da Comissão de Economia e Finanças.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

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A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Pede a palavra para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Sócrates (PS): - Para me pronunciar sobre esta matéria, Sr.ª Presidente.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, creio que o debate deve decorrer com alguma naturalidade.
A afirmação que o Deputado José Sócrates fez pode ser questionada mas, seguramente, o que é relevante para a questionar não é saber se ele esteve ou não na reunião da Comissão de Economia e Finanças, porque ele pode fazer uma afirmação sobre o conteúdo de um debate numa comissão sem lá ter estado, desde que devidamente informado. O que é relevante, como é evidente, é a transcrição das intervenções da Sr.ª Ministra nessa reunião. É isso que esclarece aquilo que importa esclarecer.
Nesse sentido, sabendo que o Sr. Deputado José Sócrates não esteve nessa reunião da Comissão de Economia e Finanças, em que eu estive e muitos outros estiveram, peço à Mesa que distribua então as declarações da Sr.ª Ministra, porque essas são relevantes para o conteúdo do debate que aqui estamos a travar.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, suponho que o relato do que aconteceu exactamente nessa reunião existe e está à disposição de todos os grupos parlamentares, pelo que é, seguramente, um documento conhecido de todos os grupos parlamentares.

O Sr. José Sócrates (PS): - Sr.ª Presidente, permite-me o uso da palavra?

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado José Sócrates, ainda quer intervir sobre este ponto?

O Sr. José Sócrates (PS): - Sim, Sr.ª Presidente.
Quero apenas informar a Mesa e todos os Srs. Deputados de que fiz esta afirmação baseado nos relatos dos trabalhos da Comissão de Economia e Finanças que me foram feitos não só pelos meus colegas Deputados do Partido Socialista mas também por Deputados de outras bancadas e que me afiançaram que a Sr.ª Ministra nunca teve esta interpretação e que, na Comissão, defendeu esta portaria tal e qual como nós a interpretámos.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Não é verdade!

O Orador: - É apenas nisto que me baseio para dizer que a Sr.ª Ministra recuou desde esse momento até agora.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Há a transcrição dessa reunião!

O Orador: - Este facto é muito importante e lamento muito que os Srs. Deputados não me acompanhem nesta avaliação objectiva do que se passou nessa reunião, porque todos os Srs. Deputados que lá estiveram são unânimes em me acompanhar e em sustentar aquilo que eu disse.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, vamos encerrar este ponto. É evidente que existe, seguramente, um relato escrito, como existe a memória de cada um - cada um dos Srs. Deputados terá a sua memória sobre isto -, e todos os grupos parlamentares têm acesso àquilo que está escrito e que é, decerto, um relato fidedigno sobre aquilo que aconteceu.
Vamos avançar na discussão, Srs. Deputados.
Para formular um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Cravinho.

O Sr. João Cravinho (PS): - Sr.ª Presidente, em primeiro lugar, como Presidente da Comissão de Economia e Finanças, quero dizer que importa que o relato, a transcrição do que foi dito nessa reunião seja presente num Plenário desta Assembleia, porque não é impunemente que cada um diz o que quer sobre o que se passou ou não passou. Fazem-se, precisamente, gravações e há transcrições, essas, sim, autênticas, porque retiradas da voz própria de quem as proferiu.
Sobre esta questão, se bem percebi, o que o Sr. Secretário de Estado diz é que o n.º 1 da portaria deve ser lido do seguinte modo: para efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, considera-se que a matéria colectável imputável às operações realizadas no âmbito da zona franca não pode ser superior a 20% do valor global. É este o seu entendimento!

Neste momento, o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais acena com a cabeça em sentido afirmativo.

Ó Sr. Secretário de Estado, é este o seu entendimento. Então, tendo o Sr. Secretário de Estado revogado agora, numa interpretação autêntica, aquilo que a Sr.ª Ministra publicou no Diário da República, faça o favor de pedir à Sr.ª Ministra que escreva exactamente isso. E se algum dos Srs. Deputados, ou a Sr.ª Ministra, ou o Sr. Secretário de Estado, nos vier aqui dizer que o que está publicado no Diário da República, que é radicalmente distinto disto, deve ser lido desta forma - e até a banca, certamente, que é a quem se dirige esta matéria, não protestará ou coonestará -, então, o caso é extremamente grave, porque é um caso de colisão de interesses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Ninguém aplaudiu. É sintomático!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Cravinho, como disse, a interpretação autêntica está nas palavras que estão registadas em acta e, neste caso, julgo que não se torna, evidentemente, necessário estar a alterar qualquer texto da

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portaria, pela razão simples de que os esclarecimentos sobre as intenções e a interpretação que é dada à portaria têm sido sempre, devo dizer, os que constaram desde o início.

Vozes do PS: - Não é verdade!

O Orador: - A interpretação que esteve sempre subjacente foi aquela que transmiti às Sr.as e aos Srs. Deputados e, portanto, ela é pública, os esclarecimentos estão dados, para isso nos deslocámos hoje, aqui, à Assembleia da República. E, de facto, a interpretação da portaria não pode ser outra senão esta, sob pena de ser, evidentemente,…

Vozes do PS: - Pode e deve!

O Orador: - Ah! Os senhores entendem que deve ser outra?! Os senhores querem estabelecer uma confusão, justamente em favor…

Protestos do PS.

Peço imensa desculpa mas quero dizer o seguinte: toda esta polémica é extremamente negativa, porquanto, de facto, a interpretação inequívoca é no sentido de, na realidade, esta portaria constituir uma restrição, porque, como disse o Dr. Ricardo Sá Fernandes, é preferível ter um limite quantitativo do que não ter rigorosamente nada. Devo dizer, com toda a franqueza, que a interpretação é esta, a interpretação do Governo que tem estado subjacente a esta matéria sempre foi esta e, por consequência, do nosso ponto de vista, não tem razão de ser qualquer alteração adicional à portaria.

O Sr. José Sócrates (PS): - Ah!…

O Orador: - Neste campo, estão prestados os esclarecimentos necessários e, no domínio da administração tributária, actuaremos em conformidade.
Por outro lado, devo dizer que, em relação às isenções, já falámos o suficiente. O Sr. Deputado Lino de Carvalho falou das isenções da zona franca e relembro-lhe que, evidentemente, não é possível restringir direitos adquiridos. Ao abrigo da Lei Geral Tributária, isenções fiscais concedidas, temporalizadas não podem ser postas em causa e, portanto, goste-se muito, pouco ou nada da Zona Franca da Madeira, a verdade é que, legal e constitucionalmente, não podemos restringir direitos que estão consagrados na lei.
Por outro lado, em relação à portaria da organização da contabilidade, ela não é posta em causa, o que significa que esta é, digamos,…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - São dois mecanismos!

O Orador: - … uma restrição adicional na imputação dos proveitos, não é mais do que isso.
Penso que, com isto, terei prestado os esclarecimentos no que toca às questões que os Srs. Deputados me colocaram.

O Sr. José Sócrates (PS): - Todos percebemos.

O Orador: - Quanto à pergunta do Sr. Deputado João Cravinho, dei já o meu assentimento com a cabeça e reafirmo oralmente que aquilo que o Sr. Deputado afirmou é de facto a minha interpretação, a nossa interpretação, desta portaria.

O Sr. João Cravinho (PS): - Quer fazer deste país um país de analfabetos!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Talvez a Sr.ª Presidente, que é uma ilustre jurista, possa esclarecer-nos sobre se a interpretação, autêntica, verbal de um qualquer membro do Governo pode substituir o que está na letra da lei. Como suponho que não pode, a única solução que o Governo tem é a de alterar a letra da portaria.

Protestos do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, antes da minha intervenção, permita-me que faça uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, creio que estamos a chegar a um ponto que eu diria do absurdo,…

Vozes do PS: - É normal!

O Orador: - … porque o Direito não é aquilo que cada um quer que seja.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - É o Dr. Sá Fernandes que quer uma coisa diferente.

O Orador: - As interpretação são as possíveis de acordo com a letra da lei.
Eu nem sequer vou aqui discutir e vou dar de barato que o Sr. Secretário de Estado e a Sr.ª Ministra, ao redigirem a portaria, pretendiam efectivamente, e só, aquilo que é agora a interpretação, dita autêntica, do Sr. Secretário de Estado. Mas há uma coisa que o Sr. Secretário de Estado tem de reconhecer: acontece-nos muitas vezes não expressarmos fielmente por escrito aquele que é o nosso pensamento, e isto leva, pelo menos, a equívocos.

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Ora, o Sr. Secretário de Estado terá de reconhecer que, pelo menos, vários Deputados…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, peço desculpa mas não está a fazer uma interpelação à Mesa…

O Orador: - Estou sim, Sr.ª Presidente,…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Não está…

O Orador: - … tem as ver o andamento dos trabalhos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Circunstância em que seria possível que interviesse neste momento, mas, a não ser assim, tenho de fazer prosseguir o debate de acordo com as inscrições feitas.

O Orador: - Sr.ª Presidente, se me deixar terminar verá que a minha interpelação tem a ver com o andamento dos trabalhos.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mas não está a fazer uma interpelação à Mesa!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado António Costa, uma interpelação é uma figura precisa, como o Sr. Deputado sabe.

O Orador: - É uma figura precisa, e é a essa figura precisa que vou reconduzir-me no final da minha intervenção.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ah!… Afinal, é uma intervenção!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Espero que seja bastante depressa, Sr. Deputado.
Faça o favor de prosseguir.

O Orador: - Portanto, se, de boa fé, o Sr. Secretário de Estado e o Governo - e eu só posso acreditar na boa fé do Governo, que também tem de acreditar na boa fé de quem fez uma interpretação diversa - constatam que, do texto de uma portaria, no mínimo, é possível extrair interpretações divergentes, devemos ter mesmo, e só, se é apenas isso o que está em causa, a humildade de esclarecer, da forma legalmente prevista, o conteúdo efectivo da portaria, para que não subsistam dúvidas. Se assim for, não faz sentido o debate continuar. Todos poderíamos não perder mais tempo com o que pode ser um mero equívoco!
Portanto, Sr.ª Presidente, o que lhe peço é que pergunte ao Governo se está ou não disponível para deixar escrito, preto no branco, sob a forma de portaria, o seu verdadeiro pensamento sobre esta matéria, de forma a que não subsistam quaisquer dúvidas sobre qual foi a sua intenção.
Se assim for, por nós o debate está encerrado; se assim não for, então, o problema é muito mais grave.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para uma interpelação à Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, como vimos, pela via da interpelação há um recuo nítido do Partido Socialista nesta matéria. Já não temos o discurso do Deputado José Sócrates, de que teríamos de revogar a portaria, agora já estamos na sua alteração.
Sr.ª Presidente, em forma de interpelação à Mesa, quero apenas dizer que estamos aqui a discutir uma questão perfeitamente teórica…

O Sr. José Sócrates (PS): - Teórica?!

O Orador: - … e abstracta, por uma razão muito simples: esta portaria só entra em vigor em Janeiro de 2003.
Nessa altura, se a questão se colocasse, eu perceberia que o Partido Socialista viesse aqui dizer: os serviços estão a interpretar e a aplicar esta portaria desta forma… Em benefício dos bancos, estão a fazer esta interpretação! Tudo isto seria natural!
Mas, Sr.ª Presidente, a questão é esta: depois deste debate, haverá algum serviço fiscal em Portugal a fazer a interpretação socialista e laxista desta portaria?! Não me parece que haja!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, o que acabou de ser dito pelo Sr. Secretário de Estado como uma explicação da portaria tal como nós a vimos não diverge da explicação que eu dei à Comissão de Economia e Finanças quando lá estive.
Todavia, há dois ou três pontos que gostaria de focar.
Primeiro, não altero a portaria.

O Sr. José Sócrates (PS): - Bem me parecia!

A Oradora: - Segundo, se os Srs. Deputados consideram que a portaria tem a interpretação que lhe estão a dar, solicitem a sua inconstitucionalidade junto do Tribunal Constitucional. Têm Deputados em número suficiente para o fazer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Claro!

A Oradora: - Terceiro, a interpretação que damos à portaria é a que sempre demos, e se os bancos, que são objecto da tributação que vão ter de pagar, a quem vamos aplicar a portaria tal como a estamos a explicar, não concordarem com a sua aplicação terão de recorrer aos tribunais, provavelmente,…

O Sr. António Costa (PS): - Ah!…

A Oradora: - … porque a interpretação é nossa. Mas veremos quantos o farão, Sr. Deputado.

Vozes do PSD: - Vamos ver!

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A Oradora: - Vamos ver, Sr. Deputado!
Sr. Deputado José Sócrates, já todos nós percebemos que os senhores arranjaram uma forma de encapotar o vosso recuo. Muitos dos Srs. Deputados da sua bancada já perceberam…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Que «meteram o pé na argola»!

A Oradora: - … que a interpretação que o senhor, demagogicamente, tem andado a fazer não está correcta, e agora arranjaram a forma para encapotar o vosso recuo, considerando que existe uma interpretação errada. Se a interpretação é aquela que nós damos, então ela está certa!
Obrigada, Sr. Deputado, mas não preciso disso. Recorra ao Tribunal Constitucional, pois eu não altero a portaria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegados aqui, é óbvio que, neste momento, não há nada que a Mesa tenha de esclarecer quanto ao que foi dito pelos Srs. Deputados.
Portanto, podemos considerar que este ponto está arrumado. Vamos continuar?

O Sr. António Costa (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, é óbvio que temos de continuar. Depois da resposta inqualificável dada pela Sr.ª Ministra das Finanças só temos de continuar.
Não há recuo algum da parte do Partido Socialista. Julguei que os senhores estivessem de boa fé; percebo agora que estão de má fé e que há uma negociata com os bancos.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado António Costa, quando eu disse que esta questão estava arrumada referia-me à interpelação, porque, como é óbvio, há já oradores inscritos para discutir a questão de fundo, que prossegue.
Portanto, se os Srs. Deputados permitem, vamos voltar às inscrições.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, a magistrada Maria José Morgado, recentemente «sacrificada no altar do Estado», declarou recentemente, quando ainda exercia as funções de Vice-Directora da Polícia Judiciária, que os offshore são paraísos do crime organizado, cuja função é estruturar a evasão fiscal.
Percebo, por isso, que, quando se discutem matérias tão importantes para a democracia portuguesa como o controlo, a regulação e a transparência das práticas contabilísticas das entidades que operam nos offshore, haja um extremo nervosismo. E por isso mesmo o Sr. Deputado Guilherme Silva, apesar de a União Europeia continuar um processo contra o offshore da Madeira por benefícios injustificados, acha que o que desprestigia é um debate, quando, pelo contrário, é o debate que pode esclarecer.
Portanto, vamos directamente ao que tem sido discutido até agora.
O que é que diz a portaria que está em causa? Acho que, porventura, vai ser difícil perceber, no fim deste debate, quando se ler a transcrição, nas múltiplas referências da Sr.ª Ministra e do Sr. Secretário de Estado aos tais 20%, a que é que se referem esses 20%. E eu vou tentar perceber ao que é.
O texto diz rigorosamente o seguinte: «Para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais,…» - que identifica a isenção em IRC na Zona Franca da Madeira -, «… considera-se que 80% do lucro tributável da actividade global das entidades a que se refere a alínea c) (…), é resultantes de actividades exercidas fora (…) daquelas zonas francas».
Portanto, 80% estão fora, 20% estão dentro. O que é que são os 80% e os 20%?
Temos, de facto, várias interpretações. Vejamos: 80% do lucro tributável de quê? Da actividade global das entidades financeiras. Quem são essas entidades? São aquelas que operam na Zona Franca da Madeira e também fora dela.
A partir daqui, temos duas interpretações possíveis. Primeira: a da letra da lei, que diz que, para as entidades que operam dentro e fora da zona franca, 80% do lucro tributável é considerado decorrente de actividades exercidas no exterior da zona franca e 20% de actividades exercidas na zona franca, sendo, portanto, isentos. E, portanto, à pergunta «20% de quê?», temos a resposta: 20% é um limite, é um total do conjunto das operações isentas a 100% registadas na Madeira e que podem chegar até aos 20% do total da actividade bancária do grupo que está em causa.
Se não for esta a interpretação - e esta é a interpretação da lei -, todas as outras são absurdas. E quais são as outras? É que o global não se refere ao global nacional; é um global que não é global, é parcial. E, então, ficaria: 80% do lucro tributável da actividade na Zona Franca da Madeira - na Madeira -, e a tributação na zona franca passava de 0% para 80%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Esta observação não é a viável.
Por outro lado, não se pode aplicar lucro tributável às operações na zona franca, porque o lucro não é tributável nas operações da zona franca. O lucro dessas operações com não residentes não é tributável. Seria, então, 80% de zero, que é zero.
Só resta, verdadeiramente, uma única interpretação: no conjunto das actividades de um grupo financeiro não pode, nunca, pesar mais de 20% o total das operações feitas com não residentes, que, portanto, ficam isentas de IRC e de IRS.
Ora, na prática, isto tem duas consequências: primeira, sendo que o total dessas operações é, hoje, menos do que 20%, o limite é muito aumentado…

Vozes do PSD: - Não! Não!

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O Orador: - … e convidam-se os bancos a aumentarem o seu número de operações com não residentes para se deixar de ter 1% ou 4% e passar a ter-se 20%.
Mas a segunda consequência é muito pior ainda: cria-se um limite que é forfetário. Não existe qualquer controlo desses 20%,…

O Sr. António Costa (PS): - Exactamente!

O Orador: - … desde que o banco declare que são operações com não residentes. O Estado abdica da sua função fundamental.
Porém, já que se cita Ricardo Sá Fernandes - agora, como pessoa respeitável -, Sr.ª Ministra, devo dizer que esta foi a sua opinião. É certo que não havia qualquer limite para as operações realizadas na Madeira, mas o que agora se está a dizer é que os bancos, cujo peso das operações realizadas na Madeira era muito inferior a 20%, podem chegar facilmente aos 20%.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Já era assim!

O Orador: - Sr.ª Ministra, vamos ver se nos entendemos. O que está escrito na portaria é: «(…) 80% do lucro tributável da actividade global (…)». Se não for assim, é ao Governo que compete fazer o esclarecimento, que tem de ser categórico. É preciso que entendamos bem que, neste momento, os bancos estão a proceder como se tivessem recebido um cheque em branco…

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não é verdade!

O Sr. António Costa (PS): - Estão sim!

O Orador: - … para passarem a fazer estas operações no limite que quiserem. E isto, Sr.ª Ministra, vai ver-se nas contas e nas conclusões desses bancos.
Se a Sr.ª Ministra está verdadeiramente disposta a assumir aqui o único combate que a democracia nos exige que tomemos, que é passar dos menos 15% de IRC que a banca paga a partir de todos os mecanismos possíveis de evasão legal - que é um número verdadeiro, pois são as contas certas - para aquilo que pagam as outras empresas, então isso significa não facilitar. Mas neste caso o que o Governo faz é facilitar.
Pode tentar confundir-se este debate com 20% de zero, 20% de 80% ou 20% do que quer que seja, que o que está escrito e o que vai ser aplicado é um convite a todo o sistema financeiro para aumentar a sua capacidade de actuação.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Não é verdade!

O Orador: - Neste sentido, isto é muito grave, porque se aceita a opacidade, o desinteresse e a inexistência de Estado em relação a 20% das operações do sistema financeiro. Isto é inadmissível pela mesma razão que impõe que haja regulação neste sistema tributário.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - É exactamente o contrário!

O Orador: - A Sr.ª Ministra terá oportunidade de fazer a sua intervenção e de dar esclarecimentos posteriores, porque tem tempo para isso.
O certo é que nos deixa nesta ambivalência, nesta ambiguidade, neste paradoxo que os interesses económicos não podem deixar de utilizar a seu favor, como já o estão a fazer e como sempre o têm feito. A função regulatória, a função do Ministério das Finanças neste Governo é a de aplicar uma tributação justa, equitativa e igual. Não pode continuar, como a banca tem feito e como o faz com esta portaria, a haver uma situação de benefício, uma situação de privilégio e uma situação de ocultação fiscal legalizada desta forma.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Deputados: Já afirmamos a nossa posição de fundo sobre esta matéria.
As zonas francas foram criadas em certo momento com a intenção de mobilizar o investimento para zonas não desenvolvidas e carenciadas dele. Todos sabemos que, neste momento, as zonas francas em geral deixaram de prosseguir esse objectivo no fundamental para passarem a ser plataformas giratórias de fraude e evasão do fisco e até de alta criminalidade.
Aliás, como a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado estão recordados, esta questão foi aflorada logo a seguir aos acontecimentos de 11 de Setembro e o Presidente norte-americano até pôs a hipótese de, no plano internacional, avançar com uma iniciativa para limitar a actividade nas zonas francas. Claro que rapidamente isto se esqueceu, pois não interessava aos interesses especulativos financeiros que utilizam as zonas francas e à alta criminalidade. Mas a questão é que, hoje, isto é reconhecido por toda a gente.
A Zona Franca da Madeira, especificamente, não contribui com um tostão para o desenvolvimento da Região Autónoma da Madeira - é preciso que se diga isto claramente para não se vir com demagogias - mas, sim, para engordar os lucros, os rendimentos não tributáveis de quem lá exerce actividade.
Portanto, não tem qualquer sentido, sobretudo num quadro de dificuldades financeiras do Estado, manter o offshore da Madeira nos termos em que está. Mas, mantendo-o, face ao quadro legal há soluções para resolver este problema. Já as referimos há pouco quando falámos largamente sobre a interpretação da portaria.
A Sr.ª Ministra veio agora dizer: «Bom, se é essa a vossa interpretação, então isso é uma inconstitucionalidade e os senhores devem requerer dela». Não sou jurista, Sr.ª Ministra, mas não há qualquer inconstitucionalidade na portaria. Não há, não! Mesmo na nossa interpretação! E sabe porquê, Sr.ª Ministra? Haveria inconstitucionalidade se a Sr.ª Ministra tivesse alterado o n.º 1 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, no sentido de dizer que as entidades enquadradas neste procedimento deixariam de estar isentas a 100%. No entanto, não altera este ponto. O que a Sr.ª Ministra faz é dar corpo ao n.º 17 do artigo 33.º; ou seja, uma vez que as actividades exercidas na

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zona franca estão isentas, o Governo imputa a essas entidades uma percentagem da sua actividade a partir da qual é tributável. Não altera os 100%.

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Não é isso!

O Orador: - É evidente que é!
Portanto, Sr.ª Ministra, o problema não é esse. O problema é aquele que há pouco levantámos e ao qual o Sr. Secretário de Estado não respondeu. A lei estabelece um procedimento claro que, apesar de podermos estar em desacordo com a questão de fundo, determina que as entidades nessas condições devem organizar a sua contabilidade de modo a que através dela transpareça claramente os proveitos e os custos que são assumidos em resultado das actividades na zona franca para isentar essa parte e tributar a restante. Era isto que deveria ser feito, Sr.ª Ministra!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Isso mantém-se!

O Orador: - Então, se isto se mantém, por que razão fazem uma portaria a fixar um valor abstracto e geral?! Não tem sentido!
Aliás, Sr.ª Ministra e Sr. Secretário de Estado, não tem sentido existirem estas duas portarias, porque uma manda organizar a contabilidade e a outra fixa um valor abstracto de 20% de isenção para o lucro tributável das actividades financeiras. Então, para que é a contabilidade que se vai organizar?!
Portanto, não há outra volta a dar, e esta portaria, no mínimo, tem de ser alterada.
Srs. Deputados, queremos fazer aqui uma proposta ao Governo, que, se não a aceitar, nós próprios iremos suscitar esta questão. Já que o Governo trouxe aqui uma interpretação que não é, de todo em todo, a que resulta da leitura da portaria, desafiamos o Governo a fazer uma consulta - e gostaríamos que o Governo nos desse a sua resposta, porque, se o Governo a não fizer, faremos nós - à Procuradoria-Geral da República ou ao seu conselho consultivo para fazerem a interpretação da portaria, pondo em confronto a letra da portaria e a interpretação aqui trazida pelo Governo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se a interpretação da Procuradoria-Geral da República for no sentido daquela que o Governo faz, temos o assunto encerrado e arrumado. Se não for, não restará ao Governo mais do que alterar a própria portaria. É este o desafio que aqui deixamos, e esperamos uma resposta até ao fim do debate. Se o Governo não der essa resposta, suscitaremos esta iniciativa junto da Procuradoria-Geral da República.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Faça o que entender!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Compreendemos as posições aqui assumidas pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista Português. Desde há vários anos, sobretudo o Bloco de Esquerda, têm usado esta bandeira do offshore da Madeira como luta política. Compreendemos isso. Já debatemos isso aqui muitas vezes.
Foi o Partido Comunista Português que, em Maio deste ano, requereu a presença da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças na Comissão de Economia e Finanças para prestar esclarecimentos sobre esta portaria. Daí que também compreendamos, face a esta iniciativa, a posição do Sr. Deputado Lino de Carvalho, que aproveito para saudar pela coerência da sua intervenção com as posições que sempre tomou, nomeadamente nessa reunião da Comissão.
Tenho muita pena de não ter uma cópia da acta dessa reunião, porque, a meu ver, seria bom para o debate e para o esclarecimento de todos - tentei obtê-la, mas, face ao atraso dos serviços, ainda não está descodificada -, pois poderia demonstrar quais foram as posições da Sr.ª Ministra e de todos os grupos parlamentares nesta matéria.
É bom que se saiba que, nessa altura, o Partido Socialista não teve a atitude que hoje teve neste debate. É preciso que se diga isto. Porque, quando se vem aqui dizer que a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças fez uma interpretação diferente e que o Sr. Secretário de Estado dá agora uma outra interpretação, está a dizer-se algo que não é verdade e que, apesar de não se poder comprovar neste momento, pode comprovar-se em qualquer altura.
Deixem-me que vos diga algo mais. O Partido Socialista começou, mas, nessa altura, passou um pouco à margem nesta matéria. Repito, foi o Partido Comunista Português que solicitou a presença da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças na Comissão de Economia e Finanças para prestar esclarecimentos sobre esta matéria. No entanto, passados mais de dois meses sobre a publicação da portaria, ouvi, como cidadão e como Deputado, o Sr. Deputado José Sócrates referir-se, como facto negativo da semana, a uma espécie de fim do mundo, que era o facto de este Governo ter cedido a lobbies - como se isto fosse algo que acontecesse com este Governo, quando, pelo contrário, como se recordam, aconteceu com o governo anterior.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E de que maneira!

O Orador: - Este Governo não cedeu a nenhum lobby.
Todos ficámos espantados e perguntámos: «Como é possível? Agora é que este problema é trazido para a praça pública?!». Há aqui um aumento do benefício fiscal? Há aqui uma protecção à banca? Não há! Aliás, isso já foi esclarecido aqui, hoje.
O próprio Partido Socialista iniciou este debate, ainda no período de antes da ordem do dia, através do Sr. Deputado José Sócrates, que começou por dizer que, não sendo jurista, apenas lia as normas. Ora, deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, que as leu mal.
De igual modo, gostaria de me dirigir ao Sr. Deputado Eduardo Cabrita, um jurista que entendo que temos de

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respeitar, o qual já muitas vezes vimos interpretar convenientemente as normas, mas que, hoje, também esqueceu um pormenor fundamental… E faço aqui um parêntesis para dizer que, entretanto, o debate enveredou pela interpretação. Ou seja, agora, andamos todos a interpretar a Portaria n.º 555/2002…!
Continuando e relativamente à interpretação que já foi dada pelo Sr. Deputado Francisco Louçã, aproveito para dizer que a sua interpretação não é, efectivamente, a da portaria, embora o Sr. Deputado tenha tentado explicar a sua interpretação com grandiloquência, como sempre o faz.
Mas, Sr. Deputado Francisco Louçã, a interpretação desta portaria tem de ser feita no contexto do Estatuto dos Benefícios Fiscais. No entanto, ainda não ouvi essa interpretação ser feita nesse contexto. Ora, tenho a certeza de que os juristas do Partido Socialista sabem perfeitamente que, se atenderem ao contexto do Estatuto dos Benefícios Fiscais, nomeadamente do artigo 33.º, n.º 1,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não lhes convém!

O Orador: - … a interpretação é aquela que foi dada pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e confirmada pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.
É que, Sr. Deputado Francisco Louçã, fala-se em 1,5% e em 5% e diz-se que, agora, a percentagem poderia ser muito maior. Sabem que havia instituições financeiras que chegavam a ter isenções que atingiam 40%, 50% e 60%? Isto é que era escandaloso!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - O que terá de se perguntar é isto: porque razão o Partido Socialista… Aliás, aproveito para saudar os Deputados do Partido Socialista Pina Moura e Guilherme d'Oliveira Martins, os quais, enquanto ministros, sempre revelaram alguma compreensão no que toca a estas matérias relacionadas com a zona franca da Madeira, o chamado Centro Internacional de Negócios da Madeira. Ainda bem que não os ouvi dizer hoje, aqui, que a interpretação é contrária à que tem sido referida.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - É que, na realidade, o que esta retardada arma de arremesso político está a fazer é a denegrir o Centro Internacional de Negócios da Madeira e eu próprio, enquanto Deputado eleito por aquela Região Autónoma, terei de recusar-me a aceitar que se denigra uma zona franca de enorme credibilidade, apesar do processo que corre termos na União Europeia, relacionada com outras zonas francas, quer na Europa quer fora da Europa, para mais com a liberdade de que usufrui qualquer instituição financeira para recorrer a essas zonas francas que lhes dão muito melhores garantias. Aliás, como já é público, face ao actual regime fiscal português, há países, mesmo na Europa, onde o regime de IRC é mais favorável do que o que é aplicado na zona franca da Madeira em relação às operações financeiras que impliquem não residentes.
Portanto, deixem-me que vos diga qual é a nossa posição sobre esta matéria.
Em primeiro lugar, que fique claro que o Governo, a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sempre tiveram esta interpretação, embora nem sequer devesse empregar a palavra «interpretação».
Sinceramente, quando oiço alguns Deputados afirmarem que «a leitura que daqui se extrai é esta», deixem-me que vos diga que, se fosse assim tão claro, haveria quem não tivesse essa leitura. Acontece - e repito - que esta portaria tem de ser interpretada de acordo com o que dispõe o Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Aliás, vejamos.
Houve uma legislação que foi aprovada na vigência do governo socialista, a qual, naturalmente, apoiámos, porque se tratava de medidas que tendiam a moralizar todo este sistema.
Depois, o próprio governo do PS publicou uma portaria relativa a custos, o que também considerámos correcto no âmbito da tributação deste tipo de operação.
No entanto, não tenhamos dúvidas de que faltava a regulamentação, por portaria, da questão dos proveitos. É que essa matéria não estava regulamentada.
A questão que poderá colocar-se é a de saber por que razão o Partido Socialista nunca o fez. Isto é, de entre as normas aplicadas, nada havia relativamente a proveitos.
Portanto, ao contrário do que se pretende fazer passar, esta portaria é moralizadora desta matéria, acaba com a isenção a 100% e, dentro do princípio de que as instituições financeiras têm de ter a respectiva contabilidade organizada, tem de haver uma distinção clara entre as operações com residentes e as operações com não residentes, tem de ficar claro quais são as imputações de custos para determinação da matéria colectável, mas faltavam as medidas relativas aos proveitos - e ei-las agora aqui!
Portanto, pela parte do PSD, não temos qualquer problema em aceitar que não só esta é a interpretação correcta como, ainda, que, apesar de alguns faits divers deste debate, fica claro que consta desta portaria, que é regulamentadora, que a mesma tem de ser lida em conjunção com o artigo 33.º, n.º 1, do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o qual estabelece uma isenção a 100%.
Portanto, o PSD cumpriu aquilo com que se comprometeu durante a campanha eleitoral, nomeadamente nesta matéria.
Devo dizer-vos - e, aqui, deixem que vos fale como Deputado eleito pela Região Autónoma da Madeira - que o fundamental é que estas matérias não sejam negativas para a zona franca da Madeira.
Ao contrário do que é dito no sentido de que isto nada interessa à Madeira, recordo-me de um estudo, feito há uns anos atrás pelo Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, em que se dizia que, para a economia da Madeira e, no fundo, para a economia do País, o Centro Internacional de Negócios da Madeira poderia e deveria ser fundamental. Isto pela simples razão de que a economia da Região Autónoma da Madeira vive fundamentalmente do sector dos serviços de turismo, pelo que quer a zona franca industrial quer a zona franca financeira são fundamentais para a economia.
A terminar, quero dizer o seguinte: que o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista continuem com este tipo de «bandeira» em relação à zona franca da Madeira compreendemos que é por uma questão de coerência. Já não compreendemos que o Partido Socialista, através de alguns porta-vozes - e aproveito para felicitar alguns que não

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quiseram ser -, tenha tentado transmitir uma interpretação completamente enviesada em relação ao que consta da portaria.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - O Sr. Deputado Francisco Louçã pediu a palavra para formular um pedido de esclarecimento, mas já não tem tempo disponível…

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, talvez o PSD me ceda 1 minuto do seu próprio tempo…

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o PSD confirma que lhe cede 1 minuto, pelo que vou dar-lhe a palavra para o efeito.
Faça favor.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Hugo Velosa, ouvi a sua intervenção e registei que apelou a que lêssemos a portaria em conjunção com o artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, o qual garante a isenção a 100% das operações financeiras nas condições ali descritas. No entanto, na sua intervenção, disse-nos que a vantagem da portaria é a de acabar com a isenção a 100%. Ficou, portanto, a dúvida quanto a saber a que é que se refere.
Assim, sugeria-lhe que me explicasse - e, aí, ficará claro para mim próprio e, porventura, para outros - a que é que se aplicam os 20% de isenção. 20% sobre quê? Os 20% de isenção incidem sobre que matéria? Explique-nos, por favor, Sr. Deputado.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não sabe a resposta, mas estão a soprar-lha!

O Sr. Hugo Velosa (PSD): - Sei, sei!
Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, essa sua questão já foi respondida hoje pelo Governo e por mim, através da intervenção que fiz.
É que, ao contrário da interpretação que se pretendeu fazer passar, o que se estabelece na portaria é um plafond a partir do qual passa a haver uma tributação, mesmo em relação às operações com não residentes nas zonas francas da Madeira e da ilha de Santa Maria, a qual tem sido aqui muito esquecida. É, pois, esta a nossa interpretação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, trata-se de uma portaria que vem regulamentar correctamente uma questão que tinha esta lacuna e estou convencido de que, através de toda a legislação aplicável, todos concordarão que, no actual sistema - e só haverá alteração a partir de 1 de Janeiro de 2003, com a entrada em vigor das duas portarias -, havia situações concretas, repito, havia situações concretas, em que algumas instituições financeiras apresentaram, nos anos anteriores, operações com não residentes e lucros tributáveis superiores a 40%, 50% e 60%.
Ora, em nosso entender, e respondendo à sua pergunta, esta portaria acaba com essa imoralidade.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Num debate que se tem demonstrado muito vivo, queria começar com uma nota mais descontraída fazendo uma referência ao Deputado José Sócrates, que, neste momento, mudou a sua posição.
Ainda há pouco, a meio de uma intervenção muito enérgica, por várias vezes, ouvi o Deputado José Sócrates dizer: «É feio! É feio!»… Parece que era uma palavra que tinha especialmente em atenção na altura, mas, neste preciso momento e perante a saída da Sala do Deputado José Sócrates, o Deputado Diogo Feio pretende dar-lhe algumas respostas que parece não o interessarem excessivamente.
Estamos aqui perante um tema já recorrente, recorrente ao quadrado, porque já foi tratado na Comissão de Economia e Finanças, assim como no período de antes da ordem do dia de hoje, quando tal discussão estava agendada para o período da ordem do dia. E quando este tema foi levado à Comissão de Economia e Finanças, já a Sr.ª Ministra Manuela Ferreira Leite, na altura, deu um conjunto de explicações a um requerimento do Partido Comunista Português.
Parece que agora, meses depois, o Partido Socialista se aproxima desse mesmo requerimento e não fosse o Deputado Lino de Carvalho dar-nos aqui uma explicação sobre a não existência de complementaridade sobre as duas posições poderíamos ficar a pensar que haveria alguma aproximação entre o Partido Comunista Português e o Partido Socialista. Assim, ficamos a ver que é apenas um mero efeito de reboque!…
Há posições de fundo contrárias à existência de situações como os offshore e as zonas francas, há quem considere que essa é uma questão de natureza problemática. É preciso que se diga que qualquer determinação que seja feita pelo Governo português ou por esta Assembleia da República em relação a essa matéria não vai, por si, resolvê-la. Este problema, a existir, tem características internacionais, tem, até, ramificações a nível de outras situações na União Europeia e necessita, obviamente, de uma regulamentação feita no âmbito dos estudos que têm sido estabelecidos, desde logo, pela OCDE.
Até porque também tem de referir-se o seguinte: a posição do Governo português tem de ser a de, por um lado, respeito perante o princípio da legalidade e, por outro, respeito por aquilo que está estabelecido, de forma temporalmente determinada, no artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Mas esta é, ainda, uma matéria que cria alguns problemas de natureza técnica, específica. Desde logo, a forma de fazer a imputação dos custos e dos proveitos de uma qualquer entidade que tenha actividade numa zona franca ou num offshore, com vista a determinar de forma rigorosa qual a sua actividade para efeito tributável.
Portanto, é preciso saber qual a forma de imputar o lucro tributável, que é composto (com toda a certeza que aqueles que são juristas sabem-no) por uma referência aos custos, aos proveitos, às variações patrimoniais positivas e negativas.

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Daí que, para que se determine aquilo que, de facto, acontece numa zona franca, tem de se saber qual a forma de imputar custos e proveitos a essa mesma zona franca. Se assim não for, pode acontecer, pelo menos no plano teórico, e se nada estiver determinado, como aconteceu em relação à zona franca da Madeira durante muito tempo, que se imputem os custos a uma zona onde existe tributação e se imputem os proveitos a uma zona em que há uma actividade isenta. Ora, era isso que acontecia em Portugal. A situação transformou-se parcialmente com uma portaria do ano passado, em que se passava a fazer a determinação em relação aos custos, mas apenas aos custos, deixando fora os proveitos.
Ainda recentemente, tive oportunidade de ler a revista Fisco, n.º 95/96, de Abril de 2001, onde vem publicado um texto com o título «A reforma fiscal inadiável», assinado pelos Drs. Joaquim Pina Moura e Ricardo Sá Fernandes, e já nessa altura (e, repito, estou a falar de Abril de 2001) se dizia, em relação à tributação das pessoas colectivas, no «Sexto Objectivo: Medidas para impedir a utilização abusiva das zonas francas» o seguinte: «As soluções (…) - definição de critérios de imputação dos proveitos e custos às entidades ali instaladas de forma a ultrapassar as dúvida que têm subsistido nessa área.» Este texto é, repito, de Abril de 2001.
Em Abril de 2002, o governo socialista abandonou as suas funções e o que fez foi apenas determinar o critério em relação à matéria dos custos, deixando fora os proveitos, que o actual Governo veio resolver com uma rapidez que é de salientar, no sentido de alguns autores, como, por exemplo, o já referido Dr. Ricardo Sá Fernandes ter comentado: «É melhor isto do que nada. Até porque é importante testar a solução».
Na verdade, não se pode fazer comparação entre actividades das sociedades financeiras no offshore da Madeira numa altura em que não havia imputação em relação aos proveitos com uma altura em que essa imputação passará a existir. Daí que seja importante tomar uma solução como a que estamos aqui a discutir.
Por outro lado, é preciso atender um pouco à fundamentação do Partido Socialista nesta discussão, que não era imaginável há uns tempos. Veio falar de favorecimento à banca, veio falar de evasão fiscal e, ainda por cima, quando é apresentada uma interpretação, que, ao que parece, favorece aquilo que são as suas posições ou os seus intentos, ficam zangados, porque, afinal, parece que não queriam que a interpretação fosse concedida.
Mas expressões como «favor à banca» e «negociatas com a banca» eram, de facto, inimagináveis. Será que voltamos - espero que não, acredito que não! - ao inimigo «banca»? Será que não é importante atender-se ao facto de a banca ter uma importante função em relação ao Produto do País, em relação à criação de riqueza e à sua distribuição? Será que vamos, agora, criar, em pleno ano de 2002, questões que já pareciam há muito ultrapassadas? Estas são questões que, com toda a certeza, têm de ficar com o Partido Socialista.
Mas ainda se referem ao fenómeno da evasão fiscal. Perdoem-me a expressão mas parece-me que estão a cumprir o princípio «olhem para o que eu digo, não olhem para o que eu faço». Isto porque a questão da evasão fiscal depende, de uma forma muito clara, de vontade política, e não sou só eu a dizê-lo.
Ainda esta semana, o Dr. Joaquim Pina Moura disse, em relação à questão da evasão fiscal, o seguinte: «Assim haja, agora, a vontade, determinação e firmeza que há dois anos faltou…», e termina com umas misteriosas reticências.
Srs. Deputados, há algo muito claro: a questão da evasão fiscal, como também é dito neste artigo, não depende de grandes alterações ao quadro legislativo fiscal. Esse até deve manter-se com alguma constância. O que é importante é que haja vontade política para tomar as medidas administrativas necessárias e, para isso, um qualquer governo não precisa de uma maioria mas, isso sim, de efectuar essas medidas, seja através da informatização seja através da qualificação daqueles que estão na administração fiscal.
Esta é uma competência do Governo e, como ouvi o Sr. Primeiro-Ministro Durão Barroso aqui referir que o combate à evasão fiscal é uma prioridade, espero muito claramente que este Governo faça o que VV. Ex.as não fizeram e em que não foram exemplo.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pina Moura, que dispõe de mais 2 minutos cedidos pelo Grupo Parlamentar Os Verdes.

O Sr. Joaquim Pina Moura (PS): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Queria intervir neste debate com a serenidade possível e, para isso, começava por colocar uma questão.
O presidente de uma determinada instituição financeira portuguesa, numa entrevista dada há poucos dias, deixou claramente entendido que os lucros apurados por essa instituição financeira na zona do offshore da Madeira seriam 4% do total dos lucros da referida instituição financeira. Ora bem, lendo a Portaria n.º 555/2002, cruzada com a alínea c) do n.º 1 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, a conclusão que tiro - e pergunto -, aplicando o que está escrito e a interpretação que quer a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças quer o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais deram ao que está escrito (pelo menos, foi assim que o entendi), é a de que essa instituição financeira passará a ter uma isenção não sobre 4% dos seus lucros mas sobre 0,8% dos seus lucros.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não!

O Sr. José Sócrates (PS): - Mas foi o que disseram!

Orador: - Esta parece-me ser a interpretação que resulta do que eu entendi das palavras da Sr.ª Ministra e do Sr. Secretário de Estado, ao quererem tornar mais clara a interpretação autêntica da portaria.
Portanto, e uma vez que a Sr.ª Ministra ainda vai intervir, gostava de saber se esta minha interpretação da vossa reinterpretação é ou não certa.
Não vou entrar nos aspectos político-partidários da questão, estou muito à-vontade nesse ponto (aliás, o Sr. Deputado Hugo Velosa já o referiu), foi a maioria liderada pelo Partido Socialista e o governo liderado pelo Partido Socialista que fizeram variadíssimos ajustamentos,

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também com o apoio do PSD na altura, ao Estatuto dos Benefícios Fiscais na zona offshore da Madeira para a salvaguardar, e eu defendo que essa salvaguarda deve continuar e prosseguir enquanto tal tipo de instituições existir em países concorrentes. Portanto, não tenho qualquer posição de princípio contra a zona offshore da Madeira.
Contudo, há um aspecto absolutamente incontestável que devemos ter presente ao redigir esta portaria - e apelo a V. Ex.ª, Sr.ª Ministra, no sentido de o ter em conta: refiro-me ao interesse público e aos interesses do Estado, para além da nossa própria presença seja no governo seja na oposição. E uma portaria que cria, em debate político e em debate técnico (como tem sido patente nos jornais), um grau de controvérsia na sua interpretação como esta já criou, do meu ponto de vista (e é este o ponto que quero sublinhar), corre o risco de, no futuro, independentemente da boa e recta intenção que os membros do actual Governo tenham sobre ela e independentemente da boa interpretação que, eventualmente, os representantes do sistema financeiro hoje possam dar, ao ser aplicada pela administração fiscal, dar origem a uma enorme litigância contra o Estado por parte das instituições que vão ser tributadas segundo essa interpretação mais favorável e com a qual me identifico.
Ou seja, em nome da salvaguarda dos interesses do Estado, em termos de futuro, e para reduzir ou, mesmo, eliminar essa probabilidade de litigância contra os interesses do Estado e contra o exercício por parte da administração tributária desta portaria, apelo à Sr.ª Ministra para considerar a hipótese de a redacção ser clarificada. Não tenho a mínima preocupação de «levar a taça para casa», no sentido de dizer que nós impusemos um recuo! Creio que o que está aqui em causa são interesses mais importantes do Estado, interesses esses que vão para além dos governos do PSD, dos governos do PS, da existência desta ou de outra maioria qualquer!
A portaria deve eliminar uma zona de interpretação duvidosa que, quanto a mim, suscita - este e outros debates demonstram-no! - e essa eliminação é, do meu ponto de vista, o que favorece o exercício da função tributária do Estado em relação aos factos fiscais que aqui são tipificados.
É este o apelo que lhe deixo, Sr.ª Ministra.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, a interpelação que quero fazer prende-se com o andamento dos trabalhos e com alguns procedimentos que é necessário acelerar para dar corpo a algo que anunciámos há pouco.
Como a Sr.ª Presidente está recordada, há pouco, lançámos o desafio ao Governo, a fim de clarificar toda esta polémica interpretativa que aqui percorreu a nossa reunião, no sentido de solicitar uma interpretação à Procuradoria-Geral da República. O Governo não respondeu a essa questão e, pelos gestos da Sr.ª Ministra, percebi que não estava disponível para ser ele a tomar essa iniciativa.
Por isso mesmo, queremos aqui confirmar que, pela nossa parte, vamos iniciar os procedimentos necessários para, junto da Procuradoria-Geral da República, poder clarificar esta interpretação da Portaria.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Claro!

O Orador: - Nesse sentido, estamos disponíveis - e convidamos as demais bancadas parlamentares que assim o queiram - a redigir e a subscrever connosco o texto a enviar à Procuradoria-Geral da República.
Em todo o caso, Sr.ª Presidente - e este ponto tem a ver directamente com a Mesa -, para acelerarmos os procedimentos e podermos dispor dos elementos de sustentação dessa carta à Procuradoria-Geral da República, solicitamos à Mesa que diligencie, junto dos serviços, para que possa ser finalizada, o mais breve possível, a transcrição da acta desta reunião, bem como a acta da reunião da Comissão de Economia e Finanças, realizada há cerca de 2 meses sobre esta mesma matéria.
Pedimos, pois, à Mesa para acelerar os procedimentos, de modo a que sejam feitas tanto a acta desta reunião como a acta da reunião, que foi gravada na altura, da Comissão de Economia e Finanças, para podermos iniciar, desde logo, os procedimentos necessários, com vista a sustentar a carta que queremos dirigir à Procuradoria-Geral da República e para a qual, como dissemos, convidamos os outros partidos a associarem-se.

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr. ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, conforme foi aqui dito, não se dispõe neste momento da transcrição da acta da reunião da Comissão de Economia e Finanças. No entanto, acabo de ser informada de que os serviços já sabem que têm de dar prioridade à transcrição dessa acta, de que já aqui várias vezes falámos. De facto, ela não está disponível neste momento, mas os serviços já sabem que devem dar prioridade à respectiva transcrição, para que a mesma seja rapidamente posta à disposição dos Srs. Deputados.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, refiro-me não só a essa acta mas também, fundamentalmente, à acta da reunião da Comissão Permanente de hoje, porque aqui é que se passaram as interpretações novas do Governo sobre esta matéria.

A Sr. ª Presidente (Leonor Beleza): - Serão dadas instruções nesse sentido, Sr. Deputado.
Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Para finalizar, gostaria de fazer um resumo do que se passa em relação a esta matéria.
Em primeiro lugar, não foi intenção do Governo acabar com a zona franca da Madeira. Como não foi essa a intenção do Governo, não se poderia esperar que houvesse uma decisão no sentido de se acabar com benefícios fiscais na zona franca da Madeira.
Aquilo que se passava - e, por isso, o governo anterior legislou - era que os bancos (não podemos escamotear

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esta questão) tinham alguma tendência para alocar os custos ao continente e os lucros à zona franca da Madeira.
Por causa disso, o governo anterior, porque não era possível (e aceito que não era possível, dada a desmaterialização que existe no funcionamento da Região neste tipo de operações), não conseguia determinar exactamente quais eram os custos associados às operações que estavam ligados a isenções. Era difícil!
Por essa razão, o governo anterior criou uma portaria, arranjando um critério, falível, de alocação de custos. Isto é, arranjou uma determinada percentagem a que alocou os custos, na impossibilidade de o fazer caso a caso.
Contudo, ficou de fora a questão dos lucros, e existia alguma tendência para haver lucros atribuídos à zona franca, porque, evidentemente, isso trazia proveitos. Era, portanto, necessário haver um critério do mesmo estilo do que foi arranjado para os custos, que não era propriamente uma análise de caso a caso, mas que era um critério de percentagem para ser alocado à zona franca da Madeira.

O Sr. António Costa (PS): - Até aqui tudo bem!

A Oradora: - Até aqui tudo bem!
Nessa circunstância, aquilo que se verificou foi que havia forma de distribuir os custos, mas não havia forma de distribuir os proveitos. Nessa situação, estavam isentos ou, melhor, poderiam estar isentos a totalidade dos proveitos de determinada instituição financeira.

Protestos do PS.

Poderiam! Teoricamente, isso era assim!

Protestos do PS.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Com os não residentes!

A Oradora: - Teoricamente era assim!

Protestos do PS.

Por isso, tentámos a portaria e aplicámos para os proveitos o mesmo critério seguido para os custos. Ou seja, há, então, apenas determinada percentagem que pode ter esse benefício, portanto, há um limite para essa atribuição, o que significa que de uma isenção total se passou para uma isenção parcial.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não é isso que está escrito na portaria!

A Oradora: - Repito, passou-se de uma isenção total para uma isenção parcial!

Protestos do PS.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Eles não querem ouvir!

A Oradora: - Aqui chegados, a prova de que a interpretação que nós fazemos é aquela que fazem os destinatários a quem se destina esta portaria é a de que nós temos as afirmações públicas, por parte da Associação Portuguesa de Bancos, que dizem que os bancos usarão menos a zona franca.

Protestos do PS.

E acrescentam: «A partir de 1 de Janeiro de 2003, a banca passa a ter menos possibilidade de utilizar o Centro Internacional de Negócios da Madeira e alguns bancos podem utilizar outros centros financeiros.» De resto, a informação que temos neste momento é exactamente a de que existe já alguma deslocalização dos negócios para fora da Madeira.
Por conseguinte, se alguma crítica existe é exactamente no sentido da concretização de alguma deslocalização, o que, devo dizer, considero negativo para a região da Madeira.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não, não!

A Oradora: - Esta é, pois, uma medida que não é de forma alguma beneficiária para a Madeira. É uma medida que está a ter consequências negativas.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Olhe que não!

A Oradora: - Portanto, os destinatários têm uma interpretação que não é aquela que os Srs. Deputados estão a dar. Se assim não fosse, eu diria que estava a acorrer à zona franca da Madeira um acréscimo de operações, quando efectivamente está verificar-se o contrário.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Não, não!

A Oradora: - Assim, se havia prova necessária de que o objectivo da portaria era este, ela fica confirmada com esta condição.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Sr. ª Presidente (Leonor Beleza): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra, ao longo deste debate, houve algum progresso, pelo menos no esclarecimento dos termos das opções.
O que a Sr.ª Ministra acabou de nos dizer é que se passou de uma isenção total - que era a garantida pelo n.º 1 do artigo 33.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais - para uma isenção parcial. E se bem entendo, a resposta que nos dá aos «20% de quê» é que o «quê» era o conjunto das operações com não residentes na zona franca da Madeira. O que eu entendi que nos disse foi que desse conjunto de operações com não residentes na zona franca da Madeira, 80% passa a ser tributado e 20% não, ao contrário dos 100% que havia anteriormente.

O Sr. António Costa (PS): - Agora já é diferente!

O Orador: - Portanto, passaríamos da isenção total para a isenção parcial, o que suscita dois problemas em relação aos quais agradecia o seu esclarecimento.

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A Sr. ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, o tempo de que dispunha esgotou-se.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Em primeiro lugar, isto pode ser questionado do ponto de vista jurídico, porque se trata de uma portaria que altera uma lei; em segundo lugar, não é isso que está realmente na portaria, porque «lucro tributável da actividade global» não é a actividade global na Madeira, a não ser que nos dê esse esclarecimento e que ele seja plasmado em texto.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Ainda para pedir esclarecimentos à Sr.ª Ministra, inscreveram-se os Srs. Deputados Lino de Carvalho e Pina Moura. Porém, o Sr. Deputado Pina Moura não dispõe de tempo e o Sr. Deputado Lino de Carvalho dispõe de pouco tempo.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Vou ser breve, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr.ª Presidente, a Sr.ª Ministra citou o Sr. Presidente da Associação Portuguesa de Bancos e eu também gostava de o citar. É que, quando a portaria foi publicada, o Sr. Presidente da Associação Portuguesa de Bancos disse o seguinte: «Esta medida vem sobretudo clarificar a realidade fiscal dos bancos. Com este limite de 20%, deixa de haver o argumento de que os bancos fogem aos impostos, usando as zonas francas.»
E o Sr. Ministro da Presidência, Nuno Morais Sarmento, disse: «Esta medida apenas foi tomada depois de contactadas e consultadas as entidades que operam no âmbito daquele regime.»
Morais Sarmento adiantou, também, que os responsáveis por estas instituições se mostraram «compreensíveis, aceitando sem grande oposição a implementação do novo regime, que entrará em vigor em 2003.»
É caso para perguntar, Sr.ª Ministra: antes desta Portaria, não havia uma outra, um anteprojecto,…

O Sr. António Costa (PS): - Havia duas!

O Orador: - … que limitava a 10% a imputação dos lucros e que passou para 20%, em resultado da imposição da Associação Portuguesa de Bancos?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças.

A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças: - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, se havia essas portarias, porque é que não foram publicadas? Pergunte ao Partido Socialista porque é que não as publicaram!

Protestos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, deixem a Sr.ª Ministra falar, por favor!

A Oradora: - Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, é a primeira vez que me dirijo a si neste debate.
Gostaria de lhe perguntar se confirma, ou não - e eu tenho o processo -, que, neste projecto de revisão da zona franca da Madeira, constava uma portaria relativamente aos custos e uma portaria relativamente aos proveitos e que esta última tinha um traço por cima para não seguir, tendo seguido apenas a portaria relativamente aos custos.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Exactamente!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Ó diabo!

A Oradora: - Muito obrigada, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não devia ter perguntado!

O Sr. José Sócrates (PS): - E então?!…

A Oradora: - E então é para dizer que o governo do Partido Socialista entendeu, por vários motivos, que não devia fazer seguir a portaria relativamente aos proveitos. E fomos nós que a fizemos seguir. É só isso, Sr. Deputado! É tão simples quanto isso!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Já devia ter começado essa «guerra» no tempo do seu governo, Sr. Deputado José Sócrates!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - E quanto à isenção parcial e à isenção total?!

A Oradora: - É o total do rendimento tributável dos bancos!

Vozes do PS: - Ah!…

A Oradora: - É o total do rendimento tributável dos bancos!

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - No caso, global!

A Oradora: - Global.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, voltámos ao início!

A Oradora: - Voltaram ao início os Srs. Deputados!
Porque, Sr. Deputado, não era possível continuar a haver uma isenção total, que poderia levar a que um banco não pagasse impostos, se dissesse que todas as suas receitas, todos os seus proveitos, eram gerados na zona franca da Madeira. E nós acabámos com isso! E dizemos: não é mais possível existir uma isenção em relação a mais do que x%, mesmo que realizem lá todas as suas actividades. Mesmo que haja um banco que tenha…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O BCP tem 4% e agora passa a ter 20%!

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A Oradora: - Não, Sr. Deputado!
Sr. Deputado, há aqui um ponto que, provavelmente, ainda está no ar: é que a portaria só se aplica a rendimentos resultantes com não residentes, senão, a zona franca não pode funcionar. E pode haver um banco que diga que só tem actividade com não residentes… Suponha que há um banco que diz: «Eu só tenho actividade com não residentes». Mesmo nestas circunstâncias vai ter de pagar imposto.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - O BCP tinha 4% e agora passa a ter 20%!

A Oradora: - Não! Só paga 4%, Sr. Deputado! Só paga 4%!

O Sr. Francisco Louçã (BE): - Mas, se tiver 20% de operações com não residentes, passa a 20%!

A Oradora: - Mas isso era o que já tinha! Agora, se tiver 25%, passa a 20%!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Falta o «até»!

A Oradora: - Há uma restrição, que não havia. Era possível haver um banco que atribuísse a totalidade dos seus proveitos à zona franca da Madeira e agora isso não pode acontecer, e, portanto, há uma limitação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só não entende quem não quer!

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Para interpelar a Mesa no sentido de, através de V. Ex.ª, poder esclarecer cabalmente a questão que me foi posta pela Sr.ª Ministra das Finanças.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Sr.ª Presidente, confirmo aquilo que a Sr.ª Ministra há pouco referiu como tornando-se indispensável começar pela imputação de custos.
O Sr. Deputado Lino de Carvalho conhece bem este processo, uma vez que houve uma iniciativa, designadamente do Partido Comunista, no sentido de uma rápida regulamentação desta questão, e eu comprometi-me aqui a que essa regulamentação seria feita relativamente aos custos e que entraria em vigor no dia 1 de Janeiro de 2002. Foi o que aconteceu.
Neste momento, verifica-se que a Sr.ª Ministra adiou a sua entrada em vigor de 2002 para 2003.
É tudo, Sr.ª Presidente.

O Sr. António Costa (PS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, é para, em forma de interpelação à Mesa, e na sequência da declaração/convite há pouco feita pelo Sr. Deputado Lino de Carvalho, dizer que, depois de, durante todo o debate, ter ficado claro que o Governo não quer clarificar o que tem de ser clarificado,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Outra vez!?

O Orador: - … e, portanto, não ter aceitado alterar a portaria para «pôr preto no branco» aquilo que diz ser a sua interpretação, não tendo sequer aceite a proposta que lhe foi feita pelo Partido Comunista Português no sentido de tomar a iniciativa de esclarecer o assunto junto do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República e acabar com as dúvidas, nos associaremos ao pedido de consulta ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, para que este órgão clarifique, de uma vez por todas, qual é a interpretação adequada e se estamos ou não perante um monumental escândalo de favor que este Governo acaba de conceder aos bancos, a exemplo do que tem concedido a outras instituições.

Vozes do PS: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, eu dei-lhe a palavra para interpelar a Mesa e não foi exactamente isso que o Sr. Deputado fez.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Já vai longo este debate. Nunca pensei que uma portaria pudesse ocupar-nos durante tanto tempo, mas ainda bem que dedicamos o tempo que é necessário a estas questões, que têm conotação com problemas de carácter fiscal, relativamente aos quais temos de deixar claro que há uma postura diferente deste Governo nestas matérias, como resulta da circunstância de ter ficado congelada, com os tais dois traços, esta portaria no Ministério das Finanças no tempo dos governos socialistas.
Mas é bom que façamos agora uma recapitulação rápida de como é que esta questão foi aqui colocada e de como é que penso que ela acaba neste momento.
Esta questão foi aqui colocada pelo Sr. Deputado José Sócrates nestes termos: havia bancos que realizavam determinadas operações com não residentes por via do offshore da Madeira e que, em relação aos lucros resultantes dessas operações, tinham, de harmonia com o Estatuto dos Benefícios Fiscais, isenção. E trouxe aqui o exemplo concreto da Caixa Geral de Depósitos que teria no cômputo global dos seus lucros apenas 1,5% de resultados obtidos no offshore da Madeira, e, portanto, só em relação a 1,5% dos lucros é que tinha tido a isenção que o Estatuto dos Benefícios Fiscais dava por via do offshore da Madeira.
«E, agora,…» - dizia o Sr. Deputado José Sócrates - «… com esta portaria, o que é que vai acontecer? Vai acontecer que há uma presunção…»

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O Sr. José Sócrates (PS): - Mais do que uma presunção!

O Orador: - «… de que 20% dos lucros da Caixa Geral de Depósitos são imputados à zona franca da Madeira, e, portanto, o Estado vai ser prejudicado, porque, enquanto, no passado, a Caixa Geral de Depósitos apenas beneficiou em 1,5%, tendo pago imposto em relação aos restantes 98,5%, agora vai pagar imposto só sobre 80%, porque o Governo dá de mão beijada esta vantagem».

O Sr. José Sócrates (PS): - É isso mesmo!

O Orador: - Isto é absolutamente desonesto, Sr. Deputado José Sócrates! Isto é desonesto!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Defender esta interpretação é desonestidade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Completamente!

O Orador: - Sabendo o contexto deste processo e a sua evolução e as razões da portaria, é desonesto fazer esta interpretação!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - É preciso, sem mais, dizer, de uma vez por todas, que isto é desonestidade! E foi esta desonestidade que os senhores tentaram defender neste debate até este momento!
Está perfeitamente clara a seguinte situação: os bancos podem fazer operações com não residentes por via do offshore da Madeira. Somam o lucro dessas operações com os restantes lucros das operações gerais do continente, ou seja, fora do offshore da Madeira. Se esses lucros provenientes das operações realizadas no offshore da Madeira não ultrapassarem 20%, têm 20% de isenção dessas operações, mas é preciso demonstrar que foram feitas por não residentes, e pagam imposto sobre 80%. Mas se acontecer que a Caixa Geral de Depósitos volta apenas a ter 1,5% de lucros nas operações com não residentes, vai continuar a ter isenção apenas sobre 1,5%…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como é evidente!

O Orador: - … e vai continuar a pagar imposto sobre o restante.
Mas se, porventura, as operações da Caixa Geral de Depósitos ou de outra instituição evoluírem e passarem a ter não já 1,5% de lucros resultantes de operações com não residentes no offshore da Madeira mas, sim, 30%, então, não vai ter isenção sobre 30% mas, sim, por imposição da portaria, isenção de, apenas, 20%!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - Porque razão se fez isto? E porque razão mais uma desonestidade por parte do Sr. Deputado José Sócrates? É que o Sr. Deputado José Sócrates foi buscar o exemplo da Caixa Geral dos Depósitos de 1,5%. Mas não foi buscar o exemplo de outras instituições de crédito, que tinham 30% e 40%.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essas não davam jeito!

O Orador: - Ou seja, forçavam a afectação de lucros e de operações ao offshore para subverterem o espírito do benefício. E foi com isto que se quis acabar.
Ora, estes 20% não são por acaso. São 20% calculados numa média resultante das operações anteriores, no seu conjunto, e que pareceu ser um limite razoável. E digo que pareceu ser um limite razoável porque isto prende-se com uma questão que os senhores do PS esquecem sistematicamente (e é por isso que, penso, este debate é contra o offshore da Madeira): é que nós estamos numa Europa em que há outros offshore…

O Sr. Jorge Neto (PSD): - Claro!

O Orador: - … e estas medidas que os senhores aqui estão a discutir desta maneira…

O Sr. Jorge Neto (PSD): - É uma vergonha!

O Orador: - … afectam a concorrência do offshore da Madeira relativamente às outras praças.

Protestos do PS.

Afectam a argumentação do Governo português perante a Comissão Europeia, quando defendemos que devemos manter o offshore da Madeira com a mesma competitividade que a Europa mantém em relação às outras praças!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Que falta de vergonha!

O Orador: - Não devemos ser nós a ser os primeiros prejudicados, enquanto se mantêm na Europa outros offshore!

Protestos do PS.

É imperdoável que, em vez da primeira compreensão que deve exigir-se para com regiões insulares, regiões ultraperiféricas que têm de lançar mão de um sistema destes para contribuir para o seu desenvolvimento e suprir dificuldades que a insularidade lhes traz, seja o maior partido da oposição a vir aqui, mais uma vez, a pôr em causa, a desprestigiar, a atacar o offshore da Madeira, sempre por vias ínvias e sempre com a mesma desonestidade!
É esta coisa muito simples que esta portaria determinou. O que é que havia antes? Puxavam-se ao máximo as operações para o offshore e tinham-se os tais 30% e 40% e não apenas os 1,5%, porque esse é um caso isolado.

O Sr. José Sócrates (PS): - O senhor não sabe do que está a falar!

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Qual é o banco?!

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O Orador: - Mas há outra questão: o Sr. Deputado José Sócrates refere-se a uma determinada situação…

O Sr. José Sócrates (PS): - E qual é a situação?!

O Orador: - … em que não estava ainda clarificada a contabilidade, como agora está, para se distinguir de forma clara o que são operações com não residentes e o que não são operações com não residentes…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Orador: - … e outras formas que não se permitia poder avaliar devidamente nessa altura. É este quadro novo em que se insere e complementa a omissão - e os senhores saberão responder… Aliás, pensei que o Sr. Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, quando interveio, respondesse a isso, ou seja, porque é que puseram dois traços na portaria e não tiveram a coragem de fazer essa limitação aos bancos, que o Governo do PSD fez, e vêm agora tentar «voltar o feitiço contra o feiticeiro» e dizer que o Governo do PSD é que foi favorecer e beneficiar os bancos. Tenham vergonha! Assumam as vossas responsabilidades! Procure, Sr. Deputado José Sócrates, saber por que é que foram postos dois traços na portaria, antes da saída do governo socialista do poder!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, peço a palavra!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. António Costa (PS): - Para a defesa da honra da bancada.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Tem a palavra, Sr. Deputado!

O Sr. António Costa (PS): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, V. Ex.ª e o Governo revelaram que o Verão não tem sido bom conselheiro e apresentam-se, no reinício dos trabalhos parlamentares, num tom de nervosismo,…

Vozes do PSD: - Nervosismo?!

O Orador: - … inaceitável para um debate parlamentar civilizado.
Permita-me um conselho, Sr. Deputado Guilherme Silva: aproveite os dias que faltam até ao dia 18 de Setembro, tire umas fériazinhas de forma a voltar civilizado a uma Casa que está habituada a gente civilizada!

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Não sou socialista! Tenho de trabalhar!

O Orador: - Sr. Deputado Guilherme Silva, o senhor perceberá que não voltará a chamar desonesto a nenhum Deputado da minha bancada, sobretudo, depois de um debate no qual a sua bancada e a do Governo se comportaram como se comportaram!
Há uma entrevista do Sr. Eng.º Jardim Gonçalves, Presidente do BCP, dizendo que não imputam à zona franca da Madeira mais do que 4% dos seus lucros. Tem o relatório e contas do BPI, onde se diz que não imputam à zona franca da Madeira mais do que 6%. A Caixa Geral de Depósitos não imputa mais de 1,5%. Estes são os factos!
E os factos que resultam desta portaria, que todos sabemos ler, e que não consentem duas interpretações - e não consentem duas interpretações para a própria banca e para a própria comunicação social - é que agora estabeleceram um regime forfetário. E o regime forfetário não está incorrecto. O que está incorrecto é terem estabelecido um regime forfetário em que concedem 20% de isenção aos lucros resultantes da actividade global dos bancos, independentemente de ser ou não realizado na zona franca da Madeira.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Isso é um absurdo!

O Orador: - Foi isto que os senhores fizeram!
Os senhores tiveram, aqui, duas oportunidades de testarem a vossa boa fé. Primeiro, quando eu disse que se a questão é de má interpretação e se o que os senhores quiseram expressar é aquilo que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais aqui disse, tem bom remédio: escrevam-no, preto no branco!

Protestos do Deputado do PSD Jorge Neto.

Porque não é só para os serviços da administração fiscal, é para o conjunto dos cidadãos, é para o conjunto dos operadores, que têm de saber claramente o que é que vale!
Sr. Deputado Guilherme Silva, e agora o que vale é o que o Governo diz no Diário da Assembleia da República e já não é o que o Governo diz no Diário da República?! Mas desde quando é que a lei geral do País é o que os Srs. Membros do Governo dizem aqui e não o que os Srs. Membros do Governo escrevem, preto no branco, no Diário da República?! Qual é o grau de incerteza e de insegurança jurídica que os senhores pretendem consagrar?! Se estão de boa fé, alterem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Mas quem tem dúvidas é o senhor!

O Orador: - Mas o Sr. Deputado Lino de Carvalho foi até mais condescendente, ao dizer: «Muito bem, se há dúvidas sobre a interpretação, então, consultem o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República!» Pergunto: por que é que não consultam? Porque não estão de boa fé! Sabe porquê? Porque fizeram uma negociata com os bancos, um escândalo neste ano, em particular neste ano, em que exigem sacrifícios a todos os portugueses, não podem agora recuar e não têm a coragem política de o assumir.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Sr. Deputado, conclua, por favor.

O Orador: - Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Portanto, propõem esta moscambilha: nós temos uma interpretação «para Deputado ver» e temos uma portaria «para o banco ganhar». Isto é desonestidade!

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Guilherme Silva, ponha a mão na consciência e retire a sua bancada, este Governo e o País desta trapalhada. Se o que querem é diferente do que aquilo que escreveram, tenham a humildade de corrigir!
Há limites para a arrogância, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças!

Aplausos do PS.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Costa, quero dizer-lhe que não chamei desonesto a ninguém.

Vozes do PS: - Ah!…

O Orador: - Disse que havia desonestidade no raciocínio que estava a ser apresentado na defesa da interpretação que fizeram.
Sr. Deputado António Costa, eu ainda podia atenuar este meu juízo relativamente ao Sr. Deputado José Sócrates, que é engenheiro. Em relação a V. Ex.ª, que é jurista, desculpe que lhe diga mas persistir nesse raciocínio é intelectualmente desonesto.

O Sr. António Costa (PS): - Está escrito!

O Orador: - Vou explicar-lhe!
O Sr. Deputado vem agora dizer esta coisa muito simples: trata-se de uma solução forfetária, em que se diz: agora, os senhores têm aqui «de bandeja», foi a expressão utilizada pelos senhores, 20% isentos de imposto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Só mesmo por desonestidade!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, não tem a noção de que esta portaria está articulada com o Estatuto dos Benefícios Fiscais e de que só há isenção, e é com o limite de 20%, relativamente a operações com não residentes?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Está a brincar!

O Orador: - V. Ex.ª vem dizer que quer se trate ou não de operações com não residentes, agora, os bancos têm 20% de isenção! Podem nem ter qualquer operação no offshore, mas têm, «de bandeja», 20% de isenção!

O Sr. António Costa (PS): - É o que está escrito na portaria!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, desculpe mas V. Ex.ª é jurista e sabe que se trata de uma regulamentação do Estatuto dos Benefícios Fiscais, sabe que esse benefício só se dá em operações com não residentes e insiste em dizer que a portaria dá 20% de isenção mesmo a operações de não residentes?!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É mesmo má fé!

O Sr. António Costa (PS): - É o que está cá escrito!

O Orador: - O Sr. Deputado António Costa não sabe ler o Estatuto dos Benefícios Fiscais?!

O Sr. António Costa (PS): - Então, não sei ler! E não sei eu, nem sabe ninguém!

O Orador: - Sr. Deputado António Costa, estou hesitante entre duas coisas: entre a sua inteligência e a sua honestidade e tenho pena de ter de dizer que tenho de me inclinar para a desonestidade!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sendo eu ainda um Deputado jovem nesta Câmara, não tendo propriamente anos de debates mas apenas meses, acompanho o fenómeno político há algum tempo e aquilo que sou forçado a concluir é que o Partido Socialista, perante questões como estas, não tem emenda.

O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): - Seja sério!

O Orador: - Porque o Partido Socialista tinha referências, que mostrei há pouco, num texto do Dr. Ricardo Sá Fernandes, num texto do Dr. Joaquim Pina Moura, em que se referia a necessidade de haver regras claras quanto à imputação quer dos custos quer dos proveitos em relação à zona franca da Madeira.

Vozes do PS: - Não é isso que está em causa!

O Orador: - Os senhores não o fizeram!
Ainda por cima, confundiram, vieram fazer interpretações que, como foi aqui demonstrado - foi dito pela Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças e foi dito pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais -, não estão correctas. Mesmo assim, os senhores não aceitam.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - É verdade!

O Orador: - Infelizmente, a minha conclusão é esta: esperei que os senhores governassem, esperei que os senhores fossem capazes de fazer uma oposição construtiva, clara e séria e em relação a isto tive de ficar à espera!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

A Sr.ª Presidente (Leonor Beleza): - Srs. Deputados, chegámos ao fim dos trabalhos desta reunião da Comissão Permanente.
Informo que a acta da reunião de hoje estará disponível a partir do fim do dia de amanhã.
Está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 5 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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