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Sexta-feira, 2 de Maio de 2003 I Série - Número 116

IX LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 30 DE ABRIL DE 2003

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas.

Antes da ordem do dia. - Deu-se conta da apresentação da proposta de lei n.º 59/IX, dos projectos de lei n.os 270, 273 e 275 a 281/XI, do projecto de resolução n.º 148/IX e de requerimentos.
Em declaração política, a Sr.ª Deputada Isabel Castro (Os Verdes) chamou a atenção para a perigosidade das minas abandonadas, concretamente a da Urgeiriça.
Também em declaração política, o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP) abordou a questão do combate à sinistralidade rodoviária e, no fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Vitalino Canas (PS) e Francisco José Martins (PSD).
Ainda em declaração política, a Sr.ª Deputada Odete Santos (PCP) referiu-se ao trabalho desenvolvido pela Associação para o Planeamento da Família (APF) e à recente visita feita a Angola por algumas Deputadas a convite da Ministra da Família angolana. Depois respondeu a pedidos de esclarecimento do Sr. Deputado Vítor Ramalho (PS).
O Sr. Deputado José Apolinário (PS) falou das consequências para o sector do turismo da eventual concessão de parte do património da Enatur à gestão privada, após o que deu resposta a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Graça Proença de Carvalho (PSD) e Lino de Carvalho (PCP).

Ordem do dia. - Foi apreciado, e posteriormente aprovado, o projecto de resolução n.º 149/IX - Viagem do Presidente da República à Estónia, à Letónia e à Lituânia (Presidente da AR).
Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo PCP, sobre a situação na TAP, tendo usado da palavra, a diverso título, além do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação (António Carmona Rodrigues), os Srs. Deputados Bruno Dias (PCP), Fernando Pedro Moutinho (PSD), Miguel Coelho (PS), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Lino de Carvalho (PCP), Luís Fazenda (BE) e Heloísa Apolónia (Os Verdes).
Entretanto, o Sr. Deputado Luís Marques Guedes (PSD), em interpelação a Mesa, solicitou o adiamento da votação do projecto de deliberação n.º 18/IX - Prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República, tendo-se também pronunciado o Sr. Deputado José Magalhães (PS).
O projecto de lei n.os 24/IX - Cria o sistema de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes (PS) e o projecto de resolução n.º 64/IX - Sobre a informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes) foram discutidos na generalidade, tendo intervido, a diverso título, os Srs. Deputados Renato Sampaio (PS), Joana Amaral Dias (BE), Isabel Castro (Os Verdes), Luís Gomes (PSD), Honório Novo (PCP) e Miguel Paiva (CDS-PP).
Entretanto, aquando da verificação do quórum de votação pelo sistema electrónico, o Sr. Deputado José Lello (PS) manifestou discordância quanto ao que se passou nesse momento, tendo o Sr. Presidente prestado esclarecimentos. De

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seguida, a Câmara aprovou, na generalidade, as propostas de lei n.os 46/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de Enquadramento Orçamental) e 55/IX - Altera o n.º 22 do artigo 11.º e o artigo 33.º do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 41 969, de 24 de Novembro de 1958.
Foram também aprovados três pareceres da Comissão de Ética, autorizando um Deputado do CDS-PP e dois do PSD a deporem, por escrito, como testemunhas, em tribunal.
Foi, ainda, discutido, na generalidade, o projecto de lei n.º 165/IX - Estabelece a inversão do ónus da prova no âmbito da prestação de serviço público (PCP), tendo usado da palavra, a diverso título, os Srs. Deputados Lino de Carvalho (PCP), Gonçalo Capitão (PSD), António Montalvão Machado (PSD), Bruno Dias (PCP), Jorge Lacão (PS) e Miguel Paiva (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 35 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António Jorge Gonçalves e Gama de Oliveira
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Barroso Soares
João Cardona Gomes Cravinho
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura

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Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José da Conceição Saraiva
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Santos de Magalhães
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Luís José Vieira Duque
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Odete dos Santos
Vicente José Rosado Merendas

Bloco de Esquerda (BE):
Joana Beatriz Nunes Vicente Amaral Dias
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes":
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o Sr. Secretário da Mesa vai proceder à leitura do expediente.

O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de lei n.º 59/IX - Transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n.º 2001/55/CE, relativa a normas mínimas em matéria de concessão de protecção temporária no caso de afluxo maciço de pessoas deslocadas e a medidas tendentes a assegurar uma repartição equilibrada do reforço assumido pelos Estados-membros ao acolherem estas pessoas e suportarem as consequências decorrentes desse acolhimento, que baixa à 1.ª Comissão; projecto de lei n.º 270/IX - Estatuto de direitos e deveres das organizações não governamentais de direitos das mulheres, que baixa à 1.ª Comissão, 273/IX - Adopta medidas dissuasoras do recurso às falências fraudulentas e desenvolve medidas de protecção dos trabalhadores, que baixa às 5.ª e 8.ª Comissões, 275/IX - Reforça os direitos das crianças na adopção, que baixa à 1.ª Comissão, 276/IX - Limitação de mandatos sucessivos, que baixa à Comissão de Reforma do Sistema Político, 277/IX - Limitação dos mandatos dos eleitos locais e da titularidade dos altos cargos políticos, que baixa à Comissão de Reforma do Sistema Político, 278/IX - Altera a Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro (Lei da Nacionalidade), que baixa à 1.ª Comissão, 279/IX - Estabelece o regime de duração dos mandatos dos membros dos órgãos dos institutos públicos e dos órgãos de gestão das autoridades reguladoras independentes, que baixa à Comissão da Reforma do Sistema Político, 280/IX - Estabelece o regime da duração do exercício de funções do Sr. Primeiro-Ministro, dos Presidentes dos Governos Regionais e do mandato do Presidente dos órgãos executivos das autarquias locais, que baixa à Comissão de Reforma do Sistema Político, 281/IX - Alterações à lei eleitoral dos órgãos das autarquias locais, que baixa à Comissão de Reforma do Sistema Político; projectos de resolução n.º 148/IX - Reaquisição da nacionalidade portuguesa por cidadãos portugueses e seus descendentes por cidadãos que adquiriram outra nacionalidade antes da entrada em vigor da Lei n.º 37/81, de 3 de Outubro.

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Foram apresentados na Mesa diversos requerimentos.
Nos dias 16 e 22 e nas reuniões plenárias de 23 e 24 de Abril - aos Ministérios da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, da Economia e das Obras Públicas, Transportes e Habitação, formulados pelo Sr. Deputado José Apolinário; a diversos Ministérios e à Câmara Municipal de Cascais, formulados pelos Srs. Deputados Heloísa Apolónia e Honório Novo; aos Ministérios da Ciência e do Ensino Superior e da Educação, formulados pela Sr.ª Deputada Luísa Mesquita; ao Ministério da Cultura, formulado pelo Sr. Deputado Miguel Coleta; ao Sr. Primeiro-Ministro e aos Ministérios da Administração Interna e da Saúde, formulados pelos Srs. Deputados António Galamba e Renato Sampaio; aos Ministérios das Obras Públicas, Transportes e Habitação, da Justiça e da Educação e ao Governador Civil da Guarda, formulados pelos Srs. Deputados Abílio Almeida Costa, Fernando Cabral, Isabel Castro, José Junqueiro, Mota Andrade e Bruno Dias; à Ministra de Estado e das Finanças e ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, formulados pelos Srs. Deputados Carlos Luís; aos Ministérios da Economia, da Segurança Social e do Trabalho e da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, formulados pelo Sr. Deputado João Teixeira Lopes; ao Ministério das Finanças e às Secretarias de Estado das Comunidades Portuguesas e da Segurança Social e do Trabalho, formulados pela Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar; ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, formulado pela Sr.ª Deputada Maria Santos; ao Ministério da Segurança Social e do Trabalho, formulado pelo Sr. Deputado Vicente Merendas; ao Governo, formulados pelas Sr.as Deputadas Cristina Granada e Rosa Maria Albernaz; e à Secretaria de Estado dos Transportes, formulado pela Sr.ª Deputada Isabel Castro.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A situação nas minas abandonadas em Portugal é alarmante e assume contornos de particular perigosidade e elevado risco no complexo mineiro da Urgeiriça.
A catástrofe ambiental que pode estar eminente, uma ameaça para a saúde pública a que toda uma população beirã do País vive naquela vasta região mineira está sujeita.
Um problema velho de anos para o qual Os Verdes, repetidamente, alertaram esta Câmara e que acabou por estar na origem da apresentação de sucessivas iniciativas políticas, uma das quais conduziu à aprovação unânime, pelo Parlamento, há precisamente dois anos, de um projecto de resolução visando a definição de um plano de emergência no perímetro daquele complexo.
A Resolução com base num projecto de Os Verdes, recordo-vos, Srs. Deputados, que acolhia, igualmente, uma iniciativa vinda do Partido Social-Democrata e contributos do Partido Socialista, e que tinha como objectivo sinalizar uma vontade dos Deputados: a de comprometer politicamente o Governo pela responsabilidade de levar à prática um conjunto de medidas tidas como necessárias e urgentes para dar resposta imediata a problemas existentes, concretamente o da minimização de impactes ambientais mais graves.
Propostas ainda de orientação futura, em termos de saúde pública com reflexos ambientais e sociais, prevenindo incorrectas ocupações do território e propondo naquela vasta área uma observação continuada dos índices de contaminação existentes, numa óptica de prevenção quer em relação às pessoas quer em relação ao recursos naturais aí existentes.
Resolução registe-se, ainda, que o confronto com aquela realidade regional tornava já então imperativa e que fazia eco dos apelos que crescentemente nos chegavam dos cidadãos, reclamando medidas capazes de assegurar o seu bem-estar, a segurança e a saúde pública face a uma mina cujas radiações de urânio tinham, pelos seus efeitos nefastos, marcado gerações.
Uma recomendação que impunha um plano de acção a ser posto em prática no imediato através de medidas de emergência, cuja necessidade se tornava evidente perante a gravidade extrema e a complexidade da situação.
Medidas para atender aos problemas ambientais identificados nos diversos concelhos dos três distritos nos quais esta mina estava situada, impactes aos níveis paisagístico e dos ecossistemas afectados em razão dos diferentes graus de contaminação no ar, no solo, na água.
Medidas com especial premência para zonas especialmente afectadas e colocadas em situação crítica devido à relevância aí assumida pela exploração de urânio e pelas actividades com ela relacionadas, concretamente as de localização de resíduos de minério e as atingidas pelos processos químicos ao longo de anos usados.
Medidas, ainda, perante a catástrofe ecológica eminente que o estudo caracterizador encomendado então pelo governo e feito pelo Instituto Geológico e Mineiro deixava antever, designadamente na Cunha Baixa, nas minas da Bica, no concelho de Sabugal, e nas minas da Urgeiriça, em Nelas.
Áreas onde se encontravam, e encontram, escombreiras dispersas com material radioactivo e resíduos de elevada toxicidade depositados sem qualquer protecção, resíduos que se estima só na Urgeiriça poderem rondar as 2,5 milhões de toneladas e cuja presença, como bem se compreende, não pode continuar a ser negligenciada.
Medidas de urgência ditadas, ainda, pela identificação de lagunas com águas residuais ácidas ricas em metais pesados resultantes das operações realizadas durante anos na Oficina de Tratamento Químico, também elas de enorme nocividade e susceptíveis de contaminarem todos os aquíferos da região.
Medidas porém, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que, não obstante a Assembleia da República as ter proposto com carácter de urgência em função do que estava em jogo - e sublinhe-se que aquilo que estava em jogo era a necessidade de impedir um desastre ambiental de enormes proporções e de garantir a saúde pública -, lamentavelmente, dois anos volvidos, ainda se encontram distantes de terem sido satisfatoriamente concretizadas. Trata-se de um incumprimento que pode vir a tornar esta região uma autêntica bomba de efeito retardado.
Por isso, Os Verdes entendem ser sua responsabilidade pressionar aqui o Governo para que possam ser ultrapassadas. É um dever que se nos impõe pela actividade fiscalizadora que nos compete sobre o governo, qualquer que ele seja, responsabilidade que, seguramente, de nós se espera por aqueles - e foram muitos - que confiaram nos Deputados e que não podem ver defraudada a sua confiança.
Medidas que se impõem, desde logo, para que se faça a delimitação de toda a área envolvida neste complexo, delimitação essa, repito, ainda não feita.

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Medidas, ainda, de sinalização que são fundamentais para que novos acidentes - que, aliás, têm ocorrido - não se repitam e para evitar que os cidadãos possam desprevenidamente incorrer em maiores riscos do que aqueles a que já estão sujeitos.
Medidas para que não mais se continuem a amontoar, a céu aberto, "montanhas" de resíduos de urânio, ou outros de elevada toxicidade, numa região como esta.
Medidas igualmente em falta para que um perímetro de protecção, seja, como o Instituto Geológico e Mineiro propunha, definido e dentro do qual as actividades agrícolas e de pastoreio sejam interditadas.
Medidas de monitorização da qualidade da água cujos aquíferos, provavelmente, estarão em grande parte contaminados e cuja monitorização se revela essencial para evitar a contaminação que pode afectar perigosamente os seres humanos.
É isto, Sr.as e Srs. Deputados, que se exige. As medidas positivas que foram anunciadas embora timidamente pelo Governo há dias não são, obviamente, de descurar, mas estão muito longe daquilo que foi a recomendação da Assembleia da República.
É, pois, esta mesma Assembleia da República em nome do seu prestígio que não se pode esquecer das recomendações que fez: fê-las não para cumprir um exercício de forma mas, sim, em nome da segurança e da saúde e é em nome dessa mesma segurança e dessa mesma saúde que apelo a esta Câmara - e muito em especial ao Sr. Presidente da Assembleia da República - para que se discuta proximamente quem deve garantir, dentro deste Parlamento, o cumprimento de uma Resolução positiva que em boa hora, por unanimidade, todos tomámos.

Aplausos de Os Verdes, do PCP e do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por culpa da agenda da oposição, a Assembleia da República tem vindo a ser alheada dos grandes debates, dos debates de temas que verdadeiramente preocupam e afligem os portugueses, dos temas que devem merecer a atenção de todas as bancadas.
No passado recente, o Partido Socialista determinava a sua acção no governo pelas oscilações dos barómetros de opinião; hoje, na oposição, o Partido Socialista e a demais oposição de esquerda determinam a sua acção pela busca das manchetes mais sensacionalistas e como resultado temos tido nas iniciativas da oposição debates vivos no confronto, quase sempre, desnecessário e assente nos ataques pessoais quase sempre infundados.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Mas outro tanto não se diga ao nível da substância e da nobreza da temática parlamentar, essa, sim, tem perdido, nos últimos tempos, com a estratégia da oposição.
Por isso, o tema que hoje vos propomos, não sendo particularmente mediático e falando pela positiva, raramente enche páginas de jornais, ou abre telejornais, ainda assim é um tema que preocupa verdadeiramente milhões de portugueses, milhões de famílias que nos comprometemos a representar e que todos os dias têm de percorrer as estradas de Portugal.
Falo-vos, obviamente, do drama da sinistralidade rodoviária, mas drama este que, também pela positiva, vamos abordar com base em resultados conseguidos de uma acção muito clara do Governo de Portugal.
Com pena e tristeza de todos, certamente, Portugal tem vindo a bater pela negativa, nos últimos anos, todos os recordes de sinistralidade rodoviária.
Isto com culpa de muitos!
Culpa do Estado, que vinha sendo lento na programação de aplicação de medidas de prevenção, no planeamento e na construção de vias adequadas, na reparação de muitas outras vias danificadas, na implementação de uma legislação e de uma fiscalização eficaz e da punição exemplar que a situação há anos reclama.
Mas culpa também de muitos condutores, que ao longo de outros tantos anos têm vindo a dar exemplos de tremenda falta de civismo e desconsideração pelas vidas e pelo património de todos os demais.
Consciente desta realidade, o Governo da maioria estabeleceu, como prioridade essencial da sua acção, o combate decisivo à sinistralidade rodoviária e às suas causas.
Muitas foram as medidas tomadas desde a sua posse, que, diga-se, culminaram recentemente com a apresentação de um Plano Nacional de Prevenção Rodoviária com um objectivo ambicioso, é certo, mas muito claro.
Pretendem-se criar as condições necessárias para uma actuação consistente e tecnicamente fundamentada para melhoria da segurança rodoviária, visando concretamente uma redução de 50% do número de mortos e feridos graves até ao ano de 2010.
Para tanto, tem o Governo vindo a implementar medidas a diversos níveis e, designadamente, da educação contínua dos utentes, da criação de um ambiente rodoviário que confira maior confiança, da adequação de um quadro legal exemplar na aplicação e na adequação das velocidades praticadas, na exigência de maior segurança para os utentes de motas e motocicletas, no combate à condução sob a influência do álcool e de drogas, na maior utilização de dispositivos de segurança, na adequação das infra-estruturas rodoviárias e no melhor socorro às vítimas de acidentes.
De resto, demonstrando a determinação do Governo na aplicação destas medidas, o Sr. Primeiro-Ministro deu o mote, quando na apresentação pública do Plano referiu que o essencial "é que os portugueses se apercebam da guerra civil que há nas estradas portugueses e do drama aí vivido todos os dias, impondo-se como prioridade uma aplicação estrita da lei, com tolerância zero para o incumprimento".
Trata-se, temos consciência, de um objectivo ambicioso, mas trata-se também de um objectivo que se impõe. E, indo a factos, isso mesmo mostram todos os números, mostram todas as estatísticas.
Portugal entrou na década de 90 com um número anual de mortos que rondava, em média, os 2400 e hoje, decorridos muitos anos e apesar de esforços que se reconhecem, os números continuam verdadeiramente aterradores. Nas nossas estradas têm vindo a morrer, em média, cerca de 4 pessoas por dia. Cerca de 155 ficam feridas e destas, 8,5% em estado grave.
E como prémio, Portugal lá vem continuando a ganhar muitas vezes no plano europeu, o prémio do país com maior número de mortos e feridos por 1000 habitantes.

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Por essa razão, quando falamos de sinistralidade rodoviária, falamos do património de milhões de portugueses, mas falamos também, e principalmente, das suas vidas e da sua integridade física afectada irreversivelmente na sequência de acidentes quase sempre estúpidos e evitáveis.
Como falamos de prejuízos para o próprio País, que assim se vê privado da sua força produtiva e é obrigado a investir milhões com o tratamento e a reabilitação da sua população sinistrada.
Para terminar, com esta intervenção que hoje vos trazemos fazemos justiça à acção governativa e aos resultados extraordinários que começaram a ser visíveis desde que assumiu funções.
Com efeito, se compararmos os resultados da sinistralidade, em 2001, com a sinistralidade de 2002 verificamos que, com o actual Governo em funções, o número de acidentes com vítimas diminuiu de 3251 para 3225.
Por seu lado, com regozijo certamente de todos, podemos também verificar que esta tendência é contínua e também se regista presentemente.
Se compararmos os números da sinistralidade rodoviária do primeiro trimestre de 2003 com os números do período homólogo de 2002, verificamos que o número de mortos diminuiu de 450 para 370; o número de feridos graves de 1353 para 1280; o número de feridos leves de 14 633 para 13 808 e o número total de vítimas de 16 436 para 15 458. São dados objectivos que nos enchem de esperança, não porque consideremos que a batalha já foi ganha, porque não foi, naturalmente.
Sabemos que há ainda um longo caminho a percorrer, mas sabemos também que com estes números se demonstra, inquestionavelmente, que temos hoje um Governo que age, mas principalmente que apresenta resultados; um Governo que sabe governar e um Governo que sabe o que quer, o que demonstra também que os portugueses escolheram bem e que os portugueses podem continuar a confiar.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vitalino Canas.

O Sr. Vitalino Canas (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, gostaria de começar por felicitá-lo pelo facto de ter trazido o tema da sinistralidade rodoviária a Plenário.
É um tema que nos preocupa a todos, que todos os governos têm procurado combater, em Portugal, mas nem sempre com grande sucesso por motivos vários que importaria escalpelizar um dia destes.
Mas a sua intervenção, para além do exagero em relação ao sucesso da intervenção do seu Governo nesta área, suscita-me uma dúvida, que gostaria de lhe colocar, sem prejuízo, obviamente, de estar de acordo com a necessidade de tomar medidas e de estar de acordo, nomeadamente, com o Plano Rodoviário Nacional, que foi apresentado e aprovado, que deve ser implementado e em que todos nos devemos envolver.
Mas há uma área, Sr. Deputado, onde este Governo, de facto, não tem um bom registo. Trata-se da questão do combate ao consumo do álcool pelos condutores.
O último Relatório de Segurança Interna revela que o número de condutores apanhados a conduzir com taxas elevadas de álcool - com taxas criminalizadoras, até - subiu e subiu bastante!
Creio que isto tem que ver - porventura, dir-me-á (e, se calhar, com razão) - com um acréscimo de fiscalização, mas tem que ver também com o discurso errado que o Governo fez nesta área.
Como o Sr. Deputado se recorda, procurámos, no início desta Legislatura, criar uma comissão que iria estudar o impacto do consumo de álcool ao nível da condução. O Governo entendeu que não era necessário, a maioria suportou essa opinião e hoje continuamos sem saber qual é verdadeiramente o impacto do consumo de álcool sobre os condutores, porque continua a não se fazer o que quer que seja!
A pergunta que lhe faço é qual é a iniciativa, a acção, qual é o conjunto de políticas que o Governo tenciona desenvolver nesta área, uma vez que não há qualquer política em concretização, neste momento.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco José Martins.

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, vem o Sr. Deputado trazer à discussão, e a esta Câmara, um problema sério, que entronca com uma medida muito importante tomada pelo Governo: o Plano Rodoviário Nacional.
É rigorosamente verdade que este País tem de dar uma atenção especial à problemática da sinistralidade rodoviária, e que isso encontra eco numa preocupação do Governo, que trouxe há algum tempo a esta Assembleia o Plano Nacional de Prevenção Rodoviária.
Por que é que isto foi importante? V. Ex.ª trouxe aqui o particular daquilo que ocorreu na Páscoa e foi muito importante. Coincidência ou não? Pensamos que não, porque foi feita uma pedagogia muito importante neste sentido.
A verdade é que houve menos acidentes, menos acidentes graves, menos feridos graves, menos feridos leves, menos mortos; em suma, indicadores que nos permitem, desde já, manifestar uma plena satisfação por aquilo que realmente foi, e está a ser, uma campanha de sensibilização, que encontra no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária um instrumento global de análise nesta matéria.
Mas permita-me que aluda a um particular a que o Sr. Deputado Vitalino Canas também se referiu: o Relatório de Segurança Interna do País.
É rigorosamente verdade que este relatório nos permite ter em atenção que uma grande parte da percentagem de criminalidade em Portugal tem a ver com o problema da condução sem habilitação e com o problema do álcool, questão essencial para aquilo que consideramos, apesar de tudo, ser uma percentagem de 4,9% de aumento em termos de segurança na Europa, que entendemos ser globalmente positivo no sentido de que esses crimes, como outros que não graves, significam 76% da criminalidade em Portugal.
Quero com isto significar - e evidenciar aquilo que V. Ex.ª referiu - que a resposta do Governo a esse como a outros problemas desta natureza entronca no particular de crimes que têm a ver com a sinistralidade rodoviária no Pano de Segurança Rodoviária que o Governo pôs em execução.
Gostaria, pois, que V. Ex.ª nos transmitisse se porventura aquilo que neste momento podemos apreciar desse Pano de Segurança Rodoviária e se os resultados evidenciados na Páscoa - que são resultados globalmente positivos e resultados que, queremos aqui manifestar, se traduzem numa

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resposta do Governo a esta problemática séria - nos podem dar alento para que no futuro possamos estar satisfeitos e empenhados em continuar um programa que tem a ver com aquilo que é o respeito pelos portugueses, que, neste particular, é muito importante.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, que dispõe de 5 minutos cedidos pelo PSD.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, antes de mais, deixe-me que lhe diga que lhe louvo o registo de elevação que colocou na sua intervenção e na sua questão, o que já deixava saudades. Mas temos consciência de que, de facto, o tema assim o justifica.
No entanto, Sr. Deputado, gostaria de começar por salientar que, nesta bancada, fomos os primeiros a reconhecer, desde logo no anterior governo, a necessidade de se implementarem medidas - que em alguns casos foram implementadas e noutros casos ficaram aquém - e que temos também a consciência de que algum do sucesso que hoje se regista advém de um esforço passado.
Mas, Sr. Deputado, é também inquestionável que nesta melhoria, que é acentuada e muito significativa (e já lá vamos, novamente), se nota um esforço claro e decisivo do Governo, que, no seu Programa, estabeleceu o tratamento destas questões como uma necessidade de acção, verdadeiramente, prioritária.
Ora, o Sr. Deputado escolheu, porventura, o pior exemplo, que é o exemplo do combate ao drama que é também o da condução sob a influência do álcool. É que, Sr. Deputado, este é um exemplo que temos do passado recente, na acção da governação socialista, de uma profunda hesitação, de uma falta de determinação e, inclusivamente, de um ziguezague que os caracterizou nessa acção governativa.
O Sr. Deputado recordar-se-á que, num primeiro momento, com grande força e determinação, anunciaram que iam apresentar medidas de "Tolerância Zero" para a condução sob a influencia do álcool. Mas, logo depois, Sr. Deputado, recuaram imediatamente, quando viram que as sondagens e os estudos de opinião vos eram desfavoráveis nessa medida. E, portanto, lá anunciaram um dos vossos famosos grupos de estudo para estudarem tudo e mais alguma coisa… E, no final, não fosse a acção decisiva do Partido Social-Democrata e do CDS-PP, teríamos tido uma solução que era um pouco de tudo e um pouco de coisa nenhuma, porque não era aplicável na prática, na medida em que estava dependente de estudos, e mais estudos, e mais estudos, que nunca eram concluídos!

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Portanto, Sr. Deputado, a verdade é que, graças à acção destas bancadas e de alguns Srs. Deputados do Partido Socialista que tiveram melhor senso à data, foi aprovada uma solução que, ainda assim, é intermédia, e bem menos permissiva do que, por exemplo, a inglesa, que como sabe fixa uma taxa máxima de alcoolémia nos 0,8 g/l, quando Portugal tem uma taxa máxima muito menos permissiva, porque está nos 0,5 g/l. Por isso, bem vê, estamos, também aqui, com a generalidade dos países da Europa que optaram por esta solução.
Por conseguinte, Sr. Deputado, digo-lhe: faça fé nestas medidas que o Governo está a implementar e, principalmente, satisfaça-se connosco pelos resultados que já vamos conseguindo alcançar!
O que me leva, naturalmente, ao Sr. Deputado Francisco José Martins.
Sr. Deputado, é evidente - isto são dados, por isso é inquestionável - que a melhoria se verifica a todos os níveis. E, se dúvidas havia na análise comparativa dos resultados de 2002 com 2001, essas dúvidas foram completamente dissipadas com a análise dos resultados do primeiro trimestre de 2003 comparada com o primeiro trimestre de 2002, que referem resultados que surgiram, até, mediante governações diferentes. Isto porque, como sabe, no primeiro trimestre de 2002, a governação era ainda socialista, e no primeiro trimestre de 2003 a governação era já da maioria. Ora, nesta comparação o Sr. Deputado verifica que o número de mortos foi reduzido a todos os níveis. Repare: o número de mortos diminuiu de 450 para 370; o número de feridos graves de 1353 para 1280; o número de feridos leves de 14 633 para 13 808 e o número total de vítimas de 16 436 para 15 458.
Por isso, Sr. Deputado, não há um único item, daqueles que normalmente são considerados neste tipo de análises comparativas, em que possamos dizer que os resultados foram desfavoráveis. Não! A vitória em termos de resultado e de eficácia destas medidas que foram tomadas pelo Governo é em toda a linha e em todos os indicadores!
Como também devemos ter a esperança de que assim vai continuar, e nesta razão decrescente, porque isso mesmo nos foi transmitido pelo Sr. Primeiro-Ministro aquando da apresentação do Plano Nacional de Prevenção Rodoviária,…

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Exactamente!

O Orador: - … que, de forma clara e sem hesitações, anunciou que no combate à sinistralidade rodoviária a tolerância vai ser "Tolerância Zero"; e, por outro lado, que os portugueses têm de ser os primeiros a ter consciência da importância destas medidas e da importância para as suas vidas, para os seus patrimónios e para o nosso país, e por isso colaborar neste esforço. Daí, também, uma outra vertente ao nível da educação onde o Governo da maioria está a implementar medidas.
Por isso, estamos todos de parabéns, Sr. Deputado. Bom será que, no próximo ano, possamos continuar com este registo, porque é sinal de que continuamos a governar bem. E tenho a certeza de que continuaremos a governar bem!

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Associação para o Planeamento da Família, instituição prestigiada, tem em curso, já desde 1998, um projecto a que chamou de iniciativa com parlamentares.
Através deste projecto - que deu origem à criação de um grupo de Deputadas e Deputados de todos os partidos representados neste Parlamento, o grupo para as questões da população e de desenvolvimento -, APF contribui

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para a concretização dos objectivos da Conferência do Cairo de 1994.
E, dos objectivos fixados para o Milénio, todos os países do mundo se comprometeram nessa declaração a reduzir para metade, até 2015, os níveis de pobreza, comprometendo-se, consequentemente, a erradicar os factores que contribuem para o agravamento do fosso entre pobres e ricos: a fome, a doença, o analfabetismo, a fecundidade descontrolada, a desigualdade entre os sexos. Os direitos sexuais e reprodutivos, surgem, neste contexto, como uma peça fundamental na erradicação da pobreza.
O último Relatório do Fundo das Nações Unidas para as questões da População e Desenvolvimento, sobre a situação da População Mundial em 2002, destaca que, depois de 1970, os países em desenvolvimento que viram baixar os índices de fecundidade e o crescimento demográfico viram aumentar a produtividade, o rendimento e o investimento produtivo. "Registaram…" - diz o Relatório das Nações Unidas - "… um crescimento económico mais rápido".
E continua ainda o Relatório: "Os investimentos na saúde e na educação, assim como a igualdade entre os sexos, têm aqui um papel importante a desempenhar. Os programas de planificação familiar e de assistência aos problemas da população são responsáveis pela diminuição, a nível mundial, de quase 1/3 da fecundidade no período entre 1972 e 1994. Estes investimentos sociais lançam um ataque directo contra a pobreza e libertam os seres humanos, sobretudo as mulheres. Investem-nas no direito de escolher".
Esta estratégia visa, de facto, a conquista de direitos humanos e o crescimento económico surge como uma consequência - tudo se transformando em desenvolvimento -, ao contrário das estratégias daqueles que apenas se preocupam com o crescimento económico, espezinhando direitos humanos como os direitos sexuais e reprodutivos, com o que só determinam o aumento da pobreza e do subdesenvolvimento.
E é por isso que o recente Relatório das Nações Unidas não deixa de vincar que o fosso entre pobres e ricos não cessa de aumentar, chamando a atenção para a necessidade que o mundo tem de promover um investimento social mais importante, necessário para precipitar a acumulação do capital humano indispensável a um desenvolvimento acelerado e duradouro. Isto se se quiser cumprir o tal compromisso referido de reduzir para metade a pobreza até ao ano 2015.
Trata-se de uma emergência. Trata-se de investimento social e não de investimento de guerra.
Aliás, a recente visita a Angola, promovida pela APF, a convite da Ministra da Família de Angola, do grupo de parlamentares portuguesas para as questões da população e desenvolvimento evidenciou bem como a guerra é sinónimo de pobreza, de subdesenvolvimento, de desigualdades, de analfabetismo, de doença, de subnutrição, de crise humanitária e de violação de direitos humanos.
Angola mostra-se em "carne viva", noticiava a jornalista Leonor Figueiredo, que acompanhou a delegação. E foi essa "carne viva" que nos foi mostrada por membros do Governo, por ONG's angolanas, como a Angobefa, por ONG's portuguesas que cooperam com a República Popular de Angola e por ONG's de outros países.
Duas décadas de guerra perpetrada contra o povo de Angola, deixaram marcas nos 5 milhões de pessoas que vivem em Luanda, nas crianças de rua com quem convivemos no Lobito, nas crianças que perderam os pais ou que romperam os laços familiares por causa da guerra, nos atrasos relativamente ao saneamento básico e aos cuidados de saúde e nas estatísticas que constam dos relatórios das Nações Unidas, que nos dizem que existe: uma taxa de mortalidade infantil de 118 por cada 1000 nados-vivos; uma esperança de vida de 44 anos e meio para os homens e de 47 anos para as mulheres; uma taxa de 229 nascimentos por cada 1000 mulheres entre os 15 e os 19 anos em cada ano; uma taxa de mortalidade materna de 1300 em cada 100 000 nados-vivos; apenas uma taxa de prevalência de 8 em relação a métodos contraceptivos e de 4 em relação a métodos contraceptivos modernos; uma taxa bruta de escolarização no secundário de 19 em cada 100 jovens para os rapazes e de 13 em cada 100 para as raparigas; e uma taxa de 5,5% de SIDA, afectando os adultos entre os 15 e os 49 anos.
Entretanto, constata-se em Angola uma indómita vontade de devolver a dignidade ao povo, de desenvolver aquilo a que o Ministro da Reinserção Social chamou de produtos de soberania - os produtos agrícolas -, que garantem a independência, e de transformar as riquezas naturais em riqueza-produto do capital humano acumulado.
Angola, que já despendeu milhões e milhões de dólares com a reintegração dos elementos da UNITA, necessita de um reforço da cooperação internacional e de um reforço da cooperação de Portugal para que se estreitem os laços que a nossa História perpetua, para que não tornemos a ler que a Revolução dos Cravos não consta, agora, dos manuais escolares de Angola.
Temos laços fraternos com os combatentes angolanos pela liberdade. Muitos deles ajudaram a construir o 25 de Abril, com a sua resistência ao fascismo, lá e aqui, e estiveram mesmo nas masmorras da PIDE. E estes laços são eternos porque eterna é a luta pela liberdade!

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Ramalho.

O Sr. Vítor Ramalho (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, é a segunda vez, num curto espaço de tempo, que uma delegação de parlamentares portugueses visita o Estado de Angola. Nesta segunda deslocação, houve a preocupação de responder a uma questão prática, que tem a ver com a ajuda ao desenvolvimento, concretamente ao desenvolvimento de Angola.
Neste mundo conturbado e incerto, estas relações de solidariedade com os povos e países de língua portuguesa é absolutamente determinante para o nosso futuro colectivo.
Temos procurado, enquanto partido, chamar a atenção para esse aspecto, na busca do aprofundamento que integre um desígnio nacional e que corporize avanços significativos nesta mesma cooperação - e, infelizmente, é minha convicção que poderíamos fazer mais e melhor, tanto ao nível dos instrumentos públicos afectos à cooperação, e estou a falar concretamente no recém-criado IPAD, que sucedeu à APAD e ao ICP, bem como no Instituto Camões - como ao nível de outros instrumentos que, em termos de política comunicacional, particularmente da radiofónica, são indispensáveis no estreitamento desses laços.

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Lamento profundamente que, por efeito desse apoio público ou, melhor dizendo, de fundos públicos, a Rádio Renascença tivesse, recentemente, de encerrar a sua secção para os países africanos lusófonos, que era um instrumento indispensável para o futuro.
Há outros domínios, particularmente ligados à situação da Guiné-Bissau e ao concreto resultado da própria vivência de um Estado, que, em termos de reforço para a democracia, seria essencial salvaguardar e aprofundar e cuja contribuição me parece estar a ser prestada deficientemente por parte dos poderes públicos.
Por essa razão e em concreto, pergunto à Sr.ª Deputada se sentiu esta realidade da insuficiência para que estou aqui a chamar, mais uma vez, a atenção e, por outro lado, em que medida é que esta visita de parlamentares portugueses pode contribuir, de alguma maneira, para superar também esse défice, que é gritante e que é absolutamente necessário ser superado e cuja priorização o Governo português tem fortemente descurado.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vítor Ramalho, agradeço o seu pedido de esclarecimento e, embora não tenha procuração de ninguém, porque se trata de uma intervenção do meu grupo parlamentar, penso, pelas declarações que as outras Sr.as Deputadas fizeram em Angola, que posso dizer que este grupo está verdadeiramente unido na necessidade de constituir, digamos, um lobby para que, de facto, se desenvolva a cooperação.
Aliás, esta visita já foi antecedida de outras, uma a Moçambique e outra a S. Tomé e Príncipe, e sempre foi nosso objectivo reforçar a cooperação de Portugal com os países de língua portuguesa.
A Assembleia da República já teve aqui a oportunidade, mais do que uma vez, de se exprimir no sentido do reforço da cooperação. Foi aprovada há anos uma resolução, de cuja data não me recordo, sobre a necessidade de reforço do financiamento aos países africanos de língua portuguesa para o combate à SIDA e, recentemente, foi também aprovada uma resolução, que foi apresentada pelo Sr. Presidente da Assembleia da República na sequência da sua visita a Angola.
Pude constatar - não posso dizer o contrário - a existência, aqui e além, de alguns resultados dessa cooperação, tendo-me sido referido, por exemplo, uma contribuição para uma obra social, mas a impressão com que fiquei foi a de que pode ser feito muito mais.
Por exemplo, reunimos com organizações não governamentais portuguesas e dessas apenas uma contava simultaneamente com o apoio de Portugal, e digo simultaneamente porque também era apoiada pelos Estados Unidos, porque todas as outras ONG eram apoiadas por outros países, pela França, pela Itália, etc.
Creio, por isso, que Portugal deve, de facto, reforçar estes laços de cooperação e ver como é que é possível apoiar mais as organizações não governamentais portuguesas na prossecução de objectivos de combate à SIDA e a outras doenças, em matéria de ensino e de educação e em matéria de formação de professores, porque queixaram-se muito acerca disso. A cooperação nesta área é indispensável para formação de quadros.
Por outro lado, Portugal também tem a obrigação de, nas instâncias internacionais, pressionar para que internacionalmente se dê mais cooperação a Angola. Angola é um país que tem representado em África um papel importante no apoio a outros países para se libertarem de colonialismos e de neocolonialismos e merece, de facto, da comunidade internacional um maior apoio.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, peço-lhe que termine, pois já esgotou o seu tempo.

A Oradora: - Termino já, Sr. Presidente.
É doloroso vermos como a guerra levou aquele país, que podia estar muito mais avançado, àquela situação. E nós, de facto, estamos dispostos a continuar nessa pressão para que a cooperação se desenvolva.

Aplausos do PCP.

O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção sobre assunto de interesse político relevante, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.

O Sr. José Apolinário (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Uso da palavra nesta sessão com legitimidade parlamentar e em nome da bancada do PS, mas também com a convicção de que é minha obrigação cívica chamar a atenção do Plenário e da actual maioria governamental para o atentado ao turismo, para o lugar secundário a que foi remetido o interesse público e para a perspectiva de venda a preço de favor e inicialmente com condições de amigo da anunciada privatização de parte do capital e concessão da gestão da Enatur-Pousadas de Portugal.
O Castelo de Alcácer do Sal, conquistado definitivamente aos mouros em 1217, nos nossos dias uma das mais bonitas pousadas históricas, actualmente com gestão da Enatur, a concretizar-se o processo em curso, terá futuramente uma gestão entregue a uma empresa privada. Mas não só! Os arautos desta privatização vão concessionar a gestão de mais 12 monumentos nacionais, a saber, e entre outros: os Castelos de Óbidos, de Estremoz e de Palmela, os Conventos de Santa Marinha, em Guimarães, e de São Francisco, em Beja, os Mosteiros Flor da Rosa, no Crato, e de Lóios, em Évora, e futuramente do Forte de Peniche, do Convento da Graça, em Tavira, do Palácio de Estói e do Forte de São Sebastião, em Angra do Heroísmo.
As Pousadas de Portugal - 18 pousadas históricas, localizadas em monumentos nacionais, como conventos, mosteiros, castelos ou fortalezas, 23 pousadas regionais, situadas em áreas de excepcional beleza paisagística, e 2 pousadas em regime de franchising -, com uma marca com mais de 60 anos, inicialmente com um importantíssimo papel na qualificação e descentralização da oferta turística, depois, ainda e sempre na descentralização (não está, afinal, a afirmação de um Alentejo turístico também ligado ao despontar das pousadas?), na recuperação e na utilização de monumentos nacionais, despertaram a cobiça da fúria privatizadora, e, quando a convicção é fraca e o desconhecimento do sector abre as portas a tal voragem, o resultado está à vista.
A semana passada, a Subcomissão de Turismo decidiu - e bem! - solicitar ao Governo cópia do caderno de

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encargos deste processo. O Governo e o novo Secretário de Estado do Turismo devem também explicar os mais recentes desenvolvimentos neste processo. E há muito a explicar, politicamente falando!
É porque num processo de reprivatização, dentro da lei-quadro de privatizações, haveria lugar à avaliação prévia do valor da empresa por duas entidades independentes. Será que o Governo se prepara para vender a Enatur ao desbarato, considerando apenas o capital social, e, como tal, vendendo 37,6% da empresa por pouco mais de 5 milhões de euros?! Recentemente só a venda de duas pousadas regionais - as de Santiago do Cacém e Miranda do Douro - terá permitido à Enatur arrecadar perto dos 3 milhões de euros. E quem assegurará o cumprimento do clausulado do contrato de concessão? Onde está o Estado regulador? E quais as regras e o valor de utilização da marca em regime de franchising?
Por outro lado, nos últimos anos, os investimentos da Enatur em conservação e restauro ascenderam a cerca de 900 000 euros/ano. Quem vai, no futuro, assegurar esta responsabilidade?
Quem vai assegurar e qual o regime de apoios públicos aplicável na concretização das pousadas integrantes do plano de investimentos 2000/2006, com seis novas pousadas previstas, em Estói, Serra da Estrela, Peniche, Angra, Vila do Conde e Tavira? E com que garantias e direitos podem contar os cerca de 1300 trabalhadores? Há localidades onde a pousada é dos maiores empregadores privados. Mesmo no Algarve, região turística de excelência, a Pousada de S. Brás de Alportel, a funcionar desde 1944, é a única estrutura hoteleira do concelho.
Este processo nasceu, pois, torto!
Na opinião melhor informada, na imprensa especializada, paira a dúvida sobre a efectiva igualdade de condições entre todos os eventuais interessados neste processo. A "mão cheia de interessados" parece agora reduzir-se, talvez porque são muitas as dúvidas sobre a transparência de todo o processo. Por nós queremos apenas que a Enatur continue a ser um instrumento da política de turismo e que no caminho seguido pela maioria parlamentar seja salvaguardado o interesse público, sem perder de vista o papel das pousadas para o turismo em todo o País e para a qualidade do turismo em Portugal.
As Pousadas de Portugal foram, no período ditatorial, um modelo de descentralização da oferta hoteleira, mas também de imposição de um modelo de "bom gosto" nacional de discutível gosto!... Mas neste tempo invoca-se o fim do "Estado hoteleiro". Sejamos claros: investiria um privado, sem apoios públicos, numa pousada em monumento nacional? E no interior? Creio que não. Na fase actual do sector, neste caso concreto, se não me repugna que uma reestruturação da empresa leve à alienação de algumas pousadas regionais, como foi determinado no passado recente, o caminho seguido pela actual maioria governamental é, num sentido figurativo, um "crime de lesa-turismo".
O Governo pode ainda arrepiar caminho. O anterior Secretário de Estado do Turismo demitiu-se, ao que parece, entre outras razões, por ter sido colocado à margem deste dossier. O Governo, entretanto, decidiu atrasar o processo em 30 dias. É uma excelente oportunidade para arrepiar caminho, se não na decisão de fundo, que o Governo parece considerar definitiva, ao menos que os 30 dias de compasso de espera sirvam para trazer transparência ao processo, garantindo efectiva igualdade de oportunidades a todos os potenciais interessados, salvaguardando o interesse público, clarificando e respondendo às questões, ainda sem resposta, que atempadamente colocámos, e impedindo a celebração de um contrato leonino à custa do turismo e do património de todos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos ao orador, inscreveram-se os Srs. Deputados Graça Proença de Carvalho e Lino de Carvalho.
Sr.ª Deputada Graça Proença de Carvalho, tem a palavra.

A Sr.ª Graça Proença de Carvalho (PSD): - Sr. Presidente, antes de mais, o Sr. Deputado José Apolinário na sua intervenção começou por tecer um quadro verdadeiramente catastrófico - "atentado ao turismo", "fúria privatizadora"… O PS, afinal, já não pensa da mesma maneira. É que, no passado, julgo, o PS também alienou participações do Estado, também foi impetuoso a nível de privatizações, levou a cabo importantíssimas privatizações que são muito importantes para a dinamização da economia portuguesa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - E o Sr. Deputado invocou também aqui questões como a da conservação do património que, penso, não se enquadra, aliás, na resolução do Conselho de Ministros aprovada. Está salvaguardado que esses direitos fiquem consagrados no contrato, por isso, a entidade a que vier a ser adjudicada a concessão ficará inclusivamente sujeita a obrigações, se calhar, até mais exigentes do que as ultimamente verificadas…
Eu, por exemplo, não sou de opinião que o Estado seja um bom conservador dos monumentos portugueses.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Pois não!

A Oradora: - Por isso, quem sabe se, através de um contrato com um certo grau de exigência, isso poderá vir a ocorrer de uma outra maneira…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Por que é que não sugere a privatização dos Jerónimos?

A Oradora: - Por outro lado, Sr. Deputado, também invocou, aqui, a questão da lei-quadro das privatizações. Mas penso também que esta privatização - aliás, foi um tema que o Sr. Deputado invocou anteriormente (como sabe, também sou vogal da mesma Subcomissão Parlamentar de Turismo) - não se enquadra na lei-quadro das privatizações, porque o capital da Enatur nunca foi nacionalizado; ela enquadra-se, sim, na Lei n.º 71/88, de 24 de Maio, e, até, por se tratar de participação minoritária. Por isso, penso que essa questão, aí, é diferente.
Mas fiquei mais satisfeita porque, no final da sua intervenção, referiu que o que procurava mais era a transparência do processo e não tanto apreciar, eventualmente, se esta será, ou não, uma solução válida. Antes de mais, penso que há aqui questões que estão salvaguardadas, como, por exemplo, a de o Estado manter a maioria e, no fundo, a de se salvaguardarem também os interesses e os direitos dos trabalhadores, o que é algo que também tem vindo a ser referido pelo PS.

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Ora, eu gostava de saber, Sr. Deputado (e tocou um ponto de crescente interesse nesta matéria), por que é que o PS não teve interesse nas outras alienações que o IPE veio a levar a cabo, por efeito da sua extinção? Lembro-me do caso da Gener, um assunto que nunca vi aqui referido neste Plenário…!
Por outro lado, e porque, pelos vistos, conhece o processo e sabe que esta empresa tem prejuízos avultados ao longo dos últimos anos, pergunto-lhe se julga que era realmente preciso fazer qualquer coisa? Penso, inclusivamente, que passou a haver a participação do IPE porque o IPE teve de injectar capital na empresa, pois estava descapitalizada. Pergunto-lhe, pois, se, no fundo, o facto de se tomar uma decisão de encontrar uma forma de injectar capital na empresa (de modo a que ela possa ter uma gestão mais eficiente e, afinal, trazer melhorias quer para a empresa quer também para o sector em geral) não é uma solução. E ainda: por que é que o PS, no passado, não tomou outras decisões no sentido de realmente levar a cabo um processo de reestruturação numa empresa que precisa disso, e já precisa desde há muito tempo?

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Apolinário, quer responder a cada pergunta em separado ou conjuntamente?

O Sr. José Apolinário (PS): - Respondo em conjunto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado, como vai responder às duas perguntas, dou então a palavra ao Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado José Apolinário, é oportuno o tema que traz, não tanto porque a política de turismo que, aliás, está paralisada, se reduza à questão da Enatur, mas porque a questão da Enatur é simbólica; mais do que simbólica, ela é importante na definição de uma estratégia para a política do turismo, em Portugal. E porquê? Porque a rede nacional de pousadas, e de pousadas históricas, em Portugal, tem constituído, sem dúvida, uma imagem, um símbolo da qualidade e do turismo em Portugal.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Quando, hoje, se argumenta com o prejuízo que a Enatur dá, argumenta-se, umas vezes, com o prejuízo para privatizar e outras com a recuperação da empresa para, depois, privatizar a seguir (como aliás, vamos ver, a seguir, no debate da TAP)…
Mas, quando se argumenta com o prejuízo da Enatur para a privatizar, esquece-se que a Enatur, enquanto empresa pública, ao longo dos últimos 20/30 anos, assumiu responsabilidades na recuperação do património histórico com as receitas da exploração, incumbindo-se de despesas que, a ela, em boa verdade, não competiam mas, sim, ao Estado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Se descontássemos esses encargos que a empresa assumiu, e que não são o resultado da própria exploração turística no sentido estrito do termo, seguramente que o equilíbrio financeiro seria outro.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, se olharmos para o que se passava com as pousadas, em Portugal, antes do 25 de Abril, que eram entregues à exploração privada e que chegaram ao 25 de Abril no estado de degradação em que estavam; e se olharmos para o trabalho de recuperação e de valorização do património que foi feito pela empresa pública Enatur ao longo de 25 anos, só encontramos razões para nos orgulharmos desta empresa e da forma como ela geriu o seu património.
Acresce que a Empresa dispõe de pessoal altamente qualificado, de trabalhadores que se empenharam, que são bons e qualificados na área do turismo. Não nos parece que a privatização da Enatur sirva o turismo em Portugal, ou que sirva a estabilidade do emprego para os trabalhadores nem que sirva, seguramente, a manutenção da recuperação do património histórico.
Aliás, ouvi a Deputada Graça Proença de Carvalho dizer uma coisa espantosa: o Estado não é bom conservador do património… Por este caminho, o PSD ainda vai defender a privatização dos Jerónimos, não tarda muito!

Vozes do PCP: - Exactamente! Muito bem!

Protestos do PSD.

O Orador: - Mas a questão que se coloca, Sr. Deputado, em nosso entendimento e neste quadro, é a de que a Enatur, pelo que representa de símbolo e de imagem do turismo em Portugal, deve manter-se como um instrumento da política pública para a área do turismo! Embora os senhores e o próprio PS tivessem preparado um dossier de privatização da Enatur, a verdade é que nós nos opusemos, ontem, como nos opomos, hoje, a esta estratégia.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ora, Sr. Deputado, a questão…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
A questão que coloco, Sr. Deputado, é esta: o Partido Socialista está contra este processo só porque ele é pouco transparente - e é! - ou está contra este processo porque, no fundo, entende que a Enatur deve manter-se uma empresa pública e no quadro das políticas públicas para o turismo?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário. Dispõe no máximo de 5 minutos.

O Sr. José Apolinário (PS): - Presidente, Srs. Deputados Graça Proença de Carvalho e Lino de Carvalho, muito obrigado

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pelas vossas perguntas, às quais tentarei responder conjuntamente.
Em primeiro lugar, quanto à questão de fundo: a nossa posição no governo foi no sentido de defender a reestruturação da Enatur com aumento do seu capital social e alienação de algumas das pousadas ditas regionais, mas não das pousadas históricas. Esta foi a decisão e houve, aliás, algumas das pousadas que foram alienadas no seguimento desse processo, mas isto por razões de gestão da própria rede.
Coisa diferente é aquilo que a actual maioria pretende fazer…

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - … que é entregar a um consórcio privado, que vai ter 37,6% e, depois, passará para 49%, quer esse capital quer a concessão, sem qualquer regulação.
Onde é que está o papel regulador do Estado? Quem é que vai garantir o cumprimento do clausulado? Quem é a entidade reguladora, aqui?

Protestos da Deputada do PSD Graça Proença de Carvalho.

Como é que se vai definir qual será a intervenção a fazer-se em cada um dos monumentos nacionais?
É que há aqui uma questão de fundo! A Sr.ª Deputada Graça Proença de Carvalho perguntou: então, e as outras privatizações?
Bom, penso ter sido claro ao sublinhar que a parte mais significativa desta empresa resulta do aproveitamento útil de monumentos nacionais e parece-me correcto defender um justo equilíbrio na utilização pública desses monumentos nacionais.

Protestos da Deputada do PSD Graça Proença de Carvalho.

Mas não é isso o que está a ser preparado pelo actual Governo. Eu, aliás, estou curiosíssimo para saber qual é a posição do Governo, depois da última remodelação. Porque era claro que o anterior Secretário de Estado do Turismo - ele disse-o, publicamente! - era contra um processo de privatização da Enatur que a colocasse à margem de ser instrumento de intervenção do turismo.
É que diz-se assim: há muita pressão, por vezes, local, em torno da criação da pousadas. Mas pergunto se caso, porventura, o Presidente da Câmara Municipal de Tavira (para falar do círculo por onde sou eleito) propuser que no seu concelho se crie uma pousada no Convento da Graça, ele não faz isto que é: comprar o edifício na perspectiva de ter uma estrutura de qualidade com uma determinada marca?
Ora, este papel, no sentido da descentralização do turismo e de utilização proveitosa de monumentos nacionais, pode e deve ser continuado pela Enatur. Mas aquilo que estão a fazer é um "crime de lesa-turismo"! Porque, em 1976, quando foi criada a Enatur, o quadro em que encontrava o conjunto de participações do Estado no sector do turismo era anárquico. Porém, foi dada uma linha de orientação: vamos utilizar a Enatur para a recuperação do património histórico.
É aliás, curioso, que uma das primeiras reivindicações feitas em Peniche, logo a seguir ao 25 de Abril, foi a de transformar o Forte de Peniche numa pousada - que está, aliás, prevista, agora, no plano de expansão.
Mas, Sr.ª Deputada, eu coloquei mesmo a questão sob o ponto de vista da transparência, porque penso que aquilo que tem sido público é que este processo não tem sido transparente. Não se sabe quem vai pagar a conservação, a intervenção nessas futuras pousadas. Não se sabe quem vai assegurar o cumprimento do clausulado de um contrato de concessão. Até, pasme-se, a mesma empresa que fez a consultadoria para o processo de reestruturação da Enatur é, agora, parceira de um dos publicamente interessados neste processo!…
Falta transparência a este processo!

Protestos da Deputada do PSD Graça Proença de Carvalho.

Do ponto de vista político, apenas vim aqui defender: transparência no processo; salvaguarda do interesse público; salvaguarda da Enatur como instrumento de política de turismo que é, porque é de todos e porque tem a ver com o património que também é de todos!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 10 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início ao período da ordem do dia com a apreciação do projecto de resolução n.º 149/IX - Viagem do Presidente da República à Estónia, à Letónia e à Lituânia (Presidente da AR).

Pausa.

Como não há oradores inscritos, votá-lo-emos em momento oportuno.
Passamos, então, ao debate de urgência, requerido pelo Grupo Parlamentar do PCP, sobre a situação na TAP.
Vejo que os representantes do Governo já se encontram presentes, por isso, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Bruno Dias, para iniciar este debate. Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Ao abrigo do novo Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP exerceu o seu direito potestativo de agendamento deste debate de urgência, em Plenário, dedicado à situação na TAP.
Com esta iniciativa, o PCP prossegue a intervenção que há anos vem desenvolvendo no plano parlamentar, mas também no esclarecimento e na mobilização dos trabalhadores, em defesa do futuro da companhia aérea.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de uma companhia que, aquém e além fronteiras, granjeou ao longo dos tempos um prestígio e uma importância para a economia e a soberania nacionais que constituem um importante património do País

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e de toda a população - e evidentemente dos seus trabalhadores, que daqui saudamos.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Em diversas ocasiões, o PCP denunciou as malfeitorias lançadas à TAP pelas opções do poder político. Nas incorrectas orientações estratégicas, na ausência de capacidade (ou vontade) de defender e afirmar a companhia, ou, no exemplo mais flagrante que foi o vergonhoso processo Swissair, a vida veio demonstrar que o PCP tinha razão.
A TAP esteve bem pior do que está hoje, nos planos económico e financeiro. E a experiência dos últimos anos é claramente ilustrativa: se a privatização tivesse ido por diante, teria sido provavelmente o fim da empresa. Mas a tal privatização, que era, no entender do governo PS, inevitável, inadiável e imprescindível, afinal não se concretizou, o que significou, aí sim, a sua sobrevivência. Diga-se, em respeito da verdade, que a TAP, hoje, existe e tende a recuperar-se, exactamente, porque não foi privatizada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Agora, mesmo numa conjuntura internacional particularmente difícil, surgem sinais de uma tendência de recuperação económica da empresa. E é preciso ter memória e seriedade para constatar que essa recuperação, essa nova perspectiva de futuro, se tornou possível justamente no quadro de uma TAP de capitais públicos, com a complementaridade das suas diferentes áreas de negócio (transporte aéreo, manutenção, assistência em escala), com a estabilização de um curso estratégico de desenvolvimento e, aspecto não menos significativo, com o esforço e o sacrifício dos seus trabalhadores.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É neste quadro tendencial de recuperação da TAP que o Governo traz de volta o que de pior marcou nesta matéria a actuação do executivo anterior. Aquilo que o governo anterior não conseguiu concretizar é, agora, o que este Governo procura levar por diante, adoptando formas diversas de prosseguir a mesma estratégia: a privatização da TAP, custe o que custar. É caso para dizer que, pelo menos no que respeita à TAP, a tal "pesada herança" é assumida pela direita com um pressuroso entusiasmo.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Muito bem!

O Orador: - De tal forma que, desta vez, o Governo vai mais longe na ofensiva e, actuando ao arrepio das suas próprias afirmações, produzidas por mais do que uma vez nesta Assembleia, deixa cair o compromisso de defender a TAP, enquanto companhia aérea de bandeira, unida nas suas diferentes valências, e aposta numa linha de segmentação da companhia, a começar, desde já, na alienação de todo o sector da assistência em escala, vulgo, handling.
A pretexto de cumprir uma directiva comunitária à custa da TAP, sabendo que é possível criar outras alternativas, o Governo avança com uma medida que vem seriamente comprometer o futuro da companhia: nada menos do que forçá-la a renunciar a toda a actividade da assistência em escala (incluindo a assistência aos seus próprios voos) e recorrer aos serviços da tal sociedade de serviços portugueses de handling, essa que se pretende criar a partir do desmembramento da TAP.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Em suma: o Governo decreta que a TAP deixa de prestar um serviço essencial para o transporte aéreo, pelo qual, depois, terá de pagar! É uma receita, já antiga, aplicada em diversos serviços públicos, sempre com o mesmo resultado: o prejuízo ainda maior para as respectivas empresas e o lucro fácil para os grupos económicos envolvidos. Assim foi, por exemplo, com a RTP, em 1992, quando o governo PSD lhe retirou toda a rede de transmissores, tendo a empresa pago, até hoje, mais do triplo do valor que recebeu pelo serviço que antes lhe pertencia. É isto que se pretende fazer com a TAP, Sr. Ministro? É isto que o Governo considera defender a empresa?
A verdade é que o Governo invoca uma falsa questão quando afirma que a TAP tem de alienar a sua assistência em escala por razões de orientação comunitária. Nem a empresa está impedida a priori de participar e concorrer na prestação deste serviço a terceiros, nem, muito menos, existe qualquer regulamentação, nacional ou internacional, que a impeça de garantir o seu próprio handling.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, a falta de transparência vai ainda mais longe quando o Governo estabelece também para o importante sector da manutenção e engenharia o mesmo destino que está já apontado à assistência em escala. Aqui, nem sequer há directivas comunitárias que sirvam de pretexto para esta decisão.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Vamos falar claro: o que está em causa é a segmentação da TAP como estratégia de privatização. São duas faces da mesma moeda: primeiro, segmentar a companhia; em seguida, vendê-la a retalho, com mais facilidade.
O que o Governo procura não é um "parceiro" para a TAP mas, sim, um comprador que aceite fechar negócio e ficar com a empresa.
É indesmentível que quando a TAP estava em situação de prejuízo e de pré-falência (como o próprio Governo alegava) sempre se assumiu o esforço que seria necessário à sua recuperação.
É inaceitável que agora, após todo este caminho percorrido, perante a perspectiva de uma TAP economicamente viável, o Governo entenda que está na hora de entregar a companhia aos privados, por via desta segmentação. Como se não bastasse, o Governo e a maioria ainda têm o desplante de afirmar que assim se está a salvar a empresa.
É um verdadeiro insulto aos portugueses e, principalmente, aos trabalhadores da TAP.
A actuação deste Governo é, de resto, bem demonstrativa do seu entendimento quanto ao respeito pela opinião das estruturas representativas dos trabalhadores. A própria legalidade sai ferida deste processo quando se constata que não foi respeitada a Lei das Comissões de Trabalhadores, relativamente ao direito de participação que esta prevê para aquelas estruturas. Numa matéria essencial para o futuro da companhia, o Governo "mandou

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às urtigas" a lei em vigor. Determinou, aprovou e mandou seguir!
Que futuro está reservado aos direitos adquiridos dos trabalhadores da TAP? O que podem eles esperar deste processo? É preciso que o Governo esclareça o que vai acontecer a estes trabalhadores, aos que hoje se encontram no activo, aos que estão inseridos nos planos sociais de pré-reforma e aos que, no futuro, venham a integrar a empresa.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Se o Governo tem alguma estratégia, alguma ideia daquilo que pretende para o sector do transporte aéreo, está mais do que na hora de a explicar ao País.
Qual é, afinal, o seu entendimento sobre a importância da TAP para Portugal? Qual o papel que lhe atribui para o seu desenvolvimento estratégico, para a economia, para a soberania nacional?
Até agora, o que tem aparecido nas palavras e nos actos deste Governo é um único objectivo: privatizar a TAP.
O que o Governo está a fazer à TAP não se chama reestruturação, chama-se desmembramento. E é preciso que, neste debate que agora iniciamos, o Governo responda por essa opção, clara e indesmentível, de favorecer os interesses privados e o capital estrangeiro, em prejuízo da empresa, dos seus trabalhadores e do interesse nacional.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação (António Carmona Rodrigues): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostaria, em primeiro lugar, de começar por me congratular com a oportunidade de estar nesta Assembleia, manifestando desde já a minha inteira disponibilidade para estar presente sempre que VV. Ex.as entendam oportuno.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Permitam-me, antes de mais, que vos deixe esta nota: a TAP é uma empresa de bandeira, carregada de uma tradição plena de simbolismo nacional; a TAP é um elo que reforça os laços de portugalidade espalhados pelo mundo e representa uma extensão natural de Portugal no contexto internacional; a TAP é, e sempre foi, um valor de modernidade a alicerçar num mercado de extrema competitividade.
O Programa do Governo, em matéria de transportes aéreos, defende a adopção de uma política clara e transparente de privatização da TAP, procurando as parcerias estratégicas que, numa base séria, viabilizem o seu saneamento financeiro a curto prazo.
Tendo presente este objectivo, importa afirmar, com toda a clareza, que a TAP está numa situação de grande vulnerabilidade financeira, por se encontrar fortemente descapitalizada e, assim, incapaz de viabilizar, só por si, o seu futuro.
Com toda a objectividade, esta é uma situação de risco para a empresa e para todos os que dela dependem, directa ou indirectamente, uma situação que importa ultrapassar, de forma a assegurar a sua sobrevivência.
O processo de viabilização da TAP depara-se com condicionalismos incontornáveis. Desde logo, sendo o Estado accionista único, as regras da concorrência não permitem a injecção de meios para o reforço dos capitais, porque isso seria considerado um auxílio do Estado, o que, como é sabido, é incompatível com as regras do mercado comunitário. Recordo que a TAP foi objecto de um auxílio de carácter único à sua reestruturação em 1994.
Deste modo, só através de um processo de recomposição accionista, com entrada, em posição significativa, de parceiros privados, é possível conferir à TAP uma estrutura financeira que lhe permita assegurar a sua viabilidade. Aliás, foi esta solução que presidiu à definição do modelo de privatização em 1998.
O actual momento, quer no sector do transporte aéreo, quer no mercado de capitais, aconselha prudência no processo de reprivatização da companhia.
Contudo, é clara a orientação política do Governo em garantir a viabilidade da TAP como empresa de bandeira no contexto europeu.
Para isso, importa promover as seguintes acções: prossecução da reestruturação global da empresa; entrada de parceiro estratégico para a unidade de negócio de handling, gerando um necessário encaixe financeiro; diminuição do gap estrutural, através da consolidação, a nível nacional, do transporte aéreo e do estabelecimento de uma aliança estratégica global capaz de potenciar a densidade da oferta, do fortalecimento das redes comerciais, de economias de marketing, da racionalização das compras conjuntas, de condições propícias à entrada de investidores institucionais; entrada accionista de parceiro estratégico na TAP, SGPS, visando o fortalecimento da empresa.
Apesar do contexto desfavorável no sector do transporte aéreo, no pós-11 de Setembro, foi possível, desde já, à TAP, apresentar indicadores que traduzem o esforço de recuperação. Neste sentido, o Governo privilegiou o valor da estabilidade, face a uma conjuntura internacional muito volátil, e regularizou a situação contratual com a equipa dirigente, que, como se sabe, já se arrastava há alguns anos.
Não obstante, a situação estrutural de extrema vulnerabilidade financeira não se alterou. Há, pois, necessidade de acelerar a reestruturação da empresa, com a adopção das referidas medidas, com vista a preparar a sua reprivatização, que, como já se disse, é a única alternativa razoável para a resolução do problema estrutural da TAP.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Existe ainda um outro factor de oportunidade que veio impulsionar a reestruturação da TAP. Estou a falar da situação de incumprimento da directiva comunitária de acesso ao mercado de assistência em escala, designada por handling, nos aeroportos de Lisboa e Porto. Esta directiva não está a ser cumprida, visto que estabelece a obrigatoriedade de, a partir de 1 de Janeiro de 2001, pelo menos um dos prestadores desses serviços dever ser independente da entidade gestora do aeroporto ou do transportador com mais de 25% do movimento de passageiros.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Para sanar esta situação de incumprimento, a única solução razoável, e que permite preservar o potencial do negócio do handling da TAP e, assim, catalizar o seu processo de reestruturação, é a de procurar um parceiro estratégico para o handling da TAP, de modo a

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potenciar as seguintes vantagens adicionais: permitir o acesso a capacidades organizativas, tecnológicas e de gestão do negócio de maior nível, que, necessariamente, o parceiro terá de trazer; possibilitar a prestação de serviços em condições de maior controlo e qualidade em outros aeroportos onde o parceiro esteja a operar; abrir a possibilidade de desenvolvimento do negócio em outros mercados; e, acima de tudo, possibilitar a valorização do negócio do handling da TAP e, gerar, de imediato, a capacidade financeira indispensável à reestruturação financeira da empresa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Como é sabido, os dois prestadores de assistência em escala para terceiros são a TAP e a Portway, dominada pela ANA.
Atendendo à importância desta actividade de handling para a TAP, enquanto empresa de transporte aéreo, nos seus hub de Lisboa e Porto, serão adoptadas as garantias necessárias para que a mesma tenha uma influência determinante na gestão da nova empresa, através dos mecanismos adequados. Nestes, serão incluídas as condições que salvaguardem os direitos e regalias dos trabalhadores, bem como a imagem de marca da empresa.
Por esta ordem de razões, o Governo aprovou o Decreto-Lei n.º 57/2003, de 28 de Março, na sequência do estabelecido no Decreto-Lei n.º 34/2000, pelo qual se permitiu, desde logo, a constituição da TAP, SGPS, com a criação da unidade de negócio de handling numa empresa específica.
Com o referido diploma, foi autorizada a alienação da participação maioritária do capital da sociedade de handling a constituir, através de concurso público internacional.
Releve-se ainda que, nos diplomas que regem esta operação, foi expressamente salvaguardada a situação dos trabalhadores ao serviço, pré-reformados e pensionistas da TAP que nela ficarem.
A orientação estrita do Governo é no sentido de serem garantidos os direitos dos trabalhadores, de acordo, aliás, com o estabelecido na lei especial que rege a reprivatização da TAP e na Lei-Quadro das Privatizações. Com efeito, foram dadas orientações ao Conselho de Administração da TAP para que este adopte todos os mecanismos jurídicos e contratuais para assegurar o cumprimento das referidas disposições legais.
O modelo a adoptar encontra-se em fase de estudo e será analisado com as estruturas representativas dos trabalhadores.
Acresce que nos documentos do concurso (anexos ao caderno de encargos) serão explicitadas as obrigações da empresa face à manutenção das referidas garantias, sendo, por isso, ao abrigo da lei, uma cláusula contratual imperativa. Quanto a este assunto, Srs. Deputados, gostaria que não restassem quaisquer dúvidas.
Por outro lado, de acordo com a Lei-Quadro das Privatizações e os diplomas específicos já referidos, será reservada uma fracção de capital para aquisição ou subscrição preferencial pelos trabalhadores.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: As opções legislativas referidas resultaram essencialmente da urgência na tomada de decisão relativamente ao handling, num quadro de maximização estratégica dos benefícios financeiros para o futuro da TAP.
Para concluir, a viabilidade sustentada da TAP passa, inevitavelmente, por uma objectividade e um realismo na sua gestão, uma modernização do seu modelo empresarial e, por último, por um clima de paz social.
A TAP, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, tem de ter futuro, e a TAP tem futuro.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como sabemos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, o caminho não é fácil, e temos de o fazer com responsabilidade, com determinação e com confiança.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, na primeira ronda do debate, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP decidiu pedir este debate de urgência sobre a situação na TAP. Está no seu direito.
Curiosamente, foi o mesmo PCP que solicitou, e prontamente foi aceite, que o então Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação fosse ouvido na 9.ª Comissão Parlamentar, o que efectivamente aconteceu no dia 26 de Março de 2003.
Hoje, um mês depois, o PCP suscita, de novo, a urgência no debate desta matéria.
Mas, afinal, qual é a urgência do PCP?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - O ministro mudou!

O Orador: - Infelizmente, é pela agitação e para lançar a dúvida nos trabalhadores da empresa sobre um processo que se quer reestruturador para garantir a sobrevivência da TAP como companhia de bandeira.
O PCP não ignora que a situação que a TAP vive hoje não é de "vacas gordas", como não o foi em anos anteriores. A diferença em relação a outros momentos é que, nessas ocasiões, o Estado podia intervir na TAP. Isso aconteceu, com sucessivas injecções financeiras, sendo a última mais significativa, no valor de 180 milhões de contos, assegurada pelo Governo do então Primeiro-Ministro Prof. Cavaco Silva, com vista a permitir a reestruturação e consolidação financeira da TAP e a reconversão da sua frota.
O "negócio" com a Swissair, por seu turno, que o Governo anterior defendeu, partiu de uma premissa,…

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Um desastre!

O Orador: - … que era a existência de um parceiro com grande capacidade financeira numa aliança global com outras companhias aéreas.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Como é sobejamente conhecido, esta opção foi desastrosa, tendo posto em risco a sobrevivência da TAP.

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Apesar destas vicissitudes, a TAP, através dos seus trabalhadores, soube compreender os sinais e as dificuldades, pois, sendo pessoas conhecedoras da complexidade do transporte aéreo, tiveram, ao longo destes últimos tempos, a capacidade de não pôr em causa as condições para a subsistência da TAP como companhia de bandeira.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A TAP é hoje, indiscutivelmente, uma referência nacional, o que é motivo de orgulho dos seus funcionários e do País. Mas todos sabemos que a TAP precisa de medidas de fundo que, caso contrário, se não forem tomadas, levarão ao fim desta companhia, tal como hoje a conhecemos, senão mesmo à sua falência.
A Sabena faliu, várias outras companhias tiveram o mesmo destino ou têm graves problemas de sobrevivência.
Dirão alguns mais optimistas, ou, na minha opinião, mais demagogos…

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Irresponsáveis!

O Orador: - … e irresponsáveis,…

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Exacto!

O Orador: - … que, "enquanto o pau vai e vem, folgam as costas". Não creio que esta expressão popular se aplique, hoje, à situação da TAP.
Portugal estava em transgressão junto da União Europeia, por causa da inexistência de um operador independente de handling. Hoje, esta situação está salvaguardada, esperando-se que, até ao fim do ano, seja concretizada esta nova realidade.
A TAP precisa de ter uma maior e imediata disponibilidade financeira, e esta é a questão de fundo.
Esta solução assegura um encaixe financeiro para a companhia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - A TAP precisa de estabelecer parcerias. A solução encontrada para o handling permite encontrar um operador forte no aeroporto de Lisboa, e um parceiro estratégico para a gestão, e eventuais novas oportunidades em outros aeroportos, para que deixemos de nos posicionar apenas na defensiva e passemos a agir como um operador global.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - A TAP não vai vender património mas robustecer-se, vai agregar meios externos e experiências.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Muito bem!

O Orador: - A TAP, SGPS, vai permitir um comando estratégico único para as várias unidades deste negócio.
Os funcionários do handling da TAP, à semelhança de todos os outros, verão asseguradas, no concurso, cláusulas que preservam as suas regalias e direitos.
As dúvidas e preocupações terão de ser desfeitas nas várias peças contratuais e nos acordos parassociais, bem como na lei.
Assim, consegue-se salvar a TAP, pela sua reestruturação, preparando-a para outras oportunidades e dificuldades que, obviamente, o futuro ofereça.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Os trabalhadores da TAP sabem, como ninguém, que a agitação pela agitação não traz a solução, antes pode contribuir para que se reduzam as condições de êxito desta companhia.
Portugal e os portugueses precisam da TAP. A TAP só faz sentido enquanto constituir um espaço de afirmação de Portugal. É, pois, com esperança que o PSD encara esta reestruturação, já que vai permitir evitar que a TAP desapareça.
Os trabalhadores da TAP estarão atentos e todos os agentes políticos, incluindo a Assembleia da República e os grupos parlamentares, acompanharão este processo, de forma a que tudo o que é essencial seja assegurado.
Por isso, e para terminar, pergunto-lhe, Sr. Ministro: está em condições de garantir que esta reestruturação é a mais adequada para a TAP? Está em condições de garantir que os direitos e regalias dos trabalhadores estão salvaguardados pela lei e por outras disposições, neste processo que pretendemos que seja uma boa solução para a TAP?
Sr. Ministro, eram estas as questões que pretendia colocar-lhe.
Para bem da TAP, esperemos que tudo aquilo que está, neste momento, a ser concretizado seja, efectivamente, a luz ao fundo do túnel e que tenhamos uma companhia de bandeira que continue a dar orgulho a Portugal e a ter uma perspectiva de futuro, pois bem a merecem os trabalhadores e, sobretudo, o País inteiro.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação, quero cumprimentá-lo nesta sua primeira presença no Plenário da Assembleia da República. Já tivemos oportunidade de dialogar noutro fórum e sei, por experiência própria, desse diálogo, que V. Ex.ª é uma pessoa atenta às observações de quem não pensa do mesmo modo, que estuda os dossiers e que, várias vezes, reconhece razão aos seus adversários.
Por isso, quero dizer-lhe, com grande sinceridade, que também o Partido Socialista está preocupado com a actual situação da TAP. E estamos preocupados, desde logo, porque, no passado recente, no tempo do seu antecessor e do actual Conselho de Administração da TAP, nomeadamente do seu Presidente, revelou-se uma grande falta de visão estratégica em relação a esta empresa.
Estamos preocupados com uma certa posição de ambiguidade quanto ao próprio modelo de privatização que se quer agora imprimir, estamos preocupados com uma guerrilha que tem sido promovida pelo Sr. Presidente do Conselho de Administração, o Sr. Eng.º Cardoso e Cunha, e também por um sector dos trabalhadores, designadamente

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os que apoiam o partido maioritário deste Governo, em relação aos restantes gestores da TAP, nomeadamente aos gestores contratados. Trata-se de uma guerrilha que provoca instabilidade e, evidentemente, situações que poderão vir a ser prejudiciais para o futuro da empresa.
Que fique muito claro que o Partido Socialista não se opõe à privatização de parte do capital da TAP, em coerência, aliás, com o que defendia no tempo que era Governo, em que foi elaborado o decreto-lei que tal previa. Mas, evidentemente, Sr. Ministro, sempre entendemos que o Estado, neste processo de privatização, deve continuar a ter uma posição maioritária, uma posição de comando estratégico. E, em face das novas perspectivas, em face do novo decreto-lei que o seu antecessor recentemente elaborou, tal situação não está garantida, com o que, como é evidente, não estamos de acordo.
Por outro lado, também não estamos contra a criação de unidades de negócio na empresa - é evidente que não, aliás tal já havia sido previsto no tempo em que fomos Governo -, mas desde que as mesmas estejam enquadradas numa holding TAP e que, em cada uma, o Estado tenha, evidentemente, o papel principal e a voz de comando, coisa que agora, em nosso entender, deixou de estar salvaguardada, o que nos preocupa, em face do futuro da empresa.
Pedimos, pois, ao Sr. Ministro que analise este dossier no sentido de saber se é este o caminho que querem seguir ou se não será melhor salvaguardar a posição do Estado, enquanto posição maioritária, na criação destas unidades de negócio e até na própria privatização da empresa. É que nós estamos contra uma alienação casuística, uma alienação que vise apenas "desnatar" a TAP, isto é, estamos contra a ideia de que, uma vez que o handling dá resultados positivos, vamos privatizar à pressa, sem, de facto, se fazer, em primeiro lugar, a reestruturação da empresa e, então, depois, a partir daí, iniciar-se um processo de privatização, onde, volto a repetir, o Estado deve continuar a garantir a sua posição maioritária.
Portanto, nesta matéria, Sr. Ministro, deixo-lhe este repto: V. Ex.ª está a iniciar o seu mandato e este é o momento exacto de corrigir o "tiro", de impedir que esta empresa deixe de ser uma empresa de bandeira e que a marca TAP se possa diluir em várias subempresas que deixam de ter identidade entre si, com graves prejuízos para o futuro da empresa, para a própria economia e para os próprios trabalhadores.
Estamos, evidentemente, preocupados com o facto de esta privatização poder pôr em causa - V. Ex.ª já garantiu que tal não sucederá (tomamos como boas as palavras, mas é preciso passar aos actos) - os direitos e as regalias dos trabalhadores e também vir a provocar mais despedimentos na empresa. Aliás, algumas vozes bem avisadas e bem preparadas dizem que a TAP, em alguns sectores, até precisa de mais trabalhadores. Portanto, é necessário encontrar um equilíbrio e a justa posição.
Sr. Ministro, aquilo que, em suma, o Partido Socialista defende é a manutenção da marca TAP, da empresa de bandeira, da holding TAP - a criar -, a criação de algumas unidades de negócio - pelo menos três, pois também não pensamos que sejam necessárias mais do que essas - e que, em todas, o Estado tenha, de facto, uma posição maioritária, uma posição de comando estratégico, o que, como eu disse, com este processo, pode não vir a suceder.
Continuamos apreensivos com a telenovela a que se tem assistido entre a administração e os gestores contratados mas, também aqui, pedimos ao Sr. Ministro uma particular atenção.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, esgotou-se o tempo de que dispunha.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Termino, dizendo apenas que os últimos resultados têm sido encorajadores, portanto é necessário prosseguir no bom caminho e não, com a pressa de privatizar ou de entregar a alguns "boys" aquilo que ainda não está entregue, estragar o futuro desta empresa.

Aplausos do PS.

Vozes do PSD: - "Boys" é com vocês!

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Não havia necessidade de terminar assim!

O Sr. Presidente: - Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero começar por me dirigir ao Sr. Ministro, saudando a sua nomeação e aproveitando para referir, com agrado, a prontidão com que veio debater a situação da TAP, atitude que, de resto, vem na linha de actuação do actual Governo, nas suas relações normais e normalizadas com o Parlamento.
A Assembleia da República tem hoje um conhecimento exacto da situação em que se encontra a nossa transportadora aérea. Tivemos, em sede de comissão, oportunidade de ouvir, sobre este tema, o ex-Ministro, por duas vezes, e o Presidente da TAP, numa audição que se prolongou por mais de três horas. A sinceridade e a frontalidade demonstradas nessas audições, de resto, reconhecidas, inclusive, pela oposição, permitem-nos realizar este debate com total conhecimento de causa.
A TAP é uma empresa com capitais próprios negativos, que enfrenta uma crise mundial do sector da aviação civil, agravada pelo 11 de Setembro, e em que o Estado, accionista único, está impedido, pelas leis comunitárias de regulação da concorrência, de lhe prestar assistência financeira para suportar as reformas estruturais indispensáveis que dão sustentabilidade aos esforços actualmente feitos para equilibrar a empresa.
É incontornável que a única saída possível é uma recomposição accionista, com entrada de outros parceiros. O desafio é transformar uma estrutura rígida, quase monolítica - que ainda tem os seus adeptos nos dias de hoje -, em unidades de negócio distintas e como tal geridas, mas mantendo-a una na estratégia e salvaguardando os direitos laborais dos trabalhadores.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - É para eles, que têm participado activamente na recuperação, e que são indispensáveis para que esta reestruturação chegue a bom termo, que vai uma segunda palavra de saudação da minha parte.

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Tenho a firme certeza de que, vencidas algumas convulsões típicas destes momentos, o Eng.º Cardoso e Cunha, que teve, enquanto comissário europeu - e eu fui testemunha presencial disso -, relações exemplares, e hoje muito recordadas, com os sindicatos e com outras estruturas representativas dos trabalhadores, e o Eng.º Fernando Pinto, que acabou por se impor, apesar das reticências iniciais, como um bom gestor, ganharão a confiança incondicional dos trabalhadores na tarefa de construírem conjuntamente uma nova TAP para o século XXI.
Sr. Ministro, a marca TAP é provavelmente o maior activo da companhia, a marca TAP é a marca portuguesa com maior visibilidade nacional a nível europeu.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Vou já concluir, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Faça o favor, Sr. Deputado.

O Orador: - A pergunta que quero fazer-lhe, Sr. Ministro, vai exactamente neste sentido: está o Governo sensibilizado para a necessidade imperiosa de garantir em todas - repito, em todas - as empresas que vierem a nascer debaixo do "chapéu" TAP, SGPS, a manutenção da marca, da imagem e dos símbolos identificadores e marcantes?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - O orador seguinte é o Sr. Deputado Lino de Carvalho.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Ministro começou por dizer, na sua intervenção, que a TAP é uma empresa de bandeira, que a TAP é um elo de ligação com as comunidades portuguesas, que a TAP é um valor de modernidade. E até podia dizer mais, Sr. Ministro: podia afirmar que a TAP é um instrumento e um símbolo da soberania nacional e só depois dizer que a TAP é isto tudo enquanto empresa pública.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Portanto, a questão que se coloca é esta: se a TAP é isto tudo, porquê privatizar a TAP?
O Governo diz que isso se justifica porque a TAP está com uma grande vulnerabilidade financeira, sendo preciso injectar capitais frescos. O Partido Socialista refere que não se opõe à privatização da TAP desde que o Estado assegure uma posição maioritária.
Mas, Sr. Ministro, isto é tudo contraditório com a vida, porque foi o próprio Governo e a administração da TAP que, ainda recentemente, tornaram público que, enquanto empresa pública, e em condições difíceis do mercado aéreo, a TAP recuperou resultados em 2002 e prevê lucros em 2003. E fez isto tudo enquanto empresa pública! E fez isto tudo com áreas de negócios autónomas, mas no quadro de uma empresa única e de uma companhia de bandeira que defende os interesses e o símbolo nacional!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Então, se o fez agora, por que é que não será possível continuar a fazê-lo, designadamente num período em que se prevê uma recuperação do mercado aéreo, Sr. Ministro?
Mais: veio o Partido Socialista dizer "não, nós temos fé que se faça uma privatização desde que o Estado mantenha a posição maioritária." Mas desconhece o Partido Socialista que o primeiro decreto de privatização da TAP, segmentando para a assistência em escala para permitir o início do processo de privatização, prevê exactamente, no seu artigo 19.º, que quem tem o capital maioritário na nova sociedade de assistência em escala não é o Estado, é a empresa privada que vai adquiri-la?!

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Claro!

O Orador: - Disse o Sr. Deputado do CDS-PP que é preciso garantir uma empresa una. Mas que empresa una, Sr. Deputado, se se vai entregar o handling ao sector privado, se se vai entregar a manutenção ao sector privado e se a TAP corre depois o risco de, no actual quadro da reorganização do transporte aéreo, vir a ficar como mero operador regional, subsidiário de grandes companhias tradicionais?!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - É preciso explicar, e isso leva tempo!

O Orador: - Portanto, Sr. Ministro e Srs. Deputados, a questão que se coloca é esta: o que é que justifica a privatização da TAP, o que é que justifica mais um momento de desestabilização da empresa, que só está na sua actual situação com o esforço que tem sido feito designadamente pelos trabalhadores?
O que o justifica é o interesse de privatizar por privatizar, por razões ideológicas e de cedência a interesses privados. É esse, aliás, Sr. Ministro, o papel do vosso comissário. O vosso comissário está lá em conflito, numa atitude de desestabilização, para mais facilitar o processo de privatização. O vosso comissário é hoje responsável por métodos de instabilidade que podem pôr em causa a recuperação que está a ser feita.
Portanto, a questão que se coloca é esta, Sr. Ministro: diga-nos, por favor, quais são, de facto, as razões de fundo que levam à privatização e à alienação da TAP que, como o Sr. Ministro diz, é um símbolo de modernidade, de ligação com as comunidades, é um valor da soberania nacional.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação disse-nos, num tom quase angelical, que quer manter uma companhia de bandeira, que quer manter o valor da solidariedade nacional que tem sido a empresa TAP, que quer manter factores de modernidade acrescidos. Falou-nos vagamente da necessidade de uma recomposição accionista para fazer face a debilidades financeiras, falou-nos de uma directiva comunitária

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que quase obrigaria a um procedimento lateral e à necessidade de seccionar uma unidade de negócios, o que, aliás, não é assim rigorosamente face ao Direito comunitário, mas não nos explicou aquilo que, de uma forma mais clara, nos explica o Presidente do Conselho de Administração, que nos diz, sem qualquer tibieza, que é mais fácil uma estratégia de privatização da TAP secção a secção, retalho a retalho, do que uma estratégia de privatização global.
Ora, quando o Sr. Eng.º Cardoso e Cunha o assume fá-lo, de certeza, com conhecimento do Governo, com partilha de projectos estratégicos. E a pergunta é óbvia: qual foi a estratégia de privatização que aconselhou, empurrou e pressionou para o desmembramento da empresa, para a sua segmentação?

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Muito bem!

O Orador: - É que, por aquilo que nos é dado ver, trata-se da ficha técnica de uma operação, mas não estamos a ver a projecção dessa operação. E se nós, Bloco de Esquerda, discordamos de uma estratégia privatizadora - não rejeitaríamos alianças ou parcerias estratégicas, mas rejeitamos uma estratégia privatizadora para a TAP -, a verdade é que a questão que hoje se põe e que une todo o pessoal da TAP, todos os sectores e todas as sensibilidades, nem é exactamente o porquê ou a urgência desta privatização (que constava já do programa do Governo, quanto a nós erradamente), mas sim o modelo desta privatização, a forma como ela é ensaiada, a obscuridade dos propósitos que não são enunciados. E o Sr. Ministro das Obras Públicas, na sua intervenção de há pouco, nada nos disse sobre isso; para a frente ficou um enorme nevoeiro.
Ao que parece, neste momento nada há que nos garanta que a TAP, sob um modelo ou outro, venha a ser uma companhia una, venha a ser uma companhia de bandeira. Portanto, são legítimas as preocupações, as apreensões de que, na realidade, se esteja a tentar fazer uma segmentação que venha a destruir uma empresa como a TAP.
O Sr. Presidente do Conselho de Administração, o Eng.º Cardoso e Cunha, disse que os trabalhadores têm de ter "carradas" de bom senso - coisa que eles têm tido nos últimos anos, ajudando extraordinariamente à recuperação da empresa - e o Sr. Ministro referiu-nos aqui que serão garantidos todos os direitos, mas desde já ameaça com centenas de despedimentos. Como compatibilizar estas intenções com os reais propósitos do Governo?

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Ministro, quero também, nesta sua primeira presença em Plenário, saudá-lo em nome do Grupo Parlamentar de Os Verdes.
O Sr. Ministro começou por mencionar que a TAP é estratégica para Portugal. O que lhe pergunto, Sr. Ministro, é como é que, sendo estratégica, pode então ficar ao sabor das lógicas dos destinos e de outras orientações que dêem lucro e não ao serviço daquilo que efectivamente serve a Portugal. Mais concretamente, pergunto: como é que este objectivo, esta lógica de estratégia para a TAP pode compatibilizar-se com os objectivos que todos sabemos estarem inerentes a uma lógica de privatização?
Por outro lado, deixe-me dizer-lhe, Sr. Ministro, que ainda estranhei mais vinda de si essa visão do problema, porque o senhor foi uma pessoa que, até há relativamente pouco tempo, se dedicou, de forma que posso qualificar como séria, às questões ambientais. Por isso, trazer aqui, ao Plenário da Assembleia da República, uma visão de curto prazo para a TAP e analisá-la exclusivamente nessa lógica, não faz qualquer sentido.
Na verdade, o Sr. Ministro apontou a necessidade de saneamento financeiro numa perspectiva de curto prazo, o que me leva a perguntar: e no futuro? Como é que o Sr. Ministro pode garantir, com esta lógica de privatização, com esta lógica única e exclusiva de tapa buracos financeiros, a qualidade do serviço prestado e que a empresa servirá os interesses estratégicos de Portugal?
De facto, o vosso objectivo é privatizar a todo o custo! O Governo defende o saneamento económico desta empresa segundo uma visão de maior facilidade de privatização e não verdadeiramente como a recuperação de uma empresa estratégica para o País. Para o Governo, a segmentação significa a privatização mais fácil, uma maneira de aliciar mais e melhor à privatização. O vosso verdadeiro objectivo é esse e não o de salvar uma empresa necessária a Portugal.
Quero também saudar os trabalhadores da TAP, que, de uma forma incansável, vieram inúmeras vezes à Assembleia manifestar as suas preocupações, tendo sido unânimes em afirmar - essa é a preocupação que levantam - que a segmentação é o fim desta empresa, é a sua desestruturação, é a forma de tornar a TAP inviável.
A terminar, Sr. Ministro, gostaria de referir que os senhores querem começar pela privatização da assistência em escala, coisa que não faz sentido nenhum: vendem este sector e a empresa aérea, que de facto precisa desses serviços, terá depois de recorrer a terceiros para que eles lhe sejam prestados. Isto não tem lógica absolutamente nenhuma! Aliás, há exemplos de que tal medida deu resultados caóticos.

O Sr. Presidente: - A finalizar a primeira ronda, tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação. Dispõe do tempo máximo de 10 minutos.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero, em primeiro lugar, agradecer a cada um dos intervenientes dos vários grupos parlamentares as questões que levantaram.
Numa primeira apreciação dessas intervenções, notei que, pelo menos, há uma sintonia geral alargada relativamente à questão essencial: a privatização.
Iniciando as minhas respostas por ordem cronológica, o PSD questionou-me por duas vezes sobre se esta será a reestruturação mais adequada para a TAP e se há garantias para os trabalhadores, pergunta que, aliás, foi recorrente de outros grupos parlamentares.
Srs. Deputados, tentei explicitar aqui, da forma mais clara e convincente, o empenho e a garantia de que o Governo tudo fará para salvaguardar os direitos e as garantias de todos os trabalhadores como a questão primeira de todo este processo.
Quero dizer também que este modelo de reestruturação se nos afigura como o mais adequado. Podemos falar em alternativas, podemos falar em opções, podemos falar em caminhos distintos, simplesmente, ponderando tudo, tendo em atenção a realidade que temos, tendo em atenção o

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enquadramento internacional que estamos a viver, tendo em atenção experiências já ocorridas em Portugal ou no estrangeiro neste ou noutros sectores de transporte, estamos convictos de que o modelo que preconizamos é o que, não só no curto prazo, como foi dito, mas numa perspectiva de médio e de longo prazo de sustentabilidade da empresa, melhor defenderá tanto os interesses dos trabalhadores e da empresa como os interesses de Portugal.
Isto prende-se com uma importante questão por mim brevemente levantada e também aqui suscitada por Srs. Deputados: a consagração ou preservação da imagem da marca TAP.
Como tive oportunidade de dizer logo no início da minha intervenção, essa é também para nós uma questão quase de honra e tudo faremos para o garantir. Dispomos dos meios que podem dar-nos a garantia da preservação dessa imagem e dessa marca.
Outra questão que aqui foi levantada, e que eu não referi na minha intervenção, tem a ver com a existência de uma aparente "guerrilha" - foi essa a palavra aqui sugerida - entre o Sr. Eng.º Cardoso e Cunha e outros gestores da TAP.
Devo dizer que isso não traduz a realidade, que não é contraditório o discurso de alguém que diz que a situação da TAP "melhorou" - discorda da expressão "recuperou" - com o de outra pessoa que diz que a situação continua grave. Ambas as afirmações são verdadeiras.
Recentemente, regularizámos uma situação que era insustentável, que era a de, na TAP, há mais de dois anos, haver pessoas a gerir ou com simples tarefas sem contrato de trabalho. Era altamente atípico, para aplicar uma expressão que agora se usa muito.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Essa situação era insustentável.
Apostámos na manutenção da estabilidade, dando um voto de confiança à equipa que está a gerir a TAP, e estamos confiantes que vai continuar a produzir bons resultados.
Não cremos que seja possível inverter totalmente uma lógica que esteve subjacente quando, em 1998, o Governo optou - e bem - pela privatização, mas é possível inverter a tendência, pois não cremos que, com o modelo actual, seja possível a recuperação, e é por isso que pensamos que esta restruturação é o modelo mais indicado.
Não se trata, como foi aqui sugerido, de uma segmentação para venda a retalho. O objectivo não é o de privatizar, mas o de salvar a TAP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Nesse aspecto, relativamente à observação que foi feita de que a alienação da sociedade criada no âmbito da holding TAP, SGPS é uma operação casuística, feita à pressa, quero dizer que não é casuística, mas estratégica, e não é feita à pressa, mas sim feita com carácter de urgência, tal como este debate.
É urgente, de facto, resolver a situação da forma que hoje se avizinha como a mais adequada, tendo em atenção a perenidade da solução e a sustentabilidade da empresa.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Queria também chamar a atenção para o facto de, obviamente, o Estado ir manter a posição maioritária na futura empresa holding TAP, SGPS.
Quanto à criação de três áreas de negócio - navegação ou transporte aéreo, manutenção e handling -, o que se tem aqui de afirmar é que não temos dúvidas de que este caminho, que leva, no curto prazo, pelo carácter de urgência e por razões de ordem comunitária, à necessidade de privatização do capital mínimo que confira o estatuto de empresa independente neste sector de operação do handling (a uma das empresas do grupo SGPS), não conduzirá, inevitavelmente, a uma sucessão de outras privatizações de empresas da holding. Para o Governo, está claro que é uma solução inevitável, necessária e positiva para a TAP.
Portanto, não estamos aqui com pressa em arranjar outras privatizações. Estamos conscientes de que esta acção é benéfica, é necessária e é urgente.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Estamos conscientes de que não é nada benéfica!

O Orador: - Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria também deixar uma palavra sobre a questão das parcerias estratégicas. Vamos ter, pelas razões óbvias, todas as cautelas no processo que vai conduzir a esta privatização. O concurso e o caderno de encargos do concurso que vai ser feito, o acordo parassocial que há-de ser celebrado com a empresa, toda a tramitação do processo até à sua execução final vai conhecer, da nossa parte, a maior atenção para que nada seja prejudicado, tendo em vista os objectivos que foram definidos.
Não há uma lógica de lucro. Diria que há uma lógica de não ruína financeira.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Claro!

O Orador: - Como referi, a lógica que está em causa é, em primeira análise, a da salvaguarda da TAP enquanto empresa importante, como símbolo nacional que é, e a de não deixar ruir a empresa, que é aquilo que tem vindo a acontecer.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Não se trata de privatizar a todo o custo. Temos, pois, de encarar toda esta estratégia (e não queria repetir muito aquilo que já foi dito) com uma atitude muito responsável. O caminho não é fácil. Na linha da estabilidade que queremos dar à empresa - e demos sinal disso -, na linha de uma atitude de transparência e de diálogo permanente, de grande responsabilização, conscientes das dificuldades, mas muito seguros e determinados neste caminho, quero dizer a todos os que aqui se encontram e aos trabalhadores da TAP que não será fácil, mas estamos muito confiantes no futuro da TAP.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Honório Novo (PCP): - É a chamada "questão de fé"!

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, entrando na segunda ronda do debate, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pedro Moutinho.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, este debate tem, de facto, uma vantagem: permite voltar a relembrar factos passados, permite reafirmar intenções que têm de ser para o presente e também para o futuro da TAP.
É preciso não esquecer a lição da relação com a Swissair, o quanto desastrosa podia ter sido para a TAP - e de alguma forma foi, com certeza, origem de muitos dos actuais problemas da TAP.
Foi possível salvar a TAP até ao momento. Terá de ser possível salvar a TAP, mas, mais do que isso, terá de ser possível fazer com que a TAP seja, de facto, uma referência de sempre para Portugal.
Por isso, não posso deixar de aqui dizer: a TAP está vulnerável; a TAP está descapitalizada; a TAP precisa de uma injecção financeira urgente para não pôr em causa os seus trabalhadores e o papel que hoje desempenha.
É preciso, por isso, encontrar uma solução adequada às circunstâncias e ao momento. E esta que o Governo apresenta, pela forma como o Sr. Ministro aqui a colocou, é, manifestamente, a melhor posição.
Contudo, não posso deixar de referir que o Sr. Deputado Lino de Carvalho, na sua intervenção, salientou um aspecto que me levantou alguma dúvida: pareceu-me, por instantes, perceber que o PCP estaria de acordo com uma privatização parcial da TAP se fosse no seu conjunto, ou seja, se não fosse, como dizem, a retalho. Sr. Deputado, não sei se percebi bem: é essa a solução que o PCP apresenta?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Percebeu mal! Não percebeu nada!

O Orador: - É porque não ouvi mais nenhuma solução da parte do Sr. Deputado. O Sr. Deputado não teve nenhuma solução para a TAP!
Sr. Deputado, se não estava a defender isso, estava, no fundo, a apostar na ruína. E não é, seguramente, essa a opinião que tenho da sua capacidade e da sua percepção do problema.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Por isso, percebeu mal! Esteja descansado que não é!

O Orador: - Portanto, terei de deduzir que estava a favor da privatização parcial da TAP e que considerava que era essa a opção.
Mas não é essa a opção do Governo.
O Sr. Deputado vai, seguramente, encontrar-se nessa opção do Governo, que defende os trabalhadores da TAP, defende a TAP, defende-nos a todos, e assim continuaremos a ter a TAP como companhia de bandeira.
Aquilo que é importante salvaguardar neste momento é, sem dúvida nenhuma, a oportunidade de presente, mas também de futuro.
O Sr. Deputado pode dar-nos garantias, perante a situação do transporte aéreo internacional, de que, se houvesse um problema sério - como poderia ter acontecido com o arrastamento da guerra do Iraque, mas também com outras circunstâncias -, a TAP poderia eventualmente sobreviver três ou quatro meses numa situação de clara quebra de receitas provenientes da não venda e da extinção de voos que teria de promover por falta de passageiros?! O Sr. Deputado conseguiria apresentar isso a esta Assembleia como solução?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Então, se não houvesse guerra não havia privatização?!

O Orador: - A TAP, provavelmente, não teria condições, porque, como sabe, precisa de uma injecção financeira.
O Sr. Deputado sabe que para a TAP ter presente, mas também futuro, tem de adoptar a solução que defendemos.
E quanto àquele "papão" de os senhores insinuarem de que poderiam estar em causa os postos de trabalho, os trabalhadores da TAP já perceberam muito bem que os estavam a instrumentalizar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Coelho.

O Sr. Miguel Coelho (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro das Obras Públicas, Transporte e Habitação, V. Ex.ª disse que não havia guerrilha, mas olhe que não é o que parece. E o que parece muitas vezes é.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Às vezes não é!

O Orador: - De facto, temos assistido a uma grande animosidade por parte do Sr. Eng.º Cardoso e Cunha em relação à equipa de gestão da empresa, e também, aliás, por parte dos representantes de um dos partidos que apoiam o Governo, nomeadamente dos TSD.
Devo dizer que há aqui duas linhas de pensamento distintas: a do Sr. Eng.º Cardoso e Cunha, que diz que os trabalhadores têm de ser metidos na ordem, que a TAP está numa situação que pode levar à falência, e a de V. Ex.ª, que é o seu contrário, que diz coisas diferentes, que quero aqui registar.
A verdade é que o que passa para fora da empresa é, até agora, a posição de um e, a partir de agora, também a posição do Sr. Ministro. Espero, pois, que o Sr. Ministro, rapidamente, ponha ordem na casa e que, nesta matéria, o Governo e o Conselho de Administração da TAP passem a falar a uma só voz.
Por outro lado, o Sr. Ministro disse que esta não era uma privatização a retalho. Mas olhe que continua a parecer, porque VV. Ex.as deviam, em primeiro lugar, promover a restruturação da empresa e só depois falar de privatização em moldes correctos, continuando o Estado a deter uma posição maioritária, tal como sempre defendemos.
Nesta matéria, como é evidente, o Partido Socialista não tem uma posição imobilista, que seja contra qualquer tipo de privatização - demonstrou isso no seu passado -, mas também não quer uma privatização da empresa a retalho, que a venha a pôr em causa como companhia de bandeira, como grande empresa nacional, como empresa de marca, o que está, de facto, em perigo, pelo que era necessário ter agora em linha de conta antes de se avançar com processos aventureiristas.
Por outro lado, V. Ex.ª voltou a dizer, e registo, que está salvaguardada - e é uma primeira garantia - a defesa dos

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direitos dos trabalhadores. As declarações valem o que valem e são importantes quando vêm da parte de uma pessoa que tem a responsabilidade de ser Ministro, mas volto a insistir que entre as palavras e os actos vai uma grande diferença.

O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): - Isso foi no vosso tempo!

O Orador: - Tal como já aqui foi referido por um Deputado de outra bancada, o Sr. Eng.º Cardoso e Cunha, muito recentemente, ameaçou os trabalhadores, dizendo, entre outras coisas, que "ou eles têm muito juízo ou, então, isto vai por água abaixo".
Portanto, não podemos estar tranquilos, ainda por cima perante a insensibilidade muito grande que o Governo do qual V. Ex.ª faz parte tem demonstrado nesta matéria desde que está no poder, há cerca de um ano e meio.
Por outro lado, também gostava de dizer a V. Ex.ª que é necessário manter os níveis de qualidade do próprio handling, porque o handling da TAP é um dos mais prestigiados e de melhor qualidade da Europa. Portanto, agora, com este processo de aventureirista que está a ser levado a cabo, temo que os níveis de qualidade possam vir a descer de uma forma assustadora.
Para terminar, queria felicitar o PCP pela oportunidade deste debate, ainda por cima porque temos um novo Ministro, sendo oportuno ouvirmos aquilo que pensa sobre esta empresa.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Anacoreta Correia.

O Sr. Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Quero apenas recordar, como aqui já foi dito, que a TAP é uma empresa que assegura a nossa presença no mundo e que tem um bom nível de qualidade, que se reflecte sobretudo na segurança de voo, questão cada vez mais importante e que, em grande parte, está ligada à manutenção que faz aos seus aviões bem como a aviões de outras companhias.
Durante muitos anos, o transporte aéreo foi um negócio fácil, particularmente em Portugal, noutra época, em que as relações políticas eram injustas. Hoje, o negócio do transporte aéreo é difícil, exigente, volátil e de grande concorrência.
A TAP é naturalmente vulnerável em relação a vários factores, como o preço do petróleo e a actividade económica global.
No seguimento do que foi feito noutras companhias - em quase todas as companhias aéreas -, a única saída para a TAP passa por uma profunda reestruturação que crie condições para que esta se torne mais robusta, mais ágil, menos vulnerável e mais preparada para o futuro.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Este debate trouxe poucas novidades. Nem nas questões levantadas pelo PCP, que são recorrentes, nem, naturalmente, na resposta do Governo, que mantém em tudo uma linha coerente, de continuidade e de determinação e, por consequência, também no que diz respeito à reestruturação da TAP.
Enganam-se os que falam em desmembramento da companhia. O que se pretende fazer é uma reestruturação, autonomizar negócios distintos, optimizar gestões que são necessariamente diferentes, e submeter esses negócios a uma estratégia comum, que os torne coerentes perante os interesses estratégicos do País.
Do que falei há pouco foi de uma empresa una na estratégia e não de uma empresa monolítica. São duas coisas diferentes.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - O que se pretende é fazer com que se autonomizem os negócios, com que se optimizem as gestões.
Ao PCP, nesta matéria, é preciso dizer, claramente: não se enganem no diagnóstico e não se enganem nas soluções!
Não é sério dizer que se quer uma TAP unida, como empresa de bandeira, com capitais exclusivamente públicos e, em simultâneo, não explicar como é que isso se faz num sistema fechado e numa empresa "blindada", dados os condicionalismos existentes e os riscos que tal acarreta para os trabalhadores.

O Sr. Carlos Rodrigues (PSD): - Claro!

O Orador: - Os trabalhadores tiveram grande mérito - e saúdo-os - e deram um grande exemplo ao terem tido os salários congelados durante três anos, mas com certeza que a solução não é fazer recair sobre os trabalhadores a incerteza e a vulnerabilidade desta questão.

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

Sr. Deputado Lino de Carvalho, podemos discutir estas questões em sede de comissão ou quando quiser!
Sr. Ministro, pensa o Governo definir, de forma inequívoca, que os diferentes parceiros para as diferentes empresas, a constituir sob o chapéu da TAP, SGPS, devem, além das mais-valias, submeter-se, em dinâmica de sinergia, ao objectivo estratégico comum de reforçar o papel da TAP como companhia de bandeira e o de Portugal como um hub privilegiado no que diz respeito a África e ao Brasil?

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Debrucemo-nos sobre a Directiva 96/67/CEE, que é a grande sustentação do Governo e da maioria nesta discussão, ao dizerem que o sector da assistência em escala tem de ser retirado à companhia e privatizado para cumprimento da Directiva. Antes de mais, isto simplesmente não é verdade. O que a União Europeia impõe é que, de entre os operadores de cada aeroporto, haja um que não seja controlado nem pelo gestor do aeroporto respectivo - em Portugal, é a ANA - nem pela companhia aérea principal utilizadora, que, em Portugal, é a TAP.

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Isto leva-nos a introduzir neste debate a questão do segundo operador de handling, que já existe em Portugal, a Portway. Esta empresa, criada pela ANA - Aeroportos de Portugal, faz concorrência à própria TAP, baixou os preços no mercado, tendo criado a esta última uma situação difícil, e é detida, em pelo menos 40%, por um accionista privado, a Fraport - Aeroportos de Frankfurt.
Ora, com a alteração de uma pequena percentagem no capital da Portway, fica resolvida a questão do cumprimento da Directiva, Sr. Ministro, porque o Governo pode decidir nesse sentido e tal decisão carece, evidentemente, de intervenção da tutela.
Assim, por que razão insiste o Governo em sacrificar e comprometer o futuro da TAP quando há outras formas de cumprir a Directiva da União Europeia e não apenas a da alienação de um serviço que, depois, vai contratar com terceiros?
Aliás, é interessante a notícia, hoje vinda a público, quanto ao desaparecimento eventual da Portway, de acordo com uma estratégia eventual da ANA a que, eventualmente, o Sr. Ministro terá dado o seu parecer.
É curioso que a multiplicidade de operadores seja considerada interessante quando está em causa o facto de o Estado ser alvo de concorrência, mas quando entram em campo os privados e assumem o mercado, então, considera-se que a concorrência já se torna perigosa. É, pois, interessante o que hoje veio a público a este propósito.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Mais: em que parágrafo da Directiva ou de qualquer outra regulamentação está previsto que a TAP tenha de renunciar à sua própria assistência em escala seja em que situação for?
Como explica o Governo que um sector, como dizia o Ministro seu antecessor, seja apetecível e interessante para mais de uma dúzia de empresas e seja para a TAP um peso indesejado?
Como pode o Governo demonstrar que é mais vantajoso para a TAP ter o respectivo handling feito por outros em vez de por si própria?

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Em que estudo está demonstrado quanto é que a TAP gasta actualmente com o seu handling e quanto é que pagará por esse mesmo serviço contratado a terceiros, a uma empresa em cujo nome nem é mantida a designação "TAP"?
O Sr. Ministro vem falar na imagem de marca da TAP como sendo uma questão de honra, mas parece esquecer que, no que diz respeito ao handling, deixa de existir a marca "TAP", não existindo, pois, nenhuma imagem de marca. Onde estão essa marca e essa imagem numa empresa denominada Sociedade Portuguesa de Handling, S.A.?
Já agora, gostaria que o Sr. Ministro esclarecesse uma afirmação que fez há pouco. Pretende privatizar apenas o serviço de handling, ficando tudo o resto numa empresa de capitais públicos, ou estamos perante uma táctica de pequenos passos? É que todo o preâmbulo do decreto-lei relativo à segmentação da empresa diz algo muito diferente, ou seja, que a privatização é o objectivo, dê por onde der.
Trata-se de uma obsessão que compromete o futuro da empresa e que continuará a merecer o nosso combate.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, disse que, havendo um processo de privatização na área de negócios de assistência em escala, handling, não se pode inferir daí que, necessariamente, haja um processo de privatização nas outras áreas de negócios. Ora, isso é absolutamente contraditório com as afirmações do Presidente do Conselho de Administração da TAP, que afirmou que a segmentação da empresa é uma estratégia de privatizações, que seria melhor sucedida do que uma privatização global da empresa.
Devo, portanto, anotar neste debate a formidável contradição entre as opiniões aqui expendidas pelo Sr. Ministro e o que diz o Presidente do Conselho de Administração, o qual também ouviremos na Assembleia da República dentro de alguns dias.
É que é claro que, por parte do Conselho de Administração, vem uma ideia, que não podemos supor que não tenha cobertura governamental, segundo a qual está assumida uma estratégia de privatização "a retalho", enquanto o Sr. Ministro vem dizer-nos que estamos perante um caso pontual para dar cumprimento a uma directiva comunitária e que nada vai passar-se, quando o que está claramente assumido é uma estratégia de segmentação da empresa para posterior privatização.
Repito, pois, a pergunta que já lhe fiz, Sr. Ministro: qual é essa estratégia de privatização que, pelos vistos, está assumida no âmbito do Conselho de Administração da TAP mas que o Governo não evidencia?
Hoje, sabemos que, eventualmente, a ANA desistirá do negócio de handling, o que, claramente, deixa nas mãos de um operador privado todo este processo e que, a nosso ver, também demonstra com muita evidência que, de modo algum, está transparente este processo de privatização.
Sr. Ministro, insisto em que nos dê explicações sobre o que tem vindo a dizer o Sr. Presidente do Conselho de Administração da TAP, isto é, que há espaço de menos para tantas companhias aéreas, que a TAP até pode fechar, que todos têm de precaver-se contra tolices. Trata-se de afirmações que constituem uma verdadeira faísca incendiária, invectivando os trabalhadores e o esforço que têm feito para a recuperação da empresa e desmentindo completamente os sons muito maviosos aqui ouvidos quanto à preservação da marca, à companhia de bandeira e até dessa coisa extraordinária que agora se chamará "chapéu TAP".
Portanto, há qualquer coisa que não está a bater certo entre as declarações duras e absolutamente claras do Presidente do Conselho de Administração da TAP e as tentativas contemporizadoras do Sr. Ministro neste debate.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.

A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Ministro, voltou a entrar em contradição na segunda intervenção que fez, tendo referido que não é possível recuperar a TAP como está. Mas o facto é que a realidade

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fala por si: a empresa tem estado a recuperar economicamente como empresa pública. Houve uma inversão da quebra para recuperação e, portanto, não há que desmentir os factos.
Sr. Ministro, essa estratégia de denegrir por todas as formas tudo o que é público para justificar as privatizações já é profundamente conhecida.
É preciso que fique claro que a privatização é uma vossa opção, não é o único caminho a seguir para salvar a TAP. Trata-se portanto, de uma opção política e de uma questão de vontade política…

Vozes do PCP: - Exactamente!

A Oradora: - … que deve ser assumida como tal. Obviamente, nunca seria essa a nossa própria opção política.
Sr. Ministro, o que nos faz muita confusão é o facto de as coisas já estarem delineadas antes de se concretizarem, ou seja, muitas vezes, antes de o ser já o eram.
Os senhores escudam-se na Directiva da União Europeia, mas eu gostava era que o Sr. Ministro falasse, clara e seriamente, sobre eventuais acordos, já previamente estabelecidos, entre o seu antecessor, Valente de Oliveira, e a Sr.ª Comissária dos Transportes da União Europeia. Gostava de ouvir o Sr. Ministro sobre isso, pois creio que, nesta discussão, temos de ser muito sérios relativamente aos dados que são suscitados.
O Sr. Ministro, com a segmentação, tem em vista a privatização. Ora, na perspectiva de Os Verdes, os senhores estão a contribuir definitivamente para afundar de vez a TAP como estratégia para Portugal.

Vozes de Os Verdes e do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Vou tentar responder a algumas questões adicionais que foram suscitadas.
A primeira questão tem a ver com a política de transporte aéreo que a TAP poderá seguir. Ora, como tive oportunidade de dizer, as grandes orientações vão no sentido da prossecução da reestruturação global da empresa, da entrada de um parceiro estratégico para a unidade de negócio de handling.
Quanto à diminuição do gap estrutural, recordo, repetindo o que tive oportunidade de dizer há pouco, que, realmente, tem havido uma inflexão na tendência negativa a que se assistia em termos da TAP. Houve uma inversão da tendência na exploração, o que é positivo e em relação ao que só podemos estar contentes. No entanto, isso não significa que a empresa esteja no sentido de uma total recuperação.
A este propósito, recordo que, em 31 de Dezembro de 2002, o défice de tesouraria era da ordem de 40 milhões de euros, o que, por si só, reflecte uma dificuldade muito grande de gestão da empresa.
Como dizia, para além das três orientações que acabo de referir, temos ainda a da consolidação, a nível nacional, do transporte aéreo e o estabelecimento de uma aliança estratégica global.
Respondendo ao Sr. Deputado Anacoreta Correia, dir-lhe-ei que, nesta abordagem de reestruturação empresarial, é fundamental o estabelecimento de uma aliança estratégica global que implica densidade de oferta de redes comerciais mais fortes, economias de marketing, contas conjuntas, a criação de condições para a entrada de investidores institucionais na empresa.
Por último, temos também a entrada accionista de um parceiro estratégico na TAP, SGPS, o que fortalecerá certamente a empresa e garantirá a sua sobrevivência face à consolidação do modelo de mercado europeu.
Sr. Deputado Bruno Dias, devo dizer que resolver o problema do cumprimento da Directiva comunitária não resolve o problema da TAP. A questão do handling, uma actividade dentro da divisão das áreas de negócios da TAP, não foi apenas devida à reacção a uma imposição da Directiva comunitária, mas tratou-se, de facto, de uma opção…

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Ah! Já mudaram de argumento!

O Orador: - Não, é as duas coisas! Não tem de haver contradição; é muito claro!
Portanto, uma possível resolução do problema que hoje pode existir devido à imposição de uma directiva comunitária não resolve a questão de fundo da TAP.
Assim, há que ter presente que o acordo accionista que esteve na origem da criação da Portway baseou-se na possibilidade de, sendo uma empresa maioritariamente detida pela ANA, ter um acesso perpétuo e incondicional ao mercado de handling. Foi reavaliado todo este contexto, tendo-se concluído que não era juridicamente possível alterar o modelo existente, já que tal obrigaria, por um lado, a que houvesse lugar a prováveis indemnizações muito significativas e, por outro, não dispensaria a abertura de concurso para a entrada de um operador independente de handling.
Do nosso ponto de vista, a constituição da Portway não deveria ter sido feita dessa forma, mas também não é defensável quebrar os compromissos anteriormente assumidos.
Portanto, uma solução alternativa de resolução do problema que a Directiva nos coloca também não iria contribuir de modo algum para a resolução do problema financeiro da TAP e, como foi referido, poderia até dar um contributo ainda mais negativo, em termos concorrenciais, para a actividade de handling da própria TAP. Diria, pois, que, desse ponto de vista, trata-se de problemas independentes.
Foram suscitadas outras questões, nomeadamente sobre a modernização e a competitividade. A este propósito, devo dizer que o que está a fazer-se nesse domínio - trata-se de uma aposta consciente e ponderada - é no sentido do modelo de reestruturação de uma empresa que tem em vista a sua competitividade e a sua modernização.
Não há, de facto, uma fragmentação, palavra que não se usou até agora mas que parece estar subjacente a algumas das apreciações que foram feitas. Há, tão-só, uma reestruturação empresarial com claras vantagens para o universo TAP, em que se passa de uma mega-empresa - chamemos-lhe assim - com negócios distintos para a forma organizativa de um modelo empresarial. Mantém-se intacta a unidade de gestão, bem como o contexto das relações e os acordos laborais e permite-se aproveitar as vantagens da existência de negócios específicos, tendo como clientes quer a empresa de transporte aéreo, quer terceiros, ou outras companhias aéreas.

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O facto de em nenhuma destas empresas haver parceiros estratégicos pode constituir uma enorme mais-valia e não significa perda de qualquer componente da actividade da actual empresa.
Estamos, pois, conscientes de que a aposta neste modelo não só é a possível mas é, de facto, a melhor e que, cremos, conduzirá à solidificação e à sustentabilidade da empresa. Repito que não é uma operação de curto prazo; é, antes, a operação que, no curto prazo, permite a viabilidade a longo prazo.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quanto a outras questões que foram referidas, não querendo repetir-me, diria que os vectores principais passam pela consolidação do modelo - como já disse, a sociedade TAP, SGPS acabou de ser constituída através de documento legal -, pela consequente criação de três bem distintas áreas de actividade, mas ligadas entre si e tuteladas pelo accionista Estado.
Assim, está agora nas nossas mãos, com esta aposta de privatização da sociedade Handling, garantir a marca "TAP", a qual, como sabem, também por razões concorrenciais, não pode constar da própria denominação da empresa Sociedade Portuguesa de Handling, sendo, no entanto, possível, através de um acordo parassocial e dos termos de referência do concurso que vamos levar por diante, garantir que essa imagem e essa marca se mantenham e disso também não abdicamos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Por último, outro aspecto fundamental - e também não quero repetir-me - é a total assumpção e defesa dos direitos e regalias dos trabalhadores, na medida em que é legalmente possível, pelo que já foi atempadamente indicado à administração para proceder em conformidade.
Uma última nota sobre uma aparente contradição que possa haver no modelo de gestão da empresa. De facto, a TAP tem um modelo de gestão que resulta da legislação portuguesa e que espelha as boas práticas de gestão europeias e mundiais do sector. Tem um conselho de administração cujo presidente é o primeiro responsável pela gestão estratégica da empresa e que determina o seu futuro.
O Conselho de Administração da TAP, nos termos dos artigos 406.º e 407.º do Código das Sociedades Comerciais, delegou as competências de gestão corrente num administrador delegado. No entanto, ao Conselho de Administração compete assegurar as grandes opções estratégicas, como, por exemplo, as relativas à reprivatização da TAP, sendo que, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, o órgão delegante não deixa de ser responsável pelas competências delegadas, pelo que mantém um dever de supervisão sobre a gestão da empresa.
Este é, aliás, um modelo que tem tido sucesso em muitos outros países na Europa, nomeadamente no sector do transporte, e, também por isso, estamos confiantes de que é o melhor rumo a traçar para a empresa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra para interpelar a Mesa sobre a condução dos trabalhos, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria que V. Ex.ª me confirmasse se as votações vão ser efectuadas às 18 horas, como está regimentalmente disposto.
Em segundo lugar, relativamente ao guião das votações distribuído, gostaria de saber se o Sr. Presidente aceitaria que a votação do projecto de deliberação n.º 18/IX, relativo à prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República, fosse adiada, a fim de o assunto ser ainda discutido na Conferência de Líderes. É que, a meu ver, há necessidade de ponderar um conjunto de marcações feitas para o mês de Junho, como as jornadas parlamentares, e há ainda os feriados.
Assim sendo, gostaria de saber se o Sr. Presidente poderia aceitar o adiamento desta votação para a próxima semana, depois da Conferência de Líderes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, quanto à hora das votações, o que está acordado entre nós é que elas se realizem às 18 horas e julgo que se devem manter a essa hora. É certo que, em relação à ordem do dia de hoje, há diplomas cuja discussão não vai estar terminada às 18 horas, mas esses serão votados oportunamente num próximo agendamento de votações.
Quanto à votação do projecto de deliberação n.º 18/IX, por mim apresentado, relativo à prorrogação do período normal de funcionamento da Assembleia da República, eu próprio já tinha pensado em retirá-lo, porque verifiquei, depois de o ter formalizado, que surgiram determinadas iniciativas dos grupos parlamentares, aliás, legalíssimas, que obrigam a repensar a organização dos nossos trabalhos para o mês de Junho e, eventualmente, para a primeira semana de Julho. Por isso, a minha intenção é retirar este diploma do guião das votações e, uma vez discutida a questão na Conferência de Líderes, haveremos de reformulá-lo em termos razoáveis, que permitam, por um lado, respeitar o mais possível o princípio constitucional, segundo o qual o Parlamento encerra a 15 de Junho, mas, ao mesmo tempo, atender também àquelas razões verdadeiramente urgentes que devem ser tidas em conta antes da interrupção constitucional.
Julgo que, com isto, ficam esclarecidos os pontos que o Sr. Deputado aflorou.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa sobre a mesma matéria.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, há pouco, tinha consultado a Mesa sobre a questão do período de votações e julgo que a solução a que a Mesa chegou e que, por meu intermédio, transmitiu à bancada do PS é a sensata e adequada. Não haverá dano sensível, até porque um dos diplomas, precisamente o do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, tem um pedido de baixa à Comissão sem votação, o que faz com que possa ser votado oportunamente - questão é que haja condições para chegar

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a um texto apurável em comissão, é este o nosso voto e o nosso desejo e para isso contribuiremos.
Em relação à segunda questão que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes comunicou à Câmara, gostaria só de registar a nossa surpresa, uma vez que esta questão tem vindo a ser discutida na Conferência de Líderes, desde há muito. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista tem insistido muito na clarificação do horizonte temporal dos trabalhos. Todos conhecemos a norma constitucional e as normas regimentais sobre o período de funcionamento da Assembleia da República. Aguardamos, portanto, com expectativa saber em que se traduz este período de pausa e de reflexão da maioria parlamentar e do Sr. Presidente, para que não se perca, em qualquer caso, aquele que foi o sentido das reflexões que fomos tendo sempre, de maneira muito transparente e concertada, na Conferência.
Portanto, o voto que posso deixar aqui exarado é o de que essa não seja uma surpresa desagradável e seja, em qualquer caso, devidamente fundamentada, como tenho a certeza de que, num cenário óptimo, será.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, deixe-me dar-lhe a mais firme garantia de que a questão será ponderada e a proposta que irei formalizar será o mais razoável possível.
De resto, já tive ocasião de trocar impressões com o presidente do seu grupo parlamentar sobre esta matéria, mas, de qualquer modo, quero discutir a questão em Conferência de Líderes. A minha intenção é a de assegurar que possamos ter nessa semana, uma vez que o dia 30 de Junho é uma segunda-feira, mais duas ou três reuniões plenárias, que nos permitam cumprir alguns trabalhos e efectuar votações no dia regimental, quinta-feira.
A minha ideia - mas quero ainda discutir a questão em Conferência de Líderes e só adianto isto para que, depois, não haja o efeito surpresa - seria a de substituir "30 de Junho" por "3 de Julho". De resto, tenho sido um dos mais extremos defensores do respeito da norma constitucional, segundo a qual os trabalhos terminam no dia 15 de Junho e reabrem no dia 15 de Setembro. O que está na Constituição, também neste domínio, deve ser para cumprir.
Esclarecida a questão, vamos continuar os nossos trabalhos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Finalmente!

O Sr. Presidente: - Para encerrar este debate de urgência, darei a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação e, depois, em nome do partido interpelante, ao Sr. Deputado Lino de Carvalho, dispondo ambos para o efeito de 5 minutos.
Tem a palavra o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação.

O Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Creio que não irei esgotar o tempo total, porquanto muito do que foi aqui debatido suponho já ter sido suficientemente esclarecido.
No entanto, quero, em primeiro lugar, congratular-me pela importância e pertinência deste debate. Foi extremamente útil. Pegando nas palavras do Sr. Deputado Miguel Coelho, tentarei continuar sempre a prestar a melhor atenção a todas as observações e comentários que me fazem chegar sobre esta ou qualquer outra matéria, pelo que, desde já, quero agradecer o contributo de todos neste debate.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes): - Muito bem!

O Orador: - Quero também realçar a grande sintonia que houve neste debate sobre a via a seguir, sentido esse global sobre esta matéria e adoptado pelo Partido Socialista, pelo PSD e pelo CDS-PP.
Efectivamente, PS, PSD e CDS-PP concordam com o Governo quanto à via da privatização a seguir e quanto à prudência e à responsabilidade necessárias em todo este processo, para, no fundo, conduzir a um consenso muito alargado, que é necessário, em torno de uma questão que, eu diria, é complexa, mas de grande interesse nacional.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Orador: - Por último, gostaria de dar um voto e transmitir um sinal de grande confiança. Confiança, em primeiro lugar, no futuro. Poderá o Sr. Deputado Bruno Dias dizer que é uma questão de fé. Acho que a fé sempre foi uma característica dos portugueses e, em muitos casos, levou a bom porto. Mas não é só uma questão de fé, é uma questão de acreditar.

Vozes do PCP: - É fé!

O Orador: - E nós acreditamos.

Risos do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vozes do PCP: - Logo, é fé!

O Orador: - Mais do que ter fé, é acreditar com convicção na solução que está aqui hoje a ser apresentada.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: - Muito bem!

O Orador: - Confiança também nas soluções. As soluções têm de ser vistas como uma forma perene e sustentável de uma viabilidade de uma empresa, que todos desejamos. Os resultados continuam a ser negativos, mas a situação melhorou, é verdade. Porém, ainda não se poderá dizer que estamos no caminho final da resolução. Com este caminho, sim, queremos ter uma confiança nas soluções que vamos perfilhar.
Finalmente, confiança nos trabalhadores. Têm sido eles os garantes e o sustentáculo da empresa…

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Ainda bem que o reconhece!

O Orador: - … e são eles a aposta e a viabilidade dessa mesma empresa.
Confiança, em última análise, na TAP, para que possa servir e continuar a servir bem o País e o interesse nacional.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Valeu a pena o PCP ter suscitado este debate de urgência. E valeu a pena, primeiro, porque o Governo confirmou a total ausência de uma visão estratégica para o transporte aéreo, em Portugal, e entrou em várias contradições. A única perspectiva que anima o Governo é o de privatizar, privatizar, privatizar! O Sr. Ministro, aliás, até disse aqui que a TAP, enquanto empresa pública, é um valor de modernidade e um elo de ligação com as comunidades, presta um serviço de qualidade e em segurança e até apresenta indicadores de recuperação económica. Mas, mesmo assim, privatiza-se. É irracional! A única lógica que preside a esta estratégia é de facto a lógica dos serviços em relação aos interesses privados e aos compromissos privados a que o Sr. Ministro aqui se referiu e que teremos de vir a esclarecer.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Segundo, valeu a pena, porque ficaram desmontados os argumentos do Governo para desmantelar - porque é desmantelar, Sr. Deputado - a TAP, segmentando-a em empresas juridicamente autónomas. Esta decisão, irracional do ponto de vista dos interesses da TAP e do contributo que as três áreas de negócios - operação aérea, manutenção e assistência em escala - dão, através das sinergias que criam, para o equilíbrio financeiro global da empresa, só tem um sentido: criarem-se melhores condições para a privatização da TAP, uma vez que cada uma das áreas tem interessados diferentes.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Segmentar, neste quadro concreto, é obviamente condição para privatizar.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Nada tem a ver com uma melhor gestão da empresa, que pode ser feita, Sr. Deputado Anacoreta Correia (como sabe, porque é gestor de empresas), através de áreas de negócios próprias, sem que tal implique o desmantelamento da empresa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Terceiro, valeu a pena porque é falsa a argumentação quanto à obrigação, por imposição da directiva comunitária, de alienar a assistência em escala. Aliás, o Sr. Ministro, hoje, já recuou nesse argumento, já inventou um outro argumento, já veio aqui dizer que havia compromissos que tinham de se respeitar. O Sr. Ministro vai ter de explicar, em sede de comissão, que compromissos são esses.

Vozes do PCP e de Os Verdes: - Exactamente!

O Orador: - Sem prejuízo da nossa discordância de fundo quanto aos fundamentos da directiva, a verdade é que nada nela obriga, como aqui já foi dito, a que a TAP tenha de privatizar a sua assistência em escala. Por que não se mantém esta no operador público? Por que é que se vai criar uma situação em que a TAP vai ter de passar a comprar a terceiros (mais caro) o serviço que ela própria agora presta a si mesma?

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - E, agora, com as notícias que vieram a público, o que se perspectiva é a transferência da assistência em escala para um único operador privado.
Quarto, valeu a pena porque ficou patente a contradição entre uma política de recuperação da empresa, para a qual os trabalhadores têm contribuído de forma sacrificada e decisiva, e a privatização. A TAP tem tido situações desequilibradas e, durante esse período, pertence ao sector público. Há um esforço, orçamental, dos gestores e dos trabalhadores, para reequilibrar a empresa. E agora, que já está (segundo os dados da própria administração e do Governo) a caminho do equilíbrio financeiro, a caminho inclusivamente de poder dar lucro, entrega-se aos privados.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - É uma vergonha!

O Orador: - O Estado assumiu os prejuízos. Agora que a empresa está recuperada, entrega-se, com lucros, aos privados. É esta a lógica, Srs. Deputados! É esta a lógica!
Quinto, valeu a pena porque também se percebeu que o recente conflito entre o boy do PSD, arvorado em presidente do Conselho de Administração, e o administrador delegado tem tudo a ver com a necessidade de os interesses privatizadores poderem manobrar mais à vontade e não tanto com os vencimentos dos gestores, que serviram tão-somente para desviar a atenção do essencial.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Aliás, o Presidente do Conselho de Administração Cardoso e Cunha nunca escondeu, nem sequer aqui na Comissão, que o único mandato e imperativo que recebeu do Governo foi para privatizar, rapidamente, em força e em quaisquer condições.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - Já chega, Sr. Ministro e Srs. Deputados, de experiências com a TAP. Ainda está bem presente na memória dos portugueses todo o processo da Swissair - aliás, o PSD e o CDS-PP, na altura, apoiaram o PCP contra esse processo e a favor da manutenção de uma empresa una, mas, agora que chegaram ao Governo, já mudaram de opinião!

Vozes do PCP: - Já se esqueceram!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi mal feito!

O Orador: - Ainda está presente na memória esse processo e ao que levou a precipitação e a incompetência com que foi conduzido. E não venham dizer que só com a entrada de parceiros privados é que é possível ter uma estrutura financeira saudável. Mesmo numa conjuntura difícil para o transporte aéreo, a vida tem demonstrado exactamente o contrário. E nada impede que as necessárias

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parcerias estratégicas, que defendemos, se façam enquanto empresa pública.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - O desmantelamento e a privatização da TAP ao que pode levar, a prazo, é que o processo de reorganização do transporte aéreo na Europa se faça em sério prejuízo da TAP, se nela se sobrepuserem os interesses privados aos interesses nacionais. Nesse quadro, a possibilidade de a TAP se transformar num mero operador regional, subsidiário de alguma grande companhia, é uma perspectiva bem real. E, então, não vale a pena voltarem a verter-se lágrimas sobre o desaparecimento dos centros de decisão nacionais, porque estes só podem salvaguardar-se quando se puser termo a políticas irresponsáveis ao serviço de interesses alheios ao interesse nacional, como aquelas que estão em curso para a TAP.
Da nossa parte, Grupo Parlamentar do PCP, que à defesa da TAP, como operador aéreo público, como empresa una, temos dedicado uma parte efectiva do nosso trabalho, continuaremos a lutar nesse sentido.
E quanto ao argumento ad terrorem, de que se a TAP não for privatizada é encerrada e os trabalhadores perdem o seu emprego, faz-me lembrar um outro argumento do ex-Ministro Jorge Coelho, em tempos, de que se não se entregasse a TAP à Swissair não haveria salários para pagar no mês seguinte.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - O argumento é do mesmo tipo.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - É igual!

O Orador: - Sr. Presidente, como este debate foi percorrido por várias contradições e obscuridades da parte do Governo, permita-me que anuncie que queremos prossegui-lo, em sede de comissão, onde iremos propor um conjunto de audições, que envolva a administração, que continue a envolver o Governo e que envolva os trabalhadores e especialistas do transporte aéreo, para continuarmos a discutir e a acompanhar o futuro da TAP, enquanto companhia de bandeira, pública, una, ao serviço do interesse nacional.

Aplausos do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições e antes de dar por encerrado o debate, como passageiro frequentíssimo da TAP, há várias dezenas de anos a viajar na TAP mais do que uma vez por semana, quero congratular-me com a declaração feita pelo Sr. Ministro quanto ao empenho do Governo na manutenção e fortalecimento da nossa companhia de bandeira, que tem sido, manifestamente, um grande factor de prestígio para o nosso país.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Agora, sim, dou por encerrado o debate de urgência, requerido pelo PCP, e vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei n.º 24/IX - Cria o sistema de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes (PS) e do projecto de resolução n.º 64/IX - Sobre a informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico (Os Verdes).
Para apresentar o projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei ora em discussão visa criar um sistema complementar de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes no meio hídrico.
Este projecto de lei conjuntamente com um outro por nós já apresentado, que estabelece medidas de protecção da orla costeira, com a introdução do princípio da recarga das nossas praias com areias provenientes de extracções efectuadas a 1 km da linha de costa, constituem um exemplo real da defesa e protecção ambiental, que todos estamos obrigados a salvaguardar. E a nossa maior riqueza, a verdadeira riqueza do homem, está no bem que possamos fazer ao ambiente.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os inertes e, sobretudo, as areias, quer sejam do leito dos rios, da orla costeira ou dos sistemas lagunares, são um bem público que é fundamental preservar e que o Estado tem a obrigação, e o dever, de saber gerir como um bem que lhe pertence e pertence a todos os portugueses.
Reconhecemos que em algumas situações se torna necessário e imprescindível proceder a dragagens e desassoreamentos em parcelas do nosso meio hídrico, uma vez que estes assoreamentos podem constituir eles próprios não só um problema ambiental mas também uma questão de segurança marítima.
Todavia, estas dragagens terão de ser disciplinadas e os seus proveitos deverão ser postos ao serviço do ambiente e não de interesses económicos, por mais legítimos que se nos apresentem.
Aceitamos hoje que a extracção de areias é uma actividade económica reconhecida e classificada, que pode e deve ser executada em conformidade com a legalidade, a par de outras que exploram bens comuns, como sejam as extracções minerais, de rochas ornamentais ou outras.
Os agentes económicos que exercem a sua actividade neste sector não podem estar permanentemente sobre suspeita e muito menos podem ser considerados empresários desqualificados e o seu trabalho marginal à economia nacional.
Estamos certos de que a esmagadora maioria dos empresários que se dedicam à extracção de inertes exercem a sua actividade dentro da maior legalidade e são respeitadores das normas e leis em vigor no País. Mas também não nos custa aceitar que, como em qualquer outro sector económico, esta actividade esteja sujeita a algumas irregularidades, que devemos condenar e o Estado deve punir. É exactamente para prevenir eventuais irregularidades que o Estado deve aperfeiçoar os mecanismos de controlo e fiscalização, utilizando para esses fins as tecnologias mais modernas, que hoje estão ao seu dispor.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A intervenção do homem no meio hídrico, com o aproveitamento hidroeléctrico dos nossos rios, veio provocar uma permanente instabilidade dos seus leitos, com consequências ainda hoje não completamente identificadas. Esta instabilidade do leito dos rios deriva sobretudo de alterações das suas correntes e da diminuição dos seus caudais sólidos.

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Estes dois fenómenos associados induzem à diminuição da produção de areias e inertes e o seu depósito em locais menos apropriados provocam assoreamentos que urge serem corrigidos permanentemente. Estas correcções, indispensáveis para garantir a segurança à navegação, devem ser cirúrgicas para minimizar os efeitos negativos no ambiente e nos ecossistemas, que, de um modo geral, são extremamente sensíveis.
É, pois, neste quadro de obrigatoriedades técnicas que se têm processado os licenciamentos de dragagens que hoje se estão a operar.
Embora nos últimos anos se tenha assistido a alguma disciplina na exploração de areias, todos consideramos que é necessário um maior rigor nestas operações, especialmente na adopção de medidas mais adequadas e eficazes em matéria de vigilância, com especial enfoque no aumento do controlo e fiscalização do exercício da sua actividade no meio hídrico.
A monitorização contínua, via satélite, das embarcações de dragagem e extracção de inertes constitui um instrumento privilegiado no reforço da sua fiscalização e controlo, permitindo aumentar a vigilância das áreas onde aquelas actuam, garantindo ainda este sistema de monitorização que as embarcações só operem em zonas autorizadas e extraiam as quantidades devidamente licenciadas.
A instalação deste sistema é uma obrigatoriedade que deve ser entendida, na perspectiva de tornar a actividade de dragagens e extracção de inertes mais transparente e cada vez mais limitada e condicionada, pelos impactos negativos que provoca nas áreas onde esta actividade é exercida.
Temos, pois, consciência das nossas responsabilidades, manifestando sempre a nossa disponibilidade para, em sede de especialidade, melhorar e aperfeiçoar este diploma. Aguardamos, assim, o sentido de Estado desta Câmara para viabilizar esta iniciativa, que em muito contribuirá para garantir a preservação e conservação do ambiente e dos nossos recursos naturais.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Joana Amaral Dias.

A Sr.ª Joana Amaral Dias (BE): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, sabemos que muitos dos nossos recursos naturais têm estado sujeitos ao saque e à delapidação, tendo, frequentemente, esse saque contado com a permissividade das entidades fiscalizadoras. E a visão, reducionista e perigosa, de que os rios são meros depósitos de areia é disso um exemplo bastante ilustrativo, pelo que nos congratulamos, como é evidente, com a iniciativa apresentada hoje pelo Partido Socialista.
Os areais são um recurso de todos, pelo que deveriam ser explorados de forma ordenada, evitando desequilíbrios ambientais. E o anarquismo deste recurso natural tem, por um lado, um forte impacto ambiental, com uma destruição de solos com aptidões agrícolas e florestais, a possibilidade de alterações no nível freático, ou mesmo a contaminação desses mesmos lençóis freáticos, que se poderá agravar, como o Sr. Deputado saberá, com as alterações climáticas que fazem aumentar o nível do mar, mas também tem um rombo grande no nível de segurança das vias fluviais navegáveis e na entrada dos portos.
Neste sentido, consideramos que é, de facto, urgente a actuação das entidades fiscalizadoras para punir os prevaricadores, de molde a obrigá-los a repor a situação original, nomeadamente a terraplanagem e a reposição do coberto florestal.
Sr. Deputado, embora este sistema de monitorização por satélite seja, com certeza, um excelente aproveitamento dos recursos de alta tecnologia, que se justifica tendo em conta este contexto e a importância desta questão, gostaríamos de saber se não considera que a aplicação deste recurso deveria ser feita num contexto diferente, nas áreas que têm sido escândalo nacional, e há muitas reclamações de vários movimentos civis sobre a extracção de areias feita por várias instituições, concedendo apenas os licenciamentos para as áreas que foram objecto de um estudo aprofundado de identificação como passíveis de aí se poder proceder à extracção de areias. Não acha que seria da maior pertinência proceder-se a uma breve avaliação do impacte ambiental, para que esta medida não seja apenas um enorme dispêndio para a tutela, não se obtendo depois um resultado eficiente do avanço que se pretende com ela. Gostaríamos de saber, nomeadamente, qual é a viabilidade da implementação deste sistema em todos os rios, de Norte a Sul, nas zonas costeiras, nos sistemas lagunares, etc.
Enfim, no entender do Bloco de Esquerda, a alteração radical desta situação de impunidade com que é exercida esta actividade, que muitas vezes tem sido ilegal e que tem sido denunciada, é importante e pensamos que este projecto de lei, que é, com certeza, da maior pertinência, obrigará a um enquadramento mais vasto.
Por último, quanto ao que tem sido as coimas aplicadas e a revisão das mesmas, deixo uma nota sobre a exigência de um depósito bancário, com o objectivo de assegurar a reposição e reparação dos efeitos da extracção indevida.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Joana Amaral Dias, começo por agradecer-lhe o facto de ter concordado com esta iniciativa legislativa e de ter salientado a sua importância, contudo, quero dizer-lhe duas coisas: primeiro, os custos não são tão elevados quanto aparentemente parecem, porque, hoje, já há equipamentos deste tipo no mercado, o que diminui, obviamente, os custos; segundo, é evidente que este é um sistema complementar de fiscalização das embarcações licenciadas para operar na extracção de inertes.
É evidente que o licenciamento depende, como é óbvio, de estudos e, aliás, por iniciativa do governo do Partido Socialista, não houve qualquer licenciamento de extracção de inertes que não tivesse obedecido a um estudo feito pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, nomeadamente os realizados no Tejo e no Douro.
Ora, isto significa que estes estudos são demasiado importantes, é assim que os consideramos, e também achamos importante a utilização de novas tecnologias, nomeadamente as via satélite, para apoiarem a elaboração desses estudos. Porém, isto não depende de uma lei mas, sim, dos estudos e de quem for encarregado de os elaborar.
Portanto, dá-me ideia de que há aqui duas questões diferentes: uma, é a fiscalização complementar, que procuramos colocar nas embarcações licenciadas, e, outra, são os estudos feitos para se poderem conceder os licenciamentos.

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Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para apresentar o projecto de resolução n.º 64/IX, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A extracção de areias é, desde há longos anos, um grave problema ambiental em Portugal.
Uma actividade industrial, em regra, dificilmente pouco controlada, caótica, exercida sem eficaz fiscalização, não sustentada por estudos de impacte ambiental, raramente circunscrita às únicas razões que legalmente a sustém, o desassoreamento e a reposição das condições naturais.
Quem o afirma são não só Os Verdes, quem partilha a nossa opinião e quem a validou foram os múltiplos testemunhos de entidades insuspeitas, reputados técnicos, em audições parlamentares por nós realizadas e em depoimentos realizados no âmbito do inquérito feito aquando da queda da ponte de Entre-os-Rios.
Dados que convergem na identificação de um fosso entre o País legal e o País real; um define os requisitos a que deve subordinar-se esta actividade extractiva; o outro é aquele em que a extracção continua a ser um verdadeiro "negócio das arábias" e uma riqueza pilhada como um verdadeiro "petróleo branco". Uma pilhagem que a própria Administração Pública, através dos institutos portuários e entidades por si tuteladas, tem, ela própria, protagonizado, muitas vezes através de dragagens, que mais não são do que explorações encapotadas, que representam uma fonte certa de receitas e de reequilíbrio orçamental, como, anualmente, o estudo dos relatórios e contas, invariavelmente o evidenciam, desde os portos do Algarve aos do Minho.
Um absurdo a que se soma outro, como o de se permitir que em áreas protegidas, como, por exemplo, a de São Jacinto, se extraiam, sob jurisdição do porto de Aveiro, mais de 350 000 m3/ano de areia, que rendem valores na ordem dos 2,25 milhões de euros, e, simultaneamente, a jusante, precisamente em consequência dessa extracção e procurando travar o fenómeno de erosão assim agravado, se alimentem com areias as praias da Costa Nova ou da Barra, o que naturalmente custa ao erário público rios de dinheiro.
O absurdo de uma actividade, que, segundo os últimos dados do INE, nos permite estar perante um negócio na ordem dos 290 milhões de contos, razões da apresentação deste projecto de resolução.
Um diploma que visa enfrentar uma situação que, não obstante modificações pontuais e circunscritas territorialmente ao rio Douro, em nosso entendimento, continua a existir no País, designadamente pela falta de uma abordagem integrada e de um conhecimento e diagnóstico exactos da mesma - é este o objectivo que pretendemos ultrapassar com esta iniciativa legislativa.
Uma iniciativa que, recordo, foi, em Maio de 2001, juntamente com outras iniciativas, debatida nesta Câmara e que foi inviabilizada por dois empates sucessivos.
Uma iniciativa que nos parece manter toda a pertinência e oportunidade.
É, fundamentalmente, uma iniciativa com o objectivo de mandatar a Administração para: um recenseamento e publicitação de todos os locais ao nível da bacia hidrográfica e do litoral, onde foi autorizado o licenciamento de extracção de inertes; a elaboração de uma listagem de todas as actividades de extracção licenciadas; a informação disponibilizada sobre as acções de fiscalização realizadas; e a informação, que nos parece da maior importância, sobre os estudos que, aquando do inquérito parlamentar, independentemente de constarem da recomendação da Assembleia, continua a não ser dada. Uma necessidade que, a nosso ver, implica, ainda - e, porventura, este o dado mais importante do nosso projecto de resolução -, a implementação da monitorização em todo o território, para que se saiba aquilo que está a ser feito, ou aquilo que, não o sendo, é forçoso fazer.
Em suma, Sr. Presidente e Srs. Deputados, um passo, que consideramos mínimo mas, em todo o caso, elementar, para garantir transparência, disciplina e, sobretudo, resolver um problema que é demasiado complexo e sério para poder continuar a ser adiado.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Gomes, que é o orador que se segue, estando a ser 18 horas, hora regimental de votações, vamos interromper o debate e proceder à votações dos diplomas agendados para hoje.
No entanto, antes de mais, lembro os Srs. Deputados de que foi adiada da véspera do 25 de Abril para a véspera do 1.º de Maio a apresentação do livro do ex-Presidente da Assembleia da República Almeida Santos, e, por coincidência, eu também vou apresentar um livrinho, em conjunto, porque, certamente, muitos quererão participar na apresentação, e que terá lugar logo a seguir às votações.
Por conseguinte, peço já ao Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho para dirigir os trabalhos após as votações. Espero poder voltar entretanto, mas, se, porventura, a apresentação do livro do Dr. Almeida Santos estiver muito animada, peço desde já também ao Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró para dirigir a última parte dos trabalhos, porque o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho está inscrito para intervir no último ponto da ordem de trabalhos.
Srs. Deputados, vamos, finalmente, dar início às votações, começando pela verificação do quórum de votações nos termos habituais, para o que terão de introduzir o respectivo cartão electrónico no sistema.

Pausa.

Não vale a pena os Srs. Deputados retardatários introduzirem os cartões, porque já não vão ser registados, visto já estar ligado o sistema.
Peço aos Srs. Deputados que carreguem na tecla "sim", que é a verde, para marcar a presença.

Pausa.

Encontram-se presentes na Sala, de acordo com o quadro electrónico, 134 Srs. Deputados, pelo que temos quórum de votação para proceder às votações. Há, no entanto, mais Srs. Deputados presentes, que, por terem chegado tardiamente, não puderam introduzir o respectivo cartão no sistema e, por isso, não foram registados no sistema.

O Sr. José Lello (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, confesso - e V. Ex.ª perdoar-me-á - que não gostaria de ser considerado

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relapso a introduzir o cartão no sistema. O sistema é que está mal feito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quando eu estava a pedir que introduzissem os cartões, V. Ex.ª conversava amenamente na terceira fila do Hemiciclo.

Vozes do PSD e do CDS-PP: - É verdade!

O Sr. Presidente: - Lamento!

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, eu não conversava quando V. Ex.ª disse isso.

O Sr. Presidente: - Eu vi perfeitamente, Sr. Deputado. Tenho muita pena!

O Sr. José Lello (PS): - Eu não conversava…

O Sr. Presidente: - Talvez o registo em vídeo possa tirar esta dúvida.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, quando quiser, vamos a registar tudo o que se diz e aquilo que V. Ex.ª também diz aqui.

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado José Lello. Com certeza, aliás, está tudo registado, Sr. Deputado. Então, o que eu digo está tudo registado!
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do projecto de resolução n.º 149/IX - Viagem do Presidente da República à Estónia, à Letónia e à Lituânia (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 46/IX - Procede à segunda alteração da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto (Lei de enquadramento orçamental).

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD, do CDS-PP, do PCP e de Os Verdes e votos contra do PS e do BE.

A proposta de lei n.º 46/IX baixa à 5.ª Comissão, para a discussão na especialidade.
Vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 55/IX - Altera o n.º 22 do artigo 11.º e o artigo 33.º do Código da Sisa e do Imposto sobre as Sucessões e Doações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 41 969, de 24 de Novembro de 1958.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, atendendo à urgência deste processo legislativo, venho requerer que a baixa à 5.ª Comissão seja por oito dias.

O Sr. Presidente: - Defiro o requerimento, Sr. Deputado. E, assim, a proposta de lei n.º 55/IX baixa à 5.ª Comissão, para apreciação na especialidade, por um prazo de 8 dias.
Srs. Deputados, visto a discussão do projecto de lei n.º 24/IX e do projecto de resolução n.º 64/IX ainda não estar concluída e estar ainda por fazer o debate do projecto de lei n.º 165/IX não podemos proceder às respectivas votações.
Por isso, vou dar a palavra ao Sr. Secretário da Mesa para proceder à leitura de três pareceres da Comissão de Ética, que terão de ser votados.
Tem a palavra, Sr. Secretário.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho - Processo n.º 252/02.1TAESP -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Montenegro (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o parecer está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votá-lo.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção do 4.º Juízo do Tribunal Criminal de Lisboa - Processo n.º 20830/97.8TDLSB -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Jorge Neto (PSD) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Visto não haver pedidos de palavra, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Secretário (Manuel Oliveira): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção da 14.ª Vara Cível de Lisboa - Processo n.º 591/1999 -, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Narana Coissoró (CDS-PP) a prestar depoimento, por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em apreciação o parecer.

Pausa.

Visto não haver objecções, vamos votá-lo.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Srs. Deputados, terminadas as votações, vamos retomar o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 24/IX e do projecto de resolução n.º 64/IX.

O Sr. José Lello (PS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Lello (PS): - Sr. Presidente, é para informar V. Ex.ª que a partir deste momento me recuso a utilizar o cartão electrónico, que não está personalizado, num sistema que não funciona e que leva a um conjunto de incidentes, como o que hoje sucedeu, que são extremamente prejudiciais para o bom nome e dignidade da Assembleia da República e até para o relacionamento institucional com V. Ex.ª.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Lello, não sei se essa recusa é regimental.

Risos.

Vou mandá-la à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para a apreciar.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Lino de Carvalho.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gomes.

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje uma iniciativa do Partido Socialista, que tem como objectivo a criação de um sistema de vigilância e de controlo do exercício da actividade de dragagem e extracção de inertes nas principais linhas de água de Portugal.
Com os infelizes acontecimentos que têm vindo a ocorrer nos últimos anos e com as proporções de que, como é público, se revestem estas situações, cabe à Assembleia da República e ao Governo de Portugal encontrar o enquadramento necessário, por forma a que estes acontecimentos possam ser naturalmente evitados.
É urgente evitar a ocorrência de tragédias materiais, mas, sobretudo, humanas, em que, na maioria das situações, a própria história não consegue ultrapassar as más memórias e as feridas que nos deixam a todos.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado Luís Gomes, peço desculpa por o interromper, mas quero pedir aos Srs. Deputados que quiserem sair o favor de o fazer e aos que ficam que criem as condições para que o Sr. Deputado se faça ouvir.
Pode prosseguir, Sr. Deputado Luís Gomes.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
A engenharia tem respostas. Cabe a nós, políticos, darmos corpo e substância legal às mesmas.
Neste quadro, importa reflectirmos de forma lúcida e inteligente no problema, por forma a que a solução possa surgir com naturalidade, contribuindo para a sua resolução efectiva.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os problemas decorrentes da ausência de ordenamento fluvial são por demais evidentes e praticamente a sua totalidade é do conhecimento geral. Neste contexto, importa, assim, sabermos ultrapassá-los, através de soluções efectivas e estruturantes, que atenuem possíveis danos públicos e que permitam, fundamentalmente, a segurança das populações e o equilíbrio ecológico das principais linhas de água do nosso país.
Não podemos, porém, equacionar as soluções sem que seja feita uma reflexão séria acerca dos problemas actualmente existentes. A título de exemplo, gostaria de destacar os seguintes: em primeiro lugar, as intervenções que alteram o equilíbrio dos leitos dos rios; em segundo lugar, a construção de infra-estruturas em zonas de erosão dos rios, que podem acabar por ser destruídas por descalçamento da sua estrutura, sempre que não se tomem as devidas precauções; em terceiro lugar, as intervenções que conduzem a uma destabilização das margens dos rios, provocando cheias em determinadas alturas do ano; em quarto e último lugar, a construção de esporões ou de barragens que acentuam a criação de processos de erosão a jusante e que pode levar a uma situação extrema, como a queda de pontes, ou alteração das margens e dos leitos dos rios.
Este é, infelizmente, o quadro actual em muitas zonas do nosso país. Contudo, devemos ter sempre presente que a sua resolução deve encerrar uma política de intervenção estruturada, em que se estudem todas as variáveis inerentes, de modo a compatibilizar as legítimas expectativas das actividades económicas com o equilíbrio fundamental e a segurança das populações, que, naturalmente, se exige.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O projecto de lei apresentado hoje a esta Câmara pelo Partido Socialista e também o projecto de resolução apresentado por Os Verdes não constituem resposta às preocupações e aos desafios aqui enunciados.
Permita-me, Sr. Deputado Renato Sampaio, que lhe diga que o projecto de lei que V. Ex.ª aqui apresenta em nome do Partido Socialista constitui uma iniciativa avulsa, cujo contexto só se percebe como uma suposta manobra para marcar a agenda política, quando os senhores não trataram deste problema nos seis anos em que governaram o nosso país.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Aliás, VV. Ex.as já não conseguem disfarçar tal pretensão, pois nem sequer esperaram que o Governo legislasse sobre esta matéria.

Vozes do PS: - Era o que faltava!

O Orador: - O projecto de lei que VV. Ex.as apresentam à discussão nesta Câmara, em nossa opinião, encerra um conjunto de enfermidades que importa naturalmente sublinhar.
Em primeiro lugar, carece de enquadramento institucional. O n.º 2 do artigo 1.º estabelece que o sistema MONICAD seria aplicado em todo o território nacional, mas, no entanto, atribui à Inspecção-Geral do Ambiente toda a fiscalização desse sistema. Não se percebe como é que se articula este mandato com as competências próprias das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.

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Por outro lado, a Lei Orgânica da Inspecção-Geral do Ambiente não enquadra a função que o Partido Socialista pretende como entidade fiscalizadora do chamado sistema MONICAD. Convém sublinhar que os organismos com competência, à luz da legislação em vigor sobre esta matéria, para atribuição de licenças de extracção de inertes, para além, como é do conhecimento de VV. Ex.as, das competências próprias dos organismos portuários, são as direcções regionais do ambiente e do ordenamento do território.
Neste contexto, não se percebe como é feita - e, pelos vistos, este ponto essencial não foi devidamente equacionado no projecto de lei por VV. Ex.as apresentado - a articulação entre as várias entidades licenciadoras e a entidade fiscalizadora. Como é que esta última entidade tem conhecimento das quantidades de inertes que foram devidamente autorizadas dragar? Como é que esta entidade tem conhecimento da validade e vicissitudes que o título de extracção entretanto sofreu, admitamos por hipótese? Esta é uma competência que deverá ser remetida a uma Inspecção-Geral do Ambiente? Dita-nos o bom senso que as entidades que emitem uma licença possam também partilhar, a par de outras, a fiscalização do cumprimento da mesma.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Segunda enfermidade: o projecto de lei que V. Ex.a apresenta carece de operacionalidade e de razoabilidade. O projecto de lei do Partido Socialista, ao estabelecer a obrigação da instalação deste sistema para todas as embarcações, indistintamente, garante a inviabilidade de todas as empresas que não terão capacidade financeira para suportar a sua instalação, manutenção e monitorização, cujos custos aparentam ser elevados, embora o texto apresentado não tenha tido por base, ao que conhecemos, qualquer dado objectivo ou mesmo meramente indicativo relativamente a custos com a implementação do sistema - aquisição, manutenção e formação de técnicos. Também não se sabe se, na prática, um projecto como este funcionaria, pois nunca, Srs. Deputados, foi testado.
Em resumo, estar-se-ia a obrigar que todos os agentes do sector cumprissem um dispositivo legal, que ninguém sabe se funciona. Deveria ter sido, desde logo, proposta uma fase de investigação preliminar ou apresentados dados que comprovassem a eficácia das medidas a adoptar.
Sr.as e Srs. Deputados, legislar sobre uma solução experimental pode consubstanciar, em nosso entender, uma irresponsabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Terceira enfermidade: carece de enquadramento estratégico e de uma abordagem integradora das políticas de ordenamento do território e do ambiente.
A extracção de inertes deve assentar numa política global e integrada de ordenamento das linhas de água e em função das suas especificidades. O Plano Nacional da Água e os diferentes planos de bacia, já elaborados, reflectem, de resto, a necessidade de se proceder à elaboração de planos de ordenamento de extracção de inertes. E é em sede destes instrumentos que é oportuno definir-se o quadro da intervenção no que respeita à extracção de inertes, bem como às dragagens, incluindo, naturalmente, a definição dos meios de monitorização destas actividades, bem como os seus impactes ambientais.
É forçosamente importante, neste sentido, que as decisões a tomar nesta matéria e em sede própria tenham em conta as disponibilidades de inertes existentes e também os condicionalismos de natureza física, morfológica ou ecológica das zonas onde se realizam.
Neste âmbito, e numa perspectiva integrada de equação do problema da extracção de inertes, o Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente determinou, através de um despacho normativo, um conjunto de normas técnicas, tendentes à elaboração de planos específicos de gestão da extracção de inertes em domínio hídrico e estabeleceu também como prioritária a elaboração dos planos específicos para os rios Cávado, Douro, Lima, Mondego, Tejo, Vouga e Zêzere.
Deste modo, é possível saber, Srs. Deputados, com exactidão quais os locais onde é necessário extrair inertes e as quantidades a extrair em cada um desses locais e como proceder a essa extracção, em perfeito equilíbrio com o ambiente e, naturalmente, com a biodiversidade.
Não interessa ter um sistema de vigilância e de controlo nas embarcações e, depois, permitir-lhes que extraiam quantidades em muito superiores, ou inferiores, ao necessário, ou até mesmo em locais não adequados. Há que começar pelo princípio.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este diploma, embora apresente uma tentativa de resposta, insuficiente a nosso ver, para a vigilância e controlo da actividades de dragagens e extracção de inertes, e por esse motivo seja digno de algum mérito, não faz qualquer sentido, pois não integra um todo coerente e estruturado.
Permita-me V. Ex.ª ainda dizer que esta iniciativa constitui um espelho da actual política do Partido Socialista, pois nem sequer enquadra o seu espírito com os planos e documentos elaborados quando VV. Ex.as eram governo.
Para terminar, estas iniciativas legislativas surgem como peças soltas, quando deveriam integrar um todo; diria mesmo que pretendem construir a casa pelo telhado e só depois construir as fundações. Não nos admira, assim, que, enquanto governo, VV. Ex.as tivessem contribuído para a derrocada de Portugal.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o seu tempo.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Face às condições aduzidas, a posição de voto do PSD depende da manifestação de vontade dos Grupos Parlamentares do Partido Socialista e do Partido Ecologista "Os Verdes" em fazer baixar à 4.ª Comissão estes diplomas, a fim de lhes serem efectuados os necessários melhoramentos.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Srs. Deputados, apesar de compreender as razões que levaram muitos Srs. Deputados a ausentarem-se da Sala para assistir ao lançamento dos livros do actual e do ex-Presidente da Assembleia da República, apelo às bancadas, sobretudo às que estão mais desguarnecidas, que criem as condições para que se mantenha o quórum de funcionamento.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Principalmente ao PS!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Renato Sampaio e Isabel Castro.
Tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Gomes, em primeiro lugar, quero dizer-lhe que este contributo que apresentámos na Assembleia não pretende ser uma lei-quadro da extracção de inertes mas, sim, um contributo complementar para a fiscalização desta actividade.
O Sr. Deputado confunde licenças de extracção com licenças das embarcações para operar e o estudo dos locais para extracção de inertes com os próprios locais onde eles devem ser extraídos. E quero dizer-lhe que sobre isto nós, no PS, não recebemos lições de ninguém, porque fomos o partido que no governo mais moralizou esta problemática, pois autorizou a extracção de inertes através de estudos elaborados pelo LNEC e, por outro lado, fê-lo em concurso público e não à margem de nada.
O Sr. Deputado falou na questão dos custos. Pergunto-lhe: o Sr. Deputado fez algum estudo? Qual é o custo efectivo que tem para a instalação destes equipamentos?
O Sr. Deputado também diz que os operadores iriam à falência. Ó Sr. Deputado, se lesse as notícias da LUSA, constatava facilmente que a Associação das Empresas de Dragagens do Norte, por exemplo, está de acordo com a implementação deste sistema e que os operadores que estão a operar no rio Tejo já o têm,…

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Muito bem!

O Orador: - … o que significa que este é um bom sistema para a fiscalização.
Por outro lado, o Sr. Deputado fez uma grande crítica a este projecto de lei e terminou dizendo: "Bem, nós vamos melhorá-lo, vamos dar contributos na Comissão para o melhorar". Quero saber em que é que ficamos. Se acha que ele pode ser melhorado, isso significa que ele é bom, e, sendo bom, admite ser melhorado. E nós aceitamos que seja melhorado, aceitamos os contributos positivos. Agora, aceitamo-los de quem faça melhor e não de quem diz que faz. Ora, o Sr. Deputado diz que faz, que o vosso Governo vai fazer, mas a verdade é que as iniciativas são nossas.
Por último, também quero dizer-lhe que esta iniciativa não é de hoje, ela já foi apresentada por nós nesta Câmara na Legislatura passada, quando o governo era do Partido Socialista, e voltamos a apresentá-la nesta Legislatura há um ano, mas só agora o PSD permitiu que fosse agendada.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Gomes, eu, na sua intervenção, na forma como optou fazê-la, tive alguma dificuldade em identificar uma análise crítica a cada um dos diplomas, porque V. Ex.ª optou por misturar coisas distintas e por fazer uma análise conjunta de diplomas que são diferentes, já que um é um projecto de lei, que trata de uma matéria muita determinada, e o outro é um projecto de resolução de âmbito mais alargado.
Mas, independentemente da confusão com que decidiu conduzir a sua intervenção, gostaria de dizer-lhe que o projecto de resolução de Os Verdes, precisamente por não termos para nós que as casas se devam começar pelo telhado, procura exactamente que aquilo que venha a ser feito de modo integrado - e, em relação a isto, estamos ansiosos pelas novidades do Sr. Ministro na próxima semana, aquando da interpelação ao Governo - seja sustentado em alicerces.
Ora, o nosso projecto de resolução procura exactamente isso, razão pela qual um dos prestigiados dirigentes da Associação Portuguesa dos Recursos Hídricos, que esteve numa audição parlamentar realizada pelo meu grupo parlamentar, se posicionou favoravelmente em relação a ele.
Aliás, gostaria que o Sr. Deputado esclarecesse o que é que mudou desde Maio de 2001 até hoje, uma vez que o Partido Social Democrata foi favorável à recomendação então aprovada e a única alteração que o nosso projecto de resolução integra é a que resulta de um projecto da altura, da iniciativa do CDS-PP, que veio a ser acolhido pela Câmara, porque era um contributo positivo. Portanto, é esta a única modificação que existe no projecto de resolução que está hoje em discussão.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Gomes.

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Renato Sampaio, dir-lhe-ei que o projecto de lei apresentado por V. Ex.ª, como já tive oportunidade de referir na minha intervenção inicial, enferma da desconformidade com planos estruturantes já existentes elaborados pelo vosso governo.
Não podemos colocar os instrumentos de intervenção à frente das políticas, e é neste quadro que estamos convictos de que esse é o melhor modelo de intervenção. É importante, numa primeira fase, implementar aquilo que está no Plano de Bacia Hidrográfica do Douro, no Plano Nacional da Água - e foram os senhores que os criaram quando foram governo -, em que se define a elaboração de planos de ordenamento e de extracção de inertes.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - O que é que eu tenho com isso?!

O Orador: - Naturalmente, se permitir que conclua, é importante definir primeiro os locais mais apropriados, as quantidades que devem ser extraídas, ou que devem ser dragadas, para impedir os impactes que hoje todos nós conhecemos. É importante intervir com uma política estruturante, uma política de médio e longo prazos e não com políticas casuísticas e voluntaristas.
Passando agora às questões colocadas pela Sr.ª Deputada Isabel Castro, de facto, aquele que é o conteúdo da proposta de resolução apresentada por VV. Ex.as está contemplado no Despacho Normativo n.º 14/2003 do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente,…

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr. Deputado, peço-lhe que termine, pois já esgotou o seu tempo.

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O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Como eu estava a dizer, o conteúdo do vosso diploma já está contemplado no Despacho Normativo n.º 14/2003, que, de alguma forma, já contém aquelas que são as medidas necessárias para intervir sustentadamente nestas situações e naquelas que a Sr.ª Deputada referiu.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Honório Novo.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Começo por sublinhar, numa primeira nota, que o enquadramento legislativo que regula a actividade de extracção de areias nos parece suficiente, adequado e capaz de estabelecer o exercício sustentado desta actividade.
Só que a questão não está, nem esteve, na existência ou não de legislação adequada, porque essa existe, Srs. Deputados. Parafraseando o Sr. Deputado Luís Gomes, do PSD, a enfermidade reside no facto de a legislação existente não ter, na maioria dos casos, tradução em actos concretos.
O problema é que não tem havido capacidade, nem vontade política, não para ter enquadramento legislativo, porque esse já existe há muitos anos, mas, pelo contrário, para fazer aplicar muita da legislação em vigor, fiscalizar e controlar, de forma permanente e eficaz, a actividade de extracção de areias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Continuam a verificar-se, Sr.as e Srs. Deputados, muitas situações em que a extracção de areias se processa sem sustentação técnica - sem os tais planos específicos de que fala a lei -, sem a realização, nos casos previstos na lei, de estudos de impacto ou de incidência ambiental e sem que o prazo de validade das licenças existentes seja condicionado pelas reais necessidades de extracção dos inertes considerados em excesso. A situação, no fundamental, mantém-se, tanto com o governo anterior como com o actual.
É assim que, um pouco ao longo de todo o País, há explorações de areias, em rios ou em zonas costeiras, que prosseguem em aparente ou, porventura, mesmo real conflito com o quadro legal existente, com os procedimentos que ele determina, tudo isto perante a passividade, a inoperância ou, se calhar, a incapacidade para actuar por parte das entidades a quem estão, em princípio, cometidas responsabilidades de licenciamento, de controlo, de avaliação e, naturalmente, por maioria de razão, de fiscalização.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A extracção de areias - importa sublinhar e repetir sempre - não é em si mesma uma actividade condenável que mereça ou tenha de ser proscrita.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Nunca tivemos e continuamos a não ter essa posição. Consideramos mesmo que a extracção de areias corresponde a uma actividade desejável em determinados locais e circunstâncias, respondendo adequadamente a necessidades colectivas bem objectivas.
Só que tudo isto exige, igualmente, a sua sujeição a condicionalismos técnicos que não permitam que a capacidade de extracção supere, muitas vezes de uma forma substancial, os caudais sólidos transportados ou, então, que se verifiquem graves prejuízos ambientais, resultantes de alterações físicas e de composição, seja dos leitos, seja das margens, dos meios hídricos sujeitos à actividade da extracção.
Mas, para que tudo isto seja possível e compatibilizável, é fundamental avaliar, controlar e fiscalizar. Permita-me, Sr. Deputado Luís Gomes, mais uma vez é fundamental agir e não arranjar pretextos para manter a situação inalterada, tal como está.
Em suma, é fundamental cumprir a lei. E já agora, é também fundamental cumprir as resoluções desta Assembleia, sendo, a este propósito, útil que a maioria parlamentar, já que o Governo não está aqui presente, nos possa informar sobre o seguimento dado à recomendação aprovada em Maio de 2001 com a abstenção do PS e votos a favor das restantes bancadas, da autoria do CDS-PP, que encarregou o actual Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente de "efectuar o levantamento batimétrico regular dos trechos aluvionares dos nossos principais cursos de água". Onde foram feitos, Sr. Deputado? Com que regularidade e que resultados determinaram esses levantamentos? Já passaram dois anos - menos de um do anterior governo e mais de um do actual Governo - e estamos na mesma. Afinal, onde é que está a inoperância?
É por isso, Sr. Presidente e Sr.as e Srs. Deputados, que continuamos a afirmar que, mesmo depois do acidente de Entre-os-Rios e com a honrosa excepção da zona afectada pelo acidente, esquecido o drama local e remetida a catástrofe para a relação das efemérides anuais, muito pouco parece ter mudado, infelizmente, nos procedimentos gerais da Administração relativamente ao enquadramento, no plano nacional, da actividade de extracção de areias.
Temos hoje, porém, a propósito do projecto de lei n.º 24/IX, do Partido Socialista, que cria o sistema de vigilância e controlo do exercício de actividade de dragagem e extracção de inertes, e do projecto de resolução n.º 64/IX, do Partido Ecologista "Os Verdes", sobre a informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico, mais uma oportunidade para voltar a discutir este tema e para aprovar, caso haja vontade política, orientações que, a serem colocadas em prática, constituirão passos concretos para a criação de atitudes e métodos diferentes e diferenciados na forma de conhecer, de avaliar, de controlar e de fiscalizar a actividade de extracção de areias.
A criação de uma base de dados com o recenseamento dos locais licenciados para a extracção de areias ou onde esta actividade tenha sido identificada, mesmo que resultante de actos ilegais, a incorporação nessa base de dados de elementos das características dos licenciamentos e dos seus condicionamentos, tal como recomendam Os Verdes no seu projecto de resolução, constituem certamente passos consensuais, mas em frente, do conhecimento na avaliação e acompanhamento da situação a nível nacional.
De igual forma, o projecto de lei do PS - que é, aliás, uma reposição de uma iniciativa legislativa apresentada na anterior legislatura mas que nunca chegou a ser agendada para discussão - impõe um sistema de verificação automático, via satélite, do tipo de actividade desenvolvida por embarcações afectas à extracção de areias, que

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- reconheça-o, Sr. Deputado Luís Gomes -, articulado com a tal base de dados inexistente mas recomendada pelo Partido Ecologista Os Verdes, faria desaparecer mais uma das tais enfermidades a que aludiu na sua intervenção.
Servindo-se de experiência utilizada noutros sectores da actividade económica no nosso país, onde, aliás - não sei se sabe, Sr. Deputado - o know-how português tem assumido, neste sector, relevância significativa (como é o caso das pescas), a implementação obrigatória de um sistema de monitorização da acção destas embarcações pode servir para alterar, de forma drástica mas positiva, a vigilância e o controle da actividade de dragagens e de extracção de inertes em meio hídrico.
Por tudo isto, qualquer das duas iniciativas legislativas em apreciação merece a nossa avaliação positiva, pelo que as votaremos favoravelmente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Estamos a falar de sistemas de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes e de informação, avaliação e disciplina na actividade de extracção de areias em meio hídrico. Discutimos, concretamente, os projectos de lei e de resolução, respectivamente, do Partido Socialista e do Partido Ecologista "Os Verdes".
Na anterior legislatura, o CDS-PP apresentou também um projecto de resolução sobre esta matéria, a que foi atribuído o n.º 136/VIII.
Optou agora por não o fazer. Decidiu - e bem, na minha opinião - não fazer o que fez o Partido Socialista, não fazer o que fez o Partido Ecologista "Os Verdes", que, em ambos os casos (e sem que isto implique qualquer juízo valorativo negativo), tiraram a iniciativa do arquivo, onde se encontrava desde então, desde a anterior legislatura, e voltaram a apresentá-la.
Nós não o fizemos, desde logo (mais uma vez, repito, sem que isto implique algum juízo crítico para quem decidiu agir de modo diverso), porque temos sentido prático de actuação e sabemos que o Governo prepara, ao que julgo saber, para breve, regulamentação sobre este assunto.
Não o fizemos ainda, porque, tratando-se de matéria com particular incidência técnico-administrativa, ao Governo cabe a respectiva regulação, num quadro de salvaguarda do interesse público e, em particular, da defesa do ambiente.
É certo que a Assembleia de República tem competência política, legislativa e de fiscalização, mas a verdade é que é o Governo que dirige os serviços técnicos e os técnicos dos respectivos serviços, que, com vantagem e exacto conhecimento da realidade, podem equacionar as soluções e, nomeadamente, gizar medidas que possibilitem a compatibilização e o equilíbrio entre o exercício de actividades económicas e o meio ambiente.
A propósito da discussão das iniciativas apresentadas na anterior legislatura, o CDS disse, e hoje mantém, que, e passo a citar, "está a fazer falta um sistema de informação sobre o que se passa no leito dos nossos rios".
A extracção de areias das margens e dos leitos dos rios não é em si mesma uma actividade condenável e pode até ser, em determinados casos e em certas circunstâncias, uma operação desejável.
Em nossa opinião, e com o devido respeito por opinião contrária, há que respeitar a necessidade de sujeitar a extracção de areias das margens e dos leitos dos rios a dois condicionamentos técnicos.
Primeiro, para que uma operação de extracção esteja devidamente controlada, não basta efectuar um levantamento batimétrico localizado, pois só com o conhecimento de toda a batimetria do rio se poderão antecipar e acompanhar os efeitos da operação, a montante e a jusante.
Segundo, há que integrar a extracção de inertes em modelos matemáticos de transporte sólido devidamente calibrados.
Em resumo, impõem-se providências para que a Administração Pública retome a actividade de levantamento batimétrico nos nossos principais rios - e, aí, estamos de acordo. E isto, sim, em termos de recomendação de posição de princípio, cabe a este Parlamento dizer e recomendar ao Governo.
Em tese, portanto, consideramos mais adequado, essencialmente pelas razões que tentei expor, o projecto de resolução, sendo certo, porém, que o diploma de Os Verdes se nos afigura deficiente em termos técnicos e, sobretudo, incongruente e incapaz de atingir os objectivos pretendidos, designadamente em face da dimensão e abrangência do problema em causa.
Mas o adequado tratamento deste problema, a gestão cuidada e rigorosa dos nossos principais cursos de água, impõem igualmente medidas que se prendem com a fiscalização e protecção das suas margens, com a detecção das ocorrências que possam prejudicar o normal escoamento e provocar a erosão e o assoreamento, em suma, com a actividade de polícia fluvial.
A implementação de um sistema de fiscalização que possibilite a acção de agentes de protecção do meio hídrico é, pois, outra linha de actuação imediata que acontecimentos ainda recentes na nossa memória aconselham para obviar à actual degradação da gestão dos nossos cursos de água.
Em síntese, impõe-se regular, fiscalizar e policiar uma actividade que gera riqueza e desenvolvimento, mas que, simultaneamente e em muitos casos, contribui para o equilíbrio ambiental.
E a estas acrescento uma outra palavra, também ela terminada em "ar": trabalhar. Isto porque quero lembrar, a propósito, as centenas de trabalhadores das empresas de extracção de areias do rio Douro que ainda estão sem trabalho, em consequência da queda da ponte Hintze Ribeiro, em Castelo de Paiva. Falamos das famílias, naturalmente, e de trabalhadores essencialmente dos concelhos de Castelo de Paiva, Cinfães, Penafiel, Marco de Canavezes, Gondomar, Porto, Matosinhos, Amarante e Paredes, mas recordo também toda uma série de actividades conexas que foram, ou ainda estão a ser, afectadas por este problema.
Esta é, também, preocupação nossa e que, neste particular, de modo algum pode ser esquecida. Daí que aguardemos, com expectativa, o que sobre esta matéria o Governo prepara - de resto, e ao que julgo saber, como já o disse, em adiantada fase.
Os projectos em análise têm, seguramente, o mérito de colocar a questão. Não o fizeram, contudo, da melhor forma. São, do nosso ponto de vista, incongruentes, incompletos, incoerentes, impraticáveis e, como tal, ineficazes.

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Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Reconhecemos a necessidade de encarar o problema. As soluções têm de ser as adequadas na forma e na substância; têm de ser adequadas e eficazes.
Esse é o objectivo. Essa é a nossa aposta.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para pedir esclarecimentos, em tempo cedido pelo Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Paiva, ouvi a sua intervenção e confesso a confusão que a mesma me suscitou.
O Sr. Deputado aludiu a dois aspectos que, em seu entender, são as condições que o Partido Popular considera essenciais ter em conta para o correcto exercício da actividade de extracção de inertes em meio hídrico. Referiu levantamentos batimétricos, mas não pontuais, e a necessidade de conhecimento do transporte de sedimentos.
Sr. Deputado, são precisamente essas duas medidas que, e bem (aliás, fiz referência na minha intervenção), o Partido Popular apresentou no seu projecto, o qual veio a ser viabilizado. Na altura, não defendiam levantamentos batimétricos casuísticos mas regulares, assim como projecções, tendo por base modelos matemáticos, sobre transporte de sedimentos.

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha terminou.

A Oradora: - Portanto, Sr. Deputado Miguel Paiva, a questão que lhe coloco é a de saber por que é que o seu Governo não concretizou esta prática que a Assembleia recomendou.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente! Há dois anos que estão à espera!

O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Castro, começo por agradecer não só a questão que me colocou mas também a homenagem que prestou ao facto de dizermos hoje, que estamos inseridos numa maioria e num Governo, aquilo que dissemos ontem, o que mostra que somos coerentes.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Não, não! É que ontem viabilizaram!

O Orador: - Sr.ª Deputada, não sei se tem conhecimento mas a verdade é que há um despacho de 14 de Março de 2003, portanto, do actual Governo, o qual, em termos muito concretos e práticos, fala da avaliação do estado da linha de água, de tipologias de intervenção, de redes de monitorização, de análises económicas, de avaliação ambiental dos planos específicos de extracção. Enfim, tudo aquilo de que, então, falámos e de que, hoje, continuamos a falar.
Por esta razão é que eu disse, da Tribuna, que aguardávamos com expectativa e com muita esperança aquilo que o Governo prepara nesta matéria, porque este indicador, que é seguro, sólido e já está no terreno, dá-nos essa garantia e a certeza de que a política, também nesta área, no futuro, será, seguramente, diferente daquilo que foi no passado.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Narana Coissoró.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.

O Sr. Renato Sampaio (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostava de dizer à Câmara que nós, no PS, nunca perguntaremos ao Governo o que anda a fazer para podermos tomar qualquer iniciativa nesta Casa. Isto porque, se o fizéssemos, acontecia-nos o destino dos requerimentos: apresentamo-los e os senhores demoram três ou quatro meses a responder.

Protestos do PSD.

Por outro lado, era nossa convicção de que esta questão da extracção de inertes iria para a longa lista das medidas a adoptar pelo Governo no futuro, ou seja, "em breve", mas depois nunca mais as adoptaria.
A terminar, gostava de dizer o seguinte: foram feitas, por parte da bancada do PSD, duas afirmações puramente gratuitas, sendo a primeira relacionada com os custos. É preciso que saibamos que os custos não são elevados. Por outro lado, também afirmaram que o sistema não está testado e que era preciso um período de experimentação. Não é verdade! O sistema está testado, é utilizado, hoje em dia, nas embarcações de pescas.
E não façamos depender a fiscalização da extracção de inertes de planos de licenciamento de extracção. Quanto aos planos, eles podem ser feitos. Este é um sistema de fiscalização da extracção de inertes. Porque, senão, também estaríamos muito tempo à espera de podermos fiscalizar.
O que está em causa no nosso projecto é tão só esta coisa simples: a de saber se, no imediato, vamos adoptar a teledetecção no aproveitamento da fiscalização da detecção de inertes. É isso que está em causa.
Sr. Deputado, para o sossegar, vou ler o título do nosso projecto de lei, porque, provavelmente, nem sequer o leu: "Cria o sistema de vigilância e controlo do exercício da actividade de dragagens e extracção de inertes". Isto nada tem a ver com o licenciamento de inertes mas com o controlo da fiscalização, é um sistema complementar de fiscalização. O que está em causa é exactamente isto! E para quê? Justamente para fazer cumprir a legislação que está em vigor e para fazer cumprir os licenciamentos que são dados.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, chegámos ao fim deste…

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

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O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, sob a forma de interpelação, quero fazer a sugestão de distribuição aos Srs. Deputados quer do Partido Popular quer do Partido Social Democrata que intervieram, e que não estiveram presentes no anterior debate, do Diário da Assembleia da República de 5 de Maio,…

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Tenho-o aqui, Sr.ª Deputada!

A Oradora: - … pois o mesmo permitirá perceber que os dois partidos votaram favoravelmente, sem o conjunto de obstáculos que agora invocaram, um projecto de resolução, apresentado por Os Verdes, de sentido muito semelhante ao que estamos hoje a discutir.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Já que falámos em coerência!…

O Sr. Luís Gomes (PSD): - Está aqui, na minha mão, Sr.ª Deputada!

O Sr. Renato Sampaio (PS): - E o Sr. Deputado leu-o?!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Srs. Deputados, dado este esclarecimento, que consta do Diário da Assembleia da República, e não havendo mais inscrições, declaro encerrada a discussão conjunta do projecto de lei n.º 24/IX e do projecto de resolução n.º 64/IX.
Vamos passar à apreciação, na generalidade, do projecto de lei n.º 165/IX - Estabelece a inversão do ónus da prova no âmbito da prestação de serviço público (PCP).
Para fazer a apresentação do referido projecto de lei, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta nossa iniciativa legislativa explica-se por si mesma.
Como todos estaremos de acordo, a relação dos utentes e consumidores de serviços públicos com as entidades que prestam as respectivas actividades nem sempre é, infelizmente, uma relação isenta de conflitualidades, designadamente quando a qualidade da prestação desse serviço não corresponde aos direitos dos cidadãos que o consome e às condições exigidas à sua prestação.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Como afirmamos na "Exposição de motivos" do nosso projecto de lei, utentes de serviços públicos, sejam cidadãos, sejam empresas, têm o direito, constitucionalmente consagrado, de usufruir de serviços públicos de qualidade e com segurança. Isto é tanto mais relevante quanto se trata, na generalidade dos casos, de actividades que satisfazem necessidades básicas seja na área do fornecimento de energia eléctrica, gás, telecomunicações, transportes colectivos, serviços de saúde, entre outros.
Mas o que sucede tantas vezes é que, quando há deficiências na prestação de serviços públicos, quando estes são fornecidos com falta de qualidade, quando há intervenções ou acidentes ocasionados pela ruptura ou não cumprimento de medidas de segurança e quando, em consequência disso, os utentes daqueles serviços sofrem prejuízos, os mecanismos legais existentes não estão, claramente, do lado de quem se considere lesado. E isto porque é o cidadão lesado que tem de demonstrar que o prejuízo que sofreu se deve à deficiência do serviço prestado, o que na maior parte das vezes é absolutamente impossível, porque os cidadãos dificilmente têm acesso a meios e a informação técnica que lhes permitam fazer tal prova.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Exemplos não faltam: os cortes abruptos no fornecimento de energia eléctrica, que avariam equipamentos, sejam domésticos, sejam, designadamente, de empresas fabris; os acidentes rodoviários pela existência de estradas cujo nível de conservação não é cuidado ou não é reposto, depois de obras realizadas - ainda recentemente, tivemos o exemplo da saga de um utente de uma auto-estrada que, para fazer valer os seus direitos, em virtude de um acidente que ocorreu numa das auto-estradas concessionadas à Brisa, teve de percorrer um processo complexo em sede judicial, de modo a ver reparados alguns dos prejuízos cuja responsabilidade é imputável à Brisa, o que só foi possível dadas as condições particulares do cidadão em causa; rupturas em condutas de gás que dão origem a perigosos incidentes, etc.
A nossa proposta é simples: quando alguém se considere lesado pela não aplicação do princípio da prossecução do interesse público pelas entidades que prestam serviços públicos essenciais e apresente, perante um tribunal ou outra instância, reclamação por essa mesma razão, incumbe à entidade prestadora desses serviços provar que não houve violação desse princípio, provar que não foi por sua responsabilidade que se originaram rupturas ou acidentes no fornecimento de tal ou tal serviço.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Muito bem!

O Orador: - É verdade que o quadro legal português, designadamente as Leis n.os 23/96 e 24/96, de Julho, instituiu já um conjunto de normas que permitem proteger os consumidores em relação ao fornecimento de alguns serviços públicos. Contudo, não foi, então, resolvido o problema do ónus da prova.
Continuam a ser os consumidores, os utentes, no fundo, a parte mais frágil da relação, a ter de demonstrar o que compete ser assegurado e demonstrado por quem fornece o serviço público em causa.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É isso que nos propomos alterar: dar ao cidadão, ao consumidor, os meios que o quadro legal ainda não disponibiliza e que permitam operacionalizar normas que estão inscritas no quadro legal existente, permitindo-lhes, por essa via, assegurar melhor a defesa dos seus direitos e a reparação dos prejuízos que sofrem em resultado de eventuais deficientes prestações de um serviço público.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Capitão.

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O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Lino de Carvalho, o projecto de lei que apresentou sobre a inversão do ónus da prova na prestação de serviço público tem um desiderato louvável. Ninguém o nega. Mas, para nós, é mais factível no domínio da utopia, em que os comunistas, de facto, são campeões.

Risos do Deputado do PCP Honório Novo.

O PSD também entende que tem de haver serviços públicos, desde logo, como correctivo do mercado, pois este é um mecanismo que prezamos mas que tem de ser corrigido, e, por outro lado, que eles têm de ter qualidade e segurança. Agora, o afã de protecção que coloca em relação às novas "vítimas da fome" leva-o a querer uma responsabilização quase de princípio de quem presta serviços públicos.
Não entrando, sequer, no melindre de definir o que será qualidade e segurança na questão do serviço público, basta abordar o irrealismo de querer, a qualquer falha na prestação do serviço, obrigar o prestador do serviço a provar que, de facto, o prestou. Imagine o que isso significa em matéria de comunicações telefónicas, por exemplo, e em matéria de fornecimento de gás. Isso obriga as concessionárias a dizer, por exemplo, "sim, senhor, tinha o telefone ligado", "sim, senhor, tinha o gás ligado".

O Sr. António Costa (PS): - Claro!

O Orador: - Agora, imagine o que isto representará quando se multiplicarem os pedidos.
Mas este vosso projecto de lei tem um benefício, uma vantagem colateral, que nem os senhores previram: é que vamos passar de uma situação em que temos excesso de licenciados em Direito para uma situação em que teremos défice de licenciados em Direito, porque os departamentos jurídicos das empresas, das concessionárias, etc., vão passar a ser, com certeza, aqueles que estarão mais providos de quadros.
Portanto, a pergunta que faço tem um pouco a ver com isto: não lhe parece que está aqui presente um gravíssimo e irresolúvel problema de praticabilidade do direito e de proporcionalidade? Não lhe parece que está no caminho de uma sociedade ideal que não existe e, novamente, no caminho do homem novo?
De facto, numa sociedade onde não houvesse, de vez em quando, um "homem-lobo" do homem, era possível que tudo fosse perfeito. É um desiderato bonito, é possível num mundo de anjos, é possível no céu, mas não acreditamos que seja factível por cá.
Aliás, o PCP nem é bom para as suas próprias teses, porque já que defende, geralmente, o alargamento quase irrestrito do serviço público a todas as áreas, desta forma, está a emperrar o Estado, está a burocratizar o Estado e a impedir que ele preste um bom serviço.
Imagine o que seria, de hoje para amanhã, ver o Instituto de Meteorologia a ter de justificar a uma senhora que pôs a roupa no estendal, porque contava com sol, por que é que, entretanto, previu mal e se desencadeou uma bátega de água. Ou, então, quando nessa sociedade ideal, os clubes, que também seriam quase entidades públicas, tivessem de pôr a direcção do "Spartak do Porto", do "Dinamo da Luz" ou da "Politécnica de Coimbra" a justificar ao fotógrafo que foi atingido pela bola que o avançado não queria chutar ao lado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Há-de experimentar vir aqui um dia falar a sério!

O Orador: - Estou, obviamente, a ironizar mas, sendo realista, e sendo louvável a vossa preocupação, quero perguntar-vos se entendem que isto é praticável e como demonstram a praticabilidade desta vossa inversão do ónus da prova.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, tem de terminar, uma vez que já ultrapassou o tempo de que dispunha.

O Orador: - Vou terminar, Sr. Presidente.
Quase me lembram um provérbio russo, que diz que "num país sem cães, far-se-ia ladrar os gatos". Cá, os gatos não ladrarão e o vosso projecto não passará, a menos que demonstrem a sua praticabilidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, querendo, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - "Querendo", de facto, Sr. Presidente, porque só por respeito pelo trabalho parlamentar é que vou responder.
Há, de facto, Deputados que trazem permanentemente ao debate a marca genética de não serem capazes de tratar problemas sérios, mesmo que sobre eles haja diferença de opiniões, de forma séria.

Vozes do PCP: - Exactamente!

O Orador: - E, nessa medida, são recorrentes em ironias despropositadas, de mau gosto, sem sentido…

O Sr. Honório Novo (PCP): - Palhaçadas!

O Orador: - … e que, aliás, não prestigiam, seguramente, o debate parlamentar, nem para quem nos está a ver através dos meios tecnológicos.

O Sr. António Costa (PS): - Muito bem!

O Orador: - Lamento, Sr. Presidente, lamento, e não nos dá, seguramente, vontade de debater e de responder a perguntas nestes termos.
Em todo o caso,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - A resposta é para a nossa bancada, não é para a Mesa!

O Orador: - Dirigi-me ao Sr. Presidente, porque é ele que está a dirigir os trabalhos. Mas penso que o Sr. Deputado Marques Guedes, no fundo, não acompanha, certamente, este tipo de comportamentos.

Vozes do PCP: - É claro que não! Não pode!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não diga isso!

O Orador: - Em todo o caso, Sr. Deputado, por respeito pelos trabalhos parlamentares, a operacionalidade da medida que propomos, e que os senhores reconhecem que

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é importante do ponto de vista da defesa dos direitos dos cidadãos, é aquela que hoje acontece em muitos Estados da União Europeia, é aquela que é proposta pela Associação de Defesa dos Consumidores, a DECO, que é parceira social do Governo, Sr. Deputado.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E, se o seu problema não é a questão de princípio mas como se criam mecanismos que evitem que este direito operacionalize a legislação existente desde 1996, de uma forma de tal modo absoluta que possa ser usada abusivamente, estamos disponíveis, Srs. Deputados, para, em sede de especialidade, encontrar as soluções e os mecanismos concretos que procurem responder a essa preocupação, que reconheço ser uma preocupação legítima.
Nesse sentido, se é essa a questão, estão criadas as condições para o PSD permitir a baixa do projecto de lei à comissão e aí podermos encontrar os mecanismos que resolvam esse problema.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa legislativa que hoje discutimos visa, no essencial, como já aqui foi dito, consagrar em lei a inversão do ónus da prova sempre que alguém se considere lesado pela não prestação de um serviço público de qualidade e com segurança, dizendo-se, no articulado, que "(…) recai sobre a entidade que presta o serviço público a incumbência de provar o cumprimento das suas obrigações (…).
Realmente, o assunto parece claro, mas não é. A bondade do projecto parece indiscutível, mas é muito discutível.
Importa, desde já, e sem receios, adiantar que este projecto de lei é inepto, inapto e inútil, e procurarei demonstrar as razões pelas quais assim sucede.

Protestos do Deputado do PCP Lino de Carvalho.

A iniciativa assenta num enorme erro de conceptualização acerca do chamado "princípio da prossecução do interesse público". O projecto parte desse princípio para consagrar, completamente a despropósito, a inversão do ónus da prova de uma coisa que em nada se relaciona com o dito princípio. É que o princípio da prossecução do interesse público não se respeita ou desrespeita com esta medida pela simples e única razão de que os Srs. Deputados proponentes confundem interesse público com serviço público.
Para bem sabermos o que é o interesse público basta lermos o artigo 266.º da Constituição. O princípio da prossecução desse interesse implica que a Administração, ao actuar, deve ter em vista, justamente, o interesse público, isto é, está proibida de prosseguir interesses privados, bem como outros interesses públicos para além daqueles que a lei lhe confiou, ou seja, para além daqueles que lhe estão afectados. Exemplifiquemos, para que se perceba melhor: um hospital não pode prestar outros serviços que não os de saúde, como um tribunal não pode prestar outros serviços que não os de fazer justiça e aplicar a lei. Nisto consiste a prossecução do interesse público, o principal - criar uma sociedade com condições para que cada um se possa realizar, para que serve, afinal, o Estado - e os secundários - a justiça, a saúde, a segurança social, etc.
Ora, o que é que isto tem a ver com o projecto de lei em discussão? Nada! Rigorosamente nada! A não ser que os proponentes imaginem que um hospital comece a realizar julgamentos ou um tribunal a fazer operações e, então, os lesados possam instaurar acções de indemnização, competindo ao hospital provar que, afinal, não estava realizando julgamentos e ao tribunal demonstrar que, afinal, não estava procedendo a intervenções cirúrgicas.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Completamente absurdo!

O Orador: - Portanto, no artigo 4.º proposto não se pode partir da lesão que alguém possa sofrer pela não aplicação do princípio da prossecução do interesse público.
Deixem-me dar outro exemplo para ajudar quem vai votar: a EDP, quando interrompe em determinada freguesia o fornecimento de energia devido ou quando o fornece de má qualidade, não deixa de prosseguir no interesse público, não viola o princípio da prossecução do interesse público, na medida em que não passa a prosseguir, por isso, interesses privados nem passa a prosseguir, por isso, outros interesses públicos para os quais não está afectada. O que, nesse caso, a EDP viola - e é isto que é preciso saberem, porque há um erro de conceitos na vossa proposta - não é o princípio da prossecução do interesse público mas o princípio da continuidade da prestação do serviço público, de acordo com os standards de qualidade exigidos.
Ora, não é isto que está no projecto de lei. Não é nada disto que consta do diploma. Há uma confusão entre conceitos, que não é sequer característica do partido proponente mas que inquina por completo o sucesso da iniciativa. Se de candidata a lei ela passasse a lei, a proposta constituiria um grosseiro erro legislativo, que jamais subscreveríamos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Isto para além de outras diversas imprecisões, como é o caso da referência, no artigo 2.º, a entidades que prestem serviços públicos essenciais na decorrência de contratos de concessão ou outros contratos administrativos. Outros contratos administrativos?! Mas que outros contratos administrativos se conhecem?! Que outros contratos administrativos a doutrina conhece, no caso concreto, senão os contratos de concessão?! Mais nenhuns, evidentemente! Não há qualquer outro contrato administrativo que permita que uma entidade privada explore serviços públicos. Eu, pelo menos, não conheço.
Portanto, já vimos os erros técnicos do projecto e já vimos que ele não pode pretender o ridículo.
Admitamos, então, que, embora deficientemente, ele visa inverter o ónus da prova nos casos em que a Administração ou as entidades concessionárias violam o tal princípio da continuidade da prestação do serviço público, de acordo com os standards de qualidade exigidos. Deve ser isso que querem, mas não é isso o que está lá.

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Mesmo a ser assim, o projecto de lei, tal como está, proporciona igualmente um outro ridículo: sempre que 1, 10, 1000 ou 10 000 cidadãos se lembrarem de instaurar acções de indemnização contra a EDP - voltemos ao exemplo - por lhes ter sido cortada, sem aviso prévio, a energia durante um determinado período de tempo competiria à empresa concessionária demonstrar 1, 10, 1000, 10 000 vezes que jamais cortou a energia e que, portanto, não desrespeitou aquele princípio da continuidade da prestação de serviço.
Que se saiba - e os Srs. Deputados sabem! - desde 1939 que se consagrou na lei processual que a prova negativa de um facto é, senão mesmo impossível, a mais das vezes dificílima. Por isso é que os factos se devem alegar e provar pela positiva, devendo competir ao autor daquela acção de indemnização anteriormente dita alegar e provar, pela positiva, pela afirmativa, que ocorreu o tal corte de energia, com referência ao dia, à hora e a outras condicionantes, bem como alegar e provar os prejuízos sofridos, não competindo, evidentemente, à entidade concessionária alegar e provar, pela negativa, que jamais ocorreu qualquer corte de energia.
Nisto consiste uma adequada e lógica repartição do ónus da prova. E se é nisto que consiste uma adequada e lógica repartição do ónus da prova, é exactamente o contrário disto que o projecto em discussão se propõe fazer, atenta a letra do artigo 4.º. Só que, a ser aprovado o diploma, agora não estaríamos perante um erro jurídico grosseiro mas, certamente, perante uma verdadeira aberração jurídica, à qual jamais nos associaríamos.
Finalmente, será que os proponentes quiseram uma outra coisa diferente daquelas a que até agora aludimos? Será que quiseram inverter o ónus da prova nos casos em que a Administração ou a entidade concessionária tenha violado o dito princípio da continuidade da prestação por qualquer motivo de força maior, consagrando-se, então sim, que compete a ela, Administração, ou entidade concessionária a prova dessa força maior e a sua consequente desresponsabilidade? Mas claro que compete! Mas para isso não é preciso esta iniciativa legislativa.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Com certeza!

O Orador: - Compete, porque isso envolve claramente matéria de defesa, mais concretamente matéria de defesa por excepção peremptória, sendo, pois, sobre o réu, no caso, sobre a Administração ou sobre a entidade concessionária, que recai tal ónus da prova. Evidentemente! Não é preciso a lei!
Claro que compete ainda, porque até a lei já o refere, ainda que indirectamente, pois que o Decreto-Lei n.º 48 051, já com mais de 30 anos mas ainda em vigor, preconiza, incontroversamente, essa repartição do ónus da prova.

O Sr. José Magalhães (PS): - Está em revisão!

O Orador: - Está em revisão, mas não nesse ponto. Está em revisão o artigo 7.º, como sabe.
Claro que compete ainda, porque toda a jurisprudência conhecida e toda a doutrina conhecida, desde Freitas do Amaral a Sérvulo Correia, desde Vieira de Andrade a Gomes Canotilho, sem a mais pequena polémica, defendem e ensinam que os casos de força maior desresponsabilizadores da Administração Pública, evidentemente, têm de ser alegados e provados pela própria Administração Pública.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, eu disse no início que a proposta era, e é, inepta, inapta e inútil. É inepta, porque está mal feita; é inapta, porque não se adapta ao fim pretendido; é inútil, porque sempre visaria regular o que já está regulado por lei, o que já está resolvido por toda a jurisprudência, o que já está pacificado pela doutrina.
Com estas excelentes "qualidades", fácil é vislumbrar o desfecho da iniciativa.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Montalvão Machado, eu não retribuirei o gesto da sua bancada perante a intervenção do grupo parlamentar do meu partido, vou, antes, apelar a alguma serenidade na abordagem desta questão e, até, se possível, elevar um pouco o nível da discussão que estamos a travar, referir-me a alguns aspectos concretos e travar alguma discussão política que é aquela que, pelos vistos, carece neste debate.
A intervenção de V. Ex.ª, que procurou qualificar de despropositada esta iniciativa, foi, ela própria, eventualmente, demasiado taxativa e de uma agressividade um pouco injustificada,…

O Sr. José Magalhães (PS): - No mínimo!

O Orador: - … que, no mínimo, sentenciou com adjectivos um propósito que, através de uma visão a que alguns chamariam de tecnicista e que outros considerariam florentina, passou ao lado das questões essenciais que estão em discussão neste Plenário e que têm a ver com o inalienável valor próprio, intrínseco, da defesa do interesse público e do direito do consumidor.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Desse ponto de vista, penso que é importante fazermos uma reflexão política, da qual a intervenção do Sr. Deputado careceu. De facto, a prestação dos serviços públicos é o valor fundamental desta nossa iniciativa e o Sr. Deputado passou ao lado desta questão, não a valorizou. Aliás, nos termos da legislação em vigor, de 1996, como já referimos, os Decretos-Leis n.os 23/96 e 24/96, não estão a servir os propósitos inalienáveis, fundamentais, de garantia do direito ao consumidor. Quando o Sr. Deputado falou em outros contratos, que não os de concessão, certamente não ignorou que, nomeadamente, ao nível da saúde, há exemplos como o do Hospital Amadora-Sintra em que o contrato não é de concessão mas de gestão. Desse ponto de vista, a limitativa visão microscópica de um aspecto em concreto não pode servir para ignorar nem para deixar passar ao lado todo um conjunto de situações como este exemplo que acabei de referir.
Por outro lado, o Sr. Deputado certamente que não ignora aquilo que já referenciámos neste debate, que é a existência em diversos Estado europeus de um normativo legal que apresenta a garantia de esta defesa ser dada - aliás, no estrangeiro e no nosso país. O eminente jurista que é V. Ex.ª certamente não está a esquecer que o artigo 344.º do Código Civil admite a inversão do ónus da prova.

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Não estamos a inventar a roda, ela já existe noutros lados e aqui também existe, não está é a ser aplicada, não está em andamento.
Por isso, a defesa do consumidor, em muitos aspectos, e no plano da justiça, está parada.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, vou ser muito breve, até porque não disponho de tempo.
Em todo o caso, sempre diria que não posso ter uma intervenção mais fundamentada do que a que tive. Procurei demonstrar várias razões: em primeiro lugar, que a lei está, de facto, tecnicamente mal concebida; depois, que, sob o ponto de vista jurídico, e não apenas de técnica jurídica, e, até, de direito constitucional, que está também mal concebida; e, no limite, que os anseios dos Srs. Deputados proponentes estão consagrados.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Não apoiado!

O Orador: - Ou seja, não é preciso, depois de tantos anos em democracia, imaginarmos agora que descobrimos a pólvora e que temos necessidade de uma norma, quando ela não é precisa. Está dito por toda a doutrina que, sempre que haja um prejuízo para o utente por qualquer prática da Administração Pública ou entidades concessionárias, compete ao utente propor a acção, fazer a alegação e a prova dos factos constitutivos do seu direito - quais são? são, naturalmente, a deficiente prestação de serviços e os prejuízos que sofreu -, competindo ao réu, que será a defesa, a prova dos factos impeditivos, modificativos e extintivos.
O Sr. Deputado citou, e bem, o artigo 344.º do Código Civil, mas lembro que este artigo é uma norma absolutamente excepcional, repito, é uma norma absolutamente excepcional.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Que pode ser aplicada neste caso!

O Orador: - Não, Sr. Deputado. Não se justifica aplicá-la neste caso.
Permita-me que lhe diga o seguinte: V. Ex.ª apelidou a minha intervenção de agressiva, taxativa, florentina. Bom, o que não pode chamar-lhe é utópica.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Sr. Deputado, tenha em atenção o tempo e a substância da resposta.

O Orador: - Com certeza, Sr. Presidente.
A terminar, direi que a sua crítica não faz sentido e, por isso, vamos, evidentemente, manter o sentido de voto.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao ouvir o modo como este debate foi introduzido e tem estado a decorrer, ocorreu-me aquela velha expressão popular de que "água mole em pedra dura tanto dá até que fura."

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Há matérias para as quais é preciso ter paciência e perseverança e a matéria da responsabilidade civil do Estado e demais entes públicos é, certamente, uma delas.
Acontece que esta matéria já tem vindo algumas vezes a Plenário: veio na legislatura passada, por uma iniciativa do governo anterior, no que diz respeito ao regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado, o qual precisa ser profundamente revisto no nosso ordenamento jurídico (e, que eu saiba, ninguém tem dito o contrário!) e voltou na presente Legislatura, por iniciativa do Partido Socialista, retomando, no essencial, a iniciativa pretérita do governo do PS, na medida em que o actual Governo e, também, a actual maioria se têm mostrado omissos nesta matéria.
Está a presidir aos nossos trabalhos o Sr. Deputado Narana Coissoró, mas ele desculpar-me-á que invoque um momento de um diálogo que tivemos ocasião de travar em que o Sr. Deputado Narana Coissoró - e estou convencido de que em inteira boa fé! - dizia que o Governo, na senda da iniciativa que o Partido Socialista apresentou em matéria de responsabilidade civil do Estado, apresentaria também, muito em breve, uma proposta de lei sobre a matéria, tanto mais que se conhecia um propósito divulgado pela Sr.ª Ministra da Justiça de encomendar a um reconhecido jurista e professor de Direito a revisão dessa matéria.
A verdade é que passaram muitos meses, a Assembleia da República aprovou, na ocasião, na generalidade, o projecto de lei apresentado pelo PS, estamos em fase de ponderação, na especialidade, desse tema e, até agora, o Governo e a maioria mostraram-se omissos relativamente a iniciativas neste domínio.
Faz sentido criticar, e de forma tão violentam, como se viu, a iniciativa agora apresentada pelo Partido Comunista quanto à matéria do ónus da prova no que diz respeito à relação garantística dos utentes de serviços públicos? Essa reacção violenta, do meu ponto de vista, não faz qualquer sentido. Isto porque a questão, temos de o reconhecer, é pertinente. A pertinência que ela tem ao nível da responsabilidade civil extracontratual do Estado, nesse plano, foi abordada, designadamente, na iniciativa que venho aludindo do Partido Socialista por reconhecer a necessidade de qualificar aquilo que muitas vezes, nos serviços, é uma omissão da qual resulta um determinado dano e, portanto, um determinado prejuízo para outrem. Não sendo, todavia, possível determinar em concreto o responsável individual desse mesmo dano, utilizando a conhecida figura do direito administrativo da falta de serviço, há que, justamente, criar uma modalidade de responsabilidade objectivada através da figura da culpa de serviço e, portanto, presumir que a responsabilidade é mesmo da Administração, através do órgão competente.
Ora aqui está uma matéria que, obviamente, implicará alguma coisa com o ónus da prova, porque, designadamente, em termos de regra geral de direito, aonde a lei estabelecer uma presunção de responsabilidade, obviamente, desonera o lesado de ter de alegar a culpa que, na circunstância, se

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se tivesse verificado e muito menos de a imputar a alguém em concreto, quando isso não seja possível de ocorrer.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Orador: - A matéria do ónus da prova, muito ligada também às presunções legais de responsabilidade e de culpa, tem toda a actualidade na nossa reflexão jurídica. E tem toda a actualidade que se faça no plano geral dos utentes de serviços ou dos consumidores de bens, ou seja, no âmbito geral dos direitos dos consumidores, e por maioria de razão tem justificação pertinente ao nível de utentes de serviços públicos.
A matéria ao nível do direito geral dos consumidores atravessa, hoje, o próprio debate das ordens jurídicas europeias. E permitam-me que chame à colação - como, aliás, foi feito num relatório que tive ocasião de apresentar na 1.ª Comissão, votado por unanimidade, permitam-me sublinhá-lo - o Direito brasileiro, que, em matéria relativa ao código dos direitos dos consumidores, estabelece soluções de presunção legal e de inversão do ónus da prova com a particularidade de deixar ao juiz do processo a possibilidade de avaliar, no caso concreto, se essa inversão do ónus da prova é verosímil face aos factos apontados ou se o utente em causa não está em condições de poder aceder ao conjunto das informações suficientes para poder fundamentar bem a sua queixa. Ou seja, há aqui, ao nível dos direitos dos consumidores, a atribuição na ordem jurídica de um papel muito mais activo ao juiz que, em vez de ser uma parte meramente neutra e indiferente ao litígio em questão, é chamado a ter uma participação activa, que vai, designadamente, ao ponto de poder consolidar a inversão do ónus da prova a favor do queixoso, quando forem muito verosímeis os fundamentos da queixa apresentada.
Não há, portanto, Sr. Deputado Montalvão Machado, permita-me que o refira, razão para qualificar de inapta, de inepta e de inútil a iniciativa apresentada.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Que ela deva ser ponderada nas sua várias aplicações certamente que sim. Que essas implicações são complexas é óbvio para todos. Que elas não podem ser reduzidas à dimensão linear em que as quis situar o Sr. Deputado Montalvão Machado também me parece óbvio.
Por exemplo, ouvimo-lo aqui dizer que, em matéria de contratos administrativos, conhecia os contratos de concessão e mais nenhuns.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Nesta legislatura!

O Orador: - Peço desculpa, mas já aqui foi referido, e com pertinência, que com a natureza de contratos administrativos inteiramente pertinentes para matéria deste tipo são, por exemplo, os contratos de gestão de serviços públicos. Foi aqui dado o exemplo de contratos de gestão de unidades hospitalares.

O Sr. Bruno Dias (PCP): - Esses não são visíveis ao microscópio do Sr. Deputado Montalvão Machado!

O Orador: - Pergunto como é que deveríamos classificar certos contratos de cooperação como, por exemplo, aqueles que são firmados hoje por entidades públicas no âmbito da saúde para a recuperação das filas de espera. Não há também aqui um tipo de contrato administrativo que, obviamente, não é subsumível, não podia ser, ao nível do contrato de concessão? Claramente que sim! E não resultam daqui relações entre responsáveis pela prática de determinados serviços públicos e consequências para os utentes desses mesmos serviços?

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro que resulta!

O Orador: - É óbvio para todos. Portanto, continua aqui a estar presente matéria atinente à culpa, à presunção da culpa e à eventual inversão do ónus da prova onde tal se considerar justificado.
Diria, portanto, que o que esta Assembleia faria bem, na sequência da apreciação do projecto de lei apresentado pelo Partido Comunista Português, era validar a sua aprovação na generalidade, a fim de permitir enriquecer, em sede de especialidade, aquilo que neste momento já temos em mãos, que é a avaliação global do regime da responsabilidade civil extra-contratual do Estado, beneficiando agora, também, com esta problemática que acresce ao nível da ponderação dos casos em que se justifique a inversão do ónus da prova a benefício de utentes não apenas de consumidores em sentido genérico mas, como é apresentado, especificamente de utentes de serviços públicos.
Não ignoro que há questões a precisar. Isto porque sabemos, também hoje, que, quanto àquilo a que tradicionalmente chamávamos serviços públicos, por efeito dos mecanismos de privatização ou por necessidade de conexão do direito interno com o direito comunitário, há agora áreas de prestação de serviços e de bens que entram no chamado "conceito de serviços de interesse económico geral" que não resultam de contratos de concessão mas, por exemplo, de actos de licenciamento que colocam os prestadores desses serviços ou desses bens de interesse económico geral na necessidade de cumprir um conjunto de requisitos, esses, sim, de interesse geral e que, eventualmente, deverão ser, ou não, abarcados num regime como este a ponderar, designadamente em sede processual quanto ao tipo de poderes de apreciação a dar ao juiz da causa em função da avaliação dos casos concretos.
Portanto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, penso que, conscienciosamente, deveríamos ter uma posição favorável quanto a esta matéria, havendo a disponibilidade de todos para considerar que ela é, afinal, bastante pertinente e se inscreve na ordem do dia da problemática do direito de consumo em geral e, especificamente, da garantia dos direitos na prestação e na utilização de serviços públicos e que, em sede de especialidade, com outros diplomas já apreciados, poderíamos desbravar o caminho.
Pena é - e não posso deixar de voltar a sublinhá-lo - que, mais uma vez, nesta como na matéria da responsabilidade civil extra-contratual, nem a maioria nem o Governo, até agora, tenham dado qualquer sinal de vida.

Aplausos do PS e do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

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O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A iniciativa que o Partido Comunista Português traz hoje à discussão visa criar um mecanismo eficaz de responsabilização das pessoas colectivas de direito público que integrem a Administração Pública ou de outras entidades que prestem serviços públicos directamente ou através de concessão ou de outro contrato administrativo.
O objectivo da iniciativa é o de garantir uma maior eficácia na prestação de serviço público, em aplicação do princípio da prossecução do interesse público, e destina-se a assegurar que qualquer pessoa que se considere lesada pela não aplicação deste princípio possa fazer valer os seus direitos através da via judicial, eventualmente após recurso a outras instâncias competentes.
Considera, ainda, o Partido Comunista que a legislação de protecção dos direitos dos utentes de serviços públicos essenciais, e dos consumidores, constituirá letra morta se não forem criados mecanismos que lhes dêem efectiva capacidade de defesa e, desse modo, tornem a justiça acessível, pronta e eficaz.
Trata-se de uma asserção à qual não podemos aderir.
O legislador português sempre teve presente um sentido de rigor acentuado quando se propõe contemplar situações de inversão do ónus da prova, e disso existem vários exemplos, designadamente no Código Civil.
No campo da protecção dos direitos dos consumidores, pese embora as numerosas disposições que se ocupam desta protecção, o legislador sempre optou, e bem, por consagrar a inversão quanto a cada situação em que entende dever fazê-lo, nunca a generalizou.
Deste ponto de vista, a iniciativa em apreço não merece a nossa concordância.
Mas não merece também por outras razões.

O Sr. José Magalhães (PS): - Então, porquê? Até agora, nada disse!

O Orador: - O conceito de interesse público que releva, para efeitos da presente iniciativa, restringe-se ao conjunto de necessidades vitais da comunidade que são satisfeitas pelas pessoas colectivas atrás referidas.
De acordo com esta definição, estamos aparentemente a referir-nos a um universo que compreende os serviços públicos essenciais, nomeadamente os de fornecimento de água, de energia eléctrica, de gás e de telefone.
Mas também poderíamos incluir aqui os transportes públicos, os serviços da área dos registos e notariado, os serviços de segurança pública, de saúde pública. Enfim, os exemplos poderiam multiplicar-se.
A questão que colocamos é a seguinte: seria o recurso a um conceito indeterminado, como o de "necessidades vitais da comunidade", o meio mais indicado de conferir efectividade a esta inversão do ónus da prova?
Se a ideia dos autores do projecto era a de inverter o ónus da prova quando estivesse em causa o fornecimento de serviços públicos essenciais, seria mais indicado a sua previsão expressa no texto da iniciativa ou uma remissão para a legislação específica sobre esta matéria.
Contudo, antevemos o pior se esta iniciativa viesse a ser aprovada, mercê desta aliança explosiva entre a excepção que é erigida em regra geral e a indefinição conceptual que a sustenta.
Por exemplo: será o direito à informação, previsto no artigo 37.º da Constituição, uma necessidade vital da comunidade? Estamos a pensar nos serviços noticiosos, por exemplo, que são uma das obrigações dos concessionários de serviço público de televisão e de radiodifusão e cujo tratamento deve obedecer a princípios de objectividade e isenção.
Partindo do princípio de que o direito à informação é integrável nas necessidades vitais da comunidade, será que os autores do projecto avaliaram as dificuldades que se poderão colocar aos concessionários destes serviços públicos, quando colocados perante a necessidade de provar que o tratamento noticioso de determinado facto não se desviou dos princípios de isenção e objectividade?
Os exemplos poderiam multiplicar-se, mas não é agora o que mais importa.
Entendemos que esta não é uma forma adequada de defesa dos interesses dos consumidores, porque põe essa defesa acima de outros interesses e princípios mais gerais, como sejam os da certeza e segurança jurídicas, para já não nos debruçar sobre as eventuais consequências nefastas que uma pseudogarantia como esta teria sobre o entendimento do privilégio da execução prévia como característica essencial de todos os actos administrativos, porque presumidamente praticados de acordo com a lei.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Deixemos à vasta panóplia de garantias já existentes a defesa dos direitos dos consumidores, de que são exemplo as Leis n.os 23/96 e 24/96, a primeira de 26 e a segunda de 31 de Julho, que criaram no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais e estabeleceram a definição do regime legal aplicável à defesa dos consumidores.
Nesta matéria, tem-se caminhado para um regime que, transcendendo o mero âmbito da preocupação do social, consagra princípios que constituem um verdadeiro código de regras de defesa daqueles direitos.
Deste ponto de vista, até nos atreveríamos a classificar esta iniciativa como um retrocesso, dada a incerteza que propenderia a instalar, pelas razões que atrás procurei explicitar com maior pormenor.
Não embarquemos, pois, em aventuras de futuro incerto,…

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - … porque essa é uma responsabilidade que temos: a de não legislar para criar confusão, a de não legislar para complicar, mas para resolver os problemas efectivos das pessoas.
Essa é a nossa preocupação e será em conformidade com essa posição que aqui daremos o nosso voto.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Para uma intervenção, tem a palavra, para encerrar este debate, o Sr. Deputado Lino de Carvalho

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Quero, muito brevemente, afirmar que nos surpreendeu o debate e a forma como as bancadas da maioria, em particular o PSD, se comportaram em relação a esta matéria.

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Sr. Deputado Montalvão Machado, permita-me que lhe diga que, do alto de alguma sobranceria académica,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Intolerância!

O Orador: - … ficou patente que a sua intervenção tem claríssimas insuficiências não só no plano jurídico mas também no plano político.
Temos como exemplo o recente debate que aqui travámos com o Sr. Ministro da Economia em que, em relação à qualidade dos serviços públicos que são prestados pela EDP ou pelas entidades que os concessionam, foi o próprio Ministro que, ao reconhecer a necessidade de se avançar nesse domínio, informou que o Governo estava a ponderar integrar no texto legal que vai dar corpo ao regulamento da qualidade dos serviços eléctricos a possibilidade da inversão do ónus da prova em relação aos incidentes permanentes que estão a registar-se em matéria de interrupções de fornecimento de energia eléctrica e aos prejuízos para os utentes, sejam cidadãos sejam empresas.
Não percebo por que é que isto é possível fazer ao nível do regulamento da qualidade dos serviços eléctricos e não é possível fazer ao nível de uma legislação geral, naturalmente balizada, ponderada e com todas as precauções para que não se torne no exercício de abuso de direitos, mas que permita generalizar, ao nível dos direitos dos consumidores, aquilo que o próprio Governo assume num sector específico.
Sr. Deputado Montalvão Machado, não percebo por que não é possível avançar na legislação sobre a responsabilidade civil do Estado, nos termos e nas condições que o Sr. Deputado Jorge Lacão aqui expôs e cuja intervenção queremos sublinhar.
Permita-me que lhe diga, Sr. Deputado, que a ideia de que o Estado tem sempre razão e de que os direitos dos cidadãos devem continuar a ser desprotegidos estão já desfasadas no tempo.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): - Não é nada disso!

O Orador: - Como já foi aqui dito, hoje - e o Sr. Deputado, tão ilustre académico e jurista que é, devia sabê-lo, aliás, não sei se passaria neste exame -, o debate sobre os direitos dos consumidores atravessa horizontalmente a nova jurisprudência nesta matéria.
Seria bom que o PSD desse um passo em frente nesta matéria e que, perante iniciativas da oposição, não afirmasse "chumba-se!" só por virem da oposição, assim procurando dissolvê-las sem fundamentos sólidos e sérios, sem ter em conta, neste caso concreto, o que são os novos direitos dos consumidores que urge proteger num quadro ponderado para que os mesmos não sejam objecto de abuso.
Manifestamos, pois, disponibilidade para trabalhar esta matéria em sede de especialidade, demonstrado que está que a intervenção do PSD não tem qualquer fundamentação - e não quero devolver-lhe os adjectivos que nos trouxe -, não é, seguramente, apta, nem juridicamente válida, nem politicamente escorreita em relação à matéria que temos estado a discutir.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Narana Coissoró): - Não há mais inscrições, pelo que está encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 165/IX.
Srs. Deputados, a próxima reunião plenária realiza-se quarta-feira, dia 7 de Maio, com início às 15 horas, e constará de período da ordem do dia integralmente preenchido com a interpelação n.º 4/IX - Sobre ambiente, ordenamento do território e sustentabilidade do desenvolvimento (Os Verdes).
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 35 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Paulo Martins Pereira Coelho
Arménio dos Santos
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando Jorge Pinto Lopes
Henrique José Monteiro Chaves
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Augusto Clemente de Carvalho
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Eduardo Artur Neves Moreira
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira

Partido Socialista (PS):
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
José Manuel de Medeiros Ferreira

Partido Popular (CDS-PP):
Henrique Jorge Campos Cunha

Partido Comunista Português (PCP):
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
José Manuel Pereira da Costa
Luís Manuel Machado Rodrigues

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4903 | I Série - Número 116 | 02 de Maio de 2003

 

Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
João Rui Gaspar de Almeida
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco

Bloco de Esquerda (BE):
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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4904 | I Série - Número 116 | 02 de Maio de 2003

 

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