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Sábado, 6 de Março de 2004 I Série - Número 60

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 5 DE MARÇO DE 2004

Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral

Secretários: Ex. mos Srs. Manuel Alves de Oliveira
Ascenso Luís Seixas Simões
Henrique Jorge Campos Cunha

S U M Á R I O


O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 10 horas.
Procedeu-se ao debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 229/IX - Tipifica o crime da mutilação genital feminina (CDS-PP). Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Isabel Gonçalves (CDS-PP), Odete Santos - que, na qualidade de relatora da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, procedeu também à apresentação do relatório -, Celeste Correia (PS), Adriana Aguiar Branco (PSD), Isabel Castro (Os Verdes), Alda Sousa (BE), Telmo Correia (CDS-PP), Luísa Portugal (PS) e Miguel Paiva (CDS-PP).
A Câmara apreciou ainda, conjuntamente, as petições n.os 27/VIII (1.ª) - Apresentada pela Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, solicitando a revogação imediata da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, 3/IX (1.ª) - Apresentada pela Associação Nacional de Sargentos (ANS), solicitando que a Assembleia da República adopte medidas no sentido da revisão do actual Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), e 31/IX (1.ª) - Apresentada pela Assembleia Municipal de Santiago do Cacém, alertando a Assembleia da República para a falta de pessoal médico e de enfermagem e degradação das instalações do Centro de Saúde de Santiago do Cacém e das respectivas extensões. Usaram da palavra os Srs. Deputados Henrique Campos Cunha (CDS-PP), Luísa Portugal (PS), José António Silva (PSD), Alda Sousa (BE), Bernardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes), Rodrigo Ribeiro (PSD), Paulo Veiga (CDS-PP), Marques Júnior e Alberto Antunes (PS) e Rodeia Machado (PCP).
A Sr.ª Presidente encerrou a sessão eram 11 horas e 55 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 10 horas.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Carlos de Sousa Pinto
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Joaquim Almeida Henriques
António Manuel da Cruz Silva
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Elvira da Costa Bernardino de Matos Figueiredo
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
Fernando António Esteves Charrua
Fernando Jorge Pinto Lopes
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Campos Vieira de Castro
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel de Matos Correia
José Manuel dos Santos Alves
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa

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Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Filipe Soromenho Gomes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Maria Isilda Viscata Lourenço de Oliveira Pegado
Maria João Vaz Osório Rodrigues da Fonseca
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Paula Barral Carloto de Castro
Maria Teresa da Silva Morais
Mário Patinha Antão
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Pedro Filipe dos Santos Alves
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Vasco Manuel Henriques Cunha

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Bernardes Costa
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Cabodeira
Fernando Pereira Serrasqueiro
Fernando Ribeiro Moniz
Guilherme Valdemar Pereira D'Oliveira Martins
Jaime José Matos da Gama

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Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José António Fonseca Vieira da Silva
José Augusto Clemente de Carvalho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
José Manuel Pires Epifânio
José Manuel Santos de Magalhães
José Maximiano de Albuquerque Almeida Leitão
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luísa Pinheiro Portugal
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson da Cunha Correia
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo

Partido Popular (CDS-PP):
Álvaro António Magalhães Ferrão de Castello-Branco
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos

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João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Manuel de Almeida Cambra
Manuel Miguel Pinheiro Paiva
Narana Sinai Coissoró
Paulo Daniel Fugas Veiga
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

Partido Comunista Português (PCP):
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
Lino António Marques de Carvalho
Maria Odete dos Santos

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Botelho Correia Sousa
Francisco Anacleto Louçã
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Isabel Maria de Almeida e Castro

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, hoje, a nossa ordem do dia é preenchida, na primeira parte, com a apreciação do projecto de lei n.º 229/IX - Tipifica o crime de mutilação genital feminina (CDS-PP) e, na segunda parte, com o debate das petições n.os 27/VIII (1.ª), 3/IX (1.ª) e 31/IX (1.ª).
Para apresentar o projecto de lei do seu grupo parlamentar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mutilação genital feminina existe, é uma prática frequente, particularmente em África, mas também em países da Ásia, do Pacífico, das Américas do Norte e Latina e da Europa.
Segundo dados fornecidos pelo Fundo das Nações Unidas para a População, divulgados pelo Departamento de Informação das Nações Unidas em Maio de 2000, calcula-se que entre 85 e 114 milhões de mulheres e raparigas, residentes principalmente em África, no Médio Oriente e na Ásia, foram submetidas à mutilação dos seus órgãos genitais.
A Organização Mundial de Saúde, segundo dados de Novembro de 2003, estima que mais de 130 milhões de mulheres e crianças foram já sujeitas a esta prática.
Por ano, são cerca de 2 milhões as mulheres e crianças que, naqueles países africanos, do mundo árabe e do sudoeste asiático, correm o risco de sofrer mutilação dos seus órgãos genitais.
Por dia, cerca de 6000 meninas são submetidas à mutilação genital, segundo dados divulgados pela organização Serviço para a Paz no Mundo, num seminário realizado em Portugal, no ano passado, subordinado ao tema "Mutilação Genital Feminina - Direitos Humanos e Saúde".
Os números mais altos são encontrados na Somália e no Djibouti. Nestes países, em 1992, 98% das mulheres jovens foram sujeitas a este ritual. No mesmo ano, na Eritreia, 90% das mulheres jovens foram também sujeitas a esta prática. Ainda em 1992, esta prática atingiu 250 000 mulheres na Guiné-Bissau.
A mutilação genital feminina ocorre igualmente em países da Europa Ocidental, segundo dados recolhidos num documento da autoria da Eurodeputada Emma Bonino e apresentado ao Parlamento Europeu em 2000, apontando as estimativas para cerca de 30 000 casos no Reino Unido, perto de 28 000 na Itália e para cerca de 20 000 mulheres em risco na Alemanha.
Em Portugal, o fenómeno é conhecido de forma empírica, pelo aparecimento, nos nossos hospitais, de parturientes que foram sujeitas a mutilação genital, provenientes sobretudo da comunidade guineense. No entanto, queixas ou denúncias não existem.
Estes são apenas os números conhecidos graças aos esforços da Organização das Nações Unidas, através dos seus departamentos especializados, no entanto, malgrado tais esforços, não deixamos de admitir a probabilidade da existência de elevadas cifras negras ou, dito de outro modo, de um défice de

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conhecimento da realidade efectiva.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mutilação genital feminina é uma prática comum a diversos povos por razões culturais, étnicas ou religiosas.
Os fundamentos desta prática são vários. Enquanto nalgumas comunidades assume a característica de ritual para assinalar a passagem de menina a mulher, noutras é encarada como forma de evitar que a mulher atinja o prazer, privilégio apenas reservado ao homem. Noutras ainda reflecte o consenso social imperante de que é preciso preservar a virgindade da rapariga e da mulher até ao casamento e que a sua sexualidade deve ser controlada. Nessas culturas, os homens não se casam com raparigas que não tenham sido sujeitas a esta prática por as considerarem impuras ou sexualmente indulgentes.
Importa referir que a mutilação genital feminina tem consequências graves a curto e a longo prazo. É extremamente dolorosa, pode provocar infecções urológicas crónicas, cicatrizes malignas ou mesmo a morte, provoca dificuldades no parto e, além do mais, é um factor acrescido de vulnerabilidade na transmissão do vírus VIH/SIDA. Em última análise, causa graves e irreversíveis danos na integridade física e psicológica da mulher, bem como na sua saúde sexual e reprodutiva.
A mutilação genital feminina é, em geral, praticada sem qualquer tipo de anestesia e sem quaisquer condições de higiene, utilizando-se nesta prática facas, tesouras, lâminas ou mesmo cacos de vidro.
A mutilação consiste na ablação total ou parcial do clitóris e outros órgãos genitais, assumindo três formas: a clitoridectomia; a excisão; e a forma extrema, a infibulação, que consiste na ablação total da parte externa dos órgãos sexuais femininos.
É um holocausto silencioso o das mulheres que continuam a ser sujeitas a esta prática. É um acto de violência e hediondo também porque, na maioria dos casos, é praticado por imposição ou com a participação de familiares e amigos.
É, além disso, um crime, na perspectiva do CDS-PP e também do Parlamento Europeu, que, através da sua Resolução 2001/2035 (INI), recomenda aos países da União que procedam à harmonização legislativa e à elaboração de legislação específica sobre a mutilação genital feminina sempre que a mesma não exista.
É ainda uma forma de resposta ao repto, se assim lhe podemos chamar, do Sr. Primeiro-Ministro no discurso proferido em 18 de Setembro de 2002, na tomada de posse da Dr.ª Amélia Paiva como nova Presidente da Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres, a quem foi pedido que considerasse a excisão feminina como fenómeno prioritário nas preocupações da Comissão.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tal como havia anunciado em declaração política produzida perante esta Câmara em 19 de Fevereiro do ano passado, o CDS-PP apresenta hoje uma iniciativa legislativa cujo objectivo é o de criar um novo tipo legal de crime no nosso Código Penal, especificamente destinado a punir a mutilação genital feminina.
Através deste projecto de lei, procede-se à tipificação do crime de mutilação genital, punindo-o com pena equivalente à prevista para o crime de ofensas à integridade física grave, constante do artigo 144.º do Código Penal, ou seja, de 2 a 10 anos de prisão.
Propõe-se o aditamento de um artigo 144.º-A, com a epígrafe "Mutilação genital feminina" ao capítulo respeitante aos crimes contra a integridade física. Igualmente, e em consequência desse aditamento, é proposta a inclusão do novo tipo legal nos artigos do Código Penal que curam da agravação pelo resultado (artigo 145.º) e que qualificam a ofensa à integridade física (artigo 146.º).
Finalmente, é proposto que, nestes casos, o consentimento não releve de forma alguma, pela introdução de um inciso de exclusão deste crime no artigo 149.º do Código Penal, que trata precisamente do consentimento nos crimes de ofensa à integridade física.
Poder-se-ia considerar que a mutilação genital feminina, em qualquer das suas formas, consistiria numa ofensa à integridade física e, portanto, já contemplada, ainda que de forma não expressa, no crime de ofensas à integridade física simples, o qual, como se sabe, pune tal conduta com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa. No entender do CDS-PP, porém, tal pena não é a adequada às condutas descritas.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não me diga que só está contemplada no artigo 143.º!

A Oradora: - Mostrando-se mais adequada a moldura penal do artigo 144.º, suscitaram-se-nos, porém, fundadas dúvidas de que as circunstâncias qualificadoras fossem aplicáveis, sem mais, ao caso da mutilação genital feminina ou, no mínimo, que abarcassem todas as feições que este fenómeno pode revestir.
Tendo em conta, porém, toda a envolvência cultural, religiosa e social da prática da mutilação genital feminina, não pôde o CDS-PP deixar de prever a circunstância de a mutilação ser feita a pedido da vítima, desde que tal pedido seja feito de forma séria, instante e expressa, caso em que se optou por

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prever a penalização equivalente à do homicídio a pedido da vítima, previsto no artigo 134.º do Código Penal.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É diferente, nada tem a ver com isso!

A Oradora: - Tendo sido esta a solução encontrada, não temos a pretensão de que a mesma seja perfeita, pelo que, evidentemente, estamos receptivos a melhoramentos que possam ser introduzidos, em sede de especialidade.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves, vou formular um pedido de esclarecimentos muito breve. Na apresentação do relatório, direi o que é que a relatora - que fui eu - pensa sobre isto e depois farei ainda uma intervenção.
Ouvi a intervenção da Sr.ª Deputada, mas esta não me esclareceu absolutamente nada em relação à questão de já existir, ou não, um artigo que puna esta situação. É evidente que não é o artigo 143.º, de que também falou, mas é o 144.º.
Pergunto-lhe, pois, quais são as mutilações genitais femininas que não entram nesse artigo, uma vez que temos uma definição muito concreta dessas mutilações, feita pela Organização Mundial de Saúde, que consta do relatório. Portanto, pergunto: quais são as mutilações que não entram na vossa proposta? A ablação do clitóris parcial ou a total? O clitóris não é um órgão importante, classificado no artigo 144.º? Quais são essas mutilações?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem! Boa pergunta!

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves.

A Sr.ª Isabel Gonçalves (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Odete Santos, talvez a Sr.ª Deputada não tenha tomado atenção quando referi os artigos do Código Penal. É que não referi o artigo 143.º mas, sim, o 144.º.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Não, Sr.ª Deputada; referiu-o, a uma dada altura.

A Oradora: - Prevemos a inclusão e a tipificação deste crime quanto a todas as mutilações genitais, repito, todas, desde a considerada mais leve e simplificada até à considerada a pior, que, como sabe, consiste na ablação total dos órgãos genitais externos femininos.

Protestos das Deputadas do PS Luísa Portugal, do PCP Odete Santos e de Os Verdes Isabel Castro.

O nosso Código Penal, como sabe, não prevê a tipificação deste crime, fala em ofensas corporais graves,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Pois fala!

A Oradora: - … e nós, CDS, o que pretendemos com este projecto de lei é que, efectivamente, no nosso Código Penal fique tipificada como crime a prática de mutilação genital feminina sem margem para dúvidas. Qualquer que seja essa mutilação, ela é considerada um crime, um atentado contra a integridade física das mulheres.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Também penso assim!

A Oradora: - O que queremos com este projecto de lei é que, sem margem para dúvidas, este crime fique tipificado, ainda que não se conheça se ele existe, para já, em Portugal. Mas pode vir a existir…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Ah!…

A Oradora: - … e, estando tipificado no nosso Código Penal, temos a lei adequada para punir

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qualquer dessas situações de mutilação genital.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Na qualidade de relatora, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos, para apresentar o relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Dispõe de 3 minutos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, serei efectivamente muito breve.
Do relatório consta a análise das mutilações genitais femininas definidas pela Organização Mundial de Saúde e que os países africanos recomendaram, no ano passado, em Addis Abeba, que fosse a definição seguida em todo o mundo. Ora, essa definição contém todas as mutilações, das mais ligeiras às mais graves.
Perante essa definição, no relatório faz-se a análise das mutilações genitais femininas para concluirmos se elas caem ou não na previsão legal do artigo 144.º do Código Penal e, efectivamente, consta das conclusões do relatório - que, aliás, foram aprovadas por unanimidade - já estarem incluídas no artigo 144.º do Código Penal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - De facto, percorrendo as alíneas todas do artigo 144.º do Código Penal, a conclusão a que chegamos é que, efectivamente, a previsão legal das mutilações genitais femininas já está prevista nesse artigo 144.º.
Ora, em termos de técnica jurídica, a primeira questão que se nos coloca é se esta é uma boa técnica. De facto, temos um artigo onde já está consagrado um crime e depois vamos fazer outro?
A outra questão, que, aliás, é uma questão sociológica bastante interessante, consiste no seguinte: é através da "feminização" do Código Penal que se deve, então, prosseguir na via da chamada discriminação positiva? A Prof.ª Dr.ª Teresa Beleza tem um apontamento muito interessante sobre este assunto, na sua tese.
Ora, para além do mais - e isto também consta do relatório -, da maneira como foi feita essa "intervenção cirúrgica" no Código Penal, uma previsão legal como essa conduz a que, então, o artigo 144.º vise as mutilações genitais masculinas e o artigo 144.º-A as femininas. Comparando os dois artigos, chegamos à conclusão de que as mutilações masculinas passam a ser mais penalizadas do que as femininas, porque no artigo que prevê as masculinas não há qualquer número que diga que a sua moldura penal será menos grave para os casos em que haja pedido sério e insistente da vítima. A conclusão é que, então, as mutilações masculinas são mais nobres para punir do que as femininas.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - É aí que entra aquele argumento do CDS!

Risos da Deputada de Os Verdes Isabel Castro.

A Oradora: - Por último, refiro apenas a questão do consentimento. O artigo 149.º também já tem a solução que, em relação às mutilações genitais femininas, conduz a não se contemplar o consentimento. A solução está lá, pelo que não é preciso qualquer alteração.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em vésperas do Dia Internacional da Mulher, data que gostaria de saudar, desde já, quero expressar que há quem diga que aqui, em Portugal, não precisamos de importar problemas - por exemplo, o véu, nas escolas; a mutilação genital feminina (MGF) -, mas bastaria que soubéssemos que, em Portugal, uma única mulher, uma única jovem fosse vítima da MGF para que considerássemos positivo o facto de o CDS-PP ter trazido este tema para a discussão!
A MGF é a mais espalhada e a mais mortal de todas as violências que vitima mulheres e raparigas, em África, em certas zonas da Ásia e do Médio Oriente, num número que as Nações Unidas calculam ser de milhões de mulheres. Ultimamente, com as migrações, esta prática passou igualmente a registar-se na Europa e em outras zonas do mundo.

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A MGF é uma prática inserida num ritual de passagem que mutila mulheres em razão do seu sexo, repito, em razão do seu sexo, é um acto de violência que as mantém submissas, subordinadas e indefesas perante as mulheres mais velhas, muitas vezes familiares, perante as fanatecas (as que praticam o fanado, ou seja, a MGF), perante os curandeiros, perante os homens.
O silêncio, o nosso silêncio, seria o melhor aliado para dar a esses homens a possibilidade de exercerem um controlo sobre a sexualidade, a autonomia e a vida das mulheres. Estas seriam e são depositárias da honra familiar e daí a necessidade de controlo sobre os seus corpos.
Falamos de estruturas sociais que se apoiam na desigualdade dos sexos e em relações desequilibradas de poder e nas quais a pressão social e familiar está na origem da violação do direito fundamental, que é o respeito pela integridade pessoal, pela saúde física e mental, bem como pelos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres.
Alguém disse, há tempos, em Portugal, como se viu na reportagem da jornalista Sofia Branco, no Público: "(…) não pode ser crime, porque é a nossa tradição. É um símbolo da nossa identidade, (…)".
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A tradição pode ser uma forma de reconhecimento mútuo, um código partilhado que, em situações de sofrimento, de perda, de solidão e discriminação, é um ponto de apoio fundamental. Mas nem sempre as crenças e as tradições contribuem para o desenvolvimento pessoal e colectivo do ser humano, a tradição pode ser retrógrada e pode ser um crime. Neste caso é um crime, e é um crime intolerável! Como são intoleráveis, para nós, outras tradições: a de seres humanos poderem ser apedrejados até à morte, sujeitos à pena de morte, a de decepar mãos ser castigo para o roubo, a de mulheres poderem ser queimadas com ácido e vítimas de crimes de honra e punições públicas, a de mulheres passarem uma vida inteira sem rosto e não serem tratadas em hospitais se aí não houver médicas, etc. É a idade das trevas em que parte do mundo ainda vive mergulhado e que nenhum relativismo cultural justifica, repito, nenhum relativismo cultural justifica.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Muito bem!

A Oradora: - O nosso respeito pelas tradições e costumes de outros povos acaba quando a questão se coloca ao nível dos direitos humanos, como disse e bem, há tempos, a Deputada Teresa Morais.
É evidente que é preciso usar de tacto e discrição ao analisarmos e legislarmos sobre questões que radicam em crenças tão profundamente arreigadas que, de culturais, com o correr do tempo, passam a religiosas. Temos, pois, de ser cuidadosos e pedagógicos.
As Eurodeputadas portuguesas que fazem parte da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade de Oportunidades no Parlamento Europeu consideram que, mais do que uma lei específica sobre a MGF, são necessárias medidas de prevenção e campanhas de sensibilização. São necessárias medidas no sentido de se modificarem os padrões sociais e culturais de conduta de homens e mulheres com práticas assentes em estereótipos de um ou de outro sexo. E porque esta questão envolve uma complexidade de factores sócio-culturais, económicos e sociais, é necessária uma abordagem multidisciplinar e intersectorial que promova a igualdade de oportunidades sem que haja lugar a estigmas junto de populações minoritárias onde a MGF é praticada.
É preciso oferecer apoio, por um lado, às mulheres que são vítimas de mutilação dos seus órgãos genitais e, por outro, à luta das organizações que se batem, em condições muito difíceis, por mudanças culturais.
A Associação para o Planeamento da Família entende também que esta questão não se circunscreve unicamente à lei penal, ela abrange a promoção da cidadania, a participação das comunidades e, especificamente, das mulheres, na resolução dos problemas que as afectam.
Este crime não está expressamente autonomizado e previsto na nossa lei penal, embora o artigo 144.º do Código Penal, segundo algumas interpretações jurídicas, o possa abranger, porque estamos perante a ablação de um importante órgão do ser humano.
Na União, para além da Espanha e do Reino Unido, não se conhecem outros países que tenham lei penal específica para a MGF, mas a Itália proíbe, terminantemente, aos médicos, a prática de qualquer forma de mutilação genital feminina.
A abordagem da MGF implica, igualmente, o respeito pelos acordos firmados nos fora da ONU, na União Europeia, no Comité Interafricano sobre Práticas Tradicionais, na União Africana, entre outros, e implica também que as acções sejam acompanhadas por programas e medidas estruturais.
É necessário que a MGF e outras formas de violência mas, particularmente, a MGF seja incluída nos programas de cooperação com os países em desenvolvimento onde esta prática exista.
É desejável e exige-se que, por um lado, sejam estruturados programas de saúde com objectivos de prevenção, actuação e apoio junto das comunidades migrantes, ao nível da saúde sexual e reprodutiva, incluindo o VIH/SIDA, a violência de género, a maternidade segura, o planeamento familiar, a

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erradicação da pobreza e, por outro lado, sejam desenvolvidas campanhas públicas de informação para autoridades policiais, médicos, professores, etc.
Exige-se ainda conteúdo explícito sobre a MGF e outras formas de violência nos programas de educação e igualdade de oportunidades.
Espera-se também que seja apresentada neste Parlamento a resposta de Portugal ao Comité para a Eliminação da Discriminação Contra as Mulheres, que, lembro, está em atraso.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta é uma questão complexa e movediça. Não queremos, e tenho a certeza de que os autores desta iniciativa também não querem, que ela pareça uma arma de arremesso contra a população imigrante em Portugal, ainda que encapotada. Não queremos que ela tenha um efeito contrário e leve as comunidades a fecharem-se ainda mais em defesa dos seus segredos e dos seus costumes ancestrais, um pouco à semelhança do que está a acontecer, neste momento, em França, com a proibição do véu islâmico, com todas as consequências daí advindas, como, por exemplo, a de as meninas deixarem de ir às escolas públicas.
Também queremos que as comunidades imigrantes saibam, sem equívocos, que não transigimos, aqui, em Portugal, com aquilo que é, para nós, o desrespeito pelos direitos humanos.
Não é fácil encontrarmos a actuação justa, séria e pedagógica que defenda as mulheres e jovens e seja promotora de cidadania e de desenvolvimento. Mas é justamente por não ser fácil que não podemos desistir, tendo sempre claro, nas nossas decisões, que o Estado de direito tem a obrigação de velar pelo respeito dos direitos individuais e combater todas as violações deste princípio. Para tal, é preciso punir o delito, sim, mas também pôr em prática uma estratégia global de educação/formação.
Em síntese, não somos contra a penalização de algo que viola os direitos humanos, mas o Parlamento deve sentir-se obrigado a desenvolver as medidas complementares que visem uma efectiva erradicação da MGF. Para este desiderato, contem com o PS.

Aplausos do PS e da Deputada do PSD Teresa Morais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Adriana Aguiar Branco.

A Sr.ª Adriana Aguiar Branco (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Comemora-se, na próxima segunda-feira, o Dia Internacional da Mulher, que aproveito, hoje, para evocar.
Como é sabido, embora esse dia não constitua, em si mesmo, a solução para problemas concretos, tem o grande mérito de, pelo menos uma vez por ano, dar voz a uma maioria silenciosa de mulheres que a não tem.
Lamentavelmente, os avanços, no que respeita à evolução para a igualdade plena de direitos, estão muito aquém do que seria justo e desejável. Por coincidência, o assunto de que hoje estamos a tratar é bem o retrato de quão longínqua está ainda essa tão proclamada igualdade de direitos.
Infelizmente, a mutilação genital feminina é apenas um dos muitos exemplos do vasto leque de atropelos à dignidade das mulheres que diariamente ocorrem por todo o mundo.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Se dúvidas houvesse quanto ao insucesso das políticas mundiais no combate à discriminação, desigualdade e violência contra as mulheres, as estatísticas relativas à mutilação genital feminina seriam suficientes para demonstrar o seu completo falhanço.
O costume de extirpar, total ou parcialmente, os órgãos genitais femininos é uma forma particularmente brutal de violência sobre as mulheres e tem as suas raízes numa concepção radicalmente injusta e discriminatória quanto ao lugar que as mesmas devem ocupar na sociedade, colocando-as numa posição de inferioridade face aos homens, que exercem uma função de controlo sobre a sua sexualidade, a sua autonomia e as suas vidas.
Não vou especificar aqui os diferentes tipos de mutilação genital feminina, descrever a forma e as condições arrepiantes em que a mesma se pratica nem as estatísticas assustadoras, pois esses aspectos foram já objecto de reflexão nesta Câmara quando o assunto aqui foi trazido, pela primeira vez, pela Sr.ª Deputada Isabel Gonçalves, do CDS-PP, e pouco tempo depois pela minha companheira de bancada Teresa Morais.
Tive, aliás, o cuidado de ler com atenção as intervenções proferidas em ambas as ocasiões e constatei a grande unanimidade e consenso que se gerou, quer quanto à veemente reprovação que tal prática deve merecer da nossa parte, quer quanto à necessidade de aprofundar se a mesma ocorre entre nós.
Esta é, claramente, uma questão de violação de direitos humanos a que todos somos igualmente sensíveis…

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Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - … e é bom, é muito bom verificar que estamos todos de acordo e não temos complexos em o assumir.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Efectivamente, como afirmou recentemente a Eurodeputada Emma Bonino, "os direitos humanos são património mundial, não têm limitações geográficas nem fronteiras, devendo preocupar todas as pessoas".
É por isso que embora a dimensão desta monstruosidade, a existir entre nós, nomeadamente no seio de certas comunidades imigrantes, não atinja grandes proporções, isso não deve ser motivo para o nosso alheamento.
Bastaria um único caso, onde quer que fosse praticado, para que condenássemos do mesmo modo essa prática hedionda e fossemos igualmente solidários com as mulheres e crianças que sofrem em silêncio.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Privar as mulheres do direito a fruirem em liberdade e plenitude a sua sexualidade é já em si uma prática sórdida, mas quando a ela está associada, como é sabido, a violação de regras elementares de saúde pública então torna-se verdadeiramente monstruosa.
Trata-se de ignorância, de crueldade pura e dura, de violação básica de direitos humanos, que os valores que adquirimos como nossos não podem tolerar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - E nem o argumento da tradição nos pode tornar menos sensíveis ao problema, pois não há costume ou cultura que justifique semelhante barbárie.
Estamos perante um caso em que a tradição deve ser claramente condenada já que o multiculturalismo tem limites, tendo necessariamente que ceder sempre que esteja em causa a violação de valores superiores.
É fundamental distinguir a tolerância e a defesa da diversidade cultural da permissividade e cumplicidade perante atitudes e costumes próximos da tortura e contrários ao respeito da igualdade e da dignidade das pessoas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Tradições como esta não merecem - não merecem mesmo! - o nosso respeito.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mas o que podemos nós fazer sem correr o perigo de ingerência e desrespeito pela autodeterminação dos povos onde esta prática é uma realidade avassaladora, nomeadamente na Guiné-Bissau, onde as nossas irmãs sofrem diariamente o horror dessa tortura e esse atentado à dignidade?
Podemos sempre, em nome da universalidade dos direitos humanos, expressos e proclamados em todos os tratados internacionais sobre a matéria, exercer pressão, nomeadamente a nível europeu, exigindo a tomada de medidas específicas e o respeito pelos direitos humanos aos Estados que são parceiros económicos da União Europeia e fecham os olhos a esta realidade que a todos deveria envergonhar.
Alertar o mundo e criar uma verdadeira onda de solidariedade, dando voz a quem a não tem, será só por si um valioso contributo, tanto mais que, como é sabido, o silêncio é o melhor aliado deste costume horrível e aberrante.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Em Portugal, podemos e devemos fazer ainda mais. Em primeiro lugar, é preciso investigar de modo a entender a real dimensão do problema, para depois, e rapidamente, começar a actuar

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sem hesitações, antes que o fenómeno se torne aceite e tolerado.

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Muito bem!

A Oradora: - Devemos ser firmes e fazer entender às comunidades imigrantes que este tipo de tradições constituem violações dos direitos humanos e que, por isso, são crimes que como tal devem ser punidos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Não creio, no entanto, que punir seja o único caminho a seguir, devendo, antes de mais, actuar-se preventivamente a nível pedagógico, informando, aconselhando e alertando para as consequências, quer físicas quer psicológicas, que tal prática provoca nas vítimas desse tipo de violência.
Trata-se aqui, sobretudo, de mudar mentalidades, pelo que o trabalho de sensibilização no terreno junto a essas comunidades é de importância capital.
O cerne da questão está em insistir que essas mutilações violam os direitos fundamentais das mulheres e crianças e em fazer entender que se trata de uma tradição perversa que deve ser erradicada.
Estou certa de que esta prática só desaparecerá se essas comunidades, e nomeadamente as mulheres, acreditarem que podem abandoná-la sem abdicar de aspectos significativos da sua cultura.
São por isso necessárias estratégias multifacetadas, designadamente com vista à formação e sensibilização, não só dos imigrantes mas também dos profissionais da saúde e dos serviços sociais.
O segredo está na prevenção e não na repressão ou discriminação desta ou daquela comunidade e está também na capacidade de sermos solidários sem, no entanto, transigirmos nos princípios.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

É um combate difícil, em que todos - Governo, políticos, poder local, médicos, organizações não governamentais e sociedade civil - devemos estar envolvidos.
Infelizmente, certo é que tudo o que fizermos será sempre pouco face ao muito que é necessário fazer.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Por tudo o que fica dito é de aplaudir esta iniciativa legislativa do CDS-PP, que louvamos quanto à questão de fundo que visa proteger.
Já quanto à forma encontrada, e do ponto de vista estritamente técnico-jurídico, temos algumas dúvidas de que a solução proposta seja a mais adequada.
É que a mutilação genital feminina já se subsume hoje ao crime contra a integridade física grave, previsto no artigo 144º do Código Penal,…

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - … não carecendo, por isso, de tratamento específico e autónomo. Não há de todo, em nosso entendimento, nenhuma lacuna na lei penal portuguesa relativamente a esta matéria que necessite de ser colmatada.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Relativamente à questão do consentimento da mulher, que o projecto de lei teve a preocupação de tornar ilícito, importa referir que se é verdade que no artigo actualmente em vigor se estabelece que "para efeitos do consentimento a integridade física considera-se livremente disponível", também o é que o consentimento só funciona como causa de exclusão de ilicitude se "o facto não ofender os bons costumes",…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - … como determina o n.º 1 do artigo 38º do Código Penal, que terá sempre de ser visto e articulado com o disposto no n.º 1 do artigo 149.º.
Ora, é obvio que a mutilação genital feminina é contrária aos bons costumes, razão pela qual o consentimento da mulher não afasta a ilicitude do facto, o que implica a punição do agente, que conhece o consentimento, com a pena prevista para o crime de ofensa à integridade física, ou seja, prisão de 2 a 10 anos.

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A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É isso mesmo!

A Oradora: - Acontece, porém, que o projecto lei, ao consagrar um regime específico para a mutilação genital feminina, acaba, embora sem o pretender, por tratar a questão do consentimento de forma mais leve e menos grave do que a que resulta do regime actualmente vigente, já que ao invés de punir o agente, que conhece o consentimento da mulher, com pena idêntica ao que realiza a prática sem esse consentimento, ou seja, prisão de 2 a 10 anos, o pune apenas com uma pena de prisão até 3 anos, o que é substancialmente inferior e não nos parece adequado.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exacto!

A Oradora: - Acresce que, face à pequena expressão que o problema tem entre nós, é duvidoso que deva merecer uma tipificação específica.
Pode, inclusive, essa atitude ser interpretada como discriminatória pelas minorias que muito respeitamos e prejudicar o processo de integração de algumas comunidades imigrantes, em que todos estamos empenhados e que pretendemos plena e pacífica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pelas razões expostas, o Grupo Parlamentar do PSD, reconhecendo e aplaudindo a importância desta iniciativa legislativa, que teve, desde logo, o grande mérito de trazer a debate e alertar para esta problemática, propõe a reanálise do projecto de lei na 1.ª Comissão, a fim de que se encontre a solução mais adequada, até no quadro global das alterações ao Código Penal, que, como é sabido, estão em apreciação na mesma Comissão.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra a Sr. ª Deputada Isabel Castro.

A Sr. ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mutilação genital feminina é um acto de violência, que não pode, em caso algum, ser aceite ou ser justificado.
A mutilação genital feminina é uma violação dos direitos humanos e, como aqui já foi referido, os direitos humanos são universais, não têm diferentes interpretações em diferentes latitudes.
A mutilação genital feminina significa, a par do apedrejamento, da punição em praça pública, dos casamentos forçados, da escravatura, do tráfico e da exploração sexual, é um dos muitos crimes que são cometidos com base no género e em valores ditos de honra e que afectam mulheres de todas as idades, culturas e religiões. Não é uma realidade que possa ser tolerada de modo algum, já que, para além de atentatória da integridade humana e da saúde física e mental das mulheres, reflecte a discriminação de que, lamentavelmente, muitas e muitas mulheres são ainda objecto em todo o planeta.
A mutilação genital feminina é, pois, um atentado horroroso contra a integridade física da mulher, contra a sua dignidade e contra a plenitude dos seus direitos sexuais e reprodutivos, que não pode, em caso algum, ser aceite.
A realidade da mutilação genital feminina, tal como outras formas peculiares de violência contra as mulheres, tem sido objecto de cada vez maior atenção por parte dos diferentes fóruns internacionais. Sabe-se quais são os cerca de 28 países - situam-se, principalmente, no continente africano e em alguns países da península arábica, como o Iémen, os Emiratos Árabes Unidos, na Indonésia e na Malásia - onde esta violência contra as mulheres é perpetrada.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a questão que para nós se coloca na discussão desta iniciativa política, que compreendemos na sua bondade, é a de saber em que medida a procura de tipificação diferenciada se justifica para além daquilo que o Código Penal já contempla no seu artigo 144.º, que, do nosso ponto de vista, dá total enquadramento jurídico ao crime que a mutilação genital feminina tem implícito. Do nosso ponto de vista, não se justifica, e por isso temos imensas reservas em relação a esta iniciativa e à solução que ela preconiza.
Temos para nós que há um enorme trabalho a fazer, tal como é alertado em muitas das recomendações internacionais do Conselho da Europa e como também já foi referido em recomendação do Parlamento Europeu. Recordo, aliás, que a mesma recomendação do Parlamento Europeu, que chama a atenção para a necessidade de os países que não têm legislação - não é o caso do nosso - de punição da mutilação genital feminina a criem, exorta os países a que se abstenham de agir judicialmente contra as mulheres que tenham feito abortos ilegais. O problema que está colocado é, no mesmo plano e sempre em última análise, o velho problema, tão lentamente resolvido, da garantia da plenitude de direitos para as mulheres.
Em nosso entendimento, há um trabalho de prevenção e de informação a fazer no nosso país, é necessário que a cooperação portuguesa faça aquilo que ao longo de anos não tem feito, designadamente

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programas de cooperação nas áreas da saúde e da educação para prevenir estes crimes, tendo em conta que eles ocorrem nalguns dos países de língua portuguesa, como em regiões de Angola e na Guiné-Bissau.
É nosso entendimento que aquilo que aconteceu há um ano, em Portugal, não pode voltar a acontecer: uma mulher queniana que procurou refugiar-se em Portugal, porque era perseguida pela sua família, que lhe impunha uma mutilação genital, e a quem foi recusado o direito de asilo. Do nosso ponto de vista, o asilo político deve passar a ver diferentemente a questão da mutilação genital feminina e, nessas circunstâncias, a acolher essas mulheres, o que actualmente não faz.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar, senão ser-lhe-á desligado o microfone.

A Oradora: - É nosso entendimento que há todo um enorme trabalho a fazer, por Portugal, na cooperação, mas também enquanto parte integrante da União Europeia com os seus parceiros…

O Sr. Presidente: - Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Segundo a definição da Organização Mundial de Saúde, a mutilação genital feminina abrange todos os processos de remoção total ou parcial dos órgãos genitais externos por razões de ordem cultural e não terapêutica.
É praticada desde a antiguidade em muitos países de África e em partes do mundo árabe e sudeste asiático; ao contrário do que às vezes é sugerido, não tem no Islão a sua origem. A Organização Mundial de Saúde estimava, em 2001, que apenas em África cerca 140 milhões de mulheres sofriam mutilação genital feminina, quase sempre praticada quando ainda crianças.
A prática da mutilação genital feminina atenta contra os direitos das crianças e contra a sua integridade, traduzindo-se em consequências irreversíveis na saúde das mulheres: consequências físicas, psicológicas e sexuais. Constitui uma das mais graves violações dos direitos fundamentais das mulheres, nomeadamente dos direitos sexuais e reprodutivos. A mutilação genital feminina é um acto de violência brutal que não pode ser justificado com bases nas tradições ou na cultura. Nada pode explicar essa violência.
A mutilação genital feminina é um crime hediondo e, como tal, deve ser punida no Código Penal.
Contudo, o projecto que o CDS-PP traz para esta discussão tem uma abordagem extremamente limitada da problemática da mutilação genital feminina. Limita-se, única e exclusivamente, à via repressiva, não tratando nunca das formas ou dos meios de erradicar esta tradição.

Protestos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.

E, no entanto, quer na Europa quer em muitos outros países, incluindo muitos países africanos, muito já foi pensado, testado, avaliado, criticado. Há muitas experiências feitas no terreno, quer de ONG que trabalham em África quer de ONG que na Europa acompanham as comunidades onde a mutilação genital feminina se pratica. Não partimos, portanto, do zero. Há também muitas resoluções internacionais: da Organização Mundial de Saúde, da UNICEF, da Conferência de Pequim, da conferência do Cairo de 2003 e de outras instâncias internacionais, mas referir-me-ei, em particular, à resolução do Parlamento Europeu.
Nesta resolução condenam-se energicamente as mutilações genitais femininas e solicita-se à Comissão que defina uma estratégia integral para a eliminação da prática das mutilações genitais femininas na União Europeia, que não se deve limitar à simples denúncia destes actos, e que estabeleça mecanismos não apenas jurídicos e administrativos, mas também preventivos, educativos e sociais, que permitam às mulheres que são vítimas ou que se encontram na situação de virem a sê-lo obterem uma protecção efectiva.
Pede-se à Comissão, ao Conselho e aos Estados-membros que tomem medidas no que respeita à concessão de autorizações de residência e à protecção das vítimas desta prática, reconhecendo o direito de asilo às mulheres, jovens e meninas que se encontrem em risco de sofrerem mutilações genitais.
A resolução não deixa de recordar que o estabelecimento de redes entre as organizações não governamentais e as organizações baseadas nas várias comunidades a nível nacional, regional e internacional é fundamental para o êxito da erradicação das mutilações genitais femininas e da troca de informações e experiência e para a realização de esforços conjuntos. A prevenção das mutilações genitais femininas deve converter-se também numa prioridade dos programas de cooperação em matéria de saúde e de direitos sexuais e reprodutivos.

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Pensamos que estas recomendações do Parlamento Europeu, bem como a declaração do Cairo de 2003, poderiam ser um importante ponto de partida para uma discussão séria.
Vale a pena ainda consultar o interessante estudo da Associação de Planeamento Familiar, segundo o qual ficamos a saber que 97% dos profissionais de saúde inquiridos em Portugal não têm, de facto, dúvidas em afirmar que a mutilação genital feminina não deve, em caso algum, ser aceite e que 53% defende ainda a adopção de um protocolo de actuação a ser aplicado pelos profissionais de saúde perante eventuais casos.
O Bloco de Esquerda pretende contribuir para esta discussão com algumas propostas concretas: que mulheres ou suas filhas que tentem escapar à mutilação genital feminina possam ser acolhidas ao abrigo do direito de asilo, alterando-se assim, em sede de revisão constitucional, o artigo 33.º, de forma a consagrar o direito de asilo por razões humanitárias e para que não volte a acontecer o que aconteceu com a jovem Susan, mulher queniana, que fez um pedido de asilo e que ainda continua à espera de uma resposta; que o problema da mutilação genital feminina deverá ser incluído no Plano Nacional para a Igualdade de Oportunidades e nos planos de cooperação ao nível da educação e da saúde; que sejam promovidas acções junto dos profissionais de saúde em Portugal, nomeadamente para o estabelecimento de um protocolo médico que inclua também o acompanhamento psicológico, tal como recomenda a Organização Mundial de Saúde; e que seja promovido, apoiado e incentivado um trabalho de mediação social, cultural e de saúde nas comunidades.
A mutilação genital feminina deve ser punida no Código Penal. Mas se ficarmos por aqui, pouco mais faremos do que aliviar as nossas consciências. Exige-se mais. Exige-se uma atitude que vise transformar a realidade.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Há dois ou três anos, integrei uma delegação europeia que visitou dois países de África, o Burkina-Faso e o Mali, na base de um programa do IPPF (International Planned Parenthood Federation) de apoio às comunidades africanas, nomeadamente às mulheres.
No Mali tive ocasião de ver o trabalho de organizações não governamentais em relação a esta questão das mutilações genitais femininas e descobri, através de vídeos que nos foram mostrados, a brutalidade destas mutilações. No final, todos os membros da delegação estavam com lágrimas nos olhos.
Verifiquei que no Mali é desenvolvido um grande combate à mutilação genital feminina através de programas de sensibilização da comunidade para a gravidade dessa prática. Tive, assim como toda a delegação, ocasião de confraternizar numa cooperativa de mulheres ex-excisadoras - neste crime as excisadoras e as mães é que são as arguidas - que abandonaram voluntariamente a prática da sua actividade - que é uma prática altamente rentável, sendo a excisadora muito venerada nestas comunidades - devido às tais acções de sensibilização.
Assisti a pequenos espectáculos de teatro, organizados por grupos de jovens, que os desenvolvem na rua, junto das comunidades, sobre a mutilação genital feminina.
Finalmente, os deputados malineses disseram-nos que criminalizar não resolveria o problema, porque num país vizinho (que não me lembro qual é), quando foi aprovada a lei da criminalização, houve uma rebeldia e fizeram-se excisões colectivas e em público.
Num trabalho muito importante do FNUAP (Fundo das Nações Unidas para a População) sobre esta questão, apresentado num seminário realizado em Portugal, podemos ver que a percentagem de execução das leis, que existem nalguns países, é praticamente nula. Lembro-me que a maior percentagem de condenações teve lugar no Burkina-Faso, que tem uma lei que pune, e onde 60 mulheres foram condenadas a prisão. Mas nos outros países trata-se, de facto, de uma lei meramente simbólica.
Criei, pois, a convicção de que se tinha de lutar contra este problema através de um investimento grande nesses meios preventivos, e que no Mali eram efectivamente utilizados dentro das possibilidades do país.
É por isso que, ao discutirmos esta questão assim, desligada de qualquer outro programa de prevenção, como existe na Noruega - a Noruega tem um importante programa de prevenção das mutilações genitais femininas -, parece que estamos a ter uma atitude xenófoba. Ontem, um jornalista da RDP África telefonou-me para que eu, como relatora da comissão, dissesse qualquer coisa sobre o problema, tendo-me colocado a questão da seguinte forma: "Diga lá por que é que o Parlamento português vai criminalizar uma prática cultural?" Foi assim!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Essa prática é uma barbaridade!

A Oradora: - É verdade que é uma barbaridade! Mas, agora, temos de ir junto das mulheres que pertencem a essas comunidades para ver o que pensam e reflectir sobre como há-de tratar-se o problema. É uma barbaridade, não tenho dúvidas absolutamente nenhumas sobre isso. Mas repito que temos de ver como há-de tratar-se a questão, e não é desta forma, através da tipificação de crime.
Aliás, como eu própria já disse, e consta do relatório, esta prática cabe no artigo 144.º do Código Penal, excepto para quem pensa que o clitóris não é um órgão importante. Mas nós não pensamos assim.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

A Oradora: - Isto leva-nos a outra questão.
Não vou debruçar-me sobre os aspectos legais, porque já estão tratados. No entanto, chamo a atenção para a Declaração do Cairo, de 2003, em que representantes de 38 países africanos onde existe este hábito falaram sobre o que deveria ser feito, tendo recomendado que esta questão fosse enquadrada noutros problemas - direitos das mulheres, direito à saúde, igualdade de oportunidades. Recomendaram ainda, até porque eles é que trabalham com estas questões, que esta matéria fosse tratada com o máximo cuidado, que é o que o CDS não quer que se faça.

Protestos do CDS-PP.

Reprimir, reprimir, reprimir, é só o que vocês sabem fazer!

Protestos do CDS-PP.

Aliás, há uma forma de tratar este problema através da educação sexual, o que os senhores não querem! Este problema tem de ser tratado através da educação sexual ministrada nas escolas para que, desde pequeninas, as crianças comecem a não aceitar esta prática bárbara e selvagem.

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar, senão ser-lhe-á desligado o microfone.

A Oradora: - Termino, dizendo que esta é uma prática que o colonialismo não extirpou…

O Sr. Presidente: - Sr.ª Deputada Odete Santos, como já tinha alertado, o seu tempo terminou.

Aplausos do PCP à intervenção da Deputada Odete Santos.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Para que efeito, Sr. Deputado?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, a Sr.ª Deputada Odete Santos fez uma afirmação que constitui uma inverdade óbvia a que o meu grupo parlamentar tem de reagir, seja através da figura de defesa da honra da bancada seja interpelando a Mesa.
Refiro-me, não ao contexto global da intervenção, porque a Sr.ª Deputada tentou fundamentar uma posição, mas à questão da educação sexual.

O Sr. Presidente: - Se se considera afrontado, Sr. Deputado, tem a palavra para defesa da honra da bancada.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): - Sr. Presidente, serei muito breve. De resto, nem seria preciso invocar o direito de defesa da honra da bancada.
Apenas quero dizer à Sr.ª Deputada que procura divergências numa matéria em relação à qual penso não ter de haver divergência.
É que a tipificação do crime, ainda que possa entender-se que este já tem contemplação penal, certamente não é prejudicial e, como sabe, foi esse o caminho seguido por vários países quanto a esta matéria. Portanto, a tipificação certamente não é prejudicial nem é contraditória com outras medidas que tenham de ser tomadas, sobre as quais até estaria disposto a concordar consigo, porque entendo que são

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relevantes, são importantes e têm de ser tomadas. Ou seja, esta parte da discussão não obsta a tudo o resto que a Sr.ª Deputada disse e sobre o que até poderíamos estar de acordo.
O que não aceito - e é o que queria deixar claro - é que a Sr.ª Deputada venha dizer que somos contra a educação sexual nas escolas quando, anteontem mesmo, e conjuntamente com o Grupo Parlamentar do PSD, aprovámos um diploma que visa precisamente reforçar a componente de educação para a saúde e de educação sexual nas escolas.
Nós votámos anteontem e fizemo-lo em consciência. Portanto, Sr.ª Deputada, não pode dizer o que disse. Pode dizer que o nosso modelo não é o mesmo da Sr.ª Deputada, mas não pode dizer que não defendemos a educação sexual nas escolas porque não é verdade. Somos a favor da informação, somos a favor da educação e foi nesse sentido que votámos anteontem.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, respondo-lhe dizendo-lhe que o projecto de lei que apresentam era absolutamente desnecessário, porque esta prática já está criminalizada.
Não diga que outros países fizeram o que os senhores aqui vêm propor, pois são apenas dois, o Reino Unido e a Espanha. Nos restantes países da União Europeia onde este crime é denunciado ele é punido ao abrigo da moldura penal de "ofensas à integridade física", como, por exemplo, em França.
Portanto, se, no nosso país, houver uma queixa por causa de uma prática destas, a pessoa que tiver praticado uma mutilação genital feminina não deixará de ser punida ao abrigo do artigo 144.º do Código Penal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

A Oradora: - Não vou reeditar agora uma discussão que tivemos na sessão da passada quarta-feira, mas toda a gente sabe o que pensa a Sr.ª Secretária e Estado da Educação sobre educação sexual, o que, aliás, provocou gargalhada geral.
No debate sobre o aborto, os senhores vieram falar sobre educação sexual, ao que vos respondo que é uma hipocrisia!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): - Lá está a linguagem do costume!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Portugal.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na discussão sobre a matéria que hoje tratamos, aliás, como noutros locais e até noutros países da União Europeia, vêm à colação muitos argumentos que têm a ver com questões sanitárias, de saúde. A este propósito, surge o grande argumento, com que desde já concordo, de que esta questão da mutilação genital feminina, sendo uma violência infligida sobre as mulheres, é um problema de saúde pública.
De facto, este é um problema de saúde pública, mas é de tal maneira complexo que não pode encarar-se estritamente em termos da criação de melhores condições sanitárias, de melhor tratamento ou de melhor intervenção.
A questão não pode, de facto, encarar-se dessa forma porque um típico problema de saúde pública não é criminalizável. O caso em discussão, para além de um problema de saúde pública, é, de facto, uma violência sobre as mulheres e traz consequências graves.
Penso que, para a resolução deste problema em termos mais gerais, o pior que pode acontecer é querer-se medicalizar o seu tratamento. Os médicos têm de estar preparados para lidar com esta questão mas o problema em si não pode ser medicalizado.
É que ainda que esta prática seja realizada em boas condições higiénicas, com bisturis bem esterilizados, com a mulher comodamente anestesiada, não deixa de ser um crime. Portanto, mesmo que praticado em boas condições do ponto de vista médico, não deixa de ser um crime. É esta a questão que não quis deixar de trazer aqui, nesta intervenção obrigatoriamente breve.
Aproveito o breve tempo de que ainda disponho para dizer que, hoje, em Portugal, temos de ter algum cuidado no que toca à criminalização desta prática violenta. É que estamos a tratar com comunidades

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específicas, identificadas, conhecidas, e podemos suscitar um efeito de alguma forma adverso no sentido de que todo o silêncio que envolve este problema se torne mais denso, portanto, mais preocupante e mais difícil de romper, não nos permitindo, assim, resolver uma questão que, naturalmente, todos queremos ver resolvido.

Vozes do PS e do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Paiva.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A mutilação genital feminina constitui, de facto, uma das mais graves violações dos direitos fundamentais das mulheres e, quanto a isso, todos estamos de acordo. É um acto de violência extrema que nenhuma razão, seja de que natureza for - cultural, religiosa -, pode justificar.
Não se trata aqui da estigmatização de quaisquer minorias mas, antes, do combate de práticas assentes numa concepção de inferioridade da mulher, o que, de facto, tem de ficar bem claro.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Trata-se de promover a plena cidadania e não de estigmatizar quem quer que seja.
Não posso deixar de estranhar e de vincar aqui a incoerência de quem, como o Bloco de Esquerda, vem dizer que o problema é preocupante e que é um assunto importante, considerando, porém, o nosso projecto de lei insuficiente e não apresentando qualquer alternativa, qualquer proposta, que possa resolver este problema.
É evidente que…

O Sr. Presidente: - Srs. Deputado, o seu tempo esgotou-se.

O Orador: - Termino, Sr. Presidente, referindo rapidamente o seguinte…

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas não posso dar-lhe mais tempo. Tenho pena, mas a regra é esta.
Srs. Deputados, está encerrado o debate, na generalidade, do projecto de lei n.º 229/IX (CDS-PP), que será votado, na generalidade, na primeira ocasião regimental.
Vamos passar à apreciação conjunta das petições n.os 27/VIII (1.ª) - Apresentada pela Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, solicitando a revogação imediata da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, 3/IX (1.ª) - Apresentada pela Associação Nacional de Sargentos (ANS), solicitando que a Assembleia da República adopte medidas no sentido da revisão do actual Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR), e 31/IX (1.ª) - Apresentada pela Assembleia Municipal de Santiago do Cacém, alertando a Assembleia da República para a falta de pessoal médico e de enfermagem e degradação das instalações do Centro de Saúde de Santiago do Cacém e das respectivas extensões.
Cada grupo parlamentar dispõe de 10 minutos, que administrará como muito bem entender, para intervir sobre estas três petições.
Tem a palavra o Sr. Deputado Henrique Campos Cunha.

O Sr. Henrique Campos Cunha (CDS-PP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: É presente à Assembleia da República a petição n.º 27/VIII (1.ª), da iniciativa da Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, subscrita por 4680 cidadãos e que deu entrada nesta Assembleia no dia 14 de Abril de 2000.
Os peticionantes vêm exigir a revogação da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, que veio disciplinar a actividade profissional dos odontologistas, por considerarem que a mesma se traduziu numa mera legalização administrativa de um conjunto de indivíduos que não possuíam formação adequada e a competência exigida internacionalmente.
A referida lei, que resultou de dois projectos, um do PS e outro do CDS-PP, foi aprovada por unanimidade e veio disciplinar a profissão de odontologista, considerando odontologistas os profissionais como tais inscritos no Ministério da Saúde, desde que exercessem a profissão há, pelo menos, 18 anos e tivessem tido uma formação profissional em saúde oral de, pelo menos, 900 horas, à data da entrada em vigor da referida lei.
A Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, também considerava odontologistas os profissionais que

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comprovadamente exercessem a profissão há, pelo menos, 18 anos e que, embora não possuíssem uma carga horária de formação profissional em saúde oral de, pelo menos, 900 horas, a viessem a adquirir até três anos após a entrada em vigor da lei, concedendo o Ministério da Saúde uma autorização provisória para o exercício da actividade.
Em 22 de Fevereiro de 2002, a Lei n.º 4/99 foi alterada pela Lei n.º 16/2002, que resultou de um projecto de lei do Partido Socialista, aprovado por unanimidade. A referida lei aditou uma disposição que considerou a profissão de odontologista residual, ficando expressamente vedadas quaisquer medidas que visassem a regularização de situações profissionais para além das previstas. Também considerou como definitivas as legalizações previstas na Lei n.º 4/99.
Em 22 de Agosto de 2003, foi publicada a Lei n.º 40/2003, que expressamente revogou as Leis n.os 4/99 e 16/2002 e que veio regular e disciplinar a actividade profissional de odontologia, restringindo, ainda mais, o acesso à profissão e referindo especificamente os actos que os mesmos podem ou não praticar.
Com esta lei, o Governo deu provimento à pretensão dos peticionantes.

Vozes do CDS-PP e do PSD: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Luísa Portugal.

A Sr.ª Luísa Portugal (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Em relação à petição n.º 27/VIII (1.ª), da iniciativa da Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, penso que praticamente tudo foi dito pelo Sr. Deputado que me antecedeu. Até porque, de alguma forma, ela perdeu o seu objecto aquando da substituição da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, por iniciativa deste Ministério da Saúde, por uma outra semelhante ou que, no fundo, tem o mesmo âmbito ou o mesmo objecto.
No entanto, gostava de dizer mais alguma coisa, porque penso que todos nós temos de ler alguns sinais nas petições que os cidadãos fazem entrar nesta Assembleia.
De facto, quando jovens em formação trazem, de alguma maneira, crítica a outros profissionais que têm desempenho aparentemente na mesma área, penso que estamos em áreas que têm a ver com a mesma formação e com o desempenho enquanto profissionais de saúde. E é pena que não esteja presente nenhum representante do Ministério da Saúde para eventualmente nos dar algumas respostas, pois a verdade é que, no fim de 2001, estava preparado um plano estratégico para a formação nas áreas da saúde, plano esse que, a meu ver, é um documento extremamente importante em termos de conhecimento do que se passa actualmente com a formação e com as futuras vagas e preenchimentos por parte dos profissionais de saúde e até - como o nome diz, plano estratégico - para prever, em termos de futuro, o que vai acontecer com os vários intervenientes profissionais na saúde.
Repito: é pena que não esteja presente ninguém do Ministério da Saúde para nos dizer em que fase é que está, passados dois anos de governação PSD/CDS-PP, a estratégia para os recursos humanos e concretamente para a formação - e, se cá estivesse alguém, provavelmente, até aproveitaríamos para saber coisas mais concretas, como, por exemplo, o que se passa com a ampliação da rede de ensino superior, nomeadamente, na área da medicina, e isto porque lê-se muita coisa na comunicação social, mas, de concreto, nada sabemos.
Deixo, no entanto, todas estas questões para uma altura em que o Ministério da Saúde se faça representar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José António Silva.

O Sr. José António Silva (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A petição n.º 27/VIII (1.ª), da iniciativa da Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, é subscrita por 4680 cidadãos e tem como objectivo a revogação da Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, a qual disciplinava a actividade profissional dos odontologistas.
Segundo os peticionantes, a Lei n.º 4/99, embora assumindo como principal objecto o enquadramento ético e deontológico de uma classe profissional já existente, veio a traduzir-se numa mera legalização administrativa de um conjunto de indivíduos que comprovadamente se encontravam a exercer uma profissão, apesar de, na altura, não terem formação para tal.
Relativamente à pretensão dos peticionantes, cumpre referir que, na anterior Legislatura, a matéria em, apreço foi objecto de uma iniciativa legislativa que deu origem à Lei n.º 16/2002, de 22 de Fevereiro,

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a qual veio introduzir a primeira alteração ao diploma referido pelos peticionantes, a Lei n.º 4/99.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Longe vão os tempos em que vivíamos com défice de estomatologistas e médicos dentistas. Longe vão os tempos - felizmente para nós - em que a cobertura dos cuidados de saúde dentária estava a cargo quase exclusivamente de pessoas sem formação médica.
O panorama actual é diferente. Existem, em Portugal, sete faculdades de medicina dentária, que formam cerca de 500 novos médicos dentistas por ano, contribuindo, assim, para a existência de recursos humanos suficientes e de qualidade.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Em 1991, com a criação da Associação Profissional dos Médicos Dentistas, depois, em 1998, com a transformação da Associação em Ordem dos Médicos Dentistas e, posteriormente, em 2003, com a Lei n.º 44/2003, de 22 de Agosto, que visava a segunda alteração ao Estatuto da Ordem dos Médicos Dentistas e que comete a esta Ordem a obrigação de controlar o acesso à profissão e ao exercício clínico, mediante provas de agregação e cumprimento de obrigações de estágio pós-licenciatura, tudo titulado pela Ordem, e, simultaneamente, com a Lei n.º 40/2003, de 22 de Agosto, a Assembleia da República regulou e disciplinou a actividade profissional de odontologia, revogando, deste modo, a Lei n.º 4/99, de 27 de Janeiro, e indo ao encontro daquilo que era o desejo dos peticionantes.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Sousa.

A Sr.ª Alda Sousa (BE): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, a petição n.º 27/VIII (1.ª), que aqui hoje discutimos, apresentada pela Associação de Estudantes da Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto, remete-nos para uma importante questão: a medicina dentária no nosso sistema de saúde e as condições do exercício profissional da mesma profissão.
O Bloco de Esquerda, aliás, já apresentou, nesta Legislatura, um projecto de lei, defendendo a integração da medicina dentária no Serviço Nacional de Saúde. De facto, a situação actualmente existente neste sector é intolerável: 60% da população portuguesa não tem hipóteses económicas de aceder às clínicas dentárias privadas, sendo que 98% dos médicos dentistas exerce exclusivamente na medicina privada.
Neste caso, o que nos parece importante é estender, e não limitar, as condições de acesso da população aos cuidados de saúde oral, razão pela qual nos parece mais importante que o Ministério da Saúde cumpra os preceitos de qualidade na creditação da autorização provisória para o exercício de actividade e fiscalização da mesma do que limite os direitos de profissionais, que, assim sendo, cumprem os requisitos dispostos em lei, vistoriados pelo Ministério da Saúde, e que não têm culpa de que, aquando do início da sua carreira profissional, a mesma não dispusesse de formação superior.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República foi confrontada, em anteriores legislaturas, com o problema da disciplina profissional dos odontologistas, que nunca foi resolvido por qualquer dos governos.
No momento inicial em que estes profissionais começaram a exercer as suas funções, o Estado socorreu-se deles, embora não tendo os mesmos formação superior, para resolver graves problemas de insuficiência nos cuidados de saúde oral e que continuam, aliás, a existir no nosso país.
É evidente que a legislação que foi aprovada pelo esforço consensual dos vários partidos na Assembleia da República não os transformou em médicos dentistas, nem em estomatologistas, isto sempre ficou absolutamente claro. É por isto que não têm todas as competências, mas apenas um núcleo restrito, definidas na lei e bem delimitadas, e que esta é uma categoria residual que desaparecerá à medida que estes profissionais, que, legitimamente, têm agora o seu exercício reconhecido nas condições em que a lei prevê, forem deixando de exercer a profissão.
Aliás, o período transitório estabelecido na lei inicial já terminou e, portanto, está exactamente delimitado o universo de profissionais nesta matéria.
Esta solução envolveu amplas consultas em sede de Comissão aos intervenientes, incluindo a Ordem

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dos Médicos Dentistas, os próprios interessados, e foi aprovada por unanimidade.
Resta dizer que continuamos a ter no nosso país graves problemas de saúde oral, que continuamos a não ter no Serviço Nacional de Saúde a disponibilidade e a acessibilidade a cuidados de saúde oral, designadamente pela falta de médicos dentistas e estomatologistas no Serviço Nacional de Saúde, não havendo, sequer, a carreira de médicos dentistas, e que não é solução para este problema, como o Governo parece querer indiciar, contratar por convenção médicos dentistas para estes cuidados de saúde. É preciso integrá-los nos hospitais e nos centros de saúde do Serviço Nacional de Saúde para aí se garantir os cuidados de saúde à população.
Melhor seria que o Governo também se preocupasse com a proliferação de cursos no sector privado de medicina dentária em condições que a Ordem dos Médicos Dentistas e que os estudantes de medicina dentária têm denunciado como precárias e que podem pôr em causa, para além de, eventualmente, um excesso de médicos dentistas, o que também tem de ser suplantado pela sua integração no Serviço Nacional de Saúde, a qualidade dos cuidados prestados e da formação dos profissionais.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes). - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta petição remete-nos para uma questão que, há muitos anos, reflecte uma situação conflituante, porque, por um lado, durante décadas, a actividade de médico dentista foi preenchida por técnicos de outra formação mas que manifestamente eram os únicos em Portugal capazes de dar uma resposta a um sector importante da saúde, a saúde dentária, e, por outro, hoje, a questão remete-nos, já numa perspectiva diferente, para problemas de formação e de deficiente formação levadas por diante por algumas escolas privadas do País, sem a atenção devida da tutela, em cursos, o que a prazo vai ser comprovado, pondo no mercado técnicos que não estão habilitados correctamente para o exercício da sua função. Estes cursos têm, designadamente, um peso excessivo de disciplinas nas áreas das ciências sociais e das línguas, mas onde a efectiva prática da medicina tem um papel residual, pelo que, naturalmente, isso vai ser penalizador e os efeitos negativos dessa deficiente qualificação vão fazer-se sentir.
Por último, gostaria de dizer que a petição remete-nos para a velha questão das enormes lacunas existentes em Portugal na área da saúde oral, que continua a ser um parente pobre, que continua a ser em exclusivo exercida no quadro da medicina privada e que está arredada do Serviço Nacional de Saúde, com todas as implicações negativas que essa situação acarreta.

O Sr. Presidente: - Para apreciar a petição n.º 3/IX/1.ª, tem a palavra o Sr. Deputado Rodrigo Ribeiro.

O Sr. Rodrigo Ribeiro (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho pena que o tempo disponível para análise da petição n.º 3/IX (1.ª) seja tão curto, uma vez que é inversamente proporcional ao muito tempo e há muita dedicação que todos os Deputados da Comissão de Defesa Nacional têm dedicado a este tema. Aliás, creio que posso falar por todos os Deputados da Comissão que tiveram uma especial atenção em todas as iniciativas, em todas as actividades dos sargentos portugueses.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No que concerne à presente petição, ela só por si já é uma evolução. O simples facto desta petição estar hoje aqui na Assembleia já é uma evolução e com certeza absoluta de que os sargentos portugueses disto não se esquecerão. Como também não se esquecerão de que não são nem mais nem menos do que os restantes pares das Forças Armadas, pelo que não devem ser nem prejudicados nem beneficiados, e estão dependentes, como, aliás, todos os militares, daquilo que for a melhor opção escolhida para todos os membros, sem excepção, das Forças Armadas.
Em relação à matéria, vários são os assuntos peticionados, e a mesma foi objecto de dois relatórios, aliás, aprovados por unanimidade, sendo que é de salientar que o Ministro de Estado e da Defesa Nacional já se pronunciou em conferência de imprensa, onde disse ser finalmente possível corrigir a distorção de níveis remuneratórios, por exemplo, entre os sargentos das Forças Armadas e da GNR. E o próprio Presidente da ANS (Associação Nacional de Sargentos) referiu, textualmente, que "via com bons olhos esta medida, até porque já tinha sido reivindicada junto do governo anterior".
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, aqui fazem-se leis, não se fazem milagres.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

O Orador: - E os problemas das Forças Armadas - e são muitos - serão resolvidos em conjunto.

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E é neste espaço de tempo, em que se espera que o Governo faça um pouco do muito que há para fazer, que se verá não a classe de sargentos mas a classe dos sargentos. Da parte da minha bancada e creio que da parte da maioria e de quase todos os Deputados, estou certo de que todos, sem excepção, fazemos votos para que os sargentos de Portugal tenham exactamente aquilo que fizerem por merecer.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Veiga.

O Sr. Paulo Veiga (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao abrigo do exercício do direito de petição previsto na Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto, a Associação Nacional de Sargentos entregou uma petição colectiva com 6277 assinaturas, vindo mais tarde a formalizar a exposição, com a entrega pessoal de 1790 assinaturas ao Sr. Presidente da Assembleia da República.
A petição agora em discussão tem como principal objectivo alertar para a necessidade de se fazer uma nova revisão do Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR).
Em primeiro lugar, é de realçar e de considerar o exercício aqui presente, do direito de petição colectiva dos militares, estabelecido nos termos da nova redacção dada ao artigo 31.º da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas - é uma evolução muito positiva nos direitos dos militares.
A petição aqui em discussão chama a atenção para o facto do presente EMFAR não praticar princípios fundamentais de desenvolvimento de carreiras, nomeadamente o princípio da universalidade e da igualdade de oportunidades.
Alerta, igualmente, para o descontentamento e a desmotivação sentidas pela classe de sargentos por virtude de o legislador, aquando da Lei n.º 25/2000, de 23 de Agosto, não ter introduzido mecanismos de fluxos contínuos e equilibrados nas carreiras destes militares.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Orador: - Resolver a problemática no desenvolvimento das carreiras militares, inserir mecanismos capazes de assegurar um fluxo contínuo e equilibrado de acesso vertical aos diferentes postos da classe de sargentos e ainda harmonizar os três ramos das Forças Armadas são as aspirações destes peticionantes.
O Grupo Parlamentar do CDS-PP está atento a esta situação e demonstra a sua preocupação pela situação vivida. O EMFAR aprovado pelo governo do Partido Socialista, em 1999, foi alvo de críticas por parte do meu partido. Parte das reivindicações da ANS são justas e legítimas e devem, por isso, merecer, da nossa parte e na medida das possibilidades financeiras do País, o nosso apoio.
Aproveito, ainda, para relembrar que o Governo, através do Ministério da Defesa Nacional, anunciou para esta Legislatura, o agendamento do projecto de revisão do EMFAR, no sentido de resolver grande parte destes problemas, demonstrando, assim, estar atento às necessidades manifestadas por esta Associação.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A propósito da petição apresentada pela Associação Nacional de Sargentos, gostaria de dizer, e não é um figura de retórica, que a Associação Nacional de Sargentos tem tido uma importância extraordinária na consolidação da nossa própria democracia e que se deve à ANS, através da forma como se tem comportado ao longo destes anos, o ter criado as condições para que a Assembleia da República legislasse sobre o associativismo das Forças Armadas.
Os militares e todas as pessoas que passaram pelas Forças Armadas sabem que os sargentos são a espinha dorsal das próprias Forças Armadas; são, portanto, um elemento absolutamente essencial das Forças Armadas.
Temos tido, ao nível da Assembleia da República e do Governo, ao longo destes anos, uma relação institucional muito correcta com a Associação Nacional de Sargentos e tal deve-se - é justo reconhecê-lo - à forma como a Associação Nacional de Sargentos e os sargentos em geral têm encarado a sua missão de estarem ao serviço dos portugueses, sem, naturalmente, deixarem de abdicar daquela que é efectivamente uma acção essencial de uma organização como a ANS e de pugnarem por aqueles que são os legítimos direitos e expectativas que lhes têm sido criados.
Em relação à maior parte das reivindicações que constam desta petição, pessoalmente considero-as justas e reconheço que não são de hoje mas de há alguns anos a esta parte. E, a nosso ver, atendendo e

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considerando que uma grande parte das reivindicações é muito técnica e muito específica e que a resolução de um problema cria naturalmente, a montante e a jusante, outro tipo de problemas, deve ser prioritariamente o Governo a equacionar e a tratar deste problema. Aliás, de acordo com aquilo que está legislado em termos de petições, a Comissão de Defesa Nacional pediu ao Governo a melhor atenção para a estas matérias, e aguardamos a resposta do Governo, sendo certo que, como agora disse o Sr. Deputado Paulo Veiga, o CDS-PP, quando estava na oposição, considerava justas as reivindicações. Logo, agora, que está no Governo e juntamente com o Sr. Ministro Paulo Portas, tem uma grande oportunidade para encontrar as soluções para estes problemas.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Creio que a Assembleia da República não pode, nem deve, abdicar das suas responsabilidades específicas,…

O Sr. Guilherme d'Oliveira Martins (PS): - Muito bem!

O Orador: - … mas deve ter o sentido de responsabilidade para entender que algumas destas matérias não podem, tecnicamente, a não ser com algum sentido de irresponsabilidade, ser exclusivamente objecto de atenção pela Assembleia da República.

O Sr. Pedro Silva Pereira (PS): - Com certeza!

O Orador: - Portanto, neste domínio, o Governo assume a grande responsabilidade.
O Partido Socialista mantém a sua posição, que é a de acompanhar com todo o interesse e a de incentivar e apoiar o Governo, e reserva-se o direito de tomar uma atitude, relativamente a estas matérias, se o Governo manifestar dificuldade em encontrar soluções para estes problemas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em 21 de Março de 2001 - vai para três anos -, a Associação Nacional de Sargentos apresentou uma petição a esta Assembleia, subscrita por mais de 6000 cidadãos, solicitando a atenção do Parlamento para um conjunto de propostas de alteração ao Estatuto dos Militares das Forças Armadas.
As razões de descontentamento dos sargentos, em relação à sua situação estatutária, haviam sido expostas à Comissão parlamentar respectiva, em Fevereiro de 2000. No entanto, a revisão do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, ocorrida em Agosto desse mesmo ano, não teve em conta essas preocupações.
A petição apresentada contém um conjunto significativo de propostas, visando alterar as regras de desenvolvimento das carreiras militares, alterando designadamente os tempos mínimo e máximo de permanência nos postos; visando a inserção de mecanismos capazes de assegurar um fluxo, contínuo e equilibrado, de acesso vertical aos diferentes postos da classe de sargentos, com a eliminação de disparidades entre ramos quanto ao tempo médio de permanência nos postos; visando ainda harmonizar as carreiras dos sargentos dos três ramos das Forças Armadas, de forma a eliminar situações de injustiça geradoras de desmotivação e de graves problemas institucionais.
Em Maio de 2002, pouco tempo após o início da presente Legislatura, mas mais de um ano após a entrega da petição, a Comissão de Defesa Nacional aprovou um relatório intercalar, solicitando um parecer sobre a matéria ao Ministério da Defesa Nacional.
Em 6 de Junho de 2002, esse parecer foi efectivamente solicitado e, como não houve resposta, a Comissão voltou a debruçar-se sobre ao assunto em Fevereiro de 2003, reiterando a solicitação e chamando a atenção para o dever legal que, nos termos da lei, impende sobre o Ministério da Defesa Nacional - o dever de, segundo o regime do exercício do direito de petição, dar resposta prioritária aos pedidos relativos a petições apresentadas na Assembleia da República.
A resposta dada, em três linhas, pelo Ministério da Defesa Nacional, um mês depois, refere tão-só "que se estima para breve o agendamento do projecto de revisão do EMFAR, tendo a Associação Nacional de Sargentos sido ouvida sobre a questão em apreço".
Ou seja, o Ministério da Defesa Nacional recusou-se a cumprir a lei, negando o parecer que lhe foi solicitado pela Comissão parlamentar, a menos que, por absurdo, alguém se atreva a considerar como

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parecer as três linhas que acabei de citar, as quais só tiveram o mérito de demonstrar duas coisas: a falta de respeito pela lei e pela Assembleia da República, por parte do Ministério da Defesa Nacional, e a sua falta de vontade em resolver as questões concretas suscitadas pela Associação Nacional de Sargentos.

O Sr. Honório Novo (PCP): - Exactamente!

O Orador: - A prova disto foi a mais recente revisão do EMFAR, que não teve minimamente em conta essas preocupações e que faz com que a petição apresentada mantenha toda a sua pertinência e actualidade.
Pela nossa parte, e reconhecendo a complexidade técnica do processo em causa, queremos declarar aqui a nossa disponibilidade para considerar atentamente as propostas apresentadas, visando corrigir injustiças que afectam a classe dos sargentos. Mas, para que esse processo tenha sentido útil, importa conhecer com clareza a posição da maioria.
O Governo recusou-se até agora a dar resposta às propostas constantes na presente petição e recusou mesmo a colaboração que lhe foi solicitada pela Assembleia da República, pelo que importa saber o que tenciona fazer a maioria: se secundar a posição do Governo, ou se está disponível para apreciar, com atenção, as propostas dos peticionantes, como nós próprios estamos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Antunes.

O Sr. Alberto Antunes (PS): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PS saúda a iniciativa da Câmara Municipal de Santiago do Cacém e a participação cívica dos cidadãos que chamam a atenção para os problemas de saúde que os afecta.
O distrito de Setúbal, na altura dos governos do Partido Socialista, teve um forte investimento na área dos equipamentos destinados aos cuidados primários de saúde. Foram construídos de raiz 17 novos centros de saúde no distrito e intervencionados, ao nível da reparação, muitos outros centros de saúde.
Relativamente ao litoral alentejano, foi feita a expropriação do terreno e lançado o concurso de construção do centro de saúde de Alcácer do Sal, bem como elaborado o projecto do centro de saúde de Sines, cujo concurso apenas não foi lançado por divergências, relativamente ao local de implantação, com a respectiva câmara municipal.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Muito bem!

O Orador: - O desenvolvimento do litoral alentejano e os investimentos que o anterior governo projectou e executou nesta região exigem e impõem que estes sejam acompanhados da resolução dos problemas de acesso à saúde por parte da população residente. Foi com esta preocupação que o anterior governo lançou o concurso de concepção e construção do hospital regional do litoral alentejano.
A obra estava praticamente concluída e só a não assumpção de responsabilidades por parte do actual Governo, que não quis continuar a obra e atrasou o lançamento do concurso para o fornecimento de energia eléctrica e de aquisição de equipamentos, impede que este esteja em pleno funcionamento neste momento.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Infelizmente, o novo hospital abrirá com o orçamento e o quadro de pessoal do anterior, o que, quanto a nós, é manifestamente insuficiente.
Equipamento novo exigiria orçamento adequado e quadro de pessoal ajustado. Se isto é verdade, reconhecemos que os recursos humanos não se resolvem tão facilmente como a construção de equipamentos. Ora, foi com o objectivo de colmatar esta lacuna que o anterior governo alargou o acesso às faculdades de medicina existentes, criou duas novas faculdades de medicina e, no distrito de Setúbal, uma escola de enfermagem e auxiliares de acção médica.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Mas, no quadro de soluções transitórias, adoptou ainda as seguintes medidas: a contratação de médicos de centros de saúde para prestar serviços ao nível da urgência do hospital (no serviço de atendimento permanente e no serviço de urgência); a contratação provisória de médicos em

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Espanha, para colmatar as lacunas existentes na região; e, também, a contratação de alguns especialistas disponíveis para o Hospital Conde do Bracial.
A nossa convergência com os países da União Europeia exige que a prestação de cuidados primários de saúde seja uma prioridade absoluta. É urgente e indispensável que, para além do direito constitucionalmente consagrado, o acesso à saúde seja uma exigência ética e moral de um Estado ao serviço dos cidadãos.

Aplausos do PS e do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Rodeia Machado.

O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição que hoje discutimos - petição n.º 31/IX (1.ª) -, apresentada pelo município de Santiago do Cacém e visando, exactamente, chamar a atenção para a questão dos cuidados primários de saúde dos habitantes daquela zona, foi subscrita por 4622 cidadãos e entregue na Assembleia da República no dia 6 de Março de 2003, faz, portanto, amanhã um ano.
A situação, pode dizer-se, mantém-se inalterada: num universo de aproximadamente 29 000 utentes, 9000 não dispõem de médico de família - é uma situação verdadeiramente gritante! - e o centro de saúde de Santiago do Cacém não dispõe de instalações convenientemente apetrechadas para, em condições, prestar cuidados de saúde primários à população. E esta deterioração das instalações, a par do pequeno quadro de pessoal existente, demonstrado exactamente pelo facto de 9000 utentes não terem médico de família, é uma situação que tem de ser rapidamente ultrapassada. Aliás, o levantamento desta situação, aquando da interpelação do PCP sobre as questões da saúde, denunciou a existência de uma situação gritante no interior do País - e não só, também no litoral -, em virtude da falta de médicos e da existência de instalações pouco apetrechadas para prestar os cuidados de saúde primários.
Esta é uma situação que tem de ser ultrapassada. Os municípios como parte interessada em primeira linha, dada a sua privilegiada situação de proximidade com os eleitores, têm conhecimento e capacidade de interpretar as condições, ou as não condições, existentes em relação aos seus cidadãos.
Hoje mesmo irá ser debatida no litoral alentejano, em Santiago do Cacém, a mesma questão de saúde que diz respeito não só ao Centro de Saúde de Santiago do Cacém mas ao hospital do litoral alentejano, localizado nesta região, que já aqui foi referido.
Esse hospital é um hospital novo, mas tem um orçamento e um quadro de pessoal do hospital antigo. Ora, assim não se resolvem os problemas nem se cumpre o compromisso formalizado, cuja matéria não está hoje em cima da mesa, que diz respeito à abertura da maternidade no novo hospital.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Exactamente!

O Orador: - É uma situação gritante!!
É preciso compreender e conhecer aquela região, onde, por exemplo, em Odemira, há mulheres parturientes que têm de ir para Beja e que, muitas vezes, têm os filhos dentro das ambulâncias, sem quaisquer condições.
Repito: é uma situação gritante!! Os números não podem ser só aferidos pela quantidade de população que existe, mas pela situação clara e objectiva das necessidades de cuidados primários. Ora, nesta situação da maternidade, o Governo não pode ter "um peso e duas medidas" nem uma leitura sobre o carácter economicista da saúde.
A privatização não resolve o problema. Pode ser um passo em alguns aspectos, mas o Serviço Nacional de Saúde é fundamental e está constitucionalmente consagrado para dar apoio à população em termos de cuidados primários e de cuidados secundários.
É essa petição que está em cima da mesa e é isso que o Governo deve fazer o mais rapidamente possível.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José António Silva.

O Sr. José António Silva (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A petição n.º 31/IX (1.ª), subscrita por 4622 cidadãos, é da iniciativa do município de Santiago do Cacém.
Ouvimos aqui o Sr. Deputado Alberto Antunes saudar a iniciativa. Penso que aquela saudação foi por essa iniciativa ter sido tardia, pois já deveria ter sido feita há mais tempo, precisamente quando o Partido

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Socialista esteve no governo e não satisfez a pretensão das pessoas de Santiago do Cacém.

O Sr. Afonso Candal (PS): - Abram o hospital!

O Orador: - Quero sublinhar que somos sensíveis a estes problemas de saúde e também à solicitação dos peticionários, que foi no sentido de que a Assembleia da República interviesse junto do Ministério da Saúde de forma a ser preenchido o quadro de pessoal do centro de saúde, bem como a beneficiar as suas instalações. E porquê? Porque segundo os peticionários os cuidados de saúde primários estão muito aquém das necessidades reais daquela população. Há carência de médicos - para cerca de 10 000 utentes há 100 médicos de família - e há carências de pessoal de enfermagem, sendo necessário dar cobertura a estas necessidades.
Referem também os peticionários que este não é um problema novo, não sendo, pois, da responsabilidade deste Governo. Este Governo tem algumas responsabilidades porque governa há dois anos, mas os próprios peticionários reconhecem que esta situação já se arrasta há alguns anos. Ora, nesta matéria também há responsabilidade do Partido Socialista. Por isso não vejo motivo para grandes entusiasmos por parte do Partido Socialista na saudação que faz ao município por esta iniciativa…!

O Sr. Afonso Candal (PS): - Abram o hospital!

O Orador: - Para o Partido Social-Democrata, como já referi, a saúde é uma matéria muito sensível, mas são igualmente sensíveis as razões invocadas pelos peticionários.

Risos da Deputada de Os Verdes Isabel Castro.

Ó Sr.ª Deputada, é verdade! Somos sensíveis à saúde. O que é que a senhora quer?

O Sr. Afonso Candal (PS): - Muito sensíveis…!

O Orador: - Nesse sentido, e após o contacto com os responsáveis da Administração Regional de Saúde, porque estamos interessados em satisfazer as pretensões e em dar uma resposta ao que nos é solicitado pelos peticionários, ou seja, a nossa intervenção, transmito aos Srs. Deputados que estamos a tentar resolver este assunto.
Já foram abertos dois concursos para preenchimento de três vagas na carreira de médicos de família, mas infelizmente ficaram desertos. Tentou-se, sem êxito, atrair os médicos espanhóis, mas eles não responderam aos convites. Contratou-se uma médica que esteve lá durante algum tempo, mas que, por razões familiares, abandonou o concelho e foi para o Algarve. Se não fosse a disponibilidade de médicos colocados em outros centros de saúde para colmatarem as necessidades daquele centro de saúde a situação estaria muito pior.

O Sr. Afonso Candal (PS): - E o que é que o Governo fez? Zero!

O Orador: - Temos de reconhecer que tem havido a disponibilidade dos profissionais de saúde para colmatarem uma necessidade que é por todos nós reconhecida, atendendo a que assumimos e reconhecemos que há cerca de 10 000 utentes sem médico de família.

O Sr. Afonso Candal (PS): - E não há soluções!

O Orador: - Quanto às instalações, vai ser aberto um novo hospital, que foi iniciado no mandato do Partido Socialista - e tiveram sete anos para o pôr a funcionar.
Relativamente ao centro de saúde, vai ser ampliado o existente ou, então, vai ser arrendado o edifício contíguo de modo a satisfazer as necessidades da população.
Quero aqui realçar que têm sido feitos bastantes investimentos em instalações em Santiago do Cacém.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.

A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta petição de mais de 4000 cidadãos de Santiago do Cacém, vem alertar e confrontar a Assembleia da República com a

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desprotecção e a ausência de cuidados primários de saúde em zonas significativas do nosso território, muito particularmente no litoral alentejano.
Estamos aqui em concreto com cerca de 30 000 utentes inscritos, dos quais 9230 não têm, pura e simplesmente, qualquer resposta em termos de médico de família, ou seja, são excluídos do sistema.
Esta questão é grave e tem hoje maior actualidade porque, independentemente de os técnicos de saúde, de os médicos procurarem dar resposta a esta situação e, portanto, colmatarem as brutais deficiências do sistema nesta região, a verdade é que as reformas de muitos destes cidadãos têm vindo a colocar em patamares mínimos, que são intoleráveis, a situação em termos dos profissionais de saúde, que se tem vindo a degradar, juntando-se a isto a degradação das condições físicas de prestação de cuidados de saúde.
Esta é uma situação que sabemos que não é nova, mas, não sendo nova, é totalmente lamentável que a maioria não explique por que é que não deu resposta, por que é não honrou os seus compromissos em relação a estes cidadãos, que são tratados como cidadãos de segunda, e como é que ainda hoje, dois anos depois de terem assumido responsabilidades no Governo, se permitem reconduzir, de uma forma estéril, a discussão a questões de "heranças" ou de procura de identificação do momento exacto em que os problemas aconteceram.
Os problemas existem, exigem uma resposta e é isso que estes 4 600 cidadãos vêm fazer: alertar a Assembleia da República para que não deixe de estar atenta a este problema e, mais, para que seja capaz de pressionar designadamente os partidos da maioria para assumirem a sua responsabilidade, que é a de garantirem a prestação de cuidados de saúde primários aos quais estes cidadãos estão hoje, pura e simplesmente, impedidos de aceder.

O Sr. Presidente: - Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Antunes.

O Sr. Alberto Antunes (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostaria de responder ao Sr. Deputado José António Silva dizendo-lhe o seguinte: efectivamente, como já referi, o Governo do Partido Socialista construiu 17 novos centros de saúde no distrito de Setúbal. Em seis anos - não sete, como o Sr. Deputado referiu -, quintuplicou nos cuidados primários de saúde o investimento que o anterior governo do PSD tinha feito.
Tal como referi na minha intervenção, é evidente que, ao nível dos recursos humanos, não é tão fácil nem tão simples colmatar as lacunas que o Partido Socialista herdou do anterior governo do PSD. Mas a esse nível concretizámos um conjunto de acções como seja o alargamento do acesso de novos alunos às Faculdades de Medicina, a criação de duas novas Faculdades de Medicina e a criação, no Instituto Politécnico de Setúbal, da escola de enfermagem e de auxiliares de acção médica. Tudo isto foram acções que concretizámos.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, o seu tempo esgotou-se. Tem de terminar senão ser-lhe-á desligado o microfone.

O Orador: - Para terminar, devo dizer que, paralelamente, foram adoptadas algumas soluções transitórias como seja o recrutamento de médicos no estrangeiro…

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Veiga.

O Sr. Paulo Veiga (CDS-PP): - Ex.mo Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Petição n.º 31/IX (1.ª) é da iniciativa da Assembleia Municipal de Santiago do Cacém e está subscrita por 4 622 cidadãos. Deu entrada aqui, na Assembleia da República, em Março do ano passado e solicita que esta Câmara se debruce sobre a situação vivida pelos utentes do Centro de Saúde do concelho de Santiago do Cacém.
Os munícipes de Santiago do Cacém, bem como a sua Assembleia Municipal, expõem uma situação preocupante: segundo os peticionantes, o seu Centro de Saúde padece de falta de médicos e enfermeiros, e as instalações das suas extensões encontram-se degradadas de ta1 forma que os cuidados de saúde devidos à população de Santiago do Cacém são postos em causa em resultado desta conjuntura.
Compreendemos que estes problemas são sentidos de forma aguda pela população, tanto mais que a saúde é um direito elementar de todos os cidadãos.
Assim, a situação descrita não pode deixar de nos inquietar. No entanto, estamos também conscientes de que a solução para este problema terá de passar por uma actuação governamental, nomeadamente através do Ministério da Saúde.

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Temos a certeza de que também o Governo não é alheio a estes problemas e que está a fazer os possíveis para resolvê-los e proporcionar melhores cuidados de saúde à população de Santiago do Cacém.
De facto, e quanto à falta de pessoal médico, já foram abertos dois concursos, num total de três vagas, para fazer face a este problema. No entanto, um ficou deserto e outro encontra-se ainda a decorrer. Por outro lado, em 2003, foi contratada uma médica que, entretanto, concorreu para outro local, pelo que o problema se manteve - aliás, esta questão já foi salientada pelo Sr. Deputado do PSD José António Silva.
Apesar disto, conseguiu-se que alguns médicos de outros centros de saúde se desloquem a Santiago do Cacém para aí realizarem consultas e, assim, de alguma forma minimizarem o problema criado pela falta de profissionais de saúde.
É, aliás, de louvar, o profissionalismo dos médicos deste Centro de Saúde que tentam, com a sua actuação, acudir a todas as extensões, bem como aos utentes sem médico.

O Sr. Miguel Paiva (CDS-PP): - Muito bem!

O Orador: - Estamos, portanto, perante um problema de falta de profissionais na área da saúde, que, infelizmente, afecta não só a população de Santiago do Cacém mas também muitos outros cidadãos nos mais diversos pontos do País.
O Governo já tomou medidas para corrigir esta carência, mas, infelizmente, os seus efeitos não são muitas vezes visíveis no curto prazo.
No que toca à degradação das instalações, já foram realizados vários investimentos para que a situação seja corrigida, mas o assunto terá de ser pensado em articulação com a abertura do novo hospital, para que a oferta em termos de saúde seja coordenada e para que a população de Santiago do Cacém possa, no futuro, usufruir de cuidados de saúde de qualidade, eficazes e que possam responder às suas necessidades.

Aplausos do CDS-PP e do PSD.

O Sr. Presidente: - Sr.as e Srs. Deputados, a lista de oradores está esgotada, pelo que declaro encerrado este debate.
Chegámos ao fim dos nossos trabalhos.
A próxima reunião plenária terá lugar na próxima quarta-feira, às 15 horas, constando da ordem do dia a apreciação da proposta de lei n.º 112/IX.
Está encerrada a sessão.

Eram 11horas e 55 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
José Apolinário Nunes Portada
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel de Medeiros Ferreira
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Rui do Nascimento Rabaça Vieira

Partido Popular (CDS-PP):

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João Rodrigo Pinho de Almeida

Partido Comunista Português (PCP):
José Honório Faria Gonçalves Novo

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Social Democrata (PSD):
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Social Democrata (PSD):
Alberto Pedro Caetano
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Carlos Jorge Martins Pereira
Eduardo Artur Neves Moreira
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Miguel Gonçalves Miranda
Luís Cirilo Amorim de Campos Carvalho
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Sérgio André da Costa Vieira

Partido Socialista (PS):
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
António Luís Santos da Costa
Francisco José Pereira de Assis Miranda
José da Conceição Saraiva
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Popular (CDS-PP):
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.

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