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Sexta-feira, 11 de Maio de 2007 I Série — Número 82

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 10 DE MAIO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Abel Lima Baptista

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Procedeu-se à eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República proposto pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.
Foram discutidos conjuntamente, na generalidade, o projecto de lei n.º 324/X — Define o regime socioprofissional aplicável aos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual (PCP), a proposta de lei n.º 132/X — Aprova o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos, o projecto de resolução n.º 48/X — Recomenda ao Governo a criação de um regime laboral, fiscal e de protecção social especial para os trabalhadores das artes do espectáculo (CDS-PP) e o projecto de lei n.º 364/X — Estabelece o regime laboral e social dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual (BE), que foram aprovados. Intervieram, a diverso título, além da Sr.ª Ministra da Cultura (Isabel Pires de Lima) e do Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), Cecília Honório (BE), Maria José Gambôa (PS), Arménio Santos (PSD), João Oliveira (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP), Teresa Portugal (PS), Ana Zita Gomes (PSD), Francisco Madeira Lopes (Os Verdes) e Miguel Laranjeiro (PS).
Na generalidade, foi aprovada a proposta de lei n.º 121/X — Altera a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais, e foram rejeitados os projectos de lei n.os 286/X — Cria o instituto de assistência jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE), 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE), e 377/X — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, revogando o regime jurídico existente (PCP).
A proposta de lei n.º 126/X — Aprova o regime jurídico da avaliação do ensino superior, foi aprovada na generalidade.
Em votação final global, foi, ainda, aprovado o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 93/X — Aprova o regime jurídico de entrada, permanência e saída de estrangeiros do território nacional,

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e ao projecto de lei n.º 248/X — Altera o regime de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (Quarta alteração do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, alterado pela Lei n.º 97/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, e pelo Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro) (PCP).
Produziram declarações de voto os Srs. Deputados Celeste Correia (PS), Cecília Honório (BE), Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP) e António Filipe (PCP).
Finalmente, foi aprovado um parecer da Comissão de Ética, autorizando um Deputado do PS a depor, como testemunha, em tribunal.
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 17 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Arons Braga de Carvalho
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
António Ribeiro Gameiro
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
David Martins
Deolinda Isabel da Costa Coutinho
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira

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Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José Mártires Rodrigues
Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria Isabel Coelho Santos
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Renato José Diniz Gonçalves
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Jorge Teixeira de Freitas
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Paulo Martins Pereira Coelho

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António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves
Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pais Antunes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
Artur Jorge da Silva Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo

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João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Miguel Tiago Crispim Rosado

Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Álvaro José de Oliveira Saraiva

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sublinho que estão desde já abertas, até ao final da sessão, as urnas para a eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República. O candidato proposto pelo CDSPP é o Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo.
Srs. Deputados, da nossa ordem do dia consta um agendamento potestativo do PCP.
Vamos proceder à discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei n.º 324/X – Define o regime socioprofissional aplicável aos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual (PCP), da proposta de lei n.º 132/X — Aprova o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos, do projecto de resolução n.º 48/X — Recomenda ao Governo a criação de um regime laboral, fiscal e de protecção social especial para os trabalhadores das artes do espectáculo (CDS-PP) e do projecto de lei n.º 364/X — Estabelece o regime laboral e social dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual (BE).
Srs. Deputados, as votações terão lugar no final do debate e não às 18 horas.
Para apresentar o projecto de lei do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

Pausa.

Sr.as e Srs. Deputados, peço a vossa atenção. Peço também paciência ao orador, Sr. Deputado António Filipe, mas há um problema com o registo de presenças que está a ser resolvido, o que significa também uma elevada taxa de audiências à sessão e ao orador que vai intervir.

Pausa.

Tem a palavra, Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Hoje é o dia em que a Assembleia da República discute pela primeira vez a resolução de um problema que já devia estar resolvido há muitos anos. Trata-se de reconhecer aos trabalhadores do sector das artes do espectáculo e do audiovisual um estatuto, que é o seu mas que lhes tem sido negado, trata-se de reconhecer que os trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual são trabalhadores como os demais.
O sector em que trabalham tem especificidades que a lei deve reconhecer e regular devidamente.
Mas o que tem acontecido é que, na falta dessa lei, o sector tem primado pela desregulação, obrigando

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a grande maioria dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual a recorrer à ficção de se apresentarem como profissionais liberais e a trabalharem a recibos verdes, quando, na verdade, são trabalhadores por conta de outrem, subordinados e sujeitos ao poder de direcção de uma entidade patronal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Os profissionais das artes do espectáculo estão sujeitos aos deveres inerentes à sua condição de trabalhadores por conta de outrem mas não têm os direitos inerentes a essa qualidade nem têm qualquer protecção legal perante a situação de precariedade e de intermitência que caracteriza o sector em que trabalham.
Na última campanha eleitoral para a Assembleia da República, o PCP assumiu publicamente para com os profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual o compromisso de propor nesta Legislatura a aprovação de um estatuto sócio-profissional que lhes fosse especificamente aplicável.
«Deitámos mãos à obra», com a consciência de que regular este sector de forma adequada, com a multiplicidade de profissões que o integram e com a complexidade inerente aos diferentes tipos de actividade que o compõem, seria uma tarefa árdua. Foi uma tarefa árdua.
Contámos, evidentemente, com a opinião dos profissionais do sector, que, aceitando o nosso convite para participarem numa audição sobre esta matéria, nos habilitaram com opiniões preciosas sobre a forma de encarar legalmente os problemas e as especificidades das artes do espectáculo e do audiovisual, que, aliás, publicamente agradecemos.
Apresentámos, em Outubro do ano passado, o projecto de lei n.º 324/X, que abriu o caminho que hoje percorremos. Com a consciência da importância e urgência da aprovação deste estatuto para os profissionais envolvidos mas também para o desenvolvimento e progresso da cultura em Portugal, decidimos usar o direito à fixação da ordem do dia de que dispomos nesta sessão legislativa para promover este debate, na generalidade.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Em nome do Grupo Parlamentar do PCP, saúdo todos os profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual que assistem a esta sessão, dando testemunho da importância que atribuem à matéria em discussão.

Aplausos do PCP.

Saúdo particularmente a Plataforma dos Intermitentes e as associações que integram, cuja participação e empenhamento neste processo têm sido de um valor inestimável.
Saúdo também os grupos parlamentares e o Governo que, tendo entretanto apresentado iniciativas legislativas sobre esta matéria, pretenderam associá-las a este debate, solicitando o seu agendamento em conjunto, o que, enquanto autores do agendamento, aceitamos com satisfação.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Refiro-me, evidentemente, ao Bloco de Esquerda, que apresentou um projecto de lei, ao CDS-PP, que apresentou um projecto de resolução, e ao Governo, que, tendo apresentado uma proposta de lei cujo prazo de discussão pública ainda decorre, aceitou agendar para hoje a sua apreciação na generalidade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Sem prejuízo das objecções que temos quanto ao seu conteúdo, de que adiante darei conta, registamos com muito agrado o agendamento para hoje da proposta de lei do Governo. Sem que haja qualquer prejuízo do processo de audição pública da proposta de lei, que termina no próximo dia 26, a discussão conjunta de todas as iniciativas já apresentadas abre boas perspectivas de que os trabalhadores das artes do espectáculo possam ter a curto prazo o estatuto sócio-profissional de que ainda se encontram privados.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Referir-me-ei em seguida às principais soluções constantes do projecto de lei do PCP.
É sabido que o sector das artes do espectáculo e do audiovisual em Portugal tem vindo, desde os

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anos 90, a sofrer uma crescente expansão e visibilidade, com o consequente acréscimo de pessoas que se dedicam profissionalmente a este sector de actividade e com o surgimento de novas profissões. Contudo, apesar do crescente reconhecimento do valor cultural, social e económico das actividades culturais e artísticas, acentuou-se o carácter precário e descontínuo do exercício profissional, resultado da desregulamentação do sector, da inexistência de uma política de protecção específica, da desarticulação entre formação e profissionalização e do subfinanciamento por parte do Estado.
Actualmente, assistimos a uma total desregulamentação do sector das artes do espectáculo, que se traduz, nomeadamente, no esbatimento ou desaparecimento do papel do empregador e consequente alienação das suas responsabilidades sociais; na utilização abusiva e até ilegal do contrato de prestação de serviços, com perda de regalias sociais e elevada carga fiscal para o trabalhador; na precariedade dos vínculos laborais e consequente instabilidade no emprego, em parte devido à natureza intermitente da profissão;…

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço silêncio aos Srs. Deputados circunstantes.
Sr. Deputado Miguel Relvas, pode perfeitamente tratar desse assunto de forma mais discreta.
Sr. Deputado Manuel Maria Carrilho, também se pode sentar.
Agradecia que escutassem o orador com o respeito que ele merece.
Pode prosseguir, Sr. Deputado.

O Orador: — Dizia eu, Sr. Presidente, que assistimos actualmente a uma total desregulamentação do sector das artes do espectáculo também traduzido na inexistência de uma certificação profissional que confira dignidade ao exercício profissional e contribua para a clarificação deste universo.
Importa ainda salientar que os contratos de trabalho são sobretudo utilizados na contratação de pessoal com funções de mediação ou administração, já que a maior parte dos profissionais com funções artísticas e técnico-artísticas têm um vinculo de prestação de serviços, sofrendo com a desprotecção laboral e social inerente a este tipo de contratação.
Uma parte significativa destes trabalhadores independentes ou desconta o escalão mínimo para a segurança social ou não realiza qualquer tipo de descontos, caindo em situações de ilegalidade geradas pela própria injustiça do sistema.
A mudança do tipo de vínculo laboral, instituindo o contrato de trabalho como regra de contratação nas artes do espectáculo e combatendo o recurso ao falso trabalho independente, seria uma forma de travar este tipo de situações e de incluir todos os profissionais que se encontram fora do sistema de segurança social, contribuindo inclusivamente para o seu equilíbrio.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Esta é, para nós, a questão essencial e razão de ser primeira do nosso projecto de lei: a consagração do contrato de trabalho como regime regra de contratação no sector das artes do espectáculo, sempre que existam relações de trabalho subordinado ou relações de exercício profissional que, pela sua integração numa estrutura organizacional, se caracterizem pela dependência económica do prestador do trabalho em face da entidade empregadora.
Só mediante a consagração deste princípio será possível regular de forma justa e adequada as reconhecidas especificidades deste sector em matéria de duração e organização do horário de trabalho, conciliando as suas exigências específicas com o respeito por direitos inalienáveis dos trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Uma segunda questão essencial diz respeito à intermitência. As profissões das artes do espectáculo caracterizam-se pela intermitência das suas actividades. Diferentemente do que ocorre com a maioria das demais profissões, estes trabalhadores, independentemente da sua situação contratual, não têm quaisquer garantias quanto à continuidade do seu trabalho ao longo dos 12 meses de cada ano.
Seja por razões de instabilidade e precariedade ligadas à realidade do sector, seja por razões inerentes à natureza das próprias actividades que exigem períodos mais ou menos alargados de descontinuidade, o carácter intermitente das actividades das artes do espectáculo é um dado de facto que não pode deixar de ser devidamente contemplado na regulação do sector com vista a assegurar a protecção social e profissional dos trabalhadores envolvidos.
A proposta do PCP consiste na consagração de um regime de atribuição de subsídio de desemprego, mais flexível e abrangente, de modo a contemplar uma justa protecção dos trabalhadores intermitentes, reduzindo os prazos de garantia para a atribuição do subsídio com o consequente ajustamento dos períodos de concessão.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

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O Orador: — Uma terceira questão diz respeito ao acesso à profissão, à certificação para o seu exercício e à garantia da contratação de profissionais para espectáculos de natureza profissional.
O PCP entende que qualquer produção de natureza profissional deve incluir uma percentagem mínima de profissionais contratados não inferior a 70%, salvaguardadas as situações em que a natureza própria da produção não permita a aplicação dessa regra às profissões artísticas.
Não se trata de estabelecer aqui qualquer privilégio corporativo. Trata-se de consagrar uma exigência de qualidade dos espectáculos de natureza profissional que são oferecidos ao público. Para este efeito, profissionais são os detentores de diploma de curso superior ou de curso profissional habilitantes para o exercício de profissão no âmbito das artes do espectáculo que sejam oficialmente reconhecidos ou certificados nos termos aplicáveis aos respectivos graus de ensino ou de formação; são ainda os cidadãos que tenham exercido profissão no âmbito das artes do espectáculo e do audiovisual de forma exclusiva ou predominante, ou da qual tenha dependido a sua subsistência, por mais de um ano; são ainda os que tenham exercido profissão no âmbito das artes do espectáculo e do audiovisual por um período mínimo de 240 dias no último ano.
Esta garantia de contratação de profissionais, que nos parece indispensável para que o estatuto dos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual não seja uma mera ficção, exige a adopção de mecanismos de fiscalização do seu cumprimento,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — …o que só será possível mediante a existência de um registo de profissionais das artes do espectáculo e mediante a obrigatoriedade do depósito de uma relação dos trabalhadores envolvidos em cada produção, com cópia dos respectivos contratos de trabalho, por parte das entidades promotoras de espectáculos e conteúdos audiovisuais de natureza profissional.
Farei ainda uma breve apreciação dos demais projectos em discussão.
O projecto de lei do Bloco de Esquerda segue de perto as soluções do projecto de lei do PCP, detendo-se em alguns pontos específicos. Trata-se de uma contribuição para a discussão que consideramos positivamente, sem prejuízo de considerações de especialidade que aqui não têm lugar neste momento.
O projecto de resolução do CDS-PP, que recomenda ao Governo a adopção de uma iniciativa, está, de certa forma, manifestamente prejudicado, dado que a iniciativa está aqui para ser discutida. O CDSPP não apresentou outra iniciativa para além dessa, mas recomendou que o Governo o fizesse. Fica, portanto, o registo de uma preocupação e o reconhecimento da premência da matéria que hoje discutimos.
Quanto à proposta de lei, a primeira observação é a de que, do nosso ponto de vista, fica a meio do caminho. O Governo reconhece que é indispensável consagrar o contrato de trabalho como regime regra da contratação dos artistas de espectáculos públicos, o que é positivo, evidentemente. Porém, o Governo adopta uma concepção muito restritiva quanto ao universo de profissionais a abranger, esquecendo que o sector das artes do espectáculo e audiovisual não integra apenas profissões de natureza artística mas também profissões técnicas e de mediação, sem as quais não existiriam espectáculos, e que compartilham com os artistas, nomeadamente, os problemas decorrentes da intermitência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, o Governo remete para diploma próprio o regime de segurança social aplicável aos trabalhadores artistas de espectáculos públicos. Trata-se de uma questão de reconhecida premência, mas, segundo a proposta de lei — paciência! —, ficará para uma próxima oportunidade. A proposta do Governo fica a meio caminho, e no que já andou nem sempre vai pelo bom caminho.
Não pretendemos com isto desvalorizar a iniciativa legislativa do Governo. O Governo reconhece aquilo que é, para nós, o mais importante. O regime regra de contratação do sector das artes do espectáculo deve ser o contrato de trabalho. É esse o caminho e podem contar connosco para ir por aí. As discordâncias que temos em relação à proposta de lei não nos fazem esquecer que essa é, de facto, a questão essencial.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Claro que, na especialidade, há clarificações a fazer, há aspectos que, do nosso ponto de vista, devem ser corrigidos e há soluções de que discordamos, designadamente quanto à fraca protecção que é dada à intermitência. Quanto à solução constante do artigo 18.º, consideramo-la infeliz, ou seja, a reclassificação do trabalhador que perca a aptidão para a actividade artística para que foi contratado.
Faremos essa discussão na especialidade e não a vamos esgotar seguramente neste debate.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

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O Orador: — O que nos importa é que a partir de hoje está aberto o caminho para pôr fim à iníqua situação de precariedade laboral que afecta os trabalhadores das artes do espectáculo. Prosseguiremos esse caminho com a nossa disposição de sempre, que é a de trabalhar com empenho pela dignificação das artes e da cultura em Portugal e pela valorização de todos os que dedicam a essa causa o melhor da sua criatividade e das suas energias.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para apresentar proposta de lei n.º 132/X — Aprova o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.

A Sr.ª Ministra da Cultura (Isabel Pires de Lima): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a presente iniciativa legislativa, o Governo pretende dar resposta a uma necessidade do nosso ordenamento jurídico, procedendo à regulação do regime especial de trabalho dos profissionais de espectáculos. Estamos perante um acto da mais completa justiça, devido, há muitos anos, a esta classe profissional! Trata-se de rever um regime jurídico que ainda hoje se alicerça em diplomas de 1960, já derrogados parcialmente por um de 1987.
Desde esta data e nestes 20 anos, muitos foram os que prometeram, mas, efectivamente, não regularam a actividade dos profissionais do espectáculo.
Somos, pois, o primeiro Governo a assumir, concretizando uma promessa eleitoral do Partido Socialista, a apresentação desta proposta de lei, que, estou certa, vai responder de forma concreta e positiva aos que intervêm nesta área.
É perfeitamente pacífico e suponho que estamos todos de acordo que o actual regime jurídico específico dos trabalhadores do espectáculo se encontra completa e inteiramente desajustado da realidade.
Também sabemos, todos, que o Código de Trabalho não está vocacionado para integrar e enquadrar de forma eficaz e adequada a relação contratual dos profissionais artísticos.
Por isso mesmo, hoje, a actividade artística não está regulada nem legalmente enquadrada.
Desta realidade, que não é mais do que a mera constatação de um facto, retira-se uma outra conclusão: as relações contratuais no âmbito da actividade dos espectáculos — salvo algumas poucas e raras excepções, entre as quais aquelas em que são entidades empregadoras as instituições ligadas ao Ministério da Cultura — são enquadradas, regra geral, pelo regime da prestação de serviços, também denominado de recibos verdes.
Daqui decorre que a precarização do trabalho tem sido uma característica da actividade artística, com as evidentes consequências nefastas que daí resultam para todos os profissionais que tornam possível o mundo dos espectáculos de que todos nós usufruímos.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Logo, a proposta que aqui trazemos hoje é, em primeiro lugar, um gesto da mais elementar justiça social. Este Governo prometeu, este Governo cumpre! Sr. Presidente, Srs. Deputados: A criação de um regime jurídico de trabalho para os trabalhadores de espectáculos assume-se como uma complementaridade do Código do Trabalho no âmbito dos denominados contratos de trabalho em regime especial, reconhecendo de forma expressa que se trata de realidades contratuais que se caracterizam por especificidades próprias, não coadunáveis com as regras do Código.
Acresce que a falta de legislação enquadradora da actividade artística vai, hoje, a par de um cada vez maior desenvolvimento das artes de espectáculo, mercê do seu fomento no quadro das políticas públicas de apoio à produção artística e à criação de redes físicas de cine-teatros, e resultado também de uma maior intervenção de agentes privados neste sector.
Face à realidade descrita, ainda que de forma sucinta, justifica-se, de pleno, a adopção de um regime contratual de trabalho diferenciado para os artistas de espectáculos públicos que consagre as especificidades que lhe são próprias.
Com a presente iniciativa legislativa, traduzida em proposta de lei, o Governo pretende dar resposta aos principais problemas com que se debatem os profissionais das artes: a precariedade contratual, evitando-se, por essa forma, o sistemático recurso aos recibos verdes; a clarificação do que se deve entender por trabalhador-artista ou profissional de espectáculos; a falta de acreditação profissional; o desajustamento das regras gerais do contrato individual de trabalho, nomeadamente das regras do contrato de trabalho a termo, e o desajustamento das regras do tempo de trabalho.
A iniciativa legislativa pretende definir as actividades que poderão vir a ser consideradas artísticas e, por essa forma, os profissionais que potencialmente estarão abrangidos pelo seu regime. Será criado um sistema de registo facultativo dos profissionais de espectáculos, clarificando-se o que se há-de entender por profissional artístico e organizando-se um sistema de acreditação que sirva os profissionais e a acti-

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vidade artística em si mesma.
Com o novo regime jurídico, pretende o Governo também que a regra de contratação de trabalhadores seja a decorrente do regime do contrato de trabalho e não a do regime de prestação de serviços.
Desse modo, estaremos a resolver uma situação que é de natureza jurídica mas que, acima de tudo, é de natureza social, como já referi. Reconduzindo a relação contratual de trabalho à relação jurídica de trabalhador por conta de outrem, estamos a criar os mecanismos legais para que estes profissionais possam vir a ter um mais eficaz acesso às políticas de protecção social.
Mas não são só as questões de natureza social que aqui estão em causa. Pretendemos regular e enquadrar legalmente uma actividade que está desregulada e que se desenvolve ao sabor das condutas que são determinadas por quem contrata.
Nesse sentido, além de reconduzirmos a contratação destes profissionais às regras do contrato de trabalho, na forma de contrato por tempo indeterminado ou a termo resolutivo, criamos a figura jurídica inovadora do contrato de trabalho intermitente. Caracteriza-se este tipo de contrato por um vínculo laboral que compreende a existência de tempos de trabalho efectivo e de períodos de não trabalho.
Outra das inovações que me cumpre salientar é a da criação do contrato de trabalho em grupo. Com tal inovação, estamos a dar resposta a uma realidade que a prática do sector já consagrou mas que o nosso sistema jurídico não reconhece. Trata-se da realização de uma tarefa que envolve uma pluralidade de trabalhadores, representados pelo denominado chefe de grupo, e que dá origem a tantos vínculos contratuais quanto o número de trabalhadores envolvidos.
A prestação de trabalho, no que diz respeito ao tempo, horário, trabalho nocturno e descanso semanal, entre outros aspectos, tem aqui tratamento específico, por se ter em conta a natureza da actividade.
Uma última apreciação que, no entanto, não deixa de ser das mais importantes é a relativa ao enquadramento jurídico da figura de reclassificação profissional do trabalhador.
A actividade artística pode acarretar a perda de aptidão para a sua realização nos termos em que o trabalhador foi contratado. Numa situação normal, este facto poderia traduzir-se na caducidade do contrato de trabalho, de acordo com as regras do Código do Trabalho. Com a presente iniciativa legislativa pretendemos que, nesses casos, se proceda à reclassificação profissional do trabalhador para uma função compatível com as suas qualificações profissionais. Só existirá a caducidade do contrato caso não existam funções compatíveis ou, existindo e sendo-lhe propostas, o trabalhador não as aceite. Mesmo assim, nestes casos, o trabalhador terá direito a uma compensação. Com este princípio pretendemos acima de tudo privilegiar a manutenção do emprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eis no essencial, ainda que de forma muito resumida, os traços mais relevantes da proposta de lei que o Governo coloca à discussão da Assembleia da República. Saliento que, por mecanismos próprios desta Assembleia – e, por isso, alheios ao Governo –, o presente debate ocorre paralelamente à discussão pública desta iniciativa legislativa. Considero que seria mais interessante e enriquecedor para todos que o debate neste Parlamento pudesse já contar com os contributos que adviessem da apreciação pública. De qualquer modo, estou certa de que esses contributos serão tidos em consideração em sede de especialidade.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A proposta de lei que acabei de apresentar constitui uma primeira etapa do que há-de ser o estatuto do artista. Trata-se, agora, de enquadrar e regular as questões relativas ao contrato de trabalho. Como compreenderão, fazê-lo constitui uma condição sine qua non para que o Governo possa evoluir para uma segunda etapa, consagrando-se a norma legal reguladora do regime específico de protecção social dos profissionais do sector artístico.
Mais uma vez, o Ministério da Cultura apresenta-se nesta Câmara com o sentimento grato de estar a cumprir o Programa do Governo que os portugueses sufragaram. Ainda temos muito caminho pela frente, mas os objectivos estão traçados, temos consciência das dificuldades e temos, sobretudo, um rumo do qual não nos desviaremos, tendo em conta a importância vital que o sector cultural tem em qualquer país que se quer desenvolvido.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, à Sr.ª Ministra cinco Srs. Deputados.
Antes de mais, para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, é assinalável a sua preocupação com a precariedade dos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual, mas gostaria de lhe propor que vertesse essa preocupação para a proposta que o Governo aqui traz.
Coloco-lhe, contudo, algumas questões. Em primeiro lugar, gostava de saber por que é que esta proposta deixa de parte os trabalhadores técnicos ou técnico-artísticos.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — Não deixa!

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A Oradora: — Por que é que esta proposta deixa de lado trabalhadores altamente qualificados do audiovisual, da televisão ou do cinema, como realizadores, operadores de câmara ou directores de fotografia?

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não deixa!

O Orador: — Poder-se-á dizer que os artigos 11.º a 16.º abrangem estes trabalhadores, mas tal não é verdade, porque a aplicação destes artigos pressupõe a existência de um contrato de trabalho e a maior parte destes profissionais não o tem.
A segunda questão é esta espécie de «cheque em branco» relativo à segurança social que a proposta de lei inclui. Não se percebe! Talvez a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado nos possam esclarecer no contexto deste debate.
A terceira questão é relativa ao artigo 6.º da proposta de lei. Cumprimentando e salvaguardando a importância das reivindicações da Plataforma dos Intermitentes, o artigo 6.º não consagra as grandes preocupações e reivindicações destes profissionais. Na verdade, este dispositivo coloca a possibilidade de existir um contrato de trabalho, mas não obriga a que tal aconteça, o que acaba por abrir a porta à continuidade dos recibos verdes. Ora, o contrato de trabalho é, obviamente, a questão de fundo para estes profissionais, que são, neste momento, vítimas da maior precariedade. Como tal, só com um contrato de trabalho podem os seus direitos sociais e laborais ser salvaguardados.
Por seu turno, o artigo 7.º fala de um contrato intermitente que não se aplicará aos trabalhadores que neste momento têm alguma estabilidade profissional. O que é que vai acontecer, então, aos trabalhadores dos teatros nacionais, das orquestras ou da Companhia Nacional de Bailado? Será que este contrato intermitente não se destina fundamentalmente a estes profissionais? Se for assim, há aqui uma armadilha muito preocupante, que é a de tornar intermitente e precário o que não o é neste momento. Para mais, a trabalhadores que em tempo intercorrente receberão apenas 30% do seu salário.
Finalmente, não posso deixar de me referir ao artigo 18.º e à proposta de reclassificação profissional, que abre a porta aos despedimentos colectivos.
Vamos ver, então, se esta proposta se confirma como a possibilidade de resolver a precariedade dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual em Portugal.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa.

A Sr.ª Maria José Gambôa (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, centraria este pedido de esclarecimentos em torno do artigo 18.º da proposta de lei hoje em apreço, que coloca uma questão importante para as preocupações do Governo e dos profissionais do espectáculo, a da perda de aptidão para a realização da actividade artística e as suas consequências.
A primeira questão que coloco à Sr.ª Ministra procura saber, então, quem decide sobre a perda das aptidões artísticas dos profissionais do espectáculo.
Por outro lado, apesar de o diploma conter uma salvaguarda relativamente à reclassificação ou reconversão dos profissionais, uma vez que é omisso em matéria de formação profissional, pergunto se está previsto algum diploma autónomo para o contexto da formação profissional ou se este será revertido para o âmbito do que actualmente o Código de Trabalho comporta para situações desta natureza.
Queria ainda saber que entidades, públicas ou privadas, são objecto deste diploma.
Por fim, retomando a questão que a Sr.ª Deputada Cecília Honório já colocou, pedia à Sr.ª Ministra que tecesse alguma consideração sobre os técnicos-artistas eventualmente englobados por este diploma na categoria de «outros». Em concreto, queria saber que regras e perfis profissionais estão previstos para estas «outras actividades».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Ainda para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Arménio Santos.

O Sr. Arménio Santos (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, as artes do espectáculo são, de facto, uma área em que as actividades profissionais obedecem a especificidades muito próprias, sendo as normas gerais do Código do Trabalho insuficientes para as abranger.
Na verdade, estamos na presença de profissionais em permanente mobilidade (estão hoje em Lisboa e podem amanhã estar noutra qualquer cidade) e cujo horário de trabalho é extremamente irregular, fugindo à «normalidade» dos horários que têm início às 8 horas e fim às 17 ou 18 horas. Porventura, os profissionais deste sector trabalharão mais a partir das 22 horas, estendendo-se a sua actividade pela noite dentro. Por outro lado, há ainda neste domínio profissões de desgaste rápido, como é o caso dos

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bailarinos.
Por todas estas razões, a ausência de lei especial que regule o trabalho neste sector tem vindo a permitir o recurso excessivo aos recibos verdes, em detrimento dos contratos de trabalho e das suas mais estáveis normas. Daí impor-se a adopção de regras específicas que tenham em conta as realidades dos profissionais desta área.
Estas iniciativas hoje em discussão significam, na nossa opinião, um avanço positivo, garantindo e definindo direitos laborais e estabelecendo prestações sociais para estes profissionais.
As três modalidades de contratos previstas na proposta de lei prevêem a possibilidade de a celebração ser levada a cabo pelo trabalhador ou por um representante comum ou chefe de grupo, caso o contrato abranja vários profissionais. Porém, em sítio algum do diploma encontramos qualquer referência às organizações representativas de trabalhadores, mesmo sabendo que estas existem neste sector.
De facto, há organizações sindicais que têm a sua base de representação na área das artes do espectáculo, mas a verdade é que neste diploma não se encontra qualquer referência a este tipo de representação. Como tal, gostaríamos de perceber que razão – que existe, seguramente – justifica esta ausência.
Por outro lado, os direitos sociais deste sector são por todos reconhecidos e foram, de resto, mencionados pelos oradores que apresentaram as iniciativas, em particular pela Sr.ª Ministra da Cultura. Gostaríamos de saber, contudo, tendo em conta a afirmação da Sr.ª Ministra de que finalmente estamos a dar resposta a um problema que se tem vindo a prolongar no tempo e porque pensamos que esta iniciativa poderia estar em maior consonância com as expectativas das pessoas, por que é que se remete esta matéria dos direitos sociais para diploma posterior, a ser produzido pelo Governo não sabemos quando.
Será daqui a dois, três, quatro ou seis meses? Não sabemos! A verdade é que podíamos integrar já esta matéria na iniciativa que hoje debatemos.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, procurarei começar por responder a uma preocupação manifestada pela Sr.ª Deputada do Bloco de Esquerda relativamente aos tipos de contrato que o diploma em discussão estabelece.
Ora, como tive ocasião de referir, creio que todos estamos de acordo quanto ao desajustamento do Código do Trabalho relativamente à natureza do trabalho artístico, uma vez que impede a realização do contrato a termo com características que possam ser adequadas ao carácter transitório, intermitente, à própria natureza do trabalho artístico e à duração incerta dos espectáculos. Donde, o tipo de contrato de trabalho que parece ser mais adequado à actividade das artes e do espectáculo é o contrato intermitente ou de grupo. Evidentemente que o facto de estes dois se adequarem mais à natureza do trabalho artístico não significa que não possa haver um contrato por tempo indeterminado. Se a entidade empregadora assim o entender, com certeza que poderá haver esse tipo de contrato.
O que constatamos é que, na realidade, as entidades empregadoras, sejam elas de natureza privada ou não, com excepção de alguns organismos ligados ao Ministério da Cultura, não estabelecem contratos por tempo indefinido. Donde, a generalidade dos trabalhadores das artes do espectáculo não tem um contrato de trabalho, tem uma precariedade de emprego que parece evidente, recorrendo sistematicamente ao recibo verde, o que significa que a entidade empregadora também não tem responsabilidade quanto às prestações sociais.
Ora, este estatuto em nada impede a existência de contratos por tempo indefinido. Apenas permite que, face às características do mercado e da actividade das artes do espectáculo, seja mais frequente este tipo de contrato. Portanto, permitir que haja este tipo de contrato, dado que — relembro — o Código do Trabalho impede um contrato a termo com características como as que aqui são enunciadas, isto é, com a possibilidade de ser renovado, havendo paralelamente uma dimensão intermitente, vai criar uma situação de muito menor precariedade em relação aos trabalhadores do espectáculo.
Por outro lado — e respondendo ainda à Sr. ª Deputada Cecília Honório e à Sr.ª Deputada Maria José Gambôa —, o n.º 2 do artigo 1.º do estatuto, constante da nossa proposta de lei, enumera, a título meramente exemplificativo, um universo de artistas, como bailarinos, actores de teatro, coreógrafos, entre outros. Ora, o que fazemos é combinar esta delimitação meramente exemplificativa do universo de artistas com um sistema de acreditação dos profissionais das artes do espectáculo. Se fizermos essa combinatória, evidentemente que este leque meramente exemplificativo pode ser alargado, dependendo tão só do trabalhador querer acreditar-se como trabalhador artístico, como trabalhador das artes do espectáculo.
Gostava de acentuar que este n.º 2 do artigo 1.º em nada exclui a possibilidade de estarem incluídos profissionais da área técnico-artística. Entendemos que um sonoplasta ou um desenhador de luzes, que está directamente implicado na produção e na criação do espectáculo, é evidentemente um trabalhador artístico. Mas cabe-lhe a ele acreditar-se como tal.

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Portanto, se os trabalhadores com uma dimensão técnico-artística entenderem submeter-se a um processo de acreditação como trabalhadores artísticos ficam com o estatuto profissional idêntico aos outros trabalhadores artísticos que foram enumerados a título exemplificativo. Caso o não façam, esse estatuto apenas lhes é aplicado naquilo a que se reporta o artigo 19.º, que é basicamente o tempo de trabalho.
É fundamentalmente esta a distinção que fazemos.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, quero começar este pedido de esclarecimentos por registar aquilo que creio resultar um pouco de todas as intervenções feitas e que, no entender do PCP, é o ponto fundamental desta discussão. Trata-se da necessidade de dar resposta à situação do sector das artes do espectáculo, que é marcada pela instabilidade, pela insegurança, pela precariedade e pela desprotecção social destes trabalhadores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Portanto, centrando a discussão neste ponto fundamental, que é o da garantia de resposta a estes problemas, o PCP valoriza esta discussão e agendou-a para hoje precisamente por entender que é uma realidade que necessita de uma resposta urgente no plano laboral, mas também porque significa, na prática, a negação do exercício do direito da criação artística, pois condiciona o desempenho destes profissionais.
Portanto, tendo em conta estes problemas que temos para resolver, as questões que quero colocar têm a ver com alguns assuntos que já foram abordados e que entendo que ainda não foram esclarecidos pela Sr.ª Ministra.
O primeiro tem a ver precisamente com o conceito de intermitência, que sintetizo na seguinte frase: a proposta de lei tem em conta o conceito de intermitência da actividade, mas não garante a cabal protecção dos trabalhadores perante esta intermitência. Ou seja, reconhecendo que esta actividade pode ser marcada pela intermitência, em nosso entender, não garante a resposta necessária no âmbito da protecção dos trabalhadores que à mesma estão sujeitos.
A questão que é definida na alínea a) do n.º 6 do artigo 7.º relativamente aos 30% da retribuição normal parece-nos que fica um pouco aquém daquela que deveria ser a protecção garantida a estes trabalhadores e, conjugando com o n.º 3 deste artigo 7.º, esta preocupação resulta ainda mais evidente.
No que diz respeito aos contratos a termo previstos no artigo 6.º importa fazer uma reflexão que tem a ver com o n.º 3 deste artigo, o qual refere uma série de regras previstas para os contratos a termo. É que esta proposta de lei prevê a adaptação do regime geral dos contratos a termo e não prevê uma adaptação, que neste caso importa, da protecção que é garantida aos trabalhadores.
Uma segunda questão tem a ver com a consideração dos bailarinos no âmbito desta proposta. É que, de facto, Sr.ª Ministra, há uma dúvida que nos assalta e que tem a ver com o artigo 18.º. Este artigo, cruzado com o âmbito de aplicação definido no n.º 2 do artigo 1.º, pode empurrar os bailarinos para uma situação em que, simultaneamente, ficam desprotegidos no plano da protecção garantida pelo regime de segurança social, porque podem não ter acesso à aposentação, mas também impedidos de exercer a sua profissão, uma vez que o seu contrato caduca por força de uma coisa inevitável, que é o passar do tempo e o aumento da idade destes profissionais.
A questão que lhe quero colocar tem a ver com a necessidade de ponderarmos o artigo 18.º e os efeitos perversos que poderá ter relativamente aos bailarinos.
Ainda relacionado com o âmbito desta proposta, foi colocada uma questão que tem a ver com a abrangência a outros trabalhadores que não aqueles que estão tipificados no n.º 2 do artigo 1.º, nomeadamente quando este regime lhes possa ser mais favorável.
Para terminar, quero colocar-lhe uma última questão, que também já foi levantada e que para nós é importante.
A situação que se vive, hoje, no sector das artes do espectáculo não pode mais ser adiada. Portanto, o PCP entende que a previsão do artigo 21.º da proposta de lei, relativa à regulamentação num diploma posterior das questões relacionadas com a segurança social, tem condições para ficar definida já, aquando da discussão em sede de especialidade, pelo que gostaríamos que o Governo desse algum sinal no sentido da sua disponibilidade para resolver esta questão.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, vou colocar uma questão muito directa e muito simples.
Peço à Sr.ª Ministra que esclareça o conteúdo do artigo 18.º. Como é que se irá operar a classifica-

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ção do trabalhador? Neste artigo, estabelecem-se as consequências no caso de o trabalhador perder, superveniente e definitivamente, a aptidão para a realização da actividade artística — e isto tem especial incidência no caso das actividades artísticas de desgaste rápido como o ballet clássico, muito especialmente quanto aos bailarinos da Companhia Nacional de Bailado, cujo destino aproveito para perguntar à Sr.ª Ministra qual vai ser.
Quando é que essa não aceitação da reclassificação irá causar a caducidade do contrato de trabalho? É que, em nosso entender, os termos do artigo 18.º estão formulados de maneira pouco específica e não deixam de causar uma grande sensação de incerteza. Ora, aquilo que é entendido como reclassificação e como actividade que poderá estar ou não dentro das suas classificações profissionais não é suficientemente claro e não assegura aos profissionais — muito particularmente aos que têm, como já disse, um desgaste rápido — a segurança de que o seu contrato de trabalho não irá caducar de uma forma unilateral e arbitrária, sem qualquer tipo de objectividade.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, gostava de esclarecer o Sr. Deputado do PSD relativamente à questão que colocou sobre o trabalho de grupo.
Esta questão, na prática, não existe. Isto é, no fundo, o que está estabelecido neste estatuto em nada colide com os direitos e com o papel dos sindicatos. Não há qualquer incompatibilidade entre o contrato de trabalho de grupo e os direitos sindicais. De modo algum! São os direitos normais. Portanto, repito, não há qualquer incompatibilidade.
Gostaria também de voltar à questão que a Sr.ª Deputada Maria José Gambôa, do PS, me colocou sobre o artigo 18.º, que estabelece as regras referentes ao desgaste rápido e sobre quem decide.
Quanto a quem decide, trata-se se uma decisão que pode partir do empregador ou pode partir do trabalhador. Se for aceite por ambas as partes, então o problema está resolvido.
No entanto, pode acontecer haver conflito entre as partes, porque pode dar-se o caso, por exemplo, de o artista entender que está numa situação de incapacidade para o exercício da sua actividade artística e o empregador entender que não — embora também possa suceder o contrário, evidentemente.
Se houver esta situação de conflito, há que recorrer a um processo de arbitragem. O que defendemos é uma avaliação da perda de aptidão por parte de uma comissão de arbitragem, que deverá incluir um representante do empregador, um representante do trabalhador e uma personalidade independente, de reconhecida capacidade técnica naquela área específica, a qual deve ser designada por acordo das duas partes, do trabalhador e do empregador. Portanto, esta é a solução que defendemos, em caso de conflito, para a avaliação da questão do desgaste rápido.
Uma outra matéria à qual gostaria de responder diz respeito à questão da classificação do universo de trabalhadores.
Voltando à questão que foi colocada, quer pela Sr.ª Deputada Cecília Honório, do BE, quer pelo Sr. Deputado João Oliveira, do PCP, penso que será necessário criar um mecanismo de acreditação no âmbito do Ministério da Cultura para que o trabalhador possa, voluntariamente, proceder a essa acreditação. Isto porque pode haver trabalhadores do domínio técnico-artístico a quem não interesse estarem sujeitos ao estatuto do trabalhador artístico, mas pode haver outros a quem isso interesse.
Portanto, o trabalhador deverá acreditar-se, caso queira, junto de uma entidade, no caso do Ministério da Cultura, no âmbito da Inspecção-Geral das Actividades Culturais (IGAC), exactamente para que, a partir daí, possa ser contratado e, consequentemente, ter as regalias que são passíveis de ter enquanto trabalhador sujeito a este estatuto.
No fundo, em relação aos profissionais da área técnico-artística, volto a insistir, depende deles serem ou não considerados trabalhadores artísticos, porque depende deles acreditarem-se ou não com esse estatuto.
Naturalmente que caberá, depois, à entidade empregadora contratualizar ou não segundo este tipo de contratos. Mas tudo isto passará, necessariamente, pela criação de uma acreditação no âmbito IGAC, situação que, evidentemente, ficará sujeita a regulamentação, através de portaria do Ministério da Cultura, que criará esse sistema de acreditação.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projecto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Por detrás de um espectáculo que deleita os olhos está a clandestinidade de profissionais sem direitos.
A insegurança e a precariedade marcam a vida da maioria dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual, quer se trate de intérpretes quer de técnicos, «reféns» de recibos verdes, sem contrato

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de trabalho, sem subsídio de desemprego, sem protecção social.
Todas estas são razões para o Bloco de Esquerda apresentar este projecto de lei onde consagra um regime que garante aos trabalhadores das artes e do espectáculo direitos sociais e laborais adequados às suas actividades.
O diploma propõe que essa adequação seja feita: através de um contrato de trabalho, celebrado sem termo ou a termo certo ou incerto, mas obrigatoriamente reduzido a escrito; através de regras de contratação, de certificação profissional, de segurança social e de protecção no desemprego; da presunção da existência de um contrato de trabalho, sempre que o trabalhador esteja inserido numa estrutura organizativa; através do limite máximo de renovação do contrato de trabalho até dois anos, após o qual o contrato pode ser convertido em contrato de trabalho sem termo; da protecção, através da definição da percentagem mínima de profissionais que deve integrar cada produção; através, ainda, do acesso às prestações, como o subsídio de desemprego e prevendo o acesso ao direito antecipado às pensões de velhice e de invalidez, tendo em conta as profissões artísticas particularmente penosas e de desgaste rápido; adequado, enfim, através da previsão de um regime especial de reconversão profissional dignificante da vida e da carreira destes profissionais.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: São estas as condições que permitirão dignificar os trabalhadores das artes, do espectáculo e do audiovisual.
Mas, à exigência de dignidade destes trabalhadores, o Governo do Partido Socialista tem dado promessas com uma mão e tem retirado com outra, nomeadamente com a proposta de lei que hoje discutimos.
No entanto, tem de se reconhecer que a Sr.ª Ministra da Cultura acabou de dar ao artigo 18.º uma formulação diferente daquela que está na proposta de lei e, por isso, talvez a discussão na especialidade abra portas para situações que a proposta de lei, efectivamente, não contém.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

A Oradora: — Em Dezembro, o estatuto estava pronto. Em Março, lançado o desafio neste Plenário, o Partido Socialista nada disse.
E, agora, que proposta é que o Governo aqui traz? Traz uma proposta que se destina a artistas e que esquece os demais trabalhadores do espectáculo.
É uma proposta que nada diz sobre os trabalhadores da área do audiovisual.
Uma proposta com contratos maximamente «flexi», sem duração máxima, limites de renovação e com agravamento da taxa social única.
Uma proposta que pressiona os profissionais com contrato por tempo indeterminado a passarem a intermitentes, criando um período de inactividade cujo pagamento se reduz a 30% e que aposta, afinal, num contrato intermitente, que é uma possibilidade, não é uma obrigação, não é a condição da dignidade dos trabalhadores, ignorando o que é trabalho intermitente e precarizando a relação, por baixo preço.
Uma proposta, enfim, que remete o direito à segurança social «para as calendas» e que no artigo 18.º «abre mesmo a porta» aos despedimentos sem justa causa, como se estes trabalhadores fossem descartáveis.
Em suma, uma proposta que não podemos permitir, porque fere os direitos e a dignidade dos trabalhadores das companhias nacionais, dos teatros nacionais, das orquestras. Esta proposta não pode ser uma porta aberta à precariedade ou aos despedimentos, como acontece, por exemplo, na Companhia Nacional de Bailado, em nome da nova via da OPARTE.
São estas as condições para garantir uma lei que se ajuste efectivamente aos direitos e às expectativas destes trabalhadores. É expectável, então, que, em sede de especialidade, todas as propostas do Bloco de Esquerda possam atribuir e criar uma boa lei para estes profissionais.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para apresentar o projecto de resolução do CDS-PP, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Existe uma realidade inequívoca — o estatuto do artista é uma reivindicação antiga, justa e legítima por parte dos profissionais dos espectáculos, que, lamentavelmente, tarda a ser concretizada!

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Oradora: — Daí que saudemos a iniciativa do PCP em usar o seu agendamento potestativo para discutir esta matéria.
O CDS tem-no dito inúmeras vezes: a cultura tem de ser encarada, de uma vez por todas, como um factor de afirmação de Portugal no mundo. Para tal, temos de cuidar de proteger e de salvaguardar todos

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aqueles que contribuem para este aspecto tão importante do nosso desenvolvimento.
Esta falta de regulamentação é especialmente grave se considerarmos o número crescente de profissionais das artes e do espectáculo e das actividades sem enquadramento laboral apropriado; ou se tivermos em conta que a maior parte destes profissionais não tem protecção social adequada e que muitos já se encontram em idade de reforma.
Os aspectos específicos da maioria das actividades relacionadas com as artes do espectáculo, como a intermitência, a itinerância, os horários inconstantes e o desgaste rápido constituem a maior dificuldade na elaboração de um quadro normativo mas constituem também a principal razão para a exigência de uma legislação ajustada.
Tão-pouco a dificuldade em encontrar um maior denominador comum entre artistas tão diferentes como músicos e artistas de circo, ou actores e coreógrafos, ou técnicos de cinema e bailarinos, ou toureiros e profissionais do audiovisual pode ser argumento para deixar todos estes cidadãos numa nebulosa de indefinição e precariedade.
Concordamos que são, sobretudo, os profissionais da mediação e da administração os que, neste momento, são abrangidos por contratos individuais de trabalho.
E eis que, mais de dois anos após o compromisso para remeter ao Parlamento uma proposta de lei com o estatuto do artista, o Governo socialista apresenta um modelo que, em nosso entender, ainda está incompleto e é, por vezes, injusto.
Desde logo, não compreendemos por que razão o grupo de trabalho constituído por este mesmo Governo, em 1 de Setembro de 2006, para elaborar o estatuto do bailarino, não foi sequer consultado para efeitos de apresentação desta proposta de lei.
Depois, nada se refere, nesta proposta, quanto à formação técnica e valorização profissional dos trabalhadores com contrato sem termo, contrariamente ao que dispõe a Constituição da República Portuguesa.
Também ainda não vimos esclarecida a dúvida colocada há pouco à Sr.ª Ministra quanto à extensão do artigo 18.º da proposta de lei. Não sabemos o que se entende por «funções compatíveis com as suas qualificações profissionais». Não sabemos o que se entende por «compatível» quando um bailarino, aos 30 anos, já está definitivamente incapaz de exercer a profissão que escolheu. O que é que se entende como «compatível com as suas qualificações»? Porque, a não ser aceite, o seu contrato de trabalho caducará, ou seja, o trabalhador ficará sem qualquer tipo de protecção.
Não compreendemos, enfim, por que razão não apresenta o Governo um verdadeiro estatuto do artista, que inclua o enquadramento da protecção social e o regime fiscal a aplicar a estes profissionais.
Na verdade, o que o Governo socialista fez, ao fim de dois anos, foi apresentar um trabalho que, em larga medida, já estava feito pelo governo anterior.

Protestos do PS.

É verdade que esta proposta de lei é louvável, mas é muito redutora relativamente às verdadeiras pretensões deste sector — a salvaguarda da sua protecção social na doença, no desemprego e na reforma, direitos esses que, em larga medida, estão vedados aos profissionais da área do espectáculo.

Protestos do PS.

Isto porque, aplicando-se o regime geral da segurança social ou do IRS, estes trabalhadores, que agora poderão, isso, sim, ter modelos de contrato de trabalho específicos, serão na mesma prejudicados por descontos incompletos, continuarão desprotegidos porque os seus descontos, de acordo com o regime geral, são feitos em função do tempo de trabalho.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

A Oradora: — Daí que se mantenha a total pertinência do projecto de resolução apresentado pelo CDS. Pretendemos que, até ao final da legislatura, o Governo assuma o compromisso de apresentar uma solução global e cabal para a vida e para as preocupações dos profissionais das artes e do espectáculo.
Esperamos que o Partido Socialista entenda que este período é mais do que suficiente para acautelar estas pretensões.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Portugal.

A Sr.ª Teresa Portugal (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: As minhas primeiras palavras dirigem-se aos trabalhadores, aos artistas do espectáculo aqui presentes, que

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o Partido Socialista saúda calorosamente.
Também o Partido Socialista valoriza este debate, como valoriza o facto de ele se fazer com a apresentação de uma proposta de lei do Governo, que cumpre uma promessa que fazia parte do seu programa eleitoral e do seu Programa de Governo.
Esta iniciativa é tão mais importante quanto vem preencher uma antiga lacuna legislativa de regulamentação laboral dos artistas do espectáculo, que, há muito, reclamavam a sua existência.
Fazer a história do percurso dos direitos laborais e sociais destes trabalhadores leva-nos de volta — imaginem — até aos anos 60, ao aparecimento de um decreto-lei, só timidamente revogado em Janeiro de 1987.
Portanto, estes trabalhadores têm vivido e trabalhado num quase vazio de direitos, abrigados por uma legislação velha de anos, desajustada no tempo, com o passo desacertado relativamente à evolução da vida do espectáculo, alvo de grandes mudanças ao longo das últimas décadas e com realidades diversas e específicas.
Faltava fazer o que hoje começamos a fazer, que é clarificar a situação jurídica dos artistas do espectáculo, inscrevendo estes trabalhadores num quadro do regime dos direitos laborais e sociais.
Para este fim, não bastam as palmas, é preciso conhecer a realidade dos artistas do espectáculo, as suas vidas como cidadãos com direitos iguais aos outros. Se algo, de facto, os distingue são, justamente, as condições laborais para que foram remetidos, em que as palavras dominantes, como já foi largamente dito nas anteriores intervenções, têm sido precariedade, desprotecção, reduzida segurança social, desregulamentação laboral e incerteza quanto ao futuro.
É, assim, este o mundo que nos escapa quando, como público, participamos num qualquer espectáculo. De facto, não vamos lá para conhecer a vida dos artistas, que não serão idênticas ao mundo mágico que, de regresso a casa, o público transporta consigo.
Por isso, hoje e agora, é nossa obrigação alterar as condições de trabalho destes fazedores de sonhos, que nos preenchem o lado estético da vida com o seu talento e a sua criatividade, mas também com trabalho intenso e persistente.

A Sr.ª Manuela de Melo (PS): — Muito bem!

A Oradora: — Hoje e aqui devemos ir aos bastidores e dar a conhecer como têm sobrevivido.
Ficaremos a saber que só o reconhecimento do público tem valido como única certificação profissional, instrumento até agora inexistente, mas contemplado no presente diploma.
Ficaremos a saber que, à excepção de algumas iniciativas parlamentares dirigidas ao caso concreto dos bailarinos e que não tiveram sequência, nesta matéria, só agora estamos a aproximar-nos de outros países europeus. Convém, contudo, saber que este não é um caminho simples, dado o carácter atípico das condições de trabalho, e que alguns desses modelos adoptados ainda não atingiram o formato ideal, como é o caso da Espanha, por exemplo, em que existe regime laboral mas não existe estatuto do trabalhador, ou no Reino Unido, onde apenas existem estatutos de natureza regional.
Ficaremos ainda a saber que é útil e compreensível a abrangência global das diferentes actividades artísticas, como propõe a proposta de lei do Governo, sendo que não se podem esquecer as especificidades próprias de um sector, como, por exemplo, o dos bailarinos clássicos, considerado o de maior desgaste.
O ponto de partida deste diploma é a definição da actividade artística, abrangendo as mais diversas áreas, do actor ao bailarino, do encenador ao coreógrafo, que esta discussão tem também clarificado um pouco.
Consagra a certificação da profissão, através da inscrição facultativa, em termos que, depois, serão definidos por portaria própria, que confere, assim, um título profissional.
No essencial, propõe a adopção de um regime de trabalho diferenciado, assente em duas novas modalidades de contratação, que já foram aqui salientadas — o trabalho intermitente e o trabalho em grupo.
Adopta o regime comum de contrato de trabalho a termo, atendendo a que nesta área essa é a regra e não a excepção, não fazendo aplicar o limite máximo das renovações, nem o regime de contratos sucessivos, e alarga — o que é muito importante — o motivo justificativo deste tipo de contrato.
Ajusta o regime laboral comum em matéria de tempo de trabalho e de local de trabalho, de acordo com a realidade actual do espectáculo.
Contempla, como já foi dito, a possibilidade de reconversão do trabalhador, na linha do que alguns países europeus já adoptaram, e confere também direito à compensação, nos termos no Código do Trabalho.
É nossa convicção, Sr.as e Srs. Deputados, que este será um passo marcante na vida dos trabalhadores do espectáculo e que, por esta via, o Código do Trabalho, que se revelou incapaz de soluções específicas para esta área, ganha também um complemento qualificador.
Os projectos dos diferentes partidos apresentados hoje à Assembleia da República têm, como já se viu, pontos de convergência, que até nos fazem esquecer algumas situações de alguns antecedentes a

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que se referiu a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro. Ora, estes pontos de convergência, juntamente com os contributos que virão da discussão pública e do próprio trabalho dos Deputados em sede de especialidade, fazem prever que, de facto, será encontrado o bom caminho, Sr. Deputado António Filipe, para, no final, termos um bom diploma.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Portugal, com certeza que, em sede de especialidade, juntamente com o resultado da discussão pública, teremos oportunidade de encontrar um diploma adequado a regular os aspectos laborais que se destinam a regular os contratos de trabalho dos profissionais das artes e do espectáculo.
Mas o que lhe quero perguntar muito directamente, porque foi a Sr.ª Deputada que fez a intervenção em nome do Partido Socialista, é se o PS está disponível para viabilizar o projecto de resolução apresentado pelo CDS, que dá ao Governo um prazo até 2009 para apresentar propostas de lei nas áreas da segurança social e fiscal, de forma a permitir que os profissionais do espectáculo tenham direito a uma legislação que acautele a sua situação quando não puderem exercer a sua função principal, em caso de doenças profissionais e acidentes de trabalho, e a formação profissional, bem como o enquadramento fiscal destas actividades.
Relembro, Sr.ª Deputada, que muitos profissionais do espectáculo já estão em situação de reforma e têm reformas de miséria exactamente porque nunca foi contemplado um regime específico para estes artistas.
Agradeço, portanto, uma resposta muito concreta.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Portugal.

A Sr.ª Teresa Portugal (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, creio que há aqui um problema de destempo por parte da Sr.ª Deputada, porque, por um lado, em determinado momento revelou alguma pressa relativamente àquilo que poderia já estar feito a partir de uma coisa que não sabemos bem se existe ou não e, por outro, remete-nos para 2009.

A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Não! Só uma parte!

A Oradora: — O próprio projecto de resolução também vem a destempo, uma vez que hoje nesta Assembleia está em discussão um diploma que trata a matéria que é recomendada nesse projecto de resolução. Portanto, o Partido Socialista está, neste momento, a fazer esse trabalho e continuará a fazêlo, com os contributos, naturalmente, que se revelarem válidos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes.

A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD gostaria de iniciar a sua intervenção nesta discussão por afirmar a sua pertinência. Na verdade, há muito que o País carece de um regime que regulamente, de forma transparente e rigorosa, a actividade dos profissionais das artes e do espectáculo e do audiovisual, cuja presença aproveitamos para saudar.
Esta é, na nossa óptica, uma discussão verdadeiramente útil, que pode ser abordada por duas vertentes, igualmente relevantes: por um lado, o elemento enquadrador de toda esta questão, isto é, a importância da criação cultural e da actividade artística; e, por outro lado, a questão que se prende com a situação profissional dos cidadãos que empenham o seu tempo, o seu brio, no fundo, a sua vida, precisamente em prol da concretização dessa mesma actividade cultural e artística.
São, pois, duas questões absolutamente conexas, mas que — por sistematização de raciocínio — não deixaremos de distinguir.
Em primeiro lugar, o papel da Cultura — nas suas múltiplas variáveis — no desenvolvimento e no bem-estar dos povos.
Aqui, o PSD não esboça qualquer hesitação quando afirma, com toda a convicção, que a aposta na Cultura é um investimento no que de mais perene, mais marcante e mais gratificante uma sociedade pode ter.
A aposta na Cultura não pode — e não deve! — ser uma opção conjuntural. Pelo contrário, deve ser

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um eixo estruturante em torno do qual se poderão erguer ramificações, essas sim, próprias de conjunturas, de momentos ou de opções parciais. O PSD assume-o com profunda convicção.
Por isso mesmo, não podemos deixar de recordar, neste debate, o caminho seguido por este Governo de crescente desvalorização deste sector, no contexto nacional e dentro do próprio Governo.
Os brutais cortes orçamentais, assumidos ao arrepio das promessas eleitorais e, mesmo, do plasmado expressamente no Programa de Governo, são apenas, infelizmente, um pequeno sinal que evidencia a absoluta ausência de uma verdadeira política cultural neste País.
O PSD rejeita liminarmente qualquer tentação que possa resvalar para um qualquer «dirigismo cultural».
Aqui — e de forma bem mais vincada do que em qualquer outra área — acreditamos na sociedade, no indivíduo, na livre criação e na livre expressão.
Não queremos — e não aceitaremos — um Estado dirigista, impertinente, a condicionar a livre iniciativa dos cidadãos.
Contudo, tal atitude não significa ausência ou desvalorização do Estado pela Cultura.
Sabemos que uma sociedade que se quer livre, próspera e solidária, deve assumir que os poderes públicos têm um papel insubstituível a desempenhar. Um papel a desempenhar não só na regulação de todo este sector, que, por razões óbvias, não pode sobreviver limitado aos arbítrios do mercado, mas também um papel activo no incentivo, no apoio e na promoção de objectivos estratégicos.
Creio que este Governo não percebeu este papel.
Apesar de reconhecermos os esforços da Sr.ª Ministra, a verdade é que tal não tem sido suficiente para vencer a insensibilidade do Sr. Primeiro-Ministro.

Vozes do PSD: — Muito bem!

A Oradora: — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, não é, de resto, por acaso que todos sentimos que estamos aqui hoje a discutir um problema laboral e não uma questão da Cultura, o que se fundamenta, precisamente, nesta ausência de visão estratégica que caracteriza a acção deste Governo, também para as questões da Cultura.
Assim, no PSD, lamentamos que esta — e saliento — pertinente questão laboral seja abordada sem qualquer réstia de uma política cultural enquadradora.
Sublinho que todas as iniciativas hoje em discussão têm o mérito de pretender regulamentar uma actividade que, de facto, está hoje desregulada.
Na verdade, os cidadãos que exercem esta actividade não podem permanecer num limbo, despojados de qualquer protecção social.
Por essa mesma razão, o PSD não votará contra qualquer uma delas.
É nosso entendimento que a discussão em especialidade poderá ser particularmente importante para melhorar este conjunto de boas pretensões, como tal, esta discussão deve ser, o mais possível, aberta e abrangente.
Advogamos, igualmente, que, aquando da discussão na especialidade, a respectiva Comissão Parlamentar deve levar a efeito um conjunto vasto e diversificado de audições com o sector do espectáculo e do audiovisual. Estamos certos de que dessa forma todos estaremos habilitados a construir uma melhor lei.
Contudo, apesar deste mérito que reconhecemos a todas as iniciativas em causa, não podemos deixar de registar alguns pontos em que, claramente, divergimos.
Os projectos do PCP e do BE, do nosso ponto de vista, assumem, nalguns casos, um voluntarismo que poderá ser contraproducente.
Com efeito, o excesso de protecção pode tornar insustentável a actividade artística associada a estes profissionais. Merecem, pois, na nossa opinião, uma melhor reflexão e ponderação algumas das propostas que nos são apresentadas.
Por outro lado, e com sentido de responsabilidade, não deveremos, ficar indiferentes aos custos associados a estes passos que nos são propostos.
Quanto à proposta do Governo, importa enfatizar algumas lacunas que consideramos determinantes.
Referimo-nos, concretamente, à ausência de qualquer alusão às especificidades próprias das carreiras de desgaste rápido que, como todos sabemos, caracterizam a actividade de muitos profissionais das artes e do espectáculo, designadamente, os bailarinos.
Estas carreiras merecem uma particular atenção, com a devida ponderação de soluções concretas ao nível da possibilidade de aposentação no final da carreira ou da reconversão profissional, nomeadamente e por exemplo, para o ensino artístico.
De igual modo, permanece para nós inexplicável que o regime de segurança social para estes profissionais seja regulado por diploma a apresentar mais tarde.
Estando o Parlamento a debruçar-se, de forma tão empenhada, neste importante passo para a regulação das carreiras dos profissionais do espectáculo, faz todo o sentido que também essa matéria seja agora apresentada.

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A definição da actividade artística também nos oferece dúvidas. A exclusão dos trabalhadores técnicos desta categoria e a inclusão, por exemplo, de todo e qualquer figurante parece-nos um pouco despropositada.
Assim, o PSD assume, desde já, que em sede de discussão na especialidade apresentará propostas concretas que visem colmatar estas lacunas e, assim, na nossa opinião, melhorar e valorizar a proposta.
Assumimos, portanto, uma postura construtiva, cumprimentando todos os autores das diferentes iniciativas e pretendendo contribuir, com sugestões em sede de especialidade, para atingirmos o fim a que — estou certa — todos nos propomos: fazer a melhor lei possível, a bem da Cultura e de todos aqueles que, dia após dia, lutando contra tantas incompreensões e dificuldades, vão doando o seu suor e o seu talento, em benefício da Arte!

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes, a sua intervenção, antes de mais, causa-nos alguma perplexidade porque o PSD esteve no governo antes do actual Governo do Partido Socialista… Sabemos que talvez tenhamos de ouvir outra vez a desculpa de que tiveram o seu mandato interrompido a meio, mas posso dizer-lhe que, por parte do PCP, preparámos a proposta que aqui temos com menos tempo do que aquele que os senhores tiveram no último governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Portanto, a falta de tempo não é desculpa para não haver iniciativa! A verdade é que hoje, neste debate, registamos, mais uma vez, a ausência de qualquer iniciativa do PSD e, ainda assim, a Sr.ª Deputada traz-nos aqui uma posição um tanto ou quanto amorfa de que o PSD não inviabilizará a iniciativa que o PCP apresenta, mas que esta peca por algum voluntarismo.
Assim sendo, Sr.ª Deputada, pergunto-lhe o seguinte: a proposta do PCP peca por voluntarismo em quê? Porque prevê a necessidade de um contrato de trabalho para trabalhadores que hoje não têm contrato de trabalho e são remetidos para vínculos laborais precários?! É voluntarista em quê? Porque prevê a protecção social nas situações de desemprego, de maternidade, de doença, quando estes trabalhadores são afectados por estas situações?! Sr.ª Deputada, compreendo o relato que aqui nos trouxe nas vantagens que o PSD vê na regulação e no funcionamento do mercado, e dessas concepções personalistas ou individualistas do funcionamento e do desenvolvimento da sociedade que, obviamente, distanciam estas bancadas de uma ponta do universo à outra, mas não podemos compreender que o PSD — e gostava que a Sr.ª Deputada corrigisse esta informação se ela estiver errada — se abstenha de tomar uma posição relativamente àquilo que é uma necessidade de garantir a estes trabalhadores o reconhecimento e os direitos que têm todos os outros trabalhadores e que a sua situação, que é de uma fragilidade brutal, exige nesta realidade com que estamos hoje confrontados.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes.

A Sr.ª Ana Zita Gomes (PSD): — Sr. Deputado, agradeço a sua pergunta e quero dizer-lhe que o exemplo que deu sobre o passado não foi um bom exemplo.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ai pois! Não foi nada bom exemplo!!

A Oradora: — Recordo apenas o empenho que o ex-ministro Pedro Roseta continuado pela exministra Bustorff tiveram na realização de trabalho com vista a esta regulamentação.
É natural que não nos acompanhem em algumas dessas críticas, mas volto a salientar que a nossa postura hoje, aqui, é construtiva e podemos resolver todas essas dúvidas, todos esses problemas, em sede de especialidade. Para isso, propomo-nos contribuir de uma forma construtiva. Queremos ouvir todo o sector e queremos uma lei que funcione, de facto, uma lei que funcione para as pessoas e não contra as pessoas.
Dou como exemplo, em relação ao projecto do PCP, a questão da carga horária sobre a qual temos dúvidas que possa beneficiar todos os trabalhadores… Penso, por isso, que mais discussão podemos têla em sede de especialidade, pelo que mantemos a nossa posição.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: o Partido Ecologista «Os Verdes» saúda este agendamento potestativo do PCP para discutir o projecto de lei n.º 324/X, que define o regime socioprofissional aplicável aos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual.
Saudamos igualmente o Bloco de Esquerda, o Governo e o CDS que vieram, depois do Partido Comunista Português, apresentar as suas propostas para responder a uma evidente e grave carência do nosso ordenamento jurídico respeitante à regulação da actividade dos profissionais dos espectáculos.
Portugal conheceu um crescimento grande destas actividades nos últimos anos e com ela um aumento do número de trabalhadores que fazem das actividades artísticas a sua profissão exclusiva como modo principal de vida.
Aumentou também a formação artística, não só com a abertura de novas escolas mas também com a proliferação de formação não institucional com uma qualidade, regularidade e profissionalidade muito variáveis que cumprem funções tão distintas como formar públicos, realizar formação contínua ou complementos de formação, formação de amadores ou iniciar mesmo os futuros profissionais.
Mas a este aumento do número de profissionais, infelizmente, não tem correspondido a salvaguarda dos direitos fundamentais destes trabalhadores, quer ao nível laboral quer ao nível da protecção social, como nas situações de gravidez, desemprego ou doença, incluindo doença profissional.
A generalização das situações de recibo verde, mascarando, sob a capa de prestação de serviços, verdadeiras situações de subordinação jurídica e de independência económica e que, como tal, se deveriam subsumir à lógica do contrato de trabalho, ainda que adequado à realidade económica do sector e socioprofissional dos seus trabalhadores, é uma imposição ética.
Esta situação conduz, na prática, a uma inaceitável situação de precariedade no emprego dos trabalhadores sem qualquer horário de trabalho, sem segurança social, que os coloca numa situação de extrema fragilidade social e familiar, de impotência para reivindicar os seus direitos e de medo em relação ao seu futuro, designadamente nas situações de profissão de desgaste rápido.
Esta é, volto a dizer, uma imposição ética que se coloca ao Parlamento e à qual não podemos voltar costas! Fazê-lo seria sancionar uma vergonhosa situação hoje existente de marginalização de muitas pessoas que, com a sua actividade, contribuem de forma determinante para enriquecer o panorama cultural do País, criando, produzindo, construindo, divulgando e apresentando as mais diversificadas obras de arte e/ou de entretenimento nos domínios do espectáculo e da performance ao vivo através de meios audiovisuais.
Todas as iniciativas que temos perante nós contêm boas intenções, contêm soluções interessantes que, certamente, em sede de especialidade, serão passíveis de aperfeiçoamento.
Esperamos, designadamente, que haja disponibilidade por parte do Governo e do Partido Socialista para rever questões que nos suscitam preocupação, tal como suscitaram às cerca de 15 associações e sindicatos representativos dos profissionais do sector do espectáculo e do audiovisual que constituíram a Plataforma dos Intermitentes.
De resto, seria desejável que essa Plataforma pudesse ser ouvida, entre outras entidades, em sede de especialidade num trabalho a desenvolver a seguir.
Desde logo, o conceito de intermitência. A intermitência é uma realidade de grande parte ou da maioria dos trabalhadores e consiste, essencialmente, não apenas na intermitência ou falta de continuidade da apresentação de uma determinada produção de um espectáculo mas, sim — e é sob esta forma que afecta o maior número de trabalhadores e de situações profissionais —, a intermitência de produções ou entre produções, isto é, o facto de muitos destes profissionais hoje estarem a trabalhar com um determinado empregador e não saberem dali a um mês, ou dali a seis meses, onde estarão, a fazer o quê, para quem e em que condições.
Esta intermitência está ausente das preocupações patentes na proposta de lei n.º 132/X.
Aliás, ao que o Governo pode dar azo com as suas propostas é a que os trabalhadores das artes do espectáculo que, neste momento, já têm uma situação mais condigna e estável venham a conhecer uma redução do seu salário actual.
Da mesma forma, o rol de actividades artísticas previstas no artigo 1.º da proposta do Governo, apesar da cláusula aberta que apresenta, esquece todo um conjunto de profissionais das artes do espectáculo, especificamente dos audiovisuais, com uma actividade artística muito concreta, como é o caso do sonoplasta e do iluminoplasta, o director de fotografia, o argumentista, o cenógrafo, entre tantos outros, ou outras, o que é discutível, mas que poderão ter uma actividade considerada menos artística, como é o caso do luminotécnico, do carpinteiro de cena, do operador de câmara, etc., e sem os quais os espectáculos, de certeza absoluta, nunca seriam uma realidade, nunca chegariam ao público! A mera referência a técnicos ou auxiliares, sem definir estes conceitos, cria uma discriminação que não se afigura justificável e que, por isso, entendemos ilegítima.
Também a consagração do trabalho nocturno entre as 24 horas e as 5 horas da madrugada, sem mais referências, carece de justificação plausível, tal como o trabalho em dia feriado, em que se prevê a

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possibilidade de ser gozado a posteriori por escolha do empregador, o que não salvaguarda, certamente, o direito dos trabalhadores.
Em último lugar, porventura o mais grave é a não assunção pelo Governo, desde já, daquela que é uma das razões principais para regular esta matéria: precisamente, a ausência de protecção social destes trabalhadores. O Governo ao remeter isto para mais tarde, sem mais explicações, dá um péssimo sinal a estes trabalhadores, que esperam, hoje, uma decisão definitiva em relação aos seus problemas!! Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a noção das diferenças e especificidades existentes dentro deste sector, tão diversificado, e da necessidade de consagrar o reconhecimento e a certificação destes profissionais, damos, hoje, certamente, um pontapé de saída fundamental, mas impõe-se que não nos fiquemos por meias-tintas e assumamos aqui as nossas responsabilidades, regulando este sector naquilo que, desde já, seja possível.

Aplausos de Os Verdes e do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.

O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje o futuro modelo laboral para todos os trabalhadores e profissionais das artes do espectáculo, um tema altamente relevante para um não menos relevante sector da sociedade portuguesa. A actividade destes profissionais tem vindo a sofrer grandes mudanças nas últimas décadas e há muito que é consensual, na sociedade portuguesa, a necessidade de uma regulamentação laboral específica.
Houve uma evolução determinante no número de profissionais envolvidos, de espectáculos produzidos, de projectos e de empresas. Há hoje uma diversidade de abordagens artísticas como nunca no passado. Assistimos a um crescimento das políticas públicas, com origem no poder central ou de âmbito local, mas também de iniciativas privadas, que consolidaram o desenvolvimento deste sector, que hoje representa um contributo inquestionável, não só no reforço cultural do País mas também no emprego que origina e no impacto que tem na economia nacional. Tem havido mais oportunidades para os profissionais, mas originaram novos desafios. Trata-se, pois, de uma realidade sobre a qual importa reflectir, e também nesta Assembleia.
Um país moderno e assumidamente europeu é aquele que olha para a sua actividade cultural como uma referência e como fazendo parte do desenvolvimento integral da própria sociedade. Mas, se esta é a nova realidade, é fundamental e urgente adequar a legislação laboral a um sector que é diferente dos demais mas que é tão determinante como todos os outros.
Neste contexto, a proposta apresentada pelo Governo vai no sentido de conferir maior dignidade profissional e mais segurança laboral ao conjunto dos profissionais.
Queremos também saudar, no quadro do presente debate, os Grupos Parlamentares do PCP e do Bloco de Esquerda, pela apresentação dos projectos de lei, iniciativas legislativas que visam, também, a aprovação de um estatuto laboral especial, provando a importância do tema que hoje debatemos, assim como o projecto de resolução do CDS-PP. Estas iniciativas legislativas, não obstante as divergências existentes ao nível de algumas opções normativas, apenas reforçam a nossa convicção de que estamos perante um sector de actividade que reclama do legislador uma tutela jurídico-laboral específica.
Mas vamos à proposta de lei n.º 132/X, que também hoje está em discussão: trata-se de uma iniciativa legislativa que merece a nossa concordância, já que pretende dotar estes profissionais de um enquadramento jurídico adequado e equilibrado face aos interesses em presença, e cuja aprovação contribuirá, seguramente, para a valorização e para a dignificação da função, assim como para o desenvolvimento do sector em causa. Uma iniciativa legislativa necessária e oportuna, no plano dos objectivos que visa atingir, correspondendo a uma justa e legítima aspiração dos profissionais deste sector.
A definição de condições claras e adequadas ao exercício profissional dos trabalhadores de espectáculos constitui, para o Partido Socialista, desde logo, um imperativo de ordem social.
A ausência de um enquadramento jurídico, moderno e adaptado às especificidades e à evolução do sector, tem levado, como todos sabemos, ao recurso generalizado a formas de trabalho autónomo (vulgo «recibos verdes»), situação que não se compadece com a realidade do sector e que, naturalmente, gera elevados níveis de desprotecção social e de precariedade laboral dos trabalhadores envolvidos.
Sr.as e Srs. Deputados: Ao criar um novo enquadramento jurídico para as artes do espectáculo, o Partido Socialista honra o compromisso que assumiu, um compromisso plasmado no Programa do XVII Governo e que, agora — estamos certos! —, inicia a sua concretização.
No plano das soluções que preconiza, consideramos que a proposta de lei n.º 132/X vai no sentido apropriado, como já acontece, aliás, noutros países, caminhando para soluções inovadoras, modernas e adequadas à realidade do sector e aos interesses dos seus profissionais, destacando-se, pela sua importância, em primeiro lugar, a abertura a novos modelos de contratação laboral, prevendo a figura do contrato de trabalho intermitente e do contrato de trabalho de actividade artística em grupo, a par do contrato de trabalho por tempo indeterminado e do contrato a termo, certo e incerto, com as necessárias adaptações. Pretende-se, assim, que o contrato de trabalho seja a regra e não a excepção — repito, a

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regra e não a excepção!! O que estamos a propor são mais soluções contratuais para defesa dos interesses dos trabalhadores: queremos mais contratos regulados, queremos menos precariedade! Em segundo lugar, a possibilidade de inscrição em registo próprio, a criar no âmbito dos serviços do Ministério da Cultura, instrumento adequado ao reconhecimento e à valorização da profissão, conferindo um título profissional.
Em terceiro lugar, o reconhecimento de direitos e deveres especiais dos profissionais de espectáculo, assim como a previsão de normas específicas ao nível da duração, da organização do tempo de trabalho e de um regime de reclassificação profissional, aspectos essenciais da prestação laboral.
Uma nota que perpassou do debate relativamente às profissões de desgaste rápido, e foi suscitada nas intervenções do Bloco de Esquerda, do CDS-PP e também do PSD, é uma matéria que deve ser analisada com cuidado, para evitar maiores injustiças do que aquelas que pretendemos combater. E aqui, exactamente aqui, cremos que não pode haver voluntarismo legislativo, porque, como referi há pouco, poderemos criar situações ainda mais injustas.
Recordo que, no acordo de concertação social relativamente à reforma da segurança social, ficou definido o ano de 2007 para a discussão do adequado enquadramento, em face das condições particulares de cada profissão.
Portanto, a Assembleia da República não pode nem deve substituir-se a um debate que tem o seu lugar próprio, que é a concertação social. E, naturalmente, depois, a própria Assembleia da República debaterá esta matéria.
Por todas estas razões, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista acolhe favoravelmente a proposta de lei em discussão, na convicção de que estamos a contribuir para a aprovação de uma legislação necessária e fundamental quer do ponto de vista do desenvolvimento do sector quer do ponto de vista do reforço dos direitos laborais dos profissionais do espectáculo.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Porque deseja o maior consenso possível naquilo que são preocupações comuns, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista manifesta, desde já, a sua abertura para que, em sede de debate na especialidade, possam ser encontradas as melhores soluções que, sem porem em causa os objectivos essenciais da proposta do Governo, aliás, em linha com os compromissos eleitorais do Partido Socialista, contribuam para a aprovação de um regime jurídico justo, equilibrado e que concorra, efectivamente, para a valorização e a dignificação dos profissionais de espectáculos.
Desde já, ficamos a aguardar as propostas de todos os partidos — algumas das quais já foram aqui explanadas —, nomeadamente as do PSD, uma vez que foi o único partido que ficou fora deste debate.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito de passagem, e referindo-me à intervenção da Sr.ª Deputada Ana Zita Gomes, eu gostaria de sublinhar que este Governo criou novos instrumentos para a dinamização da criação artística, da produção artística, designadamente na área das artes em geral e do cinema. E não só criou novos instrumentos como também mobilizou mais recursos, e consideráveis, porque manteve os 22 milhões de euros para o apoio à criação artística e conseguiu, para o cinema, mais 16 milhões de euros/ano. Ou seja, neste momento, podemos contabilizar em cerca de 50 milhões de euros o esforço do Estado, em 2006, para apoio à criação artística, fora os organismos de produção artística. É o que este Governo está fazer, isto é, conter o défice e conseguir mais resultados.
Entrando, agora, em questões concretas que foram aqui suscitadas, quero referir-me, em primeiro lugar, ao problema da não contemplação da segurança social. Aqui há uma «sequencialidade»: não é possível contemplar adequadamente os problemas da segurança social sem estar, primeiro, definido o quadro normativo que se aplica ao regime laboral. E é isto que é preciso fazer com cuidado, guardando para um segundo momento a questão da regulamentação da segurança social.
Além disso, em sede de concertação social com os parceiros sociais, o Ministério do Trabalho comprometeu-se a entregar, até ao fim deste ano, o regime de regulamentação das profissões de desgaste rápido, que não são apenas as dos artistas mas outras, pelo que é necessário que todas sejam contempladas com um regime coerente.
Nessa medida, guardar-se a segurança social para um diploma autónomo é um sinal de que também a situação dos artistas será contemplada de uma forma mais adequada e de que se darão mais garantias de protecção social.
Gostaria ainda de me referir à questão da reconversão profissional, que foi aqui suscitada a propósito do artigo 18.º O que se pretende com este artigo é garantir mais emprego, porque, quando há uma situação de desgaste rápido, há um dever de o empregador encontrar soluções alternativas para o trabalhador artístico e só no caso de essas soluções não serem encontradas é que se coloca a possibilidade da

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caducidade do contrato e da indemnização. Mas repare-se que se trata de um regime muito mais favorável do que o do Código do Trabalho, porque pode haver direito à indemnização por motivo de desgaste rápido imputável ao trabalhador, ao passo que no Código do Trabalho essa situação só é previsível para o empregador.
Depois, coloco aos Srs. Deputados a seguinte questão: alguém se reforma aos 40 anos? Ninguém se reforma aos 40 anos!! Qualquer pessoa que entra numa situação de desgaste rápido aos 40 anos procura um segundo emprego.
Portanto, nós temos, designadamente no âmbito da OPART, que aqui foi referida, a possibilidade de reconversão num estúdio de ballet, que não existia e passou a estar previsto, ou até, eventualmente, numa segunda companhia que não exija as mesmas condições que uma companhia de bailado clássico.
São duas hipóteses de reconversão, no caso concreto da Companhia Nacional de Bailado (CNB).
Por outro lado, a hipótese de receber uma indemnização, nas situações em que a reconversão não é possível, vai também permitir ao trabalhador uma possibilidade de reconversão profissional, porque, se é o caso de um trabalhador com 40 anos, ninguém acredita que ele, ao receber uma reforma aos 40 anos, não vai procurar um segundo emprego. Vai, com certeza, procurar um segundo emprego! Por isso, em muitos regimes europeus, prevê-se uma situação análoga à que prevemos no artigo 18.º e que é a da reconversão profissional ou, em alternativa, a da indemnização, que também permite essa eventualidade. No entanto, este aspecto pode ainda ser reforçado, evidentemente, com medidas que venham a ser contempladas em sede do regime de segurança social.
Agora, quanto à CNB, é preciso que fique muito claro que a preocupação do Governo foi a de não haver qualquer despedimento e, por isso, no diploma que cria a OPART está expressamente previsto que os trabalhadores tanto da CNB como do Teatro Nacional de São Carlos transitam com todos os direitos e regalias.

Aplausos do PS.

Se houvesse, da parte do Governo, qualquer pretensão escondida de não considerar devidamente o mérito e as possibilidades desses trabalhadores, certamente, poderia ter aproveitado a transição para entidade pública empresarial para determinar uma desvinculação profissional. Mas não foi essa a atitude do Governo! A atitude do Governo foi a de dar todas as garantias aos trabalhadores, tanto do Teatro Nacional de São Carlos como da Companhia Nacional de Bailado! E, diga-se de passagem, a OPART destina-se precisamente a um melhor aproveitamento de recursos, para que a Companhia tenha ainda mais possibilidades de afirmação.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, lembro que está a decorrer a eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República. Aqueles que ainda não exerceram o direito de voto podem fazê-lo nas urnas colocadas junto ao serviço de apoio ao Plenário.
Para pedir esclarecimentos ao Sr. Secretário de Estado da Cultura, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, diploma sequencial porquê? Relativamente à segurança social está a produzir legislação «às pinguinhas». Se tem de apresentar um diploma por que não o trouxe aqui e agora para sabermos claramente o que estamos a discutir? Esta é a primeira questão que quero deixar-lhe.
Passo à segunda questão. Se não se importa, queria ouvi-lo dizer claramente que nem o artigo 7.º nem o artigo 18.º, nem, portanto, a precariedade prevista neste mesmo artigo, se destinam aos trabalhadores da Companhia Nacional de Bailado. Gostaria de o ouvir assumir plenamente esta questão.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cecília Honório, já dei uma explicação cabal a esse respeito.
Não é possível contemplar de uma forma adequada neste diploma a complexidade dos problemas que se colocam em sede de segurança social. Foi por um sentido de responsabilidade em relação aos problemas da segurança social e por aquilo, que já referi também, que foi decidido em sede de concertação social que se considerou ser melhor concentrarmo-nos no problema do combate à precariedade contratual e na regulação de um sector que está completamente desregulado e encontrar um regime adequado para que o legislador, em sede de segurança social, esteja devidamente documentado sobre todas as nuances e questões que esse regime levanta. Misturar as duas coisas no mesmo diploma, nes-

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te momento, não seria conveniente.
Quanto à questão da Companhia Nacional de Bailado, já disse que se houvesse qualquer coisa escondida «na manga» não se teria estabelecido na OPART a garantia de que os trabalhadores transitavam do Teatro Nacional de São Carlos para a Companhia Nacional de Bailado com todos os direitos e antiguidade.

Aplausos do PS.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Isso está ausente da lei!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Do que foram as intervenções aqui hoje produzidas já é possível prever que o resultado das votações que terão lugar dentro de alguns momentos — aliás, o facto de se aproximar o momento das votações faz com que seja cada vez mais difícil cada um de nós fazer-se ouvir pelo burburinho na Sala — será positivo e que as iniciativas legislativas em discussão serão viabilizadas.
Queríamos, desde logo, saudar o espírito com que o Governo encarou este debate. O Governo tem uma iniciativa legislativa apresentada cuja consulta pública ainda decorre até ao dia 26. Sendo este um agendamento do PCP, o Governo não era obrigado a agendar a sua proposta de lei. Fê-lo e, por isso, saudamos o facto de ter sido possível hoje, nesta sessão plenária, discutir as várias alternativas apresentadas, as várias propostas em cima da mesa, e de as viabilizar para que todas possam ser conjuntamente discutidas na especialidade.
Quero dizer, desde já, que o Grupo Parlamentar do PCP vai votar favoravelmente as iniciativas legislativas apresentadas, quer a proposta de lei do Governo quer o projecto de lei do BE, para além do projecto de lei do PCP, como é óbvio, apesar de divergências de especialidade que temos em relação às mesmas.
Já tive oportunidade de salientar que há aspectos que entendemos que a proposta de lei não resolve da melhor forma. Achamos que tem um âmbito restrito quanto à sua aplicação e que não abrange profissões que deveriam ficar abrangidas por este regime; achamos que a solução para a intermitência é fraca — 30% do salário nos meses de inactividade parece-nos uma protecção fraca —; temos preocupações quanto à solução do artigo 18.º, se for aplicável, designadamente, aos bailarinos; e temos o problema da segurança social.
Registámos a explicação do Sr. Secretário de Estado. Ficará para depois de regulado o regime laboral a regulação do regime da segurança social. Não víamos objecção nenhuma, e por isso o propusemos, a que a regulação das duas matérias pudesse ser feita ao mesmo tempo, até porque o problema da segurança social é fundamental para os intermitentes quando estão em situação de desemprego,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — … mas vamos retirar daqui um efeito útil. Que se resolva depressa o problema da regulação laboral para que não se perca muito tempo na resolução do problema da segurança social.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Portanto, com esta posição do Governo fica aqui um apelo para que, pelo menos, o problema da regulação laboral seja resolvido quanto antes para que se possa, então, encarar esse segundo problema, que, saliento, quanto a nós poderia ser resolvido desde já.
Neste final de debate, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queremos deixar um sinal claro daquela que, para nós, é a questão essencial.
Antes das eleições legislativas para esta Assembleia, houve uma iniciativa pública no Teatro São Luiz promovida por um conjunto muito significativo, e com uma grande presença, de trabalhadores das artes do espectáculo onde participaram todos os partidos concorrentes às eleições legislativas ou, pelo menos, aqueles que tinham aspirações a ter representação parlamentar. Todos os partidos com representação parlamentar participaram, todos consideraram que a questão era muito relevante e que nesta Legislatura a mesma teria de ser resolvida. É preciso dizer que essa é uma altura em que prometer não custa!… Pela nossa parte, após as eleições, deitámos mãos à obra e fizemos o que estava ao nosso alcance para honrar esse compromisso. E não ficámos pelo reconhecimento das dificuldades, porque é muito fácil vir aqui dizer que o problema é muito difícil e, ao mesmo tempo, criticar o que os outros propõem quando não se propõe nada. Nunca foi essa a nossa atitude. E, portanto, sabendo as dificuldades, enfrentámo-las o melhor que soubemos e apresentámos um projecto de lei. Mais do que isso: esforçámo-nos e usámos um agendamento potestativo para que esta matéria fosse de facto discutida com todas

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as propostas já apresentadas.
Vamos continuar com este nosso empenhamento e fazemos votos para que, o mais rapidamente possível — e pensamos que até ao final da presente Sessão Legislativa será possível dar um passo significativo —, os trabalhadores das artes do espectáculo fiquem com um regime laboral que lhes permita serem reconhecidos com um estatuto de trabalhadores que efectivamente são e que acabe esta situação absolutamente iníqua e injustificada de terem de recorrer a «recibos verdes» como se fossem trabalhadores independentes, profissionais liberais, quando de facto, na sua grande maioria, estão sujeitos à direcção de uma entidade patronal e têm toda a subordinação jurídica inerente a uma relação de trabalho.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Portanto, pela nossa parte, vamos empenhar-nos para que, o mais rapidamente possível, esta questão se resolva. Claro que isto não é tudo. Há aspectos relacionados com as várias profissões das artes do espectáculo que têm especificidades.
Já foi aqui referida a situação de desgaste rápido da profissão de bailarino, que tem a máxima relevância. É uma questão muito relevante e que deve ser resolvida. Entendemos não a incluir nesta iniciativa legislativa porque pensámos que nela deveríamos procurar o denominador comum a todas as profissões das artes do espectáculo. Foi uma opção nossa. Não significa menosprezo para com o problema, pois achamos que o mesmo deve ser, de facto, resolvido, mas, sim, que entendemos que devemos resolver aqui aquilo que é comum a todas as profissões e que, depois, deveremos todos empenhar-nos também para que se encontre uma solução para aquelas que exigem uma solução específica. E reconhecemos que, efectivamente, os bailarinos exigem essa solução,…

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — … dado o desgaste rápido inerente à sua profissão e que não é comum a outras profissões das artes do espectáculo.
Entendemos, Sr. Presidente, que este agendamento valeu a pena e congratulamo-nos com o facto de termos tomado a decisão de agendar esta matéria ainda na presente Sessão Legislativa.
Seria muito gongórico da nossa parte dizer que este será um debate para ficar na História. Não se trata disso, mas se todos honrarmos o compromisso que todas as bancadas aqui assumiram de dar grande prioridade a esta matéria e de a resolver rapidamente, podendo, como é óbvio, não concordar com todas as soluções que afinal venham a ser decididas e achar que há insuficiências na regulação que se venha a aprovar, acreditamos que este dia pode vir a ser uma grata recordação, isto é, pode vir a ser lembrado como a primeira vez em que a Assembleia da República discutiu este problema, que é muito relevante para os trabalhadores das artes do espectáculo e para a cultura em Portugal, e que a partir daqui se desbloqueou uma situação que precisava de ter sido desbloqueada.
Se assim for, e acreditamos que vai ser assim, ou seja, que a partir deste debate nada vai ficar como antes, esperamos vir a ter uma grata recordação do dia 10 de Maio de 2007, em que a Assembleia da República encarou este problema e honrou os seus compromissos para com os cidadãos.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.

A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No final deste debate, gostaria de congratular-me com o bom acolhimento que a proposta de lei que o Governo aqui trouxe teve. Evidentemente, esse bom acolhimento decorre também do facto de estarmos a introduzir regulação no ordenamento jurídico de uma área profissional, dos profissionais das artes do espectáculo, que carecia há muitos e longos anos dessa regulação.
Portanto, acho — e nisto concordo com o Sr. Deputado do PCP — que esta é uma proposta histórica e que este é, certamente, um debate histórico para os profissionais das artes do espectáculo.
Gostava de acentuar, como, de resto, o fiz na minha intervenção inicial, que este também é um momento histórico porque somos o primeiro Governo que efectivamente trouxe este debate à Assembleia da República. Este debate teve lugar hoje por iniciativa do PCP, mas, obviamente, teria lugar, de qualquer forma, a partir do momento em que o Governo apresentou esta proposta de lei, após a consulta pública que está a decorrer neste momento.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Gostaria também de acentuar que esta proposta de lei, ao contrário do que sugeriu a Sr.ª Deputada do PSD, não surge isoladamente no âmbito das preocupações e da política do Governo e

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do Ministério da Cultura para a produção artística.
Como o Sr. Secretário de Estado há pouco lembrou, durante estes dois anos de Governo tivemos ocasião de introduzir uma nova regulamentação do apoio às artes e tivemos também ocasião de relançar, com um novo formato, um programa de apoio à difusão cultural, chamado Território Artes, que retoma, transformando, como acabei de dizer, o apoio à difusão que o governo do PSD tinha liquidado de uma forma absolutamente abrupta e incompreensível.
Gostava, ainda, de acentuar que também interviemos, no âmbito do apoio às artes, com a regulamentação da lei do cinema e audiovisual e com a criação do fundo para o cinema, que possibilitou um acréscimo de 16 milhões de euros para o apoio a essa área de produção artística.
Queria também acentuar uma dimensão que já aqui foi referida pela bancada do PCP. Trata-se do carácter inovador que esta proposta de lei tem em vários aspectos. De facto, a criação de um novo tipo de contrato, que adequa o Código do Trabalho à especificidade e às características da actividade dos profissionais das artes, tem uma componente inovadora em Portugal e, porventura, em alguns aspectos, também à escala europeia, embora, como também aqui já foi lembrado pela bancada do PS, usemos alguns modelos que estão em prática em países europeus, como é o caso, por exemplo, do contrato de trabalho intermitente que existe em França ou em Espanha.
Gostava de sublinhar, de novo, que esta proposta de lei contempla apenas uma primeira etapa do estatuto do artista, que se reporta tão-só ao contrato laboral, às questões contratuais. E, se queremos regular devidamente, no âmbito de uma segunda etapa, o regime específico da segurança social, era fundamental que esta primeira etapa fosse considerada, isto é, era fundamental estipularmos e regulamentarmos os tipos de contrato de trabalho para podermos, depois, regular de uma forma também ela especial o regime da segurança social.
E, dirigindo-me muito particularmente à bancada do CDS, volto a lembrar que o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social se comprometeu, no âmbito do acordo sobre a reforma da segurança social, estabelecido em sede de Conselho Económico e Social e de concertação social, a regular os regimes especiais de segurança social no que se reporta às profissões de desgaste rápido, durante o ano de 2007 e não em 2009!

O Sr. João Oliveira (PCP): — Não se esqueça!

A Oradora: — Por último, estou certa de que, em face do bom acolhimento que a proposta de lei teve nesta Assembleia, o Grupo Parlamentar do PS e, penso, os outros grupos parlamentares também, assim o referiram, poderão acolher, em sede de especialidade, muitos dos contributos que a discussão pública certamente trará.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está concluída a discussão conjunta, na generalidade, do projecto de lei n.º 324/X (PCP), da proposta de lei n.º 132/X, do projecto de resolução n.º 48/X (CDSPP) e do projecto de lei n.º 364/X (BE).
Recordo que as urnas continuam abertas, até ao final da sessão, para a eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República proposto pelo CDS-PP, na sequência da renúncia do Sr. Deputado Telmo Correia. Peço aos Srs. Deputados que ainda não exerceram o direito de voto o favor de o fazerem.
Vamos entrar no período regimental de votações.
Antes de mais, vamos proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 201 presenças, às quais se somam 4 registadas pela Mesa, pelo que temos quórum para proceder às votações.
Vamos começar por votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 324/X — Define o regime socioprofissional aplicável aos trabalhadores das artes do espectáculo e do audiovisual (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Esta iniciativa baixa à 11.ª Comissão.
Vamos proceder à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 132/X — Aprova o regime dos contratos de trabalho dos profissionais de espectáculos.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

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A proposta de lei baixa também à 11.ª Comissão.
Vamos votar o projecto de resolução n.º 48/X — Recomenda ao Governo a criação de um regime laboral, fiscal e de protecção social especial para os trabalhadores das artes e espectáculo (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do CDS-PP e abstenções do PS, do PSD, do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 364/X — Estabelece o regime laboral e social dos profissionais das artes do espectáculo e do audiovisual (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

O projecto de lei baixa à 11.ª Comissão.
Vamos votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 121/X — Altera a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que altera o regime de acesso ao direito e aos tribunais.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

A proposta de lei baixa à 1.ª Comissão.
Vamos passar à votação, na generalidade, o projecto de lei n.º 286/X — Cria o instituto de assistência jurídica para tornar efectivo o acesso à justiça e ao direito (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Vamos votar, na generalidade, o projecto de lei n.º 287/X — Lei relativa ao acesso à justiça e ao direito (BE).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do BE e de Os Verdes e a abstenção do PCP.

Vamos proceder à votação, na generalidade, do projecto de lei n.º 377/X — Garante o acesso ao direito e aos tribunais, revogando o regime jurídico existente (PCP).

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP, votos a favor do PCP e de Os Verdes e a abstenção do BE.

Vamos passar à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 126/X — Aprova o regime jurídico da avaliação do ensino superior.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e abstenções do PSD e do CDS-PP.

A proposta de lei baixa à 8.ª Comissão.
Vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 93/X — Aprova o regime jurídico de entrada, permanência e saída de estrangeiros do território nacional, e ao projecto de lei n.º 248/X — Altera o regime de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (Quarta alteração do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, alterado pela Lei n.º 97/99, de 26 de Julho, pelo Decreto-Lei n.º 4/2001, de 10 de Janeiro, e pelo Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25 de Fevereiro) (PCP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do CDS-PP e do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Celeste Correia. Dispõe de 3 minutos.

A Sr.ª Celeste Correia (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na sequência da Lei da Nacionalidade e da apresentação do Plano para a Integração dos Imigrantes, esta iniciativa que acabámos de aprovar é mais um passo no sentido do aprofundamento da inclusão dos imigrantes na sociedade portuguesa.

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Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — A proposta do Governo já tinha beneficiado de inúmeros e valiosos contributos que chegaram de diferentes sectores da sociedade civil, mas beneficiou igualmente, e muito, dos contributos dos elementos do grupo de trabalho, formado no âmbito da 1.ª Comissão, que integrou os Deputados Cecília Honório, do BE, Nuno Magalhães, do CDS-PP, António Filipe, do PCP, e Feliciano Barreiras Duarte, do PSD. Agradeço pessoalmente a todos, mas permitam-me que destaque os contributos prestados por este último. Temos em comum — é verdade que com outros — o facto de colocarmos as questões da imigração acima de querelas partidárias.

Aplausos do PS e do PSD.

Consagra-se, com este texto, uma política de imigração ajustada à capacidade da sociedade portuguesa de receber com dignidade — e, Srs. Deputados, repito «receber com dignidade» — os que nos procuram para melhorar as suas vidas, ajustadas aos valores que defendemos, como, por exemplo, o direito ao reagrupamento familiar, o combate ao tráfico de seres humanos e à imigração ilegal, a protecção às vítimas do tráfico de seres humanos, etc.
Consagra-se a necessidade de atrair imigrantes legais, imigrantes qualificados. Desburocratizam-se os procedimentos nesta área. Simplifica-se a vida dos imigrantes e contribui-se decisivamente para resolver situações de injustiça social.
Com esta iniciativa, é acautelada a necessidade de defesa da sustentabilidade do nosso mercado de trabalho e, para tanto, consolidou-se um novo regime de contingentação anual de oportunidades de trabalho não preenchidas por nacionais, cidadãos comunitários ou estrangeiros residentes em Portugal.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Já tem sido dito que a imigração é um desafio e deve ser uma oportunidade para todos — imigrantes, países de origem, países receptores.
Por isso, não estamos, não estivemos de acordo com algumas propostas do Bloco de Esquerda, pois, em nosso entendimento, se fossem aprovadas, retirar-se-iam ao Estado instrumentos de defesa, o que poderia pôr em causa a segurança nacional.
Com efeito, não se poderia indicar para efeitos de não admissão, não se poderia cancelar a autorização de residência ou expulsar quem atentasse contra a segurança nacional e a ordem pública ou quem constituísse ameaça aos interesses ou à dignidade do Estado português ou dos seus nacionais. Não é esse o nosso caminho.
Para nós, os imigrantes não devem ser nem diabolizados nem endeusados, devem ser tratados como seres humanos, sujeitos de dignidade.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — São entendimentos diferentes sobre o papel da imigração, sobre os equilíbrios, sempre difíceis, entre direitos humanos e direitos soberanos, de como encarar as novas pressões migratórias que tendem a manter-se, quando não a aumentar, diversificando-se.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A terminar gostaria de salientar que esta lei da imigração funda-se no aprofundamento da visão humanista que esta Assembleia vem afirmando e consolidando. Os imigrantes são tratados de forma justa, equilibrada e pragmática (daí a recusa dos efeitos suspensivos, com algumas excepções) e abre-se-lhes uma janela de oportunidades.
No momento em que na Europa, e não só, assistimos a retrocessos nesta área, esta iniciativa releva de uma democracia, a nossa, que procura enfrentar as questões da imigração, não com demagogias, não com populismos mas com maturidade, o que deve constituir um orgulho para todos nós.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados: Na lei da imigração proposta pelo Governo, e onde PS e PSD se dão as mãos, não há a inspiração dos melhores exemplos europeus. Os bons ventos dos processos de regularização de indocumentados, em Espanha e, mais recentemente, na Holanda e Alemanha, não chegam a Portugal.
Onde se exigia a coragem para a regularização de todas as pessoas que aqui trabalham, temos respostas coxas e medrosas: fecham-se as portas da frente e abrem-se frestas nas janelas dos fundos.
E as perguntas mantêm-se, são as mesmas: quantos vão ficar de fora? A que custo? E para que precisa o Governo de uma política de imigração restritiva, se o grande problema que tem em mãos é o da emigração?

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Ao medo da regularização, o Governo acrescenta outro funil, o das quotas. Onde se exigia agilização dos mecanismos de circulação das pessoas, quando toda a gente sabe e todos os estudos revelam que elas circulam e circularão para além dos muros, temos as quotas consagradas no artigo 59.°, as quotas em que, afinal, ninguém acredita.
Por outro lado, o filtro securitário da lei, a suspeição que continua a recair sobre os imigrantes, expressa em tantas matérias como a esperada caça aos casamentos por conveniência, o reforço do poder discricionário do SEF e da sua «audácia» (garantida pelo Ministro da Administração Interna e presente no aumento das expulsões em 33%, no ano de 2006) provam que ainda não se olha os imigrantes como factor de sustentabilidade do País, como garante da sobrevivência do seu sistema de segurança social, como factor de vitalidade e sustentabilidade demográfica.
Mas o labirinto que é esta lei tem uma zona profundamente cinzenta no que respeita às liberdades e aos direitos fundamentais: o visto do imigrante pode ser anulado sem que este tenha direito a defesa. À proposta do Bloco de Esquerda de criação de gabinetes jurídicos da Ordem dos Advogados nas zonas internacionais, o Partido Socialista disse «não». A todas as decisões passíveis de impugnação judicial, para as quais o Bloco de Esquerda propôs o efeito suspensivo, PSD e PS, de mãos dadas, disseram que não e mantiveram o efeito devolutivo.
Onde se esperava, ao menos em nome dos direitos humanos, que o direito de defesa fosse um pilar do diploma, encontramos modestas aberturas. É inaceitável que continue a haver afastamentos do País, sem intervenção judicial e por mera intervenção administrativa.
O PS esforçou-se por limpar os muitos anos de políticas de imigração direitistas e a lei tem avanços, no reagrupamento familiar, nos limites à expulsão, na legalização das crianças nascidas em Portugal e que cá frequentam a escola, mas o esforço não chega, não basta, para fazer desta a lei que os imigrantes, que vivem e trabalham em Portugal, merecem.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Passados mais de 40 anos sobre a aprovação da primeira lei da imigração em Portugal, acabámos de aprovar hoje, aqui, a nona lei da imigração com o que nosso país vai passar a contar.
Registe-se: 40 anos depois. Com um mundo muito diferente, com uma Europa muito mais complexa e com um Portugal muito mais aberto e moderno e a necessitar cada vez mais de um choque de universalismo e de pragmatismo na abordagem do fenómeno migratório e fiéis à nossa história, de povo que nunca teve medo de cruzar relacionamentos com outros povos.
Sr.as e Srs. Deputados: Não somos só nós a fazê-lo, a mudar a nossa lei da imigração, são muitos outros países, sobretudo na Europa. Porque a imigração está no topo das agendas políticas à escala mundial e europeia. Por razões diversas.
É que os países «concha» têm os dias contados. As migrações no mundo são um dos fenómenos mais relevantes na vida dos povos. Com impactos decisivos a vários níveis: culturais, políticos, económicos e sociais.
O PSD entende estas matérias de imigração como uma matéria de regime. Daí que, nestas como noutras matérias, estejamos sempre empenhados em contribuir para encontrar as melhores soluções jurídicas e políticas para os problemas e para os bloqueamentos existentes.
E, Meus Senhores e Minhas Senhores, sempre imunes a estratégias exclusivamente partidárias. Porque temos uma agenda política clara para a imigração. Porque o que nos interessa, nesta como noutras matérias, é o País. Para nós, a imigração não é um problema, é uma oportunidade. Para nós, nem sempre os que falam mais vezes, e ruidosamente, têm a razão do seu lado.
O «generalismo» destas matérias é tão mau como o populismo e a demagogia, venham de que lado vierem. Somos totalmente contra o efeito «papão», como, também, contra o efeito «chamada». Os dois — o efeito «papão» e o efeito «chamada» — são quase sempre parte dos problemas e não das soluções.
Hoje, na oposição, como, ontem, no governo e, no futuro, no governo de Portugal de novo, o PSD continua a defender o mesmo e a contribuir para pôr em prática uma verdadeira política de imigração, assente em dois pilares: rigor e humanismo nas entradas; responsabilidade e humanismo na integração.
Por isso, participámos activamente na elaboração desta nova lei.
Para nós, não estiveram em causa apenas valorações jurídicas, mas também princípios humanistas que fazem parte do nosso código genético e do nosso ideário político.
Empenhámo-nos, com sinceridade, na procura de consensos e das melhores soluções. Estamos convencidos de que chegámos a um diploma equilibrado que será um poderoso instrumento, não só da regulação dos fluxos migratórios mas também da consolidação de uma política de integração realista e humanista.

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Foram muitas e variadas as propostas que apresentámos e que foram praticamente todas aprovadas, o que registamos. Neste momento, aproveito para, em nome do PSD, apresentar uma palavra de reconhecimento à Sr.ª Deputada Celeste Correia que, durante vários meses, liderou este grupo de trabalho.
Com as nossas propostas, a lei ficou melhor. Por exemplo, pela primeira vez em Portugal, passa a existir a institucionalização da figura do imigrante-empreendedor, como forma de apostar ainda mais na imigração qualificada. Com as nossas propostas, alterámos, para melhor, em nossa opinião, o regime jurídico de admissão e melhorámos as condições de acesso ao apoio judiciário por parte dos imigrantes.
Em suma, e para terminar, quem ganha com esta nova lei é Portugal e muitos daqueles que, cá vivendo, não são portugueses.
Mas o trabalho continua. Por isso, no momento da aprovação desta nova lei, e depois da aprovação da lei da nacionalidade, queremos afirmar que, para nós, se justifica que se dê início a um novo debate, um debate que permita discutir a criação de uma nova geração de direitos e deveres dos imigrantes em Portugal, assente em quatro pilares: a língua; o trabalho; a habitação; e mais direitos políticos. Mais, além deste debate, deve haver a coragem de abrir um outro sobre as matérias referentes ao princípio da reciprocidade.
Tudo isto a pensar em Portugal e nos portugueses.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A presente alteração à denominada «lei de imigração» é uma alteração relevante numa área que o CDS sempre considerou prioritária.
Ao contrário de outros, mantemos hoje o que sempre defendemos: uma política de imigração consciente deve ser rigorosa nas entradas para ser humana na integração e firme no combate às redes de tráfico ilegal de pessoas.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Com o anterior governo socialista, a comunidade imigrante duplicou em apenas dois anos, por força de uma política de entradas não regulada, baseada em sucessivos processos de regularização extraordinária, mais ou menos envergonhados.
Políticas mais rigorosas, entretanto seguidas, com uma imigração regulada a partir dos países de origem, resultaram, a partir de 2003, numa diminuição dos fluxos migratórios para Portugal, como é assinalado por relatórios diversos e de entidades independentes.
Por isso, a primeira crítica que fizemos, e fazemos, a esta proposta de lei é quanto à sua oportunidade. Os regimes que regulam um fenómeno tão complexo como a imigração, com a excepção das alterações resultantes da transposição de normas comunitárias, devem ser estáveis.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Ora, Portugal, em oito anos e com a aprovação da presente proposta de lei, vai ter quatro regimes diferentes, sobre matérias e opções que não se limitam a dar execução a uma eficaz política europeia de imigração, que aceitamos, mas que, ao invés, resultam apenas e tão-só de meras opções ideológicas, que, no caso concreto, nos parecem erradas.
A nosso ver, o Governo deveria criar condições para a efectiva execução da lei em vigor, que até contou com a abstenção do então Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
Reforçou a rede consular existente? Não! Aumentou o número de oficiais de ligação? Não! Agilizou a relação entre o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) e o Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP)? Não, apenas muda a lei!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Quanto ao mérito, é caso para dizer que o que é novo e resulta da União Europeia é bom. E o que é novo e resulta do PS, ou é incompreensível, ou é mau.
Concordamos, por isso, com a agravação da moldura penal do crime de auxílio à imigração ilegal, com o aumento das coimas às empresas que explorem conscientemente imigrantes em situação ilegal ou, até, com a criminalização dos denominados «casamentos por conveniência».
Mas o Partido Socialista não conseguiu refrear o seu ímpeto imaginativo quanto à política de imigração e, dois anos após ter criado as autorizações de permanência, apresenta-nos uma nova medida cujos efeitos, a nosso ver, podem ser perversos e graves.
Refiro-me, concretamente, ao artigo 59.º, que consagra um nova forma para a obtenção de um visto:

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a «manifestação individualizada de interesse da entidade empregadora». A partir de agora, Sr.as e Srs. Deputados, um visto pode ser obtido por um contrato de trabalho ou por uma promessa de trabalho (como é normal e estava previsto na lei), mas também por uma mera «manifestação de interesse da entidade patronal», que nunca existiu, não é normal, nem se sabe como e por que razão aparece,…

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — … permitindo a concessão de um visto por três meses a alguém que nada mais possui do que uma mera manifestação de interesse.

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Em que consiste esta manifestação? Que forma assume? Como impedir que as redes de tráfico ilegal possam adoptar este sistema para as suas actividades criminosas? O que acontece ao imigrante que, ao fim de três meses em território nacional, não vê confirmado o interesse da entidade patronal? Nada sabemos! Nada se sabe!

O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — É esta a política humanista do Partido Socialista.
Por outro lado, o efeito chamada que esta medida pode provocar (e, mais do que um papão, é uma realidade) é por demais evidente e a sua aprovação é tanto mais preocupante quanto o Governo não consagrou uma norma que proíba a realização unilateral de processos de regularização extraordinária, aceitando a sugestão em discussão na União Europeia.
Pelo contrário, diversos responsáveis do Governo e do PS assumem que esta lei vai regularizar muitos casos de ilegalidade, o que permite, desde já, perceber e adivinhar opções futuras que a abrangência da presente proposta permite, designadamente ao prever expressamente que o contingente global de oportunidades de emprego é meramente indicativo — e, pela prática do Partido Socialista, percebemos que o «meramente indicativo» quer, apenas e tão-só, dizer, que não é para cumprir.
Em suma, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, apesar de ter participado activamente na discussão, na especialidade, desta lei, procurando melhorar o seu conteúdo, e de ter registado a abertura sempre demonstrada pela Deputada Celeste Correia, coordenadora deste mesmo grupo, o CDS não pode deixar de votar contra uma proposta de lei, que, embora contenha aspectos positivos, ainda que importados, tem graves riscos que vão ao arrepio de uma política de imigração consciente, regulada, rigorosa e integradora que não apenas hoje mas desde sempre defendemos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A lei de imigração, que hoje chega a votação final global, resulta de um longo e intenso trabalho de discussão, na especialidade, das iniciativas legislativas apresentadas pelo Governo e pelo PCP e aprovadas na generalidade. Concluído esse trabalho, o Grupo Parlamentar do PCP considera muito positivamente o resultado obtido.
A aprovação desta lei de imigração inverte um ciclo legislativo, iniciado em 1993, marcado por sucessivas tentativas de fechar as portas à imigração legal e por restrições drásticas aos direitos dos estrangeiros. Foi um ciclo marcado por sucessivas revisões das leis da imigração, que redundaram em clamorosos fracassos e que só contribuíram para fazer aumentar o drama social da imigração clandestina.
Podemos dizer da lei que hoje aprovámos que, pela primeira vez desde há muitos anos, estamos perante uma lei que não piora a situação dos imigrantes, em Portugal, e que não dificulta a sua integração, e a das suas famílias, em condições de legalidade na sociedade portuguesa.
É certo que, na legislação hoje aprovada, permanecem aspectos negativos que são estruturantes da legislação vigente, que não são alterados e com os quais o PCP não se identifica. São disso exemplos: a manutenção de um sistema de quotas no acesso dos imigrantes ao emprego, ainda que com um carácter relativamente simbólico; o carácter meramente devolutivo da maior parte dos recursos de decisões desfavoráveis aos cidadãos, o que pode inviabilizar o efeito útil de decisões que venham a ser favoráveis aos recorrentes; os poderes discricionários que são conferidos ao SEF na aplicação da lei; ou a manutenção dos chamados «centros de instalação temporária» para cidadãos estrangeiros em situação ilegal ou em situação indefinida.
O PCP não pode concordar com estes princípios basilares da legislação vigente e entende que não deve votar favoravelmente uma lei que os mantenha.
Importa, entretanto, assinalar, muito positivamente, que a lei hoje aprovada acolhe um conjunto signi-

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ficativo de disposições constantes do projecto de lei do PCP, de que se salientam, por exemplo: a atribuição de autorização de residência aos titulares de vistos ou autorizações de permanência com carácter precário, contando todo o tempo de permanência em Portugal para efeitos de obtenção de autorização de residência permanente; o reforço dos poderes do Conselho Consultivo para os Assuntos da Imigração em vários domínios; a protecção adequada aos menores que viajem desacompanhados; a substituição dos diversos vistos de trabalho e dos vistos de estudo por autorizações de residência; o reforço significativo do direito ao reagrupamento familiar; o alargamento do direito à autorização de residência permanente; a eliminação do atentado aos «bons costumes» como fundamento de expulsão; ou, ainda, o dever de comunicação por parte do SEF aos serviços da administração fiscal, da segurança social e do emprego dos dados necessários à inscrição dos cidadãos que tenham regularizado a sua situação em Portugal.
Para além destes pontos, existem outros aspectos da lei hoje aprovada que o PCP regista positivamente. São os casos, nomeadamente: da prorrogação de permanência, a fim de possibilitar a necessária obtenção de contrato de trabalho ou a comprovação da existência de uma relação laboral por sindicato, por associação com assento no Conselho Consultivo ou pela Inspecção-Geral do Trabalho, para efeitos de concessão de autorização de residência; da concessão de autorização de residência ao cidadão estrangeiro que seja ou tenha sido vítima de tráfico de pessoas, mesmo que tenha entrado ilegalmente no País ou não preencha as condições de concessão de autorização de residência; do facto de se permitir a um conjunto muito alargado de cidadãos a possibilidade de obtenção de autorização de residência temporária sem necessidade de visto; da possibilidade de conceder autorização de residência com dispensa de visto aos pais das crianças estrangeiras nascidas em Portugal, que aqui tenham permanecido e se encontrem a frequentar a educação pré-escolar ou o ensino básico, secundário ou profissional; da criação do estatuto de residente de longa duração, a atribuir aos estrangeiros residentes há mais de cinco anos, com um grau elevado de equiparação de direitos em relação aos nacionais.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Assim, o Grupo Parlamentar do PCP, apesar de não votar favoravelmente o texto hoje aprovado pelas razões já explicitadas, considera-o um progresso assinalável relativamente à lei de imigração actualmente em vigor e congratula-se com o resultado que foi possível obter no final deste processo legislativo.
A lei hoje aprovada não resolve todos os problemas que seria importante resolver, e não conseguirá acabar com o flagelo da imigração clandestina e do trabalho ilegal. Mas Portugal terá, pela primeira vez desde há muitos anos, uma lei que representa um progresso para os direitos dos imigrantes e das suas famílias, que vai possibilitar em definitivo a legalização de muitos milhares de cidadãos que permanecem entre nós em situação ilegal e que será uma importante contribuição para reduzir a imigração ilegal e as consequências sociais e humanas negativas que dela decorrem.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária vai dar conta de um parecer da Comissão de Ética, que será votado após a respectiva leitura.

A Sr.ª Secretária (Isabel Santos): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 5.ª Juízo do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, Processo n.º 7002/06.1 — TDLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado João Soares (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está em apreciação.

Pausa.

Não havendo pedidos de palavra, vamos votar.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Peço aos serviços que, no final da sessão, encerrem as urnas e aos Srs. Deputados membros da Mesa que presidam, depois, ao escrutínio para a eleição do Vice-Presidente da Assembleia da República proposto pelo Grupo Parlamentar do CDS-PP.
Aproveito para desejar felicidades ao PSD na realização das suas jornadas parlamentares, em Barcelos, de cujo êxito não duvidamos porque a Mesa, através do Sr. Deputado Fernando Santos Pereira, está com altas responsabilidades nesse evento.
Srs. Deputados, a próxima sessão plenária realizar-se-á quarta-feira, dia 16, pelas 15 horas, e, para

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além do período de antes da ordem do dia, do qual constarão declarações políticas, terá como ordem do dia a aprovação dos n.os 68 a 77 do Diário, a apreciação, na generalidade, dos projectos de lei n.os 304/X — Altera o Decreto-Lei n.º 185/93, de 22 de Maio, na parte respeitante à colocação no estrangeiro de menores residentes em Portugal, com vista à adopção (PS), e 232/X — Cria o regime jurídico do divórcio a pedido de um dos cônjuges (BE), e a discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 125/X — Autoriza o Governo a aprovar um regulamento das custas processuais, introduzindo mecanismos de modernização e simplificação do sistema de custas, a revogar o Código das Custa Judiciais e a alterar o Código de Processo Civil, o Código de Processo Penal e o Código de Procedimento e de Processo Tributário, e do projecto de lei n.º 265/X — Altera o regime das custas judiciais e dos encargos da justiça (BE).
Está encerrada a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António José Ceia da Silva
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Teresa Maria Neto Venda
Vitalino José Ferreira Prova Canas

Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Mário Henrique de Almeida Santos David
Mário Patinha Antão
Pedro Augusto Cunha Pinto

Partido Popular (CDS-PP):
Paulo Sacadura Cabral Portas

Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missões internacionais:

Partido Socialista (PS):
João Barroso Soares
Maximiano Alberto Rodrigues Martins

Partido Social Democrata (PSD):
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Mendes Bota

Srs. Deputados não presentes à sessão por se encontrarem em missão parlamentar:

Partido Social Democrata (PSD):
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Manuel Alegre de Melo Duarte
Maria Júlia Gomes Henriques Caré

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Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Carlos Jorge Martins Pereira
João Bosco Soares Mota Amaral
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Manuel de Matos Correia
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
Maria Luísa Raimundo Mesquita

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º
77/2003, de 11 de Outubro):

Partido Social Democrata (PSD):
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Luís Fazenda Arnaut Duarte

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