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Sexta-feira, 13 de Julho de 2007 I Série — Número 105

X LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2006-2007)

REUNIÃO PLENÁRIA DE 12 DE JULHO DE 2007

Presidente: Ex.mo Sr. Jaime José Matos da Gama

Secretários: Ex.mos Srs. Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Fernando Santos Pereira
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz

SUMÁRIO O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 10 minutos.
Antes da ordem do dia. — A Câmara aprovou o projecto de resolução n.º 221/X — Deslocação do Presidente da República a Estrasburgo e a Bruxelas (Presidente da AR).
Em declaração política, o Sr. Deputado Francisco Louçã (BE) comentou a recente decisão da França de não cumprimento do Pacto de Estabilidade, que apontou como instrumento de destruição das políticas sociais e da criação de emprego, tendo desafiado o Governo e o Parlamento a contribuírem para o seu fim. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento e a uma defesa da consideração da bancada do Sr. Deputado Afonso Candal (PS).
Também em declaração política, o Sr. Deputado Agostinho Branquinho (PSD) acusou o Governo de ter uma estratégia de centralização do poder, tendo apontado vários exemplos nesse sentido. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Abel Baptista (CDS-PP) e José Junqueiro (PS).
Igualmente em declaração política, o Sr. Deputado Pedro Mota Soares (CDS-PP) denunciou o caso dos professores, entretanto falecidos, que foram obrigados a regressar ao trabalho apesar de sofrerem de cancro e deu conta de uma audição pública sobre o problema das juntas médicas, a realizar pelo seu grupo parlamentar. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados Zita Seabra (PSD), Maria de Belém Roseira (PS) e Bernardino Soares (PCP).
O Sr. Deputado Afonso Candal (PS) elogiou as reformas que o Governo está a levar a cabo e informou a Câmara da aprovação, hoje mesmo, em Conselho de Ministros, de um decreto-lei que altera a composição das juntas médicas e o procedimento de verificação de incapacidade.
Ordem do dia. — Procedeu-se a um debate de urgência, requerido pelo PCP, sobre direitos dos trabalhadores e as perspectivas do Governo em matéria de legislação laboral, no qual intervieram, além do Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social (Vieira da Silva), os Srs. Deputados Francisco Lopes (PCP), Miguel Laranjeiro (PS), Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Pedro Mota Soares (CDS-PP), Mariana Aiveca (BE), Álvaro Saraiva (Os Verdes), Carlos Andrade Miranda (PSD) e Jorge Machado (PCP).
No encerramento do debate, intervieram o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva) e o Sr.

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Deputado Bernardino Soares (PCP).
O Relatório e Conta de Gerência da Assembleia da República foi aprovado.
A proposta de lei n.º 151/X — Primeira alteração à Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, que estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo foi aprovada, na generalidade, tendo sido rejeitado, também na generalidade, o projecto de lei n.º 285/X — Terceira alteração ao regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 53/2000, de 7 de Abril, e pelo Decreto-Lei n.º 310/2003, de 10 de Dezembro (PCP).
Foram aprovadas, em votação global, as propostas de resolução n.os 51/X — Aprova o Instrumento entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005, conforme o n.º 2 do artigo 3.º do Acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América sobre Extradição, assinado em Washington, a 25 de Junho de 2003, e seu Anexo, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005; 52/X — Aprova o Instrumento entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América, feito em Washington em 14 de Julho de 2005, conforme o n.º 3 do artigo 3.º do Acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América sobre Auxílio Judiciário Mútuo, assinado em Washington a 25 de Junho de 2003 e Seu Anexo, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005; 47/X — Aprova a Emenda ao artigo 1.º da Convenção sobre a Proibição ou Limitação do Uso de Certas Armas Convencionais que Podem ser Consideradas como Produzindo Efeitos Traumáticos Excessivos ou Ferindo Indiscriminadamente, adoptada pelos Estados Partes na Declaração Final da Segunda Conferência de Revisão da referida Convenção, que decorreu entre 11 e 21 de Dezembro de 2001, em Genebra; 49/X — Aprova o Protocolo sobre Explosivos Remanescentes de Guerra (Protocolo V) à Convenção sobre a Proibição ou Limitação do Uso de Certas Armas Convencionais que Podem ser Consideradas como Produzindo Efeitos Traumáticos Excessivos ou Ferindo Indiscriminadamente, adoptado pelas Altas Partes Contratantes na reunião de Estados Partes na referida Convenção, em 28 de Novembro de 2003, e 53/X — Aprova o Protocolo Adicional referente ao Estabelecimento da Sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em Portugal, assinado em Lisboa, em 26 de Março de 2007.
A proposta de lei n.º 153/X — Regula o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP-Estradas de Portugal, EPE foi aprovada na generalidade.
Na generalidade, na especialidade e em votação final global, foi aprovada a proposta de lei n.º 139/X — Autoriza o Governo a legislar sobre a fixação do limite máximo de idade para o exercício de funções dos pilotos comandantes e copilotos de aeronaves operadas em serviços de transporte público comercial de passageiros, carga ou correio.
A proposta de lei n.º 150/X — Aprova a lei relativa à implementação da Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Armazenagem e Utilização de Armas Químicas e sobre a sua Destruição foi aprovada, na generalidade, tendo o projecto de lei n.º 392/X — Alteração do artigo 65.º da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto (na redacção introduzida pela Lei n.º 48/2006, de 29 de Agosto) (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes) sido aprovado na generalidade, na especialidade e em votação final global.
Em votação final global, foram aprovados os seguintes textos finais: Apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 142/X — Aprova a lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança e aos projectos de lei n.os 229/X — Estabelece a obrigatoriedade de aprovação de uma lei de programação de investimentos das forças e serviços de segurança (PCP) e 387/X — Aprova a nova lei-quadro das leis de programação de investimento das forças de segurança (CDS-PP); Apresentado pela mesma Comissão, relativo à proposta de lei n.º 108/X — Cria um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos susceptíveis de afectar a verdade, a lealdade e a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva e ao projecto de lei n.º 320/X — Combate à corrupção e defesa da verdade desportiva (PSD); Apresentado pela mesma Comissão, relativo à proposta de lei n.º 98/X — Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e aos projectos de lei n.os 211/X — Altera o Código Penal (PS), 219/X — Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º (Os Verdes), 236/X — Altera o Código Penal (PSD), 239/X — Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas (PSD), 349/X — Altera o Código Penal em matéria ambiental (Os Verdes) e 353/X — Altera o Código Penal (BE); Apresentado pela mesma Comissão, relativo à proposta de lei n.º 127/X — Define os objectivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2007/2009, em cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23 de Maio, que aprova a Lei-Quadro da Política Criminal, tendo produzido declarações de voto os Srs. Deputados António Montalvão Machado (PSD) e Ricardo Rodrigues (PS); Apresentado pela Comissão de Defesa Nacional, relativo à proposta de lei n.º 135/X — Estabelece o regime especial dos processos relativos a actos administrativos de aplicação de sanções disciplinares previstas no Regulamento de Disciplina Militar.
Foram aprovados três pareceres da Comissão de Ética, autorizando um Deputado do PSD, outro do PS e outro do CDS-PP a prestarem depoimento como testemunha.
O projecto de resolução n.º 198/X — Promoção do Baixo Mondego (PSD) foi discutido, tendo intervindo os Srs. Deputados Miguel Almeida (PSD), Horácio Antunes (PS), Abel Baptista (CDS-PP), Agostinho Lopes (PCP) e Francisco Madeira Lopes (Os Verdes).
Foram, ainda, discutidos conjuntamente, na generalidade, a proposta de lei n.º 141/X — Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual, alterando o Código da Propriedade Industrial, o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos e o Decreto-Lei n.º 332/97, de 27 de Novembro, e o projecto de lei n.º 391/X — Altera o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito dos direitos de propriedade intelectual (PCP).
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho), os Srs. Deputados António Filipe (PCP), José Luís Arnaut (PSD) – que exerceu também o direito de defesa da honra, tendo-lhe sido dadas explicações pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares —, Teresa Portugal (PS), Fernando Rosas (BE) e José Paulo Carvalho (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados presentes à sessão:

Partido Socialista (PS):
Agostinho Moreira Gonçalves
Alberto Marques Antunes
Alberto de Sousa Martins
Alcídia Maria Cruz Sousa de Oliveira Lopes
Aldemira Maria Cabanita do Nascimento Bispo Pinho
Ana Maria Cardoso Duarte da Rocha Almeida Pereira
Ana Maria Ribeiro Gomes do Couto
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António José Ceia da Silva
António José Martins Seguro
António Ramos Preto
Armando França Rodrigues Alves
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Carlos Alberto David dos Santos Lopes
David Martins
Elísio da Costa Amorim
Esmeralda Fátima Quitério Salero Ramires
Fernanda Maria Pereira Asseiceira
Fernando Manuel de Jesus
Fernando dos Santos Cabral
Glória Maria da Silva Araújo
Horácio André Antunes
Hugo Miguel Guerreiro Nunes
Isabel Maria Batalha Vigia Polaco de Almeida
Isabel Maria Pinto Nunes Jorge
Jacinto Serrão de Freitas
Jaime José Matos da Gama
Joana Fernanda Ferreira Lima
Joaquim Barbosa Ferreira Couto
Joaquim Ventura Leite
Jorge Filipe Teixeira Seguro Sanches
Jorge Manuel Capela Gonçalves Fão
Jorge Manuel Monteiro de Almeida
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Carlos Bravo Nico
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Jovita de Fátima Romano Ladeira
João Barroso Soares
João Carlos Vieira Gaspar
João Cândido da Rocha Bernardo
João Miguel de Melo Santos Taborda Serrano
Júlio Francisco Miranda Calha
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís António Pita Ameixa
Luís Miguel Morgado Laranjeiro
Luísa Maria Neves Salgueiro
Lúcio Maia Ferreira
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel António Gonçalves Mota da Silva
Manuel Francisco Pizarro de Sampaio e Castro
Manuel José Mártires Rodrigues

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Manuel Luís Gomes Vaz
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Marcos Sá Rodrigues
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos
Maria Antónia Moreno Areias de Almeida Santos
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Cidália Bastos Faustino
Maria Helena Terra de Oliveira Ferreira Dinis
Maria Helena da Silva Ferreira Rodrigues
Maria Hortense Nunes Martins
Maria Irene Marques Veloso
Maria José Guerra Gamboa Campos
Maria Júlia Gomes Henriques Caré
Maria Manuel Fernandes Francisco Oliveira
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maria Matilde Pessoa de Magalhães Figueiredo de Sousa Franco
Maria Odete da Conceição João
Maria Teresa Alegre de Melo Duarte Portugal
Maria Teresa Filipe de Moraes Sarmento Diniz
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria de Lurdes Ruivo
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Nuno André Araújo dos Santos Reis e Sá
Nuno Mário da Fonseca Oliveira Antão
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Barros Teixeira Santos
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paula Cristina Nobre de Deus
Pedro Manuel Farmhouse Simões Alberto
Renato Luís Pereira Leal
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel de Amaral Rodrigues
Rita Manuela Mascarenhas Falcão dos Santos Miguel
Rita Susana da Silva Guimarães Neves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Sandra Marisa dos Santos Martins Catarino da Costa
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Umberto Pereira Pacheco
Vasco Seixas Duarte Franco
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Vítor Hugo Machado da Costa Salgado de Abreu
Vítor Manuel Bento Baptista
Vítor Manuel Pinheiro Pereira

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva
Agostinho Correia Branquinho
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Zita Barbas Marvão Alves Gomes
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Joaquim Almeida Henriques
António Ribeiro Cristóvão
Arménio dos Santos
Carlos Alberto Garcia Poço
Carlos Alberto Silva Gonçalves

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Carlos António Páscoa Gonçalves
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Feliciano José Barreiras Duarte
Fernando Santos Pereira
Fernando dos Santos Antunes
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Henrique José Praia da Rocha de Freitas
Hugo José Teixeira Velosa
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Virgílio Leite Almeida Costa
Jorge Fernando Magalhães da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José António Freire Antunes
José Eduardo Rego Mendes Martins
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
José Manuel Pereira da Costa
José Manuel de Matos Correia
José Mendes Bota
José Raúl Guerreiro Mendes dos Santos
José de Almeida Cesário
João Bosco Soares Mota Amaral
Luís Filipe Carloto Marques
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Luís Miguel Pereira de Almeida
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Maria Helena Passos Rosa Lopes da Costa
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Cassola de Miranda Relvas
Miguel Jorge Pignatelli de Ataíde Queiroz
Miguel Jorge Reis Antunes Frasquilho
Mário Patinha Antão
Mário da Silva Coutinho Albuquerque
Nuno Maria de Figueiredo Cabral da Câmara Pereira
Paulo Miguel da Silva Santos
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Pedro Miguel de Santana Lopes
Pedro Quartin Graça Simão José
Regina Maria Pinto da Fonseca Ramos Bastos
Ricardo Jorge Olímpio Martins
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Zita Maria de Seabra Roseiro

Partido Comunista Português (PCP):
Agostinho Nuno de Azevedo Ferreira Lopes
António Filipe Gaião Rodrigues
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Francisco José de Almeida Lopes
José Batista Mestre Soeiro
José Honório Faria Gonçalves Novo
João Guilherme Ramos Rosa de Oliveira
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Miguel Tiago Crispim Rosado

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Partido Popular (CDS-PP):
Abel Lima Baptista
José Paulo Ferreira Areia de Carvalho
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
Luís Pedro Russo da Mota Soares
Nuno Miguel Miranda de Magalhães

Bloco de Esquerda (BE):
Alda Maria Gonçalves Pereira Macedo
Fernando José Mendes Rosas
Francisco Anacleto Louçã
Helena Maria Moura Pinto
João Pedro Furtado da Cunha Semedo
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Maria Cecília Vicente Duarte Honório
Mariana Rosa Aiveca Ferreira

Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Francisco Miguel Baudoin Madeira Lopes
Álvaro José de Oliveira Saraiva

ANTES DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos começar por proceder à votação do projecto de resolução n.º 221/X — Deslocação do Presidente da República a Estrasburgo e a Bruxelas (Presidente da AR).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — O Presidente francês, Nicolas Sarkozy, foi esta segunda-feira a Bruxelas apresentar a decisão de não cumprir o Programa de Estabilidade.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Notável!

O Orador: — Deste modo, a França adia para 2012, ou para quando lhe for conveniente, o objectivo de alcançar o défice nulo. A França anula, desta forma, o compromisso que tinha assinado com a União e actuará em função do seu interesse próprio e não de qualquer regra europeia.
Depois de uma barragem de críticas azedas, os principais responsáveis europeus acabaram por admitir esta decisão. Juncker, presidente do Ecofin, aplaudiu Sarkozy, o governo alemão aceitou o facto consumado e José Sócrates garantiu, mesmo sem grande convicção, que a Europa não pratica o «pensamento único», isto é, a França faz o que quiser.
O que esta decisão francesa torna evidente é que a segunda fase do Pacto de Estabilidade está paralisada. Se um país não cumpre, os outros não cumprirão.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

O Orador: — E, assim, a crise do Pacto de Estabilidade interpela duplamente a Presidência portuguesa.
Em primeiro lugar, porque revela a agenda completa do Pacto e como é difícil aplicá-lo. José Sócrates, Presidente em exercício, tem, por isso, uma escolha: ou a Europa continua a fingir que acredita num Pacto debilitado ou vai corrigi-lo.
Em segundo lugar, esta crise do Pacto sublinha como ele tem sido o instrumento da destruição das políticas sociais, e a resposta a essa situação já é uma responsabilidade deste Parlamento. Quando a França diz que não vai cumprir, ficamos nós calados? Aceitaremos que se mantenha o atrofiamento da economia? Mergulharemos numa nova ronda de cortes orçamentais? O Bloco de Esquerda convida os grupos parlamentares e o Governo a pronunciarem-se sobre esta questão, pois ela é decisiva para o nosso país e para a União.
O objectivo do défice de 3% — «o estúpido Pacto», como lhe chamou um dos seus progenitores, Romano Prodi — era, de facto, somente o princípio de um mecanismo que devia implacavelmente conduzir a um

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défice de cerca de 0% nos próximos três anos. Para o Pacto, a única solução para as contas públicas é exterminar o défice.
Ora, o défice nulo não é um objectivo inteligente para nenhuma política económica.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Orador: — Nenhuma economia se torna mais saudável pelo facto de equilibrar despesas e receitas em cada ano sem cuidar das dificuldades ou de como deve melhorar a vida das pessoas. Uma economia saudável, bem pelo contrário, é a que faz as escolhas mais certas para a criação de emprego e que gasta o que é necessário desde que possa pagar a conta.
É por isso que muitos economistas de renome defendem que o único critério de disciplina orçamental deve ser o montante total da dívida pública. E há países europeus cuja dívida é o dobro da portuguesa.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — É verdade!

O Orador: — Em todo o caso, é preciso disciplina orçamental, mas com regras claras e não com regras que qualquer governo com voz grossa possa vir a sabotar. E, neste contexto, o défice nulo é o pior de todos os critérios, grotesco e pernicioso.
A ficção do défice nulo já provou o que valia. Thatcher conseguiu défice nulo; uns anos depois a Inglaterra voltava ao défice. Reagan conseguiu excedente; agora, Bush mergulhou os Estados Unidos no maior défice da história da humanidade. O défice nulo nunca resolveu qualquer problema.
A disciplina orçamental, pelo contrário, requer regras de confiança e a garantia de que se pode pagar cedo o que se deve agora, que o dinheiro é utilizado com rigor. É disso que precisa e de nada mais.
Sr.as e Srs. Deputados: A recusa da França em cumprir o Pacto de Estabilidade é importante para Portugal ainda por uma outra razão: demonstra que a Comissão Europeia não quer fazer mudanças, mas cede perante os governos dos grandes países, e que o Governo português não faz parte do roteiro desta discussão.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

O Orador: — José Sócrates, ontem, no Parlamento, entendeu não dizer uma palavra sobre esta matéria, e não é por ela ser importante.
Entre o bom aluno e o cábula apanhado em falta, os governos portugueses tiveram sempre em comum este silêncio comprometido: Portugal faz o que lhe mandarem. E o que lhe mandam é muito claro: o objectivo do Programa de Estabilidade, com o qual o Primeiro-Ministro se comprometeu, não se vai concluir com os 3% em 2008.
O objectivo é chegar a 0% e, portanto, em 2009 e 2010 deve conseguir-se uma redução equivalente àquela que já terá demorado quatro anos a conseguir, com tantos sacrifícios.
José Sócrates comprometeu o País com a poupança orçamental suplementar, em 2009 e 2010, de mais 5000 milhões de euros. E este, Sr.as e Srs. Deputados, é um corte colossal. É mais do que o total da formação bruta de capital fixo de toda a administração pública, é mais de um quarto de todas as despesas com pessoal na Administração, é mais o que o orçamento de muitos ministérios e é um corte colossal em dois anos.
Aconteça o que acontecer nas eleições de 2009, e mesmo que haja nas suas vésperas um leilão de promessas, o Pacto é impiedoso e determina que o próximo mandato conduza a cortes mais violentos e mais depressa. A vida económica portuguesa vai viver sob o signo do corte.
À luz dos sacrifícios já impostos, podemos avaliar o que vai ser esta purga orçamental. Tudo o que foi feito — supranumerários da função pública, ameaça de despedimento, congelamento dos salários, desemprego, aumento da idade da reforma, redução das pensões futuras, aumento das taxas na saúde, quebra do financiamento das universidades — empalidece perante a grandiosidade dos desígnios pactistas da segunda fase, o que a França recusa e que Portugal está a calar.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Muito bem!

O Orador: — Até agora, e ainda não chegámos a essa segunda fase, o Pacto já tem sido uma máquina de erros que perseguiu direitos e conduziu a enganos sucessivos.
Passo a apontar exemplos.
A privatização da REN foi explicada com a pressão do Pacto e o resultado é clarificador: o Estado vende a empresa e encaixa 300 milhões de euros, que era o que receberia em dividendos e lucros em somente três anos, ficando, nesse caso, com a empresa, que é proprietária, aliás, de um bem nacional. A privatização é um disparate económico, sem qualquer justificação racional. Um disparate é um disparate.
A privatização da Estradas de Portugal é um truque orçamental para maquilhar as contas, a pretexto do Pacto. Mas a Brisa, ou outra empresa, beneficiará de uma renda garantida pelo imposto dos portugueses

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durante 50 anos. Pagamos, perdemos, e as estradas de Portugal ficam todas sob gestão de uma empresa privada.
As parcerias público-privado na construção de 10 hospitais são justificadas pelo Pacto. Recorre-se a dinheiro privado, reduz-se a curto prazo um montante no investimento público, aliás, para efeitos do Pacto, mas o resultado é que, nos próximos anos, pagamos cada ano 10% acima do que seria necessário se o investimento fosse público, com recurso à dívida pública. Todos os anos 10% a mais em juros e dividendos para os accionistas; saúde mais cara e hospitais mais caros.
E, Srs. Deputados, a brutalidade das decisões das juntas médicas da Caixa Geral de Aposentações, a que agora o País tem estado atento — e tão bem —, demonstra, da forma mais agressiva, as instruções em que se traduzem os cortes orçamentais. As pessoas não importam, o que conta são as contas. As doenças são irrelevantes para tantas dessas juntas, porque não estão ali para avaliar doenças mas, sim, para cumprir ordens, independentemente das pessoas.

Vozes do BE: — Exactamente!

O Orador: — Por isso, concluo, Sr. Presidente, dizendo que a política do Pacto conduz à irracionalidade, a negócios absurdos, a perdas injustificadas, à insensibilidade social. E se assim foi até agora, Srs. Deputados da maioria, o que será dentro de dois anos, com um novo corte de mais 5000 milhões de euros?! Portugal tem agora a oportunidade de corrigir este Pacto e tem a responsabilidade de dizer na União, como Presidente em exercício, que exige a sua revisão.
Assumindo José Sócrates a Presidência, cumpre-lhe quebrar o silêncio e propor uma alternativa à Europa para além do Pacto. Pois, agora, só temos este silêncio, e tão atrapalhado que ele é, que é a desistência da Europa.
Nós, que não desistimos da Europa,…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Que bom!

O Orador: — … desafiamos o Parlamento e o Governo a contribuir para o fim deste Pacto e para salvar o País da trituração orçamental que está em curso.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, numa intervenção do género «sortido rico», V. Ex.ª abordou muitos temas, o que cria, obviamente, algumas dificuldades do ponto de vista da contestação — V. Ex.ª é um Deputado inteligente e sabe-o bem.
Quero apenas aqui deixar uma nota breve sobre a sua profunda desconfiança em relação aos médicos que compõem as juntas médicas, que, supostamente, cumprem ordens e instruções e não olham propriamente à saúde das pessoas. Esse é um problema que V. Ex.ª terá de dirimir não com a bancada da maioria nem com o Governo mas, eventualmente, com a Ordem dos Médicos. Nós não partilhamos dessa desconfiança. Eventualmente, terá de haver alteração de algumas regras, de algumas normas, de algumas leis, mas não, certamente, de uma tutela sobre os médicos que os impeça, porque eles jamais o aceitariam, de olhar à saúde e ao interesse das pessoas.
É de registar, embora estranhando, o seu novo referencial político: Sarkozy, Presidente francês — é a primeira novidade do debate. Mas V. Ex.ª, dizendo algumas verdades, fez sobre elas uma enorme construção, essa, eventualmente, já menos verdadeira.
Diz V. Ex.ª que o défice nulo anual não é um nobre objectivo de uma política orçamental permanente.
Estamos de acordo. Mas nunca ninguém o propôs e ninguém o tem como objectivo. A questão está em saber se V. Ex.ª considera que uma política orçamental assente num défice constante, ano após ano, se uma política orçamental e de gestão dos dinheiros públicos que aumenta sucessivamente a dívida pública é virtuosa.
Penso que estamos de acordo numa lógica de que ora pode haver défice, se ele se justificar, ora superavit, ora saldo nulo, mas não a obrigatoriedade de saldo nulo permanente, que não é objectivo nem deste Governo nem de governo algum. O problema que se põe aqui é o problema de uma gestão rigorosa do dinheiro que é de todos. E um Estado que, sucessivamente, ano após ano, gasta mais, bastante mais, do que aquilo que tem para gastar está a criar um problema não às gerações actuais, porventura, mas, certamente, às gerações futuras, porque alguém vai ter de pagar esse diferencial.
Portanto, ou V. Ex.ª defende que se empenhe o futuro das novas gerações, sem razão, ou seja, com carácter de permanência, ou então V. Ex.ª não pode deixar de concordar com o esforço que está a ser feito por este Governo na redução do défice, cujo objectivo não é o saldo nulo permanente.

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Aplausos do PS.

Mas, mais, esta redução do défice faz-se numa dupla lógica, como V. Ex.ª muito bem sabe: ou pela redução das despesas ou pelo aumento das receitas. E há aqui uma outra componente que V. Ex.ª subvalorizou — e mal — e que leva também ao aumento das receitas, logo à consolidação orçamental, que é a nova realidade do País, ou seja, o crescimento económico. Dir-me-á que não é ainda o crescimento económico suficiente, gerador de um caudal de novos empregos líquidos que permita combater o desemprego. Estamos igualmente de acordo. Mas passou-se de um crescimento negativo para níveis crescentes e sempre positivos.

O Sr. Presidente: — Agradeço que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: — Concluo já, Sr. Presidente.
A criação de emprego líquido existe. Não é ainda suficiente, mas existe. E muita da política que está a ser executada, que tem expressão no Programa de Estabilidade e Crescimento que decorre do Pacto, deveria ser sempre executada, independentemente de haver Pacto ou não, porque défices constantes elevados não são virtuosos para as novas gerações. Se V. Ex.ª fala para os eleitores de hoje, porventura fala bem, mas se está preocupado com o futuro do País, V. Ex.ª fala mal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, começou por fazer uma observação sobre as juntas médicas da Caixa Geral de Aposentações. O que nos diz é completamente irrazoável! Diz que não pode haver desconfiança sobre as decisões profissionais dessas juntas,…

O Sr. Afonso Candal (PS): — Pode, pode!

O Orador: — … mas que se vão mudar as regras. Ora, se as regras não estão bem é porque provaram que são incompetentes, e são incompetentes porque são desumanas. E o senhor devia ter a atenção de perceber que o País nos está a mostrar que essa desumanidade não é aceite.

Vozes do BE: — Muito bem!

O Orador: — Mas pergunte-se porquê, pergunte-se porque é que há profissionais que, vendo os doentes ou não, podem tomar decisões tão brutais como aquelas que foram tomadas. É por uma única razão: é que algumas dessas pessoas — serão casos raros, mas gravíssimos — não estão ali senão para cumprir ordens. Interessa-lhes as contas e o que a Caixa Geral de Aposentações vai pagar, mas não lhes interessa as pessoas. E esse desprezo é inaceitável. E gostaria de ter ouvido da sua bancada uma palavra de cuidado e de humanidade e não de desinteresse…

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Muito bem!

O Orador: — … e de contabilidade, como fez. É inaceitável o que fez!

Aplausos do BE.

Sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento diz o Sr. Deputado que há um novo referencial político da parte do Bloco de Esquerda. Devo dizer-lhe que o Presidente Sarkozy já escolheu os seus referenciais e, na verdade, quem ele elogiou foi o Primeiro-Ministro, José Sócrates. E elogiou-o pela razão pela qual José Sócrates é contestado em Portugal. Sarkozy entendeu que era um grande exemplo para a França o modelo de aumento da idade de reforma e de redução das pensões por causa do álibi do Pacto e contra os interesses das pessoas, que o seu Governo, com o seu voto, tem vindo a praticar. Sarkozy já escolheu: não está do lado desta esquerda, está do lado do seu Governo.
Mas a questão de fundo colocada pela decisão da França é esta: a França não vai cumprir o Pacto de Estabilidade. Eu sei que a França pode e que o Governo português se encolhe, porque o que o Governo português não quer, e devia querer, é que se faça um debate sobre a Europa, sobre o futuro da Europa.
Porque é que um país grande, de um governo forte, pode dizer que cumpre o que quer e não cumpre o que não quer e em Portugal tem de se despedir na função pública? Por alguma racionalidade económica?! Cortar nas universidades?! Aumentar as taxas moderadoras?! Veja o que se está a passar no País! Sr. Deputado, cada um dos exemplos que referi é uma acusação à sua bancada. E se houvesse

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socialistas no Governo, que não há, não era esta a política que se fazia.

Vozes do PS: — Não há?!

O Orador: — Veja o exemplo da REN. Vamos entregar a uma empresa privada toda a rede de infraestruturas da distribuição da energia por 300 milhões de euros. Eu faço as contas e digo-lhe que, em três anos, esse dinheiro é o lucro daquela empresa. Três anos! Vendemos para todo o sempre uma empresa por causa de um rendimento que, em três anos, era pago ao Estado?! Acha natural um truque deste tipo? Não será uma violência contra aquele que é o princípio elementar da boa governação?! Fala-me de gestão para o futuro. Digo-lhe que, no futuro, os seus filhos vão ter um País em que a rede de distribuição da energia não é um bem nacional, e o País todos os anos perdeu dinheiro.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: — Sr. Deputado, chamo a isto incompetência. Chamo a isto desleixo, desmazelo, incompetência. Lamento, mas a palavra é esta: incompetência! Os senhores estão a prejudicar o futuro do País e, pior que tudo, estão a fazê-lo de propósito.

Aplausos do BE.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para defesa da consideração da bancada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado, dispondo, para o efeito, de 3 minutos.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Francisco Louçã, a bancada do PS não aceita lições de preocupação sobre a saúde e o estado de saúde gravoso de alguns portugueses.

Vozes do BE: — Deviam aprender!

O Orador: — Não aceita pela simples razão de que o Governo e a bancada do PS aprendem com os problemas que existem e buscam soluções para os mesmos. Por isso, ouvida que foi a Ordem dos Médicos sobre a matéria, ainda hoje houve decisões no Conselho de Ministros no sentido da alteração das normas, que não são instruções nem preocupações de carácter financeiro em relação às situações das pessoas, são normas que clarificam e aumentam a independência, que se quer absoluta do ponto de vista da análise técnico-científica-médica sobre a situação de cada um.
Como V. Ex.ª sabe, há formatação legal também para a atribuição das várias classificações em relação às patologias diversas. Há um percurso grande a fazer nessa matéria, e V. Ex.ª, uma vez mais,… Entendo que o Bloco de Esquerda não tem, e porventura não terá tão cedo, qualquer preocupação construtiva, porque não tem a seu cargo a responsabilidade de resolver problema algum.

Vozes do PS: — A questão é essa!

Protestos do BE.

O Orador: — Cumpre o seu papel, às vezes bem, outras vezes mal, de fazer a denúncia dos problemas, o que é também um papel útil do ponto de vista democrático, mas não é o papel exclusivo de uma oposição. As oposições responsáveis têm também a obrigação de propor soluções e de fazer essas chamadas de atenção de forma construtiva, não apenas de fazer análises de mérito ou de demérito em relação às maiorias e aos governos.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Essa agora!

O Orador: — E mais: fazer juízos de intenção, nomeadamente o que fez na ponta final da intervenção, da suposta incompetência…

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Está a dar-nos uma lição?!

O Orador: — V. Ex.ª, um dia, porventura — quem sabe? —, poderá estar em situação de demonstrar a sua própria competência que, para já, só pode alegar mas não pode demonstrar.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Espere por isso!

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O Orador: — Devo dizer-lhe que, do ponto de vista da oposição, essa é a chamada competência relativa, porque vai apenas fazendo a denúncia, porventura tendo o seu segmento de eleitorado um pouco mais alargado, mas que não chega para ser chamado a essas outras responsabilidades de construir… E V. Ex.ª não tem tido essa preocupação, mas sim a de acusar o Governo de incompetência deliberada de maldade, ou seja, a de fazer as coisas com dolo, no sentido de prejudicar o País.
V. Ex.ª, desculpe, mas não tem a mínima hipótese de acusar este Governo e esta bancada de, fazendo seja o que for, o faça deliberadamente para prejudicar o País, seja em que ponto for.
V. Ex.ª pode ter leituras diferentes relativamente às soluções, mas não sabemos quais são, porque dificilmente nos apresenta uma solução para os problemas. A sua posição é sempre a de criticar a solução que é encontrada pela maioria e pelo Governo.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Olhe que não!

O Orador: — É um problema seu, não é meu.
Mas quando o Governo e a maioria fazem,…

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — … fazem na profunda convicção de que essas são as melhores soluções e com as formulações mais justas face às necessidades do País.
Pode, porventura, V. Ex.ª contribuir com outras ideias e, sendo de facto um Deputado inteligente, pode até ter mais razão e a maioria concede-lhe essa razão a si…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Afonso Candal, tem de concluir.

O Orador: — Termino já Sr. Presidente.
Dizia eu que a maioria pode concede-lhe a razão a si, Sr. Deputado Francisco Louçã, ou a qualquer grupo parlamentar, como há prova mais do que suficiente. Mas esse juízo de intenção não o consegui perceber. No entanto, é bom que V. Ex.ª diga, em concreto, quais são as tais maldades deliberadas que são feitas, porque a acusação que fez é inconcebível e só lhe fica mal.

Aplausos do PS.

Protestos do BE.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Francisco Louçã, tem a palavra para responder.

O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Afonso Candal, presumo que, em nome da sua bancada, entendeu tentar responder a algumas questões com muitas qualificações e juízos de valor.
Vou abordar os juízos de facto.
Primeiro exemplo — a venda da REN: os senhores vendem a REN para ganharem, num ano, para efeitos orçamentais, o que ganhariam em três anos, ficando com a REN. É irresponsável! Segundo exemplo — Estradas de Portugal: trata-se de um «truquezinho» para tirar 500 milhões da conta do Orçamento. O Governador do Banco de Portugal já mostrou todas as suas dúvidas, já se sabe que dificilmente o défice será modificado e são 500 milhões que continuam a ser pagos com os nossos impostos, para serem entregues a uma empresa privada que vai gerir, sabe-se lá por quantos anos, todas as estradas de Portugal.

Protestos do Deputado do PS Afonso Candal.

É uma brincadeira! Estão a brincar com o que é nosso e eu não discuto as suas intenções. É um crime económico contra o interesse nacional.
Terceiro exemplo — juízo de facto, parcerias público-privado. Faça as contas: fazem-se 10 hospitais nos próximos anos, que vamos pagar, cada ano, em juros e dividendos, 10% acima daquilo que pagaríamos se o Estado os construísse.

Protestos do PS.

Perdemos dinheiro! Chamo a isso incompetência económica.
Não queira discutir as boas intenções. Acho que estão cheios de boas intenções, não tenho dúvida alguma que só querem o bem de toda a gente. O problema é que nem toda a gente beneficia desse «bem»! Quem ganha na Estradas de Portugal é a Brisa, quem ganha nas parcerias público-privado é a Duarte Ferreira, a começar pela próxima.

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Protestos do PS.

Sobre a questão dos médicos: percebo o seu incómodo, porque o Sr. Deputado quer, simultaneamente, dizer que está tudo bem e que está bem que o Governo modifique as regras. Veremos o resultado da modificação das regras.
Estamos aqui para registar, pressionar, discutir e propor as alterações necessárias. Mas, entendamonos bem, Sr. Deputado: se há uma junta médica que recebe um professor que está com um cancro em fase terminal, que não tem voz e que decide que ele não pode ser aposentado e tem de regressar ao serviço docente é porque ou não viram a pessoa, ou não leram os relatórios médicos, ou é por desumanidade absoluta. Isto é inaceitável!

O Sr. Afonso Candal (PS): — Estamos de acordo!

O Orador: — Muito bem! Mas, se é inaceitável, o senhor não pode justificar este tipo de actuações. Elas são imperdoáveis e a razão pela qual o são é o facto de a pressão da Caixa Geral de Aposentações ser sempre no sentido de reduzir a despesa neste contexto.
Veja a irresponsabilidade do seu Governo: a Ministra da Educação esteve ontem presente na Assembleia e isso foi-lhe perguntado.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Isso não é com ela!

O Orador: — Não lhe parece que uma ministra teria de se informar?! Não lhe parece que tem que ver com ela o que se passa numa escola?! E não se passa só numa, passa-se noutra, e noutra, e em tantas escolas seguidas! É disso que a acusamos, porque não admitimos que a Ministra da Educação finja que não sabe o que sabe e finja que não se interessa por aquilo que interessa a todo o País, menos à Ministra da Educação.
Isso não é com a Caixa Geral de Aposentações, é, em primeiro lugar, com ela, e, portanto, é comigo, consigo e com todos os responsáveis políticos.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Não é!

O Orador: — É sim, senhor! E nós temos a obrigação de responder — e a Ministra em primeiro lugar — pelas escolas e pelos professores.
O que a Ministra fez foi a prova de que, se o Sr. Deputado quiser procurar irresponsabilidade, tem de ir à «5 de Outubro» bater à porta do gabinete da Ministra. Aí encontra irresponsabilidade!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal tem, hoje, o Governo mais centralista da nossa vida democrática.
Trata-se de um Governo que tudo decide, fechado nos gabinetes ministeriais do Terreiro do Paço, e com uma concentração de poderes em torno da figura do Primeiro-Ministro como nunca se viu em democracia.
Trata-se de um Governo que torna cada vez mais real, todos os dias que passam, a figura de estilo segundo a qual o que está para além do Terreiro do Paço é «província». É ao abrigo desta visão distorcida da realidade nacional que se encerram, sem qualquer estratégia, sustentabilidade ou razoabilidade política ou económica, serviços públicos de enorme necessidade social, sobretudo no interior do País, como é manifestamente o caso de equipamentos nas áreas da saúde, da educação, da segurança, das finanças.
Trata-se de um Governo que não percebe que um desenvolvimento sustentado, equilibrado e multipolar é a chave do sucesso para os graves problemas económicos e sociais que conhecemos. Trata-se de um Governo que, na boa senda do jacobinismo socialista, é incapaz de definir e aplicar políticas de discriminação positiva em relação às zonas mais deprimidas, nomeadamente as do interior, seja no domínio fiscal, seja nos incentivos à criação de empresas e de emprego, seja no acesso à saúde, à educação, à justiça.
Trata-se de um Governo que, todos os dias, contribui para um criminoso abandono de largas áreas do nosso país.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Trata-se de um Governo que não conhece, nem pratica, o princípio da subsidiariedade.
Este é, infelizmente, o retrato de um Governo que asfixia cada vez mais os cidadãos, nas áreas dos

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direitos e das liberdades, e cuja estratégia passa pelo ataque desenfreado, sem limites e sem ética,…

Protestos da Deputada do PS Maria Antónia Almeida Santos.

… a todos os poderes legítimos e democráticos que dele ousem divergir.

Aplausos do PSD.

Vejamos cinco exemplos desta centralização galopante.
Comecemos pelo QREN, o Quadro de Referência Estratégica Nacional. Estamos a falar do terceiro «pacote» de fundos comunitários relevante — e, provavelmente, o último — a que Portugal tem acesso. É unânime reconhecer que nos vinte anos anteriores houve uma participação alargada na formulação da estratégia nacional apresentada a Bruxelas, a par de uma presença de outros poderes democráticos, nomeadamente as autarquias e os Governos Regionais, na definição dos programas operacionais e na sua concretização no terreno.
Ora, hoje, assistimos a um impensável secretismo e a uma selectividade político-partidária na definição das orientações estratégicas do QREN e, pior, na sua futura concretização.
Em 2007, não haverá quaisquer investimentos, públicos ou privados, que venham a ser comparticipados por fundos comunitários devido à incompetência deste Governo socialista. Se a isso adicionarmos os cortes cegos nos últimos PIDDAC, que afectaram, sobretudo, as regiões do interior do País, obtemos o resultado desastroso que é o completo abandono de largas áreas de Portugal, com todas as implicações socioeconómicas que conhecemos, sobretudo no que diz respeito ao encerramento de pequenas e médias empresas e ao consequente aumento brutal do desemprego.
Os programas operacionais regionais, que eram geridos através das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regionais (CCDR), passam a obedecer às orientações do Governo central, sem qualquer participação relevante das autarquias no processo de decisão sobre os projectos a concretizar no terreno.
São autarquias que, de resto, têm sido sucessivamente desqualificadas por este Governo, nomeadamente quando lhes retirou a capacidade de, democraticamente, elegerem os presidentes das CCDR. Hoje, os Presidentes das CCDR são impostos a partir do Terreiro do Paço, a quem devem obediência, sendo-lhes coarctada toda a capacidade de serem interlocutores válidos entre a administração central e as autarquias.
Ganharam o estatuto de «paus mandados» do Governo, numa lógica centralista que se julgava ultrapassada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — A terceira evidência desse centralismo galopante é a asfixia das autonomias regionais e das autarquias locais, promovida pelo actual Governo. Foi o que sucedeu com a Leis das Finanças Regionais e com a das Finanças Locais; está a sê-lo agora na discussão da transferência de competências, onde se procura impor os vícios e as ineficiências da administração central.
Mas, vejamos um caso paradigmático: o caso da cidade de Lisboa é bem ilustrativo. Em vez de devolver a zona ribeirinha à autarquia, o Governo inventa uma entidade central, entrega-a a alguém da sua confiança, para ali desenvolver, confessadamente, um projecto imobiliário.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Uma vergonha!

O Orador: — Maior exemplo de desrespeito e de desconsideração pelo poder autárquico era impossível.

Aplausos do PSD.

Todo este contexto assume uma maior gravidade nacional, sobretudo por se desbaratar uma oportunidade ímpar de se mudar o paradigma, focalizando-se a Administração Pública nos cidadãos e nas suas necessidades.
Escandalosa é, também, a situação na área do ambiente, onde estamos a assistir, de forma inacreditável, a uma descarada nacionalização do sector. Mais de 30 anos depois das nacionalizações de 1975, este Governo, pela calada, e aproveitando a débil situação financeira de muitos municípios, está a impor um modelo centralizado, dirigido instrumentalmente pela empresa pública Águas de Portugal. É um modelo que assenta no alargamento da actividade das empresas gestoras dos sistemas multimunicipais de águas à área do saneamento, impondo, de forma ignóbil e chantagista, a adesão forçada dos municípios.
Ainda um último exemplo. A empresa Metro do Porto conseguiu, em poucos anos, criar uma rede de metropolitano ligeiro com mais de 50 km de extensão. A sua administração assentou numa verdadeira parceria entre o poder central e a Junta Metropolitana do Porto. É um bom exemplo na concretização de objectivos previamente definidos, numa obra pública complexa e de grande dimensão.

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Pois bem, o actual Governo impôs um modelo centralista de gestão à Metro do Porto, em que todos os administradores executivos serão — todos! — nomeados por si, cerceando, de forma inacreditável, o poder de intervenção dos autarcas no processo de tomada de decisão. E a chantagem foi de novo a arma do Governo: ou a Junta Metropolitana do Porto aceitava esse modelo, ou não havia mais obras. E para que a chantagem fosse levada mesmo a sério, durante cerca de 18 meses a administração da Metro do Porto ficou sem quaisquer poderes de decisão, em matérias de gestão corrente, de acordo com um despacho assinado pelos actuais Ministros das Finanças e das Obras Públicas.
É esta a estratégia e a prática centralizadora do actual Governo.

Aplausos do PSD.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Apresentei cinco exemplos desta estratégia de centralização do poder, de hostilidade e consequente abandono do País por parte deste Governo socialista. Poderia apontar muitos outros exemplos, em áreas tão diversas como a gestão portuária, a gestão dos transportes, a gestão das florestas, a gestão das estradas, a gestão do património arquitectónico, das áreas protegidas, etc., etc.
Vivemos hoje com um Governo que cultiva a ânsia de tudo querer controlar.
O famoso «Big Brother», em termos de actuação do Estado, está aí.
A realidade com que nos confrontamos com o PRACE é a de sinais claros de uma ainda maior centralização do processo de decisão em Lisboa.

O Sr. Pedro Duarte (PSD): — Claro!

O Orador: — O que deveria ser uma oportunidade de oiro de transferir para outras regiões do País, sobretudo no interior, serviços que não têm minimamente que estar em Lisboa, e, desse modo, alavancar o seu desenvolvimento, a orientação que está a ser seguida vai, exactamente, em sentido contrário.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — À fúria centralista do actual Governo é necessário contrapor outro rumo. O nosso caminho, a nossa visão estratégica para Portugal é completamente o oposto à do actual Governo. Acreditamos que o desenvolvimento do nosso País passa pela aposta nas potencialidades e nas competências de todos, repito, de todos os portugueses, onde quer que eles vivam, trabalhem ou estudem.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — O que este Governo está a fazer tem efeitos devastadores no desenvolvimento equilibrado do País. Tudo faremos para denunciar e combater esta política centralista, que penaliza, de forma particularmente dramática, todo o interior.
Em nome de um País com mais ambição, mais equilibrado, com um desenvolvimento homogéneo e mais sustentável, com a indispensável solidariedade nacional e a promoção de uma verdadeira igualdade de oportunidades para todos os portugueses, em nome de um País melhor, em nome de uma democracia com mais qualidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para pedidos de esclarecimento.
Em primeiro lugar, tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Branquinho, antes de mais nada, felicito-o…

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Muito obrigado!

O Orador: — … por ter trazido a esta Câmara o aspecto de o Partido Socialista dizer, muitas vezes, que não recebe lições de ninguém — aí é que parece estar o mal do Partido Socialista — e que também não recebe lições de ninguém no que diz respeito a descentralização e a desconcentração, porque faz exactamente o contrário daquilo que, muitas vezes, diz em campanha eleitoral.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — O Sr. Deputado suscitou várias questões e quero referir-me a uma delas, que é a do QREN. Para além da forma concentrada como vai ser feita a discussão e a decisão dos projectos que vão

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estar em funcionamento, e ainda não sabemos quais, vamos ter um ano sem qualquer tipo de financiamento a projectos estruturantes para o País, que estão totalmente a descoberto de apoio comunitário. O III Quadro Comunitário de Apoio terminou em 31 de Dezembro, o próximo quadro — o QREN — não vai ter efeitos financeiros no corrente ano, pelo que o País vai perder um ano de actividade económica, por falta de capacidade, por falta de decisão e por falta de empenho deste Governo, que, curiosamente, no ano passado, terá dito que o QREN seria entregue em Bruxelas em finais do mês de Julho de 2006 mas, na realidade, só foi entregue em Março deste ano e, portanto, não vai ter qualquer efeito financeiro para o País. Gostaria, pois, que V. Ex.ª comentasse este facto.
A segunda questão que quero suscitar-lhe é a da administração de proximidade. V. Ex.ª referiu cinco casos e eu refiro mais alguns.
Os encerramentos de escolas são vários por este País, à revelia daquilo que são os documentos aprovados, nomeadamente das cartas educativas municipais, que têm força de lei, como sabe, porque são um documento de planeamento integrado no próprio PDM. À revelia de tudo e de todos, sem qualquer revisão dessas cartas educativas, são encerradas escolas dos 2.º e 3.º ciclos e do ensino secundário por este País, à vontade não se sabe de quem mas, com certeza, contra as populações e as autarquias.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Quanto aos serviços de saúde, nem vale a pena falar, mas gostava de acentuar a tónica em dois serviços, esses, sim, verdadeiros serviços desconcentrados e que deveriam estar muito próximos daqueles que estão no terreno: as zonas agrárias dos serviços da Direcção-Geral dos Recursos Florestais.
As zonas agrárias têm vindo a encerrar por esse País fora e a região Norte tem sido um exemplo extraordinariamente infeliz de encerramento, designadamente em Trás-os-Montes e no Douro. Obviamente, também gostaria de saber a opinião de V. Ex.ª sobre esta questão.
As comunidades urbanas têm sido completamente votadas ao abandono, sem criar qualquer tipo de alternativa, seja de regionalização ou do que quer que seja, e estavam a desempenhar um papel extraordinário, por vontade das populações, por vontade das autarquias, mas estão, hoje, completamente abandonadas.
Finalmente, Sr. Deputado, gostaria ainda de saber a opinião de V. Ex.ª sobre uma outra questão que, para o CDS, também é muito cara: as comunidades portuguesas no estrangeiro e o encerramento dos serviços consulares por esse mundo fora. Qual é, hoje, a política deste Governo? É de abandono total daqueles que, durante muitos anos, saíram do País, que não soube acolhê-los, e que, neste momento, são, ainda, muito daquilo que nós esperamos dos nossos portugueses espalhados na diáspora e que têm sido completamente ostracizados e abandonados por este Governo socialista.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado José Junqueiro.

O Sr. José Junqueiro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Agostinho Branquinho, notei, na sua intervenção, que V. Ex.ª começou, logo, por fazer uma piada política ao Presidente da Câmara Municipal do Porto.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Orador: — É evidente que todos sabemos que têm relações de alguma dificuldade mas, quando V.
Ex.ª fala em centralismo, está a dirigir-se à Câmara Municipal do Porto, ao Presidente Rui Rio e não, certamente, ao Governo nem às autarquias locais. E explico porquê.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — É melhor fazer um desenho!

O Orador: — Não está a dirigir-se ao Governo, porque não há nenhum governo que, como este, tenha vindo tantas vezes a esta Assembleia, entre ministros e secretários de Estado, às comissões, dar os esclarecimentos necessários sobre as políticas públicas que estão a concretizar-se.
Mas também não está a dirigir-se às autarquias locais. V. Ex.ª anda distraído, porque não focou aqui a descentralização das atribuições e competências para as autarquias locais, na educação, na saúde e noutras matérias. Aliás, esqueceu-se mesmo de que sempre que houve descentralização no País para o poder local, partilha de responsabilidades com o poder local foi com o Partido Socialista e nunca com o PSD.

Aplausos do PS.

Em segundo lugar, V. Ex.ª diz que há uma desatenção, digamos assim, relativamente ao interior do

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País, com o encerramento de serviços, como sejam as escolas. V. Ex.ª está também divorciado dos autarcas do seu partido, inclusivamente, porque aquilo que foi feito, em reorganização da carta escolar, foi feito consensualmente com as autarquias locais.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Orador: — V. Ex.ª desconhece, no âmbito do seu próprio partido, aquilo que foi uma realidade importante para os pais, para as famílias, para os professores e para os autarcas que aprovaram essa reforma.

Aplausos do PS.

Mas há outra coisa extraordinária: V. Ex.ª refere-se ao interior do País, dizendo que está desprotegido, mas quando este Governo criou sistemas de estradas que beneficiam o interior do País,…

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem! Bem lembrado!

O Orador: — … quando quer fazer mais relativamente a Bragança, o que V. Ex.ª quer é portagens em todas as estradas, sobretudo no interior do País.

Aplausos do PS.

Essa é a hipocrisia máxima do PSD! Quanto a equipamentos sociais, VV. Ex.as encheram o País de promessas e encheram as IPSS, as misericórdias, as associações em geral de dívidas, de promessas, de promessas que não cumpriram.
Quando este Governo chegou ao exercício das suas funções saldou essas dívidas, mas quero dizer-lhe que nestes dois anos fez mais do dobro do investimento em equipamentos sociais do que VV. Ex.as fizeram durante os dois governos e os dois mandatos do PSD.

Aplausos do PS.

Não podendo ir a todo o lado, nestes 3 minutos, gostaria de terminar, dizendo-lhe o seguinte: o QREN é um documento discutido com toda a gente, com os parceiros sociais, com as autarquias locais, mas, mais uma vez, V. Ex.ª, nos programas operacionais regionais, esquece-se de que há uma equipa liderada pela CCDR, mas há dois elementos indicados pela Associação Nacional de Municípios Portugueses. Por que é que, tendo a Associação Nacional de Municípios, as autarquias e administrador executivo nestes PO regionais, V. Ex.ª diz aqui, com uma grande leviandade, que não há consulta, não há partilha, é segredo e não há discussão? É ou não verdade que isto acontece assim?

O Sr. Mota Andrade (PS): — Muito bem!

O Orador: — Para terminar, diria, muito rapidamente, duas coisas.
Em primeiro lugar, quando V. Ex.ª falar nas autonomias regionais e nas finanças regionais, lembre-se do seguinte: a Madeira é o que é, com os défices acumulados; os Açores, que são uma autonomia regional, vão no 5.º ano consecutivo com défice zero. Esta é a grande diferença entre os Açores e a Madeira! Em segundo lugar, relativamente a Lisboa, que V. Ex.ª chamou aqui à colação, devo dizer, então, que grande infelicidade, que péssimo exemplo. Ou não estiveram VV. Ex.as
, em Lisboa, nos últimos seis anos, a causar aquilo que causaram, ou seja, a maior crise numa autarquia local que é conhecida desde que a democracia existe em Portugal?!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Branquinho.

O Sr. Agostinho Branquinho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Abel Baptista, antes de mais, quero retribuir-lhe os cumprimentos e dizer-lhe que, de facto, vivemos aqui, neste Parlamento, uma situação única: o partido do Governo tem uma sobranceria tal que, todos os dias, em todos os Plenários, nos vem aqui dizer que não recebe lições de ninguém. Era bom que tivesse um pouco mais de humildade e percebesse o que é que o povo português, lá fora, está a sentir, para tentar verificar as maldades que anda a fazer ao povo, as promessas que não está a cumprir e, sobretudo, os ataques que anda a fazer àquilo que tem a ver com as liberdades, as garantias, os direitos sociais dos cidadãos portugueses.
Quanto à questão do QREN, que o Sr. Deputado Abel Baptista colocou e ao contrário do que disse o Sr. Deputado José Junqueiro, mas já lá iremos, de facto, o QREN só foi amplamente discutido no Largo do Rato. No Largo do Rato, o QREN deve ter sido amplamente discutido!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É verdade!

O Orador: — Aquilo que é importante no QREN, conforme disse na minha declaração política, e V. Ex.ª também o sublinhou, é que se perdeu um ano. O PSD disse aqui, nesta Câmara, há mais de um ano e meio, que estávamos a perder uma oportunidade, que 2007 ia ser um ano perdido. E, de facto, pela total irresponsabilidade do Governo, vamos ter 2007 como um ano perdido, como um ano em que não vamos poder aproveitar plenamente os fundos comunitários.
Quanto ao encerramento dos serviços, pegando no exemplo dos consulados, que V. Ex.ª deu, gostava de lhe dizer que o PSD esteve na primeira linha do combate a essa política cega, totalmente irresponsável, em termos daquele que deve ser o papel da soberania do Estado português, com as medidas que foram tomadas por este Governo em relação ao encerramento de consulados. O líder do meu partido esteve em várias cidades…

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Foi de férias?!

O Orador: — … a tentar demonstrar, ao lado dos emigrantes, a procurar chamar a atenção e a tentar criar alguma sensibilidade, infelizmente, impossível, no seio do Governo socialista, para a atitude irresponsável, do ponto de vista nacional, que foi o encerramento de um conjunto de consulados.

Protestos do PS.

Sr. Deputado José Junqueiro, ao longo da sua intervenção, estive tentado a pedir ao líder da sua bancada para que o beliscasse, para ver se V. Ex.ª acordava do sonho,…

Aplausos do PSD.

… desse sonho que é um pesadelo para todos os portugueses. É que o seu sonho pode ser cor-derosa, mas é um cor-de-rosa choque, é um pesadelo para os portugueses.

Protestos do PS.

Fiquei também a saber, Sr. Deputado José Junqueiro, que V. Ex.ª tem um conceito muito interessante sobre descentralização. Para V. Ex.ª descentralização é ir do Terreiro do Paço para o Palácio de São Bento ou, então, é o Sr. Primeiro-Ministro descer do Palácio de São Bento, visitar os jardins e, porventura, vir aqui uma vez ou outra à Assembleia da República.

O Sr. Mota Andrade (PS): — Uma vez ou outra?!

O Orador: — É este o seu conceito de descentralização!

A Sr.ª Helena Terra (PS): — O Deputado Marques Guedes está quase a beliscá-lo!

O Orador: — Mas, Sr. Deputado José Junqueiro, no fundo, o que estranhei foi, quando V. Ex.ª falou de Lisboa, não ter dito nada, não ter dito uma única palavra sobre aquele feroz ataque ao poder autárquico, sobre aquela que é uma das maiores desconsiderações do poder autárquico, que foi, em vésperas das eleições intercalares para Lisboa, o seu Governo retirar ao poder autárquico toda a gestão da frente ribeirinha, criar uma empresa, entregá-la a um amigo e fazer com que a Câmara Municipal de Lisboa, a seguir, não tenha possibilidade de ter uma palavra a dizer sobre essa parte importante da cidade.

Aplausos do PSD.

Protestos do PS.

Sr. Deputado, sei que custa a VV. Ex.as ouvir as verdades, mas é este o País em que vivemos, um país que VV. Ex.as procuram fechar, asfixiar, onde procuram pôr em causa as liberdades, os direitos e as garantias dos cidadãos, um país onde tudo, tudo, cada vez mais, se decide no Terreiro do Paço. É contra esse país, que VV. Ex.as querem criar, que nós aqui estamos. Nós queremos um país mais participado, um desenvolvimento mais homogéneo, um desenvolvimento sustentável. E podem contar com a nossa energia para que esse país venha a ser uma realidade!

Aplausos do PSD.

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O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Artur Silva era professor há mais de 30 anos quando foi traído por um cancro na garganta. Perdeu a laringe e só o auxílio de um aparelho tornava possível que falasse.
Não tendo o mais importante instrumento que um professor pode utilizar — a voz — pediu a sua aposentação.
Em 18 de Abril de 2006, um junta médica, que nem sequer o examinou ou solicitou a sua presença, indeferiu o seu pedido. A conclusão era só uma: tinha de se apresentar na escola.
Manuela Estanqueiro era professora há mais de 30 anos. Era conhecida pela tenacidade que punha em todas as causas por que lutava. Após meses de cansaço crónico, foi-lhe diagnosticada uma leucemia. Sem condições para continuar a dar aulas, submeteu-se a uma junta médica. O relatório desta junta concluía, e passo a citar, «não se encontrar absoluta e permanentemente incapaz para o exercício das suas funções».
A conclusão era só uma: tinha de se apresentar na escola.
Infelizmente, o paralelismo entre estas duas situações não se fica por aqui. Infelizmente, ambos os profissionais vieram a falecer no exercício das suas funções profissionais.
Quando estes casos foram relatados publicamente, o País ficou chocado. A forma bárbara e desumana como dois professores foram tratados e a insensibilidade que representava, para si e para toda a escola, a sua apresentação ao serviço não deixaram ninguém indiferente.
O CDS, logo que teve conhecimento destes casos, requereu ao Ministério da Educação explicações sobre o sucedido, sobre a forma como ultrapassar estas situações e, ainda, sobre a existência de outras semelhantes.
A primeira responsabilidade de quem exerce um cargo político é a de ser a voz dos mais fracos e oprimidos, é a de ser firme na denúncia de injustiças e forte na procura de soluções.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — A única resposta que recebemos do Ministério da Educação foi um comunicado com acusações de aproveitamento político e um enorme descartar de responsabilidades para o Ministério do lado.
A Sr.ª Ministra da Educação é sempre muito rápida a lançar acusações sobre os outros, mas, infelizmente, é lenta a reconhecer problemas internos que existem no seu Ministério.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Demorou ao Governo mais de duas semanas para, pela voz do Primeiro-Ministro, reconhecer que, afinal, há um problema com as juntas médicas e que, afinal, tem de se mudar o sistema.
Pela nossa parte, congratulamo-nos com o facto de o Governo ter reconhecido o problema e ter já, hoje, alterado a composição das equipas de profissionais que fazem parte dessas juntas.
Mas não estamos contentes, nem sequer achamos que tudo está resolvido.
No dia 4 do corrente mês, a Ministra da Educação dizia que não tinha conhecimento de outros casos semelhantes. Só ontem e hoje, a comunicação social — que tem, e bem, neste caso, tido um papel de verdadeira denúncia social — relatou, pelo menos, mais dois casos em muito semelhantes aos que atrás falei.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — Por isso, para nós, não basta mudar a composição das juntas médicas. É preciso saber se há casos semelhantes e se há outras injustiças a reparar. É preciso saber como é que a Administração se comporta nestes casos e nestas situações. É preciso saber como é que a Administração trata estes profissionais e as suas famílias, sujeitos a dramas humanos muito difíceis de suportar. É preciso saber se a Administração tem uma resposta célere para a adaptação dos profissionais que se encontrem incapacitados para uma função, mas que possam, eventualmente, desempenhar outras. É preciso saber como é que os nossos governantes reagem perante a denúncia destas injustiças: se são céleres a encontrar soluções ou se, pelo contrário, enxotam e aligeiram as suas responsabilidades para o parceiro do lado.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Por tudo isto, o CDS vai organizar, no Parlamento, uma audição pública sobre o problema das juntas médicas, ouvindo especialistas da área, dirigentes responsáveis, técnicos em administração e os directamente visados nesta questão.
Para o CDS, fazer oposição é, acima de tudo, reagir contra as injustiças, exigir a correcção do que está errado e apresentar soluções e alternativas que visem minorar essas desigualdades.

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O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Sabemos que, com este Governo, isso não é fácil. Ultrapassar a teimosia de quem se recusa a reconhecer as dificuldades a que os portugueses estão sujeitos é, muitas vezes, uma tarefa hercúlea para o Parlamento e para os Deputados.
Bem nos lembramos o que foi preciso para que o Governo, primeiro, reconhecesse o erro que estava a cometer no caso das declarações obrigatórias ao fisco dos donativos entre país e filhos e o tempo que tivemos de insistir — mais de 7 meses — para obrigar o Governo a rectificar essa situação.
Mas esta é a nossa obrigação e desse caminho não nos desviaremos.
Estou certo de que muitas das Sr.as e Srs. Deputados, tal como eu, quando ouvem o Sr. Presidente da República falar em casos de intolerância democrática, se lembram destes exemplos e desta falta de tolerância do Governo socialista.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Inscreveram, para pedir esclarecimentos, três Srs. Deputados.
Dou a palavra, em primeiro lugar, à Sr.ª Deputada Zita Seabra.

A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, quero associar-me à sua intervenção, no que diz respeito à denúncia da insensibilidade social do Governo e, muito particularmente, da Ministra da Educação ainda ontem, na resposta que deu neste Parlamento, quando interpelada sobre a lamentável situação das juntas médicas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

A Oradora: — Se há traço que tem sido característico deste Governo é, como disse e eu sublinho, a insensibilidade social e o desrespeito para com os portugueses que sofrem, infelizmente, de uma doença oncológica. Os casos que têm vindo a lume têm todos a ver com doentes de oncologia e são tratados pela Administração Pública com absoluto e total desrespeito, como referiu e como tem dito a comunicação social.
As listas de espera que existem nos hospitais públicos de doentes de oncologia — designadamente, de doentes de oncologia graves, que precisam de intervenções imediatas, sob pena de verem agravada a sua situação, tornando-se, por vezes, irreparável — é dos aspectos mais gritantes! Há muito pouco tempo atrás, o Sr. Ministro da Saúde veio ao Parlamento, aquando da interpelação sobre a política de saúde, do PSD, e disse que não era verdade que havia listas de espera. Três dias depois, o relatório oficial veio explicar que há listas de espera para os doentes de oncologia e que nalguns casos essas listas são de tal forma dramáticas que tornam a situação irreparável para os doentes de oncologia que aguardam uma consulta ou uma intervenção cirúrgica num hospital oncológico do País.
Pergunto ao Sr. Deputado se não considera que, a este problema dramático e de desrespeito pelas pessoas, óbvio e evidente, dos casos que vieram a lume (e só conhecemos alguns) de doentes oncológicos que as juntas médicas dão como aptos para todo o trabalho, devemos acrescentar a situação dramática dos doentes oncológicos que estão em listas de espera para uma consulta ou uma cirurgia oncológica nos hospitais públicos, no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria de Belém Roseira.

A Sr.ª Maria de Belém Roseira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Mota Soares, tomei boa nota da sua intervenção e gostaria de repor a verdade dos factos.
Em primeiro lugar, tomei a iniciativa, como Presidente da Comissão Parlamentar de Saúde, logo que os casos foram conhecidos através da comunicação social — que aproveito para saudar por ter dado visibilidade a casos que, como é evidente, chocaram a sensibilidade de todos e, nestas matérias, não há uns mais sensíveis do que outros —, presumindo que todos fôssemos sensíveis,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Presumindo!…

A Oradora: — … de escrever, de imediato, ao Bastonário da Ordem dos Médicos. Dei, de imediato, conhecimento dessa diligência ao meu grupo parlamentar e o Presidente do meu grupo parlamentar logo se disponibilizou para fazer uma reunião com o Sr. Bastonário da Ordem dos Médicos no dia seguinte. Isto já aconteceu há cerca de duas ou três semanas.

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Neste sentido, considerámos ter despoletado aquilo que é um processo de reavaliação do modelo de funcionamento das juntas médicas, quer no domínio da Caixa Geral de Aposentações quer no domínio da segurança social. Queria dizer, a este propósito, que o Ministério da Educação não tem rigorosamente nada a ver com esta matéria.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Mas a Ministra tem! A Ministra é do Governo!

A Oradora: — Nessa sequência, as diligências que tomámos pretendem aliar o rigor que é indispensável na obtenção de pensões por incapacidade com a humanidade que é necessária relativamente às pessoas que são portadoras de qualquer problema, seja de saúde que possa derivar em incapacidade.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Oradora: — Gostava de explicar ao Sr. Deputado que o pior que se pode fazer nestas matérias são aproveitamentos políticos.

Aplausos do PS.

Protestos da Deputada do PSD Zita Seabra.

Tenho várias dezenas de anos de trabalho, muitos deles na segurança social, e todos sabemos que há muitos e muitos pedidos de pensões de invalidez que não se justificam. Aquilo que pretendemos é que todas as prestações de pensão de invalidez sejam dadas a quem delas realmente tem direito, uma vez que quem acede a uma prestação de solidariedade social sem a ela ter direito está a privá-la a todos aqueles que têm de facto direito e está a cometer aquilo que é um crime social, porque está a beneficiar da solidariedade colectiva, sem dever. E, se há alguma coisa que o século XXI deve acrescentar ao período do sublinhar dos direitos, é a época do sublinhar dos deveres. Todos deveremos, realmente, ter essa preocupação.
Considero que andou muito bem o Governo quando, de imediato, fazendo uma avaliação do que estava a funcionar mal, hoje mesmo, aprovou, em Conselho de Ministros, um diploma, que fica disponível para consulta pública e para todos os contributos que as entidades que têm intervenção nestes processos e os partidos políticos queiram dar para o aperfeiçoamento de todo o regime de concessão de prestações ou de pensões de invalidez, para que, assim, este sistema possa atingir os seus objectivos, conceder prestações a quem delas necessita e conceder também a reabilitação a quem dela necessita para continuar a trabalhar. Foi isto que foi feito. Queria saudar, em meu nome, a iniciativa do Governo, que, de forma célere, tomou as decisões que devia tomar.
Agora, todos devemos contribuir para que aquilo que se passou não volte a repetir-se, uma vez que todos defendemos, ou deveríamos defender, um rigor necessário para que não haja abuso no acesso às prestações financiadas pela solidariedade colectiva e se alie a humanidade com que devem ser tratados todos os casos que dela careçam.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, queria começar por cumprimentar o Sr. Deputado Pedro Mota Soares e a bancada do CDS por terem trazido este tema ao debate.
Sr. Deputado, gostaria de fazer uma pequena correcção ao que disse na sua intervenção. O problema não se suscitou há duas semanas, com este último caso mais visível, que veio a público. Há vários meses que se conheceu o primeiro caso…

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

O Orador: — … e o Governo andou a «dormir na forma» em relação a este problema. O Governo, durante meses, não quis intervir sobre esta matéria. A Ministra da Educação ignorou que funcionários do seu Ministério estavam sujeitos a esta situação.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Augusto Santos Silva): — É só demagogia!

O Orador: — Alguém pode admitir que o dirigente máximo de um ministério ignore que isto esteja a acontecer dentro dos quadros do seu ministério?!

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O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — É só demagogia!

O Orador: — O Governo e a bancada do Partido Socialista só se preocuparam com esta matéria quando a situação adquiriu foros de escândalo nacional e, portanto, saltou para as primeiras páginas noticiosas. Aí, sim, o Governo resolveu intervir sobre esta matéria.
Queria dizer à Sr.ª Deputada Maria de Belém que tem todo o direito e legitimidade e faz muito bem em intervir e promover reuniões preocupada com esta questão, mas não o faz em nome da Comissão de Saúde, na qual esta matéria nunca foi discutida. É bom que mantenhamos as diferenças entre os diversos estatutos.
Queria dizer também que o problema que tem estado a ser posto em cima da mesa pelo Governo é apenas o da composição das equipas que constituem as juntas médicas.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Não é verdade!

O Orador: — Essa matéria merece, evidentemente, discussão e aperfeiçoamento. Estou de acordo com isso. O problema de fundo não é, contudo, esse. O problema de fundo é a orientação geral em matéria de restrição das aposentações extraordinárias e das reformas por invalidez.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Orador: — É a orientação geral que obriga a que os serviços e todos quantos estão envolvidos neste processo sigam uma filosofia altamente restritiva que, como bem agora vimos na intervenção da Sr.ª Deputada Maria de Belém, entende como burlões todos os funcionários que pretendem aceder à reforma por invalidez.

Vozes do PCP: — Exactamente!

Protestos do PS.

O Orador: — Ora, como a vida tem vindo a provar, não são burlões a maioria dos que pedem esta reforma, mas o Governo, à sombra desta concepção retrógrada e anti-social, tem vindo a limitar sistematicamente o acesso a esta reforma extraordinária.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Mas lá que há burlões, há! Não são é todos!

O Orador: — Há, com certeza, burlões, Sr. Deputado Afonso Candal, mas nem 100 nem 1000 burlões justificam que o Governo aplique a orientação que está a aplicar a estas pessoas, que não deviam estar nesta situação.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O que a lei diz, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que só tem acesso a esta aposentação extraordinária quem esteja absoluta e permanentemente incapaz. Ora, este critério aplicado ao extremo significa que só quando alguém não puder dar um passo, só quando alguém, sendo professor, não puder falar é que está absoluta e permanentemente incapaz.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — É vergonhoso!

O Orador: — E é esta aplicação indevida de uma norma abusiva da lei que cria as situações que o Sr. Deputado referiu e não apenas a mera composição das juntas médicas que merece ser revista.

Vozes do PCP: — Exactamente!

O Orador: — Termino, dizendo o seguinte: a lei agora vai ser mudada e veremos se em termos completamente satisfatórios. Mas o desafio que tem de ficar para o Governo é o de saber se vai rever as decisões dos últimos meses e anos, para ver onde é que casos como estes também sucederam, ainda não tendo sido denunciados pela comunicação social, e poder corrigi-los antes que tenhamos de assistir à repetição das dramáticas situações ocorridas nas últimas semanas e meses.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Zita Seabra, agradeço a sua questão. Como é óbvio, concordo consigo quanto ao problema das listas de espera em oncologia, mas permita-me que lhe diga uma coisa que me parece muito importante: neste caso específico, não admito, e penso que qualquer político responsável não pode admitir, que, nomeadamente, a maioria queira fazer a diabolização dos médicos, como que passando a ideia de que o problema das juntas médicas é, única e exclusivamente, dos médicos que compõem essas juntas.

Vozes do CDS-PP, do PSD e do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Isso, estou certo, que a Sr.ª Deputada, tal como eu, não admitirá.
Por isso mesmo, entendo que é justo que também se faça o reconhecimento público da postura construtiva com que a Ordem dos Médicos quis participar neste processo, obviamente aligeirando um pouco as responsabilidades que, a páginas tantas, a maioria quis fazer passar para cima destes profissionais — o que, como é óbvio, não podemos admitir que aconteça.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — A Sr.ª Deputada falou, e bem — e com isto começo a responder também à Sr.ª Deputada Maria de Belém, a quem agradeço a pergunta —, sobre a intervenção da Ministra da Educação. Como é óbvio, nenhum de nós acha que a questão das juntas médicas é um problema da Ministra da Educação. No entanto, há um aspecto que é um problema directo da Ministra da Educação: todos estes são casos que se passam com professores. Aliás, ontem, foi dito pela Sr.ª Ministra aqui, no Parlamento, que estes são casos de que tinha conhecimento há meses.
Pergunto-me, pois, se a primeira responsabilidade de um político não é a de reagir contra as injustiças, quando tem conhecimento delas,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Exactamente!

O Orador: — … se não é a de apresentar soluções quando, de facto, verifica que há algo que choca a sua consciência.
Sabe o que fez a Sr.ª Ministra quanto a isto? «Lavou as mãos», disse que o problema não era dela, era de uns senhores lá da Caixa Geral de Aposentações, era de um outro ministério, e que ela própria nada tinha a ver. É isso que qualquer um de nós não pode deixar passar como «cão por vinha vindimada»! Por isso mesmo, Sr.ª Deputada Maria de Belém, respondo à questão do aproveitamento político de que falou.
Eu próprio, quando tive conhecimento destes casos, fiz o meu dever: escrevi a quem tinha de escrever, pedi explicações, pedi uma solução. Ontem, descobri que a Sr.ª Ministra da Educação conhecia este caso há vários meses e nada tinha feito. Sabe qual é a diferença, Sr.ª Deputada? É que achei que o grande problema era o da burocracia do Ministério da Educação; ontem, descobri que o grande problema tem um nome, é a própria Sr.ª Ministra da Educação.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Orador: — Esse é que é o problema e é o que hoje, aqui, também temos de saber denunciar.
Sr. Deputado Bernardino Soares, agradecendo as questões que colocou, há um ponto relativamente ao qual concordo consigo em absoluto. De facto, nesta matéria, o problema não é só o de mudar a composição das juntas médicas ou até, eventualmente, dar aos médicos uma formação específica e acrescida, mas é, também, o de sabermos como é que a Administração se comporta perante estes casos, qual é a resposta que dá a estes casos.
Por isso mesmo, o CDS, ainda não tendo conhecimento do que sobre esta matéria foi tratado hoje, em sede de Conselho de Ministros, propôs uma audição pública, não só de pessoas directamente visadas por este problema, não só de médicos com especialidade nesta matéria mas também de técnicos em administração, por forma a que nos expliquem quais os mecanismos internos da Administração que, obrigatoriamente, têm de mudar para que casos como estes, que chocam todos nós, que são de uma desumanidade muito grande, não voltem a acontecer em Portugal.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Afonso Candal, para uma intervenção de interesse político relevante.

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O Sr. Afonso Candal (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O País tem, de facto, vários problemas. Problemas de dimensão nacional e até de enquadramento internacional e problemas internos de mecanismos cujo funcionamento deve ser corrigido.
Ainda hoje, nesta Câmara, discutiu-se a questão das juntas médicas e alguns problemas, que têm vindo a público, decorrentes de alguns mecanismos actualmente existentes e que levam a situações de injustiça.
Se é bem verdade que não é razoável admitir-se, como parece admitir o Partido Comunista, que toda a gente que pede apoio social cumpre os requisitos, a verdade é que é bom que se admita também que sempre há lugar à melhoria dos instrumentos, por forma a que recebam apoio todos os que cumprem os requisitos para que tal aconteça.
Assim, o Governo já agiu e, relativamente à questão das juntas médicas, fez alterações muito significativas, que convém precisar aqui, hoje, nomeadamente três, que são da máxima relevância.
Primeiro, o reforço da componente técnico-científica ou médica, com as juntas médicas a serem compostas exclusivamente por médicos.
O segundo ponto, também já referenciado de passagem, hoje, é o da obrigatoriedade de haver um encontro presencial com o requerente, ou seja, não há que se limitar à questão mais formal dos exames e dos relatórios, mas deve haver um conhecimento físico da pessoa que pretende adquirir este benefício.
Finamente, o reforço dos direitos dos cidadãos, conferindo a possibilidade de, ao nível da Caixa Geral de Aposentações, haver uma junta médica de recurso, coisa que já existe na segurança social, para cuja composição o interessado indicará um dos médicos. Ou seja, há sempre a possibilidade de serem cometidos erros, o que passa a ser minimizado do ponto de vista técnico, e passa a haver uma instância de recurso na qual a parte interessada, o cidadão, também tem o seu próprio representante.
Mais: por decisão, de hoje, do Conselho de Ministros, isto é feito, não só em relação à Caixa Geral de Aposentações como também, através de aditamento, em sede das leis orgânicas da PSP e da GNR, diplomas que estão em análise na Assembleia da República.
Portanto, em relação às situações que hoje são conhecidas, já existem propostas de correcção.
Mas há muitos outros desafios com que o País se confronta: os desafios da competitividade e os da coesão.
Assim, em termos de competitividade, é preciso reforçar e apoiar o papel das nossas empresas e dos nossos empresários — e, já hoje, registam-se resultados ao nível do crescimento das exportações e da riqueza produzida também no domínio do turismo, questão que tão cara é ao País —, é preciso apoiar os trabalhadores, nomeadamente na melhoria das respectivas qualificações, o que está a ser feito através do Programa Novas Oportunidades, de amplo sucesso.
Mas há também os desafios da coesão, como referi: ao nível do combate à pobreza, com programas como o do complemento solidário para idosos, ao nível do emprego, com a atracção de investimento directo estrangeiro de apoio às pequenas e médias empresas, nomeadamente com a desburocratização dos procedimentos. Tudo isto está a ser feito e a dar os seus resultados.
É verdade que, também no quadro geral, isto se faz com maior facilidade, e, acima de tudo, com maior vantagem para todos, num quadro de finanças públicas saudáveis.
Assim sendo, o Governo tem encetado inúmeras reformas ao nível das finanças públicas: em termos de finanças locais, com a nova lei das finanças locais; ao nível das finanças regionais, com uma nova lei das finanças das regiões autónomas; ao nível da profunda reestruturação que foi feita em termos da segurança social e das pensões dos portugueses, acabando com situações absolutamente inaceitáveis e, do ponto de vista económico, absolutamente irracionais.
Mas também ao nível da Administração Pública o Governo tem encetado reformas, tendo em consideração os direitos dos trabalhadores mas potenciando um bom serviço público para todos os cidadãos.
Todos sabemos que há serviços públicos que funcionam menos bem, mas que alguns funcionam menos bem porque têm gente a mais e que outros funcionam menos bem porque têm gente a menos. É obrigação do Governo — e o Governo não descartou essa obrigação, antes trabalhou-a, aprofundada e pormenorizadamente — dotar os serviços públicos dos meios financeiros e humanos necessários ao cumprimento das respectivas missões e da missão primeira que é a prestação de serviço aos cidadãos.

Aplausos do PS.

Destaque-se, igualmente, o facto de esta consolidação das finanças públicas, fruto de várias reformas e reestruturações muito significativas, não ter sido alicerçada no que, anteriormente, era uma prática normal: operações excepcionais que visavam tão-só a obtenção de receitas fáceis para corrigir o défice de um determinado ano, não obstante gerarem encargos duradouros para os anos seguintes.
Não há nenhuma operação feita por este Governo com objectivos meramente contabilísticos e de cosmética, ao contrário do que houve no passado, nomeadamente a operação da titularização de créditos, grande negócio feito entre um governo antecessor do actual e o Citigroup.
De igual modo, não houve lugar a uma outra operação, terrível para a Caixa Geral de Aposentações (CGA) e para o seu futuro financeiro, que é o futuro de muitos e muitos portugueses, com a integração do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos na CGA.

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Portanto, tudo o que referi tem sido feito com estudo, com trabalho, com análise, com esforço, procurando as soluções mais justas para o que tem de ser feito. Do ponto de vista da oposição, muitas vezes parece ser pouco, mas a verdade é que, no passado, nunca nada disto se fez.
A este propósito, veja-se, por exemplo, a questão das juntas médicas, acerca da qual se diz, hoje, que, afinal, não é tão recente quanto isso porque os problemas já vêm de trás. Ora, valha a verdade — e é bom tê-lo em consideração — que nenhum governo precedente corrigiu o problema, enquanto o actual Governo tem, pelo menos senão mais, a virtude de, confrontado com casos concretos de injustiça, ter tido a capacidade e a determinação para alterar as regras que vigoravam.

Aplausos do PS.

Termino com um apelo à oposição, um apelo que é a bem da própria maioria, a bem do Governo, mas, porventura, igualmente a bem da própria oposição, que é o que menos me preocupa. Apelo à oposição para que não se fique pelo campo da denúncia, não se fique pela contestação às medidas, mas dê um passo em frente que credibilize a sua prestação enquanto oposição e que ajude a encontrar as soluções, senão óptimas, melhores para os problemas do País. Apelo a que a oposição não se fique pela crítica, pela denúncia, e tenha a coragem de avançar propostas correctivas, sejam complementares ou alternativas às do Governo.
Pela nossa parte, cá estaremos para saber reconhecer o que é correcto e justo e para alterar. Mas, para fazermos alterações, é preciso saber o que os senhores pensam.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminámos o período de antes da ordem do dia.

Eram 16 horas e 30 minutos.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, o primeiro ponto da ordem do dia de hoje é preenchido com um debate de urgência, requerido pelo PCP, sobre direitos dos trabalhadores e as perspectivas do Governo em matéria de legislação laboral.
Para proceder à intervenção inicial, em representação do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Lopes.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Deste Governo já se espera tudo mas, ainda assim, continua a surpreender pela negativa. Com o Relatório, dito «de Progresso», da Comissão do Livro Branco das Relações Laborais, o Governo PS faz uma autêntica declaração de guerra aos trabalhadores portugueses.
O Governo quer a facilitação dos despedimentos individuais sem justa causa, considerando justa causa aquilo que nunca o pode ser. Ao mesmo tempo, quer acelerar os processos, instituindo um género de «despedimento na hora», e criar condições para que, mesmo que o trabalhador ganhe o processo, não tenha possibilidades de reintegração.
Como se não tivéssemos já precariedade suficiente, quer agora colocar todos os trabalhadores em situação de vínculos precários.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O Governo atinge as condições de trabalho, visando a sua desregulamentação e fixação arbitrária pelas entidades patronais, instituindo uma autêntica «lei da selva» nas relações de trabalho.
Com a proposta de eliminação do conceito de horário diário de 8 horas e a avaliação do horário apenas no plano semanal e anual, um trabalhador poderia ter de estar disponível para trabalhar para a empresa 24 horas diárias, com intervalos de entre 1/2 hora e 2 horas de duração, a fazer de 5 em 5 horas, podendo uma parte deste tempo nem sequer ser pago. Se tal ideia fosse para diante, passaria a ser legal a situação do trabalhador como autêntico escravo, sem vida pessoal ou familiar.
Por outro lado, o Governo quer abrir a possibilidade de redução dos salários, numa linha de agravamento da exploração que passa, igualmente, pela redução dos subsídios de férias e de Natal e pelo alargamento do número de horas extraordinárias, acabando com a sua remuneração, orientação que contribuiria também para reduzir o número de postos de trabalho e para aumentar o desemprego.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — É verdade!

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O Orador: — O Governo promove a fragilização da contratação colectiva. Quer manter e mesmo acelerar os processos de caducidade dos contratos e pretende diminuir os direitos garantidos aos trabalhadores, caso esta se verifique.
Quanto ao principio do tratamento mais favorável, que foi violado pelo Código do Trabalho quando prevê a possibilidade de, na contratação colectiva, haver condições abaixo da lei, não só não altera essa situação como abre a possibilidade de, no âmbito do contrato individual de trabalho, se poderem estabelecer condições piores do que as definidas na contratação colectiva.
O Governo ataca os sindicatos e a organização dos trabalhadores em geral: quer diminuir o número de dirigentes que podem recorrer ao tempo previsto de quatro dias mensais; quer desagregar a organização sindical, pôr em causa os próprios sindicatos como associações e afectar a sua ligação à organização sindical na base, apontando para acabar a possibilidade de os filiados de um sindicato elegerem os delegados sindicais do respectivo sindicato;…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Orador: — … quer dificultar ou, mesmo, impedir a realização de reuniões e plenários de trabalhadores no local de trabalho, estabelecendo a confusão sobre o accionamento dos créditos de horas para o efeito; quer promover a desresponsabilização do Estado em matéria de justiça laboral, mantendo e agravando a situação do impedimento prático do recurso à justiça para uma grande parte dos trabalhadores e a situação de ineficácia da Inspecção de Trabalho.
É a flexissegurança à portuguesa, e é mau demais!

Aplausos do PCP.

Diz o Governo que se trata de um relatório intercalar, a que seguirá um relatório final, uma fase de discussão na concertação social e depois a discussão na Assembleia da República, e que o Governo ainda não se pronunciou. Conversa fiada! Na realidade, trata-se de uma comissão nomeada pelo Governo, de um relatório encomendado pelo Governo, de conclusões acompanhadas pelo Governo, publicadas com o acordo do Governo na data que este combinou e que, por isso, responsabilizam inteiramente o Governo.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Independentemente do que vier a acontecer, uma coisa está clara: o Governo PS tem como opção piorar o Código do Trabalho.
Sabemos que o conteúdo provocatório das propostas não lhes dá nenhuma hipótese de irem adiante. Já muitos tentaram antes e foram derrotados. É um programa máximo, para fazer passar um programa mínimo que seria sempre intolerável!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Não é aceitável o caminho de mais flexibilidade, precariedade, insegurança, desemprego, degradação das condições de vida, fragilização da contratação colectiva e limitação dos direitos democráticos e da organização dos trabalhadores. É um caminho inaceitável e ilegítimo.
Quando da discussão do Código do Trabalho, o PS e o actual Ministro do Trabalho, enquanto Deputado do PS, caracterizaram-no e assumiram compromissos.
O então Deputado Vieira da Silva manifestou a preocupação que o Código «desloque a favor das entidades patronais o frágil equilíbrio das relações de trabalho, nomeadamente por obrigar (…) os sindicatos a negociar em situação de necessidade».

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E tinha razão!…

O Orador: — No Programa Eleitoral para as eleições legislativas de 2005, o PS compromete-se a alterar o Código, fazendo referência às propostas que apresentou quando da sua discussão. Assumiu, assim, o compromisso da alteração de alguns dos seus aspectos mais negativos. Agora, a orientação do Relatório é a oposta e também por isso é inaceitável e ilegítima no plano político.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Após milénios de exploração do trabalho para além das possibilidades humanas, sem limite e sem horário, a luta de milhões de trabalhadores, que tem como momentos significativos a jornada de 1 de Maio de 1886, em Chicago, e a Primavera

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de 1962 nos campos do sul de Portugal, acabou por impor esse grande avanço social e civilizacional que constituiu o horário de trabalho diário das oito horas.
Em 2007, 120 anos após esse dia 1 de Maio, 45 anos após essa Primavera de 1962, um Governo do PS procura inverter a marcha da história e promover o regresso aos tempos de ignomínia, à legitimação do trabalhador como máquina, a uma certa ideia de competitividade, que em outras épocas tudo justificou.
Tal como hoje, quando a competitividade é invocada como princípio dos princípios a que tudo se deve sacrificar, também nesse tempo a eficácia, a sociedade e o mundo não podiam existir sem a escravatura. É essa concepção retrógrada, de regresso ao passado que o PS agora promove com as propostas sobre a legislação laboral.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E perante isto, o Governo ri-se!

O Orador: — Uma concepção e propostas a derrotar.
A greve geral de 30 de Maio, a grande manifestação de 5 de Julho em Guimarães, a luta dos trabalhadores da Administração Pública e de tantos outros, que daqui saudamos, mostram a realidade de um descontentamento que se afirma, de um protesto que se reforça, de uma exigência de mudança que cresce para garantir o caminho de justiça social e desenvolvimento que Portugal precisa.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social (Vieira da Silva): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há três formas de encarar a situação económica e social que vivemos.
Uma delas, a do PCP, é a do imobilismo. Temer e rejeitar qualquer mudança, temer e tentar bloquear as reformas de que o País carece.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Parece o Ministro Bagão Félix!

O Orador: — Conhecem-se os efeitos e os traços desta estratégia, que apoia hoje o que ontem declarou inaceitável e que, com grande probabilidade, defenderá amanhã aquilo a que hoje se opõe.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — O resultado da estratégia do PCP não seria o congelamento do presente mas apenas a degradação crescente e acentuada da já difícil situação actual.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É preciso ter lata!…

O Orador: — A segunda forma de encarar a realidade com que nos deparamos é a da liberalização e desregulação total. Mais mercado e o menor Estado possível, e de preferência também sem sindicatos.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É uma boa autocrítica!

O Orador: — Insensíveis às desigualdades sociais, declarando-se vítimas perenes da Constituição da República, prometem o que a Constituição — e bem! — os impede de fazer e apregoam, até aos limites de que são capazes, todas as políticas de desregulação que conseguem descortinar.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Também neste caso se conhecem os resultados: aumento das desigualdades, desequilíbrios e instabilidade social, sem qualquer garantia de melhoria da produtividade, do crescimento e do emprego.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É o que está á vista!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há, porém, uma outra forma enfrentar a situação — a da coragem reformista.

Vozes do PCP: — Ah!…

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Falsa coragem!

O Orador: — Ter uma visão clara da realidade e dos problemas e reformar o que carece de reforma, com lucidez e determinação. Procurar, sempre que possível, o acordo, nomeadamente dos parceiros sociais, mas não hesitar no momento da decisão. É esse caminho que estamos a trilhar, e que prosseguiremos.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Porque ele trouxe-nos bons resultados, designadamente, na sustentabilidade da segurança social, no crescimento do salário mínimo nacional, na contratação colectiva, na construção de um sistema de arbitragem laboral prometido há mais de uma década, na protecção no desemprego, na formação e qualificação dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — No aumento do desemprego!

O Orador: — Não é, apenas, o caminho do Governo. É o caminho de todos aqueles que, negociando, promovem situações de defesa do emprego e de aumento da competitividade.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Os resultados estão à vista!

O Orador: — E é este o caminho que nos levará, Sr.as e Srs. Deputados, à reforma do Código do Trabalho.

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PCP está a tentar inquinar e mistificar o debate sobre as alterações ao Código do Trabalho, invocando o espectro da liberalização dos despedimentos e da total desregulamentação das relações do trabalho. Convoca medos, torce ideias e conceitos, foge ao debate das verdadeiras questões.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Vamos ao debate!

O Orador: — Busca unicamente pequenos ganhos de natureza partidária,…

Protestos do PCP.

… não hesitando em procurar, sem qualquer pudor e como poucas vezes se viu, instrumentalizar o movimento sindical.

Aplausos do PS.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Tenha vergonha! Fale a sério!..

O Orador: — Sejamos, portanto, muito claros, já que o Governo não teme as palavras e, menos ainda, as ideias.
Nós somos a favor do reforço da contratação colectiva e somos a favor de mais mudanças negociadas na organização do trabalho das empresas para alcançar patamares de competitividade, de que depende o futuro do emprego e de que depende a melhoria da conciliação da vida profissional e pessoal de todos nós.
E o PCP? É contra os modelos negociados de adaptabilidade interna das empresas? É contra a liberdade e o protagonismo dos parceiros na negociação colectiva? É indiferente à atracção do investimento directo estrangeiro?

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem o viu e quem o vê!…

O Orador: — Nós queremos reduzir a precariedade no nosso mercado de trabalho e somos a favor do reforço dos direitos sociais dos trabalhadores mais desprotegidos. Pelo emprego digno e com qualificação.

Vozes do PS: — Muito bem!

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O Orador: — E o PCP? Não se dá conta que o recurso a formas atípicas de trabalho é, vezes demais, a resposta à rigidez e ao imobilismo? Não se dá conta que as empresas e trabalhadores que mais enfrentam este problema são precisamente aquelas que procuram cumprir a lei?

Protestos do PCP.

Nós rejeitamos a liberalização dos despedimentos sem justa causa e somos a favor de procedimentos céleres em todas as matérias laborais,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Nota-se!

O Orador: — … porque uma lei só protege quando a justiça é célere e quando se consegue a efectividade dos direitos e a segurança jurídica em caso de despedimento.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — É a injustiça rápida e «na hora»!

O Orador: — E o PCP? Não percebe que as teias dos processos só prejudicam os trabalhadores? Que ter uma justiça a tempo em matéria de trabalho é importante e essencial, especialmente para a protecção dos mais frágeis? Nós somos a favor de mais apoio activo aos desempregados na busca de um novo emprego e pela forte protecção social dos seus rendimentos enquanto não o conseguem obter. Foi por isso que procedemos ao alargamento da cobertura do subsídio de desemprego…

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Alargamento?! Em que País?

O Orador: — … e que não procedemos a qualquer diminuição da taxa de substituição de rendimentos.

Aplausos do PS.

Nós somos a favor de um intenso esforço em matéria de políticas activas de emprego e de qualificação dos trabalhadores. Por isso, lançámos as Novas Oportunidades, a que já aderiram centenas de empresas e muitos milhares de trabalhadores.
E o PCP é contra estes princípios? Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A Comissão do Livro Branco das Relações Laborais entregou ao Governo um relatório provisório e preliminar em que dá conta do que fez na primeira metade do seu mandato. O Governo, apesar do seu carácter intercalar, apresentou-o aos parceiros sociais e tornou-o disponível a todos os cidadãos.
Em Novembro, quando a Comissão terminar os trabalhos em curso, o Governo avaliará os resultados e assumirá, perante os parceiros sociais e, naturalmente, perante a Assembleia da República, as responsabilidades políticas que lhe competem.
Por enquanto, o que a seriedade dos problemas a tratar aconselha é um debate sereno e a crítica fundamentada de um processo inteiramente transparente. Aqui estaremos, podem estar certos, a apresentar as soluções legislativas que iremos construir.
Procuraremos soluções socialmente equitativas, que consagrem um equilíbrio indispensável entre direitos e deveres de ambas as partes da relação laboral e que forneçam uma boa base para o desenvolvimento do diálogo social e da negociação colectiva, do topo à base do nosso sistema de relações laborais.
Prosseguiremos o caminho do reforço da adaptabilidade interna das empresas, da promoção da empregabilidade, da protecção da mobilidade, da redução da precariedade, da redução das desigualdades verticais e de género e da adaptação dos direitos sociais à nova era que vivemos e à reforma do modelo social europeu.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Ministro.

O Orador: — Estou mesmo a concluir, Sr. Presidente.
Os que hoje procuram um emprego ou estão na periferia do nosso sistema de emprego, os que vêem negar-lhes o acesso à formação de que depende o seu desenvolvimento profissional, os que são vítimas da discriminação e das desigualdades existentes, bem como os que acreditam que o futuro de Portugal depende da sua iniciativa e do seu trabalho, exigem que nós prossigamos este caminho.
É por eles e para eles que não deixaremos de o fazer.

Aplausos do PS.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos iniciar a primeira ronda de pedidos de esclarecimentos.
O primeiro orador inscrito é o Sr. Deputado Francisco Lopes, a quem dou a palavra de imediato.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, há duas formas de encarar a realidade do mundo do trabalho e das relações laborais e de conceber o futuro.
Uma, que é a concepção do PCP e consagrada, aliás, na Constituição da República, assenta numa perspectiva de progresso civilizacional dos direitos dos trabalhadores e dos direitos sociais; a outra, que é a concepção do Governo, assenta na ideia de regresso ao passado, retrógrada, de «saltar» o século XX e regressar aos tempos anteriores à legislação do trabalho e ao Direito do Trabalho.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Esta é a realidade, é isto que nos diferencia e que está aqui em discussão hoje, com a questão do Código do Trabalho e as alterações que estão em causa.
Esperava-se que o Sr. Ministro viesse clarificar alguma coisa, mas, afinal, sobre a questão essencial do conteúdo das alterações não disse nada, não clarificou nada.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Zero!

O Orador: — E, como não o fez, então temos de tirar a conclusão de que o Governo assume, no essencial, o rumo que está indicado na Comissão do Livro Branco das Relações Laborais.

Aplausos do PCP.

Isto é, se lhe permitirem, o Governo poderá aplicar o programa máximo que agora anuncia para ver qual é a reacção que suscita. Estamos convencidos de que não vai poder fazê-lo, e não vai poder porque na sociedade portuguesa há forças capazes, tanto os trabalhadores como as suas organizações, para impedir que tal suceda.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Em Novembro, teremos cá o Governo a dizer uma coisa diferente e, depois, o resultado também será diferente, não por opção do Governo mas por opção da dinâmica da sociedade portuguesa, da acção dos trabalhadores.
É necessário, Sr. Ministro, que clarifique um pouco mais, que vá mais ao fundo das questões, que não fique neste exercício aleatório,…

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Retórico!

O Orador: — … virtual, sem fazer uma abordagem concreta da realidade do que estamos aqui a discutir.
É, pois, necessário que responda, claramente, às seguintes questões: é o não orientação e opção do Governo considerar nas alterações ao Código do Trabalho a possibilidade de diminuição dos salários reais, do subsídio de férias e do subsídio de Natal? É ou não orientação e opção do Governo apontar para o fim do conceito do horário de trabalho das oito horas diárias? É ou não orientação e opção do Governo abrir a possibilidade de facilitar os despedimentos individuais sem justa causa, numa falsa resposta à precariedade, uma vez que tal coloca todos os trabalhadores em situação precária?

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!

O Orador: — É ou não opção e orientação do Governo, ao contrário do que se comprometeu, fragilizar ainda mais a contratação colectiva? Por exemplo, o princípio do tratamento mais favorável, que foi uma das propostas apresentadas pelo Partido Socialista aquando da discussão do Código do Trabalho, vai ser alterado? Ele vai manter-se ou vai agravar-se ainda, como está indicado no Código? É opção e orientação do Governo seguir a linha de fragilização da organização sindical, limitando o espaço de intervenção democrática e os direitos consagrados na Constituição? Estas são algumas questões concretas que precisam de resposta.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Espero que o Sr. Ministro a dê, porque é isso que importa hoje em termos de esclarecimento da Assembleia da República e dos trabalhadores.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Laranjeiro.

O Sr. Miguel Laranjeiro (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, o Partido Comunista Português decidiu agendar para hoje um debate sobre os direitos dos trabalhadores e as perspectivas do Governo em matéria de legislação laboral. Não é a primeira vez que discutimos estas matérias em Plenário. O emprego, a qualidade do emprego, as relações laborais, entre outras, têm sido áreas de debate aberto e franco neste Parlamento.
Em todas as discussões é importante sistematizar a base do problema. E nesta matéria, aquilo com que nos confrontamos, nós e todos os países da União Europeia, é com um mercado crescentemente global, onde o trabalho e o emprego sofrem mudanças e desafios mais complexos do que no passado. Estas mudanças são uma realidade à qual não é possível virar as costas. O pior que Portugal poderia fazer, o pior que poderia acontecer aos trabalhadores portugueses e às empresas era considerarmos a inexistência desta realidade, fecharmo-nos numa concha alheios à mudança e à evolução do mundo, esperando que a realidade se adaptasse às nossas intenções, por muito válidas que sejam. Os portugueses sabem que o pior seria virar as costas ao problema, na esperança vaga que ele desaparecesse por si só.
Mas importa reconhecer que estas alterações têm consequências na vida dos cidadãos e dos trabalhadores, traduzindo-se muitas vezes num aumento da precariedade e da insegurança laboral, à qual deve ser dada uma resposta, e uma resposta ponderada e positiva.
Provavelmente, na descrição do problema e do desafio estaremos praticamente todos de acordo. No que divergimos, como se viu já neste debate, é na forma como enfrentá-lo.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: No que diz respeito à legislação laboral e à revisão do Código do Trabalho, o que o Governo propôs foi uma comissão independente, que preparou um relatório de progresso, que serve de apoio e de aconselhamento ao Ministério do Trabalho, mas o debate e a discussão será sempre em sede de concertação social, com os parceiros sociais e, politicamente, nesta Casa, no Parlamento português.

Aplausos do PS.

Aliás, é importante referir que foi este Governo, um Governo do Partido Socialista, que mais acordos na concertação social obteve em menos tempo. Desde a formação profissional à segurança social, passando pelo acordo sobre a fixação e evolução da remuneração mínima mensal garantida. Estes acordos são a prova de que a concertação social está viva e dinâmica e de que o diálogo com todos os parceiros sociais tem uma importância decisiva para o Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O combate em que todos estamos envolvidos é o da modernização da sociedade portuguesa, da melhoria das condições de vida, do desenvolvimento económico com coesão e consciência social. Não é um combate fácil, é exigente, e só com a participação de todos é que será possível vencê-lo de uma forma rápida e eficaz. O Partido Socialista estará sempre na primeira linha deste desafio.

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Muito bem!

O Orador: — O que está verdadeiramente em causa no debate de hoje é a forma como damos garantias de emprego, de mais e de melhor emprego, a todos os portugueses, desde logo aos mais jovens.
Como promovemos a competitividade e como construímos uma solução mais válida para o desafio da globalização.
Uma reforma laboral nunca será a única panaceia para a resolução de problemas de competitividade da economia nacional. Sejamos claros. É importante, mas não é tudo. Por isso, não ignoramos as questões relativas à qualificação e à formação profissional dos recursos humanos, à aprendizagem ao longo da vida, mas também à melhoria dos níveis de gestão empresarial de uma grande parte das empresas portuguesas e à eficácia das políticas activas de emprego.
Melhor economia e mais crescimento económico criarão mais e melhor emprego. Mais qualificações garantem aos trabalhadores mais instrumentos de defesa face a um mundo em mudança. Mais formação permite mais adaptabilidade a novas necessidades e exigências. Os portugueses sabem bem que é assim, e a prova do que estou a dizer é a adesão maciça ao programa Novas Oportunidades. Centenas de milhares de trabalhadores portugueses estão inscritos nesta nova oportunidade, porque sabem que é melhor para o seu futuro e querem novos instrumentos para enfrentar esse mesmo futuro. Convido, aliás, os Srs. Deputados do Partido Comunista Português, que sugeriu este debate, a conviver com a experiência que os trabalhadores portugueses estão a desenvolver nos processos de reconhecimento e de certificação de

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competências ou nas acções de formação profissional. Perceberão nesse dia que esses trabalhadores — os mesmos de que os Srs. Deputados falam — são os primeiros a reconhecer que o aumento das suas qualificações é a melhor forma de defender o seu próprio emprego ou de encontrar um novo.

Aplausos do PS.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não aceitaremos a desregulação do mercado de trabalho, na mesma medida em que não concordamos com o imobilismo proposto pelo Partido Comunista, que agendou este debate. A conciliação entre estes dois interesses, ou seja, entre a adaptabilidade interna das empresas num mercado global exigente e a necessária garantia da defesa dos interesses dos trabalhadores, será sempre o objectivo central do Partido Socialista.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Reconhece que são interesses conflituantes, portanto!

O Orador: — Sobre o conceito da flexissegurança, já foi dito pelo Governo que não haverá cópia de modelos predefinidos.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Imagino! O vosso modelo ainda deve ser pior!

O Orador: — Esta é uma matéria da reserva dos Estados-membros da União. Não há soluções que sirvam a todos, devendo ser tomado em conta a história das relações laborais, a cultura dos povos ou, até, os níveis de formação de todos os intervenientes. Um conjunto vasto de realidades que exigem diálogo social.
Tudo faremos para reforçar a protecção dos direitos dos trabalhadores, desde logo pelo seu direito ao emprego, e será sempre nesse sentido que se farão as reformas necessárias, que passarão também pelo Parlamento.
Como ontem referiu, desta tribuna, um camarada meu de bancada, «antes da flexibilidade virá sempre a segurança do trabalhador».

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.

O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, ouvi o Sr. Ministro do Trabalho com atenção e constatei a diferença que existe entre o Ministro Vieira da Silva e o Deputado Vieira da Silva.

Vozes do PCP: — Isso é verdade!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Nesse aspecto, tem razão!

O Orador: — Nem valerá a pena reproduzir mais uma vez todas as coisas que o senhor e outros camaradas seus, como o ex-Deputado Paulo Pedroso, disseram acerca das alterações ao Código do Trabalho feitas pelo anterior governo,…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Mas pode lembrar porque não há problema!

O Orador: … nem lembrar a diabolização que lançaram sobre muitas das matérias que estão hoje em discussão.
Sr. Ministro, o tema que hoje discutimos é actual e devia fazer corar de vergonha o Governo e o Partido Socialista pela incoerência das vossas posições nestas e noutras matérias e pela responsabilidade quase exclusiva do falhanço de algumas das políticas públicas de criação de emprego e de promoção do desenvolvimento económico e social do nosso país.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Escusava de ouvir isto, Sr. Ministro!

O Orador: — Como disse há pouco, nem sequer é necessário continuar a lembrar algumas das coisas que os senhores foram dizendo no passado sobre estas e outras matérias.
Precisamente por tudo o que digo, o PSD vem para este debate com todo o à-vontade, assumindo que às vezes não se importa de estar em minoria para não ter de mudar de opinião e de convicções, como acontece com o Governo e com o Partido Socialista.

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Vozes do PSD: — Muito bem!

O Orador: — Não perderei mais tempo com o vosso passado, lembrando a diabolização que fizeram às anteriores alterações ao Código do Trabalho, o que diziam sobre a diminuição dos direitos dos trabalhadores, aquilo a que chamavam de precarização e inviabilização das relações de trabalho, a força exagerada que diziam ser dada às entidades patronais, etc.
O PSD, como partido de futuro, gostava de ser esclarecido em relação ao seguinte: o Governo assume ou não o compromisso de só apresentar propostas sobre estas matérias após a sua discussão em sede de concertação social? Ou reafirma o Sr. Ministro que, se não existir consenso, o Governo não ficará à espera desse consenso, como já disse nas últimas semanas? Quais vão ser as propostas concretas do Governo? Já tem alguma coisa para dizer ao Parlamento sobre algumas das propostas plasmadas no Livro Branco? Vai tentar importar a papel químico algum modelo do exterior sobre algumas destas matérias, sem ter em conta a especificidade portuguesa? Gostava de saber, por exemplo, o que pensam o Sr. Ministro e o Governo sobre a facilitação dos despedimentos derivada da inaptidão. O mesmo se diga sobre a redução dos salários, sobre o fim do horário diário e sobre o afastamento das organizações de trabalhadores no diálogo com os empregadores. Sobre estas e outras matérias, os senhores, que na oposição tinham opinião pronta sobre tudo, já nos podem adiantar alguma coisa neste debate? Sr. Ministro, o que tem a dizer sobre aquilo que algumas pessoas consideram um escândalo (para não dizer que é publicidade enganosa), isto é, o facto de, ao iniciarmos o 2.º semestre do ano, ainda não existirem condições para aplicar devidamente o Programa Operacional «Potencial Humano»? É que, se todos concordamos com a necessidade da aposta e valorização da qualificação e da adaptabilidade para um modelo de desenvolvimento sustentado em mão-de-obra qualificada, não faz sentido o Governo falhar também nestas matérias.
Finalmente, Sr. Ministro, gostava de saber se o Governo fez ou não um acordo secreto com alguns parceiros sociais sobre estas matérias, em especial, com alguma entidade representativa de empresários. Se o fez, podemos conhecer alguns pormenores do mesmo?

Aplausos do PSD.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quando é o PSD a fazer uma pergunta destas…

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho, peço-lhe que não leve a mal o facto de fazer esta intervenção olhando para si com alguma ironia. De facto, para preparar este debate fui ler as intervenções do PS e de V. Ex.ª a propósito da aprovação do Código do Trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Isso é que é pior!

O Orador: — Fui ler aquela famosa declaração de voto que vários Deputados do Partido Socialista e V.
Ex.ª produziram quando foi aqui votado o Código do Trabalho.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Isso até é deselegante!

O Orador: — Fui ler algumas entrevistas em que, a propósito de tudo e de nada, os senhores falavam nas inconstitucionalidades que existiriam no Código do Trabalho.
Agora, ao ler algumas das suas declarações e o Relatório de Progresso da Comissão do Livro Branco das Relações Laborais, o Sr. Ministro só me faz lembrar duas personagens muito conhecidas do humor português, a Olívia patroa e a Olívia trabalhadora. Na verdade, o Sr. Ministro foi quem, na anterior maioria, melhor encarnou a personagem da Olívia trabalhadora e é quem hoje melhor encarna a personagem da Olívia patroa! A verdade, porém, é que uma coisa não bate certo com a outra! Tive ocasião de ler um conjunto de matérias do Relatório de Progresso e penso que não se trata, hoje, do mesmo Vieira da Silva. Ou houve um fenómeno de clonagem ou o substituíram por alguém, por um primo, eventualmente. Mas não é possível que a mesma pessoa diga, no espaço de três anos, uma coisa e o seu contrário.

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Paulo Pereira Coelho (PSD): — Se o Van Zeller manda, o Governo escreve!

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O Orador: — Ora, sabendo que o Sr. Ministro não leva a mal esta ironia, aproveito para lhe fazer uma pergunta relativa à atitude política.
Li este Relatório de Progresso feito no âmbito da Comissão do Livro Branco das Relações Laborais e penso que há, de facto, uma atitude que não compreendo e que a Câmara tem de denunciar. Na verdade, não é possível que o Governo, em matérias eminentemente técnicas, como, por exemplo, as relativas ao novo aeroporto, decida primeiro e mande, depois, fazer estudos para sustentar a sua decisão. Por outro lado, em matérias eminentemente políticas, de conteúdo político e de escolha política, como acontece com o financiamento do Serviço Nacional de Saúde e com as alterações ao Código do Trabalho, o Governo adopta uma técnica que é exactamente oposta, dizendo o seguinte: «Vamos fazer uns relatórios e umas comissões e depois lá havemos de decidir. Depois, veremos o que vamos pensar e decidir sobre isto.»

O Sr. João Rebelo (CDS-PP): — Exactamente!

O Orador: — Percebo que isso é a única coisa que justifica o atraso de mais de dois anos que sofreu este Relatório de Progresso. Lembro que o programa de VV. Ex.as dizia que o Governo queria «Criar uma comissão independente encarregada de avaliar os impactos do Código do Trabalho nas relações laborais, tendo em vista o lançamento, no termo do primeiro ano da legislatura» — lembro a quem esteja distraído que estávamos em 2005! — «de um Livro Branco sobre as Relações Laborais em Portugal». Ora, estamos em Julho de 2007 e a única coisa que temos é um Relatório de Progresso parcial. Ou seja, nem sequer o Livro Branco sobre esta matéria nós temos! Percebo que o Governo, que nesta matéria estava cheio das ideias da «Olívia trabalhadora Vieira da Silva» quis, agora, pôr isto de lado. Mas, Sr. Ministro, não é possível que um membro do Governo de Portugal, para mais responsável pela matéria do trabalho, não responda directamente a três ou quatro questões sobre o seu pensamento.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Antes de mais, gostava de saber o que é que o Sr. Ministro pensa sobre a flexibilização do horário de trabalho. Admite que se extinga o artigo 168.º do Código do Trabalho, que proíbe que os horários de trabalho atinjam 24 horas por dia? Porque esgotei o meu tempo, deixarei para a segunda ronda um conjunto de outras questões que lhe quero colocar.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados, o Sr. Ministro tem obrigação de deixar hoje claro quais são as suas linhas tendenciais de consenso.
Creio que, da tribuna, falou em muitos pressupostos. Aliás, na mesma linha do tal Relatório de Progresso. Como tal, o que lhe quero perguntar directamente é se essas linhas tendenciais de consenso são aquelas que correspondem ao programa eleitoral de acordo com o qual o senhor se candidatou e foi eleito, ou seja, ao programa eleitoral do Partido Socialista, que previa exactamente a revisão do Código do Trabalho, de acordo com as propostas do PS na oposição. Neste Relatório, contudo, muito pouco encontramos desse programa eleitoral.
Lembra-se, com certeza, o Sr. Ministro, aquando da discussão do Código do Trabalho, de que o então ministro falava da necessidade absoluta daquele Código, tendo em vista o aumento da produtividade e a competitividade das empresas. Curiosamente, também este Relatório e a Comissão que o elaborou (nomeada pelo seu Governo) dizem que o objectivo central é o de propor um conjunto de medidas de regulação do mercado de trabalho que promovam a competitividade da economia portuguesa e a coesão social do País.

O Sr. Secretário de Estado da Segurança Social (Pedro Marques): — Ah! Fala da coesão social!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Como tem mais uma palavrinhas, já ficam descansados?!

A Oradora: — Acontece que as propostas que são feitas neste Relatório recorrem a um novo «dicionário», a algo a que o Sr. Ministro tem feito imensa propaganda: a adaptabilidade. Esta é a coisa nova! Deixando para trás todos os outros argumentos, o nome da «flexicoisa» será a adaptabilidade! E o que nos propõem é a adaptabilidade nos despedimentos, ou seja, a total liberalização dos despedimentos, os «des-

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pedimentos na hora», os despedimentos a gosto. Quanto aos salários, permitem que os patrões os negociem em baixa. Isto significa não reconhecer que, numa relação de trabalho, o patrão e o empregado não são a mesma coisa — e voltamos à história do elo mais fraco e do artigo 4.º.
Depois, o subsídio de férias, as férias reduzidas são uma série de propostas de adaptabilidade, a tal nova «flexicoisa».
Por último, quero colocar-lhe a questão da concentração de horários. Sr. Ministro, se o «Código Bagão Félix» retomou a legislação de 1914 — porque as leis de 1915 já instituíam um regime de duração de trabalho de 10 horas diárias e, depois, em 1919, de 8 horas diárias, isto é, 45 horas semanais, portanto, o «Código Bagão Félix» é de 1914 — , pergunto-lhe se, com este novo Código, quer retornar a 1906. É que, em 1907, a 3 de Agosto, consagrou-se expressamente, pela primeira vez, a obrigatoriedade do descanso semanal de, pelo menos, 24 horas. Pergunto, então: onde nos situamos e que coragem reformista é esta?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.

O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: Este Governo, ao longo dos seus dois anos de vida, tem vindo a dar sinais evidentes de uma vocação centralista e neo-liberal, que, passo a passo, vem agredindo alguns dos princípios e valores democráticos e vem concretizando uma vontade indomável de desmantelar o Estado social.
As «bandeiras» agitadas na campanha eleitoral de salvar o Estado social, do combate às desigualdades sociais, de tornar o País mais competitivo mas sem perder o horizonte da solidariedade, já há muito que foram esquecidas ou mesmo atiradas para a reciclagem.
A postura do Governo e da maioria que o suporta conseguiram fomentar a divisão entre sectores público e privado, alimentada e explorada com muita propaganda, caracterizando-se os primeiros como «malandros» que nada fazem, que são os mais privilegiados e responsáveis pela crise, e os segundos como os sacrificados perante a crise. Estes e outros argumentos serviram para legitimar toda uma política de reestruturação na Administração Pública, profundamente injusta e lesiva para o próprio interesse público.
A realidade laboral portuguesa dos dias de hoje é caracterizada por uma política nefasta que aponta em todos os sentidos contra os trabalhadores.
A crescente precariedade vivida pelos trabalhadores e o desrespeito pelos seus direitos têm como principal causa as opções políticas dos vários governos, cujo objectivo único é o de atacar e reduzir os direitos dos trabalhadores, promovendo várias alterações ao quadro legal e que teve até agora o seu momento alto no Código do Trabalho. Dizemos até agora porque, ao contrário do que o Partido Socialista prometeu durante o debate do Código do Trabalho e, depois, após as eleições de 2005, ou seja, que iria propor alterações ao Código nos seus aspectos mais negativos, nada disso se vai concretizar.
O que o Governo e o PS fazem é, com base na flexigurança, agravar ainda mais aquilo que de pior existe no Código do Trabalho.
Em vésperas da reunião dos Ministros do Emprego e Assuntos Sociais, realizada em Guimarães, o Governo deu a conhecer o Relatório de Progresso da Comissão do Livro Branco das Relações Laborais, que tem como base e prioridade alargar a todos os trabalhadores as políticas anti-sociais que está a impor na Administração Publica.
Seguindo orientações bem definidas, prepara-se a flexigurança e com ela vem a liberalização dos despedimentos individuais sem justa causa e a arbitrariedade na fixação de horários, carreiras, remunerações e condições de trabalho.
São feitas propostas de alteração da legislação laboral procurando aplicar a flexigurança, facilitando os despedimentos sem justa causa, alargando o conceito de inaptidão, liberalizando o despedimento na hora, fragilizando a contratação colectiva, acelerando os processos de caducidade dos contratos colectivos e fragilizando a actividade dos sindicatos.
A proposta pretende diminuir o número de dirigentes que podem utilizar o tempo previsto na lei para a actividade sindical; impõe a desregulamentação e a arbitrariedade na fixação das condições de trabalho, sobretudo ao nível dos horários e das remunerações; elimina o conceito de horário diário de 8 horas, passando a avaliação do horário a ser feita apenas no plano semanal e anual, obrigando um trabalhador a ter de estar disponível para a empresa até às 24 horas diárias.
Por outro lado, pretende abrir a possibilidade de redução dos salários, não só dos salários reais, como tem acontecido nos últimos sete anos, mas dos próprios salários nominais.
Sr. Ministro, no programa da Presidência portuguesa da União Europeia é apresentada como prioridade a conciliação entre trabalho e vida privada e familiar.
Sr. Ministro, a pergunta que lhe coloco é esta: como é possível conciliar trabalho e vida familiar quando a flexigurança aponta em sentido contrário? Este Governo consegue, pela calada da noite, ou melhor, pela «sombra das férias», fazer os maiores atentados de que há memória no que concerne aos direitos dos trabalhadores, contrariando o Capítulo III da própria Constituição da República.

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O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Gostava de começar por me referir às questões colocadas pelo Deputado Francisco Lopes.
Antes de mais, gostaria de dizer que é muito frequente que quem faz estas intervenções reproduza o seu modelo de raciocínio, a sua forma de ver a vida, a organização social, e o Partido Comunista faz isso com muita eficiência.
Li num texto do Partido Comunista — e foi aqui repetido textualmente — a seguinte frase: «A Comissão do Livro Branco foi nomeada pelo Governo, o relatório foi por si encomendado, as conclusões foram por si acompanhadas, publicadas com o seu acordo e na data que combinou. É, assim, um relatório que responsabiliza inteiramente o Governo». Quem tem na cabeça a ideia do centralismo democrático só pode pensar assim.

Protestos do Deputado do PCP Francisco Lopes.

Quem não percebe a composição da comissão, quem não leu a resolução do Conselho de Ministros, que fixou o timing do trabalho desta Comissão, é que pode tentar fazer passar a ideia de que não está escrito que esta tem inteira independência técnica e científica. Está lá escrito!

Protestos do PCP.

E mais, Sr. Deputado: quem escreve isto demonstra um profundo desrespeito por um conjunto de personalidades que aceitaram prestar um serviço público de enorme importância e fizeram-no empenhando a sua credibilidade técnica e científica.

Aplausos do PS.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Não vá por aí!

O Orador: — Os senhores acusam os outros de fazerem o que os senhores fazem nas instituições que controlam.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Diga lá, então, por que é que não foi em Maio?

O Orador: — Sr. Deputado, o timing — aliás, conhecido — para a discussão às alterações ao Código do Trabalho é aquele que o Governo fixou e não o que o Partido Comunista vai tentar impor.
Podem fazer, até ao fim deste debate, todas as perguntas que entenderem e eu respondo às que são adequadas ao programa de trabalho que o Governo aprovou e ao qual está comprometido, pelo respeito que tenho pela Comissão que foi nomeada com uma exigente e difícil tarefa.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — O Sr. Ministro veio aqui para não responder a nada?!

O Orador: — Uma vez que o relatório é da Comissão, não vou debater, ponto por ponto, as apreciações que foram feitas, algumas delas resultantes de leituras rápidas, outras apenas da leitura dos comentários já feitos por alguém a essa proposta. Mas devo dizer que a insinuação que foi feita de que quem elaborou este relatório defende ou sequer admite a hipótese de uma jornada de trabalho diário sem limite é de profunda má-fé ou, então, de profunda ignorância sobre o que está escrito naquele Relatório.

Aplausos do PS.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — É o que está lá escrito!

O Orador: — O que está escrito, de forma clara, é que a lei deve fixar os limites diários de tempo de descanso e os limites semanais.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Duas horas de descanso?!

O Orador: — Só quem não saiba ler português ou tenha um profunda má-fé é que não o entende. Mas, repito, não vou discutir aqui cada um dos pontos do relatório da Comissão, que continua a merecer-me um profundo respeito.

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O Sr. Jorge Machado (PCP): — Não vai porque não quer admitir que não concorda com o relatório!

O Orador: — É certo que defendo — e esta resposta serve para muitas intervenções — que as nossas relações laborais precisam de incorporar mais fortemente o conceito de adaptabilidade.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem o viu e quem o vê!

O Orador: — Explico o que é o conceito de adaptabilidade.
Por exemplo, «durante seis meses, seguidos ou interpolados, ao longo de um período de 12 meses, o período semanal de trabalho pode ser ampliado até ao limite de 50 horas por semana, de segunda a sextafeira, com o limite de 10 horas de trabalho por dia. O período de referência de 12 ou 6 meses conta a partir da primeira utilização». Não se trata de uma proposta do Governo, mas de uma citação do regime de adaptabilidade do contrato colectivo de trabalho do sector do calçado, assinado em 2006, por uma federação sindical filiada na CGTP. É este o conceito de adaptabilidade.
Já que agora estamos na linha das citações, querem mais?!

Aplausos do PS.

Um outro contrato objecto de revisão global em 2006 por uma federação de sindicatos afecta à CGTP regula expressamente a «possibilidade de adopção de um regime especial de adaptabilidade se uma maioria de 60% dos trabalhadores não se opuser por escrito ao plano de adaptabilidade.» Estes contratos colectivos regulam o período normal de trabalho definido em termos médios, com um período de referência de 12 meses, e este é do sector têxtil e cordoaria.
Srs. Deputados, poderia fazer mais citações, mas estas chegam para ver o que penso que pode ser, no interesse dos trabalhadores e da economia nacional, um modelo de adaptabilidade.
O Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte disse que eu deveria corar de vergonha pelo debate que hoje estamos a fazer. Sr. Deputado, cite todas as vezes que intervim, tudo o que escrevi, tudo o que subscrevi na anterior legislatura que assumo integralmente tudo o que lá está.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Isso é impossível!

O Orador: — Se alguém devia corar de vergonha era uma maioria que lançou um País num debate tremendo sobre a revisão laboral e que conseguiu produzir um Código que, ao fim destes anos, todos, mas todos, consideram que nada de novo produziu, que nenhuma melhoria introduziu no sistema de relações laborais em Portugal, nem do lado dos direitos dos trabalhadores, nem do lado da promoção da competitividade das empresas.

Aplausos do PS.

Nada de novo introduziu e hoje todos o consideram uma gloriosa oportunidade perdida!

O Orador: — Sr. Deputado Mota Soares, não sei como é que integra essa revisão legislativa nessa sua citação da RTP Memória, mas o Código não é «Olívia» nenhuma! É um Código que não serviu para nada! Serviu apenas para uma tentativa de alterar as relações de forças no meio laboral, que, ainda por cima, foi totalmente falhada.

Aplausos do PS.

O Sr. Francisco Lopes (PCP): — Agora quer melhorar?!

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Ministro, decida-se: ou é bom ou é mau!

O Orador: — Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, gostaria de dizer com toda a clareza que se a Sr.ª Deputada quiser saber quais são as orientações globais sobre a revisão do Código que o Governo defende, é muito simples: elas estão plasmadas na resolução do Conselho de Ministros que solicitou o livro branco da reforma da legislação laboral. Estão lá todos os pontos e assumimo-los completamente, obviamente sem pôr em causa o desenvolvimento dos trabalhos desta Comissão.
Todos sabem, nesta Assembleia, os que a conhecem, que se trata de uma Comissão credenciada do ponto de vista técnico e científico e que tem uma ampla representatividade, do ponto de vista das sensibilidades sociais, acerca das relações laborais.
Sr. Deputado, desafio-o a provar quando e como, alguma vez, eu ou algum membro do Governo demos alguma instrução concreta sobre a forma como este Relatório deveria ser elaborado, ou sequer o relatório

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final.
Mas, mais uma vez — porque voltamos sempre ao mesmo —, referindo-me à questão da adaptabilidade, dos direitos, da flexissegurança, eu era capaz de subscrever, Sr.ª Deputada Mariana Aiveca, uma citação que lhe passo a ler: «O melhor é partirmos para as negociações de forma positiva, cedendo aqui e ganhando ali. Dói-me quando vejo alguns sindicalistas a dizer não, sem apresentar alternativa. Não conheço nenhum dirigente sindical a tempo inteiro que esteja desempregado, e assim é fácil haver sindicalismo e dizer não a tudo. Têm de dar o salto. Caso contrário, as empresas continuam a fechar e os patrões continuam a atirar o ónus para cima dos sindicatos». Sabe quem é que disse isto, Sr.ª Deputada?

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Não é minha essa citação, não me faz corar!

O Orador: — Foi o coordenador da Comissão de Trabalhadores da Autoeuropa, António Chora, que já se sentou aí, na sua bancada parlamentar.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Andrade Miranda.

O Sr. Carlos Andrade Miranda (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, é exactamente sobre adaptabilidade e flexibilidade que lhe quero colocar algumas questões, mas não sem antes dizer que não vou entrar em citações de V. Ex.ª, enquanto Deputado da oposição e Deputado da bancada do Partido Socialista, precisamente sobre o conceito que então tinha de adaptabilidade, nem lhe vou dizer, Sr. Ministro, graças a que é que foi possível o Sr. Ministro fazer hoje essa citação desse contrato colectivo de trabalho, adoptando um conceito de adaptabilidade que só graças ao Código do Trabalho existe e está hoje em prática.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Está enganado!

O Orador: — A prova provada de que este Código acompanha rigorosamente o momento histórico em que vivemos, Sr. Ministro, é o facto de o relatório preliminar da Comissão do Livro Branco não lhe apontar praticamente defeito ou omissão nenhuma. Cosmética, sim! Há aqui propostas de nova sistematização, há propostas de aprofundamento de conceitos que estão já no Código do Trabalho, mas não há ruptura, não há fractura. Esta Comissão não rompe com o Código do Trabalho vigente.
O PSD tem presente o que a este propósito se contém no relatório desta Comissão precisamente sobre flexibilidade interna e sobre flexibilidade externa. O PSD tem presente a comunicação, de 27 de Junho, da Comissão Europeia ao Conselho, sobre flexissegurança. O PSD tem também presente as conclusões da Reunião Informal de Ministros do Emprego e Assuntos Sociais, que decorreu em Guimarães na semana passada, no sentido de ser conseguida, no plano da flexissegurança, uma abordagem integrada e equilibrada, com combinações adequadas de flexibilidade e segurança. O PSD tem presente a inevitabilidade histórica da introdução de medidas de flexibilização das empresas, que permitam adaptar-se às novas condições de mercado, o que implica também, inevitavelmente, a flexibilização das relações de trabalho.
Mas o PSD tem também presente que o caso português é um caso muitíssimo especial, que a Comissão do Livro Branco retrata de forma sintética, que eu não posso deixar de ler: «As oportunidades de emprego são poucas e segmentadas. O desemprego de longa duração é maioritário. O nível dos salários reflecte o nível de qualificações dos trabalhadores e empresários e da eficiência (…)».

O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou concluir imediatamente, Sr. Presidente.
Termino, Sr. Ministro, pedindo-lhe uma comunicação política a esta Câmara no sentido seguinte: neste contexto, tendo em conta o caso especial português e as dificuldades económicas de Portugal, qual é o modelo que V. Ex.ª irá propor nesta matéria à Comissão, em Setembro? Um modelo importado? Um modelo especial?

O Sr. Afonso Candal (PS): — Se já soubesse, propunha!

O Orador: — Que tipo de solução vai propor? Gostaria de saber se prefere uma directiva comunitária sobre esta questão da adaptabilidade e, sobretudo, em que medida é que a posição do Governo sobre esta matéria, no quadro da União Europeia, vai influenciar directamente a textura da norma sobre adaptabilidade e flexibilidade no âmbito da revisão do Código do Trabalho.

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Machado.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo , Sr.as e Srs. Deputados: Começa a ficar claro neste debate que o Governo concorda com o relatório. A verdade é que o Governo concorda e já acata algumas das propostas apresentadas.

O Sr. Afonso Candal (PS): — Está escrito há 15 dias!

O Orador: — Sim, Sr. Ministro, o Governo, no plano do concreto, está a aplicar a «cartilha» neoliberal encomendada pelos «monges do Beato» e entregue pela dita Comissão. Os «monges» pedem, a Comissão entrega, o Governo «abençoa» e concretiza.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O Sr. Ministro pode afirmar mil vezes que é apenas um relatório, que não é definitivo. Mas para os trabalhadores da Administração Pública a flexissegurança, a precariedade, a liberalização dos despedimentos e o ataque aos sindicatos são já propostas concretas deste Governo.
Sr. Ministro, basta comparar o que o relatório propõe e aquilo que consta da proposta de lei quanto à revisão do regime jurídico dos vínculos, de carreiras e remunerações para perceber que assim é.
Vejamos alguns exemplos. O relatório propõe a criação de novas formas de contratos, leia-se, «legalização do trabalho precário». O Governo concretiza na proposta de lei para a Administração Pública, ataca o vínculo estável dos trabalhadores e promove a precariedade.
A Comissão propõe a possibilidade de redução de salários por acordo directo entre o trabalhador e a entidade patronal. Na Administração Pública, o Governo propõe a negociação directa da posição remuneratória.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É um facto!

O Orador: — O relatório quer reduzir o número de dirigentes que podem ter crédito de horas para actividade sindical. O Governo, com a proposta de lei n.º 145/X, quer limitar o exercício da liberdade sindical, retirando crédito de horas aos dirigentes.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É verdade ou não é?

O Orador: — Por fim, quanto aos despedimentos, Sr. Ministro, o relatório propõe o alargamento dos motivos do despedimento. Fala de inaptidão, para alargar as causas de despedimento sem justa causa. O Governo, na proposta de lei, além de permitir que todos os anos, por via dos mapas de pessoal, os serviços possam despedir os trabalhadores, prevê o despedimento por inaptidão, ou seja, por insuficiência do desempenho pelos trabalhadores da Administração Pública.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — É o vanguardismo do Governo!

O Orador: — Sr. Ministro, a hipocrisia tem limites! O Governo, ao contrário do que o Sr. Ministro pretende afirmar, não só concorda com os despedimentos sem justa causa como já está a tentar implementá-los na Administração Pública. Qualquer semelhança entre este relatório intercalar e a proposta que o Governo já apresentou quanto à Administração Pública não é pura coincidência. É pura realidade!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O Sr. Ministro pode utilizar a retórica que quiser. Pode usar e abusar da demagogia, do logro e do sofisma, mas não consegue disfarçar a semelhança que existe da linguagem utilizada e a semelhança que existe entre as propostas apresentadas no relatório e as propostas que o Governo adopta para a Administração Pública.

O Sr. Bruno Dias (PCP): —Está bem à vista!

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Sr. Ministro, só me ocorre uma palavra para este comportamento: vergonha! Depois da promessa do PS quanto à legislação do trabalho, depois do que PS disse nesta Assembleia,

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depois do que o Sr. Ministro disse, aquando da discussão do Código do Trabalho da direita, vem agora o Sr. Ministro apresentar uma proposta de lei que visa piorar o Código do Trabalho. Tenha vergonha, Sr.
Ministro!

Aplausos do PCP.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quem o viu e quem o vê!

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, como é óbvio, não venho aqui fazer-lhe perguntas sobre matéria do relatório. O Sr. Ministro tem uma responsabilidade política, eu também tenho uma responsabilidade política, o papel dos técnicos aos técnicos, o papel dos políticos aos políticos.
O Sr. Ministro diz que tem muita estima e consideração pelos profissionais que fizeram o relatório. É exactamente isso mesmo que eu sinto. A estima e a consideração que refere não é menor do que a minha.
Fui até, nalguns casos, aluno de algumas pessoas que lá estão e tenho a maior consideração em relação a eles.
Mas é essencial, como lhe disse há pouco, Sr. Ministro, conhecer o pensamento do Governo sobre estas matérias.
O que não posso permitir, como penso que qualquer Deputado não pode permitir, é que o Governo queira utilizar nesta matéria um bocadinho o método da sonda. Não diz o que pensa, não diz o que quer e põe cá fora uns relatórios com umas «sondas», a ver se pega, a ver o que as pessoas dizem sobre isto. É por isso que me parece essencial, na sua componente política, Sr. Ministro, conhecer o seu pensamento.
Sr. Ministro, penso que há coisas que estão muito bem feitas e muito bem pensadas neste relatório. Por exemplo, gostei de ler, neste relatório, que a matéria do artigo 4.º, do tratamento mais favorável dos trabalhadores, deve ser mantida na futura revisão do Código do Trabalho.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Leu mal!

O Orador: — Quem acha que isso não deve ser mantido é o Sr. Ministro Vieira da Silva, ou pelo menos achava, quando se sentava na bancada do PS.
Por exemplo, a matéria que diz respeito à sobrevigência dos contratos colectivos de trabalho, geralmente tratada por matéria da caducidade, foi uma matéria que o Partido Socialista verberou e contra a qual votou quando era oposição, aliás, como o fez em relação ao artigo 4.º,…

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — E bem!

O Orador: — … tendo dito «o que Maomé não diz do toucinho» sobre ela, que era inconstitucional, etc., e este relatório diz que, afinal, faz sentido mantê-la. Portanto, se calhar, há um conjunto de matérias neste relatório que me parece que até faz algum sentido manter.
Agora, o que quero conhecer é o pensamento do Governo, dos políticos, sobre esta matéria.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Muito bem!

O Orador: — Sobre o artigo 4.º e sobre a sobrevigência, Sr. Ministro, não lhe vou colocar questões.
Conheço o seu pensamento no passado e se evoluiu, ainda bem, fico contente.
Mas gostaria de colocar-lhe uma pergunta sobre uma ideia que está neste relatório e que até agora não ouvi referida em sítio algum — mesmo na comunicação social, que tem feito trabalhos muito interessantes sobre esta matéria. Gostaria de conhecer o pensamento político do Governo sobre uma linha que vem no relatório relativamente a aspectos conexos do Código do Trabalho e que tem a ver com a matéria das fontes do Direito do Trabalho e dos contratos colectivos.
Diz, a páginas tantas, que é importante estudar, até, eventualmente, a eliminação dos regulamentos de condições mínimas. Pessoalmente, tenho algumas dúvidas quanto a isto, mas estou aberto à discussão.
Diz que pode haver, quanto aos regulamentos de extensão, a instituição de um tratamento diferenciado, conforme os contratos abranjam muitos sindicatos e muitos trabalhadores ou não, ideia que me parece interessante e vale a pena ser estudada, e, depois, há também aqui um ponto que me parece muito interessante, respeitante à clarificação da possibilidade de adesão individual de trabalhadores a contratos colectivos de trabalho, adesão individual essa que pressupõe, obviamente, que o trabalhador não faz parte do sindicato que subscreveu essa convenção.
Ora, este é um princípio que me parece muito interessante. É um princípio com o qual, pessoalmente, concordo há muito tempo — tenho até algumas coisas escritas sobre isso —, mas, acima de tudo, pareceme um princípio muito interessante de ser discutido.

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Agora, o que é essencial é saber o pensamento político do ministro da tutela, dos políticos, sobre este ponto. É uma matéria sobre a qual o Governo vai avançar na concertação social? Será que a adesão do princípio de filiação é uma matéria que o Governo vai pôr em cima da mesa? Pessoalmente, espero que sim, mas, acima de tudo, quero é conhecer o seu pensamento sobre isto, Sr. Ministro.

Aplausos do CDS-PP. O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Aiveca.

A Sr.ª Mariana Aiveca (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social, uma primeira nota relativa à leitura que fez de uma intervenção do meu camarada António Chora, ou de uma entrevista que este deu. Não é comigo e por isso não me faz corar, sendo que nada do que ali está dito retira direitos aos trabalhadores. Mas sempre lhe direi que, no próximo mês de Setembro, terá oportunidade de lhe reler as intervenções cara a cara, como certamente o António Chora lhe relembrará algumas das suas.
Se falarmos da adaptabilidade, quem tem vindo a adaptar-se é exactamente o Governo do Partido Socialista e é a bancada do Partido Socialista, porque o que era um «míssil», um «petardo», na declaração de voto sobre o Código do Trabalho, na célebre declaração que o Sr. Ministro subscreve, deixou de o ser.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Exactamente!

A Oradora: — O Código precisava de ser «desarmadilhado», mas o que temos neste relatório e aquilo que o Sr. Ministro nos veio dizer com a sua coragem reformista, é que ele vai ser mais «artilhado».
Portanto, não vai ser «desarmadilhado».
Aliás, ontem, o Sr. Deputado Jorge Strecht fez uma intervenção, que até já foi invocada, e volto a falar dessa tal adaptação que o PS tem vindo a fazer, no sentido de que já não vai rever o Código do Trabalho de acordo com as suas propostas na oposição mas em coerência com as conclusões obtidas neste percurso todo. E tudo isto vinha a seguir às conclusões do relatório de progresso de que hoje temos estado aqui a falar.
Portanto, em termos da tal adaptabilidade, creio que estamos perfeitamente conversados e convinha, efectivamente, que o Governo clarificasse e desse aqui hoje um novo sinal, uma nova oportunidade. Já que se fala tanto nas novas oportunidades, este Governo deveria dar uma nova oportunidade aos milhares e milhares de jovens licenciados precários e aos desempregados, que, como bem sabe, são hoje praticamente humilhados na senda, a que são obrigados de 15 em 15 dias, de mostrar papéis e mais papéis, sendo maltratados em muitas das empresas onde vão exigir o carimbo para mostrar da centro de emprego, porque, afinal, nem os centros de emprego conseguiram ainda unificar os seus procedimentos no controlo aos desempregados que este Governo lhe impõe.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr.ª Deputada.

A Oradora: — Dissemos, na altura, que seria bem melhor que o Governo pusesse em cada desempregado uma pulseira electrónica e, agora, vem-se provar, com a lei que o Sr. Ministro produziu, que, efectivamente, os desempregados são tratados desta forma.
Era essa nova oportunidade que hoje nos deveria aqui trazer, porque essa coragem que aqui tanto invoca é, de facto, apenas a coragem para os mais fortes e não a coragem para os mais fracos.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Álvaro Saraiva.

O Sr. Álvaro Saraiva (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: Tiveram razões e mais do que razões os trabalhadores portugueses ao mobilizarem-se para a greve geral que se realizou no passado dia 30 de Maio. Ela constituiu uma importante expressão das razões do descontentamento e do protesto popular e uma clara afirmação de exigência de mudanças.
Pode o Governo fazer conferências de imprensa de hora a hora, proibir plenários, ameaçar com processos disciplinares ou recorrer à GNR para dificultar o exercício constitucional, que é o direito à greve, que os trabalhadores não desistirão de lutar.
Havia muitos motivos para convocar e para se fazer a greve: há dois milhões de pobres no nosso país; Portugal tem hoje a maior taxa de desemprego dos últimos 20 anos; acentua-se a tendência para a emigração, muitas vezes sem quaisquer direitos; aumenta a idade de reforma e diminui o valor das pensões; cresce a precariedade dos vínculos e das condições de trabalho e aumenta a instabilidade e a insegurança na vida, sobretudo dos jovens; 1,2 milhões de trabalhadores têm vínculo precário, dos quais 500 000 são jovens; eternizam-se os recibos verdes, a prestação de serviços e o trabalho temporário.

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Por isso, Sr. Ministro, os trabalhadores não desistirão de lutar por melhores condições de vida; não desistirão de lutar por um crescimento económico sustentado, que inclua o pleno emprego; não desistirão de lutar por uma melhoria da qualidade do emprego, que tenha como base a garantia de trabalho com direitos; não desistirão de lutar por uma verdadeira política de inclusão social, de combate à pobreza e à exclusão social; não desistirão de lutar por um serviço público, universal e eficaz, que vá ao encontro da resolução dos problemas dos portugueses.
A confirmá-lo está a luta dos trabalhadores da função pública, que hoje, mais uma vez, saem à rua, manifestando-se contra o desmantelamento da Administração Pública, defendendo o direito ao emprego, às carreiras profissionais e aos salários.
Sr. Ministro, a verdadeira política de uma Europa social faz-se no quadro de uma política de respeito pelos direitos dos trabalhadores, com a sua participação, garantindo o acesso dos cidadãos, em igualdade de circunstâncias, aos serviços públicos e às funções sociais do Estado e reforçando a participação democrática das populações.
E não resisto a terminar da mesma maneira que terminei, há dois meses atrás, num debate com o Sr.
Ministro: «Há hoje um facto indiscutível na situação social do nosso país. (…). Estamos perante uma grave situação (…). Porque o desemprego não poupa qualquer segmento, dos mais importantes da força do trabalho nacional, seja o que é fruto dos despedimentos colectivos em escala e dimensão anormal (…)».
Foi o Sr. Ministro que disse isto há três anos atrás nesta própria Casa. É igual ao que se está a passar hoje.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Trabalha e da Solidariedade Social.

O Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social: — Sr. Presidente, começo por responder à questão colocada pelo Sr. Deputado Carlos Miranda, que é, de facto, uma questão relevante e importante para percebermos como é que o desenvolvimento do nosso sistema de relações laborais e o nosso modelo social vão evoluir no quadro dos compromissos que temos na União Europeia.
As conclusões do encontro informal de ministros em Guimarães, conclusões do trio de presidências mas que reflectem, em grande medida, o que penso ser o consenso na União Europeia a propósito do debate sobre essa expressão agora tão famosa da flexigurança, têm três ou quatro pontos que considero fundamentais.
Primeiro: a verificação ou a valorização de que os modelos baseados nesse conceito aplicados em diversos países da Europa não são transferíveis mecanicamente para os diferentes mercados de trabalho ou para os diferentes sistemas de protecção dos Estados-membros da União Europeia. Não é ambição da União Europeia criar um mercado de trabalho único ou um sistema de protecção social único.
Segundo: o desenvolvimento desse modelo, que levou muitos anos em alguns países e que neles produziu, na minha opinião, bons resultados, à escala europeia tem de ser inspirado por um equilíbrio muito cuidadoso da dimensão da flexibilidade e da dimensão do reforço da segurança. Este também é um ponto consensual não apenas entre Estados-membros da União Europeia mas também entre os parceiros sociais, que estiveram representados ao mais alto nível no encontro informal de Guimarães.
Um outro aspecto de enorme importância é que não há modelo algum que se possa inspirar na flexigurança, seja isso o que for, tenhamos as interpretações que tivermos desse conceito, se não for fortemente assumido pelo diálogo social e pela negociação entre os parceiros. Este é um aspecto absolutamente essencial.
Respondendo concretamente à sua questão, direi que não creio que seja possível ou desejável que sobre esta questão exista qualquer espécie de legislação, qualquer espécie de processo legislativo, no âmbito da União Europeia e, portanto, afasto a hipótese de qualquer directiva sobre esta matéria. Deve haver, sim, um processo de coordenação de políticas nesta área. Julgo que, havendo uma distinção clara entre o que é a política social e a coordenação de políticas à escala europeia e a concretização em cada país, nomeadamente no nosso, que é vantajoso que possamos aproveitar os aspectos positivos deste debate.
Como já várias vezes disse, valorizo duas dimensões de aprendizagem como fundamentais relativamente aos exemplos bem sucedidos desses países: a dimensão do reforço da adaptabilidade e a dimensão da formação ao longo da vida. É isso que julgo que podemos retirar como dimensões mais positivas deste debate.
Ao Sr. Deputado Jorge Machado, que já sabia que a minha intervenção ia ser caracterizada por sofismas, porque já estava escrito nas suas notas, e talvez eu pudesse ter arriscado uma hipérbole ou uma parábola mas não estava preparado para isso, direi que, de facto, temos visões diferentes sobre este debate, temos visões diferentes sobre as reformas a produzir, mas aquilo que está verdadeiramente em causa é saber quem é que está disponível para um debate sério sobre as reformas a introduzir no nosso sistema de relações laborais e quem é que está verdadeiramente preparado para um debate em torno destas experiências que citei — do calçado e do têxtil — ou de outras experiências negativas que poderia citar no âmbito

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da negociação colectiva em Portugal. É a partir desse debate que vale a pena avançarmos, porque é a partir dele que valorizamos esta dimensão naquilo que ela tem de mais importante, que é o reforço do diálogo social, o reforço da contratação colectiva, porque é na procura dos caminhos que valorizem esse diálogo social que encontramos resposta para os nossos problemas.
Sr.as e Srs. Deputados, dei aqui exemplos de adaptabilidade, mas também podia dar exemplos de como a rigidez…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Não repita, responda!

O Orador: — Sr. Deputado, tenha calma! Tenha calma! Como eu estava a dizer, também poderia dar exemplos de como a rigidez de alguns comportamentos, nomeadamente sindicais e, naturalmente, também empresariais, têm levado ao falhanço de projectos de mudança em importantes empresas e sectores no nosso país. Poderia dar exemplos de como a incapacidade de negociar e a incapacidade de entender positivamente a adaptabilidade têm levado a mais desemprego, a menos investimento, a menor crescimento e a um pior Estado social.

Aplausos do PS.

Sr. Deputado Pedro Mota Soares, não exprimi aqui qualquer posição sobre o artigo 4.º. Acredito e até fiquei com a impressão de que o Sr. Deputado leu com atenção o relatório intercalar da Comissão do Livro Branco, mas, já agora, aproveito para lhe relembrar que valeria a pena o Sr. Deputado levar em linha de conta que este trabalho não nasceu hoje, o Governo desenvolveu um trabalho preparatório, que considero — desculpem-me a imodéstia — de enorme importância, que foi a elaboração do Livro Verde sobre as relações de trabalho em Portugal e, depois disso, considerou que estavam criadas as condições para uma avaliação e para a produção de respostas.
Agora, nem o Livro Branco nem sequer o relatório tomam uma posição definitiva relativamente ao artigo 4.º. Não tomam! E o Sr. Deputado sabe muito bem que são aí colocadas três hipóteses sobre essa dimensão, que é uma dimensão fundamental ou, pelo menos, simbolicamente importante no domínio das relações laborais.
Tenho a minha posição, que é conhecida, já a expressei várias vezes. O Sr. Deputado teve a qualidade de, na sua intervenção, levantar um conjunto de questões importantes para debate, que julgo que seria muito interessante que pudéssemos aqui aprofundar, mas não espere que eu, nesta fase e a poucos meses do final do trabalho da Comissão, esteja a fechar esse trabalho, dizendo: façam o que fizerem, discutam o que quiserem, que a conclusão do Governo já está tomada. Isso não seria nem sério, nem justo.
E deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, voltando à sua primeira intervenção, que faz todo o sentido, em Portugal ou em qualquer outro país, o modelo que seguimos para a preparação da revisão do Código de Trabalho. Não foi uma invenção portuguesa. A existência de um grupo de peritos com elevada capacidade e com diferentes sensibilidades na preparação de uma proposta desta natureza foi utilizada em diversíssimos países.
O Sr. Deputado sabe tão bem quanto eu que o Código de Trabalho que agora está em vigor foi encomendado a uma equipa que o preparou, só que sem qualquer transparência, porque nem chegámos a saber quem o tinha elaborado. Aqui sabemos quem é que está a fazer este trabalho, por que existem nomes, existe um programa e existe uma responsabilidade.

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Mas isto era para ser até 2005!

O Orador: — Sr. Deputado, já lhe disse que terei todo o prazer em discutir todas essas questões, mais de dimensão técnica mas muito relevantes, mas não o farei agora, porque seria estar a condicionar de uma forma que eu considero não só desleal como também errada…

O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Era até 2005!

O Orador: — Sr. Deputado, o tempo de reforma deste Código é o Governo que o determina. O tempo de discussão não será condicionado pela intervenção de qualquer Deputado, seja de que partido for.
Mas, já agora, gostaria de reafirmar aqui, porque foi uma questão importante colocada neste debate, a que não dei resposta, uma posição muito clara acerca do desenvolvimento deste trabalho.
Em Novembro teremos um Livro Branco sobre as relações de trabalho em Portugal e o Governo apresentará as suas linhas de orientação para a reforma à concertação social, onde serão debatidas, bem como, naturalmente, na Assembleia da República ou onde for entendido como relevante. E, de facto, havendo ou não acordo, o Governo apresentará as suas propostas de revisão das relações laborais.
Esta não é a questão decisiva para a competitividade da economia portuguesa, poderá até nem ser a questão mais importante, mas é uma peça relevante para a credibilidade do nosso sistema de relações

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laborais, para ele funcionar como instrumento de progresso, de desenvolvimento e de coesão. É por isso e com estes princípios que iremos apresentar a esta Assembleia uma revisão global do Código de Trabalho.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, se não virem inconveniente, faremos primeiro o encerramento do debate e depois as votações, uma vez que há apenas um deferimento destas por cinco minutos.
Para encerrar o debate, em nome do Governo, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Compreendese o embaraço do Partido Comunista Português…

Risos do PCP.

… que resulta, em primeiro lugar, do facto de este Governo estar a conseguir redinamizar a concertação social e a conseguir, sucessivamente, acordos de concertação social. São matérias que têm directamente a ver com os direitos dos trabalhadores e com um núcleo mais forte que são os direitos dos trabalhadores, como as matérias relativas à negociação colectiva, ao subsídio de desemprego, à organização e ao sistema de segurança social, ao salário mínimo nacional e à formação profissional. Isso embaraça o Partido Comunista Português.
Mas o Partido Comunista Português tem um embaraço adicional. E o embaraço adicional consiste em verificar que, ao longo destes anos, com este Governo, com este novo clima de estímulo à negociação colectiva que se conseguiu, organizações sindicais que o PCP se habituou a considerar como estando dentro da sua esfera de influência política,…

Protestos do Deputado do PCP Bernardino Soares.

… também vêm paulatinamente entrando no caminho da concertação e dos acordos que modernizam a legislação laboral e as condições de trabalho dos portugueses.
Estou a referir-me à participação da CGTP no acordo relativo ao subsídio de desemprego, decreto esse, aliás, que depois o Grupo Parlamentar do PCP pediu para ratificar no Parlamento e manifestou a sua divergência. Estou a referir-me aos acordos de contratação colectiva conseguidos na indústria do calçado e na têxtil,…

Risos do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.

… que mostram que o PCP não hegemoniza o mundo dos trabalhadores…

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Muito bem!

O Orador: — … e não tem a bandeira da defesa dos direitos dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

Porque uma coisa é evidente, Sr.as e Srs. Deputados: o tema é «direitos dos trabalhadores» — é um bom tema —, mas nunca mais se falará em Portugal sobre a acção política para defesa e promoção dos direitos dos trabalhadores sem se mencionar o aumento histórico do salário mínimo proposto por este Governo e aceite por todos os parceiros em concertação social.

Aplausos do PS.

O PSD e o PCP usaram palavras fortes, usaram a palavra vergonha. Mas vergonha de quê? É uma palavra forte que eu não vou usar.

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Vocês não têm é vergonha!

O Orador: — Mas vamos ver: em relação à questão do Código do Trabalho toda a gente insinuou que haveria incoerência entre as posições tomadas por membros do Governo, então Deputados do Partido Socialista,…

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O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Insinuou? Dissemos!

O Orador: — … em relação ao debate do Código do Trabalho e as posições que o Programa de Governo e o Governo defendem.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Mas, que ideia!…

O Orador: — Mas, sintomaticamente, em concreto, nenhuma citação foi feita! Sintomaticamente, em concreto, nenhum um argumento então usado foi brandido!

O Sr. Jorge Strecht (PS): — Muito bem!

Risos do PCP.

O Orador: — Porquê? Porque todos sabemos que não há incoerência alguma! Qual era o propósito do Código do Trabalho em 2004? Era um propósito unicamente ideológico: quebrar a força, do ponto de vista da negociação colectiva, às organizações sindicais e sugerir que o direito do trabalho era apenas um ramo do direito civil. Contra isso se opôs o PS e com o PS nunca isso existirá! Como dissemos na altura, o Código do Trabalho não permitia responder a nenhuma necessidade de modernização e de adaptabilidade nas relações laborais em Portugal. E, por isso, é que, três anos depois, é preciso pôr na ordem do dia, de novo, a revisão da legislação laboral.

Protestos do PCP.

Mas o PCP disse que o Ministro devia ter vergonha. Devolvo essa acusação, porque é a posição «controleirista» do PCP…

Vozes do PS: — Muito bem!

O Orador: — … que cede tudo só para manter o controlo pelo comité central de organizações sociais representativas dos trabalhadores.

Aplausos do PS.

É a posição imobilista do PCP que, demagogicamente, tudo destorce só para evitar que se possa criar uma dinâmica de modernização e de defesa dos direitos dos trabalhadores que não esteja sob a alçada do Comité Central do PCP.

O Sr. António Filipe (PCP): — Do Secretariado! Não percebe nada do PCP!

O Orador: — É a posição profundamente conservadora do PCP que não aceita qualquer mudança, qualquer modernização! É a posição estruturalmente anti-negociação colectiva, anti-compromisso, antinegociação colectiva típica do PCP.

Protestos do PCP.

É esta atitude estrutural do PCP que, se não fosse a acção da outra esquerda, que se recusa a essa atitude, condenaria os trabalhadores portugueses à precariedade — essa, sim! —, ao desemprego — esse, sim! — e a ficarem colocados numa posição de absoluta inferioridade nas relações de trabalho.

Aplausos do PS.

Protestos do PCP.

O Sr. Presidente: — Pode concluir, Sr. Ministro.

O Orador: — Estou a concluir, Sr. Presidente.
Mas exactamente porque todos sabemos isso, e os trabalhadores também o sabem, é que este Governo tem conseguido acordos com várias organizações sindicais, como ainda agora se viu nas leis da Administração Pública, e tem conseguido apoio da opinião pública e dos trabalhadores ao passo que as acções que o PCP força a fazer fora de tempo…

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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Cuidado!…

O Orador: — … têm tido a adesão que todos nós também conhecemos.

Aplausos do PS.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Eu, no seu lugar, Sr. Ministro, não estaria tão confiante!

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Veremos!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares, que é o último orador deste debate de urgência.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo teria preferido que este debate não acontecesse. Não teria, assim, que ser confrontado com as propostas da Comissão do Livro Branco.

Protestos do PS.

O Governo utiliza a velha técnica de criar como batedores para as suas decisões comissões supostamente independentes e relatórios pretensamente técnicos. É ver o caso do Ministério da Saúde, que lançou um relatório sobre o encerramento das urgências no nosso país e que, depois, o Governo veio concretizar na realidade.
O Governo neste debate foi instado a pronunciar-se, no concreto, sobre as gravíssimas opções propostas no relatório e, num total desrespeito pela Assembleia da República, não respondeu às questões concretas.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!

O Orador: — O embaraço que o Ministro dos Assuntos Parlamentares atribuiu ao PCP está no Governo! É o embaraço de quem traiu os seus compromissos com os trabalhadores, quando estava na oposição.

Aplausos do PCP.

O Governo acusa o PCP de imobilismo com a habitual caricatura de que o PCP defende o que está atrás e que contestou. Não, Srs. Membros Ministros! No PCP, ninguém passou a defender o Código do Trabalho; quem passou a defendê-lo foi o Sr. Ministro do Trabalho e o seu Governo.
Foi o PCP quem apresentou um projecto de lei, nesta Assembleia, de alteração completa do Código do Trabalho, e o Governo e o PS só apresentam o agravamento do que já está previsto no Código do Trabalho.
De facto, na nossa posição, há algum imobilismo: antes das eleições, éramos contra o Código do Trabalho; depois das eleições, continuamos a ser contra o Código do Trabalho e somos também contra o seu aprofundamento que o Governo PS agora quer.
O Governo, o PS e o Ministro Vieira da Silva, de facto, não são imobilistas. De facto, as posições do PS nunca ficam imóveis quando passam da oposição ao Governo. Mudam sempre e mudam muito!

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Essa é que é essa!

Protestos do Deputado do PS Jorge Strecht.

O Orador: — A coragem reformista de que o Governo fala é apenas a versão travestida da desregulação e liberalização da legislação laboral. É a retórica de um Governo ao serviço das orientações neoliberais e anti-sociais. Já todos percebemos que o Ministro Vieira da Silva é um digno sucessor de Bagão Félix e do seu Código do Trabalho!

Vozes do PCP: — Exactamente!

Protestos do PS.

O Orador: — O problema do desenvolvimento económico e da produtividade não tem a solução na desregulamentação da legislação laboral mas na qualificação, na formação dos empresários, na incorporação de mais-valias tecnológicas e de modernização. Aliás, o Código do Trabalho da direita e de Bagão Félix não

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trouxe, por si mesmo, qualquer aumento da produtividade, como prometia a direita quando o aprovou.

Vozes do PCP: — Muito bem!

O Orador: — O que houve nos últimos meses e anos foi um enorme aumento da precariedade: contratos a prazo e trabalhadores a recibo verde são já hoje cerca de 1,5 milhões.
Com as propostas do Livro Branco e do Governo acrescenta-se, agora, a possibilidade de despedir à vontade, usando uma ambígua e vaga razão de inadaptação.
O Governo citou disposições de contratos colectivos assinados na vigência do Código do Trabalho que instituiu um mecanismo de chantagem sobre a contratação colectiva,…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Ora, aí está!

O Orador: — … que, antes, o PS criticava mas que agora usa como argumento para justificar a aceleração que propõe para a degradação da contratação colectiva.

Protestos do PS.

O Ministro Vieira da Silva afirmou — com desplante, é preciso dizê-lo — que o Governo procedeu «ao alargamento da cobertura do subsídio de desemprego».

O Sr. Jorge Machado (PCP): — Exactamente!

O Orador: — Srs. Deputados, só se for um «alargamento para dentro», porque o que temos é cada vez mais desempregados e cada vez mais desempregados sem subsídio de desemprego no nosso país.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — Quis dizer «alagamento»!

O Orador: — A retórica do PS diz que só haverá flexibilidade depois de haver segurança; o Governo destrói a segurança e prepara o caminho para uma maior flexibilidade.
Para este Governo, tal como para o anterior, a produtividade só se faz à conta de baixos salários e menores direitos.
A legislação laboral para o PS não tem de se preocupar com os trabalhadores, só tem de se preocupar com o mercado! Na concepção do Governo, o direito do trabalho deve ser equitativo: não proteger a parte mais fraca — como manda a Constituição, não é como diz o PCP — ,…

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Essa é que é a grande volta! Leiam a Constituição!

O Orador: — … mas colocar-se numa posição equidistante, deixando as mãos livres à parte que «tem a faca e o queijo na mão», que é o patronato e são os grupos económicos no nosso país.
O Governo terá combate a esta política, o mesmo combate que arrancou um aumento do salário mínimo nacional que, um ano antes, o Primeiro-Ministro considerava irrealista, o mesmo combate que derrotará esta nova ofensiva contra os direitos dos trabalhadores.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, está encerrado debate de urgência, requerido pelo PCP.
Vamos passar ao período regimental das votações e começamos por proceder à verificação do quórum, utilizando o cartão electrónico para sinalizar a presença dos Srs. Deputados.
Os Srs. Deputados que, por alguma razão, não puderem realizar a certificação electrónica da sua presença, deverão assinalar esse facto à Mesa e assinar o registo de presenças que está disponível nos serviços de apoio ao Plenário.

Pausa.

Srs. Deputados, o quadro electrónico regista 210 presenças, havendo mais oito Srs. Deputados que assinalaram a sua presença à Mesa, o que perfaz um total de 218 presenças, pelo que temos quórum de deliberação.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do Relatório e Conta de Gerência da Assembleia da República de 2005.

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Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Segue-se a votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 151/X — Primeira alteração à Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, que estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e do PSD, votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

A proposta de lei baixa à 7.ª Comissão.
Srs. Deputados, seguidamente vamos votar, na generalidade, o projecto de lei 285/X — Terceira alteração ao regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 380/99, de 22 de Setembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 53/2000, de 7 de Abril (PCP).

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-P e votos a favor do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos, agora, votar a proposta de resolução n.º 51/X — Aprova o Instrumento entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005, conforme o n.º 2 do artigo 3.º do Acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América sobre Extradição, assinado em Washington, a 25 de Junho de 2003, e seu Anexo, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Vamos votar a proposta de resolução n.º 52/X — Aprova o Instrumento entre a República Portuguesa e os Estados Unidos da América, feito em Washington em 14 de Julho de 2005, conforme o n.º 3 do artigo 3.º do Acordo entre a União Europeia e os Estados Unidos da América sobre Auxílio Judiciário Mútuo, assinado em Washington a 25 de Junho de 2003 e Seu Anexo, feito em Washington, em 14 de Julho de 2005.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, votos contra do BE e abstenções do PCP e de Os Verdes.

Passamos à votação da proposta de resolução n.º 47/X — Aprova a Emenda ao artigo 1.º da Convenção sobre a Proibição ou Limitação do Uso de Certas Armas Convencionais que Podem ser Consideradas como Produzindo Efeitos Traumáticos Excessivos ou Ferindo Indiscriminadamente, adoptada pelos Estados Partes na Declaração Final da Segunda Conferência de Revisão da referida Convenção, que decorreu entre 11 e 21 de Dezembro de 2001, em Genebra.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos, agora, votar a proposta de resolução n.º 49/X — Aprova o Protocolo sobre Explosivos Remanescentes de Guerra (Protocolo V) à Convenção sobre a Proibição ou Limitação do Uso de Certas Armas Convencionais que Podem ser Consideradas como Produzindo Efeitos Traumáticos Excessivos ou Ferindo Indiscriminadamente, adoptado pelas Altas Partes Contratantes na reunião de Estados Partes na referida Convenção, em 28 de Novembro de 2003.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Vamos votar a proposta de resolução n.º 53/X — Aprova o Protocolo Adicional referente ao Estabelecimento da Sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa em Portugal, assinado em Lisboa, em 26 de Março de 2007.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Passamos à votação, na generalidade, da proposta de lei n.º 153/X — Regula o financiamento da rede rodoviária nacional a cargo da EP-Estradas de Portugal, EPE.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS e votos contra do PSD, do PCP, do CDSPP, do BE e de Os Verdes.

Srs. Deputados, a proposta de lei n.º 153/X, que acabámos de votar, baixa à 9.ª Comissão, que é a Comissão competente, podendo esta delegar na 5.ª Comissão a votação, em sede de especialidade, de

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todos os artigos respeitantes à parte fiscal.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, permite-me uma interpelação à Mesa?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, a nossa bancada preferia uma baixa à 5.ª Comissão, até porque vão ser necessárias — suponho — audições a várias entidades que se relacionam com as competências da 5.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Mas tudo isso poderá ser feito, Sr. Deputado, com a modalidade que lhe indiquei.

O Orador: — E como é que se faz uma votação separada, em duas comissões, de artigos da mesma proposta de lei?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a 5.ª Comissão, depois, transmite à 9.ª Comissão o resultado dessa votação e o único artigo que respeita a matéria que não é fiscal será votado na 9.ª Comissão. Há acordo dos presidentes das respectivas Comissões para se proceder desta forma e, aliás, não é caso inédito na Assembleia.
De qualquer modo, tudo o que o Sr. Deputado refere está ao alcance de ser realizado pela 5.ª Comissão.

O Orador: — Em todo o caso, Sr. Presidente, parece-me pouco curial uma votação repartida, na especialidade, de uma mesma proposta de lei. Mas aceito o entendimento da Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Não havendo objecção, este sistema…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, permite-me…

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente, não posso deixar de dizer que, de acordo com o meu entendimento do Regimento, um diploma só pode baixar a uma comissão, em sede de especialidade, exactamente por causa das votações e da sua coerência e homogeneidade.
Portanto, a posição de princípio desta bancada é a de que o diploma deverá baixar à 5.ª Comissão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, a bancada do Partido Socialista apoia a decisão do Sr. Presidente quanto às duas Comissões.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, no entender do CDS-PP, também nos parece, com todo o respeito, que a 5.ª Comissão é a mais apropriada, tendo em atenção a matéria em causa.

O Sr. Presidente: — Se os Srs. Deputados quiserem, podemos submeter a opção do Presidente a uma deliberação, mas, não havendo recurso para a Mesa, proceder-se-á como indicado, o que, aliás, não prejudica em nada aquilo que está salvaguardado em absoluto. Aliás, a minha decisão foi tomada depois de ter ouvido os Presidentes das duas Comissões.
Portanto, a baixa à Comissão da proposta de lei n.º 153/X processar-se-á como indiquei.
Vamos, agora, votar, na generalidade, na especialidade e em votação final global, a proposta de lei n.º 139/X — Autoriza o Governo a legislar sobre a fixação do limite máximo de idade para o exercício de funções dos pilotos, comandantes e co-pilotos de aeronaves operadas em serviços de transporte público comercial de passageiros, carga ou correio.

Submetida à votação, foi aprovada, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Vamos ainda votar, na generalidade, a proposta de lei n.º 150/X — Aprova a lei relativa à implementação da Convenção sobre a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Armazenagem e Utilização de Armas Químicas e sobre a sua Destruição.

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Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade.

Srs. Deputados, a proposta de lei baixa à 2.ª Comissão.
Passamos à votação, na generalidade, na especialidade e final global, do projecto de lei n.º 392/X — Altera o artigo 65.º da Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto (na redacção introduzida pela Lei n.º 48/2006, de 29 de Agosto) (PS, PSD, PCP, CDS-PP, BE e Os Verdes).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 142/X — Aprova a lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança e aos projectos de lei n.os 229/X —Estabelece a obrigatoriedade de aprovação de uma lei de programação de investimentos das forças e serviços de segurança (PCP) e 387/X — Aprova a nova lei-quadro das leis de programação de investimento das forças de segurança (CDS-PP).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço desculpa, permite-me o uso da palavra?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero apenas informar a Câmara de que o CDSPP, relativamente à votação do texto final que acabámos de realizar, irá apresentar, por escrito, uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado.
Vamos proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 108/X — Cria um novo regime de responsabilidade penal por comportamentos susceptíveis de afectar a verdade, a lealdade e a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva e ao projecto de lei n.º 320/X — Combate à corrupção e defesa da verdade desportiva (PSD).

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Passamos à votação final global do texto final, também apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 98/X — Procede à vigésima primeira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e aos projectos de lei n.os 211/X — Altera o Código Penal (PS), 219/X — Altera o Código Penal, eliminando a discriminação com base na orientação sexual existente no artigo 175.º (Os Verdes), 236/X — Altera o Código Penal (PSD), 239/X — Aprova o regime da responsabilidade penal das pessoas colectivas (PSD), 349/X — Altera o Código Penal em matéria ambiental (Os Verdes) e 353/X — Altera o Código Penal (BE).

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS e do PSD e abstenções do PCP, do CDSPP, do BE e de Os Verdes.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, se me permite…

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, do mesmo modo, quero informar a Mesa de que iremos apresentar uma declaração de voto, por escrito, relativamente à votação deste texto final.

O Sr. Presidente: — Está registado, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.

O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, uso da palavra exactamente para o mesmo efeito, ou seja, para informar a Mesa de que o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentará uma declaração de voto, por escrito.

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O Sr. Presidente: — Fica também registado, Sr. Deputado.
Passamos à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 127/X — Define os objectivos, prioridades e orientações de política criminal para o biénio de 2007/2009, em cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23 de Maio, que aprova a Lei-Quadro da Política Criminal.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, votos contra do PSD, do PCP, do BE e de Os Verdes e a abstenção do CDS-PP.

Srs. Deputados, a Mesa foi informada de que o Sr. Deputado António Montalvão Machado pretende fazer uma declaração de voto a propósito da votação deste texto final, mas, antes, concluiremos as votações finais globais, uma vez que resta apenas realizar uma votação.
Vamos, então, proceder à votação final global do texto final, apresentado pela Comissão de Defesa Nacional, relativo à proposta de lei n.º 135/X — Estabelece o regime especial dos processos relativos a actos administrativos de aplicação de sanções disciplinares previstas no Regulamento de Disciplina Militar.

Submetido à votação, foi aprovado, com votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e de Os Verdes.

Agora, sim, para uma declaração de voto, a propósito da votação do texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 127/X, tem a palavra o Sr. Deputado António Montalvão Machado.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PSD pretende apresentar uma declaração de voto sobre o seu sentido de voto em relação à lei que define os objectivos, prioridades e orientações de política criminal.
É sabido de Portugal e dos portugueses que o PSD sempre defendeu a existência de uma lei que fixe as prioridades e as orientações essenciais da política criminal.
De facto, Sr. Presidente e Srs. Deputados, numa verdadeira democracia, só pode competir aos órgãos de soberania a aprovação dessa lei que fixa as prioridades de política criminal. Foi, aliás, o PSD — permitame que o relembre, Sr. Presidente — o partido que protagonizou essa inovação legislativa na Constituição da República Portuguesa, quando, em 1997, defendeu e conseguiu fazer aprovar o actual artigo 219.º da Constituição, que estabelece que são os órgãos de soberania que fixam e definem, de facto, a política criminal.
Foi por isso, Sr. Presidente, que o PSD, há cerca de um ano e meio, se associou à Lei-Quadro de Política Criminal que o Governo aqui apresentou e que previa que, de dois em dois anos, o Governo apresentasse a este Parlamento as prioridades de política criminal, como começou a apresentar com esta Lei.
Fizemos bem, embora, na altura, tivéssemos alguns contras e algumas dúvidas sobre essa Lei, mas fizemos bem! Sucede que, quando a lei que aqui votámos hoje, a lei que, de facto, define as prioridades de política criminal, entrou na Assembleia da República, todos esperávamos que o Governo e o PS ouvissem os partidos da oposição, ouvissem ao menos o maior partido da oposição, no fundo, ouvissem o Parlamento.
O Governo e o PS, autistas, arrogantes, menosprezando e desmerecendo a democracia, não alteraram um artigo, não alteraram um número, não alteraram uma alínea, não alteraram uma vírgula que fosse da proposta que apresentaram.
Uma lei destas, Sr. Presidente, uma lei desta envergadura para a democracia, uma lei verdadeiramente original, tinha de ter o apoio de outras bancadas. Não teve! Uma lei destas tinha de ter o apoio técnico dos magistrados portugueses, quer da magistratura judicial, quer da magistratura do Ministério Público. Também não teve! Uma lei destas tinha de ter o apoio técnico da advocacia portuguesa. Também não teve! Uma lei destas tinha de ter o apoio dos portugueses, e é aqui que se consegue ou não esse apoio. Também não teve! Foi por tudo isto, Sr. Presidente, que o Partido Social Democrata votou contra.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Ricardo Rodrigues.

O Sr. Ricardo Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista está muito satisfeito com a aprovação desta lei. Trata-se de uma lei inovadora no sistema e no Estado de direito democrático, trata-se de uma lei relativamente à qual tivemos todo o empenho para a sua formalização e aprovação nesta Assembleia.

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Estranhamos muito a atitude do PSD neste momento, desde logo, porque, na verdade, é um órgão de soberania que aprova a lei de política criminal, é a Assembleia da República.
Em segundo lugar, não há aprovação de alterações à Constituição sem o apoio do Partido Socialista, pelo que a paternidade que o Sr. Deputado António Montalvão Machado invocou não lhe fica bem, uma vez que foi com o acordo do PS que se fez essa alteração da Constituição.
Depois, estranhamos ainda mais este ciúme do PSD por não ter sido ouvido. Até parece que, na Comissão, não ouvimos o PSD e os demais grupos parlamentares! Penso que, na última reunião que tivemos para apreciar esta matéria, a Comissão aceitou uma proposta do Sr. Deputado António Montalvão Machado para alterar a forma como um artigo estava redigido,…

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Era um erro técnico!

O Orador: — … ou seja, fizemos uma alteração proposta pelo Sr. Deputado.

Aplausos do PS.

O Sr. António Montalvão Machado (PSD): — Era um mero erro técnico!

O Orador: — Também convém que fique claro que a 1.ª Comissão ouviu todos os parceiros: a associação dos Srs. Juízes, dos magistrados do Ministério Público. Acolhemos várias alterações propostas pela Procuradoria Geral da República, a quem, essencialmente, essa lei se destina.
Nesse sentido, o Partido Socialista está de consciência tranquila, porque fez uma lei em consonância com as regras da democracia e é uma lei que servirá o País.

Neste momento, registou-se burburinho na Sala.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço a vossa atenção para a intervenção do Orador.

O Orador: — Obrigado, Sr. Presidente.
A finalizar, repito que ouvimos todas as entidades, acolhemos alterações propostas pela Procuradoria Geral da República, a quem essa lei se destinava originária e principalmente e, por isso, cumprimos as regras da democracia.
A declaração de voto do PSD é um mero ciúme, que, por isso mesmo, desculpamos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Secretária vai dar conta de pareceres da Comissão de Ética.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pela 2.ª Secção da 5.ª Vara Cível de Lisboa, Processo n.º 5845/04.0 — TVLSB, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Luís Carloto Marques (PSD) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, de acordo com o solicitado pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras, Processo n.º 449/03.7 — GAFLG, a Comissão de Ética decidiu emitir parecer no sentido de autorizar o Sr. Deputado Fernando Jesus (PS) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

A Sr.ª Secretária (Celeste Correia): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, o terceiro parecer diz respeito a uma rectificação de um outro parecer da 4.ª Secção do Ministério Público, Distrito Judicial de Lisboa — DIAP, Processo n.º 1963/07.0 — TDLSB-04, do seguinte teor: «No segundo parágrafo, onde se lê «autorizar o Sr. Deputado Hélder Amaral (CDS-PP) a prestar depoimento por escrito, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.», deve ler-se: «autorizar o Sr. Deputado Hélder Amaral (CDS-PP) a prestar depoimento presencialmente, como testemunha, no âmbito dos autos em referência.»

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade.

Vamos passar ao ponto seguinte da ordem do dia, que consta da apreciação do projecto de resolução n.º 198/X — Promoção do Baixo Mondego, apresentado pelo PSD.
Para apresentar o diploma, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Almeida.

O Sr. Miguel Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Situado na Beira Litoral, entre as cidades de Coimbra e da Figueira da Foz, o vale do Baixo Mondego é constituído por uma extensa planície de origem aluvial, com uma área de cerca de 14 000 ha, que se desenvolve ao longo do rio Mondego.
Esta região é sobejamente conhecida pelo seu elevado potencial agrícola, onde a produção de arroz representa hoje 25% da produção nacional e as hortícolas encontram condições excepcionais para um aumento de produção, representando, aliás, uma aposta cada vez maior quer dos agricultores quer dos industriais desta região.
No entanto, as possibilidades de desenvolvimento agrícola do vale têm sido sempre prejudicadas, ao longo dos tempos, pela ocorrência frequente de cheias violentas que originam um assoreamento continuado, por uma acentuada variabilidade sazonal e anual dos caudais, por uma rede de drenagem agrícola bastante incipiente e muito pouco funcional e por uma estrutura fundiária desordenada e dispersa, com inúmeros prédios de diversas dimensões e formas.
É certo que a construção das barragens da Aguieira, de Fronhas e de Raiva, bem como do açude de Coimbra vieram permitir a regularização dos caudais do Mondego.
Para além disso, a construção de diques entre Coimbra e a Figueira da Foz veio permitir a defesa das populações ribeirinhas e dos seus bens e a edificação do canal condutor geral e do canal de Lares viabilizaram, por seu turno, o abastecimento de água às diversas actividades económicas e às populações locais.
No entanto, a componente mais esquecida de todas as intervenções previstas para o Baixo Mondego diz respeito à regularização dos rios Ega, Arunca, Pranto, Foja e a ribeira de Ançã, todos afluentes do Mondego. Destes, o único projecto que conheceu a luz do dia foi o da regularização do rio Arunca, tendo, contudo, mesmo assim, esta obra sido abandonada a meio. E, quanto aos restantes afluentes, tal não passou ainda, sequer, da fase inicial de projecto.
No que respeita às reestruturações fundiárias, desde os primórdios do aproveitamento hidroagrícola do Baixo Mondego que se tem tentado implementar o emparcelamento rural. As acções de emparcelamento já empreendidas e a adaptação ao regadio têm tido, quando aplicadas, um enorme impacto positivo nos rendimentos dos agricultores abrangidos.
A disseminação deste tipo de melhoramentos fundiários em todo o vale do Baixo Mondego permitiu a recuperação e a correcção de vastas manchas de solos ainda algo irregulares e, até, mesmo improdutivos.
Não obstante, a dimensão e a profundidade do trabalho ainda a realizar pode ser nitidamente expressa pelos seguintes dados: em todo o vale do Baixo Mondego existem cerca de 6500 explorações agrícolas, que correspondem a 35 000 prédios rústicos.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Confrontados com este panorama, importa, pois, empreender no Baixo Mondego uma intervenção estrutural, moderna, sustentável, que, proporcionando, desde logo, protecção e segurança para pessoas e bens, abranja áreas produtivas de futuro como a agro-industrial, a energética, a agroturística e a ambiental.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Não podendo ser aqui esquecida, naturalmente, a superior valia turístico-económica de um projecto de navegabilidade para o rio Mondego.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Aqui chegados, a nossa proposta passa pela recomendação ao Governo para que, de uma forma firme e determinada, empreenda uma estratégia de desenvolvimento racional e sustentado do vale do Baixo Mondego, contemplando, designadamente: a regularização dos afluentes hidrográficos e a construção das infra-estruturas complementares, com a consequente disponibilização energética e de água para o consumo pelas populações e as explorações económicas locais; a recuperação dos ecossistemas locais degradados ou subvalorizados; a reconstrução das infra-estruturas afectadas pelas cheias de 2001; a constituição de associações de utilizadores, compostas pela totalidade ou parte dos utilizadores do domínio público hídrico; a implementação de um sistema de gestão da água; a melhoria das acessibilidades no vale e no seu relacionamento com o exterior; a infra-estruturação para o uso urbano do vale e do rio Mondego, concebendo o primeiro deles como um corredor verde intermunicipal; e a maximização do aproveitamento racional de todo o potencial agrícola da região, incluindo medidas para a promoção da agricultura biológica e agroenergéticas.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pensamos ser, pois, de superior interesse nacional um correcto e

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harmonioso aproveitamento de todo o potencial produtivo e turístico do Baixo Mondego. Esta região e as suas gentes têm esse direito, os agricultores anseiam-no e os autarcas merecem-no.
Quero, aliás, a este propósito dar uma palavra especial ao Sr. Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Velho, que há muito vem reivindicado estes investimentos, bem como aos Srs. Presidentes de junta e aos agricultores aqui presentes.

Aplausos do PSD.

Esperamos que este projecto de resolução seja aprovado por unanimidade e que Governo saiba, com grande sentido de responsabilidade, acatar o seu conteúdo para que as obras do vale do Baixo Mondego, iniciadas na década de 70, sejam finalmente concluídas, com enormes vantagens para a região Centro.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Horácio Antunes.

O Sr. Horácio Antunes (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O PSD apresenta-nos, hoje, aqui, o projecto de resolução n.º 198/X, sobre o Baixo Mondego. Esta é, quanto a nós, uma situação de relevante importância não apenas para a região do Baixo Mondego e das cidades de Coimbra e da Figueira da Foz mas para todo o País.
Quero, em primeiro lugar, cumprimentar os representantes do Baixo Mondego que aqui se encontram — a associação dos beneficiários, os presidentes de junta e o Presidente da Câmara de Montemor-o-Novo — e dizer-lhes que este projecto de resolução chegou, aqui, em boa hora.
Desde 1976, o trabalho desenvolvido em todo Baixo Mondego já consumiu 664 milhões de euros e requer-se, agora, que toda esta obra possa vir a ser concluída não apenas para melhorar as condições agrícolas do Baixo Mondego mas, fundamentalmente, porque é importante para que os agricultores possam ter ali uma mais-valia e um maior contributo para o seu ganha-pão.
Não vou enunciar todo o trabalho que já foi desenvolvido ao longo destes anos — e foram executadas muitas obras —, mas dizer apenas que, destes 664 milhões de euros, 378 milhões de euros referem-se a obras efectivamente realizadas no Baixo Mondego, a jusante de Coimbra.
Vou, de uma forma mais clara, dizer aquilo que é importante realizar nos próximos anos. Sabemos que, de facto, há muito trabalho ainda a executar em relação ao eixo central do Baixo Mondego. São obras que é importante levar por diante não apenas na sua execução mas também na manutenção e na conservação do leito central, que ainda irão custar mais de 5 milhões de euros. Penso, no entanto, que é uma obra extremamente importante.
Todo o trabalho que até agora foi feito só poderá ser rentabilizado se, também e para além do leito central, pudermos levar por diante um trabalho que, de algum modo, já foi iniciado não apenas com estudos mas também com algumas obras no rio Arunca, devido aos problemas das cheias. Penso que, se não tivessem acontecido as cheias de 2001, muitas das verbas já gastas para reconstrução das infra-estruturas danificadas com essas cheias, no valor de mais de 44 milhões de euros, poderiam, com certeza, ter sido canalizados para as obras que falta terminar.
As obras que falta empreender e que são ainda extremamente importantes têm a ver, como já aqui foi dito pelo Sr. Deputado Miguel Almeida, com os afluentes do rio Mondego.
Obras como a regularização do rio Arunca, do rio Pranto, do rio Ega, do rio Foja ou da ribeira de Ançã ou a construção das centrais elevatórias do Arunca, do Pranto, do Ega e de Quada-Lares são extremamente importantes para complementar toda a acção em boa hora empreendida a partir de 1976 e que é importante concluir para rentabilizar o trabalho que os agricultores têm desenvolvido no Baixo Mondego.
Neste momento, estão concluídas mais de 93% das obras que têm a ver com o projecto do aproveitamento do Baixo Mondego, pelo que falta cerca de 7% para concluir esta obra.
Penso que tudo isto é extremamente importante.
A realização das intervenções previstas são fulcrais para o desenvolvimento do vale do Mondego não só pelos benefícios directos em termos de controlo de cheias e regularização fluvial como também porque constituem infra-estruturas de segurança, sem as quais não será possível implementar os restantes empreendimentos de carácter hidroagrícola, nomeadamente nos vales secundários do Arunca, do Ega, do Pranto, de Ançã e do Foja, impedindo a modernização e eficiência das práticas agrícolas, a obtenção de um maior rendimento de produção e a diminuição de custos.
Há também que ter em linha de conta os benefícios de outra ordem, nomeadamente os benefícios ambientais, paisagísticos e de carácter social, igualmente importantes, sem esquecer os próprios benefícios de âmbito turístico.
Em sintonia com a Lei da Água, estão em base de discussão e finalização dois diplomas legislativos com importância directa para este aproveitamento. Trata-se do novo regime económico-financeiro dos recursos hídricos e a criação e constituição das associações de utilizadores.

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A constituição de uma associação de utilizadores é fundamental para garantir a gestão sustentável do aproveitamento. Por outro lado, pensamos que o novo regime económico-financeiro e o início do novo Quadro de Referência Estratégica Nacional constituirão instrumentos importantes na sustentabilidade da futura associação e do aproveitamento deste grande complexo hidroagrícola.
Em boa hora se apresentou este projecto de resolução. O Partido Socialista está inteiramente de acordo com aquilo que foi apresentado. Assim, temos de reivindicar, junto do Governo, não apenas a conclusão dos trabalhos dos blocos do Bolão, de Maiorca e da margem esquerda mas, fundamentalmente, daqueles afluentes da margem esquerda.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Como dizia, depois dos projectos que foram realizados ainda durante a vigência do QCA III, pensamos que agora, com o QREN, é importante não apenas concluir os trabalhos a desenvolver no Ega, no Arunca, no Foja, na ribeira de Ançã e no Pranto mas, com certeza, arranjar os meios económicos e financeiros para que estas obras possam ser lançadas e possam começar a ser executadas o mais rapidamente possível.
Assim, apraz-me dizer que o Partido Socialista dá o seu inteiro acordo para a aprovação deste projecto de resolução, pois entendemos que a matéria em causa é extremamente importante para todos os agricultores do Baixo Mondego.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Abel Baptista, para uma intervenção.

O Sr. Abel Baptista (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje um projecto de resolução, da autoria de vários Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, que reclama do Governo a aplicação, a toda a região do vale do Baixo Mondego, de uma estruturada e consequente estratégia de desenvolvimento racional e sustentado, de acordo com os objectivos ali arrolados e estruturados.
Esta iniciativa surgiu no seguimento de uma visita da Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território e da Subcomissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, realizada ao vale do Mondego, no dia 5 de Março do corrente ano.
Com uma grande ligação ao Projecto Hidroagrícola do Baixo Mondego, que está sob a alçada do Ministério da Agricultura, este projecto de resolução propõe, contudo, que o Projecto Hidroagrícola seja alçado à categoria de estratégia de desenvolvimento rural e sustentado do Baixo Mondego. O facto não diminui a sua bondade nem deixa de merecer um comentário positivo da nossa parte.
A zona geralmente conhecida por Baixo Mondego corresponde ao troço final da planície aluvial entre Coimbra e Figueira da Foz, englobando as bacias hidrográficas dos respectivos afluentes e ocupando uma área de cerca de 1500 ha.
Esta planície do Baixo Mondego é uma zona rica em história, em diversidade biológica e em actividade agrícola, mas é, igualmente, uma zona de extrema complexidade e sensibilidade, tanto nos aspectos físicos e biológicos, como humanos. As suas dimensão, produtividade potencial e localização conferem-lhe enorme importância ecológica, socioeconómica e política.
Além dos monumentos de Coimbra, no Baixo Mondego existe um vasto património arquitectónico, de que são exemplos o castelo de Montemor-o-Velho, o celeiro dos Duques de Aveiro, em Pereira do Campo, igrejas e conventos, dos quais resultou alguma doçaria regional (conventual), como as queijadas de Pereira e as barrigas-de-freira.
Por outro lado, parece que, junto ao Outeiro de Santa Eulália (Maiorca), teria existido um porto flúviomarítimo, ocupado, nos séculos VIII e VII a. C., por uma feitoria fenícia ou por populações de origem cretense que, visando a exploração de metais, estabeleciam relações comerciais com o Mediterrâneo Ocidental.
Do ponto de vista ambiental, cumpre referir que, num habitat integrado, como é o dos pauis e áreas alagadiças da planície do Mondego, existe um equilíbrio entre as espécies, o qual permite que todas sobrevivam sem que alguma prevaleça de forma determinante sobre a outra. A própria vegetação é mantida sob controlo pelos animais e o ambiente envolvente goza de um equilíbrio derivado do próprio pântano ou área húmida.
Todavia, a drenagem indiscriminada dessas planícies alagadiças ou pantanosas e a colmatagem, com o objectivo de cultivar ou construir, têm contribuído para a destruição das culturas nas áreas vizinhas devido ao desaparecimento das aves que tinham os insectos nocivos sob controlo.
Detenho-me neste ponto para aludir às consequências da regularização do Mondego — que produziu efeitos de relevância ambiental não despicienda, traduzidos em modificações ecológicas drásticas que se processaram e ainda se estão a processar — e pela simples razão de o primeiro objectivo concreto que o PSD recomenda ao Governo ter a ver, precisamente, com a regularização dos rios Arunca, Pranto, Ega e Foja, afluentes do Mondego.

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Recordo que uma das graves consequências da obra de regularização do Mondego foi o derrube, ou destruição, de um grande número de árvores, de que é um exemplo o caso do Choupal (cerca de 5000 árvores mortas).
As culturas e todo o vale estão, assim, mais sujeitos à acção erosiva dos ventos, dando-se, paralelamente, o desaparecimento significativo de dois interfaces — o solo e a água.
Outra grave consequência foi a situação de ruptura dos ecossistemas do vale, com repercussão nos equilíbrios biológicos das áreas limítrofes, como os da costa e os da zona designada por «monte», dandose, assim, a desertificação biológica do vale central.
Muitas outras modificações drásticas se deram após a regularização do Mondego, das quais vale a pena mencionar as cheias. A regularização permitiu que não se sentissem os efeitos das cheias durante os últimos anos.
As cheias do Mondego causavam, muitas vezes, é certo, graves prejuízos, particularmente à agricultura, quando se davam nas alturas das sementeiras ou das colheitas. Mas as cheias transportavam sedimentos úteis e «limpavam» a planície da excessiva concentração de produtos químicos resultantes do uso abusivo de pesticidas e nutrientes artificiais.
Por outro lado, há que referir que os pauis do Baixo Mondego representam o ambiente ideal para algumas espécies de animais e de plantas, defendem as terras interiores da agressão da salinidade, funcionam como reguladores do clima, quer na região mais junto ao litoral, quer no interior.
Também os pauis sofrem com as já referidas drenagens e colmatagens, com o objectivo de cultivar ou construir, bem como com a construção de infra-estruturas, como portos artificiais, estradas, caminhos-deferro e indústrias e agregados populacionais, que, embora necessários, não deixam de drenar os efluentes para os pauis.
Todo o Baixo Mondego, aliás, é um exemplo do impacte provocado por essas actividades da civilização, além da impermeabilização provocada pelas obras de irrigação e no leito do rio.
Não divisamos, contudo, entre os objectivos do projecto de resolução, qualquer menção à protecção destes pauis.
Sem prejuízo das questões atrás suscitadas, e para terminar, gostaríamos de referir que o Grupo Parlamentar do CDS-Partido Popular apoia, no essencial, este projecto de resolução, visto que o mesmo visa dar corpo às conclusões da visita acima aludida, as quais apontam no sentido da reconversão e regularização da obra hidroagrícola do Baixo Mondego, do aproveitamento turístico, hidroagrícola e ambiental do vale do Mondego e da inclusão no Quadro Comunitário que se rege pelo QREN 2007-2013.
Os autarcas dos municípios daquela zona alertam, de resto, para o facto de a maior parte dos investimentos necessários já estarem estudados, faltando apenas afectar recursos financeiros.
Já foram gastos 664,2 milhões de euros no aproveitamento hidroagrícola do Mondego, desde 1976. No entanto, desde 1999 que os investimentos pararam no vale do Mondego, faltando concluir 7% da obra.
É imperativo que haja uma priorização real desses investimentos, sob pena de pôr em causa o projecto.
A conclusão da obra em falta tem um custo de 50 milhões de euros, pelo que a inclusão no QREN de verbas a afectar a este projecto é essencial.
Por outro lado, e com o objectivo de sustentar os custos inerentes à manutenção e ao uso das infraestruturas, há que tomar uma opção: ou criar um organismo público, do tipo do Gabinete da Ria de Aveiro, que fará o papel de gestor do sistema, ou deixar esse papel a associações de consumidores constituídas especificamente para esse efeito.
Uma conclusão parece-nos inevitável. É necessário concluir as obras no vale do Mondego, é necessário acabar as infra-estruturas para o vale do Mondego poder ser mais competitivo. As reivindicações do Baixo Mondego são antigas e merecem todo o nosso interesse e apoio.
Pelo exposto, o CDS votará favoravelmente o presente projecto de resolução.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Agostinho Lopes.

O Sr. Agostinho Lopes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de começar por saudar os representantes do Baixo Mondego presentes nas galerias.
Srs. Deputados, é sempre assim: quando se volta à oposição, soltam-se as fontes da clarividência política e da inteligência estratégica e apetece fazer tudo aquilo que não se fez enquanto se foi governo; quando se regressa ao governo, um denso e amnésico nevoeiro cai e obnubilam-se a clarividência e a inteligência estratégica. E esquece-se de fazer tudo o que se tinha prometido/proposto fazer enquanto se era oposição.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Muito bem!

O Orador: — PSD e PS, à compita, são mestres nesta dialéctica alternância do arrependimento na oposição, do esquecimento no governo. Percebe-se também a necessidade de precisar o vulgar dito «cura de oposição». É que a «cura» só dura enquanto se é oposição. A recaída é imediata, logo após a saída desse

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«estado»!

O Sr. Honório Novo (PCP): — Bem lembrado!

O Orador: — O PSD foi, durante anos a fio, governo do País, quase sempre governando com maioria parlamentar absoluta, sozinho ou com o CDS-PP. E é agora, na oposição, passados três Quadros Comunitários de Apoio e mais de 50 000 milhões de euros disponíveis para investimentos, como o que agora se propõe, passados não sei quantos Orçamentos do Estado, que o PSD se lembra de promover o Baixo Mondego. Sempre se dirá «mais vale tarde do que nunca»!… O problema é que, tarde ou cedo, PS e PSD nunca se endireitam e sempre esquecem, no governo, o que diziam e propunham, na oposição! Para o PSD, chegou a vez dos «saudosos campos do Mondego».
Era obrigatório que, na abordagem desta iniciativa, o PSD, tendo uma continuada e prolongada permanência no governo deste país, começasse por nos dizer, por esclarecer, porque não fez o que agora propõe que o Governo PS faça.
Que razões orçamentais, políticas, económicas, explicam não se terem concretizado investimentos de tão evidente necessidade, tão claramente reprodutíveis, tão facilmente «orçamentáveis», face aos seus valores modestos, quando cotejados com faraónicas obras e projectos de sucessivos governos (bastariam, nalguns casos, as «derrapagens» de algumas obras públicas)? Porquê, 30 anos passados sobre o seu início, não estarem acabadas as obras do aproveitamento hidroagrícola do Baixo Mondego? Por que nos encontramos a cerca de 50% dos previstos 13 500 ha e 18 blocos do perímetro de rega? Por que só cerca de 60% do emparcelamento agrícola se encontra realizado? Por que o alargamento das obras aos vales secundários dos rios Arunca, Pranto, Arzila, Ega, Anços, Foja e ribeira de Ançã, para os estabilizar, continua por fazer? E não foi por falta de lembrança, pois, ao longo destes anos, o PCP e também as organizações agrícolas e autárquicas da região muitas e muitas vezes reclamaram essas obras.

O Sr. José Soeiro (PCP): — Muito bem!

O Orador: — E não basta cantar loas às enormes potencialidades agrícolas do Baixo Mondego, à qualidade do seu arroz, às potencialidades da sua horticultura ou à qualidade das suas searas de milho.
É necessário, a par da urgente concretização das obras de engenharia hidroagrícola e de emparcelamento, uma política agrícola que desenvolva potencialidades. Não a política agrícola que foi, ontem, do PSD e é, hoje, do Governo do PS. Uma política agrícola de defesa da produção nacional, de preços e mercados, de ajudas e incentivos, e em que as condicionalidades ambientais, que parece só existirem para os agricultores, não se transformem em nova e insuportável carga para os produtores.
Disto isto, percebemos as preocupações do PSD. Está, com grande atraso, iniciado um novo quadro de fundos comunitários — QREN e Plano de Desenvolvimento Rural (PDR). Ora, apesar das avultadas verbas para regadios previstas no Plano de Desenvolvimento Rural, nenhuma referência concreta aparece para o Baixo Mondego, aliás, como para outras áreas de potenciais regadios, à excepção de Alqueva.
Na opinião do Grupo Parlamentar do PCP, é obrigatório que as obras hidroagrícolas do Baixo Mondego sejam dotadas com as verbas adequadas às suas necessidades, seja através do Plano de Desenvolvimento Rural seja através do QREN.
Por estas e muitas outras razões, fiel aos seus compromissos, o Grupo Parlamentar do PCP está de acordo com o projecto de resolução em debate, mesmo se precisava de algumas pequenas correcções, como: substituir «remodelação» por «construção» de uma escada de peixes, que não foi feita; clarificar, na alínea a), o que se entende por «uso urbano do Vale e do Rio Mondego», não vá isto transformar-se nalgum ataque à terra agrícola; ou uma nova redacção da alínea d), precisando «recuperação ambiental», através da limpeza do leito central do rio Mondego e dos leitos periféricos — Arunca, Ega, Pranto, Foja e ribeira de Ançã.
Questões que não impedem o nosso voto favorável ao projecto de resolução apresentado.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes, para uma intervenção.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes de mais, saúdo os representantes dos agricultores e dos autarcas do Baixo Mondego presentes nas galerias a assistir a esta discussão.
Na apreciação do projecto de resolução n.º 198/X, apresentado pelo PSD, visando a promoção do Baixo Mondego, o Partido Ecologista «Os Verdes» acompanha o entendimento de que, de facto, naquela zona do nosso país existem problemas muito específicos, preocupantes e que, lamentavelmente, não têm merecido a melhor atenção e, no investimento feito, nem sempre têm conhecido as melhores soluções.
De facto, historicamente, o rio Mondego, designadamente no Baixo Mondego, isto é, naquela planície

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aluvial sedimentar que se prolonga desde Coimbra até ao Atlântico, na Figueira da Foz, atravessando ainda os concelhos de Montemor-o-Velho, Soure e Condeixa-a-Nova, apresenta características muito particulares que levaram mesmo a alcunhá-lo de «basófias», pela irregularidade natural do seu regime hídrico e das suas cheias, mas algo anormal ou diferente quando comparado com outros rios portugueses, sendo impossível prever quando e por onde sairia o rio do seu leito principal.
Esta situação, e o desejo de fazer o aproveitamento hidroeléctrico daquela zona, levou a que se tivesse encetado uma profunda alteração no Baixo Mondego, com uma intervenção porventura demasiado pesada, nem sempre se tendo recorrido às soluções técnicas mais adequadas e com várias edificações e transformações no terreno, como a construção de diques de protecção ou de barragens, como a da Aguieira ou a da Raiva, na intenção de se regularizar o regime hídrico do rio Mondego.
Hoje, vários técnicos, quer da área ambiental quer da hidrogeologia, chamam a atenção para o facto de que algumas daquelas intervenções vieram a contribuir para alguns efeitos indesejados, como o assoreamento ou a perda de biodiversidade, não só na fauna piscícola, caso da lampreia marinha, da enguia, do sável ou da savelha, mas também na avifauna, uma vez que estamos perante uma zona com valores ambientais a serem acautelados, a zona húmida do estuário do Mondego ou a reserva natural do Paúl de Arzila, ZPE (Zona de Protecção Especial) da Rede Natura 2000.
Assim sendo, é fundamental que qualquer intervenção naquela zona seja bem equacionada, bem planeada e acompanhada, antes, durante e depois das obras, para garantir que estas se fazem tendo em atenção que um rio é um ecossistema importantíssimo e, simultaneamente, fonte de vida e potencial de desenvolvimento agrícola, energético, turístico e de lazer, mas sempre salvaguardando a necessidade de compatibilizar — e compatibilizar não é submeter uns aos outros — os diferentes usos do rio, os diferentes interesses em causa, incluindo o interesse público de defesa da natureza e do ambiente, a sustentabilidade ecológica e, naturalmente, a qualidade de vida e a segurança das populações ribeirinhas dos cinco concelhos e dos seus agricultores.
As dramáticas cheias de 2001, que colocaram em perigo pessoas e bens, desalojaram centenas de famílias e destruíram culturas e infra-estruturas, vieram demonstrar que nem tudo está bem (não só a nível de falta de coordenação de entidades), designadamente no que diz respeito às barragens e aos seus despejos em altura de chuvas, mas também num balanço que se requeria em relação às intervenções que já foram feitas.
De facto, sempre que se intervém na natureza, em especial nos rios, é preciso muito cuidado e redobrada atenção, compreendendo os ciclos naturais e que qualquer intervenção de regularização de um curso de água tem sempre consequências, por vezes difíceis de prever, por vezes altamente indesejadas.
Contudo, há que reconhecer que está aqui criada uma situação em que se iniciou um determinado tipo de intervenção e o pior que se poderia fazer agora era não concluir o projecto há tantos anos iniciado, há tantos anos a aguardar um desfecho tão esperado, os tais 7% que faltam para acabar a obra.
O respeito pelos autarcas, agricultores e populações exige outra postura por parte das entidades responsáveis, designadamente pelos governos — e, é de referir, pelas duas forças políticas que se têm alternado no poder, PSD e PS. Exige não só que se concluam os projectos mas que as infra-estruturas já construídas ou reconstruídas sejam acompanhadas de obras de manutenção.
Em relação ao presente projecto de resolução, Os Verdes gostariam de dizer que estamos de acordo com várias medidas propostas para incluir na tal Estratégia de Desenvolvimento para o Baixo Mondego, que a Assembleia da República recomendará ao Governo que adopte, designadamente: recuperação ambiental do leito central do Mondego e do leito periférico direito; remodelação da escada de peixes do açude-ponte de Coimbra; melhoria das acessibilidades no vale e do seu relacionamento com o exterior; aproveitamento adequado de todo o potencial produtivo agrícola, nomeadamente através da promoção de emparcelamentos fundiários, da promoção da agricultura biológica e, também, da promoção da participação expressiva e interessada dos cidadãos e entidades abrangidas pelas medidas constantes da tal Estratégia de Desenvolvimento.
Não podemos, contudo, acompanhar aquela proposta que vai no sentido de, na lógica do novo Regime Jurídico da Água e dos Recursos Hídricos, desresponsabilização do Estado e da entrega a privados da gestão desses recursos e de competências do poder público, pois isso pode vir a significar a entrega da gestão da água naquela região a uma única entidade privada, por exemplo, a EDP, que sempre estará tentada a colocar os caudais ecológicos, os interesses agrícolas e a própria segurança das populações depois do uso hidroeléctrico.
Os Verdes não deixam, ainda, de referir que seria muito útil a constituição de uma comissão de acompanhamento e de vigilância em relação aos eventuais perigos causados pelas obras naquela região.

O Sr. Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.

O Orador: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Por último, Os Verdes não vão, naturalmente, obstar à aprovação deste projecto de resolução, ao contrário, aliás, do que fez o Partido Social Democrata, que acompanhou o Partido Socialista nas votações dos diferentes Orçamentos do Estado nos últimos anos, em que chumbaram propostas, designadamente

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do Partido Ecologista «Os Verdes», de alteração do PIDDAC, que criavam rubricas financeiras para que certas obras, indo ao encontro das necessidades das populações ribeirinhas do Baixo Mondego já pudessem estar hoje concretizadas, designadamente, a ciclovia do Mondego entre Coimbra e Praia da Claridade, a construção da escada de peixes no açude-ponte de Coimbra ou o desassoreamento do rio Mondego.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, terminada a apreciação do projecto de resolução n.º 198/X, vamos dar início à discussão conjunta, na generalidade, da proposta de lei n.º 141/X — Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito dos Direitos de Propriedade Intelectual, alterando o Código da Propriedade Industrial, o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos e o Decreto-Lei n.º 332/97, de 27 de Novembro, e do projecto de lei n.º 391/X — Altera o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, transpondo para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, relativa ao respeito pelos direitos de propriedade intelectual (PCP).
Para apresentar a proposta de lei n.º 141/X, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A propriedade intelectual é um direito fundamental, constitucionalmente consagrado e desde há muito objecto de convenções internacionais e de legislação comunitária.
Os desafios lançados pela inovação tecnológica, cada vez mais acelerada no domínio da produção, transmissão e suporte da informação, têm obrigado a sucessivos reajustamentos do quadro legal. Tal é o caso da Directiva cuja transposição para a ordem jurídica interna é objecto da presente proposta de lei, que abrange os domínios do Direito de Autor e da Propriedade Industrial.
O objectivo principal da Directiva é intensificar o combate à contrafacção — ou «pirataria», como se diz na gíria —, introduzindo medidas processuais que tornam mais simplificada, célere e efectiva a neutralização das actividades ilícitas. Trata-se não só de combater a contrafacção mas, também, de a desencorajar.
O que se pretende com a Directiva é que os infractores, neste caso, em especial aqueles que operam à escala comercial, sejam confrontados, desde logo, processualmente com medidas tão eficazes que deixem de ter margem para encarar a sanção da prática ilícita como um mero risco que vale a pena correr ou como um mal menor, comparado com as vantagens materiais da reincidência.
A Directiva aplica-se tanto à contrafacção de bens e serviços fabricados, distribuídos e prestados ilicitamente dentro do mercado interno europeu como à contrafacção importada de países terceiros e que logrou ilicitamente passar os controlos alfandegários.
A proposta de transposição para a ordem nacional cinge-se, no essencial, ao conteúdo da Directiva.
Seria desajustado ir mais além, estando o direito processual civil em fase de significativa revisão.
Foi devidamente ponderado o destino a dar aos bens ilícitos e aos materiais e instrumentos apreendidos que tenham servido para a sua criação, fabrico e distribuição.
Assim, na presente proposta de lei, mas somente no que respeita ao Direito de Autor e Direitos Conexos, atendendo à natureza dos bens em causa, atribui-se ao juiz a competência para, ouvido o lesado, decidir no sentido da reutilização social dos bens, entregando-os a instituições de solidariedade social, ensino, cultura ou investigação sem fins lucrativos.
Aproveita-se também a transposição da Directiva para reajustar o regime de isenções relativas à obrigação da remuneração por comodato, isto é, empréstimo de obras. O leque de instituições isentas passa a ser agora limitado a bibliotecas públicas, escolares e universitárias.
Assegura-se assim, de uma forma equilibrada, a harmonização de dois interesses. A saber: o interesse da defesa do Direito de Autor e da dinâmica do mercado editorial que o serve, servindo a cultura; e o interesse em salvaguardar e promover o acesso público, tão alargado quanto possível aos bens culturais, à educação, informação e investigação.
A proposta de lei foi objecto de debate público numa versão inicial, colocada no site do Gabinete do Direito de Autor, do Ministério da Cultura. Algumas sugestões avançadas por entidades de gestão colectiva do Direito de Autor e Direitos Conexos, advogados e representantes qualificados do mundo académico foram acolhidas no texto final.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para fazer a apresentação do projecto de lei n.º 391/X, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Cultura e Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do PCP, após ter recebido e lido com atenção a proposta de lei, decidiu trabalhar com vista a contribuir, neste debate, com uma iniciativa legislativa própria sobre a matéria. Isto porque, depois

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de termos ouvido opiniões de várias entidades que participaram neste processo legislativo, que trabalham esta matéria e se debruçam sobre ela e que têm um interesse directo nesta questão — as associações representativas dos autores, dos criadores, e também a própria Ordem dos Advogados —, pareceu-nos que tinha razoabilidade um reparo que era feito por muitas destas associações, que, aliás, fizeram chegar a esta Assembleia uma posição comum sobre esta matéria. Foi-nos dito que a transposição da Directiva no que se refere às alterações propostas ao Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos padecia de algumas insuficiências, ficando aquém do que prevê a própria Directiva nalguns aspectos.
Para além disso, estando nós a legislar em matéria essencialmente de processo civil, dever-se-ia encontrar em Portugal um enquadramento que pudesse tutelar de uma forma mais efectiva os Direitos de Autor perante um fenómeno que é de todos conhecido, que é o da contrafacção, normalmente conhecida por «pirataria».
Ora, recolhendo as várias opiniões e os diferentes contributos que foram apresentados, ponderámos e trabalhámos no sentido de apresentar um projecto de lei que esperamos que venha a ser considerado no debate na especialidade, que se seguirá a esta fase do processo legislativo.
Há um consenso generalizado quanto à gravidade do fenómeno da contrafacção, particularmente num domínio em que a contrafacção é extremamente fácil e, como tal, extremamente lucrativa, que também é feita através de formas de criminalidade altamente organizada. Não estamos a falar de alguém que, na sua casa, faz contrafacção de CD ou de DVD, embora isso seja cada vez mais acessível de ser feito, mas, sim, de criminalidade organizada, altamente lucrativa, à custa do roubo de direitos de propriedade intelectual. É isto que é preciso combater.
Efectivamente, há que reconhecer que a legislação processual civil que temos — o Código de Processo Civil— não é suficiente, não tem os mecanismos mais adequados para uma tutela efectiva desse direito.
Assistimos, por isso, a que os defensores (em termos jurídicos e em termos judiciais) dos direitos que são lesados com este tipo de fenómenos vejam os respectivos processos arrastarem-se nos tribunais, com uma grande dificuldade em ter uma tutela efectiva do direito que visam proteger.
Portanto, é necessário adaptar o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos com mecanismos processuais (os mecanismos de processo civil) capazes de, em tempo útil, prevenir e impedir esse tipo de fenómenos, mas, quando eles ocorram e sejam detectados, levar a cabo uma acção pronta e efectiva que possa pôr cobro a esses factos.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — Para mais, uma acção que permita, designadamente em sede indemnizatória, ressarcir os lesados dos direitos que foram violados e do património de que foram esbulhados.
Daí que, em determinadas matérias, o nosso projecto vá mais longe do que a proposta de lei, nomeadamente em matéria de procedimentos cautelares, que, do nosso ponto de vista, deveriam ser adoptados.
Pensamos, portanto, que não se deveria perder esta oportunidade.
Já que o Governo ainda dispõe de tempo, poderia habilitar-nos com a sua opinião sobre esta matéria, dizendo como está a encarar este processo legislativo e se já teve oportunidade de se debruçar sobre o projecto de lei do PCP. Gostávamos de saber se o Governo considera ser possível, neste processo legislativo que ora iniciamos, chegar a uma conclusão que tenha mais em conta as opiniões que têm sido manifestadas por quem, de facto, conhece por dentro este problema e por quem conhece, no dia-a-dia, as dificuldades que existem hoje para, perante os tribunais, fazer valer os direitos dos autores.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!

O Orador: — O nosso espírito, neste processo legislativo, não é o do confronto com a proposta de lei mas, sim, de complementaridade. Pensamos que há insuficiências que podem e devem ser colmatadas e que há muita reflexão sobre esta matéria de que todos podemos beneficiar.

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Muito bem!

O Orador: — A Assembleia da República ainda tem algum tempo. Sabemos que há prazos de transposição que já foram ultrapassados, mas também nos parece que não é por aí que vem mal ao mundo e que no tempo que teremos nos próximos meses será possível elaborar um trabalho legislativo que permita fazer uma alteração ao Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos favorável a que os direitos de autor se possam fazer valer perante fenómenos de pirataria e de contrafacção, que são um prejuízo para os autores e para o País, são um prejuízo para economia nacional, pela economia paralela que geram, mas também para a cultura nacional. É, de facto, um «crime de lesa cultura» o fenómeno da contrafacção impune de muitas horas, de muita criatividade e de muito investimento a que se assiste hoje.
O nosso espírito é este. Esperamos que o Governo esteja dotado de idêntico espírito e que possamos fazer uma lei positiva.

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Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Arnaut.

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: O Estado português tinha um prazo até 29 de Abril de 2006 para transpor a directiva conhecida por directiva do «Enforcement», no jargão comunitário.
No direito da propriedade intelectual — sobretudo na propriedade industrial — , pior do que não ter lei nenhuma é ter uma lei que não é aplicada ou é deficientemente aplicada. A protecção da propriedade industrial, em particular, implica sempre elevados custos, principalmente num sistema de patentes. Uma gestão correcta de marcas, desenhos e patentes significa para uma qualquer empresa um orçamento muito significativo. Custa também vigiar a contrafacção e processar os infractores, algo que sai cada vez mais caro.
Como tal, as expectativas depositadas numa patente, sendo traídas, podem trazer grandes prejuízos ao titular, face aos investimentos que teve de realizar. E nada pior para a economia — uma economia que se pretende da inovação e das novas tecnologias — do que criar, em qualquer circunstância legislativa, falsas expectativas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — A economia da inovação tem tendência firme a sedear-se exclusivamente em países previsíveis e que dêem garantias efectivas de respeito pela propriedade intelectual.
Os vultuosos gastos com a criação e marketing não podem, pura e simplesmente, ser deitados a perder por manifesta ineficiência de um qualquer sistema legal de um país dito desenvolvido.
Por todas estas razões, uma lei que se aplique inadequadamente, como parece querer esta transposição particularmente no âmbito do Direito de Autor, ou que não se aplique de todo, faz com que as empresas suportem os custos do putativo sistema de protecção sem tirar dele qualquer benefício, para já não referir a sensação de insegurança e do pior dos sentimentos, o da frustração, que provoca, nada favoráveis à estabilidade e ao desenvolvimento dos negócios num país que quer e pretende atrair inovação e novas tecnologias, como tanto anuncia este Governo.
Onde há custos sem benefícios, é urgente eliminar os custos! Portugal tem de decidir, de uma vez por todas, que política pretende implementar a este respeito. Não haverá pior política, repete-se, do que a de criar falsas expectativas aos agentes económicos, que se traduzem em perfeitos logros e que, além disso, são acompanhadas de custos que se revelam totalmente inoficiosos.
Poder-se-á perguntar por que é que, com frequência, o decisor político afirma uma coisa e, na sua acção, faz outra. Neste caso, um dos legisladores, o Ministério da Cultura, parece ter sido mal aconselhado por pessoas que são de opinião de que o direito intelectual se destina, sobremaneira, a proteger as grandes multinacionais estrangeiras. Neste sentido, essas pessoas parecem pensar que é preciso fazer tudo para abrir algumas brechas no direito intelectual que permitam dar uma janela de oportunidade ao pequeno e médio pirata nacional, para que uma certa economia marginal e decadente possa sobreviver.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Na verdade, esta postura parece evidenciar resquícios de um «Gonçalvista» que por aí existirá! É evidente que isto é completamente errado por vários motivos. Desde logo, pelo facto de o pequeno e médio piratas nacionais já terem sido há muito substituídos por organizações internacionais muito bem preparadas e com grande capacidade de escoamento do material contrafeito.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — O futuro de qualquer país desenvolvido passa pela sociedade do conhecimento, passa pela inovação e passa também pela indústria da cultura. São estes os sectores nevrálgicos do progresso.
Ou os favorecemos ou deles abdicamos. Em nenhuma circunstância podemos ficar «a meio da ponte».
Por esta razão, é absolutamente decisiva a adopção de um elevado nível de protecção da propriedade intelectual em Portugal e, por isso, esta transposição só peca por tardia. O enforcement do direito da propriedade intelectual pressupõe um sistema completo e harmonioso não só de normas de direito substantivo mas, sobretudo, de disposições de cariz processual.
O direito processual comum que existe actualmente serve para tudo e, por isso, pode acabar por servir pouco ou quase nada quando se trata de matérias de carácter muito específico que pedem soluções particulares.
Uma questão chave reside na correcta compreensão dos direitos de exclusivo. Aliás, importa salientar que, quanto à sua natureza, estes direitos de exclusivo são direitos absolutos, isto é, direitos oponíveis erga

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omnes.
Por outro lado, a protecção de bens imateriais, que constituem o objecto destes mesmos direitos, exige medidas legislativas diferentes das normalmente apropriadas para proteger os bens de natureza material ou tangível. É indispensável compreender que, por exemplo, a violação de um direito de autor não é a mesma coisa que o roubo de um automóvel ou de uma mala de viagem. As medidas que asseguram o domínio das coisas corpóreas não são, em princípio, adequadas a uma correcta tutela dos bens imateriais.
A directiva tem bem presente a estrutura específica destes direitos, que é, aliás, uma das suas principais justificações. É pena que quem, no Ministério da Cultura, teve o cuidado de fazer esta transposição não o tenha percebido ou, tendo percebido, tenha feito exactamente o contrário com intuitos pouco claros que ainda estão por esclarecer.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Deve sublinhar-se, no entanto, que a directiva não visa a harmonização do Direito Processual Civil europeu. Nesta directiva temos apenas um conjunto de medidas voltadas para determinados aspectos dessa implementação, que se impõe harmonizar com mais premência.
A directiva parte de um nível normal de protecção do direito da propriedade intelectual num país desenvolvido. Não toma em consideração nem tem como ponto de partida ordenamentos jurídicos particularmente fragilizados nesta matéria, como é, sem dúvida, o caso português. A directiva não enuncia um conjunto de medidas hierarquizadas, com carácter sistemático e completo.
Por tudo isto, importa que haja também harmonia naquela que é a transposição da directiva no que respeita ao Código do Direito de Autor e ao Código da Propriedade Industrial. Não pode haver uma interpretação da directiva para o Direito de Autor e outra para o Código da Propriedade Industrial. De facto, o Direito de Autor está na tutela do Ministério da Cultura, onde algumas forças reaccionárias (porque estão contra a modernização, a inovação e as novas tecnologias) ainda conseguem ter alguma influência, e a propriedade industrial está na tutela do Ministério da Justiça, que aposta manifestamente no espírito da directiva e no discurso político do Governo, de apoio à inovação e às novas tecnologias.

A Sr.ª Zita Seabra (PSD): — Muito bem!

O Orador: — Mas é precisamente esta a diferença que existe e esta harmonia que não acontece, como salientaram as entidades ouvidas em sede de Comissão de Educação e Cultura e como ressalta do relatório feito na 1.ª Comissão, em que se destaca a necessidade de corrigir, em sede de especialidade, todas as incongruências no âmbito da transposição feita pelo Ministério da Cultura.
Esta visão de que o Direito de Autor visa a protecção das multinacionais e que há que proteger os «piratas pequeninos e coitadinhos» não está adequada ao espírito da directiva, está datada e é contra uma política que o Governo apresenta como sendo de inovação e de tecnologia.
Não se percebe como o Ministério da Cultura está contra os próprios desígnios políticos do Governo e, em particular, contra o discurso do Primeiro-Ministro no apoio à inovação e às novas tecnologias. O Ministério da Cultura tem, portanto, de se harmonizar com o discurso do Sr. Primeiro-Ministro.
Importa também e cabe à Assembleia da República não se demitir dessa sua responsabilidade, agora em sede de especialidade, para que possamos ter uma transposição que não desvirtue a razão de ser da directiva e para que as forças de bloqueio que aparentemente ainda persistem no Ministério da Cultura percebam que o seu tempo já passou.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de terminar.

O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Como vê, o seu tempo também já passou!

O Orador: — Só espero que o Governo, por fim, acorde e não permita estes sinais contrários à inovação e às novas tecnologias.
Só uma correcta transposição, da qual resulte harmonia quanto às alterações a efectuar no Código dos Direitos de Autor e Código da Propriedade Industrial, nos dotará de instrumentos jurídicos iguais a outros países europeus. É esse o trabalho que temos de fazer na especialidade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Portugal.

A Sr.ª Teresa Portugal (PS): — Sr. Presidente, salvaguardando a admiração que resulta das minhas lei-

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turas de infância e também da história, penso que já não há piratas como antigamente!

Risos do PS e do PCP.

Estou a lembrar-me dessa grande figura que foi o Francis Drake, entre outros.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Ou do Sandokan!

A Oradora: — Só o digo para descansar o Sr. Deputado José Luís Arnaut, assegurando-lhe que o Partido Socialista, salvaguardando este aspecto, não defenderá os grandes piratas nem, neste caso, os pequenos piratas. Portanto, há um bom ponto de partida para o trabalho que temos pela frente.
Nesta hora do dia, não vou repetir o objecto desta transposição, que já está claro, mas vou acentuar a razão de ser desta directiva, porque me parece ser o mais importante, e vou falar de pirataria.
O que acontece é que o aumento do tráfico dos produtos de que estamos a falar tem atingido proporções verdadeiramente preocupantes, que chegam a afectar as economias nacionais. E compreendese que isto aconteça pelo desenvolvimento das redes digitais, que, não na hora, neste caso, mas no minuto, conseguem divulgar e pôr na chamada rede global a distribuição dos produtos ilícitos.
Esta crescente violação dos direitos também se explica bem porque utiliza e explora a diversidade da legislação dos vários Estados-membros, como também a diversidade das medidas.
Portanto, esta é a grande razão de ser da directiva em causa, que se propõe harmonizar as diferentes legislações no sentido de se garantir, em primeiro lugar, o respeito pela propriedade intelectual, e, sobretudo, de promover uma luta eficaz contra estes actos ilícitos.
Também gostaria de falar um pouco do enquadramento histórico desta directiva, porque penso que se trata de um lado interessante do papel da União Europeia, que tem produzido e aprovado inúmeros documentos no sentido da protecção dos direitos de autor e da propriedade intelectual. Refiro, por exemplo, um projecto de resolução recente que aponta para que crie, a nível da União Europeia, o estatuto europeu do artística e utiliza como pressuposto o respeito pelos direitos de autor como um acto de partida para o desenvolvimento cultural dos países.
Portanto, há dois pontos de partida conhecidos. Um deles foi a criação de um Livro Verde, em 1998, que fez o diagnóstico desta situação de pirataria e, dois anos depois, na sequência deste livro, apontou-se para a necessidade da criação de uma directiva.
Também sabemos que há inúmeros acordos internacionais nesta área, a que os Estados-membros estão obrigados, desde logo o célebre Acordo TRIPS, sobre os direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio, e várias convenções, como a de Roma, a de Berna e a de Paris.
Portanto, a existência de um quadro legal que harmonize esta diversidade de legislações, no âmbito da defesa da propriedade intelectual, é, em primeiro lugar, uma medida protectora dos direitos de autor, mas, em si mesmo, estimula a criação e permite ao autor o reconhecimento de um lucro legítimo. Garante também condições de circulação, de livre expressão e faz barreira aos obstáculos que possam ser criados à divulgação das obras.
Assim, todo este quadro de que estamos a falar tem reflexos, como já se disse, quer no mercado interno quer na economia, porque o desenvolvimento cultural é cada vez mais acentuado como um factor de desenvolvimento económico.
Naturalmente que o legislador, autor da proposta de lei agora em apreciação, fez as suas próprias opções e, dada a natureza da directiva, transpõe quer para o Código de Direitos de Autor e Direitos Conexos quer para o Código da Propriedade Industrial as diferentes normas em apreço, e não vou agora maçar-vos discriminando-as.
Na sequência do trabalho feito no âmbito da 8.ª Comissão, tivemos oportunidade de realizar algumas audições aos representantes dos artistas, dos autores e dos bibliotecários — que aproveito para saudar, porque percebi que estão presentes —, das quais resultaram interessantes e variadas observações ao trabalho realizado e estou de acordo que, em sede de especialidade, teremos um tempo próprio para apreciar os diferentes contributos.
Gostaria de dar uma curta ideia de algumas das questões que foram levantadas. Uma delas já foi registada pelo Sr. Secretário de Estado, uma vez que está incluída nesta directiva, é a da correcção de aspectos ligados aos direitos de aluguer e comodato e que consta agora desta nova versão.
Como se sabe, a este propósito, Portugal sofreu uma sanção do Tribunal de Justiça Europeu e, por isso, diminuiu-se o uso de estabelecimentos apenas àqueles que já aqui foram referidos: as bibliotecas de leitura pública, as bibliotecas escolares e as universitárias.
Nessa audição, conhecemos a preocupação dos representantes dos bibliotecários sobre este aspecto, que é uma preocupação saudável, na defesa do investimento nacional no âmbito da rede pública.
Cito este exemplo para lhes dar a ideia de que nem sempre é muito pacífica a harmonização entre os direitos de autor e os restantes direitos.
Ainda a título exemplificativo, e só para terminar, não quero deixar de referir um conjunto de preocupações registadas quer pela Sociedade Portuguesa de Autores quer pelo Gabinete do Direito de Autor (GDA),

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entre muitas outras, com o arresto e a prestação de prova.
Nesta matéria, há uma divisão relativamente à opção tomada pelo legislador, que, neste caso, propõe uma reutilização para fins sociais do material apreendido enquanto que aqueles organismos se dividem, por um lado, na sua total inutilização e destruição ou, no caso que agora se assemelha ao projecto de lei apresentado pelo Partido Comunista Português, pressupõem a sua reutilização para fins sociais, desde que o autor concorde.
Portanto, só para traçar uma pequena ideia do panorama, do conjunto técnico desta complexidade de questões, temos matéria de trabalho para uma próxima reunião na especialidade.
Assim, é minha convicção que a Assembleia da República saberá, no cumprimento das suas funções, proporcionar um acrescento de melhoria à proposta de lei, quer na defesa dos direitos de autor quer na busca das melhores medidas contra as actividades comerciais ilícitas. E também aqui, como noutros aspectos, a cultura ganha sempre com a diversidade dos contributos.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Rosas.

O Sr. Fernando Rosas (BE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Discutimos hoje a proposta de lei n.º 141/X e o projecto de lei n.º 391/X, do PCP, tendo por objecto a transposição para a ordem jurídica portuguesa da Directiva n.º 2004/48/CE, do Parlamento e do Conselho, relativa ao Respeito dos Direitos de Propriedade Intelectual, alterando o Código da Propriedade Industrial, o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, e alterando ainda a proposta de lei o Decreto-Lei n.º 332/97, de 27 de Novembro.
Não merecendo reparos de fundo os referidos diplomas nem a directiva agora transposta, no seu justo propósito de reprimir a contrafacção contra os direitos de autor, pensamos que algumas das soluções encontradas pela proposta de lei deveriam merecer alguma reflexão.
Em primeiro lugar, não podemos aceitar a nova formulação relativa ao empréstimo público de obras protegidas pelos direitos de autor, aqui designado por «comodato». Note-se que esta noção de empréstimo público já pressupõe em si, tal como o referido no Decreto-Lei n.º 332/97, de 27 de Novembro, que essa disponibilização é feita sem fins comerciais, quer directos, quer indirectos. Ou seja, não há qualquer lucro por parte da entidade que procede ao empréstimo.
No entanto, de acordo com a proposta de lei, passam a ter de cobrar taxas aos seus utilizadores os museus, os arquivos públicos, as fundações públicas e as instituições privadas sem fins lucrativos, no caso do mero empréstimo sem fins lucrativos.
A nosso ver, deveria ser encontrada uma solução para o pagamento dessa retribuição; uma das hipóteses possíveis seria, por exemplo, a solução francesa, onde foi constituído um fundo com receitas das vendas para o pagamento destas remunerações.
Para além disso, deve incluir-se uma regulamentação expressa da remuneração a aplicar (em vez da arbitragem, como está mencionado na proposta), prevendo-se expressamente que os autores possam renunciar a essa remuneração.
Num País como o nosso, onde o acesso à leitura e aos bens culturais é tão escasso, lamentamos que seja criado, afinal, mais um entrave a esse acesso, prejudicando quer os grupos mais desfavorecidos, que poderiam dele beneficiar quer as instituições que se dedicam precisamente à cultura e sem fins lucrativos.
É a mesma ordem de considerações que nos leva também apoiar a ideia da reutilização de material apreendido, desde que seja para fins essenciais e com o devido controlo por parte das autoridades.
Salientamos ainda a distinção, quer no Código dos Direitos de Autor, quer no Código da Propriedade Industrial, consoante a infracção seja cometida ou não «à escala comercial», ou seja, distinguem-se — e bem —as situações, consoante as violações de direitos de autor sejam feitas com o propósito de obter um lucro económico, essas, sem dúvida, bastante condenáveis. Em si, esta distinção parece-nos positiva.
No entanto, parece-nos demasiado vago o termo utilizado pela proposta de lei. De facto, não se define claramente o que seja uma «vantagem económica comercial», o que pode propiciar interpretações abusivas do conceito. É que, sendo esta uma matéria tão específica, é perigoso deixar a definição deste conceito a uma interpretação casuística. Por outro lado, é duvidoso que exista na nossa ordem jurídica uma definição precisa do referido conceito. Dado que o que se pretende é graduar a gravidade de uma infracção, um termo como este, a nosso ver, não pode ser deixado assim, mais ou menos em branco.
Sr.as e Srs. Deputados, finalmente, uma observação de conjunto. Como proteger quem deve verdadeiramente beneficiar dos direitos de autor? Referimo-nos, como é óbvio, aos autores em si, ou seja, àqueles que efectivamente criam as obras em questão. O mesmo se diga, com as necessárias adaptações, quanto à propriedade industrial.
De facto, o que se passa hoje em dia é que os direitos de autor são cada vez mais «direitos de editor».
São inúmeros os relatos, sobretudo de jovens criadores, que referem não receber qualquer importância pela edição, utilização e comercialização das suas obras, embora elas sejam, de facto, postas no mercado, distribuídas e comercializadas.

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Assim sendo, este aparente reforço dos mecanismos processuais ao dispor dos direitos de autor e da propriedade industrial — que não pomos em causa, pelo contrário — pode vir a não beneficiar, necessária e directamente, os primeiros interessados de tudo isto, que são os autores. Seria, pois, mais desejável que a nova proposta de lei pudesse também adoptar mecanismos que, efectivamente, assegurassem uma repartição mais justa e equitativa dos direitos que se pretendem acautelar entre os autores e os seus próprios editores. Só assim estaria realmente protegida a criação e assegurados os direitos dos criadores.
Sem eles é que nem se pode falar em direitos de autor.

Aplausos do BE.

O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Sr.as e Srs. Deputados: Sr.as e Srs. Deputados: Pretende o Governo, através da proposta de lei n.º 141/X, transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2004/48/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril de 2004, a qual versa, como aliás já foi referido exaustivamente, a matéria dos direitos de autor e dos direitos da propriedade industrial.
Desta forma, quer o Governo alterar o Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos, o Código da Propriedade Industrial e ainda o regime previsto no Decreto-Lei n.º 332/97, de 27 de Novembro.
Escusado será dizer que se trata de matéria de assinalável relevo para a protecção jurídica daquilo que, muito genericamente, podemos apelidar de actividade criativa, nas suas diversas e multifacetadas dimensões.
Esta matéria reveste-se de enorme delicadeza, pois são múltiplos os legítimos interesses em jogo que cumpre acautelar, começando pelo acto de criação propriamente dito, passando pelo acto de divulgação cultural, até ao benefício económico que daí pretenda retirar o autor ou terceiros legitimamente autorizados.
Do mesmo modo, é um dado que não pode ser escondido o facto de funcionarem circuitos clandestinos de contrafacção e reprodução de diversos tipos de criações, que urge combater de maneira muito mais eficaz. Choca a todos a forma descarada como estes circuitos clandestinos de comercialização operam no nosso país. A todos nos incomoda saber que, perante a impotência das autoridades públicas para combater estes circuitos de mercado negro de produção e comercialização, a que aqui já se chamou pirataria, tenham de ser, frequentemente, os próprios interessados a criar novos meios de fiscalização, por conta própria.
As audições que já foram sendo realizadas no âmbito da 8.ª Comissão, como, aliás, já foi referido pela Sr.ª Deputada Teresa Portugal, permitiram constatar que, apesar de parecer haver um grande consenso sobre o caminho que é preciso percorrer e sobre as opções a tomar, nem por isso deixa esta matéria de se revestir de assinalável grau de complexidade técnica, jurídica e até prática. Basta ver, a título de exemplo, a discussão e falta de consenso sobre quais as realidades, factos ou instituições às quais será aplicável o regime do aluguer ou as cláusulas e estipulações relativas ao regime do comodato.
Apelamos por isso ao Governo e à maioria para que as limitações e deficiências que têm sido apontadas a esta proposta de lei pelos vários agentes dos diversos sectores implicados tenham acolhimento na versão a submeter a votação final.
As medidas de natureza civil e processual civil, bem como de natureza mais tipicamente administrativa apresentadas neste diploma são necessárias à protecção de autores, artistas e empresas comerciais, tendo como objectivo agilizar, num domínio que se pode caracterizar como cautelar, mecanismos de obtenção de prova e de reacção rápida contra comportamentos infractores.
Porem, é necessário melhorar aspectos em que a proposta de lei apresenta sérias limitações.
Sabemos que o regime desta directiva não está homogeneamente transposto na versão que consta desta proposta de lei, quer do ponto de vista técnico-jurídico, quer das soluções que preconiza, quer até do ponto de vista da nomenclatura ou forma de redacção, como, aliás, tem sido destacado por especialistas vários sectores e aqui já foi referido.
O PCP apresentou também um projecto de lei, visando precisamente corrigir algumas destas limitações, nomeadamente na parte referente ao Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, que nos parece melhorar e trazer contributos positivos, que saudamos e que nos parece que podem ser, de facto, uma significativa ajuda relativamente ao que pode ser a versão final deste diploma.
O CDS, por isso, manifesta a sua disponibilidade para acolher e defender, na discussão na especialidade que agora terá o seu início, os diversos contributos tendentes à melhoria desta proposta de lei que entretanto fomos recebendo, e estamos certos que, dentro de um espírito de abertura e de um debate sereno, que já tem sido feito, conseguiremos alcançar a melhoria dos códigos em questão. Por isso, havendo, segundo parece, absoluto consenso nos objectivos e também nas causas do problema, estranho seria que não se atingisse o consenso quanto aos meios de o combater.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura.

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O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Arnaut, todos reconhecemos em si um especialista nesta matéria. No entanto, o que ouvimos não foi uma análise serena de um especialista mas um panfleto político. Foi um tipo de intervenção em que não houve uma só exemplificação concreta do que afirmou, de tal maneira que, se há aqui preconceito ideológico, ele é seu, não é nosso, porque, na verdade, o Sr. Deputado não documentou minimamente as suas afirmações. O Sr. Deputado vê gigantes onde há moinhos!

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Está enganado! Veja o relatório!

O Orador: — Ora bem, temos aqui vários níveis. Primeiro, estamos a transpor uma directiva, não estamos a rever o Código dos Direitos de Autor.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Muito bem!

O Orador: — Por outro lado, está em curso uma revisão de fundo do Código de Processo Civil. Vamos misturar a revisão de fundo do Código de Processo Civil com uma intervenção na área do processo civil, a propósito da transposição de uma directiva? Além disso, há várias questões que estão relacionadas com aquilo que o Sr. Deputado afirmou e que têm a ver, designadamente, com o facto de o Código dos Direitos de Autor ter 22 anos e o Código da Propriedade Industrial ser de 2003. Há, pois, questões de sistematização e de integração que são diferentes num caso e noutro.
Certamente que estas dificuldades de sistematização e de regulamentação são complexas, certamente que há contributos de todas as bancadas a este respeito, mas, sobretudo porque esta é uma matéria em que os interesses contraditórios são igualmente legítimos, é muito difícil encontrar o equilíbrio desejável e possível entre eles. Precisamente por isso, creio, haverá toda a vantagem em que, em sede de especialidade, se possa aperfeiçoar a proposta de lei apresentada pelo Governo, incorporando os contributos das diferentes bancadas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado José Luís Arnaut pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Para defesa da honra pessoal, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Defesa da honra pessoal, Sr. Deputado?!

Risos do PS.

Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Arnaut (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Secretário de Estado da Cultura invocou o meu nome. De qualquer forma, gostaria apenas de precisar dois aspectos.
Em primeiro lugar, recomendo ao Sr. Secretário de Estado a leitura do relatório feito na 1.ª e na 8.ª Comissões, bem como o parecer onde estão mencionadas todas as observações que tinham de ser feitas relativamente aos artigos, artigo a artigo, e que têm de ser objecto de alguma harmonização com o Ministério da Justiça.
É evidente que, nos 5 minutos de que dispunha para intervir, não podia entrar numa análise técnicojurídica, por isso falei no conceito. Penso que o que está em questão é o conceito e sempre acreditei que o Sr. Secretário de Estado não tinha aquele conceito, que tinha havido algumas influências, que estão ultrapassadas e datadas no tempo, ou seja, tinha tido alguma influência nesta matéria mas não era esta a posição do Governo, porque essa posição não está consentânea com o discurso sobre a aposta no Plano Tecnológico e da Inovação.
Por isso, Sr. Secretário de Estado, o que defendi e o que apresentei foi uma ideia geral, aliás, como fizeram outras bancadas, que também mostraram a necessidade de corrigir o diploma. Não é por acaso que houve unanimidade entre todas as bancadas no sentido de corrigir algo que foi feito na área dos direitos de autor e não na área da justiça. Portanto, há alguma coisa que está mal, mas é no reino do direito de autor e não no da justiça.
Por isso, o que é preciso é harmonizar, por forma que o Governo tenha sobre a mesma directiva a mesma interpretação e que o diploma reflicta exactamente o espírito da directiva quer quanto ao direito de autor quer no que diz respeito ao direito da propriedade industrial.

Vozes do PSD: — Muito bem!

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O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr. Presidente, quero apenas dar à Câmara uma explicação.
O Sr. Secretário de Estado não pode dar explicações ao Sr. Deputado José Luís Arnaut porque, como é manifesto, ele não ofendeu em nada a sua consideração nem o Sr. Deputado fez a defesa da consideração. Gastou 3 minutos a reproduzir os seus argumentos.
Do lado do Governo, a única coisa que posso dizer é que se mantém toda a disponibilidade para, em sede de especialidade, analisar todas as questões que sejam consideradas.

A Sr.ª Helena Terra (PS): — Exactamente!

O Orador: — Mas não confundamos a discussão política com questões de consideração pessoal, que nunca aqui estiveram em causa. Dizer que uma intervenção é um panfleto não ofende o autor da intervenção nem sequer a intervenção. O Manifesto Comunista é um grande panfleto!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, chegámos ao fim dos nossos trabalhos de hoje.
A próxima reunião plenária terá lugar amanhã, pelas 10 horas, com a seguinte ordem de trabalhos: apreciação da proposta de lei n.º 147/X — Transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2003/72/CE, do Conselho, de 22 de Julho de 2003, que completa o estatuto da sociedade cooperativa europeia no que diz respeito ao envolvimento dos trabalhadores; discussão da proposta de lei n.º 128/X — Autoriza o Governo a legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes e incidentes ferroviários, na medida em que as competências a atribuir aos responsáveis pela respectiva investigação técnica sejam susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais; debate da proposta de lei n.º 131/X — Autoriza o Governo a aprovar o regime jurídico de acesso e exercício das actividades de produção de energia eléctrica a partir da energia das ondas e ainda do projecto de lei n.º 373/X — Princípios gerais para a prevenção da produção, a redução da perigosidade e a gestão de resíduos da construção e da demolição (PSD).
Nada mais havendo a tratar, está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 55 minutos.

Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa à votação final global do texto final, apresen-
tado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de
lei n.º 142/X e aos projectos de lei n.os 229/X e 387/X.

O CDS-PP votou favoravelmente o texto final, apresentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais,
Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta de lei n.º 142/X, do Governo, e ao projecto de lei n.º
387/X, do CDS-PP, que aprova a lei de programação de instalações e equipamentos das forças de
segurança, por entender que a modernização, o reforço dos sistemas de tecnologia de informação e de
comunicação, das viaturas, do armamento e do demais equipamento das forças e serviços de segurança
são urgentes e constituem um imperativo nacional que deve ser planificado a médio prazo, com objectivos
concretos e uma programação plurianual própria.
Em Setembro de 2000, o CDS deu entrada do projecto de lei n.º 302/VIII, que estabelecia as bases
gerais da coordenação, equipamento, reestruturação e reorganização das forças de segurança e onde,
entre outras, propunha a existência de um investimento planificado nas forças e serviços de segurança.
Infelizmente, este mesmo projecto foi rejeitado pelo então governo do PS.
Sete anos depois, o CDS voltou a apresentar outro projecto, o projecto de lei n.º 387/X, que propõe a
aprovação de uma lei-quadro das leis de programação de investimento das forças de segurança e
consagra, por via legislativa, a obrigatoriedade de o governo investir, de forma planificada, em efectivos,
equipamentos, armamento e infra-estruturas, à semelhança do que sucede na lei de programação militar.
Este investimento seria efectuado em quatro anos mas, prevendo-se a eventualidade de novas necessi-
dades surgirem da lei de política criminal, consagra-se a revisão de dois em dois anos deste investimento.
Ao mesmo tempo, e por forma a garantir uma participação efectiva das forças e serviços de segurança na
elaboração dos investimentos, prevê-se a obrigatoriedade de, anteriormente à sua aprovação, o Conselho
Superior de Segurança Interna ser ouvido e, garantindo a fiscalização da Assembleia da República sobre a
execução desta Lei de Programação de Investimentos, a obrigatoriedade de ser anualmente discutida na
Assembleia da República, com a discussão do Relatório de Segurança Interna.
A nosso ver, esta solução é aquela que possibilita uma fiscalização adequada da política de segurança
do Governo pois permite, em simultâneo, conhecer e discutir os números da criminalidade e os investimen-

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tos efectivamente realizados no equipamento das forças e serviços de segurança, em cada ano, pelo
Governo.
Durante a discussão na especialidade, perante a importância da matéria em causa e com sentido de
Estado, o CDS apresentou propostas que pudessem melhorar a proposta de lei do Governo. O PS aceitou
as propostas do CDS de consagrar a obrigatoriedade de audição prévia do Conselho Superior de
Segurança Interna e a inclusão e discussão da execução desta lei no Relatório de Segurança Interna. Foi
assim possível encontrar uma solução de compromisso entre a proposta de lei do Governo e o projecto de
lei do CDS, plasmado no texto comum apresentado e aprovado na especialidade pela Comissão de
Assuntos Constitucionais e Direitos, Liberdades e Garantias.
Contudo e não obstante o seu voto favorável (coerente com o que sempre defendeu e propôs), o CDS
entende que as verbas previstas pelo Governo para o investimento durante os próximos anos é manifesta-
mente insuficiente e, face ao estado actual de degradação das instalações e equipamentos das forças e
serviço de segurança, é exíguo nas verbas dos dois primeiros anos de execução desta lei, que corresponde
ao período que resta à legislatura do Governo do PS.
Na verdade, um investimento global de mais de 400 milhões de euros até 2012 é manifestamente escas-
so para as necessidades das forças e serviços de segurança e, sobretudo nos anos de 2008 e 2009, atinge
valores quase simbólicos de 62 e 74 milhões de euros, respectivamente.
Por outro lado, a não previsão nesta lei do reforço de meios humanos, conforme a proposta do CDS, é
uma importante falha no quadro de investimento para as forças e serviços de segurança previsto na
presente proposta, razão pela qual, e não obstante a existência de um texto comum, o CDS votou contra o
artigo 2.° e o quadro anexo deste texto, onde estão previstos os valores concretos do investimento para as
forças e serviços de segurança.
Em suma, o CDS congratula-se com o facto de, sete anos depois de ter apresentado esta proposta, a
mesma ter sido aprovada por larga maioria da Assembleia da República e, por isso mesmo, votou favora-
velmente o texto comum, mas não deixa de alertar para a exiguidade do investimento previsto e para a
ausência da previsão do reforço de efectivos das forças e serviços de segurança.

Os Deputados do CDS-PP, Telmo Correia — Nuno Magalhães — Pedro Mota Soares — Nuno Teixeira
de Melo — Hélder Amaral — José Paulo Carvalho — Abel Baptista — António Carlos Monteiro — João
Rebelo.

———

Declarações de voto enviadas à Mesa, para publicação, relativas à votação final global do texto final, apre-
sentado pela Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, relativo à proposta
de lei n.º 98/X e aos projectos de lei n.os 211/X, 219/X, 236/X, 239/X, 349/X e 353/X

O Grupo Parlamentar do PCP absteve-se, em votação final global, na revisão do Código Penal.
Foi afirmado, no início deste processo legislativo, que a proposta de lei do Governo não visava alterar a
filosofia do Código em vigor, procedendo, aqui ou ali, a uma sistematização diferente, introduzindo altera-
ções materiais ditadas sobretudo por instrumentos internacionais e promovendo alterações que a prática
vem ditando. Tanto assim foi que, de entre os 130 artigos alterados ou aditados, o Grupo Parlamentar do
PCP votou contra em 17, absteve-se em outros 17, e votou favoravelmente os restantes.
Cumpre também assinalar que das propostas do PCP, que incidiam sobre 53 disposições da proposta
de lei de revisão do Código Penal, foram aprovadas 13. Assim, os textos aprovados para os artigos 78.°, n.º
2 (conhecimento superveniente do concurso de crimes); 121.°, n.º 3 (interrupção da prescrição); 132.°, n.º
2, alínea l), (homicídio qualificado); 171.°, n.º 4 (abuso sexual de crianças); 172.°, n.º 3 (abuso sexual de
menores dependentes); 209.°, n.º 3 (apropriação ilegítima); 212.°, n.º 4 (dano); 213.°, n.º 1, alínea c), (dano
qualificado); 216.°, n.º 3 (alteração de marcos); 217.°, n.°4 (burla); 220.°, n.º 3 (burla para obtenção de
alimentos, bebidas ou serviços); 240.°, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea a), (discriminação racial, religiosa ou
sexual) beneficiaram, no todo ou em parte, de propostas de redacção apresentadas pelo PCP.
Importa porém assinalar que muitas propostas do PCP não obtiveram acolhimento e que, em diversos
aspectos relevantes, as soluções aprovadas tiveram os votos contrários do PCP. São exemplos disso, entre
outros, o artigo 43.°, que permite a substituição da pena de prisão por pena de proibição de exercício de
actividade pública ou privada; o artigo 47.°, que sobe de 1 para 5 euros o mínimo diário da pena de multa,
que se abaterá sobre os pobres e que os colocará em risco de virem a cumprir prisão subsidiária, sendo um
entrave à sua reinserção social; o artigo 50.°, que alarga a suspensão da pena de prisão para crimes até 5
anos de prisão, aplicando-se assim a tipos criminais de elevada gravidade; o artigo 80.°, que passa a
permitir que seja descontada na pena de prisão, por inteiro, qualquer medida preventiva ainda que relativa a
qualquer outro crime; a configuração dada no artigo 152.° à tipificação do crime de violência doméstica,
com a rejeição das propostas do PCP sobre essa matéria; ou ainda, o artigo 371.°, que pune por violação
do segredo de justiça, com prisão até dois anos, quem der conhecimento do teor de acto processual
mesmo que não tenha tido contacto com o processo.

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Esta última disposição assume particular gravidade, na medida em que os incriminados pela violação do
segredo de justiça não serão aqueles que, tendo acesso ao processo, têm o dever de guardar segredo mas
sobretudo os jornalistas que, não tendo acesso directo ao processo, divulguem factos nele contidos. Este
artigo do Código Penal, juntamente com o recentemente aprovado Estatuto do Jornalista, configuram uma
escalada legislativa visando condicionar a liberdade de imprensa e intimidar os jornalistas quanto ao livre
exercício da sua profissão.
Tudo ponderado, o Grupo Parlamentar do PCP entendeu não votar contra a presente alteração do Códi-
go Penal, tendo em atenção algumas melhorias que nele foram introduzidas e para as quais, inclusivamen-
te, contribuiu, mas entendeu igualmente não a poder votar favoravelmente, tendo em conta o carácter nega-
tivo de algumas das alterações introduzidas.

O Deputado do PCP, António Filipe.

———

O CDS-PP absteve-se na votação final global do texto de substituição da Comissão de Assuntos Consti-
tucionais, Direitos, Liberdades e Garantias relativo às iniciativas legislativas que visavam alterar o Código
Penal por entender que, face à importância do diploma, a Assembleia da República podia, e devia, ter
encontrado soluções mais ambiciosas e inovadoras. Recorde-se que esta revisão foi a primeira de um con-
junto de iniciativas constantes do pacto de justiça celebrado pelo PS e pelo PSD com o objectivo de mudar
a justiça em Portugal.
Nas múltiplas reuniões do grupo de trabalho entretanto criado, o CDS, com sentido de Estado e de
forma construtiva, discutiu e votou diversas propostas constantes do seu projecto de lei, as quais
melhoraram substancialmente a proposta de lei do governo.
Assim aconteceu com o artigo 207.º da proposta, relativo aos furtos de valor diminuto. O Governo propu-
nha que estes crimes passassem a ser crimes particulares, dependentes de acusação e de constituição de
assistentes pelas vítimas. Ou seja, alguém que sofresse um furto de valor inferior a 96 euros, para que o
crime fosse sequer investigado, teria que deduzir acusação, contratar um advogado e pagar custas no valor
de 192 euros.
Era este o sinal que a proposta do Governo queria dar aos cidadãos em matéria de prevenção penal. No
caso de serem furtados, para que se fizesse justiça, tinham que pagar o dobro do valor do furto para se
constituírem assistentes, contratar um advogado e deduzir acusação. Assim poder-se-á descongestionar os
tribunais mas certamente não se contribui para o necessário sentimento de segurança que deve presidir a
uma sociedade livre como aquela que pretendemos para Portugal.
Só assim não aconteceu porque o CDS apresentou uma proposta de eliminação desta alteração e o
furto de valor diminuto mantém-se como crime semi-público.
Por outro lado, no projecto de lei apresentado, o CDS propunha medidas em diversas áreas, mas
apenas nos crimes contra a autodeterminação sexual, no segredo de justiça e na reforma do sistema
prisional viu algumas delas aprovadas. Nestes aspectos, o CDS reconhece que alguns passos positivos
foram dados, mas não olvida que este Parlamento, pura e simplesmente, não quis discutir a nossa proposta
de redução da idade da imputabilidade penal.
Mantemos que a actual definição dá lugar a consequências contraproducentes que o legislador continua
a não perceber: A consciência da inimputabilidade é um facto real que provoca um efeito de «provocação à
lei» e contribui para uma crise de credibilidade do sistema judicial e das forças de segurança. Impunha-se,
assim, harmonizar a idade de imputabilidade com a realidade e o regime previsto em outros países que têm
idades iguais ou inferiores à proposta pelo CDS. É assim em Inglaterra, na Holanda, na Grécia, em França,
na Alemanha, em Itália ou nos países escandinavos, entre outros.
Por tudo isto e apesar de considerarmos algumas destas alterações positivas, podíamos e devíamos ter
ido mais longe e ao menos ponderado a redução da idade da imputabilidade.
Por todas estas razões o CDS absteve-se na votação final global.

Os Deputados do CDS-PP, Nuno Magalhães — Pedro Mota Soares — Hélder Amaral — José Paulo
Carvalho — António Carlos Monteiro — Abel Baptista — Teresa Vasconcelos Caeiro.

———

Aprovámos hoje uma importante reforma do Código Penal português, que pretende, essencialmente,
uma melhor adequação deste diploma à realidade social actual, quer através de uma melhor adequação
dos tipos criminais, quer de alterações significativas na Parte Geral do código.
Várias são as novidades deste Código que aplaudimos e que consideramos positivas e essenciais para
acautelar os direitos, liberdades e garantias das cidadãs e dos cidadãos. Entre estas realçamos a
autonomização do crime de violência doméstica e, especialmente, a redacção final do artigo. Não podemos
deixar de sublinhar o desaparecimento do inciso «de modo intenso» e a inflexão relativamente ao inciso

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«de modo reiterado», para cuja perversidade várias vezes alertáramos esta câmara. A redacção final dará,
sem dúvida, um sinal claro no sentido oposto ao da redacção inicial, e por isso contribuirá para a protecção
das vítimas deste crime hediondo.
Salientamos também:
— a aprovação de um regime de responsabilidade penal das pessoas colectivas;
— o reforço das penas alternativas à pena de prisão;
— o fim da discriminação, em termos de direito de queixa, das uniões de facto em relação ao
casamento;
— a criminalização da excisão feminina;
— a consagração do crime de tráfico de pessoas.
Sublinhamos a adequação do Código Penal à actual redacção do artigo 13º da Constituição, com a
inclusão do ódio em razão do sexo ou da orientação sexual como circunstâncias qualificantes do homicídio,
bem como o fim da discriminação dos homossexuais relativamente aos heterossexuais quanto à idade para
o consentimento para actos sexuais, pondo desse modo fim a uma norma já declarada inconstitucional pelo
Tribunal Constitucional. E, por fim, a punição da discriminação em razão do sexo ou da orientação sexual.
Não podemos, contudo, deixar de lamentar veementemente algumas das alterações aprovadas. Neste
âmbito, chamamos particularmente a atenção para o facto de o crime continuado passar a abranger os
crimes contra as pessoas, quando praticados contra a mesma pessoa, o que obviamente terá efeitos ao
nível da pena. Estamos a falar de crimes como o abuso sexual de menores, a violência doméstica ou de
maus tratos, que darão lugar a critérios de punição bem mais benévolos para o agente quando praticados
contra a mesma vítima. Entendemos que esta alteração dará um sinal aos possíveis prevaricadores bem
diverso do que se pretende e que de modo algum acautela os princípios de prevenção geral ou especial.
Também a alteração da idade da eficácia do consentimento para maiores de 16 anos terá implicações a
nível, por exemplo, da prescrição de contracepção a adolescentes entre os 14 e os 16 anos, sem o acom-
panhamento de um adulto, pelo que não podemos deixar de manifestar a nossa total discordância.
Sublinhamos ainda como negativo a aprovação da nova redacção do crime de violação do segredo de
justiça, cujo único objectivo é a punição e perseguição cega dos jornalistas.
Não podemos deixar de referir que lamentamos que tenham sido rejeitadas as várias propostas relativas
à corrupção e, consequentemente, se tenha perdido uma oportunidade de excelência para as alterar e para
reafirmar o interesse do poder político nesta luta.
Quanto às novas redacções do crime de danos contra a natureza e do crime de poluição, consideramos
que, embora representem um avanço relativamente à redacção actual, ficam muito aquém das propostas
das organizações e associações de carácter ambiental e, consequentemente, muito aquém do que seria
necessário fazer em termos ambientais.
Por fim, lamentamos a rejeição da proposta deste grupo parlamentar de tipificação do crime rodoviário,
mas congratulamo-nos com a aprovação das propostas do BE relativas ao artigo 192.º, e consequente
inclusão da intercepção, gravação, registo, utilização, transmissão ou divulgação de mensagens de correio
electrónico e de facturação detalhada, na tipificação do crime de devassa da vida privada, e ao artigo 277.º,
criminalizando a infracção de regras legais, regulamentares ou técnicas na modificação de construções, à
qual foi ainda aditada, em sede de trabalho de especialidade, a conservação das construções.

Os Deputados do BE, Luís Fazenda — Mariana Aiveca — Helena Pinto — Cecília Honório — Alda
Macedo — Francisco Louçã — João Semedo — Fernando Rosas.

Srs. Deputados que entraram durante a sessão:

Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Ana Catarina Veiga Santos Mendonça Mendes
Cláudia Isabel Patrício do Couto Vieira
João Raul Henriques Sousa Moura Portugal
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
José Alberto Rebelo dos Reis Lamego
José Augusto Clemente de Carvalho
José Eduardo Vera Cruz Jardim
Maria de Fátima Oliveira Pimenta
Maria Isabel Coelho Santos
Pedro Nuno de Oliveira Santos
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves

Partido Social Democrata (PSD):
António Alfredo Delgado da Silva Preto

Página 70

70 | I Série - Número: 105 | 13 de Julho de 2007

António Paulo Martins Pereira Coelho
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Emídio Guerreiro
Hermínio José Sobral Loureiro Gonçalves
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
José Luís Fazenda Arnaut Duarte
José Pedro Correia de Aguiar Branco
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Mário Henrique de Almeida Santos David
Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva
Pedro Augusto Cunha Pinto
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva

Partido Comunista Português (PCP):
Artur Jorge da Silva Machado
Jerónimo Carvalho de Sousa

Partido Popular (CDS-PP):
António Carlos Bívar Branco de Penha Monteiro
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
José Hélder do Amaral
Paulo Sacadura Cabral Portas
Teresa Margarida Figueiredo de Vasconcelos Caeiro

Srs. Deputados que faltaram à verificação do quórum de deliberação (n.º 29 da Resolução n.º 77/2003,
de 11 de Outubro):

Partido Socialista (PS):
António Bento da Silva Galamba
Marcos da Cunha e Lorena Perestrello de Vasconcellos

Partido Social Democrata (PSD):
Adão José Fonseca Silva

Srs. Deputados que faltaram à sessão:

Partido Socialista (PS):
António Ribeiro Gameiro
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria Jesuína Carrilho Bernardo
Sónia Isabel Fernandes Sanfona Cruz Mendes

Partido Social Democrata (PSD):
Domingos Duarte Lima
Fernando Mimoso Negrão
Luís Miguel Pais Antunes

Partido Popular (CDS-PP):
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia

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