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10 DE OUTUBRO DE 2014

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O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A Lei da Água, do Governo do Partido Socialista e de Sócrates, a pretexto da

transposição da Diretiva-Quadro da Água, veio introduzir, em Portugal, a possibilidade de privatização da água

e, em boa parte, do domínio público hídrico. O PCP denunciou essa intenção. O Ministro do Ambiente, de

então, foi claro e confirmou a estratégia do Governo PS como uma privatização de baixo para cima.

Por essa altura, o Grupo Águas de Portugal perdeu para os privados a sua primeira empresa — a Aquapor

—, pelas mãos do Partido Socialista. Ou seja, a ambição de privatização das águas e dos sistemas de

abastecimento, distribuição e tratamento é uma velha aspiração dos protagonistas da política de direita,

aspiração essa que este Governo PSD/CDS partilha e tenta concretizar com o fervor ideológico que o

caracteriza, contra o interesse público, contra as populações, preparando o setor inteiro e as empresas

públicas que atualmente o gerem para a sua aquisição por privados.

Todas as peças da política do Governo para o setor da água encaixam numa clara estratégia de

reconfiguração empresarial e funcional dos sistemas, no sentido de assegurar a sua rentabilidade económica,

fazendo das autarquias cobradores em nome de terceiros.

A água não é uma mercadoria nem constitui um mercado concorrencial. Os seres humanos não podem

escolher não beber água, nem podem trocar a água por qualquer outro bem ou produto. Como tal, o valor da

água ultrapassa em muito o seu valor económico, tem um valor ambiental, um valor social e um valor que é

por natureza vital para todos os seres vivos do planeta.

A conceção do Governo, porém, não contempla as diversas dimensões da importância da água, concentra

a sua política na exploração do seu valor financeiro, particularmente num contexto de apropriação por

privados.

A chamada reestruturação do setor das águas, isto é, os despedimentos e a preparação para a

privatização, o PEASAR II e o novo enquadramento da chamada entidade reguladora são as peças de um

puzzle político que consiste na criação e empresarialização de um mercado privado que se apropria de um

bem público para o vender de acordo com os seus desígnios de acumulação e de lucro.

E é importante explicar aqui a dívida das autarquias à Águas de Portugal, porque tem sido utilizada como

pretexto para a privatização, mas importa referir que essa dívida é empolada quer pelos investimentos cujo

retorno é obrigatório em 50 anos — investimentos para os quais as autarquias não opinam, não contribuem,

não decidem —, quer pelos consumos mínimos obrigatórios que, muitas vezes, as autarquias são obrigadas a

contratualizar, ou seja, que não consomem mas têm de pagar.

A privatização da água tem vindo a demonstrar-se uma opção desastrosa, nos mais diversos sentidos, e

em todo o mundo.

Em primeiro lugar, porque retira a gestão da água da intervenção democrática dos cidadãos. Enquanto que

os cidadãos elegem os órgãos de soberania locais e nacionais, não elegem os membros dos conselhos de

administração das empresas privadas.

Em segundo lugar, porque acrescenta aos custos da água, da sua distribuição e do seu tratamento, o custo

do lucro dos acionistas, aumentando os preços.

Em terceiro lugar, a qualidade do serviço tenderá a degradar-se como em qualquer privatização, na medida

em que quanto menor for o investimento e quanto menos trabalhadores participarem nas empresas mais lucro

essas empresas gerarão.

O projeto de lei que é apresentado pelos cidadãos estabelece o direito fundamental à água e ao

saneamento e disposições de proteção desse direito, bem como do direito à água e à sua propriedade pública,

como recurso, e à sua gestão no interesse coletivo, hierarquizando as utilizações da água e impedindo a

privatização e a mercantilização dos serviços de águas das infraestruturas públicas e do domínio público.

Esta iniciativa legislativa de cidadãos constitui uma afirmação dos direitos e dos interesses de toda a

população, no cumprimento da Constituição da República Portuguesa, e garante a Portugal a universalidade

do direito humano à água e ao saneamento, tal como já reconhecido pelas Nações Unidas e que Portugal

subscreveu, mas ainda não verteu na legislação nacional, apesar de ter um Governo que pratica, no seu

território, o contrário.

Todas as privatizações se mostraram, até agora, lesivas do interesse nacional, dos utilizadores dos

serviços, da qualidade, e até mesmo lesivas para a economia e a soberania nacionais, entregando aos

grandes grupos económicos o controlo de alavancas fundamentais da nossa economia.

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