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Quinta-feira, 21 de novembro de 2019 I Série — Número 8

XIV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2019-2020)

REUNIÃOPLENÁRIADE20DENOVEMBRODE 2019

Presidente: Ex.mo Sr. Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues

Secretários: Ex.mos Srs. Maria da Luz Gameiro Beja Ferreira Rosinha Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Ana Sofia Ferreira Araújo Lina Maria Cardoso Lopes

S U M Á R I O

O Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 2 minutos.

Foi aprovado um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados relativo à suspensão do mandato de um Deputado do PSD e à respetiva substituição.

Deu-se conta da entrada na Mesa dos Projetos de Lei n.os 73 a 80/XIV/1.ª, do Projeto de Regimento n.º 4/XIV/1.ª e dos Projetos de Resolução n.os 45 e 53 a 69/XIV/1.ª.

Em declaração política, o Deputado Emídio Guerreiro (PSD) acusou o Governo de promover o facilitismo ao pretender eliminar as reprovações no ensino básico e

insurgiu-se contra o facto de haver escolas fechadas por falta de funcionários e de, a um mês do fim do primeiro período de aulas, existirem alunos sem professor. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Joana Mortágua (BE), Porfírio Silva (PS), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Mariana Silva (PEV) e Ana Mesquita (PCP).

Em declaração política, o Deputado Moisés Ferreira (BE), referindo-se à importância do Serviço Nacional de Saúde, defendeu a contratação de recursos humanos necessários e propôs um regime que promova a exclusividade dos seus profissionais, devendo para tal ser criados incentivos. Deu,

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depois, resposta a pedidos de esclarecimento dos Deputados Álvaro Almeida (PSD), Ana Rita Bessa (CDS-PP), Hortense Martins (PS), José Luís Ferreira (PEV) e Paula Santos (PCP).

Em declaração política, o Deputado António Filipe (PCP), a propósito de uma manifestação de protesto dos profissionais das forças e serviços de segurança, solidarizou-se com algumas das suas reivindicações e acusou o Governo de não dar resposta aos problemas com que se debatem e de impor processos disciplinares a dirigentes associativos que agem na defesa dos seus associados. Respondeu, depois, a pedidos de esclarecimento dos Deputados José Magalhães (PS), Mónica Quintela (PSD), Telmo Correia (CDS-PP) e Sandra Cunha (BE).

Em declaração política, o Deputado Telmo Correia (CDS-PP), também sobre a mesma manifestação de protesto dos profissionais das forças e serviços de segurança, elogiou o seu esforço e dedicação e insurgiu-se contra o Governo por nada ter feito na anterior Legislatura em relação às questões reivindicadas, tendo ainda anunciado a apresentação, pelo seu partido, de iniciativas legislativas sobre esta matéria. Respondeu, de seguida, a pedidos de esclarecimento dos Deputados Pedro Rodrigues (PSD) e João Ataíde (PS).

Em declaração política, a Deputada Cristina Rodrigues (PAN), tendo em conta os efeitos nefastos que o amianto representa para a saúde, alertou para a necessidade do cumprimento de legislação já aprovada relativa à proibição da sua utilização tanto em edifícios públicos como privados. No final, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados

Filipa Roseta (PSD), Nelson Peralta (BE), Hugo Pires (PS), Mariana Silva (PEV), João Pinho de Almeida (CDS-PP) e Alma Rivera (PCP).

Em declaração política, o Deputado José Luís Ferreira (PEV) condenou a existência de paraísos fiscais e apelou ao Governo para que, internacionalmente, desenvolva esforços no sentido de acabar com os offshore. No fim, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Carlos Silva (PSD), Duarte Alves (PCP), Fernando Anastácio (PS) e Mariana Mortágua (BE).

Em declaração política, a Deputada Elza Pais (PS), a propósito do Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, chamou a atenção para a necessidade de implementação de medidas públicas para a prevenção e combate à violência de género, após o que respondeu a pedidos de esclarecimento dos Deputados Sandra Pereira (PSD), Inês de Sousa Real (PAN), Sandra Cunha (BE), Mariana Silva (PEV) e Alma Rivera (PCP).

Em declaração política, ao abrigo do n.º 2 do artigo 71.º do Regimento, o Deputado André Ventura (CH) culpou o Primeiro-Ministro por faltar à verdade em relação a uma afirmação que fez relacionada com as forças de segurança e anunciou a intenção do seu partido de se associar à manifestação de protesto convocada por aqueles profissionais.

O Presidente encerrou a sessão eram 18 horas e 11 minutos.

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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está aberta a sessão.

Eram 15 horas e 2 minutos.

Antes de passarmos à ordem do dia de hoje, que será preenchida com declarações políticas, cumprimento

as Sr.as e os Srs. Deputados, as Sr.as e os Srs. Funcionários e as Sr.as e os Srs. Jornalistas e peço aos Srs.

Agentes da Autoridade para abrirem as portas das galerias ao público.

Srs. Deputados, a Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha vai dar várias informações.

Faça favor.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, em primeiro lugar, queria

dar conta de um parecer da Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados, emitido em reunião de hoje.

«Nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º, alínea b) do n.º 2 do artigo 5.º e do n.º 1 do artigo 9.º do

Estatuto dos Deputados, o Deputado do PSD Duarte Marques (círculo eleitoral de Santarém) suspende o

mandato, sendo substituído por Sónia Patrícia Silva Ferreira Quintino, pelo período de 18 de novembro de 2019

a 6 de dezembro de 2019, inclusive.

Analisados os documentos pertinentes de que a Comissão dispõe, constata-se que a cidadã indicada, Sónia

Patrícia Silva Ferreira Quintino, é realmente a candidata seguinte que deve assumir o mandato, conforme lista

apresentada a sufrágio no concernente ao respetivo círculo eleitoral.

Foram observados os preceitos regimentais e legais aplicáveis.

Nestes termos, a Comissão entende proferir o seguinte parecer: a suspensão do Deputado do PSD Duarte

Marques cumpre os requisitos legais, sendo substituído por Sónia Patrícia Silva Ferreira Quintino, a partir do dia

18 de novembro de 2019 até 6 de dezembro de 2019, inclusive.»

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos votar o parecer.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência do CH.

Continua no uso da palavra a Sr.ª Secretária.

Faça favor.

A Sr.ª Secretária (Maria da Luz Rosinha): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa os

seguintes projetos de lei: n.º 73/XIV/1.ª (PSD) — Regulamentação do lobbying, que baixa à 1.ª Comissão; n.º

74/XIV/1.ª (BE) — Promove a contratação coletiva, procedendo à 16.ª alteração ao Código do Trabalho,

aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que baixa à 10.ª Comissão; n.º 75/XIV/1.ª (BE) — Alterações

ao regime jurídico-laboral e alargamento da proteção social dos trabalhadores por turnos e noturnos (16.ª

alteração ao Código do Trabalho), que baixa à 10.ª Comissão; n.º 76/XIV/1.ª (BE) — Consagra as 35 horas

como período normal de trabalho no setor privado (16.ª alteração ao Código do Trabalho), que baixa à 10.ª

Comissão; n.º 77/XIV/1.ª (PAN) — Determina a obrigatoriedade de proceder à análise mensal das águas

destinadas a consumo humano a fim de verificar da presença de glifosato, que baixa à 7.ª Comissão; n.º

78/XIV/1.ª (PAN) — Visa a não comercialização de herbicidas com glifosato para usos não profissionais, que

baixa à 7.ª Comissão; n.º 79/XIV/1.ª (PEV) — Consagra o direito a 25 dias de férias anuais (16.ª alteração ao

Código de Trabalho), que baixa à 10.ª Comissão; e n.º 80/XIV/1.ª (PEV) — Desincentiva a venda de alimentos

com excesso de açúcar, gordura e sal nas máquinas de venda automática em escolas, procedendo à alteração

do Decreto-Lei n.º 55/2009, de 2 de março, que baixa à 8.ª Comissão.

Deu, igualmente, entrada na Mesa o Projeto de Regimento n.º 4/XIV/1.ª (PSD) — Quarta alteração ao

Regimento da Assembleia da República n.º 1/2007, de 20 de agosto, alargando os direitos dos Deputados únicos

representantes de um partido e definindo critérios de fixação de grelhas de tempos, que baixa à 1.ª Comissão.

Deram, ainda, entrada na Mesa os seguinte projetos de resolução: n.º 45/XIV/1.ª (CH) — Pela instauração

da celebração solene do 25 de novembro; n.º 53/XIV/1.ª (IL) — Recomenda ao Governo que não introduza um

sistema de incentivos à assiduidade dos funcionários públicos, que baixa à 13.ª Comissão; n.º 54/XIV/1.ª (PEV)

— Abandono do processo relativo à construção do aeroporto no Montijo e realização de uma avaliação ambiental

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estratégica para aferir das melhores opções ao nível aeroportuário, que baixa à 6.ª Comissão; n.º 55/XIV/1.ª

(BE) — Contratação de mais profissionais para o Serviço Nacional de Saúde, de acordo com o estabelecido na

lei para o reforço de autonomia das instituições e na nova Lei de Bases da Saúde, que baixa à 9.ª Comissão;

n.º 56/XIV/1.ª (BE) — Publicação da portaria para reconhecimento de especialistas em física médica; n.º

57/XIV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo a necessidade de concretização urgente do financiamento do novo

hospital para a Madeira; n.º 58/XIV/1.ª (PEV) — Plano de ação para controlo do jacinto-de-água, que baixa à

11.ª Comissão; n.º 59/XIV/1.ª (PSD) — Por uma política integrada para a infância e a família; n.º 60/XIV/1.ª

(PSD) — Recomenda ao Governo que faça cumprir as obrigações do Estado e dos seus organismos, garantindo

uma circulação segura da população local e de todos os que utilizam a EN225; n.º 61/XIV/1.ª (BE) — Recomenda

ao Governo a promoção da coesão territorial nos distritos de Santarém, Portalegre, Castelo Branco e Guarda,

eliminando as portagens na A23, que baixa à 6.ª Comissão; n.º 62/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a

promoção da coesão territorial nos distritos de Viseu e Vila Real, eliminando as portagens na A24, que baixa à

6.ª Comissão; n.º 63/XIV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a promoção da coesão territorial nos distritos de

Aveiro, Viseu e Guarda, eliminando as portagens na A25, que baixa à 6.ª Comissão; n.º 64/XIV/1.ª (L) —

Concessão de Honras do Panteão Nacional a Aristides de Sousa Mendes, que baixa à 12.ª Comissão; n.º

65/XIV/1.ª (CH) — Pela abolição das portagens na A28 – Autoestrada do Norte Litoral, que baixa à 6.ª Comissão;

n.º 66/XIV/1.ª (CH) — Contratação de mais profissionais para o serviço nacional de educação, com especial

incidência no pessoal não docente, que baixa à 8.ª Comissão; n.º 67/XIV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo a

reorganização e reforço dos efetivos das forças de segurança, que baixa à 1.ª Comissão; n.º 68/XIV/1.ª (CH) —

Pela abolição das portagens na Via do Infante, que baixa à 6.ª Comissão; e, finalmente, n.º 69/XIV/1.ª (BE) —

Reabilitação da Casa da Pesca na Quinta do Marquês, em Oeiras.

Em termos de expediente, é tudo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Secretária Maria da Luz Rosinha.

Vamos, agora, passar às declarações políticas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Facilitismo — esta é a palavra-

chave da política educativa deste Governo. Conforme se pode constatar em qualquer dicionário de Língua

Portuguesa, facilitismo consiste em facilitar a execução de algo que habitualmente exige esforço, empenho ou

disciplina. Em síntese, é o contrário de exigência.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Conhecida que é a vontade do Governo de eliminar as retenções no

ensino básico, a coberto de teorias educativas que desvalorizam as mesmas, é politicamente importante

perceber as razões desta opção e o seu verdadeiro alcance. É que não estamos perante uma decisão

meramente pedagógica; bem pelo contrário. Esta decisão política mais não resulta que da conjugação de duas

coisas: em primeiro lugar, poupar dinheiro; em segundo lugar, atingir de forma artificial números de excelência

no desempenho escolar.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É o próprio Governo que quantifica em 250 milhões de euros por ano a

poupança com o fim das retenções, sem atender às consequências desta decisão. E com o fim das reprovações

o milagre das estatísticas do sucesso educativo português vai, com certeza, surpreender o mundo.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Num mundo perfeito todos os estudantes apreendem tudo e adquirem

os conhecimentos necessários, mas, infelizmente, não vivemos num mundo perfeito. Os nossos alunos vêm de

diferentes contextos familiares, de múltiplas condições sociais e esta sistemática tentativa da esquerda em tratar

por igual aquilo que não o é reduz as possibilidades dos mais desfavorecidos.

Aplausos do PSD.

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Quando um estudante, porque a escola que temos e a sua família não lhe deram as condições necessárias,

não apreendeu, não sabe as matérias e passa de ano, o Estado não está a cumprir o seu papel de potenciar a

igualdade de oportunidades, está a roubar-lhe o futuro.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É disto que se trata com o primado do facilitismo. Para poupar e

artificialmente melhorar estatísticas prejudica-se aqueles que precisam da formação que a escola dá para

desenvolver o seu potencial e ter uma vida digna.

Não se trata aqui de tornar o «chumbo» o alfa e o ómega do sistema educativo; bem pelo contrário, trata-se,

sim, de, em função de uma avaliação que tem múltiplos parâmetros, entre os quais a avaliação dos

conhecimentos adquiridos, permitir planos específicos para cada um.

Como pode alguém que não sabe passar de ano? Se não sabe é porque não aprendeu, não teve apoio

específico, não teve família que o estimulasse a trabalhar, não teve empenho. No ano seguinte, caso não haja

medidas dirigidas, terá ainda mais dificuldades e, no final, volta a passar. Depois chega o dia em que tudo se

desmorona, onde fica claro que a ausência de conhecimentos é um fator discriminador e lesivo para o seu futuro.

Deixemo-nos de hipocrisias: estamos a empurrar com a barriga para a frente. Estamos a enganar as famílias

e os alunos que mais precisam de uma escola que os prepare para a vida profissional e a sonegar as

oportunidades que necessitam e merecem.

Aplausos do PSD.

Aqueles que conhecem a escola pública sabem bem das suas virtudes, conhecem o empenho dos

profissionais, conhecem os crescentes problemas de indisciplina, conhecem, porque, ao contrário de muitos

governantes, têm os seus filhos na escola pública, conhecem de perto o esforço dos docentes e dos funcionários,

sabem que a desvalorização social da classe dos professores tem de parar,…

O Sr. Adão Silva (PSD): — Claro!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … sabem que o reforço da autoridade dentro da sala de aula é

fundamental para o ensino e sabem, ainda, que as anunciadas medidas de acompanhamento só são possíveis

com investimento, investimento esse que não existe nem em meios, nem em equipamentos, nem mesmo em

recursos humanos.

Ainda nesta semana, tivemos escolas fechadas por falta de funcionários — hoje mesmo isso aconteceu — e

já todos percebemos que o Sr. Ministro da Educação mais não faz do que anunciar sempre a contratação dos

mesmos funcionários e perante o clamor das escolas veio culpabilizar as mesmas da falta de funcionários e do

caos instalado.

A um mês do fim do primeiro período existem cerca de 20 000 alunos sem professor, pelo menos, a uma

disciplina. E também aqui a culpa é sempre alheia, a responsabilidade nunca é do Governo. É uma atitude

lamentável e irresponsável.

Aplausos do PSD.

Por isso, não venham com a história de que o fim administrativo das retenções será acompanhado de

medidas pedagógicas. Como? Com que meios? Com quem? Com os professores existentes, inundados de

burocracias e desmotivados por uma perseguição sistemática protagonizada por este Governo? Com

funcionários que não existem nas escolas?

Claro que quem tem posses, perante tudo isto, coloca os seus filhos na escola privada. Mas e quem não

tem? Fica à mercê do experimentalismo do Ministério da Educação!

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A escola pública é uma ferramenta indispensável para a igualdade de

oportunidades, uma escola onde se pretende que as retenções diminuam e que até desapareçam pelo facto de

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os alunos saberem, por adquirirem conhecimento e competências e nunca por decreto. A escola pública tem de

ser um local onde se ensinam e aprendem as matérias curriculares e as não curriculares, onde os funcionários

e os professores são respeitados e valorizados por todos, onde é possível ter recursos para acompanhar os que

têm mais dificuldades e para que estes também adquiram conhecimento e competências. A não ser assim,

estamos a tornar a escola pública num engano que as novas gerações pagarão caro no seu futuro.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Estou a terminar, Sr. Presidente.

O Governo quer uma escola onde se faz de conta que todos sabem e, como tal, todos passam, onde impere

o facilitismo e não o trabalho e o empenho.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo. Peço que termine, Sr. Deputado.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Estou a terminar, Sr. Presidente.

O Governo, mais uma vez, põe em causa o trabalho e o empenho de milhares de profissionais que todos os

dias tentam dar conhecimento e competências aos jovens.

Não é isto que queremos! Não é disto que as famílias e os jovens portugueses precisam e merecem; eles

merecem uma escola que os prepare para um mundo em permanente mutação, onde o conhecimento será cada

vez mais fundamental para cumprir uma vida digna.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Emídio Guerreiro, inscreveram-se cinco Srs. Deputados para pedir

esclarecimentos. Como pretende responder?

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, pretendo responder aos três primeiros Srs. Deputados e,

depois, aos outros dois.

O Sr. Presidente: — Vamos, então, começar pelo pedido de esclarecimento da Sr.ª Deputada Joana

Mortágua, do Bloco de Esquerda. Faça favor.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, Portugal é um dos países

com níveis de retenção mais elevados na Europa.

De acordo com a perspetiva do PSD, um aluno que não sabe deve chumbar, o que significa que aquilo que

o PSD está a querer dizer-nos é que Portugal tem os alunos mais burros da Europa. Portanto, os alunos em

Portugal não sabem! É isso que o PSD está aqui a dizer.

Protestos do PSD, do CDS-PP e do CH.

Mas isso não é o que dizem todos os dados internacionais, isso não é o que diz o PISA (Programme for

International Student Assessment), não é o que diz a OCDE (Organização para a Cooperação e

Desenvolvimento Económico), não é, aliás, o que está em todos os relatórios que até dizem que Portugal está

acima da média em relação ao número de alunos com desempenho suficiente a ciências e a matemática.

Portanto, se não temos os alunos mais burros nem mais impreparados da Europa, por que razão chumbam

os alunos em Portugal? Ora, a OCDE, o CNE (Conselho Nacional de Educação), a Comissão Europeia…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — David Justino!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … dizem-nos que os alunos, em Portugal, chumbam devido a uma cultura

de retenção,…

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Risos do PSD, do CDS-PP e do CH.

… devido a uma convicção de que é pela retenção que se melhoram as aprendizagens dos alunos. Uma

retenção é um ato administrativo que determina que um aluno repete um ano, mas não diz que vai ter estratégias

alternativas de aprendizagem, não diz que vai ter reforço de tutores ou de professores, não diz que vai ter mais

atenção em qualquer dimensão da sua aprendizagem, não diz que vai ser mais ou menos bem classificado, não

diz que vai ter mais ou menos professores; diz que ele vai repetir um ano, é isso que diz. Diz que um aluno que,

por alguma razão, não conseguiu acompanhar o ritmo de aprendizagem recebe o castigo de repetir um ano.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Não é castigo!

O Sr. André Ventura (CH): — Pois se não sabem!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Todos os estudos dizem que a retenção não é o método mais eficaz para

melhorar as aprendizagens.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Então, qual é?!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O PSD não vê isto, porque o PSD não está à procura de ver a educação

como método de melhoria de aprendizagens, está à procura de ver a educação como uma corrida de cavalos,

em que aqueles que, por alguma razão — por culpa própria, por contexto familiar ou outra —, não conseguem

acompanhar são deixados para trás.

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito obrigada, Sr. Presidente.

É isso que queremos evitar, que haja alunos que sejam deixados para trás.

Protestos do PSD, do CDS-PP e do CH.

A visão do PSD que, pura e simplesmente, chumba…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine a sua intervenção, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Quero terminar, Sr. Presidente, mas estou a ter algumas dificuldades.

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — Pois está! Claramente!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — A visão do PSD…

Protestos do PSD, do CDS-PP e do CH.

O Sr. Presidente: — Peço aos Srs. Deputados para se comportarem com a oradora, tal como a bancada da

oradora se comportou com o Sr. Deputado que falou anteriormente. É o mínimo!

Aplausos do PS.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Tão bem-comportados que eles eram!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Muito obrigada, Sr. Presidente.

Sr. Deputado, reduzir um problema complexo de aprendizagem a um chumbo tem um nome: facilitismo.

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Protestos do PSD, do CDS-PP e do CH.

O que o PSD quer é impor o primado não do facilitismo, mas do obscurantismo…

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr.ª Deputada Joana Mortágua.

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — … e deliberadamente restringir o acesso do povo ao conhecimento.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Porfírio Silva, do Grupo

Parlamentar do PS.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Deputado Emídio Guerreiro, não sei se vai chumbar, mas uma coisa é certa:

não estudou o assunto.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Então?!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — E vou dizer-lhe porquê, Sr. Deputado. Nós temos um problema com a retenção,

fundamentalmente porque a retenção, como medida pedagógica, é ineficiente, não dá resultado, não corrige as

aprendizagens e, muitas vezes, tem a consequência de atirar para o abandono escolar precoce aqueles que

repetem o ano.

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Portanto, temos um problema!

Aplausos do PS.

Temos um problema que tem de ser resolvido por duas vias: pela legislação adequada e pelas práticas

adequadas.

Com a legislação, o que está em causa? O Decreto-Lei n.º 55/2018, aprovado pelo Governo anterior, no que

diz respeito a esta questão, fundamentalmente diz que a retenção fora dos anos terminais é uma medida

excecional, mas os senhores dizem que é facilitismo.

Vou dar-lhe uma novidade, Sr. Deputado: é que precisamente esse critério existe desde 2012 por via de um

decreto-lei — o Decreto-Lei n.º 139/2012 —, assinado pelo Sr. Primeiro-Ministro Passos Coelho e pelo Sr.

Ministro Nuno Crato.

Portanto, Sr. Deputado, quanto ao primeiro ponto, chumbou, porque está a acusar-nos de uma coisa que os

senhores já tinham feito anteriormente.

Aplausos do PS.

Só que os senhores fizeram isso com falta de convicção e, portanto, não fizeram o resto que era praticar,

mas nós praticamos. Por isso, o Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar tem resultados à vista.

Vou dar-lhe um exemplo muito concreto, até para desmentir a sua ideia de que quem não sabe passa à

mesma. O Projeto-Piloto de Inovação Pedagógica, que deu autonomia reforçada às escolas para procurarem

estratégias de não retenção, vá-se lá saber porquê, conseguiu baixar muito as retenções…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Seis escolas!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … porque houve investimento,…

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A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Exato!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … mas não acabou com elas. Porquê?

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Por uma razão muito simples: porque não há aqui nada de administrativo, não há aqui nada de automático,

não há passagens automáticas, não há passagens administrativas. Quem não sabe não passa!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Afinal não acaba a retenção! Em que ficamos?

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Porém, a escola tem de fazer com que os alunos saibam.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Sr. Deputado, dou-lhe um conselho: pergunte ao primeiro Vice-Presidente do

seu partido, o Prof. David Justino, o que queria dizer quando acusava a existência de uma cultura de retenção

e de seletividade…

O Sr. Ricardo Baptista Leite (PSD): — É melhor ir ler!

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — … porque é dessa cultura de retenção e de seletividade que o senhor padece.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Porfírio Silva, tem de concluir!

O Sr. Porfírio Silva (PS): — É preciso estudar a lição! É preciso estudar a lição!

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do Grupo

Parlamentar do CDS-PP.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, queria começar por saudar o Sr. Deputado Emídio

Guerreiro por trazer este tema a Plenário, um tema que o CDS trouxe, também, há 15 dias, por ocasião da nossa

declaração política. Vale a pena, como se vê, insistir no assunto, porque claramente as ideias não estão

arrumadas.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Pois é! Cada dia há uma versão!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — A Sr.ª Deputada Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda, diz que

chumbar é um castigo.

Sr.ª Deputada, castigo é passar sem ter oportunidade de aprender, castigo é passar um aluno porque sim e

condená-lo a um futuro no qual, mais tarde, se irá descobrir impreparado para lidar com a sua vida futura.

Protestos da Deputada do BE Joana Mortágua.

Sr.ª Deputada, sabe por que razão um aluno chumba, que foi a pergunta a que a Sr.ª Deputada não

respondeu? Um aluno chumba, no nosso sistema de ensino, público ou privado, porque o sistema lhe falhou.

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Então, chumba-se o sistema!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — É por isso que o aluno chumba, porque não teve oportunidade de

aprender.

Sr.ª Deputada, para um aluno ter oportunidade de aprender é preciso que haja funcionários nas escolas para,

por exemplo, abrir a biblioteca, porque, se estiver fechada, os alunos não podem ter acesso aos livros; é preciso

que haja professores na sala de aula não só no início do ano letivo, mas também quando há substituições; é

preciso que as escolas secundárias não estejam anos seguidos sem professores de português e de matemática

e, depois, haver um exame no final e não acontecer nada; é preciso que haja escolas com obras feitas e em que

os alunos não tenham de vestir casacos e luvas para poderem assistir às aulas;…

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Conclusão: chumbam-se os alunos!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — … é preciso que haja o tal plano digital que ia transformar a educação

para dar corpo à flexibilidade curricular, mas nada disso acontece.

Pergunto ao Sr. Deputado Emídio Guerreiro se concorda ou não comigo quando digo que o problema é o

sistema falhar aos alunos, é por esta razão que eles chumbam, e que nada disto se resolve com legislação,

decretando simplesmente, num papel escrito, que não vai haver retenções até ao final da Legislatura.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Ignoram aquilo que está a ser feito?!

O Sr. Presidente: — Para responder a este conjunto de pedidos de esclarecimento, tem a palavra o Sr.

Deputado Emídio Guerreiro, do Grupo Parlamentar do PSD.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados e às Sr.as Deputadas as

questões que me colocaram.

Começava por dizer à Sr.ª Deputada Mortágua que são os senhores que, sistematicamente, pretendem que

os portugueses sejam burros ao ouvi-los. Sejamos claros! Os senhores é que são cúmplices conscientes dos

desinvestimentos que têm sido feitos nas escolas.

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Tenho pena que não tenha ouvido o que eu disse, porque não se trata —

volto a repetir a frase que disse da tribuna — de «transformar os chumbos no alfa e no ómega da educação».

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — É melhor explicar isso!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Trata-se, sim, de criar condições para que cada um possa ter o seu

percurso assegurado.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Luís Monteiro (BE): — Só isso?!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — É aqui que a escola tem falhado, porque o Governo não investe, e não o

faz porque vocês são cúmplices!

Aplausos do PSD.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Não, não tem falhado!

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A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Então, o problema não é chumbar?!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Os senhores há quatro anos que fingem, às segunda, quarta e sexta, que

não fazem parte do Governo e, às terça e quinta, estão a votar ao lado deles e a viabilizar as suas propostas.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

Por isso é que nós não aceitamos, Sr. Deputado Porfírio Silva, que as retenções, não sendo o instrumento

único, sejam completamente desvalorizadas, porque nós não assistimos maciçamente nas escolas à resposta

que é necessária, pois não há professores suficientes, não há funcionários e não há dinheiro. Mas os senhores

continuam a fazer de conta que é verdade que basta pôr num decreto-lei todas essas condições.

Aplausos do PSD.

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

Sr.as e Srs. Deputados, se tudo isso fosse verdade, se esse mundo perfeito a que fiz também referência

existisse, se tudo isso estivesse a acontecer, com certeza que não teríamos o número de retenções que temos.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Exato!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Porque as respostas estariam a ser dadas, mas não estão.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — Veja as estatísticas!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Lamento muito que o Governo e os partidos que apoiam este Governo

não tirem a cabeça de dentro da areia e não percebam que este problema só se resolve com investimento sério,

de forma séria e consistente.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Não é isso que ainda hoje vemos quando temos escolas fechadas por

falta de funcionários e mais de 20 000 alunos que ainda não têm professores, pelo menos, a uma disciplina.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exatamente!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Expliquem aos portugueses como é que pode haver planos de

recuperação se nem sequer temos professores para as disciplinas curriculares normais!

Aplausos do PSD.

Tirem a cabeça de dentro da areia! Cumpram as vossas responsabilidades e apertem com o vosso Governo

para transformar o que está no papel numa realidade!

Protestos do Deputado do PS Porfírio Silva.

A questão é esta, Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa: não basta dizer, é preciso fazer; não basta parecer, é

preciso saber. O que é importante é que todos os alunos nas escolas aprendam para saber. E, Sr. Deputado

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Porfírio Silva, quanto a essa responsabilidade, que é vossa, estão a falhar completamente, porque os senhores

são incapazes!

Aplausos do PSD.

O Sr. Porfírio Silva (PS): — É o PSD a correr atrás do CDS!

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Emídio Guerreiro, estão ainda inscritos os

Srs. Deputados Mariana Silva, de Os Verdes, e Ana Mesquita, do PCP.

Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, Os Verdes têm assumido a

defesa da escola pública e de qualidade para um ensino democrático, plural e inclusivo como condição para

assegurar o direito constitucional à educação e por reconhecermos, na educação, a condição do

desenvolvimento sustentável e da conquista, no futuro, de um mundo mais justo e solidário.

A retirada à escola pública de centenas de milhões de euros e o afastamento de milhares de trabalhadores

durante o Governo PSD/CDS devia fazer corar de vergonha os Srs. Deputados que, agora, vêm «chorar lágrimas

de crocodilo» sobre a escola pública.

Foi este desinvestimento que nos levou a este ponto, onde reina a escassez de recursos, levando ao

avolumar dos problemas para os estudantes, em primeiro lugar, e para os professores e todos os funcionários

que nelas trabalham, que se veem, assim, desrespeitados e desvalorizados no seu papel na construção de uma

sociedade democrática. Todos os dias, assistimos a comunidades escolares a manifestarem-se contra a falta

de condições, sobretudo no que aos auxiliares diz respeito, que estão muito aquém dos serviços mínimos para

o funcionamento das escolas em segurança.

Já aqui dissemos que estes não são problemas de agora e que as responsabilidades são partilhadas entre

o PS, o PSD e o CDS, mas exatamente por isso, exigem-se respostas imediatas. Investir na escola pública é

investir na qualificação dos portugueses e no desenvolvimento futuro do País.

Relativamente à falta de auxiliares de educação nas escolas, temos agora o jogo do empurra entre as

câmaras municipais que assinaram o protocolo de descentralização de competências e o Ministério da

Educação, na sequência dos acordos entre PSD e PS. Por um lado, as câmaras municipais dizem que ainda

não foi efetivada a transferência dos funcionários e muito menos receberam as respetivas verbas; por outro, o

Ministério da Educação lava as suas mãos, dizendo já não ser sua a responsabilidade pessoal das escolas dos

municípios que assinaram o protocolo de descentralização.

Sr. Deputado, o PSD não se sente também responsável por esta situação, uma vez que viabilizou a

descentralização?

Está o PSD disposto a fazer o seu ato de contrição, por ter desinvestido drasticamente na educação…

O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente.

Está o PSD disposto a fazer o seu ato de contrição, por ter desinvestido drasticamente na educação e

diminuído o número de funcionários das escolas durante o seu último Governo?

Aplausos do PEV.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Ana Mesquita.

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Emídio Guerreiro, o PCP considera que os

professores devem ter todas as ferramentas e todos os meios para, pedagogicamente, definirem e avaliarem

cada caso.

Se, de facto, questionamos que medidas concretas vão ser tomadas por parte do Governo nesta matéria —

porque há um problema que está assinalado, identificado quanto às retenções —, a pergunta que se impõe fazer

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é a seguinte: que medidas propõe o PSD para o reforço, por exemplo, da avaliação contínua, para a eliminação

das barreiras sociais, económicas, de aprendizagem no prosseguimento de estudos?

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Que medidas propõe o PSD para que a escola não seja um mecanismo de

reprodução de todas as desigualdades sociais?

Disto é que interessa falar. O Sr. Deputado pode vir aqui dourar a pílula e falar do subfinanciamento, da falta

de professores, da falta de pessoal de apoio educativo, mas, ó Sr. Deputado, que medidas é que, afinal, o PSD

foi tomando ao longo da sua história, sempre que esteve no Governo…

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Claro!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — … e que contribuíram, apenas e só, para levantar mais, e mais, e mais

barreiras a quem estuda, designadamente a quem tem mais carências económicas?

Na verdade, aquilo que conseguiu fazer foi cortar no investimento, foi despedir professores e pessoal de

apoio educativo, em barda — uma coisa escandalosa! —, foi impor exames, e mais exames, e mais exames,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — … foi aumentar o número de alunos por turma e, portanto, as condições para

a melhoria do processo de ensino/aprendizagem ficaram pelo caminho, foi reduzir o número de auxiliares e

reduzir o rácio, foi tornar precário técnicos especializados.

Sr. Deputado, parece-me que, aqui, há um banho de demagogia por parte do PSD, porque aquilo que se vê

é que o PSD quer dificultar mais, mais e mais a quem mais dificuldades tem, mas o prosseguimento de estudos

tem de ser uma questão fundamental, para a qual o PSD, ao longo dos anos, ao longo da sua prática de Governo,

nunca contribuiu com soluções, apenas e só contribuiu para o agravar dos problemas.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado Emídio Guerreiro, do Grupo Parlamentar

do PSD.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Sr. Presidente, agradeço as questões colocadas pelas Sr.as Deputadas

Mariana Silva e Ana Mesquita.

Já se falou aqui das medidas implementadas em 2012, que, supostamente, abriram a porta àquilo que está

a acontecer agora. O que se omitiu foi que, nesse modelo, as avaliações de final de ciclo não eram feitas ao fim

de 9 anos de escolaridade, havia avaliações intermédias, que permitiam recolher dados para se poder…

O Sr. Bruno Dias (PCP): — E continua a haver!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Ó Sr. Deputado, se chama avaliações às provas de aferição é porque não

tem filhos na escola pública, porque, se tivesse, não dizia isso.

Protestos do BE e do PCP.

Se falar com uma criança com 13 ou 14 anos, ela vai dizer-lhe o que é uma prova de aferição e o que é um

exame e, se calhar, o Sr. Deputado aprenderia muito!…

Queria também dizer que, como as Sr.as Deputadas Mariana Silva e Ana Mesquita também têm

conhecimento, de 2012 em diante, o abandono escolar decresceu imenso, foi em flecha. Ou seja, as medidas

não foram assim tão más.

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Protestos do BE e do PCP.

No entanto, percebo bem o vosso problema: querem remeter esta questão para um passado mais longínquo.

Se todos recuarmos a um passado mais e mais longínquo, é uma forma de lavar consciências e «sacudir a água

do capote».

Porém, direi que nunca estivemos em situação tão má como agora!

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — Que exagero!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — A um mês do fim do primeiro período, nunca tivemos 20 000 crianças, 20

000 estudantes, sem professores a todas as disciplinas. Nunca! Sabem porquê?!

Protestos do PS e do BE.

Sabem porquê?! Porque os senhores, ao longo de quatro anos, e vão começar o quinto ano…

Continuação de protestos do PS e do BE.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço que deixem o orador acabar de intervir.

Aplausos do PSD.

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Muito obrigado, Sr. Presidente.

Como dizia, ao longo dos quatro anos anteriores — e preparam-se para fazer o mesmo este ano e nos

próximos! —, os senhores viabilizaram, votando favoravelmente, a proposta orçamental que, na prática, não

paga aos professores que são precisos, não paga aos funcionários que são precisos e muito menos paga os

projetos educativos que são necessários para combatermos esse flagelo.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Ora aí está!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — Esta é que é a questão!

E os senhores, como também têm essa responsabilidade porque são cúmplices conscientes desta política

— a esquerda toda junta —, chegam aqui e, em vez de assumirem responsabilidades e fazerem com que as

coisas mudem, não, olham para trás, para trás, para trás!

Protestos do PCP.

Mas o tempo é hoje, é um passado recente e é, sobretudo, o futuro, esse, sim, que me incomoda, que nos

deve incomodar a todos, porque o que está aqui em jogo é o sonegar de oportunidades àqueles que mais

precisam.

Como eu disse, quem tem dinheiro já tirou os filhos da escola pública e meteu-os nos colégios privados,…

A Sr.ª Joana Mortágua (BE): — O Sr. Deputado quer é os colégios privados!

O Sr. Emídio Guerreiro (PSD): — … e esse é um legado que, sinceramente, nunca pensei que a esquerda

portuguesa caucionasse.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado Moisés Ferreira, do Grupo

Parlamentar do Bloco de Esquerda.

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O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O nosso Serviço Nacional de Saúde

(SNS) é dos melhores do mundo. A ele devemos a redução drástica da mortalidade infantil e o aumento da

esperança média de vida.

E os nossos profissionais de saúde são, também, dos melhores do mundo. A eles devemos a resiliência do

SNS e a sua capacidade extraordinária de fazer da saúde um direito. E isto é inquestionável.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Um exercício útil é, aliás, conhecer a experiência de quem recusou a opção

histórica por um Serviço Nacional de Saúde.

Veja-se o caso dos Estados Unidos da América: o pagamento das despesas médicas é a maior causa de

falência pessoal nos Estados Unidos. Mais do que o desemprego, é o pagamento dos cuidados de saúde que

atira as pessoas para a miséria.

Em Portugal, até os que têm dedicado todo o seu tempo a combater o Serviço Nacional de Saúde, desde

1979, têm enormes dificuldades em colocá-lo em causa. É que a população sabe que o SNS é imprescindível

no seu dia a dia, sabe que o único caminho é o do seu reforço.

Não é, por isso, aceitável que se ponham em cima da mesa hipóteses como a do encerramento rotativo de

urgências, como já foi colocado em Lisboa.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — O SNS não pode ser uma manta curta, que destapa de um lado para tapar

do outro.

Não é aceitável que se encerrem serviços, ora à noite, ora ao fim de semana, por falta de profissionais, como

acontece no Garcia de Orta. O SNS não é um serviço intermitente.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Não é aceitável que faltem profissionais para garantir escalas, consultas e

cirurgias. O SNS que o País merece não é o dos serviços mínimos, é o da resposta pronta para todas as

necessidades.

O nosso SNS não é o dos encerramentos, o nosso SNS não é o que está proibido, por despacho, de contratar

os profissionais de que necessita. O nosso SNS é o dos profissionais, é o dos utentes, é o que contrata e cria

condições para fixar profissionais no Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do BE.

Sr.as e Srs. Deputados, prestem atenção aos seguintes números.

Faltam obstetras para garantir escalas nas urgências? Existem 1400 em funções no País, apenas 850 no

Serviço Nacional de Saúde.

Faltam anestesistas para escalas em urgências para responder às listas para cirurgias? Os dados da Ordem

mostram quase 2000 inscritos, mas o balanço social do Ministério da Saúde diz que apenas metade trabalha no

SNS.

O Garcia de Orta tem dificuldade para captar pediatras? Novamente: a Ordem dos Médicos fala em 2000

inscritos, mas o balanço social do Ministério da Saúde lista 1100 especialistas em pediatria médica, mais 64 em

cirurgia pediátrica.

Esta realidade replica-se por muitas outras especialidades. Em oftalmologia e urologia temos tempos de

espera inaceitáveis. Porquê? Um terço dos recém-especialistas em urologia e oftalmologia não quiseram ficar

no Serviço Nacional de Saúde. É muito! É demais! Até porque todos eram necessários.

Há muitos profissionais que já não estão no SNS. Outros não querem lá ficar, quando acabam a formação.

Os que saem falam do excesso de trabalho, de uma carreira que não progride, da não valorização da sua função.

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Os que não querem lá ficar, mesmo depois de terem feito lá a sua formação especializada, consideram-no pouco

atrativo.

Esta é uma realidade que temos de mudar. Esta é a realidade que temos de mudar, que nos propomos

mudar, para termos um SNS robusto, com acessibilidade e rapidez de resposta.

É preciso, pois, que o Governo tire o garrote ao SNS, que permita contratar os profissionais necessários.

Para isso, não pode vigorar nenhum despacho, que pretende ignorar a lei de bases ou a lei do reforço da

autonomia das instituições.

Aplausos do BE.

É preciso, pois, Sr.as e Srs. Deputados, que se crie um regime que promova a exclusividade dos profissionais,

que proteja o recurso mais valioso do SNS, ou seja, quem se dedica a tempo inteiro ao serviço público, que

permita captar profissionais para que os serviços não encerrem, para que os tempos de espera não se

perpetuem, para que as populações tenham melhores cuidados. Isto é, aliás, algo que já ficou previsto na Lei

de Bases. É, pois, tempo de o concretizar.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Pergunta n.º 1: como se deve conseguir essa exclusividade? Responde o

Bloco de Esquerda: há cargos em que essa exclusividade deve ser condição obrigatória, como é o caso de

diretores de serviço. Há casos em que deve ser opcional, a começar pelos recém-especialistas, por algumas

áreas carenciadas, e a alargar para todos os profissionais que queiram trabalhar a tempo inteiro e em

exclusividade no Serviço Nacional de Saúde. Com a exclusividade devem ser criados incentivos na

remuneração, na progressão, nas horas para investigação e na organização do tempo de trabalho.

Pergunta n.º 2: com que recursos se pagarão esses incentivos? É que, certamente, há quem vá dizer que

um regime deste tipo vai ficar muito caro.

Sr.as e Srs. Deputados, caro é não haver profissionais no Serviço Nacional de Saúde e depois gastar o dobro

ou o triplo para oferecer piores serviços à população.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Foram gastos mais de 260 milhões de euros em horas extraordinárias, 105

milhões de euros em prestações de serviços — mais concretamente, 36 milhões de euros em médicos sem

especialidade para assegurar serviços de urgência, 8 milhões de euros para assegurar anestesistas, 6 milhões

de euros em obstetras, quase 3 milhões de euros em radiologia, outros 3 milhões em pediatria, mais 8 milhões

de euros em medicina interna, e por aí adiante.

Hoje, desperdiçam-se muitos recursos porque não há o regime de exclusividade. Havendo, esses recursos

não seriam desperdiçados, mas, sim, investidos no SNS.

Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Fernando Negrão.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que o Bloco de Esquerda está disposto

a propor, a contribuir e a criar esse regime de exclusividade. A questão é a seguinte: estarão os Srs. Deputados

dispostos a acompanhar?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, inscreveram-se cinco Srs. Deputados para formular

pedidos de esclarecimento. Como pretende responder?

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O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, respondo aos dois primeiros Srs. Deputados e, depois, aos

restantes três.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Álvaro

Almeida, do PSD.

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado do Bloco de Esquerda…

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Moisés Ferreira!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — … veio aqui defender o reforço do Serviço Nacional de Saúde e argumentar

que há falta de recursos humanos no SNS. Não podíamos estar mais de acordo. É necessário reforçar o SNS e

a primeira coisa a fazer é reforçar os recursos humanos.

No entanto, é preciso lembrar por que razão a situação dos recursos humanos no SNS é a que temos hoje.

E o que temos é uma degradação do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente a nível dos hospitais,

degradação essa que resulta essencialmente das políticas do Partido Socialista que, durante quatro anos,

governou o País e governou o Serviço Nacional de Saúde a partir do Ministério das Finanças.

Aquilo que temos hoje é um conjunto de hospitais cujos conselhos de administração estão limitados na sua

atuação, quer na sua capacidade de gestão, quer nos recursos financeiros que podem utilizar, quer na liberdade

de gerir os recursos humanos.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — E essas restrições vêm de onde? Vêm de quatro Orçamentos do Estado

que este Governo concebeu e executou.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — Mas é preciso lembrar que estes quatro Orçamentos do Estado, aprovados

e executados pelo Governo do Partido Socialista, foram quatro Orçamentos aprovados pelo Bloco de Esquerda.

Aplausos do PSD.

É preciso ter consciência de que a degradação crescente do SNS é consequência direta e inevitável desses

Orçamentos do Estado. Por isso, pergunto-lhe, Sr. Deputado, quando é que o Bloco de Esquerda vai assumir a

sua responsabilidade pelo estado atual de degradação do SNS, responsabilidade essa que decorre diretamente

do facto de ter aprovado os quatro Orçamentos do Estado…

O Sr. Paulo Neves (PSD): — Muito bem!

O Sr. Álvaro Almeida (PSD): — … que conduziram o SNS a esta situação de caos que se vê nas urgências

do Hospital Garcia de Orta, do Hospital de Santa Maria, do hospital de Aveiro e do hospital de Viseu.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Também para formular pedidos de esclarecimento, tem a palavra a

Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do CDS-PP.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Moisés Ferreira, traz-nos hoje o tema da

degradação do SNS, estabelece essa premissa, com a qual estamos de acordo, com a única diferença de que

nós, nos últimos quatro anos, não assinámos por baixo os Orçamentos do Estado que o Bloco de Esquerda

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assinou. Embora sempre em grande litigância e refilando sempre muito, mas, na hora da verdade, lá aprovava

o Orçamento do Estado! Temos essa diferença, concordando na premissa.

Depois, a seguir, o que o Sr. Deputado fez foi dar a explicação tradicional do Bloco de Esquerda para esta

degradação, dizendo que a culpa é dos privados: os privados são maus porque abrem hospitais ao lado para

satisfazer uma necessidade de procura de cuidados de saúde que não é satisfeita pelo SNS; os médicos são

tomados por uma força maléfica e lá vão trabalhar para os privados, onde têm, de facto, melhores salários e

melhores condições de trabalho para prestar esses cuidados de saúde; as pessoas também andarão, de certeza,

muito enganadas, particularmente as que têm ADSE e são funcionários públicos, porque acabam por recorrer

ao privado para verem as suas necessidades de saúde satisfeitas, embora os senhores também não tenham a

coragem de acabar com a ADSE, que era aquilo que gostariam. E é assim que resolvem as grandes

responsabilidades e os grandes problemas da degradação do SNS!

E agora trazem uma nova solução, típica do Bloco de Esquerda, que é uma solução de autoritarismo, a de

obrigar os médicos a ficarem no SNS, ainda que os médicos das urgências, por exemplo do Hospital de Santa

Maria, assinem declarações a dizer que se escusam a qualquer responsabilidade porque não encontram

naquelas urgências as condições para garantir os cuidados clínicos que deveriam garantir!

Mas isso, a si, Sr. Deputado, não lhe interessa. O que lhe interessa é que os médicos lá estejam,

desejavelmente até a ganhar menos, obrigados, porque esse é o seu dever para com a Pátria!

Sr. Deputado, gostaria de saber se é desta vez, se será neste Orçamento do Estado que vai ser, de facto,

definidor e definitivo para o Bloco de Esquerda a aprovação do mesmo em função do que for o orçamento do

SNS. É que estamos cansados de os ouvir queixarem-se, mas, na hora da verdade, a porem a vossa assinatura

e, com isso, a garantirem que fica tudo exatamente na mesma.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Moisés Ferreira.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Álvaro Almeida e Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa,

quero, obviamente, agradecer-vos as questões que colocaram.

Sr. Deputado Álvaro Almeida, em relação aos quatro Orçamentos do Estado, era um pouco previsível que

viessem por aqui, como também era bastante previsível que…

Vozes do PSD: — Não é verdade?!…

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Calma, Srs. Deputados, já vou responder. Também é preciso ter tempo e

espaço para isso!

Era, pois, um pouco previsível essa argumentação, como era também previsível que, sobre o assunto da

declaração política, se se concorda ou não com o regime de exclusividade para os profissionais, não tivessem

grande coisa a dizer. Portanto, correspondeu à previsibilidade e à expectativa, que infelizmente não era a mais

alta, sobre o que pudesse ser o contributo do PSD e do CDS-PP para este debate. Mas vou lá!…

O Bloco de Esquerda votou favoravelmente os quatro Orçamentos do Estado porque aumentaram sempre o

orçamento do Serviço Nacional de Saúde, contra os quais o PSD e o CDS-PP votaram, se calhar porque

aumentavam o orçamento do Serviço Nacional de Saúde. Talvez tenha sido esse o problema do PSD e do CDS-

PP!

Aplausos do BE.

O Sr. José Manuel Pureza (BE): - Bem visto!

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Mas, então, está tudo maravilhoso!…

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O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Não nos arrependemos de os ter votado favoravelmente, como também não

nos arrependemos de ter criado uma nova Lei de Bases da Saúde, lei essa contra a qual o PSD e o CDS-PP

votaram porque queriam aquela primazia dos privados, que os recursos fossem todos canalizados para os

privados e que o orçamento do SNS fosse virado para o privado.

Protestos do CDS-PP.

Não vai acontecer assim, não pode acontecer assim. E o que o Bloco de Esquerda faz agora é não se

arrepender do passado e aprofundar o caminho que tem estado a fazer: defender mais recursos para o SNS,

dar centralidade ao SNS com a Lei de Bases da Saúde e, agora sim, dar novos passos,…

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Cá está! Está a ver como é previsível?

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — … nomeadamente no regime jurídico de exclusividade, que implica dar

incentivos aos profissionais para os captar e fixar no Serviço Nacional de Saúde.

Da parte do PSD e do CDS-PP não tivemos grande participação nesse debate. Aliás, da parte do CDS-PP

pareceu até haver uma corriqueira desatenção em relação ao que eu disse há pouco da tribuna. Nós não falámos

propriamente da degradação que o CDS-PP quer que exista no Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo!

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Creio que tenho 3 minutos, Sr. Presidente. Trata-se de uma resposta conjunta.

Nós chamámos a atenção para duas propostas muito concretas no sentido de melhorar as condições no

Serviço Nacional de Saúde: não haver despachos que criem um garrote à contratação e criar o tal regime de

exclusividade no Serviço Nacional de Saúde. Não falámos em obrigar os médicos a ficarem no Serviço Nacional

de Saúde. Aliás, dissemos que o regime de exclusividade deve ter incentivos associados, nomeadamente

incentivos remuneratórios, de progressão de carreira, de horas para investigação e outras e para a organização

do tempo de trabalho. Mas o que me parece é que o CDS e o PSD não querem que haja esses incentivos,

porque não querem captar e fixar médicos no Serviço Nacional de Saúde. Talvez estejam confortáveis com os

105 milhões de euros que vão para prestações de serviços e com os muitos outros que vão para os privados!

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Seguem-se mais três pedidos de esclarecimento.

Em primeiro lugar, tem a palavra a Sr.ª Deputada Hortense Martins, do Partido Socialista.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Moisés Ferreira, de

facto, agradecemos que tenha trazido este tema ao Plenário da Assembleia da República.

Efetivamente, o Serviço Nacional de Saúde permitiu conquistas inquestionáveis na prestação de cuidados

de elevada qualidade à população, na melhoria do acesso à saúde, tendo sido encontradas respostas para os

problemas que se foram enfrentando.

O Serviço Nacional de Saúde está hoje perante novos desafios e é a esses desafios que nos compete

responder.

Sim, Sr. Deputado, nós também sabemos que temos de ter medidas estruturais de modo a avançarmos para

a resposta a esses problemas e reconhecemos que uma das medidas que tomámos foi a do reforço em meios

e recursos humanos, com mais 11 000 profissionais para o Serviço Nacional de Saúde.

Aplausos do PS.

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Gostaria também de lhe dizer que tomámos medidas no sentido do reforço dos cuidados primários, da criação

das unidades de saúde familiar, do reforço dos cuidados continuados, bem como tomámos muitas outras

medidas.

Estamos de acordo em que os recursos humanos constituem o pilar de qualquer organização e, por via de

maior relevo, também na prestação de cuidados de saúde. E orgulhamo-nos desse Serviço Nacional de Saúde,

em que temos de continuar a investir, reforçando esses mesmos recursos humanos, não só em termos de

dotação orçamental, para que consigamos aumentar o número de profissionais, mas também através da

valorização de carreiras, do investimento nos estabelecimentos hospitalares e unidades de saúde, porque só

tornando mais atrativas as unidades do Serviço Nacional de Saúde, designadamente com a valorização das

carreiras, conseguiremos atrair e fixar mais profissionais.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, atenção ao tempo!

A Sr.ª Hortense Martins (PS): — Quanto à questão da dedicação plena, nós também achamos que temos

de dar alguns passos, mas deverão ser sempre faseados: através da atratividade do sistema e não propriamente

através de medidas que possam ter efeitos contraditórios. Portanto, sim, estamos de acordo em que temos de

continuar a reforçar o Serviço Nacional de Saúde, e tudo faremos para isso.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Deputado Moisés Ferreira,

acompanhamos as preocupações que aqui manifestou relativamente à necessidade de valorização do Serviço

Nacional de Saúde, mas também do reforço de meios humanos, porque os serviços públicos, em geral, estão

muito fragilizados, com particular enfoque na área da saúde, sendo, aliás, o Hospital Garcia de Orta apenas um

exemplo do retrato que a situação da saúde encontra no País, porque a falta de meios humanos e técnicos é

um problema transversal a todos os serviços de saúde e é sentido por todo o lado.

Mas, Sr. Deputado Moisés Ferreira, nós sabemos que o problema não é de agora, não é um problema novo

e, ao contrário do que diz o Sr. Deputado Álvaro Almeida, o mundo não começou há quatro anos, começou

muito antes. Portanto, a situação de hoje também decorre de dois elementos que vou referir: por um lado,

decorre do subfinanciamento crónico a que o SNS esteve sujeito durante décadas e, por outro, da passagem

do Governo PSD/CDS pelos destinos do País, porque um governo que via a saúde apenas como uma fonte de

despesa que e tinha uma visão dela como um mero livro de deve e haver orientou toda a sua política por

elementos que muito contribuíram para a situação que agora se vive.

E dou apenas dois exemplos: se bem se recordam, o Governo PSD/CDS encerrou serviços por todo o País

e, além do subfinanciamento desses serviços, não só não contratou profissionais como ainda dispensou

milhares de profissionais na área da saúde, deixando os serviços de saúde na penúria.

Protestos do PSD e do CDS-PP.

Sr. Deputado Moisés Ferreira, sabemos disso, mas também sabemos que isto não pode servir de desculpa,

de pretexto para que o Governo não dê resposta a estes problemas. Até nos parece que a resposta tarda e que

o investimento demora e consideramos, inclusivamente, que ou o Governo começa a olhar com olhos de ver

para a qualidade — ou para a falta dela — do acesso dos portugueses aos cuidados de saúde ou, então, o caos

instalar-se-á definitivamente.

Por isso, parece-nos muito pouco sensato que o Governo tenha a pretensão de ter as contas certas com a

União Europeia e não tenha as contas certas com os portugueses, ainda por cima numa área tão sensível como

a da saúde.

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Posto isto, Sr. Deputado Moisés Ferreira, coloco-lhe a seguinte pergunta: não lhe parece que seria muito

mais sensato e justo que o Governo fizesse boa figura com o SNS e a qualidade dos serviços públicos prestados

aos portugueses, em vez de dar prioridade à boa figura para a Europa ver?

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Paula Santos.

Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Moisés Ferreira, cumprimento-o também pelo

tema que traz a debate, o das preocupações com o Serviço Nacional de Saúde e com os seus profissionais.

Começo por referir que não é por acaso que um dos ataques que é dirigido ao Serviço Nacional de Saúde

seja feito através do ataque aos direitos dos seus profissionais: a sua desvalorização, o seu não reconhecimento

e a insistência em opções políticas que levam à desmotivação, ao cansaço e à exaustão, levando a que muitos

profissionais de saúde acabem por sair do Serviço Nacional de Saúde exatamente por estas razões, por já não

conseguirem aguentar mais e por se sentirem profundamente desvalorizados e não reconhecidos.

O PSD veio aqui falar dos últimos quatro anos, mas nós vamos avivar-lhe um bocadinho a memória. É que

o PSD gosta muito de pôr o conta-quilómetros no ano de 2016, mas, infelizmente, a história já vem um pouco

mais de trás. Durante décadas, com sucessivos governos, do PS, do PSD e do CDS, houve desinvestimento no

Serviço Nacional de Saúde, seja atacando os seus profissionais ou com a progressiva entrega de serviços

públicos a grupos económicos privados.

Quando aqui colocamos questões de defesa do Serviço Nacional de Saúde é porque temos plena

consciência que é um serviço público universal e gratuito que dá resposta a todos, mas a todos, os cidadãos, a

todos, mas a todos, os utentes, sem discriminação. Os senhores estão mais preocupados em defender o negócio

e os interesses dos grupos privados e, por isso, vão numa lógica de fragilização e de descrédito do Serviço

Nacional de Saúde para beneficiarem os interesses privados.

O Partido Socialista faz referência às conquistas e àquilo que, de facto, possibilitou o Serviço Nacional de

Saúde, só que a sua defesa não é com retórica, mas sim com medidas concretas, que faltam.

Queria, pois, questionar o Sr. Deputado Moisés Ferreira…

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, atenção ao tempo.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Para defender o Serviço Nacional de Saúde é imprescindível, é fundamental defender e reforçar os direitos

dos seus profissionais, valorizar as suas carreiras, o seu desempenho profissional. Sim, é fundamental avançar

no sentido da dedicação exclusiva,…

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, o tempo de que dispunha já foi, em muito,

ultrapassado.

A Sr.ª Paula Santos (PCP): — … porque só com profissionais valorizados e motivados é possível ter um

Serviço Nacional de Saúde com mais qualidade e com melhores cuidados e prestação de serviço aos utentes.

Muito obrigada pela sua tolerância, Sr. Presidente.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado Moisés Ferreira, dispõe de 3 minutos para responder.

Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Moisés Ferreira (BE): — Sr. Presidente, quero agradecer as questões colocadas pela Sr.ª Deputada

Hortense Martins, pelo Sr. Deputado José Luís Ferreira e pela Sr.ª Deputada Paula Santos.

Sr.ª Deputada Hortense Martins, houve, efetivamente, um reforço dos profissionais, dos recursos humanos

e também um reforço orçamental do Serviço Nacional de Saúde nos últimos quatro anos. Contribuímos para

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isso, certamente, não nos arrependemos, como já disse hoje aqui, em Plenário, mas queremos aprofundar tudo

isso.

Conseguimos avanços, nomeadamente com uma nova Lei de Bases da Saúde, que agora é preciso

concretizar, como no que toca à dedicação plena e ao estabelecimento de incentivos.

Consideramos, aliás, que é possível fazer já, neste momento, muito mais do que aquilo que está a ser feito.

Podemos começar, por exemplo, por, nesta Assembleia da República, e por proposta do Bloco de Esquerda,

recomendar a revogação de um despacho que amarra as instituições e que não permite que estas contratem

segundo as suas necessidades. Trata-se do despacho n.º 1 do Secretário de Estado da Saúde, o que,

simbolicamente, não abona muito a favor do Governo, mas creio que a Assembleia da República deveria afirmar

— o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, obviamente, também deveria fazê-lo — que esse despacho não

deveria existir, não deveria produzir efeito e que as instituições deveriam poder criar postos de trabalho, contratar

conforme as suas necessidades.

A Sr. Deputada falou ainda da dedicação plena e da posição que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista

tem de dar passos faseados. É preciso, então, ver quais. A dedicação plena tem de ser uma realidade. Se é

para dar passos faseados, então creio que temos de começar pelos diretores de serviço e dizer que estes têm

como condição para o exercício do cargo a exclusividade de funções. São eles que chefiam equipas, são eles

que organizam equipas e é entre eles que a promiscuidade se pode verificar em maior grau e, portanto, devem

ser os primeiros. Depois, como dissemos, deve-se continuar com recém-especialistas, com especialidades mais

carenciadas e outros profissionais, todos os que queiram aderir, com um regime de incentivos, à exclusividade

no Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Deputado José Luís Ferreira falou sobre contas certas. Julgo que essa é uma muito boa discussão,

porque, efetivamente, não são contas certas estarmos a gastar 260 milhões de euros em horas extraordinárias

quando, com esse dinheiro, poderíamos contratar 8000 profissionais para o Serviço Nacional de Saúde. E não

são contas certas gastar 105 milhões de euros em prestações de serviços de tarefeiros, quando, com esse

dinheiro, poderíamos criar um regime de incentivo à dedicação exclusiva, que fixaria profissionais no Serviço

Nacional de Saúde.

Para terminar, a Sr.ª Deputada Paula Santos falou sobre o reforço dos direitos profissionais. Estamos,

obviamente, de acordo com que o regime de incentivo e de promoção da exclusividade também tenha como

retorno o reforço dos direitos dos profissionais, seja do ponto de vista remuneratório, seja do ponto de vista de

carreira, porque quem se dedica exclusivamente ao SNS também deve ter esse retorno na sua carreira.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem agora a palavra, para uma declaração política, o Sr. Deputado

António Filipe, do PCP.

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Amanhã mesmo, os profissionais das

forças e serviços de segurança saem à rua para manifestar o seu protesto pela falta de resposta, por parte do

Governo, às suas legítimas reivindicações.

Quando se trata de elogiar a ação das forças e serviços de segurança, os governantes não poupam nas

palavras. O que está certo. Os governantes não poupam nos elogios, mas o problema é que não passam disso.

As justas reivindicações dos profissionais das forças e serviços de segurança, expressas através dos seus

sindicatos e associações socioprofissionais, deparam sistematicamente com a indiferença dos governantes, com

a falta de diálogo e com a ausência de qualquer resposta.

Na passada Legislatura, o PCP colaborou na aprovação de uma lei sindical da PSP (Polícia de Segurança

Pública) para acabar com o abuso da criação de sindicatos sem qualquer representatividade, tão só com o

objetivo de beneficiar de créditos de horas sindicais. Mas, com o mesmo sentido de responsabilidade, o PCP

apresentou nesta Assembleia projetos de lei sobre a adoção de um estatuto da condição policial e sobre

condições de higiene e segurança no trabalho das forças e serviços de segurança, propostas lamentavelmente

rejeitadas pelos partidos que não se cansam de elogiar os seus profissionais.

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É digno de elogio que os profissionais das forças e serviços de segurança, a braços com a exiguidade de

meios materiais e humanos que constantemente denunciam, contribuam decisivamente para que os

governantes se possam orgulhar de Portugal ser um dos Países mais seguros do mundo.

É digno de elogio o profissionalismo e o sentido de humanidade com que os profissionais das forças e

serviços de segurança portugueses salvam vítimas no Mediterrâneo, ajudando a mitigar as consequências da

situação humanitária catastrófica que se abateu sobre diversos Países e para a qual a União Europeia muito

tem contribuído, através de políticas irresponsáveis que conjugam a ingerência, a desestabilização e a pilhagem

de recursos desses Países com a recusa em encarar de frente a resposta humanitária que se impõe, perante o

drama de milhares de seres humanos que procuram na imigração as suas possibilidades de sobrevivência.

É digna de elogio a determinação dos profissionais das forças e serviços de segurança que têm de enfrentar

situações de enorme penosidade e risco e que, tantas vezes, no cumprimento das suas missões, enfrentam

agressões ou, como recentemente aconteceu, perdem a própria vida.

No entanto, problemas como a justa reposição de carreiras e do montante das pensões de reforma, depois

de quase uma década de congelamento, como a criação de subsídios de risco e penosidade das missões, como

o apoio médico e psicológico, como a garantia mínima de condições de higiene e segurança no trabalho, como

a dotação de efetivos em número razoável para o cumprimento das missões ou como a definição de um horário

de serviço na GNR (Guarda Nacional Republicana) não tiveram da parte do Governo qualquer resposta.

Em vez disso, o que vemos é a imposição de processos disciplinares a dirigentes associativos por terem a

coragem de cumprir o seu dever de dirigentes, defendendo publicamente os direitos e interesses dos seus

associados.

O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Enquanto o PS, o PSD e o CDS nada fazem, nem deixam fazer, os suicídios

nas forças e serviços de segurança continuam a níveis alarmantes, os profissionais não obtêm qualquer resposta

às suas reivindicações, e, consequentemente, aumenta a frustração e o descontentamento que obriga os

polícias a sair à rua.

O PCP não defende a instauração de um Estado policial. As polícias devem agir no estrito limite das suas

atribuições e no respeito escrupuloso pelos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. E deve haver o

maior rigor na fiscalização e controlo da atividade policial. Os abusos de autoridade e o incumprimento da lei por

parte de agentes policiais devem ser sempre objeto de fiscalização rigorosa e do apuramento de

responsabilidades que devam ter lugar. A infiltração das forças e serviços de segurança por elementos de

extrema-direita, racistas e xenófobos, deve merecer um combate implacável da parte dos Governos e de todas

as forças democráticas.

VozesdoPCP: — Muito bem!

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — As forças e serviços de segurança não podem ser corpos estranhos à ordem

democrática que têm por missão salvaguardar, mas isso implica que os direitos democráticos dos seus

profissionais sejam de igual modo respeitados.

O Sr. JoãoOliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — O PCP já reapresentou nesta Legislatura os seus projetos de lei sobre o

estatuto da condição policial, sobre as condições de higiene e segurança no trabalho das forças e serviços de

segurança e sobre o horário de serviço na GNR.

Esperamos que, quando estas iniciativas forem agendadas para debate em Plenário, haja de todos os demais

partidos alguma coerência entre as palavras e os atos.

O Sr. JoãoDias (PCP): — Muito bem!

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O Sr. AntónioFilipe (PCP): — De nada serve elogiar os profissionais das forças e serviços de segurança

em palavras e depois, quando se trata de lhes dar condições para desempenharem as suas missões e para

demonstrar respeito pelos seus direitos e pelas suas reivindicações fundamentais, haja um enorme silêncio,

quando não uma obstrução às iniciativas construtivas que são apresentadas para melhorar a situação desses

profissionais.

Aguardamos que, quando esses debates tiverem lugar, haja coerência entre as palavras e os atos por parte

de todos os partidos e que estes profissionais vejam esta Assembleia da República aprovar um estatuto da sua

condição policial que respeite, efetivamente, os seus direitos e as suas reivindicações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado António Filipe, inscreveram-se quatro Deputados para

pedidos de esclarecimento. Como pretende responder-lhes?

O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Respondo dois a dois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Começo, então, por dar a palavra, para um pedido de

esclarecimento, ao Sr. Deputado José Magalhães, do PS.

O Sr. JoséMagalhães (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado António Filipe, durante muito

tempo, a direita conduziu um debate em torno de uma falsa dicotomia — ou liberdade ou segurança. Julgo que

o Partido Socialista ajudou a denunciar essa falsa dicotomia, afirmando que não há liberdade sem segurança, e

a contribuir, concretamente, de forma objetiva e efetiva, para a criação de melhores condições de segurança.

Aplausos do PS.

Estamos, portanto, de acordo! E também estamos de acordo quanto ao papel de uma polícia ou das forças

de segurança num Estado democrático.

Fomos, durante anos, objeto daquela teoria da ditadura segundo a qual onde estivesse um polícia estava a

repressão, e onde está um polícia está a democracia e o respeito pela Constituição da República. E o que a

gente andou para aqui chegar!

VozesdoPS: — Muito bem!

O Sr. JoséMagalhães (PS): — Isso é muito importante para nós.

Mas a sua tese, desenvolvida reiteradamente — contei umas sete vezes —, é a de que não passam de

elogios as palavras que o Governo dirige e nada mais do que isso.

Julgo que isso é desmerecer o trabalho, em que o PCP colaborou na passada Legislatura, de aprovação de

diplomas que melhoraram as condições de financiamento, desde logo os Orçamentos e a Lei de Programação

das Infraestruturas e Equipamentos para as Forças e Serviços de Segurança, que garantiu 450 milhões de euros

para o setor da segurança, o que, como sabe bem, é muito importante. Por outro lado, está no Programa do

Governo o compromisso de uma lei de recrutamento, de três em três anos, de pessoal para as forças e serviços

de segurança.

Aplausos do PS.

Protestos do CH.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado José Magalhães, chamo a atenção para o seu tempo.

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O Sr. JoséMagalhães (PS): — São coisas concretas! Outras serão discretas. A infiltração de elementos de

extrema-direita nas forças de segurança exige medidas adequadas e discretas. E não é uma ilusão, Sr.

Deputado André Ventura!

O Sr. AndréVentura (CH): — Não, não é uma ilusão…

O Sr. JoséMagalhães (PS): — Infelizmente, é uma realidade que deve ser extirpada!

Sr. Deputado António Filipe, qual é a sua posição?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra, para um pedido de esclarecimento, a Sr.ª Deputada

Mónica Quintela, do PSD.

A Sr.ª MónicaQuintela (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, saúdo desde já o Sr. Deputado

António Filipe por ter trazido a debate este tema, que não poderia ser de maior pertinência, atenta a manifestação

que amanhã vamos ter à porta da Assembleia da República, na qual se estima que pelo menos 10 000 efetivos

da PSP e da GNR venham reivindicar as suas justas aspirações.

O Sr. AdãoSilva (PSD): — Bem lembrado!

A Sr.ª MónicaQuintela (PSD): — Também não posso deixar de chamar à colação a aprovação, na anterior

Legislatura, da Lei de Programação de Infraestruturas e Equipamentos das Forças e Serviços de Segurança,

que teve uma estimativa de execução de apenas 60%. E porquê? Todos o sabemos: por causa das célebres

cativações!

Esta lei-quadro permitia que, atempada e programadamente, como o título da própria lei o indica, se pudesse

programar a saída dos efetivos da GNR e da PSP — que, quero aqui frisar, não são só órgãos de polícia criminal,

cumprem também uma função absolutamente prioritária e fulcral na nossa sociedade, desde apoiarem os

idosos, a ajudar-nos a todos — e o que está acontecer é que a maioria das saídas destes efetivos se dá por

limite de idade, por reforma.

Ora, a reforma é um aspeto absolutamente previsível e programável e, como tal, poderia ser equacionada e

prevenida de modo a que a GNR e a PSP não ficassem completamente desfalcadas e depauperadas, como

estão. A generalidade destas aposentações poderiam ter sido logo compensadas com novos efetivos que

tivessem entrado.

Constatamos também o estado em que estão as esquadras da GNR e da PSP, a falta de equipamentos que

têm…

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada Mónica Quintela, chamo a sua atenção para o tempo.

A Sr.ª Mónica Quintela (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente, colocando a seguinte pergunta: onde é que

estava o PCP quando aprovou os Orçamentos do Estado e a política de cativações que deixaram que se

chegasse a esta situação, à qual, amanhã, infelizmente, todos iremos assistir num palco privilegiado?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, não posso estar mais de

acordo consigo quando o Sr. Deputado diz que há uma falsa dicotomia entre a liberdade e a segurança. Não

podíamos estar mais de acordo quanto a isso, é uma falsa dicotomia. Bem o dizia Benjamin Franklin, com a sua

célebre frase, em que referia mais ou menos isto: «Quem está disposto a sacrificar a liberdade em nome da

segurança não merece uma nem outra».

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Portanto, em nosso entender, há que ter um maior rigor no cumprimento da lei, no respeito pelos direitos dos

cidadãos, na atuação das forças e serviços de segurança, mas também é preciso respeitar os profissionais das

forças e serviços de segurança e valorizar a sua atuação, dando igualmente resposta às suas justas

reivindicações.

E aí o Sr. Deputado diz que estaríamos a desmerecer o trabalho para o qual contribuímos na última

Legislatura. Mas não é isso, Sr. Deputado, até porque na minha intervenção valorizei o facto de termos aprovado,

inclusive, uma nova lei sindical para a PSP. O que lamentamos é não se ter feito, na anterior Legislatura, aquilo

que se poderia ter feito. Lamentamos, designadamente, que as propostas aqui apresentadas pelo PCP, quer

quanto ao estatuto da condição policial, quer quanto ao melhoramento das condições de segurança e de higiene

no trabalho dos profissionais das forças e serviços de segurança, não tivessem sido aprovadas — e, aí, o PS, o

PSD e o CDS convergiram na não aprovação dessas medidas. Elas poderiam ter sido aprovadas, dando, assim,

alguma satisfação a reivindicações justas dos profissionais das forças e serviços de segurança.

Sr.ª Deputada Mónica Quintela, agradeço-lhe também as perguntas que colocou. É curioso que tenha falado

da lei-quadro de programação de investimentos em equipamentos e infraestruturas das forças de segurança,

porque essa lei existiu, mas, depois, deixou de existir, porque o PSD e o CDS, no Governo, acabaram com ela.

E, na passada Legislatura, foi, de novo, aprovada uma lei-quadro,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … com a qual o PCP concordou. Aliás, quem apresentou a primeira iniciativa

nesse sentido, há muitos anos, nesta Assembleia, foi precisamente o PCP.

O Sr. João Oliveira (PCP): — Bem lembrado!

O Sr. Adão Silva (PSD): — O problema é a execução!

O Sr. António Filipe (PCP): — Portanto, necessário é que essa lei seja cumprida. É que ela está

praticamente no ano zero e este ano seria o ano um. Portanto, esperemos que esta lei seja efetivamente

cumprida e que não aconteça como aconteceu outras vezes, em que tivemos uma lei no papel mas que não

passou para a prática. Mas cá estaremos para fiscalizar a aplicação desta lei-quadro de investimentos.

Perguntou-me onde estava o PCP e eu pergunto onde estava o PSD — nós sabemos, nós estávamos aqui

e os senhores estavam aí —, quando permitiu que fosse rejeitado o estatuto da condição policial, proposto pelo

PCP,…

Protestos do Deputado do PSD Adão Silva.

… e quando também não aprovou o projeto de lei do PCP sobre condições de higiene e segurança no

trabalho dos profissionais das forças e serviços de segurança.

É que os senhores falam muito das forças de segurança, mas, quando se tratou de aprovar aqui medidas

concretas para beneficiar a sua situação, aí os Srs. Deputados faltaram à chamada.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo

Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, essa sua última referência é

muito interessante, porque eu sei onde é que o Sr. Deputado estava quando esta Câmara, na Legislatura

passada, aprovou o subsídio de risco, e o senhor também sabe onde é que eu estava e onde estavam todos os

outros Deputados — estávamos todos aqui! E o subsídio de risco foi aprovado. Só que, depois, o que é que

aconteceu? Houve subsídio de risco? Não, não houve!

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Por isso, Sr. Deputado, recomendava-lhe, quando fala na Legislatura passada e no que fizeram na

Legislatura passada, que pensasse melhor no que fez na Legislatura passada. E se os senhores acham que

fizeram bem, na Legislatura passada, tendo uma maioria a governar durante quatro anos, como é possível

termos chegado à situação a que chegámos hoje? Uma situação em que as forças e serviços de segurança, os

sindicatos que os senhores conhecem bem e os representantes dos profissionais que os senhores também

conhecem bem dizem: «Nunca estivemos assim, nunca estivemos numa situação tão dramática e tão

desesperada como aquela em que estamos hoje!» Portanto, convém os senhores saberem o que estão a fazer.

Já agora, desafio o Sr. Deputado António Filipe a fazer algo muito simples. O senhor diz «vamos ser

coerentes, vamos ser concretos». Então, vamos a isso, Sr. Deputado! Vamos a isso!

Brevemente, chegará a esta Câmara o Orçamento do Estado e vamos ver que propostas apresenta —

propostas de promoção, de inclusão de efetivos, de compra de meios e de obras nas esquadras. Vamos ver o

que estará no Orçamento do Estado. E vamos ver como vota cada um dos partidos. Eu comprometo-me, desde

já, em nome do CDS, a votar a favor dessas propostas e dessas reivindicações justas. Vamos ver como é que

os senhores votam e vamos ver que conclusão tirarão no fim do Orçamento. Vamos ver se continuarão, ou não,

a fazer como fizeram nos últimos quatro anos, ou seja, falam, falam, falam, mas, no fim, quando votam, aprovam

o Orçamento do Partido Socialista e fica tudo na mesma. É isso que queremos saber, Sr. Deputado.

Já agora, deixo-lhe mais uma pergunta. O PCP tem defendido o aumento do salário mínimo nacional — e

tem-no feito, independentemente da concertação social, mas não quero abrir agora essa discussão. Mas se os

senhores defendem um salário mínimo nacional, diga-me o Sr. Deputado de quanto é. É de 800 €?

O Sr. António Filipe (PCP): — É de 850 €!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Então, se os senhores defendem um salário mínimo nacional desse nível,

que salário defendem para os homens e mulheres das forças de segurança e que salário estão dispostos a

aprovar no Orçamento do Estado para essas mesmas forças?

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, queira terminar.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E se esse salário não for aprovado, como é que os senhores votarão o

Orçamento do Estado?

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra

Cunha, do Bloco de Esquerda.

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, quero saudá-lo pelo tema que

trouxe a este Plenário e dizer-lhe que os profissionais das forças e serviços de segurança desempenham, de

facto, funções absolutamente importantes e fundamentais para a nossa vida em sociedade. E não são as

infiltrações de elementos da extrema-direita nas forças e serviços de segurança — aliás, bem expressas nos

vários relatórios internacionais, designadamente europeus, como o relatório da ECRI (European Commission

against Racism and Intolerance) do ano passado, pelo que esta é uma realidade que temos de considerar e que

as próprias forças e serviços de segurança também têm de considerar — que devem servir para denegrir a

imagem ou para diminuir a importância das funções destes homens e destas mulheres, nem tão-pouco para

ignorar aquilo que são as suas justas reivindicações e os seus direitos.

É que falar em dignificação e valorização das forças e serviços de segurança começa precisamente pelo

respeito destes direitos e por garantir as condições de trabalho dignas a estes homens e a estas mulheres.

O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — E não houve só falta de investimento na anterior Legislatura, já que esta falta

de investimento é norma em sucessivos governos. E falo da falta de investimento não só naquilo que respeita

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ao número de efetivos — sabemos que os que têm saído são mais do que aqueles que têm entrado, pelo que

nunca conseguimos ter um número de efetivos suficiente para as necessidades dos serviços e especialmente

para as funções operacionais — mas também, e principalmente, naquilo que respeita à degradação dos edifícios

das esquadras e do parque automóvel e à falta de equipamentos.

De norte a sul do País, há esquadras e postos da GNR e da PSP com placas de fibrocimento e que continuam

a ter placas de fibrocimento, sem acesso para pessoas com mobilidade condicionada, em que chove lá dentro,

portanto sem quaisquer condições.

Este investimento previsto na lei de programação de infraestruturas, a qual, com o Governo da Legislatura

passada, foi reativada, tem de ser cumprido, e tem de sê-lo noutros moldes e para além daquilo que foi

conseguido fazer na última Legislatura.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada, tem de terminar.

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Termino já, Sr. Presidente.

Assim sendo, pergunto ao Sr. Deputado António Filipe se não concorda com a necessidade de que as leis

aprovadas neste Parlamento tenham execução, cumprimento e implementação, isto é, que, para além daquilo

que está escrito no papel, sejam efetivamente implementadas na prática.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia não me levará a mal que eu

responda primeiro à Sr.ª Deputada Sandra Cunha por uma questão de arrumação lógica da minha resposta.

Sr.ª Deputada, efetivamente, concordamos que a legislação aqui aprovada deve ser cumprida e que esta

Assembleia deve fiscalizar o seu cumprimento. Assim, vamos estar muito atentos à execução da lei aprovada

relativamente às instalações e equipamentos das forças e serviços de segurança. E pensamos que as

reivindicações que os sindicatos e as associações sócio-profissionais das forças e serviços de segurança têm

vindo a manifestar são justas, porque eles foram gravemente lesados nas suas carreiras no tempo da troica e

do Governo PSD/CDS e houve problemas que nunca foram resolvidos até hoje.

Obviamente que se os problemas que foram criados não foram resolvidos adequadamente — e começo já a

responder também ao Sr. Deputado Telmo Correia —, eles tendem a agravar-se. Portanto, há que compreender

a frustração dos profissionais das forças e serviços de segurança.

Mas, Sr. Deputado Telmo Correia, é preciso ter descaramento para, depois de o Governo PSD/CDS ter

cortado os salários aos polícias,…

O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!

O Sr. António Filipe (PCP): — … os senhores virem aqui manifestar preocupações salariais.

Aplausos do PCP.

É que, entre nós, há uma grande diferença: nós agora falamos da necessidade de aumentos, quando os

senhores, no vosso Governo, impuseram cortes. Isso é completamente diferente.

Mas há problemas para resolver, inclusivamente a nível salarial. Daí que tenhamos a maior compreensão

pelas reivindicações que os profissionais das forças e serviços de segurança têm vindo a manifestar.

O Sr. Deputado interrogou-me sobre onde vamos estar quando se discutir o próximo Orçamento do Estado

sobre esta matéria. Sr. Deputado, nós cá estaremos, cá estaremos para discutir o Orçamento do Estado, para

apreciar as propostas que sejam apresentadas nessa matéria. O que não somos é intermitentes. É que, até ir

para o Governo, o CDS apresentava-se como um grande paladino da defesa dos polícias, mas quando foi para

o Governo esqueceu-se completamente, houve um apagão!

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Aplausos do PCP.

Quando foi para o Governo houve um apagão absoluto no discurso do CDS acerca do problema dos polícias.

Já quando foi para a oposição retomou a defesa dos polícias no seu discurso. Mas, convenhamos, com a

experiência que todos tivemos quando os senhores estiveram no Governo, isso retirou qualquer credibilidade

ao vosso discurso relativamente à necessidade de resolver os problemas dos polícias.

Nós, sem intermitências, continuamos onde sempre estivemos: em defesa da legalidade democrática e em

defesa do respeito da legalidade e dos direitos dos cidadãos por parte dos polícias. E também achamos que

deve haver um escrupuloso respeito pelos direitos dos profissionais das forças de segurança e que devem ser

atendidas as suas justas reivindicações.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para uma declaração política, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo

Correia, do CDS-PP.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A começar, e em continuação,

quero só lembrar-lhe, Sr. Deputado António Filipe, que, mesmo nos tempos da troica, houve um Ministério que

foi excecionado em termos de cortes, que foi, precisamente, o Ministério da Administração Interna. Se queremos

falar sobre isto, falemos, então, de forma séria e rigorosa, dizendo a verdade: isto aconteceu mesmo no tempo

da troica, Sr. Deputado!

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — É verdade!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Mas já sabemos que, sempre que se discutem temas de segurança, de

criminalidade ou qualquer outro dessa área, da parte do Governo e dos partidos que o têm suportado e apoiado,

ao longo dos últimos quatro anos, a resposta é sempre a mesma: «Não há problema nenhum, não há questão

nenhuma. Portugal é um dos países mais seguros do mundo!» Para o Governo e para os partidos da maioria,

não há problema nenhum, a segurança não é sequer assunto.

Que Portugal seja um País relativamente seguro é um dado obviamente positivo. Só que convém não

esquecer porque é que isso acontece. Isso acontece devido ao extraordinário trabalho, esforço, espírito de

dedicação e sacrifício das mulheres e homens que integram as forças de segurança, no dia a dia, sem terem as

condições para isso, como lembrou, hoje mesmo, o Sr. Comandante da Área Metropolitana de Lisboa da Polícia

de Segurança Pública. De resto, ao longo dos últimos quatro anos, houve inúmeras manifestações que ilustram

isso mesmo.

Nessas manifestações, durante o Governo anterior, de António Costa e Eduardo Cabrita — como eu próprio

tive ocasião de recordar ao antigo e novo Ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita —, era bem visível

um slogan muito repetido e muito conhecido, que era este: «Ó Cabrita, olha para isto, o País seguro e os polícias

nisto!».

Este slogan foi repetido e ilustra a realidade do que têm sido estes últimos quatro anos.

Srs. Deputados, debate após debate, RASI (Relatório Anual de Segurança Interna) após RASI, Orçamento

do Estado após Orçamento do Estado, em nome do CDS, fomos reclamando, apelando e exigindo respostas

para esta questão. Fizemos propostas em sede de Orçamento do Estado, propusemos as verbas necessárias

e elas foram sistematicamente chumbadas pelo Governo do Partido Socialista e pela maioria que o apoiou ao

longo de quatro anos.

É certo que a segurança é condição primária da liberdade, mas também é certo que sem autoridade do

Estado não há segurança nem liberdade.

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Ao longo da Legislatura anterior, alertámos para a irresponsabilidade de

não ter sido dada resposta a questões essenciais e que a situação das forças de segurança caminhava para o

insustentável. Do Governo, até agora, nada. Zero!

Ao longo de quatro anos, nem admissões de efetivos, nem índices remuneratórios, nem concursos para

promoção, nem evolução justa dos salários, nem o subsídio de risco que o próprio Parlamento aprovou, nem

sequer os suplementos que o tribunal tinha determinado o Governo pagou, nem investimento em esquadras

degradadas ou equipamentos. Esta é a verdade! Durante uma Legislatura inteira, nada, zero!

Agora que a situação se tornou cada vez mais insustentável, agora que o descontentamento cresceu

exponencialmente, nem assim veio o Governo dar respostas satisfatórias, e não foi por falta de ocasião. Basta

lembrar, por exemplo, que, no debate do Programa do Governo, eu próprio e outros Srs. Deputados

perguntámos ao Sr. Primeiro-Ministro, então aqui sentado, o que é que tinha a dizer sobre estas matérias e

estas reivindicações. De forma arrogante, o Sr. Primeiro-Ministro não se dignou sequer a responder.

A Sr.ª Cecília Meireles (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Agora que a preocupação e o descontentamento estão bem espelhados

por aí — basta circular, hoje, à volta deste Parlamento —, o que diz o Ministro da Administração Interna?

Primeiro, diz que o descontentamento não é com o Programa do Governo. Bom, quanto a isso, tem razão. De

facto, não é possível estar descontente com uma nulidade e, nesta matéria, o Programa do Governo é zero. É

uma nulidade.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

Segundo, diz que, finalmente, vai pagar aquilo que os tribunais já tinham condenado a pagar. Cá estaremos

para ver, no Orçamento do Estado.

Terceiro, diz que uma agressão contra um polícia é mais grave porque é uma agressão contra o Estado. A

preocupação fica-lhe bem, mas qual é a consequência? Convém lembrar que, só até junho deste ano, foram

feridos em serviço 391 elementos da PSP, 238 dos quais em Lisboa; da GNR, no ano passado, foram 220.

Se, em Portugal, temos um problema sistemático de ofensas a quem exerce autoridade, seja nas ruas ou

nas escolas — e, por isso, o CDS apresentou um projeto relativo à violência escolar —, obviamente que tem de

haver uma resposta política.

Hoje mesmo, daremos entrada na Mesa de um projeto que visa agravar a moldura penal nos crimes

praticados contra elementos das forças de segurança.

Por outro lado, se agredir um polícia é agredir o Estado, como diz o Sr. Ministro, pergunto: ignorar, anos a

fio, as reivindicações justas dos agentes e forças de segurança é o quê? É, obviamente, pôr em causa o Estado

e a liberdade de todos nós, e é isso que este Governo tem feito.

É preciso dignificar a função dos que nos protegem e reconhecer as situações de risco, tal como o Parlamento

já fez no passado, instituindo o subsídio de risco. Vamos propô-lo, também, hoje mesmo.

E se o Sr. Primeiro-Ministro quer aumentar o salário mínimo, pois, muito bem, comece por aumentar, de

forma justa, o salário das mulheres e homens que garantem a nossa proteção e segurança dia após dia.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo-o à atenção para o tempo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Vou terminar, Sr. Presidente, dizendo que, se o Governo afirma uma

coisa e as forças de segurança afirmam outra, a responsabilidade de ir saber, de ir ver e de acompanhar no

terreno é do Parlamento. Por isso, vamos propor que este Parlamento constitua um grupo de trabalho que vá

ao terreno, que saiba e que valorize o trabalho de quem, todos os dias, arrisca a vida para nos proteger a todos.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado Telmo Correia, a Mesa registou a inscrição de dois

Srs. Deputados para formularem pedidos de esclarecimento.

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Como pretende responder?

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, individualmente.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro

Rodrigues.

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Telmo Correia, antes de mais, quero saudá-

lo por ter trazido este tema a Plenário, bem como pela circunstância de ter denunciado um exercício de

propaganda. É que hoje percebemos que, enquanto o Governo faz propaganda, a esquerda mais à esquerda

ocupa-se de um exercício novo, que é o de saber onde é que estivemos no verão passado. Mas já estamos

habituados a estes exercícios da esquerda.

Portanto, saúdo-o por ter denunciado este exercício de propaganda constante que o Governo e o Partido

Socialista têm feito também em matéria de segurança interna. Fez-me até lembrar, quando recorreu a um dos

slogans de uma manifestação antiga, o «Ó Cabrita, olha para isto, enquanto andas na propaganda vamos

continuar nisto».

A verdade, Sr. Deputado, é que o Governo tem vindo a propalar sucesso em matéria de segurança interna.

Mas pergunto: como é que podemos considerar que temos sucesso em matéria de segurança interna, quando

continuamos a ter esquadras fechadas à noite por falta de operacionais?

Vozes do PSD: — Muito bem!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Como é que podemos continuar a considerar que temos sucesso em

matéria de política interna, quando são os operacionais que, pelos seus próprios meios, têm de comprar

equipamento e material essencial para a sua função?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Srs. Deputados, como é que podemos continuar a considerar que há

sucesso em matéria de política de segurança interna, quando continuamos a assistir a um desinvestimento

progressivo, a défice de operacionais — só na GNR está na casa dos 5000 — e, constantemente, a dotações

orçamentais cativadas e investimento restringido?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Bem lembrado!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Sr. Deputado Telmo Correia, como é que podemos considerar que temos

sucesso em matéria de segurança interna, quando, ainda há meia dúzia de anos — há três ou quatro anos —,

as vítimas dos incêndios ficaram totalmente desprotegidas,…

Vozes do PSD: — Bem lembrado!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — … sem uma resposta efetiva da parte do Estado e das forças de proteção

civil?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Lamentável!

O Sr. Pedro Rodrigues (PSD): — Por isso, Sr. Deputado Telmo Correia, a pergunta, muito singela, que lhe

quero fazer é a seguinte: do seu ponto de vista, como é possível continuarmos a enganar os portugueses,

iludindo-os com a bandeira da propaganda de que temos maior e melhor segurança interna, quando,

sucessivamente, Orçamento atrás de Orçamento, o que constatamos é um desinvestimento progressivo nas

forças de segurança e nos seus operacionais?

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Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia para responder.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado Pedro Rodrigues, em primeiro lugar, gostaria

de agradecer a sua pergunta.

Em segundo lugar, registo, em concordância, que o Sr. Deputado colocou o dedo na ferida. E a ferida é esta,

a de um Governo que se baseia nos números globais da criminalidade para dizer que somos um País seguro,

ainda que, em minha opinião, não se possa nem deva ignorar certo tipo de crimes específicos que estão a

crescer, como por exemplo: os homicídios, que crescem exponencialmente, e muitos deles, como sabemos,

ligados a questões familiares ou à própria violência doméstica; os assaltos; e a violência em meio escolar, que

me parece particularmente importante.

A violência em meio escolar é um crime que tem aumentado e é algo que deve preocupar o nosso País,

porque, do nosso ponto de vista, além de termos falta de apoio e de investimento, temos, efetivamente, alguma

crise de autoridade, sendo que quem exerce funções de autoridade — pode ser um professor, pode ser um

contínuo, pode ser um bombeiro, como vimos recentemente em Borba, pode ser um agente das forças de

segurança — não é respeitado. E não só não é respeitado como não sente o apoio necessário da parte do poder

político.

Por isso propomos a valorização, por isso colocámos hoje propostas concretas em cima da mesa e por isso

sugiro também que a Assembleia da República faça o seu trabalho.

O Sr. Deputado já tem muita experiência política — lembro-me de si de outra ocasião —, tendo regressado

agora ao Parlamento, e bem, e devo dizer-lhe que, nos últimos quatro anos, da esquadra da Bela Vista, no

Porto, à Unidade Especial de Polícia, aqui na Ajuda, ouvimos sistematicamente dizer «as nossas condições são

deploráveis», «chove lá dentro», «caiu uma parte do teto», com o Governo a dizer sempre o contrário ou a dizer

aquilo que ouvimos hoje mesmo, ou seja, «agora vamos fazer» e «para o ano que vem já estará tudo resolvido».

Ouvimos isto durante quatro anos, portanto, acho que é tempo de irmos ao terreno ver o que falta. Os coletes

balísticos estão, de facto, fora de validade ou não estão? São utilizáveis ou não são? Quem é que paga,

efetivamente, as algemas?

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino já, Sr. Presidente.

Acho que temos de fazer esse trabalho, temos de ser concretos, porque o descontentamento é justo, é

legítimo e, obviamente, é preciso dar-lhe uma resposta política.

Agradeço, por isso, a sua pergunta, Sr. Deputado.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — O Sr. Deputado João Ataíde, do PS, tem agora a palavra para pedir

esclarecimentos.

O Sr. João Ataíde (PS): — Sr. Presidente, aproveito para saudar a Assembleia, as Sr.as Deputadas e os Srs.

Deputados, nesta minha primeira intervenção sobre um tema que, para mim, é um equívoco. Utilizar as

reivindicações de ordem corporativa — e justas! — dos guardas e polícias das nossas forças de segurança para

resvalar para um discurso securitário parece-me um aproveitamento.

A Sr.ª Cláudia Santos (PS): — Muito bem!

O Sr. João Ataíde (PS): — Todavia, pegando na questão que nos diz respeito, parece-me fundamental dizer

que nos honramos dos polícias que hoje temos, porque desde a aprovação da Lei de Segurança Interna que há

uma aposta permanente e contínua nos nossos guardas e nos nossos polícias, numa cultura de cidadania e de

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aproximação a um Estado de direito. Não numa perspetiva meramente securitária, mas numa perspetiva

fundamentalmente preventiva e que coloca o cidadão como primeiro objetivo.

Aplausos do PS.

Nessa perspetiva, os relatórios anuais de segurança interna prestam contas ao País e dão-nos dados.

Gostaria também de chamar a atenção do Sr. Deputado Telmo Correia para o facto de a lei de programação

de infraestruturas e equipamentos estar dotada de 443 milhões de euros para fazer face a muitas das

reivindicações dos nossos polícias e das nossas forças de segurança interna, porque eles reivindicam não só

melhor qualidade de serviço como regalias que lhes são devidas.

Por isso, o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado já encetaram um programa de negociação e de audição

de todos os intervenientes, para que se possam ter em consideração todos os aspetos que dizem respeito ao

seu estatuto e à justa reivindicação dos direitos que lhes foram atribuídos e são devidos.

Mas não é só essa, felizmente, a sua reivindicação. Também querem um Estado mais seguro e querem

pugnar pela qualidade do serviço que prestam, e, quanto a isso, iremos acompanhá-los.

O que pergunto ao Sr. Deputado é se teve em conta estes dados que nos são fornecidos reiteradamente

pelos relatórios anuais de segurança interna.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Ataíde, apesar de ser a sua primeira

intervenção no Parlamento, V. Ex.ª tem vasta experiência, inclusivamente governativa, pelo que saúdo a sua

presença.

Não me leve a mal, mas começo por reconhecer que houve alguma dificuldade na sua pergunta. V. Ex.ª falou

em cidadania, em valores elevados, em valores importantes, mas o socialista é o Sr. Deputado, não sou eu. Eu

sou o não-socialista.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

Às vezes, sou mesmo quase antissocialista. Mas isso sou eu.

E, tanto quanto sei, há muitos anos que o socialismo tem uma ideia clara de que, normalmente, quando há

uma contestação séria, quando há um levantamento sério, quando homens e mulheres que foram treinados na

disciplina, na hierarquia e na obediência estão no limite dos limites e vêm em massa protestar para a rua, é

porque alguma coisa se passa, Sr. Deputado. Repito, é porque alguma coisa se passa.

Protestos do Deputado do PS João Ataíde.

O senhor é que é o socialista, não sou eu!

Normalmente, os grandes movimentos sociais, as revoluções, as contestações, os protestos, vindos eles de

onde vierem, não existem porque alguém não percebeu as coisas. Existem porque são sentidos, porque são

profundos e porque são verdadeiros.

O que temos de saber, Sr. Deputado, é se é verdade, ou não, que temos homens e mulheres nas forças de

segurança, vindos por exemplo do norte do País, a dormir em rulotes porque não têm dinheiro para dormir nas

imediações de uma grande cidade como Lisboa.

Protestos do Deputado do PS José Magalhães.

O Sr. Bruno Dias (PCP): — O valor das rendas não tem nada a ver com isso?! Qual é agora a surpresa?

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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É ou não verdade que eles estão a pagar os seus próprios equipamentos?

É ou não verdade que a Assembleia aprovou o subsídio de risco que os senhores propuseram mas sobre o qual

o Ministro Eduardo Cabrita disse «isso é só uma resolução da Assembleia, não tenho de lhe dar expressão»,

desrespeitando o Parlamento?

Vozes do CDS-PP: — Muito bem!

O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É ou não verdade? Sr. Deputado, se tudo isso for verdade, as

reivindicações são justas. Mas antes da cidadania está a democracia e esta é, obviamente, uma questão

democrática, de um Estado de direito democrático.

Estou de acordo com tudo aquilo que diz — mais cidadania, mais correção, mais evolução, mais capacidade,

mais formação —, mas é também necessário que tenham condições dignas para poderem fazer o seu trabalho,

e é sobre isso que a democracia tem de se preocupar e é isso que tem de exigir.

Aplausos do CDS-PP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para fazer uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada

Cristina Rodrigues, do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Voltamos a um assunto que,

não sendo novo, continua, infelizmente, a ser atual. Falamos do amianto, que, passados mais de 20 anos sobre

a descoberta dos seus efeitos nefastos e após a proibição da sua utilização desde 2005, se mantém presente

no nosso dia a dia, nas escolas, nos hospitais, nas empresas, nas nossas casas.

O contacto com o amianto é responsável pelo surgimento de mesotelioma e de cancro do pulmão. De acordo

com um estudo da Organização Mundial da Saúde, o custo com o tratamento das doenças e respetivos custos

acrescidos com a segurança social ascendem a cerca de 1,6 milhões de euros por paciente.

A Lei n.º 2/2011 foi aprovada com vista a estabelecer procedimentos e objetivos para a remoção de produtos

que contêm fibras de amianto ainda presentes em edifícios. Foi, assim, definido que, num prazo de um ano, ou

seja, em 2012, o Governo procederia ao levantamento de todos os edifícios que contêm amianto na sua

construção e que, subsequentemente, publicaria uma listagem desses locais, devendo, num prazo de três

meses, a Autoridade para as Condições do Trabalho definir os locais onde se deveria proceder à monitorização

ou à retirada de materiais contendo amianto. Por fim, deveria o Governo, nos três meses seguintes, ainda em

2012, estabelecer um plano calendarizado quanto à remoção dos materiais, definindo a hierarquia e as

prioridades das ações corretivas a promover.

Passados praticamente nove anos da aprovação da referida Lei, quase tudo continua por fazer. Em face

desse incumprimento, o anterior Governo criou, e bem, um grupo de trabalho, cujo desempenho culminou na

publicação da Resolução do Conselho de Ministros nº 97/2017, com os objetivos de atualizar e completar a

listagem de materiais que contêm amianto nos edifícios onde se prestam serviços públicos, elencar, segundo

graus de prioridade, as intervenções a efetuar e encontrar soluções para o seu financiamento e célere execução.

Essa Resolução refere ainda que, de acordo com o relatório do grupo de trabalho do amianto, o número de

edifícios diagnosticados que careciam de intervenção ascendia a 4263, que o custo estimado das intervenções

nestes edifícios seria de cerca de 422 milhões de euros e que estaria verificada a elegibilidade do investimento

por parte do Banco Europeu de Investimento e do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa, com um

financiamento até 75% do custo total, sendo o restante financiamento assegurado por fundos europeus e verbas

do Orçamento do Estado.

Resumindo: em fevereiro de 2011, foi aprovada uma lei para a remoção do amianto em edifícios públicos,

que não foi cumprida; em 2016, o anterior Governo constituiu um grupo de trabalho com o objetivo de cumprir a

legislação e de salvaguardar a saúde dos funcionários públicos e dos utentes dos seus edifícios; em 2017, o

anterior Governo concluiu a avaliação de cerca de 88% dos edifícios da administração central, não estando

sequer iniciada a avaliação dos edifícios da administração local, e concluiu, ainda, que, na administração central,

existiam cerca de 1364 edifícios que constituíam perigo imediato para a saúde dos seus trabalhadores; no

mesmo ano, o Governo assegurou o financiamento de 75% do custo destas intervenções por parte do Banco

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Europeu de Investimento e do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa, sendo apenas encargo do

Orçamento do Estado os restantes 25%. Estamos a falar de um encargo para o Orçamento do Estado de cerca

de 34 milhões de euros para salvaguardar a vida e a saúde dos seus utentes e trabalhadores que se encontram

nos edifícios considerados prioritários.

Perguntamos: está concluída a remoção do amianto nestes 1364 edifícios prioritários? E nos edifícios da

administração local, onde se enquadram tantas escolas do ensino básico? O diagnóstico foi concluído em 2017,

como preconizava a Resolução do Conselho de Ministros? Qual a calendarização das intervenções? Em

quantos edifícios se encontra em causa a saúde pública? Não sabemos. Pelos vistos, ninguém sabe.

Os números divulgados pela plataforma SOS Amianto apontam para a existência de 3730 edifícios públicos

onde falta intervir. Significa isto que, entre 2017 e 2019, mesmo com 75% do financiamento garantido extra

Orçamento do Estado, o Governo apenas removeu o amianto em 367 edifícios prioritários?! Ou seja, é verdade

que o Governo apenas assegurou a saúde pública em 27% dos edifícios de intervenção prioritária, nestes últimos

dois anos?

É que, utilizando as taxas médias de incidência das doenças de mesotelioma e de cancro do pulmão em

ambientes de contacto com o amianto, estamos a falar da vida de cerca de 200 pessoas em Portugal — as quais

trabalham em edifícios da administração central —, que poderão contrair essas doenças e vir mesmo a falecer.

Se a saúde dessas pessoas não for argumento suficiente, salientamos que os custos resultantes do seu

tratamento e prestações da segurança social serão superiores a 250 milhões de euros. Ao Orçamento do Estado,

para evitar este cenário, basta suportar 105 milhões de euros para a eliminação total do amianto nos edifícios

públicos da administração central. Bastam 105 milhões de euros, Srs. Deputados, para salvar a vida e evitar

esta doença a cerca de 200 pessoas, bem como evitar custos para o Estado superiores a 250 milhões de euros.

A par disto tudo, existe a questão do amianto em edifícios privados. Apesar de já estar em vigor a Lei n.º

63/2018 e de ter sido aprovada uma recomendação para que o Governo elaborasse um estudo visando a criação

de incentivos para a remoção do amianto em instalações de natureza privada, nada foi feito, deixando os

cidadãos à sua sorte.

Por fim, chamamos ainda a atenção para a necessidade de o Governo garantir a existência de meios de

fiscalização para que o transporte e destino final de resíduos contendo amianto se concretize sem ameaça para

a saúde pública. Não é por acaso que o fazemos: tomámos conhecimento, pela comunicação social, de que tal

não é garantido.

Queremos, assim, chamar a atenção para o aterro de resíduos não perigosos e de fibrocimento em Valongo,

que opera sob os protestos da população e da própria autarquia. É um aterro onde já ocorreram vários incêndios.

Um aterro que arde não é um aterro, Srs. Deputados, é uma lixeira. É urgente a fiscalização das condições de

operação deste local de receção de amianto e de outros como este, assim como a divulgação pública dos

resultados dessa fiscalização. A saúde pública da população de Valongo não pode ser um segredo guardado

pela empresa privada que explora esse local.

Importa recordar, porque parece que há quem o tenha esquecido, que o direito à saúde é para todos e cabe

ao Estado assegurá-lo. Assim, já não existiriam edifícios com amianto em Portugal e certamente não estaríamos

a importar resíduos com amianto para aterrar em locais sem condições para o efeito, com prejuízo para a saúde

de todos nós e com impactes ambientais significativos.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Inscreveram-se, para formular pedidos de esclarecimento, seis Srs.

Deputados, aos quais a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues irá responder em conjuntos de três.

Tem a palavra, para esse efeito, a Sr.ª Deputada Filipa Roseta, do PSD.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues,

agradecemos ao PAN por ter trazido a este debate a questão do amianto.

Como sabem, ontem, o Grupo Parlamentar do PSD pediu, com caráter de urgência, para ouvir o Ministro,

porque estamos muito preocupados com aquilo que se está a passar nas nossas ruas, nas nossas escolas e

nos nossos hospitais.

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O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — De todo o histórico e listagem que fez, faltaram algumas referências que

gostava de acrescentar, embora não sei se os 2 minutos de que disponho serão suficientes para dar conta de

tudo o que esta Casa já fez para tentar resolver esta questão. A saber: a Lei n.º 2/2011; a Portaria n.º 40/2014;

uma listagem feita em 2014, que não citou; a Resolução da Assembleia da República n.º 170/2016; o artigo

164.º da Lei n.º 42/2016; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 97/2017; o Programa Nacional de Reformas;

o Programa de Remoção do Amianto, que foi reavaliado em 2017 e em 2018.

Há uma quantidade inacreditável — repito, inacreditável — de produção legislativa desta Casa para resolver

este problema. Sabem o que é que falta? Falta fazer!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Exato!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Falta fazer!

O Sr. Adão Silva (PSD): — Falta resolver o problema!

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Caros Deputados, caras Deputadas, Ex.ma Deputada do PAN, propuseram

fazer mais um plano em sede de comissão. A nossa pergunta é a seguinte: não será mais lógico chamar à

responsabilidade quem a tem e exigir que se faça um ponto da situação antes de fazer mais um plano nacional?

O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Não será mais lógico chamar o Ministro à nossa Comissão? Não será mais

lógico obrigá-lo a dizer qual é o ponto da situação? Não será mais lógico perguntar ao Primeiro-Ministro porque

é que disse em 2016 que ia estar tudo concluído em 2018 e não está? Não será mais lógico perguntar qual é

este programa 2018/2020, que ninguém sabe o que é, ninguém sabe como foi feito e ninguém sabe como é que

o vão cumprir?

Cara Deputada Cristina Rodrigues, agradecemos a sua intervenção e acompanhamos a vossa preocupação.

Fica a seguinte pergunta: não será mais lógico exigirmos ao nosso Governo que faça aquilo que tem de fazer?

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado Nelson Peralta, do Bloco de Esquerda, tem a palavra

para um pedido de esclarecimento.

O Sr. Nelson Peralta (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, o amianto e a sua presença

em edifícios públicos, como escolas, hospitais e outros serviços públicos, é uma das grandes preocupações do

Bloco de Esquerda. O amianto, como se sabe, é cancerígeno e causa também doenças respiratórias. Estamos,

portanto, perante um risco para a saúde de alunos, dos próprios doentes e demais profissionais dos serviços

públicos. É urgente a sua remoção.

Por isso mesmo, o Bloco de Esquerda apresentou hoje um projeto de lei — o qual contém duas propostas

— que visa acelerar esse processo e torná-lo mais transparente.

A primeira proposta do projeto de lei que apresentámos é a de atualizar a listagem de edifícios com amianto.

É sabido — aliás, o Governo admitiu-o há dois anos — que a listagem de edifícios com amianto foi feita de uma

forma incompleta, pois foi verificado, na maior parte dos casos, se os edifícios tinham fibrocimento e não foi

verificada a existência de outros materiais que poderiam ter amianto. Por isso, o Bloco de Esquerda propõe que

seja feita uma atualização e que se complete essa lista.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Foi feita! Foi feita pelo Jorge Moreira da Silva!

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O Sr. Nelson Peralta (BE): — A segunda proposta que consta do nosso projeto de lei é a de que o calendário

das obras de remoção passe a ser público. Infelizmente, já o pedimos e disseram-nos que não é público. É

essencial que os profissionais e os utentes dos serviços públicos possam saber quando se iniciam e acabam as

obras de remoção de amianto desses edifícios. É uma questão de confiança nos serviços públicos, uma questão

de confiança no Estado e também uma questão de confiança na saúde pública preservada pelo Estado.

Tenho duas perguntas para colocar à Sr.ª Deputada. Primeira: concorda com a nossa proposta? Segunda:

atendendo a alguns incumprimentos e à falta de informação da parte do Governo, não acha que o tempo de

recomendações ao Governo acabou e que estamos agora no tempo em que o próprio Parlamento tem de legislar

e tornar vinculativas medidas essenciais para a transparência do processo e para a remoção do amianto nos

serviços públicos, nomeadamente nas escolas, nos hospitais, o que é uma medida essencial para a saúde

pública no País?

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para um pedido de esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado

Hugo Pires, do PS.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, o PAN

traz-nos hoje uma matéria, apesar de não ser nova, em relação à qual o PS atribui a maior importância. Aliás,

deixe-me que lhe diga que foram os Governos do Partido Socialista os únicos que assumiram uma postura

proativa relativamente ao amianto em edifícios públicos.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — É mentira! Portaria n.º 40/2014!

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr.ª Deputada, sabe o que é que o Governo do PSD fez quando estava obrigado

a cumprir uma lei relativa à remoção do amianto dos edifícios públicos? Fez zero, zero, zero!

Aplausos do PS.

Protestos do PSD.

Não cumpriu a lei, não ouviu as autarquias, não cumpriu os prazos. Empurrou sucessivamente o problema

com a barriga!

O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Não é verdade!

O Sr. Hugo Pires (PS): — Remeteu-se, pura e simplesmente, a serviços mínimos e, deixem-me que diga a

VV. Ex.as, a serviços mínimos muito mal feitos.

Não obstante a incompetência do Governo do PSD, na reunião da Comissão de Ambiente de ontem, a Sr.ª

Deputada Filipa Roseta disse que estava muito preocupada com o tema e que era necessário agir urgentemente.

Pois bem, quero dizer ao PSD: bem-vindos ao debate da remoção do amianto! Sejam bem-vindos ao debate!

Aplausos do PS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Bem-vindos?! Que disparate!

O Sr. Hugo Pires (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, foi preciso esperar por um novo Governo

do Partido Socialista para que esta matéria voltasse a ser entendida como um problema sério para a saúde

pública e para o ambiente.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — É mentira!

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O Sr. Hugo Pires (PS): — Em 2016, o Governo do PS apresentou um relatório em que hierarquizava as

intervenções e os custos de cada uma delas. Desde então, já se fizeram mais de 360 intervenções de remoção.

Só para termos uma noção, a lista que o PSD apresentou,…

O Sr. Bruno Coimbra (PSD): — Que vocês ficaram de concluir!

O Sr. Hugo Pires (PS): — … aliás, uma «listinha», na altura do Governo de VV. Ex.as, falava em 3542

edifícios. Já a lista feita pelo anterior Governo do PS falava em 6202 edifícios.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, chamo a sua atenção para o tempo.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Ou seja, o Governo do PSD deixou 2660 edifícios de fora. Não viu ou não quis

ver!

Só quero dizer que temos consciência de que este é um tema em relação ao qual precisamos de começar

de novo e fazer tudo aquilo que o PSD não fez no seu Governo. Isto não acontece num simples estalar de dedos.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, agradecia que terminasse.

O Sr. Hugo Pires (PS): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, só quero deixar a garantia de que se há Governo e houve Governos que

têm a preocupação da remoção do amianto dos edifícios públicos são os do Partido Socialista.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, tem a palavra para responder

aos pedidos de esclarecimento.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr. Presidente, agradeço aos Srs. Deputados as suas intervenções.

Gostava de começar por dizer que, independentemente de quem fez mais ou de quem fez menos por este

assunto, o facto é que o problema ainda existe nos dias de hoje.

A Sr.ª Filipa Roseta (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Face a isto, importa ainda referir que estamos a falar da vida de

pessoas, que entre 4% e 12% dos casos de cancro de pulmão se devem à exposição a amianto e que, entre

2007 e 2012, morreram 208 pessoas com este problema. Portanto, é, de facto, urgente avançar.

No que diz respeito ao PSD, obviamente, achamos que é essencial a vinda do Ministro, para que ele possa

ser questionado relativamente a esta matéria. Como tal, trazemos este assunto a debate, hoje, porque achamos

que é importante falar dele e dar o mote para que alguma coisa se faça e se resolva.

Relativamente ao Bloco de Esquerda, Sr. Deputado Nelson Peralta, apresentámos um projeto de resolução,

que já foi debatido em comissão e será votado na sexta-feira. Como foi referido, ele recomenda que se proceda

à divulgação da lista de edifícios públicos da administração central que contêm amianto e que se divulgue o

calendário para a sua remoção, bem como para a inventariação dos edifícios da administração central.

Obviamente, este plano estratégico para o amianto é urgente, como, de resto, as associações têm vindo a

reclamar. Se nada for feito, avançaremos com a apresentação de uma iniciativa legislativa, nos moldes que

referiu.

Sr. Deputado Hugo Pires, estamos de acordo. Folgo em ouvir a referência feita pelo PS, mas o desafio é,

realmente, que o Governo venha apresentar a lista e o calendário. É por isso que aguardamos, para que possa

haver uma fiscalização e um escrutínio daquilo que foi feito, ou não, nos últimos anos.

Aplausos do PAN.

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O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana Silva, do Partido Ecologista

«Os Verdes», para pedir esclarecimentos.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, o

Partido Ecologista «Os Verdes» tem colocado na agenda política, com uma relevante prioridade, as questões

da presença de amianto em edifícios públicos, do perigo que tal realidade pode constituir e, também, das

soluções adequadas para a eliminação desse risco.

O amianto é um agente cancerígeno, que pode causar doenças como o cancro do pulmão ou o cancro

gastrointestinal. As microfibras depositam-se nos pulmões, onde permanecem por longos anos, podendo revelar

uma doença apenas anos mais tarde, o que muitas vezes dificulta a associação direta de causa/efeito entre a

inalação de fibras, por exemplo, por exposição profissional e a doença revelada.

Sr.ª Deputada, como saberá, Os Verdes há muito que seguem esta questão de perto e, conscientes desta

realidade e da necessidade de fazer algo para erradicar este perigo, apresentaram, na Assembleia da República,

um projeto de lei com vista à deteção, monitorização e remoção de amianto em edifícios públicos, o qual foi

aprovado e resultou na Lei n.º 2/2011, de 9 de fevereiro.

Esta Lei, para além de outros pormenores, determinou a realização de um levantamento da presença de

amianto em edifícios públicos, a listagem desses edifícios e a respetiva divulgação, bem como a realização de

ações corretivas, que incluíam a remoção do material contendo amianto onde se verificasse a necessidade

dessa intervenção.

Hoje, em Conferência de Líderes ficou agendada a discussão, para o dia 12 de dezembro, de um projeto de

lei com o objetivo de alterar a Lei n.º 2/2011, na parte relativa à calendarização da remoção de amianto em

edifícios, instalações e equipamentos públicos.

A Sr.ª Deputada não considera que este projeto representa um contributo importante para dar resposta aos

problemas que se continuam a sentir em relação às questões do amianto, que não aparecem uma única vez no

Programa do Governo?

Aplausos do PEV e de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João

Almeida, do CDS.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cristina

Rodrigues, em nome do CDS, também agradeço o facto de ter trazido a debate este tema, que é de enorme

relevância e que tem vindo a ser tratado neste Parlamento há mais de uma década. Isto mostra bem aquilo que

disse: esta não é uma questão de disputa entre Governos, não é sequer uma disputa sobre quem mais fez para

resolver o assunto; infelizmente, é um problema de inconsequência na resolução do problema.

Aliás, até é oportuno que eu fale a seguir ao Partido Ecologista «Os Verdes», que lembrou, e bem, que, em

2011, Os Verdes apresentaram uma iniciativa sobre esta questão e que um Governo maioritário, na altura,

aprovou essa iniciativa. Veja-se lá a excentricidade que é, aos olhos dos tempos de hoje, um Governo maioritário

de direita aprovar uma iniciativa de Os Verdes para tratar do problema do ambiente!… Tivéssemos nós, hoje,

Governos de esquerda com a mesma abertura relativamente a iniciativas da oposição e, se calhar,

conseguiríamos resolver problemas mais depressa.

A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Muito bem!

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Pode-se considerar que é pouco, mas o que se fez, na altura,

foi a primeira lista com critérios objetivos sobre a realidade da presença de amianto nos edifícios públicos, em

Portugal. Pode ser pouco, visto aos olhos de hoje, mas, em 2011, não só não havia nenhuma lista como o

problema já estava identificado há muito tempo.

Agora, quando o Governo do Partido Socialista assume funções e se esperava que desse cumprimento à

resolução dos problemas que tinham sido identificados anteriormente, o Partido Socialista, em vez de fazer as

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obras, fez um grupo de trabalho. Portanto, enrolou o assunto, conseguiu até, como a Sr.ª Deputada bem disse,

financiamento para fazer as obras, de modo a que nem sequer o impacto financeiro no Orçamento do Estado

pudesse ser desculpa para não as fazer, e, mesmo com 75% de financiamento externo, teve um nível de

execução baixíssimo.

Sr.ª Deputada, a questão de Valongo é muito importante, porque estes passivos ambientais que vão sendo

criados só tomam a proporção de conhecimento público…

O Sr. Presidente (Fernando Negrão): — Sr. Deputado, peço que tome atenção ao tempo.

O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Vou já terminar, Sr. Presidente.

Como dizia, estes passivos ambientais só tomam a proporção de conhecimento público, muitas vezes,

quando já estão num estado muito difícil. Ora, muito perto de Valongo, em São Pedro da Cova, tivemos, durante

muitos anos, uma situação muito parecida.

Portanto, o que lhe pergunto é se acha que o que se está a passar em Valongo obriga a um esclarecimento

imediato para que não tenhamos uma situação parecida com a que aconteceu em São Pedro da Cova.

Relativamente ao problema, pergunto se não acha que não é com leis, projetos de lei ou grupos de trabalho que

ele se resolve, mas com uma exigência de todos, uma exigência do Parlamento, para que o Governo cumpra a

sua missão e faça aquilo que é sua obrigação.

Aplausos do CDS-PP.

Entretanto, reassumiu a presidência o Presidente, Eduardo Ferro Rodrigues.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para pedir esclarecimentos, a Sr.ª Deputada Alma Rivera, do Grupo

Parlamentar do PCP.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, para o PCP,

há muito que é hora de resolver o problema do amianto.

Múltiplos foram os avisos aqui trazidos, pelo menos desde 2001, mas a verdade é que, infelizmente, esta é

uma preocupação atual e presente na vida de muitas pessoas, por ainda persistirem estruturas em fibrocimento,

muitas visivelmente degradadas, com risco de libertação de partículas de amianto, e pelo que isso significa em

termos de consequências para a saúde de quem trabalha, estuda e utiliza serviços onde existe este material.

O Sr. João Dias (PCP): — Muito bem!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Em boa hora, quase há uma década, aprovámos o projeto de lei do Partido

Ecologista «Os Verdes» para proceder à remoção de amianto nos edifícios públicos.

O Sr. João Dias (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — O Governo de então ficou incumbido de elaborar levantamentos e de definir

tempos e calendários. Mais de dois mandatos depois, volvidos mais um Governo do PSD e do CDS e outro do

PS, a maior fatia do problema continua por resolver. Aliás, ficou por resolver não só por inoperância, mas porque

ambos, em particular o Governo do PSD e do CDS, criaram uma situação tal de cortes e asfixia nas funções

sociais de Estado,…

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — … que as obras ficaram adiadas, em geral, chegando-se ao cúmulo de ter

edifícios em que o amianto foi removido apenas parcialmente, continuando exposto noutras zonas,…

O Sr. João Dias (PCP): — Exatamente!

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A Sr.ª Ana Mesquita (PCP): — Bem lembrado!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — … e também porque o PS, podendo ter feito o investimento que se impunha e

avançado neste sentido, tomou outras opções, que todos conhecemos.

Vozes do PCP: — Claro!

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — O PCP requereu, há dias, a nova listagem das escolas onde existe amianto,

mas é necessário considerar toda a extensão do problema, porque, de facto, falamos de centenas de repartições

e serviços. Quer nesta discussão em concreto, relativamente à retirada do amianto, quer no global dos

investimentos urgentes e inadiáveis nos serviços públicos, está o PAN disponível para acompanhar o PCP na

luta por opções políticas que ponham em primeiro lugar as necessidades do povo português?

Falamos de serviços públicos que asseguram direitos fundamentais e isso não se compadece com atrasos

e adiamentos, porque o que está em causa é a saúde pública e é o princípio da preocupação e da

responsabilidade que lhe está subjacente.

Aplausos do PCP e do PEV.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Cristina Rodrigues, do PAN.

A Sr.ª Cristina Rodrigues (PAN): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, agradeço as vossas intervenções.

Sr.ª Deputada Mariana Silva, agradecendo e acompanhando as suas preocupações, gostava de referir que

a aprovação da Lei n.º 63/2018, na anterior Legislatura, teve por base também uma iniciativa legislativa do PAN

sobre este mesmo assunto. Esperávamos um maior apoio para que a remoção de amianto nos edifícios de

propriedade privada fosse também tida em conta, mas, infelizmente, tal não foi possível. De facto, é lamentável,

porque estamos a falar, em grande parte, dos edifícios públicos, mas não podemos esquecer nunca os edifícios

privados, cuja contabilização ainda nem sequer foi feita.

Sr. Deputado João Almeida, a questão de Valongo é elucidativa da grande falta de fiscalização deste tipo de

situações. Na área dos resíduos, em particular, esta é, infelizmente, uma situação comum e onde se denota

algum desnorte. O nosso compromisso é que, sempre que tomarmos conhecimento de alguma situação,

interviremos, seja questionando o Governo, seja pedindo explicações, avançando com as ferramentas ao nosso

dispor para esse efeito.

Sr.ª Deputada Alma Rivera, obviamente, acompanhamos também as preocupações do PCP e faremos aquilo

que estiver ao nosso dispor, sempre.

Aplausos do PAN.

O Sr. Presidente: — Para proferir uma declaração política, em nome de Os Verdes, tem a palavra o Sr.

Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O mecanismo dos paraísos fiscais

carateriza-se, regra geral, por um regime fiscal extremamente favorável, em termos de impostos sobre o

rendimento, pela ausência do controlo das atividades desenvolvidas, pela permanência do sigilo bancário e

comercial e pela falta de transparência e ausência de troca de informações.

Através desse mecanismo, as empresas ou pessoas registam os lucros não no país onde fazem os negócios

e ganham esse dinheiro, mas sim nos paraísos fiscais, para beneficiarem dessas vantagens, não sendo os seus

lucros sujeitos a impostos sobre rendimentos nem as suas receitas taxadas. Não será, por isso, de estranhar

que uma das formas mais comuns de evasão fiscal internacional seja o recurso a paraísos fiscais, estimando-

se que haja uma concentração de 26% da riqueza mundial nesses sítios, que já há muito se percebeu para que

servem e quem servem.

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Perante estes factos, facilmente se conclui que os paraísos fiscais têm contribuído e continuam a contribuir,

aliás, de forma muito acentuada, para a imoralidade e para a injustiça fiscal que vai reinando entre nós. Também

por isso, Os Verdes consideram inaceitável que existam zonas absolutamente intocáveis, onde a supervisão

financeira não entra, a cooperação judicial fica à porta e os próprios Estados preferem fingir que não estamos

perante um problema que urge resolver.

Ora, um Estado não pode pactuar com este mecanismo, que permite não pagar impostos, fugir ao pagamento

das obrigações fiscais e esconder dinheiro. Não deve pactuar com isso sobretudo quando sabemos que estas

atividades podem estar, na maioria dos casos, associadas a negócios pouco claros, à economia clandestina, à

evasão e fraude fiscal, ao crime organizado, à lavagem de dinheiro e, por vezes, até a práticas que fragilizam a

estabilidade mundial, como o negócio da droga e do armamento.

Do outro lado, temos os cidadãos que trabalham, que têm menos rendimentos, mas que contribuem para a

economia e para o desenvolvimento do País e são obrigados a pagar os seus impostos, tendo ainda salários e

pensões muito baixos. Logo, não é aceitável que se continue a perpetuar um sistema onde a generalidade dos

cidadãos viva num verdadeiro inferno fiscal e outros, uns poucos, vivam em paraísos fiscais, gozando o privilégio

de pouco ou nada pagarem em impostos pelos seus avultados rendimentos.

Acresce ainda que a existência de paraísos fiscais é absolutamente inseparável do agravamento das

desigualdades sociais, da pobreza e da insustentabilidade do modelo económico que se vai instalando no

mundo. Num Estado de direito, exige-se que a lei seja igual para todos e ninguém, por muito dinheiro que tenha,

pode ter um tratamento diferenciado. Aliás, a falta de transparência e clareza que estas isenções fiscais

envolvem acaba por trazer custos elevados aos Estados nacionais, tanto por via da fuga de capitais e,

consequentemente, pela perda de receita fiscal, como pela pressão que exercem sobre as jurisdições, por via

da concorrência fiscal.

Efetivamente, os paraísos fiscais fragilizam de forma substancial as bases financeiras do Estado e não criam

riqueza para o País, colocando em causa as suas receitas e os seus recursos, que, de outro modo, poderiam

ser canalizados para investimento público em áreas absolutamente prioritárias, como os serviços públicos ou as

políticas sociais.

Segundo um estudo da Comissão Europeia, os portugueses — ou melhor, uma parte de alguns portugueses

— desviaram cerca de 50 000 milhões de euros para offshore entre 2001 e 2016, tornando-se Portugal no

terceiro País da União Europeia que mais riqueza transferiu para paraísos fiscais.

Por outro lado, é bom não esquecer que os paraísos fiscais também foram palco de alguns acontecimentos,

como a falência de bancos ou as fraudes em larga escala.

Por cá, sempre será oportuno recordar os processos escandalosos do BCP, do BPP ou do BPN, que iniciaram

práticas relacionadas com empresas sediadas, precisamente, em paraísos fiscais e cuja fatura acabou por ser

paga pelos contribuintes.

Como facilmente se percebe, a existência de paraísos fiscais, para além da injustiça e da imoralidade que

transportam, têm ainda consequências negativas do ponto de vista económico, financeiro, social e político, razão

pela qual Os Verdes sempre se opuseram a este sistema e sempre clamaram o seu fim.

A verdade é que a Organização das Nações Unidas e a OCDE têm aconselhado, há décadas, um combate

à utilização dos paraísos fiscais, mas optando pela vertente da necessidade de troca de informações entre os

paraísos fiscais e os Estados, o que, sendo importante, não resolve, de todo, o problema da própria existência

dos paraísos fiscais.

Portanto, por uma cultura de responsabilidade democrática, impõem-se medidas para combater as práticas

que continuam a favorecer quem pretende fugir às suas obrigações fiscais.

É, pois, imperioso caminhar no sentido de eliminação dos paraísos fiscais, e de uma vez por todas como

forma de ajudar também a credibilizar o nosso sistema fiscal.

Bem sabemos que o Governo português não pode impor o fim dos paraísos fiscais fora das suas fronteiras,

mas também sabemos que não podemos esperar passivamente que o problema se resolva. E, sobretudo,

sabemos que o Governo pode e deve diligenciar, junto dos restantes Estados da União Europeia e das

organizações internacionais de que faz parte, no sentido de procurar medidas e de encontrar soluções para

acabar com os paraísos fiscais.

Nesse sentido, Os Verdes deram hoje entrada na Assembleia da República de uma iniciativa legislativa

exatamente com o objetivo de recomendar ao Governo que tome a iniciativa de se envolver ativamente, junto

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dos restantes Estados e das organizações internacionais de que faz parte, no sentido de encontrar soluções

com vista à eliminação dos paraísos fiscais.

Aplausos do PEV e do PCP.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Luís Ferreira, a Mesa regista a inscrição de quatro Srs. Deputados

para pedirem esclarecimentos. Como deseja responder?

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Respondo em conjuntos de dois, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra, em primeiro lugar, o Sr. Deputado Carlos Silva, do Grupo

Parlamentar do PSD.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, como bem disse o Sr. Deputado José

Luís Ferreira, Portugal é o terceiro país com maior riqueza em offshore, disse-nos a Comissão Europeia. Só

Chipre e Malta têm a percentagem mais elevada do que Portugal e, portanto, foram desviados para offshore

cerca de 25% do PIB nacional dos últimos 15 anos, qualquer coisa como 50 000 milhões. Escandalosamente,

cerca de 30 000 milhões destes 50 000 foram transferidos para offshore nos últimos três anos.

O Sr. Adão Silva (PSD): — Só?!

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Sr.as e Srs. Deputados, relativamente ao mandato do governo de salvação

nacional do PSD e do CDS, em tempo de troica, quando se percebeu que tinham sido transferidos 10 000

milhões de euros, «caiu o Carmo e a Trindade», estivemos perante um escândalo nacional. Os Srs. Deputados

da esquerda parlamentar, que suportaram o anterior Governo, ficaram indignados, rasgaram vestes. Mas

quando o desvio do património para paraísos fiscais triplicou para o montante de 30 000 milhões, no anterior

Governo do Partido Socialista, com toda a esquerda parlamentar a apoiar, o vosso silêncio é ensurdecedor.

No passado, a Deputada Mariana Mortágua até filmes realizou para o youtube. Agora, nem um pio!

Risos do Deputado do PSD Adão Silva.

Foram só 9000 milhões de euros que foram transferidos para offshore recentemente, em 2018! O que têm

os senhores a dizer acerca do aumento de 66%, comparado com o triénio anterior? Já conhecem as razões?

São aceitáveis? Onde andam os megafones da esquerda parlamentar?

Sr.as e Srs. Deputados, sabem, porventura, quanto perderam os contribuintes portugueses com esta atitude

colaborante da vossa parte?

Sr. Deputado do PEV, não esperava esta sua intervenção,…

Protestos do Deputado do PEV José Luís Ferreira.

… já que os senhores fizeram parte de um episódio que, neste Parlamento, não se pode deixar passar em

claro. Por isso, pergunto-lhe como votou o PEV uma medida proposta pelo CDS, a qual repunha os territórios

de três paraísos fiscais como Jersey, Ilha de Man e Uruguai na lista negra dos offshore,…

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Não é verdade! Isso não funcionou assim!

O Sr. Carlos Silva (PSD): — … de onde o Governo socialista, através de portaria, os tinha retirado, contra o

parecer da AT (Autoridade Tributária e Aduaneira), de forma escandalosa e vergonhosa.

Vou dar-lhe a resposta,…

O Sr. Presidente: — Mas tem de dar a resposta muito rapidamente, Sr. Deputado.

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O Sr. Carlos Silva (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.

Vou dar-lhe a resposta, se não a souber, Sr. Deputado: votou contra a norma do CDS e, com esse voto

contra, contribuiu para a continuidade desses territórios fora da lista negra. Na altura, o que valeu foi a posição

do PSD…

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir. Já ultrapassou o seu tempo.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — … para a manutenção desses territórios na lista negra de países não

colaborantes.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Alves, do Grupo Parlamentar do PCP.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Deputado José Luís Ferreira, em primeiro

lugar, gostaria de saudar o Partido Ecologista «Os Verdes» por trazer à discussão o tema dos paraísos ficais.

Os paraísos fiscais são utilizados por aqueles que mais têm e que mais podem para fugir ao pagamento dos

impostos devidos, traduzindo-se em grandes perdas para a receita fiscal. É um verdadeiro escândalo que os

portugueses que vivem do seu trabalho sejam chamados a contribuir, ao passo que os grandes grupos

económicos, que obtêm o seu lucro cá, podem decidir não pagar os seus impostos no País e colocar os seus

lucros nos paraísos ficais.

Como referiu na sua intervenção, segundo um estudo recente divulgado pela Comissão Europeia, Portugal

é o terceiro país com mais transferências para paraísos fiscais entre 2001 e 2016 — foram mais de 50 000

milhões de euros com perdas de receita fiscal na ordem de 1% do PIB. Significa isto que o País deixou de ter à

sua disposição milhares de milhões de euros que poderiam estar a ser investidos na saúde, na educação, nos

transportes, no investimento público, no desenvolvimento do País, mas, em vez disso, estão nos bolsos dos

artistas do planeamento fiscal.

Sucessivos governos têm desviado o olhar das grandes fugas aos impostos levadas a cabo com o recurso a

paraísos fiscais — e aqui tanto vale serem governos do PS como do PSD e do CDS —, não atuando de forma

sistemática para pôr fim a este escândalo, nomeadamente rejeitando as propostas apresentadas pelo PCP. No

entanto, o PCP não deixará de apresentar mais propostas e de as defender.

A irradicação dos paraísos fiscais exige uma cooperação internacional alargada, nomeadamente um pacto

de cooperação com vista à regulação dos mercados financeiros, à tributação das transações financeiras, ao

combate à evasão e elisão fiscais e à extinção dos paraísos fiscais.

A necessidade de cooperação internacional não pode servir de pretexto para, a nível nacional, não se

tomarem medidas de combate à fuga aos impostos, envolvendo paraísos fiscais e territórios com regimes fiscais

mais favoráveis.

O PCP continuará a apresentar propostas para que, no plano nacional, se avance no sentido de proibir as

relações comerciais e as transações financeiras com paraísos fiscais não cooperantes e para obrigar ao registo

das transações que envolvem outros paraísos fiscais, taxando fortemente essas transações com taxas de 90%.

Sr. Deputado,…

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Duarte Alves (PCP): — Estou mesmo a terminar, Sr. Presidente, perguntando se o PEV acompanha

o PCP nestas medidas para acabar com este escândalo de uma vez por todas, obrigando quem faz os lucros

em Portugal a pagar os seus impostos no País, como todos os portugueses.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

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O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, antes de mais, queria agradecer ao Sr. Carlos Silva, do

PSD, e ao Sr. Deputado Duarte Alves, do PCP, as perguntas que me colocaram.

Sr. Deputado Carlos Silva, tanto me importa que seja muito ou pouco o que foi transferido. Nem sei se isso

até se deve ao mérito do Governo. Daqui a pouco, vamos dizer que o foi o Governo do PSD e do CDS que não

deixou que o dinheiro fosse para os offshore. Se calhar, foi isso…

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Foram as medidas que tomámos!

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Quando há pouco dizia que se fez muito barulho no tempo do PSD e do

CDS, o Sr. Deputado sabe perfeitamente qual foi o motivo da discussão e do barulho que isso gerou, que nada

teve a ver com o volume de transferências de capitais. O Sr. Deputado sabe muito bem qual foi o motivo.

Protestos do Deputado do PSD Carlos Silva.

Já agora, a propósito dos megafones, deixe-me dizer uma coisa, Sr. Deputado: não pode dizer que Os Verdes

estiveram em silêncio, porque hoje escolheram como tema da sua declaração política os paraísos fiscais.

Mas, a propósito de megafones e da vossa preocupação — que, certamente, também partilham connosco

— com a injustiça que representa a existência dos paraísos fiscais, vamos ver onde o Sr. Deputado Carlos Silva

e os Deputados do PSD vão colocar o megafone quando chegar a altura de votar o projeto que Os Verdes

apresentaram hoje na Assembleia da República, exatamente para que o Governo possa diligenciar, tanto na

Comissão Europeia como nas organizações de que faz parte, no sentido de acabar com este regabofe, em que

uns vivem em paraísos fiscais e a generalidade das pessoas vive num verdadeiro inferno fiscal.

Sr. Deputado Duarte Alves, é verdade, como eu disse da tribuna, que os paraísos fiscais estão muitas vezes

ligados à economia clandestina e até a outras questões muito mais graves. Mas, naturalmente, esta proposta

de Os Verdes não invalida nem substitui a luta ou o combate que tem de ser feito em relação à evasão e à

fraude fiscal que temos pela frente e que é preciso travar. Por isso, contará também com o contributo do Partido

Ecologista «Os Verdes» para esse debate, como também para promover o combate à evasão fiscal.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem mais duas perguntas.

Para o efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Anastácio, do Grupo Parlamentar do PS.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, queria, em primeiro

lugar, agradecer-lhe ter trazido este tema a debate. De facto, é um tema importantíssimo e que merce todo o

escrutínio parlamentar e todo o escrutínio da sociedade portuguesa.

É importante que também tenhamos a noção de quais são os mecanismos importantes para combater a

evasão fiscal que muitas vezes está subjacente à utilização destes paraísos fiscais. O nosso sistema — e já se

falou hoje aqui sobre as chamadas listas negras —, que é, digamos, um dos mais largos da Europa em termos

das chamadas listas negras, tem-se revelado ineficiente. E tem-se revelado ineficiente porque melhor do que as

listas negras é a cooperação. Aliás, temos indicadores — nomeadamente relatórios já deste ano —

extremamente concertos que nos mostram que onde houve cooperação permitiu corrigir um conjunto de

situações.

A respeito de certos casos, e já que se falou da eficiência do PSD sobre esta matéria, não queria deixar de

recordar aqui o célebre caso do Sr. ex-Secretário de Estado Paulo Núncio,…

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — É isso mesmo!

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — … que, apesar de existir um despacho que obrigava à comunicação das

transferências para offshore pela Autoridade Tributária, o ignorou durante muito tempo e foi preciso o Governo

do Partido Socialista, na altura através do Secretário de Estado Fernando Rocha Andrade, repor esta situação.

Portanto, sobre transparência estamos conversados.

Protestos da Deputada do CDS-PP Cecília Meireles.

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E estamos conversados porque ficou claro que foi por iniciativa do Governo do Partido Socialista…

O Sr. João Paulo Correia (PS): — Muito bem!

Protestos do Deputado do CDS-PP Telmo Correia.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — … que se corrigiu algo que os senhores, muito calmamente, procuraram

que não se soubesse.

Aplausos do PS.

Já agora, para terminar, pois estou no final do meu tempo, queria só chamar a atenção para dois casos, que

foram muito falados. Quanto ao caso dos Panama Papers, por exemplo, queria dizer que, por força da

cooperação, em Portugal já houve 111 casos que foram sujeitos a processos e, em consequência desses

processos, houve uma arrecadação em IRS de mais de 4 milhões e 600 mil euros.

No caso de Malta Files, um outro caso também conhecido, tivemos já cerca de 100 casos suscitados, com

uma regularização voluntária de 31 milhões de euros, que implicou cerca de 10 milhões de euros em impostos

e de juros.

Portanto, a eficácia da administração fiscal, a eficácia deste Governo está comprovada pelos números que

aqui temos. Por isso, da nossa parte, haverá toda a disponibilidade…

O Sr. Presidente: — Tem de concluir, Sr. Deputado.

O Sr. Fernando Anastácio (PS): — … para, juntamente com o PEV e com os demais partidos, encontrar

soluções que permitam ao Governo melhorar a eficácia na prevenção e no combate à fraude e à evasão fiscal.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para os últimos pedidos de esclarecimento, tem a palavra a Sr.ª Deputada Mariana

Mortágua.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Luís Ferreira, os dados indicam que,

ao longo dos últimos anos, uma parte substancial da riqueza produzida em Portugal ou devida a cidadãos

nacionais tenha sido colocada em offshore ou em territórios de tributação privilegiada.

Há diferentes razões para que assim seja. Isto foi possível porque foi facilitado pela lei e promovido pela

banca, e não nos esquecemos da Operação Furacão nem de como os bancos andavam a promover esquemas

de fuga ao fisco; foi possível para fugir precisamente aos impostos, e não nos esquecemos como o Sr. Horta e

Costa esteve neste Parlamento a explicar como usou uma rede de offshore para esconder uma comissão que

recebeu no processo de compra dos submarinos, num Governo PSD e CDS.

Sabemos também como os bancos usaram os offshore para todo o tipo de falcatruas, para fraudes, para

fugas ao fisco. Os casos do BES, do BPN, do BCP, estão cá para nos contar todas estas histórias.

Mas sabemos mais do que isso. Sabemos como ao longo dos anos os crimes fiscais que foram possíveis

pela utilização de offshore foram branqueados e perdoados por amnistias fiscais: duas no tempo do PS, e, a

maior de todas, no tempo do PSD e do CDS, no seu último Governo.

Sr. Deputado Carlos Silva, o Governo de castigo nacional foi a salvação de Ricardo Salgado nos seus

alegados crimes fiscais, que foram limpos e branqueados por uma amnistia fiscal aprovada pelo PSD e pelo

CDS, entre outros.

Aplausos do BE.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Dos últimos quatro anos não ouvi nada!

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A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Os offshore representam o que de pior há na economia e no mundo. São

as desigualdades. É o crime, é a evasão fiscal.

Mas não nos enganemos: só existem porque, por todo o mundo e em toda a Europa, há governos que os

protegem, incluindo na União Europeia. Os piores offshore só existem porque funcionam em rede e utilizam

territórios que, não sendo offshore, têm tributações e legislações privilegiadas que facilitam a triangulação: Malta,

Irlanda, Holanda, Reino Unido, Luxemburgo, Suíça,…

Protestos do Deputado do PSD Carlos Silva.

… Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM).

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — O Centro Internacional de Negócios da Madeira tem uma legislação que

tem sido melhorada mas que está a ser investigada pela Comissão Europeia.

Por isso, a pergunta que deixo ao Sr. Deputado José Luís Ferreira, e termino, Sr. Presidente, é se não acha

que devíamos alterar a lei do Centro Internacional de Negócios da Madeira para que os privilégios fiscais sejam

associados à criação de emprego e de riqueza na região autónoma.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira.

O Sr. José Luís Ferreira (PEV): — Sr. Presidente, queria agradecer os pedidos de esclarecimento

formulados pelo Sr. Deputado Fernando Anastácio e pela Sr.ª Deputada Mariana Mortágua.

Sr. Deputado Fernando Anastácio, de facto, também em Portugal têm surgido algumas tentativas no sentido

de modificar o enquadramento jurídico dos paraísos fiscais. Mas não tiveram, não têm, nem podem ter grande

sucesso porque, acima de tudo, o que é preciso, creio, é acabar com os paraísos fiscais.

O tema é importante, como o Sr. Deputado diz, não só porque os paraísos fiscais promovem a injustiça e a

imoralidade fiscais, mas, sobretudo, porque descredibilizam o Estado de direito democrático, sendo até

prejudiciais para o próprio Estado, que perde receitas por via da fuga de capitais que podiam ser investidos ao

nível dos serviços públicos onde tanta falta fazem.

Depois, Sr. Deputado, de facto, é verdade que a questão das listas é um aspeto lateral, digamos assim. Era

importante que houvesse cooperação com o propósito de acabar com os paraísos fiscais. A cooperação para a

troca de informações é importante, mas o que era realmente importante era acabar com os paraísos fiscais.

Sr.ª Deputada Mariana Mortágua, de facto, há uma parte da riqueza que é transferida para esses paraísos

fiscais e todos sabemos porquê. O objetivo primeiro será, exatamente, o de fugir ao fisco, isto é, não pagar

impostos. Muitas vezes, são dinheiros cuja proveniência é duvidosa e, nalguns casos, a sua origem está ligada

a coisas bem mais complicadas como o armamento e o negócio das armas.

Mas também é verdade o que refere: tudo acontece porque a lei o permite e também porque foi muito

promovido pela banca. Todos sabemos que isso é verdade e que há responsáveis por isso, como também foi

referido.

Sobre a alteração da lei em relação ao Centro Internacional de Negócios da Madeira, quando a proposta

aparecer — creio que não foi apresentada ainda —, teremos a oportunidade de nos pronunciarmos sobre ela.

O Sr. Presidente: — Para uma declaração política, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais, do Grupo

Parlamentar do PS.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Assinala-se, no próximo dia 25 de novembro,

o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres.

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Segundo o Eurostat, 80% das vítimas de tráfico de seres humanos são mulheres. Segundo a Agência de

Direitos Fundamentais, uma em cada três mulheres na União Europeia é vítima de violência de género.

Em todo o mundo, cerca de 12 milhões de raparigas com menos de 18 anos são obrigadas todos os anos a

casamentos forçados. Pelo menos 200 milhões de mulheres e raparigas são sujeitas a esse crime hediondo da

mutilação genital feminina que as impede, quase à nascença, de serem felizes.

Não podemos esquecer a interseccionalidade, conjugação de discriminações múltiplas, de género, etnia e

classe, que expõe ainda mais algumas mulheres a estes abusos e a estas violências. Estamos perante uma das

mais graves violações dos direitos humanos, que resulta de um desequilíbrio de poder entre homens e mulheres

e que está socialmente enraizada e, até, naturalizada como se de um comportamento normal se tratasse.

Aplausos do PS.

É por isso urgente derrubar estereótipos que ainda persistem. Muitos já foram derrubados, mas há outros

que resistem e têm impedido uma adequada aplicação das leis que estão obviamente alinhadas com a

Convenção de Istambul, do Conselho da Europa, que Portugal subscreveu, assinou e ratificou na linha da frente.

Sr.as e Srs. Deputados, apesar de todos os combates, e têm sido muitos ao longo de 20 anos de políticas

públicas para combater um flagelo que não pode deixar ninguém sossegado, é certo que as mulheres continuam,

infeliz e atrozmente, ainda hoje a ser assassinadas.

Este ano já foram assassinadas 31 mulheres e cerca de 27 000 apresentam queixa todos os anos, repito,

todos os anos, às forças de segurança. Ou seja, há uma ocorrência em cada três horas. Enquanto decorre este

Plenário, uma mulher apresentou queixa na sua esquadra ou no seu posto da GNR.

Estamos perante um terrorismo — não podemos ter medo das palavras —, estamos perante um terrorismo

doméstico e uma enorme catástrofe social que, nos últimos 15 anos, já matou mais de 500 mulheres e deixou

mais de 1000 crianças e jovens órfãos.

Os movimentos de solidariedade e de indignação coletiva fazem-se ouvir cada vez com mais intensidade.

Não posso deixar de referir as cartas abertas, assinadas por mulheres mas também por homens, num apelo

intransigente e de tolerância zero a esta criminalidade que mata.

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Este crime exige um combate integrado e sem tréguas e que não

façamos nunca desta realidade uma arma de arremesso político. É por isso importante que o amplo consenso

político, transversal a todas as governações, que permitiu construir aquilo que hoje temos, isto é, um quadro

legislativo exigente e rigoroso no combate a esta violência de género, se mantenha.

O Governo tem colocado a prevenção e o combate à violência de género como uma das suas grandes

prioridades políticas. Um dia de luto pelas vítimas de violência doméstica…

O Sr. Carlos Silva (PSD): — E muito bem!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Muito bem, Sr. Deputado! É isso mesmo: muito bem.

O Governo tem colocado esta área, o combate à violência doméstica, como prioridade política.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — É só bla, bla, bla!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Um dia de luto pelas vítimas de violência doméstica este ano foi uma iniciativa

simbólica ao mais alto nível do Governo…

O Sr. Carlos Silva (PSD): — Só simbólica!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — …que constituiu um alerta de prevenção único e que fez mais do que muitas e

importantes campanhas que sobre esta matéria se têm promovido.

Aplausos do PS.

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Está hoje em vigor o Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência contra as Mulheres e Violência

Doméstica no quadro da Estratégia Nacional Portugal mais Igual. Foram criadas novas estruturas de

atendimento, respostas de acolhimento de emergência, foi feito mais investimento em vigilância eletrónica e

teleassistência.

Temos uma rede de salas de apoio às vítimas nas forças de segurança. Foram criados programas para

agressores, módulos de formação e manuais de boas práticas, em protocolo entre a CIG (Comissão para a

Cidadania e a Igualdade de Género), a SEJ (Secretaria de Estado da Justiça) e a Ordem dos Advogados, e

estão em curso projetos de autonomização e empoderamento das vítimas, em articulação com municípios

solidários.

Foi implementada, no ano passado, a educação para a cidadania em todos os níveis de escolaridade.

Aplausos do PS.

Há, hoje, instrumentos importantíssimos que resultam de recomendações internacionais e nacionais, como

o GREVIO do Conselho da Europa (Grupo de Peritos sobre o Combate à Violência contra as Mulheres e a

Violência Doméstica), a Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica e o mais recente

relatório, de junho passado, da Comissão Técnica Multidisciplinar, liderado pelo Conselheiro Rui do Carmo, que

nos indicam o caminho preciso que temos de percorrer e que antes não existia.

Especial destaque merece a necessidade de aperfeiçoamento de mecanismos de proteção das vítimas nas

72 horas subsequentes à apresentação da queixa. É aqui que se localizam, sabemo-lo hoje, algumas falhas que

podem desproteger as vítimas. É aqui que é preciso agir com ganhos de eficácia.

Mas também destacamos a criação, por parte da PGR (Procuradoria-Geral da República), de secções

especializadas, integradas, para a violência doméstica que irão começar a funcionar em janeiro, como

experiência-piloto, em comarcas de Lisboa e do Porto.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Trata-se, portanto, de um projeto inovador este que vai ser promovido pela PGR.

Para terminar, Sr. Presidente, gostaria de dizer que a violência de género não pode ser uma fatalidade. Estão

sinalizados problemas já identificados e há propostas de resolução para colmatar falhas. Temos de acabar com

a cultura de impunidade à agressão, promover a formação para alterar a cultura judicial muito desculpabilizante

deste tipo de agressões.

O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Temos de levar às escolas, como vai acontecer já este ano no Parlamento dos

Jovens, projetos de prevenção de violência no namoro…

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, já ultrapassou em mais de 1 minuto o tempo de que dispunha.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, mesmo para terminar, não podemos banalizar, parafraseando

Hannah Arendt, a violência de género para que a violência de género não seja uma fatalidade.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, a Mesa regista cinco inscrições para pedidos de esclarecimento. Como

pretende responder?

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, responderei primeiro a três e, depois, a dois.

O Sr. Presidente: — Muito bem.

Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Pereira, do Grupo Parlamentar do PSD.

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A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sr. Presidente, começando exatamente onde a Sr.ª Deputada Elza Pais

acabou, não devemos banalizar o combate à violência doméstica.

Devo confessar que fiquei surpreendida por ver o Partido Socialista fazer uma declaração política sobre

violência doméstica, precisamente uma área onde quase tudo, Sr.ª Deputada, se não mesmo tudo, tem corrido

mal.

O Sr. Carlos Silva (PSD): — O Governo não fez nada!

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Este ano, em Portugal, e a Sr.ª Deputada também o disse, já se contam

mais de 30 mortes por violência doméstica. Estes números, estes resultados deveriam fazer corar de vergonha

o Governo e o Partido Socialista.

O Sr. Afonso Oliveira (PSD): — Muito bem!

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Mas não fazem!

O Partido Socialista e o Governo vêm aqui fazer um bocadinho mais do mesmo, que é a fuga para a frente

e o bater com a mão no peito, lavando as mãos como Pilatos, como se não tivessem nenhumas

responsabilidades em tudo aquilo que há por fazer, Sr.ª Deputada, e que já está identificado.

Foi o Governo do Partido Socialista que assumiu, no passado dia 7 de março, que este era um combate

prioritário e fê-lo perante todos os portugueses.

Mas em relação ao tal dia de luto nacional que a Sr.ª Deputada referiu aqui como sendo um dia simbólico,

foi, de facto, apenas um dia simbólico em que se fizeram inúmeros anúncios, mas a maioria deles não foi

concretizada. Assim, queria perguntar-lhe, Sr.ª Deputada, concretamente, o que é que foi feito desde esse dia

de luto nacional para acelerar o combate à violência doméstica. Quais foram as medidas concretas que foram

adotadas pelo Governo, Sr.ª Deputada, para cumprir esta prioridade?

Por exemplo, Sr.ª Deputada, porque é que o alargamento do programa para agressores de violência

doméstica em contexto prisional, que a Sr. ª Deputada referiu, está parado? Porquê? Isto quando os Serviços

de Reinserção Social dizem que já está pronto a avançar. Digo-lhe porquê: porque não há dinheiro para esse

financiamento!

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Vou terminar, Sr. Presidente.

A restruturação da linha de apoio foi anunciada aqui no dia 7 de março como uma medida inovadora e que

serve para garantir apoio especializado durante as 24 horas do seu funcionamento, sendo necessário apenas

contratar profissionais. Porque é que ainda não está a funcionar?

O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, tem mesmo de concluir.

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Vou mesmo terminar, Sr. Presidente.

Priorizar o combate à violência doméstica é alocar meios e recursos às políticas. Não é com meros anúncios

que se resolve o problema.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Inês de Sousa Real, do

PAN.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, permitam-me que, constatando

a atualidade deste tema, comece por lamentar a violência doméstica e o peso que continua a ter na nossa

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sociedade, o que, de facto, nos deve impelir a agir com firmeza e de forma proporcional à violência que cada

vítima clama.

Aqui, os números conhecidos são, de facto, particularmente reveladores da gravidade deste flagelo, que tem

sido transversal a sucessivos governos que têm alternado no poder.

Por isso, Sr.as e Srs. Deputados, há, de facto, um longo caminho a percorrer, porque continuamos a falhar

apesar do que até aqui foi feito.

É nosso entendimento que uma resposta eficaz nesta matéria terá, necessariamente, de ser feita em três

níveis ligados entre si: o da prevenção, com medidas que possibilitem evitar este flagelo; o da punibilidade do

crime, com a implementação de medidas que sejam simultaneamente dissuasoras do fenómeno e que reflitam,

de alguma forma, o juízo de censura generalizado que a sociedade sente em relação àquele; e, paralelamente,

porque, não tenhamos ilusões, este flagelo não será erradicado de um dia para o outro, importa dar respostas

céleres e contundentes na proteção das vítimas, ajudando-as a prosseguir com as suas vidas em segurança.

Mas precisamente pelo caminho que ainda há a percorrer neste domínio, há algumas questões que não

podemos deixar de colocar, Sr.ª Deputada. É, desde logo, notório que muitos dos casos de violência doméstica

se estendem no tempo, por vezes durante anos, o que, de facto, leva a que as vítimas em circunstâncias várias

não sejam sinalizadas atempadamente, seja porque não se deixam sinalizar, seja porque o sistema falha na sua

sinalização.

Assim, perguntamos se estará o Partido Socialista disponível para caminhar no sentido de uma maior

prevenção, nomeadamente através do reforço dos meios afetos a esta temática e a especialização dos mesmos

e para quando.

Ao nível da punibilidade do crime, conhecendo-se o efeito dissuasor que as penas cumprem, pergunto

também se estará o Partido Socialista disponível para ajustar a moldura penal do crime de violência doméstica,

porque penas suspensas não chegam, Sr.ª Deputada; as vítimas clamam por uma justiça mais eficaz que afaste,

efetivamente, os agressores mas que também puna as suas condutas.

Por último, ao nível do apoio às vítimas, porque o que se constata é que temos um País a várias velocidades

na resposta que dá àquelas,…

O Sr. Presidente: — tem de concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Inês de Sousa Real (PAN): — Concluo já, Sr. Presidente.

… com gabinetes de apoio à vítima ora inexistentes, ora permanentemente encerrados ou sem meios, ou

dependentes da boa vontade local, o que perguntamos ao Partido Socialista é se estará disponível para construir

uma estratégia alocada a meios a começar no próximo Orçamento do Estado.

O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Sandra Cunha.

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elza Pais, mais uma vez felicito o Grupo

Parlamentar do PS por trazer este tema para as declarações políticas.

Queria dizer, pegando nas suas palavras, que temos 20 anos de políticas públicas, de leis, de instrumentos

vários e importantíssimos para promover a igualdade de género e, especialmente, para a prevenção e o combate

à violência doméstica, mas a verdade é que estamos continuamente, ano após ano, a perder esse combate,

porque os índices e as queixas de violência doméstica não diminuem, os femicídios não diminuem e as vítimas

não diminuem, muito pelo contrário.

Aquilo que precisamos é de continuar o caminho com todas as informações que recebemos das equipas que

foram constituídas, de quem trabalha no terreno, dos relatórios que são produzidos, mas precisamos também

do investimento necessário para garantir a implementação no terreno dessas medidas e para garantir que se

concretizam estes 20 anos de políticas públicas.

Falando nisso, temos uma série de políticas públicas, uma série de instrumentos, uma série de coisas em

andamento, mas, depois, essas medidas não têm resultados concretos ou não são implementadas.

Falou-se, há mais de um ano, no Observatório Judicial da Violência Doméstica e ele continua empacado,

sem avançar e sem se ter notícia nenhuma do seu desenvolvimento.

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Também sabemos que só podemos atuar com eficácia quando conhecemos bem a realidade e a verdade é

que falta-nos muita informação, faltam-nos muitos dados, principalmente da área da justiça, não só no que

respeita a sentenças mas também no que respeita, precisamente, aos programas para agressores e aos

sistemas de proteção às vítimas, mulheres e crianças.

Então, pergunto: onde é que está o Observatório Judicial da Violência Doméstica que foi anunciado e que

ficou parado?

Gostaria ainda de referir…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Sandra Cunha (BE): — Vou já concluir, Sr. Presidente.

Gostaria ainda de referir que metade das autarquias não integra a rede de apoio à habitação para vítimas de

violência doméstica e, portanto, pergunto que trabalho é que se está a fazer com as autarquias para que passem

a integrar esta rede e a proporcionar habitação às vítimas de violência doméstica.

Aplausos do BE.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, há aqui uma nítida e clara diferença entre as perguntas populistas

da Sr.ª Deputada Sandra Pereira, a que já estamos habituados há muito a esta parte, porque não responde,

minimamente, ao apelo que fazemos do consenso político relativamente a esta área e o que quer é utilizar a

violência doméstica como arma de arremesso político.

Protestos do PSD.

Sr.ª Deputada, vai mal! Vai mal!… Continue a ser populista, porque esse não é o nosso caminho, nem vai

ser!

Aplausos do PS.

Não posso deixar de dizer…

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — E dados? Dados?

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Quer dados?! Bom, qualquer mulher assassinada merece, da nossa parte, o maior

respeito e um alerta máximo para que, mesmo sendo apenas uma, consigamos no ano seguinte não ter

nenhuma.

Sabe quantas mulheres foram assassinadas em 2015? 38, Sr.ª Deputada! Portanto, não venha com esse

discurso que não a leva a lado nenhum. Aliás, as propostas que têm feito são sempre fáceis e populistas.

Relativamente à Sr.ª Deputada Inês Real e à Sr.ª Deputada Sandra Cunha saúdo as vossas perguntas,

porque vão numa linha construtiva, numa linha de perguntar o que se faz em termos de prevenção.

Neste momento, há um programa de educação para a cidadania, este Parlamento vai promover o Parlamento

dos Jovens e já muitas autarquias inseriram no programa o debate sobre a violência no namoro. É, pois, pela

prevenção que se mudam comportamentos, que se mudam atitudes e que se mudam valores.

A prevenção tem de passar a ser a prioridade máxima de todas as prioridades, porque mudar leis é fácil, mas

mudar comportamentos e valores é muito difícil, são longos anos de interiorização de novas atitudes, de respeito

pelo outro, de construir afetos sem que sejam dominados pelas desigualdades de género que afetam muitas

das nossas relações.

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — E dados? Dados?

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A Sr.ª Elza Pais (PS): — A Sr.ª Deputada quer dados? Relativamente à teleassistência foram investidos mais

550 000 euros. Quer mais? Mais três casas de abrigo do que na vossa governação, mais 38 vagas em casas

de abrigo, mais 100 respostas de acolhimento de emergência, mais 46 vagas de resposta de acolhimento de

emergência, mais 824 acolhimentos de resposta de emergência.

Quer mais números, Sr.ª Deputada? Também lhe dou outros números: mais 248 pessoas condenadas por

crime de violência doméstica. Mais 1 926 000 euros de investimento na rede nacional de apoio a vítimas de

violência doméstica. Portanto, o investimento tem sido imenso.

Dir-me-á que há falhas…

O Sr. Presidente: — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Concluindo, Sr. Presidente, dir-me-á a Sr.ª Deputada que há falhas. Sr.ª Deputada,

sim, há falhas! Elas foram identificadas pelo GREVIO, foram identificadas pela equipa da análise retrospetiva do

homicídio em situações de violência doméstico. O que temos de fazer? Temos de conhecer para melhor intervir.

É isso que estamos a fazer, vamos ver onde estão as falhas, elas, neste momento, estão identificadas e,

portanto, o próximo passo é o de colmatar essas falhas.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — A Sr.ª Deputada Elza Pais, tem ainda dois pedidos de esclarecimento, sendo o primeiro

da Sr.ª Deputada Mariana Silva, a quem dou a palavra.

A Sr.ª Mariana Silva (PEV): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A violência doméstica já matou mais

de 30 mulheres em 2019. Para além desta assustadora evidência – mulheres, crianças, homens, idosos,

pessoas com deficiência, população LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgéneros)

–, muitos são os que sofrem de violência doméstica, a maior parte das vezes, escondida entre quatro paredes.

Vemos cartazes que nos sensibilizam, números de telefone disponíveis, correntes nas redes sociais que

demonstram indignação e solidariedade por quem sofre, as denúncias aumentam e muitas vítimas ganham

coragem para dizer «basta», o que é positivo.

No entanto, ouvimos cada vez mais histórias de medo, de falta de proteção, de processos arquivados por

suposta falta de provas e sem condenação. Processos que deixam as quatro paredes e passam para a esfera

pública. A vítima fala com a polícia, com os técnicos, com os psicólogos, com os advogados, com assistentes

sociais, com os professores dos filhos, com a entidade patronal e, dependendo dos casos, pode ver a sua vida

completamente exposta na televisão e nos jornais.

Gostaria de lembrar também que a violência doméstica e os seus nefastos efeitos também se alimentam,

embora não só, da pobreza, dos baixos salários, da ausência de direitos, da desvalorização da mulher no mundo

do trabalho e na vida.

As vítimas serão também vítimas da sua denúncia, da sua luta para conquistarem a liberdade perdida e a

sociedade ainda não foi capaz de encontrar soluções mais rápidas, concretas e menos violentas para proteger

aqueles a quem se promete proteção.

Sr.ª Deputada, é urgente continuar a denunciar para que as entidades responsáveis possam agir. É

necessário exigir das entidades responsáveis mais celeridade na resolução dos casos, mas será que há meios

suficientes? Estará este Governo disponível para contratar mais técnicos, psicólogos e agentes de segurança,

para que as respostas sejam rápidas e não se prolonguem as denúncias por falta de meios?

E, mais importante: há vontade política para dar condições de vida e de autonomia às mulheres para que

possam tomar as suas decisões sem outros constrangimentos?

Aplausos de Deputados do PCP.

O Sr. Presidente: — Há ainda um pedido de esclarecimento por parte da Sr.ª Deputada Alma Rivera, a quem

dou a palavra.

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A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elza Pais, a eliminação da violência sobre as

mulheres é um tema que merece, mais do que reflexão e iniciativas simbólicas de grande nível, a tomada de

atitudes correspondentes com essa preocupação.

Falamos de um flagelo com causas profundas, mas há medidas de alcance imediato que devem ser

consideradas no âmbito de uma resposta pública, articulada e descentralizada ao problema da violência

doméstica em Portugal.

Para o PCP, o combate à violência sobre as mulheres é indissociável da eliminação da exploração laboral,

da precariedade, da desigualdade, que, em si mesmas, alimentam e reproduzem essa violência. Para que as

mulheres vivam, trabalhem e participem em igualdade, para vencer preconceitos e estereótipos é preciso justiça

social e direitos concretizados.

Desde já, é necessário avaliar com seriedade a implementação de medidas previstas como as que resultam

da resolução do Conselho de Ministros que aprova medidas de prevenção de combate à violência doméstica, é

necessário proceder à avaliação dos programas dirigidos aos agressores para combater a reincidência da

violência e importa refletir também sobre os critérios mediáticos e noticiosos da violência doméstica e dos

homicídios.

Mas, para todos os que estão empenhados nesta luta, impõe-se ainda algumas perguntas e as que queria

deixar-lhe são as seguintes: o PS vai acompanhar as propostas do PCP de reforço dos meios financeiros,

técnicos e humanos dos serviços responsáveis pela deteção, sinalização, encaminhamento, proteção e defesa

das mulheres, para que possam cumprir cabalmente o seu papel, nomeadamente ao nível dos centros de saúde

e hospitais, das escolas e universidades, das forças de segurança, da polícia de investigação criminal, do

Ministério Publico, dos tribunais e dos serviços de segurança social?

O PS vai acompanhar as propostas do PCP para assegurar formação especializada e meios a quem intervém

nas primeiras 72 horas após a queixa? Que medidas vai tomar para que, antes e depois da atribuição do estatuto

de vítima, exista celeridade na avaliação de risco? Concretamente, quem se responsabiliza por estas soluções

e por estas mulheres?

A visão que o Governo nos tem apresentado preocupa-nos, porque é de responsabilização…

O Sr. Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Alma Rivera (PCP): — Termino já, Sr. Presidente.

… é de transferência para as autarquias de competências nucleares, como a própria justiça, e isso é

incompatível com a necessária resposta universal, pública, coerente e capaz que um problema desta gravidade

merece.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Deputada Elza Pais.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Sr. Presidente, em resposta à Sr.ª Deputada Mariana Silva, do PEV, e à Sr.ª

Deputada Alma Rivera, do PCP, gostaria de dizer, desde já, que os meios nunca são suficientes para as

necessidades que se apresentam para combater os problemas que são estruturais.

De todo o modo, muito tem sido investido em várias estruturas de acolhimento, de emergência,

teleassistência, vigilância eletrónica, formação. Sim, formação, quer de forças de segurança, quer dos próprios

magistrados, quer ao nível das comunidades e das organizações não governamentais.

Nós defendemos a autonomia da vítima e nesse sentido têm sido…

A Sr.ª Sandra Pereira (PSD): — Sem dinheiro!

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Não é sem dinheiro; é também com dinheiro, mas nem toda a autonomia passa

pelo dinheiro, até porque este fenómeno é transversal a todas as classes sociais. Não há uma violência dos

pobres e uma ausência de violência nas classes mais elevadas. Há uma violência que tanto se faz sentir em

classes mais baixas como nas mais elevadas e, depois, há uma diferenciação por tipo de violência, mas isso

levaria muito tempo a explicar neste contexto.

Página 55

21 DE NOVEMBRO DE 2019

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A violência doméstica é transversal e, por isso, temos de utilizar estratégias de autonomia da vítima, e elas

estão em curso, de empoderamento das vítimas e de alguns recursos alocados a alguns projetos, como também

acontece. Por exemplo, temos hoje mais 18 fogos para autonomização atribuídos e mais 25 municípios solidários

que aderiram a esta rede.

Portanto, o trabalho com as autarquias é absolutamente essencial e algumas casas estão a ser atribuídas

para autonomização das vítimas, quer quando saem das casas de abrigo ou dos centros de emergência, quer

quando precisam urgentemente deste tipo de equipamento social.

Gostaria de dizer também que defendemos a autonomia da vítima e o seu próprio empoderamento, bem

como todos os projetos levados a cabo pelas organizações não-governamentais por todo o território nacional.

Nós, hoje, temos uma rede de organizações não-governamentais que chega a todos os cantos do País e que

não existia há uns anos. Portanto, são 20 anos, Sr.as Deputadas!

Temos de ser realistas e honestas: não, não está tudo feito, porque, se estivesse tudo feito, também não

estaríamos aqui a falar deste problema. Também digo que não vai ser tudo feito, por mais meios que sejam

alocados a esta causa nos próximos anos, porque a raiz do problema é estrutural: está na cabeça, nos valores

de desigualdade de género que se inscrevem nas relações entre as pessoas, e esses não se alteram. Também

está a nível de valores de operadores no sistema total, judicial e não só, que ainda se orientam muito por

desvalorizar este tipo de agressões.

Portanto, temos também aqui uma cultura de impunidade que urge remover através de formações,

obviamente, específicas e cirúrgicas, como as que estão a ser feitas. Aliás, foi aprovada, na Legislatura anterior,

nesta Casa, uma lei que obriga à inscrição da formação em violência de género, no Centro de Estudos

Judiciários.

O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Elza Pais (PS): — Portanto, Sr.as Deputadas, obrigada pelas perguntas, que introduzem contributos

numa estratégia extremamente difícil, estratégia essa que precisa, seguramente, de todas e de todos nós para

fazermos face a este difícil fenómeno da violência doméstica, estrutural e persistente, que se combate com leis,

mas também com uma mudança de valores.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Temos, ainda, uma declaração política.

Sr. Deputado André Ventura, do Chega, faça favor.

O Sr. André Ventura (CH): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Muito obrigado a esta Casa por nos deixar

falar hoje, a título excecional. Parece estranho, na Casa da democracia, mas assim é.

Hoje, quando estamos a poucas horas de uma das maiores manifestações de sempre à porta desta Casa,

uns preferem falar do amianto e outros de paraísos fiscais. Uns, ainda, preferem falar de tudo menos do que

tem que ver com o que se vai passar amanhã, à frente desta Casa.

Uma enorme sombra paira sobre nós e a enorme sombra é esta: temos uma ampla maioria de esquerda e o

Governo, ao mesmo tempo que aprova o aumento de despesas com viagens, 116 milhões, que aumenta em 71

milhões as despesas dos gabinetes, é o mesmo que deixa o Hospital Garcia de Orta fechado, deixa o hospital

de Coimbra degradado e deixa a nossa saúde no estado calamitoso em que se encontra. Ainda ontem,

soubemos que adiaram uma consulta a um homem com mais de 90 anos. Imaginem: um homem de 90 anos

com uma consulta adiada! E riem-se, como se não fosse sério demais uma vida humana em risco, quando se

gasta dinheiro em viagens e em subvenções vitalícias pagas a criminosos condenados pelos tribunais.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estão preocupados com a infiltração do Chega em manifestações. Não

deviam estar! Deviam estar preocupados com o estado a que chegaram as nossas forças de segurança, com o

estado a que chegaram as forças que nos defendem, quer segurança privada, quer segurança pública.

Tivemos aqui, nesta Casa — e, por isso, pedimos hoje para falar — um Primeiro-Ministro que mentiu aos

portugueses. Disse, e cito: «Os polícias não têm de comprar equipamentos para si próprios. Sr. André Ventura,

mude de informador!».

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I SÉRIE — NÚMERO 8

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Aqui estão as faturas que dezenas de polícias nos fizeram chegar, com a compra de elementos e de material

pago do seu bolso e que serão entregues, ainda hoje, àqueles senhores que ali estão, da comunicação social,

para devida publicação. Estão aqui! Vêm do País inteiro e deviam envergonhar qualquer democracia.

Neste momento, o orador exibiu os documentos que mencionou.

Estão aqui faturas de algemas, de coletes e de tudo o mais que o Sr. Primeiro-Ministro disse que não existia

e que não se verificava na nossa Casa. Vergonha, Sr. Primeiro-Ministro! Vergonha, Sr. Ministro da Administração

Interna!

Disse o Partido Socialista: honremos os nossos polícias; disse o Partido Comunista: os polícias merecem-

nos respeito, mas juntam, na mesma frase, as palavras «abusos» e «fiscalização». Sempre a mesma história a

que estamos habituados!

Amanhã, teremos uma das maiores manifestações frente a esta Casa, à qual nos associaremos sem medo,

sem problema, sem medo de olhar para trás. É assim, quando os valores estão certos e estamos do lado certo

da história e não do lado dos que escondem a verdade. Esta mesma verdade que hoje circulará por toda a

imprensa e por toda a internet.

Mas o que podíamos esperar desta sombra que nos atormenta em Portugal? A mesma que diz que não vai

aumentar impostos, sabendo nós que o englobamento vai matar o mercado de arrendamento em Portugal; a

mesma que diz que vai combater os precários, quando eles existem no Gabinete do próprio Primeiro-Ministro.

Imaginem, no Gabinete do próprio Primeiro-Ministro!

Não há outra solução! Uma sombra enorme paira sobre este País e é com uma enorme sombra de

preocupação que os portugueses olham hoje para esta Casa. Uma maioria de esquerda ri-se, desvaloriza e diz:

estamos em maioria, vamos continuar a mandar. Talvez mais cedo do que pensam, talvez mais cedo do que

esperam, o povo português seja chamado às urnas, novamente, para pôr fim à vergonha que hoje se verificou

nesta Casa. Não façam perguntas, peçam desculpa pelo que aconteceu aqui. Era isso que esperávamos de

vocês hoje.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, na parte que me diz respeito, não houve nenhum beneplácito do

Presidente para que pudesse falar. O senhor tem direito, como todos os Deputados únicos representantes de

partidos, a falar três vezes em três ordens do dia como esta, em que há declarações políticas. Portanto, não

percebo por que razão fez essa referência. Aliás, qualquer um dos outros Deputados únicos representantes de

partidos podia ter usado da palavra hoje e só não o fizeram porque não quiseram.

Aplausos do PS.

Creio que não há perguntas.

Pausa.

Chegámos, assim, ao final desta sessão plenária.

A próxima sessão terá lugar amanhã, às 15 horas, com um debate temático, requerido pelo Grupo

Parlamentar do PS, sobre transição digital.

Muito obrigado e até amanhã.

Eram 18 horas e 11 minutos.

Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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