I SÉRIE — NÚMERO 38
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O Sr. António Filipe (PCP): — Não faz nenhum sentido pretender aplicar o regime de proteção dos animais
de companhia a todos os animais. Se mesmo entre os animais de companhia existem naturais diferenças de
comportamento animal que nem sequer são tidas em conta, já é do reino do absurdo pretender aplicar a todos
os animais um regime idêntico, que ignore as abissais diferenças de natureza e de habitat que coexistem no
mundo animal e que impõem naturais diferenças de relacionamento quer dos animais entre si, quer dos humanos
com as diferentes espécies.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — Faz algum sentido que um ancião que viva numa aldeia do interior e que nem
tenha acesso a cuidados de saúde para si seja ameaçado com pena de prisão até 6 meses se não tiver
condições para assegurar os cuidados médico-veterinários adequados a um animal que tenha a seu cargo?!
Faz algum sentido ameaçar com uma pena de prisão alguém que proceda ao abate de uma galinha criada
para autoconsumo?
Uma ação e desratização feita por razões de saúde pública dá pena de prisão?
Faz algum sentido encher a legislação penal, que por definição deve ser precisa, de conceitos vagos e
indeterminados, como «afetação da etiologia do animal» ou «maus tratos psicológicos»?
A proteção dos animais, como tudo na vida, não dispensa a razoabilidade e o bom senso. Não se pode tratar
como igual o que é manifestamente diferente.
O Sr. Presidente: — Já ultrapassou o seu tempo, Sr. Deputado.
O Sr. AntónioFilipe (PCP): — Termino de imediato, Sr. Presidente.
A Serra da Malcata não é uma varanda da avenida de Roma. E, como escreveu Mário de Carvalho, é
importante não confundir o género humano com o Manuel Germano.
O PCP está disponível para aprovar aperfeiçoamentos que se revelem úteis para a proteção do bem-estar
animal, mas não aceita transformar o Código Penal português num repositório incoerente de fundamentalismos
insustentáveis — disse bem, Sr. Presidente, insustentáveis.
Aplausos do PCP e de Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, o Sr. Deputado Telmo Correia, do Grupo
Parlamentar do CDS.
O Sr. TelmoCorreia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Como efetivamente foi dito, estes
diplomas — e não são todos a mesma coisa — têm um ponto que é comum, que, no fundo, é uma preocupação
que admitimos corresponder a uma nova sensibilidade social de combate aos maus-tratos a animais e à
crueldade contra animais.
Até aí, estamos todos de acordo, até aí está tudo certo. As mentalidades mudam, as mentalidades vão
evoluindo e ainda bem que essa evolução existe.
A partir daí, existem de facto projetos diferentes, como aqui foi dito e estou de acordo, e existem projetos que
estão eivados de um fundo de radicalismo — enfim, temos de procurar qualificar, talvez se trate de um
radicalismo animalista, por assim dizer — que não faz nenhum sentido.
Desde logo, não faz sentido porque, como já foi explicado por mais de um grupo parlamentar, faz uma
amálgama e uma generalização que não tem lógica. É evidente que a distinção entre sencientes e sencientes
vertebrados não existe, uma vez que todos os vertebrados o serão, mas há animais muito diferentes.
Ora, quando estabelecemos a lógica de alargar o regime que temos para os animais de companhia, que faz
todo o sentido, a todo o tipo de animais, estamos a lidar com realidades tão diferentes como a dos animais de
companhia, os cães e os gatos, a dos ratos ou ratazanas ou a de outros animais, como por exemplo, nalguns
casos, répteis. Será possível, ou não, combater uma praga de ratazanas, por exemplo, com base nesse regime,
ou as pessoas serão condenadas?