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Quinta-feira, 24 de Março de 1988

II Série — Número 59

DlÁRIO

da Assembleia da República

V LEGISLATURA

1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1987-1988)

SUMÁRIO

Decretos (n.M 58/V e 59/V):

N.° 58/V — Alterações dos nomes da freguesia e da povoação de Póvoa para Póvoa de São Miguel .. II46 N.° 59/V — Âmbito da aplicação do artigo 106.° da Lei n.° 38/87, de 23 de Dezembro (Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais)............................. 1146

Deliberação n.° 3-PL/88:

Comissão Parlamentar para Contactos com as Cortes Espanholas................................. 1146

Propostas de lei (n.°* 16/V c 31/V a 33/V):

N.° 16/V (alteração à Lei n.° 24/87, de 24 de Junho, que estabelece o regime disciplinar da alienação de participações ou bens e instalações detidas pelo Estado em empresas de comunicação social):

Relatório e texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a votação na especialidade da proposta de lei 1146

N.° 31/V (Lei de Bases da Reforma Agrária):

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei ....................... 1148

N.° 32/V (autoriza o Governo a aprovar o regime geral de arrendamento rural):

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei....................... 1151

N.° 33/V (autoriza o Governo a aprovar as bases gerais do emparcelamento e fraccionamento dos prédios rústicos e de exploração agrícolas):

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei ........................ 1152

Projectos de lei (n.M 179/V, 207/V e 208/V):

N.° 179/V (reabilitação e reintegração do ex-cônsul de Portugal em Bordéus Aristides de Sousa Mendes):

Parecer e texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

N.° 207/V — Elevação da freguesia de Cacia à categoria de vila (apresentado pelo CDS)............ 1153

N.° 208/V — Retoma o projecto de lei n.° 410/IV — Elevação a vila da freguesia da Carapinheira (apresentado pelo CDS)............................. 1155

Voto n.° 26/V:

Sobre o Dia Nacional do Estudante (apresentado pelo PCP)..........................................

Pessoal da Assembleia da República:

Avisos de nomeação de dois técnicos profissionais de relações públicas de 2.° classe e de um técnico auxiliar de apoio parlamentar principal do quadro do pessoal da Assembleia da República................ 1157

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II SÉRIE — NÚMERO 59

DECRETO N.° 58/V

ALTERAÇÃO DOS NOMES DA FREGUESIA E DA POVOAÇÃO . DE PÓVOA PARA POVOA DE SÃO MIGUEL

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea d) do artigo 164.° e do n.° 2 do artigo 169.° da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.° A povoação de Póvoa, sede de freguesia no Município de Moura e distrito de Beja, passa a designar-se Póvoa de São Miguel.

Art. 2.° A freguesia de Póvoa, no Município de Moura e distrito de Beja, passa a designar-se Póvoa de São Miguel.

'Aprovado em 11 de Março de 1988.

O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereirh Crespo.

DECRETO N.° 59/V

ÂMBITO DA APLICAÇÃO DO ARTIG0106.° DA LEI N.° 38/67, DE 23 DE DEZEMBRO (LEI ORGÂNICA DOS TRIBUNAIS JUDICIAIS)

A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 164.°, alínea d), 168.°, n.° 1, alínea q), e 169.°, n.° 2, da Constituição, o seguinte:

Artigo 1.° O disposto no artigo 106.° da Lei n.° 38/87, de 23 de Dezembro, não é aplicável às acções pendentes à data da sua entrada em vigor, sem prejuízo, porém, dos casos julgados entretanto formados.

Art. 2.° A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.

Aprovado em 17 de Março de 1988.

O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.

DELIBERAÇÃO N.° 03-PL/88

COMISSÃO PARLAMENTAR PARA CONTACTOS COM AS CORTES ESPANHOLAS

A Assembleia da República, na sua reunião de 17 de Março de 1988, deliberou, nos termos do artigo 181.°, n.os 1 e 2, da Constituição e do artigo 30.° do Regimento, o seguinte:

1 — Constituir uma comissão eventual com o objectivo de promover contactos com o Congresso dos Deputados das Cortes Espanholas.

2 — A Comissão promoverá a concretização de contactos entre os dois Parlamentos para troca de pontos de vista e promoção de cooperação.

3 — 0 quadro geral das atribuições da Comissão será concretizado no seu regimento.

4 — A Comissão será integrada por 29 elementos indicados pelos grupos e agrupamentos parlamentares, de acordo com a seguinte distribuição:

Grupo Parlamentar do PSD — 16 deputados; Grupo Parlamentar do PS — 7 deputados; Grupo Parlamentar do PCP — 2 deputados;

Grupo Parlamentar do PRD — 1 deputado; Grupo Parlamentar do CDS — 1 deputado; Grupo Parlamentar Os Verdes — 1 deputado; Agrupamento Parlamentar da Intervenção Democrática — 1 deputado.

Assembleia da República, 17 de Março de 1988. — O Presidente da Assembleia da República, Vítor Pereira Crespo.

Relatório e texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre a votação na especialidade da proposta de lei n.° 16/V (alteração à Lei n.° 24/67, de 24 de Junho, que estabelece o regime disciplinar da alienação de participações ou bens © Srtstaiações detidas pelo Estado em empresas úe comunicação social).

I

1 — Quanto ao artigo 1." da proposta de lei:

a) Nova redacção dada ao n.° 1 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e votaram contra os deputados do PS, do PCP e da ID);

b) Nova redacção dada ao n.0 1 do artigo 6.0 do Decreto-Lei n.° 358/86: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD, absti-veram-se os deputados do PS e votaram contra os deputados do PCP e da ID);

c) Nova redacção dada ao artigo 8.° do Decreto--Lei n.° 358/86: aprovada por unanimidade;

d) Nova redacção dada ao artigo 10.° do Decreto--Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e abstiveram-se os deputados do PS, PCP e ID).

2 — Quanto ao artigo 2. ° da proposta de lei:

a) Nova redacção dada ao n.° 1 do artigo í.° do referido Decreto-Lei n.c 358/86, na redacção da Lei n.° 24/87, de 24 de Julho: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e votaram contra os deputados do PS, PCP e ID);

b) Nova redacção dada ao n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 358/86, na redacção da Lei n.° 24/87: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e votaram contra os deputados do PS, PCP e ID);

c) Nova redacção dada ao n.° 1 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 358/86, na redacção da Lei n.° 24/87: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD, abstiveram-se os deputados do PS e votaram contra os deputados do PCP e da ID);

d) Nova redacção dada ao n.° 1 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 358/86, na redacção da Lei n.° 24/87: aprovada por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e votaram contra os deputados do PS, PCP e ]D),

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3 — Quanto ao artigo 3. ° da proposta de lei:

Aditamento de uma alínea d) ao n.° 1 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 358/86: aprovado por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e do PS e abstiveram-se os deputados do PCP e da ID).

4 — Quanto ao artigo 4." da proposta de lei: aprovado por maioria (votaram a favor os deputados do PSD e votaram contra os deputados do PS, PCP e ID).

II

1 — As propostas de alteração apresentadas pelos deputados do PS foram recusadas por maioria, com os votos contra dos deputados do PSD e votos a favor dos deputados do PS.

2 — As propostas de alteração, eliminação ou aditamento apresentadas pelos deputados do PCP foram recusadas por maioria, com os votos contra dos deputados do PSD e votos a favor dos deputados do PCP e da ID.

III

Face a esta votação é o seguinte o texto final da proposta de lei n.° 16/V, aprovado nos descritos termos na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias:

Artigo 1.° Os artigos 3.°, n.° 1, 6.°, 8.°, n.os 1, alínea e), e 2, e 10.° do Decreto-Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro, passam a ter a seguinte redacção:

Art. 3.° — 1 — A alienação de bens ou instalações de empresas públicas de comunicação social será efectuada por concurso público, sempre que o seu valor seja igual ou superior a 20% do activo imobilizado das respectivas empresas.

Art. 6.° — 1 — Do regulamento do concurso referido no artigo 4.° terão de constar obrigatoriamente, pelo menos, os elementos seguintes:

a) Prazo para a apresentação das respectivas propostas, o qual não poderá ser inferior a 30 nem superior a 60 dias;

b) Base de licitação;

c) Identificação do objecto de alienação;

d) Fixação da caução provisória a prestar pelos candidatos, através de depósito ou garantia bancária, de montante correspondente a 10% do valor da base de licitação;

e) Indicação da data e local da abertura das propostas e menção do prazo máximo, não superior a 30 dias, para a decisão da adjudicação;

f) Indicação concreta dos prazos e demais condições de pagamento;

g) Indicação dos documentos a apresentar pelos candidatos;

h) Regime de exercício do direito de preferência.

2 — No caso das propostas apresentadas pelas cooperativas referidas na alínea a) do n.° 1 do artigo 8.°, a caução provisória não pode ser superior a 5% do valor da base de licitação.

Art. 8.° — 1 —......................

a)...........................;......

d) ............................;.....

e) Empresas editoriais. .

2 — Os candidatos referidos no numero anterior podem beneficiar dos seguintes privilégios, sempre que o objecto do concurso seja constituído por títulos ou capital:

a) Pagamento até cinco anos, com prestações semestrais e com um período de carência até um ano, no caso das cooperativas mencionadas na alínea 0) do número anterior;

b) Pagamento até três anos, com prestações semestrais e com um período de carência até seis meses, nos restantes casos.

Art. 10.° O despacho a que se refere o n.° 3 do artigo 4.° conterá obrigatoriamente a menção dos pareceres solicitados, bem como da audição dos trabalhadores e do resultado de tal diligência.

Art. 2.° Os artigos 1.°, n.° 1, 2.°, n.os 1 e 2, 4.°, n.os 1, 2 e 3, e 7.°, n.° 1, alínea c), do Decreto-Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro, na redacção dada pela Lei n.° 24/87, de 24 de Julho, passam a ter a seguinte redacção:

Artigo 1.° — As partes, quotas ou acções que o Estado ou qualquer outra entidade pública detenham em empresas de comunicação social são alienáveis nos termos da Constituição e do presente diploma.

Art. 2.° — 1 — É igualmente legítima, desde que observado o disposto no presente diploma, a alienação, oneração ou reforço de capital das empresas públicas de comunicação social, bem como a alienação de títulos ou conjunto de bens e instalações que integrem o respectivo estabelecimento comercial.

2 — A alienação, oneração ou reforço de capital de empresas públicas de comunicação social é precedida da respectiva transformação em sociedades anónimas.

Art. 4.° — 1 — Compete ao Governo decidir, mediante resolução, dos actos previstos nos artigos precedentes.

2 — A decisão do Governo reveste a forma de decreto-lei sempre que dela resulte a constituição, a extinção de uma empresa pública de comunicação social ou a sua transformação em sociedade anónima.

3 — A execução do previsto no n.° 1 será objecto, caso a caso, de despacho, a publicar no Diário da República, proferido pelo mem-

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bro do Governo que exerce a tutela e acompanhado, quando for caso disso, do regulamento do concurso a que se refere o número seguinte.

Art. 7.° — 1 — .......................

a) .................................

b) .................................

c) Compromisso de não alienação, transacção, cedência, gratuita ou onerosa, da participação ou bens adquiridos por concurso, antes de ser integralmente realizado o respectivo pagamento e nunca antes de decorridos dois anos sobre a celebração do contrato, salvo comprovado motivo de força maior.

Art. 3.° — É aditada uma alínea d) ao n.° 1 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro, com a seguinte redacção:

■ Art. 7.° — 1 — .......................

à) .................................

b) .................................

c) .................................

d) Compromisso de não proceder directa ou indirectamente à limitação, total ou parcial, do exercício do direito à exploração.

Art. 4.° São revogados o artigo 2.°, n.os 3 e 4, do Decreto-Lei n.° 358/86, de 27 de Outubro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 24/87, de 24 de Junho, o artigo 2.° da Lei n.° 24/87, de 24 de Junho, e os artigos 3.° e 4.° da Lei n.° 20/86, de 21 de Junho.

Palácio de São Bento, 18 de Março de 1988. — O Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Mário Raposo.

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei n.° 31/V (Lei de Bases da Reforma Agrária).

I

1.1 —A vertente central da impugnação dos Srs. Deputados do PCP é a de que a proposta de lei n.° 31/V está intencionalizada a reconstituir o latifúndio e a grande exploração capitalista, destruindo as unidades colectivas e as cooperativas de produção e «invertendo completamente o conceito constitucional de reforma agrária».

E para avalizar ou mais concretamente exprimir tal conclusão aduzem um conjunto de razões e de preceitos constitucionais em seu entender violados.

Encarar-se-ão neste parecer, ponto por ponto, esses aspectos parcelares.

Pertinente será, no entanto, delinear em traços muito gerais e preliminares o quadro histórico e o envolvimento normativo do que é designável por reforma agrária.

Como é sabido, foi ela desencadeada por um vasto movimento de ocupação de terras, desenrolado à margem de qualquer suporte legal. Tratou-se de um condicionalismo especificamente português «pois não se verificou em qualquer outro país que tenha lançado uma reforma agrária inserida num processo de construção do socialismo, e tornou-se indispensável para vencer a constante hesitação do poder político quanto a uma decisão clara em concretizar com a necessária urgência a legislação adequada». Disse isto mesmo o antigo Secretário de Estado da Reestruturação Agrária, António Bica, em depoimento publicado no n.° 4 dos Cadernos de O Jornal (Agosto de 1976).

Foi o Programa da Reforma Agrária incluído nas medidas económicas de emergência aprovadas pelo Decreto-Lei n.° 203-C/75, de 15 de Abril, que, ainda muito vagamente, esquiçou algumas acções a levar a efeito. Surgiriam depois os Decretos-Leis n.os 406-A/75, de 29 de Julho, e 407-A/75, de 30 de Julho, por via dos quais as ocupações de terras até então consumadas poderiam ganhar uma possível referenciação legal (Afonso de Barros, A Reforma Agrária em Portugal, 1979, p. 71).

Entretanto, as situações de facto e as soluções jurídicas estavam longe de uma clarificação minimamente desejável.

Daí que no acordo firmado entre os representantes dos partidos políticos que integravam o VI Governo Provisório se tenha constatado que o processo da reforma agrária se desenrolara até àquele momento (Janeiro de 1976) «praticamente sem controle, nem enquadramento por parte dos organismos estatais a quem caberia justamente a sua condução». Constatou--se ainda que o Decreto-Lei n.° 4C6-A/75 «longe de ter servido para disciplinar e orientar as expropriações que deviam constituir o ponto de partida para a reforma agrária, tem servido apenas para a legalização de situações de facto. É assim que, enquanto se estima em cerca de 1 000 000 ha a área actualmente ocupada, a área objecto de expropriação nos termos da lei não excede os 300 000 ha». Asseverou-e então a indispensabilidade de fazer cumprir a lei, pondo, designadamente, termo às ocupações ilegais de terras.

Esta, em breve esquema, a situação à data da Constituição.

1.2 — Inserido no âmbito da organização económica, não escapou o título respeitante à reforma agrária (título iv da parte n) à carga colectivizante que o texto constitucional teve em 1976 de suportar.

Só que as coisas mudaram substancialmente depois de 1982, com a 1.a revisão constitucional.

A organização económico-social deixou de assentar no desenvolvimento das relações de produção socialistas (artigo 80.°) e a reforma agrária deixou de ser pensada como «um dos instrumentos fundamentais para a construção da sociedade socialista», para passar a ser encarada como «um dos instrumentos fundamentais da realização dos objectivos da política agrícola» (artigo 96.°).

E, o que não é despiciendo, da Constituição foram expurgadas todas as referências ao proceso revolucionário, do qual as práticas sobre que se erguera a ocupação ilegal de terras haviam recolhido a sua «legitimidade».

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1.3 — Certo é que, mesmo na versão originaria, a Constituição se limitara, no tocante à reforma agraria, a algumas fórmulas vagas, de sentido predominantemente programático. E daí que na revisão de 1982 escassas alterações textuais tenham sido necessárias, para além da decisivamente relevante que modificou, no artigo 96.°, as concepções que antes lhe estavam subjacentes (a construção da sociedade socialista).

Desde logo, não há uma definição constitucional de reforma agrária.

E que será um latifúndio? A resposta terá de ser dada pelo legislador ordinário ou lançando mão de aportações doutrinais. Assim, para Joaquim da Silva Lourenço (cf. «Reforma agrária», em Estudos sobre a Constituição, i, 1977, p. 220), tal designação corresponderá «necessariamente a um conceito não só quantitativo, como qualitativo — propriedade rústica de grande extensão, nela se verificando subaproveitamento da terra e ou do homem —, porque, de contrário, se o conceito fosse meramente quantitativo — correspondente à propriedade concentrada —, a referência a grandes explorações capitalistas seria inteiramente redundante». Já para Gonçalo Ribeiro Teles a característica dominante do latifúndio é a monocultura, a cultura em extensão, a constante degradação do capital terra em benefício do capital exploração máquina ou adubação (no citado n.° 4 dos Cadernos de O Jornal, p. 60).

2 — Foi neste amplo contexto de anomalias sedimentadas numa realidade em convulsão que surgiu a Lei n.° 77/77, de 29 de Setembro, que pela primeira vez compendiou as bases gerais da reforma agrária.

Publicada no I Governo Constitucional, ficou-se ela a dever, precipuamente, ao Ministro António Barreto, que, num texto publicado em 1986 («A elaboração da lei de bases da reforma agrária», em A Feitura das Leis, i, pp. 139 e segs.), dá conta das circunstâncias e escolhos que teve de enfrentar.

Representou a Lei n.° 77/77, inquestionavelmente, «a ruptura pacífica e democrática com a revolução». Só que se vivia então «com uma Constituição ainda predominantemente revolucionária».

E «o Alentejo estava bipolarizado e dividido, o Alentejo organizado, que falava e que se ouvia, eram os proprietários, por um lado, os sindicatos e as UCPs, por outro lado. A base social da pequena e média agricultura camponesa e da média empresa capitalista não se fazia ouvir. Não havia sequer a aparência dessa base social».

Não será, pois, difícil de configurar que, mais de dez anos decorridos sobre a sua publicação, careça a Lei n.° 77/77 de ser substituída.

II

3 — Em justificação das conclusões que preliminarmente consignaram, os Srs. Deputados recorrentes fazem uma listagem de situações e preceitos da proposta de lei (PL).

Será agora o caso de os analisar um por um.

4.1 — No n.° 1 do artigo 12.° da PL diz-se não serem expropriáveis, qualquer que seja a sua pontuação, os prédios rústicos propriedade de:

a) Agricultores autónomos;

b) Cooperativas agrícolas;

c) Instituições particulares de interesse público.

Todas estas entidades estão compreendidas no n.° 3 do artigo 23.° da Lei n.° 77/77.

Dir-se-á que à expressão «instituições particulares de interesse público» não corresponde um sentido muito preciso, sendo eventualmente preferível a de «pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública».

Só que, ao invés do que se poderá supor, a expressão usada na PL é mais restritiva do que aquela outra, já que, na clássica tipologia das pessoas colectivas, as de direito privado e utilidade pública são todas as que não visem um interesse lucrativo de um determinado número de pessoas privadas (por exemplo, Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, 1, 1964, pp. 77 e segs., e Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 2.a ed., 1983, p. 287).

Apenas será de definir, em sede de especialidade, a quem compete o reconhecimento do interesse público. Parece que deverá ser ao Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, à semelhança do que acontece no sistema da Lei n.° 77/77 [alínea f) do n.° 3 do artigo 23.°].

4.2 — No que se reporta aos prédios cuja área, porque não significativa, os torne não expropriáveis (30 ha no regime da lei e 60 ha no da PL), é evidente que se trata de uma opção que ao legislador ordinário cabe fazer, firmado em razões de experiência e tendo em vista uma racionalização fundiária mais conforme aos objectivos globais da política agrícola.

Não estarão, obviamente, em causa nem «latifúndios», nem «grandes explorações capitalistas».

E ao mesmo plano se situa o preceito do n.° 3 do artigo 12.° da PL, imposto por uma captável razão de coerência sistemática.

4.3 — Os limites previstos no artigo 40.°da PL têm como detectável escopo a ideia de que da entrega de prédios expropriados ou nacionalizados nos termos do artigo 39.° não resulte risco para a concretização de uma política agrícola normalizada.

Impensável seria, por exemplo, que da eliminação, por actos expropriaiivos, de «latifúndios» resultassem depois novos e possivelmente maiores ... «latifúndios».

5 — Argumentam os Srs. Deputados recorrentes que o alargamento do direito de reserva e a manipulação dos critérios de pontuação suprimirão, na prática, os limites à propriedade latifundiária.

Não terão, no entanto, razão.

Já aquando da publicação da Lei n.° 77/77 se suscitou a falta de cobertura constitucional do direito de reserva, completamente inaceitável «com a extensão e nas condições previstas (naquela) Lei de Bases» (Dimas de Lacerda, «Reforma agrária», em Fronteira, n.° 1, 1978, pp. 18 e segs.). Acontecia, entretanto, que ele já era previsto no Decreto-Lei n.° 406-A/75, de 29 de Julho, embora em mais restritos moldes.

Não resta dúvida de que o critério legal terá de recolher as experiências de mais de uma dezena de anos e a realidade constitucional de hoje, diversa da que prevalecia antes da revisão de 1982.

6 — Ao invés do que se afirma no recurso, é o artigo 31.° determinado por uma óbvia preocupação de justiça, que nem sequer é nova (assim, por exemplo, o n.° 2.3.3 do acordo de Janeiro de 1976 entre os partidos políticos). O escopo será assegurar o princípio da paridade de situações, da igualdade jurídica: tratamento igual do que é essencialmente igual.

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O instituto da caducidade, que tem a ver com a extinção, pelo não uso, de um direito protestativo, não pode aqui ser chamado à colação, até porque o que está em jogo é um direito subjectivo fundamental: o direito de propriedade. E o Estado é sempre livre de conceder a renovação de um prazo que em relação a e/e funciona.

O que poderia estar em jogo seria um instituto completamente diverso: o da extinção de direitos, pela desligação do direito da pessoa do seu titular, quebrándole o nexo ou enlace que preexistia entre ele e essa pessoa, a qual teria deixado de ser sujeito do mesmo direito. Isto sucede, por exemplo, na hipótese da transmissão de um direito para um novo titular por vontade do transmitente. O que agora não está em causa.

7 — No caso da herança indivisa, cada um dos herdeiros tem um direito sobre toda ela, embora ocorra uma compressão desse direito, em razão da coexistência de outros com ele concorrentes. A partilha não é fonte de direitos; apenas se destina a dissolver a universalidade que a herança era.

No plano das realidades, é óbvio que os contitulares de uma herança indivisa não deverão ser postos em situação de inferioridade face àqueles que operaram já a partilha. E isto pela consabida razão de que a partilha muitas vezes não se faz para que a contitularidade possa potenciar a capacidade de actuação colectiva dos diversos herdeiros.

A solução dada aos indivisos parece impecavelmente certa.

Dir-se-á, entretanto, incidentalmente, e sem qualquer ressonância na problemática da constitucionalidade do preceito, que a redacção dada à alinea a) do artigo 17.° da PL não se afigura muito clara.

Dir-se-á, ainda, e no mesmo plano por assim dizer não constitucional, que a solução dada ao exercício do direito de reserva por parte dos sócios de sociedades comerciais não se mostra inteiramente parificável com a dos contitulares de uma herança indivisa. Se é líquida a similitude de critérios quanto às sociedades civis, desprovidas de personalidade jurídica, a opção feita quanto aos sócios de sociedades de capitais (por quotas e anónimas) terá de ser melhor justificada.

8 — O artigo 20.° da PL consagra uma solução que não poderá ser tida como menos certa. Decorre, exactamente, do princípio da igualdade jurídica.

9 — A audição dos interessados prevista no artigo 27.° respeita os direitos de todos aqueles que são, num plano de legalidade, realmente interessados. E a notificação edital tem, na circunstância, a mesma ope-rância que a notificação pessoal, até porque o acto que é publicitado não tem, por si só, o efeito de afectar desde logo direitos reconhecíveis.

Tudo se passa, aliás, numa fase meramente processual, em que deve haver uma preocupação de urgência, em ordem a normalizar relevantes interesses públicos.

10.1 — Não integra o artigo 29.° da PL um caso de desnacionalização.

E isto, desde logo, porque, ao contrário do que sustentam Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, 1.° vol., 2.a ed., 1984, p. 409), as expropriações efectuadas com base no artigo 97.° da Constituição não estão abrangidas pela limitação do artigo 83.°

Parece mesmo duvidoso que o estejam as «nacionalizações» feitas ao abrigo do Decreto-Lei n.° 407-A/75, de 30 de Julho. De qualquer modo, o artigo 32.° da PL exceptua da aplicação daquele artigo 29.° os prédios neias compreendidos.

A razão que pode abonar a distinção feita na PL será a de que naquele diploma de 30 de Julho de 1975 se nacionalizaram desde logo determinados prédios, praticando-se o acto jurídico «instantâneo» a que alude Katzarov (Théorie de la nationlisation, 1960, p. 227). Isto ao invés do que acontece com as expropriações previstas no Decreto-Lei n.° 406-A/75, que apenas declarou sujeitos a expropriação os prédios rústicos genericamente nele previstos.

Em qualquer dos casos, o que se pretendeu expropriar foram prédios rústicos, e não estruturas empresariais. São neste sentido elucidativos o parecer da Procuradoria-Geral da República n.° 111/80, de 20 de Novembro de 1980 (Boletim do Ministério da Justiça, n.° 306, pp. 88 e segs.), e, em decisiva medida, o parecer da Comissão Constitucional n.° 24/77 (sobretudo a declaração de voto de Isabel Magalhães Colaço).

10.2 — Isto dado como assente, nem se vê como questionar a reversão de prédios rústicos em relação aos quais se terá concluído não se justificar, por razões de interesse público, a apreensão expropriativa.

Repare-se, aliás, que nem sequer se figura um direito dos particulares, mas uma faculdade a exercer pelo Governo. O artigo 29.° é bem claro acerca disso.

III

11 — Colocam ainda os Srs. Deputados recorrentes o problema de nos artigos 14.° e 47.° da PL se restringir o exercício pelos tribunais do seu poder de suspensão da eficácia dos actos administrativos; isso poria em risco a liberdade de decisão e a independência do poder judicial.

Ora, salvo melhor opinião, tal não acontece.

O que a Constituição garante, em relação aos actos administrativos definitivos e executórios, é o recurso contencioso com fundamento em ilegalidade; assegura também o direito ao recurso para o particular obter o reconhecimento de um direito ou interesse legalmente protegido (artigo 268.°, n.° 3).

A suspensão jurisdicional da «executoriedade» ou da «eficácia» do acto administrativo é uma fase processual do recruso contencioso que o tribunal administrativo só poderá conceder se se verificarem alguns requisitos que a lei consigne. Trata-se de uma providência assimilável aos procedimentos cautelares do processo civil. Destina-se a ultrapassar a justiça administrativa au ralenti, na expressão de um autor francês (citado por Sampaio Caramelo, em «Da suspensão da executoriedade dos actos administrativos por decisão dos tribunais administrativos», em O Direito, ano 100.°, 1968, pp. 32 e segs., máxime p. 57). Trata-se, no entanto, de um incidente excepcional (id., p. 60), até porque põe em causa o poder de autoridade da Administração, que se presume ser intencionalizado à prossecução do interesse público.

Dá-se, para mais, o caso de no Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (Decreto-Lei n.° 129/84, de 27 de Abril) nem sequer se definir qual o sistema de suspensão da eficácia dos actos administrativos (n.° 1 do artigo 26.°).

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Foi na Lei de Processo dos Tribunais Administrativos (Decreto-Lei n.° 267/85, de 16 de Julho, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 4/86, de 6 de Janeiro, e pela Lei n.° 12/86, de 21 de Maio) que se precisou o sentido e conteúdo desse meio processual acessório.

O disposto no n.° 2 do artigo 14.° da PL tem inúmeros precedentes no nosso ordenamento jurídico. O artigo 47.° também não é susceptível de censura, podendo, quando muito, sem alteração de conteúdo, ser beneficiado quanto à forma. É evidente que a lei pode condicionar, com maior ou menor amplitude, a prevalência do interesse particular sobre o interesse público que à Administração cabe prosseguir.

12 — Diversa questão será a dos novos meios de tutela dos direitos que a Constituição comporta.

Os actos administrativos praticados terão de visar a prossecução do interesse público, «no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos» (n.° 1 do artigo 266.° da Constituição).

Como toda a actividade pública, a Administração está subordinada à Constituição, e a ofensa desta por um acto administrativo integra o vício de violação de lei (Freitas do Amaral, Direito Administrativo, n, 1984, p. 263).

Mais, porém.

Os actos administrativos deverão ter subjacentes os princípios da justiça, da imparcialidade e da igualdade (artigos 266.°, n.° 2, e ¡3.° da Constituição).

Um acto administrativo pode ser susceptível de anulação contenciosa não apenas pelos fundamentos tradicionais, como pela violação desses princípios; por ser, em sentido amplo, injusto.

Para Freitas do Amaral, a injustiça do acto administrativo, em que se poderá basear um recurso contencioso, revestirá três modalidades:

a) Violação do princípio da justiça, em sentido estrito (n.° 2 do artigo 266.°): o acto será ilegal quando impuser ao particular, seu destinatário, um sacrifício de direitos infundado ou desnecessário, ou quando resultar do uso de dolo ou má fé por parte da Administração;

b) Violação do princípio da igualdade (artigo 13.°): havendo igualdade de situações, a Administração tem de lhes dar tratamento igual;

c) Violação do princípio da proporcionalidade (n.° 2 do artigo 272.°).

Até 1976, um acto injusto não era nunca um acto ilegal sindicável pelos tribunais.

«Agora já não é assim. Por força do princípio da justiça [...], o acto (discricionário) injusto é um acto ilegal, ferido de violação da lei, e como tai pode ser impugnado perante os tribunais do contencioso administrativo, e por eles anulado.» (Freitas do Amaral, «Direitos fundamentais dos administrados», em Nos Dez Anos da Constituição, 1987, máxime p. 21.)

13 — Quer isto dizer que o complexo ce mecanismos de tutela dos cidadãos está ampliado e antagónica do interesse público resultaria, por certo, uma utilização excessiva, numa área em que tudo aponta para uma urgente normalização, de um incidente acessório e tendencialmente excepcional, como é o da suspensão da eficácia dos actos administrativos.

Aliás, o regime do artigo 47.° da PL (cuja redacção, repetimos, se nos afigura menos feliz, sem prejuízo da pertinência do seu conteúdo), é contrabalançado, quanto ao periculum in mora, pelo do n.° 2 do artigo 14.° da PL.

IV

14 — Tem-se, pois, que o recurso interposto pelos Srs. Deputados do PCP deve improceder, já que a proposta de lei n.° 31/V — Lei de Bases da Reforma Agrária — parece não violar a Constituição.

E o que se fundamentou valerá também para o recurso interposto pelos Srs. Deputados da ID, que se limitam a invocar alguns preceitos constitucionais sem justificarem a sua ofensa.

Conclui-se, assim, que a aludida proposta de lei foi correctamente admitida.

Palácio de São Bento, 18 de Março de 1988. — O Relator e Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Mário Raposo.

Nota. — Este parecer foi aprovado com votos a favor do PSD, votos contra dos partidos que interpuseram recurso e a abstenção com reserva de voto do PS.

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos Interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei n.° 32/V (autoriza o Governo a aprovar o regime geral de arrendamento rural).

1.1 — Fundamentam-se os dois recursos na violação do n.° 2 do artigo 168.° da Constituição. Explicitam os Srs. Deputados do PCP que a proposta de lei «não define no seu artigo 1.° o sentido da autorização».

1.2 — Dispõe aquele n.° 2 do artigo 168.°:

As leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada.

É óbvia a razão de ser do preceito. Atribuindo ao Governo competência (própria) para legislar sobre matérias que são da sua competência reservada, não deve a Assembleia da República passar um «cheque em branco», ficando no desconhecimento total do modo como a autorização irá ser utilizada.

A confiança parlamentar no bom uso da competência que atribui ao Governo deve ser motivada. Isto até porque não ocorre uma transferência de poderes ou uma delegação de competências, mas a atribuição de uma competência própria ao Governo para uma matéria específica, de entre as listadas no n.° 1 do artigo 168.°

Importa que a Assembleia da República actue com conhecimento de causa, de antemão sabendo como e guando irá actuar o Governo. Daí as condicionantes consignadas no n.° 2 desse mesmo preceito constitucional.

2 — Acontece, entretanto, que a vida não é apenas forma; é, sobretudo, realidade.

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Ora, o Governo, para além de apresentar a proposta de lei precedida de uma breve exposição de motivos, elucidativa do sentido global, da intencionalidade decisiva do decreto-lei constituendo, a ela aditou o texto do mesmo decreto-lei.

Claro está que o decreto-lei não faz parte integrante, numa acepção formal, da proposta de lei. Mas a transposição, para aqui, do velho brocardo de que «o que não está nos autos não está no mundo», ter-se-ia como demasiado simplística.

É evidente que o Governo não utilizaria a autorização legislativa em sentido substancialmente diverso do que resulta desse projecto de decreto-lei; quando muito, poderá nele introduzir alguma alteração pontual, não essencialmente significativa.

3 — E, quando, por absurdo, assim não acontecesse, sempre poderia a Assembleia da República lançar mão dos poderes que lhe advêm do artigo 172.° da Constituição; «[...] apesar da autorização da AR, os decre-tos-leis autorizados estão igualmente sujeitos ao regime de apreciação parlamentar dos decretos-leis prevista no artigo 172.°, podendo, pois, ser imediatamente revogados ou alterados pela AR» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.° vol., 2." ed., 1985, p. 206).

4 — Como, aliás, se verá, não deixará o debate parlamentar de incidir sobre as opções caracterizadamente assumidas pelo Governo e que constam do decreto-lei constituendo.

Entre elas contar-se-ão, por certo, logo no que respeita aos primeiros preceitos do futuro diploma:

a) A supressão do âmbito do «arrendamento rural» do arrendamento para fins de exploração florestal (artigo 1064.° do Código Civil, artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 201/75, de 15 de Abril, e artigo 1." da Lei n.° 76/77, de 29 de Setembro);

b) Exigência, em qualquer caso, de forma escrita, numa retoma do critério do n.° 1 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 201/75;

c) Alargamento do prazo inicial da generalidade dos arrendamentos rurais para dez anos, ao invés do que dispunha o Código Civil (artigo 1065.°) e aqueles dois decretos-leis;

d) Melhoria do estatuto dos arrendamentos ao agricultor autónomo, em confronto com o regime do artigo 6.° da Lei n.° 76/77.

5 — Aduziram-se estes exemplos com mero propósito de amostragem e para denotar que, não obstante não ocorrer uma recepção do decreto-lei constituendo na proposta de lei, a Assembleia da República poderá debater, em consciência, as opções do Governo e conceder-lhe ou não a solicitada autorização legislativa.

6 — Tudo visto, afigura-se que aos Srs. Deputados recorrentes não assiste razão, pelo que os seus recursos deverão improceder.

A proposta de lei foi correctamente admitida e deve subir a Plenário.

Palácio de São Bento, 18 de Março de 1988. — O Relator e Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Mário Raposo.

Nota. — Este parecer foi aprovado com votos a favor do PSD, votos contra dos partidos que interpuseram recurso e a abstenção do PS.

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre os recursos Interpostos pelo PCP e pela ID quanto à admissão da proposta de lei n.° 33/V (autoriza o Governo a aprovar as bases gerais do emparcelamento e fraccionamento dos prédios rústicos e de exploração agrícolas).

1.1 — Reside a inconformidade dos Srs. Deputados recorrentes na alegada preterição do disposto no n.° 2 do artigo 168.° da Constituição; ao que se vê do requerimento dos Srs. Deputados do PCP, a proposta de lei «não define o sentido da autorização».

Como já tivemos ocasião de, com algum detalhe, explicitar no parecer desta Comissão Parlamentar sobre os recursos interpostos da proposta de lei n.° 32/V (arrendamento rural), aquele n.° 2 do artigo 168.° está intencionalizado a permitir que a Assembleia da República, ao conferir ao Governo poderes para legislar sobre uma matéria da sua competência reservada, o faça com conhecimento de causa. A Assembleia da República deve saber como e quando irá legislar o Governo.

1.2 — Só que, na presente situação, o Governo não apenas fez preceder a proposta de lei de uma extensa e particularizante exposição de motivos, como aditou àquela o próprio texto do diploma constituendo.

Não sendo este parte integrante da proposta de lei, não poderá, no entanto, ser ignorado. O Governo não escamoteou à apreciação parlamentar o que pensa fazer sobre a matéria, ou, melhor, o que sobre ela já fez.

Um rigorismo excessivo seria, na circunstância, inadequado, até porque, se o futuro viesse demonstrar que o Governo teria iludido a expectativa parlamentar, poder-se-ia lançar mão dos mecanismos previstos no artigo 172.° da Constituição.

2 — Afigura-se ainda de assinalar que a correcta concretização de uma política agrícola impõe que se estabeleça o quadro em que se poderá processar o redimensionamento da propriedade rústica e da empresa agrícola. Designadamente, ao artigo 97.° da Constituição e ao artigo 75.° da Lei n.° 77/77, nunca se seguiu uma legislação que viesse substituir a de 1962.

O debate parlamentar é, pois, possível com a maior amplitude — e necessário, com a maior urgência.

3 — Pelo que assim se deixa fundamentado, conclui-se que os recursos deverão improceder.

O Governo observou o n.° 2 do artigo 168.° da Constituição e a proposta de lei está em condições de subir ao Plenário.

O Relator e Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, Mário Raposo.

Nota. — Este parecer teve votação idêntica à do parecer relativo à proposta de lei anterior.

Parecer e texto final da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o projecto de lei n.° 179A/ (reabilita-

Nos termos do Regimento da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias,

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especialmente os seus artigos 21.°, n.° 2, alínea b), e 22.°, cumpre emitir parecer sobre o projecto de lei n.° 179/V.

0 projecto de lei em causa visa a reintegração, a título póstumo, no quadro do Ministério dos Negócios Estrangeiros do cônsul Aristides de Sousa Mendes, a quem foi aplicada, no ano de 1940, a pena disciplinar de um ano de inactividade, com perda de metade dos seus vencimentos, seguida da sua aposentação compulsiva.

Os elementos de facto que constituem a moldura do caso e que foi possível apurar são essencialmente os que a seguir, resumidamente, se descrevem:

1 — Aristides de Sousa Mendes foi nomeado cônsul de Portugal em Bordéus e encontrava-se no exercício das sus funções quando, em 1940, se deu a invasão da França pelas tropas nazis e a subsequente ocupação da maior parte do território francês pelas forças invasoras.

2 — Bordéus, cidade onde Aristides de Sousa Mendes exercia as suas funções consulares, situava-se exactamente na zona de ocupação militar nazi.

3 — Perante o quadro de perseguição que desde logo se iniciou, Aristides de Sousa Mendes tomou a iniciativa de conceder numerosos vistos — milhares de vistos — a refugiados judeus (e não só) que procuravam, por todos os meios, subtrair-se à deportação e ao extermínio desencadeados pelos nazis.

4 — A sua corajosa atitude tornou possível a efectiva saída de França de outras tantas vidas, que só por esse facto puderam escapar aos horrores dos campos de concentração e do que veio a ser a morte organizada num holocausto sem precedentes.

5 — Foi-lhe concedida por S. Ex.a o Sr. Presidente da República, a título póstumo, a Ordem da Liberdade.

Parece oportuno recordar que Portugal então permanecia em paz e que, por isso, milhares de pessoas dos países ocupados pelos nazis encontravam no nosso país refúgio e acolhimento.

Esse facto mereceu, na altura, o reconhecimento internacional e a gradidão desses refugiados, o que a propaganda oficial de então repetidamente salientava.

É por isso que nem sequer se entende a severidade da punição aplicada a quem agiu, afinal, norteado pelos mesmos princípios de que as autoridades de então se autoproclamavam defensoras.

Aristides de Sousa Mendes agiu, portanto, determinado pelas mais altas razões humanitárias e de respeito pelos mais elementares direitos humanos.

Ainda que se pudesse entender que, no plano formal, o comportamento do cônsul Aristides de Sousa Mendes tenham constituído efectiva infracção disciplinar, um facto permanece: é que as circunstâncias singulares e sem paralelo em que agiu nem tinham nem podem constituir precedente para qualquer outro caso, devendo entender-se que essas excepcionalíssimas circunstâncias são justificativas do facto.

Conclusão

O projecto de lei n.° 179/V encontra-se em condições de subir a Plenário.

Palácio de São Bento, 16 de Março de 1988. — O Presidente da Comissão, Mário Raposo. — O Relator, Leonardo Ribeiro de Almeida.

Texto final

Artigo 1.° Nos termos da lei, será reintegrado na carreira diplomática, a título póstumo, o ex-cônsul-geral de Portugal em Bordéus Aristides de Sousa Mendes.

Art. 2.° A reintegração referida no número anterior será feita em categoria nunca inferior àquela a que o cidadão em causa teria direito se sobre o mesmo não tivesse impendido a sua demissão compulsiva.

Art. 3.° Será devida indemnização reparadora aos herdeiros directos, calculada nos termos da legislação aplicável.

Palácio de São Bento, 16 de Março de 1988. — O Presidente da Comissão, Mário Raposo.

Nota. — O parecer e o texto final foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.° 207/V

ELEVAÇÃO 0A FREGUESIA DE CACIA A CATEGORIA DE VILA Cacia lusoromana

O geógrafo Gaspar Barreiros (1561), referindo-se a Cacia, diz que «nas Ribeiras do Vouga se hajam vestígios antigos [... ] e que na memória dos homês ficou fama de hüs em outros chegavam navios da foz do mar, porque ainda ali se acharam pedaços deles & anchoras iuncto da dieta torre em hüa lagoa afora muitos vestígios & ruínas d'argamassa que dentro do seu âmbito cõprehende hüa milha pouco mais ou menos».

Em 1930, o distinto arqueólogo aveirense Dr. Alberto Souto, em visita de rotina a uma exploração saibreira no sítio da Torre, junto à igreja matriz, no local referenciado por Gaspar Barreiros, veio a confirmar a notícia deixada por este célebre geógrafo. E no seu livro A Estação Arquelógica de Cacia Alberto Souto regista textualmente o seguinte:

Surgiu-me cerâmica doméstica de qualidade e forma vária, mas alguns pedaços de colo de ânfora, misturados com tegulae, fmbrices e tijolo, restos de cozinha, ossos de caça, cascas de moluscos e uma grande extensão de cinzas e carvão, mostraram-me que ali existira um povoado importante e não apenas uma vila [...] que constituía uma estação arqueológica luso-romana até aí não identificada, embora indicada, nas margens do baixo Vouga.

O sítio chama-se a Torre e dali se tem desenterrado há muitos anos, louça, âncoras, ferragens, moedas de ouro, prata e cobre, mós manuárias, restos de esqueletos humanos, etc.

[...] A Civilização romana passara por ali e por ali deixara vestígios indeléveis.

No Museu Nacional de Aveiro estão devidamente guardadas as peças arqueológicas encontradas nas sai-breiras da Torre. Algumas moedas existentes e também lá desenterradas estão na mão dos coleccionadores.

Cacia na nacionalidade

A freguesia de Cacia está situada na margem esquerda do Vouga, a 6 km de Aveiro (sede do con-

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celho), e tem hoje aproximadamente 6000 habitantes, distribuídos por 1500 fogos. Compõe-se dos lugares de Cacia, Sarrazola, Póvoa, Quinta do Loureiro, Vilarinho e Testada.

No lugar de Vilarinho (>Vilares)Vila), que alguns defendem ser a Cacia pré-romana, existe a família Couceiro da Costa, detentora do título «Morgado de Vilarinho», instituído em 19 de Agosto de 1445, cujos respectivos solar e brasão se encontram ainda bem conservados.

Metade de Cacia pertenceu ao Mosteiro de Lorvão por doação do conde D. Henrique e de D. Teresa por carta de 24 de Janeiro de 1076. Muitos outros documentos medievais se lhe referem.

«Foi Vila e pertencia ao concelho de Esgueira e foi Comenda da Ordem de Cristo [...]. O povoamento do território desta freguesia parece ser de épocas pré--romanas. De facto, entre Cacia e Esgueira existiu uma edificação dolménica, a qual é citada no documento henriquino-teresiano de 1076 da Era Cristã.» (Enciclopédia Luso-Brasileira.)

Cacia no antigo recente e na actualidade

Até meados do presente século, o povo desta região caciense vivia da agricultura, da criação de gado bovino e cavalar, da pesca e da caça. O comércio era reduzido e a indústria era nula. Muitos dos seus filhos emigravam para o Brasil ou América e alguns para as nossas colónias africanas. Outros procuravam na indústria da panificação melhorar a sua vida, conseguindo alguns mais afortunados singrar de maneira notável. O motivo da emigração baseava-se mais no desejo de fugir ao esforço agrícola e à melhoria do seu pé-de-meia que propriamente a qualquer necessidade de sobrevivência, pois que toda esta região é muito farta em pastagens, arroz e cereais.

«É região fertilíssima, extremamente pitoresca, muito cortada por canais do Vouga, que dominam a paisagem e a transformam na Holanda portuguesa.» (Enciclopédia Luso-Brasileira.)

E ainda hoje, não obstante o surto da instalação no seu termo de muitas indústrias, algumas grandemente poderosas, o povo autóctone continua numa actividade agrícola que lhe permite ter completa auto-suficiência alimentar em carne, leite, cereais e hortaliça.

É fácil constatar esta abundância no comércio que se realiza no seu concorrido mercado semanal.

A partir do final da década de 40, a comunidade de Cacia viu-se autenticamente «invadida» por indústrias que arrastaram consigo centenas e centenas de operários e técnicos oriundos dos mais diversos pontos do País e que nesta freguesia se radicaram e constituíram família.

A primeira grande indústria a instalar-se em Cacia foi a Companhia Portuguesa de Celulose, que criou, logo de início, mais de 1000 postos de trabalho; esta e a Fábrica de Automóveis Portugueses e, mais tarde, a indústria francesa de automóveis Renault, com a sua associada fábrica de fundição FUNFRAP, ao criarem milhares de postos de trabalho, vieram, só por si, contribuir para um contínuo desenvolvimento de outras indústrias, como construção civil, metalo-mecânica, oficinas de reparações, madeiras, camionagem, etc. Muitas outras aqui se foram instalando e hoje Cacia é um centro comercial e industrial de grande importância no concelho e distrito de Aveiro.

Servindo-nos de um estudo feito há três anos por dois universitários intitulado «Cacia — Estudo Sócio--económico», extraímos os seguintes números estatísticos:

Actividades económicas colectadas nas finanças entre 1980 e 1984

Serviços ................................. 55

Comércio................................ 95

Construção civil.......................... 36

Fábricas................................. 12

Hotel...................................._\_

_199

Trabalhadores por conta própria e conta de outrem, por ramo de actividade

Agricultura............................... 332

Indústrias transformadoras................. 1 035

Alimentação e bebidas.................... 27

Indústria têxtil, vestuário e couro.......... 16

Indústria de madeiras..................... 17

Indústria de papel........................ 640

Indústrias metalúrgicas.................... 222

Construção e obras públicas............... 106

Comércio e restaurantes................... 139

Transporte, armazenagem e comunicações... 100

Serviço à colectividade e administração pública 93

Outras actividades........................ 349

3 076

Nota. — Não estão incluídos o pessoal doméstico e as «donas de casa».

A freguesia de Cacia dispõe hoje de todas as condições previstas no artigo 12.° da Lei n.° 11/82, de 2 de Jbnho, para ser elevada à categoria de vila.

Assim:

Nos cadernos de recenseamento eleitoral estão ins-' critos 4981 eleitores.

a) Tem posto de assistência médica instalado na casa do povo; quatro consultórios médicos; um laboratório de análises médicas;

b) Tem farmácia;

c) Casa do povo e salão paroquial, com instalações para espectáculos; centro de alegria no trabalho; dois pequenos parques infantis; rinque de patinagem; três ranchos folclóricos (da casa do povo, do Rio Novo do Príncipe e as Lavadeiras de Serrazola); associações culturais, e desportivas ou recreaticas [APROCRED, Estreia Azul (esta dispondo de campo de futebol federativo) e AVECELCA e uma associação de veteranos da Celulose]; corpo de bombeiros da PORTU-CEL/Cacia, ao serviço da comunidade;

¿0 Transportes públicos: linha do caminho de ferro do Norte; carreiras de camionetas de empresa particular a ligar Cacia a Aveiro, com passagem por todos os lugares da freguesia; carreiras entre a cidade de Aveiro e o Porto; carreiras em autocarros camarários entre Aveiro e Cacia; praça de táxis dispondo de dois elementos;

e) Estação dos CTT instalada em edifício construído para esse fim;

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f) Estabelecimentos comerciais: padarias, cafetarias, mercearias, mini-mercados, casas de pasto e restaurantes, um hotel, além de carpintarias, móveis, aparelhos electro-domésticos, livraria e papelaria, decorações, etc;

g) A freguesia dispõe de sete edifícios escolares, seis dos quais em funcionamento, de construção adequada e em bom estado de conservação, sendo alguns de recente construção;

h) Tem agência bancária em boas condições e agentes bancários.

Nestes termos, os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do CDS, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo único. — É elevada à categoria de vila a freguesia de Cacia, no concelho de Aveiro.

Palácio de São Bento, 18 de Março de 1988. — Os Deputados do CDS: Narana Coissoró — Adriano Moreira — Nogueira de Brito — Basílio Horta.

PROJECTO DE LEI N.° 208/V

ELEVAÇÃO A VILA DA FREGUESIA DA CARAPINHEIRA

As terras da Carapinheira cedo foram povoadas. Atestam o facto as localidades de Bandurreira e as vilas pré-nacionais de Lavariz e Alhastro.

Bandurreira, no apelativo originário, deriva de Banda Redicus, divindade lusitano-romana, e Lavariz foi a Villa Locrici de Leodericus.

Mas, na origem do desenvolvimento da Carapinheira está a vila de Oleastro, que ainda hoje se encontra à cabeça de todas as povoações que constituem a freguesia, com a designação de Alhastro.

Oleastro resulta de oleastrum, planta da família das oleaginosas Olea europea oleaster, variedade de oliveira abundante na região.

Efectivamente, a vila de Oleastro pertenceu a Rodrigues Abulmundar Moçárabe, que no ano de 954 da era cristã a doou ao abade Teodorico, do Mosteiro do Lorvão, conforme reza o seu testamento. D. Sisnando, grande senhor de Tentúgal e conde de Coimbra, veio a herdar esta vila, que mais tarde, já em 1034, Gonçalo Trastamires conquistou aos Árabes, agora com a designação de Albiaster.

Porém, só em 1064 Fernando Magno a coloca definitivamente nas mãos dos Cristãos, passando então a chamar-se Olastro e mais tarde Oleastrelo e, por fim, Alhastro.

Tal foi o seu desenvolvimento que D. Afonso III, em 26 de Setembro de 1265, lhe concedeu foral em parceria com a Póvoa de Santa Cristina. Já em 22 de Abril de 1288 o Alhastro foi doado ao Mosteiro de Santa Cruz.

Porém, em redor do Alhastro foram-se desenvolvendo muitos casais e quintas na Idade Média, constituindo a paróquia de São Miguel de Montemor.

Ao mesmo tempo e à sombra da Ordem de Malta, a norte, cresceu e prosperou a paróquia de Ribeira de Moinhos, sufragánea da de São Miguel, que por volta de 1614 obteve a sua independência e tinha igreja junto à Quinta da Ordem de Malta, sob a protecção de São Paio de Coimbra.

Mas, porque a ocupação das terras.para o sul fosse uma constante e a população aumentasse com a exploração dos campos do Mondego, a freguesia de São Miguel foi desmembrada e fundada a nova freguesia de Carapinheira, assim chamada por ter sido levantado naquele local, por ser central, o novo templo para o culto. Nascia assim a Carapinheira, que englobou a antiga vila de Oleastro e a paróquia da Ribeira de Moinhos.

Em 1720 construiu-se a igreja da Carapinheira, que ainda hoje existe, em louvor a Santa Susana, sendo o maior templo cristão do concelho de Montemor-o--Velho. É um templo de traça neoclássica elegante, que tem no seu interior uma capela abobadada do século xvii. É ornada de muitas imagens valiosas, distinguindo-se, entre outras, Santa Ana, do século xv, e a célebre imagem de roca de Nossa Senhora das Dores, do século xvm, muito venerada.

Em 1758 o P.e Luís Cardoso designava a freguesia como «a grande freguesia de Carapinheira» no seu dicionário geográfico de Portugal, pois contava nessa época com 385 fogos e 1088 habitantes.

Até 1759 a Carapinheira foi senhorio dos duques de Aveiro, mas, porque os bens desta família foram confiscados nesse ano, passou para a Coroa até 1834, sendo seus donatários os duques de Cadaval.

Em 1789 realizaram-se as primeiras festas em honra de Nossa Senhora das Dores, que ainda hoje perduram com tanto brilho, constituindo também a maior manifestação de fé religiosa do Baixo Mondego.

A 26 de Junho de 1808, a população da Carapinheira mobilizou-se e soube bater-se ao lado de Académico Zagalo, que comandava o 1.° Batalhão Académico, desalojando os franceses do Forte de Santa Catarina da Figueira da Foz.

A 26 de Maio de 1852, a Carapinheira é visitada pela rainha D. Maria II, que, deslocando-se com o seu séquito em direcção à Figueira da Foz, aqui fez paragem e foi recebida com muitas festas e honrarias.

Mas a Carapinheira actual é uma freguesia em franco desenvolvimento.

Implantada precisamente a meia distância entre Coimbra e Figueira da Foz, numa encosta suave e soalheira, a norte da estrada nacional n.° 111, tem a seus pés os mais férteis campos do Mondego.

O «campo da Carapinheira», como é conhecido em todo o Baixo Mondego, produz mais de 5000t de arroz, para além de milho, trigo e até tabaco.

No monte produz vinho e azeite e os mimos, em terrenos de ribeira, que os Carapinheirenses tratam com desvelo e dedicação, começando agora a produção em estufa a dar os primeiros passos.

A par de uma actividade agrícola intensa já mecanizada, também a criação de gado para engorda e a produção de leite e de ovinos são factores importantes de desenvolvimento.

Além de sede do concelho, é a maior freguesia, que nesta data dispõe de plano ordenador de urbanização.

Na verdade, tendo em conta a importância e o desenvolvimento da Carapinheira, a antiga Direcção-Geral do Planeamento Urbanístico, hoje Direcção-Geral do Ordenamento Territorial, já há dez anos considerou a freguesia da Carapinheira centro fulcral de toda a área concelhia, conferindo-lhe, por isso, estatuto especial e dotando-a de um plano de urbanização que tem controlado o seu crescimento.

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II SÉRIE — NÚMERO 59

É ainda a Carapinheira centro fornecedor de mão--de-obra importante para toda a região do Baixo Mondego, possuindo nesta data cerca de 25% da população activa no sector terciário e secundário.

Comercialmente, nenhuma outra freguesia do concelho dispõe de tantos estabelecimentos comerciais (32), para além de uma feira mensal a 26 de cada mês, onde tudo se comercializa, e de um mercado semanal.

É, no entanto, na actividade industrial que a Carapinheira aposta no futuro.

Dispondo já de uma fábrica de malhas, serração de madeiras, diversos construtores de aluminio, serralharias, oficinas de mecânica auto, etc., aguarda, a todo o momento, a instalação, por parte da EDP, de novos abastecimentos de energia junto à estrada nacional n.° 111 capazes de dotar toda a área do parque industrial, a implantar no extremo oeste da freguesia, da energia que lhe é necessária para o arranque.

Possui já a freguesia abastecimento de água, uma escola preparatória e agência bancária, factores indesmentíveis do progresso que nos últimos anos se tem processado.

É ainda na Carapinheira que estão centralizados os serviços de transporte rodoviário que servem a margem direita do Mondego entre Coimbra e Figueira da Foz, dispondo, para tal fim, de um moderno centro coordenador rodoviário.

Mas convém ainda realçar que existe na freguesia um clube desportivo de grandes tradições, já por duas épocas disputando a III Divisão Nacional de Futebol e nesta data bem classificado na I Divisão Distrital de Coimbra.

Sobre o aspecto lúdico, também existe uma discoteca moderna, com restaurante a abrir brevemente, dois ranchos folclóricos e uma banda musical infantil, que constitui o orgulho da juventude local.

A Carapinheira orgulha-se ainda de possuir uma rádio local muito activa e com audição muito elevada em todo o Baixo Mondego.

Mas, a juntar a todos os factores de progresso enumerados, é na Carapinheira que se realizam as afamadas festas religiosas dedicadas a Nossa Senhora das Dores, que em Agosto constituem um cartaz invulgar, não só pela dignidade das suas procissões, como pela diversidade, tradições e colorido do seu programa.

Com uma população que brevemente atingirá os 4000 habitantes, pela integração de duas novas localidades que pretendem juntar-se à freguesia, e perto de 3000 eleitores, a Carapinheira possui a maior densidade populacional do concelho —220 habitantes por quilómetro quadrado— e dispõe ainda de:

Centro de Saúde — extensão do Centro de Saúde

de Montemor-o-Velho; Casa do povo; Escolas primarias (dez salas); Escola preparatória; Ensino pré-primário;

Artesanato de ferro forjado, cestaria, cerâmica e

tanoaria; Automóveis de aluguer; Farmácia; Estação dos CTT; Talhos e padarias; Barbearias;

Associações de seguro mútuo (três); Cafés (quatro);

Restaurantes (três);

Estabelecimentos de venda e reparação de tractores (três); Biblioteca;

Medicina privada (diversos médicos); Posto da GNR (com terreno adquirido e prometido para 1988); Estabelecimentos comerciais (32).

É, ainda, um aglomerado populacional contínuo ao longo da estrada nacional n.° 335 e de ruas paralelas muito elevado (Lavariz, Pelames, Alhastro, Casal do Meio, Carapinheira, Estrada, Boleta, Nobrezos, etc).

Verifica-se, pois, que a povoação da Carapinheira preenche os requisitos da Lei n.° 11/82, de 2 de Junho, para poder ser elevada à categoria de vila.

Nestes termos, os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do CDS, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É elevada à categoria de vila a povoação da Carapinheira, no concelho de Montemor-o-Velho, no distrito de Coimbra.

Palácio de São Bento, 18 de Março de 1988. — Os Deputados do CDS: Narana Coissoró — Adriano Moreira — Nogueira de Brito — Basílio Horta.

Voto n.° 26/V

A 24 de Março comemora-se o Dia Nacional do Estudante.

Trata-se de assinalar uma data que desde 1951 vem adquirindo um particular relevo na afirmação dos direitos e interesses específicos dos estudantes portugueses.

Durante o período da ditadura fascista, milhares de jovens foram detidos, perseguidos ou ameaçados por participarem em acções de elevado significado no combate pela instauração da democracia e da liberdade.

A repressão desencadeada sobre os estudantes em 1962, associada à tentativa de proibição governamental destas comemorações, deu origem a um vastíssimo movimento de protesto estudantil que se estendeu ao longo de vários meses e constituiu a mais significativa «crise académica» verificada durante a ditadura. Desde então, o movimento estudantil fixou 24 de Março como data escolhida para comemorar o Dia do Estudante.

Facto de elevado significado foi a aprovação, no ano passado, pela Assembleia da República da Lei n.° 19/87, de 1 de Julho, que consagra o 24 de Março como Dia Nacional do Estudante. Ao aprovar esta lei, a Assembleia da República procurou contribuir para a dignidade acrescida das comemorações desta data, associando-se ao seu profundo conteúdo democrático e de iniciativa própria dos jovens.

Nestes termos, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados propõem a aprovação do seguinte voto:

Neste ano, em que pela primeira vez se comemora o Dia Nacional do Estudante com pleno acolhimento numa lei da República, a Assembleia da República entende expressar o seu voto de congratulação pela passagem desta data; aproveita esta ocasião para saudar todos os estudantes portugueses e as suas estruturas associativas; formula sinceros votos de êxitos nas suas actividades lectivas e anseios sócio-culturais; pronun-

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24 DE MARÇO DE 1988

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cia-se no sentido de que sejam garantidas as necessárias condições que permitam o pleno êxito das comemorações estudantis.

Assembleia da República, 23 de Março de 1988. — Os Deputados do PCP: Rogério Moreira — Lourdes Hespanhol — José Manuel Mendes — Luísa Amorim.

Aviso

Por despachos de 18 de Fevereiro de 1988 do Presidente da Assembleia da República:

Ana Paula da Silva Pereira e João Rocha de Brito Ricardo — nomeados técnicos profissionais de relações públicas de 2." classe do quadro do pessoal da Assembleia da República, ficando exonerados dos lugares que ocupam actualmente a partir da data da posse. (Visto, TC, 8-3-88. São devidos emolumentos.)

Direcção-Geral dos Serviços Parlamentares, 16 ce Março de 1988. — O Director-Geral, José António G. de Souza Barriga.

Aviso

Por despacho de 22 de Outubro de 1987 do Presidente da Assembleia da República:

Maria Filomena Aveiro Alves — nomeada técnica auxiliar de apoio parlamentar principal do quadro do pessoal da Assembleia da República, ficando exonerada do lugar que ocupa actualmente a partir da data da posse. (Visto, TC, 3-3-88. São devidos emolumentos.)

Direcção-Geral dos Serviços Parlamentares, 16 de Março de 1988. — O Director-Geral, José António G. de Sousa Barriga.

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DIÁRIO

da Assembleia da República

Depósito legal n.º 8819/85

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