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1613 | II Série A - Número 028 | 15 de Janeiro de 2004

 

relevância municipal, restringem-se à "manutenção da tranquilidade pública" e à "protecção das comunidades locais", e são exercidas em cooperação, não em plena autonomia.
Por outro lado, da análise das competências consagradas na lei para os polícias municipais verifica-se que estas não se diferenciam particularmente das estabelecidas para os funcionários públicos em geral: estão obrigados à denúncia nos precisos termos a que o estão os funcionários; os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova que podem praticar até à chegada do órgão de polícia criminal competente não se distinguem das medidas necessárias para impedir o desaparecimento da prova a que se referem os artigos 48.º e 48.º-A do regime geral das contra-ordenações; a competência para detenção é idêntica à de qualquer cidadão; a competência para identificar limita-se a "infractores" e não a "suspeitos". Além disso, renova-se a indicação de que as polícias municipais não estão autorizadas a actuar em matérias relativas à prevenção e à investigação criminal.
Em todo o caso, concede-se o benefício da dúvida à fundamentação apresentada na exposição de motivos: a criação de um estatuto disciplinar próprio poderá ser justificada pelo facto de se tratar de "corpos uniformizados e armados onde a hierarquização de funções assume natural especificidade". Atente-se, porém, que há outros corpos uniformizados e armados, como os guardas florestais, que não dispõem de estatuto disciplinar distinto.
d) Dependência hierárquica directa e coordenação:
Pretende o projecto de lei, no artigo 6.º, n.º 1, que a polícia municipal deixe de ser organizada na dependência hierárquica directa do presidente da câmara.
Por sua vez, no n.º 2 desse artigo, o projecto de lei propõe que a coordenação entre a acção da polícia municipal e as forças de segurança passe ser exercida na área do respectivo município sob a égide do presidente da câmara e já não pelo presidente da câmara e por quem o Governo designar, como prevê a lei actual.
No primeiro caso, a alteração não se afigura, por si, relevante, uma vez que a polícia municipal continuará na dependência hierárquica do presidente, só não o sendo directamente.
No segundo caso, no entanto, a coordenação entre a polícia municipal e as forças de segurança passa agora a ser exercida sob a égide do presidente, mas sem definir a quem é efectivamente atribuída, o que confere uma natureza difusa a essa coordenação e dificulta o seu reconhecimento e responsabilização perante a comunidade local.
Assim, se a polícia municipal deixa de depender directamente do presidente e a coordenação passa a ser efectuada sob o "escudo" do presidente, este parece pairar num estádio superior, sem interferência directa num assunto com a importância da tranquilidade pública e da protecção da comunidade local.
Mas o projecto de lei ao eliminar a dualidade da coordenação entre as polícias municipais e as forças de segurança estará a afastar-se da letra e do espírito do n.º 3 do artigo 237.º da Constituição.
Com efeito, a Constituição fala de "cooperação", o que pressupõe uma actuação articulada, em paridade, entre a polícia municipal e as forças de segurança, designadamente no sentido da necessária articulação entre os interesses locais, que estão cometidos ao município, e os nacionais, que competem ao Governo.
Entre as polícias municipais e as várias polícias nacionais que constituem as forças de segurança, integradas em administrações distintas, a local e a central, não há qualquer relação de hierarquia ou de superintendência.
Deste modo, dificilmente se pode admitir que entidades ou órgãos da administração local tenham, por si só, poderes de coordenação de forças de segurança que estão hierarquicamente dependentes do governo central e prosseguem objectivos de âmbito mais vasto do que os de inspiração local.
No sector da segurança os interesses que se perseguem não são exclusivamente da administração local, nem se podem desligar dos interesses nacionais no seu conjunto, exigindo, antes, uma articulação de modo transversal entre as várias polícias, as várias comunidades locais e a comunidade nacional.
Ora, competindo ao Governo o exercício de funções de segurança interna a nível nacional, estando obrigado a exercê-las se o município o não fizer ou não dispuser de polícia municipal, e cabendo-lhe, em última instância, a responsabilidade política nesta matéria, é evidente que apenas este está em condições de assegurar a articulação dos diversos interesses concorrentes e, em última análise, de garantir a plena autoridade do Estado.
Idêntico entendimento é patenteado por Catarina Sarmento e Castro, na monografia anteriormente citada, ao afirmar: "No caso das competências em matéria de segurança não é de prossecução absolutamente autónoma que se trata. É de prossecução em cooperação. O que significa, no fundo, que afastada a relação de superintendência, entre administração estadual e administração autónoma em matéria de polícia, sempre resta, a coberto do princípio da cooperação, uma certa supremacia estadual, revelada, aliás, nas especiais relações de controlo que se estabelecem nesta matéria" - Castro, Catarina Sarmento, A questão das Polícias Municipais, Coimbra Editora, p. 333.
Assim, a cooperação implica a existência da dualidade da coordenação entre o poder local e o poder central. A haver qualquer espécie de supremacia, aliás indesejável, ela não poderia deixar de ser atribuída ao Estado, a quem compete a responsabilidade global e final pela segurança. Mas o texto constitucional parece simpatizar e obrigar, sobretudo, a uma coordenação igualitária entre Estado e autarquias.
e) Considerações finais:
Algumas das alterações propostas padecem de dificuldades de compatibilização com o texto constitucional, carecendo de reavaliação em sede de discussão na especialidade. Mesmo que se conclua pela sua viabilidade constitucional, é aconselhável um esforço suplementar de densificação das mesmas no sentido da sua clarificação. Isso tem maior premência no tocante à caracterização das polícias municipais (hierarquia e agentes) como órgãos de polícia criminal, à actuação das polícias municipais fora dos limites da sua área municipal e aos mecanismos de coordenação entre a Administração Central e a administração local.
De resto, refira-se que a revisão do regime das polícias municipais deveria ocorrer tendo como base não a data de entrada em vigor da Lei n.º 140/99, mas a análise da sua experiência concreta.

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