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Terça-feira, 8 de janeiro de 2019 II Série-A — Número 42
XIII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2018-2019)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 885, 927, 937, 938 e 966/XIII/3.ª e 1061 a 1066/XIII/4.ª):
N.º 885/XIII/3.ª (Impede a comercialização e a utilização de medicamentos veterinários, de uso pecuário, contendo diclofenac): — Alteração do texto do projeto de lei.
N.º 927/XIII/3.ª [Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro)]. — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 937/XIII/3.ª (Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os alimentos geneticamente modificados): — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 938/XIII/3.ª [Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas (OGM)]: — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 966/XIII/3.ª (Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-incêndio): — Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio.
N.º 1061/XIII/4.ª (CDS-PP) — Implementa um programa de redução da utilização de microplásticos em cosméticos e produtos de higiene e limpeza.
N.º 1062/XIII/4.ª (PAN) — Regulamenta o uso adulto da canábis.
N.º 1063/XIII/4.ª (PAN) — Melhoria das condições de Saúde, em ambiente laboral, das Forças e Serviços de Segurança.
N.º 1064/XIII/4.ª (PAN) — Cria um Observatório na Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens para monitorização do cumprimento das obrigações impostas pela Convenção dos Direitos da Criança.
N.º 1065/XIII/4.ª (PSD) — Lei de Bases da Saúde.
N.º 1066/XIII/4.ª (CDS-PP) — Lei de Bases da Saúde. Projetos de Resolução (n.os 1928 a 1930/XIII/4.ª):
N.º 1928/XIII/4.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo a adoção de plano de ação de contingência para minimizar os efeitos e consequências de uma saída desordenada do Reino Unido da União Europeia: — Texto inicial do projeto de resolução. — Alteração do texto inicial do projeto de resolução.
N.º 1929/XIII/4.ª (BE) — Medidas de despoluição, proteção e valorização ambiental da Pateira de Fermentelos, Requeixo e Carregal e do rio Cértima.
N.º 1930/XIII/4.ª (Presidente da AR) — Deslocação do Presidente da República ao Panamá:
— Texto do projeto de resolução e mensagem do Presidente da República.
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PROJETO DE LEI N.º 885/XIII/3.ª (*)
(IMPEDE A COMERCIALIZAÇÃO E A UTILIZAÇÃO DE MEDICAMENTOS VETERINÁRIOS, DE USO
PECUÁRIO, CONTENDO DICLOFENAC)
O diclofenac, cuja composição química é C14H11Cl2NO2, constitui um anti-inflamatório não esteroide,
largamente utilizado desde a década de 60, com ação essencialmente analgésica e anti-inflamatória, e cujo
fármaco mais amplamente conhecido é dado pelo nome Voltaren. A sua utilização é bastante generalizada tanto
ao nível humano como veterinário.
Ocorre que a utilização de diclofenac como princípio ativo em medicamentos veterinários, nomeadamente
de utilização pecuária, tem-se revelado letal para as aves necrófagas, a uma dimensão preocupante na Ásia.
Na Índia, entre 1992 e 2007, a presença deste fármaco em menos de 1% dos cadáveres de gado predado
por diversos grupos de abutres e águias levou ao declínio das suas populações em mais de 97%, segundo
relatórios de algumas organizações não-governamentais de ambiente, o que levou à necessidade de banir
aquela substância para os casos em causa. Existem estudos científicos que relacionam diretamente o uso do
fármaco em gado com a morte de aves necrófagas.
Com efeito, nomeadamente, abutres e águias do género Aquila alimentam-se de cadáveres de gado
medicado com diclofenac e acabam por morrer num curto espaço de tempo, pois aquela substância atinge o
seu sistema renal provocando insuficiência renal aguda. Este fármaco persiste nas carcaças de gado, com
efeitos letais para os que deles se alimentam, pelo menos até dois dias após morte daqueles.
Apesar de ter sido banido da Índia pelas autoridades governamentais, devido ao seu impacto nas aves
necrófagas, o diclofenac está atualmente autorizado em diversos países da Europa, nomeadamente Espanha e
Itália, e prepara-se para ser autorizada a sua comercialização e utilização no nosso país. Uma autorização neste
sentido constituiria uma ameaça a componentes importantes da nossa biodiversidade, de espécies em concreto.
Esta é uma situação preocupante, ainda para mais quando as espécies em causa apresentam estatuto
sensível pelo Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. Falamos de espécies quase ameaçadas como o grifo
(Gyps fulvus), de espécies em perigo como o abutre do Egito (Neophron percnopterus ) e a águia real (Aquila
chrysaetus), ou de espécies criticamente em perigo como o abutre negro (Aegypios monachus) e a águia
imperial ibérica (Aquila adalberti).
São espécies que no nosso País têm sido alvo de programas de recuperação das suas populações,
nomeadamente programas comunitários como os projetos Life. Recentemente observámos algum sucesso na
nidificação e na reprodução do abutre negro e da águia imperial, espécies extremamente sensíveis e cujas
populações têm estado em declínio.
Por estas razões, torna-se imperioso impedir a utilização de medicamentos veterinários e pecuários,
contendo diclofenac no nosso País, até porque existe uma variada gama alternativa de medicamentos sem os
efeitos referidos nas aves em causa.
As responsabilidades de Portugal, que ratificou convenções internacionais tão relevantes como a Convenção
sobre a Diversidade Biológica ou a Convenção sobre a Conservação de Espécies Migradoras pertencentes à
Fauna Selvagem, impõem-nos medidas que erradiquem perigos e que preservem espécies sensíveis e
ameaçadas.
É com esse objetivo que, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo
Parlamentar de Os Verdes apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei impede a utilização de fármacos de aplicação veterinária pecuária que contenham o princípio
ativo diclofenac, de modo a preservar e a recuperar componentes importantes de biodiversidade.
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Artigo 2.º
Definições
Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) «Diclofenac» – princípio ativo, utilizado em medicamentos, cuja composição química é C14H11Cl2NO2;
b) «Medicamento veterinário» – fármaco utilizado para tratamento de animais;
c) «Gado» – animais domésticos criados para alimentação humana ou para trabalho, englobando espécies
bovinas, equinas, ovinas, caprinas e asininas;
d) «Ave necrófaga» – espécies da avifauna, pertence à família Accipitiridae, que se alimentam
frequentemente de cadáveres de animais.
Artigo 3.º
Princípio geral
É proibida a utilização, comercialização e fabrico, em território nacional, de medicamentos veterinários para
uso pecuário que contenham diclofenac ou substâncias ativas análogas que possam ser precursoras do
diclofenac.
Artigo 4.º
Informação e sensibilização
Cabe à Direção Geral de Alimentação e Veterinária, adiante designada por DGAV, proceder à divulgação de
informação, designadamente junto da Ordem dos Veterinários e dos criadores de gado, sobre as alternativas ao
diclofenac e sobre os perigos da utilização de medicamento veterinário contendo o princípio ativo diclofenac.
Artigo 5.º
Fiscalização e apuramento de ocorrências
1 – Compete à DGAV assegurar a fiscalização do cumprimento das disposições contidas na presente lei.
2 – No caso de a DGAV detetar o uso ilícito de medicamentos veterinários, em pecuária, deve reportar a
situação ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, adiante designado por ICNF.
3 – O ICNF elabora e publicita um registo de ocorrências de mortes de aves necrófagas resultante da ingestão
de alimento contendo diclofenac.
Artigo 6.º
Contraordenações
1 – A violação do artigo 3.º do presente diploma constitui contraordenação punível com coima de € 1250 a €
3750, no caso de responsabilidade de pessoa singular, e de € 3500 a € 10 500, em caso de responsabilidade
de pessoa coletiva.
2 – O produto das coimas é distribuído da seguinte forma:
a) 60% para o Estado;
b) 40% para a DGAV.
Artigo 7.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
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Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 22 de maio de 2018.
Os Deputados de Os Verdes: Heloísa Apolónia — José Luís Ferreira.
(*)Texto inicial substituído a pedido do autor em 8 de janeiro de 2019 [Vide DAR II Série-A N.º 117 (2018.05.22)].
————
PROJETO DE LEI N.º 927/XIII/3.ª
[PROÍBE A PRODUÇÃO E O CULTIVO COMERCIAL DE ORGANISMOS GENETICAMENTE
MODIFICADOS (REVOGA O DECRETO-LEI N.º 72/2003, DE 10 DE ABRIL, E O DECRETO-LEI N.º
160/2005, DE 21 DE SETEMBRO)]
Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio
Parecer
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião do Deputado Autor do Parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV- Anexos
PARTE I – CONSIDERANDOS
1– Introdução
O Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª, «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos geneticamente
modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de
setembro)», deu entrada na Assembleia da República a 20 de junho de 2018, subscrito pelo Deputado único
representante do Partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da
Constituição da República Portuguesa (Constituição) e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da
República (RAR).
Foi admitido e baixou à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª) a 21 de junho, por despacho de S. Ex.ª o
Presidente da Assembleia da República, tendo sido, nesse mesmo dia, anunciado em sessão plenária.
2 – Objeto e Motivação
Com o Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª o PAN pretende a proibição da produção e do cultivo comercial de
organismos geneticamente modificados, revogando o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei
n.º 160/2005, de 21 de setembro.
Afirma o proponente, na exposição de motivos, que «os organismos geneticamente modificados (OGM) são
organismos cujo material genético é modificado de uma forma que não ocorre por comportamentos e/ou
recombinação natural» e que «o seu cultivo e consumo acarretam riscos para a agricultura, para a economia,
para o ambiente, para a saúde humana e para a saúde dos animais não humanos».
Em seu entender, a proibição do cultivo de OGM, corresponde à aplicação do «princípio da precaução, (…)
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ao fomento da biodiversidade vegetal e animal criada por processos naturais e ao aumento da segurança
alimentar», uma vez que, através do «consumo de alimentos vindos de regiões cada vez mais distantes, ao
invés do consumo de alimentos de produção local (…) verifica-se a perda de informação sobre a origem e o
método de produção dos mesmos perdendo-se também a identidade cultural», pois «a inclusão da produção de
OGM» leva à perda de «variedades regionais (…) assim como os sabores tradicionais e os conhecimentos
gastronómicos, constituindo por isso uma ameaça à soberania alimentar mas também à cultura gastronómica»
de Portugal.
Ainda, segundo o proponente, «a extrema riqueza genética vegetal» cifra-se num «elevado número e tipo de
variedades usadas e cultivadas em Portugal», e que, não obstante, «o facto de a geografia do País não ser de
todo uniforme e, portanto, existirem regiões que conseguem cumprir os requisitos da coexistência mas outras
não o conseguem fazer devido à forma e dimensão das parcelas (…) verifica-se um potencial de transferência
não intencional e aleatória de material genético superior, o que acaba por dificultar a coexistência entre as
espécies existentes e os OGM (…) pois dependendo da região em que se encontrem, os agricultores poderão
ter ou não possibilidade de optar por este tipo de produção».
Conclui o proponente que «a uniformização mundial da produção agrícola está a destruir o património
agrobiodiverso e nutricional, bem como as tradições gastronómicas» situação que «só com a proibição da
produção e cultivo de OGM no nosso território será possível cumprir os objetivos da política agrícola, proteger a
diversidade e a pureza das sementes, os solos e o ordenamento do território urbano e rural».
Informação mais detalhada na nota técnica (NT) anexa, elaborada pelos serviços da Assembleia da
República, ao abrigo do disposto no artigo 131.º do RAR.
3 – Do enquadramento constitucional, legal e antecedentes
O Deputado único representante do PAN apresentou a iniciativa, ora em análise, Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª
«Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro».
A apresentação foi efetuada, no âmbito do poder de iniciativa da lei, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo
167.º da Constituição da República Portuguesa (Constituição) e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da
República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, nos termos
da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR.
A iniciativa toma a forma de Projeto de Lei em conformidade com disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR.
Este é redigido em artigos, apresenta uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é
precedido de uma exposição de motivos, dando cumprimento aos requisitos formais previstos nas alíneas a), b)
e c) do n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
O título do Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos
geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de
21 de setembro)» traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º
da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário.
A referência à revogação do Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e do Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de
setembro é conforme com a regra de legística segundo a qual «as vicissitudes que afetem globalmente um ato
normativo devem ser identificadas no título, o que ocorre, por exemplo, em atos de suspensão ou em revogações
expressas de todo um outro ato» (formalmente, apenas se sugere que os meses das respetivas datas de
publicação sejam redigidos em minúsculas, de acordo com o acordo ortográfico).
Em caso de aprovação, esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que concerne ao enquadramento internacional (direito comparado) e antecedentes legislativos sobre a
matéria em questão, o presente parecer remete para NT.
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PARTE II – OPINIÃO DO RELATOR
O Deputado relator exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto de Lei n.º
584/XIII/2.ª, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da
Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar em que se integra, reserva a sua posição para o debate posterior.
PARTE III – CONCLUSÕES
1 – A 20 de junho de 2018,o Deputado único representante do PAN apresentou à Assembleia da República,
o Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª que «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos geneticamente
modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de
setembro)».
2 – Esta apresentação foi efetuada nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-
se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.
3 – De acordo com o n.º 4 do artigo 131.º do RAR, deve a nota técnica, elaborada pelos serviços da
Assembleia, ser junta, como anexo, ao parecer e acompanhar a iniciativa legislativa ao longo de todo o processo
legislativo.
4 – Nos termos regimentais aplicáveis, deve o presente parecer ser remetido a sua Excelência o Presidente
da Assembleia da República.
5 – Face ao exposto, a Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que a iniciativa em apreço reúne os
requisitos exigidos para ser discutida e votada em Plenário.
Palácio de S. Bento, 19 de setembro de 2018.
O Deputado relator, João Gouveia — O Presidente da Comissão, Joaquim Barreto.
Nota: O parecer foi aprovadocom votos a favor do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP e do PCP, tendo-se
registado a ausência de Os Verdes e do PAN, na reunião da Comissão de 3 de janeiro de 2019.
PARTE IV – ANEXOS
Nos termos do n.º 2 do artigo 137.º do RAR, segue em anexo, ao presente parecer, a nota técnica a que se
refere o artigo 131.º do mesmo Regimento.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª (PAN)
Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos geneticamente modificados (revoga o
Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro).
Data de admissão: 21 de junho de 2018.
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª).
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Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Anabela António e Filipe Xavier (DAC), Rafael Silva (DAPLEN), Rosalina Alves (BIB) e José Manuel Pinto (DILP). Data: 11 de setembro de 2018.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
O projeto de lei em apreço deu entrada no dia 20 de junho de 2018, foi admitido, anunciado e baixou, na
generalidade, à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), em 21 de junho de 2018.
Refere a exposição de motivos que «os organismos geneticamente modificados (OGM) são organismos cujo
material genético é modificado de uma forma que não ocorre por comportamentos e/ou recombinação natural»,
os quais são «patenteados por multinacionais da engenharia genética (Monsanto, Syngenta, Bayer, etc.)».
Referem os proponentes que «o seu cultivo e consumo acarretam riscos para a agricultura, para a economia,
para o ambiente, para a saúde humana e para a saúde dos animais não humanos», sendo que dos «vinte e oito
Estados-Membros que compõem a União Europeia, dezanove já proibiram totalmente o cultivo de OGM ou
aprovaram algum tipo de limitação ao seu cultivo».
Em Portugal, referem os proponentes que «a nível regional e local (…) a Região Autónoma da Madeira
declarou-se livre de cultivo de variedades de organismos geneticamente modificados a partir de janeiro de 2008,
um passo seguido pelos Açores em maio de 2012. No continente, o Algarve e pelo menos 27 municípios de
norte a sul do País também se declararam livres de OGM».
A proibição do cultivo de OGM, no entender dos proponentes corresponde à aplicação do «princípio da
precaução, (…) a fomentar a biodiversidade vegetal e animal criada por processos naturais e a aumentar a
segurança alimentar», uma vez que, através do «consumo de alimentos vindos de regiões cada vez mais
distantes, ao invés do consumo de alimentos de produção local (…) verifica-se a perda de informação sobre a
origem e o método de produção dos mesmos perdendo-se também a identidade cultural», pois «a inclusão da
produção de OGM» leva à perda de «variedades regionais (…) assim como os sabores tradicionais e os
conhecimentos gastronómicos, constituindo por isso uma ameaça à soberania alimentar mas também à cultura
gastronómica» de Portugal.
Neste domínio, esclarecem os proponentes que «a extrema riqueza genética vegetal» cifra-se num «elevado
número e tipo de variedades usadas e cultivadas em Portugal». Não obstante, «o facto de a geografia do País
não ser de todo uniforme e, portanto, existirem regiões que conseguem cumprir os requisitos da coexistência
mas outras não o conseguem fazer devido à forma e dimensão das parcelas (…) verifica-se um potencial de
transferência não intencional e aleatória de material genético superior, o que acaba por dificultar a coexistência
entre as espécies existentes e os OGM (…) pois dependendo da região em que se encontrem, os agricultores
poderão ter ou não possibilidade de optar por este tipo de produção».
Citam os proponentes dados estatísticos provenientes da Organização das Nações Unidas para Agricultura
e Alimentação, segundo os quais «75% das variedades agrícolas despareceram no último século (…) ao longo
de 12.000 anos de agricultura, utilizaram-se cerca de 7.000 espécies de plantas e vários milhares de animais
para alimentação. No entanto, hoje apenas 15 variedades de cultivos e 8 de animais representam 90% da nossa
alimentação».
Nessa medida, concluem os proponentes que «a uniformização mundial da produção agrícola está a destruir
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o património agrobiodiverso e nutricional, bem como as tradições gastronómicas» situação que «só com a
proibição da produção e cultivo de OGM no nosso território será possível cumprir os objetivos da política agrícola,
proteger a diversidade e a pureza das sementes, os solos e o ordenamento do território urbano e rural».
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
O Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª é subscrito pelo Deputado único representante do partido Pessoas-Animais-
Natureza, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa (Constituição)
e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei.
Trata-se de um poder dos Deputados, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do
n.º 1 do artigo 4.º do RAR.
Toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR, encontra-
se redigido sob a forma de artigos, é precedido de uma breve exposição de motivos e tem uma designação que
traduz sinteticamente o seu objeto principal, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no
n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
De igual modo encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo
120.º do RAR, uma vez que este projeto de lei não parece infringir princípios constitucionais e define
concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 20 de junho de 2018. Foi admitido e baixou na generalidade à
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª) a 21 de junho, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da
República, tendo sido, nesse mesmo dia, anunciado em sessão plenária.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O título da presente iniciativa legislativa – «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos
geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de
21 de setembro» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º
da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário1.
A referência à revogação do Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e do Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de
setembro é conforme com a regra de legística segundo a qual «as vicissitudes que afetem globalmente um ato
normativo devem ser identificadas no título, o que ocorre, por exemplo, em atos de suspensão ou em revogações
expressas de todo um outro ato»2 (formalmente apenas se sugere os meses das respetivas datas de publicação
sejam redigidos em minúsculas, de acordo com o acordo ortográfico).
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que respeita ao início de vigência, o artigo 9.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor
ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo
2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles
fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Aproveitamos para assinalar a existência de uma norma de regulamentação (artigo 7.º) pelo Governo no
prazo de 120 dias e de um período transitório para pequenos agricultores (n.º 2 do artigo 4.º). Nesta fase do
processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face da lei formulário.
1 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho. 2 Duarte, D., Sousa Pinheiro, A. et al (2002), Legística. Coimbra, Editora Almedina, pág. 203.
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III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
Dispõe o n.º 1 do artigo 60.º da Constituição que «os consumidores têm direito à qualidade dos bens e
serviços consumidos, à formação e à informação, à proteção da saúde, da segurança e dos seus interesses
económicos, bem como à reparação de danos». Acrescentam a alínea i) do artigo 81.º que incumbe
prioritariamente ao Estado a garantia da «defesa dos interesses e direitos dos consumidores» e a alínea e) do
artigo 99.º que a proteção dos consumidores constitui um dos objetivos da política comercial do Estado. Em
matéria ambiental, o artigo 66.º estipula que «todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e
ecologicamente equilibrado e o dever de o defender».
Por sua vez, os artigos 93.º a 100.º da Constituição enformam aquilo a que a doutrina chama a Constituição
agrícola ou agrária, enquanto parte integrante da Constituição económica (artigos 80.º a 107.º). De entre os
objetivos da política agrícola destaca-se o do aumento da produção e produtividade da agricultura, dotando-a
de infraestruturas e outros meios que se revelem adequados, com vista, designadamente, a assegurar a
qualidade dos produtos e o melhor abastecimento do País [alínea a) do n.º 1 do artigo 93.º].
Outro objetivo da política agrícola passa por «assegurar o uso e a gestão racional dos solos e dos restantes
recursos naturais, bem como a manutenção da sua capacidade de regeneração» – alínea d) do n.º 1 do artigo
93.º. Este fim concorre para que o Estado promova «uma política de ordenamento e reconversão agrária e de
desenvolvimento florestal, de acordo com os condicionalismos ecológicos e sociais do País» (n.º 2 do artigo
93.º).
Genericamente, a Lei n.º 19/2014, de 14 de abril «Define as bases da política de ambiente»3, estabelecendo
na alínea d) do artigo 11.º que a política de ambiente tem também por objeto os componentes associados a
comportamentos humanos, nomeadamente as alterações climáticas, os resíduos, o ruído e os produtos
químicos, com o objetivo de garantir a avaliação e gestão do risco associado aos OGM de modo a garantir a
proteção do ambiente e da saúde humana.
Relacionada com o objeto concreto das iniciativas em apreço, cite-se o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de
abril «Regula a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados4 e a colocação no
mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna
a Diretiva n.º 2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de março», alterado pelo Decreto-Lei
n.º 164/2004, de 3 de julho. Tenha-se em conta que a Diretiva 2001/18/CE dizia respeito à libertação deliberada
no ambiente de OGM, revogando a Diretiva 90/220/CEE do Conselho.
Na sequência da aprovação de outros instrumentos normativos comunitários complementares da Diretiva
2001/18/CE, designadamente os Regulamentos (CE) n.º 1829/2003 e 1830/2003 do Parlamento Europeu e do
Conselho, ambos de 22 de setembro, o primeiro relativo a géneros alimentícios e alimentos para animais
geneticamente modificados e o segundo sobre a rastreabilidade e rotulagem de organismos geneticamente
modificados e a rastreabilidade dos géneros alimentícios e alimentos para animais produzidos a partir de
organismos geneticamente modificados, alterando a Diretiva 2001/18/CE, e as Diretivas 2002/53/CE e
2002/55/CE do Conselho, ambas de 13 de junho, a primeira atinente ao catálogo comum das variedades das
espécies de plantas agrícolas e a segunda respeitante à comercialização de sementes de produtos hortícolas,
surgiu o Decreto-Lei n.º 154/2004, de 30 de junho «Estabelece o regime geral do Catálogo Nacional de
Variedades de Espécies Agrícolas e de Espécies Hortícolas e transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva
2002/53/CE, do Conselho, de 13 de junho, que diz respeito ao Catálogo Comum das Variedades das Espécies
de Plantas Agrícolas, e a Diretiva 2002/55/CE, do Conselho, de 13 de junho, respeitante à comercialização de
sementes de produtos hortícolas», o qual, depois de sofrer diversas alterações, viria a ser revogado e substituído
pelo Decreto-Lei n.º 42/2017, de 6 de abril5 «Regula a produção, o controlo, a certificação e a comercialização
de sementes de espécies agrícolas e de espécies hortícolas, transpondo as Diretivas de Execução (UE) n.os
3 Texto consolidado retirado do portal eletrónico do Diário da República. 4 No contexto dos projetos de lei em análise, a expressão «organismos geneticamente modificados», se bem que possa abarcar a manipulação genética de animais, tem em vista apenas as variedades agrícolas ou hortícolas geneticamente modificadas, razão por que também utilizamos mais à frente a expressão «variedades geneticamente modificadas». 5 Texto consolidado retirado do Diário da República Eletrónico (DRE).
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2015/1168, 2015/1955, 2016/11 e 2016/317». Este diploma refere no preâmbulo, para além de outros motivos,
o propósito de consolidar mais de uma dezena de alterações que o anterior decreto-lei havia sofrido e
dificultavam «significativamente a perceção do regime jurídico aplicável».
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 168/2004, de 7 de julho, veio estabelecer regras de execução do referido
Regulamento (CE) n.º 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho de 22 de setembro.
O quadro jurídico nacional é completado pelo Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro «Regula o cultivo
de variedades geneticamente modificadas, visando assegurar a sua coexistência com culturas convencionais e
com o modo de produção biológico».
Através do Decreto Legislativo Regional n.º 15/2010/M, de 13 de agosto, a Região Autónoma da Madeira
declarou-se «zona livre de cultivo de variedades de organismos geneticamente modificados» (artigo 1.º),
proibindo «a introdução de material de propagação, vegetativo ou seminal, que contenha organismos
geneticamente modificados no território da Região Autónoma da Madeira, assim como a sua utilização na
agricultura» (artigo 2.º).
Também a Região Autónoma dos Açores, mediante o Decreto Legislativo Regional n.º 28/2012/A, de 26 de
junho, se declarou «zona livre do cultivo» de OGM (n.º 2 do artigo 1.º) embora não interditando a sua introdução
e produção em toda a sua plenitude (vide artigo 4.º).
Os antecedentes da iniciativa em apreço são os seguintes:
– Projeto de Lei n.º 30/VIII «Organismos geneticamente modificados: submissão da lei ao princípio da
precaução», apresentado pelo BE;6
– Projeto de Lei n.º 43/VIII «Proíbe a comercialização e importação e produção com fins comerciais de
organismos geneticamente modificados», apresentado pelo PEV;7
– Projeto de Lei n.º 524/IX «Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho, que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de Organismos Geneticamente
Modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os Regulamentos (CE) n.º 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro», apresentado pelo PEV;8
– Projeto de Lei n.º 11/X «Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os Regulamentos (CE) n.º 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro», apresentado pelo PEV;9
– Projeto de Lei n.º 224/XI «Revisão da Lei de Bases do Ambiente», apresentado pelo PSD;10
– Projeto de Lei n.º 456/XI «Estabelece as Bases da Política de Ambiente», apresentado pelo PCP;11
– Projeto de Lei n.º 457/XI «Lei de Bases do Ambiente», apresentado pelo PEV;12
– Projeto de Lei n.º 515/XI «Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente», apresentado pelo BE;13
– Projeto de Lei n.º 560/XI «Revisão da Lei de Bases de Ambiente», apresentado pelo CDS-PP;14
– Projeto de Lei n.º 29/XII «Lei de Bases do Ambiente», apresentado pelo PEV;15
6 Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 43/VIII. Deu origem à Lei n.º 12/2002, de 16 de fevereiro «Organismos geneticamente modificados«, através da qual foram suspensas a libertação deliberada no ambiente de produtos geneticamente modificados e a importação e comercialização de produtos que contenham na sua composição organismos geneticamente modificados e que se destinem à alimentação humana ou animal até à transposição da Diretiva n.º 2001/18/CE. 7 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 30/VIII. 8 Caducou em 22 de dezembro de 2004. 9 Caducou em 14 de outubro de 2009. 10 Apesar de aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19 de junho de 2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 456/XI e 457/XI. 11 Apesar de aprovada, a iniciativa viria a caducar em 19 de junho de 2011. Foi discutida em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 457/XI. 12 Embora aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19 de junho de 2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 456/XI. 13 Iniciativa caducada em 19 de junho de 2011. 14 Iniciativa caducada em 19 de junho de 2011. 15 Retomou o Projeto de Lei n.º 457/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 143/XII e 154/XII.
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– Projeto de Lei n.º 39/XII «Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente», apresentado pelo BE;16
– Projeto de Lei n.º 143/XII «Estabelece as Bases da Política de Ambiente – Revoga a Lei n.º 11/87, de 7 de
abril, que aprovou a ‘Lei de Bases do Ambiente’», apresentado pelo PS;17
– Projeto de Lei n.º 154/XII «Estabelece as Bases da Política de Ambiente», apresentado pelo PCP;18
– Projeto de Lei n.º 182/XII «Informação sobre cultivo de transgénicos – alteração ao Decreto-Lei n.º
160/2005, de 21 de setembro», apresentado pelo PEV;19
– Projeto de Lei n.º 308/XII «Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»,
apresentado pelo PCP;20
– Projeto de Lei n.º 784/XII «Proíbe o cultivo, importação e comercialização de organismos geneticamente
modificados vegetais», apresentado pelo BE;21
– Projeto de Lei n.º 805/XII «Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»,
apresentado pelo PCP;22
– Projeto de Lei n.º 811/XII «Impede o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente Modificados», apresentado pelo PEV.23
Os Projetos de Resolução relacionados com este tema são os seguintes:
– Projeto de Resolução n.º 26/VIII «Sobre produtos provenientes de organismos geneticamente
modificados», apresentado pelo CDS-PP;24
– Projeto de Resolução n.º 28/VIII «Adoção da Diretiva 90/220/CEE relativa à libertação deliberada no
ambiente de organismos geneticamente modificados», apresentado pelo PS;25
– Projeto de Resolução n.º 37/VIII «Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal
produzidos a partir de organismos geneticamente modificados», apresentado pelo PEV;26
– Projeto de Resolução n.º 194/X «Recomenda ao Governo a aplicação do princípio da precaução em relação
a milho geneticamente modificado», apresentado pelo PEV;27
– Projeto de Resolução n.º 230/X «Recomenda ao Governo uma moratória sobre o cultivo de sementes que
contenham ou sejam constituídas por Organismos Geneticamente Modificados (OGM)», apresentado pelo BE;28
– Projeto de Resolução n.º 166/XI «Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz
transgénico LLRice62», apresentado pelo BE;29
– Projeto de Resolução n.º 236/XII «Recomenda ao Governo que proíba a importação e comercialização de
milho transgénico MON810», apresentado pelo BE;30
– Projeto de Resolução n.º 470/XII «Recomenda ao Governo que proíba a importação, comercialização e
cultivo dos organismos geneticamente modificados milho MON810 e batata amflora», apresentado pelo BE;31
– Projeto de Resolução n.º 492/XII «Prevê a aplicação do princípio da precaução relativamente ao milho
transgénico NK 603», apresentado pelo PEV;32
– Projeto de Resolução n.º 1293/XII «Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de
transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se
16 Retomou o Projeto de Lei n.º 515/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 17 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 18 Retomou o Projeto de Lei n.º 456/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 143/XII. 19 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Resolução n.º 236/XII. 20 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Resolução n.ºs 470/XII e 492/XII. 21 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 805/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 22 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 23 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 805/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 24 Iniciativa considerada caducada em 4 de abril de 2002. 25 Iniciativa considerada caducada em 4 de abril de 2002. 26 Daria origem à Resolução da Assembleia da República n.º 64/2000, de 14 de julho «Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal produzidos a partir de organismos geneticamente modificados». 27 Iniciativa caducada em 14 de outubro de 2009. 28 Iniciativa caducada em 14 de outubro de 2009. 29 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 104/2010, de 16 de agosto «Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz transgénico LLRice62». 30 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 182/XII. 31 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 492/XII. 32 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 470/XII.
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refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente
modificados (OGM) no seu território», apresentado pelo PS.33
Na presente legislatura foram apresentados e debatidos quatro Projetos de Lei n.os 17/XIII, 69/XIII, 100/XIII
e 102/XIII com a mesma finalidade. Foram rejeitados na votação na generalidade, sendo apropriado, em todo o
caso, remeter para as considerações constantes do parecer da comissão parlamentar competente e respetiva
nota técnica, onde se fornecem ligações importantes a relatórios e estudos sobre a matéria.
Cabe salientar, por fim, que o primeiro dos projetos de lei em apreciação, todos no sentido de proibir a
produção e libertação no ambiente de variedades geneticamente modificadas, revoga expressamente os
Decretos-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e 160/2005, de 21 de setembro. O segundo revoga «todas as
disposições legais» contrárias, incluindo os referidos Decretos-Lei. O terceiro revoga esses dois Decretos-Lei e
ainda o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 7 de julho, assim como as Portarias n.º 904/2006, de 4 de setembro34, e
1611/2007, de 20 de dezembro35.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
DOBBS, Mary – Genetically modified crops, agricultural sustainability and national opt-outs: enclosure as the
loophole? Common Market Law Review. Leiden. ISSN 0165-0750. Vol. 54, n.º 4 (Aug. 2017), p. 1093-1122.
Cota: RE-227.
Resumo: De acordo com a autora «os Estados-Membros da UE enfrentam um dilema: após décadas a exigir
poderes para escolher cultivar ou não culturas geneticamente modificadas (GM), a UE devolveu-lhes alguns
poderes limitados, mas significativos.» Uma diretiva permite que os Estados-Membros «opt-out» do cultivo de
OGM, desde que cumpram alguns critérios relevantes.
Um dos critérios é a sustentabilidade agrícola. Em princípio, as culturas GM poderiam promover a
sustentabilidade agrícola, inclusive através do aumento da biodiversidade agrícola, uma vez que facilitam a
introdução de novas características ou espécies num ecossistema. No entanto, a natureza das suas
modificações permite a aplicabilidade da lei de patentes, com consequências negativas sobre a disponibilidade
de recursos genéticos vegetais e a biodiversidade agrícola a longo prazo.
Diz a autora que os Estados-Membros devem decidir urgente e cuidadosamente se e como restringir as
culturas GM, uma vez que a natureza permeável do ambiente facilita a disseminação de organismos
geneticamente modificados uma vez cultivados.
E argumenta «que a adoção de medidas legais poderia justificar a imposição de restrições ao cultivo de
transgénicos, a fim de conservar a biodiversidade agrícola como um recurso natural esgotável, essencial à agro-
sustentabilidade. Para melhorar a probabilidade de as restrições serem legalmente aceites tanto a nível da UE
como da Organização Mundial do Comércio (OMC), tais justificações devem ser distinguidas claramente de
quaisquer preocupações ambientais mais amplas, uma vez que tanto a UE como a OMC impõem restrições
rigorosas quando são levantados objetivos ambientais.»
LES ORGANISMES génétiquement modifiés. Futuribles: analyse et prospective. Paris. ISSN 0337-307X. N.º
383 (mars 2012). 192 p. Cota: RE-4.
Resumo: Este número da revista Futuribles é inteiramente dedicado aos organismos geneticamente
modificados (OGM) e, mais especificamente, às plantas geneticamente modificadas, às suas virtudes e perigos,
reais e alegados, sendo apresentados diferentes pontos de vista e argumentos, de quem defende e de quem se
opõe ao seu estudo/investigação, cultivo e consumo.
Cécile Désaunay no artigo «Vers un monde génétiquement modifié?: applications possibles des
biotechnologies», pág. 5-16, apresenta uma breve visão sobre o que são os OGM, o estado da investigação e
33 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 32/2015, de 1 de abril «Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE, de 12 de março, no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território». 34 Foi alterada pela Portaria n.º 16/11/2007, de 20 de dezembro («Estabelece as condições e o procedimento para o estabelecimento de zonas livres de cultivo de variedades geneticamente modificadas»). 35 Que altera a Portaria n.º 904/2006, de 4 de setembro.
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as perspetivas que se poderão abrir a médio-longo prazo. A autora analisa as principais aplicações existentes e
as áreas preferenciais de investigação na indústria (especialmente para reduzir os custos de produção e da
utilização de produtos poluentes), na agricultura, alimentos e medicamentos. Destaca os riscos inerentes à
biotecnologia, para o ambiente e saúde humana e animal e os obstáculos enfrentados pelo setor e as questões
levantadas pela concentração da investigação nas mãos de algumas grandes empresas.
David Sawaya, um especialista em biotecnologia vegetal, escreve «Les biotechnologies végétables à
l’horizon 2030», pág. 17-34, sobre as grandes tendências de desenvolvimento que são suscetíveis de acontecer
nesse setor até o ano de 2030. O autor aponta as mudanças que se têm verificado nas características, no âmbito
da biotecnologia vegetal, mostrando que as características de primeira geração (resistência a pragas e
herbicidas) tendem a dar lugar às características de segunda geração, que são mais de caráter agronómico
(resistência a vários tipos de stresse, melhores rendimentos).
A opinião dos europeus (pág. 119-133) sobre este assunto é analisada por Daniel Boy que, com base em
inquéritos Eurobarómetro aos cidadãos europeus realizados ao longo de 15 anos ou mais, mostra que nunca
houve uma maioria na UE a favor do desenvolvimento de OGM para a produção de alimentos e, entre 1996 e
2010, a proporção de pessoas relutantes em ver esse desenvolvimento, na verdade, aumentou. Neste artigo,
Boy mostra as disparidades existentes entre os vários países europeus e apresenta razões que podem explicar
essas diferenças.
Salientamos ainda o artigo de Pierre Feillet, «Les OGM, atouts d’une alimentation durable», que nos oferece
uma análise das principais vantagens de OGM, quando se trata de alcançar um fornecimento sustentável de
alimentos para todos no planeta. O autor descreve a extensão, localização e natureza dos cultivos transgênicos
em todo o mundo (10% das terras cultivadas) e, seguidamente, aborda outra questão altamente controversa: a
presença, na cadeia alimentar, de produtos geneticamente modificadas em animais alimentados com essas
culturas.
PIGNATARO, Laura – La politique de l'Union Européenne en matière d'OGM. Revue du droit de l'Union
Européenne. Paris. ISSN 1155-4274. N.º 3 (2011), p. 361-380. Cota: RE-200.
Resumo: Neste artigo, após definir com brevidade o conceito de organismo geneticamente modificado, as
condições para a aceitação e os procedimentos para a sua autorização e introdução na União Europeia (UE), a
autora faz uma análise do quadro regulamentar aplicável no âmbito da UE e as iniciativas legislativas, em curso,
que visam a sua alteração.
LE PUILL, Gérard – Nourrir neuf milliards d'humains. La pensée. Paris. ISSN 0031-4773. N.º 376 (oct.-déc.
2013), p. 31-41. Cota: RE-87.
Resumo: Neste artigo o autor, Gérard Le Puill, aborda a capacidade que o planeta terá, num prazo de 40
anos, de alimentar nove mil milhões de pessoas com recurso a técnicas de agricultura ecológica.
SEMINÁRIO do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida – Nanotecnologias e o. g. m.: ciência,
ética e sociedade. Colecção Bioética. Lisboa. ISBN 978-9728368-30-2. N.º 12 (2011), 94 p. Cota: RP-718.
Resumo: No âmbito destes seminário destacamos a comunicação de Pere Puigdomènech, com o título
«Ciencia, ética y sociedad : las nuevas tecnologias en agricultura» na qual o autor faz uma análise ética sobre
o uso das novas tecnologias na agricultura, tecnologias essas que têm sido objeto de diferentes estudos,
incluindo um parecer do Grupo Europeu de Ética na Ciência e Novas Tecnologias. O autor refere que os efeitos
de agricultura sobre o meio ambiente são bem conhecidos e que poderão pôr em perigo o acesso a alimentos
para as gerações futuras. Seguindo estas ideias a utilização de organismos geneticamente modificados ou a
aplicação de biocombustíveis devem ser discutidos.
Maria Eduarda Gonçalves, no artigo «Entre incertezas e controvérsias: a regulação do O.G.M. na Europa»
analisa os desafios suscitados pelas inovações de base tecnológica cujos impactes são difíceis de avaliar e se
encontram envoltas em controvérsia e contestação social e política. Na Europa (Áustria, Grécia, França,
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Alemanha), onde esta controvérsia tem sido mais intensa têm sido evidenciadas as incertezas que envolvem a
avaliação de benefícios e riscos das culturas e alimentos transgénicos.
A autora refere que a UE respondeu a estas incertezas e controvérsias instituindo um sistema regulador
assente, desde 2001, no princípio da precaução. A premissa essencial deste princípio é que a ausência de prova
do risco não deve ser invocada como justificação da omissão de medidas que possam prevenir a manifestação
desse risco, sendo que a legislação aplicável prevê a consulta do público e de grupos de interesse na fase da
avaliação dos processos de licenciamento de OGM, mas esta consulta não tem tido expressão efetiva e a prática
mostra que os cidadãos são encarados como meros consumidores numa relação de mercado.
Destaque ainda para a comunicação de Paula Cruz de Carvalho, «Organismos geneticamente modificados
na agricultura» segundo a qual na procura por novas características, melhor adaptação aos diferentes ambientes
agrícolas, maior resistência a pragas e doenças, maior produtividade por unidade de solo arável, os
investigadores, através de um longo e evolutivo trabalho de melhoramento vegetal, têm vindo ao longo dos
tempos a obter uma extensa gama de diferentes variedades das espécies vegetais utilizadas na agricultura, em
particular para benefício do agricultor e do consumidor e, em geral para um mais eficiente uso dos recursos
naturais disponíveis.
TRUNINGER, Mónica; FERREIRA, José Gomes – Consumo, alimentação e OGM. In Ambiente, alterações
climáticas, alimentação e energia: a opinião dos portugueses. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2014.
(Observatórios ICS.; 1). ISBN 978-972-671-335-7. p. 199-245. Cota: 52 – 217/2015.
Resumo: A obra em apreço «apresenta um panorama da evolução da opinião pública em Portugal sobre
questões de ambiente, consumo e energia nas últimas décadas. A enquadrar cada tema analisam-se as
principais políticas entretanto lançadas às escalas europeia e nacional. As acentuadas e rápidas mudanças
ocorridas no País desde 1986 constituem um pano de fundo essencial para compreender muito do que se passa
e pensa atualmente neste domínio. Da energia à mobilidade urbana, das alterações climáticas aos resíduos, da
água ao consumo, as respostas dos portugueses aos inquéritos Eurobarómetro são vistas à luz das tendências
europeias e das diferenças por idades, género ou nível de educação. São exploradas questões como a
informação sobre temas ambientais, nível de preocupação com os problemas, concordância com as medidas
de política ou práticas do quotidiano.»
No capítulo em referência os autores analisam as atitudes, opiniões e informação dos portugueses sobre
alimentação e organismos geneticamente modificados. Os autores verificam que os portugueses têm vindo a
manifestar preocupações e opiniões convergentes com as dos restantes europeus, relativamente às
características de exigência de qualidade dos produtos. No entanto, na hora de comprar o preço ainda é mais
importante que a qualidade.
Quanto à insegurança alimentar, os dados obtidos nos inquéritos mostram que os portugueses estão mais
seguros, resultado dos esforços de implementação de uma estratégia robusta de segurança e controlo
alimentares.
Quanto à confiança, os portugueses confiam na opinião dos cientistas para obter informação credível sobre
a qualidade e a segurança alimentares.
Os autores terminam analisando com maior detalhe a temática da aplicação da biotecnologia à produção
alimentar, quer através da utilização de OGM, quer através da clonagem animal e concluem que os portugueses,
tal como os europeus, mostram-se muito críticos.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Entende-se por OGM «qualquer organismo, com exceção do ser humano, cujo material genético tenha sido
modificado de uma forma que não ocorre naturalmente por meio de cruzamentos/ou de recombinação natural»36.
Neste sentido, a UE estabeleceu um quadro jurídico estrito para o cultivo e a comercialização de OGM
utilizados em géneros alimentícios ou alimentos para animais, que estabelece a obrigatoriedade da Autoridade
Europeia de Segurança Alimentar (AESA), juntamente com os organismos científicos dos Estados-Membros,
36 Diretiva UE 2001/18/CE
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efetuar uma avaliação científica dos riscos, de forma a excluir qualquer perigo para a saúde humana, a saúde
animal ou o ambiente, antes da colocação no mercado de qualquer OGM.
Tendo como fundamento o parecer da AESA, a Comissão Europeia (CE) prepara um projeto de decisão de
forma a conceder ou recusar a autorização, a qual é objeto de votação, por maioria qualificada, por um comité
de peritos constituído por representantes dos Estados-Membros. Todos os géneros alimentícios ou alimentos
para animais produzidos a partir de OGM ou contendo OGM têm a obrigatoriedade de ser rastreáveis e rotulados
como tal, para que os consumidores possam fazer escolhas informadas.
Em abril de 2015 entrou em vigor a Diretiva (UE) 2015/412 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de
março de 2015, que altera a Diretiva n.º 2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros
limitarem ou proibirem o cultivo de OGM no seu território, concedendo aos Estados-Membros maior flexibilidade
relativamente ao cultivo de OGM, sem pôr em causa a avaliação do risco ambiental, que faz parte do regime de
autorizações de OGM da UE previsto no Regulamento (CE) n.º 1829/2003 e na Diretiva 2001/18/CE. Permitindo,
desta forma, aos países proibir ou limitar, a título individual, o cultivo de OGM, mesmo que sejam autorizadas a
nível da UE.
Em 2016, o Parlamento Europeu (PE) adotou resoluções37 contra a autorização pela CE de OGM e a favor
do envidamento de esforços para facilitar a proibição do cultivo de OGM pelos Estados-Membros, em
conformidade com o objetivo de proteger a biodiversidade, a natureza e os solos. O PE fez também um apelo à
CE para apresentar propostas legislativas relativas à indicação obrigatória do país de origem, com especial
enfoque da carne utilizada como ingrediente em alimentos transformados. Esta medida teve como objetivo
restaurar a confiança dos consumidores na sequência dos escândalos de fraude alimentar.
Em 2017, o PE e o Conselho chegaram a acordo relativamente às novas regras de forma a reforçar os
controlos oficiais dos alimentos, a fim de melhorar a rastreabilidade dos alimentos e combater a fraude. Na
sequência de preocupações sobre os riscos decorrentes da utilização na agricultura da substância herbicida
glifosato, o PE decidiu, em fevereiro de 2018, instituir a Comissão Especial sobre o Procedimento de Autorização
da União para os Pesticidas (PEST) para examinar o procedimento de autorização de pesticidas na UE.
Seguidamente, a CE propôs um reexame da legislação alimentar geral da UE, de forma a aumentar a
transparência das avaliações de risco da AESA e a independência dos estudos científicos subjacentes,
melhorando a cooperação com os Estados-Membros respeitante à disponibilização de dados e peritos. Está
igualmente previsto o reexame de atos legislativos fundamentais, em domínios como novos alimentos, OGM,
pesticidas, materiais em contacto com géneros alimentícios e aditivos alimentares.
Em abril de 2018, a CE propôs uma revisão do Regulamento Geral da Legislação Alimentar Geral38, que
estabelece os princípios gerais de toda a legislação alimentar nacional e da UE, em conjunto com a revisão de
oito atos legislativos setoriais, de forma a torná-los conformes com as regras gerais e reforçar a transparência
em matéria de OGM, aditivos para a alimentação animal, aromatizantes de fumo, materiais em contacto com
géneros alimentícios, aditivos alimentares, enzimas e aromas alimentares, produtos fitofarmacêuticos e novos
alimentos.
Tendo presente o balanço de qualidade sobre a legislação alimentar geral realizado pela CE, este irá:
Permitir aos cidadãos um maior acesso às informações apresentadas à AESA sobre as aprovações
relativas à cadeia agroalimentar;
Dar a possibilidade à CE de solicitar estudos adicionais;
Envolver de forma estreita os cientistas dos Estados-Membros nos procedimentos de aprovação.
Assegurar maior transparência, permitindo aos cidadãos terem acesso automático e imediato a todas as
informações relacionadas com a segurança apresentadas pela indústria no processo de avaliação dos riscos;
Criar um registo europeu comum de estudos encomendados, de forma a garantir que as empresas
requerentes de autorização apresentam todas as informações pertinentes, não omitindo estudos desfavoráveis;
Permitir que a AESA solicite estudos adicionais, a pedido da CE, financiados pelo orçamento da UE;
Requerer a consulta das partes interessadas e do público sobre os estudos apresentados pela indústria
37 Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de maio de 2016, sobre a indicação obrigatória do país de origem ou do local de proveniência de determinados alimentos (JO C 76, 28.2.2018, p. 49). 38 Regulamento (CE) n.º 178/2002.
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de forma a apoiar os pedidos de autorização dos produtos;
Aumentar a participação dos Estados-Membros na estrutura de governação e painéis científicos da AESA;
Reforçar a comunicação dos riscos aos cidadãos, com ações comuns de forma a fortalecer a confiança
dos consumidores, promovendo a sensibilização e a compreensão do público e explicando de uma melhor forma
os pareceres científicos expressos pela AESA, bem como a base das decisões em matéria de gestão dos riscos.
Enquadramento internacional
Países europeus
Diversos relatórios e estudos que tivemos ocasião de consultar indicam que a nível mundial uma elevada
quantidade de países já baniu a produção e ou importação de OGM, rondando as quatro dezenas. Num deles,
por exemplo, existe de uma lista de 38 países, organizada da seguinte forma:
«• Algeria: Cultivation banned. Imports banned.
• Austria: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Azerbaijan: Cultivation banned. Imports allowed.
• Belize: Cultivation banned. Imports allowed.
• Bhutan: Cultivation banned. Imports banned.
• Bosnia and Herzegovina: Cultivation banned. Imports allowed.
• Bulgaria: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Croatia: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Cyprus: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Denmark: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Ecuador: Cultivation banned. Imports allowed.
• France: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Germany: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Greece: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Hungary: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Italy: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Kenya: Cultivation prohibited. Imports banned.
• Kyrgyzstan: Cultivation banned. Imports banned.
• Latvia: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Lithuania: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Luxembourg: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Madagascar: Cultivation banned. Imports banned.
• Malta: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Moldova: Cultivation banned. Imports allowed.
• Netherlands: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Northern Ireland, Scotland, Wales (United Kingdom): Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Norway: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Peru: Cultivation banned. Imports banned.
• Poland: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Russia: Cultivation banned. Imports banned.
• Saudi Arabia: Cultivation banned. Imports allowed.
• Serbia: Cultivation banned. Imports allowed.
• Slovenia: Cultivation prohibited. Imports allowed.
• Switzerland: Cultivation banned. Imports allowed.
• Turkey: Cultivation banned. Imports allowed.
• Ukraine: Cultivation banned (though law is widely ignored). Imports allowed.
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• Venezuela: Cultivation banned. Imports banned.
• Zimbabwe: Cultivation banned. Imports banned.»39 40
A nível europeu, outros estudos referem que mais de metade dos 28 Estados-Membros41 já terão utilizado a
faculdade de proibição, faculdade essa que lhes é conferida pela legislação europeia, orientada pelo princípio
da precaução, de decidirem se pretendem utilizar organismos geneticamente modificados, podendo optar por
escolher a proibição geral (opt out42). A organização Sustainable Pulse, composta por cidadãos comuns e
cientistas, refere na sua webpage, que a Alemanha, Áustria, Bulgária, Croácia, Chipre, Dinamarca, Escócia,
Eslovénia, Grécia, Holanda, Hungria, Irlanda do Norte, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, País de
Gales e Polónia, já proibiram a sua utilização.
Não obstante, estes números devem ser analisados com alguma cautela, pois não é seguro que os dados
recolhidos estejam inteiramente corretos, restando ainda dúvidas sobre se dizem respeito à proibição geral de
uso e importação de organismos geneticamente modificados ou apenas a algumas espécies agrícolas ou
hortícolas43. Nalguns casos pode ter acontecido a proibição do cultivo, mas não a importação de OGM44. Tudo
indica, no entanto, que o número de países que já baniram a produção e comercialização de OGM seja dessa
ordem de grandeza.
Os que se mostram contra o cultivo e comercialização de variedades geneticamente modificadas,
designadamente os proponentes dos projetos de lei em apreço45, salientam os seus malefícios para a saúde
humana e os riscos para a agricultura, o ambiente, a economia, a segurança alimentar e a biodiversidade vegetal
e animal46, ao passo que os seus defensores47 as apresentam como panaceia para a fome no mundo, as
alterações climáticas e a subnutrição, não lhes imputando riscos para a saúde humana.
A legislação específica comparada é apresentada aqui apenas para países em relação aos quais obtivemos
elementos legislativos suficientes para comprovar as soluções em vigor sobre a proibição geral ou não dos
organismos geneticamente modificados, incidindo sobre os seguintes Estados-Membros: Espanha, França e
Irlanda.
ESPANHA
O regime jurídico paralelo do direito espanhol consta da Ley 9/2003, de 25 de abril «establece el régimen
jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»48, regulamentada pelo Real Decreto 178/2004, de 30 de enero «por el que se aprueba el
Reglamento general para el desarrollo y ejecución de la Ley 9/2003, de 25 de abril, por la que se establece el
régimen jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»49, não se proibindo, em geral, a utilização, libertação deliberada e comercialização de
organismos geneticamente modificados, embora se estabeleçam requisitos apertados para a produção,
39 Optámos pela transcrição da lista na língua original (inglês) para se entender melhor os países que proibiram o cultivo (cultivation banned) e também a importação (imports banned), assim como os que proibiram o cultivo mas não a importação (imports allowed). 40 Por contraposição, a GeneWatch asseverava, em 2015, que a nível mundial só 28 países cultivavam variedades agrícolas e hortícolas geneticamente modificadas (dados coincidentes com os de um outro relatório de 2016). Contam-se entre esses países os seguintes: África do Sul, Argentina, Austrália, Bangladesh, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Eslováquia, Espanha, Estados Unidos da América, Filipinas, Honduras, Índia, México, Myanmar, Paquistão, Paraguai, Portugal, República Checa, Sudão, Uruguai e Vietname. Existe, aliás, uma base de dados, gerida pela International Service for the Acquisition of Agri-Biotech Applications, organizada por país e por espécie agrícola, onde são registadas as variedades geneticamente modificadas usadas em todo o Mundo. 41 Para este efeito, ainda incluído o Reino Unido. 42 Também designada por «cláusula de salvaguarda». Em traços gerais, dir-se-á que, face às regras da UE em vigor, as culturas geneticamente modificadas só são permitidas após uma avaliação profunda dos riscos, embora os Estados-Membros tenham agora flexibilidade para escolher entre permitir e proibir ou restringir o cultivo de organismos geneticamente modificados no seu território. Continua a ser permitido cultivar variedades agrícolas ou hortícolas geneticamente modificadas, mas só depois de terem sido autorizadas a nível da UE depois de uma avaliação rigorosa dos riscos realizada pela AESA. Após tal autorização, os países da UE só podem proibir a utilização do produto geneticamente modificado no seu território através da utilização da chamada «cláusula de salvaguarda», tendo de justificar esta decisão provando que o organismo geneticamente modificado em causa pode causar danos aos seres humanos ou ao meio ambiente. 43 Em https://www.thenation.com/article/twenty-six-countries-ban-gmos-why-wont-us fala-se em proibição total ou parcial. 44 Como nos mostra a página da Internet do Genetic Literacy Project e resulta da lista de países que baniram o cultivo, acima transcrita. 45 Outro caso é o da organização Slow Food, que se opõe à produção de organismos geneticamente modificados. 46 Na medida em que estes sejam alimentados com rações transgénicas. 47 Como, por exemplo, António Coutinho, ex-Diretor do Instituto Gulbenkian de Ciência e Presidente da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa. 48 Texto consolidado retirado de www.boe.es. 49 Texto consolidado retirado de www.boe.es.
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confinada, desses organismos.
FRANÇA
A legislação básica está concentrada no Título III do Livro V da Parte Legislativa do Code de l'Environnement,
sob a epígrafe «Organismes génétiquement modifiés». Embora haja indicação de que a França proibiu a
produção de pelo menos alguns organismos geneticamente modificados, não o fez expressamente em relação
à sua importação. A libertação e colocação no mercado de organismos geneticamente modificados é regulada
nas secções 2 e 3 do Capítulo III «Dissémination volontaire d'organismes génétiquement modifiés» do referido
Título III, continuando a admitir-se a sua existência, embora sempre com sujeição a rotulagem obrigatória e
exame prévio do respetivo pedido de autorização que tem em conta os riscos para o ambiente e a saúde pública
(artigos L533-3 a L533-8-2).
IRLANDA
No Genetically Modified Organisms (Deliberate Release) Regulations 2003 (S.I. n.° 500 of 22/10/2003), não
sujeito a alteração na sequência das modificações na legislação comunitária de 2015, continua a admitir-se a
produção, cultivo e comercialização de variedades agrícolas e hortícolas geneticamente modificadas.
Outros países
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
De acordo com a lei federal numerada como Public Law 114-2016, também os Estados Unidos da América,
à semelhança de países como a China, o Brasil e o Canadá, admitem o cultivo e comercialização de organismos
geneticamente modificados, embora sujeito a rigorosas normas de autorização prévia e rotulagem e identificação
do produto alimentício, que obrigam, designadamente, à indicação da quantidade de substâncias geneticamente
manipuladas nele contidas, de acordo com o Safe and Accurate Food Labeling Act of 2015.
Organizações internacionais
As restrições às leis nacionais provenientes das regras de Direito Internacional Público Convencional
emanam de duas fontes: as convenções internacionais sobre biodiversidade e os acordos estabelecidos ao nível
da Organização Mundial do Comércio (OMC). As duas são pelo menos aparentemente conflituantes entre si, já
que, por um lado, as primeiras estabelecem a obrigação de a legislação atinente a organismos geneticamente
modificados respeitar o ambiente e, em particular, a diversidade biológica global e, por outro lado, os segundos
preveem o dever de a mesma legislação não limitar desnecessariamente o comércio internacional.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)
A Convenção sobre a Diversidade Biológica obriga os seus membros a contribuir para a proteção e
conservação da diversidade biológica, uso sustentável dos seus elementos e partilha justa e equitativa dos
benefícios resultantes dos recursos genéticos, determinando explicitamente, na alínea g) do seu artigo 8.º, que
cada parte contratante deve, «na medida do possível e conforme o apropriado», «estabelecer ou manter meios
para regulamentar, gerir ou controlar os riscos associados à utilização e à libertação de organismos vivos
modificados como resultado da biotecnologia que possam ter impactes ambientais adversos passíveis de afetar
a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, tendo também em conta os riscos para a
saúde humana». A noção de «biotecnologia», por seu turno, consta do artigo 2.º, sendo definida como «qualquer
aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos ou seus derivados para a criação ou
modificação de produtos ou processos para utilização específica».
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ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO (OMC)
De acordo com as regras e princípios estabelecidos pela OMC, os Estados não podem discriminar
importações e devem tratar a importação de produtos não menos favoravelmente do que a comercialização de
produtos de origem nacional, mas podem adotar as medidas necessárias a proteger a vida ou a saúde de seres
humanos, animais ou plantas se tais medidas não constituírem uma discriminação arbitrária ou injustificada entre
países ou uma disfarçada restrição ao comércio internacional. As medidas mencionadas, dirigidas à proteção
da saúde ou do ambiente, têm de ser baseadas em fundamentos científicos, sem prejuízo de os Estados
poderem livremente determinar os seus próprios níveis de risco e de proteção ambiental.50
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada consulta à base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontram em
apreciação, na Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), as seguintes iniciativas legislativas sobre matéria conexa
com a presente:
Projeto de Lei n.º 936/XIII/3.ª (PEV) – «Impede o cultivo e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente modificados (OGM)»;
Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª (PEV) – «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os alimentos
geneticamente modificados»;
Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª (PCP) – «Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente
modificadas (OGM)».
Petições
Consultada a base de dados da AP, não se identificou qualquer petição pendente, neste momento, sobre
matéria idêntica.
V. Consultas e contributos
Dado o teor da iniciativa poderão ser consultadas entidades que atuem no âmbito do ambiente e agricultura,
nomeadamente, a Plataforma «Transgénicos Fora», a Confederação dos Agricultores de Portugal, a Associação
dos Jovens Agricultores de Portugal, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e as Regiões
Autónomas da Madeira e dos Açores.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face da informação disponível, não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes
da aprovação da presente iniciativa.
————
50 Vide artigo XX do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, conhecido pela sua sigla em inglês (GATT).
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PROJETO DE LEI N.º 937/XIII/3.ª
(ALARGA A ABRANGÊNCIA DAS REGRAS DE ROTULAGEM PARA OS ALIMENTOS
GENETICAMENTE MODIFICADOS)
Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio
Parecer
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião da Deputada Autora do Parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – CONSIDERANDOS
1 – Introdução
O Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª, «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os organismos
geneticamente modificados», deu entrada na Assembleia da República a 03 de julho de 2018, subscrito por dois
Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV), ao abrigo do disposto no n.º 1 do
artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa (Constituição) e no artigo 118.º do Regimento da
Assembleia da República (RAR).
Foi admitido e baixou, na generalidade, à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), em conexão com a Comissão
de Economia, Inovação e Obras Públicas (6.ª), a 04 de julho, tendo sido, nesse mesmo dia, anunciado em
sessão plenária.
2 – Objeto e Motivação
A iniciativa em apreço – Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª – da autoria de dois deputados do GP do PEV
apresentam, na exposição de motivos, a definição de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) como
«sendo aqueles que sofreram uma alteração do seu material genético, com a introdução de um ou mais genes
de outro organismo da mesma espécie ou de espécie diferente».
Afirmam, os subscritores, que os OGM são seres vivos que são sujeitos a uma técnica de manipulação que
em nada se prende com ocorrências de cruzamentos ou recombinações proporcionadas pela própria natureza,
sendo que um dos objetivos mais generalizado da manipulação genética de plantas é assegurar-lhes resistência
a herbicidas.
Segundo os signatários, o alargamento da produção agrícola biológica, procura ser livre de agroquímicos,
pelo que, a permissão de culturas OGM torna-se, uma incongruência e um perigo.
Referem, ainda, os subscritores, que há países da UE que, através de moratórias ou cláusulas de
salvaguarda, foram impedindo o cultivo de OGM nos seus territórios, mesmo antes de a UE ter expressamente
alterado as regras estipuladas, passando a decisão de não cultivo de transgénicos para os respetivos Estados-
Membros, a partir de 2015.
Afirmam os signatários que Portugal, ao contrário de países como a Alemanha, a Áustria, a França, o
Luxemburgo ou a Polónia, mantém em geral a permissão de cultivo de OGM. No entanto, visando salvaguardar
a imagem e a qualidade da sua produção agrícola, algumas áreas do território nacional declararam-se livre de
OGM.
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Segundo os subscritores, diversos estudos demonstram que os cidadãos da UE são críticos em relação aos
OGM, dando relevância aos riscos que estes comportam para a saúde humana, não sendo igualmente
indiferentes às ameaças que comportam também para o ambiente.
O GP do PEV sublinha que ao longo de diversas legislaturas tem apresentado um conjunto de iniciativas
visando proibir o cultivo de OGM, iniciativas essas que têm sistematicamente sido rejeitadas com os votos do
PSD, CDS e PS (já nesta Legislatura foi rejeitado o Projeto de Lei n.º 539/XIII/2.ª).
Reconhecendo os subscritores que não têm conseguido vingar as suas pretensões, consideram que há
aspetos atualmente previstos na legislação que regula o cultivo e a comercialização de OGM, que não respeitam
a autonomia de cada cidadão naquelas que devem ser as suas livres e plenas escolhas e por isso o GP do PEV
propõe com esta iniciativa a:
– A obrigatoriedade de todos os produtos que contém OGM, serem devidamente identificados na rotulagem;
– A obrigatoriedade de estender as regras de rotulagem para alimentos com OGM a produtos e subprodutos
de origem animal.
Informação mais detalhada na nota técnica (NT) anexa, elaborada pelos serviços da Assembleia da
República, ao abrigo do disposto no artigo 131.º do RAR.
3 – Requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimento da lei do formulário
De acordo com a NT, dois Deputados do PEV apresentaram o Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª «Alarga a
abrangência das regras de rotulagem para os organismos geneticamente modificados», no âmbito do poder de
iniciativa da lei, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa
(Constituição) e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). Trata-se de um poder dos
Deputados, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR,
e dos grupos parlamentares, nos termos da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f) do
artigo 8.º do RAR.
A iniciativa toma a forma de projeto de lei em conformidade com disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR.
Este é redigido em artigos, apresenta uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é
precedido de uma exposição de motivos, dando cumprimento aos requisitos formais previstos nas alíneas a), b)
e c) do n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
O título do Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os organismos
geneticamente modificados» traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2
do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário, embora no caso se aprovação,
possa ser objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final, conforme
referido na nota técnica anexa.
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
4 – Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Em termos de legislação ordinária relacionada com o objeto concreto da iniciativa em apreço, cite-se o
Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril («Regula a libertação deliberada no ambiente de organismos
geneticamente modificados (OGM) e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos
por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 12 de março»), alterado pelo Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho. Tenha-se em conta que a
Diretiva 2001/18/CE dizia respeito à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados, revogando a Diretiva 90/220/CEE, do Conselho.
Para análise detalhada dos antecedentes legislativos sobre a matéria em questão e ao enquadramento
comunitário e internacional remete-se para consulta da NT anexa.
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PARTE II – OPINIÃO DA RELATORA
A Deputada relatora exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto de Lei n.º
937/XIII/3.ª, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da
Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar em que se integra, reserva a sua posição para o debate posterior.
PARTE III – CONCLUSÕES
1 – A 03 de julho de 2018, dois Deputados do Grupo Parlamentar do PEV apresentaram à Assembleia da
República, o Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª que «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os
organismos geneticamente modificados».
2 – Esta apresentação foi efetuada nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-
se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.
3 – De acordo com o n.º 4 do artigo 131.º do RAR, deve a nota técnica, elaborada pelos serviços da
Assembleia, ser junta, como anexo, ao parecer e acompanhar a iniciativa legislativa ao longo de todo o processo
legislativo.
4 – Nos termos regimentais aplicáveis, deve o presente parecer ser remetido a sua Excelência o Presidente
da Assembleia da República.
5 – Face ao exposto, a Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que a iniciativa em apreço reúne os
requisitos exigidos para ser discutida e votada em Plenário.
Palácio de S. Bento, 05 de dezembro de 2018.
A Deputada relatora, Lúcia Araújo Silva — O Presidente da Comissão, Joaquim Barreto.
Nota: O parecer foi aprovadocom votos a favor do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP e do PCP, tendo-se
registado a ausência de Os Verdes e do PAN, na reunião da Comissão de 3 de janeiro de 2019.
PARTE IV – ANEXOS
Nos termos do n.º 2 do artigo 137.º do RAR, segue em anexo, ao presente parecer, a Nota Técnica a que se
refere o artigo 131.º do mesmo Regimento.
Nota Técnica
Projeto de lei n.º 937/XIII/3.ª (PEV)
Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os alimentos geneticamente modificados
Data de admissão: 4 de julho de 2018.
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
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II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: José Manuel Pinto (DILP), Rafael Silva (DAPLEN),Filipe Luís Xavier (CAE), Rosalina Alves (Biblioteca) e Joaquim Ruas (DAC). Data: 17 de outubro de 2018.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
A iniciativa em apreço apresentada pelo GP do PEV começa por definir, na exposição de motivos, os
Organismos Geneticamente Modificados (OGM) como «sendo aqueles que sofreram uma alteração do seu
material genético, com a introdução de um ou mais genes de outro organismo da mesma espécie ou de espécie
diferente».
Sublinha-se que são seres vivos que são sujeitos a uma técnica de manipulação que em nada se prende
com ocorrências de cruzamentos ou recombinações proporcionadas pela própria natureza, sendo que um dos
objetivos mais generalizado da manipulação genética de plantas é assegurar-lhes resistência a herbicidas.
Relevam os signatários que quando se procura alargar a produção agrícola biológica, livre de agroquímicos,
a permissão de culturas OGM torna-se, de facto, uma incongruência e um perigo.
Refere-se que há países da UE que através de moratórias ou cláusulas de salvaguarda, foram impedindo o
cultivo de OGM nos seus territórios, mesmo antes de a UE ter expressamente alterado as regras estipuladas,
passando a decisão de não cultivo de transgénicos para os respetivos Estados-Membros, a partir de 2015.
Afirma-se que, ao contrário de países como a Alemanha, a Áustria, a França, o Luxemburgo ou a Polónia,
entre outros, Portugal mantém em geral a permissão de cultivo de OGM. No entanto, visando salvaguardar a
imagem e a qualidade da sua produção agrícola, algumas áreas do território nacional declararam-se livre de
OGM.
Segundo os subscritores, diversos estudos demonstram que os cidadãos da UE são críticos em relação aos
OGM, dando relevância aos riscos que estes comportam para a saúde humana, não sendo igualmente
indiferentes às ameaças que comportam também para o ambiente.
O GP do PEV sublinha que aos longos de diversas legislaturas tem apresentado um conjunto de iniciativas
visando proibir o cultivo de OGM, iniciativas essas que têm sistematicamente sido rejeitadas com os votos do
PSD, CDS e PS (já nesta Legislatura foi rejeitado o Projeto de Lei n.º 539/XIII/2.ª).
Reconhecendo os subscritores que não têm feito vencimento as suas pretensões, consideram que há
aspetos atualmente previstos na legislação que regula o cultivo e a comercialização de OGM, que não respeitam
a autonomia de cada cidadão naquelas que devem ser as suas livres e plenas escolhas e por isso o GP do PEV
propõe com esta iniciativa a:
– A obrigatoriedade de todos os produtos que contém OGM serem devidamente identificados na rotulagem;
– A obrigatoriedade de estender as regras de rotulagem para alimentos com OGM a produtos e subprodutos
de origem animal.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
O Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª é subscrito por dois Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Ecologista
«Os Verdes», ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e no artigo 118.º do Regimento da
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Assembleia da República (doravante RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder
dos Deputados, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
RAR, e dos grupos parlamentares, nos termos da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea
f) do artigo 8.º do RAR.
Toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR, encontra-
se redigido sob a forma de artigos, é precedido de uma breve exposição de motivos e tem uma designação que
traduz sinteticamente o seu objeto principal, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento em caso de
aprovação, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
De igual modo encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo
120.º do RAR, uma vez que este projeto de lei não parece infringir princípios constitucionais e define
concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 3 de julho de 2018. Foi admitido e baixou na generalidade à
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), em conexão com a Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas
(6.ª) a 4 de julho, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, tendo sido anunciado
nesse mesmo dia em sessão plenária.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O título da presente iniciativa legislativa – «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os alimentos
geneticamente modificados» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2
do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário1, embora, em caso de
aprovação, possa ser objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.
Este projeto de lei promove a alteração do Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação
deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) e a colocação no mercado de
produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva
2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de março. Ora, segundo as regras de legística formal,
«o título de um ato de alteração deve referir o título do ato alterado, bem como o número de ordem de
alteração»2.
Através da consulta do Diário da República Eletrónico verificou-se que o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de
abril, até à data apenas foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho, pelo que, em caso de
aprovação, esta constituirá a sua segunda alteração.
Assim, em caso de aprovação na generalidade, sugere-se para efeitos de apreciação na especialidade o
seguinte aditamento formal ao título da iniciativa: «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os
alimentos geneticamente modificados, procedendo à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de
abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente modificados (OGM) e a
colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM».
Segundo o disposto no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, «Os diplomas que alterem outros devem indicar
o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles
diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas», sendo que no artigo 1.º
do projeto de lei é identificado o diploma que alterou o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril (bastando tal
informação constar do proémio do artigo, pelo que se sugere a sua omissão na epígrafe).
Os autores não promoveram a republicação, em anexo, do Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, nem se
verificam quaisquer dos requisitos de republicação de diplomas alterados, previstos no artigo 6.º da lei
formulário.
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
1 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho. 2 Duarte, D., Sousa Pinheiro, A. et al (2002), Legística. Coimbra, Editora Almedina, pág. 201.
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No que respeita ao início de vigência, o artigo 2.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor
ocorrerá no prazo de seis meses após publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do
artigo 2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles
fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face
da lei formulário.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Determina o n.º 1 do artigo 60.º da Constituição que «os consumidores têm direito à qualidade dos bens e
serviços consumidos, à formação e à informação, à proteção da saúde, da segurança e dos seus interesses
económicos, bem como à reparação de danos». Acrescentam a alínea i) do artigo 81.º que incumbe
prioritariamente ao Estado a garantia da «defesa dos interesses e direitos dos consumidores» e a alínea e) do
artigo 99.º que a proteção dos consumidores constitui um dos objetivos da política comercial do Estado. Em
matéria ambiental, o artigo 66.º estipula que «todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e
ecologicamente equilibrado e o dever de o defender».
Por sua vez, os artigos 93.º a 100.º da Constituição enformam aquilo a que a doutrina chama a Constituição
agrícola ou agrária, enquanto parte integrante da Constituição económica (artigos 80.º a 107.º). De entre os
objetivos da política agrícola destaca-se o do aumento da produção e produtividade da agricultura, dotando-a
de infraestruturas e outros meios que se revelem adequados, com vista, designadamente, a assegurar a
qualidade dos produtos e o melhor abastecimento do País [artigo 93.º, n.º 1, alínea a)].
Outro objetivo da política agrícola passa por «assegurar o uso e a gestão racional dos solos e dos restantes
recursos naturais, bem como a manutenção da sua capacidade de regeneração» [artigo 93.º, n.º 1, alínea d)].
Este fim concorre para que o Estado promova «uma política de ordenamento e reconversão agrária e de
desenvolvimento florestal, de acordo com os condicionalismos ecológicos e sociais do País» (artigo 93.º, n.º 2).
Genericamente, a Lei n.º 19/2014, de 14 de abril («Define as bases da política de ambiente»)3, estabelece,
no seu artigo 11.º, que a política de ambiente tem também por objeto os componentes associados a
comportamentos humanos, nomeadamente as alterações climáticas, os resíduos, o ruído e os produtos
químicos, com o objetivo de garantir a avaliação e gestão do risco associado aos organismos geneticamente
modificados de modo a garantir a proteção do ambiente e da saúde humana [alínea d)].
Em termos de legislação ordinária relacionada com o objeto concreto da iniciativa em apreço, cite-se o
Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril («Regula a libertação deliberada no ambiente de organismos
geneticamente modificados (OGM) e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos
por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 12 de março»), alterado pelo Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho. Tenha-se em conta que a
Diretiva 2001/18/CE dizia respeito à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados, revogando a Diretiva 90/220/CEE, do Conselho.
Pelo projeto de lei em apreciação, modifica-se a redação do n.º 2 do artigo 26.º desse diploma, quanto aos
«produtos relativamente aos quais não seja possível excluir a existência fortuita ou tecnicamente inevitável de
vestígios de» organismo geneticamente modificado (OGM), assim como se adita um n.º 3 prevendo a situação
dos «produtos e subprodutos com origem em animais alimentados com produtos transgénicos». Mantendo-se
intocado o n.º 1, relativo aos «produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM», a numeração dos
novos preceitos que constam do artigo 1.º do projeto de lei como n.os 1 e 2 constitui óbvio lapso, pois passarão
a ser, caso o projeto de lei venha a merecer concordância, os seus n.os 2 e 3, não sendo o projeto de lei claro
sobre o que acontecerá ao atual n.º 3, aditado pelo Decreto-Lei n.º 164/20044.
Na sequência da aprovação de outros instrumentos normativos comunitários complementares da Diretiva
2001/18/CE, designadamente os Regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do
Conselho, ambos de 22 de setembro, o primeiro relativo a géneros alimentícios e alimentos para animais
geneticamente modificados e o segundo sobre a rastreabilidade e rotulagem de organismos geneticamente
3 Texto consolidado retirado do portal eletrónico do Diário da República. 4 Estamos em crer que não tem sentido mantê-lo.
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modificados e a rastreabilidade dos géneros alimentícios e alimentos para animais produzidos a partir de
organismos geneticamente modificados, alterando a Diretiva 2001/18/CE, e as Diretivas 2002/53/CE e
2002/55/CE, do Conselho, ambas de 13 de junho, a primeira atinente ao catálogo comum das variedades das
espécies de plantas agrícolas e a segunda respeitante à comercialização de sementes de produtos hortícolas,
surgiu o Decreto-Lei n.º 154/2004, de 30 de junho («Estabelece o regime geral do Catálogo Nacional de
Variedades de Espécies Agrícolas e de Espécies Hortícolas e transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva
2002/53/CE, do Conselho, de 13 de junho, que diz respeito ao Catálogo Comum das Variedades das Espécies
de Plantas Agrícolas, e a Diretiva 2002/55/CE, do Conselho, de 13 de junho, respeitante à comercialização de
sementes de produtos hortícolas), o qual, depois de sofrer diversas alterações, viria a ser revogado e substituído
pelo Decreto-Lei n.º 42/2017, de 6 de abril5 («Regula a produção, o controlo, a certificação e a comercialização
de sementes de espécies agrícolas e de espécies hortícolas, transpondo as Diretivas de Execução (UE) n.os
2015/1168, 2015/1955, 2016/11 e 2016/317»). Este diploma, para além de outros motivos, refere, no preâmbulo,
o seu propósito de consolidar também mais de uma dezena de alterações que o anterior decreto-lei havia sofrido
e dificultavam «significativamente a perceção do regime jurídico aplicável».
Por sua vez, o Decreto-lei n.º 168/2004, de 7 de julho, veio estabelecer regras de execução do referido
Regulamento (CE) n.º 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de setembro.
O quadro jurídico nacional comporta ainda os seguintes diplomas, com os quais o projeto de lei se combina:
– A Lei n.º 24/96, de 31 de julho6 7, alterada pela Lei n.º 85/98, de 16 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º
67/2003, de 8 de abril, e pelas Leis n.os 10/2013, de 28 de janeiro, e 47/2014, de 28 de julho8;
– O Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro («Regula o cultivo de variedades geneticamente
modificadas, visando assegurar a sua coexistência com culturas convencionais e com o modo de produção
biológico»);
– O Decreto-Lei n.º 26/2016, de 9 de junho («Assegura a execução e garante o cumprimento, na ordem
jurídica interna, das obrigações decorrentes do Regulamento (UE) n.º 1169/2011, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 25 de outubro de 2011, relativo à prestação de informação aos consumidores dos géneros
alimentícios, e do Regulamento de Execução (UE) n.º 1337/2013, da Comissão, de 13 de dezembro, no que
respeita à indicação do país de origem ou do local de proveniência da carne fresca, refrigerada e congelada de
suíno, de ovino, de caprino e de aves de capoeira, e transpõe a Diretiva 2011/91/UE, do Parlamento Europeu e
do Conselho, de 13 de dezembro).
Importa reter:
– No que concerne à Lei n.º 24/96, o que se dispõe nos seus artigos 3.º, alínea d), e 8.º, que dizem respeito
ao direito do consumidor à informação, «de forma clara, objetiva e adequada», sobre os bens e serviços que
são postos à sua disposição;
– No que se refere ao Decreto-Lei n.º 26/2016, o que se prescreve nos seus artigos 3.º, 4.º, 5.º e 8.º, que
foram objeto de modificação por uma das iniciativas legislativas apresentadas no decurso da presente legislatura
e entretanto rejeitada (Projeto de Lei n.º 639/XIII).
Como antecedentes, diretos ou indiretos, da iniciativa em apreço, podem ser apontados os seguintes projetos
de lei:
– Projeto de Lei n.º 30/VIII («Organismos geneticamente modificados: submissão da lei ao princípio da
precaução»), apresentado pelo BE;9
– Projeto de Lei n.º 43/VIII («Proíbe a comercialização e importação e produção com fins comerciais de
organismos geneticamente modificados»), apresentado pelo PEV;10
5 Texto consolidado retirado do Diário da República Eletrónico (DRE). 6 Texto consolidado retirado do DRE. 7 «Estabelece o regime legal aplicável à defesa dos consumidores. Revoga a Lei n.º 29/81, de 22 de Agosto.» 8 Esta lei contém a versão consolidada da Lei n.º 24/96, republicada em anexo. 9 Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 43/VIII. Deu origem à Lei n.º 12/2002, de 16 de fevereiro («Organismos geneticamente modificados»), através da qual foram suspensas a libertação deliberada no ambiente de produtos geneticamente modificados e a importação e comercialização de produtos que contenham na sua composição organismos geneticamente modificados e que se destinem à alimentação humana ou animal até à transposição da Diretiva 2001/18/CE. 10 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 30/VIII.
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– Projeto de Lei n.º 524/IX («Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho, que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de Organismos Geneticamente
Modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os Regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro»), apresentado pelo PEV;11
– Projeto de Lei n.º 11/X («Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho» que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que «regula a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro»), apresentado pelo PEV;12
– Projeto de Lei n.º 224/XI («Revisão da Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PSD;13
– Projeto de Lei n.º 456/XI («Estabelece as Bases da Política de Ambiente»), apresentado pelo PCP;14
– Projeto de Lei n.º 457/XI («Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PEV;15
– Projeto de Lei n.º 515/XI («Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo BE;16
– Projeto de Lei n.º 560/XI («Revisão da Lei de Bases de Ambiente»), apresentado pelo CDS-PP;17
– Projeto de Lei n.º 29/XII («Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PEV;18
– Projeto de Lei n.º 39/XII («Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo BE;19
– Projeto de Lei n.º 143/XII [«Estabelece as Bases da Política de Ambiente (Revoga a Lei n.º 11/87, de 7 de
abril, que aprovou a ‘Lei de Bases do Ambiente’)»], apresentado pelo PS;20
– Projeto de Lei n.º 154/XII («Estabelece as Bases da Política de Ambiente»), apresentado pelo PCP;21
– Projeto de Lei n.º 182/XII («Informação sobre cultivo de transgénicos – alteração ao Decreto-Lei n.º
160/2005, de 21 de setembro»), apresentado pelo PEV;22
– Projeto de Lei n.º 308/XII («Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»),
apresentado pelo PCP;23
– Projeto de Lei n.º 784/XII («Proíbe o cultivo, importação e comercialização de organismos geneticamente
modificados vegetais»), apresentado pelo BE;24
– Projeto de Lei n.º 805/XII («Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»),
apresentado pelo PCP;25
– Projeto de Lei n.º 811/XII («Impede o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente Modificados»), apresentado pelo PEV.26
Os projetos de resolução relacionados com a questão são os seguintes:
– Projeto de Resolução n.º 26/VIII («Sobre produtos provenientes de organismos geneticamente
modificados»), apresentado pelo CDS-PP;27
– Projeto de Resolução n.º 28/VIII («Adoção da Diretiva 90/220/CEE relativa à libertação deliberada no
ambiente de organismos geneticamente modificados»), apresentado pelo PS;28
11 Caducou em 22-12-2004. 12 Caducou em 14-10-2009. 13 Apesar de aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19-6-2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 456/XI e 457/XI. 14 Apesar de aprovada, a iniciativa viria a caducar em 19-6-2011. Foi discutida em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 457/XI. 15 Embora aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19-6-2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 456/XI. 16 Iniciativa caducada em 19-6-2011. 17 Iniciativa caducada em 19-6-2011. 18 Retomou o Projeto de Lei n.º 457/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 143/XII e 154/XII. 19 Retomou o Projeto de Lei n.º 515/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 20 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 21 Retomou o projeto de lei n.º 456/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 143/XII. 22 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Resolução n.º 236/XII. 23 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Resolução n.ºs 470/XII e 492/XII. 24 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 805/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 25 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 26 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 805/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 27 Iniciativa considerada caducada em 4-4-2002. 28 Iniciativa considerada caducada em 4-4-2002.
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– Projeto de Resolução n.º 37/VIII («Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal
produzidos a partir de organismos geneticamente modificados«), apresentado pelo PEV;29
– Projeto de Resolução n.º 194/X («Recomenda ao Governo a aplicação do princípio da precaução em
relação a milho geneticamente modificado»), apresentado pelo PEV;30
– Projeto de Resolução n.º 230/X [«Recomenda ao Governo uma moratória sobre o cultivo de sementes que
contenham ou sejam constituídas por Organismos Geneticamente Modificados (OGM)»], apresentado pelo BE;31
– Projeto de Resolução n.º 166/XI («Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz
transgénico LLRice62»), apresentado pelo BE;32
– Projeto de Resolução n.º 236/XII («Recomenda ao Governo que proíba a importação e comercialização de
milho transgénico MON810»), apresentado pelo BE;33
– Projeto de Resolução n.º 470/XII («Recomenda ao Governo que proíba a importação, comercialização e
cultivo dos organismos geneticamente modificados milho MON810 e batata amflora»), apresentado pelo BE;34
– Projeto de Resolução n.º 492/XII («Prevê a aplicação do princípio da precaução relativamente ao milho
transgénico NK 603»), apresentado pelo PEV;35
– Projeto de Resolução n.º 1293/XII («Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de
transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se
refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente
modificados (OGM) no seu território»), apresentado pelo PS.36
Na presente legislatura foi já apresentado e debatido o Projeto de Lei n.º 539/XIII, com a mesma finalidade
do que está em apreciação na presente nota técnica. Foi rejeitado na votação na generalidade, sendo apropriado
remeter para as considerações constantes do parecer da comissão parlamentar competente e respetiva nota
técnica.
A iniciativa reprovada foi discutida em conjunto com os Projetos de Lei n.os 639/XIII – «Torna mais
transparentes as regras de rotulagem e de fiscalização relativas à presença de organismos geneticamente
modificados assegurando aos consumidores o acesso à informação» – e 641/XIII – «Direito à informação aos
consumidores sobre alimentos geneticamente modificados (OGM) (segunda alteração ao Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril)».
O primeiro desses projetos37, versando a matéria central em questão, propunha a introdução de alterações
tanto ao Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, como ao Decreto-Lei n.º 26/2016, de 9 de junho.
No primeiro caso, para além de alterações ao artigo 26.º, como acontece com o projeto de lei em apreciação,
propunham-se ainda as seguintes modificações no artigo 29.º:
«Artigo 29.º
[…]
1 – ...................................................................................................................................................................
2 – O resultado das fiscalizações efetuadas deverá ser compilado num relatório anual a elaborar pela
autoridade competente, devendo o mesmo ser tornado público.
3 – A listagem de entidades que sejam condenadas nos termos do disposto no artigo 35.º deve ser tornada
pública no referido relatório.»
29 Daria origem à Resolução da Assembleia da República n.º 64/2000, de 14 de julho («Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal produzidos a partir de organismos geneticamente modificados»). 30 Iniciativa caducada em 14-10-2009. 31 Iniciativa caducada em 14-10-2009. 32 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 104/2010, de 16 de agosto («Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz transgénico LLRice62»). 33 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 182/XII. 34 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 492/XII. 35 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 470/XII. 36 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 32/2015, de 1 de abril («Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE, de 12 de março, no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território»). 37 Apresentado pelo PAN.
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No segundo caso, aditava-se uma alínea f) ao n.º 1 do artigo 3.º (com o seguinte teor: «Informação se o
género alimentício contém organismos geneticamente modificados e, em caso afirmativo, usar a expressão ‘este
produto contém organismos geneticamente modificados’»), uma alínea c) ao n.º 1 do artigo 4.º (com o seguinte
teor: «Informação se o género alimentício contém organismos geneticamente modificados e, em caso afirmativo,
usar a expressão ‘este produto contém organismos geneticamente modificados’»), uma alínea f) ao n.º 1 e uma
alínea i) (com o mesmo teor) ao n.º 2 do artigo 5.º (com o seguinte teor: «Informação se o género alimentício
contém organismos geneticamente modificados e, em caso afirmativo, usar a expressão ‘este produto contém
organismos geneticamente modificados’»), um novo n.º 4 ao mesmo artigo 5.º [com o seguinte teor: «No caso
das embalagens ou recipientes cuja face maior tenha uma superfície inferior a 10 cm2, só são obrigatórias na
embalagem ou no rótulo as menções previstas nas alíneas a), b), c), d) e i) do n.º 2, sendo as menções referidas
nas alíneas e), f) g) e h) do mesmo número ser fornecidas por outros meios, ou disponibilizadas a pedido do
consumidor»], uma alínea f) ao n.º 1 do artigo 8.º (com o seguinte teor: «Informação se o género alimentício
contém organismos geneticamente modificados e, em caso afirmativo, usar a expressão ‘este produto contém
organismos geneticamente modificados’») e um novo artigo 12.º-A, com a epígrafe «Relatório anual» [com dois
números, do seguinte teor: «1 – O resultado das fiscalizações efetuadas deverá ser compilado num relatório
anual a elaborar pela autoridade competente, devendo o mesmo ser tornado público no sitio da internet da
referida entidade. 2 – A listagem de entidades que sejam condenadas nos termos do disposto no artigo 11.º, n.º
1, alínea a), deve ser tornada pública no referido relatório.»].
O segundo dos projetos38 optou, à semelhança do projeto de lei em apreciação, por alterar apenas o artigo
26.º do Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, dando-lhe a seguinte redação:
«Artigo 26.º
[…]
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – É obrigatória a rotulagem com indicação de presença de OGM:
a) Independentemente da percentagem de OGM presente no produto;
b) Sempre que não se possa excluir a presença de OGM no produto, incluindo quando a presença desses
vestígios possa ser acidental ou tecnicamente inevitável;
c) Para produtos e subprodutos de origem animal que tenham sido alimentados com OGM;
d) Alimentos confecionados com OGM e/ou com produtos ou subprodutos de origem animal alimentados com
OGM.
3 – (Revogado).»
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
AZEVEDO, M. Alexandra Santos de – Os produtos transgénicos: avanços e recuos: segurança alimentar.
RPDC. Coimbra. N.º 63 (set. 2010), p. 111-141. Cota: RP-633.
Resumo: Neste artigo a autora começa por apresentar uma definição do que são os alimentos transgénicos.
Seguidamente, levanta a questão da segurança destes produtos e apresenta informação sobre os riscos
potenciais dos mesmos, sobre o que se sabe sobre os seus efeitos na saúde e sobre as medidas implementadas
a nível europeu para avaliação do risco e aprovação dos transgénicos.
A autora conclui este artigo dizendo que «com o cultivo de transgénicos não é apenas a soberania alimentar,
mas a própria segurança alimentar que é posta em causa – e a adoção de transgénicos depois de consolidada,
é um passo social a muitos níveis irreversível.»
CUNHA, Luís Pedro – Responsabilidade e mercado: organismos geneticamente modificados e comércio
internacional. Boletim de ciências económicas. Lisboa. ISSN 0870-4252. Vol. 53 (2010), p. 61-93. Cota: RP-
353.
38 Apresentado pelo BE.
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30
Resumo: O autor analisa as transações internacionais dos organismos geneticamente modificados, à luz dos
tratados internacionais vigentes, com enfoque nas relações tensas entre os Estados Unidos e a União Europeia,
sobre esta matéria, motivadas por questões ambientais, de segurança e de rotulagem dos produtos.
GONÇALVES, Maria Eduarda – Regulação do risco e «risco» da regulação: o caso dos organismos
geneticamente modificados. In Estudos comemorativos dos 10 anos da Faculdade de Direito da
Universidade Nova de Lisboa. Coimbra: Almedina, 2008. ISBN 978-972-40-3426-3. Vol.1, p. 441-471. Cota:
12.06 – 16/2017.
Resumo: Neste artigo a autora analisa a regulação dos riscos associados, direta ou indiretamente, ao
desenvolvimento tecnológico e industrial, os quais geram particular inquietação na sociedade. Por regulação do
risco entende a autora «a intervenção dos poderes públicos no mercado ou nos processos económicos e sociais,
visando controlar as consequências potencialmente adversas que deles possam resultar para a saúde pública,
o ambiente ou, de uma maneira geral, a segurança das pessoas e bens.»
No ponto 2 do artigo – A regulação europeia dos organismos geneticamente modificados – a autora analisa
a legislação europeia sobre este assunto e aborda a problemática da rastreabilidade e rotulagem de OGM.
Segundo a mesma «a rastreabilidade (‘traceability’) de OGM permite acompanhar o percurso dos produtos
desde o seu fabrico à sua distribuição tendo em vista verificar o cumprimento das obrigações de rotulagem,
controlar potenciais efeitos sobre a saúde e o ambiente e retirá-los do mercado se for detetado um risco não
previsto. As exigências em matéria de rotulagem visam, por seu lado, informar o consumidor ou utilizador do
produto permitindo-lhes assim uma ‘escolha informada’. O Regulamento 1830/2003 que estabelece os requisitos
a cumprir nestas matérias aplica-se a todos os OGM autorizados a circular no mercado europeu, produtos
alimentares ou não, sementes, etc.
No entanto, partindo do pressuposto de que é praticamente impossível fabricar produtos 100% puros –
tratando-se de produtos alimentares sem recurso a OGM – excetuam-se das obrigações estipuladas os produtos
que contenham traços de OGM abaixo do limite de 0.9% sob condição de essa presença ser fortuita ou
tecnicamente inevitável; ou seja, os produtores devem demonstrar ter tomado medidas apropriadas para evitar
a presença desse material (Artigo 4.º, n.os 7 e 8). Excetuam-se ainda carne, leite ou ovos obtidos a partir de
animais alimentados ou tratados medicinalmente com produtos OGM. Admite-se além disso a presença até um
máximo de 0.5% de OGM já avaliados cientificamente como não colocando em perigo o ambiente e a saúde,
ainda que a sua aprovação formal esteja pendente.»
LES ORGANISMES génétiquement modifiés. Futuribles: analyse et prospective. Paris. ISSN 0337-307X.
N.º 383 (mars 2012). 192 p. Cota: RE-4-.
Resumo: Este número da revista Futuribles é inteiramente dedicado aos organismos geneticamente
modificados (OGM) e, mais especificamente, às plantas geneticamente modificadas, às suas virtudes e perigos,
reais e alegados, sendo apresentados diferentes pontos de vista e argumentos, de quem defende e de quem se
opõe ao seu estudo/investigação, cultivo e consumo.
A opinião dos europeus (pág. 119-133) sobre este assunto é analisada por Daniel Boy que, com base em
inquéritos Eurobarómetro realizados ao longo de 15 anos ou mais, mostra que nunca houve uma maioria na UE
a favor do desenvolvimento de OGM para a produção de alimentos e, entre 1996 e 2010, a proporção de pessoas
relutantes em ver esse desenvolvimento, na verdade, aumentou. Neste artigo, Boy mostra as disparidades
existentes entre os vários países europeus e apresenta razões que podem explicar essas diferenças.
PIGNATARO, Laura – La politique de l'Union Européenne en matière d'OGM. Revue du droit de l'Union
Européenne. Paris. ISSN 1155-4274. N.º 3 (2011), p. 361-380. Cota: RE-200.
Resumo: Neste artigo, após definir com brevidade o conceito de organismo geneticamente modificado, as
condições para a aceitação e os procedimentos para a sua autorização e introdução na União Europeia, a autora
faz uma análise do quadro regulamentar aplicável no âmbito da UE e as iniciativas legislativas, em curso, que
visam a sua alteração.
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SANTOS, Ana Morgado dos; CAETANO, José Manuel – Legislação sobre os organismos geneticamente
modificados: segurança alimentar ou protecionismo? Nação e defesa. Lisboa. ISSN 0870-757X. N.º 125 (2010),
p. 193-208. Cota: RP-72.
Resumo: «Os grandes produtores e exportadores mundiais de produtos agrícolas têm vindo a adotar a
engenharia genética nesta atividade com o intuito de melhorar a produtividade dos fatores e aumentar a
rentabilidade das empresas. Na última década, os Estados Unidos (EUA) e a União Europeia (UE)
implementaram legislação muito díspar no que diz respeito à produção, comercialização e consumo de
organismos geneticamente modificados (OGM). Aparentemente, a forte pressão política exercida pelos
consumidores europeus no sentido de efetuarem escolhas informadas sobre os alimentos que consomem, levou
a UE a tornar obrigatória a rotulagem dos OGM, assim como, o seu rastreio ao longo das sucessivas fases da
cadeia de produção e de distribuição. Neste contexto, o presente artigo tem por objetivo identificar e entender
as potenciais motivações que têm estado por detrás das diferentes políticas seguidas pela UE e pelos EUA
relativamente aos produtos alvo de modificação genética.»
SEMINÁRIO do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida – Nanotecnologias e o.g.m.: ciência,
ética e sociedade. Coleção Bioética. Lisboa. ISBN 978-9728368-30-2. N.º 12 (2011), 94 p. Cota: RP-718.
Resumo: No âmbito deste seminário destacamos a comunicação de Maria Eduarda Gonçalves, que no artigo
«Entre incertezas e controvérsias: a regulação do OGM na Europa» analisa os desafios suscitados pelas
inovações de base tecnológica cujos impactes são difíceis de avaliar e se encontram envoltas em controvérsia
e contestação social e política. Na Europa (Áustria, Grécia, França, Alemanha), onde esta controvérsia tem sido
mais intensa têm sido evidenciadas as incertezas que envolvem a avaliação de benefícios e riscos das culturas
e alimentos transgénicos.
A autora refere que a União Europeia respondeu a estas incertezas e controvérsias instituindo um sistema
regulador assente, desde 2001, no princípio da precaução. A premissa essencial deste princípio é que a
ausência de prova do risco não deve ser invocada como justificação da omissão de medidas que possam
prevenir a manifestação desse risco, sendo que a legislação aplicável prevê a consulta do público e de grupos
de interesse na fase da avaliação dos processos de licenciamento de OGM, mas esta consulta não tem tido
expressão efetiva e a prática mostra que os cidadãos são encarados como meros consumidores numa relação
de mercado.
Destaque ainda para a comunicação de Paula Cruz de Carvalho: «Organismos geneticamente modificados
na agricultura» segundo a qual na procura por novas características, melhor adaptação aos diferentes ambientes
agrícolas, maior resistência a pragas e doenças, maior produtividade por unidade de solo arável, os
investigadores, através de um longo e evolutivo trabalho de melhoramento vegetal, têm vindo ao longo dos
tempos a obter uma extensa gama de diferentes variedades das espécies vegetais utilizadas na agricultura, em
particular para benefício do agricultor e do consumidor e, em geral para um mais eficiente uso dos recursos
naturais disponíveis.
TRUNINGER, Mónica; FERREIRA, José Gomes – Consumo, alimentação e OGM. In Ambiente, alterações
climáticas, alimentação e energia: a opinião dos portugueses. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2014.
(Observatórios ICS; 1). ISBN 978-972-671-335-7. p. 199-245. Cota: 52 – 217/2015.
Resumo: A obra em apreço «apresenta um panorama da evolução da opinião pública em Portugal sobre
questões de ambiente, consumo e energia nas últimas décadas. A enquadrar cada tema analisam-se as
principais políticas entretanto lançadas às escalas europeia e nacional. São exploradas questões como a
informação sobre temas ambientais, nível de preocupação com os problemas, concordância com as medidas
de política ou práticas do quotidiano.»
No capítulo em referência os autores analisam as atitudes, opiniões e informação dos portugueses sobre
alimentação e organismos geneticamente modificados. Os autores verificam que os portugueses têm vindo a
manifestar preocupações e opiniões convergentes com as dos restantes europeus, relativamente às
características de exigência de qualidade dos produtos. No entanto, na hora de comprar, o preço ainda é mais
importante que a qualidade.
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Quanto à insegurança alimentar, os dados obtidos nos inquéritos mostram que os portugueses estão mais
seguros, resultado dos esforços de implementação de uma estratégia robusta de segurança e controlo
alimentares.
Quanto à confiança, os portugueses confiam na opinião dos cientistas para obter informação credível sobre
a qualidade e a segurança alimentares.
Os autores terminam analisando com maior detalhe a temática da aplicação da biotecnologia à produção
alimentar, quer através da utilização de OGM, quer através da clonagem animal e concluem que os portugueses,
tal como os europeus, mostram-se muito críticos.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Em termos de legislação europeia, entende-se por OGM «qualquer organismo, com exceção do ser humano,
cujo material genético tenha sido modificado de uma forma que não ocorre naturalmente por meio de
cruzamentos/ou de recombinação natural»39.
Neste sentido, a UE estabeleceu um quadro jurídico estrito para o cultivo e a comercialização de OGM
utilizados em géneros alimentícios ou alimentos para animais, que estabelece a obrigatoriedade da EFSA,
juntamente com os organismos científicos dos Estados-Membros, efetuar uma avaliação científica dos riscos,
de forma a excluir qualquer perigo para a saúde humana, a saúde animal ou o ambiente, antes da colocação no
mercado de qualquer OGM.
Tendo como fundamento o parecer da EFSA, a CE prepara um projeto de decisão de forma a conceder ou
recusar a autorização, a qual é objeto de votação, por maioria qualificada, por um comité de peritos constituído
por representantes dos Estados-Membros. Todos os géneros alimentícios ou alimentos para animais produzidos
a partir de OGM ou contendo OGM têm a obrigatoriedade de ser rastreáveis e rotulados como tal, para que os
consumidores possam fazer escolhas informadas.
Em abril de 2015 entrou em vigor a Diretiva (UE) 2015/412 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de
março de 2015, que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros
limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território, concedendo
aos Estados-Membros maior flexibilidade relativamente ao cultivo de OGM, sem pôr em causa a avaliação do
risco ambiental, que faz parte do regime de autorizações de OGM da UE previsto no Regulamento (CE) n.º
1829/2003 e na Diretiva 2001/18/CE. Permitindo, assim, aos países proibir ou limitar, a título individual, o cultivo
de OGM, mesmo que sejam autorizadas a nível da UE.
Em 2016, o Parlamento adotou resoluções40 contra a autorização pela CE de organismos geneticamente
modificados (OGM) e a favor do envidamento de esforços de forma a facilitar a proibição do cultivo de OGM
pelos Estados-Membros, em conformidade com o objetivo de proteger a biodiversidade, a natureza e os solos.
O PE fez também um apelo à CE de forma a apresentar propostas legislativas relativas à indicação obrigatória
do país de origem, com especial enfoque na carne utilizada como ingrediente em alimentos transformados. Esta
medida tem como objetivo restaurar a confiança dos consumidores na sequência dos casos de escândalos de
fraude alimentar.
Em 2017, o Parlamento e o Conselho chegaram a acordo relativamente às novas regras, de forma a reforçar
os controlos oficiais dos alimentos, a fim de melhorar a rastreabilidade dos alimentos e combater a fraude. Na
sequência de preocupações sobre os riscos decorrentes da utilização na agricultura da substância herbicida
glifosato, o PE decidiu, em fevereiro de 2018, instituir a Comissão Especial sobre o Procedimento de Autorização
da União para os Pesticidas (PEST) de examinar o procedimento de autorização de pesticidas na UE.
Seguidamente, a Comissão propôs um reexame da legislação alimentar geral da UE, de forma a aumentar a
transparência das avaliações de risco da EFSA e a independência dos estudos científicos subjacentes,
melhorando a cooperação com os Estados-Membros respeitante à disponibilização de dados e peritos. Está
igualmente previsto reexaminar atos legislativos fundamentais, em domínios como novos alimentos, OGM,
pesticidas, materiais em contacto com géneros alimentícios e aditivos alimentares,
39 Diretiva UE 2001/18/CE 40 Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de maio de 2016, sobre a indicação obrigatória do país de origem ou do local de proveniência de determinados alimentos (JO C 76, 28.2.2018, p. 49).
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Em abril de 2018, a CE propôs uma revisão do Regulamento Geral da Legislação Alimentar Geral41, que
estabelece os princípios gerais de toda a legislação alimentar nacional e da UE, em conjunto com a revisão de
oito atos legislativos setoriais, de forma a torna-los conformes com as regras gerais e reforçar a transparência
em matéria de OGM, aditivos para a alimentação animal, aromatizantes de fumo, materiais em contacto com
géneros alimentícios, aditivos alimentares, enzimas e aromas alimentares, produtos fitofarmacêuticos e novos
alimentos.
O balanço de qualidade sobre a legislação alimentar geral, realizado pela CE, irá:
Permitir aos cidadãos um maior acesso às informações apresentadas à Autoridade Europeia para a
Segurança dos Alimentos (EFSA) sobre as aprovações relativas à cadeia agroalimentar;
Dar a possibilidade à Comissão Europeia de solicitar estudos adicionais;
Envolver de forma estreita os cientistas dos Estados-Membros nos procedimentos de aprovação.
Assegurar maior transparência, permitindo aos cidadãos terem acesso automático e imediato a todas
as informações relacionadas com a segurança apresentadas pela indústria no processo de avaliação
dos riscos;
Criar um registo europeu comum de estudos encomendados, de forma a garantir que as empresas
requerentes de autorização apresentam todas as informações pertinentes, não omitindo estudos
desfavoráveis;
Permitir que a EFSA solicite estudos adicionais, a pedido da CE, financiados pelo orçamento da UE;
Requerer a consulta das partes interessadas e do público sobre os estudos apresentados pela indústria
de forma a apoiar os pedidos de autorização dos produtos;
Aumentar a participação dos Estados-Membros na estrutura de governação e painéis científicos da
EFSA;
Reforçar a comunicação dos riscos aos cidadãos, com ações comuns de forma a fortalecer a confiança
dos consumidores, promovendo a sensibilização e a compreensão do público e explicando de uma
melhor forma os pareceres científicos expressos pela EFSA, bem como a base das decisões em matéria
de gestão dos riscos.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes Estados-membros da União Europeia: Espanha e
França.
ESPANHA
O regime jurídico paralelo do direito espanhol consta da Ley 9/2003, de 25 de abril («establece el régimen
jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»)42, regulamentada pelo Real Decreto 178/2004, de 30 de enero («por el que se aprueba el
Reglamento general para el desarrollo y ejecución de la Ley 9/2003, de 25 de abril, por la que se establece el
régimen jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»)43.
No que concerne ao aspeto específico tratado no projeto de lei sob análise, o primeiro dos referidos diplomas
alude, no seu preâmbulo, à adequada rotulagem dos produtos em questão para garantir quer o controlo pelas
autoridades competentes quer a informação dos consumidores, remetendo, no seu artigo 22, para os requisitos
de etiquetagem a determinar por via regulamentar.
41 Regulamento (CE) n.º 178/2002 42 Texto consolidado retirado de www.boe.es. 43 Texto consolidado retirado de www.boe.es.
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Regulamentando a questão, o Decreto Real 178/2004 estabelece, na alínea e) do n.º 2 do artigo 3244, a
respeito do pedido de autorização para colocação do produto no mercado, que a proposta de rotulagem deve
obedecer aos requisitos estabelecidos no seu anexo VIII e indicar claramente a presença de organismos
modificados geneticamente. Diz ainda esse preceito que no rótulo ou nas informações adicionais deve figurar a
frase seguinte: «Este producto contiene organismos modificados geneticamente».
Quanto aos produtos relativamente aos quais não seja possível excluir a existência fortuita ou tecnicamente
inevitável de vestígios de organismos geneticamente modificados, rege o n.º 2 do artigo 50, segundo o qual se
deve garantir que «los operadores apliquen los umbrales mínimos establecidos por la Comisión Europea, por
debajo de los cuales no necesitarán etiquetarse los productos respecto de los cuales no puedan excluirse rastros
accidentales o técnicamente inevitables de organismos modificados genéticamente autorizados».
FRANÇA
A legislação básica está concentrada no Título III do Livro V da Parte Legislativa do Code de l'Environnement,
sob a epígrafe «Organismes génétiquement modifiés». A libertação e colocação no mercado de organismos
geneticamente modificados é regulada nas secções 2 e 3 do Capítulo III («Dissémination volontaire d'organismes
génétiquement modifiés») do referido Título III, continuando a admitir-se a sua existência, embora sempre com
sujeição a rotulagem obrigatória e exame prévio do respetivo pedido de autorização que tem em conta os riscos
para o ambiente e a saúde pública (artigos L533-3 a L533-8-2).
Com relevância para a questão em apreço, o portal eletrónico InfOGM45 refere que a matéria é enquadrada
principalmente ao nível europeu, mas deixa aos Estados-membros margem de manobra para precisarem
determinados aspetos do regime jurídico respetivo, designadamente no plano da rotulagem dos produtos. De
acordo com o guia aí disponibilizado, o regime jurídico nacional46 não exceciona o caso dos produtos com origem
em animais alimentados com produtos transgénicos, mantendo-se, assim, a não obrigação de rotulagem desses
produtos, o que decorre diretamente da legislação europeia.
Outros países
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
De acordo com a lei federal numerada como Public Law 114-2016, também os Estados Unidos da América,
à semelhança de países como a China, o Brasil e o Canadá, admitem o cultivo e comercialização de organismos
geneticamente modificados, embora sujeito a rigorosas normas de autorização prévia e rotulagem e identificação
do produto alimentício, que obrigam, designadamente, à indicação da quantidade de substâncias geneticamente
manipuladas nele contidas, de acordo com o Safe and Accurate Food Labeling Act of 2015.
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada consulta à base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontram em
apreciação, na Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), as seguintes iniciativas legislativas sobre matéria conexa
com a presente:
Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª (PAN) – «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos
geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de
21 de setembro)»;
44 Que tem a disposição simétrica, no que se refere à decisão de autorização da comercialização do produto, na alínea e) do artigo 37. 45 Portal específico dedicado às questões relativas aos organismos geneticamente modificados. 46 O qual envolveu a modificação de vários códigos, nomeadamente o Code de l´Environnement.
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Projeto de Lei n.º 936/XIII/3.ª (PEV) – «Impede o cultivo e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente modificados (OGM)»;
Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª (PCP) – «Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente
modificadas (OGM)».
Petições
Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), não se identificou qualquer petição pendente,
neste momento, sobre matéria idêntica.
V. Consultas e contributos
Consultas facultativas
Podem ser ouvidas Associações de Consumidores, Associações Ambientalistas e Associações de
Agricultores, bem como a Agência Portuguesa do Ambiente e a Direção-Geral de Saúde.
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face da informação disponível, não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes
da aprovação da presente iniciativa.
————
PROJETO DE LEI N.º 938/XIII/3.ª
[REGULA O CULTIVO DE VARIEDADES AGRÍCOLAS GENETICAMENTE MODIFICADAS (OGM)]
Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio
Parecer
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião da Deputada Autora do Parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – CONSIDERANDOS
1 – Introdução
Quinze Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) apresentaram o Projeto de
Lei n.º 938/XIII/3.ª «Regula o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM)», no âmbito do poder de
iniciativa da lei, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa
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(Constituição) e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
O Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª «Regula o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM)», foi
admitido e baixou na generalidade, à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), em conexão com a Comissão de
Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização e Poder Local e Habitação (11.ª), a 4 de julho, tendo
sido, nesse mesmo dia, anunciado em sessão plenária.
2 – Objeto e Motivação
Na exposição do Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª (PCP) «Regula o cultivo de variedades agrícolas
geneticamente modificadas (OGM)», apresentada pelo GP do PCP, sublinha-se que «A biotecnologia tem vindo
a ganhar crescente importância a nível mundial, apresentando enormes potencialidades, as quais, se
concretizadas e utilizadas de forma adequada, poderão dar um valioso contributo para o desenvolvimento
económico e o progresso social».
Os subscritores da iniciativa Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª (PCP) «Regula o cultivo de variedades agrícolas
geneticamente modificadas (OGM)», pretendem que a agricultura convencional e/ou biológica sejam a regra da
agricultura nacional e que todo o País seja considerado zona livre de transgénicos, remetendo o cultivo de OGM
para o âmbito da exceção.
Os subscritores consideram que não podem deixar de pugnar por uma criteriosa aplicação do princípio da
precaução e, em defesa dos seus princípios para o setor agrícola, no contexto dos OGM, fundamentam as suas
motivações nos seguintes pressupostos:
Na agricultura portuguesa dominam as explorações agrícolas familiares, de pequena e média dimensão,
de pendor policultural, com pouca apetência para o uso de Organismos Geneticamente Modificados (OGM).
Sob o ponto de vista comercial, a agricultura nacional só tem a ganhar com a defesa da promoção da
qualidade do produto nacional, «biológico», de espécies regionais e tradicionais, assegurando nichos de
mercado.
A legislação nacional sobre OGM fomenta o cultivo de sementes transgénicas, sobrepondo o direito de
cultivar essas sementes ao direito a não cultivar.
Esta opção ignora as dúvidas cientificamente sustentadas sobre os efeitos da utilização de OGM, quer no
plano da segurança alimentar, quer da biodiversidade, colocando ainda em risco a própria soberania alimentar,
dado que quem investiga, desenvolve e comercializa os OGM são multinacionais estrangeiras.
Portugal pela sua geomorfologia, pelas suas características pedológicas e pela sua estrutura fundiária e
de produção agrícola, não apresenta vantagens em optar pelo cultivo transgénico, relevando-se que as
exportações agroalimentares nacionais só têm a ganhar com a imagem de um País livre de culturas
transgénicas.
A União Europeia tomou a decisão de abertura ao cultivo de variedades geneticamente modificadas,
remetendo essa mesma decisão para os Estados-Membros, a possibilidade de proibirem a sua plantação em
parte ou em todo o seu território.
O risco de generalização das produções transgénicas poderá fazer com que a agricultura convencional e
ou biológica se tornem exceções.
3 – Requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimento da lei do formulário
A iniciativa toma a forma de projeto de lei em conformidade com disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR.
Este é redigido em artigos, apresenta uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é
precedido de uma exposição de motivos, dando cumprimento aos requisitos formais previstos nas alíneas a), b)
e c) do n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
O título do Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª «Regula o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM)»
traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98,
de 11 de novembro, conhecida como lei formulário, embora no caso de aprovação, possa ser objeto de
aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final, conforme referido na Nota
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Técnica anexa.
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
4 – Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Em termos de legislação ordinária relacionada em concreto com o objeto concreto das iniciativas em apreço,
cite-se o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril («Regula a libertação deliberada no ambiente de organismos
geneticamente modificados (OGM) e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos
por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 12 de março»), alterado pelo Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho. Tenha-se em conta que a
Diretiva 2001/18/CE dizia respeito à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados, revogando a Diretiva 90/220/CEE, do Conselho.
Para análise detalhada dos antecedentes legislativos sobre a matéria em questão e ao enquadramento
internacional (direito comparado) remete-se para consulta da NT anexa.
PARTE II – OPINIÃO DA RELATORA
A Deputada relatora exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto de Lei n.º
938/XIII/3.ª, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da
Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar em que se integra, reserva a sua posição para o debate posterior.
PARTE III – CONCLUSÕES
1 – A 3 de julho de 2018,15 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português
apresentaram à Assembleia da República, o Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª que «Regula o cultivo de organismos
geneticamente modificados (OGM)».
2 – Esta apresentação foi efetuada nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-
se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.
3 – De acordo com o n.º 4 do artigo 131.º do RAR, deve a Nota Técnica, elaborada pelos serviços da
Assembleia da República, ser junta, como anexo, ao Parecer e acompanhar a iniciativa legislativa ao longo de
todo o processo legislativo.
4 – Nos termos regimentais aplicáveis, deve o presente parecer ser remetido a sua Excelência o Presidente
da Assembleia da República.
5 – Face ao exposto, a Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que a iniciativa em apreço reúne os
requisitos exigidos para ser discutida e votada em Plenário.
Palácio de S. Bento, 5 de dezembro de 2018.
A Deputada relatora, Lúcia Araújo Silva — O Presidente da Comissão, Joaquim Barreto.
Nota: O parecer foi aprovadocom votos a favor do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP e do PCP, tendo-se
registado a ausência de Os Verdes e do PAN, na reunião da Comissão de 3 de janeiro de 2019.
PARTE IV – ANEXOS
Nos termos do n.º 2 do artigo 137.º do RAR, segue em anexo, ao presente parecer, a Nota Técnica a que se
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refere o artigo 131.º do mesmo Regimento.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª (PEV)
Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas (OGM)
Data de admissão: 4 de julho de 2018.
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: Rafael Silva (DAPLEN), José Manuel Pinto (DILP), Rosalina Alves (Biblioteca), Filipe Xavier (CAE) e Joaquim Ruas (DAC).
Data: 17 de setembro de 2018.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
Na exposição da iniciativa em apreço, apresentada pelo GP do PCP, sublinha-se que «A biotecnologia tem
vindo a ganhar crescente importância a nível mundial, apresentando enormes potencialidades, as quais, se
concretizadas e utilizadas de forma adequada, poderão dar um valioso contributo para o desenvolvimento
económico e o progresso social».
No entanto, os subscritores referem que não podem deixar de pugnar por uma criteriosa aplicação do
princípio da precaução, em particular no setor agrícola.
Sublinha-se que na agricultura portuguesa dominam as explorações agrícolas familiares, de pequena e média
dimensão, de pendor policultural, com pouca apetência para o uso de Organismos Geneticamente Modificados
(OGM).
Afirma-se que, do ponto de vista comercial, a agricultura nacional só tem a ganhar com a defesa da promoção
da qualidade do produto nacional, «biológico», de espécies regionais e tradicionais, assegurando nichos de
mercado.
Consideram os subscritores que a legislação nacional sobre OGM fomenta o cultivo de sementes
transgénicas, sobrepondo o direito de cultivar essas sementes ao direito a não cultivar.
Acrescentam os proponentes que esta opção ignora as dúvidas cientificamente sustentadas sobre o efeitos
da utilização de OGM quer no plano da segurança alimentar, quer da biodiversidade, colocando ainda em risco
a própria soberania alimentar, dado que quem investiga, desenvolve e comercializa os OGM são multinacionais
estrangeiras.
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Referem os subscritores que Portugal pela sua geomorfologia, pelas suas características pedológicas e pela
sua estrutura fundiária e de produção agrícola, não apresenta vantagens em optar pelo cultivo transgénico,
relevando-se que as exportações agroalimentares nacionais só têm a ganhar com a imagem de um País livre
de culturas transgénicas.
Releva-se que a União Europeia tomou a decisão de abertura ao cultivo de variedades geneticamente
modificadas, remetendo essa mesma decisão para os Estados-Membros, a possibilidade de proibirem a sua
plantação em parte ou em todo o seu território.
Considera-se que o risco de generalização das produções transgénicas poderá fazer com que a agricultura
convencional e/ou biológica se tornem exceções. Ora, o que os subscritores da iniciativa em apreço propõem é
precisamente o contrário, isto é, que a agricultura convencional e/ou biológica sejam a regra da agricultura
nacional e que todo o País seja considerado zona livre de transgénicos, remetendo o cultivo de OGM para o
âmbito da exceção.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
O Projeto de Lei n.º 938/XIII/3.ª é subscrito por 15 Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista
Português, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e no artigo 118.º do Regimento da
Assembleia da República (doravante RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder
dos Deputados, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
RAR, e dos grupos parlamentares, nos termos da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea
f) do artigo 8.º do RAR.
Toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR, encontra-
se redigido sob a forma de artigos, é precedido de uma breve exposição de motivos e tem uma designação que
traduz sinteticamente o seu objeto principal, embora possa ser objeto de aperfeiçoamento em caso de
aprovação, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
De igual modo encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo
120.º do RAR, uma vez que este projeto de lei não parece infringir princípios constitucionais e define
concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 3 de julho de 2018. Foi admitido e baixou na generalidade à
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), em conexão com a Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território,
Descentralização, Poder Local e Ambiente (11.ª) a 4 de julho, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da
Assembleia da República, tendo sido anunciado nesse mesmo dia em sessão plenária.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O título da presente iniciativa legislativa – «Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente
modificadas (OGM)» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo
7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário1, embora, em caso de aprovação, possa
ser objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.
Tomando em consideração a regra de legística segundo a qual «as vicissitudes que afetem globalmente um
ato normativo devem ser identificadas no título, o que ocorre, por exemplo, em atos de suspensão ou em
revogações expressas de todo um outro ato»2, sugerimos que se informe no título a revogação efetuada ao
Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de organismos
geneticamente modificados (OGM) e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos
1 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho. 2 Duarte, D., Sousa Pinheiro, A. et al (2002), Legística. Coimbra, Editora Almedina, pág. 203.
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por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2001/18/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 12 de março, ao Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro, que regula o cultivo de variedades
geneticamente modificadas, visando assegurar a sua coexistência com culturas convencionais e com o modo
de produção biológico, e à Portaria n.º 904/2006, de setembro, que estabelece as condições e o procedimento
para o estabelecimento de zonas livres de cultivo de variedades geneticamente modificadas.
Assim, sugere-se por exemplo a seguinte formulação: «Regula o cultivo de variedades agrícolas
geneticamente modificadas, revogando o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, o Decreto-Lei n.º 160/2005,
de 21 de setembro, e a Portaria n.º 904/2006, de setembro».
A norma revogatória, para além de referir os Decretos-Leis n.os 72/2003, de 10 de abril, e 160/2005, de 21
de setembro, e a Portaria n.º 904/2006, de setembro, também refere a revogação do Decreto-Lei n.º 164/2004,
de 3 de julho, que altera o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e da Portaria n.º 1611/2007, de 20 de
dezembro, que altera a Portaria n.º 904/2006, de 4 de setembro. No entanto, em caso aprovação na
generalidade, coloca-se à consideração da Comissão analisar se estes devem ou não ser elencados na norma
revogatória, uma vez que o seu conteúdo normativo se esgota nas alterações que introduziram na redação aos
outros diplomas legais, globalmente revogados.
Aproveitamos para assinalar que o artigo 9.º da iniciativa prevê uma contraordenação, a ser aplicada pela
autoridade administrativa competente para a fiscalização, e regulada pelo Governo no prazo de 30 dias após
publicação da lei.
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que respeita ao início de vigência, o artigo 10.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor
ocorrerá no dia seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o previsto no n.º 1 do artigo
2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, segundo o qual os atos legislativos «entram em vigor no dia neles
fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da publicação».
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face
da lei formulário.
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
Dispõe o n.º 1 do artigo 60.º da Constituição que «os consumidores têm direito à qualidade dos bens e
serviços consumidos, à formação e à informação, à proteção da saúde, da segurança e dos seus interesses
económicos, bem como à reparação de danos». Acrescentam a alínea i) do artigo 81.º que incumbe
prioritariamente ao Estado a garantia da «defesa dos interesses e direitos dos consumidores» e a alínea e) do
artigo 99.º que a proteção dos consumidores constitui um dos objetivos da política comercial do Estado. Em
matéria ambiental, o artigo 66.º estipula que «todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e
ecologicamente equilibrado e o dever de o defender».
Por sua vez, os artigos 93.º a 100.º da Constituição enformam aquilo a que a doutrina chama a Constituição
agrícola ou agrária, enquanto parte integrante da Constituição económica (artigos 80.º a 107.º). De entre os
objetivos da política agrícola destaca-se o do aumento da produção e produtividade da agricultura, dotando-a
de infraestruturas e outros meios que se revelem adequados, com vista, designadamente, a assegurar a
qualidade dos produtos e o melhor abastecimento do País [artigo 93.º, n.º 1, alínea a)].
Outro objetivo da política agrícola passa por «assegurar o uso e a gestão racional dos solos e dos restantes
recursos naturais, bem como a manutenção da sua capacidade de regeneração» [artigo 93.º, n.º 1, alínea d)].
Este fim concorre para que o Estado promova «uma política de ordenamento e reconversão agrária e de
desenvolvimento florestal, de acordo com os condicionalismos ecológicos e sociais do país» (artigo 93.º, n.º 2).
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Genericamente, a Lei n.º 19/2014, de 14 de abril («Define as bases da política de ambiente»)3, estabelece,
no seu artigo 11.º, que a política de ambiente tem também por objeto os componentes associados a
comportamentos humanos, nomeadamente as alterações climáticas, os resíduos, o ruído e os produtos
químicos, com o objetivo de garantir a avaliação e gestão do risco associado aos organismos geneticamente
modificados de modo a garantir a proteção do ambiente e da saúde humana [alínea d)].
Em termos de legislação ordinária relacionada em concreto com o objeto concreto das iniciativas em apreço,
cite-se o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril («Regula a libertação deliberada no ambiente de organismos
geneticamente modificados (OGM)4 e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam
constituídos por OGM, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva 2001/18/CE, do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 12 de março»), alterado pelo Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho. Tenha-se em conta que
a Diretiva 2001/18/CE dizia respeito à libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados, revogando a Diretiva 90/220/CEE, do Conselho.
Na sequência da aprovação de outros instrumentos normativos comunitários complementares da Diretiva
2001/18/CE, designadamente os Regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do
Conselho, ambos de 22 de setembro, o primeiro relativo a géneros alimentícios e alimentos para animais
geneticamente modificados e o segundo sobre a rastreabilidade e rotulagem de organismos geneticamente
modificados e a rastreabilidade dos géneros alimentícios e alimentos para animais produzidos a partir de
organismos geneticamente modificados, alterando a Diretiva 2001/18/CE, e as Diretivas 2002/53/CE e
2002/55/CE, do Conselho, ambas de 13 de junho, a primeira atinente ao catálogo comum das variedades das
espécies de plantas agrícolas e a segunda respeitante à comercialização de sementes de produtos hortícolas,
surgiu o Decreto-Lei n.º 154/2004, de 30 de junho («Estabelece o regime geral do Catálogo Nacional de
Variedades de Espécies Agrícolas e de Espécies Hortícolas e transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva
2002/53/CE, do Conselho, de 13 de junho, que diz respeito ao Catálogo Comum das Variedades das Espécies
de Plantas Agrícolas, e a Diretiva 2002/55/CE, do Conselho, de 13 de junho, respeitante à comercialização de
sementes de produtos hortícolas»), o qual, depois de sofrer diversas alterações, viria a ser revogado e
substituído pelo Decreto-Lei n.º 42/2017, de 6 de abril5 («Regula a produção, o controlo, a certificação e a
comercialização de sementes de espécies agrícolas e de espécies hortícolas, transpondo as Diretivas de
Execução (UE) n.os 2015/1168, 2015/1955, 2016/11 e 2016/317»). Este diploma, para além de outros motivos,
refere, no preâmbulo, o seu propósito de consolidar também mais de uma dezena de alterações que o anterior
decreto-lei havia sofrido e dificultavam «significativamente a perceção do regime jurídico aplicável».
Por sua vez, o Decreto-Lei n.º 168/2004, de 7 de julho, veio estabelecer regras de execução do referido
Regulamento (CE) n.º 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de setembro.
O quadro jurídico nacional é completado pelo Decreto-Lei n.º 160/2005, de 21 de setembro («Regula o cultivo
de variedades geneticamente modificadas, visando assegurar a sua coexistência com culturas convencionais e
com o modo de produção biológico»).
Através do Decreto Legislativo Regional n.º 15/2010/M, de 13 de agosto, a Região Autónoma da Madeira
declarou-se «zona livre de cultivo de variedades de organismos geneticamente modificados (OGM)» (artigo 1.º),
proibindo «a introdução de material de propagação, vegetativo ou seminal, que contenha organismos
geneticamente modificados no território da Região Autónoma da Madeira, assim como a sua utilização na
agricultura» (artigo 2.º).
Também a Região Autónoma dos Açores, mediante o Decreto Legislativo Regional n.º 28/2012/A, de 26 de
junho, se declarou «zona livre do cultivo» de organismos geneticamente modificados (n.º 2 do artigo 1.º), embora
não interditando a sua introdução e produção em toda a sua plenitude (vide artigo 4.º).
Como antecedentes da iniciativa em apreço, podem ser apontados os seguintes projetos de lei:
– Projeto de Lei n.º 30/VIII («Organismos geneticamente modificados: submissão da lei ao princípio da
precaução»), apresentado pelo BE;6
3 Texto consolidado retirado do portal eletrónico do Diário da República. 4 No contexto dos projetos de lei em análise, a expressão «organismos geneticamente modificados», se bem que possa abarcar a manipulação genética de animais, tem em vista apenas as variedades agrícolas ou hortícolas geneticamente modificadas, razão por que também utilizamos mais à frente a expressão «variedades geneticamente modificadas». 5 Texto consolidado retirado do Diário da República Eletrónico (DRE). 6 Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 43/VIII. Deu origem à Lei n.º 12/2002, de 16 de fevereiro («Organismos geneticamente modificados»), através da qual foram suspensas a libertação deliberada no ambiente de produtos geneticamente modificados e a importação
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– Projeto de Lei n.º 43/VIII («Proíbe a comercialização e importação e produção com fins comerciais de
organismos geneticamente modificados»), apresentado pelo PEV;7
– Projeto de Lei n.º 524/IX («Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho, que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que regula a libertação deliberada no ambiente de Organismos Geneticamente
Modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os Regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro»), apresentado pelo PEV;8
– Projeto de Lei n.º 11/X («Altera o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 3 de julho ‘que altera o Decreto-Lei n.º
72/2003, de 10 de abril, que ‘regula a libertação deliberada no ambiente de organismos geneticamente
modificados – OGM – e a colocação no mercado de produtos que contenham ou sejam constituídos por OGM,
de acordo com os regulamentos (CE) n.os 1829/2003 e 1830/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de
22 de setembro»), apresentado pelo PEV;9
– Projeto de Lei n.º 224/XI («Revisão da Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PSD;10
– Projeto de Lei n.º 456/XI («Estabelece as Bases da Política de Ambiente»), apresentado pelo PCP;11
– Projeto de Lei n.º 457/XI («Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PEV;12
– Projeto de Lei n.º 515/XI («Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo BE;13
– Projeto de Lei n.º 560/XI («Revisão da Lei de Bases de Ambiente»), apresentado pelo CDS-PP;14
– Projeto de Lei n.º 29/XII («Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo PEV;15
– Projeto de Lei n.º 39/XII («Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente»), apresentado pelo BE;16
– Projeto de Lei n.º 143/XII [«Estabelece as Bases da Política de Ambiente (Revoga a Lei n.º 11/87, de 7 de
abril, que aprovou a ‘Lei de Bases do Ambiente’)»], apresentado pelo PS;17
– Projeto de Lei n.º 154/XII («Estabelece as Bases da Política de Ambiente»), apresentado pelo PCP;18
– Projeto de Lei n.º 182/XII («Informação sobre cultivo de transgénicos – alteração ao Decreto-Lei n.º
160/2005, de 21 de setembro»), apresentado pelo PEV;19
– Projeto de Lei n.º 308/XII («Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»),
apresentado pelo PCP;20
– Projeto de Lei n.º 784/XII («Proíbe o cultivo, importação e comercialização de organismos geneticamente
modificados vegetais»), apresentado pelo BE;21
– Projeto de Lei n.º 805/XII («Regula o cultivo de variedades agrícolas geneticamente modificadas»),
apresentado pelo PCP;22
– Projeto de Lei n.º 811/XII («Impede o cultivo, a comercialização e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente Modificados»), apresentado pelo PEV.23
Os projetos de resolução relacionados com a questão são os seguintes:
e comercialização de produtos que contenham na sua composição organismos geneticamente modificados e que se destinem à alimentação humana ou animal até à transposição da Diretiva 2001/18/CE. 7 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 30/VIII. 8 Caducou em 22-12-2004. 9 Caducou em 14-10-2009. 10 Apesar de aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19-6-2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 456/XI e 457/XI. 11 Apesar de aprovada, a iniciativa viria a caducar em 19-6-2011. Foi discutida em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 457/XI. 12 Embora aprovado na generalidade, o projeto de lei caducaria em 19-6-2011. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 224/XI e 456/XI. 13 Iniciativa caducada em 19-6-2011. 14 Iniciativa caducada em 19-6-2011. 15 Retomou o Projeto de Lei n.º 457/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 143/XII e 154/XII. 16 Retomou o Projeto de Lei n.º 515/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 17 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 154/XII. 18 Retomou o Projeto de Lei n.º 456/XI, que caducara. Foi rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 29/XII, 39/XII e 143/XII. 19 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Resolução n.º 236/XII. 20 Rejeitado na votação na generalidade. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Resolução n.ºs 470/XII e 492/XII. 21 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 805/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 22 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 811/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII. 23 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com os Projetos de Lei n.ºs 784/XII e 805/XII e com o Projeto de Resolução n.º 1293/XII.
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– Projeto de Resolução n.º 26/VIII («Sobre produtos provenientes de organismos geneticamente
modificados»), apresentado pelo CDS-PP;24
– Projeto de Resolução n.º 28/VIII («Adoção da Diretiva 90/220/CEE relativa à libertação deliberada no
ambiente de organismos geneticamente modificados»), apresentado pelo PS;25
– Projeto de Resolução n.º 37/VIII («Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal
produzidos a partir de organismos geneticamente modificados»), apresentado pelo PEV;26
– Projeto de Resolução n.º 194/X («Recomenda ao Governo a aplicação do princípio da precaução em
relação a milho geneticamente modificado»), apresentado pelo PEV;27
– Projeto de Resolução n.º 230/X [«Recomenda ao Governo uma moratória sobre o cultivo de sementes que
contenham ou sejam constituídas por Organismos Geneticamente Modificados (OGM)»], apresentado pelo BE;28
– Projeto de Resolução n.º 166/XI («Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz
transgénico LLRice62»), apresentado pelo BE;29
– Projeto de Resolução n.º 236/XII («Recomenda ao Governo que proíba a importação e comercialização de
milho transgénico MON810»), apresentado pelo BE;30
– Projeto de Resolução n.º 470/XII («Recomenda ao Governo que proíba a importação, comercialização e
cultivo dos organismos geneticamente modificados milho MON810 e batata amflora»), apresentado pelo BE;31
– Projeto de Resolução n.º 492/XII («Prevê a aplicação do princípio da precaução relativamente ao milho
transgénico NK 603»), apresentado pelo PEV;32
– Projeto de Resolução n.º 1293/XII («Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de
transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se
refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente
modificados (OGM) no seu território»), apresentado pelo PS.33
Na presente legislatura foram já apresentados e debatidos quatro Projetos de Lei – os n.os 17/XIII, 69/XIII,
100/XIII e 102/XIII – com a mesma finalidade dos que estão em apreciação na presente nota técnica. Foram
rejeitados na votação na generalidade, sendo apropriado, em todo o caso, remeter para as considerações
constantes do parecer da comissão parlamentar competente e respetiva nota técnica, onde se fornecem ligações
importantes a relatórios e estudos sobre a matéria.
Cabe salientar, por fim, que o primeiro dos projetos de lei em apreciação, todos no sentido de proibir a
produção e libertação no ambiente de variedades geneticamente modificadas, revoga expressamente os
Decretos-Leis n.os 72/2003, de 10 de abril, e 160/2005, de 21 de setembro. O segundo revoga «todas as
disposições legais» contrárias, incluindo os referidos decretos-leis. O terceiro revoga esses dois decretos-leis e
ainda o Decreto-Lei n.º 164/2004, de 7 de julho, assim como as Portarias n.os 904/2006, de 4 de setembro34, e
1611/2007, de 20 de dezembro35.
Enquadramento doutrinário/bibliográfico
DOBBS, Mary – Genetically modified crops, agricultural sustainability and national opt-outs: enclosure as the
loophole? Common Market Law Review. Leiden. ISSN 0165-0750. Vol. 54, n.º 4 (Aug. 2017), p. 1093-1122.
Cota: RE-227.
24 Iniciativa considerada caducada em 4-4-2002. 25 Iniciativa considerada caducada em 4-4-2002. 26 Daria origem à Resolução da Assembleia da República n.º 64/2000, de 14 de julho («Sobre rotulagem em alimentos para consumo humano ou animal produzidos a partir de organismos geneticamente modificados»). 27 Iniciativa caducada em 14-10-2009. 28 Iniciativa caducada em 14-10-2009. 29 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 104/2010, de 16 de agosto («Recomenda ao Governo que rejeite a comercialização de arroz transgénico LLRice62»). 30 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 182/XII. 31 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 492/XII. 32 Rejeitado. Foi discutido em conjunto com o Projeto de Lei n.º 308/XII e com o Projeto de Resolução n.º 470/XII. 33 Deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 32/2015, de 1 de abril («Recomenda ao Governo orientações atinentes ao processo de transposição da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 2001/18/CE, de 12 de março, no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território»). 34 Foi alterada pela Portaria n.º 16/11/2007, de 20 de dezembro («Estabelece as condições e o procedimento para o estabelecimento de zonas livres de cultivo de variedades geneticamente modificadas»). 35 Que altera a Portaria n.º 904/2006, de 4 de setembro.
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Resumo: De acordo com a autora «os Estados-Membros da UE enfrentam um dilema: após décadas a exigir
poderes para escolher cultivar ou não culturas geneticamente modificadas (GM), a UE devolveu-lhes alguns
poderes limitados, mas significativos.» Uma diretiva permite que os Estados-Membros «opt-out» do cultivo de
OGM, desde que cumpram alguns critérios relevantes.
Um dos critérios é a sustentabilidade agrícola. Em princípio, as culturas GM poderiam promover a
sustentabilidade agrícola, inclusive através do aumento da biodiversidade agrícola, uma vez que facilitam a
introdução de novas características ou espécies num ecossistema. No entanto, a natureza das suas
modificações permite a aplicabilidade da lei de patentes, com consequências negativas sobre a disponibilidade
de recursos genéticos vegetais e a biodiversidade agrícola a longo prazo.
Diz a autora que os Estados-Membros devem decidir urgente e cuidadosamente se e como restringir as
culturas GM, uma vez que a natureza permeável do ambiente facilita a disseminação de organismos
geneticamente modificados uma vez cultivados.
E argumenta «que a adoção de medidas legais poderia justificar a imposição de restrições ao cultivo de
transgénicos, a fim de conservar a biodiversidade agrícola como um recurso natural esgotável, essencial à agro-
sustentabilidade. Para melhorar a probabilidade de as restrições serem legalmente aceites tanto a nível da UE
como da Organização Mundial do Comércio (OMC), tais justificações devem ser distinguidas claramente de
quaisquer preocupações ambientais mais amplas, uma vez que tanto a UE como a OMC impõem restrições
rigorosas quando são levantados objetivos ambientais.»
LES ORGANISMES génétiquement modifiés. Futuribles : analyse et prospective. Paris. ISSN 0337-307X. N.º
383 (mars 2012). 192 p. Cota: RE-4.
Resumo: Este número da revista Futuribles é inteiramente dedicado aos organismos geneticamente
modificados (OGM) e, mais especificamente, às plantas geneticamente modificadas, às suas virtudes e perigos,
reais e alegados, sendo apresentados diferentes pontos de vista e argumentos, de quem defende e de quem se
opõe ao seu estudo/investigação, cultivo e consumo.
Cécile Désaunay no artigo «Vers un monde génétiquement modifié?: applications possibles des
biotechnologies», pág. 5-16, apresenta uma breve visão sobre o que são os OGM, o estado da investigação e
as perspetivas que se poderão abrir a médio-longo prazo. A autora analisa as principais aplicações existentes e
as áreas preferenciais de investigação na indústria (especialmente para reduzir os custos de produção e da
utilização de produtos poluentes), na agricultura, alimentos e medicamentos. Destaca os riscos inerentes à
biotecnologia, para o ambiente e saúde humana e animal e os obstáculos enfrentados pelo setor e as questões
levantadas pela concentração da investigação nas mãos de algumas grandes empresas.
David Sawaya, um especialista em biotecnologia vegetal, escreve «Les biotechnologies végétables à
l’horizon 2030», pág. 17-34, sobre as grandes tendências de desenvolvimento que são suscetíveis de acontecer
nesse setor até o ano de 2030. O autor aponta as mudanças que se têm verificado nas características, no âmbito
da biotecnologia vegetal, mostrando que as características de primeira geração (resistência a pragas e
herbicidas) tendem a dar lugar às características de segunda geração, que são mais de caráter agronómico
(resistência a vários tipos de stresse, melhores rendimentos).
A opinião dos europeus (pág. 119-133) sobre este assunto é analisada por Daniel Boy que, com base em
inquéritos Eurobarómetro aos cidadãos europeus realizados ao longo de 15 anos ou mais, mostra que nunca
houve uma maioria na UE a favor do desenvolvimento de OGM para a produção de alimentos e, entre 1996 e
2010, a proporção de pessoas relutantes em ver esse desenvolvimento, na verdade, aumentou. Neste artigo,
Boy mostra as disparidades existentes entre os vários países europeus e apresenta razões que podem explicar
essas diferenças.
Salientamos ainda o artigo de Pierre Feillet, «Les OGM, atouts d’une alimentation durable», que nos oferece
uma análise das principais vantagens de OGM, quando se trata de alcançar um fornecimento sustentável de
alimentos para todos no planeta. O autor descreve a extensão, localização e natureza dos cultivos transgênicos
em todo o mundo (10% das terras cultivadas) e, seguidamente, aborda outra questão altamente controversa: a
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presença, na cadeia alimentar, de produtos geneticamente modificadas em animais alimentados com essas
culturas.
PIGNATARO, Laura – La politique de l'Union Européenne en matière d'OGM. Revue du droit de l'Union
Européenne. Paris. ISSN 1155-4274. N.º 3 (2011), p. 361-380. Cota: RE-200.
Resumo: Neste artigo, após definir com brevidade o conceito de organismo geneticamente modificado, as
condições para a aceitação e os procedimentos para a sua autorização e introdução na União Europeia, a autora
faz uma análise do quadro regulamentar aplicável no âmbito da UE e as iniciativas legislativas, em curso, que
visam a sua alteração.
LE PUILL, Gérard – Nourrir neuf milliards d'humains. La pensée. Paris. ISSN 0031-4773. N.º 376 (oct.-déc.
2013), p. 31-41. Cota: RE-87.
Resumo: Neste artigo o autor, Gérard Le Puill, aborda a capacidade que o planeta terá, num prazo de 40
anos, de alimentar nove mil milhões de pessoas com recurso a técnicas de agricultura ecológica.
SEMINÁRIO do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida – Nanotecnologias e o. g. m.: ciência,
ética e sociedade. Coleção Bioética. Lisboa. ISBN 978-9728368-30-2. N.º 12 (2011), 94 p. Cota: RP-718.
Resumo: No âmbito destes seminário destacamos a comunicação de Pere Puigdomènech, com o título
«Ciencia, ética y sociedad : las nuevas tecnologias en agricultura» na qual o autor faz uma análise ética sobre
o uso das novas tecnologias na agricultura, tecnologias essas que têm sido objeto de diferentes estudos,
incluindo um parecer do Grupo Europeu de Ética na Ciência e Novas Tecnologias. O autor refere que os efeitos
de agricultura sobre o meio ambiente são bem conhecidos e que poderão pôr em perigo o acesso a alimentos
para as gerações futuras. Seguindo estas ideias a utilização de organismos geneticamente modificados ou a
aplicação de biocombustíveis devem ser discutidos.
Maria Eduarda Gonçalves, no artigo «Entre incertezas e controvérsias: a regulação do O.G.M. na Europa»
analisa os desafios suscitados pelas inovações de base tecnológica cujos impactes são difíceis de avaliar e se
encontram envoltas em controvérsia e contestação social e política. Na Europa (Áustria, Grécia, França,
Alemanha), onde esta controvérsia tem sido mais intensa têm sido evidenciadas as incertezas que envolvem a
avaliação de benefícios e riscos das culturas e alimentos transgénicos.
A autora refere que a União Europeia respondeu a estas incertezas e controvérsias instituindo um sistema
regulador assente, desde 2001, no princípio da precaução. A premissa essencial deste princípio é que a
ausência de prova do risco não deve ser invocada como justificação da omissão de medidas que possam
prevenir a manifestação desse risco, sendo que a legislação aplicável prevê a consulta do público e de grupos
de interesse na fase da avaliação dos processos de licenciamento de OGM., mas esta consulta não tem tido
expressão efetiva e a prática mostra que os cidadãos são encarados como meros consumidores numa relação
de mercado.
Destaque ainda para a comunicação de Paula Cruz de Carvalho, «Organismos geneticamente modificados
na agricultura» segundo a qual na procura por novas características, melhor adaptação aos diferentes ambientes
agrícolas, maior resistência a pragas e doenças, maior produtividade por unidade de solo arável, os
investigadores, através de um longo e evolutivo trabalho de melhoramento vegetal, têm vindo ao longo dos
tempos a obter uma extensa gama de diferentes variedades das espécies vegetais utilizadas na agricultura, em
particular para benefício do agricultor e do consumidor e, em geral para um mais eficiente uso dos recursos
naturais disponíveis.
TRUNINGER, Mónica; FERREIRA, José Gomes – Consumo, alimentação e OGM. In Ambiente, alterações
climáticas, alimentação e energia: a opinião dos portugueses. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2014.
(Observatórios ICS; 1). ISBN 978-972-671-335-7. p. 199-245. Cota: 52 – 217/2015.
Resumo: A obra em apreço «apresenta um panorama da evolução da opinião pública em Portugal sobre
questões de ambiente, consumo e energia nas últimas décadas. A enquadrar cada tema analisam-se as
principais políticas entretanto lançadas às escalas europeia e nacional.
As acentuadas e rápidas mudanças ocorridas no País desde 1986 constituem um pano de fundo essencial
para compreender muito do que se passa e pensa atualmente neste domínio. Da energia à mobilidade urbana,
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das alterações climáticas aos resíduos, da água ao consumo, as respostas dos portugueses aos inquéritos
Eurobarómetro são vistas à luz das tendências europeias e das diferenças por idades, género ou nível de
educação. São exploradas questões como a informação sobre temas ambientais, nível de preocupação com os
problemas, concordância com as medidas de política ou práticas do quotidiano.»
No capítulo em referência os autores analisam as atitudes, opiniões e informação dos portugueses sobre
alimentação e organismos geneticamente modificados. Os autores verificam que os portugueses têm vindo a
manifestar preocupações e opiniões convergentes com as dos restantes europeus, relativamente às
características de exigência de qualidade dos produtos. No entanto, na hora de comprar o preço ainda é mais
importante que a qualidade.
Quanto à insegurança alimentar, os dados obtidos nos inquéritos mostram que os portugueses estão mais
seguros, resultado dos esforços de implementação de uma estratégia robusta de segurança e controlo
alimentares.
Quanto à confiança, os portugueses confiam na opinião dos cientistas para obter informação credível sobre
a qualidade e a segurança alimentares.
Os autores terminam analisando com maior detalhe a temática da aplicação da biotecnologia à produção
alimentar, quer através da utilização de OGM, quer através da clonagem animal e concluem que os portugueses,
tal como os europeus, mostram-se muito críticos.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Entende-se por OGM «qualquer organismo, com exceção do ser humano, cujo material genético tenha sido
modificado de uma forma que não ocorre naturalmente por meio de cruzamentos/ou de recombinação natural»36.
Neste sentido, a UE estabeleceu um quadro jurídico estrito para o cultivo e a comercialização de OGM
utilizados em géneros alimentícios ou alimentos para animais, que estabelece a obrigatoriedade da EFSA,
juntamente com os organismos científicos dos Estados-Membros, efetuar uma avaliação científica dos riscos,
de forma a excluir qualquer perigo para a saúde humana, a saúde animal ou o ambiente, antes da colocação no
mercado de qualquer OGM.
Tendo como fundamento o parecer da EFSA, a CE prepara um projeto de decisão de forma a conceder ou
recusar a autorização, a qual é objeto de votação, por maioria qualificada, por um comité de peritos constituído
por representantes dos Estados-Membros. Todos os géneros alimentícios ou alimentos para animais produzidos
a partir de OGM ou contendo OGM têm a obrigatoriedade de ser rastreáveis e rotulados como tal, para que os
consumidores possam fazer escolhas informadas.
Em abril de 2015 entrou em vigor a Diretiva (UE) 2015/412 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de
março de 2015, que altera a Diretiva 2001/18/CE no que se refere à possibilidade de os Estados-Membros
limitarem ou proibirem o cultivo de organismos geneticamente modificados (OGM) no seu território, concedendo
aos Estados-Membros maior flexibilidade relativamente ao cultivo de OGM, sem pôr em causa a avaliação do
risco ambiental, que faz parte do regime de autorizações de OGM da UE previsto no Regulamento (CE) n.º
1829/2003 e na Diretiva 2001/18/CE. Desta forma, permitindo aos países proibir ou limitar, a título individual, o
cultivo de OGM, mesmo que sejam autorizadas a nível da UE.
Em 2016, o Parlamento adotou resoluções37 contra a autorização pela CE de organismos geneticamente
modificados (OGM) e a favor do envidamento de esforços de forma a facilitar a proibição do cultivo de OGM
pelos Estados-Membros, em conformidade com o objetivo de proteger a biodiversidade, a natureza e os solos.
O PE fez também um apelo à CE de forma a apresentar propostas legislativas relativas à indicação obrigatória
do país de origem, com especial enfoque da carne utilizada como ingrediente em alimentos transformados. Esta
medida tem como objetivo restaurar a confiança dos consumidores na sequência dos escândalos de casos de
fraude alimentar.
Em 2017, o Parlamento e o Conselho chegaram a acordo relativamente às novas regras de forma a reforçar
os controlos oficiais dos alimentos, a fim de melhorar a rastreabilidade dos alimentos e combater a fraude. Na
sequência de preocupações sobre os riscos decorrentes da utilização na agricultura da substância herbicida
36 Diretiva UE 2001/18/CE. 37 Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de maio de 2016, sobre a indicação obrigatória do país de origem ou do local de proveniência de determinados alimentos (JO C 76, 28.2.2018, p. 49).
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glifosato, o PE decidiu, em fevereiro de 2018, instituir a Comissão Especial sobre o Procedimento de Autorização
da União para os Pesticidas (PEST) de examinar o procedimento de autorização de pesticidas na UE.
Seguidamente, a Comissão propôs um reexame da legislação alimentar geral da UE, de forma a aumentar a
transparência das avaliações de risco da EFSA e a independência dos estudos científicos subjacentes,
melhorando a cooperação com os Estados-Membros respeitante à disponibilização de dados e peritos. Está
igualmente previsto reexaminar atos legislativos fundamentais, em domínios como novos alimentos, OGM,
pesticidas, materiais em contacto com géneros alimentícios e aditivos alimentares.
Em abril de 2018, a CE propôs uma revisão do Regulamento Geral da Legislação Alimentar Geral38, que
estabelece os princípios gerais de toda a legislação alimentar nacional e da UE, em conjunto com a revisão de
oito atos legislativos setoriais, de forma a torna-los conformes com as regras gerais e reforçar a transparência
em matéria de OGM, aditivos para a alimentação animal, aromatizantes de fumo, materiais em contacto com
géneros alimentícios, aditivos alimentares, enzimas e aromas alimentares, produtos fitofarmacêuticos e novos
alimentos.
Tendo presente o balanço de qualidade sobre a legislação alimentar geral realizado pela CE, irá:
Permitir aos cidadãos um maior acesso às informações apresentadas à Autoridade Europeia para a
Segurança dos Alimentos (EFSA) sobre as aprovações relativas à cadeia agroalimentar;
Dar a possibilidade à Comissão Europeia de solicitar estudos adicionais;
Envolver de forma estreita os cientistas dos Estados-Membros nos procedimentos de aprovação.
Assegurar maior transparência, permitindo aos cidadãos terem acesso automático e imediato a todas as
informações relacionadas com a segurança apresentadas pela indústria no processo de avaliação dos riscos;
Criar um registo europeu comum de estudos encomendados, de forma a garantir que as empresas
requerentes de autorização apresentam todas as informações pertinentes, não omitindo estudos desfavoráveis;
Permitir que a EFSA solicite estudos adicionais, a pedido da CE, financiados pelo orçamento da UE;
Requerer a consulta das partes interessadas e do público sobre os estudos apresentados pela indústria
de forma a apoiar os pedidos de autorização dos produtos;
Aumentar a participação dos Estados-Membros na estrutura de governação e painéis científicos da EFSA;
Reforçar a comunicação dos riscos aos cidadãos, com ações comuns de forma a fortalecer a confiança
dos consumidores, promovendo a sensibilização e a compreensão do público e explicando de uma melhor forma
os pareceres científicos expressos pela EFSA, bem como a base das decisões em matéria de gestão dos riscos.
Enquadramento internacional
Países europeus
Diversos relatórios e estudos que tivemos ocasião de consultar indicam que a nível mundial uma elevada
quantidade de países já baniram a produção e ou importação de organismos geneticamente modificados,
apontando-se números que rondam as quatro dezenas. Num deles, por exemplo, fala-se de uma lista de 38
países, organizada da seguinte forma:
«• Alemanha: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Arábia Saudita: Cultivo banido. Importação permitida.
• Argélia: Cultivo banido. Importação banida.
• Áustria: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Azerbaijão: Cultivo banido. Importação permitida.
• Belize: Cultivo banido. Importação permitida.
• Bósnia Herzegovina: Cultivo banido. Importação permitida.
• Bulgária: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Butão: Cultivo banido. Importação banida.
• Chipre: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Croácia: Cultivo proibido. Importação permitida.
38 Regulamento (CE) n.º 178/2002.
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• Dinamarca: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Escócia, Irlanda do Norte e País de Gales (Reino Unido): Cultivo proibido. Importação permitida.
• Eslovénia: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Equador: Cultivo banido. Importação permitida.
• França: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Grécia: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Holanda: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Hungria: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Itália: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Letónia: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Lituânia: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Luxemburgo: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Madagáscar: Cultivo banido. Importação banida.
• Malta: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Moldova: Cultivo banido. Importação permitida.
• Noruega: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Perú: Cultivo banido. Importação banida.
• Polónia: Cultivo proibido. Importação permitida.
• Quénia: Cultivo proibido. Importação banida.
• Quirguistão: Cultivo banido. Importação banida.
• Rússia: Cultivo banido. Importação banida.
• Sérvia: Cultivo banido. Importação permitida.
• Suíça: Cultivo banido. Importação permitida.
• Turquia: Cultivo banido. Importação permitida.
• Ucrânia: Cultivo banido (embora a lei seja largamente ignorada). Importação permitida.
• Venezuela: Cultivo banido. Importação banida.
• Zimbabué: Cultivo banido. Importação banida.»39
A nível europeu, outros estudos referem que mais de metade dos 28 países que compõem a União Europeia40
já se terão decidido pela proibição, no uso da faculdade que lhes é conferida pela legislação comunitária,
orientada pelo princípio da precaução, de decidirem se pretendem utilizar organismos geneticamente
modificados, podendo optar por escolher a proibição geral (opt out41). A organização Sustainable Pulse,
composta por cidadãos comuns e cientistas, como ela própria se anuncia, fala em dezanove na sua página da
internet. Nesses 19 países incluem-se Alemanha, Áustria, Bulgária, Croácia, Chipre, Dinamarca, Escócia,
Eslovénia, Grécia, Países Baixos, Hungria, Irlanda do Norte, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, País
de Gales e Polónia.
Estes números têm de ser analisados com alguma cautela, pois não é seguro que os dados recolhidos
estejam inteiramente corretos, restando ainda dúvidas sobre se dizem respeito à proibição geral de uso e
importação de organismos geneticamente modificados ou apenas a algumas espécies agrícolas ou hortícolas42.
Nalguns casos até pode ter acontecido que se haja proibido o cultivo, mas não a importação de organismos
39 Por contraposição, a GeneWatch asseverava, em 2015, que a nível mundial só 28 países cultivavam variedades agrícolas e hortícolas geneticamente modificadas (dados coincidentes com os de um outro relatório de 2016). Contam-se entre esses países os seguintes: África do Sul, Argentina, Austrália, Bangladesh, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Eslováquia, Espanha, Estados Unidos da América, Filipinas, Honduras, Índia, México, Myanmar, Paquistão, Paraguai, Portugal, República Checa, Sudão, Uruguai e Vietname. Existe, aliás, uma base de dados, gerida pela International Service for the Acquisition of Agri-Biotech Applications, organizada por país e por espécie agrícola, onde são registadas as variedades geneticamente modificadas usadas em todo o Mundo. 40 Para este efeito, ainda incluído o Reino Unido. 41 Também designada por «cláusula de salvaguarda». Em traços gerais, dir-se-á que, face às regras da União Europeia em vigor, as culturas geneticamente modificadas só são permitidas após uma avaliação profunda dos riscos, embora os Estados-Membros tenham agora flexibilidade para escolher entre permitir e proibir ou restringir o cultivo de organismos geneticamente modificados no seu território. Continua a ser permitido cultivar variedades agrícolas ou hortícolas geneticamente modificadas, mas só depois de terem sido autorizadas a nível da União Europeia depois de uma avaliação rigorosa dos riscos realizada pela Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA). Após tal autorização, os países da União Europeia só podem proibir a utilização do produto geneticamente modificado no seu território através da utilização da chamada «cláusula de salvaguarda», tendo de justificar esta decisão provando que o organismo geneticamente modificado em causa pode causar danos aos seres humanos ou ao meio ambiente. 42 Em https://www.thenation.com/article/twenty-six-countries-ban-gmos-why-wont-us fala-se em proibição total ou parcial.
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geneticamente modificados43. Tudo indica, no entanto, que o número de países que já baniram a produção e
comercialização de organismos geneticamente modificados seja dessa ordem de grandeza.
Os que se mostram contra o cultivo e comercialização de variedades geneticamente modificadas,
designadamente os proponentes dos projetos de lei em apreço44, salientam os seus malefícios para a saúde
humana e os riscos para a agricultura, o ambiente, a economia, a segurança alimentar e a biodiversidade vegetal
e animal45, ao passo que os seus defensores46 as apresentam como panaceia para a fome no mundo, as
alterações climáticas e a subnutrição, não lhes imputando riscos para a saúde humana.
A legislação específica comparada é apresentada aqui apenas para países em relação aos quais obtivemos
elementos legislativos suficientes para comprovar as soluções em vigor sobre a proibição geral ou não dos
organismos geneticamente modificados, incidindo sobre os seguintes Estados-Membros da União Europeia:
Espanha, França e Irlanda.
ESPANHA
O regime jurídico paralelo do direito espanhol consta da Ley 9/2003, de 25 de abril («establece el régimen
jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»)47, regulamentada pelo Real Decreto 178/2004, de 30 de enero («por el que se aprueba el
Reglamento general para el desarrollo y ejecución de la Ley 9/2003, de 25 de abril, por la que se establece el
régimen jurídico de la utilización confinada, liberación voluntaria y comercialización de organismos modificados
geneticamente»)48, não se proibindo, em geral, a utilização, libertação deliberada e comercialização de
organismos geneticamente modificados, embora se estabeleçam requisitos apertados para a produção,
confinada, desses organismos.
FRANÇA
A legislação básica está concentrada no Título III do Livro V da Parte Legislativa do Code de l'Environnement,
sob a epígrafe «Organismes génétiquement modifiés». Embora haja indicação de que a França proibiu a
produção de pelo menos alguns organismos geneticamente modificados, não o fez expressamente em relação
à sua importação. A libertação e colocação no mercado de organismos geneticamente modificados é regulada
nas secções 2 e 3 do Capítulo III («Dissémination volontaire d'organismes génétiquement modifiés») do referido
Título III, continuando a admitir-se a sua existência, embora sempre com sujeição a rotulagem obrigatória e
exame prévio do respetivo pedido de autorização que tem em conta os riscos para o ambiente e a saúde pública
(artigos L533-3 a L533-8-2).
IRLANDA
No Genetically Modified Organisms (Deliberate Release) Regulations 2003 (S.I. n.° 500 of 22/10/2003), não
sujeito a alteração na sequência das modificações na legislação comunitária de 2015, continua a admitir-se a
produção, cultivo e comercialização de variedades agrícolas e hortícolas geneticamente modificadas.
Outros países
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA
De acordo com a lei federal numerada como Public Law 114-2016, também os Estados Unidos da América,
à semelhança de países como a China, o Brasil e o Canadá, admitem o cultivo e comercialização de organismos
43 Como nos mostra a página da Internet do Genetic Literacy Project e resulta da lista de países que baniram o cultivo, acima transcrita. 44 Outro caso é o da organização Slow Food, que se opõe à produção de organismos geneticamente modificados. 45 Na medida em que estes sejam alimentados com rações transgénicas. 46 Como, por exemplo, António Coutinho, ex-Diretor do Instituto Gulbenkian de Ciência e Presidente da Sociedade das Ciências Médicas de Lisboa. 47 Texto consolidado retirado de www.boe.es. 48 Texto consolidado retirado de www.boe.es.
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geneticamente modificados, embora sujeito a rigorosas normas de autorização prévia e rotulagem e identificação
do produto alimentício, que obrigam, designadamente, à indicação da quantidade de substâncias geneticamente
manipuladas nele contidas, de acordo com o Safe and Accurate Food Labeling Act of 2015.
Organizações internacionais
As restrições às leis nacionais provenientes das regras de Direito Internacional Público Convencional
emanam de duas fontes: as convenções internacionais sobre biodiversidade e os acordos estabelecidos ao nível
da Organização Mundial do Comércio (OMC)49. As duas são pelo menos aparentemente conflituantes entre si,
já que, por um lado, as primeiras estabelecem a obrigação de a legislação atinente a organismos geneticamente
modificados respeitar o ambiente e, em particular, a diversidade biológica global e, por outro lado, os segundos
preveem o dever de a mesma legislação não limitar desnecessariamente o comércio internacional.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU)
A Convenção sobre a Diversidade Biológica obriga os seus membros a contribuir para a proteção e
conservação da diversidade biológica, uso sustentável dos seus elementos e partilha justa e equitativa dos
benefícios resultantes dos recursos genéticos, determinando explicitamente, na alínea g) do seu artigo 8.º, que
cada parte contratante deve, «na medida do possível e conforme o apropriado», «estabelecer ou manter meios
para regulamentar, gerir ou controlar os riscos associados à utilização e à libertação de organismos vivos
modificados como resultado da biotecnologia que possam ter impactes ambientais adversos passíveis de afetar
a conservação e a utilização sustentável da diversidade biológica, tendo também em conta os riscos para a
saúde humana». A noção de «biotecnologia», por seu turno, consta do artigo 2.º, sendo definida como «qualquer
aplicação tecnológica que utilize sistemas biológicos, organismos vivos ou seus derivados para a criação ou
modificação de produtos ou processos para utilização específica».
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DO COMÉRCIO (OMC)
De acordo com as regras e princípios estabelecidos pela OMC, os Estados não podem discriminar
importações e devem tratar a importação de produtos não menos favoravelmente do que a comercialização de
produtos de origem nacional, mas podem adotar as medidas necessárias a proteger a vida ou a saúde de seres
humanos, animais ou plantas se tais medidas não constituírem uma discriminação arbitrária ou injustificada entre
países ou uma disfarçada restrição ao comércio internacional. As medidas mencionadas, dirigidas à proteção
da saúde ou do ambiente, têm de ser baseadas em fundamentos científicos, sem prejuízo de os Estados
poderem livremente determinar os seus próprios níveis de risco e de proteção ambiental.50
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada consulta à base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontram em
apreciação, na Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), as seguintes iniciativas legislativas sobre matéria conexa
com a presente:
Projeto de Lei n.º 927/XIII/3.ª (PAN) – «Proíbe a produção e o cultivo comercial de organismos
geneticamente modificados (revoga o Decreto-Lei n.º 72/2003, de 10 de abril, e o Decreto-Lei n.º 160/2005, de
21 de setembro)»;
Projeto de Lei n.º 936/XIII/3.ª (PEV) – «Impede o cultivo e a libertação deliberada em ambiente de
Organismos Geneticamente Modificados (OGM)»;
49 Organização Mundial do Comércio. 50 Vidé artigo XX do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio, conhecido pela sua sigla em inglês (GATT).
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Projeto de Lei n.º 937/XIII/3.ª (PEV) – «Alarga a abrangência das regras de rotulagem para os alimentos
geneticamente modificados».
Petições
Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), não se identificou qualquer petição pendente,
neste momento, sobre matéria idêntica.
V. Consultas e contributos
Consultas obrigatórias
Consultas facultativas
Pareceres / contributos enviados pelo Governo
Contributos de entidades que se pronunciaram
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face da informação disponível, não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes
da aprovação da presente iniciativa.
————
PROJETO DE LEI N.º 966/XIII/3.ª
(REFORÇA A PRESERVAÇÃO DA FAUNA E ESPÉCIES CINEGÉTICAS EM CONTEXTO DE PÓS-
INCÊNDIO)
Parecer da Comissão de Agricultura e Mar e nota técnica elaborada pelos serviços de apoio
Parecer
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião do Deputado Autor do Parecer
Parte III – Conclusões
Parte Iv – Anexos
PARTE I – CONSIDERANDOS
1 – Introdução
O Deputado único do PAN, André Silva, apresentou o Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª «Reforça a preservação
da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-incêndio», no âmbito do poder de iniciativa da lei, ao abrigo
do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e no artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República
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(RAR).
O Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª «Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de
pós-incêndio» foi admitido e baixou na generalidade, à Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), a 18 de julho, tendo
sido, nesse mesmo dia, anunciado em sessão plenária.
2 – Objeto e motivação
Deputado Único Representante de Partido André Silva (Pessoas-Animais-Natureza, PAN) fundamenta a
apresentação desta iniciativa através de um vasto conjunto de argumentos, nomeadamente:
«O ordenamento cinegético é efetuado como medida de controlo populacional das espécies cinegéticas
sedentárias, com o objetivo de corrigir os excedentes da população que podem provocar desequilíbrio nos
ecossistemas, por haver inexistência de predadores suficientes para garantir o balanço ecológico,
concretizando-se esse ordenamento através das zonas de caça.»
«… não existe qualquer obrigatoriedade de fazer estimativas qualitativas das várias populações para as
zonas de caça municipais e nacionais …»
«A inexistência de qualquer monitorização de espécies sujeitas a exploração cinegética é factual,
traduzindo-se numa total ausência de informação no que diz respeito à abundância, demografia e tendências
populacionais.»
«Atualmente, a única informação que existe é a relativa ao númeno de animais mortos, a qual é
comunicada após o ato venatório.»
A elaboração do calendário venatório, por parte do ICNF, pode partir de pressupostos errados, já que falta
de informação relativa ao estado de conservação das populações, podendo algumas delas estar a ser
sobrestimadas e consequentemente com limites de abate desadequados.
Esta situação agrava-se quando se verificam casos de incêndio.
Citando (Rui Morgado e Francisco Moreira – Ecologia do Fogo), o fogo pode afetar de formas muito
diferentes a fauna dependendo da intensidade, frequência, época do ano, forma, extensão e velocidade de
propagação, entre outros.
A alteração da vegetação tem efeitos nas comunidades animais originais; que a intensidade do incêndio
pode destruir o habitat, com consequências nefastas, sendo o efeito mais importante de curto prazo, a
mortalidade.
Conclui o signatário que a observação é fundamental antes de permitir qualquer tipo de atividade cinegética
nas zonas ardidas e que a distância de proibição de caça deve ser aumentada de 250 para 500 metros,
proporcionando assim uma maior proteção às espécies e permitindo a regeneração do ecossistema.
3 – Requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimento da lei do formulário
A iniciativa toma a forma de projeto de lei em conformidade com disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR.
Este é redigido em artigos, apresenta uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é
precedido de uma exposição de motivos, dando cumprimento aos requisitos formais previstos nas alíneas a), b)
e c) do n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
O título do Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª «Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto
de pós-incêndio» traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º
da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário, embora no caso de aprovação, possa ser
objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade, conforme referido na Nota Técnica anexa,
em que é apresentado, como aditamento formal ao título da iniciativa:
«Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-incêndio, procedendo à nona
alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto que estabelece o regime jurídico da conservação,
fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua gestão sustentável, bem como os princípios
reguladores da atividade cinegética».
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Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
Refira-se ainda que dispõe a alínea a) do n.º 3 do artigo 6.º da lei formulário que deve proceder-se à
republicação integral dos diplomas que revistam a forma de lei, em anexo, sempre que existam mais de três
alterações ao ato legislativo em vigor. Sendo esta a nona alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de
agosto, tratar-se-á da quarta alteração após a republicação do diploma pelo Decreto-Lei n.º 202/2011, de 6 de
janeiro pelo que se sugere que a Comissão, também na fase de especialidade, pondere e promova a respetiva
republicação.
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face
da lei formulário.
4 – Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Para análise dos antecedentes legislativos sobre a matéria em questão e ao enquadramento internacional
(direito comparado) remete-se para consulta da NT anexa.
PARTE II – OPINIÃO DO RELATOR
O Deputado relator exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto de Lei n.º
938/XIII/3.ª, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento da
Assembleia da República.
O Grupo Parlamentar em que se integra, reserva a sua posição para o debate posterior.
PARTE III – CONCLUSÕES
A 18 de julho de 2018, o Deputado único do PAN, André Silva, apresentou à Assembleia da República, o
Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª que «Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-
incêndio»:
1 – Esta apresentação foi efetuada nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-
se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos.
2 – De acordo com o n.º 4 do artigo 131.º do RAR, deve a nota técnica, elaborada pelos serviços da
Assembleia, ser junta, como anexo, ao parecer e acompanhar a iniciativa legislativa ao longo de todo o processo
legislativo.
3 – Nos termos regimentais aplicáveis, deve o presente parecer ser remetido a sua Excelência o Presidente
da Assembleia da República.
4 – Face ao exposto, a Comissão de Agricultura e Mar é de parecer que a iniciativa em apreço reúne os
requisitos exigidos para ser discutida e votada em Plenário.
Palácio de S. Bento, 20 de dezembro de 2018.
O Deputado relator, Pedro do Carmo — O Presidente da Comissão, Joaquim Barreto.
Nota: O parecer foi aprovadocom votos a favor do PSD, do PS, do BE, do CDS-PP e do PCP, tendo-se
registado a ausência de Os Verdes e do PAN, na reunião da Comissão de 3 de janeiro de 2019.
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PARTE IV – ANEXOS
Nos termos do n.º 2 do artigo 137.º do RAR, segue em anexo, ao presente parecer, a Nota Técnica a que se
refere o artigo 131.º do mesmo Regimento.
Nota Técnica
Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª (PAN)
Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-incêndio
Data de admissão: 18 de julho de 2018
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª)
Índice
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da
lei formulário
III. Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
IV. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
V. Consultas e contributos
VI. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Elaborada por: José Filipe Sousa (DAPLEN), Filipe Xavier (CAE), Cristina Ferreira/Nuno Amorim (DILP) e Joaquim Ruas (DAC)
Data:26 de outubro de 2018.
I. Análise sucinta dos factos, situações e realidades respeitantes à iniciativa
Releva-se na iniciativa em apreço, apresentada pelo Deputado Único Representante de Partido André Silva
(Pessoas-Animais-Natureza, PAN) que «O ordenamento cinegético é efetuado como medida de controlo
populacional das espécies cinegéticas sedentárias, com o objetivo de corrigir os excedentes da população que
podem provocar desequilíbrio nos ecossistemas, por haver inexistência de predadores suficientes para garantir
o balanço ecológico, concretizando-se esse ordenamento através das zonas de caça».
Considera-se que a inexistência de monitorização de espécies sujeitas a exploração cinegética é factual,
traduzindo-se numa falta de informação que, para a UE é determinante para a devida avaliação dos efeitos e
impactos que a exploração cinegética pode surtir na dinâmica das populações
Segundo o signatário da iniciativa, esta falta de informação da Entidade Reguladora (Instituto da
Conservação da Natureza e Florestas – ICNF) pode condicionar a bondade do calendário venatório, dado não
haver um conhecimento rigoroso da densidade populacional de cada espécie, podendo algumas delas estar a
ser sobrestimadas e consequentemente com limites de abate desadequados.
Sublinha-se que esta situação se agrava quando se verificam casos de incêndio, recordando-se os graves
incêndios de 2017 que, para além de fortes impactos sociais, tiveram também impactos ambientais significativos,
sendo a situação de tal forma gravosa, que justificou a publicação de duas Portarias.
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Segundo alguns especialistas (Rui Morgado e Francisco Moreira – Ecologia do Fogo), o fogo pode afetar de
formas muito diferentes a fauna dependendo da intensidade, frequência, época do ano, forma, extensão e
velocidade de propagação, entre outros.
Releva-se que a alteração da vegetação tem efeitos nas comunidades animais originais; que a intensidade
do incêndio pode destruir o habitat, com consequências nefastas, sendo o efeito mais importante de curto prazo,
a mortalidade.
Conclui-se que a observação é fundamental antes de permitir qualquer tipo de atividade cinegética nas zonas
ardidas e que a distância de proibição de caça deve ser aumentada de 250 para 500 metros, proporcionando
assim uma maior proteção às espécies e permitindo a regeneração do ecossistema.
II. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
Conformidade com os requisitos formais, constitucionais e regimentais
O Projeto de Lei n.º 966/XIII/3.ª é subscrito pelo Deputado único representante do partido Pessoas-Animais-
Natureza, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e no artigo 118.º do Regimento da
Assembleia da República (doravante RAR), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder
dos Deputados, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
RAR.
Toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 119.º do RAR, encontra-
se redigido sob a forma de artigos, é precedido de uma breve exposição de motivos e tem uma designação que
traduz sinteticamente o seu objeto principal, dando assim cumprimento aos requisitos formais estabelecidos no
n.º 1 do artigo 124.º do RAR.
De igual modo encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo
120.º do RAR, uma vez que este projeto de lei não parece infringir princípios constitucionais e define
concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 18 de julho de 2018. Foi admitido e baixou na generalidade à
Comissão de Agricultura e Mar (7.ª) a 18 de julho, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da
República, tendo sido, nesse mesmo dia, anunciado em sessão plenária.
Verificação do cumprimento da lei formulário
O título da presente iniciativa legislativa – «Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em
contexto de pós-incêndio» – traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do
artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, conhecida como lei formulário 1, embora, em caso de aprovação,
possa ser objeto de aperfeiçoamento, em sede de apreciação na especialidade ou em redação final.
Com efeito, a iniciativa promove a alteração do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, que estabelece o
regime jurídico da conservação, fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua gestão
sustentável, bem como os princípios reguladores da atividade cinegética.
Segundo o disposto no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário, «Os diplomas que alterem outros devem indicar
o número de ordem da alteração introduzida e, caso tenha havido alterações anteriores, identificar aqueles
diplomas que procederam a essas alterações, ainda que incidam sobre outras normas».
Através da consulta do Diário da República Eletrónico verificou-se que o Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de
agosto, até à data foi objeto de oito alterações, pelo que, em caso de aprovação, esta constituirá a sua nona
alteração.
1 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, que estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas, alterada e republicada pelas Leis n.os 2/2005, de 24 de janeiro, 26/2006, de 30 de junho, 42/2007, de 24 de agosto, e 43/2014, de 11 de julho.
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Cumpre referir que se encontram pendentes na Comissão de Agricultura e Mar (7.ª) várias iniciativas do
proponente que alteram diferentes normas do mesmo diploma pelo que será recomendável a sua discussão
conjunta tendo em vista a aprovação e publicação de uma única lei.
Assim, em caso de aprovação na generalidade, sugere-se para efeitos de apreciação na especialidade o
seguinte aditamento formal ao título da iniciativa:
«Reforça a preservação da fauna e espécies cinegéticas em contexto de pós-incêndio, procedendo à nona
alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, que estabelece o regime jurídico da conservação,
fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua gestão sustentável, bem como os princípios
reguladores da atividade cinegética.»
Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que respeita ao início de vigência, o artigo 3.º deste projeto de lei estabelece que a sua entrada em vigor
ocorrerá no primeiro dia do segundo mês seguinte ao da sua publicação, mostrando-se assim conforme com o
previsto no n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, segundo o qual os atos legislativos «entram
em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da
publicação».
Refira-se ainda que dispõe a alínea a) do n.º 3 do artigo 6.º da lei formulário que deve proceder-se à
republicação integral dos diplomas que revistam a forma de lei, em anexo, sempre que existam mais de três
alterações ao ato legislativo em vigor. Sendo esta a nona alteração ao Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de
agosto, tratar-se-á da quarta alteração após a republicação do diploma pelo Decreto-Lei n.º 202/2011, de 6 de
janeiro, pelo que se sugere que a Comissão, também na fase de especialidade, pondere e promova a respetiva
republicação.
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face
da lei formulário.
Enquadramento legal e doutrinário e antecedentes
Enquadramento legal nacional e antecedentes
O Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto (versão consolidada), que as duas iniciativas pretendem alterar,
estabelece o regime jurídico da conservação, fomento e exploração dos recursos cinegéticos, com vista à sua
gestão sustentável, bem como os princípios reguladores da atividade cinegética e regulamenta a Lei de Bases
Gerais da Caça (texto consolidado), aprovada pela Lei n.º 173/99, de 21 de setembro2, e alterada pelos
Decretos-Leis n.º 159/2008, de 8 de agosto, e n.º 2/2011, de 6 de janeiro.
O Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, foi alterado pelos Decretos-Leis n.º 201/2005, de 24 de
novembro, n.º 159/2008, de 8 de agosto, n.º 214/2008, de 10 de novembro, n.º 9/2009, de 9 de janeiro, n.º
2/2011, de 6 de janeiro, n.º 81/2013, de 14 de junho, n.º 167/2015, de 21 de agosto, e n.º 24/2018, de 11 de
abril.
O Projeto de Lei n.º 965/XIII/3.ª propõe alterações ao artigo 19.º do referido Decreto-Lei, relativo às
obrigações das entidades gestoras das zonas de caça nacionais e municipais no sentido de apresentarem
anualmente a lista das espécies cinegéticas objeto de exploração bem como a estimativa qualitativa das
populações, que esses dados sejam objeto de tratamento estatístico e relevem para efeitos de elaboração do
calendário venatório. A definição de zonas de caça de interesse nacional, municipal, turística e associativa vem
prevista no artigo 9.º, mas destas somente as zonas de caça turística e associativa é que se encontram
vinculadas a prestar aquela informação, por força do disposto no artigo 35.º do mesmo diploma. A gestão das
diversas zonas de caça está sujeita a diversos planos (consoante os casos) sendo que para o Estado e
municípios e lei prevê a existência de planos anuais de exploração [artigos 8.º, n.º 1 e 19.º, alínea f)] e para as
zonas de caça associativa e turística prevêem-se planos de ordenamento e exploração cinegética conforme
2 Teve origem na Proposta de Lei n.º 142/VII (Gov).
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dispõem os artigos 8.º, n.º 1 e 35.º. Para além destes, existem ainda, como instrumentos de gestão do
ordenamento cinegético, os planos de gestão [artigos 8.º, n.º 1 e 27.º, n.º 2, alínea c)] cuja apresentação está
vinculada em caso de requerimento de transferência da gestão de terrenos cinegéticos não ordenados e no qual
deve constar, também, a «listagem das espécies cinegéticas objeto de exploração e estimativa qualitativa das
respetivas populações, assim como as medidas a implementar para o seu fomento e conservação» nos termos
do ponto iii), da alínea c), do n.º 2, do artigo 27.º.
Conexo com o objeto da iniciativa em questão, cumpre mencionar o Regulamento para o funcionamento das
zonas de caça municipais, aprovado pela Portaria n.º 148/2018, de 22 de maio.
O Projeto de Lei n.º 966/XII/3.ª propõe uma alteração ao artigo 4.º (Preservação da fauna e das espécies
cinegéticas) do Decreto-Lei n.º 202/2004, de 18 de agosto, no sentido de proibir a caça nas zonas ardidas ou
circundantes até 500 metros por um período mínimo de 180 dias.
A versão atual do artigo 4.º impede a caça durante 30 dias e numa faixa de 250 metros circundante à área
ardida. Trata-se de uma redação igual à da alínea e) do n.º 1, do artigo 6.º da Lei de Bases Gerais da Caça que
dispõe:
«Artigo 6.º
Preservação da fauna e das espécies cinegéticas
1 – Tendo em vista a conservação da fauna e, em especial, das espécies cinegéticas, é proibido:
.........................................................................................................................................................................
e) Caçar nas queimadas, áreas percorridas por incêndios e terrenos com elas confinantes, numa faixa de
250 m, enquanto durar o incêndio e nos 30 dias seguintes;
......................................................................................................................................................................... »
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 88/2012, de 18 de outubro, que aprovou os procedimentos e
medidas expeditos destinados a minimizar as consequências de incêndios de grande dimensão e gravidade,
estipula no seu n.º 4, alíneas d) e e), que «o membro do Governo responsável pela área da agricultura e florestas
desencadeia os procedimentos necessários à minimização dos prejuízos provocados pelos incêndios, com
recurso aos seguintes instrumentos: d) Estabelecer um período de interdição da caça nas áreas afetadas,
superior ao legalmente previsto, com a finalidade de ser garantida uma adequada recuperação das populações
cinegéticas; e) Avaliar a possibilidade de isenção ou redução proporcional das taxas de concessão, por parte
das entidades gestoras das zonas de caça afetadas pelos incêndios, enquanto decorrer o período de interdição
do ato venatório.»
Atendendo a dimensão e violência dos incêndios que atingiram o País no verão de 2016 e considerando que
o período legal de interdição da caça, em áreas percorridas por incêndios provava ser insuficiente para acautelar
a preservação das espécies cinegéticas atingidas, o governo aprovou a Portaria n.º 277-A/2016, de 21 de
outubro, que aditou o artigo 3.º-A à Portaria n.º 142/2015, de 21 de maio3, (versão consolidada) proibindo o
exercício da caça a qualquer espécie cinegética para a época venatória de 2016/2017 nos terrenos situados no
interior da linha perimetral percorrida pelos incêndios, ou grupos de incêndios contínuos4 de área superior a
1000 hectares, bem como na faixa de proteção de 250 metros, nos concelhos afetados por aqueles.
Em 2017, o governo estendeu esta proibição, na época venatória de 2017/2018, aos conselhos afetados
pelos grandes incêndios ocorridos no mês de junho através da Portaria n.º 274/2017, de 15 de setembro, que
deu uma nova redação ao artigo 3.º-A da Portaria n.º 142/2015, de 21 de maio. Mais tarde, através da Portaria
n.º 333-A/2017, de 3 de novembro, foi alargado o âmbito da proibição também aos concelhos e distritos afetados
pelos incêndios ocorridos no mês de outubro. Foi, igualmente, proibido o exercício da caça em terrenos
cinegéticos não ordenados e às espécies de caça menor sedentárias na área das zonas de caça abrangidas por
alguns dos concelhos afetados.
De referir que as espécies cinegéticas às quais é permitido o exercício da caça nas épocas venatórias 2018-
2021, bem como os períodos, os processos e outros condicionalismos para essas mesmas épocas se encontram
3 Esta Portaria definiu as espécies cinegéticas às quais é permitido o exercício da caça e fixou os períodos, os processos e outros condicionamentos para a época venatória 2015-2016, 2016-2017 e 2017-2018. 4 Na primeira versão deste artigo lia-se «contíguos».
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aprovados pela Portaria n.º 105/2018, de 18 de abril, com efeitos a partir de 1 de junho de 2018. Esta Portaria
proíbe, no seu artigo 4.º, a caça a todas as espécies sedentárias, em terrenos ordenados e não ordenados, num
conjunto determinado de conselhos.
O Instituto de Conservação da Natureza e Florestas, IP, criado pelo Decreto-Lei n.º 135/2012, de 29 de junho,
(versão consolidada), desempenha as funções de autoridade nacional para a conservação da natureza e
biodiversidade, assegura a conservação e a gestão sustentável de espécies, habitats naturais da flora e da
fauna selvagens e tem diversas competências próprias no domínio da caça, nomeadamente na divulgação, no
seu sítio da Internet, dos mapas com as áreas onde não tem sido permitido caçar, nos termos das Portarias
atrás mencionadas.
Relacionados com a matéria em apreço, saliente-se a Convenção Relativa à Proteção da Vida Selvagem e
dos Habitats Naturais na Europa, aprovada pelo Decreto n.º 95/81, de 23 de julho, e a Estratégia Nacional de
Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º
55/2018, de 7 de maio.
Enquadramento do tema no plano da União Europeia
Em 1979, a Diretiva 79/409/CEE (Diretiva Aves I) relativa à conservação das aves selvagens, estabeleceu
um regime geral de proteção de todas as espécies de aves.
Desde a implementação da Diretiva Aves, a mesma foi alterada pelas Diretivas 81/854/CEE, 91/244/CEE,
94/24/CE, 97/49/CE, 2006/105/CE e Regulamento (CE) n.º 806/2003, relativos à conservação das aves
selvagens.
A Diretiva Aves II estabelece metas, incluindo a identificação e classificação de Zonas de Proteção Especial
(ZPE) para as espécies mais raras e vulneráveis, listadas no seu Anexo I, bem como para todas as espécies
migratórias que ocorrem regularmente no território europeu. Tendo presente que estas espécies devem ser alvo
de medidas de conservação especial relativas ao seu habitat, de modo a garantir a sua sobrevivência e a sua
reprodução na sua área de distribuição, é atribuída uma importância reforçada à proteção das zonas húmidas,
particularmente às de importância internacional.
Desta forma, a Diretiva Aves II determina o dever dos Estados-Membros de enviar à CE, de três em três
anos, um relatório sobre a aplicação das disposições nacionais adotadas. Este ciclo de relato pode ser dilatado
até um máximo de 6 em 6 anos, de acordo com a Diretiva Habitats.
Em 1992, a Diretiva Habitats contribuiu para assegurar a biodiversidade na União Europeia (UE) através da
conservação dos habitats naturais e das espécies da fauna e da flora selvagens. Criou também a rede «Natura
2000», constituída por zonas especiais de conservação designadas pelos países da UE ao abrigo da Diretiva
Habitats, incluindo as zonas de proteção especial designadas nos termos da Diretiva Aves II. No prazo de seis
anos, a contar da designação dos Sítios de Importância Comunitária (SIC), os Estados-Membros deverão aplicar
as medidas necessárias de forma a certificar a manutenção ou o restabelecimento do estado de conservação
favorável dos valores naturais que estão na sua origem, seja por via regulamentar, contratual ou administrativa.
A Diretiva Aves II estabelece assim, um sistema geral de proteção de todas as aves selvagens na UE. A
Diretiva Habitats estabelece diferentes níveis de proteção para diferentes listas de espécies (que não sejam
aves), mas não lista espécies que podem ser caçadas.
Em 2001, a Comissão Europeia (CE) lançou a Iniciativa de Caça Sustentável com o objetivo de contribuir
para melhorar a compreensão dos aspetos jurídicos e técnicos das disposições das diretiva relativas à caça5,
desenvolvendo um programa científico, de conservação e de sensibilização para promover a caça sustentável.
Em 2004, os principais parceiros da Iniciativa de Caça Sustentável – BirdLife International e FACE
(Federação de Associações de Caça e Conservação da UE) – chegaram a acordo sobre dez pontos que
possibilitarão que a caça continue dentro de um quadro bem regulado, respeitando as disposições da diretiva.
Em 2009, a Diretiva 2009/147/CE relativa à conservação das aves selvagens, definiu regras relativas à sua
proteção, gestão e controlo, abrangendo as aves e os seus ovos, ninhos e habitats.
Em 2015, a CE emitiu, pela segunda vez, um relatório sobre o estado de conservação ao abrigo da Diretiva
Aves II, permitindo a realização de uma avaliação comparativa. Segundo este relatório, e de acordo com um
5 Diretiva Aves II e Diretiva Habitats
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relatório semelhante realizado ao abrigo da Diretiva Habitats, os conhecimentos sobre o estado e as tendências
das espécies e dos habitats protegidos mostram sinais de recuperação, existindo indicações que a rede Natura
2000 desempenha um papel fundamental na estabilização dos habitats e das espécies, sobretudo nos casos
em que foram aplicadas medidas a uma escala adequada.
A CE tem prevista a criação de uma plataforma estatística, de forma a assegurar um esquema comum de
coleta de estatísticas de bolsas de caça. Esta iniciativa, formalmente lançada em Atenas a 3 de junho de 2006,
está a ser desenvolvida pela FACE em colaboração com a BirdLife International e vários organismos como a
Agência Europeia do Ambiente.
Enquadramento internacional
Países europeus
A legislação comparada é apresentada para os seguintes países europeus: Espanha e França.
ESPANHA6
A proteção, conservação e gestão das espécies cinegéticas é regulado pela Ley 1/19780, de 4 de abril, de
caza7. Quando, por força de uma catástrofe como um incendio, uma inundação ou uma seca, os animais se
encontrem privados do seu meio natural e a sua capacidade de defesa se encontre diminuída, é proibida a sua
caça, conforme previsto no artigo 31, referente a limitações e proibições de caça.
A atividade de caça é desenvolvida pelas diversas comunidades autónomas, que têm autonomia para legislar
sobre esta matéria. A título exemplificativo, a comunidade da Galiza, através da Ley 13/2013, de 23 de diciembre,
de caza de Galicia, estabelece a obrigatoriedade de aprovar um regulamento, denominado de «plano anual de
caça», no qual são definidas todas as regras necessárias à atividade, incluindo, entre outros, a estimativa de
extração sustentável das espécies a caçar, bem como a evolução destas populações, tendo por base os
números dos anos anteriores (artigo 49, 50 e 51).
Igual plano existe na comunidade de Aragão, previsto na Ley 1/2015, de 12 de marzo, de Caza de Aragón,
o qual contem um censo inicial das populações cinegéticas dos terrenos autorizados para a prática de caça e
um estudo de avaliação de impacto da caça nessas mesmas populações (artigo 37).
FRANÇA
As condições gerais para o exercício da caça encontram-se previstas nos artigos L.420-1 a L. 426-1 e artigos
R. 421-1 a 429 do Código do Ambiente.
De acordo com o artigo L.425-1 do Código Ambiental, um «Schéma Départemental de Gestion Cynégétique»
(plano departamental de gestão cinegética – SDGC)8 é estabelecido em cada departamento, por um período de
6 anos renovável, podendo ser prorrogado por um período não superior a 6 meses.
Este plano é elaborado pelas Fédérations Départementale ou Interdépartementale des Chasseurs em
concertação com as Chambres d’Agriculture, os representantes das propriedades ruais e os representantes dos
interesses florestais. De entre as diversas disposições constantes destes planos, estes têm obrigatoriamente
que conter (L425-2):
As medidas para a caça e sua gestão:
As medidas de segurança dos caçadores e não caçadores;
As ações de melhoramento da prática da caça, incluindo, por exemplo quotas máximas permitidas de
determinas espécies;
As medidas para assegurar a preservação, proteção e renovação dos habitats naturais;
6 Análise confinada às comunidades autónomas da Galiza e de Aragão. 7 Diploma consolidado retirado do portal oficial BOE.es. 8 Tradução livre.
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As medidas de fomento do equilíbrio cinegético; e
As medidas de monitorização sanitária das espécies, das pessoas e dos animais de domésticos.
A título exemplificativo, apresenta-se a proposta de plano de gestão cinegética do Departamento de d’Indre-
et-Loire, para os anos de 2018-2024, no qual se encontram estabelecidas as medidas acima descritas, prevendo
a proteção, por exemplo, de algumas espécies cinegéticas como veados, javalis ou coelhos bravos.
III. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Iniciativas legislativas
Efetuada consulta à base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontram em
apreciação, na Comissão de Agricultura e Mar (7.ª), as seguintes iniciativas legislativas sobre matéria conexa
com a presente:
Projeto de Lei n.º 965/XIII/3.ª (PAN) – «Altera as obrigações das entidades gestoras das zonas de caça
passando a ser obrigatório incluir estimativas populacionais das espécies cinegéticas nos respetivos planos»;
Projeto de Lei n.º 982/XIII/3.ª (PAN) – «Impede a caça à raposa com recurso à paulada e a matilhas»;
Projeto de Lei n.º 983/XIII/3.ª (PAN) – «Retira a raposa e os saca-rabos da lista de espécies sujeitas a
exploração cinegética».
Petições
Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), não se identificou qualquer petição pendente,
neste momento, sobre matéria idêntica.
IV. Consultas e contributos
Consultas facultativas
Devem ser ouvidas Associações Defensoras dos Direitos dos Animais, Associações Ambientalistas,
Associações de Caçadores e a Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP).
V. Apreciação das consequências da aprovação e dos previsíveis encargos com a sua aplicação
Em face da informação disponível, não é possível determinar ou quantificar eventuais encargos resultantes
da aprovação da presente iniciativa.
————
PROJETO DE LEI N.º 1061/XIII/4.ª
IMPLEMENTA UM PROGRAMA DE REDUÇÃO DA UTILIZAÇÃO DE MICROPLÁSTICOS EM
COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE E LIMPEZA
Vários estudos têm sido desenvolvidos ao longo dos últimos anos e todos vão no sentido da necessidade de
reduzir a introdução dos plásticos, e em particular dos microplásticos, no meio ambiente.
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Não obstante os efeitos da poluição por microplásticos e a avaliação integrada dos seus riscos ecológicos
constituir atualmente uma prioridade da investigação, o verdadeiro impacto deste tipo de poluição é ainda muito
difícil de quantificar, o que constitui uma lacuna no conhecimento. Mas o certo é que já foram encontrados
microplásticos em muitas espécies de peixes, mariscos e alguns cetáceos e existe uma grande incerteza sobre
os seus possíveis efeitos, uma vez que são capazes de atravessar as paredes celulares, o que gera
preocupações em diversos Estados-membros da União Europeia (UE) e em todo o mundo acerca do seu
impacto, não apenas no meio marinho como também na saúde humana, por via da sua introdução na cadeia
alimentar.
Os microplásticos existentes no meio marinho são provenientes de diversas fontes, nomeadamente de
depuradoras industriais, da degradação de peças maiores de plástico que se vão quebrando ao longo do tempo,
mas também pelos que são adicionados a uma variedade de produtos cosméticos e de cuidados pessoais, tais
como sabões, esfoliantes, loções e pastas dentífricas, de modo a tornar o produto mais abrasivo ou para
decoração.
Fonte: COMBATING MARINE LITTER SOURCES, Report for European Commission DG Environment, 2016
As cadeias de valor do plástico têm um caráter cada vez mais transfronteiriço, pelo que as oportunidades e
os problemas associados aos plásticos devem ser analisados à luz da evolução da conjuntura internacional e
europeia. O plástico é, aliás, uma das áreas prioritárias no «Plano de Ação da União Europeia para a Economia
Circular», tendo a Comissão Europeia definido 2030 como a data limite para acabar com as embalagens de
plástico descartável na UE, mudando para plástico reciclável e reutilizável e limitando o uso de microplásticos.
A UE produziu, em 2014, 25 milhões de toneladas de resíduos de plástico, dos quais apenas 30% são
reciclados, sendo os restantes incinerados (39%) ou tendo como destino os aterros (31%). Portugal contribuiu
com cerca de 370 mil toneladas, o que corresponde a 1,5% do total europeu.
Por constituir uma preocupação crescente, a Comissão Europeia apresentou em janeiro de 2018 a
«Estratégia Europeia sobre Plásticos», integrada numa transição para uma economia circular, e bem acolhida
por todos, incluindo a própria indústria europeia de plásticos, representada pela PlasticsEurope’s que, como
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medida de responsabilidade ambiental, assumiu compromissos voluntários e estabeleceu metas ambiciosas
para 2030. Aliás, a ação integrada da UE com a indústria conduziu à realização de um conjunto de reuniões
sobre os tópicos chave identificados, que irão decorrer no primeiro semestre de 2019.
A aposta e o reforço da economia circular, no caso em apreço no domínio dos plásticos, abre a porta a novas
oportunidades para a inovação, a competitividade e a criação de empregos.
São por isso essenciais medidas de redução de resíduos plásticos relacionadas com o aumento dos plásticos
reutilizáveis, a redução da utilização dos sacos plásticos leves e pesados e ainda as campanhas de
sensibilização para a redução dos lixos nas praias, as quais começaram a ser implementadas com reforma da
fiscalidade verde, em 2013.
No entanto, apesar de estas serem as principais origens do contributo da Europa, e também de Portugal,
nomeadamente no que diz respeito aos microplásticos no meio marinho, é necessária uma ação também ao
nível de outros resíduos de microplásticos que resultam de uma incorporação direta no ecossistema e não da
sua decomposição. E neste grupo encontram-se os microplásticos utilizados em cosméticos e produtos de
higiene que vão parar ao esgoto e não são depois retidos nas estações de tratamento de águas residuais.
Estimativa das emissões europeias anuais de microplásticos no meio marinho, por tipo de produto:
Fonte: COMBATING MARINE LITTER SOURCES, Report for European Commission DG Environment, 2016
Na Europa, os microplásticos com origem nos cosméticos e produtos de higiene correspondem a cerca de
4% do total de microplásticos que têm como destino o meio marinho, o que, sendo minoritários, ainda assim não
se podem desprezar, pois correspondem a valores estimados entre 2500 e 8600 toneladas anuais.
Por isso mesmo, de acordo com informação disponibilizada pela UE, a indústria de cosméticos europeia está
já a trabalhar no sentido de procurar reduzir significativamente estas quantidades, sendo que a Cosmetics
Europe emitiu mesmo uma recomendação aos seus associados para uma redução gradual, mas significativa, já
a partir de 2020.
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Fonte: COMBATING MARINE LITTER SOURCES, Report for European Commission DG Environment, 2016
Nesse sentido, e de forma a alcançar uma significativa redução da utilização deste tipo de microplásticos que
necessariamente terminam nos oceanos, é necessário um conjunto de medidas políticas que conduzam a uma
verdadeira mudança de mentalidades na sociedade – produtores e consumidores.
Os desafios relacionados com a produção, consumo e destino final dos plásticos podem ser uma
oportunidade para a UE e para a competitividade da indústria europeia, mas apesar da existência de alternativas
já estabelecidas no mercado, essencialmente orgânicas, a transição dos atuais produtos para outros com estas
componentes orgânicas obriga à reformulação das composições e testes de eficácia no consumidor, que têm
custos não desprezíveis.
A Lei n.º 19/2014, de 14 de abril, que Define as bases da política de ambiente, determina que compete ao
Estado a promoção da cidadania ambiental, nomeadamente o desenvolvimento sustentável com
responsabilidade intra e intergeracional, para garantir a satisfação das necessidades do presente sem
comprometer as das gerações futuras.
Estabelece ainda que as políticas públicas de ambiente devem ter subjacentes vários princípios,
nomeadamente:
– A cooperação internacional que obriga à procura de soluções concertadas com outros países e
organizações internacionais, no sentido da promoção do ambiente e do desenvolvimento sustentável;
– A educação ambiental que obriga a políticas pedagógicas viradas para a tomada de consciência ambiental;
– A informação e a participação que obrigam ao envolvimento dos cidadãos nas políticas ambientais.
Determina também, como não podia deixar de ser, que qualquer legislação específica terá de ser
consentânea com as políticas europeias e internacionais aplicáveis em cada domínio.
Nestes termos, o Grupo Parlamentar do CDS-PP, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais
aplicáveis, apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma pretende criar um mecanismo para a redução gradual da utilização e comercialização de
microplásticos em cosméticos e em produtos de higiene.
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Artigo 2.º
Programa para a redução de microplásticos
1 – O Governo estabelece um programa para a redução da incorporação de microplásticos em cosméticos e
em produtos de higiene, em particular daqueles que resultam em libertação direta de microplásticos no meio
ambiente, em linha com as metas estabelecidas pela União Europeia.
2 – O Governo define, por portaria, os termos do referido programa, nomeadamente as metas de redução a
alcançar anualmente até 2030, colocando maior exigência na redução até 2021.
3 – As metas de redução deverão ser estabelecidas em articulação com os representantes do setor, por via
da autorregulação num período transitório, passando depois a obrigatórias.
Artigo 3.º
Incentivo à utilização de produtos isentos de microplásticos
1 – Com o objetivo de permitir uma escolha responsável dos consumidores, bem como incentivar a colocação
no mercado de produtos isentos de microplásticos, o Governo estabelece um regulamento para a criação de um
«selo» identificativo da não presença de microplásticos que poderá ser utilizado voluntariamente pelas empresas
que comercializem produtos no território nacional.
2 – O selo de produto isento de microplásticos deverá ser certificado por uma entidade certificadora.
Artigo 4.º
Informação e Sensibilização
O Governo promove campanhas de sensibilização e informação ao consumidor com enfoque:
1 – Na informação aos consumidores sobre a existência de microplásticos nos produtos de uso corrente,
como de higiene e cosméticos, e do seu impacto no meio marinho;
2 – Na importância de consumir de forma responsável, optando por produtos isentos de microplásticos.
Artigo 5.º
Regulamentação
A presente lei é regulamentada no prazo de 90 dias após a data da sua publicação.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Palácio de S. Bento, 7 de janeiro de 2019.
Os Deputados do CDS-PP: Patrícia Fonseca — Nuno Magalhães — Telmo Correia — Hélder Amaral —
Cecília Meireles — Álvaro Castello-Branco — Ana Rita Bessa — António Carlos Monteiro — Assunção Cristas
— Filipe Anacoreta Correia — Ilda Araújo Novo — Isabel Galriça Neto — João Gonçalves Pereira — João Pinho
de Almeida — João Rebelo — Pedro Mota Soares — Teresa Caeiro — Vânia Dias da Silva.
————
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PROJETO DE LEI N.º 1062/XIII/4.ª
REGULAMENTA O USO ADULTO DA CANÁBIS
Exposição de motivos
Enquadramento histórico
Em 1923 foi aprovada a primeira lei de controlo de droga em Portugal, Lei n.º 1687, de 6 de agosto. Entre
este período e 1970, o consumo de estupefacientes em Portugal foi pouco expressivo.
Esta questão começa a tomar uma maior expressão na década de 1970 e é nesse contexto que é aprovado
o Decreto-Lei n.º 420/7010, que regulava a produção, tráfico e uso de estupefacientes. Depois da Revolução de
25 de abril de 1974 verificou-se um aumento acentuado do consumo de drogas, especialmente de heroína
injetada, que provou ser um grande desafio, já que as instituições de saúde não estavam preparadas à data
para lidar com este tipo de situações. Criou-se assim o Centro de Estudos da Juventude, que viria em 1976 a
ser substituído pelo Centro de Estudos da Profilaxia da Droga, dedicado à pesquisa de meios de prevenção e
tratamento, e o Centro de Investigação Judiciária da Droga, com o objetivo de fazer cumprir a lei e reduzir o
tráfico.
Em 1976, face ao contínuo aumento do consumo, especialmente nas camadas jovens da população, foi
aprovado o Decreto-Lei n.º 792/76, de 5 de novembro. Este diploma refere pela primeira vez a necessidade de
se rever a noção de consumo de droga como um ato criminoso, referindo que o infrator deve passar a ser visto
como um doente e não como um criminoso, sendo por isso imune «ou pouco menos» a uma imputação de culpa.
É ainda possível ler no mesmo diploma que «a solução médico-social do fenómeno droga terá́ de ser procurada
com total independência em relação às medidas e estruturas de carácter judiciário ou policial». Assim, com a
experiência e com o conhecimento do fenómeno, foi-se tornando claro que era necessário encontrar um
equilíbrio entre a proteção da saúde pública e as consequências negativas de um controlo excessivamente
repressivo.
Em 1983 é aprovado o Decreto-Lei n.º 430/83, de 13 de dezembro que, apesar de aumentar o foco repressivo
sobre o tráfico de droga e manter a posição de que o uso de estupefacientes era socialmente condenável,
demonstra no seu preâmbulo um reconhecimento do «reduzido ou nulo efeito dissuasor da simples previsão de
penas severas», questionando se «deverá o consumo de droga [...] ser censurado penalmente?».
Em 1987 foi criado o Projeto VIDA, o primeiro programa nacional de luta contra a droga. Este projeto
procurava tanto a redução da procura como a da oferta e permitiu a abertura de centros de tratamento
especializados por todo o país, desta vez colocados sob alçada do Ministério da Saúde.
É em 1993, no mesmo ano em que surge o primeiro programa de testes da SIDA e de troca de seringas em
Portugal, que surge também uma nova lei da droga, ainda hoje em vigor, sobre a redução da oferta: o Decreto-
Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro. Este diploma vem no seguimento da Convenção contra o tráfico de substâncias
ilícitas e de substâncias psicotrópicas de 1988 e definia a pena aplicável para o consumo de várias substâncias,
bem como para os casos de tráfico de droga e de consumidor-traficante. Apesar de manter a criminalização do
consumo de droga, pode ler-se que «o consumidor de drogas é sancionado pela lei vigente de maneira quase
simbólica, procurando-se que o contacto com o sistema formal da justiça sirva para o incentivar ao tratamento».
Para além disso refere que «para os consumidores ocasionais, acima de tudo deseja-se a sua não etiquetagem,
a não marginalização».
Ao longo dos anos foram feitos vários esforços mas a situação continuou a agravar-se especialmente no que
concerne ao consumo de heroína e transmissão de VIH. Em 1999 foi aprovada, através da Resolução do
Conselho de Ministros no 46/99, a «Estratégia Nacional da Luta Contra a Droga». Esta estratégia exclui
expressamente a liberalização da droga e a regulação do tráfico, mas classifica definitivamente a
toxicodependência como uma doença, para além de prever a criação e expansão de estruturas de apoio aos
consumidores. Também sugere a criação de novos mecanismos de coordenação e é por isso que, logo em
1999, o Projeto VIDA e o gabinete do Ministério da Justiça para os assuntos da droga se unem para dar lugar
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ao IPDT – Instituto Português da Droga e Toxicodependência, mais tarde renomeado IDT – Instituto da Droga e
Toxicodependência).
O Plano de Ação Nacional de Luta contra a Droga e a Toxicodependência – Horizonte 2004, continha várias
recomendações, sendo uma delas a descriminalização do consumo de estupefacientes, que veio a culminar
com a aprovação da Lei n.º 30/2000 de 29 de novembro, conhecida como o «regime jurídico do consumo de
estupefacientes», que entrou em vigor a 1 de julho de 2001.
Esta Lei estabelece a posse, aquisição e consumo de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas até uma
quantidade estabelecida (de até 10 dias para consumo médio individual) como contraordenação, deixando assim
de ser um crime. As quantidades máximas estão definidas por substância no mapa anexo à Portaria no 94/96,
de 26 de março, e só quando na posse de quantidades acima das estipuladas o individuo é então encaminhado
para o sistema judicial.
O objetivo desta lei é promover condições que permitam perceber a motivação do consumidor e encaminhá-
lo para tratamento, enquanto se asseguram as medidas de reintegração social. A prova está no artigo 3.º quando
dispõe que, caso o consumidor ou o seu representante legal procure tratamento de forma espontânea, o disposto
na lei não se aplica.
Assim, este modelo pioneiro modifica o estatuto legal do consumidor. Quando em situação de incumprimento,
o infrator é encaminhado para uma Comissão de Dissuasão para a Toxicodependência (CDT), regulada pelo
Decreto-Lei n.º 130-A/2001.
Em suma, esta reforma surge depois de anos de tensão entre a criminalização do consumo de droga e a
vontade de ajudar os consumidores e resolver um problema de saúde pública, aceitando que este é um problema
que deve ser resolvido pela tutela da saúde e não da justiça (ou não exclusivamente). Com a sua aprovação,
Portugal passa a dar prioridade ao tratamento e à prevenção em vez da sanção, orientando a sua política para
a saúde pública, sendo essa a sua principal característica.
E é nessa senda que se pretende continuar. Na verdade, Portugal tem dado passos importantes e pioneiros
na forma como lidar com as dependências, por um lado, e com a canábis em particular por outro. De tal forma
que foi já reconhecido pelo Parlamento português, após provas científicas no mesmo sentido, que a canábis tem
um valor medicinal relevante, o que levou à aprovação da lei n.º 33/2018, de 18 de julho. Isto para além de já
desde 2014 existirem no nosso País plantações legais de canábis, a qual não pode, no entanto, ser
comercializada em Portugal.
Estatística sobre o consumo de estupefacientes em Portugal
Em 2000, como já foi referido, Portugal foi pioneiro na descriminalização do consumo de estupefacientes
através da aprovação da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, que «Define o regime jurídico aplicável ao
consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, bem como a proteção sanitária e social das pessoas
que consomem tais substâncias sem prescrição médica.» Assim, com a aprovação desta lei, o consumo,
independentemente do fim medicinal ou recreativo, passou a ser permitido, embora o tráfico continue,
naturalmente, a ser proibido.
Esta alteração legislativa foi marcante, na medida em que possibilitou uma viragem na tendência de consumo
de drogas à data, a qual consubstanciava um problema de saúde pública grave. Inclusivamente foi a política
portuguesa, pioneira na Europa, que atraiu a atenção de especialistas de todo o mundo. O constitucionalista
liberal norte-americano, Glenn Greenwald, por exemplo, apresentou em 2009, um relatório intitulado «Drug
decriminalization in Portugal – Lessons for creating fair and successful drug policies»1. Neste relatório, de grande
impacto internacional, o autor refere que no período de 1999-2006, o consumo jovem decresceu, tal como as
doenças e mortes relacionadas com o consumo de droga.
Para além disso, Greenwald menciona que houve um crescimento do número de pessoas em programas de
substituição, de 1999 a 2003, (acréscimo de 147%) e que «a prevalência do consumo desceu de 14,1% para
10,6% (face a 2001) na faixa etária 13‐15 anos, e de 27,6 para 21,6% nos 16‐18 anos».
1 https://object.cato.org/sites/cato.org/files/pubs/pdf/greenwald_whitepaper.pdf
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De facto, uma avaliação interna dos planos nacionais contra a droga e toxicodependência, levada a cabo em
2009, mostrou que a situação da droga em Portugal melhorou no período de 2004-2007. Concluiu-se que até
2009 houve um aumento na procura de tratamento e um decréscimo do consumo, especialmente na população
mais jovem, o que se atribui à concentração de esforços na procura de ações de redução em vez de ações nos
tribunais.
Segundo Greenwald, estes decréscimos pós-descriminalização haviam sido antecedidos por grandes
aumentos nos anos 90, quer do consumo, quer de mortes, de casos de SIDA e VIH relacionados com droga e
de Hepatite B e C. Esses aumentos exacerbados na década de 90 resultaram em esforços de alerta e informação
sobre o vírus da SIDA antes da descriminalização, bem como de outras Doenças Sexualmente Transmissíveis
(DST), o que também já contribuirá para mudar os números, mas é inegável que a tendência para a diminuição
de casos tenha acelerado depois da descriminalização. Simultaneamente, a descriminalização acabou por ser
positiva para os toxicodependentes que já existiam.
Resumindo, a aprovação da Lei n.º 30/2000, de 29 de novembro, não levou a aumentos substanciais de
consumo de droga. Os dados apontam antes para uma redução do consumo problemático de drogas, de danos
causados pelas drogas e do excesso de casos criminais2.
Historicamente, a prevalência durante a vida de drogas ilícitas tem sido baixa em Portugal quando comparada
com outros países da União Europeia (UE). Em 2001, apenas 7,8% dos indivíduos dos 15 aos 64 anos tinham
consumido uma droga ilícita3. Por contraste, no Reino Unido, em 2001/2002, 34% dos indivíduos entre os 16 e
59 anos já o tinha feito (Aust et al., 2002). Isso manteve-se depois da descriminalização do consumo, segundo
Greenwald. Por exemplo, e virando o foco para as duas drogas mais consumidas na Europa, canábis e cocaína,
entre 2001 e 2005 a prevalência ao longo da vida do consumo de canábis na população portuguesa entre os 15
e os 64 anos era a mais baixa da (UE), e da cocaína a sexta mais baixa.
Igualmente, em 2006, a prevalência de drogas em Portugal era menor do que a da média europeia, segundo
o relatório desse ano do Instituto da Droga e da Toxicodependência. No mesmo ano, a percentagem de
indivíduos em idade estudantil que consumira canábis pelo menos uma vez era de 8,2%, enquanto na Europa
era de 25%. Já a cocaína apontava para os 1,6%, enquanto na Europa a taxa de prevalência de consumo de
cocaína em estudantes era de 4%, ou seja, 12 milhões de pessoas que consumiram cocaína pelo menos uma
vez. Já em 2007, o consumo de cocaína entre indivíduos entre os 15 e 34 anos apontava para o nível mais baixo
em relação à media da União Europeia e Noruega, que se situa nos 2,1%, apresentando Portugal níveis de
1,2%4.
Novamente, em 2011, um relatório do European Monitoring Centre for Drugs and Drug Addiction (EMCDDA)
revelou que em Portugal o consumo moderado estava abaixo da média europeia. Por exemplo, o consumo
moderado de canábis entre indivíduos entre 15 e 34 anos era de 6,7%, enquanto na Europa a média era de
12,1%. Já em relação a crianças entre os 15-16 anos, Portugal apresentava uma prevalência de 13%, a mais
baixa na Europa Ocidental.
Ainda assim, e especificamente sobre o caso português,segundo o Serviço de Intervenção nos
Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) e os resultados dos estudos epidemiológicos nacionais
realizados ao longo dos anos em diferentes populações e contextos, a canábis surge sempre como a droga com
as maiores prevalências de consumo em Portugal. Em 2016/2017 foi realizado em Portugal o IV Inquérito
Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoativas na População Geral, Portugal 2016/2017, replicando os
estudos de 2012, 2007 e 2001, onde foi possível apurar em relação às idades de início dos consumos – e
focando no grupo de 15-24 anos, onde é maior a probabilidade de inícios recentes dos consumos –, que a
canábis continua a ser a substância que apresenta as idades mais precoces, com uma idade média de início do
consumo idêntica à registada em 2012 (17 anos) e uma idade modal superior (16 anos em 2012 e 17 anos em
2016/17).
Em 2016/17, uma vez mais, a canábis foi a substância ilícita que registou as maiores prevalências de
consumo ao longo da vida – pelo menos uma experiência de consumo na vida – e de consumo recente e atual
2Hughes, Caitlin e Stevens, Alex, «WHAT CAN WE LEARN FROM THE PORTUGUESE DECRIMINALIZATION OF ILLICIT DRUGS?» in BRIT. J. CRIMINOL. (2010) 50, 999–1022 Advance Access publication 21 July 2010, disponível online em http://www.sicad.pt/BK/Dissuasao/Documents/CaitlinElizabethHughesAlexStevens.pdf. 3 Apresentação «Inquérito Nacional ao Consumo de Substâncias Psicoactivas na População Portuguesa – 2001, CEOS, Investigações Sociológicas, FCSH, UNL». 4 Drug Policy Profile: Portugal, European Monitoring Centre for Drugs and Drug Addiction, 2011, disponível online em http://www.emcdda.europa.eu/publications/drug-policy-profiles/portugal
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– nos últimos 12 meses e nos últimos 30 dias à data da inquirição –, seja na população total (15-74 anos), seja
na população jovem e jovem adulta (15-34 anos). Essas prevalências foram respetivamente de 10%, 5% e 4%
na população de 15-74 anos, e de 15%, 8% e 6%, na de 15-34 anos. Entre 2012 e 2016/17 verificaram-se
aumentos destas prevalências, em particular ao nível do consumo recente (últimos 12 meses) e atual (últimos
30 dias).
Estas continuam a ser mais expressivas no grupo masculino – 14% ao longo da vida, 7% nos últimos 12
meses e 5% nos últimos 30 dias na população de 15-74 anos e 21%, 11% e 9% na de 15-34 anos –, por
comparação ao feminino – 6%, 3% e 2% nos 15-74 anos e 10%, 5% e 4% nos 15-34 anos. Apesar de se terem
verificado subidas destas prevalências em ambos os sexos, verifica-se uma diminuição do rácio de
masculinidade entre 2012 e 2016/17.
As subidas das prevalências de consumo recente e atual de canábis foram particularmente relevantes nos
grupos etários dos 35-44 anos e 25-34 anos, sendo menos expressivas na população jovem de 15-24 anos. Tal
evolução alterou os perfis etários ao nível do consumo recente e atual, deixando de haver uma clara variação
das prevalências na razão inversa das idades como em 2012, ou seja, passando os grupos decenais dos 25-34
anos e dos 35-44 anos a registar as maiores prevalências de consumo recente e atual (e com valores mais
próximos nestes grupos), e já não a população jovem de 15-24 anos.5
Face a estes dados, podemos concluir que apesar da descriminalização da posse em 2001 e dos receios
que a mesma provocava junto da população, Portugal conseguiu manter o consumo abaixo da média europeia
e inverter a tendência no consumo de certos tipos de drogas e das consequências que daí advinham. No entanto,
o consumo ainda subsiste e no que diz respeito à canábis em particular a tendência é para o aumento do
consumo e, em consequência, do tráfico. O quadro atual beneficia o comércio ilegal, mais especificamente o
narcotráfico, com prejuízo para os consumidores em particular e para a sociedade em geral.
As substâncias vendidas não são sujeitas a qualquer controlo, é absolutamente desconhecido para o
consumidor a proveniência da canábis ou o seu nível de concentração de Tetrahidrocanabinol (THC), o que
implica riscos acrescidos no consumo e na saúde pública.
Experiências internacionais
A experiência portuguesa demonstrou-nos que a descriminalização pode ser um caminho eficiente no
combate ao consumo e ao tráfico, à qual se alia a experiência de outros países que já deram o passo de legalizar
o consumo de canábis, com determinadas restrições. Vejamos.
O Uruguai foi o primeiro país do mundo a legalizar a produção, distribuição, venda e consumo de canábis em
dezembro de 2013. O Governo declarou que pretendia controlar a produção, o preço e a qualidade da planta,
assim defendendo a saúde pública e combatendo o narcotráfico. Segundo a lei uruguaia, cada pessoa pode
comprar até 40 gramas de canábis por mês, sendo a produção do próprio Governo. O limite legal de idade para
poder comprar canábis é aos 18 anos e para proceder à compra é necessário estar-se registado numa base de
dados nacional que rastreia o consumo, assim assegurando que a quantidade limite não é ultrapassada. A venda
de canábis é assegurada através da rede de farmácias. É admitido o autocultivo para autoconsumo, portanto,
sem fins comerciais, sendo admitidas seis colheitas por ano, por habitação, até 480 gr. São também admitidos
clubes de produção, os quais funcionam como uma associação de produtores, que pode cultivar até 99 plantas
por ano.
Nos Estados Unidos da América (EUA), vários Estados já legalizaram a produção, distribuição, venda e
consumo de canábis, como é o caso da Califórnia, Alasca, Colorado, Oregon, Massachusetts, Washington,
Maine e Nevada. Todos eles admitem o consumo a partir dos 21 anos de idade, sendo depois variáveis de
Estado para Estado as restrições e condicionantes.
Mais recentemente, em dezembro de 2018, o Canadá aprovou a «Cannabis Act», ou seja, liberalizou a
produção, distribuição, venda e consumo de canábis, mediante determinadas regras, tendo como objetivos
principais a redução do tráfico de drogas mas também, admitindo o consumo, que o mesmo seja o mais
5 Relatório Caracterização e Evolução da Situação – Tendências por Droga: Cannabis http://www.sicad.pt/BK/EstatisticaInvestigacao/InformacaoEstatistica/TendenciasDrogas/Documents/Tendencias_por_Drogas_Cannabis.pdf.
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esclarecido possível. É admitido o autocultivo com restrições, bem como limites à compra de canábis, a qual só
pode acontecer em locais devidamente licenciados para o efeito.
Segundo o relatório «From Prohibition to Progress: A Status Report on Marijuana Legalization»,elaborado
pela Drug Policy Alliance6 e publicado em janeiro de 2018, a legalização da canábis nos EUA teve um sucesso
tão grande que a questão deixou de ser se deve ou não legalizar-se a canábis, mas sim como fazê-lo.
Os processos judiciais decorrentes da posse ilegal, venda ou consumo de canábis decresceram
acentuadamente. A experiência americana apresenta impactos significativos na saúde, já que a legalização da
canábis está vinculada a menores taxas de danos relacionados com o consumo de opiáceos, incluindo mortes
por overdose de opióides e transtornos por uso de opióides não tratados. Uma análise das mortes por overdose
de opiáceos no Colorado revelou que após a legalização da canábis para uso adulto houve uma redução de 0,7
mortes por mês no Estado e que a tendência ascendente de overdoses de décadas começou a diminuir após
2014, o primeiro ano de vendas legais de canábis no Estado.
Quais as vantagens da legalização do uso adulto de canábis?
Segundo Ricardo Batista Leite e Lisa Ploeg, em «O Caminho para a Legalização Responsável e Segura do
Uso de Cannabis em Portugal»7, são vários os benefícios da legalização da canábis.
De acordo com estes autores, a legalização possibilitará um maior controlo sobre o mercado e sobre o
produto em si, portanto, sobre o que é consumido. Para além disso, verificar-se-á consequentemente uma
quebra significativa no rendimento dos traficantes e redução de atividade criminosa neste âmbito. A legalização
da canábis repercute-se também na melhoria do sistema judicial, já que reduz significativamente o número de
detenções e investigações neste âmbito.
Acresce que, de acordo com a experiência americana, a legalização permite uma redução do consumo de
canábis sintética, cujos efeitos são menos conhecidos e tendencialmente mais gravosos.
O mercado legal permite ainda aos Estados verificar de forma mais concreta os padrões de consumo e, em
consequência, delinear estratégias mais adequadas ou pormenorizadas.
Outra das vantagens que os autores apontam é o aumento de qualidade dos produtos vendidos, decorrente
da regulamentação, e que previsivelmente resultará numa redução do número de internamentos hospitalares
ou episódios de urgência provocados pelo consumo de canábistratados por químicos, como a fenilciclidina.
Ao mesmo tempo prevê-se uma redução no consumo da canábis sintética.
Em alguns locais onde foi legalizado o consumo de canábis verificou-se uma redução no consumo de álcool,
o que gera também benefício para a saúde pública e previsivelmente a redução do número de acidentes de
viação.
Por fim, verificar-se-á uma maior eficiência no combate ao tráfico de drogas, uma vez que os meios policiais
e judiciais terão mais disponibilidade para a sua investigação.
O que pretendemos
O objetivo desta alteração legislativa é precisamente a proteção da saúde e segurança pública. Mais
concretamente, pretende-se uma proteção acrescida da saúde dos jovens adultos, restringindo o seu acesso a
produtos controlados; impedir o incentivo ao consumo de outros estupefacientes mais nocivos para a saúde;
promover uma produção lícita de canábis, o que em consequência levará a uma necessária redução da produção
ilícita; dissuadir a prática de ilícitos criminais relacionados com o consumo e tráfico, através de um quadro penal
adequado; reduzir o número de processos em tribunal relacionados com a posse e tráfico de droga; providenciar
um acesso seguro e informado à canábis e, por fim, criar debate e consciência sobre os riscos associados ao
consumo de canábis.
6 Disponível online em http://www.drugpolicy.org/sites/default/files/dpa_marijuana_legalization_report_feb14_2018_0.pdf. 7 Batista Leite, Ricardo e Ploeg, Lisa, «O Caminho para a Legalização Responsável e Segura do Uso de Cannabis em Portugal», disponível online em https://www.actamedicaportuguesa.com/revista/index.php/amp/article/view/10093.
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O que propomos
O PAN apresenta propostas concretas para um debate sério e livre, num caminho que deve envolver vários
representantes da sociedade, que visa conseguir reduzir as dependências no nosso país, combater o tráfico de
droga, prevenir e tratar as dependências de forma mais eficaz e incrementar níveis de informação para a saúde
e segurança de todos.
Face à evolução da legislação e do pensamento português relativo ao consumo de estupefacientes, tendo
em conta o cenário nacional no que diz respeito concretamente ao consumo de canábis e, por fim, a
aprendizagem que podemos retirar da experiência internacional, o PAN considera que deve existir uma reflexão
sobre a legalização da canábis para fins adultos e sobre a forma como a mesma deve ocorrer. Numa tentativa
de conciliação dos vários valores em causa, segurança, saúde pública, liberdade individual e combate ao
narcotráfico, considera-se fundamental dar um passo além da mera descriminalização da posse e regular a
produção, fabrico, distribuição, comércio por grosso e retalho de canábis. Esta legalização deve ser, no entanto,
limitada.
Assim, propomos um limite mínimo de idade para aquisição ou produção de canábis. As pessoas singulares
ou coletivas que pretendam proceder ao cultivo devem ser devidamente autorizadas pela entidade competente
e estarão sujeitas a fiscalização e a um quadro sancionatório adequado às eventuais infrações.
A venda a retalho deve ocorrer exclusivamente em farmácias, porque são pontos de venda neutros, onde é
prestado um serviço público, onde há profissionais informados e habilitados a prestar quaisquer tipos de
esclarecimentos necessários, nomeadamente no que diz respeito aos potenciais riscos para a saúde, legalmente
sujeitas ao dever de sigilo. Existe uma rede de mais de 3000 farmácias em todo o País possibilitando o acesso
equilibrado. As farmácias são há vários anos elementos essenciais no combate ao VIH e SIDA, através do
programa de troca de seringas nas farmácias.
Acresce que Portugal é frequentemente referido nos meios políticos e científicos como um dos países na
Europa em que um maior leque de serviços é disponibilizado à população em Farmácia Comunitária. Em muitas
zonas do território nacional, as farmácias são a única estrutura de saúde disponível capaz de prestar cuidados
de proximidade e um papel determinante na promoção da literacia em saúde. Desta forma, é a farmácia
comunitária que tem maior proximidade à população, apresentando uma posição estratégica no sector da saúde
e podendo contribuir para uma monitorização cuidada e estudo deste tipo de dependências, bem como fazer
uma dispensa informada e consciente de canábis.8
É importante também impedir a publicidade a produtos à base de canábis, bem como quaisquer tipo de
patrocínios por parte dos seus produtores. As embalagens devem ser neutras e informativas, alertando para os
eventuais danos para a saúde do consumidor. Por uma questão de transparência, os rótulos devem ser claros
e identificar a variedade de canábis e concentração de THC. Não deve ser admitida a produção de canábis
sintética, cujos malefícios se julgam superiores ao da planta em si, nem de produtos comestíveis ou bebíveis à
base de canábis.
Importa, uma vez mais, sublinhar que o objetivo da legalização do uso adulto e informado de canábis é o de
prevenir o consumo e os danos que advêm do mesmo, pelo que deve haver um esforço significativo na criação
de barreiras a quaisquer tipos de estratégias ou mecanismos que visem a promoção e publicidade do consumo,
bem como deve prevalecer um esforço na criação de respostas à dependência e ao consumo esclarecido.
Importa ainda referir que apenas os cidadãos portugueses ou cidadãos estrangeiros com autorização de
residência em Portugal poderão proceder à compra de canábis. Esta medida visa impedir o turismo relacionado
com o consumo de estupefacientes.
Por fim, de 2 em 2 anos deve ser elaborado um relatório estatístico que permita verificar do sucesso dos
objetivos identificados na presente lei, assim se possibilitando uma adequação da mesma às necessidades da
sociedade portuguesa.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis o Deputado Único Representante do PAN
apresenta o seguinte projeto de lei:
8 https://www.ordemfarmaceuticos.pt/pt/areas-profissionais/farmacia-comunitaria/.
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Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei admite o uso adulto e informado de canábis, definindo para o efeito o regime jurídico
aplicável ao cultivo, comercialização, aquisição e detenção da planta, substâncias e preparações de canábis.
2 – A presente lei tem como objetivo proteger as pessoas dos riscos do comércio ilegal e narcotráfico, bem
como das consequências para a saúde, sociais e económicas que o uso irresponsável e desinformado de
substâncias psicoativas podem ter na sociedade. Assim, é do interesse público que o Estado tome ação no
sentido de proteger, promover e melhorar a saúde pública, mediante uma política orientada para minimizar os
riscos e reduzir os danos do consumo de canábis, especialmente obtido de forma ilegal, e os efeitos prejudiciais
que podem advir do referido consumo.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por:
a) «Planta Cannabis sativa L.», vulgarmente conhecida como planta de canábis, cujas substâncias ativas
são os canabinóides, localizadas por toda a planta, sendo que o principal princípio ativo é o Tetrahidrocanabinol
(THC) e varia conforme a variedade da planta, desta podem-se produzir vários tipos de preparados para
consumo humano;
b) «Fabrico», processo de produção ou transformação de produtos à base de canábis para fins comerciais;
c) «Comércio por grosso», atividade de revenda de produtos de canábis a outros comerciantes grossistas
ou retalhistas;
d) «Comércio a retalho», venda direta de produtos de canábis ao consumidor final, em quantidades limitadas,
exclusivamente em Farmácia Comunitária;
e) «Autocultivo», o cultivo feito para autoconsumo, sem qualquer fim comercial e com as limitações previstas
no presente diploma.
Artigo 3.º
Princípios gerais
1 – A utilização adulta e informada de canábis é permitida a todos os portugueses ou cidadãos estrangeiros
com autorização de residência em Portugal desde que maiores de 18 anos e que não padeçam de doença
psíquica ou outra patologia, que possa agravar-se devido ao consumo deste tipo de substância, nos termos da
presente lei.
2 – A venda de canábis seja a grosso ou retalho, assim como a produção, extração ou fabrico comercial
apenas podem ser efetuadas por entidades devidamente autorizadas para o efeito.
Artigo 4.º
Regulação e Supervisão
O Governo regulamenta a supervisão das atividades de cultivo, produção, extração e fabrico comercial,
comércio por grosso, distribuição às farmácias, importação e exportação, trânsito, aquisição, venda de canábis.
Artigo 5.º
Autorização
1 – O cultivo, fabrico, comércio por grosso, importação e exportação da planta, substância e preparações de
canábis para fins comerciais, com destino à utilização adulta, está sujeito a autorização da Direção-Geral de
Alimentação e Veterinária e comunicação obrigatória à entidade responsável pela supervisão.
2 – Ao pedido de autorização de cultivo dá-se preferência a pequenos produtores, nos termos a regulamentar
pelo Governo.
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3 – A venda de sementes só pode ser efetuada em locais especialmente autorizados para o efeito pela
Direção-Geral de Alimentação e Veterinária.
Artigo 6.º
Locais de venda a retalho
A venda a retalho de produtos à base de plantas de canábis apenas é permitida em farmácias comunitárias,
nos termos a regulamentar pelo Governo.
Artigo 7.º
Proibição de consumo em determinados locais
1 – É proibido o consumo de canábis:
a) Nos locais onde estejam instalados órgãos de soberania, serviços e organismos da Administração Pública
e pessoas coletivas públicas;
b) Nos locais de trabalho;
c) Nos locais de atendimento direto ao público;
d) Nos estabelecimentos onde sejam prestados cuidados de saúde, nomeadamente hospitais, clínicas,
centros e casas de saúde, consultórios médicos, postos de socorros e outros similares, laboratórios, farmácias
e locais onde se dispensem medicamentos não sujeitos a receita médica;
e) Nos lares e outras instituições que acolham pessoas idosas ou com deficiência ou incapacidade;
f) Nos locais destinados a menores de 18 anos, nomeadamente infantários, creches e outros
estabelecimentos de assistência infantil, lares de infância e juventude, centros de ocupação de tempos livres,
colónias e campos de férias e demais estabelecimentos similares;
g) Nos estabelecimentos de ensino, independentemente da idade dos alunos e do grau de escolaridade,
incluindo, nomeadamente, salas de aula, de estudo, de professores e de reuniões, bibliotecas, ginásios, átrios
e corredores, bares, restaurantes, cantinas, refeitórios e espaços de recreio;
h) Nos centros de formação profissional;
i) Nos recintos de diversão, nos casinos, bingos, salas de jogo e outro tipo de recintos destinados a
espetáculos de natureza não artística;
j) Nas zonas fechadas das instalações desportivas;
k) Nos conjuntos e grandes superfícies comerciais e nos estabelecimentos comerciais de venda ao público;
l) Nos estabelecimentos de restauração ou de bebidas, incluindo os que possuam salas ou espaços
destinados a dança;
m) Nas áreas de serviço e postos de abastecimento de combustíveis;
n) Nos aeroportos, nas estações ferroviárias, nas estações rodoviárias de passageiros e nas gares marítimas
e fluviais;
o) Nas instalações do metropolitano afetas ao público, designadamente nas estações terminais ou
intermédias;
p) Nos elevadores, ascensores e similares;
q) Em qualquer outro lugar onde, por determinação da gerência, da administração ou de outra legislação
aplicável, designadamente em matéria de prevenção de riscos ocupacionais, se proíba fumar.
2 – É ainda proibido o consumo de canábis nos veículos afetos aos transportes públicos urbanos, suburbanos
e interurbanos de passageiros, bem como nos transportes rodoviários, ferroviários, aéreos, marítimos e fluviais,
nos serviços expressos, turísticos e de aluguer, nos táxis, ambulâncias, veículos de transporte de doentes e
teleféricos.
Artigo 8.º
Apresentação do produto
1 – A rotulagem da embalagem individual e de qualquer embalagem exterior, não pode incluir nenhum
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elemento ou característica, constante de textos, símbolos, designações, marcas comerciais, sinais figurativos
ou outros, que:
a) Promova um produto de canábis ou incentive o seu consumo criando uma impressão errónea quanto às
suas características, efeitos na saúde ou riscos;
b) Sugira que um determinado produto de canábis é menos nocivo que outros ou que tem propriedades
revitalizantes, energéticas, curativas, rejuvenescentes, naturais, biológicas ou outros benefícios para a saúde
ou o estilo de vida;
c) Se refira ao sabor, odor, qualquer aromatizante ou outros aditivos ou à sua ausência;
d) Se assemelhe a um produto alimentar ou a um cosmético.
2 – As embalagens individuais e qualquer embalagem exterior não podem, através de textos, símbolos,
designações, marcas comerciais, sinais figurativos ou outros, sugerir vantagens económicas ou campanhas
promocionais, por meio de cupões impressos, ofertas de descontos, livre distribuição, dois pelo preço de um, ou
outras ofertas similares.
3 – A embalagem individual ou qualquer embalagem exterior deve conter obrigatoriamente:
a) Informação detalhada sobre os componentes presentes no respetivo produto, assim como as suas
quantidades e concentrações;
b) A origem e o tipo de produção, se em modo biológico ou não;
c) Advertências e informação sobre os efeitos adversos, potenciais consequências para a saúde, e uso em
grupos especiais.
Artigo 9.º
Comunicação dos ingredientes de produtos à base de canábis
1 – Os fabricantes e os importadores de produtos à base de canábis devem, antes da comercialização de
novos produtos, apresentar à Direcção-Geral da Saúde a lista de todos os ingredientes, e respetivas
quantidades, utilizados no fabrico de tais produtos, por marca e por tipo, devendo especificamente indicar a
concentração de Tetrahidrocanabinol (THC) presente em cada um dos produtos.
2 – Os fabricantes e os importadores de produtos à base de canábis devem igualmente comunicar à Direcção-
Geral da Saúde, e antes da sua comercialização, qualquer alteração à composição de um produto que afete a
informação prestada ao abrigo do presente artigo.
3 – A Direcção-Geral da Saúde assegura a divulgação, no seu sítio na Internet, dos dados apresentados nos
termos do presente artigo, tendo em conta, sempre que seja caso disso, as informações que constituam sigilo
comercial e que para tal efeito tenham sido especificadas pelo fabricante ou importador de produtos à base de
canábis.
4 – Caso a Direcção-Geral da Saúde necessite de informações complementares relativamente à composição
dos produtos à base de canábis pode solicitá-las, sendo dever dos fabricantes ou importadores fornecê-las.
5 – Antes de ser introduzido no mercado, qualquer produto à base de canábis deve ser sujeito a controlo de
qualidade, ao nível toxicológico, de biocontaminantes e composição analítica em termos de canabinóides.
Artigo 10.º
Limitações
1 – O Governo pode fixar um limite máximo à concentração de THC nos produtos a comercializar.
2 – É proibida a adição de outras substâncias que não as próprias da planta da canábis com o objetivo de
potenciar o efeito psicoativo ou de criar dependência, assim como é proibida a utilização de aditivos que confiram
cor às emissões, aromas ou sabores diversos dos que são próprios da planta de canábis.
3 – O fabrico e a comercialização de canábis sintética não é admitido.
4 – O fabrico e a comercialização de produtos bebíveis ou comestíveis de canábis não é permitido.
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Artigo 11.º
Rastreabilidade
1 – Todas as embalagens individuais de produtos de canábis comercializadas em território nacional devem
ser marcadas com um identificador único, que deve ser impresso ou afixado de modo inamovível, indelével, não
sendo de forma alguma dissimulado ou separado, inclusive por estampilhas especiais ou marcas de preço, ou
pela abertura da embalagem individual, que permita determinar:
a) A data e o local de fabrico;
b) A instalação de fabrico;
c) A máquina utilizada para fabricar os produtos de canábis;
d) O turno de produção ou a hora de fabrico;
e) A descrição do produto;
f) O mercado a retalho visado;
g) A rota de expedição prevista;
h) O importador, quando aplicável;
i) A rota de expedição realmente percorrida, desde o fabrico até ao primeiro estabelecimento retalhista,
incluindo todos os armazéns utilizados, bem como a data de expedição, o destino da expedição, o ponto de
partida e o destinatário;
j) A identidade de todos os compradores, desde o fabrico até ao primeiro estabelecimento retalhista; e
k) A fatura, o número de encomenda e os registos de pagamento de todos os compradores, desde o fabrico
até ao primeiro estabelecimento retalhista.
2 – As informações referidas nas alíneas a) a g) do número anterior e, quando aplicável, a referida na alínea
h) do mesmo número, devem fazem parte do identificador único, devendo as informações referidas nas alíneas
i), j) e k) do número anterior ser eletronicamente acessíveis através de uma ligação ao identificador único.
3 – Todos os operadores económicos envolvidos no comércio de produtos de canábis, desde o fabricante
até ao último operador económico antes do primeiro estabelecimento retalhista, devem registar a entrada de
todas as embalagens individuais em sua posse, bem como todos os movimentos intermediários e a saída
definitiva das embalagens individuais da sua posse, podendo tal registo ser feito mediante marcação e registo
da embalagem agregada, desde que continue a ser possível localizar e seguir todas as embalagens individuais.
4 – Todas as pessoas singulares e coletivas envolvidas na cadeia de fornecimento de produtos de canábis
devem manter registos completos e exatos de todas as transações referidas no presente artigo.
5 – Os dados registados não podem ser modificados ou apagados por nenhum operador económico
envolvido no comércio de produtos de canábis, sendo respeitada a legislação relativa à proteção de dados
pessoais.
Artigo 12.º
Publicidade e promoção
1 – São proibidas todas as formas de publicidade e promoção da canábis e aos produtos à base de canábis,
incluindo a publicidade oculta, dissimulada e subliminar, através de suportes publicitários nacionais ou com sede
em Portugal, incluindo os serviços da sociedade de informação.
2 – O disposto no n.º 1 não é aplicável à informação comercial circunscrita às indicações de preço, marca e
origem exibida exclusivamente no interior das farmácias que vendam produtos de canábis, desde que esta não
seja visível no exterior dos estabelecimentos, designadamente nas respetivas montras.
3 – A publicidade na imprensa e noutros meios de comunicação impressos só é permitida em publicações
destinadas exclusivamente aos profissionais do comércio da canábis ou em publicações impressas e editadas
em países terceiros, desde que não se destinem principalmente ao mercado comunitário.
4 – É proibida a distribuição gratuita ou a venda promocional de produtos de canábis ou de quaisquer bens
de consumo, que visem, ou tenham por efeito direto ou indireto, a promoção desses produtos de canábis ou do
seu consumo.
5 – É proibida a distribuição de brindes, atribuição de prémios ou a realização de concursos, ainda que
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exclusivamente destinados a consumidores de canábis, por parte de empresas direta ou indiretamente
relacionadas com o fabrico, a distribuição ou a venda de produtos de canábis.
6 – É proibida a comunicação comercial audiovisual, prevista na Lei n.º 27/2007, de 30 de julho, alterada
pelas Leis n.os 8/2011, de 11 de abril, e 40/2014, de 9 de julho, a produtos de canábis.
Artigo 13.º
Patrocínio
É proibida qualquer forma de contributo público ou privado, nomeadamente por parte de empresas cuja
atividade seja o fabrico, a distribuição ou a venda de produtos de canábis, destinado a um evento, uma atividade,
um indivíduo, uma obra audiovisual, um programa radiofónico ou televisivo, que vise, ou tenha por efeito direto
ou indireto, a promoção de um produto de canábis ou do seu consumo.
Artigo 14.º
Campanhas de informação, de prevenção ou de promoção de vendas
São proibidas campanhas ou outras iniciativas promovidas ou patrocinadas pelas empresas produtoras,
distribuidoras, subsidiárias ou afins, de produtos de canábis que visem, direta ou indiretamente, a informação e
a prevenção do consumo de canábis.
Artigo 15.º
Limites à aquisição para uso adulto
Na venda a retalho, a quantidade a adquirir por cada pessoa não pode exceder a dose média individual
calculada para 30 dias, tal como disposto na Portaria n.º 94/96, de 26 de março.
Artigo 16.º
Autorização de autocultivo para uso adulto
1 – Apenas podem solicitar autorização para autocultivo de canábis os cidadãos que cumpram os seguintes
requisitos:
a) Sejam maiores de 18 anos de idade;
b) Tenham nacionalidade portuguesa ou autorização de residência permanente.
2 – A autorização mantém-se válida por um período de um ano, podendo ser renovada.
3 – É à Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária que cabe a análise e decisão do pedido de cultivo de
canábis, devendo ser dado conhecimento ao Ministério da Administração Interna dos pedidos aprovados para
efeitos de eventual fiscalização.
Artigo 16.º-A
Limitações ao autocultivo
1 – É permitido o cultivo para uso pessoal adulto até um limite máximo de 6 plantas por habitação própria e
permanente.
2 – O cultivo para uso pessoal adulto é feito, obrigatoriamente, com sementes adquiridas nos
estabelecimentos licenciados para o efeito.
3 – O autocultivo nos termos do presente artigo não pode em qualquer circunstância ter fim comercial.
Artigo 17.º
Preço de retalho
O Governo fixa preços máximos de venda ao consumidor que, após a aplicação do imposto devido, devem
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ser inferiores aos preços médios praticados no mercado ilegal.
Artigo 18.º
Tributação
É criado, no âmbito do Código dos Impostos Especiais de Consumo, um imposto sobre a planta, substâncias
e preparações de canábis, a entrar em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à entrada em vigor da
presente lei, devendo ter uma taxa diferenciada e mais reduzida a canábis que for produzida em modo biológico.
Artigo 19.º
Receita fiscal
A receita fiscal obtida através da comercialização dos produtos de canábis, é consignada em 50% ao
investimento em programas de prevenção e combate ao consumo de estupefacientes, bem como à pesquisa de
meios de prevenção e tratamento; ao estudo e investigação dos efeitos sociais e na saúde relacionados com o
consumo de estupefacientes.
Artigo 20.º
Fiscalização
Compete à DGAV, às DRA e aos órgãos de polícia criminal assegurar a fiscalização do cumprimento das
normas constantes do presente diploma, sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades.
Artigo 21.º
Ilícitos criminais
1 – Quem incumprir o disposto no artigo 5.º, 6.º, 16.º e 16.º-A, ou seja, quem cultivar, fabricar, vender por
grosso ou a retalho, importar e exportar a planta, substância e preparações de canábis sem a autorização devida
é punido com pena de prisão de 3 a 12 anos.
2 – Se a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios
utilizados, a modalidade ou as circunstâncias, a ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou
preparações de canábis a moldura penal é reduzida para metade, ou aplicada pena de multa até 600 dias.
3 – Quem cultivar plantas, produzir ou fabricar substâncias ou preparações ilícitas diversas das que constam
do título de autorização é punido nos termos do capítulo III do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.
4 – No caso de punição pela infração, revertem para o Estado todos os objetos, substâncias, direitos e
vantagens associados à prática da infração.
Artigo 22.º
Contraordenações
1 – Quem incumprir o disposto no artigo 7.º comete uma contraordenação punível com coima de 750 a 5000
euros.
2 – Quem incumprir o disposto nos artigos 9.º, 10.º, 12.º, 13.º, 14.º e 15.º, comete contraordenação punível
com coima de 25 000 a 250 000 euros.
3 – A oposição a atos de fiscalização ou a recusa a exibir os documentos exigidos pelo presente diploma,
depois de advertência das consequências legais da conduta em causa, constitui contraordenação punível com
coima de 2500 a 25 000 euros.
4– A tentativa é punível.
5 – Podem ser aplicadas sanções acessórias tais como a revogação ou suspensão da autorização concedida
para o exercício da respetiva atividade e a interdição do exercício da profissão ou atividade por período não
superior a cinco anos.
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Artigo 23.º
Informação e educação para a saúde
1 – O Estado, designadamente os sectores da saúde, da educação, da juventude, do desporto, da defesa do
consumidor, do ambiente, do trabalho, da economia e da cultura, bem como as regiões autónomas e as
autarquias locais, devem promover a informação dos cidadãos, utilizando, sempre que possível, a língua gestual
e a linguagem Braille, e contribuir para a criação de condições favoráveis à prevenção e ao controlo do consumo
de canábis.
2 – Os serviços de saúde, independentemente da sua natureza jurídica, designadamente centros de saúde,
hospitais, clínicas, consultórios médicos devem promover e apoiar a informação e a educação para a saúde dos
cidadãos relativamente aos malefícios decorrentes do consumo de canábis através de campanhas, programas
e iniciativas destinadas à população em geral ou a grupos específicos, designadamente crianças e jovens,
grávidas, entre outros.
3 – A temática da prevenção e do controlo do consumo de canábis deve ser abordada no âmbito da educação
para a cidadania, a nível dos ensinos básico e secundário e dos currículos da formação profissional, bem como
da formação pré e pós-graduada dos professores destes níveis de ensino.
4 – A temática da prevenção e do tratamento do uso e da dependência da canábis deve fazer parte dos
currículos da formação pré e pós-graduada dos profissionais de saúde, em particular dos médicos, dos médicos
dentistas, dos farmacêuticos e dos enfermeiros, enquanto agentes privilegiados de educação e promoção da
saúde.
Artigo 24.º
Estudo estatístico
1 – A Direcção-Geral da Saúde, em articulação com o Observatório Nacional de Saúde, Serviço de
Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) e com o grupo técnico consultivo,
assegura o acompanhamento estatístico e epidemiológico do consumo de canábis em Portugal, bem como o
impacte resultante da aplicação da presente lei, a fim de permitir propor as alterações adequadas à prevenção
e controlo do consumo do canábis e diminuição de dependências.
2 – Com o objetivo de avaliar o impacte da presente lei na saúde pública o Ministério da Saúde deve habilitar
a Assembleia da República com um relatório contendo os elementos referidos no número anterior, de dois em
dois anos.
3 – O primeiro relatório deve ser entregue na Assembleia da República decorridos dois anos sobre a entrada
em vigor da lei.
Artigo 25.º
Norma revogatória
São revogadas todas as disposições legais que se mostrem incompatíveis com o presente diploma.
Artigo 26.º
Regulamentação
O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 180 dias a partir da sua entrada em vigor.
Artigo 27.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação do Orçamento do Estado que segue à sua aprovação.
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O Deputado do PAN, André Silva.
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PROJETO DE LEI N.º 1063/XIII/4.ª
MELHORIA DAS CONDIÇÕES DE SAÚDE, EM AMBIENTE LABORAL, DAS FORÇAS E SERVIÇOS DE
SEGURANÇA
Exposição de motivos
As condições da missão desempenhadas pelas forças de segurança, como o contacto com situações
potencialmente traumáticas, risco de morte e níveis altos de stress e ansiedade, obrigam a que estes
profissionais sejam sujeitos a um acompanhamento constante. Este acompanhamento, por via da realização de
exames médicos para avaliação da aptidão física e psíquica, é essencial para assegurar que o trabalho é
prestado em condições que salvaguardem a segurança e a saúde dos profissionais das forças de segurança.
Atendendo à natureza das funções que exercem, o acompanhamento psicológico é fundamental, existindo
estudos e situações concretas que demonstrem que tal nem sempre acontece.
Estudos recentes da investigadora Cristina Queirós, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação
da Universidade do Porto, em conjunto com psicólogos da Divisão de Psicologia da PSP, sobre o Burnout e
indicadores psicopatológicos em polícias, revelam que os jovens agentes da PSP, colocados em Lisboa,
apresentam no seu primeiro ano de serviço efetivo «valores baixos de burnout», «bom estado psicológico» e
«realização profissional boa». Contudo, a investigadora diz que a progressão do mal-estar psicológico, cansaço
emocional e stress crónico no trabalho aumentam à medida que os polícias vão sendo colocados no terreno,
em que são confrontados com «mais exigências emocionais» e «cada vez menos recursos», diminuindo a sua
realização profissional e a motivação para as tarefas e aumentando a exaustão emocional, o que proporciona o
aparecimento de síndrome de burnout, o qual, no limite, pode conduzir ao suicídio.
De facto, o número de suicídios nas forças de segurança é alarmante. De acordo com os números
apresentados no livro «Os polícias não choram», da autoria de Miguel Rodrigues, citados pelo Diário de Notícias,
137 agentes acabaram com a sua própria vida entre 2000 e 2017, o que dá uma média de 16,9 casos por 100
mil habitantes, enquanto que na população em geral a taxa de suicídios foi de 9,7 por 100 mil habitantes, sendo,
em consequência, a taxa de suicídio na PSP e GNR quase duas vezes maior do que na população em geral.
O aumento da prevalência da perturbação mental na Europa e em Portugal são preocupantes. Em 2008, a
União Europeia estimava que cerca de 50 milhões de pessoas (cerca de 11% da população) tinham algum tipo
de perturbação mental. O «Estudo Epidemiológico Nacional de Morbilidade Psiquiátrica: Prevalência, fatores de
risco, carga social e económica e utilização de serviços» de 2010, aponta para que Portugal seja o País da
Europa com a maior prevalência de doenças mentais na população. Em 2009, 1 em cada 5 portugueses sofreu
de uma doença psiquiátrica (23%) e cerca de 43% já teve uma destas perturbações durante a vida.
Ora, estando os profissionais das forças e serviços de segurança sujeitos a enorme desgaste e elevadíssimos
níveis de stress é essencial que estes tenham o devido acompanhamento a nível físico e psicológico.
Assim, propomos que se clarifique na lei a necessidade de realização de exames de saúde para avaliação
da aptidão física e psíquica dos militares da GNR e da polícia para o exercício da atividade, os quais devem ser
realizados anualmente, no caso de profissionais com mais de 45 anos, e de dois em dois anos para os restantes.
Ainda, para além destes, sempre que se mostre necessário, o médico ou psicólogo podem submeter o
profissional à realização daqueles exames, sendo estes também realizados sempre que se verifiquem quaisquer
alterações substancias que possam ter repercussões nocivas na saúde física ou psíquica do militar, bem como
nos casos de regresso ao trabalho depois de uma ausência superior a 60 dias por motivo de doença ou acidente.
Para além disso, tendo em conta que atualmente a realização de ações de medicina preventiva para os
militares da Guarda devem ser realizadas com uma periodicidade de 5 anos, sendo reduzida para 3 anos a partir
dos 45 anos de idade, propomos que, atendendo à sua importância, estas passem a ocorrer com uma
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periodicidade nunca superior a 3 anos, sendo reduzida para 2 anos, a partir dos 45 anos de idade.
Por último, estabelecemos expressamente na lei que os polícias têm direito a beneficiar de medidas e ações
de medicina preventiva, nos mesmos moldes já referidos para os militares da Guarda.
Consideramos que é essencial que se faça o acompanhamento daqueles profissionais por forma a ajuda-los
a lidarem com os problemas, a adaptarem-se a mudanças, a superarem obstáculos ou a resistirem à pressão e
ao stress, procurando soluções para enfrentar e superar as adversidades. Por isso é fundamental que estes
tenham acesso a exames regulares de avaliação psicológica e ações de medicina preventiva, como forma de
detetar precocemente eventuais patologias e proceder ao seu tratamento.
O PAN apresentou já dois projetos de resolução que visavam reforçar o acompanhamento psicológico dos
militares da GNR e dos polícias, os quais foram rejeitados. Contudo, a situação mantem-se inalterada, pelo que
apresentamos o presente projeto que visa aquele objetivo, acreditando que o mesmo contribuirá para melhorar
as condições de trabalho dos profissionais das forças e serviços de segurança, com impactos significativos na
melhoria da sua qualidade de vida e saúde.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do PAN apresenta o seguinte projeto
de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei visa alterar o Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março, que aprova o Estatuto dos Militares da
Guarda Nacional Republicana e o Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, que aprova o estatuto profissional
do pessoal com funções policiais da Polícia de Segurança Pública, promovendo uma melhoria das condições
de saúde no trabalho dos militares da Guarda e Polícias.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março
São alterados os artigos 168.º e 169.º do Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março, os quais passam a ter a
seguinte redação:
«Artigo 168.º
Apreciação da aptidão física e psíquica
1 – A instituição deve promover a realização de exames de saúde, a realizar por médico ou psicólogo clínico,
para avaliar a aptidão física e psíquica do militar da Guarda para o exercício da atividade, bem como a
repercussão desta e das condições em que é prestada na saúde do mesmo.
2 – Sem prejuízo do disposto em legislação especial, devem ser realizados exames de saúde e avaliações
psicológicas com a seguinte periodicidade:
a) No início do exercício da função;
b) Anualmente para os militares com idade superior a 45 anos e de dois em dois anos para os restantes;
c) Sempre que se verifiquem quaisquer alterações substancias que possam ter repercussões nocivas na
saúde física ou psíquica do militar, bem como nos casos de regresso ao trabalho depois de uma ausência
superior a 60 dias por motivo de doença ou acidente.
3 – Atendendo a que a aptidão física e psíquica deve ser apreciada quando for julgado conveniente, o médico
e o psicólogo clínico, face ao estado de saúde do militar, podem alterar a periodicidade dos exames previstos
no número anterior, devendo os militares submeter-se a esta apreciação sempre que devidamente convocados.
4 – No cumprimento do disposto no presente artigo quanto à periodicidade, os meios de apreciação da
aptidão psíquica são aplicados de acordo com os regulamentos próprios, tendo em conta o escalão etário e as
características e especificidades de cada quadro ou especialidade, sendo os meios e métodos de apreciação
da aptidão física objeto de despacho do comandante-geral.
5 – (Anterior n.º 4).
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Artigo 169.º
Medicina preventiva
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – As ações de medicina preventivas referidas no n.º 1, de carácter obrigatório, serão realizadas com uma
periodicidade nunca superior a 3 anos, sendo reduzida para 2 anos, a partir dos 45 anos de idade.»
Artigo 3.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro
É alterado o artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 21.º
Apreciação da aptidão física e psíquica
1 – A instituição deve promover a realização de exames de saúde, a realizar por médico ou psicólogo clínico,
para avaliar a aptidão física e psíquica do polícia para o exercício da atividade, bem como a repercussão desta
e das condições em que é prestada na saúde do mesmo.
2 – Sem prejuízo do disposto em legislação especial, devem ser realizados exames de saúde e avaliações
psicológicas com a seguinte periodicidade:
a) No início do exercício da função;
b) Anualmente para os polícias com idade superior a 45 anos e de dois em dois anos para os restantes;
c) Sempre que se verifiquem quaisquer alterações substancias que possam ter repercussões nocivas na
saúde física ou psíquica do polícia, bem como nos casos de regresso ao trabalho depois de uma ausência
superior a 60 dias por motivo de doença ou acidente.
3 – Atendendo a que a aptidão física e psíquica deve ser apreciada quando for julgado conveniente, o médico
e o psicólogo clínico, face ao estado de saúde do polícia, podem alterar a periodicidade dos exames previstos
no número anterior.»
Artigo 4.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro
É aditado o artigo 21.º-A ao Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, com a seguinte redação:
«Artigo 21.º-A
Medicina preventiva
1 – Os polícias têm direito a beneficiar de medidas e ações de medicina preventiva.
2 – As ações de medicina preventiva visam permitir a deteção de patologias potenciais ou em fase precoce
da sua evolução no momento mais propício ao seu controlo ou cura.
3 – Todos os dados relativos às ações e medidas efetuadas no âmbito da medicina preventiva devem ser
registados no livrete de saúde, com acesso restrito ao responsável pela medicina preventiva e ao polícia.
4 – As ações de medicina preventivas referidas no n.º 1, de carácter obrigatório, serão realizadas com uma
periodicidade nunca superior a 3 anos, sendo reduzida para 2 anos, a partir dos 45 anos de idade.
5 – As medidas e ações de medicina preventiva são fixadas por despacho do diretor nacional.»
Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no prazo de 60 dias contados da data da sua publicação.
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Assembleia da República, 7 de janeiro de 2019.
O Deputado do PAN, André Silva.
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PROJETO DE LEI N.º 1064/XIII/4.ª
CRIA UM OBSERVATÓRIO NA COMISSÃO NACIONAL DE PROMOÇÃO DOS DIREITOS E
PROTEÇÃO DAS CRIANÇAS E JOVENS PARA MONITORIZAÇÃO DO CUMPRIMENTO DAS
OBRIGAÇÕES IMPOSTAS PELA CONVENÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA
Exposição de motivos
A Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, doravante designada por
Comissão Nacional, é uma pessoa coletiva de direito público, com autonomia administrativa e património próprio,
que funciona no âmbito do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Criada pelo Decreto-Lei
n.º 159/2015, de 10 de agosto, tem a seu cargo a importante missão de contribuir para a planificação da
intervenção do Estado e para a coordenação, acompanhamento e avaliação da ação dos organismos públicos
e da comunidade na promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens.
A Comissão Nacional tem diversas atribuições, cujo elenco exemplificativo consta do n.º 2 do artigo 3.º, dos
quais destacamos a elaboração de um plano nacional plurianual de promoção e proteção dos direitos da criança
e o planeamento, acompanhamento e avaliação de uma estratégia nacional para a aplicação da Convenção dos
Direitos da Criança, tendo em vista, designadamente, a recolha e o tratamento dos dados estatísticos relevantes
no âmbito de aplicação desta convenção.
A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pelas Nações Unidas em 20 de novembro de 1989 e
ratificada por Portugal em 21 de setembro de 1990, enuncia um amplo conjunto de direitos fundamentais (civis,
políticos, económicos, sociais e culturais) de todas as crianças, contendo disposições para a sua efetiva
aplicação e assenta, em suma, na não discriminação, na consideração prioritária do superior interesse da criança
em todas as ações que lhe digam respeito, devendo a sua voz ser ouvida e tida em conta em todos os assuntos
que se relacionem com os seus direito, bem como na garantia de acesso a serviços básicos e igualdade de
oportunidades para que as crianças possam desenvolver-se plenamente.
Consideramos que tendo em conta a composição abrangente e diversificada do Conselho Nacional, a
Comissão Nacional reúne as condições necessárias e adequadas para realizar a monitorização da aplicação da
Convenção sobre os Direitos da Criança. De facto, tendo em conta que esta assume já, entre outras atribuições
relevantes nesta matéria, a atribuição de planeamento, acompanhamento e avaliação de uma estratégia
nacional para a aplicação da Convenção dos Direitos da Criança, pretendemos como este projeto possibilitar
que a Comissão Nacional possa assumir, plenamente, a monitorização da Convenção, através do reforço das
suas competências, no cumprimento das obrigações assumidas pelo Estado Português, aquando da ratificação
da Convenção. Em consequência, entendemos que a criação de um Observatório no âmbito da Comissão
Nacional permitirá incrementar o conhecimento técnico e existente sobre esta matéria, possibilitando a definição
de políticas públicas mais eficazes de promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens.
Nos termos do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, o Conselho Nacional, na sua
modalidade alargada, é composto por 18 entidades especificamente previstas, estando ainda prevista a
possibilidade de ali terem assento personalidades de mérito reconhecido para colaborar na representação da
Comissão Nacional, sempre que a especificidade das matérias o justifique, conforme estabelecido na alínea s)
do n.º 1 do referido artigo. Ora, atendendo a que o presente projeto visa reforçar as atribuições da Comissão
Nacional na monitorização da implementação da Convenção sobre os Direitos da Criança, consideramos
importante alterar o elenco de entidades prevendo também que aquela integre um representante de uma
associação da sociedade civil com trabalho reconhecido em matéria de infância e de juventude.
Face ao exposto propomos, por via de alteração ao Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, alterado pelo
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Decreto-Lei n.º 139/2017, de 10 de novembro, a criação de um Observatório para a monitorização da aplicação
da Convenção dos Direitos da Criança no âmbito da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção
das Crianças e Jovens. Consideramos que, sem prejuízo de outras soluções que têm sido discutidas, este
modelo é aquele que tem reunido maior consenso nas organizações que atuam nesta área, sendo o defendido
pela própria Comissão Nacional. Propomos ainda o alargamento da composição do Conselho Nacional da
Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, na modalidade alargada,
passando este a integrar um representante de uma associação da sociedade civil com trabalho reconhecido em
matéria de infância e juventude, algo que consideramos importante, especialmente em virtude do reforço de
competências da Comissão.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do PAN apresenta o seguinte projeto
de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente Lei procede à alteração do Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, que cria a Comissão
Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, promovendo a criação de um
Observatório na Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens para
monitorização da aplicação da Convenção dos Direitos da Criança, bem como alterações à composição do
Conselho Nacional.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto
São alterados os artigos 3.º, 8.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, os quais passam a ter
a seguinte redação:
«Artigo 3.º
[…]
1 – ................................................................................................................................................................... .
2 – São atribuições da Comissão Nacional, nomeadamente:
a) ..................................................................................................................................................................... ;
b) ..................................................................................................................................................................... ;
c) ..................................................................................................................................................................... ;
d) ..................................................................................................................................................................... ;
e) ..................................................................................................................................................................... ;
f) ...................................................................................................................................................................... ;
g) Acompanhar o cumprimento das obrigações impostas pela Convenção sobre os Direitos da
Criança, através da criação de um Observatório com funções de monitorização da respetiva aplicação,
que integre na sua composição investigadores universitários com especiais conhecimentos nesta área;
h) Aprovar e divulgar anualmente o seu plano de ação e o relatório de atividades, do qual constará anexo
o relatório produzido na sequência da atividade de monitorização prevista na alínea g);
i) [Anterior alínea g)];
j) [Anterior alínea i)];
K) [Anterior alínea j)];
l) [Anterior alínea k];
m) [Anterior alínea l];
n) [Anterior alínea m];
o) [Anterior alínea n];
p) [Anterior alínea o];
q) [Anterior alínea p].
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Artigo 8.º
[…]
1 – O Conselho Nacional, na sua modalidade alargada, tem a seguinte composição:
a) ..................................................................................................................................................................... ;
b) ..................................................................................................................................................................... ;
c) ..................................................................................................................................................................... ;
d) ..................................................................................................................................................................... ;
e) ..................................................................................................................................................................... ;
f) ...................................................................................................................................................................... ;
g) ..................................................................................................................................................................... ;
h) ..................................................................................................................................................................... ;
i) ...................................................................................................................................................................... ;
j) ...................................................................................................................................................................... ;
k) ..................................................................................................................................................................... ;
l) ...................................................................................................................................................................... ;
m) .................................................................................................................................................................... ;
n) ..................................................................................................................................................................... ;
o) ..................................................................................................................................................................... ;
p) ..................................................................................................................................................................... ;
q) ..................................................................................................................................................................... ;
r) ..................................................................................................................................................................... ;
s) Um representante de uma associação da sociedade civil com trabalho reconhecido em matéria de
infância e juventude;
t) [Anterior alínea s)].
2 – ................................................................................................................................................................... .
3 – ................................................................................................................................................................... .
4 – ................................................................................................................................................................... .
Artigo 10.º
[…]
1 – Ao Conselho Nacional, na modalidade alargada, compete efetuar todas as ações necessárias à
prossecução das atribuições da Comissão Nacional previstas nas alíneas a), d) a h) e k) a p) do n.º 2 do artigo
3.º, bem como ao cumprimento do disposto nos artigos 4.º e 5.º.
2 – ................................................................................................................................................................... .»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
1 – A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
2 – A organização, a composição e o funcionamento do Observatório para a monitorização da aplicação da
Convenção dos Direitos da Criança é regulamentada pelo Governo no prazo de 60 dias após a publicação da
presente Lei.
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PROJETO DE LEI N.º 1065/XIII/4.ª
LEI DE BASES DA SAÚDE
Exposição de motivos
Ao longo das últimas quatro décadas, o sistema de saúde português e, muito especialmente, o Serviço
Nacional de Saúde, constituiu um instrumento decisivo na promoção da saúde e na proteção à doença dos
portugueses, desse modo concretizando o direito fundamental à proteção da saúde, que a Constituição consagra
no seu artigo 64.º.
Com efeito, nestes mais de 40 anos de democracia, a realidade nacional evoluiu significativamente – e num
sentido bem positivo – designadamente em termos de acesso à proteção da saúde, seja na cobertura de serviços
de saúde, nos indicadores epidemiológicos ou no que se refere ao próprio estado de saúde da população
portuguesa.
Assim, verificou-se um considerável aumento da oferta de cuidados de saúde no nosso País, com mais
instituições prestadoras de cuidados de saúde, tanto públicas como privadas e do sector de economia social,
garantindo aos portugueses níveis de acesso a serviços e prestações de saúde nunca antes existentes.
Por outro lado, também o estado de saúde da população portuguesa registou assinaláveis progressos nos
últimos 40 anos, como o demonstra o expressivo aumento da esperança média de vida – que ultrapassou já a
média da União Europeia – a assinalável diminuição da mortalidade infantil – uma das mais baixas do Mundo –
ou, ainda, a diminuição dos óbitos na generalidade das doenças evitáveis – como sucede na tuberculose, no
VIH/Sida ou na diabetes.
Esta evolução positiva, tanto no aumento da oferta de serviços de saúde como na melhoria dos indicadores
de saúde, hoje muito mais próximos ou mesmo em linha com os desejáveis padrões internacionais, muito deve
à criação e funcionamento do nosso Serviço Nacional de Saúde.
Aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, a Lei de Bases da Saúde vigente foi modificada apenas uma
vez e quase não foi objeto de iniciativas legislativas visando a sua alteração, factos que demonstram bem o
carácter progressivo da mesma e a adequação que revelou em relação às exigências dos desejáveis níveis de
saúde dos portugueses.
Volvidas quase três décadas desde a aprovação da referida lei, impõe-se reconhecer que Portugal evoluiu
substancialmente e que surgiram realidades que, não raro, assumem elevada complexidade e colocam
exigentes desafios, assim como carecem de soluções inovadoras e cada vez mais ajustáveis, não podendo o
sistema de saúde a eles ficar alheio, sob pena de soçobrar.
De entre essas realidades avultam, desde logo, o acentuado envelhecimento que se verificou na população
portuguesa nas últimas décadas, assim como a forte redução da taxa de natalidade registada no mesmo período,
fatores que condicionam, decisivamente, a sustentabilidade dos sistemas de proteção social e, em
consequência, dos próprios sistemas públicos de saúde.
O reconhecimento da importância dos determinantes sociais e de outros determinantes não clínicos na
definição do estado de saúde dos cidadãos e da população em geral exige que o sistema de saúde seja capaz
de implementar soluções englobadas numa visão de saúde em todas as políticas.
Por outro lado, as alterações epidemiológicas em curso – onde sobressai o aumento do peso das doenças
crónicas –, a mudança dos paradigmas da prestação de cuidados de saúde – cada vez mais reorientados para
a prevenção das doenças e a intervenção na sua fase inicial –, a progressiva exigência de melhoria do nível da
qualidade assistencial e, bem assim, o crescente impacto financeiro decorrente dos avanços científicos e dos
recursos tecnológicos e instrumentais necessários para o tratamento das pessoas; colocam inegáveis desafios
ao Estado e exigem novas abordagens em que os cidadãos devem ser cada vez mais o centro do sistema de
saúde.
Para o Partido Social Democrata, o sistema de saúde português e, em particular, o Serviço Nacional de
Saúde, devem, cada vez mais, orientar-se para o aprofundamento de um contexto favorável à saúde dos
indivíduos, no qual o sistema público constitui um supremo garante da proteção dos cidadãos na doença,
assegurando-lhes eficazes políticas de saúde pública, cuidados de saúde de qualidade e equidade no acesso
aos serviços de saúde.
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Certo é que, neste enquadramento, o Serviço Nacional de Saúde deve continuar a coexistir com os sectores
de economia social e privado com objetivos de saúde, cooperando com estes na realização de prestações
públicas de saúde, sempre que tal contribua para a melhoria do acesso e a obtenção de ganhos em saúde para
os utentes e possa reduzir a carga da doença, assim como os respetivos encargos para os contribuintes.
A referida cooperação deverá assentar sempre em exigentes regras de transparência e imparcialidade, sendo
necessariamente acompanhada de uma efetiva e rigorosa regulação e fiscalização, de que nenhuma atividade
na área da saúde deve estar isenta.
Este princípio de integração decorre da recusa que o PSD sempre assumirá, enquanto partido personalista,
pluralista e reformista, relativamente a qualquer modelo político de pendor estatizante, que, na área social, tenda
a preconizar a concentração exclusiva no Estado, da realização direta de todas as prestações públicas de saúde.
Assim, para o PSD, a gestão da saúde deve ser primordialmente pública e o recurso do Serviço Nacional de
Saúde aos setores privado e social, para a realização de prestações públicas de saúde, deve verificar-se sempre
que tal se revele necessário, atenta a capacidade instalada dos serviços públicos; vantajoso, em termos de
relação qualidade-custos; e, mais importante ainda, quando tal cooperação possa conduzir à obtenção de
ganhos em saúde para os utentes do Serviço Nacional de Saúde, principalmente os mais fragilizados e
vulneráveis.
Considera ainda o PSD ser a Lei de Bases de Saúde a sede apropriada para o reconhecimento de novas
realidades e direitos sociais, cuja proclamação é de molde a inspirar e reforçar no País e, em particular, nas
instituições públicas, a necessidade de se aprofundar uma cultura moderna e de efetivação de uma cidadania
responsável.
Através da presente iniciativa legislativa, que nasce das ideias inspiradoras da Lei n.º 48/90, de 24 de agosto,
diploma que se revelou um importante instrumento de coesão social ao longo destes 28 anos, o PSD oferece
as suas propostas com vista à modernização da atual legislação enquadradora do sistema de saúde português,
respondendo a novos problemas de saúde e alcançando soluções progressivas, orientadas para os ganhos em
saúde dos cidadãos, o reforço das suas condições de proteção num contexto de doença e, num sentido mais
geral, para uma sociedade mais justa, coesa e solidária.
Recorreu-se ainda ao trabalho recentemente produzido pela Comissão de Revisão da Lei de Bases da
Saúde, cujos contributos não podem ser ignorados.
O PSD acredita que este seu contributo possa concorrer para o tão desejável desiderato político de ser
possível congregar todos os partidos pluralistas em torno de uma nova Lei de Bases da Saúde inclusiva,
moderna, transversal e suficientemente flexível que permita alcançar um máximo denominador político comum.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados do Grupo Parlamentar do Partido
Social Democrata apresentam o seguinte projeto de lei:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Base I
Princípios gerais
1 – A proteção da saúde, ao longo de todo o ciclo de vida, constitui um direito dos indivíduos e um bem da
comunidade que se efetiva pela responsabilidade conjunta dos cidadãos, da sociedade e do Estado, em
liberdade de procura e de prestação de cuidados, nos termos da Constituição e da lei.
2 – O Estado promove e garante o acesso de todos os cidadãos aos cuidados de saúde nos limites dos
recursos humanos, técnicos, científicos e financeiros disponíveis, em obediência aos princípios da autonomia,
da vulnerabilidade, da não-maleficência, da equidade e da justiça.
3 – O Estado reconhece a importância social e económica da saúde como promotora do desenvolvimento
humano, da inovação e da criação de valor.
4 – As prestações de saúde são asseguradas, sob regulação e fiscalização do Estado, por serviços e
estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúdee por entidades do setor de economia social e do setor privado,
bem como por profissionais em regime de trabalho independente.
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Base II
Direito à proteção da saúde
1 – O direito à proteção da saúde, comodireito constitucionalmente protegido, compreende o acesso às
prestações adequadas, designadamente promotoras de saúde, preventivas, terapêuticas, de reabilitação, de
cuidados continuados e de cuidados paliativos.
2 – A efetivação do direito à proteção da saúde, em todas as suas vertentes e nas suas manifestações
individuais e coletivas, constitui o fundamento e a finalidade primeira do Serviço Nacional de Saúde, que deve
ser dotado dos meios adequados para o efeito.
3 – A proteção do interesse e do bem-estar da pessoa devem prevalecer sobre o interesse único da
sociedade ou da ciência, devendo as restrições aos direitos individuais limitar-se ao estritamente necessário
para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
Base III
Política de saúde
1 – A política de saúde tem âmbito nacional, centra-se na pessoa e no seu bem-estar e obedece às diretrizes
seguintes:
a) A promoção da saúde e a prevenção da doença fazem parte das prioridades no planeamento das
atividades do Estado e determinam a definição e a execução de todas as políticas públicas;
b) A igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde e a não discriminação das pessoas,
nomeadamente em razão da sua situação económica, condição social, sexo, género, orientação sexual,
ascendência, raça, etnia, cor, língua, idade, constituição genética, deficiência, estado de saúde, religião,
convicções políticas ou ideológicas, instrução ou local de residência;
c) A garantia da equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços;
d) A garantia do acesso, em tempo adequado, às prestações de saúde necessárias;
e) O investimento na prevenção das infeções associadas a cuidados de saúde, das doenças crónicas, do
alcoolismo, do tabagismo, da obesidade e do sedentarismo;
f) A adoção de medidas especiais relativamente a grupos em situação de maior vulnerabilidade,
designadamente mulheres grávidas, puérperas ou lactantes, crianças, adolescentes, pessoas com deficiência,
idosos, pessoas com doença crónica, em particular com multimorbilidade, pessoas com comportamentos
aditivos e outras patologias de saúde mental, pessoas com insuficiente situação económica, trabalhadores cuja
atividade o justifique e reclusos;
g) O rastreio das doenças que constituam as principais causas de morte precoce, designadamente doenças
do sistema circulatório e cardiovasculares, neoplasias e patologias respiratórias, ou que sejam potencialmente
tratáveis ou curáveis, designadamente doenças metabólicas, como diabetesmellitus e doenças infeciosas,
especialmente infeção por VIH, hepatites virais e tuberculose;
h) A conceção, a organização e o funcionamento dos estabelecimentos e serviços de saúde e o
desenvolvimento e a gestão dos recursos humanos de acordo com os direitos, os interesses e as necessidades
em saúde das pessoas e das comunidades, articulando-se entre si e com os serviços associados à realização
de outras políticas públicas fundamentais, em especial com os serviços de segurança e solidariedade social;
i) A gestão dos recursos disponíveis segundo critérios de qualidade, eficácia, efetividade e eficiência, de
forma a obter deles o maior proveito socialmente útil, a alcançar ganhos em saúde e a evitar a subutilização, o
desperdício e a utilização indevida dos serviços;
j) A cooperação entre os sectores público, privado e de economia social com objetivos de saúde, em
concorrência, com vista à melhoria da efetivação do direito à proteção da saúde das pessoas;
k) A participação das pessoas e da comunidade na definição, no acompanhamento e na avaliação das
políticas de saúde, bem como no planeamento e controlo do funcionamento dos serviços, devendo ser apoiada,
em particular, a intervenção das associações representativas das pessoas com doença;
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l) A promoção da educação das populações para a saúde, com vista a elevar o respetivo nível de literacia
para a realização de escolhas livres e esclarecidas, bem como a estimular a adoção de estilos de vida saudáveis
e a modificação de comportamentos potencialmente nocivos à saúde pública ou individual.
m) O reconhecimento da ciência como bem público e do direito de todos beneficiarem do progresso científico,
nos termos da lei;
n) A promoção do desenvolvimento científico e da gestão do conhecimento para a melhoria da qualidade;
o) A essencialidade da investigação em saúde e para a saúde, devendo nela participar os serviços, os
profissionais e a comunidade, em articulação com outros setores da sociedade que a ela se dediquem.
2 – A política de saúde tem carácter transversal, dinâmico e evolutivo, adaptando-se ao progresso do
conhecimento científico e às condições, às necessidades e aos recursos da realidade nacional, regional e local,
visando ganhos em saúde.
Base IV
Responsabilidade do Estado
1 – Ao Estado cumpre a tarefa de realização do direito à proteção da saúde e de redução das desigualdades,
atuando nas determinantes da saúde em todas as políticas através da criação de condições económicas, sociais,
culturais e ambientais que a garantam e otimizando e distribuindo equitativamente, pelo território nacional, os
recursos humanos, materiais e financeiros necessários que devam ser afetados àquela finalidade e fiscalizando
a qualidade das prestações de saúde.
2 – O Estado é responsável por garantir a promoção da saúde, a prevenção da doença e a prestação de
cuidados de saúde e por implementar os respetivos programas e medidas.
3 – A responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde efetiva-se, primordialmente,
através do Serviço Nacional de Saúde.
4 – O Governo define a política de saúde, tendo em conta os princípios e as diretrizes fixados na presente
lei.
5 – Cabe ao membro do Governo responsável pela área da saúde propor a definição da política de saúde,
promover e fiscalizar a respetiva execução e coordenar a sua ação com a dos demais ministérios e outras
entidades, com respeito pelo disposto na presente lei.
6 – Compete ao ministério que tutela a área da saúde:
a) Exercer, em relação ao Serviço Nacional de Saúde e às outras entidades que realizam prestações
públicas de saúde, funções de regulamentação, orientação, planeamento, avaliação, auditoria e inspeção;
b) Regular e fiscalizar a atividade na área da saúde, sem prejuízo das funções que a lei atribuir às ordens
profissionais;
c) Inspecionar, fiscalizar e desenvolver a ação disciplinar no setor da saúde, incidindo sobre todos os
domínios da atividade e da prestação de cuidados de saúde, sem prejuízo das competências disciplinares
atribuídas pela lei às ordens profissionais.
7 – A lei define a natureza, as atribuições, a organização e o funcionamento das entidades públicas às quais
o Estado atribui as competências referidas no número anterior.
8 – O Estado pode constituir uma entidade reguladora da saúde, independente e com funções de autoridade
nacional de fiscalização, supervisão e regulação da atividade na área da saúde.
Base V
Transversalidade e integração
1 – A transversalidade da política de saúde impõe a sua consideração em todos os sectores da vida
económica, social e cultural, e obriga à sua articulação e integração com as demais políticas setoriais, visando
a promoção de relações de coerência e de complementaridade entre elas.
2 – Para os efeitos do disposto no número anterior, todos os departamentos, especialmente os que atuam
nas áreas específicas da segurança e bem-estar social, da educação, do emprego, do desporto, do ambiente,
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da economia, da agricultura, do sistema fiscal, da habitação e do urbanismo, devem ser envolvidos na promoção
da saúde.
3 – No sentido de promover e acautelar os princípios e objetivos da política de saúde, os bens de saúde
devem ser ponderados com outros bens fundamentais, de forma a assegurar a sua interdependência, num
exercício de compatibilização que inclua uma avaliação de cenários alternativos e que promova a realização do
interesse público, no curto, médio e longo prazos.
Base VI
Natureza da legislação sobre saúde
A legislação sobre saúde é de interesse e ordem públicos, implicando a sua inobservância responsabilidade
penal, contraordenacional, civil e disciplinar, conforme o estabelecido na lei.
Base VII
Regiões Autónomas
1 – A organização, o funcionamento e o desenvolvimento dos sistemas regionais de saúde nas Regiões
Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como a definição e a execução da respetiva política de saúde, cabem
aos seus órgãos próprios, em obediência aos princípios estabelecidos pela Constituição e pela presente lei.
2 – A aplicação da presente lei às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não prejudica a
regulamentação própria em matéria de organização e funcionamento, bem como a regionalização dos serviços
de saúde.
3 – Na promoção e na defesa da realização regional do direito à proteção da saúde, e de acordo com os
princípios de solidariedade e de unidade nacionais, podem o Governo da República e os Governos Regionais,
através dos respetivos serviços públicos de saúde, estabelecer a articulação e a referenciação para efeitos do
acesso às prestações de saúde necessárias.
Base VIII
Autarquias locais
1 – Sem prejuízo de eventual transferência de competências, as autarquias locais participam na ação comum
a favor da saúde coletiva e dos indivíduos, intervêm na definição das linhas de atuação em que estejam
diretamente interessadas e contribuem para a sua efetivação dentro das suas atribuições e responsabilidades.
2 – A intervenção das autarquias locais manifesta-se, designadamente no apoio aos sistemas locais de
saúde, com especial incidência nos cuidados de proximidade e nos cuidados na comunidade, bem como no
planeamento da rede de estabelecimentos prestadores e na participação nos órgãos de acompanhamento e de
avaliação do sistema de saúde.
3 – As autarquias locais devem participar na prestação de apoio a pessoas vulneráveis, em parceria com as
entidades competentes da administração central e outras entidades dedicadas à promoção e à proteção da
saúde, podendo, igualmente, ser promovida a sua participação, em articulação com as estruturas centrais, na
construção e manutenção das instalações de saúde, no transporte de pessoas em contexto de saúde e noutros
serviços considerados adequados.
4 – Deve ser igualmente promovida a participação das autarquias locais na ação comum a favor da promoção
da saúde individual e da saúde coletiva e, designadamente na atuação sobre as determinantes de saúde, na
prevenção da doença e dos riscos para a saúde, na educação para a saúde e na promoção da atividade física
da população e na salvaguarda de um ambiente saudável.
5 – A elaboração dos planos municipais de ordenamento do território e de outros instrumentos territoriais
deve compreender a promoção e a proteção da saúde e a prevenção da doença.
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Base IX
Relações internacionais
1 – Tendo em vista a indivisibilidade da saúde na comunidade internacional, o Estado Português reconhece
as consequentes interdependências sanitárias a nível mundial e assume as respetivas responsabilidades.
2 – O Estado Português apoia as organizações internacionais, desenvolve a sua política de acordo com as
orientações dessas organizações, nomeadamente da Organização Mundial de Saúde, e garante o cumprimento
dos compromissos internacionais a que está vinculado.
3 – O Estado Português desenvolve uma política de cooperação internacional que incida na melhoria
sustentável da saúde e do bem-estar humano, numa perspetiva de saúde global e no contexto das organizações
internacionais, designadamente a Organização das Nações Unidas, o Conselho da Europa, a União Europeia,
a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Económico.
4 – O Estado Português participa no processo de tomada de decisão e nas ações desenvolvidas no âmbito
da União Europeia, seguindo uma abordagem intersectorial das políticas públicas da União, designadamente
através de estudos de impacto na saúde e de reforço da coesão económica, social e territorial e da redução das
desigualdades, tendo em vista assegurar o mais elevado nível de proteção da saúde.
5 – Enquanto Estado-Membro da União Europeia, Portugal assegura a nível interno a execução das decisões
europeias, sem prejuízo das competências nacionais na definição e execução das políticas de saúde, na
organização e gestão dos serviços de saúde, na afetação dos recursos e na prestação de cuidados de saúde.
6 – O Estado Português garante a cooperação na vigilância das ameaças graves para a saúde com dimensão
transfronteiriça, no alerta em caso de tais ameaças e no combate contra as mesmas.
7 – O Estado garante a implementação de mecanismos de alerta rápida e de resposta, no quadro
internacional e dos instrumentos existentes, perante doenças novas ou emergentes, emergências em saúde
pública e ameaças sanitárias transfronteiriças, em especial atentas as rápidas modificações do padrão de saúde
e doença num mundo globalizado.
Base X
Conselho Nacional de Saúde
1 – O Conselho Nacional de Saúde é um órgão independente que desempenha funções consultivas do
Governo na definição das políticas de saúde.
2 – O Conselho Nacional de Saúde representa os intervenientes no funcionamento do sistema de saúde,
devendo, obrigatoriamente, incluir representantes:
a) Das pessoas em contexto de saúde;
b) Das entidades prestadoras de cuidados de saúde;
c) Dos subsistemas de saúde;
c) Dos profissionais de saúde;
e) Dos departamentos governamentais com áreas de atuação conexas e de outras entidades.
3 – A composição, a competência e o funcionamento do Conselho Nacional de Saúde constam da lei, sendo
os representantes das pessoas em contexto de saúde eleitos pela Assembleia da República.
CAPÍTULO II
DOS DIREITOS E DEVERES EM SAÚDE
Base XI
Direitos
1 – Os cidadãos têm direito a que os serviços públicos de saúde se constituam e funcionem de acordo com
os seus legítimos interesses.
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2 – É reconhecida a liberdade de escolha no acesso à rede nacional de prestação de cuidados de saúde,
com as limitações decorrentes dos recursos existentes e da organização dos serviços.
3 – A pessoa em contexto de saúde tem direito:
a) A aceder às prestações de saúde, com respeito pelo princípio da igualdade e da não discriminação;
b) A receber as prestações de saúde adequadas à sua situação, com prontidão e no tempo considerado
clinicamente aceitável, de forma humanizada, de acordo com a melhor evidência científica disponível e seguindo
as boas práticas de qualidade e segurança em saúde;
c) A escolher, no âmbito do sistema de saúde, na medida dos recursos existentes e de acordo com as regras
de organização, o serviço e agentes prestadores;
d) A decidir, livre e esclarecidamente, a todo o momento, receber ou recusar as prestações de saúde que
lhe são propostas, salvo nos casos excecionais previstos na lei;
e) A ver salvaguardada a sua dignidade;
f) À reserva da vida privada e à proteção de dados pessoais revelados ou apurados em contexto de saúde,
estando os profissionais obrigados ao dever de confidencialidade e sigilo, salvo disposição da lei em contrário;
g) Ao acompanhamento por familiar, cuidador informal ou outra pessoa por si escolhida, de acordo com a lei
e as regras em vigor;
h) A receber, se o desejar, assistência religiosa e espiritual;
i) A ser informada de forma adequada, acessível, objetiva, completa e inteligível pelo prestador dos
cuidados de saúde, de modo a garantir um esclarecimento efetivo, sobre a sua situação, o objetivo, a natureza,
as alternativas possíveis e os benefícios e os riscos das intervenções propostas, bem como sobre a investigação
relevante para a sua situação de saúde e a evolução provável do seu estado, em função do plano de cuidados
a adotar;
j) A aceder livremente à informação que lhe respeite, sendo a informação de saúde sua propriedade, sem
necessidade de intermediação de um profissional de saúde, salvo quando o solicitar, e sem embargo da
adequada proteção do sigilo de terceiros;
k) A ser informada, pelo estabelecimento de saúde, sobre o tempo de resposta para a prestação dos
cuidados de que necessita;
l) A escolher outra pessoa que deva receber, em seu lugar, as informações a que aludem as alíneas i) a k)
ou recusar receber essas informações, salvo quando, no caso previsto na alínea i), essa recusa possa constituir
risco para a saúde pública ou para terceiros;
m) A emitir diretivas antecipadas de vontade e a nomear procurador de cuidados de saúde, nos termos
definidos pela lei;
n) A reclamar, fazer queixa ou apresentar sugestões e obter resposta das entidades responsáveis;
o) A receber indemnização pelos danos sofridos, em tempo razoável, nos termos definidos na lei;
p) A participar na defesa dos seus direitos e interesses no âmbito das decisões que sejam suscetíveis de as
afetar;
q) A constituir entidades que a represente e defenda os seus direitos e interesses junto dos serviços de
saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de outras entidades.
4 – Ninguém pode ser discriminado no acesso a cuidados de saúde por ter recusado a celebração de contrato
de seguro de saúde ou a participação em investigação em saúde ou por ter emitido diretiva antecipada de
vontade.
Base XII
Deveres
1 – Os cidadãos são os primeiros responsáveis pela sua própria saúde, individual e coletiva, tendo o dever
de a defender e promover.
2 – As pessoas, em contexto de saúde, devem, em especial:
a) Exercer o direito à proteção da saúde com respeito pelos valores da cidadania responsável e da justiça;
b) Respeitar os direitos das outras pessoas em contexto de saúde e os dos profissionais de saúde;
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c) Observar as regras sobre a organização, o funcionamento e a utilização dos serviços e estabelecimentos
de saúde a que recorrem;
d) Colaborar com os profissionais de saúde em todos os aspetos relevantes e em função da sua situação
concreta;
e) Pagar os encargos que derivem da prestação dos cuidados de saúde, quando for caso disso;
f) No âmbito do Serviço Nacional de Saúde, respeitar os princípios que o enformam.
Base XIII
Pessoas que carecem de capacidade
Relativamente a menores e a maiores impossibilitados de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os
seus direitos pessoais, a lei deve prever as condições de exercício dos seus direitos, com observância dos
seguintes princípios:
a) Qualquer intervenção sobre uma pessoa que careça de capacidade para prestar o seu consentimento
apenas pode ser efetuada em seu benefício direto, salvo previsão legal ou decisão judicial em contrário;
b) A opinião do menor é tomada em consideração como um fator progressivamente determinante, em função
da sua idade e do seu grau de maturidade;
c) A pessoa maior sem capacidade para consentir deve, na medida do possível, participar no processo de
autorização, sendo tomada em consideração a sua vontade, designadamente a vontade anteriormente
expressa, e respeitadas, nos termos da lei, as diretivas antecipadas de vontade.
Base XIV
Saúde e deficiência
1 – Com vista a assegurar às pessoas com deficiência o gozo do melhor estado de saúde possível sem
discriminação nela baseada, o Estado toma as medidas apropriadas para lhes garantir o acesso:
a) A serviços e programas de saúde pública de igual natureza e qualidade aos prestados às demais pessoas,
em todas as áreas, incluindo a da saúde sexual e reprodutiva;
b) A cuidados de saúde de que necessitem, em particular devido à sua deficiência, incluindo a deteção e a
intervenção atempadas da deficiência, quando apropriadas, e os cuidados destinados a minimizar e a prevenir
outras deficiências;
c) A cuidados de saúde que atendam às especificidades decorrentes do género, da idade e da natureza e
origem da deficiência e que lhes permitam manter o máximo grau de independência e de inclusão na
comunidade em que se inserem.
2 – O ministério responsável pela área da saúde promove a formação dos profissionais de saúde no que
concerne aos direitos das pessoas com deficiência.
3 – Os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde tomam as medidas de adaptação apropriadas
para assegurar que as pessoas com deficiência exercem, em condições de igualdade com as demais, os seus
direitos fundamentais em contexto de saúde.
4 – O desenho dos produtos, ambientes, programas e serviços em contexto de saúde deve obedecer as
regras do desenho universal, salvo quando seja necessário adotar dispositivos específicos de assistência a
grupos particulares de pessoas com deficiência, nomeadamente através do recurso à língua gestual ou ao
braille.
Base XV
Cuidadores informais
1 – É promovido o papel da família, das pessoas próximas e da comunidade na saúde e no bem-estar das
pessoas com doença, dependência e ou perda de funcionalidade ou em risco de a perder, quando a pessoa
manifeste tal vontade.
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2 – A lei estabelece o estatuto dos cuidadores informais de pessoas em situação de doença crónica,
deficiência e ou com dependência, parcial ou total, transitória ou definitiva, ou noutra condição de fragilidade
relevante e que determine a necessidade de cuidados de terceiros, os seus direitos e deveres, com vista a
assegurar a qualidade dos cuidados informais, bem como o bem-estar das pessoas cuidadas e dos cuidadores
informais.
3 – A lei deve promover o reconhecimento do importante papel do cuidador informal, a sua responsabilização
e capacitação para a prestação, com qualidade e segurança, dos cuidados básicos regulares e não
especializados que realizam.
4 – A lei deve ainda assegurar a articulação entre a pessoa cuidada e os serviços de saúde e a
implementação do plano integrado de prestação de cuidados de saúde de que a pessoa carece.
5 – O Estado, através do ministério responsável pela área da saúde, em conjunto com os ministérios
responsáveis pelas áreas das finanças e do trabalho e da segurança social, define as medidas de apoio aos
cuidadores informais e às pessoas cuidadas, com vista a assegurar a qualidade dos cuidados informais e a
melhoria da qualidade de vida da pessoa com dependência.
Base XVI
Dados pessoais e informação de saúde
1 – O tratamento de dados pessoais e da informação de saúde, em especial relativa a qualquer pessoa, viva
ou falecida, obedece a legislação específica, de modo a garantir a proteção da sua confidencialidade e
integridade, a assegurar o cumprimento rigoroso do dever de sigilo por parte dos profissionais e dos serviços de
saúde e a impedir o acesso e uso indevidos.
2 – Deve ser assegurada a circulação dos dados de saúde e outros dados pessoais em condições de
interoperabilidade, interconexão e rastreabilidade dos sistemas de informação, garantindo a confidencialidade,
a portabilidade, a segurança e a proteção dos dados e o respeito pelo princípio da intervenção mínima, de acordo
com o regime jurídico aplicável.
Base XVII
Direito de associação e de representação
1 – É reconhecido o direito de as pessoas constituírem, nos termos da lei, entidades sob a forma de
associação ou outras entidades com personalidade jurídica e sem fins lucrativos que as representem e defendam
os seus direitos e interesses junto dos serviços de saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de
outras entidades.
2 – Nos termos do número anterior, podem ser constituídas associações de utilizadores dos serviços de
saúde, associações de pessoas com doença, associações de cuidadores informais, associações para a
promoção da saúde e prevenção da doença, ligas de amigos de estabelecimentos de saúde ou outras entidades
que prossigam os referidos fins.
3 – As associações e entidades constituídas nos termos do n.º 1:
a) Devem atuar de forma autónoma, independente e transparente, assegurando a legitimidade e a
representatividade da sua atuação;
b) Têm o direito de participar no procedimento legislativo e no procedimento administrativo regulamentar,
assim como nos processos de consulta e de audição públicas, nos termos da lei;
c) Têm legitimidade procedimental e legitimidade processual para representar interesses coletivos de acordo
com o seu objeto e fins.
4 – A Administração Pública deve promover a participação das associações e outras entidades constituídas
nos termos do n.º 1 em tudo o que respeite aos direitos e interesses das pessoas no contexto da saúde.
5 – A Administração Pública pode apoiar as associações e outras entidades constituídas nos termos do n.º
1 e as suas iniciativas, em particular no domínio da sensibilização, informação, literacia, prevenção, rastreio,
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segurança, investigação e formação na respetiva área de atuação, fiscalizando a execução dos apoios
concedidos.
CAPÍTULO III
DA SAÚDE PÚBLICA
Base XVIII
Saúde pública
1 – A promoção e a defesa da saúde pública constituem uma responsabilidade do Estado e são asseguradas
através da atividade do Serviço Nacional de Saúde e de outros entes públicos, devendo as pessoas, as
entidades dos setores de economia social e privado e outras organizações da sociedade civil ser associadas
àquela atividade.
2 – Compete ao Estado acompanhar a evolução do estado de saúde da população, do bem-estar das
pessoas e da comunidade, através do desenvolvimento e da implementação de instrumentos de observação em
saúde, nomeadamente de monitorização e vigilância epidemiológica, incluindo a laboratorial, com vista,
designadamente à:
a) Deteção precoce de ameaças e de alterações ao estado de saúde da população e ainda de tendências
de curto, médio e longo prazo;
b) Identificação de áreas prioritárias de intervenção e de outras ações de promoção da saúde e de prevenção
da doença;
c) Avaliação criteriosa e rigorosa dos efeitos das medidas adotadas e a adotar;
d) Coordenação das respostas de emergência, de promoção da saúde e de prevenção da doença ao longo
de todo o ciclo de vida.
3 – O acompanhamento da evolução do estado de saúde da população deve abranger, designadamente a
mortalidade e suas causas específicas, a morbilidade, as deficiências, as incapacidades e as determinantes
desse estado de saúde, nomeadamente, genéticas ou outras biológicas, ambientais, sociológicas,
comportamentais e organizacionais, bem como as necessidades em cuidados de saúde.
4 – A salvaguarda da saúde pública abrange políticas públicas no domínio das alterações climáticas, do
acesso a alimentação adequada e a água própria para consumo de qualidade e de garantia da qualidade do ar,
bem como do adequado tratamento e gestão dos resíduos.
5 – A promoção da saúde e a prevenção da doença podem contemplar a aprovação de medidas de
discriminação fiscal positiva relativamente a suplementos alimentares, cujo benefício na saúde humana se
encontre cientificamente comprovado pelas autoridades competentes.
6 – A prevenção da doença deve permitir um reforço dos fatores protetores da saúde através do apoio ao
desenvolvimento de programas de saúde pública devidamente sustentados no conhecimento científico,
designadamente nas áreas da vacinação, saúde escolar, saúde oral, saúde mental, saúde ambiental, saúde
respiratória, saúde sexual, saúde reprodutiva, saúde ocupacional e lesões e traumatismos, bem como através
de rastreios e na gestão da doença crónica, integrando nas ações os diversos níveis de prevenção.
7 – As ações de promoção da saúde e de prevenção da doença devem ser desenvolvidas de modo integrado
e articulado e considerando as especificidades locais.
8 – As ações de saúde pública devem ser suportadas por sistemas de informação dedicados de apoio e dos
adequados estudos, investigação e informação epidemiológica e pela produção sistemática de estatísticas sobre
saúde pública, proteção ambiental, saúde e segurança no trabalho.
9 – Deve ser desenvolvido um sistema de vigilância de saúde pública, nos termos da lei, que permita
identificar, avaliar, gerir e comunicar, de forma transparente, clara e rigorosa, situações de risco relativamente a
doenças transmissíveis e outras ameaças para a saúde pública, bem como ter sistematicamente preparados e
atualizados planos de contingência face a situações de emergência ou de calamidade pública e determinar as
medidas temporárias necessárias à proteção da saúde pública.
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10 – É reconhecida a natureza interdisciplinar e intersectorial dos instrumentos de política de saúde pública
e promovida a ação concertada dos mesmos pelos diferentes ministérios e serviços, com vista à obtenção de
ganhos efetivos em saúde e ao aumento dos potenciais anos de vida saudáveis da população.
11 – É promovida a avaliação dos impactos na saúde pública das diferentes políticas, designadamente
políticas sociais, de trabalho, ambientais, de obras públicas, de habitação, de urbanismo e de transportes.
Base XIX
Autoridades de saúde
1 – As autoridades de saúde situam-se a nível nacional, regional e local, para garantir a intervenção oportuna
e adequada do Estado, designadamente em situações de risco para a saúde pública, e estão hierarquicamente
dependentes do membro do Governo responsável pela área da saúde, através do diretor-geral competente, que
exerce as funções de autoridade nacional de saúde e constitui o ponto de contacto nos termos dos normativos
internacionais aplicáveis.
2 – As autoridades de saúde têm por funções a defesa da saúde pública e a avaliação do impacto das
decisões de outras entidades nesta matéria.
3 – É atribuída às autoridades de saúde a decisão de intervenção do Estado na promoção e proteção da
saúde e na prevenção da doença, bem como nas situações de alto risco para a saúde pública e no controlo dos
fatores de risco e das situações suscetíveis de causarem ou acentuarem prejuízos para a saúde dos cidadãos
e das comunidades.
4 – Para defesa da saúde pública cabe, em especial, às autoridades de saúde:
a) Proceder à vigilância epidemiológica das populações;
b) Proceder à vigilância das condições sanitárias dos serviços, estabelecimentos e locais de utilização
pública;
c) Ordenar a suspensão de atividade ou o encerramento dos serviços, estabelecimentos e locais referidos
na alínea anterior, quando funcionem em condições de risco para a saúde pública;
d) Desencadear, de acordo com a Constituição e a lei, o internamento ou a prestação compulsiva de
cuidados urgentes de saúde a indivíduos que, de outro modo, constituam perigo grave para a saúde pública;
e) Exercer a vigilância sanitária do território nacional e das fronteiras e fiscalizar o cumprimento do
Regulamento Sanitário Internacional ou de outros normativos internacionais correspondentes;
f) Proceder à requisição de serviços, estabelecimentos e profissionais de saúde em casos de epidemias
graves e outras situações semelhantes ou de calamidade pública.
5 – As funções de autoridade de saúde são independentes das de natureza operativa dos serviços de saúde.
6 – As intervenções e as decisões das autoridades de saúde são de natureza técnica, independentes do
poder político, suportadas pela evidência científica e apoiadas por sistemas de informação disponíveis em todos
os níveis da rede.
7 – Das decisões das autoridades de saúde cabe recurso hierárquico e contencioso nos termos da lei.
8 – Sem prejuízo do disposto na presente lei, os princípios e regras de organização e funcionamento das
autoridades de saúde são desenvolvidos em diploma próprio.
Base XX
Defesa sanitária das fronteiras
1 – O Estado Português promove a defesa sanitária das suas fronteiras, com respeito pelas regras gerais
emitidas pelos organismos competentes.
2 – Em especial, cabe aos organismos competentes estudar, propor, executar e fiscalizar as medidas
necessárias para prevenir a importação ou exportação das doenças submetidas ao Regulamento Sanitário
Internacional, enfrentar a ameaça de expansão de doenças transmissíveis e promover todas as operações
sanitárias exigidas pela defesa da saúde da comunidade internacional.
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Base XXI
Situações de emergência em saúde pública
1 – Sempre que ocorram situações de catástrofe ou de outra grave emergência em saúde pública, a
autoridade nacional de saúde toma as medidas de exceção indispensáveis, designadamente coordenando a
atuação dos serviços centrais do ministério responsável pela área da saúde com as instituições e serviços do
Serviço Nacional de Saúde e as autoridades de saúde de nível nacional, regional e local.
2 – Se justificado, o membro do Governo responsável pela área da saúde mobiliza a intervenção de outros
ministérios e serviços do Estado.
3 – Sendo necessário, pode a autoridade nacional de saúde, nas situações referidas no n.º 1, requisitar, pelo
tempo absolutamente indispensável, os profissionais e estabelecimentos de saúde em atividade dos setores
público, de economia social e privado.
4 – Compete à autoridade nacional de saúde articular-se com entidades nacionais e internacionais, no âmbito
da preparação para e na resposta a ameaças, deteção precoce, avaliação e comunicação de risco.
Base XXII
Saúde e genómica
1 – O Estado reconhece a importância da genómica no âmbito da saúde pública, devendo o legislador regulá-
la no respeito dos seguintes princípios:
a) Dignidade e direitos de todas as pessoas, independentemente das suas características genéticas;
b) Consentimento livre e esclarecido em matéria de testes genómicos preditivos realizados em contexto de
saúde e precedidos de indispensável aconselhamento genético;
c) Confidencialidade dos dados genómicos associados a uma pessoa identificável;
d) Não discriminação injustificada, com base nas características genéticas da pessoa, em particular se
associadas a doença ou deficiência;
e) Liberdade de investigação científica na área da genómica, atenta a sua importância para a melhoria da
saúde dos indivíduos e da Humanidade no seu conjunto;
f) Ampla divulgação dos conhecimentos disponíveis na área da genómica e promoção do seu intercâmbio
a nível nacional e internacional.
2 – O Estado incentiva a investigação na área da genómica, em particular em matéria de prevenção e
tratamento de doenças e deficiências raras de origem genética, assegurando especial proteção aos indivíduos,
famílias e grupos populacionais particularmente vulneráveis por elas afetados.
Base XXIII
Procriação medicamente assistida
A lei regula e estabelece as condições de acesso às técnicas de procriação medicamente assistida.
Base XXIV
Saúde mental
1 – O Estado promove a melhoria da saúde mental das pessoas e da sociedade em geral, designadamente
através da promoção do bem-estar mental, da prevenção e da identificação atempada das doenças mentais e
dos riscos a elas associados, da proteção dos direitos humanos e da prestação integrada de cuidados de saúde
mental às pessoas afetadas por doenças mentais.
2 – A saúde mental deve, pela sua transversalidade e relação com diferentes setores da sociedade, ser
considerada nas políticas com impacto na saúde pública.
3 – Os cuidados de saúde mental devem ser:
a) Centrados nas pessoas, reconhecendo a sua individualidade, necessidades específicas e nível de
autonomia;
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b) Prestados através de uma abordagem interdisciplinar e integrada e prioritariamente a nível da
comunidade.
4 – A promoção da saúde mental positiva da população, como fator de progresso económico, de coesão
social e de desenvolvimento sustentável da sociedade, é assegurada através de programas plurissectoriais que
desenvolvam a resiliência e outros recursos pessoais e atuem sobre as determinantes sociais, económicas,
culturais e ambientais que os condicionam.
5 – As pessoas com doença mental, os seus representantes legais, acompanhantes ou cuidadores devem
ser ativamente envolvidos no plano de cuidados a prestar, com respeito pelos direitos das pessoas com doença
mental.
6 – O Estado apoia a investigação interdisciplinar na área da saúde mental que permita produzir evidência
sobre o impacto das perturbações mentais e das políticas e dos cuidados de saúde mental, a nível individual e
social.
7 – As pessoas afetadas por doenças mentais não podem ser estigmatizadas ou negativamente
discriminadas ou desrespeitadas em contexto de saúde, em razão desse estado.
Base XXV
Saúde ocupacional
1 – Todos os trabalhadores têm o direito de beneficiar de medidas que lhes permitam gozar do melhor estado
de saúde ocupacional possível, no âmbito da proteção da sua dignidade no trabalho.
2 – O empregador ou, na ausência de relação jurídico-laboral, a pessoa que gere as instalações em que a
atividade é desenvolvida, deve assegurar que o trabalho é prestado em condições que respeitem a saúde dos
trabalhadores.
3 – De modo a proteger eficazmente este direito do trabalhador, os ministérios responsáveis pelas áreas da
saúde e do trabalho promovem, em consulta com as organizações representativas dos trabalhadores e dos
empregadores, a adoção de medidas que garantam a proteção da saúde no meio laboral, designadamente as
que visam assegurar a sensibilização, informação e prevenção em matéria de doenças ocupacionais e os riscos
a elas associados.
4 – Serão, em especial, adotadas medidas tendentes a melhorar a saúde e a prevenir os riscos psicossociais
dos trabalhadores particularmente vulneráveis, designadamente:
a) As trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes;
b) Os trabalhadores menores em caso de trabalhos que, pela sua natureza ou pelas condições em que são
prestados, sejam prejudiciais à sua saúde e ao seu desenvolvimento físico, psíquico e moral;
c) Os trabalhadores que têm uma relação de trabalho a termo ou temporário.
5 – Para a promoção da melhoria da saúde no trabalho é incentivada a investigação científica na área da
saúde ocupacional, em particular a relativa à emergência de novos fatores de risco e de doença, bem como a
educação, formação e informação nesse sentido, de modo a sensibilizar-se a sociedade para a importância da
prevenção de doenças ocupacionais.
Base XXVI
Saúde e envelhecimento
1 – Com vista a assegurar o exercício efetivo do direito das pessoas mais velhas à proteção da saúde,
permitindo-lhes permanecer durante o maior período de tempo possível membros ativos da sociedade, o Estado
compromete-se a tomar, quer diretamente quer em cooperação com os sectores de economia social e privado,
medidas apropriadas e que visem, designadamente:
a) A difusão das informações relativas aos serviços e equipamentos ao seu dispor, em contexto de saúde;
b) O acesso a cuidados de saúde apropriados ao seu estado e que contribuam para que lhes seja possível
participar ativamente na vida pública, social e cultural;
c) A disponibilização, em conjugação com os ministérios responsáveis pelas áreas da segurança social, do
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trabalho, das obras públicas e dos transportes, de bens e serviços apropriados às suas necessidades e estado
de saúde, por forma a permitir-lhes uma existência condigna e independente no seu ambiente habitual, enquanto
o desejarem e tal se revelar possível;
d) A prevenir que lhes sejam infligidos maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais,
privações da liberdade e apropriação indevida de rendimentos;
e) Assegurar, às pessoas que se encontrem institucionalizadas, a assistência apropriada no respeito pela
sua privacidade e a participação na definição das condições de vida da instituição.
2 – Os cuidados de saúde prestados às pessoas mais velhas são globais, integrados e continuados, atendem
à sua especial vulnerabilidade, designadamente em situação de multimorbilidade, e são prestados, sempre que
possível, por profissionais de saúde com conhecimentos específicos na área.
3 – Ninguém pode ser negativamente discriminado ou desrespeitado em contexto de saúde em razão da sua
idade avançada.
Base XXVII
Cuidados Continuados
1 – O Estado reconhece o direito das pessoas que, independentemente da idade, se encontrem em situação
de dependência, ao acesso a cuidados continuados, considerando-se estes como as prestações adequadas,
designadamente promotoras de saúde, preventivas, terapêuticas e de reabilitação.
2 – O direito previsto no número anterior é concretizado através de uma rede nacional, criada no âmbito dos
ministérios que tutelam as áreas da saúde e do trabalho e da solidariedade social, e baseada num modelo de
intervenção integrada e articulada que preveja diferentes tipos de unidades e equipas para a prestação de
cuidados continuados de saúde e ou de apoio social.
3 – A prestação dos cuidados a que se refere a presente Base deve contemplar, designadamente a resposta
a situações de:
a) Doentes ainda sem alta hospitalar mas com critérios de internamento ao domicílio, sob responsabilidade
da unidade hospitalar em causa;
b) Doentes com alta hospitalar mas que não apresentam critérios clínicos para regresso ao local de
residência;
c) Pessoas com necessidades de saúde ou de cuidados pessoais prolongados, que carecem de cuidados
domiciliários continuados de média e longa duração para viver de forma tão independente e segura quanto
possível.
4 – Os cuidados continuados são prestados por serviços e estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde,
podendo essas prestações de saúde, quando a resposta pública se revelar insuficiente ou quando tal se afigurar
vantajoso para os doentes, ser também asseguradas por entidades do setor social ou privado, certificados nos
termos da lei.
Base XXVIII
Cuidados em fim de vida e paliativos
1 – O Estado reconhece o direito dos cidadãos que padeçam de doença grave ou incurável, em fase
avançada e progressiva, a cuidados em fim de vida epaliativos, devendo estes centrar-se na prevenção e alívio
do sofrimento físico, psicológico, social e espiritual, na melhoria do bem-estar e no apoio a esses doentes e às
suas famílias e no planeamento do fim de vida.
2 – O direito previsto no número anterior é concretizado através de uma rede nacional, criada no âmbito do
ministério que tutela a área da saúde, baseada num modelo de intervenção integrada e articulada e que preveja
unidades e equipas para a prestação de cuidados paliativos.
3 – Os cuidados em fim de vida epaliativos são prestados por serviços e estabelecimentos do Serviço
Nacional de Saúde, podendo essas prestações de saúde, quando a resposta pública se revelar insuficiente ou
quando tal se afigurar vantajoso para os doentes, ser também asseguradas por entidades do setor social ou
privado, certificados nos termos da lei.
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Base XXIX
Literacia para a saúde
1 – É promovida a educação em saúde em todas as etapas da vida e atendendo às necessidades específicas
e à diversidade de níveis de competência das pessoas na matéria, habilitando-as para aceder e utilizar
informação sobre saúde, de modo a decidirem de forma consciente e informada em matéria de cuidados de
saúde, prevenção da doença e promoção de estilos de vida saudável, a fim de desenvolverem o seu potencial
de saúde.
2 – Para o efeito, o ministério responsável pela área da saúde deve:
a) Promover, em articulação com os ministérios responsáveis pelas áreas da educação e do ensino superior,
a importância da literacia para a saúde, incluindo-a, tão cedo quanto possível, nos currículos dos diferentes
níveis de ensino e de forma ajustada aos diversos grupos etários;
b) Desenvolver projetos e apoiar iniciativas de promoção da literacia para a saúde, em colaboração,
designadamente, com as autarquias locais, os estabelecimentos de ensino e outras entidades relevantes na
matéria;
c) Promover que os profissionais de saúde sejam agentes de melhoria do nível de literacia para a saúde,
nomeadamente no âmbito de intervenções específicas de promoção da saúde e de prevenção da doença;
d) Sensibilizar as pessoas para a adoção de estilos de vida saudáveis, acentuando a importância da
alimentação equilibrada e do exercício físico regular, de forma a permitir uma melhor qualidade de vida individual
e coletiva;
e) Apoiar iniciativas que melhorem a literacia para a saúde, em particular as dirigidas aos grupos mais
vulneráveis da sociedade.
3 – É avaliado o impacto dos programas adotados, criando-se, para o efeito, um sistema de monitorização e
acompanhamento da literacia para a saúde a nível nacional.
Base XXX
Instrumentos de avaliação
1 – Os programas, planos e projetos, públicos ou privados, que possam afetar a saúde pública, devem estar
sujeitos a avaliação de impacto com vista a assegurar que contribuem para o aumento do nível de saúde da
população.
2 – A avaliação a que se refere o número anterior visa assegurar que o processo de tomada de decisão
integra a ponderação dos impactos relevantes em termos de saúde, económicos, sociais, culturais e ambientais,
tendo em conta o nível saúde pública já alcançado, a ponderação de alternativas, os efeitos cumulativos
decorrentes de outros programas em execução, bem como os contributos recebidos, designadamente através
de participação pública.
3 – A avaliação prevista no n.º 1 compete ao ministério responsável pela área da saúde.
CAPÍTULO IV
DA PRESTAÇÃO EM SAÚDE
Secção I
Disposições Gerais
Base XXXI
Sistema de saúde
1 – O sistema de saúde visa a efetivação do direito à proteção da saúde e é constituído pelo Serviço Nacional
de Saúde e por todas as entidades públicas que desenvolvam atividades de promoção, prevenção, prestação
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de cuidados e tratamento na área da saúde, bem como por todas as entidades dos setores de economia social
e privado e pelos profissionais em regime de trabalho independente que atuem na prestação de cuidados de
saúde.
2 – O sistema de saúde orienta-se para a proteção e a garantia da dignidade e integridade da pessoa
humana, devendo a lei regular a existência de comissões de ética e de humanização nos estabelecimentos
prestadores de saúde.
3 – Para efetivação do direito à proteção da saúde, o Estado atua através do Serviço Nacional de Saúde e
de outros serviços próprios, articula-se com entidades dos setores de economia social e privado para a prestação
de cuidados, de acordo com um princípio de cooperação pautado por regras de transparência e imparcialidade,
e fiscaliza a restante atividade privada na área da saúde.
4 – A articulação entre os setores público, de economia social e privado é ainda determinada de acordo com
a garantia de acesso e demais direitos das pessoas em contexto de saúde, a qualidade das prestações de saúde
e os ganhos em saúde, bem como pelos princípios da eficiência, da avaliação e da regulação.
5 – A prestação de cuidados de saúde por entidades dos setores de economia social e privado e por
profissionais em regime de trabalho independente obedece aos princípios da livre iniciativa, com salvaguarda
das regras que regulam, nomeadamente, a concorrência e a instalação de equipamentos médicos pesados.
6 – O Estado, através dos órgãos competentes, fiscaliza a realização de prestações de saúde por sujeitos
privados ou por entidades dos setores de economia social e privado, com vista a garantir a qualidade das
prestações e um nível elevado de proteção da saúde humana.
7 – Cabe ao legislador estabelecer mecanismos de garantia de acesso equitativo aos cuidados de saúde e
fixar mecanismos de sanção por seleção adversa e indução indevida da procura.
8 – A abertura, a modificação e o funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde,
qualquer que seja a sua denominação, natureza jurídica ou entidade titular da sua gestão, são disciplinados por
lei com vista a garantir a qualidade e a segurança nas prestações e são titulados por licença ou outro meio
idóneo.
9 – Para os efeitos do número anterior, são fixados requisitos técnicos e de higiene, de segurança e de
salvaguarda da saúde pública dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde.
10 – No desenvolvimento da sua atividade, os profissionais dos estabelecimentos prestadores de cuidados
de saúde devem observar o cumprimento das regras deontológicas aplicáveis.
Base XXXII
Níveis de cuidados de saúde
1 – O sistema de saúde compreende:
a) Cuidados de saúde primários, em que são prestados cuidados de saúde gerais;
b) Cuidados de saúde secundários, em que são prestados cuidados de saúde especializados;
c) Cuidados de saúde terciários, em que são prestados cuidados de saúde continuados, em fim de vida e
paliativos e a pessoas em situação de dependência que deles careçam.
2 – Deve ser promovida a intensa articulação entre os vários níveis de cuidados de saúde, privilegiando, nas
situações que não requerem intervenções especializadas, os cuidados primários como primeiro nível de contacto
dos utentes com os serviços de saúde e reservando a intervenção dos cuidados mais diferenciados para as
situações deles carecidas.
3 – Os cuidados de saúde primários, continuados e paliativos devem, na medida do possível, localizar-se
com a proximidade geográfica possível das comunidades.
Base XXXIII
Relatório sobre o estado do sistema de saúde
1 – O Governo apresenta à Assembleia da República, até ao final do primeiro semestre de cada ano, um
relatório sobre o estado do sistema de saúde em Portugal, referente ao ano anterior.
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2 – O plenário da Assembleia da República aprecia o relatório previsto no número anterior em sessão a
realizar com a presença obrigatória do Governo.
Secção II
Serviço Nacional de Saúde
Base XXXIV
Características
1 – A responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde é assegurada através de
um Serviço Nacional de Saúde ao qual cumpre garantir o acesso, atempado e equitativo, de todos os utentes
às prestações de saúde necessárias de acordo com a sua situação de saúde.
2 – O Serviço Nacional de Saúde caracteriza-se por:
a) Ser universal quanto à população abrangida, garantindo que todos tenham acesso à promoção e à
proteção da saúde;
b) Ser geral, determinando que o acesso aos meios de promoção e de proteção da saúde englobe,
tendencialmente, todos os tipos de prestações de saúde;
c) Ser solidário, garantindo o caráter tendencialmente gratuito das prestações de saúde, tendo em conta as
condições económicas e sociais dos cidadãos e daqueles que sejam a estes equiparados;
d) Ser acessível, salvaguardando que o acesso às prestações de saúde é realizado em tempo útil e
adequado de acordo com a situação de saúde;
e) Ter equidade, promovendo a correção dos efeitos das desigualdades económicas, sociais, culturais e
geográficas ou quaisquer outras no acesso aos cuidados e na realização das prestações de saúde, dando
particular atenção às necessidades dos grupos vulneráveis e dos grupos cujos indicadores de saúde sejam
inferiores aos da média nacional da população;
f) Prestar integradamente cuidados ou garantir a sua prestação, salvaguardando que o modelo de prestação
garantido pelo Serviço Nacional de Saúde está organizado e funciona atendendo aos diferentes tipos de
cuidados, articulados e em rede, tendo em conta as necessidades das populações;
g) Ter cobertura nacional, garantindo que todo o País dispõe de uma cobertura racional e eficiente de
recursos em saúde, de acordo com um princípio da proximidade dos serviços às populações e através de
mecanismos de referenciação que assegurem os meios necessários e adequados à prestação efetiva e
atempada dos cuidados de saúde;
h) Adotar medidas de discriminação positiva que assegurem uma distribuição equitativa de profissionais de
saúde em todo o território nacional;
i) Ter organização descentralizada, através do estabelecimento de instituições e serviços com autonomia
para a realização de objetivos de saúde e de serviços adequados e eficientes;
j) Ter gestão participada, valorizando a perspetiva dos utilizadores dos serviços de saúde e dos profissionais
de saúde na organização e funcionamento dos estabelecimentos e serviços;
k) Articular as várias políticas públicas e atuação conjugada de diferentes entidades públicas,
designadamente através da participação das regiões autónomas e das autarquias locais nos termos da
Constituição e da lei, e de outras entidades que atuam na área da saúde;
l) Proporcionar cuidados de qualidade, visando prestações de saúde efetivas, seguras e eficientes, com
base na evidência, realizadas de forma humanizada, com correção técnica e atenção à individualidade da
pessoa;
m) Orientar-se para a sustentabilidade financeira, assegurando a utilização eficiente, equitativa e sustentada
dos recursos públicos disponíveis, numa perspetiva centrada nos ganhos em saúde;
n) Respeitar a dignidade dos utilizadores dos serviços de saúde, providenciando para que os mesmos sejam
devidamente tratados, de modo a alcançar os melhores resultados possíveis nas prestações de saúde e a
assegurar o reconhecimento e valorização dos profissionais de saúde que as realizam;
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3 – Assegurar a existência e disponibilidade para consulta pública de informação atualizada, transparente e
precisa, sobre as condições de acesso, a afetação e a utilização dos recursos financeiros que são anualmente
atribuídos pelo Orçamento do Estado e as prestações de saúde efetuadas.
Base XXXV
Organização e funcionamento
1 – O Serviço Nacional de Saúde constitui um conjunto organizado de estabelecimentos e serviços públicos
prestadores de cuidados de saúde tutelado pelo membro do Governo responsável pela área da saúde para
efetivação da responsabilidade que cabe ao Estado na proteção da saúde individual e coletiva.
2 – O Serviço Nacional de Saúde dispõe de estatuto próprio e é organizado de acordo com um modelo
descentralizado, adaptativo e dotado de flexibilidade que o adeque às especificidades locais, epidemiológicas,
sociais e geográficas, e de acordo com um modelo integrado e colaborativo de prestação de cuidados de saúde.
3 – A lei regula a articulação em rede dos vários estabelecimentos e serviços prestadores que integram o
Serviço Nacional de Saúde ou que realizam prestações públicas de saúde, tendo em vista, designadamente a
obtenção de ganhos em saúde para os utentes.
4 – Deve ser promovida a elaboração e a implementação de planos estratégicos de saúde que permitam
uma adequada integração de cuidados e o desenvolvimento de meios no Serviço Nacional de Saúde para
obtenção de ganhos efetivos em saúde, a par de uma programação plurianual de encargos.
5 – Os planos estratégicos de saúde devem ser suportados por instrumentos prévios de avaliação das
necessidades de saúde da população com base em estudos e em repositórios de conhecimento que produzam
evidência em saúde e por sistemas dedicados de apoio ao planeamento, monitorização e avaliação das
atividades e do impacto do Serviço Nacional de Saúde.
6 – A lei deve prever a criação de planos locais de saúde, bem como a criação de modelos organizativos de
coordenação e articulação entre unidades de saúde de uma área geográfica, através de redes e de sistemas
locais de saúde que visem a prevenção da doença, a promoção e a proteção da saúde, a continuidade da
prestação de cuidados de saúde e a utilização racional dos recursos disponíveis.
Base XXXVI
Gestão das unidades de saúde
1 – A gestão das unidades de saúde do Serviço Nacional de Saúde:
a) Deve obedecer às melhores e mais qualificadas práticas de gestão, de acordo com os padrões
internacionais, podendo a lei permitir a realização de experiências inovadoras de gestão, submetidas a regras
por ela fixadas;
b) É pública, podendo ser assegurada por entidades privadas e de economia social, desde que estas
revelem evidentes ganhos em saúde para os cidadãos e demonstrem ser economicamente vantajosas para o
Estado.
2 – O Serviço Nacional de Saúde deve dispor de uma articulação eficaz entre os vários tipos e níveis de
cuidados de saúde, assegurando que estes são prestados de acordo com as necessidades, com qualidade e
segurança e nos tempos adequados à situação concreta.
3 – Deve ser garantida a referenciação para outro estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde ou para
outro que também realize prestações públicas de saúde, sempre que se conclua pela insuficiência dos recursos
humanos ou materiais existentes para dar resposta adequada e em tempo útil à situação clínica da pessoa.
4 – No funcionamento articulado do Serviço Nacional de Saúde deve ser promovida a integração em rede
dos profissionais com recurso às tecnologias da saúde e de informação ao serviço das mais adequadas
prestações de saúde.
5 – A escolha dos titulares dos órgãos de administração, fiscalização e consulta das entidades que integram
o Serviço Nacional de Saúde deve ser feita de acordo com critérios de mérito para a função e com os princípios
da concorrência, da publicidade, da transparência e da igualdade.
6 – O ministério responsável pela área da saúde deve assegurar, como vetor de qualidade do Serviço
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Nacional de Saúde, os mais elevados níveis de preparação científica e profissionalismo, selecionando os
melhores profissionais, assegurando a sua progressão na carreira, através de provas públicas, bem como a
retribuição com base no mérito e facultando-lhes a adequada formação ao longo da vida.
7 – A liderança das equipas multiprofissionais e interdisciplinares é estabelecida em função da
responsabilidade pela prestação de saúde, devendo estes profissionais receber formação específica em gestão
e liderança, e é exercida com reconhecimento da autonomia e respeito pelos atos próprios de cada profissão,
com possibilidade de delegação de competências desde que salvaguardadas a qualidade e a segurança dos
cuidados.
8 – Ao Serviço Nacional de Saúde incumbe ainda promover, nos seus estabelecimentos e serviços, a
investigação e o ensino e a formação.
Base XXXVII
Prestações públicas de saúde
1 – Realizam prestações públicas de saúde o Serviço Nacional de Saúde, outras entidades públicas que
desenvolvam atividades de promoção, prevenção e tratamento na área da saúde e os estabelecimentos ou
instituições dos setores de economia social e privado e os profissionais em regime de trabalho independente ou
grupos de profissionais que tenham contrato, convenção ou acordo com o Estado, através do ministério
responsável pela área da saúde, ou com outro ente público, nos termos da lei.
2 – Sempre que vantajoso para o Estado e para os utentes do Serviço Nacional de Saúde, o disposto no
número anterior abrange a possibilidade, nos termos legalmente estabelecidos, de ser autorizada a celebração
de contratos que tenham por objeto a realização de prestações de saúde através de um estabelecimento de
saúde integrado ou a integrar no SNS, em regime de parceria público-privada, com entidades dos sectores de
economia social ou privado.
3 – Os contratos, convenções ou acordos para a realização de prestações públicas de saúde do Serviço
Nacional de Saúde, devem:
a) Assegurar o preenchimento dos requisitos de qualidade, segurança, eficácia, efetividade, eficiência e
regras de contratação exigíveis nos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde;
b) Garantir o direito de acesso dos utentes por eles abrangidos e incluir como objetivo a criação de ganhos
em saúde para a população destinatária;
c) Revelar-se vantajosos, nomeadamente face à consideração do binómio qualidade-custos;
d) Observar os princípios da concorrência e da transparência quanto à escolha do prestador.
4 – Para os efeitos do disposto no número anterior, na celebração e na execução dos contratos, convenções
ou acordos para a realização de prestações públicas de saúde do Serviço Nacional de Saúde:
a) Deve ser salvaguardado pelo ente público que é estabelecido e observado o dever de atuação em
conformidade com os princípios do Serviço Nacional de Saúde;
b) Devem igualmente ser estabelecidos e fiscalizados parâmetros de qualidade de atividade assistencial
para garantia da qualidade das prestações de saúde;
c) Devem ser respeitadas as orientações técnicas emanadas do ministério responsável pela área da saúde;
d) Devem as entidades prestadoras fornecer atempadamente as informações necessárias ao
acompanhamento do contrato, convenção ou acordo, bem como a informação relevante para efeitos da Base
XXIX.
5 – A execução de prestações públicas de saúde realizada pelos estabelecimentos, instituições ou grupos
de profissionais está sujeita a fiscalização e acompanhamento pelo contraente público no quadro do Serviço
Nacional de Saúde.
6 – Para efeitos de fiscalização e acompanhamento da execução dos contratos, convenções ou acordos para
a realização de prestações públicas de saúde do Serviço Nacional de Saúde, o contraente público deve designar
um gestor do contrato, com a função de acompanhar permanentemente a execução destes, em especial o
respeito por uma atuação conforme com os princípios e as caraterísticas do Serviço Nacional de Saúde, da
observância das regras e dos parâmetros de qualidade e os direitos das pessoas em contexto de saúde.
7 – Os termos da contratação, convenção ou celebração de acordos para a realização de prestações públicas
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de saúde devem ser desenvolvidos por lei.
8 – A lei pode estabelecer que a contratação da realização de prestações públicas de saúde dite a integração
do estabelecimento no Serviço Nacional de Saúde, nos termos a estabelecer no respetivo contrato.
9 – A lei pode prever, com respeito pelos princípios e regras definidos na presente Base, a celebração de
contratos-programa com autarquias locais ou outras pessoas coletivas públicas para a realização de prestações
públicas de saúde.
Base XXXVIII
Beneficiários
1 – São beneficiários do Serviço Nacional de Saúde todos os cidadãos portugueses.
2 – São igualmente beneficiários do Serviço Nacional de Saúde:
a) Os cidadãos nacionais de Estados-Membros da União Europeia ou equiparados, nos termos das normas
comunitárias aplicáveis;
b) Os cidadãos, com residência permanente ou em situação de estada ou residência temporárias em
Portugal, que sejam nacionais de países terceiros ou apátridas, nos termos do regime jurídico aplicável.
3 – O Serviço Nacional de Saúde presta ainda assistência em saúde:
a) Aos reclusos dos estabelecimentos prisionais, nos termos definidos pelos membros do Governo
responsáveis pelas áreas da saúde e da justiça.
b) Aos requerentes de proteção internacional, bem como a migrantes, nos termos da legislação aplicável.
Base XXXIX
Taxas moderadoras
1 – Com o objetivo de orientar a procura e moderar a procura desnecessária, perante alternativas
clinicamente aceitáveis,a lei prevê a cobrança de taxas moderadoras pelas prestações públicas de saúde,
determinando a isenção de pagamento em situações de interesse de saúde pública, de maior risco de saúde ou
de insuficiência económica.
2 – A lei pode estabelecer limites ao montante total de taxas moderadoras a cobrar.
Base XL
Assistência no estrangeiro
1 – A referenciação para o estrangeiro dos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde para prestações de
saúde necessárias nas condições exigíveis de qualidade, segurança, efetividade e tempo clinicamente
recomendado, constituindo encargo do Serviço Nacional de Saúde, deve verificar-se nas seguintes situações:
a) Em matéria de assistência mútua no quadro da União Europeia ou no âmbito das redes europeias de
referência entre os prestadores de cuidados de saúde e os centros de especialização nos Estados-Membros;
b) Em circunstâncias excecionais em que não seja possível garantir essas prestações em Portugal e em que
seja possível fazê-lo no estrangeiro.
2 – A lei regula as condições da referenciação para o estrangeiro, bem como o acesso a cuidados de saúde
transfronteiriços.
Base XLI
Financiamento
1 – O Serviço Nacional de Saúde e as prestações públicas de saúde são financiados por verbas do
Orçamento do Estado transferidas para o ministério responsável pela área da saúde, sem prejuízo de outras
receitas.
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2 – O financiamento dos estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde é estabelecido através
de mecanismos de contratualização com o ministério responsável pela área da saúde e definidos por diploma
próprio, de acordo com critérios objetivos e mensuráveis que visem ganhos em saúde, atendendo,
designadamente à prestação a realizar, aos níveis de qualidade e aos resultados a atingir, à otimização da
capacidade instalada dos estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde e a critérios de gestão
eficiente.
3 – A realização de investimentos em formação de profissionais, infraestruturas, equipamentos e tecnologias
da saúde e dos sistemas de informação e de comunicação obedece a uma programação plurianual, que elenca
os respetivos objetivos e os correspondentes encargos financeiros a assumir em cada ano económico.
4 – Os serviços e estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde podem cobrar as seguintes receitas, a
inscrever nos seus orçamentos próprios:
a) Dotações, comparticipações e subsídios do Estado ou de outras entidades;
b) O pagamento de cuidados por parte de terceiros legal ou contratualmente responsáveis;
c) O pagamento de cuidados prestados a não beneficiários do Serviço Nacional de Saúde quando não há
terceiros responsáveis;
d) O pagamento por serviços prestados, designadamente no âmbito da investigação em saúde, ou utilização
temporária de instalações ou equipamentos por entidades exteriores ao Serviço Nacional de Saúde, nos termos
da lei;
e) O pagamento de cuidados em quarto particular ou outra modalidade não prevista para a generalidade dos
utentes;
f) O produto de rendimentos próprios;
g) O produto de alienação de bens próprios e da constituição de direitos sobre os mesmos;
h) O produto de taxas por serviços prestados e de coimas previstas na lei, designadamente em resultado da
efetivação de responsabilidade dos utentes por infrações às regras da organização e do funcionamento do
sistema e por uso doloso dos serviços e do material de saúde;
i) O produto de donativos;
j) O produto de benemerências ou doações.
Base XLII
Avaliação permanente e transparência
1 – O funcionamento do Serviço Nacional de Saúde e a realização das prestações públicas de saúde estão
sujeitos a avaliação permanente, baseada em informações de natureza estatística, epidemiológica,
administrativa e de desempenho e de qualidade assistenciais e das respostas e ganhos em saúde.
2 – Para os efeitos do disposto no número anterior deve ser colhida informação, designadamente sobre:
a) Os resultados assistenciais;
b) A adequação e a qualidade dos procedimentos técnico-científicos;
c) Os tempos de espera;
d) O nível de satisfação da população utente e dos profissionais do Serviço Nacional de Saúde;
e) Os ganhos em saúde decorrentes das atividades de saúde pública e de prestação de cuidados de saúde;
f) A eficiência da utilização dos recursos e a razoabilidade da sua utilização em termos de custos e
benefícios.
3 – A informação prevista no número anterior é tratada em sistema completo e integrado que abrange todos
os tipos de cuidados e todas as entidades que realizem prestações públicas de saúde.
4 – É da responsabilidade do ministério responsável pela área da saúde a divulgação pública e periódica da
informação e da avaliação referidas nos números anteriores.
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Secção III
Iniciativas particulares com objetivos de saúde
Base XLIII
Entidades do setor de economia social
1 – As entidades do sector de economia social com objetivos específicos de saúde intervêm na ação comum
a favor da saúde da comunidade e dos indivíduos, de acordo com o princípio da cooperação e a salvaguarda
do primado do interesse da pessoa em contexto de saúde e com observância do disposto na presente lei e
demais legislação específica aplicável.
2 – As entidades do sector de economia social ficam sujeitas, no que respeita às suas atividades de saúde,
ao poder orientador e de inspeção dos serviços competentes do ministério responsável pela área da saúde, sem
prejuízo da independência de gestão estabelecida na Constituição e na sua legislação própria.
3 – As entidades do sector de economia social com objetivos específicos de saúde podem ser subsidiadas
financeiramente e apoiadas tecnicamente pelo Estado e pelas autarquias locais.
Base XLIV
Entidades do setor privado com fins lucrativos
1 – As entidades do setor privado com objetivos de saúde podem cooperar com o Serviço Nacional de Saúde
na realização de prestações públicas de saúde, de harmonia com o disposto na Base XXXVI da presente lei.
2 – O Governo pode estabelecer incentivos à criação de unidades privadas, em função das vantagens sociais
decorrentes das iniciativas em causa.
Base XLV
Seguros privados de saúde
1 – Os seguros privados de saúde são de adesão voluntária.
2 – A celebração dos contratos de seguro de saúde deve ser precedida da prestação, pela entidade
seguradora, de informação, clara e inteligível, quanto às condições do seguro, âmbito e limites da cobertura,
incluindo informação expressa quanto à eventual interrupção ou descontinuidade de prestação de cuidados de
saúde caso sejam alcançados os limites contratualmente estabelecidos, de forma a permitir uma decisão
esclarecida.
3 – Os estabelecimentos de saúde informam as pessoas sobre os custos a suportar pela prestação de
cuidados de saúde ao abrigo de seguros privados de saúde, incluindo para a totalidade da intervenção proposta.
4 – A lei pode fixar incentivos ao estabelecimento de seguros privados de saúde.
Secção IV
Outras atividades em saúde
Base XLVI
Tecnologias da saúde
1 – As tecnologias da saúde, designadamente os medicamentos, os dispositivos médicos e os procedimentos
médicos ou cirúrgicos, bem como outras utilizadas na prevenção, no diagnóstico ou no tratamento de doenças,
devem ser desenvolvidas e utilizadas de forma a garantir a proteção da saúde, a satisfação das necessidades
em saúde das pessoas e a qualidade, eficácia, eficiência e segurança das tecnologias.
2 – A sujeição a regimes de autorização, avaliação de impacto e benefício-custo, produção, distribuição,
comercialização e utilização das tecnologias da saúde, assim como a sua disciplina e fiscalização por parte do
Estado, são objeto de legislação específica.
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Base XLVII
Atividade farmacêutica
1 – A atividade farmacêutica tem legislação especial e fica submetida à disciplina e fiscalização conjuntas
dos ministérios competentes, de forma a garantir a defesa e a proteção da saúde, a satisfação das necessidades
da população e a racionalização do consumo de medicamentos e produtos medicamentosos.
2 – A disciplina referida no número anterior incide sobre a instalação de equipamentos produtores e os
estabelecimentos distribuidores de medicamentos e produtos medicamentosos e o seu funcionamento.
Base XLVIII
Investigação
1 – É apoiada a investigação em saúde e com interesse para a saúde, devendo ser estimulada a colaboração
neste domínio entre o ministério responsável pela área da saúde e os estabelecimentos de ensino superior, os
organismos responsáveis pela investigação científica e tecnológica e outras entidades, públicas e privadas.
2 – O Estado incentiva a participação portuguesa em programas de investigação no campo da saúde levados
a efeito por redes de investigação internacionais ou por organizações internacionais, designadamente no âmbito
da União Europeia.
3 – É reconhecida a liberdade de investigação em saúde, com obediência aos seguintes princípios:
a) Respeito pela dignidade e os direitos fundamentais, a segurança e o bem-estar das pessoas que nela
participam;
b) Realização em seres humanos apenas se não houver alternativa de eficácia comparável;
c) Ter como finalidade, nas situações em que não seja previsível um benefício direto para a saúde da pessoa
envolvida, contribuir para a obtenção de resultados que permitam benefício para outras que sofram da mesma
doença ou condição;
d) Não comportar para a pessoa envolvida riscos e incómodos desproporcionais face aos potenciais
benefícios;
e) Integridade, transparência e responsabilidade na investigação;
f) Ter sido aprovada pela instância competente após apreciação independente sobre o seu mérito científico
e aceitabilidade ética;
g) Realização de acordo com as regras da boa prática de investigação, nomeadamente as aplicáveis à
investigação em seres humanos e à investigação em animais;
h) Obtenção de consentimento livre e esclarecido, específico e escrito da pessoa que nela participa, o qual
pode ser livremente revogado, em qualquer momento, sem que tal implique qualquer discriminação no acesso
a cuidados de saúde de que venha a necessitar;
i) Assegurar a especial proteção às pessoas incapazes de nela consentir;
j) Atender a variáveis suscetíveis de condicionar os resultados obtidos, como sejam o sexo, o género, a
idade e a condição económica e social das pessoas sobre que incidem;
k) Promover a inclusão de grupos sub-representados, nomeadamente de mulheres, sempre que tal se
afigure como potencialmente benéfico;
l) Não ter como contrapartida quaisquer incentivos ou benefícios financeiros para a pessoa envolvida, sem
prejuízo do reembolso de despesas e do ressarcimento pelos prejuízos sofridos com a participação na
investigação;
m) Ser acompanhada de seguro que cubra a responsabilidade civil do promotor e do investigador, nos casos
e nos termos da lei.
4 – As condições a que deve obedecer a investigação em saúde, em particular a experimentação em seres
humanos e os ensaios clínicos de medicamentos e de dispositivos médicos, são definidas em diploma próprio.
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Base XLIX
Inovação e empreendedorismo em saúde
1 – O Estado deve promover o acesso equitativo à inovação em saúde nas suas vertentes integradas e
complementares de ciências de informação e comunicação, nanotecnologia, genética e computação, em
particular no recurso à inteligência artificial e à robótica.
2 – A aplicação das novas tecnologias deve reforçar a humanização, garantir a resposta adequada às
necessidades das pessoas e a qualidade nas prestações de saúde, com respeito pelos direitos fundamentais.
3 – São promovidas a inovação e a investigação associadas ao empreendedorismo e à criação de valor
social e económico na área da saúde.
4 – O Estado incentiva as melhores práticas empreendedoras e a proteção das invenções e das criações
intelectuais na área de saúde, nomeadamente através do apoio ao registo das respetivas patentes.
Base L
Saúde digital
1 – O Estado deve promover, com garantia da proteção dos dados pessoais e da cibersegurança, a utilização
segura e eficiente das tecnologias de informação e comunicação no âmbito da prestação de cuidados de saúde,
da gestão dos serviços de saúde, da vigilância em saúde, da literacia para a saúde, do ensino, da formação, da
investigação e da análise e do tratamento de grandes volumes de dados.
2 – Nos termos do número anterior, as tecnologias de informação e comunicação apoiam uma abordagem
integrada e centrada nas pessoas com vista à melhoria da prestação em saúde, à salvaguarda do acesso
equitativo a serviços de saúde de qualidade, à gestão eficiente dos recursos, ao controlo da sua utilização e à
avaliação do desempenho dos estabelecimentos de saúde e da realização de prestações em saúde.
3 – A saúde digital compreende, nomeadamente, registos de saúde eletrónicos, registos centralizados
assentes em plataformas únicas, ferramentas eletrónicas de auxílio à decisão, telessaúde, sistemas de
monitorização à distância, ensino por meios eletrónicos, aplicações móveis e redes sociais, partilha da
informação e do conhecimento entre profissionais de saúde e entre entidades prestadoras de cuidados de saúde
independentemente da respetiva natureza, com respeito pelas finalidades determinadas, explícitas e legítimas
que presidiram à recolha dos dados.
Base LI
Terapêuticas não convencionais
1 – O exercício das terapêuticas não convencionais é regulado pela lei, de forma a garantir a proteção da
saúde das pessoas e das comunidades, a qualidade e a evidência científica.
2 – É competência do ministério responsável pela área da saúde a credenciação, tutela e fiscalização da
prática das terapêuticas não convencionais, de acordo com a definição aprovada pela Organização Mundial de
Saúde.
Base LII
Outras atividades complementares
1 – As atividades que se destinem a facultar meios materiais ou de organização indispensáveis à prestação
de cuidados de saúde, atenta a sua instrumentalidade para a qualidade dessa prestação e independentemente
da natureza do prestador, estão sujeitas a regras próprias e à disciplina e inspeção, de forma articulada, do
ministério responsável pela área da saúde e, sendo caso disso, de outros ministérios ou entidades competentes.
2 – Nas atividades referidas no número anterior incluem-se, nomeadamente, a colheita, distribuição e
utilização de produtos biológicos, bem como a produção e distribuição de bens e produtos alimentares, a
produção, a comercialização e a instalação de equipamentos e bens de saúde, as tecnologias de informação de
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saúde, o estabelecimento e exploração de seguros de saúde, o transporte de doentes e o tratamento de
resíduos.
CAPÍTULO V
DOS PROFISSIONAIS
Base LIII
Profissionais de saúde
1 – Os profissionais de saúde desempenham uma relevante função social ao serviço das pessoas e da
comunidade.
2 – São profissionais de saúde aqueles que realizam atividades técnicas relacionadas com as prestações de
saúde e estão sujeitos a direitos e a deveres especiais e a regras deontológicas próprias, designadamente os
médicos, os médicos dentistas, os enfermeiros, os farmacêuticos, os nutricionistas, os psicólogos, bem como
os demais técnicos superiores de saúde e os técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica.
3 – A lei estabelece os requisitos indispensáveis ao exercício de uma profissão de saúde.
4 – A política de recursos humanos para a saúde visa satisfazer as necessidades da população, garantir a
formação, a estabilidade e a motivação dos profissionais, prevenindo conflitos de interesse entre a atividade
pública e a atividade privada, facilitar a mobilidade entre o sector público e os setores de economia social e
privado, satisfazer as necessidades serviços de saúde de profissionais qualificados, em particular do Serviço
Nacional de Saúde, e assegurar uma adequada cobertura no território nacional.
5 – O ministério responsável pela área da saúde organiza um registo nacional de todos os profissionais de
saúde, sem prejuízo da inscrição obrigatória numa associação profissional de direito público.
6 – Os profissionais de saúde são inscritos na respetiva associação profissional de direito público, caso
exista, funcionando a inscrição como registo nacional dos profissionais, sendo facultada ao ministério
responsável pela área da saúde sempre que por este solicitada.
Base LIV
Direitos e deveres dos profissionais de saúde
1 – A lei consagra os direitos e deveres dos profissionais de saúde, designadamente os de natureza
deontológica, sem prejuízo das competências próprias das Ordens profissionais.
2 – São, nomeadamente, direitos dos profissionais de saúde:
a) Exercer a sua atividade, desde que detenham as habilitações legalmente exigidas;
b) Aceder à formação e ao aperfeiçoamento profissionais;
c) Contribuir para a gestão rigorosa, eficaz e eficiente dos recursos existentes;
d) Constituir associações de profissionais que podem revestir a natureza de associações públicas, quando
seja considerado necessário ao correto exercício da profissão;
e) Exercer a objeção de consciência.
3 – Os profissionais de saúde com deficiência ou com doença crónica incapacitante têm direito a que sejam
adotadas medidas apropriadas para adaptar as condições de trabalho às suas necessidades, quer quanto ao
acesso aos locais de trabalho, às tecnologias e sistemas de informação e de comunicação, quer quanto à
formação profissional inicial e contínua.
4 – São, nomeadamente, deveres dos profissionais de saúde:
a) Observar as regras técnicas e deontológicas da sua profissão;
b) Respeitar os direitos da pessoa a quem prestam cuidados;
c) Guardar sigilo profissional sobre a informação de que tomem conhecimento no exercício da sua atividade;
d) Facilitar à pessoa a quem prestam cuidados a liberdade de escolha do profissional de saúde;
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e) Atuar na sua área de competência, reconhecendo a especificidade das outras profissões de saúde, com
salvaguarda dos limites decorrentes da existência de competências diferenciadas;
f) Contribuir para a salvaguarda da saúde pública.
5 – A lei estabelece as incompatibilidades dos profissionais de saúde.
Base LV
Formação do pessoal de saúde
1 – A formação, o aperfeiçoamento e a atualização profissionais, incluindo a formação ao longo da vida do
pessoal de saúde, constituem um objetivo fundamental a prosseguir.
2 – A formação do pessoal deve assegurar uma elevada qualificação técnico-científica, tendo em conta a
natureza da atividade prestada, com vista ao respeito pela dignidade e pelos direitos da pessoa em contexto de
saúde, ao reforço do sentido da responsabilidade profissional pela prestação de cuidados de saúde com
qualidade e segurança, da comunicação interpessoal e da necessidade de utilização eficiente dos recursos
disponíveis.
3 – O ministério responsável pela área da saúde colabora com o ministério responsável pelo ensino superior
nas atividades públicas de ensino e formação na área das ciências da saúde que estiverem a cargo deste,
designadamente através da indicação das competências que entende por adequadas e que sejam adquiridas
na formação pré-graduada, facultando os seus serviços para aquelas atividades e realizando as que lhe
estiverem cometidas por lei nesse domínio.
Base LVI
Estatuto dos profissionais de saúde do Serviço Nacional de Saúde
1 – Os profissionais de saúde que trabalham no Serviço Nacional de Saúde têm um regime jurídico próprio
e podem constituir-se em corpos especiais, independentemente da natureza da relação jurídica de emprego.
2 – As carreiras dos profissionais de saúde do Serviço Nacional de Saúde são unitárias e aplicáveis
independentemente da natureza da relação jurídica de emprego, cabendo à lei estabelecer as condições e os
critérios de progressão nomeadamente através de provas públicas.
3 – Os postos de trabalho existentes nas pessoas coletivas públicas do Serviço Nacional de Saúde podem
ser preenchidos por quaisquer trabalhadores, independentemente da natureza da relação jurídica de emprego.
4 – Os profissionais de saúde do Serviço Nacional de Saúde carecem, nos termos gerais, de autorização
para exercerem funções privadas, não podendo ser autorizada a acumulação de funções se daí resultarem
prejuízos ou, direta ou indiretamente, encargos para o Serviço Nacional de Saúde, e deve ser criado um registo
para o efeito.
5 – A lei estabelece as formas de remuneração e de incentivos financeiros ou de outra natureza, assentes
em critérios objetivos de avaliação do desempenho, com base no mérito e nos resultados.
6 – A lei pode criar incentivos financeiros ou de outra natureza que promovam a dedicação exclusiva e a
investigação em saúde e para a saúde.
Base LVII
Contratação coletiva no âmbito do Serviço Nacional de Saúde
1 – Independentemente da natureza da relação jurídica de emprego, as condições de trabalho dos
trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde são objeto de contratação coletiva conjunta, de acordo com o
disposto em lei especial.
2 – É atribuída capacidade às pessoas coletivas que integram o Serviço Nacional de Saúde para celebrar
convenções coletivas de trabalho de nível local que deve ser articulada com os restantes níveis de contratação
coletiva nos termos da lei.
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Base LVIII
Profissionais de saúde em regime de trabalho independente
1 – Os profissionais que prestam cuidados de saúde em regime de trabalho independente desempenham
uma função de importância social reconhecida e protegida pela lei.
2 – O exercício de qualquer profissão que implique a prestação de cuidados de saúde em regime de trabalho
independente é regulamentado e fiscalizado pelo ministério responsável pela área da Saúde, sem prejuízo das
funções cometidas às Ordens profissionais.
3 – Os profissionais de saúde em regime de trabalho independente devem ser titulares de seguro contra os
riscos decorrentes do exercício da sua atividade.
Base LIX
Fiscalização da atividade dos profissionais de saúde
Todos os profissionais de saúde estão sujeitos à fiscalização do ministério responsável pela área da saúde,
sem prejuízo das atribuições das ordens profissionais e de outras entidades legalmente competentes para o
efeito.
CAPÍTULO VI
DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS
Base LX
Regulamentação e aplicação
1 – O Governo promove, no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor da presente lei, a
adaptação da legislação em vigor e a adoção da legislação complementar necessária ao seu desenvolvimento.
2 – A legislação prevista no número anterior deve contemplar, designadamente, os seguintes aspetos:
a) Direitos e deveres das pessoas em saúde, incluindo o direito à indemnização pelo dano injusto causado
na prestação de cuidados de saúde, promovendo meios expeditos de resolução de litígios em contexto de saúde
e o ressarcimento do dano anónimo;
b) Organização e funcionamento do Serviço Nacional de Saúde;
c) Carreiras dos profissionais de saúde e outras disposições;
d) Inovação em saúde;
e) Sistemas de informação e proteção de dados em saúde.
3 – O eventual regime de transição que conste de disposições regulamentares a publicar para efeitos do
número anterior não pode afetar a tutela dos direitos legalmente protegidos dos trabalhadores do Serviço
Nacional de Saúde.
4 – Sem prejuízo do prazo previsto no n.º 1, deve o Governo, no prazo de dois anos, elaborar e apresentar,
para aprovação na Assembleia da República, um plano de desenvolvimento, com um horizonte temporal a médio
prazo e limite no ano 2030, que assegure a realização faseada e sustentada da presente lei e demais legislação
complementar.
Base LXI
Norma revogatória
1 – É revogada a Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro.
2 – Até revogação expressa, mantêm-se em vigor as disposições legais e regulamentares aprovadas ao
abrigo do diploma referido no número anterior.
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3 – Em tudo o que não for contrário às suas disposições, entendem-se feitas para a presente lei todas as
referências ao diploma referido no n.º 1.
Base LXII
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 7 de janeiro de 2019.
Os Deputados do PSD: Fernando Negrão — Adão Silva — José de Matos Rosa – Ricardo Baptista Leite –
Luís Vales – Ângela Guerra – Cristóvão Simão Ribeiro – Fátima Ramos – Isaura Pedro – José António Silva –
Miguel Santos — António Topa — Emília Santos — José Silvano — Laura Monteiro Magalhães — Maria Manuela
Tender — Regina Bastos — Sara Madruga da Costa.
————
PROJETO DE LEI N.º 1066/XIII/4.ª
LEI DE BASES DA SAÚDE
Exposição de motivos
É amplamente reconhecida a necessidade de atualização da Lei de Bases da Saúde – Lei n.º 48/90, de 24
de agosto, na redação dada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro –, uma Lei com 29 anos que urge ser
adaptada a novas formas de atender à promoção e proteção da saúde dos portugueses, com garantia de
igualdade no acesso aos cuidados de saúde e qualidade assistencial. Será uma lei que enquadre o Sistema de
Saúde, em geral, e o Serviço Nacional de Saúde (SNS), em particular, como base determinante no primeiro.
Uma nova Lei de Bases é uma oportunidade de revisitar e formular princípios que o CDS-PP, de forma
consistente, tem vindo a defender. De resto, há 18 anos atrás, o Grupo Parlamentar do CDS-PP apresentou o
Projeto de Lei n.º 491/VIII, em cuja exposição de motivos se descrevia um quadro que, no essencial, se mantém
atual:
«A conceção atual do Serviço Nacional de Saúde (SNS) estatizado, centralizado, com concentração de
funções, não racionalizado e despesista tornou-se insustentável. Para além desta realidade do SNS, as
alterações demográficas, a complexidade crescente dos cuidados de saúde decorrente da introdução constante
de novas tecnologias, as discrepâncias notórias entre os recursos disponíveis para prestar cuidados de saúde
e as expectativas crescentes dos utilizadores, a necessidade de privilegiar critérios de racionalidade e eficiência
em estruturas pesadas e altamente burocratizadas constituem fatores que forçaram os governos, em diferentes
países e independentemente do modelo de que partiam, a refletir sobre as reformas a introduzir.
Essas reformas sociais carecem de algum tempo para que produzam em pleno os seus resultados de
equidade, de eficácia e de eficiência interna. E, exatamente porque são geracionais, devem ser inadiáveis. Tais
tendências reformistas devem ser encaradas como salvaguarda da efetivação do direito de proteção da saúde,
universal e geral, constitucionalmente consagrado e que, responsabilizando eticamente todos, assente na
solidariedade dos cidadãos e no Estado como regulador e garante. (…)
Na realidade, em face de um cenário onde os recursos são finitos e as necessidades são superiores, é
fundamental a busca permanente de uma coabitação socialmente justa e economicamente eficaz entre as
responsabilidades públicas e a livre expressão das responsabilidades das famílias e das empresas. (…)
A articulação entre público e privado deve ser efetuada de forma ponderada, responsável e sustentada,
encarada sob uma perspetiva de rede, com real complementaridade entre os dois setores, o que significa que o
setor privado não deve existir apenas para suprir deficiências do público. (…)
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A identificação de grupos de doenças crónicas, assente em princípios objetivos, baseados na evidência,
recorrendo a mecanismos de intervenção integrada e mediante uma planificação de cuidados baseada na
população e com complementaridade dos diferentes profissionais de saúde são, hodiernamente, fatores
determinantes de mudança na área da prestação de cuidados de saúde e permitem uma definição do papel
atribuído aos diferentes profissionais de saúde na prossecução de um objetivo comum.
O conhecimento rigoroso dos custos associados às diferentes componentes do sistema é importante para a
racionalização de cuidados e para a elaboração de estratégias dirigidas à prevenção da doença, promoção da
saúde, educação e formação.
A consagração de um sistema de informação adequado às necessidades, no sentido de se obter um
levantamento exato das despesas, de indicadores clínicos e económicos, proporciona formas de avaliação e
validação contínuas dos projetos em execução e propicia a introdução de melhorias de cuidados de uma forma
continuada. (…)
A desumanização e degradação da qualidade dos serviços prestados é uma certeza que se tem traduzido
no crescimento incontrolado das despesas públicas de saúde, no incessante, injustificado e desproporcionado
esforço financeiro exigido aos cidadãos, nas condições inaceitáveis de atendimento e muito em especial na
dimensão intolerável das listas de espera para uma intervenção cirúrgica ou uma simples consulta, enquanto o
estado de saúde de muitos cidadãos se agrava. (…)
O direito à saúde constitui um desígnio constitucional que se traduz no acesso fácil de todos os cidadãos aos
cuidados de saúde (…)
A reforma do setor da saúde deve ser entendida como salvaguarda do direito de proteção da saúde, universal
e geral, que, responsabilizando eticamente todos, assente na solidariedade dos cidadãos e na garantia do
Estado.»
Com o propósito de proporcionar ao País uma nova Lei de Bases da Saúde, o então Sr. Ministro da Saúde,
Prof. Adalberto Campos Fernandes, criou a Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde, através do
Despacho n.º 1222-A/2018, de 31 de janeiro. Nos termos dos n.os 2, 3 e 4 do referido Despacho:
«2 — A Comissão tem por mandato apresentar os termos de referência para a elaboração de uma Proposta
de Lei até ao início da sessão legislativa 2018/19, com projeto de articulado, visando a revisão da Lei de Bases
da Saúde n.º 48/90, de 24 de agosto, atualmente em vigor.
3 — A Comissão desenvolverá o seu trabalho em quatro fases, com a seguinte sequência:
3.1 — Elaboração de um primeiro projeto legislativo;
3.2 — Discussão desse projeto com os parceiros institucionais, os representantes dos agentes do setor e
ainda as entidades relacionadas, cuja audição a Comissão considere importante para o bom andamento dos
trabalhos;
3.3 — Promoção da discussão pública do projeto;
3.4 — Entrega do trabalho final nos termos referidos no n.º 2.
4 — Para efeitos do disposto em 3.1, a Comissão consultará especialistas das várias áreas do saber que
sejam necessários para a elaboração do primeiro projeto.»
No início de maio de 2018, um grupo de reconhecidas personalidades subscreveu um documento intitulado
«Princípios Orientadores para uma Lei de Bases da Saúde» onde, entre outros, se defendem alguns princípios
que o CDS-PP subscreve, designadamente:
− «O Sistema de Saúde deve ser centrado no cidadão e nas suas necessidades em saúde»;
− «O Sistema de Saúde deve evoluir no sentido de alargar e diversificar as formas de prestação e de gestão
dos serviços de saúde, em benefício dos cidadãos, independentemente da natureza pública, privada ou social
das instituições prestadoras de saúde, salvaguardados os princípios de transparência, da prestação de contas
e da avaliação de resultados»;
− «Deve ser definido o apoio ao envelhecimento saudável e ao acompanhamento e tratamento da doença
crónica, bem como da doença mental»;
− «Deve ser apoiada a investigação e desenvolvimento científicos com interesse para a saúde, estimulando-
se a colaboração entre os serviços do Ministério da Saúde, a Agência de Investigação Clínica e Inovação
Biomédica, as unidades de cuidados de saúde públicas, privadas e sociais, as instituições científicas e
académicas, e outras organizações nacionais e internacionais que atuam neste âmbito».
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Durante o ano de 2018, muitas foram as personalidades que intervieram publicamente sobre o conteúdo de
uma nova Lei de Bases da Saúde, assim contribuindo para o processo amplamente reconhecido da necessidade
da sua revisão. BE e PCP apresentaram, também, as suas propostas.
No início do passado mês de setembro, a Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde entregou ao
Governo um projeto de Proposta de Lei, dando cumprimento ao n.º 2 do Despacho acima citado e, no passado
dia 13 de dezembro, o Governo enviou ao Parlamento a Proposta de Lei n.º 171/XIII cujo objeto determina que
«é aprovada em anexo à presente lei, da qual faz parte integrante, a Lei de Bases da Saúde.»
Pode ler-se na exposição de motivos desta Proposta de Lei que «(…) considerado o trabalho apresentado
pela referida Comissão e os contributos recebidos, quer da discussão com os parceiros institucionais e agentes
do setor, quer com o público em geral, cumpre ao Governo a apresentação de uma proposta de nova Lei de
Bases da Saúde que responda aos desafios que o sistema de saúde português enfrenta neste início de século
e o prepare para aqueles que o futuro inexoravelmente lhe trará. Para que possa resistir à passagem do tempo
e à dinâmica caraterística do setor da saúde, a proposta de lei que se apresenta é intencionalmente concisa,
pretendendo-se que o seu conteúdo programático não restrinja desnecessariamente a função executiva que
compete a cada Governo, sem prejuízo da salvaguarda clara da matriz universal, geral e solidária do direito à
proteção da saúde, primordialmente assegurada por serviços financiados por impostos e com gestão pública.
(…)».
A Proposta de Lei do Governo é, de facto, concisa, pois apresenta apenas 28 Bases, verificando-se que
grande parte do projeto apresentado pela Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde, contendo 59 Bases,
foi ignorado. Ora, tendo a Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde sido constituída por diversas
personalidades da área, tendo consultado diversos especialistas e tendo o projeto estado em discussão pública,
o CDS-PP não encontra outra justificação para este «apagão», senão a mudança de titular da pasta da saúde
e eventual cedência a pressões e preconceitos ideológicos que colocam em causa, até, o repto do Senhor
Presidente da República: «As metas e os caminhos a definir devem ser, em tese, de longo fôlego — e por isso
ultrapassando um Governo, uma legislatura, um mandato presidencial (…) procurando um acordo com o maior
denominador comum entre partidos e parceiros e que combine ambição e realismo» (junho de 2018).
Assim, e tendo em conta que o CDS-PP defende intransigentemente o direito à proteção na saúde, à
prestação de cuidados de saúde de qualidade, um SNS sustentável, humanizado e modernizado, adaptado ao
século XXI e o direito de acesso de todos os cidadãos a esse mesmo SNS em tempo clinicamente útil; e tendo
em conta que consideramos que, na Proposta de Lei n.º 171/XIII, não foram tidas em atenção matérias
determinantes que constavam no projeto da Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde, entendemos que
o trabalho realizado por essa Comissão não pode, sem mais, ser ignorado. Nesse sentido, e reconhecendo que,
apesar de discordâncias pontuais, este é, na sua globalidade, um trabalho abrangente e adaptado às reais
necessidades do País e do SNS, entendemos dever recuperar o projeto de Lei de Bases da Saúde elaborado
pela Comissão de Revisão, introduzindo nele alterações que refletem princípios defendidos pelo CDS-PP e
apresentar o resultado na presente iniciativa legislativa.
O CDS-PP é um partido democrático, respeitador do trabalho consistente, séria e abrangentemente
elaborado, que merece a oportunidade que o originou de ser discutido no Parlamento.
Acresce que, sendo defensores do SNS, estamos informados e conscientes das tremendas dificuldades e
constrangimentos que o SNS atualmente atravessa e que carecem de urgente resolução. Mas não nos deixamos
iludir: não será uma nova Lei de Bases da Saúde que, só por si, resolverá esses problemas. Não será uma nova
Lei de Bases da Saúde que, por si só, dotará o SNS de mais profissionais de saúde, que reduzirá as
intermináveis listas de espera para consultas e cirurgias ou que substituirá os equipamentos avariados e
obsoletos. Não será uma nova Lei de Bases da Saúde que, por si só, aumentará o orçamento do SNS, nem que
pagará as dívidas que não param de aumentar. Não será, certamente, uma nova Lei de Bases da Saúde que,
por si só, resolverá a insatisfação, a desmotivação e a exaustão dos profissionais de saúde, que abrirá os
concursos a tempo e horas, ou que dotará as administrações hospitalares de maior autonomia libertando-as do
permanente condicionamento do Ministério das Finanças.
Estas são, todas elas, matérias de ação governativa das quais o Governo não se pode demitir. E o CDS-PP
estará, como sempre, atento, fiscalizador e proponente de alternativas sérias, fundamentadas e exequíveis.
O papel de uma Lei de Bases da Saúde é outro, muito mais amplo. Cumpre-lhe enquadrar o direito
constitucional de todos os cidadãos à proteção da saúde; a dignidade da pessoa em todas as fases da vida; a
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proteção da vida; a defesa e proteção dos mais vulneráveis; o acesso em tempo clinicamente útil a um SNS
organizado, moderno, de qualidade e com toda a segurança; para defesa da sustentabilidade do pilar social em
que assenta o direito dos cidadãos à saúde, tem de instituir o princípio concorrencial dentro dos serviços do
SNS e entre os setores público, privado e social, para que se gerem melhores resultados e maior eficiência; e
cumpre-lhe definir os princípios enquadradores em áreas tão determinantes como, entre outras, a promoção da
educação e da literacia em saúde, a promoção da investigação, da inovação, a saúde pública, o reconhecimento
das terapêuticas não convencionais, a saúde mental, os cuidados continuados e paliativos, e, evidentemente
também, o reconhecimento da enorme relevância dos cuidadores informais.
Estes são alguns dos vários princípios enquadradores que devem constar de uma Lei de Bases da Saúde.
Todos eles constam do projeto da Comissão de Revisão da Lei de Bases da Saúde e muitos deles foram omitidos
na Proposta de Lei apresentada pelo Governo, o que a torna mais concisa, mas claramente pior, atendendo à
natureza e fim a que este tipo de Lei se destina.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do CDS-PP abaixo-assinados apresentam o seguinte Projeto de Lei:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Base I
Objeto
A presente lei estabelece as bases da realização do direito à proteção da saúde, garantindo a todos
prestações de saúde de qualidade, centradas na proteção da dignidade em todas as fases da vida e dos direitos
das pessoas em contexto de saúde, e definindo as bases do Sistema de Saúde, onde se encontra devidamente
enquadrado o Serviço Nacional de Saúde, enquanto fundamental pilar social do Estado.
Base II
Direito à proteção da saúde
1 – O direito à proteção da saúde, como direito humano e direito constitucionalmente protegido e entendido
como o direito de todas as pessoas de gozar do melhor estado de saúde física, mental e social possível,
pressupõe a criação e o desenvolvimento de condições económicas, sociais, culturais, ambientais e de
educação e literacia que garantam níveis de vida e de trabalho suficientes e saudáveis e compreende o acesso
às adequadas prestações, designadamente promotoras de saúde, preventivas, terapêuticas, de reabilitação, de
cuidados continuados e de cuidados paliativos.
2 – A efetivação do direito à proteção da saúde, em todas as suas vertentes e nas suas manifestações
individuais e coletivas, constitui o fundamento e a finalidade primeira do Serviço Nacional de Saúde, que deve
ser dotado dos meios adequados para o efeito.
3 – A proteção do interesse e do bem-estar da pessoa devem prevalecer sobre o interesse único da
sociedade ou da ciência, devendo as restrições aos direitos individuais limitar-se ao estritamente necessário
para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
Base III
Princípios gerais
1 – A proteção da saúde ao longo de todo o ciclo de vida, como direito das pessoas e um bem da comunidade,
efetiva-se pela responsabilidade conjunta dos indivíduos, da sociedade e do Estado, em liberdade de procura e
de prestação, nos termos da Constituição e da lei.
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2 – O Estado promove e garante o acesso de todos às prestações de saúde, nos limites dos recursos
humanos, técnico-científicos e financeiros disponíveis, em obediência aos princípios da beneficência, da não-
maleficência, da autonomia, da vulnerabilidade e da justiça.
3 – O Estado reconhece a importância social e económica da saúde como promotora do desenvolvimento
humano, da inovação e da criação de valor.
4 – A promoção e a defesa da saúde enquanto bem público e direito fundamental são garantidas através da
atividade do Estado, em particular, através do Serviço Nacional de Saúde, bem como de outros entes públicos,
devendo as pessoas, as entidades dos setores de economia social e privado e outras organizações da sociedade
civil ser associadas àquela atividade.
5 – As prestações de saúde são asseguradas, sob regulação e fiscalização do Estado, por serviços e
estabelecimentos do Estado, por outras entidades do setor público, do setor de economia social e do setor
privado, bem como por profissionais em regime de trabalho independente, regendo-se por princípios éticos, de
transparência e eficiência.
6 – A responsabilização partilhada de todos os intervenientes, incluindo o utente, sobre os vários aspetos e
fatores da saúde, nomeadamente o uso racional de recursos, de princípios de eficiência, da solidariedade e da
sustentabilidade.
7 – O Estado promove os princípios constitucionais da Dignidade, da Autonomia, e do respeito pela
Privacidade nos cuidados de saúde a serem prestados.
8 – O Estado promove o direito à informação, em particular dando a conhecer ao indivíduo a natureza,
extensão e importância do seu contributo, a bem da construção de um ciclo crescente de solidariedade,
confiança, progresso e justiça.
Base IV
Política de saúde
1 – A política de saúde centra-se na pessoa, na sua dignidade, em todas as fases da vida, e bem-estar e
obedece às diretrizes seguintes:
a) A promoção da saúde e a prevenção da doença, como prioridades no planeamento das atividades do
Estado e determinando a definição e a execução de todas as políticas públicas, reconhecendo-se a interligação
existente entre o direito à saúde e, nomeadamente, os direitos à alimentação, à integridade pessoal, à
privacidade, ao acesso à informação e às liberdades de associação e de circulação, ao trabalho, à segurança
social, à habitação, à educação;
b) A igualdade no acesso e na realização das prestações de saúde e a não discriminação das pessoas
nomeadamente em razão da sua situação económica, condição social, sexo, género, orientação sexual,
ascendência, etnia, língua, idade, constituição genética, deficiência, estado de saúde, território de origem,
religião, convicções políticas ou ideológicas, nível de instrução e local de residência;
c) A garantia da equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços;
d) A garantia do acesso em tempo clinicamente adequado às necessárias prestações de saúde, com
qualidade e segurança;
e) A adoção de medidas especiais relativamente a grupos em situação de maior vulnerabilidade, tais como
as mulheres grávidas, puérperas ou lactantes, as crianças, os adolescentes, as pessoas com deficiência, os
idosos, as pessoas com doença crónica, em particular com multimorbilidade, as pessoas com comportamentos
aditivos, as pessoas com insuficiência económica, os reclusos e os trabalhadores cuja atividade, por riscos
acrescidos associados, o justifique;
f) A conceção, a organização e o funcionamento dos estabelecimentos e serviços de saúde e o
desenvolvimento e a gestão dos recursos humanos de acordo com os direitos e com as necessidades em saúde
das pessoas e das comunidades, articulando-se entre si e com os serviços associados à realização de outras
políticas públicas fundamentais, onde a saúde deve ser tida como uma linha transversal estruturante;
g) A gestão dos recursos disponíveis segundo critérios de qualidade, eficácia, efetividade e eficiência de
forma a obter deles o maior proveito socialmente útil, alcançar ganhos em saúde e evitar a subutilização, o
desperdício e a utilização indevida dos serviços;
h) A promoção do desenvolvimento científico, enquanto bem patrimonial público e do qual todos devem
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beneficiar, nos termos da lei, e da gestão do conhecimento para a melhoria da qualidade;
i) A promoção da educação das populações para a saúde com vista a elevar o respetivo nível de literacia
para a realização de escolhas livres e esclarecidas e a estimular a adoção de estilos de vida saudáveis e a
modificação de comportamentos potencialmente nocivos à saúde;
j) A participação das pessoas na definição, no acompanhamento e na avaliação das políticas de saúde,
devendo ser apoiada em particular a intervenção das associações representativas das pessoas portadoras de
doença;
k) A essencialidade da investigação em saúde e para a saúde devendo nela participar os serviços, os
profissionais e a comunidade em articulação com os outros setores da sociedade que a ela se dediquem.
2 – A política de saúde tem carácter transversal, dinâmico e evolutivo, adaptando-se ao progresso do
conhecimento científico e às condições, às necessidades e aos recursos da realidade nacional, regional e local,
visando ganhos em saúde.
Base V
Responsabilidade do Estado
1 – Ao Estado cumpre a tarefa de realização do direito à promoção e à proteção da saúde e de redução das
desigualdades, atuando nas determinantes da saúde através das políticas públicas nas áreas económicas,
sociais, culturais e ambientais que a garantam e otimizando e distribuindo equitativamente pelo território nacional
os recursos humanos, materiais e financeiros necessários que devam ser afetados àquela finalidade e
fiscalizando a qualidade das prestações de saúde.
2 – O Estado é responsável por assegurar a prestação de cuidados de saúde de acordo com as necessidades
dos cidadãos e por implementar os respetivos programas e medidas, alocando os recursos humanos e os
equipamentos adequados ao fim em vista.
3 – A responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde efetiva-se primeiramente
através do Serviço Nacional de Saúde.
4 – O Estado, enquanto garante do acesso de todas as pessoas ao direito à promoção e à proteção da saúde,
organiza-se separando devidamente e com transparência as seguintes funções:
a) De financiador, através da dotação orçamental do Serviço Nacional de Saúde resultante da
contratualização com maior responsabilidade e autonomia, bem como da dotação orçamental para a
contratualização com prestadores dos setores privado e social que, a cada momento, se justifique;
b) De prestador de cuidados através do Serviço Nacional de Saúde;
c) De fiscalizador e avaliador da qualidade dos cuidados de saúde prestados no sistema de saúde.
5 – Cabe ao Governo a definição da política de saúde tendo em conta os princípios e as diretrizes fixados na
presente lei.
6 – Cabe ao membro do Governo responsável pela área da saúde propor a definição da política de saúde,
promover e fiscalizar a respetiva execução e coordenar a sua ação com a dos outros ministérios e outras
entidades, com respeito pelo disposto na presente lei.
7 – Os serviços centrais do ministério que tutela a área da saúde exercem, em relação ao Serviço Nacional
de Saúde e às outras entidades que realizam prestações públicas de saúde, funções de regulamentação,
orientação, planeamento, avaliação, auditoria, acreditação e inspeção.
8 – O Estado regula e fiscaliza a atividade na área da saúde, sem prejuízo das funções que a lei atribuir às
Ordens Profissionais.
9 – Compete ao ministério que tutela a área da saúde auditar, inspecionar, fiscalizar e desenvolver a ação
disciplinar no setor da saúde, incidindo sobre todos os domínios da atividade e da prestação de cuidados de
saúde, sem prejuízo das competências disciplinares atribuídas pela lei às Ordens Profissionais.
10 – A lei define a natureza, as atribuições, a organização e o funcionamento da entidade pública à qual o
Estado atribui as competências referidas no número anterior, de forma a assegurar com eficiência e prontidão a
inspeção das atividades de saúde.
11 – O Estado pode constituir uma entidade reguladora da saúde, independente e com funções de autoridade
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nacional de fiscalização, supervisão e regulação da atividade na área da saúde.
Base VI
Natureza da legislação sobre saúde
A legislação sobre saúde é de interesse e ordem públicos, pelo que a sua inobservância implica
responsabilidade penal, contraordenacional, civil e disciplinar, conforme o estabelecido na lei.
CAPÍTULO II
Dos direitos e deveres das pessoas em contexto de saúde
Base VII
Direitos das pessoas em contexto de saúde
1 – As pessoas em contexto de saúde têm direito:
a) A aceder às prestações de saúde com respeito pelo princípio da igualdade e da não discriminação;
b) A receber as prestações de saúde adequadas à sua situação, com prontidão e no tempo considerado
clinicamente aceitável, de forma humanizada, de acordo com a melhor evidência científica disponível e seguindo
as boas práticas de qualidade e segurança em saúde;
c) A ver salvaguardada a sua dignidade em todas as fases da vida, com particular enfoque no inicio e fim de
vida, e respeitada a sua privacidade;
d) A ser informadas de forma adequada, acessível, objetiva, completa e inteligível pelo prestador dos
cuidados de saúde, de modo a garantir um esclarecimento efetivo, sobre a sua situação, o objetivo, a natureza,
as alternativas possíveis e os benefícios e os riscos das intervenções propostas e a evolução provável do seu
estado em função do plano de cuidados a adotar;
e) A escolher outra pessoa que deva receber em seu lugar a informação a que alude a alínea anterior ou
recusar receber essa informação, salvo quando possa constituir risco para a saúde pública ou para terceiros;
f) A decidir, livre e esclarecidamente, a todo o momento, receber ou recusar as prestações de saúde que
lhes são propostas, salvo nos casos excecionais previstos na lei;
g) A emitir diretivas antecipadas de vontade e a nomear procurador de cuidados de saúde, nos termos
definidos pela lei;
h) A ser informadas sobre a investigação relevante para a sua situação de saúde;
i) À reserva da vida privada e à proteção de dados pessoais revelados ou apurados em contexto de saúde,
estando os profissionais obrigados ao dever de confidencialidade e sigilo, salvo disposição da lei em contrário;
j) A aceder livremente à informação que lhes respeite, sendo a informação de saúde propriedade da pessoa,
sem necessidade de intermediação de um profissional de saúde, salvo quando o solicitar, e sem embargo da
adequada proteção do sigilo de terceiros;
k) A ser informadas pelo estabelecimento de saúde sobre o tempo de resposta para a prestação dos
cuidados de que necessitam;
l) Ao acompanhamento por familiar, cuidador informal ou outra pessoa por si escolhida, de acordo com a lei
e as regras em vigor;
m) A receber, se o desejarem, assistência religiosa e/ou espiritual;
n) A reclamar, fazer queixa ou apresentar sugestões e obter resposta das entidades responsáveis;
o) A receber indemnização pelos danos sofridos, em tempo razoável, nos termos definidos na lei;
p) A participar na defesa dos seus direitos e interesses no âmbito das decisões que sejam suscetíveis de as
afetar;
q) A constituir entidades que as representem e defendam os seus direitos e interesses junto dos serviços de
saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de outras entidades.
2 – Ninguém pode ser discriminado no acesso a cuidados de saúde por ter recusado a celebração de contrato
de seguro de saúde ou a participação em investigação em saúde ou por ter emitido diretiva antecipada de
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vontade.
Base VIII
Deveres das pessoas em contexto de saúde
As pessoas, em contexto de saúde, devem:
a) Contribuir para a defesa e a promoção da sua própria saúde e para a melhoria da saúde da comunidade;
b) Exercer o direito à proteção da saúde com respeito pelos valores da cidadania responsável e da justiça;
c) Respeitar os direitos das outras pessoas em contexto de saúde e os dos profissionais de saúde;
d) Observar as regras sobre a organização, o funcionamento e a utilização dos serviços e estabelecimentos
de saúde a que recorrem;
e) Colaborar com os profissionais de saúde em todos os aspetos relevantes e em função da sua situação
concreta;
f) No âmbito do Serviço Nacional de Saúde, e dos demais prestadores de cuidados de saúde, respeitar os
princípios que os enformam.
Base IX
Pessoas que carecem de capacidade
Relativamente a menores e a maiores impossibilitados de exercer, plena, pessoal e conscientemente, os
seus direitos pessoais, a lei deve prever as condições de exercício dos seus direitos, com observância dos
seguintes princípios:
a) Qualquer intervenção sobre uma pessoa que careça de capacidade para prestar o seu consentimento
apenas pode ser efetuada em seu benefício direto, salvo previsão legal ou decisão judicial em contrário;
b) A opinião do menor é tomada em consideração como um fator progressivamente determinante, em função
da sua idade e do seu grau de maturidade;
c) A pessoa maior sem capacidade para consentir deve, na medida do possível, participar no processo de
autorização, sendo tomada em consideração a sua vontade, designadamente a vontade anteriormente
expressa, e respeitadas, nos termos da lei, as diretivas antecipadas de vontade.
Base X
Saúde e deficiência
1 – Com vista a assegurar às pessoas com deficiência o gozo do melhor estado de saúde possível sem
discriminação nela baseada, o Estado toma as medidas apropriadas para lhes garantir o acesso:
a) A serviços e programas de saúde pública de igual natureza e qualidade aos prestados às demais pessoas,
em todas as áreas, incluindo a da saúde sexual e reprodutiva;
b) A cuidados de saúde de que necessitem, em particular devido à deficiência de que são portadores,
incluindo a deteção e a intervenção atempadas da deficiência, quando apropriadas, e os cuidados destinados a
minimizar e a prevenir outras deficiências;
c) A cuidados de saúde que atendam às especificidades decorrentes do género, da idade e da natureza e
origem da deficiência e que lhes permitam manter o máximo grau de independência e de inclusão na
comunidade em que se inserem.
2 – O ministério responsável pela área da saúde promove a formação dos profissionais de saúde no que
concerne aos direitos das pessoas com deficiência.
3 – Os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde tomam as medidas de adaptação apropriadas
para assegurar que as pessoas com deficiência exercem, em condições de equidade com as demais, os seus
direitos fundamentais em contexto de saúde.
4 – O desenho dos produtos, ambientes, programas e serviços em contexto de saúde deve obedecer as
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regras do desenho universal, salvo quando seja necessário adotar dispositivos específicos de assistência a
grupos particulares de pessoas com deficiência, nomeadamente através do recurso à língua gestual ou ao
braille.
Base XI
Direito de associação e de representação
1 – É reconhecido o direito de as pessoas constituírem, nos termos da lei, entidades sob a forma de
associação ou outras com personalidade jurídica e sem fins lucrativos que as representem e defendam os seus
direitos e interesses junto dos serviços de saúde, do ministério responsável pela área da saúde e de outras
instituições.
2 – Nos termos do número anterior, podem ser constituídas associações de utilizadores dos serviços de
saúde, associações de pessoas com doença, associações de cuidadores informais, associações para a
promoção da saúde e prevenção da doença, ligas de amigos de estabelecimentos de saúde ou outras entidades
que prossigam os referidos fins.
3 – As associações e entidades constituídas nos termos do n.º 1:
a) Devem atuar de forma autónoma, independente e transparente, assegurando a legitimidade e a
representatividade da sua atuação;
b) Têm o direito de participar no procedimento legislativo e no procedimento administrativo regulamentar,
assim como nos processos de consulta e de audição públicas, nos termos da lei;
c) Têm legitimidade procedimental e legitimidade processual para representar interesses coletivos de acordo
com o seu objeto e fins.
4 – A Administração Pública deve promover a participação das associações e outras entidades constituídas
nos termos do n.º 1 em tudo o que respeite aos direitos e interesses das pessoas no contexto da saúde.
5 – A Administração Pública pode apoiar as associações e outras entidades constituídas nos termos do n.º
1 e as suas iniciativas, em particular no domínio da sensibilização, informação, literacia, prevenção, rastreio,
segurança, investigação e formação na respetiva área de atuação, fiscalizando a execução dos apoios
concedidos.
6 – Do disposto no número anterior excetuam-se as associações e outras entidades constituídas nos termos
do n.º 1 e as suas iniciativas, sempre que apoiadas por entidades que possam configurar conflitos de interesses
com o Serviço Nacional de Saúde.
Base XII
Cuidadores informais
1 – É promovido o papel da família, das pessoas próximas e da comunidade na saúde e no bem-estar das
pessoas com doença, dependência e/ou perda de funcionalidade ou em risco de a perder, sempre e na medida
em que tal papel seja conveniente e desejado, e tendo por base o melhor interesse da pessoa com doença.
2 – A lei deve promover o reconhecimento do importante papel do cuidador informal, a sua responsabilização
e capacitação para a prestação, com qualidade e segurança, dos cuidados básicos regulares e não
especializados que realizam.
3 – A lei estabelece o estatuto dos cuidadores informais de pessoas em situação de doença crónica,
deficiência e/ou dependência, parcial ou total, transitória ou definitiva, ou noutra condição de fragilidade e
necessidade de cuidados, os seus direitos e deveres, e também as medidas de apoio aos cuidadores informais
e às pessoas cuidadas.
4 – O Estado, através do ministério responsável pela saúde, deve ainda assegurar a articulação entre a
pessoa cuidada, o cuidador informal e os serviços de saúde, e a implementação do plano integrado de prestação
de cuidados de saúde de que a pessoa carece.
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Base XIII
Dados pessoais e informação de saúde
1 – O tratamento de dados pessoais e da informação de saúde em especial relativa a qualquer pessoa, viva
ou falecida, obedece a legislação específica de modo a garantir a proteção da sua confidencialidade e
integridade, a assegurar o cumprimento rigoroso do dever de sigilo por parte dos profissionais e dos serviços de
saúde e a impedir o acesso e uso indevidos.
2 – Deve ser assegurada a circulação dos dados de saúde e outros dados pessoais em condições de
interoperabilidade, interconexão e rastreabilidade dos sistemas de informação, garantindo a confidencialidade,
a portabilidade, a segurança e a proteção dos dados e o respeito pelo princípio da intervenção mínima, de acordo
com o regime jurídico aplicável.
3 – Deve ser privilegiado o consentimento da partilha e a garantia da autonomia através da participação
consciente, livre e informada dos cidadãos, na integração de cuidados, na centralidade da sua decisão e na
partilha dos seus dados, respeitando os seus legítimos interesses.
4 – Dever ser assegurada proteção legal contra quaisquer formas de discriminação e dadas garantias efetivas
contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana.
CAPÍTULO III
Da saúde pública
Base XIV
Saúde pública
1 – A defesa da saúde pública é uma responsabilidade do Estado, devendo este proceder de modo a que
todos e cada um reconheçam a saúde como um bem coletivo que devem, em colaboração, promover, preservar
e defender.
2 – Compete ao Estado acompanhar a evolução do estado de saúde da população, do bem-estar das
pessoas e da comunidade, através do desenvolvimento e da implementação de instrumentos de observação em
saúde, nomeadamente de monitorização e vigilância epidemiológica, incluindo a laboratorial, com vista,
designadamente, à:
a) Deteção precoce de ameaças e de alterações ao estado de saúde da população e ainda de tendências
de curto, médio e longo prazo;
b) Identificação de áreas prioritárias de intervenção e de outras ações de promoção da saúde e de prevenção
da doença;
c) Avaliação criteriosa e rigorosa dos efeitos das medidas adotadas e das medidas a adotar;
d) Coordenação das respostas de emergência, de promoção da saúde e de prevenção da doença ao longo
de todo o ciclo de vida.
3 – O acompanhamento da evolução do estado de saúde da população deve abranger, designadamente, a
mortalidade e suas causas específicas, a morbilidade, as deficiências, as incapacidades e as determinantes
desse estado de saúde, nomeadamente, genéticas ou outras biológicas, ambientais, sociológicas,
comportamentais e organizacionais, bem como as necessidades em cuidados de saúde.
4 – A salvaguarda da saúde pública abrange políticas públicas no domínio das alterações climáticas, do
acesso a alimentação adequada e a água própria para consumo de qualidade e de garantia da qualidade do ar,
bem como do adequado tratamento e gestão dos resíduos.
5 – A prevenção da doença deve permitir um reforço dos fatores protetores da saúde através do apoio ao
desenvolvimento de programas de saúde pública, designadamente nas áreas da vacinação, saúde escolar,
saúde oral, saúde mental, saúde ambiental, saúde respiratória, saúde sexual, saúde reprodutiva, saúde
ocupacional e lesões e traumatismos, bem como na gestão da doença crónica, integrando nas ações os diversos
níveis de prevenção.
6 – As ações de promoção da saúde e de prevenção da doença devem ser desenvolvidas, de modo integrado
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e articulado, em rede, atendendo às especificidades locais.
7 – As ações de saúde pública devem ser suportadas por sistemas de informação dedicados de apoio e dos
adequados estudos, investigação e informação epidemiológica e pela produção sistemática de estatísticas
nacionais e comunitárias sobre saúde pública, proteção ambiental, saúde e segurança no trabalho.
8 – Deve ser desenvolvido um sistema de vigilância de saúde pública, nos termos da lei, que permita
identificar, avaliar, gerir e comunicar, de forma transparente, clara e rigorosa, situações de risco relativamente a
doenças transmissíveis e outras ameaças para a saúde pública, bem como ter sistematicamente preparados e
atualizados planos de contingência face a situações de emergência ou de calamidade pública e determinar as
medidas temporárias necessárias à proteção da saúde pública.
9 – É reconhecida a natureza interdisciplinar e intersectorial dos instrumentos de política de saúde pública e
promovida a ação concertada dos mesmos pelos diferentes ministérios e serviços, com vista à obtenção de
ganhos efetivos em saúde e ao aumento dos potenciais anos de vida saudáveis da população.
10 – É promovida a avaliação dos impactos na saúde pública das diferentes políticas, designadamente
políticas sociais, de trabalho, ambientais, de obras públicas, de habitação, de urbanismo e de transportes.
11 – A avaliação prevista no número anterior e a função de observatório da saúde são realizadas pelo Instituto
Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, IP, sem prejuízo da sua articulação com outros serviços e entidades,
designadamente para a obtenção da informação e da colaboração necessárias à concretização dessas
atribuições.
12 – O Estado deve assegurar, ao Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, IP, todos os meios e
recursos técnicos e humanos necessários ao seu bom e regular funcionamento, para o adequado cumprimento
do fim em vista.
Base XV
Autoridades de saúde
1 – As autoridades de saúde situam-se a nível nacional, regional e local, para garantir a intervenção oportuna
e adequada do Estado, designadamente em situações de risco para a saúde pública, e estão hierarquicamente
dependentes do membro do Governo responsável pela área da saúde, através do diretor-geral competente.
2 – O diretor-geral a que se refere o número anterior exerce as funções de autoridade nacional de saúde e
constitui o ponto de contacto nos termos dos normativos internacionais aplicáveis.
3 – As autoridades de saúde têm por funções a defesa da saúde pública e a avaliação do impacto das
decisões de outras entidades nesta matéria.
4 – É atribuída às autoridades de saúde a decisão de intervenção do Estado na promoção e proteção da
saúde e na prevenção da doença, bem como nas situações de alto risco para a saúde pública e no controlo dos
fatores de risco e das situações suscetíveis de causarem ou acentuarem prejuízos para a saúde dos cidadãos
e das comunidades.
5 – Para defesa da saúde pública, cabe, em especial, às autoridades de saúde:
a) Proceder à vigilância epidemiológica das populações;
b) Proceder à vigilância das condições sanitárias dos serviços, estabelecimentos e locais de utilização
pública;
c) Ordenar a suspensão de atividade ou o encerramento dos serviços, estabelecimentos e locais referidos
na alínea anterior, quando funcionem em condições de risco para a saúde pública;
d) Desencadear, de acordo com a Constituição e a lei, o internamento ou a prestação compulsiva de
cuidados urgentes de saúde a indivíduos que, de outro modo, constituam perigo grave para a saúde pública;
e) Exercer a vigilância sanitária do território nacional e fiscalizar o cumprimento do Regulamento Sanitário
Internacional ou de outros normativos internacionais correspondentes;
f) Proceder à requisição de serviços, estabelecimentos e profissionais de saúde em casos de epidemias
graves e outras situações semelhantes ou de calamidade pública.
6 – Sem prejuízo do disposto na presente lei, os princípios e regras de organização e funcionamento das
autoridades de saúde são desenvolvidos em diploma próprio.
7 – Compete ao diretor-geral a que se refere o n.º 1, sem prejuízo de outras competências que a lei lhe venha
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a atribuir:
a) Regulamentar, orientar e coordenar as atividades de promoção da saúde e de prevenção da doença,
incluindo a vigilância epidemiológica, ambiental e entomológica e a proteção específica através nomeadamente
da vacinação e da deteção de doenças genéticas, anomalias congénitas e cancro;
b) Definir as condições técnicas para a adequada prestação de cuidados de saúde, planear, programar e
monitorizar a política nacional para a qualidade no sistema de saúde e para a melhoria contínua da qualidade
clínica, organizacional e funcional dos serviços de saúde;
c) Coordenar e assegurar a elaboração, a execução, a atualização periódica e a monitorização da execução
do Plano Nacional de Saúde, bem como de planos regionais e locais, e dos programas nacionais para áreas
específicas da saúde e da doença;
d) Coordenar as relações internacionais do ministério responsável pela área da saúde;
e) Garantir a vigilância epidemiológica a nível nacional, regional e local de doenças transmissíveis e não
transmissíveis, incluindo as doenças raras, e assegurar a contribuição da respetiva vigilância no quadro
internacional;
f) Gerir, com independência, situações de emergência em saúde pública.
8 – As intervenções e as decisões das autoridades de saúde são de natureza técnica, independentes do
poder político, suportadas pela evidência científica e apoiadas por sistemas de informação disponíveis em todos
os níveis da rede.
9 – As funções de autoridade de saúde são independentes das de natureza operativa dos serviços de saúde.
10 – Sem prejuízo dos deveres de apoio e de informação de outras entidades, a defesa da saúde pública e
as atividades desenvolvidas pelas autoridades de saúde são apoiadas e avaliadas técnica e cientificamente pelo
Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, IP, laboratório de referência do Estado para a saúde e
observatório nacional de saúde.
Base XVI
Situações de emergência em saúde pública
1 – Quando ocorram situações de emergência em saúde pública, em especial situações de epidemia,
calamidade ou catástrofe, a autoridade nacional de saúde toma as medidas de exceção indispensáveis,
designadamente coordenando a atuação dos serviços centrais do ministério responsável pela área da saúde
com as instituições e serviços do Serviço Nacional de Saúde e as autoridades de saúde de nível nacional,
regional e local.
2 – O membro do Governo responsável pela área da saúde mobiliza a intervenção de outros ministérios e
serviços do Estado quando necessário.
3 – Pode a autoridade nacional de saúde nas situações referidas no n.º 1 requisitar, pelo tempo
absolutamente indispensável, os profissionais e estabelecimentos de saúde em atividade dos setores público,
de economia social e privado.
4 – Compete à autoridade nacional de saúde articular-se com entidades nacionais e internacionais, no âmbito
da preparação para e na resposta a ameaças, deteção precoce, avaliação e comunicação de risco.
5 – As funções das autoridades de saúde devem ser apoiadas por um fundo para emergências em saúde
pública que possibilite, quando necessário, atuar de forma rápida, integrada e eficiente.
Base XVII
Saúde e genómica
1 – O Estado reconhece a importância da genómica no âmbito da saúde pública, devendo o legislador regulá-
la no respeito dos seguintes princípios:
a) Dignidade e direitos de todas as pessoas, em todas as fases da vida e independentemente das suas
características genéticas;
b) Consentimento livre e esclarecido em matéria de testes genómicos preditivos realizados em contexto de
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saúde e precedidos de indispensável aconselhamento genético;
c) Confidencialidade dos dados genómicos associados a uma pessoa identificável;
d) Não discriminação injusta com base nas características genéticas da pessoa, em particular se associadas
a doença ou deficiência;
e) Liberdade de investigação científica na área da genómica, atenta a sua importância para a melhoria da
saúde dos indivíduos e da Humanidade no seu conjunto, de acordo com o necessário enquadramento ético;
f) Ampla divulgação dos conhecimentos disponíveis na área da genómica e promoção do seu intercâmbio
a nível nacional e internacional.
2 – O Estado incentiva a investigação na área da genómica, em particular em matéria de prevenção e
tratamento de doenças e deficiências raras de origem genética, assegurando especial proteção aos indivíduos,
famílias e grupos populacionais particularmente vulneráveis por elas afetados.
3 – A investigação na área da genómica obedece a critérios éticos devidamente enquadrados,
nomeadamente atendendo ao papel do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida enquanto órgão
consultivo independente, que tem por missão analisar os problemas éticos suscitados pelos progressos
científicos nos domínios da biologia, da medicina ou da saúde em geral e das ciências da vida.
Base XVIII
Saúde mental
1 – Todos têm direito a gozar do melhor nível de bem-estar mental, enquanto base do seu desenvolvimento
equilibrado durante a vida, importante para as relações interpessoais, vida familiar e integração social e
profissional, e para plena participação comunitária e económica de cada um.
2 – O Estado promove a melhoria da saúde mental das pessoas e da sociedade em geral, designadamente
através da promoção do bem-estar mental, da prevenção e da identificação atempada das doenças mentais e
dos riscos a elas associados, da proteção dos direitos humanos e da prestação integrada de cuidados de saúde
mental às pessoas afetadas por doenças mentais.
3 – São combatidos os estereótipos negativos e o estigma associados à doença mental, bem como a
discriminação negativa das pessoas que dela sofrem, designadamente através da adoção de programas pelo
ministério responsável pela área da saúde ou em articulação com outras entidades.
4 – A saúde mental deve, pela sua transversalidade e relação com diferentes setores da sociedade, ser
considerada nas políticas com impacto na saúde pública.
5 – Os cuidados de saúde mental devem ser centrados nas pessoas, reconhecendo a sua individualidade,
necessidades específicas e nível de autonomia, e ser prestados através de uma abordagem interdisciplinar e
integrada e prioritariamente a nível da comunidade.
6 – A promoção da saúde mental positiva da população, como fator de progresso económico, de coesão
social e de desenvolvimento sustentável da sociedade, é assegurada através de programas plurissectoriais que
desenvolvam a resiliência e outros recursos pessoais e atuem sobre as determinantes sociais, económicas,
culturais e ambientais que os condicionam.
7 – As pessoas com doença mental, os seus representantes legais, acompanhantes ou cuidadores devem
ser ativamente envolvidos no plano de cuidados a prestar, com respeito pelos direitos das pessoas com doença
mental.
8 – Os cuidados de saúde mental devem ser prestados de forma multidisciplinar, no âmbito de instituições
polivalentes.
9 – O Estado apoia investigação interdisciplinar na área da saúde mental que permita produzir evidência
sobre o impacto das perturbações mentais, das políticas e dos cuidados de saúde mental, a nível individual e
social.
Base XIX
Saúde ocupacional
1 – Todos os trabalhadores têm o direito de beneficiar de medidas que lhes permitam gozar do melhor estado
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de saúde ocupacional que possam atingir, no âmbito da proteção da sua dignidade no trabalho.
2 – O empregador ou, na ausência de relação jurídico-laboral, a pessoa que gere as instalações em que a
atividade é desenvolvida, deve assegurar que o trabalho é prestado em condições que respeitem a saúde dos
trabalhadores.
3 – De modo a proteger eficazmente este direito do trabalhador, os ministérios responsáveis pelas áreas da
saúde e do trabalho promovem, em consulta com as organizações representativas dos trabalhadores e dos
empregadores, a adoção de medidas que garantam a proteção da saúde no meio laboral, como sejam as que
visam assegurar a sensibilização, informação e prevenção em matéria de doenças ocupacionais e os riscos a
elas associados.
4 – Serão, em especial, adotadas medidas tendentes a melhorar a saúde e a prevenir os riscos psicossociais
dos trabalhadores particularmente vulneráveis, como sejam as trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes,
os trabalhadores com deficiência, os trabalhadores menores em caso de trabalhos que, pela sua natureza ou
pelas condições em que são prestados, sejam prejudiciais à sua saúde e ao seu desenvolvimento físico, psíquico
e moral e os trabalhadores que têm uma relação de trabalho a termo ou temporário.
5 – Para a promoção da melhoria da saúde no trabalho é recomendada a educação, formação e informação
nesse sentido, de modo a sensibilizar-se a sociedade para a importância da prevenção de doenças
ocupacionais.
Base XX
Saúde e envelhecimento
1 – Com vista a assegurar o exercício efetivo do direito das pessoas mais velhas à proteção da saúde,
permitindo-lhes permanecer durante o maior período de tempo possível membros de pleno direito da sociedade,
o Estado compromete-se a tomar quer diretamente, quer em cooperação com os setores de economia social e
privado, medidas apropriadas que visem, designadamente:
a) A participação ativa nas decisões e plano de cuidados referentes ao idoso, a difusão das informações
relativas aos serviços e equipamentos ao seu dispor em contexto de saúde;
b) O acesso a cuidados de saúde apropriados ao seu estado e à sua condição, e que contribuam para que
lhes seja possível participar ativamente na vida pública, social e cultural;
c) A disponibilização, em conjugação com os ministérios responsáveis pelas áreas da segurança social, do
trabalho, das obras públicas e dos transportes, de bens e serviços apropriados às suas necessidades e estado
de saúde de modo a permitir-lhes uma existência condigna e independente no seu ambiente habitual, enquanto
o desejarem e for possível;
d) A prevenir que lhes sejam infligidos maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais,
abandono, privações da liberdade e apropriação indevida de rendimentos;
e) O assegurar, às que vivam em instituições, a assistência apropriada no respeito pela sua privacidade e a
participação na definição das condições de vida da instituição.
2 – Os cuidados de saúde prestados às pessoas mais velhas são globais, integrados e continuados, atendem
à sua especial vulnerabilidade, designadamente em situação de multimorbilidade, e são prestados, sempre que
possível, por profissionais de saúde com conhecimentos específicos na área.
3 – Ninguém pode ser negativamente discriminado ou desrespeitado em contexto de saúde em razão da sua
idade avançada.
Base XXI
Literacia para a saúde
1 – É promovida a educação em saúde em todas as etapas da vida e atendendo às necessidades específicas
e à diversidade de níveis de competência das pessoas na matéria, habilitando-as para aceder e utilizar
informação sobre saúde, de modo a decidirem de forma consciente e informada em matéria de cuidados de
saúde, prevenção da doença e promoção de estilos de vida saudável, por modo a desenvolverem o seu potencial
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de saúde.
2 – Para o efeito, o ministério responsável pela área da saúde deve:
a) Promover, em articulação com os ministérios responsáveis pelas áreas da educação e do ensino superior,
a importância da literacia para a saúde, incluindo-a, tão cedo quanto possível, nos currículos dos diferentes
níveis de ensino e de forma ajustada aos diversos grupos etários;
b) Desenvolver projetos e apoiar iniciativas de promoção da literacia para a saúde, em colaboração,
designadamente, com os serviços de saúde locais, as autarquias locais, as escolas e outras entidades
relevantes na matéria;
c) Promover que os profissionais de saúde sejam agentes de melhoria do nível de literacia para a saúde,
nomeadamente, no âmbito de intervenções específicas de promoção da saúde e de prevenção da doença;
d) Sensibilizar as pessoas para a adoção de estilos de vida saudáveis, de forma a permitir uma melhor
qualidade de vida individual e coletiva;
e) Apoiar iniciativas que melhorem a literacia para a saúde, em particular as dirigidas aos grupos mais
vulneráveis da sociedade.
3 – É promovida a literacia acerca da prevenção em saúde, hábitos e estilo de vida saudáveis, cuidados de
saúde recomendados, utilização dos serviços de saúde, utilização dos dados em saúde e literacia digital.
4 – É avaliado o impacto dos programas adotados, criando-se para o efeito um sistema de monitorização e
acompanhamento da literacia para a saúde a nível nacional.
CAPÍTULO IV
Da prestação em saúde
Base XXII
Serviço Nacional de Saúde
1 – A responsabilidade do Estado pela realização do direito à proteção da saúde é assegurada através de
um Serviço Nacional de Saúde capaz de garantir o acesso, clinicamente atempado e equitativo, de todos às
prestações de saúde necessárias de acordo com a sua situação de saúde.
2 – A organização e o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde são disciplinados por lei de acordo com
os seguintes princípios e valores fundamentais:
a) Universalidade, garantindo que todos, em todas as fases da vida, tenham acesso à promoção e à proteção
da saúde;
b) Generalidade, determinando que o acesso aos meios de promoção e de proteção da saúde englobe todos
os tipos de prestações de saúde;
c) Solidariedade, garantindo o caráter tendencialmente gratuito das prestações de saúde, tendo em conta
as condições económicas e sociais dos cidadãos e daqueles que sejam a estes equiparados, e impondo que o
desenvolvimento da política pública de saúde seja financiado pelo Orçamento do Estado, sem prejuízo de outras
receitas;
d) Acessibilidade, salvaguardando que o acesso às prestações de saúde é realizado em tempo clinicamente
útil e adequado de acordo com a situação de saúde;
e) Equidade, promovendo a correção dos efeitos das desigualdades económicas, sociais, culturais e
geográficas ou quaisquer outras no acesso aos cuidados e na realização das prestações de saúde, dando
particular atenção às necessidades dos grupos vulneráveis e dos grupos cujos indicadores de saúde sejam
inferiores aos da média da população;
f) Integração de cuidados, salvaguardando que o modelo de prestação garantido pelo Serviço Nacional de
Saúde está organizado e funciona atendendo aos diferentes tipos de cuidados, articulados e em rede, tendo em
conta as necessidades das populações;
g) Cobertura nacional, garantindo que todo o País dispõe de uma cobertura racional e eficiente de recursos
em saúde, de acordo com um princípio da proximidade dos serviços às populações e através de mecanismos
de referenciação que assegurem os meios necessários e adequados à prestação efetiva e clinicamente
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atempada dos cuidados de saúde;
h) Adoção de medidas de discriminação positiva que assegurem uma distribuição equitativa de profissionais
de saúde em todo o território nacional;
i) Gestão descentralizada, através do estabelecimento de instituições e serviços com autonomia para a
realização de objetivos de saúde e de serviços adequados e eficientes;
j) Gestão participada, valorizando a perspetiva dos utilizadores dos serviços de saúde e dos profissionais
de saúde na organização e funcionamento dos estabelecimentos e serviços;
k) Articulação das várias políticas públicas e atuação conjugada de diferentes entidades públicas,
designadamente através da participação das regiões autónomas e das autarquias locais nos termos da
Constituição e da lei, e de outras entidades que atuam na área da saúde;
l) Qualidade, visando prestações de saúde efetivas, seguras e eficientes, com base na evidência, realizadas
de forma humanizada, com correção técnica e atenção à individualidade da pessoa;
m) Sustentabilidade, assegurando a utilização eficiente, equitativa e sustentada, dos recursos públicos
disponíveis, numa perspetiva centrada nos ganhos em saúde;
n) Respeito pela dignidade dos utilizadores dos serviços de saúde e dos profissionais de saúde,
providenciando para que os mesmos sejam devidamente tratados, de modo a alcançar os melhores resultados
possíveis nas prestações de saúde e a assegurar o reconhecimento e valorização de quem os presta;
o) Assegurar a existência e disponibilidade para consulta pública de informação atualizada, transparente e
precisa, sobre as condições de acesso, a afetação e a utilização dos recursos financeiros que são anualmente
atribuídos pelo Orçamento do Estado e as prestações de saúde efetuadas.
Base XXIII
Organização e funcionamento do Serviço Nacional de Saúde
1 – O Serviço Nacional de Saúde é um conjunto organizado de estabelecimentos e serviços públicos
prestadores de cuidados de saúde tutelado pelo membro do Governo responsável pela área da saúde para
efetivação da responsabilidade que cabe ao Estado na proteção da saúde individual e coletiva.
2 – O Serviço Nacional de Saúde dispõe de estatuto próprio e é organizado de acordo com um modelo
descentralizado, adaptativo e dotado de plasticidade que o adeque às especificidades locais, epidemiológicas,
sociais e geográficas, e de acordo com um modelo integrado e colaborativo de prestação de cuidados de saúde.
3 – A lei regula a organização e o funcionamento do Serviço Nacional de Saúde e a articulação em rede dos
vários estabelecimentos e serviços prestadores que integram o Serviço Nacional de Saúde.
4 – Deve ser promovida a elaboração e a implementação de planos estratégicos de saúde que permitam
uma adequada integração de cuidados e o desenvolvimento de meios no Serviço Nacional de Saúde para
obtenção de ganhos efetivos em saúde, a par de uma programação plurianual de encargos.
5 – Os planos estratégicos de saúde devem ser suportados por instrumentos prévios de avaliação das
necessidades de saúde da população com base em estudos e em repositórios de conhecimento que produzam
evidência em saúde e por sistemas dedicados de apoio ao planeamento, monitorização e avaliação das
atividades e do impacto do Serviço Nacional de Saúde.
6 – A lei deve prever a criação de planos locais de saúde, bem como a criação de modelos organizativos de
coordenação e articulação entre unidades de saúde de uma área geográfica, através de redes e de sistemas
locais de saúde, que visem a prevenção da doença, a promoção e a proteção da saúde, a continuidade da
prestação de cuidados de saúde e a utilização racional dos recursos disponíveis.
7 – Deve ser garantida a referenciação para outro estabelecimento do Serviço Nacional de Saúde ou outro
prestador de cuidados, sempre que se conclua pela insuficiência dos recursos humanos ou materiais existentes
para dar a resposta adequada e em tempo útil à situação clínica da pessoa.
8 – Deve ser promovida uma articulação eficaz entre os vários tipos e níveis de cuidados de saúde,
assegurando que estes são prestados de acordo com as necessidades, centrados no cidadão e assegurando a
sua liberdade de escolha, com equidade, qualidade e segurança e nos tempos clinicamente adequados à
situação concreta.
9 – No funcionamento articulado do Serviço Nacional de Saúde deve ser promovida a integração em rede
dos profissionais com recurso às tecnologias da saúde e de informação ao serviço das mais adequadas
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prestações de saúde.
10 – A escolha dos titulares dos órgãos de administração, fiscalização e consulta das entidades que integram
o Serviço Nacional de Saúde deve ser feita de acordo com critérios de competência e mérito para a função, e
com os princípios da concorrência, da publicidade, da transparência e da igualdade.
11 – O ministério responsável pela área da saúde deve assegurar, como vetor de qualidade do Serviço
Nacional de Saúde, os mais elevados níveis de preparação científica e profissionalismo, selecionando os
melhores profissionais, assegurando a sua progressão na carreira, através de provas públicas, e a retribuição
com base no mérito e facultando-lhes a adequada formação ao longo da vida.
12 – A liderança das equipas multiprofissionais e interdisciplinares é estabelecida em função da
responsabilidade pela prestação de saúde e é exercida com reconhecimento da autonomia e respeito pelos atos
próprios de cada profissão, com possibilidade de delegação de competências desde que salvaguardadas a
qualidade e a segurança dos cuidados.
13 – Ao Serviço Nacional de Saúde incumbe ainda promover, nos seus estabelecimentos e serviços, a
investigação e o ensino e a formação.
14 – A qualidade assistencial e os cuidados de saúde prestados devem obedecer à melhor evidência
publicada e disponível na prática clínica.
15 – Os cuidados de saúde prestados e os resultados obtidos devem ser criteriosamente medidos e
publicados com transparência, incluindo variáveis de oferta e de procura de cuidados, de produção e de
qualidade.
Base XXIV
Beneficiários do Serviço Nacional de Saúde
1 – São beneficiários do Serviço Nacional de Saúde todos os cidadãos portugueses.
2 – São igualmente beneficiários do Serviço Nacional de Saúde os cidadãos, com residência permanente ou
em situação de estada ou residência temporárias em Portugal, que sejam nacionais de Estados-Membros da
União Europeia ou equiparados, nacionais de países terceiros ou apátridas, nos termos do regime jurídico
aplicável.
3 – O Serviço Nacional de Saúde presta ainda assistência em saúde aos reclusos dos estabelecimentos
prisionais, nos termos definidos pelos membros do Governo responsáveis pelas áreas da saúde e da justiça.
Base XXV
Prestações públicas de saúde
1 – Realizam prestações públicas de saúde o Serviço Nacional de Saúde, outras entidades públicas que
desenvolvam atividades de promoção, prevenção e tratamento na área da saúde e os estabelecimentos ou
instituições dos setores de economia social e privado e os profissionais em regime liberal ou grupos de
profissionais que tenham contrato, convenção ou acordo com o Estado, através do ministério responsável pela
área da saúde, ou com outro ente público, nos termos da lei.
2 – Para garantir o acesso em tempo clinicamente adequado às necessárias prestações de saúde em áreas
não asseguradas pelo setor público, os contratos, convenções ou acordos para a realização de prestações
públicas de saúde do Serviço Nacional de Saúde ficam sujeitos à avaliação da necessidade designadamente
atenta a capacidade instalada e aos princípios da qualidade e da segurança, da eficácia, da efetividade, da
eficiência e da economia que devem presidir à justificação da decisão da sua celebração e os princípios da
concorrência e da transparência quanto à escolha do prestador.
3 – Na celebração e na execução dos contratos, convenções ou acordos para a realização de prestações
públicas de saúde do Serviço Nacional de Saúde:
a) Deve ser salvaguardado pelo ente público que é estabelecido e observado o dever de atuação em
conformidade com os princípios do Serviço Nacional de Saúde;
b) Devem igualmente ser estabelecidos e fiscalizados regularmente parâmetros de qualidade de atividade
assistencial para garantia da qualidade das prestações de saúde;
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c) Devem ser respeitadas as orientações técnicas emanadas do ministério responsável pela área da saúde;
d) Devem as entidades prestadoras fornecer atempadamente as informações necessárias ao
acompanhamento do contrato, convenção ou acordo, bem como a informação relevante para efeitos da Base
XXIX.
4 – A execução de prestações públicas de saúde realizada pelos estabelecimentos, instituições ou grupos
de profissionais está sujeita a fiscalização e acompanhamento pelo contraente público no quadro do Serviço
Nacional de Saúde.
5 – Para efeitos de fiscalização e acompanhamento da execução dos contratos, convenções ou acordos para
a realização de prestações públicas de saúde do Serviço Nacional de Saúde, o contraente público deve designar
um gestor do contrato, com a função de acompanhar permanentemente a execução destes, em especial o
respeito por uma atuação conforme com os princípios e as características do Serviço Nacional de Saúde, da
observância das regras e dos parâmetros de qualidade e os direitos das pessoas em contexto de saúde.
6 – Os termos da contratação, convenção ou celebração de acordos para a realização de prestações públicas
de saúde devem ser desenvolvidos por lei.
7 – A lei pode estabelecer que a contratação da realização de prestações públicas de saúde dite a integração
do estabelecimento no Serviço Nacional de Saúde, nos termos a estabelecer no respetivo contrato.
8 – A lei pode prever, com respeito pelos princípios e regras definidos na presente Base, a celebração de
contratos-programa com autarquias locais ou outras pessoas coletivas públicas para a realização de prestações
públicas de saúde.
9 – Os encargos com o acompanhamento dos contratos, convenções ou acordos celebrados nos termos da
presente Base devem ser contabilizados para efeitos de avaliação da eficiência.
Base XXVI
Assistência no estrangeiro
1 – A referenciação para o estrangeiro dos beneficiários do Serviço Nacional de Saúde para prestações de
saúde necessárias nas condições exigíveis de qualidade, segurança, efetividade e tempo clinicamente
recomendado, constituindo encargo do Serviço Nacional de Saúde, deve verificar-se nas seguintes situações:
a) Em matéria de assistência mútua no quadro da União Europeia ou no âmbito das redes europeias de
referência entre os prestadores de cuidados de saúde e os centros de especialização nos Estados-Membros;
b) Em circunstâncias excecionais em que não seja possível garantir essas prestações em Portugal e em que
seja possível fazê-lo no estrangeiro.
2 – A lei regula as condições da referenciação para o estrangeiro, bem como o acesso a cuidados de saúde
transfronteiriços.
Base XXVII
Financiamento público
1 – As prestações públicas de saúde são financiadas por verbas do Orçamento do Estado transferidas para
o ministério responsável pela área da saúde, sem prejuízo de outras receitas.
2 – O financiamento dos estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde é estabelecido através
de mecanismos de contratualização com o ministério responsável pela área da saúde e definidos por diploma
próprio, de acordo com critérios objetivos e mensuráveis que maximizem a autonomia dos estabelecimentos em
causa e visem ganhos em saúde, atendendo, designadamente, à prestação a realizar, aos níveis de qualidade
e aos resultados a atingir, à otimização da capacidade instalada dos estabelecimentos e serviços do Serviço
Nacional de Saúde e a critérios de gestão eficiente, nomeadamente o valor gerado para os doentes atendidos.
3 – Para defesa da sustentabilidade do pilar social em que assenta o direito dos cidadãos à saúde, institui-
se o princípio concorrencial dentro dos serviços do Serviço Nacional de Saúde e entre os setores público, privado
e social, para que se gerem melhores resultados e maior eficiência, devendo o Estado adquirir serviços de
saúde, em igualdade de circunstâncias, aos prestadores públicos, privados e sociais.
4 – A realização de investimentos em formação de profissionais, infraestruturas, equipamentos e tecnologias
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da saúde e dos sistemas de informação e de comunicação obedece a uma programação plurianual, que
discrimina os respetivos objetivos e os correspondentes encargos financeiros a assumir em cada ano
económico.
5 – Os serviços e estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde podem cobrar as seguintes receitas, a
inscrever nos seus orçamentos próprios:
a) Dotações, comparticipações e subsídios do Estado ou de outras entidades;
b) O pagamento de cuidados por parte de terceiros legal ou contratualmente responsáveis;
c) O pagamento de cuidados prestados a não beneficiários do Serviço Nacional de Saúde quando não há
terceiros responsáveis;
d) O pagamento por serviços prestados, designadamente no âmbito da investigação em saúde, ou utilização
temporária de instalações ou equipamentos por entidades exteriores ao Serviço Nacional de Saúde, nos termos
da lei;
e) O produto de rendimentos próprios;
f) O produto de alienação de bens próprios e da constituição de direitos sobre os mesmos;
g) O produto de donativos;
h) O produto de taxas e coimas previstas na lei.
6 – Os modelos de financiamento devem refletir a tradução da qualidade em valor para o utente, harmonizada
com os dados de produção. O valor para o utente constitui a medida de sucesso e é definido como um rácio
entre os resultados de saúde alcançados e os custos suportados para o alcance desses resultados.
7 – Para o efeito referido no número anterior, deverão ser adotadas as melhores práticas, diferenciando o
valor das terapêuticas e de inovação farmacêutica alcançando os melhores resultados aos menores custos e,
assim, assegurando a sustentabilidade do sistema.
8 – São asseguradas a medição e publicação de resultados para estes modelos de financiamento.
Base XXVIII
Taxas moderadoras
1 – Com o objetivo de orientar a procura e moderar a procura desnecessária, sem pôr em causa o acesso às
prestações de saúde necessárias, a lei pode prever a cobrança de taxas moderadoras pelas prestações públicas
de saúde, determinando a isenção de pagamento em situações de interesse de saúde pública, de maior risco
de saúde ou de insuficiência económica.
2 – A lei estabelece limites ao montante total de taxas moderadoras a cobrar por episódio e por ano.
Base XXIX
Avaliação permanente
1 – A realização das prestações públicas de saúde está sujeita a avaliação permanente, baseada em
informações de natureza estatística, epidemiológica, administrativa, de desempenho e de qualidade
assistenciais, incluindo designadamente informação sobre os resultados assistenciais, a adequação dos
procedimentos técnico-científicos, os tempos de espera, o nível de satisfação da população e dos profissionais
e a eficiência da utilização dos recursos.
2 – Esta informação é tratada em sistema completo e integrado que abrange todos os tipos de cuidados e
todas as entidades que realizem prestações públicas de saúde.
3 – É da responsabilidade do ministério responsável pela área da saúde a divulgação pública e periódica da
informação e da avaliação referidas nos números anteriores.
Base XXX
Outras atividades complementares
1 – As atividades que se destinem a facultar meios materiais ou de organização indispensáveis à prestação
de cuidados de saúde, atenta a sua instrumentalidade para a qualidade dessa prestação e independentemente
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da natureza do prestador, estão sujeitas a regras próprias e à disciplina e inspeção, de forma articulada, do
ministério responsável pela área da saúde e, sendo caso disso, de outros ministérios ou entidades competentes.
2 – Nas atividades referidas no número anterior incluem-se nomeadamente a colheita, distribuição e
utilização de produtos biológicos, bem como a produção e distribuição de bens e produtos alimentares, a
produção, a comercialização e a instalação de equipamentos e bens de saúde, as tecnologias de informação de
saúde, o estabelecimento e exploração de seguros de saúde, o transporte de doentes e o tratamento de
resíduos.
Base XXXI
Tecnologias da saúde
1 – As tecnologias da saúde, designadamente os medicamentos, os dispositivos médicos e os procedimentos
médicos ou cirúrgicos, bem como outras utilizadas na prevenção, no diagnóstico ou no tratamento de doenças,
devem ser desenvolvidas e utilizadas de forma a garantir a proteção da saúde, a satisfação das necessidades
em saúde das pessoas e a qualidade, eficácia, eficiência e segurança das tecnologias.
2 – A sujeição a regimes de autorização, avaliação de impacto e benefício-custo, produção, distribuição,
comercialização e utilização das tecnologias da saúde, assim como a sua disciplina e fiscalização por parte do
Estado, são objeto de legislação específica.
Base XXXII
Inovação em saúde
1 – O Estado deve promover o acesso equitativo à inovação em saúde nas suas vertentes integradas e
complementares de ciências de informação e comunicação, nanotecnologia, genética e computação, em
particular no recurso à inteligência artificial e à robótica.
2 – O Estado deve promover uma política do medicamento sólida, racional e custo-efetiva, de acordo com os
mais elevados padrões técnico-científicos, por forma a assegurar a todos os que deles necessitam o acesso aos
medicamentos com real mais-valia terapêutica, face aos já existentes.
3 – A aplicação das novas tecnologias deve reforçar a humanização, garantir a resposta adequada às
necessidades das pessoas e a qualidade nas prestações de saúde, com respeito pelos direitos fundamentais,
bem como a critérios éticos devidamente enquadrados, nomeadamente atendendo ao papel do Conselho
Nacional de Ética para as Ciências da Vida enquanto órgão consultivo independente, que tem por missão
analisar os problemas éticos suscitados pelos progressos científicos nos domínios da biologia, da medicina ou
da saúde em geral e das ciências da vida.
Base XXXIII
Saúde digital
1 – O Estado deve promover, com garantia da proteção dos dados pessoais e da cibersegurança, a utilização
segura e eficiente das tecnologias de informação e comunicação no âmbito da prestação de cuidados de saúde,
da gestão dos serviços de saúde, da vigilância em saúde, da literacia para a saúde, do ensino, da formação, da
investigação e da análise e do tratamento de grandes volumes de dados.
2 – Nos termos do número anterior, as tecnologias de informação e comunicação apoiam uma abordagem
integrada e centrada nas pessoas com vista à melhoria da prestação em saúde, à salvaguarda do acesso
equitativo a serviços de saúde de qualidade, à gestão eficiente dos recursos, ao controlo da sua utilização e à
avaliação do desempenho dos estabelecimentos de saúde e da realização de prestações em saúde.
3 – A saúde digital compreende nomeadamente registos de saúde eletrónicos, registos centralizados
assentes em plataformas únicas, ferramentas eletrónicas de auxílio à decisão, telessaúde, sistemas de
monitorização à distância, ensino por meios eletrónicos, aplicações móveis e redes sociais, partilha da
informação e do conhecimento entre profissionais de saúde e entre entidades prestadoras de cuidados de saúde
independentemente da respetiva natureza, com respeito pelas finalidades determinadas, explícitas e legítimas
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que presidiram à recolha dos dados.
4 – No âmbito da saúde digital, devem ser observados critérios éticos devidamente enquadrados,
nomeadamente atendendo ao papel do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida enquanto órgão
consultivo independente, que tem por missão analisar os problemas éticos suscitados pelos progressos
científicos nos domínios da biologia, da medicina ou da saúde em geral e das ciências da vida.
Base XXXIV
Terapêuticas não convencionais
1 – O exercício das terapêuticas não convencionais é regulado pela lei, efetuado de modo integrado com as
terapêuticas convencionais e de forma a garantir a proteção da saúde das pessoas e das comunidades, a
qualidade assistencial e tendo por base a melhor evidência científica.
2 – É competência do ministério responsável pela área da saúde a credenciação, tutela e fiscalização da
prática das terapêuticas não convencionais, de acordo com a definição aprovada pela Organização Mundial de
Saúde.
Base XXXV
Sistema de saúde
1 – O sistema de saúde integra todas as entidades que atuem na prestação de cuidados de saúde.
2 – O sistema de saúde orienta-se para a proteção e a garantia da dignidade e integridade da pessoa
humana, devendo a lei regular a existência de comissões de ética e de humanização nos estabelecimentos
prestadores de saúde.
3 – A prestação de cuidados de saúde por entidades dos setores de economia social e privado e por
profissionais em regime liberal obedece aos princípios da livre iniciativa, com salvaguarda das regras que
regulam nomeadamente a concorrência e a instalação de equipamentos médicos pesados.
4 – Os setores público, de economia social e privado devem atuar entre si de acordo com um princípio de
cooperação e com um princípio de separação pautado por regras de transparência e imparcialidade.
5 – A cooperação dos setores público, de economia social e privado é ainda pautada pelos princípios da
eficiência, da transparência, da avaliação e da regulação.
6 – A cooperação entre os setores público, de economia social e privado é determinada de acordo com as
necessidades, a garantia de acesso e dos demais direitos das pessoas em contexto de saúde, a prestação a
realizar, a qualidade das prestações de saúde, os resultados a atingir, a otimização da capacidade instalada dos
estabelecimentos e serviços do Serviço Nacional de Saúde, a critérios de gestão eficiente e a demonstração de
eficiência e os ganhos em saúde.
7 – Cabe ao legislador estabelecer mecanismos de garantia de acesso equitativo aos cuidados de saúde e
fixar mecanismos de sanção por seleção adversa e indução indevida da procura.
8 – O Estado, através dos órgãos competentes, fiscaliza a realização de prestações de saúde por sujeitos
privados ou por entidades dos setores de economia social e privado, com vista a garantir a qualidade das
prestações e um nível elevado de proteção da saúde humana.
9 – A abertura, a modificação e o funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde,
qualquer que seja a sua denominação, natureza jurídica ou entidade titular da sua gestão, são disciplinados por
lei com vista a garantir a qualidade e a segurança nas prestações e são titulados por licença ou outro meio
idóneo.
10 – Cabe ao legislador desenvolver os requisitos técnicos e de higiene, segurança e salvaguarda da saúde
pública dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde.
11 – Os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde devem funcionar de acordo com o regime legal
e regulamentar aplicável e com as normas científicas e técnicas aplicáveis.
12 – No desenvolvimento da sua atividade, os profissionais dos estabelecimentos prestadores de cuidados
de saúde devem observar o cumprimento das regras científicas, éticas e deontológicas aplicáveis.
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Base XXXVI
Conselho Nacional de Saúde
1 – O Conselho Nacional de Saúde é um órgão independente, que desempenha funções consultivas do
Governo na definição das políticas de saúde e representa os interessados no funcionamento do sistema de
saúde, visando a melhoria dos resultados em saúde.
2 – O Conselho Nacional de Saúde deve incluir representantes das pessoas em contexto de saúde.
3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, a composição, a competência e o funcionamento do
Conselho Nacional de Saúde são definidos por lei.
Base XXXVII
Entidades do setor de economia social com objetivos de saúde
As entidades do setor de economia social com objetivos de saúde intervêm na ação comum a favor da saúde
da comunidade e dos indivíduos, de acordo com a presente lei e demais legislação específica aplicável, o
princípio da cooperação e a salvaguarda do primado do interesse da pessoa em contexto de saúde.
Base XXXVIII
Seguros privados de saúde
1 – Os seguros privados de saúde são de adesão voluntária.
2 – A celebração dos contratos de seguro de saúde deve ser precedida da prestação, pela entidade
seguradora, de informação atempada, clara e inteligível, quanto às condições do seguro, âmbito e limites da
cobertura, incluindo informação expressa quanto à eventual interrupção ou descontinuidade de prestação de
cuidados de saúde caso sejam alcançados os limites contratualmente estabelecidos, de forma a permitir uma
decisão esclarecida.
3 – Os estabelecimentos de saúde informam as pessoas sobre os custos a suportar pela prestação de
cuidados de saúde ao abrigo de seguros privados de saúde, incluindo para a totalidade da intervenção proposta.
CAPÍTULO V
Dos profissionais
Base XXXIX
Profissionais de saúde
1 – Os profissionais de saúde desempenham uma relevante função social ao serviço das pessoas e da
comunidade.
2 – São profissionais de saúde aqueles que realizam atividades técnicas relacionadas com as prestações de
saúde e estão sujeitos a direitos e a deveres especiais e a regras éticas e deontológicas próprias,
designadamente os médicos, os enfermeiros, os farmacêuticos, os médicos dentistas, os psicólogos, os
nutricionistas, os assistentes sociais, os terapeutas, os profissionais do Instituto Nacional de Emergência
Médica, IP, bem como os terapeutas não convencionais devidamente regulamentados e detentores de cédula
profissional.
3 – A lei estabelece os requisitos indispensáveis ao exercício de uma profissão de saúde.
4 – A política de recursos humanos para a saúde visa satisfazer as necessidades da população, garantir a
formação, a estabilidade e a motivação dos profissionais, prevenindo conflitos de interesse entre a atividade
pública e a atividade privada, satisfazer as necessidades dos serviços de saúde de profissionais qualificados,
em particular do Serviço Nacional de Saúde, e assegurar uma adequada cobertura no território nacional.
5 – O ministério responsável pela área da saúde organiza um registo nacional de todos os profissionais de
saúde, sem prejuízo da inscrição obrigatória numa associação profissional de direito público.
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6 – Os profissionais de saúde são inscritos na respetiva associação profissional de direito público, caso
exista, funcionando a inscrição como registo nacional dos profissionais, sendo facultada ao ministério
responsável pela área da saúde sempre que por este solicitada.
Base XL
Direitos e deveres dos profissionais de saúde
1 – A lei consagra os direitos e deveres dos profissionais de saúde, designadamente os de natureza
deontológica, sem prejuízo das competências próprias das Ordens profissionais.
2 – São, nomeadamente, direitos dos profissionais de saúde:
a) Exercer a sua atividade, desde que detenham as habilitações legalmente exigidas e sejam portadores de
cédula profissional;
b) Aceder à formação e ao aperfeiçoamento profissionais;
c) Contribuir para a gestão rigorosa, eficaz e eficiente dos recursos existentes;
d) Constituir associações de profissionais que podem revestir a natureza de associações públicas, quando
seja considerado necessário ao correto exercício da profissão;
e) Exercer a objeção de consciência.
3 – Os profissionais de saúde com deficiência ou com doença crónica incapacitante têm direito a que sejam
adotadas medidas apropriadas para adaptar as condições de trabalho às suas necessidades, quer quanto ao
acesso aos locais de trabalho, às tecnologias e sistemas de informação e de comunicação, quer quanto à
formação profissional inicial e contínua.
4 – São, nomeadamente, deveres dos profissionais de saúde:
a) Observar as regras técnicas, éticas e deontológicas da sua profissão;
b) Respeitar os direitos da pessoa a quem prestam cuidados;
c) Guardar sigilo profissional sobre a informação de que tomem conhecimento no exercício da sua atividade;
d) Facilitar à pessoa a quem prestam cuidados a liberdade de escolha do profissional de saúde;
e) Atuar na sua área de competência, reconhecendo a especificidade das outras profissões de saúde, com
salvaguarda dos limites decorrentes da existência de competências diferenciadas;
f) Contribuir para a salvaguarda da saúde pública.
5 – A lei estabelece as incompatibilidades dos profissionais de saúde.
Base XLI
Formação do pessoal de saúde
1 – A formação, o aperfeiçoamento e a atualização profissionais, incluindo a formação ao longo da vida do
pessoal de saúde, constituem um objetivo fundamental a prosseguir.
2 – A formação do pessoal deve assegurar uma elevada qualificação técnico-científica tendo em conta a
natureza da atividade prestada, com vista ao respeito pela dignidade e pelos direitos da pessoa em contexto de
saúde, ao reforço do sentido da responsabilidade profissional pela prestação de cuidados de saúde com
qualidade e segurança, da comunicação interpessoal e da necessidade de utilização eficiente dos recursos
disponíveis.
3 – O ministério responsável pela área da saúde colabora com o ministério responsável pelo ensino superior
nas atividades públicas de ensino e formação na área das ciências da saúde que estiverem a cargo deste,
designadamente através da indicação das competências que entende por adequado que sejam adquiridas na
formação pré-graduada e pós-graduada, facultando os seus serviços para aquelas atividades e realizando as
que lhe estiverem cometidas por lei nesse domínio.
4 – A formação dos profissionais de saúde pode, também, ocorrer em instituições dos setores privado e
social, desde que lhes seja atribuída idoneidade formativa por parte das respetivas Ordens profissionais e não
dependendo de financiamento do Orçamento do Estado.
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5 – Deve ser considerada formação em organização dos sistemas de saúde e percurso do cidadão no sistema
de saúde, gestão e economia de saúde, e formação digital em saúde.
6 – Deve também ser reforçada a formação conjunta entre profissionais de saúde, como forma de estimular
o trabalho de equipa e multidisciplinar, bem como a reciclagem de conhecimentos nestas áreas.
Base XLII
Estatuto dos profissionais de saúde e outros trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde
1 – Os trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde têm um regime jurídico próprio, independentemente da
natureza da relação jurídica de emprego.
2 – As carreiras dos profissionais de saúde do Serviço Nacional de Saúde são unitárias e aplicáveis
independentemente da natureza da relação jurídica de emprego, cabendo à lei estabelecer as condições e os
critérios de progressão nomeadamente através de provas públicas.
3 – Os postos de trabalho existentes nas pessoas coletivas públicas do Serviço Nacional de Saúde podem
ser preenchidos por quaisquer trabalhadores independentemente da natureza da relação jurídica de emprego.
4 – Os profissionais de saúde do Serviço Nacional de Saúde carecem, nos termos gerais, de autorização do
ministério responsável pela área da saúde para exercerem funções privadas, não podendo ser autorizada a
acumulação de funções se daí resultarem prejuízos ou, direta ou indiretamente, encargos para o Serviço
Nacional de Saúde, e deve ser criado um registo para o efeito.
5 – A lei estabelece as formas de remuneração e de incentivos financeiros ou de outra natureza, assentes
em critérios objetivos de avaliação do desempenho, com base no mérito e nos resultados.
6 – A lei pode criar incentivos financeiros ou de outra natureza que promovam a dedicação exclusiva e a
investigação em saúde e para a saúde
Base XLIII
Contratação coletiva no âmbito do Serviço Nacional de Saúde
1 – Independentemente da natureza da relação jurídica de emprego, as condições de trabalho dos
trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde são objeto de contratação coletiva conjunta, de acordo com o
disposto em lei especial.
2 – É atribuída capacidade às pessoas coletivas que integram o Serviço Nacional de Saúde para celebrar
convenções coletivas de trabalho de nível local que deve ser articulada com os restantes níveis de contratação
coletiva nos termos da lei.
Base XLIV
Profissionais de saúde em regime liberal
1 – Os profissionais que prestam cuidados de saúde em regime de profissão liberal desempenham função
de importância social reconhecida e protegida pela lei.
2 – Os profissionais de saúde em regime liberal devem ser titulares de seguro contra os riscos decorrentes
do exercício da sua atividade.
Base XLV
Fiscalização da atividade dos profissionais de saúde
Todos os profissionais de saúde estão sujeitos à fiscalização do ministério responsável pela área da saúde,
sem prejuízo das atribuições das Ordens Profissionais e de outras entidades legalmente competentes.
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CAPÍTULO VI
Das Regiões Autónomas e do poder local
Base XLVI
Regiões Autónomas
1 – A organização, o funcionamento e o desenvolvimento dos sistemas regionais de saúde nas Regiões
Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como a definição e a execução da respetiva política de saúde cabem
aos órgãos próprios, em obediência aos princípios estabelecidos pela Constituição da República e pela presente
lei.
2 – A aplicação da presente lei às Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira não prejudica a
regulamentação própria em matéria de organização e funcionamento, bem como a regionalização dos serviços
de saúde.
3 – Na promoção e na defesa da realização regional do direito à proteção da saúde, e de acordo com os
princípios de solidariedade e de unidade nacionais, podem o Governo da República e os Governos Regionais,
através dos respetivos serviços públicos de saúde, estabelecer a articulação e a referenciação para efeitos do
acesso às prestações de saúde necessárias.
Base XLVII
Autarquias locais
1 – As autarquias locais participam na realização do direito à proteção da saúde, no âmbito das suas
atribuições e sem prejuízo de eventual delegação ou transferência de competências do Estado e de outras
entidades públicas, assegurando-se que a eventual delegação ou transferência de competências não resulta
numa desresponsabilização por parte do Estado.
2 – A intervenção das autarquias locais manifesta-se, designadamente, no apoio aos sistemas locais de
saúde, com especial incidência nos cuidados de proximidade e nos cuidados na comunidade, bem como no
planeamento da rede de estabelecimentos prestadores e na participação nos órgãos de acompanhamento e de
avaliação do sistema de saúde.
3 – Deve ser igualmente promovida a participação das autarquias locais na ação comum a favor da promoção
da saúde individual e da saúde coletiva e designadamente na atuação sobre as determinantes de saúde, na
prevenção da doença e dos riscos para a saúde, na educação para a saúde, na promoção da atividade física,
na melhoria das condições económicas, sociais e culturais na população e na salvaguarda de um ambiente
saudável.
4 – Na elaboração dos planos municipais de ordenamento do território e de outros instrumentos territoriais,
devem as autarquias locais visar a promoção e a proteção da saúde e a prevenção da doença.
5 – Devem ainda as autarquias locais participar na prestação de apoio a pessoas vulneráveis, em parceria
com as entidades competentes da administração central e outras entidades dedicadas à promoção e à proteção
da saúde, podendo igualmente ser promovida a sua participação, em articulação com as estruturas centrais, na
construção e manutenção das instalações de saúde, no transporte de pessoas em contexto de saúde e noutros
serviços considerados adequados.
CAPÍTULO VII
Das relações internacionais
Base XLVIII
Relações internacionais
1 – Atendendo à universalidade, à indivisibilidade, à interdependência e à inter-relação dos direitos humanos
e ao caráter transnacional da saúde, o Estado Português assume na comunidade internacional as
responsabilidades que lhe cabem nesta área.
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2 – O Estado Português apoia as organizações internacionais, desenvolve a sua política de acordo com as
orientações dessas organizações, nomeadamente da Organização Mundial de Saúde, e garante o cumprimento
dos compromissos internacionais a que está vinculado.
3 – O Estado Português, através da diplomacia em saúde, desenvolve uma política de cooperação
internacional que incida na melhoria sustentável da saúde e do bem-estar humano, numa perspetiva de saúde
global, e no contexto das Organizações Internacionais, designadamente, a Organização das Nações Unidas, o
Conselho da Europa, a União Europeia, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e a Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Económico.
4 – O Estado garante a implementação de mecanismos de alerta rápida e de resposta, no quadro
internacional e dos instrumentos existentes, perante doenças novas ou emergentes, emergências em saúde
pública e ameaças sanitárias transfronteiriças, em especial atentas as rápidas modificações do padrão de saúde
e doença num mundo globalizado.
5 – É ainda promovida a cooperação bilateral, no âmbito da saúde, em particular com os Estados-Membros
da União Europeia e com os Estados que integram a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
Base XLIX
União Europeia
1 – O Estado Português participa no processo de tomada de decisão e nas ações desenvolvidas no âmbito
da União Europeia, seguindo uma abordagem intersectorial das políticas públicas da União, designadamente
através de estudos de impacto na saúde, e de reforço da coesão económica, social e territorial e da redução
das desigualdades, tendo em vista assegurar o mais elevado nível de proteção da saúde.
2 – O Estado Português garante a cooperação na vigilância das ameaças graves para a saúde com dimensão
transfronteiriça, no alerta em caso de tais ameaças e no combate contra as mesmas.
3 – Enquanto Estado-Membro, Portugal assegura a nível interno a execução das decisões europeias, sem
prejuízo das competências do Estado Português na definição e execução das políticas de saúde, na organização
e gestão dos serviços de saúde, na afetação dos recursos e na prestação de cuidados de saúde.
4 – Para garantia de um elevado nível de proteção da saúde e redução das desigualdades, deve ser
promovida a cooperação através de mecanismos dedicados e regulado o acesso em matéria de cuidados de
saúde transfronteiriços.
Base L
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Portugal privilegia o reforço da cooperação recíproca no quadro da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa em matéria de sistemas de saúde e de investigação em saúde e para a saúde, promovendo a
colaboração em políticas e planos estratégicos, nacionais e transnacionais, em matéria de saúde,
designadamente nas componentes de recursos humanos, do medicamento, das infraestruturas, do
financiamento e da gestão, bem como a partilha e a divulgação de conhecimento em acesso aberto e em língua
portuguesa na área da saúde.
CAPÍTULO VIII
Da conciliação da política de saúde com outras políticas sectoriais
Base LI
Transversalidade e integração
1 – A transversalidade da política de saúde impõe a sua consideração em todos os setores da vida
económica, social e cultural, e obriga à sua articulação e integração com as demais políticas setoriais, visando
a promoção de relações de coerência e de complementaridade entre elas.
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2 – Deverá ser especialmente acautelada uma articulação permanente e conjunta entre as áreas da saúde,
do trabalho, da segurança social, da solidariedade e das finanças, com o objetivo de se assegurar uma rápida
e ágil prossecução de políticas sociais e laborais, de reabilitação, e de cuidados de saúde específicos.
3 – Deve ser promovido o alargamento do leque de intervenientes na saúde enquanto fator global, agindo
sobre as determinantes da saúde e combatendo iniquidades de género, geográficas ou etárias.
4 – No sentido de promover e acautelar os princípios e objetivos da política de saúde, os bens de saúde
devem ser ponderados com outros bens fundamentais, de forma a assegurar a sua interdependência, num
exercício de compatibilização que inclua uma avaliação de cenários alternativos e que promova a realização do
interesse público no médio e longo prazo.
Base LII
Investigação
1 – É apoiada a investigação em saúde e para a saúde, devendo ser estimulada a colaboração neste domínio
entre o ministério responsável pela área da saúde e os estabelecimentos de ensino superior, os organismos
responsáveis pela investigação científica e tecnológica e outras entidades.
2 – O Estado incentiva a participação portuguesa em programas de investigação no campo da saúde levados
a efeito por redes de investigação internacionais ou por organizações internacionais, designadamente no âmbito
da União Europeia.
3 – É reconhecida a liberdade de investigação em saúde, com obediência aos seguintes princípios:
a) Respeito pela dignidade e os direitos fundamentais, a segurança e o bem-estar das pessoas que nela
participam;
b) Realização em seres humanos apenas se não houver alternativa de eficácia comparável;
c) Ter como finalidade, nas situações em que não seja previsível um benefício direto para a saúde da pessoa
envolvida, contribuir para a obtenção de resultados que permitam benefício para outras que sofram da mesma
doença ou condição;
d) Não comportar para a pessoa envolvida riscos e incómodos desproporcionais face aos potenciais
benefícios;
e) Integridade, transparência e responsabilidade na investigação;
f) Ter sido aprovada pela instância competente após apreciação independente sobre o seu mérito científico
e aceitabilidade ética;
g) Realização de acordo com as regras da boa prática de investigação, nomeadamente as aplicáveis à
investigação em seres humanos e à investigação em animais;
h) Obtenção de consentimento livre e esclarecido, específico e escrito da pessoa que nela participa, o qual
pode ser livremente revogado, em qualquer momento, sem que tal implique qualquer discriminação no acesso
a cuidados de saúde de que venha a necessitar;
i) Assegurar a especial proteção às pessoas incapazes de nela consentir;
j) Atender a variáveis suscetíveis de condicionar os resultados obtidos, como sejam o sexo, o género, a
idade e a condição económica e social das pessoas sobre que incidem;
k) Promover a inclusão de grupos sub-representados, nomeadamente de mulheres, sempre que tal se
afigure como potencialmente benéfico;
l) Não ter como contrapartida quaisquer incentivos ou benefícios financeiros para a pessoa envolvida, sem
prejuízo do reembolso de despesas e do ressarcimento pelos prejuízos sofridos com a participação na
investigação;
m) Ser acompanhada de seguro que cubra a responsabilidade civil do promotor e do investigador, nos casos
e nos termos da lei.
4 – As condições a que deve obedecer a investigação em saúde, em particular a experimentação em seres
humanos e os ensaios clínicos de medicamentos e de dispositivos médicos, são definidas em diploma próprio.
5 – Deve ser promovida a investigação e inovação através da alocação de recursos humanos e materiais,
bem como através da valorização da investigação nas carreiras, a definir em legislação própria.
6 – Através da função de Observatório de Saúde, devem ser definidas áreas prioritárias para a investigação
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clínica e inovação nos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde.
7 – Deve ser apoiada a investigação e inovação com interesse para a saúde nacional, promovendo a
colaboração entre os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, universidades e outras entidades
públicas, sociais ou privadas que desenvolvam, promovam ou financiem a investigação em Saúde.
8 – Deve conferir-se especial importância à investigação aplicada e ensaios clínicos enquanto via estratégica
para ganhos em saúde e educação médica, poupanças para os hospitais e fontes de financiamento para os
mesmos.
9 – Para efeitos do número anterior, os estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde devem ser
devidamente capacitados para captar investigação e inovação.
Base LIII
Empreendedorismo
1 – São promovidas a inovação e a investigação associadas ao empreendedorismo e à criação de valor
social e económico na área da saúde.
2 – O Estado incentiva as melhores práticas empreendedoras e a proteção das invenções e das criações
intelectuais na área de saúde, nomeadamente através do apoio ao registo das respetivas patentes.
Base LIV
Instrumentos de avaliação
1 – Os programas, planos e projetos, públicos ou privados, que possam afetar a saúde pública, devem estar
sujeitos a avaliação de impacto com vista a assegurar que contribuem para o aumento do nível de saúde da
população.
2 – A aludida avaliação visa assegurar que o processo de tomada de decisão integra a ponderação dos
impactos relevantes em termos de saúde, económicos, sociais, culturais e ambientais, tendo em conta o nível
de saúde pública já alcançado, a ponderação de alternativas, os efeitos cumulativos decorrentes de outros
programas em execução, bem como os contributos recebidos designadamente através de participação pública.
3 – Essa avaliação compete ao ministério responsável pela área da saúde.
Base LV
Relatório sobre o estado do sistema de saúde
O Governo apresenta à Assembleia da República, anualmente, um relatório sobre o estado do sistema de
saúde em Portugal, referente ao ano anterior.
CAPÍTULO IX
Disposições finais e transitórias
Base LVI
Regulamentação e aplicação
1 – O Governo promove, no prazo de um ano, a adaptação da legislação em vigor e a adoção da legislação
complementar necessária para o desenvolvimento da presente lei, que contemple, designadamente, os
seguintes aspetos:
a) Direitos e deveres das pessoas em contexto de saúde, incluindo o direito à indemnização pelo dano injusto
causado na prestação de cuidados de saúde, promovendo meios expeditos de resolução de litígios em contexto
de saúde e o ressarcimento do dano anónimo;
b) Organização e funcionamento do Serviço Nacional de Saúde;
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c) Carreiras dos profissionais de saúde e outras disposições;
d) Inovação em saúde;
e) Sistemas de informação e proteção de dados em saúde.
2 – O eventual regime de transição que conste de disposições regulamentares a publicar para efeitos do
número anterior não pode afetar a tutela dos direitos legalmente protegidos dos trabalhadores do Serviço
Nacional de Saúde.
3 – Sem prejuízo do prazo previsto no n.º 1, deve o Governo, no prazo de dois anos, elaborar e apresentar,
para aprovação na Assembleia da República, um plano de desenvolvimento, com um horizonte temporal a médio
prazo e limite no ano 2030, que assegure a realização faseada e sustentada da presente lei e demais legislação
complementar.
Base LVII
Acompanhamento da Lei de Bases da Saúde
1 – Competirá à Entidade Reguladora da Saúde e ao Conselho Nacional da Saúde proceder a uma avaliação
independente sobre o cumprimento do presente diploma, nomeadamente:
a) Promover uma análise técnica sobre a aplicação da presente lei, em particular sobre o cumprimento e a
coerência na sua regulamentação;
b) Fiscalizar a estrita observância dos princípios e regras nela consagrados e a regulamentação devida
prevista na presente Lei;
c) Elaborar os pareceres que a Assembleia da República ou o Governo entendam necessários sobre
matérias nela previstas;
d) Apresentar eventuais propostas de revisão da presente lei que acompanhem a evolução demográfica,
socioeconómica e científica.
2 – Todas as entidades públicas, privadas e sociais que prestem serviços no âmbito do sistema de saúde
estão obrigadas ao fornecimento atempado de dados e aos esclarecimentos adicionais que lhes forem
solicitados.
Base LVIII
Norma revogatória
1 – É revogada a Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro.
2 – Até revogação expressa, mantêm-se em vigor as disposições legais e regulamentares aprovadas ao
abrigo do diploma referido no número anterior.
3 – Em tudo o que não for contrário às suas disposições, entendem-se feitas para este diploma todas as
referências ao diploma referido no n.º 1.
Base LIX
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 60 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 7 de janeiro de 2019.
Os Deputados do CDS-PP: Isabel Galriça Neto — Teresa Caeiro — Ana Rita Bessa — Assunção Cristas —
Nuno Magalhães — Cecília Meireles — Hélder Amaral — João Pinho de Almeida — Álvaro Castello-Branco —
Filipe Anacoreta Correia — António Carlos Monteiro — Ilda Araújo Novo — João Gonçalves Pereira — João
Rebelo — Patrícia Fonseca — Pedro Mota Soares — Telmo Correia — Vânia Dias da Silva.
————
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1928/XIII/4.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A ADOÇÃO DE PLANO DE AÇÃO DE CONTINGÊNCIA PARA
MINIMIZAR OS EFEITOS E CONSEQUÊNCIAS DE UMA SAÍDA DESORDENADA DO REINO UNIDO DA
UNIÃO EUROPEIA
(Texto inicial)
O cenário do Reino Unido da União Europeia uma saída sem acordo vai ganhando forma e crescente
probabilidade. Este quadro torna evidente a necessidade dos Estados-Membros se prepararem para os efeitos
negativos e potencialmente prejudiciais que resultam dessa circunstância.
Não é, portanto, de estranhar que o último Conselho Europeu de dezembro (13-14) tenha apelado «à
intensificação dos trabalhos de preparação, a todos os níveis, para as consequências da saída do Reino Unido,
tendo em conta todos os desfechos possíveis».
São muitas as áreas antevistas como sensíveis constantes da Comunicação da Comissão -Preparação para
a saída do Reino Unido da União Europeia em 30 de março de 20191 -, de 13 de novembro de 2018, que exigirão
resposta eficaz e em tempo útil no eventual cenário de saída não ordenada. As mais significativas são as
seguintes: cidadãos, serviços financeiros, transporte aéreo, transporte rodoviário, questões aduaneiras,
requisitos sanitários e fitossanitários, dados pessoais e política climática da UE. É importante notar que existem
outras áreas que, no caso português, deverão merecer medidas adicionais como seja o turismo e a
internacionalização (empresas a operar e exportar para o Reino Unido).
Em resumo, constata-se que o Portugal deverá ser capaz de assegurar estabilidade e previsibilidade
atempadas, no contexto de incerteza, minimizando os efeitos e consequências de uma saída desordenada do
RU, sendo importante apresentar tão rápido quanto possível o seu Plano de Contingência, de forma a evitar
bloqueios e a responder adequadamente «à necessidade de adaptar a legislação nacional e de adotar medidas
administrativas e práticas» nos sectores, à semelhança de outros Estados-Membros.
Neste contexto, há duas áreas que o CDS reputa de maior importância para concentrar esforços e os recursos
da política pública: os cidadãos e o apoio às empresas a exportar para o RU.
Em primeiro lugar, os cidadãos nacionais a residir no RU. Um cenário de saída desordenada adensa a
incerteza e as inquietações sobre a vasta comunidade portuguesa a residir e trabalhar em RU. São detetáveis
sentimentos de preocupação assinaláveis junto dos cerca 400 000 cidadãos nacionais que, persistentemente,
têm resistido a todo o processo do Brexit e às alterações inevitáveis que se anunciam.
Nesse sentido, é essencial assegurar respostas administrativas céleres e eficazes que garantam os direitos
dos cidadãos a residir e a trabalhar no RU. Uma solução possível para obstar a este tipo de sentimentos e a
uma eventual mas indesejável «corrida» aos consulados é redobrar as permanências consulares e reforçar os
meios humanos e técnicos, capazes de acautelar um processo de regularização da situação legal dos cidadãos
nacionais que residem e trabalham no RU.
No que respeita às empresas nacionais, impõe-se certamente a contenção de perdas, o controlo da
instabilidade e a mitigação da perturbação previsivelmente induzidas na dinâmica empresarial. As quase 3000
empresas nacionais a operar e exportar para o RU e o facto das exportações terem registado um aumento de
mais de 2% comparativamente a 2017 atestam uma forte dinâmica empresarial.
Assumindo que o mercado britânico representa o 4.º mercado de exportação de bens e serviços da economia
nacional e o n.º 1 ao nível dos serviços, com uma taxa de cobertura das importações pelas exportações acima
dos 200%, é absolutamente essencial consolidar o apoio ao investimento e à dinâmica empresarial aqui
evidenciada.
1 COM(2018) 880 final.
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Esta necessidade é, aliás, patente há muito tempo, mas nunca teve resposta adequada, até ao momento, do
Governo português. O Governo subvalorizou o cenário de uma saída desordenada do RU da União como rejeitou
proceder à dinamização de um processo de reflexão e discussão pública sobre as medidas a adotar, no âmbito
de um Plano de Contingência, mormente na vertente económica.
Uma prova clara de que o Governo não realizou devidamente esse processo de consulta pública reside no
facto de, na audição realizada com a CIP – Confederação Empresarial de Portugal, na Comissão de Assuntos
Europeus, no dia 4 de dezembro de 2018, a requerimento do Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre o estudo
«Brexit: As consequências para a economia e as empresas portuguesas», o Presidente da CIP ter afirmado
«não ter conhecimento que se esteja a desenrolar ou que haja alguma metodologia para planos de contingência»
por parte do Governo nem tão-pouco «que o Governo esteja a desenvolver qualquer estratégia para acautelar
ou minorar esta ou aquela situação», no contexto do Brexit.
O Governo português adotou como seu o referido estudo, não se conhecendo, até ao momento, e desde
então, ações adotadas pelo Governo português no sentido de minimizar as os riscos e potenciar as
oportunidades do Brexit para as empresas portuguesas, previstas no capítulo 8 – Conclusões e Recomendações
– do referido estudo.
Desde o final de 2018 que o CDS-PP tem, insistentemente, instado o Governo a desenvolver, sem demora,
um plano de contingência, face a um quadro de instabilidade decorrente de uma saída desordenada do RU.
Perante esse indesejável mas não improvável cenário, a urgência das nossas respostas representa uma
verdadeira condição de salvaguarda dos interesses nacionais.
Assim, em ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República resolve
recomendar ao Governo a adoção:
1 – Adote um Plano de Ação de Contingência transversal nas variadas áreas identificadas como sensíveis
no caso de uma saída desordenada do Reino Unido da União Europeia, constantes da Comunicação,
envolvendo os parceiros sociais e refletindo os seus contributos nas medidas sectoriais a adotar;
2 – Intensifique as permanências consulares e aposte numa maior capacidade de resposta dos serviços
consulares no Reino Unido nos processos de regularização da situação dos cidadãos nacionais a residir e
trabalhar no RU;
3 – Crie e operacionalize, no Plano de Ação de Contingência, uma linha de crédito vocacionada para o apoio
às empresas portuguesas que operam ou exportam para o Reino Unido;
4 – Lance, à margem do Plano de Ação, de forma planeada e eficaz uma campanha de informação orientada
para as empresas, e em particular para necessidade destas desenvolverem planos de contingência para a
mitigação dos efeitos perniciosos que
Palácio de S. Bento, 7 de janeiro de 2019.
Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — Nuno Magalhães — Filipe Anacoreta Correia — João
Gonçalves Pereira.
(Texto substituído a pedido do autor)
O cenário de uma saída sem acordo do Reino Unido da União Europeia vai ganhando forma e crescente
probabilidade. Este quadro torna evidente a necessidade dos Estados-Membros se prepararem para os efeitos
negativos e potencialmente prejudiciais que resultam dessa circunstância.
Não é, portanto, de estranhar que o último Conselho Europeu de dezembro (13-14) tenha apelado «à
intensificação dos trabalhos de preparação, a todos os níveis, para as consequências da saída do Reino Unido,
tendo em conta todos os desfechos possíveis».
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São muitas as áreas antevistas como sensíveis constantes da Comunicação da Comissão -Preparação para
a saída do Reino Unido da União Europeia em 30 de março de 20191 –, de 13 de novembro de 2018, que
exigirão resposta eficaz e em tempo útil no eventual cenário de saída não ordenada. As mais significativas são
as seguintes: cidadãos, serviços financeiros, transporte aéreo, transporte rodoviário, questões aduaneiras,
requisitos sanitários e fitossanitários, dados pessoais e política climática da UE. É importante notar que existem
outras áreas que, no caso português, deverão merecer medidas adicionais como seja o turismo e a
internacionalização (empresas a operar e exportar para o Reino Unido).
Em resumo, constata-se que o governo português deverá ser capaz de assegurar estabilidade e
previsibilidade atempadas, no contexto de incerteza, minimizando os efeitos e consequências de uma saída
desordenada do RU, sendo importante apresentar tão rápido quanto possível o seu Plano de Contingência, de
forma a evitar bloqueios e a responder adequadamente «à necessidade de adaptar a legislação nacional e de
adotar medidas administrativas e práticas» nos sectores, à semelhança de outros Estados-Membros.
Neste contexto, há duas áreas que o CDS reputa de maior importância para concentrar esforços e os recursos
da política pública: os cidadãos e o apoio às empresas a exportar para o RU.
Em primeiro lugar, os cidadãos nacionais a residir no RU. Um cenário de saída desordenada adensa a
incerteza e as inquietações sobre a vasta comunidade portuguesa no RU. São detetáveis sentimentos de
preocupação assinaláveis junto dos cerca de 400 000 cidadãos nacionais que, persistentemente, têm resistido
a todo o processo do Brexit e às alterações inevitáveis que se anunciam.
Nesse sentido, é essencial assegurar respostas administrativas céleres e eficazes que garantam os direitos
dos cidadãos a residir e a trabalhar no RU. Uma solução possível para obstar a este tipo de sentimentos e a
uma eventual mas indesejável «corrida» aos consulados é redobrar as permanências consulares e reforçar os
meios humanos e técnicos, capazes de acautelar um processo de regularização da situação legal dos cidadãos
nacionais que residem e trabalham no RU.
No que respeita às empresas nacionais, impõe-se certamente a contenção de perdas, o controlo da
instabilidade e a mitigação da perturbação previsivelmente induzidas na dinâmica empresarial. As quase 3000
empresas nacionais a operar e exportar para o RU e o facto de as exportações terem registado um aumento de
mais de 2% comparativamente a 2017 atestam uma forte dinâmica empresarial.
Assumindo que o mercado britânico representa o quarto mercado de exportação de bens e serviços da
economia nacional e o primeiro ao nível dos serviços, com uma taxa de cobertura das importações pelas
exportações acima dos 200%, é absolutamente essencial consolidar o apoio ao investimento e à dinâmica
empresarial aqui evidenciada.
Esta necessidade é, aliás, patente há muito tempo, mas nunca teve resposta adequada, até ao momento, do
Governo português. O Governo subvalorizou o cenário de uma saída desordenada do RU da União como rejeitou
proceder à dinamização de um processo de reflexão e discussão pública sobre as medidas a adotar, no âmbito
de um Plano de Contingência, mormente na vertente económica.
Uma prova clara de que o Governo não realizou devidamente esse processo de consulta pública reside no
facto de, na audição realizada com a CIP – Confederação Empresarial de Portugal, na Comissão de Assuntos
Europeus, no dia 4 de dezembro de 2018, a requerimento do Grupo Parlamentar do CDS-PP, sobre o estudo
«Brexit: As consequências para a economia e as empresas portuguesas», o Presidente da CIP ter afirmado
«não ter conhecimento que se esteja a desenrolar ou que haja alguma metodologia para planos de contingência»
por parte do Governo nem tão-pouco «que o Governo esteja a desenvolver qualquer estratégia para acautelar
ou minorar esta ou aquela situação», no contexto do Brexit.
O Governo português adotou como seu o referido estudo, não se conhecendo, até ao momento, e desde
então, ações adotadas pelo Governo português no sentido de minimizar os riscos e potenciar as oportunidades
do Brexit para as empresas portuguesas, previstas no capítulo 8 – Conclusões e Recomendações – do referido
estudo.
Desde o final de 2018 que o CDS-PP tem, insistentemente, instado o Governo a desenvolver, sem demora,
um plano de contingência, face a um quadro de instabilidade decorrente de uma saída desordenada do RU.
1 COM(2018) 880 final.
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Perante esse indesejável mas não improvável cenário, a urgência das nossas respostas representa uma
verdadeira condição de salvaguarda dos interesses nacionais.
Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República resolve
recomendar ao Governo o seguinte:
1 – Adote um Plano de Ação de Contingência transversal nas variadas áreas identificadas como sensíveis
no caso de uma saída desordenada do Reino Unido da União Europeia, constantes da Comunicação da
Comissão – Preparação para a saída do Reino Unido da União Europeia em 30 de março de 2019 – Plano de
Ação de Contingência, envolvendo os parceiros sociais e refletindo os seus contributos nas medidas sectoriais
a adotar.
2 – Intensifique as permanências consulares e aposte numa maior capacidade de resposta dos serviços
consulares no Reino Unido nos processos de regularização da situação dos cidadãos nacionais a residir e
trabalhar no RU
3 – Crie e operacionalize, no Plano de Ação de Contingência, uma linha de crédito vocacionada para o apoio
às empresas portuguesas que operam ou exportam para o Reino Unido.
4 – Lance, à margem do Plano de Ação, de forma planeada e eficaz uma campanha de informação orientada
para as empresas, e em particular para necessidade de estas desenvolverem planos de contingência para a
mitigação dos efeitos perniciosos que possam resultar da saída do Reino União da União Europeia.
Palácio de S. Bento, 7 de janeiro de 2019.
Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — Nuno Magalhães — Filipe Anacoreta Correia — João
Gonçalves Pereira.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1929/XIII/4.ª
MEDIDAS DE DESPOLUIÇÃO, PROTEÇÃO E VALORIZAÇÃO AMBIENTAL DA PATEIRA DE
FERMENTELOS, REQUEIXO E CARREGAL E DO RIO CÉRTIMA
A Pateira de Fermentelos é a maior lagoa natural da Península Ibérica, com uma área de superfície que pode
chegar aos 5km2 e que se estende pelos concelhos de Águeda, Aveiro e Oliveira do Bairro.
Esta lagoa constitui uma zona de biodiversidade florística e faunística de elevada importância,
proporcionando a presença de várias espécies vegetais e animais. Podemos enumerar, a título de exemplo, os
amieiros, os salgueiros, os freixos, os choupos, os ulmeiros, os pilriteiros, os nenúfares, o caniço, algumas
espécies de plantas carnívoras ou ainda inúmeras espécies de aves, como o perna-longa, o guarda-rios, o
milhafre-preto, a garça-branca, a garça-vermelha ou a águia-sapeira.
A Pateira é ainda o habitat de vários peixes, crustáceos, moluscos, répteis, anfíbios e alguns mamíferos,
como é o caso da lontra. É, portanto, um importante ecossistema com um valor inestimável para o ambiente,
para a região e para as populações. Esta lagoa foi, aliás, classificada como Zona Húmida de Importância
Internacional.
O rio Cértima nasce a Ponte de Viadores (Casal Comba, Mealhada) e estende-se por cerca de 43 km, sendo
que as suas águas se deslocam no sentido sul-norte. O rio percorre os concelhos da Mealhada, Anadia, Oliveira
do Bairro e, por último, Águeda. O rio desagua no rio Águeda e atravessa, junto da sua foz, a Pateira de
Fermentelos. Trata-se da principal fonte de alimentação da lagoa.
A poluição de que é alvo o rio Cértima coloca em causa todo este ecossistema. Este rio tem sido alvo de
recorrentes descargas poluentes, sejam elas descargas de efluentes não tratados que são despejados
diretamente no rio, sejam elas provenientes da pecuária ou atividade industrial. Tem sido vários os episódios de
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poluição em que o rio fica coberto por um manto verde e espesso, com detritos, gorduras e um cheiro
nauseabundo e em que se verifica a mortalidade de milhares de peixes.
As águas do rio Cértima são utilizadas para irrigar terrenos de cultivo de milho e de arroz. A poluição de que
é alvo coloca em causa a biodiversidade, mas também a saúde pública de forma agravada atendendo ao seu
uso para fins agrícola.
A preservação do ambiente e dos recursos naturais deve ser uma prioridade das entidades públicas. Face a
essa preocupação, há um ano questionamos o governo sobre esta matéria (Pergunta n.º 52/XIII/3.ª). Na
resposta, o Ministério do Ambiente dava conta que tinham sido «efetuadas ações de fiscalização à Estação de
Tratamento de Águas Residuais (ETAR) da Mealhada, gerida pela Câmara Municipal da Mealhada, e à ETAR
de Arcos, sob gestão da Câmara Municipal de Anadia» e que nessas ações «foram verificadas anomalias na
qualidade do efluente rejeitado pelas ETAR em questão».
É ainda adiantado que, em articulação com a GNT – SEPNA foram identificadas «outras fontes de eventual
poluição do rio Cértima, das quais resultaram vários autos de contraordenação, nomeadamente às empresas
‘Destilaria Levira’, ‘Oficina de reparação Auto António Martins’, ‘Sogrape’, ‘Virgílio dos Leitões’ e ‘Hipermercado
Modelo Continente’».
Atendendo à poluição que o rio Cértima e da Pateira de Fermentelos, Requeixo e Carregal tem sofrido,
consideramos que é essencial avançar com um plano para impedir novos focos de poluição e eliminar os focos
presentes. É ainda necessário proceder à despoluição e valorização ambiental deste ecossistema e à realização
de dragagens que sejam avaliadas como necessárias.
Consideramos que é essencial impedir a descarga de efluentes não tratados nestes cursos de água. Não
pode ser admissível que equipamentos de tratamento de águas residuais, de responsabilidade de entidades
públicas, sejam um dos focos de poluição deste ecossistema. São urgentes medidas que adaptem as ETAR da
região às necessidades de tratamento de água.
Recentemente foi anunciado um investimento público para a criação de passadiços na pateira. No entanto é
necessário avançar também para medidas de proteção ambiental. A pateira tem todas as características que
lhe permitem ser um polo de atração de turismo da natureza, devidamente compatibilizado com a proteção do
ecossistema. A sua desproteção é também retirar valor económico e emprego à região. Deste modo, urge tomar
as medidas necessárias para repor o seu bom estado ecológico.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo:
1 – A criação de um plano de despoluição e proteção do ecossistema da Pateira de Fermentelos, Requeixo
e Carregal e do rio Cértima.
2 – A eliminação de focos de poluição do rio Cértima e da Pateira.
3 – Garantir que as ETAR que servem a zona têm as condições de funcionamento necessárias para garantir
a despoluição de águas e que em nenhum caso emitam contaminação para as águas do ecossistema em causa.
4 – Proceder às dragagens necessárias à preservação da Pateira, garantindo ainda o necessário destino
dos dragados.
5 – A valorização ambiental, económica e turística da Pateira de Fermentelos, Requeixo e Carregal e do rio
Cértima garantindo a preservação da sua biodiversidade e do ecossistema.
Assembleia da República, 8 de janeiro de 2019.
As Deputadas e os Deputados do BE: Moisés Ferreira — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana
Mortágua — Pedro Soares — Isabel Pires — José Moura Soeiro — Heitor de Sousa — Sandra Cunha — João
Vasconcelos — Maria Manuel Rola — Fernando Manuel Barbosa — Jorge Falcato Simões — Carlos Matias —
Joana Mortágua — José Manuel Pureza — Luís Monteiro — Ernesto Ferraz — Catarina Martins.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1930/XIII/4.ª
DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA AO PANAMÁ.
Texto do projeto de resolução e mensagem do Presidente da República
Texto do projeto de resolução
Sua Excelência o Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º e da alínea b) do
artigo 163.º da Constituição, o assentimento da Assembleia da República para se deslocar ao Panamá, nos dias
24 a 28 do corrente mês, a convite do seu homólogo panamiano, a fim de participar nas XXXIV Jornadas
Mundiais da Juventude, fazendo escalas em Espanha.
Assim, apresento à Assembleia da República, nos termos regimentais, o seguinte projeto de resolução:
«A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da
Constituição, dar assentimento à deslocação de Sua Excelência o Presidente da República ao Panamá, nos
dias 24 a 28 do corrente mês, a convite do seu homólogo panamiano, a fim de participar nas XXXIV Jornadas
Mundiais da Juventude, fazendo escalas em Espanha.»
Palácio de São Bento, 8 de janeiro de 2019.
O Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.
Mensagem do Presidente da República
Estando prevista a minha deslocação ao Panamá nos dias 24 a 28 do corrente, a convite do meu homólogo
panamiano, a fim de participar nas XXXIV Jornadas Mundiais da Juventude, venho requerer, nos termos dos
artigos 129.º, n.º 1 e 163.º, alínea b) da Constituição, o assentimento da Assembleia da República.
Mais informo que farei escalas em Espanha.
Apresento a Vossa Excelência os meus respeitosos cumprimentos
O Presidente da República,
(Marcelo Rebelo de Sousa)
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.