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Quarta-feira, 9 de Julho de 1997 II Série - RC - Número 116

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 8 de Julho de 1997

S U M Á R I O


O Sr. Presidente (Jorge Lacão) deu início à reunião às 10 horas e 45 minutos.
Prosseguiu o debate e votação das propostas de alteração aos artigos 240.º, 241.º, 243.º, 244.º, 246.º, 247.º, 249.º, 251.º a 256.º, 258.º, 260.º a 263.º, 265.º a 268.º, 270.º, 272.º e 274.º a 277.º.
Intervieram, a diverso título, os Srs. Deputados Luís Sá (PCP), Luís Marques Guedes (PSD), José Magalhães (PS), Nuno Correia da Silva (CDS-PP), Barbosa de Melo e Carlos Encarnação (PSD), Cláudio Monteiro (PS), Moreira da Silva (PSD), António Filipe e João Amaral (PCP), Sérgio Sousa Pinto (PS) e Miguel Macedo (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 50 minutos.

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O Sr. Presidente (Jorge Lacão): * Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados, vamos apreciar o artigo 240.º, para o qual temos, em segunda leitura, uma proposta apresentada pelo Sr. Deputado Luís Sá que foge ao enquadramento sistemático do artigo 171.º e, sobretudo, do artigo 169.º, quanto às formas dos actos. Mas, enfim, percebe-se a intenção…
O Sr. Deputado Luís Sá já teceu abundantes argumentos no sentido de considerar que a Lei das Finanças Locais deve ser uma lei de valor reforçado - é isso que está em causa.
Por outro lado, da primeira leitura tinha resultado uma possibilidade, que, salvo melhor opinião, os Deputados do PS e do PSD enquadrarão num outro artigo, relativo ao poder local. Isso significará que poderemos passar à votação, pois julgo que a matéria de debate sobre este artigo está já realizada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, o problema das leis de valor reforçado não tem que ver com a forma dos actos mas, sim, com o facto de se tratar de diplomas com particular estatuto e com uma particular relação com outras leis.

O Sr. Presidente: * Não chega a querer dar-lhe natureza de lei orgânica.

O Sr. Luís Sá (PCP): * É evidente que poderia haver vários enquadramentos sistemáticos. Tive, aliás, oportunidade de perguntar, na altura própria, por que é que a lei das finanças regionais não merecia o estatuto de lei orgânica e a Lei das Finanças Locais sim. Independentemente desse facto, a verdade é que outras concessões foram sempre recusadas, de modo que resta esta.
Estaria inteiramente disponível para resolver este problema por qualquer das inserções que o Sr. Presidente referiu, desde que tivesse o mínimo de lógica, evidentemente, mas o problema é que elas foram sendo sucessivamente afastadas.

O Sr. Presidente: * Pois é, Sr. Deputado Luís Sá, efectivamente, o Sr. Deputado tem-se esforçado imenso para defender um ponto de vista que tem sentido, mas devo confessar que nem tudo o que tem sentido tem tido acolhimento constitucional.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, acredito, e tenho-o defendido coerentemente ao longo da revisão, que se uma revisão da constituição tem sentido é exactamente para resolver os problemas de ordem prática que a vida colocou.
Não tenho grandes dúvidas que, do ponto de vista constitucional, a Lei das Finanças Locais deveria ter efectivamente este estatuto. A partir do momento em que o mesmo foi sendo recusado, quer na Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro, quer na Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro, e em que há um acórdão que o recusa expressamente, creio que está aqui um problema em aberto para o legislador da revisão constitucional, em que este problema é recusado.
Mais: creio que, travando-se esta discussão na semana seguinte à realização de debates que tiveram exactamente como objecto a Lei das Finanças Locais, este é um momento particularmente oportuno, sob pena de concluirmos que os debates perdem sentido, isto é, que aquilo que foi debatido em torno das finanças locais, afinal, resolver-se-ia com o cumprimento inequívoco da Lei das Finanças Locais, como aconteceu há alguns anos.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta 244, apresentada pelo PCP e por Os Verdes, de aditamento de um número ao artigo 240.º.

Submetida à votação, foi rejeitada, com os votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era a seguinte:

A lei de finanças locais é uma lei de valor reforçado.

O Sr. Presidente: * Das propostas originárias, deseja o PSD submeter algo a votação, Sr. Deputado Luís Marques Guedes?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, na sequência do debate da primeira leitura, o PSD está aberto a uma formulação na linha daquilo que vem proposto no guião pelo Presidente da Comissão.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, então, que destino daria a uma proposta, que suponho será apresentada daqui a pouco, relativamente ao artigo 254.º, quando se diz que os municípios dispõem de receitas tributárias próprias, nos termos da lei? Evidentemente, estamos a falar de receitas e aqui fala-se de poderes tributários próprios, mas creio que a solução das receitas foi, na altura, um compromisso possível com o PSD. Ou estou errado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, obviamente que o PSD se revê nessa inserção sistemática, só queria deixar em acta que uma coisa decorre da outra e que, portanto, a nossa receptividade é essa, como o Sr. Presidente chamou a atenção.
Em termos sistemáticos, isto pode passar para outro artigo, mas neste momento quero que fique claro em acta - e aproveito para o dizer ao Sr. Presidente - que o PSD retira a sua proposta de alteração ao artigo 240.º em benefício dessa solução.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, quero ter a certeza absoluta de que entendi o pensamento agora expresso pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O âmbito das duas soluções, a aventada no guião a propósito do artigo 240.º e a decorrente do acordo político de revisão constitucional em sede do artigo 254.º, é distinto. E, portanto, seria possível sempre ter uma solução geral inserida nos princípios gerais desta parte da Constituição e ter uma particularização a propósito do poder tributário municipal, por assim dizer.

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Gostaria de estar seguro sobre qual é o ponto de vista do PSD nessa matéria, uma vez que a nossa posição decorre cristalinamente da proposta que apresentámos e cuja reformulação, nos termos constantes da nota do guião que temos vindo a referenciar, seria por nós perfeitamente aceitável; seria uma redacção geral complementada com uma particular.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, não vou imiscuir-me nas negociações, porém, como elas dizem respeito a matérias que foram conclusões acolhidas na primeira leitura, gostaria de pronunciar-me.
Uma coisa é dizer, no artigo 254.º, que os municípios dispõem de receitas tributárias próprias, nos termos da lei, outra coisa é dizer, no artigo 240.º, que dispõem de poderes tributários nos casos e termos previstos na lei. Em rigor, a redacção proposta para o artigo 254.º reporta-se a receber receitas de determinados impostos, enquanto que aqui temos algo de diferente, por exemplo, fixar a taxa de incidência de um imposto - a contribuição autárquica é o caso evidente, pois é possível fixar uma taxa que vai de 1,1% a 1,3% -, o que é diferente de receber o imposto.
Pode, naturalmente, discutir-se a questão da inserção sistemática, em todo o caso sou favorável a que, por um lado, no artigo 240.º fosse acrescentada uma redacção do tipo da que foi objecto de conclusão colectiva na primeira leitura, e a que, por outro lado, quanto ao artigo 254.º fosse analisada a proposta que também foi objecto de conclusão colectiva na altura própria.

O Sr. Presidente: * Obrigado, Sr. Deputado Luís Sá. A discussão está, de facto, em aberto.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, respondendo directamente à questão suscitada, em primeiro lugar, pelo Sr. Deputado José Magalhães, quero reafirmar aquilo que só por lapso meu poderá não ter ficado claro na minha intervenção inicial. Ou seja, o PSD tem disponibilidade para, neste artigo, colocar um princípio geral com uma redacção que aponte apenas para a possibilidade de a lei conferir, de uma forma perfeitamente limitada, poderes tributários próprios às autarquias, que, de resto - relembro-o ao Sr. Deputado José Magalhães e ao Sr. Deputado Luís Sá -, é o conteúdo útil do projecto inicial do PSD.
O PSD, no seu projecto inicial, que agora pedi ao Sr. Presidente que considerasse prejudicado, alterava o n.º 2 deste artigo no sentido de dizer que "O regime das finanças locais, a estabelecer por lei, dotará as autarquias locais de poder tributário (…)".
No fundo, o conteúdo útil é o de deixar claro um princípio através do qual se permite que a lei ordinária, de uma forma perfeitamente limitada, atribua poderes tributários às autarquias locais, princípio a que não é estranho, como ficou claro da apresentação da proposta do PSD na primeira leitura, o interesse, do nosso ponto de vista, em pacificar a doutrina, quanto mais não seja relativamente à magna questão da definição das taxas da contribuição autárquica. Como os Srs. Deputados sabem, existe uma corrente maioritária que tem vindo a considerar constitucional a actual situação, em que o elemento "taxa" é definitivamente determinado pelas autarquias locais no que respeita à contribuição autárquica, existindo alguma doutrina que questiona a legitimidade constitucional dessa operação.
O sentido útil da proposta inicial do PSD e da fórmula simples e absoluta que o Presidente desta Comissão, na primeira leitura, avançou e que consta do guião tem, do ponto de vista do PSD, fundamentalmente o objectivo de deixar claro, de uma vez por todas, que não é inconstitucional que a legislação, seja ela o Código da Contribuição Autárquica ou, de hoje a amanhã, o Código do IRC - aliás, já houve propostas do Partido Popular nesse sentido nesta sessão legislativa -, seja uma outra legislação da Assembleia da República, atribua poderes tributários em situações perfeitamente definidas e enquadradas pela lei.
É com o objectivo de inserir uma norma constitucional que ponha fim a uma querela em torno dessa possibilidade que o PSD se revê e que na primeira leitura se reviu.
A questão do artigo 254.º, como o Sr. Deputado José Magalhães referiu, tem um alcance um pouco mais precioso, como está bem de ver, mas também não me parece que fique esgotada por este princípio que referi. É sempre necessário, no artigo 254.º, acrescentar aquilo que lá está, porque se trata de uma questão politicamente densa, tendo o Partido Socialista e o Partido Social Democrata ocasião de, quando lá chegarmos, explicitar a razão de ser do acordo em torno dessa questão.
Sr. Presidente, penso que as duas propostas não se esgotam. Reitero, assim, a abertura do PSD para, não na forma da sua proposta inicial, cuja retirada já pedi, mas numa forma enxuta como aquela que foi sugerida pelo Sr. Presidente possa ser votada e acolhida para a Constituição.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Luís Marques Guedes, sendo assim, suponho que podemos, neste domínio, realizar na Comissão um consenso universal que espelhe o ponto de vista já sustentado na primeira leitura.

Pausa.

Srs. Deputados, está a circular uma outra proposta, subscrita pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP, que foi consensualizada na primeira leitura, de aditamento de um n.º 4 ao artigo 240.º, do seguinte teor: "As autarquias locais podem dispor de poderes tributários nos casos e nos termos previstos na lei".
Creio que a proposta do PS pode considerar-se substituída pela actual, bem como a do PSD que, em vez de retirada, será considerada substituída.
Uma vez que ninguém se opõe, vamos votá-la.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

4. As autarquias locais podem dispor de poderes tributários nos casos e nos termos previstos na lei.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos agora votar em bloco, se não houver objecções, os n.os 3, 4 e 5 do

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artigo 240.º constantes do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era a seguinte:

3. As autarquias locais participam nas receitas do Estado, nos termos da lei, devendo as transferências financeiras ser actualizadas de modo a impedir a sua degradação em termos reais.
4. (Actual n.º 3.)
5. O Estado não poderá reter as transferências financeiras legalmente devidas às autarquias locais, nem afectar o seu património para efeitos de pagamento de dívidas ao próprio Estado ou a outras pessoas colectivas públicas.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, o Partido Social Democrata votou contra não por discordar dos princípios que decorrem das propostas do PCP, a saber, o princípio da actualização das transferências financeiras do Estado para as autarquias locais de forma a impedir a sua degradação em termos reais e o princípio da não retenção das transferências financeiras legalmente devidas às autarquias locais, mas por não concordar, nem de perto, nem de longe, que estes sejam princípios a observar de uma forma cega e absoluta em todo e em qualquer tipo de situação.
São princípios profundamente válidos, princípios correctos politicamente, princípios que, de resto, decorrem do princípio constitucional mais lato e que está na Constituição, que é o de uma justa repartição de recursos entre o poder central e o poder local. Só que há situações e situações.
A título de exemplo, direi que o primeiro princípio, o da actualização permanente das transferências financeiras e a impossibilidade de degradação em termos reais, chocaria com uma situação de crise nacional, que, oxalá, não venha a acontecer. É que, nesta situação, a solidariedade teria, obviamente, também de fazer sentir-se a nível das autarquias locais…

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * … e não seria de todo em todo politicamente aceitável que, se o País ficasse confrontado com uma situação de dificuldade, essa dificuldade, esse "apertar de cinto", não tivesse de ser feito a todos os níveis da Nação e pudesse haver ao nível do poder local a continuação de um crescimento financeiro em termos reais.
E o mesmo se diga relativamente ao segundo princípio, que também é profundamente correcto mas que não deve ser "absolutizado".
Por essa razão, o PSD vota contra. Mas que fique em acta que o nosso voto contra tem que ver com uma lógica que sempre decorreria da sua constitucionalização, que era a de tornar absoluto um princípio que, sendo válido e politicamente adequado, nos parece que não deve ser "absolutizado" em nenhuma circunstância.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 241.º, que tem por epígrafe "Órgãos deliberativos e executivos".
Temos as propostas 242 e 243 sobre, respectivamente, o modo de constituição dos órgãos das autarquias locais e o referendo local, apresentadas pelo PS e PSD.

Pausa.

Sr. Deputado Luís Marques Guedes, antes de avançarmos no debate, estamos a fazer uma correcção material à proposta 243, que se reporta ao regime do referendo local.
Dado que se fala em autarquias locais e em competências das autarquias locais, para que houvesse uma correcção técnica, de duas, uma: ou, falando-se em autarquias locais, falar-se-ia em atribuições ou, para manter a referência às competências, o que me parece constitucionalmente mais adequado, é, aliás, a expressão actual da Constituição, verdadeiramente temos de falar em órgãos deliberativos das autarquias locais. E a proposta ficaria assim:"Os órgãos deliberativos das autarquias locais podem submeter a referendo (…).
Não vejo objecção a esta alteração.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Acho isso um preciosismo sem…

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * No n.º 3 do artigo 241.º está "órgãos".

O Sr. Presidente: * É verdade, porque só os órgãos deliberativos é que podem propor o regime do referendo…

O Sr. José Magalhães (PS): * Ninguém deseja que os órgãos executivos proponham referendos!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à apreciação destas duas propostas.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, queria só deixar em acta que, no meu entendimento, não passa pela cabeça de ninguém que as autarquias locais não têm competência. É evidente que quando um texto como o da Constituição utiliza o termo "autarquias locais" nele subsume toda a realidade, inclusive os seus órgãos.
Portanto, falar-se em atribuições e competências das autarquias locais, do meu ponto de vista, não é, nem nunca foi, um conceito errado e, nesse sentido, parece-me perfeitamente…

O Sr. Presidente: * A ideia não é a de inserir as atribuições.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Mas a ideia parte da dúvida sobre se é correcto falar-se em competências das autarquias locais e, pessoalmente, rejeito qualquer tese que diga que não é correcto falar-se em competência das autarquias locais.

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O Sr. Presidente: * A questão é muito simples: enquanto autarquia local é pessoa colectiva e as pessoas colectivas têm atribuições, os órgãos têm competências. Como estamos aqui a dizer competências, o objectivo técnico é o de reportar as competências aos órgãos competentes das autarquias.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, nós queremos alargar as possibilidades de intervenção popular, por iniciativa própria ou por convocação de órgãos, em deliberações que tenham a ver com competências locais.

O Sr. Presidente: - Certo.

O Sr. José Magalhães (PS): * Não queremos, todavia, creio, circunscrever os referendos possíveis a matéria da competência das assembleias locais. Não queremos isso!

O Sr. Presidente: * Tem toda a razão!

O Sr. José Magalhães (PS): * Claramente, não queremos.
Portanto, não podemos escrever o que quer que seja que inculque que só matérias da competência da assembleia municipal, por exemplo, é que podem ser referendadas. Não é assim!
Por outro lado, devemos deixar à lei ordinária a possibilidade de gizar um esquema em que os executivos possam, em determinadas circunstâncias, convocar referendos, ou serem chamados a convocar referendos, ou excluir essa hipótese liminarmente, mas não excluir do âmbito do referendo matérias que sejam, na repartição de competências internas das autarquias locais, da competência do executivo. Porque se o fizéssemos, dada a relevância dos executivos e das suas competências, estaríamos a restringir, e muito, as possibilidades de referendos locais, o que, repito, não desejamos.

O Sr. Presidente: * E se puséssemos "os órgãos deliberativos podem submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências das autarquias locais"?

Pausa.

Srs. Deputados, é claro que se, em vez de "os órgãos deliberativos das autarquias", disséssemos "os órgãos das autarquias", tal como está actualmente na Constituição, superávamos as dificuldades.

O Sr. José Magalhães (PS): - Essa é uma boa ideia, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, se seguirmos a revisão constitucional actual neste ponto, ficaremos com o seguinte: "As autarquias locais podem submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos (…)".

Pausa.

Feita esta correcção, vamos à questão de fundo.
Srs. Deputados, inscrevo-me para fazer uma intervenção.
Creio que estamos neste momento, e perante esta proposta, numa matéria nuclear quanto ao futuro destino do sistema de governo das autarquias locais.
É sabido que o sistema actualmente vigente tem merecido reparos críticos de intensidade crescente, apontando-lhe defeitos vários que vão desde o excesso de partidarização do modo como funcionam as autarquias locais a um estranho sistema de governo em que quem ganha e quem perde eleições coabita ao nível dos órgãos executivos fazendo uma fixação e uma rigidez de mandato do órgão executivo que o torna, na prática, completamente independente do órgão colegial que supostamente são as assembleias deliberativas das autarquias locais. Tudo também, consequentemente, em prejuízo da capacidade de fiscalização dos órgãos deliberativos sobre os órgãos executivos no domínio do poder local.
Acresce, por outro lado, que o excesso de rigidez na constituição do executivo municipal, interditando, portanto, qualquer hipotética renovação de equipa ao longo de um período de mandato, acaba muitas vezes por ter consequências de enquistamento em tudo prejudiciais à eficácia do trabalho autárquico e à própria coesão que as equipas de governo deveriam exprimir em todas as circunstâncias. Esta avaliação crítica do sistema actual é partilhada, suponho, não apenas pelo PS mas também pelo PSD e, porventura, por outros partidos políticos.
Mais difícil se revelou um consenso para uma nova solução, na medida em que, justamente aqui, perpassam propostas até ao momento não conciliáveis e que, por isso mesmo, não permitiram viabilizar uma solução constitucional que reflectisse já uma ideia positiva de superação do regime actual.
Estavam, por isto, colocadas duas opções: na inexistência de uma solução desde já estabelecida, ser impossível alterar as disposições constitucionais actuais e manter, na sua rigidez vigente, o actual sistema de governo autárquico e isso, porventura, redundaria num prejuízo idêntico à impossibilidade de mudar um sistema que já não tem hoje, manifestamente, um consenso suficiente.
Adoptou-se, por isso, uma solução com maior flexibilidade: a de permitir que a Constituição estabeleça um conjunto de princípios fundamentais quanto à constituição do sistema de governo das autarquias locais, admitindo que a lei, no futuro, venha a definir a concretização desse mesmo sistema e das possibilidade que a Constituição vai abrir. Com uma regra de cautela fundamental: também aqui, não deve deixar-se ao sabor de maiorias conjunturais, quaisquer que elas sejam, a possibilidade da definição do sistema de governo autárquico.
Por isso, as disposições da lei que se reportam ao sistema de governo - e já o votámos aquando da apreciação do artigo 171.º - exigirão maiorias qualificadas de dois terços. Será, assim, sempre necessário um amplo consenso parlamentar para viabilizar uma nova solução quanto ao governo das autarquias locais.
Enquanto tal não for possível, prevalecerá, sem crise, o actual sistema de governo, que é, aliás, aquele que, em perfeita normalidade, irá ainda dar lugar à constituição dos mandatos que resultarem das próximas eleições autárquicas, como todos sabemos.
Nesta circunstância, estamos a preparar caminhos de futuro para reformas que exigirão ainda muito trabalho de aproximação mas que ficarão viabilizadas pela abertura constitucional que, provavelmente, iremos adoptar.

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Gostaria, ainda, de reconhecer que, à semelhança do que acontece nas disposições eleitorais, designadamente para a Assembleia da República, se manterá também, no que ao poder local diz respeito, a afirmação de um princípio para nós fundamental: o de que a conversão de votos em mandatos obedecerá sempre ao sistema da representação proporcional.
Portanto, com esta garantia constitucional, não estão, a nosso ver, prejudicadas aquelas linhas de orientação em matéria de lei eleitoral, que são, aliás, reserva de revisão da Constituição e, por isso, a nosso ver, esta é uma solução que exprime um compromisso evidente com as virtualidade de abrir a reformas futuras que superem os vícios do sistema de governo actual.
Era esta apresentação que gostaria de fazer, complementando-a apenas com uma referência a uma formulação com maior virtualidade no que diz respeito ao regime do referendo local, na medida em que se possibilitará - o que, até ao momento, não tinha acontecido - a viabilização de consultas populares directas no plano local, justamente por se retirar da actual fórmula constitucional a referência à competência exclusiva para podemos adoptar uma solução mais flexível com a referência a competências próprias, e não a competências exclusivas, o que permitirá que as deliberações dos órgãos autárquicos para a convocação do referendo local sejam possíveis de ter concretização e conformidade constitucional adequada.
Por outro lado, admite-se também que, no futuro, as iniciativas de referendo local possam ser suscitadas por cidadãos eleitores, o que vai manifestamente em benefício de uma maior possibilidade de participação política não apenas dos munícipes mas de todos aqueles que se enquadram no regime das autarquias locais no âmbito das respectivas áreas de competência.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em nome do PSD, queria fazer algumas considerações sobre esta proposta comum para o artigo 241.º, que me parece um dos aspectos de maior importância e de maior alcance nesta revisão constitucional.
É conhecida, desde há muitos anos, a posição crítica do PSD relativamente ao modelo constitucional de que vem enformado o poder local.
Pese embora o PSD, muitas vezes, ter chamado a atenção para o facto de o poder local democrático ser inquestionavelmente um dos maiores ganhos e avanços que a democracia portuguesa trouxe para o desenvolvimento do País e a satisfação das necessidades das pessoas, o que também é inquestionável, do ponto de vista do PSD, é que a realidade veio a demonstrar que o modelo inicialmente previsto e estatuído no texto constitucional é em si portador de alguns problemas, é portador da criação de alguns obstáculos reais, e não artificiais, ao melhor desempenho ainda que as autarquias locais poderiam trazer às populações e às comunidades locais.
Nesse enquadramento, desde há vários anos e em sucessivos projectos de revisão constitucional, o Partido Social Democrata foi apresentando propostas no sentido de alterar esse modelo. De início, sem sucesso, deparando-se, inclusive, com uma posição de quase acusação política da parte dos partidos da esquerda do nosso espectro político, acusação no sentido de que queríamos perverter a democraticidade desse mesmo poder local. Mas o que é facto é que as críticas e as observações que o PSD, ao longo dos anos, foi suscitando sobre esta matéria foram fazendo o seu curso, foram iluminando alguns espíritos e, chegados à revisão constitucional de 1997, constata-se que foi possível perceber - de resto, foi possível perceber logo nos projectos iniciais apresentados em 1996 - que alguns partidos que no início estavam mais renitentes relativamente a esta matéria, com o decorrer do tempo, acabaram por demonstrar uma clara abertura à alteração do modelo constitucional instituído na nossa Lei Fundamental desde 1975, abrindo as portas a uma reforma que, sendo estruturante do próprio poder local, acaba por ser em si também estruturante do nosso próprio modelo político de Estado de direito.
No entanto, do ponto de vista do PSD, é evidente que uma reforma como esta não pode ser feita, aliás, não o pôde no passado, pese embora as tais propostas que o PSD foi suscitando ao longo dos tempos, sem um alargado entendimento das forças políticas mais representativas do nosso país, por forma a que o poder local, que é uma realidade tão pujante do nosso sistema democrático, não se torne numa fonte de quezília, de polémica, assim subvertendo o seu objectivo essencial, que é o de resolver os problemas das populações e proporcionar o desenvolvimento das comunidades a nível local.
O PSD está, pois, consciente de que esta é uma reforma que tem de ser feita com prudência e com a participação, a explicação e a informação o mais alargada possível às populações para que o modelo que, a final, for adoptado seja um modelo no qual o máximo possível de cidadãos possam rever-se e esses mesmos cidadãos depositem uma esperança positiva de melhoria no desenvolvimento desse poder local para a satisfação das suas necessidades, dos seus problemas, enfim, das aspirações legítimas que todas as comunidades locais têm para o desenvolvimento desse poder local.
Por essa razão, o PSD acabou por optar, em conjunto com o PS, por uma solução que nos parece feliz, porque concilia o interesse em avançar-se para uma reforma, quiçá profunda, do nosso modelo de poder local, sem, no entanto, deixar de ter em atenção a necessidade de haver um debate alargado, participado, com uma informação muito vasta, em que todas as pessoas possam ter a plena consciência daquilo que se pretende alterar e uma percepção adequada sobre as vantagens em se alterar o modelo e se caminhar para novas fórmulas.
Sempre seria difícil chegar-se a uma revisão constitucional com um modelo claramente adquirido. Daí a vantagem, do ponto de vista do PSD, nesta fórmula do artigo 241.º que flexibiliza o texto constitucional, o que, como está bom de ver, é um princípio adequado em muitas matérias, desde que não se firam os princípios de democraticidade fundamentais, o que, do nosso ponto de vista, não acontece aqui de uma forma clara, como, aliás, já foi referido pelo Sr. Presidente. A dita flexibilização é sempre o caminho mais adequado para que se possa, de uma forma participada, encontrar as soluções correctas e onde o maior número possível de cidadãos se revejam por forma a que as reformas sejam sucessos e não fontes de polémica numa matéria como esta, que são matérias de incidência política evidente e onde não é desejável que haja demasiados aspectos controvertidos.

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A solução aqui preconizada salvaguarda dois princípios, os tais valores sem os quais, do nosso ponto de vista, a flexibilidade não é possível: por um lado, o sistema de representação proporcional ao nível do poder local, sistema esse que, maxime, ao nível dos órgãos deliberativos de assembleia, tem de ser, necessária e impreterivelmente, defendido e salvaguardado; por outro, não só, ao nível dos órgãos executivos, deixa a porta aberta a soluções diferentes que assegurem a estabilidade desses mesmos executivos, estabilidade essa que sempre foi uma das bandeiras mais queridas do PSD e em relação à qual se colocava um dos obstáculos mais necessários de remover para o avanço que eu há pouco referi, o da vitalidade do poder local democrático, mas também salvaguarda um aspecto que nos parece fundamental em termos de defesa da tradição municipalista portuguesa com séculos e séculos, que é a legitimidade democrática directa do presidente de câmara.
Em qualquer circunstância, e ao contrário de outros projectos que apontavam para outras soluções, democraticamente aceitáveis mas discutíveis como tal e, do ponto de vista do PSD, politicamente não aceitáveis com o modelo que defendemos, entendemos que o presidente de câmara, esse representante máximo onde as populações, do nosso ponto de vista, de uma forma legítima, depositam a confiança também pessoal, além de política, para melhor conduzir os destinos da sua terra e o desenvolvimento da comunidade local, tem de ser objecto de uma escolha democrática directa por parte dos cidadãos da autarquia. Esse sempre foi o ponto de vista do PSD, sendo um princípio e um valor fundamentais que ficam salvaguardados nesta proposta comum.
São estes os valores que o PSD considerou fundamentais nesta matéria. É evidente que esta proposta não é a do projecto inicial do PSD. Os compromissos e os entendimentos políticos, os acordos políticos, são um caminhar no sentido da aproximação para denominadores comuns onde nos possamos rever, sem perda dos nossos princípios fundamentais.
Os princípios fundamentais do PSD, nesta matéria, são aqueles que acabei de expor e, por essa razão, o PSD subscreveu e revê-se nesta proposta comum. Depositamos, inclusive, uma grande esperança em que, como o Sr. Presidente referiu há pouco, na sequência do acto eleitoral para os órgãos autárquicos que ocorrerá no final deste ano de 1997, e passada a refrega eleitoral, onde necessariamente há sempre uma certa clivagem política de posições, que é normal e salutar em democracia, a partir do ano de 1998, possamos - e falo no plural porque me refiro a toda a comunidade política e, também, aos cidadãos individualmente considerados - dedicar-nos à tarefa construtiva de encontrar um modelo que possa reformar o actual modelo autárquico e, retirando da experiência os melhores ensinamentos, dele remover os obstáculos que a experiência tem demonstrado existirem ao mais eficiente desempenho desta instituição tão bem sucedida desde o 25 de Abril, como foi o poder local democrático.
São esses os votos que o PSD faz e deixo aqui, Sr. Presidente, a congratulação viva pela possibilidade desta flexibilização do texto constitucional, que abrirá portas a uma reforma muito necessária no modelo político nacional.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): * Sr. Presidente, embora reconheçamos os méritos e as virtualidade que, ao longo dos últimos anos, devem ser reconhecidos às autarquias locais - aliás, consideramo-las como um legado precioso do nosso património democrático -, partilhamos as mesmas dúvidas quanto ao modelo de gestão, à eficácia e, mesmo, à democraticidade do modelo instituído.
Também não temos certezas quanto ao modelo alternativo. Pensamos que deverá ser objecto de um consenso nacional e ser precedido de um amplo debate, que ainda não foi feito. Nesse sentido, entendemos que a proposta 242 vem ao encontro do pensamento do Partido Popular sobre esta matéria.
Julgamos que é fundamental, em primeiro lugar, abrir o leque de possibilidades de candidatura aos órgãos autárquicos, retirando aos partidos políticos esse monopólio.
Por outro lado, julgamos que está salvaguardada a possibilidade de haver uma maioria conjuntural a impor um modelo que prejudique aqueles que, para nós, deverão ser os interesses e os princípios fundamentais, que são os da eficácia e o da eficiência, em função de interesses meramente partidários.
Uma vez salvaguardados estes princípios, revemo-nos nesta proposta e, em função disso, retiramos a que apresentámos.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, foram aqui elogiados os méritos do poder local e, ao contrário do que foi dito, creio que boa parte dos méritos do poder local são inseparáveis do modelo que foi adoptado e que o actual modelo tem a vantagem de integrar mais sectores políticos na gestão e na comunidade locais e de permitir às minorias colaborar e fiscalizar de uma forma mais directa e mais intensa.
De qualquer modo, não gostaria de deixar de sublinhar que, na falta de um acordo em torno de um modelo, o PS, o PSD e o PP, pura e simplesmente, pedem um "cheque em branco" para, em qualquer altura, alterarem o modelo.
Julgo que este procedimento, que já foi adoptado noutras matérias, é extremamente negativo, porque corresponde a afastar cada vez mais a Constituição material da Constituição em sentido formal, para quem aceita estas distinções, e estes são aspectos negativos.
Tenho dificuldade em entender que o elenco dos eleitores para um órgão de soberania como o Presidente da República não conste da Constituição, tenho dificuldade em entender que o sistema eleitoral para a Assembleia da República não conste da Constituição e tenho dificuldade em entender, igualmente, que o sistema eleitoral para as câmaras municipais não conste da Constituição.
Penso que há aqui um caminho que se traduz, no fim de contas, no seguinte: em todas as matérias em que não houve acordo, o PS e o PSD acordaram em estabelecer aquilo a que o Sr. Deputado Marques Guedes chama "flexibilização do texto constitucional", que é um eufemismo para designar o facto de a Lei Fundamental não conter aquilo que deveria conter.
Julgo que nenhum sistema pode afirmar-se como perfeito. No entanto, também me parece evidente que aqueles que foram adiantados como alternativas são mais imperfeitos ainda.

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Dar o prémio de maioria conferindo automaticamente a maioria absoluta a quem o povo não quis conferir ou propor que o órgão executivo seja designado pela assembleia de entre os seus membros por proposta do presidente de câmara e sendo precisos dois terços dos membros das assembleias para obter uma alternativa são duas situações que me parecem manifestamente infelizes e qualquer das duas de sentido não democrático.
Assim, aquilo que aqui foi apelidado de flexibilização é, para nós, um factor de inquietação, porque são caminhos bem menos democráticos do que aqueles que estão actualmente estabelecidos.
Há, de acordo com o sistema actual - e foi esta a grande crítica que foi feita -, situações de instabilidade. Julgo é que num outro tipo de sistema de sentido não democrático haveria, provavelmente, mais situações de instabilidade do que neste momento.
Por outro lado, não julgo que aquilo que se adianta salvaguarde a representação proporcional. Esta deve existir onde estava originariamente estabelecida e, se é substituída por qualquer outra forma, é evidente que é eliminada ou pode ser eliminada.
Por outro lado ainda, também me parece que, se o sistema actual tem, muito mais por virtude da lei ordinária do que do próprio texto constitucional, sentido presidencialista, aquilo que era adiantado, particularmente na proposta do PS, teria um sentido provavelmente muito mais presidencialista.
Chamo, ainda, a atenção não só para o facto de estarmos preocupados com o aumento de poderes das assembleias, particularmente no plano da fiscalização, no plano financeiro e noutros, mas também para o facto de que as restrições que houve nesta matéria - e que até hoje, infelizmente, não foram eliminadas - datam do tempo do bloco central. E, portanto, em última instância, são aqueles que neste momento invocam o fortalecimento do poder das assembleias para justificar esta solução que têm a grande responsabilidade nesse enfraquecimento em matérias que eram particularmente importantes ao longo de todo um mandato e não propriamente apenas no momento da eleição do respectivo órgão.
Quanto à questão do referendo, a proposta que é adiantada corresponde à redacção que tinha sido proposta na sequência da primeira leitura, com excepção da diferença entre atribuições e competências, que já aqui tivemos oportunidade de discutir. Existem mesmo elementos desta proposta que têm origem no projecto do PCP, como a questão da iniciativa dos cidadãos eleitores, e, neste sentido, não posso deixar de lamentar, mais uma vez, o facto de o acordo PS/PSD se ter apropriado do trabalho conjunto da primeira leitura em benefício próprio. Mas, enfim, cada um adopta os métodos e os processos que bem entende…!
Em todo o caso, como para nós aquilo que importa não são este tipo de procedimentos mas questões de conteúdo, votaremos a favor da proposta de artigo 241.º-A.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Muito obrigado, Sr. Presidente. Era só para deixar registado um pequeno apontamento.
Congratulo-me com o resultado a que se chegou. E tenho uma especial razão para me congratular visto que fui o primeiro subscritor de um projecto de lei apresentado e defendido em 1976, na 1.ª Sessão Legislativa da I Legislatura, segundo o qual este sistema de garantir à maioria relativa da câmara uma maioria de funcionamento seria o sistema possível de acordo com a Constituição ainda hoje vigente. Mas não foi assim entendido.
A razão pela qual este sistema é de saudar assenta num elemento fundamental do sistema democrático: o princípio da responsabilidade política.
Fala-se muito que nas autarquias locais as forças políticas e as personalidades se concertam e acertam para gerir os assuntos municipais e, porque se pensa que estes acertos e concertos também respondem, se calhar, por muitos dos desvios democráticos que se verificam também no exercício do poder local, entendo que, ao darmos este passo (e oxalá o legislador o dê rapidamente!) se garante a clareza da responsabilidade política, e sem responsabilidade política, cobrada em eleições pelas forças partidárias que exerceram o poder, não há democracia saudável. Se, quando se chega às eleições, um pode dizer: "foste tu o culpado, porque eu não tinha maioria!", o povo fica sem saber a quem imputar responsabilidades e a quem escolher.
Portanto, este é um avanço altamente positivo, do ponto de vista democrático.
Por outro lado, o sistema eleitoral não é, nas Constituições mais evoluídas, matéria constitucional. A Constituição define os princípios constitucionais, e é bom que mantenha o princípio da representação proporcional, mas não define o regime, o próprio sistema eleitoral, isso faz parte de uma competência normal do legislador ordinário, aliás, trata-se, de resto, de uma competência que é especialmente cautelosa, visto que vai ser adoptada por uma lei que tem um processo de formação particularmente severo e exigente.
Por último, gostaria de dizer que as purezas da representação democrática são impossíveis. Qualquer sistema tem de introduzir modificações quando se trata de transformar os votos em mandatos, e introdu-las inevitavelmente.
Lembro o sistema proporcional, o mais evoluídos dos sistemas, por mais voltas que se dêem, por mais sonhos que se tenham com Inglaterra e França etc. Julgo que um dos méritos do nosso sistema político é o de ter garantido a todas as forças políticas com o mínimo de representação, não fixado na lei mas resultante do jogo normal dos votos, que tenham podido exercer a sua crítica dentro das instituições do Estado, e não na rua.
Este avanço ganhou-se através do sistema de representação proporcional; é um ganho e é mantido aqui.
Mas, como dizia, o sistema de representação proporcional também implica, desde logo, distorções em si para poder funcionar. Não se pode partir um Deputado em bocados para entrarem umas décimas e ficarem outras décimas de fora. Há sempre arranjos a fazer.
Portanto, a lei é equilibrada. Saúdo o avanço que ela constitui, lamento, porém, a forma bastante mal-amanhada em que se apresenta, mas esta é uma minha lamúria habitual.
Há aqui umas "suas" e uns "seus" mal colocados no fim do texto; há um "regulará" que deve ser "regular". Na expressão "sendo designado presidente", esta palavra

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"designado" tem alguma função? Julgo que não tem. Designado por quem?
Sugiro, pois, que seja dada uma revisão formal a este n.º 3 que me parece realmente muito complexo e misturado.

O Sr. Presidente: * Muito obrigado, Sr. Deputado Barbosa de Melo.
Só uma pequena referência: a palavra "designado" tem, de facto, um efeito útil, uma vez que, quando da formulação da nova lei, se articulará necessariamente com os requisitos que na lei vierem a ser estabelecidos para as regras, tanto da constituição como de destituição. Significa isto que poderão ser encontradas soluções menos ou mais flexíveis, em função justamente do princípio da responsabilidade a que o Sr. Deputado Barbosa de Melo há pouco aludia.
Por isso, esta é uma expressão que permitirá que o presidente possa vir a exercer mandato, ou por todo o período correspondente do mandato, ou em função de uma dependência de responsabilidade das assembleias municipais. Esta última, eventualmente, também poderá ser substituída de acordo com uma lógica de alternância democrática e, nessa altura, a expressão "designado" abre aqui a porta para a possibilidade também da substituição alternante do presidente.
Simplesmente, isto são soluções hipotéticas neste momento. Porque o são, apenas queremos que a formulação normativa consinta várias possibilidades. A possibilidade que, em concreto, vier a ser adoptada, o futuro a dirá.
Srs. Deputados, posto isto, suponho que estamos em condições de passar à votação.
Todos os testemunhos e pontos de vista, creio que relevantes, estão assumidos em função destas propostas. Vamos, pois, votá-las.
Em primeiro lugar, vamos votar a proposta 242, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 241.º - Órgãos deliberativos e executivos.
Esta proposta tem uma coerência intrínseca. Proponho, por isso, que a votemos globalmente.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, desculpe, mas há aqui questões que não estão efectivamente ligadas. Por exemplo, o n.º 4 não tem uma ligação com o resto.

O Sr. Presidente: * Se o Sr. Deputado considerar preferível, votaremos autonomamente o n.º 4. Aliás, tem razão, porque trata-se da questão das candidaturas independentes.
Então, vamos votar em conjunto os n.os 1, 2 e 3 do artigo 241.º constante da proposta 242.

Submetidos à votação, obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

São os seguintes:

1. A organização das autarquias locais compreende uma assembleia eleita dotada de poderes deliberativos e um órgão executivo colegial perante ela responsável.
2. A assembleia é eleita por sufrágio universal, directo e secreto das cidadãos recenseados na área da respectiva autarquia, segundo o sistema de representação proporcional.
3. O órgão executivo da autarquia é constituído por um número adequado de membros, sendo designado presidente o primeiro candidato da lista mais votada para a assembleia ou para o executivo, de acordo com a solução adoptada na lei, a qual regulará também o processo eleitoral, os requisitos da sua constituição e da sua destituição os termos do seu funcionamento.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à votação do n.º 4 do artigo 241.º constante desta mesma proposta 242.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É o seguinte:

4. As candidaturas para as eleições dos órgãos das autarquias locais podem ser propostas por partidos políticos, isoladamente ou em coligação, ou por grupos de cidadãos eleitores, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta 243, apresentada pelo PS e pelo PSD, referente ao artigo 241.º-A - Referendo local.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

As autarquias locais podem submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas competências dos seus órgãos, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei estabelecer, a qual pode admitir a iniciativa dos cidadãos eleitores.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, há que votar, também, a disposição transitória.

O Sr. Presidente: * Falta votar uma proposta a que, há pouco, não tive ocasião de aludir mas que já vos foi distribuída.
Trata-se da proposta 246, com a natureza de disposição final, e que visa regular a fase transitória entre o regime actual e as possibilidades de aplicação do novo regime derivado da Constituição.
Srs. Deputados, vamos, pois, passar à votação da proposta 246 que se refere à disposição final relativa ao artigo 241.º.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

Até à entrada em vigor da lei prevista no artigo 241.º, n.º 3, os órgãos das autarquias locais são constituídos e funcionam nos termos de legislação correspondente à redacção da Constituição em vigor à data da aprovação da presente lei de revisão.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, calculo que há pedidos de palavra para declarações de voto, mas antes gostaria de esgotar as matérias que em torno deste tema estão pendentes de votação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, as propostas do PSD estão prejudicadas.

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O Sr. Presidente: * Srs. Deputados do CDS-PP, podemos dar por prejudicadas as vossas propostas face às votações agora realizadas?

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): * Sr. Presidente, eu anunciei que as retirava.

O Sr. Presidente: * Estão, pois, retiradas as propostas apresentadas pelo CDS-PP.
As propostas do PSD estão consideradas substituídas e as propostas do PS substituídas estão. As do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, são consideradas prejudicadas com assentimento geral.
Srs. Deputados do PSD, há uma proposta subscrita pelo Deputado Arménio Santos e outros, do PSD, que se reporta ao referendo local. Podemos considerá-la prejudicada?

O Sr. Francisco José Martins (PSD): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Com certeza.
A proposta subscrita pelo Deputado do PCP João Corregedor da Fonseca está prejudicada com assentimento geral.
Srs. Deputados do PCP, qual é o vosso entendimento relativamente às vossas propostas?

O Sr. Luís Sá (PCP): * A proposta relativa ao n.º 4 está prejudicada, mas não a que se refere ao n.º 5.

O Sr. Presidente: * Então, vamos passar à votação de um n.º 5 ao artigo 241.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, votos a favor do PCP e abstenções do PSD e do CDS-PP.

Era o seguinte:

5. As assembleias das autarquias locais podem deliberar a criação, sob proposta dos respectivos executivos, de comissões municipais, integradas por organizações económicas, sociais e culturais que exerçam a sua actividade na área da autarquia, a fim de estimular a participação na gestão de sectores de actividade a cargo dos municípios.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, acho que isto não é para a Constituição.

O Sr. Presidente: * Então, tivesse votado contra!
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): * Sr. Presidente, é para reafirmar duas coisas em relação a este conjunto de artigos.
Em primeiro lugar, a clareza de duas conclusões que tiramos com esta votação. A primeira, a de que a Constituição, pela primeira vez, consagra de maneira nítida a necessidade de uma reforma em relação ao modelo eleitoral para as autarquias locais, coisa que há muito tempo vínhamos reclamando. A segunda, a do princípio da flexibilização do texto constitucional em relação à matéria eleitoral, um princípio que também há muito tempo nos é caro e que, mais uma vez, vemos consagrado como uma certeza.
Em segundo lugar, gostaria de salientar quatro princípios que, para mim, são muito importantes nas votações que acabámos de fazer, designadamente dos artigos 241.º e 241.º-A.
Sabemos da importância histórica do modelo eleitoral que tem sido seguido para as autarquias locais, não negamos a importância histórica que eventualmente teve, mas estamos perfeitamente conscientes de que o mesmo, na verdade, há muito tempo tinha entrado em crise.
Não que essa crise diga respeito a duas questões essenciais do nosso ponto de vista e que estão salvaguardadas na votação que fizemos do artigo 241.º, não que a crise abrangesse a manutenção do sistema de representação proporcional, não que a crise abrangesse a identificação, com força significativa, do presidente de câmara municipal como elemento catalisador da responsabilidade do órgão autárquico. Mas, em relação às matérias como a da fiscalização, a da eficiência da administração municipal, a da possível confusão de responsabilidade entre maioria e oposição e a do aumento da participação dos cidadãos, penso que a discussão, designadamente a feita na primeira leitura, foi muitíssimo importante e o modelo genérico que, nesta altura, é atribuído no artigo 241.º também aponta um caminho de reforma que é muitíssimo importante e vai, quanto a nós, no bom sentido.
Em termos de participação dos cidadãos, é-nos particularmente grato salientar quer o aumento da participação eleitoral através da possibilidade de constituição de grupos de cidadãos eleitores, quer, em relação à participação referendária, o aumento, também, das possibilidades, tanto de solicitação, como de participação, como da diversificação das consultas aos eleitores.
Portanto, do nosso ponto de vista, este é um conjunto de artigos votados, que são significativos, são importantes, são positivos, são um bom contributo para esta revisão constitucional.
Todavia, Sr. Presidente, quero salientar que, no que diz respeito à proposta 246, já aprovada, deverá ser objecto de algumas melhorias do ponto de vista do texto em sede de redacção final. É que há alguns elementos nitidamente excedentários e um pouco "confusionistas" na determinação do seu conteúdo que parece que poderiam cair e ser substituídos por um texto melhor.

O Sr. Presidente: * Muito obrigado, Sr. Deputado. Lá chegaremos.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de declarar que está aberta a porta para alterações ao actual sistema de eleição, em particular das câmaras municipais, o que não significa que a porta que vier a ser seguida não deva observar outros princípios que estão igualmente consagrados na Constituição.
A nosso ver, entretanto, o sistema actual provou, revelou-se vantajoso, naturalmente tinha dificuldades que foram resolvidas, desde logo com eleições intercalares em que aqueles que as provocaram foram castigados. Também há outras vias, como o acréscimo de poderes do presidente de câmara, mas tememos que as vias que vierem a ser

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adoptadas sejam muito menos eficazes e muito menos democráticas do que aquelas que, até este momento, foram postas em prática.
Por outro lado, continuamos a julgar que há questões em que o texto constitucional não deve ser flexível, deve conter a regulamentação dos problemas que são os esteios fundamentais do sistema democrático e, a nosso ver, entre estes esteios está inequivocamente o poder local.
Congratulamo-nos, entretanto, com o facto de as alterações introduzidas no regime do referendo poderem vir, eventualmente, a possibilitar referendos locais, o que não foi possível até ao momento, bem como com a clarificação da possibilidade de os grupos de cidadãos eleitores apresentarem candidaturas aos órgãos municipais.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, passamos ao artigo 243.º, que tem por epígrafe "Tutela administrativa".
Temos sobre a mesa uma proposta de um n.º 4, do PCP, e outra, que altera o n.º 3, do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS. Não creio que alguma delas tenha tido acolhimento na primeira leitura; no entanto, gostava de chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de o n.º 3 do artigo 243.º da Constituição dizer que, e cito, "A dissolução de órgãos autárquicos resultantes de eleição directa só pode ter por causa acções ou omissões ilegais graves."
No regime das autarquias locais, as juntas regionais, por efeito constitucional, já não eram formadas em função de uma eleição directa e agora abriu-se a porta, pela votação que já teve lugar, à eventual possibilidade de tal também vir a ocorrer quanto à constituição do órgão "município", a câmara municipal.

O Sr. Luís Sá (PCP): * As juntas de freguesia também não eram!

O Sr. Presidente: * As juntas de freguesia também já não eram.
Daí que me interrogue, e vos interrogue, sobre se faz sentido continuar a fazer referência aos órgãos autárquicos "resultantes de eleição directa" e não apenas aos órgãos autárquicos tout court, redacção que me parecia mais avisada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, do ponto de vista do PSD, e na sequência da reflexão que fizemos entre a primeira e a segunda leituras, quero reiterar que não alterámos a nossa posição neste pormenor.
Assim, relativamente à proposta apresentada pelo Partido Comunista, não concordamos com o termo "cessação individual", porque é evidente que as situações, nomeadamente as de renúncia (para não dar outros exemplos), não podem ser postas em causa por uma norma desta natureza e, nesse sentido, utilizando aquela que já é a linguagem constitucional - relativamente aos Deputados, a Constituição utiliza a dicotomia conceptual entre perda e renúncia -, o termo "cessação individual" deveria aqui ser substituído por "perda".
Do ponto de vista do PSD, também o problema da efectivação por via judicial só é aceitável como requisito necessário, eventualmente, nos casos da perda de mandato e já não no caso de dissolução de órgãos deliberativos. Por razões de eficiência de funcionamento do nosso Estado de direito, entendemos que a via judicial pode ser uma mera via de recurso, não pondo em causa a dissolução em termos operativos, em termos legais imediatos.
Sr. Presidente, o PSD estará receptivo a uma alteração que tenha uma redacção deste género: a dissolução de órgãos autárquicos, bem como a perda de mandato dos seus titulares, só podem ter por causa acções ou omissões ilegais graves. E ponto final!
O PSD estará disponível, repito, para viabilizar uma redacção deste género, que, julgo, também resolve indirectamente o problema que o Sr. Presidente acabou de referir e não abre dificuldades novas à legislação actualmente em vigor e que, de resto, foi recentemente alterada em alguns aspectos por unanimidade, nesta Assembleia.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, não terei dificuldade em acompanhar uma redacção do tipo da que foi proposta pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes. Porém, o Sr. Deputado não clarificou o que o leva a não admitir que este tipo de actos, isto é, a dissolução de órgãos autárquicos e actos conducentes à perda individual do mandato, se possa efectivar por via judicial! E essa não aceitação é tanto mais estranha quanto, felizmente, estamos a falar de uma conquista a que já chegámos na lei ordinária, na nova lei da tutela.
No fundo, o que é que o impede de consagrar constitucionalmente um princípio que me parece, de todo em todo, salutar? Isto é, por que razão não admite que a apreciação da actuação dos eleitos, daqueles que são democraticamente eleitos ou têm uma legitimidade indirecta, possa ser feita por via judicial e que a perda do mandato, a dissolução do órgão só se processe por via judicial?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Sá, em primeiro lugar, embora concordando genericamente como o princípio, o PSD não considera essencial esta inscrição constitucional. E, como o Sr. Deputado acabou de referir, e bem, esta questão já tinha sido discutida na primeira leitura.
Com efeito, o actual texto constitucional não impediu, como o Sr. Deputado Luís Sá acabou de recordar, que o legislador ordinário tenha optado por uma solução desse tipo, solução que, do nosso ponto de vista, dificilmente sofrerá um recuo.
Em qualquer circunstância, por variadíssimas razões - e é evidente que as situações não são comparáveis -, por exemplo, na perda de mandato dos Deputados também não é exigível a intervenção necessária de tribunais, o que se prevê, sim, é a possibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional.
Sei o que o Sr. Deputado Luís Sá irá dizer, mas poupo-lhe esse trabalho, porque comecei por dizer que, evidentemente, as situações não são comparáveis. Desde logo, a Assembleia da República é um órgão de soberania… Mas, Sr. Deputado, não vale a pena reeditarmos o debate da primeira leitura. De facto, só estaríamos disponíveis para consagrar a obrigatoriedade da via judicial para a perda de mandato, o que obrigaria a redigir números autónomos, sob

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pena de a redacção desta disposição ficar impossível em termos de uma perceptibilidade fácil. Aliás, já o tínhamos deixado claro na primeira leitura.
Ou seja, o PSD estará receptivo a uma norma desse tipo, que consagre a via judicial obrigatória, mas desde que ela se destine apenas à perda de mandato. Só que tal obrigaria a que se fizesse uma alteração, incluindo um número novo na Constituição para separar as duas situações, o que não nos parece francamente necessário. O que interessa é que constem da Constituição estes princípios gerais, cabendo depois ao legislador ordinário (o que já fez) densificar, em termos adequados, a forma como terão lugar este tipo de situações.
Portanto, para nós bastaria dar-se aqui o mote, acrescentando-se, a par da dissolução dos órgãos, a perda de mandato dos seus titulares, prevendo como requisito essencial a ocorrência de acções ou omissões ilegais graves.
Quanto ao mais, compete ao legislador ordinário consagrar quais são os mecanismos que devem ser observados para a concretização destes princípios.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, temos de fazer a seguinte ponderação: por um lado, parece haver consenso quanto a que se suprima a referência "resultantes de eleição directa" mas, por outro lado, há ainda alguma hesitação sobre se se deve ou não incluir uma referência expressa, a par da dissolução dos órgãos autárquicos, à perda de mandato dos titulares dos órgãos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Cláudio Monteiro.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, quanto à supressão da expressão "resultantes de eleição directa", parece-me normal e lógica, tendo em conta que hoje em dia, independentemente de o texto constitucional o referir ou não, designadamente, o presidente de câmara é órgão do município e é discutível que ele seja designado por eleição directa no sentido próprio do termo.
No entanto, queria chamar a atenção para a circunstância de que não se pode confundir dissolução de órgão autárquico com perda de mandato autárquico, porque a perda de mandato autárquico não é acto de natureza tutelar, é acto de natureza sancionatória, aplicado individualmente ao titular do órgão. Em sentido estrito, acto de natureza tutelar é apenas o acto de dissolução do órgão. E não é verdade que todos os casos de perda de mandato resultem exclusivamente de acções ou omissões ilegais graves no sentido próprio do termo, porque há, de facto, alguns casos em que a natureza sancionatória do acto está mais vincada e não tem necessariamente que ver com aquilo que é normalmente o conceito de acção ou omissão ilegal grave, que, aliás, é um conceito vago e indeterminado que a lei de certa forma preenche, embora com alguma margem de liberdade.
Parece-me, pois, errado querer tratar aqui a questão da perda de mandato. Aliás, e fazendo uma crítica ao PCP, tratando essa matéria neste capítulo, referindo expressamente a decisão judicial, deixa de ser acto de natureza tutelar e deixa de fazer sentido que possa estar previsto no artigo 243.º, porque uma decisão do tribunal não é, com certeza, uma medida tutelar! Uma medida tutelar pressupõe, por definição, um acto de um órgão administrativo relativamente a actos de outro órgão administrativo.
Nesse sentido, a perda de mandato, sendo hoje, como é na lei, sempre decretada pelo tribunal, nem sequer é medida tutelar pela simples razão de que deixou de ser acto administrativo e passou a ser acto do poder jurisdicional.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Muito bem!

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Por outro lado, não tenho a certeza absoluta do que vou afirmar - o Sr. Deputado Luís Sá estará mais bem informado, porque trabalhou mais directamente no dossier do que eu - mas tenho ideia de que, na lei ordinária, a dissolução de órgão continua a ser competência do governo e não dos tribunais.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Não, Sr. Deputado. É dos tribunais!

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Já é dos tribunais? É que na lei anterior essa diferença continuava estabelecida de forma bem clara.
Contudo, independentemente de a lei ordinária prever ou não prever, não me parece que seja boa solução confundir a dissolução de órgão com a perda de mandato autárquico e, nesse sentido, julgo que, a ser introduzida alguma benfeitoria útil ao artigo, para além daquela que proponho mas que, aparentemente, não colhe consenso, seria a de eliminar a referência aos órgãos designados por eleição directa.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, tendo em conta a intervenção do Sr. Deputado Cláudio Monteiro, apenas gostaria de fazer a seguinte referência: independentemente de a decisão final da dissolução ou da perda de mandato competir aos tribunais, como já acontece, neste momento, em relação a todos os casos, de acordo com a última alteração que foi introduzida na lei ordinária, não impede que se insira essa situação, sem forçar demasiado, neste artigo sobre a tutela administrativa. E porquê? Porque, em última instância, quem comunica ao Ministério Público os factos apurados em inspecção, inquérito ou sindicância para efeitos de instaurar a acção é o governo, servindo-se do que foi apurado em acções inspectivas.
Nesse sentido, diria que o acto judicial é um acto terminal de um processo de tutela, em que todas as outras etapas são etapas, na medida em que resultam da relação entre o governo e as autarquias locais.
De qualquer modo, se a crítica do Sr. Deputado for procedente, então, ela é tão procedente para a perda do mandato como é para a dissolução, porque quer uma quer outra são efectivadas por via judicial.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, é para reafirmar que, como dissemos na primeira leitura, não vemos razão para alterar a norma constitucional atinente ao regime de dissolução no sentido da jurisdicionalização obrigatória, irretorquível, de sentido único, ainda que com as mitigações procedimentais a que aludiu agora o Sr. Deputado Luís Sá.

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Por outro lado, é positivo e vantajoso não misturar, como o Sr. Deputado Cláudio Monteiro acabou de alertar, um regime que é puramente sancionatório, o atinente à perda de mandato, matéria sobre a qual, aliás, no artigo 120.º incorporámos, no n.º 2, uma benfeitoria para criar uma cláusula constitucional que permita estatuir legalmente sanções de diversos tipos face ao incumprimento de normas legais sobre deveres, responsabilidades e incompatibilidades dos titulares de cargos políticos, dos mais diversos tipos. Essa mistura não tem nenhuma razão de ser dada a natureza muitíssimo distinta das duas figuras e, sobretudo, tendo em conta que estas acções ou omissões ilegais são acções e omissões qualificadas, sendo certo que, não estando, seguramente, no campo e no horizonte do legislador ordinário sancionar com perda de mandato condutas de lana caprina, os requisitos são distintos.
Por último, Sr. Presidente, gostaria de dizer que estaríamos de acordo em suprimir o inciso "resultantes de eleição directa", constante deste número, que tem dado origem a bastantes confusões.
Na verdade, dizer-se, como diz o actual n.º 3 do artigo 243.º da Constituição, que "A dissolução de órgãos autárquicos resultantes de eleição directa" pode ter lugar em determinadas circunstâncias pode inculcar uma de duas coisas: ou a possibilidade de dissolução em relação a esses órgãos não resultantes de eleição directa poder fazer-se por factos nada graves, não graves, minimamente graves, ou, então, uma proibição de dissolução desses órgãos, o que, francamente, não faz sentido. Seria um regime de protecção especialmente forte, o qual não tem nenhuma razão de ser a seu favor, antes pelo contrário.
Logo, estaríamos disponíveis para votar a eliminação do inciso "resultantes de eleição directa".

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD):* Sr. Presidente, antes de procedermos à votação da proposta que está em cima da mesa no sentido de eliminar o inciso "resultantes de eleição directa", proponho que se ponha à consideração se não poderíamos aditar a expressão "representativos". E o n.º 3 do artigo 243.º ficaria assim: "A dissolução de órgãos autárquicos representativos só pode ter por causa acções ou omissões ilegais graves". É que os artigos 245.º, relativamente às freguesias, 250.º, relativamente aos municípios, e 259.º, relativamente às regiões administrativas, dizem expressamente quais são os órgãos representativos das freguesias, dos municípios e das regiões administrativas. Penso que só esses se pretende abranger nesta norma do artigo 243.º, n.º 3, e não outros órgãos autárquicos que existem, e são muitos, não especificados na Constituição mas especificados nas leis.
Por isso, penso que, retirando a expressão "resultantes de eleição directa" e acrescentando a expressão "representativos", poderia ficar explícita esta questão.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Moreira da Silva, sinceramente não vejo vantagem. Porque se vierem a ser constituídas outras entidades com natureza inframunicipal, por exemplo, com a constituição de órgãos próprios, não vejo razão pela qual o seu regime de tutela, em homenagem ao princípio da autonomia do poder local, não deva ser rigorosamente o mesmo. Francamente não vejo!
Por isso, porque estamos a tratar de causas de dissolução, parece-me que a supressão do inciso "resultantes de eleição directa", que, pelo menos, parece fazer consenso entre nós, é um passo em frente. Quanto ao mais, julgo que seria prudente não introduzir novos factores de distinção.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, chamo a atenção para o seguinte: não estou totalmente convencido de que seja fundamental colocar a palavra "representativos", embora a sugestão me pareça correcta. E parece-me correcta porque, na Constituição, "órgãos representativos" não é um conceito novo, existe na Constituição. Desde logo, no artigo inicial do capítulo do poder local e, depois, nos subcapítulos que têm que ver com cada um dos graus de autarquias, onde sempre se utiliza o termo "órgãos representativos".
Portanto, "órgãos representativos" é algo que a Constituição delimita muito bem, logo, não é um conceito novo. Se é necessário ou não pôr na Constituição, penso que pode, eventualmente, ser discutível, porque é evidente que, quando a Constituição fala em dissolução de órgãos autárquicos, refere-se àqueles que a Constituição prevê e não outros. Seria de todo inadequado pensar-se que, por exemplo, os conselhos municipais que venham a ser criados em determinadas autarquias, que serão órgãos autárquicos, só pudessem ser dissolvidos por acções ou omissões ilegais graves quando a sua própria existência deve depender de um critério de oportunidade da própria autarquia.
Portanto, não faz qualquer sentido que a Constituição venha pôr em causa…

O Sr. Presidente: * Mas isso é uma deliberação normal ao abrigo de um regime de competência, não tem nada a ver com o exercício de uma função local!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, foi isso mesmo que eu disse. Tenho dúvidas de que seja necessário incluir no texto a palavra "representativos". No entanto, que fique claro em acta que é exactamente esse o sentido que lhe queremos dar. Ou seja, quando se fala em dissolução dos órgãos autárquicos, estamos a referir-nos aos representativos e não a outros, porque a Constituição define muito bem quais são os órgãos representativos e é exactamente a esses que queremos dirigir-nos nesta norma da tutela administrativa que fala em dissolução e coloca condições à dissolução. De facto, é a dissolução dos órgãos representativos que temos em meta e não outro. Gostava que isso ficasse claro em acta.
Se é necessário ou não pôr na Constituição, também me parece que, como dizia há pouco o Sr. Deputado Cláudio Monteiro, uma vez que estamos em sede de artigo da tutela e em sede de Constituição da República, por maioria de razão, estamos a falar desses e não de outros órgãos que estão na liberalidade do legislador ordinário ou das câmaras municipais criar e instituir e, obviamente, também dissolver ou extinguir em qualquer momento.

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O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar a uma fase deliberativa sobre este artigo.
Proponho que votemos, em primeiro lugar, a proposta 251, apresentada pelo PS, que tem como efeito único apenas a supressão, no n.º 3 do artigo 243.º, da referência "resultantes de eleição directa".

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

3. A dissolução de órgãos autárquicos só pode ter por causa acções ou omissões ilegais graves.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, subsiste agora, na proposta do PCP, a referência à efectivação por via judicial.
Sr. Deputado Luís Sá, deseja que a proposta seja submetida a votação?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Com certeza, Sr. Deputado.
Vamos, então, votar o n.º 4 do artigo 243.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e a abstenção do CDS-PP.

Era o seguinte:

4. A dissolução de órgãos autárquicos e a cessação individual do mandato dos seus titulares só podem ter por causa acções ou omissões ilegais graves e só podem efectivar-se por via judicial.

O Sr. Presidente: * Retirada a proposta que altera o n.º 3 do artigo 243.º, apresentada pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, passamos ao artigo 244.º.
Uma vez que não há inscrições, vamos proceder à votação do n.º 2 do artigo 244.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

É o seguinte:

2. É aplicável aos funcionários e agentes da administração local o regime dos funcionários e agentes do Estado, com as adaptações necessárias, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: * Em relação ao artigo 246.º, temos uma proposta comum, a 248, apresentada pelo PS e PSD, que visa harmonizar as referências aos órgãos da freguesia com o votado já para o artigo 241.º.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma curta declaração sobre a votação do n.º 2 do artigo 244.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD.

O Sr. Presidente: * Então, voltamos atrás?

O Sr. José Magalhães (PS): * Sim, Sr. Presidente. Peço desculpa.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, não objectámos e, pelo contrário, viabilizámos esta proposta do PSD, em grande parte, porque ela é uma explicitação de algo que já decorre da Constituição e não acarreta qualquer distorção na leitura que fazemos da proposta.
Trata-se de um processo através do qual um determinado regime jurídico tem em conta especificidades. A aplicabilidade não pode ser, em muitos casos, directa e a adaptação não pode contrastar com princípios fundamentais. Não permite, por exemplo, "irrelevantizar" valores como o mérito, a competência ou as regras de bom acesso à função pública; não permite postergar boas regras em matéria de estatuto disciplinar; não permite diminuir o estatuto ou criar uma espécie de funcionários de segunda ou de terceira. A norma actual não o permite e esta norma também não.
Portanto, é de adaptação virtuosa que se fala aqui.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, relativamente ao artigo 246.º, como disse há pouco, temos uma proposta comum, a 248, apresentada pelo PS e PSD, que visa harmonizar as referências aos órgãos da freguesia com o votado já para o artigo 241.º, n.º 2.
Estamos em condições de votá-la?

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, gostava de fazer uma declaração para me congratular com o facto de, relativamente às freguesias, as opções do plano terem sido consagradas na proposta do PS e do PSD. O Deputado António Filipe dizia-me que faltava aqui a expressão "grandes" antes de "opções do plano", mas, apesar disso, não deixa de ter o seu mérito.

O Sr. Presidente: * E tem um outro, que o Sr. Deputado Luís Sá não referiu mas que, já agora, me permito referir.
É que, ao conferir-se a competência para os órgãos deliberativos aprovarem o orçamento - será assim para a freguesia, será assim para o município -, faz-se uma alteração muito significativa relativamente ao regime actual. Isto porque o regime actual condiciona, designadamente, as assembleias municipais mas também as assembleias de freguesia a votarem o orçamento apenas por um voto "sim" e "não", sem possibilidade de alteração, na especialidade, das propostas de orçamento que são apresentadas pelos respectivos executivos.
Ao dar-se, em sede constitucional, competência plena aos órgãos deliberativos para aprovação destes documentos, eles ganham, iniludivelmente, competência não apenas para uma aprovação final global mas também para uma aprovação mediante eventuais propostas de modificação na especialidade.
Esse também é, a meu ver, um adquirido que vale a pena realçar.
Srs. Deputados, passamos à votação proposta 248, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 246.º.

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Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

1. A assembleia de freguesia é o órgão deliberativo da freguesia, constituído por membros eleitos nos termos do artigo 241.º, n.º 2, salvo os casos de plenário.
2. (Actual n.º 3).
3. Compete à assembleia de freguesia exercer as competências prevista na lei, incluindo aprovar as opções do plano e o orçamento.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, ainda quanto ao artigo 246.º, vamos ver o que acontece às propostas dos projectos originários. A proposta do PS foi substituída, a do CDS-PP está prejudicada, evidentemente, tal como as propostas do Deputado Pedro Passos Coelho e outros, do PSD, e do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 247.º, relativamente ao qual há também uma proposta comum, a 247, apresentada pelo PS e PSD, mais uma vez para harmonização com o artigo 241.º.
Srs. Deputados, vamos, então, passar à votação da proposta 247, apresentada pelo PS e pelo PSD, relativa ao artigo 247.º.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

A junta de freguesia é o órgão executivo colegial da freguesia, sendo o presidente da junta designado e a constituição do órgão estabelecido nos termos do artigo 241.º, n.º 3.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos agora ver o que acontece às propostas restantes dos projectos iniciais. A proposta do PS é substituída e a do Sr. Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, está prejudicada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Está prejudicada pela ausência do Deputado!

O Sr. Presidente: * Há, ainda, uma proposta do PCP, de aditamento de um artigo 247.º-A, do seguinte teor: "As freguesias podem constituir associações para administração de interesses comuns".

O Sr. José Magalhães (PS): - Penso que a podemos votar já, Sr. Presidente, uma que já foi discutida.

Pausa.

Srs. Deputados, daqui a pouco, quando estivermos em sede de competências dos municípios, será apresentada uma norma relativamente à possibilidade de constituição de associações e federações de municípios.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, isso é no capítulo dos municípios!

O Sr. Presidente: * Foi o que acabei de dizer, Sr. Deputado Marques Guedes!
Portanto, aquilo que eu gostaria é que não encontrássemos soluções desequilibradas. De duas, uma: ou não fazemos qualquer referência ou, então, fazemos uma referência que, do meu ponto de vista, não seria idêntica à proposta do PCP mas, sim, à do guião.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sem dúvida!

O Sr. José Magalhães (PS): * "As freguesias podem constituir, nos termos da lei, associações para administração de interesses comuns".

O Sr. Presidente: * Portanto, a proposta que vem no guião pode ser materializada, não é verdade? Vamos, então, materializá-la.
Vamos passar à votação da proposta 252, subscrita pelo PS, PSD, CDS-PP e PCP, no sentido de acrescentar um novo artigo, do seguinte teor: "As freguesias podem constituir, nos termos da lei, associações para administração de interesses comuns". Vamos votá-la apenas com a indicação de se tratar de um artigo novo e, depois, em sede de redacção final, veremos a sua inserção.
Vamos, então, proceder à votação.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

As freguesias podem constituir, nos termos da lei, associações para administração de interesses comuns.

O Sr. Presidente: * A proposta originária do PCP será substituída por aquela que acabámos de votar.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, a proposta 247 já foi votada?

O Sr. Presidente: * Já, Sr. Deputado, e por unanimidade.

O Sr. António Filipe (PCP): * Foi por distracção minha, Sr. Presidente, pois eu queria votar contra essa proposta.

O Sr. Presidente: * Qual?! A proposta relativa ao artigo 247.º?!

O Sr. António Filipe (PCP): * Exactamente, Sr. Presidente.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O que não deixa de ser uma surpresa!…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado António Filipe, peço-lhe desculpa mas repare que, neste momento, apenas estamos a fazer harmonização técnica com o que foi votado para o artigo 241.º.

O Sr. António Filipe (PCP): * Exactamente, e nós discordámos do artigo 241.º! Discordámos num caso e discordamos no outro!

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O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, não faço disto uma grande questão, mas neste momento não estamos a inovar em sede constitucional neste ponto, estamos apenas a harmonizar.

O Sr. António Filipe (PCP): * Houve um lapso da nossa parte, Sr. Presidente.

O Sr. José Magalhães (PS): - Se foi um lapso, não amarremos ninguém a um lapso!

O Sr. Presidente: * Com certeza, Sr. Deputado António Filipe. Fica, então em acta que a posição de fundo do PCP é contra.

O Sr. António Filipe (PCP): * É contra. Exacto.

O Sr. Presidente: * Como estamos apenas num acto de harmonização técnica…!
Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 248.º.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, o artigo pode ser refundido para incluir a virtuosa matéria aprovada antes e manter a actual, cujo impacto social é, de resto, profundo.
Portanto, Sr. Presidente, por mim, julgo que deveríamos ter soluções criativas nessa matéria.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, só tenho para pôr à votação uma proposta do PSD, de eliminação deste artigo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, como é evidente, a proposta do PSD prende-se com a eliminação do Capítulo V deste Título da Constituição, relativo às organizações de moradores.
Portanto, julgo que não vale a pena o Sr. Presidente pôr à votação esta proposta agora. Se, como o PSD bem espera, imperar o bom senso e as organizações de moradores saírem da Constituição todas estas disposições caem por natureza. Se tal não ocorrer, todas elas vão ter de ficar e não vale a pena estarmos a votá-las em separado.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, fica em suspenso a votação do artigo 248.º até à apreciação do destino das comissões de moradores.
Passamos ao artigo 249.º, relativamente ao qual foi apresentada pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, uma proposta de um n.º 2.
Srs. Deputados, vamos votá-la.

Submetida à votação, foi rejeitada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Era a seguinte:

2. A criação ou a extinção de municípios pode ser precedida de consulta directa aos cidadãos eleitores recenseados na área das autarquias abrangidas, nos termos que a lei estabelecer.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, passamos ao artigo 251.º, que tem por epígrafe "Assembleia municipal". Mais uma vez, e por simetria à proposta há pouco votada quanto às freguesias, temos uma proposta de harmonização.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação da proposta 249, apresentada pelo PS e pelo PSD, relativa ao artigo 251.º.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

1. A assembleia municipal é o órgão deliberativo do município, constituído por membros eleitos nos termos do artigo 241.º, n.º 2, em número superior ao dos presidentes de junta de freguesia que o integram.
2. Compete à assembleia municipal exercer as competências previstas na lei, incluindo aprovar as opções do plano e o orçamento.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, verifico que, nesta proposta, desaparecem os presidentes de junta!

O Sr. Presidente: * Claro!

O Sr. António Filipe (PCP): * Voto contra, Sr. Presidente.
Gostaria de fazer um reparo à redacção do n.º 1 deste artigo.
A redacção actual começa por dizer que a assembleia municipal é constituída pelos presidentes das juntas de freguesia e por outros membros não eleitos. Na proposta que acabámos de votar a afirmação de que a assembleia é composta pelos presidentes de junta deixa de ser explícita e passa a estar implícita na segunda parte da norma.

O Sr. Presidente: * Não, integra-a, Sr. Deputado António Filipe!

O Sr. António Filipe (PCP): * É que está um bocado equívoca!…

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, a proposta 249 foi aprovada por unanimidade, considerando-se a proposta originária do PS quanto ao artigo 251.º substituída.
Quanto ao artigo 252.º, voltamos à mesma situação, ou seja, foi apresentada pelo PS e PSD uma proposta comum, a 250, de harmonização com o artigo 241.º.
Vamos votá-la.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

É a seguinte:

A câmara municipal é o órgão executivo colegial do município sendo o presidente da câmara designado e a constituição do órgão estabelecido nos termos do artigo 241.º, n.º 3.

O Sr. Presidente: * A proposta do CDS-PP está prejudicada. E as do PSD foram substituídas, não é verdade?

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Menos o n.º 4, Sr. Presidente, que queríamos submeter à votação.

O Sr. Presidente: * São, então, substituídos os n.os 1, 2 e 3 do artigo 252.º, constantes do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD.
Vamos votar o n.º 4 do mesmo artigo, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do PSD e a abstenção do CDS-PP.

Era o seguinte:

4. A lei fixa o número máximo de mandatos sucessivos do presidente da câmara.

O Sr. Presidente: * As propostas dos Srs. Deputados Cláudio Monteiro e outros, do PS, e Pedro Passos Coelho e outros, do PSD, estão prejudicadas e a do PS foi substituída.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 253.º, em relação ao qual há uma proposta comum, a 253, apresentada pelo PS e PSD, com vista à constituição de associações e federações.
Vamos votá-la.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

Os municípios podem constituir associações e federações para a administração de interesses comuns, às quais a lei pode conferir atribuições e competências próprias.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, nesta matéria não se altera em nada o regime de criação destas entidades associativas, qualquer que seja a sua designação, as quais deixaram desde 1982 de poder ser constituídas obrigatoriamente, portanto, são entes de criação livre sem obrigação de contiguidade geográfica para esse efeito, com este limite (e aí reside a inovação): além de poderem partilhar e, em certo sentido, aperfeiçoar o exercício de competências comuns aos diversos municípios, há a possibilidade de, tendo em conta o fim a que se destinam e a escala aumentada em que passam a actuar, a lei conferir atribuições e competências próprias.
Essas atribuições e competências próprias, obviamente, têm que respeitar, por um lado, o limite do nível em que se inserem e, por outro, ter em conta que, na lógica agora aprovada (não era essa a lógica originária do PSD, é bom reconhecer, uma vez que o PSD prescindia da essência das regiões administrativas), não lhes cabe fazer aquilo que caiba fazer às regiões administrativas na sua esfera própria.
Portanto, é nesta óptica harmonizadora entre diversos níveis de administração, entre o nível regional qua tale, o nível municipal qua tale e esta esfera associativa intermunicipal que se insere esta disposição, que assim se harmoniza com a arquitectura constitucional tal qual resultará desta revisão, a qual, repito, não se identifica com a arquitectura constitucional imaginada pelo seu proponente inicial.
Houve aqui, portanto, uma transmutação e é essa a razão pela qual viabilizámos esta proposta.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, não quero entrar em polémicas sobre interpretações cruzadas que já tivemos aqui a propósito de outros capítulos, as coisas são o que são e o ganho constitucional desta alteração é o de deixar claro que as associações e as federações de municípios deixam de ter, como durante anos aconteceu na lei ordinária, apenas a possibilidade de exercer competências que lhe fossem delegadas pelos órgãos municipais que elas representam em termos associativos para poderem passar a ter, ope legis, atribuições e competências próprias que estão na esfera do poder central e que este opte por transferir para esta realidade associativa. Isto com as virtualidades que todos conhecemos, nomeadamente pela experiência das associações mais conhecidas e sucedidas até ao momento neste plano que são as de municípios representativos de áreas metropolitanas, onde é evidente, por razões de economia de escala e de melhor eficiência de determinado tipo de serviços públicos, a vantagem da possibilidade de a administração central atribuir legalmente determinado tipo de competências, passando do plano da administração central para esse plano alargado de municípios, com economias de escala, com gestão mais eficiente e eficaz de determinado tipo de serviços às populações.
O objectivo desta norma é, portanto, o de dar esse salto qualitativo e passar a permitir que haja da parte do legislador a capacidade de conferir claramente atribuições e competências próprias a estas realidades.
De resto, esta é uma reivindicação antiga, nomeadamente, dos municípios representados na Área Metropolitana de Lisboa, onde, como sabemos, existe uma preponderância de representação de municípios do Partido Comunista e do Partido Socialista e onde, em colóquios realizados por esta entidade, têm vindo a ser "reivindicados" alguns aspectos entre os quais se coloca sempre com destaque esta possibilidade de a lei poder conferir determinado tipo de atribuições e competências próprias à realidade associativa que eles representam.
É este o passo que o PSD tinha proposto inicialmente no seu projecto, através de uma formulação ligeiramente diferente, mas, em termos substantivos, em termos políticos, diria, o objectivo inicial do PSD foi o de dar este passo que nos parece importante e que vem, de facto, conferir uma eficácia, uma eficiência acrescida e assim abrir as portas a uma maior apetência da parte dos municípios por esta via associativa para defesa de interesses comuns, com vantagens manifestas para as populações e para o todo nacional, sempre que estejam em causa, nomeadamente, questões de economias de escala e de maior eficiência na satisfação de serviços e necessidades colectivas.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos agora proceder à votação da proposta comum, a 254, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao n.º 2 do artigo 254.º.

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Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

2. Os municípios dispõem de receitas tributárias próprias, nos termos da lei.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos votar a proposta de eliminação do artigo 255.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo CDS-PP.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do PCP e votos a favor do CDS-PP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma curta declaração de voto.

O Sr. Presidente: * Convém, porque, a partir de agora, o PP vai desencadear um "guerra" aberta com o PSD!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não é o caso, Sr. Presidente.
Entrámos num capítulo onde muita contra-informação correu, ao longo do tempo, acerca dos propósitos do PSD sobre esta matéria e parece-me que as actas da revisão constitucional são uma das sedes qualificadas e adequadas para o PSD deixar expressa a sua posição, posição que assumiu desde o início.
O PSD, desde a apresentação do seu projecto de revisão constitucional, nunca foi pela extinção das regiões administrativas da nossa Constituição da República. A posição do PSD sempre foi apenas a de que a realidade jurídica "regiões administrativas" só deveria passar à prática se fosse essa a vontade maioritária expressa livremente em referendo pelo povo português.
Nesse sentido, o PSD, desde a apresentação do seu projecto de revisão constitucional, sempre propôs, nomeadamente para este artigo 255.º - e, neste momento, todos temos à nossa frente o projecto inicial do PSD sobre esta matéria -, que as regiões administrativas continuassem a constar da Constituição da República.
Ao contrário, portanto, de muita contra-informação que para aí grassou e grassa, nunca o PSD propôs, pura e simplesmente, o fim da hipótese de regionalização administrativa do continente.
O que o PSD fez, e faz - e, felizmente, conseguiu que, neste momento, todos os partidos democráticos, à excepção do Partido Comunista, que continua com algumas reticências nesta matéria, mas, enfim, é a excepção que confirma a regra, o acompanhem -, foi defender que, para uma reforma deste tomo e deste fôlego, seja necessária a realização de um referendo nacional prévio que possa auscultar junto dos portugueses a vantagem e a oportunidade em se proceder a uma reforma a este nível na administração do Estado. Esta sempre foi a posição do PSD.
Portanto, o PSD colocou apenas no seu projecto a desconstitucionalização da obrigatoriedade de se proceder à regionalização, aliás, foi essa, de resto, a alteração qualitativa, em termos políticos, assumida logo em 1994 por uma comissão política do PSD, e, a partir daí, os projectos de revisão constitucional do PSD, em consonância com este princípio, sempre apontaram para este sentido.
Ora, alguma contra-informação pretendeu dar a este posicionamento do PSD a opção pela eliminação pura e simples de qualquer anseio ou aspiração de regionalização administrativa do continente, mas não é esse o caso, pois o PSD, com o mesmo respeito com que entende que deve caber aos cidadãos a possibilidade e a decisão sobre se se deve ou não avançar para a regionalização, respeita também essa vontade soberana dos portugueses para a eventualidade de a opção assim expressa pelos portugueses ser, de facto, pelo avanço de um processo de regionalização.
A nossa posição política é esta, que deve, de uma vez por todas, numa sede qualificada como são as actas de revisão constitucional, ficar explicitada. O PSD defende, e continuará a defender, neste momento já com algumas garantias políticas que muito nos apraz registar, que todo este processo fique condicionado à pronúncia livre e soberana dos cidadãos portugueses em referendo sobre a oportunidade e a vantagem do avanço de um processo de regionalização administrativa do território do continente.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos, então, depois de nos termos pronunciado pela recusa da eliminação da norma, votar as outras propostas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, a proposta do PSD está prejudicada.

O Sr. Presidente: - Há uma proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, que temos de submeter agora à votação e que visa suprimir o princípio da simultaneidade.
Vamos, portanto, votar a proposta de alteração do artigo 255.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.

Submetida à votação, foi rejeitada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Era a seguinte:

As regiões administrativas são criadas por lei, a qual define os respectivos poderes, a composição, a competência e o funcionamento dos seus órgãos, podendo estabelecer diferenciações quanto ao regime aplicável a cada uma.

O Sr. Presidente: * A proposta do PSD, como há pouco acabámos de ouvir, foi retirada.
Vamos passar ao artigo 256.º.
Aquando da apreciação do artigo 118.º, ficou estabelecido por consenso unanimemente partilhado na Comissão que não haveria oposição de nenhum dos grupos parlamentares - e a questão, na altura, pôs-se particularmente com ao PP - relativamente à adaptação, nesta segunda leitura, de algumas deliberações tomadas na primeira leitura.
Na primeira leitura, excepcionalmente, tínhamos votado matéria relativamente ao artigo 118.º, que é o regime geral do referendo, e matéria relativa ao regime específico do referendo para a regionalização.
Há ligeiras adaptações de texto que já tiveram reflexo no artigo 118.º e que têm agora também para o artigo 256.º e, na altura, obteve-se o consenso do PP para se admitir essa reformulação e se fazer nova deliberação, sendo que a substância da votação que já teve lugar não é alterada

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no seu essencial pela disposição que vamos agora poder votar.
Srs. Deputados, em todo o caso, foi apresentada uma proposta para modificação profunda do artigo 256.º quanto ao regime de instituição em concreto das regiões administrativas. Como o debate, no essencial, já teve lugar aquando da deliberação da proposta, proponho que passemos à votação.

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, vamos votar uma proposta comum, a 255, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 256.º.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

É a seguinte:

1. A instituição em concreto das regiões administrativas, com aprovação da lei de instituição de cada uma delas, depende da lei prevista no artigo anterior e do voto favorável expresso pela maioria dos cidadãos eleitores que se tenham pronunciado em consulta directa, de alcance nacional e relativa a cada área regional.
2. Quando a maioria dos cidadãos eleitores e participantes não se pronunciar favoravelmente em relação a pergunta de alcance nacional sobre a instituição em concreto das regiões administrativas, as respostas a perguntas que tenham tido lugar relativas a cada região na lei não produzirão efeitos.
3. As consultas aos cidadãos eleitores previstas nos números anteriores terão lugar nas condições e nos termos estabelecidos em lei orgânica, por decisão do Presidente da República, aplicando-se, com as devidas adaptações, o regime decorrente do artigo 118.º.

O Sr. Presidente: * Face ao resultado desta votação, estão prejudicadas a proposta do Deputado Pedro Passos Coelho e outros, do PSD,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * A do PSD está substituída.

O Sr. Presidente: * … a proposta do CDS-PP, uma vez que, a partir do momento em que no artigo 255.º se confirmou a regionalização, o regime teve de passar a ser estabelecido, e a proposta do PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro não está prejudicada. Temos é de saber se ele quer que seja votada ou não.

O Sr. Presidente: * A proposta do PS é substituída e a proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, está prejudicada no que se refere ao n.º 1 e verdadeiramente também já está prejudicada no que se refere ao n.º 2.
Estão, assim, esgotadas as votações em torno do artigo 256.º.
Passamos ao artigo 257.º - Atribuições.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, então, considerou retirada a proposta do Sr. Deputado Cláudio Monteiro? É que ela não está prejudicada, Sr. Presidente. Tem, então, de a considerar retirada.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Marques Guedes, para evitar dúvidas, prefiro voltar atrás e submetê-la a votação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, é porque coloca o referendo como facultativo.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos, então, passar à votação do n.º 2 do artigo 256.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, sobre o qual há dúvidas sobre se está ou não prejudicado.

Submetido à votação, foi rejeitado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Era o seguinte:

2. A instituição ou a extinção de regiões administrativas pode ser precedida de consulta directa aos cidadãos eleitores recenseados na área abrangida pela região, nos termos que a lei estabelecer.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, quanto ao artigo 257.º, a proposta do CDS-PP está prejudicada, o mesmo acontecendo com a do PSD, pelo que nesta matéria nada temos a deliberar.
Passamos ao artigo 258.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: * Temos aqui um pequeno problema.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, relativamente ao artigo 258.º, de acordo com as alterações que fizemos no artigo 92.º, a proposta inicial do Partido Socialista tem pertinência, mas sem a referência "nos termos".
Penso, portanto, que, com o sentido útil do aditamento da palavra "nacionais" relativamente aos planos previstos no artigo 92.º, entendo que aqui tem toda a pertinência, é, de resto, uma harmonização a que o Sr. Presidente já tinha chamado a atenção para ser feita também no artigo 164.º, o que aconteceu. Até porque, Sr. Presidente, como se recordará, na nova redacção do artigo 92.º, para além destes planos nacionais, há uma referência indirecta a planos de incidência sectorial em que o Governo é competente e onde dificilmente se deve entender que há uma obrigação constitucional de as regiões terem de participar na sua elaboração. Os planos de incidência sectorial são uma competência governamental, que já hoje em dia existe.
Penso que a proposta do Partido Socialista, do ponto de vista do PSD, deve ser votada no sentido útil do aditamento da palavra "nacionais", ficando o artigo com a seguinte redacção: "As regiões administrativas elaboram planos regionais e participam na elaboração dos planos nacionais previstos no artigo 92.º."

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O Sr. Presidente: * Eu até proporia o seguinte: "As regiões administrativas elaboram planos regionais e participam na elaboração dos planos nacionais."

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Também não há qualquer problema, Sr. Presidente. Penso, no entanto, que a referência, no texto actual, aos planos nacionais previstos no artigo 92.º mantém actualidade. É uma questão de estilo.

O Sr. Presidente: * Neste caso, como não se trata da aplicação de uma regra estrita de competência, penso que não se justifica sequer.
Se estiverem de acordo, votaremos a proposta justamente fazendo cessar o texto em "planos nacionais".

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Só uma pergunta, Sr. Presidente: no artigo 164.º também não ficou qualquer remissão para o artigo 92.º, pois não?

O Sr. Presidente: * Não, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Então, faz sentido que aqui também não fique.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos começar por votar a proposta de eliminação do artigo 258.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo CDS-PP.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS, do PSD e do PCP e votos a favor do CDS-PP.

Quanto à proposta do PSD,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Foi retirada, portanto está prejudicada!

O Sr. Presidente: - Muito bem, Sr. Deputado.
Quanto à proposta apresentada pelo Deputado Pedro Passos Coelho e outros, do PSD, face ao destino que teve a estrutura de planeamento, proponho que a consideremos prejudicada.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Concordo.

O Sr. Presidente: - A nova redacção da proposta de alteração do mesmo artigo 258.º, apresentada pelo PS, que, no fundo, visa apenas eliminar um dispositivo actual, passará a ter seguinte redacção: "As regiões administrativas elaboram planos regionais e participam na elaboração dos planos nacionais."
Srs. Deputados, vamos votar esta proposta.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do PCP e a abstenção do CDS-PP.

A proposta de alteração do artigo 258.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, visa enriquecer as funções do planeamento, com a referência expressa aos planos de ordenamento do território. Não creio, no entanto, que tal seja necessário; isso dependerá das outras competências que a lei estabelecer para as regiões administrativas.

O Sr. António Filipe (PCP): - Esta proposta não está prejudicada, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - Não!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não! Isto é passar os PROT para a responsabilidade regional, com a agravante de que, se não houver regiões, não há PROT.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar a proposta de alteração do artigo 258.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.

Submetida à votação, foi rejeitada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

Era a seguinte:

As regiões administrativas elaboram planos de desenvolvimento regional e planos regionais de ordenamento do território e participam na elaboração dos planos previstos no artigo 92.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Foi rejeitada por unanimidade, com a ausência do proponente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Sim, Sr. Deputado, com a ausência do proponente.
Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 259.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * A proposta do PSD está prejudicada, Sr. Presidente.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): - E a do CDS-PP também.

O Sr. Presidente: * Estão, então, prejudicadas as propostas do PSD e do CDS-PP para o artigo 259.º.
Vamos passar ao artigo 260.º, em relação ao qual temos uma proposta comum, a 256, apresentada pelo PS e PSD. Mais uma vez, é uma norma de adaptação.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, no fundo, trata-se, com esta proposta, de acrescentar um n.º 2.

O Sr. Presidente: * E também fazer referência expressa ao seu modo de constituição nos termos do artigo 241.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sim, por causa dos independentes.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos votar a proposta 256, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 260.º.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

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É a seguinte:

1. A assembleia regional é o órgão deliberativo da região constituído por membros eleitos nos termos do artigo 241.º, n.º 2, e por membros, em número inferior ao daqueles, eleitos pelo sistema de representação proporcional e o método da média mais alta de Hondt, pelo colégio eleitoral constituído pelos membros das assembleias municipais da mesma área designados por eleição directa.
2. Compete à assembleia regional exercer as competências previstas na lei, incluindo aprovar as opções do plano e o orçamento.

O Sr. Presidente: * As propostas do CDS-PP e do PSD para o artigo 260.º estão prejudicadas.
Assim sendo, vamos passar ao artigo 261.º, em relação ao qual temos uma proposta comum, a 257, apresentada pelo PS e PSD. Mais uma vez, trata-se de uma norma de adaptação.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

É a seguinte:

A junta regional é o órgão colegial executivo da região sendo o presidente da junta designado e a constituição do órgão estabelecida nos termos dos artigos 241.º, n.º 3, e 255.º.

O Sr. Presidente: * A proposta do CDS-PP para o artigo 261.º está prejudicada e a do PSD também. A proposta do PS para o mesmo artigo é substituída. A proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, está prejudicada.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 262.º, em relação ao qual temos uma proposta comum, a 259, apresentada pelo PS e PSD.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, ficamos por aqui e retomamos após o almoço?

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, propunha que votássemos já esta proposta, que vos distribuiria de imediato, porque ela é simples. É apenas para, onde se diz "Junto da região haverá um representante do Governo (…)", se passar a dizer "Junto de cada região poderá haver (…)". Ou seja, passa a ser uma faculdade e não uma regra imperativa.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Seria melhor "pode haver", Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * "Pode haver", propõe o Sr. Deputado Barbosa de Melo. Na redacção final, teremos de harmonizar todos os verbos, mas, neste caso, com certeza, podemos fazê-lo já, Sr. Deputado.
Srs. Deputados, vamos, então, votar a proposta 259, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 262.º.

Submetida à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do PCP e a abstenção do CDS-PP.

É a seguinte:

Junto de cada região pode haver um representante do Governo, nomeado em Conselho de Ministros, cuja competência se exerce igualmente junto das autarquias existentes na área respectiva.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder à votação da proposta de eliminação do artigo 262.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo CDS-PP, que já deveria ter sido votada.

Submetida à votação, foi rejeitada, com votos contra do PS e do PCP, votos a favor do CDS-PP e a abstenção do PSD.

A proposta do PSD para o artigo 262.º está retirada.
Srs. Deputados, vamos agora interromper os trabalhos para almoço. Retomá-los-emos às 15 horas e 30 minutos.
Está interrompida a reunião.

Eram 13 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Srs. Deputados, em relação ao artigo 263.º, foram apresentadas duas propostas de eliminação, uma pelo CDS-PP e outra pelo PSD, constantes dos projectos de revisão constitucional apresentados, respectivamente, pelo CDS-PP e pelo PSD.
Vamos votá-las em simultâneo.

Submetidas à votação, foram rejeitadas, com votos contra do PS e do PCP e votos a favor do PSD e do CDS-PP.

Srs. Deputados, relativamente ao artigo 264.º, são consideradas prejudicadas as propostas de eliminação deste artigo, constantes dos projectos de revisão constitucional apresentados, respectivamente, pelo CDS-PP e pelo PSD.
Em relação ao artigo 265.º, vamos votar a proposta, apresentada por Os Verdes, de aditamento de uma alínea c) ao n.º 1 deste artigo, constante do seu projecto de revisão constitucional.

Submetida à votação, foi rejeitada, com os votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era a seguinte:

c) De recurso aos tribunais para defesa dos seus interesses colectivos ou difusos específicos.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Encarnação.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria apenas dizer que ainda não foi desta que o Sr. Deputado José Magalhães veio ao nosso encontro em relação à nossa proposta de eliminação deste artigo. É uma das matérias que ficará para a

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próxima revisão constitucional, estou certo disso! Entretanto, o Sr. Deputado José Magalhães vai pensar maduramente nesta matéria e vai verificar quão anacrónico é este modelo organizativo inserido na nossa Constituição!
Gostaria de dizer muito claramente que o que nos leva a hesitar quanto à introdução de algumas alterações é algo que é traduzido numa fórmula deste género: devemos perguntar se fará ainda sentido, ou não, manter este modelo na Constituição. E, em resposta a esta questão, não temos dúvidas de espécie alguma, porque não faz qualquer sentido manter estes preceitos na Constituição. Entendemos, mesmo, que tal significa manter uma visão completamente distorcida e forçada sobre instrumentos que não têm qualquer efeito nem conteúdo não só na vida prática como do ponto de vista ideológico. São, manifestamente, qualquer coisa de perfeitamente ultrapassado.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, votámos contra as propostas de eliminação e, também, contra a proposta de aditamento, a qual, de resto, é inteiramente inútil, porque as entidades a que se referem estas disposições da Constituição podem exercer de forma estruturada todos os direitos em matéria de acção colectiva e em matéria de acção popular, que a Constituição já previa e passará a prever em termos renovados. Portanto, há aqui uma pura inutilidade.
Quanto ao juízo a fazer sobre a rejeição destas propostas de eliminação, a história rezará o que tiver que rezar! Pela nossa parte, não figurava, nem figura, no nosso programa a ablação constitucional destas disposições, as quais têm, no imaginário do PSD, um valor de recuo ou de combate histórico, francamente ele próprio no seu carácter enragé e com cheiro a pólvora um pouco desactualizado e inapropriado.
A história faz o seu caminho nas margens deste "rio" constitucional, cuja alteração a partir do topo não se afigura necessária.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar ao artigo 266.º, Título IX, que se reporta à Administração Pública.
Relativamente a este artigo, resultou, da primeira leitura, uma disponibilidade, suponho que geral, para acolher a integração do princípio da boa-fé, entre os vários princípios a que devem estar subordinadas as condutas dos órgãos e dos agentes administrativos.
Se assim for, se não tiver havido arrependimento entre a primeira e segunda leituras, pedia, talvez ao Sr. Deputado José Magalhães, o favor de redigir uma proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, apenas pretendo relembrar a argumentação que aqui foi produzida na primeira leitura.
Houve, da parte da bancada do PSD, vários Deputados que, entusiasticamente, dir-se-ia, seguiram esta ideia de que era importante incluir, entre os princípios fundamentais relativos à Administração Pública, o princípio da boa-fé. Julgo ter sido crítico, o mais crítico dessa inclusão. Fi-lo, e mantenho as ideias que então expendi, por uma razão fundamental: é que o princípio da boa-fé já faz parte do instrumentário global do direito público português; faz parte e exprime-se numa pluralidade de institutos jurídico-públicos.
Não vou agora fazer um elenco sequer aproximado, dou só um exemplo concreto: o princípio da irrevogabilidade dos actos administrativos constitutivos de direitos é um princípio que ninguém discute, tal como o princípio da inderrogabilidade singular dos regulamentos. E são ambos um produto directo do princípio da boa-fé. Dá a impressão de que, ao consagrarmos este princípio, iríamos introduzir algo que não existia no direito público português, e isso não é verdade!
Em todo o caso - e esta é a minha atitude pessoal -, nada se ganha em incluir aqui o princípio da boa-fé, mas também nada se perde. Se VV. Ex.as querem incluir o princípio da boa-fé…

O Sr. José Magalhães (PS): * É algo que se acrescenta!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Não se acrescenta coisíssima nenhuma, acrescentam-se palavras e trabalho ao tipógrafo, nada mais! Mas, enfim, se assim o querem, pois que se acrescente o princípio da boa-fé.

O Sr. Presidente: * Este é um daqueles princípios que o Sr. Deputado Barbosa de Melo considerará que está ínsito no direito natural que a Constituição, como tal, deve acolher.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * É uma evidência!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, a proposta de adopção deste princípio é comum nas propostas do PCP e do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, apresentadas nos respectivos projectos originários.
Se estiverem de acordo, votá-las-emos em simultâneo, com o entendimento de que, a ser adoptado, o princípio acrescerá àqueles que já actualmente estão plasmados no n.º 2 do artigo 266.º.

Pausa.

Srs. Deputados, então, vamos votar em conjunto as duas propostas de alteração do n.º 2 do artigo 266.º, que prevêem a inclusão do princípio da boa-fé, constantes dos projectos de revisão constitucional apresentados, respectivamente, pelo PCP e pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.

Submetidas à votação, foram aprovadas por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

São as seguintes:

2. Os órgãos e agentes da Administração estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé.
--
2. Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei e devem actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, imparcialidade, proporcionalidade, justiça e boa-fé.

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O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, assume que a inserção deste princípio é feita na parte final da norma?

O Sr. Presidente: * Salvo se o fizermos acrescer logo a seguir à referência ao princípio da justiça.
De qualquer modo, Srs. Deputados, podemos deixar essa questão para a redacção final.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Se me permitem, depois faço uma sugestão, pegando nestes princípios e ordenando-os.

O Sr. Presidente: * Com certeza! Fica o Sr. Deputado Barbosa de Melo convidado a, em sede de redacção final, dar um contributo de harmonização dos princípios consagrados.
Srs. Deputados, quanto ao artigo 267.º - Estrutura da Administração, o Sr. Deputado José Magalhães poderia ir referindo o significado da proposta comum, a 260, apresentada pelo PS e PSD, que vai ser distribuída.
Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, temos sobre a mesa várias propostas comuns e devo dizer que todas elas resultam de discussões que fomos fazendo e que foram abundantemente registadas na primeira leitura.
Trata-se de completar o edifício normativo respeitante à estrutura da Administração, incorporando neste artigo precisamente, sem prejuízo de outros, mas neste artigo em especial, algumas dimensões sem as quais o edifício é incompleto, lacunar, perigosamente lacunar, em alguns domínios.
Em primeiro lugar, trata-se de fazer uma limitação, introduzir uma clarificação aos poderes do Governo em matéria de Administração Pública; trata-se de aditar, ao texto actual, uma alusão aos poderes de direcção, superintendência e tutela dos órgãos competentes, não apenas do Governo, neste domínio.
Em segundo lugar, trata-se de clarificar o estatuto das entidades privadas que exerçam actividades de interesse público e que podem ser sujeitas a fiscalização administrativa. É importante que, uma vez que exercem actividades de interesse público, essas actividades sejam exercidas com uma espécie de prolongamento da tutela e da fiscalização que é inerente a essa actividade, independentemente da natureza da entidade que a pratica.
A terceira contribuição é muitíssimo importante: visa-se criar uma credencial constitucional inequívoca, diria mesmo irretorquível, para a existência de entidades administrativas independentes. As entidades administrativas independentes vieram, manifestamente, para ficar, tivemos ocasião de reflectir sobre elas nesta Casa, na Assembleia da República, num colóquio que deu uma excelente contribuição para a reflexão sobre as diversas dimensões que a sua existência tem hoje entre nós. Não se trata agora de projectar tudo o que são adquiridos infraconstitucionais neste domínio; trata-se, sim - o que é extremamente importante -, de criar e delimitar uma credencial constitucional bastante para permitir ao legislador ordinário operar actividades de criação.
A norma é extremamente económica, diria mesmo, prudentemente económica. Torna possível a criação de entidades administrativas independentes e remete para lei a definição do respectivo regime.
Trata-se de um domínio em que a intervenção habilitadora e ordenadora, provavelmente através de uma lei paramétrica, poderá ter alguma importância, mas a Constituição, nesta redacção, não fixa a mediação obrigatória de uma lei paramétrica, definidora de critérios gerais para a criação de entidades administrativas independentes, limita-se a dizer que a instituição há-se ser feita por lei, e queda-se por aqui.
É lacónico, mas virtuoso e, entendemos nós, bastante.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, são três alterações, todas elas extremamente virtuosas, e, naturalmente, é preciso não esquecer que isso vem acrescer ao conteúdo extremamente rico do artigo 267.º, o qual, designadamente em matéria de associações públicas, tem dimensões extremamente importantes e, em matéria de processamento da actividade administrativa, previa já, desde há muitos anos, situações cuja execução importa assegurar no plano infraconstitucional, mas não há nada a aditar no plano constitucional.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, gostaria só de acrescentar àquilo que já foi dito que esta proposta comum relativa ao artigo 267.º, em larga medida, decorre do, em meu entender, alargado e bastante produtivo debate que aqui mantivemos na primeira leitura.
Assim, a alteração do n.º 2 é formulada em comum pelo Partido Socialista e pelo Partido Social Democrata na exacta redacção a que se chegou no final do debate da primeira leitura e que consta do guião do Dr. Vital Moreira.
Conforme foi referido na altura, e relativamente àquilo que o Sr. Deputado José Magalhães aqui mencionou agora, valerá a pena acrescentar tão-só que, quando se substitui a expressão "poderes de direcção e superintendência do Governo", constantes do texto actual, por "poderes de direcção, superintendência e tutela dos órgãos competentes", se pretendeu, por um lado, consagrar também aqui os poderes de tutela, que são diferentes conceptualmente da superintendência e dos poderes de direcção lato sensu, e, por outro lado, abarcar nesta norma, para além do Governo, outras realidades que têm poderes de direcção, superintendência e tutela em termos da estrutura da Administração Pública, nomeadamente os governos regionais e também, noutros planos, as próprias autarquias locais. É essa a benfeitoria e a mais-valia deste texto relativamente ao actual.
Quanto ao novo número que se propõe, sobre as entidades administrativas independentes, nada mais há a acrescentar. Decorre de um debate que já aqui tivemos, mesmo na segunda leitura, a propósito de outras normas da Constituição, nomeadamente aquando da discussão das matérias relativas à tutela do direito à informática e à Alta Autoridade para a Comunicação Social, em que a realidade "entidades administrativas independentes" passou a ter consagração no texto constitucional a propósito de realidades próprias, como o eram o direito à informática e a Alta Autoridade para a Comunicação Social.
É aqui chegado o momento de, em sede geral, na estrutura da Administração, constitucionalizar uma das realidades que no último decénio ganharam força em vários sectores de actividade, ganharam força jurídica e estatuto orgânico próprio, desde o Mercado de Valores Mobiliários à Alta Autoridade para a Comunicação Social, entre outras.

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Chegou, pois, a altura de constitucionalizar esta realidade, que por muitos é considerada como um dos caminhos de desenvolvimento natural da Administração numa sociedade democrática participada pelos cidadãos e pelos vários agentes económicos.
Por último, no que respeita à questão da fiscalização administrativa, nas várias propostas postas sobre a mesa, nomeadamente na do texto inicial do projecto de revisão constitucional do Partido Socialista, o denominador comum em torno da constitucionalização situou-se quanto às entidades que exerçam poderes públicos, uma vez que está bem de ver que talvez seja um passo demasiado arriscado falar-se apenas em actividades de interesse público genericamente considerado, uma vez que hoje em dia as próprias fronteiras do interesse público são bastante alargadas e pouco precisas e delimitadas.
O que está aqui em causa é, de facto, a capacidade e a competência do exercício da fiscalização administrativa sempre que estejam em causa poderes públicos, numa altura em que a evolução da Administração aponta claramente para uma dispersão e delegação em vários domínios de actividade de poderes públicos em entidades de natureza privada. Quando isso ocorra devem, em simultâneo, ficar sempre salvaguardados os mecanismos de fiscalização administrativa, que se justificam precisamente pelo exercício desses poderes de natureza pública, que, como tal, se impõem a todos os cidadãos e pessoas colectivas.
É essa a razão de ser fundamental destas alterações e o PSD congratula-se, obviamente, com estes passos. Como o Sr. Deputado José Magalhães dizia, num artigo já bastante rico da Constituição da República, consegue-se, de facto, acrescentar mais-valias perceptíveis por todos e que ajudarão no processo desejado de modernização da nossa Administração.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero dizer que concordamos com esta proposta comum.
Em relação ao n.º 2, há uma alteração de ordem técnica que tem vantagens e que, sem dúvida nenhuma, era justificada. A consagração das entidades administrativas independentes e do poder de fiscalização em relação a entidades privadas também nos parece vantajosa.
Não podemos deixar de lamentar, entretanto, o procedimento mais uma vez adoptado por parte do PS e do PSD, de privatizar uma proposta que resultava dos trabalhos da discussão colectiva da primeira leitura.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, se esta proposta puder ter uma partilha de votação mais alargada será, em lugar de "privatizada", "publicizada"!

O Sr. Luís Sá (PCP): * Os Srs. Deputados sabem bem que ela foi objecto de consenso na primeira leitura! Escusava de fazer parte do acordo!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, se não houver objecções, proponho que votemos em bloco a proposta comum, a 260, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 267.º.

Pausa.

Uma vez que ninguém se opõe, vamos votá-la.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

2. (…) sem prejuízo da necessária eficácia e unidade de acção da Administração e dos poderes de direcção, superintendência e tutela dos órgãos competentes.
2-A. A lei pode criar entidades administrativas independentes.
(…)
5. As entidades privadas que exerçam poderes públicos podem ser sujeitas, nos termos da lei, a fiscalização administrativa.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos ver agora se algo resta para votar dos projectos originários.
Na proposta do PSD, há uma alteração ao n.º 1 do artigo 267.º. Pergunto ao Sr. Deputado Luís Marques Guedes se deseja submetê-la a votação. Trata-se, mais uma vez, da questão das organizações de moradores.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, trata-se, mais uma vez, da questão das organizações de moradores e de outros correlativos de pouco interesse, do ponto de vista do PSD.
Sr. Presidente, no contexto da discussão que já tivemos anteriormente, penso que o PSD pode considerar prejudicada essa sua proposta, embora com pena que esta matéria não possa ser objecto de simplificação e "emagrecimento" da Constituição porque, de facto, são matérias que já não têm dignidade para lá estarem.

O Sr. Presidente: * Então, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, a proposta está prejudicada.
Sr. Deputado José Magalhães, a proposta originária do PS deve ser considerada inteiramente substituída ou o segmento final do n.º 2 tem ainda alguma utilidade?

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, em bom rigor, a clarificação que pretendíamos foi feita na primeira leitura, isto é, estes poderes a que se refere o n.º 2 do artigo 267.º só se aplicam a quem se possam aplicar, ou seja, as entidades que pela sua própria natureza gozam do estatuto de independentes não o seriam se estivessem sujeitas a este tipo de poderes.

O Sr. Presidente: * A própria circunstância de, no artigo 267.º, introduzirmos uma nova cláusula sobre as entidades administrativas independentes cria, na Constituição, uma norma especial de salvaguarda. É esse o entendimento?

O Sr. José Magalhães (PS): * Exacto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Então, consideraremos a proposta totalmente substituída.

O Sr. José Magalhães (PS): * Podemos retirar virtuosamente a proposta…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, está substituída pela proposta 260.

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O Sr. Moreira da Silva (PSD): * A minha interpretação não é essa!

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Moreira da Silva, não me leve a mal que lhe diga que perdeu uma boa oportunidade para estar calado!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Na primeira leitura, eu disse as razões por que não concordava de forma alguma com essa interpretação!

O Sr. Presidente: * Pelos vistos, merece consagração, não posso dizer universal mas, pelo menos, um entendimento muito generalizado.
Srs. Deputados, passamos ao artigo 268.º, em relação ao qual há, em segunda leitura, uma proposta do Deputado Moreira da Silva relativa ao n.º 3 e uma proposta comum, a 261, do PS e do PSD para um n.º 4 novo, que englobaria os n.os 4 e 5 actuais, e para modificação do n.º 5.
Srs. Deputados do PS e do PSD, parece que estes n.os 4 e 5 da proposta comum visam modificar os n.os 4 e 5 actuais sem mexer no n.º 3.

O Sr. José Magalhães (PS): - É sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Para apresentar a sua proposta, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, a proposta que agora apresentei não é nova no sentido em que ela resulta do debate em primeira leitura, como a acta de 17 de Dezembro de 1996 é explícita. Se bem se recordam, a minha proposta teve uma opinião favorável de todos os partidos, excepto do meu próprio, em que eram levantadas algumas objecções.
A minha proposta, no seguimento desse debate, traz duas alterações ao n.º 3 do artigo 268.º: uma, relativamente à notificação, e, outra, relativamente à fundamentação.
No que respeita à notificação, visa-se a eliminação do inciso acrescentado em 1989, tendo passado a ler-se, no n.º 3, que a notificação é feita "na forma prevista na lei".
Como referi aqui em primeira leitura, e por isso escuso-me agora de maiores considerações, recordo que este artigo da Constituição, tal como ficou formulado, tem permitido uma interpretação pacífica da doutrina e da jurisprudência que leva a que o artigo 67.º, n.º 1, alínea b), do Código do Procedimento Administrativo dispense a notificação quando o interessado, através de qualquer intervenção no procedimento, revele perfeito conhecimento do conteúdo dos actos em causa. Ou seja, no fundo, há aqui uma dispensa por mero conhecimento presumido do acto que, no meu entender, pode pôr em causa - e em caso de procedimentos alargados põe claramente em causa - o direito constitucional de notificação e de conhecimento do acto que se pretendia acautelar neste artigo 268.º, n.º 3.
Por isso, entendo que a eliminação do inciso "na forma prevista na lei" não tem quaisquer inconvenientes, porque sempre a lei poderá prever aquilo que o artigo 70.º prevê, ou seja, que as notificações podem ser feitas por via postal, pessoalmente, e por outras formas, não pondo isso em causa o direito de notificação.
Desta forma, esta eliminação, no meu entender, era um claro benefício constitucional face à interpretação pacífica que tem sido feita, até porque era uma interpretação doutrinária anterior à própria constitucionalização do direito à notificação.
É esta a razão pela eliminação desse inciso na revisão de 1989, que tinha outros motivos, mas que, penso, não os conseguiu alcançar e, pelo contrário, trouxe inconvenientes graves.
A segunda questão tem a ver com a fundamentação e é, no fundo, a explicitação de algo que algumas pessoas, como o Professor Barbosa de Melo, poderão dizer "já lá está". "Já lá está" mas normalmente as pessoas não conseguem ler o que "já lá está"! E o que está no direito à fundamentação é uma sua consequência lógica, que é o direito ao conhecimento da fundamentação. Ou seja, o direito à fundamentação inclui o direito à fundamentação stricto sensu e o direito ao conhecimento da mesma.
O que acontece na maior parte dos casos, diria sempre, é que é normalmente protegido pela jurisprudência o direito à fundamentação mas não o direito ao conhecimento dessa fundamentação. E sem essa garantia do direito ao conhecimento da fundamentação, o que acontece é que o próprio direito à fundamentação é normalmente posto em causa.
Por isso, muito sucintamente, o que eu pretendia era que ficasse claro que a Constituição protege não só o direito à fundamentação stricto sensu mas também o direito ao conhecimento dessa fundamentação e por isso deve ser forçosa e constitucionalmente garantido que ela está incluída na notificação do acto administrativo aos particulares.
São estas, muito sinteticamente, na medida em que já tinham sido discutidas em primeira leitura, as razões destas duas alterações que proponho para o artigo 268.º, n.º 3.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de dizer que vejo com simpatia esta proposta de alteração, a qual, de resto, parcialmente corresponde a preocupações que estavam subjacentes à que foi apresentada pelo PCP.
Parece-nos manifesto - e não desenvolvo o tema porque ele foi sobejamente discutido na primeira leitura - que hoje em dia há formas que são afirmadas como sendo suficientes de levar os actos da Administração ao conhecimento dos administrados, mas, particularmente, os meios urbanos nas áreas metropolitanas claramente não são suficientes.
Nesse sentido, a alteração proposta é virtuosa, da mesma forma que o conhecimento obrigatório da fundamentação também nos parece ir no sentido do fortalecimento dos direitos dos administrados, o que constitui uma preocupação que manifestamente temos nas propostas que formulámos em relação a essas disposições.
Por isso, sem prejuízo de aperfeiçoamentos de ordem formal que o autor da proposta esteja disposto a fazer, pela nossa parte, temos uma posição de simpatia em relação à proposta apresentada.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

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O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, indo por partes, devo dizer que o Sr. Deputado Moreira da Silva procura resolver através daquilo a que eu poderia chamar a "alavanca" da notificação um problema que não tem obrigatoriamente que ser resolvido através da notificação, que é um acto com finalidades próprias e específicas.
O fundamental é garantir a boa e adequada informação do cidadão, do administrado, sobre os fundamentos de um determinado acto administrativo e essa informação pode obter-se - é esse o espírito dos n.os 1 e 2 deste artigo - por muitas vias e fórmulas.
As soluções legais actuais não são de "bronze", nem são seguramente infalíveis e creio que seria mau legislar em sede constitucional a partir de um determinado juízo sobre uma "encarnação" legal de uma solução que não tem vocação de eternidade nem de solução única.
Ataquemos, então, em vez de sobrecarregar a notificação - é preciso ver que a fundamentação em muitos casos pode ser abundante e significativamente pesada…

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Pode ser por síntese. Já é admitido…

O Sr. José Magalhães (PS): * Pode, mas também pode não ser.
Ora, se o objectivo a assegurar é, se quiser, mais transparência e mais acessibilidade, então, o melhor é dizê-lo, aditando à cláusula que prevê que a fundamentação deva ser expressa uma outra cláusula que obrigue a torná-la acessível, não no sentido de ser susceptível de ser compreendida por um bonus pater familias, são de espírito e em boas condições, mas, sim, no sentido utilizado nos n.os 1 e 2 deste artigo, ou seja, susceptível de ser acedido, de ser conhecido através de meios, que, aliás, tenderão a ser cada vez mais próximos dos cidadãos e mais fáceis de aceder.
Portanto, talvez seja melhor aditar, sem tocar no recorte da figura constitucional, não me refiro à legal, notificação, um outro qualificativo à fundamentação. Por exemplo, uma redacção deste tipo: "(…) fundamentação expressa, acessível, quando afectem direitos ou interesses (…)".
É um sinal de simpatia e de favor constitucional da transparência, a qual obteria aqui, neste cenário, mais uma consagração e uma demonstração de afecto constitucional.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, gostei muito de ouvir o Sr. Deputado Moreira da Silva, aliás, já o tinha ouvido com muito interesse na primeira leitura, mas continuo resistente a estas mudanças.
Compreendo a intenção, que, no fundo, também não é inovadora. A boa doutrina, e não podemos andar atrás das más doutrinas para as corrigir aqui… Quando se diz que os actos administrativos "carecem de fundamentação expressa", isso quer significar que o interessado tem de ter acesso a ela, ao seu conhecimento, se não apenas se dizia "carecem de fundamentação".

O Sr. José Magalhães (PS): - Uma fundamentação secreta!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Fundamentação secreta era um bocado complicado!…
Por outro lado, quando se diz que "os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei", devolve-se aqui para o princípio da legalidade e o legislador é que deve dizer quando e o que basta.
O que, porventura, está errado é o artigo do Código do Procedimento Administrativo, porque o aqui está comporta uma boa formulação do Código.
A fórmula parece-me escorreita, lapidar. Dizer que "os actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos" parece-me suficiente e tem as virtudes próprias das fórmulas constitucionais exemplares.
Aliás, o Sr. Deputado Moreira da Silva não disse que estava a fazer modificações de fundo, esteve, sim, a prevenir interpretações malévolas, deficientes feitas pelos tribunais ajudados pelos advogados, pelas partes interessadas, etc… Todos sabemos como é, todos nós somos juristas!… Puxa por aqui, puxa por acolá!… Mas é a verdade é que nenhum de nós pode ter a veleidade de arranjar uma formulação que paralise todas essas manobras, todas essas perversões.
Acho que o texto está bom, precisa é de bom intérprete e, porventura, o Código do Procedimento Administrativo precisa de um retoque nesta matéria.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, estamos na seguinte situação: a proposta do Sr. Deputado Moreira da Silva não mereceu acolhimento quanto à formulação, mas pareceu ter merecido algum acolhimento quanto à preocupação subjacente à sua proposta. Ao Sr. Deputado Barbosa de Melo não lhe parece também que seja necessário ir mais longe na expressão constitucional do n.º 3. O Sr. Deputado José Magalhães tinha admitido um inciso para que se introduzisse o termo "acessível", entre vírgulas, a seguir a "fundamentação expressa".
Sr. Deputado Moreira da Silva, depois do debate havido, retira a sua proposta?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, posso fundamentar?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, se me permite, sugiro que se mantenha a mesma redacção, acrescentando-se a expressão "e acessível", a seguir a "expressa", sem mais.

O Sr. Presidente: * Essa é a proposta que já estava subjacente.

O Sr. Luís Sá (PCP): - A intenção era a de pôr termo a formas de notificação que estão ultrapassadas pela natureza das coisas!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Mudem a lei! Não mudem a Constituição, mudem a lei! VV. Ex.as são legisladores normais mudem as leis. Fiquem as leis ordinárias!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, deu entrada na mesa a proposta 265, apresentada pelo Sr. Deputado do PSD Moreira da Silva, que adita ao n.º 3 do artigo 268.º a expressão

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"e acessível" a seguir a "fundamentação expressa" e que, no fundo, foi objecto de um consenso geral, tanto quanto pude interpretá-lo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, obviamente, face a este consenso e como já aqui foi dito pelo Sr. Deputado Luís Sá, mais vale qualquer coisa do que nada. Congratulo-me por este debate ter permitido que a boa doutrina, como disse o Professor Barbosa de Melo, tivesse suplantado nesta discussão (já na primeira leitura isso também assim foi afirmado) dois problemas muito graves e que se têm verificado relativamente à notificação e à fundamentação e que giram em torno destas interpretações, muitas vezes más, do direito constitucional que aqui está assegurado no artigo 268.º, n.º 3.
Com efeito, congratulo-me que desta discussão tenha resultado aquilo que é, no meu entender também, a boa doutrina de que o direito à notificação previsto no artigo 268.º, n.º 3, torna inconstitucional estas despensas, tal como as previstas no artigo 67.º, n.º 1, alínea b) do Código do Procedimento Administrativo.
Por outro lado, o direito à fundamentação inclui, sem sombra de dúvidas, o direito ao conhecimento da fundamentação. E isso era muito grave, na medida em que, como se sabe, a única forma que o legislador ordinário criou para ter acesso à fundamentação não abrange todos os casos em que a Administração pratica actos administrativos e, por isso, fora desses casos previstos quer na Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, artigos 31.º e 82.º, punha-se claramente a questão de que não estavam sujeitos ao direito ao conhecimento da fundamentação.
Por isso, congratulo-me com a inclusão deste novo inciso na Constituição.

O Sr. Presidente: * A sua proposta inicial é retirada a benefício desta, que vamos agora passar a votar.
Srs. Deputados, vamos, então, votar a proposta 265, apresentada pelo Sr. Deputado do PSD Moreira da Silva, que adita ao n.º 3 do artigo 268.º a expressão "e acessível" a seguir a "fundamentação expressa".

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

3. (…) fundamentação expressa e acessível, quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.

O Sr. Presidente: * Está em discussão uma proposta comum, a 261, apresentada pelo PS e PSD, que visa uma modificação dos n.os 4 e 5 da versão actual do artigo 268.º.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, pedi a palavra para dar uma breve explicação das razões que levaram a esta redacção.
Creio que fizemos uma excelente discussão desta matéria na primeira leitura, resta saber se o resultado é tão excelente como todos nós desejámos e francamente não temos, da nossa parte, razões senão para nos congratular com o texto que está sujeito à vossa apreciação.
Por um lado, porque se substitui o velho conceito, ainda herdeiro de uma visão limitada dos meios à disposição dos cidadãos para reagirem contra a má Administração, constante do n.º 4 do artigo 268.º, que está todo ele excessivamente construído em torno do recurso contencioso, por um conceito mais rico, mais amplo, que é o conceito de garantia de uma tutela jurisdicional efectiva dos direitos ou interesses legalmente protegidos.
É um conceito inteiramente harmonioso com a alteração que já adoptámos em sede do artigo 20.º, cuja epígrafe e cujo conteúdo foi precisamente alterado nesta óptica, com carácter geral, projectado em todos os domínios. Estamos agora a reger na esfera do direito administrativo e das relações entre os cidadãos e entidades administrativas dos mais diversos tipos.
Nesse domínio, Sr. Presidente, este conceito não só é proclamado no primeiro segmento da norma como depois é explicitado e desenvolvido em muitas e diversas dimensões e segundo uma ordem que não é casual. Essa ordem quer precisamente distanciar-se da narrativa constitucional actual e dar muito ênfase às acções, às iniciativas de reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos.
A seguir, alude-se à impugnação de actos administrativos - deliberadamente, se faz para poder incluir nesse conceito tanto o recurso propriamente dito como pedidos de declaração de ilegalidade e outras formas de actuar contra actos administrativos lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos. Não por acaso é esse o conceito que é aqui recortado, ou seja, actos administrativos que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos, independentemente da sua forma, mantendo-se as conquistas constitucionais nessa matéria contra o arbítrio administrativo, qualquer que seja a forma de que a acção se socorra.
Alude-se, em terceiro lugar, à possibilidade de obter dos tribunais a determinação da prática de actos administrativos que sejam legalmente devidos. Esta formulação foi cuidadosamente ponderada para evitar, ela própria também, uma administração de juízes ou uma substituição do juiz ao decisor administrativo. Há que, em sede infraconstitucional, delimitar com rigor os termos e condições em que pode ocorrer a apresentação deste tipo de iniciativas junto dos tribunais, mas é uma componente fundamental que se quis destacar.
Por último, faz-se menção à possibilidade de poder requerer e obter dos tribunais providências cautelares de diversos tipos, que aqui, obviamente, não se especificam, e que podem revestir as mais diversas corporizações para acompanhar necessidades de combate à ilegalidade administrativa ou à prática de quaisquer actos administrativos que sejam lesivos do conspecto de direitos e interesses que ficam delimitados no segmento n.º 1 deste preceito.
É, no conjunto, uma contribuição que releva de uma visão moderna do que deve ser a panóplia de meios e de ferramentas ao serviço da acção cívica contra a má Administração.
Mais: não se circunscreve, no primeiro segmento desta norma, a acção ao administrado "Galahad", singular ou agindo de motu proprio; abre-se ao legislador ordinário a possibilidade de tipificar formas várias de intervenção e acção judicial, inclusivamente conjunta e colectiva.

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O n.º 5 foi muito discutido igualmente entre nós e visa permitir aos cidadãos a impugnação de normas administrativas, não apenas actos, com eficácia externa, que sejam lesivas nos termos que o próprio preceito identifica. É um ponto em que o Partido Socialista insistiu especialmente. A redacção que tínhamos proposto e que consta da Antologia, pág. 735, era, na nossa óptica, menos aperfeiçoada do que esta, que, muito obviamente, incorporou conclusões da nossa discussão colectiva e congratulamo-nos com o facto de essa incorporação ter sido possível.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, também gostava de me congratular neste momento por esta alteração no artigo 268.º da fusão dos, ainda actuais, n.os 4 e 5.
Bem recordando o debate da primeira leitura, pareceu-me nessa altura que essa fusão, que ficou por fazer em 1989, era extraordinariamente necessária, na medida em que a actual redacção com os dois números separados punha em causa uma ordem lógica entre o recurso e a acção e com isso prejudicava gravemente as interpretações em torno da compatibilização desses dois instrumentos do nosso contencioso administrativo.
Recordo, como recordei na primeira leitura, o célebre artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 48 051 com os problemas que ele tem, bem como relativamente às acções para reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos com os problemas que tem relativamente à necessidade, ou não, de interposição de recursos contenciosos prévios.
A junção destes dois números e a afirmação da tutela jurisdicional efectiva é um ganho constitucional de enorme importância em termos dos direitos dos administrados. Por isso, esta valorização constitucional é sobremaneira de realçar.
No entanto, depois de saudar esta alteração, gostava de fazer dois reparos.
Primeiro, ultrapassada a questão tradicional de contestação da figura do recurso contencioso, talvez seja agora o momento de iniciar o "movimento de saudade" em torno do recurso contencioso, porque me parece que se foi do "8 ao 80". Ou seja, penso que o recurso contencioso, da forma como ele é tratado na nossa legislação ordinária, tem ainda um papel de extraordinária importância no nosso contencioso administrativo e para a defesa dos direitos dos administrados. Ora, a supressão do termo "recurso contencioso" no artigo 268.º, n.º 4, trocado aqui por este termo mais vasto que o Sr. Deputado José Magalhães referiu, que abrange outras realidades, "da impugnação", penso que poderá trazer mais desvantagens que vantagens. Gostava, pois, que ponderassem essa substituição do termo.
O Sr. Deputado José Magalhães referiu, como englobando o termo "impugnação", também a declaração de ilegalidade. Pergunto-lhe que declaração de ilegalidade de actos administrativos é que poderia conceber com vantagem face a um recurso directo de anulação de actos administrativos. Porque não vale a pena estar aqui a abranger um novo termo de impugnação e substituindo com isso um termo já adquirido na nossa doutrina de jurisprudência, o de recurso, sem com isso trazer benefícios evidentes.
Por isso, parece-me que, face a todo este benefício desta alteração ao artigo 268.º, não gostava que ele fosse "conspurcado"…

O Sr. Presidente: - Ó Sr. Deputado!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * … (eu disse entre aspas) com uma troca de palavras eventualmente menos desejável, perdendo-se a figura do recurso contencioso que, como digo, ainda tem bastantes vantagens e agora premiado com as restantes fórmulas de contestação de actos ou de acção da Administração. Isto relativamente ao novo n.º 4.
Relativamente ao novo n.º 5, como já sabem, é uma matéria que me é muito cara e continuo a ver aqui problemas de alguma gravidade, pelo que também chamava a vossa atenção.
A redacção finalmente acolhida nesta proposta conjunta diz que "Os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administrativas com eficácia externa lesiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos." Ou seja, este direito de impugnação de normas administrativas de eficácia externa, os chamados regulamentos administrativos, será apenas limitado àqueles que lesem os seus direitos ou interesses legalmente protegidos, o que significa que estão aqui a abranger apenas duas realidades, e gostava que houvesse essa consciência: a impugnação indirecta e a impugnação directa de regulamentos imediatamente lesivos de direitos ou interesses legalmente protegidos. O que significa que realidades que hoje já a nossa lei prevê não têm guarida constitucional, como seja a impugnação directa de regulamentos autárquicos não imediatamente lesivos.
Por isso, no meu entender, a versão deste n.º 5 é exclusivamente subjectiva, sem ter aquela ponderação que o nosso contencioso administrativo tem, que ainda é objectivo e subjectivo ao mesmo tempo.

O Sr. Presidente: - Tem razão!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Ora, não sei em que medida é que não poderíamos, para evitar essa questão, trocar o inciso "lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos" por outro que dissesse "com fundamento em ilegalidade".
Se fizéssemos essa troca, alargávamos, no meu entender, este direito constitucional à impugnação de normas. Teríamos aí a vantagem de ter ao mesmo tempo consagrado o direito objectivo à impugnação de normas e o direito subjectivo à impugnação de normas.
De outra forma, penso que estaríamos a diminuir direitos que já hoje estão consagrados na nossa legislação ordinária.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, a minha intervenção será sob a forma de pergunta para permitir uma aclaração mais rápida.

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Sr. Deputado Moreira da Silva, obviamente, não estaríamos a excluir coisa nenhuma se consagrássemos o que está previsto no n.º 5, uma vez que o legislador ordinário preservaria a margem de manobra que tem para acrescer a liberdade e para inventar meios que protejam direitos e que protejam a legalidade e, portanto, estas normas nunca são "normas-tampão" ou normas limitativas, são adquiridos constitucionais que não proíbem o legislador de criar novos espaços de liberdade.
O que o Sr. Deputado pode lamentar é que se perdesse oportunidade para consagrar um mais elevado nível de protecção constitucional, e estou a reformular aquilo que disse porque aquilo que disse poderia ser interpretado negativamente em relação à possibilidade de manobra do legislador ordinário.
Dito isto, também devo dizer-lhe que não vejo qualquer inconveniente em elevar esse patamar de protecção constitucional e de passar a aludir, como de resto sugeriu, em vez de "lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos", a um outro segmento que diga "com fundamento em ilegalidade" para abranger as diversas dimensões possíveis dessa ilegalidade.

O Sr. Presidente: * Se houver consenso e para retirar a subjectividade da norma…

O Sr. José Magalhães (PS): * Não utilizaria a expressão "direito", com D, grande, ou d, pequeno…

O Sr. Presidente: * Se fosse "lesivas de direitos ou interesses legalmente protegidos".

O Sr. José Magalhães (PS): * Não! Porque isso não resolve o problema que o Sr. Deputado Moreira da Silva quer aludir.

O Sr. Presidente: * Penso que resolve, porque a alusão do Sr. Deputado Moreira da Silva reportava-se à natureza estritamente subjectiva que decorre deste n.º 5.

O Sr. José Magalhães (PS): * Se puder ser abrangido o subjectivo universal decorrente do plasmar da lei sobre…

O Sr. Presidente: * Objectivávamos a referência aos "direitos ou interesses legalmente protegidos". Não tem de ter a configuração de um direito subjectivo, necessariamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, só refiro essa questão porque, por vezes, há a errada impressão de que a consagração de recursos directos de regulamentos garante melhor os direitos dos particulares do que recursos indirectos, o que nem sempre é verdade,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim, sim!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * … porque depende muitas vezes do conjunto do sistema contencioso criado, e isso verifica-se em vários outros ordenamentos na Europa.
Por isso, parece-me que ao afastar aqui uma impugnação objectiva poder-se-ia perder algo neste normativo.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, estava decidido a nada a dizer sobre estas alterações. Esse assunto já foi amplamente discutido na primeira leitura e, ao que julgo, porque ainda não tive ocasião de as rever, já consta das actas o que eu disse a propósito.
Aqui, no n.º 4, explicitam-se muitas coisas. Pessoalmente, também não gosto muito das mudanças de terminologia e de matriz cultural que aqui se verifica. A impugnação procede da cultura italiana e o recours pour excès de pouvoir vem da cultura francesa. Não sei o que se ganha em passar de uma língua neolatina mais a Ocidente para uma língua neolatina mais a Oriente…!?
Agora, as explicitações dos vários tipos de acção é que são importantes neste texto. O n.º 4 alarga o leque dos tipos de acção que é possível ao particular usar para defesa dos seus direitos perante a Administração e esta é uma grande conquista. A forma como aqui estão introduzidos, se calhar, não é a mais feliz.
Quanto ao n.º 5, uma vez que chegaram a este acordo, entendo que é prudente não lhe mexer. Não podemos cair no princípio de que é bom poder recorrer de tudo. Na República de Sólon, no século V, na Grécia, é que tudo interessava a todos e todos estavam sempre legitimados para discutir tudo. Só que hoje, se abrirmos a porta a estas coisas, engarrafamos os tribunais de tal maneira que nem aqueles que precisam de uma protecção mais intensa, porque são lesados directamente nos seus direitos e posições jurídicas subjectivas, conseguem obter tutela jurisdicional efectiva porque os tribunais estão, pura e simplesmente, afogados em processos judiciais. Portanto, por mim, deixava estar o n.º 5 na redacção acordada, e não lhe mexia.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, penso que o essencial já foi dito pelo Sr. Prof. Barbosa de Melo.
Em qualquer circunstância, numa matéria de relevância tão significativa como esta, não queria deixar de dar uma pequena opinião pessoal para a acta.
Do meu ponto de vista, e pese embora o reconhecimento da nobreza das intenções da proposta avançada oralmente pelo Sr. Deputado Moreira da Silva, devo dizer que considero perigosa essa alteração, liminarmente, por uma razão.
É que, não sendo essa a intenção do proponente, penso que uma engenharia desse tipo teria o condão de afastar liminarmente o requisito da legitimidade processual que, apesar de tudo, numa matéria como esta, não deixaria de ser um contributo a contrario para a eficiência e para o combate à morosidade da justiça, também em matéria administrativa.
Por essa razão, parece-me que o texto que cá está, de per si, é, inquestionavelmente, um ganho - como dizia o Professor Barbosa de Melo, tem um avanço significativo -, digamos que situa um universo de situações, que não a totalidade, um subuniverso de situações, em que se justifica uma mais aguda protecção jurídica aos cidadãos na defesa das suas garantias de administrados.

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Assim, pô-lo numa formulação mais genérica penso que seria um passo no sentido, talvez errado, de se poder questionar o requisito da legitimidade, o que, numa matéria como esta, parece-me que redundaria, em última instância, numa desprotecção efectiva, ou prática, se quiser, daquelas situações em que se pretende garantir uma maior protecção.
Por estas razões, embora compreendendo e aplaudindo a nobreza das intenções e até da fundamentação da proposta avançada, creio que é mais prudente e cautelar deixarmos as coisas conforme surgiram na proposta comum, que me parece não ter os efeitos potencialmente perversos que poderia ter uma mexida no sentido avançado.

O Sr. Presidente: * O Sr. Deputado Moreira da Silva voltou a pedir a palavra.
Faça favor.

O Sr. Moreira da Silva (PSD):* Sr. Presidente, face às várias objecções formuladas, que compreendo e aceito perfeitamente, formulo uma outra proposta.
A minha outra proposta é a de não existir este n.º 5 e, no n.º 4, onde se lê "impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem" passar a ler-se, como em todos os outros ordenamentos constitucionais europeus (por exemplo, o espanhol, o francês ou o alemão), "impugnação de quaisquer actos da Administração que os lesem", o que inclui obviamente, actos administrativos e actos normativos da Administração. Aí deixa de haver problemas, porque esta questão da legitimidade, ainda agora referida pelo Sr. Deputado Marques Guedes, está aqui salvaguardada.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Moreira da Silva, a sua proposta vai ser certamente ponderada.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, para além de ficar a aguardar com interesse o resultado desta ponderação, a proposta parece-me francamente sugestiva, porque creio que a que é adiantada em relação ao n.º 4 visa caminhar para um entendimento da justiça administrativa sem uma base exclusivamente subjectiva.
A proposta que é adiantada para o n.º 5, tomada, pelo menos, pelo seu valor facial, parece assentar o direito à impugnação de actos normativos da Administração numa base fundamentalmente subjectiva e, de algum modo, independentemente de sabermos sempre que o legislador ordinário pode ir mais longe, isto significa alguma contradição.
Neste sentido, diria apenas que, de acordo com as posições que tomámos ao longo da primeira leitura, vemos com simpatia alterações do n.º 4 no sentido de que a justiça administrativa deixe de assentar fundamentalmente no recurso directo de anulação e passe a incluir uma referência ao conjunto de meios de tutela jurisdicional de direitos ou interesses legalmente protegidos.
Assim, esta alteração é vantajosa e gostaríamos que a disponibilidade dos outros partidos permitisse resolver os problemas que aqui estão colocados, designadamente em matéria de regulamentos, e que nos parecem ter razão de ser.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, no meu esforço de ser sintético não levei até ao fim o meu raciocínio e, depois, fui questionado sobre ele.
A introdução desta minha última proposta, ou seja, de não se pôr um novo n.º 5, mas de se incluir, no n.º 4, aquilo que chamaríamos "actos da Administração", teria variadíssimos benefícios, como, por exemplo, desde logo - e, hoje, isso é extraordinariamente discutido na doutrina -, a questão de saber se é possível providências cautelares relativamente à impugnação contenciosa de regulamentos da Administração. Defendo que sim; há muita gente de bom nome que defende que não.
Defendo que sim, principalmente tendo em conta o processo de declaração de ilegalidade de normas, que é claramente objectivo e que, como não visa a resolução do caso concreto, pode pôr muitos problemas ao próprio administrado que veio pedir a declaração de ilegalidade dessa norma julgando que se aplicava ao caso concreto, mas que, depois, verá que não se lhe aplica forçosamente.
Por isso, nesses casos, a providência cautelar, como, por exemplo, a suspensão de eficácia - e, aliás, em jurisprudência dos anos 40 do Supremo Tribunal Administrativo já foi uma vez decidido favoravelmente -, penso que teria todas as vantagens.
O novo n.º 4, tal como está construído, em tudo leva a esse raciocínio, de junção dos actos individuais com os actos normativos, porque, no fundo, é a afirmação clara do princípio geral da garantia da tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, seja por que acto for da Administração, acto individual ou acto normativo…

O Sr. Presidente: * Independentemente da forma dos actos.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Isso é outra questão! Falamos agora da parte material e não formal, ou seja, acto individual ou acto normativo.
Penso, pois, que poderíamos ganhar se este n.º 5 fosse transposto para o n.º 4, dentro da afirmação genérica de impugnação de quaisquer actos da Administração que os lesam.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Barbosa de Melo, tem a palavra para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, a redacção que aqui está, numa leitura aberta e objectiva, conduz exactamente àquilo que o Sr. Deputado Moreira da Silva pretende, porque diz-se que "os cidadãos têm" e, depois, diz-se "igualmente", e esta palavra muda o curso das coisas. E "têm igualmente", o quê? O direito de impugnar.
O que está aqui mal, do meu ponto de vista, é esta ideia, que se introduziu na nossa cultura - é uma coisa recente -, de que normas são sempre gerais e abstractas, de que não há normas individuais e concretas, ao contrário da teoria do Kelsen, por exemplo, e de muitas outras práticas pelo mundo fora.
O que deveria dizer-se aqui era "impugnar os regulamentos com eficácia externa", mas está "impugnar as normas administrativas". Sacrifique-se, pois, a essa linguagem que por aí anda.

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Agora, julgo que já cá está tudo dito o que o Sr. Deputado quer dizer - e era sobre isto que queria ouvi-lo -, ao dizer-se que "têm igualmente direito de impugnar as normas (…)".

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, penso que o "igualmente" significa que um dos casos de tutela jurisdicional efectiva será a impugnação de normas administrativas com eficácia externa lesivas. Mas será, por exemplo - e devolvo-lhe a pergunta -, que, neste "igualmente", se quer incluir "a adopção de medidas cautelares adequadas", que consta do final do n.º 4?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Deputado, o n.º 4 começa "É garantido aos cidadãos tutela jurisdicional efectiva" e, depois, enunciam-se vários caminhos desta tutela, nomeadamente "a adopção de medidas cautelares" efectivas. Depois, no n.º 5, diz-se que "Os cidadãos têm igualmente direito" - "igualmente" a essas coisas todas, que estão para trás - a dirigir essa artilharia toda contra os regulamentos.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Eu repouso na sua interpretação.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * E eu acho que repousa bem, Sr. Deputado. Confie em mim.

O Sr. Presidente: * Os Srs. Deputados têm revelado algumas preocupações, designadamente quanto a alguma subjectivização por efeitos do problema da legitimidade na instauração da acção. Mas se os Srs. Deputados meditarem sobre as consequências da aplicação do artigo 52.º, que se refere ao direito de acção popular, verificarão como em muitos domínios considerados de relevante interesse público - a saber, o da protecção dos direitos de consumidores, o da qualidade de vida, ou o da preservação do ambiente e do património cultural - é conferido um amplo direito jurisdicional de iniciativas, sem quaisquer restrições. Importa talvez também lembrar isto, para que, no momento próprio, se faça uma adequada interpretação que integre o disposto no artigo 268.º com o disposto, neste particular, no artigo 52.º.
Srs. Deputados, vamos, então, proceder à votação dos n.os 4 e 5 do artigo 268.º, constantes da proposta comum, a 261, apresentada pelo PS e PSD.
Começamos pela votação do n.º 4 do artigo 268.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É o seguinte:

4. É garantido aos administrados tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administrativos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prática de actos administrativos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas.

O Sr. Presidente: * Passamos à votação do n.º 5 do artigo 268.º.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É o seguinte:

5. Os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administrativas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos.

O Sr. Presidente: * Assim sendo, Srs. Deputados, vamos ver se algo sobra dos projectos originários.
Quanto ao projecto de revisão constitucional do PCP, podemos considerar que a votação do n.º 3, cuja alteração aí se propõe, está prejudicada, Sr. Deputado Luís Sá?

O Sr. Luís Sá (PCP): * Insatisfatoriamente prejudicada, mas está!

Risos.

O Sr. Presidente: * Quanto ao n.º 7, aí proposto, vamos votá-lo, Sr. Deputado Luís Sá?

O Sr. Luís Sá (PCP): * Sr. Presidente, como tive ocasião de dizer na primeira leitura, este é um problema que tem uma incidência cada vez maior e em que o cidadão está desprotegido face aos meios tecnológicos utilizados pela Administração. Aliás, é a própria Administração que, em contacto com a Assembleia da República, diz que os meios que utiliza frequentemente não merecem fiabilidade suficiente.
Nesse sentido, creio que era uma melhoria efectiva a aprovação desta norma, pelo que a mantemos para votação.

O Sr. Presidente: * Então, vamos votá-la.
Srs. Deputados, vamos proceder à votação de um n.º 7 ao artigo 268.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do PSD, votos a favor do PCP e a abstenção do CDS-PP.

Era o seguinte:

7. A lei estabelecerá garantias efectivas de fiabilidade dos actos e provas obtidos através de meios tecnológicos.

O Sr. Presidente: * Há, ainda, uma proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, admitida em primeira leitura, para o n.º 5, que acaba de ficar prejudicada.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, prejudicada não, antes contemplada e verdadeiramente consagrada

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no seu espírito e, até, na sua carnação. Diria até superada.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, o n.º 5 constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, vai mais longe do que o n.º 5 que acabámos de apreciar. Vamos ter de votá-lo.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não pode!

O Sr. Presidente: - Diz o seguinte: "É igualmente sempre garantido aos administrados o acesso à justiça associativa para tutela dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo o acesso a meios processuais que permitam intimar a Administração a adoptar ou a abster-se de certo comportamento."

O Sr. José Magalhães (PS): * Essas intimações estão incluídas expressis verbis com outra formulação e são aludidas outras acções, medidas cautelares e, inclusivamente, acções e abstenções. E mais: a conduta sobre injunção judicial…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, chega, por favor!
Srs. Deputados consideramos, por consenso, que esta proposta está prejudicada?

O Sr. José Magalhães (PS): * Prejudicada não, consumida!

O Sr. Presidente: * Está, então, tecnicamente prejudicada pelas votações, que a consumiram, Sr. Deputado!

Risos.

A proposta do PS está prejudicada.
Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, sinto-me na obrigação de dizer qualquer coisa como declaração de voto, na medida em que fiz algumas objecções à versão final adoptada e porque não queria que essas objecções toldassem o espírito de clara reforma e de benefício que a nova versão do artigo 268.º comporta, no meu entender, para os direitos dos administrados. Era com essa profissão de fé no futuro, embora, claro, prefigure que ficam ainda bastantes questões para discussão na doutrina e na jurisprudência, que, penso, no seu global, a proposta é claramente de benefício para os direitos dos administrados.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, passamos ao artigo 270.º.
Peço a vossa atenção para a proposta 266, apresentada pelo PS e PSD, relativa a este artigo, que visa enquadrar no âmbito do regime de possibilidade de restrição do exercício de direitos não apenas os militares e os agentes militarizados mas também os agentes dos serviços e forças de segurança e que vai ser imediatamente distribuída.
Recordo, entretanto, aos Srs. Deputados que já votámos uma norma com exacta equivalência a esta aquando da votação das competências em sede de reserva absoluta do Parlamento no que diz respeito ao regime de restrição de direitos.
Portanto, verdadeiramente esta norma é uma decorrência necessária daquela que já foi votada, como acabei de referir, pelo que se trata agora tão-só de harmonizar o conteúdo do já votado no artigo 167.º com o disposto no artigo 270.º. Não há matéria nova.
Por isso, Srs. Deputados, proponho que passemos à votação da proposta 266, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 270.º.

Submetida à votação, obteve maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP.

É a seguinte:

(…) em serviço efectivo, bem como por agentes dos serviços e forças de segurança, na estrita medida das exigências nas funções próprias.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, a proposta do PS constante do projecto originário é considerada substituída.
Passamos ao artigo 272.º…

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, peço a palavra para fazer uma breve declaração de voto.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * É a chamada "declaração de voto pró-sindicato".

O Sr. Presidente: * Pelo contrário, a votação do PCP prejudica, e de que maneira, a consagração do sindicato.
Tem a palavra, Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, é esse raciocínio que ainda não conseguimos perceber, mas talvez o defeito seja nosso…! Ou o defeito é nosso, ou a explicação é insuficiente, ou, então, as duas coisas, mas, repito, é algo que ainda não conseguimos perceber!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Por deficiência vossa, com certeza!

O Sr. António Filipe (PCP): * De facto, o entendimento que temos - e não nos foi explicado suficientemente outro - é que, a partir da aprovação desta norma, passa a ser possível a restrição legal ao exercício de direitos não apenas dos militares e agentes militarizados mas também dos agentes das forças e serviços de segurança, que, em nosso entender, não estavam incluídos na actual redacção do artigo 270.º.
Portanto, ao contrário do que parece ser o entendimento do Partido Socialista, o nosso entendimento é o de que esta norma restringe direitos a um conjunto de profissionais das forças de segurança que até à data não estão abrangidos pelo artigo 270.º.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, já agora, também farei uma breve declaração de voto para explicitar o seguinte: até hoje, como sabe, agentes das forças de segurança têm sido, por via de lei, enquadrados no estatuto de forças militarizadas para com isso se possibilitar um regime

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restritivo de direitos a esses mesmos agentes de forças de segurança. Sempre foi nosso entendimento que deve haver uma tendencial separação de águas entre o regime das forças militares e o regime das forças de segurança.
Por isso, entendemos que é possível e desejável que se possa criar um regime de direitos próprio das forças de segurança e um regime de direitos próprio dos agentes militares.
Ora, na medida em que esta hipótese não fosse aceite, a eventual consagração futura, em termos mais amplos, de direitos de associação sócio-profissional, designadamente no quadro da PSP e, eventualmente, de outras forças de segurança, ou se faria sem qualquer restrição de direitos, o que é impensável à luz da natureza específica de uma força de segurança, ou para que seja possível regular, ainda que em termos mais amplos, esse tipo de direito associativo, introduzindo-lhe algumas restrições inerentes à natureza dessas funções como, designadamente, a do direito à grave, é preciso que haja uma cobertura constitucional específica, sem a necessária equiparação ao regime das forças militares.
Foi isto o que, até hoje, o PCP não quis ver, não quis entender, sendo certo que esta definição de regime de direito está sempre submetido a uma regra de maioria qualificada de dois terços e se a norma não fosse alterada, forçaríamos os agentes das forças de segurança a ter, ad eternum, um estatuto equivalente ao das forças militarizadas, o que redundaria sempre em prejuízo do estatuto tendencialmente mais civilista dessas mesmas forças de segurança.
Também para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, porque não é essa a função das declarações de voto, não vou comentar as declarações de voto que me antecederam, quero apenas deixar, em nome do PSD, a interpretação que temos desta norma.
De facto, do ponto de vista do PSD, a vantagem desta alteração constitucional é só uma: clarificar, em letra da Constituição, aquilo que, sendo embora a doutrina jurisprudencial adquirida sobre esta matéria, não estava actualmente isento de alguma polémica e de algum carácter controvertido em termos doutrinários.
A verdade é que discute-se, e discutiu-se, de resto, em decisões jurisprudenciais sobre esta matéria, a propriedade com que se fazia aplicar esta norma constitucional às restrições de direitos para agentes de forças de segurança.
Contudo, do ponto de vista do PSD, o problema fica clarificado em definitivo com esta nova redacção da Constituição, embora seja apenas essa a vantagem desta alteração constitucional, uma vez que o texto constitucional já era claro na parte final da norma, em que ligava necessariamente essas restrições à estrita medida das exigências das suas funções próprias. É, pois, bem evidente que esta parte final da norma constitucional já deixa, como sempre deixou, a porta aberta a que, atendendo às situações em que as funções próprias sejam diversas, como, por exemplo, o são entre as forças armadas e as forças de segurança, também as restrições, uma vez que devem ocorrer na estrita medida das exigências das funções próprias, possam claramente ser diferenciadas pelo legislador. Não é essa, do ponto de vista do PSD, a vantagem desta clarificação da normal. A vantagem é exactamente a de uma clarificação para de algum modo pôr fim a uma querela doutrinária da boa interpretação do texto da Constituição nesta matéria.
O legislador ordinário, nos termos da reserva de lei de dois terços, já aqui referida, que decorre da Constituição, continua a poder estabelecer restrições ao exercício de direitos dos agentes das forças armadas e das forças de segurança com a vantagem apenas de o texto constitucional afastar quaisquer polémicas sobre a boa leitura e interpretação do texto constitucional.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, quanto ao artigo 272.º, que tem por epígrafe "Polícia", não há propostas novas, pelo que vamos deliberar sobre as propostas da primeira leitura.
Em primeiro lugar, vamos deliberar sobre a proposta constante do projecto originário do PSD, salvo se o PSD a retirar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Está prejudicada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: * Muito bem. Está prejudicada.
Vamos passar à votação do n.º 2 do artigo 272.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado por Os Verdes. Onde se diz actualmente "não devendo" pretendem Os Verdes que passe a constar "não podendo".

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

2. As medidas de polícia são as previstas na lei, não podendo ser utilizadas para além do estritamente necessário.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, a proposta originária do PS foi retirada, mas a do PCP deverá ser votada.
Assim, vamos passar à votação do n.º 4 do artigo 272.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

4. A lei fixa o regime das forças de segurança, as quais têm natureza civil, sendo a organização de cada uma delas única para todo o território nacional.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, passamos ao artigo 274.º - Conselho Superior de Defesa Nacional, relativamente ao qual não foram apresentadas propostas novas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, quero dizer que o PSD mantém a posição que defendeu na primeira leitura no que respeita à alteração do n.º 1 da forma constante do guião, que é uma fórmula que não quantifica nem densifica, em termos de regime de eleição, a representação da Assembleia da República no Conselho Superior de Defesa Nacional mas tão-só a constitucionaliza.
O PSD mantém a posição que já tinha defendido nessa altura, de resto, a proposta surgiu de uma formulação avançada pelo PSD e é similar àquela que ocorre em outras áreas da Constituição onde se prevê uma representação da Assembleia da República em órgãos externos.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, essa sugestão pareceu ter, em primeira leitura, um acolhimento assinalável. Peço-vos, então, o favor de a transformar em proposta.

Pausa.

Srs. Deputados, enquanto estamos neste compasso de espera, lembro que há pouco deixámos em suspenso a votação do artigo 248.º para sabermos do destino das comissões de moradores. Estabelecido o destino das comissões de moradores, vamos passar à votação do artigo 248.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, a proposta do PSD está prejudicada. Eu disse, na altura, que se não fosse eliminado, como era nossa intenção…

O Sr. Presidente: * Então, fica clarificado que a proposta do PSD quanto ao artigo 248.º está prejudicada e, portanto, nada haverá para votar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, voltando ao artigo 274.º, há uma proposta que vai ser distribuída de modificação do n.º 1, que surge como proposta comum da Comissão. No entanto, há uma outra proposta também de modificação do n.º 1, que não mereceu acolhimento, constante do projecto originário do PCP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Pensei que o PCP retirava a sua proposta em benefício desta proposta conjunta.

O Sr. Presidente: * Vamos ver o que o PCP decide.

Pausa.

Sr. Deputado António Filipe, a proposta agora distribuída foi classificada como sendo do PS e do PSD mas, se o PCP entender acolhê-la, a sua autoria será alargada ao PCP. Suponho, no entanto, que ela tem elementos materialmente diferentes do projecto originário do PCP e, por isso, essa decisão fica à vossa consideração.
Pergunto aos Srs. Deputados do PCP se subscrevem ou não esta proposta.

O Sr. João Amaral (PCP): - Não a subscrevemos, mas votamo-la.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar à votação da proposta 268, apresentada pelo PS e PSD, que altera o n.º 1 do artigo 274.º.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, devíamos votar primeiro a proposta do PCP.

O Sr. Presidente: * Não, Sr. Deputado.
Vamos votar a proposta 268, apresentada pelo PS e PSD…

O Sr. João Amaral (PCP): - Não é isso que diz o Regimento, Sr. Presidente. O que diz o Regimento é que…

O Sr. Presidente: - Já cá faltava o Sr. Deputado João Amaral para, no final do processo de revisão constitucional, questionar o método de votação.
Srs. Deputados, vamos votar da proposta 268, apresentada pelo PS e PSD, que altera o n.º 1 do artigo 274.º.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

1. O Conselho Superior de Defesa Nacional é presidido pelo Presidente da República e tem a composição que a lei determinar, a qual incluirá membros eleitos pela Assembleia da República.

O Sr. Presidente: * A proposta originária do PCP quanto ao n.º 1 do artigo 274.º tem ainda um segmento novo, que diz "de harmonia com o princípio da representação proporcional". O PCP mantém este segmento para votação?

O Sr. João Amaral (PCP): - Não, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Nesse caso, a proposta do PCP quanto ao n.º 1 deste artigo está prejudicada.
Srs. Deputados, vamos passar à votação de um n.º 3 ao artigo 274.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

3. As decisões e pareceres do Conselho Superior de Defesa Nacional devem ser fundamentados.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, passamos ao artigo 275.º, relativamente ao qual foi apresentada uma proposta comum, a 262, apresentada pelo PS e PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, a alteração ao n.º 2 decorre da proposta que surge mais à frente, de alteração ao artigo 276.º, com a desconstitucionalização da obrigatoriedade do serviço militar. A alteração é a de retirar o serviço militar obrigatório como base da organização das Forças Armadas, uma vez que no contexto das duas propostas assim deixará necessariamente de ser.

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Quanto aos n.º 5 e 6 que surgem na proposta, no fundo, são alterações que decorrem do debate da primeira leitura, em que ficou clara, face às propostas iniciais que havia da parte do PSD e também de outros partidos, nomeadamente do Partido Socialista, a vantagem de se explicitar as incumbências das Forças Armadas logo no n.º 5, que surge a falar das matérias que têm que ver com o relacionamento das Forças Armadas em termos do posicionamento internacional do Estado português, e da constitucionalização de um princípio para o qual tem evoluído muito recentemente a política externa, não só do Estado português como, em geral, em termos das próprias Nações Unidas, de envolvimento em missões humanitárias e de paz assumidas por organizações internacionais. Tem sido esta uma prática comum em que, nos últimos anos, se tem desenvolvido a política externa portuguesa, na qual as Forças Armadas são chamadas amiúde para tomar um papel fundamental e essencial na execução dessa política. Ora, é a constitucionalização disso mesmo que se propõe nesta nova redacção do n.º 5.
Quanto ao n.º 6, propõe-se alguma rectificação do texto actual com a consagração de matérias tão importantes como, por exemplo, a da problemática da protecção civil, que nos parece uma questão fundamental, e as das acções de cooperação técnico-militar no âmbito da política nacional de cooperação, uma vez que a normalização das relações externas de Portugal com os novos países de expressão oficial portuguesa tem dado azo a políticas de cooperação técnico-militar que se têm traduzido em outras tantas incumbências importantes e relevantes das nossas Forças Armadas.
É neste contexto que surge o conteúdo útil destas inovações, totalmente inserido, repito, naquilo que foi a linha de orientação política básica do debate que aqui travámos na primeira leitura, embora com algumas concretizações consensuais entre o Partido Socialista e o Partido Social Democrata que resultaram do trabalho posterior à primeira leitura.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos entender-nos: o n.º 5 desta proposta corresponde a um número novo e o n.º 6 corresponde à modificação do actual n.º 5, passando o n.º 6, por sua vez, a n.º 7.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. Presidente: - Mais algum Sr. Deputado quer usar da palavra?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, esta é uma disposição extremamente relevante deste processo de revisão constitucional e congratulamo-nos com o facto de ter sido tão cuidadosamente discutida a solução encontrada para o n.º 2, ou seja, a questão do regime exacto através do qual o serviço militar passa a ser regulado constitucionalmente. Isto foi o resultado de uma aturada busca de um equilíbrio, encontrado não nesta sede mas em sede de artigo 276.º, n.º 2, através de uma norma que apreciaremos de seguida, a qual estatui que o serviço militar será regulado por lei e será a lei a fixar as formas, a natureza voluntária ou obrigatória, a duração e o conteúdo da prestação do serviço militar.
Repercute-se neste n.º 2 do artigo 275.º esta solução, adiante expressa de forma inequívoca, e dá-se, assim, cumprimento a um compromisso que, pela nossa parte, assumimos perante o eleitorado e que amplamente fundamentámos na busca de um equilíbrio, repito, que cremos ter sido atingido no artigo 276.º.
Os n.os 5 e 6 do texto que está contido na proposta 262 procuram também, de forma equilibrada, por um lado, explicitar algo que entendemos que não é prescrito constitucionalmente hoje, ou seja, a realização pelas Forças Armadas de acções que sejam satisfação de compromissos internacionais do Estado português no âmbito militar, e, por outro, a participação em determinado tipo de missões humanitárias e de paz, não em todas, mas nas que, doravante, ficarão delimitadas neste novo n.º 5. Portanto, este número tem a virtude de ser uma solução expressa, delimitada, "principologicamente" cristalina e modernizadora da função das Forças Armadas.
O n.º 6, correspondente ao actual n.º 5, procura dilucidar algumas confusões apreciáveis geradas pelo texto anterior. Proclama-se, por um lado, de forma inequívoca, que o legislador pode determinar o envolvimento das Forças Armadas em missões de protecção civil, dada a sua alta importância e a imprevisibilidade da ocorrência das catástrofes que a protecção civil visa precisamente conjurar - e, portanto, a prevenção é ela própria incluída no âmbito desta norma e não apenas a acção, a quente, que estava referida de forma um pouco apocalíptica na parte final do actual n.º 5 -, e explicita-se, por outro, que, no âmbito da política nacional de cooperação, podem ter lugar - e trata-se de outra explicitação meritória de alguma coisa que não era prescrita constitucionalmente - acções de cooperação técnico-militar, a serem realizadas, obviamente, pelas Forças Armadas, com o seu estatuto próprio e com a articulação e subordinação ao poder civil democrático, que é timbre do texto constitucional desde a revisão constitucional de 1982.
É, portanto, um resultado globalmente satisfatório e, em cada uma das suas partes, na nossa leitura, positivo.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Correia da Silva.

O Sr. Nuno Correia da Silva (CDS-PP): * Sr. Presidente, o Partido Popular congratula-se com a nova redacção que é apresentada para o n.º 2, que vem, aliás, ao encontro da proposta que o próprio Partido Popular apresenta.
Entendemos que o serviço militar tem uma natureza instrumental, não é um princípio. O princípio que, entendemos, deve estar consagrado e, julgamos, se mantém consagrado na Constituição é o princípio do dever, da obrigação e do direito de todo o cidadão português participar na defesa da Pátria.
Acontece que, por razões históricas e da própria nova conjuntura militar e geoestratégica, o serviço militar perdeu actualidade. Nessa medida, entendemos que deve ser regulado, se assim for necessário, e remetido para legislação ordinária. Penso que perdeu dignidade para estar no texto constitucional.
Gostaria de reforçar a ideia de que, para o Partido Popular, o serviço militar ou o recurso ao serviço militar por parte das Forças Armadas não fica afastado com esta nova redacção. Pensamos, sim, que é consagrado um novo princípio, um

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princípio mais abrangente, ao contrário do que muitas vezes se quer fazer crer, de que, hoje, a garantia da defesa e da integridade do território não passa apenas pelo serviço militar e seguramente não pela quantidade de efectivos, que era um princípio que, de alguma forma, sustentava a consagração do serviço militar obrigatório. Hoje, a garantia da nossa defesa e da nossa integridade passa não pela quantidade dos efectivos mas, seguramente, pela qualidade quer dos recursos humanos quer dos recursos logísticos.
É, portanto, nesta medida que o Partido Popular votará favoravelmente esta alteração ao n.º 2.
Em relação ao n.º 5, apresentado na proposta conjunta do PS e PSD, também nos parece que tem toda a pertinência, face, cada vez mais, à dimensão global que deve ter e à conjugação de esforços que deve merecer a defesa da integridade nacional e, nomeadamente, às obrigações que decorrem das instituições internacionais de que somos membros, de que somos parte. Assim sendo, votaremos favoravelmente.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, não vou repetir o que já foi dito na primeira leitura em termos das opções que estavam em confronto nas alterações do n.º 2 do artigo 276.º, das quais, depois, decorre a alteração do n.º 2 do artigo 275.º.
Quero apenas registar o seguinte: a ideia de que a defesa da Pátria é direito e dever de todos os portugueses é uma ideia que se projecta ou que se deveria projectar também na componente militar.
O conceito de defesa nacional, contido na Constituição e vertido na Lei de Defesa Nacional, não é um conceito exclusivamente militar e não há novidade alguma quanto a isso nestas alterações, porque o conceito actualmente aceite e consagrado na lei e na Constituição é o de que a defesa nacional é multidisciplinar e, evidentemente, abrange sectores tão diferenciados como a educação, as reservas estratégicas, etc. Portanto, não existe nisso qualquer novidade.
Agora, o que é novidade aqui - e é em relação a isto que há uma reformulação - é que a componente militar deixa, tendencialmente, de ser direito e dever de todos os portugueses. Porquê? Porque, não havendo serviço militar obrigatório, pode estabelecer-se a confusão de que nem todos os portugueses estão obrigados à prestação do dever de integrarem a componente militar de defesa nacional quando seja caso disso. Ora, nós encaramos isso de uma forma negativa.
Evidentemente que havia alternativas. Teria sido possível gizar alternativas, em sede de uma discussão aprofundada deste tema. E, desde logo, uma, relativamente evidente, que era a de manter a obrigatoriedade do serviço militar, admitindo a suspensão da mesma.
Mais: o que teria sido, provavelmente, interessante para os que defendem isso era percorrerem um trajecto que os conduzisse à ideia de qualquer coisa semelhante ao que os franceses estão a ensaiar neste momento, que é o rendez-vous citoyens, isto é, um qualquer processo que leva todos os jovens, por um período muito curto, num acto cívico, a assumirem o compromisso de defesa da Pátria, incluindo a sua componente militar.
Teria sido interessante fazer esse caminho. Porém, o caminho que aqui está traçado é o mais simples: o de satisfazer compromissos eleitorais e não tanto o de reflectir sobre esta questão.

O Sr. Nuno Correia Silva (CDS-PP): * Não está prejudicado esse caminho!

O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Deputado está enganado! Esse caminho foi, efectivamente, prejudicado, porque ninguém quis discutir esta questão com profundidade, o resultado estava feito. E não se tratava de discutir se o resultado era bom; tratava-se, tão-só, de argumentar, face a um resultado que estava dado, que era um ponto assente.
Aliás, em relação ao n.º 2 do artigo 275.º, põe-se exactamente uma questão semelhante, porque teria sido possível conceber um sistema de Forças Armadas que continuasse baseado no serviço militar obrigatório, através de uma estrutura militar latente, isto é, pré-posicionada, admitindo a possibilidade de mobilização e, portanto, de, a uma certa altura, integrar os portugueses no seu conjunto. Tudo isto, que teria sido possível, não foi feito, e nós vemos com pena que isso não tenha sido feito.
Quanto ao n.º 5 do artigo 275.º, registamos o facto de aparecer como nova incumbência alguma coisa que está a ser feita. Registei as opiniões daqueles que diziam que isto não era necessário, mas também registo o cuidado com que o querem inserir aqui.
Quanto ao n.º 6, ele contém uma contradição curiosíssima, que é esta: alargam-se as incumbências das Forças Armadas em matéria de situações de emergência, não só aos casos de calamidade verificados como também às medidas gerais de protecção civil e, portanto, à própria prevenção a esse nível. Isto é: no exacto momento em que se profissionalizam as Forças Armadas, incumbe-se-lhes o dever ou o encargo de serem, simultaneamente, também bombeiros. Eu já disse, e repito, que vão ser os bombeiros mais caros da História de Portugal, mas é o que é possível fazer neste quadro, pois a discussão está feita e sei que há situações em que se debita para a acta posições e pouco mais do que isso, que é o que, mais uma vez, faço.
Já agora, e para resolver a questão, quero também pronunciar-me quanto a uma proposta apresentada pelo PSD, que, prevendo a possibilidade de mobilização geral - aliás, devia ser mobilização geral ou parcial, porque creio que era de prever também a mobilização geral ou parcial…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Isso é no artigo 276.º, Sr. Deputado!

O Sr. João Amaral (PCP): - Sim, mas eu faço a análise em conjunto!
Considero que esta proposta tem uma vantagem, que é a de, pelo menos, dar um sinal de que este processo de alteração não conduz à desresponsabilização dos portugueses no seu conjunto da componente militar. Tem, pelo menos, essa vantagem e, nessa medida, considero que seria positivo que isto fosse inserido.
Assim sendo, as nossas posições decorrem da exposição que acabei de fazer.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Sérgio Sousa Pinto.

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O Sr. Sérgio Sousa Pinto (PS): * Sr. Presidente, quero fazer apenas uma breve observação, que me vincula apenas a mim na qualidade de representante da minha organização de juventude, relativamente ao n.º 2 do artigo 275.º.
Faço votos de que as soluções mitigadas de organização militar aqui aventadas pelo Sr. Deputado João Amaral fiquem definitivamente arredadas com a redacção proposta para este número do artigo 275.º, justamente porque a nossa posição é a de que o serviço militar obrigatório corresponde a uma solução de organização militar obsoleta que não dá resposta às actuais exigências de defesa nacional.
Portanto, entendemos politicamente a alteração que vai agora ser votada como a remoção de um obstáculo constitucional à extinção do serviço militar obrigatório.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, gostaria de fazer também um brevíssimo apontamento pessoal e reproduzir aqui o que eu disse na primeira leitura.
Pertenço ao número daqueles que lamenta que tenha sido abolido, no fundo sem uma grande discussão, o princípio do serviço militar obrigatório e que tenhamos caído no exército mercenário, no exército legionário, de que cujos exemplos, e maus exemplos, está cheia a História.
A partir daqui, o legislador ordinário - as circunstâncias podem ser várias e as situações muitas - pode encaminhar-se para uma organização militar que nada tem que ver com a Nação em armas.
A preparação militar mínima parece ser um elemento fundamental do empenhamento cívico da generalidade das pessoas na vida e na defesa do País. Lamento que esta ideia tenha caído, mas espero que, se o legislador constituinte perdeu a serenidade, ao menos o legislador ordinário a recupere ou a mantenha.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, está esgotado o debate em torno do artigo 275.º.
Gostaria apenas de referir, para que ficasse registado em acta, que o entendimento não pode deixar de ser o de que o regime de cooperação das Forças Armadas, designadamente em missões de protecção civil e outras relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações, ocorrerá sempre e necessariamente no regime constitucional de direitos, liberdades e garantias. É, aliás, a esta luz que se interpretará o actual n.º 6, que diz que apenas no regime de estado sítio e de estado de emergência outras podem ser as condições de emprego das Forças Armadas.
Srs. Deputados, vamos passar à votação de uma proposta comum, a 262, apresentada pelo PS e PSD, relativa ao artigo 275.º. Pergunto se a proposta pode ser votada em bloco.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, gostaríamos de votar em separado o n.º 6.

O Sr. Presidente: - Com certeza.
Srs. Deputados, vamos, então, votar os n.os 2 e 5 do artigo 275.º, constantes da proposta 262 apresentada pelo PS e PSD.

Submetidos à votação, obtiveram a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP, votos contra do PCP e a abstenção do Deputado do PSD Barbosa de Melo.

São os seguintes:

2. As Forças Armadas compõem-se exclusivamente de cidadãos portugueses e a sua organização é única para todo o território nacional.
(…)
5. Incumbe às Forças Armadas, nos termos da lei, satisfazer os compromissos internacionais do Estado português no âmbito militar e participar em missões humanitárias e de paz assumidas pelas organizações internacionais de que Portugal faça parte.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos agora votar o n.º 6 do artigo 275.º, constantes da proposta 262 apresentada pelo PS e PSD.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e a abstenção do PCP.

É o seguinte:

6. As Forças Armadas podem ser incumbidas, nos termos da lei, de colaborar em missões de protecção civil e tarefas relacionadas com a satisfação de necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações, bem como em acções de cooperação técnico-militar, no âmbito da política nacional de cooperação.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, relativamente aos projectos de revisão originários, temos a seguinte situação: a proposta do CDS-PP está prejudicada; a proposta do Deputado Pedro Passos Coelho e outros, do PSD, está prejudicada; a proposta do PS está substituída; a proposta do PSD está substituída; e a proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, está prejudicada.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Sr. Presidente, por que razão a minha proposta está prejudicada e as outras estão substituídas?!

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, porque os outros Deputados do PS e do PSD subscreveram uma proposta comum para modificar o artigo 275.º.

O Sr. Cláudio Monteiro (PS): * Eu ainda sou Deputado do PS, Sr. Presidente!

Vozes do PSD: - "Ainda"…!

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, como é autor de um projecto autónomo, quando não é subscritor explícito das propostas, não é havido como tal.
Srs. Deputados, quanto ao artigo 275.º, temos ainda que votar dois novos números, os n.os 7 e 8, constantes do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, vamos votar o n.º 8, porque quanto ao n.º 7, ele está prejudicado pela votação feita no artigo 167.º - aliás, o PCP votou a favor do artigo 167.º exactamente com prejuízo desta sua proposta.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, então, da proposta do PCP, vai ser votado o n.º 7 e está prejudicado o n.º 8.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Não, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: * Não é assim, Sr. Deputado Luís Marques Guedes?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, vamos votar o n.º 8 e está prejudicado o n.º 7 porque já está subsumido na votação atrás feita.

O Sr. Presidente: * Então, foi considerado prejudicado o n.º 7 e vamos votar o n.º 8.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Exactamente!

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos, então, votar o n.º 8 do artigo 275.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PCP.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

8. A natureza de corpo militar é exclusiva das Forças Armadas, e só elas podem integrar militares.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, passamos ao artigo 276.º, relativamente ao qual foi apresentada pelo PSD a proposta 267, que altera o n.º 1, e uma proposta comum, a 263, do PS e PSD, que altera o n.º 2.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, a proposta que o PSD apresenta para o n.º 1 é, em grande medida, produto da reflexão que fizemos após o debate da primeira leitura na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
Como os Srs. Deputados estão recordados e as actas reflectem, uma das grandes preocupações, aliás, ainda há pouco recordadas pelo Sr. Deputado João Amaral, tinha justamente que ver com o sentido que em termos de opinião pública e da comunidade nacional no seu todo se atribuiria à noção, que quisemos expressamente manter na Constituição, de que a defesa da Pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses.
É justamente para vincar que o caminho que queremos percorrer é o de atribuir à lei, em cada momento, a decisão de determinar se o serviço militar se reveste de natureza obrigatória ou voluntária e em que medida essa natureza se vai concretizar em termos de organização do serviço militar que fazemos este aditamento ao n.º 1 do artigo 276.º, desde já dizendo que me parece boa a proposta há pouco avançada pelo Sr. Deputado João Amaral no sentido de, à nossa redacção, aditarmos a expressão "ou parcial" a seguir à expressão "geral". Assim, ficaria "(…) podendo a lei prever a mobilização geral ou parcial dos cidadãos perante a iminência de agressão ou ameaça externa ou durante a vigência do estado de guerra".
Julgo que este aditamento que consta da proposta do Partido Social Democrata inequivocamente aponta para a manutenção da natureza de direito e dever dos cidadãos e dos portugueses em relação à defesa da Pátria.
Julgo que num momento particularmente sensível em que, em termos constitucionais, se assume esta mudança não faz mal que o legislador constitucional explicite aquilo que, do nosso ponto de vista, já decorreria sempre do texto da Constituição.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado, não há nada pior contra o patriotismo do que o "patrioteirismo"!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Já vamos ao n.º 2!

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, ouvimos com muita atenção a explicação agora dada pelo Sr. Deputado do PSD, que é inovadora em certo sentido, aliás, surpreendente. Como é óbvio, não temos qualquer objecção a fazer ao facto de o Sr. Deputado Miguel Macedo ter tido o cuidado de se pré-concertar para conseguir uma proposta que tivesse um consenso mais alargado, por parte do PCP.
Pela parte que nos cabe, e sendo certo que depende algo de nós a conquista de dois terços para a alteração deste preceito, gostaria de dizer que a inserção é errada e que a proclamação do direito e do dever de os portugueses defenderem a Pátria está, como diria o Sr. Deputado Barbosa de Melo, lapidar e cristalinamente feita no actual n.º 1. E o que está lapidar e cristalinamente feito não se altere, sobretudo porque se trata de aditar aquilo que o Sr. Deputado Miguel Macedo autoqualificou como a explicitação do que decorre do n.º 2. Muito obviamente decorre!…
Como pela nossa parte não temos qualquer dúvida de que decorre e, mais ainda, de que a lei pode e deve regular as formas através das quais os cidadãos podem ser chamados a prestar qualquer forma de serviço militar, perante as circunstâncias enunciadas nesta proposta do PSD ou mesmo outras, circunstâncias que serão apropriadamente tipificadas pelo legislador, gostaria de anunciar que não acompanharemos o PSD nem o PCP na aprovação deste tipo de coisas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Mas reconsiderarão!

O Sr. José Magalhães (PS): * Não, não!

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, parece que é inevitável fazermos a discussão conjunta dos n.os 1 e 2, para os quais há propostas, aliás, em relação ao n.º 2 há uma proposta comum do PS e PSD.

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Pondo de parte a questão levantada pelo Sr. Deputado José Magalhães da inserção sistemática, na lógica do artigo 276.º, da proposta que o PSD agora faz, a verdade é que o acrescento que fazemos no n.º 1 do artigo 276.º não tem exclusivamente a ver com o teor e o conteúdo do n.º 2 do mesmo artigo, como está bom de ver.
Justamente como há pouco se referiu, sem que isso implicasse qualquer pré-concertação com o PCP, porque a nossa posição…

O Sr. José Magalhães (PS): * Mas qual é o mal?!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado José Magalhães, não estou a dizer que há mal, só estou a responder a uma acusação que nos fez!

O Sr. José Magalhães (PS): * Não!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Como estava a dizer, sem que isso implicasse qualquer pré-concertação com o PCP - a não ser que esse aparte tenha sido dirigido ao Sr. Deputado Barbosa de Melo, que há pouco teve oportunidade de explicitar, a título pessoal, a sua posição sobre esta matéria! -, porque a nossa posição de princípio, que é de todos conhecida, é, obviamente, diferente da que o PCP tem explicitado sobre esta matéria, a verdade é que a questão da mobilização geral - ou parcial, acrescento eu, e este é o ganho em relação à discussão que há pouco travámos - pode não ter a ver exclusivamente com a questão da organização do serviço militar obrigatório e o facto de um serviço militar obrigatório, em cada momento, nos termos da lei, ter ou não natureza obrigatória, isto é, ser obrigatório ou voluntário.
A questão da mobilização, justamente apelando ao conceito de defesa nacional, pode ter a ver com mais áreas, com áreas diferentes da estrita componente militar da prestação do serviço militar. E não me parece errado, na lógica da defesa nacional, da "defesa da Pátria", como se refere no n.º 1, acautelar na lei as regras e as condições em que pode operar a mobilização geral para efeitos de serviço militar, ou não! É esta a lógica.
Julgo que isto é medianamente claro…

O Sr. José Magalhães (PS): * Uma nova situação restritiva de direitos não tipificada!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado José Magalhães, a lei já hoje prevê…

O Sr. José Magalhães (PS): * É por conhecer bem a lei e as tentativas inconstitucionais de fazer passar na Assembleia da República uma lei inconstitucional que digo isto!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado José Magalhães, já hoje a lei prevê…

O Sr. José Magalhães (PS): * Isso foi no ciclo político anterior!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Já hoje a lei prevê os mecanismos em que pode operar a mobilização em caso de ameaça ou estado de guerra - estão previstos na lei.
Portanto, não tem nenhum mal, bem pelo contrário, que na Constituição se explicite o mecanismo pelo qual se vai operar esse tipo de mobilização geral ou parcial.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, queria fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Macedo, o gerúndio aqui utilizado, "podendo a lei", é para exemplificar o que está previsto atrás. Pergunto: será que as medidas que tomou o Sr. Winston Churchill, mobilizando as mulheres e os homens de Inglaterra para as fábricas a fim de trabalharem num período crítico em prol da defesa da Pátria, estão ou não previstas neste inciso, neste gerúndio?

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, essa foi, aliás, uma das questões que estávamos há pouco a discutir, porque uma das alternativas era a de substituir o "podendo" por "devendo" no texto do n.º 1 do artigo 276.º. Essa é uma questão em relação à qual, obviamente esperamos o contributo dos Srs. Deputados nesta Comissão para a Revisão Constitucional…

O Sr. Osvaldo Castro (PS): * Isto é uma requisição civil para todos os portugueses!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado Osvaldo Castro, justamente para afastarmos esses "fantasmas", estamos a falar na exacta situação que vem descrita na nossa proposta, isto é, no caso de iminência agressão, ou ameaça externa, ou na vigência de estado de guerra. São as três situações que estão aqui previstas!

O Sr. José Magalhães (PS): * "Ou ameaça externa",sic!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Deputado José Magalhães, devo dizer que estou particularmente à vontade nesta matéria. Já estive, em anteriores comissões de revisão constitucional, a defender sozinho a desconstitucionalização do serviço militar obrigatório. Portanto, estou particularmente à vontade nesta matéria e, no entanto, devo dizer que eu próprio fiz serviço militar.
Mas a questão não é essa, a questão é a de sabermos se podemos…

O Sr. José Magalhães (PS): * Não vão invocar "dragonas", pois não?!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Eu não estou a invocar "dragão" nenhum, mas também não quero que invoquem "fantasmas", Sr. Deputado José Magalhães!
A questão que se põe é a de saber se, no caso de ameaça externa ou no caso de estado de guerra, estão ou não previstos explicitamente na Constituição da República

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Portuguesa os mecanismos que prevêem a mobilização geral - ou parcial, acrescento - em relação ao nosso texto. E, ao mesmo tempo, a lei é que vai determinar se o serviço militar é voluntário ou obrigatório. Essa, sim, é a questão.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado Miguel Macedo, já houve tempo em que a elaboração do regime de suspensão do exercício de direitos, no quadro do artigo 19.º, em estado de sítio e em estado de emergência, permitia, justamente pelo mecanismo da suspensão e adequação dos direitos ao regime de estado de sítio e do estado de emergência, regular em termos adequados a matéria que agora o Sr. Deputado quer, de uma maneira sui generis, regular no artigo 276.º.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Não tem nada a ver uma coisa com a outra!

O Sr. Presidente: * Tem, tem, Sr. Deputado!

O Sr. Miguel Macedo (PSD): - Não, Sr. Presidente. Pode haver mobilização geral…

O Sr. Presidente: - Porque ao falar da possibilidade de mobilização geral, o Sr. Deputado está a introduzir aspectos que vão justamente colidir com o regime de direitos dos cidadãos.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Não, necessariamente!

O Sr. Presidente: * Ora, o modo como deve ocorrer o tratamento do regime de direitos dos cidadãos há-de ocorrer em regime de estado de sítio ou de estado de emergência,…

O Sr. José Magalhães (PS): - É um estado de excepção atípico, como é óbvio!

O Sr. Presidente: * … sendo que o estado de sítio ou o estado de emergência pode ser declarado justamente em função de uma agressão efectiva ou latente. E, portanto, Srs. Deputados, o que estão aqui a querer regular com menor cautela é algo que, com as devidas cautelas, se encontra admitido no artigo 19.º da Constituição
Portanto, tudo o mais que se fizer, em minha opinião, não beneficia, só prejudica, os aspectos constitucionais que justamente se reportam ao regime do estado de sítio e do estado de emergência.
É por isso, Srs. Deputados, que não vos acompanhamos nesta vossa proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria apenas dizer que me espanta, de alguma forma, os "fantasmas" que se procuram criar à volta desta proposta, na medida em que, no fundo…

O Sr. Presidente: * O Sr. Deputado que foi contra o regime da requisição civil dos trabalhadores durante o período da greve é agora inteiramente favorável ao regime da requisição civil dos portugueses fora do regime do estado de sítio e do estado de emergência!

O Sr. José Magalhães (PS): * É notável!

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, pedia que me interrompesse, pelo menos, um Deputado de cada vez!…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado António Filipe, faça favor de continuar no uso da palavra.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, não consigo compreender a interrupção feita por dois Deputados ao mesmo tempo! Se quiserem interromper-me, terei todo o gosto; se me quiserem deixar falar, também terei todo o gosto.

O Sr. Presidente: * Dou-lhe a palavra, Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): * Sr. Presidente, vejo esta norma como uma forma de compatibilizar o n.º 1 do actual artigo 276.º com as disposições seguintes. É que se se diz que "A defesa da Pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses", tem de se tirar uma consequência lógica disso.

O Sr. Presidente: * Não diga enormidades, por amor de Deus!…

O Sr. António Filipe (PCP): * Eu entendo que a proposta apresentada encontra uma forma de compatibilizar este dever com outras disposições já votadas. Não está aqui em causa a declaração do estado de sítio e do estado de emergência…

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado António Filipe, pior ainda, pior ainda!

O Sr. José Magalhães (PS): * Isso é que é grave!

O Sr. António Filipe (PCP): * Está em causa a possibilidade de, perante uma situação de ameaça externa que exija inequivocamente a mobilização dos portugueses, tirar consequências lógicas do n.º 1 do artigo 276.º, do facto de a defesa da Pátria ser um dever fundamental de todos os portugueses e não apenas daqueles que cumprem serviço militar.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, o que está a acontecer é que, em relação a cada intervenção, o Sr. Presidente responde para defender a sua posição!
O que é totalmente incompreensível é a vossa posição! É totalmente incompreensível!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes…

O Sr. António Filipe (PCP): * Quer dizer que o tal serviço militar obrigatório é o estado de sítio permanente?!

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Deputado António Filipe, vamos discutir seriamente porque a matéria não é exactamente trivial.

O Sr. Presidente: * Algum Sr. Deputado deseja usar da palavra?

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Já me tinha inscrito, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Sr. Presidente, espero que esta intervenção sirva para pôr fim a um debate que começa a ser pouco edificante.
Queria apenas relembrar dois ou três aspectos.
Em primeiro lugar, ao contrário do que foi dito, quer pelo Sr. Deputado José Magalhães quer pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, porque não o fez na qualidade de Presidente, devo dizer que são totalmente inusitadas face à tradição republicana de que, nomeadamente, o Partido Socialista se diz ser portador as posições assumidas pelos Srs. Deputados que acabei de citar. E tenho pena que não seja possível contar nesta segunda leitura com Sr. Deputado Vital Moreira, que na primeira leitura invocou esses mesmos princípios republicanos para pôr em causa esta apressada retirada da Constituição da obrigatoriedade do serviço militar quando conexionado com o dever de defesa da Pátria que, sendo mais vasto, incorpora, obviamente, também a componente militar.
Em segundo lugar, Sr. Presidente, queria dizer o seguinte: é evidente que o que acontece em situações de estado de sítio e de estado de emergência não tem que ver, obviamente - só por uma confusão manifesta ou deliberada -, com a problemática da guerra. É manifesto para todos que o Sr. Presidente da República tem competência para determinar o estado de guerra, sem que seja determinado o estado de sítio ou o estado de emergência, e vice-versa.
Portanto, as situações não são confundíveis e, atendendo a que as intervenções são feitas por pessoas qualificadas, só por uma vontade política de gerar alguma confusão (que não consigo compreender) é que se pode lançar alguns equívocos sobre esta matéria, sendo certo que o texto constitucional sempre tratou e trata, de uma forma perfeitamente diferenciada, o estado de guerra e o estado de sítio ou de emergência.
O que os proponentes pretendem é, face à oportunidade de, neste texto constitucional, se desconstitucionalizar a obrigatoriedade do serviço militar, colocar aqui, como que numa lógica de contrapeso, uma explicitação clara de que isso não preclude em nada o dever fundamental de todos os portugueses à defesa da Pátria, dever fundamental esse que engloba quer uma componente eventual de mobilização militar quer uma componente de mobilização de outro tipo, mobilização que pode ocorrer em planos não militares, em planos onde a defesa nacional entenda chamar esses mesmos cidadãos ao dever de colaboração fundamental. É o que se pretende com esta proposta.
Quem quiser acompanhá-la, acompanhe-a, na certeza de que o que se pretende é perfeitamente constitucional, embora não mereça uma constitucionalização expressa, constitucionalização expressa essa que ao PSD parece particularmente oportuna numa revisão constitucional em que se desconstitucionaliza a obrigatoriedade do serviço militar, uma das componentes, quiçá a mais visível, embora não a esgote, e aquela a que os cidadãos dão mais relevância, da defesa nacional.
Por essa razão, eu, particularmente - e o PSD também - revejo-me totalmente nesta proposta, independentemente da sua sistematização, porque aí, sim, julgo que poderia haver alguma reponderação sobre a inserção sistemática mais adequada, ou como um acrescento ao n.º 1, ou em número autónomo.

O Sr. Presidente: * Para que o Sr. Deputado Marques Guedes não se vá sem resposta, também o Deputado Jorge Lacão queria fazer algumas considerações.
Primeiro, é assinalável que a Constituição, com todas as cautelas, tenha definido o regime do estado de sítio e do estado de emergência, configurando a necessidade de partilha de responsabilidades por parte dos órgãos de soberania, particularmente a Assembleia da República e o Sr. Presidente da República, a quem incumbe a declaração do estado de sítio e do estado de emergência, dependendo, como sabe, de autorização do Governo e de prévia autorização da Assembleia da República e definindo o regime de direitos, liberdades e garantias, de acordo com princípios constitucionais fundamentais, designadamente o da proporcionalidade, e não só.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o que ocorre na vossa proposta é que remetiam para a lei geral a possibilidade de uma entidade, não constitucionalmente definida, poder definir o regime da mobilização geral dos cidadãos, o que era verdadeiramente um atropelo possível ao regime de direitos, liberdades e garantias.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Se alguma ligeireza há, é na proposta de que os Srs. Deputados são subscritores, a que considerei movida por intuitos "patrioteiros" e não patrióticos, porque representaria, de forma gravosa, uma verdadeira excepção à harmonia constitucional e ao regime de direitos, liberdades e garantias fundado na Constituição.
E não se diga, Srs. Deputados, que a Constituição, justamente num regime de estado de sítio e de emergência, não prevê as possibilidades de mobilização dos cidadãos. No entanto, fá-lo em condições adequadas a que a Assembleia da República, o Presidente da República e os princípios constitucionais são chamados a integrar esse processo de decisão.
Nada disto esteve nas preocupações dos Srs. Deputados…

O Sr. José Magalhães (PS): - E com possibilidade de mobilização parcial, Sr. Presidente. Um escândalo!

O Sr. Presidente: - … e, por isso, a vossa proposta deve merecer aquilo que, em minha opinião, deve merecer: um rotundo "não"!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mobilização parcial!? Só falta dizer pessoal!…

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos proceder, em primeiro lugar, à votação do n.º 1 do artigo 276.º, constante da proposta 267 apresentada pelo PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS e do CDS-PP e votos a favor do PSD e do PCP.

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Era o seguinte:

1. A defesa da pátria é direito e dever fundamental de todos os portugueses, podendo a lei prever a mobilização geral dos cidadãos perante a iminência de agressão ou ameaça externa ou durante a vigência do estado de guerra.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, esta proposta foi rejeitado e, não resisto ao comentário, felizmente.
Vamos passar à votação do n.º 2 do artigo 276.º, constante da proposta comum, a 263, apresentada pelo PS e PSD.

Submetido à votação, obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado votos a favor do PS, do PSD e do CDS-PP e votos contra do PCP e do Deputado do PSD Luís Marques Guedes.

É o seguinte:

2. O serviço militar é regulado por lei, que fixa as formas, a natureza voluntária ou obrigatória, a duração e o conteúdo da respectiva prestação.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): * Vou ser muito breve, Sr. Presidente, porque as actas da primeira leitura já traduzem o meu pensamento pessoal sobre esta matéria.
Como subscritor geral do acordo, devo dizer que disciplinadamente acato, sem grande dificuldade, devo dizer, esta formulação sugerida em comum pelo PSD e pelo PS na sequência do acordo político.
No entanto, quero expressar, mais uma vez, para que fique em acta que, numa perspectiva estritamente pessoal, embora compreenda os argumentos de quem defende convictamente esta solução, na balança dos prós e dos contras de uma solução como esta, continuo a considerar que, no actual momento histórico, não é adequado operar-se na nossa lei fundamental a extinção do serviço militar obrigatório.
Pessoalmente (é uma opinião estritamente pessoal), entendo que, no actual momento histórico, continuam a existir argumentos poderosos - quiçá até conjunturais em termos de momento histórico, portanto com uma latitude um pouco ampla em qualquer circunstância - no sentido de não desvincular este dever de cidadania fundamental, numa altura em que o mundo está em grandes mutações e em que existem tensões centrífugas várias contrárias à lógica da nacionalidade. Nesse sentido, parece-me que esta é uma opção errada.
É uma posição pessoal, vale o que vale. Compreendo perfeitamente os argumentos de quem tem uma opinião contrária, mas ao longo de muitas discussões e da audição e confrontação com muitas opiniões diferentes da minha continuo a considerar que ainda militam mais razões no sentido de se manter o serviço militar obrigatório do que, sendo já várias e de peso, em sentido contrário.
Por essa razão e pessoalmente apenas, embora aceite disciplinadamente a opção do acordo político, não me revejo no sentido político desta alteração.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, peço a palavra para também fazer uma declaração de voto.

O Sr. Presidente: * Não pode, Sr. Deputado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * É-me proibido?

O Sr. Presidente (PSD): * Sr. Deputado, em princípio, seria mas ninguém relevará a falta do Presidente.
Tem a palavra, Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Muito obrigado, Sr. Presidente. Fico-lhe mesmo muito grato.
Julgo que a proposta apresentada pelos meus colegas de bancada não foi bem redigida, mas entendo que o princípio que os inspirou é um princípio certo.
No fundo, o que eles quiseram propor foi o seguinte: caso o Presidente da República use a competência que lhe dá o artigo 138.º, alínea c), de declarar guerra - e tem de o fazer em caso de agressão efectiva ou iminente - e a Assembleia da República o autorize a fazer essa declaração, estabelecesse-se um outro de estado diferente do estado de sítio e do estado de emergência. E nessa situação, do meu ponto de vista, a lei pode (e era bom que a Constituição o dissesse) mobilizar, conforme as necessidades da defesa nacional, os cidadãos para este efeito.
Era isto que queriam dizer, mas não redigiram bem a proposta. No entanto, o princípio não é um princípio em relação ao qual possamos adoptar uma atitude despicienda. Ninguém procurou alterar nada de essencial no Estado de direito. Pelo contrário, procurou-se regular pela lei uma coisa que a própria natureza da vida humana leva a que seja sempre regulada de qualquer maneira.

O Sr. Presidente: * Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo.

O Sr. Miguel Macedo (PSD): * Sr. Presidente, em nome do PSD, gostaria de dizer o seguinte: julgo que, no essencial, já se percebeu a lógica e o sentido da proposta que fizemos para o artigo 276.º.
Independentemente das questões de redacção ou de más interpretações, deliberadas ou não (algumas delas, obviamente, deliberadas) que aqui foram feitas na discussão da nossa proposta, fica o sentido útil daquilo que aqui quisemos propor com toda a justeza, com toda a equidade e com toda a premência, num momento em que a revisão constitucional trata do que trata e altera o que altera na parte respeitante ao serviço militar.
Espero que o Partido Socialista reflicta sobre estas matérias. Ainda há tempo para emendar o percurso que agora acabámos de votar e espero que dessa reflexão que todos haveremos de fazer possa sair uma melhoria efectiva do texto constitucional em relação a esta matéria.
É esse o desejo do Partido Social Democrata.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, proponho que votemos em bloco não só o n.º 2 mas também as propostas que eliminam os n.os 3 a 7 do artigo 276.º, constantes do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Pedro Passos Coelho e outros, do PSD.

Pausa.

Não havendo objecções, vamos votá-los.

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Submetidos à votação, foram rejeitados, com votos contra do PS, do PCP e CDS-PP e a abstenção do PSD.

Eram os seguintes:

2. O serviço militar é voluntário, salvo na vigência de estado de guerra em que a lei pode determinar o princípio de mobilização geral.
3. (Eliminado.)
4. (Eliminado.)
5. (Eliminado.)
6. (Eliminado.)
7. (Eliminado.)

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, em relação ao n.º 2 do artigo 276.º, estão prejudicadas a proposta admitida na primeira leitura subscrita pelo Deputado do PSD Luís Marques Guedes, a proposta do PS, a proposta do PSD e a proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.
Vamos votar o n.º 3 do artigo 276.º, constante da proposta comum, a 269, apresentada pelo PS e PSD.

Submetido à votação, foi aprovado por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É o seguinte:

3. Os cidadãos sujeitos por lei à prestação do serviço militar e que forem considerados inaptos para o serviço militar armado prestarão serviço militar não armado ou serviço cívico adequado à sua situação.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, em relação ao n.º 3, foram substituídas a proposta do PS e a proposta do PSD e está prejudicada a proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS.
Vamos votar o n.º 4 do artigo 276.º, também constante da proposta comum, a 269, apresentada pelo PS e PSD.

Submetida à votação, foi aprovada por unanimidade, registando-se a ausência de Os Verdes.

É a seguinte:

4. Os objectores de consciência ao serviço militar a que legalmente estejam sujeitos prestarão serviço cívico de duração e penosidade equivalentes às do serviço militar armado.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, em relação ao n.º4, a proposta do PS foi substituída e a proposta do Deputado Cláudio Monteiro e outros, do PS, está prejudicada.
Pergunto ao Sr. Deputado José Magalhães se o n.º 6 do artigo 276.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PS, é para ser votado ou retirado.

O Sr. José Magalhães (PS): * Retirado, Sr. Presidente. Aliás, essa norma constava da proposta apenas para uma leitura pedagógica do projecto.

O Sr. Presidente: * Com certeza, Sr. Deputado.
Também a proposta do PCP, que se reportava ao serviço militar obrigatório, está prejudicada.
Srs. Deputados, assim sendo, vamos proceder à votação de um novo n.º 7 ao artigo 276.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado por Os Verdes.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

7. Nenhum cidadão pode ser prejudicado nos seus direitos civis ou políticos em virtude da sua situação de militar.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos agora votar um artigo 276.º-A, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado do PCP João Corregedor da Fonseca.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PCP.

Era o seguinte:

Artigo 276.º-A
Armas nucleares

É proibido o fabrico, o estacionamento e o trânsito de armas nucleares em todo o território nacional.

O Sr. Presidente: * Srs. Deputados, vamos passar agora ao artigo 277.º, que, por sinal, já se reporta ao regime da fiscalização da constitucionalidade.
Da primeira leitura, ficou pendente uma questão suscitada pelo Sr. Deputado Moreira da Silva, que já deu azo à apresentação de uma nova proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, creio que esta nova proposta já foi suficientemente explicitada na primeira leitura. A sua intenção é a de alargar a excepção prevista no n.º 2 do artigo 277.º a todas as convenções internacionais, incluindo os acordos em forma simplificada.
As objecções que então foram referidas, nomeadamente pelo Sr. Deputado José Magalhães, estão perfeitamente corrigidas pelas duas ressalvas da parte final do n.º 2 do artigo 277.º, que são as seguintes: "desde que tais normas sejam aplicadas na ordem jurídica da outra parte" e "salvo se tal inconstitucionalidade resultar de violação de uma disposição fundamental". "Disposição fundamental" é, desde logo, por exemplo, as que constam dos nossos artigos 167.º e 168.º - assim é pacificamente entendido.
Por isso, ao abrigo desta excepção de inconstitucionalidades orgânicas ou formais, não poderia haver, por exemplo, uma usurpação de competências do Governo em relação a matérias da Assembleia da República, ou vice-versa! Penso que essa era a objecção fundamental do Sr. Deputado José Magalhães, mas tal não estaria em causa de forma alguma, porque essa situação estaria

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sempre ressalvada pela parte final deste n.º 2 do artigo 277.º.
Pelo contrário, ao não incluir aqui os acordos na forma simplificada estaríamos ao arrepio daquilo que, na ordem jurídica internacional, cada vez mais se vai afirmando, apesar de a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969, ainda não estar em vigor, de que o artigo 46.º dessa Convenção não faz nenhuma excepção entre tratados em forma solene e acordos em forma simplificada.
Por isso, a nossa Constituição estaria nessa matéria a restringir algo que se vai afirmando na comunidade internacional.
Assim, sem prejuízo para as regras fundamentais do nosso direito constitucional, porque essas estão ressalvadas pela parte final do artigo 277.º, não vejo nenhuma outra objecção a que, nesta excepção, se possam considerar também os acordos em forma simplificada.
É essa a razão de ser desta alteração.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Presidente, gostaria de fazer a seguinte pergunta ao Sr. Deputado Moreira da Silva: o conteúdo dos acordos em forma simplificada, que são uma modalidade de convenção internacional, também faz parte da ordem jurídica portuguesa?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado Barbosa de Melo, se percebi bem…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * A pergunta é simples, Sr. Deputado. Um acordo em forma simplificada, por exemplo um acordo celebrado por departamentos dos ministérios nas relações externas - os chamados acordos administrativos, que são acordos em forma simplificada do ponto de vista do direito internacional -, o seu conteúdo normativo ainda faz parte da ordem jurídica portuguesa?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Deputado Barbosa de Melo, esse tipo de exemplo que deu…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * É evidente que faz!

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Deputado, desculpe que o diga, mas o exemplo que deu não é constitucional, porque são acordos em forma ultra-simplificada, que não têm assento na nossa Constituição e, por isso, não seriam regularmente ratificados ou assinados, como proponho. Portanto, esses acordos não estariam ao abrigo desta excepção.
Os acordos em forma simplificada previstos pela nossa Constituição têm de ser forçosamente aprovados na forma de decreto do Governo e assinados pelo Presidente da República. Essas são as únicas formas previstas. Ou seja, só há duas fórmulas previstas, das três fórmulas que doutrinalmente se entende que existem em direito internacional e uma delas não é permitida pela nossa Constituição. Refiro-me aos chamados acordos em forma ultra-simplificada, muito utilizados nos Estados Unidos, mas que não são admitidos pela nossa Constituição.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Está seguro disso?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Estou, Sr. Deputado.
Todos têm de passar pelo Presidente da República, ou para ratificação, ou para assinatura, porque eles têm de ser aprovados, sob forma de decreto, pelo Governo e submetidos à assinatura do Presidente da República, nos termos do artigo 138.º da Constituição.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): * Sr. Deputado, dou-lhe mais um exemplo: um daqueles acordos admitidos directamente pelo direito internacional celebrado entre comandantes em chefe em teatro de guerra (um armistício, por exemplo) só faz parte integrante da ordem jurídica portuguesa se for assinada pelo Presidente da República?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Deputado, penso que essa situação estaria ao abrigo do estado de sítio ou de emergência e, por isso, poderia envolver alteração à ordem constitucional. Mas, em situação normal, o n.º 2 do artigo 8.º é claro, ao definir que as normas constantes de convenções internacionais (tratados e acordos em forma simplificada) só valerão na ordem interna portuguesa desde que regularmente ratificadas ou assinadas. Portanto, o Presidente da República necessita sempre de participar na formação dessas convenções, através da ratificação ou através da assinatura do decreto do Governo que o aprovou. São as únicas duas formas permitidas na nossa Constituição.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente e Srs. Deputados, a única matéria que, neste domínio, gostaríamos de sujeitar a veredicto é aquela que consta do nosso projecto e que, de acordo com uma determinada lógica, garante que não serão submetidas a fiscalização sucessiva da constitucionalidade as leis de revisão constitucional.
Em relação a esta matéria, o alargamento da possibilidade, absolutamente excepcional, contida no actual n.º 2 do artigo 277.º tem inconvenientes que abordámos na primeira leitura.
A inserção de acordos em forma simplificada alargaria (e, num certo sentido, suponho que não teria um efeito particularmente útil, morigerado) as possibilidades de que vigorem na ordem interna normas que são inconstitucionais, orgânica ou formalmente. O que não é, em si mesmo, saudável.
Esta é uma norma cuja exegese constitucional teve, ao longo da nossa experiência constitucional, tentativas, algumas das quais, julgo, bem afortunadas, e creio que é cedo para seguir o que o Sr. Deputado Moreira da Silva considera ser a tendência do direito internacional, sobretudo no que diz respeito aos tais acordos em forma simplificada.
Mais ainda: a norma actual já suscita algumas dificuldades, porque o que para nós são tratados, em alguns Estados, dos quais somos, de resto, aliados e com os

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quais temos excelentes relações, não passam de acordos em forma simplificada e, todavia, podem dizer respeito, por exemplo, a compromissos relevantes em matéria de defesa, de cooperação político-militar, ou militar e política, etc. - já essa área suscita problemas gravíssimos de exegese.
Alargar essa área, à qual a nossa ordem jurídica é, numa parte, completamente alheia, uma nova área problemática, em que instrumentos de direito internacional, inconstitucionais por razões de carácter orgânico ou formal, poderiam, apesar de tudo, vigorar relevantemente na ordem jurídica portuguesa como se não o fossem, é um passo que não estamos em condições de dar neste momento.

O Sr. Presidente: * Tem a palavra o Sr. Deputado Moreira da Silva.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhães, percebo algumas das objecções que coloca, mas penso que essa última que referiu, de que alguns parceiros internacionais de Portugal…

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Deputado, se me permite a interrupção, a última não tem a ver com o seu alargamento de âmbito, foi apenas utilizada no meu suporte analítico para dizer que a norma actual como está já suscita problemas melindrosos de aplicação e de exegese.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Eu diria mais: então, nesse seguimento, e não contrariamente, a não ampliação, conforme propus, ainda suscita mais problemas, porque para alguns Estados serão acordos em forma simplificada e para nós serão tratados em forma solene, tendo por isso um tratamento diferente em cada uma das ordem jurídicas, e com a agravante de eles poderem estar já a seguir uma norma costumeira retirada do artigo 46.º da Convenção de Viena de 1969, e nós não, por imperativo da Constituição. Tal significa que permitiríamos…

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Tal significa apenas que, se houver que intervir, a Assembleia da República deve intervir mais ainda! E isso seria contraditório com a tendência que assumimos de só o Parlamento poder passar a aprovar, por ratificação, tratados.
Ou seja, por um lado, incluíamos, como competência parlamentar monopolística, a aprovação de tratados, proibindo o Governo de intervir nessa área, e, por outro lado, dávamos ao Governo não só a possibilidade de fazer o que deve fazer por acordo em forma simplificada como ainda, até mesmo nos casos em que isso fosse dúbio, poder fazer vigorar na ordem interna normas inconstitucionais.

O Sr. Moreira da Silva (PSD): * Sr. Deputado, peço desculpa mas não esteve atento ao início da minha intervenção quando apresentei esta proposta, porque nessa altura referi que tinha consciência, com base no debate travado na primeira leitura, que essa era a sua grande objecção a este alargamento. Mas logo tive oportunidade de dizer que essa objecção não procede devido à parte final do n.º 2 do artigo 277.º, ou seja, quando se ressalva esta excepção aos casos em que tal inconstitucionalidade resultar de violação de uma disposição fundamental. E as disposições fundamentais são, nomeadamente, as dos artigos 167.º e 168.º, isto é, as que dizem respeito às reservas absolutas e relativas da competência da Assembleia da República.
Por isso, há inconstitucionalidades orgânicas, como as que referiu, e que são um perigo, mas essas não estão ressalvadas pelo artigo 277.º, n.º 2, porque são disposições fundamentais da nossa Constituição. Se calhar, são outras inconstitucionalidades orgânicas.

O Sr. José Magalhães (PS): * Quais?

O Sr. Moreira da Silva (PSD): - Outras!… Mas essas não são, de certeza. E essas são as fundamentais e estão ressalvadas pela parte final do artigo 277.º, n.º 2.
Por isso, não vejo razão para não se alargar este âmbito. Aliás, a doutrina tem alargado inconstitucionalmente este âmbito, fazendo interpretações correctivas da norma, e continuará a fazê-lo, com certeza.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Moreira da Silva, reconheço que foi um esforço meritório!
Srs. Deputados, vamos proceder à votação do n.º 1 do artigo 277.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo Deputado Arménio Santos e outros, do PSD.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PCP e do CDS-PP e a abstenção do PSD.

Era o seguinte:

1. São inconstitucionais as normas e as decisões jurisdicionais que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação do n.º 2 do artigo 277.º, constante da proposta 46 apresentada pelo Deputado do PSD Moreira da Silva.

Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PS, do PSD, do CDS-PP e do PCP, voto a favor do Deputado do PSD Moreira da Silva e a abstenção do Deputado do PS Cláudio Monteiro.

Era o seguinte:

2. A inconstitucionalidade orgânica ou formal de convenções internacionais regularmente ratificadas ou assinadas não impede a aplicação das suas normas na ordem jurídica portuguesa, desde que tais normas sejam aplicadas na ordem jurídica da outra parte, salvo se tal inconstitucionalidade resultar de violação de uma disposição fundamental.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos proceder à votação de um n.º 3 ao artigo 277.º, constante do projecto

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de revisão constitucional apresentado pelo PS, a que já aludiu há pouco o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, relativamente a esta questão da fiscalização da constitucionalidade, o PSD tem o princípio de mostrar abertura para encontrar uma boa formulação, que se traduz no seguinte: como não pode deixar de ser, porque decorre do nosso modelo político de Estado de direito, o PSD está de acordo em que se afirme na Constituição a "superioridade" da Assembleia da República relativamente à aprovação dos poderes constituintes que tem e a aprovação do texto constitucional, não subordinando essa soberania, que lhe advém da sua representatividade popular, a qualquer triagem.
Nesse sentido, estamos perfeitamente abertos a uma qualquer formulação, que seja entendida como necessária, que afaste claramente do texto constitucional, quer a possibilidade de fiscalização preventiva, quer a possibilidade de fiscalização sucessiva, dentro desta lógica que acabei de situar, isto é, a lógica de que o Estado de direito assenta na soberania do povo, delegada nos seus representantes na Assembleia da República, sendo que, de acordo com o texto constitucional, esse poder constituinte não pode, ou não deve, ser contrariado por nenhum outro poder que não radique a sua representatividade directamente do povo, como sucede com a Assembleia da República.
Isto já acontece, claramente, por exemplo, no que diz respeito ao Presidente da República, conforme se pode ver no capítulo relativo das leis de revisão constitucional, onde fica claro que, pese embora a legitimidade democrática do Presidente da República, ele não pode recusar a promulgação do texto constitucional, o que, digamos, é já a afirmação deste princípio. Pelo que o PSD não vê com dificuldade a afirmação desse mesmo princípio também relativamente ao poder de fiscalização de constitucionalidade, que acaba por ser um poder jurisdicional também.
Sucede, porém, que temos dúvidas de que a inserção sistemática mais correcta da inconstitucionalidade por acção seja neste artigo 277.º. Porventura, no capítulo próprio da Constituição relativo à revisão constitucional é que, eventualmente, se deveria afirmar essa "superioridade" da Lei Fundamental, no plano geral do nosso Estado de direito.
Em face do que acabo de expor, Sr. Presidente, gostaríamos de saber a reacção dos proponentes relativamente a esta questão.

O Sr. José Magalhães (PS): * Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, quero apenas referir que vamos considerar a questão colocada pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes com todo o interesse, porque se trata de uma solução construtiva para um problema que o Sr. Deputado equacionou muito bem.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o n.º 3 ao artigo 277.º, constante do projecto de revisão constitucional apresentado pelo PS…

O Sr. José Magalhães (PS): * Não, Sr. Presidente. Neste cenário, não vamos votar a proposta apresentada pelo PS.

O Sr. Presidente: * É retirada?

O Sr. José Magalhães (PS): * Não, Sr. Presidente. Fica a "levedar", aguardando a solução construtiva.

O Sr. Presidente: * Sr. Deputado José Magalhães, a haver solução, já não irá passar pela fiscalização preventiva, portanto penso que podemos "arrumar" a norma.

O Sr. José Magalhães (PS): * Sr. Presidente, é melhor não. Porque pode passar, pode não passar… (espero que não!).

Pausa.

Não vejo qualquer inconveniente, Sr. Presidente. Porque é que não há-de ficar a "levedar"? Porque é que há-de ser rejeitada? Além de mais, nós votaríamos a favor.

O Sr. Presidente: * Nesse caso, Srs. Deputados, a proposta fica pendente. Reapreciá-la-emos quando tratarmos da matéria relativa às garantias e à revisão da Constituição.
Srs. Deputados, declaro esgotadas as votações em torno do artigo 277.º.
Antes de dar por terminados os trabalhos, informo que a próxima reunião realiza-se amanhã com início às 21 horas e 30 minutos, sendo que dessa ordem de trabalhos constará a apreciação das restantes normas, incluindo as relativas às Disposições Finais e Transitórias. Nos dias seguintes desta semana, teremos oportunidade de equacionar votações sobre artigos que estão pendentes, bem como sobre as modalidades de apreciação e aprovação dos relatórios do nosso trabalho.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 18 horas e 50 minutos.

A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL

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