O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

492

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

presentação, estranhou que o governo tivesse demittido um administrador, sendo elle da sua politica.

Eu não quero entrar na questão da politica do administrador demittido, mas o que eu posso afiançar á camara é que, sendo eu deputado pelo circulo do Carregal, contra a minha eleição trabalharam todas as auctoridades judiciaes e fiscaes de tres concelhos, e não pedi nunca ao governo que demittisse ou transferisse qualquer d'estas auctoridades.

Não levantaria esta questão se acaso o meu illustre collega não tivesse vindo lançar uma insinuação ao apresentar a representação, assegurando que a demissão d'aquelle funccionario não fôra proposta pelo seu chefe, mas talvez resultado de informações de alguem. Creio que se referia ao deputado do respectivo circulo.

Posso affirmar a v. ex.ª e á camara que não exigi do sr. ministro do reino, nem dos outros srs. ministros, a demissão ou transferencia de auctoridade alguma do meu circulo.

Mas quer v. ex.ª saber a rasão por que o governador civil propoz a demissão do funccionario de que se trata? Foi para que não continuasse a ser o pae administrador do concelho, o filho juiz ordinario e o primo sub-delegado! Não sei se isto é permittido, mas o que de certo não é, é decente.

Sabe v. ex.ª porque o governador civil propoz a demissão d'esse funccionario? Foi para que não continuasse no concelho de S. João de Areias a fazerem-se as eleições camararias por acclamação, como ainda acontecia ha poucos annos! Para que não continuasse no concelho de S. João de Areias a recrutar-se um mancebo quatro vezes! Para que no concelho de S. João de Areias se não repetisse o facto de um mancebo requerer certidão do numero que lhe havia tocado no recrutamento, bem como o de todos os mancebos recrutados n'esse anno, e se lhe respondesse que ao numero um e dois não tinha tocado mancebo algum!

Foi para que no concelho de S. João de Areias não continuasse a fazer-se pagamento aos expostos da maneira por que o foi durante muitos annos.

Estas é que são as rasões principaes por que se demittiu aquelle funccionario, e se o illustre deputado me provocar, eu ainda apresentarei outros motivos mais.

Disse o illustre deputado, e di-lo tambem a representação, que o administrador nomeado era um assassino, fundando-se para isto nos artigos e correspondencias firmadas por um homem muito respeitavel e meu particular amigo.

V. ex.ª e a camara sabem perfeitamente quaes foram as scenas desoladoras que se passaram na Beira desde 1834 até 1855, principalmente na epocha das nossas dissensões politicas.

N'esse tempo formaram-se dois batalhões moveis, um com a sede no Carregal do Sal e outro com a sede em Midões, um tinha por chefe Antonio Soares, de Cabanas, e o outro tinha por chefe João Brandão.

A esses batalhões pertenceu muita pessoa honrada, muito cavalheiro, assim como pertenceu muito bandido. Foi para lá muita gente de livre vontade e foi tambem muita gente por medo, porque ai d'aquelle que se oppunha á vontade dos dois chefes.

Ao batalhão de Antonio Soares, de Cabanas, pertenceu o bacharel o sr. Herculano Franco, actual administrador de S. João de Areias, que teria então dezenove annos.

Em Villar Secco, na occasião em que se estava aboletando uma força de que fazia parte o sr. Herculano, como commandante de uma companhia, um dos soldados de Midões, porque tambem ali estava ao mesmo tempo Roque Brandão, que era tenente de uma companhia; um dos soldados de Midões, digo, fazendo exigencias ao seu patrão, este lhe deu uma facada.

Sabido o facto, a soldadesca correu sobre o homem que fugiu, foi preso depois de ferido e mais tarde morto por um soldado de Midões, que por esse motivo foi castigado com sessenta varadas junto a Nellas por ordem do general Lapa, commandante geral d'essa força.

O outro facto, a que se refere a representação, é a morte de um preso mandada executar por Antonio Soares, de Cabanas.

Ora, suppondo mesmo que estes factos eram criminosos, a responsabilidade não caberia aos chefes? E qual foi o partido que na epocha das nossas lutas politicas não commetteu excessos?

Qual foi? E se os houve, não houve depois uma amnistia, não houve um decreto que amnistiou tanto uns como outros?

Pois chama-se assassino a um individuo porque pertenceu a um batalhão, aonde se commetteram excessos no tempo das nossas dissensões politicas? N'essas circumstancias está muita gente, a quem nunca ninguem se lembrou de chamar assassino.

A opinião publica não é tão desfavoravel ao sr. Herculano, como aqui se quiz inculcar, porque propondo-se deputado pelo circulo do Carregal em 1865, venceu a eleição no seu concelho. Provavelmente essa opinião desfavoravel appareceu desde que elle deixou de acompanhar os amigos do sr. Coelho do Amaral.

O sr. Herculano depois d'essa epocha frequentou a universidade de Coimbra com muito aproveitamento, e não consta que praticasse ali acto algum que o deslustrasse.

É um advogado intelligente e honrado, tendo por vezes exercido empregos com muita intelligencia e honestidade. Não precisa nem quer ser administrador de concelho, porque os negocios da sua casa lhe não permittem ausentar-se d'ali; e se aceitou ser administrador de concelho, foi por dedicação aos seus amigos.

O sr. Luiz de Campos alludiu tambem a um facto ultimamente acontecido na igreja do Carregal, por occasião das eleições camararias.

Posso assegurar a v. ex.ª e á camara, que esse facto é menos exacto; digo mais, é completamente falso. Só o actual presidente da, camara do Carregal sonhou com o punhal. A auctoridade administrativa e judicial, que investigou do facto, reconheceu que era pura invenção, pois de tantos individuos que estavam presentes, nenhum confirmou a asseveração do presidente da camara.

Termino aqui, declarando a v. ex.ª e acamara, que não concorri para a demissão do administrador, e asseverando que o actual é um homem honesto e intelligente, que não é um homem desprestigiado, como se quiz inculcar, e que ha de perante os tribunaes exigir a responsabilidade dos signatarios da representação, pelos nomes calumniosos que lhe assacaram.

O sr. Francisco de Albuquerque: — Mando para a mesa um requerimento pedindo esclarecimentos ao governo.

Peço a v. ex.ª que lhe mande dar o competente destino. Com relação ao assumpto em que acaba de fallar o meu illustre amigo, o sr. Vieira das Neves, tenho de dizer a v. ex.ª que eu não estava presente na camara quando se tratou d'este negocio, ao qual sou alheio; mas apesar de nada ter com elle, desejo fazer um pequeno reparo; e é que tendo o illustre deputado vindo a esta camara queixar-se de que se fizessem aqui arguições a um funccionario que fôra nomeado para um cargo publico, s. ex.ª viesse ao mesmo tempo fazer arguições graves contra outro funccionario que foi demittido (apoiados).

Parece-me que s. ex.ª não tem em seu poder os documentos precisos para provar as proposições que aventou, e posto a sua palavra para mim valha muito, não devêra jamais vir aqui accusar quem não tem logar n'esta casa, para se defender (apoiados).

É esta exactamente a, jurisprudencia que s. ex.ª acabou de ter para com os cavalheiros que asseveraram factos de que s. ex.ªs, em sua consciencia, estão convencidos (apoiados). Nem acredito que viessem dizer aquillo de que não estivessem convencidos.

O sr. Vieira das Neves: — Eu tambem estou convencido do que digo.

Resultados do mesmo Diário