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Deus guarde a VV. mm. Paço das Côrtes em 21 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José Ferreira Borges.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa concedem a V. Sa. licença por tanto tempo quanto seja necessario para tratar do restabeleci mento da sua saude; esperando do seu conhecido zelo e amor da patria, que apenas seja possivel, V. Sa. não deixara de vir logo continuar neste soberano Congresso as funcções, de que dignamente se acha encarregado. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.

Deus guarde a V. Sa. Faço das Cortes em 21 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Antonio Manoel da Silva Bueno.

A s Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão participar a V. Sa. que deve apresentar-te neste soberano Congresso para tomar o exercicio de Deputado substituto pela provincia de S. Paulo.

Deus guarde a V. Sa. Paro das Cortes em 21 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Galvão.

SESSÃO DE 22 DE FEVEREIRO.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Serpa Machado, foi lida e approvada a acta da antecedente.

Leu o Sr. Secretario Felgueiras os papeis seguintes.

Um officio do Ministro da justiça, ácerca de promover aos lugares da magistratura no Ultramar homens addidos ao systema constitucional, e de conhecida intelligencia. A' Commissão de Constituição.

Um dito do Ministro da marinha, enviando a conta do Governo da Ilha do Principe, igual e similhanye á outra que directamente veio a este Congresso. Ao Governo.

Um dito do Ministro da guerra, procurando o parecer das Cortes, ácerca da mostra, apuração dos vencimentos, e verificação da promoção do batalhão n.° 2, vindo de Pernambuco, declarada pela Junta governativa daquella provincia. A Commissão militar.

Dois ditos mais do mesmo Ministro: um sobre o requerimento de José Eloy Pessoa, major de artilharia da Bahia, que pede ser tenente coronel, e lente de mathematica no dito regimento; e outro ácerca de não haver medico em Villa Viçosa, que tome conta dos soldados doentes, e que pertencem aos corpos ali existentes. Ambos forão reenviados ao Governo, porque não pertence ás Cortes o conhecimento de taes objectos.

Um officio do Ministro do interior, ácerca do máo estado das cadeias de Pinhel, enviando o plano de uma nova casa, e o orçamento de sua despeza, mandado pedir pelo Governo. A' Commissão das artes.

Os Srs. Deputados abaixo assignados declarárão os seus votos na fórma seguinte. - Na sessão de hontem fornos de voto em contrario á decisão tomada de não poderem os clerigos ser eleitos para officiaes da camara. - Guerreiro, Franzini, Ferrão, Moraes Sarmento.

O Sr. Deputado Mendonça Falcão pediu licença, para se tratar na sua moléstia.

O Sr. Bastos offereceu alguns exemplares de um impresso, intitulado: Plano para a reforma e melhoramento do commercio, principalmente para a cidade do Porto; por um amante da Nação. Que se destribuão.

O Sr. Fernandes Thomaz apresentou um manuscripto de Mauricio José Teixeira de Moraes, contatador geral; intitulado Balanço do commercio de Portugal. Foi acceito com agrado.

O Sr. Franzini: - Requeiro que o balanço que nos foi offerecido, e que he de summa importancia para conhecimento da Nação, que se mande publicar. para que a Nação veja o estado em que se acha o commercio entre Brazil e Portugal: e digo mais, que até seria util o mandar-se publicar, o de dois ou tres annos passados.

O Sr. Luiz Monteiro: - Eu apoio o Sr. Franzini, e accrescento que se mande pedir isto mesmo á Junta do commercio, e que o continue a enviar todos os annos; pois a ella he que pertence dar este balanço. Por tanto digo que ella o deve mandar officialmente, pois se este cidadão o offerece he pelo seu patriotismo, e não por obrigação.

O Sr. Borges Carneiro: - Requeiro que o Sr. Luiz Monteiro apresente a sua indicação por escrito, para se mandar pedir á Junta do commercio o que elle propõe.

Assim se resolveu.

Feita a chamada, esta vão presentes 106 Srs. Deputados, e faltavão os seguintes: os Srs. Falcão, Moraes Pimentel, Gyrão, Canavarro, Ribeiro Costa, Barão de Mollelos, Sepulveda, Bispo de Castello Bronco, Gouveia Durão, Filisberto de Sequeira, Pessanha, Araujo Pimentel, Van Zeller, Brandão, e Castro, Mantua, Queiroga, Castello Branco, Pinto de Magalhães, Rosa, Ferreira Borges, Faria, Affonso Freire, Sousa e Almeida, Castro e Abreu, Gomes de Brito, Pamplona, Grangeiro, Sande, Ribeiro Telles.

O Sr. Lino leu o fim do artigo 171 do projecto da Constituição, que diz:

Esta instituição porem não terá lugar senão depois da reforma do codigo criminal.

O Sr. Annes de Carvalho: - Este ponto creio que está decidido; pois já se disse que devia haver jurados. O que se diz aqui he (leu); he justamente o que já está decidido.

O Sr. Borges Carneiro: - O que está decidido he, que os codigos hão de determinar as causas em que os jurados hão de ter, lugar, e a fórma porque

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hão de proceder; porém quando ha de começar esta instituição a verificar-se, he isso o que não está determinado, e o que peço se declare, aliás poderão as legislaturas seguintes, sem infringir a Constituição, nunca instalar esta instituição.

O Sr. Annes de Carvalho: - Mas se nos codigos ha de vir o systema dos jurados, julgo então que não he prenso fazer aqui esta declaração.

O Sr. Caldeira: - Eu repito o que já por vezes aqui disse, e he, que os codigos podem estar feitos, decretados, e mesmo sanccionados; porém daqui não se segue que elles comandem logo a ter vigor. A' vista disto parece-me que o fazer a declaração não faz mal algum.

O Sr. Presidente: - Proponho se se julga necessario fazer-se esta declaração?

Venceu-se que sim.

O Sr. Presidente: - O artigo seguinte parece-me que já foi discutido e approvado; porem mandou-se vir a acta para se ver.

O Sr. Vasconcellos: - Em quanto não vem a acta lembro ao Congresso que seria necessario nomear a Commissão de justiça civil de fóra das Cortes; para principiar a tratar da formação dos codigos. Apoiado.

O Sr. Annes de Carvalho: - Insto tambem para que se nomeie a de instrucção publica; porque nada ha mais necessario do que isto. As escollas estão muito más, e ha muita falta de educação. Sem que a instrucção publica esteja derramada, eu não sei como se possa propagar o syssena constitucional. Estes são os motivos que me induzem a pugnar para que se nomeie. Apoiado.

O Sr. Presidente: - Se ao Congresso parece se tratará destas nomeações na primeira occasião opportuna.

Assim ficou resolvido.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão sobre o artigo 172.

O Sr. Guerreiro: - Parece-me que a discussão do artigo 172, não póde ter lugar hoje, nem em quanto senão apresentar a nova redacção que se lhe mandou fazer; e em quanto ella não vier, não se póde tratar da sua materia.

O Sr. Presidente: - Eu achava-me doente, quando se tratou deste objecto, e por isso não sei a resolução que houve; mas se o illustre Preopinante está lembrado de que foi essa a resolução que houve, então muito bom.

O Sr. Guerreiro: - Muito bem me lembro, de se julgar que este artigo não podia entrar em discussão senão com o outro, por ser uma consequencia delle, e por isso se mandou á redacção, do que estou bem certo.

O Sr. Freire leu a acta a este respeito.

O Sr. Caldeira: - Eu Sr. Presidente, requeiro que este objecto entre quanto antes em discussão, e peço á Commissão apresente os seus trabalhos com a brevidade possivel. He necessario desvanecer o escandalo em que se labora de se dizer, que nas bases da Constituirão se tinha decretado que ninguem seria prezo bem culpa formada! Os magistrados desculpão-se com isto, e daqui resulta uma grande impunidade; e os malevolos a capa com que se cobrem he o dizerem, que ninguem poderá ser prezo sem culpa formada.

O Sr. Borges Carneiro: - O artigo 178 mandou-se voltar á Commissão sem indicação alguma para ser novamente redigido. O artigo 173 está já decidido, e approvada a sua doutrina. Quanto ao artigo 174, o n.° 1.° foi approvado; o segundo voltou á redacção, a qual a Commissão á manhã apresentará. Falta por tanto tratar-se do n.º 3.° que ficou adiado, e deve agora entrar em discussão.

O Sr. Camello Fortes: - Ficou adiado até á decisão ao artigo 107; porém elle já está decidido.

O Sr. Borges Carneiro: - O n.° 3.º deste artigo 171 está já approvado até ás palavras: Os implicados em crimes relativos á segurança do Estado, etc.; e por isso creio que o Sr. Camello Fortes, está com alguma equivocação. Quanto ao resto deve ficar adiado, pois se refere aos casos em que a patria estiver em perigo, dos quaes se ha de tratar no artigo 181, e quando lá chegarmos então trataremos disso.

O S, r. Presidente: - O artigo diz: Sómente poderão ser prezos sem dependencia de culpa formada, etc.

O Sr. Borges Carneiro: - Isso lá se tratará no artigo 181, pois he dos casos em que estiver em perigo a patria; e então as Cortes fazem esta declaração, etc. Em lá chegando se discutirá.

O Sr. Presidente: - Se ao Congresso parece, passemos ao artigo 175.

O Sr. Lino leu o art.

175. Em todos os casos o juiz dentro de vinte e quatro horas, contadas do momento da prizão, dará entregar ao réo uma nota por elle a em que se declare o motivo da prisão, e os nomes do accusador, havendo-o, e das testemunhas que o arguirem.

O Sr. Camello Fortes: - Este artigo está nas Bases (leu), he exactamente o mesmo que aqui veia no projecto.

O Sr. Brito: - Peço a palavra. Este artigo parece-me escusado, considerada a indicação que eu offereci em outro tempo sobre esta materia para ninguem ser recolhido á cadea sem primeiro ir á presença do juiz, e ser ouvido n'um previo interrogatorio, indicação, que ficou reservada para agora, a qual devo estar na meza. Eu julguei que aquella cautela era muito necessaria para segurar tanto a liberdade do homem, como o castigo do culpado: por quanto indo um cidadão á presença do juiz, antes de ser levado á cadea, elle ali poderá muitas vezes desmanchar com quatro palavras, ou algum documento, a intriga que se houver urdido contra elle, se na realidade estiver innocente, ou culpado de culpa leve que não obrigue a prizão, e evitar a injuria, e damno irreparavel da encarceração. E no caso contrario de ser verdadeiramente culpado o ir logo para a cadea antes de ser interrogado, tem o inconveniente de ir aprender, e estudai a maneira de illudir o juiz que depois lho fizer. A experiencia mostra que sendo os réos perguntados na occasião em que são aprehendidos, ou confessão fran-

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camente o que tem perpetrado, ou circunstancias taes, com as quaes facilmente á vista da devassa são convencidos. Se logo o não são pela presença dos que o prenderão, ou cumplices, ou testemunhas, que muitas vezes se conduzem ao mesmo tempo, maiormente nas prisões em fragante. Para acautelar estes inconvenientes, he que eu offereci a minha indicação, e peço á Augusta Assembléa a tome em consideração, pois que ella he propria igualmente para prevenir o enxovalho dos cidadãos probos, e a impunidade dos verdadeiros malfeitores.

O Sr. Caldeira: - Eu conformo-me muito com aquella opinião, mas he preciso examinar se se póde praticar o que se requer naquella indicação. Muitas vezes o cidadão he prezo em cccasião que o Ministro está impedido, e que não o póde ouvir. Quero pois eu saber se este homem ha de estar em custodia espera que o ministro o ouça? Daqui podem resultar graves inconvenientes. Muitas vezes acontecerá passar-se uma ordem de prizão, a qual não se poderá pôr em execução; porque, por exemplo, o ministro póde estar fora da terra, e o prezo ha de estar no meio da rua á espera do ministro? Se o ministro estivesse sempre prompto a dar audiencia, então está bom; mas isso he que eu não sei. He por conseguinte necessario tomar estas reflexões em consideração.

O Sr. Camello Fortes: - Leamos o artigo 173 (leu). Se neste caso elle não póde ser prezo, sem mandado da justiça, resta saber o que se ha de pratica para com os salteadores.

O Sr. Bastos: - Sr. Presidente: está-se discutindo sobre uma indicação, sem se ler essa indicação: requeiro pois que ella só leia.

O Sr. Borges Carneiro: - Levanto-me para falar sobre a ordem; pois que se está tractando de cousas que não vem ao caso. A questão reduz-se unicamente a decreminar, se se deve declarar na Constituição que o juiz dentro de certo praso communique ao preso o nome do accusador, e das testemunhas e o toais que diz o artigo. Esta he a questão. Não percamos tempo com ideias fugitivas.

O Sr. Brito: - A' vista na minha indicação, que subministra á liberdade do cidadão uma garantia mais ampla fica escudado este artigo. (O Sr.
Carneiro interromper), dizendo "pois então tire-se o que está nas bases.") O orador continuou. A indicação bem longe de se oppôr ás bases, segura melhor o direito da liberdade, que elas afianção. Nem se diga que póde o juiz estar ausente, porque alguem ha-de fazer o seu officio, e na propria indicação está Acautelado o caso das prisões, que se efectuão fóra d'oras, e por concequencia torno a insistir em que se faça a declaração.

O Sr. Presidente: - A questão reduz-se a saber, só se linde declarar o nome do accusador, e das testemunhas.

O Sr. Guerreiro: - He evidente que se deve declarar; pois só na inquisição he que se occultavão os nomes do accusador!

O Sr. Presidente: - Os Srs. que acharem, que esta materia esta suficientemente discutida, queirão ter a bondade de se levantarem. - Venceu-se que sim.

O Sr. Presidente: - Ponho a vottos se se deve fazer a declaração seguinte. - Que se declare o nome do accusador, e das testemunhas que o arguirem. Os Srs. que julgarem necessario fazer esta declaração, querião levantar-se. - Venceu-se, que se fizesse.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão do artigo seguinte.

O Sr. Freire: - Leu o art. 176. Dentro de 3 dias ao mais tarde será o preso interrogado sem juramento, e se fará auto da interrogação. Para este fim se lhe, terá anticipadamente entregue por cópia a accusação, os depoimentos das testemunhas, os documentos, e tudo o mais que for concorrente á formação da culpa. Todo o ulterior processo será publico.

O Sr. Freire: - Leu tambem um additamento a este artigo 176.

O Sr. Guerreiro: - Sr. Presidente: eu creio que uma Constituição, não he um codigo; e por isso me parece improprio da Constituição, tanto o artigo que se acaba de ler, como o additamenlo. Isto pertença ao codigo criminal, não queiramos pois converter a Constituição em código!

O Sr. Britto: - A Constituição não tem outro objecto, senão declarar e garantir os direitos, e os deveres do cidadão para com o Governo, e reciprocamente. A liberdade he o primeiro dos direitos do homem, e o respeitala he um dever sagrado daquelles a quem a Constituição contra o deposito, e administração da jurisdicção, e da força publica. Por tanto cabe tudo isto na Constituição, nem ella póde ser completa sem tal garantia.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu julgo que são constitucionaes todos aquelles principios que segurão de um modo estavel a segurança do cidadão; e estes forão os motivos, porque se declarou no artigo antecedente - que em todos os casos o juiz dentro de vinte o quatro horas, etc. - Se pois he constitucional o principio, do que o juiz dentro de vinte e quatro horas deve dar ao praso o nome do accusador e das testemunhas, não he meros constitucional que dentro do certo prazo o deva ouvir. Que importa que seja prompto em lhe fazer aquellas communicações, senão o for em o ouvir? Tanto he constitucional um principio, como o outro. Não chamo a isto minucias: chame-lhe uma grande garantia da liberdade individual, e por isso desejo se marque na Constituição. - Isto supposto vou falar quanto ao dito prazo. A Constituição de Hespanha estabeleceu vinte e quatro horas, porém os redactores do projecto, vendo ser este um prazo mui apertado, e considerando que deve haver o tempo necessario para dispôr a interrogação, indicárão um maior prazo; e disserão: "Dentro de tres dias ao mais tardar."

O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - Os homens tem até agora visto que a sua liberdade lhes era tolhida, e que até erão tirados os direitos do cidadão; para segurar pois estes direitos, he que nós temos aqui vindo. O homem criminoso deve ser castigado, mas o juiz deve igualmente ouvilo. Não reputo isto como = minucia mas sim uma causa de muita consideração. Por tanto assento, que estes principios devem ser marcados na Constituição, e sanccionados nella.

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O Sr. Ribeiro Saraiva: - Esta lembrança de que aqui se tem falado he boa, mas para as prisões que forem feitas em fragante delicto, em cujo caso deve necessariamente ir o prezo á presença do ministro; mas não serve esta medida para aquellas que forem feitas com antecedencia.

Sr. Presidente: - Essa questão já está decidida.

O Sr. Presidente: - Sr. Presidente: Nós devemos forcejar para acautelar todos os abusos, e para este fim se faz necessario que o prezo vá á presença do juiz; e mesmo porque ás vezes uma parte que vai á presença do juiz, com um unico documento, convence as testemunhas, e desfaz o crime se elle he fantastico. Quando se souber que o prezo ha de ir á presença do ministro, os denunciantes se hão de acautelar mais em armar as suas aceitações, que muitas e muitas vezes são filhas da intrica, e só dirigidas a enxovalhar um cidadão em despique ou satisfação de odios.

O Sr. Borges Carneiro: - Falo sobre a ordem; e digo, que se deve tratar primeiro do artigo, que da indicação. Falando pois, sobre o artigo digo: que cada uma das tres partes d'elle, deve ser proposta separadamente, e ser separada discussão. B quanto á primeira, digo: que em tres dias todo o juiz tem tempo para ouvir o preso, e fazer-lhe a interrogação. Quanto á segunda, não acho embaraço algum, para que o juiz, não mande tirar uma copia do auto do crime, para que o prezo veja, qual he a sua culpa formada.

O mesmo digo sobre a terceira e ultima parte isto he, que todo o processo seja publico. Peço pois, que cada um destes tres pontos, seja um artigo constitucional; e entre em discussão separadamente a indicação do Sr. Brito, como he questão distincia, depois se tratará d'ella.

O Sr. Soares de Azevedo: - Eu reprovo a lembrança do Sr. Borges Carneiro. A maioria deste artigo não sei de modo nenhum, que sustenta a liberdade do cidadão, e a sua segurança. Se nós determinássemos os casos em que elles devessem ser julgados, isto sim, isto he que garantiria a liberdade do cidadão. Por consequencia digo, que este artigo deve ficar para o Codigo. Em quanto á 3.ª parte. - Todo o processo será publico. - Parece-me que esta materia se deverá tractar no codigo civil, e este he o meu voto.

O Sr. Guerreiro: - Por ora, ainda não estou convencido, de que esta doutrina deva entrar na Constituição; pois que não ha lei alguma, seja ella fôr, que não segure a garantia do cidadão; porém esta que agora se offerece aqui, não obstante todas as cautelas, que se ponhão, com tudo o ministro póde mandar o prezo para o cadeia. Em quanto á ultima parte do artigo eu estou persuadido, que esta medida he constitucional, e necessaria; mas accrescento que esta medida, deve igualmente servir, para aquelles que se livrão soltos, e que o processo seja da mesma maneira publico. Creio que todos que tem inquerido testemunhas, sabem, que he cousa facilima, o fazer dizer a testemunha quanto se quizer: por quanto, eu nunca vi sem horror, que um réo fosse obrigado a defender-se da accusação feita contra elle, sem saber quem erão as testemunhas que havião jurado contra elle. Sou por conseguinte de opinião, que se estabeleça em lugar deste artigo o seguinte.

Proponho que a publicidade decretada para o inquerito das testemunhas nas causas eiveis e crimes, seja extensiva a todo o processo nas causas civeis: e nas crimes a todo o processo depois da pronuncia. - Guerreiro.

O Sr. Moura: - A idea de que o inquirito das testemunhas deve ser publico, he de necessidade fixar-se na Constituição; mas em lugar de se explicar o § como se explica deve dizer-se assim - que o inquirito das testemunhas, se fará sempre na presença do juiz, das partes, ou seus procuradores - porque o publico era o processo até aqui; e tão sómente era ccculto o inquerito das testemunhas: sou consequentemente de opinião, que este inquirito se faça na presença do juiz, assistindo a elle a parte, e na sua falta. o seu procurador. De maneira, que a maior utilidade consiste em ser publico o inquirito das testemunhas. Quanto á idea do Sr. Brito, respondo. Se o homem for prezo em fragante delicto, então deve ir á presença do ministra; porem, se o réo não he prezo em fragante mas sim em consequencia de culpa formada, então pergunto eu ao Sr. Brito, o que vai elle fazer á presença do juiz? Eu não encontro utilidade nenhuma, em que o réo vá á presença do juiz senão no caso de fragante; quando porem a culpa já está formada, e o criminoso já está no rol dos criminosos, então que necessidade ha, que elle vá á presença do ministro? Que lhe póde fazer o juiz em seu descargo? Nem absolvelo, nem culpalo mais.

O Sr. Camello Fortes: - Eu appoio a doutrina da publicidade; ella era conhecida, e adoptada pelos Romanos; e roqueiro mais alguma cousa, e he, que se extenda igualmente isto ao accariamento do réo, com as testemunhas.

O Sr. Brito: - Um illustre Preopinante disse; que nenhuma utilidade resulta ao prezo em ir á presença do juiz; porém eu já mostrei que resulta utilidade, e não só ao preso, mas ao publico; pois o publico tira a vantagem de provar um delicto, e isto he a bem do estado. Ao contrario, se o cidadão está innocenre, (pois eu já tenho visto destes exemplos) quando chegar á presença do ministro, elle dirá. - Eu não sou esse que vossa mercê mandou prender. - Aqui mesmo, neste Congresso, estão Srs. Deputados da Bahia, que podem attestar o que succedeu a um sargento-mór, que na Bahia foi proso por engano, o qual indo á presensa do tenente-general, então os ajudantes de ordens, lhe disserão. - Sr., este, não he o homem que V. Ex. mandou prender. - E elle respondeo - então, mangarão comigo. Muitos outros casos poderia referir, e que tem sido constantes. Para evitar que falo succeda he que sustento, que isto seja admittido.

O Sr. Barata: - Diz o illustre Preopinante o Sr. Camelo Fortes excellentes cousas, e citou o direito Romano; porém fallou-lhe accrescentar, e seria bom que o dissesse - que o direito Romano era direito de escravos. Eu já aqui disse muitas vezes, que estes casos devião ser da competencia dos jurados, e

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igualmente o art. 176, que está entre mãs, o deve ser da mesma fórma, pois que elle pertence aos jurado. Ao juiz pertence fazer todas as indagações, como se o preso commetteu o crime que se lhe imputa; onde o commetteu, etc., etc. Requeiro pois ao Congresso, tome isto em consideração, para nos não vemos para o futuro em embaraços.

O Sr. Presidente: - Proponho ao Congresso se está bem discutida esta materia. Os Srs. que a julgarem sufficientemente discutida, queirão levantar-se. Venceu-se que sim.

O Sr. Presidente: - Os Srs., que julgarem, que a primeira parte do artigo, seja ommissa na Constituição: levantem-se? - Venceu-se, que fosse omissa.

O Sr. Presidente, propoz a 2.ª parte. - Venceu-se, que fosse igualmente omissa.

O Sr. Presidente: - Agora proponho a ultima parte. = Todo o ulterior processo será publico. = Não proponho á votação, se deve ser omissa; mas proponho primeiro, se se deve conservar tal qual está......(foi interrompido pelo Sr.
Brito, que disse - A opinião do Sr. Moura não foi rejeitada por ninguem na assemblea. -)

O Sr. Guerreiro: -- O que eu propuz he = que todo o processo depois da pronuncia seja publico. =

O Sr. Moura: - Basta que sanccionemos o principio de que as testemunhas hão de ser tiradas publicamente.

O Sr. Borges Carneiro: - A primeira votação deve ser = se todo o processo ha de ser publico = como quer o Sr. Guerreiro; ou como quer o Sr. Moura = se a inquirição das testemunhas seja publica. =

O Sr. Presidente: - Ponho a votos = se deve ser o depoimento das testemunhas nas causas crimes publico = e que se declare isto na Constituição?

Venceu-se nesta conformidade.

O Sr. Presidente: - Resta propôr = se todo o processo deve ser publico. =

O Sr. Sarmento: - Será preciso fazer certas excepções; pois que podem occorrer casos em que deva haver certa cantella, por amor da decencia, e honestidade. Desejaria pois que na redacção se tivesse isto em vista.

O Sr. Macedo: - Deve se entender, que a resolução do Congresso, foi, que seria publico depois do inquerito das testemunhas.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Parece-me, que antes mesmo do inquerito das testemunhas elle deve ser publico: e geralmente, todas as vezes que se houver de tratar de qualquer ponto do processo, e não houver segredo no crime, elle deve ser todo publico. A lembrança do Sr. Sarmento, deve attender-se, pois haverá caso em que seja necessario haver alguma cautela. Em quanto a deporem as testemunhas em publico; julgo que ellas não terão duvida nisso, uma vez, que saibão do objecto, sobre que vão ser perguntadas.

O Sr. Freire: - Eu não sou de opinião que o processo seja publico antes da pronuncia, pois que vejo um perigo extraordinario nisso, já pelo risco de se escaparem os co-réos, já pelo susto das testemunhas etc. etc. E os illustres Preopinantes melhor do que eu conhecem se póde haver, ou não grandes inconvenientes admittindo isto.

O Sr. Bastos: - Já está decidido que o inquirito das testemunhas ha de ser publico, e porque o não será igualmente todo o procedo? Esta regra geral pareça apenas admittir a excepção recommendada pela honestidade, e a decadencia lembrada por um Preopinante. A liberdade e a segurança dos cidadãos exige publicidade em tudo o mais. Se nisto polé haver algum inconveniente, no contrario os ha muito maiores. Perguntarei eu aos illustres Preopinantes, que falão contra este principio, se nós poderemos com razão chamar ao nosso o paiz da liberdade, continuando a ter esses processos inquisitorios, que tanto o tem opprimido?

O Sr, Moura: - Podem resultar inconvenientes de ser o processo publico, diz o Sr. Freire, he verdade; mas de ser occulto podem resultar mil calamnidades á innocencia. Qual he o primeiro fim do processo crime? He apurar a verdade. Tanto interesse deve ter o juiz em punir, como em absolver: que se escape o criminoso, mas apure-se a verdade. Esta nunca resultará pura de processos occultos, e inquesitoriaes. Publicidade, e mais publicidade, e ainda que o culpado se possa escapar, comtudo vem deste modo a não poder ser culpado nenhum innocente. Eu sustento pois que a publicidade he o unico meio de se acclarar a verdade, e de fazer com que esta appareça tão clara como o he a luz do dia. (Apoiado).

O Sr. Borges Carneiro: - Grande inconveniente tem esta doutrina, porque quando se tratar de formar a culpa a um delinquente, que ainda não estiver preso, as testemunhas não dirão nada do que souberem, e dirão com sigo: que necessidade tenho eu de me ir malquistar com este homem. Pelo que admittida a doutrina de serem as testemunha perguntadas em publico antes de o réo estar preso, pôr-se-hia o maior embaraço aos depoimentos das testemunhas; pois então não dirão o que souberem, e a impunidade será o resultado, o qual quanto soja perigoso ninguem o ignora.

O Sr. Lino: - Eu não posso deixar de apoiar as ideas do Sr. Moura por serem muito coherentes com os principies estabelecidos na mesma Constituição, e muito mais, porque pelo methodo proposto, se póde conhecer a innocencia do homem, e ainda que por elle se escapem alguns criminosos, escapem-se embora, com tanto que os innocentes não padeção. Estas maximas são concordes com as idees de todos os publicistas, e analogas aos principios liberaes.

O Sr. Soares de Azevedo: - São na verdade necessarias o fazerem-se algumas excepções; porém repito o que já disse, que se refervem essas excepções para se marcarem no codigo. He necessario lembrarmo-nos, e reflectirmos que não nos devemos persuadir de que o réo em publico confesse os seus delictos. Poderemos igualmente persuadirmo-nos que as testemunhas em publico tenhão a franqueza de declarar

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tudo quanto souberem sobre o objecta par que são perguntadas? Certamente não. Reparemos por tanto que nós não estamos legislando para um paiz de quimeras, mas sim para um paiz illustrado. Acautelemos por consequencia os inconvenientes que daqui se podem seguir.

O Sr. Araujo Lima: - Apoio que as tastemunhas sejão produzidas em publico; pois não acho que se possa seguir daqui mal algum; assim como de se prender um homem innocente. O damno he verdade ser mui grande, mas esse homem na opinião publica nada perde; porque depois restaura o perdido, declarando-se estar innocente.

O Sr. Guerreiro: - Poço palavra para fazer uma reflexão. Julgo que a discussão tem versado sobre a emenda que eu propuz; requeiro se leia, o que já se decidiu para se tirarem todas as duvidas.

O Sr. Lino: - Eu leio o que já puz na acta, sobre o decidido (leu).

O Sr. Guerreiro: -rCreio que então ainda faltava outra cousa: a primeira votação foi, que todo o processo fosse publico; e a 2.ª que fosse publico o inquerito das testemunhas.

O Sr. Lino: - Eu julgo que esta questão se deve tratar agora; porque o Sr. Fernandes Thomaz quer que o processo seja publico antes, e outros Srs. que não sobre isto he que deve, versar a discussão.

O Sr. Presidente: - Eu antes de fechar a votação, satisfaço ao illustre Preopinante,: diz elle na sua emenda.... (leu a emenda do Sr. Guerreiro).

O Sr. Lino: - Aqui ha alguns Srs. Deputados que querem que os processos sejão todos publicos; mas o Sr. Guerreiro quer que elles sejão só publicos depois da pronuncia.

O Sr. Presidente: - Proponho se está este objecto sufficientemente discutido.

Venceu-se que sim.

O Sr. Presidente: - O Sr. Borges Carneiro propõe a seguinte excepção (leu-a). Proponho se se approve. Venceu-se que sim, isto he, só depois de culpa formada.

O Sr. Presidente leu a emenda do Sr. Guerreiro.

O Sr. Guerreiro: - Eu não julgava ser necessario fazer esta declaração, mas o que me moveo a fazella foi, para não dar lugar a que os membros da redacção dissessem, que ou excedia os lermos da votação.

O Sr. Presidente: - Proponho, se esta publicidade deve ser extensiva a todas as causas.

Venceu-se que sim.

O Sr. Presidente: - Se deverá o processo ser publico antes do inquerito das testemunhas.

Venceu-se que sim.

O Sr. Freire leu o artigo 177.

O Sr. Guerreiro: - Parece-me que a doutrina deste art. 177 não podo ser sanccionada, nem discutida com a attenção necessaria sem primeiro se ter decidido a doutrina do art. 172, sem primeiro se ter determinado em que casos póde haver lugar a prisão: proponho por tanto que fique adiado para quando aquelle estiver discutido.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu não acho nenhuma difficuldade em approvar este artigo. Determinar em geral que em todos os nomes que as leis não exceptuarem, possão os réos livrar-se soltos. He este artigo um dos maiores para avançar a liberdade individual. Nada ha mais cruel e mais barbaro do que um homem muito rico, ou que occupa um emprego eminente, e que estaria prompto a dar muitas fianças, não lhe serem estas admittidas, e ser obrigado a livrar-se prezo, talvez por um crime bem leve, como por um furto de valor de cem reis,, um ferimento simples feito em rixa, etc., nada, torno a dizer, ha mais barbaro que este homem ser prezo antes de entrar em livremente, e não se lhe admittir fiança. O direito romano era nesta parte generoso: nós fomos miseros e mesquinhos. Deve pois sanccionar-se como constitucional o principio da admissão da fiança em todos os crimes em que a lei a não prohibir. Pois, por exemplo, commette alguem um crime, de que a maior pena que lhe póde resultar na sentença, he uma multa pecuniaria, um exterminio para fóra de villa e termo, etc., se elle dá um fiador que se obriga a pagar aquella multa, ou a fazer que o réo vá para fóra da villa e termo; para que ha de elle ser prezo, e livrar-se da cadea! A prisão durante o processo não he pena: he um meio pira segurar a effectividade do julgado, e o cumprimento da condemnação que resultar. Se pois o réo de fiança que segura essa effectividade do julgado de maneira que se não torne illusorio, es á preenchido o fim da lei. Tão evidente se tem isto achado que alguns nossos praxistas nos casos leves admittem pronunciar-se o réo a livrar-se solto, posto que nenhuma lei autorize esta praxe. Por consequencia ponho como principio constitucional que em todos os crimes em que a lei não prohibir expressamente a fiança, deve ella ser admittida.

O Sr. Guerreiro: - A fiança para o réo não ser prezo não póde ter lugar naquelles crimes, que provados, devam ser punidos com penas corporaes, ao menos com as penas mais graves, por que não póde haver fiança alguma que segure a satisfação destas penas. Por tanto a fiança não póde ter lugar senão naquellas culpas, sobre as quaes hão do recair penas leves, e se nestes casos o juiz não podo livrar a prizão, acho inutil estabelecer-se aqui a fiança pura não ser prezo. O artigo 172 tem relação com este; só depois delle se apresentar aqui he que se póde decidir, quando e em que casos póde ter lugar a fiança. Faço por tanto uma proposição expressa, para que o artigo 177 fique adiado para quando se discutir o artigo 173, feita a nova redacção que apresentar a Commissão.

O Sr. Borges Carneiro: - Esta idéa teria lugar, se agora se tratasse do decidir quaes hão de ser os crimes em que se ha de prohibir a fiança, e quaes aquelles em que ella ha de ser permittida. Forem no artigo não se entra nessas especificações. Por consequencia bem se póde decidir este artigo independentemente do outro, com o qual não tem nada.

O Sr. Brito: - Eu julgo que se deve votar sobre este artigo, e que he muito constitucional; porque tende, a evitar que se attente contra a liberdade do cidadão sem necessidade, como aconteceria se se per-

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mittisse prendelo em casos, nos quaes a lei lhe imposesse sómente uma multa, estando prompto apagala, ou segurar o seu pagamento.

O Sr. Manoel Antonio de Carvalho: - A liberdade deve manter-se ao cidadão sempre que ella não possa causar mal á sociedade; ella he um bem estimavel do cidadão, que se lhe deve conservar quanto caiba no possivel: em outros paizes, mesmo naquelles em que se não professão ideas tão liberaes, e que se não tem querido adoptar uma liberdade tão legitima como lio nosso; chegão os prezos condemnados á morte, a poderem dar fiadores: como pois não se ha de admittir fiança em o nosso paiz? Estou pelo que muito bem disse o Sr. Brito, he um artigo constitucional; o homem não deve ser punido, não deve ser castigado, não deve soffrer pena alguma, quando elle satisfaz á mesma sociedade aquillo sobre que elle a tenha offendido.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu supponho que a duvida do Sr. Guerreiro não he sobre a doutrina do artigo, pois creio que elle está persuadido de que he constitucional, e que deve ir na Constituição; a sua duvida he se póde ir antes de discutir-se o artigo 172. Todavia parece-me que não tem fundamento o que diz o Sr. Guerreiro, e que o artigo se póde discutir já antes daquelle. Se neste artigo se tratasse de especificar os casos em que a fiança devia ou não devia ter lugar, então poderia elle considerar-se como dependencia do 173, aonde se hão de dizer os casos em que o juiz deve pronunciar a prizão, ou a livramento somente. Como porem no artigo unicamente se trata de estabelecer uma proposição geral, convém a saber de que o prezo será solto com fiança nos casos em que a lei o determinar, acho que uma hypothese não tem nada com a outra: e que por tanto nenhuma necessidade ha do adiamento proposto pelo Sr. Guerreiro, e que pelo contrario o artigo deve ser approvado tal qual se acha como um dos meios de fazer menos restricta a liberdade do cidadão sem perjuizo de terceiro.

O Sr. Guerreiro: - Duas vezes falei já sobre este artigo, e em ambos propuz o addiamento, não sei se me he licito falar terceira vez, mas creio que he licito perguntar, se a questão versa sobre o adiamento, ou sobre a materia do artigo peço a palavra para falar sobre o artigo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, póde fallar.

O Sr. Guerreiro: - Eu quereria que um artigo constitucional, quando fosse possivel, nunca ficasse dependente de lei regulamentaria; conforme com este principio eu desejava que no artigo 177 se declarem os casos em que podião ter lugar as fianças; e convencido eu de que he impossivel por agora serem elles expecificados antes de se tratar do artigo 172, eis-aqui está a razão que me moveo a propor o adiamento. Por tanto digo eu, que para fazermos este artigo verdadeiramente constitucional, era necessario fazer uma expecificação dos differentes casos em que ha de ler ou não lugar a fiança; e como este artigo 172 está adiado, era necessario ficar adiado este tambem.

O Sr. Presidente: - Os Srs. que achão este artigo sufficientemente discutido, queirão ter a bondade de se levantar? Decidiu-se que sim.

Os Srs. que aprovarem o artigo queirão levantar-se. Foi approvado.

O Sr. Freire leu o artigo 178.

O Sr. Moura: - Este artigo não he constitucional, este he regulamentar, deve ir fóra.

O Sr. - Presidente: - Os Srs. que approvarem, que a doutrina deste artigo deve ficar para uma lei regulamentar, e portanto omisso na Constituição, queirão levantar-se? Decidiu-se que ficasse omisso.

O Sr. Freire leu o artigo 179.

O Sr. Villela: - Eu acho que este artigo está nas circunstancias do anterior. (Apoiado, apoiado).

O Sr. Borges Carneiro: - Eu tenho a opinião contraria. Uma das causas por que eu louvo a Constituição de Hespanha, he porque ella consignou os principios liberaes, de que os legisladores dos annos futuros não podem resilir. Outro tanto devemos nós fazer, porque de outra maneira acontece com o andar dos tempos que o espirito publico se esfria, e contra as liberdades publicas vem a passar cousas que agora não passarião. Em França por exemplo conseguirião agora os Deputados sectarios do despotismo, que os crimes da liberdade de imprensa fossem julgados nos tribunaes, e não nos jurados, que foi o mesmo que minar pela raiz a liberdade da imprensa e conseguirião elles isto no anno passado, ou dahi em para traz? Não certamente. Nas Cortes passadas de Hespanha já não se poderão estabelecer muitos principies de liberdade, que ha dois annos passavão sem difficuldade. Pois o mesmo ha de vir acontecer em Portugal. Principios de liberdads que agora passão, talvez já não passem nas Cortes seguintes, e de agora a dez annos muito menos. O despotismo vai sempre ganhando terreno. Pot conseguinte eu não acho inutil, antes muito proveitoso que estes principios se estampem na Constituição: eu não tenho pena de que ella gaste mais meia folha de papel: dou essa despeza por muito bem empregada. Diz-se: "tal principio he muito claro, muito bom; os codigos o hão de adoptar infallivelmente." Melhor: se he bom, se he claro, se o hão de adoptar, seguremolo já aqui, e poupemos discussões aos legisladores desses codigos. Como isto favorece a liberdade, que até agora tanto tem sido atropelada, seguremolo, e não tenhamos dor de gastar mais meia folha de papel, ou um cruzado novo com a imprensa, que he o muito que se poderá de mais gastar. Como até agora as cadeias servião aos despotas, não para o fim de serem segura custodia dos prezos, mas para os atormentarem, por isso mettião-nos em prisões escuras, humidas, e horrendas, cousa esta contra que tanto tem declamado todos os publicistas. Declare-se pois agora na Constituição que sejão limpas, bem arejadas, e construidas, a fim de que sómente sirvão de custodia, e não de castigo aos réos que se livrão, e que talvez estejão innocentes, e taes se presumem antes de sentença condemnatoria. Diz mais o artigo que haja nellas separações. Sim, ha crimes a que, se me he permittida a expressão, chamarei honrosos, como o de um official militar que acceita um desafio, aquelle que repelle um insulto no momento em que lho fazem. E que? Deverá soffrer-se, ver estes reos mettidos com salteadores e assassi-

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nos na mesma enxovia? A ultima parte do artigo diz que as cadêas devera ser visitadas (leu ). Isto para mim tambem he um principio constitucional, porque os prezos apparecendo nestas visitas dizem os segredos em que os mettêrão os ministros déspotas; dizem os máos tratamentos que lhes fizer ao os carcereiros deshumanos; dizem se os juizes os tiverão no segredo sete dias, em lugar dos cinco da lei, como ha pouco se tez nesta cidade, e assim nada se faz sem que se saiba. Por tanto voto pela conservação do artigo, porque elle he todo mui constitucional, e puro constitucional.

O Sr. Sarmento: - Sigo o opinião do illustre Preopinante, na parte em que exige que este objecto seja expresso na Constituição, Convenho que deixemos as leis regulamentares os regimentos das cadeias, e tudo o que fôr de administração dellas. A Constituição deve affiançar que as cadeas existirão, para com segurança estarem os presos, e não para tormento delles. He forçoso confessar, e semelhante declaração não he sómente vergonhoza para nos, he para todas as Nações; que os principios de philantropia tendo pertendido corregir tantos abusos, que affligem a humanidade, não se tem dirigido para o melhoramento das prisões com aquella vehemencia, que se poderia esperar para um objecto tão recommendavel. Dois homens cheios da mais abrasada caridade se declararão na sua vida os protetores dos prezos, e adevogarão a causa delles: o catholecismo apresenta em S. Vicenle, de Paula um modello da maior virtude, e os protestanres no seu philantropico Howard um objecto de veneração. A Inglaterra tem continuado a reformar os abusos que tinhão lugar nas prisões, e es Principes francezes, levando para a França as lições do tempo da sua expatriação, tem dirigido seus cuidados para um objecto de tanta humanidade, e se instituio ultimamente uma sociedade para cuidar no melhoramento das prisões, e em 1819 se instituio em Inglaterra outra sociedade para cuidar da reforma dos cossumes dos réos de pouca idade. Entre nós foi preciso o ajuntamento extraordinario deste augusto Congresso pura só principiarem a dar algumas providencias ácerca deste objecto. Quando eu peço que este artigo seja declarado na Constituição, conheço que as reformas neste ramo exigem a força da autoridade publica, porque os particulares sem outro apoio além do seu zelo, e amor da humanidade, apenas podem denunciar os abusos, e reclamar os direitos do homem. Felizmente para a Nação portugueza, poderemos fazer os melhoramentos das prisões, sem as despesas extraordinarias, de que seria mister em outras nações. Aquelles conventos, que pela reforma ecclesiaslica se achar conveniente extinguir, podem ser empregados para casas penitenciarias, até o local de alguns, especialmente os da ordem de S. Bernardo, que que procurava para os seus discipulos lugares tristes, e eramos, que trouxessem constantemente a lembrança da morte para a reclusão dos reos de crimes graves. Haverá meios de se estabelecerem cadeias separada pura os iniciados, os condem nados, os reos da pouca idade, e as mulheres. Eu confio que os nossos futuros legisladores hão de consultar o muito bem que se tem escrito, e continuo a escrever sobre a disciplina das prisões, merecendo o maior acolhimento uma recente publicação de Monsieur Danjou, o qual, apezar de pertencer á classe dos que se tem applicado ao direito romano, acaba de advogar a causa da justiça, e da humanidade.

O Sr. Caldeira: - Eu conformo-me com a opinião do Sr. Sarmento nestas duas ultimas partes do artigo. He muito necessario que a Constituição determine que um cidadão honrado e de bons costumes não vá entrar de sociedade com os matadores, homens perver os cheios de vicios, porque daqui resultão grandes inconvenientes e grandes males, muitas vezes um homem desta qualidade vai corromper a innocencia do cidadão probo, o cidadão que muitas vezes he privado da sua liberdade por um crime no qual elle não tem culpa nenhuma; deve por tanto estabelecer-se principios pelos quaes não possão acontecer similhantes monstruosidades por tanto eu voto a favor deste artigo.

O Sr. Villela: - Eu quizera que este artigo fosse omisso na Constituição: por quanto me parece ser antes objecto de lei regulamentar: mas no caso de ir, julgo que só deve approvar-se a primeira, e a ultima parte, emittindo-se na intermedia a recommendação de que hajão casas nas cadeas, em que os prezos estejão separados conforme os suas qualidades; pois assento que só o devem estar, conforme a qualidade dos seus crimes. O cidadão, que delinquiu, seja elle quem for, pede a igualdade de justiça que fique sujeito aos mesmos incommodos e penas, que o delicto traz comsigo.

O Sr. Annes de Carvalho: - Tres dos illustres Preopinantes que defendem e favorecem este artigo e que dizem que esta materia não deve ser omittida na Constituição fundão-se, em que ella he muito importante ao cidadão; daqui deduzo eu que a serem coherentes com os seus principies devem querer, que tudo aquilo que for util ao cidadão se insira tia Constituição, isto he distribuição dos poderes? Ou garantia geral dos direitos dos cidadãos? Creio que não he? Por tanto assento que não deve entrar na Constituição.

O Sr. Sarmento: - Eu considero a necessidade de se declarar este objecto artigo constitucional, até debaixo da consideração de uma garantia constitucional, que afiança ao cidadão a guarda dos seus direitos, e a protecção contra toda a violencia. Diz Montesquieu que todo o castigo que não for de absoluta necessidade he uma tyrannia: ora sendo possivel estabelecerem-se prisões só para o fim, para que ellas devem ser destinadas; existindo em vez dellas outras, que atormentem, e que alem de perda da liberdade, oprimao o cidadão em direitos, que elle não deve perder, ternos nesse caso uma violencia, e por tanto estabelecendo-se a doutrina do artigo na Constituição, afiançamos a segurança de direitos, de que elle poderia sor privado não havendo esta garantia constitucional; por tanto a consignação deste artigo na Constituição, he uma garantia de direitos do cidadão.

O Sr. Annes de Carvalho: - Eu estou com o illustres Preopinante, e approvo a doutrina de Mon-

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tesquieu: já se disse que as leis lhe imporão as penas necessarias; as garantias geraes não devem aqui entrar porque então seria a Constituição um codigo civil, e um codigo criminal.

O Sr. Barata: - Sr. Presidente o meu voto he que o artigo fique na Constituição porque de outro modo podem haver abusos. Eu sei que os segredos ainda existem; e he preciso destruillos, com tudo o quanto serve para vexar os prezos; os reos devem estar seguros, mas sem tormentos: a Constituição deve acautelar tudo, e esta materia he muito importante para que fique fora della.

O Sr. Fernandes Thomaz: -Parece-me que deve estabelecer-se na Constituição, o principio geral, que deve haver duas classes de prizão, uma como segurança para aquelles reos, que não são condemnados a prizão, e outra para aquelles que por sentença se acharem condemnados a essa pena. Esta base segundo me parece, he essencial, assim como a outra, de que ficão abolidas todas as casas de segredo; porque as nossas leis o tem considerado como uma especie de tortura, e deve ser abolido. Em 1790 se reconheceu isto mesmo; mas como não era possivel acabar com todos os abusos, continuarão ainda, e talvez no momento em que estamos discutindo esta materia, se achem alguns infelices nessas horriveis masmorras.-Offereço portanto esta indicação. Haverá casas commodas de segurança e prisão; nestas só serão guardados os que forem condemnados a essa pena. As casas de segredo ficão prohibidas para sempre. Apoiado apoiado.

O Sr. Presidente, depois de julgada a materia sufficientemente discutida, propoz: os Srs. que julgarem que a doutrina deste artigo 179 deve ficar omisso na Constituição queirão levantar-se? Decidiu-se que não ficasse omisso. Seguirão-se as votações sobre cada uma das partes do artigo, que forão approvadas.

O Sr. Presidente: - Os Srs. que julgarem necessario que se faça esta declaração que offereceu o Sr. Fernandes Thomaz queirão levantar-se.

O Sr. Soares de Azevedo: - Eu desejava saber se esta indicação do Sr. Fernandes Thomaz he relativamente a que, se devem ser abolidas as casas de segredo, ou se he o segredo.

O Sr. Guerreiro: - Peço a V. Exca. proponha a esta augusta Assemblea a indicação, qual he o sentido della; se he abolir as casas de segredo, ou se estas casas de segredo devem ser substituidas por casas aceadas aonde se meti ao os presos para não ter communicação alguma. Peço a V. Exca. que proponha isto a votação, porque aliás ficando abolidas todas as casas de segredo estão abolidos os segredos.

O Sr. Fernandes Thomaz; - Em Portugal sempre se entendeu por segredo uma casa que mais servia de atormentar do que outra cousa, em uma cadêa de Coimbra ha um almario mettido em uma parede, que he a que se chama casa de segredo, isto he justo que aqui se saiba, he isto o que agora não deve continuar. Agora se o bem da justiça pedir que um preso se conserve por um ou dois dias separado de outro, porque razão senão ha de fazer? Porventura elle he atormentado? Eu creio que não; por tanto declaro que as casas commodas e arranjadas, e em communicação com qualquer outra das que devem servir commodamente aos presos não ficão abolidas pela indicação já approvada.

O Sr. Presidente: - A questão do Sr. Guerreiro he se ficão as prizões assas commodas, mas incomunicaveis.

Os Srs. que approvarem a doutrina desta proposição tenhão a bondade de se levantar? Ficou approvada.

O Sr. Freire leu o artigo 180.

O Sr. Borges Carneiro: - A materia deste artigo está no artigo 6 das Bases, o qual diz assim (leu-o). Este artigo 6 tinha sido literalmente copiado para o artigo 4 do projecto, e quando ali se tratou, foi esta materia adiada. Depois determinou-se que na redacção se declarasse da melhor fórma que podesse ser. O artigo 6 das Bases trata sómente do caso em que se ha de castigar o que ordenar, ou que executar a prizão arbitraria: este artigo comprehende outras infracções relativas a prezos, as quaes ficão indicadas neste capitulo, como que o juiz lhes communique dentro de 24 horas o motivo da prizão, nome do accusador, etc. Por tanto o meu parecer he que se sanccione a materia deste artigo na Constituirão, e que os redactores o concebão de modo, que se conserve tudo o que está nas Bases.

O Sr. Trigoso: - Este artigo não tem nada com o artigo 6 das Bases, não tem nada com o artigo 4, de Constituição, a meu ver; por tanto assento que se póde muito bem propor á votação com a emenda do Sr. Brito.

O Sr. Presidente poz a votos o artigo 180: foi approvado; supprimindo-se as palavras como reos de prisão arbitraria.

O Sr. Freire leu o artigo 181.

O Sr. Borges Carneiro: - Eu julgo que a doutrina deste artigo he muito necessaria por aquella regra salus reipublica suprema lex esto. Para casos extraordinarios são precisos remedios extraordinarios. Quando estas circunstancias extraordinarias se apresentarem, nós não deveremos dizer como os Deputados de Napoles moderação, moderação, observancia da Constituição, e sem energia deixar arruinar o edificio constitucional. Nesse caso se a Constituição não tivesse estabelecido este artigo, e provido de remedio, devia-se romper por onde se podesse, e fazer-se uma explosão que se necessario for enchesse de horror toda a Europa. Quem não quizer não se intrometia com quem está quieto em sua casa. Pois que? Se os estrangeiros que se denominão santos se resolvessem a impulsos da sua santidade a atacar hoje a invicta Hespanha, esta ligar-se-ia ás formulas, e contentar-se-ia com dizer: moderação, moderação, como os embolados Napolitanos? Pois sim, que acordem o leão que está quieto em sua casa. Bem disserão já os de Valhadolid: será uma tempestade que despregue seus raios por todos os pontos. Por tanto digo eu nestes casos, rompe-se seja por onde for. Porem para que não se faça com infracção da Constituição o que se deve fazer, salva ella; por isso he que este artigo se estabelece na Constituição, e outro mais amplo que eu propuz, e se ha de discutir em seu lugar. Nestes casos dispensão-se formalidades ordinarias, para que se conser-

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ve o systema do governo adoptado, que he a base de toda a felicidade publica. Bem entendido, que a doutrina deste artigo não he restricta ao caso de ser atacado o systema constitucional; mas a todo o caso em que se veja ameaçada a segurança do Estado.

O Sr. Antonio Carlos: - Este artigo parece-me pouco comprehensivel: em quanto á doutrina he extinctissima, nunca se póde negar que as cousas estabelecidas para casos ordinarios não podem ser applicaveis para occorrencias extraordinarias; mas aqui diz, que a suspensão destas formalidades se poderá fazer por espacial decreto das Cortes; e se as Cortes não estiverem reunidas? He preciso ter isto em consideração, e vêr a quem se ha de confiar esta faculdade.

O Sr. Borges Carneiro: - Já está isto provido no Inçar em que se diz: a deputação permanente convindo as Cortes ou o Rei.

O Sr. Guerreiro: - Trata-se de estabelecer e conceder aos corpo? legislativos, que tão de reunir-se, o mais terrivel de todos os poderes, qual he o de suspender a execução de todos os artigos constitucionaes, e do fazer cessar todas as garantias da liberdade, da segurança; da propriedade dos cidadãos: poder terrivel quasi sempre funesto a alguns cidadãos, ou a todos elles: mas que não póde deixar de conceder-se porque muitas vezes a salvação da patria assim o exige. Esta he a unica circunstancia em que póde permittir-se o seu uso; mas creio que todas as cautelas serão necessarias para evitar o abuso, e todas ellas serão poucas. Não sendo possivel dar-se todas as cautelas para as legislaturas seguintes, eu quizera que ao decreto das Cortes que dispensasse por determinado tempo essas formalidades, precedesse uma declaração publica feita ao menos por duas terças partes de Deputados, de que a patria estava em perigo, e que só depois desta declaração se podesse dar o decreto para esta despensa.

O Sr. Villela: - Acho acertada a reflexão do illustre Deputado o Sr. Antonio Carlos: e nem se diga que no caso que elle suppoz, se convocárão as Cortes. Ha de se deixar, que em quanto ellas se reunem os revolucionarios continuem até transtornar toda a ordem da sociedade? E pergunto, como póde ser isto nas provincias do Ultramar? Lá não ha Cortes; e não se ha de estar á espera de que elles providenceiem em mal iminente. He pois necessario, que para ali se estabeleção providencias a este respeito.

O Sr. Moniz Tavares: - Eu tremo todas as vezes que ouço falar em que poderá chegar o momento fatal em que se haja de dispensar "o Habeas corpus" unico paladio da liberdade do cidadão: he preciso por tanto que nós declaremos quaes serão estas circunstancias extraordinarias. Eu lendo a Constituição dos Estados Unidos vejo que expressamente marca em que casos se ha de suspender, não vejo que marque outros senão estes dois:; rebelião declarada e invasão estrangeira eu seria de opinião que se declarasse tambem aqui que só nestes casos se podesse suspender "o Habeas corpus."

O Sr. Moura: - Eu peço que o illustre Preopinante me explique o que entende por uma "rebelião declarada" se são tumultos, e bandos, em que se reunem uns poucos de homens amotinados pelas rum gritando contra as autoridades. Então não ha duvida nenhuma que o delicto está claro; mas se esse delicto não passar de deliquio, ou de projecto occulto, como se v. g. sabendo-se que está maquinando num Clubs, havendo disto fortes indicios não seria preciso prescindir destas formalidades, não seria preciso prender antes da formada desculpa? Parece que sim, porque não he só quando ella está declarada que produz mais effeitos he tambem quando se está maquinando em alguma sociedade particular ou em algum Clubs para destruir os poderes constituidos. He preciso que não restrinjamos muito esta lei, nem tão pouco a ampliamos demasiado. Quando se diz que ha de proceder a discussão publica nisto está dito tudo, porque então ha de haver differentes opiniões no Congresso, e ha tempo de considerar se está ou não nesse caso. Eu assento que a liberdade da imprensa e discussão publica são sufficientes garantias, e que não he preciso restringir tanto, porque póde haver grande risco da causa publica.

O Sr. Vilella: - Torno a repetir: póde haver rebelião em alguma provincia do Ultramar: e por tanto he necessario, que se estabeleça, como se hade ali providenciar nesse caso.

O Sr. Borges Carneiro: - Esta materia proposta pelo Sr. Vilella acho-a muito digna de ser tratada neste augusto Congresso; porque nestes casos são necessarias sempre providencias promptas. Por tanto opino que a Commissão de Constituição haja de propôr um artigo no qual se trate do meio de evitar este perigo que aqui tratamos, quando elle se manifestar não em Portugal, mas em alguma das provincias Ultramarinas; porque he melhor obrar com lei do que sem ella.

O Sr. Moniz Tavares: - Eu assento que não se deve deixar de marcar na Constituição quaes são os casos em que se podem exigir as modificações do artigo; porque então o Governo póde tomar as medidas que lhe marcar a Constituição, como o prender os cidadãos, e dentro em vinte e quatro horas mandar-lhes formar culpa, e lembro tambem para se tomar em consideração o que em outras Constituições se tem decretado para este objecto, e que declarão que se póde suspender o Habeas Corpus sómente no caso de rebelião declarada, ou invasão de estrangeiros.

O Sr. Presidente: - Está chegada a hora da prorogação, e como eu julgo que esta materia he de muita ponderação vou propôr á assembeleia o seu addiamento. Foi approvado.

Lerão-se os seguintes

PARECERES.

Existem na Commissão de fazenda alguns requerimentos, e he de esperar que concorrão outros muitos de pessoas, que pelo seu regresso do Brazil pedem ser admittidos a gozar do vencimento do montepio, que recebião antes da ida para aquelle continente, ou os que tinhão adquirido jus pelas prestações de seus pais, e maridos. Não fendo a Commissão a

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menor duvida, em que devem por lei, é uso inalteravel ser deferidos favoravelmente a maior parte destes requerimentos; toda via para evitar a perda de tempo no exame, e parecer respectivo a cada requerimento, e a desigualdade de condicção das que já estivessem deferidas, a respeito das outras, que por não caber no tempo o não fossem ainda; propõe, que se declare ao Governo, que deve mandar abrir assento de alta na thesouraria ás viuvas, e filhas regressadas do Ultramar dos officiaes, que em Portugal havião coutribuido para o monte-pio; (com tanto que elles fossem dos que os planos admittião a esta prestação, e tenhão prehenchido todas as condicções iielles declaradas) e isto á vista das guias por ellas apresentadas, que mostrem, até quando se achão pagas; como he de costume.

Paço das Cortes 20 de Fevereiro de 1822. - Francisco de Paula Travassos, Francisco Xavier Monteiro, Francisco Barroso Pereira, Manoel Alves do Rio, Francisco João Moniz.

Approvado.

Leu-se mais o parecer da Commissão de fazenda sobre o orneio do ministra da guerra relativo a 44 officiaes regressados de Pernambuco com licença da junta governativa sendo o parecer da Commissão que se lhes pagassem dous mezes de soldo como se praticou com os officiaes regressados do Rio de Janeiro, mas que o pagamento seja regulado pela ultima ordem das Cortes, e não pela de 31 de Outubro como foi o primeiro pagamento. E nesta conformidade foi approvado o parecer.

Leu-se mais o seguinte

PARECER.

Foi presente á Commissão de fazenda d requerimento de J. B. Oreille, capitão do navio Le Henri, sahido de Antuerpia com destino a este porto de Lisboa, e ao porto do Rio de Janeiro, e com carga para hum, e outro Porto, bem como os documentos, que fundamentão a sua supplica. Allega elle, e prova que tomou carga no porto da sabida destinada para Lisboa, e a qual comprehendeo em um manifesto, e que tomou outra parte da carga entre a qual 82 barris de vinagre, com outro igual manifesto para o porto do Rio de Janeiro, vendo um, e outro autenticado pelo respectivo Consul portuguez alli. Allega, e prova que entrado neste porto, manifestou uma, e outra carga; e para a destinada para o Rio de Janeiro pedio franquia. O administrador da alfandega duvidou dar-lhe a franquia ao vinagre, o Conselho da fazenda denegou-lha, e eis-ahi o supplicante em virtude do decreto de 27 de Julho de 1785, e de 7 de Junho de 1821, em que se fundão, impedido de seguir viagem, e ameaçado de perder a carga, e o corpo, e quilha do navio. Vem em consequencia a este Soberano Congresso queixar-se da violencia, e pede prompto remedio.

A questão he de intelligencia de lei, e conseguintemente da competencia do corpo legislativo. O decreto de 27 de Julho de 1785 prohibe a entrada paira consumo dos vinagres estrangeiros, mas não prohibe a franquia. O decreto de 7 de Junho ao anno passado tolhe a franquia no vinho, agoa-ardente, e mais licores espirituosos. He, ou antes faz-se a questão, do se por ventura vinagre he licor espirituoso; isto he, senão sendo comprehendida a probibição na letra, o he no espirito da lei. Parece a Commissão que o vinagre não póde classificar-se como as bebidas, que o artigo 1.° do decreto de 7 de Junho chamou espirituosas, e neste caso vigora para decidir a questão o artigo 7.º do mesmo decreto, que diz assim: Todos os mais generos, e artigos, que não são os designados no artigo 1.º, gozarão desde já de franquia, e baldeações sob as cautelas até agora praticadas.

Se esta carga fosse não manifestada em tempo; se não viera acompanhada dos documentos legaes; se este porto não fosse um verdadeiro, e indubitavel porto de escala na derrota do navio de que se traia, poder-se-hia no caso de duvida intimar ao capitão a não entrada; o quando elle teimasse dever-se-lhe-ia impor o rigor da lei. Mas quando elle apresenta documentos legaes que apoião ao mesmo tempo a sua boa fé; quando elle despachado devidamente no porto de sahida pela authoridade competente entra no porto do destino, e nelle faz as diligencias das leis, que são geraes na policia de todos os portos, e feitas pede uma franquia, o denegar-lha, e sobre a denegação tratar de confiscar-lhe navio e carga, he procedimento singular na historia do commercio, principalmente no tempo em que todo o nosso interesse he afagar os estrangeiros para que frequentem nossos portos, e nunca desvialos quando com boa fé a elles aportão.

Por tudo parece á Commissão, que na prohibição do artigo 1.° do decreto de 7 de Junho se não comprehende o vinagre para se lhe denegar franquia; e que este genero entra na disposição do artigo 7.º do mesmo decreto. - Paço das Cortes 20 de Fevereiro de 1822. - Francisco Barroco Pereira; Francisco de Paula Travassos; Manoel Alvs do Rio; Francisco Xavier Monteiro.

O Sr. Guerreiro: - Pergunto quem pediu a declaração das Cortes a este respeito, foi a parte, ou o tribunal? (foi a parte); pois como dos tribunaes não se admitte recurso a este Congresso, eu reprovo altamente o parecer da Commissão, e seja o poder judiciario quem lhe applique a lei, pois he unicamente a quem compete.

O Sr. Fernandes Thomaz: - Eu sou do parecer tão Sr. Guerreiro: ou a lei está obscura ou não; se o não está, e elle prova que veio para o Rio de Janeiro, e que veio nas circunstancias da lei, não pertence a este Congresso deferir-lhe; por tanto voto com o Sr. Guerreiro, accrescentando, que se a lei está obscura faça-se uma declaração authentica para todos os casos que forem similhantes; porque he aos juizes a quem pertence applicar-lhe a lei, e não a este Congresso.

O Sr. Barroso: - A lei estanciara; mas o conselho da fazenda he que a não quiz entender.

O Sr. Franzini: - Pergunto: he permittido ao cidadão dizer a este Congresso, não se me applicou a lei? A quem ha de recorrer o cidadão opprimido? Não compete a este Congresso tomar conhecimento

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disso? Compete: disse o tribunal está condemnado pela lei: diz, este homem, o vinagre não he bebida he espirituosa, e por tanto não está comprehendido na lei. Isto he uma cousa muito diversa, e he preciso ignorar os principios de quimica para se dizer que o vinagre he bebida espirituosa; por tanto he necessario dizer agora que o vinagre não he uma bebida espirituosa; porque delle não se póde fazer licor (eu quizera que aquelles que dissera que o era, que o bebessem, e enfio verião que tal era). Ora o que trouxe este genero tambem não saberia se elle era ou não prohibido; porque os estrangeiros não podem, nem terá obrigação de saber quaes são prohibidos, nem quaes não são; o consul em Antuerpia desse-lhe, que podia vir, e deu-lhe os despachos, este homem veio oa bca fé, e passados alguns dias disserão-lhe, v. m. não só perderá o vinagre, mas ha de ir prezo, e ha de perder o seu navio etc.: ora este homem que conhece a ma intelligencia que se quer dar á lei, não lhe he permittido recorrer ao Soberano Congresso para que este haja de fazer esta declaração? Agora se o Soberano Congresso julga que para o futuro o vinagre não póde ser admittido, do mesmo modo que o são as bebidas espirituosas, isto he outra cousa, póde declaralo na lei; mas julgo que ella nunca poderá ter effeito retroactivo.

O Sr. Guerreiro: - O illustre Preopinante acaba de dizer, que he preciso ignorar os principios de quimica para se dizer que o vinagre he comprehendido na lei, mas eu tambem sei que basta saber os principios constitucionaes para conhecer que o podar legislativo não póde arrogar a si nenhuma attibuição dos outros dois, para o que basta ler a base da nossa Constituição, que diz assim (leu a) esta base foi jurada, e basta tambem saber o que aconteceu agora ultimamente com o requerimento de afrontes: a applicação de uma lei he attribuição do poder judiciario; e o querer o Congresso arrogar a si as attribuições do poder judiciario, he ao mesmo tempo praticar um acto de tyrannia, e ao mesmo tempo tambem vir a conhecer a verdade pela representação de um particular; por tanto não se deve tomar decisão nenhuma a este respeito; porque se a sentença he injusta o unico, meio que lhe resta, he o da revista, e se he no caso em que a lei prohibe o haver revista, póde-se dispensar na lei; mas querer o Congresso em um caso particular alterar os principios constitucionaes, hão me parece proprio.

O Sr. Lino Coutinho: - Apoio o parecer do Sr. Franzini, e tambem não desprezo o do Sr. Guerreiro; mas este Congresso tem tambem igualmente decretado que o cidadão tem o direito de petição depois de ter caminhado pelas formulas judiciaes, e he o caso em que se acha este individuo, queixando-se de haver o poder judicial entendido mal a lei, e pedindo a este Congresso a explicação de um decreto: logo pois deste negocio não está no caso de uma simples petição, elle he mais transcendente, e de certo o vinagre sobre que versa a questão não está nem póde estar comprehendido nas bebidas espirituosas de que fala o decreto, e não sei como ajunta da fazenda (contra o commum entender) declarou o vinagre bebida espirituosa - Risum teneatis amici. =

O Sr. Miranda. - Não me parece bem que se trate assim esta questão: o meu parecer he, que se mande por ora suspender o sequestro do navio, e se pergunte ao tribunal porque deu aquella sentença; entretanto póde muito bem ser que hajão outros motivos que o requerente não allegue, e he necessario ouvir primeiro o tribunal: mande-se pasmar ordem para que se suspenda a execução, e ao mesmo tempo para que o tribunal dê a razão.

O Sr. Macedo: - Eu o que peço he que se decida, se vinagre he ou não espirito, e se está ou não comprehendido na lei; tambem peço que se declare no decreto que prohibe as franquias que o vinagre deve ser prohihido.

O Sr. Peixoto: - Apoio este voto. Pelo passado deve declarar-e que os vinagres não erão comprehendidos na denegação de franquia; porque com effeito o decreto de sete de Junho restringe se ás bebidas espirituosas, e o vinagre ficou na generalidade das fazendas, e generos de que se admitte a entrada: mas aos liquidos espirituosos, excluidos da franquia, deve igualmente accrescentar-se o vinagre, para ser ao futuro como elles prohibido. O conselho da fazenda attendeu mais á razão, do que ás palavras da lei; pois sem duvida houve nella omissão a este respeito; por ser certo, que quem prohibiu o vinho por ser genero, de que o paiz abunda, intentava prohibir o vinagre, que he o mesmo vinho degenerado; bem que pela falta do vinho possa fazer-se de outros liquidos: em caso de duvida o Conselho segurou-se, tomando a parte, que não lhe podia ser indecorosa. Ao Congresso já veio um caso analogo, o qual se reputou tão controverso, que dividiu os votos por uma e outra parte: foi o do macarrão, e outras massas. Duvidou se se estava comprehendido na lei que prohibia os cereaes, e se devia expecificar-se a sua prohibição: e ultimamente tomou-se a deliberação media de admittilo, mas com um direito quasi prohibitivo.

Sou pois de opinião, que se declare, que o vinagre não está comprehendido na letra do decreto, para que está declaração possa desde logo applicar-se ao da tomadia pendente, na qual o supplicante confiscado tem de mais em seu favor (se he certo o que alega) a circunstancia de trazer a carga legalizada pelo nosso consul, o qual devia melhor do que um estrangeiro estar instruido da extensão do decreto sem escrupulo ha nas alfandegas da Russia, mas se nellas se apresenta algum genero legalizado pelos seus agentes no porto da carga admitte-se; ainda que houvesse fundamento para o contrario, e pede-se ao agente conta de seu comportamento.

Julgada a materia sufficientemente discutida o Sr. Presidente propoz: aquelles Srs. que forem de opinião que se peção informações ao Governo sobre este objecto, e que se suspenda no entanto qualquer procedimento a este respeito, queirão ter a bondade de se levantarem? (Assim se approvou.)

Fez-se a segunda leitura de um projecto do Sr. Guerreiro sobre a abolição dos privilegios de foro, tanto em materias civeis, como crimes.

Decidiu-se que se imprima, e junto ao outro n.° 167 entrasse em discussão.

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O Sr. Lédo apresentou a seguinte

INDICAÇÃO.

Tendo-se sanccionado hoje na Constituição, para triunfo da razão, da moral, e da filosofia, que nas cadêas publicas não hajão casas de segredo, onde, com vergonha da humanidade, o despotismo desenfreado tinha posto em pratica os horrores todos para opprimir o desgraçado; proponho:

Que se especa ordem ao Governo para que desde já se dêm as providencias necessarias, a fim de que taes casas sejão fechadas ou cerradas para sempre, Paço das Cortes 22 de Fevereiro de 1822. - C. G. Ledo, Manoel de Vasconcellos Pereira de Mello.

Ficou para segunda leitura.

Propoz o Sr. Presidente, que havendo alguns Srs. Deputados do Ultramar, em numero de dois ou tres, que não podendo negociar as suas letras, pedião ser pagos aqui pelo cofre nacional, se decidiu que se expedissem para isso as competentes ordens.

Entrou em discussão o artigo 1.° do projecto da reforma da moeda de ouro que tinha ficado adiado. (Vide a Sessão antecedente).

O Sr. Travassos: - Não me proponho a ostentar conhecimentos de economia politica, nem a falar vagamente sobre a natureza e usos da moeda: quero sómente chamar a discussão ao objecto de que se trata.

He sem duvida que os valores da prata de 11 dinheiros, e do oiro de 22 quilates em barra estão no mercado, na relação de 1 para 16, e que os valores nominaes destes mesmos metaes reduzidos a moeda estão depois das ordens dirigidas á casa da moeda em 1750 na relação de 1 para 131: he logo necessario restabelecer a 1 para 16 a relação alterada nas moedas de prata, e de oito. Isto se póde conseguir pela fórma proposta no projecto, determinando que a moeda de prata denominada cruzado novo tenha de pezo 4 oitavas, e que a de 4 oitavas de oiro valha 7680 réis. Julgo porém augura tanto altos estes valores nominais a respeito dos seus valores naturaes, ou em barra; porque para conservar a maior permanencia possivel ao valor das moedas em geral, he conveniente que elle defira muito pouco do que elles valerião como generos. Mas actualmente o marco de prata de 11 dinheiros em barra custa 7200 réis, e a oitava de oiro de 22 quilates em barra custa 1800 réis, donde o marco vem a custar 115$200 réis. Parece-me sufficiente para os gastos da fabricação 300 réis em cada marco de prata, como em 1750 foi regulada, mandando-se que de cada marco se cunhassem 35 cruzados novos, e por tanto que o valor do marco de prata reduzido a moeda fosse 7500 réis; nesta hipolhese será o valor do marco de oiro de 22 quilates reduzido a moeda 120$ réis; ou cada moeda de 4 oitavas valerá 7500 réis. He tambem claro que não póde realmente haver mais que uma unidade para comparar os valores das moedas, e que ainda que as leis determinassem uma para as de prata, e outra para as de oiro, ellas ficarião infallivelmente sem execução desde que pelos valores correntes dos metaes estes unidades differissem uma de outra.

Fundado nestes principios proponho, como emenda ao artigo 1.° do projecto que está em discussão, o seguinte. (Remetteu o dito Sr. para a meza uma emenda concebida em tres artigos).

O Sr. Peixoto: - Da doutrina do illustre Preopinante concluo, que toda a discussão sobre este projecto não terá outro resultado, alem de uma declaração esteril da relação actualmente existente entre o valor do ouro, e o da prata; em quanto para o effeito pratico não fará a menor innovação; porque a moeda de prata ha de continuar a representar os valores de tudo da mesma sorte que por ella estão regulados; e a de ouro ha de continuar a representar-se no valor que a praça lhe der, segundo for mais ou menos procurada, nem póde ser de outra maneira. Huma vez concedido o principio, de que a relação da moeda de ouro com a de prata não he firme, está destruida a possibilidade de estabelecer em uma lei justa essa relação: o principio foi adoptado no projecto, quando trata de provisorio o presente regulamento; e soppondo que a variação será no valor da moeda de ouro, porque a de prata he e ha de continuar a servir de unidade e termo de comparação; segue-se que uma lei que fixasse á moeda douro um valor, pelo qual devesse acceitar-se, seria uma lei contraria á ordem natural dos valores, seria originar perdas a muita gente nas relações internas da nação, e nas relações commerciaes com as praças estrangeiras, poderia ser prejudicial e nunca vantajosa ao nosso commercio; por ella senão admittidas a participarem daquillo que lhes fosse favoravel, e evitarião o desfavoravel alterando os preços dos generos, e os cambios.

Que he o que proximamente temos observado? A relação da prata com o ouro na Inglaterra tem sido quasi igual nestes ultimos annos; e entre nós a moeda de ouro tem variado, na qualidade de genero de exportação, pelas causas geraes das variações dos preços; concurrencia e consumo. As dobras de quatro oitavas valerão a principio um premio insignificante; forão subindo gradualmente com as pequenas alternativas de algum augmento mais na vespera da saída de paquetes, por serem então mais procuradas: até que chegarão a um termo em que ficarão estacionarias; porque delle para diante não podem ter consumo para a exportação: este termo he o de 1:020 de premio até 1:060 réis; e em consequencia o valor da dobra está por este cambio em 7:420 com pouca differença. Se o elevarmos, os Inglezes hão de elevar proporcionalmente o preço dos generos que nós venderem: e ainda que o augmento não passe de 7:680, qualquer cousa que o cambio melhore em nosso favor, talvez já de Inglaterra voltem para cá as dobras procurarem o lucro que offerecem: de maneira que os commerciantes que nos forem por uma parte devedores, e credores por outra, não farão o encontro por meio de letras, mandarão dobras para pagarem, e sacarão pelo que lhe deverem, a qual será o resultado desta operação? Está patente. Difficultarem-se as letras sobre Inglaterra, e o cambio dellas voltar a 40 e tantos, em lugar de 51 em que agora está: tudo em prejuizo do nosso commercio.

O risco que se corre em taes regulamentos de moe-

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da está, mui provado: bem se sabe o que aos Ingleses acaba de acontecer com a creação da moeda chamada soberano. Apesar da grande illustração que sobre taes materias ha na patria de Smisth, apesar dos mais escrupulosos exames que fizerão, errarão de tal sorte, que em pouco tempo viu-se innundada dá nova moeda, que lhe foi mandada de Hollanda e de França, e a Inglaterra, que evita quanto póde a importação de generos de manufactura estrangeira, foi obrigada a soffrer a deste de sua invenção, de que lhe resultou grave prejuizo.

O illustre autor do projecto parece que já convinha em que este novo regulamento não fosse obrigatorio entro os particulares, e servisse sómente para a casa da moeda e thesouro publico; mas isso de nenhuma sorte convém; porque o thesouro para fazer conta justa com os particulares, ha de regular como elles o valor do que dá, e do que recebe: aliás se a moeda de ouro sobisse do valor da lei; dando-a, ficaria prejudicado, porque pagava mais do que devia; e se baixasse prejudicaria por pagar menos. Concluo com a minha proposição, que lodo o resultado deste projecto será esteril para a patria.

O Sr. Vaz Velho: - Sr. Presidente, trata-se neste projecto de saber se he util ou não calcular o preço da moeda de ouro com a de prata: eu não tratarei do modo por que isto ha de ser; porque estabelecida a baze de que he util, e não só util, mas necessaria; depois o methodo para se reduzir, ou seja este plano, ou outro, isso he indifferente; por consequencia eu farei ver seguudo os principios estabelecidos, que de facto he util esta mudança que se pretende fazer; deixando agora que a moeda de ouro seja considerada como representação do valor nominal, ou seja medida, ou mercadoria, ou seja finalmente o que piles quizerem, sempre concordão todos que a moeda tem uma particularidade, que não tem o me tal que não he moeda, e vem a ser a propriedade que tem de em qualquer transacção fazer imprimir uma tal força, e um giro mais veloz que todos os outros, e póde-se fazer com que uma mesma moeda altere no giro; porque muitas vezes passa a fazer o valor de dez, vinte, trinta vezes mais do que ella tal; eis a grande propriedade que tem a moeda, por tanto seja o que for, o certo he, que a moeda he que faz com que o giro seja tão veloz, isto he que a moeda poderá valer por trinta; (suppohamos)eu com um crusado novo pago um livro a um livreiro; este livreiro devia ainda ao encadernador, paga-lhe com o mesmo crusado novo, este fica com o seu ganho, e como devia ainda a quem tinha comprado o papel, paga-lhe tambem com o mesmo crusado novo, e temos assim que com uma mesma moeda póde fazer trinta operações, como se fossem trinta mercadorias: eis a grande utilidade que o dinheiro tem ao circulo: ora o dinheiro que tem esta particularidade, deve ter um preço certo, e se elle passa a ser mercadoria unicamente, então passa a não ter esta propriedade, e isto he o que acontece ao mesmo ouro por não ter o effeito de moeda: ora como se ha de reduzir o ouro é qualidade de moeda? Creio que o unico meio he o que aponta o projecto que está em questão: ora creio tambem que isto he de grande utilidade para a nação, logo parece-me que o reduzir este valor do ouro ao da prata, como se pretende, vem a ser de grande conveniencia para o Estado, e por isso voto pelo projecto.

Depois de mais algumas breves reflexões o Sr. Presidente ponderou que estava acabada a hora.

O Sr. Lino Coutinho: - Então requeiro o addiamento, porque este negocio he de muita importancia, e deve ser tratado com toda a circunspecção.

Decidiu-se que ficasse adiado.

O Sr. Presidente designou para a ordem do dia o orçamento da fazenda, sendo-lhe apensa a resposta do Ministro á dita repartição.

Levantou-se a sessão ás duas horas. - José lano Continha, Deputado Secretario.

RESOLUÇÕES E ORDENS DAS CORTES.

Para Agostinho de Mendonça Falcão.

As Cortas Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza concedem a V. Sa. licença por tanto tempo quanto seja necessario para tratar do restabelecimento da sua saude, esperando do seu conhecido zelo e amor da patria, que apenas seja possivel, V. Sa. não deixará de vir logo continuar neste soberano Congresso as funcções de que dignamente se acha encarregado. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Luiz Monteiro.

As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que pela Thesousaria das Cortes se abonem os vencimentos de dois ou tres Deputados de provincias do Brazil, que não podem negociar as suas letras. O que participo a V. Sa. para sua intelligencia e execução.

Deus guarde a V. Sa. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para José Ignacio da Costa.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa ordenão que lhes sejão transmittidas as informações necessarias sobre a inclusa representação e documentos juntos de João Baptista Oreille, ácerca de lhe haver sido denegada pelo Conselho da fazenda a franquia que requereu de 82 barris de vinagre carregados em o seu navio Le Henry, surto no Tejo, e vindo de Antuerpia com destino aos portos de Lisboa e Rio de Janeiro, suspendendo-se no entretanto qualquer procedimento sobre este objecto. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

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Para Candido José Xavier

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa, tomando em consideração as relações inclusas, transmittidas para Secretaria de Estado dos negocios da guerra com officio de 24 de Janeiro proximo passado, de 44 officiaes regressados de Pernambuco; resolvem que fique extensiva a estes officiaes a ordem das Cortes de 4 do corrente mez, abonando-se dois mazes de soldo, ou meio soldo áquelles que expressamente estiverem comprehendidos nos precisos termos da mesma ordem, e verificando-se a legalidade dos titulos, pelos quaes cada um delles se acha em Lisboa, com declaração de que sómente se trata dos soldos devidos, em virtude de patentes ou decretos de Sua Magestade, e não em consequencia de nomeações feitas pelas juntas provisorias, ou pelos capitães generaes. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza ordenão que se abra assento de alta na Thesouraria geral das tropas ás viuvas e filhas regressadas do Ultramar, da officiaes, que em Portugal havião contribuido para o monte pio (com tanto que elles fossem do numero daquelles que os planos admittão a esta prestação, e tenhão preenchido todas as condições nelles declaradas); e isto á vista das guias por ellas apresentadas, que mostrem até quando se achão pagas, como he de costume. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portuguesa mandão dizer ao Governo que não tomão conhecimento do contheudo no officio expedido pela Secretaria de Estado dos negocios da guerra, em data de 21 do corrente mez, ácerca da execução do artigo 2.° do decreto das Cortes de 14 de Dezembro proximo passado, por ser todo esse objecto da competencia do Governo. O que V. Exca. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 20 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para o mesmo.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão voltar ao Governo, por não ser da competencia das Cortes, o incluso requerimento com os respectivos documentos, ácerca da promoção que pretende José Eloi Pessoa da Silva, major aggregado ao regimento de artilheria da Bahia, tudo transmittido ao soberano Congresso pela Secretaria de Estado dos negocios da guerra em data de 21 do corrente mez. O que V. Exc. levará ao conhecimento de Sua Magestade.

Deus guarde a V. Exc. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro de 1822. - João Baptista Felgueiras.

Para Ignacio da Costa Quintella.

Illustrissimo e Excellentissimo Senhor. - As Cortes Geraes e Extraordinarias da Nação portugueza mandão voltar ao Governo o officio incluso da Junta provisoria, creada na ilha do Principe, datado em 3 de Setembro de 1821, e transmittido ao soberano Congresso pela Secretaria de Estado dos negocios da marinha em data de 21 do corrente mez.

Deus guarde a V. Exca. Paço das Cortes em 22 de Fevereiro e 1822. - João Baptista Felgueiras.

Redactor - Velho.

SESSÃO DE 23 DE FEVEREIRO.

ABERTA a Sessão, sob a presidencia do Sr. Serpa Machado, leu-se a acta da antecedente, que foi approvada.

Os Srs. Deputados, Agostinho Gomes, Lino Coutinho, e Barata, fizerão a seguinte declaração: Requeremos que se publique na acta, que fomos de parecer na sessão de hontem, que o processo criminal fosse publicado desde o seu principio, ainda mesmo antes da pronuncia.

O Sr. Secretario Felgueiras mencionou os seguintes officios.

1.° Do Minirtro dos negocios do Reino, acompanhando quatro cartas de mercês, expedidas pelo tribunal do Desembargo do Paço do Rio de Janeiro, a favor das pessoas nellas declaradas. Remetteu-se á Commissão de Constituição.

2.° Do mesmo Ministro, enviando a informarão que se havia pedido, ácerca do requerimento de José Antonio da Crus. Remetteu-se á Commissão competente.

3.° Do mesmo ministro, remettendo a conta da camara de Guimarães, relativa á mudança da mesma villa. Foi á Commissão de saude publica.

4.° Do mesmo Ministro, participando a installação da Commissão de commercio da cidade do Porto; de que as Cortes ficárão inteiradas.

5.° Do Ministro dos negocios da guerra, dando parte de se haver realizado o offerecimento que fizera o batalhão de caçadores n.°8; de que as Cortes ficárão inteiradas.

6° Do Intendente coral da Policia, enviando a copia de um officio do juiz de fora de Santa Martha, em que relata o jubilo geral, com que no Douro se tem festejado a decisão do soberano Congresso sobre

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