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orça entra estas duas; porque nós devemos constituir o poder legislativo de maneira mais proveitosa para o paiz, e essa maneira será aquella, em que a liberdade ficar mais bem garantida.

Na Inglaterra, aonde a existencia do segundo corpo co-legislativo é antiquissima, ainda serve de monumento ao despotismo, que exerceu a classe nobre sobra aquelle paiz, e continuamente até hoje tem durado a lucta da nação contra essa classe privilegiada; ella tem pouco a pouco feito conquistas, e um dia virá, etn que a expulse de todo. A simples leitura das peças officiaes, de que se compõe o codigo politico da Inglaterra, mostre que aquillo é mais uma participação official de uma successão de batalhes de principios politicos, que uma constituição de um paiz; umas vezes prepondera o elemento monarchico, outras o aristocratico, e algumas vezes o democratico, a se alli ha liberdade deve-se ella aos habitos, e ao caracter politico do povo inglez e não á fórma, porque lá se acha constituido o poder 1egislativo. Nós somos um povo, que, a fallar a verdade, temos altas, e vehementes desejos pela liberdade; temos feito muitos sacrificios por ella, e promptos estamos para fazer muitos mais; mas é tambem uma verdade que os habitos liberaes não estão cabalmente arraigados entre nós, e por consequencia devemos considerar o povo portuguez relativamente a principios liberaes na sua infancia; a na infancia os movimentos da imaginação são mais fortes do que os do juizo. Eu não quero dizer com isto que a nação portugueza não tem juizo - tem muito; mas quero dizer que aonde se não acham os habitos liberaes arraigados completamente, e ao mesmo tempo a nação com os vehementes desejos pela liberdade, é preciso muito tento no corpo constituinte para se evitar um de dous males, ou a escandecencia dos animos, e por isso a anarchia, ou o despotismo quando se levante uma força, contra a qual se não reaja a tempo e pelas vias legaes da parte da nação. D'aqui concluo eu que é preciso mais protecção aos actos liberaes em Portugal, do que na Inglaterra, a na França. O povo inglez apresenta uma reacção tão forte contra as invasões do poder, que deve combate-lo com vantagem; o povo portuguez, para me expressar por uma allegoria, precisa de trincheiras de traz das quaes se bata com o despotismo, porque ainda não tem os habitos constitucionaes verdadeiramente arraigados, nem os pode ter senão com o tempo, que não é a obra das discussões, nem que dependa só dos bons desejos. Por isso entendo que devemos constituir o poder legislativo de uma maneira protectora para o espirito de liberdade da nação. E como havemos nós conseguir este fim? Arredando do corpo legislativo tudo quanto for sombra de privilegio; porque, diga-se o que se disser, elle é inimigo da causa publica, pune, e trabalha só para si, e seus descendentes, e não vê mais ninguem. Se nós fossemos estabelecer uma segunda Camara, com o andar dos tempos de duas cousas uma havia de succeder. Ou essa segunda Camara havia de durar o mesmo tempo que a primeira, e seria eleita pela mesma fórma, e com as mesmas attribuições, e então não tinhamos senão uma redundancia não só fastidiosa, mas prejudicial, e gastadora do tempo; ou então lhe havíamos de dar algum privilegio pobre a camara, que representasse a nação, e d'aqui viria com o andar dos tempos que esse corpo se havia de tornar uma nação separada, e apresentar sempre projectos de invasão sobre a nação, que do seu lado não tendo ainda os habitos constitucionaes completamente firmados; e em logar de lhe resistir com virtudes civicas, havia de resistir-lhe por virtude de ferro, e nós não queremos isso.

Eu entendo que na formação de um corpo legislativo deve seguir-se a analogia, que a natureza segue na formação de una ente racional. O maior argumento, que se tem produzido para demonstrar a necessidade de um segundo corpo, co-legislativo, é a precisão de que as deliberações sejam maduras, e reflectidas. Mas como havemos nós, Sr. Presidente, pôr o juizo em um corpo, e estabelecer a reflexão n'outro? Eu não posso comprehender isto por mais que m'o expliquem - um homem a discorrer, e outro a reflectir são dous entes, que se chocam, duas potencias, que se põe em guerra. É preciso que façamos como a natureza, que deu o dom de reflectir ao mesmo ente, que discorre. Por consequencia entendo que, estabelecida uma só camara, ella se póde por um regimento interno regular sobre a maneira da reflectir sobre o seu mesmo pensamento, e não ir pôr a reflexão n'um corpo estranho, que póde muitas vezes dizer-lhe que se enganou, porque lhe não convém o que decidiu, e não porque é prejudicial á nação, para quem legisla.

A vontade nacional, Sr. Presidente, entendo eu que é uma; e então se uma Camara representa a vontade nacional , a outra ha de representar uma vontade estranha á vontade nacional; e por consequencia como ha de a nação abraçar com gosto as leis, que forem votadas por um outro corpo, que não representa a sua vontade? Diz-se, Sr. Presidente, que um segundo corpo co-legislador é absolutamente ne-
cessario para servir de medianeiro entre as dissenções da Corôa e dos representantes da nação. Não sei como se possa tirar este resultado das votações d'um corpo , que vota primeiro as leis que a Corôa: não sai como possa servir de medianeiro, se elle primeiro se choca com a vontade d'outro corpo: não sei como possa isto ser; se se dissesse que a Corôa podia ser medianeira entre os choques dos dous corpos co-legislativos , isso concebia eu; mas que um dos corpos co-legisladores possa ser medianeiro nos choques da Corôa com um delles, votando esse corpo primeiro que a Corôa, isso para mim é um mysterio; então para que poderá servir este segundo corpo? Quanto a mim , não póde servir d'outra cousa senão d'uma ostentação; mas em materias constitucionaes eu não sei que se deva admittir ostentação, e resplendores quando elles não são precisos para a causa
publica, e para o bem geral da nação. Sr. Presidente, ainda dado o caso que podesse conceber-se que esse segundo corpo co-legislador poderia ser medianeiro entre as dissenções da Corôa, e os representantes da nação, pergunto eu, com quem hão de ter affinidade os interesses desse segundo corpo co-legislador? Parece-me que não póde deixar de verificar-se uma das tres hypotheses seguintes: ou os seus interesses hão de ter affinidade com os interesses da nação, ou hão de ter affinidade com os interesses da Corôa, ou hão de te-la então com um interesse privado: se no primeiro caso, então bem longe de nós termos um equilibrio entre a Corôa, e a nação, temos mais um peso sobre a tara da nação, e lá vai perdida a pertenção da Corôa; se no segundo caso, prejudica-se a nação, e vamos pesar demasiadamente a tara, de cujo lado está a preponderancia da Corôa; no terceiro: temos nós tres corpos a baterem-se no meio da nação, a formarem intrigas, e revoluções, que me parece ha de ser uma desordem peor do que a do cahos.

Ora, Sr. Presidente, eu não quero tirar argumentos contra a existencia d'uma segunda Camara; de que tem havido individuos, que compozeram sm outro tempo esse segundo corpo co-legislador, que se comportaram mal; nem tambem quero argumentar para apoiar a sua existencia com isso, de que alguns individuos, de que elle se compoz, se comportaram de maneira que fizeram gloria a si e á nação, a que pertenciam. Entendo que a estes se devem dar muitos louvores, e nos devemos vigiar d'aquelles; mas nem do procedimento de uns, nem do procedimento dos outros devemos tirar argumentos contra, ou a favor da existencia d'um segundo corpo co-legislador; devemos tira-los, sim da natureza das cousas, e das necessidades publicas. Que vemos nós, Sr. Presidente, em todos esses outros povos, aonde ha um segundo corpo co-legislador? Pelo lado da America vemos que ha de ser preciso reforma-los para pôr barreira mais forte às ambições dos presidentes. Nos corpos politicos velhos, e cansados da Europa vemos que elles estão talvez na ulti-