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JN.° 5. Immv «w B âGtrt^o 1846.
Presidência do Sr. Gorjão Henrique.
\L> hamada—Presentes 72 Srs. Deputados.
Abertura — Á uma hora da tarde.
Acia — Approvada sem discussão.
Teve segunda leitura o seguinte
Requerimento :— Requeiro que se peça ao Governo, pelo Ministério da Fazenda um mappa demonstrativo do rendimento total do imposto sobre a carne de porco, que se pagou na alfandega das Sete Casas, cm cada um dos annos de 1830 até 1845 inclusive.— José Ignacio Pereira Derramado.
Sendo admiltido foi approvado sem discussão.
O Sr. Soure: — Participo a V. Ex.1 e á Camara que o Sr. Derramado não comparece á sessão de hoje por motivo de moléstia.
A Camara ficou inteirada.
O Sr. Mattos Falcão: — Mando para a Mesa duas representações das camarás municipaes de S. Thiago de Cacem, e de Sines^ pedindo a approvaçâo do projecto apresentado paio Sr. Antonio Dias de Azevedo para a extineção do imposto do Sal.
Ficaram para segunda leitura.
ordem do dia.
Continuação da discussão, na generalidade, do projecto n." 5.
O Sr. Silva Sanches: — Sr. Presidenle, quando eu pedi a palavra pela segunda vez sobre esla maleria, era minha intenção dar simplesmente explicações sobre alguns dos factos referidos, c algumas das observações apresentadas pelo nobre Deputado o Sr. A. Albano. A isso me limitaria, se por ventura tivesse hoje comparecido o nobre Deputado o Sr. Derramado, que me precedia na palavra, que não deixaria de fazer todas as reílexões necessárias para responder aos illustres defensores do projecto. Não tendo porém elle podido comparecer, não posso eu li-milar-me, como desejava asimples explicações; mas farei por ser o mais breve que possa.
O Governo não deu ainda resposta a nenhum dos quesitos, que eu formulei quando fallei pela primeira vez. Do seu silencio devo, por consequência inferir: primo, que elle não lem a certeza de se poder ainda cortar alguma cousa na despeza : secundo, que não possue os dados estatislicos necessários para fazer uma bôa repartição; isto é, que não sabe quaes sejam os produclos da riqueza agricola ou predial, industrial e commercial, liquides de Ioda a despeza: nem qual seja actualmente a população do paiz. Por conseguinte muito mais evidenle se torna a inopportunidadc da medida ; e portanto, Sr. Presidenle, insisto ainda em que a necessidade da sua discussão de nenhum modo se pôde demonstrar. !
E não se pôde demonstrar, porque esla discussão não devia ler vindo ao Parlamento, senão depois de discutido oorçamenlo das despezas, porque só depois da fixação destas se pôde achar o quanto é indispensável exigir aos contribuinles.
Isto é doutrina corrente; mas como o nobre Deputado o Sr. A. Albano, para demonstrar que não era nova a adopção deste systema sem dados estatislicos, Vo,.. 3.°—Março —184i.
nos citou o procedimento da assembléa constituinte de França; e como, se algum de nós podesse duvidar disso, elle se valeu da auctoridade de Maçarei, também eu me vou servir da auctoridade de Maçarei para fortificar o principio que acabo de estabelecer, islo é, que. esta discussão não devia ter vindo ao Parlamento, senão depois de discutido o orçamento da despeza. Diz elle: as contribuições devem ser exactamente calculadas sobre as despezas, como as despezas devem ser rigorosamente calculadas sobre as necessidades reacs do Estado. Todo o excedente exigido ou extraviado seria uma depradação, e o abuso mais criminoso da confiança nacional. .
Como poderemos nós, Sr. Presidente, calcular as despezas, sem lermos discutido o seu respectivo >or-çanienlo, ou sem lermos investigado quaes sejam as necessidades reaes do Eslado? E sem lermos exactamente calculado as despezas, como se quer constran-ger-nos a que fixemos a contribuição directa? .
Isto basta para levar á evidencia o principio estabelecido ; e até porque o illustre Depulado o reconhece; e alé porque nenhum dos que votaram contra o adiamento, e dos que tem sustentado este projeclo, deixa de reconhecer que islo é uma verdade.
Ha comludo uma observação, que por tal modo faz palenle a nenhuma urgência desla lei, que julgo do men dever submeltel-a ainda á consideração da Camara. Esta observação, Sr. Presidenle, é que a contribuição pela cifra marcada no projeclo que se eslá discutindo, não é cobravel senão em 1847 para 1848! Eserá urgente uma tal lei? E precisamos nós de volar já uma receila, que só se pôde arrecadar em 1847 para 1848?! Daqui amais quinze mezes ?! ! Quer dizer, findo o anno económico, que principia em julho seguinte?! ! Seria necessário recorrer-se já á discussão desla maleria?! !
Mas permilla-se-me, mas cumpre que eu faça a demonstração do meu enunciado; e a demonstração é muilo simples. A. decima, e bem assim o imposto de repartição de um anno não é, não pôde ser receita senão do anno seguinte aquelle, em que se venceu, porque só no anno seguinte ao do seu vencimento é que é, é que pôde ser arrecadavel. Tal é o"que se tem seguido sempre enlre nós, o que. está determinado em lei, e o que não pôde deixar de se seguir • agora. Pois qual é a receila pela contribuição directa que o Governo está auclorisado a arrecadar neste anno económico de 1845 a 1846? É por ventura a do imposlo ou decima de repartição delerminada na lei de 19 d'abril do anno passado?
Não, Sr. Presidente, não; porque a lei do orçamenlo demonstra evidentemente o contrario; e porque em nenhuma oulra lei se determina, quando deve arrecadar-se. essa contribuição, que no anno passado foi votada.
Quanto á lei do orçamento, (mappa n.° B) que é o que respeita á receila do anno económico de 45 a 46, ou do que ha de findar em 30 de Junho — diz ella no § 2."— decima predial, industria, e de juros 1:308:929:000. — Aqui está pois, Sr. Presidenle, a receila da contribuição directa que n'esle anno se pôde cobrar, com os mais impostos que di-

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reclomente sc cobravam, que vào ser substituídos pelo da repartição, e sc acham enumerados no referido § 2.°, e todos estes impostos são os que se venceram em 1844—1845, como expressamente declara a citada lei do orçamento cm o art. 7." que diz assim —É o Governo auclorisado a mandar proceder ao lançamento e arrecadação da decima e impostos annexos do anno económico dc 1844—1845 — E então quando é que se hão de arrecadar os de 1845 — 18461 Não será, nâo deverá ser uo anno económico que principia em julho, no de 1816 — 1847?
É verdade que no orçamenlo para este diclo ánno, lia pouco apresentado a esta Camara, em vez da cifra de contribuição de repartição votada o anno passado, vem proposla a do projeclo que eslá em discussão. Mas qual ha de ser o resullado d'isso? É que ao de.Jicil de 35 contos, que apparece já no orçamenlo, deve addicionar-se ainda o de 175 por que em igual quanlia é a cifra, que se votou o anuo passado, inferior á que se tracta de volar, e que não pôde ser receila, senão do anno económico de 1847 para 1848, sendo-o aquella no de 1846 para 1847.
Nenijpenscm os illustres Deputados, que eu, insistindo Eslá portanto demonstrado: 1.° que o que na lei do orçamenlo do corrente anno ecomomico representa a receila da contribuição directa, é a decima e os impostos annexos de 1844 a 1845. 2." que a cifra de 2369 conlos de decima de repartição, vola-do na lei de 19 d'abril de 1845, ha-de ser, e só é receita do anno económico de 1846 a 1847. 3." que a quanlia que pela mesma forma sc pede no orçamento para o próximo fuluro anno económico, é uma cifra que de lá se deve eliminar, subsliluin-do-a pela já decretada. 4.° finalmente, que a cifra,' que nós estamos discutindo, embora se vença no anno de 1846 a 1847, é e somente pode ser receila cobravel e arrecadavel no de 1847 a 1848. Se isto assim não e', os illustres depulados que defendem o projecto, me contradirão. Entendo, comludo, que elles o não podem fazer, que para fazel-o nenhuma razão podem adduzir.
Mas d'aqui necessariamente resulta, que nenhuma urgência, nenhuma inevitável necessidade havia de traclarmos já d'esle assumpto. Porque, pois, se nâo seguiria, porque se não ha-de seguir a ordem natural, discutindo-se primeiro o oiçamento da despeza, e avaliando por elle nS necessidades reaes do PkssÃo n.° 5.
Eslado? E se ainda não examinamos, se mais reducçôes podiam fazer-se na despeza, se ainda se não mostrou ser impossível rcduzil-a a menos, como se pôde justificar de indispensável a somma que se quer pedir aos contribuinles ? Se dados nenhuns lemos para calcular até onde se estendem as suas faculdades, ou qual seja a sua renda colleclavel, como se pôde sustentar, que elles podem pagar tal somma, e que juslo seja o cxigir-Iha?
Disse o illustre Depulado, o Sr. Albano, que em 1791 a Constituinte estabelecerá em França esle mesmo systema, sem ler collegido dados estatislicos, porque eu lenho instado; e o Sr. Roma que ainda agora os não ha em lodos os departamentos de França. Tudo isto é verdade. Mas, por ventura, o nosso, systema tributário de até hoje pódc comparar-se com o que então existia em França? Lanem havia systema tributário. Não quero dizer com isto, que lá não houvessem tributos. Ilavia-os, e muitos,; mas não havia systema tributário, nem syslema de arrecadar os tributos, que estavam decretados.
Havia muitos tributos, como eram a decima parle dos fruclos; não o designo pelo nome de dizimo, porque este ainda era^diverso. Havia o vigessimo; o taille, ou o imposto pago pelos que nâo eram nobres, nem ecclesiaslicos, ou que nâo gozavam de izeuipção alguma. A capitação, que era lançada n Cida individuo: a gabclla, que consistia em ser cada fainilia obrigada a lirar dos selleiros do Eslado, por um preço ordinariamente exorbitante, uma certa quantidade dc sal para cada individuo. O traitc, ou os direilos exigidos á entrada, e á sabida do Reino; e mesmo os estabelecidos na linha de separação de certas províncias. O doinaine aVoccidcnt, ou direilo de Ires por cenlo sobre todas as mercadorias que vinham d'America. O sous pour livre: as cor-vées, ou o imposto pago em trabalho, com que os paizanos, islo é, os que não eram nobres, Unham de concorrer para a conslrucçâo e conservação das estradas. A main-morte que era de duas espécies, direito de mão morla territorial, e direito de mão niorln pessoal: e muitos outros que não referirei, por não cançar a altençâo da Camara, limitando-me a dizer , que chegavam ao numero de 22. E d'estes 22 tributos uma parle não pesava senão sobre os que não eram nobres, nem ecclesiaslicos, nem privilegiados: c alguns não pesavam em todas as províncias, como por exemplo a gahella, pois havia províncias que nunca a tinham pago, e outras que já a não pagavam, porque para deixarem de u pagar deram por junto uma certa somma.
Quanlo á cobrança dos tributos eslava ludo no mesmo cáhos; parte d'elles andava arrendados; havia um arrendamento geral por uma'certa somma; oulra parte era recebida por recebedores geraes.

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cessidade de decretar, d'ensaiar algum, também cu seria dc voto,' que decretássemos o melhor, e que por elle principiássemos o ensaio em matéria de tii-bulos. Mas, tendo nós um systerna liibutario conhecido ha tanto tempo no paiz, syslema n que os povos já estavam habituados, não ha razão alguma para que cllc seja substituído, sem lermos dados alguns estatísticos, os que são indispensáveis para bem se regular este objecto.
Quiz o Sr. Deputado supprir a falta dos mais importantes dados estatísticos pelo da população; e é faclo que o da população é um dos dados necessários para a boa distribuição deste imposto. Certo é também que, na falta de outros, se pôde por este calcular a somma da contribuição. Vejamos, pois, como o nobre Deputado fez o seu calculo.
Disse elle — que a nossa população montava hoje a tres milhões, e quatrocentas mil almas. — Sobre islo já eu tenho uma pergunta que fazer ao illustre Deputado, e é: esles tres.milhões e quatrocentas mil almas são só a população do Continente, ou compre-hende-se lambem n"elles a do Archipelago dos Açores? Acho que o nobre Depulado só computaria, ou deveria computar a população do Continente. Debaixo deste ponto de vista calculou elle que a riqueza do paiz deve ser de 86 mil contos de réis; e d'ahi lirou por conclusão, que a decima correspondente eram 8/600 conlos de réis, e que po"r conseguinte, a verba pedida é muilo menor, do que a que se pôde, ou poderia pagar.
Assim argumentou o illustre Deputado. E suppu-nhamos que tudo assim era, oh que é tudo assim : suppunhamos' que eram, ou que são verdadeiras as bases do seu calculo: pergunto eu, pagarão os contribuintes só os 2/545 contos de réis, que se lhes pede por este-projeclo ? Pois não monta o orçamento da despeza a onze mil conlos ? E quem paga estes onze mil contos, não são elles? E é só a despeza que vem uo orçamento que os contribuintes pagam ? Pois quem é que paga para os parochos? Quem paga ás despezas das obras municipaes? Quem paga para a sustentação dos expostos? Quem é que paga ao medico, e ao cirurgião de parlido? Não são os povos, não são os mesmos contribuintes, a quem se pedem os 2/545 conlos? Não são aquelles mesmos que pagam os onze mil contos do orçamento da despeza ? E não é certo, que nesle orçamento não entram as despezas municipaes, nem as parocbiaes ? Pôde, portanto, di-zer-se que o dobro, ou mais, do que disse o illuslre Depulado, vem a pagar os contribuintes.
Pois que! Quer V. Ex.a saber quanto elles pagam só para os parochos? Do muilo bom mappa estatístico das Côngruas dos parochos no anno de 1839 a 1840, feito na Secretaria d'Eslado dos Negócios Eccle-siaslicos e da Justiça, consta que pagam 322 contos de réis:. Repilo, pois que, ainda calculando como calculou o illuslre Depulado, os contribuintes não só pagam o que elle disse que poderiam pagar, mas muito- mais.
Comtudo a minha queslão agora é se é justo que se peça aos' Contribuintes aquillo, que se não sabe se elles podem' pagar; e não se sabendo também oque se deve1 pedir-lhes, visto que não está fixada a despeza do Estado"; que-nem juslo, nem de modo algum justificável seja, parece-me te-lo assaz demonstrado; c os próprios, defensores' da medida o lêem reconhecido1. Passarei,- por isso a traclar'da questão da op-Sr>*io n.° 5.
portiinidade, quoe' a nossa outra e principal questão. 1\ serão, na verdade, estas as circumstancias de se experimentar, o pôr em execução o systerna da decima de repartição ?
Disse eu que me não parecia ser agora a occasião opporluna, porque a miséria do paiz era muito maior agora, do que em 1842; e demonstrei-o dizendo, que o preço dos géneros era presentemente muito inferior ao d'enlão: que na proporção da infimidade do preço dos géneros diminuía o valor da propriedade; o que na proporção da diminuição da propriedade empobrecia o paiz.
Respondeu-se-me: 1que os productos tinham dobrado ; c que lanlo imporlava ao proprietário vender 30 alqueires de trigo a 600 réis, como 60 alqueires a 300 réis! ... Porém, Sr. Presidenle, a agricultura, desde 1842, se não leni diminuído, por certo que não tem augmenlado. Islo é tão geralmente sabido, que supérfluo seria o demorar-me a prova-lo. Conseguin-lemente permanece em toda a sua força a minha proposição de que o paiz eslá já mais pobre, do que em 1842. Admillirei, que os productos até esse tempo duplicassem ; ainda assim não tiro eu deste principio a consequência que delle tirou o illustre Deputado, que tal argumento produziu, porque ao proprietário não vale o mesmo vender 30 alqueires de trigo a 600 réis que 60 a 300 réis. Senão, diga-me o Sr. Depu-i lado: as despezas de sementeira, cultura, e colheita de 30, ou 60 alqueires, são por ventura as mesmas ? E se as dos 60 alqueires são inquestionavelmente maiores, não é lambem inquestionável', que maior deducçâo ha a fazer no seu produclo, e que o liquido para o proprietário vem, por conseguinte, a ser menor ?
2." — O Sr. A. Albano recorreu a dados estatísticos, pelos quaes quiz mostrar, e mostrou, que o nosso paiz de 1814 até 1819 importou géneros de primeira necessidade no valor de mais 20 milhões de cruzados; e que hoje não só os não importa, mas que alé pôde exportar alguns. Todavia, Ioda a Camara sabe, que também então circulava, e havia em Portugal incomparavelmente mais dinheiro do que ha e circula agora. Além disto: estando nós em 1846, ou a 27 annos de 1819, para que os dados estatísticos do illuslre Deputado provassem conlra o que eu avancei, cumpria e era indispensável que elles fossem mais próximos de nós, ou desta nossa época. Convinha que elle nos argumentasse com os de 1836 ou de 1837 para cá, porque ein virtude das mui benéficas medidas, das medidas salvadoras da primeira Dictadura, é que a agricultura teve um grande desenvolvimento, e este desenvolvimento em 1836, e ' 1837 tinha- quasi chegado ao seu auge.
Quero que ainda se augmenlasse em 1838 até 1840, ou 1841. Ahi é que eu queria, é que era mister que se fossem buscar os termos de comparação; e é comparando o estado do paiz nesse tempo com o de agora, que eu vou mostrar, ou antes ratificar, que a miséria agora é muito maior.
Para sc calcular a importância da contribuição de repartição tomou-se por base a cifra do orçamento de 1841 para 184*2. Pois para se mostrar a grande differença entre o preço dos géneros, lambem compararei o que elles lêem presentemente com ó que tinham em junho de 1811.

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Tejo a 520. E a como está hoje o trigo em uma e outra parle ? Em Lisboa está (a bordo) por 320 a 340, e no Alérn-Tejo a 260 ! Assim desde o anno de 18*11 até ao presente tem o preço dos géneros descido a metade, do que enlão era; e é incontroverso que não têem duplicado as producções: quando muito conservam-se na mesma. Ora, se desde 1811 não tem duplicado a producção do género, se quando muito ella se conserva no mesmo gráo de quantidade ou abundância; e se, entretanto, o preço dos géneros tem baixado a metade, não se segue que lambem a riqueza tem diminuido a melade, do que enlão era ? Poderá conlestar-se esle resultado, sem se destruir o principio de que elle dimana? E pôde o principio refular-se ? E será pois esta a occasião opporluna para se ensaiar esle syslema?... Calculando mesmo que pela contribuição de repartição se não exija actualmente, mais do que pelos impostos directos se exigia em 1841, e quando o paiz está do-bradamente mais pobre, que poderá, deverá, que será justo exigir-se-lhe tanto como quando elle era o dobro mais rico? Eu entrego esta consideração á Camara.
Eis-aqui, Sr. Presidente, os motivos, porque eu entendi da primeira vez quefallei sobre esta matéria, e porque entendo ainda agora, que não era esta a occasião de discutirmos o projecto de lei que nos oc-oceupa, e muito menos a de se ensaiar o novo systerna.
Sr. Presidente, o illuslre Deputado que hontem fallou, que lanlo, ecom tanta rasão allrahiu aallen--ção desta Assembléa, porque o seu discurso foi muitíssimo luminoso, rico de judiciosas observações, e abundante d'argumenlos para suslenlar o syslema, em que elle lalvez tenha uma grande parle; esse illuslre Depulado discorreu largamente sobre a preeminência do syslema; e escusado era cançar-se em a lornar evidente, porque ella é inquestionável, sendo somente sobre a occasião de se pôr em pratica o systerna, que nós disputámos.
O illustre Depulado pretendeu igualmente demonstrar que as injustiças que alé aqui se praticavam no lançamento da decima, e dos impostos annexos, não ião praticáveis pelo novo systerna. — Pode ser que haja alguma differença para menos, pode ser que em tão grande escalla se não possa commelle-las; mas i> certo é que para ellas ainda ha campo immenso, nem desgraçadamente podia deixar de o haver. — Eu notarei dois, ou Ires casos que me occorrem, em que para se fazerem injustiças fica Ioda a latitude. ¦ O primeiro é o da contribuição predial. Esta ha de ser calculada sobre a avaliação dos prédios. E na avaliação dos prédios, ou da renda delles, não pode haver e não fica todo oarbilrio?... E por esle meio, na repartição da contribuição predial, não se podem fazer as mesmas injustiças, que se estavam fazendo alé aqui ?
Quanto á distribuição do maneio ha igualmente outro meio de se fazerem injustiças; porque desta contribuição são isentos os indigentes, e os jornaleiros, compelindo ás Camaras Municipaes e aos com-missarios do Governo o classificar quaes elles sejam. E nesla classificação não se podem também fazer grandíssimas injustiças?... Não se pode classificar como indigente quein o não seja, e deixar de classificar quem effeclivainenle o seja ?...
Da contribuição pessoal são isentos os mesmos in-SessÃo n.° 5.
dividuos, e o meio de os classificar é o mesmo, eha, por consequência, a mesma facilidade de se praticarem injustiças na repartição delia. Quanto á taxa das profissões, ahi decerto senão podem fazer tantas injustiças, como sc faziam até aqui; porém muitas, e muitíssimas se podem ainda fazer, porque pode ser collectado no máximo quem o devesse ser no mínimo, e no mínimo quem o devesse ser no máximo. E se, desgraçadamente, a repartição fôr feita, corno a decima tem sido lançada, mais favoravelmente para os individuos da mesma côr politica das Juntas, e mais pesada para os de diversa côr, sem sealtender ássuas faculdades, digo, se ella assim fôr feita, ficaremos em muito peor eslado. — Estimarei que isso não aconteça, estimarei que nem unsnem oulros paguem mais, nem menos, do que lhes pertencer pagar; mas é de recear que tão revoltante abuso não cesse, porque pelo novo syslema lambem se podem continuar a fazer estas injustiças.
Resla-me responder a duas reflexões, que o mesmo illuslre Deputado, o Sr. Roma, fez no fim do seu magnifico discurso. Mas.,., agora me occorre uma observação, que me ia escapando, e que não é das de menos importância sobre a inopportunidade de se ensaiar agora este systerna. Fa-la-hei, pois, antes de tudo. Calculou já o Governo a quanlo montam as despezas da inscripção das malrises para a decima de repartição ?... Epara me servir da expressão mais conhecida, tornarei a perguntar: calculou já o Governo em quanlo importa.a despeza do lançamento deste novo imposto de repartição?...
Eu já vi um calculo, que se publicou, eque os Srs. Depulados puderam também ler visto: éo do que imporlará esta despeza no concelho de Bragança. — Diz-se n'elle que os impostos extinctos pela lei de*^ d'abril importaram alli, no anno de 1844—1845, em onze contos e tantos mil réis; e calculando-se as despezas da inscripção das matrizes pelos emolumentos que a lei concede aos commissarios do Governo, e ás mais pessoas encarregadas destes trabalhos, af-firma-se que sobem a sele contos e tantos mil réis, de sorle que tirados dos onze mil viriam a entrar no Thesouro somente qualro contos e lantos mil réis!
Deste modo, pelo novo methodo não chegaria a enlrar no Thesouro mais, do que um terço dos impostos; e o cerlo é que para este calculo se tomou o « termo médio dos emolumentos, que pela lei são concedidos aos commissarios, e a Iodas as mais pessoas que hão-de servir na inscripção das matrizes, não contando ainda os que devem ler os informadores. Por tanto, parece-me que tal calculo não será exaggerado.
Mas eu quero que o seja, e muito: eu admittirei por hypolhese que elle esteja exaggerado em melade, e que a despeza importe só em tres conlos e tantos mil réis. Sobre este calculo, partindo do principio de que para se pode:em repartir onze conlos de contribuição em cada concelho, excepto Lisboa, e Porto, tem de se gastar tres contos, ou menos de metade do calculado para Bragança, sabe V. Ex.a em quanto importam as despezas do lançamento? Em 895 conlos de réis.'!! E será esta a occasião, em que por tal custo se possa e deva ensaiar este syslema ?... Um syslema, em que vamos gastar, só para o lançamento, esta enorme soinma ?...

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lado, reduzindo assim as despezas do lançamento a somente á quarta parte do calculo, que me serve de fundamento. Ainda assim ellas importarão em 417 conlos! !!
E note V. Ex.a e a Camara, que ainda não está deduzida a despeza da arrecadação!!!
E será esta a occasiâo, em que nós devamos fazer pagar aos contribuinles 447 conlos só para lhes ser lançada ou feita a repartição do imposto ?... A Camara o decidirá.
Sr. Presidenle, um dos argumentos de que se serviu um illuslre Deputado, o Sr. J. J. de Mello, para atlenuar a grande falta, que eu notei de numerário nas províncias, e nos dar esperanças de subida no preço dos géneros, foi — que os capilaes estavam no seu fluxo para Lisboa, que haviam de ler o seu refluxo para as províncias, e que então o preço dos géneros haviam de tornar a subir. Mas, não deveria, o illustre Depulado indicar logo o meio de fazer com que esse refluxo começasse o mais cedo possivel ? Eu entendo que esse refluxo ha de vir; mas quando ha de vir ?... Quando a geração presente lenha desap-parecido, e eu desejaria que o podessemos conseguir quanlo anles.
O oulro illustre Deputado que honlem fallou — o Sr. Roma — apresentou a queslão de tal modo, que eu subscrevo a quasi todo o seu discurso, com pequenas excepções. Dina delias é a parle, em que se esforçou por moslrar, que o paiz não estava tão pobre como se havia dilo. Paia ver se o conseguia, fallou de algumas classes separadamente de oulras, e disse que os jornaleiros senão achavam no eslado de miséria que se linha descriplo. Não o duvido, vislo que se concedeu, que o seu jornal é agora maior, por se ter augmenlado o trabalho. Mas já se viu muilo embaraçado, quando quiz demonstrar, que os cultivadores lambem não eslavam no estado de penúria. Para isso já recorreu a que elles necessariamente haviam de ter obtido dos proprietários diminuição das lendas que antes lhes pagavam. E comludo é certo, e lodos sabem, que semilhanle abatimento, ainda que se tenha feilo, não é, não pôde ser em tal ponto, ipie os cultivadores colloque no mesmo estado, em qua se achavam anles da grande diminuição do preço dos géneros. Agora, pelo que toca aos proprietários, nem toda a força do seu génio descobriu meio algum de os pintar em medíocre prosperidade. Não, não pôde deixar de reconhecer, ou de deixar sentir, que a sorte delles é actualmente peior. E a classe dos proprietários, na balança da riqueza nacional, não avulla muito mais, do que as dos cultivadores e jornaleiros?
Quanlo aos meios, que indicou, de promover o augmento do preço dos géneros, eslou d'accordo, e principalmente no que respeita ao desenvolvimento da industria fabril pelo auxilio dos direilos protectores. Já os vimos decretados, e não contribuíram elles pouco para o tal ou qual incremento da nossa industria. Mas não se descançou, em quanlo não foram abolidos; e não creio que por essa abolição o rendimento haja subido.
Sr. Presidenle, está demonstrado pela experiência de lodos os paizes, que os excessivos direitos fazem diminuir os rendimentos, que delles se querem haver. Quando enlre nós não tivéssemos exemplos desla verdade, linha-mo-Ios na reforma feita pelo primeiro minislro de Inglaterra, ha dois ou tres annos, naquella, Vol- 3.°— Março — 1846.
pela qual elle diminuiu os direitos sobre vários géneros, resultando da diminuição grande augmento de receila. Tinha-mo-los na historia financeira do Império Britânico, cscripla pelo Sr. Pebrer, obra amais rica que eu tenho vislo em dados estatísticos, e na qual vem referidos milhares de exemplos de ler a diminuição de direitos produzido augmento de receila, por isso mesmo que diminue muilo no contrabando. É, pois, sem duvida este um meio, de que se pôde com proveito lançar mão.
Oulro, e conforme o illuslre Deputado entendeu, o principal para se promover o desenvolvimento da industria fabril, e o de se lhe facilitar a compra, pelo mais baixo preço, das matérias primas; e para isto se realisar deu elle como indispensável a necessidade de s'excluir o Governo da concorrência no mercado do dinheiro.
Por esta forma o Sr. Deputado veiu á grande causa do nosso mal, concordando em ser aquella que eu apontei da primeira vez que fallara. O illustre Depulado ha de achar lodos os membros deste lado promplos a secunda-lo nessa principal medida da organisação de nossas finanças, na exclusão do Governo do mercado do dinheiro. Mas, pergunto eu: tem o illuslre Depulado a confiança de que a aclual Administração possa ser excluida da concorrência nesse mercado? Pergunto á Camara: tem ella plena confiança em que a Administração aclual seja excluida do mercado do dinheiro?
Se a tem, deve apoiar o Ministério, e convencer-nos de que se ha de com elle chegar a esle resultado que lambem enlão nós o apoiaremos. Se a não tem, a Camara, apoiando a aclual Administração, concorre para aggravar mais e mais o grande mal que nos af-llige, a causa principal, e, pode dizer-se, a única, da desorganisação das finanças.
Ora eu, desgraçadamente, não tenho, não posso ler, não digo já plena ; mas nem mesmo alguma confiança em que o Ministério aclual possa ser excluído da concorrência no mercado do dinheiro. E porque a não posso ler? É por supposições? Será por animosidade, ou espirito de parlido? Não, Senhores; é porque os seus precedentes me dão lodo o motivo, motivos de sobejo para entender, para esperar que tal não é possivel.
Desde que existe a aclual Administração sempre ella tem tendido a esse desideratum, segundo nos tem constantemente dito; e sempre nos tem promel-lido a sua realisação, e sempre esla havia de ser o resultado de cada medida, que ella tem vindo propor, e sustentar para levantar dinheiro. Mas não serei eu quem diga que ella tem feilo essas promessas. O próprio Governo o vai dizer, porque eu hei dere-petir suas próprias palavras.
Sr. Presidenle, no fim de 1842, estabeleceu-se o actual Ministério em dictadura, porque fechou as Coites que tinha convocado para 20 de novembro, e principiou a legislar, creio que a 15, 4 ou 5 dias antes daquelle, em que ellas se deviam reunir! Atacado por esle seu procedimento em janeiro de 1843, sua justificação reduziu-se a que todas as medidas que tomara, foram para economisar; e que era imperiosa a necessidade das economias, para oGoverno se desembaraçar de receber o dinheiro das mãos dos capitalistas. Eis-aqui o que elle então dizia.

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é que estava o agio e a usura ás portas do Thesouro.....Estaria Catilina ás porias de Roma, quando,
no momento em que aqui se tractasse de crear uma receila de cem contos de réis, se estivessem no Thesouro lançando d rua muito maiores sommas ? .... E havíamos de eslar sempre neste circulo vicioso, perdendo centenas e centenas de contos de réis em operações, que era impossível impedir ?... . Eis-aqui justamente aquillo, deque nós quizemos livrar o Thesouro, na certesa de que, em quanto o Governo não estiver emancipado, é impossível governar-se em Portugal.....
Libertar as alfandegas e o contracto do tabaco deve ser o segundo objeclo para completar o systema do Governo.... Havemos de cobrar os nossos rendimentos directamente das origens donde elles procedem, sem ser necessário recebe-los pela mão de terceiras pessoas. Sem chegarmos a este desideratum não é possivel haver governo.
Bem; o Governo entendeu então, que devia legislar para fazer economias, porque delias resultava, nle'm da sua grande conveniência, a outra infinitamente superior de se livrar o Estado de perder centenas, e centenas de contos de réis em repelidas operações, habililando-se elle a receber directamente os impostos da origem d'onde provém.
Pouco depois, disçulia-se uma medida que tendia a auctorisar oGoverno para levantar 900 conlos sobre o Contracto do Tabaco; e ainda então o Governo disse — uA intenção do Governo é muito simples: é applicar estes 900 contos para desobstruir as Alfandegas, e o Contracto do Tabaco, e para se apoderar daquelles rendimentos que lemos legalmente, e dos quaes não estamos de posse... Agora se se concederem estes 900 contos, o Governo vai desobstruir essas fontes de receila; e desobstruídas ellas ha de pagar com o que tiver. m — E qual foi o resultado destas pomposas promessas, destas expressões lison-geiras, em que a maioria então acreditou? Foi que a 25 de novembro do mesmo anno vinha oGoverno pedir auctorisação para continuar a obstruir as fontes da nossa receita, porque a tanto equivale o pedir, como" pediu, que o auctorisassem a levantar sobre cilas mais 700 contos!
No seu relatório de 30 de junho de 1844 dizia o Governo —para que o Thesouro marche com regularidade é necessário desembaraça-lo dc toda a qualidade de pagamentos que não sejam os da despeza corrente... e em quqnlo não chegar esle desideratum mal pôde esperar-se uma boa administração de fazenda, e muito menos o credilo que pertence a uma nação de tantos recursos como a nossa.— Na sessão de 25 de outubro desse mesmo anno, sustentando oGoverno esla sua medida, disse—De que... se havia o Governo de oceupar primeiramente ? De fazer possivel a administração publica, porque a administração publica não podia marchar sem se pagar, e não havia para a despeza necessária. O decreto de 30 de junho satisfaz a este pensamento plenamente— Parece-me que estas sommas devem convencer o illustre Deputado, que não ha falha no plano, e que os quatro mil conlos hão dc chegar (querendo Deos) para desassombrar as receitas do Thesouro, e que o Governo com essa receita desassombrada pôde fazer a sua despeza.
E, Sr. Presidente, de promessas tantas vezes feitas o que tem resultado? Em que eslado estamos nós? SkspXo n.° 5,
Do empréstimo dos 4 mil conlos cm 1844, das mais medidas que, se adoplaram em 45 devia infalivelmente resultar o desideratum, que o Governo eslá promettendo ha tanto tempo. Assim o esperava, e affirmou elle, quando disse que o decreto de 30 de junho satisfazia a tal pensamento. E como tem elle sido satisfeito ? Em que estado estamos nós? Estamos no estado de não poder abrir-se um só pagamento, sem se fazer uma operação, ou um empréstimo...! E se isto não é verdade, os Srs. Ministros podem desmentir-me.. . .
Nos fins de 1844, e princípios de 45, vnngloria-vn-se o Governo de ler podido, e de poder levantar dinheiro ao par, e com só o juro de 5 por cento. E a como o levanta elle hoje? A como? A 10 e a 11 por cento; e cusla-lhe a encontra-lo! ... Mas, para não lhe chamar juro de 10 e dc 11, diz-se que é com o premio de 6, e a commissão de 4! O certo é que li e 4 fazem 10; e que 10 por cento é que o Thesouro ha de pagar sobre a somma que receber! E já depois, se eu estou bem informado, lhe foi necessário elevar mais, ou o premio a 7, ou a commissão a 5; quero dizer, que já somente ali por cento pôde agora levantar dinheiro! !!
Aqui está pois o desgraçadíssimo estado, em que nos achamos: tal é o desideratum a que nós lemos chegado, bem diverso, na verdade, daquelle, a que devíamos ter chegado ha muito lempo, segundo as promessas feitas pelo Governo! E nem eu ainda incito cm linha de conta, que as receitas se acham já quazi tão sobrecarregadas, como o estavam em 30 de junho de 1844, porque isso é a consequência natural do que acabo de dizer. E esle premio que o Governo é obrigado a dar pelo dinheiro, ha de ír lalvez anniquillar aquelles mesmos, que alé aqui o teem sustentado.... Para bons entendedores talvez não sejam necessárias mais explicações; e dc certo que eu tenho por conveniente não dar agora mais... Mas, se por ventura quanlo anles senão pozer um termo a este desgraçado estado, elles hão de ser vi-ctimas do muito que o tem auxiliado alé aqui...
Ora, se tal tem sido o resullado das promessas do Governo; se tal tem sido o resullado das medidas organisadoras que o Minislerio nos está apresentando desde 1842, e que deviam, segundo elle assegurava, ler produzido a definitiva organisação da fazenda; se desde que elle no-la promelle, e que suas promessas se frustram, tem decorrido quatro annos; se em quatro annos nâo temos visto senão parecer desaggra-var n'um dia para aggravar mais e mais no outro: não ha razão demais para se concluir affoutamente, que com a aclual administração não é possivel chegar ao grande desideratum de excluir oGoverno da concorrência no mercado do dinheiro; e que por consequência de certo senão pôde, continuando ella, conseguir pelos meios apontados o desenvolvimento da industria fabril, e por este o augmento no preço dos géneros ?
Concluirei com uma simples observação ácêrea do que lambem disse o illuslre Deputado, o Sr. Roma, no final do seu discurso.
Disse elle, que d'enlre as causas que concorriam para a conservação do actual Governo, a principal (O Sr. Roma:—A principal não; eu disse uma delias). O Orador: — Pois bem;, uma delias era o terror que inspiravam seus inimigos.

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tndos nos bancos da opposição uns poucos de individuos que teem estado no Poder] E nào deram elles, quando estavam no Poder, mais que sulTicicntes garantias de respeito á fé dos contractos? Não o sabe, talvez melhor do que ninguém, o illustre Depulado que honlcm fez esta observação? Não sabe elle lambem, que aquelle mesmo que agora sc acha fallando nesta Casa, fez quanlo pôde, e quanto devia para que senão faltasse aos contractos? Qne receio pôde, pois, elle e os mais amigos do Governo, ter de que os membros da opposição que se acham nesta Casa, ou aquelles que ella representa, faltem á fé dos contractos legalmente feitos?
Terá também elle medo de que sejam esles membros da opposição que promovam revoluções? Pois não deram lambem elles mais que sufficicnles garantias, quando Poder, de que eram inimigos capitães delias, e que tinham coragem para as combater, e «pie as combatiam, apparecessem ellas d'onde appa-cessem, fizesse-as quem as fizesse? Que medo pôde, pois, haver a este respeito?
Isso, Sr. Presidente, bem sei que é um dos papões com que se nielle medo a muita gente (permitla-se-me a expressão) mas é tão forte, é tão fundado como (lorno a pedir licença para usar ainda da mesma expressão) como o papão, com que se melte medo ás crianças. Não digo que haja alguns illudidos de boa fé. Porém, .se elles meditarem um pouco sobro qual tem sido o procedimento destes inimigos do Governo, hão de concluir que não é assim; e eu peço meças a lodos sobre quem tenha dado mais provas de querer a manutenção da ordem, de ler por ella feilo maiores esforços. Parece-me vêr um cerlo signal negativo do que acabo de dizer; e a esse mesmo illuslre Deputado que, se me não engano, deu o aceno negativo, a esse mesmo peço meças de qual seja mais amante da ordem ; de qual lenha feilo mais esforços pela sua manutenção.
Sr. Presidente, eu poderia ainda continuar com varias considerações, e tinha realmente desejo de as fazer, comparando as receitas de 1839 com as de 1846, mostrando para que as de então chegavam, e o para que não chegam as de agora. Mas eu já tenho fallado mais; do que tencionava fallar; e não me faltará occasião de poder convenientemente ponderar o que omillo agora.
Concluo, portanto, dizendo que todas as razões que se apresentaram para demonstrar: l.°que não havia necessidade nenhuma de discutirmos agora esta medida: 2.° que não estava demonstrado que a cifra pedida fosse necessária: 3.° que menos demonstrado estava, por conseguinte, o ser justo pedi-la, e até por se não poder calcular se as faculdades dos contribuintes comportam o pagamento d'ella: e 4.° que não é esta a occasião oportuna de se ensaiar o syslema da contribuição de repartição: repilo, concluirei dizendo, que Iodas estas razões me parecem subsistir em toda a sua força; e que, por isso, eu sinto muilo o ler de votar conlra o projecto. Mas, entenda-se bem, que votando contra o projecto, não voto conlra o principio: voto unicamente conlra a opportunidade da execução delle, e por se não ter de nenhum modo justificado a necessidade, justiça, e exequibilidade da medida.
O Sr. J. M. Grande (sobre a ordem): — Sr. Presidente, eu não quero interromper a discussão, queria só pedir a V. Ex." que tivesse a bondade de con-SkssÂo n.° 5.
vidar o Sr. Ministro da Fazenda que está presente para na hora da prorogação, quando V. Ex.* entender, ouvir a interpelação que eu desejo dirigir a S. Ex." Se isso fôr possivel hoje, bem; quando não, outro dia será, mas eu já o annunciei ha bastantes dias como V. Ex.a sabe. [
O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros: — Sr. Presidenle, ainda que acabe de ouvir o illuslre Orador, e no seu discurso se achem argumentos, que realmente mereçam toda a contemplação desta Camara; com tudo acho-me nesta questão quazi no estado em que se achou hontem o meu nobre amigo o Sr. Ferrão, porque declaro, que depois da maneira clara, explicita e magistral com que a questão foi hontem aqui Iractada, esla ceara deu o fructo que podia dar: o syslema explicou-se, o regulamento de-monstrou-se que não linha os defeitos que se lhe, queriam attribuir, e a opportunidade também se levou alé á evidencia ; porque se disse : que se tractava simplesmente de marcar as épocas em que se devia fazer a repartição, e a sua somma; e de maneira nenhuma a época em que se devia cobrar: logo, se se não tracta do quando se deve cobrar, segue-se que a maior parle dos argumentos que aqui se lem produzido, não teem muilo cabimento. Se eu estou convencido disto, a consequência necessária era não fallar; mas, Sr. Presidenle, a illuslre comnmsão, que antepoz este parecer ao parecer geral sobre o orçamento, teria a queixar-se do banco dos Ministros, se acaso nesta queslão elles guardassem silencio.
OGoverno, Sr. Presidenle, apresentou o seu orçamento, e não desejava outra cousa senão que o parecer completo sobre este orçamento apparecesse quanto antes por parte da commissão: isto era muilo importante, islo era vital; nem o Syslema Representativo pôde marchar, sem que, entre a apresenlação do orçamento, e a apresentação do respectivo parecer, decorra um espaço muito razoável; mas a illuslre commissão assentou que o orçamento carecia de um exame mais dilatado, e que devia portanto propor desde logo a cifra da repartição: nisto não alterou em nada a lei, nem ha arligo nenhum da Carla, arligo nenhum fundamental, que possa obstar a esta prática. Os dignos Depulados que teem fallado daquelle lado, assim como Ioda a Camara, tem já uma certeza moral, de que se não pôde hoje dar menos ao Governo do que se lhe deu o anno passado; os illustres Deputados teern confessado que a despeza tem augmentado: e ponhamos de parte a accusação que lêem feito aos Minislros de que a teem augmenlado indevidamente: essa questão ha de vir a propósito, quando o parecer do orçamento vier á Camara, e ha de dar logar a demonslrar-se quo esse augmento é todo legal; mas é certo que todos aquelles Senhores teem diclo que a despeza se lem augmenlado. Ora se ha mais despeza, como se pôde imaginar que os dignos membros desia Camara queiram hoje dar ao Governo'menos do que lhe deram o anno passado?! Enlão, Sr. Presidenle, ponha-se de lado todo o escrúpulo, quando se Iracta de votar um parecer, uma quantia para a repartição, que está dentro da cifra que se volou o anno passado.

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scnlu e prolongada ? E não vamos nós adiantando trabalho? Nâo se confessa que é necessário dar a este novo systema de repartição todo o vigor? Os illustres Deputados, quando faliam da vantagem do systema, teem mostrado a grande difficuldade de o levar avante. Pois se lia essa difficuldade, se o Governo tem de se ver hombro a hombio com todos os obstáculos que ha de trazer o novo syslema, porque razão havemos, perdendo lempo, augmentar o numero desses obstáculos? Não me parece pois de razão, e digo que a opporlunidade nâo se pôde contestar: acho que não ha risco algum em se tractar desla questão; acho, Sr. Presidenle, que a illuslre commissão, fazendo um serviço á causa publica, deu uma prova de que tinha confiança no Governo; e, quando ella dá esta prova, o Governo não podia ser silencioso; o Governo não podia deixar de apresentar algumas observações, de concorrer, de ajudar a illuslre commissão a levar o seu pensamento por diante: a illuslre commissão trabalha effectivamente no exame do orçamento; a illustre commissão ha de cumprir, eslou cerlo, quanto anles a missão de que foi encarregada, (apoiados) nem precisa de que a estimulem, nem precisa de que a excitem; Ioda ella tem o zelo necessário para saber quanto interessa ao publico, que se não perca tempo nesta matéria; por que sabemos por experiência que de se perder lempo entre a apresentação do orçamenlo, e a do parecer, se tem seguido por vezes resultados muito falaes.
Eu concordo em muitas asserções que fez o illustre Deputado, o Sr. Julio Gomes, e devo principiar por dizer que se acaso, n'uma ou n'outra cousa, eu discordar da sua opinião, nem por isso ponho em duvida, que o illustre Deputado tem sido um dos membros desta Camara, que maiores serviços tem feito para a conservação da ordem publica, (apoiados) Eu sei; posso altestar; c oattesiarão lodos os meus collegas que se sentam uestas cadeiras, e tuda a maioria desta Camara, que o digno Deputado alé já correu grande risco de vida, pelo» esforços que fez para a manutenção da urdem, (apoiados) Porlanto, só forçado pelo meu dever é que podeiei n'um ou n'outro ponto dissentir das suas opiniões.
Eu tenho ouvido [muitas objecções a esta lei; já o meu illustre amigo, o Sr. Roma, disse, por occasiâo de fallar na bondade ou no prejudicial da lei, que não era agora occasiâo de o fazer; mas como ainda se falia nella, como o nobre Deputado ainda agora alludiu a esse ponto, seja-me lambem permittido dizer que a esla hora, na altura em que a sessão está, eu não esperava ouvir produzir o argumento de que a França estava em muito peior estado do que nós estamos, e lirar-se daqui a conclusão, que nós não devemos agora iraclar da lei de repartição.
Sr. Presidente, tinham outros Senhores posto a objecção a estalei deque nós não estamos uo eslado de adiantamento em que a França estava, e em que a França eslá hoje ; que nós queríamos imitar ludo, sem fazermos o devido desconto ás circumstancias, que eram iodas em favor da França, e todas em prejuízo de Portugal; e agora o nobre Depulado veio-nos dizer que a França, nesse ponto, estava muito peior que nós, quando pela primeira vez decretou o systema de repartição; que estava n'um perfeito cabos, que nâo tinha syslema nenhum de fazenda. (O Sr. Silva Sanches: — Peço a palavra Sessão n.° 5.
para rectificação de um facto). Cu vou repelir o argumento com fidelidade; e se eu não o fizer, o illustre Deputado terá a bondade de me dirigir. O illustre Depulado disse, e não ha minutos, que a Fiança, antes de estabelecer o seu systema de contribuição directa, não tinha syslema algum; linha uma iminensidadede tributos dispersos, mal lançados; aberrações de todos os principias (e muito disio é veidade) ; que, nesse caso, nós não podiamos estar ; que'nesse caso nós não estávamos, porque Unhamos uma decima estabelecida ha muitos annos, e por disposições muito percepli-veis; mas uma de duas, ou se ha de fazer objecção a esta lei, porque nós não estamos no estado de adiantamento em que está a Franç.i, ou se ha de fazer objecção á lei pelo modo porque afez o illustre Deputado; porque nós estamos muito mais avançados (loque eslava a França. (apoiado) Eu procuro só mostrar, que os illustres Depulados que fazem hoje a opposição desla Camara, não eslão conformes, e que a lei ou ha de ser objeccionavel por um modo, ou o ha de ser por outro. (O Sr. Jl. Albano: — Muito bem).
Também o illustre Depulado alludiu a um aiuru-mento que se nao fez senão por termo de comparação. S. Ex.a disse, iractando da miséria ou !não miséria publica: «o Sr. Depulado Agostinho Alba-uo allirmou, que tanto fazia ter cem alqueires de milho ou de tr go, e vendel-os a seis tosiòes, como ler duzentos alqueires, e vendel-os a tres tostões;» e daqui estendeu um raciocínio que parecia que convencia ; concluindo o illustre Depulado por asseverar, que os cereaes não haviam duplicado, como dizia outro nobre Deputado a quem respondia. Ora realmente aquelle Sr. Deputado, a quem elle se referia, nâo tinha estabelecido tal proposição; o meu illustre amigo não podia apresentar uma proposição, que era logo â primeira vista absurda. Pois como havia de dizer o Sr. Agostinho Albano que os cereaes em Portugal haviam duplicado ? Era possivel que tal cousa sahisse do entendimento do illustie Deputado? Não fallou elle. pelo contrario, quando apresentou as suas estatísticas de 1815 a 19 do augmento animal de noventa mil móis, que era o equivalente do que se havia introduzido cada anno de trigo estrangeiro? O que quer pois dizer islo? Quer dizer a subsistência de um mez, não quer dizer que duplicasse. E é pouco quando uin paiz que lem nas subsistências o enorme deficit de um mez em cada anno chega a cobrir esse deficit? Pois havia de dizer o meu illustre collega que os cereaes em seis ou oito annos haviam duplicado? Isto é cousa que se possa acreditar? Sr. Presidente, não sei se me engano; nós lemos uma grande falta de estatísticas, mas não se poderá sabir muilo longe d islo—um terço de moio por cada alma de população—e se islo assim é, é pouco mais ou menos um milhão de moios o que gasta o consumo do Paiz; e se isto assim é, os noventa mil moios, de que fallou o meu illustre amigo, são pouco mais ou menos iguaes á subsistência de um mez, ena verdade em ião poucos annos é um augmento considerável. Por tanto, quando o illuslre Depulado, relator da commissão, apresentou aquelle argumento, de que seis era igual a tres quando o produclo era duplicado, não foi senão como um termo ,de comparação, mas nunca porque se chegasse a persuadir de que a producção de Portugal tinha duplicado nesles dez annos.

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dos objectos, e confesso que e' inuilo desagradável similhante maneira defallar nesta Camara; mas ainda creio que se fez a objecção a esta lei de que hoje se Iracta, de que tínhamos muitos outros tributos que ella não comprehendia: ninguém o duvida, mas o que eu não esperavaé que sc trouxesse para esle ponto as côngruas dos parochos, exclamando-se: sabe V. Ex.% Sr. Presidenle, a quanto monlam as côngruas dos parochos ? (como se fosse uma novidade) em 320 conlos... Pois, Sr. Presidente, felizmente são 320 conlos; e agora perguntarei em quanto importavam os dizimos? Em milhares dc contos: e se importavam em milhares de conlos poderemos nós deduzir dessa cifra, comparativamente pequena, que se dá hoje aos ecclesiasticos que parochiam as igrejas, que ha miséria? Podemos nós tomar isso por umsymplo-ína de miséria, ou aliás por um symploma de vexação dos povos quando assim se dota a igreja tão ra-soavel mente?
Sr. Presidenle, é uma verdade, não aposso negar, que os preços lêem descido; mas é um facto sabido o conhecido de todos que os preços de todas as pro-ducções agrícolas e fabris lêem descido em Iodas as nações curopeas. (apoiados) Eu pedi licença para interromper um illustre Depulado quando elle se lastimava de que o preço ha doze ou quatorze annos era de 500 e 800 réis por alqueire dc trigo, e que hoje se achava a 300 réis, pedi licença para reflectir que, por exemplo, o algodão (e podia apresentar muilos outros géneros, mas n'urn aparte não o devia fazer; muita bondade teve o illuslre Deputado em me admittir esta declaração) que ha poucos annos valia Ires schelings por arraiei estava hoje vendendo-se por quatro pennes, quer dizer pela terça parte do scheling, quer dizer pela sexla parle porque se vendia no anno de 1825, ha pouco mais dc vinte annos. Por tanto o que acontece em Portugal, acontece em Hespanha e em lodos os paizes da Europa, e não só em cereaes, mas cm todos os productos agrícolas e fabris: lodo o mundo sabe, e sabe o nobre Depulado melhor que ninguém, c tem agora relações mais particulares para o saber, que o machinisrno lem feito abater os géneros e manufacturas muitíssimo; mas agora era bem claro que o nobre Depulado me podia responder — porém se assim é, sc esses géneros têem diminuído tanto, enlão os Empregados devem receber um ordenado muilo menor na proporção dessa diminuição; mas islo não é assim em Ioda a sua es-lenção, em primeiro logar os ordenados já lêem descido muilo; antigamente tinha, por exemplo, um Minislro d'Estado 24:000 cruzados, e na época actual tem 7, quer dizer menos da terça parte, e eu poderia agora levar a minha revista muito longe; trazer aqui as altas dignidades ecclesiasticas, a classe judiciaria, e oulras classes da sociedade para provar que os ordenados hoje são muito menores do que os antigos, e senão, um conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça que me diga quanto lem hoje comparativamente com todos os proventos que percebia um Desembargador do Paço; que me diga quanlo faz hoje e quanto fazia em outro tempo aquelle alto funecionario a que corresponde. Mas não e ainda esla a só razão que explica o facto; é preciso também allcnder que nestes ullimos trinta annos a civilisação se tem augmenlado muilo, e com ella os hábitos e commodidades da vida: principiando do pobre jornaleiro até ás classes mais alias todos têem pro-Vol. 3."—Marco —1846.
curado gosar de mais alguma commodidade do que gosavam d'antes; podemos dizer com verdade que rara é a familia por menos abastada que seja, que não tenha em sua casa um ou outro traste demaho-gano, uma ou outra cousa que raras vezes se via em outros sempos; as próprias casas dos nossos antigos fidalgos, apezar das antigas riquezas, apezar doBra-zil, e de tudo, elles que digam se hoje as adereçam com a mesma simplicidade com que as adereçavam em outro tempo, em que as mesas e as cadeiras eram quasi toda a mobília da casa. Ora se a civilisação e os confortos tem augmentado para todas as profissões e classes, principiando das mais humildes até ás mais altas, parece-me que o empregado publico não podia ficar impassível no meio desle adiantamento.
Em maleria positiva realmente pouco poderei dizer, porque os argumentos que se apresentaram rnais forles, foram honlem combalidos de uma maneira tal que não podem reviver. O argumento que se fazia, com apparencia de tanta força, para tirar certas sommas do orçamento, ainda quando isso fosse occasião de sc traclar agora, que não é, esse argumento realmente morreu c enterrou-se; mas não poderei com tudo deixar de fazer uma observação, e é que me parece deplorável que a opposição composta de tantas capacidades, e não digo já a actual, mas as que tem havido nesla Camara, porque en as respeitei sempre, e sempre tive muita satisfação de trocar os meus argumentos com os dos principaes membros dessa opposição, alguns dos quaes sinto muito não vèr hoje nos seus logares, digo, que esta opposição lem um vicio, e perdoo-me ella, que não pôde ser do Syslema Representativo; porque ufanarem-se de lerem sido os auclorcs de uma medida, e logo que essa medida é adoptada pelo lado direito da Camara, ou p«lo Ministério que o representa, lorna-se essa medida immediatamente má, isto repito, não me parece que esteja comprehendido nos limites do Sys-tema Constitucional, e digo mais, não é o que vemos praticar em nações muilo florescentes que nos podem dar lições do Systerna Representativo. Os illustres Deputados disseram traclando-se de estradas, não ha nada mais digno de allenção, não ha nada que mais possa concorrer para o desenvolmento da riqueza do que ter estradas; a opposição ndiantou-se a propor o seu plano, e deu o seu contingente como o pôde dar, a direilo também, o Ministério que então tinha n peito, como ainda lem, esse desenvolvimento fez o mesmo, eu não fiquei ocioso neste caso, perdoem-me esla vaidade, trabalhei desde o principio nesse negocio de estradas; dentro e fóra da Camara, como aqui acaba de dizer o meu illustre Amigo, c Collega do Reiuo, fiz quanlo pude para que i sse syslema fosse ávanle, e então desde que se fixa a possibilidade de obter esse melhoramento importantíssimo, por que motivo, por que razão ha de a opposição oppôr-se ás estradas ? A própria lei de 1843 foi desde logo aggredida ! Já aqui se disse, e com verdade, que ao tributo das estradas se fez a maior guerra que era possivel fazer-se, e islo, Sr. Presidente, nào ucho eu que traga alguma utilidade ao Syslema Politico que nos rege.
«A repartição» pois o nobre Depulado, (que agora não vejo presente) não se ufanou dc ser o primeiro que nesta Camara apresentou a idéa da decima de repartição? (O Sr. Roma: — Peço a palavra para

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a explicação dc um facto.) Em quando digo que, se ufanou dislo, nâo digo que livesse razão, porque a primeira pessoa que se lembrou de decima de repartição enlre nós, foi uma alia personagem; (apoiados) foi o Auclor da Carla: (apoiados) mas eu não tracto disso; nesta Casa, Iractando-se de projectos financeiros, o digno Depulado o Sr. Garrett disseque não se podia nunca conseguir a regularisação da fazendas sem que se estabelecesse a conlribuiçâo de repartição: ora, se islo é assim, porque é que apresentando agora o Ministério a contribuição de repartição, o i] 1 ii-Ire Deputado se oppõe a ella? Porque e' que a opposição, que partilha as idéas dos seus membros, que tem uma espécie de solidariedade, se oppõe a ella ? Esse systema, repilo ainda, não me parece muilo bom; e escuso de aponlar o que se passa cm Londres quasi neste momento, escuso de aponlar que, n'uma grande medida da qual os "Wigs podiam fazer o maior appreço possivel, nessa grande medida o chefe dos Wigs, e lodos ein volta delle prestaram o seu apoio apenas o minislerio Torye a apresentou como sua. Islo entendo eu ; fuça-sc opposição ern objectos que possam ser duvidosos; cada uma das parles que compõe a Camara, tem o seu syslema, que deve ser respeitado como opinião, não tenho nisso a menor duvida; mas quando um Ministério adopta as ide'as de uma parte da Camara, seja ella da esquerda ou da direita, não se pôde admillir, qoe essa parte da Camara recue, porque a questão de opporlunidade nunca valeu nada nos Parlamentos políticos ; essa é a questão chimera — nâo adianta nada, porque nada é opportuno .... (signaes negativos nos bancos da opposição) Sem duvida que ha muitos casos em que uma medida demorada 3, 4 c 6 mezes pôde produzir melhor effeito, mas cm regra geral a queslão da opporlunidade apparece nestas Casas, quando não ha outros argumentos para combater uma medida.
Também eu, Sr. Presidenle, fui dos últimos que se convenceram de que a decima de repartição vinha agora a propósito, porque eu linha a idéa (e os meus Collegas lambem a partilharam) que cm certo modo se tornaria desnecessária; porque lodos nós os que aqui nos sentamos, acreditamos no progresso; nós lodos entendemos que o paiz nâo pôde conservar-se no eslado em que se acha, pelo que respeita ao desenvolvimento da sua riqueza, e se nós partilhámos esla idéa, Unhamos muito bem fundadas esperanças no nosso modo de entender, de que com o tempo muitos desses tributos que agora se refundiram na contribuição, podiam ser eliminados, e eliminados totalmente. Mas, Sr. Presidenle, ainda quando islo assim fosse, ficávamos nós isentos dos vicios do lançamento da decima? Eis aqui o que me levou a convencer de que era absolutamente necessário que se Iractasse do syslema de repartição: (apoiados) para que ha--viamos de gastar o tempo a remediar e aperfeiçoar o lançamento da decima, quero dizer, da lei vigente para depois a substituirmos por oulra lei ?: Enlâo era melhor franca e rasgadamente adoplar-se aquella lei que devia ser o ultimo paradeiro a que devíamos chegar.
Sr. Presidenle, eu sei que eslou cançnndo a Camara (Vozes: — Não está, não está;) tenho nisso muito sentimento: mas na verdade, lendo, por dever do meu cargo, de fallar nesta questão, ser-me-hia muito desagradável deixar de locar ainda em alguns Sp.ssÃo n.° ò.
pontos, que realmente me parece que não tiveram toda a resposta, (apoiados, falle, falle)
Um áosiiens de opporlunidade eram as dissensões politicas; a isso já se respondeu victoriosamente. O syslema antigo pelos arbilrios c defeitos que contém (como já muito bem demonstrou o illustre orador que se senla no banco superior) era muito mais próprio para exacerbar as dissensões politicas do que a actual lei (apoiados). Se fosse possivel imaginar um Minislerio que fosse capaz de dizer: «nós que estamos hoje no Poder, havemos de fazer corn que a contribuição recaia na sua maior parte sobre os nos» sos adversários» — so tal pensamento, pensamento inadmissível, pensamento (perdoe-se-iue a expressão) absurdo, fosse sustentável, as contribuições passadas eram mais próprias para realisar esse plano infernal do que a actual; isso já demonstrou o Sr. Roma alé a saciedade; e já se vê quo o Sr. Roma não disse, que agora se haviam de extirpar todos os abusos, como pareceu entender o illustre Orador que me precedeu; o nobre Orador exclamou: uE diz-se que não ha arbilrio; pois nâo se pôde multar no máximo aquelle contribuinte que só devia ser multado no termo médio ou no minimo?» Quereria o illuslre Deputado suppòr, que o meu digno amigo entendia que todos os vicios desappareciam ? Não senhor; aqui ha oulra consideração mais importante, que é reduzir o arbítrio á expressão mais simples. Pois quando n'uma lei ha só o minimo, como até agora acontecia, e os executores da lei podem elevar esse minimo dez, doze, e vinte vezes, nâo será já um grande corte nesse arbilrio o reduzir a differença entre o minimo c o máximo, e o médio, ás dimensões mais simples positivas e claras? Creio que já é um grande beneficio publico.

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tiluiçòcs) sc esle é o nosso credito politico, como pode conscienciosamente um Deputado daquelle Ia-do levanlar-se e dizer á Camara, que é o mesmo que o dizer^ ao paiz inteiro — o Governo trabalha constantemente para dividir a nação?!..
Não e' assim ; não temos remorsos por esse Indo, e o Governo apresenta-se impávido para qualquer exame que se possa fazer dos seus actos cm particular.
O mesmo Sr. Deputado a que me refiro, o Sr. Garrett, e perdoe-rne se menciono o seu nome, não entendeu bem o nobre Orador que fallnva, quando n'um aparte, mas n'um aparte muito significativo disse — Que era necessário mudar de systerna e de Governo, como quem queria dizer, que das premissas que o Sr. lloma estabelecia, se deduzia, que era necessário mudar de syslema e de Governo. Enga-nou-se completamente, não entendeu o illustre Depulado que estava fallando. O que disse o illustre Deputado? Apresentou quaes eram os principios porque se devia regular um Governo de ordem. Disse quaes tinham sido os vicios de muilas e diversas Adininislrações, não se referia só a uma. Estabeleceu depois estes principios lodos inconcussos, o dos quaes não se pôde fugir. «Para se desinvolver a riqueza é necessário em primeiro logar paz e ordem, E que o necessário para fazer valer os fructos 1 E necessário alem de paz e ordem, que liajam estradas, communicações e meios de transporte e baratos. Mas basta só isto? (disse o illuslre Depulado, e disse muilo bem) Não senhor; é necessário que os productos tenham consumo ou no pais ou na exportação. Nele caso (disse o illuslre Depulado se me não engano) o consumo do paiz ainda se deve promover com mais aífmco de que o consumo externo, porque o consumo externo é sujeito a muitas eventualidades, n Disse mais o illustre Deputado o com isto respondo ao illustre Orador que me precedeu.» — E necessário que o preço do dinheiro seja barato; e necessário porlanlo que nos unamos todos e que facilitemos a queslão das finanças, porque é necessário que o Governo não seja um concorrente que estabeleça o preço alio do dinheiro, isto e', que estabeleça juros elevados: em quanto houver juro caro nunca poderá haver nem industria, nem agricultura nein commerçio.» Eis o que disse o nobre Depulado, e S. Ex." que diga se e' isto ou não. (O Sr. Roma: — Apoiados, é verdade.) A que propósito vinha pois a consequência que quiz tirar o nobre Deputado, de que era necessário mudar de syslema e de Governo ? Não é este o systerna que tem seguido o Governo? Não tem sido o Governo o mais efficaz mantenedor da paz e da ordem publica ? Não tem sido o Governo o mais solicito em estabelecer as coinmunirações inlernas, e em procurar lodos os meios para o maior desenvolvimento da industria agrícola e fabril ? Terá o Governo sacrificado as fabricas ? Não lerá o Governo feilo todos os esforços possíveis para que o credito aug-mente.
O Governo, devido às difficuldades que o rodearam, fsieve em certa época inteiramente abandonado, cnuio disse o nobre Deputado: todos os homens de dinheiro estavam receosos deuino grande crise.. . o Governo concentrou-se, e tirou das suas próprias foiças, sem auxilio, sem coadjuvação estranha, o plano qne devia vencer todas as difficuldades: viu-Sessâo n." b.
se face a face com os seus credores; e o Governo teve a possibilidade de lhes fazer acreditar que sabia respeitar os contractos, que os seus créditos seriam satisfeitos, que não faltavam meios para isso. Qual foi o resultado do seu esforço próprio? OGoverno cumpriu plenamente, e o credito le\e um augmento tão rápido que quasi se pôde dizer prodigioso : veja-se o que se passou nos mezes de setembro e outubro do anno passado : achou ou não oGoverno dinheiro a menos preço do que o achavam as casas mais respeitáveis dc Lisboa ? De cerlo que sim. E a que era isto devido? Não seria aos esforços que o Governo tem sempre empregado, e empregara naquella occasião especial, para melhorar a, sorte do paiz, para que o preço do dinheiro fosse barato ? ( apoiados )
Dir-se-ha talvez que esse impulso não continuou a dar os mesmos resultados que então appareceram : não o nego, mas ainda assim a differença entre o nosso credito de hoje, e o de ha meia dúzia de annos é considerável: e, Sr. Presidente, bem próximo lemos nós o que se passou em Inglaterra: Sir Roberto Peei apresentou um excesso no seu Budjet do anno precedente muito superior a dois milhões de libras esterlinas, fallo do excesso da receita sobre a despeza: Iodas as considerações que então apresentou á Camara, eram risonhas e prumettedoras ; tinha um deficit de dous milhões e oitocentas mil libras, e tinha para o supprir a taxa de repartição, que se orçava em perto de cinco milhões e meio: e entre tanto, qual foi o estado das cousas não eram passados doze mezes ?... Não se viu elle nos maiores apuros ? Não esteve até fóra da Administração ?... Como se pôde dizer, pois, que é necessário que se mude de Governo e de systerna, só porque uma medida, por circumstancias muitas vezes fóra do poder dos homens, não teve todo aquelle desenvolvimento que se desejava ?... Acaso terá oGoverno caminhado em sentido contrario?... Não, Sr. Presidente, (apoiados) eu faço jusliça á Camara; creio que ella não deu a este aparte o valor que o Sr. Depulado pareceu querer-lbe dar. (apoiados)
Sr. Presidente, eu queria continuar; mas não posso, pelo meu estado de saúde, não posso ; sinto não poder apresentar mais alguns argumentos; mas antes de concluir sempre apresentarei um fueto, um facto muito verdadeiro, com o qual se prova, tia minha opinião, que a tal miséria dos proprietários, de qne fallou o illustre Deputado pelo Alemtejo, tem pelo menos muito de exaggeração.

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decadência?... Eú nào direi, Sr. Presidenle, que ella está prospera c feliz. E necessário tomar as cousas nas suas perfeitas e verdadeiras dimensões: nâò digo que está feliz. Quem o hade dizer?... Qual é a nação que diga que a sua agricultura chegou a um eslado de perfeita felicidade?... Nenhuma, em nenhuma tem chegado a esse estado : mesmo nessas em que os lavradores séoccupnin e empenham mais em desenvolver os seus conhecimentos agrícolas do que na politica, (apoiados)
Mas em Portugal ha, geralmente fallando, um defeito muito granda: quer-se que o Governo faça ludo; (apoiados) em Portugal, em logar de tractar cada um de aperfeiçoar-se na sua profissão, e dos meios de a desenvolver, embrulha se, fallo de algumas terras de que tenho conhecimento, embrulha-se cada um em seu capote, carrega o chapéu de abas largas sobre a cabeça, e vai para os pasmalorios tractar do importante negocio, se Fuão ou Fuão foi despachado pelo Governo, (apoiados) Formem cum-panbias e sociedades para trocarem as suas idéas, e desinvolver em a sua intelligencia, que graças a Deos não é pouca, assignem jornaes agrícolas estrangeiro?, aprofundem a maneira de melhorar os methodos, de economisar despezas, de multiplicar productos, que nisto é que está o verdadeiro patriotismo. (muitos apoiados)
. Falla-me a voz; não posso continuar. Concluo votando pelo parecer da commissão. (Vozes: — Não pôde votar). Pe/doe-me V. Ex.b, eu disse que votava ; eu não posso votar: tenho tanto amor a esta Casa que estou sempre persuadido que pertenço a ella. (apoiados) Sr. Ptesidente, entendo que este parecer merece ser approvado; (apoiados) e eu peço desculpa á Camara. (Vozes: — Não tem de que pedir; muito bem, muito bem).
O Sr. Pereira de Barros: — Requeiro que V. Ex." consulte a Camara, se julga discutida a maleria na generalidade.
Julgou-se discutida, e seguidamente approvou-se o projecto na generalidade,
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. José Maria Grande para fazer uma interpellação ao Sr. Ministro da Fazenda,
O Sr. J. M, Guànde: — Eu desejo interpellar o
Sr. Minislro da Fazenda sobre um objecto que não pôde levar muito tempo. Acha-se determinado pelo art. 23.° do decreto de 18 de setembro de 184-4, que o conselho fiscal de contas apresentará ao Ministro e Secretario d'Estado dos Negócios da Fazenda, para ser presente ás Cortes no principio de cada sessão legislativa, não só o relatório circumstanciado do re-ultado dos seus trabalhos no decurso do anno findo, mas também do exame da conla geral de receita e despeza do Eslado do anno económico anterior, acompanhado do seu parecer. Peço pois aS.Ex.a o obze-quio de me dizer, se este relalorio c parecer elTecli-vamente ha sido apresentado pelo tribunal de contas e se S. Ex.", na conformidade da lei, está disposto a apresenta-lo quanto antes no Parlamento; porque a lei diz que elle deve ser apresentado no principio da sessão; e eu desejo eparece-me muilo conveniente que o relatório seja apresentado á Camara antes da discussão do Orçamento.
Já me dirigi a S. Ex.% por quem tenho a mais respeitosa consideração, particularmente sobre esle objeclo, e S. Ex.a disse-me que tencionava apresentar este relalorio quanto antes, entretanto entendi dever provocar uma explicação official no Parlamento, e por isso peço a S.Ex." a bondade dc dizer-me em primeiro logar, se o tribunal cumpriu o seu dever, e em segundo, se lendo-o cumprido, S. Ex.1 tenciona apresentar a esta Camara o relatório ornais depressa possivel.
O Sr. Ministro da Fazenda: — A apresentação deste relatório é um preceito de lei, e eu terei a honra de o trazer á Camara no começo da próxima semana, e juntamente com elle'algumas medidas, que o Governo enlende dever apresentar, (apoiados)
O Sr. /. M. Grande:—Em vista do que acaba de serdicto por S.Ex.", dou-me por satisfeito.
O Sr. Presidente: — A ordem do dia para amanhã são trabalhos nas commissões, e para segunda feira o projecto n.* ò na especialidade. Está levantada a sessão. — Eram Ires horas e um quarto da tarde.

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