O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 101

101

SESSAO DE 20 DE JANEIRO DE 1872

Presidencia do ex.º sr. José Marcellino de Sá Vargas

Secretarios — os srs.

Ricardo de Mello Gouveia

Alfredo da Rocha Peixoto

SUMMARIO

Apresentação de propostas por parte do governo, e de requerimentos representações e projectos de lei de iniciativa dos srs. deputados.

Abertura — Ás duas horas da farde. Acta — Approvada.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: Agostinho de Ornellas, Agostinho da Rocha, Osorio de Vasconcellos, Albino Geraldes, Rocha Peixoto (Alfredo), Cerqueira Velloso, Barros e Sá, Soares e Lencastre, Boavida, Antonio Julio, Rodrigues Sampaio, Augusto Godinho, Barão do Rio Zezere, Carlos Bento, Claudio Nunes, Conde de Villa Real, Pinheiro Borges, Vieira das Neves, Francisco de Albuquerque, Gonçalves Cardoso, Francisco Mendes, Correia de Mendonça, Lampreia, Pinto Bessa, Silveira Vianna, Quintino de Macedo, Gomes da Palma, Sant’Ana e Vasconcellos, Jayme Moniz, Santos e Silva, Candido de Moraes, Assis Pereira de Mello, Melicio, Barros e Cunha, Ribeiro dos Santos, Vasco Leão, Gonçalves Mamede, Matos Correia, J. A. Maia, Bandeira Coelho, Cardoso Klerk, Dias de Oliveira, Figueiredo de Faria, Rodrigues de Freitas, José Luciano, J. M. Lobo d'Avila, Sá Vargas, Mello Gouveia, Menezes Toste, Nogueira, Mexia Salema, Teixeira de Queiroz, José Tiberio, Lourenço de Carvalho, Luiz de Campos, Affonseca, Pires de Lima, Rocha Peixoto (Manuel), Alves Passos, Paes Villas Boas, Mariano de Carvalho, Cunha Monteiro, D. Miguel Coutinho, Pedro Roberto, Placido de Abreu, Ricardo de Mello, Visconde de Montariol, Visconde de Moreira de Rey.

Não compareceram — os srs.: Adriano Machado, Braamcamp, Pereira de Miranda, Teixeira de Vasconcellos, Ayres de "Gouveia, Cardoso Avelino, Correia Caldeira, A. J. Teixeira, Arrobas, Telles de Vasconcellos, Barjona de Freitas, Cau da Costa, Falcão da Fonseca, Saraiva de Carvalho, Carlos Ribeiro, Eduardo Tavares, Francisco Costa, Caldas Aulete, Bicudo Correia, F. M. da Cunha, Van-Zeller, Guilherme de Abreu, Silveira da Mota, Perdigão, Frazão, J. J. de Alcantara, J. T. Lobo d'Avila, Baptista de Andrade, Dias Ferreira, Costa e Silva, Moraes Rego, J. M. dos Santos, Pinheiro Chagas, Thomás de Carvalho, Visconde de Arriaga, Visconde dos Olivaes, Visconde de Valmór, e Visconde de Villa Nova da Rainha.

EXPEDIENTE

A QUE SE D£U DESTINO FELÁ MESA

Officios

1.° Do juiz de direito da 3.ª vara da camara de Lisboa, pedindo licença para o sr. deputado Hermenegildo Gomes da Palma servir de testemunha n'um processo que corre n'aquella vara no dia 20 do corrente.

2.° Do. ministerio do reino, declarando que em virtude do artigo 27.° do decreto regulamentar de 9 de Janeiro de 1850, não póde remetter a acta do conselho d'estado sobre as nomeações dos pares do reino, pedida pelo sr. deputado Antonio Augusto Pereira de Miranda.

3.° Do mesmo ministerio, remettendo a copia da portaria de 27 de dezembro ultimo, pedida pelo sr. deputado Mariano de Carvalho.

Representações

1.ª Dos guardas de 2.ª classe do districto da alfandega de Lisboa pedindo augmento de vencimentos.

2.a Dos moradores da freguezia de Alpiarça, concelho de Almeirim, aderindo á representarão feita pela camara municipal do dito concelho, ácerca do decreto de 23 de novembro de 1871, que manda proceder á extinção dos arrozaes, comprehendidos no n.º 4.° do artigo 30.° das providencias annexas á lei de 1 de julho de 1871. Foram enviadas ás respectivas commissões.

Declarações

1.ª Declaro que faltei a algumas sessões por motivo justificado.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = 0 deputado por Leiria, João Chrysostomo Melicio.

2.ª Declaro que não compareci á sessão de 17 do corrente por incommodo de saude.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = 0 deputado por Belem, Silveira Vianna.

3.ª Declaro que o meu amigo o sr. Eduardo Tavares me incumbiu de participar a v. ex.ª e á camara que não tem comparecido a algumas sessões e falta á de hoje por motivo justificado.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = Ricardo de Mello.

4.ª Declaro que não pude comparecer ás duas ultimas sessões por motivo de incommodo de saude.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro do 1872. = Claudio José Nunes.

5.ª O sr. deputado Falcão da Fonseca encarrega-me de declarar, para os fins convenientes, que por incommodo de saude deixou de comparecer á ultima sessão, e provavelmente não poderá comparecer a mais algumas sessões.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = 0 deputado por Macedo de Cavalleiros, Guilherme Quintino Lopes de Macedo.

6.ª Declaro que, por motivo justificado, faltei ás sessões de 16 e 17 do corrente.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = A. J. Teixeira.

7.ª O sr. Barros e Sá participa á mesa que, por incommodo de saude, faltou á sessão do dia 17 do corrente, falta á de hoje e a mais algumas.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 187'2. = Francisco Costa.

8.ª Declaro á camara que, por incommodo de saude, não compareci ás duas ultimas sessões.

Sala das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = Francisco Antonio da Silva Mendes.

9.ª Participo que, por incommodo de saude, não compareci a algumas sessões d'esta camara.

Sala das sessões, em 20 de Janeiro de 1872. = 0 deputado por Lagos, Francisco Correia de Mendonça.

10.a Participo á camara que não assisti á sessão de hontem por incommodo de saude, e que ainda hoje o faço mal restabelecido.

Sala das sessões, em 20 de Janeiro de 1872,= Visconde de Montariol. Inteirada.

Requerimentos

1.° Requeiro que seja remettido á commissão de guerra o requerimento do major José Augusto da T»rra, que deu entrada n'esta camara em sessão de 1871.

Sala das sessões, 19 de Janeiro de 1872. = O deputado pelo, circulo n.º 96, Pedro Roberto Dias da Silva.

A secretaria.

2.º Requeiro que,"pelo ministerio da justiça, seja remettida a esta camara ou mandada publicar no Diario do governo a lista nominal de todos os juizes da 1.ª instancia do continente do reino e ilhas adjacentes, segundo as cías-

Página 102

102

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Sos 1 que pertencerem, e collocação que, em resultado das decisões tomadas pelo supremo tribunal de justiça, nas mesmas tiverem na data em que a lista for feita, com a Synopse dos logares que têem servido, data de suas nomeações, posses, formaturas e idades, tudo segundo, as regras estabelecidas na lei de 21 do julho de 1855, e similhante aquella lista que foi publicada no Diario do governo n.º 47, do 1857.

Sala das sessões, 20 de Janeiro do 1872. =: O deputado por Guimarães, João Vasco Ferreira Leão.

3.° Requeiro que, pelo mesmo ministerio dos negocios da justiça, em vista dos mappas dos contadores sobre, emolumentos, ou das declarações dos magistrados judiciaes e do ministerio publico, ou de quaesquer informações que existam ou se colham na secretaria respectiva, relativamente ao anno findo do 1871, ou a outro qualquer a elle proximo, sejam enviados a esta camara com a brevidade possivel os seguintes esclarecimentos:

I. Nota da importancia, annual dos emolumentos que foram divididos e pertenceram a cada um dos conselheiros do supremo tribunal de justiça;

II. Nota, identica dos que foram divididos e pertenceram a cada um dos juizes das tres relações de Lisboa, Porto e Açores;

III. Nota identica dos que foram contados e pertenceram a cada um dos juizes do 1.ª instancia em cada comarca do reino e ilhas adjacentes;

IV. Nota identica dos que foram contados e pertencerem a cada um dos delegados do procurador regio das ditas comarcas, e a cada um dos curadores geraes de Lisboa e Porto, incluindo as quotas das liquidações de contribuição de registo...

Sala das sessões, 20 de Janeiro de 1872. = O deputado por Guimarães, João Vasco Ferreira Ledo.

4.ª Requeiro, pelo ministerio do reino, um mappa demonstrativo, por concelhos, da despeza a cargo do cofre do estado com a instrução primaria no districto de Braga.

Sala das sessões, Í9 de Janeiro de 1872. = Manuel Redondo Paes Villas Boas.

5.º Requeiro que, pelos differentes ministerios, sejam remettidas á commissão de fazenda quaesquer allegações, que tenham occorrido nos serviços publicos, descriptas no orçamento de 1872-1873 desde a epocha em que foi organisado até hoje.

Sala, das sessões, em 19 de Janeiro de 1872. = O deputado, Antonio José Teixeira. Foram reemitidos ao governo.

Interpellação

Requeiro tomar parte na Interpellação annunciada ácerca da administração do districto de Vianna do Castello pelo sr. deputado por Penafiel.

Sala das sessões, em 20 de Janeiro de 1872. = O deputado pelos Arcos, Placido Antonio da Cunha de Abreu.. Foi inscripto:

SEGUNDAS LEITURAS Projecto de lei

Senhores. — Ha no meio do Oceano Atlantico uma villa notabilissima nos fastos da nossa historia contemporanea, mas quasi esquecida de nos, os successores dos bravos do Mindello, villa a que a monarchia constitucional deve a primeira, e, sem duvida, a mais importante das suas victorias, e que vera hoje, por meu intermedio, ao seio da representação nacional fazer um pequeno pedido, que, no meu limitado modo de ver, me parece mais que justo e modesto.

A villa é a da Praia da Victoria, na ilha Terceira dos Açores.

O pedido é de uma comarca.

E comquanto a villa da Praia diste apenas vinte e tantos kilometros de Angra do Heroísmo, é certo todavia que, não havendo actualmente outra comarca em toda a ilha Terceira senão a de Angra, e sendo as povoagoes todas acolá á beira mar, quero dizer no perimetro da mesma ilha, onde as distancias são relativas á grandeza d'esta, que não é muita, na vantagem real não só para a villa da Praia, mas para os diversos povos do seu actual julgado, em haver ali outra comarca, onde as suas questões particulares sejam directamente tratadas e resolvidas: que convide alguns homens de lei a estabelecerem n'ella a sua residencia, para poderem ser consultados, sem obrigar os povos a procurarem ora Angra para obterem qualquer trabalho forense, ora a Praia para fazerem uso e apresentação d'esse trabalho, andando successivamente de um para outro d'estes pontos em continuas viagens que nem para elles, nem para ninguem são productivas, porque servem só de fazer perder trabalho, dinheiro e tempo.

Sobretudo, porém, traíando-se do julgamento dos crimes pelo jury, o incommodo actual dos cidadãos é grandissiino, porque durante um largo periodo de tempo têem os jurados, que são principalmente da Praia, de ficar fóra das suas casas, e longe dos seus negocios, para satisfizerem este encargo honrado, mas pesado e incommodo.

E pelo que toca ao estado, é tão pequeno o sacrificio que pede aquella villa notavel, visto que apenas se reduz á despeza de ordenados de um juiz, de um delegado do procurador regio que, comparado elle com os direitos adquiridos e ganhos a prego do sangue, de vidas mesmo e de fazenda, pelos seus moradores, penso que ninguem se atreverá a regatear tão pequena concessão e garantia. Por estas breves considerações, senhores, apresento-vos o seguinte projecto de lei:

Artigo, unico. E creada na villa da Praia da Victoria uma comarca, constituida, pelas freguezias que compõe o seu actual julgado.

Camara dos deputados, 19 de Janeiro de 1872. = O deputado por Angra, José de Meneses Toste. = O deputado pelo circulo 96, Pedro Roberto Dias da Silva.

Renovo a iniciativa do projecto n.º 145 —A, da sessão do 1864.

Sala das sessões, 19 de Janeiro de 1864. =. Claudio José Nunes.

Foram admittidos é enviados ás respectivas commissões.

O sr.- Visconde de Montariol: — Pedi a palavra para participar a v. ex.ª e á camara que não pude comparecer á sessão de hontem por incommodo de saude; e hoje compareço, apesar de não estar restabelecido.

O sr. Placido de Abreu: — Participo a v. ex.ª que, por incommodo de saude, não tenho comparecido a algumas sessões. -

Constando-me que o sr. deputado por Penafiel annunciará uma interpellação ácerca do estado da administração no districto de Vianna do Castello, e não podendo deixar de tomar parte n'esta interpellação, mando para a mesa um requerimento n'este sentido.

Desejava agradecer no illustre deputado, que não está presente, o cuidado que lhe merece aquelle districto, do qual sou natural e representei durante muitos annos.

Tenho muito prazer em que se offereça occasião de tratar dos interesses d'aquelle districto.

O sr. Vasco Leão: -— Mando para a mesa dois requerimentos: o primeiro diz respeito á execução da lei de 21 de julho de 1855, para que os juizes tenham conhecimento da sua classificação e possam reclamar contra ella quando se julgarem offendidos; o segundo tem por fim habilitar-me a propor uma medida, que possa, sem gravame para o thesouro, harmonisar os vencimentos dos magistrados judiciaes e do ministerio publico, segundo as suas categorias, e acabar com a anomalia de alguns juizes, na mesma classe, receberem interesses e vencimentos differentes, e o que é mais notavel ainda dos de instancia e classe superior receberem menos interesses do que os das classes inferiores.

Os requerimentos são os seguintes (leu),

O sr. Pedro Roberto Mando para a mesa um re-

Página 103

103

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

querimento em que peco seja remettido á commissão de guerra um requerimento do major de artilheria José Augusto Terra para ter o devido andamento.

Este requerimento entrou na camara na sessão de 1871.

O sr. Mame de: — Fui encarregado de apresentar n'esta camara uma representação dos membros da mesa da assembléa geral, conselho fiscal e direcção da sociedade anonyma de responsabilidade limitada, que sob a denominação de «caixa de credito industrial» funcciona n'esta cidade.

Os signatarios d'esta representação queixam-se de um dos artigos da lei do sêllo e pedem providencias sobre este objecto.

Como membro da commissão de fazenda não devo antecipar a minha opinião sobre este assumpto; só posso dizer que os signatarios d'esta representação, alguns dos quaes conheço, pela sua posição, illustração e serviços, hão de merecer a attenção d'esta casa.

O sr. Correia de Mendonça: — Participo a v. ex.ª que, por incommodo de saude, não pude comparecer ás ultimas sessões.

O sr. José Tiberio: — Pedi a palavra para declarara v. ex.ª que a commissão de recrutamento se constituiu, nomeando o sr. Osorio de Vasconcellos para presidente, e o sr. Barros e Sá para secretario.

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Mando para a mesa a seguinte proposta de lei (leu o relatorio).

Pedia agora a dispensa da leitura da proposta, porque vae ser logo distribuida por todos os srs. deputados (apoiados).

O sr. Mariano de Carvalho: — Requeiro a v. ex.ª ¦ que consulte a camara se quer que só se leia na mesa a proposta, visto que ha de ser distribuida em breve. Consultada a camara decidiu affirmativamente.

Leu-se na mesa a proposta, que 6 a seguinte:

Senhores. — A organisação e completo desenvolvimento da instrução primaria é uma das aspirações mais vehementes da sociedade, ao passo que tambem é um dever indeclinavel d'ella.

Abale o espirito e confrange o animo a contemplação dos factos, que demonstram a inefficacia de todas as providencias legisladas sobre instrução nacional, durante os trinta e nove annos que hão decorrido de governo representativo.

Leis que, na epocha da sua promulgação, tendiam a satisfazer talvez as neeessidades de momento, não preencheriam de modo algum as actuaes neeessidades publicam: e tão imperfeitas as devemos considerar, que, havendo em Portugal uma população -superior a 4.000:000 de habitantes, unicamente se crearam até agora em virtude d'essas leis 2:300 escolas.

Para i:800 habitantes ha apenas 1 escola, o que nos apresenta o paiz como terra tão inculta em relação á instrucção primaria, como o é em relação á agricultura. - Se, ao visitar a escola, fazemos a estatistica das creanças que a frequentam, veremos ser tão diminuto o numero d’ellas, que a terra, que nos parecerá inculta, se nos afigura depois charneca despovoada. Estes dois fados combinados levam-nos á triste conclusão de que, por este caminhar, dia a dia se iria definhando a sociedade portugueza, se os poderes publicos fallassem ao dever de lhe acudir com instrucção e educação.

Esta desgraça, que, em assumptos de instrucção nacional, é uma calamidade publica mais terrivel, pela sua permanencia, que as revoluções do mundo physico, procedeu de se não haver comprehendido que, para se desenvolver e prosperar, a instrucção elementar absolutamente precisa da iniciativa local; sendo a gerencia do estado impotente e inefficaz para a difusão da instrucção primaria, que carece do meio que lhe é proprio, e só se expande com o concurso unanime de todos os cidadãos.

O movimento intellectual da nossa epocha tem feito, nas regiões administrativas, politicas e sociaes, reformas sucessivas e cada vez mais uteis; porém, com espanto se observa que o mesmo destino não haja seguido a educação do povo, sempre mais ou menos esquecida na sombra das sociedades modernas.

Todos os paizes do mundo, e quasi todos ao mesmo tempo, vi vem hoje preocupados d'este assumpto. Tratam-n'o com superior solicitude os governos e os povos. A instrucção e a educação todos as consideram como o mais solido fundamento da forca das nações, e o mais poderoso impulso da sua civilisação. Firmes n'estes principios, põem a questão de ensino ao lado da honra nacional; chegando até a negar os direitos do pae, quando este se esquece dos deveres do cidadão.

Notáveis ensinamentos se deprehendem dos fados que estamos vendo; salutares lições devemos aproveitar da experiencia das outras nações.

É tempo de pugnar com efficacia pela educação do povo. É tempo de vencer a difficuldade. Porque, se uma nação precisa para as heroicidades da guerra, de inocular no espirito dos cidadãos o amor da patria e o amor do ensino; para os lavores da paz necessita da instrucção, que dá o bom chefe de familia, o discreto agricultor, o operario honesto, o filho obediente, o prestante cidadão!

Alguns governos da Europa parecem preocupar-se demasiado, ao pugnar pelo desenvolvimento da instrucção popular, da influencia que ella póde ter no seu engrandecimento militar; nos, senhores, não precisamos de encararas questões da instrucção primaria pelo lado quasi exclusivo, mas temeroso, que domina em espiritos profundamente preocupados pelas necessidades da guerra. A nossa missão, divulgando o ensino, não é dar ao aço com que se vencem as batalhas, tempera mais rija, para que vá rasgar mais fundo o seio dos outros povos"; o que queremos é retemperar o cidadão para as lides do trabalho; ao que aspirámos é a estabelecer com permanencia o governo do povo pelo povo; o nosso desejo mais vivo é fundar em bases perduraveis a liberdade, apoiada na democracia, que proclama a igualdade dos homens pela virtude, pelo trabalho e pelo saber.

Sustentemos a liberdade n'este caminho, cujo trilho é tão difícil. Com este intuito erijamos, logo ao principio da estrada, um templo augusto e sagrado; levantemos ahi, para felicidade das gerações futuras, um monumento digno da perfectibilidade humana; façamos esse monumento á cu4a de todos os sacrificios. E seja o templo a escola de instrucção primaria, onde levemos pela mão o povo, rodeado de seus filhos; e seja o sacerdote, o mestre de primeiras letras, o melhor amigo da civilisação moderna.

Se fizermos isto; quando a patria chamar os filhos, que assim foram educados, para a defender nos perigos, para a ilustrar nas acções e perpetuar na historia, a patria, não o duvideis, senhores, encontrará soldados para as pelejas, operarios para as industrias, homens para tudo.

Em harmonia com o projecto de lei de administração que o governo leve a honra de propor-vos, a reforma de instrução primaria, apresentada agora ao vosso ilustrado exame, é altamente descentralisadora: confia ás camaras municipaes a administração das escolas.

É obrigatoria, para todas as creanças de um e outro sexo, a instrucção primaria elementar; e é tambem gratuita, conforme determina a caria constitucional. A primeira disposição já estava consignada no decreto de 20 de setembro de 1814, e é mantida no actual projecto; nem podia deixar de ser assim, porque este principio, admittido por quasi todas as nações, só póde ser riscado das leis, quando o povo houver attingido um grau de superior educação.

O decreto de 20 de setembro tem sido até agora, n'este ponto, quasi sempre letra morta; não só por não haver numero suficiente de escolas, como tambem por falla de outras disposições accommodadas á Índole do paiz, que podem tornar exequivel, na pratica, a obrigação do ensino.

Este preceito, que em Portugal não exige no seu cumpri-

Página 104

104

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

mentó nenhum sacrificio, porque o ensino é gratuito, deve manter-se com toda a severidade.

Tem por fim proteger individuos que não possuem vontade propria; e n'este caso a sociedade, em nome do bem geral, tem o irrefragavel direito de se collocar ao lado das creanças para as proteger na primeira idade, e não as privar de um bem, cujo uso mui tarde podiam recuperar.

A obrigação do ensino é um dever da sociedade, desde o momento em que as pessoas responsaveis pelas creanças se ponham fóra dos principios geraes que a governam; e todos devem ficar sujeitos a ella por lei ou dever de consciencia, como se sujeitam a prover de alimentos esses mesmos individuos na primeira quadra da vida.

O projecto actual emprega para o conseguir duas ordens de meios persuasivos e repressivos; e amplia tanto os primeiros, que poucas serão as circumstancias em que haja necessidade de recorrer aos segundos.

Como protecção ás familias pobres no cumprimento dos deveres sociaes, e portanto na obrigação do ensino, estabelece asylos de educação. Os asylos, cuja idéa inicial foi copiada da Allemanha, da Belgica e da Italia, onde estes estabelecimentos hão sido creados com unanime applauso de todos os homens de bem e de sinceras convicções, têem no projecto elevada significação e subido alcance. Consideram-se como auxiliares da escola e têem por fim tornar na pratica mais facilmente realisavel a obrigação do ensino. Destinados a recolher creanças, cujos annos não attingiram ainda a idade de escola, durante as horas em que as familias estão occupadas em trabalhos agricolas e industriaes, vem preencher uma lacuna muito sensivel que havia no nosso paiz. As creanças recolhidas acharáo n'elles o carinho e protecção, que a sociedade deve, nos limites do direito, aos filhos das classes indigentes; e os paes d'essas creanças encontrarão ali tambem a libertação dos braços, do que depende a existencia da familia.

Se não fóra tão difficil resolver de prompto as graves questões do ensino, sob os seus multíplices aspectos, o projecto tornaria obrigatoria para os municipios a creação dos asylos, que fizeram immortaes os nomes dos benemeritos amigos da humanidade, Froebel e Pestalozzi. Na impossibilidade de o fazer já — comquanto se julgue que um dia venham a ser os asylos assim considerados nas leis entrega a direcção d'elles ás pessoas caridosas da localidade; e para lhes assegurar inteiramente a existencia, póe-n'a sob a protecção da mulher, que, pela sua Índole e carácter elevado, ha de ter por elles o desvelo de mãe carinhosa, espargindo com mãos largas os ineffaveis e inexhauriveis thesouros da sua actividade e solicitude.

Compele á mulher um grande papel na transformação social: e quem lenha este convencimento ha de ver, que só mulher se deve entregar uma instituição capaz de lhe fazer vibrar as cordas mais sensiveis de sua extremosa alma, e que a torne, no meio da sociedade como ella já o é no seio da familia, a mãe inesperada do orpháo, o amparo da viuva, a providencia dos desvalidos, o alvo de todas as bençãos.

A importancia d'estas instituições sobe de ponto em nossos dias. Façamos uma tentativa mais para que o trabalho possa ámanhã abençoar o capital, e não o julgue, nas trevas densas do espirito, inimigo implacavel: obriguemo-lo a confessar sem abalos violentos, no centro da familia e na presença dos filhos, o que a sociedade fez por suavisar as desigualdades eternas, resultado fatal das leis economicas.

Do asylo passam as creanças mais facilmente para a escola; na qual, depois de aprenderem todas as disciplinas do primeiro gran, receberão á saída o attestado de instrucção primaria.

Este attestado, que no futuro será a folha corrida do cidadão, no que se refere ás obrigações escolares, não se alcança á custa de um exame, sempre difficil e pouco efficaz; resume, porém, em si o resultado de varias provas, feitas nos differentes annos da escola, sem commoção para os alumnos nem apparato desnecessario.

Combinando todos os interesses — no proposito de tornar uma realidade a obrigação do ensino — o projecto instítue caixas de pensões escolares, d'onde possam saír premios para os alumnos pobres, que foram na escola estudantes applicados e distinctos.

Estas caixas de pensões escolares, que a lei colloca á porta da aula, são o mealheiro que arrecada os donativos das creanças, e ajuda a tirar as almas do purgatorio da ignorancia.

A creança rica e a creança remediada contribuem, por intermedio das familias, com um pequenino obulo, a que se chama a quota cívica da instrução primaria. Nome este, que de sobra indica o fim legitimo a que ella se destina, e que symbolisa um santo principio de virtude. Facto que dispõe, desde a infancia, o espirito do homem para a verdadeira fraternidade.

Não é tributo, nem é esmola. É, sim, o auxilio mutuo, desde os primeiros annos. São as classes, dando-se as mãos na escola, para que desde ali e para todo o sempre se considerem solidarias nos interesses e nas aspirações.

A escola fica tambem organisada sob novas bases. Em logar de ser dividida em duas classes exigencia que as circumstancias não comportam por emquanto a escola é unica; mas póde abranger desde o ensino elementar, que é a expressão mais simples da sua modestia, até o ensino normal, ultimo grau de aperfeiçoamento do ensino, destinado a habilitar professores.

A escola fica assim intimamente ligada com o professor, e o acompanha, á medida que este, pela sua actividade e aptidão, se eleva na carreira do magisterio.

Para assegurar comtudo de um modo definitivo a creação do ensino complementar, a lei torna-a obrigatoria n'aquellas povoações que, pelo numero de seus habitantes, poderem exigi-lo.

Esta disposição não restringe em cousa alguma a vulgarisação do ensino complementar; mas, não póde ser mais lata porque a isso se opõem dificuldades de diversa ordem, que o governo julgou com fundamento insuperaveis.

Todos os alumnos, em relação á escola, são considerados á mesma luz, no que respeita ás questões e doutrinas da instrução; estas foram escolhidas, com o maximo escrupulo, de entre as que devem formar a base da educação intellectual e physica das creanças.

O ensino normal — táo instantemente reclamado n'outros paizes, e tão necessario entre nos, que precisamos de professores habeis para as nossas escolas tica a cargo dos districtos; e, para não sobrecarregar com exagerada despeza a iniciativa local, será estabelecido nos lyceus.

Outros prefeririam vê-lo inteiramente na mão do governo, pensando que d'esta fórma se asseguraria melhor a sua existencia e proficuidade; mas, alem do exemplo que já provou o contrario, o ensino normal por conta do estado, não teria nunca o carácter nem o desenvolvimento que o plano concebido lhe quer dar.

Para que nada falte ao ensino normal, o governo propõe, que aos estabelecimentos de instrucção secundaria haja annexa uma escola com ensino complementar, para os indispensaveis exercicios dos alumnos mestres.

Em relação ao sexo feminino, a lei admitte uma excepção; e, depois de assegurar o ensino normal pelos mesmos meios que foram indicados, estabelece duas escolas normaes. Seja permitida esta excepção em favor de uma classe que ha sido sempre desconsiderada. Façamos esta concessão, tão plenamente justificada pelas circumstancias, até que possamos fazer outra maior a do ensino do homem pela mulher.

O ensino normal fundado n'estas bases, póde tomar rapidamente o incremento necessario, e por isso se fez em relação a elle o que a experiencia aconselha para o ensino elementar. Não neguemos ao districto a possibilidade de habilitar os professores de que os municipios carecem para as suas escolas, e não apertemos no circulo das economias por muitos annos ainda o ensino normal.

Como vereis, o magisterio primario melhora tambem de situação pela presente reforma. A classe dos professores, cuja vida de abnegação só póde bem comprehender quem a haja.

Página 105

105

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

visto de perto, encontrará na organisação proposta os meios de auxilio, que lhe eram devidos. Alem do ordenado, haverá para os que souberem cumprir a sua missão elevada, com o desinteresse de que não é difficil achar exemplos, condignas remunerações de aptidão e de intelligencia, cujos limites só serão traçados pela propria actividade e zêlo do professor.

Alem dos vencimentos, acharão na lei para as diferentes pessoas de sua familia occupação honrosa, que os auxiliará a perseverar no cumprimento exacto dos deveres do magisterio; e, mais que tudo, encontrarão tambem diante de si, largo futuro, extensa carreira que lhes permitia aspirar ao supremo cargo da instrucção primaria — á categoria de inspector.

Não é a primeira vez, senhores, que no parlamento se tem considerado o professor primario digno de accesso, n'uma profissão até hoje sem futuro. Oxalá que seja a ultima em que o tenhamos de repetir.

Na escola, o professor é tudo, mas desde que a lei lhe tirar o accesso, o professor fica sendo nada.

Seja ao menos isto uma compensação para aquelle viver obscuro e prestante: e já que não podemos — porque é impossivel em toda a parte — assegurar-lhe o presente como o pediam os seus serviços, não lhe matemos o futuro, porque mataríamos igualmente o futuro de nossos filhos.

Lembremo-nos uma vez sequer que foi elle o nosso primeiro educador, o primeiro obreiro do nosso espirito.

Ás camaras municipaes compete a nomeação dos professores. Mas para que elles não possam em caso algum ser viclimas de injustiças locaes, e conservem na escola a independencia do logar que exercem, o governo reserva para si o direito de os demittir, depois de processo instaurado no districto. Em relação á escola e ás demais prerogativas do

professorado, a lei considera a mulher igual ao homem: e paga com igual retribuição iguaes serviços.

A administração e a doação das escolas de instrucção primaria passam inteiramente para os municipios; e, como as escolas exijam muita vigilancia e extraordinaria solicitude, a lei cria juntas escolares, para superintender nas escolas do concelho.

Estas juntas são delegares das camaras, e nada se oppõe a que possam constitui-las os proprios vereadores; tem n'ellas parte um delegado do governo. Seria imprudencia e leviandade, por excessivo amor de principios alias justos e fecundos, por em risco os interesses da instrucção.

O governo tem plena confiança n'este modo especial de dirigir as escolas. O plano seguido na constituição das juntas escolares devemos esperar que seja proficuo e efficaz.

Alem da commissão escolar, a junta de parochia, que fica sujeita tambem a obrigações definidas para com a escola, tem o seu delegado; e este, que vive perto da aula, completa a vigilancia local, e assegura a realisação do systema nos seus differentes pormenores.

Podemos assegurar-vo-lo, com uma convicção fundada em estudo consciencioso, que não haverá desequilibrio nem solução de continuidade, e que conseguiremos passar sem perigo do actual systema para outro que é profundamente diverso.

Entregue a escola e a instrução primaria ao municipio, falta, como complemento e garantia de que as disposições d'este projecto de lei háo de ser observadas, crear o corpo de inspecção. Talvez vos pareça limitada e pouco desenvolvida a inspecção que se propõe; oxalá que assim o considereis, porque bem facil seria, e de accordo com os desejos do governo, amplia-la. Todavia, dividido o reino em circumscripções e estas em circulos escolares, é possivel satisfazer as necessidades impreteriveis da inspecção com o corpo de inspectores que fica organisado.

Da inspecção depende em grande parte o progresso e desenvolvimento do ensino; mas como o governo se acha bem compenetrado d'esta verdade, que é intuitiva, não receia que a reforma possa ser prejudicada por tal motivo.

Para assegurar, por todos os meios ao alcance do legislador, os resultados que se esperam da reforma, pareceu necessario instituir conferencias de professores e conferencias de inspecção. N’estas reuniões annuaes, o municipio, o districto o o governo têem os meios de obter as informações de que careçam, para dirigir a instrucção pelo mais seguro caminho; e para a tutelar, como devem, quando alguma das pessoas chamadas a intervir n'ella não haja cumprido o seu dever. Ha ainda outro ponto, senhores, sobre o qual convem chamar a vossa attenção, e que o governo considera de summa grávida de.

A pratica de longos annos tem mostrado em todos os paizes, que os livros adoptados nas escolas podem exercer sobre os alumnos, e em geral sobre o ensino, influencia salutar ou perniciosa; conforme as doutrinas e conforme os melhores. Esta influencia, que se tem feito sentir nas outras nações — até n'aquellas que possuem bons livros por onde escolher deve, em um paiz como o nosso, que não gosa d'este privilegio, ser attendida a tempo, e com todo o cuidado, para que nas escolas se não esteja ensinando o que não convem que se saiba. Com este fim, o governo consigna no projecto que, em periodos determinados, serão dadas como premio edições aos auctores dos melhores livros sobre instrucção primaria; já se vé, por meio de concurso, julgado por jurys especiaes.

Esta proposta tambem reduz consideravelmente a despeza do thesouro publico.

A leitura d'ella, em todas as suas divisões, vos indicará com a sufficiente excepção o alcance, do systema, que permitte nos circumstancias actuaes:

Ter o numero sufficiente de escolas em harmonia com a população;

Propagar a instrucção primaria por todas as classes;

Applicar á educação nacional do povo a doação que elle tem o direito de reclamar para si, em nome da desmoralisação.

Com estes fundamentos o governo submette á consideração da camara a seguinte. proposta de lei:

Artigo 1.° É approvada a organisação da instrucção primaria, que faz parte da presente lei.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios do reino, em 20 de Janeiro de 1872. = Antonio Rodrigues Sampaio.

Proposta -de lei de instrucção primaria

CAPITULO 1 -Do ensino primario

Artigo I.° A instrucção primaria para o sexo masculino e feminino divide-se em dois graus, elementar e complementar.

Art. 2.° O ensino primario elementar obrigatorio comprehendo: leitura, escripta -, as quatro operações arithmetica sobre, numeros inteiros e fraccionarios, elementos de gramática portugueza e lingua portugueza, principios do systema legal de pesos e medidas, principios de desenho, educação moral e religiosa, gymnastica, canto coral, direitos e deveres do cidadão.

§ unico. O ensino primario elementar, para o sexo feminino, comprehende as materias mencionadas n'este artigo, menos a ultima (direitos e devores do cidadão); e alem d'isso os lavores proprios do sexo, e os deveres da mãe de familia.

Art. 3.° O ensino primario complementar comprehende: leitura e recitação de prosa e verso, calligraphia e exercicios de escripta, applicações usuaes da arithmetica e noções praticas de geometria, grammatica e exercicios da lingua portugueza, systema legal de pesos e medidas, desenho, moral e religião, rudimentos de sciencias physicas e naturaes e suas applicações, economia e hygiene domestica, gymnastica e canto coral.

§ unico. O ensino primario complementar, para o sexo feminino, comprehende as materias mencionadas n'este artigo, e alem d"isso os lavores proprios do sexo.

Art. 1.° A instrução primaria elementar é obrigatoria, desde a idade de seis annos até os doze, para todas as creanças de um e outro sexo, cujos paes ou tutores não provarem le-

13*

Página 106

106

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

galmente que dão, ás creanças a seu cargo, o ensino na propria casa ou em escola particular.

§ 1.° A obrigação comerá desde que a creança é inscripta pela junta de parochia, na lista das creanças em idade de escola; e cessa, logo que ellas hajam obtido o attestado de instrução primaria.

§ 2.° A obrigação do ensino comprehende: o dever de apresentar aos professores de instrução primaria as creanças em idade de escola, e o dever de as compellir á frequencia regular da aula em que estejam inscriptas.

Art. 5.° São responsaveis pela obrigação do ensino, os paes, tutores e conjuntamente os donos de fabricas, officinas ou explorações agricolas, em cujos serviços as creanças estiverem empregadas.

§ unico. Os orphãos, filhos de viuvas pobres ou de paes indigentes, impossibilitados de trabalhar, são considerados pupillos da parochia, no que se refere á obrigação do ensino.

Art. 6.° As juntas de parochia fazem, annualmente, na epocha fixada pelas juntas escolares, o recenseamento de todas as creanças de seis a doze annos, com designação dos paes ou tutores a cujo cargo estejam; das officinas e lavores agricolas em que forem empregadas. Cinco copias d’este recenceamento serão immediatamente enviadas ás escolas de instrução primaria da circumscripção escolar, e uma copia ás juntas escolares. Das cinco copias remettidas ás escolas, uma fica em poder dos professores, as outras quatro são sucessivamente mandadas, de tres em tres mezes, pelos professores aos delegados das juntas de parochia, com as notas do frequencia o aproveitamento de todos os alumnos. N’estas relações serão igualmente designadas as creanças que não frequentam a escola publica, por lhes ser dada a instrucção na familia ou em escola particular.

§ unico. Os delegados da junta de parochia, depois de haverem recebido estas relações, envjam-n'as, com as observações que julgarem preciso fazer a bem da instrução, ás juntas escolares, no praso de quinze dias.

Art, 7.° A obrigação do ensino, as disposições penaes, e os nomes das creanças em idade de escola, são annunciados pelos meios ordinarios, no começo de cada anno lectivo, e pelos parochos, durante um mez, á hora da missa conventual.

Art. 8.° Os paes, tutores ou pessoas responsaveis pela educação das creanças, que não cumpram a obrigação do ensino, durante um trimestre, são admoestados pelo delegado da junta de parochia, que os intima para cumprirem essa obrigação, declarando-lhes as penas em que incorrem, quando desobedeçam.

I unico. Os nomes dos paes ou tutores, donos de fabricas, officinas ou explorações agricolas, que não obedecerem á intimação do delegado de parochia, são lidos pelo parodio á hora da missa conventual, e affixados á porta da igreja.

Art. 9.° Os paes, tutores, donos de fabricas, officinas ou explorações agricolas que continuarem a desobedecer aos preceitos da lei, depois das penas impostas pelo artigo 8.° e §, pagara de multa, pela primeira vez, 1,5000 réis ou o equivalente em dias de trabalho, empregado a beneficio da parochia ou parochias em que a escola estiver estabelecida, e, no caso de reincidencia, a segunda multa será o dobro, a terceira o triplo, e assim progressivamente. Estas multas são impostas á vista das relações Trimestres de que trata o artigo 6.° -

Art. 10.° Os paes ou tutores que forem condemnados quatro vezes na multa imposta pelo artigo 9.°, ficam privados dos direitos politicos durante um anno; continuando a reincidencia, durante esse anno, a suspensão dos direitos politicos será elevada a cinco annos, sem prejuizo das multas progressivas fixadas pelo artigo anterior.

Art. 11.° A multa pecuniaria é imposta pelo delegado da junta de parochia, verificado o facto e ouvido o infractor.

§ unico. Da resolução do delegado da junta de parochia ha recurso para o conselho de districto.

Art. 12.° Ficam sujeitos ás mesmas penas e multas, de que fallam os artigos antecedentes, menos a perda de direitos politicos, os paes, tutores, donos de fabricas, officinas ou explorações agricolas a cujo cargo estejam as creanças, que derem mais de vinte faltas á escola em cada trimestre, sem motivo justificado. A repetição da falla de frequencia em mais de um trimestre do anno escolar reputa-se reincidencia, para o effeito do pagamento da multa.

§ 1.° A falla de frequencia ás obrigações escolares só pude dar-se por doença do alumno ou outra causa justificada.

§ 2.° Compete ao delegado da junta de parochia tomar conhecimento das faltas e julgar da validade da sua justificação.

Art. 13.° Os exercicios escolares diarios de instrução primaria elementar duram de quatro até seis horas, divididas em aula de manhã e aula de tarde, ou seguidas, segundo as exigencias da localidade.

§ unico. Podem ser excepcionalmente dispensadas da frequencia da aula de tarde pelo delegado da parochia, as creanças de mais de nove annos, que estiverem empregadas em trabalhos agricolas e industriaes.

Art. 14.º O ensino complementar não póde durar menos de duas horas. Ao ensino complementar das escolas primarias são applicaveis as disposições que se referem á frequencia da aula e justificação das faltas, mas sem applicação de penas e multas.

CAPITULO II Do ensino normal

Art. 15.° É creado o ensino normal para o sexo masculino nos estabelecimentos de instrução secundaria dos districtos do reino.

§ I.° As disciplinas do curso normal serão determinadas em regulamento especial.

§ 2.° Nos estabelecimentos de instrucção secundaria, onde se organise o ensino normal, haverá um curso especial de pedagogia e methodologia, regido por algum dos professores do lyceu ou pelo professor de instrução primaria da escola annexa, se este estiver habilitado com um curso de ensino normal.

§ 3.° Annexa ao estabelecimento de instrução secundaria, em que se der ensino normal, haverá uma escola com ensino elementar e complementar, para exercicio dos alumnos do curso normal.

Art, 16.° É mantida a escola normal do sexo feminino, actualmente existente em Lisboa, devendo crear-se outra para o mesmo sexo, na cidade do Porto.

§ 1.° Nas localidades onde se organisar o ensino normal para o sexo masculino, haverá estabelecimentos para a instrução e educação de professoras.

§ 2.ª Estes estabelecimentos são formados pela aggregação de duas escolas para o sexo feminino, com ensino elementar e complementar, onde se admitam alumnas mestras, e se professe um curso especial de pedagogia.

Art, 17.° Os professores de instrução secundaria ou de instrucção primaria, que regerem os cursos especiaes para o ensino normal, percebem annualmente uma gratificação de 200$000 réis, paga pelo governo.

§ unico. Não póde exceder de tres o numero de professores encarregados dos cursos especiaes, de que trata este artigo.

CAPITULO 111 Da escola

Art, 18.° As escolas primarias para um e outro sexo dividem-se em duas classes: escola com ensino elementar, e escola com ensino elementar e complementar.

§ unico. O ensino complementar é feito nas escolas de ensino elementar em curso separado. Em todas as povoações de 3:500 habitantes para cima fica estabelecido o ensino complementar n'uma das escolas de ensino primario elementar de cada um dos sexos.

Art. 19.° Em cada parochia haverá, em regra, uma escola primaria com ensino elementar para cada sexo.

§ unico. A escola primaria para cada um dos sexos com ensino elementar poderá servir para duas ou mais parochias,

Página 107

107

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

quando os alumnos das parochias reunidas não excedam de CO, e possam frequentar regularmente a escola. Se na parochia ou parochias adjuntas não poder estabelecer-se uma escola para cada sexo, haverá uma escola mixta.

Art. 20.° A escola primaria elementar, para o sexo masculino, é regida por professor; a escola primaria elementar para o sexo feminino por professora. A escola mixta é regida por um professor ou uma professora.

§ 1.° Não havendo professora, a escola mixta é dirigida por professor casado, ou que tenha na sua familia alguma senhora, á quem se entregue a educação das meninas e o ensino dos lavores proprios do sexo feminino, sendo considerada, para todos os effeitos, como ajudante da escola.

§ 2.° Na escola primaria com ensino elementar, como na escola primaria com ensino complementar, póde haver ajudantes e alumnos mestres, quando as necessidades do ensino assim o exigirem.

Art. 21.º Na escola primaria elementar o ensino é gratuito. O ensino complementar é retribuido pelos alumnos. O quantum da retribuido será fixado pelas juntas escolares.

Art. 22.° As juntas escolares devem promover, nos sitios que julgarem conveniente, cursos nocturnos e dominicaes para adultos.

§ unico. Estes cursos podem ser de ensino elementar, de aperfeiçoamento de ensino elementar ou de ensino complementar.

Art. 23.° As juntas escolares devem estabelecer cursos temporarios, nunca de duração inferior a seis mezes, nas localidades onde circumstancias especiaes se opponham á creação immediata das escolas, segundo as regras estabelecidas no artigo 19.°

Art. 24.° As escolas, de que tratam os artigos antecedentes, são consideradas escolas publicas para os effeitos d'esta lei. Fóra d'estas escolas, o ensino primario elementar é livre.

CAPITULO IV

Dos asylos de educação e das commissões promotoras de beneficencia e de ensino

Art. 25.0 Devem crear-se nas povoações ruraes e urbanas, como auxiliares da escola primaria, asylos de educação para recolher as creanças de tres até seis annos.

Art. 26.° As juntas geraes de districto promoverão, desde já, em cada districto, a fundação de dois asylos, nas Ierras onde os não haja actualmente, os quaes possam servir de modelo aos que do futuro houverem de crear-se nos municipios do reino.

Art. 27.° Os asylos de educação são destinados:

1.° A recolher as creanças de tres até seis annos, durante as horas em que as familias estão empregadas no trabalho;

2.° A preparar as creanças para a entrada nas escolas primarias, por meio de educação e ensino da doutrina christã, e dos primeiros rudimentos da instrucção elementar, pelos methodos modernamente aconselhados.

§ unico. N'estes asylos dar-se-ha, quando seja possivel, uma refeição ás creanças.

Art. 28.° O pessoal do asylo de educação é composto de uma mestra e de uma aia. São preferidas para estes logares as pessoas de familia do professor de instrucção primaria.

Art. 29.° As camaras municipaes organisam associações promotoras de beneficencia e de ensino, nas localidades em que houver escola ou asylo de educação, para promover a educação e instrucção das creanças pobres, e amparar as familias d'essas creanças, no cumprimento da obrigação do ensino.

§ unico. As camaras municipaes e as juntas geraes de districto subsidiarão o estabelecimento dos asylos, quando assim o julgarem necessario a bem da educação.

Art. 30.° As camaras municipaes, com o auxilio dos parochos e dos outros membros das juntas de parochia, promovem a inscripção das pessoas do sexo feminino que quizerem tomar parte nas associações.

1.° As pessoas inscriptas escolhem de entre si tres ou mais senhora, por cada asylo ou escola de instrucção primaria, para constituir a commissão promotora de beneficencia e de ensino, que tem a seu cargo vigiar o asylo e proteger as creanças desvalidas da circumscripção escolar.

§ 2.° Quando não for possivel organisar as commissões promotoras de beneficencia e de ensino, pelo modo que fica determinado, as camaras municipaes, com o auxilio dos parochos e dos outros membros das juntas de parochia, designam tres chefes de familia por cada parochia, para proteger e vigiar os asylos, ate que se organisem definitivamente as commissões.

§ 3.° O secretario das associações e commissões promotoras de beneficencia e de ensino é um chefe de familia, escolhido pelas associações ou commissões de entre as pessoas residentes na parochia ou no municipio.

CAPITULO V Do magisterio primario

Art. 3I.°-Os professores de ambos os sexos das escolas de instrucção primaria são nomeados pelas camaras municipaes, precedendo proposta das juntas escolares, de entre os individuos com capacidade legal para exercerem as funcções do magisterio primario.

§ 1.° constitue capacidade legal:

I — Diploma de approvação no ensino normal;

II — Diploma do governo, obtido em exame de habilitação para o ensino elementar;

III — Diploma do governo, obtido em exame de habilitação para o ensino complementar;

IV — Diploma de haver ensinado, por espaço de seis annos, n'uma escola publica, como alumno mestre e como ajudante do professor de instrucção primaria.

§ 2.° Quando não houver pessoal habilitado, as camaras municipaes podem nomear pessoas idoneas para o ensino primario. Esta nomeação é feita por tres annos.

§ 3.° A regencia de uma escola primaria com manifesta aptidão ou distincção, durante este tempo, substitue o exame de habilitação para o magisterio primario.

§ 4.° Constituem capacidade legal para o ensino complementar as habilitações exigidas pelos numeros I e III d'este artigo, e alem d'isso o tirocinio de dois annos n'uma escola de ensino elementar.'

§ 5.° A primeira nomeação dos professores de ambos os sexos é temporaria, e só póde tornar-se definitiva ao cabo de tres annos de exercicio.

Art. 32.° Os vencimentos dos professores de ambos os sexos de instrucção primaria elementar são: um ordenado fixo, gratificação de frequencia e gratificação de aproveitamento dos alumnos.

§ 1.° O ordenado fixo minimo é de 805000 réis nas povoações ruraes, de 100#000 réis nas povoações urbanas, e de 120#000 réis em Lisboa e Porto.

§ 2.° A gratificação de frequencia é, até sessenta alumnos, de SO réis mensaes por cada alumno que tiver assistido a cinco sextas partes da totalidade das ligues de manhã e de tarde, calculadas em relação aos dias uteis de cada trimestre.

§ 3.° Considera-se para esse fim como havendo ido á aula • os alumnos que d'ella tiverem sido dispensados, segundo o que determina o § unico do artigo 13.°

§ 4.° De sessenta alumnos para cima, metade da gratificação, por cada alumno, é para o professor, e a outra metade para o ajudante.

§ S.° A gratificação de aproveitamento é de 2$000 réis por • cada alumno que obtenha attestado de instrucção primaria, com boas notas em todas as disciplinas de que esta se compõe.

Art. 33.° Os vencimentos dos professores de ambos os sexos das escolas de instrucção primaria, com ensino elementar e complementar, são: um ordenado fixo, gratificação de frequencia e gratificação de exames.

§ 1.° O ordenado fixo minimo é de 150$000 réis. Em Lisboa e Porto é de 180,000 réis.

Página 108

108

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

§ 2.° A gratificação de frequencia é de 50 réis mensaes por cada alumno que tiver assistido ás lições, segundo o que determina o 2.° do artigo 32.°

§ 3.° A gratificação de exame é de 2$000 réis por cada alumno que alcançar certidão de approvação, com boa nota, em todas as disciplinas de que se compõe o ensino complementar.

Art. 34.° Os ajudantes de ambos os sexos das escolas elementares são nomeados pela camara municipal, sob proposta da junta escolar, de entre os alumnos mestres das escolas do concelho que tiverem completado dezeseis annos de idade.

§ unico. Na falta de alumnos mestres, podem ser admittidos como ajudantes os individuos com capacidade legal, segundo o disposto no artigo 31.° e seus §§.

Art. 35. Os vencimentos dos ajudantes de ambos os sexos são: um ordenado lixo e gratificação de frequencia.

§ 1.º O ordenado fixo minimo é de 30$000 réis.

§ 2.° A gratificação de frequencia é a que lhes corresponde pelo § 4.° do artigo 32.°

Art. 36.° Os ordenados fixos são pagos mensalmente. As gratificações de que tratam os artigos 32.º e 33.° são pagas nas epochas do seu vencimento.

§ 1.° Quando as camaras municipaes não cumpram os preceitos d'este artigo, a commissão districtal ordena o pagamento immediato, de modo que o magisterio não soffra prejuizo nos seus vencimentos.

§ 2.º Se as camaras municipaes não cumprirem a determinação da commissão districtal, incorrem na multa igual do duplo das quantias que deviam pagar-lhes, em proveito da instrucção primaria.

Art. 37.º As juntas escolares podem em cada anno, de accordo com as camaras municipaes, conceder aos professores e ajudantes licenças com vencimento que não excedam, na sua totalidade, de trinta dias. Alem deste limite, a licença faz perder o vencimento.

§ 1.° O professor de um e outro sexo, que, sem auctorisação, deixar de dar aula em algum dos dias mareados no horário da sua escola, e que não for relevado d'essa falla pela junta escolar, paga uma multa, imposta por essa junta, que não póde exceder de 400 réis por cada falta.

§ 2.° A mesma disposição se applica ao ajudante que falte ao serviço escolar, não devendo a multa exceder de 100 réis por cada falta.

Art. 38.° O professor ou professora, que por doença faltar, em cada anno, mais de trinta dias uteis á escola, perde passados os trinta dias metade do vencimento total.

§ unico. Se o impedimento se prolonga alem d'este prazo, o professor é substituido por individuo com capacidade legal, o qual recebe metade do vencimento do professor impedido, e as gratificações a que tiver direito durante o tempo da regencia.

Art. 39.° As penas disciplinares a que estão sujeitos os professores, são: admoestação, reprehensão, suspensão até um mez com perda de vencimento, e demissão.

§ 1.° A primeira e segunda pena são impostas pela junta escolar, tendo voto na deliberação o sub-inspector do circulo escolar.

§ 2.º A terceira pena é imposta pela mesma fórma, ouvido o professor.

§ 3.° A demissão só póde ser dada pelo governo, precedendo consulta da junta geral de districto, fundada na proposta da junta escolar.

Art. 40.° Os professores de instrucção primaria de ambos os sexos são aposentados segundo o disposto para os empregados camararios, na proposta de lei de administração. Conta-se para a aposentado todo o tempo de serviço effectivo nas escolas.

CAPITULO VI

Dos attestados de ensino primario, e dos exames de instrucção primaria

Art. 41.° A verificado de aptidão para os alumnos alcançarem attestado de instrucção primaria elementar, é feita por uma commissão de instrucção elementar, composta do delegado da parochia, do professor ou professora, e de um chefe de familia para este fim annualmente designado pela junta escolar do concelho, onde a escola estiver situada.

Art. 42.º A commissão reune uma ou mais vezes por anno, conforme o julgue necessario, para, nas horas da aula, verificar o estado de adiantamento das creanças de dez, onze e doze annos, lançando em livro especial nota das suas observares ácerca de cada alumno.

§ 1.° O attestado de instrucção primaria é passado pela junta escolar, em vista das notas d'esses livros, a todos os alumnos que tiverem completado a idade de escola.

§ 2.° Este attestado é gratuito, e contém unicamente, em referencia a cada uma das disciplinas, que constituem a instrucção primaria elementar, a nota de — sabe ou não sabe — segundo a capacidade do alumno.

§ 3.° Os alumnos das escolas particulares e os educados na familia são obrigados a obter, na escola publica da parochia a que pertencem, o attestado de instrucção primaria, sujeitando-se aos exercicios escolares, na epocha em que a commissão de instrucção elementar se reuna para verificar a aptidão dos alumnos das escolas publicas.

§ 4.° Os alumnos das escolas particulares e os educados na familia, que, aos dez annos de idade, não satisfizerem ao primeiro exercicio escolar, na proporção do ensino dado na escola publica, são obrigados á frequencia d'esta, d'ali por diante, até os treze annos.

§ 5.º Os alumnos das escolas publicas ou particulares, e os educados na familia, que o jury julgar habilitados nas disciplinas de instrucção elementar, antes de terminarem a idade da escola, podem ser dispensados de proseguir o ensino elementar; ficando comtudo obrigados a seguir o ensino complementar, até terminaram a idade de escola.

Art. 43.° O serviço militar no exercito e na armada será de um anno mais, alem do tempo marcado pelas leis, para todos os mancebos sorteados, que não tiverem attestado de instrucção primaria com boas notas.

§ unico. Entende-se, para o fim d'este artigo, por boas no-las, as do attestado, em que houver na maioria das disciplinas que constituem o ensino elementar o qualificativo de salte.

Art. 44.° Ha annualmente nas cabeças dos concelhos exames publicos de instrucção primaria, abrangendo as doutrinas do ensino elementar e complementar.

§ 1.° Compõe-se o jury d'estes exames do professor das escolas elementares com ensino complementar, de um vogal da junta escolar e do inspector do concelho.

§ 2.° O methodo e programma d’estes exames são determinados em regulamento especial.

§ 3.° Os resultados d'estes exames são consignados em livros especiaes, que devem ser conservados no archivo do concelho. D'esses resultados mandam as juntas escolares passar certidões gratuitamente, sempre que lhes forem requeridas.

CAPITULO VII

Da pensão de escola e da quota cívica de instrucção

Art. 45.º Para auxiliar na obrigação do ensino as familias pobres, que tenham creanças em idade de escola, é creado, em caria parochia ou parochias reunidas, um fundo destinado a formar pensões de escola, para os alumnos pobres, que obtenham attestado de instrucção primaria com boas notas.

§ 1.° Do recenseamento das creanças em idade de escola, a junta de parochia toma a rol as que pertençam a familias em circumstancias de pagar a quota cívica de instrucção, para o fundo de pensão de escola.

§ 2.° A quota cívica de instrução é distribuida por cada familia, na proporção do numero de creanças em idade de escola, e não póde exceder de 25 réis por semana e por creança.

§ 3.° A quota cívica de instrução é o maximo estipulado no § antecedente, por cada creança de seis a doze annos, que não frequentar a escola publica.

§ 4.° A quota cívica de instrução é paga em estampilhas

Página 109

109

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

do correio. A cobrança é semanal e faz-se na parochia ou parochias a que pertence a escola, por meio de um quaderno, em que estão inscriptos os nomes das creanças de cada familia, que contribue para o fundo de pensão de escola. N'esse quaderno o chefe de familia poe, na folha respectiva, as estampilhas que representam a sua quota civica.

§ 5.° No fim de cada semestre as juntas de parochia apresentam os quadernos ás delegações do correio, que no acto do pagamento inutilisam as estampilhas.

CAPITULO VIII

Da inspecção

Art. 46.° O reino e ilhas, para os effeitos da inspecção, é dividido em doze circumscripções escolares, dez para o continente e duas para as ilhas da Madeira e Açores; podendo comprehender cada circumscripção dois ou mais districtos administrativos.

§ unico. Cada circumscripção escolar é dividida em circulos escolares; podendo estes comprehender dois ou mais concelhos. O numero total dos circulos escolares não póde exceder de cincoenta.

Art. 47.° Em cada circumscripção escolar ha um inspector, em cada circulo escolar um sub-inspector, nomeados pelo governo e retribuidos pelo estado.

§ unico. O exercicio das funcções de inspector é incompativel com o de qualquer outro emprego publico.

Art. 48.° A nomeação para os logares de inspector ou subinspector é feita por tres annos.

§ unico. Os inspectores podem ser transferidos de urnas para outras circumscripções escolares, como melhor convenha ao serviço publico, não devendo nenhum d'elles residir mais de tres annos na mesma circumscripção escolar.

Art. 49.° Os vencimentos dos inspectores são: um ordenado fixo e uma gratificação.

§ 1.° O ordenado fixo é de 5000000 réis em Lisboa, Porto e no archipelago dos Açores, e de 4000000 réis nas circumscripções escolares dos outros districtos.

§ 2.° A gratificação é variavel, mas não póde exceder dois quintos do ordenado fixo.

Art. 50.° Os vencimentos dos sub-inspectores são: um ordenado fixo e uma gratificação.

§ 1.° O ordenado fixo é de 2500000 réis.

§ 2.º A gratificação é variavel, mas não póde exceder dois quintos do ordenado fixo.

Art. 51.° A nomeação para os logares de inspector e subinspector só póde recaír em individuos com capacidade legal para estes cargos.

§1.° constitue capacidade legal:

I — Diploma de approvação no ensino normal completo e attestado de haver servido cinco annos com distinção n'uma escola publica;

II — Diploma de exame de habilitação para o ensino complementar e attestado de haver servido dez annos com distinção n'uma escola publica.

§ 2.° Os attestados de que tratam os numeros I e II devem ser passados pela junta escolar e confirmados pelo inspector.

§ 3.° Os inspectores são escolhidos de entre os individuos que tenham desempenhado durante um triennio as funcções de sub-inspector.

Art. 52.° O governo determina em regulamentos as funcções e attribuições dos inspectores e sub-inspectores, e fixa as despezas correspondentes ao serviço da inspecção.

CAPITULO IX Das conferencias

Art. 53.° Ha em cada concelho, annualmente, conferencias de professores, presididas por um delegado da junta escolar, para o aperfeiçoamento dos methodos de ensino, e modo de resolver na escola as questões praticas da instrução.

§ 1.° As professoras de instrucção primaria podem tomar parte n’estas conferencias, ou não comparecendo, devem mandar o relatorio e programma da sua escola, com relação aos pontos sobre os quaes é ouvida a conferencia, nos termos d'este artigo.

§ 2.° Os professores que comparecem ás conferencias, recebem, nos dias de sessão a que assistirem, uma gratificação fixada pela camara municipal.

3.° As conferencias dos professores não devem durar mais de oito dias.

§ 4.° A conferencia consigna nas suas actas, dia a dia, todos os assumptos discutidos, e todas as opiniões por ella formuladas. O conjuncto d'estas actas constitue o relatorio da conferencia.

§ 5.° O sub-inspector toma parte nas conferencias dos professores.

Art. 54.° O inspector, encerradas as conferencias dos professores, reune em conferencia, os sub-inspectores da sua circumscripção escolar. A conferencia de inspecção, em vista das actas das conferencias dos professores e dos relatorios dos sub-inspectores sobre ellas redigidos, toma conhecimento dos assumptos e discute os resultados obtidos nas conferencias dos professores, formulando sobre as materias discutidas um relatorio que o inspector envia ao governo.

§ unico. As conferencias de inspecção não devem durar mais de oito dias.

CAPITULO X Das juntas escolares e dos delegados de parochia

Art. 55.° Ha em cada concelho uma junta escolar, composta: de tres vogaes, eleitos pela camara municipal; do subinspector do circulo escolar; de um representante das associações de beneficencia e de ensino, e na falla d'este, de um chefe de familia, designado pela camara municipal.

§ 1.° As funcções da junta escolar são obrigatorias e gratuitas; duram tres annos, findos os quaes se procede á eleição de nova junta.

§ 2.° Compete á junta escolar:

1.° Promover a execução da lei na creação das escolas;

2.° Propor, em caso de necessidade, a reunião de parochias para a creação de escola;

3.° Auctorisar a creação temporaria de escolas mixtas;

4.° Promover, nos logares em que não haja escola, e emquanto esta se não crear, cursos temporarios, segundo o disposto no artigo 23.°;

5.° Promover os cursos dominicaes, e cursos para adultos, artigo 22.°, e a formação de bibliotecas escolares;

6.° Designar na parochia ou parochias reunidas o local da escola;

7.° Approvar os planos de construcção e melhoramento dos edificios escolares e dos asylos de educação, e bem assim indicar as condições a que devem satisfazer as mobilais das aulas;

8.° Adoptar, de accordo com as deliberações das conferencias dos professores, os livros que devam ser seguidos nas escolas do concelho, ficando a escolha sujeita á approvação do inspector;

9.° Auxiliar as camaras municipaes na organisação das commissões promotoras de beneficencia e de ensino;

10.° Approvar a escolha de alumnos mestres feita pelos professores; '

11.° Impor multas aos professores e ajudantes que faltarem ás aulas sem auctorisação;

12.° Fiscalisar o cumprimento dos preceitos exarados n'esta lei, sobre o ensino obrigatorio;

13.° Fixar a epocha em que as juntas de parochia devem fazer o recenseamento das creanças em idade de escola, segundo o disposto no artigo 6.°, e fazer estatistica da instrução primaria no concelho;

14.° Nomear delegados para presidir ás conferencias dos professores, para fazer parte da commissão de instrucção elementar, e para constituir os jurys de instrução primaria;

15.° Fiscalisar os actos dos delegados das parochias nas suas relações com as escolas, e propor á junta de parochia a substituição dos que não cumprirem a lei;

Página 110

110

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

16.° Fixar o systema de applicação do fundo da pensão de escola nas parochias, e a retribuição do ensino complementar;

17.° Propor á camara municipal os individuos com capacidade legal, segundo o disposto nos artigos 31.º para exercer o magisterio primario ou servirem de ajudantes nas escolas -do concelho;

18.° Verificar se se dão as circumstancias em que se funda a gratificação de frequencia, e as gratificações de aproveitamento e de exames, segundo o disposto nos artigos 32.°, 33.° e 35.°, e determinar a concessão d'essas gratificações;

19.° Conceder licenças aos professores e ajudantes nos limites do artigo 37.°;

20.° Intervir nas penas disciplinares, segundo o disposto nos li do artigo 37.°, e no artigo 39.° e §§;

21.° Passar os attestados de instrucção primaria;

22.° Requisitar subsidios ao districto para as escolas, quando o municipio d'elles carecer;

23.° Por em pratica tudo que se julgue necessario para o exacto cumprimento d'esta lei, e para o progresso da instrucção e da educação.

Art. 56.° Ha, em cada parochia ou parochias reunidas, onde exista escola, um delegado da junta de parochia, escolhido por esta, de entre os seus membros eleitos, ou de entre pessoas estranhas.

§ 1.° As funcções de delegado de parochia são gratuitas e obrigatorias.

§ 2.° Compele ao delegado de parochia:

1.° Promover a execução da lei e dos regulamentos no seio da escola;

2.° Remetter á junta escolar, segundo o disposto no artigo 6.° e §, as relações trimestrais dos professores, e a relação das creanças em idade de escola, que são educadas na familia ou em escolas particulares;

3.° Fazer cumprir os preceitos exarados nos artigos 8.° e 11.° sobre o ensino obrigatorio;

4.° Tomar conhecimento das faltas dos alumnos e julgar da validade da sua justificação (§ 2.° do artigo 12.°);

5.° Dispensar excepcionalmente de frequentarem a aula de de tarde, segundo o disposto no § unico do artigo 13.°, os alumnos empregados em trabalhos agricolas e industriaes.

6.° Vigiar se os exercicios escolares duram o tempo marcado por lei, e no caso contrario dar parte ás juntas escolares;

7.° Fazer parte da commissão de instrucção elementar, que verifica a aptidão dos alumnos, pondo em execução os preceitos exarados nos artigos 41.°, 42.° e §§;

8.° Promover o cumprimento da obrigação imposta pelo artigo 45.° e §§, sobre a quota cívica;

9.° Informar a junta escolar ácerca de todos os assumptos da sua competencia em relação á escola;

10.° Requisitar subsidios ao concelho em nome da junta de parochia, sempre que a parochia d'elles carecer;

11.º Por em pratica tudo que seja necessario para o melhoramento da escola e progresso do ensino.

CAPITULO XI

Da dotação do ensino primario

Art. 57.° Os vencimentos dos professores e ajudantes de ambos os sexos, das escolas de instrucção primaria com ensino elementar e complementar, são encargo obrigatorio das camaras municipaes.

§ 1.° Incumbe ás juntas de parochia dar casa para as escolas, ministrar habitação aos professores, fornecer mobilia escolar, organisar a bibliotheca das escolas, e auxiliar com livros, papel e outros objectos os alumnos extremamente pobres.

§ 2.° As juntas geraes de districto consignara nos seus ornamentos annuaes as verbas indispensaveis para auxiliar os concelhos e as juntas de parochia, que carecerem de subsidio para satisfazer os seus encargos.

§ 3.° O governo propõe annualmente ás cortes uma verba, destinada a auxiliar o estabelecimento de escolas de instrucção primaria e de asylos de educação, e a construcção de casas para as escolas.

Art. 58.° São applicados ás despezas obrigatorias das camaras municipaes com as escolas de instrucção primaria:

1 — O producto da venda, aforamento, arrendamento ou cultura dos baldios municipaes;

II— As doações, legados e subsidios de individuos ou corporações;

III— Os rendimentos das confrarias, irmandades e estabelecimentos de beneficencia, que forem legalmente extinctos;

IV— As verbas consignadas annualmente nos orçamentos municipaes, indispensaveis para satisfazer aos encargos da instrucção primaria.

São applicados ás despezas obrigatorias das juntas de parochia:

I — O producto da venda, aforamento, arrendamento ou cultura dos baldios parochiaes;

II— As doações subsidios e legados de individuos ou corporações;

111 — As sobras dos rendimentos das confrarias, irmandades e estabelecimentos de piedade e beneficencia;

IV—O subsidio obrigatorio de 5 por cento do rendimento ilíquido de todas as irmandades e confrarias;

V— As verbas consignadas no orçamento parochial indispensaveis para satisfazer aos encargos da instrucção primaria.

CAPITULO XII

Disposições geraes

Art. 59.° O governo, de cinco em cinco annos, abre concurso para os livros destinados ás escolas de instrucção primaria, elementar e complementar.

§ 1.° Dos livros, sobre cada disciplina, que merecerem a primeira qualificação do jury, nomeado para este fim, mandará tirar uma edição de 10:000 exemplares, para serem gratuitamente dados aos auctores.

§ 2.° O prego dos livros preferidos pelo jury é laxado pelo governo.

Art. 60.° O governo constitue annualmente, nos logares em que julgar mais opportuno, jurys para examinar os candidatos ao professorado primario elementar e complementar.

§ unico. Estes jurys são compostos de tres membros, encarregados de classificar os candidatos, com capacidade para o ensino primario, pela ordem de merito, e de conferir diplomas aos que estiverem habilitados para exercer as funcções do magisterio primario.

Art. 61.° As escolas primarias serão providas de bibliotecas, contendo os livros necessarios para o estudo das disciplinas de instrucção primaria elementar e complementar.

Art. 62.° O governo apresenta todos os annos ás côrtes um relatorio sobre o estado da instrucção primaria em todo o reino.

Art. 63.° São objecto de disposições regulamentares todas as providencias necessarias para o exacto cumprimento d'esta lei.

Disposições transitorias

Art. 64.° Os actuaes professores vitalicios de instrucção primaria, de ambos os sexos, continuam a ser abonados pelo thesouro dos ordenados que presentemente lhes competem, e pelas camaras municipaes da gratificação estabelecida pelo artigo 26.° do decreto de 20 de setembro de 1844 até o 1.ª de Janeiro de 1873. D'essa data em diante são lhes pagos pelas camaras os seus vencimentos, nos termos d'esta lei.

§ 1.° As mesmas disposições são applicadas aos actuaes professores temporarios.

§ 2.° Os direitos adquiridos, em virtude das leis vigentes, são garantidos, para todos os effeitos, aos professores que actualmente exercem o magisterio primario.

Art. 65.° A obrigação do ensino começa desde o dia em que na parochia ou parochias reunidas, segundo o que dispõe o § unico do artigo 19.°, se estabeleça escola primaria para cada um dos sexos, ou escola mixta.

Página 111

111

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Art. 66.º Nenhuma escola actualmente em exercicio póde ser supprimida.

§ unico. As juntas de parochia são obrigadas a dar casa para aula, e habitação aos professores das escolas actuaes, nos lermos d'esta lei.

Art. 67.° As disposições d'esta lei, em relação á creação das escolas, devem estar em vigor no fim de dez annos, a contar da data da sua promulgação.

§ unico. As camaras municipaes e as juntas de parochia crearão e dotarão annualmente pelo menos a decima parte das escolas que lhes compete fundar nos lermos d'esta lei.

Art. 08.° As juntas escolares, logo depois de installadas nos diversos concelhos do reino, procedem á elaboração do plano geral provisorio das escolas, e á sua distribuição nos mesmos concelhos. Serão expressamente indicadas a reunião de parochias e a constituição de escolas mixtas n'este plano, o qual será entregue aos inspectores, no fim do primeiro semestre, e por estes remettido ao governo, a fim de servir á formação do plano provisorio das escolas do reino.

§ unico. Este plano póde ser successivamente modificado

pelas juntas escolares, todos os annos, até a completa execução da lei, segundo as regras estabelecidas.

Art. 69.° O governo, emquanto não houver pessoal habilitado para os cargos de inspector e sub-inspector, póde nomear extraordinariamente estes funccionarios de entre os professores de instrucção secundaria ou superior.

§ unico. Os professores assim nomeados conservam os seus actuaes vencimentos, quando sejam superiores aos dos cargos que váo exercer; se esses vencimentos forem inferiores aos dos logares para que são nomeados, recebem um suplemento de ordenado igual á differença.

Secretaria d’estado dos negocios do reino, em 20 de Janeiro de 1872. = Antonio Rodrigues Sampaio.

O sr. Presidente: — A camara vae reunir-se em commissões.

A ordem do dia para terça feira é a mesma que vinha para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quasi tres horas da tarde.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×