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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

13.ª SESSÃO

EM 5 DE ABRIL DE 1910

SUMMARIO. - Approvada a acta e lido o expediente, tem segunda leitura um projecto de lei da iniciativa do Sr. Visconde de Villa Moura, acerca da administração dos hospitaes da Universidade. Foi admittido. - O Sr. João Ulrich manda para a mesa o parecer da commissão de agricultura sobre importação, exportação e fabrico de açucar, melaço, etc., no archipelago da Madeira. - O Sr. Visconde de Coruche faz largas considerações ácerca da Cooperativa dos Viticultores de Portugal. Responde-lhe o Sr. Ministro das Obras Publicas (Moreira Junior). - O Sr. Claro da Ricca requer que se generalize a discussão, o que foi rejeitado, e manda para a mesa um projecto de lei equiparando os diplomas conferidos pelas escolas normaes e de habilitação aos do antigo curso complementar. Ficou para segunda leitura. - O Sr. Mario Monteiro allude ao prorogamento de prazo para o pagamento das contribuições do Estado. - Responde-lhe o Sr. Ministro da Fazenda (Soares Branco). - É rejeitada a urgencia do assunto que o Sr. Affonso Costa deseja tratar annunciando este Sr. Deputado avisos previos aos Srs. Ministros do Reino (Dias Costa) e das Obras Publicas (Moreira Junior), que manda para a mesa os documentos relativos á questão Hinton. - O Sr. Macedo Ortigão requer que se consulte a Camara sobre a publicação no Diario do Governo da informação da 3.ª Repartição de Instrucção Superior ácerca da reclamação de Antonio Cabreira. Annunciam avisos previos ao Sr. Ministro das Obras Publicas os Srs. Antonio José de Almeida, Pereira dos Santos e Oliveira Simões. - Requerem documentos os Srs. Estevam de Vasconcellos e Malheiro Reymão.

Na primeira parte da ordem do dia, eleição de commissões, o Sr. Antonio Cabral propõe a eleição de uma commissão de dezasete membros para apreciar a reforma da lei eleitoral e constitucional, e requer a urgencia com dispensa do regimento, o que foi approvado. - Seguidamente procede-se á eleição da commissão de negocios ecclesiasticos.

Na segunda parte, da ordem do dia, continuação da discussão do parecer n.° 3, fixação da força do exercito para o anno de 1910-1911, usam da palavra os Srs. Brito Camacho, Macedo Ortigão, Ministro da Marinha (Azevedo Continho) e Claro da Ricca, que fica com a palavra reservada, depois de se verificar que não havia na sala numero sufficiente de Srs. Deputados.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Presidencia ao Exmo. Sr. Conde de Penha Garcia

Secretarios - os Exmos. Srs.:

João José Sinel de Cordes
Visconde de Villa Moura

Primeira chamada. - Ás 2 horas da tarde.

Presentes: - 5 Srs. Deputados.

Segunda chamada. - Ás 2 horas e 45 minutos da tarde.

Presentes: - 54 Srs. Deputados.

São os seguintes: - Abel de Mattos Abreu, Affonso Augusto da Costa, Alfredo Carlos Le Cocq, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Amadeu de Magalhães Infante de La Cerda, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Alberto Charulla Pessanha, Antonio Augusto Pereira Cardoso, Antonio Centeno, Antonio Hintze Ribeiro, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Sérgio da Silva e Castro, Antonio Tavares Festas, Antonio Zeferino Candido da Piedade, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Pereira do Valle, Augusto Vidal de Castilho Barreto e Noronha, Aurelio Pinto Tavares Osorio Castello Branco, Carlos Augusto Ferreira, Christiano José de Senna Barcellos, Conde da Arrochella, Conde de Castro e Solla, Conde de Penha Garcia, Eduardo Valerio Augusto Villaça, Fernando de Sousa Botelho e Mello (D.), Francisco Xavier Correia Mendes, Henrique de Mello Archer da Silva, João Augusto Pereira, João Duarte de Menezes, João Henrique Ulrich, João José Sinel de Cordes, João Pinto Rodrigues dos Santos, João de Sousa Calvet de Magalhães, João de Sousa Tavares, Joaquim Heliodoro da Veiga, Joaquim José Pimenta Tello, José Bento da Rocha e Mello, José Estevam de Vasconcellos, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Oliveira Simões, José Maria Pereira de Lima, José Osorio da Grama é Castro, José Ribeiro da Cunha, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luis Vaz de Carvalho Crespo, Manuel Affonso da Silva Espregueira, Manuel de Brito Camacho, Mariano José da Silva Prezado, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Sabino Maria Teixeira Coelho, Visconde de Coruche, Visconde de Olliva, Visconde de Villa Moura.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Alberto Pinheiro Torres, Alexandre Correia Telles de Araujo e Albuquerque, Alfredo Pereira, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Bellard da Fonseca, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José de Almeida, Antonio de Macedo Ramalho Ortigão, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziot-ti, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto de Castro Sampaio Côrte Real, Conde de Azevedo, Eduardo Frederico Schwalbach Lucci, Ernesto Julio de Carvalho e Vasconcellos, João do Cauto e Castro Silva Antunes, João Carlos de Mello Barreto, João Soares Branco, Joaquim Mattoso da Camara, Joaquim Pedro Martins, Jorge Vieira, José Antonio da Rocha Lousa, José de Ascensão Guimarães, José Augusto Moreira de Almeida, José Caeiro da Matta, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Jeronimo Rodrigues Monteiro, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Malheiro Reymão, José Maria Cordeiro de Sousa, José Maria de Moura Barata Feio Terenas, José Maria de Queiroz Velloso, José Mathias Nunes, José Victorino de Sousa e Albuquerque, Luis Filippe de Castro (D.), Luis da Gania, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Nunes da Silva, Manuel Telles de Vasconcellos, Rodrigo Affonso Pequito, Thomas de Almeida Manuel de Vilhena (D.), Thomas de Aquino de Almeida Garrett, Vicente de Moura Coutinho de Almeida d'Eça.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Abilio Augusto de Madureira Beça, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre Braga, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Antonio de Almeida Pinto da Motta, Antonio Alves Oliveira Guimarães, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio José Garcia Guerreiro, Antonio Osorio Sarmento de Figueiredo, Antonio Rodrigues Costa da Silveira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Conde de Mangualde, Conde de Paçô-Vieira, Diogo Domingues Peres, Duarte Gustavo de Roboredo Sampaio e Mello, Eduardo Burnay, Emygdio Lião da Silva Junior, Ernesto Jardim de Vilhena, Fernando de Almeida Loureiro e Vasconcellos, Fernando Augusto Miranda Martins de Carvalho, Francisco Joaquim Fernandes, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Miranda da Costa Lobo, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Henrique de Carvalho Nunes da Silva Anachoreta, João Correia Botelho Castello Branco, João Ignacio de Araujo Lima, João Joaquim Isidro dos Reis, João José da Silva Ferreira Neto, João Pereira de Magalhães, Joaquim Anselmo da Matta Oliveira, José Antonio Alves Ferreira de Lemos Junior, José Cabral Correia do Amaral, José Caetano Rebello, José Francisco Teixeira de Azevedo, José Joaquim da Silva Amado, José Julio Vieira Ramos, José Maria Joaquim Tavares, José Maria de Oliveira Mattos, José Paulo Monteiro Cancella, José dos Santos Pereira Jardim, Libanio, Antonio Fialho Gomes, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avides, Matheus Augusto Ribeiro de Sampaio, Miguel Augusto Bombarda, Paulo de Barros Pinto Osorio, Roberto da Cunha Baptista, Visconde de Reguengo (Jorge), Visconde da Torre.

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SESSÃO N.° 13 DE 5 DE ABRIL DE 1910 3

ABERTURA DA SESSÃO - Ás 3 horas da tarde

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio do Reino, enviando o decreto pelo qual Sua Majestade El-Rei houve por bem nomear, pela, ordem por que vão designados, para supprirem o eventual e simultaneo impedimento dos Exmos. Srs. Presidente e Vice-Presidente da Camara, os Srs. Deputados José Joaquim da Silva Amado e Francisco Miranda da Costa Lobo.

Foi lido.

Do Ministerio da Marinha, participando que, sendo extraordinariamente grande o processo de syndicancia aos antigos juiz e subdelegado do extincto julgado municipal da Ilha do Principe. Dr. Antonio Simões Raposo e Dr. Alvaro Cesar Correia Mendes, não foi possivel tirar copias, achando se n'aquella Secretaria de Estado o original, para ser consultado pelo Sr. Deputado José Francisco Teixeira de Azevedo.

Para a secretaria.

Dos empregados da secretaria do Governo Civil de Castello Branco, pedindo melhoria de vencimento.

Para a secretaria.

A Camara ouve, de pé, a leitura feita pelo Sr. Presidente do decreto real nomeando os supplentes á presidencia e vice-presidvncia da Camara.

Decreto

Tomando em consideração a proposta da Camara dos Senhores Deputados da Nagão, e em vista do artigo 1.° da carta de lei de 3 de setembro de 1842: hei por bem nomear para supprirem, pela ordem por que vão designados, o eventual e simultaneo impedimento do Presidente e Vice-Presidente da mesma Camara os Deputados José Joaquim, da Silva Amado e Francisco Miranda, da Costa Lobo.

O Presidente da Camara, dos Senhores Deputados da Nação assim o tenha entendido e faça constar á mesma Camara.

Paço em 10 de março de 1910. = REI. = Francisco Felisberto Dias Costa.

O Sr. Presidente: - Como os Srs. Deputados nomeados não se acham presentes, prestarão juramento em occasião opportuna.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - A sciencia medica tem nos ultimos tempos seguido um percurso largo da mais patente e opportuna utilidade.

A este percurso não tem sido estranha a faculdade de medicina da Universidade de Coimbra, de ha muito assinalada pelas melhores tradições, e sempre servida por algumas das mais notaveis individualidades, que podem encarecer e documentar a mentalidade portuguesa.

E, entretanto, a legislação hospitalar de Coimbra depara-se-nos num lamentavel atraso, que mal condiz com a etiqueta dos estabelecimentos em que prove.

É que, segundo verificámos, os chamados hospitaes da Universidade são principalmente estabelecimentos de dependencia do poder central, arquem sobretudo se alligam pelos laços económicos, estão affectos incidentemente á faculdade de medicina, e de facto e alem de tudo adstrictos ao mando um tanto largo do administrador, que pouco interessa ou entende com a jurisdição virtual concedida á Universidade.

Ora foi do exame e revisão cuidada de tal legislação que resultou a ideia da presente lei, que destinamos a exprimir o principio da descentralização a favor do ensino.

Este projecto é alem de tudo lógico, com autonomia universitaria, ultimamente tão encarecida; e firma em bases novas, e nomeadamente no criterio da especialização, a pratica hospitalar, o serviço escolar e assistencia publica.

Estes fitos foram tambem as primeiras razões do actual projecto.

E cremos que no seu urdimento tem o primeiro logar. Poderá tambem parecer que incluimos materia regulamentar nas disposições que articulámos.

O facto é, ao menos em parte, propositado. Pareceu-nos de necessidade expressar bem ás bases em que os serviços hospitalares tinham de ser regulamentados. E isto para nos forçarmos á contingencia do inverso do que fizemos. De facto, a lei de julho de 1856 já exprimiu bem frisantemente que á faculdade pertencia a superintendencia hospitalar. E, no entretanto, os regulamentos que derivam desta lei centralizam no Governo o mais da sua administração.

Por isso nos encostamos á ideia inversa que preferimos. Taes, em breves palavras, as razões do presente projecto de lei:

Artigo 1.° A administração geral dos Hospitaes da Universidade de Coimbra, dependencias e estabelecimentos annexos comprehende os serviços da faculdade de medicina destinados á pratica escolar, e a assistencia medico-cirurgica do districto.

Art.º 2.° Esta administração está sob a autoridadee dependencia da faculdade de medicina e do Ministerio do Reino, e é exercida por um administrador, escolhido de entre o corpo do professorado, e um conselho fiscal.

Art. 3.° O administrador é nomeado pelo Ministro do Reino triennalmente, sob proposta da faculdade de medicina, a quem incumbe indicar o professor mais votado para tal cargo, e o conselho fiscal é nomeado tambem de tres em tres annos, em congregação da faculdade, e compõe-se de cinco membros.

Art. 4.° A faculdade de medicina pertence:

1.° A inspecção e direcção scientifica dos hospitaes e estabelecimentos annexos, a superintendencia económica, a questão disciplinar e o provimento do pessoal inferior, serviços que exerce por si e pelo administrador, conselho fiscal e directores de enfermaria, tudo de harmonia com a presente lei e diplomas regulamentares que d'ella promanem;

2.° Informar as propostas do administrador ao Governo para o provimento do clinico interno, secretario da administração official da secretaria, thesourciro, capellão e pessoal de pharmacia;

3.° Nomear todos os demais empregados mediante proposta ou informação do administrador, e ainda dos directores das enfermarias, sempre que se trate dos serviçaes que respeitem a taes repartições;

4.° Autorizar obras inferiores a 200$000 réis, e propor

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ao Governo todas aquellas que, parecendo necessarias, excedam tal verba;

5.° Propor ao Governo os regulamentos e reformas precisas para garantia e boa effectivação da assistencia publica hospitalar e pratica escolar;

6.° Ver as receitas e despesas geraes, apreciando ou discutindo o orçamento apresentado pela administração, que seguirá, com as alterações propostas e approvadas em congregação, á approvação do Governo;

7.° Nomear triennalmente os cinco membros que devem fazer parte do conselho fiscal;

8.° Dirigir os serviços das enfermarias, que deverão ser distribuidos pelos professores segundo as cadeiras e especialidades a que se entregarem, e bem assim o trabalho do banco dos hospitaes e despensatorio pharmaceutico;

9.° Prover á revisão e reforma do formulario e tabella de dietas, annualmente.

Art. 5.° Ao administrador pertence:

1.º Propor ao Governo, mediante informação da faculdade, a nomeação do clinico interno, secretario da administração, official de secretaria, thesoureiro capellão e pessoal de pharmacia;

2.° Suspender disciplinarmente o pessoal menor até quinze dias, propondo e instruindo perante a faculdade o pedido de penas superiores nos termos dos regulamentos;

3.° Informar ácerca de todas as vagas a prover no pessoal, propondo ou dando parecer ácerca dos concorrentes;

4.° Fiscalizar a receita e despesa dos hospitaes, dependencias e estabelecimentos annexos, tomando conta mensalmente ao enfermeiro, fiscal e thesoureiro; autorizar e assinar as folhas de despesas e prestar annualmente contas da sua gerencia, cujo relatorio irá com o parecer do conselho fiscal á faculdade para que ahi tenha o visto ou novo parecer em separado, fazendo seguir tudo ao Tribunal de Contas até 31 de outubro de cada anno.

5.° Satisfazer as requisições feitas pelo pessoal clinico e de pharmacia nos termos dos regulamentos, quer para o effeito da pratica docente, quer para a effectivação da assistencia publica do districto.

6.° Reunir e consultar os clinicos, quando o julgue conveniente á direcção geral dos serviços que lhe são affectos.

7.° Remetter annualmente aos governadores civis dos districtos administrativos os mappas de despesa feita pelos doentes pobres e que tenha de ser satisfeita pelas camaras e misericordias.

8.° Prover a todos os demais actos que entendam com o serviço da administração e derivem naturalmente do cargo e leis em vigor.

9.° Organizar o orçamento para ser presente á faculdade, que, depois de o ter visto e discutido, o enviará ao Governo nos termos já prescritos.

Art. 6.° No impedimento temporario do admininistrador pertence ainda á faculdade indicar quem deva substitui-lo.

Art. 7.° O conselho fiscal tem a seu cargo:

1.° Dar parecer sobre as contas e orçamento apresentado pela administração.

2.° Informar e inquirir dos processos disciplinares requeridos contra qualquer empregado.

3.° Promover, auxiliar e propor perante a faculdade tudo o que seja de molde a garantir os direitos da mesma no que entender com a administração, inspecção e solicitações de reforma dos hospitaes e estabelecimentos dependentes.

Art. 8.° O corpo clinico dos hospitaes da Universidade exerce as funcções do ensino e assistencia publica nos serviços geraes e especiaes das enfermarias, que se repartem em clinicas medicas e clinicas cirurgicas;

Art. 9.° Haverá cinco divisões de clinicas medicas, a saber: a clinica medica geral, a clinica syphilitica e dermatológica, a clinica nevrologica e psychiatrica, a clinica de pediatria medica e a clinica de doenças infecto-contagiosas; as clinicas cirurgicas comprehendem: a clinica cirurgica geral, a clinica obstetrica, a clinica de vias urinarias, a clinica de pediatria cirurgica e orthopedica, a clinica de ophthalmologia - e a clinica otorhinolaringologica.

Art. 10.° A faculdade de medicina distribuirá entre os seus membros estas clinicas, tendo em attenção as habilitações, as cadeiras e especialidades de cada um.

Art. 11.° Haverá tantas consultas externas quantos os serviços indicados, consultas que serão feitas pelos professores a quem aquellas estiverem distribuidas, á excepção da clinica medica geral e da clinica cirurgica geral, que respectivamente serão dirigidas pelo professor de pathologia interna e de pathologia cirurgica.

Art. 12.° A faculdade delibera sobre as substituições dos clinicos, nos casos do seu impedimento temporario, excepto se isto se der com os directores de clinica medica geral e clinica cirurgica geral, que teem por substitutos obrigados respectivamente o professor de pathologia interna e o professor de pathologia cirurgica.

Art. 13.° O professor de pathologia cirurgica e o professor de pathologia interna teem como remuneração dos serviços prescritos pelos artigos anteriores a gratificação que consta da tabella annexa a esta lei.

Art. 14.° O pharmaceutico do dispensatorio dos hospitaes é nomeado pelo Governo mediante concurso documental, proposta do administrador e informação da faculdade.

Art. 15.° O secretario da administração dos hospitaes tem a seu cargo a escrituração da secretaria e conselho fiscal e a guarda e a conservação do archivo.

Art. 16.° O official auxilia o secretario n'aquelles serviços e substitue-o nos seus impedimentos.

Art. 17.° O thesoureiro, que é nomeado pelo Governo nas condições já expressas, presta caução no acto da posse e tem a seu cargo a cobrança dos rendimentos dos estabelecimentos hospitalares, os pagamentos legalmente autorizados, a prestação mensal de contas ao administrador, e ao conselho fiscal, quando este o exigir.

Art. 18.° Os vencimentos dos empregados superiores são expressos na tabella junta; os do pessoal inferior constam do orçamento annual.

Art. 19.° A receita ordinaria dos hospitaes da Universidade e estabelecimentos annexos comprehendem:

1.° As rendas dos bens de raiz ainda não desamortizados;

2.° As prestações fixas com que concorre a Misericordia de Coimbra e demais estabelecimentos de beneficencia:

3.° As quantias despendidas pelas camaras e misericordias das differentes localidades para o pagamento obrigatorio dos doentes pobres que lhes respeitar e sejam recebidos nos hospitaes;

4.° Os juros das inscrições averbadas e capitães mutuados em seu nome;

5.° As quantias inscritas no Orçamento Geral do Estado que lhes forem consignadas;

6.° As receitas provenientes do tratamento dos doentes dos quartos particulares e doentes militares;

7.° A venda dos productos pharmaceuticos no dispensario.

Art. 20.° O Governo, ouvido o conselho da faculdade de medicina decretará os regulamentos complementares desta lei, estatuindo as medidas necessarias á sua execução e garantia.

Art. 21.° Fica regovada a legislação em contrario.

Sala das sessões. = Visconde de Villa Moura.

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SESSAO N.º 13 DE 5 DE ABRIL DE 1910 5

Tabella de vencimentos a que se referem os artigos. 13.° e 18.° d'este diploma

[Ver tabela na imagem]

O Deputado, Visconde de Villa Moura.

Foi admittido e enviado ás commissões de administração publica, de saude e de fazenda.

O Sr. João Ulrich: - Mando para a mesa o parecer da commissão de agricultura sobre a proposta de lei n.° 7-Q, regulando desde a publicação desta lei em deante, até 31 de dezembro de 1918, a importação e exportação de açucar, de melaço de cana de açucar, de aguardente e de alcool, o fabrico e o commercio d'estes productos e compra de cana saccarina, no archipelago da Madeira.

Foi mandado imprimir e distribuir.

O Sr. Visconde de Coruche: - Vae tratar de um assunto de gravidade que já versou. Refere-se ao negocio da Cooperativa dos Viticultores de Portugal. Sabe-se que reuniu no domingo passado a assembleia geral da cooperativa, onde, quasi isolado, combateu os actos praticados n'essa sociedade. Não vem agora discutir a illegalidade ou legalidade da entrada dos commerciantes para a cooperativa. Não quer discutir se o facto de individuos terem a producção de algumas cepas de vinha lhes dá direito de serem denominados viticultores e entrarem na cooperativa com milhares de pipas de vinho que adquiriram por baixo preço. Não pergunta, agora, se foi para esse fim que o Parlamento votou a garantia de juro ás obrigações dessa cooperativa no intuito de salvar a viticultura. Ouviu dizer na assembleia geral que a entrada desses negociantes para a cooperativa tinha sido um negocio da China. Por isso ha de combater esse facto a despeito de quaesquer ameaças em cartas anonymas. E uma questão de moralidade que ha de ter quem d'ella se occupe.

Mas vae agora tratar da questão da cooperativa, sob um aspecto novo:

A lei de 3 de abril do 1896, que alterou o decreto de 25 de setembro de 1890, diz no artigo 3.° que os Pares do Reino não podem, no exercicio do seu cargo, fazer parte de sociedades que tenham concessões ou recebam beneficios do Estado.

Ora faz parte do conselho de administração da cooperativa um digno Par do Reino que está em exercicio das suas funcções de Par do Reino, e desde que a lei é expressa a este respeito, desde que considera nullos todos os actos e contratos praticados pelos Pares do Reino, nestas circunstancias, estão nullos os actos e contratos celebrados pela Cooperativa dos Viticultores de Portugal.

O Sr. Affonso Costa: - É o que diz o Codigo Commercial.

O Orador: - Sendo Deputado, entende que deve versar este assunto, porque, tràtando-se de uma sociedade que recebe do Estado beneficios, como é a garantia do juro ás suas obrigações, o Governo não pode desinteressar-se d'esta questão. Pergunta-se o Governo deu instrucções ao seu delegado junto da cooperativa, no intuito de remediar os effeitos do facto a que se refere.

Quer tambem alludir, com os devidos melindres, visto, não o saber officialmente, ao facto de terem sido celebrados contratos entre a cooperativa e alguns dos seus empregados para a concessão de percentagens a esses empregados.

Como accionista, revoltou-se contra o facto de se darem percentagens sobre o producto bruto das vendas feitas pelos empregados dessas cooperativas e entende que o Estado tem de intervir neste assunto, que reputa grave, porquanto a percentagem dos lucros recebida por esses empregados é de 1,8 por cento sobre o producto bruto das vendas.

Ora e possivel que o movimento das vendas da cooperativa ande por cerca de 3:000 contos de réis. Portanto, a percentagem recebida por esses empregados será de 54 contos de réis por anno, o que, em face do subsidio votado pelo Parlamento á cooperativa, para o pagamento do juro das suas obrigações, é um escandalo, visto que o Parlamento fez esse sacrificio para proteger a viticultura.

Espera que o Governo fará tudo quanto possa para obstar a que a cooperativa siga nesse caminho, porque, em vez de beneficiar a viticultura, vae beneficiar interesses de particulares.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Moreira Junior): - Ouvi com a devida attenção as considerações feitas pelo illustre Deputado o Sr. Visconde de Coruche.

Particularmente chamou S. Exa. a attenção do Governo para um facto que S. Exa. julga de uma extraordinaria importancia e de uma accentuada gravidade. Alludiu ao facto hontem levantado por S. Exa. na Cooperativa Vinicola, relativamente á nullidade dos actos em que tem intervindo o Sr. Conde da Ribeira Grande, attenta a circunstancia de desempenhar funcções de Par do Reino e tambem de membro do conselho administrativo da cooperativa.

O illustre Deputado chamou, a attenção do Governo, dizendo que elle não pode desinteressar-se do assunto.

Ouvi as considerações do illustre Deputado, ouvi a leitura do artigo da carta de lei de abril de 1896, que S. Exa. aqui fez, mas cumpre-me dizer ao illustre Deputado que a lei está revogada. O que rege, o que está assente, não é o artigo que S. Exa. acabou de ler, é um outro preceito legal que na legislação se acha estabelecido. A carta de lei de 30 de abril de 1901, mandando revogar toda a legislação em contrario, nitidamente estatue quaes são os preceitos que ácerca dos Dignos Pares do Reino devem decidir no que toca ás suas responsabilidades. (Muitos apoiados).

Essa carta de lei diz assim:

(Leu).

Portanto a lei de 1896 está revogada pela lei de 1901.

É a lei de 1899 estatuo clara e precisamente quaes são as incompatibilidades dos Srs. Deputados que ficam applicadas aos Dignos Pares do Reino.

São as seguintes:

(Leu).

Quer dizer: estatue-se em relação aos Dignos Pares do Reino, no que toca ás suas incompatibilidades e com revogação da legislação em contrario, precisamente que se encontrava estatuido em 1899 para os Deputados da Nação Portuguesa.

As considerações feitas pelo illustre Deputado, por-

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tanto, no que toca á lei de abril de 1896, estão revogadas.

Cumpre-me tambem dizer a S. Exa. que, segundo as informações que me foram dadas, deve hoje ser, na Procuradoria Geral da Coroa, dado o parecer que a proposito de varias perguntas que foram feitas se tornava absolutamente necessario, para saber qual a attitude do governo em face da cooperativa dos viticultores portuguezes. Quer dizer, dentro em poucos dias eu terei em meu poder esse parecer, que, sommado com todas as outras informações pedidas ás repartições competentes, elucida completamente a questão.

Como o illustre Deputado tem um aviso prévio sobre este assunto, eu reservar-me-hei para logo que esteja de posse das informações respectivas dizer a S. Exa. que estou á sua disposição para versar o assunto na forma e nos termos que S. Exa. entender e quizer. (Apoiados}.

(O orador não reviu).

O Sr. Claro da Ricca: - Antes de me referir ao assunto para que pedi a palavra, não posso deixar de dizer, em face da resposta do Sr. Ministro das Obras Publicas, que as explicações do Governo são deficientissimas e não satisfazem a Camara. S. Exa. citou uma lei que de forma alguma podia revogar uma disposição constitucional. A lei citada pelo Sr. Ministro é uma lei ordinaria, e esta, repito, não pode revogar o que está expresso na lei constitucional.

Por isso, estando no uso do palavra, faço a declaração de que as explicações não satisfazem a Camara, e nesses termos mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que se generalize a discussão do assunto da questão vinicola, sobre que tão deficientes foram as explicações do Governo, abrindo-se sobre o incidente uma inscrição especial, com prejuizo da ordem do dia. = Claro da Ricca.

Vou apresentar um projecto de lei, que sei ter a sympathia de muitos Srs. Deputados dos varios agrupamentos representados na Camara, o qual tem por fim remediar um erro grave, reconhecido até pelas estações officiaes, no tocante á apreciação dos diplomas dos professores primarios para o effeito do provimento dos logares.

A lei não faz distincção entre a categoria dos diplomas dos professores complementares, e actuaes professores diplomados pelas, escolas normaes, e pelas escolas de habilitação para o magisterio primario.

Mas, por uma portaria de interpretação da lei, assentou-se na doutrina, e assim, se tem praticado, que os diplomas do antigo curso complementar teem, para o effeito do provimento, preferencia sobre os diplomas das escolas normaes e actuaes escolas de habilitação para o magisterio primario. Parece-me injusta esta doutrina da portaria, que vê absolutamente discordante da lei geral sobre o assunto.

Para evitar essa grande injustiça que se está praticando no provimento desses professores, elaborei o meu projecto de lei, sobre o qual tive o cuidado de consultar o Sr. director geral de instruccão primaria.

Esse projecto de lei tem por fina equiparar os diplomas actualmente conferidos pelas escolas normaes e de habilitação para o magisterio primario aos que possuem os alumnos do antigo curso, complementar.

Ficou para segunda leitura.

O Sr. Presidente: - Vae ler-se o requerimento do Sr. Claroo da Ricca.

É lido na mesa, sendo posto á votação.

O Sr. Presidente: - Approvaram o requerimento 32 Srs. Deputados e rejeitaram-no 44.

O Sr. Aifonso Costa: - Requeiro a contraprova. Procede-se á contraprova.

O Sr. Presidente: - Rejeitaram o requerimento 41 Srs. Deputados e approvaram-no 32;

O Sr. Mario Monteiro: - Peço a V. Exa., Sr. Presidente, o obsequio de fazer avisar o Sr. Ministro da Fazenda, que se encontra nos corredores, de que desejo referir-me a S. Exa. no assunto para que pedi a palavra.

(Pausa).

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra para um negocio urgente.

(Entra na sala o Sr. Ministro da Fazenda).

O Orador: - Sr. Presidente: teem sido commettidos abusos e illegalidades pelo r. Ministro da Fazenda no tocante ao prazo para o pagamento voluntario das contribuições geraes do Estado.

E vulgar - quasi quotidiano - ver nos jornaes de grande informação, a noticia de que o Sr. Ministro da Fazenda mandou prorogar por um mês, por quinze dias ou por dois dias o prazo para esse pagamento em varios concelhos, e até ultimamente se encontra n'esses jornaes a informação de que S. Exa. está disposto a dar prorogação de prazo em determinados concelhos.

Estas successivas noticias despertaram me a attenção e o desejo de saber se realmente o Sr. Ministro da Fazenda procedia bem, porque em principio me parecia absolutamente contraditorio, em todos o& seus actos, em todos os principios que regulam as attribuições dos diversos poderes do Estado, arrogando-se a faculdade de prorogar a seu arbitrio, por um simples despacho, o prazo estabelecido por lei, para pagamento de contribuições. (Apoiados).

Mas, Sr. Presidente: com surpresa direi, até com admiração, que o Sr. Ministro da Fazenda estava procedendo com generosidade e magnanimidade, concedendo prorogação de prazo, quando o prazo consignado na lei ainda não se acha determinado.

O acto do Sr. Ministro tem dado ensejo á desordem nos serviços de fazenda onde ninguem se entende.

Anteriormente a 1901, era o assunto regulado pelo decreto de 31 de dezembro de 1897, o qual determinava que as contribuições predial, industrial, de renda de casas e sumptuaria seriam pagas em duas prestações, a primeira em janeiro e a segunda com vencimento no mês de julho do anno seguinte áquelle a que se referia o lançamento, relativamente a Lisboa e Porto.

Simplesmente no que respeitava á contribuição de renda de casas e sumptuaria estabelecia-se que ficava em vigor uma disposição da legislação anterior, e relativamente a contribuição de decima de juros, constante do decreto de 3 de julho de 1896, pelo qual se determinava que a contribuição seria paga por uma só vez, com vencimento .desde 2 de janeiro até fevereiro, isto é, no prazo de 30 dias.

Esta era a legislação que vigorava anteriormente a 1901; mas em 1901, por um decreto de 24 de fevereiro do mesmo anno, no artigo 109.°, o Sr. Ministro da Fazenda de então determinou que o prazo para o pagamento de contribuições geraes do Estado, as rendas de casas e sumptuaria, as contribuições prediaes, e as decimas de juro seria de seis em seis meses, desde1 janeiro até 30 de junho, que a contribuição poderia ser paga inclusivamente era seis prestações, comtanto que se dessem determinadas circunstancias.

Isto é perfeitamente claro, é uma disposição perfeitamente determinante, e que se acha absolutamente em vi-

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gor, porque não houve nenhuma disposição de lei, nem decreto que a revogasse.

Foi isto posto em execução ha de haver dois a tres annos, mas accentuadamente agora é que esta disposição tem sido desrespeitada.

Eu poderia, ter dirigido ao Sr. Ministro da Fazenda um aviso previo sobre o caso, mas tinha receio de que S. Exa. se desgostasse por eu vir trazer uma questão que porventura S. Exa. não tivesse estudado.

Porque é que se fez a prorogação do prazo?

Por conseguinte não terminou ainda o prazo para o pagamento das contribuições relativas ao anno passado, que linda no dia 30 de julho d'este anno.

O Sr. Ministro da Fazenda tem feito de magnanimo prorogando o prazo para o pagamento das contribuições em diversos concelhos Mas porque razão procedeu S. Exa. assim?

Em que se estriba para adoptar um tal procedimento?

Eu vou antecipar a resposta de S. Exa. O artigo 113.° do decreto de 4 de dezembro de 1901 diz o seguinte:

(Leu).

Isto não quer dizer que a execução do decreto ficava dependente das instrucções, mas que o Governo auxiliaria a execução desse decreto no que fosse necessario, e tanto não se entendeu nunca que o decreto ficava dependente da publicação das instrucções, que immediatamente entravam em execução varias das suas disposições.

O decreto tem cento e tantos artigos e varios capitulos, que tratam do seguinte:

(Leu).

Relativamente á materia de alguns d'estes capitulos poderia haver necessidade, para a completa execução do decreto, da publicação de algumas instrucções, mas eu pergunto ao Sr. Ministro da Fazenda, á sua boa fé, se relativamente ao prazo para o pagamento das contribuições havia necessidade de quaesquer instrucções, se isto não é uma disposição que carece de instrucções para que entrasse em execução? Fixou-se simplesmente o prazo e nada mais.

Ao passo que o decreto de 1901 determinava que não se podiam impor multas, lançar juros de mora, começar o relaxes e não em setembro, o Sr. Ministro da Fazenda, pela forma como tem procedido, tem lançado a anarchia nos serviços da fazenda, porque os recebedores procedem uns de uma forma e outros de outra, de maneira que ninguém se entende.

Como ha pouco disse, o Sr. Ministro da Fazenda tem procedido com dupla illegalidade sobre a maneira como interpreta a lei, mandando exigir o pagamento das contribuições antes de terminar o prazo, exigindo juros de mora e ordenando que se faça o relaxe.

Mas ha mais. O Sr, Ministro da Fazenda tem praticado outras illegalidades. E que pelo seu procedimento julga-se com o direito de alterar o prazo que está na lei para o pagamento das contribuições.

Quanto ao serviço de impostos, lançamento, cobrança e tudo que lhe diga respeito, deve ser determinado pelo Parlamento, e portanto o Sr. Ministro da Fazenda não podia, por um simples despacho seu, nem por uma portaria, nem por lei, alterar o prazo.

Comprehende-se que por circunstancias excepcionaes extraordinarias, uma calamidade publica, por exemplo, como tem acontecido com os lavradores do Alemtejo isso se fizesse. Admittia-se que o Governo, estando as Cortes fechadas, usando do direito que lhe confere o Acto Addicional, alterasse, o prazo para o pagamento das contribuições, mas o Sr. Ministro da Fazenda, simplesmente, por uma portaria, por um despacho que nem sequer foi publicado no Diario ao Governo; lançar mão d'esse meio, um abuso, é uma illegalidade, por haver praticado acto que lhe não pertencia. (Apoiados).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Affonso Costa:- Eu tinha pedido a palavra para um negocio urgente.

O Sr. Presidente: - Tem V. Exa. razão.

O Sr. Affonso Costa: - Se a resposta do Sr. Ministro é rápida então cedo a palavra, de contrario usarei do meu direito.

O Sr. Ministro da Fazenda (Soares Branco): - É melhor o Sr. Deputado usar do seu direito.

O Sr. Presidente: - Convido o Sr. Deputado a expor o assunto do negocio urgente.

(Pausa).

O assunto do negocio urgente do Sr. Affonso Costa é seguinte:

Negocio urgente

Tendo o Sr. Ministro das Obras Publicas, no propósito de defender a illegalissima União Vinicola, mostrado desconhecer os mais elementares preceitos sobre interpretação e execução de leis, desejo occupar-me immediatamente das gravissimas declarações que S. Exa. fez ácerca das leis de 30 de abril de 1901 e 26 de julho de 1899, afirmando, com erro imperdoavel e com grave perigo para o Estado, que essas leis substituiram, apesar de meramente ordinarias, a disposição constitucional, relativa aos limites e Atribuições dos poderes politicos, do artigo 3.° do Acto Addicional de 3 de abril de 1896. = Affonso Costa.

O Sr. Presidente: - Os Srs. Deputados que entendem que deve ser tratado este negocio urgente, com prejuizo da ordem do dia, teem a bondade de se levantar. Vae proceder se á contagem.

(Pausa).

Foi rejeitada a urgencia por 60 votos contra 30.

O Sr. Affonso Costa: - Offensas ás disposições constitucionaes ficam sem discussão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Ministro da Fazenda.

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra para outro negocio urgente.

O Sr. Ministro da Fazenda (Seares Branco): - Vou procurar responder ao discurso do illustre Deputado Sr. Mario Monteiro.

O Discurso de S. Exa. surprehendeu-rae porque é costume os Ministros da Fazenda serem accusados pelos Srs. Deputados por exercerem demasiada pressão sobre o contribuinte, para o pagamanto das suas contribuições; mas o Sr. Mario Monteiro no começo do seu discurso do que principalmente me accusou foi da magnanimidade com que eu procedi, concedendo prorogação do prazo para o pagamento das contribuições.

O Sr. Mario Monteiro: - Dava por favor o que era de direito.

O Orador: - Não me admiro da interrupção do illustre Deputado. Temperamentos como o de S. Exa. e como o meu, a isso estão sujeitos.

Depois o Sr. Mario Monteiro voltou ao seu papel de censor, começando por me accusar de extorquir ao contribuinte quantias que não tinha direito a receber.

Eu vou responder ao illustre Deputado e á Camara o

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mais simplesmente, sem empregar nenhuns dos processos a que S. Exa. se referiu.

Comecei por conceder a prorogação do prazo para o pagamento das contribuições, aos contribuintes, mas, Sr. Presidente, se a concedi foi por causa dos estragos que tinha havido em muitos dos pontos do país; e só depois de devidamente informado fui concedendo essa prorogação.

Criticou S. Exa. que eu a tivesse concedido.

O Sr. Mario Monteiro: - Não me fiz comprehender. O caso é este: terminou ou não o prazo para pagamento de contribuições? Terminou em 30 de junho, e, portanto, estar a dar prorogação é commetter um abuso.

O Orador: - Irei mais depressa para satisfazer a ansia do illustre Deputado.

Procedi este anno exactamente como se tem procedido em todos os annos.

A disposição do decreto de 1901 a que o illustre Deputado se referiu não está em vigor. É esta a questão de facto.

O Sr. Presidente: - Previno o Sr. Ministro da Fazenda de que faltam apenas cinco minutos para se entrar ia, ordem do dia, e, em virtude da disposição do regimento, convido S. Exa. a dirigir-se á Presidencia.

O Orador: - Pois não.

Pouco tempo depois, concedidas as primeiras prorogações, li num jornal o que S. Exa. disse hoje na Camara. Cheguei á secretaria e, pela repartição competente, pedi que me informassem a esse respeito, e essa informação foi que essa parte do decreto de 1901 não estava em vigor.

Disse o illustre Deputado que me poderia ter feito um aviso prévio para tratar do assunto.

Devo dizer a S. Exa. que não era neressario faze-lo, bastava que me prevenisse que desejava tratar do assunto para immediatamente eu vir á Camara dar todas as explicações a S. Exa.

O Sr. Mario Monteiro: - Nem isso era preciso, porque S. Exa. está todos os dias a prorogar o prazo para q pagamento das contribuições.

O Orador: - O illustre Deputado parte do principio de que eu não tenho feito o que se tem praticado nos outros annos, mas eu, pelo contrario, não alterei em nada o processo que se tem sempre seguido no Ministerio da Fazenda.

O Sr. Mario Monteiro: - Vou mandar para a mesa um aviso previo.

O Orador: - Se na proxima sessão, antes da ordem do dia, se puder tratar do assunto, eu, sem S. Exa. mandar para a mesa o seu aviso prévio, comprometto-me a vir á Camara para dar todas as explicações a esse respeito.

As repartições competentes, consultadas por mim, disseram-me que não estava em vigor a disposição do decreto de 1901.

Aqui tem o illustre Deputado por que procedi como se tem procedido até aqui. (Muitos apoiados). (Vozes: - Muito bem).

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Moreira Junior): - Pedi a palavra para mandar para a mesa os dois processos que na ultima sessão declarei que enviaria para a mesa.

Um é do Ministerio da Fazenda, o outro é da Direcção Geral de Agricultura, relativo á questão madeirense.

Devo dizer a V. Exa. que ainda ha pouco, quando tive ensejo de fazer affirmações em contraposição ao illustre Deputado Sr. Visconde de Coruche, não procurei defender illegalidades de ninguém, procurei definir, perante a Camara, o que entendo que é a expressão nitida da lei. (Apoiados).

(O orador não reviu).

O Sr. Affonso Costa: - Peço a palavra para um negocio urgente, quando estiver presente o Sr. Ministro do Reino.

O Sr. Presidente: - Pergunto ao Sr. Ministro das Obras Publicas se os documentos que S. Exa. enviou para a mesa são para ficarem sobre a mesa á disposição dos Srs. Deputados ou para terem qualquer outro destino.

O Sr. Ministro das Obras Publicas (Manuel Moreira Junior): - Os documentos são para ficarem sobre a mesa á disposição dos Srs. Deputados que os desejem consultar. V. Exa. sabe que, juntamente com as propostas, enviei a maior parte dos documentos para virem appensos ao projecto de lei, que se ha de distribuir na Camara.

O Sr. Presidente: - Ficam, portanto, os documentos que o Sr. Ministro das Obras Publicas enviou para a mesa á disposição dos Srs. Deputados.

O Sr. Affonso Costa: - Pedi a palavra para quando estivesse presente o Sr. Ministro do Reino, mas como S. Exa. não está, fica apresentado o seguinte:

Aviso previo

Desejo interrogar urgentemente o Sr. Ministro do Reino ácerca da violencia commettida contra a Camara Municipal e povo de Lisboa, por sua ordem, no dia 18 de março. = O Deputado, Afonso Costa.

Para a secretaria.

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á primeira- parte da ordem do dia. Os Srs. Deputados que tenham papeis para mandar para a mesa podem faze-lo.

O Sr. Afibnso Costa: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar urgentemente o Sr. Ministro das Obras Publicas ácerca das suas declarações relativas á União Vinicola, feitas na sessão de hoje. = Affonso Costa.

Mandou-se expedir.

O Sr. Antonio José de Almeida: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar o Sr. Ministro das Obras Publicas sobre a censura que, no telegrapho do Porto, foi exercida ante-hontem sobre os telegrammas que relatavam, para a imprensa de Lisboa, os discursos pronunciados na festa republicana que teve logar em Villa Nova de Gaia. = Antonio José de Almeida.

Mandou-se expedir.

O Sr. Estevam de Vasconcellos: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que me sejam enviados com urgencia, pelo Ministerio das Obras Publicas, os seguintes documentos:

1.° Copia das actas das sessões da secção de pecuaria do Conselho Superior de Agricultura em que se apreciaram as representações da Camara Municipal de Lisboa pedindo a abolição do imposto de importação sobre as carnes congeladas.

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2.° Copia das circulares enviadas aos intendentes de pecuaria ordenando-lhes que indicassem o numero das reses bovinas existentes nos respectivos districtos. = Estevam de Vasconcellos.

Mandou-se expedir.

O Sr. Macedo Ortigão: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que seja publicada no Diario do Governo a informação da 3.ª Repartição da Direcção Geral de Instrucção Superior relativa á reclamação do socio da Academia Real das Sciencias, Antonio Cabreira. = Antonio de Macedo, Ramalho Ortigão.

A secretaria para se fazer referencia na acta e ser amanhã submettido á deliberação da Camara.

O Sr. Pereira de Lima: - Mando para a mesa os seguintes

Aviso previos

Desejo saber do Sr. Ministro das Obras Publicas, Commercio e Industria quaes os seus projectos para a criação do credito rural immobiliario. = José Maria Pereira de Lima.

Mandou-se expedir.

Desejo interrogar o Sr. Ministro das Obras Publicas, Commercio e Industria sobre as medidas que tenciona apresentar a fim de estabelecer e regulamentar a previdencia social. = José Maria Pereira de Lima.

Mandou-se expedir.

O Sr. Oliveira Simões: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Declaro que desejo interrogar o Governo sobre o modo por que se está dando o ensino em algumas escolas industriaes, nomeadamente na Escola Domingos Sequeira. = José Maria de Oliveira Simões.

Mandou-se expedir.

O Sr. Malheiro Reymão: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, pelo Ministerio da Fazenda, me sejam enviados com a maior nrgencia os seguintes documentos:

1.°

Nota das quantidades de melaço importados no Funchal em cada um dos annos de 1907, 1908 e 1909, com indicação do nome dos importadores.

2.°

Nota da quantidade de açucar extrahido da cana saccharina da Madeira, admittido em cada um d'aquelles annos no continente do reino, e impostos que por tal motivo foram cobrados ou exigidos.

3.°

Nota da quantidade de cana saccharina que em cada um daquelles annos foi entregue nas fabricas matriculadas para producção de açucar ou alcool.

4.°

Nota da quantidade total de açucar produzido nas fabricas matriculadas, discriminando-se o proveniente da cana saccharina da Madeira do extrahido do melaço exótico importado.

5.°

Nota da quantidade de açucar importado para consumo no districto do Funchal e da quantidade produzida nas fabricas matriculadas, que foi entregue ao consumo local.

6.°

Nota da quantidade de alcool produzido nas fabricas matriculadas. = Malheiro Reymão.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Eleição de commissões

O Sr. Presidente: - Vae proceder-se á eleição de commissões.

O Sr. Antonio Cabral: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que seja immediatamente. eleita uma commissão composta de dezasete membros, a fim de apreciar a proposta de lei de reforma eleitoral e constitucional. = Antonio Cabral.

Requeiro a urgencia e que, com dispensa do regimento, possa entrar desde já em discussão.

Não posso influir no voto dos meus collegas, porque a Camara é soberana, mas era meu desejo, Sr. Presidente, que todas as parcialidades politicas desta casa do Parlamento tivessem representação n'estas commissões.

O Sr. Presidente: - Antes de pôr á discussão a proposta de S. Exa. devo informar o Sr. Antonio Cabral de que só pelo que diz respeito á parte da proposta que se refere á eleição de commissões para apreciar a reforma eleitoral é que posso dar seguimento á proposta, porque na parte referente á eleição de commissões para apreciar a reforma constitucional o regimento marca tres leituras antes das admissões.

Lê-se na mesa a parte da proposta que se refere á eleição da commissão para apreciar a reforma eleitoral.

O Sr. Presidente: - Está em discussão.

(Pausa).

O Sr. Presidente: - Como ninguem pede a palavra sobre a proposta do Sr. Deputado Cabral, considero-a approvada nos seus precisos termos.

Vae procedesse á eleição da commissão para apreciar a reforma eleitoral, juntamente com a eleição da commissão de negocios ecclesiasticos. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listas.

Procede-se á chamada.

O Sr. Claro da Rioca: - V. Exa. diz-me qual é a commissão que se está a eleger.

O Sr. Presidente: - É a commissão para apreciar a reforma eleitoral e a de negocios ecclesiasticos.

O Sr. Claro da Ricca: - Peço a palavra sobre a ordem.

O Sr. Presidente: - Só posso dar a palavra a V. Exa. depois da eleição.

Continua a proceder-se á chamada.

O Sr. Claro da Ricca: - Peço a palavra para invocar o regimento. Invoco o artigo 115.° do regimento.

O Sr. Presidente: - Tem S. Exa. a palavra para invocar o regimento. Devo explicar que o Sr. Antonio Cabral mandou para a mesa uma proposta para que só pro-

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cedesse á eleição de uma commissão destinada a apreciar a reforma eleitoral, pedindo a dispensa do regimento e a urgencia.

O Sr. Claro da Ricca: - Parece-me que o Sr. Presidente devia, n'esse caso, tê-la sujeitado á votação da Camara para ver se esta considerava a sua urgencia. Essa votação não se fez; e só depois de ser reconhecida a urgencia é que se devia pôr em discussão a proposta, o que não se fez, porque, senão, muitos Srs. Deputados da esquerda da Camara se inscreveriam.

Está-se procedendo desde já á eleição, sem a Camara ter apreciado a proposta. Foi, por consequencia, infringido o artigo 115.º do regimento. A proposta deve ficar para segunda leitura.

O Sr. Presidente: - Não tenho duvida em a pôr de novo em discussão, visto o Sr. Deputado declarar que não se ouviu bem na Camara o assunto de que ella tratava. Entendi, entretanto,, que, quando ha pouco se havia posto em Discussão e que nenhum Sr. Deputado tinha pedido a palavra, implicitamente ficara approvada a proposta.

Vozes na esquerda: - Não houve votação sobre a urgencia!

Vozes na direita: - Houve, houve!

O Sr. Presidente: - O meu desejo é que os trabalhos da Camara decorram com a maxima regularidade, e, visto terem-se levantado duvidas, submetto de novo á votação da Camara a proposta.

O Sr. Antonio Cabral: - V. Exa. dá-me a palavra? Queria simplesmente dar uma explicação á Camara. Eu fui sempre leal e sincero. Houve evidentemente um engano, um equivoco.

Ha pouco muito claramente disse - e toda a Camara ouviu - que o meu desejo era que todas as parcialidades politicas da Camara tivessem representação nas commissões que propus. Logo, os illustres Deputados não podem attribuir senão a um equivoco na confecção das listas a omissão que n'ellas se deu.

(Trocam-se ápartes).

(Estabelece-se sussurro).

O Sr. Presidente: - O que eu tenho de submetter á apreciação da Camara é o requerimento do Sr. Antonio Cabral sobre a urgencia da proposta, com dispensa do regimento.

Procedendo-se á contagem, verificou-se que approvaram 38 e rejeitaram 22.

O Sr. Affonso Costa: - Chamo a attenção de V. Exa. para o facto de que 38 votos não constituem numero para a approvação. Segundo o artigo 146.° do regimento é precisa a quarta parte.

Tem de ser submettida amanhã novamente.

Assim se resolveu.

O Sr. Presidente: - Vae continuar-se com a eleição da commissão de negocios ecclesiasticos. Convido os Srs. Deputados a formularem as suas listas.

Continua a proceder-se á chamada sómente para a eleição da commissão de negocios ecclesiasticos.

O Sr. Brito Camacho: - Peço a palavra para invocação do artigo 140.° do regimento.

O Sr. Presidente: - Para eu poder attender á invocação do regimento, preciso saber se se refere a todo o artigo.

O Sr. Brito Camacho: - Refiro-me ao cumprimento integral do artigo 140.°

O Sr. Presidente: - A minha primeira obrigação é dar cumprimento aos requerimentos feitos pelos Srs. Deputados. Peço aos Srs. Deputados que occupem os seus logares. Peço ainda ao Sr. Brito Camacho que diga os nomes dos Srs. Deputados que, estando na sala, se eximiram de votar e que a Presidencia não notou. Mande S. Exa. a nota.

O Sr. Brito Camacho: - V. Exa. diz-me se já procedeu á contagem.

O Sr. Presidente: - Eu estou á espera que S. Exa. mande a nota dos Srs. Deputados que não votaram para fazer a sua chamada.

O Sr. Brito Camacho: - E eu estou á espera de que V. Exa. me diga quantos já votaram.

O Sr. Presidente: - Eu interrompi a contagem justamente em face da invocação do regimento.

O Sr. Brito Camacho: - V. Exa. então completa a contagem.

O Sr. Presidente: - Como S. Exa. é que me pediu o cumprimento integral do artigo 140.°

O Sr. Brito Camacho: - Eu entendo que a eleição está nulla, desde que houve alguns Srs. Deputados que, sendo chamados e estando presentes, não votaram.

Ora a investigação d'este acto compete a V. Exa., segundo o regimento. Nisto não vae censura a V. Exa.

O Sr. Presidente: - Perfeitamente. Mas V. Exa. sabe que por falta de elementos para uma fiscalização regular podem muito bem succeder taes factos.

O Sr. Brito Camacho: - V. Exa. faz o favor de então perguntar se ha algum Sr. Deputado que não votou, e, neste caso, convidá-lo a vir votar.

O Sr. Presidente: - Chamo a attenção dos Srs. Deputados.

Tendo o Sr. Deputado Brito Camacho invocado o regimento com o fundamento de que alguns Srs. Deputados, tendo saido da sala não tinham por isso votado, o que não foi notado na mesa, eu convido os Srs. Deputados que ainda não votaram, a faze-lo.

Varios Srs. Deputados vão á uma votar.

O Sr. Estevam de Vasconoellos (interrompendo a chamada): - Peço a palavra para um requerimento.

O Sr. Presidente: - Tem S. Exa. a palavra.

O Sr. Estevam de Vasooncellos: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a contagem dos Srs. Deputados presentes. = Estevam de Vasconcellos

Procedendo-se á chamada, verificou-se estarem presentes 59 Srs. Deputados.

O Sr. Presidente: - Não havendo mais Srs. Deputados a votar, acha-se encerrada a votação.

Convido para escrutinadores os Srs. Augusto de Castro e Pereira Cardoso.

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Corrido o escrutinio, verificou-se terem entrado na urna 61 listas, sendo 14 bancas, ficando, portanto, eleitos para a commissão de negócios ecclesiasticos os Srs.:

Abel de Mattos Abreu, com .... 47 votos
Antonio Rodrigues Costa da Silveira .... 47 votos
João Ignacio de Araujo Lima .... 47 votos
João Pereira de Magalhães .... 47 votos
José Bento da Rocha e Mello .... 47 votos
José Osorio da Gama e Castro .... 47 votos
Manuel Joaquim Fratel .... 47 votos
Visconde da Torre .... 47 votos
Visconde de Villa Moura .... 47 votos

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Continuando-se na ordem do dia - segunda parte - vae passar-se á discussão do projecto n.° 3.

Tem a palavra o Sr. Brito Camacho.

O Sr. Brito Camacho: - Começa por dizer que, passando hoje o segundo anniversario de 5 de abril, não extranhará certamente o Sr. Presidente nem a Camara que elle, orador, diga algumas palavras sobre o que então se passou, palavras de magua pelas victimas que foram barbara e estupidamente assassinadas ha dois annos no Largo de S. Domingos. Por motivos meramente eleitoraes, que nada tinham de serio na sua intenção, a guarda municipal assassinou quinze populares no Largo de S. Domingos. Esse facto commoveu mediocremente a Camara e elle, orador, recorda que, estando na Presidencia do Conselho um profissional do liberalismo, elle não teve palavras de censura bastante justiceiras para essa barbaridade, e não lhe ditou o seu coração compadecido palavras piedosas para essas tristes victimas.

Tratava-se então - como disse - de um acto eleitoral, mas o facto tinha importancia para se ver como dentro d'este regime, e com o nosso systema de impunidade garantido a quem não cumpre a lei, ha por parte de uma certa fracção da forca publica uma tristissima comprehensão do que são a ordem e a disciplina social.

Não quer elle, orador, fazer uma dissertação sobre o que seja a guerra nas cidades, mas não será novidade para o mais ignorante em cousas militares dizer que é absolutamente barbaro dentro de uma cidade, para reprimir um motim, fazer sair a forca publica, como se fez no dia 5 de abril. E positivamente uma provocação e um crime munir, em nome da segurança publica, a policia e a guarda municipal, de pistolas automáticas de grande alcance.

Manter a ordem e ter a comprehensão ou a preoccupação da disciplina social não é manter a população numerosa e ordeira, como é a de Lisboa, numa constante ameaça de assassinio.

Ditas estas palavras, que são mais de magua pelos assassinados do que propriamente censura, porque esta já foi feita a quem os matou ou mandou assassinar, vae entrar na discussão do projecto.

Antes d'isso, porem, permitta-se-lhe que, roubando dois minutos á Camara, explique o seu procedimento de ha pouco. Gosta sempre de explicar tudo quanto faz, dentro ou fora da Camara, porque tem sempre uma razão honesta.

Quando ainda agora invocou o regimento, não foi para embaraçar os trabalhos, foi simplesmente porque desde o primeiro dia que entrou na Camara tomou a peito contribuir, quanto em si coubesse, para que se levante o prestigio do Parlamento, que tão baixo está.

Acha ignobeis muitas praxes, que são hoje praxes parlamentares.

Viu-se ainda agora como se procedeu numa eleição, com as listas lithographadas...

O Sr. Presidente: - Cumprindo o regimento, pede ao Sr. Brito Camacho que entre na questão.

O Orador: - Diz que se trata de um incidente parlamentar, no qual elle, orador, teve uma intervenção directa, e a sua consciencia obrigava-o a explicar-se, entretanto entrará immediatamente na questão.

Tratava elle, orador, de velhas praxes parlamentares absolutamente condemnaveis, como é essa praxe - e elle, orador, está dentro da questão - de votar com listas lothographadas, bem como de outras praxes, que estão longe de contribuir para que se levante ou se mantenha o prestigio do Parlamento.

Precisamente uma dessas antigas praxes fazia com que fossem votados sem discussão os chamados projectos constitucionaes. Foram os Deputados republicanos que infringiram essa praxe, e ha pelo menos tres annos que este projecto se discute, largamente, porque ha opportunidade em se falar com largueza em cousas militares.

O Sr. Ministro da Guerra (Mathias Nunes, interrompendo): - Essa praxe não foi infringida pelo partido republicano. Ha dez ou doze annos discutiram-se largamente os projectos constitucionaes.

O Sr. Affonso Costa: - É verdade. Mas tinha caido em desuso.

O Orador: - Foram os Deputados republicanos que vieram restabelecer a praxe, e tanto estava no sentimento da Camara que este projecto devia, votar se sem discussão que o Sr. Ministro da Guerra quasi estranhou que se fizesse discussão sobre o projecto, chamando-lhe uma velharia.

De resto, este projecto não é propriamente um projecto de lei, é um aphorismo, e o Sr. Rodrigues Monteiro teve razão de se queixar por vê-lo tão laconico.

Se effectivamente caiu em desuso a praxe de discutir este projecto chamado constitucional, bem andaram os Deputados republicanos em a renovar, porquanto não tiveram outro pensamento que não fosse o chamar a attenção do Parlamento e do país para este problema tão grave, tão superior, tão importante, da defesa nacional.

Entretanto, no ultimo dia da sessão sómente uns vinte e tantos Deputados assistiram á resposta que o Sr. João Pinto dos Santos deu ao Sr. Ministro da Guerra, o que equivale a dizer que o interesse do Parlamento pelas questões militares levam a maioria dos Deputados a abandonar a Camara. Entendem que ,são cousas de minima importancia e que se está a perder um tempo precioso, que podia ser aproveitado em beneficio de cousas mais importantes.

Elle, orador, crê que não ha ninguem que desconheça a maxima importancia entre nós do problema da defesa nacional, e não será opinião do Sr. Ministro da Guerra, nem de nenhum Sr. Deputado que faça parte da commis-são de guerra, que este problema passará absolutamente indifferente á nação, emquanto não se procurar interessá-la n'elle.

Lamenta que o Parlamento se não interesse pelas questões militares, tanto mais que existem na representação parlamentar bastantes elementos militares - o que elle, orador, condemna-os quaes nunca lograram chamar a attenção do Parlamento para as questões militares.

Se isto acontece dentro do Parlamento, não admira nada que melhor aconteça com relação ao país. Este não se interessa por questões militares, porque as não conhece e na sua profunda ignorancia não sabe se effectivamente tem argumentos de defesa ou não tem.

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Os Deputados republicanos tiveram o intuito - que não tem nada de partidario - de deslocar as questões militares dos quartéis para as trazer para o Parlamento, para o país, como uma questão puramente nacional. Se estão longe de o conseguir, a culpa não é d'esses Deputados, que teem feito esforços para o realizar.

O almirante Sr. Ferreira do Amaral, antes de ser chamado á Presidencia do Conselho, escreveu a primeira parte de uma obra dedicada á defesa nacional. Elle, orador, já teve occasião de affirmar, e repete-o mais uma vez, que esse livro feito por um Ministro e com um dos mais elevados cargos na armada, que em toda a parte seria como que um grito de alarme lançado ao país inteiro, passou em Portugal como uma anecdota, como um dito, como uma graça, e como graça o encarou o próprio autor, que foi toda a vida um homem gracioso, dizendo certa vez que o seu livro estava sendo muito lido, mas pouco comprado.

O Sr. Affonso Costa: - Disse n'essa occasião que o comprassem mais e o lessem menos!

O Orador: - Continuando, lembra a larga campanha que fez na imprensa, mas que foi vox clamanti in deserto, porque essa campanha não teve a menor repercussão.

Os assuntos militares, acrescenta, não são absolutamente assuntos technicos, são assuntos da maior complexidade e tanto militares como civis teem o dever e a obrigação de collaborar n'elles.

O orador refere-se depois ao numero, fixado na lei organica, de 30:000 homens, e diz que, a seu ver, essa organização é uma cousa muito desorganizada.

Achava conveniente que no começo de cada legislatura se fizesse acompanhar o projecto de um relatorio em que se dessem ao Parlamento e ao país as necessarias informações de que se carecia. Este projecto, tal como está, não diz absolutamente nada.

O Sr. João Pinto dos Santos (interrompendo): - O país devia ter o maximo conhecimento d'elle, visto que é o imposto mais importante, porque, é o imposto de sangue. É um projecto importantissimo.

O Orador: - Allude em seguida, incidentemente, ao orçamento, dizendo que ha immensos annos que não se apresenta ao Parlamento dentro do prazo constitucional, e passa a criticar o modo como se fornecem regimentos, batalhões, destacamentos e as bandas regimentaes. Povoações ha que são incapazes de fazer o mais pequeno protesto, e que commettem uma verdadeira revolução caso lhe não forneçam, pelo menos, uma banda regimental.

Fala depois sobre a instrucção dos militares, que, em sua opinião, acha deficiente, e declara que essa instrucção não é dada no numero total fixado na organização e sim a um numero muito inferior, que nunca vae alem de 25:000.

O Parlamento e o país teem andado illudidos a este respeito, e emquanto em questões militares não se disser toda a verdade a discussão que sobre o presente projecto se faça será nulla, não terá a minima importancia.

O problema da defesa nacional é muito grave e importante para nós, visto sermos um pais, não simplesmente pobre, mas um país individado.

É necessario e util que se faça alguma cousa de mais é de melhor.

Lamenta que ainda não houvesse um Ministro da Guerra que, com patriotismo, expusesse com rude franqueza a situação em que o exercito se encontra e quaes os remedios de que se necessitava.

Do orçamento devem-se supprimir todas as despesas que sejam inuteis e desnecessarias.

Se se for comparar o nosso Almanach Militar com os correspondentes diplomas de outros países, observa-se que as questões militares teem mais alguma importancia que entre nós, e vê-se que effectivamente o Sr. Ministro da Guerra tem razão quando diz que somos um país com a mania das grandezas, como que soffrendo de megalomania.

Se a defesa do país pudesse ser feita por generaes, não podia ser mais bem defendida dos ataques do inimigo com Portugal.

Em 1886 existiam 125 generaes reformados e actualmente o seu numero é de 310.

O país não pode com estes excessos e tem necessariamente de acabar.

Um país pequeno, de resumida população, que só pode ter um pequeno exercito, nunca pode ter uma escala para generaes.

A seguir, o orador diz que ha tudo a fazer tanto no que respeita á defesa terrestre como á maritima.

Já estão dados para discussão projectos que se prestam a um debate sobre a reorganização da nossa marinha de guerra, e então será o momento dos Srs. Deputados que são officiaes de marinha e o proprio Sr. Ministro da Marinha, que pertence a essa corporação, dizerem de sua justiça.

No ponto de vista de defesa nacional criou-se a lenda de que não podemos ter defesa pelos nossos próprios recursos, devendo considerarmo-nos defendidos com a alliança da Inglaterra.

No dia em que pensássemos a serio em organizar a defesa nacional logo tinhamos de saber com precisão com o que podemos contar em materia de alliança.

Se não é licito contar apenas com os nossos recursos para a defesa do país, menos licito é ainda confiar essa defesa a outrem.

A respeito de defesa nacional não se pode dizer nada na Camara ou fora d'ella que em Espanha se não saiba. Teve occasião de ler o que em Espanha se tem escrito sobre a possivel defesa de Portugal.

Todos os pontos vulneraveis da extensissima fronteira terrestre, tudo isso vem assinalado em publicações espanholas.

O orador em seguida refere-se ás linhas de Torres Vedas, dizendo, que, constituindo ellas um bom elemento de defesa para a cidade de Lisboa, não teem hoje nada.

O Sr. Ministro da Guerra (Mathias Nunes) (interrompendo): - Não teem nem devem ter.

Actualmente os meios de ataque são tão energicos e valentes que as linhas de Torres perdem muito do seu valor.

O Orador: - Perderam muito e ainda lhe fazem perder o resto.

No entanto elle, orador, não conhece no país absolutamente nada que seja superior ás linhas de Torres.

Sente que não possa alongar as suas considerações porque talvez suscitasse dá parte de alguns Deputados, o desejo de entrarem n'este debate. Não lhe parece que seja absolutamente nada perdido o tempo que no Parlamento se gastar a versar este assunto, comtanto que todos entrem n'elle com o desejo de denunciar vicios, não para por meio d'elles accusar homens mas remediar defeitos.

(O discurso será publicado na integra guando o orador devolver as notas tachygraphicas).

O Sr. Presidente: - Como não ha mais ninguém inscrito vae ler-se o projecto para se votar.

É lido, sendo seguidamente approvado.

O Sr. Presidente: - Vae ler se para entrar em discussão o projecto n.° 4.

É lido.

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SESSÃO N.° 13 DE 5 DE ABRIL DE 1910 13

O Sr. João de Menezes: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. se digne mandar proceder á contagem dos Srs. Deputados. = J. de Menezes.

O Sr. Presidente: - Estão presentes 58 Srs. Deputados; pode, portanto, proseguir a sessão.

Está em discussão o artigo 10.° do projecto.

O Sr. Macedo Ortigão: - Sr. Presidente: pouco tempo tomarei á Camara, não fazia tenção de entrar na discussão deste projecto de lei, mas, na minha dupla qualidade de official da armada e de Deputado, não posso deixar de aproveitar a oocasião para protestar vehementemente, energicamente, contra o estado decadente, vergonhoso e miseravel a quee deixaram chegar a nossa marinha de guerra.

A Camara, Sr. Presidente, conhece bem a verdade que acabo de pronunciar e por isso não cansarei a sua attenção com considerações de ordem technica. Basta dizer que a nossa marinha de guerra está reduzida a um mostruario ignobil de velhas quinquilharias, que para nada servem.

Os seis melhores barcos, a que se dá o nome pomposo de cruzadores, não passam de uns chavecos inuteis, sem valor militar algum, quer pela sua velocidade, quer pela sua protecção, quer ainda pelo poder da sua artilharia.

De typos completamente differentes e heterogéneos, a artilharia varia de navio para navio com a mesma facilidade com que podemos mudar de bengala, como se isso fosse uma cousa secundaria e de nenhuma importancia. Assim os pseudo-cruzadores D. Carlos e Vasco da Gama estão armados com artilharia Armstrong e Hotchkiss; o S. Gabriel, S. Rafael e D. Amelia com Shneider-Canet e Hotchkiss, e o Adamastor com artilharia Krupp, Hotchkiss e Nordenfelt.

D'estes barcos, Sr. Presidente, os unicos que, comquanto não possam ser considerados como unidades de combate, teem ainda qualquer cousa que faz lembrar um navio de guerra são o D. Carlos, o S. Gabriel e o S. Rafael; a Camara sabe bem com quanto custo se deslocam e as modificações varias por que tem passado a sua mastreação, a fim de lhes aumentar a estabilidade.

O Adamastor é aquelle cruzadorzinho de lata, que a Camara tão bem conhece, com dois tubos lança-torpedos á popa, um a bombordo, outro a estibordo, acima da linha de agua, á altura quasi da borda, servidos por um paiol de proa, em que os torpedos, para serem utilizados, teem de fazer o trajecto pelo conves, em toda a estação do navio, constituindo um perigo imminente e gravissimo que a Camara sabe muito bem avaliar.

O Vasco da Gama é aquelle velho e tropego Pimpão, nascido em 1876 e enxertado em 1902. E finalmente o D. Amelia, recordação saudosa do Sr. Croneau, é aquelle barco que V. Exas. sabem como se foi arrastando miseravelmente até ao Oriente e que basta olhar para elle para termos a impressão de que o seu elemento não é positivamente a agua, pois mais do que navio parece uma grande ave, com as asas abertas a querer levantar o vôo.

Nas canhoneiras... nem merece a pena falar.

Referindo-me agora, rapidamente, ao pessoal, eu direi á Camara que actualmente ha primeiros tenentes com quinze annos e segundos com treze, medicos de 1.ª classe com quinze annos e commissarios de 1.ª classe com vinte annos, de 2.ª com dezasete e de 3.ª com dezaseis. Isto occupando-me apenas dos postos subalternos.

O que se tem feito, Sr. Presidente, para minorar a triste situação d'estes officiaes? Absolutamente nada.

Sr. Presidente: em dezembro de 1906, para melhorar a situação dos tenentes de artilharia, pois havia-os com treze annos de posto, criaram-se os segindos capitães.

Em janeiro seguinte concedeu-se aos officiaes do exercito vencimentos por diuturnidade de serviço, subsidios para renda de casa, ajudas de custo e indemnidade de equipamento. Pois nada d'isto foi até hoje applicado aos seus camaradas da armada, como se uns e outros não tivessem as mesmas obrigações e os mesmos direitos, como se o exercito e a armada não fizessem parte da mesma familia militar!

Em vista do que acabo de expor, Sr. Presidente, parece-me que o nosso problema naval deve ser posto da seguinte forma: ou necessitamos de marinha, ou não. Se necessitamos d'lla, como é indiscutivel e para isso basta olhar para a nossa situação geographica, para a extensão da nossa costa e para a grandeza do nosso dominio colonial, procuremos organizá-la como deve ser, mesmo que para isso tenhamos de fazer algum sacrificio.

Se não necessitamos della, o que é um absurdo, acabe-se de vez com ella, economizando annualmente alguns, não poucos, milhares de contos de réis. Como está é que não pode ser! É gastar dinheiro inutilmente e obrigar o pessoal a uma situação triste e deprimente.

Sr. Presidente: diz-se por ahi que a armada é republicana. Não é verdade. Na armada, como em todas as corporações, ha de tudo. Nem me parece que a monarchia ou a republica seja apanagio de uma determinada classe. Mas tem sido tão grande o desprezo a que se tem votado a armada, tanto no que respeita ao material, como no que toca ao pessoal, que não será para admirar que na armada haja já hoje um nucleo de officiaes que não sympathize com o actual regime.

Ouvi dizer, Sr. Presidente, que o Sr. Ministro da Marinha tencionava apresentar brevemente ao Parlamento propostas de lei organizando a marinha colonial e reorganizando a marinha de guerra. Esta noticia encheu-me de alegria, porque, comquanto seja Deputado da opposição, entendo que em questões como esta, que tão intimamente se prende com a defesa do nosso país, não, deve haver politica e sim patriotismo; mas, Sr. Presidente, desde que o Sr. Ministro da Fazenda, tão intelligente e illustrado e de quem se esperava, segundo se dizia, eu sei lá o que, nos deixou verdadeiramente estupefactos com as propostas de lei apresentadas ha dias n'esta casa do Parlamento em que por uma d'ellas o Sr. Conselheiro Soares Branco nos pretende fazer voltar aos antigos cruzados engalanados com a cruz de Christo e aos quaes não faltará, creio eu, a legenda, latina, in hoc signo vinces, estou receando que o Sr. João Coutinho ponha de parte todo o seu saber de experiencias feito, ou se esqueça de que a armada, que se honra de o contar entre os seus officiaes mais illustres, espero confiadamente que S. Exa. a levante do abatimento vergonhoso em que se encontra, para, por coherencia com o seu collega da Fazenda, ou por um phenomeno de suggestão, pretender fazer-nos voltar tambem ao tempo das antigas caravellas é das naus de tres pontes. (Apoiados).

(O orador não reviu).

O Sr. Ministro da Marinha (Azevedo Coutinho): - Limitar-me hei a dizer algumas palavras em resposta ao illustre Deputado e meu camarada, não só porque o meu estado de saude não me permitte alongar em considerações, como porque S. Exa. se limitou a fazer uma critica severa do estado da nossa marinha de guerra.

Eu posso afiançar a S. Exa. que apresentarei um projecto que, supponho, supprirá de uma forma conveniente as exigencias da marinha de guerra. Digo mais: nos projectos de lei que apresentarei encaro o problema da defesa nacional o melhor que pude e soube, attendendo á organização dos serviços de marinha e á acquisição do manter os nossos foros de nação independente. (Apoiados).

(O orador não reviu).

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14 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Claro da Ricca: - Abandonando as questões navaes, eu vou cingir-me propriamente ao projecto em discussão, que é gravissimo, porque considero problema dos mais importantes, para todas as nacionalidades, a defesa do país.

Com a isenção com que pode proceder quem não pertence a classe militar, e portanto sem preconceitos do métier, que, segundo tenho observado, impedem os membros da classe militar de dizer tudo quanto sabem, eu vou entrar no assunto.

É indispensavel acabar com a indifferenca do publico e da governantes por estes assuntos pondo a nu o perigo gravissimo que atravessamos no que respeita á defesa nacional, para ver se a febril actividade da politica, que só se preoccupa com as questões escandalosas e discussões de pessoas, se dedica a este importante assunto da salvaguarda da nossa autonomia.

O problema da defesa nacional só não o encara quem não vê o que se passa na politica da Europa. A Europa toda vive era um equilibrio instavel, e se esse equilibrio se desfazer pela luta das paixões e de interesses, o que será feito de nós no que respeita á defesa nacional!

Seremos feitos em cisco pelo incendio magno que ameaça convulsionar a Europa.

Na Belgica, ainda ha pouco a propósito da defesa, tanto por parte do Parlamento como do Ministro da Guerra, se disse tudo. Dizer a verdade em questões desta natureza é prestar um bom serviço ao país, e é obrigação de todos nós contribuir para o bem publico.

Sr. Presidente: eu sei que dizer verdades amargas, no tocante á nossa desgraçada situação de defesa nacional, pode provocar de muitos a censura de se proceder com falta de patriotismo, porque embora estas questões sejam aqui tratadas com a frieza com que n'esta Camara habitualmente se tratam as questões militares, o que é certo é que os boletins parlamentares se encarregam de fazer ouvir longe as nossas supplicas, ainda que com voz fraca como disse o Sr. Brito Camacho, frase que eu applico a mim e não a S. Exa.

Mas ia eu dizendo que se me afigura um dever, embora se caia na alçada das censurais de todos aquelles que dizem que procedemos com falta de patriotismo, pôr estas questões em toda a sua nitidez, não para prejudicar a reputação que as nações possam ter no estrangeiro, mas para fie chamar a attenção dos Governos, a fim de que elles lhes deem o remedio que possam.

Estas questões de patriotismo é certo que representam um elemento precioso para se poderem fazer discursos muito bonitos, artigos scintillantesm mas não é só com esse patriotismo que nos havemos de defender, não é recordando-nos de Camões, dos Lusiadas, das antigas naus e dos ossos de Albuquerque, que nos havemos de defender de uma invasão, porventura da Espanha ou de outro, qualquer pais, ou para tornar perduravel a nossa alliança com a Inglaterra.

Sr. Presidente: o estado actual do nosso exercito, como eu vou provar, é o desarmamento lento. Nós estamos a desaninarmo-nos lentamente e no entanto gastam-se com o exercito 9.000 contos de réis. Se querem desarmar-nos desarmem nos, mas desarmem nos carrément e ao menos que desappareça essa verba de 9:000 contos de réis.

É certo que os chamados pacifistas sustentam a conveniencia social do desarmamento, doutrina com o que eu concordo, mas acho muito conveniente que não nos desarmemos senão depois das grandes nações se desarmarem, porque nós, fiados na ideia da paz, commettemos um grande erro.

O nosso dever é evidentemente applicar aquella frase do general allemão Golthe "A nação armada", porque as nações que não são armadas não podem ter autonomia. Para nós esse criterio deve ser imprescindivel, porquanto, como ha pouco disse, nota-se hoje no equilibrio europeu uma instabilidade perigosa, que pode talvez collocar-nos numa situação grave, se acaso esse desequilibrio se der.

Postas estas considerações geraes, vejamos quaes os defeitos que tem o projecto que está em discussão.

Em primeiro logar diz o projecto no seu artigo 1.°:

(Leu).

Este projecto é uma ficção, mas é uma ficção que vem desde longo tempo.

Chega a ser uma tara pathologica de todos os Ministros da Guerra submetterem á votação do Parlamento um projecto de lei que não exprime a verdade dos factos e que não é senão uma verdadeira ficção.

Quem ler este projecto de lei, e não tiver a curiosidade que eu tive, de estudar jura pouco estas questões militares, que contendem directamente com o recrutamento, fica com a impressão de que o contingente annual de recrutas é de 16:550 praças só para o effectivo do exercito.

Pois não chega a 16:000, e eu vou dizer a razão por que.

O projecto diz que 16:000 praças são destinadas ao serviço activo do exercito, pois constituem o recrutamento annual.

Sr. Presidente: Teem de deduzir-se deste numero, que parece avultado, todos os individuos que se redimem untes de alistados e depois de alistados.

Quer dizer: de individuos apurados que, em media annual, são 27:000 a 30:000 homens por anno, como o contingente, segundo esta lei, só pede 16:550 praças, evidentemente só essa parte é que é considerada para o effeito da applicação da lei. Mas quem applica a lei já sabe que é uma ficção que se vae fazer, porque desses 16:550 individuos que constituem nominalmente o contingente do recrutamento teem de se deduzir, como ha pouco disse, todos aquelles que se redimem antes do alistamento e depois do alistamento.

Pois, pelas estatisticas que eu tive occasião de apreciar e que me deram algum trabalho a colligir e a consultar, nós vemos o seguinte, pelo que está apurado.

Em 1906 redimiram-se, antes e depois do seu alistamento, 3:195 mancebos; em 1907, 4:604; no anno immediato, 4:669, e assim por deante, mantendo-se a media de 4:000.

Quer dizer, deste numero ficticio, nominal, de I6:5õO recrutas, que a lei diz constituir o contingente annual para o exercito, já temos que deduzir annualmente 4:000 mancebos. Pois destes individuos, como já disse, parte redime-se antes do alistamento e parte redime-se depois do alistamento com a seguinte vantagem: é que os que se redimem, depois do alistamento, tendo já seis meses de serviço activo, pagam 50$000 réis, emquanto que os outros pagam 150$000 réis.

De maneira que os que não conseguem os meios necessarios para provocar a remissão antes do alistamento alistam-se, declarando immediatamente que no fim de seis meses se redimem, passam para a reserva e saem do exercito.

Veja V. Exa., Sr. Presidente, por este facto, alem de outros que já vou citar, como se conclue de uma maneira flagrante a ficção.

E nós suppornos que vamos votar um contingente annual effectivo de 16:550 soldados destinados ao serviço activo do exercito e logo vemos...

O Sr. Ministro da Guerra (Mathias Nunes): - Já se conta com esses que se redimem. Quando se pedem 16:000, conta se que entrem 12:000.

O Orador: - É então uma novidade.

Eu suppunha que não se contava com esses, de modo que a interrupção de S. Exa. me surprehendeu, porque eu tinha visto - e assim provo que estudei a ques-

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SESSÃO N.º 13 DE 5 DE ABRIL DE 1910 10

tão com cuidado que, pelo artigo 129.°, n.° 2.°, do decreto de 22 de dezembro de 1901, as vacaturas dos remidos não são preenchidas, quer isso succeda quanto ao tempo do alistamento.

Ora, como aqui nada se diz, isto fazia crer que o autor do projecto de lei tivesse entrado já em linha de conta com os descontos a fazer com os remidos antes do tempo do alistamento, cujo numero é calculado em 4:500 mancebos.

O Sr. Ministro da Guerra (Mathias Nunes): - Era assim uma maneira de não serem substituidos.

O Orador: - Evidentemente, porque á lei é clara. Mas, no entanto, em vez de se fazer a substituição dos que se redimem depois da remissão faz-se, por assim dizer, uma substituição previa.

O Sr. Ministro da Guerra (Mathias Nunes): - No anno passado fez-se um contingente supplementar.

O Orador: - Porem não é só isso.

Já vimos que dos 16:500 homens destinados ao serviço activo do exercito, havemos de descontar cerca de 4:000 homens que constituem aquelles que se redimem antes e depois do alistamento.

Ora, alem d'isto, toda a gente sabe que do exercito, por uma erradissima comprehensão das suas funcções, se destacam annualmente para diligencias de varia natureza centenas de homens que vão desfalcar enormemente o contingente annual; e, como isto se dá todos os annos, vê-se que o effectivo que pode este projecto de lei é nominal, o que é confessado pelo Sr. Ministro da Guerra.

Sobre este ponto já tive occasião de ver o seguinte facto que me fez uma grande impressão;

Quando o Sr. Conselheiro Pimentel Pinto foi Ministro da Guerra, tive curiosidade de fazer o apuramento de todos os individuos que, devendo pertencer ao exercito activo, estavam destacados em diligencias de varia ordem, que não se coadunava propriamente com o fim expresso do seu recrutamento.

Pois fui encontrar nada menos de 3:000 homens dispersos em destacamentos por todo o país.

O exercito tem outros fins do que aquelles em que muitas vezes o empregam. Estas deficiencias, que sempre se notam, devem ser remediadas.

Ainda hontem li numa revista que a China, que se vae civilizando, tinha um corpo de 1:000 homens, só para policia militar, e com o fim de evitar estas deficiencias no effectivo do seu exercito.

A propria Turquia criou a sua policia militar, exactamente para evitar estes destacamentos que se repetem annualmente.

A maior parte das nações civilizadas teem attendido a estas necessidades.

Eu comprehendo que o exercito tem de se amoldar, é certo, ás circunstancias económicas e financeiras do país, mas tambem não comprehendo que se vão tirar forças vivas que são necessarias á vida do país.

Isso seria um erro economico.

Cada país tem de amoldar ás suas aspirações as suas verbas orçamentaes e as receitas de que pode dispor, mas ha cousas que se podem conseguir sem dispendio das forças vivas da nação.

Poderia conseguir muitos fins, mas o que é certo é que estamos gastando perto de 9:000 contos de réis sem utilidade, é já que falo n'este assunto vou chamar a attençao da Camara para um facto que é digno da sua attençao.

No Orçamento Geral do Estado lê-se o seguinte:

(Leu).

Isto é a verba total.

Nestes 8:725 contos de réis annuaes que se inscrevem no orçamento para as despesas tõtaes do Ministerio da Guerra vem incluida a seguinte verba:

(Leu).

Para instrucção militar,-6:267 contos de réis.

Ora em todos os países civilizados, onde ha uma nação clara das altas funcções que o exercito tem de desempenhar, como instituição nobre que é, quer nos exercitos permanentes, quer nos de milicia, o que vemos é que a verba de instrucção attinge 50 por cento da totalidade consignada no orçamento para despesas do Ministerio da Guerra.

Pois, entre nós, a verba de instrucção militar não chega a 3 por cento.

Mas ha mais.

Esses 8:725 contos de réis são o total das despesas extraordinarias do Ministerio da Guerra.

Pois sabe V. Exa. Sr. Presidente, qual é a parcela que se gasta com o pessoal inactivo?

Nada menos do que 1:257 contos de réis.

Note bem a Camara: dos 8:725 contos de réis de despesas totaes, o que dá a Guerra para a instrucção do exercito, são só 267 contos de réis e com o pessoal inactivo gastam-se 1:257 contos de réis, quer dizer, quasi a quinta parte do que está consignado no orçamento para as despesas do Ministerio da Guerra.

Um Sr. Deputado: - O exercito não é senão uma escola de instrucção.

O Orador: - Nesse ponto não me dá o iliustre Deputado novidade alguma.

Eu sei que a Escola do Exercito, o Collegio Militar e a Escola Pratica dão instrucção, mas é essa instrucção que está reduzida a 2 por cento da verba consignada no orçamento geral.

A verba consignada para o pessoal inactivo é nada menos do que 1:257 contos de réis.

Ora, num orçamento de 8:000 e tantos contos de réis, consumirem se 1:000 e tantos contos de réis só com pessoal inactivo, produz um desfalque enorme na verba orçamental e mostra a necessidade de se fazer uma remodelação completa no nosso regime de reformas, que foi, naturalmente, delineado na melhor das ideias e principios, mas, que se está a ver que tem, na sua pratica, consequencias tão gravosas que tal regime não pode manter-se.

(Pausa).

Estava esperando que o Sr. Ministro da Guerra pudesse ouvir-me, porque, estas questões interessam a todos.

Voltarei, agora, propriamente ao projecto, porque quero fazer d'elle um estudo completo.

Já se sabe que deste effectivo para o exercito de 16:550 homens tem de se deduzir cerca de 4:000, que é o que constitue a media, antes e depois da remissão.

Temos, portanto, só 12:000 e tantos homens; e desses 12:000 e tantos ha a deduzir, naturalmente, esses taes a que ha pouco me referi, que estão collocados em diligencias diversas, segundo as suas próprias funcções de participantes do exercito activo.

E, agora, pergunto: o que ficará desse contingente annual, dividido em 74 unidades, que nós temos no nosso exercito?

Tudo isto dividido por 74 unidades do exercito chega a dar cento e tanto por cada uma dessas unidades, e ao mesmo tempo nós vemos engrossar o serviço que não devia estar entregue ao exercito como a guarda das Cortes, a guarda do Palácio Real, etc.

Ainda ha pouco tempo o serviço da guarda do Paço era feito por 30 e tantos homens, hoje são cento e tanto homens que todos os dias se consagram áquelle serviço, que é simplesmente de policia, com um official e tres subalternos.

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16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

A propria guarda das Côrtes passou de 30 homens para 90 e tantos.

A esta pobreza organica, consequente da deficiencia do numero de praças de que se faz o recrutamento ánnual, numero de que se teem de deduzir duas verbas importantes, uma relativa ás remissões e outra ao impedimento em diligencias de varias naturezas, soldados que se tiram do grosso do exercito, a este facto que representa materialmente um enfraquecimento enorme do exercito, ha a acrescentar um facto de natureza moral, e para que muito especialmente quero chamar a attenção da Camara, e foi talvez esse facto que me levou a inscrever sobre um assunto a que, technicamente, sou perfeitamente estranho; refiro-me ás remissões.

As remissões, Sr. Presidente, constituem uma vergonhosa compra feita a dinheiro do mais nobre sacrificio que o individuo deve fazer perante o seu país.

Este facto das remissões tem o aspecto de uma gravidade tão alta que e natural que sobre elle nós demoremos a nossa attenção, encarando-o sob os seus diversos aspectos e vendo como que por infelicidade nossa, porque já a Espanha remediou esse mal, e a Belgica ha pouco corrigiu esse grandissimo defeito, se transforma um exercito, que deve ser uma instituição democratica nos principios de justiça e de igualdade, numa casta em que os ricos teem preferencia aos pobres e em que o mais sagrado dever, que eu ha pouco impropriamente chamei o maior sacrificio que, o individuo tem de fazer pela sua pátria, é remido a dinheiro, numii compra que já é aviltante, que para muitos importa um mistificadissimo desdém por essa nobre classe militar. (Apoiados). É preciso acabar com isso, porque somos uma pagina triste na Europa. (Apoiados).

O argumento com que hoje se manteem as remissões é o argumento do dinheiro; remissões que dão dinheiro quando são feitas antes do alistamento, remissões que dão dinheiro quando são feitas depois do alistamento, que dão no anno 400 a 500 contos de réis. Pois, Sr. Presidente, se nós realmente temos que amoldar a instituição do nosso exercito, as nossas ambições, por mais legitimas, não só ás nossas condições económicas mas financeiras, se para o progredimento do exercito, que nós temos sem duvida nenhuma de fomentar, é indispensavel não se perder essa verba de 500 contos de réis annuaes, que se arranjam de uma maneira que é indecorosa para os nossos brios e vergonhosa, porque constituo uma excepção odiosissima....

A remissão é a compra com dinheiro do desempenho do mais alto dever que se pode ter com a pátria. O individuo que chega á idade própria da inspecção militar, sendo approvado na junta e não querendo desempenhar o serviço militar, fica isento d'esse desempenho pagando 150$000 réis, tendo dinheiro; se simplesmente é remediado, vae para o serviço, mas seis meses depois pode sair pagando 50$000 réis. A consequencia moral é flagrante.

Este imposto, que deve ser distribuido com igualdade, com justiça, fica só sendo pago pelos pobres e este facto cria no espirito publico um certo desdém pelo exercito, porque vê que á custa de dinheiro se pode livrar desse encargo que deve constituir uma obrigação restricta para cada cidadão, tanto mais que a lei fundamental do Estado diz que esse serviço é obrigatorio. Independentemente deste lado moral, temos a considerar tambem que pelas remissões o exercito deixa de contar nas suas fileiras os espiritos mais educados, mais lucidos, porquanto a classe abastada é aquella que pela sua razão de ser é mais educada, mas, exactamente por ser mais abastada, é tambem aquella que não paga o imposto de sangue.

Sr. Presidente: parece-me que não ha numero na sala e como são quasi horas da sessão se encerrar eu pedia a V. Exa. para me reservar a palavra para a proxima sessão. (Muitos apoiados).

(O orador não reviu).

O Sr. Presidente: - Fica V. Exa. com a palavra reservada para a proxima sessão.

Amanhã ha sessão á hora regimental, sendo a ordem do dia a mesma que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 5 horas da tarde.

O REDACTOR = Albano da Cunha.

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