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N.º 15

EM 7 DE FEVEREIRO DE 1899

Presidencia do exmo. sr. Luiz Fisher Berquó Poças Falcão

Secretarios - os exmos. srs.

Joaquim Paes de Abranches
Carlos Augusto Ferreira

SUMMARIO

Communicação feito polo sr. presidente. - No expediente dá-se conta de seis officios, e têem segundas leituras dois projectos de lei e uma proposta do sr. Baracho. - Instancia do Sr. Franco Castello Branco para que a commissão não demoro o seu parecer ácerca da mesma proposta. - Observações do sr. Luciano Monteiro sobre a conveniencia de se trazer para o edifício de S. Bento a installação electrica existente na academia das sciencias. Explicações do mesmo sr. deputado em relação ao procedimento do governador civil de Braga para com a respectiva commissão districtal - Refere-se novamente a sua proposta, hoje admittida, o sr. Baracho. - Sobre o mesmo assumpto apresenta o sr. Antonio de Vasconcellos algumas considerações, contrariando as do orador precedente. - Trocam-se explicações entre ou srs. Teixeira de Vasconcellos o ministro dos obras publicas sobre a escassez do milho nas provincias do norte.- O sr. Kendall secunda o sr. Campos Henriques no seu pedido, feito na sessão anterior, para que o governo mande proceder sem demora ás reparações necessarias nos molhes do porto de Leixões. Resposta do ar. ministro das obras publicas. - Annuncia o sr. presidente que chegada a hora de se passar á ordem do dia, não podendo por isso continuar o sr. ministro no uso da palavra, sem auctorisação da camara. Sendo esta consultada, resolve negativamente. - Requerimento do sr. Marianno de Carvalho. - Aviso previo do sr. Franco Castello Branco.

Na ordem do dia contínua a discussão dos artigos 5.º a 21.° do projecto de lei n.° 71, de 1898 (imposto do sêllo), tomando parte no debate os srs. Malheiro Reymão e Oliveira Matos, que apresentam propostas de alterações ás tabellas, e o sr. Dias Ferreira, que apresenta uma moção de ordem, respondendo-lhe o sr. ministro da fazenda. - Refere-se de novo aos estragos nos molhes do porto de Leixões o sr. Kendall, dando em seguida explicações sobre as providencias tomadas pelo Sr. ministro das obras publicas.-Pergunta do sr. Franco Castello Branco aos srs. ministros do reino e fazenda, que respondera em seguida. - Observações do sr. Teixeira de Sousa em referencia a uma deliberações do governador civil de Villa Real. Resposta do sr. ministro da fazenda.- Representações e justificação de faltas.

Primeira chamada - Ás duas horas da tarde.

Presentes -15 srs. deputados.

Segunda chamada - As três horas da tarde.

Abertura da sessão - Ás tres horas e um quarto da tarde.

Presente - 59 srs. deputados.

São os seguintes: - Abel da Silva, Alberto Affonso da Silva Monteiro, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Cazimiro de Almeida Ferreira, Antonio Augusto Gonçalves Braga, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amara], Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Teixeira de Sousa, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Alberto de Campo Henriques, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira Carlos José de Oliveira, Conde de Paçô Vieira, Eusebio Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Frederico Ressano Garcia, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, João Abel da Silva Fonseca, João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira do Castro, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Paes do Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Alves Pimenta de Avelar Machado, José Benedicto de Almeida Pessanha, José da Cruz Caldeira, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento, José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Matos, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, Julio Ernesto de Lima Duque, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Sarna Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Fischer Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Marianno Cyrillo de Carvalho, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro, Sebastião de Sousa Dantas Baracho e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante á sessão os srs.: - Alvaro de Castellões, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Conde de Burnay, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Furtado de Mello, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Baptista Ribeiro Coelho, João Lobo do Santiago Gouveia, Joaquim José Pimenta Tello, José Adolpho de Mello e Sousa, João Capello Frouco Frazão, José Dias Ferreira, José Gil de Borja Macedo o Menezes (D.), José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Júnior e Manuel Pinto de Almeida.

Não compareceram á sessão os srs.: - Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo César de Oliveira, Anselmo de Andrade, António Tavares Festas, Conde de Idanha a Nova, Conde de, Serra de Tourega, Conde de Silves, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Silveira Vianna, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Antonio de Sepulveda, João Joaquim Izidro dos Reis, João Marcellino Arroyo, Joaquim Ornellas de Matos, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Bento Ferreira de Almeida, José Christovão Patrocínio de S. Francisco Xavier Pinto, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães,

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Telles de Vasconcellos, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Acta - Approvada.

O sr. Presidenta: - Como a camara verá, quando se der conta do expediente, o sr. deputado Ferreira de Almeida participou-me que, por motivo de doença, não tem podido tomar parte nos trabalhos parlamentares.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da fazenda, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Teixeira de Sousa, os documentos relativos á execução de um accordão do supremo tribunal administrativo e á distribuição do contingente da contribuição predial de 1898 no districto de Villa Real.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Teixeira de Sousa, nota dos titulos vendidos durante o anno de 1898, e copia dos contratos de supprimentos realisados no mesmo anno e ainda não publicados.

Para a secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo os documentos pedidos pelo sr. deputado Pereira de Lima, com respeito aos emprestimos em vigor feitos ao governo pelas companhias que têem contratos com o estado, ás cambiaes compradas durante o anno de 1898 para occorrer ao pagamento dos encargos do estado no estrangeiro e aos títulos de divida publica vendidos durante o mesmo anno de 1898.

Para a secretaria.

Do ministerio dos negocios estrangeiros, remettendo 150 exemplares da conta da despeza d´este ministerio, na gerencia do anno economico de 1896-1897 e do exercício de 1895-1896.

Para a secretaria.

Do sr. deputado Ferreira de Almeida o seguinte officio Illmo. e exmo. sr. - Commandando a corveta D. Estephania, escola de alumnos marinheiros do norte, pedi uma inspecção ás obras que dirigi, para appropriar o navio ao serviço a que foi destinado, e bem assim ao serviço escolar e geral, e por despacho de 23 de janeiro, que me foi communicado em 26, s. exa. o ministro dispensou essa inspecção; ficando então desembaraçado do serviço ordinario e extraordinario que d´ali derivava, entreguei em 1 do corrente o commando, vindo occupar o meu logar no parlamento; mas não podendo, por doente, fazer a minha apresentação pessoal, faço-a por esta fórma, para os effeitos convenientes. - Deus guarde a v. exa. Lisboa, 2 de fevereiro de 1899. - lllmo. e exmo. Sr. presidente da camara dos senhores deputados. = José Bento Ferreira de Almeida, deputado pelo circulo n.° 92.

Para a secretaria.

Da associação da imprensa portugueza, remettendo o numero unico que esta associação mandou publicar em homenagem á memoria de Almeida Garrett.

Mandou-se archivar.

Segundas leituras

Projecto de lei

Senhores. - A camara municipal do concelho da Certã, districto de Castello Branco, contrahiu um emprestimo de 10:440$000 réis na companhia geral de credito predial portuguez, por escriptura de 30 de junho de 1886, a fim de realisar alguns melhoramentos de que instantemente carecia.

A annuidade d´esse emprestimo, que é de 602$628 réis, absorve uma parte importante da rendimentos do município, e não se podem assim effectuar obras de reconhecida urgencia e utilidade.

A camara, desejando zelar os interesses dos seus munícipes, mas reconhecendo ao mesmo tempo que não póde augmentar os seus encargos, visto que a percentagem da contribuição municipal é já de 50 por conto, resolveu na sua sessão de 11 de janeiro pedir auctorisação para desviar do cofre de viação para o do município 303$314 réis, metade d´aquella annuidade, até 1940, em que termina a auctorisação do emprestimo.

D´esta sorte conta acudir ás necessidades inadiaveis do município, realisando os melhoramentos locaes indispensaveis, e entende que não prejudica o desenvolvimento da viação municipal, não só porque esta quantia é pequena, relativamente á receita da viação, mas porque se acham quasi concluidas as estradas municipaes mais importantes.

Eu, que tenho a honra de representar n´esta casa o circulo da Certa, achando de todo o ponto exactas as ponderações da camara municipal, submetto á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° A camara municipal do concelho da Certã fica auctorisada a desviar annualmente do cofre de viação a quantia de 303$314 réis, para pagamento de parte da annuidade do emprestimo de 10:440$000 réis, contrahido na companhia geral de credito predial portuguez, por escriptura de 30 de junho de 1886.

Art. 2.° Essa auctorisação dura até 1940, em que o emprestimo se amortisa completamente.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 3 de fevereiro de 1899. = O deputado pelo circulo da Certã, João Pinto Rodrigues dos Santos.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de administração publica e de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - O decreto de 27 de julho de 1895 concedeu provisoriamente á associação protectora das meninas pobres, com séde em Santarem, o edifício, cerca e dependencias do supprimido convento de S. Domingos das Donas, na mesma cidade, onde funcciona um collegio, muito concorrido e bem dirigido, para instrucção e educação de meninas pobres.

Tendo esta instituição provado a sua utilidade, e sendo de justiça tornar definitiva aquella concessão, nos termos em que foi feita, tenho a honra de submetter á vossa approvação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É tornada definitiva a concessão feita provisoriamente á associação protectora das meninas pobres, com séde em Santarem, por decreto de 27 de julho de 1895.

Art. 2.° Esta concessão caduca sem direito á exigencia de qualquer indemnisação por bemfeitorias, logo que o edificio seja desviado do seu destino legal.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario. = O deputado, Queiroz Ribeiro.

Lido na mesa, foi admittido e enviado ás commissões de administração publica e de fazenda.

O sr. Presidente: - Vae proceder-se agora á segunda leitura da proposta, mandada hontem para a mesa pelo ar. deputado Dantas Baracho.

Leu-se a seguinte

Proposta

Proponho que no regimento da camara seja introduzida a disposição de que nenhum deputado tem iniciativa para

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propor medida alguma que, directa ou indirectamente, importe augmento de despeza. Essa faculdade fica exclusivamente adstricta aos ministros da corôa. = Sebastião Baracho.

Foi admittida e enviada á commissão do regimento e disciplina.

O sr. Franco castello Branco: - Estou convencido de que v. exa. empregará os seus bons officios junto da commissão, para que ella se apresse era dar o seu parecer.

O sr. Presidenta: - Empregarei n´esse sentido, tanto quanto me for possivel, os meus esforços.

Corno não está ainda presente, nem o sr. ministro da justiça, nem o sr. presidente do conselho, a quem foram remettidos avisos previos de alguns srs. deputados que desejam interrogal-os, vou dar agora a palavra, pela ordem da inscripção geral, aos srs. deputados que a pediram, e depois concedel-a-hei aos que no acham inscriptos com aviso previo, á medida que os srs. ministros comparecerem.

O sr. Luciano Monteiro: - Referindo-se á illuminação da sala, observa que ella é insufficiente, e ao mesmo tempo eleva a temperatura de tal modo que a torna incommoda. Para obviar a estes inconveniente, lembra ao sr. presidente que talvez se possa transferir para o edificio das cortes a installação da luz electrica, que se estabeleceu no edifício da academia das sciencias, quando a camara ali funccionou, e que lá está abandonada.

É claro que faz esta proposta na hypothese de não ter a empreza do theatro do S. Carlos tomado posse da mesma installação, o que não seria para admirar em presença de alguns factos recentes, com que ella foi beneficiada, taes como a isenção do sêllo e a exportação de mercadorias sem pagamento de direitos.

Alludindo depois a umas explicações que, no fim da sessão anterior, trocou com o sr. presidente do conselho, ácerca do procedimento do governador civil de Braga para com a respectiva commissão districtal, lamenta que s. exa. não esteja presente, porque desejava fazer ainda algumas considerações a este respeito.

Dissera-lhe s. exa. que a resolução de governador civil de Braga, nomeando novos vogaes para as commissões de recenseamento, não podia ser alterada senão por meio de recurso, de onde resultaria, a ser assim, o caso extraordinario de recorrer aquella auctoridade de um acto por ella propria praticado.

Elle, orador, foi depois examinar o codigo n´este ponto, e reconheceu que as resoluções dos governadores civis só podem ser revogadas ou annulladas, quando da annullação ou revogação não resulte prejuízo de direitos adquiridos; e como no caso de que se trata, não se prejudicavam direitos alguns adquiridos, antes, ao contrario, de fazia a affirmação d´esses direitos, dá-se a hypothese de poder e dever o sr. presidente do conselho, usando das suas attribuições, annullar a resolução do governador civil de Braga.

Conclue, pedindo ao sr. ministro da guerra que communique estas considerações ao sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente: - Tomei nota das observações do illustre deputado em referencia á illuminação da sala, e verei se é possível aproveitar o alvitre apresentado por S. exa.

O sr. Henrique Kendall: - Desejava chamar a attenção do sr. ministro das obras publicas para um assumpto especial, mas como s. exa. ainda não está presente peço a v. exa. que me reserve a palavra para quando s. exa. comparecer.

O sr. Ministro da Guerra (Sebastião Telles): - Pedi a palavra para declarar ao sr. deputado Luciano Monteiro que tomei nota das observações que s. exa. apresentou á camara, e que as communicarei ao sr. ministro do reino.

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Avellar Machado.

O sr. Baracho: - Eu é que a pedi.

O sr. Presidente: - Pareceu-me que tinha sido o sr. Avellar Machado. Vejo que houve equivoco da minha parte. Dou, portanto, a palavra ao sr. deputado Baracho.

O sr. Dantas Baracho: - Começo por agradecer V. exa. a amabilidade de me conceder a palavra, reconhecendo que o meu velho amigo, o sr. Avellar Machado, não a tinha pedido, remediando assim v. exa. o equivoco, aliás facil de dar-se pela confusão que havia na sala. E aproveitando o ensejo, tenho muita satisfação em prestar a minha homenagem á inteireza de caracter e alto criterio com que v. exa. costuma dirigir os trabalhos parlamentares.( Apoiados geraes.)

Sr. presidente, como V. exa. sabe, eu tive tambem a honra de mandar para a mesa uma modesta proposta, com relação á faculdade que têem actualmente os srs. deputados, de apresentarem quaesquer propostas ou projectos de que resultem augmento de despeza.

Esta proposta, que acaba de ser admittida e mandada a uma commissão, levantou aqui reparos por parte de alguns srs. deputados, que, se não me engano, foram os srs. João Pinto dos Santos, Francisco José Machado e Antonio Cabral.

Estes meus illustres collegas, na sua impugnação á minha proposta, consideraram-n´a sob o ponto de vista de vir ella coarctar direitos, de vir coarctar liberdades que todos desejam manter integralmente, como têem mantido até hoje. E, n´um curto áparte, quando o meu velho amigo, o sr. João Pinto dos Santos, n´um doutrinarismo de direitos, se espraiava em considerações sobre a minha salutar proposta, fiz ver que a liberal Inglaterra mantera-se desde 1706 no regimen da doutrina e dos princípios d´essa proposta, sendo por isso que ali está arreigado, como em parte nenhuma, o systema parlamentar, que em quasi todas as outras nações onde não vigoram aquelles principies, vae em decadencia accentuadissima.

Sr. presidente, quando se argumenta com o ataque aos principios liberaes, apenas tenho a recordar o que disse hontem relativamente a Gladstone, de gloriosa memoria.

Era em 1886; presidia ao conselho de ministros e estava na camara dos communs, onde continuava mantendo a liberdade dos povos e fazendo respeitar a liberdade de todos os seus concidadãos, como estadista que tinha, como poucos, ou como talvez nenhum, um culto fervoroso por indo quanto eram preceitos liberaes, o que nunca vacillou em manter intemeratos esses principios; pois, apesar d´isto, elle não hesitou, na tribuna, dirigindo-se a um deputado que, sem reclamar qualquer augmento de despeza, apenas estranhava a mesquinhez de certa verba destinada a determinado serviço, não hesitou, digo, em responder-lhe com estas palavras textuaes: a missão constitucional da camara não é a de fazer despezas, é a de reduzil-as. (Apoiados.)

Sr. presidente, se se pozesse, a valer, em execução este pensamento, e se nós só tivessemos a faculdade de fiscalisar, de certo que os governos não ousariam vir perante a camara dar maus exemplos, propondo despezas inuteis, muitas vezes absolutamente injustificadas; (Muitos apoiados) não ousariam sair dos preceitos de uma administração economica e honrada.

Mas, sr. presidente, não são só os paizes de raça saxonia que bem se administram, os que admittem princípios parlamentares d´esta natureza. v. exa. e todos os srs. deputados que acompanham e seguem o movimento político da Europa, hão de ter notado que a França, cuja riqueza é fabulosa, a ponto de poder resistir ao pagamento de indemnisações como a de 1870, ha uns annos a esta parte começou a decair, e por tal fórma, que já appareceu ali a

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idéa de se lançar um imposto de rendimento sobre os titulos da divida publica, o que fez levantar uma campanha que obrigou o governo a recuar. Mas agora já até os particulares, conhecendo que as despezas publicas dentro em pouco não poderão ser satisfeitas, se associam, juntam e formam a chamada liga dos contribuintes, onde estão inscriptos milhares de homens de valor, de dinheiro e de poder, que se tornam notaveis nos varios ramos das sciencias, das artes, e da administração publica. (Apoiados.)

Ligam-se todos, precisamente para que se ponha freio nos esbanjamentos e se contenham as despezas publicas, impedindo-se que os representantes do paiz não tenham acção para promover despezas de especie alguma, nem directas nem indirectas. (Apoiados.)

Eu gosto e folgo muito de ver invocar as liberdades.

Quantas vezes as ouvimos invocar aqui e lá fóra, quando se tratava da questão do recrutamento?! Quantas vezes se declamou e asseverou que o recrutamento não podia ser entregue, unica e exclusivamente á classe militar, porque de ahi adviria uma grande decadencia da auctoridade civil, cerceando-lhe garantias, como são as de regular a entrada no recrutamento, que representa o tributo mais oneroso que se póde pagar?! E sempre aqui vimos respeitados estes princípios erroneos na lei que estabeleceu o serviço militar obrigatorio. E o que succedia?

Eu não quero contar á camara o que se praticava, nem descer a minuciosidades; mas os factos foram de tal ordem que a acção militar teve de fazer-se sentir desde a iniciação dos trabalhos do recrutamento, e com applauso publico, porque creio que nem uma só vez se levantou contra essa acção. (Apoiados.) E o exercito tem soldados, e a moralidade subiu bastante de nivel. (Apoiados.)

Era justamente o que a daria, quando nós, deputados estivessemos inhibidos, por motivo de interesse publico, de propor qualquer augmento de despeza, por nossa iniciativa particular. (Apoiados.)

Sr. presidente, eu referi-me hontem ao facto de, no final da sessão legislativa passada, terem desfilado perante a camara projecticulos de diversa natureza, todos augmentando mais ou menos as despezas do thesouro. O illustre deputado, e meu amigo, o sr. Antonio Cabral referindo-se a este facto, teve a amabilidade, honradamente, de confirmar a asserção que eu fizera de que eu não tinha intervindo nem directa nem directamente na approvação d´esses projecto.

O sr. Antonio Cabral: - Apoiado.

O Orador: - Mas accrescentou s. exa. que d´este lado da camara se patrocinaram projecticulos d´aquella natureza.

Permitta-me s. exa. que eu lhe diga que se eu não tivesse outros argumentos para insistir sobre a minha proposta, bastava-me esse. (Apoiados.)

Quando nós todos, nas melhores intenções, seguramente, e sem distincção de partido, concorremos para augmentar as despezas publicas e praticâmos por esta fórma um acto que hoje nos devia ester vedado por todos os princípios, conveniencias e indicações, eu tenho só a felicitar-me, por ter apresentado a minha proposta e por insistir hoje novamente por ella. (Apoiados.)

E hei de insistir, sempre que se me apresente ensejo para isso, na inteira convicção de que essa proposta, ha de tornar-se em realidade, n´um periodo mais ou menes curto, porque todos ternos a consciencia de que não podemos estar a augmentar, nem em um real, as despezas publicas, quando não haja para isso um fundamento capital. (Apoiados.)

Como já tive occasião de dizer, se os deputados não tiverem o direito de augmentar as despezas publicas, serão elles os fiscaes mais rigorosos, e mais para temer do governo; e quem ha de lucrar com isso, ha de ser o paiz. Tinha ao mesmo tempo a conveniencia de mostrarmos aos nossos credores, que estavamos animados da melhor vontade de satisfazer os nossos encargos, o que de certo muito concorreria para nos elevar no seu conceito e no do publico.

Concluindo aqui as minhas observações, em replica aos illustres deputados que hontem tiveram a amabilidade de se referir ao que eu havia dito, permitta-me v. exa. que eu faça votos para que a minha proposta se torne, em curto praso, n´uma realidade para beneficio do paiz e de nós todos.

Tenho concluido.

Vozes : - Muito bem.

(S. exa. não reviu este discurso.)

O sr. Antonio de Vasconcellos: - Ninguem n´esta camara mais do que eu respeita as generosas intenções que dictaram a iniciativa da proposta do sr. José Adolpho de Mello e Sousa, nosso distincto collega n´esta camara como ninguem mais do que eu respeita as generosas intenções com que o illustre deputado o Sr. Baracho agora renovou e advogou a mesma proposta, e eu seria um dos seus mais calorosos defensores se estivesse convencido de que no meio politico e social em que vivemos ella seria uma garantia tão absoluta e tão importante como o sr. Dantas Baracho imagina que é.

Mas, na propria Inglaterra, que é um modelo de administração na Europa, este processo, este systema de coarctar a faculdade dos deputados apresentarem propostas que impliquem augmento de despeza, não tem dado resultado algum, e eu vou demonstrar com factos, que hão de merecer a confiança da camara, porque não são de pura phantasia ou producto da minha imaginação, mas ditas com a sinceridade de um crente e extrahidos dos relatorios officiaes apresentados ao parlamento inglez.

Eu, em materia de administração ou de legislação, lastimo profundamente que o meu paiz esteja cheio de retalhos.

Nós ora importâmos da Italia em materia de legislação eleitoral, e o regimento da camara fomos buscal-o á Italia, ora nos voltâmos para a França em materia de administração e de tributação, e hoje dirigimo-nos para a Inglaterra.

Eu queria da Inglaterra todo o systema de administração, mas não a queria aos bocados; eu queria um chanceller do thesouro, um contrôleur geral das finanças e um pay master general com ha em Inglaterra; todo o systema emfim de administração ingleza, no meu paiz...

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - O inglez a governar inglezes.

O Orados: - Mas tambem o que não póde ser é continuarmos a fazer da nossa legislação uma verdadeira manta de retalhos. Hoje governâmo-nos em determinado caso pelo systema da Inglaterra, ámanhã pelo da França e no outro dia pelo da Italia, sem estudar os nossos costumes e o condicionalismo do nosso meio.

O mal não está nas leis, pois que todas são boas desde que se cumpram; o mal está nos costumes.

Eu peço desculpa ao sr. Teixeira de Vasconcellos, mas sabendo bem a grande sinceridade com que s. exa. falla n´esta camara, sinto ver que não me acompanha, dizendo eu que estou fallando sinceramente e não estou fazendo sophismas. Ouça-me s. exa. até ao fim e verá depois quantas illusões se estão fazendo com o projecto de lei do sr. Mello e Sousa, e que o illustre deputado o sr. Baracho tão convictamente está defendendo ha duas sessões.

Eu vou dizer a v. exa. o que em 1883, na sessão de 5 de abril, disse mr. Childers, chanceller do thesouro:

Em tres annos houve 576 propostas de lei, que implicam augmento ou diminuição de despeza; mas d´estas houve apenas 20 e d´aquellas 556.

Mas isto não basta; o grande financeiro, conhecido de todos, mister Goscheu, chanceller do thesouro, na sua exposição financeira de 28 de abril de 1887, diz o seguinte:

Em dezesete annos a despeza publica pelos serviços civis augmentou 8:640 libras. Este augmento de despeza

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é obra mais de parlamento que dos governos que ha vinte annos têem estado no poder.

Posto que a situação do thesouro não seja má, seria muito para desejar que os membros do parlamento se abstivessem de reclamar o auxilio do governo para todas as cousas por que se interessam, como, por exemplo, compra de mobilia para museus, creação de escolas, collegios, compra de quadros, etc., etc.

Mas ha mais, ar. presidente; se a camara não está ainda convencida que e systema inglez não tem dado tão extraordinarios resultados como se estava fazendo acreditar, citarei ainda um trecho do relatorio de sir Vernon Harcourt, chanceller do thesouro, em 1893. A data é recepte e as queixas de sir Harcourt já foram reeditadas, ainda mais recentemente:

A iniciativa parlamentar, que é generosa, porque tem pouca ou nenhuma responsabilidade, entrega-se a livre carreira no caminho das despegas publicas. Conduz sabiamente, mesmo na camara, a sua campanha, e um bello dia faz votar uma resolution que custa ao estado dezenas de milhões.

Ora já vê s. exa. e a camara que, apesar de todas as ponderações a que se impoz o parlamento inglez, são os proprios chancelleres do thesouro de todas as situações, quer das presididas por lerd Rosebery, quer presididas por lord Salisbury, que vem declarar á camara que, apesar de determinações expressas na lei, a iniciativa parlamentar tem augmentado consideravelmente as despezas com os serviços civis e militares.

Disse ainda recentemente, quando estive em Londres, era 1896, mister Hicks Beach que desde 1892, devido á iniciativa parlamentar, as despezas de marinha e as de instrucção publica tinham augmentado enormemente, sendo aquellas 40 por cento e estas 43 por cento, mas longo de condemnar esse immenso encargo para o thesouro, reconhecia, bem ao contrario, a sua incontestavel utilidade, e que até á massa geral dos contribuintes essas eram sympatichas.

Isto prova a v. exa. que a medida não é efficaz.

Eu achava preferivel que restabelecessemos por inteiro a nossa lei de contabilidade de 25 de junho de 1881, acrescentando-lhe que nenhum credito extraordinario podesse ser aberto sem auctorisação d´esta camara.

Mas o que é que está succedendo?

Um dia, em 1891, mão irreflectida e descuidada acabou com a disposição do artigo 3.° da lei e regulamento geral de contabilidade publica; por ella nós tinhamos n´esta camara, a garantia que hoje não temos.

Essa disposição obrigava o governo a apresentar o orçamento de previsão, o orçamento rectificado e a proposta de lei para o regulamento definitivo dos exercicios findos, e então por este modo tinhamos nós conhecimento como os governos administravam, qualquer que fosse a sua feição partidaria, porque a mim não me importa saber quem são os administradores, o que me importa é saber como administram o paiz.

Pelo orçamento rectificado tinhamos nós meio de saber como foram realisadas as previsões da receita, quaes os impostos que as attingiram ou excederam, e podiamos estudar as causas do seu augmento ou decrescimento e até a sua boa ou má distribuição e arrecadação, e esta sobretudo precisa urgentemente ser muito estudada, porque, póde-se seguramente affirmar, desde já é pessimamente feita, e factos bem recentes, a que me não referirei agora, o estão claramente demonstrando.

Quanto á despeza podiamos nós conhecer como foi feita e se o foi em harmonia com a lei ou com as auctorisações parlamentares, que infelizmente mais de uma vez têem sido illudidas e até desacatadas... sabe-o toda a camara.

Mas mão irreflectida e descuidada, talvez movida pela desorientação política d´aquella epocha, que tilo funesta esta sendo ainda agora ao paiz, acabou com aquella salutar disposição, com grave prejuizo para as prerogativaa do parlamento, que hoje, pelas não ter, é escarnecido e desdenhado até, lançando-se-lhe, quando convem, responsabilidades que lhe não cabem. Emfim, que soffra a justa expiação da sua indesculpavel. ..(como hei de eu dizer, sr. presidente?) da sua indesculpavel fraqueza...

Vieram depois os creditos extraordinarios e supplementares sob proposta do governo, ouvido o conselho d´estado; ora, o conselho d´estado é uma corporação muito respeitavel, mas que não devia ter a menor intervenção na applicação dos dinheiros publicos, que só a nos cumpre auctorisar, pois que só por nossa intervenção se consegue pedir novos impostos ao paiz; pura isto é que nos não dispensam, mas para gastar os rendimentos publicos qualquer tribuneca tem competencia, auctoridade e força...

Pelo systema agora seguido, que fiscalisação exerce hoje esta camara, tanto na arrecadação, como na applicação dos dinheiros publicos? Nenhuma, absolutamente nenhuma! (Apoiados de, ambos os lados da camara.)

Sr. presidente, estamos agora em phase de admirarmos o systema de administração das ilhas britannicas, e ainda bem, porque é perfeitissimo; mas se ámanhã o introduzíssemos no nosso paiz, com todo o seu cerimonial, sem o qual não valeria nada, dentro em pouco mão irreflectida e nervosa mutilal-o-ia com uma simples penada, praticando assim um grande acto de força ou de manga de alpaca... (Apoiados.)

Infelizmente, entre nós o respeito pela lei não é igual em todos os cidadãos; eis o que não succede nas ilhas britannicas, eis o nosso mal. Quando uma lei, embora boa, nos constrange, derogâmol-a com uma simples penada. Lá está o conselho d´estado para ser ouvido, e cuja opinião importa pouco, quando contrario ás deliberações previamente tomadas. Pois elle tambem não é mais que um tribunal consultivo!

Ora, quer v. exa. um exemplo, o nosso systema de fazer política em relação ás ilhas britannicas.

Em 1887 a Inglaterra comprou ao khediva do Egypto, por intermedio da casa Rothschild, 170:002 acções do canal de Suez por 4 milhões. de libras; pois hoje essas 170:002 acções valem 24 milhões e asseguram á Inglaterra a sua preponderancia sobre o canal de Suez, o que para as outras nações foi fundamente desagradavel, e só já bem tarde é que a Europa soube da brilhante operação que fôra realisada. Ninguem na camara ousou interpellar o governo quando este fez esse negocio, que n´essa epocha a muitos pareceu ridiculo ou precario, porque estava, como esteve, sujeito a mil contingencias. Se isto se tivesse passado entre nós, o que ahi iria, Santo Deus!

Senão, ouça v. exa. e a camara.

Exactamente por aquella epocha, o illustre estadista e brilhante parlamentar, o sr. Marianno de Carvalho, com o justo intuito de fomentar a alta das cotações da nossa divida externa, o que tão habilmente conseguiu, e da qual o paiz tirou indiscutivel proveito pelas operações financeiras que então realisamos no estrangeiro, lembrou-se de fazer comprar, do conta do thesouro, alguns milhares de libras do fundo externo portuguez de 3 por cento; pois este acto, que devia morrer nos archivos do ministerio da fazenda, com grande proveito para todo o paiz, foi revelado ao mundo com uma inconsciencia ou paixão partidaria, que bem cara custou logo ao paiz na emissão do emprestimo externo de 4 por cento, que ficou sem tomadores, ou se os teve foi por favor, ficando o thesouro com uma boa parte d´elle.

D´estas e de outras leviandades que se têem praticado, não pela camara, cuja timidez e fraqueza tão prejudicial é aos negocios publicos, mas que de facto se têem praticado, é que resultam os grandes males de que adoece a nossa administração publica.

Se queremos imprimir á nossa administração a maxima firmeza o tambem a maxima seriedade, não será, ou eu

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me engano muito, por meio da adopção da proposta de lei, cuja iniciativa foi agora renovada pelo illustre parlamentar o sr. Baracho; creio mesmo que é outro, muito outro, o caminho a seguir.

Deixemos a Inglaterra com a sua administração, a Allemanha com o seu exercito, a França com os seus impostos e a Italia com as suas incompatibilidades parlamentares, e estudemos em nós mesmos o que convem fazer.

E tenho dito, sr. presidente. (Apoiados.)

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado.)

O sr. Presidente: - Como está presente o sr. ministro da justiça, vou dar a palavra ao sr. Malheiro Reymão.

O sr. Ministro da Justiça (José de Alpoim): - V. exa. acaba de dizer que vae dar a palavra ao sr. Reymão. Eu não recebi nenhuma communicação sobre qualquer aviso previo que me tivesse sido enviado: entretanto, se s. exa. quizer dirigir-me algumas perguntas talvez eu lhe possa responder desde já.

(Entrou o sr. Malheiro Reymão.)

O sr. Presidente: - O sr. Malheiro Reymão tinha mandado para mesa um aviso previo ao sr. ministro da justiça. S. exa. declarou, porém, que não recebeu ainda tal aviso. Vou tratar de informar-me do motivo da demora e opportunamente darei a palavra ao sr. deputado para dirigir as suas perguntas ao sr. ministro.

O sr. Malheiro Reimão: - Sim senhor.

O sr. Teixeira de Vasconcellos: - Em boa hora entrou n´esta camara o sr. ministro das obras publicas, a quem peço o favor de prestar attenção ás poucas palavras que vou proferir sobre um assumpto grave e serio de que s. exa. já deve ter conhecimento de ha muito tempo. Refiro-me á escacez do milho nas províncias do norte.

Toda a camara sabe, ou, pelo menos, sabem-n´o os deputados que representam os circulos do norte do paiz, que a producção cerealifera este anno foi immensamente escassa.

As auctoridades administrativas reclamaram do sr. ministro das obras publicas as providencias que s. exa. julgasse indispensaveis para atalhar um mal que produziu já grande soffrimento e que pela agudeza da crise se torna hoje incomportavel e ámanhã póde ameaçar seriamente a ordem publica. As medidas que s. exa. adoptou e que eu não conheço bem, a não ser pelos seus effeitos, foram absolutamente ineficazes. Não só o milho tem faltado nos mercados, como tambem o seu preço é exorbitantissimo em relação aos recursos das populações ruraes. (Apoiados.)

Este estado de cousas foi-se aggravando successivamente, as manifestações do mal então tornaram-se tão evidentes e claras, pondo em risco não só a segurança individual como e respeito pela propriedade alheia, que muitas camaras municipaes solicitam calorosamente a attenção do s. exa. o ministro para que o mal tenha um remedio immediato e a tempo de evitar grandissimas calamidades.

Eu, que nasci e vivo n´um circulo do norte que tenho a honra de representar n´esta casa, não posso deixar de estranhar com magua a indifferença profunda com que os poderes publicos recebem as reclamações das populações que se encontram disseminadas pelos campos, valles e motanhas das nossas províncias.

Quando se receia que haja falta de trigo para alimentar as populações das cidades, os ministros são pressurosos, não é necessario incital-os, elles mesmos de per si procuram todos os meios, os mais promptos e os mais efficazes, e os resultados são seguros para poupar essas populações á dôr lancinante da falta de alimentação. Mas quando, pelo contrario, sr. presidente, a crise apparece nas regiões em que a população é dispersa, e porque não tem uma voz clamorosa, porque vivem disseminados, os ministros descansam, não se affligem, não se preoccupam com uma questão que contém em si um grande fundo de justiça e de humanidade, e que ao mesmo tempo póde, quando desprezada, transformar-se n´um perigo serio para a ordem publica!

r. presidente, ha muitos annos que a producção cerealifera no norte do paiz é irregular, anormal e deficiente para a alimentação dos que encontram no cereal a base principal da sua alimentação; no anno passado, por circumstancias que todos conhecem, a producção foi escassissima, e, portanto, insufficiente para as populações ruraes do norte, e todos os remedios até hoje procurados não têem conseguido senão causar a fortuna de alguns importadores de milho estrangeiro, sem de modo algum beneficiar o consumidor. (Apoiados.)

É para este assumpto que eu chamo a attenção do sr. ministro das obras publicas, e, sem lhe querer dar conselhos, eu entendo que a questão tem apenas uma solução que é simples, mas que é a unica que, quanto a mim, póde ser adoptada n´este momento: é o governo por si importar o milho que julgue necessario para abastecer os mercados, com sufficiencia e regularidade e para manter um preço que seja compativel com o salario mesquinho e escasso que as populações ruraes recebem do seu trabalho tão pesado como arduo! (Apoiados.) Não sendo isto, sr. presidente, todos os outros meios de que o governo queira lançar mão, podem favorecer os exploradores e os monopolistas, mas não aproveitam ao consumidor!

É isto que pretendo evitar, é sobre este assumpto que chamo a attenção do sr. ministro; não é supprimindo ou diminuindo direitos de importação que s. exa. conseguirá fazer baixar o preço até uma taxa regular, justa e equitativa; é importando por sua conta e cedendo ás camaras municipaes para que ellas, sem retribuição alguma, o exponham á venda para consumo do publico.

Eu tenho o prazer mesmo de notar que a camara municipal do concelho de Amarante foi talvez das primeiras a reclamar. Essa camara compõe-se de proprietarios que, a não serem movidos por um grande sentimento de humanidade e de justiça, não devem ter grande interesse em que o estado de cousas melhore, visto que os proprietarios, tendo para vender, quanto maior for o preço de venda, maior será tambem o seu lucro. Mas ha questões em que não póde entrar o egoismo, e não póde entrar porque acima de tudo ha no fundo da consciencia de cada um o sentimento mais alto e mais elevado de solidariedade sosial e de humanidade, que faz que a justiça triumphe sobre os estimulos mesquinhos e ruins.

Não alargo mais as minhas considerações porque estou certo de que o sr. ministro das obras publicas dará ás minhas palavras o valor que ellas merecem e tomará a questão em todo o seu peão, em toda a sua importancia, porque é uma questão de justiça e de ordem publica.

Vozes: - Muito bem.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Elvino de Brito): - Já teve occasião de disser na camara que lhe merece a maior attenção a questão cerealifera, considerada no seu conjuncto, e que, na sua opinião, se deve proceder no sentido de tornar intensiva a sua cultura. N´esta ordem de idéas se mantem, e empenhará todos os esforços para melhorar a agricultura em geral.

Não cedeu ás primeiras reclamações dos governadores civis das províncias do norte, porque tinha noticia de que no paiz havia milho para se acudir ás primeiras necessidades, e era dever seu proceder com prudencia; e a prova de que procedeu bem, é que só agora, tres mezes depois, se manifesta a crise.

Ainda não ha, porém, uma hora que esta questão foi debatida em conselho de ministros, e o governo vae adoptar medidas energicas, que não eram opportunas, ha tres mezes e com as quaes só podiam então aproveitar os especuladores, que tinham armazenada uma grande quantidade d´aquelle cereal.

Depois de mais algumas considerações, conclue o ora-

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SESSÃO N.º 15 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 7

dor declarando que todos os actos da sua administrado têem tido por fim satisfazer ás necessidades das populações dos campos e fomentar a agricultura nacional.

(O discurso será publicado na integra, quando S. exa. restituir as respectivas notas tachygraphicas.)

O sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao sr. Kendall, visto achar-se presente o sr. ministro das obras publicas, mas tenho a observar a s. exa. que faltam apenas tres minutos para se passar a ordem do dia.

O sr. Henrique Kendall: - Creio que tres minutos serão sufficientes para o que tenho a dizer.

Eu desejo referir-me a um assumpto que já hontem foi tratado n´esta camara pelo sr. Campos Henriques e que diz respeito ao desmoronamento do porto de Leixões.

Creio que o sr. ministro das obras publicas algumas providencias já deve ter adoptado, pelo menos presumo-o, porque o sr. ministro da justiça disse hontem em resposta ao sr. Campos Henriques que s. exa. estava reunido com uma commissão de engenheiros para estudar o assumpto.

É certo, porém, que a cidade do Porto e todas as povoações d´esse districto estão naturalmente alarmadas com aquelle desastre, e eu pedia ao sr. ministro das obras publicas que dissesse alguma cousa a fim de desfazer o justo alarme que o deplaravel facto produziu. Desejaria no mesmo tempo que s. exa. dissesse se, tendo ficado deserto o concurso para acquisição de boias de amarração, cuja necessidade é tão instante, s. exa. está resolvido a, por novo concurso ou acquisição directa do estado, obter essas boias, que são absolutamente indispensaveis para que aquelle porto dê o resultado que deve dar.

Aguardo, pois, a resposta do nobre ministro.

O sr. Ministro das Obras Publicas (Elvino de Brito): - Tres foram as questões que encontrei pendentes, em relação ao porto de Leixões, ao assumir a gerencia da pasta das obras publicas: a do pharolim do porto, a das boias de amarração, e a das avarias causadas em um dos molhos.

Pelo que respeita ao pharolim, creio que foram vencidas todas as difficuldades e que já está funccionando; quanto ás boias, mandei abrir concurso que ficou deserto; mas, se succeder o mesmo no segundo concurso, hei de prover a essa necessidade, que considero urgentissima.

Quanto ás avarias no molho, eu devo declarar, e aproveito assim a occasião de responder ao sr. Campos Henriques, que ellas me preoccupam tanto, como me preoccupavam as outras questões a que alludi.

Achei pendente, como disse, esta questão, e, infelizmente, pelos noticias circumstanciadas, diarias, que tenho recebido desde que presenti o enorme desastre que succedeu ao molhe do sul, o mal não podia ser tão facilmente, tão promptamente remediado, como o poderia ter sido ha muitos annos.

Devo dizer á camara que a primeira noticia desenvolvida, a primeira reclamação que subiu ao ministerio das obras publicas, deu n´elle entrada no dia 24 de janeiro de 1895 e n´ella se dava conta de importantes avarias, causadas pelo temporal no molhe sul.

Sobre essa reclamação ha uma informação do director da circumscripção hydraulica, que não teve seguimento até 1896.

O sr. Presidente: - Deu a hora para se entrar na ordem do dia.

O Orador: - Poucas palavras me restam a accrescentar e, se a camara me consentisse, eu terminaria em dois minutos.

Vozes: - Fale, fale.

O sr. Luiz José Dias: - Ordem do dia.

O sr. Presidente: - N´esse caso eu consulto a camara.

Consultada resolveu-se por 31 votos contra 24 que se passasse á ordem do dia.

O sr. ministro não reviu o seu discurso.

O sr. Presidente: - Convido os srs. deputados a apresentarem os documentos que desejavam mandar para a mesa.

O sr. Mazziotti: - Mando para a mesa uma representação de tres chefes da policia judiciaria, pedindo melhoria de vencimento.

Vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Marianno de Carvalho: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que, nos termos do regimento, seja prevenido o sr. presidente do conselho e ministro do reino de que desejo dirigir-lhe perguntas ácerca da concessão de licenças especiaes para casinos e casas de jogo, por governos civis e camaras municipaes. = Marianno de Carvalho.

Mandou-se expedir.

O sr. Franco castello Branco: - Mando para a mesa o seguinte

Aviso previo

Desejo interrogar o sr. ministro da justiça ácerca da execução que pelo governo tem sido dada ao artigo 452.° do codigo administrativo, = João Franco.

Mandou-se expedir.

O sr. Fialho Gomes: - Mando para a mesa uma justificação de faltas do sr. Alfredo Cesar de Oliveira.

Vae no fim da sessão.

ORDEM DO DIA

Continuação da discurso da artigo 5.º a 2l.° do projecto
de lei n. 71, de 1898 (modificações no imposto do sêllo)

O sr. Malheiro Reymão: - Sr. presidente, levanto-me ainda sob a impressão dolorosissima que acaba de me causar a resolução, aliás muito respeitavel e por mim muito respeitada, de uma parte da maioria d´esta camara; e essa impressão é para mim dolorosa, porque quando o illustre titular da pasta das obras publicas se referia a uma questão tão delicada e sobre que n´este momento tanto cojita toda a laboriosa população da cidade mais commercial e mais importante do paiz, parece-me que não havia logar e que era para lamentar a scisão que se abre na maioria, até hoje tão compacta, d´esta camara, não querendo uma parte d´ella ouvir as explicações que largamente pretendia dar, desejava dar, o sr. ministro das obras publicas.

Eu não sei se alguma cousa houve de accintoso para o illustre ministro n´esta deliberação... e

Vozes: - Não houve, não houve.

O Orador: - Pela minha parte limito-me simplesmente a deplorar que ella se desse, porque ouviria com prazer qual tinha sido a resolução adoptada pelo illustre ministro em assumpto tão momentoso e que tanto preoccupa os habitantes da segunda cidade do reino e em geral todo o paiz.

O sr. Presidente: - Eu devo participar á camara que o sr. Kendall veiu á mesa declarar que, tendo pedido a palavra para obter uma resposta do sr. ministro das obras publicas, s. exa. se promptificou a dar-lh´a e não tendo podido fazei-o n´aquella altura da sessão, eu no uso da auctorisação que me concede o regimento, considerei o assumpto como urgente e hei de ainda dar a palavra ao sr. Kendall n´esta sessão.

Creio que com estão palavras ficam respondidas as observações do illustre deputado.

O Orador: - De maneira que é v. exa. quem cobre o sr. ministro das obras publicas do cheque que parece lhe foi dado por uma parta da, maioria d´esta camara, consi-

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derando urgente a resposta que o sr. ministro tem a dar e que uma parte da maioria se dispensou de ouvir.

E agora, sr. presidente, releve-me v. exa. e perdoe-me a camara que, rapida e ligeiramente occupe ainda por alguns momentos a sua attenção no projecto de lei, a que hontem comecei a referir-me.

Nos ultimos momentos em que usava da palavra, o sr. relator fez uma longa interrupção em que contrariou a affirmação que eu havia feito logo no começo das ponderações que, a respeito d´este projecto, hontem iniciei.

Disse s. exa. que eu tinha contestado que fosse nova e de iniciativa de s. exa. a inserção de algumas verbas n´este projecto de lei, e em seu abono citou s. exa. as disposições da lei de 1897.

Eu procuro sempre ser sincero e verdadeiro quando discuto n´esta camara e por isso devo declarar com toda a sinceridade que não conhecia bem exactamente as disposições d´aquella lei.

Mas o certo é que ellas não invalidam, por qualquer fórma, o que eu tive occasião de peremptoriamente affirmar a v. exa. e foi que pela legislação anterior e vigente estavam sujeitos a sêllo os actos e diplomas que hoje tem no projecto os n.ºs 62 e seguintes.

Aquella lei de 1897 isentou de sêllo ou dispensou do sêllo alguns actos ou diplomas, mas não foram aquelles a que o illustre relator miuda e especificadamente se referiu.

É claro que eu não posso conservar de memoria, não posso lembrar-me agora das verbas que v. exa. n´essa occasião apontou, mas recordo-me bem que v. exa., em especial, frisou aquella que se refere a licenças para capella particular, a 1 ou 2 kilometros de distancia da igreja parochial. Disse v. exa. que essa verba não se encontrava na legislação actual e tinha sido incluida por iniciativa de v. exa., em contrario e apesar da disposição d´aquella lei.

Ora, creio que o sr. relator laborava e labora n´um equivoco; o que a lei de 1897 isentou do imposto de sêllo foram as bullas para capella, que estivessem a menos de 1 kilometro de distancia da igreja parochial, mas em verbas separadas e distinctas da legislação vigente são collectadas as licenças para capella a menos de 1 ou 2 kilometros da igreja parochial, e este sêllo é hoje exigivel e legal como pelo projecto o fica sendo, que nada alterou, nem modificou n´esta parte a legislação vigente.

Tenho aqui presente a lei de 1897, que facilmente se póde cotejar com as verbas 62.ª a 69.ª, que são as que ella alterou e não as que se encontram no projecto actual.

(Leu.)

Digo isto com tanta maior sinceridade quanto é certo que se eu me houvesse equivocado ou tivesse errado, seria o primeiro a confessal-o, assim como não duvidei confessar o meu desconhecimento d´aquella lei de 1897.

Por essa occasião o illustre relator, quasi confessando o embrulhado, o mal posto, o pouco arrumado das verbas d´esta lei, dizia que podiamos mandar para a mesa quaesquer emendas, substituições ou alterações ao projecto, que toda a commissão receberia; mas v. exa., sr. presidente, sabe tambem que o illustre relator, em nome da commissão, confessa e reconhece que este assumpto é de uma extrema complexidade e tão difficil de attender em todas as suas variadissimas circumstancias, em todos os variadissimos actos que é chamado a collectar, que, apesar de todas as informações officiaes, dos relatorios das auctoridades que superintendem no assumpto, confessa que lucta com difficuldades de tal sorte graves, de tal modo invenciveis, que apenas conseguiu apresentar um projecto imperfeito.

V. exa. comprehende, sr. presidente, que a muito pouco ficam reduzidas as possibilidades do nosso trabalho na melhoria da lei, porque por mais demorado, por mais paciente, por mais serio - e por certo que o seria - que fosse o estudo dos meus collegas d´este lado da camara, faltam bases para formar apreciações rigorosas, quer no sentido de augmentar as taxas, quer no sentido de as diminuir.

Sr. presidente, uma cousa notavel, singular e indefensavel n´este momento, apparece ainda no projecto em discussão; é a disposição do artigo 20.°, que permitte reformar os serviços da fiscalisação do sêllo de maneira a gastar com ella até 2 por cento do producto total d´esse imposto. Pois nós estamos successivamente em todos os tons e por todas as vozes a gritar que é mister reduzir as despezas - que é essencial fazer reformas que diminuam os encargos do thesouro, e em uma reforma, cujo augmento de receita só póde vir de um aggravamento extraordinario e vexatorio para o contribuinte, vem logo uma auctorisação para duplicar seguramente a despeza actual? (Apoiados.)

Pois o mesmo governo que decreta que as despezas com a fiscalisação do imposto de sêllo não poderiam em caso algum exceder 22 contos de réis, pelo artigo 4.° do decreto de 25 de fevereiro de 1897, mal chegado aos bancos do poder, já agora vem fazer amende honorable, já quer uma auctorisação que lhe permitta duplicar a despeza com esse serviço? (Apoiados.) Quão depressa se esquecem as promessas que se fazem nos primeiros dias da chegada ao poder, e como depois se transige com o fervilhar dos amigos a quem é preciso contentar e servir! Eu vejo pelo relatorio presente ás camaras pelo então ministro da fazenda, o illustre deputado o sr. Ressano Garcia, que o rendimento do imposto do sêllo, comprehendendo as loterias, foi em 1896 e 1897 de 2:600 contos, e assim vamos auctorisar o governo, não podendo duvidar que elle use d´essa auctorisação, a despender uma somma de 52 contos de réis, isto é a duplicar, a mais que duplicar a despeza actual, o que tira todos os effeitos áquelle decreto, que nós ouvimos louvar tambem em todos os tons e apreguar como uma alta obra de moralidade e justiça em todos os recantos do paiz! É o governo quem agora vem rasgar pela sua propria mão com o applauso seguro da sua maioria (Apoiados.) a sua obra anterior.

Vejo ainda na lei uma outra disposição que é perigosa e talvez de assustar: é a do artigo 10.° Na legislação anterior creio que estavam sujeitos á fiscalisação dos empregados do sêllo os documentos que se encontrassem em cartorios ou archivos publicos ou em qualquer outra estação official; mas pelo artigo 10.° sem restricção de qualquer especie, sem isenção ou restricções, parece que tudo fica sujeito á fiscalisação e á inspecção dos empregados do sêllo; e francamente se isto assim é, é assustador, é pavoroso, e Deus nos livre de nos collocarmos todos e cada um n´estas tristes circumstancias. O artigo 10.° do projecto de lei do sêllo diz que a fiscalisação do sêllo

(Leu.)

A não se restringir a latitude extraordinaria d´este preceito caso venha a demonstrar-se, que eu exhibi particularmente um documento que devendo estar sellado, o não esteja, sou obrigado a apresental-o para que seja multado ou incurso na pena a que é condemnado todo aquelle que se recuse a apresentar qualquer documento sujeito a sêllo.

Segundo o $ unico, tenho de apresentar o documento particular ou o documento inutil que, por curiosidade apenas guardei e archivei, á fiscalisação - que tem garra feroz e adunca, - dos empregados de sêllo; por consequencia vae incidir sobre mim uma multa pesada que tenho de pagar sob risco e pena de ser julgado em policia correccional.

Julgo necessario que isto se esclareça, (Apoiados) creio que uão está nas intenções da illustre commissão nem da maioria suspender sobre nós esta terrivel espada de Damocles, mas se o é, importa tomar com tempo precauções para nos aproveitarmos da amnistia que concede um artigo do projecto, a fim de pormos todos os papeis em ordem e nos prepararmos para a possivel revista dos empregados da fiscalisacão do sêllo!

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SESSÃO N.º 16 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 9

Ha aqui muitas cousas que estão más e que foram ligeiramente feitas. Referi-me hontem incidentemente ao sêllo que pagam as casas de jogo licito pela licença para conservar aberta a porta depois da hora do recolher; pela legislação anterior pagavam 20$000 réis o não havia distincção entre as differentes terras do paiz!

Eu acho muito rasoavel e muito acertada a distincção introduzida pela commissão parlamentar n'esta parte da proposta de lei, estabelecendo sêllo diverso, segundo determinados actos se praticam em Lisboa e Porto, nas cidades e capitães de districto e nas mais terras do paiz. Concordo absolutamente com esta dintincção, mas por isso mesmo que concordo, é que lamento que tal preceito se não tenha estendido a outras licenças que estavam pedindo a mesma differenciação e reclamavam a mesma proporcionalidade. Porque é que se não distingue entre o sêllo a pagar em Lisboa e Porto, nas cidades e capitaes de districto e nas mais terras do paiz com respeito á licença para botequins, para casas de bilhar, para casas de pasto, para photographias, etc.? Ha muitíssimos outros actos o licenças para que estava naturalmente indicada a mesma differenciação com respeito a sêllo, attendendo-se a identico principio de justiça. {Apoiados.)

Dito isto incidentemente, eu vejo que, em relação ás licenças para conservar abertas as casas do jogo licito, ha uma diminuição na taxa do sêllo, não para Lisboa e Porto, onde é aggravada, mas para as outras cidades, onde, sendo de 20$000 réis pela legislação anterior, diminue agora para 10$000 réis, e nas demais terras do reino, onde desce a 2$000 réis.

Por consequencia parece-me que era de justiça corrigir n'esta parte do projecto similhante desigualdade, porque não sei por que motivo mereçam qualquer protecção especial as taes, chamadas por euphomismo, casas de jogo licito.

Com respeito ás casas de penhor, a mesma cousa; pagavam pelo projecto 15$000 réis em todo o reino; o sêllo era igual em todo o paiz; muito bom distinguiu a commissão entre o sêllo a pagar em Lisboa e Porto, que eleva a 30$000 réis; nas cidades e capitaes de districto ainda fica em 15$000 réis, igual ao que pagavam, mas a meu ver sem rasão; desce nas outras terras a 3$000 réis, e a não ser que queiram que emigre de Lisboa todo o penhorista, não vejo motivo algum para esta protecção que elles não merecem, porque não são entidades das mais sympathicas.

Licença para ter abertos botequins, cafes, etc., depois da hora de recolher. Pela legislação anterior pagavam 7$000 réis em Lisboa e Porto, e 4$000 réis não outras terras do reino.

Como póde explicar o illustre relator da commissão a diminuição, pelo projecto, em que, para proteger estas casas de ginginha, (Riso.) as passara de 7$000 para 6$000 réis em Lisboa e Porto e de 4$000 para 3$000 réis nas outras terras do reino.

Pois quando tão extraordinaria, tão iniquamente e, deixem-me empregar um logar commum que já o é com respeito a impacto, tão vexatoriamente se aggrava esta contribuição de sêllo, é regular e defensavel que se dê esta protecção aos botequins e cafés, diminuindo-se o imposto que até agora pagavam e que não os impedia de florescerem por toda a parte e era grande numero.

Vou seguindo um caminho um pouco desordenado e irregular; porque, como o illustre relator confessou, o assumpto é difficil e embrulhado, muito pouco agradavel e muito pouco digno, ao que parece, de impressionar e preoccupar a attenção do parlamento, mas emita muito interessante para o contribuinte, (Apoiados.)

orque rasão, dadas as circumstancias que tão rapidamente acabo de apontar, porque é meu proposito occupar o menos tempo possivel a attenção da camara, porque rasão, digo, se diminua o sêllo das portarias para acceitar ou usar bandas de ordens estrangeiras e titulos nobiliarios concedidos por qualquer nação estrangeira.

Por este projecto é permittida a importação do titulos nobiliarchicos estrangeiros, que outra cousa não é reduzir a taxa, que na lei anterior era de 300$000 réis, a 180$000 réis; isto, ao passo que se eleva de 200$000 a 400$000 réis o sêllo pela carta de mercê do titulo de marquez ou marqueza. Não se percebe.

Eu ouvi já justificar a diminuição do sêllo nas portarias para acceitar ou usar condecorações estrangeiras, allegando-se que, tendo os ministros no nosso paiz um exiguo ordenado e sendo, por dever de cortezia internacional, obrigados a receber veneras dos governos estrangeiros, era duro e iniquo sujeital-ou a um imposto pesadissimo, o que por esse facto se reduzia a taxa de 300$000 róis para 180$000 réis.

Eu não applaudo isto, mas queria que se estabelecesse na lei uma isenção do imposto para os ministros d'estado effectivos, durante o tempo da sua effectividade; (Apoiados.) e se eleve de novo a taxa de sêllo para estas portarias o concessões, para que á sombra d'aquella rasão se não possa abrigar a vaidade do argentario que se criva de veneras o commendas estrangeiras com insignificante despesa.

Ha ainda outra cousa, que eu desejava que me explicassem: porque motivo diminuiu a commissão a verba 236, sêllo para cartas de jogar, sendo estrangeiras.

Parece que ha uma predilecção especial por tudo quanto sejam casas de jogos licito, casas de jogar e cousas conjunctas e annexas.

(Interrupção ao sr. relator que se não ouviu).

Orador: - Nós não estamos aqui a fazer obras do armadilha, para que eu esteja inorepando determinadas verbas da lei do sêllo, (Apoiados.) o que v. exas. digam depois que não é exacto. (Apoiados.) Estou a fazer um trabalho leal e sincero, (Apoiados.) correspondendo aos pedidos constantes do sr. relator e apresenta isto algum trabalho e esforço proprio. (Apoiados.) Se, pois, ha correcção a fazer ao que ou digo, porque não fazel-a já?

Eu vejo que o sêllo nas cartas do jogar estrangeiras, que estava em 300 réis na proposta de lei, passa para 200 réis.

Em todo o caso, se não é verdadeira a minha argumentação, o sr. relator póde dizel-o já.

Vejo, pois, que não erro, porque o sêllo das cartas estrangeiras baixou de 300 réis para 200 réis.

Mas ainda ha outra cousa singular.

Quando nós ha dias discutiamos e approvavamos um projecto de pretendida protecção á nossa marinha mercante, não é sem singularissimo pasmo e surpreza minha, que vou encontrar aggravado o sêllo nos passaportes a embarcações nacionaeas? (Apoiados.)

Pois n'outro dia todos nós desatavamos aqui em protestos e esforços para que voltassemos aos antigos tempos florescentes, em que as nossas quilhas sulcavam as ondas alterosas e abriam rastos e clarões do luz atraves dos mares ; e agora, na lei do sêllo, vamos ratinhar uns magros cobres, ao que hontem protegiamos ou queriamos proteger.
(Interrupção).

O Orador: - Eu digo. É a verba 201.

(Leu).

Ora, desde que as intoneções da commissão o do sr. relator são fazer uma obra quanto possivel de justiça, eu queria que me explicassem todas e cada uma d'estas singularidades, porque mal se percebe que haja aquella benevolencia de lei, a que ha pouco me referi, quando vemos que os diplomas do habilitação para os professores de instrucção primaria tiveram um aggravamento de sêllo de 300 por cento, passando de 1$000 réis para 4$000 réis. Esta desvalida classe, e tambem já é um logar commum chamar-lhe desvalida, dos professores primarios, parece-me que não merecia este aggravamento, e foi até pena

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

que a commissão, pela singularidade do contraste, não mantivesse a reducção feita pelo sr. ministro da fazenda para os dentistas, que pela proposta de lei eram alliviados, pois se lhe diminuia o sêllo no diploma de habilitação de 10$000 para 5$000 réis. Foi uma pena, porque ficava bem collocado o allivio aos dentistas, ao lado do aggravamento de 300 por cento para os diplomas de habilitação de professor de instrucção primaria.

(Interrupção do sr. Ressono Garcia que não se ouviu).

O Orador: - D'aqui a nada ha pouco que fazer para os dentistas porque ha pouco que roer.

(Interrupção do sr. Ressano Garcia que não se ouviu.)

Orador: - Eu não sou technico no assumpto.

O sr. Ressano Garcia: - Mas v. exa. tem dentes.

O Orador: - Tenho dentes, mas tambem v. exa. tem botas, e no emtanto, creio que não é technico em sapataria. (Riso.)

O que me parecia justo era acabar com esta fórma de tributação a que impropriamente se chama proporcional, quando o não é, e que, até onde isso fosse possivel e onde não importasse vexame para os contribuintes, se transformassem estas taxas estabelecidas na lei do sêllo em uma percentagem fixa.

O sr. Presidente: - E terminada a hora durante a qual v. exa. póde usar da palavra. Tem v. exa. mais um quarto de hora para concluir o seu discurso.

O Orador: - Nem eu sabia que tinha gasto tanto tempo e releve-me a camara de assim haver incorrido em tal delicto de que vou penitenciar-me, pondo ponto n'estas considerações.

A commissão creio que só de novo inventou licenças para cães, para foguetes, e bilhetes de enterramento.

Pedia realmente o caso este imposto de 140 réis de sêllo nos bilhetes de enterramento, de maneira que não se possa ir para o eterno descanso sem se levar o respectivo sêllo no documento ultimo.

O sr. Luiz José Dias: - Esses 140 réis não são para os padres, são para o estado.

O Orador: - Mas quem disse que eram para os padres? Se não o disse; o que digo é que até hoje ainda ninguem se tinha lembrado da morte, e que agora nem mesmo ella escapou. (Riso.)

O sr. Ressano Garcia: - O morto não paga nada.

O Orador: - Bem sei que são os herdeiros que pagam, mas lá vae o sêllo no passaporte do morto. (Riso.)

Emfim até da morte nos rimos, e antes assim!

arece-me, n'estas ponderações rapidas e despretenciosas haver demonstrado ligeiramente quanto houve e quanto ha de pouco estudado, de pouco reflectido num projecto d'esta ordem.

Entendo que elle precisa ainda de muitas alterações que o podem corrigir em beneficio publico e sem prejuizo para o thesouro; entendo que importa n'uma contribuição, que tão successiva e amiudadamente tem soffrido alterações, fazermos uma obra que honre o parlamento e, ao mesmo tempo, poupe e attenda os interesses do contribuinte.

Como existe, como está, apesar do enorme respeito que tenho pelo illustre parlamentar que assigna a respectiva proposta de lei, e pela commissão que deu o respectivo parecer, parece-me uma obra incongruente e bizarra, em que parece predominar e reinar o arbitrio mais desajeitado e descomposto e não principios systematicos de bem regular a repartição d'este imposto.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O sr. Oliveira Matos: - Referindo-se ás considerações com que o sr. Malheiro Reymão começou o seu discurso, declara que a maioria não consentindo que o sr. ministro das obras publicas continuasse a usar da palavra, alem da hora destinada para os trabalhos antes da ordem do dia, não quiz infringir-lhe um cheque, pois que a maioria, firme como um só homem, está ao lado dos ministros, emquanto elles lhe merecerem a confiança que hoje lhe inspiram.

Se entendeu que a palavra não devia ser dada ao sr. ministro das obras publicas, foi porque a maioria, desejando que haja a maior regularidade nos trabalhos parlamentares, quer que se cumpra estrictamente o regimento, e este não permittia que s. exa. continuasse no uso da palavra.

Feita esta declaração, que julgou indispensavel para que fóra da camara não se dê ao procedimento da maioria interpretação diversa d'aquella que realmente teve, seja-lhe permittido manifestar o seu sentimento por ver que na discussão de um assumpto tão importante e grave, como o que presentemente occupa a attenção do parlamento, se recorra a processos politicos que de ha muito estão condemnados.

O processo das retaliações e das insinuações de que alguns srs. deputados têem usado n'esta discussão, parece ao orador que devia ser completamente banido, e sente que o sr. Reymão, nas insinuações que fez se tivesse posto em contradicção com o que affirmára na sessão anterior, ao começar o seu discurso, isto é, que todos deviam unir-se para repellir as insinuações que de fóra podessem vir sobre o modo por que se conduzia o governo e a camara.

O governo actual não publicou decretos, nem fez portarias para servir afilhados; tem-se mantido dentro das normas da mais estricta legalidade, cumprindo honradamente o seu dever.

Doe-lhe, por isso, que a respeito da isenção do sêllo de que está gosando a empreza do theatro de S. Carlos, venham insinuar que essa isenção foi dada por protecção; quando a verdade é que o governo não fez uma concessão nova.

Não o move nenhum sentimento de sympathia ou antipathia para com o emprezario de S. Carlos, mas o que deseja é mostrar que o governo não dispensou nenhum favor a esse emprezario, limitando-se a conceder-lhe o que até aqui tem sido de uso fazer-se.

Lendo o artigo respectivo do contrato de adjudicação do theatro, mostra o orador, que por elle a empreza concessionaria está isenta do pagamento de sêllo em todos os actos que respeitem ao exercicio da sua industria, e esse artigo, accrescenta, não é novo, já existia no contrato anterior.

O emprezario, em vista da letra do seu contrato, entendeu que essa isenção se estendia até aos cartazes, e n'esse sentido representou ao governo que, de harmonia com o parecer das estações competentes e da procuradoria geral da corôa, entendeu dever deferir o pedido do emprezario.

O mesmo succedeu mais tarde com respeito aos bilhetes de admissão no theatro e aos recibos de assignatura.

Mas para que não pareça que o governo, a despeito da informação das estações competentes, adoptou a sua resolução por favoritismo, por isso que podia deixar de se conformar com esses pareceres, lê á camara a consulta da procuradoria geral da corôa de 1898, em que se diz constar que já em 1890 se procedera por fórma igual.

Uma voz: - Leia o despacho ministerial que recaíu sobre a pretensão da empreza de S. Carlos para ser isenta do pagamento do imposto do sêllo nos bilhetes e nos recibos.

O Orador: - Não tem presente esse despacho. O que convem saber-se é se nos cofres publicos deu entrada alguma receita proveniente do imposto applicado a esses bilhetes e recibos.

Passando depois a occupar-se do projecto, sente que o sr. Malheiro Reymão, que mostrou tel-o estudado, por isso que se referiu a muitas verbas que, no seu entender, devem ser alteradas, não traduzisse o seu pensamento em proposta que a commissão podesse apreciar, podendo asseverar a s. exa. que nem por parte do governo nem de,

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SESSÃO N.º 15 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 11

commissão ha o desejo de tributar, sem rasão, qualquer classe.

O sr. Reymão: - Não tem duvida alguma em mandar para a mesa algumas propostas. Vae formulal-as.

O Orador: - Continuando, diz que não se apresenta este projecto á discussão unicamente pelo prazer do obter maiores receitas, mas sim pelo impulso das circumstancias que demandam sacrificios do contribuinte.

O que a commissão e o governo fez, foi remodelar a lei em vigor, aperfeiçoando-a quanto a igualdade do imposto e augmentando as verbas que se julgou terem elasticidade para isso, ou diminuindo aquellas que a experiencia mostrou serem demasiadamente elevadas.

A commissão estudou conscienciosamente a lei, mas isso não quer dizer que ella esteja absolutamente perfeita, não seja susceptivel de correcções. Espera, por isso, quis o sr. Reymão traduza em propostas os pensamentos que expoz perante a camara.

E com respeito a algumas das verbas que, no entender do s. exa., não deviam ser alteradas, diria que a commissão foi guiada no seu criterio pelas representações que lhe foram feitas, não procedendo a tôa e a esmo, como por s. exa. foi dito.

Em seguida justificou e mandou para a mesa as seguintes

Propostas

Proponho as seguintes alterações ás tabellas:

110 Accrescentar "ou de soccorros mutuos".

136 Em Lisboa o Porto, 16$000 réis a companhias nacionaes e 25$000 réis a companhias estrangeiras.

136 Nas capitaes de districto e outras cidades, 10$000 réis.

136 Nas outras terras, 3$000 réis.

139 Augmentar 1$000 réis na verba principal.

147 Accrescentar "das vendas de aguas medicinaes e mineraes".

175 Accrescentar "no regulamento se inscreverá o praso e termos em que deverão ser concedidas ou negadas".

219 Rectificar o erro de imprensa, em vez de "200", "20".

247 Bilhetes de passagem em transportes terrestres por serviços regulares, qualquer que seja o modo de tracção, cujo preço não seja inferior a 50 réis, 10 réis.

290 De mais de 200$000 réis, 20 réis, supprimindo-se as palavras "sendo superior, a 450$000 réis", e nas palavras "sendo circo, praça ou theatro, 20 réis".

237 Accrescentar "levando-se em conta o sêllo que se paga conjunctamente com qualquer contribuição e reconhecimento, constantes do mesmo documento".

239 Idem, idem, idem.

420 Accrescentar "quando a totalidade das prestações de
um anno não exceder 50$000 réis".

356 Na tabella 4: "Os processos o papeis nos casamentos de contrahentos pobres, e a dispensa de pregões nos casamentos de consciencia".

O deputado, Oliveira Matos.

Proponho que a tabella n.° 90 "licenças para confessar", seja elevada de "200 réis a 300 réis", e que na mesma tabella n.° 91, se desdobre em duas, da seguinte fórma; "91, licença para celebrar, 600 réis em vez de 500 réis"; "92, ou 91-A, licença para pregar, 1$000 réis em vez de 600 réis", como está. = O deputado, Oliveira Matos.

Foram admittidas e enviadas á commissão.

(O discurso será publicado na integra quando o orador restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Malheiro Reymão: - Mando para a mesa a seguinte:

Proposta de emendas

Proponho que a verba 30 da classe 3.ª passe de réis 180$000 a 300$000 réis.

Que a verba 36 se mantenha como estava na legislação anterior "Gran cruz, 300$000 réis. Grande official réis 200$000".

Que as verbas n.os 41 e 46 sejam substituídas pela seguinte o unica verba: " Patente de emprego militar do exercito ou armada, que tenha do ordenado ou vencimento até 100$000 réis, 1,5 por cento".

"De mais do 100$000 réis, 5 por cento."

Pelo diploma de accesso pagar-se-ha a taxa de sêllo correspondente a melhoria do vencimento.

Que a verba 59 se reduza de 4$000 réis a 1$000 réis.

Que a verba n.° 92, alinea 2.ª, passe de 1$000 réis a 200 réis.

Que a verba n.° 263 seja reduzida por fórma que até 100$000 réis se paguem 1,5 por cento, e d'ahi para cima 5 por cento.

Que a verba n.° 254 seja tambem reduzida, reduzindo o sêllo até 100$000 réis a 1,5 por cento, e de mais de 100$000 réis a 5 por cento.

Que a verba n.° 281 se limite a de mais de 200 tonelladas 3$000 réis.

Proponho a eliminação da verba n.° 287.

Proponho que na tabella n.° 4 se acrescentem as seguintes isenções:

"São isentos do sêllo, pelas mercês estrangeiras que lhe sejam conferidas, os ministros d'estado effectivos.

Disponho que a verba n.° 386 seja assim redigida:

"São isentos do sêllo os inventarios em que a quota legitimaria de cada herdeiro não seja superior a 60$000 réis, bem como todos os outros actos, que d'aquelles emanam e resultam. = J. Malheiro Reymão.

Foi admittida e enviada á commissão.

O sr. Franco Castello Branco: - Peço a palavra para antes de se encerrar a sessão.

O sr. Presidente: - É para negocio urgente?

O sr. João Franco: - Sim, senhor.

O sr. Presidente: - Então convido a v. exa. a vir á mesa expol-o.

O sr. Dias Ferreira: - Peço a palavra sobre a ordem.

O sr. Teixeira de Sousa: - Peço a palavra para um negocio urgente.

O sr. Ressano Garcia: - Mando para a mesa o parecer da commissão da resposta ao discurso da corôa.

O sr. Presidente: - Vae a imprimir.

O sr. Dias Ferreira (sobre a ordem): - Apresenta a seguinte

Moção

A camara resolve adiar a discussão do projecto até á apresentação das propostas financeiras promettidas no orçamento do estado, e passa á ordem do dia. = Dias Ferreira.

Explica em seguida que, ao pedir a palavra sobre a ordem, não teve por fim antepor-se a qualquer dos seus collegas, mas simplesmente evitar que a sessão proseguisse, sem que o sr. ministro da fazenda apresentasse as propostas de fazenda que prometteu no relatorio que precede o orçamento do estado.

No seu entender, Portugal chegou a uma situação que já não é possivel disfarçar. As receitas começam a diminuir em quantia consideravel, e quando tal facto se dá, só um remedio violento póde obstar ao declive por onde se vae resvalando.

No anno passado augmentaram-se os impostos com um addicional de 5 por cento, calculando-se que renderia 700 contos, e apegar d'isso a receita geral é muito menor.

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Este anno discute-se um outro addicional, porque a lei do sêllo não é outra cousa, mas bem mais perigosa, por abranger tudo.

É, portanto, com addicionaes, que o governo julga poder melhorar a situação da fazenda publica; mas engana-se completamente, porque, repete, só um meio violento nos póde tirar dos apuros em que nos encontrâmos.

O nosso mal vem de se estar a pagar mais do que podemos, e de não se ter comprehendido, ha muito tempo, que não era possivel vivermos sempre de emprestimos.

Elle, orador, combateu sempre os jubileus, mas hoje já não tem animo para isso; tantos são os ataques que tem recebido. Entretanto, sempre dirá que n'este projecto tambem se encontra um jubileu.

Tem a firme convicção de que não ha meio possivel de salvação publica sem um golpe violento, mortal, nas despezas publicas. Não se cansa de o dizer.

É preciso que não nos deixemos chegar á situação da Servia que, como nós, dizia que não podia fazer economias, mas que a final, em face da imposição estrangeira, teve de entrar n'esse caminho.

A operação que tem de fazer-se é dolorosa; não o desconhece; mas o que quer é que seja feita por mãos portuguezas, e por mãos portuguezas será feita, se for feita a tempo.

O imposto do sêllo abrange todas as manifestações da vida social e affecta todas as fontes de receita; mas, no seu entender, não é o mais apropriado para obter maiores receitas para o thesouro.

Quando elle, orador, se viu forçado a exigir sacrificios do contribuinte, uma das cousas que sempre teve em vista foi não ferir a industria e o commercio, que são as duas principaes fontes da receita publica, e por isso propoz que do preferencia se recorresse ao augmento do imposto do consumo.

Se agora fosse poder, faria o mesmo que fez Thiers, em seguida á imposição da enorme indemnisação de guerra que a França teve de pagar; recorreria ao imposto do consumo, e a quaesquer outros, como se fez em França, que se estabeleceram impostos até absurdos, porque assim era indispensavel para salvação do paiz.

Pelo que respeita á sua moção de adiamento, explica o orador que ella se funda no facto de ter o sr. ministro da fazenda promettido apresentar medidas financeiras que contribuissem para melhorar a situação da fazenda publica, ficando tambem o sr. ministro da marinha de apresentar propostas que, desenvolvendo o commercio colonial, constituam uma importante fonte de receita para a metropole. Ora, sendo isto assim, convém antes de tudo conhecer do valor d'essas propostas, para depois se ver o que é necessario pedir ao imposto para saldarmos os nossos compromissos.

Emquanto não entrarmos n'um caminho de reducção de despezas verdadeiramente violento, nunca poderemos fazer parar essa corrente que vae grande contra nós, lá fóra a cá dentro.

Depois de muitas outras considerações, conclue o orador, dizendo que, a seu ver, as grandes difficuldades para os credores, tanto internas como externas, não estão lá fóra, estão no territorio nacional, e é escusado saír de Lisboa para ir procurar difficuldades a Berlim.

(O discurso será publicado quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.}

(Leu-se na mesa, e foi admittida a moção de ordem.)

O sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao sr. ministro da fazenda, mas tenho de observar a s. exa. que a hora vae bastante adiantada e que ha alguns srs. deputados inscriptos para antes de se encerrar a sessão.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): -S. v. exa. entende que eu não devo usar da palavra, eu acato a deliberação de v. exa.

O sr. Presidente: - V. exa. póde usar da palavra, porque a sessão, em rigor, só acaba ás sete horas da tarde.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Dirá muito poucas palavras, porque não estava prevenido para responder ao discurso que s. exa. acaba de proferir. Mal podia suppor que, no meio da discussão da especialidade da lei do sêllo, se levantasse a questão do adiamento. Se a tivessem levantado logo no começo do debate, teria respondido mais amplamente a s. exa. de quem se preza de ser amigo.

Entretanto dirá que nas proprias palavras do illustre deputado está a resposta á maior parte das observações com que s. exa. exagerou o estado da nossa situação financeira.

Fallou s. exa. na diminuição das receitas e mostrou ao mesmo tempo como tinha procedido um grande paiz n'uma situação bastante afflictiva, recorrendo aos impostos mais barbaros.

Referiu-se tambem s. exa. ao augmento que houve sobre imposto do consumo, e n'essa mesma occasião pediu o adiamento da discussão deste projecto para conhecer primeiro quaes as propostas que o governo vae apresentar, dizendo ao mesmo tempo que era necessario pôr termo á situação angustiosa do thesouro.

Ora, parece que n'estas condições, o que s. exa. devia fazer, em mostrar como n'este projecto era possivel obter maior augmento de imposto, desde que reconheceu a necessidade de recorrer a impostos para melhorar a nossa situação.

Fallou o illustre deputado tambem em economias; e effectivamente s. exa. já provou o que isso vale. Pela sua parte entende, do mesmo modo que s. exa., que é necessario supprimir todas as despezas improductivas, e o governo actual tem procurado não só diminuir as despezas, mas não crear despezas novas, procurando ao mesmo tempo augmentar as receitas.

É obedecendo a esse pensamento que o governo trouxe á discussão este projecto, e que ha de apresentar ainda outros, esperando que a camara collabore com elle para melhorar as receitas do estado.

S. exa. referiu-se, ainda, á diminuição de receitas e citou o imposto de consumo. Se isso é assim, rasão de mais para se adoptar este projecto, pois que a lei do sêllo completa muitos dos outros impostos e vae buscar a todos os actos da vida social meios de attrabir aos cofres do estado maiores receitas.

Uma correcção tem entretanto a fazer ao que s. exa. disse. As receitas não diminuiram, porque a situação do paiz tivesse peiorado, mas porque não houve receita dos cereaes e por causa do premio do oiro.

Calcula que, se tivesse havido rendimento de cereaes e se os câmbios não se tivessem aggravado, haveria em diminuição de despeza e augmento de receita uma differença de 5:000 a 6:000 contos.

Se se podesse dispor agora da terça parte d'esta quantia, a situação seria desafogada. Para que este facto se dê é necessario recorrer a outra ordem de receitas.

Confia nos recursos do paiz, e tanto mais quanto é certo que as cobranças do mez de janeiro d'este anno excedem muito a dos mezes de janeiro dos annos anteriores, o que prova que a nação não está n'uma situação tão precaria como o sr. deputado disse.

É preciso, portanto, cuidar da nossa situação economica e financeira, de modo a conseguir-se uma situação desafogada, procurando-se obter rendimentos de onde hoje elles não vem, isto é, fazendo-se pagar aquelles que, podendo e devendo, não pagam n'uma justa proporção.

N'este sentido é que espera que o sr. deputado e a camara coadjuvem o governo.

(O discurso será publicado na integra guando o orador restituir se notas tachygraphicas.)

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SESSÃO N.° 15 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 13

O sr. Kendall: - Não abusarei da paciencia de v. exa. nem da dos srs. deputados que queiram dispensar-me a fineza de me ouvir.

Antes da ordem do dia, pedi explicações ao sr. ministro das obras publicas sobre na providencias que tenciona adoptar, com relação ao desmoronamento do molhe do porto de Leixões.

S. exa. estava expondo quaes eram essas providencias, quando deu a hora de se entrar na ordem do dia, não podendo, por isso, o sr. ministro concluir as suas explicações.

Mas como o assumpto é urgente e torna-se necessario que hoje mesmo s. exa. dê as precisão explicações, eu pedi a s. exa. que me concedesse a palavra para um negocio urgente, como determina o regimento.

Uso, pois, d'ella agora, tão sómente para pedir ao sr. ministro das obras publicas que, continuando na sua exposição, ha pouco interrompida, nos dê as explicações a que me refiro.

E nada mais tenho a accrescentar, porque o meu fim não é fazer commentarios, é unicamente pedir providencias ao governo. (Apoiados.)

(S. exa. não reviu.)

O sr. João Franco: - Sr. presidente, um dos ilustres deputados que tomou parte na discussão do projecto dado para ordem do dia, referiu se precisa e concretamente a um acto da responsabilidade do governo transacto, de que ou tive a honra de fazer parte. Esse acto e relativo a um despacho que se diz ter recaido sobre uma consulta da procuradoria geral da corôa de 7 de dezembro de 1895.

Não sei se esse assumpto correu pelo ministerio do reino ou pelo ministerio da fazenda, e posso menino affiançar que não tenho a mais ligeira reminiscencia d'esse assumpto; mas como se trata de um acto que se diz praticado por mim e eu não gosto de duvidas, pedia ao sr. presidente do conselho e ao sr. ministro da fazenda que se dignassem mandar para a mesa, na primeira sessão, o tal despacho e a consulta a que me refiro.

O sr. Marianno de Carvalho: Não ha despacho nenhum, ha só a consulta, e onde está é na direcção geral de instrucção publica.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros (João Luciano de Castro): - Eu não tenho conhecimento do assumpto a que o illustre deputado se referiu, senão por algumas palavras que ácerca d'elle ouvi pronunciar n'esta camara, mas não tenho duvida em mandar para a camara qualquer esclarecimento que v. exa. desejo o que exista no ministerio do reino.

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): -Posso affirmar ao illustre deputado que no ministerio a meu cargo se nno encontra documento algum com referencia ao assumpto de que s. exa. tratou.

O sr. Marianno de Carvalho: - Despacho creio que não ha nenhum; mas o que ha, está no ministerio do reino, na direcção geral de instrucção publica.

O sr. Teixeira de Sousa: - Sr. presidente, embora com muita pena, eu tenho de tomar n'esta altura da sessão, alguns minutos á camara, antes de me referir ao assumpto para que propriamente pedi a palavra e que é de natureza urgente.

Não posso dispensar-me de fazer algumas referencias á questão da commissão districtal de Braga, para a qual o meu illustre amigo, sr. dr. Luciano Monteiro, chamou a attenção do governo, obtendo do sr. presidente do conselho a resposta de que não podia intromotter-se nas deliberações da commissão districtal!

O sr. Presidente: - Eu convido o sr. deputado a entrar no assumpto para que pediu a palavra, aliás ver-me-hei forçado a retirar-lhe.

O Orador: - Eu acato com o maior respeito as observações de v. exa. mas permitta-me apenas dizer que sem pretender corrigir ao affirmações do sr. presidente do conselho, porque sei que s. exa. é muito lido em assumptos administrativos, parece-me, todavia, poder affirmar a s. exa. que está em erro, quando, em resposta ao meu amigo sr. Luciano Monteiro, declarou que mandára interpor recurso para o presidente da relação do Porto, unico meio que a lei lhe offerecia no caso sujeito.

E digo que s. exa. laborou n'um erro, porque tem na lei uma disposição clara que o auctorisa a corrigir a illegalidade praticada pelo governador civil de Braga, e eu espero que s. exa., comprehendendo quanto é justo e urgente providenciar a este respeito, não deixará de lançar mão da faculdade que a lei lhe concede.

E dito isto, eu vou expor om breves palavras o assumpto especial que me levou a pedir a palavra. Não se trata de um assumpto politico, trata-se de um assumpto importante que prendo com os direitos da contribuintes de uma parte do districto de Villa Real.

Em 1896 o sr. governador civil de Villa Real entendeu que devia deixar a antiga base para a distribuição do contingente da contribuido predial para os differentes concelhos, e fixar uma nova base, qual era a do rendimento collectavel das differentes matrizes.

Entendeu, porém, a camara municipal de Chaves, que distribuido assim o contingente da contribuição predial, se procedera illegalmente, o recorreu para o supremo tribunal administrativo.

Este, por accordão de fevereiro ultimo, annullou o acto praticado pelo governador civil e ordenou que na distribuição do futuro contingente o concelho de Chaves e os outros que ficaram pagando mais, tivessem as devidas e respectivas compensações.

Eu explico. O concelho de Chaves, em virtude da nova distribuição do contingente da contribuição predial, que o supremo tribunal administrativo julgou illegal, tem de pagar de 1897 para 1898 mais 16 contos approximadamente da contribuição predial do que pagava até então, incluidos os addicionaes para a camara municipal, acontecendo que os outros concelhos do districto ficaram pagando menos.

Como já disse, porém, o supremo tribunal administrativo resolveu que se adoptasse a antiga base, e que se d'esse ao concelho de Chaves as respectivas compensações, isto é, que no contingente a distribuir se compensasse o concelho de Chaves com os quinze contos a mais que ali haviam sido cobrados, e que o concelho de Chaves passasse este anno a pagar menos quinze contos, devendo estes ir pesar sobre os outros concelhos do districto, que de 1897 a 1898 tenham pago a menos do que deviam.

O sr. ministro da fazenda ordenou que se d'esse cumprimento exacto ao accordão do supremo tribunal administrativo; mas o sr. governador civil de Villa Real entendendo que, do "Marão para lá governa quem lá está", como costuma dizer-se, annullou a distribuição do contingente feito em abril, que é a epocha normal, e em dezembro, de harmonia com as instrucções dadas pelo sr. ministro da fazenda, fixou o novo contingente da contribuição predial, tomando a base antiga, mas a respeito das compensações não fez absolutamente nada.

O governador civil tem competencia para fazer a distribuição do contingente, ouvida a commissão districtal, e tendo-lhe esta perguntado se não dava para o concelho de Chaves a compensação a que tinha direito, pelo accordão do supremo tribunal administrativo, o governador civil respondeu n'estes termos:

"Não façam questão d'isto."

E sobre o concelho de Chaves continúa a pesar o onus de 15 contos de réis!

Pela mesma rasão por que eu disse que o sr. ministro do reino tem na lei a faculdade de annullar o acto praticado pelo governador civil de Braga, digo tambem que o sr. ministro da fazenda tem na lei faculdade de annullar o

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acto do sr. governador civil de Villa Real; e por isso me dirijo a s. exa., pedindo-lhe que dê instrucções terminantes áquella auCtoridadE no sentido de annullar a distribuição que fez e proceder a no vá distribuição, de maneira a respeitar o accordão do supremo tribunal administrativo, qual é o de compensar o concelho de Chaves dos 15 contos de réis que pagou a mais em 1897 e 1898.

(S. exa. não reviu.}

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Por não estar prevenido, eu não poderei dar explicações completas. Em todo o caso, pelo conhecimento que tenho do assumpto, posso dizer ao illustre deputado que só tive noticia dos factos, parece-me, que em fins de novembro ou em dezembro, porque veiu uma reclamação, creio eu, da camara de Chaves, e as ordens que o ministro da fazenda deu não foram ao governador civil, que não é auctoridade da sua dependencia, mas ao delegado do thesouro.

Á primeira cousa que fiz foi tratar de saber do delegado do thesouro a rasão por que não se tinha dado cumprimento ao accordão do supremo tribunal administrativo, publicado em junho, e que tendo passado desappercebido na secretaria do ministerio da fazenda, não é para admirar que o tivesse tambem passado no meu gabinete.

Respondeu-me o delegado do thesouro que tivera de se refazer todo o trabalho, mas que já estava concluido. Ordenei então que o trabalho de lançamento se realisasse de accordo com o accordão do supremo tribunal administrativo e impuz a condição de que esse trabalho se fizesse de modo que não importasse augmento de despeza, e que no 1.° de março todos os cofres estivessem abertos.

Sei que a primeira parte das minhas instrucções se cumpriu, porque ainda hoje tive occasião de ver informações dos principaes concelhos de Villa Real, affirmando que os trabalhos estão concluidos e que os cofres hão de abrir-se para a cobrança no dia 1.° de março. Quanto ao accordão, creio que foi cumprido.

O sr. Teixeira da Sousa: - Eu affirmo a v. exa. que não se cumpriu o accordâo, e se v. exa. tivesse mandado satisfazer o requerimento que eu fiz, ha mais de oito dias, teria occasião de verificar o que acabo de affirmar.

O Orador: - Eu já assignei o officio remettendo esses documentos.

O sr. Teixeira de Sousa: - Mas eu ainda não os recebi.

O Orador: - A culpa não é minha porque, como já disse, assignei o officio de remessa.

Tenho dito.

(S. exa. não reviu as notas tachygraphicas d'este discurso.)

O sr. Teixeira de Sousa: - Eu affirmo que não se deu a compensação ao concelho de Chaves, e por isso pergunto a v. exa. o que tenciona fazer.

O sr. Presidente: - A primeira sessão é na quinta feira e a ordem do dia é a mesma que estava dada para hoje.

O sr. Teixeira de Sousa: - Então o sr. ministro não responde?

O sr. Presidente: - Está encerrada a sessão.

Eram quasi sete horas da tarde.

Documentos mandados para a mesa n'esta sessão

Representações

Da associação commercial de Chaves, reclamando contra o aggravo que se faz ao concelho de Chaves, não o compensando do excesso da contribuição predial que indevidamente pagou nos annos de 1896 e 1897.

Apresentada pelo sr. deputado Teixeira de Sousa, enviada ás commissões de fazenda, e mandada publicar no Diario do governo.

Dos amanuenses da administração do concelho e da camara municipal de Bragança, pedindo melhoria de situação.

Apresentada pelo sr. deputado Gonçalves Braga, e enviadas á commissão de administração publica.

Dos chefes de policia de investigação criminal, pedindo melhoria de situação.

Apresentada pelo sr. deputado Chaves Mazziotti, e enviada ás commissões de administração publica e de fazenda.

Justificação de falta

O illustre deputado sr. conego Alfredo Cesar de Oliveira não tem comparecido ás ultimas sessões e não comparecerá a mais algumas por motivo justificado. = Fialho Gomes.

Para a secretaria

O redactor = Lopes Viera.

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SESSÃO N.º 15 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 15

Discurso proferido pelo sr. Ministro da Fazenda, que devia ler-se a pag. 12, da sessão n.° 15, de 7 de fevereiro de 1899

O sr. Ministro da Fazenda (Manuel Affonso de Espregueira): - Fallarei muito pouco, porque não estava prevenido para o discurso que acaba de ser pronunciado, e porque no meio da discussão da especialidade do sêllo, eu mal podia suppor que se levantasse a questão do adiamento, o eu sinto que esta questão se não tivesse levantado logo no começo do debate, porque então poderia ter respondido mais amplamente ao illustre deputado, de quem me prezo do ser amigo e por quem todos temos a maxima consideração. (Apoiados.)

Permitia-me, entretanto, s. exa. que lhe diga que nas suas palavras está a resposta á maior parte do que s. exa. disse. S. exa. exagerou a nossa situação financeira, fallou na diminuição das receitas publicas e indicou o modo como tinha procedido um grande paiz numa situação muito afflictiva, que todos conhecem. Disse s. exa. que esse paiz tinha recorrido aos impostos mais barbaros, fallou no augmento que houve sobre o imposto do consumo, e n'essa mesma occasião pediu o adiamento da discussão d'este projecto para conhecer quaes eram as propostas do fazenda que o governo havia de apresentar!

Ao mesmo tempo que s. exa. fallava em tudo isto, dizia que era necessario e urgentíssimo pôr cobro, por um modo energico, a situação desesperada do thesouro, parecendo, portanto, que era exactamente esta a occasião de s. exa. nos mostrar como por este projecto se podia obter o augmento do imposto a que lhe disse ser necessario recorrer para salvar a nossa situação!

S. exa. fallou-nos em economias e effectivamente já provou o que isso vale. Eu entendo, como s. exa., que é necessario supprimir todas as despezas reproductivas, e este governo tem procurado não só diminuir as despezas, mas não crear despezas novas. S. exa. em occasião mais critica, quando teve de recorrer a medidas dictatoriaes, suspendendo o pagamento aos credores externos, empregou todos os meios que julgou necessarios para conseguir o equilibrio do orçamento.

S. exa. já, sabe o que valem certas reformas, quando ellas consistem unicamente na reducção dos quadros; reduzem-se os quadros e o pessoal fica addido, continuando a pesar sobre o orçamento. Não obstante isto, quando se fez esta reducçSo, disse-se que o governo publicava uma medida economica, mas sem se lembrarem que é só n'um futuro longo que essa medida póde produzir os resultados desejados. Foi o que se fez n'aquelle tempo.

Desde então tem desapparecido gradualmente o pessoal addido o extraordinario da quadros, e s. exa. sabe que já vão passados seis annos e ainda não se completou a sua obra em muitos serviços.

Nós temos caminhado sempre o proseguimos n'esse trilho.

O governo não augmentou as despezas, e como de reconhecida necessidade não só diminuir as despezas, como tambem augmentar as receitas para o verdadeiro equilibrio do orçamento, não tem o governo duvida em pedir á camara que collabore com elle na melhoria das receitas, como actualmente se faz.

Um dos projectos mais importantes é sem duvida o que está em discussão, e a propósito d'elle referiu-se s. exa. ao imposto de consumo, mostrando que se tinham augmentado consideravelraente as taxas d'esse imposto. Todavia, o que discutimos agora não é o imposto do consumo.

S. exa. referiu-se á diminuição que tem havido em certos impostos, e citou ainda para exemplo o alludido imposto de consumo. Mais uma rasão para que s. exa. nos esclareça e aponte factos, se entende que no imposto todo introduzir-se uma modificação que, sem aggravar desmesuradamente as suas taxas, possa attrahir, para o fisco, exactamente aquelles individuos de quem s. exa. fallou, e que se conservam fóra da acção do imposto.

Ora, exactamente o que se procura é estabelecer taxas, de modo que todos os cidadãos possam contribuir com o que é justo para as despezas do estado.

O projecto do sêllo, como o illustre deputado sabe, completa muitos outros impostos estabelecidos sob differentes fórmas, vão buscar todos os actos, procura o meio de attrahir aos cofres do estado maiores receitas, e incidindo geralmente sobre a vida social tem em vista segurar resultados, pela multiplicidade a que póde chegar.

Disse o illustre deputado que se tinha dado uma diminuição nas receitas, concluindo d'ahi que a nossa situação se tornava peor.

Peço licença para dizer no illustre deputado que eu penso que essa diminuição provém, principalmente, de não se ter produzido a importação de cereaes.

'aqui resultou, no anno economico passado, uma diminuição de receita para a fazenda de perto de 1:500 contos de réis.

Se s. exa. comparar as receitas do thesouro verá que, pelo contrario, houve outros impostos em que se notou um acrescimo notavel de perto de 600 contos de réis.

Já s. exa. vê que a explicação da differença provém principalmente de ter faltado a receita dos cereaes, falta
e se deve a circumstancias absolutamente anormaes. Foi preciso que se dessem dois factos - uma grande escassez de colheita no paiz, e ao mesmo tempo o preço excessivo d'esse genero no estrangeiro, que não permittiu a introducção, como nos annos anteriores, com o pagamento de direitos. São dois factos simultaneos.

Alem d'isso uma outra causa augmentou as despezas do estado: foi a aggravação de cambios, e essa aggravação sabe-se que em grande parte se deve á situação internacional complicada que houve na maior parte das nações da Europa, anteriormente e logo depois da guerra da Hespanha com os Estados Unidos.

Tudo isto contribuiu para que a gerencia ultima não fosse tão boa, nem como deveria ser.

Unicamente com o intuito de desviar a idéa de que a situação seja gravissima, vou fazer uma simples comparação. Na gerencia de 1894-1895 cobrou o estado, pela importação de cereaes estrangeiros, 2:800 e tantos contos de réis, e o prejuizo dos cambios n'essa epocha orçava por 28, 29 e 30 por cento. Ora supponha s. exa. que na gerencia ultima o estado tinha podido cobrar a mesma somma de 2:800 e tantos contos de réis, que o cambio, em vez de chegar a 80 e 90 por cento, se mantinha nas proximidades de 30 por cento, e d'aqui resultaria a favor da gerencia ultima uma diminuição de despeza ou augmento de receita equivalente ou superior a 5:000 ou 6:000 contos de réis.

Se o ministro actual ou qualquer outro que o substituisse, alem das quantias que tem o thesouro, podesse dispor unicamente da terça parte d'essa somma, considerava perfeitamente desafogada a situação.

Página 16

16 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Já vê s. exa., para que este resultado se dê, é necessario que nas outras ordens de receitas tenha havido grande melhoramento.

Devo dizer mais a s. exa. que, no mez de janeiro actual, a cobrança effectiva nos cofres publicos, em todo o anno, excedeu muito a do anno anterior. A cobrança tem sido muito maior do que antecedentemente nas mesmas epochas.

Isto prova realmente que o paiz não se encontra na situação tão precaria como o illustre deputado julga. (Apoiados.)

Sobre este ponto repito o que já disse.

Ninguem mais do que eu tem confiança nos recursos do paiz. Estou de accordo com o sr. deputado, em que é necessario tratar da nossa questão economica e financeira, que é a mais grave, por modo que se consiga rapidamente uma situação desafogada e completamente isenta de perigos.

N'esse sentido, peço aos srs. deputados para não deixarem de continuar a discutir o projecto e de aconselhar mesmo as modificações que n'elle se possam introduzir, para que d'elle resulte maior rendimento para o estado, porque isso é indispensavel.

É necessario, sobretudo, que em todos os projectos e reformas que se possam fazer, se procure obter rendimentos exactamente d'onde elles não vêem, isto é, de quem devendo pagar, não paga. (Apoiados.)

É n'esse sentido, principalmente, que eu hei de fazer propostas á camara, quando apresentar o meu relatorio de fazenda.

Entendo que, n'esse sentido, ha muito que fazer.

Nas inspecções que tenho mandado effectuar nas repartições de fazenda, não com o intento de perseguir nem castigar nenhum empregado, mas unicamente com o desejo de averiguar positiva e realmente como se fazem os serviços de fazenda, de todas essas inspecções resulta esse facto: a certeza de que com uma boa administração regular e persistente, em todos os ramos da fazenda publica, se póde conseguir um augmento consideravel de receita, sem que aquelles que hoje pagam rigorosamente aquillo que devem, sejam sobrecarregados com mais impostos.

E assim, se o illustre deputado julga que a situação é grave, eu entendo que nós devemos empenhar todos os esforços para saírmos d'ella com honra e dignidade, esperando que todos os illustres deputados nos auxiliarão n'esse proposito. (Apoiados.)

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APPENDICE Á SESSÃO N.° 15 DE 7 DE FEVEREIRO DE 1899 17

Discurso proferido pelo sr. deputado Dias Ferreira, que devia ler-se a pag. 41 da sessão n.° 11 de 7 de fevereiro de 1899

O sr. Dias Ferreira: - Começo por ler a minha moção de ordem.

É a seguinte:

(Leu.)

Antes de mais nada uma explicação aos meus collegas. Pedi a palavra sobre a ordem, não para prejudicar os oradores inscriptos, mas porque não tenciono entrar nos detalhes e no desenvolvimento do projecto pendente da discussão da camara.

Sr. presidente, ou eu me illudo absolutamente sobre o estado financeiro e sobre a situação economica do paiz, ou os debates do ha longos dias são perfeitamente inuteis e perdidos.

Chegámos a uma situação tão tensa e tão violenta que já não é possivel disfarçar sob qualquer fórma ou pretexto a gravidade das cousas.

Nem com a arte das cifras, que segundo jornaes financeiros da França em parte nenhuma se cultivam com tanto esmero como nas margens do Tejo, é já possivel disfarçar a gravidade das circumstancias em que nos encontrâmos.

Sr. presidente, poderiamos ter augmentado largamente as despezas, e poderiamos ter administrado com pouca economia; e nem por isso a situação seria perigosa se o paiz tivesse os recursos da Belgica ou da Inglaterra.

as a logica implacavel das cifras, bem ou mal cultivadas, leva-nos á triste conclusão de que já ao passo que as despezas augmentam as receitas diminuem!

As receitas estão baixando apesar do augmento na percentagem dos impostos, que ainda no anno passado foi representada no addicional de 5 por cento!

Estes males não se curam com o elogio mutuo, que é tempo perdido, e completamente perdido! (Apoiados.)

Quem ha de passar os diplomas de merito ou de demerito aos representantes do povo ha de ser o paiz, e não os respectivos procuradores uns nos outros.

Votou-se no anno passado o addicional de 6 por cento, cujo producto foi calculado em 700 contos de réis; e a situação não melhorou, o que significa que o mal está d'outra parte, e não na falta de impostos!

Mas entre nós julgam-se conjurados todos os perigos, ainda que não haja dinheiro para pagar o que devemos, desde que nos proclamemos todos muito honrados, e o paiz como o mais honrado do mundo.

E assim iremos vivendo emquanto Deus for servido! Ao addicional dos 700 contos de réis sobre quasi todas as contribuições votado no anno passado accresce agora outro addicional, tão perigoso como aquelle, que se traduz no aggravamento das taxas do sêllo porque o sêllo abrange tudo, sem exceptuar sequer a contribuição predial!

Muitos patriotas, o patriotas, que não lêem o seu nome inscripto na matriz predial, esperam da propriedade immobiliaria os grandes recursos para continuar esta vida de perdição!

Julgam esses patriotas que sobre a propriedade do paiz pesam apenas 3:200 contos de réis da contribuição directa, denominada contribuição predial.

Não reparam em que sobre a fazenda recáe o real de agua, que abrange o vinho, o azeite e outros generos agricolas, e não fazem conta aos impostos locaes com a mesma incidencia que vão affectar a propriedade.

A contribuição de registo tambem esmaga a propriedade.

E não fallo agora no imposto predial, representado pelos taxas de emolumentos de conservatorias e das tabellas judiciaes e administrativas, etc., etc.

Todo o nosso mal provém de gastarmos mais do que podemos.

As nações, como os individuos, se não têem a prudencia precisa para pôr termo a certas despezas, chegarão afinal a uma situação desesperada. É para esta situação que nós caminhâmos!

Vivendo sempre do emprestimos, que contrahiamos no estrangeiro um anno sim e outro, não para írmos gosando o folgando, nunca nos lembrámos de que os processos de obter dinheiro alheio não podiam durar sempre!

Nenhum povo póde sustentar-se de emprestimos como meio ordinario de vida.

Mas cá não se vive de outro modo.

Basta lançar os olhos para o orçamento para se ver como caminham a marchas forçadas as despezas com os encargos geraes e com a divida fundada. E isso não doe ao paiz porque não lhe doem os emprestimos, como lhe doem os impostos.

Pois o projecto em discussão encerra um jubileu muito regular!

Reputo esgotado por agora o recurso ao imposto.

Já não ha meio de salvação publica senão n'um côrte por mais violento que seja nas despezas publicas! Não imitemos a Servia!

O governo da Servia não podia fazer reducções e côrtes nas despezas sem prejuizo dos serviços e da civilisação, mas assim que a commissão internacional tomou conta dos principaes rendimentos do thesouro para pagar os encargos da divida externa, deixando só o resto para as necessidades internas, não teve outro remedio senão conformar-se com as decisões da força omnipotente do estrangeiro! Com o meu voto não ha de este systema de governo vir para o paiz! (Apoiados.}

Os poderes publicos têem de romper com a indifferença publica para collocar em condições solidas e duradouras a situação do thesouro.

É necessaria uma operação dolorosa, dolorosissima no orçamento do estado, e sobretudo é necessario que essa operação seja feita a tempo, para ser feita exclusivamente por mãos portuguesas!

Não discuto a questão do imposto do sêllo na sua largueza e nos seus detalhes, porque é inutil n'este ponto tomar tempo á camara.

Mas não posso deixar de dizer que similhante imposto vão affectar todas as relações da vida social, abrange todas as fontes de producção do riqueza, e fere nas suas variadissimas manifestações o trabalho nacional.

Não contesto a necessidade do recorrer ao imposto, mas para uma grande necessidade publica. Para assegurar o pagamento dos encargos da divida externa propuz eu o aggravamento do imposto de consumo, com o que os partidos procuraram levantar contra mim o mar e o mundo!

Em verdade o imposto de consumo é o mais violento de todos os impostos, é um imposto de guerra, a que só deve recorrer-se em circurmstancias extraordinarias.

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mas n'uma epocha de crise economica só do imposto de consumo nos podiamos valer, porque era impossivel augmentar n'essas circumstancias anormaes um imposto que ferisse na base o trabalho e a vida nacional.

Eu não podia voltar as minhas attenções para a industria, ou para o commercio, que são em toda a parte o elemento preponderante da riqueza publica; pois que por mais rica e prospera que seja a agricultura de um povo, é o seu commercio e a sua industria que lha valorisa.

A Belgica, a Allemanha e a Inglaterra, tres nações das mais ricas do mundo, devem a sua prosperidade excepcional ao commercio e á industria.

Tambem a Allemanha no progresso da sua industria tem ganho a dianteira á França. Não provém hoje a força da Allemanha só de poder pôr 3 milhões de homens em armas, mas tambem e principalmente da sua industria e do seu commercio.

Rara é a terra estrangeira, que tenha que explorar, onde se não encontre uma colonia, um estabelecimento, ou um negociante allemão!

Alem d'isso um dos paizes mais ricos e mais bem administrados do mundo, a França, não precisou de reduzir o seu exercito nem a sua marinha, nem nenhum dos seus serviços publicos, para pagar á Allemanha a indemnisação de guerra de 900:000 contos de réis, que satisfez dentro de pouco tempo, livrando inteiramente o solo patrio da invasão estrangeira, porque recorreu principalmente ao imposto de consumo.

Thiers aggravou o imposto de consumo e outros impostos tambem violentos, porque primeiro que tudo estava salvar a França das garras do estrangeiro.

Depois com o andar do tempo todas essas providencias foram essencialmente modificadas.

Para continuar a entreter tempo não voto eu sacrificio nenhum ao paiz.

Mas para regularisar de vez a situação da fazenda e para assentar em base solida os processos governativos, não ha medida se augmento de receita que eu repute iniqua. (Apoiados.) Nem proposta a que eu negue o meu voto. (Apoiados.)

O que é preciso é regularisar a situação da fazenda publica que se não regularisa com projectos de tão pouco alcance.

Ninguem se lembraria de certo de elevar de novo o imposto do sêllo, que depois do anterior augmento baixou e baixou consideravelmente!

Á discussão do projecto deve ser adiada até que o sr. ministro da fazenda forneça os esclarecimentos necessarios para se fazer idéa exacta da situação do thesouro, e ao mesmo tempo apresente o conjuncto das propostas indispensaveis para debellar a crise.

Contar que ainda poderemos manter-nos por muito tempo com este systema homoeopathico, de um anno um addicional e outro anno outro addicional, de uns artigos sobre reforma administrativa, e da restauração de um concelho ou da creação de uma comarca, é fazer politica para a lua!

Não quero agora fallar a respeito do projectado convenio, para não alterar a minha ordem de idéas.

Direi apenas que, emquanto o ministerio não tiver um plano definido e sensato de processos governativos, o credor externo está desconfiado, como qualquer de nós o estaria, vendo continuarem de mal a peior os negocios do devedor. (Apoiados.)

O nosso primeiro trabalho seria romper com as despezas improductivas. (Apoiados.) Mas n'isso não se pensa porque se não pensa senão em fogo de vistas.

Na reforma novissima administrativa é reconhecida ás camaras municipaes a importantissima funcção de dar votos de sentimento e votos de louvor!

Mas não se lhe tira a attribuição de alterar a capricho os nomes das ruas, o que transtorna a titulação da propriedade, e prepara para uma epocha mais ou menos proxima um chuveiro de demandas!

D'estes votos usa-se largamente, porque hoje não ha cidadão que não seja illustre!

Então o que nós fazemos com a reforma do exercito é phantastico.

Não podemos dispensar o exercito permanente, (Apoiados.) como poderá talvez dispensal-o a Suissa, ou a Belgica.

Mas não nos preoccupâmos com a organisação do exercito!

Com o que nos preoccupâmos é com as promoções! (Apoiados.)

Não temos uma bôca de fogo de tiro rapido, e damos todos os nossos cuidados á questão do pessoal!

A lição dos outros não nos aproveita. Pois tinhamos grande licito de recente data, e aqui bem perto. Numerosos soldados hespanhoes acabam de regressar da grande Antilha na posição de vencidos, quando a Hespanha tinha nos campos da batalha grandes massas de tropas, compostas de soldados aguerridos e valentes.

Mas era um exercito sem o material de guerra moderno, e por isso não póde luctar.

Pois nós que não temos material aperfeiçoado, nem dinheiro para o comprar, do que tratamos é das promoções!

Em tal situação nos temos collocado, que, se ámanhã tivessemos um exercito de 100:000 homens, nem o podia-mos mobilisar, nem podiamos distribuir-lhe armamento apropriado, nem tinhamos dinheiro para lhe pagar.

Sem dinheiro não ha exercito, e é perdido o tempo empregado a discutir o orçamento porque bastam os creditos especiaes para inutilisar todos os calculos orçamentaes!

Lá vem no orçamento os creditos especiaes para despezas determinadas, como é o movimento de tropas! (Riso.)

Se continuâmos n'estas hesitações, em vez de entrar n'um caminho largo de regeneração economica e financeira, e de atacar á má cara o augmento de despezas, a catastrophe que nos espera já não virá longe!

Concluo, declarando á camara e sobretudo ao paiz, que as grandes difficuldades para os credores tanto internos como externos não estão lá fóra, estão cá dentro, procurem-nas em territorio nacional, e não é preciso ir a Berlim, encontram-se em Lisboa!

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem.

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