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N.° 42

SESSÃO NOCTURNA DE 12 DE ABRIL DE 1898

Presidente do exmo. Manuel Affonso Espergueira

Secretarios - os exmos.

Frederico Alexandrino Garcia Ramires
Carlos Augusto Ferreira

SUMMARIO

Officio, participando que prestaram juramento, na qualidade de dignos pares do reino, os srs. Elvino de Brito e Frederico Laranjo. - Declaração do sr. presidente. - O sr. Francisco Machado requer uns documentos e pede que entre em discussão o projecto de n.º 43, do anno passado. A camara não annue. - Perguntas do sr. Fialho Machado ao sr. ministro da guerra, que lhe responde em seguida. - O sr. Teixeira de Sousa insta pela remessa de um documento que pediu pelo ministerio da justiça. Resposta do sr. ministro. - O sr. Luciano Monteiro, referindo-se á noticia de estar o governo resolvido a importar farinhas por sua conta, dirige a este respeito algumas perguntas ao governo. Responde-lhe-o sr. ministro das obras publicas.

Na ordem da noite entra em discussão o orçamento de despezas do ministerio da justiça, usando detidamente da palavra o sr. Ferreira de Almeida. Responde-lhe o sr. Luiz José Dias, relator. - O sr. presidente consulta a camara sobre a licença pedida pela sr. Franco Castello Branco para se ausentar temporariamente do reino. Foi concedida. - A requerimento do sr. Teixeira de Sousa verifica-se não haver numero para a camara funccionar. - Trocam-se explicações entre o sr. ministro da fazenda e o sr. Ferreira de Almeida.

Abertura da sessão - Ás nove horas da noite.

Presentes á chamada, 40 srs. deputados. São os seguintes: - Alfredo Carlos Le-Cocq, Alfredo Cesar de Oliveira, Alvaro de Castellões, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Teixeira de Sousa, Augusto Cesar Claro da Ricca, Augusto José da Cunha, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Silveira Vianna, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Simões Ferreira, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Bento Ferreira de Almeida, José Malheiro Reymão, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria de Oliveira Matos, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luciano Affonso da Silva Monteiro, Luiz Ficher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Eusebio David Nunes da Silva, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, José Adolpho de Mello e Sousa, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José da Cruz Caldeira, José Dias Ferreira, José Eduardo Simões Baião, José Estevão de Moraes Sarmento José da Fonseca Abreu Castello Branco.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abel da Silva, Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Anselmo de Andrade, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Simões dos Reis, Antonio Tavares Festas, Arthur Alberto de Campos Henriques, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paçô Vieira, Conde da Serra de Tourega, Conde de Silves, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Furtado de Mello, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda, João Baptista Ribeiro Coelho, João Catanho de Menezes, João Joaquim Izidro dos Reis, João Lobo de Santiago Gouveia, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Capello Franco Frazão, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Gonçalves Pereira dos Santos, José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Joaquim da Silva Amado, José Luiz Ferreira Freire, José Maria Barbosa de Magalhães, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Manuel Antonio Moreira Junior, Manuel Pinto de Almeida, Marianno Cyrillo de Carvalho, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Acta. - Approvada.

EXPEDIENTE

Officio

Da presidencia da camara dos dignos pares do reino, participando que os exmos. srs. Elvino José de Sousa e Brito e José Frederico Laranjo prestaram juramento e tomaram assento, como dignos pares do reino, na sessão de hoje.

Para a secretaria.

O sr. Presidente: - Consta-me que ámanhã ha sessão da camara dos dignos pares e, como é provavel que tambem as haja nos dias seguintes, parece-me conveniente destinar uma parte da sessão d'esta camara, antes da ordem da noite, para se tratarem differentes assumptos, como succede nas sessões diurnas. (Apoiados geraes.)

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O sr. Francisco Machado: - Participo a v. exa. e á camara, que vou mandar lançar na caixa de petições um requerimento de interesse particular, e peço á commissão, que tem de o apreciar, o tome na devida consideração.

Mando agora para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que, pelo ministerio da fazenda, seja pedida ao escrivão de fazenda de Alcobaça, e me seja enviada, uma nota de todas as contribuições directas pagas pelas freguezias de Pederneira, Vallado e Famalicão, durante ou tres ultimos annos. = O deputado, F. J. Machado.»

E já que estou com a palavra, peço a v. exa. a fineza de consultar a camara sobre se permitte a dispensa do regimento, para que possa entrar desde já em discussão o projecto de lei n.° 43, do anno passado, que se refere á illuminação da cidade da Guarda, e que já está impresso e distribuido.

Consultada a camara resolveu-se negativamente.

O sr. Oliveira Matos: - Peço a v. exa. que me reservo a palavra para quando estiver presente o sr. ministro do reino.

O sr. Failho Gomes: - Pedi a palavra para perguntar a v. exa. se já chegaram a esta casa do parlamento as notas estatisticas, relativas às vaccinações e revaccinações no exercito, e que foram requeridas ao ministerio da guerra.

O sr. Presidente: - Ainda não chegaram.

O Orador: - Como estou com a palavra e vejo presente o sr. ministro da guerra, pergunto a s. exa., se está disposto a revogar ou, pelo menos, a alterar as disposições locaes que actualmente regulam os concursos para cirurgiões militares.

Como v. exa. sabe, a experiencia tem-se encarregado de demonstrar que essa lei não dá resultados praticos. Os concursos, com excepção do ultimo, no qual se apresentaram seis concorrentes para quatorze vagas, têem ficado desertos.

Comprehendo que o sr. ministro da guerra, pelas relações de estreita amisade que tem com o auctor d'esta lei, queira ter com esse cavalheiro uma certa deferencia, não quando, por isso, alterar de qualquer fórma esse documento; comprehendo, mesmo que s. exa. em questão de mero expediente, deseje não contrariar o auctor d'esse diploma, o sr. conselheiro Moraes Sarmento; mas o que não se comprehende é que se continue a manter uma lei que tão pessimos resultados está dando.

Aproveito a occasião de estar ainda com a palavra, para perguntar a s. exa., se o fornecimento da lympha a polpa vaccinica é feito por contrato particular.

Sendo feito por concurso, nada tenho a dizer; se é feito por contrato particular, desejo saber se n'elle estão assegurados os interesses do estado e da saude publica.

Por agora, nada mais tenho a dizer.

( S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro da Guerra (Francisco Maria da Cunha): - Sr. presidente, o sr. deputado Fialho Gomes perguntou á mesa se já tinham vindo uns documentos que pediu pelo ministerio da guerra, declarando v. exa. não terem ainda chegado. Creio que se trata de dados estatisticos, referentes á vaccinação das praças do exercito. Apresso-me a declarar que vou dar as ordens para que sejam remettidos esses esclarecimentos com a maxima brevidade.

Com respeito às disposições legaes sobre concursos para a admissão dos cirurgiães militares, que o illustre deputado não crê efficazes, o que lhe parece não serão modificadas por mim, por consideração com o auctor do respectivo regulamento, deve declarar que na gerencia da pasta que me foi confiada, regulo-me só pelo meu criterio.

O sr. Fialho Gomes: - Apoiado.

O Orador: - Embora tenha a maior consideração pelo sr. Moraes Sarmento, de quem sou intimo amigo, em nada influe essa circumstancia nas resoluções que tenho de tomar; e o seu distinctissimo caracter é d'isso uma garantia. (Apoiados.)

Na minha opinião é de toda a conveniencia manter o respectivo regulamento, exigindo provas praticas aos candidatos aos legares de cirurgiões ajudantes do exercito, como se exigem em todos os paizes estrangeiros, onde as condições de admissão são ainda mais rigorosas, e os interessados vão-se convencendo de que os concursos não são tão vexatorios como lhes parecia. Ainda ultimamente foram providos n'aquelles logares seis facultativos, tantos quantos compareceram.

Eu espero que em breve serão preenchidas todas as vagas que existem de cirurgiões ajudantes do exercito.

Com relação á pergunta do illustre deputado sobre a lympha vaccinica, não estou habilitado a responder n'este momento a s. exa., mas na primeiro opportunidade o farei. Agora se reconhece mais uma vez a vantagem dos avisos previos.

O sr. Fialho Gomes: - Agradeço ao sr. ministro da guerra as explicações que me acaba de dar.

O sr. Teixeira de Sousa: - Pedia a palavra porque desejava interrogar o sr. presidente do conselho e ministro do reino ácerca da execução do artigo 431.° §
3.° do codigo administrativo, relativamente ao administrador do concelho de Chaves, Domingos Gomes de Moraes Sarmento.

Como v. exa. declarou que nos concede, antes da ordem da noite, um certo espaço de tempo para tratarmos de varios assumptos, á similhança do que se pratica nas sessões diurnas, peço a v. exa. a fineza de communicar ao sr. presidente do conselho que insisto no desejo de conversar com s. exa. ácerca do assumpto que acabo de indicar.

Sr. presidente, já tenho pedido, quatro ou cinco vezes, que pela ministerio da justiça me seja enviada copia da consulta da procuradoria geral da corôa ácerca de uma syndicancia sobre que assenta a transferencia do actual delegado da comarca de Chaves, de Ancião para Villa Flor.

Mandei o meu requerimento para a mesa, insisti depois pela remessa d'aquelle documento, e até hoje nem me foi remettido, nem tenho conhecimento de que o sr. ministro da justiça se recuse á sua remessa; e como s. exa. está presente, desejo que me diga se póde mandar á camara a copia a que me refiro, ou se julga a remessa d'esse documento prejudicial ao serviço publico, para, n'esse caso, annunciar uma interpellação sobre o modo, como se está applicando a justiça no nosso paiz.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro da Justiça (Veiga Beirão): - Desejo simplesmente declarar ao illustre deputado, o sr. Teixeira de Sousa que considero o parecer a que s. exa. se referiu, um documento de caracter reservado, sendo por esta rasão que elle não foi já remettido a esta camara. E devo dizer a s. exa. que já dei ordem na secretaria a meu cargo para que n'aquelle sentido se officiasse a esta camara, para conhecimento do illustre deputado.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Luciano Monteiro: - Sr. presidente, li nos jornaes que o governo, attendendo á situação em que se collocaram os moageiros, deliberára comprar farinhas.

Pergunto ao sr. ministro das obras publicas, se é verdadeira a noticia, isto é, se o governo faz a compra de farinhas para as vender de sua conta, se n'essa compra intervem alguma firma ou entidade commercial, e, no caso affirmativo, qual foi essa firma, e as condições em que ella intervem na compra.

Acrescentarei ainda que, segundo vejo nos jornaes, os moageiros declararam que não podiam fazer a venda pelos preços da tabella governamental.

Na hypothese de se manterem n'esta teimosia, justa ou injusta, pergunto, se o governo insiste no proposito de comprar farinhas seja qual for o seu preço.

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Resumindo; o governo comprou farinhas? Porque preço as tomou? Interveiu alguma entidade commercial n'essa compra? Qual foi essa firma? No caso de se conservarem os moageiros na altitude que têem tomado até hoje, o governo, por seu lado, mantem-se no proposito de continuar a comprar farinha seja qual for o preço?

(S. exa. não reviu.)

O sr. Ministro das Obras Publicas (Augusto José da Cunha): - Responderei muito concisamente às perguntas do illustre deputado.

O governo, em vista da declaração dos moageiros, de que não podiam vender as farinhas pelo preço da tabella, a que se refere o decreto de 1 do corrente mez, que não é senão a reproducção do decreto de 26 de novembro do anno passado, encommendou uma porção de farinha, para reconhecer se o preço das farinhas, postas em Lisboa, carregadas com todas as despezas, frete, seguro, commissão, e etc., sairiam mais baratas do que o preço estipulado pelo moageiro, e se esse preço por que sairiam as farinhas podia supportar o imposto decretado no diploma a que me referi.

Está feita, e vem no caminho, a encommenda de uma porção de farinha para o governo estudar, ver o preço por que ella sáe, e reconhecer se elle é mais vantajoso do que o que pedem os moageiros.

O preço por que se compraram as farinhas é conhecido já; o que se não conhece é a importancia do frete, seguro, etc.

Calculou-se approximadamente; mas eu peço licença para não declarar, posto que já o saiba, porque o reputo inconveniente, qual o preço por que as farinhas foram compradas nos mercados estrangeiros.

Alem d'estes elementos de estudo, o governo nomeou uma commissão para estudar, calcular pelos meios ao seu alcance, qual será é preço por que os moageiros poderão vender as farinhas sem perda, e mesmo com algum lucro rasoavel; para os compensar do seu trabalho.

O governo espera estas duas informações, para tomar uma decisão definitiva, e ver se ha de ou não importar farinhas por sua conta, ou se ha de abrir as portas às farinhas estrangeiras, mediante um certo imposto.

A questão está sendo estudada, é com toda á urgencia; entretanto o decreto de 1 do corrente está em execução e d'elle não desisto, enquanto não reconhecer que os condições n'elle impostas são impossiveis.

O governo fez os seus calculos, e promulgou esse decreto; mas ha uma representação dos industriaes de moagens, feita em termos moderados e respeitosos; que o governo, querendo ser justo, não póde deixar de attender e considerar; estudando esta questão e as reclamações d'esses moageiros.

Não póde deixar de proceder assim, e se reconhecer pelas informações que obtiver, que os calculos que foram feitos pelo governo são errados, não terá duvida nenhuma em confessar esse erro e corrigil-o, porque, primeiro que tudo, está o interesse publico e o interesse mesmo das differentes industrias; mas essa modificação só será feita com perfeito conhecimento de causa; e emquanto ella se não fizer, o decreto estará de pé, ha de ser executado, e as penas por elle impostas hão de ser cumpridas, sejam quaes forem os resultados para o ministro das obras publicas. - (Vozes: - Muito bem.)

O sr. Luciano Monteiro: - Uma das perguntas que fiz, foi se na operação da compra de farinhas tinha intervindo alguma firma commercial, e como interveiu.

O Orador: - É claro que para esta operação da compra de farinhas, de uma pequena porção, relativamente á quantidade total que ha de ser precisa para o abastecimento do mercado, no caso do governo ter de lançar mão d'esse recurso devia a encommenda ser feita com toda a urgencia e, portanto, não se podia abrir concurso.

Por conseguinte, o governo lançou não da primeira firma acreditada na praça e que fez a proposta, aliás muito rasoavel, porque a compra de farinhas era pelo preço dos mercados estrangeiros que offerecessem o producto mais barato e mediante uma commissão de 1 por cento.

O governo não teve duvida em acceitar esta proposta, em vista da urgencia do caso, e mesmo porque a achou em condições rascaveis.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Luciano Monteiro: - Isso não é necessario; desejava simplesmente saber o nome da firma.

O Orador: - Não tenho duvida em dizer. É a firma Torlardes & C.ª

O sr. Eduardo Villaça: - Vou mandar deitar na caixa de petições o requerimento do sr. José Luiz Gomes, coronel do quadro auxiliar, pedindo lhe seja contada, no acto da sua reforma, a antiguidade de alferes de 27 de novembro de 1867.

Chamo para o assumpto a que o requerimento se refere, e que me parece de toda a justiça, a attenção da commissão respectiva.

ORDEM DA NOITE.

Discussão do orçamento de despeza, na parte relativa ao ministerio da justiça

Leu-se.

O sr. Baião (para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. que mande verificar se na sala ha numero de deputados sufficiente para a camara funccionar. = Simões Baião.

Procedeu-se á contagem.

O sr. Presidente: - Estão presentes 42 srs. deputados; ha, portanto, numero para poder a camara continuar a funccionar.

O sr. Ferreira de Almeida: - Vou entrar na discussão do orçamento do ministerio da justiça, a que chamarei jocosa, porque ridiculo é estar a discutir um orçamento com redacções de qualquer ordem, quando o relatorio de fazenda, apresentado pelo sr. ministro respectivo, dá o orçamento como equilibrado, até com saldos, mas em que a paginas tantas, ou folhas, como se usa dizer em processos forenses, se diz que são retiradas dos encargos geraes do estado as despezas extraordinarias de marinha sob o ponto de vista colonial, do arsenal, e as despezas extraordinarias de obras publicas, a que se procurará occorrer e providenciar em leis especiaes, provavelmente a do imposto do sêllo, já oneroso, já escandaloso nos seus processos, que se traduzem em impor multas por tal fórma injustas e illegaes, que é restituida a parte que caberia ao estado, ficando, porém, na algibeira dos compadres aquella que lhes é destinada, apesar de se reconhecer a illegalidade da incidencia!... A outra é representada pelos 5 por cento de addicional!...

Sr. presidente, se a tão pouco chega a sciencia economica do sr. ministro da fazenda, se em tão pouco se traduz o seu estro - e isto francamente, o que pedia era cantiga - então é melhor dizer que o paiz está perdido do que pedir ao publico mais impostos, como o do sêllo, que serve só para metter metade das multas na algibeira dos compadres, ou como o do addicional, que representa uma administração de mercearia, que procura augmentos de receita na alta do preço do assucar, bacalhau, manteiga, feijão, grão e macarrão, sob o pretexto de fazer face aos acrescimos de quaesquer leis, a mais das vezes ainda não publicadas!...

Entretanto, sr. presidente, demonstrarei que um paiz que, conforme diz o relatorio de fazenda, tem 28:000 e tantos contos de réis de encargos de divida publica, em

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que se comprehende o agio do oiro e os encargos geraes do ministerio da fazenda, para uma despeza geral de 52$000 contos, é um paiz perdido. Este governo, quando subiu ao poder, propunha-se melhorar radicalmente e refundir todos os elementos de administração, fazendo até tabua rasa sobre a administração passada com os chamados creditos extraordinarios mas a final depois de um anno de gerencia, tem o paiz um encargo de divida publica de 28:000 contos, conforme se diz no relatorio de fazenda ultimamente apresentado á camara pelo sr. Ressano Garcia de macinurdista memoria; um paiz em taes condições é um paiz perdido, e se o ministro da fazenda não tem outro alcance de vistas, outro objectivo, que saia d'este ram-ram, do rol diario das despezas da governação e de augmento de tributação, então é melhor liquidar por completo, como os jornaes avançados da colligação liberal diziam e dizem, se pretendeu fazer.

Para que serve estar a discutir orçamentos e córtes ridiculos de pataco, vintem e 10 réis, orçamentos em que o sr. ministro da fazenda no seu relatorio affirma ficarem de fóra as despezas coloniaes e extraordinarias de marinha, representando aquellas, por si só, mais de 1:800 contos de media de encargos por anno? De que serve, digo, estar aqui a ratinhar nas pequenas verbas quando o proprio governo não tem a coragem de reduzir e cortar n'aquellas que nos seus jornaes tão violentamente criticou da administração transacta, classificando-a de perdularia? Para que criticaram e para que ficaram essas verbas? De duas uma, ou ellas eram justas e n'este caso não se podia admittir a critica feita, ou eram injustas e então representavam uma aleivosia que não se póde admittir. (Apoiados.) Se eram injustas, porque não as eliminaram e entre ellas as que diziam respeito ao ministerio da marinha? (Apoiados.) Se essas verbas eram injustas e não se eliminaram, como é que se tem a audacia de levantar uma campanha de diffamação, de descredito, de violencias, obsecando o espirito publico a respeito de uma administração que procurou, tanto quanto póde, metter as cousas dentro dos limites que as condições politicas e a tradição de um paiz mal educado no regimen, mal podiam admittir, procedendo com prejuizo politico proprio, como succedeu na questão da redacção dos concelhos, para vir depois o governo actual restabelecel-os, e cujo restabelecimento se traduz já n'um augmento de despeza de 9 contos de réis com os escrivães de fazenda a mais que é necessario collocar nos concelhos restaurados! (Apoiados.)

Os membros do actual governo fizeram então uma colligação extraordinaria, hybrida, para debellar uma situarão que sacrificava as suas conveniencias politicas, reduzindo o numero de concelhos e de comarcas, por considerar excessiva, demasiada, inconveniente e perdularia as circumscripções existentes n'aquella epocha; e este governo, que accusára o transacto de perdulario, veiu restabelecer tudo isso com aggravamento da despeza publica. (Apoiados.)

E para mascarar os seus esbanjamentos retira do orçamentos despezas certas e grandiosas! A quem pretende o governo enganar com essa mascara? A nós, que nos conhecemos todos pau de laranjeira, ou o estrangeiro, que nos conhece pau podre, entrando eu n'este numero porque não tive quando ministro a absoluta energia de cortar tudo que devia, e cortei muita cousa. É para illudir o estrangeiro que nos conhece relapsos, fazendo mil negociatas inconvenientes para o estado!?

E fez-se uma campanha para derribar o existente!? E para quê? Para conservar do existente o que havia de mau e restabelecer o que de mau se tinha cortado. (Apoiados.)

Aqui estou orando illuminado com duas vélas quando isto está pedindo quatro tochas. (Riso.)

Sr. presidente, riem-se aqui os meus vizinhos por eu lhes dizer a meia voz que isto estava a pedir quatro tochas. É verdade. Eu já ha dias disse a respeito do centenario que essa festa não é um Te-Deum pelas glorias passadas; mas ha de constituir completa, absolutamente os exequias do nosso dominio colonial e porventura as exequias da independencia nacional.

No relatorio da fazenda encontram-se mappas errados.

Tudo errado! Parece extraordinario, como não houvesse vista para ver taes cousas!

Faz-me lembrar o que encontrei, lendo uns pareceres sobre acquisição de navios, em que diz o relator, que vae agora para Timor.

O sr. Presidente: - Tenho a observar ao sr. deputado que o que está em discussão é o orçamento do ministerio da justiça.

O Orador: - Creio que está em discussão o orçamento das despezas do paiz em geral, e em especial o orçamento da justiça. Foi deliberado que houvesse uma discussão geral e uma especial sobre cada um dos ministerios. (Apoiados.)

Se, porém, v. exa. entendo que eu tenho de me restringir absoluta e completamente ao orçamento do ministerio da justiça, terei de sujeitar-me, mas ha de permittir-me as considerações que d'ahi derivem e tiverem relação com o augmento de despeza na administração em geral.

O sr. Presidente: - O que está em discussão é o ministerio da justiça, por deliberação da camara.

O Orador: - Eu estou dentro d'essa deliberação. Discussão geral do orçamento da despeza e especial por capitulos de cada ministerio.

Foi ou não foi isso que se votou?

O sr. Presidente: - A deliberação da camara foi que discutisse o orçamento do ministerio da justiça, e é isso que está em discussão.

O Orador: - Perfeitamente, mas para justificar a fórma por que eu levava a discussão com respeito ao ministerio da justiça devo dizer a s. exa. que extraordinario é que relacionando-se com este assumpto o relatorio e propostas de fazenda que se occupam tambem da despeza, eu não possa referir-me ao facto de que se consignem erradamente ali umas verbas de um ramo de serviço publico differentes d'aquellas que constam do relatorio do sr. conselheiro Hintze Ribeiro, apresentado á camara em junho de 1894. Como, porém, v. exa. quer que me cinja restricta e absolutamente á discussão do orçamento do ministerio da justiça, não aproveitarei agora o ensejo para apreciar esses erros dos mappas, não sei se propositadamente feitos, se levianamente adoptados; e só direi, mantendo-me na these que puz, que um paiz que tem 1:800 contos de réis em media de dezoito annos, de deficit colonial, e hoje maior como demonstrarei se v. exa. se não oppozer a isso, não se salva com insignificantes cerceamentos feitos principalmente sobre os vencimentos dos pequenos funccionarios, com o aggravamento moral e politico que resulta do facto de que o pequeno é o maior numero, e o grande o menor, e este nunca dominou aquelle, e as manifestações de reacção hão de vir necessariamente, quando amanhã apparecer a tarifa de 50 por cento derivada dos encargos da divida publica e das circumstancias economicas do paiz.

Não é, com reducções insignificantes de 10 réis, 20 réis e 40 réis que o paiz ha de restabelecer as suas finanças, assim como tambem não o será com as alterações no imposto do sêllo, que só serve para os compadres, e com despropositados adicionaes que se ha de livrar o paiz de uma bancarrota mais violenta mais desgraçada, sem salvação possivel a não ser por um acto violento, sim, mas necessario.

Agora pergunto: concede-me v. exa. que eu demonstra a minha these de que o paiz tem um encargo de 1:800 contos de réis de despezas coloniaes, para justificar o que tenho a dizer sobre o ministerio da justiça?

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O sr. Presidente: - Eu peço ao sr. deputado que entre na discussão do orçamento do ministerio da justiça.

O Orador: - Toda a discussão tem preliminares geraes justificativos das conclusões que sobre a parte especial tenha a ellas de referir-se; ou isto é logico, elementar e tradicional sob o ponto de vista da critica e da analyse ou então diga-se: só o deixo fallar sobre as cousas minimas do orçamento.

Digo eu, pois, sem entrar em maior detalhes e para me manter obediente não só á boa vontade de v. exa., que deseja que eu restrinja-a minha apreciação ao orçamento do ministerio da justiça, mas ainda para com a camara que eu respeito tanto quanto ella póde fazer valer o respeito que queira ter, e cujo alcance de justiça eu já conheço, que deixarei de parte a questão dos 1:800 contos de réis do deficit colonial em media em relação a dezoito annos que terminaram em 1896 para outra qualquer discussão em que me dê o capricho de entrar. E digo capricho, sr. presidente, e não dever, porque para mim isto é tempo perfeitamente perdido.

Deixemos, pois, a critica do caso de um orçamento geral, com saldo possitivo, quando as despezas geraes têem um encargo de 1:800 contos, em media, dos ultimos dezoito annos até 1896, mas de tom crescente extraordinarissimo nos ultimos dez annos; e, submettendo-me devidamente á indicação de v. exa. que eu muito respeito pelo logar que occupa, vamos á apreciação restricta da administração da justiça.

V. exa. faz-me favor diz-me que tempo me falta para acabar?

O sr. Presidente: - V. exa. principiou a fallar às nove horas e trinta e tres minutos.

O Orador: - Tenho por consequencia trinta e tres minutos ainda n'este momento; muito bem.

Tratemos, pois, da justiça, restrictamente, singelamente, singularmente com todas as demonstrações de boa consideração a que eu me julgo obrigado para com o illustre ministro da justiça, apesar de politica, de diversa plana e de ter sido defensor á outrance do famoso caso do flagrante delicto, mas eu esqueço esse facto a que o obrigou uma dedicação partidaria muito respeitavel para ir apreciar cousas que dizem respeito ao seu ministerio singelamente, puramente e regularmente.

Dizia eu ha pouco que mal parecia estar a perder tempo com uma discussão em que a parte que respeita ao ministerio da justiça se traduz na grandiosa economia de 12:279$000 réis para fazer face a encargos que ficam fóra do orçamento, e que só no ministerio da marinha, pela parte colonial, é representada n'uma verba minima de 1:800 contos de réis. Hão de convir que chega a ser irrisorio o caso, mas para que se não diga que ella não foi devidamente considerado e para que não se extasie o espirito publico ignorante que vae atrás das figuras phantasiatas da administração publica, vendo que ha dezeseis verbas reduzidas, é que eu me occuparei d'elle.

V. exa. hão de convir que aquelles 12 contos de réis de reducção nas despezas são por si só um achado para fazer face aos extraordinarios encargos coloniaes que a metropole paga, taes como a dos 69 contos de réis de subsidio á congregação do Saint Esprit concedidos pelo meu antecessor o sr. Jacinto Candido, personna grata do sr. Barros Gomes e ambos do partido catholico, que o sr. Barros Gomes manteve, tendo sido talvez o inspirador da concessão, porque é bom não esquecer que nós temos na politica portugueza estes elementos curiosos, uma especie de colonos de Rhodes em miniatura, com um pé no partido progressista e outro no catholico, ou com um pé no partido regenerador e outro no catholico, uma especie de irmãos siamezes ligados por um interesse commum, a catholica.

Faço esta critica sob o ponto de vista do que é nocivo ao paiz, pela fórma por que a administração corre e não porque recuse as missões os subsidios que normalmente, legalmente, honestamente lhe devam ser dados, mas nunca com objectivos politicos e pessoaes, com o alargamento e desprendimento, com que estão sendo dados.

Ora, no ministerio da justiça ha dezeseis verbas de pataco e de tres vintens, perdão, de 180 e 380 réis, etc., como v. exa. já viram, o que tudo sommado não chega sequer para subsidio da congregação do Saint Esprit, e é a gota de agua no oceano, para o sumidouro da despeza publica, particula de pó para o mesmo abysmo quasi insondavel.

Não tenciono nem para o orçamento da justiça, nem para qualquer outro ministerio, a respeito do qual eu possa usar da palavra, mandar para a mesa uma só nota de reducção de despezas, porque isso era perfeitamente inutil como vou apontar a v. exa.

O anno passado, tratando-se da discussão do ministerio da marinha entre outras propuz a redacção de 7 contos de réis n'uma despeza chamada de conservação dos edificios da escola de torpedos, e foi rejeitada. Havia n'esse tempo uma especie de furor bellico beatifico, da parte do ministro da marinha contra mim, e por isso foi rejeitada, mas este anno, cousa notavel, é a commissão do orçamento, que é quasi a mesma do anno passado, que cortou na mesma verba 6 contos de réis, apenas só menos um do que eu propuz então!

Desde que eu tenho esta lição de que as propostas da opposição são radicalmente provadas, para no anno seguinte serem adoptados com outra cor e umas pequenas differenças, francamente não merece a pena fazer proposta. (Apoiados.)

Na sala estão tão poucos srs. deputados que eu estou quasi fallando só e para os srs. tachygraphos. Naturalmente foram ver a Duse.

Não admira que a maioria fugisse e fez muito bem, quando o governo é o primeiro a ausentar-se; (Riso.) Quem tinha de ouvir-me era o sr. ministro da justiça e o da fazenda, porque todos os ministerios se ligam com este, e talvez o da marinha, pois que eu faço sempre um pouco referencia às cousas do meu orneio. Realmente estou com desejos de ver quando ficamos reduzidos a dois, eu fallando e v. exa. presidindo. (Riso.)

Para me cingir tanto quanto a presidencia me tem observado á administração da justiça, vou referir-me ao serviço judicial do ultramar, nas suas relações com o serviço judicial do continente.

Sr. presidente, quando eu fui ministro da marinha, incorrendo no desagrado da classe a que pertencia e que principalmente caracterisa essa corporação, que é a classe propriamente militar, acabei com o posto de accesso, de que eu poderia tirar proveito se o mantivesse, mas puz e antepuz acima de todo o proveito proprio e de amigos ou de compadres o interesse do estado.

Acabei com o posto de accesso para o ultramar em varias commissões, acabando com a situação mais odiosa, mais inconveniente e mais prejudicial que existia para o estado; odiosa, porque não raro se via quasi um nubente naval, saído das fachas de guarda-marinha; mettendo empenhos persistentes e impertinentes, activo e deligente, ir a breve trecho, ainda antes de desempenhar as funcções de segundo tenente, governador para o ultramar, em primeiro tenente, regressando no fim de tres annos com o posto antecipado e as pitanças do logar, não raro fazendo asneiras, e, mais extraordinariamente ainda, sendo demittido, ser depois reintegrado e condecorado!

Este ultimo caso foi do meu successor! O que representa não só um subido acto de moralidade, mas de solidariedade politica. Pedra a quem toca.

A asneira não é caracteristica, por vezes recommendavel, só de uma certa classe de individuos, nem só de um partido; ha de tudo em toda a parte.

Acabei com essa velharia, que se traduzia n'um favoritismo escandaloso, prejudicial sob o ponto de vista da dis-

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800 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

ciplina e prejudicial sob o ponto de vista economico, porque os individuos nomeados com posto de accesso para as rendosas commissões do ultramar ficavam supranumerarios no quadro, ganhando pelo posto immediato e desfructando as commissões da patente, que tinham só in nomine.

O que se dava com respeito aos officiaes promovidos para o ultramar, em prejuizo dos mais antigos da sua classe e arma, dá-se com os funccionarios judiciaes, mas com prejuizo de promoção dos que ficam no reino e portanto com prejuizo de antiguidade.

Assim o funccionario judicial nomeado para o ultramar vae, com preterição absoluta e completa dos collegas do reino, á direita dos quaes passa em meia duzia de annos, sendo nomeado para commissões que, alem das vantagens de acceleração de promoção, são altamente estipendiadas e mais remuneradas agora ainda pelos srs. commissarios regios, que entenderam ir conquistar ao poder judicial apoio aos seus desmandos e violencias de toda a ordem, estipendiando melhor, não á custa das colonias, mas do estado, porque somos nós que pagamos taes demasias, porque as colonias têem deficit e porque, por mais correcto, mais bem disposto sob o ponto de vista honesto, não poderá esse pessoal deixar de se impressionar e suggestionar perante esta significativa boa vontade de effeitos praticos dos commissarios regios, que tão largamente lhe augmentaram os vencimentos.

Mas quem paga é o Zé povinho, somos todos nós, porque o deficit colonial aqui vem bater, para ser pago pela metropole, com um desiquilibrio de mais de 1:800 contos de réis annuaes.

Quando eu era ministro da marinha convidei uma commissão, que já achei organisada no ministerio da marinha e ultramar, com o nome, salvo o erro, do conselho superior da magistratura judicial do ultramar. Não me acho bem apparelhado para esta discussão, pedindo desculpa a v. exa. de alguma falta que possa haver nas citações, que eu depois corrigirei no discurso impresso, como aliás se costuma fazer em mui larga e extraordinaria escala.

Como v. exa. vê, o titulo é pomposo.

Convidei o conselho a organisar o serviço judicial no ultramar por fórma que se acabasse com a situação que a mim me parecia violenta no pé em que se achava e se acha ainda; obedecendo, como v. exa. vê, á mesma orientação que me havia determinado a cortar na minha propria classe, e em meu proprio prejuizo com o posto de accesso para o ultramar.

Este posto dava-se na classe militar sem prejuizo de antiguidade dos individuos da mesma classe e arma, emquanto que a nomeação de juizes para o ultramar se dá com prejuizo absoluto dos individuos da mesma classe no continente, pois que, preenchendo um certo numero de annos no ultramar, passa às instancias superiores do continente por cima de todos aquelles que ficaram cá, por não quererem ou porque não tiveram empenho para isso.

Creio que mais ou menos alguns ministros da justiça, têem tido vontade de reformar esta situação, mas mais ou menos os ministros da justiça têem a sua advocacia, e as propostas, não passando logo, podem, os que seriam attingidos por ellas, vir encontrar processos que examinariam com mais attenção!

Esta observação será talvez um pouco maliciosa, desculpe-me v. exa.

Isto é feitio de algarvio, talvez, ou influencia do dia e da estação, porque estamos no periodo do equinoxio e da lua cheia, e tudo isto perturba não só as mulheres, mas tambem os homens. (Riso.)

Ora o conselho superior da magistratura judicial do ultramar, formulou um projecto que, francamente, não se recommendava muito pelo alcance de vistas; e eu, a despeito da minha boa vontade, e abdicando um pouco da minha energia, não tive coragem para formular um decreto para levar ao conselho de ministros.

Mandei o parecer para o meu collega da justiça. Elle, é claro, consultou as commissões respectivas; e v. exa. sabe o que é consultar em Portugal commissões. É enternisar um assumpto.

N'isto eu saí do ministerio, metteram-se de permeio assumptos do maior monta que prejudicaram a questão judicial ultramarina, caindo o ministerio de que eu fiz parte temporariamente sem a resolver.

Mas entre o tempo que eu fui ministro e aquelle em que o dignitario da pasta da justiça saiu mediou proximamente um anno.

Ha um anno está no poder este partido; e em ostracismo ha oito. Era natural que tivesse n'estes oito annos aproveitado os ocios do assedio á conquista do poder para estudar as leis que devessem ser substituidas por outras do maior tomo, folego e alcance. (Apoiados.)

E sem duvida se alguma se recommendava era esta de organisar o serviço judicial ultramarino, por fórma que não se vissem hoje juizes, com um supposto direito por leis ou por outra ordem de considerações pouco legitimas, estarem dependentes do ministerio da justiça na chamada situação do quadro, a vencerem altissimos ordenados, que são pagos pelos cofres da metropole.

Sr. presidente, acaba a hora às dez e trinta minutos. V. exa. me dirá se tenho ainda o quarto de hora de tolerancia.

O sr. Presidente: - V. exa. começou a fallar às nove horas e trinta e tres minutos, acaba a hora às dez horas e trinta e tres minutos, mas tem ainda um quarto de hora de tolerancia que o regimento concede.

O Orador: - Muito obrigado.

Vou procurar aproveitar a faculdade que o regimento me concedo com a mais rapida exposição do que tenho a dizer.

A promoção dos juizes no continente, até chegar á relação, regula proximamente por vinte e sete annos, ao passo que os juizes do ultramar, onde, na maioria das nossas colonias, as condições da vida são regulares - e n'aquellas em que são más, rapidamente é substituido o pessoal - alem de serem melhor remunerados vem, com uma duzia ou duzia e meia de annos conquistar um logar de precedencia na segunda instancia sobre os que servem no continente. É justo isto? Vem porventura com o preciso tirocinio para a segunda instancia, onde se jogam altos interesses de toda a ordem, com doze ou dezoito annos de tirocinio os juizes do ultramar?

Vem alguns sem duvida, por excepção, mas não se póde dizer que venha a maior parte d'elles nossas condições, porque mesmo d'aquelles que no continente conquistam esses logares na relação com vinte e sete annos, como merecidamente o alcançou o antecessor de v. exa., muitos lá chegam apenas por ordem chronologica e não por merecimento de officio. Póde e deve manter-se esta situação, quer sob o ponto de vista moral, quer sob o ponto de vista absolutamente indispensavel de uma justiça educada com uma larga e longa pratica, larga no assumpto e longa no tempo? Não póde, não deve ser. (Apoiados.)

Os partidos não conquistam o poderio, para satisfação de vaidades; têem obrigação de justificar esse empenho, que póde desculpar erros e violencias nos meios empregados para ahi chegar. Mas desde que os ministros cheguem á meta do seu desideratum têem obrigação de traduzir em medidas de moralidade, justiça, economia e de alcance social, como é a questão de justiça, o seu esforço para a occupação d'esses logares.

Aqui está um ponto em que eu venho increpar o nobre ministro da justiça. Ha mais de um anno que s. exa. occupa esse logar e decorrido esse tempo aprestou apenas as medidas que dizem respeito ao orçamento traduzindo-as n'uma economia de 12 contos de réis, que para 52:000

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SESSÃO NOCTURNA N.° 42 DE 12 DE ABRIL DE 1898 801

contos de réis de despeza publica não chega a representar uma economia de 10 réis.

O sr. Luiz José Dias: - Peço a palavra.

O Orador: - Acabo de ouvir pedir a palavra o illustre deputado, illustre e considerado. (Apoiados.) Escusado era que v. exa. confirmassem esta minha affirmativa que talvez julguem ser dita em sentido gracioso. Não é; é sincera. Eu não tenho, necessidade de ser menos agradavel senão com aquelles que sejam impertinentes commigo s. exa. tem-me dispensado sempre n'uma convivencia amavel, e seria menos correcto da minha parte fazer agora qualquer referencia que não fosse leal e sincera.

Não quer responder-me o sr. ministro da justiça, porque a alta categoria, a alta plana, a alta posição de s. exa., etc, lhe não permittem que incline a magestade e delegue n'outrem, como o sr. Luiz José Dias, o encargo da replica, que muito me honra por ser de um deputado que eu vim encontrar na camara quando eu fazia a minha iniciação com quem vim aprender a metter na discussão tanto quanto possivel a amenidade, que ao seu caracter sacerdote e impõe por mandamento a Santa Madre Igreja, que eu muito respeito e que recommenda que se deve soffrer com paciencia as fraquezas do proximo, e estou a ver que s. exa. vae enthusiasmar e electrisar com o seu verbo eloquente, que nós todos conhecemos de longa data, a camara, que pena é esteja hoje reduzida a tão pequena dose de ouvintes; vae de certo ter a piedade que resulta não só do seu caracter pessoal, mas da sua posição, para se compadecer do calor com que faltei, filho de um temperamento mais meridional que o seu, mais quente, por outras circumstancias e que tem tido a sufficiente agua benta para lhe abater o fogo que é necessario haver um pouco nas discussões que por vezes tomam um caracter politico por inconveniente provocação.

O sr. Presidente: - S. exa. tem mais um quarto de hora.

O Orador: - Muito obrigado.

Diante do individuo que vae levantar-se para combater as asserções que expendi, sinto-me tão pequeno, tão caído, tão succumbido que não sei que mais diga sobre o assumpto, portanto passo a resumir as minhas observações

É triste que n'um paiz, cuja divida publica com todos os seus encargos do agio e de diversa ordem é representada por 28:000 contos de réis n'uma despeza de 52:000 contos de réis, não haja, não se apresente outra ordem de recursos para sair do difficil passo em que se acha senão a de uma economia de 12 contos de réis n'este ministerio, e pondo fóra dos encargos do estado as despezas de marinha, colonial e outra de obras publicas, quando só a despeza com as colonias é representada por 1:800 contos de réis annuaes.

Que triste é, que pelo ministerio da justiça quando não podessem fazer-se economias reduzindo-se e classificando as comarcas por uma ordem mais propria, mais adequada as condições da sua acção, se não regularise ao menos a promoção dos juizes do ultramar para o continente. Não é sr. presidente, com medidas tão comesinhas que o governo fará frente a difficuldades crescentes no transe difficil que o paiz atravessa, transe tanto mais angustioso, quanto lhe bate á porta a guerra com os vizinhos, que não sei que influencia terá no seio da nossa patria.

Tenho dito.

O sr. Luiz José Dias (relator): - Como relator especial do orçamento de despeza do ministerio da justiça usa da palavra para responder a algumas das observações do sr. Ferreira de Almeida.

Classificou o illustre deputado de mesquinhas as reducções feitas no orçamento.

Se assim é, o facto prova apenas a sinceridade com que foi confeccionado o orçamento, reduzindo-se as despezas que o podiam ser, sem se produzir desorganisação e irregularidades no funccionamento dos serviços publicos.

Pelo que respeita á passagem dos juizes do ultramar para o continente, acha judiciosas as considerações feitas por s. exa. Com ellas está inteiramente de accordo, e está tambem o sr. ministro da justiça, que, como já declarou, tenciona adoptar providencias, ouvidos os srs. ministros da fazenda e marinha, que regularisem o serviço a que se refere, em harmonia com os interesses da justiça e dos magistrados.

(O discurso será publicada na integra, e em appendice, quando s. exa. o restituir.)

O sr. Teixeira de Sousa (para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. que mande verificar se na sala ha numero para a camara poder funccionar. = Teixeira de Sousa.

Procede-se á contagem.

O sr. Presidente: - Estão na sala 37 srs. deputados.

Umas vozes: - Não ha numero.

Outras vozes: - Ha numero para discutir.

Uma voz: - A camara não póde funccionar com menos de 40 deputados.

(Pausa.)

O sr. Presidente: - Vou dar a palavra ao sr. ministro da fazenda, que a pediu para antes de se encerrar a sessão. Tem s. exa. a palavra.

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - O illustre deputado o sr. Ferreira de Almeida fallando, ha pouco, na ordem da noite, referiu-se á minha pessoa, chamando-me, se não me engano, ministro da fazenda de mac-murdista memoria.

Confesso com toda a franqueza que não sei o que significam taes palavras, mas não querendo deixar pesar sobre mim o menor equivoco, peço ao illustre deputado, sem nenhum caracter de intimação, e antes como uma mercê especial, se digne explicar qual foi o sentido em que as empregou.

(S. exa. não. reviu.)

O sr. Ferreira de Almeida: - Se não estou em erro creio que era ministro da marinha o sr. Ressano Garcia quando teve logar a rescisão do contrato Mac-Murdo. Foi ou não foi? Foi.

Todos nós sabemos o que essa rescisão tem custado e vae custar. Parece-me que s. exa. não póde rejeitar a responsabilidade de um acto tão nocivo para o paiz.

Nada mais tenho que dizer.

O sr. Ministro da Fazenda (Ressano Garcia): - Dou-me por satisfeito com as explicações do illustre deputado.

O sr. Presidente: - O sr. João Franco tendo de se ausentar do reino pede á camara a necessaria licença.

Vozes. - Já não ha numero.

O sr. Presidente: - Eu não podia submetter este pedido á deliberação da camara, se não depois de ter acabado de fallar o sr. deputado Luiz José Dias.

Creio que a camara não terá duvida em conceder a licença pedida. (Apoiados.)

Ámanhã ha sessão nocturna. A primeira chamada será ás oito horas e meia, e a ordem da noite é, alem da que já estava dada, a discussão dos projectos de lei n.ºs 58, sobre as contas da junta administrativa; 8, fixação da força naval; e 16, fixação da força do exercito.

Está encerrada a sessão.

Eram dez horas e cincoenta minutos.

O redactor = Lopes Vieira.

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