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N.° 47

SESSÃO NOCTURNA DE 19 DE ABRIL DE 1898

Presidencia do exmo. sr. Manuel Affonso de Espregueira

Secretarios - os exmos. srs.

Manuel Telles de Vasconcellos
Carlos Augusto Ferreira

SUMMARIO

Lida a acta, o sr. Ferreira de Almeida reclama uma rectificação no summario, e a acta é approvada. - Lê-se o expediente - O sr. Lourenço Cayolla apresenta uma proposta para serem aggregados á commissão do ultramar os srs. Libanio Fialho Gomes e Anselmo de Andrade. - Apresenta um parecer da commissão do ultramar o sr. Arnaldo Novaes. - Apresenta um projecto de lei, sobre a annexação da freguesia do Entroncamento á Barquinha, o sr. Izidro dos Reis.- Annunciam ter lançado requerimentos na caixa os srs. Mazziotti e Ferreira da Fonseca.-.O sr. Jeronymo Barbosa apresenta um parecer da commissão do ultramar, sobre a proposta de lei n.º 9-E, e um requerimento para entrar em discussão immediata o projecto relativo ao caminho de ferro da Regua a Chaves. Sendo este requerimento approvado vota-se o projecto com um additamento do sr. Malheiro Reymão. - O sr. Ferreira de Almeida apresenta um requerimento, pedindo esclarecimentos pelo ministerio da marinha. - O sr. Fialho Gomes requer, e é approvado, que entre em discussão o projecto de lei n.º 14, relativos á organisação da policia, rural em Beja. Fallam sobre o assumpto os srs. Menezes de Vasconcelos, Alfredo de Oliveira, Mello e Sousa. Fialho Gomes (que requer a prorogação até se votar o projecto); Cabral Moncada e Ferreira de Almeida (que requer se contem os deputados presentes). Verificando-se não haver numero, é levantada a sessão.

Abertura da sessão - Ás nove horas da noite.

Presentes á chamada, 41 srs. deputados. São os seguintes: - Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Cesar de Oliveira, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio de Menezes e Vasconcellos, Antonio Tavares Festas, Arnaldo Novaes Guedes Rebello, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Augusto Cesar Claro da Ricca, Bernardo Homem Machado, Carlos Augusto Ferreira, Conde da Serra de Tourega, Eusebio David Nunes da Silva, Francisco de Almeida e Brito, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José Machado, Francisco Manuel de Almeida, Francisco Silveira Vianna, Jeronymo Barbosa de Abreu Lima Vieira, João Joaquim Izidro dos Reis, João de Mello Pereira Sampaio, João Monteiro Vieira de Castro, João Pinto Rodrigues dos Santos, Joaquim Augusto Ferreira da Fonseca, Joaquim Heliodoro Veiga, José Alberto da Costa Fortuna Rosado, José Bento Ferreira de Almeida, José da Cruz Caldeira, José da Fonseca Abreu Castello Branco, José Joaquim da Silva Amado, José Malheiro Reymão, José Maria de Oliveira Matos, Libanio Antonio Fialho Gomes, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Pinto de Almeida, Manuel Telles de Vasconcellos, Martinho Augusto da Cruz Tenreiro e Visconde da Ribeira Brava.

Entraram durante a sessão os srs.: - Alvaro de Castellões, Antonio Teixeira de Sousa, Francisco Xavier Cabral de Oliveira Moncada, Jacinto Simões Ferreira da Cunha, José Adolpho de Mello e Sousa, José Estevão de Moraes Sarmento, José Gonçalves Pereira dos Santos, Luciano Affonso da Silva Monteiro e Manuel Antonio Moreira Junior.

Não compareceram á sessão os srs.: - Abel da Silva, Adolpho Alves de Oliveira Guimarães, Adriano Anthero de Sousa Pinto, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Alfredo Carlos Le-Cocq, Anselmo de Andrade, Antonio Carneiro de Oliveira Pacheco, Antonio Maximo Lopes de Carvalho, Antonio Simões dos Reis, Arthur Alberto de Camões Henriques, Augusto José da Cunha, Carlos José de Oliveira, Conde de Burnay, Conde de Idanha a Nova, Conde de Paço Vieira, Conde de Silves, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Barbosa do Couto Cunha Sotto Maior, Francisco Fartado de Mello, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Francisco Pessanha Vilhegas do Casal, Frederico Alexandrino Garcia Ramires, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Pereira de Carvalho de Abreu, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique da Cunha Matos de Mendia, Jacinto Candido da Silva, Jeronymo Barbosa Pereira Cabral Abreu e Lima, João Abel da Silva Fonseca, João Antonio de Sepulveda, João Baptista Ribeiro Coelho João Catanho de Menezes, João Ferreira Franco Pinto Castello Branco, João Lobo de Santiago Gouveia, João Pereira Teixeira de Vasconcellos, Joaquim José Pimenta Tello, Joaquim Ornellas de Matos, Joaquim Paes de Abranches, Joaquim Saraiva de Oliveira Baptista, Joaquim Simões Ferreira, José de Abreu do Couto Amorim Novaes, José Alves Pimenta de Avellar Machado, José Benedicto de Almeida Pessanha, José Capello Franco Frazão, José Dias Ferreira, José Eduardo Simões Baião, José Gil de Borja Macedo e Menezes (D.), José Gregorio de Figueiredo Mascarenhas, José Luiz Ferreira Freire, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, José Maria Barbosa de Magalhães, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, Leopoldo José de Oliveira Mourão, Luiz Cypriano Coelho de Magalhães, Luiz José Dias, Luiz Osorio da Cunha Pereira de Castro, Marianno Cyrillo de Carvalho, Sebastião de Sousa Dantas Baracho, Sertorio do Monte Pereira e Visconde de Melicio.

Leu-se a acta.

O sr. Ferreira de Almeida (sobre a acta): - Sr. presidente, creio que a acta costuma ser a expressão do que actualmente consta dos summarios da sessão, os quaes, não sei por que infelicidade, andam de tal maneira transtornados, que não posso deixar de chamar a attencão de v. exa. para esse facto, tanto mais que o erro a que me vou referir com um pouco de attencão era facil de ver.

Assim, diz:

«O sr. Ferreira de Almeida:

Declara em seguida que, ao contrario do que affirmou s. exa., não é adversario do limite de idade; tanto assim que o propoz para o ministerio da marinha, onde elle não existe.»

Ora, sr. presidente, o que eu disse é que tinha proposto o limite de idade para o ministerio da justiça e do proprio summario se vê que devia ser isso, porquanto o ultimo paragrapho diz:

«Faz algumas considerações tendentes a justificar esta

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opinião, e termina affirmando ter sido o sr. Emygdio Navarro quem estabeleceu o limite de idade nas commissões militares das obras publicas, e o sr. Arroyo em relação á marinha.»

Ora, se o ultimo periodo diz que o sr. Arroyo estabeleceu o limite de idade para a marinha, quem fez o summario, não devia dizer que eu é que o tinha proposto.

Isto é realmente extraordinario, e prova, como as sessões nocturnas são perniciosas, pelo menos para mim, porque os summarios dos outros discursos não estão mal.

Portanto, se a acta que não ouvi ler está como o summario...

O sr. Presidente: - A acta é redigida por outra fórma.

O Orador: - Pedi a palavra sobre a acta, por me constar que costuma ser equivalente ao summario, e a acta com uma tal inexactidão não prova bem.

V. exa. tem a bondade de mandar ler na mesa a parte da acta que me diz respeito?

O sr. Presidente: - Na acta ha apenas a indicação dos nomes.

Leu-se na mesa a parte da acta que se refere a este ponto.

O Orador: - Chamo a attenção de quem é encarregado do summario para a correcção a fazer, porque realmente é deploravel similhante erro.

(S. exa. não reviu.)

Foi approvada a acta.

EXPEDIENTE

Officios

Do ministerio da guerra, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Abel da Silva, o mappa estatistico das praças expedicionarias de Africa e India, fallecidas durante a reserva e nos hospitaes do continente e ultramar.

Á secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo o mappa referente ao recrutamento de 1895, completando assim os esclarecimentos requeridos pelo sr. deputado Moraes Sarmento em sessão de 20 de janeiro ultimo.

Á secretaria.

Do mesmo ministerio, remettendo, em satisfação ao requerimento do sr. deputado Sebastião Baracho, a relação dos solipedes existentes nos regimentos de engenheria, artilheria de campanha e de montanha, cavallaria, escolas praticas das mesmas armas e deposito de remonta e 3.ª companhia da administração militar, referida a 28 de fevereiro findo.

Á secretaria.

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - A lei de 12 de setembro de 1887 em vigor antes da publicação da de 13 de maio de 1896 que é a actual estabelecia no n.º 10.° do artigo 41.° que são dispensados do serviço activo do exercito e da armada. Os clerigos de ordens sacras e os que tiverem completado e os que tiverem completado qualquer dos cursos superiores da universidade de Coimbra, da escola polytechnica de Lisboa, da academia polytechnica do Porto, das escolas medico-cirurgicas de Lisboa, Porto e Funchal, do instituto geral de agricultura, do instituto industrial e commercial de Lisboa, do instituto industrial do Porto. A actual lei no seu artigo 6.° apenas dispensa do serviço activo os clerigos de ordens sacras, a fim de que maior numero de mancebos fossem obrigados a entrar no recrutamento do exercito e da armada.

N'esta conformidade os alumnos matriculados depois da publicação de actual lei sabiam que, no caso de serem recrutados, ou se haviam de remir para exercerem a carreira, cuja habilitação lhes dava o curso que frequentavam, ou teriam de desistir d'essa carreira para servirem no exercito ou na armada.

Os estudantes, porém, matriculados antes da publicação da actual lei, começaram, pelo contrario, os seus cursos sabendo, que logo que os concluissem, ficaram isentos do serviço activo do exercito e da armada e apenas sujeitos ao serviço da segunda reserva o que não os impossibilitavam de exercer a carreira para que os habilitavam o respectivo curso.

Da mesma sorte a lei faculta a estes a remissão, mas é isso um onus, com que não contavam e para muitos uma violencia depois de tantos sacrificios feitos por suas familias para lhes dar uma carreira.

Os alumnos matriculados antes de 1896 e a quem podem aproveitar as disposições da lei de 1887 devem estar hoje no penultimo ou ultimo anno do seu curso e por isso deve ser o seu numero muito limitado, reduzido ainda pelos que se dedicam a uma carreira limitada, sendo, portanto, de muito pouca importancia a reducção no numero dos recrutados.

A applicação da lei de 13 de maio de 1896 a individuos que estavam matriculados antes d'esta data, e que por isso gosaram das vantagens que lhes dava a lei anterior de 12 de setembro de 1887 não é justa, pois nenhuma lei deve ter effeito retroactivo e por isso e sem prejuizo deve ser estabelecido um periodo transitorio.

Por todos estes motivos sujeitamos á consideração da camara o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Ao artigo 6.º da lei de 13 de maio de 1896 é addicionado um n.º 4.º, pela seguinte fórma:

4.º Os alumnos matriculados antes de 1896, em qualquer dos cursos superiores da universidade de Coimbra, escola polytechnica de Lisboa, da academia polytechnica do Porto, das escolas medico-cirurgicas de Lisboa, Porto, Funchal, do instituto geral de agricultura, do instituto industrial e commercial de Lisboa e do instituto industrial do Porto, que mostrem terem concluido o seu respectivo curso.

§ unico. Os individuos dispensados por esta fórma do serviço activo ficam obrigados ao serviço da segunda reserva por doze annos, a contar da data da conclusão dos cursos, se antes não tiverem prestado algum serviço no exercito ou na armada, cujo tempo lhes será descontado n'aquelle periodo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario. = Joaquim Tello.

Foi enviado ás commissões de recrutamento e de guerra.

O sr. Lourenço Cayolla: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Em nome da commissão do ultramar proponho, que sejam aggregados á mesma commissão os deputados Libanio Fialho Gomes e Anselmo de Andrade. = Lourenço Cayolla = J. Barbosa.

Dispensado o regimento, foi em seguida approvado.

O sr. Arnaldo Novaes (por parte da commissão do ultramar): - Mando para a mesa o parecer sobre a proposta de lei n.° 26-A, que se refere á amarração do cabo submarino em Novo Redondo.

Foi a imprimir.

O sr. Izidro dos Reis: - Mando para a mesa uma representação da camara municipal do concelho da Barquinha e dos habitantes da povoação do Entroncamento, concelho de Torres Novas, pedindo que esta povoação seja annexada ao concelho da Barquinha.

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Mando igualmente para a mesa o seguinte projecto de lei.

(Leu.)

Peço a v. exa. para que a representação seja impressa conjunctamente com o parecer que a commissão respectiva ha de dar sobre o projecto.

O projecto ficou para segunda leitura.

A representação vae por extracto no fim da sessão.

O sr. Mazziotti: - Pedi a palavra para participar á camara que vou mandar deitar na caixa de petições um requerimento do sr. Antonio Domingos, para o qual chamo a attenção da illustre commissão de fazenda.

Não o leio por ser muito extenso.

O sr. Ferreira da Fonseca: - Pedi a palavra para communicar á camara que vou lançar na caixa de petições um requerimento, de interesse particular, pedindo a sobrevivencia de uma pensão por distincção de serviços prestados á causa da liberdade.

Parece-me de justiça que seja satisfeito o que se pede n'este requerimento, e por isso espero que a respectiva commissão o tome na devida consideração.

O sr. Jeronymo Barbosa: - Em nome da commissão do ultramar mando para a mesa um parecer sobre a proposta de lei n.° 9-E, que torna applicaveis ás provincias ultramarinas, na parte exequivel, o codigo de justiça militar de 1896.

Mando tambem para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que entre desde já em discussão o projecto relativo á concessão do caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira, que está dado para ordem do dia. = J. Barbosa.

Foi approvado.

O parecer foi a imprimir.

Leu se na mesa o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 26

Senhores. - As vossas commissões de obras publicas e fazenda foi presente a proposta de lei que auctorisa o governo a tornar definitiva a concessão provisoria feita a Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral, da construcção e exploração de um caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira, nos termos do decreto de 1 de abril de 1897, e das clausulas e condições ao mesmo annexas; bem como lhes foi presente a petição que os referidos concessionários enviaram a esta camara, em 7 de março do corrente anno, e na qual pedem, para completa realisação de tão util emprehendimento, até agora prejudicado por factos de ordem economica que têem desviado os capitães estrangeiros de todas as emprezas nacionaes:

1.° Que o praso de isenção de impostos, que lhe" foi concedido, seja prorogado por mais onze annos;

2.° Que a redacção da clausula 48.ª do decreto da concessão seja aclarada, de forma que no direito de opção, ali estabelecido, fiquem expressamente comprehendidas as concessões relativas a caminhos de ferro convergentes a pontos servidos pela linha dos concessionários dentro da zona kilometrica ali determinada;

3.° Que seja também permittida aos supplicantes a exploração da linha por meio de tracção eléctrica, se for possível e conveniente.

Reconhecem as vossas commissões de obras publicas e fazenda quanta dificuldade ha, na actual conjunctura, em obter capitães para uma empreza d'esta natureza, sem garantia de juro ou subvenção alguma, e por isso lhes parece justo que o praso da isenção dos impostos seja elevado de vinte e quatro a trinta e cinco annos, do que não resultará prejuízo algum para o thesouro publico, visto que o, isenção é restricta a impostos que incidem sobre, bases que não existiriam sem a construcção d'aquelle caminho de ferro.

Entendem tambem as vossas commissões que no direito de opção estabelecido na clausula 48.ª da concessão provisoria devem ficar expressamente comprehendidas as concessões relativas a caminhos de ferro convergentes a pontos servidos pela linha dos concessionarios, dentro da zona kilometrica ali determinada, por ser esse o espirito do decreto da concessão; e de parecer são ainda que seja permittida aos concessionários a exploração da linha por tracção electrica, se ella for possivel e o governo a julgar conveniente.

São estas as alterações pedidas, com as quaes as vossas commissões se conformam, na esperança de que ellas resolvam todas as difficuldades que até hoje se têem opposto á realisação de tão importante melhoramento, o qual satisfará a uma das maiores necessidades do norte do paiz; e por isso vos recommendam que approveis o seguinte projecto de lei, com o qual o governo está de accordo.

Projecto de lei

Artigo 1.° É o governo auctorisado a tornar definitiva a concessão provisoria feita a Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral, para a construcção e exploração de um caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira, nos termos do decreto de 1 de abril de 1897 e das clausulas e condições ao mesmo annexas.

Art. 2.° É elevado a trinta e cinco annos o praso da isenção de impostos, a que se refere o n.° 2.° da clausula 44.ª das referidas clausulas e condições.

Art. 3.° É concedido aos concessionários o direito de opção na construcção e exploração de todas as linhas convergentes a pontos situados dentro das zonas lateraes de 30 kilometros referidas na clausula 48.ª

Art. 4.° É permittida aos concessionários a exploração da linha por meio de tracção electrica, precedendo auctorisação dada pelo governo.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões das commissões reunidas de obras publicas e fazenda, em 30 de março de 1898. = Elvino de Brito = Frederico Ramires = Alvaro de Castellões = João Pinto dos Santos = Luiz José Dias = Francisco Ravasco = Henrique de Carvalho Kendall = Leopoldo Mourão = José Maria de Oliveira Mattos = Augusto Ricca = José M. de Alpoim = Antonio Eduardo Villaça = J. A. Correia de Barros = José Frederico Laranjo = Jeronymo Barbosa de Abreu e Lima Vieira, relator.

N.° 26-B

Senhores. - Tendo Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral pedido a concessão de um caminho de ferro de via reduzida, com tracção a vapor, para passageiros e mercadorias, a partir da estação da Régua no caminho de ferro do Douro e seguindo por Villa Real, Villa Pouca de Aguiar proximidades das Pedras Salgadas, Vidago e Chaves até á fronteira, sem encargos directos para o estado, pois não pediam garantia de juro para o capital empregado, nem subsidio para a construcção, entendeu o governo, ouvidas as estações competentes, dever fazer essa concessão nos termos do decreto de 1 de abril do corrente anno.

Como vereis, essa concessão tem o caracter provisorio visto que nas suas condições, annexas ao referido decreto, se dão regalias que só podem ter valor legal quando sanccionadas pelo poder legislativo.

Consistem ellas principalmente na isenção de pagamento de alguns impostos e contribuições durante prasos determinados e que incidem sobre bases que não existiriam sem a construcção do referido caminho de ferro.

Se em qualquer epocha seria de conveniencia publica obter a construcção de um caminho de ferro n'estas van-

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tajosas condições; na presente conjunctura, em que a falta de trabalho é geral no paiz, e os capitães se retrahem e fogem de emprehendimentos d'esta ordem, afigura-se ao governo que não se deve deixar de prestar todo o auxilio possivel a quem se propõe construir um caminho de ferro que irá servir uma provincia por ora tão pouco dotada d'este poderoso meio de desenvolvimento agrícola e commercial, não exigindo do estado o mínimo encargo orçamental.

O acrescimo de trafego que á linha do Douro deverá, trazer o caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira justifica a concessão de uma tarifa especial de transporte aquella linha do estado, para todos os materiaes necessarios para a construcção e exploração do novo caminho de ferro.

Como vereis, senhores, pelo exame das condições annexas ao decreto de concessão provisoria, os preceitos n'ellas estabelecidos pouco differem dos existentes em concessões analogas, e as diferenças que ha são facilmente justificaveis.

E por isso temos a honra de submetter á vossa esclarecida apreciação a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.° É o governo auctorisado a tornar definitiva a concessão provisoria feita a Alberto da Cunha Leal e Antonio Julio Pereira Cabral da construcção e exploração de um caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira, nos termos do decreto de 1 de abril do corrente anno das clausulas e condições ao mesmo annexas.

Art. 2.° É na parte que lhe diz respeito revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, em 22 de julho de 1897. = José Luciano de Castro = Frederico Ressano Garcia = Augusto José da Cunha.

Tendo-me sido pedida por Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral a concessão de um caminho de ferro de via reduzida, com tracção a vapor, para passageiros e mercadorias, a partir da estação da Régua no caminho de ferro do Douro e seguindo por Villa Real, Villa Pouca de Aguiar, proximidades das Pedras Salgadas, Vidago e Chaves até á fronteira;

Considerando as grandes vantagens publicas que resultam da construcção d'este caminho de ferro, e attendendo ás considerações expostas pelo conselho superior de obras publicas e minas, em sua consulta de 22 de março findo;

Mas visto que se pede a isenção de impostos:

Hei por bem conceder provisoriamente aos referidos Alberto da Cunha Leão e António Júlio Pereira Cabral, ou á companhia que primeiro organisarem, a auctorisação que solicitam para construir e explorar por noventa e nove annos a mencionada linha férrea nas condições annexas ao presente decreto, e que baixam assignadas pelo ministro e secretario d'estado dos negócios das obras publicas, commercio e industria, devendo esta concessão tornar-se definitiva:

a) Depois de approvada pelo poder legislativo;

b) No caso dos concessionarios, dentro do praso de seis mezes, declararem que acceitam as alterações que o poder legislativo queira introduzir nas clausulas e condições da concessão;

c) No caso de desistencia dentro de um anno, a contar d'esta data, por parte dos concessionarios, das garantias concedidas pelas clausulas n.ºs 44.° e 45.°

O presidente do conselho de ministros, e ministro e secretario d'estado dos negocios do reino, e os ministros e secretarios d'estado dos negócios da fazenda e das obras publicas, commercio e industria, assim o tenham entendido e façam executar. Paço, em 1 de abril de 1897. = REI. = José Luciano de Castro = Augusto José da Cunha = Frederico Ressano Garcia.

Está conforme. - Segunda repartição da direcção dos serviços de obras publicas, em 20 de julho de 1897. = Pelo chefe da repartição, Joaquim F. de Poças Leitão.

Clausulas e condições annexas ao decreto d'esta data, de concessão provisoria a Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral da construcção e exploração de um caminho de ferro da Regua a Chaves e á fronteira

1.ª

A empreza effectuará á sua custa, e por sua conta e risco, sem subsidio do estado, nem garantia de juro do capital empregado, pelo modo e nos prasos abaixo estipulados:

1.° Os estudos e a construcção do dito caminho de ferro com todas as suas dependencias a partir da estação da Régua no caminho de ferro do Douro e seguindo por Villa Real, Villa Pouca, proximidades das Pedras Salgadas, Vidago e Chaves ato á fronteira, assente em leito proprio ou na berma das estradas que com auctorisação do governo possa utilisar, sendo o dito caminho de ferro completo em todas as suas partes, com todas as expropriações, indemnisações a proprietarios, aterros e desaterros, obras de arte, assentamento de vias, estações e officinas de pequena e grande, eparação e todos os edifícios accessorios, casas de guarda rpassagens de nivel, muros de sustentação, muros de vedação ou sebes para separar a via ferrea das propriedades contíguas e em geral as obras de construcções previstas ou imprevistas, sem excepção ou distincção que forem necessarias para o completo acabamento d'este caminho de ferro.

§ unico. A palavra "empreza" significa sempre os concessionarios primitivos ou a primeira sociedade que por elles for organisada em conformidade das leis e da auctorisação que lhes for concedida.

2.° O fornecimento, conservação e reparação do material circulante, machinas e utensilios para as officinas, plataformas giratórias, reservatorios e apparelhos hydraulicos, guindastes, signaes e em geral todo o material fixo e circulante, designado ou não designado, que for necessário para manter o caminho de ferro em perfeito estado de exploração.

3.° O estabelecimento de. uma linha telegraphica ou telephonica ao lado do caminho de ferro em toda a sua extensão e a conservação e a renovação dos materiaes e apparelhos que forem precisos para a conservar em bom estado de serviço.

4.° A collocação de marcos kilometricos depois de terminada a linha e o levantamento de cadastro do caminho de ferro, com a descripção de todas as obras de arte e mais dependencias.

2.ª

Os projectos a apresentar comprehenderão planta geral de traçado (escala 1 por 5:000), perfil longitudinal (escalas 1 para 5:000 para os cumprimentos e 1 para 500 para as alturas), perfis transversaes (escala 1 para 200), plantas parcellares (escala 1 para 1:000), perfil typo da via (escala 1 para 50), dimensão è espaçamento das travessas (escala 1 para 100), typo dos carris (escala 1 para 50), plantas e alçados de todas as obras, apparelhos e machinas necessarias para a construcção e exploração da linha (escala 1 para 50 para os comprimentos totaes inferiores a 10 metros e 1 para 100 ou 1 para 200 quando esses comprimentos sejam comprehendidos entre 10 e 100 metros ou superior a 100 metros). Os desenhos serão acompanhados lê uma memoria descriptiva e justificativa das diversas peças do projecto incluindo as machinas, carruagens para passageiros e wagons a empregar na exploração da linha.

§ unico. A empreza se lhe convier poderá utilisar os estudos que estejam, feitos por conta do governo.

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3.ª

A empresa apresentará sempre os projectos em duplicado, sendo-lhe depois de approvado entregue um dos exemplares devidamente authenticado na direcção dos serviços de obras publicas.

4.ª

Qualquer mudança que no acto da construcção se julgue necessaria ou conveniente introduzir no projecto, será sujeita pela empreza á approvação do governo.

5.ª

Nenhum trabalho poderá ser indicado sem que os respectivos projectos tenham sido approvados pelo governo.

6.ª

A largura da via será de 1 metro entre as faces internas dos carris; a do caminho ao nivel da plataforma e dos Carris, a maxima inclinação dos traineis, o minimo raio das curvas, as dimensões das fossas e a inclinação dos taludes, quer em aterro, que em escavação serão indicados e devidamente Justificados pela empreza na memoria descriptiva e justificativa do projecto da linha, dependendo a sua adopção de approvação do governo, mediante parecer ao conselho superior de obras publicas e minas.

7.ª

A linha ferrea será construida com o leito e obras de arte para uma só via, á excepção das estações, em que haverá as necessarias vias de resguardo e as de serviço. A entre via, ou distancia entre duas vias, será, pelo menos, de 2 metros entre as faces, externas dos carris.

8.ª

As terras para a formação dos aterros, serão sempre extrahidas de maneira que se evite sr estagnação das aguas, prejudicial á saude publica.

9.ª

Todos os aqueductos, pontes e viaductos serão construidos de pedra, ou ferro, ou tijolo. Só poderão empregar-se outros materiaes em casos particulares, precedendo approvação do governo.

10.ª

As estações serão feitas de pedra ou tijolo. O seu numero e situação serão indicados no projecto.

§ unico. O governo a pedido da empreza, ou dos povos interessados, sendo aquella ouvida, poderá auctorisar o estabelecimento de estações provisorias ou apeadeiros nos pontos em que a sua conveniencia não esteja bem definida, e a sua suppressão quando se mostre que os seus resultados não são convenientes para a exploração. Quando, porém, a pratica de dois annos indicar que devem subsistir será a empreza obrigada a completar a sua construcção definitiva.

11.ª

Os carris e outros elementos constitutivos da via ferrea devem ser de boa qualidade e dos melhores modelos, proprios a preencher o fim ao seu destino.

Os carris a empregar serão de aço e o seu peso não poderá ser inferior a 20 kilogrammas por metro corrente; Beirão fixados pelo sistema, mais conveniente; segundo os ultimos aperfeiçoamentos é com previa approvação do governo.

12.ª

As travessas a empregar na linha, sendo de madeira, serão creosotadas; sendo metallicas, deverão ser de boa qualidade e dos melhores modelos já experimentados.

13.ª

As machinas locomotivas serão construidas segundo os memores modelos conhecidos e satisfarão a todas ás condições actualmente prescriptas, ou às que de futuro o forem, para pôr em circulação as mesmas machinas. As carruagens dos viajantes deverão ser igualmente dos melhores modelos, suspensas sobre molas e guarnecidas de assentos. Havel-as-ha de duas classes, pelo menos, todas serão cobertas, fechadas com vidraças e resguardadas com cortinas. As carruagens deverão preencher todas, alem do que fica dito, as condições prescriptas pelo governo, no interesse da segurança publica. Os wagons de mercadorias, e gado, as plataformas e restante, material será tudo de boa qualidade e solida construcção.

14.ª

O caminho será fechado por meio de muro, sebes vivas, ou grades de madeira que o separem das propriedades contiguas, com barreiras de serventia, não abrindo para dentro.

§ unico. A vedação poderá ser dispensada nos pontos em que o governo, a pedido da empreza, e ouvida a fiscalisação, entenda que ella é desnecessaria para a segurança do publico e da exporação.

15.ª

A empreza construirá de pedra, gesso ou tijolo os viaductos, pontes, pontões, aqueductos e canos de rega e as passagens superiores, inferiores e de nivel em numero sufficiente e com as dimensões que exigir a sua estabilidade e segurança, o volume das aguas, a largura do caminho de ferro, e a das estradas ordinarias ou caminho a que alguma d'essas obras devem dar passagem.

16.ª

Os cruzamentos da linha ferrea com as estradas de macadam ou caminhos municipaes vicinaes poderão ser de nivel, excepto nos casos em que nos projectos forem designadas passagens superiores ou inferiores.

Nos cruzamentos ou passagens do nivel em que a circulação de vehiculos for consideravel, ou em quaesquer outros que o governo, ouvida á fiscalisação, julgar necessario para a segurança publica, será obrigada a empreza a estabelecer barreiras, conforme os typos approvados pelo governo, havendo em cada uma um guarda encarregado d'este serviço. O angulo formado: pelo eixo da via ferrea com o da estrada ou caminho atravessado não poderá ser inferior á 30 graus.

17.ª

Quando o caminho de ferro passar sobre alguma estrada, ou caminho publico, a abertura do viaducto será fixada pelo governo, em vista das circumstancias locaes, sem que em caso algum possa ser inferior a 4 metros. Quando o viaducto for em arco, a distancia entre o pavimento da estrada ou caminho e o fecho do arco não será inferior a 5 metros. Se o viaducto for de vigas rectas, esta distancia poderá reduzir-se a 4m,30.

18.ª

Quando o caminho de ferro passar por baixo de uma estrada ou caminho, a largura entre os parapeitos da ponte ou viaducto será fixada pelo governo, em vista das circumstancias locaes, sem que possa ser inferior a 4 metros. Quando o viaducto for em arco, a distancia entre a face superior do carril e a abobada não será inferior a 4m,30. Se o viaducto for de vigas rectas, o minimo da distancia no eixo do caminho de ferro será de 4m,30.

19.ª

Se houver a desviar o traçado de qualquer estrada existente, os declives do novo traçado não poderão exceder os que existiam na estrada ou caminho que for substituido.

O governo, sob proposta da empreza, poderá alterar esta regra.

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20.ª

A largura dos subterraneos será, pelo menos, de 4 metros. A distancia vertical entre o intradorso e a parte superior dos carris não será inferior a 4m,30, nem a altura do fecho da abobada ao plano tangente á superficie superior dos carris não será inferior a 5 metros.

21.ª

Nos pontos de encontro das estradas ordinarias com a via ferrea, durante a feitura d'esta, a empreza construirá as precisas obras provisorias para que a circulação não seja interrompida.

22.ª

A empreza restabelecerá e assegurará á sua custa o curso das aguas, que se tenha suspendido ou modificado em consequencia das obras do caminho de ferro, ou indemnisar o proprietario segundo as leis que lhe forem applicaveis.

23.ª

As acquisições que a empreza tiver que fazer, de terrenos para as obras da linha e suas dependencias, serão reguladas amigavel ou judicialmente, pelas leis em vigor de expropriação por utilidade publica.

24.ª

Quaesquer indemnisações devidas por prejuizos resultantes de trabalhos ou de exploração ficam da cargo da empreza.

25.º

A linha ferrea deverá ser dividida nas seguintes secções ou troços:

1.ª Da estação da Regua do caminho de ferro do Douro a Villa Real;

2.ª De Villa Real a Chaves;

3.ª De Chaves á fronteira.

Os prasos para a apresentação dos projectos serão a contar da data do alvará de concessão de seis mezes para a primeira secção e tres annos para a segunda, a contar da data da communicação do ponto de ligação na fronteira, escolhido por accordo entre os governos portuguez e hespanhol, de seis mezes para a terceira secção. Os trabalhos de construcção devem começar no praso de sessenta dias a contar da data do Diario do governo em que for publicada a portaria de approvação do projecto de cada secção, devendo estar concluidos no fim de tres annos a primeira creação, no fim de cinco a segunda e no fim de dois a terceira secção, contados tambem das datas de publicação das portarias de approvação dos projectos.

§ unico. A construcção da terceira secção poderá ser adiada até que em Hespanha se proceda á construcção da linha que com este caminho de ferro venha a ligar.

26.ª

A linha poderá ser aberta á exploração por troços successivos, sendo o primeiro troço correspondente á primeira secção. Não poderá porém ter lagar senão com a auctorisação do governo e depois de examinadas por uma commissão de engenheiros.

27.ª

O governo fará fiscalisar por agentes seus e pela fórma que se estabeleça, os estudos, construcção e exploração do caminho de ferro.

28.ª

A empreza sujeitará á approvação do governo as tarifas de passageiros e mercadorias, assim como o regulamento para o serviço de exploração, não podendo fazer-lhos alteração alguma sem nova approvação.

§ unico. No caso de desaccordo vigorarão os preços das tarifas geraes applicadas nas linhas do Minho e Douro.

29.ª

As alterações nas tarifas depois de approvadas pelo governo serão annunciadas, pelo menos com oito dias de antecipação.

§ unico. Todas as fixações ou modificações de horarios ou de condições de serviço, deverão ser approvadas pelo governo, antes de serem annunciadas ao publico, pela imprensa, nas estações ou por qualquer outra fórma.

30.ª

A empreza fica obrigada a prestar ao governo os serviços seguintes:

1.ª Transporte em compartimento de 2.ª classe de qualquer comboio de passageiros que a direcção dos serviços telegrapho-postaes designar, das malas de correspondencia publica e dos seus conductores;

2.ª Transporte de material dos correios e telegraphos;

3.ª Transporte dos empregados da direcção dos serviços das obras publicas, que tiverem a seu cargo a inspecção e fiscalisação de construcção e exploração do caminho de ferro, e dos funccionarios do ministerio das obras publicas que o respectivo ministro designar;

4.ª Licença para a collocação das linhas telegraphicas e telephonicas do governo nos postes ou apoios das linhas telegraphicas ou telephonicas dos caminhos de ferro.

31.ª

Os militares ou marinheiros em serviço, viajando em corpo ou isoladamente, pagarão apenas, por si e suas bagagens, metade dos preços estipulados nas tarifas respectivas;

32.ª

A empreza fica obrigada a pôr á disposição do governo por metade dos preços das tarifas geraes, todos os meios de transportes estabelecidos para a exploração do caminho de ferro, quando elle precisar conduzir tropas ou material de guerra.

33.ª

A empreza fica sujeita:

1.ª Aos regulamentos actuaes e aos que o governo publicar para o serviço telegrapho-postal;

2.° Ás leis e regulamentos sanitarios em vigor, tanto no que respeita á execução e conservação das obras, como ao estado das officinas, estações e dependencias da linha ferrea.

34.ª

A empreza fica sujeita às leis e regulamentos vigentes, ou que de futuro se promulgarem sobre viação publica, e especificadamente sobre a fiscalisação de construcção exe ploração de caminhos de ferro.

35.ª

A empreza deverá conservar, durante todo o praso da concessão, a linha ferrea e suas dependencias com todo o material fixo e circulante, em bom estado de serviço, e no mesmo estado deverá entregar tudo ao governo, findo aquelle praso, fazendo sempre para esse fim á sua custa todas as reparações, tanto ordinarias como extraordinarias.

§ unico. Se, porém, durante o mesmo praso for destruida ou damnificada alguma parte do caminho de ferro, por motivo de guerra, sem culpa da empreza, o governo a indemnisará, pagando-lhe o valor das reparações, depois de avaliadas, em dinheiro ou em titulos de divida publica pelo seu valor no mercado.

36.ª

Logo que tenha expirado o praso da concessão, a empreza entregará ao governo, em bom estado de exploração, o caminho de ferro com todo o seu material fixo e seus edificios e dependencias de qualquer natureza que sejam, sem que para isso tenha direito a receber d'elle

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indemnisação alguma. Tambem lhe entregará todo o material circulante; mas tanto o valor d´este como o do carvão de pedra e de outros quaesquer provimentos que entregar ao governo ser-lhe-hão pagos segundo a avaliação de louvados.

37.ª

Em qualquer epocha, depois de decorridos trinta e cinco annos da data da concessão, terá o governo a faculdade de resgatar a concessão inteira. Esse resgate consistirá no pagamento de uma annuidade, durante os annos ainda não decorridos de concessão, que será determinada, tomando o rendimento liquido obtido pela empreza durante os sete annos que tiverem precedido aquelle em que a concessão deve effectuar-se, deduzindo os dois annos de menor rendimento, e achando a media dos cinco restantes. Essa annuidade, porém, nunca poderá ser inferior á que for necessaria para amortisar no praso de setenta e cinco annos, e á taxa de 5 por cento, o capital effectivo despendido na construcção, o qual nunca se poderá considerar superior ao total, dos orçamentos dos projectos approvados pelo governo.

38.ª

O uso da linha telegraphica ou telephonica será permittido gratuitamente para os despachos officiaes, e aos particulares mediante uma tabella estabelecida pela empreza de accordo com o governo.

39.ª

Os concessionarios primitivos Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral, ou a companhia primeiro por elles organisada, não poderão transferir para outra pessoa ou companhia, sem consentimento do governo, os direitos que lhes são conferidos por esta concessão.

40.ª

A empreza, seus agentes, empregados e operarios ficacarão sujeitos, em tudo que disser respeito á construcção e exploração, às leis e regulamentos de Portugal.

41.ª

O caminho de ferro, seu material fixo e circulante e o da linha telegraphica ou telephonica, servirão de garantia para o estado da execução das presentes condições.

42.ª

A empreza prestará aos agentes do governo todos os esclarecimentos precisos para elles poderem formular a estatistica da linha e a conta do capital despendido na construcção.

43.ª

Todas as questões que se suscitarem entre o governo e a empreza sobre a execução e interpretação das clausulas d'este contrato serão decididas por arbitros, dos quaes dois serão nomeados pelo governo e dois pela empreza. Para prevenir o caso de empate sobre o objecto em questão, será um quinto arbitro nomeado a aprazimento de ambas as partes. Faltando accordo para esta nomeação será ella deferida ao supremo tribunal de justiça.

44.ª

Concede o governo á empreza:

1.° Isenção, durante o periodo da concessão, de qualquer imposto especial sobre o caminho de ferro:

2.° Isenção de qualquer contribuição geral, districtal, municipal ou parochial nos primeiros vinte e quatro annos da concessão, incluindo-se n'esta isenção a contribuição industrial sobre os vencimentos de pessoal empregado na construcção e exploração do caminho de ferro;

3.° Isenção do pagamento de direitos de importação para todos os materiaes destinados á construcção da linha e para o carvão, machinas e carruagens que forem importados para o serviço da exploração durante os dois primeiros annos de aberta á circulação e cada uma das secções;

4.° Transporte no caminho de ferro do Douro para todo o material necessario á construcção e exploração da linha por uma tarifa especial, cuja base seja 8 réis por tonelada e kilometro.

45.ª

O governo não cobrará o imposto de transito emquanto o caminho de ferro não estiver aberto á exploração até Chaves, e só então será esse imposto acrescentado aos preços que vigoraram para o transporte de passageiros e mercadorias, ficando a empreza obrigada á cobrança d'esse imposto nas condições que estiverem em vigor nas demais linhas ferreas do paiz.

46.ª

A estação da Regua, no caminho de ferro do Douro, ficará commum ao serviço de exploração das duas linhas a em condições identicas às estabelecidas para a estação de Foz Tua, não lhe sendo exigida indemnisação alguma pelo uso da estação da Regua, plataforma e mais dependencias do caminho de ferro do Douro. A empreza fica, porém, obrigada ao pagamento de todas as despezas que resultarem das ampliações ou modificações a fazer na linha do Douro, estação da Regua e mais dependencias, e que forem indispensaveis para a boa exploração das duas linhas.

47.ª

Concede mais o governo á mesma empreza a faculdade de construir todos os ramaes que possam alimentar a circulação da linha ferrea a que se referem estas condições, precedendo o respectivo contrato com o governo, e sem que este lhe dê qualquer subsidio ou garantia differente das concedidas por este contrato.

48.ª

Quando, porém, o governo julgar necessario construir algum d'esses ramaes ou fazer novas concessões de cominhos de ferro nos districtos atravessados pela linha que faz objecto d'este contrato, ou esses caminhos sejam parallelos á mesma linha e a menos de 30 kilometros ou a atravessem ou n'ella venham entroncar, a empreza não póde, por pretexto algum, impedir os trabalhos precisos para o estabelecimento das mesmas linhas, nem tem direito a indemnisação alguma,, sendo-lhe, comtudo, reservado o direito de construir os ramaes nos termos da condição anterior, ou de optar pelas concessões que porventura se façam.

49.ª

A concessão caducará:

1.° Quando sejam excedidos os prasos da condição 25.ª;

2.° Se não começar a exploração dentro no praso de um mez, depois de auctorisada pelo governo;

3.° Se iniciada a exploração, a empreza a interromper por espaço superior a um mez;

4.° Se a empreza não cumprir as outras condições a a que fica obrigada.

50.ª

Nos casos previstos na clausula antecedente, o governo porá em hasta publica e adjudicará, a quem mais offerecer, a exploração do caminho de ferro pelo espaço de tempo que restar da presente concessão, e nas mesmas condições em que esta é feita, quando o julgar conveniente, pertencendo ao arrematante, não só as obras executadas pela empreza, como tambem todo o material fixo e circulante, e perdendo, portanto, a mesma empreza, todo e qualquer direito de propriedade sobre essas obras e material.

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51.ª

O preço da arrematação será entregue á empreza, depois de deduzidas quaesquer despezas que o governo tiver feito, incluindo as do fiscalisação.

52.ª

Não havendo adjudicatario, tomará o governo posse das obras e de todos os materiaes, continuando a exploração da linha por conta da empreza, na parte que já estiver aberta ao transito publico; e se, findo o praso de dezoito messes, a empreza ao não mostrar habilitada para continuar a construcção ou exploração, pagando ao mesmo tempo todas as despezas que se tiverem feito, entrará o governo immediatamente na posse definitiva do caminho de ferro e todas as suas dependencias sem indemnisação alguma.

53.ª

Exceptuam-se das disposições das clausulas precedentes os casos de força maior devidamente comprovados, podendo o governo prorogar os prasos marcados se o julgar conveniente.

54.ª

O alvará de concessão definitiva não poderá ser entregue aos concessionarios, sem que elles provem ter depositado na caixa geral de depositos, á ordem do governo, a quantia de 10:000$000 réis em dinheiro, ou o valor correspondente em titulos de divida publica portugueza, segundo o seu valor no mercado.

§ 1.° O referido deposito vencerá, sendo em dinheiro, o juro que a caixa geral de depositos pague por depositos identicos, e sendo em titulos de divida publica o respectivo juro.

§ 2.° Este deposito servirá de garantia ao cumprimento das obrigações prescriptas por esta concessão, não podendo ser levantado sem que a empreza prove ter feito obras no valor equivalente ao dobro do mesmo deposito, passando então estas obras a servir de caução.

Secretaria d'estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, em 1 de abril de 1897. = Augusto José da Cunha.

Está coforme. - Segunda repartição da direcção dos serviços de obras publicas, em 20 de julho de 1897. = Pelo chefe da repartição, Joaquim F. Poças Leitão.

E-N.º 43

Senhores deputados da nação portugueza. - Alberto da Cunha Leão e Antonio Julio Pereira Cabral, concessionarios da construcção e exploração da linha ferrea, de via reduzida, projectada da Regua á fronteira, por Villa Real e Chaves, concessão que provisoriamente lhes foi feita por decreto de 1 de abril de 1897, e cuja approvação se acha pendente da vossa sancção, vem respeitosamente expor e impetrar o seguinte:

Os supplicantes, tendo concordado nos bases em que lhes foi feita a referida concessão, obrigaram-se a construir uma linha ferrea de extensão superior a 100 kilometros, sem o menor dispendio ou encargo para o estado, o qual apenas lhe concedeu alguns favores, constantes das clausulas e condições annexas ao citado decreto.

Aconteceu, porém, que quando já se achava em via de proxima organisação a empreza que teria de realisar este importantissimo melhoramento, ha tanto tempo reclamado pela provincia de Traz os Montes é principalmente pelo districto de Villa Real, occorreram factos de ordem economica, os quaes profundamente alteraram as condições da mercados financeiros onde os supplicantes estavam tratando de obter os capitaes necessarios.

Não obstante, os supplicantes, superando taes embaraços, acham-se em condições de levar a cabo o seu emprehendimento, de tão momentosa utilidade publica, uma vez que as clausulas e condições da concessão que lhes foi feita, sejam modificadas nos termos seguintes;

1.° Que o praso da isenção de impostos seja prorogado até áquelle em que ao governo é permittida a remissão da linha;

2.° Que a redacção da clausula 48.°, das clausulas e condições annexas ao decreto da concessão, seja aclarada de modo que no direito de opção ali estabelecido fiquem expressamente comprehendidas as concessões relativas a caminhos de ferro convergentes a pontos servidos pela linha da concessionarios dentro da zona kilometrica ali determinada;

3.° Que seja tambem permittida aos supplicantes a exploração da linha por meio de tracção electrica, se for possivel e conveniente.

Em taes termos os supplicantes esperam e pedem que as indicadas modificações sejam adoptadas, visto que nas actuaes condições economicas do paiz ellas são indispensaveis para a realisação de um tão importante melhoramento.

Lisboa, 7 de março de 1898. - Por ambos os concessionarios.- E. R. M.cê = Antonio Julio Pereira Cabral.

O ar. Teixeira de Sousa: - Sr. presidente, pedi a palavra para declarar a v. exa. e á camara que eu e os meus amigos politicos votamos este projecto, primeiro, porque é ponto de partida para melhoramentos da provincia de Traz os Montes, e oxalá que elles se realisem; segundo, porque d'este projecto não resulta encargo algum para o thesouro.

O sr. Reymão: - Pedi a palavra para mandar para a mesa o seguinte additamento ao artigo. 1.º do projecto:

Additamento

É o governo auctorisado a conceder a construcção e exploração do caminho de ferro do Valle do Lima, no todo ou por partes, com as condições identicas áquellas que constam d'esta lei. = M. Espregueira = M. Reymão.- Tem voto do sr. Queiroz Ribeiro.

Foi admittido e ficou em discussão conjuntamente com o projecto.

O sr. Eduardo Villaça: - Declaro a v. exa. por parte da commissão de obras publicas e de fazenda, que estas commissões estão de accordo com o additamento apresentado pelo illustre deputado o sr. Reymão.

O sr. Presidente: - Não havendo mais ninguem que peça a palavra, vae votar-se o artigo 1.°

Leu-se e foi approvado.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o artigo 2.°

Leu-se e foi approvado sem discussão.

Leram-se e foram os restantes artigos approvados.

O sr. Fialho Gomes: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro que continue hoje a discussão do projecto de lei n.° 14. = O deputado da nação, Libanio Fialho Gomes.

Foi approvado.

Leu-se novamente o seguinte

PROJECTO DE LEI N.° 14

Senhores.- Á vossa commissão de administração publica foi presente o projecto de lei n.° 5-E, da iniciativa do sr. deputado Alfredo Cesar de Oliveira, auctorisando o governo a reorganisar o serviço de policia nos districtos de Evora, Funchal e Beja, de modo que ella possa fazer chegar a sua acção á propriedade rural.

Entende a vossa commissão que é indispensavel a reorganisação da policia n'aquelles districtos, creando-se um pequeno corpo de guardas a cavallo, para que nos campos do Alemtejo possa ser defendida a propriedade rural, dos malfeitores que a infestam, e bem assim protegidas, nas serras da ilha da Madeira, as levadas de irrigação e guar-

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dados os arvoredos seculares, que ali têem sido em parte criminosamente destruidos.

Este projecto não deve trazer augmento de despeza porque para a sustentação de um corpo de guardas a cavallo, pouco numeroso, deve chegar a economia resultante da suppressão de logares de guardas de policia civil, que em alguns districtos póde ficar reduzida a um terço.

Mas se n'algum districto houver augmento de despeza não é justo que ella venha onerar o estado, mas sim a quem mais especial e directamente aproveita tal medida.

E essa pequena despeza será realmente insensivel, distribuida equitativamente pelos camaras municipaes do respectivo districto na proporção da sua receita.

É, pois, a vossa commissão, de accordo com o governo de parecer que deve ser convertido em decreto das côrtes geraes o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a reorganisar o serviço de policia nos districtos de Evora, Beja e Funchal, de modo que a sua acção se estenda á propriedade rural, nos concelhos em que as respectivas camaras municipaes o requeiram.

§ unico. No corpo de policia de Cada um dos respectivos districtos haverá uma secção de guardas a cavallo.

Art. 2.° Nos districtos onde a execução d'esta lei importar augmento de despeza, esta será equitativamente distribuida, na proporção da sua receita, pelas camaras municipaes do respectivo districto que o tenham requerido.

Art. 3.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da commissão de administração publica, 11 de fevereiro de 1898. = Martinho Tenreiro, presidente. = J. A. Correia de Barros = Visconde da Ribeira Brava = Manuel Telles de Vasconcellos = José Frederico Laranjo = José Alberto da Costa Fortuna Rosado = J. Paes de Abranches = J. Simões Ferreira = José Benedicto Pessanha = Joaquim S. de Oliveira Baptista = Carlos J. de Oliveira = A. Simões dos Reis, relator.

N.º 5-E

Senhores deputadas. - Tem-se reconhecido que é indispensavel policiar os campos do Alemtejo, onde se acoitam vadios e criminosas, que vivem da extorsão e do roubo.

A policia, como está constituida e organisada,; composta exclusivamente de guardas a pé, não póde fazer, utilmente tal serviço, as vasta região alemtejana.

No districto do Funchal, de terreno accidentado e pessimas vias de communicação, tambem se não póde sem guardas, a cavallo fazer é policiamento das serras, para evitara completa destruição dos arvoredos e defender as levadas de irrigação, o que é do mais vital interesse na ilha da Madeira.

Por isso, submetto á apreciação de v. exas. o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica o governo auctorisado a reorganisar o serviço de policia nos districtos de Evora, Funchal e Beja, de modo que ella possa fazer chegar a sua acção á propriedade rural.

§ unico. No corpo de policia de cada um dos referidos districtos haverá uma secção de guardas a cavallo.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos senhores deputados, 4 de fevereiro de 1898. = Alfredo Cesar de Oliveira = Visconde da Ribeira Brava = Francisco Ravasco. .

O sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.°

O sr. Menezes de Vasconcellos: - Sr. presidente, sinto ter de usar da palavra nesta camara contra um projecto apresentado pelo meu illustre amigo e dedicado correligionario o sr. Fialho Gomes, mas foram taes as considerações que ouvi hontem n'esta camara, que francamente me determinaram a fallar contra esse projecto.

Mal imaginava eu que tendo assento ha tão pouco tempo n'esta camara, teria de afastar-me tão cedo dos meus amigos e correligionarios, para acompanhar nas suas eruditas considerações o illustre deputado e distincto estadista o sr. Moraes Sarmento, que na sessão de hontem combateu energicamente o projecto de lei que se acha em discussão!

Effectivamente, sr, presidente, entendo que a policia rural do Alemtejo deveria ter uma organisação militar, dividindo-se para esse effeito aquella provincia em tres zonas conforme os seus tres districtos, e em cada zona collocar se-hia uma divisão superiormente commandada por algum dos illustres generaes reformados a que hontem se referiu o meu illustre amigo e districto parlamentar o sr, major Machado.

Nem todos esses illustres officiaes de certo serão incompativeis com similhante commissão de serviço, antes se me afigura que por mais de um motivo lhes poderá convir.

A vida socegada e tranquilla do campo vae bem às organisações cansadas pela idade ou gastas pela doença.

Alem das vantagens que foram enumeradas pelo illustre parlamentar, que na sessão passada combateu este projecto, aproveitavamos um excellente ensejo de provamos aos nossos, credores que, nas circumstancias financeiras em que nos encontrâmos até aproveitamos todos os elementos uteis do nosso funccionalismo reformado ou aposentado, para a manutenção da ordem n'uma provincia essencialmente agricola, e onde, segundo diz o projecto: «tem-se reconhecido que é indispensavel policiar os campos do Alemtejo onde te acoitam vadios e criminosos que vivem da extorsão e do roubo.»

N'um ponto porém discordo eu do illustre orador, quando disse que sobre um projecto d'esta natureza não deveria tornar-se n'este momento uma resolução, porque essa policia devia ter uma organisação puramente militar, pois que para defender os proprietarios alemtejanos dos vadios que se acoitam nas suas propriedades, só os militares tinham a força de vontade, a dedicação e o patriotismo para exporem a sua vida em defeza da ordem e em bem cumprir o seu dever.

N'este ponto discordo absolutamente de s. exa. Veja s. exa. e a camara como a policia civil do Porto, que não está organisada militarmente, tem cumprido brilhantemente o seu dever em mais de uma conjunctura difficil, prestando relavantissimos serviços e expondo a sua vida á cada passo para manter a ordem na segunda capital do reino.

Sr. presidente, não apresentarei mais exemplos sobre o modo como as diversas classes civis cumprem honrada e lealmente o seu dever, cada uma na sua esphera de acção, porque acho mau, acho pessimo concitar rivalidades entre as classes militar e civil, fazendo prever ou presumir que n'uma ou n'outra haja menos, valor ou menos patriotismo. No dia em que similhante antagonismo se revelasse mal iria para todos nós.

1640 é uma data bem notavel para fazer lembrar ainda hoje que nem só o elemento militar soube defender a patria e soube resgatar o seu paiz...

José Estevão Coelho de Magalhães, o insigne parlamentar, não era militar quando se bateu nas linhas do Porto. Tomou parte em toda a campanha liberal, á frente dos mais valorosos soldados e entrou n'esta camara para illuminar com o seu espirito as camaras constituintes, mas de sobrecasaca e não de farda, que depois da componha não tornou a usar.

Sr. presidente, reconheço a impossibilidade de, n'este momento, e nas condições em que se encontra o thesouro, fazer uma organisação perfeita e completa da policia rural que se pretende e tão militarisada como desejava o ilustre orador que na sessão passada se occupou d'este projecto, por isso entendo que, emquanto os recursos do thesouro e não permittam, deveremos renunciar a tão sympathica aspiração, porque, francamente, nós devemos ser sempre em vista que os nossos credores externos nos vêem e observam, e que se os recursos do thesouro mal

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chegam para satisfazer os encargos actuaes, menos chegariam para organisar uma policia rural militar nas campinas do Alemtejo. A proposito vem dizer que desejando eu muito o avigoramento e melhoramento das instituições militares do meu paiz, reconheço que, infelizmente, não estão no grau de perfeição correspondente ao que nós com ellas temos dispendido.

Em mais de uma occasião temos visto infelizmente que assa instituição ainda não corresponde por completo às exigencias da defeza nacional e oxalá não tenhamos em breve de nos lamentarmos da nossa imprevidencia ou da nossa incompetencia.

Vou concluir mandando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. se digne consultar a camara se consente que sobre o projecto de lei n.° 14 se faça inscripção especial, considerando-se o assumpto na ordem da noite e seguindo-se a discussão n'estes termos até final liquidação. = Antonio ao Vasconcellos.

Isto é em obediencia á disposição do artigo 60.° do regimento d'esta casa.

Vozes: - Muito bem.

O requerimento foi approvado.

O sr. Alfredo de Oliveira: - Eu não podia suppor que este projecto provocasse uma discussão que chegou já a ser um pouco violenta, comquanto verdadeiramente sobre o assumpto muito pouco se dissesse. Pela minha parte eu não azedarei o debate, tanto mais quanto estou persuadido que o maior defeito que tem o projecto é ter sido da minha iniciativa.

Este projecto tem por fim libertar os lavradores do Alemtejo de uma verdadeira calamidade.

Já tive occasião de chamar a attenção de v. exa. sobre este assumpto quando enviei para a mesa o projecto; e muito melhor do que eu elucidaram a camara os illustres deputados que me secundaram, nomeadamente o meu illustre amigo o sr. Festas, que já foi districto governador civil do districto de Evora e conhece perfeitamente esta questão.

Isto não é uma questão de politica partidaria. Os lavradores do Alemtejo, que pertencem ao partido regenerador, têem tanto empenho, tão vivo desejo em ver este projecto convertido em lei, como têem os lavradores pertencentes ao partido progressista. (Apoiados.)

Isto não traz augmento algum de despeza. No districto de Evora tenho a convicção de que nem a camara municipal terá de fazer despeza alguma. N'aquelle districto podem ser supprimidos alguns dos guardas da actual policia civil, e com a economia resultante d'essa suppressão constituir-se um pequeno grupo de guardas a cavallo, auxiliado pela guarda fiscal e conteiros, que podem, sem augmento de despeza, guardar e defender a propriedade rural.

É possivel que em alguns dos districtos senão possa organisar a policia sem um pequeno augmento de despeza; mas esta hypothese está prevenida no projecto, onde se propõe que n'esse caso a despeza correrá absolutamente por conta dos municipios, note-se bem, por conta das comarcas que quizerem gosar d'esse beneficio. Já se vê, pois, que em caso algum ha augmento de despeza para o estado. Os illustres deputados regeneradores declararam no principio da sessão que não votavam projecto algum que trouxesse augmento de despeza. Este projecto está precisamente n'essas condições, não traz augmento algum de despeza para o estado.

Depois d'isso um illustre deputado d'aquelle lado da camara declarou que se não deviam pôr em discussão projeticulos, na phrase de s. exa., emquanto não tivessem sido discutidos os projectos.

S. exa. chama «projectos» às medidas propostas no parlamento pelo governo, e chama «projecticulos» aos projectos de lei mandados para a mesa pelos deputados! Ora, sendo aquelle illustre deputado muito lido, muito illustrado e já antigo parlamentar, estranho a differença que s. exa. faz entre projectos e propostas de lei, sendo discutidas e votadas as propostas e não os projectos, porque tende a apoucar, amesquinhar e a deprimir o valor da iniciativa individual dos representantes da nação1 (Muitos apoiados.)

Declarei a v. exa. e á camara que não queria azedar o debate e tambem não desejo prolongar a discussão, por isso concluo dizendo que tenho ouvido d'aquelle lado da camara dizer, não sei com que fundamento, «que o parlamentarismo tende a decair em um certo desprestigio»!

Não sei até que ponto é verdade; mas sei, sr. presidente, de sciencia certa, que não é o caminho, proprio para levantar o prestigio parlamentar esse desprezo, cada vez mais pronunciado, pela iniciativa dos representantes da nação! (Muitos apoiados).

Tenho concluido.

O sr. Mello e Sousa: - É de opinião que o projecto, redigido como está, traz necessariamente augmento de despeza.

Para que este augmento se não d'esse, seria necessario que o governo ficasse obrigado a reduzir os actuaes guardas de policia civil a um terço, como se diz no relatorio da commissão; mas no projecto não ha disposição alguma de onde resulte esta obrigação.

Desde que assim é, pede que, em harmonia com o regimento, o projecto seja enviado á commissão de fazenda.

Oppõe-se ainda ao projecto, porque é sempre inconveniente fazerem-se leis especiaes para os differentes districtos, pois que d'este facto resulta uma confusão tal na legislação, que ninguem sabe por onde se ha de governar.

Portanto, se a maioria insistir em approvar o projecto, deseja ao menos que elle seja extensivo a todos os districtos.

Analysa em seguida a legislação administrativa do paiz, manifestando a opinião de que o projecto não tem rasão de ser, visto que as camaras municipaes, pelo codigo administrativo, estão auctorisadas a estabelecer a policia campestre ou rural, que é uma e a mesma cousa.

O que lhe parece deprehender-se da discussão e mesmo do que se encontrava no projecto inicial, é que o estado é quem ha de pagar os encare-os da policia rural. Em todo o caso, se esta policia aproveita aos proprietarios, elles é que a devem pagar, por meio de um addicional á contribuição predial, não devendo soffrer similhante encargo os cidadãos a quem ella não presta serviço algum.

(O discurso será publicado na integra e em appendice quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Fialho Gomes (para um requerimento): - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a v. exa. se digne consultar a camara se julga a materia discutida. = O deputado, Libanio Fialho Gomes.

Foi julgada discutida.

Em seguida foi approvado o artigo 1.°, e entrou em discussão o artigo 2.º

O sr. Cabral Moncada: - Diz que o projecto é inutil.

Só por esta qualidade se recommenda; salvo se a intenção de quem o elaborou é a de converter o nome dos guardas, já existentes, com a designação de «campestres», em guardas com outra designação, a de «ruraes». Mas se esta variante for decretada, então, para que haja affinidade de nomenclatura, mudem tambem os bailes campestres para ruraes.

Considera um attentado contra as prerogativas da commissão de fazenda, de que aliás não tem a honra de fazer

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SESSÃO NOCTURNA N.° 47 DE 19 DE ABRIL PE 1898 867

parte, mas que pede licença para a defender, o votar-se um projecto de lei, que. importa, como este, um augmento de despeza, sem previamente ser submettido á approvação d'aquella commissão.

O projecto que se discute representa um favor, o não pequeno, aos proprietarios, á custa até dos que o não são, e favor que não lhe merece sympathia por ser conferido a uma classe já tão protegida.

É protegida licita e illicitamente na escassez dá contribuição predial e n'outros favores, todos derivados da terrivel politica do voto, que tão nefasta tem sido ao nosso paiz; protegida, como muito bem disse o illustre deputado o sr. Mello e Sousa, com direitos sobre a importação de trigos, que lhe asseguram a venda dos seus por preços exorbitantes; protegida, finalmente, para mais não dizer, pelas leis referidas da emigração, que lhe garantem grande offerta de braços e por isso reducção nos salarios a pagar.

Commentando depois o que ouvira ao sr. Vasconcellos, diz o orador, que esse illustre homem d'estado, que se chamou José Estevão, foi militar, e tanto que morreu major de artilharia.

Por ultimo, respondendo ao sr. deputado Alfredo de Oliveira, diz que as affirmações de s. exa. têem sempre perante o conceito d'elle, orador, a mais indiscutivel acceitação; mas que, officialmente, nada valem, quando feitas com a declaração de que se sabe de sciencia certa; isto é, dizendo que sabe porque sabe, visto que n'este caso até a lei, se se tratasse de depoimento, perante as justiças, o impediria de depor. -

(O discurso será publicado na integra e em appendice quando s. exa. devolver as notas tachygraphicas.)

O sr. Alfredo de Oliveira: - Disse que ouviu com muito prazer o illustre deputado que o precedeu, não só pela satisfação que causa sempre ouvir um orador que falla muito bem, mas porque ficou demonstrado que o projecto é inatacavel, pois que o illustre deputado, com toda a sua eloquencia, não conseguiu feril-o.

As considerações de s. exa., bem como as do sr. Moraes Sarmento, sobre organisação militar, talvez sejam, de qualquer modo, aproveitaveis quando se tratar da reorganisação; mas não é agora, que se discute o modo de a realisar, pois que o projecto só dá ao governo auctorisação para esse fim...

Insiste o orador na demonstração de que não havia augmento algum de despeza para o estado, que isso é expresso no projecto, e que não se póde argumentar contra uma lei, allegando que esta se não cumprirá.

Explica por ultimo a sua affirmação de que sabe de sciencia certa que o desprezo pela iniciativa dos deputados não é tendente a levantar o prestigio do parlamento.

(O discurso será. publicado na integra e em appendice, quando s. exa. restituir as notas tachygraphicas.)

O sr. Ferreira de Almeida: - Attenta a pressa com que foi votado o artigo 1.º, naturalmente será julgada discutida a materia do artigo 2.°

V. exa. terá a bondade de mandar verificar se ha numero na sala para poder deliberar, porque estar a discutir sem haver numero para resolver, é tempo perfeitamente perdido. Se v. exa. vir que ha numero para deliberar, eu fallo, se não, escuso de estar a perder tempo a fallar para quando se for a votar não haver numero.

Fez-se a contagem.

O sr. Presidente: - Estão na sala 38 srs. deputados,

Vozes da direita: - Ha 41.

O sr. Ferreira de Almeida: - A mesa é quem verifica. Eu tambem contei 38 deputados, assim como o sr. Teixeira de Sousa.

O sr. Fialho Gomes: - Peço a contra-prova.

O sr. Presidente: - Vão contar-se novamente os srs. deputados que estão na sala.

O sr. Presidente: - Estão na sala 38 srs. deputados.

O sr. Ferreira de Almeida: - V. exa. sabe o que tem a fazer diante d'este caso.

O sr. Presidente: - A ordem da noite para ámanhã é a mesma que estava dada para hoje, continuando na primeira parte a discussão d'este projecto.

Está levantada a sessão.

Eram dez horas e meia da noite.

Representação mandada para a mesa n'esta sessão

Da camara municipal do concelho da Barquinha e dos habitantes da povoação do Entroncamento, do concelho de Torres Novas, pedindo que esta povoação seja annexada ao concelho da Barquinha.

Apresentada pelo sr. deputado Izidro dos Reis, devendo ter um destino igual a um projecto de lei sob o mesmo assumpto que ficou para segunda leitura.

O redactor = Barbosa Colen.

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