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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Sessão de 18 de junho de 1868

presidencia do sr. josé maria da costa e silva

Secretarios — os srs.

José Tiberio de Roboredo Sampaio.

José Faria de Pinho Vasconcellos Soares de Albergaria.

Chamada — 71 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão — os srs.: R. de Azevedo, A. E. de Seabra, Rocha París, Costa Simões, Villaça, Antonio de Azevedo, A. Bernardino de Menezes, Gomes Brandão, A. Guerreiro, A. J. da Rocha, A. J. Teixeira, Seabra Junior, Pequito, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Torres e Silva, Falcão da Fonseca, Montenegro, Cunha Vianna, Carlos Bento, C. Testa, F. de Albuquerque Couto, Dias Lima, Silveira Vianna, Rolla, Noronha e Menezes, Freitas e Oliveira, Meirelles Guerra, Almeida Araujo, Judice, J. A. Vianna, Assis Pereira de Mello, Ayres de Campos, Gaivão, Cortez, J. M. da Cunha, João M. de Magalhães, Aragão, Pinto de Vasconcellos, Albuquerque Caldeira, Fradesso da Silveira, Ribeiro da Silva, Faria Guimarães, Gusmão, Galvão, Bandeira de Mello, Klerk, Costa Lemos, Correia de Oliveira, Faria Pinho, Carvalho Falcão, Teixeira Marques, J. I. Pereira de Carvalho, Lemos e Napoles, Vieira de Sá, Costa e Silva, Leite Ferraz, José de Moraes, José Paulino, Batalhoz, José Tiberio, L. de Carvalho, Camara Leme, Leite de Vasconcellos, Motta Veiga, Penha Fortuna, M. J. Guerra, Pereira Dias, Raymundo Rodrigues, Sabino Galrão.

Entraram durante a sessão — os srs.: A. de Ornellas, Alves Carneiro, Ferreira de Mello, Sá Nogueira, Falcão de Mendonça, Ferreira Pontes, Barros e Sá, Azevedo Lima, Arrobas, Costa e Almeida, Araujo Queiroz, Lopes Branco, Augusto de Faria, Barão da Trovisqueira, B. F. da Costa, Vieira da Motta, Conde de Thomar (Antonio), Custodio Freire, Silva Cabral, Eduardo Tavares, F. F. de Mello, Silva Mendes, Coelho do Amaral, Gavicho, F. L. Gomes, Bicudo Correia, F. M. da Rocha Peixoto, Pinto Bessa, Van-Zeller, Moraes Pinto, Gaspar Pereira, Guilhermino de Barros, Faria Blanc, I. J. de Sousa, Baima de Bastos, João de Deus, Calça e Pina, Joaquim Pinto de Magalhães, Pinto da Silva, Maia, Mardel, Sette, Dias Ferreira, Achioli de Barros, Frazão, Rodrigues de Carvalho, Menezes Toste, Mesquita da Rosa, Mendes Leal, Pinto Basto, Ferreira Junior, M. B. da Rocha Peixoto, Aralla e Costa, Lavado de Brito, Quaresma, Mathias de Carvalho, Botelho e Sousa, P. A. Franco, P. M. Gonçalves de Freitas, Ricardo de Mello, Bruges, Venancio Deslandes, Vicente Carlos, Visconde dos Olivaes.

Não compareceram — os srs.: Fevereiro, A Braamcamp, Correia Caldeira, Silva e Cunha, A. J. de Seixas, A. Pinto de Magalhães, Falcão e Povoas, Saraiva de Carvalho, Belchior Garcez, Bernardo Francisco de Abranches, Caetano Velloza, Pereira Brandão, Faustino da Gama, I. F. Silveira da Motta, Santos e Silva, Matos e Camara, J. T. Lobo d'Avila, José M. de Magalhães, Silveira e Sousa, Coelho do Amaral, Levy, Sebastião do Canto, Thomás Lobo, Scarnichia. (v

Abertura — Á uma hora menos vinte minutos.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA

Officio

Do ministerio da guerra, declarando, em satisfação ao requerimento do sr. Sabino José Maltez dos Anjos Galrão, que, logo que termine a inspecção extraordinaria ao estabelecimento do asylo dos filhos dos soldados, será remettido á camara o mappa dos alumnos pensionistas e porcionistas do mesmo asylo, o qual fôra podido por aquelle sr. deputado.

A secretaria.

Participação

Declaro que o sr. deputado Joaquim Thomás Lobo d'Avila tem faltado á camara por incommodo de saude e de sua familia, e que, pelo mesmo motivo, continuará a faltar mais alguns dias. = O deputado, José Maria Lobo d'Avila.

Inteirada.

Requerimento

Requeiro se officie ao governo, pelo ministerio do reino, para que remetta a esta camara dois processos da syndicancia que foram instaurados contra o actual administrador do concelho de Goes, districto de Coimbra, pelo acto por elle praticado quando anteriormente exerceu os mesmos cargos no referido concelho de Goes e no de Porto de Moz. = F. Van-Zeller.

Foi remettido ao governo.

O sr. Secretario (José Tiberio): — O sr. Vellosa participou á mesa, para o fazer constar á camara, que por incommodo de saude não póde comparecer á sessão de hoje, e talvez a mais algumas.

Inteirada.

O sr. Presidente: — Agora que não ha incidente algum em discussão que possa excitar os animos n'esta camara, aproveito a occasião para confessar uma falta que tenho commettido; esta confissão não fica mal a alguem.

Tenho aqui faltado muitas vezes ao meu dever como presidente, deixando progredir e divagar a discussão fóra dos verdadeiros limites que a materia lhe marca.

Estava costumado a presidir a sessões judiciarias e algumas vezes usei do rigor do respectivo regimento quando o julguei conveniente; mas elevado a esta cadeira entendi sempre que em uma assembléa tão conspicua como esta não

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era necessario o rigor do regimento, como nos tribunaes era necessario muitas vezes o rigor da reforma judiciaria, por isso que supponho e creio profundamente que todos os srs. deputados que entraram aquellas portas têem em subido grau as qualidades que são necessarias para conhecerem o quanto devem ao bem publico, ao seu patriotismo, e sobretudo ao sentimento da propria dignidade; e que, se não se levarem por estas rasões, tambem se não levam pelo rigor do regimento. Eis a rasão por que eu tenho sido muitas vezes, talvez demasiadamente condescendente. Mas como se tem abusado, principalmente por parte de individuos, cuja posição social e altos merecimentos estão muito acima do papel que julgo que involuntariamente ás vezes aqui vem representar, vou dizer que serei pontual e rigoroso no cumprimento do meu dever, e que chegarei a lançar mão dos ultimos remedios que me faculta o regimento d'esta casa, quando circumstancias extraordinarias, que muito sentirei, a isso me forçarem. Porém como aqui se costuma pedir a palavra para requerimentos e sobre a ordem, e isto só com o fim manifesto de escalar a palavra, d'aqui em diante não tenho remedio senão cumprir o regimento n'esta parte, e por isso previno os srs. deputados que tiverem pedido a palavra sobre a ordem que, logo que lhes for concedida, hão de começar por cumprir a disposição do regimento que diz (leu).

O regimento prohibe aqui explicações pessoaes. Muitas vezes a camara concede a palavra para explicações pessoaes. Não me pertence, nem posso apreciar a rasão ou sem rasão d'essa dispensa, hei de acata-la sempre, porque considero as resoluções da camara superiores ao regimento e á presidencia, mas convido os srs. deputados a absterem-se de proferir qualquer phrase menos conveniente. No calor da discussão alguns oradores alguma vez soltam palavras que elles proprios logo repellem, porque, se ellas podem injuriar alguem, é sómente á propria pessoa que as prefere; e n'este ponto de vista as pessoas a quem ellas se referem devem dar-lhes esse desconto, e não lhes ligar maior importancia.

Ora, para que não tenhamos outros desgostos maiores, saibam gregos e troianos, que de hoje em diante, logo que veja que o orador esta fóra da ordem, convida-lo-hei a entrar n'ella; se acquiescer e depois pedir a palavra para se justificar, conceder-lh'a hei; se pelo contrario a pedir para -continuar a discutir a materia impertinente, com grande mágua lh'a retirarei.

O sr. Gavicho: — Acabo de ouvir a regra em que devemos viver d'aqui em diante. Ouvi a lição que acaba de dar a mim e aos meus collegas.

O que v. ex.ª porém acaba de dizer, não se refere a mim, nem aos illustres membros da camara, porque não sou grego nem troiano, sou portuguez, e portuguezes são todos os representantes do povo.

Estou persuadido que ninguem n'esta casa falta ao regimento por acinte. O que não posso perceber é como v. ex.ª ha de julgar que um deputado, quando esteja discorrendo sobre qualquer assumpto, ou sobre qualquer materia, falla sobre cousas estranhas ao ponto que se discute.

O sr. visconde de Almeida Garrett, uma das glorias d'esta terra, cujo nome não póde ser pronunciado senão com muito respeito por todos aquelles que amam a gloria d'este paiz - e das letras, entrou um dia n'esta casa, na occasião em que se tratava de uma certa questão, pediu a palavra, e começou contando uma historia, que parecia muito estranha á discussão; disse não sei que do que succedeu a fr. Francisco Xavier na India. O sr. presidente de então observou-lhe que não estava na ordem, e disse-lhe do que se tratava, ao que o orador respondeu que bem sabia qual a materia que se discutia, e que mostraria ao sr. presidente que estava na ordem, e que do que estava dizendo havia de tirar uma conclusão necessaria para resolver a questão, como elle entendia que devia resolver.

E necessario notar que aquelle admiravel orador só soube do que se tratava, quando o presidente lhe disse qual o ponto a discutir, e o visconde de Almeida Garrett divagando, fazendo um discurso que parecia estranho á questão, dirigiu-o para o ponto a discutir com aquella habilidade que lhe era propria. Muitas vezes um deputado póde parecer que discorro sobre cousas estranhas á questão, e comtudo são as suas considerações necessarias, conforme o seu modo de ver, para tirar conclusões indispensaveis para dar a sua opinião sobre as questões sujeitas ao exame do parlamento.

Póde V. ex.ª estar certo, sr. presidente, que um deputado ha de dizer o que quizer a proposito de qualquer questão, e que acho quasi impossivel impedi-lo de expor as suas idéas. Ha dez annos que tenho assento n'esta camara, e parece-me que me tenho contido sempre nos limites em que se deve conter um homem que se presa, e que comprehende a missão que tem a cumprir aqui, e o logar honroso que occupa n'esta casa, e tenho-o feito, não porque haja uma ferula que a isso me obrigue, mas porque todo o homem deve cumprir o seu dever.

Quando alguem quer impedir que qualquer deputado falle, permitta-se-me que eu empregue um termo pouco parlamentar, quando o presidente ou alguem quizer metter uma rolha na bôca do deputado, como já aqui tem acontecido algumas vezes, o que succede é que ha então mais forte vontade de resistir; com toda a certeza o> deputado, quando quer, falla sobre o que quer a respeito de qualquer questão; tem habilidade para o fazer, e é quanto basta. Queixa-se V. ex.ª de que se escale a palavra? Vou dizer a v. ex.ª a rasão por que se escala, a palavra, é porque ha uma cohorte de apagadores...

(Interrupção do sr. presidente.)

Não me refiro a v. ex.ª nem me dirijo a ninguem. Vou fazer uma confissão. Vou-me penitenciar diante dos meus collegas; creio que v. ex.ª me permittirá que o faça.

Tenho escalado a palavra por differentes vezes, e sabe v. ex.ª porque? É por causa da cohorte de apagadores que ha muito tempo existem, e que estão apostados a abafar tudo. D'antes era este officio encartado, mas agora vulgarizou-se muito, a cohorte é numerosa.

Quando qualquer deputado receia que venha um collega pedir a palavra para um requerimento, a fim de se julgar a materia discutida, o resultado é empregar todos os meios para escalar a palavra. Não sei mesmo se v. ex.ª, quando não estava n'essa cadeira, e pertencia á camara, empregou algumas d'essas tricas parlamentares para poder fallar, por causa dos apagadores. Esta minha opinião sobre os apagadores é já velha. Nunca o fui, e a rasão é porque entendo que se a questão esta plenamente discutida e esclarecida, e os deputados inscriptos nada têem a acrescentar, elles cederão da palavra; tirar-lh'a, é que é uma iniquidade.

O sr. Falcão da Fonseca: — Mas é uma grande necessidade.

O Orador: — Não entro agora na questão de ser ou não uma grande necessidade, porque isso poder-nos-ia levar muito longe, o obrigar-me a fallar muito tempo. Deixemos esta divagação.

Pedi a palavra para fazer uma rectificação. Vem no Diario uma palavra que não sei se pronunciei; e se a pronunciei foi de certo a lingua infiel á minha rasão e ao meu pensamento.

O sr. deputado Ferreira de Mello tinha proposto que a mesa nomeasse a commissão de inquerito parlamentar, que já estava votada, e cujo numero de membros já estava fixado, e eu disse: «Nomeie a mesa os membros que faltam de entre os deputados que foram votados». Porém no Diario appareceu =que foram mais votados =. Não sei se pronunciei a palavra mais; se a pronunciei, não era essa a minha intenção; não o queria dizer, e por isso faço esta rectificação.

Agora peço a v. ex.ª que antes de se passar á ordem do dia, que é a discussão do projecto n.° 6, se continue na eleição daquella commissão, ou se discuta se a mesa a deve nomear.

Não discuto agora' se a commissão é util, necessaria e indispensavel; a camara votou esta commissão de inquerito, porque a julgou necessaria e indispensavel para a ajudar a resolver as. questões de grave momento, cujo nucleo fórma a questão de fazenda.

Começou-se a eleição d'esta commissão, e não se póde adiar, e então continue a eleição ou a camara delegue na mesa para que ella a nomeie.

Se porventura se tratasse agora de approvar a proposta que mandei para a mesa, então teria occasião de dizer que entendo que é urgente a commissão de inquerito; mas como estava fóra da ordem, se tratasse n'esta occasião de sustentar uma proposta que não mandei agora para a mesa, mas que já esta votada, limito-me a requerer a v. ex.ª que dê para ordem do dia de hoje a continuação da eleição da commissão, e a camara decidirá se a quer eleger ou se quer delegar na mesa a faculdade de a nomear. O que não póde continuar é este adiamento inexplicavel da eleição de uma commissão que se principiou e que se não concluiu.

O sr. Costa Lemos: — Mando para a mesa uma interpellação ao sr. ministro da fazenda (leu).

Peço a v. ex.ª que lhe dê o destino devido.

O sr. Ildefonso de Carvalho: — Mando para a mesa uma representação dos escripturarios da repartição de fazenda do districto de Bragança em que pedem augmento de vencimento.

Acho de justiça o pedido, porquanto os requerentes têem um vencimento muito diminuto, e com o seu augmento o thesouro nada soffre, porque será tirado da cobrança.

Peço a v. ex.ª a bondade de enviar esta representação á commissão respectiva, a fim de que a tome em consideração.

O sr. Freitas e Oliveira: — Ouvi com profundo respeito as judiciosas observações que v. ex.ª fez no principio d'esta sessão, e, comquanto ellas me não possam ser applicadas, porque não me accusa a consciencia de haver nunca faltado aos meus deveres nem excedido os limites da delicadeza e consideração para com os meus collegas, todavia sei que uma das obrigações das altas funcções que v. ex.ª desempenha n'esta casa é evitar quanto possivel scenas desagradaveis como as que por vezes aqui têem tido logar.

A maneira de as evitar são essas admoestações sempre benevolas de v. ex.ª, que eu respeito e ouço com profunda consideração.

Quando hontem pedi a palavra sobre o projecto de lei de meios, era simplesmente com o fim de motivar o meu voto. Eu approvei a lei de meios hontem, como a teria approvado antes de hontem (apoiados). Para mim, as declarações de um ministro, feitas em nome do governo, valem tanto como as feitas por outro qualquer, por maior que seja a sua qualificação (apoiados).

Não me considero zelador da dignidade ministerial; só posso considerar-me zelador da minha propria dignidade, da dignidade da camara a que pertenço, da dignidade do paiz do quem sou representante.

O sr ministro da fazenda já em uma das anteriores sessões tinha feito, a pedido de um illustre deputado, declarações sobre o adiamento ou não adiamento da camara, e essas declarações, tinham sido tão simples, tão explicitas, que a camara resolveu, que fossem inseridas na acta, como se praticou (apoiados).

Para mim, pois, já não eram precisas as explicações do sr. presidente do conselho. Se o ministerio cumpre ou não a sua palavra, é-me completamente indifferente. A responsabilidade desse acto é só d'elle e não. da camara (apoiados). Portanto, terno a repetir, votei hontem a lei de meios, como a teria votado ante-hontem.

Usando ainda da palavra, permitta-me v. ex.ª que tambem dê uma explicação muito breve aos meus honrados e antigos amigos, o sr. Coelho do Amaral e Francisco da Silva Mendes.

SS. ex.ªs julgaram-se um pouco offendidos com uma phrase que soltei aqui com relação aos cavalheiros que pretendem cercear a lista civil, persuadindo-se de que eu os alcunhara de republicanos.

Em primeiro logar devo declarar a v. ex.ª e á camara, que quando soltei aquella phrase não me referi nem ao sr. Coelho do Amaral, nem ao sr. Silva Mendes, porque não sabia n'essa occasião (pois que não estive presente ao principio da sessão), que ss. ex.ªs tinham mandado para a mesa uma proposta de mensagem; ignorava completamente esse facto; referi-me ao illustre deputado, e meu amigo, o sr. Saraiva de Carvalho. Mas nem a este illustre deputado, nem a ss. ex."3, eu chamei republicanos (apoiados). Eu disse só, que, se ss. ex.ªs fossem republicanos, e não haveria vergonha nenhuma em o serem, o podiam dizer abertamente. E quando mesmo eu dissesse que ss. ex.ªs eram republicanos, isto da minha parte, sabe o meu honrado amigo, o sr. Coelho do Amaral, nunca podia ser uma injuria (apoiados), porque uma opinião, qualquer que ella seja, por mais extrema que pareça em politica, nunca deshonra a pessoa que a tem (apoiados), nem póde deshonrar; e sobretudo em relação áquelles cavalheiros, que tanto prezo e que tanto considero, nunca da minha parte póde haver a mais leve intenção de os desconsiderar ou de lhes fazer injuria. _ _

Tenho dito, e creio que os illustres deputados estarão satisfeitos com esta explicação. Vozes: — Muito bem.

O sr. Montenegro: — Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas ácerca de um pedido da camara municipal da Covilhã. Falta a assignatura do sr. Lobo d'Avila, porque s. ex.ª não esta em Lisboa.

O sr. Carlos Bento: — Mando para a mesa a seguinte proposta que vou ler (leu). Peço a urgencia.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta,

Senhores. — Tem sido manifestado repetidas vezes o vivo desejo, de que se acha animada a camara, de que se proceda, quanto antes, á discussão do orçamento geral do estado; e como a necessidade que tem a commissão de fazenda de se empregar incessantemente no exame de propostas importantes e urgentes, que hão de ser submettidas á vossa deliberação, póde ainda demorar, contra a vontade da commissão, a apresentação do respectivo parecer sobre o orçamento, suggere, para occorrer á "difficuldade d'esta situação, o arbitrio que apresenta á vossa consideração.

O orçamento geral do estado, tal qual se acha apresentado pelo governo, póde, sem dependencia do parecer de uma commissão, ser adoptado para thema da discussão, sendo as emendas, que n'ella forem apresentadas, remettidas á respectiva commissão, para dar sobre ellas o seu parecer.

A discussão do orçamento, sem parecer de commissão, tem logar em diversas nações, alguma das quaes precedeu de muito todas as outras na marcha do systema constitucional. Acresce que, ultimamente, approvou a camara que, desde já, se podessem apresentar emendas ao orçamento, a fim de serem remettidas á commissão. O arbitrio agora suggerido completa a idéa. Desde que podem ser apresentadas emendas, póde haver discussão.

Portanto, em harmonia com a boa vontade dos eleitos do povo, e com a imperiosa exigencia das circumstancias actuaes, propõe a vossa commissão de fazenda que seja convenientemente dado para ordem do dia, sem dependencia de parecer de commissão, o orçamento geral do estado para o anno economico de 1868-1869, que já foi antecipadamente distribuido a cada um dos srs. deputados, sendo remettidas á commissão, para dar sobre ellas o seu parecer, quaesquer emendas apresentadas sobre o assumpto, que a camara entenda deverem ficar sujeitas a essa formalidade.

Sala das sessões da commissão de fazenda, 18 de junho de 1868. = José Gregorio Teixeira Marques = A. J. Ferreira Pontes = Antonio José Teixeira = Joaquim Ribeiro de Faria Guimarães = Francisco Van-Zeller = Carlos Bento da Silva.

Tem voto dos outros membros da commissão de fazenda.

O sr. Fradesso da Silveira: — Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra.

O sr. Leite de Vasconcellos: — Pedi a palavra para mandar para a mesa um projecto de lei, pelo qual ficam exceptuadas de registo as servidões apparentes. Não faço agora considerações algumas sobre este importante objecto, reservando-me para quando este projecto vier á discussão. Mando-o pois para a mesa, e peço a v. ex.ª lhe dê o destino competente.

O sr. Presidente: — Vae votar-se a urgencia da proposta apresentada pelo sr. Carlos Bento.

(Varios srs. deputados pedem a palavra.)

O' sr. Carlos Bento: — Ordinariamente não se costuma votar a urgencia quando se apresenta uma proposta sobre a qual se quer ouvir uma commissão; mas o caso presente é differente, porque é a commissão de fazenda que apresenta um parecer em que indica o arbitrio de se dar para ordem do dia o orçamento do estado apresentado pelo governo, tomando-o para thema de discussão, e remettendo-se-lhe depois, todas as propostas o emendas que ao orçamento forem apresentadas, a fim de sobre ellas dar o seu parecer (apoiados).

Por consequencia peço a v. ex.ª que proponha á camara se julga urgente a proposta da commissão.

Consultada a camara, venceu-se a urgencia.

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O sr. Pereira Dias: — Peço a palavra sobre a urgencia.

O sr. Presidente: — A urgencia já esta votada.

O sr. Pereira Dias: — Então peço a palavra sobre a proposta.

O sr. José de Moraes: — Pedi a palavra para dizer ao meu antigo amigo, o sr. Carlos Bento, pessoa que respeito ha muito tempo, que voto a proposta de s. ex.ª como uma novidade; e voto-a para ver o resultado d'esta idéa nova que aqui se apresenta.

Deus queira que me engane, mas parece-me que o governo declina a questão das economias para a camara, e que diz: «Proponha as economias que quizer, mas com a restricção que sejam justas.» Infelizmente esta restricção tem sido pesta por todos os ministerios!.

Desde que sou deputado, tenho aqui apresentado muitas propostas de economias, que não têem dado o justo resultado que esperava.

Agora me lembro eu de uma proposta que apresentei para se supprimirem dois logares do conselho ultramarino, e que me parecia justa e dever-se aceitar, e que o governo declarou então não poder admittir; entretanto o sr. ministro da fazenda propõe agora a suppressão do conselho ultramarino, mas por um modo que me não satisfaz tambem, e por isso hei de quando a proposta se discutir substitui-la por outra mais rasgada.

Da proposta que esta em discussão deduzo eu que tambem a illustre commissão de fazenda, que muito respeito, dirime as economias para a camara! Isto é, o governo e a commissão de fazenda entregam tudo á alta sabedoria da camara. Pois eu faço já a seguinte profecia: por mais economias que se proponham, creia a camara que nenhuma ha de ser votada, e que havemos de ficar como estamos.

Entretanto voto a proposta, simplesmente como uma novidade e sem comprometter o meu futuro procedimento.

O sr. Sá Nogueira: — Não tenho duvida nenhuma em votar desde já a proposta da commissão de fazenda; mas previno tambem os srs. ministros de que, não querendo fazer-lhes opposição, comtudo, quando se tratar de algumas verbas do orçamento, hei de propor tambem algumas modificações.

Não posso, por exemplo, votar a verba para a construcção de estradas sem que o sr. ministro das obras publicas apresente a esta camara o orçamento da despeza que se faz com todo o pessoal technico, mas individualmente, porque nós estamos a gastar sommas consideraveis e não auctorisadas com uma corporação cuja organisação não foi ainda confirmada pelas côrtes, como devia ser. ISTesta parte é que ha economias de centenas de contos de réis a fazer (apoiados).

Na sessão passada perguntei eu ao sr. ministro das obras publicas se era possivel apresentar o orçamento d'esta despeza; s. ex.ª deu-me uma resposta evasiva, como é costume sempre. N'este anno tambem já tenho pedido a palavra para quando estivesse presente o sr. ministro das obras publicas para interpellar s. ex.ª a este respeito, o que não pude ainda fazer, mas desde já previno a camara de que em occasião opportuna usarei do meu direito para exigir as explicações a respeito de um assumpto tão grave.

O sr. Albuquerque Couto: — Mando para a mesa uma proposta para ter o destino competente.

O sr. Pereira Dias: — Mais uma vez levanto a minha voz para louvar o governo pelo zêlo que mostra na breve discussão do orçamento.

Vendo o gabinete que não só a opposição, mas a maioria, tinham desejos de que o orçamento se discutisse e votasse, e não cabendo talvez no tempo que a commissão de fazenda lavrasse, como era costume, o respectivo parecer, apresenta-se hoje de accordo com a commissão.

O sr. Van-Zeller: — A commissão de accordo com o governo.

O Orador — A commissão de accordo com o governo? Quer dizer, a iniciativa d'este expediente não vem do governo, vem da commissão. Pois bem; os meus louvores serão em primeiro logar para a commissão e depois para o governo. Repito, vendo-se os desejos que havia da parte da camara e do paiz, que o orçamento do estado se discutisse e votasse sem interrupção dos trabalhos parlamentares, apressou-se a commissão de fazenda de accordo com o governo a apresentar o parecer negativo sobre o orçamento, dispensando-se assim o parecer que até aqui era de lei apresentar! Aceito o facto, não obstante as desastrosas consequencias que se me afiguram derivar d'esta original novidade; a responsabilidade porém do que succeder será em tempo opportuno competentemente avaliada.

Todos os dias surgem factos que obrigam os homens a mudar de opinião.

Direi á camara que, tendo eu aqui impugnado a eleição da commissão de inquerito para simplificar os serviços publicos e reformar os quadros, entendo hoje que seria altamente util e conveniente eleger essa commissão, para que ella estude o orçamento e nos apresente um trabalho que sirva de base para a discussão (riso).

Eu exponho com toda a franqueza e sinceridade as minhas opiniões; não me aventuro a propor e a formular esta idéa, estou convencido mesmo de que ella não será aceita; mas permitta-me a camara que exponha o meu parecer, em hora se lhe afigure ver n'elle uma tal ou qual ironia, propria e provocada pelo ironico procedimento da commissão de fazenda e do governo.

Repito, devia aproveitar-se a idéa da commissão parlamentar, desde o momento em que a illustrada e competente commissão de fazenda entendeu que devia declinar de si o trabalho que até aqui todas as commissões têem considerado e feito.

O orçamento, tal qual esta, não é documento serio. E para provar isto basta que eu pondere á camara que é feito pela administração passada, e tudo o que vem d'essa nefanda administração deve ser mau, muito mau, horrivelmente mau!

De certo que no orçamento feito pelo amaldiçoado gabinete fusionista devem vir cousas monstruosas, e seria muito bom que não passassem na camara (apoiados).

Eleja-se pois a commissão para pelo menos expurgar o orçamento das monstruosidades fusionistas, ficando a cargo da camara o aperfeiçoamento do resto. D'este modo ficará salva a patria.

O sr. Carlos Bento: — Entendo que a declaração de que uma idéa é nova não importa a sua condemnação.

Creio que nós não estamos obrigados a viver hoje, como viviamos hontem, e condemnar uma moção qualquer pela sua novidade, porque isso é prohibir o progresso (riso).

Para mim infelizmente esta idéa não tem o merecimento da novidade.

Já apresentei uma proposta identica, não tendo a honra de ser membro da commissão de fazenda, e sem querer confiar menos nos membros da commissão, do que em mim, devo declarar que em todos os pareceres das commissões de fazenda sobre o orçamento se observa a perfeição do echo, e digo isto sem condemnar nenhuma commissão, mas é a verdade.

Creio que se aprende pouco no echo, e que nós não somos escravos do costume para apresentar no parecer da commissão o echo das opiniões apresentadas pelas commissões passadas.

Além d'isto este progresso não nos póde envergonhar, quando nós seguirmos uma nação muito illustrada, que ordinariamente não é temeraria nas suas innovações. A camara portugueza creio que não representaria um papel improprio da sua posição, seguindo a camara ingleza na discussão do orçamento.

Os inglezes estão no triste costume de votarem o orçamento sem parecer da commissão de fazenda. É uma posição dolorosa, mas elles vivem, e, cousa singular, têem até um excesso de receita! E verdade que eu não creio que o excesso de receita brote d'este expediente; havemos de empregar muitos outros meios para chegarmos a este fim; de accordo, mas tambem esta proposta não augmenta com certeza o deficit.

Eu não ponho esta questão no terreno politico. A questão para mim não significa nem confiança nem desconfiança do governo; significa um expediente, que eu entendi que era louvavel, quando a camara e o paiz estão desejosos de tratar a questão de fazenda. Entendo que é mais bem aproveitado o tempo discutindo o orçamento do que discutindo, não digo já o amor proprio de cada um de nós, mas o amor proprio dos partidos, saber qual é o partido que teve rasão, e qual o que a não teve, etc... Estas questões serão muito importantes para livraria, mesmo para uma torre do tombo, mas nunca para se anteporem á questão magna da actualidade, a questão de fazenda.

O meu illustre amigo, que me precedeu, disse que = o orçamento tem uma procedencia, que o deve tornar suspeito. Eu comprehendo a ironia do argumento; mas s. ex.ª deve saber que o orçamento apresentado por este governo, esta modificado em alguns pontos muito importantes, como por exemplo na parte relativa ás leis de fazenda, que foram revogadas no começo d'este anno.

Esta proposta não significa a idéa de que nós entendemos, que a perfeição em materia de administração e finanças esta no orçamento, e que estamos na posição de não podermos apresentar nenhuma emenda a esse documento parlamentar. Declaro a v. ex.ª que hei de ter a temeridade de apresentar emendas e modificações ao orçamento, e que não renuncio a esse direito, nem o renunciava, ainda mesmo que não fizesse parte da commissão de fazenda, e que houvesse aliás um excellente parecer d'esta commissão.

Por consequencia a proposta não impede a liberdade da discussão nem da apresentação de qualquer emenda. A commissão de fazenda ha de por força occupar-se do orçamento, ainda que não seja senão para considerar as emendas que forem apresentadas. Pois as leis de fazenda, as leis de imposto e outras de que a commissão se tem occupado, que são senão a questão do orçamento? Ora quer a camara que a commissão de fazenda ponha de parte estas leis de que o governo precisa para viver, ou que se occupe conjunctamente do orçamento, que faça tudo ou que não faça nada, que são quasi sempre synonimos?

Eu pela minha parte declaro que não posso fazer tudo ao mesmo tempo; a minha intelligencia não me chega para tanto. Demais, a camara resolveu que fossem remettidas á commissão de fazenda quaesquer propostas relativas ao orçamento; ora, se se esperasse pelo parecer da commissão sobre o orçamento e sobre as propostas, só muito tarde se poderia dar para ordem do dia. Entendeu pois a commissão que a camara se não devia prender pela falta da apresentação do parecer da commissão (apoiados), e pela minha parte esta auctorisado este meu procedimento, porque pro *puz o mesmo expediente, quando não tinha a honra de ser membro da commissão de fazenda, e quando ainda não formavam a administração os cavalheiros que estão hoje á frente dos negocios publicos.

É por isso que não tive duvida alguma em apresentar hoje o que apresentei nas sessões antecedentes. Hoje parece-me que é mais recommendavel ainda que a discussão d'esta camara verse sobre a questão de fazenda, e eu entendo que a discussão da questão de fazenda tem logar to das as vezes que seja discutido o orçamento.

A prova de que este expediente não póde de maneira alguma tolher a iniciativa dos deputados, é que voto e proponho esta indicação, e ao mesmo tempo estou de accordo com o illustre deputado o sr. Sá Nogueira a respeito de uma verba que deve ser regulada no Orçamento, e que diz respeito á organisação do corpo de engenheria civil.

O meu amigo o sr. João Chrysostomo inseriu essa verba no orçamento, mas depois foi retirada, creio porém que se não deveria proceder assim, porque importou essa modificação em ser sobrecarregada a verba destinada para construcção das estradas.

Não devo abusar mais da attenção da camara, e creio ter apresentado as rasões para que a idéa apresentada seja adoptada pela camara.

O sr. Fernando de Mello (para uma questão previa): — Não tive tempo para formular por escripto a minha questão previa, mas, se v. ex.ª o permitte, eu a enuncio.

O sr. Presidente: — Queira formular verbalmente a questão, para depois a mandar por escripto para a mesa.

O Orador: — Tenho duvida em aceitar a proposta apresentada pelo meu amigo o sr. Carlos Bento em nome da commissão de fazenda, porque a carta constitucional no artigo 46.° diz o seguinte:

«O poder executivo exerce por qualquer dos ministros d'estado a proposição que lhe compete na formação das leis, o só depois de examinada por uma commissão da camara dos deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em projecto de lei».

V. ex.ª sabe que a mais importante proposta que nos póde ser apresentada e a que mais deve merecer a nossa attenção é evidentemente o orçamento gerai do estado.

O orçamento foi apresentado pelo governo e foi remettido á commissão de fazenda, mas a commissão declara que não póde dar o seu parecer sobre elle, porque se acha incessantemente occupada na apreciação de outras propostas offerecidas pelo governo á discussão parlamentar. (Interrupção que não se ouviu). ~

Peço perdão, o que eu tenho na mão é uma proposta em que a commissão de fazenda declara que não póde dar o seu parecer sobre o orçamento geral do estado. Isto não póde considerar-se como parecer sobre o orçamento, quando a commissão é a propria que diz no primeiro considerando d'este documento que, occupada com o exame das propostas do governo, não tem tempo de apresentar parecer sobre aquelle importantissimo assumpto.

E diz ainda mais depois n'outro considerando: «imitemos o que se pratica em paizes estrangeiros, que lá tambem se discute o orçamento sem parecer». Sr. presidente, eu antes de tudo desejava que se respeitasse a nossa lei fundamental.

Póde haver lá fóra cousas muito justas, medidas muito adoptaveis nos diversos paizes, mas nós até aqui ainda reconhecíamos como uma lei muito para ser respeitada e muito em circumstancias de ser applicada no nosso paiz a carta constitucional. Poderei enganar-me, mas nós não lucrâmos e antes temos perdido muito com a importação constante de leis e costumes estrangeiros, preferindo tudo o que vem de fóra ao que temos na nossa terra.

Attendendo ao primeiro considerando d'esta proposta da commissão, apesar de toda a confiança que eu depositava nos seus membros e do muito que eu esperava das suas luzes mais de uma vez provadas n'esta casa e n'outros logares onde têem tido occasião de mostrar os seus vastos conhecimentos sobre as questões de fazenda, vejo que ss. ex.ªs se declaram na impossibilidade por falta de tempo de dar parecer sobre o orçamento, e vista essa impossibilidade que eu muito lamento, parecia-me conveniente approvar o alvitre do meu collega e amigo o sr. Pereira Dias. A camara approvou ha dias a idéa de uma commissão de inquerito, começou mesmo a eleger essa commissão; pois bem, conclua essa eleição, e uma vez que a illustre commissão de fazenda declara que não póde com o trabalho que tem a seu cargo, vá esta commissão de inquerito eleita pela camara servir de supporte á commissão de fazenda. A commissão de fazenda póde continuar a occupar-se das propostas importantes, apresentadas pelo governo, e a commissão de inquerito que se encarregue do exame do orçamento, alliviando assim a commissão de fazenda d'este grande peso.

A commissão de fazenda declara que não póde com tanto trabalho, nós não a podemos obrigar a fazer impossiveis, a camara deve aceitar esta confissão franca, e dar-lhe auxilio, e este auxilio, quanto a mim, deve ser a commissão de inquerito.

Isto é quanto ao primeiro considerando. Agora quanto ao segundo, a pratica dos paizes estrangeiros, creio que é da Prussia e da Inglaterra a pratica a que se refere a illustre commissão, se tem dado bons resultados n'esses paizes, o que eu não contesto nem affirmo, parecia-me justo e consequente que se dispensassem todas as commissões, e mesmo as propostas de fazenda, as taes importantes, que têem estado e estão tão demoradas nas commissões, podiam vir já para a discussão taes e quaes saíram do governo. Não sei porque se ha de poder dispensar o parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento, e se não ha de poder fazer o mesmo a respeito das outras propostas, sejam ou não de fazenda. Pois ha proposta apresentada pelo governo de maior importancia para o paiz do que o orçamento? Não me parece.

Eu dou toda a consideração, tributo todo o respeito, ás proposições de lei apresentadas pelo actual governo, mesmo áquellas de que não percebo bem todo o alcance, o que acontece a muito boa gente, ainda da mais versada nos negocios publicos; mas, apesar de tudo isto, não deixo de considerar em primeiro logar o orçamento do estado.

O orçamento apresentado á camara foi feito ainda pela administração transacta, mas traz certas restricções que são da responsabilidade d'este governo, como o é hoje todo esse documento, e não do outro; é um orçamento importantissimo, porque póde por elle avaliar-se até que ponto foram cumpridas as promessas feitas pelo 'governo da situação actual em presença do paiz; é por consequencia necessario estuda-lo mais do que nunca, para ver se se realisaram taes

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promessas, e como se realisaram. Não digo que a commissão de fazenda teve melindre em eliminar certas verbas e restringir outras que a coherencia do governo pediria que não figurassem na sua lei de despeza ou, pelo menos, na importancia em que figuram; a do campo de Tancos, por exemplo, que é de 60:000$000 réis; não digo que a commissão se quizesse escusar a dar o desgosto, ao sr. ministro da fazenda, de cercear ou eliminar verbas a que s. ex.ª hoje dá grande importancia, bem diversa da que lhe concedeu em outro tempo. A commissão tem independencia de mais para arrostar com esse desagrado do sr. ministro, cerceando aquelles 60:000$000 réis e muitos outros, que não podiam esperar-se no orçamento do actual governo. Foram de certo outras as rasões, pelas quaes a commissão entendeu ser melhor que antes na camara se fizessem as correcções precisas aos esquecimentos anti-economicos do actual governo. Todos nós temos a independencia precisa para eliminar ou diminuir as verbas de despeza que nos parecerem menos proprias das circumstancias actuaes, desagrade a quem desagradar. Primeiro do que tudo esta a conveniencia do nosso dever.

E para que não sirva de pretexto, para se não discutir o orçamento, a rejeição d'esta proposta da commissão de fazenda, logo que a camara tenha decidido a minha questão previa, ainda que a decisão seja contraria á minha opinião, sujeito-me e resigno-me a ponto de não tornar a fallar mais em parecer ou não parecer sobre o orçamento. Mas declaro a v. ex.ª, sr. presidente, que ficarei sempre com a ingenuidade de gostar muito da nossa carta constitucional, que tenho e terei sempre por este livro, pequeno como parece, um amor especial. A camara póde dispensar a carta constitucional, póde dispensar tudo.

Estamos n'uma epocha nova, copiando textualmente o que vem do estrangeiro, e por isso tambem poderemos importar nova constituição para substituir a nossa, que já vae parecendo a muitos um pouco velha.

Não sei se esta presente o sr. Coelho do Amaral, que ainda hontem aqui nos disse que tinha derramado muito sangue por causa da carta constitucional da nossa monarchia. Deve dar por muito mal empregado esse sangue. Isto faz-se e desfaz-se hoje com muito menos incommodo.

(Interrupção.)

Ha muita gente que derramasse sangue pelas conquistas da nossa liberdade, e creio que muito pertencente a diversos srs. deputados, de que v. ex.ª será um. Se eu podesse fallar tambem da minha humilde pessoa, diria que alguem meu muito proximo soffreu, e não pouco, pelo mesmo motivo. De certo o sr. Coelho do Amaral não foi o unico, mas foi um dos que se incommodaram, e, segundo se vê hoje, sem grande proveito.

Se a proposta da commissão de fazenda representa o progresso, sejamos coherentes com o progresso. Dispensemos todas as commissões (apoiados). Se queremos ser coherentes, visto podermos dispensar o parecer da commissão em relação ao orçamento, façamos o mesmo em relação a todas as outras propostas, e em relação a todas as outras commissões.

É verdade, e eu vou terminar, que nós esperámos tempo de mais por esta decisão. Desde que foi apresentado o orçamento, todos os dias se pedia o parecer da commissão e todos os dias se esperava por elle. Já lá vão dois mezes, ou mais de dois mezes, e diz agora a commissão de fazenda que não dá parecer. Não era necessario estar tanto tempo para dizer isto. O melhor era a commissão ter logo declarado que não se occupava do orçamento, não só por falta de tempo, mas por ter os exemplos estrangeiros onde os parlamentos se occupam da discussão do orçamento sem parecer de commissão.

Mando para a mesa a minha questão previa formulada como a entendo, e a camara a tomará na conta que merecer.

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta,

Proponho que á camara resolva previamente, se, em vista dos artigos 46.° e 47.° da carta constitucional, póde dispensar o parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento. Fernando de Mello.

Foi admittida.

O sr. Freitas e Oliveira (para um requerimento): — Requeiro que a moção do sr. deputado Fernando de Mello seja discutida conjunctamente com o parecer da commissão de fazenda que mandou para a mesa o sr. Carlos Bento.

O sr. Presidente: — Não posso admittir isso, porque se lhe oppõe o regimento (apoiados). É uma questão previa e deve discutir-se e resolver-se de preferencia á questão principal. E tem a palavra sobre a questão previa o sr. Carlos Bento.

O sr. Carlos Bento: — Ouvi com toda a attenção as reflexões apresentadas pelo illustre deputado que me precedeu, e confesso sinceramente que desde que lhe ouvi apresentar a sua proposta, tendo na mão o parecer da commissão de fazenda, entendi que s. ex.ª tinha na mão a resposta a essa sua moção.

Com esse parecer da commissão de fazenda estará ou não cumprido o preceito da carta? Pois a carta dictou a fórma por que os pareceres das commissões hão de ser elaborados? O parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento é esse, é que o orçamento apresentado pelo governo sirva de texto á discussão da camara. Esta pois cumprido o preceito da carta.

Mas a commissão de fazenda não pára aqui, a commissão tem de dar o seu parecer sobre as emendas que forem apresentadas na discussão do orçamento, logo ainda' se faz mais do que a carta exige.

E se muitas camaras se têem contentado com um parecer da commissão de fazenda, que não é senão o echo fiel da exposição financeira feita pelo governo, o que significa apresentar-se um parecer em que se diz que se toma para thema da discussão do orçamento o proprio orçamento? Significa evitar-se o trabalho inutil e nem por isso pouco demorado de um longo relatorio em que se dissesse que não havia nada a alterar no orçamento, o que me parece que é prestar um bom serviço ao rapido andamento dos trabalhos parlamentares, nos quaes se póde e deve modificar o orçamento.

A commissão alem d'isso declarou que o exame de propostas, sobre as quaes se tem de apresentar um parecer, podia demorar a apresentação do parecer sobre o orçamento. Pois em que outra occasião se apresentaria o parecer sobre o orçamento com rapidez tal que podesse ser discutido com todo o desenvolvimento que é necessario na apreciação d'este documento, e em que não houvesse talvez objecto tão importante submettido á consideração da camara? Que melhor occasião do que esta?

Mas diz-se = a commissão vem com este parecer tanto tempo depois; porque é que a commissão não apresenta o seu parecer sobre o orçamento? = Digo mais: se procedesse esta especie de accusação, não era crueldade impedir que os illustres deputados que querem fallar sobre o orçamento o não podessem fazer só porque a commissão de fazenda demorava o parecer? Se a questão de fazenda e tão importante, se os illustres deputados estão anciosos por entrarem na discussão do orçamento, não sei como agora querem demorar essa discussão, fazendo questão do parecer.

E ao illustre deputado que disse que o ministro da guerra do ministerio actual anciava com impaciencia a occasião de examinar o parecer da commissão de fazenda sobre certas e dadas questões, dir-lhe-hei que não estou enfeudado ás opiniões do governo e que reservo a minha independencia completa e absoluta; que ha actos do governo cuja responsabilidade deixo de tomar; mas que ha muitos actos que os governos praticam e que são communs a todos os governos em dadas circumstancias, e que se absolvem e aceitam. Mas agora por uma proposta d'esta natureza não me parece que seja occasião de querer descobrir o corpo de delicto da incapacidade dos individuos que assignaram até por subserviencia.

O illustre deputado, a quem faço muita justiça, ha de tambem reconhecer que a impressão de momento o levou um pouco longe na accusação que fez, porque fez injustiça a todos os membros da commissão de fazenda, de que tenho a honra de fazer parte.

O sr. Fernando de Mello: — Sr. presidente, eu creio que fui mal apreciado ou mal entendido nas considerações que fiz para justificar a questão previa que tive a honra de offerecer á decisão da camara. Longe de mim a idéa de querer dirigir á illustre commissão de fazenda qualquer censura ou de lhe querer fazer desagradaveis insinuações. Respeito todos e cada um dos membros de que ella se compõe, e tenho por alguns particularíssima estima.

Quando ha pouco disse que se poderia julgar que a commissão de fazenda para não ter o desgosto de mutilar o orçamento tinha achado por melhor declinar para a camara essa responsabilidade, não perfilhei a idéa, assim como agora não a perfilho, de que a commissão apresentasse o seu parecer sobre o orçamento, imitando o exemplo das suas predecessoras; não seria mais do que o echo do governo. Não perfilho nem aceito.

Fiz sempre justiça á inteireza e independencia da commissão. Por falta de tempo, e por já se não usar nos paizes estrangeiros, a commissão de fazenda não nos diz a sua opinião sobre o orçamento; se não fossem estes dois motivos, propor-nos-ia córtes profundos nas verbas de despeza ou a justificação plena da sua impreterivel necessidade.

Foi este o juizo que sempre fiz, e nem me habilitava a poder fazer outro á proposta que foi mandada para a mesa.

Nem ha tempo, nem já se usa, diz a commissão; e não se perde com isto, disse o illustre relator, porque as commissões de fazenda no orçamento fizeram sempre como os echos: repetem, sem alteração. Apesar de tudo isto eu continuo no meu juizo de que devia haver um parecer sobre o orçamento, como manda a carta constitucional para todas as proposições de lei apresentadas pelo poder executivo, o estou certo de que a camara havia de lucrar muito com os esclarecimentos fornecidos n'esse documento da commissão, porque viria muito já feito do que ha a fazer para que o orçamento corresponda ás promessas do governo.

Se a commissão tivesse tempo de dar o seu parecer sobre o orçamento, e se isso se usasse lá fóra, é para mim fóra de duvida que havia de dar um parecer tão independente como independentes são os membros que a compõem.

Eu creio tambem, como diz o sr. Carlos Bento, que não é corôa de gloria para ninguem cercear uma ou outra verba do orçamento. Sei que as reformas precisas se não fazem com tão pouco. Folgo porém de ouvir dizer que muitas verbas devem ser reduzidas, e por aquelles que não acham grande incoherencia no governo approvando hoje o que tinha rejeitado hontem. Se me referi ha pouco a uma certa verba foi para apresentar um exemplo; mas ha muitas outras, copias fieis de verbas consignadas nos orçamentos da situação transacta, e que então eram desagradaveis a muitos cavalheiros dos que estão sentados n'esta casa, e que hoje lhes merecem os seus affectas especiaes. Podia referir muitas. Mas seja como for, é certo que a commissão de fazenda tem muita independencia para que, apesar dos exemplos das suas antecessoras, desviando-se d'esses exemplos, apresentasse um parecer sobre o orçamento sem ser o echo das propostas do governo, e admira por isso que apresentasse isto que ora se diz parecer sobre o orçamento, ora se chama moção de ordem; já tambem se chamou simples proposta, pedido de dispensa, etc... etc.. e que é apenas, segundo eu julgo, uma declaração assignada pelos illustres membros da commissão de fazenda, na qual se diz o que vou ler =que não póde dar parecer sobre o orçamento =. Note a camara. Se a commissão diz que não póde apresentar o parecer, como se quer agora que esta proposta sirva de parecer?

Digamos a verdade. O parecer sobre o orçamento não se apresenta porque a commissão de fazenda não tem tempo, e porque lá fóra, segundo ella diz, tambem se não usa; por isso a camara póde decidir o que julgar por melhor na sua alta sabedoria; mas o documento que esta sobre a mesa, assignado pelos membros da commissão de fazenda, que é apenas uma declaração, não póde considerar-se o parecer sobre o orçamento, como agora se lhe quer chamar.

(Interrupção que não se ouviu.)

A commissão de fazenda diz que não póde dar o parecer sobre o orçamento, e que se deve prescindir d'isso, não só porque ella não tem tempo para se occupar de tal, mas porque em muitas nações respeitaveis se dispensa essa formalidade.

A camara tem de aceitar ou de rejeitar este alvitre da commissão.

Mas eu pergunto; e essa o a minha questão previa: em virtude da disposição do artigo 46.° e seguinte da carta constitucional, podemos dispensar o parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento? E podendo, será por esta fórma?

Admittindo que se revoguem estes artigos da carta constitucional, podem se-lo simplesmente pela proposta que foi mandada para a mesa pela commissão?

Se a camara póde e quer aceitar a indicação feita na proposta, então o melhor é, e insisto pela minha idéa, dispensar todas as commissões, e entrarem em discussão todas as propostas ou projectos de lei sem pareceres de commissão; revogando-se primeiro em fórma os artigos da carta.

Não se julgue que eu com isto quero prejudicar a resolução das questões de fazenda; o que eu pretendo é, que as cousas se façam segundo as regras e prescripções estabelecidas nas leis e com especialidade na lei fundamental do estado.

A commissão de fazenda tem ouvido aqui todos os dias pedir o seu parecer sobre o orçamento, e só passado mais de dois mezes é que nos diz = que não tem tempo para o formular. = Não é este o documento pelo qual a commissão de fazenda póde provar o seu interesse o desejos pela resolução das questões de fazenda.

Pela minha parte declaro que não duvido do grande desejo que a commissão tem de que se discutam as propostas de lei, que estão affectas ao seu exame. Eu nunca fiz injustiça á commissão, e muito menos ao meu collega e amigo, o sr. Carlos Bento, de quem sou o primeiro respeitador e o mais humilde admirador. Dou publico testemunho de que não duvidei um instante do seu zêlo, interesse e dedicação pelos negocios publicos.

Mas verdade, verdade, o que prova estas qualidades não é a proposta que s. ex.ª apresentou hoje, nos termos em que esta concebida, e depois do dois mezes de repetidos pedidos pela discussão do orçamento, que todos esperavam viesse da commissão de fazenda com o seu respectivo parecer como é de uso e costume, e conforme manda a lei.

O sr. Faria Barbosa: — Requeiro a v. ex.ª, sr. presidente, que consulte a camara sobre se julga ou não sufficientemente discutida a proposta do sr. Fernando de Mello. O sr. Presidente: — Vou consultar a camara.

O sr. F. L. Gomes: — Pergunto: com a questão previa vota-se conjunctamente o parecer?

O sr. Presidente: —Não, senhor. Vota-se a questão previa; e o parecer continua depois em discussão, se a proposta não for approvada.

O sr. Camara Leme: — Peço a v. ex.ª, sr. presidente, que convide a commissão de fazenda a declarar se os membros das outras commissões, delegados dellas, que costumam aggregar-se áquella commissão para o exame do orçamento, foram ouvidos ácerca d'este parecer.

Não me consta que o fossem. Pelo menos a commissão do guerra, a que tenho a honra de pertencer, não nomeou delegado.

E admira que não se procedesse a esta formalidade.

O sr. Presidente: — Vae votar-se sobre se a questão previa esta ou não discutida.

O sr. Magalhães Aguiar: — Requeiro votação nominal.

O sr. Presidente: — Consulto a camara ácerca do modo por que se ha de proceder á votação da proposta.

Foi consultada a camara.

O sr. Secretario Tiberio: — Esta resolvido que a votação seja nominal, porque votaram 37 srs. deputados a favor, e 78 contra, e a este respeito decide um terço de votos conformes.

O sr. Carlos Bento (sobre o modo de propor): — Eu voto a proposta do sr. Fernando de Mello, e a proposta da commissão.

E preciso distinguirmos. A proposta da commissão não importa a revogação de artigo da carta, a que o illustre deputado se refere; esta proposta na occasião presente é o parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento (apoiados).

A commissão, na impossibilidade de examinar convenientemente o orçamento, entendeu que elle devia ser dado desde já como texto para a discussão, e propõe-se a dar o seu parecer sobre as emendas que se propozerem ao orçamento.

Logo a commissão de fazenda não teve, nem podia ter, a pretensão de revogar o artigo da carta.

E se a proposta do sr. deputado é a revalidação d'esse artigo, eu voto-a.

O sr. Fernando de Mello (sobre o modo de propor): — Visto que estamos em explicações do que quer dizer a minha proposta em relação a este parecer, não posso deixar

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de notar, e desejo que consignado, que a commissão declarou que não formulava parecer sobre o orçamento, que não o apresentava á camara, que não o podia apresentar porque não tinha tempo para o formular.

Ligue a camara a minha proposta com o que esta escripto, e tire as consequencias que quizer.

Agora peço a v. ex.ª sr. presidente, que ponha á votação nominalmente a minha proposta, como esta decidido.

Vozes: — Não se venceu que a votação fosse nominal.

O Orador: — Esta decidido que fosse nominal. Só se querem agora reconsiderar!

Vozes: — Não houve vencimento.

O Orador: — A mesa ainda ha pouco declarou que houve vencimento, appello para o sr. presidente...

O sr. Presidente: — Logo que haja um terço que approve, esta resolvido que haja votação nominal.

O Orador: — Mas V. ex.ª declarou que estava resolvido que a votação fosse nominal.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Peço perdão, eu enganei-me e vou rectificar o meu engano (susurro), não fica isso mal a ninguem. Confundi-me quando disse que um terço dos srs. deputados tinha approvado que houvesse votação nominal, porque votaram 78 contra e 37 a favor, façam os srs. deputados a conta, e verão que 37 não é o terço dos srs. deputados que votaram, e por consequencia não esta resolvido que a votação seja nominal.

O sr. Fernando de Mello: — Attendendo á possibilidade dos enganos, requeiro que a votação se verifique nominalmente.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Não me enganei eu só, muitos srs. deputados tambem se enganaram. Vozes: — Esta votado, esta votado.

O sr. Secretario (José Tiberio): — Mas esta votado que a votação não seja nominal, porque effectivamente não foi approvada pelo terço dos srs. deputados presentes.

O sr. Carlos Bento: — Eu creio que não é modo de votar uma proposta não attender ás circumstancias em que se vota.

Esta questão, na minha opinião, não esta bem esclarecida.

O illustre deputado não leu todo o artigo 46.° da carta desde o principio até ao fim. Esse artigo diz o seguinte:

«O podér executivo exerce, por qualquer dos ministros d'estado, a proposição que lhe compete na formação das leis, e só depois de examinada por uma commissão da camara dos deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em projecto de lei.»

Em projecto de lei, logo o orçamento não póde ser convertido em projecto de lei sem que haja um parecer da commissão sobre esse projecto. E ha de have-lo por força, porque todas as emendas que se apresentarem hão de em resultado ser approvadas ou rejeitadas pela commissão.

O sr. Presidente: — Como o sr. deputado pediu a palavra sobre a ordem, queira ler a sua moção de ordem.

O Orador: — É a seguinte (leu).

Leu-se na mesa a seguinte

Proposta,

Requeiro que a camara declare se a proposta da commissão de fazenda importa a alteração dos artigos 46.° e 47.° da carta constitucional. = Carlos Bento da Silva = José de Moraes Pinto de Almeida.

O sr. Fernando de Mello: — Peço a palavra sobre o modo de propor.

O sr. Presidente: — Quantas vezes quer que lhe dê a palavra sobre o modo de propor?

O sr. Fernando de Mello: — Quantas eu entender que é necessario para apresentar alguma proposição; e a mesma rasão que houve para V. ex.ª a dar agora ao sr. Carlos Bento ha para m'a dar a mim.

O sr. Presidente: — Mas eu lembrei ao sr. Carlos Bento que tinha a palavra sómente sobre o modo de propor, e chamei-o á questão. Mas tem a palavra.

O sr. Fernando de Mello: — Eu queria ler apenas o artigo 47.° da carta, porque na minha questão previa citei só o artigo 46.°

O artigo 47.° diz:

«Os ministros podem assistir e discutir a proposta depois do relatorio da commissão, mas não poderão votar nem estarão presentes á votação, salvo se forem pares ou deputados».

Aqui tem V. ex.ª o que diz o artigo 47.° Esqueceu-me pôr na minha proposta a citação do artigo 47.°, e se v. ex.ª dá licença eu junto á proposta a referencia ao artigo 47.°, porque completa a minha idéa. O artigo 47.° diz que só se póde votar depois do relatorio da commissão; a commissão declara que não manda relatorio, e agora vote a camara como entender.

Vozes: — Já esta votado.

O sr. Presidente: — Continua em discussão a proposta do sr. Carlos Bento.

O sr. Magalhães Aguiar: —V. ex.ª não poz á votação a proposta nominalmente, como eu requeri.

Vozes: — Foi rejeitado.

Outras vozes: — A mesa declarou que o requerimento tinha sido approvado

O sr. Secretario (José Tiberio): — Foi um engano da minha parte, e assim como eu me enganei têem-se enganado muitos srs. deputados. O requerimento do sr. Magalhães Aguiar foi rejeitado (apoiados).

Posta á votação a proposta do sr. Fernando de Mello, foi rejeitada.

O sr. Presidente: — Quem tem a palavra é o sr. Freitas e Oliveira.

O sr. Freitas e Oliveira: — Sr. presidente, não pagarei á vista o quinau que v. ex.ª me deu, por eu ignorar uma das disposições do regimento; não commentarei os factos que já depois d'aquelle quinau aqui se passaram, e que demonstram bem que o regimento tambem é ignorado por quem nunca o deveria esquecer.

A escassez dos meus dotes philarmonicos não me permittem que acompanhe o meu amigo o sr. Pereira Dias nos hymnos que hoje e hontem tem entoado ao ministerio. Tenho pouca vocação para a musica, e em questão de hymnos só sei cantar o da Maria da Fonte.

Não sei se é novidade ou antiguidade o parecer ou proposta da commissão de fazenda, nem isso me é preciso para votar d'este ou d'aquelle modo, ainda que em materia de processos politicos me parece que em geral vota pelo melhor o que votar pela novidade.

Mas apesar d'este processo, que a illustre commissão de j fazenda nos propõe, me parecer uma novidade, eu não posso vota-lo sem declaração.

Se a discussão do orçamento, a que nos convidam por este modo, importa o adiamento das propostas de fazenda apresentadas pelo governo, não voto a proposta da commissão. Se porém a discussão do orçamento sem parecer da commissão não pretere a discussão das propostas apresentadas pelo governo, não tenho duvida em votar esta innovação.

Eu supponho que esta proposta é uma questão entre a commissão de fazenda e os illustres deputados que hontem pediam e instavam com o governo para que lhes assegurasse a discussão do orçamento se queria que elles lhe votassem a lei de meios. A commissão, que não tinha ainda dado parecer sobre o orçamento e que o não podia dar tão cedo, vem hoje e diz: «Não temos tempo para dar parecer, mas propomos que se discuta o orçamento sem elle, e que depois as propostas que forem mandadas para a mesa se remettam á commissão para dar sobre ellas o seu parecer». Esta é a questão.

Declaro portanto que voto a proposta, comtanto que me assegurem que por este meio se não vae preterir a discussão das propostas do governo, que todas ellas alteram e modificam o orçamento, que por isso devem logicamente ser discutidas primeiro.

O sr. Falcão da Fonseca: — Pouco tenho a dizer em relação á proposta mandada para a mesa pelo illustre deputado o sr. Carlos Bento.

O sr. F. L. Gomes: — Parecia-me que eu tinha pedido a palavra antes do sr. Falcão.

O sr. Falcão da Fonseca: — Eu peço a v. ex.ª, sr. presidente, que me consinta ceder da palavra ao sr. Francisco I Luiz Gomes.

O sr. Presidente: — Então tem a palavra o sr. Gomes.

O sr. F. L. Gomes: — Eu gosto de cumprir fielmente o regimento, porque não sinto em mim forças nem dotes precisos para resgatar devida e promptamente essas infracções. Isso é privilegio de poucos.

Asseguro á camara que as agitações, que n'esta casa se succederá com tanta frequencia, não podem de fórma alguma seduzir ou tentar a minha imperturbável serenidade.

Pedi a palavra, para declarar que tenho escrupulos em votar a proposta que o meu illustre amigo, o sr. Carlos Bento, mandou para a mesa, em nome da commissão de fazenda.

É sempre com pezar que eu divirjo das opiniões do nobre deputado, e é sempre com esforço que o contrario.

Tenho escrupulos em votar a proposta em discussão, porque sou o primeiro a fazer justiça á nobre commissão de fazenda. Esta proposta é um documento grande de modestia e de zêlo, e é por isso mesmo que eu não a posso approvar nem a aceito, principalmente depois das explicações do sr. Carlos Bento da Silva.

Disse o illustre deputado, o sr. Carlos Bento, que = os pareceres das commissões de fazenda sobre o orçamento têem sido até aqui echo continuado de um e unico parecer =. Não quero agora discutir se isto é verdade ou não; mas o que posso affirmar a v. ex.ª é que, se os pareceres ate aqui têem sido echo, não podiam sê-lo n'esta occasião e n'esta conjunctura em que a discussão do orçamento, discussão precedida de todos os esclarecimentos, dados e estudos que só uma commissão composta de homens competentes póde prestar, é para nós não só um dever do nosso cargo, mas uma necessidade do nosso patriotismo (apoiados.)

Ouço fallar todos os dias na questão financeira e nas suas difficuldades, a uns com sustos exagerados talvez, a outros com temores, a alguns com cuidados e a todos com igual patriotismo.

Applaudo este despertar da opinião publica, que, se chega tarde para reparar o que perdemos, e que não é pouco, ainda vem a tempo para salvar o muito que resta.

Pois é n'esta occasião em que o paiz espera com anciedade a discussão do orçamento, n'esta occasião, repito, em que a questão financeira absorve todos os nossos cuidados e attenções, que havemos de prescindir do exame previo do orçamento, feito pela respectiva commissão?

Pois havemos de dispensar-nos da luz que póde lançar a opinião da commissão, quando as nossas finanças se apre: sentam mais tenebrosas? O nobre deputado que é membro da commissão diz ter pouca fé no seu parecer, póde dizer que sim; mas eu tenho toda a confiança na commissão, digo que não.

Não basta fallar na questão de fazenda nem dizer que discutimos o orçamento, é preciso que esta vontade e desejos sejam traduzidos em factos reaes e evidentes, que não deixem duvida alguma sobre a sinceridade das nossas expressões.

E pena que o sr. ministro da fazenda não se lembrasse d'este expediente, quando ainda ha poucos dias tão solicito perguntava por noticias do orçamento, se elle andava ou se estava a dormir! Ter-se-ia poupado a muitos cuidados. E

O orçamento podia ter estado em discussão logo que foi apresentado!

Não sei se á camara me permittirá discutir a questão prévia que já foi votada, mas ha de consentir de certo que declare que, quando pedi a palavra, os meus escrupulos tambem se fundavam nos artigos 46.° e 47.° da carta. Elles exigem o exame da commissão antes da discussão. Isto é claro.

Eu não posso aceitar como parecer sobre o orçamento a negação do mesmo parecer. Ora, quando a commissão diz que = por diversos motivos não póde dar o seu parecer sobre o orçamento =, é claro que pede uma dispensa d'esse mesmo parecer. Se isto é claro e evidente, não podemos aceitar essa escusa do parecer como substituição do mesmo parecer.

Mas diz-se que a commissão propõe que se tome o orçamento como thema da discussão! O orçamento ha de ser thema da discussão, porque foi apresentado n'esta casa, e como todas as propostas do governo ha de ser aqui discutido. Parece-me que até aqui o parecer não dá nenhuma novidade, nem posso conceber como parecer da commissão de fazenda sobre o orçamento o que a mesma commissão do fazenda tenha de dar sobre as diversas emendas, additamentos ou substituições que qualquer dos membros n’esta casa possa mandar no decurso da discussão. Tudo - o que ouço é inversão do que aconselha a logica e a pratica longamente seguida n'esta casa.

Ora, nós desejâmos com anciedade a discussão do orçamento (apoiados), mas esta anciedade não suppõe a preterição das formalidades que foram sempre consideradas como garantias da boa discussão. Não queremos uma discussão por mera formalidade, mas como ella deve ser, esclarecida e util. Devo portanto dizer ao illustre deputado e meu amigo o sr. Freitas e Oliveira, que não estão em contradicção aquelles que hontem pugnaram pela discussão do orçamento, não prescindindo hoje da apresentação de parecer da commissão de fazenda. São apenas estes os escrupulos que sentia para approvar a proposta da commissão de fazenda, apresentada pelo meu nobre amigo o sr. Carlos Bento da Silva.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Falcão da Fonseca: — Já vae larga a discussão sobre a proposta mandada para a mesa pela illustre commissão de fazenda, e ao que se tem dito de ambos os lados da camara pouco mais tenho a acrescentar.

Quando ouvi ler a proposta que tanto se tem discutido, confesso a v. ex.ª e á camara que tive alguns escrupulos, porque julguei haver uma certa inconstitucionalidade no que se propunha; porém, em vista do artigo 46.° da carta, que logo consultei, dissiparam-se esses escrupulos e declaro que nenhuma duvida tenho em votar a proposta.

O artigo diz o seguinte:

«O podér executivo exerce por qualquer dos ministros d'estado a proposição que lhe compete na formação das leis, e só depois de examinada por uma commissão da camara dos deputados, aonde deve ter principio, poderá ser convertida em projecto de lei.»

Pareceu-me que na proposta mandada para a mesa pela commissão de fazenda a commissão pretendia eximir-se de dar o seu parecer sobre a importante questão do orçamento; mas ao contrario o que a illustre commissão pretende é que se dê a maior latitude possivel á sua discussão, como questão magna vital do paiz, e consequentemente só tenho a louvar os illustres membros da commissão pela apresentação da sua proposta.

E votando eu esta proposta, sr. presidente, reconhecerá V. ex.ª e a camara que da minha parte ha toda a coherencia.

No dia 12 d'este mez tive eu a honra de mandar para a mesa uma proposta, que peço licença para ler, a qual foi approvada pela camara na sessão do dia 15.

A proposta é a seguinte:

«Proponho que os srs. deputados possam apresentar quaesquer propostas sobre o orçamento, independentemente da sua discussão, a fim de serem enviadas á commissão de fazenda, e esta poder aprecia-las devidamente, dando o seu parecer quando tiver de dar a sua opinião a respeito das mais propostas que forem apresentadas na discussão.»

Esta [proposta, como disse, foi approvada, e pelo enunciado d'ella se vê que as minhas idéas estão de accordo com as manifestadas pela illustre commissão de fazenda na sua proposta.

• Louvando o expediente que a mesma commissão tomou, aproveito o ensejo para lembrar a v. ex.ª e á camara a grande conveniencia que haverá em se tratar da discussão do orçamento em sessões nocturnas; d'esta fórma teriamos muito mais tempo para nos occuparmos d'este importantissimo assumpto; e por minha parte declaro que, se até ao dia 25 d'este mez não começar a discussão do orçamento, desde já me comprometto a apresentar uma proposta naquelle sentido; estimarei que seja approvada; se o não for, senti-lo-hei.

Parece-me que não teria vindo fóra de proposito se o illustre relator da commissão tivesse declarado á camara o dia, pouco mais ou menos, em que seria possivel apresentar o parecer. S. ex.ª não o declarou e isso pouco importa, nem é circumstancia que me obrigue a rejeitar a proposta mandada para a mesa, pois o artigo da carta é bem explicito quando diz: «A proposta do governo não poderá ser convertida em projecto de lei, sem que preceda o competente parecer das commissões». E é claro que a illustre commissão de fazenda é a propria que diz que = offerecêra o seu parecer depois de examinadas as propostas que forem enviadas para a mesa =, e só então a proposta do governo será! convertida em projecto de lei.

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Antes de concluir direi ainda que tento visto com bastante sentimento a maneira por que tem corrido hoje a discussão; tem-se gasto um tempo infinito e esterilmente.

Esta maneira de discutir e de desperdiçar o tempo, sem querer censurar a nenhum dos meus illustres collegas, desgosta-me summamente. Eu entendo que todas as questões que vem a esta casa devem ser tratadas com a devida seriedade, e desgraçadamente vejo que, por mais importantes que sejam as questões de que se trata, como esta que é a questão mais séria e mais grave que temos a resolver, não ha pretexto que se não busque para procrastinar o debate. Creia.v. ex.ª e a camara que isto não póde deixar de ser visto com muito desgosto pelo paiz! Elle esta aqui representado, mas tambem o esta naquellas galerias, e em toda a parte onde chega o Diario com a publicação das nossas sessões.

Portanto, em compensação do tempo perdido ou antes desperdiçado com a discussão que hoje teve logar, pedindo á camara me não leve a mal, peço a v. ex.ª que a consulte sobre se quer que se prorogue a sessão até ás cinco horas da tarde, e tenho concluido.

Vozes: — Muito bem.

O sr. Faria Guimarães: — Pedi a palavra sómente para explicar o sentido que eu ligo á proposta da commissão, em que estou assignado como membro da commissão de fazenda. A proposta não tem por fim poupar á commissão o exame do orçamento, que ella deve e ha de' fazer, e depois do qual dará o seu parecer. Tem por fim apressar a apreciação & discussão do orçamento pela camara, a fim de que cada um dos srs. deputados possa fazer as suas indicações ou propostas, que vão á commissão para dar conjunctamente o seu parecer sobre ella e sobre o orçamento. -V. ex.ª e a camara sabem, que a respeito de orçamento, seja qual for o parecer da commissão, não é por este que se regula a discussão, mas sim pelo proprio orçamento. O que varia é ser por ministerios, por capitulos, ou por artigos; mas discute-se sempre pelo orçamento e depois é que se votam as propostas de lei de despeza e de receita.

São estas as explicações que julguei dever dar para que se não pense que a commissão se quer eximir ao cumprimento do seu dever.

O sr. Presidente: — Esta esgotada a inscripção.

O sr. Aragão Mascarenhas: — Peço a v. ex.ª que tenha a bondade de me dizer se eu estava ou não inscripto logo depois do sr. Pereira Dias.

O sr. Presidente: — Tem V. ex.ª rasão. Estava inscripto, e eu peço-lhe mil perdões; mas tem agora a palavra.

O sr. Aragão Mascarenhas: — -Fico satisfeito com essa informação, e não desejo usar agora da palavra.

O sr. Presidente: — Então vae votar-se.

O sr. Magalhães Aguiar (sobre o modo de propor): — Requeiro a v. ex.ª que consulte a camara sobre se quer votação nominal.

Consultada a camara resolveu negativamente, e posta á votação a proposta da commissão de fazenda foi approvada.

O sr. Presidente: — Peço a attenção da camara.

O sr. Falcão da Fonseca, quando ha pouco concluiu o seu discurso, fez um requerimento para que a presidencia consultasse a camara sobre se queria que o tempo, que s. ex.ª julga mal empregado por esta camara em certa discussão, fosse resarcido prorogando-se a presente sessão até as cinco horas da tarde.

Vou submetter este requerimento á votação..

Foi rejeitado.

O sr. Presidente: — O sr. Barros e Sá tinha pedido a palavra para quando terminasse o incidente que se concluiu ha pouco.

O sr. Barros e Sá: — Eu desejava dizer á camara duas palavras, que não lhe tiram talvez dois minutos. Se v. ex.ª e a camara consentem, usarei da palavra.

Vozes: — Falle, falle.

O sr. Presidente: — Em vista d'esta manifestação, tema palavra.

O sr. Barros e Sá: — Sr. presidente, hontem depois de já encerrada a sessão, fui prevenido por um amigo antigo, o sr. Correia Caldeira, de que durante a discussão me escapara uma palavra que, tendo offendido-a susceptibilidade do sr. presidente do conselho, fôra ao mesmo tempo mal aceita pela camara. Bastava a auctoridade do meu nobre e honrado amigo para me arrepender de haver proferido essa palavra que me abstenho de indicar; mas desde que me foi invocada a auctoridade da camara, o arrependimento não basta, julgo do meu dever pedir licença para a retirar. Eu não a proferi no sentido natural ou vulgar, como bem comprehenderão aquelles srs. deputados que se recordarem que eu na resposta ao sr. Saraiva de Carvalho, que traçou a valia, examinei quaes foram as ovelhas que haviam ficado de cá e de lá da valia. Fallei no sentido figurado, e portanto sem allusão injuriosa. Como porém ainda assim a expressão desagradou, peço licença para a eliminar do discurso, e desejo que fique eliminada da memoria dos meus illustres collegas que constituem a assembléa.

Vozes: — Muito bem, muito bem.

O sr. Presidente: — Passa-se á discussão do parecer n.° 6, e tem a palavra, como relator da commissão, o sr. Antonio José Teixeira.

O sr. A. J. Teixeira: — A camara, rejeitando por unanimidade o adiamento proposto pelo sr. Carlos Testa, e por grande maioria os outros adiamentos, dispensa-me de os combater agora de novo, até porque não desejo por maneira alguma transgredir as disposições do regimento d'esta casa. Mas, como a respeito da materia do artigo 1.°, que esta em discussão, se têem produzido outra vez argumentos contra a generalidade do projecto, eu, como relator da commissão, não posso deixar de dizer ainda duas palavras, e peço a v. ex.ª, sr. presidente, e á camara, me permittam acompanhar os meus illustres collegas n'essa liberdade, que julgaram dever tomar.

Os differentes oradores, que trataram de impugnar o parecer, confundiram os interesses com os direitos adquiridos; porque entenderam que o estado, tendo feito um contrato com os funccionarios publicos, para lhes remunerar de certo modo os serviços, que elles lhe prestam, não podia tirar-lhes as vantagens, que lhes concedeu, porque isso seria quebrar uma das partes contratantes as condições d'esse contrato.

Sr. presidente, um contrato na accepção rigorosa e juridica da palavra não faz de certo o estado com os funccionarios publicos; faz sim, se quizerem, um contrato na accepção lata da palavra, ou antes um pacto: mas aceitando mesmo que fosse um verdadeiro contrato, ha differentes condições, a que elle esta sujeito, e pede a boa fé na argumentação, que se enumerem por um e outro lado (apoiados).

Assim como o funccionario publico póde livremente largar o serviço, tambem o estado esta no seu direito regulando as condições, com que esse serviço ha de ser desempenhado. Em rigor á faculdade, que o empregado tem, de saír quando quizer, devia corresponder identica faculdade ao governo, para o despedir, quando lhe aprouvesse; mas a isto oppõe-se, em beneficio da communidade, um interesse mais elevado, que dá a alguns servidores do estado a permanencia, para elles poderem exercer o cargo com independencia, evitando-se os abusos do poder executivo. Já se vê que são muito differentes as condições d'esses suppostos contratos, estipuladas nas nossas leis, e sujeitas todas a serem alteradas por outras leis. São de sua natureza temporarias; e esta casa, onde reside a soberania do paiz, póde modifica-las, sempre que o julgue conveniente, como na actualidade, em presença das difficeis circumstancias, que vamos atravessando (apoiados).

As jubilações datam de 1654. Eram um privilegio, como muitos outros que acabaram, quando se estabeleceu o regimen constitucional. Aquelle todavia ficou; e em nome de um interesse mais elevado, que o dos funccionarios, estendeu-se, pelos decretos de 1836, a todos os professores de instrucção publica, encurtando-se o termo das jubilações a vinte annos; e pelo decreto de 20 de setembro de 1844 tornou-se outra vez a estender a trinta annos como primitivamente. Mas nunca houve o mais pequeno escrupulo, nunca ninguem contestou o direito, em que o governo e o poder legislativo estavam, de augmentar ou restringir essas vantagens ou privilegios, que já em 1654 eram considerados otium cum dignitate.

Uma voz: — -Ocio honroso.

O Orador: — Sim, ocio honroso, ou ocio permittido pelas leis daquella época.

O mesmo que se dá com as jubilações acontece a respeito das reformas. Eu tenho aqui presente a legislação de 1790 e 1816, e posso assegurar a v. ex.ª e á camara, que as reformas para os militares não eram concedidas como um direito, mas unicamente como uma graça áquelles que mais se distinguiam na guerra, ou se impossibilitavam de servir; eram então o que são hoje as chamadas pensões de sangue, é sempre concedidas em virtude das informações honrosas dos commandantes (apoiados).

Por consequencia não ha tambem preceito algum, que possa impedir os poderes publicos de regular esta materia, da maneira que entenderem mais conveniente ao estado (muitos apoiados).

Em 1836, e em 1844, e ultimamente pela lei de 17 de agosto de 1853, entendeu-se que as jubilações para os professores, e tambem as aposentações para os magistrados, com os respectivos augmentos do terço, eram a maneira de convidar aquelles funccionarios a continuarem no serviço ou a fazerem-n'o melhor; mas como até ali se entendeu assim, tambem hoje se 'póde entender de um modo diverso. Então julgou-se conveniente o que se estabeleceu; hoje o interesse da sociedade exige, que estes assumptos se regulem de outro modo; e o que se póde fazer então n'um sentido, não ha rasão alguma para que se não possa hoje fazer n'outro (muitos apoiados).

E onde nos levaria a theoria contraria? Qual seria a consequencia atirar, se se pozesse em duvida o direito, que têem os poderes publicos de regular como entenderem mais conveniente ao paiz estes assumptos? Estabelecida tal theoria tambem se não podiam fazer deducções nos vencimentos dos empregados publicos, porque o empregado foi contratado por certo preço, e por consequencia o governo não podia fazer-lhe deducção (apoiados). E digo mais, nem o estado tinha direito de augmentar os tributos, porque os individuos que entraram para o pacto social, tambem tinham jus a queixar-se, e a contestar o direito com que esta camara lhes augmentasse os tributos. Ora, nem isto póde ser, nem a camara o póde querer (apoiados).

Sr. presidente, se fosse preciso, para defender o projecto, produzir mais alguns argumentos, do que aquelles que se têem aqui apresentado em seu favor, bastaria notar o differente modo, por que elle tem sido atacado, para concluir que a medida é justa e igual (apoiados).

Tomei alguns apontamentos das principaes rasões apresentadas pelos differentes oradores (e não distingo os que se apresentaram a favor e fallaram contra); de todos que fallaram sobre o projecto, excepto aquelles que realmente trataram de defender as suas disposições. Creio que todos com boa fé usaram da inscripção; mas depois illudiram-n'a, e trataram de outros assumptos; e mesmo alguns, que pediram a palavra a favor, fallaram contra.

Respondendo a esses argumentos direi, por exemplo, que o meu antigo amigo, collega e condiscipulo, o sr. Mathias de Carvalho, acha esta medida por si só iniqua e desigual; e entende que devia ser extensiva a todos os funccionarios publicos, não declarando todavia s. ex.ª o modo como. Em todo o caso affirmou que, para se tornar igual, era preciso que fosse extensiva a todos os empregados; mas d'ahi a pouco, por uma notavel contradicção do seu espirito esclarecido; exceptuou os professores de instrucção primaria, querendo ao mesmo tempo, que esta medida fosse applicada a todos os funccionarios publicos para ser igual e equitativa! D'ahi a pouco, repito, exceptuou uma classe de funccionarios, que entendo esta muito mal retribuida, mas que não é agora occasião propria para ser attendida. A reforma da instrucção publica ha de ser apresentada; é uma necessidade (apoiados); e então é occasião para darmos a estes funccionarios o que lhes é devido, porque todos sabem que os seus vencimentos na realidade são muito pequenos.

Mas s. ex.ª, ao passo que achava esta medida iniqua e desigual, e queria exceptuar d'ella os professores de instrucção primaria, dizia tambem que eram extraordinariamente graves as circumstancias do nosso thesouro, a ponto de talvez correr perigo a independencia do paiz. E aqui s. ex.ª mostrava-nos que comprehendia perfeitamente a situação da fazenda publica, e que entendia dever-se dar a este mal prompto remedio. S. ex.ª foi coherente dando o seu voto de approvação á generalidade do projecto; mas estas palavras e o voto do illustre financeiro protestaram contra as suas expressões, proferidas não quero dizer com paixão de politico, ou por amor de classe (muitos apoiados).

O sr. Costa e Almeida disse —que o projecto era tão mau, que exigia os funccionarios publicos arrastarem-se até á decrepitude, para poderem exercer os seus logares—; e logo em seguida o sr. Sá Carneiro, que foi n'esta casa, supponho eu, o echo daquelles militares, que com s. ex.ª se queixam, mas creio que sem rasão...

Uma voz: — Sem rasão?!

O Orador: — Estou convencido d'isso, e vou mostra-lo.

O sr. Sá Carneiro disse — que os militares haviam de trabalhar até se inutilisarem por um ataque de paralysia ou de alienação mental, entendendo que perdia muito com isto o serviço publico—. Não é exacto nem para os militares, nem para os professores, nem para os juizes. Já vieram as queixas dos militares, já vieram as queixas dos professores, e estou persuadido que hão de vir ainda as dos juizes.

Uma voz: — Não vem.

O Orador: — Hão de vir, e é justo que venham; devem ouvir-se todos, porque são as tres classes mais directamente comprehendidas n'este projecto.

Mas o sr. Sá Carneiro disse — que os militares haviam de trabalhar até se inutilisarem ou por um ataque de paralysia, ou de alienação mental, e que só n'estas circumstancias seriam reformados—. Digo francamente a v. ex.ª, e á camara, que não póde ser tal a interpretação que se deve dar á medida. Que faz o projecto? Reduz as cousas, pelo que diz respeito a reformas, ao mesmo estado em que estavam antes da lei de 8 de junho de 1863.

O sr. Camara Leme: — Esta enganado.

O sr. Sá Carneiro: — Apoiado. Peço a palavra.

O Orador: — Digo que até á lei de 1863 os militares só podiam reformar-se por impossibilidade physica. N'aquella data é que se concederam as reformas por diuturnidade de serviço.

O sr. Camara Leme: — Mas sem consulta.

O Orador: — São cautelas necessarias, porque a lei não deve estar sujeita a ser sophismada constantemente. Repito, até á lei de 8 de junho de 1863, os militares não podiam ser reformados senão por impossibilidade physica. Que faz o projecto? Faz o mesmo que estava feito antes da promulgação d'aquella lei (apoiados).

Agora aproveito a occasião para levantar uma expressão, que sendo proferida na melhor fé pelo sr. Sá Carneiro, não é applicavel ao caso de que se trata. S. ex.ª disse que o projecto ia atacar completamente a instituição militar, que o projecto tinha por fim acabar com o exercito.

Os srs. Camara Leme e Sá Carneiro: — Apoiado.

O Orador: — Não ha nada d'isto, nada absolutamente. Eu se não acreditasse na boa fé de ss. ex.ªs diria, que essas expressões tinham um outro fim, mas eu acredito piamente nas intenções dos illustres deputados. Estou persuadido que ss. ex.ªs estão illudidos. O projecto não tende a acabar com o exercito, como dizem os illustres impugnadores, o projecto colloca o exercito, quanto a reformas, no mesmo estado em que elle se achava antes da lei de 8 de junho de 1863; e até esta epocha já o exercito tinha paginas muito gloriosas na historia, sem haver as reformas por diuturnidade de serviço. Como é que os militares, até á publicação da lei de 8 de junho de 1863, se reformavam? Por incapacidade physica. E que faz este projecto? Reforma os militares d'esse mesmo modo, por incapacidade physica.

Mas é notavel que, ao passo que dois illustres deputados julgam que o projecto tende a acabar com o exercito, outro nosso collega acha-o deficiente, e declara que elle deixa as cousas no mesmo estado, e um terceiro faz mais, affirma convencido que elle, em vez de produzir economias, vae estimular o contrabando das jubilações e reformas! De maneira que os impugnadores do projecto combatem-se uns aos outros, e eu podia deixar de o defender, porque elle está defendido com esta divergencia de opiniões dos seus impugnadores. Mas nenhum argumento me parece que tem ficado sem resposta, a não ser um produzido pelo sr. Pereira Dias, meu collega e amigo, a quem no logar competente logo responderei.

Ha comtudo umas contradicções de que tomei nota, e de que preciso ainda fallar. Os srs. Costa e Almeida e Pereira Dias acham que as jubilações e os terços são até certo ponto uma compensação, correspondente aos pequenos ordenados dos professores; mas o sr. Pereira Dias separou-se n'esta parte dos seus collegas impugnadores do projecto, e

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elevou-se á verdadeira altura da questão, porque disse com toda a franqueza que os terços deviam acabar, e que se devia proceder quanto antes á reorganisação da instrucção superior. Estou plenamente de accordo com s. ex.ª, e entendo que é então o logar proprio para dar aos professores ordenados condignos (apoiados).

E necessario começar a retribuir os funccionarios por igual; é necessario fazer as economias que sejam possiveis; e este projecto é não só de economias, mas ainda tem por fim regularisar os vencimentos de uma maneira geral, ficando todavia as saídas do serviço por incapacidade physica.

Os srs. Costa e Almeida e Costa Simões defendem, com todas as suas forças, os terços; o sr. Pereira Dias não quer os terços; outros illustres deputados tambem impugnadores do projecto, e a representação da universidade de Coimbra, igualmente não querem os terços; e na verdade todas estas contradicções se podem indirectamente tomar como a favor da justiça do projecto que se discute (apoiados).

O sr. Costa e Almeida, que com toda a energia sustentou os terços, declarou que elles eram uma economia para o estado.

Permitta-me s. ex.ª lhe diga, que effectivamente os terços eram uma economia para o thesouro, nos casos em que o professor podia desempenhar o serviço, continuava a desempenha-lo por mais uma terça parte apenas, e não ía outro occupar o seu logar, mas por este projecto o professor trabalha emquanto póde trabalhar (apoiados).

E até pela legislação anterior a este projecto, se havia uma pequena economia para o thesouro, havia um grande desperdicio para a sciencia (muitos apoiados); porque parte dos professores, com a expectativa nos terços, nunca se julgavam em circumstancias de largar o serviço, e este por consequencia era por vezes mal feito.

Uma voz: — Mas agora fica sendo sempre.

O Orador: — Não fica, porque o estado quando vir que o professor não esta nas circumstancias de continuar a servir põe-o fóra, guardando, já se vê, as formalidades legaes.

Uma voz: — Nunca o fez, nem fará.

O Orador: — Salvo se o governo não cumprir com o seu dever; mas se o cumprir, tem obrigação de propor a jubilação do professor que não exercer bem o seu logar (apoiados).

Mas o sr. Costa e Almeida declarou que aceitava este sacrificio, que o desejava estender a todas as classes de funccionarios, e até assignou uma proposta de um collega nosso, em que esse pensamento se achava consignado.

Todavia permitta-me o illustre deputado, o sr. Costa e Almeida, que lhe diga, que as bases d'essa emenda são muito arbitrarias, e s. ex.ª, querendo tributar por igual todos os funccionarios, vem tributar duas vezes alguns dos comprehendidos n'este projecto! Entretanto parece-me que o illustre deputado não tomará grande calor pela defeza d'aquelle pensamento.

S. ex.ª calculou o valor dos terços em 10 ou 14 por cento; quiz que se conservassem os terços aos professores, e que esses 14 por cento fossem lançados a todos os funccionarios. Além de que os terços não me parece que valham 10 ou 14 por cento, e por isso a emenda tende a tributar desigualmente as differentes classes de empregados, ha a circumstancia de que a restricção das aposentações, jubilações e reformas, tambem pela theoria dos que lhe chamam um imposto, tem um certo valor, e os que soffrem por esta medida ficam tributados por esse modo, e ainda com a deducção da percentagem equivalente aos terços. E por consequencia s. ex.ª tributa não só estas classes de funccionarios duas vezes, mas tributa tambem todas as mais classes do funccionalismo por uma base arbitraria e injusta. Mas isto esta fóra da questão Não se podem tributar igual mente todos os funccionarios a proposito das jubilações, das reformas, das aposentações e dos terços (muitos apoiados). Isso é impossivel. Não ha base segura para tal, e quando a houvesse não serôdia estabelecer agora. E porque essa base não se póde estabelecer agora, e porque se não podem tributar desde já todos os funccionarios, havemos nós deixar de approvar este projecto de economia? Não póde ser (muitos apoiados). Esse tributo a todos os funccionarios cabe n'outra lei, que terá de vir, mas aqui, no projecto que se discute, não é o logar proprio (apoiados).

Sr. presidente, se precisasse de alguns outros argumentos para convencer a camara de que é preciso votar este projecto, bastavam-me as propostas que foram aqui apresentadas pelo sr. Costa e Almeida, com algumas das quaes concordo plenamente, discordando comtudo de muitas; propostas que têem um fim economico em vista. O seu auctor, na melhor fé, apresentou aqui aquellas lembranças com o intuito de acudir ás finanças do estado, attenuar o deficit, e equilibrar a receita com a despeza no orçamento. São reputadas por s. ex.ª uma necessidade. E d'aqui, sem combater agora uma ou outra d'essas propostas ou Lembranças, eu concluo que o illustre deputado pensa como todos nós na gravidade das nossas circumstancias, sendo muito louvavel que procure o remedio para ellas; mas s. ex.ª nessas mesmas propostas não fez senão dar argumentos para se votar o projecto n.° 6, de que tenho a honra de ser relator, e que foi apresentado pelo governo, n'esta casa, com o intuito de effectuar economias (apoiados).

É preciso que nos desenganemos.. Os funccionarios hão de prestar se a fazer alguns sacrificios, e se os não fizerem dentro em pouco tempo hão de sujeitar-se a sacrificio muito maior, o de não poderem receber os seus ordenados, porque o estado financeiro do paiz não póde continuar assim. Os empregados têem de se sujeitar a algum sacrificio....

Uma voz — Mas sejam todos.

O Orador: — Sim, senhor, sejam todos, e hão de ser todos que terão de fazer esse sacrificio; mas comecemos já por estes, até porque é preciso que as classes mais illustradas da sociedade sejam as primeiras a dar o exemplo ás outras (muitos apoiados).

Já tive a honra de responder aos argumentos apresentados por todos os illustres impugnadores do projecto, incluindo o sr. Sá Carneiro. Agora resta-me dizer duas palavras aos srs. Mardel e Pereira Dias.

O illustre deputado o sr. Mardel não combateu directamente o projecto n.° 6; apenas declarou que desejava a igualdade, e que não tinha certeza que se haveriam de votar outros sacrificios ás differentes classes do funccionalismo. Não vejo rasão para esta desconfiança do nosso collega. Eu espero que, por iniciativa do governo, virão outras providencias a respeito dos empregados do estado; mas quando não venham, temos a iniciativa parlamentar (apoiados). O sr. Mardel tem a iniciativa de deputado para apresentar quaesquer projectos para o fim a que se referiu. Portanto não ha motivo algum para o seu reparo (muitos apoiados).

O illustre deputado o sr. Pereira Dias, que foi effectivamente quem mais combateu o projecto, disse que o achava absoluta e relativamente injusto. Absolutamente injusto, porque os ordenados dos professores são mesquinhos, porque estes funccionarios não têem retribuição condigna. Mas ao passo que s. ex.ª assim fallava apontava tampem para a necessidade da reforma da instrucção publica. É tambem para esse logar que eu appello, para se poderem elevar os ordenados dos professores áquillo a que devem chegar, mas agora não é occasião propria para isso. S. ex.ª citou o exemplo da faculdade de medicina em París, na qual não estando já na altura da sciencia os seus membros, foi preciso lançar sangue novo, foi mister admittir novos professores, e retirar do ensino aquelles, que já não podiam acompanhar os progressos da siencia, que não estavam em estado de andar a par d'ella. Pois o projecto tende a fazer o mesmo entre nós. Todas as vezes que o professor não faça o seu dever, não possa acompanhar o progresso da sciencia, esta claro que se ha de ir embora; esta absolutamente incapaz do serviço, e o sangue novo entra como na faculdade de París, como na universidade, e em todas as escolas superiores de instrucção (apoiados).

Quando s. ex.ª fallou em que o projecto era relativamente injusto, comparou differentes ordenados de empregados publicos e tratou de mostrar que o professor era o que tinha menos.

Eu não acompanharei o meu illustrado collega n'esta parte, comparando desenvolvidamente os ordenados dos funccionarios em todos os ramos de serviço publico; mas já tive a honra de dizer, o repito-o agora, que, devendo esses serviços vir a ser regulados, póde s. ex.ª na occasião competente propor as reducções que entender se devem fazer relativamente á remuneração por esses serviços. Se s. ex.ª julgar que os ordenados dos empregados publicos são mais que sufficientes proponha-lhes côrtes rasoaveis (apoiados).

Apresentou comtudo s. ex.ª um argumento que á primeira vista me impressionou bastante, mas reflectindo conclui que não era applicavel. Se porventura porém me convencesse, não tinha duvida em declarar que votava contra o projecto, entoando sobre isso o poenitet, e deixando de ser o relator de similhante medida. Não tinha duvida em declarar que me havia enganado, quando s. ex.ª podesse levar ao meu espirito o convencimento de que estava em erro. Receberia até com muito gosto esta lição do meu collega.

O meu collega, combatendo este projecto pelo lado da instrucção publica, disse com effeito que elle ía tirar a assiduidade ao professorado, porque lhe faltava o estimulo da jubilação.

Mas, sr. presidente, não é exacta a observação. É preciso que se saiba que este projecto não encerra em si toda a legislação sobre jubilações, nem acaba com ellas; é apenas um additamento á legislação actual, que as concede aos professores. Quando se olha para o que estabelece o artigo 1.° (leu), e se compara esta disposição com a do artigo 4.° (leu), reconhece-se logo, que fica em vigor toda a legislação anterior, que não é derogada por este projecto.

Por consequencia o professor que se impossibilitar, tendo completado vinte annos de bom e effectivo serviço, tem a jubilação com o ordenado por inteiro; e o que não completar os vinte annos, tem a jubilação com a parte proporcional ao tempo que serviu. A circumstancia do tempo esta ligada com este projecto. E se assim é, o professor tem, depois de approvada esta medida, o mesmo empenho, a mesma necessidade de ser assiduo no serviço, que tinha antes d'ella ser convertida em lei (apoiados).

Portanto este argumento não colhe.

Resta-me agora apenas levantar uma phrase do illustre deputado.

Disse s. ex.ª no seu discurso —-que protestava contra uma expressão que eu soltei aqui.

Creio que s. ex.ª não me entendeu bem, certamente porque eu me expliquei mal.

Eu disse que de cada dez professores, em circumstancias de alcançarem o terço, talvez apenas um o merecesse, o que não quer dizer que dos que o tinham alcançado nem um talvez o merecesse. S.. ex.ª confundiu as minhas palavras, e quando ou disse que talvez só um o merecesse, disse s. ex.ª que — nem um — e quando fallei dos que estavam em circumstancias de o alcançar, s. ex.ª tomou esta phrase pelos que o tinham, alcançado. E isto é muito differente.

Eu disse e repito, talvez, um o mereça, e não vou para muita distancia de s. ex.ª porque s. ex.ª respondeu que — um não, mas de cada dez cinco—. Ora como nem todos os que estão nas circumstancias de alcançar o terço o alcançam, ou porque não querem, ou porque não podem; em tal caso não estamos muito distantes nas nossas apreciações (apoiados).

Vou concluir, porque a camara acha-se fatigada, e esta discussão esta exausta, tendo-se dito por um e outro lado o que havia a, dizer n'esta materia. Termino acompanhando o meu illustrado amigo e collega, o sr. Pereira Dias, nos desejos que exprime de que a instituição de que somos ambos filhos, a universidade, se eleve ao mais alto grau de explendor; porém não o acompanho n'outro ponto, porque me não é indifferente a questão da localidade (apoiados). Eu quero a universidade com o seu maximo explendor, mas em Coimbra; porque estou convencido de que só lá o póde ter (muitos apoiados).

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi comprimentado por muitos srs. deputados e pelo sr. ministro da fazenda.)

O sr. Pequito: — Foi remettido á commissão de redacção

O projecto auctorisando o governo para cobrar as contribuições e applicadas ás despezas do estado; mas apenas esta presente um membro da commissão, e sendo de toda a necessidade dar a ultima reducção áquelle projecto, pedia a v. ex.ª que se dignasse nomear dois membros, que fossem aggregados áquella commissão para este fim.

O sr. Presidente: — Nomeio para se aggregarem á commissão de redacção, conforme o requerimento do sr. deputado Pequito, os srs. Arrobas e Faria Blanc.

O sr. Almeida Araujo: — -Peço a v. ex.ª que consulte a camara sobre se julga a materia discutida.

Declarando alguns srs. deputados que tinham propostas a mandar para a mesa com relação ao artigo 1°, julgou-se a materia discutida, salvas quaesquer propostas, que os srs. deputados desejassem apresentar, as quaes seriam remettidas á commissão.

Foi approvado o artigo 1.° salvas as emendas.

Leram-se na mesa as seguintes propostas apresentadas depois de se requerer que a materia se julgasse discutida.

Artigo 1.° Durante o exercicio de 1868-1869 não serão concedidas aposentações, jubilações ou reformas aos empregados civis.

§ unico. Por excepção ao disposto n'este artigo, serão jubilados, aposentados ou reformados os empregados civis, cuja incapacidade para o serviço for legalmente provada, ficando em vigor para os magistrados judiciaes as disposições respectivas das leis de 9 de julho de 1849 e 21 de julho de 1855, e para os do ministerio publico os preceitos da primeira das referidas leis.

Art. 2.° Durante o mesmo exercicio, nenhum official do exercito ou da armada, ou empregado civil com graduação militar, e com direito a reforma, poderá ser reformado, addido a veteranos, collocado em praça sem accesso ou addido a ella, sem que na importancia dos soldos, votada na lei de despeza para estas classes, tenha vagado o dobro da despeza, que tiver de resultar da nova collocação.

§ unico. São exceptuados da clausula de cabimento, estabelecida por este artigo, os officiaes do exercito, da armada e os empregados civis com graduações militares, cuja incapacidade para o serviço for legalmente provada.

Art. 3.° É incompativel o vencimento de inactividade com qualquer vencimento de serviço activo pago pelo estado, ou por estabelecimento subsidiado pelo estado.

§ unico. Não é applicavel esta disposição aos jubilados, aposentados, reformados e pensionistas do estado, que tiverem sido collocados nas classes inactivas até á data da publicação da presente lei.

Art. 4.° Nas aposentações, jubilações e reformas, são incompativeis as accumulações, ficando livre a opção aos interessados.

Art. 5.° Para os effeitos da aposentação, jubilação ou reforma, durante o exercicio, não se contará o tempo que o funccionario civil ou militar empregar em serviço, que não j seja aquelle ao qual directamente corresponde o direito de aposentação, jubilação ou reforma, excepto nos casos em que j officialmente se declarar o contrario.

Art. 6.° Durante o exercicio de 1868-1869, a nenhum funccionario civil ou militar será concedido qualquer augmento de vencimento por diuturnidade de serviço.

Art. 7.° Quando for legalmente determinada a organisação geral do serviço publico, serão definitivamente estabelecidas as regras relativas ás aposentações, reformas, jubilações e augmentos de vencimentos por diuturnidade de serviço, sendo então liquidados os direitos adquiridos pelos funccionarios publicos, na conformidade das leis anteriores.

Art. 8.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões da camara dos srs. deputados, em 18 de junho de 1868. = Fradesso da Silveira.

Proponho que, no artigo 1.° do projecto n.° 6, seja eliminada a palavra absoluta. = O deputado por Alijó, Sá Carneiro Fernando de Mello = Camara Leme.

§ unico. O governo apresentará ás côrtes uma lei geral que regule as aposentações, jubilações e reformas, com relação a todos os servidores do estado, inclusivè clero parochial, empregados dos municipios e estabelecimentos subsidiados pelo estado. = Augusto Cesar Falcão da Fonseca.

Foram remettidas á commissão.

O sr. Fradesso da Silveira: — Mando para a mesa um parecer da commissão de obras publicas.

O sr. Montenegro: — Remetto para a mesa o parecer da commissão diplomatica ácerca de dois artigos addicionaes ao tratado de extradicção entro Portugal e Hespanha; parece-me conveniente que se discuta quanto, antes, quando v. ex.ª o julgar opportuno.

O sr. Secretario (José Tiberio): — A commissão de redacção não fez alteração alguma na proposta n.º 7; por consequencia expede-se para a outra camara.

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O sr. Presidente: — Está em discussão o artigo 2.°

O sr. Fernando de Mello: — Pedi a palavra sobre a ordem...

O sr. Presidente: — E queira ler a sua moção de ordem.

O Orador: — Unicamente para cumprir o regimento, e para ver se evitava essa advertencia de v. ex.ª, estava já para ler a minha proposta, e depois a mandarei para a mesa;

«Proponho a eliminação do artigo 2.° do projecto n.° 6.»

Vou affrontar as iras patrioticas dos apregoados economistas, declarando a v. ex.ª que votei contra o projecto na generalidade, e que voto contra o mesmo projecto em cada um dos seus artigos (apoiados).

Venho desde a generalidade a pedir a palavra; felizmente encontrei-a no artigo 2.°, aliás tinha tenção de chegar ao artigo 7.°, onde talvez não encontrasse tantos»competidores na inscripção.

Se eu me contentasse com os programmas governamentaes, se me satisfizessem os rótulos collocados sobre certos edificios politicos, se as promessas não tivessem sido tantas vezes desmentidas, e se os programmas não tivessem' sido tantas vezes renegados, eu deveria acreditar que o primeiro projecto de fazenda que se discute n'esta sessão é altamente economico. Mas apesar de tão apregoado, e apregoado como tal, não posso descobrir as grandes economias que da sua adopção possam provir para o thesouro; não as encontro, e acho pelo contrario que do projecto podem resultar mais desperdicios (apoiados) do que economias.

(Interrupção do sr. Teixeira Marques, que não se percebeu.)

V. ex.ª sabe que primeiro se estabelecem as proposições e vem depois a demonstração. Não se póde inverter a ordem.

Acho o projecto injusto absoluta e relativamente, acho-o inefficaz para o thesouro a não querermos com elle sacrificar completamente a instrucção publica.

Ainda ha pouco ouvi dizer ao illustre relator d'este projecto que os ordenados dos professores publicos no nosso paiz são miseraveis; que é urgente e necessario remunerar condignamente o professorado, mas que essa questão se devia tratar quando se discutisse a reforma da instrucção publica. Aceito a doutrina, mas parece-me que ella não favorece a opportunidade e justiça d'este projecto.

Porque se não reserva para então o tratar-se das jubilações, e porque se não reservam para occasião identica as aposentações e reformas?

Diz-se por toda a parte que os professores são os primeiros funccionarios do estado, sem desconsiderar qualquer outra posição official, diz-se sem contestação que devem ser bem remunerados aquelles que estão encarregados de transformar os homens rudes em cidadãos illustrados, ou de elevar o nivel scientifico do nosso paiz. Diz-se que e nas escólas de instrucção primaria que principiam a habilitar-se os cidadãos que mais tarde hão de prestar grandes serviços ao paiz, e que ás escolas de instrucção superior pertence aperfeiçoar e completar a instrucção d'esses mesmos cidadãos.

Todos os dias se encarece ou justifica a importancia do professorado, mas é sempre cedo para o remunerar condignamente. Para lhe cercearem o pouco que têem é sempre tempo. Não ha paiz algum onde sejam tão mal remunerados os professores publicos...

(Interrupção que se não percebeu.)

Sei que em muitos outros paizes se paga mal aos professores, mas peior não sei. Pois o que é 90$000 réis de ordenado para um professor de instrucção primaria, ou o que são 300$000 réis para o ordenado de professor do primeiro estabelecimento scientifico do paiz? Peior do que isto não sei que possa haver.

Uma voz: — Ha com muito menos garantias.

O Orador: — Aonde? Que garantias têem os professores do nosso paiz que lhes compensem a exiguidade dos seus ordenados?

Mas seja como for, se v. ex.ª me convencer de que os ordenados dos professores estão em relação com os dos outros funccionarios publicos, dou-me por satisfeito.

Eu se me queixo não me queixo por mim, que tenho a consciencia de ser o mais humilde e insignificante professor de um dos primeiros estabelecimentos do paiz, não venho pedir augmento de ordenado para mim, nem mesmo para os meus collegas. Todos temos a melhor vontade de prestar soccorro ao thesouro publico, e esquecemo-nos até por agora da injustiça com que somos retribuidos.

Mas se são precisos maiores sacrificios não se exijam em primeiro logar áquelles que são mais mal remunerados. Faça-se a reforma da instrucção publica, reduza-se quanto for possivel a despeza, mas pague-se aos professores em relação com o que receberem os outros funccionarios do estado de igual categoria. Regularisem-se os ordenados de todos os funccionarios e depois,?e for necessario mais, exijam-se proporcionalmente ainda novos sacrificios.

Não era de certo por este projecto que deviam principiar as reformas.

Discutamo-lo porém, e torne-se bem evidente que, alem de ser injusto, pouco ou nada póde favorecer o thesouro publico.

Não ha logar a aposentações, jubilações e reformas, sem se verificar absoluta impossibilidade de continuar no serviço, diz o artigo 1.° do projecto. Portanto o tempo antigo, os vinte annos estabelecidos para os professores, não foram mencionados no artigo 1.°, como estavam determinados nas leis vigentes.

Pergunta-se que tempo se contará para que esta absoluta impossibilidade sirva de excepção á regra geral da extincção das jubilações, aposentações e reformas? Se aos dezenove annos houver absoluta e completa impossibilidade' de exercer as funcções proprias do cargo onde se alcançou essa impossibilidade, lança o estado á margem as pobres victimas do seu serviço?

E ha aqui uma contradicção flagrante. No primeiro considerando do parecer da commissão estabelece-se a doutrina de que o estado não tem obrigação de velar pelos empregados publicos, que as molestias ou a idade impossibilitaram; e no artigo 1.° diz-se que = se elles se impossibilitarem absolutamente, o estado lhes concede as aposentações, jubilações ou reformas =.

Ora eu aceito a doutrina absoluta do primeiro considerando do parecer, quando o estado remunera os funccionarios publicos por modo que elles possam lançar algum sobejo do seu ordenado n'esses monte pios creados hoje felizmente em todos os paizes; mas quando os ordenados são por tal fórma diminutos, quando um professor recebe por exemplo 300$000 réis por anno, que ha de elle lançar na caixa economica a titulo de sobejo? (Apoiaãos.)

Este principio rigoroso do parecer podia admittir-se n'um paiz onde os funccionarios publicos sejam largamente remunerados, mas não o póde ser n'este paiz em que os ordenados de certo não chegam para as primeiras e mais urgentes necessidades (apoiados).

Mas aceitemos esta excepção misericordiosa feita no artigo 1.° por esquecimento dos principios estabelecidos no parecer, e fica o artigo 1.°, segundo indica vagamente o artigo 4.°, reunido á legislação anterior, dizendo-nos que por absoluta impossibilidade de continuar no serviço publico é permittida a aposentação, jubilação ou reforma, no tempo em que se concedia até aqui pelas leis onde não havia a palavra absoluta.

Eu não quero nem posso demorar-me muito tempo com a generalidade d'este projecto. A sua injustiça absoluta e relativa resulta tão evidente, como o seu prejuizo e damno para a instrucção publica tambem esta provado, quando seja rigoroso o cumprimento da lei. Mas não o póde ser, e d'ahi vem a inefficacia para o thesouro publico d'esta medida financeira.

Todos nós sabemos que as jubilações, aposentações ou reformas, quando as queiram obter os individuos que completarem o tempo determinado na lei, hão do ser sempre obtidas (apoiados). O caso esta em que os interessados teimem em as querer conseguir, porque o projecto não fechou a porta nem póde fecha-la.

Se o projecto quiz evitar as aposentações, jubilações e reformas, que no tempo competente se podem fazer sem necessidade absoluta e só por vontade propria dos individuos, ainda digo que as cousas ficam nas mesmas circumstancias, porque, em os funccionarios querendo, aos vinte ou trinta annos provam evidentemente que estão incapazes para o serviço publico.

Eu refiro-me agora mais propriamente aos professores, mas creio que se póde dizer o mesmo a respeito das outras classes de que trata este projecto.

Um professor, que quizer levar á evidencia que não esta nas circumstancias de reger uma cadeira, sobe para ella e declara ou mostra que lhe esqueceu tudo e que já não comprehendo nada; teima n'isto o torna a teimar, e ninguem póde do fórma alguma obriga-lo a que elle se lembre ou que elle comprehenda.

Obriguem-no a occupar o seu logar se elle ainda poder arrastar-se até lá, e duvidem do quanto perde o ensino com este simulado enfraquecimento das faculdades intellectuaes.

Mas não será preciso fingir muito na maior parte dos casos antes de chegar a impossibilidade absoluta de que falla o projecto.

Não comprehendo o que seja absoluta impossibilidade no exercicio de certas profissões. Querem que o professor seja obrigado a occupar o seu logar emquanto não houver absoluta impossibilidade na accepção rigorosa d'esta palavra, accepção unica em que se tomam as palavras das leis? Emquanto elle se podér arrastar até á cadeira, ha de ser obrigado a subir a ella?

(Interrupção que não se percebeu.)

Se é absoluta, não entendo absoluta impossibilidade de outra fórma. Custa-lhe a mover-se? Vá caminhando. Já não póde caminhar? Levem-no de rastos até á cadeira; sentem-no, porque a impossibilidade physica ainda não esta declarada.

Temos depois a impossibilidade moral, que tambem é absoluta.

O professor é bom, e aproveita com elle o ensino, emquanto comprehender alguma cousa, por pouco que seja; só quando elle não comprehender cousa alguma, e isso ainda muito examinado por differentes tribunaes, é que é dispensado do serviço, segundo o artigo 1.° d'este projecto.

Não sei que vantagem possa haver n'este artigo, que compense os prejuizos que póde causar ao ensino.

Se este projecto quer fazer economias á custa de certas classes de funccionarios publicos, não as consegue, e quando as conseguisse era por tal fórma prejudicial que nunca poderia ser approvado, alem da injustiça de só se tributarem tres classes, e não todas. A rede tributaria deve ser lançada por tal fórma que comprehenda tudo e rasoavelmente. Aceito um projecto qualquer que apanhe todos.

Uma voz: — Mas como?

O Orador: — Peço perdão, não estou justificando nenhum outro projecto; mas digo a v. ex.ª que um governo que se levantou em nome das economias não cumpre com o seu programma, apresentando projectos d'estes.

O sr. Teixeira Marques: — Começa a cumpri-lo.

O Orador: — Começa a cumpri-lo, mas é pelo sexto dos seus projectos, deixando não sei onde os primeiros. Apparece o filho primeiro do que o pae; o primeiro projecto, que era a base do systema financeiro, esse ainda não appareceu, e veiu o sexto!

O governo prometteu fazer grandes economias, e em nome dellas apresenta este projecto, que não só as não consegue, mas que revela menos attenção pela prosperidade da instrucção publica e pelos grandes serviços que têem prestado ao paiz os funccionarios das classes que comprehende, apesar da pequena retribuição de que todos elles ou quasi todos se poderiam queixar.

Apesar porém de todas as injustiças eu votava pelo projecto se visse que por elle vinha algum remedio para a terrivel molestia das nossas finanças, mas não vejo, porque quem quizer jubilar-se, aposentar-se ou reformar-se no praso marcado na legislação anterior consegue-o, sem eu querer com isto lançar insinuações sobre os tribunaes que hão de ser para isso ouvidos, nem sobre a classe medica a que tenho a honra de pertencer.

No professorado, quem quizer declarar-se incapaz de todo o serviço, declara-o, mostra-o e prova-o evidentemente, e com a tenacidade d'essas demonstrações a jubilação ha de conseguir-se, e mal iria ao ensino se so não conseguisse.

Quem não quizer continuar no serviço do magisterio, chegado aos vinte annos de serviço, visto que as notas no projecto dizem...

(Interrupção do sr. Antonio José Teixeira que se não percebeu.)

Peço perdão ao illustre deputado. V. ex.ª, sr. presidente, e a camara sabem que no artigo 1.° não se falla em tempo determinado, e apenas se diz n'elle: «Não ha logar a aposentações, jubilações e reformas sem se verificar, etc...» Parece-me que o artigo dá a entender que, declarada a impossibilidade absoluta de serviço, é logo a jubilação permittida em todo o tempo.

(Interrupção do sr. A. J. Teixeira que se não ouviu.)

Bem sei que esta.

(Interrupção do sr. A. J. Teixeira.)

Sim. Complemento da legislação actual; mas o que tambem se entende sem complemento é a redacção d'este artigo 1.°

O artigo 1.° não falla em tempo, o 2.° e o 3.° tambem não fallam n'isso, e o que se segue d'aqui é que quem não lesse os outros artigos não tinha percebido que havia uma condição de tempo para a jubilação, no caso da tal absoluta impossibilidade de serviço. Só no artigo 4.° se allude vagamente ao tempo e se dá a entender que este projecto deixa ainda em vigor o tempo antigo.

Parece-me que esta condição de tempo devia ser exarada no artigo 2.° e não esperar pelo artigo 4.° para n'elle se indicar vagamente, ou pelas notas que se lho estão fazendo na discussão.

Quiz-se tributar o professorado, foi a idéa do projecto talvez, idéa infeliz alem de injustissima.

Todos nós sabemos os ordenados que têem os funccionarios publicos de outras classes, e que não se podem comparar muito bem com os professores. Os directores das secretárias, os primeiros officiaes, os segundos officiaes, os porteiros e até os corre-os, todos têem ordenados superiores aos dos professores publicos. Pois apesar de toda esta desigualdade, quando seja necessario trazer algum recurso ao thesouro, e possam os professores traze-lo tambem, estão todos promptos; e se este projecto salvasse o paiz das difficuldades em que nós estamos, se nos salvasse daquella calamidade a que nós estamos muito arriscados, annunciada ainda não ha muito pelo sr. relator d'este projecto, de que dentro em pouco se não paga a ninguem (apoiados), se este projecto fosse a unica valvula de segurança, esquecia-me de tudo e votava-o em nome da salvação do meu paiz.

Mas similhante providencia, que não é salvadora nem para isso se encaminha, ainda é inadmissivel por outro lado, porque quiz tirar garantias aos professores, que não foram por certo convidados a entrar nos estabelecimentos de ensino pelo ordenado com que são recebidos, mas que foram attrahidos pelas garantias que se lhes offereciam.

Não venho agora discutir o contrato entre o funccionario publico e o governo; não faço questão de, se é pacto ou contrato, mas o que sei é que, pacto ou contrato, deve respeitar-se, quando forem necessarias habilitações especiaes para conseguir o logar no funccionalismo.

Quando um candidato se offereceu a concorrer a um logar das escolas superiores, por exemplo, de certo não foram 300$000 réis de ordenado que a isso o convidaram, réis 300$000 com que elle podia ter de viver por muitos annos, que podiam ser o unico ordenado por toda a vida. Mas diziam lho as leis do seu paiz que depois de 300$000 réis teria um ordenado de 500$000 réis, que mais tarde poderia ter 800$000 réis, e que finalmente ao cabo de vinte annos podia descançar do serviço, ou então, se quizesse continuar, teria mais um terço do ordenado, para no fim dos trinta annos completos ir para sua casa disfructar, se ainda podesse, o resultado dos seus trabalhos.

Eram estas as garantias que se promettiam ao professor, e para as conseguir consumiu elle muito tempo, soffreu grandes trabalhos, despendeu grossos cabedaes; e depois destes sacrificios feitos, na posse do logar que conquistou, principiam a diminuir-lhe as garantias; tiram-lhe hoje uma, para mais tarde lhe tirarem talvez todas.

Não vamos á questão rigorosa do contrato para todos os empregados publicos, mas respeite-se o pacto feito com aquelles empregados, para os quaes foram necessarias habilitações especialissimas. Quantos seriam dos professores actuaes aquelles que teriam emprehendido o conseguir um logar no magisterio, se soubessem que era possivel, e até provavel, receberem de ordenado por toda a sua vida réis 300$000? Sem movimento no respectivo quadro, porque este projecto tem como consequencia no seu rigor o diminuir esse movimento, o professor da universidade póde ficar annos e annos como substituto extraordinario. E depois

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na suprema felicidade para elle, que fica dependente da suprema impossibilidade dos seus collegas mais antigos, recebe 800$000 réis!! E ha de trabalhar, ainda que já não possa, até que a impossibilidade seja julgada absoluta!!! O futuro nos mostrará, se a lei for executada rigorosamente, como devem se-lo todas as leis, as consequencias tristissimas que hão de resultar para a instrucção publica. Lamentam-se que já foram apanhados na feliz illusão da fé dos contratos, e hão de diminuir sensivelmente as pretensões futuras ao magisterio.

Se a lei não for rigorosa até ao absurdo, cáe por insignificancia.

Eu julgo mais provavel a segunda parte do dilemma, porque é para mim fóra de duvida que se hão de conseguir todas as jubilações, aposentações e reformas, como até aqui.

Fallemos agora dos terços, cuja extincção se diz tambem ser uma grande economia para o thesouro.

Vozes: — Deu a hora.

O Orador: — Como deu a hora, peço a v. ex.ª que me reserve a palavra para a sessão seguinte.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para depois de ámanhã é trabalhos em commissões. Para segunda feira é, na primeira parte, a eleição da commissão proposta pelo sr. Gavicho, e na segunda parte a continuação da de hoje.

Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

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