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N.º 58

SESSÃO DE 18 DE ABRIL DE 1902

Presidencia do Exmo. Sr. Matheus Teixeira de Azevedo

Secretarios - os Exmos. Srs.

Amandio Eduardo da Motta Veiga
José Joaquim Mendes Leal

SUMMARIO

Lida e approvada a acta, dá-se conhecimento á Camara de cinco officios e tem segunda leitura sendo admittidos os projectos de lei: auctorizando o Governo a ceder á Camara Municipal de Campo Maior as muralhas e terrenos annexos que circundam esta villa; concedendo a Maria Angelina Parrella do Brito a sobrevivencia na pensão de sua fallecida mãe, D. Mariana Casimira Parrella; e auctorizando o Governo a ceder á Camara Municipal de Castello de Vide as muralhas que circundam a mesma villa, o castello e os terrenos annexos. - O Sr. Lima Duque, obtendo a palavra para um negocio urgente, chama a attenção do Sr. Ministro da Guerra para algumas disposições da lei do recrutamento militar. -Mandam documentos para a mesa os Srs. Alexandre Cabral, Vaz Ferreira, Madureira Boca, Motta Prego, Antonio Cabral, Magalhães Ramalho, Augusto Louza, Domingos Eusebio da Fonseca, Rodrigues Monteiro e José Caetano Rebello. - O Sr. Conde de Penha Garcia pede a palavra para um negocio urgente, a fim de solicitar do Governo immediatas providencias contra a praga de gafanhotos no concelho do Idanha-a-Nova. A mesa e a Camara não reconhecem a urgencia.

Na l.ª parte da ordem do dia (projecto de lei n.° 18, reorganizando a Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes) usam da palavra os Srs. Conde de Penha Garcia, Malheiro Dias (relator), Queiroz Ribeiro, Christovam Ayres e Antonio Cabral. - Mandam propostas de emenda para a mesa os Srs. Conde de Penha Garcia, Malheiro Dias e Vellado da Fonseca. - Approva-se o artigo 1.° do projecto, sendo approvada a proposta do Sr. Malheiro Dias e rejeitadas as restantes. - Sobre o artigo 2.° usa da palavra o Sr. Oliveira Mattos, que manda uma proposta de emenda para a mesa. - A requerimento do Sr. Costa Ornellas considera-se a materia sufficientemente discutida. - Approva-se o artigo 2 °, sendo rejeitada a proposta do Sr. Oliveira Mattos.

Na 2.ª parte da ordem do dia (projecto de lei n.° 59, relativo aos emolumentos dos secretarios dos governos civis) usam da palavra os Srs. Alexandre Cabral e Presidente do Conselho (Hintze Ribeiro) Approva-se o projecto. - Antes de se encerrar a sessão, teem a palavra para explicações os Srs. Conde de Paço-Vieira e Oliveira Mattos.

Primeira chamada - Ás 11 horas da manhã.

Presentes - 6 Senhores Deputados.

Segunda chamada - Ás 11 horas e meia.

Abertura da sessão - Ás 11 horas e 25 minutos.

Presentes - 54 Senhores Deputados.

São os seguintes: - Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, Alberto Antonio de Moraes Carvalho Sobrinho, Alberto Botelho, Alberto de Castro Pereira de Almeida Navarro, Alexandre José Sarsfield, Alfredo Augusto José de Albuquerque, Alfredo Mendes de Magalhães Ramalho, Alvaro Augusto Froes Possollo de Sousa, Alvaro de Sousa Rego, Amandio Eduardo da Motta Veiga, Antonio Augusto de Mendonça David, Antonio Augusto de Sousa e Silva, Antonio Barbosa Mendonça, Antonio Belard da Fonseca, Antonio José Lopes Navarro, Antonio Sergio da Silva e Castro, Antonio de Sousa Pinto de Magalhães, Arthur Eduardo de Almeida Brandão, Augusto José da Cunha, Belchior José Machado, Carlos Alberto Soares Cardoso, Carlos Malheiro Dias, Christovam Ayres de Magalhães Sepulveda, Clemente Joaquim dos Santos Pinto, Conde de Paçô-Vieira, Conde de Penha Garcia, Domingos Eusebio da Fonseca, Ernesto Nunes da Costa Ornellas, Francisco José Machado, Francisco José Patricio, Francisco Limpo de Lacerda Ravasco, Henrique Vaz de Andrade Basto Ferreira, Hypacio Frederico de Brion, João Alfredo de Faria, João Carlos de Mello Pereira e Vasconcellos, João Ferreira Craveiro Lopes de Oliveira, João Joaquim André de Freitas, João Marcellino Arrojo, João de Sousa Tavares, Joaquim Antonio de Sant'Anna, José Antonio Ferro de Madureira Beça, José Coelho da Motta Prego, José Jeronymo Rodrigues Monteiro, José Joaquim Dias Gallas, José Joaquim Mendes Leal, José Maria de Oliveira Mattos, José Maria de Oliveira Simões, José Nicolau Raposo Botelho, Julio Ernesto de Lima Duque, Luiz Filippe de Castro (D.), Marianno José da Silva Prezado, Matheus Augusto Ribeiro Sampaio, Matheus Teixeira de Azevedo e Rodolpho Augusto de Sequeira.

Entraram durante a sessão os Srs.: - Abel Pereira de Andrade, Agostinho Lucio e Silva, Alexandre Ferreira Cabral Paes do Amaral, Alfredo Cesar Brandão, Anselmo Augusto Vieira, Antonio Affonso Maria Vellado Alves Pereira da Fonseca, Antonio Alberto Charula Pessanha, Antonio de Almeida Dias, Antonio Centeno, Antonio Eduardo Villaça, Antonio Ferreira Cabral Paes do Amaral, Antonio José Boavida, Antonio Maria Pereira Carrilho, Antonio Rodrigues Nogueira, Antonio Rodrigues Ribeiro, Augusto Cesar da Rocha Louza, Augusto Neves dos Santos Carneiro, Carlos de Almeida Pessanha, Carlos Augusto Ferreira, Fernando Mattozo Santos, Francisco Antonio da Veiga Beirão, Francisco Roberto de Araujo de Magalhães Barros, Frederico Alexandrino Garcia Ramirez, Frederico Ressano Garcia, Gaspar de Queiroz Ribeiro de Almeida e Vasconcellos, Guilherme Augusto Santa Rita, Henrique Carlos de Carvalho Kendall, Henrique Matheus dos Santos, João Augusto Pereira, João Pinto Rodrigues dos Santos, José Caetano Rebello, José Caetano de Sousa e Lacerda, José da Cunha Lima, José Joaquim de Sousa Cavalheiro, José Maria Pereira de Lima, José Mathias Nunes, José de Mattos Sobral Cid, Julio Augusto Petra Vianna, Lourenço Caldeira da Gama Lobo Cayolla, Luiz Fisher Berquó Poças Falcão, Luiz José Dias, Manuel Affonso de Espregueira, Manuel Antonio Moreira Júnior, Manuel Homem de Mello da Camara, Mario Augusto de Miranda Monteiro, Marquez de Reriz, Rodrigo Affonso Pequito e Visconde da Torre.

Não compareceram á sessão os Srs.: - Affonso Xavier Lopes Vieira, Albano de Mello Ribeiro Pinto, Albino Maria de Carvalho Moreira, Alipio Albano Camello, Amadeu Augusto Pinto da Silva, Antonio Caetano de Abreu Freire Egas Moniz, Antonio Joaquim Ferreira Margarido, Antonio Maria de Carvalho Almeida Serra, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti, Antonio Roque da Silveira, Antonio Tavares Festas, Arthur da Costa Sousa Pinto Basto, Arthur Pinto de Miranda Montenegro, Au-

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2 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

gusto Cesar Claro da Ricca, Augusto Fuschini, Avelino Augusto da Silva Monteiro, Conde de Castro e Solla, Custodio Miguel de Borja, Eduardo de Abranches Ferreira Cunha, Eduardo Burnay, Filippe Leite de Barcos e Moura, Francisco Felisberto Dias Costa, Francisco José de Medeiros, Frederico dos Santos Martins, Ignacio José Franco, Jayme Arthur da Costa Pinto, João Monteiro Vieira de Castro, Joaquim da Cunha Telles e Vasconcellos, Joaquim Faustino de Pôças Leitão, Joaquim Pereira Jardim, José Adolpho de Mello e Sousa, José Dias Ferreira, José da Gama Lobo Lamare, José Gonçalves Pereira dos Santos, José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Julio Maria de Andrade e Sousa, Libanio Antonio Fialho Gomes, Luciano Antonio Pereira da Silva, Luiz Gonzaga dos Reis Torgal, Luiz de Mello Correia Pereira Medella, Manuel Francisco de Vargas, Manuel Joaquim Fratel, Manuel de Sousa Avides, Marianno Cyrillo de Carvalho, Ovidio de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, Paulo de Barros Pinto Osorio, Visconce de Mangualde e Visconde do Reguengo (Jorge).

Acta - Approvada.

EXPEDIENTE

Officios

Do Ministerio dos Negocios Estrangeiros, participando que o Sr. Ministro dos Estados Unidos da America do Norte nesta côrte, lhe dirigira uma nota, pedindo transmitta a S. Exa. o Sr. Presidente da Camara dos Senhores Deputados, a expressão do alto e sincero apreço em que foi tida, pelo Presidente Roosevelt a mensagem que lhe foi dirigida pela Camara dos Senhores Deputados, por occasião da morte do Presidente Mac-Kinley.

Para a secretaria

Do mesmo Ministerio, remettendo 180 exemplares do Boletim Commercial, n.° 2 de 1902, para ser distribuido pelos Senhores Deputados.

Do mesmo ministerio, remettendo 200 exemplares de um dos seis volumes do livro branco «Questão do caminho de ferro de Lourenço Marques», acompanhados de igual numero de exemplares da sentença proferida pelo tribunal arbitral de Berno.

Para a secretaria.

Do Ministerio do Reino, remettendo em satisfação do requerimento do Sr. Deputado Antonio Cabral, nota dos nomes dos administradores do concelho e regedores de parochia, em cujos processos criminaes foi denegada licença para or espectivo seguimento, desde 20 de junho de 1900.

Para a secretaria.

Da D. Maria José Gaivão Mousinho de Albuquerque, agradecendo as manifestações de pesar da Camara dos Senhores Deputados, por occasião do fallecimento de seu marido, Joaquim Mousinho de Albuquerque.

Para a secretaria.

Segunda leitura

Projecto de lei

Senhores. - A notavel transformação que nos ultimos tempos se tem operado no armamento, influiu poderosamente para modificar as condições de resistencia que as nossas antigas praças de guerra podiam oppor no inimigo. Grande numero d'ellas foram desclassificadas, ou porque pela sua situação seriam agora, attento o maior alcance das armas actuaes, completamente dominadas do terreno circundante, ou porque pelo seu traçado se não prestavam a uma boa utilização dos modernos recursos defensivos do país.

Postas assim de parte, ficaram estas praças abandonadas e a ruina das suas muralhas, que já antes era grande, augmentou ainda mais rapidamente, apresentando hoje alguma d'ellas um aspecto bastante contristador, só proprio das nações decadentes.

A hygiene tambem tem soffrido muito com a falta de asseio naquelles logares, que, por estarem na posse do Ministerio da Guerra, não permittem a intervenção das municipalidades na sua limpeza.

As muralhas das praças de guerra constituem ainda um obstaculo inpeditivo da expansão das povoações que, apertadas num circulo inflexivel, não pedem crescer em proporção com o desenvolvimento da sua população e em harmonia com as necessidades importas pelo alargamento do seu commercio e da sua industria.

Nestas condições se encontra a praça de Campo Maior e, por isso, a bem da hygiene e para que aquella villa possa alargar-se em correspondencia com o seu notavel accrescimo de população, vimos submetter á vossa esclarecida apreciação o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Fica o Governo auctorizado a ceder á Camara Municipal de Campo Maior as muralhas e terrenos annexos que circundam esta villa, com a condição de poder o Ministerio da Guerra reservar para si todo o terreno e material que julgar indispensavel para quaesquer edificações militares, assim como os terrenos necessarios para aquartelamentos ou campos de exercicio.

Art. 2.º A Camara Municipal de Campo Maior podem ordenar a demolição das muralhas, conforme as necessidades de população, as exigencias de embellezamento e as condições de salubridade publica, e utilizar dos fossos a parte que for precisa para melhorar o desenvolver a viação publica e outros serviços de interesse geral.

Art. 3.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, l6 de abril de 1902. - José Caetano Rebello - José Jeronymo Rodrigues Monteiro - Lourenco Cayolla.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica, ouvida a de guerra.

Projecto de lei

Artigo 1.° É concedida a Maria Angelina Parrella de Brito a sobrevivencia na pensão de sua fallecida mãe, D. Mariana Casimira Parrella, pensão que lhe foi concedida por decreto de 27 de junho de 1860, e sanccionada pela carta de lei de 11 de agosto de 1860, o decreto das Côrtes Geraes de 3 do mesmo mês, que confirmou o decreto de 27 de junho antecedente acima referido.

Art. 2.° É revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, em 16 de abril de 1902. = O Deputado, Antonio Maria Dias Pereira Chaves Mazziotti.

Foi admittido e enviado á commissão de fazenda.

Projecto de lei

Senhores. - Em torno da villa de Castello de Vide uma das povoações mais progressivas, de mais desenvolvimento e mais rica de condições naturaes da provincia do Alemtejo, estende-se uma linha de muralhas, em grande parte derruidas e em ruinas, apresentando assim uma manifestação de desleixo e de incuria, em parte tambem já cortadas pelas estradas que ligam aquella villa ás terras mais proximas, mas que apesar d'isso constituem ainda um entravo ao alargamento exigido pelos progressos da mesma villa.

Alem das muralhas existe ainda ali um castello, construido no seculo XIII, theatro das façanhas mais epicas de heroismo e de verdadeiro patriotismo. Tem o povo do Castello de Vide, representado pela sua Camara Municipal, o maior desejo de velar pela conservação d'esse

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monumento, que deve ser mantido com o maior respeito, para exemplo e como testemunho de que valoram os actos dos nossos maiores.

Por estes motivos pede a Camara Municipal de Castello de Vide para que passe á sua posse o castello, as muralhas e os pequenos terrenos annexos, pertencentes actualmente ao Ministerio da Guerra, com o fim de poder conservar dignamente o castello e a parte util das muralhas, e demolir a restante para promover os possiveis melhoramentos da povoação, melhoramentos ha muito reclamados. E considerando-os justos, temos a honra de vos apresentar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É o Governo auctorizado a ceder á Camara Municipal de Castello de Vide, para melhoramentos e embellezamentos da mesma villa, as muralhas que a circundam, o castello e os terrenos annexos, actualmente na posse do Ministerio da Guerra.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das sessões, 16 de abril de 1902. = José Caetano Rebello = José Joaquim Rodrigues Monteiro = Lourenço Cayolla.

Foi admittido e enviado á commissão de administração publica, ouvida a de guerra.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Lima Duque pediu a palavra para um negocio urgente, que a mesa hesitou em considerar como tal, por isso vae ler-se a respectiva nota para que a Camara resolva.

Lê-se. É a seguinte:

Nota de negocio urgente

Visto estar proximo o encerramento da Camara, e, pela natureza dos assumptos ainda a discutir, não haver ensejo de realizar, em ordem do dia, a interpellação que dirigi ao Sr. Ministro da Guerra, sobre a lei do recrutamento militar, desejo, aproveitando a presença do illustre Ministro, chamar, hoje mesmo, a attenção de S. Exa. para algumas disposições da citada lei, que hão de ser executadas nas inspecções de recrutas que brevemente vão ter logar, disposições que, a meu ver, carecem de urgente modificação. = Lima Duque.

Foi considerado urgente.

O Sr. Lima Duque: - Começo por agradecer á illustre maioria e em especial ao seu nobre leader e meu particular amigo Sr. João Arrojo a gentilesa da sua resolução.

Sr. Presidente: eis um fruto bem amargo da mais condemnavel das dictaduras - a dictadura sobre o chamado imposto de sangue. E tão melindrosa é ella, que nunca Governo algum constitucional deixou de pedir ao Parlamento o previo exame e a approvação das leis que regalam o mais pesado tributo que a patria lança sobre os seus filhos. (Apoiados}.

Estou profundamente convencido, Sr. Presidente, de que, por maior que fosse o facciosismo do Governo e da maioria, esta lei, vindo á discussão, não seria sanccionada sem notaveis modificações na sua principal contextura. (Apoiados).

Creio, porem, fazer justiça á intelligencia e nobres intenções do Sr. Ministro da Guerra dizendo que, se S. Exa. não confiasse absolutamente nos seus collaboradores, aliás distinctissimos, mas dominados por uma preoccupação verdadeiramente ferina contra as pessoas e cousas do recrutamento, se S. Exa. tivesse reflectido maduramente sobre algumas disposições d'esta lei, com certeza não a referendaria.

Assim como está, esta lei insere todos os defeitos da lei anterior, aggravados ainda com disposições novas, que carecem, por completo, de uma orientação levantada, racional e justa. (Apoiados}.

A leviandade com que foi traçada, entristece-me, o movel que a ditou, indigua-me. (Apoiados}.

Paira sobre toda esta lei, infiltra-se nos escaninhos dos seus preceitos uma tal atmosphera de suspeição sobre todos os que tinham por cargo executar a lei anterior, e ainda mesmo sobre aquelles que teem de executar a actual, que imprime uma feição excepcionalmente odiosa a este diploma legislativo. (Muitos apoiados}.

Pois que querem dizer as determinações do artigo 195.°, indicando aos membros da junta a recusa de hospedagem em casas particulares, nas terras onde haja hospedarias? Não será isto lançar uma suspeição sabre o caracter, o brio e a probidade dos officiaes do exercito? (Apoiados} Será preciso inserir na lei uma disposição d'esta ordem, iniqua e vexatoria, para que os officiaes sejam compellidos ao cumprimento dos seus deveres?

Não, Sr. Presidente, os officiaes do exercito não carecem de mais estimulo do que a sua consciencia profissional, e se algum prevaricar, o Sr. Ministro da Guerra tem nas leis militares muitos meios de cohibir os abusos.

Alem d'isso, uma tal disposição é contraproducente, pois abre excepção para o caso em que os membros da junta possam ser hospedados em casa de parentes, como se os laços de parentesco e de amizade prendessem menos do que os da simples hospedagem. (Apoiados}.

Mais ainda, Sr. Presidente, nas terras onde não haja hospedarias, manda a lei que esses officiaes sejam aboletados. E por quem? Pelo administrador do concelho! Achará o Sr. Ministro da Guerra mais nobre e mais digno que o official entre em uma casa particular imposto pela auctoridade, do que acceitando a gentileza de um convite?

Não o creio.

O official aboletado sentir-se-ha menos á vontade do que tendo sido convidado. E intuitivo. (Apoiados}.

Alem d'isto o aboletamento escolhido pelo administrador do concelho será uma armadilha politica, quando não for uma imposição facciosa e vingativa. (Apoiados}.

E aconselha-se esta pratica, Sr. Presidente, quando se diz no relatorio que a mira do legislador é desviar a politica das operações do recrutamento! É justo o proposito, mas os processos com que se pretende consegui-lo são dos mais falliveis. (Apoiados}.

Assim, para afastar a politica do recrutamento, ordena-se ás juntas que vão operar em localidades onde as paixões partidarias são mais violentas, mais acirradas, onde a politica se encara pelo lado mais mesquinho, com todos os seus horrores de odios e malquerenças pessoaes!

Ahi tem a Camara como esta lei procura cortar cerce o maior mal de que enferma o nosso recrutamento militar-a influencia da politica local.

Sr. Presidente: no meu criterio, não era de reforma da lei que nós precisavamos; do que nós precisamos, em materia do recrutamento, é de reformar os costumes. Emquanto vigorarem os habitos nefastos do livramento de recrutas, com fins eleiçoeiros, não ha lei que estorve a criminosa pratica. (Apoiados).

E em igualdade de circunstancias, Sr. Presidente, se os costumes permanecerem os mesmos, esta lei será de peores effeitos ainda do que a anterior. (Apoiados}.

Para mostrar, porem, com quanta isenção falo, como o meu espirito se desenlaça de toda a parcella de partidarismo, leal e gratamente confesso que nem tudo aqui é mau. (Apoiados}.

Duas ou tres disposições fulgem como diamantes engastados em disforme gargalheira, que aperta, estrangula e aniquila os mais humanitarios e salutares principios da organização fundamental dos exercitos. (Muito bem). E essas mesmas disposições, Sr. Presidente, representam

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antes uma aspiração, embora legitima, do que uma realização de exito completo e seguro, como demonstrarei, se o tempo me não escassear.

Sr. Presidente: não decerto importantes todos os assumptos que dizem respeito á administração publica, mas, Sr. Presidente, se ha assumpto em que um Governo deva encontrar todo o cuidado, desenvolver grande prudencia, e sobretudo seguir intemeratamente os mais genuinos principios da justiça e da equidade, esse assumpto é, sem duvida alguma, a organização do recrutamento militar (Apoiados).

Bom sei, Sr. Presidente, que o restabelecimento das remissões foi uma questão de ordem economica, mas lamentavel e triste expediente é este, que desmoraliza a instituição mais necessaria e de maior garantia para a estabilidade e integridade da nossa, autonomia nacional, a troco de uma problematica vantagem monetaria. (Apoiados}.

Mas, Sr. Presidente, acceitemos, embora com magua os factos consumados, e entremos na analyse de algumas disposições do diploma, que temos á vista, porque o tempo urge e o Sr. Presidente da Camara é implacavel. (Risos)

Começa a lei por dizer, como a anterior: o serviço militar é obrigatorio e pessoal. Pois, Sr. Presidente, nem obrigatorio, nem é pessoal.

Não é obrigatorio o serviço, facultando-se as remissões nem é pessoal um serviço que admitte as substituições Alem d'isto, Sr. Presidente, nenhum dos principios ou affirmações do laconico relatorio que precede o decreto dictatorial sobre o recrutamento, ou mesmo do parecer da commissão parlamentar, que na passada sessão legislativa aqui foi apresentado, indicando á nossa approvação um projecto de lei, que é exactamente igual ao que foi publicado um dictadura, nenhum d'esses principios ou affirmações, repito, tem correspondencia nos artigos da lei. (Apoiados).

Diz-se nesses relatorios que a lei tem por escopo especial retirar das operações do recrutamento as entidades civis; pois, Sr. Presidente, para contrariar, logo de entrada, esse pensamento, entrega-se, como antigamente, a organização do recrutamento militar a uma commissão civil!! (Apoiados).

E isto depois de conceder uma latitude extraordinaria ás commissões militares do recrutamento. Nada justifica esta duplicação de commissões, perante as disposições da nova lei. (Apoiados).

Affirma-se, nos relatorios, que a lei traz commodidades aos povos, mas o artigo 19.º manda que os mancebos e os paes d'esses mancebos, quando chegarem á idade legal do recrutamento declarem ao secretario da commissão do recrutamento qual a sua idade.

Ora, Sr. Presidente, quem introduziu esta innovação na lei, naturalmente porque ella se encontra nalgumas legislações estrangeiras, mostra bem que possue tão somente o estudo do gabinete, ignora que a grande maioria dos mancebos desconhece a sua idade, e se a quiserem saber teem de consultar os parochos respectivos. (Apoiados).

O legislador, Sr. Presidente, não sabia que, para tornar effectiva essa declaração, ou mancebos necessitavam de ir á sede do concelho, e, portanto, perderem um dia de trabalho e os paes outro. (Apoiados). Demais, esqueceu-se que, legislava para um país de analphabetos; grande parte dos mancebos não sabem escrever, precisando de recorrer a pessoa mercenaria que lhes faça a declaração exigida pela lei.

De todos estes factos resultam apenas despesas, incommodos e contrariedades. (Apoiados). Commodidades é que não descortino.

E para que todos estes enfadonhos tramites de organização recenseadora?

Para não escaparem ao recenseamento uma duzia de cidadãos, num país em que ha milhares de recrutados em excesso sobre o contingente necessario para o effectivo das forças do exercito de mar e terra.

Uma estatistica que tenho aqui presente auctoriza esta minha asserção. (Apoiados). E foi este factor que passou despercebido ao legislador, copiando do estrangeiro esta disposição, sem reparar que ella subsiste puramente nos paises em que o preenchimento dos contingentes é difficil. (Apoiados).

Sr. Presidente: insere a lei tambem muitas disposições perfeitamente draconianas e até manifestamente estultas. Assim, o artigo 11.º prescreve:

«Nenhuma praça do activo poderá ter baixa por incapacidade physica nos primeiros seis meses do encorporação na unidade activa o sem estar prompta da instrucção, salvo caso de lesão, ou deformidade consideravel que absolutamente impossibilite do trabalho, ou faça correr risco á collectividade.

§ unico. As praças a quem, no primeiro anno da encorporação no activo do exercito, for concedida licença pela junta hospitalar de inspecção, não terão vencimento algum, sendo-lhes descontada no tempo do serviço a licença que tiverem antes de promptos da instrucção».

Quero, Sr. Presidente, servir-me da melhor hermeneutica na interpretação da impossibilidade do trabalho, de que fala este artigo. Evidentemente o legislador não teve, nem podia ter, intenção de considerar essa impossibilidade referida, em absoluto, a qualquer genero de trabalho, pois seria absurdo conservar nas fieiras individuos com uma perna ou um braço do menos, visto que estes individuos ainda podem executar differentes trabalhos. Portanto, a impossibilidade de trabalho deve traduzir-se pela impossibilidade do trabalho militar, isto é: do serviço militar. (Apoiados).

Mas preceitua o artigo que somente terão baixa por incapacidade as praças impossibilitadas do serviço, quer dizer: as praças que forem incapazes!

Ora, Sr. Presidente, se isto não é prosa do amigo Banana, é, pelo menos, uma redundancia mal cabida numa lei d'este teor. (Apoiados). E sobretudo representa uma suspeição lançada sobre as juntas e um contrasenso indesculpavel. Realmente, quererá o legislador insinuar que não pode ser dada baixa do serviço a soldados capazes de o prestar?

Aqui está a suspeita do favoritismo das juntas. Quererá o legislador indicar que a praça pode ter baixa, sem estar incapaz, depois dos seis meses de serviço?

Sendo assim, o legislador affronta não só o bom senso, mas a moralidade da propria lei. Repillo, pois, esta hypothese, e considero a disposição legal como mais uma leviandade de redacção.

Inscreve igualmente o artigo a condição de que a incapacidade somente poderá ser concedida depois dos alistados estarem promptos da instrucção! Para que servirá, Sr. Presidente, a instrucção aos individuos que devem ser julgados incapazes do serviço? (Apoiados).

Veja V. Exa., Sr. Presidente, e pondere a Camara que serie de desatinos só num artigo! (Apoiados). E não ficam apenas por aqui os despropositos.

No § unico do mesmo artigo 11.º determinam-se cousas altamente revoltantes, descamaveis e até inexequiveis!

Segundo este paragrapho, aos soldados, no gozo de licença da junta, são-lhes retirados todos os vencimentos!... Pois, Sr. Presidente, se, nalguma circunstancia, o magro pret do soldado deve ser intangivel, é exactamente quando elle necessita revigorar as forças prostradas pela doença. (Apoiados).

É precisamente quando a junta medica indica uma convalescença em boas condições moraes e hygienicas, enviando os soldados para ares patrios, que elles não podem rescindir do auxilio pecuniario, em virtude do qual essa

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convalescença se faça nas condições mais aproximadas das indicações medicas. (Apoiados). Pois, Sr. Presidente, é exactamente nesta conjuntura que a lei abandona o pobre soldado aos seus unicos recursos que, na maioria dos casos, são nullos! (Apoiados}.

Frisa, no entanto, a doutrina do paragrapho, que este corte nos vencimentos somente terá logar quando só der a licença, antes de um anno de serviço.

Mais uma incongruencia, Sr. Presidente.

No primeiro anno do alistamento, e mormente nos primeiros meses é que avulta a imperiosa necessidade das licenças da junta.

A epoca da encorporação, que entro nós e a mais impropria para integrar com facilidade no recruta os habitos e as exigencias do seu novo modo de vida, imprime no organismo do soldado abalos que frequentemente o conduzem ao hospital.

E a prova do que avanço patenteia-se inilludivelmente na estatistica nosocomial. (Apoiados}.

Por consequencia, é nos primeiros tempos de serviço, o principalmente durante a recruta, que o soldado carece mais da intervenção das juntas medicas.

E então que elle mais pode aproveitar do auxilio pecuniario. (Apoiados}.

É então, porem, que a garra adunca e despiedosa da lei lhe arrebata o seu mesquinho pret!! (Apoiados}.

Simplesmente iniquo e miseravel! (Apoiados}.

Mas, ha mais, Sr. Presidente.

Ouça-o a Camara.

Se a junta arbitar a licença, não para ares patrios, mas para convalescença no quartel, o misero soldado fica condemnado a morrer de fome dentro do quartel, porque não lhe cabendo vencimentos alguns, não lhe pode ser abonado o rancho!

Basta isto para o Sr. Ministro da Guerra se compenetrar da insania que presidiu á elaboração d'este infeliz diploma legislativo. (Apoiados}.

Vou agora, na continuação da minha tarefa, analysar a constituição das juntas de recrutamento e o seu funccionamento, embora tenha de fazer essa analyse por uma forma telegraphica, pois d'isso advertem os tyrannicos ponteiros do relogio d'esta sala. (Risos}.

Sr Presidente: compõem hoje as juntas de inspecção, tres officiaes combatentes com voto deliberativo e um medico com voto consultivo.

Foi uma novidade introduzida pela commissão parlamentar.

Na proposta do Sr. Ministro da Guerra cada junta era composta por dois officiaes combatentes e um medico, todos com voto deliberativo.

Sob o ponto de vista technico nada adeanta uma á outra qualquer das organizações da junta. A maioria fica sempre confiada a quem não pode resolver scientificamente. (Apoiados}.

Qual a razão, porem, justificativa da presença de um só medico na junta?

Di-la o relatorio da commissão parlamentar-a falta de medicos para os serviços sanitarios do exercito.

Esta razão, todavia, não é concludente e muito menos é remediavel a falta pela actual disposição da lei.

Na verdade, a falta de medicos para o serviço do recrutamento provinha de que essa falta dava-se nos medicos regimentaes, por causas variadas, doenças, licenças, etc.

Ora, estas mesmas causas continuarão subsistindo, aggravadas ainda as circunstancias com a deslocação de um dos medicos regimentaes, durante quatro meses, para fora da sede do regimento. (Apoiados).

Não obvia, portanto, a lei á falta de medicos. (Apoiados).

Effectivamente, se o Sr. Ministro da Guerra entende e entendo muito bem, que os medicos militares são poucos para occorrer a todas as necessidades do serviço militar, o remedio é só um augmentar o quadro. (Apoiados}.

Tudo o mais é musica celestial. (Risos).

Mas, Sr. Presidente, se era forçoso utilizar um só medico, porque se foi buscar á França, e não á Allemanha o a outros paises, a constituição das juntas, de modo que 10 medico somente é facultado o voto consultivo?

Difficil será a resposta, e, neste momento, permitta V. Exa. que ao perpassar-me pelo espirito a ideia de que esta disposição da lei teve unicamente por motivo uma suspeição assacada á classe medico-militar, eu repilla com toda a energia, que deve merecer uma affronta injusta, a insinuação de que uma das classes mais prestantes ao exercito e ao país é demasiado complacente ao favoritismo em materia de recrutamento.

Não, Sr. Presidente, apesar dos ataques potentes que são constantemente dirigidos á probidade e responsabilidade profissional dos medicos militares, elles teem caminhado, na sua quasi totalidade, altivos e triumphantes, neste meio social de prevaricação que tudo enlameia e tudo malsina.

O Sr. Ministro da Guerra quis tirar ás juntas o escudo da responsabilidade profissional, e substitui-lo pelo capricho ou pela ignorancia.

Não o felicitarei por isso. (Apoiados).

Como comprehendo V. Exa., Sr. Presidente, que individuos leigos em medicina, possa julgar de assumptos medicos?

Com que consciencia é que esses officiaes, depois do modico indicar a existencia de uma lesão, num mancebo, negam a veracidade d'essa indicação? (Apoiados).

Por conseguinte, Sr. Presidente, os vogaes da junta ficam apurando ou isentando mancebos simplesmente por palpite ou capricho. (Apoiados}.

Ao medico resta, é verdade, o direito de recurso, mas d'esses conflictos apenas resultam despesas para o Estado e desprestigio para as juntas.

Nada mais.

E já que falo em recursos, direi que, ainda neste ponto, claudicou o legislador.

O recurso assenta num principio liberal, a que deve ser dado toda a latitude. Do contrario, o melhor é não o consignar na lei.

Desde, porem, que a lei o estabelece, deve elle ser exercido em toda a sua amplitude e aproveitar todos que possam carecer d'esse direito. (Apoiados).

O recurso serve, principalmente, áquelles que se julgam lesados nos seus direitos.

Pois exactamente ossos é que não podem recorrer a seu talante!

A lei concede o recurso a qualquer dos membros da junta, quando haja divergencia opinitiva entre elles, e aos mancebos só num caso, quando o medico discorda da resolução da junta; isto é, num caso completamente desnecessario. Quando a junta resolver contra a indicação do medico, a dignidade profissional d'este impõe-lhe o recurso.

Não haverá, pois, ensejo para o mancebo recorrer, e quem soffrerá as consequencias d'este procedimento é tão somente o Thesouro Publico, porque o recurso do medico é a expensas do Estado, e o dos mancebos era á custa d'elles.

Mais um encargo que deriva d'esta nova lei. (Apoiados).

E visto que toco no capitulo despesas, não quero passar adeante sem mostrar á Camara como é erronea e falsa a asserção do relatorio da commissão, attribuindo a esta lei uma economia de 12:000$000 réis, pelo menos.

Em breve espaço de tempo a Camara vae ficar elucidada e edificada com essa famosa economia.

Sr. Presidente: requeri, ha tempos, que, pelo Ministe-

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rio da Guerra, me fosse enviada uma nota da quantia gasta com o serviço de recrutamento, nos dois ultimos annos (1900 e 1901).

Consta d'essa nota o seguinte:

Anno de 1900............................... 16:449$329
Anno de 1901............................... 16:454$655

O Sr. Presidente: Faltam cinco minutos para se pastar á ordem do dia.

O Orador: - Agradeço o aviso, vou marchar ainda com maior velocidade. (Riso). Quem ganha com isso é o Sr. Ministro da Guerra.

roseguindo no calculo, temos que a media annual pode avaliar-se em 16:151$992 réis. Confrontando este numero com aquelle que o computo nos dá como despesa minima dimanada dos encargos trazidos somente pelas novas juntas de recrutamento, obtemos um augmento de despesa considerabilissimo.

Tenho aqui presente esse calculo baseado em dados estatisticos officiaes e em disposições legaes concernentes ao assunto. Não podendo gostar tempo em esmiuçar as verbas e as operações artithmeticas parciaes, limito-me a mencionar os resultados finaes.

Offereço, no entanto, este calculo á apreciação do Sr. Ministro da Guerra ou de qualquer dos illustres Deputados que desejo verificá-lo.

Pelas minhas contas cada junta fará despesa de réis 1:377$000. As vinte e quatro juntas do continente desponderão pois, 33:048$000 réis.

Para as ilhas ajacentes estabelece a lei um regime especial; comtudo esse redime auctoriza, o funccionamento da nove juntas, o que importará num dispendio não inferior a 9:000$000 réis. Mas supponhamos que se gastam apenss 6:000$000 réis.

Addicionando tudo, resulta uma verba de 39:048$000 réis, pelo menos!

E não contamos aqui as despesas provenientes da outras disposições da lei, que fatalmente hão de carregar o quadro.

Deduzinho agora a despesa da lei anterior, temos uma differença, para mais, de 22:596$008 réis, em cada anno.

Veja a Camara como a celebre economia de 12:000$000 réis, annunciada no relatorio da commissão, se converte uma despesa de 23:000$000 réis, proximamente. Chego a pasmar perante a audaciosa arithmetica financeira do relatorio (Apoiados).

Sr. Presidente: fechado este incidente financeiro da lei, vou concluir as minhas observações acêrca da materia do recurso.

O recurso, tal como a lei o estatue, não se reduz só a uma briga de vaidades o caprichos entre os membros da junta. A briga dá-se entre os proprios artigos da lei.

Assim, o § 8.º do artigo 88.º preceitua que o recurso tem effeito suspensivo, exceto para o sorteio. E o artigo 99.º, taxando quaes os mancebos que não entram no sorteio, diz: «... os isentos temporaria ou definitivamente (excepto aquelles de que houver recurso para a junta hospitalar, que serão sorteados)»

Logo, o recurso tem effeito suspensivo, mesmo para o sorteio.

Admire agora o Sr. Ministro da Guerra os dispanterios que referendou! (Apoiados).

V. Exa., Sr. Presidente, disse ha pouco que faltavam apenas cinco minutos, e eu não quero terminar esta discussão sem me referir aos refractarios.

Aos refractarios são comminadas, por esta lei, nada menos de seis penalidades pelo mesmo delicto!

Não se accumulam todas, é certo, mas accumulam-se algumas d'ellas; de ordinario sobrepõem-se tres.

O refractario está sujeito a prisão, se deixar de apresentar-se no prazo estipulado para a encorporação. (Artigo 171.º).

Será vexado com uma execução nos seus bens, se faltar á apresentação dentro de dez dias. (Artigo 173.º). E ainda que mam tarde lhe seja levantada a nota de refractario, porque haja justificado a falta, o que não lhe restituem é o que ficou na mão dos empregados de justiça, para custas do processo de execução. (Apoiados).

O refractario é obrigado ao serviço por mais tres annos do que os simples recrutados. (Artigo 8.º, alinea b). São os primeiros a destacar para o ultramar; não gozam de licença disciplinar, e a licença registada só lhe é concedida, por trinta dias, no segundo e terceiro anno de serviço. (Artigo 172.°).

E, por ultimo, Sr. Presidente, são mimoseados com 30 dias de cadeia, se tiverem baixa antes de um anno de praça! (Artigo 176.°).

Este sudario, Sr. Presidente, esboça a mais repugnante iniquidade que pode haver em materia legislativa! (Apoiados).

Note bem a Camara: porque a doença impossibilitou do serviço um refractario, offerece-se-lhe, como sanatorio, 30 dias de cadeia!

Pondere ainda a Camara como a lei é tanto mais cruel e deshumana quanto mais desgraçado é o refractario. A pena de cadeia pode remir se por 50$000 réis, e essa pena não existe para o refractario que se impossibilitou depois de um anno de alistamento.

Como se vê, a moralidade e a equidade estavam dormitando quando o legislador escreveu o capitulo sobre os refractarios. E não sei mesmo se alguma cousa estava alerta no espirito d'esse legislador de animo tigrino. (Apoiados).

Falta um minuto, Sr. Presidente, e não cabo no espaço de um minuto a critica severa das restantes monstruosidades d'esta lei.

Todavia, as disposições draconianas que tenho apontado são sufficientes para explicarem a saudosa invocação, no relatorio da proposta ministerial, aos tempos anteriores ao regime liberal.

Eis, Sr. Presidente, o espirito do legislador adejando pela ominosa epoca dos capitaes-mores, e chamando, com enthusiasmo, pelas delidas do recrutamento a cordel. E só não ficou de todo assim, Sr. Presidente, porque o novo regime lh'o não consentiria. (Apoiados}.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi cumprimentado por muitos Srs. Deputados).

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - Vae passar-se á ordem do dia. Os Srs. Deputados que pediram a palavra e tenham, papeis a apresentar, podem mandá-los para a mesa.

O Sr. Alexandre Cabral: - Mando para a mesa duas representações da Camara Municipal de Guimarães.

Vão por extracto no fim da sessão.

O Sr. Madureira Beça: - Mando para a mesa uma representação da Camara Municipal de Bragança e peço a sua publicação no Diario do Governo.

Foi auctorisada a publicação.

Vae por extracto no fim da sessão.

O Sr. Antonio Cabral: - Peço a V. Exa. que me diga se já chegaram os documentos que requeri pelo Ministerio do Reino.

O Sr. Presidente: - Chegaram hoje.

O Sr. Conde de Penha Garcia pediu a palavra para um negocio urgente que a Camara não considerou como tal. Vae ler-se a respectiva nota para a Camara resolver.

Leu se. É a seguinte:

Nota de negocio urgente

Tendo recebido um telegramma em que a Camara Mu-

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SESSÃO N.º 58 DE 18 DE ABRIL DE 1902 7

nicipal de Idanha-a-Nova pede immediatas providencias contra a praga de gafanhotos que invadia aquella região, desejo chamar a attenção do Governo para este assumpto. = Conde de Penha Garcia.

Foi negada a urgencia.

O Sr. Mendes Ramalho: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra sobre o projecto de lei 65-B, que tem por fim ser contado, para os effeitos da reforma, ao coronel de artilharia Joaquim Carlos Paiva de Andrada, o tempo que prestou serviço em Africa, na Companhia de Moçambique.

Mando igualmente para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. que seja consultada a Camara sobre se permitte que a commissão de guerra reuna durante a sessão. = Alfredo Mendes Magalhães Ramalho.

O requerimento foi approvado. O parecer foi mandado imprimir.

O Sr. Domingos Eusebio da Fonseca: - Apresenta o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. que, com a maxima urgencia, me seja fornecida uma copia do ultimo parecer elaborado pela Commissão Central de Pescarias sobre a armação hespanhola a Reina Regente». = Eusebio da Fonseca.

Mandou-se expedir.

O Sr. José Caetano Rebello: - Mando para a mesa um projecto de lei auctorizando o Governo a decretar o regime de protecção aos azeites nacionaes.

Ficou para segunda leitura.

ORDEM DO DIA

O Sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.º 18.

Leu-se. É o seguinte:

PROJECTO DE LEI N.° 18

Senhores. - Foi presente ás vossas commissões reunidas de instrucção publica superior e especial e fazenda a proposta de lei n.° 13-E, de iniciativa governamental, tendente a reformar a organização e o ensino da Academia, Escola e Museu de Bellas Artes da cidade do Porto, o que, em observancia do decreto n.° 3 de 24 de dezembro de 1901, mereceu o parecer favoravel do Conselho Superior de Instrucção Publica.

Estudaram-na e discutiram-na as vossas commissões com a attenção devida a um diploma d'essa natureza, e do seu trabalho vêem hoje dar-vos conhecimento.

Satisfazendo ás urgentes reclamações da Academia Real de Bellas Artes de Lisboa, para que o programma do ensino na sua Escola de Bellas Artes se reorganizasse no sentido de corresponder, quanto possivel, ás exigencias modernas da educação artistica, e de produzir um mais positivo resultado no ensinamento das artes, fornecendo aos alumnos os indispensaveis conhecimentos profissionaes, não só na parte technica de execução como na theoria que fundamenta as regras da applicação, o Governo publicou o decreto de 14 de novembro ultimo, em que procurou, sem deixar de attender ás difficuldades presentes do Thesouro, satisfazer ás mais inadiaveis d'essas reclamações, depois de haver reconhecido a sua utilidade e justiça.

Não teve esse diploma a pretenção de instituir bases definitivas ao ensino das artes no nosso país, mas permittiu essa reforma que se lhe desse mais larga e benefica distribuição e decisiva uniformidade, acudindo ás suão mais flagrantes deficiencias e contribuindo, pela amplitude dada ao ensino theorico, para mais solida educação profissional e intellectual dos futuros artistas.

Essa reforma implicava, como do seu plano uniformizador evidentemente sobresaia, a reorganização em bases, senão de todo iguaes, quanto possivel identicas, da Academia de Bellas Artes da cidade do Porto. Essa uniformidade de ensino nas duas Escolas de Bellas Artes do país impunha-se. Mas como ao Governo actual fora impossivel executar simultaneamente as duas reformas, á cidade do Porto renovou, sem mais tardar, a aspiração pela qual desde ha longos annos vinha infatigavelmente reclamando junto dos Governos, de que fosse reorganizado o programma do ensino na sua Escola de Bellas Artes e subsidiado, a titulo de conservação, pelo menos, o seu respectivo museu.

Reclamação justa, cujo direito ninguem podia contestar á segunda cidade do reino, que tanto contribuirá em todos os tempos para o progresso e o engrandecimento das artes, e cuja parte eminente e preponderante no desenvolvimento nacional, o país devidamente reconhece.

A situação de inferioridade em que se encontrava a Escola de Bellas Artes do Porto, inferioridade que nenhuma razão explicava ou desculpava, e antes as suas honrosissimas tradições condemnavam. como immerecida, exigia, não só como acto de justiça, como tambem de sabia administração publica, a sua urgente reforma.

Da Escola do Porto sairam alguns dos maiores artistas portugueses contemporaneos, e é possivel que esse numero mais elevado se tornasse, se a educação artistica nella administrada, correspondendo ás necessidades do complexo estudo das artes, chamasse um maior concurso de vocações e imprimisse áquellas que a procuram mais solido ensinamento profissional. A ausencia absoluta de cadeiras especiaes de theoria e preparação conduzia o alumno ao aperfeiçoamento, quando muito, da habilidade mechanica, sem cuidar em desenvolver-lhe e educar-lhe as aptidões artisticas. Nem a boa vontade dos professores nem o esforço dos alumnos podiam preencher a lacuna de um ensino theorico methodizado e reparar essa gravissima falta pedagogica de um cultivo preparatorio, na educação do artista. Quando um alumno não alcançava com o pensionato de Paris ou de Roma os meios de completar, senão recomeçar a sua aprendizagem, era fatalmente condemnado a permanecer estacionario ou retrogradar, por ausencia de incentivo ou falta de sciencia adquirida que bastasse ao seu espontaneo progresso como artista. É assim que o pequeno subsidio dispensado pelo Governo á Academia de Bellas Artes do Porto, longe de representar uma economia, redundava, por insufficiente, em prejuizo pura a arte e para a nação.

Nas suas multiplas correlações com a industria moderna, a arte é hoje, mais do que nunca, um elemento valiosissimo de progresso em quasi todos os ramos da actividade humana, depois de ser o mais nobre officio aberto á iniciativa e ao talento do homem.

Criar cidadãos que beneficamente o sirvam deve ser a primeira obrigação do Estado. Dos elementos progressivos das populações, do desenvolvimento das aptidões individuaes e da conjuncção de todos os esforços isolados, extrae o Estado o mais seguro penhor da prosperidade dos povos. Zelar por esse bem imponderavel da aptidão e da intelligencia, abrindo campos á sua applicação e collaboração, prestando auxilio ao seu desenvolvimento e expansão, é por certo um dos mais sabios processos de executar a administração publica.

Attendendo por isso a que o Governo, sem esquecer as circumstancias da Fazenda Nacional, e no cumprimento de uma das suas mais nobres funcções, proseguindo no seu plano de reformar com reconhecida utilidade o ensino da arte no país, e precedendo consulta do Conselho Superior de Instrucção Publica, procurou attender ás reclamações

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instantes da capital do norte, quanto á reorganização da sua Academia de Bellas Artes, as vossas commissões são de parecer, de acordo com o Governo, que deveis approvar o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º É approvado o plano de reorganização da Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes, plano annexo á presente proposta de lei e que d'ella faz parte integrante.

Art. 2.º Fica revogada a legislação em contrario.

Sala das commissões, 26 de fevereiro de 1902. = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães. = Marianno de Carvalho = João Arroyo = Rodrigo a. Pequito = J. M. Pereira de Lima = Chruistovam Ayres = Clemente Pinto = Abel Andrade = Anselmo Vieira = José Maria de Oliveira Simões = Conde de Paçô Vieira = Manuel Fratel = D. Luiz de Castro = Alberto Navarro = Luciano Pereira da Silva = Lopes Navarro = Reis Torgal = Augusto Louza = H. Matheus dos Santos = Carlos Malheiro Dias, relator.

Segue o plano de reorganização da Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes que é identico ao publicado a pag. 10.

N.º 13-E

Senhores. - Ninguem hoje contexta o valor moral da arte, a influencia que ella exerce na educação dos povos, a satisfação que dá ás necessidades ideaes do espirito, o respeito que incute por tradições que fortalecem o culto da nacionalidade.

Ninguem discute, igualmente, os eu valor economico, como fonte de riqueza publica, como criadora de preciosos elementos de permutação, e como valorisadora das industrias, quasi todas suas tributarias.

Inteiramente se justifica, pois, a ampla protecção que o Estado lhe concede, por toda a parte, no meio do applauso e das sympathias geraes.

Não podendo prodigalizar á arte um apoio tão generoso, como o que ella encontra em paises mais prosperos, cumpre-nos, todavia, favorecer os seus progressos, provendo á boa organização e ao desenvolvimento do ensino artistico, como meio mais proprio para attingir esse fim.

No cumprimento d'este indeclinavel dever, o actual Governo publicou o decreto de 14 de novembro ultimo, que reorganiza a Academia Real de Bellas Artes e o Museu Nacional de Bellas Artes de Lisboa, como primeiro passo para a reforma geral do ensino artistico, de harmonia com as exigencias modernas.

Pretende agora o Governo completar a reforma d'esses serviçois com a presente proposta de reforma da Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes, que só por difficuldades de momento, não pôde realizar juntamente com a da Academia de Lisboa.

A presente proposta de reforma, alem de corresponder a uma inadiavel necessidade publica, é ao mesmo tempo uma legitima satisfação dada á segunda capital do reino, onde ultimamente se tem iniciado uma forte corrente de protecção artistica, amplamente manifestada pela importancia acquisição de obras de arte, por parte dos particulares, pelo consideravel numero de pensionistas que os mesmos particulares mandam á sua custa ao estrangeiro aperfeiçoar-se nesses estudos, por exposições de iniciativa privada, taes como as que tem promovido a benemerita Sociedade de Estudos e Conferencias, e outros actos ainda de mais rasgada iniciativa, como a construcção da Casa da Bolsa, que é indiscutivelmente um dos mais bellos edificios modernos de Portugal, e que por si só constitue um verdadeiro museu.

Registando e applaudindo estas preoccupações tão altas e desinteressadas, o Governo, entendeu que lhe cumpria cooperar com aquella laboriosa e intelligente cidade na obra do resurgimento da arte nacional. O Governo não podia, pois, sem flagrante injustiça votar ao ostracismo a Escola Portuense de Bellas Artes, cujos admiraveis serviços reconhece.

Apesar das desfavoraveis condições em que esta Escola quasi sempre tem vivido, foi de lá que saíram artistas como Soares dos Reis, Silva Porto, Sousa Pinto e Teixeira Lopes, para só falar d'aquelles que, com mais largo quinhão, teem contribuido entre nós para o engrandecimento da arte.

Não podia tambem o Governo sem commetter uma grave falta, consentir que o Museu do Bellas Artes do Porto continuasse por mais tempo no lamentavel estado em que se encontra, isto é, sem ter alguma dotação que, na sua modestia, lhe permittisse ao menos resgatar da ruina as suas obras de arte, algumas de incontestavel valor.

Tão pouco se podia admittir que, sendo a Escola Portuense de Bellas Artes frequentada por tão grande numero de alumnos, se mantivesse por mais tempo o programma do estudos obsoleto e deficientissimo por que se tem regido aquelle estabelecimento.

Criada por decreto de 22 de novembro de 1836, pela patriotica iniciativa do grande estadista Passos Manuel, sob um plano analogo ao da Academia Real de Bellas Artes de Lisboa, sua contemporanea, foi fixada áquella Academia uma dotação de 9:050$000 réis, quasi dupla da que actualmente lhe é concedida, e attribuido um quadro docente e um programma de estudos muito superiores aquelles de que presentemente dispõe.

Ao passo que todos os estabelecimentos de ensino, pelas necessidades crescentes do progresso, e pela ordem natural das cousas, tendiam a alargar a sua esphera, a Academia Portuense assistiu, não sem repetidos protestos, á constante reducção dos privilegios que lhe conferia o seu estatuto fundamental.

Limitada, hoje, a tres simples cadeiras technicas, onde se professa o ensino da pintura, esculptura o architectura, acompanhadas de uma unica cadeira preparatoria de desenho do antigo, nem os mais rudimentares conhecimentos theoricos indispensaveis se ministram ali aos alumnos.

A pintura e a esculptura, estão-se ensinando sem auxilio das mais leves noções da anatomia e da perspectiva, tão necessarias aos artistas, e sem o concurso da historia, da esthetica e da ethnographia, indispensaveis, comtudo, para a preparação intellectual dos jovens artistas. A architectura, nem de uma simples cadeira auxiliar de desenho linear geometrico dispõe, o termina-se este curso, sem se suspeitar, sequer, das leis physicas que regem os corpos, da mechanica que assegura o seu equilibrio, das condições chimicas de que depende a sua duração, dos estylos que são as differentes linguagens da arte, da hygiene, da natureza dos materiaes, da legislação o orçamentos das edificações, de tudo quanto, emfim, em absoluto carecem os alumnos architectos para o exercicio profissional d'esta arte que, por consequencia, lhes fica, tanto antes como depois do curso, igualmente desconhecido e defeso.

Pode afoitamente dizer-se que só duas cousas apreciaveis se teem observado na Escola Portuense de Bellas Artes: - é o nobre esforço dos alumnos, e a dedicação e boa vontade dos professores; mas, para que nada falte, até estes estão sendo remunerados relativamente aos das escolas de Lisboa, com uma desigualdade que nada justifica.

Por dura que seja a confissão d'estes factos, entendo o Governo dever fazê-la, no momento em que promove uma justa e completa reparação.

Segundo a proposta de reforma da Academia, Escola o Museu Portuense de Bellas Artes, sujeito á vossa esclarecida apreciação, conseguem-se, com pequeno augmento nas despesas d'aquelles uteis estabelecimentos, as vantagens seguintes:

Integra se o ensino artistico na Escola Portuense de Bellas Artes, no que elle tem de mais essencial e pratico; identificam-se os programmas de estudos das escolas de

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Bellas Artes de Lisboa e Porto, dando-se-lhes, senão o mesmo desenvolvimento, pelo menos a mesma orientação; com a admissão de quatro professores auxiliares, apenas, alem do ensino do desenho do antigo, pintura, esculptura e architectura, que já se professava, mas que fica muito melhorado, estabelecem-se as seguintes disciplinas inteiramente novas: - desenho linear geometrico, geometria descriptiva e perspectiva, desenho e modelação de ornato, pintura de paisagem, anatomia artistica, ethnographia, historia universal e historia da arte commentada.

Para complemento da educação artistica dos alumnos architectos, aproveitam-se nas cadeiras scientificas do Instituto Industrial e Commercial do Porto as disciplinas seguintes: - algebra, geometria o trigonometria, geometria analytica o calculo infinitesimal, geometria descriptiva o suas applicações, topographia, mechanica, estudo de materiaes de construcção, resistencia de materiaes, resistencia applicada, physica experimental, chimica experimental, mineral e organica, hygiene geral, mineralogia e petrographia, e geologia.

Fornece-se, pois, uma solida educação technica e a sufficiente cultura scientifica aos alumnos de cada especialidade; amplia-se o ensino de desenho, que é o fundamento e a probidade da arte; estabelecera-se novos estimulos para os alumnos por meio de premios e de diplomas que consagrem os seus estudos e criam-se alem d'isso bolsas de viagem, que permittem aos alumnos archilectos, por meio de excursões de estudo no pais, conhecer os monumentos e as tradições da arte portuguesa.

Aos professores, que conservavam os mesmos vencimentos que lhes tinham sido attribuidos em 1836, dá-se-lhes, mais trabalho com a criação das novas cadeiras, algumas das quaes lhe compete reger; mas, em compensação, ficam equiparados aos professores da Escola de Bellas Artes de Lisboa, estabelecendo-se-lhes, ainda, gratificações, embora modestas, por outros cargos que podem accumular, taes como a direcção do Museu e a direcção o secretariado da Escola.

Dotam-se melhor alguns capitulos; separam-se os serviços pedagogicos dos serviços administrativos, fixando-se as attribuições da Academia e da Escola, e facultam-se a estas novos meios de acção, que lhes permittem exercer a sua influencia, por varios modos e mais efficazmente, em favor dos progressos da arte.

Finalmente a conservação do Museu é confiada a um director e estabelece-se a esse Museu uma pequena dotação, que, quando lhe não permitta fazer novas acquisições, é pelo menos sufficiente para evitar a ruina das excellentes obras que nelle se expõem á admiração do publico.

A presente proposta de lei traz um augmento de despesa, na importancia de 2:910$000 réis, verba esta que é quasi inteiramente compensada pela economia de réis 2:856$325, realizada com as ultimas reformas de repartições, estabelecimentos e serviços do Ministerio do Reino, decretadas pelo Governo no uso da auctorização conferida pelo artigo 18.° da carta de lei de 12 de junho de 1901.

Tal é a proposta de lei que o Governo, com o parecer do Conselho Superior de Instrucção Publica, nos termos do decreto n.° 3, de 24 de dezembro de 1901, artigo 6.°, n.° 2.º, offerece á vossa ponderação, esperando que o coadjuveis neste serviço que se procura prestar ao país.

Proposta de lei

Artigo 1.° É approvado o plano de reorganização da Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes, plano annexo á presente proposta de lei e que d'ella faz parte integrante.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 24 de fevereiro de 1902. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

Plano de reorganização da Academia, Escola e Museu Portuense de Bellas Artes

CAPITULO I

Da Academia Portuense de Bellas Artes

SECÇÃO I

Da Academia

Artigo 1.° A Academia Portuense de Bellas Artes tem por fim:

l.° Superintender no ensino artistico, no norte do país, dotando-o de todos os meios pedagogicos, em harmonia com os mais recentes trabalhos sobre bellas artes;

2.° Empregar os meios necessarios para o enriquecimento e boa conservação do Museu do Porto, Atheneu D. Pedro, annexo a esta Academia;

3.° Organizar exposições de arte, e promover conferencias sobre esthetica, historia da arte, monumentos nacionaes e archeologia;

4.º Coadjuvar a Academia Real das Bellas Artes de Lisboa no arrolamento dos objectos de arte existentes em Portugal, e obstar, por todos os meios legaes, a que saiam do país.

Art. 2.° A Academia estabelecerá relações com a Academia Real de Bellas Artes de Lisboa, o Conselho dos Monumentos Nacionaes e todas as corporações, legalmente constituidas, que tenham por fim o desenvolvimento da arte.

SECÇÃO II

Dos academicos

Art. 3.º Haverá tres classes de academicos: effectivos, de merito e honorarios. Effectivos, serão: o inspector da Academia, que occupará o logar de presidente; todos os professores da Escola Portuense de Bellas Artes e o presidente do Conselho dos Monumentos Nacionaes. Academicos de merito, serão os individuos, nacionaes ou estrangeiros, residentes ou não em Portugal, que se tenham distinguido pelas suas producções artisticas ou hajam contribuido, pelos seus escritos, para o progresso da arte. Academicos honorarios, serão as pessoas que tenham contribuido, quer com donativos quer com serviços para o desenvolvimento da arte nacional.

Art. 4.º O presidente da Academia, os academicos de merito e os honorarios serão nomeados pelo Governo.

§ 1.° A nomeação dos académicos de merito e dos honorarios dependerá de proposta da assembléa geral dos socios effectivos.

§ 2.° Para ser proposto academico de merito, é indispensavel a apresentação por parte do candidato, de uma obra por elle composta e executada, ou de qualquer trabalho de critica de arte, de historia artistica ou de investigação archeologica.

§ 3.° As obras de arte dos candidatos nomeados ficarão pertencendo á Academia.

§ 4.° Dos actuaes academicos de merito, passarão á classe de effectivos os que estiverem comprehendidos nas disposições respectivas do artigo 3.°

Art. 5.° Os academicos de merito poderão assistir ás sessões da Academia com voto consultivo.

Art. 6.º Os academicos de merito nacionaes, do sexo masculino, serão obrigados a prestar á Academia os serviços que por ella lhe forem solicitados; a fazer parte dos jurys e a substituir os professores da Escola Portuense de Bellas Artes, quando para isso sejam nomeados, vencendo neste caso metade do ordenado do professor que substituirem.

Art. 7.° Haverá na Academia um presidente, um vice presidente, um secretario e um vice-secretario.

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10 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Art. 8.° O presidente será vitalicio e de nomeação regia; o vice-presidente e os secretarios serão eleitos em assembléa geral dos socios effectivos e servirão por um triennio.

SECÇÃO III

Da commissão executiva

Art. 9.º Haverá na Academia uma commissão executiva, composta do presidente, do vice-presidente, do secretario, do vice-secretario o de dois socios effectivos, eleitos pela assembléa geral, e que servirão por um triennio.

§ unico. Os directores do Museu e Escola de Bellas Artes fazem, de direito, parte da commissão executiva.

Art. 10.º Compete á commissão executiva:

1.° Consultar acêrca dos assumptos technicos e administrativos dos estabelecimentos sobre os quaes a Academia exerça inspecção;

2.° Proceder ás distribuições das verbas orçamentaes destinadas aos referidos estabelecimentos;

3.º Fiscalizar o emprego dos fundos, e organizar as contas que hajam de ser enviadas ao Governo.

Art. 11.° As deliberações da commissão executiva só se tornarão effectivas depois de approvadas em assembléa geral, excepto para determinados casos que serão especificados no regulamento.

Art. 12.° A Academia reunirá em sessão solemne por occasião da distribuição de premios, tanto aos alumnos, como nos expositores a quem tiverem sido conferidos.

CAPITULO II

Du Escola Portuense de Bellas Artes

SECÇÃO I

Do pessoal da Escola

Art. 13.° A Escola Portuense de Bellas Artes é destinada, ao ensino de desenho, da architectura, da esculptura e da pintura.

Art. 14.º O pessoal da Escola Portuense de Bellas Artes compor-se-ha de:

Director;

4 professores do ensino technico, effectivos;

2 professores de ensino technico, auxiliares;

2 professores do ensino theorico, auxiliares;

Secretario-thesoureiro;

Bibliothecario;

Fiel-amanuense;

5 empregados menores.

SECÇÃO II

Do director da Escola

Art. 15.° O director da Escola Portuense do Bellas Artes nova um dos professores do ensino technico, nomeado pelo Governo, ouvido o presidente da Academia. O lugar do director é de commissão.

Art. 16.º Compete ao director:

1.° Exercer inspecção sobre os estudos e parte disciplinar da Escola;

2.° Presidir a conselho escolar;

3.° Cumprir e fazer cumprir os regulamentos e as deliberações da Academia e do conselho.

§ unico. No impedimento do director fará as suas vezes o professor de ensino technico que o conselho da Escola designar por meio de votação e que vencerá metade da gratificação do director.

SECÇÃO III

Dos professores

Art. 17.° Os locares de professor, tanto de ensino theorico como de ensino technico, serão providos por concurso.

§ unico. Um regulamento especial, elaborado pela Academia e approvado pelo Governo, estabelecerá o numero e a natureza das provas dos concursos.

Art. 18.° O primeiro provimento de todos os professores será por tempo de dois annos, findos os quaes o conselho da Escola procederá á votação para o provimento definitivo.

§ unico. Para ser excluido do provimento definitivo é preciso que o professor tenha contra si, na votação, dois terços do numero legal dos professores effectivos.

Art. 19.º O bom e effectivo serviço na Escola dará aos professores direito á jubilação, segundo as leis que estabelecem este beneficio para os professores de instrucção superior.

SECÇÃO IV

Do secretario-thesoureiro e do bibliothecario

Art. 20.° O secretario da Escola Portuense de Bellas Artes, que exercerá tambem as funcções de thesoureiro, será um dos professores do ensino technico, nomeado pelo Governo, ouvido o presidente da Academia, ou por pessoa idonea, mediante concurso nas condições previstas no regulamento.

Art. 21.° Compete ao secretario:

1.° Dirigir o expediente da secretaria;

2.° Assistir ás sessões do conselho escolar e dirigir as respectivas actas;

3.° Proceder á matricula dos alumnos;

4.° Conservar em ordem o archivo;

5.° Arrecadar e escripturar todas as sommas que entrarem no cofre da Academia e estabelecimentos annexos;

6.° Cumprir tudo o mais que os regulamentos determinarem.

Art. 22.° No impedimento do secretario desempenhará extraordinariamente as suas funcções um professor nomeado pelo conselho escolar, e que vencerá metade da gratificação do secretario.

Art. 23.° O logar de bibliothecario é de nomeação do Governo.

Art. 24.° Compete ao bibliothecario presidir á leitura publica, fazer a estatistica dos leitores, catalogar as obras que forem entrando e olhar pela boa conservação dos livros e estampas;

§ unico. O bibliothecario funccionará sob a inspecção do secretario da Escola.

SECÇÃO I

Do fiel-amanuense e dos empregados menores

Art. 25.° Os empregados menores são:

1 Fiel-amanuense;

2 Guardas;

1 Porteiro;

2 Serventes.

§ 1.º A nomeação do fiel-amanuense e do porteiro é feita pelo Governo, sob proposta do director da Escola; a dos guardas e serventes pertence ao director.

§ 2.º O fiel é o chefe dos empregados menores.

§ 3.° Terão preferencia para os logares da guardas e serventes os veteranos do exercito.

§ 4.° O regulamento determinará as obrigações dos empregados menores.

SECÇÃO VI

Do conselho da Escola

Art. 26.° O conselho da Escola Portuense de Bellas Artes é formado pelos professores e presidido pelo director.

Art. 27.° Ao director cumpre convocar o conselho, sempre que as necessidades do serviço o reclamem, ou requeiram, em proposta assignada, tres dos professores.

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SESSÃO N.° 58 DE 18 DE ABRIL DE 1902 11

Art. 28.° Compete ao conselho:

1.° Regular o serviço das aulas, fixar os horarios e determinar os serviços dos exames e concursos;

2.º Apreciar, discutir e approvar as propostas para o aperfeiçoamento do ensino feitos por qualquer dos seus membros;

3.° Cumprir tudo o mais que se achar disposto neste decreto e no regulamento.

4.° Nomear os jurys preparatorios dos concursos e os jurys para os exames;

5.° Julgar as provas dos candidatos a pensionistas do Estado em paises estrangeiros ou a quaesquer outros premios que a Academia tenha de conferir.

SECÇÃO VII

Do ensino

Art. 29.° O ensino será distribuido por dez cadeiras, sendo oito technicas e duas theoricas.

1.ª CADEIRA

Desenho linear geometrica, geometria descriptiva e perspectiva

1.ª Parte. - Desenho linear geometrico.

2.ª Parte. - Principios de geometria descriptiva com applicação á theoria de sombras.

3.ª Parte. - Principios de optica; perspectiva com applicação á architectura, á pintura e á scenographia.

2.ª CADEIRA

Desenho e modelação de ornato

l.ª Parte. - Desenho ornamental por estampa e do relevo.

2.ª Parte. - Desenho do ornato do relevo; estylos.

3.ª Parte. - Modelação de ornato com applicação á decoração architectonica e ás artes industriaes; flora ornamental.

3.ª CADEIRA

Desenho de figura do antigo

l.ª Parte. - Desenho de figura por estampa; elementos de desenho do antigo.

2.ª Parte. - Desenho do antigo (continuação); proporções do corpo humano; desenho anatomico.

4.ª CADEIRA

Desenho de figura do natural o pannejamentos

Desenho do modelo, nu ou trajado; desenho de pannejamentos.

5.ª CADEIRA

Aichitectura

l.ª Parte. - Desenho architectonico.

2.ª Parte. - Estudos de architectura grega e romana; estylos architectonicos.

3.ª Parte. - Projectos de architectura publica e domestica.

4.ª Parte. - Processos geraes de construcção; orçamento das edificações; legislação especial dos edificios.

6.ª CADEIRA

Pintura historica e decorativa

l.ª Parte. - Processos de pintura a oleo; copia de quadros.

2.ª Parte. - Estudo do modelo, nu ou trajado.

3.ª Parte. - Estudos de composição; esbocetos pintados ou desenhados.

4.ª Parte. - Pintura historica, de genero e decorativa.

7.ª CADEIRA

Pintura de paisagem

l.ª Parte. - Desenho de paisagem, animaes e marinhas do natural.

2.ª Parte. - Estudos de composição; esbocetes pintados.

3.ª Parte. - Pintura de paisagem, animaes e marinhas do natural.

8.ª CADEIRA

Esculptura e estatuaria

l.ª Parte. - Modelação de figura, do antigo.

2.ª Parte. - Modelação de figura, do natural.

3.ª Parte. - Estudos de composição: esbocetos desenhados ou modelados.

4.ª Parte. - Processos de moldar, fundir e pontear.

5.ª Parte. - Esculptura, estatuaria.

9.ª CADEIRA

Anatomia artistica

Noções de anatomia descriptiva, morphologia, physiologia artistica.

10.ª CADEIRA

Ethnographia, historia universal e historia da arte contentada

l.ª Parte. - Elementos de geographia e ethnographia, listaria geral e patria.

2.ª Parte. - Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos.

Art. 30.° As cadeiras a que se refere o artigo, 29.° serão distribuidas pelos seguintes cursos:

l.° Curso geral de desenho;

2.° Curso de architectura civil;

3.° Curso de pintura historica e decorativa;

4.° Curso de pintura de paisagem;

5.° Curso de esculptura e estatuaria.

Curso geral de desenho

1.º Anno

Desenho linear geometrico: principios de geometria descriptiva com applicação á theoria de sombras - l.ª cadeira (l.ª e 2.ª parte).

Desenho ornamental por estampa e do relevo - 2.ª cadeira (1.ª parte).

Desenho de figura por estampa; elementos de desenho do antigo - 3.ª cadeira (l.ª parte).

2.° Anmo

Principios de optica; perspectiva com applicação á architectura, á pintura e á scenographia - 1.ª cadeira (3.ª parte).

Desenho de ornato do relevo; estylos - 2.ª cadeira (2.ª parte).

Desenho do antigo (continuação); proporções do corpo humano; desenho anatomico - 3.ª cadeira (2.ª parte).

3.º Anno

Modelação de ornato com applicação á decoração architectonica e ás artes industriaes; flora ornamental - 2.ª cadeira (3.ª parte).

Desenho do antigo; proporções do corpo humano; desenho anatomico (continuação) -3.ª cadeira (2.ª parte).

Desenho do modelo, nu ou trajado; desenho de pannejamentos - 4.ª cadeira.

Desenho architectonico - 5.ª cadeira (1.ª parte).

Anatomia artistica - 9.ª cadeira.

4.º Anno

Modelação de ornato com applicação á decoração architectonica e ás artes industriaes; flora ornamental (continuação) - 2.ª cadeira (3.ª parte).

Desenho do antigo; proporções do corpo humano; desenho anatomico (continuação) -
3.ª cadeira (2.ª parte).

Desenho do modelo, nu ou trajado; desenho de pannejamentos (continuação) - 4.ª cadeira.

Desenho architectonico (continuação) - 5.ª cadeira (l.ª parte).

Anatomia artistica (continuação) - 9.ª cadeira.

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12 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Curso de architectura civil

1.º anno

Estudos de architectura grega o romana; estylos architectonicos - 5.ª cadeira (2.ª parte).

Elementos de geographia o othnographia; historia geral e patria - 10.ª cadeira (l.ª parte).

Algebra, geometria o trigonometria - 1.ª cadeira do Instituto Industrial e Commercial do Porto (l.ª parte).

Noções de geometria analytica e calculo infinitesimal - 1.ª cadeira do Instituto (2.ª parte).

2.º anno

Projectos de architectura publica e domestica - 5.ª cadeira (3.ª parte).

Elementos de geographia o ethnographia; historia geral e patria (continuação)-10.ª cadeira (l.ª parte).

Geometria descriptiva e suas applicações; topographia - 2.ª cadeira do Instituto (1.ª e 2.ª parte).

Mechanica; estudo dos materiaes de construcção; resistencia de materiaes; resistencia applicada - 3.ª cadeira do Instituto (2.ª parte).

3.º anno

Projectos de architectura publica e domestica. - 5.ª cadeira (3.ª parte).

Processos geraes de construcção - 5.ª cadeira (4.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos - 10.ª cadeira (2.ª parte).

Physica experimental - 4.ª cadeira do Instituto (l.ª parte). Chimica, experimental, mineral e organica - 5.ª cadeira do Instituto (l.ª parte).

4.° anno

Projectos do architectura publica e domestica. - 5.ª cadeira (3.ª parte).

Processos geraes de construcção; orçamento das edificações; legislação especial dos edificios - 5.ª cadeira (4.ª parte)

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos (continuação - 10.ª cadeira (2.ª parte).

Hygiene geral e colonial - 6.ª cadeira do Instituto (3.ª parte).

Mineralogia e petrographia - 7.ª cadeira do Instituto - (1.ª parte).

Geologia - 7.ª cadeira do Instituto (2.ª parte).

Curso de pintura historica e decorativa

1.° anno

Processos de pintura a oleo; copias de quadros - 6.ª cadeira (l.ª parte).

Estudo do modelo, nu ou trajado - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos desenhados - 6.ª cadeira (3.ª parte).

Elementos do geographia e ethnographia; historia geral e patria - 10.ª cadeira (l.ª parte).

2.º anno

Estudo do modelo, nu ou trajado (continuação) - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos do composição; esbocetos pintados - 6.ª cadeira (3.ª parte).

Elementos de geographia o ethnographia; historia geral e patria (continuação) -10.ª cadeira (l.ª parte).

3.° anno

Estudo do modelo, nu ou trajado (continuação) - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição: esbocetos pintados (continuação) - 6.ª cadeira (3.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos ou países, nos tempos antigos o modernos - 10.ª cadeira (2.ª parte).

4.° Anno

Estudo do modelo, nu ou trajado (continuação) - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos pintados (continuação)- 6.ª cadeira (3.ª parte).

Pintura historica, de genero e decorativa - 6.ª cadeira (4.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos (continuação) - 10.ª cadeira (2.ª parte).

Curso de esculptura e estatuaria

1.º Anno

Modelação de figura, do antigo - 8.ª cadeira (1.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos desenhados - 8.ª cadeira (3.ª parte).

Processos de moldar e fundir - 8.ª cadeira (4.ª parte).

Elementos de geographia e ethnographia; historia geral e patria - l0.ª cadeira (1.ª parte).

2.º Anno

Modelação de figura, do antigo (continuação) - 8.ª cadeira (l.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos modelados - 8.ª cadeira (3.ª parte).

Processos de moldar e fundir (continuação) - 8.ª cadeira (4.ª parte).

Elementos de geographia e ethnographia; historia geral e patria (continuação) -10.ª cadeira (l.ª parte).

3.° Anno

Modelação de figura, do natural - 8.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos modelados (continuação) - 8.ª cadeira (3.ª parte).

Processos de moldar e fundir (continuação) - 8.ª cadeira (4.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os países, nos tempos antigos e modernos - 10.ª cadeira (2.ª parte).

4.º Anno

Modelação de figura, do natural (continuação) - 8.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos modelados (continuação) - 8.ª cadeira (3.ª parte).

rocessos de pontear - 8.ª cadeira (4.ª parte).

Esculptura, estatuaria - 8.ª cadeira (5.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos (continuação) - 10.ª cadeira (2.ª parte).

Curso de pintura de paisagem

1.º Anno

Processos de pintura a oleo; copia de quadros - 6.ª cadeira (l.ª parte).

Estudo do modelo, nu ou trajado - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos desenhados - 6.ª cadeira (3.ª parte).

Desenho de paisagem; animaes e marinhas do natural - 7.ª cadeira (l.ª parte).

Elementos de geographia e ethnographia; historia geral e patria - 10.ª cadeira (l.ª parte).

2.° Anno

Estudo do modelo, nu ou trajado (continuação) - 6.ª cadeira (2.ª parte).

Estudos de composição; esbocetos pintados - 6.ª cadeira 3.ª parte).

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SESSÃO N.º 58 DE 18 DE ABRIL DE 1902 13

Pintura de paisagem; animaes e marinhas do natural - 7.ª cadeira (3.ª parte).

Elementos de geographia e ethnographia; historia geral e patria (continuação)-10.ª cadeira (1.ª parte).

3.º Anno

Estudos de composição; esbocetos pintados - 7.ª cadeira (2.ª parte).

Pintura da paisagem; animaes e marinhas do natural (continuação) - 7.ª cadeira (3.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos - 10.ª cadeira (2.ª parte).

4.º Anno

Estudos de composição; esbocetos pintados (continuação) - 7.ª cadeira (2.ª parte).

Pintura de paisagem; animaes e marinhas do natural (continuação) - 7.ª cadeira (3.ª parte).

Origens e historia commentada da arte, em todos os paises, nos tempos antigos e modernos (continuação) - 10.ª cadeira (2.ª parte).

Art. 31.° Organizar-se-ha junto da Escola uma collecção de reproducções plasticas de obras primas da arte antiga e moderna, como subsidio para o ensino da respectiva historia.

§ unico. A conservação o catalogação d'estes modelos ficará a cargo do professor da 10.ª cadeira.

SECÇÃO VIII

Dos alumnos

Art. 32.° Haverá duas classes de alumnos: ordinarios e voluntarios.

Art. 33.° Serão admittidos á matricula, em qualquer d'estas classes, os individuos de ambos os sexos que o requererem ao director da Escola.

Art. 34.° Os alumnos ordinarios e voluntarios serão obrigados a frequentar as disciplinas do anno em que estiverem matriculados, pela ordem e systema designados neste decreto e nos respectivos regulamentos e programmas.

§ unico. Os alumnos voluntarios poderão ser dispensados d'esta frequencia, no que se refere ao horario, de acordo com o regulamento.

Art. 35.° Haverá nos cursos da Escola Portuense de Bellas Artes exames de frequencia e exames finaes, na conformidade do regulamento e dos programmas.

§ unico. Os alumnos voluntarios não serão em caso algum dispensados dos exames das disciplinas do curso que frequentarem; e, sem approvação nesses exames, não poderão ser admittidos á matricula nas disciplinas immediatamente superiores do mesmo curso.

Art. 36.° A approvação na lingua francesa, em qualquer estabelecimento official de ensino, e condição essencial para a admissão á Escola.

§ unico. Os alumnos que á data do presente decreto frequentarem a Academia, sem terem a approvação na lingua francesa poderão continuar a frequentá-la nas mesmas condições, mas só terão direito á carta do respectivo curso depois de apresentarem a certidão da referida approvação.

Art. 37.° Os alumnos que se destinarem ao curso de architectura serão obrigados a apresentar, para a matricula no primeiro anno d'esse curso, documentos de approvação não só no curso geral de desenho, como tambem nas cadeiras de lingua portuguesa, arithmetica, geometria plana, principios de physica, chimica e historia natural em qualquer das escolas officiaes, ou certidão de approvação no exame de admissão aos Institutos Industriaes e Commerciaes de Lisboa ou Porto, que continuará a ser facultado aos alumnos das Escolas de Bellas Artes, que, o requererem, juntando ao requerimento a certidão de approvação no curso geral de desenho da mesma escola.

§ 1.° Para o ensino das disciplinas que os alumnos do curso de architectura devem frequentar fora da Academia ter-se-ha em vista que não haja incompatibilidade nos horarios.

§ 2.° Os alumnos que á data da publicação d'este decreto frequentarem o curso de architectura poderão ser dispensados das approvações nas cadeiras das escolas e institutos industriaes, mas só terão direito ao diploma de architecto quando apresentarem documentos que comprovem essas approvações.

§ 3.° Aos alumnos que ao tempo da publicação d'este decreto ou de futuro mostrarem ter sido approvados em todas as cadeiras do curso especial de architectura, não só nas professadas na Escola, como tambem nas frequentadas no Instituto Industrial e Commercial, será passado diploma de architecto.

§ 4.° Aos alumnos que, tendo terminado o curso de pintura historica, frequentarem as cadeiras technicas dos dois ultimos annos do curso de pintura de paisagem, será concedida a carta d'este ultimo curso, sendo igualmente concedida a carta do curso de pintura historica aos alumnos que, depois da conclusão do curso de paisagem, frequentarem as mesmas cadeiras do curso de pintura historica.

Art. 38.° Os alumnos reprovados em dois annos consecutivos na mesma disciplina, não poderão continuar a frequentar a Escola, salvo nos casos previstos no regulamento.

Art. 39.° Os alumnos das Escolas de Bellas Artes de Lisboa e Porto podem transitar de uma para outra d'essas Escolas, quando assim o requererem, conservando a situação em que se encontram nos respectivos cursos.

§ enico. O regulamento fixará as condições a que ficam sujeitos os alumnos a que se refere este artigo.

Art. 40.° Haverá exposições escolares no principio de todos os annos lectivos.

§ 1.° Por occasião d'estas exposições, serão conferidos premios pecuniarios, medalhas ou menções honrosas aos alumnos ordinarios que mais se houverem distinguido em qualquer dos cursos durante o ultimo anno lectivo.

§ 2.° Estas distincções serão acompanhadas do respectivo diploma.

Art. 41.° As matriculas serão gratuitas.

Art. 42.° As certidões dos exames e os diplomas dos cursos serão gratuitos.

SECÇÃO IX

Dos pensionistas do Estado em paises estrangeiros

Art. 43.° O Governo subsidiará dois individuos para, em paises estrangeiros, se aperfeiçoarem no estudo das bellas artes.

§ l.º O tempo para o estudo de cada pensionista não excederá, em regra, cinco annos.

§ 2.° Um regulamento especial, que deverá ser elaborado pela Academia e submettido á approvação do Governo, fixará:

1.° Condições de admissão aos concursos para pensionista;

2.° Termos do concurso até á proposta definitiva;

3.° Disposições acêrca da ordem que os pensionistas deverão seguir nos seus estudos, e localidade onde deverão fixar a sua residencia durante o prazo do pensionato;

4.° Trabalhos que deverão remetter á Academia, como prova do aproveitamento nos seus estudos, e prazos em que esses trabalhos hão de ser enviados;

5.° Obrigações dos pensionistas para com o Estado, modo de as tornar effectivas, e penas em que incorrem, só não as cumprirem.

Art. 44.° Aos pensionistas que, pelas informações dos seus professores e pelas provas que houverem remettido á Academia, mostrarem excepcional applicação e aproveita-

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14 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Mento, poderão conceder-se mais um ou dois annos para continuarem os seus estudos fora de Portugal, com a clausula expressa de que executarão, durante esse tempo, um trabalho digno de entrar no Museu do Porto.

SECÇÃO X

Das bolsas de viagem em Portugal

Art. 45.º O Governo subsidiará, sob proposta do Concelho Escolar, alumnos do curso de architectura, para, em viagem pelo país, estudarem os monumentos da arte nacional.

§ único. Estas viagens realizar-se-hão durante as ferias escolares, com trajecto, duração e ordem de estudos determinados pelo Conselho.

CAPITULO III

Do Museu do Porto

Art. 46.º O Museu do Porto dividir-se-ha em duas secçôes: uma de bellas artes, outra de artes decorativas.

Art. 47.° No Museu do Porto serão expostas:

a) As obras de arte ou artes decorativas actualmente existentes no Athenou D. Pedro;

b) As obras de arte que os academicos apresentarem como titulo de candidatura (artigo 4.°, § 2.°);

c) As obras de arte que forem executadas pelos pensionistas do Estado em paises estrangeiros, nos termos do artigo 44.°;

d) As obras de arte ou artes decorativas que forem doadas por corporações ou particulares;

e) As obras de arte ou artes decorativas que forem temporariamente depositadas por corporações ou particulares;

f} Quaesquer outras que possam ser adquiridas com esse fim.

Art. 48.º O pessoal do Museu do Porto será o seguinte:

1 Director;

l Guarda;

l Porteiro.

§ l.º O logar de director será de commissão e desempenhado por um dos professores do ensino technico nomeado pelo Governo, sob proposta da Academia.

§ 2.º Os logares de guarda e porteiro serão de nomeação do Governo, sob proposta do director da Academia.

Art. 49.º O director do Museu deverá proceder, com diligencia, á organização do respectivo catalogo.

CAPITULO IV

Disposições geraes e transitorias

Art. 50.º As primeiras nomeações dos professores e demais pessoal do Museu e da Escola Portuense de Bellas Artes serão feitas pelo Governo, ouvida a commissão executiva da Academia Portuense de Bellas Artes.

Art. 5l.º Pelas certidões e outros documentos passados pelo secretario da Escola, e que sejam requeridos por individuos que não pertençam ou não tenham pertencido à mesma Escola, pagar-se-hão os emolumentos da tabella que regula para estes casos nas secretarias de Estado.

Art. 52.° Os funccionarios da Escola Portuense de Bellas Artes o«estranhos ao corpo docente, mas nomeados pelo Governo, terão direito á reforma, nas condições estabelecidas para os outros empregados publicos de categoria igual ou correspondente.

Art. 53.º A Academia e o conselho escolar organizarão os regulamentos e programmas necessarios +ara a execução d'este decreto, os quaes terão caracter provisorio, devendo ser revistos ao cabo de tres annos.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 24 de fevereiro de 1902. - Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

TABELLA N.º 1

Despesa da Escola Portuense de Bellas Artes

l Director - grutificação ........................... 100$000
4 Professores do ensino technico.... ............... 2:400$000
2 Professores auxiliares de desenho ................. 800$000
1 Professor do anatomia artistica ................... 300$000
1 Professor de historia e ethnographia .............. 400$000
1 Secretario-thesoureiro - gratificação.............. 200$000
1 Bibliothecario .................................... 300$000
1 Fiel-amanuense .................................... 300$000
2 Guardas .......................................... 400$000

Porteiro ......................................... 150$000
2 Serventes......................................... 292$000
Premios a alumnos ................................... 100$000
Pensões no estrangeiro .............................. 1:440$000
Bolsas de viagem no país ............................ 60$000
Modelos vivos ....................................... 175$000
Combustivel ......................................... 30$000
Livros, encadernações e assignaturas de jornaes...... 300$000
Molduras e compra de gesso .......................... 150$000
Illuminação ......................................... 100$000
Diversas despesas e expediente....................... 93$000
8:090$000

TABELLA N.º 2

Despesa comparativa da Escola Portuense de Bellas Artes

[ver tabela na imagem]

TABELLA N.º 3

Despesas ao Museu do Porto

1 Director-gratificação.......................... 100$000
2 Guardas....................................... 200$000
l Porteiro....................................... l50$000
Diversas despesas, conservação e expediente....... 200$000

650$000

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SESSÃO N.º 58 DE 18 DE ABRIL DE 1902 15

TABELLA N.º 4

Despesa comparada do Museu do Porto

[ver tabela na imagem]

TABELLA N.º 5

Escola Portuense de Bellas Artes:

Despesa segundo o orçamento........ 5:480$000
Despesa segundo a proposta......... 8:090$000
Differença para mais.......................... 2:610$000

Museu do Porto:

Despesa segundo o orçamento....... 350$000
Despesa segundo a proposta......... 650$000
Differença para mais.......................... 300$000

Differença geral para mais..................... 2:910$000

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 24 de fevereiro de 1902. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 1.°

O Sr. Malheiro Dias (relator): - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Proponho que me seja additado ao artigo 43.° do projecto n.° 18 em discussão um § 3.°, nos seguintes termos:

Art. 43.° - § 3.° - Só poderão ser admittidos aos concursos para pensionistas do Estado, a que se refere este artigo, os alumnos da Escola Portuense de Bellas Artes. = O relator, Carlos Malheiro Dias.

Apresento tambem o seguinte

Requerimento

Requeiro que se consulte a Camara sobre se permitte que seja posto á discussão juntamente com o projecto o additamento ao artigo 43.° que tenho a honra de mandar para a mesa. = O relator, Carlos Malheiro Dias.

O requerimento foi approvado e a proposta admittida.

O Sr. Rodrigues Monteiro: - Mando para a mesa o parecer da commissão de guerra sobre as emendas apresentadas pelo Sr. Deputado José Dias Ferreira, durante a discussão do projecto n.° 53, relativo ás zonas de servidão militares.

Mandou-se imprimir.

O Sr. Conde de Penha Garcia: - Começou este Governo a sua obra de cooperação com o Parlamento trazendo á Camara um pedido de bill de indemnidade pela mais monstruosa das dictaduras, num país onde dictaduras celebres se tem feito, e parece que quer a fatalidade dos destinos politicos d'este Governo que acabe por onde principiou, trazendo á Camara um pedido de auctorização que vale bem o primeiro a que se referiu.

Para sublinhar a audacia que chega a tocar as raias da inconsciencia, o estado de espirito do Governo, basta notar que nas vesperas de se entrar na discussão de mais importante assunto para o futuro do país, manda pôr em discussão um projecto d'esta ordem.

Isto é tão extraordinario que não ha nada que se possa comparar á grandeza tragica d'este facto.

Pois o Governo que reformou, em novembro do anno passado a Academia de Bellas Artes de Lisboa, não podia fazer conjuntamente a reforma da sua congenere do Porto, que sempre andou ligada áquella e que era realmente necessaria?!

Não fez isto então, e é hoje, neste momento, que esse assumpto é dado para a discussão!

Parece que o Governo se esqueceu de que a divida fluctuante ascendo a 58:000 contos de réis, que o deficit nos ultimos oito annos passou de 30:000 contos, de que elle proprio em pouco mais de um anno recorreu a creditos extraordinarios na importancia de 10:000 contos; de que a circulação fiduciaria está em 69:000 contos e de que a divida ao Banco de Portugal anda por 56:000 contos.

Quando a situação do país é a que acaba de descrever, quando se está em vesperas de se celebrar um convenio que vem ainda aggravar mais essa situação, é digno da maior censura o procedimento do Governo, fazendo votar medidas que importam augmento de despesa.

No relatorio que precedo o projecto em discussão diz-se que o augmento de 2:900$000 réis que d'elle resulta é compensado, quasi na sua totalidade, pelas economias de 2:800$000 réis feitas pela ultima reforma do Ministerio do Reino.

É extraordinario que isto se diga, quando no Parlamento, pelo Sr. Conselheiro Alpoim, foi evidentemente demonstrado que, longe de haver economia, houve, pelo contrario, um importante augmento de despesa na reforma d'esse Ministerio.

Só nos serviços da instrucção primaria se lembra elle, orador, do que esse augmento foi de 37:000$000 réis.

Depois de se terem criado novos logares de inspectores, não só para o serviço de instrucção primaria, mas até das aguas mineraes, é para admirar o arrojo com que se fala em economias feitas, economias que só podiam ser verdadeiras, se o dinheiro que o Governo despende tivesse o mesmo condão da celebre moeda de ouro de Pedro Malas-artes.

Frisada assim a inopportunidade da discussão d'este projecto, vae elle, orador, entrar na sua apreciação, e mostrar que elle pouco vale, pois que pouco mais adeanta ao que em 1836 foi decretado pelo celebre estadista Manoel da Silva Passos.

Para que existe no Porto uma Academia de Bellas Artes? Era este o primeiro inquerito que o Governo deveria fazer.

Essa academia é destinada ao cultivo da grande arte; mas necessitará o país da cultura intensiva de mais talentos d'esta ordem?

Foi consultar as estatisticas para saber qual tinha sido a frequencia d'essa academia e verificou que nos ultimos cinco annos ella foi, em media, de 61 alumnos. Dir-lhe-hão, que esta frequencia é de attender, mas é preciso ver qual foi o numero d'esses alumnos que fez o curso completo. Elle, orador, verificou que foram dois em 1897-1898, dois em 1898-1899 e quatro em 1899-1900.

É para uma frequencia d'esta ordem que nas circunstancias actuaes do país se vem pedir ao Parlamento que se vote mais um augmento de despesa?

O plano adoptado na organização d'este ensino não lhe parece o mais conveniente. A seu ver, dever-se-hia, como lá fora, cuidar especialmente, da arte decorativa.

Não comprehendo tambem que uma reforma, feita agora, seja vasada nos antigos moldes da copia de estampas, que tira toda a originalidade e a expansão a quem as faz.

Igualmente não comprehendo como do ensino de desenho se excluiu a paisagem.

A maneira como neste projecto se organizou o ensino

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de desenho prova que, sobre este assumpto, o Governo não tinha ideias definidas.

No porto existem quatorze professores de desenho, estipendiados pelo Governo, sem contar com os dos lyceus e os das escolas municipaes, e alem d'isso há mais vinte e um professores de ensino particular, o que demonstra, que, no tocante a desenho, já aquelle districto estava muito sufficientemente dotado.

Devo ainda notar, a respeito do ensino de desenho, que o ensino de paisagem que se pretende organizar na escola do Porto é feito entre quatro paredes, contra todas as prescripções da arte.

O mesmo succede na escola de Lisboa, porque na reforma de novembro de 1901 foi esquecido totalmente este ponto.

Também não pode, elle, orador, deixar de dirigir os seus reparos para o modo como se organizam os pensionatos do Estado.

Subsidiam-se os alumnos durante cinco annos correspondentes ao curso da escola de Paris, quando esses alumnos saem do país com o seu curso já completo e apenas ali vão aperfeiçoar-se.

Representa isto um esbanjamento que devia ser corrigido até com vantagem para o aperfeiçoamento de alumnos, porque reduzindo-se tempo do pensionato a dois annos, podia subsidiar-se mais do que um alumno.

Foi, portanto, bem infeliz o Sr. Presidente do Conselho em trazer á Camara um projecto que apenas ha de ficar na historia como uma demonstração da orientação politica de um governo, nas vesperas de se discutir o assunto mais grave para a nossa situação financeira.

Mais triste do que tudo isto é ainda ver o Diario ao Governo pejado de extraordinarios productos da pujança reformativa do Governo a constatar que na pratica tudo peora.

Assim, é certo que se fez a reforma da Escola de Bellas Artes de Lisboa, mas se o Sr. Presidente do Conselho visitar essa escola de ver que apesar dos pomposos relatorios e do extraordinario augmento de pessoal, nem sequer ali existe local apropriado para o ensino de desenho do animaes, e a maior parte das aulas esta installada pessimamente, sem condições de luz e até de hygiene e de asseio.

Não são, portanto, os pomposos relatorios que produzem o bom ensino.

Basta ver que Soares dos Reis e silva Porto, dois grandes nomes na esculptura e na pintura, saíram da modesta escola do Porto.

Discorda, pois, em absoluto do projecto que nem como orientação superior, nem como organização de detalhe corresponde +a moderna orientação do ensino e ás necessidades do país.

Entretanto não quer deixar de contribuir para melhorar o projecto e por isso, terminando, chama a attenção da commissão para algumas emendas que manda para a mesa.

Nada mais accrescenta, porque não quer roubar á Camara o prazer de ouvir a voz do illustre relator, que, certamente, irá responder-lhe

Essas emendas contém-se nas seguintes

Proponho que o subsidio a artistas para no estrangeiro se aperfeiçoarem no estudo das bellas artes tome a forma de, subsidios de viagem, cuja duração não excederá dois annos, e cuja forma será devidamente regulamentada. - Conde de Penha Garcia.

Proponho que na 3.ª cadeira o desenho de figura por estampa seja substituido por desenho do natural. = Conde de Penha Garcia.

Proponho que seja destinada uma verba annual de reis 100$00 para as despesas de excursões ao campo para o ensino de paisagem, sendo esta verba tirada da inscrita para pensões no estrangeiro. = Conde de Penha Garcia.

Proponho que seja supprimido o artigo 5.°- Conde de Penha Garcia.

Proponho que faça parte de um dos annos do curso geral de desenho da Escola de Bellas Artes do Porto o desenho de paisagem, animaes e marinhas do natural l.ª parte da 7.ª cadeira). = Conde de Penha Garcia.

Lidas na mesa, foram admittidas.

(O discurso será publicado na integra guando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas.

O Sr. Vaz Ferreira: - Mando para a mesa o parecer da commissão de administração publica sobre o projecto de lei n.° 15-B, que auctoriza a Camara Municipal de Alemquer a prorogar por sessenta annos o prazo da amortização do emprestimo de que é devedora á Companhia do Credito Predial Português.

Foi a imprimir.

O Sr. Augusto Louza: - Mando para a mesa o parecer da commissão de fazenda sobre o projecto n.° 12-A, de 1902, que concede a Maria da Graça Lopes, viuva de Quirino Lopes, patrão do salva vidas do Paço de Arcos, e a seus filhos, a pensão annual do 120$000 réis.

Foi a imprimir.

O Sr. Malheiro Dias: - Sr. Presidente: cabe-me a honra, como relator d'este projecto, de responder ao Sr. Conde do Penha Garcia. S. Exa., que é um distinctissimo parlamentar, e um dos mais fortes talentos entre os novos do seu partido, não pôde discutir este projecto sob o ponto de vista exclusivamente technico, porque não é um profissional. Com o ser S. Exa. um artista da palavra, não lhe bastava essa qualidade para tratar dogmaticamente o professoralmente um assunto de pedagogia artistica, no complexo campo das artes plasticas.

O ensino das bellas artes, ainda que obedecendo a uma mesma orientação, está organizado de maneira differente na maior parte das capitães e centros artisticos da Europa. Ha variados criterios para a sua applicação. Disse S. Exa., por exemplo, que achava retrogrado o processo conservado nesta reforma para o estabelecimento de pensões no estrangeiro.

Os Estados Unidos, que S. Exa. não poderá classificar de nação retrograda, acaba justamente de reformar os serviços de bellas artes, criando pensões no estrangeiro para os seus alumnos.

Essa reforma, creio que iniciada na Escola do Philadelphia, foi immediatamente seguida pelos diversos Estados a União. Hoje, todas as academias de bellas artes e os principaes estabelecimentos de ensino artistico passam a mandar pensionistas seus, magnificamente dotados, á Europa, para desenvolver as suas aptidões e completar a sua educação artistica.

Como V. Exa. vê é muito variavel o criterio a applicar no ensino das artes, ainda que, como disse ha pouco, esse ensino obedeça a uma orientação, á primeira vista, identica.

O proprio ensino da Academia de Bailas Artes de Paris, tido como modelar, não tem escapado aos ataques e criticas dos mais eminentes professores e uma corrente contraria á officialização do ensino artistico tem-se operado nos ultimos tempos, produzindo contra ella os mais fortes ainda que contestaveis argumentos.

Parece a S. Exa. defficiente o ensino praticado pela legislação d'esta reforma? De acordo. Tambem eu penso assim.

Mas o Governo não teve em ideia o criar bases deffinitivas ao ensino artistico em Portugal. A arte é uma flor de luxo, depois de ser um dos mais importantes factores

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de desenvolvimento, tanto moral como material de um povo, nas sociedades tanto modernas como antigas. A arte é a primeira a resentir-se das crises economicas, como uma planta avida que se estiola em terra exhausta. A arte é a inimiga da avareza. Quando em Athenas se impunham tributos para a construcção da Acropole, o povo chegou a queixar-se de que as contribuições de guerra custavam menos que as contribuições de arte.

Fazer o milagre de reformar em 1902 o ensino anachronico e obsoleto de uma escola de bellas artes sem exhorbitar do orçamento para essa mesma escola decretado em 1836, e dentro da exiguidade d'estes recursos conseguir verdadeiros avanços, verdadeiros melhoramentos, verdadeiros progressos, isso estava destinado a um homem dos mais variados talentos, da mais rara iniciativa, da mais sabia ponderação, a um homem cujo nome tem de ficar, de hoje para o futuro, vinculado á historia da arte no nosso país: um homem, a quem muito ficara devendo os artistas portugueses: ao Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro.

Desde ha muito que o ensino de bellas artes, entre nós, não correspondia ás mais urgentes necessidades do ensino artistico.

Os nossos pintores, os nossos esculptores, os nossos architectos, os nossos gravadores saiam de uma escola superior de bellas artes apenas com aptidões materiaes desenvolvidas. Mais nada. O ensino theorico, essa parte essencial e importantissima da educação do artista, que lhe permittirá desenvolver os talentos naturaes, as qualidades criadoras, e sob um criterio justo concorrer para nelle se produzir essa avis rara da individualidade, esse era pouco mais que uma sombra.

D'ahi resultava que a escola de bellas artes produzia architectos que, por sua vez, produziam bellissimos projectos de construcção destinados a não sair do papel; e que nas nossas cidades formosissimas se continuavam a construir todos os dias os edificios mais absurdos, os casarões os mais disformes.

Os novos bairros de Lisboa, por exemplo, estão sendo estragados pelos architectos portugueses.

E porque lhes falta talento e aptidões? Não; porque justamente é raro, talvez, encontrar, mesmo lá fora, no ensino de bellas artes, uma somma de tão consideraveis aptidões como entre os nossos concorrentes ao ensino de bellas artes.

Não lhes faltam, portanto, aptidões nem talento, mas a verdade é que, faltando-lhes no ensino preparatorio, um cultivo superior, esses architectos não podem nem sequer realizar os projectos que lhes ensinaram a executar na escola e mal saberiam realizar, dadas certas circunstancias, novos projectos de construcção, não sendo natural que um proprietario lhes encommende uma gare de caminho de ferro, um amphitheatro, ou qualquer d'essas construcções mirabolantes, que são os themas predilectos dos cursos officiaes.

Com os nossos pintores succede exactamente a mesma cousa.

Um pintor chamado a pintar um assunto classico ou um assunto historico tinha um gravissimo problema a resolver, qual era o do conhecimento historico ou classico do assunto, com toda a complexidade que esse problema envolve.

Se alguem se lembrasse de pedir a um alumno das nossas escolas de Bellas Artes que lhe pintasse, supponhamos, os adeuses de Heitor a Andromaca, veria o artista esgasear os olhos de assombro. Quem era Heitor? Quem era Andromaca? Onde e em que epoca tinham vivido? Elle nada sabia.

Nunca ouvira falar no cêrco de Troya nem na Illiada, e ainda quando o nome de Homero lhe tivesse chegado, vagamente e por acaso aos ouvidos, faltava-lhe o conhecimento da sua obra para ajuizar do assuto e transportá-lo para a tela.

Não imagine a Camara que eu exagero.

Ainda ha pouco tempo que um dos nossos mais illustres pintores, concorrendo a um concurso para a cadeira de pintura historica, concurso para que tinha sido dado o seguinte thema: Telia passando com o carro sobre o cadaver do pae, errava 800 annos, pelo menos, na interpretação do assumpto, pondo um scenario da Roma dos Cesares numa acção da lendaria dynastia dos Reis!

E era um professor; e foi interinamente nomeado!

Cuidou o Governo em acudir a essa verdadeira desorganização do ensino das artes, criando e desenvolvendo a par da educação technica, a indispensavel educação theorica; transformando de vez os pintores de taboletas em artistas, elevando o artifice habilidoso a um artista consciente; educando a aptidão e cultivando o cerebro. Esse o pensamento fundamental da reforma.

Conseguiu o Governo o fim que tinha em vista?

Para o demonstrar não é necessario fatigar a attenção da Camara; basta ler o projecto, conferi-lo pela organização que vae substituir, para se observar o grande desenvolvimento dado ao ensino preparatorio e theorico e remediados alguns dos mais graves inconvenientes da actual organização d'esse ensino.

O projecto responde eloquentemente a todas as objecções do illustre Deputado.

E se alguma lacuna nelle existe, a razão é bem simples. É que se em 1836 era necessario um orçamento de réis 9:050$000 para uma Escola de Bellas Artes criada com fins modestos, seria necessario dotá-la com 15:000$000 ou 20:000$000 réis para a tornar verdadeiramente digna da sua actual missão.

E chegamos a um dos pontos mais importantes do discurso do illustre Deputado: - o Governo augmentou as despesas. S. Exa. exprimiu mal a sua accusação. O Governo não augmentou as despesas. Simplesmente as não diminuiu. É tudo. Se por um lado, reformando o ensino de Bellas Artes no Porto, augmenta o subsidio d'essa escola em 2:9l0$000 réis, por outro lado, nos diversos serviços do Ministerio do Reino economizou 2:856$325 réis, o que dá um saldo negativo de 53$674 réis. Reformar, tornar productivo e benefico o estudo da arte, gastando apenas 53$675 réis, ha de S. Exa. concordar que é gastar pouco, e que a arte ainda vale que se gaste com ella 50$000 réis, mesmo num país pobre.

A continuar o ensino como até aqui, o Governo só tinha uma cousa a fazer para salvaguardar do desperdicio os dinheiros publicos: fechar a Escola. Poderia e deveria fazê-lo!? Não! Se grandes o nobres razões levaram Passos Manoel a organizá-la em 1836, razões mais poderosas existem para a conservar em 1902.

Não faltava quem advogasse até a centralização do ensino artistico e a alguem ouvi argumentar com a nossa Universidade, monopolizadora do ensino theologico, philosophico e juridico.

Fechasse-se a Escola do Porto. Dotasse-se mais largamente a Escola de Lisboa e entregasse-se a uma só academia o ensino e educação artistica em Portugal.

Isso, sobre representar uma injuriosa injustiça á cidade do Porto, que tem dado a Portugal alguns dos seus maiores artistas, algumas das suas mais legitimas glorias, seria uma heresia mesmo no campo puramente especulativo da arte e da razão. Uma centralização artistica é uma phrase sem nexo. Tanto vale dizer: trazei do norte para sul as differentes modalidades do seu caracter ethnico, as leis especialissimas da mesologia, as suas variantes de temperamento, as suas paisagens, os costumes dos seus habitantes, as suas tradições, a sua vida!
Pretender que um país de montanhas sinta como um país de planicies, que um país de arvoredos sinta como um país de lesirias e charnecas, que uma raça tão originalmente pagã no seu culto da natureza e das alegrias de viver, onde as mulheres se vestem de encarnado e cobrem os peitos de ouro, sinta como uma raça tão definidamente mosarabe como a do sul e em que

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a passagem agravou a tristeza originaria e o fatalismo da herança é um absurdo!

É do Porto e do norte do país, repito, com o grande prazer de que o Sr. Conde de Penha Garcia lhe haja feito essa justiça, que teem saido alguns dos nossos artistas mais illustres.

Como esse paisagista genial que se chamou Silva Porto, esse esculptor de genio que se chamou Soares dos Reis eram do norte. Isso para só falar dos mortos. Elles bastam para honrar a arte portuguesa no fim do seculo XIX. (Apoiados).

Sr. Presidente: terminando as breves considerações a que me levou o excellente discurso do Sr. Conde do Penha Garcia, a quem renovo a homenagem da minha admiração, desejo ainda, neste capitulo de desposas, destacar o seguinte facto. É que a presente reforma representa uma despega ornamental menor do que a da primitiva organização do ensino em 1836. O projecto em discussão en volve uma despesa total de 8:740$000 réis e a de 1836 uma despesa de 9:050$000 réis. Ha, pois, uma differença para menos de 310$000 réis.

Mas mesmo que assim não acontecesse, e é milagre que não aconteça, mesmo quando o Governo precisasse de augmentar o orçamento primitivo da Escola do Porto, no empenho de tornar definitivamente aproveitaveis os reis 5:800$000 que essa estuda obsoleta e anachronica custava, não sei porque esse acto de sabia administração fosse censuravel.

Despender com acerto tambem é economizar. A reducção das despesas pode ser uma divisa politica neste momento historico em Portugal. Não o nego. Mas systemalizada, não!

Jamais um Governo poderia governar o administrar com essa divisa, tornada severa como uma regra monastica. O exagero faz de um bom principio governativo uma utopia.

Da parte da opposição, caso fervor sentimental que ella põe em todos os seus ataques, a coberto d'essa divisa de cavalleiro andante, é apenas theorico. E isso da sua parte não me admira. É um acto de tradicional coherencia com o pujado. O partido progressista foi sempre intransigentemente theorico e idealista. O governo progressista ergueu sempre o pendão das reformas politicas, como o partido regenerador o das reformas materiaes. O partido progressista tem no seu passado a Belemzada; o partido regenerador, a Regeneração. Uma é a synthese fortemente retocada de poesia e idealismo da aspiração doutrinaria; a outra a magnifica synthese dos progressos positivos.

(Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

Proposta de emendas

1.º Proponho que se addicione a commissão executiva, de que trata o artigo 9.°, o presidente da Camara Municipal do Porto, que terá voto consultivo em todas as questões que se relacionem com a administração do edificio onde se, acha installada a escola, nas suas relações com a Camara Municipal.

2.º Proponho que o titulo do museu a que se refere o capitulo 3.º se designe Museu da Escola de Bellas Artes do Porto, modificando-se nestes termos os differentes artigos do projecto que a elle se refere. - O deputado, Clemente Pinto, relator - Carlos Malheiros Dias.

Foi admittida.

O Sr. Queiroz Ribeiro: - Será o mais breve possivel.

Começa por dizer que poucas vezes tem falado sob uma caução tão profunda como a que lhe causaram, em assumpto tão absorvente para o espirito d'aquelles que se lhe entregam de uma maneira tão especial, os brilhantes discursos proferidos pelo Sr. Conde de Penha Garcia, que mais uma vez affirmou as suas notaveis qualidades de lucidez, do amor ao trabalho, e pelo seu querido amigo o grande escritor o Sr. Carlos Malheiros Dias, que acaba de fazer a affirmação brilhante da sua personalidade no Parlamento, como já a fez na imprensa.

A S. Exa. endereça as suas mais sinceras felicitações.

Quando pensou em inscrever-se era seu intuito de combater o projecto, porque no artigo 43.° se fazia a injustiça maior que poderia sustentar-se contra o Porto o contra o norte do país; mas essa injustiça foi, felizmente, reparada pelo illustre relator e o norte foi respeitado nos direitos incontestaveis que tinha de poder mandar ao estrangeiro os seus artistas.

Citou S. Exa. dois grandes nomes: Soares dos Reis e Silva Porto. Se quisesse falar dos vivos, poderia tambem citar Guilherme Braga, Silva Pinto, Julio Dinis, Soares de Passos, Julio Brandão, Luis Botelho e entre outras ainda essa distinctissima familia Arroyo, que forma como que uma dynastia, da qual um principe exilado guia hoje a maioria parlamentar.

Não quer, porem, demorar o debate o deseja ser breve, mesmo porque de um lado vê o seu illustre leader, o Sr. Beirão, reconhecendo a necessidade de diminuir a despesa, e do outro, consultando o sou coração, sente-se encaminhado a dar o seu applauso ao projecto.

Uma tal situação não pode prolongar-se, porque ella é, neste momento, precisamente a do viuvo de duas mulheres que a ambas estremecia, de modo que entre, les deux, mon coeur balance.

O illustre relator deu a perceber que o partido progressista era idealista; todavia os melhoramentos materiaes do país quasi todos teem sido executados por esse partido, embora alguns votados pelo partido regenerador.

Mas o idealismo é um titulo de gloria, porque na litteratura dá Victor Hugo, Espronceda e tantos outros; na arte Miguel Angelo, Murillo e Soares dos Reis, o grande esculptor do «Desterrado»; na sciencia Flammarion, o Petrarcha das estreitas.

Na politica o idealismo é o auctor do Filho das Hervas, d'essa obra sublime que fez a reputação de quem a escreveu; esse homem que todo elle é ideal, e que apesar de parecer uma criança, tem já no sou passado quanto basta para tornar o sen nome immorredouro nas letras.

Elle, orador, só estranha que o Sr. Malheiro Dias não se sente na Camara ao lado dos idealistas e já que, infelizmente é impossivel arrancá-lo do logar onde se collocou, termina, felicitando o partido regenerador e o Sr. Presidente do Conselho, por contar entre os seus adeptos um escritor que se chama Carlos Malheiro Dias.

(O discurso será publicado na integra quando S. Exa. restituir as notas tachygraphicas).

O Sr. Motta Prego: - Mando para a mesa o parecer da commissão de legislação civil, sobre a renovação do iniciativa do projecto de lei n.° 92, de 1901, que altera a circunscripção eleitoral dos juizos de paz do concelho das Lagens da ilha do Pico, districto da Horta.

Foi a imprimir com urgencia.

O Sr. Vellado da Fonseca: - Mando para a mesa a seguinte

Proposta

Attendendo á importancia do ensino de pintura de paisagem no norte do país, proponho que na Escola de Bellas Artes do Porto, á semelhança do que existe em Lisboa, se nomeie um professor especial para o ensino d'aquella disciplina. -Antonio Maria Vellado da Fonseca.

Foi admittida,

O Sr. Christovam Ayres: - Sr. Presidente: se não fosse quasi uma obrigação moral a que me impus de entrar neste debate, eu poderia dispensar-me de o fazer depois do brilhante discurso do illustre Deputado e meu

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amigo o Sr. Queiroz Ribeiro, que tão justo foi para o relator d'este projecto, honra da litteratura portuguesa, pela elevação com que o defendeu, e tão justo para o Governo que o incluiu no seu programma. Só encomios ouvi, aos quaes sinceramente me associo; e se uso da palavra é porque me impas este dever moral de defender um projecto de verdadeiro alcance para o país e de alta justiça para a cidade do Porto.

Como Deputado pelo Porto, quis aproveitar, o ensejo para affirmar o meu respeito e a minha gratidão pela nobre cidade, digna da consideração de todos nós (Apoiados), por ser, por excellencia a cidade do trabalho e da arte. (Apoiados).
Quis, alem d'isso, affirmar bem alto o meu apreço pela obra do nobre Presidente do Conselho, que, pelo cuidado que pôs na reorganização da Universidade, do Curso Superior de Letras, do Conservatorio, da Academia das Bellas Artes de Lisboa, das bibliothecas e archivos do reino, e em tantas outras medidas de fomento intellectual do país, e agora na iniciativa d'este projecto, mostra quanto é, principalmente, um estadista de superior cultura. (Apoiados).

Se um homem de Estado tem de ser alguma cousa mais do que um homem de acção, um chefe de partido, um chefe de Governo tem de se affirmar principalmente pela sua intellectualidade, pela sua elevação de pensamento e de acção no que respeita ás cousas do espirito.

Dizia ha annos o erudito escriptor portuense o Sr. Joaquim de Vasconcellos, num dos seus livros consagrados á arte, sua paixão e enlevo: Algum dia chegará a hora em que a questão da organização do movimento intellectual do país será a primeira no Parlamento.

Não é infelizmente chegado ainda esse dia, porque o Parlamento, assembleia de uma natureza muito especial ente nós peninsulares, continua ainda a ter por principal preoccupação a politica; mas este projecto, conjuntamente com o nucleo importante de medidas de fomento intellectual e artistico para as quaes o nobre Presidente do Conselho pediu em occasião opportuna a sancção da Camara, e foram aqui largamente discutidas, representa um amplo passo no caminho indicado por todos quantos reconhecem em Portugal que o verdadeiro progresso de uma nação está no seu desenvolvimento intellectual: litterario, scientifico e artistico. (Apoiados}.

O illustre Deputado o Sr. Queiroz Ribeiro teve a hombridade de accentuar essa feição na obra do nobre Presidente do Conselho e de a applaudir; quanto maior não deve ser a minha satisfação em poder dizer do alto d'esta tribuna, das mais elevadas do país, que applaudo com verdadeiro enthusiasmo este projecto, porquanto entra no numero d'aquellas medidas pelas quaes o nobre Presidente do Conselho mostra que não e apenas um dos primeiros, se não o primeiro parlamentar do seu país, com faculdades para se singularizar e ter o seu nome gravado em laminas do ouro em qualquer Parlamento do mundo, mas que é tambem um verdadeiro estadista, impondo-se, como seu primordial dever, o dirigir, animar e fortalecer o movimento intellectual da nação. (Muitos apoiados).

Apesar da minha qualidade de militar mo haver ensinado a ser disciplinado e a respeitar as hierarchias sociaes, confesso, Sr. Presidente, que em materia relativa ás cousas do espirito sou um insubmisso. Só reconheço superioridade na intelligencia e no saber; necessito, em quem me mande, que possua as qualidades unicas que podem dar auctoridade a um homem: o talento, a cultura, e o caracter. (Apoiados).

Nos tempos antigos em que a vida era uma permanente luta armada, corpo a corpo, os chefes que se erguiam nos escudos, nos campos de batalha, eram escolhidos entre os que se distinguiam pela sua superioridade physica; hoje, que esses prelios se ferem nos campos da intelligencia e do saber, só podem ser considerados verdadeiros chefes os que se impõem ao respeito e á consideração
dos outros pela superioridade das suas forças intellectuaes. (Apoiados).

O projecto em discussão satisfaz a um alto fim esthethico, - o de pôr a Escola Portuense de Bellas Artes em condições de dar uma verdadeira educação artistica aos seus alumnos; para esse fim estabelece num melhor criterio scientifico as bases do ensino, dota melhor os serviços, aperfeiçoa o ensino technico, e estabelece como base de todo o ensino artistico nessa Escola a perfeição no desenho, pelo qual a Inglaterra produziu a sua grande revolução artistica d'este seculo; alem disso é mais rigoroso nas exigencias dos preparatorios e das sciencias auxiliares, tão indispensaveis, como a anatomia, a ethnographia e a historia. Ao mesmo tempo colloca-se em melhores condições de satisfazer o alto fim, que com tanta distincção tem desempenhado, o Museu de Bellas Artes do Porto; procura-se salvar do exodo para o estrangeiro os productos artisticos nacionaes; e, com a criação das bolsas de viagem, pretende-se radicar no espirito do artista o culto pelos monumentos nacionaes, educando-lhes o gosto no sentido das nossas brilhantes tradições artisticas. Na situação a que chegára, tendo-se-lhe cerceado os recursos, ao ponto de estarem reduzidos a metade do que por Passos Manuel lhe fora consignado em 1836, a Escola Portuense de Bellas Artes só com grandes difficuldades e pelos esforços e sacrificios dos seus professores tem conseguido produzir, por forma a não desdourar o seu nome; mas era uma situação que não podia, nem devia continuar! Era um erro de boa administração e uma injustiça. (Apoiados).

Este projecto procura aproximar a Escola do Porto da de Lisboa, quanto á sua organização; é uma divida que se paga á capital do norte, á qual Passos Manuel em 1836 dotara a Escola com 9:050$000 réis, que a pouco e pouco se foram reduzindo; ó alem d'isso um acto de equidade, porque, comquanto Lisboa seja a capital do reino, o Porto é o velho nucleo nacional, em volta do qual se ampliou e se integrou a patria portuguesa, ora tentando voo ousado até Tuy e Zamora, ora vindo implantar sobre as arribas do Atlantico, no extremo Algarve, o pendão das quinas. Alem de que, já dizia Raczynski no seu livro, fundamento da bibliographia artistica em Portugal, que encontrava no Porto, no seu tempo, symptomas de gosto artistico muito mais desenvolvido que em Lisboa 1; da Escola do Porto, onde essa tradição, longe de esmorecer, tem criado maior incremento, até nas classes commerciaes, provieram os artistas emeritos que se chamaram Soares dos Reis, cujo escopro fazia falar a pedra, e Silva Porto, cujo pincel sentiu e traduziu, como nenhum outro ainda, a alma da paisagem portuguesa, e os artistas que se chamam Teixeira Lopes, o qual obteve o grande premio na ultima Exposição Universal de Paris, Sousa Pinto e Thomás Costa, que tão brilhantemente teem honrado o nome português nos salons da capital da França, e Ventura Terra, nome laureado, de quem é o notavel plano e a factura da Camara dos Deputados, em construcção. São nomes estes que podem competir em relevo e gloria com os de maior nomeada da Escola de Lisboa, que os tem entre os mais benemeritos, e que é hoje incontestavelmente a primeira do país.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros mostra-se neste projecto conhecedor das razões imperiosas que lhe impunham esse acto de justiça a favor do Porto, que o reclamava de ha muito.

Em fevereiro ultimo, quando no Porto constou que ia ser apresentado no Parlamento este projecto, dizia o Primeiro de Janeiro:

1 «Vous voyez, Messieurs, d'après ce que je viens de vous dire, que le goût des arts est plus répandu ici qu'à Lisbonne. On y aime plus genéralment à s'entonrer d'objets d'art Ou. ne laisse pas les tablenux se couvrir de poussière. On s'en fait gloire, ou les suspend, on les conserve», Raczygski. Les arts en Portugal, 18" Lettre.

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«Volta a prometter se a reforma da Academia de Bellas Artee do Porto. Um telegramma de Lisboa disse nos, ante-hontem, que em breve o Sr. Presidente do Conselho a apresentará ao Parlamento. Será d'esta feita, emfim?

Tem o Instituto de Bellas Artes do Porto uma justiça antiquissima, á transformação civilizadora. Mas anda-lhe por sobre os velhos telhados a sombra teimosa da má sorte. Ao passo que a sua congenere de Lisboa, no conchego da capital, aquecida pelos desvellos dos Governos, se reformava, engrandecendo-se em melhoramentos, ou, pelo menos, em accrescimos de programmas e professorado, a Academia Portuense jazia num abandonadissimo primeiro estado, mesquinha de lição, restricta de mestres. No entanto, um desforço tacito de boas vontades vingava do desprezo do poder central. A escola do Porto, apesar dos seus poucos mestres, não obstante a estreitura das materias lecionadas, mostrava uma frequencia superior á de Lisboa, e, sobretudo, offerecia aos triumphos da arte portuguesa a ala gloriosa dos seus discipulos a tomarem os logares da primeira notoriedade nos nossos dominios artisticos. É uma admiravel desforra, magnanima e eloqüente, como esta nobre gente do norte as sabe tirar nas concorrencias do trabalho».

A duvida que pairava no espirito d'esse jornal, representante da opinião do Porto, por vezes exagerada e injusta vae desapparecer em breve, com a approvação d'este projecto; e essa approvação tem a vantagem, alem de outras, de acabar com uma das razões sobre as quaes se tem pretendido fomentar um nocivo sentimento de rivalidade entre Lisboa e Porto, entre o sul e o norte do país, rivalidade que só redunda em desproveito da arte nacional e da propria nação.

O Porto vae ter a satisfação de ver este projecto approvado, sem discrepancia de meridianos, que deve ser apenas um para a alma portuguesa, e até com applausos d'aquelles que mais systematicamente condemnam os actos do Governo. (Apoiados)

A patria é sua! O Porto foi a sua cellula mãe! Lisboa é a sua côrte! Tudo é Portugal! (Apoiados)

O Porto, disse eu, é a cidade do trabalho e da arte; e é certo. (Apoiados)

O Porto, que é o eixo da nacionalidade portuguesa; o Porto que é, a um tempo, um operario e um estheta; o Porto, a patria do Vieira Portuense, tem um Museu de Bellas Artes mais antigo que e de Lisboa, pois foi fundado em 1835 pelo proprio Duque de Bragança, emquanto que e de Lisboa data de 1836; o Porto realizou um Portugal a primeira Exposição Internacional, e em 1867 a primeira exposição retrospectiva de arte e archeo logia; o Municipio do Porto comprou todo um museu muito valioso, exemplo digno de ser seguido pelos edis de Lisboa; no Porto até os particulares estimulam as artes, criando premios, subsidiando artistas que no estrangeiro se distinguem, honrando assim o seu país; no Porto a Associação Commercial é um constante estimulo ás artes, e a sumptuoso Palacio da Bolsa é uma manifestação brilhante de como aquella valorosa cidade, ao mesmo tempo que se vota a um trabalho indefesso, comprende bem que no mundo culto não há trabalho sem ideal! (Vozes: - Muito bem).

Eu poderia nesta altura, se não fosse a premura do tempo que me obriga a restringir o mais possivel o assumpto, objectar ao illustre Deputado o Sr. Queiroz Ribeiro, que, longe de se insurgir contra a classificação de idealista dada pelo nosso collega o Sr. Malheiro Dias ao partido progressista, elle devia, pelo contrario, achar esse epitheto digno da honrosa historia d'esse partido, por quanto nada ha progressivo na vida das sociedades, e, portanto, na Historia, senão o que se baseia no Ideal! (Apoiados).

Ser idealista é mais um titulo de louvor, do que um apôdo que mereça, um protesto tão energico, aliás tão brilhantemente formulado pelo illustre Deputado.

A arte não é um assumpto de tão somenos importancia como se afigura ao illustre Deputado Sr. Conde de Penha Garcia (apoiados); não representa em nenhum país culto um interesse de ordem secundario, como S. Exa. o classificou. (Apoiados).

A arte é uma das manifestações superiores do espirito humano, e para uma nacionalidade é um doo grandes elementos da sua integração. (Apoiados).

O meio ou deprime e deforma o homem, ou o alevanta e lhe dá relevo! Um meio embelezado e provido de graça e de conforto pelos recursos da arte ennobrece o homem e lhe dá uma noção mais elevada da sua individualidade. (Apoiados).

É, alem d'isso, um elemento do progresso e um dos estimulos da riqueza publica. Assim o teem comprehendido e comprovado as nações mais progressivas.

A Inglaterra possue hoje uma escola de pintura que se não confunde com outra nenhuma ao mundo, «Ha pintores allemães, hungaros, belgas, hespanhoes, seaudinavos, diz Sizeranne; mas ha uma pintura inglesa».

Ha pouco mais de meio seculo, tres artistas cheios de fé, descobrindo nos quadros anteriores a Rafael a verdade, o sentimento, o pormenor vivo, colhidos da impressão e da analyse directa da natureza, e longe do todo o espirito de convencionalismo, criaram, em volta de uma mesa onde tomavam chá era boa camaradagem, a escola do Premphaelismo que havia de produzir em toda a Inglaterra uma profunda revolução esthetica. Gabriel Rossetti, William Hunt e John Millais foram os grandes revolucionarios; Jonh Ruskin, o apostolo da belleza pura, foi o seu energico defensor e propagandista. O espirito associativo inglês constituia desde logo aquelles artistas numa confraria, - broiherhood, - que em breve adquiria adhesões poderosas, e, nobre as tradições celticas, tendo por thema as lendas do rei Arthur, que symboliza através dos seculos, a alma bretã, sempre renovada o vivificante, fundava uma escola de arte que é uma das mais fortes manifestações da individualidade inglesa.

Pouco depois, William Morris e Burn-Jones davam a esse movimento ideal uma applicação pratica; o mobiliario, a tapeçaria, a decoração das casas, a industria vidraceira adoptavam formas artisticas; e, democratizando a arte, e convertendo-a, de um objecto de luxo, só concedido aos; mimosos da fortuna, num prazer e numa utilidado para todos, determinavam uma verdadeira revolução não só artistica, mas economica. (Apoiados).

É que a arte é um dos mais poderosos factores do progresso, do conforto e do bem estar das nações. Da fundação do Museu de Kensington e da sua Escola de Arte applicada á Industria, data um notavel accrescimo na exportação de importantes productos da industria inglesa: as faianças, as rendas, o vidro, os tapetes, os tecidos de todo o genero. (Apoiados).

A Prussia, em seguida aos grandes desastres que lhe impoz o tratado de Tilsit, subjugada o retalhada por Napoleão, não pensou unicamente na sua organização militar, illudindo habilmente, pelo serviço pessoal obrigatorio, a clausula da restricção da força armada, mas sobrecarregou por tal forma o seu orçamento relativo ás necessidades do ensino e da arte, que ao em 1821 encontrava equilibrio ao seu orçamento; mas era nas universidades, nas escolar, nos ateliers dos seus artistas, nas composições dos seus musicos, que se preparava não só a grandeza da Prussia, mas a unidade do povo allemão! (Apoiados).

Na Italia foram as tradições artisticas, foram os seus poetas, os seus pintores, os seus esculptores, os seus compositores que mantiveram a unidade da alma italiana, rôta noutros elementos da actividade social.

A arte, levantando o espirito dos povos, perpetuando e engrandecendo as suas tradições, unificando os sentimentos

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pelo culto do passado em harmonia com os estimulos do futuro, tem sido muitas vezes a salvadora das nações nas suas crises mais graves. (Apoiados).

Em Portugal todas as epocas mais notaveis da actividade nacional teem sido assignaladas por obras de arte que ficaram perpetuando, ao par das glorias de um povo, as suas qualidades artisticas: durante a Reconquista, os bellos monumentos, fortalezas templos, palacios, onde brilha por vezes a arte mudejar; antes de D. João I, Alcobaça e os relevos dos tumulos de D. Pedro e D. Ignez; com D. João I, a Batalha, producto do genio nacional combinado com a arte cosmopolita que encheu a Europa de productos similares, poema de pedra que entre nós perpetua a affirmação poderosa da independencia portuguesa; com D. Manuel os Jeronimos e a formosa Torre de Belem, memorando as nossas conquistas, que tantas novas influencias trouxeram á architectura, a pintura, ao mobiliario em Portugal; com D. João V, com D. José I, com D. Maria I, com D. Fernando, animações de arte de diversa natureza, consoante as preoccupações da epoca; mas sempre, desde os tempos mais remotos, o gosto artistico manifestando-se por construcções valiosas, pela acquisição de artistas estrangeiros e de obras de arte, pela educação de artistas portugueses no estrangeiro, pois só no tempo de D. João II e de D. Manuel havia 50 pensionistas portugueses em Paris, pela criação de industrias artisticas como ns de obra de talha, esculpturas em barro, ourivesaria, azulejos, filigranas, mobilia, revelando as disposições nativas do nosso povo para os assumptos de natureza esthetica. (Apoiados).

Não é nestas condições, que um Parlamento pode negar a despesa de pouco mais de 2:000$000 réis annuaes, mesmo nas actuaes condições precarias do Thesouro, quando, sobretudo, o Ministro que pede uma verba tão modesta para satisfazer uma necessidade tão imperiosa, tem criado no seu Ministerio, e só em questões que dizem respeito á instrucção, economias ou receitas annuaes importantes, das quaes eu citarei apenas tres: - as propinas que hão de provir das novas cadeiras criadas; a eliminação das verbas aos normalistas, orçadas em 15:000$000 réis; o producto dos registos na Torre do Tombo, determinados pelo decreto de 24 de dezembro de 1901, producto orçado era 20:000$000 réis, mas que já hoje se pode calcular, pelo que tem produzido, que subirá a réis 30:000$000, sendo a meu ver ainda susceptivel de maior augmento.

Quer-me parecer, Sr. Presidente, que quem realiza economias e cria receitas d'esta natureza, tem direito a pedir a applicação de uma verba tão somenos para medida de tanto alcance como é a reforma da Academia das Bellas Artes do Porto. (Apoiados).

Para se avaliar dos resultados financeiros de um Ministerio não basta analysar as medidas de per si, convem considerá-las no seu conjunto; e já aqui mesmo, nesta casa do Parlamento, foi sobejamente provado que das medidas adoptadas pelo Sr. Presidente do Conselho de Ministros e Ministro do Reino resultam importantes economias. (Apoiados).

Vou terminar, Sr. Presidente: não quero alongar-me em considerações que me levariam muito longe. Limitar-me-hei a pedir ao Sr. Presidente do Conselho que complete agora a sua obra, prestando toda a sua attenção aos assumptos artisticos, que no país não costumam geralmente merecer as boas graças dos poderes publicos.

Pode-se dizer, sem receio de desmentido, que a arte em Portugal tem sido dos menores concorrentes do Orçamento. Teem saído do país verdadeiras preciosidades artisticas, que podiam e deviam ter sido adquiridas pelo Estado; outras teem passado a mãos de particulares, e levarão qualquer dia fim igual; os nossos artistas, alguns dos quaes são verdadeiras glorias nacionaes, não encontram estimulos nos Governos; muitos dos monumentos mais caracteristicos estão em ruina, e muitas das restaurações teem sido realizadas por uma forma verdadeiramente barbara! Basta ler-se o bello livro de Ramalho Ortigão, O culto da arte em Portugal, para se ver quanto é urgente que os Governos pensem a serio no estado da arte e das cousas artisticas entre nós. Hão d'este notavel escriptor estas palavras que confirmam o que affirmei ha pouco:

«É pela arte que o genio de cada raça se patenteia, que a autonomia nacional de cada povo se revela na sua autonomia mental, e se affirma, não só peia sua especial comprehensão da natureza, da vida e do universo, mas pelo trabalho collectivo da communidade, na litteratura, na architectura, na musica, na pintura, na industria e no commercio. É pelo culto da arte e pela educação artistica que esse culto comprehende, que a producção industrial se especializa, se valoriza pela originalidade caracteristica do producto, e transforma pela prosperidade, unicamente determinada pelo ensino, toda a economia de uma nação, como se evidenciou nos ultimos tempos em Inglaterra, na Austria, na Allemanha, por via da simples reconstituição dos museus e da multiplicação das escolas».

Tratando especialmente da arte de pintura, dizia Francisco Vieira, o Portuense, no discurso de abertura da Academia de Desenho e Pintura, no Porto, no dia 10 de julho de 1802:

«O estabelecimento de uma Academia de Pintura e Desenho será certamente para Portugal um dos passos mais agigantados no caminho da sua civilização, prosperidade e adeantamento litterario. O desenho e a pintura são uma das mais solidas e instructivas bases de muitas bellas ideias. D'ellas depende a apuração do bom gosto, resulta a perfeição das fabricas e manufacturas; por ellas vimos no conhecimento do genio dos antigos; pulem-se as maneiras e costumes de uma nação, tomando um ar de elegancia que as distingue dos povos menos adeantados nestas sublimes artes».

São verdades incontestaveis; são noções de todos os tempos, mas cuja realização nem sempre constitue capitulo obrigado no programma dos Governos. Não podia, portanto, deixar de merecer o meu applauso e de todos quantos se interessam pelos progressos do país, que tão largo quinhão tivessem tido no programma do actual Governo, em cujas ideias politicas commungo, os assumptos relativos ás letras, ás sciencias e ás artes. (Apoiados).

A unificação do ensino artistico no Porto com o ensino em Lisboa não só porá termo a desigualdades e rivalidades que não teem razão de ser, não só satisfará uma justa aspiração d'aquella cidade, mas contribuirá fortemente para affirmar a unidade artistica de Portugal, longe de todo o espirito de parcialidades e de conventiculos só proprios para prejudicar a arte portuguesa, que tem de ser inspirada e movida pelo mesmo sentimento, e os artistas portugueses que devem todos constituir uma mesma familia.

Se o Porto tem os distinctos artistas, cujos nomes deixei citados, não menos illustres, não menos notaveis, não menos credores da consideração e apreço do país são os artistas da escola de Lisboa que outrora se chamaram Domingos Sequeira, Lupi e Ferreira Chaves entre os mortos, e entre os vivos se chamam Salgado, Carlos dos Reis, Malhoa, Columbano, Simões d'Almeida, Costa Motta, José Luis Monteiro, Nunes Junior e tantos outros. (Apoiados). Todos são lustre e gloria da patria commum!

Felicito, portanto, o Sr. Presidente do Conselho de Ministros, felicito o Governo, felicito a nobre cidade do Porto, que tenho a honra de representar nesta casa do Parlamento, e felicito o país por se ir converter em lei este projecto que reputo de elevado alcance para Portugal.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado}.

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22 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O Sr. Antonio Cabral: - Sr. Presidenta: não seria ou que combateria este projecto, modificado, já se vê, porque não concordo com muitas das suas disposições, se não fosse o momento de despesa que elle acarreta. E, no momento em que vamos discutir um convenio com os nossos credores e externos, todo o projecto que trouxer augmento de despesa, representa um verdadeiro crime nacional. É este o ponto de vista do projecto, verdadeiramente odioso, e com o qual, ninguem que seja sinceramente patriota, pode concordar.

Se fosse num momento em que o país progredisse, e a nossa situação financeira levasse outro caminho, que um projecto como este viesse ao Parlamento, de acordo; mas que na hora triste em que o país precisa de mudar do rumo e necessita, como disse ha dias o Sr. Presidente do Conselho, do mudar de costumes, se traga ao Parlamento um projecto como este, em que a despesa augmenta em mais 2:000$000 réis, isso é que ninguem, que seja verdadeiramente amigo do seu país, pode acceitar. (Apoiados).

Todos nós sabemos como em Portugal estão desprezadas as bullas artes. Temos ahi um monumento, como é a Torre de Belem, essa incomparavel perola de estylo manuelino, a provar a nossa incuria e o nosso desprezo pela arte, porque no seu lado consentimos aquelle infame gazometro a estragá-la, a engrecê-la e a occultá-la ás vistas d'aquelles que visitam o nosso país.

Mais: a restauração da Batalha e dos Jeronimos é feita de uma forma tão contraria a todas as regras da arte, que demonstra bem claramente que no nosso país ha um desleixo absoluto em tudo quanto respeita ás bellas artes. E basta, como exemplos...

Portanto tudo quanto fosse melhorar as bellas artes, impulsioná-las, dar-lhes vigor, alento, vida, teria a minha approvação se os recursos do Thesouro fossem compativeis com esses melhoramentos e com a forma de dar á arte nacional o progresso do que ella carece.

Quem percorrer os outros paises da Europa, com verdadeiro interesse por assumptos de arte; quem for á Italia e, vir esses monumentos e esses museus incomparaveis de Napoles, Florença e Roma, onde se admiram as maravilhosas obras primas de Miguel Angelo, de Rafael de Urbino, do Leonardo de Vinci, de Donatello, da Corregio e de tantos outros; quem for á Belgica e examinar ahi as assombrosas telas de Rubens e de Rembrandt; quem for, mesmo, á Hespanha, a patria de Murillo, de Velasquez, de Ribera, onde ainda hoje se revela o talento de notaveis artistas que estudam os modelos legados pelos grandes mestres que o ouro hespanhol antigamente attrahia ao reino, como succedeu, por exemplo, no tempo de Filippe II, que chamou para o seu país mestres estrangeiros, indo assim, augmentar, como ainda hoje se vá no Escurial, os thesouros artisticos da nação; quem examinar o museu do Louvre, o de Versailles e todos os museus da França, essa foi formosa nação que na Renascença, sob Francisco l, fez vir da Italia artistas como Vinci, Cellini, dei Sarto, para educar os seus alumnos; quem percorrer o museu do Prado, em Madrid, e o comparar e comparar tudo o que deixo dito com os nossos museus, com os nossos monumentos, com todas as nossas manifestações estheticas e artisticas, sente uma tristeza verdadeiramente invencivel, uma dor profundamente esmagadora!

Nós temos muito pouco, quasi nada, e portanto não era de estranhar que se desse á arte esse impulso de que ella careço; mas, repito mais uma vez, para isso, era necessario que tivessemos os recursos precisos.

Por isso não posso concordar com este projecto, principalmente porque elle vem eivado d'este feio vicio de trazer um augmento de despesa perfeitamente intoleravel, não só pelas circumstancias afflictivas do thesouro, mas porque estamos em vesperas de discutir um convenio que nos traz encargos novos.

Não podem desprezar-se estas circunstancias para se estar a votar hoje mais um projecto que augmenta a despesa publica. (Apoiados}.

Note V. Exa., Sr. Presidente, que a approvação d'este projecto e de outros identicos, faz revoltar a opinião publica, e se ella não se manifesta por uma forma energica, é porque o nosso país chegou a um tal Estado de desinteresse e de indifferença pela governação do Estado, que não tem animo para se oppor por uma forma violenta a que se discutam e se approvem no Parlamento projectos d'estes.

E quem trouxe ao Parlamento este projecto?

Foi o Sr. Hintze, a quem já hoje ouvi fazer tantos elogios o que em assumptos da arte tem o conhecimento, o criterio, que eu vou mostrar á Camara, lendo no Summario das Sessões o que S. Exa. disse na sessão de hontem.

(Leu).

Ora quem tem o conhecimento que S. Exa. tem de um monumento de arte como é a Torre de Piza, cujos 294 degraus eu já tive o prazer de subir, que data do seculo XII e tem uns alicerces mais firmes do que a chefia politica de S. Exa.; quem tem assim uma noção de arte como tem o Sr. Hintze Ribeiro...

O Sr. Presidente do Conselho (Ernesto Hintze Ribeiro): - Eu não disse o que está ahi. Eu fiz as considerações que estava no direito de fazer, e disse que a argumentação do illustre Deputado a quem respondia, era inclinada como a Torre ao Piza, não tendo consolidados os alicerces, e que portanto desabava.

O Orador: - Eu li o que consta do Summario das sessões, já de proposito para que as minhas palavras não fossem taxadas de suspeitas. Ora o que aqui está é isto, e é o mesmo que eu tinha lido no jornal O Seculo e depois vim ver confirmado no Summario. Pasmei, portanto, que o grande reformador das bellas artes portuguesas, que tem uma noção d'estas sobre a Torro de Piza, cujos 294 degraus, repito, já subi, viesse...

Uma voz: - Não disse isso.

O Orador: - Não tenho o direito de duvidar da palavra do Sr. Hintze Ribeiro, mas eu li textualmente o Summario das sessões, como a Camara ouviu; portanto, se as palavras que li não são exactas, S. Exa. envolve numa censura os empregados tachygraphicos d'esta Camara, e elles que vejam só essa censura e merecida ou não, e que lh'a agradeçam. No entanto, sempre direi ao Sr. Presidente do Conselho que se porventura S. Exa. revir as provas do seu discurso, as modifique e emende, para que não se possa dizer que S. Ex.a. tem sobre a arte e sobre um tão notavel monumento artistico uma noção tão falsa.

Voltando ao assumpto, Sr. Presidente, eu direi que era justo que ao Porto se desse o que Lisboa já tem - uma Academia de Bellas Artes á altura devida.

Como já estranhou o Sr. Conde de Ponha Garcia, estranho eu tambem que ao Porto não se fizesse a justiça, a que o Sr. Hintze Ribeiro entendo que elle tinha direito, quando escreveu no seu relatorio:

(Leu).

Então se assim é, se a necessidade d'esta reforma era inadiavel para o Porto, porque não só decretou em dictadura?

Então, para Lisboa, fez-se dictadura, o para o Porto, apesar da inadiavel necessidade, não foi a reforma decretada em dictadura, e traz-se ao Parlamento este projecto?!

E note V. Exa., Sr. Presidente, que eu não estou encarecendo as dictaduras, mas notando apenas a contradicção do Sr. Presidente do Conselho.

Diz mais S. Exa. no seu relatorio.

(Leu).

Se ora uma flagrante injustiça, commetteu-a, então, o Governo, quando reformou a Escola de Bellas Artes de

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Lisboa, e não a do Porto. Portanto, o Porto que lhe agradeça.

Eu estimo ter este ensejo de fazer justiça ao Porto, tanto mais quanto é certo que a mesquinha politica me malquistou, ha tempos, com aquella cidade, assacando me que eu tinha chamado - ignara-á população portuense, quando a verdade foi que eu apenas me referi á parte ignara da população do Porto - que a ha ali, como a ha em todas as cidades, - que praticou violencias e disturbios por occasião da peste que assolou a capital do Norte. Seria, mesmo, uma insania, um disparate, classificar eu de - ignara - toda a população portuense, porque no Porto ha muita gente illustrada, erudita e conhecedora de todos os assuntos que respeitam ás artes e ás sciencias.

Voltando, porem, ao assumpto do projecto, que eu poderia discutir um pouco mais largamente, se não fosse o apertado da hora, direi que traz elle um grande augmento de despesa e que é esse o principal motivo por que elle merece a minha reprovação.

V. Exa. vê, Sr. Presidente, que no proprio relatorio, diz o Sr. Ministro do Reino.

(Leu).

Quer dizer, o Sr. Presidente do Conselho confessa que o projecto traz augmento de despesa, mas tem o impudor politico de vir dizer, no seu relatorio, que, no uso das auctorizações parlamentares, fez economias, quando é certo, e V. Exa. viu, Sr. Presidente, que, d'este lado da Camara, foi demonstrado, por vozes auctorizadissimas, excepto a minha, que o Governo não fez economias, porque augmentou extraordinariamente as despesas, sem ter direito para o fazer! Alem d'isso, desorganizou todos os serviços, nomeou commissarios regios ás dezenas, e por isso, agora, não podem esses felizes contemplados deixar de agradecer a sua nomeação, collocando o Sr. Presidente do Conselho acima de quantos estadistas tem havido no mundo! Estou convencido de que o proprio Bismarck, está, na opinião da maioria, abaixo de S. Exa....

Vir dizer ao Parlamento que o augmento de despesa trazido por este projecto é quasi inteiramente compensado com a economia realizada nas reformas a que se procedeu, no uso das auctorizações parlamentares, isto, no momento actual, chega a ser uma falta de pudor. Não posso, de modo algum, qualificar este procedimento de outra forma.

Não ha, porem, somente o augmento de despesa que no relatorio se confessa: temos, tambem, as concessões de premios, gratificações e subsidios pecuniarios aos alumnos; e tudo isto constitue augmento de despesa, que tem de vir depois, e que não pode ser votado por esta forma: não deve sê-lo!

Vae, porem, sê-lo, porque a maioria ha de votar tudo aquillo que o Governo quiser.

E contra isto me insurjo eu, declarando que não deve neste momento ser approvado nenhum projecto que traga para o Thesouro augmento de encargos, porque representa um verdadeiro crime de lesa nação, mais aggravado hoje, quando estamos em vesperas de se iniciar a discussão do convenio com os credores externos. É por isso que eu digo que se tal se fizer, a opinião publica ha de revoltar-se de uma forma verdadeiramente justificavel contra a approvação d'este projecto, sobretudo porque elle traz augmento de despesa incompativel com as circunstancias do Thesouro e com as do momento historico verdadeiramente solemne que estamos atravessando. (Apoiados}.

Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem.

(O orador foi muito cumprimentado).

O Sr. Malheiro Dias (relator): - Declaro, em nome da commissão, que as emendas do Sr. Conde de Penha Garcia não poderam ser acceites, porque contrariam a estructura fundamental do projecto.

O Sr. Presidente: - Como nau ha mais ninguem niscripto, vae votar-se o artigo l.° e as emendas a elle apresentadas.

Leu-se na mesa a proposta ao Sr. Malheiro Dias, sendo approvada.

Em seguida foram rejeitadas as emendas aos Srs. Conde de Penha Garcia e Vellado da Fonseca.

Foi approvado o ultimo artigo do projecto.

O Sr. Presidente: - Está em discussão o artigo 2.º

O Sr. Oliveira Mattos: - Sr. Presidente: decerto V. Exa. e a Camara sabem bem que eu não pedi a palavra para entrar no torneio de bellas-artes, tão brilhantemente sustentado pelos dois illustres parlamentares que me antecederam no uso da palavra: o Sr. Relator, a quem faço os meus cumprimentos pela sua bella conferencia sobre arte, e o meu collega e amigo o Sr. Queiroz Ribeiro, que tão brilhantemente lhe soube responder.

Realmente, se se tratasse de uma conferencia aqui, onde ha talentos como os dos illustre poetas que me precederam, e se esses talentos tivessem de ser postos em duvida, estavam elles tão brilhantemente affirmados nos seus discursos, que nós teriamos todos de nos curvar reverentes deante, e dar os nossos espiritos por bem recriados com tão brilhantes phrases.

Trata-se de um projecto que augmenta consideravelmente as despesas publicas, e é sob este ponto de vista que eu o vou atacar e combater, e não porque me fosse desagravei ver progredir até á maxima altura a Academia de Bellas-Artes ao Porto e todos os estabelecimentos mais ou menos artisticos do nosso país.

Parece-me que não é esta a occasião mais azada para trazer um projecto d'esta natureza, que augmenta consideravelmente as despesas publicas.

Sr. Presidente: não quero, nem irritar o debate, que correu tão ameno entre poetas idealistas, nem quero tambem desgostar nem maguar a cidade do Porto, a quem eu e todos os meus collegas d'este lado da Camara, onde ella tem representantes, prestamos a maxima homenagem de respeito e consideração pelos seus merecimentos e pelos seus trabalhos.

Isso não me impede, todavia, de dizer o que penso acêrca da inopportunidade, e só unicamente da inopportunidade d'este projecto.

Sr. Presidente: sem offensa para a cidade do Porto, eu digo que este Governo tem sido de uma generosidade tão grande e levada a tão alto ponto, que ainda na discussão do Orçamento, lhe fez um beneficio, que talvez a Camara não conheça, porque se preoccupa pouco com o estudo das questões orçamentaes e financeiras do país, e só se sente afflicta quando, augmentados os impostos para satiszer os grandes encargos, lhes pedem quotas novas; - então é que lhe doe!

Por isso, talvez a Camara não saiba uma nova generosidade, e de mais um esbanjamento, não direi escandaloso mas desnecessario; - poderia dizer escandaloso, mas não quero maguar os ouvidos do Sr. Presidente do Conselho, nem proferir phrases que possam destoar da seriedade das accusações que dirijo ao Governo por mais aquella falta praticada.

Saiba a Camara que no Orçamento se inscreveu o subsidio de 6:000$000 réis ao Palacio de Crystal no Porto, discutido e rejeitado nos ultimos annos, em todos os Orçamentos, quer nos Ministerios progressistas, quer nos regeneradores.

Empregaram-se todas as diligencias, por parte de representantes do Porto, para tornar effectivo aquelle subsidio, que se tinha suspendido por se julgar inutil, e pelo menos inopportuno, a satisfação d'elle, quando o país lutava com tantas difficuldades para sustentar o Palacio do Crystal, que não satisfaz as necessidades do commercio e do desenvolvimento industrial, pois é uma simples casa de espectaculos.

Pois, Sr. Presidente, quando se tinha resistido por tanto

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tempo a esta exigencia do Porto, o Governo fraqueja no momento mais improprio!

O Sr. Clemente Pinto: - O Governo não fez mais do que cumprir o seu dever.

O Orador: - Então porque não cumpriu o seu dever até agora?

Porque só agora, neste momento angustioso, se lembra de ser generoso e o anno passado faltou ao seu dever? (Apoiados).

O que é necessario, sobretudo, é ter brio e não entrar em grandes despesas, quando temos de pagar aos nossos credores externos. (Apoiados).

Não é nas vesperas do dia em que vamos votar encargos com os quaes não podemos, que se deve augmentar as despesas. (Apoiados).

Ha muito que essa verba não estava no Orçamento, porque as circunstancias não permittiam.

Porventura melhoraram as circunstancias do Thesouro este anno para que ella fosse inserta no Orçamento?

Portanto, o illustre Deputado levantou-se para dar uma explicação que devia ter confundido o nobre Presidente do Conselho, pela fraqueza em não saber cumprir o seu dever; por isso é que o Governo merece elogios da sua maioria, por abrir as mãos generosas, quer seja para a Academia de Bellas Artes, quer para o Palacio de Crystal.

O Governo está sempre prompto a abrir as mãos generosas e criminosas, porque é um crime augmentar as despesas neste momento. (Apoiados).

Então acha o illustre Deputado que o Governo não é generoso nomeando professores, dando gratificações?

Porventura a cidade do Porto está tão necessitada dos 6:000$000 réis que o Governo lhe vae dar, as quaes tinham sido supprimidas ha tanto tempo, não tendo sido approvadas pelo Sr. Ressano Garcia, nem pelo Sr. Espregueira?

Sempre combati, quer no Governo, quer na opposição, subsidio, todas as vezes que se tentava estabelecê-lo.

E se, quando discuti o Orçamento, como pude e soube, não o impugnei, foi por não ter tido ensejo. Mas não perderam com a demora.

Não regateio para o Porto o que lhe possamos dar, porque não costumo ser desagradavel a ninguem. O que desejo é dizer a verdade como penso.

E, neste momento em que se apresenta á discussão o convenio, em que nos pedem mais alguns milhares de contos de réis, o Sr. Hintze Ribeiro para ser realmente o nobre estadista, digno do seu nome figurar em letras de ouro, como lisonjeiramente disse o nosso collega Sr. Christovam Ayres, não deve preoccupar-se senão com a questão do convenio.

Isto é um grande dever de patriota, de quem quer cumprir o seu dever, e bem servir a nação e o Rei.

Era por esta forma que S. Exa. devia proceder, e não, trazendo á Camara um projecto que augmenta a despesa publica. (Apoiados).

Porventura, perigava a patria se não se reformasse a Escola de Bellas Artes do Porto?

Para que vae S. Exa, como confessa no proprio relatorio que procede o projecto, augmentar em 2:000$000 réis e tanto a despesa ordinaria?

Não era melhor que S. Exa. procurasse habilitar-se com os meios necessarios para satisfazer os novos encargos que ha de trazer o convenio que se vae começar a discutir, do que apresentar projectos que envolvem augmento de despesa?

Isto, SR. Presidente, é que revolta e indigna.

Não é contra o convenio que a nação se revolta e indigna, porque ella quer que se pague aos seus credores. Contra o que ella se revolta é contra o caminho errado que o Governo tem seguido, e promette seguir. (Apoiados).

Sr. Presidente: é triste, é desolador ver que, quando estamos em vesperas de acontecimentos tão importantes para as nossas finanças, quando se devia entrar num caminho novo de economias, e de boa administração dos dinheiros publicos, e só assim é que nos poderiamos resgatar dos nossos erros do passado, é triste, digo, ver o Governo apresentar projectos como este que está em discussão.

Isto é que revolta, como disse, ver o Governo nas vesperas de se discutir um facto tão importante, continuar num caminho, que não se sabe para onde nos arrastará. (Apoiados).

É por isso que eu vou apresentar a seguinte proposta, apesar de ter a certeza, que apresentá-la é o mesmo que deitá-la no cesto dos papeis velhos, porque, decerto, não será acceite.

É a seguinte

Proposta

Proponho que, emquanto se não conhecer, pela discussão do projecto, a cifra exacta dos novos encargos que a nação será obrigada a pagar pelo convenio com os credores externos, e os meios com que o Governo conta, sem aggravamento dos impostos, para os satisfazer, não seja approvada, e nem sequer admittida á discussão, qualquer proposta, projecto ou emenda de iniciativa do Governo, ou da Camara, que directa ou indirectamente pousa augmentar as despesas publicas.

Sala das sessões, 18 de abril de 1902. - O Deputado, Oliveira Mattos.

Tenho ainda outra proposta para apresentar.

Estas propostas não são de caracter politico, nem teem qualquer significação offensiva, nem para a maioria nem para o Governo.

São propostas feitas por um Deputado, unicamente no uso de um direito e no cumprimento de um dever.

Todos, pondo de parte quaesquer ideias de partidarismo politico, nos devemos conjugar num esforço para auxiliar o Governo, que não deve ser considerado, nem é, um Governo do partido regenerador ou do partido progressista, mas sim um Governo nacional, a honrar os compromissos do país.

É este o num intuito ao apresentar a minha proposta. Que ella seja approvada ou não, ficarei tranquillo com a minha consciencia, porque cumpri um dever.

Mando a proposta para a mesa.

Como já disse, não espero que ella seja approvada, porque a maioria tem provado mais de uma vez que não quer economias; mas, emfim, terei cumprido o meu dever, e continuarei com a minha companha contra o augmento e exageros de despesas, arrastando até com o degosto dos meus collegas e amigos politicos.

Superior a tudo isso está a minha consciencia de cumprir o meu dever, e de ser coherente com os meus principios.

O Sr. Presidente do Conselho podia dispensar-se de trazer este projecto para discussão. Porventura para a gloria de um estadista, de nomeada europeia, era necessario mais este florão a esmaltar u sua coroa?

Não precisava d'isto.

O Sr. Presidente da Conselho podia bom poupar-se ao côro de lisonjas que ouvimos dirigir-lhe. Já tem o seu nome na historia. Tem o nome na sua terra, em lapide commemorativa dos seus meritos de estadista.

Custou um poucochinho caro. Talvez que escrito nas paginas de ouro da nação não custasse tão caro como custou aquelle descerramento da lapide. O país já se collectou bastante para engrandecer o nome do Sr. Presidenta do Conselho.

Foi isso um erro, quando nós lutavamos lá fora, e não

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havia maneira de chegar a um acordo com os credores, e quando o Sr. Carrilho, que está presente, com o que eu folgo muito, porque posso dizer-lhe que trabalhou (Apoiados), que se sacrificou (Apoiados), que passou cinco meses fora da sua patria, e que se mais não fez foi porque não pôde (Muitos apoiados), a minha justiça chega para todos, quer para louvar, quer para accusar-quando S. Exa. andava de Berlim para Amsterdam, de Amsterdam para Paris, de Paris para Londres, aqui projectava-se uma jornada triumphal.

Quantas vezes S. Exa. não ouviria dizer aos credores: «No seu país não ha juizo, não ha tino. Diga-lhe que as nações pequenas se administram por outra forma, e que então tem direito, não direi já á nossa commisseração, mas benevolencia, para entrarmos em negociações ou contratos».

Pois sabe o Sr. Carrilho o que se passava aqui, emquanto elle lá estava, como bom patriota? O Governo declarava em seus jornaes «que a questão com os credores era questão liquidada e corrente»!

Deitavam-se fogos de vistas, havia luminarias; e dizia-se - que o nobre Ministro da Fazenda era o primeiro financeiro e o primeiro diplomata da Europa, porque tinha conseguido tudo isso!

S. Exa. sabe melhor do que ninguem o que succedia; meses depois sabia-se que tudo isso era falso!

A imprensa facciosa enganava o país, que só encontrava sobresaltado e inquieto, sem saber qual seria o resultado d'essas negociações; e o país aguardava noticias, que só mais tarde vieram.

E que tem succedido com este systema de governo, quer em questões diplomaticas e financeiras, com o convenio, quer em questões economica e internas? Tem succedido enganar-se o país, e enganá-lo sempre! (Apoiados).

Ainda agora, neste momento, com relação a este projecto, se confessa pela boca do Sr. Ministro do Reino, que traz a despesa de 2:900$000 réis. Mas analysado o projecto, conhece-se perfeitamente - o que é facil de provar-que a despesa é muito maior.

Pois pode haver esse excesso de despesa, que no projecto se indica, quando se vae melhorar a installação do estabelecimento de bellas artes ? É facil dizer - não.

E depois vêem sempre contas erradas! Isto é a repetição de cousas sediças, em que ninguem acredita. (Apoiados).

Sr. Presidente: foram combatidas as auctorizações nesta casa, provando-se que eram falsas as affirmações, que se fizeram, de que havia economias no Ministerio do Reino... as taes celebres notaveis economias, que até vêem neste projecto; aqui estão.

O Sr. Presidente do Conselho, com a sua fraqueza, não pôde resistir aos seus correligionarios no Porto. (Apoiados). S. Exa. desculpou-se com as taes notaveis economias do Ministerio do Reino, que teem sido elasticas, que teem dado para tudo!

Sr. Presidente: a hora está adeantada e vae ser encerrada a sessão. A Camara está fatigada d'este assumpto, como se fatiga com tudo aquillo em que a minha desagradavel palavra se faz ouvir, na defesa do que eu entendo ser do interesse do país e do interesse do Thesouro. Protesto contra isto; e os meus callegas d'este lado da Camara me acompanharão neste protesto contra um projecto, que é inopportuno, sem que neste protesto haja cousa alguma de offensivo para a cidade do Porto, absolutamente nada. (Apoiados). Presto a esta nobre cidade toda a homenagem do meu respeito e consideração; mas agora trata-se de interesses mais altos do que e de satisfazer os interesses da cidade do Porto.

Concluo, deixando a responsabilidade d'este projecto ao Sr. Presidente do Conselho, que é o principal culpado, pela sua fraqueza; e a maioria que o vota participará da gloria de ter augmentado a despesa. (Apoiados).

Vozes: - Muito bem.

(S. Exa. não reviu).

Proposta

Proponho que o projecto em discussão seja adiado até que as melhores circunstancias do Thesouro permittam o augmento de despesas incompativeis, neste momento, com a angustiosa situação das finanças do Estado, ameaçada de um novo e pesado aggravamento resultante dos onerosos encargos que vae custar o projecto do convenio com os credores externos, que acaba de ser distribuido nesta Camara sem que nelle o Governo diga com que recursos conta para lhe fazer face. = Oliveira Mattos.

O Sr. Costa Ornellas: - Mando para a mesa o seguinte

Requerimento

Requeiro a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que a materia seja considerada sufficientemente discutida.

Foi approvado.

O Sr. Rodrigues Nogueira: - V. Exa. diz-me quantos Deputados estavam inscritos.

O Sr. Presidente: - Estava inscrito o Sr. Conde de Paçô-Vieira.

Foi em seguida approvado o artigo 2.°, e rejeitada a primeira proposta do Sr. Oliveira Mattos, ficando prejudicada a de adiamento.

O Sr. Presidente: - Vae entrar em discussão o projecto de lei n.° 59.

PROJECTO DE LEI N.° 89

Senhores.- Com o fim de facilitar a residencia em Portugal aos estrangeiros e provocar assim a sua vinda para o nosso país, apresentou em 20 de junho de 1888 o illustre estadista Sr. Conselheiro José Luciano de Castro uma proposta de lei a esta Camara, reduzindo a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, fixado na verba n.° 4 do capitulo IV da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia até um anno a estrangeiros, no concelho capital do districto.

Tendo-se levantado reclamações contra a execução d'esta disposição, entendeu, e muito bem, o illustre estadista que era conveniente ás boas relações internacionaes e aos nossos interesses diminuir aquelle emolumento, e por isso trouxe ao Parlamento aquella proposta, que obteve parecer favoravel da respectiva commissão em 9 de julho do mesmo anno.

Mais tarde, em 22 de fevereiro do anno passado, perfilhando a sua doutrina, o Sr. Ministro do Reino, renovou a iniciativa d'essa proposta e a vossa commissão de administração publica deu em l de maio parecer, approvando-a sem alteração alguma.

De novo agora, na sessão de 3 de fevereiro, o Sr. Conselheiro Hintze Ribeiro renovou a iniciativa da mesma proposta, que estudámos com toda a attenção e a respeito da qual vimos emittir o nosso parecer.

Sobre a necessidade de alterar a bei vigente estamos plenamente de acordo com os illustres estadistas e os membros das commissões signatarias das propostas e dos pareceres de 1888 e 1901; mas entendemos que, assim como se diminue o emolumento de 800 a 500 réis para as referendas e bilhetes até l anno, deve tambem diminuir-se o de 400 réis para os de 6 meses, ficando em 300 réis quando tirados dentro de 30 dias. E para que por desleixo ou incuria, por isso mesmo que o emolumento é insignificante, os estrangeiros não deixem de ir tirar ou renovar os seus bilhetes de residencia, dentro de 30 dias,

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pareceu-nos que deveriamos elevá-lo ao dobro, quando o fizeram for a d'este prazo.

Terão assim neste augmento o justo castigo pela falta de pontualidade no cumprimento do seu dever. Quanto aos pobres, é nossa opinião que deve manter-se a isenção consignada na legislação vigente a que nenhuma das propostas fez referencia, mas que decerto não quiseram eliminar.

Prelo que fica exposto é nosso parecer, de acordo com o Governo, que deve ser approvado o seguinte projecto de lei.

Artigo 1.º São reduzidos respectivamente a 500 réis e a 300 réis os emolumentos das secretarias dos governos civis, designados na verba n.º 4 do capitulo 4.º da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia ou referendas permittindo a residencia até um anno ou até seis meses a estrangeiros no concelho capital do districto, quando forem solicitados dentro dos trinta dias immediatos á sua entrada no reino ou ao termo do prazo do bilhete ou referenda anterior.

§ 1.º Quando os interessados os solicitarem depois d'este prazo, o emolumento será respectivamente de 1$000 réis e de 600 réis.

§ 2.º É mantida a isenção de qualquer emolumento aos estrangeiros pobres consignada na lei de 23 de agosto de 1887.

Art. 2.° Fica revogada a legislado em contrario.

Lisboa, sala das sessões da Camara dos Senhores Deputados, 11 de abril de 1902. = João M. Arroyo = José Maria Pereira de Lima = M. Matheus dos Santos = Augusto Louza = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Anselmo Vieira = L. G. dos Reis Torgal = Lopes Navarro = Abel Andrade = D. Luiz de Castro = Alvaro Possollo Manuel Fratel Rodrigo Affonso Pequito = Alberto Navarro = Conde de Paçô0Vieiera, relator.

N.º 8-A

Tenho a honra de renovar a iniciativa da proposta de lei, apresentada á Camara dos Senhores Deputados da Nação, em 25 de junho de \888, que reduz a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, designado na verba 4.ª do capitulo 4.º da tabella de 23 de agosto de 1887 para os bilhetes de residencia, ou referendas, permittindo aos estrangeiros a residencia até um anno em concelho capital de districto.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 3 de fevereiro de 1902. = Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 70

Senhores -A vossa commissão de administração publica é de parecer que merece ser approvada a proposta de lei que sob o n.º 9l-B foi apresentada a esta Camara em 25 de junho de 1888, pelo então Ministro do Reino, Sr. Conselheiro José Luciano de Castro, e cuja iniciativa foi agora renovada pela proposta de lei n.° 9-D, de 22 de fevereiro do corrente anno.

Tem por fim essa proposta descer a 500 réis o emolumento de 800 réis de verba n.° 4, do capitulo 4.° da tabella de 23 de agosto de 1887, respeitante aos bilhetes de residencia ou referendas, permittindo aos estrangeiros residirem até um anno no concelho capital do districto, disposição que não é senão o justo deferimento das reclamações feitas por parte dos estrangeiros que vivem em Lisboa, e que, por attrahir aqui maior numero d'elles, é, sem duvida, altamente conveniente não só aos nossos interesses, mas tambem ás nossas boas relações internacionaes.

Já com este mesmo intuito e no desejo de provocar a vinda de estrangeiros para o nosso país, facilitando-lhes a demora e residencia aqui, a vossa commissão de fazenda dez na proposta de lei sobre sêllo importantes alterações, eliminando por completo as verbas que dizem respeito aos bilhetes de residencia, os quaes pela legislação vigente pagam, como sabeis, sêllo elevado.

Em vista do exposto é nosso parecer que merece a vossa approvação a referida proposta de lei, e por isso temos a honra de ve-la apresentar convertida no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° É reduzido a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, designado na verba n.° 4 do capitulo 4.° da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia, ou referendas, permittindo a residencia até um anno a estrangeiros no concelho capital do districto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Lisboa, l de maio de 1901. = D. Thomaz de Almeida Manuel de Vilhena = Malheiro Reymão = Alvaro Possollo = Jayme Arthur da Costa Pinto = Abel Andrade = Visconde de S. Sebastião = Manuel Fratel = José Coelho da Motta Prego = Rodrigo A. Pequito = Conde de Paçô-Vieira, relator.

N.° 9-D

Tenho a honra de renovar a iniciativa da proposta do lei, que foi apresentada á Camara dos Senhores Deputados da Nação, em 25 de junho de 1888, reduzindo a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, designado na verba n.° 4 do capitulo 4.º da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia, ou referendas, permittindo a residencia até um anno a estrangeiros no concelho capital do districto.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 22 de fevereiro de 1901 = Entesto Rodolpho Hintze Ribeiro.

N.º 102

Senhores.- A vossa commissão de administração publica, vendo que a proposta de lei n.° 91-B, de iniciativa ministerial, tem por fim reduzir um verdadeiro imposto lançado sobre estrangeiros, que, por todas as considerações economicas e politicas, convem attrahir e demorar no país, entende que ella merece a vossa approvação, e para isso a converte no seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º É reduzido a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, designado na verba n.º 4, capitulo IV da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia, ou referendas, permittindo a residencia até um anno a estrangeiros no concelho capital do districto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Sala da commissão, 9 de julho de 1888.= S. J. Coelho = Vicente R. Monteiro = Julio Cesar de Faria, e Graça = Henrique de Sá Nogueira = Simões Ferreira = Barbosa de Magalhães, relator = Tem voto dos Sra.: Conde de Castello de Paiva =Albano de Mello = Simões dos Reis.

N.º 9l-B

Senhores.- A verba n.º 4 do capitulo IV da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887 elevou a 800 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, respectivo aos bilhetes de residencia pelo mesmo tempo, a estrangeiros, no concelho capital do districto.

Tendo-se levantado reclamações contra a execução d'aquella disposição por parte dos estrangeiros, residentes em Lisboa, por se considerar exagerada a elevação do referido emolumento, parece-me conforme aos nossos interesses, e conveniente ás boas relações internacionaes propor a sua redacção a 500 réis.

Accresce que, não se tendo tornado mais difficil nos países que comnosco manteem relações, a residencia dos subditos portugueses, não parece justo que procedamos diversamente.

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Por estas considerações tenho a honra de submetter á vossa illustrada approvação a seguinte proposto de lei:

Artigo 1.° É reduzido a 500 réis o emolumento das secretarias dos governos civis, designado na verba n.° 4 do capitulo IV da tabella approvada pela carta de lei de 23 de agosto de 1887, para os bilhetes de residencia, ou referendas, permittindo a residencia até um anno a estrangeiros no concelho capital do districto.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria de Estado dos Negocios do Reino, em 25 de junho de 1888.- José Luciano de Castro.

O Sr. Alexandre Cabral: - Sr. Presidente: antes de entrar na apreciação do projecto de lei n.° 59, permitta-me V. Exa. que eu leia á Camara um telegramma que acabo de receber, e que é de natureza urgente.

(Leu).

Sr. Presidente, acaba a maioria de votar um projecto que traz augmento de despesa; e, portanto, nem V. Exa. nem ella estranharão que eu peça ao Sr. Ministro do Reino, unico que vejo presente, uma pequena verba para atalhar a epizootia, que está grassando no concelho de Baião, e que, segundo as informações que tenho, alastra ali com grande intensidade. Peço ao Sr. Ministro que faça ir, como pedem, um veterinario para aquella localidade, onde os não ha, para determinar as condições necessarias em que o tratamento da doença dos gados deve ser feito, e que disponha de qualquer pequena verba para occorrer a essas despesas.

Sr. Presidente: nesta altura da sessão, quando faltam apenas dez minutos para só encerrar, eu pouco poderei dizer sobre o projecto.

Tomo sobre elle a palavra simplesmente por obediencia partidaria.

A minoria progressista deliberou este anno discutir todos os projectos que sejam apresentados á discussão. Parece-me que acertadamente procedeu assim, porque é praxe velha, neste final do sessão legislativa, cahirem sobre a mesa enormes catadupas de projecticulos, trazendo quasi todos elles augmentos de despesa. (Apoiados}.

Ha dias, quando se discutiu o Orçamento do Estado, disse aqui o Sr. Deputado Fratel que eram penriciosos os effeitos da iniciativa parlamentar na Inglaterra, na Italia, na Belgica e na França, e talvez mais ainda entre nós, pois d'ahi resultavam despesas que sobrecarregavam os respectivos orçamentos.

É isso uma verdade.

Eu lembro-me de que foi mister que naquelle país se tomassem medidas para cohibir estes grandes abusos; e tomou-as a propria Camara dos Communs. O mesmo aconteceu recentemente na França.

Mas, entre nós, a iniciativa parlamentar é muito menos nociva do que a iniciativa ministerial. (Apoiados).

Algumas vezes os Deputados da nação apresentam projectos de lei, que trazem augmento de despesa; mas muitas vezes tambem apresentam alguns que o não trazem, e que teem por fim apenas remediar inconvenientes locaes, para que são indispensaveis medidas legislativas. (Apoiados).

Ha alguns projectos de iniciativa parlamentar, que procuram dar satisfação a verdadeiras necessidades; e eu não posso accusar este principio, porque já tive a honra de apresentar um projecto numa sessão anterior, que foi convertido em lei, e quo era de urgente necessidade publica para a localidade que eu então tinha a honra de representar nesta casa do Parlamento.

Mas nós sabemos bem quaes são os habitos do actual Governo e do partido regenerador, e, portanto, precavemo-nos e acautelamo-nos contra elles.

Foi por isso que a opposição progressista deliberou discutir todos os projectos que V. Exa. apresente para discussão.

No desempenho d'esse dever, vou discutir este.

Não posso combatê-lo; e para isso basta voltar a pagina do parecer, e ver inscripto no final da primitiva proposta de lei o nome illustre do Sr. José Luciano de Castro. Foi o prestigioso chefe do partido progressista quem tomou, em 1888, a iniciativa d'esta medida. Esta medida era justa e era tambem necessaria. (Apoiados).

A lei de 23 de agosto de 1887 e a respectiva tabella, no n.° 4 do capitulo IV, dizem que os bilhetes de residencia, passados por seis meses aos estrangeiros, no concelho capital do districto, pagarão 400 réis, e por anno 800 réis.

Estes pagamentos são devidos como emolumentos das secretarias dos governos civis.

Esta disposição era antagonica com o que se pratica em outros países que manteem relações comnosco, pois que lá não foram elevadas as taxas correspondentes; e houve pedidos para que ella fosse modificada, abatendo-se estes emolumentos.

Foi por isso que o Sr. José Luciano de Castro, quando Presidente do Conselho e Ministro do Reino, propôs que a verba de 800 réis fosse reduzida a 500.

Essa proposta, apresentada quasi no fim da sessão legislativa de 1888, não chegou a ser discutida durante ella, nem nas seguintes.

Em 1901 o actual Sr. Presidente do Conselho, na sessão de 22 de fevereiro, renovou a iniciativa d'aquella proposta de lei.

A respectiva commissão deu o seu parecer favoravel, mas tambem não foi submettido á discussão. Por isso o Sr. Hintze Ribeiro, em 3 de fevereiro do anno corrente, renovou outra vez a iniciativa d'esta proposta de lei.
Estranhei que S. Exa. carecesse de recorrer ao Parlamento para apresentar uma proposta de lei, que era da iniciativa do partido progressista, o qual não deixará de a approvar, proposta que tinha parecer favoravel das commissões parlamentares, já por duas vezes, e que não trazia augmento de despesa nem diminuição de receita do Estado,
Fiquei surprehendido, repito, por que S. Exa. viesse apresentar esta proposta ao Parlamento, depois de fazer uma larga dictadura, em que remodelou todos os serviços o tanto augmentou as despesas e diminuiu as receitas publicas.

S. Exa. podia muito facilmente incluir nessa dictadura esta medida, que não traz augmento de despesa, nem diminuição de receitas do Estado, e por consequencia passava sem reparo; mas o Sr. Presidente do Conselho via que d'esta medida não resultava a nomeação de um unico funccionario publico, e, portanto, não teve empenho em a decretar dictatorialmente. (Apoiados).

Eu já disse a V. Exa. que este projecto de lei não traz augmento de despesa nem diminuição de receita publica, e é da iniciativa do partido progressista, e que, portanto, este partido não pode deixar de concordar com elle.

Noto, Sr. Presidente, que as commissões parlamentares, que, nas duas primeiras vezes, apreciaram este assumpto, o converteram e traduziram em projectos de lei perfeitamente iguaes á proposta primitiva. Mas a illustre commissão d'este anno fez-lhe a alteração que consta do paragrapho 1.°, que diz:

(Leu).

É uma innovação da commissão, e que não deixa de ser razoavel, porque tem por fim castigar um desleixo.

Estabelece tambem o paragrapho 2.° o seguinte:

(Leu).

Parece-me que não era necessario estabelecer aqui a disposição d'este paragrapho.

O Sr. Presidente: - Previno V. Exa. que a sessão poucos mais minutos pode durar.

O Orador: - Agradeço a prevenção de V. Exa. Vou terminar já.

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A lei de 23 de agosto de 1887 continha esta excepção para os pobres, no capitulo IV da respectiva tabella.

Para que foi a commissão renovar inutilmente neste projecto e sua disposição?

Provavelmente só pelo motivo de que carecemos muito do que os estrangeiros venham para o nosso país. E isso é verdade.

Nós poderiamos elevar, sem inconveniente, os emolumentos nos passaportes de saida para que se não estabelecesse uma grande emigração; mas convem facilitar o mais possivel o ingresso dos estrangeiros, que trazem ouro e o deixam no país.

A illustre commissão, porem, parece que tinha especial empenho em que viesse para Portugal muita gente pobre, lembrada certamente das seguintes palavras latinas: «Solutio est miseris socios habere penates».

Vozes: - Muito bem, muito bem.

O SR. Presidente do Conselho de Ministros (Ernesto Rodolpho Hintze Ribeiro): - Unicamente para dizer ao illustre Deputado que ouvi S. Exa. ler o telegramma com respeito á febre aphtosa no concelho de Baião. Como esse assumpto não corre pela minha pasta, mas pela das Obras Publicas, eu communicarei ao meu collega das Obras Publicas as observações de S. Exa., que estou certo que elle as tomará na devida consideração.

Pelo que toca ao projecto, como S. Exa. o não impugnou, nada tenho que responder.

(S. Exa. não reviu.)

O Sr. Presidente: - Está esgotada a inscripção. Vae ler se o artigo 1.º, para ser votado.

Lêu-se e foi approvado.

Lido o artigo 2.º «Fica revogada a legislação em contrario», foi approvado sem discussão.

O Sr. Presidente: - O Sr. Conde de Paçô-Vieira pediu a palavra para explicações, antes de se encerrar a sessão.

Consulto a Camara sobre se devo dar a palavra a S. Exa.

Consultada a Camara, resolveu affirmativamente.

O Sr. Conde de Paçô-Vieira (para explicações): - SR. Presidente: pouco tempo gastarei á Camara. Estava longe de suppor que, a proposito da discussão do Projecto sobre a Academia de Bellas Artes do Porto, o Sr. Oliveira Mattos viesse discutir uma cousa já votada: a verba para o Palacio de Crstal, naquella cidade.

e. Exa. attribue essa verba a um esbanjamento, mas eu teria tido muito prazer em apresentar essa emenda ao Orçamento, se ella não tivesse sido apresentada pelo Sr. Ministro da Fazenda no cumprimento de uma prescripção legal, categorica e terminante.

Não se trata de favor. O Palacio de Crystal entregou, em tempo, ao Governo 75:000$000 réis em obrigações; portanto, o que o Governo está dando, representa apenas o pagamento de uma divida, em annuidades.

Eu, que tive a honra de viver no Porto, não podia sem protesto deixar passar as observações do SR. Oliveira Mattos.

(S. Exa. não reviu.)

O Sr. Oliveira Mattos: - Peço a palavra para explicações.

O SR. Presidente: - Consulto a Camara sobre se devo dar a palavra a S. Exa.

Assim se resolveu.

O Sr. Oliveira Mattos: - Agradeço á Camara a sua amabilidade; mas realmente a Camara não podia deixar de me dar a palavra - seria uma flagrante injustiça - para aclarar um ponto das observações do meu prezado amigo e illustre Deputado o Sr. Conde de Paçô-Vieira. Não combati nem a justiça nem a legalidade da verba inscrita; combati energicamente a opportunidade como combati quando o partido progressista estava no poder, e S. Exa. e outros representantes do Porto fizeram, por todas as formas, tentativas para a fazer approvar. Então combati quando esse Governo estava no poder; veiu depois um Governo regenerador e combati tambem. A justiça era a mesma, a votação da verba era inopportuno; vim combatê-la tambem hoje; portanto, sou coherente. Não precisava S. Exa. ter evocado a auctoridade do Sr. Procurador Geral da Coroa nem a auctoridade do illustre jurisconsulto o Sr. Veiga Beirão.

A opinião d'esses distinctos magistrados tem muito mais valor do que a minha; mas eu não trato da questão da legalidade; o que eu combati então e o que combato hoje é a opportunidade de se dar 6:000$000 réis no momento actual Direi mais: se isto era justo e legal porque não se fez ha mais tempo? Prova que realmente as circunstancias mudaram. Havia a mesma legalidade, a mesma justiça, davam-se os mesmos requisitos que se dão agora para ser approvada esta verba, porque não a approvaram ha mais tempo? O que eu disse, repito, foi que a verba era inopportuna e não quis com isto melindrar a cidade do Porto.

O Sr. Luiz José Dias: - Não havia lei.

O Orador: - Mas houvesse ou não houvesse lei, o facto é que, quer o partido regenerador, quer o partido progressista, recusaram-se muitos annos a pagar. Eu acho inopportuno e por isso contesto o pagamento. Nada mais.

(S. Exa. não reviu).

O Sr. Presidente: - A proxima sessão é ámanhã de manhã, sendo a primeira chamada ás 10 horas e 30 minutos e a segunda ás 11 horas, e a ordem do dia a mesma que estava dada para hoje.

Está levantada a sessão.

Eram 2 horas e 25 minutos da tarde.

Documentos enviados para a mesa nesta sessão

Representações

1.ª Da Associação Commercial de Lisboa, pedindo que seja examinado o projecto relativo ao convenio com o mais patriotico cuidado, cabendo a honra singular de inaugurar uma vida nova na politica.

Apresentada pelo Sr. Presidente da Camara, enviada á comissão de Fazenda, e mandada publicar no Diario do Governo.

2.ª Da Camara Municipal de Bragança, pedindo que seja approvada a proposta acêrca da construcção do caminho de ferro de Mirandella a Bragança.

Apresentada pelo Sr. Deputado Madureira Beça, enviada á commissão de obras publicas e mandada publicar no Diario do Governo.

3.ª Da Camara Municipal do concelho de Guimarães, pedindo auctorização para contrahir um emprestimo de 12:000$000 réis para feitura do lanço da estrada municipal n.º 13, do Lordello ao Bom Jesus do Monte, comprehendida entre as Caldas das Taipas e Santa Christina de Lamego.

Apresentaria pelo Sr. Deputado Alexandre Cabral a enviada á commissão de administração publica e de fazenda.

4.ª Da Camara Municipal de Aljustrel, contra a proposta de lei n.º 19-D, na parte em que, dispõe que sobre as taxas do real de agua não poderão incidir percentagens dos corpos administrativos.

Apresentada pelo Sr. Deputado João de Sousa Tavares, enviada á commissão de fazenda e mandada publicar no Diario do Governo.

5.ª Da Camara Municipal de Guimarães, pedindo que seja approvado o projecto que tem por fim isentar do pa-

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gamento de direitos o material que for necessario importar para a installação da illuminação electrica na cidade de Guimarães.

Apresentada pelo Sr. Deputado Alexandre Cabral e enviada á commissão de administração publica.

6.ª Da Camara Municipal do concelho de Ferreira do Zezere, contra a disposição da proposta de lei n.° 19-D, parte relativa á incidencia das percentagens dos corpos administrativos sobre as taxas do real de agua.

Apresentada pelo Sr. Presidente da Camara e enviada á commissão de fazenda.

7.ª Do zelador e officiaes de diligencias da Administração do Concelho de Villa Franca de Xira, pedindo que lhes seja extensivo o disposto pelo artigo 374.° do Codigo Administrativo, para o effeito da aposentação.

Apresentada pelo Sr. Deputado D. Luiz de Castro e enviada á commissão de administração publica.

8.ª Dos professores da séde do concelho de Povoa de Lanhoso, pedindo que se lhes torne extensivo o vencimento gradual de residencia, e que lhes seja coutado o vencimento de categoria e exercicio para o effeito da aposentação.

Apresentada pelo Sr. Deputado Visconde da Torre e enviada ás commissões de instrucção primaria e secundaria e de fazenda.

9.ª Dos amanuenses da administração do concelho de Braga, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo Sr. Disputado Visconde da Torre e enviada ás commissões de administração publica e de fazenda.

10.ª Dos officiaes de diligencias da administração e da Camara Municipal de Celorioo de Basto, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo Sr. Deputado Visconde da Torre e enviada ás commissões de administração publica e de fazenda.

11.ª Do secretario e amanuenses da administração do concelho de Villa Verde, pedindo augmento de vencimento.

Apresentada pelo Sr. Deputado Visconde da Torre e enviada ás commissões de administração publica é de fazenda.

Justificação de faltas

Tenho a honra de participar a V. Exa. que não compareci ás sessões de 14 e l5 do corrente mês por motivo justificado. = Alexandre Cabral.

Para a acta.

Participação

Participo a V. Exa. e á Camara que deitei na caixa das
petições um requerimento com que o alferes veterinario José Maria Pereira pode que lhe seja extensiva a doutrina do artigo 56.° da carta de lei de 12 de julho de 1901, que manda promover a tenentes os alferes com tres annos de serviço, promovidos a este posto depois da publicação da referida carta de lei. =O Deputado, Sousa Tavares.

Para a acta.

O redactor = Mello Barreto.

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