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1574 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tinham ousado subtrahir se ao seu dominio e acolher-se á protecção da bandeira portugueza.
Entre estes citaremos para exemplo o regulo Binguana.
De tudo o exposto é facil concluir, não só que o Gungunhama é um dos mais fieis aluados da corôa portugueza, que já tem tantos e tão fieis, mas tambem que é um dos potentados africanos que mais civilisados estão.
Elle, pelo que se infere das suas desculpas e das suas justificações, sujeita-se já nos seus dominios a uma espécie de regimen constitucional, obedecendo, não á sua vontade pessoal e propria, como até agora toda a gente suppunha que procediam os despotas e regulos de Africa, mas ás indicações e imposições dos seus cabos de guerra, que são, ao que se afigura, os poderes legislativo e executivo d'aquelle governo.
Por isso o Gungunhama, presenteado com os subditos portuguezes, e educado com esmero muito especial pelos mestres do Casalleiro, comprehende muito bem a necessidade de mandar embaixador a Lisboa, e de pedir perdão da guerra que nos fez, e em que foi derrotado, segundo dizia o telegramma do governador de Moçambique, a que nos temos referido.
Posto isto, o meu pedido resume-se em que não sejam só contemplados com a munificencia official os heroes da derrota em Matibane, e do innocente, pacifico e incruento triumpho na bahia de Tungue, mas que sejam tidos na devida consideração os heroes do desaggravo em Matibane, e os heroes vencedores em Inhambane.
Isto não contraria os nossos processos coloniaes, nem sobrecarregará muito o orçamento.
É certo que a administração ultramarina accusa um deficit de 1.700:000$000 réis, na orçamentologia colonial, que se não póde dizer demasiadamente escrupulosa, e que o podemos elevar, sem perigo de sermos mentirosos, a uma cifra annual superior a 2.000:000$000 réis.
Mas que importa isso, se com elle se sustentam heroes de tal grandeza, e o paiz se illustra com façanhas de tamanha gloria?
E se os esforços que fazemos para aniquilar o deficit na metropole são justos e louvaveis, embora nos obriguem a penosos sacrificios, não é menos justo e louvavel que as colonias se encarreguem de o augmentar e avolumar annualmente por motivos tão ponderosos, e com tanta utilidade.
Aproveito a occasião, sr. presidente, para renovar a declaração que fiz n'uma das ultimas sessões, assegurando a v. exa. e á camara, que faço o melhor conceito da inteireza e honestidade do sr. ministro da marinha, e que alimento por isso a esperança de que s. exa. empregará com todo o empenho e com toda a dedicação os meios ao seu alcance para por cobro á vergonhosa administração das nossas colonias e ás farças ridiculas complacentemente toleradas pela nossa tradicional indifferença, e que tanto justificam a inepcia, a connivencia e a venalidade dos poderes publicos.
Bem sei que a empreza não é facil, porque a complicada engrenagem da machina da administração ultramarina trabalha com elementos seguros e proprios, e os seus movimentos estendem-se a todas as regiões officiaes.
Mas com tempo e boa vontade, e com o desejo que s. exa. necessariamente tem de não manchar o seu nome honrado, partilhando responsabilidades alheias e sanccionando actos que envergonhariam o partido progressista, estou certo de que muito fará a bem das nossas colonias.
Aproveito tambem a occasião para instar por que sejam remettidos a esta camara os documentos que pedi nas sessões de 30 de abril e 25 de junho, recommendando especialmente os que dizem respeito ao celebre protectorado de Ajuda, que têem uma certa auctoridade, e que preciso para mostrar ao meu paiz o que valem os heroes ultramarinos, como são premiados e avaliados em Lisboa, como devem ,
ser considerados aos olhos da nossa consciencia e no conceito das nações civilisadas da Europa, e qual é a base do nosso prestigio colonial, que tanto exalta o nosso patriotismo degenerado e palavroso, e em que os visionarios descobrem o germen do nosso engrandecimento futuro.
Peço a v. exa. que dê as providencias necessarias para que estes documentos sejam remettidos á camara com a possivel brevidade, para se não realizar a prophecia ou ameaça, que já me tem sido feita lá fóra, de que o meu pedido não é attendido por motivos pouco acceitaveis.
Resta-me fazer uma observação aos srs. tachygraphos.
Quando me referi n'uma das ultimas sessões á administração das nossas colonias e aos acontecimentos do Dahomey, não só se adulterou completamente o sentido das minhas palavras, mas inventaram-se nomes em que não fallei, e em que só fallo por necessidade, mas sempre com muita repugnancia.
Que isto succedeu quando fallei muito pelo claro, sem allusões nem ironias, melhor poderá succeder hoje que, para não dizer verdades amargas que podem molestar o patriotismo dos que fingem acreditar na seriedade e grandeza do nosso prestigio colonial, tive de recorrer a um estylo que me não é habitual, varrendo assim a minha testada sem melindrar ninguem, mesmo por estar convencido da inutilidade dos meus protestos perante um paiz que gosta de viver de illusões e de promessas.
E, para não haver duvidas com respeito ao sentido das minhas palavras, declaro que não faço elogios a quem os não merece; que não considero serias nem proveitosas as embaixadas africanas; que não tenho em grande conta as heroicidades ultramarinas, proclamadas e apregoadas pelos respectivos heroes e seus panegyristas; que não julgo sufficiente a nossa marinha e exercito de Africa para readquirirmos o prestigio a que devemos a conservação das nossas colonias, prestigio que temos quasi perdido, graças á falta de honestidade, de isenção e de patriotismo de grande parte dos funccionarios ultramarinos, e ainda ás condecorações, presentes e embaixadas; que me parece inadiavel uma expedição de tropas do continente a alguns pontos da africa, alem dos motivos que todos conhecem, para se não dizer que o nosso exercito, que nunca se recusará ao dever de defender o territorio portuguez seja aonde for, só serve para romarias, paradas e enterros; que a distincção entre dois exercitos e legislações n'um paiz pequeno, pobre e respeitador da ordem, e com a regularidade e facilidade de communicações que temos com as nossas colonias, só se explica pelo velho systema de nos enganarmos com grandezas que não podemos ter; que é de absoluta necessidade a separação do ministerio da marinha do ministerio do ultramar, a organisação do ministerio do ultramar em bases novas, e uma syndicancia rigorosa e seria ás nossas possessões ultramarinas; e finalmente, que as nossas colonias, com a sua actual organisação e administração, e com os recursos de que dispomos, são apenas objectos de luxo dispendiosissimos, que nos impossibilitam de regularisar as nossas finanças, que alimentam o nosso descredito perante o mundo civilisado, e que em logar de serem a base do nosso engrandecimento futuro, serão fatalmente a origem dos maiores desastres para a metropole, se de prompto não mudarmos de vida, ou, limitando as despezas das colonias aos seus proprios recursos para ao menos não subcarregarem a metropole, que mal póde já comsigo, ou alienando alguma das nossas possessões ultramarinas para com o producto colonisarmos devidamente as restantes.
De outra sorte seguiremos o exemplo e teremos o destino dos nossos previdentes morgados, que, para conservarem intacto o seu patrimonio hereditario e não mancharem os seus brasões, preferem possuir o que não sabem nem podem administrar até que a usura e a agiotagem se encarreguem da liquidação dos seus haveres.
Fica assim lavrado o meu protesto, e feita a segunda