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de que fazia o que era mais conveniente aos interesses do exercito e do paiz, ou se modificou as suas opiniões? Eu quero saber do sr. ministro da guerra, a cujo caracter eu faço a mais completa justiça (apoiados), e a cuja rigidez de principios eu me presto a dar testemunho, qual a rasão por que s. ex.ª trepidou? Pergunto se isto é governo! Quando eu fallo de modificação de opinião, não a condemno, porque muitas vezes se dá nos homens que estão sentados n'aquellas cadeiras; eu sei que muitas vezes é um grande merito modificar as opiniões, transigir com os interesses, com os acontecimentos e com as circumstancias, mas sempre, mas era todas as questões, mas por todos os modos é altamente censuravel, não póde ser o pensamento do governo, é a negação d'esse governo! (Apoiados.)

Na sessão passada e durante o ministerio transacto foram apresentadas a esta camara varias propostas de lei para melhorar a organisação militar do paiz, para reorganisar o exercito sobre outras bases, para prover a certos melhoramentos, e n'uma palavra para satisfazer á necessidade imperiosa que o governo então reconhecia, como eu reconheço ainda, de collocar a força publica em circumstancias de poder satisfazer os fins da sua instituição.

A força publica não existe organisada de uma maneira permanente em parte alguma do mundo para fazer a policia, e com isto não estou fazendo a censura do governo, porque então teria de a fazer a mim proprio e aos meus antecessores, mas estou chamando a sua attenção e a da camara para um objecto que me parece da mais alta importancia. Eu quero o melhoramento do nosso exercito; e digo que quero o melhoramento do nosso exercito, não para lhe fazer aqui um cumprimento, entenda-se bem, porque isso era improprio do meu caracter e do logar em que me acho, mas para pedir aos poderes publicos que attendam a esta situação, para a collocarem em estado de poder desempenhar os seus deveres (apoiados): um exercito mal armado e pouco numeroso não serve para nada, senão para gastar ao thesouro uma somma avultada de contos de réis em pura perda; um exercito bem organisado, bem disciplinado, e tão numeroso quanto o comportam as forças do paiz, é um elemento de ordem, de independencia e de prosperidade publica; é um meio de que se servem todas as nações modernas para conservar a sua dignidade e defender os seus interesses (apoiados).

Já passou a moda de reputar o exercito infesto ás liberdades publicas: já passou, e digo-o com satisfação, porque felizmente por nenhum acto, por nenhuma consideração que seja, póde hoje sustentar-se que as liberdades do paiz correm perigo pela existencia do exercito portuguez (apoiados); o exercito, que sempre defendeu essas liberdades, que sempre acompanhou os homens liberaes até ao momento de se finalisar a luta, para se estabelecer completamente o systema representativo, não póde nunca considerar-se uma instituição perigosa para esse mesmo systema. Quero que o seja considerado como um elemento indispensavel na situação actual da Europa; como um elemento indispensavel para manter a dignidade do paiz, e defender os seus interesses; quero que o exercito tenha uma organisação que lhe possa dar força, e coadjuvar no difficil empenho para que elle é organisado.

O governo desattendeu esta proposta, mas desattendeu-a depois de a ter attendido; o governo foi ás commissões de guerra e administração publica; approvou o pensamento do projecto; as côrtes foram dissolvidas, e o que vejo eu? Vejo que esse negocio continua no esquecimento, e que o governo nem renova a iniciativa do seu projecto, nem apresenta outro, limitando-se unicamente a pedir uma somma insignificante para as fortificações de Lisboa.

Um paiz que vive no meio da Europa civilisada não póde ser indifferente ao movimento das outras nações no seu modo de existir; querer fazer uma situação á parte, completamente diversa, em opposição talvez com as tendencias que hoje se conhecem em todos os paizes cvilisados, póde ser um perigo e uma responsabilidade.

Eu não accuso ninguem, e faço votos os mais sinceros pela paz publica e pela harmonia que devemos manter a todo o custo com todas as nações nossas amigas; mas não ha de caber no fundo do meu coração de verdadeiro portuguez, este brado de alerta, e digo ao governo e aos poderes publicos que attentem sobre o estado da nossa força armada, e que a não deixem entregue a meia duzia de homens bravos sim, mas...

O sr. Sá Nogueira: — Ainda agora se lembrou d'isso?

O Orador: — Lembrei-me d'isto quando o illustre deputado talvez dormia (apoiados); lembrei-me d'isto quando os nobres ministros que s. ex.ª apoia dormiam tambem (muitos apoiados).

Honro-me muito de ter trazido ao seio da representação nacional essa proposta, que desejava fosse convertida em lei; mas quero saber a opinião do governo a respeito d'ella, quero sabe-la, e não póde o illustre deputado dizer que só agora me lembro d'isto, quando me lembro ha tanto tempo. Não obriguem os homens publicos a fallar dos seus actos; não vale a pena. Isto é uma politica mesquinha com que nos estamos a desauctorisar todos os dias (apoiados), e a dizer = vós fizestes o mesmo que eu fiz = (muitos apoiados). (O sr. Ministro da Marinha: — Apoiado.) Apoiado, sr. ministro da marinha: eu não estou comparando a administração de s. ex.ª com a minha: deixo esse mister aos outros (apoiados). Eu estou analysando os actos do governo, porque tenho direito para o fazer, e não ha força sobre a terra que me possa tirar esse direito (apoiados).

O sr. Rocha Peixoto: — O illustre deputado fallou em um acto do seu governo.

O Orador: — Pois é defezo fallar em um acto do meu governo quando os srs. ministros fallam todos os dias nos actos do seu governo? (Apoiados.)

O sr. Rocha Peixoto: — São os sessenta remendos na lei do recrutamento, que tantas foram as portarias.

Vozes: — Ordem, ordem.

O sr. Presidente: — Os srs. deputados não interrompam: se querem a palavra inscrevam-se (apoiados).

O Orador: — Declaro a V. ex.ª que essa lei do recrutamento é a mais perfeita que tem tido o paiz; é a mais perfeita: isto não quer dizer que é completamente perfeita. Mas vós que estaes ahi corrigi-a (muitos apoiados); vós que a achaes defeituosa emendae-a (muitos apoiados). Para isso é que sois maioria (muitos apoiados).

Os illustres deputados sabem só censurar esse acto e não sabem corrigi-lo? Se são maioria, porque apoiam o governo; a maioria que tome o seu logar (apoiados). A maioria governa por intervenção dos srs. ministros; os ministros são ministros de accordo com as maiorias parlamentares. Esta é a theoria constitucional.

E não venha dizer-se como motivo de censura: «vós é que fizestes a lei do recrutamento». Honro-me muito com isso; honro-me de ter tomado a iniciativa n'esta lei; e note a camara a contradicção em que estão aquelles que a condemnavam em virtude de uma disposição d'esta lei barbara (hoje já não é barbara), pela qual se mandava ás auctoridades prender aquelles que se achavam sem resalva das suas respectivas camaras. Fazia-se n'isto alguma violencia?... Creio que sim (apoiados). Declarei-o muitas vezes, e para modificar esse meio apresentei ás côrtes, e fiz passar uma lei de modificação do recrutamento. Mas que fez o governo que veio depois? Que fizeram os homens que tanto censuraram esse acto? Onde estão aquelles que tanto gritaram contra essas prisões que não vêem agora prender a cordel todos os dias? (Muitos apoiados.) Esta é a vossa coherencia! Pois para isto não precisava mudar-se a administração (apoiados). Se não servis para corrigir, ou se não sabeis, mas só para continuar, não sois capazes de ser maioria (apoiados).

Eu estou cansado, e tinha muito que dizer ainda, mas tenho a palavra segunda vez, faz muito calor e a minha saude não está muito robusta. Portanto vou concluir. Entenda a camara e o governo que no meio d'esta interrupção, o que ficou de pé é a appellação que fiz aos sentimentos dos representantes do paiz, que julgo animados das idéas mais patrioticas e mais liberaes, porque a todos reputo amigos do seu paiz; appello para todos elles, peço-lhes a sua attenção para esta questão da força publica, peço-lhes que não deixem continuar as cousas como estão; porque senão dentro em pouco tempo não temos exercito, não temos força, não temos policia e não temos nada.

Vozes: — Muito bem.

(O orador foi cumprimentado por muitos srs. deputados.)

(O sr. deputado não reviu este discurso.)

O sr. Ministro da Fazenda (A. J. d'Avila): — Sr. presidente, o nobre deputado que acaba de fallar, começou o seu discurso declarando que a opposição e todos os homens publicos tinham não só o direito, mas mesmo o dever de expor n'esta occasião a sua opinião diante do paiz, em relação aos actos da administração, e o illustre deputado entendeu que devia fazer uso d'este direito para analysar os actos que tenhamos commettido, embora s. ex.ª entenda que nós estamos prohibidos do direito de analysar os seus actos quando ministro.

A minha opinião é diversa a este respeito; eu podia abona-la com os precedentes de s. ex.ª, porque raras vezes vi, sentado s. ex.ª n'este logar, empregar outra argumentação que não fosse esta, todas as vezes que s. ex.ª era combatido, não digo já por homens que tivessem sido ministros, mas por homens que tivessem apoiado certos ministros.

S. ex.ª respondeu analysando os actos d'esse ministerio, e eu tenho por consequencia tambem o direito de fazer o mesmo a respeito dos actos de s. ex.ª como ministro. Se as accusações que s. ex.ª fez a esta administração procedessem, o que havia de acontecer era vir s. ex.ª sentar-se comnosco no banco dos réus.

Mas eu coméço por felicitar o nobre deputado pela mudança de opinião tão radical, que teve em relação ao que acaba de fazer agora (apoiados), aproveitando esta occasião para manifestar o seu modo de pensar a respeito dos actos do governo, quando ainda não ha dois annos, muito menos, ha pouco mais de um anno, sendo s. ex.ª ministro, porque um nobre deputado e meu amigo quiz discutir a resposta ao discurso da corôa, s. ex.ª tomou a palavra e começou o seu discurso dizendo o seguinte:

«O sr. Ministro do Reino (Fontes Pereira de Mello): — Sr. presidente, no fim de muitos annos de systema representativo tinhamos conquistado uma boa pratica, e tinhamo-la conquistado a aprazimento de todos os homens politicos, que ha alguns annos têem tido assento n'este parlamento. A resposta ao discurso da corôa tinha-se tornado um cumprimento official e obrigado do corpo legislativo para com o augusto chefe do estado; as questões politicas, administrativas e economicas tinham desapparecido d'este logar para entrarem no debate na occasião opportuna, no momento em que os projectos do governo, ou a iniciativa particular de cada um dos nobres deputados viessem chamar a attenção do parlamento sobre os graves assumptos da administração publica, que elle fosse chamado a decidir. Só me lembra de um momento, quando o sentimento nacional se achava commovido e sensibilisado, em que se quebrou este preceito, e em que todos julgaram que era occasião opportuna de discutir uma grande e importante questão por occasião da resposta ao discurso da corôa. Fóra d'este caso, não me recordo de que ha muitos annos tivessemos transportado as questões politicas e administrativas para este logar, levantando uma discussão inutil, completamente inutil, perdendo um tempo precioso, que devemos empregar em assumptos de administração que estão já sujeitos ao exame da camara, para mais tarde, ou repetir os mesmos argumentos, ou acharmo-nos despidos d'elles para entrar nos debates.»

Isto dizia s. ex.ª quando ministro do reino em 29 de fevereiro de 1860!

Se as doutrinas, que o nobre deputado n'aquella occasião desenvolveu, tivessem uma applicação pratica, era agora, quando não estamos em 29 de fevereiro, mas em 3 de julho de 1861, n'uma estação em que é impossivel que os nobres deputados possam demorar-se muito aqui, e quando se trata de discutir o orçamento, onde a maior parte das considerações, que o nobre deputado acaba de fazer, hão de ter logar.

E era o nobre deputado e os seus amigos, que nos censuraram pelo facto, que imaginaram, de que nós não queriamos discutir o orçamento!...

Agora verão os illustres deputados novos quem quer discutir o orçamento. Se nós, que logo que no-lo permittiram os estylos parlamentares, renovámos a iniciativa do orçamento, e a commissão de fazenda, que trouxe immediatamente sobre elle o seu parecer, que está dado para ordem do dia e podia entrar em discussão hontem mesmo; ou se aquelles, que pediram a palavra em tal escala que promette dar a esta discussão proporções taes que me parece que o mez de julho não será sufficiente para extinguir a inscripção! (Muitos apoiados.) Ha de ver-se agora quem queria sinceramente a discussão do orçamento.

Mas não julguem os nobres deputados que o governo sente, a não ser por esta consideração, que esta discussão tivesse começado; porque ha muito que elle desejava que a opposição e governo viessem declarar-se e explicar-se diante do parlamento. Não julguem os nobres deputados que podem acobertar-se com o principio que indicaram — de que estão aqui só para analysar os actos d'esta administração; nós, ministros, temos tambem direito de examinar o seu passado (apoiados), de os interrogar a respeito do seu programma para o futuro (apoiados); não basta que queiram analysar os actos do governo, é necessario que digam o que hão de fazer ámanhã (apoiados) quando forem ministros.

S. ex.ª já tirou carta de seguro, quando disse: Eu não quero ser ministro». Se o não quer ser, qual é o ministerio que quer sustentar quando este caír, porque eu não imagino que s. ex.ª queira passar a sua vida a derribar ministerios?

E disse mais: «Eu não quero ministerios caidos por meios revolucionarios, nem posso apoiar uma situação organisada por esses meios», declaração digna do nobre deputado. Mas era necessario que s. ex.ª dissesse mais = eu, nem para mim nem para os meus amigos quero o poder n'uma situação obtida tumultuariamente, por surpreza, por meios revolucionarios =; porque eu conheço muitas pessoas que, na vespera de uma revolução, declaram que não a querem e depois vão ser ministros com ella.

O ministerio, repito, anhelava por este momento em que se encontrasse face a face com a opposição, e lhe perguntasse quaes os factos que a justificam, quando descreve o paiz n'uma situação medonha, que ha de conduzir necessariamente á subversão da ordem social.

Vozes: — Muito bem.

O nobre deputado que foi ministro, queixou-se, e eu admiro-me de que s. ex.ª o fizesse, queixou-se da violencia com que era atacado pela imprensa, dizendo: «A imprensa accusou-me a mim e aos meus amigos politicos de lazaristas»; pois na imprensa do nobre deputado, n'um jornal que passa por ser propriedade sua, ainda hontem vinha eu qualificado de ministro miseravel e imbecil, phrases nada cortezes. Eu assento que é menos chamar lazarista a um homem do que dar-lhe estes epithetos; não sei como tal linguagem póde ser empregada n'um jornal dirigido por um cavalheiro. Faça s. ex.ª o caso que eu faço d'estas amabilidades, para não dizer d'estas demazias da imprensa, que só desapparecerão quando os homens que estiverem á frente d'ella se empenharem todos por dar o exemplo (apoiados).

O nobre deputado tratou da questão das irmãs da caridade, e foi a ella que consagrou a parte principal do seu discurso; mas teve a arte de censurar tudo o que nós tinhamos feito, sem dizer o que faria no nosso logar (muitos apoiados); e bem sabe a rasão.

Eu entro com muito desgosto n'esta questão: poucas questões ha que eu discuta com tanta repugnancia como esta, porque me parece que os partidos se assenhorearam d'ella, e por isso tem sido mal tratada. E o nobre deputado ainda deu uma prova d'isso, porque entrelaçou constantemente com ella a necessidade da demissão do ministerio, quando me parecia que era melhor trata-la esquecendo-se dos homens aqui sentados.

Não posso comprehender como s. ex.ª se admirasse do que, agitando esta questão os espiritos ha uns poucos de annos, não estivesse ainda resolvida. Não se recorda de que ha um anno estava s. ex.ª n'estas cadeiras? (Muitos apoiados.) E que passos deu para a resolver? (Apoiados.)

Eu dei-me ao trabalho, quando estudei este assumpto, porque entendi que, na minha posição de ministro, o devia fazer; dei-me ao trabalho de examinar e fazer a estatistica de tudo quanto se tem feito n'este paiz com respeito á questão das irmãs da caridade, começando pelo requerimento de umas poucas de senhoras, á frente das quaes estava a sr.ª duqueza de Cadaval, que serviu de base ao decreto de 14 de abril de 1819. E quer v. ex.ª saber, sr. presidente, é que acho com relação ao ministerio de que fez parte o sr. Fontes?

1859, março 28

«Officio do ministerio do reino — (conselheiro Fontes Pereira) — para o ministerio da justiça, remettendo o parecer da commissão das irmãs da caridade, e pedindo a opinião do conselheiro Mártens Ferrão sobre esse parecer.»