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que á governo fizesse? Resolver por si essa questão? O governo entendeu que não devia misturar uma questão de alta importancia com uma questão secundaria. Entendeu, mesmo para se não dizer que o que o governo pretendia era assenhorear-se d'esse edificio, deixar essa questão para ser resolvida pelos meios competentes. Se a portaria não foi pois cumprida n'esta parte, foi por virtude d'esta questão. Supponha-se, quando ella foi publicada, que o edificio de Santa Martha era uma dotação feita pelo congresso constituinte de 1821 aquella corporação: porém depois allegou-se que era propriedade particular, que tinha sido arrematada em praça; e que era propriedade da corporação que no tempo da compra estava subordinada á congregação de París. Era portanto uma questão para examinar, e que o governo não podia nem devia resolver por si.

O illustre deputado tentou tambem pôr em duvida que o decreto de 9 de agosto de 1833 comprehendia as irmãs da caridade, e foi este um dos motivos por que achou illegal o procedimento do governo: permitta-me porém o illustre deputado, que lhe diga que quando auctoridades, tão respeitaveis como aquellas que têem sido repetidas vezes citadas, deram ao decreto de 9 de agosto de 1833 a interpretação que o governo lhe dá, acho que ha alguma temeridade em querer sustentar o contrario sem rasões muito fortes em contrario; e que ha ainda maior temeridade em querer accusar o governo por ter dado essa mesma interpretação aquelles diplomas. Pois tres cardeaes patriarchas de Lisboa já o interpretaram da mesma maneira, o sr. D. Patricio, quando aceitou em 1838 essa communidade á sua obediencia; o sr. D. Guilherme, quando foi ouvido em 1845 sobre a instituição das irmãs da caridade, que se queria estabelecer no Porto; o mesmo sr. D. Guilherme em 1857, na occasião em que se pediu licença para fazer admittir algumas irmãs da caridade nos estabelecimentos de beneficencia; o sr. D. Manuel em 1860 revogando o despacho do seu predecessor, de 12 de junho d'esse mesmo anno; e ha de dizer-se que o governo, escudado com auctoridades tão respeitaveis, interpretou mal a lei e deve ser accusado por isso? Isto é que é praticar um acto muito illegal que o torna indigno de gerir os negocios publicos? Torno a dizer que ha bastante temeridade n'este procedimento.

O nobre deputado acabou o seu discurso fazendo uma resenha dos actos do ministerio actual, e sustentando que elle nada tinha feito; e fez-me a honra de me exceptuar n'essas censuras que fez a todos os meus collegas. Mas eu direi ao nobre deputado que, sem querer occupar-me da defeza dos meus collegas, que hão de toma-la de uma maneira cabal e triumphante, direi ao nobre deputado que se s. ex.ª acha que se tem feito alguma cousa na repartição de fazenda, não deve s. ex.ª esquecer-se de que hoje a repartição de fazenda exerce uma tal influencia nos negocios publicos, que basta que se diga que os negocios da fazenda vão bem, como o nobre deputado me fez a honra de dizer, ou de dar a entender, para se não poder dizer que não ha governo, que não se governa (apoiados). Pois se porventura o governo se tem occupado com zêlo da execução das leis tributarias votadas na sessão passada, e se tem vencido as repugnancias que haviam contra ellas, não se póde negar que ao menos nesta parte não tenha prestado um grande serviço a este paiz. E seja dito de passagem que não é exacta a accusação que se tem feito a este ministerio, de que elle não votou essas leis; não é assim: estão sentados nestes bancos cinco ministros que votaram essas leis, e ha um ministro que por mais de uma vez declarou que se as não votou, é porque não tinha confiança nos ministros que as propozeram; foi uma questão de mera confiança.

Quando alguns cavalheiros, que formam hoje a maioria, enumeravam em áparte alguns actos de s. ex.ª, disse s. ex.ª então = que vantagem houve em se mudar o ministerio para se fazer o que nós faziamos =? Deixassem estar os nobres deputados, que ninguem os obrigou a deixarem o poder (apoiados). Quando ouvi dizer que esse ministerio estava em crise não o acreditei.

Estava em discussão um projecto, ao qual ninguem julgava que estava ligada a existencia do ministerio. Era importante. Mas um ministerio que tinha entendido que era sua obrigação procurar melhorar a situação da fazenda publica, apresentando projectos que alteravam essencialmente o systema tributario, esse ministerio tinha uma missão tão elevada que não tinha direito de se retirar, pelo facto de uma votação duvidosa sobre um projecto que tinha apresentado, e que por muito importante que fosse, não o era tanto como os projectos que constituiam esse systema. Um dos artigos d'esse projecto ficou empatado; não houve votação contra, houve um empate, e no dia seguinte podia repetir-se a votação, e o governo tinha talvez a maioria. Pareceu-me que os srs. ministros se aproveitaram dessa occasião para se livrarem desse grande peso. Comprehendo isto, porque tenho tambem desejos muito vehementes de saír d'este logar; mas quem está n'estes logares não póde nem deve deixar-se seguir pelos desejos do seu coração: é necessario cumprir escrupulosamente a missão de que está encarregado. O ministerio que tinha apresentado um systema d'aquella ordem, tinha obrigação de esgotar todos os meios para o fazer triumphar, e não correr o risco de que esse systema fosse caír em mãos que não o fizesse approvar. Pois supponha o illustre deputado que em logar de se ter organisado no dia 4 de julho o ministerio actual que teve a coragem de fazer seus esses projectos, de se pôr á sua frente e de os fazer passar, porque só dois estavam convertidos em lei, vinha um ministerio que fechava a camara no dia seguinte e não dava andamento a esses projectos, sobre quem devia caír essa tremenda responsabilidade? Sobre os nobres deputados que eram ministros (apoiados).

Veio um ministerio que se fortaleceu com o apoio dos cavalheiros que apoiaram os nobres deputados, e fez passar essas projectos; póde negar-se, que esse ministerio não fez um bom serviço ao paiz? Por esta occasião não posso deixar de declarar, que nunca na minha vida observei um espectaculo que lisongeasse mais os meus instinctos de cidadão portuguez e de homem liberal como foi a attitude que a camara tomou em julho da sessão de 1860; oxalá que os partidos comprehendessem sempre tão bem os seus verdadeiros interesses como os entenderam então (apoiados). Mas podia acontecer o contrario d'isto, podiam vir homens que não vissem a questão como nós a vimos, que fechassem o parlamento e não dessem mais andamento aos projectos. Nós fizemos o contrario d'isto; nós tomamos sobre nós o odioso de fazer executar estes projectos, e éramos todos os dias ameaçados de movimentos revolucionarios contra a sua execução; nós temos tido a fortuna, ajudados do bom senso, do paiz, de ver que esses projectos se vão executando mansa e pacificamente; nós vemos o credito publico melhorar todos os dias; nós vemos o credito estabelecido sobre bazes mais solidas de que o encontramos quando entramos no ministerio, e a fazenda publica n'um estado que nos habilita a fazer transacções mais vantajosas do que se faziam antes, a fazer contratos para dar cumprimento ás obrigações dos caminhos de ferro e das emprezas de melhoramentos materiaes, contratos que não envergonhariam os paizes onde o credito está mais radicado; e depois d'isto, diz o nobre deputado: «Não se faz nada; não ha governo!» Pois, senhores, quando houver governo oxalá que se apresentem sempre factos d'esta natureza (apoiados).

O que eu posso asseverar aos nobres deputados é, que quando esta situação cessar de existir, e eu desejo que ella só deixe de existir pela acção combinada dos poderes legaes, pelo voto do parlamento e pela acção de quem tem a prerogativa de nomear e demittir ministros livremente; quando esta situação, digo, deixar de existir, os homens que vierem receber o legado que ella lhes deixar não hão de poder dizer contra ella cousa alguma que não se possa defender aqui de cabeça erguida; então é que se ha de reconhecer se porventura nós temos gerido mal os negocios publicos (apoiados). Esses factos que se apresentaram contra alguns ministerios recaem primeiramente sobre os homens que ha um anno ainda eram ministros (apoiados).

Vou acabar porque não quero caír no inconveniente que notei desde o principio. Entendo que se havia uma occasião em que a discussão da resposta ao discurso da corôa devesse ser muito limitada era esta, porque temos precisão de discutir o orçamento, e no orçamento se podem tratar a maior parte d'estas questões (apoiados). Temos precisão de discutir o projecto que apresentou o sr. ministro do reino, de que eu renovo a iniciativa, a respeito do instituto das irmãs da caridade, e ahi se póde tratar até á saciedade esta questão (apoiados). Temos precisão de discutir outras propostas que já estão na mesa, e é então que com aproveitamento publico se podem apresentar as observações que os illustres deputados já apresentaram, e podem ter a certeza de que então, como agora, hão de ter cabal resposta. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem, muito bem.)

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Antonio de Serpa.

O sr. Antonio de Serpa: — Faltam apenas cinco minutos, e então pedia a V. ex.ª que me reservasse a palavra para a sessão seguinte (apoiados).

O sr. Presidente: — A ordem do dia para ámanhã são trabalhos em commissões depois do expediente, e para sexta feira é a mesma que vinha para hoje. Está levantada a sessão.

Eram quasi quatro horas da tarde.