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1780

O sr. Gomes de Castro: — Peço toda a attenção da camara para as considerações que vou fazer.

Em primeiro logar mando para a mesa o seguinte requerimento (leu).

Sr. presidente, é sempre desagradavel entrar n'uma questão, da natureza d'esta, que tem até certo ponto o caracter de pessoal: a camara sabe as relações de parentesco que me ligam ao sr. barão de S. Lourenço, e por isso me repugna entrar n'esta questão; no entanto sobra-me o valor e a energia para repellir as accusações as mais infundadas que se fizeram n'esta casa contra o caracter e contra a dignidade do sr. barão do S. Lourenço. Quando teve logar o roubo da porta falsa, já o sr. barão de S. Lourenço estava no goso da sua licença, e pelo mau estado da sua saude, e pela impossibilidade de poder fazer uma viagem longa, entendeu não dever vir na mala-posta, e quando se achava a bordo do vapor é que teve conhecimento d'aquelle facto.

É preciso notar que em consequencia do pessimo estado em que se acha a casa da alfandega do Porto, por algumas vezes se tinham dado abusos, e o sr. barão de S. Lourenço por muitas vezes instou com o governo para que mandasse fazer uma nova alfandega, e fizesse n'aquella alguns concertos indispensaveis; mas essas suas instancias não foram satisfeitas. Pediu mais por muitas vezes que o habilitassem com os meios necessarios para evitar o grande contrabando que se fazia na provincia do Minho, e as suas reclamações não foram satisfeitas. Estas reclamações existem no ministerio da fazenda.

Estando pois á vapor para partir, havendo já outro director na alfandega, e suppondo que aquelle facto da porta falsa não tinha o alcance que teve, e que em todo o caso lá estava o empregado competente para tratar de examinar quem eram os complices n'aquelle contrabando, o sr. barão de S. Lourenço saíu do Porto para Lisboa. Foi assim que os factos se passaram.

Emquanto á honestidade do sr. barão de S. Lourenço, o sr. ministro já disse o que é sufficiente (apoiados). Eu estou n'uma posição especial, e é meu dever só appellar para o que disse o sr. ministro, e acrescentar que não ha documento que dê motivo nem direito a ninguem a pronunciar-se n'esta casa contra a honestidade do sr. barão de S. Lourenço.

O sr. ministro da fazenda resolveu prolongar a licença para tirar toda a idéa de que podia haver pressão da parte do director da alfandega sobre os seus empregados, e este conveio pelo mesmo motivo em aceitar a nova licença. Esta é a verdade. Durante um anno estiveram os empregados em commissão a syndicar n'aquella repartição, veio o inquerito e do inquerito não constou nada, e tanto é assim que eu vou ler á camara um documento que é a prova verdadeira, a prova unica, prova que póde apresentar-se n'esta casa. Os ministros ou são probos ou não; mas eu acredito que o são, e ninguem póde pôr em duvida a probidade e rigidez de caracter do sr. Casal Ribeiro (apoiados).

O sr. barão de S. Lourenço tendo a sua saude deteriorada, e desgostoso pelo que se tinha passado, desgostoso por todos estes motivos, pediu a sua aposentação. E que fez o ministro competente? Concedeu a aposentação n'estes termos que vou ler á camara.

«Tendo em consideração o bom serviço prestado no espaço de quasi vinte e sete annos pelo barão de S. Lourenço, Antonio Joaquim da Costa Carvalho, nos cargos de vogal da extincta commissão do tribunal do thesouro publico, estabelecida na cidade do Porto por decreto de 25 de novembro de 1832 e de director da alfandega da mesma cidade; bem como os soffrimentos e prejuizos que experimentou pela sua adhesão á causa da legitimidade, á qual em diversas epochas, e particularmente durante o cerco d'aquella cidade, na memoravel luta contra a usurpação, prestou valiosos e relevantes serviços; e attendendo ao que elle me representou sobre o estado de deterioração da sua saude: hei por bem aposenta-lo no seu actual emprego de director da alfandega do Porto, com o ordenado por inteiro, e com as honras de conselheiro do tribunal do thesouro publico, cuja graduação lhe foi concedida por decreto de 5 de novembro de 1844; ficando porém dependente esta aposentação da approvação das côrtes.

«O ministro e secretario d'estado dos negocios da fazenda assim o tenha entendido e faça executar. Paço, em 12 de outubro de 1859. = REI. = José Maria do Casal Ribeiro.»

É triste cousa que um homem, que fez tantos serviços á liberdade como o barão de S. Lourenço, um homem que prestou tantos serviços ao seu paiz, venha assim por simples diffamações que foram apresentadas nos jornaes, ser desacreditado n'esta casa n'aquillo que lho é mais caro a sua honra (apoiados). Eu tenho visto n'esta casa chamar a attenção dos srs. ministros para o procedimento de alguns empregados ou para alguns factos por elles praticados; mas alcunha-los de corruptos sem haver provas, se isto fosse aceito por esta camara, era para se dizer, como disse o sr. ministro da fazenda = que éramos um paiz de barbaros. =

A camara, ou alguns dos meus collegas que pertenceram á camara passada, hão de estar lembrados do facto que se deu aqui a respeito de Angola. Um deputado fez accusações fortissimas ao juiz de direito d'aquella provincia; pediu-se-lhe que apresentasse as provas, e como o deputado não as póde apresentar, não lhe foi permittido continuar.

Havia tão pouca influencia a actuar sobre o animo do ministerio, que na mesma occasião em que se passava este decreto de aposentação, estava eu aqui a fazer opposição ao sr. Casal Ribeiro. Mas s. ex.ª que é um espirito superior e um caracter honesto, não era capaz de se deixar obcecar pelas paixões politicas para deixar de fazer justiça a este cavalheiro (apoiados).

Mas o que se diz sobre a aposentação? Diz-se que é um acto illegal e de dictadura. O sr. Casal Ribeiro não commetteu um acto illegal ou de dictadura, porque deixou o decreto dependente da approvação das côrtes. E emquanto a este documento, emquanto ao resultado da syndicancia que precedeu este documento, eu appello para o testemunho dos collegas do sr. Casal Ribeiro no ministerio, e estou persuadido de que hão de provar a exactidão das minhas asserções.

Sr. presidente, direi mais alguma cousa: quando um homem está seguro da sua consciencia, quando conhece a probidade de um outro, não se deixa annullar por causa do parentesco que tenha com esse homem, e deve dizer toda a verdade.

O sr. barão de S. Lourenço tem sido victima de repetidas injustiças. A qualidade do logar que elle occupava provocou estas declamações nunca acompanhadas de provas. As grandes arguições que se lhe faziam, eram sobre tudo filhas da inveja d'aquelle logar, que era um logar rendoso e de representação.

O sr. Luciano de Castro citou um facto, a respeito do qual eu provoco uma resposta cathegorica da parte do sr. Fontes. O nobre deputado disse: «Que em conversação com o sr. Fontes, lhe perguntara por que é que não suspendia ou não mandava para os tribunaes o barão de S. Lourenço e que s. ex.ª respondêra, para que? Se os tribunaes o hão de absolver. Este facto é muito grave, muito importante, e eu espero do cavalheirismo do sr. Fontes que elle virá declarar a verdade do que disse a este respeito... (O sr. Fontes: — Não ouvi...)

O sr. Luciano de Castro disse = que tendo pergunta do a s. ex.ª quando ministro por que rasão não mandava metter em processo pelos seus abusos este funccionario, que era o director da alfandega do Porto, barão de S. Lourenço, s. ex.ª dissera: «Como quer que o metta em processo se o absolvem?» =

O sr. Fontes: — Peço a palavra.

O Orador: — Isto é um facto importante, porque, alem de uma offensa aos tribunaes, ha n'isto a idéa implicita de que o sr. barão de S. Lourenço estava no caso de ser levado aos mesmos tribunaes.

Portanto espero do cavalheirismo de s. ex.ª que ha de restabelecer a verdade n'este ponto.

S. ex.ª o sr. ministro da fazenda disso quanto era necessario dizer-se a respeito da probidade e honradez do sr. barão de S. Lourenço, e por isso limito-me a mandar para a mesa o seguinte

REQUERIMENTO

Requeiro que sejam remettidos a esta camara os documentos relativos á syndicancia feita á alfandega do Porto. = Gomes de Castro.

O sr. Mártens Ferrão: — V. ex.ª comprehende que eu não posso deixar de tomar a palavra nesta occasião, tendo-se feito arguições tão graves o tão infundadas, no meu entender, á administração de que tive a honra de fazer parte, o principalmente á gerencia de um cavalheiro que eu sinto que não seja membro d'esta casa (apoiados).

O illustre deputado que encetou este debate fez graves arguições á situação actual, e á que a precedeu, por ter aposentado o sr. barão de S. Lourenço, no que entendia haver uma grande immoralidade e um abuso do poder: grande immoralidade, porque era de opinião que aquelle funccionario estava complicado em malversações na gerencia do cargo que lhe estava confiado, e por isso devia ser entregue aos tribunaes, mas nunca premiado com uma aposentação; abuso do poder, dictadura mesmo, porque o governo não tinha auctorisação para o aposentar.

O nobre ministro da fazenda, na minha opinião, sustentou os bons principios. E dever dos homens que se sentam n'aquellas cadeiras (as do ministerio) defender os seus funccionarios quando não têem motivos de proceder contra elles: se o têem o seu dever é proceder, fiscalisar, punir, mas emquanto esses factos não se dão, os ministros cumprem o seu dever quando aqui se levantam defendendo com energia os empregados dependentes da administração a seu cargo. A responsabilidade do executivo pésa sobre os ministros, e portanto devem elles ser os primeiros a levantar-se em defeza dos seus subordinados.

Estimo que o sr. ministro sustentasse estes bons principios, e n'esta parte hei de dar-lhe sempre o meu apoio.

A justificação da administração passada contra a arguição de que commettêra uma grande immoralidade está nas proprias palavras do illustre deputado que encetou o debate, porque disse s. ex.ª = que devia ser mettido em processo o funccionario a que se referia, e só quando os tribunaes o julgassem illibado, então é que o governo o podia aposentar =. O governo seguiu exactamente o que s. ex.ª indicou.

A syndicancia feita na alfandega do Porto foi pelo governo mandada ao ministerio publico, aos fiscaes da corôa, para que elles mandassem proceder contra quem entendessem que se devia proceder; e ahi pára a acção do governo com relação aos tribunaes. O ministerio publico cumpriu o seu dever (e eu devo prestar homenagem á independencia com que elle n'esta terra tem procedido sempre), analysou os factos; mas entendeu que não devia mandar instaurar processo contra o sr. barão de S. Lourenço, por não haver para isso fundamento. E por consequencia o governo mesmo não podia julgar aquelle funccionario como criminoso.

Mas a posição d'elle era melindrosa o desagradavel ao mesmo tempo, e por isso, como disse o illustre deputado o sr. Castro, requereu ao governo a aposentação, baseando-se nos seus muitos annos de serviço; em serviços que lhe tinham sido reconhecidos como importantes por outros governos, em que o seu estado de saude não lhe permittia continuar á testa d'aquella repartição; e baseando-se ainda nos precedentes de muitas administrações que, embora não houvesse na lei estabelecida a aposentação para certos e determinados casos, concedia-se não obstante por um acto do executivo, ficando esse acto dependente da approvação das côrtes.

O governo entendeu que convinha aceitar a aposentação pedida por aquelle funccionario e concedeu-lh'a, mas como? Dependente da auctorisação das côrtes. E ninguem se levantou aqui nunca julgando isto um acto de dictadura que invadisse as attribuições do poder legislativo.

Eu tive occasião do aceitar da administração, que precedeu aquella de que tive a honra tio fazer parte, actos similhantes; e, n'este ponto, direi francamente que fui mais alem do que o sr. ministro da fazenda, porque s. ex.ª disse = que comquanto entendesse que a aposentação não era regular, a tinha aceitado por ter vindo da administração passada. =

O sr. Ministro da Fazenda: — Perdão. Eu disse que entendia que era regular.

O Orador: — Bem; estimo muito a declaração. Eu achei n'esta casa, quando tive a honra de entrar no ministerio, uma aposentação concedida por um decreto a um funccionario, que pela lei a não tinha; foi a respeito d'ella ouvida a commissão de legislação, e, succedeu o mesmo, foi confirmada. Se eu entendesse que ella não era justa, retirava-a, porque, não tendo solidariedade com os actos da administração que me precedera, podia dizer a minha opinião sem que n'isso fizesse injuria a essa administração, e não aceitar; mas achei-a regular e por isso sustentei a aposentação, parece-me que era a do sr. Estrella, sem que ninguem me arguisse por isso, nem ao ministro que primeiro a decretara. Eis-aqui a maneira por que procedeu a administração passada a este respeito.

Não houve immoralidade, porque indo todos os papeis, que eram concernentes a esta questão, ás estações a que deviam ir para proceder na conformidade das leis, ahi não se entendeu que houvesse base para que se podesse proceder contra aquelle funccionario. D'ahi por diante, que podia fazer o governo? Dar-lhe a aposentação? Não podia. Demitti-lo? Tambem não podia, porque não tinha factos em que se podesse fundar para isso; por consequencia fez o que faria outro qualquer governo, porque isto não são idéas d'este ou daquelle ministerio, são de todos os ministerios que ali se sentarem, que não podem senão fazer aquillo para que as leis os auctorisam.

Não houve portanto acto algum de complacencia da parte do governo para com este funccionario, nem para com nenhum; o governo praticou a este respeito sempre desprevenido de preconceitos, e póde a camara acreditar que se o governo tivesse meios de proceder contra, tinha procedido. Estão ainda bem presentes ao espirito de todos os illustres deputados de então os exemplos de actos de força praticados por aquella administração, factos porque muito foi accusado o governo, mas a que hoje a opinião publica já fez completa justiça (apoiados.)

O illustre deputado, o sr. Gomes de Castro, disse = que tanto o ministerio passado não havia procedido assim por considerações pessoaes, mas sim pelos principios de justiça que elle parente do sr. barão de S. Lourenço, n'essa epocha aqui fazia guerra a essa administração =. Peço licença para dizer ao illustre deputado, que os homens que então occupavam o poder nunca olharam para o voto do deputado, nem mesmo nas questões de favor (apoiados); entenderam sempre que a lei que garantia a liberdade de voto, vedava ao governo mover-se por motivos d'elle para se determinar nos actos da administração, que tem leis superiores por que se reger, e não pelos motivos de uma politica assim acanhada. A administração passada nunca olhou para o voto dos deputados, para segundo elle se dirigir nem nos actos de favor, quanto mais nos de justiça (apoiados). Debaixo desta consideração foi-lhe sempre indifferente a guerra injusta, posso hoje dize-lo, que lhe foi feita aqui; foram-lhe indifferentes os repetidos votos de censura com que a quizeram aqui ferir pelos actos por que bem havia merecido do paiz.

Eis-aqui o que tenho a dizer em relação ao, caso sujeito. As outras arguições, que apresentou o illustre deputado, não posso responder, porque são factos recentes da administração actual a que o sr. ministro de certo responderá com os documentos que devem existir em seu poder; sei que havia documentos, e alguns a administração passada mandou ao agente do ministerio publico para, em vista do seu exame, proceder como fosse de justiça. O resultado d'isso não sei, os srs. ministros os apresentarão; refiro-me ás questões do sr. Figanière.

Finalmente, não posso deixar do dizer ao meu illustre amigo, que abriu o debate, que não concordo com as opiniões de s. ex.ª quando disse = que os empregados das secretarias são os peiores conselheiros dos ministros. Eu tive pouco tempo a honra de me sentar n'aquelles logares, e não fiquei com saudades d'elles; mas devo declarar a v. ex.ª e á camara, que encontrei sempre nos empregados dependentes da repartição a meu cargo o mais valioso auxilio, a melhor boa vontade e exacta inteireza na apreciação de todos os assumptos em que careci de ser por elles coadjuvado. (O sr. Ministro da Fazenda: — Apoiado; é exacto.) Este testemunho devo da-lo em abono dos empregados que compunham a repartição que eu dirigi; não tem aqui logar muitos d'elles e por isso entendi que não devia ficar silencioso, muito mais tendo a certeza de que o mesmo que praticavam comigo, hão de praticar com outro qualquer cavalheiro que se sente naquelles logares. (O sr. Ministro da Justiça: — Apoiado.) Não tenho mais nada a dizer.

O sr. Faustino da Gama: — Pedi a palavra quando o sr. ministro da fazenda pareceu desconsiderar a representação que mais de onze mil cidadãos portuguezes e residentes no Rio de Janeiro dirigiram a esta camara, pedindo provi-