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SESSÃO DE 13 DE ABRIL.

Tendo dado uma hora, occupou a cadeira o Sr. Vice-presidente.

Procedeu logo o Sr. Secretario Barão d'Alcobaça e fazer a chamada, e disse que se achavam presentes 28 Dignos Pares, faltando, além dos que ainda não compareceram, os Srs. Marquez de Valença, Condes de Farrobo, de S. Paio, e da Cunha, Visconde de Sá da Bandeira, e Gamboa e Liz, sem motivo conhecido; e Sotto-maior com licença da Camara.

Estando tambem presente o Sr. Ministro da Justiça, declarou o Sr. Vice-Presidente aberta a Sessão.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares, leu a Acta da Sessão precedente que foi approvada sem reclamação.

O Sr. Vice-Presidente: — Tenho a participar á Camara que a Deputação encarregada de appresentar a Sua Magestade a Rainha a Mensagem aqui votada, foi hoje recebida pela mesma Augusta Senhora no Paço das Necessidades, depois do meio dia; preenchidas as cerimonias do estillo, eu dirigi a Sua Magestade o seguinte

DISCURSO.

SENHORA:

«A Camara dos Pares do Reino envia a Vossa Magestade esta Deputação com a seguinte Mensagem.

«A Camara dirige uma respeitosa Mensagem a Sua Magestade a Rainha; rogando-lhe queira ajustar quanto antes o Seu Cazamento, por assim convir, e se fazer mister para a estabilidade do Throno e segurança do Estado.»

Á qual Sua Magestade a Rainha se dignou dar a seguinte

RESPOSTA.

«Dignos Pares do Reino. = Ouvir duas vezes no mesmo dia o voto que acabaes de expressar-Me; excede quasi as forças do Meu magoado Coração.»

«Alguns d'entre vós, que de perto conhecesteis o Nobre e Querido Esposo, que Tive a desventura de perder, sabeis avaliar qual era a illustração do Seu Espirito e a generosa Magnanimidade de suas intenções.»

«Tudo justifica a Minha profunda saudade. Sei porém que os interesses da Nação, e os Meus proprios, que não podem ser diversos, vos conduzem hoje á Minha Presença, e quanto Devo, e Posso responder aos Dignos Pares do Reino, é que Tomo na devida Consideração as suas vozes, e os interesses Nacionaes.»

A Camara ficou inteirada, mandando que a Mensagem e Resposta fossem lançadas na Acta.

O Sr. Vice-Presidente: — Pouco depois a outra Deputação encarregada de appresentar a Sua Magestade a Rainha, o Decreto das Côrtes sobre a dispensa concedida a alguns Estudantes da Universidade e Academias, foi tambem appresentada a Sua Magestade, depositando em Suas Mãos o mencionado Decreto.

A Camara ficou inteirada.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares, leu uma Felicitação assignada pelo Presidente, Vereadores, e Secretario da Camara Municipal de Borba, participando igualmente a sua instalação. — Foi recebida com agrado, e passou ao Archivo.

Tambem deu conta da ultima redacção do Projecto de Lei approvado na ultima Sessão, para a reunião de todos os negocios dos Dominios Ultramarinos em uma só das Secretarias d'Estado. — Achando-se na forma do vencimento, foi approvada, e se mandou remetter á Camara dos Senhores Deputados.

Passando-se á Ordem do Dia, teve a palavra o Sr. Gerardo de S. Paio, na qualidade de Relator da Secção de Legislação; então leu o seguinte

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RELATORIO.

Os Membros da Secção de Legislação, os Dignos Pares Trigozo, S. Paio, Sarmento, Bispo Conde, e Ribeiro, firmes no parecer, que deram em data de 6 de Fevereiro do corrente anno, na Proposição de Lei sobre as bases para a Administração Judicial do Reino de Portugal, e Ilhas adjacentes, discordam d'alguns pontos cardeaes da presente, relativa ao desinvolvimento daquellas: 1.º não approvam, porque o prohibe a Carta, outros Juizes, que não sejam os de Direito, para applicarem a Lei aos julgados de todas e quaesquer causas, assim crimes, como civeis, cujo valôr, o destas ultimas será indeterminado, por motivo da igualdade, que todos os Cidadãos devem ter na presença da Lei, tocando ao que tem pouco o mesmo direito, e regalia, que ao que tem muito, e da mesma maneira indeterminado nas civeis, e penaes, civilmente intentadas; annuem, a que estas possam ser sentenciadas por Juizes arbitros, tão sómente convindo nisso as partes, attento que a referida Carta assim o determinou: 2.º não lhes é possivel admittir para a organisação do processo, Juizes que não sejam letrados, visto demandar este emprêgo, saber e practica do fôro. No mais da Proposição de Lei estão conformes, salvas algumas reflexões, que se appresentarão no andamento da discussão. Palacio das Côrtes 13 de Abril de 1835. = Francisco Manoel Trigoso d'Aragão Morato. = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento. = Roque Ribeiro d'Abranches Castellobranco. = José Joaquim Gerardo de S. Paio, Relator. = Bispo Conde, Fr. Francisco.

Os Membros abaixo assignados, separam-se do Parecer supra-exposto pelas rasões que na discussão farão prementes. = Manoel de Macêdo Pereira Coutinho. = D. Filippe de Souza e Holstein. = Fernando Luiz Pereira de Souza Barradas.

Leu tambem as Substituições offerecidas pela maioria da Secção de Legislação, aos Artigos 1.º e 5.º da Proposição da Camara Electiva: são as que seguem.

Substituição ao Artigo 1.º

Os Juizes de Direito de primeira Instancia instruido, na conformidade do Artigo 3.º Secção 1.º do Decreto de 16 de Maio de 1832, em seus respectivos Julgados, os processos civeis, e crimes de todas as causas, a fim de serem sentenciadas nas audiencias geraes. Exceptuam-se desta regra as Sentenças dadas pelos Juizes arbitros nos termos do Artigo 127 da Carta Constitucional. = Francisco Manoel Trigoso d'Aragão Morato. = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento. = Roque Ribeiro d'Abranches Castellobranco. = José Joaquim Gerardo de S. Paio. = Bispo Conde, Fr. Francisco.

Substituição ao Artigo 5.º

Os Juizes de Direito, na sua ausencia, ou impedimento serão substituidos, para a instrucção do processo, pelos Delegados do Procurador Regio, e este serviço lhes será contemplado quando se fizer promoção para os cargos de Magistratura. Os Delegados do Procurador Regio, quando por esta, ou outras causas, estiverem impedidos, serão substituidos por aquelle Bacharel formado, do logar mais proximo, sendo para isso nomeado pelo Presidente da respectiva Relação. Os mesmos Delegados do Procurador Regio substituirão tambem os Juizes de Direito, no acto das audiencias geraes, observando-se o turno estabelecido no Art. 3.º - = Francisco Manoel Trigoso d'Aragão Morato = Alexandre Thomaz de Moraes Sarmento. = Roque Ribeiro d'Abranches Castello-branco. = José Joaquim Gerardo de S. Paio. = Bispo Conde Fr. Francisco.

Sendo depois tudo remettido á Mesa foi ahi novamente lido pelo Sr. Secretario Barão de Alcobaça, assim como a

Proposição da Camara Electiva sobre o desinvolvimento das Bases Judiciaes, (a que se refere o Relatorio da Secção de Legislação.)

Artigo 1.º Os Juizes de Direito de primeira instancia instruirão, na conformidade do Capitulo 3.º Secção 1.ª do Decreto de 16 de Maio N.º 21, em seus respectivos Julgados, os processos crimes e civeis de todas as Causas que excederem ao valôr de 12$ réis nos bens de raiz, e 24$ réis nos móveis, a fim de serem sentenciados nas audiencias geraes. As Causas que não excederem as sobreditas quantias, serão julgadas por arbitros nomeados directamente pelas partes, ou indirectamente, e á sua revelia, pelos Juizes eleitos.

Art. 2.º Nenhum Juiz de Direito de primeira instancia fará as audiencias geraes do seu Julgado. Os Presidentes das Relações de Lisboa e Porto, e cada um no seu respectivo Districto, distribuirão por turno os Juizes de primeira instancia para o serviço das sobreditas audiencias geraes.

Art. 3.º O turno durará por todo o anno Judicial, comprehendendo assim as tres audiencias geraes de cada um anno. Os Presidentes das Relações, dividindo os seus respectivos Districtos em circulos, que comprehendam de tres até quatro Julgados, farão correr o turno alternadamente entre os Juizes de cada um delles, sem que algum possa ser mandado para fóra do seu respectivo circulo.

Art. 4.º As audiencias geraes serão sempre feitas conforme o disposto no sobredito Decreto de 16 de Maio. Os mezes em que ellas hão de ter logar serão designados pelos Presidentes das Relações como melhor convier aos interesses, e commodidade dos Povos. Se fôr possivel e conveniente formar mais de um circulo de Jurados dentro do mesmo Julgado, a audiencia geral começará na cabeça deste.

Art. 5.º Os Juizes de Direito, nas suas ausencias ou impedimentos, serão substituidos, para a instrucção dos processos, por Juizes que serão eleitos por todo o Julgado por meio de listas triplices. Havendo impedimento em algum Juiz de Direito para ir fazer as audiencias geraes, será para esse caso substituido por outro Juiz de Direito do mesmo circulo, que será designado por turno pelo Presidente da Relação respectiva.

Art. 6.º A disposição do §. 1.º do Artigo 1.º do dito Decreto de 16 de Maio, verificar-se-ha todas as vezes que uma Freguezia não chegar a ter duzentos

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fogos; annexando-se a Freguezia menor á maior dentro do mesmo Conselho, sempre por inteiro.

Art. 7.º As eleições dos Juizes de Paz, e de Juizes eleitos, serão feitas por listas triplices, e no auto da eleição ordenado no §. 1.º do Artigo 19 do citado Decreto, se lançarão igualmente os nomes das duas pessoas que, depois do eleito, obtiveram maior numero de votos, a fim de serem successivamente chamadas a servir, no impedimento do eleito; e este mesmo methodo se observará a respeito dos Juizes electivos substitutos de Juizes de Direito.

Art. 8.º Fica o Governo auctorisado a collocar os Juizes eleitos naquellas partes aonde fôr mais conveniente aos interesses e commodidades dos Povos.

Art. 9.º Terão exercicio nas Relações, que ficam existindo, os Membros e Empregados que foram despachados para as Relações, que não chegaram a instalar-se nos districtos para que haviam sido creadas. Haverá junto a cada uma das Secções em que se acham divididas as Relações, um Procurador Regio.

Art. 10.º Em cada uma das Relações, bem como em cada um dos Julgados, haverá um Contador do Juizo, que levará das partes os emolumentos que por Lei pertenciam aos antigos Contadores, pela contagem dos Feitos, ficando debaixo da immediata inspecção dos respectivos Procuradores Regios, e Delegados, os quaes continuam a exercer as mais funcções que lhes são commettidas pelo sobredito Decreto de 16 de Maio, specialmente pelo §. 1.º do Artigo 267 do mesmo Decreto.

Art. 11.º Fica revogada toda a Legislação em contrario.

Palacio das Côrtes, em 7 de Abril de 1835. = Antonio Camello Fortes de Pina, Vice-Presidente. = Francisco Xavier Soares de Azevedo Deputado Secretario. = João Alexandrino de Souza Queiroga, Deputado Secretario

Terminadas estas leituras, disse

O Sr. Vice-Presidente: — Esta Camara approvou um Projecto, que hoje está reduzido a Lei, sobre as Bases da administração judicial: já se vê que quem falla em bases suppoem a necessidade de um desinvolvimento; é este o objecto da Proposição que acaba de ler-se. Ora como as bases são differentes os desinvolvimentos differentes serão: por isso não me parece conveniente discutir-se esta questão na sua generalidade, mas sim Artigo por Artigo, porque é necessario entrar em diversas species que não tem entre si connexão alguma. — A Camara o decidirá.

O Sr. Conde de Linhares: — Como se disse que se dispensasse a este Projecto a sua discussão em geral, parece-me que passar já a discutilo por Artigos não é muito proprio, embora se admitta á discussão, uma vez que elle é necessario; porém tambem é util que as decisões não vão de galope. Nós estamos promptos a discutir as Leis, porém com tempo: tinha-se estabelecido que as Leis se discutissem em geral, e quanto a esta parecia-me isso de muita utilidade, para assim ouvirmos algumas observações dos Senhores Ministros da Corôa sobre o Parecer que a Commissão appresenta, ao qual poderão responder satisfatoriamente; e assim me parece melhor observar o que outro dia se determinou.

O Sr. Vice-Presidente: — Não me lembra que se determinasse cousa alguma a similhante respeito, e menos que este objecto fosse dado para ordem do dia na sua generalidade.

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Eu tambem não estou lembrado de que V. Ex.ª désse para hoje a discussão na sua genialidade; o que se disse simplesmente é que hoje seria discutido o Projecto, e até me parece que não podia ser outra cousa, porque este parecer não é sobre a generalidade, e assim foi que eu o intendi: não me opponho de maneira alguma a que fique addiado; mas só me levantei para dizer que o Governo pediu a urgencia desta Proposição, e que a generalidade da discussão se reduz a que podem ter todos os Artigos.

O Sr. Ministro da Justiça: — Eu não posso deixar de apoiar as ideas de V. Ex.ª, e o que acaba de dizer o Sr. Gerardo de Sampaio, porque realmente a generalidade da Proposição está em todas as bases de que ella se compõem; e por isso sem perder tempo, se poderia entrar já na discussão de cada um dos Artigos: entretanto se se intender que não póde prescindir-se dessa formalidade, não me opponho á discussão em geral, uma vez que depois se discutam os mesmos Artigos um a um. — É preciso que a Camara se lembre de que esta Proposição urge, e que por maiores diligencias que o Governo faça para montar a administração judicial, serão ellas baldadas se não se attender a esta Proposição; todos os Dignos Pares conhecem a importancia da materia, e quanto convém que ella fique decidida brevemente.

O Sr. Souza e Holstein: — Não tenho a menor idéa de que este Projecto fosse dado para Ordem do) dia na sua generalidade; e quando assim acontece, intende-se que deve haver discussão em geral se a Camara quizer; entretanto peço que se leia a Acta a ver o que se determinou a este respeito.

O Sr. Conde de Linhares: — Póde ser que eu esteja enganado, porém tenho uma idéa de que o nosso Regimento determina, que admittido qualquer Projecto seja discutido na sua generalidade, e no dia seguinte discutido por Artigos: póde ser que daqui procedesse o seu engano; entretanto parece-me que uma vez que a Commissão appresenta duvidas, devemos ter ao menos vinte e quatro horas para meditar sobre ellas, e para ouvir as observações do Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Vice-Presidente: — O nosso Regimento não diz nada a este respeito: a Camara ou discute os Projectos na sua generalidade ou por Artigos, conforme julga ser conveniente; por tanto está a Camara na sua liberdade de dizer que este se discuta na sua generalidade, ou Artigo por Artigo.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Eu julgo que é muito difficil, e até impossivel, discutir este Projecto na sua generalidade, porque esta discussão hade divagar por cada um dos Artigos, pois que uns delles não tem connexão com os outros; e assim o que resultaria era haver duas discussões em geral sobre o mesmo objecto; isto longe de ser um mal póde ser um bem, mas neste momento talvez fosse prejudicial, porque se approxima o termo de encerrar-se a Camara.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu parte da Acta da Sessão em que fôra dado para Ordem do dia o assumpto controvertido. — Tendo depois a palavra, disse

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O Sr. Conde de Linhares: — Outro dia tomou-se uma resolução de que a Acta não faz menção; isto é, que se discutiria não o Parecer da Commissão, mas a Proposição de Lei; e neste parte está a Acta pouco exacta. — É um uso Parlamentar que nenhuma Proposição de Lei passe sem tres leituras, das quaes a terceira é quando se discute na sua generalidade; e é isto mesmo o que se tem seguido nesta Camara.

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Sendo o fim do Digno Par que se discuta em geral a Proposição de Lei que veiu da outra Camara, levanto-me simplesmente para observar que se se tractasse de discutir o Parecer da Commissão, não haveria nisso impossibilidade; mas tractando de discutir-se a Proposição de Lei, é obra que só póde conseguir-se por meio de uma discussão parcial.

Não se fazendo outra reflexão sobre a questão incidente, propôz o Sr. Vice-Presidente se a Proposição da Camara Electiva seria discutida na sua generalidade, e se decidiu negativamente,

Passando-se por tanto á discussão do Artigo 1.º, conjunctamente com a substituição offerecida pela maioria da Secção de Legislação, obteve logo a palavra, e disse

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Sr. Presidente, a Secção de Justiça e Legislação está perfeitamente penetrada das rasões da necessidade, em que estamos de organisar uma Lei, que remedeie a confusão, e preplexidade, em que actualmente se acha a Administração de Justiça; todavia, conhecendo esta desagradavel posição, não póde com dignidade convir com a generalidade da Proposição de Lei, que se lhe offerece; pois que além das rasões de incoherencia, em que incorreria, se a approvasse; por ella é impossivel o conseguir-se o fim, a que nos propomos; debaixo destes rasoaveis principios offerece a Secção o seu Parecer (fallo da maioria da mesma) e é o seguinte. = Primeiramente tracta-se naquella Proporção de estabelecer valor nas causas assim civeis como crimes, julgaram os Membros da Secção, que votaram comigo, que havia uma impossibilidade de o determinar nas segundas, não só porque sendo este destinado para marcar alçada; nos crimes, de que fallo, não é elle quem a designa, sim a naturesa do crime mais ou menos grave; mas tambem porque nas sobreditas só se póde liquidar a quantia depois da sentença definitiva condemnar, ou deixar de condemnar em custas, perdas e damnos; e então, fazendo a Secção de Legislação e Justiça o verdadeiro juizo da aptidão do auctor da Proposição, ficou plenamente capacitada de que não podia deixar de haver aqui alguma falta de redacção. — Estabelece igualmente o valor nas causas civel, em bens moveis, de 24$ réis, e nos de raiz, de 12$ réis, e pareceu aos Membros da Secção, que votaram comigo, que este valor era nimiamente excessivo, e por isso devia ser menor, porque só assim seria a Lei, quanto possivel, igual para todos; mais claro — a um pobre deve competir o mesmo recurso, que a um opulento, visto que para aquelle e muito, o que para este é pouco; se aquella alçada é mais nobre, e tem a seu favor a opinião de mais exacta, deve tocar a ambos nas suas diversas situações, e guardada a devida proporção.

Agora tractando dos Juizes arbitros, a maioria dos Membros da Secção está convencida, de que as causas, não prevalecendo o juiso de conciliação, só devem na generalidade, segundo a Carta, ser decididas pelos Juizes de Direito, e que aquelles Juizes arbitros, segundo o Artigo 127 da mencionada, só podem ter logar nas civeis, e nas penaes civilmente intentadas, se as partes accordarem entre si em os nomear para esse fim; sendo delles as sentenças executadas sem recurso se tambem ellas assim convencionarem; não podendo tambem ser approvado o Artigo 1.º nesta parte, quando os determina taxativamente para decidirem as causas, que não excederem as sobreditas quantias; e assim offerece para substituir esta lacuna, que ficaria na Proposição de Lei, a substituição, que já foi lida com a dita Proposição.

O Sr. Vice-Presidente: — A Camara conhece qual é o objecto do Artigo, e da emenda: a Secção de Legislação affastou-se em duas cousas da Proposição principal; a primeira intendendo que os processos não podiam ser instruidos senão por Juizes de Direito, e a segunda não admittindo Juizes arbitros necessarios, porque a Carta os suppoem sómente voluntarios, e para a decisão de certas causas.

O Sr. Ministro da Justiça: — Vejo que as principaes objecções contra este Artigo 1.º se reduzam á intervenção, que se diz forçada, dos Juizes arbitros, e á fixação das alçadas: mas antes de produzir algumas rasões a favor do mesmo Artigo, cumpre que eu aqui repita o que tive a honra de dizer na Commissão; isto é, que por um erro de redacção se falla no Artigo em Juizes eleitos, quando se devera dizer pedaneos, e que a alçada designada o é sómente em referencia ás causas civeis.

A objecção mais essencial (a que appresenta ao menos algum aspecto apparentemente bem fundado) é a que provém da idea de que a Carta não admitte Juizes arbitros senão voluntariamente, em quinto que a Proposição em discussão actualmente, os vem a admittir não só voluntarios, mas tambem forçados. — Eu já declarei (e aqui novamente o declaro) que o Governo quando propôz este methodo teve em vista sahir das difficuldades em que se achava para combinar os principios de economia com os outros consignados na Carta. A intenção do Governo, e a da maioria das Camaras, havia sido que a instrucção, e mais actos do processo não fossem comettidos senão aos Juizes de Direito, com exclusão dos Ordinarios; entretanto havia um embaraço para o cumprimento dessa intenção, e era que o Governo se não achava auctorisado para poder nomear mais de cento e trinta e cinco Juizes de Direito. Ora estes Juizes ficariam em distancias taes, que os Povos soffreriam grande incommodo se tivessem de recorrer ás cabeças de julgados, principalmente em causas de pouca monta: assim querendo eliminar toda a idea de que houvesse um Juiz eleito com auctoridade de julgar, o que (como disse) era contrario á opinião do Corpo Legislativo, intendeu o Governo que lançando mão de um Juiz que não era excluido pela Carta, obteria a commodidade dos Povos, entregando-lhe o decidir estas pequenas causas, sem comtudo offender a mesma Carta; então lembrou-lhe designar os Juizes arbitros: e para isso, está visto que lhes suppoz a condição, não só de serem nomeados a aprazimento das partes, como determina a Carta, mas que os consi-

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derou de alguma fórma como fazendo parte da administração judicial. Não são estes Juizes rigorosamente aquelles que a Carta determina, mas não obstante intendeu o Governo que da maneira porque no Projecto se acham estabelecidos, a mesma Carta os não exclue: além de que, são elles reconhecidos pela Legislação patria, e já se acha marcada a marcha que tem a seguir nesta qualidade de processos. — Por consequencia pareceu ao Governo que não sendo estes Juizes os Ordinarios, excluidos na Lei, podia empregalos na administração da justiça, poupando incommodo aos Povos, e maiores despezas ao Estado. — É o que por ora me lembra dizer sobre o Artigo 1.º

O Sr. Conde da Taipa: — Tomara que os Senhores Jurisconsultos me dissessem como intendem estes Juizes arbitros; e se as causas hãode forçosamente ser decididas pelas pessoas escolhidas pelas partes.

O Sr. Ministro da Justiça: — Sim, Senhor, até á quantia de 12$ mil réis.

O Sr. Conde da Taipa: — Parecia-me muito mais coherente sendo pelos Juizes eleitos. — Aqui estamos outra vez, com a mesma duvida com que estivemos no discussão das bases Judiciarias; isto é, levantar testemunhos á Carta, affirmando que ella diz que todos os Juizes hão de ser nomeados pelo Rei; mas isto refere-se ao que julga, e não ao que prepara o julgado. Mas diz-se, que estes julgam nas causas de 12 até 24$ rs.; porém esta medida é pela Lei da, necessidade, e porque sem ella era impossivel poder andar a Administração da Justiça; ora agora qual será melhor para os Povos, que se nomeiem (para manter a integridade do dogma) como dizemos Senhores do lado contrario, e querem que isto se supra por 900 Juizes de Direito. — Não ha ninguem mais cioso da sua liberdade do que é o Povo Inglez, e tudo quer dicidido por arbitros e jurados: mas redargue-se que para isto se formar á Ingleza será necessario convocar uma Povoação toda; e então se o que commette um crime pequeno, uma falta etc. é julgado pelo Juiz de Policia Correccional, sejam tambem as causas de pequena monta julgadas por esses mesmos Magistrados. E então qual é a rasão porque se não ha de admittir o que se propõem? Ora em quanto a estes Juizes de Direito ha entre elles muita gente de boa fé, mas ha outros que a não temi nem todos são capazes de perder aquelles prejuizos profissionaes, e intendem que não ha ninguem que tenha habilidade para julgar uma causa de 10$ rs., senão um Jurisconsulto ou Advogado; porém eu estou persuadido de que ha muita gente capaz disso, e acho mesmo que hão da ser muito bem julgadas causas; tão bem como se o fossem por um Dezembargador; e tanto mais se se attender a que todas estas questões são faceis, pois muito rara será a causa de 12$ rs. que seja difficultosa.

Tractando agora de outra questão direi, que se nós os deste lado da Camara quizessemos fazer uma opposição facciosa ao Governo, impugnariamos esta Lei, mas para provermos o contrario do que se tem avançado, nós votâmos por ella; e espero que os Srs. Ministros vendo mesmo agora (isto é, na Semana Santa) que a opposição não é systematica, tenham ao menos a franqueia de confessar que alguma vez temos boa fé. (Riso.) — Digo pois que esta Lei é muito necessaria, por ser necessario tirar a justiça do cahos em que ella está.

Aproveitarei esta occasião para dizer ao Sr. Ministro da Justiça, que é preciso tomar muito cuidado com os seus empregados, e diligenciar que o não sejam pessoas que o não devem ser. Talvez que o que vou dizer, seja devido ao influxo do tempo; mas é preciso dar-lhe remedio. — Em certa Villa houve ainda ha pouco um homem, que tendo sido nomeado Juiz, só por ter dinheiro sahiu em Correição pelas Camaras, e a uma que não tinha senão 50$ rs. de renda, e por isso não podia pagar, ficou-lhe com os Livros. É preciso não offender assim a moralidade publica. — Este homem anda por ahi e tem patronos que o fazem esperar ser despachado Juiz de Direito. É necessario que se resista a tal nomeação, nem eu digo que o Sr. Ministro das Justiças tenha tenção de para lá o mandar outra vez, até porque ninguem seria capaz de o mandar para a terra donde elle veiu. — Eu sei o facto que citei com toda a certeza; e com individuos taes é preciso o maior cuidado. — Entretanto eu voto pela Lei, porque é muito necessario que se estabeleça uma Administração de Justiça, que nos tire desta coalisão em que estamos de Juizes de Direito, com Corregedores e Juizes de Fóra, para sahirmos de tantas difficuldades como aquellas em que hoje está o Povo Portuguez, e haver uma marcha conhecida e seguida. Eu não acho a Lei muito boa, mas ao menos tem algumas vantagens sobre aquella que actualmente existe; ao menos já teremos uma marcha certa, o que até aqui não havia; cada um julga como quer, ha uma arbitrariedade immensa, e com a má escolha que houve no pessoal da Administração Judicial, tem havido innumeraveis arbitrariedades, de que muito e com muita rasão se queixão os Povos. Por tanto parece-me que se deve votar a Lei, e depois concertala de alguma maneira, quando houver tempo para isso; mas para já é necessario que isto se approve.

O Sr. Sarmento: — Talvez que nem todas as rasões, que ha sobre este objecto, se possam agora appresentar, porque vejo que é o influxo do tempo...

O Sr. Conde da Taipa, (interrompendo o Orador): — Eu não disse que era pelo influxo do tempo, lembrando-me de applicar essa idéa a algum dos Membros da Commissão.

O Sr. Sarmento, (proseguindo): — Eu ía fazer um cumprimento ao Digno Par, quando fui interrompido, fundado naquelles principios, que naturalmente nascem do commercio do homem: quanto ao muito que haveria a produzir sobre a materia, está exposto com toda a clareza pelo meu Collega, o Digno Par Relator da Secção de Legislação; por isso farei breves reflexões.

A questão é muito simples, e consiste em saber se a Carta admitte esses Juizes eleitos, e quanto aos arbitros, se ella os admitte, para o effeito, que elles são destinados no Projecto da Camara Electiva. — Pelo que pertence ao primeiro ponto, já o meu Collega, o Digno Par Relator da Secção de Legislação preveniu as minhas idéas: direi alguma cousa sobre o segundo principalmente. — A Carta admittindo os Juizes arbitros (nem podia deixar de o fazer, porque elles dependem unicamente da vontade dos litigantes) não podia deixar de considerar a sua utilidade, pa-

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ra tudo; porque quando qualquer confia da probidade, dos conhecimentos, e da auctoridade dos outros, para decidir uma questão, não é possivel que as Leis civís, obstassem a uma cousa, que tem por base a liberdade moral; mas o Projecto tal qual se acha, tende a coarctar a extenção da auctoridade destes Juizes, quando, como disse, a Carta os estabeleceu, para tudo. Eis aqui a incoherencia, que salta aos olhos, e em que a maioria da Secção de Legislação não pôde convir.

Eu pediria a um Digno Par que nos não chame Desembargadores, porque nos poria em termos de sermos apedrejados. (Riso). Julgou-se em Portugal, que a antiga Administração publica era uma cousa muito má; mas ella estava nas mãos de todas as auctoridades estabelecidas, ao mesmo tempo que a ira pelos abusos que d'ahi provinham cahiu sómente sobre os empregados da ordem judicial: isto me faz lembrar a fabula dos animaes atacados pela peste; os quaes tendo feito um conselho, sobre o meio de aplacar os Deuses, e sendo ouvidas, todos confessaram enormes crimes, mortes, e devorações, porém allegaram privilegios, para os commetter; o Leão, e os mais fortes recorreram á immunidade que lhes dera a sua jerarchia, e força: portanto ficou alentado que a colera dos Deuses provinha da destruição feita em uma horta por um burro faminto, que fôra o animal mais fraco, que assistiu ao tal conselho. — Elle teve de pagar pelos seus crimes, e pelas atrocidades dos outros. A justiça exige, que se não attribuam a uma classe inteira os defeitos, que tem tido um, ou outro de seus membros.... Os togados que entram na Secção de Legislação tem a maior franqueza, e ao mesmo tempo a coragem necessaria, para apoiar o Governo, quando acham que elle tem rasão, assim como para o não apoiarem, quando o contrario intendem. Nem seria mesmo decente, não tendo medo de causa alguma, que devesse fazelos mudar de opinião, o sustentarem hoje principios de Administração judiciaes diversos daquelles, que ainda ha poucos dias tinham appresentado. Temos muito gosto, eu o repito, em apoiar o Governo, sempre que as suas Propostas forem conformes á rasão, e á Carta. — E se alguem se lembra de que estando a findar a Sessão actual, é por isso necessario lançar mão deste meio extraordinario, ou mesmo incoherente, lembrar-lhe-hei tambem, que não é mister recorrer áquelles, quando temos os ordinarios: o Governo póde fazer com que o Poder Moderador conserve as Camaras abertas por mais uma semana. (Apoiado. Apoiado.)

Eu não tenho conhecimento do modo porque se calcularam as alçadas estabelecidas na Camara dos Senhores Deputados; entretanto lembrarei aos Dignos Pares, que n'um paiz onde o dinheiro tem diverso valôr, que em Portugal, pelas muitas riquezas que alli ha, a maior alçada que se conhece em Inglaterra nos Juizos, para cobrança de pequenas dividas consiste até poucos shillings. E deveremos nós introduzir no Projecto a alçada de vinte e quatro mil réis para estes novos Juizes, quando haverá homens, que tenham de intentar uma causa, e cujo rendimento liquido apurado no fim do anno talvez que a tanto não chegue? Esta e outras species fazem com que a alçada de que se tracta não seja de tão pequena monta, em relação não só ás circumstancias dos Juizes, mas igualmente das partes litigantes. Além de que, estes julgados de primeira instancia não terão a extensão que tinham as nossas antigas Comarcas, porque estou persuadido, que eram maiores que estes novos districtos, e assim mesmo em todas havia avocatorias requeridas para os Corregedores, querendo os litigantes antes os incommodos de irem longe, do que terem os seus pleitos, por mais inconsideraveis que elles fossem, decididos por Juizes em que não tinham confiança.

Concluo que as rasões de conveniencia poderão ás vezes fazer com que se calem as vozes da Justiça, mas nunca deveremos consentir, que por aquellas a Carta fique em silencio: o estado da Nação talvez que exija esta, ou outra medida justificada por alguma rasão speciosa, mas nunca porque da Lei fundamental se siga similhante conclusão; e é este o motivo porque voto contra a Proposição da Camara Electiva, tal qual alli foi exarada.

O Sr. Conde da Taipa: — Eu não ataquei a integridade dos Desembargadores; e o Digno Par tomando a nuvem por Juno, deu-me um castigo que lhe não merecia. Eu disse que a opposição que se fazia a estes Juizes eleitos era um prejuizo profissional; taes preconceitos existem em todas as profissões, e tem feito muito mal; até nas Classes mercatorias havia este prejuizo, por quanto era necessario dar quatro annos para saber medir uma vara ou um covado de pano: ora isto era certamente um verdadeiro prejuizo profissional, porque não ha ninguem que não saiba medir bem uma vara de fazenda; porém isto agora acabou-se. — Acho muito bom o Artigo porque em uma causa da specie daquellas que citou o Digno Par, por exemplo a de um criado a quem o amo não pagou, chama-o perante o Juiz, e elle prova que pagou ou não. Nada mais facil que uma solução destas. — E como aliàs poderá Portugal pagar a novecentos Juizes de Direito que tantos havia no Reino entre Juizes de Fóra e Ordinarios? Como sé póde agora com cento e trinta fazer o mesmo que com aquelles todos se fazia? Não é possivel. Creio por tanto que o methodo proposto deve ser adoptado, porque de duas cousas inconvenientes se deve escolher aquella que menos pareça ter.

O Sr. Souza e Holstein: — Sobre a Ordem. — Parece-me que toda esta discussão a respeito de Juizes electivos, de Desembargadores e de não Desembargadores, é inteiramente fóra de proposito. Neste Artigo 1.º falla-se de Juizes eleitos, que são cousa diversa dos Pedaneos, mas é preciso declarar que se devem intender que são estes, como na Commissão o declarou o Sr. Ministro da Justiça, os quaes não servem senão para nomear os Juizes arbitros, e é esta a unica ingerencia que o presente Artigo lhes dá; em consequencia a questão de Juizes Ordinarios desappareceu, e a discussão se deve restringir ao merecimento do mesmo Artigo. — Desde já peço palavra para fallar depois do Sr. Barradas.

O Sr. Ministro da Justiça: — Levanto-me para confirmar o que acaba de dizer o Digno Par; isto é, que os Juizes eleitos de que tracta o Artigo são os Juizes Pedaneos; lançando-se mão delles para tirar o odioso que poderia resultar de adoptar outros; odioso que muitas vezes está mais no nome do que

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na cousa. Seria facil emendar a relacção neste sentido, mas isso mesmo fora objecto de fazer voltar a Lei á outra Camara, o que não convém pela demora. Com esta explicação parece-me ficarem satisfeitos os escrupulos dos Dignos Pares a quem a denominação adoptada no Artigo fizesse alguma duvida.

O Sr. Barradas: — A mim parece-me que a primeira questão que temos a decidir é outra. Se tractarmos da bondade da Lei, eu sou o primeiro a reconhecer que ella tem defeitos, e que é necessario uma emenda, tanto nesta como na outra: mas a nossa questão, e, se na colisão em que estamos devemos abraçar dos dois males o menor; se abraçamos a Lei abraçamos um mal, mas um mal menor que póde remediar-se depois, e ministramos com a experiencia os auxilios necessarios, para se poder obter a possivel perfeição: se a não abraçamos teremos males irremediaveis, no estado em que a administração da justiça se acha; parecia-me portanto que se tiravam todas as duvidas se V. Ex.ª propozesse; se nas actuaes circumstancias convém que, se deixe a administração da justiça no estado em que se acha ou que se adopte provisoriamente esta Lei, posto que imperfeita, visto que o tempo não permitte dar-se agora outra alguma providencia. (Apoiado.)

O Sr. Souza e Holstein: — Como, na qualidade de Membro da Secção de Legislação que tenho a honra de ser, assignei uma declaração de voto em separado da sua maioria, vejo-me na necessidade de expôr os motivos que me levaram a esse procedimento: mas antes disso, fallarei ácerca do Artigo 1.º da Proposição que se discute.

Este Artigo foi objecto de graves duvidas na Secção; eu mesmo me vi muito embaraçado, por me parecer não sómente que a sua doctrina não era admissivel, mas até por não intender algumas das suas proposições: porem logo que o Sr. Ministro da Justiça, appresentando-se na Secção ahi deu alguns esclarecimentos, mudei de opinião, e votei pelo referido Artigo, ainda que não acho boa a sua redacção. — Agora direi quaes foram as minhas duvidas. A primeira era relativamente ás alçadas, não intendendo eu, nem nenhum dos Membros da Secção, como ellas podiam ter logar a respeito das causas crimes; porém o Sr. Ministro explicou, que essas alçadas se intendiam sómente para as causas civeis, que as crimes, em todo o caso deviam ser julgadas pelos Juizes de Direito: — e assim desapareceu esta primeira duvida, que era para mim de grande importancia. — Quanto á segunda, intendi eu e a Secção que os Juizes eleitos deviam intervir algumas vezes nas causas, mas isto parecia incoherente com aquillo para que a Proposição os designava; entretanto declarou o Sr. Ministro, que estes Juizes eram os Pedaneos (e não os eleitos) e que não teriam outras attribuições nas pequenas causas, além de escolherem os arbitros á revelia das partes. — Com estas duas explicações ficaram removidas as duvidas que a principio me tinham causado embaraço, e por isso agora voto pela doctrina do Artigo 1.º; não que ella me satisfaça completamente, mas porque as rasões da maioria da Secção de Legislação contra ella, me não parecem bem fundadas.

Diz a maioria que = o estabelecer-se o valôr das cousas, é contra o principio da igualdade Constitucional. = Não vejo como: se na Proposição se determinasse que diversas causas da mesma natureza fossem julgadas umas de certa maneira, outras de outra, então não haveria igualdade perante a Lei; mas não é isso o que alli se diz, e pelo contrario se determina o mesmo Juizo para as mesmas causas; logo não é bem fundada esta duvida da maioria. — Quanto aos arbitros, diz que a Carta os reconhece mas inteiramente voluntarios, em quanto que o Artigo os estabelece necessarios, afastando-se assim da mesma Carta, e sendo tal disposição por isso anti-constitucional. Tenho a responder, que a Carta permitte que as causas possam ser julgadas por arbitros, mas não prohibe que as Camaras Legislativas, determinem que a intervenção dos mesmos arbitros seja obrigatoria: ora eis aqui o que faz a Proposição; além de que, devo observar que provavelmente poucos serão os casos em que seja necessario recorrer aos Juizes Pedaneos para nomear os arbitros, e que, por consequencia, de facto estes Juizes serão quasi sempre voluntarios, hypothese em que a maioria os admitte.

Portanto parece-me que o Artigo não é contrario á Carta; e declaro votar por elle, não porque seja o melhor, mas porque nas circumstancias actuaes é o de que melhor se póde o Governo servir. Quanto á redacção não me parece boa, e se o tempo o permittisse eu lhe offereceria uma substituição, mas a urgencia da Lei que me dispensa disso, não póde dispensar-me de pedir que se emende a palavra eleitos, para a de pedaneos, porque de contrario póde sobrevir alguma confusão.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu desejo unicamente provar á Camara que a nomeação dos Juizes arbitros não e contraria á Carta, antes pelo contrario diz ella no Artigo 127 (leu); e no Artigo 118 diz mais (leu). Em consequencia podemos nomear Juizes arbitros sendo nos casos em que os Codigos Civil e Criminal o determinam; e assim não vejo que a esta nomeação se opponha á Carta. — Era a unica observação que tinha a fazer antes de se votar; propondo-se em todo o caso o Artigo, salva a redacção.

Julgada a materia sufficientemente discutida, requereu o Sr. Marquez de Ponte de Lima que a votação fosse nominal; assim o resolveu a Camara.

Passando-se logo a votar, sobre a approvação do Artigo 1.º da Proposição da Camara Electiva, disseram approvo

Os Senhores Duque de Palmella,

da Terceira,

Marquez de Fronteira,

de Loulé,

de Ponte de Lima,

de Santa Iria,

de Ficalho,

de S. Paio,

Conde de Villa Real,

da Taipa,

de Paraty,

de Linhares,

Visconde da Serra do Pilar,

Barão d'Alcobaça,

Souza e Holstein,

Margiochi,

(P.)

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Barradas,

Gyrão,

Braamcamp,

Macedo;

e disseram rejeito

Os Senhores Trigoso,

Bispo Conde,

Conde de Lumiares,

Mello Breyner,

Gerardo de S. Paio,

Ribeiro d'Abranches,

Sarmento.

Resultando ficar o Artigo approvado por 20 votos contra 7, e prejudicada a Substituição que lhe offerecera a maioria da Secção de Legislação.

Foram depois lidos, e successivamente approvados sem discussão, os Artigos 2.º, 3.º, e 4.º

Progredindo a discussão foram conjunctamente objecto do debate o Artigo 5.º da Proposição da Camara dos Senhores Deputados e a Substituição da maioria da Secção de Legislação. — Sobre os quaes pediu a palavra o disse

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Torno a repetir coherente, e firme com as idéas, que a este respeito tive a honra de expender no meu discurso, quando se tractou das Bases judiciaes na Sessão de 13 de Fevereiro, as quaes se acham sanccionadas, que não podemos approvar a materia em questão, por ser inteiramente contraria á Carta Constitucional da Monarchia Portugueza desde o Artigo 118 até 129, aonde para decidir as causas não são admittidos outros Juizes, que não sejam os de Direito, Jurados, Juizes de Paz, e arbitros, quando, fallando só destes, as partes nisso convierem; da mesma sorte por ser opposta ao bem estar dos Povos, o que já de antiga experiencia, isto é, desde 1317 até 1521, que é o mesmo que dizer desde o reinado do Sr. D. Affonso 4.º, até ao do Sr. D. Manuel, claramente se sabe, encontrando-se então, e mesmo nas providencias da Legislação dos nossos tempos, provas nada equivocas da sua ignorancia, e parcialidade, entorpecendo assim toda a marcha da justiça. Ora se como taes os julgâmos, e continuâmos a julgar para decidir o direito das partes, que não diremos a respeito da instrucção dos processos, que reputâmos tanto, ou mais dificultosa, que a sciencia de julgar? Isto procede ainda na presença da Legislação antiga, e muito mais procederá á face da moderna, em que a boa, e conscienciosa decisão dos Jurados está toda dependente da clara, e exacta organisação dos autos: estas, Senhores, eram as idéas, de que o Governo, quando se discutiram as bases judiciaes, estava cabalmente possuido, chegando a ponto de dizer, respondendo a algumas duvidas que se lhe opposeram fundadas no augmento das despezas, que para não atacar nossas finanças, se fazia cargo d'appresentar por instructores dos processos os Juizes, que nos mesmos não houvessem de dar as suas sentenças; isto é, que o Juiz da sentença não seria o do processo, e o deste não seria o da sentença; sendo assim muito para deplorar que sobre aquellas bases a actual Administração queira erguer um edificio de materia a ellas opposta. Nada convence o dizer-se que assim o demanda a imperiosa Lei da necessidade, porque o remedio, que se offerece não é o unico, temos aquelle, que apontei, e outros, que se me forem exigidos, os apontarei com os quaes podêmos chegar ao fim, a que aspirâmos, caminhando coherentes com nossas idéas, e decisões; e a final permitta-se-me que diga, que seja qual fôr a deliberação a este respeito, a materia, que se appresenta, e que se quer defender, dá logar a que se tire esta conclusão, a saber: = ou as bases judiciaes foram mal lançadas, ou o edificio, que se pertende levantar, não quadrando com ellas, é sério, e mal pensado.

O Sr. Sarmento: — Parece que o Digno Par deu todas as rasões, em que se funda o Parecer da Secção de Legislação, para emendar a Proposta da Camara Electiva, e alli appresentada pelo Sr. Ministro da Justiça. — No estado actual das opiniões, até nisto ha uma certa conveniencia, para mostrar que a auctoridade Real está mais apoiada nesta Camara do que no Ministerio mesmo, porque o Ministerio, neste caso, appella para o poder popular por meio das eleições, que são necessarias em virtude do Projecto, e esta Camara quer que estas auctoridades sejam de nomeação Real, como lhe cumpre, em vista da sua naturesa.

Mas, além disto, a maioria da Secção de Legislação julgou o caso tambem pelo spirito da Carta, e pela utilidade publica. Uma das rasões porque esses Juizes tem mais propriedade para o serviço Nacional, sendo escolhidos pela auctoridade Real, é que assim são responsaveis por seus actos, o que não póde ter logar tão rigorosamente, quando sejam eleitos por intervenção popular. — É o mesmo que os depositarios dos dinheiros publicos nomeados pelas antigas Camaras do Reino; abusavam ás vezes dessa commissão; e quando o Governo os pertendia castigar, lembrava que elles tinham sido nomeados, e servido aquelles empregos involuntariamente. Isto causará embaraços no andamento da administração judicial; e por tanto esta Lei deve ser feita de maneira tal, que sobrevenham as menos difficuldades possiveis. A responsabilidade nunca será exigida devidamente, senão em quanto as auctoridades forem nomeadas pelo Poder Executivo. — São estas, em summa, as rasões, porque alguns dos Membros da Commissão se apartaram da Proposta da Camara dos Senhores Deputados, e da opinião do Sr. Ministro da Justiça. Não tenho mais observações a fazer, nem as julgo precisas, porque me parece que a questão está bastantemente elucidada, e que póde pôr-se á votação.

O Sr. Ministro da Justiça: — Direi poucas palavras para justificar as minhas intenções, e mesmo as da Camara Electiva em quanto approvou a Proposta em discussão. — Quando o Governo appresentou naquella Camara o Projecto das Bases judiciaes, e o do desinvolvimento dellas, intendeu que fazia um serviço, concorrendo para que esses objectos fossem decididos o mais de pressa possivel; por quanto o tractar uma Lei completa a este respeito seria assumpto de gravissimos debates; por isso appresentou este Projecto, que contém aquillo que lhe pareceu mais attendivel, e indispensavel para montar a administração judicial, entretanto não teve a vaidade de se persuadir que estas bases eram as melhores (o que desde logo confessou francamente); mas attendendo ás nossas circumstancias, era o mais que podia por agora fazer-se, o fim de pôr em inteira execução o Decreto de 16 de Maio de 1832. — Assim tenho res-

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pondido ao que se tem dito contra o merecimento do Projecto.

Quanto ao Artigo que está em discussão, devo dizer que elle era um daquelles que dá ao Governo o meio de substituir os Juizes de Direito, tanto nos casos ordinarios como extraordinarios, isto é, nas épochas das audiencias geraes, e em outros impedimentos. Segundo o Decreto de 16 de Maio de 1832, deviam estas substituições ser feitas pelos Advogados dos respectivos auditorios: mas o Governo teve alguma duvida no modo practico dessa disposição, pois até havia quem dissesse que fôra violencia obrigar os Advogados a entrar em despezas de transitos para o sitio onde deviam derigir-se a fazer as audiencias geraes, além de outros incommodos que disso lhes resultaria: por essa occasião lembrou um Membro da Camara dos Deputados, que tambem aconteceria haver julgados onde se não deparasse um só Advogado. Com effeito esta idéa surprehendeu toda a Assembléa; e não podendo encontrar-se modo de a obviar, se me encarregou que na seguinte Sessão appresentasse eu algum meio que desviasse tal inconveniente. Tractando disso não me escapou a lembrança dos Dignos Pares da Secção de Legislação, para que a substituição fosse preenchida pelo Delegado do Procurador Regio do Districto, ou por um Bacharel do Julgado proximo; mas nenhum destes dous arbitros é conveniente; não o primeiro, porque haveria muitas causas em que elle fosse parte, e por tanto não podesse ser Juiz; não o segundo, porque seria o cumulo da injustiça obrigar um homem a servir gratuitamente, (por isso que não estamos em circumstancias de fazer maiores despezas, caso em que todas as difficuldades se applanavam, mas o nosso fim é que o serviço se faça sem gravar o Estado). Accresce que algumas vezes o Bacharel estaria impedido, e que isto causaria uma especie de interregno judicial, que podia trazer graves inconvenientes, por não haver quem administrasse a justiça.

Na presença destas considerações intendi que fazendo recahir aquellas substituições nos Juizes de Paz da cabeça do Julgado (nos quaes se deve suppôr certa aptidão necessaria para o desempenho desse encargo) teriamos sahido do embaraço; e nesta conformidade appresentei uma emenda na Camara Electiva; esta idéa foi alli bastantemente seguida, mas houve quem lembrasse outro inconveniente, e vinha a ser que este substituto não tinha os suffragios da massa activa do julgado, e só de uma fracção delle; e na realidade elle os não tem senão de uma freguezia. Assentei que devia acceder a esta difficuldade, que me pareceu attendivel; e então adoptei o meio constante do Artigo (que foi suggerido por um Illustre Deputado) como o unico de que se podia lançar mão actualmente: achando-o preferivel a obrigar um Bacharel a este serviço, ou a encarregalo ao Delegado do Procurador Regio, que em muitos casos o não poderia desempenhar. — As rasões dadas para provar que tal disposição na Lei tende a diminuir as regalias da Corôa, parece-me que não tem força, porque em rigôr não são applicavel ao caso em questão; e o Governo está muito longe de consentir em que essas regalias desçam do ponto em que a Carta as collocou; mas na hypothese de que tracto, está persuadido que a approvação do Artigo em nada ataca os privilegios da Corôa.

Concluirei declarando que se o pouco tempo que resta da Sessão das Côrtes désse logar a que esta Lei podesse voltar á Camara dos Senhores Deputados, ou a que se celebrasse uma Commissão Mixta, (no caso em que aquella Camara não accedesse á opinião desta) eu não teria duvida, mas conviria em qualquer emenda plausivel, ou que nos fizesse sahir desta difficuldade; mas na quasi certeza de que essa difficuldade hade sempre achar-se de envolta com qualquer lembrança, não posso deixar de insistir na approvação do Artigo; reservando o buscar novos meios, para quando o tempo possa habilitar o Governo appresentar uma Lei completa da organisação judicial, e outra relativa á fórma do processo.

O Sr. Souza e Holstein: — Darei brevemente as, rasões que me moveram a votar por este Artigo, tal qual veiu remettido da Camara Electiva. — Tem-se fallado em Juizes de Direito, dizendo, entre outras cousas, que elles sómente podem ser nomeados pelo Rei, e que o substítuilos por empregados electivos seria contra a Carta. Eu devo declarar que votei neste sentido, e que me não arrependo de o ter assim feito. Accrescentarei agora algumas reflexões para que me não tenham por inconsequente, pois que tendo votado contra os Juizes Ordinarios, estou actualmente pela doctrina do Artigo.

Em primeiro logar direi que aqui se não tracta de seguir a consequencia de uma regra, mas sim de estabelecer um verdadeiro principio; e por isso não vejo que haja a menor contradição votando no Artigo 5.º n'uma hypothese diversa da que suppõem aquelles Dignos Pares que o combatem.

Aproveitarei esta occasião para declarar o motivo porque, em discussão connexa, votei contra o principio electivo; muito de proposito não tomei parte nesse debate, mas ouvindo os argumentos então produzidos contra a applicação daquelle principio aos Juizes Ordinarios, confesso que não cedi nelles; porque as rasões deduzidas da Carta podem ás vezes ceder ás rasões de conveniencia. Apontarei um exemplo que o prova. — É doctrina expressa na mesma Carta que a nomeação de todos os Officiaes de guerra, de mar e terra é privativa do Governo; comtudo algumas rasões de conveniencia subjeitaram a escolha dos Officiaes da Guarda Nacional á urna eleitoral — Por isso torno a dizer que não foi tendo em vista sómente a regra Constitucional, que votei contra a conservação dos Juizes Ordinarios; mas por intender que o estado de civilisação do nosso Paiz não permittia ainda o deparar facilmente, e em todas as povoações, pessoas sufficientes, e com o gráu de illustração que devesse merecer a confiança dos eleitores; e sobre tudo porque a falta de conhecimento de direito originava gravissimos inconvenientes. — Por consequencia votando por estes Juizes substitutos não estou em contradicção, porque (além do que acabo de expender) elles só hãode exercitar uma parte das funcções dos Juizes de Direito, ficando assim mesmo as causas subjeitas ao que estes julgarem nas audiencias geraes, e accrescendo que aquelles são meramente temporarios. — Confirmando pois o que disse o Sr. Ministro da Justiça, não tenho duvida em approvar o Artigo tal como está na Proposição.

O Sr. Marquez de Ponte de Lima: — Os Dignos Pares que me precederam a fallar preveniram-me ao

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que eu tinha a dizer; e por isso pouco tenho a accrescentar. Creio que este Artigo não póde offerecer duvida alguma, pois que a sua materia é geralmente reconhecida nas actuaes circumstancias; é isto uma prova evidente da boa fé com que o Governo tem procedido; e apesar de ser eu um dos que lhe tem feito mais opposição, faço-lhe esta justiça, porque a minha opposição é ás cousas, e não ás pessoas. Estes Juizes electivos, alguem ha que os tem querido impugnar; não sei para que fim, visto que nelles vemos resuscitar os Juizes Ordinarios, cuja necessidade já o Governo reconheceu, condescendendo com a opinião publica. — O que me parece pois é que a materia está sufficientemente discutida, e peço a V. Ex.ª que a proponha á Camara.

O Sr. Ministro da Justiça: — Agradecendo, como devo, a attenção com que me tracta o Digno Par que acaba de fallar, não posso receber elogios que me não competem; quero dizer, se S. Ex.ª chega ao ponto de intender que os Juizes de que falla o Artigo são os Juizes Ordinarios; porque eu fui o primeiro que me oppuz a elles, por serem contra a Carta. Os Juizes Ordinarios tinham outras attribuições que lhes estavam marcadas no Decreto da reformação das Justiças; mas aquelles de que tracta este Artigo são unicamente para o simples caso de substituir os Juizes de Direito na sua ausencia ou impedimento, e para a instrucção dos processos, mas nunca para julgar. — Mas como não foi neste sentido que o Digno Par elogiou a boa fé do Governo, dem continuar no seu conceito a estar de má fé com elle, porque em fim estes Juizes não são os Ordinarios.

O Sr. Margiochi: — Na discussão das bases Judiciaes votei pela adopção dos Juizes de Direito: muitas Leis que nós temos adoptado e outras que somos obrigados a adoptar, mostram a necessidade que ha de Juizes intendidos em Jurisprudencia, para o andamento dos negocios publicos segundo os principios da Sociedade moderna; regulados por immensidade de Leis; e eu realmente não podia votar senão segundo estes principios. Quando os Romanos foram á Grecia procurar Leis não podéram trazer senão dez, e para fazerem as doze taboas foi necessario accrescentar duas; porém hoje estamos mui longe desta simplicidade, e por tanto eu votaria, a ser agora occasião, que entre nós houvessem mais scholas de Direito. Isto seria muito conveniente para instrucção de todo o Cidadão, porque nós temos muita necessidade de homens que conheçam Leis, pois que a maior parte destes fizeram-se criminosos, e não podem ser hoje empregados, pela tendencia que tem contra a liberdade. Estes Juizes eleitos são sómente Substitutos para a falta dos Juizes de Direito, em certos casos determinados: de mais elles não dão sentenças, postoque façam cousa que é uma parte della; mas não vejo por isso que esta disposição seja contraria ás prerogativas do Poder Real, porque o principio geral determinado na Carta, fica subsistindo: porque isto são excepções de momento, pela falta de homens proprios; por consequencia não tenho a menor repugnancia em admittir estes Juizes eleitos, e por estes motivos voto pelo Artigo tal qual foi remettido da Camara dos Senhores Deputados.

O Sr. Gyrão: — Quero apenas dizer duas palavras. — Como tenho tenção de votar pelo Artigo tal qual se acha na Proposição da Camara dos Senhores Deputados, desejo declarar a rasão porque assim procedo, tendo sido um dos Membros que votaram contra os Juizes Ordinarios. A rasão é muito simples, e é porque estes Juizes em nada se parecem com os Ordinarios; eu os considero a mesma cousa que os Juizes pela Ordenação que eram os Vereadores mais velhos, em quem recahia a vara do Juiz de Fóra, nos seus impedimentos; é o que eu vejo, até porque nas terras aonde havia estes ultimos não os havia Ordinarios.

Outra rasão porque tambem voto pelo Artigo, da forma que disse, é pela absoluta necessidade de haver quem julgue: eu sei que tinhamos outro meio que era crear Substitutos Letrados dos Juizes de Direito, dando-lhes ordenados; mas temos que attender á economia da Fazenda. — Em fim como não se appresenta outro meio, e esta Lei urge, voto inteiramente pelo Artigo 5.º

O Sr. Sarmento: — Como o Digno Par acaba de fazer uma explicação, que eu não julgo inteiramente exacta, direi tambem duas palavras a este respeito. — No Vereador mais velho é que recahia a vara nos impedimentos do Juiz de Fóra; é verdade. Mas por quem era nomeado esse Vereador? Por El-Rei, ou, para melhor dizer, pelo Desembargo do Paço, em vista das pautas das Camaras. Mas além destas pautas, havia sempre glosas marginaes remettidas pelos Corregedores, tanto ao Desembargo do Paço, como ás Juntas dos Donatarios da Corôa, e ás vezes aos mesmos Donatarios, que não eram o Infantado, Casa de Bragança, e da Rainha. Não tracto agora de expôr os variados modos, porque se fazem estas eleições, sendo por um modo nas terras dos? Donatarios de alta Jerarchia, por outro nas dos mais Donatarios, e nas terras da Corôa mesmo havia differentes modos. E poderá isto considerar-se eleição popular? Certamente que não. Por consequencia um Juiz pela Ordenação, e um Juiz eleito pelo Povo, são cousas muito diversas; e então a observação do Digno Par, que se deduz da igualdade de um e outro, não é exacta. — É o que desejava dizer, para que tal asserção não fizesse alguma impressão na Camara.

Foi julgada a materia sufficientemente discutida.

Passando-se a votar nominalmente sobre o Artigo 5.º, disseram approvo

Os Senhores Duque de Palmella,

da Terceira,

Marquez de Fronteira,

de Loulé,

de Ponte de Lima,

de Santa Iria,

de Ficalho,

de S. Paio,

Conde de Villa Real,

da Taipa,

de Paraty,

de Linhares,

Visconde da Serra do Pilar,

Barão d'Alcobaça,

Souza e Holstein,

Margiochi,

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Barradas,

Gyrão,

Braamcamp,

Macedo;

e disseram rejeito

Os Senhores Trigoso,

Bispo Conde,

Conde de Lumiares,

Mello Breyner,

Gerardo de S. Paio,

Ribeiro d'Abranches,

Sarmento.

Ficou em consequencia approvado o Artigo 5.º da Proposição da Camara Electiva, por 20 votos contra 7; e prejudicada assim a Substituição da maioria da Secção de Legislação.

O Artigo 6.º foi approvado sem discussão.

Lido o Artigo 7º, disse

O Sr. Ministro da Justiça: — Este Artigo talvez pareça que vai estabelecer doctrina nova; não é assim, mas não faz mais do que remediar um defeito da Lei de 16 de Maio de 1832, na qual se não acha providencia alguma a respeito dos Substitutos, nem se determina que no auto da eleição se lancem os nomes dos mais votados depois do eleito; disto tem resultado que muitas freguezias não tem Juiz de Paz, e o methodo do Artigo tende a remediar este inconveniente.

Não se fazendo outra observação, foi o Artigo posto á votação, e approvado tal qual.

Passando-se ao Artigo 8.º pediu a palavra sobre elle, e disse

O Sr. Ministro da Justiça: — Preciso fazer uma declaração, a respeito deste Artigo. — Os Juizes eleitos de que elle falla são os Pedaneos e não os Substitutos dos Juizes de Direito.

O Sr. Conde da Taipa: — Parece-me que o Sr. Ministro da Justiça excedeu o numero dos Juizos de Direito votados pela Lei; porque além dos que ella determino ficaram os de Lisboa e Porto.

O Sr. Ministro da Justiça: — Parece-me que o contrario é expresso na Lei das Bases Judiciaes, que auctorisou o Governo a nomear até 130 Juizes de Direito conservada o Legislação existente a respeito de Lisboa e Porto. Isto é questão de facto; e á vista da Lei se conhecerá que o Governo longe de exceder as suas faculdades se conformou com ella.

Sem mais discussão foi o Artigo 8.º posto a discussão e approvado.

Em seguimento foi tambem approvado o Artigo 9.º sem discussão.

Passando a discutir-se o Artigo 10.º obteve a palavra e disse

O Sr. Gerardo de Sampaio: — Estabelece este Artigo um Contador em cada uma das Relações, bem como em cada um dos julgados; e isto revogando o determinado no Artigo 271 da Lei de 16 de Maio de 1332, aonde aquelle emprego se ajunta ao de Procurador Regio, e ao de Delegado do mesmo. Deverei dizer que me parece mui bem determinado o serem isemptos aquelles Empregados de similhantes tarefas, porque além de terem dellas, geralmente fallando, inteira ignorancia, são por outro lado muito delicadas, e demandam sciencia particular deste ramo, e grande practica, não tem tempo para as desempenhar, e assim só fariam o que até aqui se fazia, isto é, assignar o Juiz, que em alguns logares pela Legislação antiga tambem era Contador, a conta que lhe appresentava o Escrivão, pessoa que, de ordinario, não é nimiamente escrupulosa; e em taes circumstancias repito que precisamos de Contadores, que tendo a aptidão necessaria só occupem este emprego. Agora o que me parece é, que determinando este Artigo que haja um Contador em cada um dos Julgados, e tendo Lisboa seis com o nome de Districtos, e um Contador mais, que deve contar perante a Relação, sendo lhe dado por esta forma sete, este numero se torna exorbitantissimo, julgando eu que metade, dos que se propõem seria bastante. Esta a reflexão, que appresento á consideração da Camara, e do Sr. Ministro da Repartição da Justiça, que está presente, para que, sendo convidado por V. Ex.ª Sr. Presidente, diga o que se lhe offerece a este respeito.

O Sr. Ministro da Justiça: — O Digno Par que acaba de fallar, reconhece a necessidade de existir separado dos Procuradores Regios e dos Delegados destes, um Empregado a quem seja privativamente encarregada a contagem dos feitos (e nisto estamos de accordo), mas a sua duvida consiste em se persuadir que talvez o numero dos Contadores, de que tracta o Artigo, seja excessivo para Lisboa e Porto. O Governo teve em vista o facilitar ás partes, nos differentes Julgados do Reino, a contagem dos processos, por isso estabeleceu Contadores em cada um delles; é possivel que em Lisboa e Porto se possa reduzir o seu numero, mas isso é objecto que só o tempo póde mostrar; se os emolumentos que elles terá de receber se não julgarem sufficientes, então terá logar a reducção, mas por agora e sem a experiencia parece-me que não podêmos entrar nesse exame. Por consequencia o Artigo creio que está nas circumstancias de passar, pois (torno a dizelo) as vistas do Governo sobre elle, foram que as partes não tivessem embaraços por causa da falta destes Empregados.

Não se fazendo outra observação, foi o Artigo 10.º posto a votos e approvado.

O Artigo 11.º foi approvado sem discussão; sendo portanto adoptada tal qual a Proposição da Camara Electiva.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares; deu conta de dois Officios da Camara dos Senhores Deputados participando; o primeiro, haver aquella Camara adoptado as emendas desta á Proposição para a venda dos Bens Nacionaes, que com o resultado da Commissão Mixta, reduziu a Decreto de Côrtes Geraes, para ser levada á Sancção Real. — Segundo haver tambem approvado, e reduzido a Decreto a Proposição desta Camara para o augmento do numero dos Alumnos do Collegio Militar, que igualmente ía levar á Sancção Regia. — A Camara ficou inteirada.

O referido Sr. Secretario, leu mais dois Officios da Camara Electiva incluindo duas Proposições da mesma; sobre a reforma da moéda Portugueza; e outra sobre as indemnisações dos prejuizos causados pela usurpação. — Sobre a direcção da primeira disse

O Sr. Visconde da Serra do Pilar: — Proponho á Camara que a respeito desta Lei as dispensem as formalidades do Regimento; se se demora desapparecerão os poucos Soberanos que ainda andam.

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O Sr. Marquez de Fronteira:. — Pelo contrario ha de ir a uma Commissão, esta ha de dar o seu parecer, e depois ha de imprimir-se.

Pediram a palavra alguns Dignos Pares, levantando-se cinco, ou seis ao mesmo tempo, e insistindo todos em que lhe fosse concedida. — Restabelecida a Ordem disse

O Sr. Vice-Presidente: — Eu não posso, em desempenho do meu dever. propôr urgencia de Legislação, senão quando o Regimento o manda, ou o Governo o pede; neste caso estava a Lei que hoje se sanccionou (que é propriamente uma experiencia) e talvez ainda venha alguma que esteja nas mesmas circumstancias: agora quanto aos objectos cuja decisão involve direitos particulares, parece-me que seria um absurdo discutilos de improviso, e antes de irem a uma Commissão. — Se se poderem discutir todas as Leis na presente Sessão, muito que bem, senão ficarão para a outra.

O Sr. Conde de Linhares: — Eu intendo que uma vez que em observancia desta Lei se hade cunhar dinheiro, não póde ser provisoria.

O Sr. Conde da Taipa: — Peço pelo amor de Deus que me deixem fallar, e depois então caiam-me em cima. — Nós temos só tres dias de Sessão, e nada mais; em tres dias não é possivel discutir tantas Leis; a de indemnisações é muito necessaria no estado em que as cousas estão, ha muita gente descontente, a que anda querendo fazer desordens, em consequencia é necessario que esta Lei passe; e então não sei porque a Camara não hade continuar por mais dez ou quinze dias; não sei a rasão disto, e porque o Governo hade querer que em tres dias façamos tudo isto, porque não é possivel; fiz a minha observação, e declaro que não voto quando haja pressa em negocios tão importantes.

O Sr. Vice-presidente: — O que me parece é que a Camara deve fazer os seus deveres, as cousas obvias expedem-se, as difficeis demoram-se; e ao Poder Moderador, a quem pertence a faculdade de prorogar ou não as Camaras, proverá neste caso como intender ser mais conveniente para bem do Estado.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — V. Ex.ª preveniu-me em grande parte do que eu tencionava dizer quando pedi a palavra. — Eu, pela minha parte, faço grande justiça ao zelo da Camara, e conheço que tem annuido, com muita condescendencia, aos pedidos do Governo, quando se lhe tem representado a urgencia das discussões de certas Leis, como a da que acabou de votar-se agora. Todas as Leis que estão sobre a Mesa são necessarias, mas umas mais do que outras; parecia-me por tanto que entre ellas, e as que ainda poderão vir da outra Camara, se faça a selecção das que evidentemente são de maior necessidade, e que essas se discutam primeiro, com o fim de se poderem votar no praso da Sessão ordinaria, deixando, quanto ás outras, que o Poder Moderador dê exercicio á faculdade que pela Carta lhe compete.

O Sr. Vice-Presidente: — Talvez que a Proposição sobre indemnisações deva ir u uma Commissão Special.

O Sr. Souza e Holstein: — Parece-me que a Proposição sobre a reforma da moéda deve ir á Secção de Fazenda; e quanto ás das indemnisações tambem me parece da competencia da Secção de Legislação.

O Sr. Gyrão: — Concordo com o Digno Par; quanto á Proposição das indemnisações, postoque estas hãode ser dadas em valor, o ponto principal e de direito, e por isso deve ser comettido á Secção de Legislação.

O Sr. Sarmento: — Parece-me que esse objecto deve merecer uma Commissão specialissima. Tracta-se do pontos de direito, mas ha circumstancias muito particulares; é questão em que entra menos de fazenda, e mais de politica; porque, como bem disse o Sr. Conde da Taipa, se o Poder Legislativo deve cuidar em alguma cousa, é em acabar essa specie de montaria que se está fazendo aos, miguelistas: é preciso ver se ha ou não ha Lei, de outra maneira continuaremos n'um estado em que o Reino não póde permanecer. Tirem-se todos os pretextos que podem influir nessa irritabilidade; e por isso sou de parecer que se nomeie a Commissão Special.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — É essa uma das Leis para que eu julgo deve haver uma recommendação special de urgencia.

O Sr. Souza e Holstein: — Não me opponho a que se nomeie a Commissão Special, sómente queria que, conforme a regra geral, fosse essa Proposição da competencia da Secção de Legislação.

Não se fazendo outra observação sobre a direcção das mencionadas Proposições, resolveu a Camara que a da reforma da moéda Portugueza passasse á Secção de Fazenda; e bem assim que o Sr. Vice-Presidente nomeasse uma Commissão Special de sete Membros para tomar conhecimento da das indemnisações dos prejuisos causados pelos rebeldes; pelo que Sua Ex.ª designou para a comporem

Os Senhores Marquez de Loulé.

Conde da Taipa.

Mello Breyner.

Barradas.

Margiochi.

Braamcamp.

Gerardo de Sampaio.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu um Officio da Presidencia da Camara dos Senhores Deputados, incluindo a seguinte

PROPOSIÇÃO

Para que o Casamento da Rainha possa effeituar-se com Principe Estrangeiro.

Artigo unico. — O Casamento da Rainha Reinante, a Senhora DONA MARIA SEGUNDA, poderá effeituar-se com Principe Estrangeiro, declarando, e dispensando as Côrtes Geraes da Nação, para este caso, e por esta vez sómente no Artigo 90 da Carta Constitucional da Monarchia Portugueza. — Palacio das Côrtes, em 13 de Abril de 1835. — Antonio Marciano d'Azevedo, Presidente. — Francisco Xavier Soares d'Azevedo, Deputado Secretario. — Francisco Botto Pimentel de Mendonça, Deputado Vice-Secretario.

Concluida esta leitura, disse

O Sr. Vice-Presidente: — A Camara designará o andamento que deve ter esta Proposição, que é co-

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mo um complemento da Mensagem enviada a Sua Magestade em um dos ultimos dias.

O Sr. Conde da Taipa: — Eis-aqui uma Proposição que se póde decidir hoje mesmo. A primeira vez que aqui se tractou identico objecto, oppuz-me eu o que fosse discutido com urgencia: tinha motivos para isso, dos quaes alguns infelizmente se realisaram; mas hoje proponho se dispense no Regimento, para agora mesmo decidir este negocio. (Apoiado. Apoiado.)

Não se produzindo outra observação, resolveu a Camara que a Proposição referida, dispensados os tramites do Regimento, fosse hoje mesmo discutida.

Subjeita logo ao debate, de todos os lados da Camara se pediram votos; obtendo porém a palavra, disse

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Direi poucas palavras sobre a decisão que a Camara acabai de tomar, a qual me enche de satisfação. — Esta Proposta de Lei é, em certo modo, uma consequencia necessaria do voto que a Camara deu ha dous dias; uma vez que se dirigiu uma respeitosa Mensagem á Sua Magestade, pedindo-lhe ajustasse o seu Casamento, claro está que elle não póde levar-se a effeito senão com um Principe Estrangeiro; e que havendo um Artigo da Carta que o prohibe é indispensavel derrogalo para este effeito, como as Côrtes já fizeram em occasião similhante. A perda que Sua Magestade a Rainha, e a Nação toda soffrem pela morte de Sua Alteza Real o Principe D. Augusto, é talvez irreparavel: mas em fim a necessidade obriga a substituir essa falta; incumbindo ao Governo fazer todos os seus esforços para que a escolha da Rainha recáia sobre um Principe que appresente pelo menos uma grande parte das vantagens que se reuniam no Principe D. Augusto; isto é, uma boa educação, inclinações favoraveis, tanto quanto possa ser ao Systema Constitucional estabelecido na Carta, e que seja desligado pelas suas relações de parentesco quanto fôr possivel com as Familias Reinantes dos Paizes onde rege um systema de governo opposto ao deste Reino; (digo quanto fôr possivel, porque, geralmente fallando, essas Familias tem todas mais ou menos parentesco.)

São estas as principaes condições que em tal negociação o Governo hade ter em vista, além d'uma outra de que não póde prescindir que é a annuencia da Rainha, quanto o permitte a sua actual situação. Uma vez que a Camara adopte a Proposição que acaba de chegar da outra, ficará o Governo auctorisado a fazer esta escolha sem referencia a uma nova approvação, a qual se não julga necessaria em vista da Carta, pois que ella só tracta da Princeza Herdeira, e Sua Magestade cita já declarada Maior, e Reinando. Além disso, a consideração de ter de vir ás Camaras o ajuste, depois de feito, para receber a sua special approvação, difficultaria, e mesmo prolongaria o termo desta negociação, que tanto se deseja accelerar. — Á vista do que acabo de dizer, não me resta senão declarar que voto no sentido da Proposição vinda da outra Camara, e que muito folgo em ver que esta se acha tão inclinada a adoptala.

(Votos. Votos.)

O Sr. Ministro da Marinha: — Peço licença para dizer só duas palavras; sentindo infinitamente o triste motivo que faz necessaria esta Proposta, dou o meu voto a favor della com a maior sinceridade, accrescentando que tendo tido a fortuna e honra de ter conhecido e tractado de perto o Principe cuja perda tanto sentimos e deplorâmos, não posso deixar de aproveitar esta occasião para dizer que muito desejo que o Principe que tiver a fortuna de casar com a Rainha reuna qualidades e virtudes, como as que adornavam aquelle Principe. O interesse que tomava pela nossa Patria, a sua rectidão e capacidade, e a solidez dos seus principios, são qualidades pelas quaes não poderá ser esquecido por nenhum Portuguez; e pela minha parte sempre conservarei grata memoria das honras que lhe devi. (Votos, votos.)

Julgada a materia sufficientemente discutida, foi a Proposição da Camara Electiva entregue á votação, e, por acclamação, unanimemente approvada; mandando-se reduzir a Decreto, para subir á Sancção Real.

O Sr. Secretario Conde de Lumiares leu um Officio da Presidencia da Camara dos Senhores Deputados, e uma inclusa Proposição da mesma Camara sobre os = lançamentos da decima e impostos annexos.

Sobre a sua direcção disse

O Sr. Mello Breyner: — Eu reputo esta Proposição de muita transcendencia, e por isso desejaria que quanto antes passasse nesta Camara. A decima é um dos principaes rendimentos de Portugal, e sendo bem lançada póde proporcionar muitos meios ao Governo: pois que até agora o seu lançamento tem sido feito com a maior desigualdade. Vamos ter um intervallo de nove mezes, em que as Côrtes não podem providenciar este objecto, e portanto seria conveniente que elle ficasse decidido antes de acabar a presente Sessão, para o que já poucos dias faltam.

O Sr. Sarmento: — É uma verdade que não póde negar-se, a importancia dessa Lei, ou que talvez; seja a mais importante de quantas aqui se tem appresentado. Eu fui exactor da Fazenda, e vi que a decima era tão mal lançada que haviam pobres, que pagavam muito, e ricos, que pagavam pouco. Ainda que a Proposição seja tendente a emendar taes desordens, nomeando pessoas encarregadas dos lançamentos; todavia não me parece que se deva tractar a materia sem primeiro ir a uma Commissão. Quanto ao mais, que haveria a dizer, eu me resumo por ser um objecto que está ao alcance de quasi todos; apoiando as idéas do Digno Par, que me precedeu.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Levantei-me para declarar em nome do Governo, que esta é uma das Leis que elle considera urgentissimas; é tambem uma daquellas que pertencem á Camara dos Senhores Deputados.... (Uma voz: — É só na iniciativa. — O Orador prosegue:) — Não o nego; mas por isso mesmo que a iniciativa lhe pertence sobre este objecto, está implicitamente reconhecido, que aquella Camara tem um interesse mais directo no que lhe diz respeito; e é isto mesmo o que está reconhecido em todos os Paizes Constitucionaes, quer dizer, que os Deputados da Nação, tem uma missão mais special para tractar da distribuição dos impostos e dos dinheiros publicos. — Portanto sendo por todos confessada a urgencia desta Lei; sabendo

(P.)

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todos que além da decima não existe em Portugal outro algum imposto directo, (de consideração ao menos); sabendo se igualmente que entre a receita e a despeza do Estado ha um grande deficit; e em fim, que as Leis de Fazenda são daquellas que todos os annos se devem tractar, em que não podem permanecer por um longo periodo, sendo susceptiveis de um progressivo aperfeiçoamento; por todos estes motivos digo que seria muito conveniente que a Lei appresentada podesse passar sem muita discussão. (Apoiado)

O Sr. Gyrão: — Eu tinha pedido a palavra para instar pela urgencia desta Lei, porque sei de Comarcas cujo rendimento está reduzido á quarta parte, eu tenho aqui um resumo que desejo ler: (leu e proseguiu:) Está portanto demonstrado que em toda a parte succede o mesmo; nós temos pouco tempo, e para o aproveitar parecia-me que indo esta Proposição logo á Secção de Fazenda e dando ella com brevidade o seu parecer, poderia discutir-se tudo junto, assim como fizemos com a do desinvolvimento das bases Judiciarias. Eu lamento muito que se façam Leis assim, mas lamento ainda mais o tempo que temos perdido sem proveito e.... (Vozes: — Ordem. Ordem.)

O Sr. Conde da Taipa: — Esta Proposição de Lei é de muitissima importancia, mas é preciso considerar primeiro que se vote. — Disse o Sr. Duque de Palmella, ainda ha pouco, que ella é da iniciativa da Camara dos Senhores Deputados; porém a Camara dos Pares tem sempre tanto interesse e parte nella, e tanto zelo pelos objectos da Fazenda Publica, como a Camara Electiva. Seria cousa irrisoria sustentar opposta doctrina: esta Camara, sendo composta de proprietarios representa muito mais nesta Lei do que à Camara Electiva. Mas porque representa ella? Porque a maior parte de seus Membros é quem paga, e os da outra, que primeiro a votaram, recebem em logar de pagar. Portanto ainda o digo, esta Camara tem muito mais que fazer com cita Lei nas circumstancias presentes do que a outra; e por isso precisa meditala: pelo meu voto não ha de ella sair daqui sem passar por todos os tramites, porque se se reconhece urgente, na mão do Governo está o dar-nos tempo. Pois gastam-se nove mezes em palanfrorios, e depois á undecima hora, vem aqui dizer-nos = deixem vossas mercês passar todas estas Leis? Eu pela minha parte não vou para ahi; porque não tive culpa do tempo que se perdeu nos taes palanfrorios; portanto não quero votar sem conhecimento de causa, e preciso tempo, antes de me decidir, para consultar a fraca rasão que Deus me deu, e dar um voto que seja conforme m'o dictar a minha consciencia. Concluo que se me não dão mais de tres dias, nem voto, nem vou á Commissão.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Como toda a primeira parte do que o Digno Par acaba de dizer, parece dirigir-se a mim, devo responder-lhe. — Principiarei affirmando que de certo modo me fez uma injustiça, suppondo que eu poderia julgar excusado o concurso desta Camara para certos objecto: eu não neguei a ingerencia dos Dignos Pares, não neguei o seu interesse nos impostos publicos; mas disse unicamente que esta Proposição era daquellas cuja iniciativa competia á Camara dos Senhores Deputados. Que ella seja composta ou não da classe d'Empregados publicos, nada temos que tractar disso; a Nação elegendo-os exerceu o seu direito, e são indubitavelmente aquelles, a quem a mesma Nação em globo, commetteu mais directamente os seus interesses.

Esta Proposição não tem por objecto um imposto novo; nella sómente se tracta de adoptar algumas regras para a melhor cobrança de um imposto existente, e sobre tudo para a sua maior igualdade, por isso que um dos preceitos consignados na Carta, é que a Lei seja igual para todos. Ora neste caso não o tem sido, porque n'umas partes cobra-se a decima, n'outras não; aqui mais, alli menos do que deveria ser: é a isto que o Governo queria applicar algum remedio, promovendo o andamento desta Proposição: e eu sustento que o melhor modo de tractar desta materia com conhecimento de causa, é experimentando o remedio que se lhe applica, e então, vendo o seu effeito, melhor se poderá na Sessão seguinte provêr Sobre o objecto. — A respeito do que se disse de palanfrorios, não julgo deva responder, crendo que isso não é allusivo a alguem que pertença a esta Camara; e se se refere a outra parte, que não seja esta Camara, acho que ainda menos deva fazelo.

O Sr. Conde da Taipa: — A decima em Portugal não se pagava com exactidão, e isto pela simples rasão de não se poder pagar: assim todas as Leis inexequiveis se reduzem ao mesmo que se não existissem. A fallar a verdade era impossivel pagar-se a decima e o dizimo; mas hoje não acontece isso, porque aquella é o unico imposto territorial que temos: é logo preciso tomar as bases sobre as contribuições directas; mais isto não é cousa que se faça em tres dias, porque se carece de ouvir pessoas que tenham intelligencia da materia, como alguns Empregados dos que costumavam concurrer aos lançamentos da decima, que possam dizer alguma cousa das circumstancias de diversos locaes, de suas faculdades para pagar, e em fim de mil outras cousas que é indispensavel ter em vista: n'uma palavra, isto é negocio de transcendencia, que não póde concluir-se em tres dias.

O Sr. Ministro da Marinha: — Eu creio que a unica cousa sobre que se póde agora fallar, é qual o andamento que se deve dar a este negocio: todos reconhecem a importancia e urgencia delle; eu convenho em ambas as cousas, mas apesar disso parece-me que se podia admittir o que já se indicou, que é mandar imprimir a Proposta para se discutir com o Parecer da Commissão logo que fôr appresentado. — Em quanto á prorogação das Camaras, é esta do Poder Moderador.

O Sr. Sarmento: — Parece que a questão é se em tres dias se poderá decidir este objecto; sem prevenir hypothese alguma sobre este ponto, digo que o modo de adiantar o negocio é mandalo para a Commissão quanto antes. Pelo que toca á desculpa que acaba de dar o Digno Par, acho que tem muito logar; mas o Poder Moderador e o Executivo são duas irmans que moram debaixo das mesmas telhas.

O Sr. Braamcamp: — Lembrava-me, Sr. Presidente, que poderiamos adiantar os negocios que estão pendentes, da decisão da Camara, se as Sessões começassem mais cedo, e houvesse algumas de tarde: o tempo é pouco, e na verdade ha muitos

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negocios urgentes e de importancia. — Está é minha opinião.

O Sr. Conde da Taipa: — O que falta não é tempo para discutir as Leis, mas sim para meditalas; e essa falta só se remediaria se os dias que restam para fechar as Camaras, em logar de vinte quatro fossem de quarenta e oito horas ou de sessenta.

O Sr. Marquez de Fronteira: — Não temos já senão tres Sessões, e ha tres Leis de que se tem pedido a urgencia; não sei como isto se ha de fazer.

O Sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Ninguem exige impossiveis; nomeie-se a Commissão e se a Lei se não poder discutir no praso ordinario, o Poder Moderador fará o que quizer, a Camara entretanto tem feito o que pôde, e cumprido o seu dever. — Se se empregassem em meditar os Projectos, todas as horas que se passam fora da Camara, seria conveniente que as Sessões fossem mais curtas; mas como me persuado de que acontece o contrario, parece-me melhor que ellas comecem um pouco mais cedo.

O Sr. Gyrão: — Em todo caso peço que o Projecto se mande já imprimir. — Não se fazendo outra reflexão, resolveu a Camara que a Proposição sobre o lançamento da decima passasse á Secção de Fazenda.

Antes de concluir a Sessão, pediu a palavra e disse

O Sr. Sarmento: — Como póde acontecer que aqui não esteja n'outra occasião o Sr. Presidente do Conselho, lembrar-lhe-hei alguma cousa que diz respeito ao Palacio das Côrtes, pedindo ao Governo queira habilitar o Digno Par Fiscal das Obras Publicas, para levar este edificio a um ponto que honre a Nação, fazendo os necessarios arranjamentos, principalmente na sua entrada, que, segundo o que vejo executar por agora, parece mais uma alameda de Frades Capuchos. (Riso.) — Espero tambem que na seguinte Sessão se tracte da inauguração da Statua do Sr. D. PEDRO, a quem tudo devemos. (Apoiado. Apoiado.) Sim tudo; que se elle quizesse ser despota havia de sêlo: mas não, elle só quiz acabar com o despotismo. (Apoiado.) As Côrtes são quem devem levantar o primeiro monumento á sua Gloria; mas este monumento deve ter uma base digna do Grande Homem a quem se dedica. — De modo algum eu deixo de suppôr os melhores desejos no Digno Par Fiscal das Obras Publicas; o seu zello, e o seu desinteresse são bem conhecidos; mas a sua administração não póde só, e é necessario que o Governo lhe dê meios. — É preciso lembrar aos Portuguezes, quem lhes deu, e quem lhes restaurou a Liberdade; pondo á entrada deste Palacio a Statua do Homem Grande, que aqui nos trouxe. (Apoiado. Apoiado.)

O Sr. Vice-Presidente: — A Ordem do dia para a Sessão de ámanhan, é a discussão da Proposição da Camara dos Senhores Deputados, sobre os rendimentos dos Concelhos das Comarcas do Porto, que são applicados á illuminação da mesma Cidade, a qual hoje se não tractou por falta de tempo. — Está levantada a Sessão.

Eram cinco horas.

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