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244 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

ligado por voto selemne permittido pela lei. Em taes circumstancias não póde um cidadão constituir familia legitima; e é, portanto, justo que não esteja sujeito a todos os preceitos que garantam direitos e effeitos da familia legitimamente constituida. Creio que terei sido bem comprehendido n’este melindroso assumpto, que reclama urgente providencia.

Emfim, foi no proprio codigo civil que encontra a solução que lembro; foi na ultima excepção que elle prescreve para a legitima.

Na falta de descendentes, de pae e mãe, e havendo outros ascendentes, pela actual disposição do codigo civil portuguez, a legitima perde um sexto do seu valor, passando de dois terços para metade. Aqui têem s. ex.as a legitima funcção das relações de sangue entre o testador e seus naturaes herdeiros. Pois o que proponho é que seja funcção do numero dos filhos, ou d’estes descendentes e representantes. Deverá ser tambem funcção de outros encargos; mas a apreciação d’estes, não podendo convenientemente ser feita nos tribunaes, ahi mesmo póde auctorisar damnos e vexames, mais graves que o damno para que solicito providencia efficaz. E é por isto que só uma variavel considero — o numero dos filhos á epocha do fallecimento do testador, sendo considerados os filhos fallecidos que tenham deixado descendentes.

Póde parecer extravagante esta minha iniciativa por eu não ter a fortuna do ser jurisconsulto. Um facto frequente na minha profissão o esclarece.

A quem tenha de fazer observações no firmamento é frequente esquecer-se de mandar tirar a tampa do oculo; e muito é para apreciar que alguem tenha o cuidado de lembrar-lhe este inconveniente, por mais humilde que seja essa pessoa, mesmo que nem tenha competencia para mexer no oculo. Ora, é isto o que venho fazer, lembrando aos jurisconsultos a necessidade de verem e remediarem estas anomalias.

Para isso tinha eu pedido a palavra; mas, tendo ouvido o illustando e venerando prelado de uma diocese, onde tenho passado tantos annos, s. ex.a rev.ma o sr. bispo conde, permittam-me v. ex.a e a camara que esqueça a humildade da minha posição, para significar aqui a mais grata satisfação por ver o enthusiasmo como n’este paiz e particularmente n’esta camara, são recebidas todas as solicitações e diligencias para uma esclarecida propagação da fé religiosa, para o esplendor do culto e para a indispensavel consideração a que tem direito o clero de uma nação catholica, como a portugueza é, por sentimento e tradição, por convicção e pela lei fundamental da nação.

A fé não é contraria ao progresso, nem á sciencia. Pena é que alguem tenha imaginado essa opposição, que é um triste erro. A fé tem preparado para a sciencia algumas das suas mais preciosas descobertas, até das fundamentaes. A fé ainda hoje é meio poderoso para maravilhas que a sciencia tem de registar e lhe preparam progressos, que certamente de outro modo nem seriam conjecturados. A fé assegura ainda á sciencia poderosa coadjuvação.

A fé, sobretudo, como meio da acção de uma sciencia, ainda na infancia, solicita a attenção dos que, com maior paciencia, com o mais solicito escrupulo em observações e experiencias, tratam de descobrir o immenso que ainda se ignora, e que ha de ser o objecto d’essa sciencia de importancia consideravelmente superior á da chimica. Mas é melindroso para questão politica este assumpo, ao qual muito prudente e delicadamente se referiu ha pouco o illustre prelado, s. ex.a rev.ma o sr. bispo-conde.

Quero, pois, deixar aqui bem consignado o meu voto, bem sincero que é, para que todos, sem preoccupações, sem hesitações, nem de partido, nem de opiniões scientificas, cooperem n’esta grande obra, essencialmente indispensavel para a prosperidade real e effectiva de um povo; mas para isso é necêssario, é urgente, remunerar condignamente e com equidade, com meios sufficientes e por

forma de respeito e consideração, os importantissimos serviços do clero parochial, tanto na ordem religiosa, como na ordem civil. E preciso que publica e praticamente se reconheça que esta classe é tambem de funccionarios publicos, como realmente é, como é preciso que seja.

Ora, é pungente o actual processo de remuneração dos parochos, processo que tantas vezes dá motivo para conflictos, embora de legitimos interesses, para conflictos que ameaçam o prestigio da auctoridade nos funccionarios, a quem os cidadãos, desde a sua infancia e fóra da familia, têem de reconhecer a primeira auctoridade, aprendendo assim a acatar o principio da auctoridade, que é como que a gravitação dos espiritos, a lei pratica da rasão.

Desejo, e com devotado empenho, ver melhoradas as condições do clero parochial, e quero repetir que esta classe é uma corporação que serve a religião, que serve o estado e que actualmente está mal remunerada e com menos respeito.

Quero insistir nos conflictos que têem occorrido e nas apreciações injustas que podem apparecer e têem apparecido, fazendo augmentar o numero dos que desprezam o principio da auctoridade por carencia de fundamentada illustração por apparencias que a tantos erros conduzem.

E, confiando absolutamente no illustre ministro que vejo presente, como em todos os seus collegas, deixem-me v. ex.a e a camara solicitar de s. ex.a que aproveite o primeiro momento proprio, as primeiras circumstancias favoraveis, para collocar o clero parochial perante o thesouro da nação, dentro do orçamento do estado, nas condições em que lá se encontram quasi todos os outros servidores do estado.

Neste momento lembro-me, e com pezar, que ainda subsiste, embora convenientemente attenuado, analogo inconveniente para a justa remuneração dos magistrados judiciaes e do ministerio publico, mas para o clero parochial a urgencia é a primeira.

A cooperação de todos, grandes e pequenos, é indispensavel; que não falte.

Tambem é preciso que o clero parochial tenha uma educação completa, tanto na instrucção secundaria, como em philosophia, o que hoje é absolutamente indispensavel para os serviços publicos, como para profissões illustradas de certa consideração.

A occasião é magnifica para que o governo exija estas habilitações superiores, que são indispensaveis. Basta reflectir que hoje podem fechar-se as nossas escolas superiores por dez annos, sem que haja transtorno sensivel no provimento dos logares publicos e ao funccionamento regular das profissões chamadas liberaes, como a advocacia, a clinica, o alto commercio.

Nem pareça excessiva esta exigencia, que apenas representa um augmento de tres ou quatro annos nos cursos; augmento que póde bem ficar reduzido a dois annos, em geral, por convenientes reformas na instrucção superior.

Sei que não será escutada, nem lida com sympathia esta minha reclamação, que aliás corresponde a uma instante necessidade.

Vou terminar, solicitando do governo que para si tome, como é indispensavel, a suprema inspecção do ensino publico, sem exceptuar os seminarios diocesanos.

E principalmente ao poder executivo que pertence a responsabilidade do modo por que são preparados os que têem de servir o estado e a religião; principalmente aquelles a quem ha de ser confiada, com importantes funcções civis, a lição, a guarda e a fiscalisação das almas e das consciencias de tanta gente, que não póde adquirir illustração conveniente.

O estado, em Portugal, tem religião á qual deve culto, respeito e serviços.

O principal dever do estado é fiscalisar superiormente