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334 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

exactamente evitar esse vexame, que s. exa. não póde demonstrar que não exista. Pelo contrario, o vexame aggravou-se, porque havia a lei de 1863, que nunca se cumpriu, saindo cada um do reino pela raia secca como queria e á hora que queria, e agora não succede o mesmo.

Acaso todos conhecem a legislação do paiz? Um pobre homem que viva n’uma pequena terra no interior do reino, propõe-se ir a Hespanha, compra o seu bilhete para Madrid, e dizem-lhe na fronteira: «Não, senhor, não póde sair sem passaporte».

Tudo isto para que? Para apanhar uns miseraveis cobres que redundam em proveito das instituições de caridade, dos empregados e dos nossos afilhados nomeados para a tal fiscalisação.

O sr. ministro accentuou uma phrase que eu aqui empreguei «afilhados do governo».

S. exa. faz-me a justiça de acreditar que eu não desejava dirigir uma referencia malévola ao seu caracter ou ao dos seus collegas. Sei bem que os srs. ministros não dispõem dos dinheiros publicos a favor d’este ou d’aquelle individuo; porém, sei tambem, sabe v. exa. e sabe toda a gente que, em se tratando de crear pessoal para qualquer repartição, naturalmente s. exa. não preferem os seus adversarios politicos, mas procuram favorecer aquelles que lhes prestaram serviços. A esses é que eu chamo afilhados. E este procedimento não é privativo de s. essas; é de todos os governos. Pois então o sr. ministro vae empregar republicanos ou progressistas, vae nomeal-os para os logares que se crearem?

De certo que não.

Ha de procurar para esse fim os que lhe tenham prestado serviços ou lhe sejam recommendados pelos seus amigos politicos.

Não os censuro por esse facto. Ahi está o que eu chamo afilhados, e afilhados são.

Parece-me ter respondido ás considerações de s. exa. e mantenho tudo quanto disse anteriormente. Não posso votar o projecto, porque o discurso de s. exa. não me convenceu de que realmente esta medida seja proveitosa e não vexatoria.

É retrogradarmos um seculo no caminho da civilisação.

O sr. Jeronymo Pimentel (relator): — O discurso do nobre ministro do reino dispensava-me por certo de tomar a palavra para defender o projecto; tão claro elle foi, tão preciso, tão convicente, que não sei, nem poderei acrescentar quaesquer outras considerações no intuito de mostrar a utilidade d’esta medida.

Vejo, porém, que as ponderações tão lucidas do nobre ministro não poderam convencer o digno par, que insistia na sua impugnação ao projecto, sem que todavia apresentasse novas rasões. As que s. exa. adduzira anteriormente, foram desfeitas da maneira mais completa pelo discurso do sr. ministro.

- Como as rasões apresentadas não foram novas, tambem não tenho que lhes contrapor novos argumentos, e o motivo principal que me levou a pedir a palavra foi para declarar, por parte da commissão de administração, que não posso acceitar a substituição que o digno par mandou para a mesa.

Disse s. exa. que, embora houvesse uma lei que exigia passaportes para o exterior do reino, lei que tinha a data de 31 de janeiro de 1863, todavia não estava em execução, porquanto o regulamento de 7 de abril, publicado em virtude d’essa mesma lei, não se havia cumprido.

Ora, é innegavel que a referida lei estava em execução, e tanto que o estado cobrou a importancia da receita dos passaportes por ella creada. Mas, admittindo mesmo o caso de que não estivesse em execução, ao governo cumpria fazel-a executar, ou então propor a sua revogação. Rasões de conveniencia publica aconselhavam que se pozesse em plena execução o decreto regulamentar de 7 de abril de 1863,

promulgando-se para isso as providencias que necessarias fossem.

Alem de que não havia rasão para que se exigissem passaportes aos que saiam pelos portos de mar e não se exigissem aos que saiam pela raia secca. Era esta uma excepção, que realmente não se justificava.

Mas, diz o digno par, é um vexame, é um torpeço ao principio do livre transito garantido na nossa constituição, porque esta, no artigo 140.°, § 5.°, permitte que todos possam conservar-se ou sair do reino, conforme lhes convier. Mas acrescenta, esse mesmo artigo, comtanto que se sujeitem aos regulamentos policiaes, e salvo prejuizo de terceiro.

Ora, os regulamentos policiaes que se fizeram no interesse publico exigem a impetração de passaportes.

É isso o que dispõe o decreto de 7 de abril de 1863 e este, que constitue o assumpto d’este projecto de lei, e que vem completar aquelle.

Não se fez, portanto, uma innovação n’esta parte, e o que se fez foi modificar ainda algumas disposições prescriptas n’aquelle decreto, inteiramente favoraveis, como demonstrou o sr. ministro do reino.

Mas o digno par, para ser logico e coherente, não devia propor sómente a abolição dos passaportes para o exterior, e tanto pelos portos de mar, como pela raia secca, mas ainda a de todas as providencias e instituições que existem no paiz, e que podem ser um estorvo a essa mesma liberdade do transito.

Por exemplo, a conservação do lazareto e das quarentenas, não são porventura um estorvo ao livre transito?

Tratando s. exa. dos governos, disse que elles têem uma tendencia extraordinaria para se submetter ás exigencias do estrangeiro, e para corroborar a sua asserção apresentou o facto das companhias de seguros estrangeiras não pagarem contribuição industrial, ou de pagarem uma taxa inferior á das companhias nacionaes.

S. exa. sabe perfeitamente que na ultima lei, ha pouco votada sobre contribuição industrial, foi elevada a taxa d’essa contribuição imposta ás agencias de companhias estrangeiras.

Não tem sido pelo facto que o digno par apontou, mas por rasões de outra ordem, sem ser tambem por mero favoritismo ou por deferencia para com o estrangeiro, que essas agencias têem gosado até hoje de uma certa differença na contribuição industrial, differença que resulta principalmente de serem agencias e não companhias.

Justificava-se ainda essa differença por motivos de ordem economica, pela necessidade de attrahir capitães, porque os nossos não abundavam para emprezas d’esta ordem.

Referindo-se ao modo como se opera a emigração, que ainda é mais por mar, que pela via secca, citou s. exa. o exemplo da Italia.

Mas que importa que lá seja assim, quando aqui se dá o contrario?

O projecto, no seu objectivo principal, não foi impedir a emigração legal, que essa continua e é franca, mas sim fazer diminuir a emigração clandestina, que se tem apresentado n’uma proporção extraordinaria.

Como todos sabem, é ella que produz a falta de recrutas para os contingentes militares, principalmente nas provincias do norte; é ella que faz escapar á punição muitos que o registo indica como criminosos, e é ella ainda que nos vae roubar aos trabalhos do campo e á vida nacional muitos rapazes de mais de quatorze annos.

Ora, o projecto não tem em vista evitar por completo a emigração clandestina, mas pelo menos fazel-a diminuir quanto possivel, por meio de uma fiscalisação rigorosa, que permitte a exigencia dos passaportes.

S. exa. disse, e pareceu-me insistir, que o fim d’este projecto era, principalmente, obter dinheiro já para collocar afilhados, já para subsidiar estabelecimentos de caridade.