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222 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

isso não deixarei neste momento, que eu considero apropriado, de fazer algumas reflexões.

A camara deve estar lembrada de que o digno par, o sr. Mártens Ferrão, relator do projecto de resposta ao discurso da coroa, dirigiu uma pergunta ao governo relativamente á necessidade imperiosa que havia de se discutir o orçamento do estado, e que logo em seguida, como amigo que s. exa. é dos srs. ministros, lhes disse que não exigia uma prompta resposta. O que é certo, sr. presidente, é que se o sr. Mártens Ferrão bem pediu ao governo que não se precipitasse em lhe responder, melhor ainda lhe fez a vontade o sr. presidente do conselho, que nem uma palavra proferiu, e nem um gesto fez, que fosse um signal de acquiescencia da sua parte. Portanto, podemos ter quasi a certeza, repito, de que o orçamento não se discute. Farei, pois, uma succinta analyse da questão de fazenda, o para isso não poderei deixar de recorrer aos meus apontamentos em tudo que diz respeito a algarismos.

Nós temos pelo orçamento rectificado para o exercicio de 1884-1885, base das minhas apreciações, um deficit ordinario de 1.423:000$000 réis.

Sirvo-me de numeros redondos para facilitar mais as minhas demonstrações.

O sr. ministro entende que o deficit de 1.423:000$000 réis poderá ainda descer a 600:000$000 réis, attendendo ao augmento da receita, e ás vacaturas que se hão de dar nos quadros.

Peço licença para dizer ao nobre ministro que me não é possivel acceitar estas reducções, porquanto não creio que s. exa. as possa conseguir, embora sejam bons os seus desejos de realisar esse desideratum. No anno passado, por exemplo, disse tambem s. exa. que o deficit seria apenas de 969:000$000 réis, e agora vejo que teve de lhe ser addicionada a verba de 454:000$000 réis, o que perfaz o déficit de 1.423:000$000 réis, e não o que tinha sido calculado.

Passemos agora á despeza extraordinaria.

Esta despeza tinha sido orçada em 5.238:000$000 réis. Houve, porém, posteriormente um acrescimo de réis 1.782:000$000. Mas porque parte d'esta despeza tinha receitas proprias, baixou a final a despeza extraordinaria a 5.813:000$000 réis.

Ora juntando a esta despeza extraordinaria, depois de feitas todas estas rectificações por s. exa., os 1.423:000$000 réis do deficit ordinario, teremos em conclusão um deficit total bastante superior a 7.000:000$000 réis.

Parece-me que pela demonstração que acabo de fazer, este meu calculo é exacto.. Ora, sendo assim, não será licito perguntar se é realmente serio (e eu dizendo isto não quero offender o caracter de ninguem, porque não é isso proprio da minha educação nem da minha indole), mas não haveria, pergunto, uma. certa leviandade da parte dos srs. ministros pondo na bôca do soberano a affirmativa de que a situação da fazenda publica era sufficientemente desafrontada? E em presença de um deficit superior a 7.000:000$000 réis não seria conveniente moderarmos as nossas despezas, tanto mais quanto circumstancias especiaes o recommendavam, pois a situação dos mercados estrangeiros em relação aos nossos fundos não era nem melhor, nem mais favoravel do que no anno anterior.

Alem d'isto vemos que em 1881, quando o partido progressista saiu do poder, a cotação dos nossos titulos de divida externa era de 54 1/2 por cento, e que hoje oscilla entre 46 e 47 por cento. E não me refiro já á sua maior depreciação, que, a meu ver, e penso que na opinião dos srs. ministros, foi devida á questão do caminho de ferro de norte e leste, quando elles desceram até 43 por cento, pois bem sei que essa rapida descida foi attribuida, e com rasão, a um jogo bolsista.

O sr. ministro da fazenda (e esta é a parte mais interessante do seu relatorio) fez um detido estudo sobre o augmento das nossas receitas, e depois de ter feito os seus calculos, diz-nos que no periodo de cinco annos, isto é, desde 1878-1879 a 1883-1884 a nossa receita tinha crescido na rasão de 1.000:000$000 réis por anno. A opposição não occulia nem põe de parte esse elemento de apreciação, e tanto assim é que o sr. condo de Valbom no seu ultimo e excellente discurso qualificou de verdadeiramente extraordinario o augmento da receita. Mas, sr. presidente, isto não nos póde satisfazer inteiramente, porque se as receitas augmentaram como dez, a verdade tambem é que as despezas têem crescido como vinte.

Que me importa que a receita augmente em um anno 1.000:000$000 réis se as despezas crescem na rasão de 2.000:000$000 réis? E se não vejamos que emquanto no exercicio de 1881-1882 a despeza foi de 31.980:000$000 réis, ella é hoje, segundo o orçamento rectificado, de réis 40.000:000$000!

Portanto, não se podia nem deveria dizer no discurso da corôa que a nossa situação financeira é desaffrontada.

Infelizmente se nós examinarmos essas despezas extraordinarias que acresceram no ultimo anno, havemos de ver que muitas d'ellas não têem uma explicação plausivel, e que outras não se justificam pela necessidade urgente de as fazer.

E a não ser assim, não se comprehenderia que nós não possamos resolver a questão de fazenda, tendo apenas um deficit de 1.423:000$000 réis e havendo um augmento annual de 1.000:000$000 réis nas nossas receitas. E a rasão e no emtanto muito simples, e é porque os juros que se teem de pagar em consequencia do dinheiro que se levanta para fazer face ás despezas extraordinarias, vão augmentar annualmente o deficit ordinario. (Apoiados.) É por isso, pois, que, embora as receitas augmentem, mas seguindo este systema, nunca havemos de chegar a dar cabo do deficit.

O sr. Henrique de Macedo: - Nem querem acabar com elle.

O Orador: - Sr. presidente, devemos ter em vista que o estado actual da fazenda publica merece toda a nossa attenção e pede todo o nosso cuidado.

Devemos ter em vista que um qualquer acontecimento, ainda de pequena importancia para a economia do nosso paiz, poderá vir a causar-nos graves transtornos. Mas o que é muito notavel é que estas recommendações, que estou fazendo, sobre a necessidade de moderar as despezas, se encontram nos relatorios dos srs. ministros da fazenda regeneradores.

Em 1883 dizia no seu relatorio o sr. Fontes:

"Ha dois inimigos da verdade, o optimismo e o pessimismo."

E mais abaixo acrescentava:

" As receitas cobram-se e crescem todos os annos; é preciso, porém, que as despezas não cresçam tanto ou mais do que ellas."

De modo que o sr. Fontes, aquelle a quem nós accusamos de principal gastador, reconhecia esta grande verdade.

O que é certo é que, quando nós lemos os relatorios dos ministros da fazenda regeneradores, parecem-nos uns relatorios quasi á progressista; mas quando se passa á pratica, quando se vae examinar a sua gerencia financeira, essa é invariavelmente á regeneradora. Sempre, sempre.

Mas, sr. presidente, a questão não está só em moderar as despezas, como tambem em tratar de ver quaes são aquellas que não se podem adiar, e para as quaes nós temos forçosamente de fazer sacrificios.

Eu observo, sr. presidente, por exemplo, que temos fatalmente de fazer em pouco tempo despezas extraordinarias para duas ordens de serviços, sendo o primeiro com as obras dos melhoramentos do porto de Lisboa.

E digo que não podemos deixar de as fazer, embora nos custe o sacrificio; e apesar mesmo dó que ouvi dizer aqui