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REPÚBLICA PORTUGUESA

DIÁRIO DO SENADO

SESSÃO N.º 10

EM 27 DE JUNHO DE 1919

Presidência do Exmo. Sr. Júlio Ernesto de Lima Duque

Secretários os Exmos. Srs.

Bernardo Pais de Almeida

José Mendes dos Reis

Sumário. — Chamada e abertura da sessão. Leitura e aprovação da acta. Dá-se conta do expediente.

Antes da ordem do dia.—O Sr. Vasconcelos Dias faz considerações sôbre a falta de como especialmente em Lisboa.

O Sr. Vasco Marques Jaz considerações relativas à necessidade de rectificar um ponto da acta.

Fala tambêm nobre as dificuldades de passagens nos paquetes que partem do Tejo, o que dificulta a situação dos Deputados e Senadores petas ilhas e ultramar.

O Sr. Lima Alves apresenta um requerimento pedindo esclarecimentos pelo Ministério da Agricultura.

É lida uma proposta de lei, vinda da Câmara dos Deputados, pedindo ao Parlamento aprovação para dois duodécimos.

O Sr. Herculano Galhardo requere urgência e dispensa do Regimento para esta proposta de lei.

Declaram aprovar a urgência e dispensa do Regimento os Srs. Lima Duque, em nome do Partido Evolucionista e o Sr. Herculano Galhardo, em nome do Partido Republicano Português.

O Sr. Jacinto Nunes invoca o Regimento sôbre o assunto.

É dispensada a votação nominal.

Entra a proposta em discussão.

O Sr. Herculano Galhardo requere a suspensão da sessão até que a comissão de finanças dê o seu parecer sôbre a proposta de lei.

É aprovado, sendo interrompida a sessão por 30 minutos.

Reaberta a sessão, o Sr. Herculano Galhardo manda para a Mesa o parecer da comissão de Finanças.

É lido na Mesa.

Sôbre a generalidade tia proposta de lei usam da palavra os Srs. Lima Duque, Alberto da Silveira e Herculano Galhardo.

É aprovada a generalidade, sendo aprovada depois, sem discussão, a especialidade.

São aprovadas tambêm as propostas de eliminação de artigos.

É aprovada a dispensa de leitura da última redacção, o requerimento do Sr. Vasconcelos Dias.

São proclamados os Senadores pelo distrito da Horta.

O Sr. Jacinto Nunes declara constituída a comissão de administração pública.

O Sr. Presidente encerra a sessão.

Presentes à chamada 28 Srs. Senadores.

São os seguintes:

Alberto Carlos da Silveira.

Alfredo Augusto da Silva Pires.

António Alves de Oliveira.

António Augusto Teixeira.

António Maria da Silva Barreto.

António de Oliveira e Castro.

Armindo de Freitas Ribeiro de Faria.

Artur Octávio do Rêgo Chaves.

Bernardo Pais de Almeida.

César Justino de Lima Alves.

Cristóvão Moniz.

Desidério Augusto Ferro de Bessa.

Ezequiel do Sobral Rodrigues.

Joaquim Pereira Gil de Matos.

José Duarte Dias de Andrade.

José Jacinto Nunes.

José Joaquim Fernandes de Almeida.

José Joaquim Pereira Osório.

José Maria de Moura Barata Feio Terenas.

José Mendes dos Reis.

José Nunes do Nascimento.

Júlio Ernesto de Lima Duque.

Luís António de Vasconcelos Dias.

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Luís Inocêncio Ramos Pereira.

Pedro do Amaral Bôto Machado.

Raimundo Enes Meira.

Rodrigo Guerra Álvares Cabral.

Vasco Gonçalves Marques.

Srs. Senadores que entraram durante a sessão:

Abílio de Lobão Soeiro.

Afonso Henriques do Prado Castro e Lemos.

Alfredo Narciso Marçal Martins Portugal.

António Xavier Correia Barreto.

Herculano Jorge Galhardo.

Nicolau Mesquita.

Srs. Senadores que não compareceram à sessão:

Abel Hipólito.

Alfredo Rodrigues Gaspar.

António Gomes de Sousa Varela.

António Maria Baptista.

Augusto Casimiro Alves Monteiro.

Celestino Germano Pais de Almeida.

Francisco Manuel Dias Pereira.

Heitor Eugénio de Magalhães Passos.

Henrique Jardim de Vilhena.

João Cabral de Castro Freire Falcão.

João Carlos de Melo Barreto.

João Namorado de Aguiar.

Joaquim Celorico Palma.

Jorge Frederico Velez Caroço.

José Ramos Preto.

Júlio Augusto Ribeiro da Silva.

Manuel Augusto Martins.

Manuel Gaspar de Lemos.

Pedro Alfredo de Morais Rosa.

Pedro Virgolino Ferraz Chaves.

Rodrigo Alfredo Pereira de Castro.

Silvério da Rocha e Cunha.

Torcato Luís de Magalhães.

Pelas 15 horas o Sr. Presidente manda proceder à chamada.

Tendo-se verificado a presença da 25 Srs. Senadores, S. Exa. declara aberta a sessão.

Lida a acta da sessão anterior, foi aprovada, sem reclamação.

Dia no das Sessões do Senado Deu-se conta do seguinte Expediente

Ofícios

Da Câmara dos Deputados, acompanhando o projecto de lei que autoriza o Govêrno a despender até dois duodécimos das dotações fixadas para cada Ministério, no ano económico de 1919-1920.

Aprovado com alterações.

Do Ministério do Interior, acompanhando o acto de apuramento de Senadores pela Horta.

Para a comissão verificadora de poderes.

Proposta

De conformidade com o que foi proposto pelo Senador Sr. Ramos Preto e aprovado por esta Câmara, proponho que que declarado na acta que aquele Senador foi substituído na comissão de legislação civil pelo Sr,, Joaquim Pereira Gil de Matos e na comissão de fomento pelo signatário Vasco Gonçalves Marques.— Vasco Gonçalves Marques.

Para a Secretária.

Comissão de finanças

Está constituída a comissão de finanças do Senado, escolhendo para presidente o Sr. Herculano Galhardo e a mim para secretário. — Vasco Marques.

Para a Secretaria.

Telegramas

Penedono, 26.—Empregados administração concelho Penedono solicitam V. Exa. deferimento suas justas reclamações sôbre melhoria situação tam crítica momento presente.

Para o «Diário das Sessões».

Machico Madeira, 26. — Câmara Municipal concelho Machico achando ruinoso decreto n.° 5:376 de 9 de Abril último, protesta perante V. Exa. contra referido decreto em nome agricultores êste concelho.

Para o «Diário das Sessões».

Representação

Dos professores da Universidade de Coimbra e da Federação Académica de

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Lisboa, relativas à extinção da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

Requerimentos

Requeiro que, pelo Ministério da Agricultura, me sejam fornecidos com urgência os seguintes esclarecimentos sôbre a Estação de Ensaios de Maquinismos Agrícolas:

1.° Nota dos estudos, ensaios e trabalhos de experimentação, tanto de natureza scientífica como prática, sôbre máquinas, aparelhos e instrumentes úteis ao desenvolvimento da agricultura e das indústrias dela derivadas, com o intuito de apreciar o seu valor e contribuir para o seu aperfeiçoamento, e indicação das conclusões tiradas por êsses estudos, ensaios ou trabalhos, realizados na Estação de Ensaios de Máquinas Agrícolas;

2.° Número e qualidade de técnicos preparados ou em preparação para a montagem, trabalho, conservação e reparação de maquinaria agrícola;

3.° Relação de material actualmente pertencente à Estação de ensaios de Máquinas Agrícolas, de aquisição própria ou que pelo Estado lhe tenha sido entregue, e nota da distribuição que dêle tenha sido feita pelos estabelecimentos dependentes do Ministério de Agricultura, agricultores, associações e sindicatos, como designação do que se acha ainda distribuído e a quem e em depósito na Estação de Ensaios de Máquinas Agrícolas;

4.° Condições em que êsse material foi distribuído (Empréstimo? Aluguel?);

5.° Nota dos trabalhos executados na Estação de Ensaios de Máquinas Agrícolas, para subsídio ao ensino da Cadeira de Mecânica no Instituto Superior de Agronomia;

6.° Nota dos estudos, experiências e demonstrações feitas por iniciativa da Estação de Ensaios de Máquinas Agrícolas, sôbre material agrícola;

7.° Nota do pessoal técnico, administrativo e menor já nomeado para a Estação de Máquinas Agrícolas e forma de nomeação (contrato? provisório? definitivo?);

8.° Nota especificada de despesas feitas com compra, instalação de mobiliário e material scientífico, experimentação e de oficinas;

9.° Condições de abonos, ajudas de custo ou vencimentos em que o director da

Estação de Ensaios de Máquinas Agrícolas anda no estrangeiro. — O Senador, César Justino de Lima Alves.

Foram proclamados Senadores os Srs. José Machado Serpa, Amaro Justiniano de Azevedo Gomes e Manuel de Sousa da Câmara.

Parecer

Da comissão de finanças, sôbre a proposta de lei dos duodécimos.

Aprovado.

Projecto de lei

Do Sr. Senador Mendes Reis, licenciando os oficiais milicianos que não tenham prestado serviço de campanha em África ou França.

Para a comissão de guerra.

O Sr. Presidente: — Está aberta a inscrição para antes da ordem do dia e tem a palavra o Sr. Vasconcelos Dias.

O Sr. Vasconcelos Dias: — Sr. Presidente: pedi a palavra para comunicar à Câmara que já se acha constituída a comissão do Orçamento, tendo-me escolhido para Presidente e ao Sr. Senador Vasco Marques para Secretário.

Aproveito a ocasião de estar no uso da palavra para chamar a atenção de V. Exa. e da Câmara, para um facto que considero gravíssimo, qual é o da falta de carne que se nota nos mercados do país, e muito especialmente em Lisboa, quando é certo que, segundo uma nota que tenho aqui se reconhece que não é positivamente a falta de carne, mas sim o seu elevado preço nos mercados do país e ainda e muito principalmente a venda de gado pelos proprietários nas suas casas, aonde os negociantes as vão procurar para as enviar — diz-se para o Pôrto — mas de facto para Espanha, a causa principal dessa carestia.

Não sei se isto será ou não verdade, pois que não tive tempo para inquirir da verdade dos factos, mas como se trata de um assunto de bastante gravidade, não quis deixar de chamar a atenção da Câmara para êste assunto a fim de que lhe seja pôsto imediatamente cobro, se de facto assim ocorrer.

Vou agora ler à Câmara uma pé-

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quena noticia que vem hoje publicada na Imprensa (Século), que é a seguinte:

«Gado abatido.— No matadouro de Lisboa foram ontem abatidos quatro bois e vinte e cinco carneiros para consumo dos hospitais».

Ora já estão vendo V. Exa. 35 que quatro bois e vinte e cinco carneiros deve ser considerada quantidade muito inferior ao mínimo indispensável para consumo dos hospitais.

Chamo, pois, a atenção de V. Exa. e da Câmara sobro o assunto, visto não haver ainda Ministério constituído para chamar para êle a atenção do Ministro respectivo, por considerar da mais úrgica necessidade e da mais alta moralidade terminar de vez com os processos até agora seguidos de exploração de gados pela elevação constante e inconsiderada, dos preços das subsistências alimentares, assunto que considero como o mais importante a resolver no gravíssimo momento que passa para a Pátria e para a. República Portuguesa.

É absolutamente indispensável, custe o que custar, pôr termo, e rapidamente, à angustiosa situação em que se debate a população portuguesa, especialmente a de Lisboa, lançando-se constantemente na greve para obter melhoria de situação, e constantemente expoliada pela ganância insaciável dos exploradores das subsistências alimentares.

Tenho dito.

O Sr. Vasco Marques: — Sr. Presidente: pedi a palavra para comunicar à Câmara que acabo de receber um a carta do Sr. Senador Heitor Eugénio de Magalhães Passos, dizendo-me que em virtude de ter sido atropelado por um automóvel não poderá comparecer a algumas sessões desta Câmara, para o que mandará oportunamente para a Câmara o competente atestado médico.

Aproveito a ocasião de estar com a palavra para chamar a atenção de V. Exa., Sr. Presidente, para a proposta feita aqui pelo Sr. Senador Ramos Preto, e que foi aprovada per esta Câmara; mus na acta da sessão está exactamente o contrário do que deve ser, isto é, indica que para a comissão do fomento foi eleito o Sr. Pereira Gil e eu para a comissão de legislação civil.

Chamo, portanto, a atenção de V. Exa. pura o assunto, a fim de ser feita a devida rectificação.

Aproveito mais a ocasião para chamar a atenção de V. Exa. e da Câmara para um assunto que é da máxima gravidade e que decerto é conhecido de toda a Câmara, qual é a dificuldade que actualmente existo em se arranjar passagens nos vapores, e assim acontece que os Deputados e Senadores eleitos têm de andar de chapéu na mão pelas agências a pedir uma passagem para tomarem assento na sala das sessões do Congresso, ou para regressarem às suas terras.

Parece-me, pois, Sr. Presidente, que esta situação não pode continuar assim; ela é deprimente.

Um funcionário público, por mais modesta que seja a sua categoria, arranja sempre passagem de preferência a outro qualquer indivíduo. Para os Senadores e Deputados o caso parece não estar previsto, e têm por vezes de ser preteridos, não podendo vir tomar assento no Congresso, ou não podendo ir para as suas terras;

Pedia a V. Exa. Sr. Presidente, que me dissesse se êste assunto deve ser regulado por uma proposta de lei ou se V. Exa., entendendo-se com o Sr. Presidente da Câmara dos Deputados, podia dar remédio a êste mal.

Nós vêmo-nos obrigados a mendigar uma passagem, quando isso não sucede, como disse, com qualquer funcionário público.

De maneira que eu pedia a V. Exa. me dissesse qual das maneiras a que me acabo de referir é a preferível: a proposta ou a intervenção de V. Exa. juntamente com o Sr. Presidente da Câmara dos Deputados.

Tenho dito.

O Sr. Presidente: — Parece-me que não está nas atribuições dos Presidentes das duas Câmaras o fazerem o que V. Exa. deseja. Talvez seja conveniente V. Exa. ou algum outro Sr. Senador apresentar um projecto de lei ao Parlamento.

O Sr. Vasco Marques: — Sr. Presidente: Eu agradeço a explicação de V. Exa. e

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então na próxima sessão apresentarei um projecto de lei no sentido a que me referi.

O Sr. Lima Alves: — Sr. Presidente: Pedi a palavra simplesmente para mandar para a Mesa um requerimento, pedindo documentos pelo Ministério da Agricultura.

O Sr. Presidente: — Vai ler-se uma proposta de lei vinda da outra Câmara.

Seguidamente leu-se na Mesa a proposta relativa à autorização para dois duodécimo.

O Sr. Herculano Galhardo: — Requeiro urgência e dispensa do Regimento para a proposta que acaba de ser lida.

Ainda, Sr. Presidente, que eu reconheça que se trata de uma proposta da mais alta importância, como faltam poucos dias para terminar o ano económico, alêm de ter a outra Câmara de apreciar as emendas que porventura aqui lhe sejam introduzidas, eu requeiro no sentido indicado.

O Sr. Presidente: — Vai proceder-se à votação nominal.

O Sr. Lima Duque: — Sr. Presidente: eu pedi a palavra simplesmente para declarar a V. Exa. e à Câmara, que os Senadores, evolucionistas votam a urgência e a dispensa do Regimento requeridas, reservando-me para quando se discutir a proposta para apresentar as razões porque o fazem.

O Sr. Herculano Galhardo: — Pedi a palavra para declarar que os Senadores dêste lado da Câmara votam a urgência ,e a dispensa do Regimento para a proposta que há, pouco foi lida na Mesa.

O Sr. Jacinto Nunes (para invocar o Regimento): — Invoco o § único do artigo 90.° que impõe o ser ouvida a comissão de finanças.

O Sr. Alberto da Silveira: — É para declarar, simplesmente. Sr. Presidente, que os Senadores da União Republicana dispensara a chamada para a votação nominal.

O Sr. Presidente: — Está a proposta em discussão na generalidade.

O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente: concordando com a opinião expendida pelo Sr. Senador Jacinto Nunes, eu proporia que a sessão fôsse interrompida, a fim de que a comissão de finanças dêsse imediatamente o seu parecer sôbre a proposta, para o que reùniria durante a interrupção.

Isto caso o Sr. Senador Jacinto Nunes insista.

O Sr. Presidente: — Vou consultar o Senado sôbre o requerimento feito pelo Sr. Herculano Galhardo.

Foi aprovado o requerimento.

O Sr. Presidente: — Interrompo a sessão até poder ser presente o parecer da comissão de finanças.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Às 16 horas e 20 minutos é reaberta a sessão.

O Sr. Herculano Galhardo: — Por parte da comissão de finanças mando para a Mesa o parecer relativo à proposta de lei dos duodécimos.

O Sr. Jacinto Nunes: — Participo a V. Exa. e ao Senado que está constituída a comissão de administração pública, tendo-me escolhido para presidente e ao Sr. Vasco Marques para secretário.

É lido na Mesa o parecer da comissão de finanças e entra em discussão, na generalidade, a proposta de lei.

O Sr. Lima Duque: — Pedi a palavra para justificar o ter assinado com declarações o parecer da comissão de finanças.

Essas declarações não são própriamente relativas, à doutrina do parecer, mas dizem respeito à proposta de lei em discussão.

Esta proposta de lei não pode deixar de ser aprovada pelos Senadores evolucionistas, porque, sendo o Partido Evolucionista um partido de Govêrno, não pode recusar a qualquer Govêrno os meios de prover à administração pública.

Todavia, a apresentação desta proposta de lei revela, era primeiro lugar, uma incúria da parte do Govêrno em organizar o Orçamento do Estado, que constitui um dos pontos essenciais da administração pública.

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Os Govêrnos devem estar sempre prevenidos com os elementos suficientes para apresentaram às Câmaras, na época própria, o Orçamento do Estado, de modo a poder-se prescindir de leis de duodécimos, que não dão tempo ao Parlamento a poder pronunciar-se, com conhecimento de causa, em consequência das circunstâncias apertadas em que estas leis em de ser votadas para não serem prejudicados os serviços públicos.

Por outro lado. a simples leitura da proposta de lei em discussão dá a conhecer um quadro triste o desolador no que respeita à nessa questão financeira, o que deve pôr o Parlamento de sobreaviso para que, quando o Orçamento vier à discussão, se exerça uma fiscalização rigorosa das verbas orçamentais, a fim de obstar à derrocada financeira que se está a fazer.

Basta fazer notar à Câmara que o duodécimo é de 13:700 contos, o dobre do ano passado.

Só exercendo o Parlamento essa fiscalização rigorosa é que o país poderá ter , confiança nas instituições parlamentares.

O orador não reviu.

O Sr. Alberto da Silveira: — Sr. Presidente: antes de entrar própriamente no assunto de que trata a proposta que está sôbre a Mesa, permita-me V. Exa. que laça um reparo que me parece justo, principalmente sob o aspecto parlamentar e constitucional.

O Govêrno está em crise, abriu a sua crise na Câmara dos Deputados e esqueceu-se de vir ao Senado comunicar que estava em crise.

Estou convencido, não tenho disso a mínima dúvida mesmo, que não houve da parte do Govêrno nem de nenhum dos seus; membros, cujos primores de carácter sou o primeiro a reconhecer, a mais leve idea de melindrar o Senado com esta alta.

Mas o facto é o lacto; o as praxes constitucionais precisam de ser mantidas para que não caia sôbre o Senado desprestigio maior do que aquele que já vem caindo de tristes factos atrasados.

Nada perturbaria a marcha para a solução da crise o facto do Govêrno vir aqui dizer que se achava demissionário,

Em nada era prejudicada a seqüência das démarches necessárias para a solução e cumpria-se a praxe constitucional. Não se procedeu assim e lamento-o porque pela sucessão destas faltas perde-se o respeito mútuo que deve existir entre o Poder Executivo e o Legislativo.

Repito, Dão vai nestes reparos a mais leve idea de melindrar os Srs. Ministros: todos me merecem o maior respeito e consideração pelos primores do seu carácter. Era uma praxe constitucional a cumprir.

Pôsto isto vou entrar no assunto.

Apresentou-se no Parlamento uma proposta pedindo dois duodécimos de treze mil e tantos contos cada um para que o Govêrno possa governar, manter os serviços públicos, visto que não há orçamento.

E para admirar já a verba. Mas não é notável que um Govêrno que teve tempo para reformar quási todas as Secretarias do Estado, aumentando enormemente o número de empregados, desde serventes até directores gerais, não pudesse dispensar se alguns momentos da árdua e ingrata tareia de criar lugares e empregos para rever os orçamentos anteriores, estudar os decretos que criaram receitas e aumentaram despesas e preparar um orçamento para apresentar ao Parlamento.

É pena que isto sucedesse; e é pena que tudo isto se fizesse numa espécie, como direi? de boémia, sem se atender a que o país tem obrigação de conhecer o que se passa e como é administrado.

Nada sabe do que se tem gasto enormemente, como se gastou com a guerra fera do país, o que é ainda mais do que com a guerra dentro dele.

Mas o que é facto é que a Inglaterra estava na guerra como nós, em circunstâncias muito diversas, gastando enorme-mente, emprestando aos aliados e fornecendo-lhes tambêm, desde o vestuário até a comida e material de guerra, e os Govêrnos Ingleses apresentaram-se aos seus parlamentos com um orçamento equilibrado.

Isto, em comparação com o que sucede entre nós, leva-nos a não saber o que nos pode acontecer.

É para lamentar que o Govêrno não tivesse pensado em trazer maiores esclarecimentos com essa proposta, que conheço há meia hora, mercê da amabili-

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dade do Sr. Presidente da comissão de finanças, sem o que eu estaria absolutamente desconhecedor da matéria em discussão, como, de resto, o está toda a Câmara.

Traz-nos esta proposta de dois duodécimos, de treze mil e tantos contos cada um, a triste perspectiva de um orçamento de 160 mil contos, aproximadamente o dobro dos orçamentos anteriores à guerra. É um pavor:

E vem tal proposta sem quaisquer documentos que a elucidem, sem o estudo dos decretos que elevaram por tal forma as despegas públicas com a indicação daquelas que a breve trecho devem diminuir ou desaparecer, sem a indicação das receitas possíveis para ocorrer a um orçamento que considero absolutamente ruinoso para o país!

E para frizar é que é um Govêrno que se sente sem o apoio do país e do Parlamento que traz à última hora esta proposta de elucidação fraquíssima, e que anuncia um orçamento de 160 mil contos, que ninguêm sabe como devem obter-se, a não ser recorrendo ao papel moeda do Banco de Portugal, cuja desvalorização se acentua de cada vez mais.

Decerto que a continuarmos com os moldes de administração pública que temos usado nos últimos tempos a ruína é evidente. E é porque em Portugal não haja estadistas, financeiros, bons administradores? Não o acredito. Pois, então, é preciso ir procurá-los, trazê-los para as cadeiras do Govêrno, e entrarmos num caminho de progresso, de trabalho, de economia e de boa administração que possam promover o ressurgimento da nossa terra.

Outro aspecto da questão e não menos grave é o de, votando-se esta proposta, ir o Parlamento sancionar toda a série de decretos, bons ou maus, publicados anteriormente.

Ninguêm pode afirmar que toda essa matéria legislativa que se publicou nestes últimos anos possa ser isenta de pecado e de defeitos.

Podemos até afirmar o contrário. Toda ela está cheia de enormes defeitos, toda ela precisa de larguíssimas correcções. E o papel do Govêrno devia ser o de corrigidos, mas, em vez disso, aumentou os defeitos anteriores.

Reformaram-se secretarias de Estado, em tempo de guerra, como se isso fôsse a cousa mais natural. Chegou-se até a dar foros de cousa necessária, mesmo após a guerra, ao célebre Ministério dos Abastecimentos, cuja criação seria inútil, mesmo no tempo de guerra, pois que em qualquer dos Ministérios se criaria uma secção destinada ao serviço de abastecimentos. Mas desde que essa inutilidade foi criada, ela deveria ter deixado de existir logo que se assinou o armistício.

Todavia, como êsse Ministério já está incluído no Orçamento, o Parlamento sanciona uma excrescência — permita-se-me a expressão — que nunca devia existir.

Êsse Ministério não se compreende que se mantenha!

Era portanto ao Govêrno que competia tê-lo feito desaparecer.

Mais ainda: mesmo que êle fôsse criado, tudo indica-a que nele fossem colocados os funcionários que pudessem ser dispensados em todos os outros Ministérios, e em todos havia muitos que o poderiam ser.

As secretarias de Estado regorgitam de funcionários, tem mesmo a pletora.

Aos indivíduos nomeados para êsse Ministério, não se lhe devia dar a categoria de funcionários do Estado, mas sim a de assalariados, cujos serviços terminavam, quando êsse Ministério deixasse de existir.

Tudo isto era o que o bom senso mandava que se fizesse, mas foi isto o que se não fez.

Tudo isto era o que o Govêrno devia ter previsto, antes de apresentar a proposta de lei que apresentou, e cortar aquilo que devia cortar.

Sr. Presidente: lamento ter de dizer estas palavras pouco agradáveis aos membros do Govêrno demissionário, tanto mais que por todos os seus membros eu tenho o maior respeito e consideração.

Mas eu tenho obrigação, neste lugar, de dizer aquilo que sinto o que julgo ser a verdade.

Vai, pois, o Senado sancionar, não só os bons decretos, que porventura tenham sido publicados, mas tambêm os maus, e dar-lhes foros de sancção parlamentar, o que é sempre uma cousa grave.

Veja bem o Senado o que faz. A União Republicana entende que não

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deveria ser discutido êste projecto de Lei, com tam pouca elucidação documentada e com tam pouco tempo para o estudar, visto que de todos os seus membros, que têm a honra, de ter assento nesta Câmara, só eu o pude ler, por amabilidade captivante do Sr. Presidente da comissão de finanças, como já afirmei.

Tem absoluta falta de documentação a proposta, 3 com ela não se elucida nem o Parlamento nem o país, mas são sempre 160:000 contos que o país tem a pagar anualmente, importância esta que nenhum de nós pode dizer onde se há-de ir buscar.

A União Republicana não pode portanto, por estas razões, dar o seu voto à proposta, mas tambêm não vota contra.

Deixa a responsabilidade dessa votação à maioria, procedendo aqui pala mesma forma como o leader da União procedeu na outra casa do Parlamento.

Tenho dito.

O Sr. Herculano Galhardo: — Sr. Presidente, o Sr. Senador Alberto da Silveira acabou de referir-se a dois factos importantes sob o ponto de vista constitucional, um e, que S. Exa. liga grande importância, e que a tem, incontestavelmente, pelo que poderia significar, e o outro, que assume maiores proporções, pelo desprestígio que dêle resulta para as instituições parlamentares.

Não é minha missão neste momento defender o Govêrno; não o defenderei, pois mas não o acuso tambêm; o Govêrno está demissionário. Devo, porêm, dar ao Sr. Senador Silveira e á Câmara a explicação que me parece ser a da falta do Govêrno aqui.

O Govêrno esteve no Senado há cêrca de duas semanas e declarou finda a sua missão. Caca um dos leaders desta Câmara apreciou a declaração ministerial, e por ela o Govêrno concluiu que esta Câmara concordava em que o mesmo Govêrno dêsse por finda a sua pesada tarefa. O Govêrno retirou-se do Senado e, passados dias, o Sr. Ministro da Guerra apresentou à Câmara dos Deputados a questão da ordem pública, recebendo ali, por êsse motivo, a fôrça política necessária para se manter, pelo menos até estar liquidada a questão da ordem pública.

O Sr. Alberto da Silveira: — O Govêrno devia, então, ter vindo aqui.

O Sr. Herculano Galhardo: — Mas mio veio. Contentou-se com a moção da outra Câmara e entendeu, porventura, que não era seu dever apresentar-se de novo no Senado, por não ter recebido aqui nenhuma demonstração especial de confiança. Acompanhando a maneira de ver do ilustre Senador Sr. Alberto da Silveira, eu não penso tambêm que o Govêrno tivesse sido intencionalmente desprimoroso para com o Senado. Mas concordo plenamente em que é sempre bom chamar a atenção factos como êste.

Tudo quanto seja dar fôrça ao Parlamento representa um bem para a Nação; e cada um de nós deve aproveitar todos os ensejos para fazer ver e sentir ao Poder Executivo que o Poder Legislativo não se esquece dos seus deveres nem das suas prerrogativas, que lhe compete defender e fazer respeitar.

A falta de apresentação do Orçamento na época marcada pela lei é uma das modalidades da, incapacidade administrativa do listado, pura a qual muito têm concorrido os parlamentos, habituando os governos a não cuidarem a tempo e horas da elaboração das contas públicas, que lhes devem ser prementes.

Mas não são as competências individuais que faltam, nem o zêlo e dedicação pelo serviço, como muitos pensam. O que falta é uma organização bem pensada, refundida em moldes novos, baseada em princípios científicos, por ventura baseada nos mesmos princípios que são adoptados nas grandes administrações particulares, uma organização que corresponda, emfim, às necessidades urgentes do país e que dê ao Estado a capacidade necessária para a vida e progresso da Nação.

E não se dirá mais, como até aqui, que o Estado entre nós é incapaz de fazer qualquer cousa útil e de geito, ainda que nos reste a consolação de ver que, da grande conflagração que amanhã tem o seu epílogo, o Estado Providência sai mal ferido e desacreditado um pouco por toda a parte.

Apesar da grande violência com que só apresenta o movimento socialista, tenho a esperança e todos devemos tê-la, que a

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melhoria das condições da vida da humanidade há-de vir a resultar do restabelecimento e vitória dos princípios liberais em toda a sim pureza e magnitude, e não de um regime de opressão que venha substituir a tirania de uns pela tirania de outros, com o regresso a fórmulas quási primitivas das sociedades.

Não podendo trazer às Câmaras um orçamento completo e pormenorizado, apresenta-lhes, contudo, o Govêrno um projecto relativo a dois duodécimos calculados com a aproximação de um centavo. É uma compensação.

Apresentando ao Congresso esta proposta de lei, o Govêrno procura cumprir o seu dever.

Esta Câmara, votando êste projecto, em vista da urgência de o fazer, cumpre tambêm o que deve, mas não vai, a meu ver, sancionar nenhum mau acto de administração; vai apenas regularizar uma situação, ficando-lhe depois o direito de, em qualquer tempo, poder estudar e remodelar a obra do Govêrno, na parte que entender dever fazê-lo.

Nesta orientação, a vossa comissão de finanças foi de parecer que o projecto podia sem inconveniente ser aprovado, propondo vos apenas a eliminação dos seus dois artigos 3.° e 4.°, porque a sua aprovação não é urgente e as disposições neles contidas devem ser cuidadosamente estudadas pelas comissões do orçamento e das finanças, podendo depois constituir objecto de um projecto de lei especial.

A comissão teria muito desejo de examinar mais atentamente êste projecto de lei; mas em vista das circunstâncias que se dão, dispensa-se de fazer outras considerações que fará em tempo competente, quando se tratar da discussão do orçamento.

Uma cousa me parece conveniente e creio que está bem no desejo desta Câmara afirmá-lo, tanto como no da Câmara dos Srs. Deputados, e é que os Govêrnos não voltem a apresentar projectos de duo décimos. (Muitos apoiados).

Sr. Presidente: eu tenho quási a certeza de que os Govêrnos futuros serão mais cautelosos, não deixando de apresentar em tempo oportuno o Orçamento geral do Estado.

Quando o Govêrno aqui se apresentou pela última vez, e nos leu a sua declaração ministerial, foi por nós acusado, entre outras cousas, de ter legislado em excesso.

Mas logo se acrescentou que, dadas as circunstâncias em que foi levado a tomar conta do Poder e as condições da vida a que teve de fazer face, de justiça era dizer-se que talvez não lhe tivesse sido possível proceder por modo diferente.

Sendo assim, e para continuarmos a ser justos, devemos concordar em que, pelos motivos expostos, não era o Govêrno o mais competente para rever a sua obra, nem estava na sua mão fazê-lo, como acaba de ser afirmado.

Comparando o projecto em discussão com a proposta apresentada em Janeiro de 1919, vê-se que desta data para cá as despesas aumentaram em cêrca de 62:000 contos.

Disse o Sr. Senador Silveira que êste número era- suficiente para nos encher de pavor. Sob o ponto de vista financeiro eu não sou tam pessimista como S. Exa. Nós saímos da guerra bastante mal a êste respeito, mas não saímos pior do que as outras nações saem.

Não temos ainda o nosso Orçamento equilibrado, nem o podemos ter tam cedo, é certo. Mas se nós saímos da guerra financeiramente mal, não é menos certo que, sob o ponto de vista económico, saímos melhor do que nunca estivemos. O que é evidentemente preciso é não deixarmos perder a ocasião; é preciso preparar o nosso Portugal para a luta que vai seguir-se à paz Isso está nas nossas mãos. Se não estamos preparados, preparemo-nos.

No meio de perturbações internas, que parecem querer eternizar-se, é que não podemos fazê-lo, nem progredir. É preciso que mostremos que queremos e que somos capazes de sair da tremenda situação da hora presente.

A paz assina-se amanhã. Será um dia de felicidade para todo o mundo.

O Sr. Alberto Silveira: — Apoiado! Apoiado!

O Orador: — Chegou a hora, meus senhores, de não pretendermos resolver os problemas graves, instantes e formidáveis, como são aqueles que devem agora merecer a nossa atenção únicamente sob

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q ponto do vista político. (Apoiados). É preciso que a tudo se sobreponha o ideal nacional. E eu faço justiça, a todos, acreditando que não haverá ninguêm nesta Câmara, de que não haverá ninguêm no Congresso, que resista à apresentação duma plataforma nacional, na qual todos os portugueses, qualquer que seja o seu credo político, se devem encontrar unidos para a resolução dos nossos mais importantes problemas.

Sr. Presidente: tendo regressado há poucas semanas, da Conferencia Inter-Parlamentar de Comércio, onde tive a honra de representar o Parlamento Português, vi em satisfação que as reclamações de Portugal foram sempre bem recebidas e atendidas com a maior simpatia e respeito.

Portugal, pode, pois, continuar a ser uma nação respeitada e digna do seu passado glorioso. Sómente precisamos todos ter a noção exacta do momento que atravessamos; os portugueses precisam abrir a cabeça — digamos assim. — e varrer dela o espírito doentio que a perturba, indo todos para o campo de trabalho, onde estão para resolver os grandes problemas da nossa nacionalidade.

Economicamente Portugal está muito bem; tem o favor de todas as nações aliadas.

E bem recente o facto da Itália fazer declarações acêrca das nossas colónias em seguida a um artigo publicado pelo Temps. Isto prova bem que existe um espírito novo no mundo e que já não passam sem protesto as concepções que ofendem o direito e a liberdade dos povos e a soberania das nações, ainda que pequenas como a nossa.

Eu espero, Sr. Presidente, dos Parlamentos de todo o mundo a salvação dos bons princípios de liberdade e de justiça, como espero tambêm que o nosso Parlamento salve, Portugal!

Tenho dito.

Vozes: — Muito bom! Muito bem!

O Sr. Presidente: — Vai votar-se a generalidade do projecto.

Retiram da sala os Srs. Senadores unionistas.

Posta à votação a generalidade da proposta de lei, é aprovada.

Passando-se à especialidade, são sucessivamente lidos e aprovados, sem discussão, todos os artigos, com excepção do 3.° e 4.°, que foram eliminados, em harmonia com o parecer da comissão de finanças.

O Sr. Vasconcelos Dias: — Requeiro a dispensa da leitura da última redacção. O Senado dispensou.

O Sr. Gil de Matos: — Mando para a Mesa um acórdão da comissão de verificação de poderes relativo à eleição pela Horta.

O Sr. Presidente: — Lê o acórdão.

Em vista deste acórdão, proclamo Senadores pelo circulo da Horta os Srs. José Machado de Serpa, Amaro Justiniano de Azevedo Gomes e Manuel de Sousa da Câmara.

A próxima sessão será na segunda-feira à hora regimental.

Está levantada a sessão.

Eram 17 horas e 10 minutos.

O REDACTOR— Alberto Bramão.

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