O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2754 I SÉRIE - NÚMERO 82

as necessárias e profundas alterações dos Livros da Família e das Sucessões, do Código Civil, expurgando, corrigindo e acrescentando articulados, nos quais se consagrou definitivamente a plena igualdade e a não discriminação em função do sexo.
À consumada abertura interna de pleno reconhecimento dessa igualdade, Portugal abriu-se ao Mundo, assumindo novas responsabilidades e novos compromissos: desde a Convenção para a Eliminação da Discriminação contra as Mulheres, na Organização da Nações Unidas, e da Declaração sobre a Igualdade das Mulheres e dos Homens, do Conselho da Europa, até às convenções da Organização Internacional do Trabalho relativas à igualdade de remuneração e protecção da maternidade e igualdade de oportunidades e de tratamento para trabalhadores de ambos os sexos.
Também na Comunidade Europeia deparámos com um quadro jurídico e de medidas, visando assegurar paulatinamente a consagração da igualdade de direitos, nomeadamente em matéria de emprego e de segurança social, em todos os seus estados. Aliás, o projecto europeu assumiu, desde a sua génese, o princípio da igualdade de remuneração entre homens e mulheres; a história da União Europeia é um continuo afirmar da cidadania plena das mulheres e dos homens. O porvir da União passa, igual e necessariamente, pelo reforço do papel da mulher e pela, promoção da igualdade de oportunidades.
Neste sucinto enquadramento dir-se-á então que esta questão não necessita no nosso país de qualquer alteração ou inovação dos normativos legais. Infelizmente, as janelas que «Abril» abriu à emancipação das mulheres não alcançaram todos os seus objectivos. Portas houve que continuaram fechadas à plena assunção da cidadania das mulheres. Alguns empresários, pese embora a sua sabida formação cristã, corporizam uma visão retrógrada que culpabiliza Eva pelo dito «pecado original) contra os Mandamentos de Deus... Empresários que só o são porque gerados pela mulher que discriminam; e que continua a gerar a força do trabalho que lhes permite continuarem empresários; e que, para eles, na sua lógica puramente mercantilista, só deveria gerar homens se tal não pusesse em causa as leis naturais que permitem a reprodução da força de trabalho.
Parece-nos assim que, embora tendo em consideração o acerto legislativo evoluído em termos de direito comparado, não tem o mesmo correspondência com a situação verificada e constatada no nosso quotidiano. De facto (e nos factos), estas questões radicam, entre outros, em aspectos sociológicos e psicossociais da nossa cultura ocidental que 50 anos de ditadura ainda agravaram, plasmaram e consagraram na lei, secundarizando a mulher e relegando-a para papéis socialmente desfavorecidos. Perante o desfavor do poder político, nem às benesses da consideração social poderiam almejar. O sistema a todos atingiu, mas às mulheres com maior rudeza. Foi-lhes consentido o «direito» de serem boas donas de casa e domésticas de profissão. A cidadã plenamente assumida ficava para os folhetos clandestinos, heroína de poemas trauteados baixinho e só de quando em vez, ou, mais frequentemente, para conversas ditas sociais de índole infamante, alimentadas pela cultura dominante e machista. Mulheres que, no dizer de Sofia de Melo Breyner «Pois não deste homem por ti/E não ficaste em casa a cozinhar intrigas/Segundo o antiquíssimo método oblíquo das mulheres/Nem usaste de manobra ou de calúnia/E não serviste apenas para chorar os mortos.» Foi ainda o tempo da «Luísa que subia a calçada», mas também, ainda e sempre da idílica «Leonor que ia pela verdura».
Ultrapassada essa fase em termos cronológicos, dela restam traumas e resquícios nas atitudes e comportamentos que os normativos legais ainda não conseguiram demover. Bem mondaram os nossos legisladores do pós 25 de Abril: trabalho indómito, sereno e honroso, direi mesmo, gratificante. Sendo certo que permaneceram resistências, discriminações, preconceitos, alguém esperaria que estes desaparecessem por arte divina na ponta da caneta do legislador? Ninguém de bom senso o esperaria. Às escolas, às famílias, à comunicação social cabe também um relevante e não despiciendo contributo para que consigamos dominar o fantasma da discriminação presente ainda em tantos e tantos detentores de poder. Como alguém disse, «O problema é de raiz cultural. Se não fora, bastaria a lei. Sendo apenas ajuda».
Este é o desafio: construir uma nova parceria entre os homens e as mulheres, visando a participação em plena igualdade e em todos os domínios, mas assegurando uma equilibrada repartição dos benefícios dos progressos obtidos, entre uns é outras. Para tal ser atingido não basta a letra da lei; antes, pressupõe uma transformação cultural dos comportamentos individuais e das atitudes e práticas colectivas. Tal será exigido também pela plena integração na União Europeia; esta tem contribuído há muito e de forma activa no plano internacional para o reforço do papel da mulher e na promoção da igualdade de tratamento, nomeadamente na Conferência das Nações Unidas, de Viena, do Cairo, de Copenhaga e, por último, de Pequim. Os Conselhos Europeus de Essen, Cannes e Madrid valorizaram igualmente o tema e impuseram-no como tarefa prioritária da União e dos seus Estados membros. Foi elaborado um novo programa de acção até ao ano 2000 para concretização e apoio a acções específicas a favor da igualdade de oportunidades.
Qualquer política tendente à prossecução da igualdade entre homens e mulheres tem de ter em conta a situação de uns e outras nas diferentes situações do quotidiano e das transformações em curso nas sociedades. É um objectivo a prosseguir perante a aceitação prévia da identidade feminina e da identidade masculina e com a vontade determinada e firme de implantar uma partilha equilibrada das responsabilidades entre homens e mulheres. Para tal é imperiosa a activa participação de ambos, valorizando os respectivos papéis como indispensáveis ao progresso e garante da democracia e do pluralismo.
Para tal não se torna apenas necessário a adopção de iniciativas positivas em relação às mulheres mas também a adaptação da organização social para possibilitar uma mais equitativa repartição desses papéis entre mulheres e homens. Quanto tal conseguirmos estamos a libertar as sinergias que tão indispensáveis são para prosseguirmos com êxito na via de desenvolvimento que neste momento trilhámos.
Ora, o trabalho e o emprego constituem de facto domínios essenciais da igualdade de oportunidades e de tratamento. Afirmamos mesmo que o acesso ao emprego é uma componente fundamental da emancipação das mulheres e simultaneamente um impulso e um contributo indispensável para o futuro do nosso país.
Na V Legislatura, o Grupo Parlamentar do PS apresentou o projecto de resolução n.º 21/V, que visava a constituição de uma comissão eventual para a elaboração de um «Livro Branco sobre as discriminações existentes entre homens e mulheres na sociedade portuguesa que geram

Páginas Relacionadas
Página 2757:
14 DE JUNHO DE 1996 2757 ordenacionais, beneficiando para o efeito de isenção do pagamento
Pág.Página 2757
Página 2758:
2758 I SÉRIE - NÚMERO 82 carácter peculiar de tratamento, mas na realidade das empresas, e
Pág.Página 2758