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5353 | I Série - Número 128 | 31 de Maio de 2003

 

Foi, a meu ver, um avanço importante, porquanto no texto assinalado as crianças são encaradas não apenas como merecedoras de protecção especial mas passam também agora a ser vistas como seres humanos possuidores de direitos próprios, que urge respeitar, seja qual for a circunstância.
Mas o mérito da Convenção tem outra abrangência mais objectiva que a tornou ainda mais relevante, já que obriga os Estados-membros a tomarem medidas positivas para garantirem os direitos aí consagrados e que dão forma à protecção das crianças.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Aparentemente, tudo parece caminhar de acordo com os preceitos publicados, ainda mais quando ouvimos as declarações sonantes dos responsáveis dos países mais ricos e poderosos, manifestando preocupação e, às vezes, intolerância com os milhões de crianças que morrem todos os anos por fome, abusos e doenças controláveis.
A realidade, porém, é bem diferente. Por isso, não podemos deixar de mostrar a nossa perplexidade perante semelhante cinismo e gritar a nossa revolta quando assistimos às demonstrações práticas de indiferença por parte desses mesmos países, que tão pouco fazem para combater a violência, a exploração e o abuso, bem como pela saúde, educação e nutrição dessas mesmas crianças.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não creio, por isso, que exista da minha parte atrevimento se vos falar de tão desmesurada hipocrisia e falta de vergonha.
A falta de vergonha desta imensa sociedade humana, hoje quase globalizada, que, tendo ao seu dispor meios eficazes, porque fáceis, rápidos e baratos, para salvar a vida a milhões de crianças, ainda permite que, entre a complacência e o comodismo da indiferença e do desconhecimento voluntário, diariamente numerosos milhares de crianças morram por falta de elementos nutritivos, vacinas e antibióticos e que, por falta de acesso a cultura e tecnologia, estejam sujeitas ao contágio e propagação de tanta doença epidémica, a que só a ignorância dá azo.
Vivemos ainda sobre a ameaça de fantasmas que, por nossa culpa, se vão tornando realidades trágicas. O vírus HIV continua a progredir com êxito a sua caminhada de morte nas regiões do centro africano, enquanto em outras regiões do globo a venda e exploração de crianças persiste em existir, confirmando-se o aproveitamento e tráfico de órgãos com fins comerciais.
Mas não se pense, todavia, que a fragilidade e vulnerabilidade das crianças decorre apenas no ambiente de miséria ou das contingências e limitações socioeconómicas. Puro engano! Basta ver os jornais e televisões e, um pouco por todo o mundo, chegam-nos notícias aterradoras, que nos constrangem a alma e a consciência, sobre abusos e mortes por uma perversa utilização sexual e sobre o elevado número de crianças que pelas ruas das grandes urbes crescem abandonadas e negligenciadas pela família e pelo Estado, transformando, assim, por nosso querer, a cidade numa selva, onde a lei é a dos mais fortes e mais poderosos.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Oradora: - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Portugal tem uma tradição secular na produção legislativa para a infância. Basta recordar o pioneirismo da Lei de Protecção à Infância, de 1911, que invocava já o "interesse superior da criança" para a intervenção junto de crianças em situação de risco, e o facto de Portugal ter sido um dos primeiros países a ratificar a Convenção dos Direitos da Criança.
A produção de abundante legislação não evita, no entanto, que o Comité dos Direitos da Criança, na avaliação que faz da implementação dos princípios da Convenção dos Direitos da Criança na nossa lei interna e na sua aplicação prática, nos dirija fortes críticas, dando, assim, um sinal muito claro de que nem tudo vai bem.
Mas, se dúvidas houvesse, a realidade está aí, neste momento negro da nossa história, que a todos envergonha, em que se fala das nossas crianças pelos piores motivos.

A Sr.ª Natália Carrascalão (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Refiro-me ao crime da pedofilia e a aos abusos de que, durante anos a fio, foram vítimas muitas crianças da Casa Pia.
Sobre este assunto tem-se falado muito dos presumíveis criminosos e pouco das verdadeiras vítimas, que são as crianças.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

A Oradora: - A verdade, porém, é muito clara: o que sucede com a Casa Pia é uma vergonha. O encobrimento desse crime ao longo dos anos é um crime de cidadania. A circunstância de a justiça estar finalmente a funcionar é a única esperança que nos resta, a esperança de que os culpados sejam punidos, a esperança de que as vítimas sintam alguma reparação, a esperança de que novas situações não se repitam e a esperança de que a justiça se faça.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Devo, por isso, ser muito directa: não são admissíveis pressões sobre a justiça, justamente quando esta está, finalmente, a cumprir o seu papel, e algumas pressões parece que querem fazer o seu curso. Não é aceitável que se questione a justiça agora que ela investiga e funciona, quando se fizeram "ouvidos de mercador", durante anos e anos, quando a justiça não investigava nem funcionava.

Aplausos do PSD e do CDS-PP.

Às vezes, parecem existir dois pesos e duas medidas. Muitos falaram das crianças, enquanto vítimas, quando este caso se iniciou; agora, que a investigação funciona mesmo, já ninguém fala das crianças enquanto vítimas e grita-se "Aqui-d'el-Rei" que a justiça funciona.

A Sr.ª Isménia Franco (PSD): - Muito bem!

A Oradora: - Por mim, agora como antes, digo a mesma coisa. Em nome das vítimas, em nome da reparação moral das crianças afectadas, em nome da inocência de quem foi violado ou violentado, digo bem alto: faça-se

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