O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

9 | I Série - Número: 073 | 27 de Abril de 2009

bens públicos; e favoreceu o crescimento desmesurado do desemprego, que paira hoje como chantagem e medo sobre quem trabalha.
A expansão do mercado como filosofia societal trabalhou, portanto, para o estreitamento do espaço público, para o estreitamento da democracia. O modelo liberal não ficou «aquém das expectativas», não foi a sua suposta «ética» traída por alguns agentes de mercado. Não. Falhou redondamente, e não pode ser consertado. Tem que ser abandonado e substituído por outro.
Precisamos de um outro modelo de desenvolvimento, precisamos de um novo paradigma de governação democrática, e o País sabe-o.
Sabem-no os homens e as mulheres que todos os dias fazem serviços públicos. Sabem que nas escolas, nos hospitais, nas instituições de apoio social, onde trabalham todos os dias, há uma crise que tem décadas e que se vive quotidianamente com o desinvestimento público; sabem que há um discurso opressivamente dominante que favorece sempre a deslegitimação da coisa pública e a menorização da República; sabem que as desigualdades lhes entram todos os dias pelas portas adentro e que esse é o défice democrático — a democracia por cumprir — , que têm cada vez menos instrumentos, porque aos serviços públicos se impôs uma mimetização da lógica de gestão do mercado que escarnece do próprio conceito de direitos sociais; e sabem que a democracia está açaimada, estreitada e vigiada, quando os seus protestos em nome da dignidade do serviço público são sempre menorizados e enxovalhados, como se as suas vozes cidadãs fossem ruído.
Sabem-no também os homens e as mulheres que se juntam à porta das fábricas que fecham, uma noite atrás da outra, guardando as máquinas que podem ser roubadas e onde faziam o trabalho, que também lhes foi roubado. Sabem que esta crise, agora anunciada como nova, se vem apenas somar a uma crise velha, que pesa sobre as suas vidas há demasiado tempo; sabem que, antes da grande crise internacional, já em Portugal se batiam recordes nos números do desemprego.
Quem vê aumentar os dias de lay-off, quem conhece o significado de despedimento colectivo, de deslocalização ou de falência sabe que não pode contar com os poderes públicos.
Em Dezembro de 2008, as dívidas aos trabalhadores chegavam aos 191 milhões de euros em salários atrasados, indemnizações não pagas e horas extra por pagar. Em 2008, os processos de falência e insolvência foram 3344, mais dois terços do que no ano anterior; os despedimentos colectivos aumentaram 50%. E é a própria Autoridade para as Condições do Trabalho que reconhece que não tem nem meios nem cobertura legal suficiente para combater os falsos recibos verdes e o trabalho precário.
Empresas que tiveram apoios estatais fecham portas e abandonam o País sem que lhes sejam pedidas contas. Os empresários mais ousados anunciam despedimentos «preventivos» e, de novo, nada acontece.
Os homens e as mulheres do trabalho sabem que, quando o desemprego atinge os níveis actuais, se vivem os tempos do medo — que cancela a democracia quando cancela os seus direitos, escritos em letra de lei mas suspensos na prática da vida.
Os portugueses sentem que o espaço democrático das suas escolhas, da sua participação e do seu controlo democrático está estreitado, tornado irrelevante no que verdadeiramente conta. Sabem que as escolhas públicas estratégicas para o futuro do País nascem vergadas a interesses privados; sabem que a política das últimas décadas permitiu a construção de um sistema que prima pela opacidade e pela não prestação de contas, onde os dinheiros sujos são escondidos em sociedades anónimas, em offshore e em tráficos ilegais; sabem que estão a ser expropriados dos seus direitos de cidadania pela linguagem higienizada do mundo económico — deixaram de ser trabalhadores, são agora «colaboradores»; já não há despedimentos, há «ajustamentos na estrutura das empresas»; já não há encerramento de fábricas, há «deslocalizações». E até quando a economia e o seu poder de compra mirra e encolhe, dizem-lhe que há «crescimento negativo».
O poder exerce-se assim, branqueando a injustiça e o sofrimento que causa, camuflando a sua violência social, negando voz e o próprio nome de quem domina.
São os homens e as mulheres, os trabalhadores, que fazem a riqueza deste País, que construíram a democracia. Cada direito social foi por eles conquistado e, pelo seu trabalho e a pela sua solidariedade, tornado possível. Não aceitam, os portugueses não aceitam ser expropriados desses direitos, que são a sua vida democrática, e silenciados como se de incapazes se tratassem. Não querem, os portugueses não querem