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Sábado, 13 de julho de 2013 I Série — Número 113
XII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2012-2013)
REUNIÃOPLENÁRIADE12DEJULHODE 2013
Presidente: Ex.ma Sr.ª Maria da Assunção Andrade Esteves
Secretários: Ex.mos
Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco Rosa Maria da Silva Bastos de Horta Albernaz
S U M Á R I O
A Presidente declarou aberta a sessão às 9 horas e 35
minutos. Deu-se conta da entrada na Mesa da proposta de
resolução n.º 64/XII (2.ª), do projeto de lei n.º 433/XII (2.ª), do projeto de resolução n.º 800/XII (2.ª) e da apreciação parlamentar n.º 55/XII (2.ª).
Procedeu-se ao debate sobre o estado da Nação, tendo o Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho) proferido a intervenção de abertura.
No debate, usaram da palavra, a diverso título, além do Primeiro-Ministro, da Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz) e do Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Guedes), os Deputados António José Seguro (PS), Luís Montenegro (PSD), Nuno Magalhães (CDS-PP), Jerónimo de Sousa (PCP), João Semedo (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) — que
anunciou a apresentação de uma moção de censura pelo seu grupo parlamentar —, João Pinho de Almeida (CDS-PP), Paulo Sá (PCP), Ana Drago (BE), Miguel Frasquilho (PSD), Helena Pinto (BE), Teresa Leal Coelho e Guilherme Silva (PSD), António Braga (PS), Telmo Correia (CDS-PP), Catarina Martins (BE), João Oliveira (PCP), Fernando Negrão (PSD) e Luís Pita Ameixa (PS).
A encerrar o debate, interveio o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas), tendo, no final, o Deputado João Semedo (BE) protestado pela escolha deste membro do Governo para proferir a intervenção de encerramento, o que suscitou também o uso da palavra por parte do Primeiro-Ministro e dos Deputados Isabel Alves Moreira (PS) e Luís Montenegro (PSD).
A Presidente encerrou a sessão eram 13 horas e 50 minutos.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretários de Estados,
Srs. Deputados, Srs. Jornalistas, está aberta a sessão.
Eram 9 horas e 35minutos.
Os Srs. Agentes da autoridade podem abrir as galerias.
Como sabem, na sessão de hoje vamos proceder ao debate sobre o estado da Nação, que é feito nos
termos do artigo 228.º do Regimento, com a seguinte moldura: a abertura cabe ao Governo, seguindo-se um
debate com perguntas feitas pelos Srs. Deputados e, por fim, o encerramento também é feito pelo Governo.
A distribuição dos tempos está indicada expressamente no guião da ordem do dia.
Antes de darmos início ao debate, peço ao Sr. Secretário, Deputado Duarte Pacheco, o favor de ler o
expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e
foram admitidas, as seguintes iniciativas legislativas: proposta de resolução n.º 64/XII (2.ª) — Aprova a
Convenção Internacional para a Proteção de todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados,
adotada em Nova Iorque, em 20 de dezembro de 2006, que baixa à 2. ª Comissão; projeto de lei n.º 433/XII
(2.ª) — Procede à quarta alteração à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, que estabelece o processo de
reconversão das áreas urbanas de génese ilegal (PSD e CDS-PP), que baixa à 11.ª Comissão; projeto de
resolução n.º 800/XII (2.ª) — Reforço de enfermeiros no Serviço Nacional de Saúde (PCP), que baixou à 9.ª
Comissão; e apreciação parlamentar n.º 55/XII (2.ª) — Relativa ao Decreto-Lei n.º 91/2013, de 10 de julho —
Procede à primeira alteração do Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho, que estabelece os princípios
orientadores da organização e da gestão dos currículos dos ensinos básico e secundário, da avaliação dos
conhecimentos a adquirir e das capacidades a desenvolver pelos alunos e do processo de desenvolvimento do
currículo dos ensinos básico e secundário (PCP).
É tudo, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Vamos, assim, dar início ao debate sobre o estado da Nação.
A abrir o debate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro (Pedro Passos Coelho): — Sr.ª Presidente da Assembleia da República, Sr.as
e
Srs. Deputados: Nestes últimos dois anos percorremos um caminho difícil. Os portugueses têm sofrido os
efeitos da rutura financeira a que chegámos em 2011, com uma crise económica aguda e o aumento do
desemprego. O exercício da governação nestas circunstâncias é particularmente difícil, porque implica
escolhas muitas vezes dolorosas. Em grande medida, a dificuldade das escolhas e os efeitos de curto prazo
que delas decorrem explicam as atribulações políticas, incluindo as que marcaram a vida interna da coligação
que suporta o Governo.
É preciso reconhecer que ter um exigente Programa de Assistência externa para cumprir, com avaliações
regulares, estar sujeito a restrições financeiras que nunca conhecemos antes, ter recursos limitados para
proteger os mais vulneráveis, estar muito limitado na margem de manobra da ação governativa, tudo isto
aumenta consideravelmente a magnitude das divergências e a intensidade das escolhas e das discussões.
Neste quadro, o exemplo de coragem dos portugueses e a complexidade da situação obrigam todos os
agentes políticos, dos quais o Governo não se exclui, nem nunca se excluiu, a cultivar a humildade
democrática e o realismo político.
O Governo procurou, desde o primeiro momento, minimizar os sacrifícios, fazer uma sua repartição
equitativa e adequar à realidade o ritmo do ajustamento. Suavizámos de modo apreciável o Programa de
Assistência para ajustá-lo mais à realidade económica e social. Fizemo-lo quando renegociámos as taxas de
juro dos empréstimos europeus, quando, por duas vezes, obtivemos a extensão das maturidades e quando
flexibilizámos as metas orçamentais.
Procurámos proteger os mais vulneráveis e repartir equitativamente os sacrifícios quando aumentámos o
nível de proteção social da população desempregada, quando aumentámos neste biénio as pensões mínimas,
sociais e rurais para 1,1 milhões de portugueses, quando alargámos a isenção de taxas moderadoras para as
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pessoas com menores rendimentos, quando reduzimos o preço dos medicamentos ou quando dinamizámos o
mercado social de arrendamento.
Porém, as dificuldades não desaparecem de um momento para o outro. A profundidade dos nossos
problemas exclui soluções mágicas, indolores ou instantâneas. Pelo contrário, temos de lhes responder com
medidas de longo prazo, estruturais e permanentes.
Há muito que insisto em que a dimensão dos nossos desafios — presentes e futuros — exige uma visão de
longo prazo e, portanto, um grande compromisso nacional, que vá além da atual Legislatura e que coloque o
futuro de Portugal em primeiro lugar.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Na sua declaração ao País, o Sr. Presidente da República referiu
explicitamente o facto incontornável de que precisamos de continuar a fazer uma abordagem sistemática e
persistente aos nossos problemas que se estenda além da conclusão do Programa de Assistência. O seu
apelo ao compromisso entre os três partidos que subscreveram o Memorando de Entendimento com as
instâncias europeias e com o FMI resulta desta constatação que partilhamos.
Também é lícito recolher das palavras do Sr. Presidente da República um outro alerta que eu próprio tenho
feito em várias ocasiões. Um alerta para o facto de que nem sempre se tem a perceção real dos riscos a que
estamos sujeitos.
A capacidade de cumprimento do Programa de Assistência demonstrada nos últimos dois anos, e que se
deve ao tremendo esforço de todos os portugueses, também criou a ilusão em muitas pessoas de que talvez
essa tarefa não fosse assim tão difícil, que, no fundo, o desfecho positivo das revisões da troica e a conclusão
do Programa eram coisas que podíamos dar como adquiridas.
Todo o progresso que alcançámos até agora resulta do esforço dos portugueses e da decisão de
cumprirmos com rigor os nossos compromissos externos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Foi esse progresso que foi permitindo devolver uma certa normalidade à nossa vida coletiva que por vezes
nos faz perder de vista que vivemos um período excecional e de emergência.
Sabemos que a estabilidade é um bem precioso, sobretudo em circunstâncias como as nossas. Aqui falo
de uma estabilidade ativa, dirigida para a resolução dos problemas do País, para o cumprimento dos nossos
compromissos externos e para operar a viragem do ciclo económico. Não falo de uma estabilidade vazia,
puramente circunstancial. Falo da estabilidade indispensável para ultrapassar a crise nacional que se arrasta
há já tantos anos e que é responsável por termos uma economia que não cresce, por termos um desemprego
estrutural que cresce, por termos défices e dívidas consecutivos desde o início da nossa vida democrática.
Falo da estabilidade necessária para iniciar um novo ciclo de prosperidade e imprescindível para construir
uma sociedade mais justa com oportunidades para todos. Falo da estabilidade indispensável para dar sentido
e trazer recompensas aos sacrifícios que os portugueses têm feito.
Essa estabilidade supõe a estabilidade política. A coligação que suporta o Governo goza de uma ampla
maioria parlamentar. Suporta um Governo democraticamente eleito e que está em plenitude de funções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Um Governo que, no essencial dos seus objetivos internos e externos, tem cumprido, que responde
perante o Parlamento e que presta contas aos portugueses. Esse é o ponto de partida no nosso sistema
democrático constitucional.
Mas supõe também estabilidade financeira. A estabilidade financeira é fruto do percurso que já foi feito,
mas também das propostas que fazemos para o futuro. Depois da estabilização do sistema financeiro, do
desendividamento das famílias e das empresas, da gradual normalização do financiamento do Estado e da
economia, do equilíbrio das contas externas e da redução estrutural do défice público, temos de garantir a
estabilidade e a sustentabilidade financeira global do País.
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A estabilidade ativa supõe ainda a estabilidade económica. Só uma economia a crescer e resistente aos
choques poderá proporcionar aos portugueses a prosperidade que ambicionam e merecem. O propósito das
reformas que fizemos, e cujo alcance e abrangência não têm precedentes, é precisamente o de construir uma
nova economia, mais competitiva, mais aberta, mais democrática, mais aberta à participação de todos, com
mais e melhores empregos.
Da concorrência à saúde; da justiça ao mercado laboral; das administrações públicas à educação; do
mercado de arrendamento ao IVA de caixa; do pagamento de uma grande parte das dívidas do Estado a
fornecedores até ao mercado laboral; do programa de privatizações ao combate às rendas excessivas; da
Estratégia de Fomento Industrial à Estratégia Nacional para os Recursos Geológicos a ação reformista do
Governo deu novos alicerces ao crescimento económico do futuro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: As palavras do Sr. Presidente da República de apelo veemente ao
compromisso entre os três partidos que subscreveram o Programa de Assistência devem ser escutadas à luz
destes grandes desafios. É com toda a abertura democrática que quero agora traduzir essas palavras em atos
concretos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Tentei fazê-lo em diversas ocasiões, a última das quais, há poucas semanas, quando convidei todos os
partidos políticos com representação parlamentar para discutirmos em conjunto a estratégia do Governo para
o fomento industrial, a reforma do Estado e a posição de Portugal na Europa.
Mas cabe-me agora renovar o meu empenho na concertação de um entendimento entre esses três partidos
e responder ao desafio que nos é colocado a todos. Para isso não precisamos de anular as divergências
políticas entre a coligação que suporta o Governo e o Partido Socialista — elas persistem e em democracia é
natural e saudável que assim seja. Para chegarmos a acordo é suficiente que nos concentremos nas
necessidades do País e no interesse comum dos portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Façamos, por isso, um acordo que corresponda ao desejo de todos: o de concluir com sucesso o Programa
de Assistência em junho de 2014 e o de garantir que Portugal no futuro pós-troica nunca mais tenha de sofrer
uma crise como a que nos atingiu em 2011.
Não é fácil fazer com que esse entendimento seja credível e duradouro. Todos sabemos que, mesmo na
coligação que suporta o Governo, nem sempre é fácil chegarmos a essa concertação de propósitos e de
políticas.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É o mínimo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas o mesmo percurso da coligação e a imensa atividade do Governo nestes
últimos dois anos demonstram que podemos fazer muito. E foi isso que fizemos na primeira metade do nosso
mandato quando assumimos um espírito de compromisso permanente.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Esse compromisso é mais urgente hoje do que nunca. É mais urgente, porque
atravessamos aquela fase crítica e nova em que os riscos de vacilarmos no processo de ajustamento estão
tão vivos como sempre estiveram, mas os sinais das suas recompensas são mais intensos do que alguma vez
foram. Sabemos que o segundo trimestre deste ano pode já ter interrompido a sequência de 10 trimestres
consecutivos de recessão e ter-nos devolvido ao crescimento, ainda que tímido.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Temos também, além dos sinais que nos vêm das exportações, sinais encorajadores do mercado de
trabalho. O mês de junho foi o quinto mês consecutivo de descida do desemprego registado e o primeiro
semestre de 2013 foi marcado por crescimento homólogo das ofertas de emprego em todos os meses.
Estes sinais devem ser lidos com prudência, mas não deixam de inspirar a confiança de que o ajustamento
está a prosseguir eficazmente e que a sua fase mais dura pode já ter ficado para trás.
Não podemos, portanto, correr os riscos associados a hesitações e a adiamentos, mas também não
podemos desperdiçar as recompensas que agora começam a aparecer e pelas quais todo o País ansiou nos
últimos anos. Temos de investir nos sinais de viragem e não renunciar a eles.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Muito já foi feito e muito já foi conquistado, mas todos sabem que ainda há
muito por fazer. Portugal não pode parar agora. Seria incompreensível se este caminho de esforço e de luta
dos portugueses ficasse a meio ou morresse na praia.
Não podemos desistir perante as adversidades. Assumo hoje, como sempre assumi, a responsabilidade
que me foi confiada pelos portugueses: a de conduzir a governação de Portugal num dos momentos mais
complexos da sua história democrática e fechar esta crise que nos atormenta há já tanto tempo.
É dever de todos os agentes políticos não confundir a realidade do País com o mundo estrito da política e
da agenda mediática.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — O País está primeiro, o respeito pelas pessoas e a complexidade dos tempos
não exigem menos do que isto.
Como Primeiro-Ministro, nunca deixei e nunca deixarei de colocar o País primeiro. É assim para todo o
Governo, mas também terá de ser assim para a oposição.
Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, de acordo com o modelo desta discussão, entramos agora no
período de debate, com uma primeira ronda de perguntas, às quais o Sr. Primeiro-Ministro responderá
individualmente, não havendo direito de réplica.
Para o efeito estão inscritos os Srs. Deputados António José Seguro, do PS, Luís Montenegro, do PSD,
Nuno Magalhães, do CDS-PP, Jerónimo de Sousa, do PCP, João Semedo, do BE, e Heloísa Apolónia, de Os
Verdes, dispondo cada um de 5 minutos.
Tem a palavra o Sr. António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados,
Sr. Primeiro-Ministro, este é um momento insólito na vida do nosso País e na vida do nosso Parlamento:
debatemos o Estado da Nação com um Governo em estado de decomposição, de desagregação e a prazo.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Está o Governo em funções, mas objetivamente sem condições.
Aplausos do PS.
Ao contrário do que o Sr. Primeiro-Ministro disse, não basta ter uma maioria parlamentar para garantir a
estabilidade política.
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O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Sem maioria parlamentar não há estabilidade política. Mas ela é
apenas uma condição necessária, não é uma condição suficiente.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Até há duas semanas atrás seria impossível imaginar tanta
degradação no Governo a que o senhor ainda preside. Até para os maiores opositores deste Governo tal seria
impensável. E confesso, Sr. Primeiro-Ministro, quando há cerca de dois meses disse que nem para cair este
Governo era competente, que estava longe de ter tanta razão quando proferi essa afirmação.
Aplausos do PS.
O que o País esperava era que hoje o Primeiro-Ministro subisse à tribuna e assumisse as suas
responsabilidades,…
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — … não fazendo mais do que seguir o exemplo do seu ex-Ministro das
Finanças, que se demitiu através de uma carta que quis tornar pública e em que disse, claramente, que tinha
falhado, que reconhecia o falhanço e que tirava daí todas as ilações, porque era necessário que existisse
credibilidade e confiança, coisa que ele já não via no Governo e, em particular, em quem ainda lidera o
Governo do País.
O ex-Ministro das Finanças diz, clara e textualmente, que a política de austeridade que foi aplicada em
Portugal conduziu a uma redução da procura interna com gravíssimas consequências do ponto de vista
económico e do ponto de vista social.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, no dia em que o Presidente da República se preparava para dar posse à sua
nova Ministra das Finanças fomos surpreendidos, uma hora antes, com o anúncio da demissão do seu
Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, que disse, em síntese, através de um comunicado público,
que já não aguentava mais, que não aguentava tanta dissimulação e que a sua decisão era irreversível.
Para quem disse aqui, várias vezes, que não se poderia somar uma crise política à crise económica e à
crise social do País, como é que o Primeiro-Ministro consegue, pela primeira vez depois destas ocorrências,
vir a este Parlamento e não ter uma justificação perante os Deputados dos quais depende?
Aplausos do PS.
Um Ministro dos Negócios Estrangeiros que diz — e é líder do segundo partido da coligação — que a sua
decisão é irrevogável, é irreversível e que, passados dois dias, sem uma explicação ao País, aceita,
aparentemente, ser ministro de outra pasta.
Qual é a credibilidade que o seu Governo pode ter quando representa Portugal nas instituições europeias
ou em negociação com os nossos credores?
Aplausos do PS.
Vozes do PSD: — Oh!…
O Sr. António José Seguro (PS): — Qual é a confiança que os investidores, as empresas portuguesas,
podem ter no seu Governo? Qual é a confiança que os portugueses podem ter no seu Governo quando os
principais líderes do Governo se comportam desta maneira? E quando os seus dois principais ministros, o Dr.
Vítor Gaspar e o Dr. Paulo Portas, o tratam em público desta maneira e com esta clareza?
Sr. Primeiro-Ministro, hoje não tenho nenhuma pergunta para lhe fazer.
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Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…
O Sr. António José Seguro (PS): — O que é necessário é olharmos o futuro, porque o estado do nosso
País é, infelizmente, pior do que há dois anos.
O legado que o senhor nos deixa é, do ponto de vista económico e social, dramático, com quase um milhão
de portugueses desempregados, com uma espiral recessiva do ponto de vista económico e com uma crise
política como não há memória na nossa vida democrática.
Aplausos do PS.
E mais, Sr. Primeiro-Ministro: a crise política mina os alicerces da nossa democracia. B basta falar com os
portugueses para perceber que ela, infelizmente, não o atinge só a si ou ao seu Governo, alastra, infelizmente,
a todas as instituições.
A nossa responsabilidade é a de credibilizar a política…
Vozes do PSD: — Pois, nota-se!
O Sr. António José Seguro (PS): — … e de criar condições para que exista uma relação de confiança
entre os portugueses e os seus representantes.
É por isso que o Partido Socialista, não se movendo, uma única vez, nem um milímetro que seja, da sua
posição desde há dois anos, está disponível para iniciar processos de diálogo com todos os partidos políticos
com assento parlamentar.
Aplausos do PS.
Não se trata de um processo de diálogo entre o Governo e o Partido Socialista. Não, porque este Governo
tem os dias contados, está a prazo.
O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Trata-se de um processo de diálogo, correspondendo a um apelo do
Sr. Presidente da República, entre todos os partidos políticos com assento neste Parlamento que estejam
disponíveis e que queiram contribuir com soluções para o País.
Uma vez que já ultrapassei o tempo de que dispunha, terei, ao longo deste debate, oportunidade de
detalhar melhor a nossa posição. Mas quero terminar dizendo, com muita clareza, que nem o senhor nem
ninguém nesta Câmara tem o monopólio da defesa do interesse nacional e que o Partido Socialista, desde o
início, mantém disponibilidade para contribuir para as soluções do nosso País, contributos que sempre tiveram
da sua parte uma recusa. E a recusa não foi apenas em relação aos contributos do PS, foi em relação aos dos
outros partidos, dos parceiros sociais e, inclusive, do seu parceiro de coligação.
O senhor não tem o direito de fazer nenhum revisionismo histórico, tem é a obrigação de pedir desculpa
aos portugueses pelo falhanço e pelo fracasso da sua política.
Nós, tudo faremos para que a agonia do seu Governo não seja a agonia dos portugueses.
Aplausos do PS, de pé.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, o Sr. Deputado António José Seguro
gastou mais de metade do tempo que eu usei a falar daquilo que considerou importante, com certeza, mas, Sr.
Deputado, permita-me esta crítica: podia ter utilizado melhor o seu tempo a falar daquilo que consideraria
importante e não daquilo que era acessório.
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Protestos do PS.
O Sr. Deputado teve hoje uma grande oportunidade de mostrar aos portugueses que estava realmente
preocupado com o futuro do País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas, Sr. Deputado, a dimensão da sua preocupação não passou da trica política.
Protestos do PS.
Portanto, digo ao Sr. Deputado que é importante que o País saiba em que termos é que os partidos podem,
de facto, criar um entendimento.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Esse entendimento não pode, evidentemente, alhear-se da crise que vivemos.
Mas a crise que vivemos, como referi da tribuna, é uma crise funda e antiga e não é a crise que foi aberta pelo
pedido de demissão do Sr. Ministro Paulo Portas.
Sr. Deputado, a crise que é importante é aquela que justifica que, ao fim de tantos anos, o País não seja
capaz, como outros países democráticos, de criar excedentes orçamentais, de criar equilíbrio das contas
públicas, de saber separar devidamente o que é público do que é privado, de ter uma noção do que pode ser a
sustentabilidade da sua dívida pública e de valorizar suficientemente o dinheiro dos contribuintes para
respeitar a restrição orçamental. Essa é que é a verdadeira crise em que o País vive!
O Sr. Deputado fala de debilidade. Ó Sr. Deputado, um País que se viu na obrigação de pedir um resgate
financeiro é um País que valoriza ou que desvaloriza os valores da estabilidade, mas também da boa
governação?
Se o País político tivesse observado os princípios da boa governação um bom resgaste, como aquele que
aconteceu, não teria sido necessário.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Deputado, tal como o senho, eu teria muita facilidade em fazer aqui uma intervenção a atacar o Partido
Socialista, mas não o vou fazer.
Sr. Deputado, aquilo que me interessa fazer nesta altura é saber se é possível ou não encontrar uma
matéria de facto, de substância, que possa mobilizar o nosso entendimento.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Ora, esse entendimento não pode ser proclamatório, não pode ser para inglês
ver.
O Sr. António Filipe (PCP): — É para alemão ver!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Tem de incidir em matéria concreta, e para isso nós estamos disponíveis.
O Sr. Presidente da República perguntou o que é que é preciso para encerrar com êxito o Programa de
Assistência Económica e Financeira. Não é difícil responder, Sr. Deputado. O que não será fácil é saber se
todos estamos verdadeiramente empenhados nisso e em que é que isso se traduz.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O que interessa, Sr. Deputado, não é dizer que estamos disponíveis para cumprir e assumir todos os
nossos compromissos externos e depois escrever cartas a dizer que este caminho não é aceitável…
O Sr. António José Seguro (PS): — Claro que não é!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … e que esta política que resulta do entendimento com os nossos credores
não pode prosseguir, porque isso, Sr. Deputado, é que não tem credibilidade.
Se o País tivesse de pagar o preço dessa proclamação, mas sem credibilidade nas propostas, então
estaríamos no melhor dos mundos, em que nos basta dizer que queremos cumprir, mas não estamos
dispostos a nada para o fazer.
É esse o entendimento que temos de gerar. Acho que é possível fazê-lo, basta que não fiquemos
agarrados a tudo o que dissemos. É que, Sr. Deputado, muitas vezes é preciso deixar cair alguma coisa do
que se disse para que o interesse do País seja colocado em primeiro lugar. E esse esforço tem de ser feito
com dignidade e tem de ser feito com verdadeiro espírito de compromisso.
Protestos do Deputado do PS João Galamba.
É isso que nós estamos dispostos a fazer: fazer com que o pós-troica nos traga estabilidade suficiente,
como disse o Sr. Deputado, não apenas a necessária, aquela que é provida por uma maioria no Parlamento,
mas uma estabilidade suficiente para garantir que exista um amplo consenso quanto àquilo que precisamos de
fazer. E aquilo que precisamos de fazer, Sr. Deputado, quando não há dinheiro, é respeitar as restrições
orçamentais.
Por isso dizemos que, se queremos baixar a dívida, temos de baixar o défice; se temos de baixar o défice,
temos de limitar as despesas; e, se temos de limitar as despesas, temos de dizer quais e a quanto. E, depois,
temos de traduzir isso por medidas.
Isso, Sr. Deputado, está ao nosso alcance, e eu espero, com honestidade, que seja possível de alcançar,
mas de alcançar num tempo político que o País compreenda. Quero desse ponto de vista dizer que, como
Primeiro-Ministro, farei tudo o que está o meu alcance, como tenho feito, para não deixar apodrecer a situação
política em Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — E nessa medida, Sr. Deputado, serei muito rápido a disponibilizar os termos de
referência do que pode ser um entendimento alargado.
Sr. Deputado, assim todos estejamos a remar para o mesmo lado, como o País merece.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs.
Membros do Governo, começo por me referir a espírito de compromisso para garantir a confiança e para
enfrentar a exigência dos tempos que vivemos.
Sr. Primeiro-Ministro, para garantir a confiança e para consubstanciar esse espírito de compromisso, o
primeiro requisito é o de todos, no País, sermos capazes de cumprir a palavra do Estado.
Sr. Primeiro-Ministro, é importante que possamos assumir esse compromisso de cumprir a palavra, quer
avaliando aquele que foi o nosso percurso nestes últimos dois anos, concretizando precisamente os
compromissos que o Estado português assumiu ainda pela mão do Governo anterior com os nossos credores
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internacionais, e também de perspetivar como podemos continuar a fazê-lo no futuro e como devemos
comportar-nos depois de terminado este Programa de Assistência Económica e Financeira.
E temos de enfrentar a exigência do momento, porque, de facto, como disse o Sr. Primeiro-Ministro, os
tempos são de particular exigência.
Sr. Primeiro-Ministro, é a terceira vez nos últimos 35 anos que Portugal é forçado a pedir ajuda externa
para que o Estado possa cumprir as suas principais obrigações. Esta é uma sina que Portugal tem de evitar.
Não podemos nem devemos estar condenados a, de quando em quando, recorrer ao exterior para cumprirmos
as nossas necessidades mais básicas.
De resto, é importante registarmos que este momento é mesmo particularmente exigente. Recordo a esse
propósito, Sr. Primeiro-Ministro, que a última vez que pedimos ajuda externa foi em 1983. Então, o Estado
português teve necessidade de pedir 650 milhões de dólares, o que equivalia, à época, a 3,5% do nosso
Produto Interno Bruto.
Em 2011, o Estado português assumiu empréstimos de 78 000 milhões de euros, o que equivale, grosso
modo, a 50% da capacidade de riqueza que anualmente o País é capaz de produzir. O que quer dizer, desde
logo, que do ponto de vista quantitativo o esforço, desta vez, é 15 vezes maior do que aquele que foi em 1983,
e já nessa altura o País viveu grandes dificuldades: conflitualidade social, greves, salários em atraso, impostos
a subir, impostos criados excecionalmente. E na altura tínhamos uma arma, a desvalorização da moeda, no
caso a política cambial, e na altura a Europa não estava em crise, como agora está, o que dificulta ainda mais
o nosso processo de ajustamento.
Sr. Primeiro-Ministro, é bom que todos tenhamos noção da exigência do Programa a que nos obrigámos
em maio de 2011.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, este apelo ao compromisso tem de ser balizado na capacidade de o Estado
português, de todos os seus responsáveis, de todas as suas instituições assumirem a palavra dada,
cumprirem, recuperam a credibilidade e poderem, dessa forma, constituir as bases de termos um novo ciclo de
crescimento económico e um novo ciclo de recuperação de emprego.
Sr. Primeiro-Ministro, como disse (e bem!), nestes últimos dois anos nós já fomos capazes de percorrer
grande parte deste caminho de recuperação. A verdade é que, dois anos depois, do ponto de vista financeiro,
nós temos uma situação difícil, exigente, mas equilibrada.
Dois anos depois foi possível implementar várias reformas estruturais — o Sr. Primeiro-Ministro elencou-as
da tribuna; foi possível diminuir de forma muito substancial a despesa pública, não deixando de garantir a
prestação dos serviços públicos essenciais por parte do Estado; e foi possível recuperar a nossa credibilidade.
Que país, sem credibilidade, conseguia baixar as taxas de juro dos empréstimos que estão em vigor? Os juros
que nós pagamos hoje estão muito abaixo daqueles que foram negociados pelo Governo anterior, aquando da
formalização dos empréstimos. Que país, sem credibilidade, era capaz de conseguir flexibilizar as metas do
défice, adequando-as à realidade económica do País e da Europa? Que país, sem credibilidade, era capaz de
negociar com os seus credores a extensão das maturidades? Não há país que consiga estes resultados sem
credibilidade e sem confiança, Sr. Primeiro-Ministro.
E que país, sem otimismo e sem capacidade de resistência, seria capaz de ter o comportamento que hoje
tem — temos, no País — nas nossas exportações, que estão a subir, numa altura em que os nossos principais
parceiros comerciais estão a definhar do ponto de vista económico?
A economia portuguesa tem conseguido responder, as nossas exportações estão a subir, quer para os
mercados europeus, quer sobretudo para os mercados não europeus, procurando novos horizontes e novos
negócios. E como disse, Sr. Primeiro-Ministro, é um país verdadeiramente em recuperação aquele que, 10
trimestres depois, consegue ver o seu produto interno bruto a crescer.
O Sr. Primeiro-Ministro disse que é preciso ter prudência. É preciso, de facto, sermos prudentes nesta
ocasião, mas isso não significa que tenhamos de ser pessimistas, que tenhamos de desconfiar da nossa
capacidade de recuperar e de levantar este País, Sr. Primeiro-Ministro.
Por isso lhe quero dizer também, em nome do PSD, tal como fizemos desde o primeiro momento, quando
ainda na oposição apusemos a nossa assinatura ao cumprimento da palavra dada em nome de Portugal
assumindo cumprir os termos do Memorando de Entendimento mesmo antes de termos a responsabilidade de
governar, que assim nos mantemos, com esse espírito de compromisso, com esse espírito de salvaguarda do
interesse nacional e, sobretudo, Sr. Primeiro-Ministro, com uma filosofia que tem marcado a nossa atuação
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nesta Legislatura. Nós não estamos aqui para desistir, nós não estamos no PSD para desistir de recuperar e
de transformar o nosso País.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Pelo contrário, estamos aqui para resistir, para lutar e para, em conjunto
com as demais forças políticas, em conjunto com todas as forças da nossa sociedade, debelarmos esta crise
gravíssima, mas, sobretudo, evitarmos que aqueles que, no futuro, vierem a seguir a nós tenham de passar
por um momento como este.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Luís Montenegro, disse na semana passada que
não abandonava o meu País e que não me demitia.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Acompanho, portanto, o Sr. Deputado quando diz que nunca podemos desistir
do nosso País.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E é isso que estamos a fazer quando, desde o início, procurámos cumprir
obrigações externas, adaptar e flexibilizar o programa à realidade e inspirar em todos aqueles de quem
financeiramente dependíamos a confiança necessária para que pudéssemos, no final desse período, dar por
terminado aquilo que se pode considerar, numa situação de grande emergência, uma total dependência do
exterior.
Nós procurámos evitar que essa situação acontecesse e fizemos tudo, às vezes por própria iniciativa, para
que isso não acontecesse.
Estamos, portanto, a carregar connosco o País, que merece uma oportunidade de crescer, de ver uma
economia que possa oferecer oportunidades mais justas para todos e não apenas para alguns e que acredite
em si próprio e na sua capacidade para se afirmar na Europa e no mundo.
Não tem sido um caminho fácil. Disse, e reafirmo-o, que temos enfrentado quase todas as adversidades.
Não nos temos queixado delas, não as ocultamos também. Nós temos tido grandes dificuldades, como é o
caso da própria negociação com a troica. Não é simples mudar o que ficou escrito, não é fácil demonstrar, com
um ano de antecedência, que temos os meios financeiros necessários para solver os nossos compromissos.
Não foi, com certeza, por não inspirarmos credibilidade, como o Sr. Deputado disse, que os nossos
credores aceitaram flexibilizar as nossas metas, dizendo aquilo que certos responsáveis políticos não
conseguem dizer dentro do seu próprio País, ou seja, que nos mantemos dentro de uma trajetória sustentável
para a nossa dívida. Sabemos que ela tem um peso muito grande. Aliás, se eu não tivesse de pagar, pelo
Estado, quase 8000 milhões de euros de juros pela dívida que foi contraída, talvez não precisássemos de
fazer tantos sacrifícios orçamentais na saúde, na educação, na segurança social. Mas, se não honrarmos os
nossos compromissos externos, então não teremos dinheiro nem para a saúde, nem para a segurança social,
nem para o emprego.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Por isso, Sr. Deputado, temos de saber separar bem a demagogia e o populismo da responsabilidade.
Responsável não é quem diz que isto não pode conseguir-se, é quem consegue fazê-lo, apesar das
adversidades.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Essas adversidades criaram tensão política, mesmo dentro do Governo e da coligação. E não aconteceram
por razões menores, aconteceram precisamente em dois momentos de grande tensão e dificuldade, que foram
a 5.ª e a 7.ª avaliações do Memorando de Entendimento. Não foi por acaso! Foram os dois exames regulares
em que tiveram de ser feitas escolhas mais dolorosas para o País, e nenhum Governo as faz de ânimo leve.
Não foi fácil entendermo-nos todos quanto a essas escolhas, que são difíceis, mas fizemo-las, conseguimos
fazê-las, apesar das nossas divergências, apesar de termos diferenças de opinião, apesar de, porventura,
graduarmos de maneira diferente os objetivos. Mas é essa a obrigação de um Governo e de uma coligação.
O PSD e o CDS-PP não querem fundir-se numa coligação, são dois partidos autónomos que têm a sua
história e a sua identidade e querem preservá-la e mantê-la para futuro, mas se têm um compromisso de
Governo têm de o honrar e conseguiram pôr as suas divergências de lado para honrar esses compromissos.
Isso é que é importante e isso é que conta.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Não foi fácil fazê-lo à mesa da troica. Calculo o que seja, à mesa da troica, ter mais do que o Governo a
negociar. Pode ser bom, pode ser bom, mas se já é difícil entre gente que está no Governo, não parece fácil
com gente que não quer vir para o Governo a não ser que tenha eleições.
O Sr. António José Seguro (PS): — Claro, como é óbvio!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, então, que seja sem isso. Que seja sem isso! Que consigamos pôr essas
divergências de lado, como os partidos desta coligação têm feito, e que seja possível construir uma solução
para Portugal. É isto que penso, Sr. Deputado, não é o Sr. Presidente da República que o exige, é o País que
o determina.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Teremos de ser capazes de o fazer, Sr. Deputado, mas teremos de o fazer não em torno de declarações
vazias e, sim, de declarações com substância. E é essa substância que temos, agora, de procurar
consensualizar. Estou certo de que é isso que todos teremos de fazer em nome de Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para formular as suas perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, em nosso entender, este
debate sobre o estado da Nação acontece num momento de grande exigência para o País, com dois terços do
Programa de Ajustamento percorridos, sete avaliações positivas, à porta das oitava e nona avaliações, que
serão, certamente, importantes, com sinais da nossa economia que gostaríamos de sublinhar, como o
crescimento record, de 5,6% das exportações, mérito de empresas, empresários e trabalhadores, mas
também do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e do Sr. Ministro da Economia, a quem deixo uma palavra,
por serem facilitadores e por promoverem, justamente, essa possibilidade de crescimento das exportações.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Logo esses dois, Sr. Deputado! Logo esses dois!
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Risos do PCP.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Primeiro-Ministro, ainda que pareça custar ou pesar na
consciência de alguns partidos, tudo isto significa uma balança comercial consistentemente melhor, mas
significa também que há projeções de entidades independentes que preveem um crescimento económico,
ainda que ténue, mas que, sobretudo, do ponto de vista do sinal, representa, no último trimestre, uma inversão
daquilo que vinha a acontecer, que era uma recessão desde há 10 trimestres consecutivos. E também importa
que isso seja sublinhado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Mas, quando se fala muito na procura interna e na necessidade de
intensificar a procura interna, importa também referir que um estudo de uma reputada empresa ao nível do
mercado deu conta de que, no período entre 20 de maio e 16 de junho, houve um aumento do consumo, que
cresceu 5,1% em termos gerais e 5,8% no setor da alimentação, o que também é um sinal de que, com
políticas de rigor orçamental, de cumprimento daquilo a que nos comprometemos e pagando a quem
devemos, podemos estimular, não artificialmente, como outrora, mas realmente, a procura interna. E, em
nosso entender, também é importante sublinhar isso, Sr. Primeiro-Ministro.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Este debate ocorre, não há que negá-lo, numa altura em que há uma
iniciativa do Sr. Presidente da República no sentido de promover o que denominou como um «acordo de
salvação nacional», que também não deixou de identificar, de forma muito clara e exata, embora isto pareça
não ser relevante para alguns grupos parlamentares aqui representados, os riscos que eleições antecipadas
trariam ao nosso País e ao esforço a que os portugueses têm sido sujeitos nos últimos anos, sublinhando,
nomeadamente, a necessidade de compromisso e diálogo, que é uma exigência de todos, que a todos
responsabiliza e que por isso todos devem ser avaliados. São estes aspetos que, na nossa opinião, não têm
sido devidamente sublinhados.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, aqui chegados, importa sublinhar, sem qualquer tipo de dificuldade, que a
maioria ultrapassou os seus problemas, fê-lo com institucionalidade e celeridade, não se entreteve em meras
trocas de cadeiras, pelo contrário procurou uma solução política sólida.
Risos do PCP, do BE e de Os Verdes.
A situação do País, pelos vistos, merece a risota dos partidos da esquerda mais à esquerda.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Ficam, hoje, os portugueses a perceber e a entender o sentido de responsabilidade da esquerda mais à
esquerda.
Mas, Sr. Primeiro-Ministro, passando a assuntos sérios e que preocupam os portugueses, importa dizer
que, mais do que uma dança de cadeiras, procurámos uma solução política sólida e abrangente, que
permitisse evoluir para um ciclo económico mais acentuado e dinâmico, e entregámos ao Sr. Presidente da
República uma solução governativa.
Quero sublinhar, Sr. Primeiro-Ministro, a si e aos dois líderes dos partidos da coligação, que o CDS confia
nessa solução. Mas também lhe quero dizer, Sr. Primeiro-Ministro, que o CDS sabe, como todos sabemos, o
quão importante é o diálogo político e uma cultura de compromisso em qualquer altura, e, sobretudo, em
tempos excecionais, como aqueles que vivemos, e repetidamente o dissemos, quer ao maior partido da
oposição, quer em sede de concertação social.
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Portanto, Sr. Primeiro-Ministro, estabelecida a conjuntura e elencado um conjunto de factos que nos
parecem relevantes, gostaria de obter da sua parte, um comentário sobre a avaliação que faz desses mesmos
factos e, ao mesmo tempo, sobre a disponibilidade do Governo para dar consistência real, concreta, palpável e
visível a este mesmo diálogo, que se exige e sobre o qual todos parecem estar de acordo, mas em relação ao
qual, neste momento, é preciso estar à altura do desafio. Importa dialogar consequentemente, de forma
autêntica e consciente não do País que todos gostaríamos de ter, e de ter encontrado, mas do País que,
infelizmente, temos, em que estamos e que está ainda sob fortes restrições e assistência financeira.
Era esta avaliação e este comentário que queria obter da parte do Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, como referiu, e bem, tive
oportunidade de, com o líder do CDS-PP, chegar a um entendimento que reforça a coesão interna e política do
Governo e da maioria. Fizemo-lo num tempo politicamente intenso, mas, julgo eu, num tempo que o País
percebeu. Há coisas muito importantes que se podem perder de um dia para o outro, mas há outras que se
podem reganhar quando sabemos dar o tempo necessário a que se possam reconstruir. Fizemo-lo em menos
de três dias.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Foi importante que o Presidente da República pudesse saber que esta maioria
está coesa e é importante que o País saiba que, apesar das nossas diferenças, o Governo não deitará pela
janela fora tudo aquilo que os portugueses conseguiram nestes dois anos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Tenho, portanto, a convicção de que este Governo estará pronto para lidar
com todas as adversidades futuras com a mesma dignidade e a mesma força com que lidou com as
adversidades que até hoje enfrentou.
Mas, Sr. Deputado, sobre isto, tenho também uma posição de humildade, porque o que se passou não
devia ter acontecido. Porém, aconteceu e, por isso, agora temos de demonstrar aos portugueses que não
voltará a acontecer. E isto precisa, evidentemente, de um amplo esforço de todos nós.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — No entanto, agora, e uma vez que dentro da coligação e do Governo a questão
está resolvida,…
O Sr. António Filipe (PCP): — Está?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … é importante que possamos acrescentar aos portugueses, tanto quanto
possível, previsibilidade e confiança para o futuro. E um futuro que está para além da vida deste Governo
ganha com um entendimento alargado, pelo que vamos procurá-lo.
Foi justamente por isso — quero, desde já, dizê-lo — que entendi que não deveria fazer aprovar em
Conselho de Ministros alguns elementos importantes que estão prontos e respeitam à concretização de
medidas do programa de médio prazo que foi acertado com a troica para Portugal. Esses elementos estão
prontos para seguir para o Parlamento, tal como nos comprometemos, mas decidi, no entanto, que era preciso
preservar a boa fé. Não basta dizer que queremos chegar a um entendimento, é preciso dar sinais de que
estamos mesmo empenhados nisso e, se estamos mesmo empenhados nisso, então, não podemos
desenvolver uma política que possa ser entendida como de facto consumado.
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Fizemos o nosso trabalho de casa, mas solicitámos à troica que, na atual conjuntura, em que estamos à
procura de um entendimento mais alargado, o oitavo exame fosse realizado em conjunto com o nono exame,
em setembro, de modo a aproveitarmos a vinda dos chefes de missão, que espero possa ocorrer tão rápido
quanto possível, de preferência ainda na próxima semana, para que tenham oportunidade de realizar, com os
partidos da maioria, mas também com o Partido Socialista, nos termos em que subscreveu o Memorando de
Entendimento, um encontro que nos permita determinar o «chão» com que é possível prosseguir para
podermos satisfazer um dos pedidos do Sr. Presidente da República, o de saber quais as condições para que
possamos encerrar com êxito o nosso Programa de Assistência Económica e Financeira.
Trata-se, portanto, de uma prova de boa fé, de interesse nesse compromisso de não estar a fechar
soluções, mas de as poder abrir.
Evidentemente, a minha expetativa é a de que nos continuemos a guiar pela mira do cumprimento. Mas se
for possível cumprir, noutros termos, podemos cumprir noutros termos: vamos à procura deles! Mas vamos
fazê-lo não apenas com uma das partes da negociação, vamos fazê-lo com a outra parte da negociação
também.
Julgo que esta é uma demonstração, Sr. Deputado, não apenas da boa-fé, mas do empenhamento com
que este Governo tratará esta matéria.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PCP, pelo que tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de
Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro…
Pausa.
A Sr.ª Presidente: — Pedia aos Srs. Deputados que se encontram em pé na Sala que retomassem os
vossos lugares, para que o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa possa usar da palavra.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, fiz só uma pequena pausa, porque o Sr. Primeiro-
Ministro estava distraído.
A Sr.ª Presidente: — Entretanto, a Sala também fica mais calma.
Queira fazer o favor de prosseguir, Sr. Deputado.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, podíamos ter a tentação de,
hoje, discutirmos o estado do Governo, isolado do estado da Nação. É um elemento que, com os episódios
recentes, pelas contradições internas, pelas demissões concretizadas, pelas tentativas de deserção, enfim,
com certeza poderia ser interessante, mas que apenas acrescenta à crise política, económica, social e
cultural, uma crise ética, tendo em conta o comportamento dos parceiros do Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Contudo, o que é importante relevar é que, de facto, o estado do
Governo é de derrota e de falhanço. Derrota e falhanço da política de direita, apesar de terem um Governo,
uma maioria, um Presidente da República, um capital amigo e incentivador, nacional e estrangeiro, os centros
de decisão da União Europeia, uma comunicação social dominante também amiga, um exército de
comentadores, de analistas, que todos os dias procuravam formatar o pensamento dos portugueses. E a
verdade é esta: como é que foi possível? O que aconteceu para que hoje estejamos perante um Governo
derrotado, um Governo sem futuro?
Independentemente desses episódios, consideramos que a causa funda da crise reside nesta política,
neste memorando de agressão que transformou a vida de milhões de portugueses num inferno.
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Então, o que falhou? O que falhou, Sr. Primeiro-Ministro, foi que não
contaram com os trabalhadores e com o povo português.
Aplausos do PCP.
Quando nos debates quinzenais lhe falávamos dessa luta, desse descontentamento, dessa indignação,
fazia um sorriso irónico. Compreendia-nos, mas não nos dava razão. E, afinal, se quer uma explicação da sua
derrota e da derrota do seu Governo, ela deveu-se, de facto, à luta, à ação e à intervenção dos portugueses.
Por isso, quando fala em coragem, Sr. Primeiro-Ministro, digo-lhe que coragem tiveram os trabalhadores e
os portugueses que, num quadro de chantagem e de pressão, num quadro de desemprego avassalador, num
quadro de aumento da exploração e da pobreza, quando foi desenvolvida uma saraivada ideológica, em nome
das inevitabilidades, do «conformem-se», do «resignem-se», do «tem de ser assim», este pacto de agressão
tem de ser concretizado, esta política de direita tem de ser ir para a frente, neste quadro de pressão, foi a luta,
foi a coragem dos portugueses que o levou à derrota e à falta de futuro que tem neste momento.
Aplausos do PCP.
É por isso que não sabemos se dura pouco, ou se dura um pouco mais, mas é um Governo que é, de facto,
já do passado.
Quando se colocava a necessidade de demitir este Governo, de devolver a palavra ao povo para procurar
uma solução ou uma política alternativa, eis que o Presidente da República, que recentemente dizia que não
tinha poderes para demitir este Governo, é o mesmo que aparece, agora, a querer promover um Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mas a questão de fundo é esta: o Presidente da República não fez
uma proposta para salvar o País, o Presidente da República fez uma proposta para salvar a política de direita,
que os senhores, sozinhos, não são capazes de concretizar!
Aplausos do PCP.
Por último, o Sr. Primeiro-Ministro voltou a falar do novo ciclo, sem usar a palavra, sem usar o termo, mas
usou outra vez aquele discurso dos sinais, de que o pior já passou… Está a querer enganar quem, Sr.
Primeiro-Ministro?
O Sr. António Filipe (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Então, nós não sabemos aquilo que está indiciado nesse programa
de terrorismo social, em que se querem sacar mais 4700 milhões de euros aos trabalhadores, aos seus
direitos, às reformas e às pensões, aos serviços públicos da saúde e da educação; então, nós não sabemos
que vai apresentar um Orçamento duríssimo contra os portugueses, e vem dizer que o pior já passou?!
Vale por este tempo, mas a verdade é que é por estas e por outras que os senhores não têm um futuro,
são um Governo derrotado e ultrapassado.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, cumprimento-o pela sua
frontalidade.
Não estamos, de facto, a ver a situação da mesma maneira, porque o Sr. Deputado entende que, nestas
circunstâncias, a causa profunda da crise que vivemos resulta da execução do Memorando de Entendimento,
o Programa de Assistência Económica e Financeira, e eu, Sr. Deputado, estou convencido — e não estou
sozinho, não é uma obstinação minha — de que as causas profundas desta situação não estão no
Memorando, estão no que obrigou Portugal a ter Memorando. E o que obrigou Portugal a ter Memorando está
bem espelhado no facto histórico de, na nossa democracia, termos precisado ciclicamente de pedir ajuda
externa por não nos sabermos governar. É exatamente assim, Sr. Deputado!
Estivemos vezes de mais a fazer batota, a utilizar os instrumentos que tínhamos, o instrumento monetário e
cambial, para fazer de conta que éramos competitivos, a proteger grupos económicos…
Risos de Deputados do PCP.
Vozes do PCP: — E agora, não!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — … que não teriam sobrevivência se não estivessem na pendência do Estado.
Aplausos do Deputado do PCP Bruno Dias.
Foi isso que aconteceu, durante muitos anos, Sr. Deputado: uma economia protegida, sem concorrência,
um País voltado para si próprio.
O Sr. Honório Novo (PCP): — É verdade, é mesmo por causa deles que estamos assim! E tem alguns aí,
nessa bancada!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Um País, Sr. Deputado, que não conseguiu, em todos estes anos, gerar uma
única vez um excedente do seu Orçamento, que não conseguiu, uma única vez, usar — perdoe-se-me a
expressão — o que pode resultar de «tempos de vacas gordas» para o «tempo de vacas magras».
Nunca soubemos amealhar alguma coisa para tempos menos favoráveis e sempre favorecemos o desafio,
mais do que provável, de termos um País com desequilíbrios profundos, seja internos seja externos, com a
injustiça que conhecemos de sermos um dos países da Europa em que a distribuição da riqueza é mais
injusta.
Sr. Deputado, isso não foi uma consequência do Programa de Assistência Económica e Financeira, isto é
uma consequência de muitos anos.
O Sr. António Filipe (PCP): — De PSD!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, estes muitos anos têm responsabilidades de muita gente
— não quero aqui agora falar disso. De muita gente! Julgo, Sr. Deputado, que nenhuma das formações que
aqui está isenta de responsabilidades.
O Sr. António Filipe (PCP): — Ah, a culpa é nossa?!…
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Fale por si!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr. Deputado, não é isso, como dizia, que interessa mais. O que
interessa mais é corrigir essa situação.
O Programa de Assistência Económica e Financeira não é um milagre para Portugal, mas não é uma
agressão, Sr. Deputado. Fomos nós que o pedimos.
Protestos do PCP e do BE.
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E pedimo-lo, Sr. Deputado, por uma razão: não podíamos permitir que os portugueses pagassem o preço
da irresponsabilidade da bancarrota.
Sr. Deputado, sabemos — e eu sei que os portugueses sabem também — que os orçamentos são
duríssimos. Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Duríssimos para quem?
O Sr. Primeiro-Ministro: — Quando se tem uma determinada quantia no bolso para gastar e se sabe que
não é possível aumentar essa quantia, porque a moeda não é nossa, não depende de nós, e só a podemos ir
buscar se formos responsáveis e confiáveis, então, Sr. Deputado, não é possível gastar mais do que se tem. E
é isso que os portugueses percebem.
O Sr. João Oliveira (PCP): — São 150 milhões de euros para o Banif!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Há uma parte do Parlamento que quer convencer os portugueses de que esta
redução da despesa é feita porque queremos impor sacrifícios às pessoas. Mas é cada vez mais importante,
Sr. Deputado, mudar a consciência política de responsabilidade, dizendo que não vale de nada prometer o que
se não pode fazer e pôr a expetativa de realização orçamental onde não há dinheiro para a executar.
É isso que o próximo Orçamento vai demonstrar, mais uma vez, Sr. Deputado: nós viveremos à medida
das nossas possibilidades, mas estamos a fazer tudo para que essas possibilidades cresçam, no futuro. É
essa a ambição que devemos ter.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Guilherme Silva.
O Sr. Presidente: — Para formular uma pergunta, em nome do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr.
Deputado João Semedo.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, este é o debate anual sobre o estado da
Nação. O Governo vem ao Parlamento não para discutir o estado da Nação, mas para fazer a sua prova de
vida. O Governo acaba de fazer a sua prova de vida e o resultado está à vista: o Governo morreu, o Governo
acabou.
Este é o resultado do debate sobre o estado da Nação.
Aplausos do BE.
Registo que o Sr. Primeiro-Ministro chega aqui, ao debate sobre o estado da Nação, acompanhado pelos
seus 12 ministros sobreviventes, mas registo que, como se o debate sobre o estado da Nação fosse uma
representação teatral, o senhor mexeu nas bailarinas, mexeu nos atores, mexeu nos cantores, os da esquerda
passaram para a direita, os da direita passaram para a esquerda — deixe-me dizer, são todos de direita, mas
percebe-se o que quero dizer —, para criar a ilusão de que este já é outro Governo.
O Sr. Primeiro-Ministro pode procurar criar todas as ilusões, mas sabe o que é que se vê aqui, hoje, na
bancada do Governo? São os ministros que já não estão: Miguel Relvas e Vítor Gaspar, esses são aqueles
que se veem melhor!
Aplausos do BE.
O Sr. Primeiro-Ministro sabe bem que, nos últimos 10 dias, o Governo sofreu três golpes mortais, três
golpes fatais, e não vale a pena insinuar que foi apenas a demissão do Ministro Paulo Portas, que, agora, está
sentado ao seu lado direito, que criou a crise e o imbróglio político em Portugal.
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Tudo começou com o primeiro desses golpes, a demissão de Vítor Gaspar. Vítor Gaspar quando se demitiu
reconheceu os custos da política de austeridade, da política do Memorando, e reconheceu mais: reconheceu a
falta de credibilidade e de confiança.
O segundo golpe fatal, o segundo golpe mortal foi dado pela demissão do Sr. Ministro de Estado e dos
Negócios Estrangeiros, o Dr. Paulo Portas. E o Dr. Paulo Portas, nessa altura, condenou a condução política
do Governo, criticou-o diretamente a si.
Por último, como se já fosse pouco, o terceiro e mais recente golpe mortal no Governo foi dado pelo
Presidente da República, Cavaco Silva. Cavaco Silva certificou a subalternidade, a menoridade, a
incapacidade do seu Governo: recusou mudar o Governo, recusou remodelar o Governo. E mais, até chamou
o PS para salvar o Governo, salvar a política de austeridade e salvar o Memorando.
Veja bem, Sr. Primeiro-Ministro, como é que quer manter um Governo vivo, depois destes três golpes
fatais!
Aplausos do BE.
O Sr. Primeiro-Ministro ainda não percebeu que o Governo acabou. Mas, mais grave do que não ter
percebido que o Governo acabou, é ainda não ter percebido por que é que o Governo acabou. Eu dar-lhe-ei
uma explicação.
O Governo fracassou por duas razões principais: a primeira, pela política de austeridade; a segunda, pelos
governantes que não respeitam a sua própria palavra.
Em primeiro lugar, a política de austeridade não resolveu um único dos problemas do País, agravou-os a
todos e, pior do que isso, criou novos problemas.
Sr. Primeiro-Ministro, gostava de recordar que há um ano, no debate sobre o estado da Nação, o défice era
de 7,6%, hoje é de 10,6%; a dívida era 117% do PIB, hoje é 127% do PIB. Há uma ano era assim e hoje
estamos no estado que acabei de descrever.
Entretanto, o que aconteceu à riqueza do País? O que aconteceu ao desemprego? A riqueza do País — o
PIB — baixou de 168 000 milhões de euros para 162 000 milhões de euros e o desemprego que há um ano,
no debate sobre o estado da Nação, era de 14,9%, um ano depois é de 17,6%.
Estes são os resultados, a imagem do fracasso da política de austeridade, e foi a política de austeridade a
principal responsável pela derrota do Governo.
Em segundo lugar, os governantes não respeitam a sua própria palavra. E, Sr. Primeiro-Ministro descanse,
porque não estou a falar do Ministro Paulo Portas nem das suas promessas eleitorais, estou a falar de si
mesmo, Sr. Primeiro-Ministro, e da forma como o senhor não respeita a sua própria palavra.
Quero lembrar-lhe o que disse aqui, há um ano, no debate sobre o estado da Nação, vamos ouvir Pedro
Passos Coelho há um ano: «Quero reafirmar o que já disse, o Governo não está a preparar qualquer aumento
de impostos ou qualquer outra medida dessa natureza». São as suas palavras de há um ano; três meses
depois, o seu Governo aprovava o maior aumento de impostos que alguma vez a democracia portuguesa viu!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Exatamente! Não tem palavra!
O Sr. João Semedo (BE): — Como é que o Sr. Primeiro-Ministro quer que os portugueses acreditem em si
e na sua palavra? O senhor não respeita a sua própria palavra, e essa é a segunda razão de condenação e de
fracasso deste Governo.
Sr. Primeiro-Ministro, chegamos a esta fase do debate sobre o estado da Nação e não percebemos bem
que Governo está aqui, à nossa frente: se é o antigo Governo, se é o futuro Governo, se é o ex-futuro
Governo! O senhor pode mudar de modelo, pode trocar superministros por ministros «superbock» ou
«superswap», pode fazer todas essas mudanças, mas o Governo, a sua política e o Sr. Primeiro-Ministro
estão no centro da crise e, enquanto o País não se libertar desta política, deste Governo e deste Primeiro-
Ministro, o País não tem solução para sair da crise.
Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, deixe-me terminar dizendo-lhe: desista, desista! O País agradece. Deixe o
País respirar, deixe a democracia funcionar, deixe que se realizem eleições, porque garanto-lhe que, sem si,
os portugueses encontrarão a saída da crise com muito mais facilidade.
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Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, quando escuto a intervenção do Sr. Deputado João Semedo
tenho dificuldade em compreender por que há partidos que entendem que para conseguir fechar o Programa
de Assistência Económica e Financeira com êxito se deve falar também com o Bloco de Esquerda. Tenho
dificuldade em compreender, porque o Bloco de Esquerda, Sr. Deputado — sabe-o o País inteiro —, não quer
que Portugal honre os seus compromissos,…
Vozes do CDS-PP: — Exatamente!
O Sr. Primeiro-Ministro: — … não quer que Portugal cumpra o Programa de Assistência e não quer, não
vive bem dentro do euro e dentro do Tratado Orçamental que existe na Europa.
O Sr. João Semedo (BE): — Falso!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Esta é a verdade, Sr. Deputado.
Protestos do BE.
O Sr. Deputado quis trazer um quadro negro para o País — está no seu direito. Quero apenas dizer ao Sr.
Deputado que, a propósito dos tais sinais que referiu, houve um que não mencionei, mas que pode ter
importância. Ainda hoje, foi divulgado pelo Eurostat que Portugal foi o País com o terceiro maior crescimento
homólogo na produção industrial na União Europeia.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E se olharmos, então, para o mês de maio, foi mesmo o País que registou o maior crescimento de
produção industrial.
Sr. Deputado, quero apenas sublinhar que esta indicação, este sinal não é tão irrelevante quanto isso,
porque a verdade é que estamos a conseguir, há mais de três meses, mostrar sinais de retoma da nossa
produção industrial, pondo fim, portanto, a um ciclo muito antigo, em que a produção industrial caía
consecutivamente. Agora é ao contrário, Sr. Deputado.
Cada um valoriza o que quer. Eu valorizo os sinais positivos que temos.
O Sr. António Filipe (PCP): — Pois, está tudo a correr bem!…
O Sr. Primeiro-Ministro: — E quando os valorizo não digo, sequer, que eles se devem estritamente à ação
do Governo. Tenho dito, muitas vezes, que não é um governo que muda tudo, um País só muda se quiser
mudar.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O País quer é mudar de Governo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E o País que quer mudar, Sr. Deputado, não está preocupado com as suas
considerações, está preocupado com estes sinais que lhe dão um estímulo importante para acreditar que nós
vamos vencer esta crise.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa
Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro tem consciência, ao longo
destes dois anos, de quantas vezes já anunciou aqui alguns sinais que considerava extraordinariamente
positivos e que a breve prazo que viria a recuperação? O Sr. Primeiro-Ministro tem consciência de quantas
vezes fez o papel que está a fazer neste preciso debate? É sempre a mesma coisa, Sr. Primeiro-Ministro!
A história repete-se permanentemente com este Governo e com este Primeiro-Ministro. Ou seja, faz
sempre o anúncio, no meio de uma tempestade, de que a luz ao fundo do túnel está para breve, e o certo é
que essa luz ao fundo do túnel não chega, a perspetiva de mudança não chega, Sr. Primeiro-Ministro.
Em 2011, o Sr. Primeiro-Ministro disse que 2012 seria o ano de viragem, mas não foi. E depois prometeu a
recuperação económica para 2013, que não se concretizou. É o próprio Governo que perspetiva uma recessão
de 2,3% para 2013 e, agora, há de ser para 2014, para 2015, e nunca mais chega! Porquê, Sr. Primeiro-
Ministro? Porque estas políticas que o Governo tem vindo a implementar geram, elas próprias, uma crise
económica e social estrutural, Sr. Primeiro-Ministro.
É por isso, por exemplo, que o próprio Governo prevê, para 2020 (isto é, praticamente uma década depois
de o Governo tomar posse), que o crescimento não ultrapasse sequer os 2% do PIB. Obviamente, tal não se
reflete depois, Sr. Primeiro-Ministro, numa produção significativa de emprego. Portanto, estamos numa
perspetiva completamente negra.
Ao ouvir o Sr. Primeiro-Ministro no início do mandato, quem diria que chegaríamos ao debate do estado da
Nação de 2013 nas condições em que estamos hoje, com níveis de desemprego absolutamente assustadores,
com níveis de pobreza absolutamente hediondos, com um empobrecimento crescente no País, com níveis de
recessão completamente devastadores para o País?
Sr. Primeiro-Ministro, de facto, neste momento, isto não tem solução, e não tem solução por via da
continuidade da implementação de políticas que geram estes resultados. A solução é a inversão completa
destas políticas, mas os senhores assumem que não querem fazê-la e, portanto, não obterão resultados
sustentáveis visíveis, Sr. Primeiro-Ministro.
Outra questão que se coloca e que é extraordinariamente importante é esta da crise do Governo. Poder-se-
ia dizer assim: «Zangaram-se, acontece». Não, não é nada disso, Sr. Primeiro-Ministro, embora tenha sido
mais ou menos essa a ideia que quis fazer passar aqui, até dizendo que são tricas laterais, não é verdade?
Sr. Primeiro-Ministro, estamos a falar de coisas muito sérias.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Claro!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Estamos a falar de uma crise que chega ao Governo porque há
uma demonstração clara de um falhanço rotundo das políticas do Governo. Mas sabe o que é mais
preocupante, Sr. Primeiro-Ministro? É que esta crise do Governo não revela só o falhanço das políticas
seguidas até então. Os Verdes consideram que ela revela mais do que isso, revela que as perspetivas futuras
não são nada boas, porque se as perspetivas a curto prazo se revelassem boas para o Governo esta crise não
se tinha dado.
Portanto, o quadro à vista é negro, e isso é que é verdadeiramente preocupante. Não há remendos para
pôr no Governo, Sr. Primeiro-Ministro. Não peça essa benesse ao País, não peça essa segunda oportunidade
ao País. O que o Sr. Primeiro-Ministro tinha a provar ao País, já provou, não peça mais oportunidades. Falhou,
falhou, Sr. Primeiro-Ministro!
Depois, temos um outro problema, que é o de termos um Presidente da República que, em vez de assumir
o seu sentido de Estado, o que faz é promover e apoiar estas políticas negativas que têm sido implementadas.
De facto, temos diversas instituições e diversos órgãos de soberania que não estão a compreender a
generalidade dos portugueses, porque a tensão social é grande, o descontentamento e a frustração são
grandes. Mas o Sr. Primeiro-Ministro esperaria outra coisa? Não pode ser!
O Sr. Primeiro-Ministro chegou ao Governo mentido — tem consciência disso? —, disse que ia fazer coisas
que não fez e também disse que não ia fazer coisas que fez. Não é assim que se pode estar na política. A
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palavra dada aos portugueses tem de valer alguma coisa, a palavra das pessoas que estão na política em
representação dos portugueses tem de valer alguma coisa.
Termino, Sr. Primeiro-Ministro, colocando um desafio e dando uma informação.
O desafio (talvez o transforme numa pergunta) é o seguinte: será que o Sr. Ministro de «não sei quê» —
não sei exatamente o que é, mas acho que ainda é Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros —, o Sr.
Ministro Paulo Portas, vai falar no decurso do debate, de modo a que o possamos confrontar com perguntas
diretas sobre a situação que estamos a viver, naturalmente porque representa o outro partido que está no
Governo?
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Termino já, Sr. Presidente.
Por último, Sr. Primeiro-Ministro, porque este Governo se revelou um problema enormíssimo para o País,
fruto das políticas que tem implementado, porque este Governo apodreceu a vida política em Portugal e
porque este Governo acabou, Os Verdes apresentarão, no início da próxima semana, uma moção de censura
ao Governo,…
Vozes do PSD: — Oh!…
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — … que será discutida neste Parlamento, um Parlamento cuja
maioria não representa mais a população portuguesa!
Aplausos do Deputado de Os Verdes José Luís Ferreira e do PCP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, a história não é sempre a
mesma. De facto, não é sempre a mesma.
O Primeiro-Ministro tem a responsabilidade de não afundar expectativas no País quando não tem razões
para isso. Portanto, como Primeiro-Ministro, mesmo correndo alguns riscos, não posso deixar de incentivar o
País para as coisas positivas e para os sinais positivos que temos no nosso horizonte. Julgo que é essa a
minha obrigação, até porque a obrigação de todos nós é valorizar o que de positivo conseguimos no País. Não
é desvalorizar ou relativizar ou amesquinhar, é valorizar o que temos de positivo.
Criou-se este vício, o de tradicionalmente os Governos valorizarem os aspetos positivos e a oposição
destacar o que é negativo. Mas não tem de ser sempre assim. A Sr.ª Deputada poderia quebrar um pouco
este enguiço e, de vez em quando, contrariar esta pecha — e isso, sim, os portugueses valorizariam — que
temos na nossa democracia, que é a de ter a oposição sempre a dizer mal de tudo.
Vozes do PCP: — Não há nada para dizer bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Assim, a Sr.ª Deputada, hoje, no debate sobre o estado da Nação, também
teria uma boa oportunidade de poder dizer bem de alguma coisa.
O sinal que eu hoje quis aqui valorizar é um sinal positivo. Mas há um aspeto que é relevante, e é por isso
que devemos valorizar os sinais positivos: é que eles são obtidos em contexto desfavorável. Repare, Sr.ª
Deputada, que, há dois anos, a perspetiva não era a de ter, no contexto europeu, um ambiente recessivo.
Portanto, era natural que houvesse a expectativa de que o motor das exportações pudesse ter, num País que
exporta maioritariamente para a Europa, um crescimento, induzido pela procura externa, mais forte, que nos
pudesse ajudar a amortecer mais o efeito da política restritiva que temos de realizar no plano interno.
Mas o contexto europeu não evolui apenas de acordo com a nossa vontade. Foi adverso. E conseguirmos
estes resultados, apesar dessas adversidades, dá mais valor a esses resultados, Sr.ª Deputada — e é isso
que tenho de enfatizar.
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Protestos da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia.
Conseguirmos, contra o que tem sido a média europeia, um resultado melhor, dá-nos a possibilidade,
contrária àquela dos últimos 10 anos em que estivemos a divergir da Europa, de convergir com a Europa. E
isso, Sr.ª Deputada, é um sinal que evidentemente não posso deixar de valorizar.
Quanto ao que a Sr.ª Deputada referiu a título de informação, devo dizer-lhe o seguinte: é muito bem-vinda
a moção de censura.
A Sr.ª Deputada saberá que este Governo tem uma maioria coesa no Parlamento a apoiá-lo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Vamos passar à segunda ronda de perguntas ao Sr. Primeiro-
Ministro.
Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, como há sempre limitações de
tempo, vou ter de repartir as minhas intervenções.
Em primeiro lugar, gostaria de dizer que, como compreenderá, nenhum diálogo político fará mudar aquela
que é a posição do Partido Socialista. E, da parte do Partido Socialista, não contará com nenhum frete, nem
que sejamos muleta de um Governo que já não reconhecemos ter condições para continuar a governar.
Queria dizer-lhe isto com muita clareza.
Aplausos do PS.
Em segundo lugar, quero discordar do Primeiro-Ministro quando diz que as nossas referências às
demissões do Ministro das Finanças e do Ministro dos Negócios Estrangeiros são trica política. Pode ser a sua
interpretação, mas discordo. Na nossa interpretação, é irresponsabilidade política que trouxe graves prejuízos
para o nosso País, como, aliás, foram demonstrados e contarão para a história. O País poderia ter sido
poupado a essa — volto a repetir, Sr. Primeiro-Ministro — irresponsabilidade política.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — O País está numa crise política por culpa exclusivamente dos
senhores, do seu Governo. Este Governo transformou-se no maior fator de instabilidade política no nosso
País.
Aplausos do PS.
Em terceiro lugar, o facto de estarmos disponíveis para iniciar um processo de diálogo, com vista a
encontrarmos soluções para resolvermos os graves problemas do País, não pode apagar a memória destes
dois anos.
Compreendo que o Primeiro-Ministro venha ao Parlamento e queira fazer um apagão destes dois anos,
porque lhe dá jeito, porque tem interesse, porque os resultados são extremamente negativos. Numa frase:
porque falhou todos os objetivos!
Todavia, nós não permitiremos que se faça esse apagão. E mais: é fundamental que o Governo reconheça
isso, por duas razões essenciais.
Em primeiro lugar, por respeito aos portugueses, por respeito aos sacrifícios que o senhor impôs aos
portugueses, sacrifícios exageradíssimos que provocaram dor, sofrimento e desemprego como nunca houve
na história do nosso País. É que o Sr. Primeiro-Ministro prometeu aos portugueses que, em troca desses
sacrifícios, conseguia tirar Portugal da crise e o resultado foi precisamente o inverso: há mais crise social e há
mais crise económica e política.
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Em segundo lugar, porque não pode haver base para qualquer acordo, para qualquer entendimento se não
se começar por reconhecer a realidade. E a realidade que o Sr. Primeiro-Ministro tem de reconhecer
publicamente é que a sua política de austeridade falhou.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. António José Seguro (PS): — Já o reconheceu o seu ex-Ministro das Finanças, já o reconheceu o
seu parceiro de coligação, até já o reconheceu — veja lá! — a Diretora do Fundo Monetário Internacional.
Quem ainda não o reconheceu e não retirou daí as devidas consequências e ilações foi o Primeiro-Ministro de
Portugal, que obviamente devia retirá-las.
Aplausos do PS.
Volto a dizer-lhe: essa é uma condição para qualquer diálogo. Nós devemos ter um diálogo assente na
realidade, e a realidade é essa.
Outro ponto tem a ver com o processo político. E, a este propósito, também quero ser muito claro: não há
nenhum processo político entre o Governo e o Partido Socialista. Estamos disponíveis para um processo
político de diálogo entre os partidos políticos que o quiserem e consideramos fundamental, por razões
democráticas, que nenhum partido seja excluído à partida. Pelo contrário, todos os partidos devem ser
envolvidos.
Aplausos do PS.
É óbvio que cada partido sabe de si e decide se quer ou não participar. Mas quero voltar a dizê-lo com
muita clareza: todos os partidos políticos devem ser associados, nenhum tem o monopólio da defesa do
interesse nacional e todos têm propostas e contributos para dar no momento de emergência pelo qual
passamos.
Depois, o Primeiro-Ministro disse aqui que, em breve, disponibilizaria os termos de referência que
considera para o entendimento. Mas o Primeiro-Ministro está enganado. Aqui, ninguém define os termos para
esse entendimento. O Presidente da República, na sua declaração ao País, foi muito claro e definiu três
termos…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, posso terminar já, ou concluir o raciocínio. Fica à sua
consideração.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Conclua o raciocínio, Sr. Deputado.
O Sr. António José Seguro (PS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Como dizia, o Sr. Presidente da República, na sua declaração ao País, definiu os termos. E volto a recordá-
los, de um forma muito objetiva: primeiro, a realização de eleições antecipadas em 2014; segundo, que haja
contributos para que o nosso Programa de Ajustamento seja concluído com êxito e haja regresso a mercados;
terceiro, que se crie uma trajetória sustentada, em matéria de contas públicas, com particular incidência na
dívida pública.
Vozes do PS: — Exatamente!
O Sr. António José Seguro (PS): — São estes três termos, e não porventura os que o senhor quererá
introduzir, que são a base deste processo político. E é com rigor, com verdade, sem esconder absolutamente
nada aos portugueses e, por isso, com muita transparência, que o Partido Socialista reafirma aqui a sua
disponibilidade para servir o interesse nacional, mas com base nestes termos.
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Luís
Montenegro.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, a bancada do PSD queria reforçar
o seu empenho em construir as bases de um diálogo genuíno e sólido com todos os partidos e, no caso
concreto, com todos os partidos que subscreveram e apoiaram o Memorando de Entendimento.
Sr. Primeiro-Ministro, no PSD, não pretendemos que o Partido Socialista faça um frete ao Governo ou seja
a muleta desta maioria. Não temos esse complexo relativamente ao Partido Socialista e entendemos que o
Partido Socialista também não deve ter esse complexo relativamente a esta maioria. Foi, aliás, numa base
descomplexada que estes três partidos assumiram, em nome do Estado, em maio de 2011, antes de
conhecerem o resultado das eleições legislativas que se iriam realizar em junho, o cumprimento das principais
obrigações a que estávamos sujeitos, em função da negociação feita pelo anterior Governo.
Deixe-me dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que nenhum de nós quer apagar a história. E não é possível
apagar a história destes dois anos — nem daquilo que foi feito pelo Governo e por esta maioria, nem daquilo
que foi também o comportamento político do principal partido da oposição.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Devo recordar aqui, Sr. Primeiro-Ministro, que o PSD nunca recusou —
repito, o PSD nunca recusou — reunir e dialogar com nenhum partido e, muito menos, com o Partido
Socialista. Mas, nestes dois anos, o Partido Socialista recusou…
Vozes do PSD: — É verdade!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … dialogar e reunir com o Grupo Parlamentar do PSD, quando instado a
isso, a propósito de uma reforma importante, a reforma do poder local, que fazia e faz parte do Memorando de
Entendimento.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, nós não queremos apagar a história, mas
queremos que todos sejam capazes de assumir as suas responsabilidades — as responsabilidades passadas,
as responsabilidades presentes e as responsabilidades futuras.
Nós aprovámos no Parlamento uma lei do arrendamento urbano, aprovámos a reforma da administração
local, aprovámos a reforma judiciária, aprovámos o pacote laboral, aprovámos a lei dos compromissos,
aprovámos a lei-quadro das fundações.
Estas leis foram a concretização das obrigações assumidas pelo Estado português no Memorando de
Entendimento. Mas estas leis não tiveram o voto favorável do Partido Socialista que o subscreveu e negociou.
O Sr. Luís Menezes (PSD): — Bem lembrado!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr. Primeiro-Ministro, acho muito bem que façamos esse exercício
histórico, sem estarmos aqui a querer passar culpas a quem quer que seja. Mas é assumindo aquilo que
aconteceu que poderemos perspetivar o que pode acontecer. Nós queremos ser capazes de construir um
entendimento, mas um entendimento que valha, um entendimento onde todos possam subsequentemente
assumir os seus compromissos e as suas responsabilidades.
E, Sr. Primeiro-Ministro, estamos empenhados em construir esta base de entendimento e de compromisso,
sobretudo porque há algo que deve efetivamente ser evitado. Deve ser evitado o desperdício do extraordinário
esforço e sacrifício que os portugueses, as famílias portuguesas, as empresas, os empresários e os
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trabalhadores fizeram ao longo dos últimos dois anos. Temos a responsabilidade de continuar a executar o
Memorando de Entendimento,…
O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Faça favor de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — … de continuar a cumprir a nossa palavra e de não desperdiçar este
esforço.
Como muito bem demonstrou o Sr. Presidente da República, aqueles que defendem eleições antecipadas
nesta altura mais não estão do que precisamente a desperdiçar todo esse esforço, todo esse sacrifício.
Quanto aos sinais positivos, que muitos podem teimar em desvalorizar, nós não temos uma atitude
triunfalista perante eles. Temos uma atitude de confiança, uma atitude de quem está no caminho correto, não
obstante a exigência do momento e as dificuldades que temos pela frente.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entretanto, reassumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado João Pinho de Almeida.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, ao discutirmos o estado
da Nação no contexto de uma necessidade importante de alargamento do consenso político, há matérias que
são essenciais e que devem merecer a prioridade nessa discussão.
Uma delas, de que o Sr. Primeiro-Ministro já aqui falou, é a sustentabilidade da dívida pública. Devemos ter
a noção de que essa sustentabilidade da dívida pública, fruto daquilo que levou ao pedido de ajuda externa e
ao programa que agora enfrentamos, depende de conseguirmos em dois indicadores algo que nunca
conseguimos em democracia. Precisamos de ter, de forma sustentada, um excedente primário, que é algo que
nunca conseguimos ter de forma estável ao longo dos últimos 30 anos, e precisamos também de ter um nível
de crescimento sustentável e superior àquilo que foi a nossa realidade nos últimos anos.
É sobre isso que devemos concentrar a nossa atenção, quando queremos falar de algo que seja
sustentável para futuro e que deva merecer consenso. E aí não vemos grande divergência entre os partidos
que assinaram o Memorando de Entendimento.
Não há por isso razão para que fujamos à responsabilidade de discutir como atingir esses objetivos. Mas
também não podemos ignorar que, se nos últimos 30 anos esses objetivos não foram atingidos, por alguma
razão há de ser e alguma coisa tem de mudar.
Assim, quando falamos da consolidação das contas públicas (e o Partido Socialista diz sempre que quer a
consolidação das contas públicas), temos de saber então como é que o Partido Socialista quer essa
consolidação.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Qual é a despesa que ainda tem de se cortar, porque tem de
se cortar, e qual é a forma como o Partido Socialista entende que é possível nas próximas três décadas
conseguir o que não se conseguiu nas três décadas que estão para trás.
Façamos essa discussão de uma forma séria, porque todos sabemos que, sem isso, é impossível
conseguirmos sustentar a nossa dívida pública.
Por outro lado, há a questão do crescimento económico, que é essencial. A dívida pública é um ratio e
depende do nível de crescimento que conseguirmos ter nos próximos anos — como é que queremos esse
crescimento? Aí, é claro que temos de conseguir criar condições para as empresas, condições que dependem
do Estado.
A redução da burocracia é uma condição essencial para que as empresas portuguesas sejam mais
competitivas, isso depende do Estado e não há razão para que não nos entendamos sobre isso.
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A questão da pressão fiscal também é essencial para a competitividade das empresas portuguesas. A
redução da carga fiscal sobre as empresas é algo que devemos discutir de forma sustentada, também, para
permitir que essas empesas sejam competitivas.
Também já aqui foi referida pelo Sr. Deputado Nuno Magalhães a questão do consumo privado. A procura
interna através do consumo privado deve ser feita não de uma forma que não tenha sustentação mas de uma
forma sustentada. Ou seja, recuperarmos o rendimento das famílias e conseguirmos diminuir a pressão fiscal,
mas de forma a que isso permita uma sustentabilidade que até hoje nunca existiu em Portugal.
Este é o quadro da sustentabilidade da dívida pública, onde não há razão para que não haja entendimento.
Hás, pois, que analisar qual a disponibilidade da maioria e a disponibilidade dos partidos da oposição para
participarem neste esforço.
O Partido Socialista teve há pouco tempo, na semana passada, a oportunidade de apresentar no
Parlamento uma série de medidas sobre o caminho que o Partido Socialista entende que é o indicado. E qual
foi a atitude desta maioria? Foi a de fazer essa discussão e aprovar a maioria dessas propostas que o Partido
Socialista fez.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Bem lembrado!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Ou seja, se há um histórico recente de disponibilidade para o
consenso e se há um histórico recente de respeito pelas propostas da oposição que sejam construtivas, este
histórico diz-nos que a maioria está disponível, que a maioria acolheu as propostas do Partido Socialista e que
esteve presente no momento de fazer esse consenso.
Vozes do CDS-PP: — É verdade!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Este é o momento de retomarmos o espírito e, retomando
esse espírito, perante propostas concretas que a maioria faça e também outras que o Partido Socialista queira
fazer, é o momento de o Partido Socialista dizer como é que está disponível (retribuindo esse esforço que a
maioria fez), como é que quer fazer a consolidação das finanças públicas, como é que quer, em concreto,
fazer essa recuperação económica.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Termino já, Sr.ª Presidente.
Saberá que, da nossa parte, encontrará toda a disponibilidade. E o País também sabe que, havendo
disponibilidade da maioria, depende do Partido Socialista conseguirmos ou não alargar esse consenso, que é
um consenso essencial para o País.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PCP.
Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr.ª Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro escolheu para Ministra das Finanças uma
pessoa profundamente envolvida e comprometida no escândalo dos swaps.
A Sr.ª Ministra, enquanto Secretária de Estado do Tesouro, faltou à verdade perante a Comissão
Parlamentar de Inquérito dos swaps. Afirmou taxativamente que na transição de pastas entre os Governos, o
anterior e o atual, nada havia sido referido a respeito dos swaps.
Sabemos hoje que isto não é verdade.
Vozes do PCP: — Exatamente!
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O Sr. Paulo Sá (PCP): — Na pasta de transição entre os dois Governos havia documentos sobre os swaps
e o assunto foi abordado oralmente entre os dois Ministros, algo que o ex-Ministro Vítor Gaspar já confirmou
publicamente. Mas a Sr.ª Ministra das Finanças também faltou à verdade quando disse que com este Governo
não foram contratados novos swaps nas empresas públicas. Sabemos hoje, Sr. Primeiro-Ministro, que foram
contratados swaps na Parpública.
Faltou ainda à verdade quando disse na Comissão de Inquérito que, desde a tomada de posse do
Governo, se tinha procedido à recolha de informação sobre os swaps das empresas públicas. Isto foi
desmentido categoricamente pelo Presidente do IGCP, que afirmou que a recolha de informação dos swaps
das empresas públicas apenas havia começado em maio de 2012, ou seja, 11 meses depois de o Governo
tomar posse.
Vozes do PCP: — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — A Sr.ª Ministra das Finanças faltou à verdade quando afirmou na Comissão de
Inquérito que o cancelamento de operações swap das empresas públicas tinha tido um impacto neutro em
termos orçamentais. Sabemos hoje que isto não é verdade.
O cancelamento dos swaps da dívida pública contratados pelo IGCP rendeu ao Estado 830 milhões de
euros, enquanto os prejuízos dos swaps das empresas públicas foram até ao momento superiores a 1000
milhões de euros.
Tantas inverdades, Sr. Primeiro-Ministro. Tantas inverdades!
Mas há mais: a Sr.ª Ministra das Finanças, enquanto Secretária de Estado do Tesouro, esteve sentada em
cima do dossier dos swaps durante um ano, sem nada fazer, com elevados custos para o erário público.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Quando o Governo tomou posse, em junho de 2011, o valor de mercado
negativo da carteira de swaps das empresas públicas era de 1600 milhões de euros. Um ano depois já tinha
duplicado, passando para 3200 milhões de euros.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Duplicou num ano! E isto significa, Sr. Primeiro-Ministro, que, nesse ano, por
cada dia que passou em que nada se fez, por cada dia em que a Sr.ª Secretária de Estado, atual Ministra das
Finanças, esteve sentada sobre este dossier, isso custou 4 milhões de euros, por dia, em perdas potenciais.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Depois dizem que não há dinheiro!…
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Quando, finalmente, a Sr.ª Ministra decidiu agir, ao fim de um ano, cancelou os
contratos swaps das empresas públicas, num processo negocial desastroso. Desastroso para o Estado,
obviamente, mas um negócio excelente para a banca!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Foi desastroso, Sr. Primeiro-Ministro, porque, nessa negociação, 70% das
perdas potenciais com os swaps foram convertidas em perdas reais…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Paulo Sá (PCP): — … e o Governo entregou à banca, de março a junho de 2013, 1008 milhões de
euros pelo cancelamento desses swaps, representando 70% de conversão de perdas potenciais em perdas
reais.
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Por fim, Sr. Primeiro-Ministro, como se tudo isto não bastasse, a Sr.ª Ministra, quando era Diretora do
Departamento de Gestão Financeira da REFER, contratou dois swaps especulativos — sabemos isso hoje —,
um dos quais, Sr. Primeiro-Ministro, foi cancelado no dia 16 de março de 2013, com um prejuízo para o Estado
de 21 milhões de euros.
Depois de tudo isto, o que é que faz o Sr. Primeiro-Ministro? Promoveu a Secretária de Estado do Tesouro
a Ministra, entregando-lhe a pasta das Finanças e dando-lhe a terceira posição na hierarquia do Governo.
Protestos da Deputada do PSD Conceição Bessa Ruão.
Como explica, Sr. Primeiro-Ministro, esta decisão de promover a Secretária de Estado do Tesouro a
Ministra das Finanças, sabendo do seu profundo envolvimento e comprometimento no escândalo dos swaps?
Que credibilidade é que o Sr. Primeiro-Ministro tem quando toma decisões desta natureza?
Aplausos do PCP e de Os Verdes.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr.ª Presidente, o Sr. Primeiro-Ministro acaba de fazer, durante esta manhã, a
prova pública da sua incapacidade, diria mesmo, da sua incompetência para continuar a governar o País, com
o teatro que hoje nos trouxe.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Muito bem!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — O Sr. Primeiro-Ministro e o Governo gozaram daquilo que em tempos foi
chamado o «sonho da direita»: uma maioria parlamentar, um Governo, um Presidente da sua cor política.
Dois anos passados, cinco Orçamentos do Estado depois, após ter aumentado a dívida pública, o défice e
o desemprego a níveis históricos, depois de ter reduzido o PIB como nunca antes tinha acontecido na
economia portuguesa e o investimento em quase 30% no ano de 2012, depois de ter obrigado os jovens mais
qualificados a emigrar e a sentir-se no País este clima de não haver futuro nem perspetivas de alteração do
clima económico, depois de ter prometido que não aumentava impostos e ter aumentado impostos, depois de
ter dito que era uma brincadeira de mau gosto dizer-se que o Sr. Primeiro-Ministro tencionava «atacar os
subsídios de férias ou de Natal dos funcionários públicos» e ter atacado os subsídios de férias e de Natal dos
funcionários públicos,…
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — … depois de ter dito que jamais despediria funcionários públicos e agora estar a
preparar-se para despedir funcionários públicos, depois de nos ter dito que em finais de 2012 a economia
começaria a crescer, depois de nos ter dito que em 2013 é que ia ser o ano de crescimento, o Sr. Primeiro-
Ministro acha, sinceramente, que se pode apresentar no debate sobre o estado da Nação, após a crise que o
Governo viveu durante estes dias, e dizer-nos que vai continuar a marchar em frente, que a sua política não
falhou e que agora é que vai dar resultados? Acha, sinceramente, que é possível ignorar toda a realidade e,
pura e simplesmente, dizer que está tudo a correr bem, que agora é que a sua política vai dar resultados?!
Sr. Primeiro-Ministro, nos tempos que vivemos, com as dificuldades dos portugueses, é preciso clareza,
limpidez no debate político.
A verdade é que a crise no seu Governo continua instalada. Está, de facto, sentada à sua direita e à sua
esquerda, com a Sr.ª Ministra das Finanças e o Sr. Ministro — creio que ainda — dos Negócios Estrangeiros.
É verdade que, se o Dr. Paulo Portas não apresentou a sua demissão por uma questão pessoal ou por não
simpatizar com a nova Ministra das Finanças — porque, se assim fosse, não tinha obviamente condições para
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continuar a ser Ministro — e se a Sr.ª Ministra das Finanças atual não se demitiu juntamente com Vítor Gaspar
e, portanto, continua a achar que a política orçamental e financeira que foi seguida por Vítor Gaspar, que ele
assumiu na sua carta de demissão que falhou redondamente, é para continuar e não assume a sua falha,
então o Sr. Primeiro-Ministro vai ter de continuar sentado entre o Ministro dos Negócios Estrangeiros e a
Ministra das Finanças, como uma força intermediadora de paz, para que não haja um novo conflito no
Governo.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — E a verdade é que vai haver, a verdade é que vai haver!
A crise que apodreceu o Governo por dentro é a crise do resultado da austeridade. E Pior: no meio das
dificuldades do País e no meio das dificuldades que temos, o Sr. Primeiro-Ministro nada diz sobre o futuro a
não ser que vai continuar a aplicar a austeridade.
Vem camuflar o seu falhanço e dizer que continua a marchar em frente!
Ora, no momento que estamos a viver, isso é insuficiente. Mas é mais do que isso: é falhar ao País, é
falhar às nossas dificuldades, é falhar às expetativas de mudança de todos os portugueses. É porque o senhor
falhou, de forma colossal e sucessivamente, que tem de sair, o mais rapidamente possível!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António José Seguro, creia que estou
firmemente empenhado em que possamos muito proximamente obter um compromisso que assegure não o
apoio ao Governo, Sr. Deputado, porque não é o apoio ao Governo que procuramos com esse esforço de
compromisso, mas o apoio necessário ao País para que aquilo por que passámos não volte a acontecer. É
esse o objetivo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Quando referi que era indispensável que clarificássemos os nossos termos de referência, fi-lo,
evidentemente, na perspetiva de que todas as partes envolvidas têm de ter termos de referência para que,
com transparência, o País perceba o que estamos a fazer. Claro que esses termos de referência têm de estar
intrincados nas grandes linhas que foram enunciadas pelo Sr. Presidente da República, e nós estamos
disponíveis para o fazer.
Disse-o, porque não podemos partir para estes processos com reserva mental e porque estamos
totalmente empenhados em encontrar um compromisso com substância. Isso é muito importante porque
princípios meramente proclamatórios não são um compromisso que gere confiança.
Temos de encontrar um conjunto de objetivos que possamos medir, meios para os atingir que se possam
quantificar e formas que os portugueses entendam corresponder a algo que possa ser sindicado pelos
portugueses.
Isso, portanto, não pode resumir-se a uma proclamação, a um juízo de que estamos comprometidos em
chegar a um resultado sem que se perceba exatamente qual é, sob pena de bastar agora concordarmos com
os termos que foram apresentados pelo Sr. Presidente da República para dizer que temos o resultado
alcançado.
É preciso «trocar aquilo por miúdos». É preciso saber o que é que aquilo significa.
Ora, cada um de nós tem a obrigação de boa-fé apresentar os seus termos de referência para isso. É
nesse sentido que faço essa alusão.
Sr. Deputado, sobre a sua observação de que eu pretendo apagar estes dois anos, devo dizer que, pelo
contrário, não quero apagar estes dois anos. Estes dois anos são essenciais para se perceber o que
aconteceu ao País há dois anos e como é quer podemos sair desta situação de uma forma duradoura.
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Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E eu cá estou para prestar contas desse tempo, não quero apagar nada.
O Sr. Deputado disse que já toda a gente reconheceu que este caminho não leva a nada. Quero apenas
recordar-lhe, em relação a um dos nomes que citou, que a Diretora-Geral do Fundo Monetário Internacional foi
muito clara numa resposta que deu a uma carta que o Sr. Deputado lhe enviou sobre o Programa de
Assistência Económica e Financeira. Espero que o Sr. Deputado tenha isso presente.
Finalmente, Sr. Deputado Luís Montenegro, quando diz que temos de dialogar e que já perdemos
oportunidades no passado para o fazer, devo dizer que é verdade. Mas peço ao Sr. Deputado o que peço a
todos: que evitemos recordar, nesta altura, tudo o que correu mal e que façamos um voto francamente positivo
sobre tudo o que pode correr bem daqui para a frente. E, nessa medida, estou empenhado em que possamos
recuperar oportunidades de diálogo e concretizá-las, chamando os agentes mais indicados para que esse
diálogo possa ter lugar.
Disse o Sr. Deputado João Almeida que, dentro desse esforço de compromisso, precisamos de encontrar
uma trajetória de sustentabilidade para a dívida. Com certeza.
Disse ainda o Sr. Deputado uma coisa meridiana — e por isso a enfatizo porque, às vezes, de tão
meridiana dá a impressão de que é uma brincadeira e que é tão simples de obter. Não é! É que nós não
damos sustentabilidade para a dívida se não controlarmos a despesa, mas também não damos
sustentabilidade para a dívida se não tivermos uma perspetiva de crescimento para a economia. Temos de ter
as duas coisas. É muitas vezes difícil, para não dizer impossível, fazê-lo ao mesmo tempo.
Muitas vezes têm perguntado: «Não era muito mais fácil fazer consolidação com a economia a crescer?».
Ó Sr. Deputado, com certeza! Tomara eu! Se fosse possível ter a economia a crescer e consolidar…! Houve,
no passado, circunstâncias dessas em que a economia cresceu e as finanças públicas não consolidaram. Pelo
contrário, agravaram-se mais no seu desequilíbrio.
Como eu disse há pouco, não conseguimos pôr de lado, no tempo em que houve crescimento, o que
precisávamos, quando sabemos que a economia tem os seus ciclos e, no futuro, as coisas poderão correr
menos bem. Por isso é que devemos ser previdentes e não podemos estar sempre a gerar défices e dívida,
porque isso custa sempre impostos, desemprego e crise.
Ora, se precisamos de ter as duas coisas, não é possível dizer: «Parem com uma política». É possível
discutir essa política, é possível rever essa política, mas não se pode dizer: «Parem com essa política»,
porque essa política é imposta pelas circunstâncias e pela realidade, não é pela nossa vontade. Não fui eu que
escolhi ter de contrair despesas. Não fui eu que escolhi ter de diminuir o défice do Orçamento, que era de 10%
há dois anos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Também é preciso crescer e temos de encontrar um entendimento sobre as políticas de crescimento. O
Governo tem-no procurado e vamos procurá-lo de uma forma ainda mais intensa.
Mas também é preciso saber como é que se financia o crescimento. Não podemos dizer que estamos
todos de acordo, que agora é preciso resolver um conjunto de problemas para pôr a economia a crescer e
depois não dizer quais são os meios que temos para a financiar. Quais são? Onde é que eles estão? Onde é
que os vamos buscar? Como é que os identificamos? Isso tem de ser cristalino.
Portanto, Sr. Deputado, apesar de ser meridiano, é a coisa mais difícil de encontrar. E o povo não pode
deixar de julgar os esforços que são feitos para obter este equilíbrio, porque as pessoas, por mais simples que
sejam, percebem. Um pobre não diz ao outro: «Empresta-me mais dinheiro que tenho fortes necessidades».
As pessoas que não têm recursos sabem a injustiça que é viver com dificuldades. Mas não culpam o vizinho
do lado, que também não tem e que passa essas dificuldades, por não ter os meios de que eles próprios
pareciam. É preciso saber como se financia esse crescimento.
O Sr. Deputado Paulo Sá fez uma intervenção em torno da posição da Sr.ª Ministra das Finanças de tal
forma segura,…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Verdadeira!
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O Sr. Primeiro-Ministro: — … que quis até concluir o que a Comissão de Inquérito ainda não concluiu.
Protestos do PCP.
O Sr. Deputado quis vestir a toga do julgador, do juiz e, ainda a procissão vai no adro da Comissão
Parlamentar de Inquérito e já o Sr. Deputado quer condenar e dizer: «A Sr.ª Ministra das Finanças mentiu».
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E então? Não podemos tirar conclusões?!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Deputado, a Sr.ª Ministra das Finanças não mentiu.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Esteve a mentir durante 1 ano!
O Sr. Primeiro-Ministro: — A Sr.ª Ministra das Finanças, enquanto Secretária de Estado do Tesouro,
procurou corrigir uma situação que este Governo não criou.
Ora, dizer que a Sr.ª Ministra mentiu porque afirmou que neste Governo não se fizeram contratos swap,
quando é sabido que o contrato que transitou agora para o IGCP (Agência de Gestão da Tesouraria e da
Dívida Pública) não foi feito por este Governo, nem pelo IGCP, mas pelo agrupamento ELOS, no tempo do
anterior Governo, tal como a Sr.ª Ministra das Finanças, enquanto Secretária de Estado, o afirmou na
Comissão de Inquérito, é querer fazer uma mistificação.
Sr. Deputado, não estou aqui para fazer mistificações.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PCP.
Não foi este Governo que fez os contratos swap, não foi este Governo que mandou, à pressa, estudar o
que se passava com contratos que foram feitos durante mais de seis anos, mas é este Governo que está
empenhado em conseguir renegociar esses contratos, fechar essas posições e evitar que perdas potenciais
importantes se venham a materializar. É isto que estamos a fazer, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quatro milhões por dia!
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Vou concluir, Sr.ª Presidente.
Finalmente, diz a Sr.ª Deputada Ana Drago que falhámos de uma forma colossal, que eu falhei de uma
forma colossal e que tenho de sair. Sr.ª Deputada, os portugueses julgarão os meus falhanços e os meus
sucessos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — É isso mesmo!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas, Sr.ª Deputada, os portugueses hão de fazê-lo, como é normal em
democracia, quando o meu mandato tiver terminado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, entramos na terceira ronda de perguntas, à qual o Sr. Primeiro-
Ministro responderá em conjunto.
Estão inscritos, pelo PS, o Sr. Deputado António José Seguro, pelo PSD, o Sr. Deputado Miguel
Frasquilho, pelo Bloco de Esquerda, a Sr.ª Deputada Helena Pinto, e, de novo, pelo PSD, a Sr.ª Deputada
Teresa Leal Coelho.
Sr. Deputado António José Seguro, tem a palavra.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, começo por uma
concordância: quando há uma comissão de inquérito no Parlamento português, não devemos precipitar-nos,
não devemos julgar antes de se tirarem conclusões e muito menos devemos acusar antes de essas
conclusões serem apuradas.
Como bem teria ficado o Governo, em particular a equipa das Finanças, se tivesse assim agido, antes de
ter iniciado o processo na Comissão de Inquérito deste Parlamento.
Aplausos do PS.
Se houve alguém que, a esse propósito, tirou conclusões mesmo antes de estar formalizada essa
comissão de inquérito foi o seu Governo e foram membros do seu Governo. Não me esqueço que o fizeram
publicamente, através de uma conferência de imprensa dedicada ao efeito, no mesmo dia e à mesma hora em
que o Secretário-Geral do Partido Socialista iniciava a sua intervenção no Congresso Nacional do próprio
Partido Socialista.
Aplausos do PS.
Segunda nota: será um bom contributo para a democracia que todos nós tenhamos contenção e, quando
há uma comissão de inquérito, essa contenção deve ser maior. Caso contrário, não é uma comissão de
inquérito, é uma comissão de ajuste de contas entre uma maioria parlamentar conjuntural e anteriores
governos.
Aplausos do PS.
Todos têm direito ao seu bom nome e, se queremos começar por dignificar a democracia, a sua maioria
parlamentar deve seguir as suas palavras.
A terceira nota que quero deixar tem a ver com a referência à atitude e à posição da Diretora-Geral do
Fundo Monetário Internacional.
Como o Sr. Primeiro-Ministro sabe, o Fundo Monetário Internacional, pelo menos em termos de discurso,
muda de opinião com uma grande facilidade. Cabe a nós, País, defender a dignidade nacional e a dignidade
do povo português.
Nunca me ajoelhei perante a troica.
Risos do PSD.
Por muito que isto provoque sorrisos na bancada do PSD, volto a dizer: o PS nunca se ajoelhou perante a
troica.
Aplausos do PS.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Estendeu a mão!
O Sr. António José Seguro (PS): — Nunca poupei trabalhos nem argumentos para, nas reuniões que tive
com a troica, poder dizer aquilo que considerava ser o erro do Programa que estava a ser aplicado pelo seu
Governo, com as medidas adicionais que não estavam previstas, tendo em consideração a realidade
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económica do País e a realidade económica desenvolvida, entretanto, na zona euro para onde dirigíamos mais
de dois terços do total das nossas exportações.
O País quer cumprir, o País precisa de equilibrar as suas contas públicas, mas, para esse efeito, necessita
de ter um programa credível.
O que não consigo compreender é como é que, tendo havido sete avaliações, as quais deram notas
positivas ao Programa, em nenhuma dessas avaliações foram atingidos os objetivos e as metas previamente
estabelecidos.
Por isso, temos um problema de realismo, temos de deixar de fazer de conta e explicar aos nossos
credores que, em Portugal, há uma ampla vontade, alicerçada num grande consenso político e social, de
cumprir com os nossos objetivos, de equilibrar as nossas contas públicas, mas devemos fazê-lo de um modo
sustentável, não apenas para as contas do Estado mas, essencialmente, para as famílias e para as empresas
portuguesas.
Fazer qualquer processo de ajustamento que não tenha em consideração o rendimento das famílias, a
situação das famílias, a evolução das empresas e as suas dificuldades de tesouraria não é ter um programa
de ajustamento credível.
Aquilo que se passa é muito simples, Sr. Primeiro-Ministro: nós, em Portugal (e vamos ter oportunidade de
o fazer), temos, de novo — a acreditar nas palavras de todos nós, e eu acredito —, a possibilidade de
renegociar as condições do nosso ajustamento de um modo credível e que cumpram os objetivos.
Só isto é que será gerador de confiança e de credibilidade. E é de credibilidade e de confiança que o nosso
País precisa quer externa quer, sobretudo, internamente.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Frasquilho.
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Portugal está em recessão, no
que toca a variações trimestrais do PIB em cadeia, já desde o final de 2010, isto é, já antes, bem antes, do
início do Programa de Ajustamento. É um período de tempo muito longo que tem trazido muitos sacrifícios e
muitas agruras aos portugueses. Todos sabíamos, pela trajetória que nos conduziu até ao pedido de ajuda
externa, que o ajustamento da economia seria sempre um processo doloroso. Todos sabíamos disto!
Mas têm surgido recentemente algumas notícias encorajadoras, já não apenas na área financeira mas na
esfera da economia real.
Na área internacional, já desde há tempo que sabemos que as exportações têm-se mantido dinâmicas, que
cresceram 5,7% no trimestre até maio, 5,6% apenas no mês de maio e que as encomendas externas têm
recuperado.
Mas também na vertente interna, na vertente doméstica, têm surgido notícias encorajadoras: nas vendas a
retalho, os dados de maio mostram dois meses consecutivos de crescimento real em cadeia; a produção
industrial mostra que em maio, em termos homólogos, houve um crescimento de 4,5% — o terceiro maior da
União Europeia — e há dois meses seguidos de crescimento positivo, para além de se ter registado a maior
subida mensal da União Europeia a 27, isto em Portugal.
No mercado de trabalho, os números do desemprego do Eurostat e os dados do Instituto de Emprego e
Formação Profissional apontam também para uma situação menos negativa.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É, é!
O Sr. Miguel Frasquilho (PSD): — O indicador avançado da OCDE, que tem uma forte correlação com a
atividade económica, sobe consecutivamente desde março de 2012 e indicia uma expansão nos últimos
quatro meses; a execução orçamental até maio, coerentemente com tudo o que acabei de referir, mostra um
melhor desempenho das contas públicas e dados positivos para a receita fiscal, mantendo-se, assim, em
aberto a expetativa de cumprimento da meta orçamental em 2013.
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Finalmente, a síntese de conjuntura da Universidade Católica (reputada) prevê um crescimento positivo no
2.º trimestre de 2013 em redor de 0,6%, o primeiro crescimento depois de 10 trimestres de recessão.
Sr. Primeiro-Ministro, sabemos que tudo isto é claramente ainda insuficiente, mas são os primeiros sinais
da economia real que podem indiciar que alguma coisa está a mudar.
Sabemos que a conjuntura externa é muito difícil, sobretudo a conjuntura europeia e na zona euro, mas
estes indicadores permitem-nos ter não só a esperança de uma recuperação da economia mas também a
esperança de que os esforços dos portugueses, os sacrifícios por que os portugueses têm passado, e que têm
sido muitos, não foram em vão.
Não podemos desperdiçar o que até agora foi feito e, numa altura em que surgem estes sinais, Sr.
Primeiro-Ministro, queria perguntar-lhe como é que os interpreta e qual é a importância que lhes dá para a vida
dos portugueses e para o futuro do nosso País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, na sua intervenção inicial, falou pouco
sobre o estado da Nação, mas foi muito esclarecedor sobre o estado da governação ao dizer que a crise
política foi desencadeada pela demissão do Ministro dos Negócios Estrangeiros, Dr. Paulo Portas, sentado
mesmo ao seu lado.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Ficámos a saber o que é que o Sr. Primeiro-Ministro quer dizer com
estabilidade e até com estabilidade ativa.
Sr. Primeiro-Ministro, depois da demissão do Dr. Vítor Gaspar, que confessou o erro das suas políticas,
depois da demissão de Paulo Portas, que se zangou com a governação, depois de o Presidente da República
«tirar o tapete» ao Governo…
O Sr. João Serpa Oliva (CDS-PP): — Outra vez?!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — … só o senhor é que não vê e nos diz: «Que bom. Vamos continuar. Isto é
para ir para a frente!»
Ó Sr. Primeiro-Ministro, o normal em democracia é olhar de frente a realidade e reconhecer quando se
falhou.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — E o senhor falhou! A síntese da sua governação é só uma palavra: falhanço! E
só há uma possibilidade de mudança, só há uma, que é dar a voz ao povo. É dar a palavra ao povo! É isso
que é preciso fazer!
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Primeiro-Ministro, permita-me que lhe diga: tem de interiorizar esta
questão! Já acabou! Sr. Primeiro-Ministro, já acabou! Interiorize! Habitue-se à ideia e vamos fazer com que o
País possa avançar. Só o senhor é que não vê, Sr. Primeiro-Ministro!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A próxima pergunta é do PSD.
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Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho.
A Sr.ª Teresa Leal Coelho (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, o senhor e o seu Governo há
dois anos herdaram um País numa circunstância de intervenção. Mas não é a primeira intervenção em
Portugal; é já a terceira intervenção em Portugal.
Portugal tem o recorde das intervenções na Europa e quer, porventura, de acordo com aquilo que ouvimos
nesta Câmara, conseguir o recorde das intervenções no mundo… Mas nós não queremos!
O que lhe quero perguntar, Sr. Primeiro-Ministro, é se, sustentado nesta sólida e consistente maioria que
tem aqui, no Parlamento, que traça o quadro constitucional de sustentabilidade de um Governo, considera que
tem condições não só para tirar Portugal deste momento difícil, aproveitando todos os sacrifícios e toda a
determinação que os portugueses demonstraram nestes últimos dois anos, mas também se o Sr. Primeiro-
Ministro e o seu Governo estão preparados para garantir condições de tal forma que Portugal não volte a ter
uma intervenção, isto é, que não seja o campeão do mundo das intervenções económicas e financeiras.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, tem a palavra para responder a este conjunto de perguntas.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, queria só perguntar-lhe se este foi o último conjunto de
perguntas.
A Sr.ª Presidente: — Sim, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, era para saber, porque como tenho pouco tempo disponível
procurarei utilizá-lo da melhor forma possível.
Sr. António José Seguro, julgo que, como é visível, me encontro como ele num esforço de grande
contenção.
O Sr. Adão Silva (PSD): — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Acho que devemos ter grande contenção. Há momentos em que vale a pena
ter grande contenção, mas é preciso também, como o Sr. Deputado disse, ser realista.
O Sr. Deputado falou em renegociar condições a propósito do nosso programa de ajustamento. Ora,
renegociar é um termo que pode compreender realidades muito diversas. Nós, até hoje, temos conseguido
reajustar — aliás, tem sido este o termo que tenho usado — várias dimensões do nosso programa, atualizá-lo,
adaptá-lo à nossa realidade e, nessa medida, nós não estamos, evidentemente, no mesmo ponto de partida e,
da minha experiência, conseguimos fazê-lo na medida em que as avaliações foram positivas e, portanto, por
termos entregue os resultados a que nos proponhamos. Se não fosse assim, os nossos credores não teriam
aceitado essa posição. E essa é a razão pela qual Portugal é hoje visto no exterior como o País que quer
cumprir.
Sabemos, evidentemente, que nunca é possível cumprir a 100%, que tem de se conseguir uma
aproximação, mas uma aproximação que seja convincente. E ela tem sido tão convincente que, apesar dos
riscos, apesar dos desvios que tivemos, os nossos credores têm considerado que temos conseguido, no
essencial, chegar onde é preciso.
Nessa medida, posso dizer que os ajustamentos que temos vindo a fazer são ajustamentos que foram
conquistados pela nossa credibilidade e que geraram confiança. Mas gera sempre muita desconfiança
quando, com a expressão «renegociar», queremos dizer, simplesmente, que queríamos cumprir, fechando o
programa, mas não respeitando os limites de financiamento que ele contém. Esse é o nosso problema, Sr.
Deputado.
Aproveito para lhe recordar que temos um envelope financeiro e, sempre que nos desviarmos desses
objetivos, temos de financiar essa diferença em mercado. Até hoje, temos conseguido fazê-lo, mas, se
começarmos a dar ao exterior e aos mercados a ideia de que não queremos cumprir e que, por «negociação»,
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isso significa que não queremos aqueles limites, que queremos outros, que queremos mais e mais dinheiro,
nesse caso, Sr. Deputado, não geramos uma situação de confiança.
Foi por isso que eu evoquei a resposta que a Sr.ª Diretora-Geral do Fundo Monetário Internacional deu a
uma das cartas que o senhor enviou às instituições, dizendo que esta política tinha de parar e que nós
tínhamos de renegociar o Memorando. A resposta foi, julgo eu, tão certeira que convém não a esquecer
quando partimos, novamente, para uma disputa sobre os termos e condições que precisamos de reunir para
sair com sucesso da assistência económica e financeira.
O Sr. Deputado Miguel Frasquilho enunciou aqui um leque ainda mais completo de indicadores do que
aquele que eu referi inicialmente. Só posso responder-lhe, dizendo que interpreto estes sinais, para futuro,
como sinais encorajadores que, finalmente, apresentam uma medida da recompensa que os portugueses
podem finalmente aceder, depois do esforço que realizaram.
Mas sabemos também — e creio que foi a Sr.ª Ministra das Finanças que o disse há algum tempo a
propósito desta dualidade entre o crescimento e a austeridade — que, verdadeiramente, nós (e estou a citá-la)
não temos de estar a perder tempo com aprofundar a austeridade, porque não é da austeridade que se trata, é
da nova realidade em que vivemos, e a nova realidade em que vivemos tem de se sujeitar às restrições reais
que temos e não às ficcionadas.
Portanto, Sr. Deputado, são muito encorajadores estes sinais para futuro, não fazemos nenhum
triunfalismo, como disse o líder da bancada do PSD, mas não podemos deixar de intensificar os sinais
positivos que temos para o futuro, porque os portugueses esforçaram-se muito para que eles pudessem
acontecer.
Disse a Sr.ª Deputada Helena Pinto que eu, mais uma vez, falhei, que devíamos tirar conclusões e que eu
devia demitir-me. Sr.ª Deputada, não o farei! É importante, numa democracia adulta e madura, que um
Governo que foi eleito para cumprir uma legislatura o possa fazer.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Já está demitido pelo Presidente da República!
O Sr. Primeiro-Ministro: — É importante que um Governo escolhido pelos portugueses que tem de vencer
um programa de assistência económica e financeira possa entregar aos portugueses o que eles merecem: o
fecho desse programa.
Sr.ª Deputada, o que lhe posso dizer, desse ponto de vista, é que o destino do País está muito associado
ao destino deste Governo!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Por isso é que está a correr mal!
O Sr. Primeiro-Ministro: — E, nessa medida, Sr. Deputada, o que lhe posso aqui garantir é que o
insucesso deste Governo corresponderia a um grande insucesso para o País.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — É o contrário!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Portanto, Sr.ª Deputada, quando, ainda há pouco tempo, o Sr. Presidente da
República recordou a tragédia que seria esse falhanço, isso, Sr.ª Deputada, só nos faz ter eticamente um
sentido de responsabilidade ainda maior, porque sabemos que o destino do País nos está ligado para o bem e
para o mal. E isso, Sr.ª Deputada, aconselha a que o Governo não tenha estados de alma, e este Primeiro-
Ministro também os não tem. Não tem, justamente porque o País merece que possamos oferecer-lhe aquilo
que o País anseia e reclama: o fim deste resgate financeiro e a possibilidade de recuperar a nossa autonomia.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Finalmente, Sr.ª Deputada Teresa Leal Coelho, espero que se sinta respondida com aquilo que agora
mesmo acabei de dizer.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Primeiro-Ministro.
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O Sr. Primeiro-Ministro: — Deixaremos de ser o País campeão dos resgates se soubermos cumprir com
as nossas obrigações e se conseguirmos convencer-nos a nós próprios que temos de mudar de vida.
Mas o País tem mudado de vida. E não tem sido por ordem do Governo, tem sido por força da realidade,
mas também com o sacrifício e o esforço dos portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, entramos agora no período de intervenções pela ordem que já
indiquei no início, a saber, PS, PSD, CDS-PP, PCP e Bloco de Esquerda.
Pelo PS, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo,
Sr. Primeiro-Ministro: O País tem gravíssimos problemas, é notório que há uma profunda divergência quanto à
sua origem, à sua prioridade e, consequentemente, às responsabilidades.
Mas há uma unanimidade nesta Câmara de que esses problemas não são destes dois anos, mas que são
— aí já não há unanimidade, há um posicionamento claro — agravados perante a governação destes dois
anos.
Há três problemas essenciais: o desemprego, a dívida púbica e o défice orçamental. Aquilo que
poderíamos designar pelos três D: desemprego, dívida e défice.
Estes três graves problemas do nosso País só podem ser solucionados se existir crescimento económico.
É na economia que devemos colocar toda a nossa prioridade e, por isso, a receita de iniciar todo este
processo de ajustamento, dando primeiro o enfoque às finanças e só depois, mais tarde, tratar da economia,
foi completamente errada, como, aliás, tivemos oportunidade de dizer desde o início.
Economia, crescimento económico: sem economia nós não conseguimos resolver nem o desemprego, nem
pagar a dívida pública, nem reduzir o nosso défice.
Ao contrário, aliás, do que o próprio Primeiro-Ministro disse neste debate, nós, para equilibrarmos as
contas públicas, não devemos operar exclusivamente na redução da despesa, porque redução de despesa
sintetizada numa política de cortes origina consequências negativas no desempenho da nossa economia,
fazendo com que o Estado obtenha menos receitas e tenha que pagar mais, isto é, aumentar a despesa,
designadamente por via do aumento dos subsídios de desemprego.
Colocar o País a crescer, é esta a nossa grande responsabilidade. Todos nós sabemos — os diagnósticos
estão feitos — que há dois vetores essenciais: a produtividade e a competitividade.
E também sabemos que esses dois vetores essenciais não se atingem de um dia para o outro, é preciso
haver estabilidade política, é preciso haver estabilidade nas políticas públicas, é preciso haver previsibilidade
em matéria de sistema fiscal para que o ambiente propício ao desenvolvimento e ao crescimento da economia
seja estável e gerador de confiança quer para os investidores nacionais quer para os investidores
estrangeiros. Esta é a nossa posição. Para isso, é necessário abandonarmos a política de austeridade.
Gostava de voltar a dizer ao Primeiro-Ministro que não está em causa a austeridade ou o princípio do rigor
e da disciplina nas contas públicas. Nós temos de ter rigor, temos de ter disciplina nas contas públicas. Coisa
completamente diferente é ter uma política de cortes cegos que não resolvem nenhum problema e, como se
viu nestes dois últimos anos, agravaram os nossos problemas.
Segundo, é necessário renegociar as condições do nosso ajustamento. Muitas vezes, ouço o Primeiro-
Ministro e aquilo que noto é um Primeiro-Ministro resignado, é um Primeiro-Ministro que diz: «Mas isso não é
possível».
Quero dizer ao Primeiro-Ministro que chegou a hora de fazermos aquilo que é necessário e não apenas
aquilo que é possível.
E, quando o Primeiro-Ministro refere que tem havido alguma flexibilização nas metas, quero dizer-lhe que é
completamente diferente haver uma flexibilização nas metas porque o País não atingiu os seus objetivos, isto
é, por arrastamento, do que, desde início, termos a capacidade de olhar a realidade, dizer: «Isto vai dar mau
resultado» e, perante o primeiro falhanço (o que já ocorreu há algum tempo), ter a frontalidade de dizer que é
necessário elaborar um programa realista, credível, que necessita de mais tempo.
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Mais tempo foi sempre uma das causas pelas quais nos batemos. Não é mais tempo para ter facilitismo
nas contas públicas, é mais tempo para que a curva do nosso ajustamento não seja tão pronunciada e, dessa
forma, aliviarmos os sacrifícios das famílias, dos portugueses e das empresas. É esse o nosso propósito, é
esse o nosso objetivo.
Depois, temos de indexar a redução do nosso défice à evolução da economia. Tem de haver um
compromisso claro, que pode funcionar em metas mais rígidas ou em intervalos. Isto é, por cada aumento de
um ponto percentual na economia, o Estado português compromete-se a fazer uma redução de meio ponto, de
um ponto ou de um ponto e meio no défice; por cada evolução num determinado intervalo da nossa economia,
ou seja, crescimento económico, há uma relação de redução no nosso défice. Isto é, uma trajetória
sustentável, realista, credível, que reafirma a nossa vontade, o nosso compromisso, de equilibrar as contas
públicas, mas fazê-lo de uma forma sustentável e, volto a frisar, aliviando as famílias e as empresas dos
elevados sacrifícios por que estão a passar.
Isso ajuda a criar um ambiente amigo da economia, amigo das empresas e por essa via reduzir o défice,
aumentando a receita do próprio Estado.
Isto é, é fundamental reduzir o nosso défice, colocando mais enfoque na receita — não a receita por via do
aumento dos impostos, mas a receita por via de um crescimento da nossa economia.
O Primeiro-Ministro pergunta recorrentemente, e bem: «Mas como é que nós podemos financiar a
economia?».
O Partido Socialista, ao longo destes dois anos, desde setembro de 2011, que apresentou propostas
concretas. Quero hoje, aqui, deixar mais uma proposta concreta, e o Partido Socialista estará disponível para
essa negociação. E não é inédito na Europa, porque a Itália já o conseguiu. A proposta é muito simples:
durante o período do nosso ajustamento, a componente nacional de fundos comunitários destinados ao
investimento não devem contar para o défice. Repito, não devem contar para o défice.
Isso significa que nós devemos colocar o máximo de recursos dos fundos comunitários em investimento
reprodutivo, em investimento reembolsável, e a componente nacional que é destinada para esse
cofinanciamento não deve constar para o défice.
Isso significa uma política anticíclica que ajude ao investimento e que ajude a reequilibrar o nosso objetivo,
que é uma boa consolidação das contas públicas, e isto a par de regras de sustentabilidade da despesa. Isto
é, há condições, sem recorrer à política de cortes, de garantir sustentabilidade na despesa através de
compromissos que ultrapassem uma simples legislatura. E é fundamental que todas as forças políticas se
comprometam com esse objetivo e com essas regras de sustentabilidade.
Financiamento: insisto na necessidade de fundos comunitários à disposição do nosso País para
investimento reembolsável, para investimento que seja altamente produtivo.
Considero também importante que, em matéria de gestão da dívida, nós consigamos, no âmbito da União
Europeia, encontrar formas de mutualização de parte das dívidas públicas que ultrapassam os 60%.
Como considero importante atribuir uma licença bancária ao mecanismo europeu, de modo a que o Banco
Central Europeu, até uma revisão dos tratados, possa emprestar dinheiro ao mecanismo e o este possa
emprestar dinheiro aos Estados. Isso permitirá que as nossas taxas de juro sejam mais adequadas, uma
redução do défice por via da diminuição do peso do serviço da dívida e uma redução da própria dívida e uma
melhor gestão dessa dívida.
Mas não chega. Precisamos de outros prazos para essa dívida, precisamos, também, de estudar a
necessidade de termos algum diferimento do pagamento de parte desses juros.
No fundo, o que carateriza esta nossa visão é a criação de um ambiente propício para o crescimento da
nossa economia. Para isso precisamos de fazer mais e melhor, quer no contexto europeu, quer no contexto
nacional.
Volto a dizer, pesando cada palavra, que nós já não nos bastamos a nós próprios. Mesmo que o País
tivesse o melhor governo do mundo — o que não é manifestamente o caso, muito longe! —, o País já não se
bastava a si próprio. Precisamos de encontrar soluções para parte destes problemas, em particular para a
dívida, num contexto europeu.
Para isso é necessário que o nosso País seja dotado de força política com um forte apoio social. Essa força
política só pode decorrer de um novo governo, de um governo que não se arrependa a meio do caminho, de
um governo que tenha um verdadeiro projeto nacional, capaz de mobilizar respeitando a diferença de todas as
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forças políticas e de todos os parceiros sociais. Com uma legitimidade própria, com um mandato claro, com
uma corresponsabilização com os portugueses.
Isso, como é óbvio em democracia, só pode ser atingido através da vontade do povo e daquilo que resulta
quando o povo se pronuncia, através um amplo apoio popular para que o futuro governo tenha todo o País
atrás de si para defender Portugal e o interesse dos portugueses.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Pelo PSD, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados:
Debate, hoje, a Assembleia da República debate, neste final de sessão legislativa, o estado da Nação numa
conjuntura política particularmente difícil a que ninguém pode ser indiferente e em que todos têm de assumir
as suas responsabilidades.
São passados pouco mais de dois anos sobre a assunção de funções por parte do atual Governo.
Se o estado da Nação envolve, também, e inevitavelmente, um balanço da ação governativa, tal avaliação,
para ser séria, tem, antes de mais, de fixar qual o ponto de que este Governo partiu.
E não vale a pena virem os responsáveis pela gravíssima situação de onde este Governo partiu,
recorrentemente, advertir (como lhes convém), de que o passado já foi julgado, só nos sendo permitido, agora,
falar do presente.
Percebemos bem que tudo queiram fazer para se libertarem da canga incómoda, que é a herança
partidária, interna, que receberam.
A questão é que, há dois anos, não estivemos perante uma sucessão comum de governos, própria do
normal funcionamento da alternância democrática.
Na verdade, nunca um governo constitucional foi tão condicionado, na sua ação política (e continuará a ser,
muito em especial até junho de 2014), pelas graves situações criadas e pelos compromissos assumidos, em
nome de Portugal, pelo Governo anterior.
Infelizmente para os portugueses, não há presente, sem o peso das dificuldades que nos foram deixadas
por este passado recente.
Nos últimos 18 anos, apenas cinco anos, os últimos dois e três anos que antecederam os Governos de
Sócrates, foram da responsabilidade de Governos de coligação PSD/CDS. Os restantes 13 anos foram da
responsabilidade do Partido Socialista e, numa coincidência que a História registará para sempre, herdámos o
pântano de Guterres e a bancarrota de Sócrates.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Teixeira dos Santos, para quem a ultrapassagem do limite dos 7% dos juros tornara, de há muito, inevitável
o pedido de resgate, a semanas de o País ficar impossibilitado de assegurar as remunerações dos
funcionários e as pensões dos aposentados, teve de dar uma entrevista ao Jornal de Negócios, anunciando
que Portugal ia pedir ajuda externa, como única forma de ultrapassar a irresponsável teimosia de José
Sócrates, que, recusando a evidência, continuava a pairar no imaginário cor-de-rosa da sua governação
virtual.
Protestos do PS.
Mas mais grave foi a circunstância de o Governo de Sócrates, como está hoje sobejamente demonstrado,
não ter reportado às instituições que asseguraram a ajuda externa a Portugal os números corretos da dívida e
do défice.
O Programa de Ajustamento ficou, assim, fixado com base em pressupostos falsos, já que a situação era,
de facto, bem mais grave.
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Não admira, pois, que, para superar essas divergências com a realidade e para ganhar alguma margem de
segurança e não falhar o cumprimento das metas estabelecidas, o atual Governo tenha sido obrigado, em
alguns casos, a ir mais longe, em matéria de medidas de austeridade, do que o exigia o próprio Memorando.
Mas os responsáveis por esse agravamento dos sacrifícios dos portugueses são os mesmos.
Aplausos do PSD.
São os responsáveis pela situação de endividamento desregrado e desproporcionado que obrigou ao
resgate.
São os responsáveis pela vinculação do País a medidas de austeridade, de corte de remunerações de
funcionários, de aumento de impostos e de violento corte nas despesas.
São os responsáveis pelas desastrosas parcerias público-privadas.
Srs. Deputados, a falta de confiança dos nossos credores no Partido Socialista, apesar de ser, então,
Governo, ficou desde logo patente na circunstância de o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e o
Fundo Monetário Internacional terem exigido que o Memorando de Entendimento fosse também subscrito pelo
PSD e pelo CDS. Naturalmente que os partidos da coligação, com o País à beira da bancarrota, não o
poderiam ter deixado de assinar, por imperativo patriótico.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Ao invés, o PS, apesar de, enquanto Governo, ter negociado o
Memorando de Entendimento e vinculado Portugal aos compromissos que dele decorrem, tem feito tudo para
se demarcar das medidas de austeridade e tem procurado «sacudir a água do capote» que o Eng.º Sócrates,
antes de partir para Paris, teve o cuidado de deixar ao seu sucessor, no Largo do Rato.
Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Somos o mais
antigo Estado/Nação da Europa e só nos faltava agora, como entende o PS (que, neste particular, se
confunde, cada vez mais, com o Bloco de Esquerda e com o PCP), deixar de cumprir o Programa de
Ajustamento e as obrigações assumidas para com os nossos credores.
Esse Programa de Ajustamento, e o seu cumprimento, face à grave situação financeira do País, teve de
passar a ser a prioridade do atual Governo. E foi, aliás, esse esforço, graças aos pesados sacrifícios que os
portugueses têm estoicamente suportado, que restaurou a credibilidade interna e externa de Portugal. Aliás,
se não fossem cumpridas as obrigações e metas a que Portugal, pela mão do Partido Socialista, se obrigou,
não teríamos recebido as diferentes tranches dos empréstimos concedidos e, pura e simplesmente, não
teríamos assegurado o normal funcionamento do Estado. Desde o pagamento dos vencimentos dos
funcionários ao pagamento das pensões, aos serviços de saúde e de educação, tudo poderia estar em risco.
Mas, para além destes aspetos essenciais da nossa vida coletiva, ganhámos a credibilidade bastante para
ter conseguido, junto dos nossos credores e das instituições europeias, a redução dos juros, que, no âmbito da
ajuda externa, baixaram de 6% para cerca de 3,2% (uma redução de cerca de 70%, o que, só no período de
um ano, corresponde a mais de 800 milhões de euros), obtendo-se maior maturidade dos empréstimos, bem
como o alargamento dos prazos para a redução do défice.
Qual o posicionamento do Partido Socialista, nos últimos dois anos, relativamente a todas estas questões,
exigidas pelo Memorando de Entendimento? Ao maior partido da oposição, alternativa de Governo, exige-se
clareza e a assunção, sem hesitações, das suas responsabilidades.
Infelizmente, temos assistido, por parte do Partido Socialista, apesar de responsável pela grave
degradação financeira do País, por via de uma governação perdulária e de um colossal endividamento, a um
taticismo partidário e eleitoralista, que não honra o PS, como partido fundador da nossa democracia.
Foi esta postura, de subordinar os interesses do País a uma visão meramente partidária em função das
eleições mais próximas, que levou o País à grave situação financeira em que se encontra.
Persistir nesse caminho não só descredibiliza a política como desacredita os partidos, pilares fundamentais
da democracia. Mas é este o estado da oposição.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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O Secretário-Geral do Partido Socialista transformou-se num verdadeiro Frei Tomás. Diz uma coisa e faz
outra! Como seria descaramento a mais assumir que, pura e simplesmente, não respeitava o Memorando, que
o PS negociou e assinou com a troica, vai apregoando, embora cada vez menos, que honrará tais
compromissos.
Todavia, ao mesmo tempo, a propósito de todas e cada uma das medidas de execução do Memorando, o
Partido Socialista não resiste à tentação de se querer demarcar de quanto, por culpa sua, exige tão pesados
sacrifícios aos portugueses. Isto não é sério e não é eticamente admissível!
Esta duplicidade, esta incoerência e a fuga taticista às suas responsabilidades por parte do Partido
Socialista retira-lhe a idoneidade exigível, como maior partido da oposição, para se poder apresentar perante
os portugueses como alternativa de poder.
Aliás, o desastre da sua governação continua presente, não apenas na nossa memória coletiva, mas
também nos sacrifícios que, diariamente, os portugueses têm sido obrigados a suportar.
Srs. Deputados, precisamos todos de saber, o País precisa de conhecer, com clareza, qual a posição do
Partido Socialista relativamente ao apelo do Presidente da República para um acordo que permita assegurar o
cumprimento do Programa de Ajustamento Financeiro, nos prazos estabelecidos, e a saída da troica em junho
de 2014 e garanta a estabilidade do período ainda difícil que se seguirá.
Este debate do estado da Nação é uma excelente oportunidade para o Partido Socialista assumir aqui,
perante os portugueses, uma atitude clara de demonstração de que está solidário com eles, com o esforço
brutal e exemplar que estão, coletivamente, a fazer, indispensável para que Portugal se liberte, o mais
rapidamente possível, da situação de «protetorado» em que o Governo de Sócrates o colocou.
Aplausos de Deputados do PSD.
Não basta, Sr. Deputado António José Seguro, dizer que está aberto ao diálogo, e ao diálogo desde que as
propostas que o Partido Socialista impõe sejam aceites. Não é este diálogo que constrói a democracia.
Seria bom para Portugal e para a nossa democracia que o PS deixasse de pactuar com os que querem
destruir a credibilidade que Portugal reconquistou e que, ao fim e ao cabo, por essa via, mais não pretendem
do que prolongar a presença da troica ou provocar mesmo um segundo resgate, indiferentes às limitações que
tal importa para a nossa soberania.
De qualquer forma, a confirmação de que o Governo tem honrado os compromissos assumidos pelo
Estado português e restaurado a credibilidade externa de Portugal está bem patente nas sucessivas
avaliações (vamos na oitava), que têm tido resultados positivos.
A par deste esforço em matéria de austeridade e consolidação orçamental, o Governo tem levado a cabo
reformas que são sabidas e conhecidas, e já foram aqui referidas pelo Sr. Primeiro-Ministro e pelo Presidente
do Grupo Parlamentar do PSD, razão pela qual não vou maçar-vos, repetindo-as.
As medidas adotadas proporcionaram maior sustentabilidade financeira e a redução dos juros da dívida e
permitem perspetivar o regresso estável aos mercados, em condições mais acessíveis e suportáveis.
Ao mesmo tempo, a economia portuguesa começa a registar, com alguma consistência, sinais de sensível
melhoria. São conhecidos os números do estudo da Universidade Católica, são, hoje, conhecidos os números
do Eurostat, relativamente à industrialização do País, são também conhecidos os avanços que se fizeram na
redução da despesa pública e no equilíbrio da balança comercial.
Os sinais são, pois, de esperança e implicam uma responsabilidade acrescida de todos nós para que não
sejam perdidos e em vão todos os sacrifícios que os portugueses têm feito e o esforço coletivo empreendido
pelo País.
Importa ter presente que, para além das fragilidades próprias de um País sob resgate, as nossas políticas
estão altamente condicionadas pela União Europeia. Felizmente, há também sinais de que as instâncias
europeias começam a dar atenção e prioridade às políticas de estímulo ao crescimento económico, de
combate ao desemprego e de apoio às pequenas e médias empresas e ao seu financiamento.
Portugal, apesar da frágil situação em que foi colocado pelo Partido Socialista, deve prosseguir o seu
empenho reivindicativo, com vista a obter uma maior concretização de tais medidas por parte da União
Europeia.
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Nestas circunstâncias e contexto, e atenta a gravidade da situação de emergência nacional da atual
conjuntura, é de todo compreensível o apelo do Sr. Presidente da República a um acordo alargado dos
partidos subscritores do Memorando de Entendimento.
O PSD está, como sempre tem estado, aberto ao diálogo com todas as forças políticas e em especial com
o maior partido da oposição.
O Sr. Presidente da República pode, pois, contar com a disponibilidade e a cooperação do PSD para a
concretização de um acordo de salvação nacional.
Da nossa parte, tudo faremos para que Portugal continue a cumprir os compromissos assumidos e não
consentiremos que se ponham em causa os resultados já alcançados.
Tudo faremos para garantir a coesão social e prosseguir o esforço coletivo que todos estamos a fazer, com
vista à consolidação orçamental e ao saneamento das contas públicas.
É uma certeza e uma esperança que queremos partilhar com todos os portugueses, em especial com os
mais desfavorecidos, os desempregados, os jovens que procuram desesperadamente colocação, os que
suportam maiores privações e a quem temos obrigação de garantir que os sacrifícios, que, de todo, não
desejámos e lhes têm sido impostos, vão valer a pena.
Que cada um assuma as suas responsabilidades, na certeza de que, em conjunturas tão graves como a
que estamos a viver, a História julgar-nos-á a todos.
Da nossa parte, cientes de que, em condições particularmente adversas, temos, como é nossa obrigação,
feito tudo por Portugal e pelos portugueses, fiéis ao mandato que deles recebemos, não receamos o
julgamento da História!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Inscreveu-se, para fazer perguntas, o Sr. Deputado António Braga.
Tem a palavra para esse efeito, Sr. Deputado.
O Sr. António Braga (PS): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado Guilherme Silva, queria dizer-lhe que o debate
tem decorrido com a contenção que, aliás, o Sr. Primeiro-Ministro fez questão de assinalar desde o início e
que o PSD escolheu o Deputado que mais se identifica com o Governo da Região Autónoma da Madeira…
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — E o Hugo Velosa?!
O Sr. António Braga (PS): — … para falar sobre dívidas. Estamos entendidos sobre isso!
Mas fundamental, Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Deputados do PSD, era saber se o PSD se
identifica com esta intervenção e se o Sr. Primeiro-Ministro a subscreve, porque este é um debate que marca
um tempo histórico importante e se não ficarmos esclarecidos sobre se esta intervenção é aquela que
corresponde à posição do PSD, o debate fica incompleto.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Guilherme Silva, tem a palavra para responder.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado António Braga, como é, aliás, usual no
Partido Socialista, o Sr. Deputado só ouviu parte da minha intervenção,…
Protestos do PS.
… pelo que registo e lamento que não tenha dado atenção à parte que considero mais importante, que foi a
da expressão de abertura do Partido Social Democrata para o diálogo, para o acordo de salvação nacional, e
do apelo ao Partido Socialista para construir esse futuro e salvar o País, nesta situação de emergência
nacional.
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Esta é a mensagem com base na qual o Partido Social Democrata, nós, aqui, nesta bancada, e o Sr.
Primeiro-Ministro estamos, convergentemente, a desafiar o Partido Socialista para esse acordo. É um apelo ao
interesse nacional e para salvar o País e V. Ex.ª devia ter respondido a esse apelo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Pelo CDS-PP, para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e
Srs. Deputados: Este debate ocorre em circunstâncias e num momento particularmente difíceis do País e da
nossa história coletiva. Não o ignoramos, como não ignoramos nem queremos esconder que ele ocorre
também depois de momentos de tensão verificados no seio do próprio Governo.
Não ignoramos ainda a situação económica e social particularmente difícil que o País hoje vive,
designadamente ao nível do desemprego, muito em particular do desemprego jovem.
Não ignoramos nenhuma destas dificuldades e teremos, nesse contexto, a contenção que os tempos e as
circunstâncias assim recomendam.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Consideramos que este não é sequer o momento para repartição de
culpas ou atribuição de culpas. Aliás, se quisermos atribuir culpas, existirão muitas por repartir, culpas até
demais por repartir.
Sabemos, de resto, que se esta maioria não foge das suas responsabilidades, esta maioria não é
obviamente responsabilizável nem pela acumulação de dívida e de défice que conduziram ao resgate, como
não é responsável por ter alimentado a ilusão dos novos aeroportos, das terceiras travessias, das PPP, dos
TGV, que conduziram à situação em que o País se encontra.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Sabemos e compreendemos as circunstâncias especialmente difíceis de quem assume, neste momento, a
governação, com a reduzidíssima margem de manobra, a herança de um programa e as avaliações a que está
sujeito e, mais, os acórdãos negativos do Tribunal Constitucional, que nos obrigaram a uma política fiscal
muitas vezes diversa das nossas próprias convicções.
Sabemos dessas dificuldades, e é por isso, Srs. Deputados, que neste contexto e nestas dificuldades, uma
primeira palavra que gostaria de deixar é, obviamente, uma palavra de respeito, uma palavra de apreço, uma
palavra de apoio, em nome do CDS e da maioria, àqueles que, por nós, têm assumido a governação do País,
aos líderes dos partidos e, muito em particular, ao Sr. Primeiro-Ministro, Pedro Passos Coelho.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Soa a fim de ciclo!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Não ignoramos nem escondemos os momentos de tensão. Como aqui
foi dito, muitos desses momentos de tensão derivam das próprias dificuldades que vivemos.
Mas também não esquecemos que, em dois anos, foi ainda assim possível recuperar a nossa credibilidade
externa, reduzir o défice de 10,1% para 5,5%, conseguir conter a despesa primária de 48% para 43%, foi
possível ter sensibilidade social, num momento tão difícil, foi possível fazer reformas, como as reformas
importantes que se fizeram na área da saúde, e foi possível manter, como conseguimos manter, por exemplo,
o prestígio das forças de segurança.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
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O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muita coisa foi conseguida, e se uma coligação não é, de facto, uma
fusão, uma coligação não é também um concurso mas, sim, um exercício de compromisso permanente, e nós
estamos dispostos a esse mesmo compromisso.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Por outro lado, é evidente que, ao falarmos nas dificuldades, não ignoramos a necessidade e a importância
que tem, do nosso ponto de vista, a abertura, neste momento, de um segundo momento, de um segundo ciclo,
se quisermos, de um novo impulso na governação do País.
Também sabemos, indo ao encontro do apelo, que não ignoramos, do Sr. Presidente da República, que
esse novo ciclo, que esse novo impulso tem um pressuposto fundamental: a capacidade de diálogo e de
acordo político, designadamente com o maior partido da oposição, com o Partido Socialista.
É evidente que, para nós, CDS, neste momento, é muito importante — e digo-o, dirigindo-me diretamente
ao PS — não somarmos nenhuma crispação à crispação política já existente hoje em dia em Portugal.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É importante construirmos, se não uma solução de governo conjunto,
pelo menos um acordo em relação ao essencial,…
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
… em relação àquilo que ultrapassará o quadro, obviamente, de uma legislatura. É muito importante que o
consigamos, mas, para isso, também é importante que o Partido Socialista não esteja sempre numa posição
de queixa ou, então, por alternativa, respondendo a tudo com eleições antecipadas.
Não é possível que assim seja: o compromisso implica dois e implica, obviamente, acordos concretos,
soluções concretas para a estabilidade do País.
Esse segundo ciclo depende ainda de outras ideias, de ideias fundamentais, como, por exemplo, a de que
a vontade reformista seja efetiva, mas se faça no quadro constitucional de que dispomos; como, por exemplo,
que exija uma nova visão europeia de uma política de exigência de uma Europa, que tem, obviamente, de ser
mais solidária com os seus povos, designadamente com aqueles que atravessam dificuldades; que haja uma
nova atenção ao investimento e à economia; que haja uma nova abordagem de exigência com os nossos
credores, querendo cumprir, mas exigindo também aquilo que é necessário para que a flexibilização
necessária para esse cumprimento seja possível.
Srs. Deputados, muito em particular Srs. Deputados do Partido Socialista, ouvi com a maior atenção o
Secretário-Geral do Partido Socialista, o Sr. Deputado António José Seguro, dizer aqui, hoje, que o diálogo
não tem de ser só entre três partidos e se deve estender a toda a Câmara.
Obviamente que quem é democrata tem de admitir que assim é. O debate e o diálogo parlamentares têm
de ser feitos entre todos os partidos. Mas, ao mesmo tempo que o dizemos, também sabemos — e é
importante que se reconheça — que, quando falamos num acordo entre três partidos, é porque sabemos que
não há solução possível fora do cumprimento, não há solução possível fora do Memorando de Entendimento,
porque aí saímos do espaço de diálogo.
Não é possível, não há solução com apelos a não pagar, com apelos a revogações unilaterais ou com outro
tipo de soluções. Respeitamos a posição política de quem o defende, mas não acreditamos que nisso haja
solução. E é por isso que qualquer entendimento se tem de fazer entre os três partidos que assinaram o
Memorando, como é evidente.
Queremos o diálogo e estamos dispostos ao diálogo.
Queremos o diálogo em vez da vozearia, queremos o diálogo em vez da gritaria.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
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Queremos e estamos dispostos ao diálogo, mas para que haja esse diálogo é necessário responder a duas
perguntas essenciais. Primeira: como conseguimos garantir para o País uma solução governativa estável?
Segunda: como conseguimos garantir o cumprimento das nossas obrigações, mantendo a estabilidade no
País?
Desse ponto de vista, obviamente que queremos esse diálogo alargado; obviamente que respondemos
positivamente ao desafio do Sr. Presidente da República. Mas sublinhamos também, ao mesmo tempo, que
num momento de tensão entre os partidos e de tensão governativa a maioria, os líderes e os partidos
responderam com rapidez e com eficácia a essa mesma tensão e que a proposta que foi feita, que foi
formalizada e que está em cima da mesa, de uma solução governativa estável, de uma renovação do esforço
da maioria é uma proposta sólida, credível e, do nosso ponto de vista, duradoura.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
É importante garantir estabilidade e também é importante, neste momento, desfazer um conjunto de ideias
feitas.
A primeira ideia feita que é preciso desfazer é a ideia de que há alguma falta de legitimidade da maioria ou
do Governo para seguir a sua missão, cumprir o seu mandato e prosseguir os seus objetivos. Não há
nenhuma falta de legitimidade, não aceitamos essa falta de legitimidade!
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Foi o povo que lhe tirou o tapete!
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Da mesma forma, Srs. Deputados, não aceitamos que perante o
exercício democrático de quem está aqui eleito pelo povo haja uma tentativa ou uma política de intimidação
permanente como, infelizmente, aquela a que assistimos ainda ontem vinda das galerias deste mesmo
Parlamento.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Não aceitamos essa lógica de intimidação em nenhuma circunstância. Foi aqui hoje anunciada, de resto no
exercício da sua ampla e plena autonomia — estou a referir-me ao Partido Ecologista «Os Verdes», como é
evidente —, a apresentação de uma moção de censura. Queria dizer, desde já, em nome do CDS, que sim,
senhor, muito bem, é muito bem-vinda: vamos discutir a moção de censura!
Para nós, será, obviamente, um momento de afirmação, de coesão, de uma maioria que não verga, que
não desiste, e que está aqui convicta para responder àqueles que são os nossos adversários!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Termino, Sr.ª Presidente, dizendo que não aceitamos também a ideia
de que, em Portugal, de cada vez que governa o centro-direita, têm de se pedir eleições antecipadas todos os
dias, todas as semanas. Não aceitamos essa ideia!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Queremos o diálogo, mas não desistimos, porque temos um objetivo, que é o de recuperar a liberdade e a
soberania plena de Portugal.
O nosso objetivo é o de não desperdiçarmos o esforço e o sacrifício que tantos portugueses têm feito! O
nosso objetivo é o de não desperdiçarmos o empenhamento de tantas empresas e de tantos empresários! O
nosso objetivo é o de mobilizar energias nacionais! O nosso objetivo é o de pensarmos na próxima geração e
não na próxima eleição, em função, obviamente, do interesse nacional e de Portugal.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveu-se a Sr.a Deputada Heloísa Apolónia, de Os
Verdes.
Entretanto, esqueci-me de indicar algo que é óbvio, mas que convém referir para efeitos de lealdade na
dialética do debate, que é o seguinte: o Sr. Deputado Telmo Correia não dispõe de tempo para responder.
Mas a Sr.a Deputada Heloísa Apolónia fará como entender, uma vez que dispõe de tempo para formular a sua
questão.
Faça favor, Sr.a Deputada.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Não faz mal, Sr.ª Presidente…
Vozes do PSD: — Ah!…
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É que, na verdade, eu só ia perguntar ao Sr. Deputado Telmo
Correia se aquilo que anunciou relativamente à moção de censura que Os Verdes vão apresentar na
Assembleia da República é ou não irrevogável. Mas ele não saberia responder.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — De seguida, para uma intervenção, pelo PCP, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo
de Sousa.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro: O estado da
Nação, que aqui hoje debatemos, é deplorável. É esse o resultado de dois anos de Governo do PSD e do
CDS-PP e de aplicação do Memorando de Entendimento, que consideramos um pacto de agressão, que agora
o Presidente de Republica quer prolongar.
Mas desçamos à terra.
O saldo das políticas de austeridade e de concentração de riqueza é avassalador: desemprego brutal,
recessão agravada, destruição de milhares de empresas, uma dívida esmagadora, aumento da exploração do
trabalho, aumento dos impostos, corte dos salários, reformas e prestações sociais, degradação dos serviços
públicos.
Os portugueses sabem bem que não estamos melhor, estamos pior. Sabem que a sua vida está feita num
inferno pelos modelos económicos pseudocientíficos, construídos para servir os grandes interesses e onde
não cabem pessoas que pensam, trabalham e lutam. Temos um País dependente, destruído, desigual.
Temos um País com um Governo em confronto com a Constituição da República e um Presidente que quer
perpetuar o massacre do povo. Temos um País onde as tendências antidemocráticas se manifestam de forma
preocupante.
Temos um País onde é hoje absolutamente claro que não há nenhuma outra saída, digna e democrática,
para a pantanosa degradação que vivemos que não seja a da demissão do Governo, a da dissolução da
Assembleia da República e a convocação de eleições.
Aplausos do PCP.
A degradação a que assistimos nos últimos dias, com o Governo em convulsão interna, não é o resultado
de qualquer divergência de fundo entre o PSD e o CDS, é apenas o efeito da sua política nociva, o efeito do
profundo desgaste que a luta dos trabalhadores e do povo provocou neste Governo. É o resultado desse
clamor nacional que por todo o lado se exprime em lutas, em manifestações, em greves, como a decisiva
greve geral do passado dia 27, e que não só rejeita esta política como exige outro caminho para o País.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
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O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Pode o Governo fazer arrumações de pastas entre ministros, anunciar
um novo ciclo ou fazer conferências de propaganda diárias. O Governo está morto e foi a luta que o matou. E
tanto está morto que até o Presidente da República já lhe passou a certidão de óbito, mantendo-o, tão só,
ligado à máquina.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A questão que se coloca não é, contudo, apenas a da saída do Governo;
é também, e sobretudo, a da mudança de política. A situação que estamos a viver não é mais do que uma
réplica agravada de 37 anos de política de direita, de alternância no Governo sem alternativa na política.
Ao longo destes 37 anos mudaram os governos, mas pouco mudaram as políticas. Destruiu-se a produção
nacional, pagando-se para não pescar e para não cultivar, permitindo a destruição do tecido industrial;
restauraram-se os monopólios nos setores fundamentais da economia à custa da penalização das famílias e
do esmagamento das micro e pequenas empresas; afundou-se a economia com uma moeda única ao serviço
dos grandes interesses da União Europeia; retiraram-se direitos e cresceu a desigualdade; alienou-se a
soberania nacional.
Com o pacto de agressão, assinado e aceite pelo PSD, pelo PS e pelo CDS-PP, aprofundaram-se todas
estas políticas e procurou-se caminhar mais rápido ainda no empobrecimento e na exploração. É o
prosseguimento deste caminho que o Presidente da República quer garantir, mesmo com o total desrespeito
pelo regular funcionamento das instituições, mesmo juntando à fragilização do Governo uma profunda
degradação do regime democrático.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exatamente!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Para o Presidente da República ou não há eleições ou, quando as
houver, elas não podem mudar nada no rumo do País. O Presidente da República rejeita a convocação de
eleições porque teme que o povo possa escolher outro caminho, porque sente que cada vez mais portugueses
percebem que é preciso alterar a correlação de forças entre os partidos da política de direita e os setores e
forças políticas e sociais que, lado a lado, com tantos democratas e patriotas, exigem a rutura com esta
política, e que a alteração dessa correlação de forças torna mais difícil a continuação da mesma política e abre
a esperança a uma verdadeira mudança. Essa é a clarificação que o Presidente da República não quer.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — É por isso que o Presidente da República propõe este compromisso,
não para a salvação, mas para a continuação da destruição nacional, para salvar a política de direita. E é por
isso que, esquecendo as suas obrigações constitucionais, resume o debate sobre o futuro do País aos três
partidos da troica interna, pondo, aliás, em evidência o alinhamento destes partidos com a política em curso.
Com essa atitude, o que procura é o condicionamento das opções do povo português, é esconder que
existe outro caminho, é persistir na estafada propaganda de que não há alternativa à política de direita.
Mas se não há novo ciclo com o mesmo Governo, também não há novo rumo para Portugal com a mesma
política.
Aplausos do PCP.
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, rejeitamos, em absoluto, a ameaça com que a direita, o Presidente da
República e o grande capital pretendem enganar os portugueses: a mentira de que com as eleições viria o
caos; a patranha de que a chamada crise política levou o País a perder mais de 1000 milhões de euros, como
se as variações da bolsa fossem pagas pelo Orçamento do Estado; a chantagem de que viria o segundo
resgate, há muito em preparação e à espera do pretexto adequado; a falsa ideia de que realizar eleições
desperdiçaria os sacrifícios feitos pelo povo. Trata-se apenas de manipular o medo, o receio com que muitos
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portugueses olham para o seu futuro, dos seus filhos, ou do País, para os convencer a aceitar uma vida cada
vez pior.
Mas a vida não tem de ser cada vez pior e o País não está condenado ao empobrecimento. É preciso
resgatar o Pais desta política, das mãos deste Governo, da troica e do Presidente da República. Com este
Governo não há esperança, com esta política não há futuro.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Portugal precisa de uma política patriótica e de esquerda que dê
resposta aos problemas do País. Sabemos que este Governo e os anteriores deixaram o País numa grave
situação. Não há, nem haverá soluções fáceis. Mas também sabemos que Portugal não é um País pobre e
que com outra política poderemos devolver ao povo os direitos que lhe foram roubados e começar a inverter o
declínio nacional. Uma política patriótica e de esquerda, que tem de partir da rutura com o pacto de agressão,
em que ninguém queira enganar outra vez os portugueses. Não há mudança efetiva de política sem rejeição
do Memorando da troica. Uma política que exige a imediata renegociação da dívida nos seus montantes, dos
juros, dos prazos e condições de pagamento, com redução do serviço da dívida para um nível compatível com
o crescimento económico e a melhoria das condições de vida.
É falso, Sr. Deputado Telmo Correia, dizer que não se quer pagar. Um dia poderemos ouvir que não
podemos pagar, e é por isso que nós consideramos que os credores têm força, mas os devedores também
têm direitos, como é o caso, aqui, em Portugal.
Aplausos do PCP.
Uma política que aposte decisivamente na produção nacional, que defenda e desenvolva o aparelho
produtivo, aproveitando os recursos e as riquezas do País e que tenha como objetivo o pleno emprego.
Uma política que melhore as condições de vida dos portugueses, aumentando os seus rendimentos,
contribuindo também para a dinamização da nossa economia, particularmente no mercado interno.
Uma política que garanta o direito à educação, à saúde, à segurança social, à justiça, salvaguardando o
caráter público dos seus serviços e eliminando as restrições de acesso por razões económicas e que
contribuam para combater as desigualdades.
Uma política que defenda a soberania nacional e os interesses do País, designadamente face à União
Europeia. É em torno desta política alternativa, e não de continuismo da política de desastre, que se impõe a
convergência de todos os democratas e patriotas, dos trabalhadores e do povo português.
Uma política alternativa que exige um Governo que a concretize, um Governo capaz de romper com a
lógica e o ciclo vicioso que se instalou no País do sistema de alternância sem alternativa. Podem contar com o
PCP para assumir todas as responsabilidades que o povo lhe queira atribuir e para fazer a diferença no futuro
de Portugal.
Não se iludam os que julgam poder continuar a enganar para todo o sempre o nosso povo. Nós temos
confiança de que o povo português será capaz de abrir caminho novo, de esperança, de que Portugal precisa.
E temos uma profunda convicção: é que nada está perdido para todo o sempre.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Bloco de Esquerda.
Tem a palavra a Sr.ª Deputada Catarina Martins.
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Em março de
2012, Cavaco Silva, no prefácio do livro Roteiros VI, escrevia: «Há quem tenha a ilusão de que o Presidente
da República pode impor aos partidos, contra a vontade destes, a sua participação em governos de coligação,
por vezes apelidados de salvação nacional», mas advertia que essa solução seria sempre artificial e precária,
consumindo-se rapidamente em lutas internas e dando lugar a uma instabilidade política muito prejudicial ao
País.
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O que mudou no estado da Nação em menos de 18 meses para que Cavaco Silva queira agora impor a
solução que antes rejeitava? Estão, porventura, os partidos mais coligáveis? Serão os seus dirigentes mais
confiáveis e confiarão mais uns nos outros? Ouçamos o que afirmou hoje o Primeiro-Ministro: «Basta que não
fiquemos agarrados a tudo o que dissemos». Por outras palavras, nada do que este Governo diz, vale. Tanto
agora como desde o início, a palavra do Governo vale zero.
Aplausos do BE.
Explicar, portanto, a atual crise como sendo resultado de uma birra é interessante, e os seus protagonistas
até deram boas razões para acreditar nessa tese, mas não nos diz nada sobre o momento que estamos a
viver.
O problema é a política, o falhanço da política. O que sobressaltou Cavaco Silva foi a evidência do
esgotamento do programa de ajustamento. Todas as birras são a cortina de fundo que escondem o essencial:
a austeridade falhou, como o reconheceu o seu arauto máximo, Vítor Gaspar.
O défice atingiu, nesse primeiro trimestre, o valor mais alto desde o início da crise financeira. A dívida está
nos 127%, quando o Memorando previa 114% até ao final de 2013, e o ano ainda só vai a meio. Depois de
todos os aumentos de impostos, de cortes salariais, de subsídios retirados, de 400 000 postos de trabalho
destruídos, o colossal desvio de 21 000 milhões de euros na dívida é o retrato do falhanço da austeridade e do
Governo PSD/CDS.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Exatamente!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Não, não é a possibilidade de eleições que abre caminho a um segundo
resgate, como nos vêm dizendo os defensores do Governo, mas é a iminência do segundo resgate que explica
a crise na coligação e no Governo. Dizia esta semana Miguel Frasquilho, sem se rir, que o Bloco de Esquerda
pretende um segundo resgate, quando já está nas capas de toda a imprensa mundial que o segundo resgate
já está a ser preparado em Bruxelas e no Palácio de São Bento.
Não nos esquecemos, e muito menos o Governo, de que faltam apenas três dias para Paulo Portas
apresentar o famoso guião para o corte de 4700 milhões de euros, a tal reforma do Estado, nome pomposo
para descrever a diminuição das pensões, o despedimento de 30 000 funcionários públicos e o encerramento
de serviços públicos.
Se tudo está a correr tão bem, como garante o Primeiro-Ministro a prazo, como explicar a demissão
sucessiva de Vítor Gaspar e Paulo Portas? Acaso estavam cansados de tanto sucesso? Sejamos sérios.
O que Cavaco Silva procura não é uma solução de salvação nacional, mas a salvação do programa de
ajustamento.
Se a austeridade falhou e se continuar a espiral recessiva em que se está a afundar o País, a solução do
Presidente da República é resgatar o Programa de Ajustamento num acordo que, com a eventual presença do
Partido Socialista, garanta que, aconteça o que acontecer, a austeridade continuará o seu caminho.
Ao desmoronamento da direita e do programa político da direita o Presidente da República responde com o
desmoronamento da democracia.
O Sr. Pedro Filipe Soares (BE): — Muito bem!
A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Para que o Programa de Ajustamento não seja avaliado, faz a democracia
refém. Depois de termos um Governo tutelado por Belém, Cavaco Silva quer condicionar as próximas eleições
e o ciclo eleitoral: eleições sim, mas só se, através de um acordo prévio entre os três partidos que assinaram o
Memorando, ficar criado o ambiente e as convicções próprias de que elas não decidem nada e se Cavaco
Silva tiver a certeza que delas resultará sempre a continuação da austeridade que está a destruir a coligação,
o Governo e o País.
Cavaco Silva só aceita a escolha do povo quando tiver garantias de que não existirá escolha, quando todos
oferecerem o mesmo programa — o da troica, o da austeridade permanente — e a escolha do povo não seja
mais do que a podre alternância de protagonistas.
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No desespero que se vive em Portugal, o «entendam-se» do Presidente pode até soar atrativo a alguns
ouvidos. Mas entendamo-nos: este «entendam-se» é uma forma de garantir que se cortará mais nos salários e
pensões, de que se continuará a fragilizar mais os direitos do trabalho, a privatizar mais e a garantir mais
rendas a privados, a cortar mais no Estado social e a continuar a financiar os bancos com o dinheiro dos
cidadãos.
O Presidente da República tenta cavalgar o populismo, atribuindo-se poderes que não tem no nosso
quadro institucional e democrático, substituindo-se aos partidos e aos representantes eleitos na pluralidade e
no confronto em que se desenha a democracia.
A base das democracias modernas define-se como um «governo do povo, pelo povo, para o povo».
Aplausos do BE.
Está a ser subvertida pela direita para um «governo dos mercados, pelos mercados, para os mercados». É
nesta oposição, entre a democracia e a chantagem, que se joga o futuro do País.
Cavaco Silva quer salvar o Programa de Ajustamento, o programa da direita. Neste caminho, ataca a
democracia, desdiz o que já defendeu e escreveu e coloca o País numa insuportável situação de instabilidade
e pântano prolongado. Dizendo defender a estabilidade, ao escolher um Governo a prazo e com data
marcada, Cavaco Silva escolheu a solução mais instável possível.
Face ao fim de um ciclo, ao falhanço do Programa de Ajustamento e à falência da coligação, a única
solução responsável é a das eleições. Com eleições, o povo escolhe o caminho e os protagonistas; com
eleições, há uma data clara para a definição de um novo quadro político; com eleições, há uma nova
legitimidade que permite uma nova estabilidade. Sem eleições, o pântano agrava-se e eterniza-se; sem
eleições, a crise política passa a crise de regime democrático.
O Bloco de Esquerda reafirma estar disponível, pronto e preparado para um governo de esquerda que
denuncie o Memorando e renegoceie a dívida. Só esse caminho, pode permitir o crescimento económico, a
criação de emprego, a proteção do Estado social, a valorização de salários e pensões. Este caminho pode e
deve ser trilhado por uma ampla convergência de esquerda, mas só pode ser legitimado por um processo
eleitoral.
Afirmamos igualmente que nenhum partido, nem coligação de partidos, tem o mandato popular que lhe
permita negociar um segundo resgate. Também esse caminho, a que nos opomos, mas que, como o
Presidente do Banco de Portugal tão claramente afirmou, está já a ser preparado, só pode acontecer se for
legitimado pela vontade do povo expressa nas urnas.
Não aceitamos o ataque à democracia, não aceitamos a imposição de um governo não eleito, num modelo
Monti italiano, chantagem grega ou outro qualquer. A história prova à exaustão que esse é sempre o pior dos
caminhos. O caminho da responsabilidade, o que responde às exigências sérias do atual estado da Nação, é a
dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições. Chega de dissimulação.
Eleições já! Essa, sim, é uma decisão irrevogável para acabar com a dissimulação.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente: — A próxima intervenção é do Governo.
Tem a palavra a Sr.ª Ministra da Justiça.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Pensava que era a Ministra das Finanças! Ainda não é desta!
A Sr.ª Ministra da Justiça (Paula Teixeira da Cruz): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Quero
começar por dizer que este debate sobre o estado da Nação é um debate que ocorre num momento que é
particularmente exigente. E essa exigência tem de nos convocar a todos, sem exceção. É um exercício de
grande responsabilidade aquele a que todos estamos e somos convocados.
No que me respeita, tenho de afirmar aqui, com toda a clareza, que não, não desistimos. Não vamos
desistir do muito que está feito.
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Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E já que é de avaliação que se trata, quando se faz um debate sobre o estado da Nação, então vamos a
essa avaliação.
Fizemos — e não fui eu que o disse ou afirmei, disse-o um representante de uma estrutura sindical — a
maior reforma dos últimos 100 anos na área da justiça.
Risos do PS.
Compreendo os risos na perspetiva de quem não acompanha a área da justiça, eles serão seguramente
fundamentados por esse facto. Mas, Srs. Deputados, é muito fácil ver.
Temos orgulho daquilo que fizemos. Todos os meios alternativos de resolução de litígios foram vistos.
Temos uma lei de arbitragem que permite que as arbitragens, que se realizavam entre Londres e Nova Iorque,
entre Genève e Paris, se realizem em Portugal. Temos uma nova lei de mediação sistematizada. VV. Ex.as
têm
em mãos os julgados de paz. E isto só no que respeita aos meios alternativos.
Fizemos uma revolução com o Código de Processo Civil que entrará em vigor no dia 1 de setembro — e
VV. Ex.as
não o desconhecem. Os cidadãos deixarão de poder ser chamados a testemunhar todos ao mesmo
tempo, tudo terá de ser calendarizado. Os julgamentos tornar-se-ão praticamente inadiáveis.
Fizemos uma reorganização judiciária, optando por levar a especialização para o interior.
No campo da justiça penal, fizemos alterações ao Código Penal e ao Código de Processo Penal, que põem
fim aos expedientes dilatórios que tanta impunidade permitiam.
Não só vimos a justiça penal, como vimos também a justiça cível. Não são só as referências ao Código de
Processo Civil e à lei de reorganização judiciária mas também ao imenso trabalho feito na ação executiva.
Srs. Deputados, nós extinguimos 307 000 ações executivas, à data. Desde novembro de 2011 até à data
em que vos estou a falar, 307 000 ações executivas foram extintas.
Perguntarão os Srs. Deputados: porquê esta referência a este conjunto de reformas? É simples, já Platão o
dizia: a justiça é a saúde do Estado. Então, vamos avaliar como está a saúde do nosso Estado. É importante
que o façamos aqui, e que o façamos de forma séria e objetiva.
Disciplinámos, pela primeira vez, do ponto de vista da justiça económica, o chamado CIRE — Código da
Insolvência e da Recuperação de Empresas —, onde, pela primeira vez, os credores públicos não fazem valer
os seus privilégios e não «atiram ao chão» as empresas, não «enterram» imediatamente as empresas, como
sucedia até agora. Sabia-se o que acontecia com a cobrança de dívidas ou com a liquidação de empresas.
Disciplinámos claramente toda a atividade dos agentes de execução, disciplinámos claramente toda a
atividade dos administradores de insolvência.
Criámos um órgão de regulação extremamente importante: pela primeira vez, é público e sabe-se quanto é
que alguém paga por uma execução. Ontem mesmo, foi publicada uma portaria a fixar taxas nessa matéria.
Srs. Deputados, ninguém se lembrou da justiça administrativa. E a justiça administrativa é o interface entre
o cidadão e a Administração. Era preciso rever o Código do Procedimento Administrativo. E o Código do
Procedimento Administrativo está, neste momento, em debate público, como é sabido.
Queria só permitir-me chamar a atenção para três aspetos essenciais desta nova forma de relacionamento
com o cidadão. Em primeiro lugar, introduz-se o dever de boa gestão — sim, o dever de boa gestão! Era um
dever que só indiretamente resultava do nosso ordenamento, mas que fica muito claro e é aplicável a toda a
Administração Pública. Os responsáveis pela forma menos cuidadosa como é gerida a coisa pública deixarão
de ter válvulas de escape no regime. Mas também quero deixar claro que o cidadão passará a ter direito a ser
indemnizado — porque é do cidadão que estamos a falar, Srs. Deputados, é ele a nossa preocupação —
sempre que o Estado ou as demais entidades públicas se atrasem. O cidadão deixará de ter de andar de
balcão em balcão, porque o órgão decisor passa a ter de consultar os outros que são obrigados a dar parecer.
Isto é, Sr.as
e Srs. Deputados, reformar o Estado. E isto não esgota, nem de longe nem de perto, toda a
atuação, toda a revolução que estamos a fazer no Ministério da Justiça. Concederão que abater 307 000
ações executivas, no período de um ano e meio, é algo de que temos de nos orgulhar.
A Sr.ª Francisca Almeida (PSD): — Muito bem!
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A Sr.ª Ministra da Justiça: — E temos de olhar para a reforma da justiça não como algo privativo deste ou
daquele partido, mas como um contributo de todos, como, de resto, tem acontecido muitas vezes nesta Casa.
E dou disso testemunho com as sucessivas alterações que são propostas e que temos todo o orgulho em
acolher.
A reforma da justiça é um pilar da reforma do Estado, Srs. Deputados. E a isso todos temos de ser
convocados. Nenhum de nós se pode eximir a essa responsabilidade, nenhum de nós pode virar a cara à
forma como é gerida a justiça. E porquê? Porque ela é o último bastião dos nossos direitos, liberdades e
garantias.
Aplausos do PSD e CDS-PP.
Mas a justiça também é a forma como a Administração trata o cidadão. E aí, Sr.as
e Srs. Deputados, todos
temos obrigação de dizer que estamos presentes.
Aplausos do PSD e CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Ainda para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e Srs. Deputados: Sr.ª
Ministra da Justiça, esta intervenção era para ser um pedido de esclarecimento, mas, como não dispõe de
tempo para responder, ainda assim, fica a intervenção.
A Sr.ª Ministra da Justiça procurou recuperar na sua intervenção esta ideia de firmeza do Governo, a que,
aliás, o Sr. Deputado Telmo Correia associou a ideia de coesão. Sr.ª Ministra, essa ideia de firmeza não
corresponde a coesão alguma, mas à ideia do rigor mortis de um Governo que só está firme porque já está
liquidado, porque governou contra o povo e, governando contra o povo, acabou derrotado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Ministra procura recuperar e afirma aqui a ideia de que o momento é
particularmente exigente e de que não se pode desistir do muito que está feito.
Sr.ª Ministra, a exigência do momento que enfrentamos decorre das dificuldades em que os senhores
colocaram o País, decorre do agravamento das difíceis condições em que os senhores colocaram o País, em
resultado da vossa política. E, Sr.ª Ministra, aquilo que a senhora designa como «o muito que está feito» é um
património que, infelizmente, pesa, e muito, na vida dos portugueses e vai pesar muito durante algum tempo
na nossa situação nacional. É um património de desgraça nacional e de massacre do povo aquele que os
senhores deixam. E, Sr.ª Ministra, na área da justiça, o património, infelizmente, não é diferente.
A Sr.ª Ministra parece orgulhar-se do trabalho que fez enquanto Ministra da Justiça deste Governo, agora
derrotado e liquidado. Mas, Sr.ª Ministra, também na área da justiça, o património que os senhores deixam é
um património de configuração da justiça, por um lado, à medida dos interesses dos grandes grupos
económicos e, por outro, à medida da intenção de reprimir quem contesta e quem manifesta a sua
discordância deste Governo. É esse o património que os senhores deixam.
A Sr.ª Ministra fala na arbitragem. Perguntamos-lhe: quanto é que o Estado já gastou, este ano, em
arbitragens milionárias feitas nos processos das parcerias público-privadas e de outros contratos ruinosos do
Estado? Quanto?!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Ministra fala nas insolvências e nós perguntamos-lhe: quantas
insolvências já foram declaradas, à medida dos interesses da banca e da estratégia de deslocalização das
empresas para fora do País? Quantas?! Todas em prejuízo dos trabalhadores, todas em prejuízo da economia
nacional!
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O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Ministra fala no reforço dos meios ao serviço da justiça. Encerrando
tribunais, Sr.ª Ministra? Encerrando tribunais, como os senhores se propõem fazer? Não é com um objetivo de
custos, é com um objetivo de dificultar aos cidadãos o exercício e o reconhecimento dos seus direitos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. João Oliveira (PCP): — A Sr.ª Ministra passou olimpicamente ao lado dos problemas com que se
confronta o sistema prisional. O vosso património, aquilo que a Sr.ª Ministra diz que pode estar em risco é um
património de cadeias sobrelotadas, sem condições para os reclusos e sem condições para os guardas
prisionais ou para os técnicos de reinserção social que ali trabalham.
Também não disse uma palavra relativamente à degradação que a Sr.ª Ministra e este Governo têm
imposto à Polícia Judiciária. Sr.ª Ministra, o vosso património é o património de situações em que os
inspetores da Polícia Judiciária foram impedidos de perseguir o crime porque os senhores cortaram o direito
ao transporte público.
É este o património que os senhores deixam!
Risos do PSD e do CDS-PP.
Para terminar, sabe onde está espelhado o património que este Governo deixa em matéria de justiça penal,
Sr.ª Ministra? Nos 11 jovens da JCP detidos há duas semanas, no Porto, porque pintavam um mural de apelo
à greve geral!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
É esse o património que os senhores deixam em matéria de justiça penal! uma justiça que persegue quem
contesta o Governo, que procura reprimir penalmente quem contesta politicamente o Governo.
A Sr.ª Presidente: — Queira terminar, Sr. Deputado.
O Sr. João Oliveira (PCP): — É esse o património que os senhores deixam e é esse património que é
preciso combater!
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Negrão, que dispõe
de muito pouco tempo.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as
e
Srs. Deputados: Queria começar por dizer, Sr.ª Ministra da Justiça, que tem todas as razões para se orgulhar
do trabalho que realizou nos últimos dois anos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Saúdo também o Governo por ter escolhido a Sr.ª Ministra para intervir neste debate sobre o estado da
Nação, por uma razão: porque é nos momentos de crise que devemos valorizar o Estado de direito, é nos
momentos de crise que devemos valorizar os direitos, liberdades e garantias. E a intervenção da Sr.ª Ministra
foi a prova de que o Governo está efetivamente preocupado com os direitos, liberdades e garantias e com o
Estado de direito. Preocupado, no bom sentido.
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Aplausos do PSD.
Sr.ª Ministra, nada será como dantes, depois das reformas que fez na justiça durante estes dois anos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — As reformas foram da maior importância e vou realçar alguns aspetos
que não foram realçados propositadamente pelo Partido Comunista.
Em primeiro lugar, queria realçar o desequilíbrio institucional que havia em Portugal há dois anos. As
magistraturas não sentiam confiança na sua independência; os juízes não se sentiam verdadeiramente
independentes; os procuradores não se sentiam verdadeiramente autónomos. E, com a ação e a inteligência
de V. Ex.ª, hoje temos juízes que se sentem independentes e temos um Ministério Público que sente que goza
verdadeiramente de autonomia.
Esta é uma conquista fundamental para um Estado de direito e para a democracia.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Ministra, há um outro ponto que nos deve orgulhar a todos.
A Sr.ª Presidente: — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Refiro-me à reforma feita no processo civil. O processo civil foi objeto de
uma reforma que ficará para os anais da história.
Neste momento, temos um Código de Processo Civil que desvaloriza o aspeto formal e valoriza o aspeto
de mérito de todas as ações. Ou seja, temos o reconhecimento de direitos dos cidadãos de uma forma efetiva
e não de uma forma formal, como até aqui tem acontecido.
Sr.ª Ministra, não queria deixar de falar num ponto, sentido pena que não possa responder e sabendo que
tem resposta, que é o problema da corrupção, que sei que será uma preocupação sua daqui para o futuro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Também para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Pita Ameixa, do
PS.
O Sr. Luís Pita Ameixa (PS): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Queria, em
primeiro lugar, assinalar que este Governo tem de facto um problema com o Estado de direito, como o Tribunal
Constitucional repetidamente tem assinalado. Foi assim nos Orçamentos do Estado e foi assim no
enriquecimento ilícito.
Este Governo pretende gabar-se de ter feito um novo Código de Processo Civil, quando na prática o que
fez foi uma renumeração em larga escala dos artigos do Código, sem fazer uma reforma que se possa dizer
que tenha sido de fundo. E fez alterações no Código de Processo Penal que podem pôr em causa direitos
fundamentais.
Não mexeu na informática da justiça, uma informática que não está capaz de responder às alterações
feitas no Código de Processo Civil e às alterações feitas no Código de Processo Penal.
Temos um sistema prisional, Sr.ª Ministra, a que não foi capaz de dar resposta, com as prisões
sobrelotadas como não havia antes, tendo a Sr.ª Ministra parado a reforma que estava em curso nesse setor.
E tem agora presos acumulados nas prisões, que têm mais pessoas do que a sua lotação permite. Estes são
problemas que V. Ex.ª deixou agravar e não foi capaz de resolver.
Sobretudo, queria falar-lhe de uma outra questão, para explicar como a sua intervenção vem desmentir o
Sr. Primeiro-Ministro em larga medida.
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V. Ex.ª fez uma alteração fundamental em incumprimento ou com alteração unilateral do Memorando de
Entendimento que tinha sido assinado por Portugal e que tinha, aliás, a concordância do PSD e do CDS.
Refiro-me à organização judiciária.
Estava em curso um processo de reforma da organização judiciária, com a implementação de novas
comarcas — isso constava do Memorando. E o Governo alterou essa parte do Memorando unilateralmente,
sem envolver o Partido Socialista, sem dar ouvidos ao que dizia a oposição, sem querer fazer um acordo
nessa matéria. Alterando, aliás, um acordo para estabelecer um novo sistema de comarcas, que ignora os
interesses do País, que ignora os interesses do interior do País e que se foca, sobretudo, no encerramento em
larga escala de tribunais no interior do País, como já tinha encerrado freguesias e outros serviços públicos.
Essa é a má administração do Governo, é a má administração da justiça por parte do Governo e é,
também, um desmentido ao Sr. Primeiro-Ministro em relação às suas promessas de querer dialogar, porque foi
feito com base em alterações unilaterais ao Memorando de Entendimento, que foram feitas sem querer —
expressamente sem querer — envolver o Partido Socialista e contra a opinião do Partido Socialista.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, de Os
Verdes.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, se me permite, o Governo
tem legitimidade, como é óbvio — ninguém o questiona —, para escolher o membro que entender para falar
em qualquer um dos debates.
Todavia, nós não estamos num momento qualquer e os membros do Governo assumem responsabilidades
diferentes, também — não me refiro à política executada, porque ela é certamente do Governo. Ora, face a
estas últimas semanas, é estranhíssimo que o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros
demissionário não fale no debate de modo a poder sujeitar-se ao contraditório. Fará, provavelmente, a
intervenção de encerramento, sem que possa ser confrontado pelos grupos parlamentares com qualquer
questão.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Quero assinalar que consideramos isto profundamente negativo.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Mas esteve na comissão esta semana, sujeito a todas as
perguntas!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A leitura que fazemos, Sr. Primeiro-Ministro — legítima, julgo eu
—, é a de que não há, de facto, uma confiança entre membros do Governo, designadamente entre o Sr.
Primeiro-Ministro e o senhor, ainda ministro, que referi.
Por último, gostaria de dizer o seguinte: houve quem adivinhasse, Sr.as
e Srs. Deputados, designadamente
há dois anos, que daqui a uns tempos (por exemplo, neste futuro em que nos encontramos agora) estaríamos
nas condições em que estamos. E isto não quer dizer que alguém aqui seja bruxo, porque quem tivesse os
pés bem assentes na terra conseguiria medir exatamente as consequências da política absolutamente nefasta
do acordo com a troica e dos resultados que ela viria a ter a curto, a médio e, até, a longo prazo.
O Sr. Primeiro-Ministro continua a refugiar-se nas condições externas, alegando que não foram aquelas
que pensava que seriam. E o FMI continuará, de tanto em tanto tempo, a dizer que calculou mal os efeitos da
austeridade sobre a economia.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
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A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Ora, nós não podemos continuar nas mãos destas pessoas que
conhecem perfeitamente os efeitos das suas políticas na vida concreta das pessoas, mas fingem que esses
efeitos não irão acontecer e estão permanentemente a fazer promessas para o futuro que não acontecerão,
porque a alteração destas condições desgraçadas de desemprego, de recessão e de más condições para que
o País se consiga levantar e crescer sustentavelmente não pode advir destas políticas prosseguidas.
Além do mais, Sr.as
e Srs. Deputados, é muito triste estarmos perante um Governo que, face a erros
absolutamente crassos, como foi o do aumento do IVA na restauração, não consiga fazer sequer esse
«remendozinho» nas medidas que tomou, ou seja, retificando o que seria tão fácil e que é tão óbvio que foi
uma machadada na nossa economia e na delapidação da nossa economia.
Quando o Governo nem tem capacidade para ir a estes pormenores e a estes erros crassos, de facto
estamos perante um Governo que não serve rigorosamente para nada no que se refere à sustentabilidade do
País.
Isto é uma absoluta vergonha e sustenta, sim, Srs. Deputados, uma moção de censura que trará para
dentro desta Casa a voz dos portugueses!
Aplausos do Deputado de Os Verdes José Luís Ferreira e do PCP.
A Sr.ª Presidente: — Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência e dos
Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro da Presidência e dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Guedes): — Sr.ª
Presidente, a minha interpelação é sobre a condução dos trabalhos e tem a ver com o facto de a Sr.ª
Deputada que agora usou da palavra ter posto em causa o figurino do próprio debate, dizendo que o Governo
se teria furtado ao debate ao desvirtuar o figurino do debate sobre o estado da Nação.
Pedia, por isso, à Sr.ª Presidente que esclarecesse a Sr.ª Deputada e a Câmara que o figurino de
intervenções do Governo neste debate é rigorosamente o mesmo que foi praticado no debate sobre o estado
da Nação do ano passado, sem que tivesse havido qualquer crítica por parte da Câmara.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Ministro, não por memória mas por informação direta da Mesa, recordo que o
modelo foi exatamente o mesmo do ano passado.
Também para uma interpelação à Mesa, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, a minha interpelação é brevíssima, processa-se
nos mesmos termos da do Sr. Ministro e é apenas para alertar que tive o cuidado de dizer que estamos num
momento muito particular. E os portugueses sabem disso.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, passamos agora à fase de encerramento do debate, com a
intervenção do Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros (Paulo Portas): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs.
Deputados: Este debate sobre o estado da Nação acontece quando a Legislatura ainda não chegou a meio,
quando Portugal já atravessou dois terços da ponte que nos conduzirá ao fim do protetorado, na sequência de
problemas não negligenciáveis que afetaram o Governo em dois ministérios de Estado e que a maioria
superou com visão, profundidade e rapidez…
Risos do PCP.
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… e poucas horas depois de o Sr. Presidente da República ter colocado em cima da mesa uma iniciativa
de diálogo político.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Este debate tem, portanto, as suas
circunstâncias.
Sabendo que o País tem inquietações sobre o presente, devemos procurar tranquilizá-lo. Sabendo que o
País tem interrogações sobre o futuro, devemos procurar elucidá-lo.
Todas as situações políticas complexas podem ter solução desde que cada qual faça a sua parte. A
maioria fará a sua parte.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Os factos de 2011 fizeram Portugal perder a sua independência plena e introduziram o protetorado no mais
antigo Estado-Nação da Europa com fronteiras estáveis.
Como inúmeras vezes referi, nenhum português vive essa perda de independência plena sem um
sentimento pessoal e coletivo de humilhação. Quando a falta de dinheiro e de rigor na administração do
dinheiro que há leva o Estado a colocar-se na dependência extrema de quem nos empresta, financia e
condiciona — e foi nada menos do que isso o que aconteceu —, a primeira prioridade é reaver a plenitude da
independência e concluir em tempo e sem demora o período de assistência externa.
Poderemos ter, nesta Câmara, todas as diferenças naturais sobre o modo de o fazer, tendo em conta que
não decidimos sozinhos. Mas se algo nos devia unir nesta Câmara é precisamente o princípio democrático.
Assim como um país que não consegue financiar-se autonomamente é um país sem soberania plena, um
Governo e um Parlamento de um país sob assistência externa deverão fazer tudo o que está ao seu alcance
para recuperar a liberdade nacional, que é o pressuposto das nações soberanas.
Só controlamos inteiramente o que depende essencialmente de nós. Ora, os portugueses já fizeram um
caminho repleto de sacrifícios para voltar a ser cidadãos de um País, de um Portugal que controle
essencialmente as suas decisões.
Por isso, a precipitação de eleições quando a Legislatura ainda não chegou a meio, mas o Programa de
Assistência já está mais perto da casa de chegada do que da casa de partida, seria um erro que abundaria em
prejuízos e não alteraria, provavelmente senão para pior, a dependência externa.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É mais importante concentrarmo-nos todos na reconquista da independência do que perdermo-nos todos
na disputa sobre quem gere a dependência.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Por isso se demitiu!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Tanto me criticam por eu estar calado que,
quando eu falo, pedia para ser ouvido como eu vos ouvi!
Ninguém pode ignorar que o caminho feito tem um preço económico e social elevadíssimo. Bem sei que há
muitos críticos daquela regra de ouro que aconselha o equilíbrio orçamental, mas parece-me que os
portugueses, como nunca antes sucedera, tiveram consciência do preço de uma regra de chumbo. Excesso de
défice e excesso de dívida pagam-se duramente com excesso de desemprego e excesso de impostos.
Também aqui podemos aproveitar os dois tempos da Legislatura. É urgente manter a credibilidade externa
de Portugal e é essencial criar condições para uma confiança económica maior, porque o valor da confiança
gera investimento, o investimento gera crescimento e o crescimento torna viável a criação de emprego.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
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Se a recente previsão da Universidade Católica estiver certa, Portugal, ao fim de 10 trimestres em
recessão, ao cabo de 900 dias em recessão, poderá ter tido finalmente um primeiro sinal de mudança. É
apenas um sinal, mas pode fazer toda a diferença se não for um sinal interrompido.
Ao Governo compete potenciar essa mudança; à oposição democrática, parece-me, ajudar a consolidá-la;
às instituições em geral protegê-la.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Assim como o fim do protetorado não é o fim
dos constrangimentos, a mera hipótese do fim do pesadelo recessivo não é uma garantia em si, mas é uma
oportunidade que devemos agarrar com toda a força, com as duas mãos, a bem do País.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — É, aliás, uma oportunidade para aproximar
aquilo que ainda diverge, ou seja, a melhoria da perceção externa sobre Portugal e o ânimo dos portugueses
sobre a situação do País.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Queria também dizer algo sobre o facto de este debate acontecer
depois de a maioria ter superado problemas políticos não negligenciáveis.
Risos do PCP.
Ignorá-los não beneficiaria nem a humildade nem a verdade. Ter consciência da sua superação pode
beneficiar a esperança.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Que descaramento!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Sendo a maioria composta por dois partidos,
auxiliou-nos o conselho de quem deixou um legado impressivo e de quem tem a constância de um
ensinamento.
Quando não era sequer militante do partido a que presido, retive de um líder político absolutamente
invulgar, Francisco Sá Carneiro, uma grelha de avaliação para superar questões dilemáticas: primeiro,
Portugal; depois, o partido; por fim, a circunstância pessoal de cada um de nós.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Essa é uma citação «irrevogável»!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Acrescentaria que, em caso de opção entre o
interesse de Portugal e o do partido, deve prevalecer o de Portugal e, em caso de opção entre a razão de
partido e a razão pessoal, deve prevalecer a razão de partido.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — Foi com este espírito que a situação foi
superada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Foi-o, não com querelas de importância, mas avaliando, agora que estamos praticamente a meio do
mandato, as necessidades do futuro, começando pelo enfoque económico, decisivamente tão importante
como o financeiro, e garantindo melhor articulação e cooperação política entre os partidos da maioria.
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Porventura, também nos ajudou a doutrina de outro homem de Estado invulgar: Adriano Moreira. Se há um
traço no seu pensamento que é permanente, chama-se institucionalismo. O institucionalismo não obriga a
ignorar a consciência dos homens, mas vincula-nos a separar bem a consciência dos homens face ao
interesse das instituições, porque são as instituições que, em última análise, garantem o serviço dos povos e a
continuidade dos Estados.
Prefiro pagar um preço de reputação nas vossas intervenções, a não fazer o que posso e o que devo para
um futuro melhor.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Foi com este institucionalismo que a maioria trabalhou para uma solução sólida e abrangente, com tanto
desprendimento como compromisso, com mútua lealdade ao valor da estabilidade, sem renúncia à identidade
de cada qual.
Em tempo veloz porque as circunstâncias o exigiam, a maioria entregou ao Sr. Presidente da República,
para avaliação, uma solução governativa estável.
Creio ser manifesto que a sociedade, os parceiros sociais, os mercados, a maioria dos cidadãos,
registaram esse entendimento e sublinharam a evolução que continha.
O País tem uma maioria que apresentou uma solução ao Chefe de Estado. É uma solução que, bem
proximamente, demonstrará a sua confiança, vencendo, com naturalidade, a censura que foi hoje aqui
anunciada.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O terceiro elemento deste debate, tão importante como os
anteriores, é o valor do diálogo político. Reconhecerão as Sr.as
e os Srs. Deputados que, desde o primeiro dia,
defendi, aqui, nesta tribuna, e fora daqui, que a excecionalidade da situação de Portugal reclamava de todos
menos espírito de fação e mais atitude de uma só nação. Acredito profundamente nesse valor.
Como acontece no resto da Europa, a cultura de compromisso não apouca ninguém, engrandece, aos
olhos do País, quem o governa, porque revela a humildade de não confundir autoridade com arrogância, e
também engrandece quem deseja um dia governá-lo, porque revela a responsabilidade de perceber que,
depois de sermos um País intervencionado, Portugal não poderá voltar a ser governado como era
anteriormente, pelas lições que aprendemos, pelos compromissos externos que temos e pelo problema, não
ignorável, da sustentabilidade da nossa dívida pública.
O Sr. Pedro Lynce (PSD): — Muito bem!
O Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros: — O diálogo político deve, aliás, ser coerente
com a valorização do já adquirido e do que é possível e necessário para a frente, no âmbito da concertação
social.
Nessa sede de negociação institucional e operativa, faz-se isso mesmo: negociar, o que equivale a fazer
cedências de parte a parte. O foco é bem mais o dos resultados do que o da retórica. Ainda bem!
A vivacidade natural deste debate podia ter contaminado negativamente o esforço de diálogo que nos é
pedido pelo Presidente da República. Manifestamente, a contenção foi a atitude prevalecente, e isso aplica-se
tanto ao Governo como ao principal partido da oposição.
Tão-pouco ninguém cedeu à tentação de colocar condições impossíveis, o que significa que esse esforço
de diálogo, que precisa de se aproximar corajosamente da realidade das opções e que precisa também da
tolerância com as alternativas objetivas, dentro de uma margem de manobra que é o que é, pode e tem de
começar.
O excesso de crispação política não resolve nenhum dos problemas dos portugueses, fica cada um na sua.
Mas o que podemos construir em conjunto, sem prejudicar a posição institucional de ninguém, perde-se aos
microfones quando, manifestamente, podia ganhar-se na mesa de uma negociação.
Vamos fazer esse esforço!
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Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Foi a extrema-unção!
O Sr. João Semedo (BE): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, gostava de apresentar um protesto, em nome do meu grupo
parlamentar.
Vozes do PSD: — Ah!
A Sr.ª Presidente: — Em que termos?
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Semedo (BE): — Sr.ª Presidente, a minha bancada considera que é um desrespeito para com
o Parlamento e para com a Nação que o Primeiro-Ministro e o Governo tenham escolhido para encerrar o
debate sobre o estado da Nação o Ministro que se sabe que está demissionário.
Protestos do PSD.
A minha bancada reclama saber se o Sr. Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros retirou a sua
demissão ou se, então, todos os ministros já apresentaram a sua demissão.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado, o protesto fica registado.
O Sr. Ministro, por enquanto, ainda é ministro e, por isso, não posso dizer mais.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Tem a palavra, Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr.ª Presidente, desejava só informar a Câmara que já tinha informado o País
que não tinha aceite a demissão do Sr. Ministro Paulo Portas.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Faça favor, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr.ª Presidente, é apenas para informar a Câmara que aceitar ou não
um pedido de demissão compete ao Presidente da República.
Vozes do PSD: — Não, não!
O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Peço a palavra, Sr.ª Presidente.
A Sr.ª Presidente: — Sr. Deputado Luís Montenegro, tem a palavra.
Peço aos Srs. Deputados o favor de manterem a serenidade que, afinal, todo o debate teve.
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O Sr. Luís Montenegro (PSD): — Sr.ª Presidente, é, para através da Mesa, esclarecer também que não é
verdade aquilo que acabou de ser dito.
A competência do Sr. Presidente da República é exonerar ou não o membro do Governo. O pedido de
demissão é apresentado ao Primeiro-Ministro, que pode, também ele, aceitar ou não.
Mas, acima de tudo, Sr.ª Presidente, estivesse ou não qualquer pedido de demissão pendente — e, pela
informação do Sr. Primeiro-Ministro, não está porque o pedido não foi aceite —, a verdade é que o Governo e
todos os seus membros estão na plenitude de todas as suas competências e de todas as suas funções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E, Sr.ª Presidente, estando no exercício pleno de todas as suas competências e de todas as suas funções,
aquilo que se pede a todos os agentes políticos, em primeiro lugar, aos parlamentares, que representam aqui
a vontade do povo, é que o respeitem e que, se têm divergências políticas ou se, eventualmente, qualquer
membro do Governo não diz aquilo que eles queriam ouvir, ainda assim, devem continuar a respeitá-lo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, terminado o debate sobre o estado da Nação, desejo a todos muito
boa tarde.
Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Ministros, os meus cumprimentos.
Está encerrada a sessão.
Eram 13 horas e 50 minutos.
Presenças e faltas dos Deputados à reunião plenária.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.