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II Série — 3.º suplemento ao número 106

Quarta-feira, 16 de Junho de 1982

DIÁRIO

da Assembleia da República

II LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)

SUMÁRIO

Comissão Eventual para a Revlaáo Constitucional:

Acta da reunião de 23 de Abril de 1982.

Nota. — Até este momento, sobre a revisão constitucional, além do presente suplemento, foi publicado mais o seguinte:

2° suplemento ao n.u I06. de 16 de Junho de I982 (e mais o suplemento que nele se indica).

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 23 de Abril de 1982

O Sr. Presidente [Almeida Santos (PS)]: — Vamos retomar os nossos trabalhos. Tínhamos ficado no artigo 265.°, salvo erro. Creio, no entanto, que não havia nada sobre isto.

Artigo 168.° — Quanto a este artigo havia a constitu-cionalização das associações públicas. Havia uma proposta de trabalho de definição que seria a seguinte: «As associações públicas só podem ser constituídas para finalidades específicas. Não poderão exercer funções próprias das associações sindicais e terão organização interna baseada no respeito dos direitos e garantias dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos.»

O Sr. Vital Moreira tinha definido o princípio da excepcionalidade, que já estaria aqui no «só podem ser», em vez de «serão» (ver.são inicial).

Está aberta a discussão.

Dr. Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Creio que é essa a redacção, com mais ou menos apuramento, que satisfaz aquilo que me parecem ser quatro requisitos essenciais para as associações públicas: o principio da excepcionalidade, o da especificidade, o princípio não corporativo e o princípio democrático.

Do meu ponto de vista suponho que isso dava satisfação àquilo que a Constituição deve dizer, em matéria de associações públicas.

O Sr. Presidente: — Portanto, as associações públicas só podem ser constituídas (principio da excepcionalidade)

para finalidades específicas (princípio da especificidade), não podem exercer funções próprias das associações sindicais e têm organização interna baseada no respeito dos direitos e garantias dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos. Dr. Jorge Miranda, faça o favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta noção não está a ser criada em abstracto por nós, neste momento. Ela baseia-se na experiência, particularmente na experiência portuguesa depois do 25 de Abril, em que as ordens profissionais e de outras associações públicas, foram confrontadas com as tranfor-mações jurídicas, políticas e sociais entretanto ocorridas e em que os órgãos de fiscalização da constitucionalidade tiveram de definir certos parâmetros fundamentais.

Continuo a supor que se trata de noção não inteiramente satisfatória num puro plano científico, até porque não esgota todos os aspectos da matéria. Contudo, para o que nos interessa aqui o importante é que contenha princípios precisos, dentro dos quais a legislação ordinária se deve mover. E quanto a isso. parece ser adequada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, faça o favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Não tenho dúvidas em que se deva dizer, que as associações não poderão exercer funções próprias das associações sindicais e que terão uma organização democrática, embora o segundo aspecto seja relativamente dispensável, pois já resulta dos princípios gerais.

O que me levanta mais dificuldades é a primeira parte, pois não consigo perceber o que se quer dizer com isto: «Qualquer pessoa colectiva tem de ter sempre um objecto.» Específico é sempre. Ainda admitia que se dissesse que devia ser rigorosamente delimitado, mas também não sei o que isto quer dizer.

Mas. ao fim e ao cabo. as minhas objecções não são de fundo, pensando que poderíamos adoptar como base uma fórmula desta natureza, sem prejuízo de procurarmos uma definição mais rigorosa, pois esta não me parece sê-lo.

O Sr. Presidente: — Bom. o problema é que enquanto não a encontrássemos, podíamos ir perfilhando esta. depois se veria. Pergunto, agora onde é que sistematicamente

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querem colocar a definição, se no n." 3 ou se haverá um novo n.° 4?

Vozes imperceptíveis.

O n." 2 passaria a n.° 3 e o n.u 3 passaria a n.u 4. Muito bem.

Artigo 269.° — Há aqui duas reservas. Uma do CDS, relativamente ao n.° 2, e outra do PSD, relativamente ao n.° 3.

Dr Luís Beiroco. faça o favor.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — A reserva do CDS é apenas de redacção. Aliás o Dr. Nunes de Almeida compartilha também desta reserva, pois tem algumas dúvidas.

Creio, no entanto, que podemos fazer o mesmo com as associações, mantendo este texto, sem prejuízo de entretanto tentarmos aperfeiçoá-lo. Vamos ver se os técnicos conseguem dar uma ajuda nesta parte.

O Sr. Presidente: — Sim senhor. Em relação ao n.° 3 há uma outra reserva do PSD.

Dr. Amândio de Azevedo, faça o favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Em relação ao n.° 2. não penso haver grandes problemas. Em relação ao n.°3 é que. existe um problema de fundo, o qual não podemos deixar de considerar.

Uma vez que se pretende aqui garantir o recurso contra actos administrativos, independentemente da sua forma, creio que se deseja resolver a célebre questão de saber se-existe recurso contra actos de natureza legislativa, que na prática e materialmente se traduzam em actos administrativos.

Sobre isto. falaria com muito mais autoridade a minha colega Margarida Salema, mas, de qualquer modo, não tenho qualquer possibilidade de aceitar uma fórmula destas, pelo menos neste momento. Isto já foi suficientemente discutido. A maneira mais prática de resolver o problema seria não manter este inciso, independentemente da sua forma, sem prejuízo de mais tarde, no Plenário, alguém o pretender introduzir e, naturalmente, em última análise termos de defender as nossas posições ou até evoluir.

O Sr. Presidente: — Pela nossa parte manteríamos a nossa proposta.

Dr. Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, tudo está discutido e por ter sido bem discutido e esclarecido, é que me custa aceitar ou compreender a resistência do PSD em aceitar esta fórmula.

A verdade é esta: ou se quer que actos que violem os direitos dos cidadãos possam ser recorríveis por esses mesmos cidadãos — e esse é um princípio essencial de toda a legalidade, de todo um princípio de um Estado de Direito, ou não se quer. Se se quer, tem de se ir ou para esta fórmula, ou então, coisa que se me afigura ser pior, tornar inconstitucionais os actos legislativos que contenham actos administrativos

Isso levaria a sujeitá-los depois ao controle da constitucionalidade.

Parece-me ser um sistema bastante menos adequado e bastante mais pesado do que aquele que aqui se propõe.

Se se trata de um acto administrativo, se ele infringe direitos ou interesses legítimos dos cidadãos, o facto de revestir a forma de acto legislativo, não deve ser um meio de o furtar aos meios de controle da legalidade e de defesa dos direitos dos cidadãos.

Assim, das duas uma: se não se aceita isto, tem de se propor uma alternativa, sob pena de se incorrer na acusação justa de se admitir, num Estado de Direito Constitucional, que haja actos administrativos sem recurso, sem susceptibilidade de meios de defesa dos cidadãos. Porque, na verdade, é aquilo que existe hoje e essa situação não pode continuar, nem vendo como se pode justificar, em termos reais, que possa continuar. Como se justificará que possa haver actos que atinjam os direitos dos cidadãos e que estes não possuam meios que lhes permitam recurso?

É esta situação que se quer fazer manter, mas. se o é, então, digam-no claramente. Se o não é, então, não se pode legitimamente impedir uma fórmula destas, sem propor uma alternativa que, a meu ver, e, em todo o caso, seria menos adequada e coerente com o sistema constitucional que possuímos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A norma do n.° 3, tal como vem do texto da subcomissão e recolhendo uma discussão aqui havida, traz duas modificações relativamente ao texto actual do n.° 2 do artigo 269.°

Traz uma modificação no sentido do alargamento do recurso contencioso, na medida em que, hoje, a Constituição apenas garante recurso contencioso contra actos administrativos com fundamento em ilegalidade. A partir de agora vai, pelo contrário, passar a haver o direito de recurso contencioso relativamente a actos administrativos que violem os direitos dos administrados ou que lesem os seus interesses legalmente protegidos. Consagre-se. assim, a melhor doutrina e alargue-se um direito constitucional aos cidadãos.

O segundo ponto é a solução da questão doutrinal e jurisprudencial que hoje se põe. quanto a saber se há ou nào possibilidade de recurso contencioso de actos de conteúdo administrativo que revistam forma de lei. E a solução é também a melhor, ou seja. a positiva.

No tocante a este segundo ponto, quero, porém, frisar que, caso não venha a ser adoptada constitucionalmente a referência expressa à possibilidade de recurso contencioso de actos administrativos, independentemente da sua forma, a questão continuará em aberto, para ser dirimida pela jurisprudência, pela doutrina e. eventualmente, por lei de contencioso administrativo. A não se falar em actos administrativos, independentemente da sua forma, isso não quererá significar que se queira que haja apenas recurso contencioso de actos administrativos que venham a assumir a forma legal de actos administrativos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Procuro ser muito prático e evitar discussões, que não julgo terem um resultado muito palpável.

O Sr. Deputado Jorge Miranda acaba de nos fazer uma brilhante exposição sobre a problemática do n.° 2 do artigo 269.°, apenas se esquecendo de uma coisa: há, ainda, uma alteração mais, na medida em que se deixa de exigir que

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os actos administrativos sejam definitivos e executórios, o que tem a sua importância.

Penso que muito dificilmente se poderá aceitar esta alteração.

O problema que referiu ser um problema de fundo, é, de facto, um problema e cremos que todos o reconhecem, já foi discutido na Comissão de Revisão Constitucional e está muito longe de ser um problema líquido, evidente. E é exactamente por isso mesmo que penso que a melhor solução será não me comprometer desde já com a solução que aqui é defendida por alguns dos ilustres colegas e aguardar que no Plenário levantem este problema. Entretanto, o tempo nos permitirá uma reflexão e não está até excluído que venhamos lá a aceitar exactamente esta formulação.

Sem ser um administrativista, já que Direito Administrativo foi coisa que sempre estudei muito pouco na Faculdade, sempre me permito dizer que há solução para o problema que aqui fica em aberto, caso não venha a ser consagrado o teor desta proposta.

O que acontece é que um determinado acto legislativo não é válido porque não obedece eventualmente aos requisitos constitucionais e, desse modo, não é susceptível de recurso administrativo, mas pode ser susceptível de recurso adminstrativo, mas pode ser susceptível de impugnação por outros meios, nomeadamente o dos tribunais comuns. Não sei. Não queria estar a arriscar muito, mas de qualquer maneira a minha ideia fundamental ...

O Sr. Vital Moreira (PCP): — (Imperceptível.)

O Orador: — Talvez seja uma das tais asneiras que digo, mas também não tenho muitos problemas, pois quem não se arrisca a dizer asneiras também tem futuro muito triste, Sr. Deputado Vital Moreira. Aliás, na minha Faculdade, nos tempos que por lá andei, os professores animavam os alunos até a serem audaciosos, mesmo com risco de dizer asneiras, pois aqueles que eram muito cautelosos não iam muito longe ...!

O Sr. Vital Moreira (PCP): — (Imperceptível.)

O Orador: — Com certeza. Não tenho problema nenhum. Tenho consciência de que cometo muitas asneiras na vida, mas não me importo nada de correr esse risco.

Portanto, voltando a um plano mais sério (um pouco de jocosidade também não faz mal a ninguém), penso que ninguém perderá com esta solução. Neste momento não estamos em condições de retirar as reservas que colocámos e, portanto, em princípio ficaria o texto do n.° 2. tal como está no artigo 269.° Era assim que iria para o Plenário, mas lá. como é natural, os partidos da oposição reporão esta proposta, ela será discutida e desde já não digo ser impossível virmos a modificar a nossa posição.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado .Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDl): — Apenas quero fazer um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

Sr. Deputado, a posição do PSD seria a de que relativamente ao n.° 3. vindo do texto da subcomissão, era apenas eliminada a menção «independentemente da sua forma» e o resto subiria a Plenário, ou ficaria pura e simplesmente um n.° 3 igu.il ao 2 do actual artigo 269.°'?

Quanto à outra problemática, parecia-me que teria aqui havido um certo consenso, no respeitante à consagração dessa ideia de alargamento do recurso contencioso — de resto na linha da boa doutrina, designadamente do professor de Direito Administrativo do Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Não tenho objecções nenhumas ao alargamento do recurso administrativo aos actos que lesem interesses legalmente protegidos e penso que se deve manter a exigência do carácter definitivo e executório dos actos administrativos.

A minha disposição fundamental é esta. Não tenho ideias assentes, nem estou convencido de que esta seja a boa solução. Sem estar a querer «fechar a porta», admitindo que venhamos a evoluir, não queria comprometer-me agora. Penso que isto não é importante e, portanto, ficaria como está — o n.° 3 igual ao n.° 2 — sem prejuízo de depois vir a ser alterado.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, a consideração de que afinal isto tem de vir a ser consagrado pela própria natureza das coisas, é que me leva a não atribuir aquilo que acaba de suceder, a gravidade que efectivamente tem.

De facto, a reformulação no sentido negativo que o PSD acaba de fazer em relação a esta matéria, é, a meu ver, de uma tal gravidade que sou levado a pensar que aqui não se aplicaram as regras comuns de decisão que devem presidir à revisão constitucional.

Na verdade, não estão aqui em causa matérias de projectos de sociedade, nem de projectos políticos. O que aqui nos divide, é pura e simplesmente isto: se queremos ou não que a Constituição seja clara e inequívoca a respeito desta questão tão simples, que ao fim e ao cabo é das que está no princípio de toda a Constituição — saber se os cidadãos têm ou não meios de recorrer dos actos do poder que atinjam os seus direitos.

Isto figura desde o princípio da história do constitucionalismo e custa-me a admitir que não viesse a ser consagrada uma norma desta natureza.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD). — Sr. Deputado Vital Moreira, se a coisa é assim tão evidente, se realmente é quase ilegítimo colocar dúvidas a este respeito, porque é que V Ex.a e o Sr. Deputado Jorge Miranda, ilustres constitucionalistas, não consagraram a fórmula certa na Assembleia Constituinte em 1975?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Porque nunca admiti que mesmo com a fórmula que lá está. se continuassem a defender situações de «antes do 25 de Abril» e que houvesse deputados e pessoas como o Sr. Deputado Amândio de Azevedo que continuassem a admitir que possa haver actos do poder atentatórios de direitos, sem possibilidade de recurso.

Porque fora esta solução, não adiantou outra. E para além da audaciosa sugestão que fez. mas que não concretizou, pois me parece impossível fazê-lo. ficou sem resposta esta questão fundamental — os actos administrativos que revistam forma legislativa, como podem ser objecto de recurso por parte dos cidadãos? Esta resposta não veio e enquanto não vier sinto-me com legitimidade para dizer que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo e o PSD

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admitem poder haver actos administrativos que não garantam aos cidadãos por eles atingidos o respectivo e o devido recurso.

O Sr Amândio de Azevedo (PSD): — Uma última observação ligeiríssima. Sr. Deputado Vital Moreira, não atribua maior força do que aquela que deriva das minhas afirmações. Não me coloquei nem em situações categóricas, nem dogmáticas, apenas disse não estar, neste momento, em condições de retirar as reservas, considerando mais prático que o assunto possa vir a ser discutido no Plenário. E em relação a isso, manifestei muita abertura.

O Sr. Presidente: — Direi, igualmente, qualquer coisa. Também tenho pena e peço ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo para, se puder, rever a sua posição.

Esta era uma das normas da nossa proposta de que mais me orgulhava. Porque, na prática, acontece o seguinte: hoje só há recurso dos actos definitivos e executórios, significando que sempre que um acto administrativo de natureza normativa e genérica é publicado, e se sabe de antemão que afecta qualquer cidadão, o cidadão fica com aquela «espada de Dâmocles» em cima da cabeça, tendo que aguardar que haja um despacho decorrente dessa norma para que os efeitos em relação aos seus próprios interesses se produzam. E quando houver esse despacho, só então ele se torna definitivo e executório e assim dele cabe recurso.

Ora esta situação não faz sentido e semrpe assim se entendeu.

Pois se se sabe de antemão, que há uma norma que terá que acabar por ser aplicada ao senhor fulano de tal, e esse senhor vai ser lesado nos seus direitos ou interesses, não há qualquer razão para que esse senhor não possa atacar a fonte, sem estar à espera de um acto concreto de aplicação do acto administrativo normativo ao caso concreto!

Sempre se entendeu que isto é um disparate e lá fora penso que serão raros os países em que se fica à espera da aplicação por despacho de uma norma a um cidadão. Hoje é assim e o que se pretendia aqui era que deixasse de ser. Pretendia-se que desde que um acto normativo (de natureza administrativa) pudesse lesar direitos ou interesses legitimamente protegidos de qualquer cidadão, esse cidadão pudesse atacar o acto normativo, desde que fosse de natureza administrativa.

Isto não é uma grande novidade, mas uma pequeníssima concessão que em todo o caso vinha facilitar a vida aos cidadãos. E o outro aspecto é este: enquanto hoje isso só se processa com fundamento em elegalidade, passaria a ser também com fundamento em lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos.

A meu ver. trata-se de um alargamento mais que justificado. Para que se exige uma ilegalidade formal, se puder haver uma lesão de interesses legalmente protegidos? Deve o Estado manter-se indiferente ou deve o Direito manter-se indiferente a uma lesão de direitos, exigindo-se uma concreta e clara ilegalidade?

No fundo é isto. Não há um salto tão grande como isso e. portanto, pedia ao Dr. Amândio de Azevedo que, se pudesse, alterasse a sua posição para a seguinte: deixar ir este texto com o compromisso de que esta tese será discutida mais profundamente no Plenário e todos nós procuraremos obter o parecer de especialistas em Direito administrativo. E até talvez se justifique o pedido de um parecer a um ou dois dos especialistas, sem prejuízo de podermos voltar ao actual n.° 2. Porque se isto não vier a ser aprovado, o n.° 2 será recuperado.

Portanto, não peço uma concordância com o que aqui está, mas sim que deixemos ir isto no texto, até porque tem, de certo modo, uma unidade com o número anterior. Peço isto com o nosso compromisso de que todos temos dúvidas, devido a tratar-se de uma matéria altamente especializada e se não for possível colocarmo-nos de acordo no Plenário, voltaremos ao n.° 2 actual.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, concorda?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Quanto a mim, penso que essa não é a melhor solução, pois não vejo como é que as coisas se irão passar. Se o PSD não apoiar, o que é que acontece? Não atinge 2/3-

O Sr. Presidente: — Não faz mal, nessa altura fica o nosso compromisso de que foi assim que subiu, com essa condição.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Tenho uma série de dúvidas, que até posso explanar. Já disse e, aliás, o Dr. Almeida Santos acaba de dar a razão fundamental: não se trata de uma questão política. Tem muito de técnico e não domino completamente o Direito administrativo, nem até agroa tive ocasião de ter um parecer suficientemente sólido acerca desta matéria.

Mas o que sei, é suficiente para ver certas coisas. Por exemplo, esta fórmula parece-me altamente equívoca — diz-se que é garantido com quaisquer actos administrativos. Uma-portaria é um acto administrativo? Não ...

O Sr. Presidente: — Pode ser ou pode nào ser.

O Orador: — Mas então digam «substancialmente administrativo». A meu ver, esta fórmula está longe de ser rigorosamente correcta.

O Sr. Presidente: — Tem que ser um acto administrativo.

O Orador: — Temos discutido muito isto, sabendo muito bem o que é que se pretende. Mas, para mim. a fórmula é altamente insatisfatória.

Por outro lado. deve eliminar-se o carác:er executório e definitivo dos actos ...

O Sr. Presidente: — Sou da mesma opinião, também penso que se deve eliminar.

Mesmo na minha vida profissional, muitas vezes estive à espera. Era publicada uma portaria com carácter administrativo e já se sabia que vinha dirigida à empresa A ou B e tínhamos de estar à espera que acabasse por ser concretizado um despacho formal de aplicação para se tirar uma consequência da portaria, para se poder recorrer!

Ora isto não faz sentido, podendo eu logo recorrer da portaria! Isso evitaria inclusivamente que ela fosse sendo aplicada a outros indivíduos, sem capacidade de recurso, que nem sabiam que tinham direito de recorrer, etc.

Quanto a mim, penso que isso seria uma grande vantagem. No mínimo, seria um ganho de tempo, pois vai atacar-se a fonte em vez de se estar à espera que a água desça e chegue à boca.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Admito que isto •fique no relatório, mas com a reserva do PSD. Não assumo compromissos, pois não estou em condições de o fazer.

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0 Sr. Presidente: — Sim senhor.

Artigo 270.° — Temos aqui o magno problema das restrições que a lei estabelecerá a actividades políticas por parte de militares e agentes militarizados.

Dr. Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Penso que a restrição que se incluiu no artigo 270.°, não é suficiente. Não resolve integralmente o problema colocado, das restrições ao exercício dos direitos e liberdades por militares ou elementos das forças militarizadas e de segurança, uma vez que se refere apenas às actividades políticas.

Por isso. penso que seja de ponderar que o facto de haver duas restrições em duas disposições diferentes parece inconveniente. Deve haver só uma disposição, onde o problema seja resolvido, ou em sede de direitos, liberdades e garantias ou em sede do título sobre defesa nacional e Forças Armadas.

Pessoalmente, não gostaria de uma norma aberta que permitisse à lei restringir livremente o exercício de qualquer direito, inclinando-me mais para uma solução do tipo da que consta da Lei Fundamental da República Federal da Alemanha, que enumera taxativamente quais são os direitos que podem ser restringidos.

E desejava pedir ao Dr. Jorge Miranda e ao Dr. Vital Moreira que pensassem nisto e propusessem uma solução concreta, vendo os exemplos de direito comparado e que. enfim, fosse uma solução aceitável, sem se ir demasiado longe nestas matérias, o que também me parece não ser prudente, nem aconselhável.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente. Srs. Deputados: No essencial concordo com o que acaba de ser dito pelo Sr. Deputado Luís Beiroco.

A meu ver. poderia considerar-se já suficiente para a colocação ou para a resolução do problema posto a norma constante do n.° 4 do artigo 275.°. segundo o texto da subcomissão, interpretada na perspectiva global do sistema constitucional. Decorre dessa norma e do sistema de valores da Constituição que há um certo número de direitos, liberdades e garantias, em relação aos quais tem de haver restrições quanto aos militares e agentes militarizados.

No entanto, pode entender-se que esta consideração seria demasiado genérica e vaga. que se trata de matéria altamente sensível e que. a ser assim, a lei ordinária, mesmo sujeita a um princípio de proporcionalidade, poderia, por ventura, ou ser demasiado branda nas restrições, ou pelo contrário (e seria isso o mais a recear) ser demasiado extensa e severa nas restrições que estabelecesse aos direitos, liberdades e garantias dos militares e agentes militarizados.

Por isso. talvez a melhor solução consiste em no artigo 275.° se estabelecer um novo número, prescrevendo especificamente, de harmonia com uma regra de tipicidade, os direitos, liberdades e garantias dos militares, bem como dos agentes militarizados, que poderão vir a ser restringidos em virtude da natureza e da função das Forças Armadas e das Forças de Segurança.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — O único problema que se põe. em ser no artigo 275.". é que não me parece ser muito correcto, até devido à sistemática da Constituição, que se vá dizer alguma coisa sobre os elementos das

Forças de Segurança no título referente à Defesa Nacional e às Forças Armadas.

Isso era capaz de ser uma matéria delicada.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Reconheço que a colocação no artigo 275.°, relativamente aos agentes militarizados, não será inteiramente correcta. No entanto, note o Sr. Deputado o próprio termo «agente militarizados», ou agentes aos quais se aplica extensivamente, por analogia um certo tipo- de regime a que estão sujeitos os militares. A própria designação corrente «agentes militarizados», já inculca esta ideia e não deverá provocar dificuldades.

Não insisto, porém, sobre isto.

Pelo contrário, oponho-me à abertura de um novo preceito no artigo 18°, pois este tem, dentro do sistema constitucional, uma função ordenadora genérica e sofreria uma degradação se para lá dos grandes princípios, aplicáveis a todos os cidadãos e em quaisquer situações, se fosse especificamente abrir um número relativo aos militares e aos agentes militarizados.

Aliás — também importa dizer — poderá haver ainda outras restrições decorrentes do sistema constitucional e que. então, a não estarem previstas no artigo 18.°. poderiam vir a ser consideradas ilegítimas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Não estou inteiramente de acordo. Tenho dúvidas que no respeitante, por exemplo, a forças da PSP, as restrições, que se justificam igualmente, sejam inseridas no capítulo da Defesa Nacional das Forças Armadas. Julgo que ficaria muito melhor no artigo 18.°, que é o artigo que diz quais as garantias dos direitos fundamentais dos cidadãos e quais as restrições que podem sofrer.

Mas, não penso que valha a pena fazer uma grande discussão a esse respeito. Creio haver um consenso generalizado no sentido de ser necessário estabelecer algumas restrições. Estamos ainda muito longe de encontrar uma fórmula susceptível de ser aceite pelo menos por 2/3 dos deputados. Creio ser uma questão que pode continuar em aberto e a seu tempo, encontrar-se para ela a melhor solução.

Mas a minha tendência é para pensar que o melhor local para se resolver o assunto é o artigo 18.° e não qualquer outra disposição.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, independentemente da nossa posição quanto ao fundo, a qual ainda não foi explicitada (nem ainda a adoptámos), creio que a colocação do artigo 275.° não é a adequada, pois o artigo refere-se às Forças Armadas, enquanto organização e não aos militares enquanto sujeitos ou membros das Forças Armadas.

Seria, portanto, digamos, dar um novo código de entrada no artigo 275.° e julgo não ser aí a colocação correcta. Também não vejo bem (pelo menos para já) metê-la no capítulo dos Direitos fundamentais. A questão da colocação é relativamente menos importante do que a questão de fundo, valendo talvez a pena. primeiro avançar, se possível por parte dos partidos que até agora propuseram propostas de fundo para poderem ser apreciadas, designadamnte pela nossa parte, do que resolver previa-

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mente a questão da colocação que, a nosso ver, é secundária.

O Sr. Presidente: — Pessoalmente devo dizer que também tenho algumas dúvidas quanto à colocação. Mas, à primeira vista, diria que o local mais indicado é o n.° 3 do artigo 270.°

Todavia, os militares têm uma resistência muito grande a serem considerados funcionários públicos. É uma coisa terrível. Talvez tenham algumas razões, mas a última coisa que aceitam como normal, é serem considerados, ainda que implicitamente, funcionários públicos.

Por mim, era aqui que ficava, no n.° 3 do artigo 270.°

Mas, independentemente da colocação, talvez devêssemos trocar algumas impressões sobre o problema de fundo — restrições estamos dispostos a admitir, em termos casuísticos, ou em termos genéricos. Este é que é o problema!

Dr. Amândio de Azevedo, faça o favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Podia adiantar alguma coisa, sem pretender ter ideias definitivas a este respeito, mas parece-me bem que comecemos a adiantar alguma coisa sobre esta matéria, pressuposto que estamos sensíveis à necessidade de estabelecer algumas restrições a alguns direitos consagrados na Constituição, no respeitante aos elementos das Forças Armadas, das forças militarizadas e das forças de segurança.

Este problema foi resolvido pontualmente na Constituição espanhola, no artigo 28.°, n.os 1 e 2, relativamente à liberdade sindical e ao direito de petição, respectivamente, a Constituição alemã tem uma disposição genérica estabelecendo determinadas limitações, e se não estou em erro, julgo ser o artigo 17.° que diz o seguinte:

1 — As leis sobre serviço militar e sobre serviço em sua substituição, podem estabelecer restrições aos direitos fundamentais dos membros das Forças Armadas em combate e do serviço de substituição relativamente à livre difusão das suas opiniões pela palavra, por escrito e pela imagem, à liberdade de reunião e ao direito de petição, na medida em que este envolva o direito de apresentação colectiva, representação e queixas.

2 — As leis de defesa nacional, entre as quais as de protecção das populações civis, podem prever restrições aos direitos fundamentais de livre ... (tenho aqui uma abreviatura, a qual neste momento não consigo decifrar).

Esta norma está redigida um pouco à maneira alemã, não sendo bem o nosso estilo, mas de qualquer modo poderíamos adoptar um método semelhante. Isto é, havia uma disposição deste género, que teria de ser, a meu ver, no capítulo dos direitos, liberdades e garantias, podendo admitir restrições a certos direitos, concretamente identificados pela Constituição, relativamente a militares, nestas ou naquelas circunstâncias. Isso depois seria uma coisa a ver já mais em pormenor.

Estaríamos dispostos a colaborar numa via desta natureza e, a meu ver, isso iria dar satisfação, se não total, pelo menos em boa medida, às preocupações que chegaram até: nós, pela via de um ofício do chefe do Estado-Maior-Ge-neral das Forças Armadas.

A proposta do chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas é a seguinte:

O exercício dos direitos fundamentais poderá ser restringido pela lei aos elementos militares e civis das

Forças Armadas e das forças militarizadas ou das forças de segurança — esta parte foi acrescentada por mim —, na estricta medida em que tal seja exigido para assegurar o cumprimento dos seus deveres e funções legais ou por exigência da segurança e defesa nacional.

Esta norma segue um método diferente da alemã. Em vez de dizer em concreto quais os direitos a restringir e as circunstâncias em que o podem ser, no fundo, admite que a lei estabeleça restrições, dentro de um quadro e dum critério aqui definido por fórmula um pouco genérica.

Não tenho muito receio da lei ordinária. Penso que os deputados são responsáveis e se a Assembleia à democrática (como é evidente) pode, em cada momento, sobretudo com uma maioria qualificada, avaliar os problemas com a mesma profundidade e segurança com que os avalia uma Assembleia com poderes constituintes. Não vejo que diferença possa existir. A única, é a maioria qualificada. Se a maioria for diferente, naturalmente poder-se-á prever que haja mais facilidade em adoptar certas soluções. Mas, se a maioria for a mesma, em qualquer momento, em sede de revisão da Constituição ou em sede de lei ordinária, há sempre as mesmas garantias de que se não dão passos que não sejam justificados nesta linha.

Pessoalmente, penso que é uma solução muito mais prática e susceptível de adaptar mais a lei às realidades concretas da vida, e às circunstâncias de cada momento. E, no fundo, o nosos objectivo é esse. Portanto, inclinar--me-ia para uma fórmula genérica do estilo da do chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, mas exigindo, para a aprovação das leis que estabelecessem restrições aos direitos fundamentais, a maioria de 2/y

Penso que isto garantiria o mesmo cuidado e amplo consenso, e seria susceptível de dar resposta a todas as exigências que viessem a ser postas ao país nessas matérias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Penso que poderíamos, na procura de um consenso, assentar em certas questões.

Em primeiro lugar, consideraríamos apenas a possibilidade da restrição dos direitos aos militares e aos elementos das forças militarizadas ou de segurança, excluindo — já que isso não se justifica plenamente — os elementos civis ao serviço das Forças Armadas.

Em segundo lugar, penso que em vez de uma norma aberta que permita restringir todos os direitos, parece-me preferível a enumeração taxativa dos direitos que podem ser restringidos.

Em terceiro lugar, a sugestão do Sr. Deputado Amândio de Azevedo de exigir maioria qualificada é também de ponderar.

Em quarto lugar, quanto ao lugar sistemático onde deve ser incluída uma norma deste tipo, penso que o título relativo à função pública, ainda que tecnicamente pudesse ser uma solução defensável e, porventura, muito boa, há no entanto razões que já foram apontadas pelo Sr. Deputado Almeida Santos que aconselham a que não façamos isso. Se o fizéssemos, seria uma atitude verdadeiramente acintosa desta Comissão. As Forças Armadas não podem pretender dizer que não são funcionários, mas são funcionários especiais, não aceitando ser considerados como função pública, nos termos dos restantes funcionários e por isso a solução poderia ser muito mal recebida.

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Penso, por outro lado, que a inclusão no título das Forças Armadas, para além do inconveniente que já tinha apontado de não ser sistematicamente conveniente meter depois questões relativas a forças de segurança no capítulo das Forças Armadas, tem mais esse grave inconveniente que o Sr. Deputado Vital Moreira apontou: toda a organização do título está à volta do conceito de Defesa Nacional e de Forças Armadas e não dos militares, individualmente considerados. Por isso, parece-me que se ia introduzir uma vertente nova naquele título, que penso estar bastante bem concebido e cuja mudança não é conveniente.

Resta-nos, portanto, a questão da inclusão em sede de direitos, liberdades e garantias. Também estou de acordo com o Sr. Deputado Jorge Miranda, que um novo número no artigo 18° iria degradá-lo.

Por outro lado, se fosse uma norma aberta seria muito mau constar de um artigo autónomo. Mas, se for uma enumeração taxativa dos direitos que podem ser restringidos, creio que, neste caso, não haverá inconveniente algum que possa ser um artigo autónomo.

Deixava aqui esta sugestão para que fosse ponderada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, faz favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tinha aqui uma pista de solução, para eventual ponderação. E uma fórmula que corresponderia às ideias que aparece merecerem um certo consenso nesta Comissão: a necessidade de um preceito expreso; o princípio da tipicidade das restrições; e, finalmente, uma expressa menção da funcionalidade dessas restrições, a adequação dessas restrições às funções das Forças Armadas.

Essa pista de solução seria mais ou menos assim: «A lei pode estabelecer restrições aos direitos de expressão, reunião, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e dos agente militarizados no activo, na estrita medida das exigências das suas funções próprias.»

Por outro lado, a sugestão do Sr. Deputado Amândio de Azevedo no sentido de esta lei vir a ser aprovada por maioria de 2/3. parece-me altamente positiva e de acolher.

A sede própria para se contemplar a prescrição da maioria de Vj não seria esta. Seria no capítulo da competência legislativa da Assembleia da República. Mas, para ficar o problema já resolvido, poderia pôr-se aqui: «A lei aprovada por maioria de :/3 •••»•

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Nunes de Almeida, faz favor.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Continuo a considerar que a sede mais adequada para este artigo é no título respeitante à Administração Pública.

O capítulo da Administração Pública não é um capítulo sobre função pública, como há pouco decorria das palavras do Sr. Deputado Luís Beiroco.

Em segundo lugar, nesse capítulo faz-se expressa referência, por mais que uma vez — embora no nosso projecto fosse mais clara —, a funcionários e demais agentes. Não tenho a menor dúvida que nestes últimos se abrangem os militares e os agentes das forças militarizadas. São agentes do Estado. Suponho ser uma questão pacífica.

E mais: ainda ontem discutimos esta matéria a propósito de outra questão e parecia haver alguma unanimidade das intervenções feitas, no sentido de que os serviços militares se incluem na orgânica normal dos serviços públicos.

Podem ter especificidades e um tratamento especial em alguns casos, todavia ninguém dúvida que se trata de agentes do Estado.

Por outro lado, a inclusão desta matéria tem dois aspectos que mé-parece não" deverem ser protegidos: em primeiro lugar, torna claro que os militares têm os restantes direitos respeitantes aos agentes do Estado. Vêem expressos nestes artigos, designadamente os respeitantes aos processos disciplinares. Parece-me ser importante clarificar que se aplicam também aos agentes militares e militarizados. É conhecido um certo laxismo nessa matéria e não era inocentemente que, quando fazíamos a referência à excepção, que agora é alargada, no artigo 270 °, a fazíamos neste sede. Tal tinha como finalidade tomar claro que os militares não estão fora das regras que aqui se encontram expressas neste título.

Por outro lado, toma claro que restrições deste tipo não são legítimas relativamente aos restantes funcionários.

Continuo, portanto, a supor que não há qualquer razão para melindres ou problemas, devendo ser neste título que esta forma se deve situar. Não é uma norma de carácter geral para estar nos princípios gerais sobre os direitos, liberdades e garantias, não me parece que seja adequada a sua localização num título que é sobre a Defesa Nacional. É aqui o local adequado, por todas as razões apontadas para que uma norma deste tipo seja localizada.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Vital Moreira, faz favor!

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, apenas duas notas. Em primeiro lugar a questão do regime, na formulação agora sugerida pelo Sr. Deputado Jorge Miranda. Ainda sem exprimir uma oposição, a qual não estamos de momento em condições de fazer, sugeriria que se tomasse em consideração o seguinte: não resultará muito claramente da regra uma coisa que a mim me parece evidente. A medida de restrições a agentes das Forças Armadas não tem de ser necessariamente a mesma do que a das forças militarizadas.

Isto é. posso imaginar que haja estrita necessidade de estabelecer certas restrições em relação a um ou outro direito, relativamente aos agentes militares, e não as ver justificáveis em relação às forças militarizadas. Não sei se uma separação gráfica normativa em duas regras ou uma formulação que estabelecesse figurativamente essa distinção, não se justificaria na norma que viesse a ser consagrada.

Em segundo lugar, existe a questão da colocação. Creio que os argumentos agora aduzidos pelo deputado Nunes de Almeida são importantes e merecem consideração, pois incluir esta matéria aqui. não é apenas uma questão de fazer valer esta norma no lugar mais próprio. É também fazer valer para os agentes do Estado, de natureza particular (é certo que são os militares), um conjunto de outro enquadramento jurídico, sobretudo em matéria de direitos e garantias.

Creio que poderíamoss ultrapassar as objecções que possam ter algum fundamento do deputado Luís Beiroco. fundamento, digamos, não nesta sede própria, porque se se reivindica uma certa colocação constitucional das Forças Armadas, então não compreendo como é que se quer agora afastar os seus elementos da própria consideração que são agentes do Estado! É óbvio que são.

Talvez se fizéssemos, por um lado. uma separação gráfica em termos de norma própria, não metida no n.° 3. mas sim num número à parte, se colocássemos outra

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rubrica no artigo 270.° e até porventura no título onde se diz «regime da função pública», acrescentando-se «e dos agentes do Estado», passando o capítulo da «Administração Pública» a «Administração Pública e regime dos agentes do Estado». Talvez fosse uma via a explorar no sentido de salvaguardar duas coisas. Por um lado, a especificidade, como agentes do Estado, dos militares (estaremos de acordo, suponho, em admitir essa via) e, por outro lado, em não os colocar à parte, não os separar do Estado, pois eles são efectivamente seus agentes e, sobretudo, não deixar de os enquadrar na sede própria, garantindo-lhes não apenas essa sede para eventuais restrições que haja a consagrar ao exercício dos seus direitos, mas também os direitos que, como todos os agentes do Estado, devem gozar.

E uma sugestão que faço a título pessoal, não a tendo sequer considerado com os meus camaradas de partido aqui presentes. No entanto, creio poder vir a ser uma via a explorar.

O Sr. Presidente: — Temos aqui mais uma pista, a meu ver com virtualidades.

Alguém quer usar da palavra, a fim de se pronunciar sobre isto?

Dr. Vital Moreira, qual era a sua proposta em concreto?

O Sr. Vital Moreira (PCP): — A minha propsota era que esta norma a vir a ser considerada, fizesse parte, não de um número já existente do artigo 270.°, mas sim de um número à parte, desse mesmo artigo, e que a rubrica também fosse alterada. Em vez de se dizer «regime da função pública», dizer-se «regime da função pública e dos agentes do Estado», ou então «regime dos funcionários e demais agentes do Estado».

Uma fórmula deste género, que permitisse claramente uma referência à particularidade e especificidade dos militares e dos agentes das forças de segurança militarizadas, como agentes do Estado. Se fosse necessário, alterava-se também a própria rubrica do artigo. Onde se fala em «Administração Pública», acrescentar-se mais qualquer coisa.

O Sr. Presidente: — Aí é que talvez não haja necessidade.

Temos esta proposta que, em concreto, seria a seguinte: no artigo 270.°, aditava-se um novo número, mais ou menos com a redacção proposta pelo Dr. Jorge Miranda, e sugeriria que onde se fala em «restrições aos direitos» se dissesse «restrições ao exercício dos direitos».

Está certo, Dr. Jorge Miranda? Muito bem.

O artigo 270.°, em vez de dizer «regime da função pública», passaria a ter como epígrafe qualquer coisa neste género: «regime dos funcionários e agentes do Estado». Em ultima análise poderíamos ainda encarar a possibilidade de alterar a própria epígrafe deste capítulo. No entanto, isso parece-me inútil, pois não está em causa que esteja fora da Administração Pública.

Se concordassem, sem prejuízo de melhor reflexão, ficaria assim de momento.

Quanto ao actual n.° 3, começaria em «Os funcionários e agentes do Estado e das entidades públicas, não podem ser prejudicadas ...». Cortava-se «sem prejuízo das restrições que a lei estabelecer às actividades políticas por parte de militares e agentes militarizados». Ou deixávamos ficar?

Este ficaria na mesma, não é? Nessa altura, se isto fica. tirávamos daqui a capacidade eleitoral.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Exacto.

O Sr. Presidente: — Mantinhamos no n.° 3 «sem prejuízo das restrições que a lei estabelecer a actividades políticas por parte de militares e agentes ...», e na proposta do Dr. Jorge Miranda, tirávamos a referência à capacidade eleitoral passiva.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — (Imperceptível.)

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Parece-me é que a alteração do n.° 3 deixa de ter justificação, pois está consumido pelo novo número proposto.

O Sr. Presidente: — É uma hipótese. Outra será o deixar ficar.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — É isso. Abrange exactamente essa. Aliás, essa fórmula que vinha no vosso projecto, era para abranger genericamente coisas que agora o estão na proposta do Dr. Jorge Miranda.

O Sr. Presidente: — Portanto, o artigo 270.°, 2, ficaria como está hoje!

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Virai Moreira (PCP): — Sr. Presidente, como é que está o artigo, hoje, aí no texto?

O Sr. Presidente: — Está assim: «todos os cidadãos têm direito de acesso, em condições de igualdade ...»

O Sr. Vital Moreira (PCP): — É que esse n.° 1 é redundante. Está repetido e como tal deve sair daí, pois está já adquirido lá atrás.

O n.° 1 sai, o n.° 2 do texto passa a n.° 1, com a alteração que aí está. O n.° 2 mantém-se igual ao que está, acrescentando-se um novo número, que seria agora o n.° 3.

O Sr. Presidente: — E como é que seria a epígrafe? «Funcionários e agentes do Estado»? Dr. Luís Beiroco,.tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Penso que a solução de incluir aqui isto é muito má e o meu partido não a pode subscrever de modo algum.

O Sr. Presidente: — Mas há alguma outra melhor? Dr. Amândio de Azevedo, faça o favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Propunha o seguinte: temos imensos problemas de sistematização, os quais não podem de modo algum ser considerados resolvidos. Tudo o que aqui está em termos de sistematização é perfeitamente provisório e ficando bem claro que o facto de incluir aqui este n.° 3 não significa que ele deve ficar aqui, podendo ser mudado. Pedia áo Dr. Luís Beiroco que não levantasse dificuldades, pois vamos ter de fazer uma sistematização toda.

Vozes imperceptíveis.

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O Sr. Vital Moreira (PCP): — (Imperceptível.)

O Orador: — Com reserva quanto à sistematização? Admito perfeitamente e até o acompanho. Faz-se uma nota no Relatório da Comissão, de que ...

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — (Imperceptível.)

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Dr. Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Pedia ao Dr. Luís Beiroco se poderia considerar a seguinte hipótese: que esta disposição pormenorizada, como foi aqui proposta pelo Sr. Deputado Jorge Miranda, ficasse aqui. Mas que no capítulo referente a direitos, liberdades e garantias, se fizesse uma referência expressa à existência desta norma, neste sítio.

Voz imperceptível.

O Orador: — É redundante, mas é mais claro e talvez possa servir de síntese às duas posições. Por exemplo, no artigo 18.°. fazia-se uma referência expressa a esta disposição.

Vozes imperceptíveis. Como?

Vozes imperceptíveis.

Exacto, mas exemplificava-se com esta ... Vozes imperceptíveis.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Um artigo autónomo, já melhora alguma coisa.

O Sr. Presidente: — Também penso que melhora.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Continuo a insistir em que, no artigo 18.°. depois de se formular a regra geral, se dissesse «nomeadamente a norma» ...

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Então como é que fica o artigo 270.°?

O Sr. Presidente: — Ficaria igual ao que está no texto, com excepção do n.° 1 que desapareceria e o n.° 3 passaria a ser igual ao actual n.° 2.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — «A lei aprovada por maioria qualificada de 2/3 dos deputados presentes — devo dizer que podíamos ir já lá atrás e fazer esta referência aos 2/3, pois não vale a pena fazer-se aqui essa referência — pode estabelecer restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, associação e petição colectiva e à capacidade eleitoral passiva dos militares e dos agentes militarizados no activo, na estrita medida das exigências das suas funções próprias.»

O Sr. Presidente:— Dr. Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — A única coisa que queria perguntar, era a seguinte: têm a cerrteza de que os

agentes militarizados abrangem todas as coisas que pretendemos? Talvez seja bom manter isso em reserva e perguntar a um Jaime Gama ou a um especialista desses assuntos.

O Sr. Presidente: — Há aqui especialistas. Os Drs. Luís Beiroco e Nunes de Almeida são fardados por dentro.

Risos.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Sr. Deputado Sousa Tavares, as forças militarizadas são: a GNR, a PSP, a Guarda Fiscal, a Polícia Marítima, os guardas florestais e outros. Abrange o que se pretende, mas não abrange aquilo que não se pretende abranger.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Óptimo. Desde que o Sr. Deputado dê essa garantia, muito bem. Mas vi uma certa hesitação na assembleia à roda do termo.

O Sr. Presidente: — O artigo 272.° não tem nenhum problema.

O artigo 274.°, tem aqui um problema. Há a referência de que se mantém em suspenso a possibilidade de a lei atribuir ao Conselho Superior de Defesa Nacional uma certa competência administrativa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Não sou um especialista desta questão, mas parece que estes hesitam sobre se se deve ou não fazer a referência. Pessoalmente começo a inclinar-me para a afirmativa, pois como depois constato que nos vários projectos de lei de defesa nacional que já houve neste país, se distinguem, às vezes, as situações de paz e de guerra e, normalmente, se tende, numa situação de guerra, a atribuir mais poderes ao Conselho Superior de Defesa Nacional, é evidente que se não se disser nada na Constituição, depois a lei de defesa pode ser declarada insconstitucional.

Desse modo, pessoalmente, sinto-me inclinado a pensar que deve haver uma referência no sentido de dizer que a lei poderá atribuir competência administrativa àquele Conselho. No entanto, preferiria ainda por mais algum tempo, deixar a questão em aberto, para que os especialistas acabem por chegar a uma conclusão nesta matéria.

O Sr. Presidente: — Mais alguém quer usar da palavra? O PCP faz alguma oposição a que se mencione? Dr. Vital Moreira faça o favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Sr. Presidente, como se sabe nesta matéria não se trata de colocar ou não uma referência dessas. É uma onde diferente. Sabe-se que supondo-se a extinção do Conselho da Revolução, o meu partido defende que haja um órgão que deve ser completamente constitucionalizado, com uma competência constitucionalmente discriminada, em matéria de gestão e administração das Forças Armadas.

E. não é. obviamente, essa a exigência a que responde o artigo 274.° Em todo o caso, é claro que. quanto mais não seja pelas razões aduzidas pelo deputado Luís Beiroco. seria injustificável que não se dispusesse de uma norma que pelo menos cobrisse as hipóteses aduzidas.

O Sr. Presidente: — Mais alguém quer usar da palavra? A sua sugestão era: «A lei poderá atribuir ...»?

Vozes imperceptíveis.

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É que assim dizia-se que já tem, não é?

Mas vamos limitar a competência administrativa.

Voz imperceptível.

«Numa certa», não. «Compatível com as suas funções», ou outra coisa no género.

Vozes imperceptíveis.

Amanhã parece que pode governar aí uma província qualquer! A competência tem de ser limitada.

Uma referência às suas funções, por exemplo, «a competência administrativa necessária para o exercício das suas funções», ou «compatível com o exercício das suas funções». Qualquer coisa no género, pois competência administrativa, é muito.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Tenho uma fórmula.

O Sr. Presidente: — Qual é?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — «A título excepcional».

O Sr. Presidente: — Isso não.

Vozes imperceptíveis.

Agora, quanto menos claro isto ficar, mais oposição terá. Portanto, penso que deveríamos colocar aqui uma competência administrativa, adequada ao exercício das suas competências. Por exemplo «atribuir-lhe adequada competência administrativa». Está bem.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — (Imperceptível.)

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Presidente: — Ainda não estão definidas as suas funções.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Dão-me licença? Assim: «Podendo dispor da competência administrativa que lhe for atribuída por lei.»

O Sr. Presidente: — Isso é a mesma coisa.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — Não é não.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Presidente: — Isso tanto faz. se quiserem dizer «da competência administrativa que lhe for atribuída por lei».

Vozes imperceptíveis.

Artigo 275.° — Está arrumado.

Artigo 276.° — Ficou a penosidade equivalente à do serviço militar armado.

Entraremos agora na perfeição constitucional jurídica da inconstitucionalidade por acção — artigo 277.° Mas já está arrumado.

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — (Imperceptível.)

O Sr. Presidente: — Artigo 207.°? Mas isso já pertence à história ...

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Ficou uma redacção diversa do n.° 1 do actual artigo 280.°, portanto, do n.° 1 deste texto do artigo 277.°

Está apenas «Os tribunais não podem aplicar normas que infrinjam a Constituição ...» e aqui está «o disposto na Constituição».

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Não está não. Diz aqui «... ou os princípios nela consignados».

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Exacto. Falta um «disposto». Julgo que se deveria adequar o artigo 207.° Isto para não discutir o texto do artigo 207.°, pois houve aqui uma voltinha da qual não tinha dado conta.

O Sr. Presidente: — Artigo 278 ° — Não tem problemas.

Artigo 279.° — É a perfeição. Artigo 280° — A última maravilha. Dr.a Margarida Salema, faça o favor.

A Sr.a Margarida Salema (PSD): — Havia algumas dúvidas quanto ao n.° 2 do artigo 277.°, nomeadamente no respeitante à introdução do inciso «regularmente ratificados», após tratados internacionais.

Tínhamos ficado de reflectir um pouco sobre este aditamento.

O Sr. Presidente: — Dr. Jorge Miranda, faça o favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, esta fórmula do n.° 2 do artigo 277.°, merece-me algumas dúvidas. Infelizmente ainda não pude reflectir nesta atribulada semana que todos tivemos e, portanto, para já manteria as minhas reservas puramente técnicas.

O Sr. Presidente: — Portanto, fica como está, até nos trazerem uma formulação melhor.

Artigo 278.° — Como já disse não há problemas. Artigo 279.° — Também não. Artigo 280.° — Idem.

Artigo 281.° — Havia aqui uma ligeira reserva do PSD, relativamente a '/io dos deputados à Assembleia da República.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — A reserva não é ligeira.

O Sr. Presidente: — Então vamos lá debater essa altíssima questão.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Proponho que este ponto fique pendente e que andemos rapidamene, pois ainda tenho a esperança de que quando chegarmos ao fim, consigamos ultrapassar todos os pontos e terminemos hoje de manhã os nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Portanto, deixaremos esta questão em suspenso.

Artigo 282.° — Não há problemas.

Artigo 283.° — Havia aqui o problema de se saber se deveria ou não deveria o provedor de Justiça ter também

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competência para requerer ou desencadear a inconstitucionalidade por omissão.

Estão ultrapassadas as hesitações ou não? Muito bem.

Artigo 284.° — Há o «pequeno» problema da composição do Tribunal Constitucional.

Dr. Jorge Miranda, faça o favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Relativamente ao artigo 284.°, é necessário, na base do acordo que ontem se tinha esboçado, acrescentar um novo número consagrando que o presidente do Tribunal Constitucional é eleito pelos respectivos juízes.

Por outro lado, o princípio da renovação de '/3 dos membros do Tribunal Constitucional, afigura-se-me que estaria melhor neste artigo do que em disposições transitórias. Certo, que a aplicação da regra em sede de disposições transitórias, implicará efeitos também em geral, mas em rigor, aí apenas deveria ficar a concretização da regra, não a regra em si.

O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Nunes de Almeida, vamos assentar ideias.

Ficaria adquirido um novo n.° 4 com a seguinte redacção: «O presidente do Tribunal Constitucional é eleito pelos respectivos juízes.»

Dr. Nunes de Almeida, faça o favor.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Salvo o devido respeito pelo meu amigo Sr. Deputado Jorge Miranda, suponho não ser possível a regra que ele pretende, sob pena disso ter implicações muito profundas sobre o próprio período de exercício de funções dos juízes do Tribunal Constitucional.

O que propúnhamos — e tendendo que depois de termos definitivamente fixado qual a composição do Tribunal, teremos de ver isso, em termos de disposições transitórias — é que o primeiro período de funções não será igual para todos os juízes nomeados da primeira vez. Mas, uma regra que fixe tanto em tanto tempo, uma alteração de composição parcial do Tribunal Constitucional, teria como consequência que, à partida, o período de exercício de funções dos membros que fosse posteriormente designados não seria igual.

E não seria igual porque nada impede que um membro do Tribunal Constitucional venha a renunciar ao exercício do cargo ou morra, ou fique incapacitado, e para se proceder às renovações, de forma a respeitar essa regra, seria então necessário que ele quando fosse nomeado, o fosse apenas para cumprir o período que faltava ao juiz. cujo exercício de funções ele ia substituir.

Portanto, a regra proposta pelo deputado Jorge Miranda, introduziria uma complicação enorme em todo este sistema e, desse modo. parece-me que o melhor processo de resolver essa questão, é através da disposição transitória, quanto ao primeiro período de exercício de funções dos membros designados inicialmente no Tribunal, isso depois provoca que haja uma renovação normal, natural, do tribunal, que eventualmente não será sempre igual, até porque há membros que acabam o seu mandato antes. etc.

O Sr. Presidente: — Dr. Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Além desta objecção colocada pelo Dr. Nunes de Almeida, também tenho umas dúvidas, no respeitante ao n.° 3 do artigo 284.° «... são designados por 6 anos».

Coloco o seguinte problema: a admitir que haja juízes nomeados pelo Presidente da República, a substituição deste não faz caducar o mandato desses mesmos juízes?

Vozes imperceptíveis.

Portanto, prevê-se que esses juízes continuem em funções.

O Sr. Presidente: — Claro. Vozes imperceptíveis.

O Orador: — Sim senhor. Era isso que pretendia esclarecer. Mas, quero ainda perguntar outra coisa: não será demasiadamente grande o período de 6 anos?

O Sr. Presidente: — O problema é de saber se não será pequeno ...! Quanto a mim, não é grande. Dr. Jorge Miranda, faça o favor.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados. É apenas para responder ao Sr. Deputado Sousa Tavares, pois a sua pergunta deve ter uma resposta que fique gravada, para evitar dúvidas, no futuro.

Os membros do Tribunal Constitucional designados pelo Presidente da República, pela Assembleia da República, ou pelo Conselho Superior da Magistratura, não são representantes. Há uma designação, mas depois os membros, os juízes do Tribunal são completamente independentes. E é por isso que o seu mandato dos titulares dos órgãos que os designam, ao contrário do que acontece com o Conselho da República, que esse sim, é um órgão essencialmente político.

O prazo de 6 anos, é uma garantia de independência.

Pergunto, se não deveria haver outra regra que seria a da impossibilidade de recondução para o período imediato, como maior garantia ainda de independência.

O Sr. Presidente: — Isso é talvez para a lei ordinária. Dr. Amândio de Azevedo, faça o favor.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Esta fórmula do n.° 2 é totalmene inaceitável. Aliás, penso que o problema se resolve facilmente, atendendo a que na Constituição já existe hoje uma expressão que resolve o problema e a qual não deve ser alterada, pois se o fosse levantaria ainda mais problemas do que se fosse inserida aqui. pela primeira vez.

No n.° 2 do artigo 283.°. fala-se em «... cidadãos de reconhecido mérito .... sendo um deles jurista de comprovada competência». A meu ver. esta fórmula é correcta. Os membros do Tribunal Constitucional têm de ser juristas de comprovada competência e não apenas cidadãos de reconhecido mérito com formação jurídica.

Nunca demos o nosso apoio a essa fórmula, julgando que não poderemos de modo algum aceitar qualquer outra fórmula que não seja esta. aliás, exactamente igual à constante da Constituição.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Dr. Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — A meu ver, neste aspecto o Sr. Deputado Amândio de Azevedo tem razão. Já não se vai ao ponto a que chegam outras Constituições, que depois ainda especificam o que são os juristas de comprovada competência, colocando requisitos de um certo núme-

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ro de anos de exercício de profissões jurídicas, ou a exigência de serem professores de Direito, ou juízes de tribunais superiores, etc.

Não se vai para soluções desse tipo, mas tem de haver um mínimo de dignidade. Aliás, depois o saber o que é que é que se entende por comprovada competência, quem vai certificar essa comprovada competência, é, no fundo, a Assembleia da República ao elegê-los ou o Presidente da República ao nomeá-los.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A título pessoal, formularia uma proposta de aditamento ao n.° 3 deste artigo: «Os juízes do Tribunal Constitucional são designados por 6 anos, não podendo ser reconduzidos para o período imediato.»

Fica aqui a proposta, a qual poderá ser aceite ou não. No entanto, duvido que, a não ficar na Constituição esta regra, possa a lei ordinária, amanhã, estabelecer uma restrição semelhante.

Fica, de qualquer forma a ideia, para poder valer, caso venha a ser aceite.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Relativamente à intervenção do Sr, Deputado Amândio de Azevedo, desejava recordar a este Sr. Deputado que desde o primeiro dia. na subcomissão, nos opusemos terminantemente à fórmula agora enunciada por ele.

Fizemo-lo, embora houvéssemos aceite uma alteração à nossa proposta inicial, na qual se falava em «cidadãos de reconhecido mérito», tendo aceitado uma fórmula de compromisso, o acrescento «com formação jurídica». Mesmo assim, fizemo-lo com reservas aqui expressas.

A nossa posição é completamente fechada. A proposta do Sr. Deputado Amândio de Azevedo ou é completamente inútil, na medida em que dá competência ao próprio órgão que designa, para avaliar o mérito jurídico de quem é designado, ficando esta proposta sem qualquer eficácia prática ou, então, destina-se a permitir que a lei, amanhã estabeleça condições ou requisitos para a designação dos juízes do Tribunal Constitucional. Sendo assim, nesse caso, pelas razões que já expusemos nesta Comissão, teremos sempre totais reservas, já que, amanhã, a lei poderia vir a conter ideias inconcebíveis.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — A independência dos membros do Tribunal Constitucional só pode ser garantida de dois modos: pela sua nomeação, a título vitalício, ou pela sua não recondução, pelo menos, no mandato seguinte. Isto é óbvio, já que se eles puderem ser reconduzidos, então, a sua actuação vai ser influenciada pela procura de garantia de recondução no período seguinte.

Segundo os manuais e as regras gerais, só existem estes dois meios de garantir a independência dos juízes: a vitalicidade ou a impossibilidade de recondução.

Destas regras não poderemos sair e creio que à proposta do Sr. Deputado Jorge Miranda, esclarecendo e fixando já constitucionalmente esse ponto, é um sublinhar do princí-

pio de independência dos membros do Tribunal Constitucional.

Embora, mais tarde, a lei possa vir a tomar medidas específicas, considerao urgente o respeito a este teor de normas.

O Sr. Presidente: — Sou igualmente sensível a esse tipo de argumentos, mas reparo que, ao fim de 16 anos, não temos mais notáveis.

Tem a palavra o Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — A concepção base do Sr. Deputado Vital Moreira é importante, caso partamos de uma visão pessimista da vida. Existem pessoas capazes de manter a independência, mesmo sem pensarem na possibilidade de virem ou não a ser reconduzidas. Reconheço, contudo, valor à exposição deste Sr. Deputado.

Julgo, no entanto, mais procedente o argumento do Sr. Deputado Almeida Santos, dizendo que Portugal não é um país bastante rico em pessoas qualificadas para o exercício destas funções, a ponto de podermos estabelecer a impossibilidade de recondução.

O Sr. Vital Moreira (PCP): — O Sr. Deputado dá-me licença? Há certamente as personalidades a que o Sr. Deputado se refere, mas, de facto, também existem as outras personalidades e a Constituição não é feita apenas para as primeiras. Caso ela se dirigisse somente às primeiras, não seria necessária a própria Constituição.

As Constituições nasceram exactamente para esse primeiro tipo de personalidades.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — As soluções, Sr. Deputado Vital Moreira, têm de ser avaliadas em relação a todas as personalidades: às que são capazes de manter a independência e às que o não são.

Daí que afirme que a opinião do Sr. Deputado tem algum valor, mas este não é total.

Por outro lado, há o argumento invocado pelo Sr. Deputado Almeida Santos, o qual considero de uma absoluta pertinência. Não possuímos, infelizmente, pessoas cotadas em tão grande número que nos possamos atribuir o luxo de estabelecer uma norma dessa natureza.

Quanto à intervenção do Sr. Deputado Nunes de Almeida, afirmo que estamos mal, já que, se a posição do PS é fechada, a do PSD ainda o é mais. Não admitiremos, jamais, que se adopte uma fórmula diferente daquela que está actualmente na Constituição, porque a natureza do Tribunal Constitucional deve dar garantias de competência e não pode ser invadida por pessoas de qualificação meramente política ou de oura natureza, que não jurídica, sem prejuízo de que a essa acresçam outras.

Por outro lado, não penso que o Sr. Deputado tenha razão nos argumentos que invocou, pois quando a Constituição diz «juristas de comprovada competência», a lei não pode dizer outra coisa! Isto é vinculativo e qualquer lei que estabeleça diferentemente é inconstitucional.

Esta é a minha interpretação, isto é, o qualificativo é este e mais nenhum. E se esta é a interpretação correcta, creio que desaparecem, em boa medida, os argumentos que há pouco invocou.

Por outro lado, não me diga que isto não tem importância, pois há uma série de normas constitucionais imperfeitas, isto é, são preceitos não susceptíveis de controle, os actos do Presidente da República e todas as normas relativas à forma como este exerce os seus poderes, são

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normas imperfeitas. Ele pode fazer exactamente o contrário e não há maneira nenhuma de o evitar. Simplesmente, há sempre o controle político. A opinião pública pode ajuizar da comprovada competência jurídica das pessoas, indicadas quer pelo Presidente da República, quer pela Assembleia da República, quer pela Magistratura. E qualquer destes órgãos, se não agir em conformidade com aquilo que a Constituição dita, sofre politicamente as necessárias consequências.

Portanto, não considero esta expressão meramente teórica. Mas, se é tão teórica como isso, mais uma razão para o Sr. Deputado Nunes de Almeida não ter assim grandes resistências quanto a ela.

O Sr. Presidente: — Talvez pudéssemos, neste momento, não ir além, ficando este resumo: todos nós estamos de acordo em que é necessário restringir ou qualificar minimamente a qualidade dos candidatáveis.

Não podemos deixar uma aberta para que amanhã a lei ordinária limite de tal modo a qualificação, que coloque o «chapéu em cima da cabeça». Talvez pudéssemos colocar aqui a expressão «juristas de comprovada competência», excluindo a possibilidade disso vir a ser regulamentado.

Dr. Sousa Tavares, faça o favor.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Salvo o devido respeito, a expressão «de comprovada competência», não acrescenta nem atrasa nada. Se dissermos simplesmente «cidadãos juristas», está tudo dito! Não é preciso mais nada.

Voz imperceptível.

Obviamente. Não vamos nomear incompetentes. E quem é que julga e quem é que comprova a competência? Ainda há pouco disse em à parte, que eram os jornais, mas de facto, há um determinado renome ou uma determinada competência, que não havendo processo jurídico de a aferir, ou não havendo processo estabelecido para a aferir, trata-se de facto de uma questão de renome, de publicidade, de nomeada!

E esse nomeada é de opinião pública, portanto, o meu à parte tem um certo fundamento.

Voz imperceptível.

Ou então exigimos professores de Direito ou juízes que tenham exercido funções em tribunais superiores. Tudo isso são já limitações com as quais não estamos de acordo.

De modo que a grande limitação é esta: cidadãos juristas. Tudo o resto é conversa. Dizer-se de «comprovada competência» ou «não comprovada competência», é perfeitamente redundante. A única coisa que pretendemos é que sejam cidadãos juristas.

O Sr. Presidente: — Ficam estas preocupações. Havemos encontrar uma fórmula. Não será isto que irá dramatizar a constituição do Tribunal Constitucional.

Voz imperceptível.

Foi requerido que a matéria da composição ficasse para um balanço final dos problemas «quentes» pendentes.

Sim, isso talvez já pudéssemos fixar, saber se proibe ou náo, a recondução, só para o período imediato.

Bem, mas mais tarde veríamos este aspecto, uma vez que neste momento não há acordo.

Artigo 285.° — Não há problemas.

Artigo 268.° — Eliminado.

Novo artigo 286.° — «Competência e tempo de revisão». Quanto a isto estamos de acordo. Eliminou-se o n.° 3.

Artigo 287.° — Não há problemas.

Artigo 288.° — Idem.

Artigo 292.° — Idem.

Artigo 293.° — Idem.

Artigo 306.° — Não tem problemas.

Voz imperceptível.

Tem? Quais são?

Voz imperceptível.

Tem, mas não neste momento. Muito bem.

Artigo 307.° — Não há problemas e o mesmo se passa com os restantes artigos.

Chegámos ao fim. Assim, julgo que deveríamos voltar ao artigo onde ficámos de colocar o item das Forças Armadas. Salvo erro, trata-se do artigo 202.°

Onde seria e como seria? Alguém quer propor alguma coisa?

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Na alínea d).

O Sr. Presidente: — Alínea d): «Dirigir os serviços e actividades da administração directa do Estado civil e militar, superintender na administração indirecta e exercer a tutela ...»

Voz imperceptível.

Isso é evidente. Aliás volta-se agora aqui. porque foi. em princípio, acordado que se ficasse consagrada a competência administrativa do Conselho Superior de Defesa Nacional, se inscreveria aqui a competência civil e militar.

Portanto, se concordassem, isto ficaria aqui. com a oposição do PCP.

Se concordarem, iríamos agora dar uma volta aos artigos 1.° e 2.° para se fazer uma tentativa, se é que julgam valer a pena. São os únicos artigos que ainda não estão discutidos. Depois, ficariam só os pontos quentes.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): — Chegou o Sr. Presidente Borges de Carvalho.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Presidente [ Borges de Carvalho (PPM) ]: — Muito obrigado pelas boas-vindas. Sr. Deputado Vital Moreira.

Passemos aos nossos trabalhos.

Artigo I,° — Existe uma proposta de alteração por parte da AD.

Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tenha a bondade.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — A minha proposta global era a seguinte: o artigo 1,° terminava em vontade popular. Aliás, dentro de uma lógica, define os

Voz imperceptível.

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urandes fundamentos do Estado e não diz nada quanto aos seus objectivos. Isso é um problema do artigo 2.° E uma razão lógica «além do mais».

Depois, no artigo 2.°, devo dizer com toda a clareza que jamais concordaremos com qualquer fórmula que inclua um elemento de carácter programático, próprio de um determinado partido ou corrente política.

Consideramos isso antidemocrático e faremos um grande barulho na Assembleia se a nossa posição não for aceite. Aliás, penso que o PS só teria vantagens em reconhecer isto, e Ficaria grandes trunfos políticos da aceitação deste ponto de vista, pois penso não ser susceptível de ser contrariado.

Até agora, os debates existentes levam-me à conclusão de que é completamente insustentável, qualquer outra opinião em termos de puros princípios democráticos.

Portanto, o artigo 2.° poderia ficar numa fórmula, que vai ao máximo ao encontro da apresentada pelo PS. E a seguinte: «A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, que respeita e garante os direitos fundamentais, o pluralismo de expressão e organização política democráticas, a separação e interdependências dos poderes públicos, e tem por objectivo a realização plena da democracia económica, social e cultural, e o aprofundamento da democracia participativa.»

Quando digo aqui «realização plena da democracia económica, social e cultural», estou já a adoptar uma fórmula desenvolvida, que significa praticamente o mesmo, de acordo com os projectos de cada partido, que significa o socialismo. Pois se os senhores quiserem desenvolver o que é o socialismo, ele é isto. É a realização plena — dentro das vossas perspectivas — da democracia económica, social e cultural. Como também o é para o PSD, por outros caminhos, como o será, por outros caminhos para o CDS.

Portanto, trata-se duma forma que considero não reduzir em nada aquilo que de substancial existe na palavra socialismo, com a diferença de não ser uma fórmula partidária, sendo desse modo compatível com todos os projectos políticos.

Creio que não vale a pena prolongarmos a discussão, já que não colaboramos na elaboração de qualquer outro preceito que mantenha a exigência de prossecução do socialismo no artigo 2.°

Nessa altura, o artigo ficará como está e faremos disso — anuncio já — uma grande campanha contra a rigidez inaceitável do PS.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Vitorino, tem a palavra.

O Sr. António Vitorino (UEDS): — Não se trata propriamente de uma intervenção, mas sim de um pedido de esclarecimento ao Sr. Deputado Amândio de Azevedo.

Posso pedir-lhe um esclarecimento Sr. Deputado?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — (Não audível.)

O Sr. António Vitorino (UEDS): — Devo inferir das suas palavras que, na eventualidade de não desaparecer a expressão «transição para o socialismo», a AD considera que o consenso anteriormente esboçado quanto à probabilidade da inclusão da expressão «Estado de Direito democrático» não se verifica e, portanto, esta expressão não poderá ser adquirida?

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Votaremos numa proposta de aditamento dessa expressão.

Não avalizamos qualquer expressão desta natureza. O que votámos em 1975 está votado, mas, neste momento, não queremos de maneira alguma associar a nossa responsabilidade política à manutenção da fórmula desta natureza.

Digo isto com toda a clareza para não perdermos tempo. Se não podemos resolver o problema, passemos à frente.

Porém, não consideramos este ponto como essencial para a subida do relatório ao Plenário. Se ficar pendente, fica. Será uma grande batalha política!

Penso e digo-o com a máxima sinceridade, que isto seria útil para os objectivos do PS, mas, como é evidente, não é a mim que compete aferir os seus interesses.

Apenas tive a preocupação de definir com muita clareza a nossa posição para não alongarmos discussões. Pessoalmente, continuo empenhado em que ainda hoje possamos dar por terminados os nossos trabalhos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Luís Beiroco, queria solidarizar--me, em nome do meu partido, com a posição assumida pelo meu partido, com a posição assumida pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo e, por outro lado, em relação ao artigo 1.° reafirmar aquilo que já foi dito pelo meu partido aquando da apresentação do projecto da AD — Portugal não é uma República soberana, mas uma Nação soberana que se organiza como República. Daí a nossa pessoal oposição a esta fórmula do artigo 1.°

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — Queria, em primeiro lugar, solidarizar-me inteiramente com as considerações que foram feitas pelo Sr. Deputado Amândio de Azevedo. • E evidente que não haverá qualquer possibilidade de a AD vir a votar qualquer formulação de um artigo que vá substancialmente além daquilo que disse.

Queria, também, chamar a atenção para o facto de, mantendo-se o preâmbulo da Constituição, onde se diz: «A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de ... assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista ...», se expressam com muito mais correcção os princípios que enformam o socialismo democrático do que na fórmula que consta do artigo 2.°, onde se pretende que não se trate de um caminho que está aberto, mas de um caminho que tem de ser obrigatoriamente percorrido, qualquer que sejam as posteriores expressões da vonjade popular.

Penso que o PS deveria reponderar esta questão, dentro dos seus próprios princípios.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, faça o favor.

Q Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Muito obrigado. Se bem entendi, o Sr. Deputado Luis Beiroco aceitaria a conservação do preâmbulo e defenderia a alteração do artigo 2.° da Constituição.

Pergunto se a expressão constante do preâmbulo faz também parte da Constituição? O preâmbuJo não é também um elemento da Constituição?

Q Sr. Luís Beiroco (CDS): — É evidente que sim! Os constitucionalistas discutem o valor do preâmbulo e.

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pessoalmente, não ponho em causa que o preâmbulo tem um grande valor interpretativo.

Mas é evidente que a expressão do preâmbulo é diferente, porque diz que há um caminho que está aberto. Esse caminho pode ser ou não percorrido, pode ser percorrido mais devagar ou mais depressa, conforme a soberania do povo se for manifestando através dos sucessivos actos eleitorais.

O artigo 2.° é que tem um sentido perfeitamente distinto.

Concerteza, Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Isso quer dizer que se no artigo 2.° se pusesse exactamente a fórmula que está no preâmbulo, a objecção do Sr. Deputado Luis Beiroco não seria tão grande, uma vez que era apenas um caminho que estaria aberto e nada mais?

O Sr. Luís Beiroco (CDS): — É evidente que se a fórmula for a do preâmbulo, a objecção não é tão grande.

Tal não quer dizer, porém, que esteja — e pessoalmente não estou — em condição de, se a FRS propusesse a fórmula do preâmbulo, a aceitar. Mas, a objecção não seria tão grande, já que são expressões que têm um significado distinto.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Amândio de Azevedo, tem a palavra.

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Não me referi ao preâmbulo, mas quero dizer que o PSD não desiste da sua proposta quanto ao preâmbulo, embora não considere tão grave — porque o preâmbulo não tem natureza normativa — que o PS não concorda com a sua alteração.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José LuisNunes, tem a palavra.

O Sr. José Luis Nunes (PS): — Quanto ao preâmbulo, é absolutamente inaceitável que nele se mude uma palavra, uma letra, uma virgula, o que quer que seja.

Situação idêntica seria aquela em que os novos constitucionalistas quisessem mudar o preâmbulo da Constituição dos Estados Unidos da América, onde se diz «Confiamos em Deus». Deus me livre — passe-se o pleonasmo — de votar a inclusão do nome de Deus na Constituição. Mas, consideraria absolutamente ridículo, se tivéssemos que numa Constituição de 1700 cortar essa expresão, porque o Estado é laico ou qualquer outro disparate do estilo — disparate em relação à matéria concreta!

O preâmbulo é um documento que resume o estado de espírito dos constitucionalistas da altura, é um documento histórico. O PS nunca tocará no preâmbulo, esteja o que lá estiver. Nem sequer consideramos que seja objecto de revisão.

Quanto ao artigo 2.° e ao artigo 1.° penso que o Sr. Deputado Amândio de Azevedo tem todo o direito de querer ser treinador do PS, de emitir todas as opiniões sobre o que é bom e mau para nós.

Simplesmente não vale a pena discutir, postas as coisas desta forma.

Quanto ouço dizer que faremos uma campanha contra o que quer que seja, nem me interessa saber o objecto, pois voto contra.

Este o meu estado de espirito!

O Sr. Amândio de Azevedo (PSD): — Posso interromper? Retiro a palavra «campanha», pois não traduziu fielmente o meu pensamento.

Queria dizer que no Plenário atacaremos fortemente essa posição. Não é campanha pública.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — Fico bastante contente de ter ouvido isso. De outra forma, se há uma pessoa que me diz que se eu não quiser, o PSD fará uma campanha violentíssima, o meu estado de espírito é imediatamente o de votar contra no escuro.

Agora se o Sr. Deputado Amândio de Azevedo possa defender com o vigor da convicção as posições do seu partido no Plenário, obviamente que não temos nada a dizer e a questão já pode ser pensada de outra forma.

Penso que aqui dificilmente podemos avançar. Porém, em primeiro lugar, considero que a expressão do preâmbulo é diferente da usada no artigo 2°

Em segundo lugar, desde já aviso lealmente os meus colegas e queridos amigos do CDS, nomeadamente o Sr. Deputado Luís Beiroco, que tenciono pegar no Diário da Assembleia Constituinte e ler o que a esse respeito foi dito por esses deputados, na altura em que o preâmbulo foi votado.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — O artigo 1°

O Sr. José Luís Nunes (PS): — O preâmbulo e o artigo 1.°

Peço imensa desculpa Sr. Deputado Sousa Tavares, mas devo dizer que me custa um pouco estar a ver as manifestações de desagrado perante o que estou a dizer.

O Sr! Sousa Tavares (PSD): — (Não audível.)

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, agradeço que não continuem este diálogo Sr. Deputado José Luís Nunes, faz favor de continuar.

O Sr. José Luís Nunes (PS): — O senhor está a fazer uma autocrítica.

Na Assembleia Constituinte, tanto o CDS como o PSD marcaram, em relação ao preâmbulo, dizendo que era uma «coisa magnífica», havendo mesmo um deputado do CDS que afirmou que se a Constituição fosse semelhante àquilo que aparece no preâmbulo, talvez o consenso tivesse sido mais alargado. Cito de cor, mas é fácil ver o resultado desse assunto.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Queria tanto quanto possível éspacionalizar esta discussão, não envolvendo quaiquer ameaças, nem falando em campanhas. De facto, os deputados do PSD — e essa justiça pode ser reconhecida — que têm tomado uma parte mais activa nos trabalhos da revisão constitucional, têm sido aqueles que menos publicamente se têm manifestado sobre esses trabalhos e defendido qualquer espécie de orientação. Normalmente as nossas declarações cingem-se a considerá-los como bons, havendo uma cooperação de todos os deputados, etc.

Portanto, não seria agora que iríamos infringir essa regra que, de certa maneira, nos impusemos a todos para fazer uma campanha pública.

Entrando na matéria, entendo que em relação ao artigo 1.° e por uma questão de correcção de forma, se

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deveria dizer: «Portugal é um Estado independente e soberano, sob a forma política da República, baseado na dignidade da pessoa humana e na vontade popular.»

Portugal é mais do que uma República. E um Estado independente e soberano, que adopta a forma política de República. Diz o mesmofe é mais correcta a expressão. E uma questão técnica pára a qual chamo a atenção dos constitucionalistas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): — Sr. Deputado Sousa Tavares, no artigo l.° quando se fala em República não se está a definir a forma de governo, nem a forma política. Está-se a definir, sim. a República no sentido de comunidade portuguesa: é República no mesmo sentido em que Rodrigues Lobo, no século xvii. a referia.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): — Já sei. Mas. então, deveria vir com letra pequena.

Vozes.

Quando Rodrigues Lobo falava de República era com letra pequena. Era a «respublica».

Mas, isso é perfeitamente secundário, penso de facto, que aqui estamos a definir o Estado, o que é Portugal. Portugal é um estado independente, é uma Nação independente e soberana sob a forma de República.

Dizer que é uma República não consubstancia tudo. Mesmo no sentido do Rodrigues Lobo, não esgota a expressão. Portugal é uma Nação. E não dizermos que Portugal é uma Nação independente, revela uma certa deficiência.

Mas em todo o caso. considero secundário. ,

Penso que o artigo onde se contém as finalidades deve ser o artigo 2.°

Em relação a este. gostaria de fazer a seguinte pergunta ao PS: se se disser, baseando-nos na proposta da FRS ínsita no seu projecto, que «tem por objectivo assegurar a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa», não são essas as finalidades que o PS pretende obter.

É que a palavra socialismo tem. assim, um conteúdo que se situa para além da realização desta democracia económica, social e cultural.

Pergunto, então. qual. é esse significado?

O Sr. Presidente: — Estão encerrados os trabalhos.

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