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II SÉRIE-A — NÚMERO 51

referência, além dos clássicos da nossa literatura incluídos nos programas de ensino do português, principalmente nos seus níveis secundário e complementar. O Acordo leva ainda à inutilização e consequente destruição de um património constituído por largas centenas de milhares de películas

— os fotolitos — em que estão gravadas as composições de muitas obras destinadas a reimpressões.

O Acordo Ortográfico, porque não contemplou sequer prazos compatíveis com a reposição no mercado nacional de espécies bibliográficas em que a exigência de uma ortografia actualizada é imediata, como são os dicionários, pode abrir caminho a uma competição feita em detrimento da qualidade do ensino do português: nomeadamente através da entrada de dicionários publicados no Brasil, em que, sob a égide de uma ortografia unificada, se introduzem em Portugal vocábulos sem a menor tradição na nossa língua.

Assim, por exemplo, o maior editor português de dicionários precisará de seis anos para repor no mercado, com a ortografia actualizada, os dicionários que tem presentemente em circulação. Entretanto, a entrada em vigor do Acordo, prevista para 1 de Janeiro de 1994, não permite tal reposição, mas possibilita em contrapartida a entrada em Portugal de dicionários brasileiros com as consequências já referidas.

O Acordo Ortográfico poderá afectar negativamente a cooperação que hoje existe na área do livro escolar entre Portugal e os países africanos de língua oficial portuguesa. Dado que em tais países se segue a norma ortográfica portuguesa, toda a produção do livro escolar — à excepção de uma escassa produção doméstica — é exclusivamente assegurada pelos editores portugueses.

O Acordo poderá não só deslocar esta produção para o Brasil, como determinar, por arrastamento, a prevalência de docentes brasileiros na cooperação com tais países, no âmbito do ensino.

Sobre o alcance de tais efeitos a médio prazo, basta dizer o seguinte:

É através da escola que se vão formar os futuros leitores daqueles países;

A língua portuguesa, sendo naqueles países uma língua oficial e estando, por conseguinte, longe de uma grande difusão e penetração entre as respectivas populações, terá uma evolução dependente das opções polítidas dos seus governos — que podem vir a orientar-se, por efeito do Acordo, para o Brasil.

No campo da competição editorial, poderá haver tendências hegemónicas, nomeadamente através da aquisição, por parte de editores brasileiros

— cujo parque editorial é superior ao nosso —, dos direitos exclusivos para a tradução das obras culturalmente mais significativas. Este facto obrigará os leitores portugueses — que na sua maior parte não têm acesso à língua original de tais obras — a recorrer cada vez mais à edição brasileira. Já existem de resto algumas práticas nesse sentido.

Esta situação pode chegar ao limite extremo de inverter as próprias condições de difusão do livro português no nosso país, com a substituição de muitos editores que actualmente produzem livros no português de Portugal por importadores de livros brasileiros, facto reforçado pela maior facilidade — em termos económicos e financeiros — na importação do que na produção de livros novos. Enquanto a produção exige sempre tiragens elevadas, por mais pequenas que sejam, a importação é compatível com investimentos graduais de pequenas quantidades de livros e uma muito mais rápida rotação do capital.

Perante os eventuais riscos e ameaças a que se verão sujeitos os editores portugueses outro membro da CNALP sugere que, no caso de o Acordo Ortográfico vir a ser concretizado, «nele ficassem inseridas cláusulas de salvaguarda dos interesses económicos legítimos dos editores portugueses, evitando-se assim que sobre estes venham a recair danos materiais avultados», e defende «a adopção por parte de Portugal de previsão de tempo suficiente na entrada em vigor do futuro Acordo, garantia de protecção dos agentes económicos portugueses e a criação de mecanismos de apoio económicos, a título excepcional, que viabilize a manutenção das empresas portuguesas face à reconhecida maior capacidade das suas congéneres brasileiras».

5.2 — Como já ficou dito, alguns membros da CNALP formularam sérias reservas e críticas ao Acordo Ortográfico no plano técnico-linguístico.

Em primeiro lugar, deve ser referida a crítica de que o Acordo Ortográfico, tal como já acontecia, aliás, como o Anteprojecto de Bases da Ortografia Unificada da Língua Portuguesa (1988), «não só não unifica a ortografia, pois se limita a consagrar todas as divergências sistemáticas hoje existentes entre os dois usos gráficos, mas também abre caminho à legitimação e legalização de divergências dentro de cada um dos sete países onde o português se escreve como língua oficial. Daí decorrer que se não disporá extranacionalmente de uma norma gráfica do português.

São, de facto, numerosos os casos em que, contra toda a tradição doutrinal dos ortografistas portugueses, do século xvi ao século xx, e contra os interesses dos utentes da língua escrita, se cria o princípio da facultatividade gráfica.

É o que acontece, por exemplo, com a acentuação gráfica dos paroxítonos e proparoxítonos a cuja vogal tónica e ou o se segue consoante heterossilábica, os quais, de acordo com as bases ix, n.° 2.°, alíneas a), observação, e b),. observação, e xi, n.° 3.°, poderá grafar-se indiferentemente com acento agudo ou circunflexo (ténis ou tênis, António ou Antônio, por exemplo), e com a liberdade que se consagra de se escrever aspecto ou aspeto, facto ou fato, corrupto ou corrulo, súbdito ou súdito, etc. [base iv, n.os 1.°, alinea c), e 2.°]. É subjectiva, e por isso inoperante, a referência que a este e outros propósitos se faz à 'pronúncia culta* como critério para se optar por uma ou outra grafia, porquanto não só não está definido, nem no Acordo Ortográfico nem em qualquer obra idónea, o que há--de entender-se por 'pronúncia culta', mas também não existe, que se saiba, qualquer descrição acessível ao público das 'pronúncias cultas' das diferentes variedades

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