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II Série - Suplemento ao número 12

Quarta-feira, 11 de Novembro de 1981

DIÁRIO da Assembleia da República

II LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1981-1982)

SUMÁRIO

Comissão Eventual para a Revisão Constitucional:

Acta da reunião do dia 30 de Setembro.

Nota. - Até esta data, sobre a revisão constitucional, além do presente suplemento, foi publicado mais o seguinte:

Suplemento ao n.° 11, de 7 de Novembro de 1991 (e mais os números e suplementos que nele se indicam).

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião do dia 30 de Setembro de 1981

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, é muito rápida a minha intervenção a propósito desta proposta de eliminação do n.° 5 do artigo 55.° Suponho que - e até ao momento - as justificações que têm sido dadas para esta eliminação têm sido sistematicamente no sentido de que se ela não existisse nem mesmo assim ficaria proibida a constituição de comissões coordenadoras.

Fundamentalmente tem-se contrabatido esta tese dizendo que se se cortasse, como já cá tinha estado, poderia levantar-se dúvida. Suponho que não se levantaria dúvida nenhuma. Continuaria sempre a poderem constituir-se comissões coordenadoras como quaisquer outras, seja do que for. Acho que esse argumento utilizado pela AD é válido, não tem é nada que ver com o assunto que estamos a tratar, porque o que está aqui neste n.º 5 não é permitir que se constituam comissões coordenadoras. O que está aqui, de conteúdo útil, é obrigar o Estado a reconhecê-las como interlocutoras válidas para a discussão dos problemas específicos que aí vêm referidos. E se vier a ser eliminado este n.° 5, essa é a questão, as comissões coordenadoras continuarão a poder constituir-se; o que não é obrigatório é reconhecê-las como interlocutoras válidas, e necessárias, nas matérias especificadas neste n.º 5.

Esse é o conteúdo útil da eliminação e é por isso que nós nos opomos a ela.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Não há mais oradores inscritos sobre esta matéria. Creio que o n.° 5 e a problemática da sua eliminação era o último ponto a tratar em relação ao artigo 55.°

Passamos então ao antigo 56.° Vou ler o relatório da subcomissão.

A Aliança Democrática, a Frente Republicana e Socialista e o MDP/CDE propõem alterações.

A Aliança Democrática propõe a fusão das alíneas b) e c) numa só, substituindo o "exercício do controle de gestão isso empresas" pela "participação na gestão", alterando a expressão "unidades produtivas" pela "actividades produtivas" e aditando a expressão anos termos da lei ou dos estatutos da empresa".

Na actual alínea d) propõe a eliminação da referência "os planos económico-sociais e o aditamento da expressão "nos termos da lei".

A Frente Republicana e Socialista propõe o aditamento de uma nova alínea relativa aos direitos das comissões de trabalhadores, de gerir ou participar na gestão das obras sociais da empresa e ainda o aditamento de uma nova alínea respeitante à eleição de representantes de trabalhadores para os órgãos sociais das empresas públicas.

O MDP/CDE propõe a introdução na alínea b) de uma referência ao controle ou participação na gestão das obras sociais das empresas pelas comissões de trabalhadores e ainda o aditamento de um novo número, atribuindo à lei a regulamentação do efectivo exercício dos direitos enunciados no número anterior.

A Frente Republicana e Socialista opôs-se às alterações propostas pela Aliança Democrática. Quanto às propostas da Frente Republicana e Socialista a AD reservou a sua posição, tendo o PCP referido que não se opunha às ideias contidas naquelas propostas, manifestando no entanto reservas quanto à sua redacção.

O MDP/CDE colocou reservas quanto ao primeiro aditamento e apoiou o segundo. Retirou também a sua proposta de aditamento de um novo número.

Quais os Srs. Deputados que pretendem intervir sobre o artigo 56.º e designadamente sobre o primeiro ponto...

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

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O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Ainda sobre o relatório, queria fazer uma pequena correcção. Quando se refere que a FRS propõe o aditamento de uma alínea respeitante à eleição de representantes dos trabalhadores para os órgãos sociais de empresas, não se trata de empresas públicas, como aí vem, por lapso, referido, mas sim de todas as empresas do sector empresarial do Estado, que é mais vasto.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - A AD propõe que seja eliminado o conceito de controle de gestão, pretendendo substituído por participação na gestão. Suponho que é este o sentido da sua proposta.

Ora, é de rejeitar completamente esta tentativa porque não se pode confundir controle de gestão com participação na gestão. Posso talvez, sem abusar dos conceitos, dizer que a intervenção democrática dos trabalhadores na vida das empresas se pode repartir por duas formas: uma é o controle de gestão e outra é a participação na gestão. E isso está perfeitamente conciliado na lei das comissões de trabalhadores, onde a participação na gestão se faz, por exemplo, no sector empresarial do Estado, pela eleição dos representantes dos trabalhadores para o conselho de gestão e para a gestão dos serviços sociais dessas empresas.

Por outro lado, o controle de gestão é muito mais lato e, digamos, é exercido do exterior - da comissão de trabalhadores - sobre as hierarquias administrativas na empresa. O conceito de controle de gestão não implica corresponsabilização mas de certa maneira, implica corresponsabilização na gestão. Se acaso esta proposta da AD fosse admitida, direitos que os trabalhadores hoje têm nas empresas seriam automáticamente postos em causa. Já que a participação na gestão só pode ser identificada com a efectiva participação dos trabalhadores na gestão da empresa, e não com o controle, algumas das atribuições fundamentais que as comissões de trabalhadores hoje têm - que é, por exemplo, dar pareceres sobre os pianos de actividade e sobre o orçamento da empresa, isto entre muitos outros-, ficariam automaticamente postos em causa e a ler das comissões de trabalhadores ficaria em terreno frágil e seria com certeza revista, com o andar do tempo, pela própria AD, eliminando tudo o que diz respeito ao conteúdo e à natureza do controle de gestão.

Este problema foi discutido na Assembleia Constituinte, desde essa data muitas coisas aconteceram e hoje podemos ver com maior realismo, de facto, os conceitos de controle de gestão e de participação na gestão, mas também é curioso que a AD nunca tivesse avançado, designadamente o PSD, com nada de significativo no que diz respeito à participação na gestão ou até ao seu conceito de co-gestão. Nunca apresentaram uma proposta de lei, nunca tomaram qualquer iniciativa, tudo me levando a concluir que a AD não tem ideias nessa matéria e que apenas acena com a co-gestão ou com a participação na gestão para afastar um concerto mais politicamente relevante, que é o concelho de controle de gestão. Nesse sentido, acho que deve manter-se o controle de gestão tal como está na Constituição, porque ele não excluir a participação na gestão, visto que esta também pode ser um sector mais restrito de controle de gestão, embora, sem dúvida nenhuma, eu possa também aceitar que entra no campo de participação e de corresponsabilização.

Não vejo, assim, qualquer sentido adequado do conceito de participação na gestão e vejo, sim, o risco de serem eliminados atribuições e poderes que os trabalhadores e as suas comissões dispõem neste momento, se acaso fosse adoptado.

Quanto ao acrescente das alíneas e) e f), trata-se de constitucionalizar aquilo que está já na lei das comissões de trabalhadores e que, segundo me parece, foi aprovado por quase todos os partidos aquando da votação de tal lei.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Este é outro dos artigos muito expressivos, do projecto da AD, e expressivos nos seus propostos e dos limites até onde conseguiu levá-los.

Se em relação ao artigo 55.° se propõe pôr em causa a própria existência e, sobretudo, a autonomia das comissões de trabalhadores, neste artigo o propósito é, claramente, de desarmá-las, tirar-lhes qualquer possibilidade de intervir utilmente e possibilitar o controle legislativo da sua actividade.

Basta ver em que consistem as alterações: substituir controle de gestão por participação na gestão, reeditando um tema que foi ponto de grande discussão na Assembleia Constituinte e, portanto, não vale a pena aqui reeditar os motivos que nos levaram a opor ao longo destes anos a tal conceito, pois continuam a ser válidos, por maioria de razão. Remete também essa mesma participação para a ler ou para os estatutos, coisa que não consta actualmente da Constituição. A alínea c), em vez de "intervir na reorganização das unidades produtivas" - que se sabe o que é - passa a constituir em "participar na reorganização de actividades produtivas" - o que se não sabe bem o que é -, também nos lermos da ler e dos estatutos das empresas. Desaparece, na alínea c), a participação na elaboração dos planos económico-sociais e a participação na elaboração da legislação do trabalho, fica, assim, reduzida àquela que contempla o respectivo sector e não em gerai, como consta actualmente na Constituição. Tudo isto para reduzir, eliminar, cercear, restringir e remeter para a ler. O propósito é claro. Enquanto noutras propostas, várias, frequentes, repetidas, reiteradas, se procura reforçar, dar, somar os direitos do patronato e do capital, no que se refere aos direitos dos trabalhadores trata-se de cortar, restringir, sacar da Constituição, desmantelar, desarmar. Não podem, obviamente, ter o mínimo do nosso apoio, antes a nossa oposição. Não concordamos com nenhuma das propostas da AD, não estamos sequer dispostos a considera-tos. As razões acabam por ser sumariamente evidentes.

Quanto às propostas da FRS, mantemos a posição que adoptamos na subcomissão. Parece-nos que poderá haver vantagem, ou pelo menos não haver desvantagem, em constitucionalizar explicitamente estes pontos que fazem parte já da actual ler das comissões de trabalhadores. Mantemos algumas dúvidas quanto à redacção concreta dessas alíneas, mas mantemos tam-

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bem a nossa predisposição não só para aprovar as ideias mas também .para participar numa redacção que tenha em conta algumas dais reservas que enunciámos.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI):-Sr. Presidente, conforme já foi aqui recordado, o debate acerca do artigo 56.° da Constituição foi na Assembleia Constituinte um dos debates mais emocionantes, ideologicamente, e também dos mais penosos.

Suponho que a prática de 6 anos após Setembro-Outubro de 1975 - que foi a altura em que se travou esse debate - demonstrou, conforme o Sr. Deputado Carlos Lage há pouco sugeriu, de certa maneira, que a experiência é mãe de muitas coisas e que muito desse debate foi em grande medida inútil.

Isso porque na Assembleia Constituinte se estabeleceu uma contraposição, com grande carga ideológica e emotiva, entre co-gestão e controle de gestão. A co-gestão, para alguns, seria uma forma de colaboração de classes, o controle de gestão seria uma forma de luta de classes, A co-gestão implicaria, de certa maneira, um desarmamento dos trabalhadores perante o patronato, o controle de gestão, pelo contrário, uma afirmação dos trabalhadores, como tais, perante o patronato na defesa dos seus interesses.

A interposição do artigo 56.°, durante estes anos, a lei das comissões de trabalhadores e a experiência demonstraram que não havia motivo para uma interpretação tão restritiva como a que se 'fazia à volta dos conceitos ligados ao artigo 56.°

Demonstraram também que, passado o período revolucionário, naturalmente a intervenção democrática dos trabalhadores na vida da empresa, de que fala o n.° 1 do artigo 56.°, iria sendo canalizado por formas bastantes diversas, por formas de acordo com o pluralismo político e social que ao cabo e ao resto, se a Constituição não consagra, pelo menos permite, E, designadamente, o facto de se não ter conseguido em 1975-1976 -conforme o então Partido Popular Democrático sustentou- uma referência explícita à co-gestão ou à participação na gestão não impediu que a lei das comissões de trabalhadores efectivamente, de certa maneira, a viesse a consagrar, dentro da ideia do artigo 16.°, n.° 1, da não tipicidade dos direitos fundamentais. Não é por a Constituição não faiar em participação na gestão que, de harmonia com a regra do artigo 16.°, n.° 1, esse direito dos trabalhadores pode ou não vir a ser consagrado na lei. Da mesma maneira que me parece que à face do texto da Aliança Democrática, agora proposto, não seria por o controle de gestão deixar de estar na Constituição que a ler ordinária poderia deixar de o consagrar. Como direito que a ler poderia criar ao abrigo do artigo 16.°, n.° 1, isso seria possível. No entanto, o sentido da (proposta da Aliança Democrática é, por um lado, de retirar um direito que hoje já se encontra explicitamente consagrado - e nessa medida isso seria um manifesto recuo -, direito esse que, sustento, não exclui outro. Não se trata de uma disjunção, se houver controle de gestão ficar impedida a co-gestão; não é disso que se trata. Do que se trataria era de excluir o controle de gestão para incluir de forma extremamente tímida, a participação na gestão, porque seria sempre nos termos da lei.

Reparem que enquanto hoje a Constituição diz "controle de gestão", sem desenvolver para a lei, agora na fórmula da Aliança Democrática a participação na gestão seria sempre nos termos da lei e dos estatutos da empresa.

Por outro lado, considero que a Frente Republicana e Socialista, consagrando não apenas, como hoje acontece, o controle de gestão mas igualmente formas de participação na gestão, vai muito mais ao encontro de certas aspirações de 1975-1976 do que hoje e Aliança Democrática.

A Frente Republicana e Socialista não só mantém como direito constitucional explícito o controle de gestão como consagra, sem dependência da lei, algumas formas de participação na gestão - se quiserem qualificar de co-gestão - que em 1975 o então Partido Popular Democrático veio a consagrar.

Neste sentido não vejo nenhuma vantagem na retirada da expressão "controle de gestão", mesmo que se admita que a lei o poderia criar. Isso significaria um retrocesso, em termos de direitos dos trabalhadores, e, por outro lado, julgo haver toda a vantagem na consagração das formas de participação que a FRS sustenta.

Por último, e em relação ao termo "intervenção democrática dos trabalhadores" -de que se faia no actual artigo 55.° e que a Frente Republicana e Socialista contínua a defender que deve falar-se -, torna-se agora patente que a intervenção democrática dos "trabalhadores tanto pode assumir a forma de controle de gestão como de participação de gestão.

Em suma, o projecto da Frente Republicana e Socialista é muito mais aberto, mais flexível e pluralista, pelo menos, do que o projecto da Aliança Democrática.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Opomo-nos às alterações propostas pela AD na medida em que, para nós, cada uma delas, e elas no seu conjunto, representam de facto uma restrição nos direitos dos trabalhadores, interpretando, inclusive, que é uma forma de violar o artigo 290.° da Constituição.

Em relação às propostas apresentadas pela FRS, já na subcomissão e aqui, repetimos, manifestámos o nosso apoio à alínea f) - eleição de representantes para os órgãos de gestão das empresas do sector empresarial do Estado- e pusemos reservas, e continuamos a pôr, em relação à formulação que a FRS propõe para a nova alínea é) e que está em ligação com a alteração que propusemos para a actual alínea b). Concretamente, nós pensamos que, de facto, o controlo de gestão expressado constitucionalmente não proíbe formas de participação. E, digamos, uma fórmula mais ampla que absorve essas formas de participação em resultado de discussão, negociação, entendimento entre trabalhadores e respectivas entidades patronais.

Pensamos que a formulação que a FRS propõe para a sua alínea f), marcando uma diferença importante de redacção entre a actual alínea b) e esta alínea f), levaria a uma interpretação no sentido de que o controle de gestão se desenvolve apenas para as actividades eminentemente produtivas das empresas e que naquilo que tem um certo carácter social se teria re-

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servado à participação na gestão, digamos, dessa área de actividade de carácter social. Julgamos que a experiência tida pelo País nem aponta nesse sentido, que é difícil determinar com rigor o âmbito das actividades de natureza social, que há actividades dessa natureza que item muito a ver com a própria gestão das empresas, que há áreas onde é difícil esta distinção entre o que é social e o que é actividade de empresa - por exemplo, todo o serviço de transportes que as empresas colocam à disposição dos trabalhadores para se deslocarem ao locai de trabalho. E naturalmente que é quase impossível encarar, da parte dos trabalhadores, uma disposição de participar, responsavelmente na gestão dessa actividade que por algum modo é uma actividade social. E a experiência parece ter apontado muito mais, em que tem havido entendimento, entre trabalhadores e entidades patronais, de participação em actividades, por exemplo, de formação e valorização profissional - que têm um carácter de natureza social também - em actividades de bares, de cantinas, de refeitórios, mas que nas outras actividades se tem verificado mais a sua inclusão como actividades sujeitas ao controle de produção. Pensamos que a formulação proposta pelo MDP/CDE - que abre, neste caso particular das obras sociais das empresas, a dupla perspectiva de não só as incluir nas actividades normais de controle de produção como, inclusivamente, abrir para aquilo que já é uma realidade no nosso país, de participação na gestão dessas obras - não tem os riscos que procurei! apontar em relação à formulação proposta pela FRS.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sn Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Penso que nesta matéria devem ser deixados doas ou três apontamentos muito sucintos, fundamentalmente no que toca à proposta apresentada pela Aliança Democrática e em resposta a alguns argumentos que aqui foram colocados.

Penso que não pode ser invocada, como repetidamente for, a experiência dos últimos anos no concernente à aplicação dos princípios aqui consagrados relativos ao controle de gestão.

Não vamos também deixar-nos embrenhar na querela ideológica, nesta sede. Penso que sem totalmente inoportuno e não teria da nossa parte interesse nem justificação que o fizéssemos. Não vamos, pois, fazê-lo.

O que aqui importa deixar fundamentalmente acentuado é só o seguinte: o que está em causa na nossa proposta mio é um empobrecimento ou uma diminuição dos actuais direitos dos trabalhadores, mas sim, óbvia e expressamente afirmados, uma evolução qualitativa em relação à própria filosofia, é evidente, dos termos em que os trabalhadores têm direito a participar e intervir no seio das empresas em que trabalham.

Do nosso ponto de vista, o conceito de participação nas empresas envolve - e é por isso mais extensivo e mais lato, ao contrário daquilo que terá afirmado o Sr. Deputado Carlos Lage - o controle de gestão. Simplesmente é evidente que o controle de gestão, que não seria posto em causa por esta via, passaria naturalmente a estar subordinado a uma filosofia diferente, a uma filosofia de responsabilização, a uma filosofia colocando os trabalhadores, do nosso ponto de vista, naturalmente, numa posição mais adulta e mais responsável face à gestão e à própria organização das empresas. É este o sentido da nossa proposta. Não visámos empobrecer mas visámos sim, na nossa perspectiva, enriquecer, alargar e aprofundar a presença dos trabalhadores dentro das empresas.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - A minha intervenção é, de certo modo, utilitária.

Aqui está um aspecto, em que penso que todos somos suficientemente lúcidos para reconhecer que nem que estivéssemos aqui dez horas não chegaríamos B acordo. Todos nós estamos conscientes da diferença de conceito entre co-gestão e autogestão e penso que, sinceramente, não vale a pena a discussão, sobretudo depois de tudo que for para aqui dito já. O Dr. Jorge Miranda fez uma explanação histórica muito interessante, tudo o mais que foi dito tem muito interesse, mas creio que não reforçará o nosso esclarecimento a este respeito. Temos posições bastantes rígidas, temos que reconhecê-lo. A remissão para a lei pode ser inútil, mas não é tio útil como isso, mas a remissão para os estatutos então, a meu ver, inutilizaria o próprio conteúdo do direito.

Faço pois um convite aos colegas a que ultrapassássemos este ponto e não estivéssemos aqui a malhar em ferro frio.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - No fundo, a minha intervenção está prejudicada pelo que acaba de dizer o Sr. Deputado Almeida Santos.

É precisamente isto, são pontos em que fazem crise as diferentes maneiras de conceber as coisas. As posições são relativamente darás. No fundo íamos aqui reeditar as páginas e páginas do Diário da Assembleia Constituinte sobre esta matéria. Não vale a pena, as corsas são o que são, fazer política também é fazê-la com um certo realismo. Não há possibilidade de diálogo filosófico que nos convença, penso eu, nestas matérias.

Mantemos a nossa posição nesta matéria, de resto é coincidente com a que tomámos na Assembleia Constituinte que na altura não fez vencimento, e deixaremos isso.

Quanto à proposta da Frente Republicana e Socialista e à do MDP/CDE, que já foi retirada, entre as duas preferíamos a proposta feita pela FRS, pois a do MDP/CDE não podíamos aceitar. Mas, apesar de tudo, não vemos claro qual a necessidade e utilidade de inserção desta proposta no texto constitucional, sendo certo, como foi dito, que já é lei ordinária. No fundo estávamos a fazer o movimento contrário, o da constítucronafizaçâo da legislação ordinária, e nós propendemos, na medida do possível, para o movimento contrario, de desconstitucionalização da matéria cuja sede mais correcta seja, do nosso ponto de vista, a legislação ordinária.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lufe Beiroco.

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O Sr. Luís Beíroco (CDS): - Queria só dizer que concordo .perfeitamente com o que disse o Sr. Deputado Almeida Santos quer o Sr. Deputado Costa Andrade e quero fazer apenas uma nota em relação à remissão para os estatutos. Ela foi incluída no texto da Aliança Democrática apenas com a ideia dos casos em que os estatutos da empresa fossem mais longe na consagração de formas de intervenção e de participação do que a própria lei geral.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lage.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Quero apenas contestar a afirmação produzida pelo Sr. Deputado Cavaleiro Brandão de que este conceito de participação na gestão -tal como o entendiam- era mais amplo do que o controle de gestão. Para além de já aqui ter sido salientado que há doutrinais subjacentes aos conceitos, que são diferentes, não temos nenhuma indicação, não temos nenhuma prova, quer pela proposta que fazem quer pela pratica anterior, que assim seja, pelo contrário. Nunca o PSD ou o CDS fizeram qualquer projecto de lei em que estivesse definida qual a ideia que têm e que há muito tempo andam a propagandear sobre a participação na gestão ou co-gestão e sua amplitude.

Quando foi da discussão da lei da comissão de trabalhadores, o sentido do voto e das propostas tanto do PSD como do CDS, na maior parte dos casos, foi sempre no sentido restritivo dos poderes dos trabalhadores. Portanto, a sua afirmação seria importante se se traduzisse em actos. É uma afirmação meramente subjectiva, na medida em que factos anteriores e omissões indicam que o conceito que têm de participação na gestão é bastante restritivo e de natureza diferente do de controle de gestão. Como também disse logo na minha exposição iniciai, parece-me compatível o conceito de controle de gestão e de participação na gestão. Para alguns a participação na gestão tem um sentido de corresponsabilização e de co-gestão, para outros será uma forma de controle que vai mesmo dentro do órgão de gestão da empresa. Parecem-me compatíveis os dois conceitos e que até se deve explorar a fecundidade que encerram e, na verdade, a proposta da AD tem um sentido limitativo.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Não somos insensíveis ao apelo e às considerações feitas pelo Sr. Deputado Almeida Santos mas, em todo o caso, parece-me que em matérias tão relevantes é importante deixar clara a nossa posição.

Quanto a mim é muito claro que esta proposta de alteração da AD vem na linha das propostas de alteração relativamente aos artigos que nos têm ocupado nos últimos dias e que se reportam aos direitos dos trabalhadores. E todas elas são caracterizadas por uma orientação comum que é a redução dos direitos dos trabalhadores. Portanto, não vale a pena vir para aqui invocar filosofias, Bem; e se se trata de filosofia eu até reconheço que sim, que é uma outra filosofia. A filosofia que enforma estas propostas da AD é uma outra filosofia, diferente da do actual texto constitucional. Bem, mas é uma filosofia que se caracteriza exactamente por querer enriquecer, como dizia o Sr. Deputado, "os direitos dos trabalhadores", começando por retirar direitos aos trabalhadores no texto constitucional. É uma filosofia de classe, é uma filosofia patronal, é teso que é preciso reconhecer, é isso que é preciso dizer francamente. É nesta posição que nos encontramos e é por isto que as propostas de alteração da AD têm, neste domínio, a nossa completa oposição.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): -Vou ser breve, quero só focar dois ou três pontos. Nós, obviamente que vemos as propostas entroncadas, umas nas outras, articuladas. Esta proposta não é isolada, faz parte de um conjunto, como todas as propostas que se referem aos direitos dos trabalhadores, e faz parte de um conjunto em que se articulam todas as propostas relativas à Constituição económica. É uma outra Constituição de trabalho que a AD propõe, é uma outra Constituição económica que a AD propõe e isto é uma mera peça. É óbvio que não se poderá dizer sem cinismo, para não dizer desfaçatez, que este artigo não visa diminuir ou que estas alterações não teriam por resultado diminuir ou restringir os direitos dos trabalhadores! Pois é óbvio que se tais alterações fossem aprovadas as comissões de trabalhadores que actualmente podem participar na elaboração de disposições económico-sociais deixariam de o poder fazer. É óbvio que hoje que têm o direito não limitado de controle de gestão passariam a ter um direito de participar na gestão com toda a diferença que isto implica, mas nos (termos da lei ou dos estatutos. Se isto não é redução, então o que é que a AD entendia que seria redução?! Talvez "limpar", pura e simplesmente, o artigo e dizer aquilo que diz noutros artigos: a gestão fá-la o patronato e os empresários, os trabalhadores trabalham. Mas, claro, é esta a filosofia implícita e é contra ela que nós nos opomos. Também há esta questão: não nos basta constatar as diferenças de oposição e dizermos desde logo aquelas a que nos opomos imediatamente, É que a filosofia e as motivações que estão por detrás de certas alterações, por mais que nós nos opúnhamos, é importante para eliminar as razões de outras propostas de alteração e ajuda-nos a justificar por que é que não aprovamos outras que parecem mais inócuas do que estas, menos maléficas do que estas. Por isso é que achamos que, embora seja importante sacar a conclusão de que aqui não há qualquer possibilidade de compromisso, importa, no entanto, do nosso lado, pôr em relevo as razões por que o fazem para podermos justificar noutra sede as alterações que, articuladas com estas, constituiriam uma outra Constituição. E, para nós, rever a Constituição trata-se de aperfeiçoar esta e não pô-la fora e fazer outra como aparentemente propõe a AD, pelo menos em matéria de constituição de trabalho e de constituição económica. Creio que isto era importante dizê-lo, do nosso lado.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Srs. Deputados, passaríamos à matéria referente à gestão das obras sociais das empresas, constante da alínea e) da proposta da Frente Republicana e Sócia-

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lista, e a que também se refere a alínea b), na redacção dada pelo MDP/CDE. Alguém pretende intervir?

Pausa.

Como ninguém pretende intervir, entendo que se mantém as posições.

Em relação ao aditamento de uma nova alínea proposta pela FRS - que se refere a promover a eleição de representantes dos trabalhadores para os órgãos sociais das empresas, portanto ao Estado ou outras entidades públicas ou entidades directa ou incorrectamente sujeitas ao controle económico - alguém pretende intervir?

Pausa,

Como não há, passaremos à frente, artigo 57.º

A Aliança Democrática e a Frente Republicana e Socialista propõem aliterações a este artigo. Ã Aliança Democrática propõe a eliminação da segunda parte do n.° 1, a partir de condição, a substituição do corpo do n.° 2, a substituição na alínea d) do n.º 2 de "empresa" por "local de trabalho", o aditamento no n.° 2 de uma alínea referente ao direito de tendência previsto no actual n.° 5, no n.° 4 a modificação de "associações políticas" por "associações", o aditamento da expressão "à salvaguarda" e a supressão da expressão final, "fundamento da unidade das classes trabalhadoras".

A Frente Republicana e Socialista propõe o aditamento, no n.º 2, de uma alínea relativa ao direito de tendência e ainda o aditamento de um novo número respeitante aos direitos dos dirigentes e delegados sindicais.

Em relação a esta matéria, a Frente Republicana e Socialista não aceitou a proposta da AD para um n.° 1, tendo o Partido Comunista e o MDP/CDE manifestado a sua oposição. Quanto à proposta da AD para o corpo do n.° 2, a FRS, o PCP e o MDP/ CDE manifestaram a sua discordância. No que toca à alínea d), o PCP a FRS e o MDP/CDE opuseram-se à alteração adiantada peia AD, que ficou de rever a sua posição, que relativamente à nova alínea proposta pela AD e pela FRS, verifica-se que a ideia subjacente é comum, ficando por acertar a redacção definitiva. O Partido Comunista declarou não apoiar nenhuma das propostas.

Quanto às alterações propostas pela AD ao n.° 4 a Frente Republicana e Socialista decidiu reservar a sua posição. A proposta de um novo número apresentada pela FRS foi apoiada pelo PCP, tendo a AD reservado a sua posição. É tudo, em relação a este artigo 57.° Algum Sr. Deputado pretende intervir?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Quero apenas dizer que a AD, que decidira na subcomissão reconsiderar a questão da alínea d), retira a sua proposta de alteração.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Quero só dizer - não consta do relatório da subcomissão - que apoiamos a proposta do novo número, apresentada pela FRS, que seria o n.° 5 deste artigo.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Queria explicitar uma outra posição e suscitar um eventual desenvolvimento de alguns temas que foram objecto de discussão na subcomissão.

É óbvio que nos opusemos à alteração proposta pela AD para o corpo do n.° 2, na medida em que a proposta da AD visa eliminar a expressão que aponta para a garantia das componentes da liberdade sindical aos trabalhadores, sem qualquer discriminação. É nessa eliminação que consiste a proposta da AD, ela não foi explicitada mas o seu objectivo de empobrecimento, portanto de eliminação do princípio da não discriminação, é-nos completamente incompreensível.

Ou melhor, sendo compreensível por parte da AD. não podemos de modo algum apoiar.

Em relação ao n.° 5, proposto pela FRS, o nosso apoio deriva não apenas em relação a um ponto, em termos uma proposta semelhante àquela que se refere ao despedimento de dirigentes e delegados sindicais, mas também porque nos outros pontos nos parece que a proposta da FRS visa um reforço da explicitação constitucional dos direitos dos dirigentes e delegados sindicais que nos parece de todo em todo necessário, tendo em conta a experiência. O ponto que julgo poderia merecer alguma explicitação e desenvolvimento é a proposta da AD relativa ao n.° 4. Na verdade isso ficou um bocado no ar na discussão da subcomissão, a AD não chegou a explicitar bem qual era o sentido da proposta e creio que a FRS manteve reservas quanto a esse tema. Talvez fosse uma questão em que se pudesse esclarecer melhor o sentido da proposta da AD e a posição das outras . forças políticas em relação a essa proposta.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só algumas considerações para justificar a nossa posição.

Claro que nós não poderíamos aceitar, por razões que nos parecem óbvias, que desaparecesse aqui a referência do n.° 1 à unidade dos trabalhadores e defesa dos seus direitos e interesses, e dos tais cones que não podem deixar de ter sentido, uma vez mais o digo, sobretudo depois de cá ter estado. Mas já poderíamos considerar a hipótese de deixar cair a repetição do fundamento da unidade das classes trabalhadoras no n.º 4, por nos parecer que é uma referência que está implícita no que se diz no n.° 1. Quanto ao n.° 2, não podíamos de modo nenhum aceitar a proposta que foi feita pela AD, pela razão simples de que para nós é muito diferente dizer-se que a liberdade sindical compreende, nomeadamente" A B C e D e dizer-se, como se diz hoje, que no exercício da liberdade sindica] é garantido aos trabalhadores, e mais ainda, sem qualquer discriminação - não vemos razão nenhuma para que se elimine a exclusão da dis-

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criminação e para que se transforme uma garantia do exercício de um direito, na compreensão de algumas faculdades.

Relativamente ao n.° 4, já dissemos que concordamos com a eliminação de uma referência que nos parece já incluída no n.° 1, e de certo modo repetitiva, mas não estaríamos preparados para a eliminação do qualificativo de políticas, a seguir a associações.

Quanto às nossas propostas e, nomeadamente, quanto à do n.° 5, é óbvio que se trata, uma vez mais, da constitucionalização de alguns direitos que já existem na lei ordinária. Mas se há direitos na lei ordinária que merecem constitucionalização, a nosso ver, são estes. São uma garantia de reforço dos direitos dos trabalhadores, não discutimos evidentemente a redacção, essa pode ser objecto de acertos, mas gostaríamos que a AD - que reservou a sua posição - se manifestasse no sentido da aceitação desses direitos, ainda que com relativo empulamento quantitativo ou do tamanho da Constituição. Não é isso que nos preocupa, o que nos preocupa é que os direitos dos trabalhadores não possam ficar, além de um certo ponto, à mercê das contingências da lei ordinária.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Quanto ao corpo do artigo, a nossa posição parece-nos que se justifica até do ponto de Vista de economia constitucional. É evidente que a condição e garantia de construção da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses é um argumento de ratio legis, não acrescenta absolutamente nada de normativamente útil ao artigo, que ficaria: "é reconhecido aos trabalhadores a liberdade sindical". O que está a seguir é um aspecto de ratio legis, é uma fundamentação, enfim, ideológica ou uma certa construção ideológica a propósito de liberdade sindical, é perfeitamente legítima, mas não nos parece que tenha assento constitucional. Para nós é claro que não só não tem conteúdo normativo, não dispõe nada, não acrescenta nada no domínio da disciplina jurídico-constitucional, é apenas uma mera justificação ideológica, uma mera ratio legis entendida segundo determinada maneira, é evidente. É fundamentalmente essa a razão que nos leva a propor a sua eliminação, e com alguma convicção, dentro de uma certa concepção das coisas quanto à apresentação do texto constitucional. Entendemos que é perfeitamente dispensável este inciso, que é um elemento, repito, de fundamentação teleológica do artigo. Mas claro que naturalmente aprovaremos, quanto a isto, e vemos com agrado a sua proposta de eliminação no n.° 4. É evidente que aí, por maioria de razão, é absolutamente repetitivo.

Quanto ao n.º 5, esta proposta já deve ser encarada com outros olhos. Aqui sim, o conteúdo normativo da Constituição é enriquecido. Aqui são direitos que são constitucionalizáveis, ponto é saber, mais uma vez, se deve ser a Constituição a contê-los. Para nós, continuamos num estado de dúvida mas mais num plano de oportunidade de conceber as coisas nas relações entre o direito constitucional e o direito ordinário, que, quanto ao seu próprio conteúdo, de resto, fazem já parte do ordenamento jurídico actual Portanto, em relação a questões como estas vamos ver, não nos

opomos frontalmente ao seu conteúdo, não vemos razões de oposição, temos é dúvidas quanto à constitucionalização. Não queríamos que os professores de Direito Constitucional tivessem que ensinar tudo! Isto no fundo obrigava-os a ensinar o direito do trabalho e direito das relações laborais, isso seria uma sobrecarga um bocado exagerada!

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Eu consideraria a matéria do artigo 57.° ultrapassada e passaríamos ao artigo 58.°

A AD, a FRS e o MDP/CDE propõem alterações do seguinte teor: A AD propõe, no final do corpo do n.° 2, o aditamento de "exercer nos termos da lei" e a eliminação da segunda parte da alínea b) do n.° 2.

A FRS propõe, no final do n.º 3, o aditamento da expressão ao qual é garantido nos termos da lei". No n.° 4, a substituição de "competência)) por "legitimidade".

O MDP/CDE propõe, no corpo do n.0 2, o aditamento da expressão "cujo exercício será regulado na lei" e na alínea b) do n.° 2 o aditamento da expressão "em todos os níveis da respectiva estrutura". Em relação a esta matéria, as alterações propostas pela AD mereceram oposição da Frente Republicana e Socialista, do PCP e do MDP/CDE, não constando do relatório as posições em relação às propostas da FRS e do MDP/CDE.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Gostaria que me corrigissem, se prestar informações erradas.

Quanto ao acrescente da expressão "o qual é garantido nos termos da lei" suponho que houve oposição por parte do PCP e do MDP/CDE e concordância da AD.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Já agora concluiria a leitura do relatório, uma vez que há considerações sobre esta matéria.

Nota prévia: a enumeração das propostas de alteração apresentadas constam do relatório da subcomissão, bem como a súmula das posições assumidas pelos vários partidos ou coligações em relação às subscritas pela AD.

Quanto às propostas da Frente Republicana e Socialista, em relação ao n.° 3, a AD manifestou a sua concordância e o MDP/CDE e o PCP manifestaram a sua oposição.

Em relação ao n.0 4, a AD manifestou também a sua concordância, tratando-se de mera questão de redacção, o PCP declarou não apoiar a referida alteração dado a considerarem dispensável.

Quanto às propostas do MDP/CDE, em relação ao corpo do n.º 2, a AD manifestou a sua discordância e a Frente Republicana e Socialista e o PCP declararam não apoiar as referidas alterações.

Em relação à alínea b) do n.º 2, a AD declarou opor-se à referida alteração e a Frente Republicana e o PCP declararam não a apoiar.

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Será tudo em relação ao artigo 58.° Alguém pretende usar da palavra?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Tenho a impressão que há que fazer uma rectificação ao relatório.

A oposição da AD em relação à proposta do MDP/CDE não é em relação ao corpo do n.° 2, é ao n.° 2. O corpo do n.° 2 até 6 semelhante ao corpo do nosso n.' 2.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Alguém pretende usar da palavra sobre esta matéria?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Bom, as propostas da AD continuam a ter duas qualidades: a clareza e a coerência. Claras porque não enganam nem pretendem enganar ninguém, coerentes porque mantêm a mesma linha: desmantelar, reduzir, diminuir os direitos dos trabalhadores e das suas organizações.

Constituem direitos das associações sindicais, diz a Constituição, e a AD acrescenta: a exercer nos termos de lei. É óbvio, remete para a lei, portanto deixa à lei discricionaridade par definir os limites e os termos em que esses direitos existirão ou não. A alínea b) diz que as associações sindicais têm direito a participar na gestão das constituições de segurança social e noutras organizações que visem, etc., a AD elimina e saca a parte final. Certamente haverá algum deputado da AD que venha dizer, também aqui, que não se trata de diminuir mas sim de enriquecer os direitos das associações sindicais. Não sei se neste caso também algum deputado se atreve a fazer isso. Não nos surpreenderia, em todo o caso.

Portanto, nós opomo-nos com a mesma frontalidade com que nos opusemos as anteriores.

Em relação às propostas da FRS, não temos nada a acrescentar, é óbvio que o aditamento ao n.0 3, segundo o qual o direito de contratação colectiva é garantido nos termos de lei, tem algo a ver com aquilo que a AD propõe em termos gerais mas não é exactamente a mesma formulação e fazemos essa Justiça à proposta da FRS, o que - embora não nos levando a concordar com ela- nos leva, no entanto, a reconhecer que dizer ao qual é garantido nos termos de leio não é o mesmo que dizer "o qual é exercido nos termos da lei".

Trata-se de remeter para a lei os termos da garantia e não os termos do exercício desse direito.

Quanto ao n.° 4, não vemos vantagem, é supérfluo e não achamos necessário substituir competência por legitimidade, e portanto torna-se apenas de uma discordância nesse campo.

Em relação às propostas do MDP/CDE, discordamos do n.º 2 por razões idênticas às que já aditei a propósito de idêntica proposta da AD. Em relação à alínea b), achámos que era desnecessária, que não acrescenta nada e que ou era supérfluo ou então pode ser excessivo. Por qualquer das razões achamos que não há qualquer vantagem em aditar esse inciso, a todos os níveis da respectiva estrutura, à alínea b) do actual texto da Constituição.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herberto Goulart.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Em relação ao relatório da subcomissão, ele não é suficientemente expresso relativamente às posições que já tínhamos lá definido e eu repeti-las-ia aqui.

Tínhamos manifestado a nossa oposição, e aqui está expressa, à alteração ao n.° 3 proposta pela FRS. Na oportunidade dissemos que por razões semelhantes e que são visíveis, retirávamos a nossa própria proposta quanto ao corpo do n.° 2 e relativamente à alínea b), manifestámos a posição de manter esta nossa formulação, sem prejuízo de a vir a alterar, se formulação equivalente que há num outro artigo, numa outra proposta de outro partido, salvo erro do PCP, viesse a beneficiar do apoio desta Comissão.

_ O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Quanto às propostas da AD, nós não as podemos apoiar. Opomo-nos a elas por razões óbvias, o seu sentido é claro e neste caso não nos parece que possa haver qualquer espécie de entendimento. Queria também chamar a atenção para o sentido da nossa proposta, relativamente ao n.º 3 do artigo 58.°, que tem um sentido bastante diverso daquele que há pouco lhe foi dado pelo Sr. Deputado Vital Moreira. Não é exacto que quando se acrescente o inciso ao qual é garantido nos termos da lei", se possa retirar a conclusão que o Sr. Deputado Vital Moreira quis retirar, de que se diminuía o alcance do actual n.° 3 do artigo 58.°

É exactamente o contrário.

O que acontece hoje é que no n.º 3 existe a atribuição, digamos, de um direito de exclusivo às associações sindicais para o exercício do direito de contratação colectiva. E só isso. O n.° 3 do artigo 58.°, hoje, não consagra, com carácter genérico, constitucionalmente um direito à contratação colectiva. Apenas garante às associações sindicais que quando ele exista, e necessariamente por via da lei, são as associações sindicais que o exercem e não qualquer outro tipo de associação ou de entidade. Mas não há uma garantia do direito de contratação colectiva.

Nós passamos, através da nossa proposta, a garantir a existência desse direito, embora nos termos da lei. Não se trata de uma garantia da existência do direito de contratação colectiva, digamos, com carácter absoluto. Há, efectivamente, uma remissão para a lei, mas passa a ficar consagrada, pelo menos, através dessa garantia do direito de contratação colectiva, a necessidade de a lei não poder eliminar este direito e de ter que o "ferver" pelo menos em termos amplos.

O significado do nosso acrescentamento não é aquele que o Sr. Deputado Vital Moreira lhe deu, é um sentido exactamente oposto e suponho que o Sr. Deputado reconhecerá.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

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O Sr. Costa Andrade (PSD):-Não vou defender as nossas propostas, sobre as quais as diferentes forças já se pronunciaram, mas quanto às propostas apresentadas pela FRS já consta do relatório a nossa concordância de fundo no que toca ao n.° 3; quanto ao n.° 4 isto é uma questão de redacção. Por enquanto também ainda não vi bem qual o alcance da substituição da expressão "competência", que honestamente até me 'parece que seria aqui mais correcta do que a categoria mais processual do que substancial de "legitimidade", mas enfim, deixamos isso para a redacção.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, é apenas para - reforçado o que acaba de ser dito pelo Sr. Deputado Nunes de Almeida - deixar a sugestão à subcomissão de redacção para - na hipótese de haver dúvidas quanto ao alcance da proposta formulada pela Frente Republicana e Socialista, quanto ao n.° 3 - uma eventual autonomização de um artigo sobre a contratação colectiva que abrangeria os n.°s 3 e 4.

O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Passamos ao artigo 58.°-A.

Trata-se de uma proposta de novo artigo, constante do projecto do PCP sob a epígrafe "Protecção dos representantes dos trabalhadores".

Quanto à proposta deste artigo, manifestaram-se as seguintes posições, na subcomissão: A Aliança Democrática reservou a sua posição para ulterior reflexão, quanto à possibilidade de admissão de um preceito de garantia do exercício da acção dos representantes eleitos dos trabalhadores, temática sobre que versa o n.° 1 da proposta. Opôs-se à constitucionalização do princípio ínsito no n.° 2 da mesma proposta,

A Frente Republicana e Socialista pronunciou-se favoravelmente ao conteúdo deste artigo, tendo, contudo, sublinhado a sua coincidência com outras disposições constantes do seu próprio projecto, nomeadamente a alínea c) do n.° 5 do artigo 57.°, continuando a preferir, por isso, a formulação por ela inicialmente proposta.

O MDP/CDE manifestou o seu apoio à introdução deste artigo.

Algum Sr. Deputado pretende usar da palavra sobre esta matéria?

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Bom, as nossas propostas também são claras e coerentes. As da AD visam liquidar ou diminuir os direitos dos trabalhadores, as nossas visam aumentar ou reforçar. Portanto, também não há dúvidas sobre os propósitos nem sobre o seu alcance.

Bom, e como nós nos opomos às da AD, a AD, por razões óbvias e diversas, opõe-se pelo menos ao conteúdo mais directa e imediatamente relevante das nossas. Essa proposta tem a ver - tal como já se considerou a propósito do aditamento proposto pela FRS do n.° 5 do artigo 57.° -, com a resposta a uma

preocupação que a experiência cada vez mais vem pondo em relevo: é a de que os direitos das organizações dos trabalhadores serão em grande parte vazios de sentido se aqueles que mais imediatamente os simbolizam, os dirigentes dessas organizações, dirigentes sindicais e membros das comissões de trabalhadores, não tiveram protecção adequada contra a discriminação, contra a selecção repressiva dos trabalhadores. A nossa proposta em relação à da FRS autonomizámo-la porque não encontrámos meio de contemplar os dirigentes sindicais e os membros das comissões de trabalhadores numa mesma disciplina, uma vez que os artigos anteriores se referem uns às comissões de trabalhadores e outros às organizações sindicais, e por isso autonomizámos num artigo próprio à protecção dos representantes dos trabalhadores. Fora essa autonomização, a razão fundamental está aí. A experiência mostra cada vez mais que a ofensiva contra os direitos das organizações representativas dos trabalhadores não se faz tanto contra as suas actividades em abstracto, contra os seus membros em genérico, mas sim contra aqueles que a simbolizam, contra aqueles que a representam, contra aqueles sem os quais essas organizações não podem actuar. Seleccionar a repressão contra os dirigentes sindicais é o mesmo que intimidar todo aquele que se lembre de ser dirigente sindical, de dirigir lutas sindicais, seleccionar repressão contra membros de comissões de trabalhadores é o mesmo que intimidar genericamente todos aqueles que podem pensar em ser membros de comissões de trabalhadores ou aqueles que podem encabeçar a luta pia defesa dos interesses dos trabalhadores da empresa representada pela tal comissão de trabalhadores. Por isso a autonomização de uma norma especial, visando uma protecção especial dos representantes dos trabalhadores, se nos afigura extremamente necessária, tanto mais quanto é certo que começa a haver correntes.

Em segundo lugar, dizia eu que uma norma destas torna-se necessária, tanto mais quanto é certo que começam a aparecer afloramentos de uma preocupante tendência para inconstirucionalizar artificialmente as actuais normas legais de garantia dos representantes dos trabalhadores. E nem sequer falta uma declaração de inconstitucionalidade da lei de protecção especial aos dirigentes sindicais por parte da Relação do Porto, obviamente num acórdão de tal modo incrível que dá vontade de rir cinicamente quando se lê, mas que, embora não tendo importância por aí além nem qualquer possibilidade de passar nos órgãos superiores de controle de constitucionalidade, não deixam, no entanto, de ser um afloramento preocupante desse movimento que selecciona muito claramente - e os objectivos são evidentes - os dirigentes sindicais, para por essa via atingir a unidade sindical e os direitos das comissões de trabalhadores.

É por isso que normas como esta que propomos, paralelas àquela que a FRS propôs no n.° 5 do artigo 57.°, nos parecem não só justificadas como sobretudo necessárias,

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a (palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de dizer muito rapidamente que algumas intervenções que aqui foram feitas a

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respeito deste e de outro artigo merecerão noutra sede, no Plenário, uma resposta mais completa por pane da Aliança Democrática.

De qualquer modo, para me cangar agora ao artigo 58.°-A da proposta do PCP, gostaria de dizer que nós somos sensíveis, neste caso, às preocupações que o Sr. Deputado Vital Moreira formulou a respeito de alguns (problemas, designadamente o célebre acórdão da Relação do Porto. Daí que mantenhamos a nossa posição relativamente ao u.0 1 do artigo 58.°-A. ou seja, a receptividade à introdução de um dispositivo deste Cipo na Constituição.

Quanto ao n.0 2 do artigo 58.°-A, a situação é completamente diferente. O problema do despedimento dos trabalhadores diz respeito à garantia de trabalho e, naturalmente, os representantes dos trabalhadores terão que ter uma protecção especial que, aliás, a lei já consagra em sede da lei dos despedimentos.

Apesar de tudo o que se tem dito aí ultimamente a respeito do problema dos despedimentos dos trabalhadores, estamos convencidos de que não vai haver razões para que do ponto de vista da lei as coisas se compliquem. Portanto, parece-me desnecessário esta? a constitucionalizar o dispositivo deste n.0 2 e também o artigo 58.°-B, pelas mesmas razões.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de reforçar a conveniência de uma norma genérica que pudesse encabeçar aquilo que propomos no n.0 5 do artigo 57.°

Nós fomos para uma enumeração um pouco casuística, mas da qual decorre necessariamente um sentido de protecção que encontra melhor formulação no n.° 1 do artigo 58.° Pensamos que uma norma que definisse uma protecção de carácter geral e uma preocupação do legislador relativamente a acórdãos - como esse que aqui foi referido - poderia enriquecer o texto da Constituição. Portanto, era nesse sentido que eu me queria pronunciar.

Quanto ao n.° 2 do artigo 58.°-A, apresentado pelo PCP, temos algumas dúvidas de que a referência ao processo disciplinar - que não consta da nossa proposta e que aqui consta - deva constar ou não. Quer dizer, gostaríamos de pensar melhor se em todos os casos devemos fechar a porta ao recurso à acção judicial sem se completar o processo disciplinar. Hoje é assim, talvez isso deva ser consagrado na Constituição, mas sobre isto gostaríamos de pensar um pouco melhor.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que há razão para nos congratularmos com a sensibilidade que da parte de diferentes sectores se manifesta relativamente ao alcance da nossa proposta.

Queria também dizer que o meu camarada Vital Moreira já deixou claro que pensamos que é fundamental haver uma norma autónoma que dê igualmente cobertura aos dirigentes sindicais e aos membros das comissões de trabalhadores. Creio que nos tempos que correm são ainda os membros das comissões de trabalhadores que estão sobre o condicionamento e uma pressão maior. Portanto, se entendemos proteger os dirigentes sindicais, não poderíamos, sem praticarmos uma grande injustiça, deixar sem protecção os membros das comissões de trabalhadores.

Relativamente à proposta da FRS em relação ao n ° 5 do artigo 57.°, já manifestámos o nosso apreço e pensamos - no sentido que é agora adiantado pelo Sr. Deputado Almeida Santos - que talvez seja possível, a partir de uma norma genérica como o n.° 1 da nossa proposta, conceber depois para o n.° 2 um texto que contemple o que é adiantado por vós e também uma parte daquilo que é adiantado por nós. A nossa disponibilidade para chegarmos a uma redacção que dê cobertura a todas as preocupações manifestadas é muito grande, é total

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS):-Sr. Presidente, Srs. Deputados: Queria apenas chamar a atenção para o facto de que quando a FRS não apresentou um artigo próprio relativo quer a membros das comissões de trabalhadores quer aos dirigentes sindicais, e tratou desta questão no artigo 57.°, isso não era porque tivesse intenção de dar um tratamento diverso. Entendemos que se essa protecção fosse dada aos dirigentes sindicais ficariam automaticamente cobertos os membros das comissões de trabalhadores, por via do disposto no n.0 4 do artigo 55.°, onde se diz que "os membros das comissões gozam da protecção legal reconhecida aos delegados sindicais".

Ora, se se criasse um artigo próprio sobre a protecção de representantes dos trabalhadores, este n.° 4 do artigo 55.° passaria a ser inútil.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Visto não haver mais Srs. Deputados inscritos para usar da palavra, vamos passar ao artigo 58.°-B.

Este artigo é proposto pelo PCP, e tem como epígrafe "Garantias das organizações dos trabalhadores".

Quanto a esta proposta manifestaram-se as seguintes posições na subcomissão: A Aliança Democrática opõe-se à sua inclusão por razões análogas às invocadas na discussão da proposta, do artigo 58.°-A. A Frente Republicana e Socialista declarou não ser favorável à "inclusão deste novo artigo, por considerar redundante o seu n.º 1 face aos artigos 56.°, alínea d), 58.°, n.º 2, alínea a), deslocado em termos sistemáticos o n.º 3 - a apreciar ulteriormente quando do tratamento do Plano, artigo 94.°- e por ter reservas quanto ao teor do seu n.° 2; o MDP/CDE apoiou a inclusão deste novo artigo, sem prejuízo de considerar mais adequada a apreciação do seu n.º 3 quando da abordagem da temática do Plano.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, gostaria só de acrescentar que nos parece que a actual referência a uma participação na elaboração da organização de trabalho é mais ampla e mais abrangente do que a simples referência ao direito de se pronunciar sobre isso. O direito de pronúncia parece-nos restritivo em relação ao direito de participação.

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Quanto aos n.ºs 2 e 3 do artigo 58.°-B, pode parecer que, no fundo, o direito de pronúncia que é proposto se esgotaria com o que aqui se refere, nomeadamente pela falta de um advérbio: designadamente, nomeadamente, ou outro qualquer.

Portanto, parece-nos que não enriquece este artigo 58.°-B, embora provavelmente tenha sido essa a intenção, nem reforça os direitos dos trabalhadores.

Relativamente ao n.° 3 deste mesmo artigo, quando discutirmos o Plano poderemos ver se vale ou não a pena repescar a proposta que aqui é feita.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: As razões que nos levaram a apresentar esta proposta de aditamento foram fundamentalmente duas: por um lado, foi pelo facto de dar um conteúdo mais concreto a alguns dos direitos enunciados em artigos anteriores; por outro lado, para dar um lugar sistemático e único para esse conjunto de direitos de participação e intervenção das organizações dos trabalhadores.

Embora consideremos pertinentes as considerações feitas no sentido de desvalorizar a importância desse aditamento, consideramos apesar de tudo convenientes. Certamente que o n.° 1 deste artigo não adianta muito em relação ao direito de participação na organização da legislação de trabalho. Mas já não temos essa mesma opinião em relação ao n.° 2 e ao n.° 3 que, ao apontarem muito concretamente para a ideia da existência de representantes nas organizações de trabalhadores em determinadas instâncias, como seja nos órgãos de gestão das instituições centrais regionais de segurança social, seja nos órgãos nacionais, regionais e sectoriais de planeamento, significa uma concretização - a nosso ver útil, para não dizer necessária - de direitos anteriormente enunciados.

Embora se trate de explicitação constitucional de direitos já adquiridos e a nível de legislação - na generalidade, nem todos -, ainda assim entendemos que esta ressistematização num único local constitucional significaria uma vantagem e um enriquecimento da compreensão do lugar constitucional das organizações dos trabalhadores.

Em todo o caso, é óbvio que não atribuímos a esse artigo 58.°-B o mesmo alcance, em termos de protecção constitucional, que atribuímos ao artigo 58.°-A. No entanto, isso não nos leva de modo algum a sermos convencidos quanto à sua desnecessidade e muito menos quanto à sua inutilidade.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tal como acaba de ser reconhecido, é evidente que há uma diferença de importância e de relevo entre o artigo 58.°-A e o artigo 58.°-B.

Na verdade, o artigo 58.°-A introduz um conteúdo normativo útil no que toca à protecção dos dirigentes sindicais, conteúdo esse que não aparece no artigo 58.°-B. onde se trata de regulamentar o modo como determinados direitos, que já estão constitucionalmente adquiridos por força do artigo anterior, irão ser executados.

Como consta do relatório, nós não vemos com muito bons olhos a necessidade da inclusão deste artigo por duas razões fundamentais: por um lado, em concordância com aquilo que vimos dizendo, no sentido de descongestionalizar aquilo que a nosso ver não tem dignidade constitucional; por outro lado, porque estabelecidos os direitos com carácter substantivo, esta tipificação do modo do exercício pode até ser nociva pela sua rigidez.

A Constituição tem uma rigidez diferente da da legislação originária e não me parece que seja conveniente tipificar constitucionalmente os modos do exercício e os caminhos próprios da realização desses direitos.

Por estas duas razões, não iremos apoiar esta proposta do artigo 58.°-B.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Visto não haver mais inscrições, vamos passar ao artigo 59.°

Encontra-se na mesa uma proposta de um novo artigo 59.°, constante do projecto da AD, cuja epígrafe é "Associações patronais".

Em relação a esta proposta, manifestaram-se as seguintes posições na subcomissão: a Frente Republicana e Socialista opôs-se à sua consagração, por a considerar manifestamente inútil; o Partido Comunista também se opôs, por considerar que a sua consagração representaria uma reponderação da concepção da estrutura social do Estado constante do texto constitucional.

Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amaral (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-nos que existe uma lacuna na Constituição ao não se prever expressamente a existência de associações patronais.

Como é sabido, as associações patronais são organizações de natureza sindical -utilizando esta expressão em sentido técnico- e numa economia e num Estado que assegura a iniciativa privada são a contrapartida natural e histórica das associações sindicais. Portanto, parecia-nos útil que se fizesse esta referência, apesar de ela ser eventualmente desnecessária, uma vez que as associações patronais são uma instituição que a lei consagra perfeitamente.

De qualquer modo, parece-nos que a este respeito o exercício dos chamados direitos sindicais, designadamente o exercício do direito à contratação colectiva, pressupõe, na generalidade dos países em que existem empresas privadas, a constituição de associações patronais. Inclusivamente, creio que isto é da vantagem e do interesse dos trabalhadores, porquanto as associações patronais, normalmente, permitem facilitar o exercício do direito à contratação colectiva, o que seria bastante mais complicado se as empresas não estivessem associadas em associações de carácter patronal, pois isso facilita notavelmente - insisto - o exercício do direito a contratação colectiva.

Portanto, apesar de alguma oposição que se verificou na subcomissão, pensamos manter uma certa insistência neste aspecto, insistência essa que resulta da lógica do sistema.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

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O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Considerámos que este novo preceito é inútil na subcomissão, mas, além de inútil, considerámo-lo contraprudecente.

Considerámo-lo inútil porque a Uberdade de associação patronal é um corolário da liberdade de associação em geral. Poderá dizer-se que a liberdade de associação sindical também é um corolário, mas a história do constitucionalismo - e particularmente a história do constitucionalismo em Portugal no século XX -, mostra que a aquisição e a defesa da liberdade sindical é que corresponde a qualquer coisa de novo, a qualquer coisa que deve ser garantida pela Constituição, porque a função histórica das constituições é garantir aquilo que é ameaçado, aquilo que é fraco, e não garantir aquilo que por natureza das coisas não carece de uma garantia.

Aliás, todo o sentido histórico dos direitos económicos, sociais e culturais, em cuja sede se situaria este preceito, aponta nessa linha.

Eu compreenderia, em 1975 ou em 1976, que no contexto da época se inscrevesse na Constituição um artigo como este mas não compreendo isso hoje, até porque tal inclusão poderia significar que na vigência do regime constitucional não teria sido suficientemente garantida a liberdade de associação patronal, o que de modo algum corresponderia à verdade.

Em segundo lugar, é inútil porque, embora numa fórmula que poderá não ser inteiramente feliz, a Constituição já hoje o consagra numa preceito que é o artigo 94.°, n.° 2, em que se diz que "A elaboração do Plano é coordenada por um Conselho Nacional do Plano e nela devem participar as populações, através das autarquias e comunidades locais, as organizações das classes trabalhadoras e entidades representativas de actividades económicas".

Ora. este preceito foi aprovado em 1975 e nessa altura a Assembleia Constituinte, apesar do contexto externo - que porventura poderia ser considerado desfavorável - não teve qualquer dúvida em consagrar um preceito que garante a existência e a participação no Plano de associações patronais ou empresariais, como não pode deixar de ser, as entidades representativas de actividades económicas. Quem ler o Diário da Assembleia Constituinte poderá ver que é este o sentido.

Portanto, o preceito é inútil à face destes argumentos e, tendo em conta aquilo que acabo de referir, é contraprudecente. E é contraprudecente na medida em que levantar neste momento esta questão, longe de contribuir para o reforço da confiança dos agentes económicos, longe de contribuir para a defesa da iniciativa privada numa economia pluralista - e não numa economia pura e simplesmente baseada na iniciativa privada, porque esse não é o sistema português - é levantar a dúvida, é levantar a desconfiança, é, na minha opinião pessoal, servir finalidades diferentes daquelas que certamente presidiram aos autores do projecto.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP):-Sr. Presidente. Srs. Deputados: Creio que os argumentos repetidamente adiantados pela AD para justificar a desconstitucionalização de artigos e mais artigos entrariam

em crise se os Srs. Deputados se lembrassem desta proposta de constitucionalização da garantia das associações patronais, sobretudo tratando-se, como se trata, de uma garantia perfeitamente redundante.

Na verdade, não há lacuna nenhuma a respeito das associações patronais, pois elas estão garantidas, como todas as associações, pelo artigo geral do direito de associação.

Pode-se dizer que os partidos políticos e as associações sindicais têm os seus artigos próprios. Pois têm* por razões históricas e políticas muito conhecidas, na verdade, porque as associações sindicais carecem de garantia especial e específica. Historicamente assim foi; foi uma conquista penosa e que levou tempo a fazer, coisa que não se pode dizer em relação às associações patronais, a respeito das quais é pelo menos excessivo dizer que elas foram contrapartida histórica das associações sindicais. Toda a gente sabe que assim não foi.

Quanto aos partidos políticos e pela simples razão da contraposição em relação ao regime salazarista, compreende-se que a garantia dos partidos políticos tenha na Constituição o lugar que tem. portanto, a garantia específica que é necessária, compreensível e justa desses dois tipos específicos de associações não justifica que se vá autorizar todas as associações, porque também falta uma garantia específica para as associações culturais, desportivas, ecológicas e outras todas. Então por que não prever, a seguir ao artigo que garante o direito de associação, um artigo especial a garantir todas as outras associações? Não tinha sentido. Portanto, não existe qualquer lacuna.

Em todo o caso, compreendo que a AD insista neste ponto e que insista na defesa dos interesses da sua clientela política - para não dizer uma expressão mais forte.

As razões que nos levam a opormo-nos a este artigo não têm nada a ver com a não garantia com as associações patronais, pois isso nunca esteve em causa. O Sr. Deputado Jorge Miranda citou que em 1975/ 1976 seria compreensível consagrar tal coisa, mas a prova de que nem sequer em 1975 isso seria compreensível é que - se não estou em erro - ninguém o propôs, pois nunca estiveram em causa tais associações. E esta é uma das leis que foi preparada logo a seguir à revolução e, portanto, é uma lei que creio não ter sido contestada no seu globo, salvo alguns aspectos particulares.

Portanto, ir agora meter isto na Constituição seria completamente incompreensível, sem sentido e obedecendo a outros objectivos que não o de dar uma cobertura constitucional a algo que precisasse dela.

A nossa ideia quando dizemos que o segundo argumento a que nos opomos é o de que a sua inclusão representaria uma reponderação da concepção da estrutura social do Estado é uma forma um tanto crítica que o relator encontrou para muito simplesmente dizer que a Constituição actual é caracterizada por um claro favor laboratoris, um claro favorecimento do trabalhador..

Não queremos contribuir de modo algum para que este favorecimento e benefício dos trabalhadores, que caracteriza actualmente a Constituição, deixe de existir ou seja contra-equilibrar por uma constitucionalização do tipo desta, que implicaria automaticamente uma reavaliação do sistema geral do modo com a

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Constituição enfoca as relações sociais, as relações entre patronato e trabalhadores.

Portanto, por estas duas razões - pela sua inutilidade, desnecessidade e pelas suas implicações negativas - não estamos de acordo em constitucionalizar esta norma, insistindo que isso não tem nada a ver com as associações patronais, porque também esta proposta AD não tem nada a ver com isso, mas sim com interesses políticos de quem as constitui e não propriamente com a Constituição.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Jorge Miranda já expressou em grande parte aquilo que eu pretenderia dizer sobre este artigo.

Todavia, gostaria de acrescentar e pôr à reflexão o seguinte ponto: quando a Constituição regula e se refere expressamente às associações sindicais, há razões de ordem histórica para esse efeito que não têm paralelo com as associações patronais, mas, por outro lado porque a Constituição, atribuindo determinado tipo de funções às associações sindicais em diversas das suas exposições, justifica a necessidade de uma certa regulamentação do próprio tipo de organização das associações sindicais, diferentemente do que acontece com a generalidade das associações.

Ora, o que aqui se nos depara não tem nenhuma espécie de paralelismo. Trata-se agora, ao contrário do que acontece com as associações sindicais, não de definir a liberdade sindical e a constituição das associações sindicais e depois de regulamentar numa forma relativamente minuciosa a sua própria organização interna, embora com uma certa liberdade mas estabelecendo certas regras, mas trata-se de autonomizar as associações patronais sem mais nada.

Pergunto-me, por exemplo, se a AD estaria disposta - porque então, se se chegasse a constitucionalizar expressamente este artigo, seria necessário encontrar e fazer esse mesmo paralelismo- a tornar obrigatório o direito de tendência dentro das associações patronais, tal como nós e a AD propomos em relação às associações sindicais.

Seria necessário e indispensável garantir formas nos estatutos de direito de tendência porque, se se faz isto para as associações sindicais - é uma justificação até da sua própria existência-, seria necessário fazer o mesmo para as associações patronais. Estaria a AD disposta a aceitar coisa paralela?

Suponho que isso não teria grande sentido e demonstra que não há paralelismo entre as duas situações, pois são coisas radicalmente distintas. E com este próprio tipo de artigo vê-se que o artigo 46.° chega e sobra para aquilo que se pretende.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão.

O Sr. Cavaleiro Brandão (CDS): - Em primeiro lugar, tentando abordar aquilo que aqui foi referido como podendo significar a introdução de um preceito desta natureza, a modificação ou o prejuízo do princípio geral que no entender do Sr. Deputado Vital Moreira prevalece a nível do texto constitucional e que ele referiu como o princípio do favor laboratoris.

devo insistir em que esse princípio não fica posto em causa pela introdução de um preceito desta natureza.

É óbvio que o princípio do favor laboratoris tem sentido ao nível das relações entre o trabalhador e a empresa, mas também, como é óbvio, a consagração da liberdade de associativismo patronal não se ergue contra os trabalhadores nem tem nada a ver com eles, mas sim com as relações entre o patronato e o próprio Estado. É, pois, a esse nível que pode ter sentido o reconhecimento desta garantia.

E segundo lugar, queria dizer que há bocado o Sr. Deputado Jorge Miranda lembrou que o reconhecimento da maior pane das liberdades têm a ver com uma ideia de protecção dos mais fracos. Já na subcomissão tive oportunidade de acentuar que a liberdade do associativismo patronal tem a ver com a defesa dos mais fracos.

Por isso, eu acompanharia algumas sugestões que ficaram implícitas na intervenção do Sr. Deputado Nunes de Almeida. Quer dizer, eu próprio era capaz de reconhecer que, nos termos em que a liberdade de associativismo patronal fica consagrada, provavelmente poderia não estar suficientemente garantida a presença e a força das pequenas e médias empresas no seio das associações patronais e até a efectiva democraticidade do seu funcionamento. Por isso, julgo que poderíamos estar abertos a um desenvolvimento desta regulamentação em termos de avançarmos nesse sentido.

Penso que isto é importante, porque não basta dizer - como se diz noutros preceitos - que ao Estado cumpre preservar e defender as pequenas e médias empresas. Admito que nós próprios possamos fazer mais alguma coisa por elas e nesta sede teria cabimento o reconhecimento do seu direito a se associarem e a fazerem valer os seus interesse em relação a empresas que, por maior peso económico, pudessem vir a controlar, por exemplo, o associativismo patronal.

Julgo que se trata de matéria importante, julgo que se trata de matéria que o Estado não deve ignorar e que a própria Constituição poderá e deverá regulamentar.

Gostaria de dar apenas um apontamento, retomando a primeira das questões abordadas por mim e que resultou já da intervenção do Sr. Deputado Rui Amaral, pois mesmo em relação ao problema dos trabalhadores já há um bocadinho ele acentuou alguma coisa que é relevante. Isto é, do ponto de vista das organizações dos trabalhadores há normalmente preferência e vantagem em enfrentar entidades patronais associadas do que a desarticulação dessas entidades patronais, o que dificulta a contratação colectiva e o exercício de outros direitos colectivos dos trabalhadores.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu comungo da opinião dos que entendem que é desnecessária a consagração do direito dos patrões constituírem associações, mas não apenas isso, pois acho que ela seria perigosa. E isto porque esta disposição tem o aspecto de prato de balança: porque os trabalhadores têm esse direito, os patrões também têm que ter.

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Dá-me ideia que isso é consagrar na Constituição a concepção de que o patrão e o trabalhador são uma espécie de cão e gato. Portanto, não deveríamos consagrar essa imagem, porque já aqui foi feita quase a caricatura e, se fossemos então estabelecer esse paralelismo teríamos que começar por dizer: é garantida a liberdade patronal, o que era profundamente ridículo.

Depois, teríamos que dizer tudo o mais que se diz em paralelismo relativamente aos sindicatos e, com certeza, íamos ter num futuro breve o problema da unicidade e da unidade patronal e teríamos que ter qualquer dia um profundo debate sobre esse aspecto.

Ora, dá-me a impressão de que tudo isso tem um preço que não justifica a inclusão de um artigo desse género. Sinceramente, parece-me que esta concepção classista que estaríamos aqui a consagrar é não só inútil mas perniciosa ao futuro posicionamento dos patrões em face dos trabalhadores e dos trabalhadores em face dos patrões. Portanto, também por uma razão política e uma razão prática nós seríamos desfavoráveis à inclusão deste artigo.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Por pane da Aliança Democrática já foram explicitadas algumas razões que nos levam a sustentar este artigo. Por parte da Frente Republicana e Socialista e do Partido Comunista Português foram, sobretudo, aduzidos argumentos advogando a não inclusão deste artigo.

Tais argumentos não nos convenceram. No entanto, há alguma coisa a salientar de positivo e que fica para a história como elemento importante da interpretação histórica da Constituição revista que vamos ter: todos reconhecem a legitimidade constitucional da liberdade de associação. Ela não estava em dúvida, mas esta declaração de princípio tem utilidade do ponto de vista histórico.

Quanto aos argumentos utilizados para desaconselharem esta inclusão, francamente não nos convenceram, a começar por um dos argumentos utilizados, por exemplo, pelo Sr. Deputado Vital Moreira, que é o da desconstitucionalização quando diz que a AD perderia toda a legitimidade de desconstitucionalizar. Com franqueza!

Embora a Constituição não seja manifestamente como levar galinhas ao mercado onde vale é o peso das galinhas, a seguir a um artigo onde o PCP propõe um acrescento à Constituição de 33 linhas, que são os artigos 58.°-A e 58.°-B -repito, não se trata de levar galinhas ao mercado -, perde-se um bocado a legitimidade para usar este argumento, pois que a alteração que propomos tem apenas três linhas.

O argumento da desconstitucionalização que vimos utilizando é em caso de direitos que não têm ou não devem ter dignidade constitucional. Este tem, como de resto foi reconhecido por todos.

O Sr. Deputado Jorge Miranda chegou a argumentar que se consagrássemos este preceito isso assustava os empresários e eles já não investiam. Francamente que não compreendemos este argumento, assim como não compreendemos outro argumento do deputado Jorge Miranda que diz: cisto não se deve

incluir aqui porque as conquistas em matéria de liberdade, historicamente são conquistas da vertente laboral e não da vertente patronal", mas ao mesmo tempo vai dizendo que já está consagrada.

Portanto, estes são argumentos que não nos con-cem. Aliás, a favor da desconstitucionalização tinha um certo ar simbólico. O patronato não ficava preter-constituição.

Ficava integrado dentro do ordenamento jurídico-constitucional que é o ordenamento superior do Estado. Era uma certa afirmação de superioridade do diploma fundamental do Estado em relação a uma vertente importante da actividade económica.

A Constituição é mãe da legitimidade tanto de acção política como económica e, portanto, havia todo o interesse de a Constituição, apesar de tudo, pairar também sobre as associações patronais.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Brito.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - A nosso ver esta proposta da AD sobre a inclusão de um novo artigo consagrando as associações patronais vem, ao fim e ao cabo, desvendar a filosofia de que nos falava há bocado o Sr. Deputado Cavaleiro Brandão e que é a filosofia patronal subjacente a um conjunto de propostas da AD, designadamente neste capítulo da Constituição que estamos a abordar. Não deixa de ser curioso -aliás, como já foi salientado- que os Srs. Deputados da AD, ao procurarem consagrar esta inclusão no texto constitucional, tenham procedido com a maior largueza liberrimamente. Por exemplo, não fazem acompanhar a consagração deste direito de normas, dizendo que é garantida a Uberdade de inscrição, que nenhum patrão pode ser obrigado a pagar quotização para a associação patronal em que não esteja inscrito e afirmam que os corpos gerentes e os estatutos das associações patronais têm de ser aprovados em plenários dos patrões e por voto secreto, etc.

Quer dizer, não tomaram nenhuma destas cautelas. E não tomaram porquê? Por um respeito pelos patrões, que o não têm pelos trabalhadores? Eu não quero dizer que seja isso, pois suponho que seja por uma coisa diferente: é porque os Srs. Deputados sabem que este direito está consagrado na Constituição, assim como outros direitos. Portanto, sabem que estas normas e estes dispositivos são desnecessários.

Ao fim e ao cabo trata-se de querer pôr uma marca de classe na Constituição. E creio que os Srs. Deputados estão a ser pressionados pelo patronato a porem essa marca de classe na Constituição. Portanto, o patronato já não se limita a exigir-vos que reduzam os direitos dos trabalhadores; exige-vos mais: exige-vos que ponham o retrato patronal na Constituição da República,

Isso é que é inadmissível e eu pedia para os Srs. Deputados reflectirem neste assunto.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amarei (PSD): - Do nosso ponto de vista esta questão não é inútil e muito menos perniciosa.

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Gostaria de lembrar ao Sr. Deputado Vital Moreira que, de facto, há diversas interpretações da história. No entanto, com a autoridade que naturalmente reconhecerá a outros deputados, gostaria de lhe dizer que o problema das associações patronais é qualquer coisa que está perfeitamente ligado ao problema das associações sindicais. £ isto é uma coisa tão evidente que não vou voltar a esse ponto.

Contudo, há um aspecto que me parece que sobre ele está a existir uma grave falta de sensibilidade, designadamente da parte do Partido Socialista - pois da parte do Partido Comunista não me estranho muito- e que é o seguinte: se é verdade que os trabalhadores da função pública, hoje em dia, não têm direitos sindicais legalmente consagrados - isso é um facto histórico indesmentível - é porque a Intersindical se opôs a asso em 1975.

Gostaria de dizer ao Sr. Deputado Jorge Miranda que o problema da introdução das associações patronais não é uma questão inútil. E não o é porque o exercício de direitos sindicais, designadamente o exercício de direito à contratação colectiva, que é um dos direitos fundamentais dos trabalhadores, pressupõe - uma vez que se visa a contratação colectiva - a existência de uma entidade do outro lado que no caso das empresas privadas são as empresas directa e individualmente consideradas ao seu seio de empresas.

Ora é extremamente importante - e não vi este argumento ser rebatido -, para o exercício correcto do direito de associação sindical, que as associações patronais existam.

Mais: se o exercício do direito de associação patronal é um exercício livre, gostaria de dizer que no direito sindical português - aliás, como existem no direito sindical de outros países - existem limitações a esta liberdade. Por exemplo, lembro que, apesar da prática que se segue em Portugal, e que é muito grata necessariamente aos trabalhadores no sentido de estimularem as empresas a associarem-se nas respectivas associações, as convenções colectivas de trabalho, que da parte das empresas só obrigarão, nos termos da lei, as empresas filiadas, têm a seguir portarias cujo âmbito abrange todas as empresas não filiadas.

Quer dizer -e gostaria de assentar isto muito bem - que a defesa dos interesses mais profundos dos trabalhadores em países em que existe economia de mercado de empresas privadas justificaria muito abertamente que as associações patronais tivessem uma consagração constitucional. É nesta área que isso acontece e, como digo, resulta da necessidade, em termos práticos, de exercer um direito sindical fundamental, que é o direito à contratação colectiva.

Lamento que nem todos os Srs. Deputados de alguns partidos sejam igualmente sensíveis a problemas tão concretos, tão palpáveis e tão importantes como estes para os trabalhadores, designadamente em Portugal. Admito que haja outros países em que as práticas contrárias ao livre exercício do direito da contratação colectiva não são tão frequentes como em Portugal.

Precisamente por isso é que me parece que não só era uma lacuna grave da Constituição.

Enfim, gostaria de saber, então, a que propósito é que se metia aqui o lock-out e o direito à greve, mas já iremos falar sobre isso, porque também tenho alguma perplexidade sobre a posição da FRS.

Mas nós, Aliança Democrática, evidentemente que procuraremos bater-nos dentro destes princípios. É que isto resulta de uma especificação de um direito sindical que só se exerce desde que haja contrapartida e desde que essa contrapartida seja assegurada em termos mais eficazes para os trabalhadores -e não propriamente para as entidades patronais - por parte dos próprios sindicatos.

Quanto, à intervenção do Sr. Deputado Nunes de Almeida, diria que o problema do direito de tendência não se põe em causa, até porque estamos a falar de coisas sérias. O problema do direito de tendência tem a ver um pouco com a concepção política ou polítíco-sindical, o que não acontece no caso das empresas.

As empresas têm objectivos perfeitamente claros, mesmo as empresas privadas, que é a obtenção da máxima rentabilidade. No entanto, os trabalhadores têm concepções completamente diferentes, como o Sr. Deputado sabe, como seja a de abordar o problema dos direitos sindicais. Por isso é que existem duas centrais sindicais em Portugal e por isso é que há pluralismo sindical em vários países. É que existem concepções perfeitamente revolucionárias do exercício do direito sindical, existem concepções conservadoras ou intermediariamente reformistas, e num país como o nosso -em que o sindicalismo ainda não é completamente livre porque herdámos uma estrutura comporativa que se mantém maioritariamente sem grandes alterações - é fundamental assegurar esse direito de tendência, porque quando não se assegura nos termos da lei ele não se exerce. Mesmo assim, como o Sr. Deputado sabe, na maior parte dos casos não se exerce.

Não vejo que exista uma diferença radical de concepções. Não estou a ver nenhum empresário ter uma concepção revolucionária de relações de trabalho, sob pena de deixar de ser um empresário privado com filosofia capitalista.

Portanto, não há aqui diferenças quanto ao essencial. Parece-nos importante que este artigo seja incluído, porque isso significará mais um avanço no sentido da consagração dos direitos dos trabalhadores.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI):-Sr. Presidente, Srs. Depurados: Vou ser extremamente breve e limitar-me-ei ao seguinte: em primeiro lugar, não pude há pouco ouvir toda a intervenção do Sr. Deputado Costa Andrade porque fui chamado para sair da sala. Mas suponho que ninguém contestou uma afirmação que eu fiz e que é a de que já hoje a Constituição consagra a existência de associações empresariais ou patronais, ainda que empregando a expressão "entidades representativas de actividades económicas...".

O Sr. Rói Amaral (PSD): - Eu diria: mas não em sede de consagração de direitos sindicais.

O Orador - Suponho que a sede mais adequada é a sede da organização económica, onde a Constituição não apenas garante a existência como garante a participação no Conselho Nacional do Plano. Aliás, a lei ordinária tem concretizado o preceito do artigo 94.°

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Este é o primeiro ponto e é no sentido de insistir na inutilidade de se acrescentar um preceito, no não caber na sede de direitos económicos, sociais e culturais e no lamentar-se criar-se ou poder criar-se à volta desta questão um clima de desconfiança, que suponho não existir.

Mas nas intervenções dos Srs. Deputados Cavaleiro Brandão e Rui Amaral há dois aspectos a que não sou insensível. No que diz respeito ao Sr. Deputado Cavaleiro Brandão é a referência às pequenas e medras empresas. Suponho que aí uma qualquer afirmação positiva de garantia do associativismo poderá ter interesse, até para evitar aquilo que suponho que na prática muitas vezes acontece e que podem ser formas de esmagamento.

Mas, a ser assim, então sugeria que no artigo em que serão contempladas as pequenas e médias empresas se estude a possibilidade de se acrescentar uma qualquer referência ao associativismo das pequenas e médias empresas.

No que diz respeito ao Sr. Deputado Rui Amaral, lembraria que a sua preocupação no tocante a contratação colectiva não é totalmente desacompanhada

- muito pelo contrário - pela FRS. É por isso que a FRS, no artigo 58.°, n.° 3, vem acrescentar uma garantia da contratação colectiva em termos muito mais amplos do que aqueles que hoje se encontram na Constituição.

Portanto, suponho que a preocupação respeitante à participação das associações patronais na contratação colectiva é algo que está ao serviço dos trabalhadores, não terá grande razão de ser se a Aliança Democrática aprovar aquilo que a FRS propõe ou - como eu pessoalmente preferia - um artigo autónomo sobre a contratação colectiva, em que se começasse por afirmar em termos genéricos que é garantida a contratação colectiva. Isto pressuporia o reconhecimento da existência das associações patronais.

Garantir uma Constituição como a nossa, que já hoje garante, ainda que de forma algo ambígua - e há um parecer da Comissão Constitucional sobre isto -, a contratação colectiva, é garantir uma Constituição que de modo algum ignora, pelo menos implicitamente, as associações patronais.

Mas, se se quer dar um passo mais à frente, então que se aceite a proposta da FRS respeitante à contratação colectiva.

Isto para dizer que duas pistas de certa maneira alternativas da proposta da AD e que no fundo correspondem ao essencial daquilo a que eu pessoalmente não sou insensível, o associativismo nas pequenas e médias empresas, a garantia da contratação colectiva, asso não está de modo algum excluído.

Aquilo que me custa aceitar é que neste momento, em 1981 e não em 1975, haja um artigo sobre associações patronais.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira,

O Sr. Vital Moreira (PCP): - A nosso ver não foram adiantados argumentos que justificassem esta proposta, a não ser os de ir ao encontro de uma exigência política e de alterar a relação de forcas constitucionais - se me é permitido - no que concerne às relações sociais.

Antes de considerar este tema, creio que há vantagem em considerar duas questões: estou de acordo com o Sr. Deputado Rui Amaral quando diz que é possível discutir a questão histórica sobre as associações sindicais e as associações patronais, sem dar qualquer benefício à teoria, que me parece não exactamente destituída de fundamento, que desenvolveu.

Em todo o caso, o que creio é que não devíamos recorrer ou admitir a discussão na base da falsificação histórica, como aquela a que recorreu a propósito da sindicalização dos trabalhadores da função pública,

No entanto, há um tema que o Sr. Deputado desenvolveu e que me parece ser (importante: é a ideia de que existe vantagem em as entidades patronais estarem chefiadas, quanto mais não seja "para efeitos de contratação colectiva. Não discutimos esse ponto. Mas quererá isso dizer que o Sr. Deputado entende que basta a consagração constitucional de um direito já existente para as entidades (patronais correrem pressurosas e em bandos á acoitarem-se debaixo das organizações do Sr. Ferraz da Costa e companhia?

Acha que basta isso para que elas corram a associar-se a 100%? Ou será que isto é um primeiro ponto para vir a inscrição na CIP de todas as entidades patronais - na CIP ou noutra qualquer organização? Aí também estamos de acordo que embora não haja versões revolucionárias no patronato no que diz respeito às relações com os trabalhadores, há pelo menos tendências no que respeita à melhor forma de explorar os trabalhadores. Portanto, admitimos que possam haver tendências diversas e que a obrigação da inscrição não tivesse que ser necessariamente na CIP ou nas organizações a ela associadas.

Mas, a não ser que as suas considerações implicassem qualquer ideia de obrigatoriedade de inscrição, não vemos em que é que a consagração constitucional explícita deste direito implicasse qualquer instigação à organização das entidades patronais em associações.

No entanto, a nosso ver, o fundo da questão é o seguinte: é que o único argumento - para além dos políticos - até agora aduzido, a ideia da contrapartida e da paridade que existe à liberdade sindical da Constituição, às organizações sindicais e aos trabalhadores reconhecidos na Constituição importa reconhecer as (patronais. É um reflexo e um afloramento, como já disse na subcomissão da teoria da paridade a que se referiu o Sr. Deputado Almeida Santos, da ideia da contrapartida a que se referiu o Sr. Deputado Rui Amaral.

Ora, essa teoria da, paridade ou da igualdade de armas dos opositores sociais - que é um dos esteios da teoria conservadora alemã das relações de trabalho, que motiva, por exemplo, a igualdade de armas na greve e no lock-out que motiva outras teorias semelhantes - é uma teoria com a qual não podemos concordar. Não existe nenhuma paridade, pois ela só existe entre aquilo que tem igual força. Portanto, não há nenhuma contrapartida histórica, não há nenhuma relação directa de equilíbrio de forças entre a questão sindical dos trabalhadores e a questão patronal.

Por isso, invocar a contrapartida ou invocar a paridade é um argumento que, podendo ser pertinente na base das concepções da AD em relação a esta questão,

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não pode colher o nosso acordo, mas sim a nossa frontal oposição.

Na verdade, não existe paridade nenhuma. O que há é que constitucionalizar garantias especiais dos trabalhadores e das organizações sindicais contra o patronato e as suas organizações.

Uma voz não identificada: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que há duas passagens das intervenções dos Srs. Deputados Jorge Miranda e Almeida Santos que não deveriam ficar ignoradas pela nossa parte.

Em primeiro lugar, penso que deve ficar sublinhado aquilo que o Sr. Deputado Almeida Santos aqui referiu e acentuou no sentido de considerar que esta Constituição não é nem deve ser classista e que por detrás dela não se perfila uma filosofia do gato e do rato.

É óbvio que o gato e o rato nesta matéria - dado o desenvolvimento que a regulamentação dos direitos dos trabalhadores e seus representantes está contida na Constituição - só poderiam ser os trabalhadores e as suas organizações. Isto quer dizer que o Sr. Deputado Almeida Santos não pretende .que as associações patronais e o patronato possam ser aqui reconhecidos como um rato, talvez diminuído e reduzido à agravada, simpática e infantil função de novelo de lã.

Por isso, também eu penso que o Sr. Deputado Almeida Santos, na sequência da sua intervenção, estará disposto -e esperamos dele grande abertura e grande compreensão nesse sentido - a encarar com abertura de espírito a revisão de tudo aquilo que possa expressar o sentido classista da actual Constituição e o sentido classista das eventuais propostas de revisão avançadas pela FRS.

Aliás, logo nesta matéria o título -como já aqui ficou acentuado pelo Sr. Deputado Rui Amaral - que refere o direito à greve e à proibição do lock-ouí penso que não têm nada a ver com a tal história do gato e do rato ou, se tem, provavelmente vai haver uma verificação de posição por parte da FRS. Isto no que toca à intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos, que penso que esteve fora da suai tradição habitual de segurança, de subtileza e de importância.

No que toca à intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda, penso que não pode deixar de ser respondida uma questão que é importante, que já abordou na subcomissão e que mais uma vez me havia escapado: penso que a referência que a actual Constituição contém no que toca à participação das organizações económicas na elaboração ou na concepção do Plano, não só não implica o reconhecimento mas, exactamente ao contrário, pressupõe a necessidade desse reconhecimento.

Quer dizer, a Constituição tem implícita a ideia de que as organizações patronais têm direitos e deveres no que toca a um certo número de iniciativas e de actividades do Estado, nomeadamente no Plano, mas depois esquecer-se de lhe dar qualquer espécie de forma e de estruturação que ele próprio possa reconhecer como sério, de o regulamentar em termos que aqui foram de algum modo avançados.

Mas - insisto -, penso que aquilo que ali está à frente não é o reconhecimento do associativismo patronal, mas sim o contrário, é e tem como pressuposto a necessidade desse reconhecimento. No entanto, isso não implica à partida o reconhecimento, pelo menos em termos organizados e formais, como o exercício desse dever e desse direito na prática terá que exigir.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Amaral.

O Sr. Rui Amaral (PSD):-Em relação ao Sr. Deputado Vital Moreira, gostaria de salientar que falei em contrapartida e não em paridade - isto não tem nada que ver com as teorias que o Sr. Deputado aqui referiu.

Insisto que do nosso ponto de vista existe um direito de os sindicatos exercerem a contratação colectiva e deveria existir a obrigação de as entidades patronais corresponderem de uma forma leal ao exercício desse direito.

Portanto, não se trata propriamente de uma paridade nem de uma situação de igualdade, embora do meu ponto de vista - e em parte - eu entenda que os empresários inteligentes são aqueles que tendem a facilitar, na medida das suas conveniências de classe, o exercício da contratação colectiva e não aqueles que tendem a agravar conflitos.

Portanto, não se trata de igualdade de direitos. Pelo contrário, trata-se do exercício de um direito, por um lado, trata-se do exercício daquilo que eu diria uma contrapartida no sentido de uma obrigação, por outro lado.

Isto entronca com a intervenção do Sr. Deputado Jorge Miranda e releva mais uma vez da imponência de introduzir aqui uma disposição deste tipo. Por que não, eventualmente, irmos até mais longe do que isso e consagrarmos em termos constitucionais ou em termos legais no futuro, se não for possível na Constituição, o que teria sede adquadíssima neste local, designadamente a obrigação que as entidades patronais deveria caber de uma prática leal, no sentido de legal, de contratação colectiva?

Aliás, isto está consagrado em várias legislações de vários países democráticos do mundo e naturalmente que se houvesse receptividade por parte dos partidos da FRS quanto a isto, pela nossa parte estaríamos perfeitamente receptivos.

Isso parece-nos também uma lacuna, eventualmente até uma lacuna deste projecto de revisão da Aliança Democrática, porque queremos que a estabilidade das instituições democráticas em Portugal, o próprio desenvolvimento no movimento sindical em Portugal, pressupõe que o Estado adopte normas no sentido de levar as entidades patronais - e há várias formas de o fazer - à adopção de normas de comportamento leal nas relações de trabalho, designadamente ao nível da negociação colectiva.

Isso é mais simples de se introduzir, desde que as entidades patronais estejam associadas. Portanto, do meu ponto de vista - insisto -, é de toda a vantagem, não só em termos de classe laboral dos trabalhadores mas para o exercício correcto do direito da contratação colectiva que no meu ponto de vista é uma garantia de estabilidade das instituições democráticas, que este princípio fosse consagrado e até desenvolvido.

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O Sr. Presidente [Borges de Carvalho (PPM)]: - Srs. Deputados vamos suspender a reunião e continuaremos às 15 horas.

Queria pedir aos Srs Deputados para fazerem um esforço no sentido de serem mais pontuais para o início da continuação dos trabalhos.

A sessão foi suspensa.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sobre o novo artigo 59.° proposto pela AD, tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, é pena não estar o Sr. Deputado Rui Amaral, porque era fundamentalmente em relação a uma ou duas afirmações que ele produziu que eu desejava pronunciar-me. E era neste sentido: algumas das afirmações que foram feitas pelo Sr. Deputado Rui Amaral são até, eventualmente, judiciosas. Só que se destinam a defender ou outro qualquer preceito que não é proposto pela AD e que não tem nada a ver com aquele que estamos a discutir neste momento. Efectivamente - e aí estou perfeitamente de acordo com o deputado Vital Moreira -, a resolução integrai dos problemas suscitados pelo Sr. Deputado Rui Amaral, na lógica em que ele os apresentou, só se resolveriam, com a obrigatoriedade de filiação nas associações patronais, o que me parece estar fora de causa. Por outro lado a resolução de problemas relacionados com a contratação colectiva teria que ver com qualquer acrescento, por exemplo, à regra sobre a legitimidade para a celebração de convenções colectivas a trabalho, o que não é proposto pela AD.

Eu devo dizer que nós, em relação a isso, estaríamos dispostos a uma análise. A nossa oposição relativamente à introdução deste artigo da Constituição não é, obviamente, por a gente não gostar da palavra ou do termo "associações patronais". É pela inutilidade e pelas inconveniências que já foram aqui referidas. Mas isso não significa que a talhe de foice e por razões funcionais se não falem nelas na Constituição quando tal for útil, conveniente ou necessário. Mas isso são duas coisas distintas. E as afirmações que o Sr. Deputado Rui Amaral fez não têm nada a ver com esta questão da liberdade de constituição, porque essa, independentemente de cá estar ou não, já estava consagrada e não vai resolver nenhum problema novo.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Srs. Deputados, ultrapassaríamos o artigo 59.° proposto pela AD e entraríamos na matéria referente ao artigo 59.° e que é objecto de uma proposta de alteração do artigo 60.°

A este artigo propõem alterações a AD e a FRS. A AD propõe a eliminação do n.° 2 do artigo da expressão "não podendo a lei limitar esse âmbito" e o aditamento de um novo n.° 3, segundo o qual "to exercício do direito à greve não pode perturbar a prestação dos serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades nacionais básicas, que serão definidas por lei".

A FRS apenas propõe uma alteração de ordem sistemática, consistindo na fusão dos actuais artigos 59.° e 60.° num único artigo, que passara a ser o artigo 58.°, com a epígrafe "Direito à greve e proibição de lock-out, sendo os n.ºs 1, 2 e 3 desse artigo constituídos, respectivamente, pelos n.°s 1 e 2 do actual artigo 59.° e pelo corpo do actual artigo 60.°

Do debate que foi efectuado na subcomissão e que versou apenas as propostas da AD, dado ser prática da subcomissão não apreciar neste momento as propostas de mera alteração sistemática, resultaram as seguintes posições:

A FRS opôs-se à eliminação da parte final do n.° 2 do artigo 60.° e à remissão para a lei da designação dós serviços mínimos indispensáveis à satisfação de necessidades nacionais básicas que não possam ser prejudicadas pelo exercício do direito à greve.

O PCP e o MDP/CDE opuseram-se a todas as alterações propostas pela AD, porque as consideraram restritivas do direito constitucionalmente consagrado.

Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Era apenas para uma questão prévia sobre o próprio texto do relatório. Penso que na subcomissão o Sr. Dr. Nunes de Almeida admitiu, quanto ao aditamento do n.° 3 da proposta da AD, que, embora não houvesse qualquer abertura da FRS a considerar este n.° 3 com esta formulação, a FRS aceitaria reconsiderar a possibilidade de se acrescentar um n.° 3 que contivesse o que está na base da actual Lei da Greve.

Creio que isto tem interesse para a discussão na Comissão.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Correndo o risco de ser acusado de "malhar em ferro frio", ou creio que o ferro não está nada frio. Estas propostas AD entroncam na observação geral que vimos fazendo acerca das propostas da AD nesta matéria de direito dos trabalhadores.

Pretendia, apenas, reafirmar aquilo que desenvolvemos na subcomissão - e que não vou aqui repetir - no que respeita à fundamentação da nossa oposição a estas propostas, designadamente em relação ao n.° 2. Não podemos, de modo algum, concordar e, portanto, só podemos opormo-nos à eliminação da parte final desse número na parte respeitante à expressão "não podendo a lei limitar esse âmbito" que consta da redacção actual da Constituição e que a AD se propõe eliminar. Essa eliminação não poderia ter outra consequência se não significar a admissão do contrário, isto é, a admissão da possibilidade de a lei limitar o âmbito dos interesses a defender através da greve.

Em relação ao n.º 3: por mais que se argumente que ele se legitima na actual Lei da Greve, nós não entendemos assim. Na verdade, o n.° 3 tal como está - e independentemente de qualquer ligação com a actual Lei da Greve - permitiria, pura e simplesmente, proibir esse exercício do direito à greve em determinados sectores. E isso está completamente fora de qualquer possibilidade de nós considerarmos.

Insisto em que este n.º 3 não pode de modo algum ser legitimado com a invocação da actual disciplina da greve por parte da Lei da Greve.

O n.° 3 tal como está, lido a seco, sem qualquer outra ligação, permite, pura e simplesmente, que a lei venha proibir o exercício do direito à greve em determinados sectores, que a própria lei pode definir mais largamente, uma vez que não há aqui qualquer critério

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material que defina com suficiente rigor o que são essas necessidades nacionais básicas.

Contra isto não podemos deixar de nos opor. Quanto a outras propostas de eventual substituição com que a AD queria insistir nesta matéria, considerá-la-emos no momento em que forem apresentadas.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Quanto ao n.° 3.* parece-me que o princípio geral da constitucionalização de um limite, ou, pelo menos, da ideia de que há-de haver serviços fundamentais nos quais o exercício da greve esteja sujeito a determinadas exigências, é necessário. Este princípio geral, portanto, sem fixarmos já os seus contornos, parece-me que é uma ideia a que não seremos contrários e qualquer das forcas políticas não será contrária. De resto, a ideia, como já disse, está na actual Lei da Greve. Pode, eventualmente, negociar-se uma formulação alternativa melhor do que esta, melhor do que esta em termos de conseguir consenso mais fácil do que esta, mas parece-me que a ideia era de manter. E, portanto, talvez ultrapassarmos e depois, na altura correcta, aparecerá uma formulação susceptível de registar o consenso quanto à discutibilidade de incluir na Constituição um preceito como este.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Passamos ao artigo 60.°

Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Para que não restem dúvidas, quero afirmar que nós só nos pronunciamos acerca de propostas existentes que sejam apresentadas. E, portanto, não se pode invocar da nossa parte qualquer abertura a considerar propostas que não existem. Em relação à proposta que está, ela tem o nosso total desacordo, tem a nossa total oposição. Opormo-nos a toda e qualquer proposta que admita ou possa admitir, numa interpretação em que são hábeis todos os juristas que põem os seus dotes ao serviço dos interesses do patronato, qualquer admissão da proibição de greve. Isto não se dirige a ninguém. Eu vi alguns sorrisos na boca de algumas pessoas que prezo. Não dirigi tal a ninguém. Não era nenhum ataque.

Queria eu dizer que não admitiremos qualquer redacção que implique uma admissão da possibilidade de proibição da greve em qualquer sector que seja. Isto que fique explícito e, portanto, não pode ser invocada quaisquer possibilidade de adargar a nós um consenso que implique uma ideia disso.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Artigo 60.°: apenas de ordem sistemática, existe uma proposta de alteração da FRS.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Eu estive com a máxima atenção, mas, mesmo assim, fiquei sem saber exactamente em que paramos a respeito do artigo 59.°

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - A respeito do artigo 59.°, mantêm-se as posições que vinham da subcomissão, limitando esta Comissão quase a fazer declaração de voto, segundo entendi. Isto em relação ao n.° 3. Creio que, aliás, já constava.

O Sr. Deputado Nunes de Almeida quer fazer o favor de confirmar?

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, para não haver dúvidas.

Evidentemente que "nos mantemos exactamente a posição que assumimos na subcomissão. O que consta do relatório da subcomissão é integralmente exacto. O que lá consta é que nós nos opomos à remissão para a lei da designação dos serviços mínimos. Isto significa que nós não podemos aceitar e nos opomos determinantemente a este n.° 3 proposto pela AD.

Se aparecer uma outra proposta que respeite minimamente aquilo que nós consideramos ser essencial, pois nós estaremos dispostos a considerá-la nessa ocasião. É esta a nossa posição. Não há nenhum consenso sobre qualquer alteração, sobre qualquer proposta. A posição que tomámos na subcomissão mantém-se integralmente.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Dizia eu em relação ao artigo 60.° que, de ordem sistemática, apenas existe uma proposta de alteração da FRS, a que já se fez referência no ponto 3 do anterior artigo 59.°, bem como uma proposta, igualmente de ordem sistemática, da AD, visando integrar esta disposição no artigo 51.°, a qual não mereceu acolhimento.

Dado que são considerações de ordem sistemática, ficará para outra sede.

Quanto ao artigo 61.°, a AD e a FRS apresentam propostas de alteração.

A AD propõe a eliminação do n.º 1 do artigo 61.° da expressão ode acordo com o Plano" e ainda o aditamento no n.° 2 do adjectivo "viáveis" a seguir a "experiências".

A FRS propõe: no n.° 1, a substituição da expressão "devendo o Estado, de acordo com o Plano, estimular e apoiar as iniciativas nesse sentido" pela expressão "desde que observados os princípios cooperativos" (que já consta do actual artigo 84.°, n.° 2); a alteração da inserção do n.° 2 do actual artigo 61.°, que passa a constituir o novo n.° 3 do artigo 84.°; o aditamento de um novo n.° 2, segundo o qual "as cooperativas desenvolvem livremente as suas actividades e podem livremente agrupar-se em uniões, federações e confederações" (princípios actualmente constantes do n.° 2 do artigo 84.°); o aditamento de um n.° 3, com a seguinte redacção: "É reconhecido o direito de autogestão, nos termos da lei."

Do debate resultaram as seguintes posições na subcomissão:

Quanto às propostas da FRS:

A AD concordou com as propostas que apenas significam uma alteração da sistematização, tendo, contudo, reservas quanto à referência feita no n.° 1 aos princípios cooperativos e quanto à ulterior referência no artigo 84.° às experiências de autogestão.

O PCP considerou que as (propostas da FRS, ao representarem uma melhoria da técnica expositiva do texto constitucional, mereciam a sua concordância.

Quanto às propostas da AD:

Atendendo à concordância expressa pela AD às propostas da FRS de tratamento neste artigo, na óptica

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exclusiva da consagração de direitos, remeteu as suas propostas de alteração, cujo conteúdo se traduz essencialmente na definição de obrigações do Estado, para a discussão do artigo 84.°

Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Apenas para referir que as reservas expressas pela AD tinham mais a ver com o chegar-se ao artigo 84.°, para depois ver o problema globalmente. E já resultou da análise pela subcomissão do artigo 84.° que, quanto à primeira referência aos princípios do cooperativismo, essa reserva foi retirada, e, portanto, a única questão que permanece é depois em relação à autogestão: saber-se se deve ficar incluída no artigo 84.°, ou deve ficar num artigo autónomo. Ficaram os partidos de fazer consultas aos seus cooperativistas.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Creio que depois da discussão na subcomissão não restam, digamos; grandes discordâncias quanto ao conteúdo. Mas importa salientar o que creio ser um princípio de aquisição de discussão na subcomissão, que é uma clara distinção entre aquilo que deve caber na parte dos direitos fundamentais e aquilo que deve caber na parte da organização económica.

Na parte dos direitos fundamentais constarem as afirmações dos direitos e das liberdades e na parte da organização económica constarem as obrigações do Estado em matéria de apoio, quer em matéria de cooperativismo, quer em matéria de autogestão.

Nesse aspecto as propostas da FRS mereceram o nosso apoio, porque, na realidade, constituem uma melhoria muito sensível da sistemática, constitucional.

O artigo ficaria com esta redacção enxuta:

1 - Todos têm o direito de constituir cooperativas, desde que observados os princípios cooperativos;

2 - As cooperativas desenvolvem livremente as suas actividades e podem livremente agrupar-se em uniões, federações e confederações;

3 - É reconhecido o direito de autogestão, nos termos da lei.

No artigo 84.° ficaria então tudo aquilo que diz respeito ao apodo do Estado às cooperativas e à experiência da autogestão.

Quanto ao segundo ponto que foi discutido, a ligação no mesmo artigo entre cooperativas e autogestão, nós não fazemos questão disso. Aliás, tanto histórica como teoricamente há uma certa ligação entre a ideia de autonomia e autogestão social. Ligado ao cooperativismo, pelo menos ao cooperativismo doutrinário, de que foi expoente em Portugal António Sérgio. Não há, portanto, da nossa parte qualquer objecção à continuação da ligação das duas coisas e continuávamos a dar apoio à proposta que foi feita.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Passamos ao artigo 62.°, tendo a AD e a FRS apresentado propostas de alteração.

A AD propõe a substituição do n.° 2 deste artigo peto novo n.° 2, do seguinte teor:

A expropriação e a requisição por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante pagamento da justa indemnização.

O aditamento ainda de um novo n.º 3, dispondo que anão haverá confisco de bens, salvo no caso previsto no artigo 88.° da Constituição da República Portuguesa".

A FRS propõe a alteração da epígrafe do artigo, que passaria a ser "Propriedade e iniciativa privadas", e ainda o aditamento de um novo n.° 3, em parte coincidente com o teor do n.º 1 do actual artigo 85.°, mas com a seguinte redacção:

Nos quadros definidos pela Constituição e pela lei pode exercer-se livremente a iniciativa económica privada, enquanto instrumento de progresso colectivo.

Na subcomissão os diferentes partidos pronunciaram-se do seguinte modo:

A FRS opõe-se às alterações propostas quer quanto ao n.º 2, que quanto ao aditamento do n.º 3 da AD, porque a sua admissão implicaria a eliminação do n.º 2 do artigo 87.°, que prevê que, "no caso de abandono injustificado dos meios de produção, a expropriação não confere direito a indemnização". Admite, contudo, a FRS reservar uma posição definitiva para ulterior momento quanto à referenda à reserva de lei e quanto à inclusão de uma referência à requisição, constantes do n.° 2 da proposta da AD.

O PCP e o MDP/CDE declararam a sua oposição a todas as propostas apresentadas pela AD. Quanto às propostas da FRS, resultaram as seguintes conclusões do seu debate: A AD declarou a sua concordância, enquanto o PCP e o MDP/CDE declararam a sua oposição.

A FRS sublinhou que a aquisição definitiva das suas propostas está dependente da adopção das propostas de alteração de ordem de sistematização deste título, que igualmente apresentou e que foram remetidas para ulterior momento.

A AD sublinhou de igual forma que a concordância que manifestou com as propostas da FRS em relação ao artigo 62.°, não envolvia qualquer compromisso quanto às propostas de alteração da sistematização do texto constitucional concomitantemente apresentadas pela FRS.

Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luis Beiroco (CDS): - Apenas também para referir que do exame, já na subcomissão, de disposições ulteriores a AD, em relação ao caso dos bens que estão, em abandono, já mostrou grande abertura à proposta da FRS, pelo que solicitava que fosse considerada a possibilidade de no n.° 3 do artigo 62.° passar a falar-se anão haverá confisco de bens, salvo nos casos previstos nos artigos 87.° e 88.º da Constituição". Isto sem embargo, realmente, de a discussão entre juristas chegar à conclusão que afinal o caso da expropriação sem indemnização dos bens em abandono não constitui um caso de confisco, já que houve aqui uma certa dúvida sobre o conceito de confisco.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

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O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, e Srs. Deputados: Houve da parte da FRS a preocupação de valorizar simultaneamente aquilo a que se pode chamar aos direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores" e o "direito e iniciativa privada". Assim, por um lado, a FRS preconiza que no título II da parte I respeitante aos "direitos, liberdades e garantias" se abra um capítulo donde conste aquele núcleo fundamental dos "direitos, liberdades e garantias" dos trabalhadores, desde a liberdade sindical ao direito à greve, à proibição do lock-out, etc.

Por outro lado, a FRS preconiza que a referência à iniciativa privada que hoje consta do artigo 85.°, n.° 1, passe a constar do título atinente aos "direitos fundamentais", no capítulo específico que é o capítulo "Direitos económicos". Depois de a Constituição enunciar a iniciativa cooperativa, depois de aludir à autogestão, justifica-se plenamente, da nossa perspectiva, que a Constituição contempla a iniciativa privada como direito, como direito económico, como direito fundamental.

Já hoje, aliás, à face do artigo 85.°, n.° 1, poderia discutir-se a iniciativa privada, nos termos em que a Constituição a consagra, é ou não um direito fundamental Naturalmente não vamos entrar aqui nessa discussão, mas, pelo menos, a consagração em sede de direitos fundamentais da iniciativa privada traduz uma vontade assinalável de reforço do seu estatuto constitucional. Isso, ao mesmo tempo que deixa de se falar no n.° 1 desse artigo 85.°, transplantado para o artigo 62.°, em "Plano". Julgo, portanto, que a proposta apresentada pela FRS está inteiramente de acordo com as preocupações de compromisso e de pluralismo que norteiam já hoje a Constituição, que norteiam o .projecto da FRS, e que merece ser acolhida favoravelmente pela Comissão.

No que toca à ligação entre iniciativa e propriedade privada, trata-se, da parte da FRS, apenas de uma adjunção de materiais que têm uma evidente conexão, além de ter havido até a preocupação de não aumentar o número de artigos do texto constitucional.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, era apenas para me referir às questões colocadas pelo Sr. Deputado Luís Beiroco.

Nós temos, de facto, muitas dúvidas se no artigo 87.°, n.° 2, se trata de "confisco" e supomos que essa questão devia ser revista em conjunto, na medida em que, se não for "confisco", o problema estará em saber se deverá haver um ressalva no n.° 3 proposto pela AD ou no n.º 2. E, portanto, poderíamos remeter esta questão para momento posterior, reservando nós a nossa posição para o momento em que se discutir essa redacção dos preceitos.

Por outro lado, nós reservámos também a nossa posição na subcomissão e mantemos essa reserva para momento ulterior relativamente a dois pontos: Quanto à inclusão da "requisição" no n.° 2 deste artigo 62.° proposto pela AD e a referência à necessidade de autorização de lei para se efectuar qualquer expropriação ou requisição. Como disse, reservamos, também a nossa posição sobre estes dois pontos para momento posterior.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP:-Sr. Presidente, há 2 tipos de alterações a este artigo: Uma da AD e outra da FRS, que, estranhamente, ultrapassa a da AD nesta matéria.

Em relação às da AD, a nossa grande oposição é que, de facto, a combinação do ponto 2 com o ponto 3 resulta da articulação com a eliminação do artigo 87.°, n.° 2, isto é, da possibilidade de haver a expropriação dos bens de produção em abandono sem indemnização. Na verdade, no n.º 2 propõe-se a exclusão da expressão que actualmente consta do n.° 2 do artigo 62.°, segundo a qual há casos na Constituição em que a expropriação não dá lugar a indemnização, e um deles é, precisamente, a dos meios de produção em abandono, enquanto no novo n.° 3 proposto pela AD, referente ao confisco, abrange-se apenas, e a meu ver bem, o artigo 88.°

Portanto, é essa a nossa grande objecção. Se a AD mantivesse no n.° 2 "fora os casos previstos na Constituição" e, no lugar próprio, mantivesse o artigo 87.°, n.° 2, outra poderia ser a nossa consideração em relação às propostas da AD.

Quanto às outras, inclui a requisição, a prever o princípio da legalidade, a prever a questão do confisco, são questões a que a nossa redacção não é tão forte como, digamos, a abolição indirecta do artigo 87.°, n.° 2. Temo-las apenas por supérfluas ou por não necessárias, embora não de todo impertinentes, como é óbvio.

A proposta da FRS suscita-nos bastantes mais objecções, porque propõe uma coisa que nem a AD propôs, isto é, consagrar em sede de direitos fundamentais um direito de iniciativa privada. Não .é tanto pela transferência, mas, sim, porque o facto da inclusão em sede de direitos fundamentais juntamente com a propriedade privada não implica apenas uma reconsideração da iniciativa privada em sede constitucional; pode, inclusivamente, implicar uma reconsideração constitucional do direito da propriedade privada, que actualmente está feita em. abstracto, sem ligação privilegiada ao direito de propriedade dos meios de produção, e, portanto, à propriedade económica em sentido estrito. Mas, uma vez ligado com a iniciativa privada, ganha obviamente um papel privilegiado de garantia da propriedade privada dos meios de produção e, portanto, de garantir especialmente um tipo de propriedade.

Quanto a nós, parece-nos que, se algum tipo de propriedade deve ser garantido, deve ser o outro tipo de propriedade, a propriedade pessoal, e não propriamente a dos meios de produção.

Em todo o caso, é um ponto que consideramos de particular relevância na proposta da FRS. Não pode colher, de modo algum, o nosso apoio, pelo contrário, a nossa oposição frontal, tal como se ela viesse da AD - estranhamente, aqui terá havido uma espécie de subrogação. Mas, em todo o caso, isso não nos deixa de suscitar a possibilidade de sermos esclarecidos por que é que a proposta da FRS não só transmite para sede de direitos fundamentais a questão da iniciativa privada, como elimina a referência ao Plano. Quererá isto dizer que a proposta da FRS vai ao ponto de eliminar qualquer possibilidade de referência do Plano como quadro de referência da

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iniciativa privada e que o reforço constitucional do status da iniciativa privada proposto vai ao ponto de isentar de toda e qualquer referência e condicionamento por parte do Plano? É um aspecto que gostaríamos de ver esclarecido, para podermos, digamos, referir o grau da nossa consideração em relação a esta proposta da FRS.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Bom, eu inscrevi-me, mais ou menos, quando o Sr. Deputado Jorge Miranda tinha acabado de falar e inscrevi-me, fundamentalmente, para exprimir a minha concordância total com as considerações que ele acaba de tecer. De facto, há toda a conveniência em antecipar para o domínio dos direitos fundamentais, a referência à iniciativa privada, como o f az a proposta da FRS e pelas razões que ele. expôs, e bem.

O Sr. Deputado Vital Moreira não me parece que tenha plena razão quanto a mostrar-se tão chocado com esta alternativa. Eu próprio é que estou chocado um pouco com ele, pois o Sr. Deputado Vital Moreira reconhece facilmente a possibilidade de o "ter" ser um direito fundamental e não a possibilidade de o "fazer", criar riqueza, ser um direito. De certa maneira, bem sei que não estará nos seus propósitos, mas poderia eventualmente ver-se aqui o "ter" parasitariamente é um direito fundamental, o "fazer", o empreender, não o é. Não nos parece que tenha razão. De resto, no que toca à iniciativa privada é evidente que o ater" implica a necessidade de usar as coisas que legal e constitucionalmente se têm, no sentido de criar e de as fazer produzir.

Portanto, o direito da iniciativa privada de certa maneira estava co-envolvido no direito de propriedade privada. "Ter" é também ter empresa, enquanto a Constituição e a lei o permitirem. E, de um ponto de vista ético, parece-me que é tão legítimo, ou mais, proteger o fazer, o criar a riqueza, do que o simples ter.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Preferimos proteger o "ser" e não o "ter".

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vítor Constando, tem a palavra.

O Sr. Vítor Constando (PS): - Apenas para referir, no que diz respeito à proposta da FRS, que exclui da redacção do artigo 85.°, agora proposto, passar ao n.º 3 do artigo 62.° a referência ao Plano, para justificar essa alteração. Pareceu-nos que, consagrando a Constituição que o Plano apenas é imperativo para o sector público, e, expressamente, assim o consagra, era contraditório um artigo em que se faiava do exercício da indicativa privada - "exercer livremente a iniciativa económica privada" -, falar-se também que esse exercido só podem realizar-se nos quadros definidos pelo Plano. O que quereria dizer que então o Plano sem Imperativo também para o sector privado, visto que apenas dentro dos seus quadros este poderia exercer a sua actividade. Isto seria contraditório com os artigos que expressamente tratam do Plano e do seu carácter imperativo apenas para o sector público. Daí a alteração que propusemos.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Não há mais nenhum senhor deputado inscrito? Passaríamos ao artigo 63.°

Sr. Deputado Vital Moreira, se faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Respondendo até certo ponto à intervenção do deputado Costa Andrade, eu diria que entre o "ter" e o afazer" nós preferíamos uma terceira ao ser", sem deixar de proteger o necessário ater" para proteger o "ser". Não é isso que está em causa, como é óbvio, e o deputado Costa Andrade sabe-o tão bem como eu. O que está em causa é o aplauso com que as palavras do deputado dá AD na subcomissão foram recebidas a propósito desta proposta da FRS, de que nós não podemos obviamente compartilhar, pelo contrário, só poderemos lamentar que uma proposta da FRS nesta matéria possa ter, como tem, justificadamente, o aplauso da AD.

Em todo o caso, devemos dizer o seguinte: entre esta proposta da FRS, que é de passar a redacção do artigo 85.°, mesmo sem o Plano, para aqui, e a proposta da AD para o artigo 85.°, que visa, inclusivamente, retirar o condicionamento de progresso colectivo, é óbvio que nós preferimos a manutenção da redacção do actual artigo 85.° onde quer que esteja, pela simples razão de que entre um terramoto de grau 2 e um terramoto de grau 10, nós preferimos de todo sofrer dois!...

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Bom, eu, a bem da celeridade, queria só dizer o seguinte para não deixar passar sem um breve comentário a afirmação do Sr. Deputado Vital Moreira de que neste caso nós ultrapassámos a AD. Eu não queria envolver-me neste momento, e creio que os meus colegas também não estão interessados nisso, na discussão desse ponto. Queria só anunciar que oportunamente poderemos, noutra sede, quando tivermos uma visão global da revisão constitucional, discutir este ponto e ver, então, que a margem de novidade é praticamente nula e que, efectivamente, não ultrapassámos ninguém.

Vozes imperceptíveis.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, tem a palavra.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - A explicação que o Sr. Dr. Vítor Constando deu a respeito da proposta de eliminação do Plano, quanto a nós não nos parece suficiente ou, pelo menos coerente, porque aquilo que ali estava escrito podia ler-se assim: "nos quadros definidos pela Constituição, pela lei em geral e pela lei, essa particular, do Plano", porque é de uma lei que se trata. Mas anos quadros" não quer dizer que seja taxativo aquilo que se contém no Plano para a iniciativa privada, quer dizer que ela se enquadra também no Plano. Que este também a enquadra, sem que isso obrigue a que haja normas taxativas.

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E, portanto, o que se diz de facto na Constituição é que o Plano não é obrigatório para o privado, mas serve de quadro, pelo que continuamos sem perceber muito bem para que se retira o Plano. Por um lado, ele é uma lei, a lei do Plano, que nós sabemos todos - e o que estava aqui era a lei em geral nós sabemos todos o que é a lei em geral e a lei do plano em particular -, e, por outro lado, porque o que se diz é ano quadro definido", e isto não significa que o Plano se traduza em obrigatoriedade para a iniciativa privada, ou melhor, em estreita obrigatoriedade.

Gostaríamos de ouvir mais um pouco a justificação do Sr. Dr. Vítor Constando.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vítor Constando, pretende usar da palavra para explicitar melhor, ou entende que... Faz favor, então.

O Sr. Vítor Constando (PS): - Muito brevemente, para dizer que a referência que consta no artigo 85.° ao Plano é, de facto, distante de uma só referência à lei do Plano, porque essa é coberta por uma referência genérica à lei. Diz o artigo "nos quadros definidos pela Constituição, pela lei", ou seja, por todas as leis, incluindo a do Plano, e acrescenta apelo Plano em si mesmo", e isso é que nos pareceu dar origem a uma qualquer ambiguidade. É um facto que, existindo um Plano como a Constituição o consagra, é óbvio que ele é sempre um quadro de referência global para toda a actividade económica. Só que esse quadro de referência é fornecido e os instrumentos que o Estado utiliza para influenciar a actividade económica no quadro do Plano são instrumentos que actuam também sobre o sector privado de forma indirecta e não directa, através de instituições administrativas que lhe pudessem ser impostas directamente pelo Plano.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Quanto a nós, serviu perfeitamente o esclarecimento. Ficámos a saber que a lei do Plano é também o decreto-lei sob o qual é publicado o Plano em concreto, continua a ser o quadro de referência para a iniciativa privada, e que o retirar daqui do Plano não tem significado segundo a FRS. É isto exactamente. Muito obrigado.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Quanto ao artigo 63.°, a AD apresentou propostas de alteração, do seguinte teor: propõe a supressão, no n.º 2 do artigo, da expressão "de acordo" e a substituição da expressão "organizações sindicais e outras organizações das classes trabalhadoras" pela expressão "e associações representativas dos beneficiários, nos termos da lei".

Propõe ainda a substituição, também no n.º 3, da expressão "instituições privadas de solidariedade social" por "instituições particulares de solidariedade social" e ainda a substituição da expressão "que serão permitidos, regulados por lei e sujeitos à fiscalização do Estado" pela expressão "que dele farão parte quando se proponham finalidades de segurança social".

No decurso do debate exprimiram-se as seguintes posições:

Da parte da FRS, a reserva de posição quanto à expressão do n.° 2 "de acordo" e a oposição à substituição da parte final do mesmo n.º 2, manifestando, contudo, disponibilidade para encontrarem uma solução que contemple cumulativamente a redacção actual do texto constitucional e a referência às associações representativas dos beneficiários constante do projecto da AD.

Quanto ao n.° 3, a FRS opõe-se às alterações propostas pela AD, a qual, aliás, declarou pretender ponderar a questão para nova discussão em ulterior momento.

Da parte do PCP e do MDP/CDE registou-se oposição a todas as propostas da AD, tendo, contudo, aqueles partidos exprimido a disponibilidade de apreciar uma formulação do tipo da avançada pela FRS no decurso do debate quanto à parte final do n.° 2 do artigo 63.°

Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD):-Pronunciava-me, para já, e com argumentos puramente linguísticos, quanto à eliminação da expressão "de acordo". Parece-me que a expressão em si não tem um conteúdo que a justifique. "De acordo com" dava a entender que seria, naturalmente, uma ideia de carácter vinculativo dos pareceres ou do trabalho da participação das associações sindicais. Parece-me que o que está em causa é assegurar a participação. Assegurá-la nos termos legais. Ora o "de acordo com" significa que o que resulta da participação das associações sindicais é vinculativo; não é vinculativo. Parece-me que não está no espírito de ninguém tornar absolutamente vinculativo o resultado da participação das associações no sentido de que serão intervenientes, mas não poderão ser elas, com carácter vinculativo e com carácter imperativo, a decidir as questões. Portanto, o "de acordo com", e até de um ponto de vista linguístico, parece-me que não tem sentido e devia eliminar-se.

Quanto à proposta da AD no que toca aos beneficiários, parece-me de toda a conveniência inserir, sem sustentar, por enquanto, a substituição dos beneficiários às associações sindicais - de resto, as associações sindicais, de um ponto de vista da segurança social, são beneficiárias da segurança social -, mas o conceito de beneficiário é mais amplo e há uma certa tutela constitucional a categorias que já não fazem parte das associações sindicais. Por isso, parece-me que esta é muito mais ampla e tinha um conteúdo muito mais expressivo em relação a camadas muito expressivas da população que já não estão tuteladas pelas associações sindicais ou já não estão integradas nelas. Por isso, penso que devíamos arranjar uma fórmula cumulativa a discutir depois em redacção.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O relatório da subcomissão exprime exactamente aquilo que se passou. Nós queremos, apenas, reafirmar a nossa disponibilidade para considerar uma redacção alternativa para o n.º 2 que permita, ao lado daquilo que lá está, isto é, de as associações sindicais integrarem as associações de beneficiários, na medida em que, apesar de cada vez mais a nossa sociedade ser constituída por pessoas

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que trabalham na dependência de outra e, portanto, terem vocação para estarem integradas em associações sindicais, há, no entanto, sectores que não estão integrados ou não estão integrados nessa qualidade, e importa também admitir a sua participação na organização da segurança social. Daí a nossa abertura, que se mantém, e que é aqui reafirmada.

Queremos também reafirmar e acentuar a nossa oposição à alteração em relação ao n.° 3. Na verdade, cremos que a discussão na subcomissão não podia acolher, claramente, eco total no relatório. Eu creio que, aí, houve a conclusão de que, de facto, a proposta de redacção da AD para um novo n.º 3 não pode claramente colher apoio. As organizações, chamadas organizações privadas de solidariedade social, não podem deixar de estar submetidas a uma medida de fiscalização do Estado, por um lado, e, por outro lado, sendo diferentes do sistema público de segurança social, não podem ser consideradas como fazendo parte dele. São coisas diferentes, que podem coadjuvar, que podem ser coordenadas, que podem ser subsidiárias, que podem ser supletivas, que podem ser o que se ache, mas o que não podem é ser entendidas como fazendo parte do sistema público de segurança social. E; por outro lado, não podem deixar de estar sujeitas a uma medida de fiscalização estadual. A proposta AD implicaria, entre outras coisas, a total inconsideração do actual sistema - que ninguém põe em causa - de fiscalização pública das chamadas pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, entre as quais se integram estas, e, portanto, creio que uma reconsideração desta matéria, à luz das considerações que foram feitas na subcomissão, levará, necessariamente, a uma reconsideração da proposta da AD. Para além dos propósitos políticos que podem estar aí contidos e com os quais não concordamos. Cremos, no entanto, que, independentemente disso, seria, obviamente, necessário reformularmos aquilo que me parece um notório disparate da proposta AD.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Beiroco.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - A AD tinha ficado de ponderar o n.° 3 deste artigo 63.° à luz das considerações que a FRS produziu na subcomissão e que, não sendo coincidentes com as produzidas pelo Sr. Deputado Vital Moreira, foram, de facto, essas, e não estas agora por ele produzidas, que nos levaram a considerar esta questão e a retirar esta proposta. É que isto consistia, afinal, em o Estado poder intervir em instituições particulares que desejam continuar a desenvolver a sua acção como até aqui.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Registamos a atitude da AD como atitude positiva. As nossas reservas, na verdade, iam mais para o n.° 3 do que para o n.° 2. Em relação ao n.° 2, não se esgota num problema gramatical, mas em grande medida tratava-se de um problema gramatical. Nós consideramos que a referencia aos representantes dos beneficiários pode ser um acrescento útil se não sacrificar a referência às associações sindicais, que nos parece não justificada.

Quanto à expressão ade acordo" que implica uma vinculação que seria tanto mais grave quanto mais nós aumentarmos o número de pessoas a concordar, nós estamos dispostos a revê-la em melhor oportunidade. Neste momento admitimos a possibilidade de deixar cair esta expressão, embora ainda com reservas.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Relativamente ao artigo 64.° são propostas alterações pela AD e pela FRS.

A AD propõe a substituição de algumas expressões do n.° 2, a ficar com a seguinte redacção:

O direito à protecção da saúde é assegurado pelo estabelecimento de um Serviço Nacional de Saúde, nos termos da lei, bem como pela criação das condições económicas, sociais e culturais mais adequadas.

Propõe-se ainda a supressão da actual alínea c) do n.º 3 e a concomitante transferência da actual alínea d) para alínea c) do mesmo número e também o aditamento de uma nova alínea d), do seguinte teor:

Promover a saúde pública e a educação sanitária.

Propõe ainda a substituição na actual alínea e) da expressão "e controlar" pela expressão "e fiscalizar".

Por sua vez, a FRS propõe o aditamento de um novo número, do seguinte teor:

O Serviço Nacional de Saúde será gerido de forma descentralizada e participada.

No debate efectuado na subcomissão resultaram as seguintes posições:

A FRS, o PCP e o MDP/CDE opõem-se a todas as alterações propostas pela AD.

Esta, por sua vez, reservou a sua posição quanto à proposta de aditamento de um novo número da FRS.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Eu penso que a AD concordará que esta matéria é uma matéria que a própria AD se encarregou de tornar polémica e que traz uma carga política que faz com que nós não nos aproximemos de qualquer alteração possível sem as maiores cautelas.

Tenderíamos, portanto, a confirmar a posição que foi tomada na subcomissão dê rejeição global destas alterações - que não nos parece, na verdade, necessárias- e insistíamos na nossa alteração, uma questão que, provavelmente, a AD retribuirá, mas não vemos, por exemplo, razão válida para não aceitar a alínea d) 'do n.0 3. "Promover a saúde pública e a educação sanitária" é excelente, mas não vejo grande vantagem, sobretudo da parte de quem se propõe reduzir o tamanho da Constituição, mas também não vejo nenhuma razão que possa justificar que alguém neste mundo se oponha a que o Estado promova a saúde pública e a educação sanitária. Portanto, e tirando este aspecto, um pouco inócuo, peco e espero que compreendam que, por razões de outra ordem, não vale sequer a pena estarmos aqui a perder tempo com a discussão da proposta.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra.

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O Sr. Sousa Tavares (PSD): -Tanto quanto entendi das palavras do Sr. Deputado Almeida Santos, a FRS não considera discutível melhorias, indiscutíveis, aliás, como seria a da abolição da alínea c) do n.º 3 - "orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos -, bem como a referência ao Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, não é isso? A FRS não considera isto discutível?

O Sr. Almeida Santos (PS):-O problema é esse. Nós divergimos profundamente vasto, e tanto, que acho que não vale a pena discutir. Discutível é tudo. Se quiser vamo-nos entreter a discutir, aqui, isto. De um ponto de vista prático, eu acho que não vale a pena. Mas se nos quisermos entregar ao deleite intelectual de discutir, pois, com certeza, terei muito gosto nisso.

Se se espera que nós eliminemos daqui a referência à socialização da medicina, à natureza gratuita, universal, etc., compreende que isto tem sido tão discutido entre nós,...

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Dr. Almeida Santos...

O Sr. Almeida Santos (PS): -... ganhou uma carga política tão grande...

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Dr. Almeida Santos, entendamo-nos: é evidente que tem uma carga política muito grande. Estamos de acordo. Mas nós não podemos aceitar um Serviço Nacional de Saúde estabelecido em termos de universalidade, de generalidade e gratuitidade, independentemente dás circunstâncias económicas do cidadão, tal como está estabelecido na Constituição.

Primeiro, porque é irrealizável. É estúpido e irrealizável. E nós não devemos consagrar constitucionalmente aquilo que é estúpido. E ainda, por isso, aquilo que é irrealizável na prática. Tem se revelado isto com todos os termos, inclusivamente com os do PS, e continuará a revelar-se. E, portanto, quando a AD quer graduar a gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde conforme as possibilidades económicas dos cidadãos, suponho que a AD tem razão.

Se o- PS entende que os multimilionários devem ter acesso a um Serviço Nacional de Saúde gratuito nas mesmas condições das pessoas indigentes, a FRS ficará com o odioso do problema, mas não queremos que isto passe sem discussão. A nossa posição nisto também é implacável.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença? Sr. Deputado Sousa Tavares, julguei que me tinha interrompido, mas afinal de contas fez um discurso no meio do meu.

O que lhe queria dizer é o seguinte: desde já não ganha nada em classificar de estúpidas as posições dos que se lhe opõem, porque estúpido é usar expressões como essas que usou, desculpara que lhe diga.

Irrealizável não é aquilo que já foi realizado noutros lugares e que já foi realizado entre nós, por exemplo, em relação à educação em grande escala. Eu não sei se o Sousa Tavares está disposto a defender que os filhos dos ricos paguem a escola primária.

De qualquer modo, a circunstância de uma coisa ser difícil não quer dizer que seja impossível e acredite que os ricos recorrerão sempre à medicina privada.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Eu queria dizer que, na realidade, rejeitamos veementemente toda e qualquer forma de discussão, na Comissão e fora dela, que comece por classificar como estúpidas as posições divergentes das nossas.

Cremos que é uma posição que só pode justificar-se, na melhor das formas, por incontinência verbal e que um bocado de continência seria necessária.

Em relação ao fundo da questão, na verdade nós opomo-nos fundamentalmente a retirar da Constituição os qualificativos de generalidade, universalidade e gratuitidade que lá constam.

Não achamos impossível nem estúpida tal pretensão. E achamos que o argumento de que dar um Serviço Nacional de Saúde gratuito para os milionários seria a prova de que o sistema é estúpido é um argumento que de facto não colhe. Na verdade, os multimilionários continuarão a ir à Suíça e à Inglaterra, tal como continuam a ter as suas escolas privadas, apesar do ensino ser gratuito para toda a gente.

E o facto de o Serviço Nacional de Saúde gratuito poder ser mais caro do que o serviço nacional de educação gratuito não quer dizer, obviamente, que ele seja estúpido ou que tenha menos possibilidade de ser realizado do que foi realizado o sistema de educação. Provavelmente os argumentos que hoje se dirigem contra o Serviço Nacional de Saúde dirigiam-se há 50 anos contra o serviço nacional de educação universal, geral e gratuito. E, no entanto, apesar desses argumentos de estupidez, estultícia, o serviço nacional de educação universal, geral e gratuito é hoje uma realidade, felizmente, para quase todos os cidadãos portugueses e em muitos países. Esperemos que daqui a 50 anos, bastante menos do que isso, possa ser também uma realidade para toda a gente o Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Bom, eu devolvo os cumprimentos que me foram dirigidos. Não tive nenhuma incontinência verbal e continuo a dizer que é estúpida esta disposição.

Em primeiro lugar, eu queria dizer ao Sr. Dr. Vital Moreira que quando fala na gratuitidade do ensino deve estar mal informado. Porque o ensino continua a não ser gratuito. Continua a não ser gratuito nos livros, continua a não ser gratuito numa série de . coisas. Não, não é o problema AD! É o problema universal do Estado. É um problema que até aqui ninguém resolveu e que continua a ser agudamente posto em todas as aberturas de anos lectivos.

Quanto à questão do problema da saúde, põe-se com uma acuidade extraordinária. Não há nenhum país no Mundo que tenha realizado um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito. A não ser que nós condenemos esse serviço nacional universal, geral e gratuito a ser um serviço de terceira ordem,

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como acontece nos países socialista, em que os membros do partido têm um serviço especial e têm formas de tratamento especial. Se é isso que nós queremos criar, acho uma vergonha e uma indignidade nacional. Continuo a sustentar este ponto e peço a atenção da FRS para este ponto, que é um ponto vital.

Um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito não é hoje em dia pensável nas actuais circunstâncias da medicina moderna. Há determinados acessos a determinadas formas de tratamento que não podem, de forma nenhuma, ser considerados como podendo fazer parte de um serviço universal, geral e gratuito. E, portanto, eu continuo a sustentar: se não houver correcções num estado e numa nação essencialmente pobres como nós somos, depauperados no nosso sistema financeiro, se não houver elementos de temporização, inclusivamente de graduação financeira de acesso a este Serviço, como, por exemplo, sejam as taxas moderadoras que têm sido instituídas e. que têm sido tão criticadas exactamente à luz e à sombra desta disposição constitucional, se isto não for corrigido, nós temos aqui uma fonte permanente de conflitos, porque o irrealizável está longe de beneficiar o povo.

Nós ou queremos beneficiar o povo; ou queremos beneficiar os demagogos. O problema reside nisto. Se nós queremos, realmente, criar um Serviço Nacional de Saúde para uso da demagogia jornalística ou de demagogia política, para dizer que ele existe sem existir, perfeitamente de acordo com a disposição constitucional.

Se nós queremos criar um Serviço Nacional de Saúde para benefício do povo, para que ele tenha realmente um Serviço Nacional de Saúde digno desse nome, nós temos de criar determinado tipo de taxas moderadoras. Não podemos admitir a sua universalidade a todas as camadas da população. Temos de o fazer pagar sobre determinados aspectos. Isto é uma realidade que se imporá a qualquer governo, seja ele de que partido for. Claro que eu sei que os partidos comunistas costumam sofismar isto de uma forma muito hábil. Os partidos socialistas são ingénuos, não querem sofismar, mas depois, perante as realidades, metem o barco ao fundo.

Eu pergunto é se nós, perante uma realidade política e social como é a da Nação Portuguesa, podemos estar a criar mitos constitucionais e aldrabices constitucionais - que isto é uma aldrabice que não pode ser aplicada por ninguém-, ou se, na realidade, queremos criar um Serviço Nacional de Saúde que seja adaptado, e esta é que é a questão. Isto parece-me um elemento fundamental da Constituição que não pode ser tratado com ligeireza que deve ser, inclusivamente, tratado à luz do que se passa hoje em dia com os serviços nacionais de saúde em todo o mundo.

O exemplo da Inglaterra. Sabe perfeitamente o Sr. Deputado Vital Moreira que o Serviço Nacional de Saúde em Inglaterra tem sido corrigido sob variadíssimos aspectos, que hoje está com as maiores deficiências, que a medicina privada usurpou, em grande parte já, o papel de Serviço Nacional de Saúde e que, inclusivamente, deixou de ser universal, geral e gratuito.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Dadas as posições já definidas e as argumentações

já feitas, eu creio que deveríamos avançar. De qualquer maneira...

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Sr. Presidente, eu só queria acrescentar algo que me ficou por dizer, porque entretanto...

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado, faça favor de acrescentar...

O Sr. Sousa Tavares (PSD):-É que eu também não concordo com a redacção apresentada pela AD. Quero ser muito sincero.

Também não entendo como o direito à protecção da saúde é assegurado pelo estabelecimento de um Serviço Nacional de Saúde, nos termos da lei. Lá vem a eterna expressão anos termos da lei", que eu detesto, que eu considero anticonstitucional e perigosa. E, portanto, aí também não estou de acordo com essa redacção.

Não estou de acordo com a redacção actual. Faço "finca-pé" em que ela seja modificada. Recordo a todas as pessoas presentes o debate que houve este ano na Assembleia da República sobre Serviço Nacional de Saúde e gostaria que este problema fosse repensado na sua verdade e despido da demagogia fácil de que as palavras se rodeiam.

Nem estou agarrado à fórmula da AD nem, por outro lado, posso concordar com a manutenção da fórmula constitucional aqui presente.

Gostaria de pedir se isto não deveria ser repensado por todos os partidos.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Apenas para dizer que concordo perfeita e totalmente com a intervenção que fez o Sr. Deputado Almeida Santos.

Creio que esta é uma matéria em que as posições de todas as forças políticas representadas na Assembleia são bem conhecidas.

Creio que nenhuma das forças políticas vai abdicar substancialmente, nesta matéria, das posições que defende. E que, portanto, nesta disposição o mais que poderá de facto haver são aperfeiçoamentos da redacção, mas não se conseguirá com certeza fazer alterações substanciais. E, neste sentido, parece-me que -independentemente de depois do plenário poderem ser amplamente discutidas as várias propostas de alteração, a da AD e outras que eventualmente venham a surgir na área da AD e talvez noutras áreas- deveríamos não perder demasiado tempo na Comissão numa discussão que não nos conduzirá rigorosamente a nada.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Srs. Deputados, sem embargo de estarmos todos um pouco dubitativos em relação à possibilidade do que possa obter aqui na discussão, parece que convirá, apensar de tudo, termos bem consciência do que é que significam as propostas.

A verdade é que as propostas e a argumentação do único deputado da AD que argumentou a favor

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da proposta do Sr. Deputado Sousa Tavares conduzem a compreender, exactamente, a posição que tem a AD e a sua proposta. É uma posição classista que, aliás, contém uma contradição no objectivo. Porque começa no n.° 1 por não alterar e diz "todos têm direito à saúde, etc., etc." no n.° 2 empenha-se em afirmar que nem todos terão. Isto é uma coisa que, além desta contradição, o que significa é que o que se pretende que haja saúde para ricos e saúde para pobres.

O Sr. Deputado Sousa Tavares disse, e muito bem, que há certos tratamentos que não podem ser tidos como gerais, universais e gratuitos. Ao dizer isto significa o seguinte: haverá pessoas que têm direito a uma certa saúde e outras têm direito a outra, outras, porventura, a outra.

Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD):-Precisamente a minha posição não é essa.

Eu entendo que deve existir um Serviço Nacional de Saúde e que a sua gratuitidade deve ser graduada conforme as possibilidades que as pessoas têm, é isso que os senhores não admitem, o que acho completamente absurdo.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Bom, Sr. Deputado, nós não achamos absurdo. Já aqui foi dado o exemplo do ensino, que é um exemplo magnífico, mas podia referir outros exemplos.

Para o confrontar com uma realidade, o problema que está subjacente à nossa proposta é a defesa da possibilidade de utilização da saúde, do direito à saúde, como meio de ganhos, de ganhos capitalistas. Esta é que é a questão, Sr. Deputado. Porque os senhores não se lembraram de propor que a segurança e a ordem pública asseguradas pela PSP, GNR, etc., sejam pagas. Porque aqui não há nenhum filão a explorar. Os senhores deputados não se lembraram de propor que, por exemplo, a defesa nacional e as forças armadas sejam pagas directamente pelo utente, porque aqui também não se vê imediatamente um filão a explorar. Mas os senhores lembram-se de propor que e medicina e os cuidados de saúde sejam pagos, porque aqui há um filão a explorar. O problema são dois: um é a visão classista que vocês têm; outro é a protecção dos lucros privados da medicina. E é esta simplesmente a questão. Não há nada de impossível do que aqui está na Constituição. Também o que se pode dizer é que não é realizável de um dia para o outro e nisso estamos todos de acordo. Mas impossível não é, nem é estúpido, evidentemente. Nem estulto sequer. Nem nada de utópico mesmo. O que aqui está pode realizar-se com vantagem para todos nós, inclusive para os ricos, Sr. Deputado.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Carlos Brito, mantém a sua inscrição?

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sim, muito rapidamente, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Então, faz favor.

O Sr. Carlos Brito (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na verdade, o meu camarada Veiga de Oliveira já adiantou muito da nossa posição, agora já em réplica ao Sr. Deputado Sousa Tavares.

Em todo o caso, o Sr. Deputado Sousa Tavares usou expressões e fez afirmações que nós não podemos deixar passar sem uma referência mais. Quero começar por dizer que, quando o Sr. Deputado diz os "comunistas têm meios de sofismar", eu agradecia que o Sr. Deputado não usasse expressões como esta para que nós não tenhamos que replicar com expressões semelhantes. Como o Sr. Deputado sabe podemos usar. Vamos, então, moderar a linguagem e, particularmente, se não entende que deve fazê-lo em relação a outros, nós, pela nossa parte, pedimos-lhe, insistentemente, que modere a linguagem em relação a nós.

Também queremos dizer que muitas coisas que o Sr. Deputado afirmou não são verdadeiras, não têm nenhuma cobertura. E onde o Sr. Deputado diz que não pode, nós dizemos pode.

Risos.

É essa a nossa posição.

Eu creio que é difícil nós aceitarmos que o problema do Sr. Deputado Sousa Tavares em relação ao Serviço Nacional de Saúde e à definição constitucional que dele é feita como serviço universal, geral e gratuito não é apenas uma questão das taxas moderadoras. Mas, de qualquer maneira, era bom que o Sr. Deputado explicasse se assim é, se é só uma questão das taxas moderadoras. Eu não acredito que tanta paixão seja provocada pelas taxas moderadoras. Eu creio até que a falta de lucidez do Sr. Deputado nesta questão, a sua falta de razão, tem um critério que decorre das suas próprias palavras.

Quando o Sr. Deputado acha que o mal do Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito é o ele poder dar alguns serviços de medicina gratuitos aos milionários, isto mostra a insensatez da posição do Sr. Deputado Sousa Tavares. Eu não quero dizer que o Sr. Deputado Sousa Tavares seja um defensor do comércio da saúde, que seja um defensor do comércio da medicina. Eu faço-lhe justiça de pensar que não é assim, que há outras motivações que o animam, que o fazem intervir nestas questões com tanta exaltação e com tanto entusiasmo. Mas, na verdade, aquilo que o Sr. Deputado faz é defender o comércio da saúde. É isso que o Sr. Deputado faz. O Sr. Deputado tornou-se o porta-voz dos defensores do comércio da saúde e com a ousadia que muito poucos usam utilizar. Parece-me que é isto e o Sr. Deputado deveria ponderar.

E, talvez, se o Sr. Deputado está seriamente preocupado com esta questão e está seriamente preocupado com um serviço de saúde que seja realista e que só lhe causa, ao fim e ao cabo, essa objecção, de ser necessário comportar taxas moderadoras, talvez tenha que rever bastante da sua atitude, da sua posição, e de juntar-se a nós, que nos preocupamos, seriamente, sem profismas, em encontrar os caminhos da saúde para o nosso povo, como o demonstrámos, por exemplo, quando fizemos na Assembleia da República uma interpelação ao Governo nesta matéria. E aí não só nos limitámos a contestar teoricamente, mas procurámos trazer ao conhecimento da Assembleia múltiplos casos, múltiplos problemas

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concretos da saúde do nosso povo, que revelam, pelo menos isto, o nosso interesse por esta questão e o nosso empenhamento em conhecer os problemas.

Era isto que mais deveria sensibilizar o Sr. Deputado Sousa Tavares e não outras questões, em que padece, pelo menos, do desconhecimento da realidade não só nacional, como, veio, lamentavelmente também, da realidade internacional

Eram estas as considerações que queria fazer.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Srs. Deputados, estão inscritos dois senhores deputados: o Sr. Deputado Almeida Santos e o Sr. Deputado Sousa Tavares. Eu vou dar a palavra aos senhores deputados que estão inscritos e depois vou passar ao artigo seguinte. Sr. Deputado Almeida Santos, faz favor.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Como o Sr. Deputado Sousa Tavares, meu querido amigo, hoje veio mal disposto depois de almoço e já pediu a palavra, era para ver se lhe pedia que não me chamasse mais nomes. Começou por me chamar um nome feio, que eu tive de retribuir com alguma deselegância, mas logo a seguir chamou-nos ingénuos. Depois faiou em aldrabices constitucionais, depois falou em agradar ao povo, aos demagogos, eu sei lá. Hoje está mal disposto, não há dúvida...

Há aqui uma coisa que eu não entendo. Nós estamos preocupados em que o povo tenha medicina gratuita. O Dr. Sousa Tavares, contra isto, está preocupado em que os ricos não paguem a medicina. Há aqui qualquer coisa que não está certo...

Risos.

Então os ricos não vão pagar? Sinceramente, nós não somos contra o facto de os ricos pagarem a medicina. Se esse for o caminho mais curto para os pobres e remediados a terem de graça, conte comigo. Só que eu não acredito nisso. O problema é só esse.

Então, Sousa Tavares, nós, nas Constituições, devemos também sonhar com um bocadinho de utopia. Suponhamos que é difícil de realizar. Nós sabemos que é. Impossível não é. Mas então temos que eliminar da Constituição tanta coisa que cá está, que não é atingível no imediato, o direito à habitação, sei lá, tantos direitos que há aqui que são metas que nós procuraremos atingir o melhor possível.

Mas, de qualquer modo, sempre lhe quero dizer também que já encontrámos aqui tantos exemplos de gratuitidade, universalidade na educação até certo nível. Em muitos serviços. E então essa sua preocupação de os ricos pagarem aquilo que os pobres não devem pagar em matéria de medicina temos que levá-la inclusivamente aos preços da comida. Por que é que a comida há-de ter o mesmo preço para os ricos e para os pobres? O senhor é revolucionário, muito mais do que nós. É um colectivista, muito mais do que qualquer de nós. Nós até nem o somos. Há qualquer coisa aqui que eu não entendo e, só para acabar - não nos vamos alongar -, queria dizer-lhe que os ingénuos são normalmente os mais sinceros.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Ninguém respondeu às minhas objecções nem àquilo que eu disse.

Em primeiro lugar, queria dizer que não falei nos comunistas portugueses. Falei nos governos comunistas e na forma como eles têm resolvido o problema, que é uma coisa completamente diferente.

Se os senhores assimilam a esses governos, pior para os senhores. Eu não tenho culpa nenhuma disso, não tenho nada a ver com isso.

Quanto ao Sr. Deputado Almeida Santos, eu queria dizer o seguinte: pois o Sr. Deputado Almeida Santos mostrou uma certa abertura - eu não quis insultar ninguém - mas eu continuo a manter que disposições com esta têm uma gravidade muito grande porque se reflectem na prática, porque não são certas. Uma coisa é o senhor dizer que todos têm direito ao trabalho, à habitação, a isto e àquilo, e outra coisa é uma imposição constitucional da organização de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito. É completamente diferente, porque entra numa matéria puramente concreta. Ora, qual é a minha finalidade? Parece-me que ela é perfeitamente razoável: é que nós possamos criar para a população que está necessitada -e aí penso que ninguém pode duvidar das minhas intenções, que, aliás, têm sido afirmadas por milhares de vezes e em milhares de sítios diferentes - um serviço de saúde o melhor possível. Simplesmente, eu entendo que esta disposição constitucional é contrária a esse desiderato. Na medida em que nós estipulemos um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, nós o estamos, de antemão, a condenar a ser um serviço degradado, a ser um serviço de segunda, e não um serviço de cuidados condignos.

Eu entendo, portanto, que há aqui elementos que se opõem; na medida em que nós queremos um Serviço Nacional de Saúde digno para o povo que precisa dele, não o podemos criar como universal, geral e gratuito, Se o queremos criar como universal, geral e gratuito, automaticamente nós estamos a condená-lo a ser degradado ou a ser falsificado. A opção é vossa.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador - Faz favor, Sr. Deputado.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP):-Sr. Deputado, repare no seguinte: o senhor diz que para ser digno o Serviço Nacional de Saúde - para ser, afinal, eficaz, é o que cabe dizer - não pode ser nem geral nem universal. É esta contradição que está sempre subjacente às suas palavras. Há pouco o Sr. Deputado Almeida Santos disse, e com muita razão, que os ingénuos são os mais entusiastas. E é isso.

O Sr. Deputado está a ser ingénuo quando nos diz para que seja digno e para o povo, depois diz que não será para o povo, já que não será nem geral nem universal.

intervenção imperceptível do Sr. Sousa Tavares (PSD)

o Sr. Deputado, era melhor rever um pouco as sua palavras e ter em atenção que o que está por detrás de tudo isto, desta guerra...

Vozes não perceptíveis.

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... ninguém pediu para que os ricos pagassem o polícia que controla a sua rua. Não pediu para que os ricos pagassem uma companhia das forças armadas, uma companhia do Exército e, porventura, uma das corvetas da Marinha. Mas pede, paradoxalmente, que os ricos paguem a saúde. O que estará por detrás, Sr. Deputado? Não será qualquer outra coisa?

O Orador: - Dá-me licença?

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Srs. Deputados: eu pedia que evitassem o diálogo...

O Orador: - Estou no uso da palavra, mas se o Sr. Presidente quiser, eu interrompo...

Eu penso que não é assimilável a segurança pública ou a defesa nacional à questão do Serviço Nacional de Saúde. Já fui aqui acusado de classista, mas então, se os senhores quiserem, eu sou classista ao contrário. Quer dizer, eu defendo a questão do Serviço Nacional de Saúde com uma graduação de despesas efectivas pelo cidadão conforme as suas possibilidades económicas. E é essa fórmula que eu defendo.

Agora, no momento em que os senhores estabelecem aqui numa disposição constitucional que ao Serviço Nacional de Saúde é universal, geral e gratuito", quer dizer que ele tem de ser em absolutas circunstâncias de igualdade seja para quem for, independentemente das disponibilidades económicas do cidadão, afectando gravemente as possibilidades económicas do Estado e criando um classismo ao contrário, dos vossos próprios desideratos. Porque é evidente que, nas circunstâncias do Estado Português esse Serviço Nacional de Saúde nunca se revestirá da eficácia e da dignidade de que se deve revestir e será sempre um serviço degradado. E contra isto eu ainda não vi produzir nenhuns argumentos válidos. Quando eu digo que o serviço deve ser graduado conforme as possibilidades económicas dos cidadãos e que deve ser gratuito para quem não tem possibilidades, deve ser menos gratuito para quem tem algumas, não deve ser nada gratuito para quem tem muitas, eu estou a criar a possibilidade de esse serviço ser melhor. Os senhores não me entendem, paciência. Serei eu que sou burro, não sei. Mas tenho a impressão de que a minha linguagem é bastante clara e que meditar neste preceito constitucional tem vantagens, porque foi dito este ano na Assembleia - e não foi refutado - que nós não temos capacidade financeira nem orçamental - e parece que disto ninguém duvida - para criar um Serviço Nacional de Saúde nos termos constitucionais. E as taxas moderadoras eram inconstitucionais. Foram os senhores que o disseram.

Ora, se as taxas moderadoras são inconstitucionais, em face disto que aqui está, se nós criarmos, obrigatoriamente, a gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde, seja qual for a possibilidade económica do cidadão, estamos ou não estamos a condenar a degradação desse Serviço Nacional de Saúde? Onde está a lógica? Está em mim ou está nos senhores? Eu não percebo, mas gostaria que me explicassem.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Carlos Lage, tem a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Parece-me que esta discussão está completamente deslocada, na medida em que não está aqui em alternativa a discussão de um Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito por nós defendido e um Serviço Nacional de Saúde com graduação de pagamento segundo as possibilidades económicas de cada cidadão. Mas a alternativa real, como nós conhecemos através- das discussões travadas na Assembleia da República e por toda a prática seguida pelos partidos e pelo governo da AD, é entre Serviço Nacional de Saúde universal, geral e gratuito, ainda que com taxas moderadoras, que já existiam, e a medicina convencionada, Sr. Deputado Sousa Tavares. Sabe perfeitamente que essas são as alternativas e a discussão é essa. Consiste em saber se há medicina convencionada, se o Serviço Nacional de Saúde é organizado na base da medicina convencionada, e aí a sua tese de que o Serviço Nacional de Saúde é demasiado dispendioso pode cair por terra, porque há quem defenda, .também com bons argumentos, que a medicina convencionada ainda fica mais dispendiosa do que a medicina socializada.

Portanto, esta é a discussão real e sobre isso, como já disse o Sr. Deputado do CDS, já trocaram armas, já definiram posições. Nós sabemos que a AD é a favor da medicina convencionada, por sistema. E nós temos uma opinião diferente. É aquela que está consignada na Lei do Serviço Nacional de Saúde e que está aqui também na Constituição.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Dá-me licença, Sr. Deputado Carlos Lage?

Eu não sou pela medicina convencionada. Tenho dito. Nem sequer a AD toda o é. A última concepção de Serviço Nacional de Saúde, do Dr. Paulo Meneio e, inclusivamente, do Ministro, já demitido, Dr. Carlos Macedo, não era de- maneira nenhuma nesse sentido. Foi interpretada nesse sentido sem os senhores conhecerem a legislação.

Eu sustento que um Serviço Nacional de Saúde deve ter em atenção as possibilidades económicas dos cidadãos. A única coisa contra que eu me levanto, portanto, não é entre essas duas concepções. Porque se o senhor me põe o problema entre essas duas concepções, eu digo-lhe: estou do seu lado.

O problema é outro, completamente diferente. É que, aqui, p que está na Constituição proíbe em absoluto a existência, por exemplo, de taxas moderadoras ou da graduação do acesso dos cidadãos, conforme as suas possibilidades económicas, ao Serviço Nacional de Saúde. É indiscutivelmente ilegal.

Ora, eu pergunto se isso é razoável num país de tantas desigualdades sociais como aquelas que nós temos? Olhe que eu estou a ser completamente sincero. E suponho que ninguém tem sequer direito a duvidar da minha sinceridade, porque tem sido sustentada publicamente há muitos anos.

Agora o que eu digo é que isto é irracional. Isto é difícil de conseguir mesmo nos países ricos. Num país pobre como o nosso isto é a condenação a priori de um Serviço Nacional de Saúde digno desse nome.

Os senhores não querem atender a isso, nós vamos para a sofismação da Constituição, para um Serviço Nacional de Saúde essencialmente degradado e defeituoso, quando eu entendo que o Serviço Nacional de Saúde devia ter em atenção as possibilidades económicas dos cidadãos. É simplesmente isto que eu pretendo dizer e não saio desta posição. E não me atribuam intenções que eu não tenho.

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O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Carlos Brito, tem a palavra.

O Sr. Carlos Brito (PCP):-Sr. Presidente, começo por dizer -nem sequer dou a isto o sentido de um protesto- que, quando o Sr. Deputado Sousa Tavares usa a palavra "comunistas", nós entendemos que se nos está a dirigir aqui na Comissão. Não pensamos que está a falar...

Vozes não identificadas e inintelegíveis.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Agradecia que não entrassem em diálogo.

O Orador: - O senhor deputado garante que usou as palavras "países comunistas", mas não usou. Usou a palavra "comunistas". E quando usa a palavra "comunistas", nós entendemos que se nos está a dirigir.

Não nos assimilamos a ninguém e também gostaríamos que o Sr. Deputado não insistisse nessa maneira de se nos referir e de assimilações, para que nós também não tenhamos dê usar uma linguagem correspondente em relação ao Sr. Deputado.

Quanto à questão de fundo, eu volto a insistir neste ponto: custa-me que todo o problema do Sr. Deputado Sousa Tavares seja a questão das taxas moderadoras. Porque, se fosse só essa questão, então parece que o Sr. Deputado aceitaria toda a lei Amaut, salvo no que toca às taxas moderadoras. Aceitaria tudo o mais.

Bem, eu suponho que não é isso.

E também me parece, Sr. Deputado, que tudo isto tem muito interesse ser discutido, mas na sede própria.

Por exemplo, Sr. Deputado, quanto é que o Estado Português gasta actualmente com a saúde? Quanto é que vai gastar com as novas orientações estabelecidas pela AD em matéria de medicina convencionada? O que é que isso permite fazer, se houver um conveniente aproveitamento dos recursos?

As coisas são mais complicadas, Sr. Deputado. Não é só uma questão de taxas moderadoras, não é só isto. Faça o Sr. Deputado as contas a quanto está a gastar actualmente o Estado Português com a saúde e diga-me se o aproveitamento desses recursos de maneira conveniente e virada para o povo português ma concepção do Serviço Nacional de Saúde não poderia traduzir-se em serviços de saúde muito mais eficazes, úteis e completos para o nosso povo.

Essa é a questão.

O Sr. Deputado, portanto, não pode insistir messe ponto de gratuitidade como a causa obrigatória de fracasso do serviço. Não é essa a situação.

Está a gastar-se muito parque há comércio da medicina, E é aí que o Sr. Deputado vai quando contraria, quando combate, o Serviço Nacional de Saúde. Vai ao comércio da medicinas vai à medicina convencionada que a AD defende, que a AD está a implementar.

Também a própria dei Antaut apontava - e o debate na Assembleia da República não mostrou que isso fosse irrealizável - para uma implementação progressiva do Serviço Nacional de Saúde.

O Sr. Deputado também esquece que nós já fizemos a experiência de legislar o preceito constitucional e que o resultado é uma lei realizável, como a experiência do nosso país demonstrou, e só não foi realizável por todos os boicotes e sabotagens que lhe foram feitos.

Portanto, o Sr. Deputado não tem razão quando argumento nos .termos em que o faz. E, fazendo-o, está a procurar iludir o fundo da questão, o fundo do problema, que é o de darmos o serviço de saúde aos Portugueses o mais rapidamente possível e o mais universal possível.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Em relação ao n.° 4 da FRS...

Uma voz não identificada:-Não há nenhuma evolução da posição da AD nesse aspecto.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Os senhores deputados ainda pretendem intervir acerca desta matéria'?

Sr. Deputado, só queria dizer o seguinte: eu sei que a matéria é apaixonante, mas as diferentes forças policiais já tomaram posição, e, como tal, vou apenas dar a palavra às pessoas que estão inscritas, e, seja quem for a pessoa que peca a palavra, eu já não lha dou. E se, efectivamente, forem contra isto, vou começar a apitar rigidamente o Regimento e as inscrições são a seguir à leitura das alterações e depois só protestam ou pedem escurecimentos. Isto vou fazê-lo a partir de agora, se efectivamente não se encerrar o debate deste tema.

Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Eu pedi a palavra porque já há pouco tinha utilizado esse sistema e depois abriu outra vez. Foi apenas por isso.

Serei extremamente rápido. Não vou entrar no , fundo de toda esta problemática, vou apenas salientar três notas.

Em primeiro lugar, a norma do antigo 64.°, respeitante ao Serviço Nacional de Saúde, como tangas outras normas da Constituição, é uma norma programática. É uma norma programática, define um objectivo. É uma norma que, portanto, não admite que se volte atras -e tem de ser assim, tendo em conta as condições económicas, sociais e culturais do País, tendo em conta ainda a norma que consta do artigo 50.° hoje vigente -, é uma norma que irá sendo executada progressivamente. A Constituição, portanto, não impõe. Não resulta directa, imediata, forçosamente da Constituição que todo e qualquer Serviço Nacional de Saúde a criar tenha de ser gratuito. Impõe, sim, que todo e qualquer Serviço Nacional de Saúde deve tender para isso, de acordo com as possibilidades do Pais. Esse é o sentido da norma constitucional. É aqui tal como a norma respeitante ao direito ao trabalho, ao direito à educação, ao direito à habitação, etc.

Portanto, julgo ser uma falsa questão interpretar a norma constitucional como se fosse uma norma preceptiva, desligando-a de todo o contexto deste título da Constituição.

Em segundo lugar, Sr. Deputado, aquilo que caracteriza uma política social-democrata é a igualdade, é a distribuição por igual de benefícios, devendo, pois, aqueles que mais podem pagar através dos impostos. Que repugnância terei eu em que os ricos não paguem os cuidados de saúde, desde que paguem mais impostos do que os pobres? Esta é a política social-demo-

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crata em matéria de saúde, de segurança social e de educação. É através dos impostos que os ricos deverão pagar.

Em terceiro lugar, registo que o Sr. Deputado Sousa Tavares é contra a medicina convencionada.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra, mas pedia-lhe que fosse muito rápido para avançarmos para o artigo seguinte.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, nós estamos a discutir as propostas que existem. Toda a discussão do Sr. Deputado Sousa Tavares foi sempre na base de uma proposta que não existe.

O que está em discussão é uma proposta da AD, com a qual nós não podemos concordar. É um Serviço Nacional de Saúde nos termos da lei, isto é, completamente aberto ao desmantelamento de toda e qualquer ideia de Serviço Nacional de Saúde.

Agora, se houver qualquer proposta no sentido de que os ritos paguem especialmente o Serviço Nacional de Saúde, pote nós não nos recusamos a considera-la. Se o Sr. Deputado Sousa Tavares quiser fazer essa proposta, proposta em que haverá um Serviço Nacional de Saúde pago especialmente pelo rico, então faça-a, que nós estamos dispostos a considerá-la. Não nos recusamos a considerá-la. O que mós nos recusamos é a considerar esta discussão nos termos de uma proposta que não existe, porque a proposta que cá está é a de eliminação do Serviço Nacional de Saúde, e contra essa, nós estiamos. Se a AD a quiser substituir por outra proposta, nós estamos dispostos a considerá-la. Não nos recusamos a considerá-la. Mas, enquanto não existir, pois recusamo-nos obviamente a considerar a discussão nos lermos em que ela está.

Se a questão é a da relação entre os ricos e o Serviço Nacional de Saúde, pois seja posta através de uma conveniente proposta vinda da AD. Nessa altura será considerada.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Sousa Tavares, é realmente em relação a alguma afirmação que foi feita, ou é para entrar no debate da questão de fundo?

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Não volto à questão de fundo. É só em relação a uma afirmação que foi feria pelo Prof. Jorge Miranda.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Eu pergunto simplesmente ao Sr. Prof. Jorge Miranda se entende que é a mesma coisa dizer, em termos programáticos, que o ensino deve ser universal, gratuito e aberto a toda a gente, ou a criação concreta de um Serviço Nacional de Saúde que tem de obedecer a esta, a esta e a esta característica?

É diferente. Porque, se este artigo dissesse que a saúde deve ser garantida universal, gratuitamente e em generalidade a todo o povo, eu podia aceitar a sua argumentação. Mas não é isso que se da aqui. É que qualquer Serviço Nacional de Saúde que se crie tem de ter estas características. Ora, o que o senhor me esteve a dizer é que nós podemos legislar inconstitucionalmente. Quer dizer, como os senhores. Parece que não põem uma objecção de princípio às taxas moderadoras, parece que, apesar do que está consagrado aqui na Constituição, amanhã um Serviço Nacional de Saúde pode, por exemplo, ter determinado preço, conforme as circunstâncias económicas da população, paira o uso de determinados serviços. Eu considero isso inconstitucional em face do que aqui está. Quanto à questão dos (impostos, eu queria só dizer em duas palavras que isso era muito bonito se realmente Portugal fosse um país onde a efectividade do imposto fosse real Mas quando é que ela será num país dominado essencialmente pela especulação de pessoas que não pagam impostos?

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Passamos ao artigo 65.° Tem a palavra o Sr. Deputado Vital Moreira.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - O meu camarada Veiga de Oliveira tinha pedido primeiro a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Então, faca lavor.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, eu ouvi aquilo que suponho que era uma advertência do Sr. Presidente a respeito de novos pedidos de palavra.

Nós temos por hábito chegar aqui de manhã, à hora, e da paute da tarde também, temos também por hábito esperar por outros, incluindo deputados da AD, mas não queremos ver esta discussão aqui na Comissão de qualquer forma limitada. E se o Sr. Deputado fala em aplicar as normas regimentais que se aplicam por mera recorrência ao Regimento da Assembleia, eu devo-lhe dizer que não ganha nada com isso. As normas supletivas que se aplicariam iriam certamente, quando esgotadas as possibilidades, levar a um gasto muito maior de tempo.

Portanto, não percebi, pois, se há aqui) antigos cujo interesse é reduzido e nós até passamos adiante sem estar com grande discussão, há outros em que há interesse em discutir. Não entendemos, assim, qual foi a advertência do Sr. Presidente, Eu gostaria que esclarecesse, para saber "m que regime é que estamos, porque de qualquer maneira tem de ser um regime que não seja de rolha, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - A minha intervenção for, pura e simplesmente, para significar que um debate ilimitado sobre matérias, sobretudo quando as diferentes posições já estão proclamadas pelas diferentes forças políticas, efectivamente não pode admitir-se. Este artigo é um dos artigos onde efectivamente já todos tomaram posição, posição em rotação à aceitação ou não de alterações. Inclusivamente as várias forças políticas fundamentaram essas posições e a minha posição foi apenas no sentido de dizer que esta situação não poderá continuar.

Não sei se efectivamente a aplicação das normas regimentais que melhor caibam "irá dilatar ou não, ma-

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evidentemente que, se elas forem um meio de encurtar e se não chegarmos aqui a um esquema de trabalho que permita que realmente as coisas funcionem, eu não sei, é uma questão a ver, mas a verdade é que isto tem de funcionar. E eu creio que poderíamos ultrapassar desde já.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, se me dá licença, eu entendo que o Sr. Presidente provenha no sentido de que es trabalhos corram da melhor maneira e nós todos estamos aqui para Isso. Não há na minha tentativa de aclaramento nenhuma ideia de obstruir os trabalhos. Não é essa a ideia. Agora o que nós não podemos é pensar que, dando-se, por exemplo, e como se deu ainda agora, a palavra ao Sr. Deputado Sousa Tavares, se ele dissesse alguma coisa que merecesse ser respondida, é óbvio que o Sr. Presidente me daria a palavra.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - É óbvio que eu dava a palavra...

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Pronto, é esta a questão.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Passamos ao artigo 65.° Sr. Deputado Sousa Tavares, eu agradecia que ficasse para um momento posterior, uma vez que neste momento não há abertura paira se considerar asso nesta Comissão. Na Comissão de Redacção o seu intento será posteriormente considerado e ver-se-á da viabilidade de isso ser feito.

Artigo 65.°: em relação a este artigo apenas a AD apresenta propostas de "Iteração. Propõe, no n.° 3, a substituição da expressão "de acesso" pela expressão "o acesso" e o aditamento in fine da expressão "nomeadamente promovendo a transformação da condição de inquilino na de proprietário".

No n.° 4, o aditamento de uma (referência às regiões autónomas entre a referencia ao Estado e a referência às autarquias locais, bem como a substituição da expressão "procederão a necessária nacionalização ou municipalização dos solos urbanos e designarão o respectivo direito de (utilização" pela expressão "nos termos da lei, que designará também a política de solos urbanos".

Sobre estas propostas foram expressas as seguintes posições na subcomissão:

A FRS tem reservas quanto ao aditamento proposto ao n.º 3, admitindo a apreciação de substituição de redacção da expressão cede acesso" na respectiva subcomissão criada para o efeito.

O PCP opõe-se às alterações propostas ao n.° 3.

O MDP/CDE reservou, quanto ao mesmo n.° 3, a sua posição em relação às propostas da AD.

Quanto ao n.° 4, quer a FRS, quer o PCP, quer o MDP/CDE declararam a sua oposição face às propostas de alteração da AD.

Srs. Deputados, está aberta a discussão em relação às propostas de alteração.

Nenhum senhor deputado pretende intervir?

Sr. Deputado Herberto Goulart, faz favor.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - Eu gostaria só de esclarecer a posição do MDP/CDE em relação ao que está aqui no relatório. Já foi desenvolvido o ponto de vista na subcomissão e que significa não apenas uma reserva em relação à parte final do n.° 2, salvo erro, proposto pela AD, mas, de facto, o nosso não acordo a esta proposta, sem prejuízo, evidentemente, de podermos contemplar se a AD viesse a apresentar uma formulação diferente, como parece ter ficado subentendido durante a discussão na própria subcomissão.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Veiga de Oliveira, tem a palavra.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Para que fique clara a nossa posição, em relação à alteração da redacção já está dito e não é necessário nenhuma justificação especial. Mas, em relação ao aditamento do n.° 3 a que nós nos opomos, o que aqui está não vai no sentido de garantir habitação a todos, mas no sentido de isentar os proprietários, sobretudo dos das rendas mais baixas', do ónus de continuarem a ser proprietários, a ser senhorios.

Naturalmente criando uma solução para esses senhorios e não tanto para aqueles que precisam de casa.

Quanto mais não fosse, eu diria que a proposta estava aqui deslocada. Neste artigo da Constituição o que se trata é de resolver o problema da habitação de quem a não tem, e não de resolver outros problemas que também existem - nós reconhecemos que existem -, mas que não são para aqui, porventura nem são para a Constituição, chamados e que muito menos o são para o direito de habitação.

Quanto ao n.° 4, não vale a pena também entrar em grandes detalhes. O acrescento "nos termos da lei" significa, efectivamente, retirar da Constituição as garantias que cá estavam dadas à política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível com o rendimento familiar.

A proposta da AD no que concerne a este n.° 4 tem também a nossa oposição. O introduzir aqui as regiões autónomas também se justificou em subcomissão que não é necessário nem faz sentido. No Estado estão incluídas desde já as regiões autónomas e, portanto, o n.° 4 tal qual está na Constituição não carece de nenhuma alteração.

Por outro lado, a parte útil da proposta da AD consiste em eliminar aquilo que cá estava e que, quanto a nós, é fundamental, que é a referência à nacionalização ou municipalização dos solos urbanos, única medida que poderia rapidamente resolver o problema da habitação.

Todos nós sabemos que o problema da habitação tem como uma das principais dificuldades a questão da especulação fundiária.

E, portanto, a proposta da AD consiste em retirar a parte mais útil daquilo que se continha no n.° 4. Daí a nossa oposição.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sem alteração das posições que assumimos na subcomissão, queria só explicar isto: quando nós pomos reservas à promoção e transformação da condição de inquilino na de proprietário, não é que não sejamos radicalmente contra isto. Obviamente, seria bom que todos os inquilinos pudessem ter casa de que fossem donos. Só que nos parece que isto não resolve o problema habitacional.

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Quer dizer, parece-nos uma ilusão até perigosa de certo modo, pois pode criar situações que podem não ser muito justas na maioria dos casos. Mas estamos dispostos a discutir uma solução deste género ou uma formulação diferente.

Se tivéssemos que referir aqui as regiões autónomas, parece-me que tínhamos que referi-las em muitos outros artigos da Constituição. Parece-nos, assim, que não é muito razoável que estejamos a semear uma referência às regiões autónomas esporádica aqui e acolá, o que pareceria que, na verdade, as regiões autónomas só interviriam quando fossem referidas. Eu penso que é preferível uma definição genérica da interferência das regiões do que fazer referências esporádicas, que, nesse caso, teriam que ser mais numerosas.

Portanto, a nossa ideia não é contra, digamos, o reforço de alguns poderes das regiões autónomas, é no sentido de que isso, pelo contrário, nos parece restringir esses mesmos poderes.

Também pomos, evidentemente, as clássicas reservas à referência aos "termos da lei" e parece-nos também que a previsão da nacionalização e municipalização dos solos urbanos, dada a gravidade do problema habitacional, é um recurso a expedientes que não devem ser banidos da Constituição. É uma necessidade urgente, penso eu, e que, portanto, bani-las neste momento seria agravar o problema, e não contribuir para a sua solução.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Em relação ao artigo 66.°, apenas a FRS apresenta propostas de alteração, que são as seguintes:

Adita ao corpo do n.° 2 a expressão "nem conjugação com as autarquias locais", imediatamente após "organismos próprios", e ainda adita a expressão "e apoio" entre "por apelo" e "a iniciativas populares".

Propõe também a substituição do n.° 3 actual por um novo n.° 3, segundo o qual "é conferido a todos o direito de promover, nos termos da lei, a prevenção ou cessação dos factores de degradação do meio ambiente, bem como, em caso de lesão directa, o direito à correspondente indemnização".

Do debate efectuado na subcomissão emergiram as seguintes conclusões:

A AD exprimiu a sua concordância com todas as alterações propostas pela FRS, enquanto o PCP declarou não se opor às alterações propostas ao n.° 2 e concordar com a proposta ao n.° 3, com reservas quanto à expressão "lesão directa". O MDP/CDE declarou concordar com a alteração proposta ao n.° 3.

Algum senhor deputado pretende usar da palavra em relação à alteração proposta pela FRS, que possa acrescentar algo àquilo que já é adquirido da subcomissão?

Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS): - É que nós não fazemos questão em que permaneça a referência à "lesão directa", se houver consenso nesse sentido, nós poderíamos, na verdade, deixar cair o adjectivo.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sendo assim, dadas as objecções que já vinham da subcomissão, pois entender-se-ia que isso seria adquirido. Portanto, deixariam cair a expressão "lesão directa". Sr. Deputado Vital Moreira, faz favor.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Face a esta consideração, creio que podíamos dar por adquirida a alteração do n.° 3, nos termos que resulta desta consideração.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Exacto, Sr. Deputado.

O artigo 67.° é objecto de alterações por parte da AD e do PCP.

As alterações propostas pela AD traduzem-se numa nova organização sistemática do artigo em 3 números.

Um n.° 1, com a seguinte redacção:

A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à protecção da sociedade e do Estado.

Um n.° 2, com a seguinte redacção:

Para assegurar a protecção da família e do seu direito à educação dos filhos, incumbe prioritariamente ao Estado:

a) Definir e executar uma política da família com carácter global integrado;

b) [Corresponderia à actual alínea a)];

c) [Corresponderia à actual alínea b)];

d) [Corresponderia à actual alínea c)].

A alínea é) teria a seguinte redacção:

Promover os meios adequados ao exercício pelos cidadãos do seu direito ao planeamento familiar.

Haveria uma alínea f), que seria correspondente à actual alínea e).

Um n.° 3 do referido artigo, com a seguinte redacção:

As associações de âmbito nacional representativas das famílias participam na definição da política da família,

O PCP propõe que o artigo actual passe a constituir o n.° 2, sendo aditado um novo n.° 1, do seguinte teor:

As famílias têm direito à efectivação de todas as condições que permitam a realização pessoal de todos os membros do agregado familiar.

Na subcomissão, efectuado o debate, foram expressas, em síntese, as seguintes posições:

Quanto às propostas da AD:

O PCP opõe-se a todas elas.

A FRS reservou a sua posição quanto ao n.° 1, inclinando-se para uma redacção que concilie a referida proposta da AD com a proposta do n.º 1 do projecto do PCP.

Quanto ao n.º 2, a FRS declarou reservar a sua posição quanto à alínea a) e opõe-se à alínea e).

Quanto ao n.° 3, a FRS declarou levantar objecções e o MDP/CDE declarou opor-se ao mesmo.

No concernente à proposta do PCP:

A FRS apoia-a, por traduzir a transformação de uma garantia institucional num direito fundamental.

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A AD opõe-se-lhe por considerar que ela não reconhece a unidade da entidade familiar, mas tão-só a das pessoas, que individualmente integram a família.

Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS):-Sr. Presidente, quanto ao n.° 1, há 2 propostas, uma da AD e outra do PCP.

Nós consideramos que há na proposta do PCP um elemento importante que tem sido objecto de aceitação na maioria das exposições desta parte da Constituição, que é uma redacção em termos que garanta o direito. Admitimos, no entanto, na subcomissão a possibilidade de ultrapassar algumas dificuldades que na redacção levantava à AD e, por isso, admitimos que se possa encontrar, eventualmente, uma redacção de consenso para o n.° 1, dado que a redacção proposta pela AD tal como está nos merece objecções, como já referimos.

Sugeria por isso, e na medida em que nós temos objecções efectivas e totais também em relação à alínea e), também objecções no que concerne ao n.° 3 e reservas em relação às restantes matérias, não nos parecendo que neste momento seja possível chegar a qualquer conclusão, que se remetesse para momento posterior uma análise conjugada deste artigo, perante eventuais propostas de substituição que possam surgir em tempo breve.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Estas propostas de alteração deram lugar na subcomissão a uma vivaz discussão. Não queremos reeditá-la, até porque insistimos na nossa ideia de que esta é matéria em relação à qual nos recusamos a transformá-la em lugar privilegiado de combate político.

A nossa proposta já foi explicada. Visou apenas transformar em direito fundamental e, portanto, reforçar a garantia constitucional daquilo que hoje é uma simples garantia institucional. Pareceu-nos que esta proposta devia merecer o apoio generalizado.

Não foi assim. Invocou-se contra ele o facto de, repetindo o relatório da subcomissão, se dizer que ela não reconhece a unidade da entidade familiar, mas tão" -só a das pessoas que individualmente integram a família.

Não é assim. Não tivemos esse propósito, nem cremos que a redacção que demos ao n.° 1 da nossa proposta possa ter esse sentido.

É óbvio que não é a nossa concepção, e recusaríamos qualquer proposta nesse sentido, de uma concepção transpersonalista da família. Mas não é isso, não é a versão contrária, isto é, uma concepção individualista, que está no nosso n.º 1.

Em todo o caso, nós não somos indiferentes â argumentação e estaríamos dispostos a considerar uma redacção alternativa para o n.° l, que poderia ser do tipo desta ou de outra que julgassem adequada, desde que no mesmo plano.

"As famílias têm direito à efectivação de todas as condições que permitam a realização do agregado familiar e de todos os seus membros." Portanto, uma referência expressa ao agregado familiar enquanto tal. Não sei se os deputados interessados ouviram a sugestão que acabo de fazer? É uma reconsideração que propúnhamos para o n.° 1.

Não estamos, ao contrário, disponíveis para alterar a nossa posição em relação às propostas da AD. Já dissemos que o n.° 1 contém uma definição essencialista da família, que nos parece deslocada na Constituição. A Constituição não é propriamente o local para definir qual deve ser o papel da família, embora a segunda parte - ter "direito à protecção da sociedade e do Estado"- constitua uma formulação em relação à qual não temos qualquer objecção a que seja, por exemplo, aditada ao nosso n.º 1 ou ao nosso n.° 2. Portanto, a ideia do direito à protecção da sociedade e do Estado é uma ideia que não tem, da nossa parte, oposição.

Já tem a primeira parte e o conjunto, enquanto mera definição.

Quanto às propostas de alteração para o n.° 2, quer a que respeita ao corpo do artigo, quer a respeita à alínea a), quer as outras todas, não colhem o nosso acordo e algumas têm a nossa posição formal.

Por exemplo, a alínea à). O que é isso de uma política global da família? O problema não é haver política da família, embora desde logo a ideia de uma política de família nos faça recordar tempos, digamos, de uma concepção em que a família era considerada como uma espécie de aparelho ideológico do Estado. Mas, para além disso, o problema não é saber se existe ou não a política de família. A política em que sentido? Com que critério? Existir política, bom, sempre existirá uma política mais ou menos coerente. Agora, dizer apenas que existirá uma política não é dizer nada. Política de acordo com quê? Para que finalidades? De acordo com que critério?

Portanto, a alínea a) não pode merecer o nosso apoio, pelo contrário.

E o mesmo em relação às restantes propostas.

Resumindo, portanto: a reconsideração que fizemos dos debates da subcomissão leva-nos à aceitar uma reconsideração do n.° 1, a ter em conta a segunda parte do n.º 1, do projecto da AD, mas não a aceitar qualquer das subpropostas contidas em relação ao n.° 2.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Apenas para referir, e muito brevemente algumas questões que foram mais profundamente analisadas na subcomissão.

A primeira é que, quanto à proposta do PCP, as reservas da AD não consistiram já na subcomissão em acolher a transformação num direito da garantia que constava já da Constituição, referem-se só à formulação, pelo que eu creio que em Comissão de Redacção se pode debater a fórmula agora apresentada pelo Sr. Deputado Vital Moreira e outras que eventualmente surjam.

Quanto à questão e às sugestões que a AD faz às propostas de alteração do n.° 1 da questão da definição de família, é a definição que consta da Declaração Universal dos Direitos do Homem, como foi referido na subcomissão, creio que pelo Sr. Deputado Jorge Miranda, e, portanto, embora essa declaração tivesse já uma aceitação no direito português, nós pensamos que a sua constitucionalizacão tem interesse e, por isso mesmo, procurámos encontrar uma definição de

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família que não revestisse um carácter eventualmente polémico. Fomos assim, buscar uma definição que é geralmente aceite, uma vez que consta da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Quanto às alterações que a AD propõe ao n.° 2, a alteração e a política da família com carácter global integrado não significa, dê maneira nenhuma, qualquer política que visa a intervenção do Estado na família. Significa apenas que entendemos que o Estado deve ter um quadro geral de política de família que seja ponderado de uma forma global, e não, o que normalmente acontece, que as medidas que nas várias políticas sectoriais afectam a família estejam, portanto, desgarrados de uma certa visão de conjunto. É isto e mais nada. Tudo o que se pretende para além disto não tem qualquer correspondência com as intenções da Aliança Democrática ao apresentar esta proposta.

Quanto à alteração da alínea e), que é aquela que merece reservas mais fortes, a oposição da Frente Republicana e Socialista, pois a Aliança Democrática está disposta a reponderar a sua formulação de modo a que se possa encontrar uma solução aceite por todos.

Quanto ao n.° 3, esta é uma questão também essencial no projecto de revisão da Constituição da Aliança Democrática e é evidente que nos parece que, sem que se consagre neste momento em Portugal a família como parceiro social - o que seria ainda prematuro; dado que essas próprias organizações terão que fazer o seu caminho -, pensamos, no entanto, que, assim como noutros sectores as políticas são elaboradas com consulta a organizações representativas do sector, também na política de família as famílias devem poder participar na elaboração dessas políticas. E, portanto, daí que consideremos importante esta alteração que propomos.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Miranda.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Conforme acaba de lembrar o Sr. Deputado Luís Beiroco, diz o artigo 16.°, n.° 3, da Declaração Universal dos Direitos do Homem:

A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito a protecção desta e do Estado.

Por outro lado, como é sabido, segundo o artigo 16.°, n.° 2, a declaração é critério de interpretação e integração da Constituição.

Por conseguinte, parece nítido que a fornia apresentada pela Aliança Democrática para o novo n.° 1 do artigo 67.°, não traz nenhuma novidade ao direito constitucional português vigente e, por conseguinte, também não levanta judidicamente nenhum problema. A levantar um qualquer problema, então deveria ter sido discutido se tivesse sido apresentada uma proposta de alteração ao artigo 16.°, n.° 2. Isto para dizer que da nossa parte - ou da minha parte pessoal - não há nenhuma oposição ao acrescentar, aqui explícito, desse artigo, embora considere que juridicamente o interesse é puramente insignificativo.

Julgo que há condições para se encontrar um texto satisfatório que vá ao encontro, simultaneamente, como disse o deputado Nunes de Almeida, de certas

aspirações expressas pela Aliança Democrática e de certas considerações, que parecem perfeitamente pertinentes, constantes do projecto do Partido Comunista Português.

Salientar, por um lado, o papel da família, mas, por outro lado, salientar que a família não vale em si e por si. A família vale na medida em que é um elemento fundamental para a realização dos seus membros. Esse aspecto não está claramente salientado no projecto da AD, está, sim, salientado na fórmula preconizada pelo PCP.

Adiantando uma sugestão puramente pessoal, uma fórmula como esta "a família é um elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito a todas as condições que permitam a realização dos membros", poderia, porventura, ir ao encontro de muito do que foi discutido na subcomissão e de muito que poderia ter sido discutido neste momento.

O que eu considero fundamental é que não façamos deste lema um tema polémico de revisão constitucional. A ninguém aproveitaria e certamente que só prejudicaria as famílias portuguesas.

Apraz-me registar que a AD está disposta a reponderar a fórmula proposta para a alínea e) do n.° 2. É uma matéria a que eu sou particularmente sensível desde a Assembleia Constituinte. Seria bom que toda esta matéria fosse reconsiderada em termos satisfatórios e tendo em conta a função da família e a natureza dos direitos fundamentais dentro da nossa ordem jurídica.

Quanto ao n.° 3 da proposta da AD e quanto à alínea a) do n.° 2, eu tenho as mais fortes objecções, na medida em que esses novos preceitos que a AD pretende inserir, para lá de terem um conteúdo útil extremamente reduzido, podem ter conotações que deveriam ser afastadas. Eu julgo que, mais importante do que fazer grandes proclamações, é, a respeito das matérias que interessam mais directamente à família, como a educação, a juventude, a infância, etc.., aí ter em conta o papel que a família pode e deve desempenhar.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Almeida Santos, tem a palavra.

O Sr. Almeida Santos (PS):-Julgo que houve aqui uma afirmação colectiva de boa vontade no sentido de se rever a redacção do n.° 1. Queria só dizer o seguinte: É que, independentemente de não nos podermos comprometer com qualquer redacção que não seja previamente proposta por nós ou por qualquer outro partido, nós também não estamos felizes com a actual redacção.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Srs. Deputados, vamos entrar no debate do artigo 68.°

Vou ler o relatório da subcomissão.

Em relação a este artigo apenas há uma proposta de alteração ao seu n.° 1, apresentada pelo PCP.

Na subcomissão verificou-se consenso quanto a uma modificação que passe a consagrar o reconhecimento de um direito atribuído às mães, sem embargo de se procurar compatibilizar esse direito com o reconhecimento do valor social da maternidade, conforme está já hoje consagrado.

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Algum senhor deputado pretende usar da palavra em relação à alteração proposta pelo PCP?

Pausa.

Portanto, mantém-se consenso.

Artigo 69.°: não foram apresentadas quaisquer propostas de alteração.

Artigo 70.°: é objecto de proposta de alteração por parte da AD.

Uma alteração ao n.° 2, que se traduz na introdução do qualificativo "integral", acrescentado à palavra "desenvolvimento".

Quanto ao n.° 3, a AD também apresenta uma proposta de alteração.

A substituição no texto actual da expressão "as empresas, as organizações populares de base e as colectividades de cultura e recreio" por "outras organizações sociais".

Apresenta também a substituição da expressão "fomentará e auxiliará" por "estimulam e apoiam".

A introdução da expressão "as regiões autónomas e as autarquias locais", acrescentada a seguir a "Estado", como sujeito do dispositivo,

A introdução da expressão "família".

A eliminação de "na prossecução daqueles objectivos" (referido ao apoio dado pelo Estado às organizações juvenis).

Na subcomissão verificou-se aceitação unânime da alteração proposta para o n.° 2.

Relativamente às propostas de alteração do n.° 3, resultou do debate o seguinte:

O PCP não apoia qualquer das propostas de alteração.

A FRS opõe-se à introdução de "regiões autónomas e autarquias". Aceita a fórmula traduzida em "estimular e apoiar". Defende a manutenção da expressão "na prossecução daqueles objectivos". Opõe-se à expressão "outras organizações sociais" e ficou de ponderar melhor, em fase subsequente, as demais alterações.

Algum senhor deputado pretende usar da palavra em relação a esta matéria?

Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, relativamente a este n.° 3, eu suponho que, se não estou em erro, pediria que fosse corrigido, nesse caso, no que diz respeito ao inciso "na prossecução daqueles objectivos", tinha sido relativamente aceite pela AD que ele se deveria manter.

No que concerne aos outros pontos, nós não podemos aceitar a substituição da referência "às empresas, às organizações populares de base e às colectividades de cultura e recreio" pela expressão "outras organizações sociais". Todavia, estamos dispostos a admitir e introdução da referência à "família" ao lado das outras entidades que se encontram referidas neste número.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Eu creio que este é um exemplo claro em que a AD apresenta uma série de alterações, mas em que, mais do que alterações significativas de fundo, o que se f az é uma série de

pequenas alterações, umas mais significativas do que outras, mas em que a nossa objecção é menos quanto ao que elas implicam -no caso em que implicam alterações de fundo-, mas sobretudo quanto à necessidade de estar a introduzir uma série de pequenas alterações cujo alcance praticamente não se tem.

Por exemplo, que significado tem substituir "fomentará e auxiliará" por "estimulam e apoiam", quando, na verdade, são sinónimos, para todos os efeitos?

É das tais propostas cuja vantagem, cuja utilidade, cuja pertinência não compreendemos.

Em relação às outras propostas, a nossa discordância filia-se, também, nesta consideração. Há alterações de pequeno alcance em que a vantagem que se colhe na precisão perde-se, de facto, em não se compreender precisamente por que é que foi alterada uma coisa de tão pequena monta.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Era apenas para dizer que ouvimos aquilo que disse e Sr. Deputado Nunes de Almeida no sentido de que estariam dispostos a aceitar a inclusão da "família", mas que era importante para a FRS que se mantivesse a enumeração de todas as outras entidades. A AD não tem quaisquer dúvidas no que se refere às empresas, bem como às colectividades de cultura e recreio. Reserva a sua posição no que respeita às organizações populares de base, porque tem que ver em que medida é que isso é compatível com o papel que lhes dá na organização do poder local.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Não há mais nenhum senhor deputado que queira falar?

Pausa.

Sr. Deputado Herberto Goulart, tem a palavra.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): -Ê só muito rapidamente para dizer que na subcomissão isso não está expresso no relatório. Não nos pronunciámos sobre estes muitos pormenores de alteração ao n.° 3 propostos pela AD, mas expressámos a nossa oposição à substituição de "empresas e organizações populares de base e colectividades de cultura e recreio" por esta expressão genérica, que nem acolheria, "outras organizações sociais". E manterão-nos nessa posição.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Correia de Jesus, tem a palavra.

O Sr. Correia de Jesus (PSD): - Era só para perguntar a um dos senhores deputados da FRS por que é que se opõem à inclusão neste n.° 3 do artigo 70.° da proposta da AD das regiões autónomas.

O Sr. Deputado Almeida Santos há pouco explicou isso em relação a outro preceito, mas parece-me que de facto o parque imobiliário e, aqui, a juventude e os problemas da juventude são, na verdade, coisas qualitativamente diversas, mas a razão é a mesma.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Em relação ao artigo 71.° não há qualquer proposta de alteração.

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Em relação ao artigo 72.° há propostas de alteração por parte da AD e por parte do PCP.

A proposta de alteração apresentada pelo PCP reporta-se ao n.º 1, destinando-se a consagrar como um direito das pessoas idosas o que até aqui surgia no texto constitucional como uma obrigação do Estado.

A proposta de alteração da AD visa condensar o teor do actual n.° 2, sem significativas alterações de conteúdo.

Do exame efectuada na subcomissão resultou que a proposta do PCP mereceu consenso de todas as forças políticas.

A proposta da AD foi deixada para ulterior apreciação da subcomissão de redacção, registando-se consenso quanto à ideia nela implícita e quanto à necessidade de manter a referência ao "convívio familiar" que consta do actual texto do artigo.

Bom, esta ulterior apreciação na Comissão de Redacção não é propriamente uma remissão sem mais. Não sei se alguém quer usar da palavra em relação às alterações propostas ao artigo 72.

Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - É claro que a aceitação de um n.° 1 consagrando um direito das pessoas idosas à segurança e isenção na vida da comunidade e implica de per si, automaticamente, a necessidade de adaptar o decurso da redacção do n.º 2. Pela nossa parte, estaríamos dispostos a aceitar apenas as alterações estritamente necessárias para fazer essa adaptação, e não aquelas que constam, digamos, das obras propostas pela AD.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Era também para fazer uma pequena referência. Há pouco não me recordei

Suponho que tinha ficado relativamente aceite que não só a referência ao convívio familiar, mas também às condições de habitação, seriam as condições de habitação e convívio familiar que se deveriam manter no texto.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Passamos ao artigo 72.°-A.

A AD apresenta uma proposta de criação de um preceito novo, traduzindo o dever de apoio pelo Estado às instituições particulares de solidariedade social, fundamentando a sua iniciativa com base na necessidade de se fazer uma referência autónoma às instituições particulares de solidariedade social, de se afirmar o dever do Estado de as apoiar, desde que visem prosseguir, em moldes não lucrativos, as finalidades reconhecidas nos artigos anteriores da Constituição e compatíveis com a sua natureza.

Do debate na subcomissão resultou que a FRS exprimiu reservas quanto à localização e autonomização do preceito, mostrando-se, porém, aberta a ponderar a possibilidade de consagração do dever de apoio por parte do Estado, se vier a encontrar-se fórmula que satisfatoriamente evite eventuais abusos nesta matéria. O MDP/CDE tomou na subcomissão posição idêntica à da FRS, enquanto o PCP não apoia a proposta da AD. Algum senhor deputado pretende usar da palavra?

Pausa.

Sr. Deputado Costa Andrade, faz favor.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Eu desejava apenas que fosse explicitada a razão por que é que o PCP se opõe. Para já, gostava que o PCP fizesse o favor, tivesse a gentileza, de explicitar por que é que se opõe. Se é por razões de fundo, se é por razões sistemáticas, ou quais as razões que o levam a opor-se?

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Alguém do PCP pretende prestar o esclarecimento pedido?

O Sr. Vital Moreira (PCP): - A pergunta surpreendeu-nos um bocado, tendo-se em conta a discussão que já houve a propósito de uma alínea respeitante às restrições de privar a solidariedade social que são reconhecidas pela Constituição e que obriga, portanto, a que serão permitidas e fiscalizadas pelo Estado. É a fórmula constitucional.

Portanto, achamos que esta é uma forma suficiente de reconhecimento constitucional destas instituições. Não nos parece que a repetição seja justificada e a sua autonomização. Nem sequer em termos de direito, mas em termos de obrigação do Estado, o que, aliás, iria contra a sistematização e a lógica de sistematização constitucional que vimos seguindo. E, portanto, a nossa oposição à constitucionalização desta obrigação deriva do nítido excesso que haveria em autonomizar à parte, repetidamente, esta ideia.

Para além, obviamente, de considerações que têm a ver com a mudança do nome de instituições privadas para instituições particulares, cuja vantagem não vemos, para além de não se fazer referência à necessidade de fiscalização que consta do artigo anterior e que aqui, portanto, insistiremos. As considerações que fizemos na subcomissão, que gostosamente aqui repetimos para que constem, mas que, sinceramente, não vemos a que propósito vem a interpelação, tendo em conta a discussão que já houve.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Luís Beiroco, tem a palavra.

O Sr. Luís Beiroco (CDS): - Era só para acrescentar que a AD considera que têm fundamento algumas das reservas postas pela FRS à consagração do artigo neste local, com a sua extensão, e que, portanto, está aberta a procurar encontrar uma fórmula mais restrita, mas que permita a constitucionalização do apodo do Estado a estas entidades.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Herberto Goulart, tem a palavra.

O Sr. Herberto Goulart (MDP/CDE): - É só para uni pequeno pormenor de correcção em relação ao relatório da subcomissão, na medida em que o MDP/ CDE tomou posição idêntica à da FRS, no que respeita apenas à primeira parte - expressar reservas

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quanto à localização e autonomização do preceito -, e não se pronunciou sobre esta abertura de reconsiderar, se houvesse uma redacção diferente da parte da AD.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Quanto ao fundo, é óbvio que nós não temos nenhuma objecção de princípio ao apoio do Estado às instituições privadas de solidariedade social, com um único proviso de que esse apoio, sobretudo de financiamento, não pusesse em causa o sistema público de segurança social.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - O artigo 73.° é objecto de propostas de alteração da AD e da FRS.

A AD propõe o desdobramento deste artigo em 2 dispositivos diferenciados, um referente à cultura e outro à educação.

No primeiro dos preceitos apresentados, o relativo à cultura, a AD sugeriu alterações ao actual n.° 3, traduzidas essencialmente na eliminação da expressão "em especial dos trabalhadores", na supressão da referência aos meios de promoção cultural e no alargamento do sujeito dos deveres estatuídos às "regiões autónomas e às autarquias locais". Além disso, a AD propõe ainda um novo número, em que se estabeleceria a obrigação de o Estado "preservar, defender e valorizar o património cultural do povo português".

No segundo dos preceitos propostos (artigo 73.°-A), relativo à educação, a AD eliminou a adjectivação (formativas) relativa aos meios e substituiu a expressão "para o progresso da sociedade democrática e socialista" por "desenvolvimento da sociedade democrática)).

A FRS propôs a substituição no n.° 2 actual da expressão "progresso da sociedade democrática e socialista" por "progresso social".

Do exame na subcomissão resultou o apoio da AD e do MDP/CDE à proposta da FRS.

Quanto às propostas da AD, ficou postergada para a fase de sistematização a ponderação do desdobramento proposto, verificando-se consenso quanto ao facto de se dever considerar prejudicado o novo n.° 3 por estar já consagrado no artigo 9.°

A FRS opôs-se à introdução de "regiões autónomas e autarquias", manifestando reservas quanto à eliminação da expressão "em especial dos trabalhadores" e quanto à omissão da referência aos meios de produção cultural (em especial dos meios de promoção social).

O PCP não apoia qualquer das propostas apresentadas nesta matéria.

Estão abertas inscrições para o debate neste tema.

Pausa.

Sr. Deputado António Reis, tem a palavra.

O Sr. António Reis (PS): - O desdobramento proposto pela AD relativamente à questão da educação e da cultura parece-me ser totalmente pertinente. Ou seja, não faz sentido confundir num mesmo artigo a questão do direito à educação e a questão do direito à cultura. Trata-se de realidades diferentes e de tal como está, de facto, acabamos por confundir uma questão que é de meios com uma questão de fins, uma questão que é .de esqueleto com uma questão que é de carne ou substância. Nesse sentido, aliás, conviria aqui acrescentar que a proposta que a FRS apresenta para a modificação do artigo 78.° na prática contempla já o n.° 3 deste artigo 73.° e, em boa lógica, a proposta de revisão constitucional da FRS deveria ter admitido a eliminação do n.° 3 do artigo 73.° e da expressão "è à cultura" do n.° 1 do artigo 73.° na medida em que essa questão do direito à cultura e da criação e da fruição cultural é retomada mais adiante na proposta de revisão constitucional da FRS, a propósito do artigo 78.°

Portanto, eu estou de acordo com o desdobramento desta questão do direito à educação e da questão do direito à cultura e com a eliminação nesta sede do n.° 3 do artigo 73.°, que em nova redacção poderia ser retomado a propósito do artigo 78.°

E seria, portanto, útil que nós abordássemos, separadamente, aqui mesmo nesta discussão, em sede do plenário da Comissão, primeiro, todos os artigos referentes à questão da educação e do direito à educação e, posteriormente, à parte, os artigos referentes ao direito à cultura.

A propósito do artigo 78.°, que fala de preservação e valorização do património cultural, poderíamos, então, abordar também a questão do direito à criação e à fruição cultural.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, à discussão da subcomissão, cujo relato dá uma ideia justa daquilo que foi essa discussão e das conclusões, nós queríamos adiantar as seguintes considerações:

Em primeiro lugar, não nos parece, de facto, que as propostas da AD signifiquem enriquecimento da Constituição nesta matéria, pelo contrário. Em geral, significam um empobrecimento, em relação ao qual mantemos o nosso desacordo, e, portanto, propostas em que ele se manifesta não as apoiamos, antes nos opomos.

Consideramos, no entanto, não susceptível de oposição da nossa parte a ideia de separar um direito à educação de um direito à cultura. Portanto, susceptível de colher o nosso apoio em termos aproximados daqueles que são propostos.

Quanto à proposta da FRS relativa à parte final do n.° 2, nós estaríamos dispostos a não nos opormos à substituição pela expressão "progresso social" da pane final desse número, no que se refere a progresso de sociedade socialista, mas entendemos útil manter uma referência expressa aos valores democráticos, se a proposta da FRS mantivesse uma referência expressa depois do "desenvolvimento da personalidade" ao aprofundamento dos valores democráticos ou uma fórmula qualquer que não abandonasse a referência aos valores democráticos como componente da democratização da educação. É, portanto, uma sugestão que nos atrevemos a fazer para transformarmos a nossa não aprovação numa, pelo menos, não oposição.

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O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - O artigo 74.° é objecto de alterações por parte da AD, do PCP e do MDP/CDE.

A AD propõe no n.° 2 a substituição da expressão (ta sua função conservadora da divisão social do trabalho" por "discriminações económicas, sociais e culturais".

No n.º 3 propõe introduzir uma alínea, com o seguinte teor:

Estabelecer uma rede pública escolar que cubra as necessidades de todo o País, em articulação com as escolas privadas e cooperativas.

Substituir na actual alínea d) o vocábulo "capacidade" por "aptidão" e a expressão "aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica e da criação artística" por "diferentes graus de ensino". Na alínea f), substituir a expressão "actividades produtivas e sociais" por actividades económicas e sociais". Na alínea g), eliminar a expressão "originários das classes trabalhadoras" e introduzir outra alínea, com o seguinte teor "Assegurar aos filhos dos emigrantes o ensino da língua portuguesa", que seria a alínea í).

Propõe-se ainda introduzir um n.° 4, visando assegurar a participação de várias instituições na definição da política do ensino, designadamente as associações de pais, as associações de professores e as associações de estudantes.

O PCP propõe uma nova redacção para o n.° 1, nos termos seguintes:

Todos têm direito ao ensino e à igualdade de oportunidades na formação escolar.

Do relatório consta uma nota que refere o seguinte: as diferenças no pormenor da redacção relativamente ao texto publicado resultaram da indicação dos representantes do PCP nesse sentido.

O MDP/CDE propõe, relativamente ao n.° 3, na alínea a), a substituição da expressão "segundo as suas capacidades" por "sem discriminações de carácter social" e ainda o aditamento de duas novas alíneas: a alínea f)-A), com o seguinte teor:

Criar condições e promover o ensino da língua portuguesa no estrangeiro, privilegiando os países que usam o português como língua oficial.

E uma outra alínea, a alínea f)-B), com o seguinte teor:

Garantir o ensino de português a filhos de emigrantes no estrangeiro.

Do debate efectuado na subcomissão resultaram as seguintes posições: quanto ao actual n.° 1, verificou-se consenso favorável à nova redacção proposta pelo PCP.

Quanto ao actual n.° 2, a FRS e o MDP/CDE consideraram a proposta da AD redundante em relação ao já disposto no n.° 1, mas mostraram-se abertos à possibilidade de revisão da actual redacção. O PCP opõe-se à proposta da AD, só se pronunciando na devida altura sobre possíveis propostas alternativas.

Quanto ao n.° 3, relativamente às propostas da AD: a FRS não aceita a nova alínea a), considera as alterações à alínea d) como uma questão de sistematização e de redacção a discutir oportunamente; aceita a modificação proposta para a alínea f), declarando que só posteriormente se pronunciará quanto às alterações à alínea g); aceita a introdução da alínea O, com redacção a fixar oportunamente e que deverá ter em conta a proposta do MDP/CDE [alínea f)-B)] e a proposta da FRS quanto à segunda parte de uma alínea e) para o artigo 74.°, concordando, porém, em dever fixar-se aqui a sua localização. O PCP opõe-se a todas as propostas, salvo a relativa à alínea i) que aceita.

Relativamente às propostas do MDP/CDE, verificou-se consenso quanto ao conteúdo da alínea f)-A), restando averiguar em ulterior oportunidade sobre a sua melhor localização. Houve também acordo quanto à proposta de acrescento de uma alínea de teor equivalente ao da f)-B).

Quanto ao n.° 4 (cuja introdução é proposta pela AD): A FRS manifestou preferência pela sua própria proposta nesta matéria, contida no artigo 77.º, n.° 2, e defendeu a sua autonomização em preceito próprio. A AD manteve a proposta, enquanto o PCP e o MDP/CDE manifestaram a sua preferência pela citada iniciativa da FRS, opondo-se à da AD.

Não há nenhum senhor deputado que pretenda intervir sobre esta matéria?

Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Nós estamos em condições de anunciar qualquer alteração de posição em relação àquelas que tomámos na subcomissão e que são enunciadas no relatório.

Em relação às propostas da AD, cuja discordância é generalizada da nossa parte, salvo a alínea i), é óbvio que consideramos umas mais graves do que outras.

A mais grave é, sem dúvida, a proposta de aditamento de uma nova alínea à), sobre o estabelecimento de uma rede pública escolar que cubra as necessidades de todo o País, em articulação com as escolas privadas e cooperativas, que deve ser articulada com a eliminação proposta pela AD para o artigo 75.°, na redacção actual da Constituição, segundo o qual "o Estado criará uma rede de estabelecimentos oficiais de ensino que cubra as necessidades de toda a população". Esta alteração é significativa. Deixaria de haver uma obrigação do Estado para cobrir o País com escolas públicas, em termos de satisfazer todas as necessidades da população. Nós entendemos que um direito de todos os cidadãos deve ser o da possibilidade de acesso à escola pública e, portanto, estamos em desacordo fundamental com esta proposta da AD.

Mantemos a nossa discordância em relação às outras, mas este é um aspecto para cuja importância não queremos deixar de chamar a atenção e de explicar as razões que nos levam, portanto, a manter, a reforçar, se é possível, a nossa oposição a tal proposta.

Cremos, por outro lado, que deve manter-se autonomizado um artigo sobre esse direito de acesso à escola, constante nos termos em que está no artigo 75.°, e isso bastaria para nos opormos à integração dessa matéria no artigo 74.°

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O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Veiga de Oliveira.

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, aproveitando o facto de nestas propostas de alteração ninguém aqui ter pretendido acrescentar ao "Estado", como, aliás, no artigo anterior fizeram, "regiões autónomas e autarquias", eu queria lembrar, além daquilo que já disse, que, de facto, quando está "o Estado" não faz sentido acrescentar "regiões autónomas", ou, então, temos a ideia de que o Estado é o Governo, que é aquilo que faria sentido. Se estivesse "o Governo", cãs regiões autónomas e as autarquias" faria algum sentido, agora o Estado... As regiões autónomas e as autarquias é um disparate, quanto a mim, estar sempre a referi-las. De maneira que parece que deveria ser corrigido este aspecto.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Carlos Lage, tem a palavra.

O Sr. Carlos Lage (PS): - Só uma pequena achega, Sr. Presidente.

No n.º 2 do artigo 74.° a AD pretende substituir a expressão "ca superar a sua função conservadora de divisão social do trabalho" por uma outra expressão, que é: "O Estado deve modificar o ensino, de modo a superar as discriminações económicas, sociais e culturais". Não cobre o conteúdo desta expressão constitucional

Mas também reconhecemos que a expressão constitucional é bastante rebarbativa e talvez não esteja bem formulada. Eu atrevia-me a dar uma sugestão. Talvez se pudesse exprimir uma expressão deste teor: "O Estado deve modificar o ensino, de modo a superar a sua função reprodutora de desigualdades sociais e culturais." Porque o objectivo do conteúdo desta expressão é reflectir a preocupação dominante de que a instituição do ensino reproduz de uma forma geral os níveis sociais e culturais donde as crianças são provenientes.

Está claro que não se pode de forma nenhuma resolver este problema por meios puramente constitucionais, mas lutar contra isso deve ser um objectivo da política seguida no nosso país.

De forma que essa expressão parece-me, à primeira vista, uma expressão mais adequada, mas reconheço que também não é uma expressão feliz.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Costa Andrade, tem a palavra.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Eu concordo. inteiramente com o que acaba de ser dito. Também me parece pouco feliz e não sei bem qual é o conteúdo da expressão "superar a função conservadora da divisão social do trabalho". Eu confesso que ele me explicarem o que é esta divisão social do trabalho, é o conceito de Durkheim de divisão social do trabalho, o que é que está aqui? Teremos que criar um sistema de ensino que nos faça a todos advogados de igual categoria; ou médicos de igual categoria, ou constitucionalistas de igual categoria, não sei bem o que está aqui em causa. Portanto, ainda bem que há consenso quanto à necessidade de alterarmos esta forma. Eu concordo inteiramente com o que o Sr. Deputado Carlos Lage acaba de dizer quanto à inadequação desta forma. Também me parece que há consenso quanto ao que se pretende. No fundo, é que o ensino não seja um instrumento de manutenção ou, até, de dinamização das desigualdades, mas, pelo contrário, elemento redutor das desigualdades. Uma fórmula como esta, do género da proposta da AD ou outra, deve ser procurada. Deixemos para a redacção a fórmula final. Pela nossa parte, fica o consenso quanto à necessidade - da FRS colhemos aplausos nesta matéria - de superar esta fórmula que eu compreendo, ou melhor, confesso que não sei bem o que é.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): -Sr. Presidente, é, ainda a respeito desta questão, também uma sugestão, na Unha do que vem sendo dito para o n.° 2 do antigo 74.° Eu suponho que o significado deste n.° 2 é o que lhe foi dado pelo deputado Carlos Lage há momentos. Julgo, no entanto, que, por ser assim, então seria melhor adoptar uma fórmula nesta linha. Mas eu não gosto, pessoalmente, o reprodutor e preferia uma fórmula deste género: "A política de ensino deve tender a superar todas as desigualdades económicas, saciais e culturais."

Seria uma fórmula positiva. Ou, então, deve tender a superar qualquer função conservadora das desigualdades económicas, sociais e culturais, Fica, então: "Uma política de ensino deve tender a superar qualquer função conservadora das desigualdades económicas, sociais e culturais."

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Portanto, o problema seria de tentar encontrar uma redacção, tendo presente o sentido das alterações.

Sr. Deputado Sousa Tavares, tem a palavra.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Por que é que não se põe como sujeito desta disposição o ensino, em vez de pôr o Estado? "(O ensino deve ser orientado de forma [...]" Talvez fosse mais claro. E o Estado dever orientar ou dever organizar o ensino, se pusermos como sujeito o ensino, tenho a impressão que simplifica muito o problema.

Pausa.

Uma vez que está tudo de acordo...

Eu também queria fazer uma anotação ao que disse há um bocadinho o Sr. Deputado Veiga de Oliveira, com quem estou cem por cento de acordo ou cento e trinta por cento de acordo.

Mas queria que essa observação não fosse ocasional. Tenho a impressão de que temos de a aplacar a todo o texto constitucional ou, então, quando se diz o Estado, as autarquias, as regiões autónomas, deveríamos dizer o Estado, através das autarquias, ou o Estado, através das regiões autónomas, porque a concepção de Estado - pelo menos para mim - abrange as regiões autónomas, abrange as autarquias. E dizendo-se o Estado diz-se tudo. A não ser que nós queiramos especificar uma determinada competência exercida através das autarquias ou exercida através das regiões autónomas. De outra maneira estamos, realmente, a carregar a Constituição de pleonasmos. Queria chamar a atenção da Comissão de Redacção para isso.

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O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Vamos passar ao artigo 75.°

Em relação a este artigo há uma proposta de eliminação do preceito por parte da Aliança Democrática que, no entanto, transpõe o conteúdo do n.° 1 para a primeira parte da alínea à) do artigo 74.° da sua proposta.

A FRS e o PCP manifestaram oposição em relação a esta eliminação. Algum senhor deputado pretende intervir?

Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, lido o .relatório da subcomissão, sem ter em conta a comparação entre o que está no artigo 75.° e aquilo que a AD propunha para a alínea à) do artigo 74.°, verifica-se, na verdade, que não há uma transposição de conteúdo. Há uma transposição da ideia, alterada. E é essa alteração que nos leva a não concordar, de modo algum, com a alteração. Não vou repetir aquilo que disse, mas, na verdade, nós não podemos concordar, antes temos de nos opor, a qualquer proposta que, por eliminação ou por alteração, vise, de algum modo, diminuir o direito de todos os cidadãos a terem acesso à escola pública e a obrigação do Estado de garantir esse direito.

Na medida em que a proposta AD põe em causa esse direito, nós não podemos deixar de nos opor a tal proposta de eliminação. E também não podemos concordar com o "desarme" do direito e da obrigação do Espado de fiscalizar o ensino que não seja essencialmente privado, Isto é, o ensino que, de algum modo, compita, que concorra, com o do Estado e, portanto, que seja vocacionado, também, para o ensino público.

São dois aspectos que constam do artigo 75.° e com cuja eliminação não podemos concordar. Não encaramos qualquer possibilidade de alternativas nesse campo.

Se me é permitida uma sugestão, o máximo até onde poderíamos ir era incluir esse artigo num eventual artigo que conglobasse todas as "regras respeitantes a um eventual direito de acesso à escola como complemento do direito do ensino. É uma sugestão que fica no ar, no caso de alguém desejar pegar nela.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Jorge Miranda, item a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, era apenas para, relativamente a este artigo, salientar que, a subsistir, de deverá ser tido em conjugação com o n.° 4 do artigo 43.° proposto pela FRS, se esse novo preceito vier, por sua vez, a ser aprovado. Por conseguinte, terá de haver uma leitura integrada dos dois preceitos, e não um separado do outro.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS):-Sr. Presidente, era exactamente para salientar que este artigo 75.° tem uma leitura - que em alguns casos foi considerada equívoca. Depois do novo preceito, proposto por nós, para o n.° 4 do artigo 43.°, essa leitura deixa de ser equívoca. É unívoca. Não corre os riscos que muitas vezes foram apontados, nomeadamente em guerras da Aliança Democrática, já que o seu alcance passa a ser bem determinado. Assim, nós não podemos, de maneira alguma, acertar a eliminação deste artigo, a qual, se viesse a acontecer, teria como consequência, desde logo, que o Estado não pudesse fiscalizar o ensino particular e, por outro lado, teria como consequência que a rede pública escolar seria diminuída na sua extensão e alcance. O acesso à escola pública, devido à articulação que se estabelece na proposta da AD, aio artigo 74.°, com as escolas particulares e cooperativas. Elas devem existir, mas não implica, no nosso ponto de vista, que o Estado não tenha a obrigação de proporcionar a todos o acesso à escola pública.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - O artigo 76.° é objecto de uma proposta de alteração por parte da AD e do MDP/CDE.

A AD propõe um texto novo, sob a epígrafe "Acesso aos graus mais elevados":

Compete ao Estado garantir o acesso de todos aos graus mais elevados do ensino, da investigação científica, da criação artística e da formação técnica, independentemente da capacidade económica ou social de cada um.

O MDP/CDE propõe uma nova redacção, do seguinte teor:

O acesso ao ensino superior, designadamente à universidade, deve ter em conta as necessidades do País em quadros qualificados e possibilitar e estimular a entrada dos trabalhadores e dos filhos das classes trabalhadoras.

No debate da subcomissão foram apresentadas as seguintes posições:

A FRS propôs uma posterior reponderação desta matéria, conjuntamente com a alínea e) do artigo 74.r e com a nova redacção proposta pela AD, nomeadamente com vista a averiguar-se melhor sobre a conveniência, ou não, de se manter um artigo específico sobre o acesso à universidade, ou ao ensino superior, ou aos graus de ensino mais elevado.

O PCP deixou reservada a sua posição, não excluindo a possibilidade de reavaliação da questão.

Sr. Deputado Jaime Gama, tem a palavra.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Embora, naturalmente, eu considere que a forma como está redigido este artigo 76.° tem que ser completamente repensada, gostaria de pôr algumas questões ao articulado que é proposto pela AD e que tem a ver com o seguinte: independentemente de toda a questão de saber o que é a garantia de acesso de todos os graus mais elevados da criação artística e mesmo da investigação científica, eu gostaria de perguntar, para me esclarecer, se o objectivo deste dispositivo constitucional é inconstitucionalizar o numerus clausus?

Risos.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sousa Tavares.

O Sr. Sousa Tavares (PSD): - Eu, além da dúvida - perfeitamente pertinente - do deputado Jaime Gama, gostaria que me explicassem o que é "com-

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petir ao Estado garantir o acesso aos graus mais elevados da criação artística"? Isto é, realmente, faz-me uma confusão, ou seja, que seja estabelecido constitucionalmente. O Estado vai fabricar poetas, escultores, etc.?

Risos.

Acho, de facto, o acesso, não sei, o acesso ao disparate...

Risos.

Criação artística! Não é de eliminar esta expressão? Eu acho que sim.

Vozes não perceptíveis.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Vital Moreira, tem a palavra.

O Sr. Vital Moreira (PCP): - Sr. Presidente, de facto, como diz o relatório da subcomissão, nós deixámos reservada s nossa posição e algumas das coisas que nós gostaríamos de dizer, depois de considerada a questão, estão ditas. Algumas das coisas caricaturizadas pelo Sr. Deputado Sousa Tavares provam como algumas propostas da AD tiveram como efeito substituir uma disposição que tem sentido - o actual artigo 76.°- por uma disposição puramente semântica e, digamos, sem qualquer sentido, a não ser que se visasse constituir alguma coisa como um serviço público de criação artística, um serviço nacional artístico.

Em todo o caso, nós não estamos de acordo com a proposta AD nem estamos de acordo com a eliminação do actual artigo 76.° na parte em que ele aponta para uma discriminação positiva no acesso à universidade.

Para além da questão levantada pelo deputado Jaime Gama, que é a questão do numerus clausus universitário, o que nós entendemos é que um dos efeitos úteis contidos no artigo 76.° da Constituição é uma discriminação positiva a favor de certas camadas no acesso à universidade. E este é um aspecto de que não estamos dispostos a abdicar, que deve ser mantido no texto constitucional e que também não consta do projecto de alteração da AD. Esta é a segunda razão que nos leva a opor à proposta de substituição da AD.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Costa Andrade, tem a palavra.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Da nossa parte é evidente que pomos também algumas reservas, a formular no sentido das formas na redacção. O que está aqui em causa é a incumbência ou a obrigação para o Estado de criar as condições necessárias para que as pessoas que são naturalmente poetas e artistas tenham possibilidades materiais de desenvolver os seus dotes.

Risos.

Não é, obviamente, fazer poetas e artistas, mas que eles tenham as suas escolas e os meios para realizarem a sua vocação artística.

De todo o modo, reconheço que a formulação não é feliz e, portanto, na altura da redacção, veremos isso melhor e é para aí que nós remetemos o problema.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nunes de Almeida.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Sr. Presidente, está quase tudo dito e eu só queria referir dois pontos que me parecem importantes, um dos quais é que a referência ao acesso a todos os graus, aos graus mais elevados do ensino, é mais correcto do que falar-se em acesso à universidade.

O segundo ponto é que parece, de facto, que não se pode eliminar a referência, que hoje está no artigo 76.°, de que esse acesso deve ter em conta as necessidades do País em quadros qualificados, nomeadamente por razões e preocupações que já aqui foram expressas e referidas.

Em terceiro lugar, deveria ser reformulado o texto e a fórmula que vem no artigo 76.°: Estou de acordo. Devemos, no entanto, ter em conta que em alguns aspectos a parte final deste artigo, com uma redacção que não é das mais felizes, com certeza, tem, todavia, alguns efeitos práticos. Assim como foi a referência à necessidade de se dever ter em conta as necessidades do País em quadros qualificados, por exemplo, que tornou constitucional e possível o numerus clausus, foi também a referência final ao estímulo e ao fornecimento de entrada dos trabalhadores na universidade que permitiu a criação de uma quota especial para trabalhadores-estudantes no numerus clausus. Parece-me que qualquer destes dois pontos deve ser tido em conta quando se encontrar uma redacção finai.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Artigo 77.º

Vozes imperceptíveis.

Risos.

A FRS apresenta uma proposta de alteração ao artigo 77.º

Propõe, por um lado, a supressão, nesta sede do preceito actual, por o considerar excluído dos "direitos", remetendo-o para o artigo 81.°, alínea b), aí o abrangendo nos deveres do Estado.

Em substituição, propõe um novo preceito, subordinado à epígrafe "Participação democrática no ensino", do seguinte teor:

1 - Os professores e alunos têm o direito de participar na gestão democrática das escolas, nos termos da lei.

2 - A lei regula as formas de participação das associações de professores, de alunos e de pais na definição da política do ensino.

Do debate na subcomissão decorreram as posições seguintes:

O PCP, no tocante à supressão do texto actual, abordou a possibilidade (técnica) de se encarar a reconstrução do texto actual sob a ideia de uma liberdade de investigação, mas não exclui as hipóteses da eliminação.

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Em relação ao novo preceito, a AD e o PCP mostraram abertura em relação ao n.° 1.

(O n.° 2 havia sido objecto de análise, no âmbito da discussão do n.° 4 do artigo 74.° do projecto da AD.)

Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS):-Sr. Presidente, quanto ao actual artigo 77.°, na subcomissão, mais adiante já o posso referir, foi aceite a inclusão no artigo 81.° de uma nova alínea, a alínea p), onde é recebido e acolhido o conteúdo deste artigo 77.º Portanto, suponho que é uma questão que está relativamente resolvida.

Suponho que, também quanto à hipótese suscitada pelo PCP na subcomissão, foi também já verificado que essa matéria quanto à liberdade de investigação está já coberta num outro artigo e, portanto, penso que o PCP já não punha qualquer reserva quanto a este assunto.

Quanto ao artigo 77.°, a única divergência que subsiste é no seu n.° 2: saber se as instituições de ensino particular e cooperativo devem ou não figurar ao lado das associações de professores, de alunos e de pais na definição da política de ensino.

Se deve haver uma referência expressa ou não, suponho que é a única divergência que ainda subsiste.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Jorge Miranda, tem a palavra.

O Sr. Jorge Miranda (ASDI): - Sr. Presidente, eu vou fazer uma intervenção suscitada pela intervenção de há pouco do deputado António Reis acerca do artigo 73.° e por uma observação que há momentos, em conversa particular, tivemos acerca da eliminação do artigo 77.°

Na intervenção que fez atrás, o deputado António Reis, concordando com a proposta de alteração da FRS, entendia que a educação e cultura deviam ser tratadas em artigos distintos, ao contrário do que hoje acontece no projecto da FRS.

Por outro lado, a respeito da eliminação do artigo 77.°, sobre investigação e criação científica, e a sua passagem para o artigo 81.°, a respeito de incumbências prioritárias do Estado, o deputado António Reis fez uma observação que suponho extremamente pertinente e que ainda não me tinha ocorrido e que não queria deixar de transmitir, até porque, de certa maneira, fui eu o indirectamente responsável por esta alteração no artigo 77.°

O que diz o deputado António Reis, com toda a razão, é que corresponderia a uma degradação da ciência, se nós a considerássemos apenas na perspectiva da organização económica e social. Ela está para além disso e está num plano superior ao da economia e da organização social, embora não passe sem estas, dissociada.

A dificuldade que me surgia e que surgiu a todos nós até agora é configurar uma referência à educação neste capítulo, uma vez que é difícil afirmar aí um direito que não fosse o direito dos cientistas à protecção por parte do Estado, o que parece que não deveria ter cabimento aqui. Mas, talvez haja outra solução, que seria manter o artigo 73,°, porque educação, cultura e também ciência são realidades indissociáveis, manter, dizia, o artigo 73.° actual,

com uma ou outra alteração no género das que foram preconizadas pela FRS, e, eventualmente, acrescentar-lhe um novo número, em que se fizesse referência à política de investigação científica e tecnológica.

Assim, o artigo 73.°, em vez de se referir apenas à educação e à cultura, referir-se-ia à educação, cultura e ciência, teria os números que se considerassem pertinentes e teria ainda um número respeitante à criação e investigação científica. Parece que seria mais adequado tratar a educação, cultura e ciência no artigo inicial de todo este capítulo sobre direitos culturais do que tratar apenas a respeito da organização económica. E, por outro lado, assim se evitaria a dificuldade de configurar a política de ciência, independentemente de um direito fundamental, dificuldade essa que provocou a necessidade de uma transferência para incumbências do Estado no artigo 81.°

Suponho não ter atraiçoado o pensamento do deputado António Reis e, por outro lado, ter, de certa maneira, justificado a minha discordância em relação à posição dele de separação do artigo 73.° em 2 artigos.

O artigo 73.°, em vez de ser desdobrado, deveria, em minha opinião, ser ampliado, de maneira e tratar conjuntamente educação, cultura e ciência, porque, em minha opinião, essas realidades não podem ser separadas, não há educação distinta da ciência, assim como não pode haver cultura e ciência à margem da educação.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado António Reis, tem a palavra.

O Sr. António Reis (PS): - Relativamente às palavras que o Sr. Deputado Jorge Miranda acaba de pronunciar, eu congratulo-me por verificar que a minha observação foi acolhida por ele. Simplesmente, continua a ter as minha dúvidas quanto à localização correcta deste artigo sobre criação e investigação científicas. Porque se estas não podem ser reduzidas à ordem do "ter" e devem situar-se na ordem do "ser", integradas na actividade superior do espírito humano, elas deverão ter uma dignidade constitucional semelhante ou equiparada à que tem o direito à cultura, à fruição e à criação artísticas, etc.. Neste sentido, eu inclinar-me-ia para a autonomização de um artigo sobre a criação e investigação científicas, sem prejuízo do artigo 73.°, que, realmente, é uma espécie de introdução geral a todo este tipo de direitos e de deveres dos cidadãos e do Estado, e que tivesse uma redacção em que figurassem estas finalidades de ordem cultural e científica.

Nesse sentido, e ao contrário do que eu há pouco referi, embora continue a defender a eliminação do n.° 3 do artigo 73.°, poder-se-ia, em relação ao n.° 2, aproveitar a forma actual sobre a democratização e sobre as finalidades da educação, para se dizer qualquer coisa como apara que a educação contribua para o desenvolvimento da personalidade e para o progresso social, cultural e científico". Neste sentido podíamos, em sede do artigo 73.°, acolher o "meio-educação" e as finalidades globais da educação que têm a ver com o desenvolvimento cultural e científico e, depois, especificar o artigo 73.° uma série de artigos dedicados exclusivamente à educação, que se lhe seguem, noutro exclusivamente dedicado à cultura e noutro exclusivamente dedicado à investigação

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e criação científicas. Isto teria uma certa lógica e seria um esquema que decorreria, normalmente, dessa redacção mais genérica do artigo 73.°

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Nunes de Almeida, tem a palavra.

O Sr. Nunes de Almeida (PS): - Eu queria apenas chamar a atenção que a investigação científica não está apenas referida no artigo 77.° e que existe um artigo 42.°, em matéria de direitos, liberdades e garantias, e por isso, na parte mais nobre dos direitos fundamentais, em cujo n.° 1 se diz que "é livre a criação intelectual, artística e científica" e, no n.° 2, se especifica que "esta Uberdade compreende o direito à intelectual, artística e científica" e, no n.° 2, se especifica que "esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica [...]". Por isso, não é inteiramente exacto dizer que se remeteu integralmente toda a matéria de investigação científica para a organização económica. A realidade é que o que é remetido para este é, pura e simplesmente, aquilo que tem que ver com o apoio do Estado, a intervenção do Estado, etc.

Aquilo que e a parte mais nobre da investigação científica está na parte mais nobre da Constituição, a dos direitos fundamentais, que é em "Direitos, liberdades e garantias".

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Santana Lopes, tem a palavra.

O Sr. Santana Lopes (PSD): - Só para dizer rapidamente que, embora seja pertinente a recordação do Sr. Deputado Nunes de Almeida, de qualquer modo não deixa de ter razão o Sr. Deputado António Reis. De maneira nenhuma esta matéria deve ser tratada

na parte da organização económica. Foi um lapso da nossa parte, aqui na subcomissão, e que, pessoalmente, acho que deve ser corrigido. De modo nenhum mesmo, enquanto incumbência do Estado, se ficasse (também não deve ficar) em tarefa fundamental do Estado, ou no artigo 9.° - que também seria exagerado -, mas, de qualquer maneira, nunca na parte da organização económica, já se constituiria uma visão extremamente reducionista. Acho, assim, que não deixa de ser pertinente o reparo.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Sr. Deputado Jaime Gama, tem a palavra.

O Sr. Jaime Gama (PS): - Era também para apoiar as observações que fez o meu colega António Reis. A referência, em sede de direitos fundamentais, à investigação científica é importante, no mesmo plano de igualdade em que ela é feita em relação à cultura e creio que também à educação. Parece-me que não é sistematização correcta a insersão do problema da criação e da investigação científica em sede de incumbências económicas do Estado e que a inserção correcta deste artigo no texto constitucional deveria ser a seguir ao actual artigo 73.°, e seguir ao ensino e à universidade, embora decorra de uma lógica tradicional de tratamento destes problemas, que não e a mais adequada.

A investigação científica e a cultura são a verdadeira realidade que funda o próprio ensino e o precede, pelo que no texto constitucional essa ordem deve ser respeitada.

O Sr. Presidente [Fernando Condesso (PSD)]: - Bom, parece que são 7 horas e, portanto, daria esta reunião por terminada e reiniciaríamos os nossos trabalhos amanhã, às IO horas, com o debate das propostas de alteração ao artigo 78.°

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