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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

logo que lhe votem o orçamento, ou a lei de meios, encerrar o parlamento, visto que o não póde adiar nem dissolver.

Quanto á reserva ha de servir não para defender o paiz (apoiados), mas para sustentar o governo contra a vontade da nação n'essa doce tranquillidade em que até agora tem vivido (muitos apoiados); tendo deixado de tomar as providencias com que devia ter antecipado os acontecimentos, mas, alem d'isso, faltando tambem aos compromissos solemnes que o sr. presidente do conselho nos trouxe aqui no seu primeiro relatorio sobre o estado da fazenda publica, de equilibrar a receita com a despeza, e não me refiro a outros compromissos, porque que pelo que diz respeito ao saldo positivo, eu nunca o tomei a serio (riso).

Mas, sr. presidente, eu entendo que a opposição cumpre o seu dever para com o paiz, quando salva a sua responsabilidade em todos estes desacertos; e posto que seja indifferentes ao governo approvar ou não approvar a minha moção, eu tenho por ella a sympathia que não posso deixar de ter por uma concepção do meu espirito, que pôde obter o pleno assentimento dos meus illustres collegas que se sentam d'este lado da camara.

E digo que é indifferentes para o governo approvar ou rejeitar, porque o sr. ministro do reino, para que não faltasse nada entre o sublime e o ridiculo, entre as questões temerosas e o burlesco d'ellas, quando deu o seu apoio para admittir a minha proposta á discussão, declarou em presença de toda a gente: «Eu não sei de que se trata, mas approvo».

Ora, desde que os ministros da corôa estão resolvidos a tratar sempre de um modo faceto e ridiculo as questões mais serias que a opposição traz aqui, quando são elles os proprios que desacreditam o governo do meu paiz, é-me licito declarar á camara que a minha opposição ha de ser tenaz, ha de ser vigorosa e ha de ser repetida todos os dias (muitos apoiados); e que embora me possam accusar de querer embaraçar o governo nos seus actos governativos, eu hei de fazer todo o possivel para o impossibilitar de continuar a estar n'aquelles logares (muitos apoiados).

Póde o governo desauctorisar se como quizer; póde mesmo o governo julgar que já é indifferente approvar ou rejeitar uma moção, na qual uma parte da camara diz que confia no patriotismo do povo portuguez, e que espera que elle seja igual ás difficuldades da crise que se annuncia; mas eu pela minha parte é que não estou resolvido a deixar passar sem a censura merecida um procedimento, que póde ser digno dos homens que não têem em grande consideração a sua responsabilidade, mas que não póde ser admittido nos membros do parlamento ou nos conselheiros responsaveis da corôa (muitos apoiados).

Ouvi dizer (e não sei se será essa uma objecção contra a minha proposta), que o ter eu estabelecido n'ella a clausula «sem interrupção», constitue o meu grande crime.

Ora, eu já declarei á camara que na minha moção não está, nem implicita nem explicita, a idéa de preterir nenhuma questão de importancia igual á da resolução da questão de fazenda. Mas quando ella lá estivesse, o poder da camara para regular os seus trabalhos continua a ser o mesmo que é agora, dando o seu assentimento á proposta que se discute.

Pois se de repente uma circumstancia extraordinaria se apresentasse, a camara, a opposição mesma, seria tão insensata, que dissesse: «Não, senhor, vamos a discutir as questões de fazenda sem interrupção?» Se houvesse, por exemplo, uma sublevação interna, uma invasão estrangeira, ou outro qualquer assumpto de summa gravidade a resolver, por exemplo, a organisação da força publica, porque todos estes assumptos são complexos, ligam-se e estão comprehendidos na minha moção, a opposição seria tão insensata, que objectasse a que as propostas de fazenda fossem intercaladas com essas reformas importantes?

Creio que esta objecção não póde ser seria; mas se o é, eu peço aos illustres deputados d'aquelle lado da camara (o direito), e que principalmente rejeitaram a discussão, que vejam bem que na minha moção estão comprehendidas as questões de fazenda e reformas. Não me escapou a prevenção d'esse pretexto, que antecipadamente cortei para lhes não deixar uma sombra de véu sequer onde possam esconder a sua intolerancia obstinada.

Os illustres deputados julgam que eu não pensei, não meditei bem a moção que mandei para a mesa? Meditei, sim, senhores. Podem rejeita-la, mas o paiz ha de julgar os illustres deputados (apoiados). Porque é necessario que se saiba que já aqui houve n'esta casa maiorias muito maiores do que aquella que actualmente existe, e que essas maiorias tiveram de caír diante da opinião publica (apoiados).

Esta doutrina não é só minha, é a doutrina do gabinete actual, dos seus collegas e consocios; porque o sr. Mártens Ferrão fallando n'esta casa contra um ministerio que era presidido pelo sr. duque de Loulé, dizia o seguinte:

«As situações, sr. presidente, não vivem de votos, vivem da opinião; quando ellas a não representam, ha uma triste illusão, que, cedo ou tarde, se faz sentir.

«É pela opinião que vivem, quando ella as abandona perecem a despeito mesmo dos votos.

«É pela opinião que as situações vivem; quando ella as abandona, devem retirar-se, e não querer prolongar uma existencia agonisante; porque a agonia de um governo é a agonia do paiz.»

E effectivamente é assim. Posso dispensar-me do continuar a leitura. Estas são as doutrinas mais liberaes.

O sr. Mártens Ferrão, depois de ter declarado que não via senão o governo pessoal e absoluto conforme o sr. Stuart Mill o define, trazia para aqui todos os desastres que tinham caído sobre o paiz em consequencia d'esses abusos, que não podem existir se não se deixarem illaquear por partidos facciosos e pelos partidos reaccionarios as monarchias constitucionaes.

Então o sr. Mártens Ferrão dizia que era muito mais liberal do que nós.

Então accusava-nos de absolutistas, com a justiça com que nos accusa agora de convencionaes.

É que ainda n'essa epocha não tinha adoptado aquelle celebre principio applicado pelo sr. marquez d'Avila aos conferentes do casino, de que cada um póde pensar o que quizer comtanto que se contente com isso. Com a condição de não dizer o que pensa.

Eu estou resolvido a dizer tudo.

Não regateio ao governo os meios de defender o paiz e de manter a ordem no momento em que as instituições liberaes ou a nossa independencia estiverem em perigo.

Eu dou ponto de reunião a quem quizer saber se cumpro a minha palavra, no sitio mais perigoso onde esta questão se decida por meio das armas. Emquanto estiver aqui tenho obrigação de fazer todo o possivel para que esse mal se afaste de nós, e para que essa crise se conjure.

Eu entendo a monarchia constitucional, mas a monarchia constitucional fundada nas instituições e nas reformas que o paiz reclama, e que a corôa nos disse que eram indispensaveis em harmonia com o espirito do seculo. Entendo que essas instituições e reformas, algumas das quaes o governo já apresentou, precisam ser immediatamente trazidas á tela da discussão. E isto é tanto mais preciso quanto ellas hão de ser o pasto do espirito publico; satisfação ás impaciencias que supportaram, e que se não se occuparem n'estes assumptos de grande interesse, podem desviar-se para outros assumptos, para tratar de providencias que talvez o governo com a força militar, com peças de artilheria e armas raiadas, não possa obstar que se debatam.

Era uma verdade o que dizia o sr. Mártens Ferrão. Não bastam os votos. Os exemplos foram muito bem trazidos. Eram exemplos da historia, hoje mais completos.

A immoralidade da corte de Luiz XV levou ao cadafalso Luiz XVI.