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O Sr. Passos Pimentel: — Sr. Presidente, cabe-me a honra de encetar a discussão de um Projecto que a Nação esperava com tanto alvoroço, e que a todos nos satisfaz vêr em discussão; e o Projecto das Estradas. Mas, Sr. Presidente, satisfará elle a expectativa? Será este Projecto que nós vamos discutir, aquelle que nos dará Estradas? Parece-me que não! Muito sinto dize-lo. Conheço quanto é possivel comprehender o que enriquecem ou interessam a uma Nação as Estradas: mas, Sr. Presidente, eu sou daquelles que tem a desgraça de conhecer que quem corre, cança. Vi o Projecto, e neste meu pequeno golpe de vista considerei-o como monstruoso, e infeliz fui eu, quando descobri que elle abrangia em si tanta cousa, e de tal monta, que seria submergido debaixo do seu peso. Eu digo, Sr. Presidente, que o Projecto é monstruoso, porque tracta d'Estradas directas e transversaes, caminhos de districtos, ruraes e visinhaes, e porque manda pôr tudo em acção ao mesmo tempo! Este Projecto, Sr. Presidente, augmenta as contribuições de 20 por cento addicionaes sobre as contribuições directas; esta contribuição calculada no seu maximo, e votada a contribuição por 10 annos segundo elle propõe, teremos um resultado de 200 a 240 contos por anno. Perguntarei eu, será sufficiente esta somma só para costear as differentes Repartições que o Projecto marca? Parece-me que não. Sr. Presidente, cria-se uma Junta Central, uma outra em cada Districto, o que perfaz 18; marca-se um Engenheiro para cada um delles como Delegado do Inspector Geral, e uma Delegação em cada um dos Concelhos, e estabelece-se, como diz o art. 14, um pessoal indefinido para cada uma destas Juntas; manda-se que as suas qualificações e ordenados, em opposição com a Carta Constitucional, sejam estabelecidos pelo Governo com a especial circumstancia de elles serem pagos pelos Cofres Centraes, isto é, pelos 20 por cento. Ora, Sr. Presidente, havendo no Continente do Reino 17 Districtos, e dando-se para cada um delles um Engenheiro, e mais outro para a Junta Central, e tendo estes Empregados uns por outros l$000 réis por dia, ahi teremos uma somma por semana de 108$000 réis, é por anno de 5.184$000 réis, e note-se bem que isto é só verba — Engenheiros. Accrescente-se agora o material daquellas Repartições e outras despezas, e perguntarei que dinheiro ficará para as Estradas, de caminhos directos e indirectos, transversaes e visinhaes? Ninguem dirá que a somma proposta será bastante. Sr. Presidente, parece-me que o Projecto não só pecca na injustiça, mas tambem na inconstitucionalidade. A Carta Constitucional marca as prerogativas do Poder Legislativo em relação ás suas funcções da derrama das contribuições directas, porque diz no seu art. 15 (Leu).

Mas, Sr. Presidente, o Projecto propõe que esta Camara vote um tributo por 10 annos. Pois esta Camara que não é Constituinte, com que poderes ha de lançar este tributo? Com que poderes havemos de prender as mãos ás Camaras futuras? Isto, Sr. Presidente, é um salto que não se póde vencer, e demais estas contribuições são essencialmente desiguaes, porque vão affectar unicamente os Proprietarios, e por isso dá-se uma desigualdade na repartição deste tributo, que importa graves injustiças. A primeira pesa sobre os Proprietarios, que já estão muito subcarregados e tem soffrido uma perda de sua fortuna de 60 por cento nestes ultimos annos. A segunda injustiça pesa especificamente sobre os Proprietarios urbanos. Sr. Presidente, os Proprietarios urbanos já soffrem o imposto nas suas Propriedades de 3 e 4 por cento; e que dirão estes Proprietarios, se nós formos lançar mais um imposto da natureza daquelles que acabo de impugnar? Em resumo o que me parece, é que o Projecto não dá Estradas, mas apenas nos dará 500 a 600 homens Empregados em projecto de caminhos! Desgraçadamente é o que eu vejo.

Não fallarei agora da nomeação das Juntas Centraes, compostas do Presidente da Camara, e mais dois Proprietarios do Concelho sem missão; é certo que a centralisação dos caminhos em que o Projecto se basea, anniquilla o poder das Camaras Municipaes, e faz augmentar as attribuições das Juntas Centraes, e vai de alguma maneira acabar com todas essas obras maiores ou menores, que as Camaras Municipaes podiam fazer com os seus proprios recursos.

Que direi eu agora, Sr. Presidente, do § 5.º que falla das expropriações? Esta materia, Sr. Presidente, é grave, e summamente grave, porque é constitucional, e a Carta a respeito das expropriações diz:

«É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o Bem Publico, legalmente verificado, exigir o uso, e emprego da Propriedade do Cidadão, será elle previamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.»

A Carta Sr. Presidente, nesta parte não admitte interpretação; é clara e terminante; como V. Ex.ª acabou de ouvir, diz ella que o Proprietario deverá ser indemnisado previamente da expropriação de sua Fazenda, se o interesse publico assim o exigir; mas estabelecendo o Projecto que as expropriações sejam primeiro que a indemnisação, claro está que a doutrina do Projecto vai d'encontro á Carta, e dará um sem numero de questões nos Tribunaes.

Outra inconstitucionalidade, Sr. Presidente, e não é mais pequena, vem a ser das Commissões Particulares que o Projecto manda crear, ou que propõe se criem para decidir das Causas das expropriações, mas esta materia é tambem inconstitucional, como eu vou mostrar. No § 11.º do art. 145 da Carta, diz-se: — «Será mantida a independencia do Poder Judicial. Nenhuma Auctoridade poderá avocar causas pendentes, susta-las, ou fazer reviver os processos findos.» E no § 16 do mesmo artigo diz: — «A excepção das causas, que por sua natureza pertencem a Juizes Particulares, na conformidade das Leis, não haverá foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas civeis ou crimes.» Ora o Projecto propõe crear Commissões particulares para tractar das Causas das expropriações, quando verificada a sua necessidade, e toda a gente sabe que isto pertence ao Poder Judicial; e então de nada serve esta disposição, porque está fóra do nosso alcance a nomeação destas Commissões.

Algumas razões mais poderia eu accrescentar para fortificar a minha opinião contra outras cousas, que encerra o Projecto; porém seria demasiada ousadia em mim gastar mais tempo em privar os habeis Oradores, que se sentam nesta Casa, dotados d'outros conhecimentos que não tenho, para tractar uma questão em si tão grave, e de tanta importancia.

VOL. 2.º — FEVEREIRO — 1849.

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