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Já O anno passado veiu confessar ás Cortes que tinha infringido a Lei; agora confessa o mesmo, e com a mesma franquesa; no intervallo das Sessões violou a Carta, no despacho que fez de um Governador para o Ultramar, e está ainda debaixo do peso dessa responsabilidade. Desta maneira estabelece-se em regra normal para o Sr. Ministro da Marinha a infracção das Leis e da Constituição, e annuncia-o com uma franquesa que eu nem já sei qualificar; porém hesito entre o que deve maravilhar mais — se a sem-ceremonia com que o Governo confessa, de cabeça levantada, estes peccados conslitucionaes, se a impassibilidade com que o Parlamento os ouve!

Porém, a respeito do negocio em questão, não ha só um abuso, uma violação flagrante da Lei de §6 de agosto, mas uma barbaridade repugnante — Pela falta do Sr. Ministro se não ter habilitado com os necessários fundos para occorrer ao estabelecimento deMacáo, mandou para lá o dinheiro destinado para pagamento das soldadas dos pobres marinheiros por-tuguezes, que entretanto se deixam morrer de fome. Termino, Sr. Presidente, dizendo que vim a este campo com repugnância, e somente provocado com as explicações do nobre Ministro.

O Sr. Cunha Sotto- Maior:—Não pedi a palavra para defender o estado infeliz em que se acha a Marinha Portugueza ; se eu tal fizesse, defenderia a decadência e a ruina, mas a misericórdia de Deos ainda não retirou de sobre mim a sua mão para eu vir em publico dar um testimunho de tanto absurdo e demência. Não é sobre a progressiva decadência da Marinha que eu discorrerei; os seus desastres são notórios e sabidos; elles tem contristado o senti-mento da nação, e enxovalhado o seu brio e pundonor.

Basta fallar na íris, na Vasco da Gama, em Ma* cáo, no Brigue Mondego, para se assentar uma opinião muito desfavorável acerca de como correm as cousas da nossa Marinha.

Por occasião do desastre do Brigue Mondego, ouvi algumas allusões ao Inspector do Arsenal, que são injustas, quanto podem ser. A Política não é para mim um sentimento desabrido que suffoque todos os affectos. O Inspector do Arsenal é um empregado digno no sentimento mais lato da palavra (Apoiados) : é um Cavalheiro activo, probo, e intelligente em todos os assumptos da sua Repartição (Apoiados). Aquelle logar é muito invejado, e por isso este benemérito empregado é alvo de muita intriga.

Quer a Camará saber a sua situação durante os concertos do Brigue Mondego ? O Brigue esteve atracado á ponte do Arsenal uns poucos de mezes, O Sr. Lopes Lima alcançou do Governo poderes absolutos e discricionários, uma auctoridade dictatorial, sobre tudo e para tudo que dissesse respeito ao Brigue. Exigia sem resguardo nem commedimento tudoquan-to lhe vinha á fantezia. Dinheiro, operários, madeiras, petrechos, tudo era exigido pelo Sr. Lopes de Lima, com a arrogância de um Bachá de três caudas. Elle viu, analysou, inspeccionou, com os seus olhos, e com os olhos da gente que e He escolhera, o Brigue desde a quilha até ao convéz : viu o Brigue todos os dias, de alto abaixo, concertou-o, arranjou-o conforme quiz, sem admittir reflexões. O Governo queria a todo o custo vêr-se livre daquelle terrível e poderoso adversário, e para salvar a situação dos botes do tremendo Ferrabraz poz a Secretaria aos seus VOL. 3.°—MARÇO —1851.

pés. Faça o que quizcr o Sr. Lopes de Litna, comíàn* to que se vá embora — eis o raciocínio do Governo* Os mastros estiveram estirados no Arsenal dias sem conto á vista dos entendidos e não entendidos. O carpinteiro que fez a operação da verruma era da confiança do Sr. Lima. Sendo esta a situação, para que se chama á auctoria o Inspector do Arsenal ? Em que é elle culpado? Neste negocio ha dois grandes culpados, dois só: ó Governo culpado de direito, o Sr. Lopes de Lima culpado de facto. O Governo porque escolheu, o Sr. Lopes de Lima porque saiu n'um Brigue, que elle inspeccionou, e oão via que tinha a quilha podre! Não me tachem de menos generoso; em 1849 ou em 1850, ou em ambas as Sessões, o Sr. Lopes de Lima tractou também na ausência e com muito desfavor um benemérito Otficial da Marinha Portugueza, em comrnissâo nas agoas do Brasil. E de mais a mais, não me importa a presença ou ausência do indivíduo para emittir a minha opinião.
Triste, lamentável, e vergonhoso é o estado da nossa Marinha. A ella devemos já muita gloria. Pequenos na Europa, fomos conquistar por meio de prodígios a grandesa do espaço na África, na Ásia, e na America. Assoberbamos todos os mares com os nossos vasos, e levamos o pavilhão das Quinas a remotas regiões. Achamos um Mundo perdido, e descu-brimos um Mundo novo. Tributámos os Potentados do OrientCj e nas geografias da Pérsia lia-se — Portugal, Capital da Europa. O que nos resta de tudo isto ? Ruínas sem poesia, miséria sem compensação, e um futuro sem esperanças.
Eu espero que o Governo não deixe passar sem exame o desastre do Brigue Mondego. Não devemos mais demandar os portos do Brasil só para pedir esmolas, a fim de reparar a podridão dos nossos navios de guerra. O sinistro do Brigue aconteceu a 2 gráos do Sul da linha; o Brigue podia com o mastro arrotado chegar a salvamento ao Cabo da Boa Espe-raça, podia chegar á Bahia, não havia pois necessidade alguma de entrar no Rio de Janeiro. Esta entrada não e' uma arribada, é um acto livre e espontâneo, é/um facto que o nobre Ministro não deve deixar impune para bem da disciplina.
Não culpemos o actual Cavalheiro que dirige os Negócios da Marinha, de tudo quanto lamentamos: sejamos justos, um anno e um homem é muito pouco para tanto; nem ha tempo, nem acção. O mal vem de longe; concorreu para o mal um sem-nume-ro de causas, e contribuíram para essas causas a indolência, a incapacidade de muitos Governos, a incúria e perguiça de muitos Estadistas, a illustração progressiva dos outros povos, e o nosso proverbial atraso. O Sr. Falcão: — Não pedi a palavra para entrar nas diversas considerações que se toem feito, mas unicamente para responder a um illostre Deputado, que, alludindo á Commissão de Marinha, a respeito do Projecto de Reforma do Arsenal de Marinha, apresentado pelo Sr. Ministro competente^ disse — Que a Commiãsâo de Marinha havia concedido uma auctorisação, e que esta auctorisaçâo tinha tido por fim illudir a questão. — Pelo que me pertence, digo com toda a franqueza, que eu não tive parte no tal Projecto, que se chamou illudir a questão, e que de -todo o meu coração desejo as reformas nas Repartições, mas reformas bem pensadas, e que possam pró* duzir bom resultado.